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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 136

ANO DE 1952 14 DE MARÇO

ASSEMBLEIA NACIONAL

V LEGISLATURA

SESÃO N.º 136, EM 13 DE MARÇO

Presidente: Exmo. Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior

Secretários: Exmos. Srs.
Gastão Carlos de Deus Figueira
José Guilherme de Melo e Castro

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 10 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foram aprovados os n.ºs 131 e 135 do Diário das Sessões, com uma emenda do Sr. Deputado Pinto Barriga quanto a este.
O Sr. Presidente anunciou estar na Mesa uma proposta de lei relativa ao exercício do comércio bancário no ultramar, que vai baixar às Comissões de Legislação e Redacção e de Colónias da Assembleia.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Galiano Tavares, Manuel Lourinho, que anunciou um aviso prévio, e Bartolomeu Gromicho.

Ordem do dia. - Prosseguiu o debate acerca do aviso prévio do Sr. Deputado Armando Cândido relativo ao excesso demográfico português, relacionado com a colonização e a emigração.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Carlos Mantero e Armando Cândido, que enviou para a Mesa uma moção, que, submetida à votação, foi aprovada.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas e 35 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 16 horas.

Fez-se a chamada, â qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Abel Maria Castro de Lacerda.
Adriano Duarte Silva.
Afonso Eurico Ribeiro Cazaes.
Alberto Henriques de Araújo.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alexandre Alberto de Sousa Pinto.
André Francisco Navarro.
António Abrantes Tavares.
António Augusto Esteves Mendes Correia.
António Bartolomeu Gromicho.
António Carlos Borges.
António Cortês Lobão.
António Joaquim Simões Crespo.
António Júdice Bustorff da Silva.
António Maria da Silva.
António Raul Galiano Tavares.
António dos Santos Carreto.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Proença Duarte.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Avelino de Sousa Campos.
Caetano Maria de Abreu Beirão.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos Mantero Belard.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Carlos Vasco Michon de Oliveira Mourão.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Délio Nobre Santos.
Diogo Pacheco de Amorim.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Ernesto de Araújo Lacerda e Gosta.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco Eusébio Fernandes Prieto.
Frederico Maria de Magalhães e Meneses Vilas Boas Vilar.

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Gaspar Inácio Ferreira.
Gastão Carlos de Deus Figueira.
Henrique Linhares de Lima.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Herculano Amorim Ferreira.
Jaime Joaquim Pimenta Prezado.
João Alpoim Borges do Canto.
João Ameal.
João Cerveira Pinto.
João Luís Augusto das Neves.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim de Oliveira Calem.
Joaquim de Pinho Brandão.
Joaquim dos Santos Quelhas Lima.
Jorge Botelho Moniz.
José Dias de Araújo Correia.
José Garcia Nunes Mexia.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Luís da Silva Dias.
José Pinto Meneres.
Luís Maria Lopes da Fonseca.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Colares Pereira.
Manuel França Vigon.
Manuel Hermenegildo Lourinho.
Manuel José Ribeiro Ferreira.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel de Magalhães Pessoa.
Manuel Maria Vaz.
Manuel Marques Teixeira.
Manuel de Sousa Meneses.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Mário Correia Teles de Araújo e Albuquerque.
Mário de Figueiredo.
Miguel Rodrigues Bastos.
Paulo Cancela de Abreu.
Ricardo Malhou Durão.
Ricardo Vaz Monteiro.
Salvador Nunes Teixeira.
Sebastião Garcia Ramires.
Tito Castelo Branco Arantes.
Vasco de Campos.
Vasco Lopes Alves.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 78 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 16 horas e 10 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Estão em reclamação os n.ºs 134 e 135 do Diário das Sessões.

O Sr. Pinto Barriga: - Sr. Presidente: pedi a palavra para fazer as seguintes rectificações: no Diário das Sessões n.º 134, a p. 473, col. 1.ª, 1. 67, onde se lê: «possibilidade», deve ler-se: «passividade»; e no Diário das Sessões n.º 135, a p. 498, col. 1.ª, 1. 19, onde se 16: «oculturativas», devo ler-se: «aculturativas».

O Sr. Presidente: - Como mais nenhum Sr. Deputado pede a palavra sobre estes números do Diário, considero-os aprovados com a rectificação apresentada.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Está na Mesa uma proposta de lei relativa ao exercício do comércio bancário no ultramar.
Esta proposta de lei vai ser enviada à Câmara Corporativa e baixa às Comissões de Legislação e Redacção e de Colónias desta Assembleia.
Tem a palavra antes da ordem do dia o Sr. Deputado Galiano Tavares.
O Sr. Galiano Tavares: - Sr. Presidente: em editorial do Diário de Noticias de 25 de Janeiro e de hoje com o titulo «Em favor da vida rural», fizeram-se uns comentários a que não posso deixar de me referir, por traduzirem um critério que há muitos anos tenho defendido na imprensa e em documentos oficiais.
Apoiando-se nos elementos financeiros relativos a receitas e despesas das autarquias locais e que constam das Contas Gerais do Estado de 1945, o referido jornal escreve:

Quem analise a posição das finanças municipais através dos dados obtidos e relacionados nesse inquérito não chegará a conclusões muito optimistas, mas obterá a explicação, pelo menos em grande parte, do estado de atraso em que se encontra parte do Pais, principalmente nas zonas rurais, não obstante as grandes cifras larga e metodicamente despendidas pelo Estado para melhoramentos rurais.
Como os subsídios do Estado são concedidos em forma de comparticipação, acontece que são exactamente os concelhos mais pobres os que estão em piores circunstâncias para receber auxílio. São, por conseguinte, os mais necessitados de verbas para obras essenciais e os que mais precisariam de dinheiro paira operar a transformação das condições de vida dos habitantes no que diz respeito a caminhos, salubridade, água e esgotos, edifícios públicos, etc., os que mais dificilmente obterão as verbas indispensáveis ao seu progresso.
E prossegue:
Nos cinco anos que decorreram de 1945 a 1949, apesar do terem sido concedidos 639 mil contos de comparticipações - correspondendo 317 mil a melhoramentos urbanos, 164 mil a melhoramentos rurais, 153:500 a abastecimento de águas e obras de saneamento e o saldo a estudos de urbanização -, a situação não se modificou profundamente e foram ainda os concelhos mais pobres, os que têm menos receitas e, portanto, só encontram em piores condições para empreender obras, os que menos receberam.
Eu sei, Sr. Presidente, e também o tenho defendido, que é indispensável para haver verdadeiro progresso que aos melhoramentos materiais corresponda uma renovação na mentalidade e no espírito das pessoas que promoverem esses melhoramentos e dos que hão-de usufruir os benefícios derivados dessas realizações.
Quero dizer, a construção de uma escola, o traçado de uma nova estrada, a pavimentação de um caminho, a construção de redes de esgoto e de águas o bairro económico, o dispensário ou o preventório, o jardim, são aquisições indispensáveis no momento actual, principalmente nos pequenos aglomerados populacionais, mas é necessário, por outro lado, que ao construir a escola tenhamos a certeza prévia de que ela será frequentada com regularidade, que, ao traçar uma estrada, perante o interesse público cessem os interesses particulares, de modo a acabar com as consabidas dissenções quanto aos locais a atravessar.
Que o pavimentar de um caminho sirva à população para lhe incutir noções de respeito pela própria rua.
Nesta adorável cidade de Lisboa não é verdade que esse elementar preceito se infringe a todo o momento, o que sobretudo escandaliza o estrangeiro que nos visita?!
O tratar da salubridade pública implica, necessariamente, o ter noções de respeito pela higiene, nossa e

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alheia, pois que não faz sentido inaugurar um balneário para depois só o mostrar às visitas.
É indispensável que os melhoramentos que alcançamos correspondam rigorosamente a uma necessidade não artificial.
Fazemos afirmações de carácter genérico, porque reconhecemos ser indispensável graduar, fazer como que uma escala de valores nos melhoramentos a promover, de modo a que correspondam de facto a uma necessidade, e não à satisfação de um capricho.
O grande hotel onde não haverá hóspedes, o grande café onde não haverá fregueses, o grande jardim onde não haverá flores, etc., já têm constituído argumento empregado até pelas próprias repartições técnicas superiores para .não verem com agrado certas aspirações.
Sucede, por isso, que o melhoramento provadamente inadequado, nesses casos, tenha constituído obstáculo para o deferimento doutros projectos que correspondem a uma necessidade visível e só contestada por quem desconhece o próprio meio.
Se não podemos dizer, em absoluto, que tudo o que é local é nacional, não há dúvida nenhuma de que muito do que se tem feito tem, sobretudo, carácter nacional.
Os próprios melhoramentos que se inauguram numa freguesia, sendo locais na aparência, não serão nacionais na essência?
O mundo rural pede arquitectos, escreve Richard Neutra, e esclarece: o afluxo exagerado da população rumo à cidade grande terá de ser restringido combatendo-se a solidão, o tédio e a falta de saneamento e das facilidades que tornam a vida mais suave.
A técnica moderna e a compreensão das necessidades humanas podem realizar esse milagre. São de reconhecer os serviços prestados à humanidade pelas grandes cidades, mas não é justo pretender que a norma de todas as actividades seja a dos grandes centros urbanos.
Disse e repito - porque nunca é demais insistir nos princípios fundamentais- que é absolutamente necessário pormos o nosso espírito e os nossos actos em concordância com as reivindicações de natureza concreta que vamos obtendo.
Quem manda também obedece, e só quem sabe obedecer tem condições para saber mandar.
É conveniente saber usar de espirito de franqueza, que nunca deve confundir-se com o espírito de intriga. A crítica sem uma base honesta a orientá-la transforma-se em maledicência o carácter dos homens deduz-se da coragem posta nos seus actos ao serviço de uma cansa, porque nem todos são iguais na sua formação intelectual nem na sua resistência moral. A par disto, é indispensável, sobretudo nos pequenos aglomerados de população, preparar o meio, criar uma opinião propicia ao desenvolvimento e aplicação de determinadas normas que queremos estabelecer.
As pessoas investidas em cargos de responsabilidade pertencem-se a si próprias menos do que quaisquer outras, e dai o conceito, geralmente aceite, segundo o qual não é comandante todo aquele a quem foram atribuídas, e só por isso, prerrogativas de mandar.
Fora do quadro de determinadas instituições, o comando, hoje mais do que nunca, deve ser o fruto de uma conquista, e nunca de um favor ou simples predilecção; por isso tem dê ter a categorizá-lo um certo equilíbrio de actividades que evitem perda de prestigio, porque perder o prestígio é, neste caso, perder todas as possibilidades de comandar com proveito.
Desprezar, porém, a influência de certos homens sobre a opinião é principio que não deve aceitar-se, e, escolhidos os melhores, com vista ao interesse nacional, é possível contribuir para melhorar as condições de vida de muitos, criando uma harmonia social que tenha como objectivo o princípio de prestar justiça a todos.
O inquérito de 1940 permitiu classificar como concelhos pobres os do interior ou fronteiriços.
Tais concelhos, embora tenham o recurso do empréstimo, carecem dos meios necessários para depois liquidarem esses encargos, os quais, pelo conteúdo do artigo 674.º do Código Administrativo, não poderão exceder a quinta parte da receita ordinária arrecadada no ano anterior àquele em que se efectuou o empréstimo, a menos que se trate de serviços municipalizados.
E os encargos obrigatórios?
Foram os concelhos ricos os beneficiados com maior número de comparticipações, e portanto os que mais progrediram.
Ainda no parecer sobro as contas gorais do Estado de 1949 e relativamente ao inquérito de 1945 se consigna, o que muito judiciosamente também transcreveu:
Conviria estabelecer uma discussão adequada sobre a vida dos concelhos pobres, de modo a esclarecer as suas possibilidades e encontrar a melhor solução para equilibrar os mais pobres, sobretudo na parte que diz respeito às necessidades imediatas que levam ao revigoramento da vida rural.
PropOs-se que, por intermédio das juntas provinciais ou governos civis, em conjunção com os serviços de saúde, de estradas e de urbanização, se recolhessem todos os possíveis elementos para estabelecer um plano dê acção revigoradora.
Esse plano deverá, naturalmente, ter em conta o grau de progresso e a falta* de recursos das diversas regiões do País, porque, como se viu, as zonas pobres são naturalmente aquelas que menos aproveitam o auxílio do Estado e, de um modo geral, são aquelas que tem necessidade de mais obras.
Temos defendido sempre o princípio que consideramos justo - de a comparticipação ser concedida (consoante a natureza da obra, é evidente) na razão inversa dos recursos da entidade que a solicita e isto precisamente em favor da vida rural, de que nesta Câmara se tem falado tanto.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Manuel Lourinho: - Sr. Presidente: poucas palavras.
Ficarão de reserva os argumentos, para quando me for permitido apresentar o problema em toda a sua extensão.
Apenas alguns ligeiros toques.
O professor dos pequenos aglomerados é inegavelmente um meio de fixação do homem rural ao seu Habitat.
Onde o meio retrocede o homem apaga-se ou emigra. Emigra com a amargura, a servir de travo de mau sabor, na luta que irá empreender em terras distantes, em concorrência com homens desconhecidos.
Onde o meio não progride o homem faz-se rotina, e, ou se conforma e embrutece, ou se desumaniza e revolta.
A desumanização do homem é um mal que resulta dos factores desinquietantes do actual viver social.
A revolta do rural nasce do complexo de inferioridade que lhe criou o não ter conseguido vencer a rotina o meio.
Sr. Presidente: o caminho para melhorar o ambiente rural foi bem traçado de cometo.
E neste momento abro uma nota de comovido respeito o subida admiração pelo Dr. Antunes Guimarães,

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Ministro que subscreveu o primeiro decreto sobre melhoramentos rurais.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O seu amor ao «bem» português foi, como sempre, a directriz que o levou à publicação do decreto de 20 de Março de 1931. Ele traduziu em lei a possibilidade de realização dos anseios, às vezes seculares, de quase toda a gente que povoa as nossas aldeias. Tenho muita honra em lhe testemunhar aqui a minha profunda admiração e arrojo-me a afirmar que a alma de médico me deu certamente a sensibilidade de sentir com verdade o interpretar com oportunidade a necessidade de melhorar a vida rural.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: não restam dúvidas. A legislação que regula o assunto está antiquada. E mal seria que vinte anos passados duma época que se movimentou amalgamando as verdades, com as subverdades, as certezas com as mentiras, as necessidades com a folgança, digo eu, mal seria que tudo quanto só projectou em 1981 fosse possível estar em forma no ano de 1952.
Nada parou no Mundo. Nem o mal nem o bem! Nem o viver nem o morrer! Nem os homens nem as coisas! E se alguns dos movimentos do Mundo continuaram iguais em rotação e translação, no meio social tudo mudou. As trajectórias económicas mudaram em ponto de apoio, direcção e sentido. As reivindicações das massas mudaram da rebelião mecânica para a marcha vitoriosa dentro da organização corporativa.
Os longes aproximaram-se tanto que perderam o seu significado geométrico. Os acontecimentos do dia, dramas o comédias da vida humana, tornaram-se tão desconcer-tantes que deixaram de nos provocar reacções de sensibilidade.
Tudo se passa, as grandes e as pequenas coisas, numa mesma planificação horizontal.
Tudo se passa num galopar, em que a grandeza e a miséria se sucedem ou confundem, perturbando os espíritos avisados que procuram encontrar e seguir o caminho da luz, da paz e da felicidade.
Os humildes são cada vez mais humildes, mas os grandes, os potentados, julgam-se mais senhores, mais poderosos, supondo que a humildade dos primeiros é uma homenagem à sua projecção no meio em que todos vivem.
Mas a vida, para ser vida, tem de ser humana. E para ser humana terá de ser simples. E para ser simples terá de ser copiada da humildade. E tudo quanto se conceder aos humildes concede-se a Deus. E tudo quanto se conceder á Deus transformar-se-á em grandeza, poderio e abastança.
Ao Governo não tem. sido indiferente a vida das populações rurais, mas é mister que tais directrizes se continuem, aumentem e melhorem. Daí virá a grandeza da Nação. E para a maior grandeza da Nação todos os sacrifícios são pequenos, nenhuns são inúteis e, por mais que se façam, nunca são bastantes.
É tal critério que me leva a apresentar o aviso prévio que tenho a honra de enviar para a Mesa, pedindo para ele antecipadamente a melhor atenção do Governo. Creio também antecipadamente que o Governo fará, como até aqui, quanto lhe caiba.
Passo a ler esse aviso prévio:

«Nos termos do Regimento, tenho a honra de enviar para a Mesa uma nota de aviso prévio sobre melhoramentos rurais e designadamente sobre as disposições legais que concedem as participações.
Pretendo provar:

1.º Que as disposições do Decreto n.º 19:502, de 20 de Março de 1931, se encontram desactualizadas, necessitando de ser revistas e reformadas no conjunto e no pormenor;
2.º Que o mesmo facto se dá com a doutrina do Decreto n.º 21:698, de 19 de Setembro de 1932, que regulamentou o decreto referido no número anterior;
3.º Que a legislação posteriormente publicada sobre a matéria não atingiu fim bastante, de forma a desmentir as premissas que ficam afirmadas nos n.08 1.º e 2.º deste aviso;
4.º Que, não tendo a Assembleia Nacional poderes constitucionais para, por iniciativa de um Deputado, discutir uma lei que ponha o problema na sua forma adequada com as soluções que o actual ambiente de progresso nacional admite, me parece útil provocar um debate largo e profundo sobre melhoramentos rurais, em ordem a dar ao Governo elementos de sugestão que sirvam de base à reforma completa das leis em vigor».
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Bartolomeu Gromicho: - Sr. Presidente: por mais estranho que pareça, vou falar de futebol.
Quando em 1905, com a reforma do ensino liceal, se introduziu em Portugal a educação física em estabelecimentos escolares deu-se início a uma nova era de renovação na vida da juventude.
A ginástica sueca servia de base a essa educação física e logo após esboçaram-se actividades desportivas organizadas segundo o figurino anglo-saxónico.
As antigas actividades dispersas e os jogos tradicionais foram gradualmente sendo absorvidos e esquecidos para dar lugar às organizações desportivas de modelo inglês. E assim surgiram as associações desportivas por todo o País com finalidade principal do exercício do futebol.
Todas as outras modalidades tom mantido uma posição secundária ou, como no caso do hóquei em patins, limitada a sectores restritos.
O futebol expandiu-se de tal maneira e atingiu proporções de interesse colectivo de tal monta que nas cidades e aldeias proliferaram os campos mais ou menos apropriados, até que o Estádio Nacional veio trazer o coroamento e a sanção oficial do desporto futebolístico, tão largamente difundido e tão profundamente enraizado no espírito das massas populares.
Foi um bem, foi um mal?
O que é certo é que se- trata de uma realidade que não pode escapar mesmo às pessoas que detestam ou se desinteressam do futebol.
De resto, o fenómeno é mundial, por isso que em quase todos os países mais ou menos civilizados o futebol quase monopolizou as actividades lúdicas da juventude.
Assim, o Governo entendeu e bem, criar um organismo que presidisse à regulamentação e orientação de actividade social tão vasta e proeminente.
Surgiu oportunamente a Direcção-Geral da Educação Física, Desportos e Saúde Escolar, organismo dependente do Ministério da Educação Nacional.
Tem sido notável a acção dessa Direcção-Geral no sentido da melhor orgânica dos clubes, da melhor eficiência da complicada engrenagem desportiva e do mais conveniente aproveitamento das importantes receitas colhidas.

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É natural que nem todas as medidas tenham alcançado o resultado previsto; é compreensível que haja mesmo erros e injustiças a corrigir. A experiência irá fornecendo os elementos de correcção que convém ir introduzindo com prudência e decisão na vasta máquina desportiva.
Na fase pioneira dos clubes o entusiasmo pelo desporto era visível, ingénuo e sincero. Daí o amadorismo que se criou, com a vantagem da extensão do exercício desportivo ao maior número.
À medida, porém, que o futebol ia alastrando e de certo modo aperfeiçoando-se, nasceu e cresceu o VII interesse das competições rendosas, com todo o cortejo do falseamento da- finalidade educativa, que parecia ser o principal objectivo a alcançar.
Do amadorismo puro ao profissionalismo mal disfarçado foi um passo, e um passo infeliz, que está na base do sistema ruinoso dos clubes e na base do descalabro educativo a que assistimos, confrangidos e alarmados.
Não sou autoridade na matéria no que respeita à orgânica clubista.
Julgo-me, porém, com muita autoridade para encarar o agudo problema como educador que sou por profissão, que não pode ficar indiferente perante o gravíssimo panorama que se desenvolve à volta das exibições de futebol por esse país fora.
Vou tentar concretizar o meu pensamento: marcar uma divisória inconfundível entre amadorismo e profissionalismo é imprescindível e urgente. Ser este devidamente regulamentado e limitado aos clubes dos grandes centros com a necessária capacidade financeira para a manutenção dos temas profissionais.
Fomentar e desenvolver o amadorismo puro nos clubes regionais, de forma a que estes regressem à intenção primitiva de se tornarem focos de educação física e social.
Talvez assim se reduzissem ou eliminassem os males que as exibições futebolísticas estão a produzir em todas as camadas sociais.
Os desportistas da velha guarda e o público em geral tiveram a doce ilusão de que o desenvolvimento dos clubes e do futebol traria extraordinárias vantagens sociais, pelo intercâmbio das terras, sem excluir o valor turístico das deslocações em larga escala das chamadas massas associativas e dos aficionados.

O Sr. Délio Santos: - Era apenas para acrescentar, Sr. Presidente, que concordo inteiramente com o que acaba de dizer o Sr. Deputado Bartolomeu Gromicho, mas quero, além disso, acentuar um outro ponto, que considero muito importante: houve, por assim dizer, um desvio na finalidade dos exercícios físicos. Perdeu-se de vista que os exercícios físicos desempenham um complemento da educação do homem e derivou-se quase completamente para a competição atlética, que é contrária à educação física. O erro não resido na falta de educação do povo, reside também no desvio da finalidade dos exercícios físicos.

O Orador: - Estou inteiramente de acordo com V. Ex.ª Ao invés, criou-se e acirra-se cada vez mais a animosidade entre as localidades, outrora em amistosas relações; fomenta-se e sustenta-se o ódio entre os associados dos vários clubes que se enfrentam. E o tão desejado intercâmbio turístico e recreativo das populações que se deslocam para ver os desafios transformou-se em viagens-relâmpago de agressividade e distúrbios, que se, estão a tornar perigosos e indesejáveis para os poucos pacatos aficionados, que desejariam ver um espectáculo de destreza, de lealdade e de luminoso movimento.

O Sr. Elísio Pimenta: - A polícia não tem sabido distinguir onde acaba o desportivo e se torna necessária a intervenção do agente da ordem pública.
O Ministério da Educação Nacional está a fazer uma obra notável através da Direcção-Geral da Educação Física, Desportos e Saúde Escolar, mas a polícia é que, muitas vezes, nos campos de futebol, assiste impassível a autênticos crimes públicos, porque não pode entrar nesses campos. Todos os que assistem aos domingos, por esse Portugal fora, a desafios de futebol são testemunhas de ofensas corporais, arremesso de pedras, ameaças e injúrias, que noutros locais dariam lugar a imediato procedimento criminal.
Parece-me, portanto, que o problema neste momento é de ordem pública, e não de desporto.

O Orador: - O problema não é só policial, mas muito mais profundo. É o falso profissionalismo que tem facilitado aquilo a que estamos assistindo.
Hoje é preciso terem coragem e arriscarem-se a incómodos sérios os que, ilusoriamente, tentam gozar o que dantes se chamava uma boa tarde desportiva. O que se passa no rectângulo entre jogadores - que por vezes são mais da violência que da bola -, o que se observa entre a assistência e quase sempre no rescaldo do jogo, dentro e fora dos campos, é de tal modo desconcertante e grave que urge encarar de vez a possível solução para os males, que toda a gente conhece de sobejo, para eu ter de os citar em pormenor.
É possível que na massa do nosso sangue estejam resquícios dos espectadores dos circos romanos.
E talvez tenha razão o autor de recente revista quando explicava que o espectador de futebol aproveita essas horas domingueiras para despejar a bílis acumulada pelas contrariedades da semana.
Np fundo, realmente, o que há é em larga escala falta de educação cívica, que não é 30 de atribuir, e nisto é que está o pior, apenas às pessoas menos educadas, mas que se observa frequentemente nos indivíduos que, pela sua posição e cultura, têm maiores responsabilidades.
Tem-se, em resumo, desenvolvido uma espécie de loucura colectiva, que é degradante e que perturba o organismo social.
Questão de polícia nos jogos? E visível que não basta, lia que haver uma acção viva e intensa de reorganização e de propaganda que meta nos eixos o que anda desastradamente fora deles.
Há mesmo que adoptar medidas drásticas contra os agressores, quer entre os jogadores, quer entre o público, responsabilizando-os judicialmente pelas agressões cometidas à margem dos desastres próprios e consequentes do jogo.
Sabe-se que em muitos casos, dentro do rectângulo, há a caça visível e propositada ao. homem, em vez do jogo leal dentro das regras normais. Se qualquer agressão1 vulgar é punida pelo rigor das leis, porque não responsabilizar os jogadores severamente pelos desmandos cometidos contra a integridade física do adversário?

O Sr. Carlos Moreira: - Creio mesmo que não é preciso criar novas disposições legais, bastando aplicar as que já existem no nosso Código Penal.

O Sr. Elísio Pimenta: - Bastava que a polícia pudesse entrar nos campos de jogos.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Nas nossas normas de direito geral, como nas normas de direito desportivo, há sanções para esses desmandos, e eu estava a ver se era possível num desporto de homens evitar que muitos desmandos ocorram...
Desmandos há-os, dada a fraqueza da pobre humanidade, em qualquer sociedade organizada. Este é o facto; o importante é que eles não passem em julgado e, ao

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contrário, sejam reprimidos pela aplicação de um sistema de sanções. Este sistema existe; o que há a discutir é se é convenientemente aplicado. O importante é que o seja.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Mário de Figueiredo: - Numa sociedade organizada é preciso que haja instituída uma forma de reacção contra os inadaptados ou inadaptáveis que provocam a desordem. A forma de reintegração da ordem é o castigo dos desordeiros.
Qual é a sociedade em que não há delitos, em que não há desadaptados?
Obrigar atletas a comportarem-se em jogos de competição com atitudes reverenciais de salão não parece o bom caminho.
Num jogo de homens, é preciso prestar homenagem à força o masculinidade dos que lutam; não acarinhar os tímidos. O facto de se ser forte, entrando sem medo, não impede que se seja também leal.

O Orador: - É exactamente o que se pretende.
Evidentemente que há leis repressivas em todos os casos vulgares de agressão, mas no campo desportivo depende-se muito do critério quase absoluto dos árbitros e da autorização da Direcção-Geral para levar as questões ao Poder Judicial.
Impõe-se o refreamento destes desmandos, quer do lado dos jogadores, quer do lado do público, de forma a que as competições desportivas deixem de ser espectáculos desmoralizantes e assumam o carácter educativo que está na sua intenção e na sua mais nobre finalidade.
Aos Ministérios da Educação e do Interior cabe um papel decisivo na intervenção e modificação deste perigoso estado de coisas.
Confio e espero que não se cruzem os braços perante problema tão candente e tão vasto e com tantos reflexos na vida da Nação.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Bustorff da Silva enviou para a Mesa um projecto de lei sobre a suspensão das penas de prisão correccional.

Ordem do dia

O Sr. Presidenta: - Continua era discussão o aviso prévio do Sr. Deputado Armando Cândido, acerca do excesso demográfico português relacionado com a colonização e a emigração.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Mantero.

O Sr. Carlos Mantero: - Sr. Presidente: não vou trilhar os mesmos caminhos nem pesquisar os meamos terrenos que os oradores precedentes irá exploraram a fundo com tanto brilho e cópia de informações, porque onde tudo está dito nada mais há a dizer.
A Câmara já terá formado o seu juízo sobre as ideias aqui expostas.
Retardatário no intervir, terei de me contentar com o que me deixaram.
É, sem dúvida, este problema da emigração um problema-chave da política nacional, porque da emigração portuguesa depende, em boa parte, o futuro do Mundo Português e, portanto, da nossa posição e importância na comunidade das nações.
Mas a emigração é apenas uma face de um problema maior: o problema demográfico em toda a sua extensão e, mais particularmente, o problema migratório, que envolve, simultaneamente, questões de emigração e questões de imigração, correntes imigratórias internas e externas e correntes emigratórias também nos dois sentidos.
Assim, o continente, as ilhas adjacentes, Cabo Verde e o Estado da Índia são regiões de emigração, enquanto Angola, Moçambique, S. Tomé, Guiné e Timor são regiões de emigração, fora os movimentos estacionais ou periódicos de populações trabalhadoras dentro de cada território ou entre territórios diversos.
O problema é, portanto, complexo nas três faces em que se decompõe.
O Mundo Português, que se define pelo conjunto dos territórios onde a língua, a raça, a cultura ou tradição e os interesses portugueses preponderam, ou se alimenta do manancial vivificador da nossa emigração que o irrigue e fecunde constantemente, preservando-o e engrandecendo-o, ou, seco o manancial português, outras fontes, raças estranhas, subverterão a pouco e pouco a civilização que erguemos na imensidão do nosso Mundo Atlântico, dissolvendo as nossas tradições e amesquinhando os interesses nacionais.
Tocamos neste debate o ponto sensível da nossa política, da nossa política como potência mundial, da nossa política económica e social. Eu creio que do rumo que dermos à política migratória dependerá, no período incerto que vivemos, mais do que de qualquer outra coisa, o curso da nossa história.
Quer-me, por isso, parecer que deveremos contar com este imperativo como um dos essenciais da nação portuguesa e procurar defini-lo e articulá-lo para uma acção construtiva dentro do complexo da política nacional, de que é parte integrante.
Durante os longos séculos da nossa história a emigração seguiu sempre o seu curso natural, mesmo quando a orientação régia interveio em seu reforço com a instituição das capitanias, ou no povoamento do Rio Grande do Sul com açorianos que foram os antepassados dos actuais gaúchos, e em tantos outros casos. Mas as intervenções dos reis, feitas muitas vezes para salvar dificuldades de momento, não alteraram o carácter essencial da nossa emigração de natureza espontânea. Orientou-se para onde as circunstâncias propícias - geográficas, económicas e sociais a atraíam no nosso destino missionário de povo civilizador e povoador do Atlântico Sul.
Nos últimos cem anos o poder político tem interferido, por diversas vezes, na ordem natural das coisas, imprimindo à economia metropolitana novas orientações, ora no sentido da política cerealífera, ora no sentido da política industrialista. A elas devemos a retenção aqui durante este largo período de uma boa parte do nosso crescimento fisiológico. No período de sessenta e cinco »anos, que vai de 1886 a 1950, de que existe resenha estatística, constata-se que a emigração absorveu 1.651:000 pessoas e que ficaram retidas na metrópole 2.893:000. Terá, ao menos, sido em benefício do nível de vida geral o
Estudando as curvas migratórias externas, parece poder concluir-se que as correntes internacionais se avolumam após as guerras e revoluções e se deprimem fortemente durante elas ou no desenrolar de graves crises económicas. Assim se verifica também entre nós. No decénio que precedeu o assassinato de el-rei D. Carlos e as convulsões internas que levaram à proclamação da República, a nossa emigração andou por 27:000 pessoas em média anual. Nos anos seguintes, até ao começo da primeira grande guerra, subiu para 57:000 e durante a guerra voltou a baixar para 10:500. Terminada esta, novamente a emigração se situa em 36:700 no período que vai até ao desenrolar da grande

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crise económica que teve início em 1929 nos Estados Unidos. Durante a prolongada crise, de que o Mundo se não havia ainda reconstituído quando rebentou a segunda guerra mundial, ela voltou a cair para 11:900.
Nos anos da guerra baixou outra vez para 5:600 e nos subsequentes, até 1950, fixou-se em KJ: 100, e não foi mais por causa da enérgica acção restritiva exercida até recentemente pelo Estado, a qual teve a sua aparente justificação no Decreto-Lei n.º 36:199, de 29 de Março de 1947. A emigração tem, neste momento, irresistível tendência a aumentar. Em 1951 atingiu possivelmente 30:000, e não seria de estranhar que este ano ela se fixasse em 40:000 ou, porventura, em número mais elevado.
A nossa experiência centenária como país de emigração põe-nos à vontade, ao rever o passado, para ajuizarmos da conveniência de mantermos a tradição emigratória ou de reconsiderarmos a política nacional neste sector, em face das condições inteiramente novas que à nossa emigração se têm deparado nos últimos sessenta ou setenta anos com a concorrência das poderosas correntes de italianos, alemães, sírios, eslavos e japoneses, orientados para as regiões tradicionais de povoamento português, de facto, o Mundo Português.
Esta invasão estrangeira das nossas terras e a sua ocupação levantou novos problemas que requerem novas soluções.
Põe-se aqui a questão de como barrar o passo a tais correntes, concorrendo vantajosamente com elas. E isto levanta, por sua vez, o duplo problema da quantidade e da qualidade dos nossos emigrantes. Com efeito, a insuficiência do número e a deficiente preparação técnica abriram caminho franco às migrações estrangeiras!. Elevar o número e promover a valorização profissional do emigrante português constitui, por isso, o problema que nos defronta.
Isto implica a definição da nossa política migratória dentro do complexo da política nacional. Teremos de ver até que ponto o emigrante, partindo, contribuirá para elevar o nível de vida dos que ficam mais do que permanecendo no País; teremos de decidir até que ponto nos convém mecanizar a economia rural e. modificar as culturas para libertarmos mão-de-obra; até que ponto nos convém levar a industrialização e, consequentemente, a absorção por este sector de uma maior ou menor parte do saldo fisiológico; ate que ponto estamos dispostos ou até onde a produção de novos capitais nos permite colonizarmos os nossos territórios do ultramar, a fim de sabermos qual é, no fim de tudo, o excedente que fica para a emigração externa, e teremos ainda de decidir para onde convém à nação (portuguesa, no respeito pelo seu passado e na consideração do seu futuro como potência mundial, encaminhar esse excedente. Parece-me que este aspecto do problema não se apresenta duvidoso. O excedente deverá fixar-se, sobretudo, no Brasil. Resta-nos assentar em que condições a emigração para o Brasil melhor serve a nação portuguesa- mais útil é ao Brasil e mais conveniente é para Portugal.
O Brasil carece de portugueses, porque português é o «eu fundo étnico, porque com o nosso emigrante não se põe o problema, da adaptação ou assimilação, porque' necessita preservar e defender a sua fisionomia nacional contra influências exóticas que a deformem e descaracterizem. A função assimiladora que determina a unidade cultural da nação ficou, assim, reservada à nossa raça. Fundindo as tradições, sentimentos e atitudes dos estrangeiros, determina a sua imersão gradual no grupo luso-brasileiro. E precisamente neste campo misterioso da interpenetração das almas que se encontram os mais sérios obstáculos à assimilação. Por isso é de tão grande importância a afluência de portugueses ao Brasil.
O Brasil também tem o seu patriotismo, que se alimenta das suas tradições, e este sentem-no melhor do que ninguém os portugueses de Portugal, que beberam o próprio amor à Pátria na fonte pura da história comum.
Mas a função assimiladora que o~ Português exerce, importante e fundamental como é, não constitui, não pode constituir, a única função da emigração portuguesa. O Brasil carece também de técnicos, de profissionais, de artífices especializados de vária natureza. Não podemos abandonar este campo inteiramente à emigração estrangeira. Quanto mais alto situarmos o nível qualitativo da emigração portuguesa mais elevado será o ponto de partida na vida do nosso emigrante, e, portanto, mais depressa e com maiores probabilidades de sucesso atingirá as zonas hierárquicas superiores, evitando neles excessivas concentrações de estrangeiros. E isto convém à nação portuguesa, que o mesmo é dizer ao Brasil e a Portugal.
Quanto mais favorável for para nós a comparação, que não deixará de fazer-se, entre o nosso emigrante e o estrangeiro no plano profissional, tanto maior será o nosso prestígio, e isto importa a Portugal.
Também por isso o nosso rural não de ir para o Brasil perpetuar a agricultura das- queimadas e da enxada, mas sim preparado a dar o seu contributo a reconstituição do campo brasileiro, que não pode ficar sendo exclusiva glória de alemães, italianos, holandeses e até norte-americanos, como aquele célebre grupo de planters que, desiludido com a sorte do Sul depois da Guerra da Sucessão, emigrou para o Brasil, onde foi o primeiro a chamar a atenção para o uso da máquina agrícola.
Em extensas zonas do campo brasileiro existem fortes concentrações de estrangeiros da primeira e segunda geração, tornando premente o eficaz funcionamento do processo assimilatório a que antes me referi.
A valorização técnica do nosso emigrante, que é um objectivo de urgente realização, não deve, porém, entorpecer enquanto se não efectiva em larga escala a corrente migratória para o Brasil, pela iminência do perigo que nos defronta.
Diz-se que os salários e as condições de vida ião interior do Brasil não suo de molde a atrair o nosso trabalhador do campo. Contudo, a imigração alemã, por exemplo, não só deixou vencer pelas circunstâncias prevalecentes nas regiões onde ainda se praticam processos primitivos de amanho e de colheita, com a preponderância da velha enxada nacional e do rudimentar carro de bois, num dispêndio esgotante de energias humanas. Ela criou para si as próprias condições de uma vida melhor, na conveniente escolha dos locais de fixação e na aplicação ao meio dos seus conhecimentos técnicos. Desenvolvendo uma agricultura racional, amplamente mecanizada, os imigrantes estrangeiros tornaram possível o progresso agrícola que se verifica sobretudo no estado de S. Paulo e nos estados do Sul e que de ano para ano se acentua e tomou expressão nos últimos tempos no crescimento vertiginoso do número de tractores em uso no- campo, que passou de 8:600 em 1949 pura 14:400 em 1950 e para cerca de 24:000 em 1951. Cito como exemplo deste surto agrícola a próspera comuna de Londrina, na zona nova do Paraná, planeada e organizada há vinte e cinco anos por um grupo cie homens da City. Onde em U930 era o sertão está hoje uma cidade moderna de 50:000 habitantes, centro urbano das mais ricas plantações de café do Brasil.
Nestes tempos, em que o intervencionismo parece não ter limites, não se compreende bem como é que num sector tão importante como o da emigração ainda se não tenha tratado a sério, entre nós, da valorização do homem, em cujas mãos está, afinal, o engrandeci-

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mento do nosso vasto mundo, além de disposições administrativas de carácter restritivo relacionadas com a saída dos emigrantes, mais inspiradas no desejo de lhes dar protecção do que em qualquer preocupação de imprimir renovado vigor e consistência à função povoadora e histórica do emigrante português.
Não é este, evidentemente, Sr. Presidente, um problema que se resolva, com a criação de escolas da especialidade. A principal parte caberá às escolas técnicas e profissionais e a disposições administrativas que regulamentem a emigração em vista aos superiores objectivos da nossa política migratória. Só os emigrantes que se destinam à agricultura carecem de especialização relacionada com a natureza do clima e com as culturas e métodos mais adequados às regiões onde desejam fixar-se.
Pensou-se nisto, timidamente, em relação ao povoamento ultramarino. Em 1945 atribuiu-se por força do Decreto n.º 34:464 uma verba de 30:000 contos ao Ministério das Colónias para diversos fins, entre eles a educação de futuros colonos em estabelecimentos adequados. Em 1951 esta dotação estava quase esgotada e dispôs-se, por isso, no Decreto n.º 38:200, que o Ministério das Colónias receberia uma dotação anual destinada a fomentar o povoamento do ultramar. Como se vê, não fomos largos. Em seis anos 30:000 contos; em média 5:000 contos por ano!
Talvez valesse a pena que o Estado abandonasse intervenções menos importantes ou até inconvenientes para concentrar melhor atenção e mais recursos à preparação técnica do emigrante, que é um dos valores essenciais da Nação.
Não devemos, corem, agir no desconhecimento do complexo de tradições, anseios e realidades sociais e económicas que afectam, cá e lá, a emigração portuguesa para o Brasil.
É um erro supor-se que o nosso emigrante parte, como qualquer outro, apenas em busca de melhor salário. Não! Ele parte cheio de ilusões, na ânsia de subir de posição social. Está disposto a passar muitos sacrifícios para ser alguém no comércio, na indústria, no artesanato e até mesmo no campo. Vai em busca de oportunidades, porque ouviu dizer que do lado de lá elas são muitas e proveitosas. É este outro factor a indicar o sentido da sua preparação profissional e técnica.
Temos no Brasil uma laboriosa classe comercial, que prepondera não só nos grandes centros como também nas cidades, vilas e lugarejos do interior. Sobretudo no Norte e Nordeste e no Brasil Central a classe comercial ó, em grande maioria, constituída por portugueses ou descendentes próximos de portugueses. No próprio estado de S. Paulo, onde tão numerosa é a colónia italiana, temos uma posição de considerável destaque.
As poderosas associações comerciais do Brasil são quase exclusivamente dirigidas por brasileiros de origem portuguesa ou portugueses domiciliados no Brasil.
Também na indústria a posição dos luso-brasileiros é muito importante e na banca prepondera, quer pelos capitais que nela tem investidos, quer pelas pessoas que a dirigem.
Não quero aqui alongar-me sobre a destacada situação dos luso-brasileiros na política, na literatura e no jornalismo, mas não posso deixar de frisar a importância deste facto e, por consequência, a consideração que deve merecer na formulação da nossa política migratória.
€abe agora considerar a posição e as possibilidades do ultramar, sobretudo Angola e Moçambique.
Durante muito tempo pensou-se e agiu-se como se os nossos territórios não fossem susceptíveis de um vasto povoamento europeu, ignorando-se tudo o que se passou
no Brasil, onde as condições de clima e meio são de uma similitude impressionante e onde o progresso da colonização branca já tinha atingido no século XVIII um tal desenvolvimento que se citava o caso do Brasil como o grande exemplo ide uma colónia de povoamento nos trópicos. Ali estão a atestá-lo as inúmeras cidades e vilas portuguesas, de puro estilo setecentista, intactas em seu alvo casario, e palácios senhoris, suas igrejas e conventos monumentais.
Foram várias as tentativas feitas, desde os descobrimentos, para colonizar a nossa África, mas há que convir que foi limitada a sua projecção. Assim, chegámos ao alvorecer do século XX com uma população branca que não ultrapassaria muito 20:000 pessoas.
No século XIX os nossos territórios ultramarinos eram de facto feitorias comerciais. Só no último quartel se iniciou um activo movimento no sentido da sua transformação em territórios de plantação.
Foi nessa altura que um grupo de homens de grande iniciativa e capacidade de organização, a que nunca é demais render homenagem, abriu a nossa África às grandes plantações europeias dos tempos modernos.
O considerável desenvolvimento das novas culturas, com as suas crescentes exigências de mão-de-obra, determinou migrações dentro e entre os vários territórios, dando início a uma nova fase do nosso problema migratório interno, que havia de culminar numa verdadeira escassez de trabalho indígena, hoje insuficiente para acudir a todas as actividades agrícolas, mineiras e até industriais e aos múltiplos serviços que se desenvolveram no ultramar nos últimos sessenta anos.
As garantias de que está cercado o nosso trabalhador indígena, a melhoria considerável das condições de vida e a constante elevação dos salários augura, no aumento progressivo do nível de vida, um porvir auspicioso para as populações nativas.
Nestas circunstâncias parece ir-se afastando o tempo em que o desnível das jornas reais entre o trabalhador de campo em África e o da metrópole e a superabundância de mão-de-obra indígena eram factores que operavam em contrário do povoamento europeu.
Surge, assim, o problema, quase de improviso, sem nos encontrarmos verdadeiramente preparados para o encarar de uma forma construtiva, pondo rapidamente em acção um conjunto de medidas eficazes.
A parte algumas tentativas isoladas de colonização experimental, como a efectuada nos últimos anos pela Companhia do Caminho de Ferro de Benguela nu região do Longonjo, pouco mais se fez nos últimos tempos no sentido do povoamento ou fixação racional de populações brancas.
Contudo, quinze anos de experiência devidamente verificada pela Companhia vieram confirmar na nossa África o que já se observara no Brasil: que a fixação do colono à terra no regime de pequena ou média propriedade depende sobretudo da sua preparação técnica. Tal como no Brasil, o problema em África é essencialmente o da defesa do solo contra a erosão, o da adubação e da mecanização.
A colonização agrícola não será, portanto, possível em larga escala senão pela associação dos três elementos que este postulado implica -* homem, capital e técnica.
O povoamento, porém, não se limita à agricultura ou à pecuária, se bem que estas, dada a natureza dos nossos territórios e a índole da nossa gente, devam constituir a sua forma mais importante. O desenvolvimento mineiro e o desenvolvimento industrial, a organização e alargamento do comércio, os serviços públicos e os transportes, os ofícios e as profissões, são outros tantos meios ou formas de povoamento.

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Parece termos já atingido a fase em que iodos os elementos da colonização ou povoamento operam simultaneamente.
Mas, qualquer que seja o ângulo por que se olhe para o problema põe-se sempre a questão essencial dos investimentos. Sem largos investimentos públicos, preparando o meio económico e social, sem numerosos investimentos particulares na constituição de unidades produtoras, o povoamento será sempre uma aventura, que o tempo rectificaria, por certo, mas é precisamente o que mais falta, nos faz neste momento, porque não temos tempo a perder.
Em que escala poderão fazer-se investimentos públicos e como poderão eles ser financiados? A sua magnitude não deverá ser tal que absorva a maior parte dos novos capitais, deixando u iniciativa privada desprovida, porque nos faria correr o risco de vermos estranhos, mais afortunados, virem ocupar o espaço abandonado pela nossa iniciativa particular à míngua de capitais, utilizando em seu proveito o meio económico favorável que os investimentos públicos tivessem criado.
Não devemos também iludir-nos com as possibilidades deflacionistas dos investimentos públicos. Num mercado rarefeito de mercadorias, a imobilização de capitais flutuantes em escala apreciável na construção de obras públicas reforçaria o poder de compra geral em dois sentidos: na maior «procura de mercadorias escassas e no maior volume de salários Operaria, portanto, como novo factor inflacionista, a não ser que as mercadorias utilizadas nas obras viessem na sua maioria, de fora, por acréscimo da nossa importação corrente, e o seu pagamento implicasse retracção da massa monetária. Mesmo assim, ainda restaria o acrescido volume de salários a influir sobre os preços. Teremos, portanto, de andar com cautela neste momento, mas andar, apesar de tudo, o mais rapidamente que pudermos.
Até agora o povoamento das nossas províncias ultramarinas não absorveu grandes massas populacionais à metrópole. Em 1940, dos 84:000 brancos da população ultramarina, uns 45:000 eram naturais da metrópole, espalhados pelas diversas províncias. O resto da população branca era constituído em grande parte por euro-africanos, na sua maioria de origem portuguesa, e por alguns milhares de estrangeiros.
Se a colonização rural não atraiu muita gente, a organização dos quadros das actividades económicas e administrativas das províncias ultramarinas, por contra, tem contribuído para fixar um crescente número de pessoas, recrutadas na metrópole, sobretudo, entre a* profissões e ofícios.
O conjunto da emigração da metrópole para o ultramar tomou notável ímpeto depois da guerra.
No triénio 1937-1939 o saldo embarcado para o ultramar, isto é, a diferença entre os portugueses que partiram e os que regressaram, andou por 5:000 pessoas. Durante a guerra houve um ligeiro declínio, mas no triénio 1946-1949 iniciou-se um brusco movimento ascendente, com 16:300 pessoas, tendência que ainda mais se acentuou no último triénio, tendo o saldo atingido 25:000.
Os números indicam, portanto, que, até recentemente, o ultramar foi pouco atraente para as nossas populações. E que se tratava de territórios de plantação. A era do café parece querer transformá-los agora em territórios de povoamento.
Nas regiões de imigração verifica-se sempre certa coincidência entre o engrossamento desmedido das correntes populacionais que entram e a descoberta de minerais ricos ou de valiosos produtos agrícolas. E o caso do tabaco no século XVII, que determinou o rápido povoamento da Virgínia, berço dos futuros Estados Unidos, é o ouro do Brasil no século XVII, é no século XIX, o ruch do Far-West, que fez a Califórnia, e é agora o café de Angola.
Não podemos nem devemos quebrar, no momento, crucial do nosso destino africano, o ímpeto da grande arrancada que teve início no esforço de um punhado de homens ilustres que em fins do século passado abriu as portas da África Portuguesa ao surto magnífico dos grandiosos empreendimentos, que nos revelaram as possibilidades imensas das suas riquezas naturais.
Agora, que o movimento povoador verdadeiramente começou, qualquer inoportuna intervenção no sentido de eliminar ou diminuir os estímulos económicos que o determinaram poderá interrompê-lo abruptamente com o retraimento dos capitais e das pessoas, porque sem confiança na livre disposição dos frutos do trabalho não se desterram voluntariamente os homens nem tomam os grandes riscos. Sem fé não há iniciativa, sem esperança não se fazem sacrifícios.
Do alto desta tribuna, que alguma coisa significa pela responsabilidade que incute a quem dela se dirige à Nação, eu quero chamar a atenção para as trágicas consequências dos ânimos desiludidos sobre o progresso da nossa colonização africana.
Creio que nada devemos fazer que vá diminuir o entusiasmo dos nossos colonos, dos grandes produtores e do comércio ultramarino, seu activo agente fomentador, creio que devemos deixar intacto o estímulo que encerram as fortes possibilidades lucrativas no ultramar, para que os novos para lá se encaminhem e os capitais afluam confiantes.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E de desaconselhar qualquer forma racional de redistribuição dos novos capitais ali formados, à sombra de princípios ou regras abstractas, com desprezo da função económica da repartição natural, pelo menos enquanto não se verificarem tibiezas injustificáveis na iniciativa privada, essa iniciativa que se tem demonstrado exuberante na nossa África, criadora de riqueza até aos limites e para além das próprias possibilidades.
O que suportariam, possivelmente, as velhas economias sobre capitalizadas seria desastroso nas regiões económicamente atrasadas, e, por consequência, ainda no período de subinvestimento.
Consideremos agora o que a industrialização poderá fazer no sentido de absorver uma parte substancial do nosso crescimento demográfico. Talvez que o estudo do passado, sobretudo dos recentes anos, em que se tornou notória a espécie de misticismo criado em torno desta esperança, nos possa esclarecer.
Entendo por indústria toda aquela actividade económica que transforma uns produtos noutros, dentro de oficinas organizadas com utilização de força motriz. As outras actividades, transformadoras de produtos constituem o artesanato. Não existem, que eu saiba, entre nós elementos estatísticos de confiança para avaliarmos criteriosamente como se subdivide a nossa população entre estes dois sectores, e- muito menos como se tem comportado em volume no decorrer dos últimos anos.
Utilizando alguns elementos dispersos, como os da estatística industrial, verificamos que nas dezanove espécies industriais efectivamente transformadoras mencionadas no volume de 1944 o número de pessoas empregadas baixou de 81:744 neste ano para 80:770 em 1950.
Se compararmos, por outro lado, a população associativa em 105 sindicatos nacionais ligados a indústrias transformadoras de produtos, ou indústrias propriamente ditas, verificamos no mesmo período os seguintes números: 191:869 sócios em 1944 e 228:812

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em 1950 (neste ano os sindicatos relativos às mesmas espécies industriais eram 112), um aumento de 37:057.
Bem sei que a inscrição nos sindicatos não é obrigatória, mas, como a contribuição é compulsória em cerca de 90 por cento dos sindicatos activos, não é natural que o número dos contribuintes não inscritos como sócios exceda agora a proporção, anteriormente verificada, de 30 por cento, quando o número de sindicatos de contribuição compulsória era apenas de 80 por cento. Por outro lado, o número de operários não contribuintes é hoje proporcionalmente menor em relação com a totalidade da massa operária do que era em 1944. Portanto, o crescimento relativo destes números excede o crescimento proporcional daquela massa.
Seja como for, a verdade é que dos 447:000 habitantes que em 1950 tínhamos a mais do que em 1944 a indústria absorveu, na melhor das hipóteses, uma bem pequena parte, enquanto a emigração para o estrangeiro e para o ultramar levou 79:21-5 pessoas - saldos líquidos -, ou 15 por cento do crescimento da população, apesar das restrições a que esteve sujeita, cá e lá fora, durante este período. Mas foram a lavoura, o comércio, a pesca, a construção civil, a mineração, os transportes, as actividades ligadas com os serviços públicos, a burocracia, o artesanato e as profissões liberais que, na verdade, mais uma vez deram rumo à grande maioria.
A pobreza das nossas estatísticas relativas à economia industrial e ao emprego não nos permite ir muito mais longe nesta investigação. Contudo, não se pode fazer trabalho sério sem contar com esses elementos de informação e de estudo. Sem eles a política económica assenta num empirismo que já foi ultrapassado na governação pública pela ciência e pela técnica aplicadas.
Em todo o caso, e até ao ponto onde é permitido formar juízos por índices imperfeitos, poderia concluir-se dos números apontados que a industrialização, apesar dos esforços feitos e dos sacrifícios impostos por condicionamentos tantas vezes antieconómicos, não é um meio eficaz de absorção do nosso saldo fisiológico.
Não desejo encarar os aspectos sociais da solução industrialista do problema demográfico. Talvez não seja necessário para esclarecer o nosso espírito sobre a questão aqui posta.
Se entrássemos nesse campo, teríamos de ver até que ponto a produtividade do trabalho na metrópole permite salários ou vencimentos comparáveis com os que o nosso emigrante pode receber noutras regiões, no Brasil ou no ultramar, teríamos de ver se a criação de um condicionalismo favorável à industrialização intensiva, com que se procurou reter no continente grandes massas trabalhadoras, não operou afinal com a pressão que o excesso de mão-de-obra exerce sobre os salários, como um factor contrário à racionalização e à mecanização intensiva, portanto, impeditivo da baixa dos custos de produção e dos preços e simultaneamente da elevação dos salários reais.
São estes outros tantos problemas acessórios de um problema maior.
Não possuímos um conjunto de leis de um estatuto em que se defina a nossa política migratória, marcando a sua função dentro da política nacional e do planeamento económico.
O regime vigente entre nós rege-se pelo Decreto-Lei n.º 36:558, de 28 de Outubro de 1947, posteriormente alterado pelo Decreto n.º 37:037, que se preocupa, sobretudo, com a protecção ao emigrante, relegando para a Junta da Emigração, que cria uma série de atribuições para o conveniente exercício das quais ela carece de conhecer a política migratória nacional. Não me parece que a actual organização da Junta seja adequada ao estudo de um problema tão complexo, que requer o esforço concentrado de numerosos especialistas.
De resto, ela encontra-se assoberbada com as funções administrativas da nossa emigração, que recrudesceu vigorosamente ante o aligeiramente das anterior es peias. A política migratória, pela sua transcendência e como parte integrante da política nacional, terá de ser superiormente definida.
Prevê o decreto a assinatura de acordos de emigração. Sucede, porém, que tais acordos se não assinaram e que, após vários anos de expectativa infrutífera, voltámos a deixar as coisas correr ao sabor da Natureza, constrangendo apenas a corrente emigratória a um certo número de formalidades de fácil satisfação.
Merece contudo especial referência aqui a protecção ao emigrante, que entre nós está sendo exercida por forma muito eficaz e nos coloca neste capítulo em lugar de destaque entre os países de emigração.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, o regime legal da colonização encontra-se definido pelo Decreto-Lei n.º25:027, de 9 de Fevereiro de 1935, do antigo Ministro das Colónias Dr. Armindo Monteiro, relativamente à experiência da Companhia do Caminho de Ferro de' Benguela, e pelo Decreto-Lei n.º 34:464, de 27 de Março de 1945, da autoria do Prof. Dr. Marcelo Caetano, quanto à colonização orientada directamente pelo Estado. Ambos estes decretos sofreram posteriormente alterações.
Isto quanto aos aspectos do problema como eles se podem ver do lado português. Se, porém, nos situarmos no terreno dos países que recebem os nossos emigrantes, e, por agora, cingir-me-ei ao Brasil, e olharmos para o problema geral da emigração como ele lá se apresenta, com especial referência à imigração portuguesa, vemos tomarem forma a pouco e pouco e precisarem-se os contornos de uma política imigratória bem definida e de uma decidida preferência pelo imigrante português.
No alvorecer do século XIX o Brasil alimentava-se em gente quase exclusivamente na emigração portuguesa e nas levas de negros africanos:
Nessa altura o dispositivo heterogéneo da população começou a preocupar a Corte e a questão da emigração pôs-se. O rei tomou posição sobre a matéria. Iniciou-se a formação de pequenas propriedades rurais com alemães e suíços, que fundaram Nova Friburgo, e com açorianos: Introduziu-se depois o regime da parceria agrícola, na qual o fazendeiro interessava o colono. Só em face dos resultados pouco brilhantes daqueles dói» sistemas se iniciou o sistema do assalariado rural, que só veio a tomar verdadeiro vulto quando em 1888 foi necessário acudir às propriedades abandonadas pelos escravos libertos. O campo foi rapidamente invadido por legiões de proletários rurais, em que preponderava o italiano. Em vinte e cinco anos entraram no Brasil 1.121:000 imigrantes italianos, fora os alemães, espanhóis, japoneses e outra gente de todo o Mundo.
O Estado durante muito tempo pagou as passagens aos imigrantes, procurando atraí-los com intensa propaganda que fazia nos países de emigração. No domínio interno esforçava-se por criar condições favoráveis aã trabalho no campo, publicando uma vasta legislação protectora.
Actualmente o povoamento faz-se indistintamente pelo sistema de colonização, ou fixação ao solo de famílias rurais, ou pelo sistema da imigração pura e simples. O sistema de colonização em vigor prevê que em todos os núcleos 30 por cento dos lotes sejam atribuídos a colonos brasileiros ou, na sua falta, a colonos portugueses, de preferência e por acréscimo da quota que a estes corresponda no aglomerado.

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Durante muito tempo a questão da nacionalidade de origem dos imigrantes parece não ter preocupado os homens do Império. O problema só começou verdadeiramente a alarmar por altura da abolição da escravatura, quando Sílvio Romero, num -desabafo em que ia muito desalento patriótico, ao ver esquecido o ubérrimo Norte e os territórios imensos a ocidente, abandonado ao próprio definhamento étnico o Brasil intermédio, «o velho Brasil, o Brasil português e histórico», enquistadas nos estados do sul poderosas concentrações de outros povos, exclamava: «O Brasil futuro será de outra raça que não a nossa e o papel do povo português aqui terá sido simplesmente o do primeiro desbravador do terreno; terá sido o de uma população provisória, que veio limpar o caminho para os outros».
Os tempos passaram. No Mundo sucedeu muita coisa imprevista e o vaticínio de Sílvio Romero não se verificou em toda a extensão do seu cruel pessimismo. Mas a ameaça existe e o perigo será real se continuarmos em grande minoria na imigração brasileira. Em 66 anos, de 1884 a 1949, o Brasil recebeu 1.250:000 portugueses em 4.272:800 imigrantes, menos de terça parte, precisamente 30 por cento, uma perigosa minoria, que a partir de 1904, por circunstâncias diversas, em que conta muito a política imigratória brasileira, sofreu salutar correcção, tendo a nossa posição passado no período de 1904 a 1949 para 36 por cento. Mas ainda estamos longe de ocupar uniu posição suficientemente forte para a conveniente protecção dos interesses comuns de Portugal e do Brasil.
O grito de alarme foi dado por Sílvio Romero, mas terá ele, ao menos, sido ouvido? No Brasil, decerto. Mas por nós? Que fizemos nós no plano político ou no campo prático para proteger os nossos irmãos do Brasil, ameaçados de serem subvertidos pela maré alta das imigrações nórdicas, mediterrâneas, levantinas e asiáticas? Primeiro, abandonando-nos a Natureza, e não foi o pior; .depois, abandonando a Natureza em busca de um condicionamento, por certo bem intencionado, que não realizamos, mas que quase paralisou a corrente emigra-tória durante este perigoso pós-guerra, contribuindo a enfraquecer a1 defesa étnica- do Brasil.
Se não fosse o novo rumo dado à política emigratória italiana, orientada, agora, no sentido do Norte de África, teríamos perdido, por certo, muito terreno nos últimos mios.
No Brasil o problema emigratório tem sido objecto de uma vasta legislação, que culmina no Decreto-Lei de 4 de Maio de 1938 e disposições regulamentares de 20 de Agosto cio mesmo ano e adquire a sua derradeira forma no Decreto-Lei n.º 7:967, de 1945, que refunde a lei anterior, verdadeiro Estatuto da Imigração e Colonização, e imprime ao movimento migratório uma «orientação racional», cuja definição precisa se encontra nas instruções de 12 de Março de 1948 do Conselho de Imigração e Colonização:
A política imigratória do Brasil - dizem aquelas instruções - obedece primordialmente a dois princípios fundamentais:
1.º Conservar e desenvolver na composição étnica da população brasileira os característicos mais convenientes da sua ascendência europeia;
2.º Defender os legítimos interesses da economia « do trabalhador nacional.
O Brasil tem e deve ter preferência acentuada pelos factores humanos e culturais, que, em associação secular, já comprovaram a sua capacidade de adaptação proveitosa ao meio brasileiro ... e restringe inevitavelmente o ingresso de elementos que, por sua origem, índole e costumes, se revelaram inassimiláveis.
Mas foi na resolução n.º 34, de 22 de Abril de 1939, do Conselho de Imigração e Colonização, que ficaram expressos em toda a sua diáfana precisão os princípios fundamentais da política imigratória brasileira.
Merece ser lida aqui essa resolução, cujos considerandos constituem a mais forte e patriótica expressão do lusismo feita nos tempos modernos no Mundo Português.
Diz assim:
Considerando que a defesa, a segurança do Brasil e a formação da nacionalidade indicaram novos rumos à nossa política imigratória, impondo-nos a dosagem das correntes alienígenas de forma a assegurar a sua assimilação às instituições sociais, políticas e económicas do país;
Considerando que o fundamento dessa orientação podia atingir o elemento português, que tem sido o factor primordial e a força cooperante mais idónea na formação do povo brasileiro;
Considerando a identidade de religião, de idioma e de costumes, bem como as afinidades raciais e históricas entre portugueses e brasileiros;
Considerando que a actual política imigratória brasileira, que visa concorrer para a solução do problema do aumento da nossa densidade demográfica, deverá ter em vista o sentido da formação histórica da nacionalidade, que é luso-brasileira;
Considerando que o Português, pelo facto de representar uma étnica que foi também a nossa até ao primeiro quartel do século XIX, é um elemento sociológico de incontestável valor eugénico, com um poder de adaptação que lhe é característico, assimilando-se rapidamente ao nosso povo e ao nosso país, como se este fora um prolongamento da própria pátria ;
Considerando que os (portugueses tem aqui colaborado pacificamente durante mais de quatro séculos e que em todo o território nacional se encontram vestígios do génio criador da raça atestando sua civilização, cultura e sentimentos, de perfeita solidariedade connosco;
Considerando que, «por esses motivos, vínculos profundos ligam os portugueses aos brasileiros, identificando-os perfeitamente;
Considerando que o Decreto-lei. n.º 3:010, de 20 de Agosto de 1938, equipara os portugueses aos brasileiros, com o objectivo de ser evitada a concentração de estrangeiros nos núcleos coloaniais;
Considerando que a supressão de qualquer limitação-numérica, em se tratando da entrada de portugueses no território nacional, só poderá contribuir para. o fortalecimento da nossa formação étnica:
O Conselho de Imigração e Colonização resolve considerar os .portugueses, para efeitos do Decreto n.º 3:010, de 20 de Agosto de 1938, isentos de qualquer restrição numérica quanto à sua entrada no território nacional.
E assim terminou para os portugueses o regime de quotas pouco tempo depois de ter nascido, numa elevada afirmação de princípios, como que uma excusa da raça a raça, da nação à nação, por haverem os nossos sido inadvertidamente abrangidos pelas restrições quantitativas estabelecidas «pela nova lei com relação a imigrantes estrangeiros.
A política assim formulada dá decidida preferência á imigração portuguesa e justifica-a.
A apoiar esta orientação estão as opiniões publicamente manifestadas pelos homens mais representativos ou por entidades politicamente responsáveis no Brasil.

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O Presidente Getúlio Vargas não perdeu a oportunidade de afirmar, quando ainda decorria o seu anterior mandato presidencial, que a imigração portuguesa, além de útil, é necessária ao Brasil, porque continua sendo um elemento integrador das tradições da raça na expansão da vida social do país.
O embaixador Frederico de Castelo Branco Clark, ao tempo presidente do Conselho de Imigração e Colonização, frisou que «devem os portugueses figurar em lugar privilegiado..., abrindo mão, se necessário, de algumas das excepções existentes em relação à entrada de portugueses no Brasil».
O conselheiro José de Oliveira Marques, autor das bases para um planeamento de colonização apresentado a S. Ex.ª o Presidente da República pelo Conselho de Imigração e Colonização, afirmava a sua preferência por aquelas correntes imigratórias «que, pela sua formação moral e religiosa, tenham afinidades com a etnia brasileira e ofereçam .segurança de completa integração no novo meio, assimilando-se à população nacional para que o País não seja enquistado por grupos que ameacem a unidade nacional».
Num estudo feito por um dos partidos políticos brasileiros em 1948 lê-se, entre as conclusões apresentadas, uma preconizando que se devem «criar para o imigrante português condições especiais de carácter exclusivo, tendo-se em vista a identidade de sangue, de espírito, de história e de sentimentos" que nos ligam ao povo português».
São inúmeros os escritores ë políticos brasileiros de todos os partidos que têm deposto no sentido de uma decidida preferência pela imigração portuguesa, verificando-se idêntica atitude da parte da grande maioria da imprensa, ao ponto de se poder afirmar que a consciência pública no Brasil considera hoje a nossa imigração como uma constante da política nacional e tem perfeita compreensão do perigo de deformação étnica e cultural do povo brasileiro e da necessidade imperiosa de proteger e .revigorar a sua feição «própria, ,o que quer dizer: irrigá-la constantemente de sangue português.
O sistema estabelecido pela Lei de 1945 prevê a imigração espontânea contingentada por países e a imigração dirigida. Esta desdobra-se em imigração de colonização ou fixação e imigração propriamente dita. O sistema de quotas a que inicialmente estava sujeita a emigração espontânea sofreu profundas derrogações com a exclusão dos portugueses logo de início e, mais recentemente, dos emigrantes de origem espanhola, italiana e francesa. Por consequência, quanto às nacionalidades excluídas do regime de quotas, já não existem limitações quantitativas, mas simplesmente qualitativas e administrativas. Nota-se, no entanto, no Brasil um certo clamor, que tem tido eco na imprensa, reclamando a concessão de maiores facilidades ao imigrante.
Sr. Presidente: a necessidade de reequilibrar o volume da produção agrícola com o vertiginoso crescimento da produção industrial e o povoamento do campo com o urbanismo induziu os homens de Estado e os estudiosos a considerarem primacial a imigração de trabalhadores de campo e a colonização rural.
Pará se poder aquilatar o acerto deste juízo basta atentar na disparidade do ritmo de crescimento da produção industrial e agrícola do Brasil nos últimos tempos. Enquanto a produção industrial subiu quantitativamente 21,4 por cento no quinquénio de 1946-1950, a produção agrícola apenas subiu 13,6. A disparidade acentuou-se ainda no ano de 1951. Contra um aumento de 7 por cento na produção industrial em relação ao ano anterior verifica-se um aumento do quantitativo em toneladas da produção agrícola de 1,2 por cento.
O novo poder de compra criado pela indústria teve, portanto, em grande parte, contrapartida no poder de
compra adicional do campo, imprimindo, com o aumento do volume do circuito interno de riquezas, acrescida solidez à economia brasileira. Por outro lado, o aumento relativo do volume da produção excedeu consideràvelmente o aumento relativo da população no mesmo período, o que significa uma maior capitação na produção e consumo de bens, donde se poderia inferir que o nível de vida teria subido, a não ser que a repartição da riqueza se tivesse tornado menos equitativa, revertendo a diferença a favor do lucro, ou que os sobreinvestimentos tivessem sido feitos em escala tão elevada que prejudicassem os consumos correntes e, portanto, o nível de vida. Verifica-se, porém, o aumento do salário real no Brasil, que, de 1946 a 1950, teria subido na indústria cerca de 14 por cento, referido o índice de salários ao índice de preços de retalho de géneros alimentícios, segundo os índices sociais de conjuntura económica.
Simultaneamente o circuito internacional de riquezas, expresso em quantidades físicas exportadas, moveu-se em sentido contrário, como não podia deixar de ser, uma vez que o aumento de produção industrial foi proporcionalmente maior que o aumento de produção agrícola. Enquanto u população subiu de 1940 a 1950 mais de 27 por cento, o volume das exportações apenas subiu 10 por cento. Se não fosse a vantagem apreciável que o Brasil encontrou nos seus actuais terms of trade, por efeito da extraordinária valorização dos produtos que exporta, proporcionalmente maior do que a dos que importa, o seu apetrechamento teria sido retardado e os consumos individuais fortemente afectados na parte em que dependem das importações.
A nossa política de emigração terá de considerar as diversas fases do problema migratório nas suas grandes divisões: a emigração para o exterior, as migrações entre as nossas diversas unidades territoriais e as migrações internas em cada unidade. Assim, somos, quanto ao todo, um país de emigração, de portugueses de raça branca na metrópole, de nativos em África e de indo-portugueses na Asia, internamente temos territórios de emigração e territórios de imigração e, dentro de cada território, correntes migratórias de carácter estacionai, periódico ou definitivo. Neste último caso estão o urbanismo e a colonização interna.
Mas como determinar a quota-parte das populações que devemos orientar num sentido ou noutro:* O motivo político e o motivo económico terão de ser o nosso guia.
No campo político, quanto ao ultramar, a necessidade imperiosa de um extenso povoamento europeu, dando a primazia às províncias da África continental; quanto ao estrangeiro, obediência cega ao imperativo histórico de um Brasil luso-brasileiro. Interessa-nos também ir alimentando a imigração norte-americana, mas essa, pelo estreito condicionamento das suas leis, é de pouca importância numérica. O resto interessa-nos muito secundariamente no campo político.
No económico - e este tem de ser o esteio de toda a emigração teremos de começar por assentar no que mais convém à nossa riqueza ou ao nosso bem-estar individual: se reter na metrópole o maior número possível de habitantes, se apenas reter aqueles a quem se possa assegurar um nível de vida confortável ou, «pelo menos, humanamente aceitável nos tempos correntes.
Teremos de averiguar qual a natureza da economia conducente àquele desiderato, revendo toda a nossa política de produção. Será melhor uma elevada produção cerealífera, ou será melhor 41 arboricultura, as culturas irrigadas e a pecuária? Será de manter a industrialização à sobreposse, ou será preferível limitá-la às indústrias económicamente viáveis, que são aquelas capazes . de produzir de uma maneira constante artigos de qualidade e «preços equivalentes aos da concorrência inter-

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nacional e dar garantias de um/amplo abastecimento do mercado interno? Deverão conservar-se as actuais concentrações industriais, ou será melhor redistribuir territorialmente certas indústrias, [procurando aproximá-las dos centros produtores das matérias-primas, deslocando populações operárias de regiões sobrepovoadas para as fixar em territórios subpovoados? .Será melhor reavivar o comércio livre Se optarmos pela maior utilidade económica e nos guiarmos principalmente pelo critério da preferência, pelos custos de produção relativamente mais baixos, especializando a nossa economia num sentido verdadeiramente racional, se mecanizarmos fortemente a produção, libertando largos blocos da população metropolitana, teremos de lhes dar arrumo onde os pudermos empregar com maior vantagem económica, e isto põe o problema capital de sabermos onde e em que parte do Mundo o trabalho dos que partirem contribuirá mais para o elevamento do nível de vida dos que ficarem.
A parte que atribuirmos às províncias ultramarinas terá dê ser precedida de fortes investimentos públicos e acompanhada dos necessários investimentos particulares, paru ser verdadeiramente útil, social e economicamente. Ao Estado compete cuidar dos investimentos de interesse geral não directamente reprodutivos, em suma, a preparação material do meio económico-social em que há-de desenvolver-se a iniciativa privada, e a esta os investimentos em actividades directamente reprodutivas.
Mas, para atrair os capitais e as pessoas, terá de criar-se no ultramar um meio económico relativamente mais lucrativo do que o da metrópole. A fiscalidade devora, (por isso, ser ali menos pesada do que aqui. Parte importante du responsabilidade mi .criação desse meio económico mais favorável, e portanto no aceleramento dos investimentos privados e do povoamento, impende sobre a política fiscal.
A parte da nossa população -e será muito tempo u maior - que seguir para o Brasil não exige, de uniu maneira geral, investimentos da nossa parte. «Compete ao Estado brasileiro promovê-los, e poderiam «ser objecto de acordo entre os dois países. Esta corrente terá, no entanto, de produzir rendimento económico, poder de compra adicional ao País.
É outro ponto que não nos devo escapai1. Au alienarmos valiosos elementos de produção a. favor do aumento da «produção alheia, é, além de equitativo, económicamente indispensável que venha para cá uma parte compensadora da riqueza produzida pelo nosso braço nos países de emigração.
A redistribuição interna será essencialmente guiada pela posição que tivermos tomado no saneamento e reorganização da nossa economia.
Produção agrícola, produção industrial, produção ultramarina, emigração e migrações internas são aspectos de um mesmo problema, que se não resolve parcelarmente e se não pode encarar de costas voltadas para aquilo que sobreleva tudo e a tudo guia: os imperativos da nossa história, as constantes da política, nacional.
À política atlântica de Portugal, em que se funda a nossa expansão, estão abertos novos horizontes. Em Salazar ela reviveu com fulgor desusado.
Dominando estrategicamente o Atlântico, que é o mar do Ocidente, e ocupando, povoando e civilizando as duas margens do Atlântico Sul, que é o nosso mar, realizámos o Mundo Português. E no nosso sangue que ele se perpetua e engrandece.

Por isso, Srs. Deputados, a política migratória tem tão grande importância na determinação da política nacional.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem !

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Armando Cândido:-Sr. Presidente: é um ponto que se diz conquistado pela sociologia esse de que o homem «sofre a poderosa influência do meio geográfico onde vive».
Quem sabe se foram as rajadas que nos açoitam nesses Açores batidos de vendavais que me deram este feitio de lutar sem medo nenhum à sorte de cair vencido?
Este meu aviso prévio é uma prova de humildade combativa.
Podem acusar-me de que não usei os argumentos todos. Mas eu não quis agravar o assunto e muito menos tive a pretensão de o esgotar. Fora a capacidade que desejaria possuir, tão complexas me pareceram as realidades, que me limitei u segurar algumas.
Carreei o que pude. Depois de deitarem mãos ao conjunto é que se há-de ver. Então se julgará o esforço e os materiais conseguidos. Desde que não façam falta ou apareçam outros melhores, podem não prestar.
Não há nada pior nas soluções humanas do que a prosápia do infalível.
O não quando tem do ser vale tanto como o sim quando é justo.
Sempre considerei o trabalho uma obrigação honesta.
Fui extenso, demorei a exposição ?
Mal iria a Assembleia Nacional se não desse aos problemas que lhe são postos a atenção que lhes deve. Grandes ou pequenos, estamos aqui para os apreciar e tratar com o mesmo zelo, quer sejam breves ou longos. O que importa é que tenham interesse.
E não hesito em afirmar que pôs em discussão com este meu aviso prévio um problema de alta importância nacional, talvez o nosso maior problema. Sinto-me, pois, imensamente perdoado do tempo que roubei.
Disse mal deste ou daquele pormenor?
Enalteci este ou aquele aspecto?
Nunca digo mal - quando o mal que digo é para o bem que pretendo.
E como hão-de acreditar no bem, que se louva, se não virem o mal, que se castiga?
Sempre entendi o meu mandato como uma missão de consciência.
Não se pode ter consciência faltando à honra de a servir.
Fui romântico?
Moldei por vezes as palavras, na exaltação poética?
Quando se é poeta - dizia Oliveira Martins a propósito de Antero - a imaginação vibra como as harpas que os Gregos expunham às virações da brisa.
Mas eu não vibrei pela imaginação, vibrei pelo sentimento, e não fui romântico a dizer o que pensava, fui verdadeiro a dizer o que sabia.
Pôr o mais possível de sonho na realidade não é imaginar a realidade: quer dizer ardor, fremência, entusiasmo de construir.
Cada qual tem a sua linguagem ou o seu estilo, e a mim. parece-me que só deixo de ser frio quando me dominam os grandes temas patrióticos.
Reconheço então que, sem deixar de ser preciso, sou vibrante; que, sem deixar de ser razoável, sou apaixonado.
Com os factos da ordem geral, com as coisas que tem de ser contadas a nu, com os números, pratico a exactidão serena.
É diferente e é para distinguir.

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Não fui atacado em nenhum destes pontos - antes me confesso grato às amáveis alusões que não mereço -, mas eu é que gosto de me explicar a tempo e sem rebuço.
Sr. Presidente: subiram a esta tribuna vários oradores.
Admiro o trabalho que tiveram com a matéria em discussão.
As suas ideias, os seus esclarecimentos, são de extraordinário proveito.
Valeu a pena.
Revendo o que disseram e confrontando as afirmações e as sugestões para assinalar as divergências, não vejo motivos para muita réplica, tão poucas ou nenhumas são as diferenças de critério. Nas linhas mestras ou de fundo, todos de acordo. Pequenas variantes, unicamente, nas fórmulas secundárias.
Talvez a discordância que o Sr. Deputado Carlos Mantero continuou a manifestar quanto à restrição da saída de Angola e Moçambique dos capitais provenientes dos lucros ali obtidos __e a que já respondi ao ser-me feito, por S. Ex.ª, o respectivo aparte - me desperte só mais estes comentários ...
O Sr. Carlos Mantero: - V. Ex.ª dá-me licença? Eu não sou favorável à saída dos capitais; o que sou é desfavorável a qualquer forma compulsória de a evitar.
O Orador: - A posição de V. Ex.ª está definida.
Conheço-a bem. V. Ex.ª desejaria que os capitais se fixassem voluntariamente, mas, como eu vejo alguns emigrarem, não desisto dos comentários.
O povoamento do ultramar é essencialmente uma tarefa de cooperação. Quem faltar a ela falta a si próprio, negando o dever que lhe assiste de contribuir para a obra total.
Quando os deveres nacionais não são voluntariamente cumpridos pelos particulares, há que impor uma lei.
A colonização á ainda uma obra de sofrimento.
Dizer, neste caso, ao capital que se detenha dentro das nossas fronteiras e que dentro delas progrida em investimentos úteis, comparando com a ânsia dos que buscam trabalho e não o encontram, nem sequer é exigir ao capital que sofra alguma coisa.
No mais, no fundamental, concordância esmagadora.
Todos compreendem a necessidade de realizarmos uma política migratória que distribua e arrume satisfatoriamente, e o mais breve possível, os acréscimos populacionais da metrópole e das ilhas adjacentes.
Pode dizer-se que esta compreensão é geral.
Agora mesmo, poucos momentos antes de usar da palavra, entregaram-me um exemplar da tese apresentada ao III Congresso da União Nacional pelos engenheiros Camilo Mendonça, Augusto Henriques e Frederico Rodrigues.
Nas conclusões, as mesmas certezas, os mesmos dilemas: sempre o excesso demográfico o efectivo excesso demográfico- a reclamar o avanço económico e a transferência de gente para o ultramar «através do estabelecimento de uma agricultura industrial».
Só o Sr. Deputado Pinto Barriga, decompondo o ver para crer em todos os tempos, pediu os 2 e 2 são 4 da tabuada estatística para se saber o número certo dos que estão a mais nas zonas sobrepovoadas.
A exigência é útil, afirmo até imprescindível, na fase de execução, para se regular e condicionar o escoamento, mas não chega para invalidar a demonstração feita pelos factos e - pelos quadros apresentados de que o excesso demográfico existe em determinadas regiões.
Cairíamos, salvo seja, na história do homem do capote de surrobeco, depois de se lhe abrirem em cima as cataratas do céu:
- Então, molhado a valer ?
- Não sei, só medindo a chuva.
Sr. Presidente: nada quero adiantar ao que já disse na longa exposição que fiz nesta tribuna durante duas t sessões consecutivas.
Acentuo um ponto:
Não se poderia trazer à Assembleia Nacional um problema de tal magnitude se não fossem as condições de segurança financeira em que vivemos.
No meio da anarquia orçamental era impossível. Os deficits crónicos provocariam o riso da incredulidade, tornariam ridícula a pretensão.
Hoje podemos ser sérios com os problemas sérios.
E mais esta nota, se me permitem:
No jardim da sua vivenda em Oackland, um açoriano, influente político e alto funcionário da grande América, mandou reproduzir a pequena casa ilhoa onde nascera, para nela se conservar sozinho quase todos os dias, durante algumas horas, a curtir saudades - conta o Dr. Luís Ribeiro no seu opúsculo O Emigrante Açoriano.
Que quer isto dizer?
Falando na Câmara Municipal de Luanda em Junho de. 1945, o Prof. Mafcelo Caetano exaltou o homem como elemento fundamental da colonização, «o homem que a resistência física, a facilidade de adaptação, a capacidade de sofrimento, o amor ao trabalho, a moderação de ambições, a força do carácter, a energia moral, a compaixão pelos semelhantes, a bondade espontânea, a compreensão fácil, o gosto da aventura, a tenacidade no sacrifício.. s.
Se estes atributos distinguem o comum dos portugueses, não deixam de retratar o carácter dos açorianos.
Dos que foram para o Rio Grande do Sul disse o general Borges Fortes:
Honrados, simples e austeros os homens.; santas e virtuosas as mulheres.
Já VI escrito que não há nada mais agradável do que uma vitória difícil, desde que o combate dependa de nós.
Os açorianos são soldados experimentados e vitoriosos de uma intensa batalha de povoamento. Justo é que se lhes dá agora que já não cabem nas suas ilhas lugar de vanguarda nas novas e grandes batalhas a travar.
Resta-me agradecer, Sr. Presidente, a V. Ex.ª a generosidade que me dispensou; aos Srs. Deputados que me deram a honra da sua colaboração, a preciosa ajuda que trouxeram ao. desenvolvimento do meu aviso prévio; aos Srs. Deputados que tiveram o incómodo de me escutar, a gentileza com que o fizeram, e a todos aqueles que me facultaram os elementos estatísticos e as informações precisas, o cuidado e a deferência que mostraram.
Agradeço também à imprensa o relevo que deu ao debate.
E por a evidente importância do assunto tratado o requerer, mais do que por obediência à praxe seguida, cabe-me apresentar a seguinte moção:

Moção

«Reconhecendo tudo o que se tem feito no sentido de dar emprego aos trabalhadores por meio do investimento de largas somas em milhares de obras públicas que melhoraram enormemente a fisionomia do País, mas verificando, não obstante, que certas regiões da metrópole e as ilhas adjacentes, em especial a Madeira e S. Miguel, acusam densidades demográficas excessivamente elevadas, pelo que se prova a necessidade de soluções de fundo tendentes ao aproveitamento instante de todos os nossos espaços territoriais susceptíveis de aumentarem a produção com vista à suficiência económica, e considerando que, através das Juntas de Colonização Interna e da Emigração, das facilidades de transporte

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concedidas a uma grande parte dos colonos que se dirigem., para Angola e Moçambique e das obras de fomento concluídas, iniciadas ou em projecto, tanto na. metrópole como naquelas duas províncias, se está dando ao problema uma evidente e apreciável atenção, a Assembleia Nacional, na. compreensão do destino histórico de Portugal como Nação povoadora, exprime o confiante voto de que o Governo, por meio de uma política migratória estudada o exercida sob a mais efectiva unidade de conjunto, intensifique o mais possível a valorização e o consequente povoamento da metrópole e do ultramar, utilizando, afinal, as correntes emigratória, devidamente preparadas e assistidas».

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Presidente I - Não está mais ninguém inscrito para usar da palavra na ordem do dia.
Considero, pois, encerrado o debate, e vou submeter à apreciação da Assembleia a moção que VV. Ex.ª acabaram de ouvir ler.

Submetida à aprovação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão.
A ordem do dia da sessão de amanhã será a discussão na generalidade, em conjunto, das propostas de lei de organização geral da Aeronáutica Militar e do recruta, mento e serviço militar nas forças aéreas.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 35 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão.
António Jacinto Ferreira.
António Pinto de Meireles Barriga.
João Mendes da Costa Amaral.
Manuel Domingues Basto. Manuel Maria Múrias Júnior.
D. Maria Baptista dos Santos Guardiola.
D. Maria Leonor Correia Botelho. Teófilo Duarte.
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Alberto Cruz.
Américo Cortês Pinto.
António de Almeida.
António Calheiros Lopes.
António de Matos Taquenho.
António de Sousa da Câmara.
Artur Rodrigues Marques de Carvalho.
Carlos de Azevedo Mendes.
Daniel Maria Vieira Barbosa.
Jerónimo Salvador Constantino Sócrates da Costa.
João Carlos de Assis Pereira de Melo.
Joaquim de Moura Relvas.
José Cardoso de Matos.
José Diogo de Mascarenhas Gaivão.
José Gualberto de Sá Carneiro.
José dos Santos Bessa.
Luís Filipe da Fonseca Morais Alçada.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Pedro de Chaves Cymbron Borges de Sousa.
O REDACTOR - Luís de Avillez.
Proposta de lei a que se referiu o Sr. Presidente no princípio da sessão:

Exercício do comércio bancário no ultramar

O surto de progresso de que as províncias ultramarinas estão beneficiando não pode deixar de considerar-se apoiado fundamentalmente na prosperidade de uma economia que tem vindo a ser largamente impulsionada nos últimos anos. Várias são as razões que deram origem e causa a esta actividade algumas porventura de natureza ocasional e temporária, mas outras certamente em número e peso suficientes para garantir a continuidade do movimento progressivo.
Desta maneira é indispensável acompanhar e satisfazer as exigências da vida económica do ultramar, pondo ao seu serviço os meios que a protejam ou disciplinem e lhe facilitem o mais estável e o mais largo desenvolvimento.
Reveste-se da maior importância, neste aspecto, a existência dos organismos bancários. E se é certo que algumas províncias ultramarinas contam com vários estabelecimentos de crédito, também se verifica que na maioria delas apenas funcionam os bancos emissores. Benéfica tem sido a actividade destes últimos, sem dúvida, pois que, não se limitando à ortodoxia da sua razão de ser, se adaptaram às circunstâncias do momento, procurando satisfazer as mais prementes e instantes necessidades. A eles se deve o crédito de fomento, embora limitado, que até hoje tem sido concedido em algumas províncias ultramarinas e que tão frutuosos resultados tem dado.
E de justiça acentuar que, pela própria essência dos bancos emissores, o crédito que eles concedem tem sido rodeado de cautelas e de prudência, atitude que, se pode ter sido tomada como limitação de actividades, também não deverá deixar de ser olhada como um salutar correctivo de muitas tentações de aventura. Mesmo assim, tiveram de se estruturar para o crédito a longo prazo, ainda que sem nunca atingirem, por formação e por necessidade, a elasticidade que parece ser necessária para mais largas operações de fomento.
Estamos assim perante uma situação que não é recomendável manter. Não se pode nem se deve ir mais além, desviando ou arrastando os institutos emissores para fins diferentes dos fundamentais; nem é possível, perante as suas limitações orgânicas, com eles atender a todas as legítimas solicitações de crédito. E não se trata de consentir na existência acidental de outros estabelecimentos de crédito, porque o que importa é criar as condições que lhes permitam uma actuação franca, moldada nas regras que os superiores interesses da Nação recomendam.
Torna-se pois necessário regulamentar em bases sólidas o exercício do comércio bancário no ultramar, de modo que as províncias ultramarinas possam com segurança, desfrutar todo o crédito de que necessitam.
E evidente que ninguém lucraria com a existência de estabelecimentos precários de crédito comercial e de fomento. Sem capital suficiente, sem garantias de boa utilização dos recursos das províncias, sem um sólido apoio exterior para suprir possíveis dificuldades de momento, sem regras severas quanto à segurança dos fundos depositados - como poderia considerar-se benéfica a acção dum novo banco? Porque não se poderá esquecer que, sendo embora lógico e lícito procurar IUCPOS nesta actividade, é essencial que a instalação dos novos organismos bancários seja movida pelo sincero desejo de promover, e não asfixiar, o desenvolvimento dos territórios em plena evolução.
Reconhece-se que o progresso da economia ultramarina não poderá ficar exclusivamente dependente do

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banco emissor e que, enquanto não for possível organizar e fazer viver bancos de fomento, se terá de admitir elasticidade suficiente para que bancos comerciais ou mistos satisfaçam as maiores necessidades de crédito, sem que em qualquer caso possam comprometer a segurança dos depósitos.
Para isso haverá que considerar, entre outras medidas, os fundos de reserva, o estabelecimento de um mínimo de disponibilidades, regras de contabilização e publicidade e condições especiais para o exercício das funções de direcção, de forma a evitar o predomínio de interesses particulares.
A vida económica do ultramar tem de ser orientada com prudência, pelo que se não pode descurar a formação de organismos que, como estes, financiadores do crédito, exercem poderosa influência no meio. A sua capacidade .técnica e moral tem de ser comprovada.
Dos bancos que de futuro venham a instalar-se e exercer a actividade ao abrigo da nova legislação se espera que .possam, ao mesmo tempo, fomentar o progresso em larga medida, não se confinando ao crédito a curto prazo, como os emissores, imitando estes apenas na confiança que devem inspirar e nos moldes de seriedade em que devem trabalhar.
São estas as principais razões que levaram à elaboração da proposta de lei que se submete à consideração da Assembleia Nacional.

CAPÍTULO I

Dos organismos bancários ultramarinos

BASE I

Os organismos bancários ultramarinos, a que se referem as presentes bases, deverão revestir a forma de sociedades anónimas, com sede no ultramar, constituídas de harmonia com a lei portuguesa, e terão por objecto todas ou algumas das operações designadas nos artigos 1.º e 2.º do Decreto. n.º 10:634, de 20 de Março de 1925, salvo as reservadas aos bancos .emissores, podendo ocupar-se também de operações de crédito agrícola e industrial.

BASE II

O estabelecimento idos referidos organismos nas províncias ultramarinas, depende de autorização do Ministro do Ultramar, sob parecer fundamentado do Conselho Ultramarino, depois de ouvida a Inspecção-Geral de Crédito e Seguros, tendo i«m atenção as exigências económicas do meio, a natureza e extensão das operações activas e passivas a realizar e a capacidade financeira o idoneidade moral e técnica dos requerentes.

BASE III

O requerimento será sempre acompanhado dos elementos seguintes:
a) Memória ou exposição acerca das necessidades económicas que justificam a criação do organismo ; ,
b) Um exemplar dos estatutos, elaborado de harmonia com a lei, contendo designadamente indicação da sede, capital e fundos de reserva, modalidade de operações passivas e activas a realizar;
c) Compromisso de, no acto da fundação, depositar no banco emissor da respectiva província, para efeitos do n.º .3.º e § 4.º do artigo 162.º do Código Comercial, 50 por cento do capital inicialmente realizado.

BASE IV

Terão preferência, quanto ao estabelecimento nas províncias ultramarinas, os organismos bancários que, satisfazendo os requisitos exigidos nestas bases e na lei geral, sejam constituídos com uma comparticipação de, pelo menos, 50 por cento do capital pertencente a estabelecimentos de crédito metropolitanos.

BASE V

Os estatutos dos organismos bancários a que se referem estas bases e as suas reformas e alterações carecem também de ser aprovados pelo Ministro do Ultramar.
Dependem ainda de autorização do Ministro do Ultramar a fusão de organismos bancários ultramarinos, os aumentos e reduções de capital e as aquisições a efectuar por eles de acções ou partes de capital de outras instituições de crédito.
A autorização de tais aquisições será concedida se delas não resultar inconveniente para a economia da província e o valor das acções ou partes do capital não exceder 50 por cento dos fundos de reserva do organismo adquirente/
Este limite poderá, no entanto, ser excedido quando as referidas aquisições representem uma forma de reembolso de créditos.

BASE VI

Não poderão realizar novas operações activas os organismos bancários cujas disponibilidades imediatas, ou a curto prazo tenham diminuído para limite inferior a dois terços do capital social enquanto não forem elevadas para aquele limite.

BASE VII

Os organismos bancários ultramarinos terão um fundo de reserva permanente, ao qual destinarão uma percentagem não inferior a 10 por cento dos lucros líquidos anuais até que a respectiva soma atinja montante igual ao do capital social.
Os lucros provenientes de emissões de acções e obrigações revertem integralmente para o referido fundo.
Os valores do fundo de reserva não podem ser dados em garantia ou caução especial. ,

BASE VIII

A direcção, administração e fiscalização dos organismos bancários serão exercidas pela assembleia geral, conselho du administração e conselho fiscal, com a composição e atribuições definidas nos estatutos aprovados nos termos da base v.

BASE IX

Não podem ser vogais dos conselhos de administração ou fiscal: as pessoas morais, os membros do conselho de administração ou fiscal de um banco ou casa bancária à data em que tenha suspendido pagamentos, os falidos mesmo depois de reabilitados, os que tenham sido condenados criminal ou disciplinarmente por qualquer das infracções previstas no artigo 129.º da Carta Orgânica do Ultramar Português e os que tenham tido1 letras protestadas por falta de pagamento.
Não podem, ainda, pertencer aos conselhos de administração ou fiscal os que tiverem filhos, enteados, irmãos, cunhados, concunhados, parentes até ao 4.º grau ou sócios fazendo parte dos referidos conselhos no mesmo organismo bancário.
Ninguém pode pertencer aos conselhos de administração ou fiscal de mais de um banco operando na mesma província.

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BASE X

Os administradores, e membros do conselho fiscal de qualquer organismo bancário mão podem receber sob qualquer forma crédito do mesmo organismo.

BASE XI

Os membros dos conselhos de administração ou fiscal estilo inibidos de participar na discussão e votação de propostas relativamente a operações em que intervenha qualquer sociedade de que sejam sócios, e as propostas em tais condições- só podem ser aceites se forem aprovadas por unanimidade dos restantes membros do conselho de administração.

BASE XII

Os membros do conselho de administração consideram-se responsáveis, civil e criminalmente, por todos os actos contrários à lei e aos estatutos em que tenham tomado parte e em relação aos quais não hajam manifestado a sua oposição ou, discordância.
São ainda obrigados a participar ao conselho fiscal os mesmos actos praticados pela administração anterior, logo que deles hajam tomado conhecimento.

BASE XIII

Os organismos bancários são obrigados a ter a sua escrita segundo o sistema de partidas dobradas, a qual estará sempre em dia e deverá ser perfeitamente clara. Deverão ainda proceder a balanço nos dias 30 de Junho e 31 de Dezembro de cada ano, o qual será publicado lio Boletim Oficial da respectiva província u no Diário do Governo.

BASE XIV

As valorizações do activo dos organismos bancários em relação ao quantitativo por que figuravam no balanço anterior serão devidamente justificadas e não poderão fazer-se sem a aprovação dos membros dos conselhos de administração e fiscal.

CAPITULO II

Das dependências de organismos bancários

TITULO I

Disposições gerais

BASE XV

O estabelecimento nas províncias ultramarinas de dependências - sucursais, filiais ou agências - de organismos bancários nacionais e estrangeiros é sujeito a autorização do Ministro do Ultramar, nos termos e com os fundamentos da baseII.

Tratando-se, porém, de dependências de organismos bancários metropolitanos, a autorização carece de prévio assentimento do Ministro das Finanças, tendo em atenção, principalmente, a capacidade de expansão do organismo e as possíveis repercussões em relação a ele derivadas da actividade da dependência a instalar.

BASE XVI

O requerimento para a instalação de dependências bancárias será acompanhado dos elementos seguintes:
a) Memória ou exposição acerca das necessidades económicas para satisfarão das quais se pretende criar a dependência;
b) Um exemplar dos estatutos do organismo a que pertence a dependência a criar e cópia do último balanço daquele;
c) Indicação do lugar o III que se pretende efectuar a instai II cão;
d) Indicação do capital destinado as operações e modalidades destas;
e) Compromisso de no acto da instalação depositar no banco emissor da respectiva, província, para efeito do n.º 3.º e § 4.º do artigo 162.º do Código Comercial, 50 por cento do capital referido na alínea d).

BASE XVII

As dependências dos organismos bancários - salvo as dos bancos emissores- são obrigadas a ter um capital mínimo, devidamente realizado, afecto às operações a efectuar na. província em que exercerem as suas funções e um fundo de reserva permanente, constituído por uma percentagem não inferior a 10 por cento dês lucros líquidos anuais da dependência ou dependências operando ria província e até ao montante do capital a que se refere a presente base.
Os valores do fundo de reserva não porem sor dados em garantia ou caução especial.

BASE XVIII

Não poderão realizai1 novas operações activas as dependências cujas disponibilidades imediatas ou a curto prazo sejam de quantitativo inferior a dois terços do capital a que ,se refere a base anterior enquanto não forem elevadas para aquele limite.

BASE XIX

Todo o activo dos organismos bancários com dependências nas províncias ultramarinas responde pelas obrigações contraídas por elas; o activo, porém, que possuírem em qualquer província do ultramar -incluindo o que representar o capital e o fundo de reserva - responderá em primeiro lugar pelas obrigações contraídas na mesma província e só poderá responder por outras depois de solvidas aquelas.

BASE XX

Os organismos bancários com dependências numa província ultramarina terão sempre nesta um representante idóneo, habilitado com os poderes suficientes para responder perante as autoridades e os particulares pelos actos praticados pelas referidas dependências no respectivo território, sem limitação ou reservas.
A entidade a que se refere esta base fica inibida de realizar operações ou de ter negócios com qualquer dependência do organismo que representa.

BASE XXI

Não podem exercer funções de gerente, guarda-livros ou caixa de qualquer dependência os que estiverem ligados por laços de parentesco ou afinidade até ao quarto grau.
Também não podem realizar operações ou ter negócios com a dependência em que exerçam a sua actividade: os inspectores, gerentes e empregados da mesma e ainda as sociedades que tenham como. sócios o inspector, gerente, guarda-livros ou caixa da dependência.

BASE XXII

As dependências a que se referem estas bases são também obrigadas a ter á sua escrita organizado, em conformidade com o disposto na base XIII e a proceder aos respectivos balanço nas datas nela previstos.

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520 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 136

Os balanços das dependências serão publicados no Boletim Oficial da província e no Diário do Governo, assim como os balanços gerais do organismo a que pertencem

TITULO II

Das dependências de organismos bancários estrangeiros

BASE XVIII

As dependências de organismos bancários estrangeiros estabelecidas em território ultramarino português são especialmente obrigadas ao uso da língua portuguesa nos livros mestres da escrita, segundo o Código Comercial Português, e na correspondência com os clientes residentes em território português.
Todos os avisos patentes ao público nas referidas dependências serão escritos em língua portuguesa, embora possam estar igualmente patentes ao lado as suas traduções em língua estrangeira, com caracteres e dimensões iguais

Os empregados em contacto com o público devem falar correntemente a língua portuguesa.

BASE XXIV

As dependências de organismos bancários estrangeiros que vierem a ser autorizadas são obrigadas a ter em depósito no banco emissor e em moeda portuguesa quantia não inferior a 25 por cento dos valores líquidos do seu activo e a trocar por moeda portuguesa ou outra aceite pelo mesmo banco a moeda do seu próprio país existente no território em que exerçam a sua actividade e que lhes seja apresentada para esse efeito.

BASE XXV

Os organismos bancários estrangeiros e suas dependências são obrigados a cumprir fielmente o preceituado nestas bases e seus regulamentos, a legislação especial dos territórios ultramarinos em que exerçam a sua actividade e, subsidiariamente, a lei geral portuguesa.

Ficam ainda sujeitos u jurisdição das autoridades e tribunais portugueses.

BASE XXVII

Não podem ser autorizadas dependências de organismos bancários estrangeiros cujos estatutos ou pactos sociais contenham disposições contrárias ao interêssse público ou à lei portuguesa, enquanto subsistirem tais disposições.
CAPITULO III Disposições comuns

BASE XVII

Os organismos e dependências a que se referem as bases anteriores deverão orientar a sua actividade de harmonia com os interesses gerais da província em que operem, visando especialmente os objectivos seguintes: valorização da moeda portuguesa; destinação dos capitais a úteis aplicações da produção e do comércio regular; fixação da riqueza e dos lucros nacionais; equilíbrio social pela justa e prudente distribuição do crédito.

BASE XXVIII

Os organismos bancários e suas dependências não poderão possuir bens ou direitos imobiliários além dos nédios urbanos necessários ao desempenho das suas unções, salvo quando tenham sido adquiridos para assegurar o reembolso de créditos, devendo, porém, proceder à liquidação desses bens no prazo que lhes for determinado pela Inspecção do Comércio Bancário.

BASE XXIX

As taxas de juros de descontos e de empréstimos efectuados pelos organismos bancários e suas dependências não poderão execeder a taxa de desconto do banco emissor acrescida de 2 por cento. Se houver comissões a cobrar, serão estas consideradas conjuntamente com o juro, para efeito do limite acima fixado, salvo os prémios Se transferência respeitantes a letras pagáveis em praça diferente daquela onde tiver lugar o desconto é o reembolso de despesas efectuadas.

BASE XXX

O juro atribuído aos depósitos em conta corrente à ordem não poderão exceder metade da taxa média do desconto do banco emissor durante o semestre anterior à
liquidação do mesmo juro.

BASE XXXI

Os organismos bancários e suas dependências terão sempre "m caixa, incluindo os depósitos à ordem do banco emissor, uma importância total que perfaça, pelo menos, um quinto da quantia atingida pelos depósitos à ordem e outras responsabilidades à vista.

BASE XXXII

Os organismos bancários e suas dependências ficam especialmente sujeitos à Inspecção do (Comércio Bancário da respectiva província, à qual deverão fornecer os elementos de informação que lhes forem solicitados e patentear a sua escrita e respectiva documentação quando for julgado necessário; são obrigados designadamente a enviar à Inspecção os seus balancetes mensais e a subordinar a sua receita às regras de contabilização que esta estabelecer. Os balanços anuais a remeter à mesma entidade serão acompanhados da conta de ganhos e perdas e do mapa de fundos flutuantes, onde não estiver organizada a Inspecção do Comércio Bancário, podendo as respectivas funções ser cometidas ao banco emissor ou serviço oficial da província.

BASE XXXII
Os empregados da mesma categoria trabalhando no mesmo estabelecimento devem perceber o mesmo vencimento, qualquer que seja a raça ou nacionalidade.

São igualmente independentes da raça ou nacionalidade as condições gerais de promoção.

BASE XXXIV

Consideram-se reservados aos bancos emissores os actos que constituem objecto de privilégio ou concessão especial e ainda as operações de câmbios.

BASE XXXV

São mantidas as autorizações de instalação e funcionamento concedidas a organismos bancários e dependências em exercício no ultramar português, desde que se conformem com o disposto nestas bases até 31 de Dezembro de 1952.

BASE XXXVI

Podem ser cassadas as autorizações de instalação e funcionamento dos organismos bancários e dependências nos casos seguintes:

a) Quando praticarem actos contrários aos fins estabelecidos na base XXXVII de que resultem prejuízos;

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b) Quando deixarem de fornecer as informações pedidas pela Inspecção ou se recusarem a permitir o exame à escrita;

c) Quando tiverem viciado a escrita.

O procedimento previsto nesta base será adoptado sem prejuízo da responsabilidade civil ou criminal que no caso couber.

Em tudo que não estiver regulado nas presentes bases e seus regulamentos aplicar-se-á a legislação em Portugal sobre a organização bancaria e, em geral, sobre sociedades anónimas.

3 de Março de 1952- Sarmento Rodrigues.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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