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REPUBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL
DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 112
ANO DE 1951 13 DE DEZEMBRO
V LEGISLATURA
SESSÃO N.º 112 DA ASSEMBLEIA NACIONAL
EM 12 DEI DEZEMBRO
Presidente: Ex.mo Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior
Secretários: Ex.mos Srs.Gastão Carlos de Deus Figueira
José Guilherme de Melo e Castro
SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta, a sessão às 15 horas e 45 minutos.
Antes da ordem do dia. - Foi aprovado o Diário das Sessões n.º 111.
Deu-se conta do expediente.
O Or. Deputado Miguel Bastos tratou da localização das instalações, das empreitas petrolífera e dou perigos que ela oferece.
O Sr. Deputado Magalhães Ramalho preconizou a protecção do Estado às iniciativas de resolução do problema da habitação rural.
O Sr. Deputado Sousa Pinto ocupou-se da situação dos funcionários do ultramar que vêm em gozo de férias à metrópole.
Ordem do dia. - Continuou o debate, na generalidade, acerca da proposta, de lei de autorização das receitas e despesas para 1952. Falaram os Srs. Deputados Bartolomeu Gromicho, Galiano Tavares, Pinto Barriga e Ernesto de Lacerda.
O Sr. Presidente, encerrou, a sessão às 17 horas e 45 minutos.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Eram 15 horas e 30 minutos.
Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Abel Maria, Castro de Lacerda.
Adriano Duarte Silva.
Afonso Enrico Ribeiro Casões.
Alberto Cruz.
Alberto Henriques de Araújo.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alexandre Alberto de Sousa Pinto.
Américo Cortês Pinto.
André Francisco Navarro.
António Abrantes Talares.
António de Almeida.
António Augusto Esteves Mendes Correia.
António Bartolomeu Gromicho.
António Calheiros Lopes.
António Cortês Lobão.
António Joaquim Simões Crespo.
António Júdice Bustorff da Silva.
António Maria da Silva.
António de Matos Taquenho.
António Pinto de Meireles Barriga.
António Raul Galiano Tavares.
António dos Santos Carreto.
António Sobral Mendes de Magalhães Ramalho.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Proença Duarte.
Caetano Maria de Abreu Beirão.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos de Azevedo Mendes.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Carlos Vasco Michon de Oliveira Mourão.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Délio Nobre Santos.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco Eusébio Fernandes Prieto.
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Frederico Maria de Magalhães e Meneses Vilas Boas Vilar.
Gaspar Inácio Ferreira.
Gastão Carlos de Deus Figueira.
Henrique Linhares de Liana.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Jaime Joaquim Pimenta Prezado.
Jerónimo Salvador Constantino Sócrates da Costa.
João Alpoim Borges do Canto.
João Ameal.
João Luís Augusto das Neves.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim Mandes do Amaral.
Joaquim de Oliveira Calem.
Joaquim de Pinho Brandão.
Joaquim dos Santos Quelhas Lima.
Jorge Botelho Moniz.
José Cardoso de Matos.
José Dias de Araújo Correia.
José Diogo de Mascarenhas Gaivão.
José Garcia Numes Mexia.
José Gualberto de Sá Carneiro.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Luís da Silva Dias.
Luís Filipe da Fonseca Morais Alçada.
Luís Maria Lopes da Fonseca.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Domingues Basto.
Manuel Hermenegildo Lourinho.
Manuel José Ribeiro Ferreira.
Manuel de Magalhães Pessoa.
Manuel Maria Vaz.
Manuel Marques Teixeira.
Manuel de Sousa Meneses.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Mário de Figueiredo.
Miguel Rodrigues Bastos.
Paulo Cancela de Abreu.
Pedro de Chaves Cymbron Borges de Sousa.
Ricardo Malhou Durão.
Ricardo Vaz Monteiro.
Salvador Nunes Teixeira.
Sebastião Garcia Ramires.
Teófilo Duarte.
Tito Castelo Branco Arantes.
Vasco Lopes Alves.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 81 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 15 horas e 46 minutos.
Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente: - Esta em reclamação o Diário das Sessões n.º 111.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Como nenhum dos Srs. Deputados deseja fazer qualquer reclamação, considero-o aprovado.
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Exposição
De ex-guardas e graduados da Polícia de Segurança Pública do Porto que não foram reintegrados pelo decreto de amnistia e que se julgam em condições semelhantes àqueles que o foram.
O Sr. Presidente: - Estão na Mesa os elementos solicitados pelo Sr. Deputado Melo Machado ao Ministério da Economia, pela Junta Nacional do Vinho. Vão ser entregues àquele Sr. Deputado.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Bastos.
O Sr. Miguel Bastos: - Sr. Presidente: há relativamente pouco tempo foi nomeada pelo Governo uma comissão para estudar IV forma por que, de futuro, se deve fazer no porto de Lisboa a descarga dos petroleiros que vêm ao Tejo.
Esta notícia, divulgada pelos jornais, sugeriu-me II ideia de mais uma vez chamar a atenção do Governo para as excepcionais «condições que tem Setúbal para no seu porto se vir a construir um porto petroleiro, dando-se assim, e por esta forma, plena satisfação ao voto emitido pelo XVII Congresso Internacional de Navegação, reunido em Lisboa no ano de 1949.
Realmente parece que devemos definir nesta matéria uma posição que evite situações futuras muito graves para o normal comércio dos petróleos.
Na verdade, o problema tem aspectos que urge encarar com largueza de espírito e pensamento claro das realidades.
Actualmente as coisas passam-se por forma bastante delicada, o que causa nos espíritos atentos a estes problemas as mais sérias apreensões.
Por razões que desconheço, mas que certamente se filiam no facto de não haver outro espaço livre - o que é certo -, têm sido autorizadas as companhias de petróleos a construir as suas instalações na zona de Cabo Ruivo, isto é, a montante do rio Tejo. Já ali estão: a Sacor, a Sonap, a Atlantic, e, diz-se - o que sinceramente não creio -, que para lá vão também os depósitos da, Vacuum e da Shell, até agora situados em Alcântara e na Junqueira.
Esta concentração é verdadeiramente inconveniente e perigosa.
Eu digo em duas palavras porquê.
Este problema comporta dois aspectos: o das instalações terrestres e o das instalações marítimas.
Quanto ao problema das instalações terrestres, não é sem legítimo receio que muitos olham a concentração em Cabo Ruivo das instalações da Atlantic, da Sonap e da Sacor, esta última a cavalo sobre os terraplenos do porto de Lisboa e a dois passos da doca dos Olivais, base da aviação marítima comercial. É certo que os regulamentos prevêem para estas instalações certas medidas de segurança. Assim, além de zonas de protecção, prevê-se que cada depósito elevado possua um depósito de retenção onde se possa acumular o produto que jorre de qualquer rotura que se verifique. Este condicionamento é perfeitamente eficiente quando se trate de simples rotura das chapas de um reservatório, mas é perfeitamente ineficaz se por qualquer motivo, eventual ou provocado, se dá a explosão do líquido inflamável. Nesta hipótese é certo que o líquido inflamado levará, em torrente impetuosa, a ruína e a morte a toda uma larga zona que lhe fique adjacente. Ainda há pouco um depósito construído em Cabo Ruivo rebentou e deu aos que viram o acidente uma imagem - aliás bem pouco agradável da gravidade de um desastre deste género. Apenas houve agora a boa diferença de que o líquido que jorrou daquela cratera e inundou torras e ruas não era inflamável, mas apenas água.
Perante esta realidade parece urgente que procuremos para estas instalações áreas de terreno perfeitamente livres, onde elas possam viver sem ameaçarem
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constantemente a vida e segurança de uma população) a população de uma grande cidade que é a própria capital do País.
Mas se é grave o aspecto que se prende com este problema e que diz respeito a instalações terrestres, muito mais grave - se isso é possível - é ainda o aspecto que se liga ao problema das instalações marítimas.
Na verdade, os fundos em Cabo Ruivo não permitem que ali cheguem em pleno os petroleiros. Estes, se trazem produtos brancos ou fitei, vão primeiro descarregar parte do seu carregamento nos depósitos existentes na margem sul, na Banática e no Porto Brandão, e só depois desta operação podem ir a Cabo Ruivo, para, no preia-mar (uma hora em cada vinte e quatro), fazer o resto da descarga. Se o barco traz petróleo bruto ou se é impossível deixar produto suficiente na Banática e no Porto Brandão - o que sucede com frequência -, torna-se necessário proceder à trasfega, a meio do rio, para um batelão. Esta trasfega de navio para navio, quando se trate de produto cujo ponto de inflamação é inferior a 150º F. (como é o caso do petróleo bruto), é condenada pelas grandes companhias transportadoras de petróleos e só é permitida em circunstâncias excepcionais, rodeando a operação das maiores cautelas. Em Lisboa, porém, este procedimento é corrente e normal e já houve até necessidade imperiosa de realizar trasfegas entre dois navios de grande tonelagem.
Estas operações, que sucintamente descrevi, além dos perigos que acarretam, custam, por ano, alguns milhões de escudos, que, no fim de contas, vêm u ser pagos pela economia nacional.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Pode melhorar-se este estudo de coisas?
E possível que sim, ainda que não se vislumbre bem como. Uma coisa é, porém, certa e irremovível: é que Cabo Ruivo fica u montante do rio Tejo. E se um dia acontece qualquer acidente naquele local - e com frequência clamorosa eles se estão a verificar em todos os portos onde se faz a trasfega de produtos petrolíferos -, o produto inflamado, correndo na vazante do rio, iluminará com pavor toda a margem sul desta grande e bela, cidade que é Lisboa, causando u navegação que frequenta o seu porto uniu hora- de desolação e desespero. Conhece-se a impetuosidade do rio e bem definidos estão os sentidos das suas correntes. O desastre será certo e inevitável.
O porto de Setúbal possui condições naturais esplêndidas para ser o primeiro porto petroleiro do nosso país.
Realmente, aio extremo poente da península de Tróia, aia ponta do Adoxe, junto a barra do Sado, servida por uma zona marítima sempre calma e de grandes fundos, onde as correntes de enchente e vazante não rasam qualquer margem habitada nem interferem com a navegação, poder-se-ia criar uma larguíssima zona petroleira, sem que daí resultasse qualquer dos inconvenientes que actualmente se verificam nas instalações de Cabo Ruivo.
Na ponta do Adoxe, entre a extremo da península e a lagoa, existem terrenos de fraco relevo, ocupando área superior a 100 hectares. Neles se poderiam instalar a vontade todas as instalações petroleiras com as suas necessidades presentes e larga reserva para o aumento que vão exigir as necessidades futuras.
Julgo - sem vaidade - que o problema posto tem vivo interesse e o seu estudo urge para que se livre Lisboa do perigo iminente em que vive actualmente.
Nesta ordem de ideias tenho a honra de sugerir ao Governo: 1.º, que se tomem já as medidas julgadas necessárias pura evitar o aumento em Cabo Ruivo da concentração petroleira que já ali existe; 2.º, que se nomeie uma comissão, com representantes dos Ministérios cia Marinha, da Economia e das Comunicações e das Administrações dos Portos de Lisboa e Setúbal, para, em conjunto, estudar este problema do primeiro porto petroleiro do País, oferecendo assim, com as conclusões do seu estudo, elementos para o Governo definir concretamente, de futuro, a sua posição neste importantíssimo assunto.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Magalhães Rama lho: - Sr. Presidente: ao estudar-se há dias, na nossa Comissão de Economia, o artigo 22.º da proposta da Lei de Meios para 1952, foi chamada a atenção por alguém para uma omissão que se verifica na sua alínea a) e com a qual não estiveram também de acordo vários outros Deputados e que nesse sentido já tiveram ocasião de dizer ontem aqui de sua justiça.
Nesse artigo 22.º - em que se estabelece a ordem de precedência dos auxílios financeiros para a melhoria das condições de vida dos aglomerados rurais - omitiu-se, com efeito - e a meu ver foi pena -, o problema da habitação rural, que tem, indiscutivelmente, importância de relevo mais do que suficiente para dever figurar sempre nessa lei à cabeça da escala de precedências, em paralelo com o problema do abastecimento de águas, da electrificação e do saneamento.
Não discutirei, no entanto, por agora, as razões de ordem financeira que podem ter levado, a essa omissão.
Não irei reeditar também as razões de ordem moral, social e até económica que deviam contrariar tal orientação, embora limitando a horizontes mais modestos aquela política vigorosa que se impõe sobre a habitação das classes económicamente mais desprotegidas.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Sem discutir a obra grandiosa e bela que já se acha realizada nessa matéria, não irei tão pouco criticar certas soluções e orientações que têm tornado as tarefas demasiadamente lentas e caras por, inclusivamente, não se haver previsto - sobretudo para a solução do caso da habitação rural- a contribuição do trabalho e das iniciativas dos próprios beneficiados e suas famílias, ajudando a erguer ou reconstruir, amorosamente e por suas próprias mãos, os tectos sob que hão-de viver as suas horas de felicidade e de amargura.
Eu pretendo apenas hoje, Sr. Presidente, com esta intervenção, chamar a atenção superior para um aspecto que me parece andar um pouco arredio dos nossos espíritos, na obsessão de se realizarem obras tecnicamente perfeitas, grandiosas, que todos vejam e sintam imediatamente.
Ora a verdade nua e crua é esta, Sr. Presidente: o problema de uma habitação condigna para todos os portugueses é, de facto, uma tarefa gigantesca e excessivamente onerosa para dever assustar os espíritos menos caldeados ao calor de uma verdadeira fé. Tal circunstancia, porém, longe de nos desanimar, deve abrir-nos os olhos, ofuscados pela preocupação do grandioso e do perfeito, e levar-nos a ver que só numa mobilização total de todas as boas vontades è iniciativas felizes, por mais humildes que elas sejam, podemos encontrar à força que nos ajude a remover essa montanha !
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Desprezar, criminosamente, essas boas vontades e iniciativas, deixá-las morrer ou asfixiar só porque se conta com a intervenção do Estado para resolver tudo, parece-me não só estulta orientação, mas criminosa atitude, de que nos hão-de ser pedidas contas um dia - se tiver estado em nossas mãos evitá-la - por Aquele a quem tudo devemos e para Quem tantas vezes apelamos para que nos não falte com aquilo que afinal, com a nossa indiferença, tantas mais vezes negamos ao nosso próprio semelhante: um pouco de amor, de compaixão, de carinhosa compreensão pelas nossas mais instantes necessidades!
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Ora, Sr. Presidente, quando há dias fiz a leitura comovida, como me costuma suceder sempre, dessa brasa viva de justiça, de amor e de caridade que é a palavra do padre Américo, no seu jornal O Gaiato, da «Obra dos rapazes, para rapazes e pelos rapazes», fiquei varado de assombro e de indignação ao verificar que uma ideia sublime, digna do coração de um grande santo - como é a da obra do «Património dos pobres», para a construção de casas para desprotegidos da sorte -, não tivesse ainda encontrado entre nós, já não digo o aplauso unânime de todos os portugueses, mas ao menos o apoio benévolo e carinhoso do Estado e das autoridades administrativas!
Vozes: - Muito bem, muito bem !
O Orador: - Lê-se, com efeito, nesse Gaiato do dia 24 de Novembro passado que uma casa para famílias na miséria custa à roda de 30 contos - alcançados por esmolas, sabe Deus à custa de que sacrifícios! -, mas que desses 30 contos cerca de 5 contos - isto é, 16,5 por cento! - vão para o Estado, ou para as câmaras municipais respectivas, em imposto de sisa do terreno, em licenças, vistorias, multas, etc.!
Lê-se e não se acredita, e, não sei por que associação cruel, vem sem querer à ideia aquela parábola do homem ambicioso e de Jesus, em que o ambicioso pede, como único bem que deseja, a concessão de todas as riquezas que a sua vista puder abranger na caminhada de um dia. Concedido o que pedia, põe-se o homem a caminho, ávido de tudo o que pudesse valer e a sua vista abrangesse : o palácio, a cidade, a quinta, a própria montanha onde pacientemente pastava humilde rebanho! ...
Cego na sua paixão, não vê que o fim do dia se aproxima, e quando dá, finalmente, conta de que o Sol já se vai a esconder, só numa corrida frenética de regresso poderá cumprir a cláusula, a que se obrigara, de vir dar notícia do que escolhera antes da noite desse mesmo dia. E corre, corre, corre angustiadamente, até conseguir chegar a tempo de morrer exausto aos pés de Jesus e ouvir ainda da sua boca uma lição que o Mundo parece não ter aprendido:
Oh homem! Pobre homem ! Tanta terra ambicionaste e por ela tanto sofreste, quando afinal sete palmos apenas te chegavam!...
Sr. Presidente: diz o povo, na pureza do seu sentir, que quem dá aos pobres empresta a Deus, o que implicitamente deve querer significar que quem tira aos pobres tira a Deus.
Se assim é e a minha razão me não atraiçoa, faço então daqui um veemente apelo ao Sr. Presidente do Conselho para que, através dos vários Ministérios - o das Finanças, o do Interior, o das Obras Públicas e não sei também se o da Justiça -, o caso de consciência que apontei tenha a solução legal condigna que
merece e que todos os corações bem formados ardentemente desejam.
Como humildemente se confessa no jornal que citei, a obra «Património dos pobres» não pede que as câmaras a ajudem. Já se contenta com que não a estorvem!...
Como representantes da Nação, eu creio que devemos, porém, ser mais exigentes: não basta não estorvar obras dessa natureza; é nossa estrita obrigação moral ajudá-las e acarinhá-las, e uma primeira ajuda é, pelo menos, não lhe tirar, em pagamento de encargos oficiais, bens que são sagrados, porque são património dos pobres, porque são património de Deus!...
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Sousa Pinto: - Sr. Presidente: na sessão de ontem referiu-se o ilustre Deputado Sr. António de Almeida « visita à metrópole, por convite do Sr. Ministro do Ultramar, de um numeroso grupo «lê jornalistas dos territórios portugueses ultramarinos. E inteiramente justificado o regozijo e o aplauso que a esse respeito ficaram consignados no Diário desta Assembleia.
É justo salientar que esta feliz iniciativa é apenas uma fias muitas manifestações da superior orientação com que o Governo procura, por todos os meios, conseguir que a grei portuguesa espalhada pelo Mundo BB conheça melhor, facilitando aos portugueses da metrópole visitas às terras do ultramar e aos portugueses que nestas residem o exame directo dos progressos e das actividades, que em todos os sectores caracterizam o momento que passa da vida do Portugal metropolitano.
Vozes: - Muito bem !
O Orador: - Faço votos porque este intercâmbio se intensifique cada vez mais. Nada teria eu a acrescentar ao que ontem ficou dito se a satisfação com que registo os factos que aqui foram referidos não fosse ateimada por uma nota sombria, que na o oculto. É que das facilidades apontadas não participam, em geral, os funcionários do ultramar, colaboradores do progresso das terras onde vivem e trabalham, os quais o Estado deveria obrigar a vir retemperar a saúde à metrópole quando chega a altura de lhes serem concedidas as suas licenças graciosas. Sem me demorar a repetir as considerações que neste lugar fiz há um ano, direi mais uma vez que para esses só há dificuldades.
Estabelecido, por um critério que "Considero errado, que esses funcionários, ao chegarem à metrópole, passem a vencer o que vencem os funcionários metropolitanos de categorias iguais às suas, a vida aqui torna-se para a maioria deles impossível, donde resulta muitos desistirem de vir gozar a licença, o que é um mal, e outros, quando chegam a vir, procurarem regressar ao ultramar antes de findo o tempo normal, por se lhes terem esgotado os recursos amealhados pelo trabalho de alguns anos.
Mais uma vez peço a atenção do Sr. Ministro do Ultramar para a situação dos funcionários em gozo de licença graciosa, bem como para a dos reformados, que, por um critério que considero igualmente injusto, se vêem forçados a esperar a morte nas terras onde prestavam serviço, porque a pensão reduzida que se considera ser-lhes devida na metrópole não chega aqui para lhes matar a fome.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Agora, que o conhecimento das circulares n.ºs 7 e 8 da Direcção-Geral de Fazenda, enviadas
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a todas as províncias ultramarinas, revela que o Governo tem o propósito de rever os vencimentos do funcionalismo, tenho esperança de que este apelo seja oportuno e que esse funcionalismo, quer o que se encontra em exercício, quer o que está na situação de reforma, deixe de estar excluído das facilidades que o nosso Governo está dando ais deslocações recíprocas entre o ultramar e a metrópole, as quais suo merecedoras do mais caloroso aplauso.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito comprimentado.
Ordem do dia
O Sr. Presidente: - Continua em discussão, na generalidade, a proposta de lei de autorização das receitas e despesas para o ano de 1952.
Tem a palavra o Sr. Deputado Bartolomeu Gromicho.
O Sr. Bartolomeu Gromicho: - Sr. Presidente: a proposta da Lei de Meios tem sido larga e sabiamente analisada por ilustres Deputados, que são simultaneamente abalizados financeiros e economistas. Já aqui foram focados aspectos, os mais diversos, quer quanto às receitas, quer quanto às despesas do Estado.
Não serei eu, leigo em matéria tão vasta e tão delicada, que me abalançarei a meter foice em seara alheia, certo de que o faria sem a necessária autoridade.
Em todo o caso, como político, algo julgo possível e de meu dever abordar, dando assim o meu modesto contributo para este debate, tão importante para o prestígio, uma ou outra vez tão injustamente malferido, deste organismo essencial à boa marcha dos negócios do Estado, que é esta Assembleia Nacional.
Como político, portanto, apraz-me louvar muito sinceramente o Sr. Ministro das Finanças, que no seu alto posto não tem decepcionado esta Assembleia, de que é um dos mais brilhantes ornamentos, antes, pelo contrário, tem confirmado o elevadíssimo conceito em que nos habituámos a considerá-lo pelas suas sempre magistrais intervenções, sobretudo no ramo complexo e transcendente das finanças públicas.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Pela segunda vez S. Ex.ª envia a esta Câmara uma proposta da Lei de Meios, sabiamente documentada e promissora. A que se discute veio acompanhada de elementos tão esclarecedores que, mesmo para leigos como eu, é de certo modo clara quanto às suas intenções e ao seu profundo alcance.
Pela primeira vez na história das finanças públicas, aparece um cômputo tão perfeito quanto possível, por falta, em alguns sectores, de trabalhos preparatórios, do rendimento nacional, que serviu e servirá de futuro ainda melhor para se avaliar e utilizar equilibradamente a massa tributária do Pais.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Também é animadora a afirmação genérica de que a tributação não deverá ser agravada, e oxalá que sejam, de facto, dispensáveis as tais circulares ultraconfidenciais, a que se referiu tão judiciosamente o Sr. Deputado Melo Machado.
Na minha modesta opinião, a proposta merece a aprovação na generalidade.
A eliminação do artigo 6.º da proposta, conforme alvitra o parecer da Câmara Corporativa, não é procedente, porque a moral e a justiça impõem-se em matéria de tamanha monta e que tem tido desagradáveis reflexos na propaganda política contrária.
Se a política de acumulações tem sido trio restritiva, especialmente nas aglutinações de pequenos empregos, porque se admite capacidade ilimitada de acumular situações por vezes as mais díspares, só porque são altamente rendosas?
Vozes:- Muito bem!
O Orador: - A escassez de competências e de valores pessoais especializados, como alega o parecer da Câmara Corporativa, é simplesmente infantil, porquanto o argumento serviria tanto para as grandes como para as pequenas acumulações. Um simples exemplo: um distinto professor do liceu abriu um curso de inglês numa sociedade recreativa, destinado aos sócios, que não frequentavam qualquer curso liceal.
Não foi autorizado por força de uma disposição do estatuto que proíbe o ensino particular aos professores liceais. Perdeu-se assim uma actuação especializada e útil para tantas pessoas desejosas de melhorar a sua cultura.
Há, pois, que estender as incompatibilidades á todos os sectores onde estas se imponham como acção moralizadora.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Entretanto, o adicionamento ao imposto complementar deve efectivar-se na base preconizada, de 240 contos, pois não representa extorsão odiosa, mas sim acto de justiça social.
Não se tem, aliás, praticado o imposto por via indirecta, no que se refere ao abono de família, quando os cônjuges são funcionários e têm o lar comum ? É sabido que pequenos funcionários perdem totalmente o abono de família só porque vivem sob o mesmo tecto os cônjuges funcionários.
Isto creio que não é justo e é até um tanto dissolvente do núcleo familiar.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Uma vez que falo de abono de família, volto ao tema, já em tempos por mim aqui versado, de que o abono foi em boa hora criado como auxílio às famílias, e não como pagamento de serviços, função esta que é atribuída aos vencimentos.
Se é auxílio que é, como quem diz, amparo às famílias necessitadas-, por que razão esse abono de família é indiscriminadamente atribuído a todas as famílias de funcionários de economia débil, suficiente ou abastada? Não haverá certo absurdo na concessão do abono a quem não precisa?
Não seria preferível que se revisse o problema no sentido de aumentar a quantia do abono à custa da eliminação do dos que dele não necessitam?
Deixo estas perguntas à meditação do Governo e das estações competentes.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - No que respeita à doutrina do artigo 19.º, é animador verificar que o Governo encara de frente o problema da situação do funcionalismo, não só pela melhoria económica que preconiza, como pelo Índice de melhoria financeira do Estado que a medida subentende.
Ninguém sabe a forma ou extensão dessa melhoria anunciada no referido artigo 19.º
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Uma coisa se nos afigura justa: é que a percentagem, se é que haverá percentagem, não deverá ser igual para todos os vencimentos.
É óbvio que há vencimentos abaixo de um mínimo compatível com a necessidade de viver e há vencimentos relativamente mais desafogados.
O negrume das dificuldades é variável na razão inversa do que se aufere. Cabe ao Governo estabelecer um ajustado equilíbrio de responsabilidades de funções e nível suportável de vida familiar.
De toda a justiça se apresenta o dever de ser extensiva a todos, quer na actividade, quer na aposentação ou na reforma ou no regime de pensionistas, a melhoria que se anuncia. Em 1943 foram totalmente esquecidos os reformados quando do primeiro subsídio de 20 por cento.
Tive a honra de levantar então a questão nesta tribuna a favor das classes inactivas, nas quais se encontram tantos funcionários que tão brilhantes e valiosos serviços prestaram ao País.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - No § unico do artigo 19.º a palavra apodera» era de desejar que fosse substituída por «deverá». Assim seriam abrangidos todos os aposentados, reformados, da reserva e pensionistas.
Por outro lado, concordo inteiramente com o parecer da Câmara Corporativa quanto ao estudo que se impõe no que se refere aos vencimentos do professorado primário.
O Ministério da Educação Nacional está intensificando a campanha contra o analfabetismo, pelo que só merece aplausos de toda a Nação. Nunca é tarde tentar resolver um problema que tem sido uma vergonha nacional: a alta percentagem de analfabetos, especialmente nos meios rurais.
Muito se tem feito com a construção de escolas do chamado Plano dos Centenários e com a reabertura de escolas do magistério primário.
Muito há que realizar para que a rede de escolas se complete e essas escolas se tornem eficientes.
Sabe-se que dois factores essenciais decidem na campanha contra o analfabetismo: a existência de escolas decentemente apetrechadas e uma vasta equipe de professores devidamente preparados e estimulados.
A preparação deriva evidentemente da acção das escolas do magistério primário, que funcionam com certa eficiência, mas que necessitam urgentemente de aperfeiçoamento. Na base do estimulo está o tratamento justo no que respeita a vencimentos. Realmente, 1.170$ para os professores sem diuturnidades e cerca de 1.500$ após trinta anos de serviço é remuneração que mal serve a um continuo do Ministério, quanto mais tratando-se de funcionários a quem se exige um curso e a formação e renovação espiritual das camadas infantis, que são o estofo, o sangue e a alma da Nação.
O Sr. Carlos Moreira: - V. Ex.ª dá-me licença? Também o problema das professoras deverá ser encarado, pois até agora não temos visto solução para a sobreposição dos agentes femininos de ensino, que não só quase absorvem o ensino primário, mas também tendem a absorver o ensino secundário.
O Orador: - Tem V. Ex.ª muita razão.
Seria demais que tais beneméritos serventuários fossem equiparados a terceiros-oficiais do Ministério com acesso razoável por duas diuturnidades, a considerar aos dez e vinte anos de serviço?
Se non solo pane vivit homo, sem pão ou com pão escasso estiolam todas as energias e enfraquecem as mais decididas e valorosas vontades.
Portanto, na campanha ao analfabetismo é de considerar em plano de relevo a situação material do professorado primário, se dele queremos exigir o cumprimento integral do seu nobre e patriótico dever.
Não é apenas quanto aos professores primários que o Decreto n.º 26:115, de 1935, necessita de revisão.
Ocorre-me citar um caso de flagrante injustiça quanto aos bibliotecários-arquivistas, que são actualmente considerados ou equiparados a funcionários administrativos, com os vencimentos-base de 900$, 1.200$ e 1.500$, quando é certo que os bibliotecários-arquivistas de hoje são licenciados pelas Faculdades e têm além disso um curso de especialização de dois anos, acrescido de um estágio de seis meses. São, pois, funcionários técnicos, que, pela importância cultural dos serviços a seu cargo, bem mereciam auferir o necessário para se dedicarem exclusivamente às suas elevadas funções.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Para concluir estas desataviadas considerações, são meus votos que as despesas terrivelmente fatais do rearmamento não venham tolher o essencial nos campos da instrução e do fomento nacional.
Que o programa deste último não seja perturbado, é o que anseia o País, que já começou a habituar-se a confiar na obra realizada de electrificação e irrigação e espera que as obras em marcha possam ser concluídas, para solução de tantos problemas sociais que se encontram em premente equação e que são a natural preocupação de governantes e governados.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Galiano Tavares: - Sr. Presidente: a proposta de lei de autorização da» receitas e despesas para 1952 merece-me, na. generalidade, alguns comentários.
Apresenta-se, como a anterior, bem informada e esclarecedora.
A Assembleia Nacional compete a discussão do orçamento com vista a autorizar a cobrar receitas para defrontar as despesas, podendo o Governo aplicar às despesas extraordinárias de maior interesse e urgência as disponibilidades que resultem da compressão das próprias despesas ordinárias.
Consignasse num dos artigos a atenção que o Governo dará ao «melhoramento da produção agrícola», para o que se propõe auxiliar de preferência, além do abastecimento de águas, electrificação e saneamento, as melhorias agrícolas - obra» de rega, defesa ribeirinha e enxugo-, depois de afirmar o objectivo de «promover a melhoria das condições de vida dos aglomeradas rurais».
Após o debate que nesta Assembleia se desenvolveu a propósito das crises de trabalho no Alentejo, uma revista de «cultura não especializada, mas indubitavelmente uma cias de maior fôlego, escrevia, depois de uma análise do problema, com evidente clareza e desassombro, apontando, entre muitas outra*) medidas tendentes a combater este flagelo social, embora no parecer da Câmara Corporativa se afirme, entre os índices favoráveis de 1900, não haver praticamente desemprego:
Expropriação temporária e, em caso de resultado positivo, progressiva da propriedade excessivamente grande e não aproveitada, ou sob forma de arrendamento e subarrendamento à classe dos seareiros e pequenos proprietários, com a devida assistência técnica, feita nos centros populacionais, mormente nas proximidades das grandes vias de comunicação.
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Eu desejo trazer à Câmara, em síntese, os resultados de uma obra levada a cabo no distrito de Portalegre e promovida pela Junta de Colonização Interna.
Reporto-me à resolução do problema conhecido pelo litígio do Sobral e Carvalhal de Tolosa.
O inquérito à grande propriedade não explorada efectivamente impõe-se. Já Plínio escrevia: Latifundia perdidere Italiana», considerando o ager publicus como necessário, já então, à manutenção da classe média.
Os trabalhos relativos à solução deste litígio entre os proprietários e o povo situam-se no ano de 1942, embora proviessem de longa data, e então tanto o povo como os proprietários se atribuíam a propriedade plena do Carvalhal « Sobral de Tolosa. A situação de facto traduzia-se em o povo usufruir 8/9 da herdade e os proprietários 1/9 por sua própria concessão.
Estudos preliminares e morosos em que intervieram, no decorrer do tempo, várias entidades.
Respeitando-se esse acordo, havia, porém, que atender:
a) Que nos cálculos se não consideravam os aspectos fungível do compáscuo e de perpetuidade da terra;
b) Que, não sendo permitida a substituição do arvoredo, os rendimentos auferidos por ambas as partes tendiam a uma maior aproximação;
c) Que a própria situação de facto estaria dependente de pleito judicial, propondo-se que a proporção entre os rendimentos de ambas as partes fosse a do meio termo na situação de direito e de facto.
Só há meses, porém, se pôde chegar a uma solução definitiva, assentando-se em que, segundo os elementos fornecidos pela Junta de Colonização Interna:
a) Os valados constituídos depois da actuação do Código Civil (1868) seriam considerados, para efeito do acordo, como zona ainda em uso comum;
b) A zona a atribuir ao povo ficaria na parte mais próxima de Tolosa, por ser a que se presta melhor à constituição de pequena propriedade, pelas suas características agrológicas e hidrológicas, e pela distância ao local de habitação dos utentes;
c) 2/5 do valor do Sobral e Carvalhal de Tolosa ficassem, em propriedade plena, a pertencer aos proprietários e os 3/5 restantes ao povo;
d) As despesas inerentes à solução não correriam por conta dos proprietários.
Neste pleito, que, por vezes, chegou a tomar aspectos graves, interveio criteriosamente a Junta de Colonização Interna, que mandou elaborar projecto, do qual consta planta topográfica, onde ficaram implantados os terrenos a atribuir à junta de freguesia e a cada um dos proprietários, os quais, em número de 46, passariam a usufruir em propriedade plena 46 prédios, individualizados, com a área de 11 há, 3223, em vez de 112 prédios em propriedade imperfeita, com a área de 10 ha, 3464.
Esta proposta de solução, apresentada em 1942 pela Junta, só em Novembro de 1949, pelo Decreto-Lei n.º 37:603, foi mandada executar e o baldio, considerado zona de uso comum pertencente à Junta de Freguesia de Tolosa, foi reconhecido por despacho de 4 de Novembro (Diário du Governo n.º 257, 2.ª série, de 1960).
No decorrer dos trabalhos desta .Assembleia a imprensa noticiou a divisão e atribuição definitivas do Sobral e Carvalhal de Tolosa.
Com efeito, criada a comissão para executar o projecto relativamente à situação dos proprietários, que ficaram em conjunto com 520 ha, 8258, foi constituída uma comissão composta de um técnico da Junta, do conservador do Registo Predial de Nisa e do chefe da Secção de Finanças do concelho.
Deu-se por concluído esse trabalho em Maio de 1950, o qual só em 26 de Outubro era homologado pelos Ministérios do Interior e da Economia (Portaria n.º 13:340, de 26 de Outubro de 1950). A Junta de Freguesia solicitou, entretanto, à Junta de Colonização Interna a divisão em glebas, .a distribuir pelo povo, pedido que o governador civil do distrito secundou e apoiou, como já anteriormente promovera e se interessara pelo seu estudo definitivo.
Era a solução ambicionada: os 63 ha, 3890 foram divididos em 504 glebas, com a superfície variável entre O ha, 6750 e 3 ha, 8980, com o valor de 1.500$, a pagar em vinte anos, ao juro de 2 por cento, e o arvoredo pelo seu valor venal, das quais 485 já foram atribuídas, sendo 41 por emparceiramento e as restantes por sorteio, consoante as normas seguintes, que inteiramente aplaudo:
a) Ser português de origem;
b) Residir na freguesia há mais de um ano;
c) Ser chefe de família;
d) Ser trabalhador rural ou pequeno agricultor;
e) Não ter idade superior a 60 anos, se não tiver filhos a cargo, ou a 70, se os tiver;
f) Não pagar mais de 600$ de contribuição industrial e ter interesses ligados à terra, dela provindo 20 a 60 por cento dos recursos familiares;
g) Ser artífice por profissão, não obtendo mais de 80 por cento de trabalho especializado, sendo os restantes 20 por cento provenientes da terra;
h) Não ter ordenado fixo superior a 600$ mensais.
Muito gostaria que VV. Ex.ªs, Srs. Deputados, presenciassem o que se fez desde então no Carvalhal e Sobral de Tolosa. Uma completa transformação!
No corpo do mesmo artigo 22.º faz-se referência a construções para fins assistenciais ou para instalação de serviços.
Não preconizo a adopção de um serviço social comparável ao Welfare State (o Sogiale Fürsoge alemão), instituído pelo trabalhismo.
Todos os países europeus se preocupam com a organização dos serviços sociais, uns para lutar contra o socialismo, outros com o propósito de o estabelecer! O próprio plano Beveridge se deve ao governo de coligação partidária, ao qual se associaram, portanto, os próprios conservadores.
Os serviços de saúde custavam ali mais de 300 milhões de libras por ano, embora seja, na verdade, lícito perguntar se é consentâneo com a ideologia então predominante atribuir serviços médicos gratuitos àqueles mesmos que dispõem de dinheiro e de meios para os pagar.
A própria reforma do sistema fiscal, tendo em vista uma redistribuição de rendimentos em favor dos menos privilegiados, pode .considerar-se como o resultado do aparecimento de uma nova classe dirigente, oriunda da grande e média burguesia de Oxford e Cambridge. Seja como for, a antiga classe dirigente perdeu muito da sua influência e, sem se considerar oprimida, admite a eliminação progressiva das grandes fortunas inúteis. Aos próprios conservadores não repugna esta evolução, pela necessidade de permitir aos indivíduos, em todos os graus da hierarquia, um campo de expansão que dife-
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rencie salários e rendimentos consoante as capacidades, segundo as obras e méritos, sem desatender e desconsiderar as próprias necessidades vitais.
A assistência entre nós não pode confinar-se a construções assistenciais.
Vozes: - Muito bem !
O Orador: - O problema exige mais alguma coisa, até para cumprimento das próprias estipulações do Decreto n.º 35:108 a assistência paliativa, que se propõe aliviar os sofrimentos ocasionados pela miséria; a curativa, com o propósito de recuperar as condições normais de existência; a construtiva, tendente a melhorar as condições sociais e a elevar o nível da existência, e a assistência preventiva, criando condições de combate aos flagelos sociais.
E esta é a política social a empreender para combater as dissolventes doutrinas colectivistas, despotismo estadual que se não coaduna nem harmoniza com as liberdades essenciais, que são apanágio do homem e capital moral de uma nação como a nossa.
A assistência religiosa no nosso país é meritória, é profunda, é extensa, mas é, por si só, insuficiente.
Multiplicam-se os centros de assistência social, mas as instalações de per si não bastam, e a própria assistência a inválidos e à família, não obstante o bem que faz, não pode abranger e não abrange - mesmo como deve ser - na medida das necessidades.
Finalmente, desejo relacionar os problemas sociais com o problema dó próprio funcionalismo. Entre outros Srs. Deputados de que me lembro, defenderam
nesta tribuna a revisão dos vencimentos os Srs. Engenheiro Daniel Barbosa, Dr. Pinto Barriga, Coronel Ricardo Durão, Tenente-Coronel Sousa Rosal e Dr. Bartolomeu Gromicho, principalmente pelo confronto com os vencimentos dos organismos de coordenação económica e corporativos.
Cito um exemplo dos que mais me impressionam:
Um professor primário com a 1.ª diuturnidade aufere 700$ - o que ganha qualquer primeiro-escriturário nos organismos de coordenação económica. Um professor agregado do mesmo ensino recebe 650$ - tanto como um escriturário.
Um escriturário auxiliar de qualquer junta recebe 750$ - mais do que um professor com dez anos de bom e efectivo serviço.
Há, indubitavelmente, uma desierarquização determinada pelo decurso do tempo, desde a publicação do Decreto-Lei n.º 26:115, de 23 de Novembro de 1935, e em vigor desde 1 de Janeiro de 1936.
A Constituição de 1933 considera a família a célula da organização social e política. Na proposta nada se diz acerca da actualização do abono de família, quando, na verdade, os quantitativos de tal abono se encontram desactualizados.
Um funcionário solteiro, sem encargo de família, porque ganha pouco, tem como compensação um suplemento. Um funcionário casado com 6, 7, 8 e 9 filhos recebe por cada um - se tiverem aproveitamento escolar - 70$. A qualquer aumento de vencimento corresponde, sempre, sejam quais forem as providências, um aumento do custo de vida. Mesmo se tais providências resultarem eficazes, esta elevação do custo de vida será menor do que o aumento, quando se trata de um só indivíduo. Já o mesmo se não verifica numa família numerosa.
Ter muitos filhos é um obstáculo insuperável - fora do quadro do .funcionalismo do Estado - à obtenção de trabalhos ou emprego. Recrutam-se e aceitam-se, de preferência, os sem filhos - por menos onerosos. O abono de família transformou-se, assim, em desespero neste caso !
Na proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1951, no artigo 13.º, escrevia o Sr. Ministro das Finanças que no mais curto lapso de tempo o Governo faria a revisão das disposições legais e da prática em vigor sobre a existência e utilização de automóveis oficiais.
Não obstante os louváveis "propósitos do Sr. Ministro das Finanças, pode dizer-se, afoitamente, que a prodigalidade continua.
Só nos serviços militares do Exército - tanto quanto presumo saber - o ditame é observado. Há juntas em .que cada dirigente tem o seu automóvel e serviços onde o automóvel é mais para uso particular que oficial.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito comprimentado.
O Sr. Pinto Barriga: - Sr. Presidente: era minha ideia não usar da palavra senão depois de receber os elementos que ontem pedi, por requerimento, que reforçam as minhas próprias anotações.
Mas como poderá ser demorada a sua entrega e não quero deixar de marcar a minha posição neste assunto resolvi não esperar por esses apontamentos, por recear, repito, que eles não chegassem às minhas mãos antes de encerrada a discussão, na generalidade, desta importante proposta de lei.
Sr. Presidente: relembremos, com a justiça de sempre, quem, pelo seu clarividente bom senso, iniciou e permitiu a nossa política financeira de ressurreição.
É de louvar a temporaneidade, a coragem desassombrada e a técnica da proposta de lei que ora discutimos.
Merecem o nosso agradecimento as atenções que dispensou aos seus antigos colegas desta Casa o Sr. Doutor Águedo de Oliveira.
Que hei-de dizer do parecer? Senão registar o que pode pensar duma magnifica lição um discípulo atento e admirador: é um verdadeiro tratado de finanças.
Pode divergir-se mesmo nas divergências, e politicamente algumas vezes isso comigo tem acontecido. No entanto não podemos deixar de admirar mesmo quando dissentimos. Plenamente de acordo com o relator quando considera:
Feliz iniciativa do Sr. Ministro das Finanças, inaugurada há um ano, para antecipar a data da remessa da proposta à Câmara Corporativa. Como sempre, os serviços primaram em facilitar a entrega dos dados que serviram de base aos mapas anexos. Embora os elementos fornecidos interessem sobre- tudo o passado, constituem material apreciável. Só é pena, quando esperamos elucidações sobre o futuro exercício - e não parece excessiva pretensão quando se trata de uma lei que para esse futuro se encontra exclusivamente voltada-, o não consigamos vislumbrar.
Pelas próprias palavras do meu querido mestre e amigo ouso concluir pela condenação do § único do artigo 1.º, de que se propõe a substituição:
Às exigências normais do que faz a boa letra de uma lei, que deve antes formular preceitos do que doutrina - suum cuique -, acresce, numa lei de meios, a sua limitação quanto ao tempo. Nem preceitos que disponham para além da duração do exercício; nem a prática de repetir, em sucessivos diplomas de vigência anual, disposições cuja inserção em leis permanentes fica assim contraprovada.
O Orçamento é um acto jurídico complexo, mas funcionalmente é vincadamente um acto administrativo e a
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própria Lei de Meios não é exactamente uma lei no sentido material, senão quando exorbitada na competência normal e inclui matéria parasitária. Mas este termo pejorativo não pode ser empregado senão quando essas normas se deslocam do acto administrativo não compreendido como um mero acto individual de administração, mas quando os actos regulamentares assumem uma fórmula de solução de standards administrativos, quando autolimita o seu discricionário de planificação.
É por isso que as noções de acto administrativo da escola germânica assumem com o estatismo moderno «un regam de actualité».
O parágrafo como o propõe o Ministro é um exemplo flagrante de autolimitação na administração financeira do ano corrente. Fazer essas normas ultrapassarem a anualidade orçamental a aprovar é simplesmente contrariar o espírito e a letra da nossa Constituição, violar a anualidade dos poderes orçamentais.
O Sr. Carlos Moreira: - V. Ex.ª dá-me licença?
É que eu tenho a impressão de que o que será inconstitucional não é a matéria informativa dos preceitos legais, mas os próprios preceitos legais.
O Orador: - Os preceitos legais que vinham insertos na proposta não marcavam uma acção que limitava o Parlamento para o orçamento seguinte.
Penso que, ou essa disposição proposta pela Camará Corporativa não tem qualquer valor de obrigatoriedade jurídica ou, se o tem, é inconstitucional.
O Sr. Carlos Moreira: - Se bem me parece, V. Ex.ª diz que essa disposição não é inconstitucional, mas sim a doutrina que informa essa disposição.
O Orador: - Evidentemente que nenhum parágrafo por si é inconstitucional, mas sim pela matéria que contém.
O Sr. Carlos Moreira: - Mas se V. Ex.ª conclui pela inconstitucionalidade da matéria desse parágrafo ...
O Orador: - Perdão, a matéria não é inconstitucional. Se essa matéria se alargar com vista aos anos futuros, então sim.
O Sr. Carlos Moreira: - Mas não é isso que está escrito na proposta de substituição da Câmara Corporativa em discussão.
O Orador: - Está, sim senhor. De resto, a leitura do parágrafo pode esclarecer-nos.
Leu.
Como V. Ex.ª vê, marca-se aqui a disposição do saldo.
O Sr. Carlos Moreira: - Julgo que u disposição du, lei se refere apenas ao aproveitamento posterior do saldo.
O Orador: - Insisto na minha ideia: ou reconhecemos que o referido parágrafo não tem qualquer valor jurídico, ou, se lho reconhecemos, temos de concluir que coloca o futuro orçamento de 1903 um pouco fora da alçada directa da Assembleia.
O Sr. Carlos Moreira: - É uma forma de interpretação; não pode ser mais do que isso.
O Orador: - O parecer da Câmara Corporativa pulveriza com o seu D. D. T. disposições que supõe um tanto parasitárias, mas às vezes o vento volta-se e, como um boomerang ...
Sobre o artigo 6.º já formulei o meu ponto de vista no meu projecto sobre a limitação de vencimentos.
Requeri nota das taxas médias, que só na especialidade me chegarão de certeza, para criticar o meu ponto de vista com a justiça costumada e a Assembleia poder votar com plena consciência do assunto.
Por agora leio os quadros da minha responsabilidade pessoal:
Tabela das taxas do imposto complementar
a) Para as pessoas singulares:
[...ver tabela na imagem]
Quadro das taxas que, aplicadas aos rendimentos auferidos por acumulações, líquidos dos impostos dedutíveis nos termos da alínea b) do artigo 10.º do Regulamento do Imposto Complementar, reproduzem o imposto resultante das taxas médias constantes do quadro anterior.
[...ver tabela na imagem]
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Quadro das taxas médias, calculadas com o agravamento previsto no artigo 6.º da proposta da Lei de Meios, para o máximo, aplicáveis nos rendimentos superiores a 240 contos, em imposto complementar, quando se trate de acumulações:
[ver tabela na imagem]
(a) A aplicar sobre as remunerações liquidas dos impostos de que trata o artigo 10.º e o Regulamento do Imposto Complementar e depois do feita a dedução mínima de 30.0000, nos termos do n.º 2.º do § 1.º do artigo 21.º do mesmo regulamento.
Tirarei na discussão na especialidade as conclusões necessárias, apoiado decerto pelos dados que me vão ser fornecidos pelo Ministério das Finanças.
Há em Portugal uma habitual apatia fiscal - a trágica brandura dos nossos costumes - em lugar de atingir, com equidade necessária, o anonimato, «penicilino-resistente» ao actual sistema tributário, procura-se feri-lo nas acumulações, que não temos a coragem de restringir por disposições directas de direito administrativo-político, mas que vamos limitando por disposições riscais de fácil cobertura por recuperação contabilística, mas deixando a descoberto no nosso «menagenal system» posições feudais.
E de louvar e encarecer a intenção corajosa do Sr. Ministro das Finanças. O imposto complementar deveria ser declarado e processado quanto aos administradores das sociedades anónimas na própria Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, e não na secção fiscal, onde se faria pela tesouraria respectiva meramente u sua cobrança.
Alterada a percentagem nos termos do artigo 6.º é de elementar justiça revogar a disposição do Decreto-Lei n.º 26:115 que limita em termos de baixa nível os honorários dos corpos gerentes das empresas concessionárias.
Vencimentos - problema, candente que a desvalorização monetária cumpliciou.
Desvalorização monetária, inesperada em finanças sãs, a princípio trabalhada pela pressão quantitativa dos signos monetários, não absorvidos pela congelação, volframizada por trocas cambiais. Um aforro sem silos, num país de baixas possibilidades industriais, com um nível de vida já de si baixo, mas avultado ainda pela decomposição do poder de compra, deflacionada por retracção. Concentracionismo sem managers, desvirtuado pela aquisição rápida de fortunas e pela incapacidade como dirigentes dos seus detentores.
Euforia de gozadores e sem capitães de indústria.
A economia portuguesa, repleta de cambiais sem um efectivo poder de compra de mercadorias, empobreceu cerca de um terço sobre 1939.
Um comércio externo em que damos um pouco do necessário metropolitano e colonial sem obter reciprocidade de utilização, reduzidos a consumir por importação muito do supérfluo, para não nos avultar mais ainda o nosso pecúlio cambial congelado por impossibilidade de compra.
Inflacionamos por necessidade do nosso comércio externo, guardando divisas ... duma hierarquia monetária de pendor inflacionista e, portanto, desvalorizante.
O quadro seria sombrio se não tivéssemos Salazar; à menor reabsorção dos fenómenos de pré-guerra em que vivemos a crise surgirá como um surto inevitável se não nos prepararmos para ele com um bom clearing, muito nosso, sem deixar quintacolunizar os importadores e exportadores estranjeiros do nosso mercado colonial e metropolitano.
Confiemos, em matéria de vencimentos, nas boas intenções do Sr. Ministro das Finanças; mesmo que quiséssemos ter opinião pessoal faltar-nos-iam os elementos estatísticos para, concretamente, formularmos o nosso ponto de vista. Mesmo o Ministro, sem ter ao seu alcance uma pirâmide estatística do funcionalismo português, não pode afastar-se da estrada nacional dos aumentos globais.
Em todo o caso, permito-me insistir para que o aumento incida, principalmente, sobre as categorias de funcionários que menos recebem, para que os aposentados não sejam esquecidos, sobretudo para aqueles que se reformaram antes do Decreto-Lei n.º 26:115, e que teimam ainda em viver. As pensionistas merecem a caridade e a atenção do Sr. Ministro das Finanças. Há funções em que as horas extraordinárias e as gratificações constituem o mais claro de um vencimento; não são um complemento, são o essencial.
Sr. Presidente: confio no bom senso e inteligência do Sr. Ministro das Finanças; e mais uma vez felicito o Governo pela apresentação de um orçamento equilibrado numa Europa em completo e desordenado desequilíbrio de contas.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Ernesto Lacerda: - Sr. Presidente: estando em discussão a proposta de lei de autorização das receitas e despesas para o ano de 1952, não quero deixar de, embora em breves palavras, dizer o que penso em relação a alguns dos aspectos que considero mais dignos de relevo desta importante proposta de lei.
Mas antes cube-me o dever, a que gostosamente dou cumprimento, de agradecer ao Sr. Ministro das Finanças os valiosos elementos que recebi juntamente com u proposta e que me habilitaram a conhecer melhor um projecto de lei que é fundamental para a vida da Nação e cuja apreciação constitui, por isso mesmo, uma das maiores prerrogativas desta Assembleia.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: entrando, na apreciação na generalidade da proposta, começo por dar o meu inteiro aplauso ao estabelecido no seu artigo 3.º, destinado a garantir o equilíbrio das finanças do Estado.
É que, embora felizmente já distante, não esqueço o tempo em que as contas públicas apresentavam deficits permanentes e em que a situação financeira do País era tão angustiosa que se chegou ao ponto de se pensar no recurso ao crédito externo em condições humilhantes para a nossa dignidade e para o nosso prestígio de povo soberano. Não posso esquecer também que foi precisamente o equilíbrio financeiro a primeira grande
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e árdua tarefa que Salazar encetou ao deixar a sua cátedra na Faculdade de Direito de Coimbra para, numa hora feliz para a Nação, entrar na vida pública portuguesa.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Foi graças u resolução do problema das finanças, então justamente considerado primacial, que se preparou o terreno pura os grandes cometimentos futuros e se inaugurou a era da renovação e do progresso que temos vivido, impondo-se de novo no Mundo o prestígio de Portugal.
A preocupação do equilíbrio contida na proposta representa a continuação da política financeira inaugurada pelo Sr. Presidente nlo Conselho, política que deve ser mantida para que a Nação continue a. caminhar na senda do progresso que ela tornou possível.
Vozes: - Muito bem !
O Orador: - Sr. Presidente: no artigo 4.º da proposta, fazendo-se referência aos objectivos da Lei n.º 2:045, de 23 de Dezembro de 1950, diz-se que a Comissão de Estudo e Aperfeiçoamento de Direito Fiscal e a Comissão de Técnica Fiscal, criadas pelo Decreto n.º 38:438, de 25 de Setembro de 1951, prosseguirão os seus estudos para inteira realização dos objectivos que aquela lei pretende alcançar.
Fazendo referência a esta disposição, e aplaudindo-a, eu quero manifestar :aqui a esperança de que estas Comissões cheguem, com brevidade e a proficiência, que as circunstâncias reclamam e é de presumir, dada a alta competência daqueles que as compõem, à finalidade que se pretende atingir, pois dela resultará um alto benefício para o Estado e até para o contribuinte.
É tão profusa e tão dispersa a legislação fiscal que é tarefa inadiável e de grande valia a que venha simplificar e esclarecer, economizando trabalho e tempo, que são preciosos na vida absorvente de hoje.
É tão deficiente a determinação das matérias colectáveis, tão irregular a distribuição da carga tributária, tão grande a multiplicidade dos deveres impostos aos contribuintes, que estes não podem estar certos de os cumprir inteiramente, tão deficiente também a técnica do lançamento e liquidação das colectas, que tudo isto constitui um vasto campo de acção, uma enorme e ingrata tarefa .para estas Comissões, que, cumprindo-a, prestarão ao País um dos mais relevantes serviços.
Um outro ponto digno de realce é o que se refere a acumulações e incompatibilidades.
O Sr. Ministro das Finanças diz-nos que até 30 de Abril de 1902 se fará a revisão do regime legal existente.
Creio que esta moralizadora medida terá o maior alcance político e social. Com ela o Governo vem ao encontro daqueles sentimentos e anseios de equidade e de justiça a que aspiram os povos.
É necessário que alguns recebam menos para que maior número receba o suficiente, é necessário encontrar meios de reagir à vaga de egoísmo e de materialismo que campeia na sociedade de hoje, meios de reagir contra a psicose do .ouro e da riqueza.
Tenho ouvido críticas, queixas e revoltas contra a acumulação de cargos altamente remunerados e sabe-se como isto foi aproveitado pelos inimigos da Situação na sua insidiosa, propaganda nas passadas campanhas eleitorais.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Bem sabemos que a oposição fez a este propósito acusações malévolas e infundadas, acusações que foram repetidas com a reposição da verdade dos factos, que ela desvirtuou com o tendencioso desejo de lançar no eleitorado a sombra negra da dúvida sobre a moralidade da Administração.
Mas também sabemos que a opinião pública manifesta desacordo contra um regime de acumulações que permite, que alguns recebam aquilo que podia chegar para muitos.
Não haverá que falar de imoralidade, mas há que pôr de parte um regime que tem levantado legítimos reparos.
E certo que a Câmara Corporativa no seu douto parecer conclui pela eliminação pura e simples do artigo 6.º da proposta, aduzindo argumentos de vária ordem.
Creio que esses argumentos não invalidam o que sucintamente «e acaba de dizer quanto à concordância com a revisão ido que existe Legislado relativamente a acumulações.
Não colhe o argumento de que muitas vezes «os segundos empregos» são um recurso para suprir a deficiente remuneração dos primeiros, visto que, tratando-se de empregos de baixa, ou média retribuição, nem eles são atingidos pelo adicional do imposto complementar nem é certamente com vista a tais empregos que a revisão se fará. O que interessa, principalmente, são os segundos e, os primeiros empregos altamente remunerado».
Também não colhe o argumento de que as nossas élites são quantitativamente deficitárias, porque não está provado que tal afirmação traduza a realidade e ainda porque tal critério levaria a fechar as portas a muitos que, embora com competência paira o desempenho de altos cargos, não teriam jamais oportunidade de verem reconhecidos os seus méritos, por não se considerarem incluídos nessas, fachadas elites.
Quanto a mim e sem me deter mais tempo na apreciação deste ponto, parece-me fora de dúvida que a revisão corresponde à satisfação de um premente sentimento de justiça social.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - O Sr. Ministro das Finanças, propondo-se corajosamente enfrentar o problema, merece o meu inteiro aplauso, e, se consideramos que, a par disso, a proposta pretende também melhorar a situação dos funcionários concedendo-lhes um novo suplemento, temos de concluir que o Governo, procurando dar satisfação às
necessidades das classes menos favorecidas, segue uma política orientada nos grandes princípios da civilização cristã, política que visa a melhorar as condições de vida dos que mais precisam, para que todos possam ter, com o trabalho que honra e dignifica, o pão suficiente para viver.
A melhoria, das condições a que se pretende fazer face através do previsto ,novo suplemento não deverá, porém, ser feita, uniformemente, mas sim de forma a favorecer em maior escala ou proporção os funcionários mais modestos*
Só assim, em meu entender, se adoptará um critério que se ajuste aos sentimentos de equidade e de justiça a que já me referi.
Vozes: - Muito bem!
O Orador:- Sr. Presidente: desnecessário seria afirmar aqui a aprovação que me merecem as medidas previstas na proposta, de lei relativamente à eficiência das despesas e custo dos serviços e ainda às tendentes à economia, de despesas não consideradas indispensáveis, pois a sua justificação e benéfico alcance estão certamente no espírito de todos os portugueses.
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Pretendo, antes de finalizar estas considerações, fazer ainda uma alusão aos compromissos internacionais de ordem militar de que fala a proposta.
Não oculto que foi com verdadeiro sentimento de angústia que li no artigo 25.º a autorização a conceder ao Governo para despender nos próximos três anos a enorme cifra de 1:500 milhares de contos para satisfazer as necessidades de defesa militar, «em harmonia com compromissos tomados internacionalmente».
Tão grande soma há-de reflectir-se de forma sensível e prejudicial no nosso esforço restaurador, porque para um país como o nosso ela representa, sem dúvida, uma parte apreciável das nossas disponibilidades e recursos, que será desviada da aplicação em obras de apetrechamento e de fomento que levariam à melhoria do nível de vida da nossa população.
Porém, há que considerar que esse dispêndio representa o nosso indispensável contributo na tarefa de salvar na Europa e a civilização do Ocidente dos perigos de morte que a ameaçam.
É que, infelizmente, o Mundo de hoje está dividido em dois campos de antagonismo irredutível: dum lado os que, como nós, respeitam os grandes ideais da civilização milenária que as passadas gerações nos legaram, do outro os que se empenham numa luta de extermínio de, todos os valores morais, de tudo quanto pode elevar e dignificar o homem.
E este o clima, que a guerra nos legou, essa guerra que foi a maior de todas, mas que ficará a perder de vista se o bom senso não dissipar os desentendimentos e os ódios que vão sobre o Mundo e forem desencadeadas as terríveis forças de destruição que a ciência moderna pôs ao alcance dos homens.
É num Mundo assim que nós vivemos, alinhando com aqueles que desejam ver o triunfo da paz e da justiça sobre a Terra. Colaborando com outras nações, ajudamos a formar a barreira que se procura erguer contra as ameaças que se acumulam no horizonte, pois nesta barreira temos, por direito, o lugar de relevo que nos vem de sempre termos vivido nas grandes verdades da civilização cristã, dentro destas verdades em que se fundou a nacionalidade, se difundiu a fé e o Império, se descobriram e deram novos mundos ao Mundo e lhe estamos dando no presente o exemplo da nossa ordem, do nosso progresso e da nossa paz social.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Não podemos, nem queremos, portanto, furtar-nos aos sacrifícios que a ingente tarefa comum exige. Por isso estamos presentes no Pacto do Atlântico e nos propomos de ânimo forte fazer face aos sacrifícios que ele impõe, honrando como sempre a palavra dada. Se, no final, todos juntos, pudermos vencer as forças do mal que sobre nós se conjuram, podemos considerar com orgulho que tais sacrifícios não foram feitos em vão e que tivemos a nossa quota-parte na defesa do património comum da civilização.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: apesar das dificuldades criadas pela aplicação de tão grandes somas em fins de defesa militar, estou certo de que o Governo há-de inscrever nos orçamentos dos anos futuros as verbas necessárias para fazer face à realização de obras e melhoramentos públicos, dando preferência àquelas de mais directa produtividade e de maior necessidade, como são as referidas nos artigos 21.º e 22.º da proposta.
É que só com a ajuda dos financiamentos e comparticipações do Estado as câmaras municipais poderão, dadas as suas fracas disponibilidades, levar a cabo os seus planos de actividade tão necessários para que não seja interrompida nem diminuída a série magnífica de realizações que tem levado a todos os cantos da nossa terra os benefícios que promovem o aumento do bem-estar e o desenvolvimento dos aglomerados rurais.
Tenho fé em que venceremos as dificuldades da hora presente. A Lei de Meios que o Sr. Ministro das Finanças submeteu à nossa apreciação e a que acabo de fazer um simples comentário, continuando a política da ordem, de equilíbrio e de saneamento das finanças, públicas, é de molde a fazer-nos confiar no progresso e no engrandecimento de Portugal.
Tenho dito.
Vozes : - Muito bem!
O orador foi cumprimentado.
O Sr. Presidente : - Vou encerrar a sessão.
O debate prosseguirá na sessão de amanhã.
Está encerrada a sessão.
Eram 17 horas e 45 minutos.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Herculano Amorim Ferreira.
João Carlos de Assis Pereira de Melo.
João Mendes da Costa Amaral.
D. Maria Baptista dos Santos Guardiola.
D. Maria Leonor Correia Botelho.
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
António Carlos Borges.
António Jacinto. Ferreira.
António de Sousa da Câmara.
Artur Rodrigues Marques de Carvalho.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Avelino de Sousa Campos.
Carlos Mantero Belard.
Daniel Maria Vieira Barbosa.
Diogo Pacheco de Amorim.
Elisão de Oliveira Alves Pimenta.
João Cerveira Pinto.
Joaquim de Moura Relvas.
José Pinto Meneres.
José dos Santos Bessa.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel França Vigon.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel Maria Múrias Júnior.
Mário Correia Teles de Araújo e Albuquerque.
Vasco de Campos.
O REDACTOR - Leopoldo Nunes.