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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 95

ANO DE 1951 II DE ABRIL

V LEGISLATURA

SESSÃO N.º 95 DA ASSEMBLEIA NACIONAL

EM 10 DE ABRIL.

Presidente: Exmo. Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior

Secretários: Exmos. Srs.Castão Carlos de Deus Figueira
Luís Filipe da Fonseca Morais Alçada

SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 14 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foram aprovados os n.ºs 93 e 94 do Diário das Sessões.
Deu-se conta do expediente.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Carlos Moreira, sobre problemas de interesse para o concelho de Mesão Frio; Salvador Teixeira, acerca da recente intervenção do Sr. Deputado Bustorff da Silva, sobre a orgânica dos CTT; Manuel Vaz, sobre o mesmo assunto; Cerveira Pinto, para um requerimento aos Ministério das Finanças e das Comunicações ainda sobre o mesmo assunto; Botelho Moniz, para enviar para a Mesa um requerimento sobre o comércio das carnes em Lisboa.

Ordem do dia. - Continuou a discussão, na generalidade, da proposta de lei sobre, a revisão constitucional.
Usaram da palavra o Srs. Deputados Alberto Cruz, Jacinto Ferreira, Duarte Silva, Ribeiro Cazaes e Galiano Tavares.
O Sr. Presidente declarou encerrada a sessão às 19 horas e 15 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 16 horas.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Adriano Duarte Silva.
Afonso Enrico Ribeiro Cazaes.
Alberto Cruz.
Alberto Henriques de Araújo.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alexandre Alberto de Sousa Finto.
Américo Cortês Pinto.
André Francisco Navarro.
António Abrantes Tavares.
António de Almeida.
António Augusto Esteves Mendes Correia.
António Bartolomeu Gromicho
António Carlos Borges.
António Cortês Lobão.
António Jacinto Ferreira.
António Joaquim Simões Crespo.
António Júdice Bustorff da Silva.
António Maria da Silva.
António de Matos Taquenho.
António Raul Galiano Tavares.
António dos Santos Carreto.
António Sobral Mendes de Magalhães Ramalho.
António de Sousa da Câmara.
Artur Proença Duarte.
Caetano Maria de Abreu Beirão.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Délio Nobre Santos.
Diogo Pacheco de Amorim.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco Eusébio Fernandes Prieto.
Gaspar Inácio Ferreira.

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Gastão Carlos de Deus Figueira.
Linhares de Lima.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Jaime Joaquim Pimenta Prezado.
Jerónimo Salvador Constantino Sócrates da Costa.
João Alpoim Borges do Canto.
João Ameal.
João Cerveira Pinto.
João Luís Angusto das Neves.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim de Oliveira Calem.
Joaquim de Pinho Brandão.
Joaquim dos Santos Quelhas Lima.
Jorge Botelho Moniz.
José Cardoso de Matos.
José Dias de Araújo Correia.
José Diogo de Mascarenhas Gaivão.
José Garcia Nunes Mexia.
José Luís da Silva Dias.
José Pinto Meneres.
Luís Filipe da Fonseca Morais Alçado.
Luís Maria Lopes da Fonseca.
Manuel Domingues Basto.
Manuel José Ribeiro Ferreira.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel de Magalhães Pessoa.
Manuel Maria Vaz.
Manuel de Sousa Meneses.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
D. Maria Baptista dos Santos Guardiola.
Mário Correia Telas de Araújo e Albuquerque.
Mário de Figueiredo.
Miguel Rodrigues Bastos.
Paulo Cancela de Abreu.
Pedro de Chaves Cymbron Borges ao Sousa.
Ricardo Vaz Monteiro.
Salvador Nunes Teixeira.
Sebastião Garcia Remires.
Tito Castelo Branco Arantes.
Vasco Lopes Alves.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 74 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 10 horas o 14 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Estão em reclamação os n.ºs 93 o 94 do Diário das Sessões.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se nenhum dos Srs. Deputados deseja fazer qualquer reclamação sobro os referidos números do Diário, considero-os aprovados.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Telegramas

Numerosos da província de Moçambique pedindo a suspensão das novas pautas aduaneiras, assinados pelas seguintes entidades:. Eduardo Dias Capela, Lda , A. Gonçalves, L.da Salvado Costa & C.a, Cooperativa de Criadores de Gado, António A. Mariano, Dionísio & Almeida, L.da, Manuel Vaz, Socomol, Marracuene Agrícola, Casa Florela, Companhia Portuguesa de Ferragens, Lda, Manso Almeida, Auto Sobresselente, Lda, Ronil Lda, John Orr & C.a, Serracor Mecânica, Lda Sapataria
Gentil Lopes & C.a, Catoja, Empresa Moderna, Salvado, Costa & Branco, Crutosilva, União Comercial. L.da, P. Santos Gil & C.ª e suas associadas, José Bento Simões, Papelaria Progresso, Magalhães & Pinheiro, Lda Universal Comercial, A. J. da Costa, L.da, gerência da firma Manuel Mendes, L.da, Pinto & Tavares, Magalhães & Sousa Dias, Jacques Sebo & C.a, Sociedade Colonial, das forças vivas de António Enes, Ferreira & Silva, Empresa Industrial de Tabacos Costa & Cordeiro, L.da, Sociedade Ultramarina, Lda, Manuel Frutuoso Agostinho, do comércio, industria e agricultura de Porto Amélia, Câmara do Comércio de Lourenço Marques, Associação do Fomento de Quelimane, Associação Comercial da cidade de Moçambique, Associação do Comércio e Indústria de Chinde, Associação Comercial de Gaza, Associação do Comércio o Indústria de Teta, Associação Comercial da colónia de Moçambique o Sociedade Importadora o Exportadora, L.da

O Sr. Presidente:- Tem a palavra antes da ordem do dia o Sr. Deputado Carlos Moreira.

O Sr. Carlos Moreira:- Sr. Presidente: algumas palavras prévias de justificação ao assunto que vou tratar. No quadro das instituições que o mundo antigo legou ao moderno a mais bela foi, no autorizadissimo dizer de Herculano, o município.
Não se ignora como foi notável entre nós a sua acção na consecução das liberdades populares e no desenvolvimento local.
É certo que o concelho de hoje não pode ser o que foi o município medieval; este tinha, a dupla função política e administrativa; no concelho de boje aquela primeira função quase desapareceu.
Não obstante a orientação demasiadamente centralista que as nossas leis administrativas em vigor, desavisadamente, em meu entender, têm imprimido à orgânica municipal, o concelho ou município é ainda, pelo menos na doutrina constitucional, a primeira autarquia, conforme pode deduzir-se do artigo 125.º da Constituição.
Pena é, repito, que aos municípios tenham continuado a cercear-se prerrogativas os elementos de vida, situação agravada ainda por imposições de serviços o despesas, nesse pendor da dependência, que vem já de longo e que, a continuar, os transformará definitiva e inevitavelmente em mais uns órgãos do Poder Contrai do que em autarquias livres, defensoras dos justos interesses locais, à feição do que foram quando constituíam essas pequenas repúblicas dentro de uma monarquia caracteristicamente popular e paternal, como foi apanágio das nossas tradicionais instituições políticas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Creio que, em certo sentido, ainda poderão vir a ter realização aquelas palavras de Herculano referentes à instituição municipal"é dela que esperamos a regeneração do nosso país, quando de todo se rasgar o véu, já tão raro, das ilusões deste século".
Ultrapassado o meio do século em que vivemos, século que se seguiu ao das ilusões a, que se refere Herculano, a profecia do grande historiador ainda se não cumpriu inteiramente. 0 véu raro, esse está já mais que defeito; pulverizou-se, como que apodrecido pelo bolor das ilusões mortas.
A regeneração do Pais, essa vai-se fazendo larga e profunda nos domínios do material; menos viva do que se impunha, é certo, nos domínios do espírito, mas, no entanto, em certos aspectos, também dessa podem aperceber-se todos aqueles a quem não perturbem cegos facciosismos.

Vozes : - Muito bem, muito bem!

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O Orador: - É para tal regeneração é justo salientar-se que muito contribuiu a obra de rejuvenescimento local iniciada e levada a efeito pelas comissões administrativas municipais após o advento da ditadura do Exército instaurada, em nome da salvação pública, em 28 de edifício Maio de 1926.
Alguns dos que mo ouvem decerto não ignoram essa obra notável o tanto mais digna de apreço quanto é certo ter sido levada a cabo com recursos próprios.

O Sr. Carlos Borges: - E com inteiro abandono das fórmulas das normas estabelecidas para a administração local, mas respeitáveis e bem sucedidas.

O Orador: - Muito agradeço a concordância de V. Ex.ª
Mas, continuando: estávamos ainda longe da acertada medida que proporcionou subsídios para melhoramentos rurais.
Acto de justiça é lembrar neste momento o grande homem de bem, estrénuo defensor dos interesses locais das populações rurais e, particularmente, dos interesses nortenhos, que foi o nosso inesquecível companheiro desta Casa-o Dr. Antunes Guimarães.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Neste encadeamento de ideias e factos em que me ia perdendo se situa o assunto que desejo tratar neste momento.
Embora assunto de natureza local e restrita, ele cabe bem no ambiente desta Assembleia, onde devem chegar e encontrar eco e guarida as justas reclamações dos povos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:- De resto, nem que outras razões não houvesse, o interesse nacional a3o reside só nos grandes problemas de aspecto total ou que toquem grandes áreas ou massas populacionais avultadas, mas esse mesmo interesse nacional é ainda o somatório dos interesses das várias regiões que merecem ser acautelados, por motivo da mais elementar justiça política e social.

Vozes; - Muito bem!

O Orador:- Por isso aqui levanto a minha voz e dirijo o meu apelo ao Sr. Ministro do Interior e ao Governo.
Sr. Presidente: rogada pelos legítimos representantes do concelho de Mesão Frio - a sua Câmara Municipal - a minha intervenção no assunto que muito interessa àquele concelho, eu não pude nem quis recusar a minha modesta contribuição para que o vital problema de que vou tratar atinja a solução justa que se pede. Antes aceitei gostosamente o encargo.
Encostado, em magnífico cenário, ao pano de fundo do Marão, altaneiro e debruçado sobre a torrente do Douro, que rumoreja cá em baixo, estende-se o concelho de Mesão Frio, do distrito de Vila Real, que tenho a honra de representar, com outros ilustres colegas, nesta Câmara.
Ao seu valor actual nos aspectos agrícola o comercial, a que anda intimamente ligado o cultivo da vinha nessas ásperas e generosas terras durienses ásperas na luta de um trabalho quase ciclópico, generosas no prémio de uma produção magnífica, em qualidade ao valor actual do, concelho de Mesão Frio, dizia eu, acresce a importância da sua longa tradição histórica.
Gozou de prerrogativas excepcionais, e entre elas a de escolher para senhor quem melhor lhe aprouvesse, como uma das únicas dezasseis behetrias do reino.

O Sr. Carlos Borges: - República autêntica.

O Orador: - Daquelas pequenas repúblicas de que falei a VV. Ex.ªs, integradas numa monarquia, fecho do edifício.

O Sr. Mário de Albuquerque: - Era uma república, mas aristocrática.

O Orador: - A sua primeira carta de foral foi-lhe dada pelo Rei Fundador no ano de 1152, foral depois confirmado por El-Rei D. Afonso II, em Trancoso, em 1217. Teve segundo foral, em 27 de Novembro de 1513, dado por El-Rei D. Manuel I.
Para, em poucas razões, aquilatar da importância deste concelho, basta dizer-se que Alexandre Herculano o equiparou aos concelhos do Porto o de Guimarães.
E para avaliar do carácter de unidade desta circunscrição bastará reparar em que as terras que o constituíram são as mesmas desde a sua fundação até 1837.
0 sol da liberdade vintista e das outras que se lhe seguiram retalhou-o na sua constituição multi-secular e em nome, possivelmente, de interesses de influências políticas em que a época foi fértil, pois não se descobrem outras razões susceptíveis de explicar o facto, foram-lho arrebatadas para o vizinho concelho de Bailio, do distrito do Porto, as freguesias de Frende, Teixeira, Teixeiró, Tresouras e Loivos da Ribeira.

O Sr. Carlos Borges:- Foi antes de 1910.

O Orador: - Eu já respondo a V. Ex.ª Sim; em pleno regime liberal.
De um oficio recebido na Câmara Municipal em 21.de Outubro de 1837 consta a ordem de remessa pura e simples para a Câmara de Baião do arquivo respeitante às referidas freguesias. Não foi dada outra razão pela entidade signatária do ofício - o administrador-geral (19 Vila Real, que, segundo a organização da época, desempenhava as funções dos actuais governadores civis - sendo a de que, por determinação régia, haviam sido as mesmas freguesias desanexadas do concelho de Mesão Frio e transferidas para o de Baião.
Parece que, segundo consta e se refere na exposição que a Câmara Municipal dirigia ao Sr. Ministro do Interior. a alavanca que moveu a feitora do decreto fora um preso liberal de nome João Ribeiro, mercê da influência obtida a seguir á entrada em Lisboa do duque da Terceira. 0 motivo da intervenção deste João Ribeiro fora, ao que parece, uma pendência judicial oriunda de uma questão de águas, pendência respeitante à freguesia de Teixeira, donde era natural o mesmo João Ribeiro, parte nesse litígio.
Se me explano nestas considerações, que podem à primeira visita considerar-se desnecessárias e até fastidiosas é para melhor ficar demonstrada a sem-razão do acto que de integrou as aludidas freguesias do concelho a que sempre até ai pertenceriam. Assim ressaltará, como não pode deixar de ser, a justiça de uma reparação ao acto injustificado de há mais de um século.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador:- Mas não são estas as únicas razões, Sr. Presidente, nem porventura até as melhores.
0 concelho de Mesão Frio tem a sua área tradicional com uma delimitação natural de acidentes orográficos o hidrográficos: o Marão ao norte, o Douro ao sul, a leste o rio Seromenho e a neste o rio Teixeira. Dentro dessa área se encontram as freguesias em referência.
Quanto a distâncias da sede e caminhos a percorrer, para não abusar da atenção da Assembleia, apenas refe-

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rirei o seguinte: das freguesias reivindicadas a que fica mais distante da sede do concelho de Mesa o Frio é a de Frende; pois não obstante, segundo dados oficiais, a distância a percorrer para chegar à sede do concelho de Mesão Frio faz-se em cerca de quarenta e cinco minutos a pé e por boa estrada, ao passo que para chegar à sede do concelho de Baião se gasta à volta de quatro horas, por caminhos Ínvios e, no Inverno, verdadeiramente impraticáveis, por motivo da travessia da serra, com neve, e de linhas de água.
Tanto nesta freguesia como nas restantes, e nestas por maioria de razão, por ficarem ainda mais próximas de Mesa o Frio, as relações de ordem comercial, como as de assistência clinica e hospitalar, a utilização dos serviços postais, telegráficos e telefónicos e outros meios de comunicação (estradas e caminhos de ferro) fazem-se por intermédio de Mesão Frio; à sede do concelho de Baião aquelas populações apenas se deslocam por motivos forcados de imposições legais.
Nuca inquérito realizado por determinação do Sr. Ministro da Justiça a propósito do julgado municipal de Mesão Frio o inquiridor, Sr. Desembargador Toscano Pessoa, diz no seu relatório, referindo-se às freguesias aludidas:

Umas e outras com Mesão Frio mantêm a plenitude das suas relações voluntárias. Ali vão abastecer-se, para o que encontram tudo o que precisam: comércio, mercados e feiras mensais e de ano. A Baião deslocam-se apenas quando obrigados oficialmente: tribunal, câmara, polícia, finanças, registo civil, etc. Pagam lá as sisas, mas vêm celebrar os contratos ao notário de Mesão Frio. Ali vão ao médico e ao farmacêutico. Ali vão pagar a taxa militar e é do seu hospital que se servem.

Mas, pergunta-se, apesar de todas as razões invocadas, não poderá haver uma contra-indicação para que seja atendido o pedido da Câmara Municipal de Mesão Frio, contra-indicação imposta pela disparidade quanto a população e receitas em que possam ficar os dois concelhos?
Muito ao contrário.
O concelho de Mesão Frio, que é de 3.ª ordem, conta 8:205 habitantes; o de Baião, que é de 2.ª ordem, tem 29:200 habitantes. No caso de as cinco freguesias reivindicadas virem a regressar à área do concelho de Mesão Frio, somando todas elas a população de 4:578 habitantes, subiria a população do concelho de Mesão Frio para 12:783 habitantes, descendo consequentemente a do concelho de Baião para 24:622.
Além da razão moral, o concelho de Mesão Frio teria a possibilidade de uma vida mais desafogada, sem que o de Baião deixasse de manter as condições necessárias para viver, e bem mais desafogadamente que o de Mesão Frio.
Não mudariam de ordem os dois concelhos, pois nem o de Mesão Frio atingiria os 20:000 habitantes, para subir à 2.ª, nem o de Baião desceria desse limite, para que tivesse de passar à 3.ª
Sr. Presidente: porque é do meu conhecimento, como já referi, que o Município de Mesão Frio dirigiu sobre este assunto uma exposição fundamentada ao Sr. Ministro do Interior, em quem confiamos, como membro do Governo da Nação e trasmontano ilustre, eis a razão por que não apresento, no uso das atribuições que a Constituição me confere, um projecto de lei para resolução do caso.
O Código Administrativo vigente contém, a respeito desta matéria, duas disposições essenciais: as dos artigos 7.º e 12.º, n.º 3.º Pela primeira se determina que as circunscrições administrativas só por lei podem ser alteradas e pela segunda se confere ao Governo a competência de resolver as dúvidas acerca dos limites das circunscrições administrativas, fixando-os quando sejam incertos.
O artigo 9.º do mesmo código também dispõe sobre matéria semelhante, mas diz respeito exclusivamente à criação de novas freguesias, que não é o caso presente. Este, 'salvo melhor opinião, terá de enquadrar-se por analogia dentro da disposição do n.º 3.º do artigo 12.º Trata-se, evidentemente, de resolver acerca dos limites de duas circunscrições municipais.
Daqui me dirijo, pois, ao Governo, pedindo equidade e justiça, pois não pode continuar esta flagrante disparidade entre dois concelhos limítrofes de duas províncias histórica e geograficamente diferentes, disparidade que, por ser velha e sem motivo superior que a determinasse, mais se impõe que seja eliminada para beneficio dos povos que a estão sofrendo e para prestígio do Poder.

O Sr. Carlos Borges: - É melhor um projecto de lei.

O Orador: - Talvez V. Ex.ª tenha razão. Mas não descreio das providências que peço.
Porque estamos, felizmente, longe, daqueles tempos em que a voz da província só era escutada nas vésperas das eleições e vivemos nesta emergência histórica a comunicação constante e in loco entre governantes e governados, é confiadamente que pode esperar justiça e receber mercê quem pede justiça e mercê, como eu peço em nome das populações trasmontanas que para mim apelaram.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Salvador Teixeira: - Sr. Presidente: a intervenção, na sessão de sexta-feira, 6 do corrente, do Sr. Deputado Bustorff da Silva levou-me seguidamente a pedir a palavra a V. Ex.ª para fazer um ligeiro depoimento acerca do assunto versado por S. Exa.
Agradeço que ela me tivesse sido concedida só para hoje, porque dessa forma me foi possível ampliar esse depoimento.
Entendi dever usar da palavra para não ocultar à Assembleia Nacional e, através dela, ao País o que sobre as afirmações do Sr. Deputado Bustorff da Silva penso.
Quanto ao discurso proferido pelo correio-mor numa palestra profissional levada a efeito na Sala Algarve da Sociedade de Geografia, em 13 de Fevereiro último, e à qual, segundo informações que tenho, assistiram exclusivamente funcionários da respectiva Administração e meia dúzia de pessoas estranhas ...

O Sr. Bustorff da Silva: - V. Ex.ª dá-me licença que o interrompa? V. Ex.ª dá-me licença, Sr. Presidente?
A informação dada ao nosso ilustre colega é inexacta. Assistiram a essa sessão dois directores da Companhia do Gás, um professor do Instituto Superior Técnico, de apelido Carriço, e várias outras personalidades, algumas até acompanhadas pelas esposas, senhoras do meu maior respeito.

O Orador: - Quando referi que eram meia dúzia de pessoas queria dizer que se tratava de um número restrito.

O Sr. Mário dê Figueiredo: - O que importa saber é se V. Ex.ª pode dar a garantia de que a reunião era pública ou particular, se era por convites dirigidos de uma maneira indiscriminada ou dirigidos exclusivamente a funcionários dos CTT.

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O Orador: - Não posso informar V. Ex.ª Mas julgo que os convites foram dirigidos exclusivamente aos funcionários dos CTT e a algumas personalidades de actividades afins.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Estou em condições de informar V. Ex.ª de que isso não é exacto.

O Orador: - Mas isso não infundamenta o que vou dizer.
Afigura-se me que, certamente, não são de louvar algumas expressões ali proferidas pelo correio-mor e referentes ao Sr. Deputado Bustorff da Silva.
Direi que menos de louvar é ainda o procedimento da pessoa que trouxe as referidas palavras do correio-mor ao conhecimento daquele senhor. É possível que nem toda a gente assim pense; mas eu não esqueço o velho prolóquio muito em uso em terras trasmontanas: «Mal haja quem de mim mal diz; mas mais mal haja quem mo traz ao nariz».
As palavras do correio-mor foram proferidas do improviso, numa reunião de família, pois assim podemos considerar aquela a que venho aludindo e em que tomaram parte só os elementos atrás referidos.

O Sr. Botelho Moniz: - V. Ex.ª dá-me licença? As Companhias Reunidas Gás e Electricidade também pertencem à família?

O Orador: - Julgo que não e que talvez sejam duma família que nem sequer é afim.
Essas palavras têm alguma explicação - e não digo justificação cabal - num certo nervosismo, que não é de estranhar em pessoa que, tendo cumprido sempre, e só, o seu dever, se julga alvejada pela frase inserta a p. 163 do Diário das Sessões datado de 14 de Dezembro de 1950:

E a par desta prática -já de si indefensável-, ainda outra: a da elaboração de orçamentos confusos, com verbas de receitas e despesas consciente mas artificiosamente fixadas, a fim de se estabelecer plofond, por baixo do qual é possível levar a cabo tudo, mas absolutamente tudo, que nas suas antonomíssimas ganas couber.

O Sr. Bustorff da Silva: - Sr. Presidente: V. Ex.ª dá-me licença para uma interrupção? V. Ex.ª, Sr. Deputado, dá-me licença?
O Sr. Correio-Mor apresentou números demonstrativos de que não era verdadeira, a afirmação aqui produzida?

O Sr. Cerveira Pinto: - Eu posso esclarecer V. Ex.ª de que a superavaliação das receitas em causa, que foi o cavalo de batalha do Sr. Deputado Bustorff da Silva, foi ordenada ao correio-mor por quem superiormente dirigia esse sector.
Portanto, posso esclarecer V. Ex.ª de que o correio-mor recebeu instruções expressas para que nos orçamentos por ele elaborados ficassem a constar as verbas que haviam de advir de um aumento tarifário.
Assim não há orçamentos confusos, nem plafonds, nem coisa nenhuma.

O Sr. Bustorff da Silva: - Quer dizer: durante doze anos reincide-se na prática - não contestada e, aliás, por todos confessada - de orçamentar receitas por excesso! E não há plafonds!

O Orador: - Portanto, as palavras do Sr. Deputado Cerveira Pinto vão justamente ao encontro das minhas considerações.

O Sr. Cerveira Pinto: - O aumento tarifário estava posto desde 1933; foi feito um pequeno aumento em 1941, e nesse ano já não apareceu o excesso, mus justamente o contrário, verificando-se outro aumento em 1948.

O Sr. Bustorff da Silva: - V. Ex.ª dá-me licença? Dá-me licença Sr. Presidente?
Agrava-se ainda mais a atitude do funcionário que dirige os CTT, porque, em vez de dar essa explicação aos seus subordinados e domais personalidades que se encontravam reunidos na Sala Algarve, ocupou uma hora, ou mais, a acumular impertinências a respeito das palavras proferidas por um Deputado na Assembleia Nacional no pleno exercício dos t«eus direitos.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Bustorff da Silva: - Seria preferível que o Sr. Correio-Mor tivesse recorrido a argumentos seguros, em vez de recorrer a insultos.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Bustorff da Silva: - Tive por isso dobrada razão para censurar.

O Sr. Cerveira Pinto: - Nesse discurso da Sociedade de Geografia o Sr. Correio-Mor disse com todas as letras que tinha fornecido ao seu Ministro todos os elementos que refutavam as afirmações de V. Ex.ª

O Sr. Bustorff da Silva: - Palavras!

O Sr. Cerveira Pinto: - Disse-o lá.

O Sr. Bustorff da Silva: - Palavras! Palavras!
Com números é que devia refutar.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Bustorff da Silva: daqui por diante V. Ex.ª, ou qualquer dos Srs. Deputados, não interrompe mais o orador sem que à Mesa peça a necessária autorização.

O Sr. Bustorff da Silva: - Suponho que ainda não deixei de o fazer em qualquer das minhas intervenções.

O Sr. Presidente: - Peço ao Sr. Deputado Salvador Teixeira o favor de continuar.

O Orador: - Apraz me muito declarar aqui que considero o correio-mor, Sr. Engenheiro Luís de Albuquerque Couto dos Santos, possuidor de inexcedíveis qualidades de aprumo, correcção, honestidade e devoção ao interesse nacional. Para tanto, parece-me suficiente dizer a alta estima e respeito que lhe tributam todos os seus colaboradores - e digo esta palavra porque como tais se julgam muito honrados os seus subordinados - e todas as pessoas que dele se acercam para tratarem de qualquer assunto de interesse geral.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Isso não está em causa.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Bustorff da Silva: - Apoiado!

O Sr. Mário de Figueiredo: - A questão é outra, isto é: não é se o Sr. Correio Mor é ou não um bom funcionário; se é ou não respeitado pelos seus funcionários.
A questão é muito diferente: é saber se um serviço que fui criticado na Assembleia Nacional pode responder nos termos em que respondeu o Sr. Correio-Mor.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

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O Sr. Mário de Figueiredo: - Eu admito que um serviço se defenda publicamente de acusações que aqui lhe são dirigidas, não obstante saber que a norma desta Assembleia é pedir contas ao responsável, e o responsável é o Ministro. Admito, no entretanto, que um serviço venha dizer publicamente que foi acusado sem fundamento nesta Assembleia; que os números que aqui só produziram não estão certos ou, se estão certos, têm esta ou aquela explicação. Neste caso a explicação podia ser, inclusivamente, aquela que acaba de dar o Sr. Deputado Cerveira Pinto.

O Sr. Presidente: - Peço ao Sr. Deputado Mário de Figueiredo a fineza de deixar continuar o orador.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Suponho que os meus esclarecimentos eram devidos não só à Assembleia, como até a V. Ex.ª Estou apenas a defender o prestígio desta Assembleia.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não devo também esquecer neste momento que aquele ilustre engenheiro, além de ter sido professor distintíssimo da Faculdade de Engenharia do Porto, onde o foi buscar o nosso pranteado e nunca assaz homenageado colega Dr. João Antunes Guimarães, quando foi escolhido para Ministro do Comércio, demonstrou, como seu chefe de Gabinete, notáveis e invulgares qualidades de realizador, não devendo esquecer-se a legislação inicial sobre melhoramentos rurais, verdadeira carta de alforria pura os nossos aglomerados populacionais, que vegetavam longe dos grandes centros, e que àqueles dois eminentes homens públicos se ficou devendo.
Não esqueçamos também a sua extraordinária acção à frente dos serviços dos CTT, que certamente o anunciado aviso prévio do Sr. Deputado Bustorff da Silva porá em justa evidência. Mas desde já devo dizer que à surpreendente acção dinamizadora do correio-mor, acompanhado por uma equipe de elite, que abrange todo o pessoal de tão prestante organismo, se deve a transformação verdadeiramente milagrosa dos serviços a cargo da respectiva Administração-Geral, serviços que rivalizam hoje com os melhores da Europa, apesar de nalguns aspectos importantes, como o das comunicações telefónicas, o engenheiro Couto dos Santos ter partido quase do zero.
Salientarei ainda os relevantes serviços prestados no Norte do Pais quando do trágico ciclone de Fevereiro de 1941, não só no sector que dirigia e dirige como também em todos os demais serviços públicos, para o que recebeu latos e especiais poderes do Governo.
Do Comércio do Porto do 20 de Fevereiro de 1941 reproduzo a seguinte conversa, realizada por intermédio da Emissora Nacional, entre o grande Ministro Duarte Pacheco e o nosso ilustre colega Sr. Dr. Mendes Correia, então presidente da Câmara Municipal do Porto, conversa que dá bem a medida da extraordinária acção do Sr. Engenheiro Couto dos Santos:

Tudo se vai normalizando por aqui, pouco a pouco disse o Sr. Dr. Mendes Correia, graças à acção magnífica do Sr. Administrador-Geral dos CTT. Todos nós, portuenses, estamos gratos ao Sr. Administrador-Geral e aos seus colaboradores pela montagem do cabo elevatório da água, tão oportuna que sem isso o Porto estava na contingência de ficar dois dias sem água.

Do engenheiro Couto dos Santos disse em 1943, em discurso público, o engenheiro Duarte Pacheco:

Há dez anos, quando escolhi o engenheiro Luís de Albuquerque Couto dos Santos para o alto e espinhosíssimo cargo de administrador-geral dos correios, eu tinha então uma intenção e formulara uma esperança: a intenção de impulsionar o ressurgimento desta instituição, que outrora tivera em Portugal o merecido prestigio; alimentara a esperança de que encontraria no engenheiro Couto dos Santos, por aquilo que já conhecia do seu saber, da sua ponderação e do seu ardente desejo de servir aberta e completamente o bem comum, dizia eu, alimentara a esperança de encontrar nele o dirigente capaz de realizar essa intenção.
Não foi preciso que decorresse muito tempo para me convencer de que, ao menos desta vez, o Ministro acertara. A escolha, aliás feita através de muitas dificuldades, tinha sido feliz. Eu pusera realmente à frente da Administração-Geral dos Correios, Telégrafos e Telefones um homem raro - raro pelas suas virtudes, pela sua dedicação ao bem público e pela sua firmeza.
Pouco mais direi. Apenas isto: tenho muita satisfação em, na presença de tantos funcionários dos correios, reafirmar o juízo que, acerca da personalidade do engenheiro Couto dos Santos, já muitas vezes tenho expresso - considero-o um dos melhores funcionários do Estado, um dos melhores servidores da Nação. A confiança que nele deposito tem sido cada dia que passa robustecida. Ele merece cada vez mais ser possuidor da confiança do Governo no desempenho da sua missão.
É com o maior prazer e com íntima comoção que vou pôr-lhe ao peito o prémio que o nosso Presidente da República, Sr. General Carmona - sempre atento a tudo o que representa o interesse geral da Nação -, quis ter a bondade de atribuir ao engenheiro Couto dos Santos como sinal de que o Governo da Nação e o Chefe do Estado não esquecem os que sabem bem servi-los.

Também dele disse, em discurso proferido em Anadia, em Setembro de 1945, o ilustre homem público Sr. Engenheiro Augusto Cancela de Abreu, então Ministro das Obras Públicas e Comunicações e actualmente presidente da comissão executiva da União Nacional:

Sinto grande prazer em pôr em destaque, na presença de tantos conterrâneos meus, as altas qualidades do engenheiro Couto dos Santos e os serviços que tem prestado ao País, manifestando-lho assim em público a minha grande consideração pela sua pessoa e pela sua obra.

Seria indesculpável que eu aqui deixasse de reproduzir a afirmação do Sr. Deputado Bustorff da Silva, publicada a p. 167 do Diário das Sessões atrás citado, com referência aos administradores dos CTT:

A sua honestidade pessoal não está em causa. Mais claro: não pode nem ao de leve ser tocada, seja por quem for. Para cada um deles, pessoal, economicamente, nada reverte.

O Sr. Bustorff da Silva: - Pois não. Disse-o claramente na minha intervenção.
Mas agora espero de V. Ex.ª duas palavras marcando o confronto entre a atitude do Deputado e a resposta do funcionário que dirige os CTT. Compare-se a correcção usada nesta sala com o que se passou na charla da Sala Algarve. Tudo o mais é... arrombar uma porta aberta.

O Orador: - Estimo que assim tenha acontecido.
Do pouco que disse e do muito que aqui ouvi não quero deixar de concluir que o correio-mor, engenheiro

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Luís de Albuquerque Couto dos Santos, bem merece o respeito, estima e consideração do Pais e, mais do que isso, verdadeiro reconhecimento pelos assinalados serviços prestados e que, peço a Deus, possa continuar nas suas actuais funções ou outras ainda superiores, a que for chamado pelos seus altos méritos, durante muitos anos.
É que ele não justifica os votos aqui formulados, na sessão de 16 de Março próximo findo, pelo Sr. Deputado Ricardo Durão «para que o ruído das espadas não seja substituído pelo ruído dos talheres». Ele enquadra-se perfeitamente no conceito de Salazar:

Os homens que se habituam a cumprir sempre e só o seu dever pouco se lhes dá o lugar que ocupam; interessa-lhes muito desempenhá-lo bem.

Terminarei com a afirmação de Duarte Pacheco, repetindo-a:

Ele merece cada vez mais ser possuidor da confiança do Governo no desempenho da sua missão.

Disse.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Bustorff da Silva, a propósito da discussão da Lei do Meios, tratou aqui dos aspectos financeiros da administração dos CTT.
Fê-lo com veemência, como é próprio do seu temperamento, mas com correcção.
O administrador-geral dos CTT, visado pelas críticas do Sr. Deputado Bustorff da Silva, entendeu responder-lhe numa reunião dos funcionários dos CTT (por enquanto não sei se lá estavam outras pessoas), e fê-lo nos termos absolutamente estranháveis, impróprios e ofensivos de que a Câmara tomou conhecimento pelo documento lido à Assembleia na última sessão.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - É evidente que este procedimento não pode deixar de merecer a. inteira reprovação da Câmara e a minha, e por esse facto apresento ao Sr. Deputado Bustorff da Silva os meus cumprimentos.
Sobre esse aspecto creio que não há discordância entre os membros desta Assembleia; mas o Sr. Deputado Bustorff da Silva apreciou os aspectos financeiros da administração dos CTT apoiado em razões, e voltou a dar e ampliar essas razões ao tratar do assunto antes da ordem do dia, quando deu à Câmara conhecimento do discurso ou charla do Sr. Administrador dos CTT.
Sobre o ponto da questão posto pelo Sr. Deputado Bustorff da Silva e sobre os argumentos que aduziu não posso nem devo impedir que os Srs. Deputados emitam a sua opinião e procurem esclarecer a Assembleia e o País.
Precisava de dar à Câmara esta explicação e ao Sr. Deputado Bustorff da Silva este devido testemunho da nossa consideração neste momento; e, ao mesmo tempo, a Câmara fica sabendo a posição do seu Presidente neste assunto.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Manuel Vaz: - Sr. Presidente: quando na sessão de 13 de Dezembro do ano findo o nosso ilustre colega Dr. Bustorff da Silva chamou a nossa atenção para os orçamentos dos CTT, salientando o facto de em vários anos as previsões das receitas excederem em muito as que na verdade foram liquidadas, a repetição quase uniforme - com excepção de 1941 - dessa circunstância causou-me estranheza, pareceu-me ter o seu quê de misterioso.
Mas a verdade é que, como não sou homem de contabilidades, a minha curiosidade não foi além dessa estranheza.
As suas observações pareceram-me justificadas, em face dos números que apresentou.
Porém, quando na sessão de 27 de Fevereiro deste ano aquele nosso ilustre colega nos veio referir que o correio-mor, na Sala Algarve da Sociedade de Geografia, numa reunião com o seu pessoal, criticara a sua intervenção, ameaçando o com um processo criminal, eu censurei, como censuro ainda agora, um tal procedimento do correio-mor, que entendo ter-se excedido.
A faculdade de apreciar livremente os actos da Administração e dos seus organismos é um direito constitucional, de que esta Assembleia não abdica.

O Sr. Bustorff da Silva: - Muito bem, muito bem, muito bem!

O Orador: - Mas isso é outro caso, a analisar oportunamente.
Este incidente, porém, despertou a minha curiosidade e decidi tentar averiguar as causas - se as houvesse - das superavaliações das receitas, que foi o que mais me chocou na sua intervenção de 13 de Dezembro. E como a discussão do aviso prévio anunciado ainda demora, acho conveniente ir esclarecendo o caso desde já.

O Sr. Bustorff da Silva: - V. Ex.ª substitui-se ao Sr. Correio-Mor?

O Orador: - Não o substituo e terei ocasião de o mostrar a V. Ex.ª

O Sr. Cerveira Pinto: - Eu quero reafirmar o seguinte: o Sr. Deputado Bustorff da Silva recebeu a cópia integral do discurso pronunciado na Sala Algarve da Sociedade de Geografia. Neste discurso está lá dito, com todas as letras, que o correio-mor tinha fornecido ao seu Ministério os elementos necessários para rebater as afirmações do Sr. Deputado. Portanto o Sr. Correio-Mor fez aquilo que tinha a fazer, e não podia fazer mais nada.

O Sr. Bustorff da Silva: - Os meus reparos são simples e claros: o discurso ou charla proferido na Sala Algarve foi lido a esta Assembleia; a resposta que lhe dei consta do Diário das Sessões hoje distribuído.
O Sr. Deputado Cerveira Pinto tem certamente presentes as palavras que aqui proferi, reproduzindo passagens do discurso feito na Sala Algarve da Sociedade de Geografia, nas quais o funcionário que dirige os CTT chegou a fazer a afirmação de que muitas vezes nem os orçamentos se viam e que tudo era deliberado sobre memórias que ele apresentava ao respectivo Ministro.
Isto sucedeu durante doze anos.
E lembrei então, a propósito, a afirmação produzida num discurso do Sr. Presidente do Conselho no qual se aprende que avaliar sistematicamente em excesso as receitas, sabendo-se antecipadamente que a previsão excederá as receitas a final liquidadas, é praticar a «mentira das previsões».
A lição não é minha, nem do Sr. Deputado ou do Sr. Correio-Mor, mas do Sr. Presidente do Conselho, que nesse capítulo dá lições a todos nós.

O Orador: - Não vou analisar números. Não tenho tempo nem jeito para isso. Mas - uma vez constatado o facto, inegável, de as avaliações, em orçamentos sucessi-

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vos, excederem, por vezes muito, as receitas na verdade liquidadas- indagar se existiram razões justificativas do que se nos afigura erro de cálculo na previsão das receitas, e erro repetido em anos sucessivos.
Devo declarar que não conheço pessoalmente o correio-mor, Sr. Engenheiro Conto dos Santos. E julgo que nem mesmo de vista. Estou, assim, à vontade: liem amizades, nem inimizades.
Relendo aquela intervenção de 13 de Dezembro, julgo poder sintetizar as arguições que nela se formulam quanto aos orçamentos dos CTT desta maneira:

a) Orçamentos confusos;
b) Superavaliações das receitas;
c) Capitalizações das reservas dos fundos (privativos dos CTT).

Comecemos pela primeira: orçamentos confusos.
A estrutura dos orçamentos dos CTT encontra-se fixada nos Decretos n.º 24:197, de .20 de Julho de 1934, e 31:044, de 28 de Dezembro de 1940. É segundo as normas neles estabelecidas que os orçamentos dos CTT se terão de elaborar, visto serem deles privativos.
A doutrina destes diplomas não pode divergir dos preceitos gerais da contabilidade pública, porque é evidente que se não publicariam se os contrariassem.
E uma vez que os orçamentos referidos se cingem às suas disposições, não vejo em que possam ser incriminados.
E não se argúem de inobservância da lei. O reparo, se tivesse razão de ser, atingiria, não os orçamentos, mas a própria lei. E com ela nada têm os CTT, senão cumpri-la.
Passemos, por isso, à segunda arguição: superavaliação das receitas.
As contas de gerência dos CTT são publicadas em suplemento ao Diário do Governo. E nelas pareceu-me encontrar razões justificativas das acusadas superavaliações.
Lê-se, por exemplo, nas de 1934-1935 e 1936 que certas receitas foram mandadas avaliar por excesso por ordem superior.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Bustorff da Silva: - Quer dizer: as contas continuam a estar erradas ... por ordem superior.

O Orador: - É assim que se diz no Diário do Governo, único elemento de que me servi.

O Sr. Melo Machado (para interrogar a Mesa): - Eu desejava apenas saber se na Mesa está alguma explicação fornecida pelo Sr. Ministro das Comunicações.

O Sr. Presidente: - Na Mesa não se encontra qualquer explicação do Sr. Ministro das Comunicações.

O Sr. Melo Machado: - Parece-me que o Sr. Ministro das Comunicações seria a pessoa indicada para explicar o assunto em questão.

O Orador: - Se esta afirmação não fosse verdadeira, decerto se não faria nem se publicaria no Diário do Governo. E isto é uma razão de poso. O funcionário tem de cumprir as ordens dos seus chefes.
E em todas essas contas se faz expressa referência a um projectado agravamento das tarifas (1936, 1938, 1940 e 1942), que só se verificou em 1 de Setembro de 1948.
Este agravamento vinha sendo previsto desde 1934. Contava-se com ele, tanto mais que o déficit de 1930 lhe dava oportunidade. Era natural, por isso, que nele se baseassem as previsões das receitas. Mas ele foi sendo adiado ano após ano, até que se efectivou em fins de 1948.

O Sr. Pinto Barriga: - O problema que ora se discute anda um pouco deslocado, o que interessa saber é qual a posição das concessionárias nos rendimentos dos CTT, a forma como contribuirão essas entidades para indirectamente provocarem esses deficits.
Isso é que importa para avaliar a estatura financeira, administrativa e moral dessa administração autónoma.

O Orador: - Este adiamento deve ter sido a segunda razão justificativa da falha das previsões.
Nas contas de gerência de 1949 a receita cobrada não atingiu ainda a que fora prevista. Invocam-se ali duas causas, a saber:

a) O desfazimento que vem notando-se nos tráfegos e, portanto, nas receitas; e
b) As circunstâncias económicas dominantes, acompanhadas da aversão natural ao novo tarifário.

E acrescenta se:

Em que medida cada uma delas é responsável pelos resultados obtidos é problema de assaz complexa resolução, não repugnando nada, porém, considerar a actual conjuntura económica, nos seus perniciosos efeitos, como o principal factor do retrocesso observado.

E não há dúvida de que este retrocesso na cobrança se verificou (p. 6900) nas receitas de algumas rubricas. Outras receitas mantêm-se diminutas devido ao pequeno volume de tráfego e pela mesma razão os aumentos verificados em algumas não foram tão substanciais como se esperava.
Estas razões, porque ninguém ignora as circunstâncias económicas actuais, parecem me aceitáveis e justificativas dos erros de cálculo apontados, tanto mais que não eram à data previsíveis. Julgo assim que o caso não merece
os reparos suscitados.
Vejamos agora as capitalizações nas reservas.
O fundo de reserva destina-se a custear a renovação do material e das instalações, bem como a cobrir prejuízos e déficit» eventuais, como se vê na base 3.º da Lei n.º 1:959, de 1937, regulamentada pelos Decretos n.ºs 32:896, de 7 de Julho de 1943, e 37:671, de 12 de Dezembro de 1949.
Argúem-se os orçamentos de artificiosamente desviarem para este fundo uma boa parte do volume das comparticipações que ao Estado caberiam se não fora este artifício.
O Estado tem uma renda anual de 3:000 000$ e além dela 20 por cento dos lucros anuais (base X da Lei n.º 1:909, de 3 de Agosto de 1937).
Julgo que não há dúvida de que o desvio para este fundo de uma parte dos lucros reduz o volume das comparticipações do Estado. Mas esta redução foi consentida por ele. E, se assim foi, parece-me que ninguém se pode queixar desse facto. Só ele é que teria esse direito. E convenço-me de que o consentiu, pelo seguinte:
Em primeiro lugar, porque esses orçamentos são aprovados pelo Governo (base II da Lei n.º 1:909), o que importa dizer que são por ele estudados, porque ninguém aprova unia coisa sem a estudar primeiro.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E, se aprovou, consentiu, autorizou os desvios citados nas capitalizações referidas.
Nesse estudo e aprovação consiste, suponho eu, a revisão económica solicitada.

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Mas há ainda mais. É que não só as consentiu, mas até e em alguns anos as reforçou, publicando decretos especiais de abertura de créditos.
Estão neste caso os Decretos n.ºs 27:168, de 10 de Novembro do 1936, 28:254, de 4 de Dezembro de 1937, 31:015, de 27 de Dezembro de 1940, e 31:692, de 24 de Novembro de 1941.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Manuel Vaz: lembro a V. Ex.ª que já atingiu o limite regimental.
Peço a V. Ex.ª para abreviar o mais possível as suas considerações.

O Orador: - Eu acabo já, Sr. Presidente.
É de notar que estes reforços vieram no fim do ano, quando o Estado conhecia já os lucros de exercício desses anos.
Os decretos desta natureza são aprovados pelo Conselho de Ministros e referendados pelos Ministros das Finanças e da pasta a que interessar o crédito.
Os créditos assim abertos são registados na Direcção-Geral da Contabilidade Pública e as minutas respectivas devem ser visadas pelo hoje Tribunal de Contas, como tudo se determina no artigo 36.º e § único do Decreto com fôrça de lei n.º 18:381.
Finalmente, as contas dos CTT são julgadas pelo aludido Tribunal de Contas.
Entendo, por isso, que a actuação dos CTT quanto a capitalizações na reserva, consentida e até reforçada pelo Estado, é perfeitamente legitima. O Estado prescinde, tacitamente pelo menos, de parte dos seus lucros, e eles capitalizam-na no seu fundo de reserva.
Em conclusão:
O que me pareceu equívoco de inicio já o não é agora para mim.
De resto, a maior ou menor perfeição técnica do mecanismo dos orçamentos, sejam eles quais forem, só medianamente mo interessa, porque não sou homem de contabilidades. O que me interessa é a honesta aplicação dos dinheiros públicos e a obra com elos realizada. E essa está à vista. Define um homem e exalta um funcionário.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Cerveira Pinto: - Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa o seguinte requerimento:
«Para rebater as afirmações do Sr. Dr. Bustorff da Silva sobre contas, orçamento e estrutura financeira da Administração-Geral dos Correios, Telégrafos e Telefones e poder provar que, nesta matéria, tudo é claro, legal e perfeitamente correcto naquele importante organismo, e ainda para fazer realçar a forte personalidade do engenheiro Couto dos Santos em tudo quanto representa intransigente defesa dos superiores interesses da Nação, requeiro:

a) Que me seja fornecida informação pelo Ministério das Finanças sobre a regularidade e legalidade da estrutura orçamental dos CTT e dos projectos de orçamento que anualmente a Administração-Geral tem submetido a visto, desde 1933 ate 1951, inclusive;

Pelo Ministério das Comunicações:

b) Cópia de todos os elementos requeridos pelo Sr. Dr. Bustorff da Silva na sessão de 6 do corrente;
c) Cópia da informação que o correio-mor, no seu discurso na Sociedade de Geografia, diz ter prestado ao Governo relativamente às críticas do Sr. Dr. Bustorff da Silva feitas na sessão de 13 de Dezembro de 1950».

O Sr. Botelho Moniz: - Sr. Presidente: requeiro que pelo Ministério da Economia me sejam fornecidos os elementos seguintes:

1.º Informação sobre a origem e natureza da resolução que autorizou o Grémio Concelhio dos Comerciantes de Carnes de Lisboa a realizar operações comerciais de aquisição de gados e fornecimento do carnes, em concorrência com o comércio legítimo;
Razões imperativas que determinaram esto novo desvio de funções, que parece contrário à orgânica corporativa o aos votos da Assembleia Nacional expressos sobre o relatório da comissão parlamentar de inquérito aos organismos corporativos e de coordenação económica;
3.º Motivos que justificam não só o último aumento de preço das tabelas de carne do vaca na cidade de Lisboa, mas também a falta do aplicação de tabelas idênticas nos concelhos limítrofes ou outros onde as despesas de matança e distribuição são superiores;
4.º Informação sobre a quantidade média (diária, mensal ou anual) de venda de carne, por talho, na cidade de Lisboa nos anos de 1948, 1949 e 1950, e se a mesma é considerada remuneradora pelos organismos oficiais competentes para fazer face aos encargos dos talhantes;
5.º Confirmação ou desmentido dos boatos de intoxicações alimentares produzidas por carne fornecida pelo Grémio Concelhio dos Comerciantes do Carnes de Lisboa, condenada sanitária mente por veterinários oficiais;
6.º Indicação dos preços da carne de vaca fornecida pelo Grémio citado às unidades militares e estabelecimentos oficiais, com discriminação por categorias e por entidades abastecidas, preços esses referidos ao dia 31 de Março de 1951, e daqueles que porventura passem a vigorar a partir de hoje; motivos de alta, baixa ou de divergência de preços;
7.º Destino dado pelo Grémio às sobras diárias da carne fornecida a estabelecimentos oficiais, esclarecendo se a mesma é rateada entre todos os talhos agremiados ou se se tem atribuído apenas a alguns, quer porque se encontrem em relações mais estreitas com os directores desse Grémio, quer por outros motivos; designação dos talhos que recebem essas sobras e nomes dos seus proprietários; proporção entre os fornecimentos atrás citados e as sobras diárias.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continua em discussão na generalidade a proposta de lei sobre a revisão da Constituição e do Acto Colonial.
Tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Cruz.

O Sr. Alberto Cruz: - Sr. Presidente: quando dirijo os meus passos para esta tribuna e subo estas escadas faço-o sempre com o maior constrangimento e cheio

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de apreensões, porque são tais as condições acústicas da sua colocação que as frases aqui proferidas ouvem-se anal cá dentro, mas o seu eco repercute-se rapidamente por todo o Império, e por isso têm de ser muito claras as afirmações produzidas e em termos de tanta simplicidade que possam ser compreendidas e meditadas por todos os portugueses, mesmo os de menor diferenciação cerebral, porque mesmo a esses lhes deu Deus a faculdade de ouvir, falar e agir e a Constituição do País lhes outorgou os mesmos direitos e os mesmos deveres dos mais favorecidos de inteligência.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sabemos que a maioria dos portugueses não está apta a compreender discursos académicos de filosofia política e que também há muitos indivíduos nascidos em Portugal que têm interesse em deturpar as nossas palavras e, consequentemente, as nossas atitudes, no sentido de provocar perturbações nos espíritos e inquietação nas almas, o que tudo pode traduzir desconfiança e desunião.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O que vai pelo Mundo já chega e sobra para nos tirar o sossego, e não sejamos nós, numa altura destas, os fornecedores de mais elementos de confusão ou desagregação.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Entrei nesta Câmara há dezasseis anos, aproximadamente, pela mão da União Nacional, que indicou o meu nome ao sufrágio eleitoral, sem querer saber se eu era republicano ou monárquico, e no decurso desse tempo assisti à discussão dos mais transcendentes problemas, em ordem ao engrandecimento moral e material do Império, e cujas soluções estão patentes aos olhos de nacionais e estrangeiros, que não regateiam louvores e a sua admiração ao formidável e quase inconcebível esforço realizado.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Tomei parte activa na revolução de 28 de Maio e tive a honra de servir, lá em Braga, nas horas incertas em que tão poucos éramos, às ordens desse grande soldado de tantas campanhas cujo nome e figura jamais serão esquecidos por todos a quem a sua coragem e a sua fé dinamizaram: o general Gomes da Costa.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E só essa qualidade de soldado revolucionário de 28 de Maio, com as responsabilidades que esse título me outorga e com a fidelidade à palavra dada - compromisso para mim sempre sagrado -, que me dá o arrojo de subir a esta tribuna para proferir breves e simples palavras, que Deus permita sejam ouvidas e compreendidas por todos os portugueses de boa fé.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Fomos para a revolução - republicanos e monárquicos - sem perguntarmos uns aos outros quais as nossas tendências ideológicas, mas todos com o mesmo objectivo: salvar a Pátria, dignificando o Poder e engrandecendo o Império.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Essa uniformidade de pensamento deu-nos a vitória. Aos homens que nos seguiram e connosco se bateram demos a nossa palavra de que não modificaríamos as instituições vigentes.
Pudemos dentro deste critério assistir ao milagre do nosso resgate. E podemos hoje também orgulhar-nos todos do conceito internacional que usufruímos, da paz em que vivemos e da relativa prosperidade que a nossa ainda pobre economia nos concede.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Enviou agora o Governo, presidido pelo grande português que em boa hora a Providência, pela nossa mão, lá colocou, um diploma com as alterações que a experiência lhe sugeriu à Constituição Política de 1933.
Essas alterações não põem questões de regime, nem qualquer modificação nas instituições que nos regem. Portugal continua República unitária e corporativa. Sublinho isto, bem alto, para acabar com as especulações a que tem levado -a interpretação das palavras aqui proferidas pelos ilustres Deputados que têm honrado esta tribuna com as luzes do seu espírito e os fulgores do seu talento.
Discutir-se-ão somente as alterações que o Governo enviou conjuntamente com o douto parecer da Câmara Corporativa. Essas alterações as discutiremos serenamente, porque continua firme a mesma fé e o mesmo patriotismo que nos tem aqui unido a todos - republicanos e monárquicos - e que espero continuará até que se desassombre o panorama do Mundo e se tornem mais claros os caminhos do futuro.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Jacinto Ferreira: - Sr. Presidente: não subiria hoje a esta tribuna se nisto tivesse de obedecer apenas aos meus sentimentos. E faço-o não para tirar efeitos políticos, mas porque, creio, seria imprudente deixar o juízo das minhas atitudes entregue ao zelo dos amigos ou à maledicência dos adversários.
Em política o que parece é - proclamou certo dia na nossa terra um alto espírito. E esta máxima, que afinal nenhum governante consegue ter sempre presente, é que constitui o motivo principal da minha presença hoje neste lugar.
Não para que eu seja o que porventura vier a parecer, mas apenas para que não pareça o que na realidade não sou. Não quis que o meu silêncio nesta matéria
pudesse ser levado à conta de conformismo, de renúncia,, e adaptação a isto ou àquilo. Mas também estou perfeitamente seguro de que a minha intervenção neste debate em nada influirá nas resoluções finais.
Quando há um ano apreciámos a proposta para a Assembleia Nacional assumir poderes constituintes, alguém afirmou, com vivo aplauso de numerosos Deputados, que o bem público exigia imperiosamente uma revisão constitucional urgente.
Passado esse tempo e em face desta proposta de lei n.º 111 parece que não constituirá impertinência formular uma pergunta: era isto o que o bem público imperiosamente exigia?
Pode ser que eu, ao tentar responder a ela, não interprete o pensamento de toda a parte da Nação politicamente sã, mas estou seguro de interpretar, pelo menos, o de uma grande parte dos que consideram o bem público coisa sumamente valiosa, digna de respeito e de carinho, e por ele sacrificam o seu bem-estar pessoal.

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Ora que poderiam estes esperar no aspecto político da revisão constitucional?
Primeiro que tudo que mais latos poderes fossem atribuídos à Câmara Corporativa e se concedesse maior liberdade na designação dos seus membros.
Não é de estranhar que muitos tenham experimentado neste aspecto, como em outros, uma desilusão bastante amarga, até pesque foi anunciada publicamente a intenção de se reforçarem aqueles poderes - reforço esse porventura a ser obtido à custa das atribuições da Assembleia Nacional.
Organizada a Nação corporativamente, mal ou bem (presentemente pouco bem, mas sem estar anulada a esperança de vir a fazer-se francamente bem), não poderá, logicamente, haver lugar para assembleias chamadas políticas, as quais, além de perigosas, seriam absolutamente inúteis.
Perigosas porque, mesmo contra todas as boas intenções, terão ou poderão ter o efeito de manter latente a vitalidade do vírus do sufrágio e o espírito partidista e até mesmo o de fomentar a sua revivescência quando vier a ser tomada a resolução de definitivamente os eliminar.
Inúteis porque, exceptuando o período transitório, a representação nacional deverá ser total, não ficando, portanto, realidades algumas da Nação excluídas, a justificarem manutenção de anacronismos políticos.
Diz-se em oposição a isto - e eu sei-o muito bem - que o homem não é só profissional, não é apenas chefe de família, não necessita exclusivamente de comer, de vestir e de repousar. O homem é um ser político, quer dizer, tem direito a ser interessado na governação pública. Mas este direito, que se deve traduzir quanto à generalidade dos cidadãos apenas numa intervenção por assim dizer do primeiro grau, exerce-se pelas possibilidades de interferir na administração local e de nomear os seus delegados a uma assembleia onde se vele pelo cumprimento das leis e pelo respeito da sua personalidade.
A esta intervenção, a que chamei do primeiro grau. outras se sucedem na hierarquia política, mas o seu exercício deve já ser da competência exclusiva de certos órgãos ou instituições, dotados de faculdades tanto mais latas quanto mais profundamente se for acentuando a sua independência dos interesses puramente pessoais eu locais, até se chegar a um órgão de independência máxima, representado pelo chefe natural, cujas atribuições e seu exercício não estão à mercê de escolha ou de designação fortuitas. A ele deverá então corresponder o poder supremo, a suprema autoridade.
A representação nacional, em regime corporativo, dirige-se às realidades do País, e não a supostos direitos, aspirações ou fantasias mais ou! menos atraentes.
Os direitos dos seus súbditos exarados na Constituição têm a zelá-los a assembleia dos representantes (dê-se-lhe a designação que se quiser, porque isso é de somenos importância), onde não é lícito pretender-se assinalar a presença de técnicos em oposição à de políticos, porque de facto deverá considerar-se que estão lá apenas pessoas conscientes, esclarecidas e livres.
Dir-se-á, porém, que tal representação visa apenas os interesses especiais e que, além disso e acima disso, existe o interesse geral da Nação.
Pergunto então: quem é que nas democracias (e as assembleias eleitas por sufrágio universal não podem deixar de ser democráticas), regimes essencialmente mutáveis, interpreta o interesse geral, na sua expressão fundamental e permanente?
Nos regimes de partidos ninguém o interpreta, porque ele nem sequer conta em face dos interesses dos grupos, das facções ou até das forças plutocráticas.
Com certeza que não se pretende cair na posição absurda de considerar os interesses especiais, representados pelos que trabalham, pelos que estudam, pelos que pensam, e atribuir a representação do interesse geral ... aos outros.
Mas se não sei quem em democracia pode legitimamente representar o interesse geral, sei, em compensação, muito bem quem é o seu intérprete permanente e natural na nação corporativa, na qual nunca poderá haver distinção entre o país legal e o país real.
A História nos diz que, à parte os acidentes, transitórios por sua natureza, em que uma figura nacional se destaca e consegue polarizar as aspirações da grei
- e alguns casos destes ela refere, mas todos transitórios, até porque dez, vinte 001 trinta anos são um momento na vida multicentenária das nações - foram, constantemente os reis os intérpretes permanentes do interesse nacional e o fizeram sempre com a maior fidelidade e a maior elevação moral.
E qual poderá ser a fonte de informação e elucidação deste interesse? Ao contrário do que sucede no comum das actividades humanas, em que o especial deriva do geral ou o tem por base, na verdadeira representação nacional será o geral! a brotar do conjunto harmónico e colaborante dos legítimos interesses especiais.
Não digo que seja a soma dos interesses especiais (soma é uma operação aritmética puramente democrática), digo, sim, que resulta, e a tal ponto que, se fosse possível na nação o desaparecimento dos interesses especiais, também o interesse geral não teria significado, por ausência de base. Digo que resulta, como diria que o interesse da família não é a soma dos interessas dos pais e dos filhos, da mesma maneira que as propriedades da água pura não derivam da soma das do oxigénio e do hidrogénio, seus elementos constituintes. É o poder criador das sínteses - já suficientemente invocado -, e de que o Mundo anda tão afastado, talvez por excessiva, preocupação da análise.
Não posso, por isto, regozijar-me com a consagração das assembleias políticas e gostaria até que a sua existência fosse encurtada ao máximo possível. E comigo
- posso afirmá-lo - pensa toda a parte não democrática, o que praticamente equivale a dizer: toda a parte não republicana do País.
E se, em resposta a estes motivos portugueses, se quiser argumentar em americano, também se pode aceitar a discussão, embora não estejamos a apreciar uma Constituição para a América ou para o Mundo, mas apenas para Portugal. Desde já dou para isso o seguinte subsídio:
No parecer da Câmara Corporativa lê-se:

Durante a presidência de Franklin D. Roosevelt a recusa da promulgação de providências votadas pelo Congresso - o veto - verificou-se 505 vezes, ou seja 30 por cento, só nessa presidência, de todos os vetos formulados na história constitucional dos Estados Unidos (1:635).

E, talvez em consequência disto, a revista americana The Cross and the Flag escrevia no seu número de Março do corrente ano:

Durante a vida de Franklin D. Roosevelt a Constituição foi ameaçada, falseada e iludida ...
Se ele tivesse tido êxito (nas suas tentativas) ter-se-ia tornado, de facto, ditador.

505 vetos! 1:635 vetos!

O Sr. Carlos Borges: - V. Ex.ª está pondo a questão de uma república democrática, com o parlamentarismo, ou está pondo a questão de uma república presidência-

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lista, com todas as regalias e responsabilidades da república norte-americana?

O Orador: - Penso desta maneira: de quantos reis reza a História que tenham usado de poderes semelhantes?!
Será isto democracia? Em que se distingue do poder pessoal?

O Sr. Carlos Borges: - É que a monarquia tem não sei quantos séculos de existência e a república americana tem pouco mais de um século.

O Orador: - Esse argumento é contra V. Ex.ª

O Sr. Carlos Borges: - V. Ex.ª e eu havemos de nos encontrar no presidencialismo.

O Orador: - Devo afirmar, como que num parêntese, que respeito profundamente as convicções republicanas dos Srs. Deputados que as professam, e desejo que estas minhas livres afirmações não sejam tomadas como indelicadeza ou incorrecção. Respeito as convicções mesmo daqueles que para as abraçarem têm de repudiar a voz dos seus antepassados; deixam de ouvir «a voz dos seus egrégios avós».
Por mim, que não sou um Deputado monárquico, mas, apenas um monárquico Deputado da Nação, posso afirmar que devo as minhas convicções à graça de Deus e à minha inteligência; não tenho antepassados a conduzirem-me e a falarem-me à alma. Não tenho genealogia. Sou inteiramente plebeu.
Ao lado do reforço dos poderes da Câmara Corporativa, qualquer alteração construtiva quanto à designação do Chefe do Estado poderia constituir caminho aberto para a resolução do problema político português, porque o futuro da Revolução Nacional exige instantemente que o edifício em construção tenha como alicerce seguro uma independência total, uma permanência tão grande quanto, humanamente, seja possível e uma continuidade sem sobressaltos, que encontra a sua plena expressão na sucessão natural de uma família - não uma família qualquer, mas aquela que, historicamente, é a primeira da Nação o cujos membros mais representativos são especialmente educados na arte e na ciência política, ciência e arte independentes de todas as outras.

O Sr. Sousa Rosal: - V. Ex.ª, como professor distinto que é, pode esclarecer as suas referências no sentido de eu as perceber bem? Pergunto se é suficiente para que um aluno seja um técnico distinto ser bem ensinado ou se é necessário que ele tenha em si qualidades especiais?

O Orador: - A resposta a essa pergunta divide-se em duas partes: primeira, para que essa pergunta tivesse fundamento seria necessário que V. Ex.ª nos garantisse que da eleição resulta a escolha do melhor. Isso não está provado. O que está provado é o contrário. E, racionalmente, não seria possível prová-lo.

O Sr. Carlos Borges: - A melhor forma de se fazer a escolha é a eleição.

O Orador: - Por quem? O ignorante a proceder à escolha do competente?

O Sr. Sousa Rosal: - Eu perguntei apenas se um aluno, pelo facto de sor ensinado num determinado ramo, tom forçosamente de ser distinto.

O Orador: - Segunda parte da resposta: para tudo se exige competência e educação. Só para a mais alta função pública isso seria dispensável.
Não serão estas as qualidades especiais mais de recomendar?
Se V. Ex.ª amanhã estiver doente, o que prefere? Um médico, ainda que seja pouco inteligente, ou um barbeiro que se destaque pela sua inteligência?

O Sr. Carlos Moreira: - A essência é a criação e da criação é que vem a evolução e a selecção.

O Sr. Carlos Borges: - Mas a criação já é uma consequência da selecção.

O Orador: - VV. Ex.ªs conseguem provar-me lógica e historicamente que da eleição resulta o melhor?

O Sr. Sousa Rosal: - A essa pergunta respondo com outra pergunta: V. Ex.ª está convencido de que a hereditariedade resolve o problema do melhor?

O Orador: - Cientificamente está provado que a hereditariedade confirma as qualidades.
O Sr. Bartolomeu Gromicho: - Quando não houver aberrações.

O Orador: - Isso já é de natureza patológica e excepcional.
Não se deve argumentar com a excepção.

O Sr. Carlos Borges: - Os lugares da Academia das Ciências virão a ser preenchidos por hereditariedade?

O Orador: - Se eu fosse a reproduzir aqui o que se tem dito dos académicos e das Academias...
Feito o que referi, o resto que ainda faltasse surgiria por consequência; em caso contrário, tudo o que forçosamente for instituído sem os convenientes fundamentos corre o risco de ruir e de nos sepultar nos seus escombros.
Num estudo efectuado pelo Círculo de Estudos Portugueses e de que foi feita tiragem muito limitada o seu relator, ilustre professor de Direito e Procurador à Câmara Corporativa, termina um dos capítulos da seguinte maneira:

O drama político do Estado Novo consiste, por conseguinte, em:
Pretender realizar princípios de essência imutável com órgãos estruturalmente instáveis;
Apresentar como encarnação do lídimo interesse nacional instituições fundadas na mera vontade da maioria numérica em certo momento.

Se alguém não concordar e quiser contraditar, fica desde já convidado a fazê-lo no mesmo círculo de estudos.
Mas - é lícito perguntar-se - porquê um tal interesse dos monárquicos pelo futuro do Estado Novo, que, afinal, se tem organizado sob a égide da República?
Vamos responder com brevidade, mas, antes de tudo, assentemos num ponto incontroverso: toda a doutrina do Estado Novo constitui repúdio formal dos princípios republicanos e democráticos.

O Sr. Botelho Moniz: - É uma opinião. Eu, por exemplo, sinto-me bem, e sou republicano presidencialista.

O Orador: - Eu, se fosse republicano, também me sentiria bem.

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Volvamos o nosso pensamento vinte e cinco anos atrás:
Numerosos portugueses, dos mais sacrificados durante longos anos, pelos seus males e pelos males da Pátria, depois de terem feito o 28 de Maio e de nele haverem colaborado dedicadamente, aclamaram com entusiasmo a Situação que se lhe seguiu. E, quando apareceu um Homem que falou, em nome desta, a linguagem que eles imediatamente reconheceram como sua, descansaram sossegados e entregaram-se de corpo e alma à defesa e à construção do novo estado de coisas.
O integralismo lusitano, por exemplo, dissolveu-se espontaneamente, honrando assim com nobreza o& seus pergaminhos de puro movimento de ideias, que não de partido político, ávido de escalar o Poder.
Passaram-se os anos. Os problemas financeiro, económico e social foram sucessivamente equacionados e só não resolvidos inteiramente porque problemas vivos nunca têm resolução definitiva e as soluções devem acompanhar a sua evolução. Só é definitivo o que se emancipa das contingências da vida.
Porém, quanto ao problema político, parece que se apossa dos responsáveis um torpor que os inibe de dar em frente um passo largo e até os leva a sustar o desejo de caminhar manifestado por aqueles que, embora noutro sentido, se julgam também responsáveis.
E esses portugueses a quem me referi entram então em inquietação porque começam a recear que o seu sacrifício, o seu apoio, a sua colaboração possam no futuro servir apenas de alicerce a tentativas de consolidar o inconsolidável. E, pior do que isso, começam a adquirir a cruel certeza de que, a insistir-se no precário, toda a obra realizada fique à mercê de um acidente político vulgar ou da simples actuação das leis da fisiologia humana.
Não será então compreensível o anseio desta grande parte da Nação pelo futuro do Estado Novo?
São os seus sacrifícios e os seus princípios que se encontram em grave emergência!
Se eu fosse republicano estaria perfeitamente tranquilo quanto aio futuro.
O Estado Novo continua? Viva a República, que o tornou possível e durável.
O Estado Novo falece? Viva a República, restituída à sua pureza, sem coletes de força a tolherem-lhe os excessos da sua liberdade e as explorações da sua fraternidade.
E também faria coro, dizendo que a ocasião não é oportuna, etc., para amedrontar a opinião conservadora e continuar a gozar, sem encargos, o seu sacrifício feito no altar da Pátria. Mas em qualquer caso não estranharia que os monárquicos fizessem ouvir a sua voz sobressaltada e, em vez de os censurar, manifestar-lhes-ia o meu agradecimento pela sua isenção tão duradouramente manifestada, sem benefício sequer para as soías ideias.
Ao lado destas desilusões também, felizmente, muitos portugueses encontraram na proposta governamental fortes motivos de satisfação, visivelmente patentes nas modificações constantes do Acto Colonial e na tendência para uma mais aberta política social. Quero referir-me ao estabelecimento do direito ao trabalho e à ultrapassagem do. critério do mínimo nas condições de vida das classes sociais menos favorecidas.
Por minha parte exulto com o facto de na Constituição ser exarado este princípio do direito ao trabalho, direito fundamental da pessoa, embora igualmente dever sagrado, mas do qual deriva, por sentença divina, a possibilidade de aquisição do necessário à vida material e moral.
Parece que outro tanto não sucedeu à Câmara Corporativa, a qual considera este direito deveras perigoso e a ultrapassagem a que me referi destinada a não produzir qualquer resultado prático.
Sem quebra da elevada consideração que me mereço o ilustre relator do parecer, confesso que gostava muito mais da sua prosa, das suas ideias, dos seus sentimentos quando S. Ex.ª dirigia uma revista anti-republicana, antidemocrática, antiburgueza, anticapitalista, antitplutocrática, etc., do que o documento, aliás cheio de lógica e de sabedoria, que a este respeito elaborou.
Que me importa que Proudhon tivesse afirmado um dia que se lhe dessem o direito ao trabalho deixaria, por desnecessário, de combater o direito de propriedade? Restar-me-ia saber se, na sua duplicidade socialista, ele não pretendia exactamente burlar os burgueses, para que nunca, o privassem de uma poderosa arma de propaganda.
Que malefícios ou perigos poderá trazer tal disposição para o Estado ou para a sociedade, se na própria proposta vem consignado que esse direito será reconhecido nas. condições que a lei prescrever?
Talvez seja boa altura de retirarmos ao adversário o exclusivo de poder inscrever nas suas bandeiras os princípios de justiça, que nós também preconizamos, e de deixarmos de dar às massas a noção errónea de que só os inimigos de Deus e da ordem compreendem as suas aspirações e possuem remédio para os seus males.
Cada vez me convenço mais de que a falta de inteligência do capitalismo e a cegueira dos chamados burgueses constitui maior perigo para a civilização cristã
- cujos fundamentos dizem abraçar e defender, mas intensamente vão corrompendo e minando - do que o repúdio brutal ou os ímpetos demolidores dos seus adversários mais declarados.
O direito ao trabalho é, nas sociedades modernas, tão sagrado como o direito à vida e à integridade pessoal.
Considerarem-se estes dois direitos efectivamente existentes, por serem já garantidos pelas sanções penais, e apelidar-se aquele de melindrosíssimo, só porque vem criar um novo direito público subjectivo, não me parece defensável.
O direito ao trabalho deve ser, tanto como os outros dois referidos, filiado nas leis eternas do direito natural, sobretudo nos tempos que correm, em que não poder ganhar o pão de cada dia quase equivale a hipotecar o direito à vida. Para os que sofrem as agruras da miséria devido ao desemprego torna-se quase ridículo falar-se-lhe no direito u vida e à integridade pessoal.
Não serão em certos casos o alimento e o abafo factores valiosos desta integridade? Ou ela no aspecto material consistirá apenas em ter a pele sem soluções de continuidade e os ossos inteiros?
Os órgãos internos não valerão coisa alguma? Nem o equilíbrio fisiológico?
Ora o alimento e o abafo - dois requisitos essenciais à integridade vital - só se podem adquirir normalmente à custa do trabalho.
Esta expressão «direito ao trabalho», de origem socialista, é interpretada por muitos à luz desta ideologia em franca decadência; nada se opõe, porém, a que só lhe atribua um significado extra-socialista e se estabeleçam na lei as condições em que tal direito poderá ser usufruído.
Se este direito ao trabalho constitui o caminho aberto para o direito à propriedade, isto é, o direito para o proletário de se tornar proprietário, seja ele benvindo, porque será então o melhor antídoto da ideologia comunista.
Merece, portanto, louvores o Estado Novo pela coragem com que propõe se lance no diploma fundamental da Nação estes dois princípios a que me estou referindo.
Naturalmente o facto irá passar despercebido aos interessados, porque a propaganda oficial quase se tem

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limitado às distracções e às obras públicas, algumas das quais, embora exerçam uma influência notável na economia, nacional, estuo longe de politicamente, merecerem tão grande atenção.
Pena é que também não possamos louvá-lo pela sua coragem em enfrentar o problema político.
Mas, como disse António Sardinha, a esperança renasce sempre sobre os túmulos. Esperamos então em que ainda venhamos a ter voz para gostosamente o louvarmos, como tantas vezes o temos feito espontaneamente e sem alentarmos qualquer conta ao longo destes vinte e cinco anos de desterro dos mitos antinacionais.
Disse.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Duarte Silva: - Sr. Presidente: prosseguindo na orientação traçada desde que vim a esta Câmara, intervenho no debate só para apreciar a proposta de revisão do Acto Colonial, e limitar-me-ei a ligeiras considerações de ordem geral, para me deter um pouco mais sobre o chamado «caso de Cabo Verde», emitindo quanto a ele a minha opinião, que julgo poder afirmar representa o sentir da gente da minha terra, que, ao cabo de tantos infortúnios, dos quais não era certamente o menos doloroso a pouca atenção que se lhe dedicava, logra ver-se compreendida e justamente apreciada, com a satisfação da sua mais querida e anais fundada aspiração.
Por feliz me darei, Sr. Presidente, se com a minha modesta intervenção eu conseguir mostrar a sem-razão das poucas hesitações que ai mia se manifestam quanto à posição que deve ter aquele arquipélago no sistema da administração portuguesa e, assim, habilitar a Assembleia a resolver o assunto com plena consciência de o haver feito com justiça e da forma mais conveniente aos interesses da Nação.
Sr. Presidente: o relatório que precede a proposta em discussão define com clareou a sua finalidade, que é a integração do Acto Colonial no texto da Constituição, aproveitando o ensejo para retocar ou completar algumas definições, melhorar a sistematização, e relegar para a lei ordinária alguns «preceitos que não devem ter carácter constitucional.
Entende a Câmara Corporativa que não convém alterar os preceitos vigentes apenas para aperfeiçoar a sua sistematização ou tornar mais claras tendências, que já se encontram suficientemente definidas e asseguradas no texto vigente.
Julgo também que seria injustificada uma revisão constitucional apenas com esse objectivo. Mas, desde que outras razões nos levam à revisão, parece-me que é de aproveitar a oportunidade para realizar o seu aperfeiçoamento.
Exactamente porque a Constituição deve ser estável e não pode sujeitar-se a frequentes alterações é que a sua redacção necessita de ser, quanto possível, clara e precisa.
A imutabilidade ou rigidez das Constituições diz respeito aos princípios, à doutrina, e não à forma.
Por outro lado, há que atender a que após a última guerra se entrou numa nova era histórica - a idade do plástico. E, com muito mais razão, poderemos agora repetir o que em 1930 se afirmava no parecer do Conselho Superior das Colónias acêrca do Acto Colonial:

... que nos tempos que vão correndo, os preceitos constitucionais e as próprias Constituições dos estados perderam de há muito aquela linha solene, hierática, intangível, que era apanágio dos diplomas constitucionais de outras eras.
Julgo, pois, de louvar, agora que estamos a rever o texto constitucional, todas as tentativas que se façam para o melhorar, tornando-o mais claro e mais preciso.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Um dos aspectos mais discutidos da proposta, do Governo é a eliminação, que ela preconiza das expressões «colónias» e «Império Colonial».
O facto colonial está, realmente, em crise.
Quando os impérios se desagregam e o Chefe de Estado de uma potência colonial proclama solenemente que morreu o colonialismo, não podemos iludir-nos fechando os olhos à realidade. E o que vemos no Mundo actual é que os leaders das duas correntes políticas que o dominam - os Estados Unidos e a Rússia - se manifestam ambos abertamente, ainda que por motivos diferentes, contra o fenómeno colonial.
Para o Mundo de hoje colónia significa dominação, sujeição, exploração económica.
Para que agarrar-mo-nos pois a uma expressão que só designa hoje uma política que jamais praticámos e que é contra a nossa maneira de ser, sobretudo quando essa expressão é de adopção recente e nunca conseguiu plena aceitação?
Se outros, como os Franceses, que antes de nós a empregavam, a abandonaram, porque havemos nós de teimar em manter essa denominação, que, pelo menos para alguns, se presta a dúvidas e a censuras?
Nem se diga que, pondo-a de parte, nos limitamos a imitar os outros. Já em 1930 se afirmou no Conselho Superior das «Colónias que a expressão «colónia» era uma importação estrangeira, sem alcance prático nem tradição que a justificasse. O Congresso Colonial Nacional reunido nesse mesmo ano também se pronunciou pela supressão do termo. E Afonso Lopes Vieira, poeta cuja obra é toda ela repassada do mais puro nacionalismo, numa bela poesia que devia constar de todas as selectas das nossas escolas secundárias, por sua vez dizia:

Lá para alem do mar há terras nossas,
a Fé e o Império no-las foi criando
e tão nossas ficaram
pelo sangue, pela alma,
que até hoje por nossas se guardaram
entre ansiosas cobiças erriçadas
que as espreitam gulosas.
São as nossas províncias
- oh! desterrai de vez
o nome vil colónias
que não é português! -

Sou, portanto, pela supressão do termo «colónias».
E porque, com o Prof. Doutor Armindo Monteiro, considero inadequada a designação «territórios», que tem um significado restrito ao meio físico e não abrange a população, com os seus sentimentos e aspirações, nem se pode aplicar ao conjunto de valores morais que importa considerar, voto pelo regresso à tradição, não perdida inteiramente, da denominação de «províncias».
E se, ao contrário do que suponho, se verificar o terramoto que a sismologia política prevê, só temos que imitar o marquês de Pombal: enterrar os mortos e cuidar dos vivos.
Contra a designação proposta opina o mesmo ilustre professor, afirmando que lhe repugna, sobretudo, a ideia de assimilação que ela traduz e que contraria todo o sistema do Acto Colonial, que é de solidariedade.
E acrescenta:

A assimilação nunca esteve nas nossas tradições nem está na base do regime administrativo que, com mil esforços e sacrifícios - e com incontestável êxito -construímos nas últimas dezenas de

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anos. Diante das correntes internacionais que hoje empurram os «territórios não autónomos» para a independência, parece-me perigoso recuar no sentido acima de todos amaldiçoado - a assimilação.

Salvo o muito respeito que nos merece o ilustre professor e colonialista, não nos convence a sua argumentação.
Amaldiçoam a assimilação aqueles que atacam a unidade dos estados e julgam poder tirar proveito da sua desintegração.
Amaldiçoam-na aqueles a quem convém promover as dissenções internas nos países que cobiçam, para assim os enfraquecer e mais facilmente os submeter à sua escravidão.
Amaldiçoam-na ainda, por mero idealismo - a confiarmos na sua sinceridade -, aqueles que a consideram um embuste a encobrir a antiga sujeição, porque não concebam que um povo possa, sem se diminuir e sem perder as suas características, unir-se, como fez o nosso, tão intimamente a populações de outras raças, a ponto de conseguir, sem violência e apenas com admirável espírito de compreensão e de apostolado, chamá-las a si, adaptá-las aos seus usos e costumes e fazê-las participar da sua própria vida.
Não a amaldiçoam, porém, aqueles a quem mais directamente interessa: os próprios naturais das colónias, que aspiram a ser considerados cidadãos da nação colonizadora, desde que o facto seja reconhecido sem reservas e no mesmo pé de igualdade dos metropolitanos.
Diz S. Ex.ª que o sistema do Acto Colonial é de solidariedade.
Posta de parte a sujeição, considerada como a exploração dos povos atrasados, pela exclusividade dos interesses metropolitanos que tinha em vista e pelo abuso da força que ela representava, as nações colonizadoras passaram, mais marcadamente a partir do século XIX, a atribuir-se, na sua tarefa colonial, um propósito mais nobre: o exercício de uma acção civilizadora sobre as populações atrasadas.
E assim surgiram os dois novos sistemas: a assimilação, em que essa acção civilizadora visa a integrar a colónia na vida da metrópole, formando com ela uma unidade política, moral e económica, em que os interesses metropolitanos se não sobrepõem aos da colónia, antes devendo ambos ceder ao que for considerado o interesse nacional, e a autonomia, em que a metrópole prepara a colónia para a independência.
Os dois sistemas divergem, pois, no fim para que tendem: um conduz à integração e o outro à separação.
Ora, a solidariedade não nos parece que possa servir de fundamento para o exercício da actividade colonizadora. É, sem dúvida, um objectivo nobre, mas não justifica o facto colonial.
Entendemo-la como sendo a interdependência que resulta de uma ligação íntima, e pode, sob certos aspectos, existir tanto no regime de assimilação como no de autonomia.
Não será a solidariedade económica o traço mais característico da Comunidade Britânica?
Mas, se em vez de se verificar num determinado sector ela apenas abranger todas as actividades, isto é, se a solidariedade for completa, então não é mais do que um elemento da assimilação.
Esta, bem entendida, não apresenta os inconvenientes que se lhe apontam. Não conduz, necessária e fatalmente, à uniformidade absoluta, tão contrária à natureza das coisas. A assimilação deve ser concebida e praticada não como um sistema rígido, mas como uma tendência que, lenta e gradualmente, se vá acentuando. Deverá ser algo de semelhante à noção que nas matemáticas se dá de limite, isto é, a administração e as leis das colónias aproximam-se cada vez mais das da metrópole, sem nunca, porém, chegarem a confundir-se inteiramente com elas.
E, de resto, a prática por nós adoptada, mantendo para as ilhas adjacentes um estatuto administrativo próprio.
Afirma Girault que a melhor política colonial é a assimilação, desde que seja moderada e ecléctica, indo buscar aos dois outros sistemas o que têm de bom: a unidade ao princípio da sujeição e as liberdades locais e a descentralização ao princípio da autonomia.
Isto se compreende se considerarmos que a classificação é obra dos teóricos e cientistas, que, por comodidade de estudo e de exposição, procuram agrupar, por afinidades reconhecidas, os processos usados pelos povos coloniais, e que os sistemas apontados não são modelos fixos por que se tenha de optar.
Por vezes não haverá muita lógica em todos os passos de uma orientação tomada. E que a política, se constitui uma ciência, é, na prática, mais uma arte, que tem de ter em conta sobretudo os sentimentos, e o político necessita mais de ser um psicólogo do que um bom lógico.
A bem dizer, só o sistema da sujeição se encontrava em toda a sua pureza. E é por isso, e porque ele passou ao domínio da história, que se pode afirmar que morreu o colonialismo.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Os outros dois regimes, tendo por termo inevitável o desaparecimento das colónias, se os considerássemos na sua pureza, devem ter-se, pois, como tendências mais ou menos acentuadas, conforme a mentalidade do povo colonizador, a orientação política que nele domina e as condições especiais de cada colónia.
Tanto assim é que a França, considerada como seguindo a assimilação, coloca em graus diferentes, nas suas relações com a metrópole, os seus territórios ultramarinos, como também não é igual a autonomia dos diversos territórios que constituem à Comunidade Britânica.
Tendo a nossa expansão ultramarina sido levada a efeito sob o signo da Cruz e sendo seu principal objectivo a dilatação da Fé, não admira que a orientação seguida desde o início tivesse sido a que nos impunha a religião católica, no seu zelo pela dignidade da pessoa humana e pela fraternidade dos povos.
«No texto das leis e na mente dos governantes preponderava a ideia da igualdade humana», como se diz no preâmbulo do decreto que promulgou o Acto Colonial.
Não era assimilação em toda a sua pureza, que, aliás, como dissemos, nunca se verifica. Não o era também na sua fase mais marcada, que só ocorreu com a implantação do constitucionalismo quando a Administração se unificou e as diferentes secretarias do Estado passaram a ocupar-se dos negócios da sua especialidade, mesmo que respeitassem ao ultramar.
Era, porém, sem dúvida a assimilação, com o seu respeito pela personalidade do nativo e com a afirmação da unidade nacional, que são as suas características principais.
Não compreendemos, pois, como se possa afirmar que a assimilação nunca esteve nas nossas tradições.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - São numerosos os textos que nos acreditam como partidários desse sistema e assim somos considerados pelos tratadistas de direito colonial.

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E o mesmo ilustre professor implicitamente o reconhece quando, a propósito do artigo 2.º do Acto Colonial, afirma: a nenhuma das nossas populações era com ela diminuída; a tarefa colonizadora pertencia a toda a Nação».
A política da assimilação está na nossa maneira de ser, na nossa mentalidade e nos nossos hábitos. Quando das visitas do Chefe do Estado ao ultramar, a sua primeira afirmação foi: «Aqui é Portugal», afirmação que não representava um mero cumprimento ou uma frase de efeito, antes traduzia o pensar e o sentir de todos os portugueses.
Se pode causar estranheza que nós, partidários da assimilação, condenemos a uniformidade administrativa, o que se nos afigura incompreensível é que a mesma uniformidade se já defendida por aqueles a quem repugna a ideia de assimilação.
Já dissemos que consideramos a assimilação como uma tendência que não pode ser levada até ao extremo e que, como aconselhava Girault, deve ser corrigida com uma adequada descentralização.
Ocorre salientar que entre nós se tem continuado a confundir a descentralização, que diz respeito aos órgãos locais não dependentes do Governo, com a desconcentração de poderes, que amplia a esfera de competência das autoridades dependentes do Governo. Diz o citado tratadista francês que a desconcentração era própria do regime de sujeição, em que era necessário conceder aos governadores poderes latos, e refere que o governador de Batávia tinha tão grandes poderes que bem se podia dizer que o Ministro das Colónias não era senão o seu correspondente e representante na Europa.
Contra a excessiva concentração que se adoptou entre nós manifestou-se António Enes no seu relatório sobre Moçambique, escrevendo:

O regime das relações entre o governo central e o provincial precisa ser alterado, e alterado em dois sentidos: ampliando-se a esfera de acção ordinária e legal deste último governo e restringindo-se-lhe a esfera de acção extraordinária ou ilegal. Presentemente esta esfera é indefinida e aquela demasiadamente acanhada. Os governadores-gerais mal podem mover-se dentro da lei, mas permitem-se-lhes com absoluta irresponsabilidade todos os saltos e todas as correrias fora da legalidade. Em princípio, é o Terreiro do Paço quem governa todo o mundo português, mas como o Terreiro do Paço não pode nem com o mero expediente de tanta glória, abdica, e abdica arbitrariamente no arbítrio das autoridades provinciais. Esta abdicação é inevitável e, não podendo a legislação evitá-la, tem de regularizá-la.

A descentralização, que é mais própria do regime de autonomia, consiste em intensificar a administração local, que fica entregue aos próprios interessados, limitando-se o governo central e as autoridades dele dependentes a mera fiscalização.
A sua utilidade é evidente. Além de ser de presumir neles um melhor conhecimento dos problemas locais, os administrados, compartilhando da administração, não só tomam mais interesse pela coisa pública, como ficam em condições de apreciar com mais justiça os actos do Governo.
Depois, convém não esquecer que a participação na administração local é a melhor preparação para a arte de governar.
E, porque assim é, julgamos que à política da assimilação, tal como a entendemos, não repugna, antes convém, uma certa descentralização administrativa.
É claro que nos referimos a uma descentralização que o seja na verdade.
A Constituição de 1911, as Leis n.ºs 277 e 278, de 15 de Agosto de 1914, e vários diplomas posteriores, incluindo o Acto Colonial e a Carta Orgânica do Império Colonial, prescreveram para as províncias ultramarinas o regime de descentralização administrativa e a autonomia financeira.
A verdade é que tudo isso não passou do papel.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A administração local, salvo uma ou outra rara excepção, tem estado entregue a comissões nomeadas pelos governadores e compostas, na sua maioria, de funcionários públicos, quase sempre sem outra ligação à terra que não seja a residência temporária nela.
Quanto à autonomia financeira, bastará para elucidação da Assembleia que eu refira a VV. Ex.ªs um caso que se passou em Cabo Verde.
O arquipélago tem, como se sabe, uma vida financeira difícil. De entre as suas receitas, logo depois dos direitos de importação, que ocupam o primeiro lugar, sobretudo por causa dos combustíveis importados para fornecimento à navegação, avulta o rendimento das taxas telegráficas que são pagas pelos telegramas que transitam pelos cabos submarinos que amarram em S. Vicente.
Essa receita andou largos anos desviada dos cofres de Cabo Verde e foi necessária uma verdadeira luta para que a Administração-Geral dos Correios, Telégrafos e Telefones da metrópole, então dirigida por um dos grandes chefes políticos da época, consentisse na sua entrega à colónia, apesar de haverem sido promulgados alguns diplomas legais que tal determinavam.
Pois bem! Pelos Decretos-Leis n.ºs 28:415, de 15 de Janeiro de 1938, e 29:039, de 6 de Outubro do mesmo ano, foram reduzidas de um terço essas taxas de trânsito, estabelecendo-se ainda que não haveria duplicação, do que resultou ficar Cabo Verde a receber dois terços do que dantes lhe cabia nos telegramas que não transitam por outra estação em território português e apenas um terço naqueles que transitam.
Esclareço desde já que não estou a criticar a medida tomada, admitindo mesmo que ela tenha sido boa, mas tão-sòmente aponto o facto para salientar que no caso não foi a colónia ouvida ou achada.
Poderá dizer-se que tem autonomia financeira uma entidade à qual se altera, sem a sua intervenção, uma das suas principais receitas?
Em que consiste a autonomia?
Os orçamentos, feitos dentro de normas rígidas, são alterados na metrópole como esta entende e não pode, por si só, o governo da colónia fazer a mais insignificante transferência de verba.
Por outro lado, a existência dos quadros comuns traz por vezes encargos importantes para uma colónia pobre, como Cabo Verde.
Os funcionários para ela transferidos procuram, com certa razão, evitar ou adiar quanto possível o prejuízo material que a colocação em colónia de vencimentos pobres para eles representa e, de passagem pela metrópole, esgotam todas as licenças que possam obter, na esperança de conseguirem a colocação noutra colónia. Só em último caso seguem para Cabo Verde, onde procuram demorar-se o menos tempo possível. E, como as passagens e os vencimentos durante as licenças constituem encargo da colónia onde o funcionário está colocado, Cabo Verde tem pago muita vez vencimentos e passagens e até paga pensão de aposentação a funcionários que nunca lhe prestaram qualquer serviço.

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Mas, Sr. Presidente, já me alonguei mais do que desejava e é tempo de pôr termo a estas considerações gerais e passar a ocupar-me do chamado caso de Gabo Verde.
Na sessão de 5 de Abril de 1949 tive ocasião de afirmar que o progresso económico de Cabo Verde dependia da resolução de um outro problema - a sua organização administrativa. E depois de me referir à opinião de notáveis estadistas, como Sá da Bandeira, Oliveira Martins, Ferreira do Amaral, Dias Costa e, nos nossos dias, o Doutor Vieira Machado, que reconheciam todos a condição especial de Cabo Verde e admitiam a hipótese da sua desintegração do sistema colonial, acrescentei:

É que, na verdade, Sr. Presidente, Cabo Verde não apresenta aquilo que mais caracteriza as colónias: a existência de uma população com língua, organização social, religião e usos próprios que determinem a necessidade de se lhe aplicar uma legislação diferente.

Como é sabido, as ilhas de Cabo Verde não eram habitadas quando foram descobertas e o seu povoamento fez-se com elementos idos da metrópole, sobretudo do Algarve e da Madeira, aos quais se juntou depois o elemento africano, trazido da costa da Guiné.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - A colonização fez-se, pois, inteiramente à vontade do elemento metropolitano, sem necessidade de respeitar quaisquer usos ou de transigir com instituições Locais, que não existiam.
Constituiu-se, assim, uma sociedade nova, em tudo semelhante à que os colonos haviam deixado na Europa, e, por isso, quem da metrópole for visitar o arquipélago nenhuma novidade encontrará, pois, salvo uma pigmentação mais forte, derivada certamente da sua localização entre os trópicos e de uma maior percentagem de sangue africano, o cabo-verdiano, não apresenta diferenças essenciais do metropolitano: vive como ele, ainda que, em geral, mais pobremente, fala a mesma língua, se bem que corrompida e semeada de arcaísmos, tem a mesma religião, veste-se da mesma forma e até apresenta uma taxa de analfabetismo inferior à de muitos dos distritos do continente.
E assim é que o metropolitano se sente absolutamente no meio quando chega a Cabo Verde, do mesmo modo que o cabo-verdiano não estranha o ambiente da metrópole.
Até 1879 esteve a Guiné administrativamente ligada a Cabo Verde, formando o conjunto um governo-geral.
Compreendia-se então que tais territórios, abrangendo uma população ainda não totalmente assimilada e parte da qual, possuindo usos e costumes próprios, se encontrava em atraso, necessitando por isso de leis adequadas que lhe garantissem uma certa protecção, estivessem submetidos a um regime especial, como aquele que se adopta para as colónias.
Hoje, porém, existindo no arquipélago apenas civilizados, não há razão para que continue a reger-se por leis administrativas que se destinam aos povos atrasados, quando as outras leis, como o Código Civil, o Código Comercial, os Códigos de Processo, ali se encontram em pleno vigor e se aplicam indistintamente a todos os seus habitantes.
Dissemos há pouco que a política colonial portuguesa se orienta no sentido da assimilação, cujo termo final é a integração da colónia no sistema metropolitano.
Ora Cabo Verde, como se vê, atingiu já o grau de civilização suficiente para se incorporar na administração metropolitana.
Não o admitindo, a metrópole renega a sua própria obra. Há dezenas, há mais de uma centena de anos, já os estadistas consideravam o arquipélago bastante adiantado no caminho da integração. O próprio Girault, no seu livro, publicado em 1907 (vol. I, p. 57), expressamente admitia essa possibilidade.
Queremos nós afirmar que foram inteiramente perdidos os sessenta anos que decorreram desde que Ferreira do Amaral anunciou que Cabo Verde se encontrava já na transição da condição de colónia para a de arquipélago adjacente?
A Espanha considera as Canárias uma província metropolitana, e, todavia, não estão muito mais próximas da metrópole do que Cabo Verde.
A França equiparou aos departamentos metropolitanos os territórios da Reunião, da Martinica, da Guiana e da Guadalupe, todos eles também mais distantes.
Devo dizer que Cabo Verde não se sente menos português na sua actual condição de colónia. Tem pelas outras províncias do ultramar o carinho fraternal que a solidariedade que sempre lhe manifestaram bem justifica. Simplesmente a Reforma Administrativa Ultramarina, feita para territórios em que, ao lado dos civilizados, existem populações ainda em atraso, é inadequada a Cabo Verde, onde só têm aplicação aquelas disposições que são comuns a todos os códigos administrativos.
Ao contrário, o Estatuto dos Distritos Autónomos das Ilhas Adjacentes adapta-se-lhe inteiramente, cumprindo apenas ter em conta que, sendo o grosso das receitas constituído pelos impostos indirectos, haverá que adoptar um critério diferente na distribuição das receitas cobradas.
Cabo Verde tem sido vítima da sua condição de colónia e do sistema administrativo adoptado para as colónias.
O retrocesso administrativo verificado nos últimos anos é confrangedor. De doze câmaras municipais que funcionavam há vinte anos restam apenas duas, tendo as outras sido substituídas por juntas locais, de acção limitada e de recursos reduzidos.
Eleições administrativas, cuja animação era índice seguro do interesse dos administrados, nunca mais só fizeram. Ao tempo existiam três comarcas e em cada ilha funcionava, pelo menos, um julgado municipal, com um juiz e um subdelegado. Hoje há só duas comarcas - em S. Vicente e na Praia - e nos restantes concelhos funcionam como juizes instrutores os respectivos administradores, com todos os inconvenientes que resultam, sobretudo nas terras pequenas, da concentração de funções administrativas e judiciais nas mãos do mesmo indivíduo.
Os juizes municipais e os subdelegados eram outrora, por assim dizer, fiscais dos administradores, a cujos possíveis desmandos serviam de travão, para garantia e tranquilidade dos cidadãos.
Hoje, tal como sucede no sertão, os administradores são omnipotentes e não há recurso operante dos excessos que possam praticar, pois, como dizia surpreendido
aquele funcionário a que se refere o Dr. Brito Camacho, as ilhas são separadas umas das outras e as comunicações são hoje mais difíceis do que antigamente.
Dir-se-á que existe o telégrafo. Mas, além de que só serão transmitidos os telegramas que o administrador do concelho considere como não alarmantes ou tendenciosos, da eficiência, das comunicações telegráficas em Cabo Verde talvez VV. Ex.ªs já tenham avaliado se leram no Diário de Noticias de 29 de Março último uma correspondência publicada sob o título «Navio desarvorado em águas de Cabo Verde».
Nela se lê que à Brava chegou um bote que o navio em perigo enviara a pedir socorro, mas, como a estação

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telegráfica daquela ilha já estava fechada, a notícia só dois dias depois foi recebida na ilha do Fogo, que fica a uma distância de pouco mais de vinte quilómetros.
Do que fica dito resulta que da orientação uniformizadora da nossa administração colonial derivou um incontestável retrocesso para Cabo Verde, que assim é vítima do que nos podemos chamar uma assimilação regressiva.
Que pena, Sr. Presidente, não nos confinarmos à observação e à experiência dos que viveram no ultramar e não conseguirmos resistir à tentação de imitar o estrangeiro ou de experimentar inovações!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Já no relatório de António Enes se dizia:

Deixemo-nos de uniformidades e simetrias. O vício fundamental da nossa legislação ultramarina é ser em parte a do reino em parte uma imitação ou um simples arreglo dessa, quando, pelo contrário, devia variar não só do reino para o ultramar, senão também de província para província do ultramar, considerando também as variações naturais de toda a espécie que se dão dentro da mesma província.

E, todavia, a uniformização intensificou-se.
Voltando ao caso de Cabo Verde:
Importa considerar que ali não encontramos o traço característico do ambiente colonial: a existência de duas populações distintas que se enfrentam e a que se devam aplicar estatutos pessoais diferentes.
A Câmara Corporativa, reconhecendo-o, afirma que o arquipélago se pode considerar colonizado. Chegou ao termo previsto na assimilação, pelo que deve deixar de ser considerado colónia.
Cabo Verde é, como a Reunião, uma colónia muito semelhante às do tipo antigo, fundada por elementos metropolitanos que se estabeleceram em território não habitado.
É certo que na formação da sociedade caboverdiana interveio também um outro elemento - o africano.
Mas, se considerarmos que o elemento africano apareceu posteriormente, trazido pelo europeu para uma terra estranha, onde passou a viver com ele, em contacto permanente, e nunca se manteve em grupo à parte, antes se diluiu no seio das diferentes famílias europeias, não nos custará a compreender que nenhuma resistência ele poderia opor à assimilação dos hábitos e da civilização dos europeus e que logo os tivesse adoptado.
Diz o parecer que em Cabo Verde existe uma considerável população negra que, embora não seja indígena, também se não pode dizer civilizada.
Pondo de lado a cor, que supomos não ser de considerar, diremos que o que existe em Cabo Verde é precisamente o mesmo que aqui, no continente, se encontra em alguns pontos: não falta de civilização, mas miséria pura e simples; famílias que vivem em furnas ou cavernas, sem roupa e sem pão, no maior primitivismo.
Há que atender ao facto apenas para o remediar, e não para dele concluir a necessidade de um sistema diferenciado de administração.
Apoiados.
Também não é exacto dizer-se que existem em Cabo Verde três grupos étnicos, o que poderia levar à ideia, falsa, da ausência de uma população possuidora de um teor uniforme de civilização e à consequente necessidade de um estatuto que atendesse à diversidade existente.
Em Cabo Verde não se pode, com rigor, falar em grupos étnicos. O que há é, como em toda a parte, diferentes classes, nascidas não do factor étnico, mas do factor económico e do comportamento dos indivíduos perante as oportunidades que se lhes ofereçam ou saibam criar. Como para o Brasil salientou Gilberto Freire, é mais um problema social e de cultura material e moral do que um problema étnico.
Não há que considerá-lo no sistema de administração.
Também se diz que o arquipélago tem uma economia africana. Sob esse aspecto não vemos que difira do da Madeira, que, aliás, muito deve ter influído na sua formação, sabido que entre os primeiros colonos abundavam os madeirenses.
O próprio parecer da Câmara Corporativa conclui afirmando que Cabo Verde poderia passar do estatuto de colónia ao das ilhas adjacentes, apenas pondo em dúvida os benefícios que dessa mudança poderia colher o arquipélago e ponderando que ela deverá ser feita com a maior circunspecção. Apresenta mesmo a respectiva proposta, que eu aceito, embora entenda que será mais próprio de um texto constitucional enunciar o princípio de forma mais categórica, ainda que a sua realização tenha de ser gradual, como é evidente.
Sr. Presidente: quando há cinco anos se discutiram nesta Assembleia as alterações à Carta Orgânica do Império Colonial Português, tive oportunidade de me pronunciar sobre o assunto e, depois de afirmar que tal modificação, constituindo o desenvolvimento lógico do regime de assimilação e prova irrefutável do génio colonizador da Baça, representava para a colónia uma conquista de valor, concluía:

Pràticamente, porém, importa não corrermos atrás de meras vantagens teóricas ou ideais e estudarmos cuidadosamente o que convém a Cabo Verde, já que os próprios arquipélagos dos Açores e da Madeira ainda hoje têm necessidade de um regime especial. E assunto que estou estudando com interesse, e a seu tempo, se for caso disso, apresentarei à consideração de S. Ex.ª o Ministro das Colónias, visto ser a ele que compete a iniciativa de uma proposta de tal natureza.

Passaram-se cinco anos e hoje existe em mim a convicção radicada de que a integração de Cabo Verde no sistema metropolitano é a única solução que permitirá a realização das medidas de que o arquipélago necessita para o seu progresso e bem-estar.
A sua insuficiência financeira impede-lhe progredir na condição de colónia.
No sistema colonial Cabo Verde é uma anomalia. Integrado no sistema metropolitano terá as condições de vida que convêm ao seu estado de adiantamento e que lhe podem proporcionar um maior progresso, a que tem direito.
Impõe-se, pois, a sua transformação em dois distritos autónomos, com estatuto semelhante ao da Madeira e Açores.
Sei que não é assunto que se resolva inteiramente de um momento para outro. A sua execução demanda algum tempo e terá de ser feita gradualmente. Mas que fique expresso o princípio, deixando-se ao Governo, como não podia deixar de ser, a oportunidade da sua execução.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: diz o povo que Deus escreve direito por linhas tortas.
Quis a Providência, servindo-se da particular simpatia que por nós tem mostrado certa potência, que Portugal não pertença à O. N. U., cuja sanha anticolonialista se tem manifestado sem desfalecimento, a ponto de, nas resoluções de Dezembro de 1949, se ter

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constituído em juiz supremo das decisões sobre anexação, integração ou assimilação tomadas pelas potências coloniais.
Não é o nosso país membro da O. N. U., mas, que o fosse, nenhuma dúvida se poderia levantar acêrca do caso em questão, visto que é o próprio território não autónomo, é toda a sua população, que deseja e pede a sua integração na metrópole.
É interessante que seja a própria colónia que, consciente da sua maturidade, deseje, não a independência, como tanto está em moda, mas a sua integração.
Nestes tempos de feroz anticolonialismo, em que se encorajam e .promovem movimentos de rebeldia dos chamados povos não autónomos contra aqueles que os dirigem, é bem significativa esta atitude, como é desvanecedor verificarmos que as nossas províncias ultramarinas estão unidas à Mãe-Pátria por laços indissolúveis, a ela estão ligados, mais que por interesses materiais, pelo sangue e pelo espírito.
É que sempre fomos portugueses pelo coração e pela inteligência o continuamos a ser, e esse, bem alto o proclamamos, é o nosso maior orgulho.
Tenho dito.

Vozes! - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Ribeiro Cazaes: - Sr. Presidente: também assinei o cheque em branco passado ao Sr. Doutor Oliveira Salazar!
E assinei-o quando as assinaturas não abundavam.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Assinei-o com longos dias de prisão, com as horas de martirizante ansiedade a ouvir, discutir o meu exílio, com a amargura de ver dissolvido o meu batalhão - o batalhão de caçadores n.º 5 -, fundado pela devoção, pelo sacrifício, pelo esmagamento das legítimas ambições de moços oficiais, que procuraram, assim, erguer uma fortaleza que fosse a garantia segura de que a voz de comando da Nação, soltada em 28 de Maio de 1926, seria cumprida, custasse o que custasse, doesse a quem doesse.
Esta a razão fundamental por que subo agora à tribuna da Assembleia Nacional, a intervir no debate sobre a proposta de lei de alteração da Constituição Política.
Do documento em discussão interessa, em meu entender, verificar, acima de tudo, o que ele representa e define como projecção futura na vida do País.
Sim, Sr. Presidente, eu julgo, talvez por insuficiência, que a lei fundamental dum país, tronco de todas as mais leis, deve, não só definir os princípios em que a Nação se alicerça, mas também, como verdadeiro farol da vida dum povo, abrir, bem rasgado, bem iluminado, o caminho do futuro.
Ora, da análise da proposta de lei que se discute talvez ressalte, em relação ao passado, uma melhoria sensível pelo que respeita à definição das características alicerçais da nossa raça, mas vejo ainda tão cerrados como até agora os horizontes da vida portuguesa.
Deve ser assim?
Deve caminhar-se de olhos nos pés?
Penso que não.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Os homens de 26, dando-se todos ao bem comum, acalentaram sempre o sonho alto de reintegrar Portugal na sua trajectória histórica e rasgar
para seus filhos os caminhos da vida, que garantissem um futuro de paz e de grandeza.
Passados vinte e cinco anos de lutas, de sacrifícios, de constante labor (que a minha geração desejaria ver definidos na história como época de ressurgimento), olho em redor e pergunto onde estão os homens a quem devemos passar o facho, olho para diante e vejo o horizonte cortado por cordilheiras intransponíveis, cobertas de espesso nevoeiro, mais cerrado agora pelo fumo dos incêndios que abrasam o Mundo.
E sinto, por isso, uma profunda amargura como soldado e como pai.
Onde estão os homens, nascidos da minha geração, que hoje, já na pujança da vida, deviam ser armados cavaleiros, mostrando-se capazes de garantir o existente e ir mais adiante?
Onde está quem possa continuar Salazar?
A proposta de lei em discussão responde de algum modo a estas perguntas?
Creio que não.
Ao formulá-las desejaria que se compreendesse que o faço com unia amargurante ansiedade, a que a sombria recordação do tempo vivido depois da morte de Sidónio empresta um especial significado.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Então, como já disse nesta Assembleia, ainda quase imberbe, senti-me, como todos os que procuravam olhar para diante e para mais alto, esmagado por uma disciplina definida e apregoada pôr quem só tinha olhos para o momento que passava, enleado num conceito de obediência de cuja falsidade só mais tarde, muito mais tarde, me apercebi.
Hoje, ao encarar o futuro, as perspectivas que se apresentam ao meu espírito não são infelizmente melhores.
Mas não voltarão a encontrar-me, ingénua e confiadamente ..., aguardando, como nessa época já distante - afirmei-o há tempos nesta Casa e volto a repeti-lo!
Continuo a honrar a minha assinatura no cheque em branco. E não faço tal afirmação como receoso credor, antes com a segura confiança de quem pensa que talvez não tenha sido possível ir mais adiante agora e ... sabe esperar.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mas seja-me permitido, por isso mesmo, dizer mais algumas palavras, que, se outro merecimento não tiverem, devem significar bem claramente o meu firme desejo de leal colaboração.
Um dia, já lá vão muitos anos, numa reunião duma boa centena de oficiais discutia-se quem deveria assumir as funções de Ministro da Guerra. Considerava-se então instante este problema.
Falei em último lugar e até, confesso, sem esperar ter de fazê-lo.
E naturalmente, lealmente, expus o que pensava, face às necessidades que os meus limitados conhecimentos de política militar e de política de guerra pareciam aconselhar, concluindo com a afirmação de que o problema só seria resolvido capazmente se Salazar assumisse as funções de Ministro da Guerra.
Ergueu-se um coro de protestos, quase de imprecações, quando tal disse, mas daí em diante, dia a dia, se avolumou a ideia lançada naquele momento.
As reformas militares de 1937 e o nível a que o Exército subiu com Salazar e Santos Costa vieram dar-me razão.
Se outra reunião tivesse havido para encarar o problema da educação nacional, diria sem hesitações que a solução ideal estava em Salazar.

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E hoje, tantos anos volvidos, hoje, face ao panorama desalentador que em redor de nós se desenrola e nos leva a perguntar, ansiosamente, a quem entregaremos o facho, chego a pensar que talvez fosse melhor que o problema do Exército tivesse ficado para trás.
Mas basta de carpir mágoas, que podem dar um aspecto que está longe do meu espírito.
O que interessa encarar é isto: para onde vamos? O que vem depois de Salazar e de nós?
Julgo que talvez pudesse melhorar-se a perspectiva se, desde já, um escol de homens garantisse a continuidade do nosso esforço.
Não me parece que através do Conselho de Estado, tal como está definido na proposta de lei em questão, assim suceda, antes vejo nele graves inconvenientes pelo que respeita à sua composição e atribuições. Também sou de opinião, como já aqui foi dito, que a sua acção fará perder altura ao Chefe do Estado.
Não seria melhor organizar um conselho mais amplo, que tivesse como atribuição fundamental proclamar o Chefe do Estado?
Se desse Conselho fizessem parte em maior número homens escolhidos pelo povo, a par dos que, pela sua posição, ali devessem ter assento, a voz do povo, traduzindo, como diz o rifão, a voz de Deus, não deixaria de fazer-se sentir, alcançando-se assim o maior benefício atribuído à eleição - como é desagradável esta palavra - realizada por sufrágio directo, a qual oferece muitos inconvenientes e, em determinados momentos, gravidade séria, como todos sabem e até o sentiram já.
Não desejo maçar a Câmara dissertando sobre o que se tem dito e escrito por esse mundo de Cristo desde que as constituições se inventaram. Não o faria tão profundamente nem com o brilho dos oradores que me antecederam (não apoiados) e que têm emprestado à Assembleia Nacional uma altura que lhe dá o aspecto, por vezes, mais de uma academia do que de uma câmara política.
Confio nesse alto espírito para que os Srs. Deputados saibam ser generosos, compreendendo e desculpando a minha fraca contribuição neste debate, de tão alta importância e de especial melindre.
Penso que será desnecessário desfiar argumentos para defender a minha sugestão e lucubrações culturais a tal respeito parecem-me descabidas aqui.
Também só valerá a pena articulá-la se alguém achar que é digna de ser considerada.
Pareceu-me a melhor solução para responder, de momento, respeitando, embora, as ideologias políticas de cada um, mas ultrapassando-as, às perguntas que sombreiam o espírito de todas as almas bem formadas e são a preocupação dominante dos soldados da Revolução Nacional: como garantir o que está? O que vem depois de nós?
Compreendo que quem dirige superiormente a vida do Estado não possa ter seguido caminho diferente do que traçou na sua proposta de lei e que mais além conduza, da mesma forma que terá necessidade de servir-se, de quando em quando, de quem não desejaria, encontrando-se assim, por vezes, a conveniência política com a satisfação das vaidades sem freio, que esmagam tudo o que é respeitável e sagrado.
Por isso mesmo, antes de concluir, desejo afirmar que a minha sugestão, ditada pela angustiosa ansiedade do meu espírito, não representa de forma alguma «casamata» em que me recolha para destruir o cheque em branco que assinei.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Galiano Tavares: - Não tencionava, Sr. Presidente, subir à tribuna para entrar neste debate na generalidade. Parecia-me efectivamente que a doutrina contida e expressa no artigo 5.º da Constituição não suscitaria problemas de índole essencialmente política, até porque nem fora motivo de qualquer emenda ou correcção.
No decorrer das últimas sessões tenho assistido com surpresa, mas também com optimismo, a divagações de filosofia política - dizia Lessing que por vezes há maior prazer em correr atrás das lebres do que em as apanhar -, tendentes a demonstrar que, sob o aspecto nacional, uma só doutrina é possível defender, uma só atitude é patriótica: a substituição do regime, o regresso à Monarquia.
Não contesto a ninguém o direito de livremente expor os seus conceitos ou os seus sentimentos quando eles traduzem uma convicção ou supuram mesmo um inofensivo saudosismo ... quase histórico.

O Sr. Morais Alçada: - V. Ex.ª dá-me licença? V. Ex.ª tem a certeza de que essa palavra «supurar» é realmente a própria para significar a ideia citada por V. Ex.ª?

O Orador: - Supurar é fazer sair à supuração. Não vejo que esta expressão não seja própria.

O Sr. Carlos Moreira: - Mas supurar é trazer à superfície aquilo que purga.

O Orador: - Eu devo esclarecer que esta palavra não tem quaisquer intuitos ofensivos, e seria incapaz de me servir desta tribuna para o fazer.
Acho que o assunto assim explicado não dá lugar a qualquer dúvida.

O Sr. Morais Alçada: - Quero crer que assim fosse. Mas, para evitar equívocos, não estou arrependido da minha interrupção. V. Ex.ª esclareceu-se e, por mim, estou satisfeito.

O Sr. Carlos Moreira: - A minha interrupção é por motivo um pouco diferente: é que V. Ex.ª começou por afirmar que não está em discussão o artigo 5.º De facto, não está, mas ninguém, que eu tenha dado por isso, se referiu ao artigo 5 º Agora o que aqui se discutiu largamente foi a matéria dos artigos 72.º e seguintes, que dizem respeito a eleição do Chefe do Estado.

O Orador: - A discussão na generalidade serviu para focar e pôr problemas como aqueles a que me estou a referir, no uso de um legítimo direito que tenho e que ninguém me contesta. E V. Ex.ª está a querer contestar-me esse direito, o que não pode ser.

O Sr. Carlos Moreira: - Eu não contesto nenhum direito.

O Orador: - Eu sei ser correcto, ainda que tenha vibração e entusiasmo como V. Ex.ª Eu não contesto a ninguém que exponha os seus pensamentos, quando eles realmente traduzam uma opinião sincera, e, portanto, não posso permitir, repito, que tal direito me não seja facultado.
As citações que tenho ouvido ler de discursos do Sr. Presidente do Conselho entendo acrescentar este passo:

Eu sei o que valem e custam convicções sinceras para que não tenha por elas absoluto respeito: não

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se ordena à inteligência que deixe de olhar a verdade onde a vê.
Mas as ideias não tom sempre força realizadora nem utilidade prática; por vezes morrem para a acção, e importa não deixar os homens amarrados a cadáveres.
Salvo raras excepções, as monarquias na Europa com carácter de solidez e estabilidade acantonam-se ao norte, onde é geral e radicada a convicção de caber no seu seio todo o progresso e de que ao seu abrigo se podem realizar as mais profundas reformas económicas e sociais.
Estas monarquias mesmo são, mercê dos tempos que vivemos, quase só republicas hereditárias.

Com efeito a Câmara dos Comuns, por exemplo, sabem-no VV. Ex.ªs Srs. Deputados, é uma assembleia soberana e constituinte. Pode fazer ou revogar qualquer lei, mudar a forma de governo e a própria sucessão da coroa, extinguir os mais sagrados direitos. Não há distinção legal entre si e o povo porque a totalidade dos seus direitos e das suas faculdades civis residem em si mesma. É prática e legalmente a única depositária da autoridade da nação, irresponsável e omnipotente adentro da órbita da lei.
Prosseguindo na citação:

Para o sul e para leste, mesmo tendo em conta as pressões de ordem externa que explicam algumas transformações políticas, formou-se a convicção nas camadas mais extensas da sociedade de que certas reivindicações sociais eram mais facilmente realizáveis sob a república que sob a monarquia e aquelas são mais progressivas que estas.
A persistir nos espíritos a posição indicada, a ideia monárquica tem perdido, não se sabe por quanto tempo, a sua força actuante. Ponto é que, em frente das ondas revolucionárias, as repúblicas sejam ou queiram ser regimes de ordem e de autoridade e os povos tenham a certeza de que estão sob o seu domínio defendidos e seguros.

Estamos, contudo, na Assembleia Nacional e tem cada um de nós responsabilidades marcadas, imperativos de consciência e de formação mental e até de lealdade a um regime que, pela sua ética, pelos seus métodos, pela sua própria estrutura e pela probidade de quem o representa e simboliza, há mais de vinte anos tem contribuído iniludìvelmente para demonstrar que o regime republicano não é incompatível com a perenidade da Pátria Portuguesa e até porque reputo a lição do Sr. Presidente do Conselho como susceptível de «criar escola activa» e ter, portanto, continuadores.
E como não admiti-lo, se S. Ex.ª tem sido paradigma de clarividência, de argúcia, de habilidade e tacto para um mundo em constante sobressalto, em crise de conduta e principalmente «m crise de caracteres!?
Sinto neste aspecto que o seu exemplo pessoal, o seu estoicismo, o seu poder de inibição não têm sido quiçá adoptados como regra de vida por alguns que se inculcam como seus discípulos, mas aqui mesmo, nesta Assembleia, tenho ouvido proclamar com insistência e por certo com sinceridade o refrain que tenho repugnância em considerar apenas verbal para não o dever mencionar: temos uma doutrina.
Sr. Presidente: não tenho passado político público, mas tenho tido sempre convicções políticas e, mesmo quando execrava a poluição de certos corifeus e caudilhos da demagogia, sabia ressalvar os homens honrados que serviram a República e que se sacrificaram.
Ainda há pouco o Sr. Deputado Ricardo Durão evocou o nome de Manuel de Arriaga, e outros se poderiam relembrar, numa revisão crítica de valores, se nesta tribuna fosse oportuno fazer nesta conjuntura a apreciação moral e política de alguns dos seus homens, suas vítimas. Les Dieux ont soif ...
E quando no início desta legislatura ouvi um ilustre Deputado prestar homenagem fervorosa e eloquente a um dos últimos monarcas portugueses, ocorreu-me, por analogia, que também esse caluniado representante da realeza baqueou em holocausto a um regime envilecido pelos erros dos seus próprios sequazes e cortesãos. Les morts qui parlent ...
O Comércio do Porto, em «Notas políticas» logo após o regicídio, escrevia:

Sejam quais forem as origens do criminoso atentado, é incontestável que elo veio integrar-se num mal-estar que há muito se faz sentir na nossa existência política.

E a seguir:

... por qualquer forma que se encare o atentado de 1 de Fevereiro de 1908, foi, sem dúvida, um desvario; mas para aqueles que souberem ver o fundo dos acontecimentos as duas vítimas das armas homicidas não expiaram culpas próprias; foram imoladas a essa pecaminosa indiferença, a essa desordem moral que na sociedade portuguesa vem manifestando-se há muitos anos.

O Sr. Jacinto Ferreira: - V. Ex.ª dá-me, licença? V. Ex.ª com as suas palavras quer significar que foram os monárquicos que mataram o rei D. Carlos? Parece que está provado que foram os republicanos.

O Sr. Ricardo Durão: - Perdão, mas isso é que não está.

O Sr. Jacinto Ferreira: - Não foi a Maçonaria? E a Maçonaria não estava ligada aos republicanos?

O Sr. Ricardo Durão: - Na Maçonaria existiam tanto republicanos como monárquicos.

O Sr. Morais Alçada: - Não está provado que tivessem sido ou monárquicos ou republicanos, porque o regime que se sucedeu não consentiu nem quis que se provasse. E na minha terra costuma dizer-se que tão ladrão é o que vai à vinha como o que fica ao portão ...

O Orador: - Já decorreram bastantes anos para que a história se possa fazer. De resto, VV. Ex.ªs lêem os caudilhos monárquicos da época e ai há muito que. observar e coligir para se chegar a uma conclusão. Verbero esse atentado e afirmo aqui a minha homenagem a D. Carlos, apesar do ser republicano.
Confrange-me, mas não me atormenta, porque confio na unidade nacional, que promana de uma coesão étnica e territorial indestrutível («com todos os harmónicos sentimentais que lhe acompanham a sonoridade fundamental e lhe dão timbre acentuadamente emotivo, a noção da pátria prende-se - escreve Leonel Franca - imediatamente a terra pátria e por ela aos ascendentes, a quem devemos a vida»), o panorama que se desfruta: em nome de uma coerência de ficção, puramente romântica, há ainda republicanos que consideram a colaboração com o regime um anátema irreparável (às vezes para não ser estimado não basta ser superior, basta ser diferente), embora vituperando retrospectivamente a indisciplina e delinquência, e monárquicos que, não se abstendo de servir, não acreditam ou acreditam provisòriamente.

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800 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 95

O problema do regime não é de se pôr, disse recentemente nesta tribuna o Sr. Deputado Dr. Mendes Correia.
Sim, não é de pôr, até porque há problemas que superam e transcendem o fenómeno político puro, tanto no domínio das ideias como dos próprios factos.
É frequente ouvir proclamar a Inglaterra como bastião de liberdades políticas. Com efeito, a Magna Carta é uma arma decisiva contra o poder pessoal e o Estatuto da Câmara dos Comuns uma limitação efectiva desse poder. A expressão fundamental do respeito pela pessoa humana, habcas corpus (1679), está igualmente na base da noção inglesa de liberdade. É fora de dúvida, contudo, que nos últimos anos o conceito de liberdade, tal com se concebia, se transformou substancialmente.
Ser livre era para Stuart Mill fazer o que se deseja, conquanto para Edmundo Burke o critério de liberdade era também função da ordem e da virtude. A massa trabalhadora sente que a capitosa independência individual já lhe não é necessária. Para proteger os seus interesses melhor é associar-se que dividir-se. O problema está na recristianização dos homens pela solidariedade entre si. O facto não é já político - é moral e social. Por isso se .propõe, no n.º 1.º do artigo 8.º das alterações à Constituição, além do direito à vida e à integridade pessoal, o direito ao trabalho, nos termos que a lei venha a prescrever e por certo, por assim o ter considerado Monsenhor Carreto, com a sua autoridade, se referiu, e muito bem, à necessidade de instituir o salário familiar.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Cumpre, porém, ter presente que, se o capitalismo liberal caiu na desumanização do trabalho, degradação das actividades humanas por amor dos bens materiais, o comunismo o divinizou como valor absoluto. O trabalho deve nascer da pessoa, tem um significado intrínseco, pessoal; o contrário é desprezá-lo na sua essência, pondo o homem ao serviço das coisas, e não estas ao serviço do homem. Sem autonomia do espírito, sem dignidade, o homem é máquina.
Aquele que só pertence à sociedade dificilmente se pertence a si próprio.
Defendo o sufrágio directo, porque declarar os homens iguais é ditar uma maneira de os tratar, manter a igualdade de faculdades jurídicas não é manter a igualdade das faculdades reais - chacun selon ses oeuvres - ca cada um segundo os seus méritos».
A concepção que declara os homens iguais não exclui o sentimento de que são semelhantes, nem exclui, de modo nenhum, o sentimento de que são diferentes. Igualdade não é identidade, e em boa técnica social o que é fundamental é fazer justiça a todos.
No sufrágio directo está, enfim, a afirmação de que a Humanidade tem um valor próprio e que, portanto, todos os homens têm direitos, não obstante certas distinções - não há sociedade complicada que não tenha sido diferenciada- com correspondentes deveres.

O Sr. Jacinto Ferreira: - Eu gostaria que V. Ex.ª concretizasse o significado dessa parte final, que eu, confesso, não atinjo.

O Orador: - Eu quero que na base da organização os homens tenham iguais direitos.

O Sr. Jacinto Ferreira: - Mas correspondentes a quê?

O Sr. Manuel Lourinho: - O melhor é V. Ex.ª explicar isso num anexo ao Diário das Sessões ...

O Sr. Carlos Moreira: - Com as anotações de V. Ex.ª

O Orador: - Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão. A próxima será amanhã, à hora regimental, com a mesma ordem do dia da de hoje.
Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 15 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

António Calheiros Lopes.
António Pinto de Meireles Barriga.
Carlos Mantero Belard.
José Gualberto de Sá Carneiro.
José dos Santos Bessa.
Manuel França Vigon.
Manuel Hermenegildo Lourinho.
Manuel Maria Múrias Júnior.
D. Maria Leonor Correia Botelho.
Ricardo Malhou Durão.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Abel Maria Castro de Lacerda.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Rodrigues Marques de Carvalho.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Avelino de Sousa Campos.
Carlos de Azevedo Mendes.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Carlos Vasco Michon de Oliveira Mourão.
Daniel Maria Vieira Barbosa.
Francisco Higino Craveiro Lopes.
Frederico Maria de Magalhães e Meneses Vilas Boas Vilar.
Herculano Amorim Ferreira.
João Carlos de Assis Pereira de Melo.
João Mendes da Costa Amaral.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim de Moura Relvas.
José Guilherme de Melo e Castro.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Marques Teixeira.
Teófilo Duarte.
Vasco de Campos.

O REDACTOR - Luís de Avillez.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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