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REPUBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 155

ANO DE 1952 19 DE ABRIL

V LEGISLATURA

Sessão N.º 154 DA ASSEMBLEIA NACIONAL

EM 18 DE ABRIL.

Presidente: Ex.mo Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior

Secretários: Ex.mos Srs. Gastão Carlos de Deus Figueira
José Guilherme de Melo e Castro

SUMÁRI0: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 12 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foi aprovado o n.º 151 do Diário das Sessões.O Sr. Presidente referiu-se ao primeiro aniversário da morte ao Sr. Marechal Carmona.
O Sr. Deputado Pinho Brandão agradeceu o voto de pesar da Câmara pelo falecimento de sua, mãe.
O Sr. Deputado Pinto Barriga ocupou-se do Código Administrativo e dos poderes dos presidentes dos Municípios de Lisboa e Porto.
O Sr. Deputado Salvador Teixeira pediu ao Governo a conclusão do monumento a Nun`Alvares em Lisboa.

Ordem do dia. - Discutiu-se o Decreto-Lei n.º 38:704. Usaram da palavra os Srs. Deputados Carlos Mantero, Pinto Barriga e Botelho Moniz.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 19 horas e 32 minutos.

O Sr. Presidente:-Vai proceder-se à chamada.
Eram 16 horas e 5 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Adriano Duarte Silva.
Afonso Eurico Ribeiro Cazaes.
Alberto Cruz.
Alberto Henriques de Araújo.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alexandre Alberto de Sousa Pinto.
André Francisco Navarro.
António Abrantes Tarares.
António de Almeida.
António Augusto Esteves Mendes Correia.
António Bartolomeu Gromicho.
António Carlos Borges.
António Cortês Lobão.
António Joaquim Simões Crespo.
António Maria da Silva.
António de Matos Taquenho.
António Pinto de Meireles Barriga.
António Raúl Galiano Tavares.
António dos Santos Carreto.
António de Sousa da Câmara.
Avelino de Sousa Campos.
Caetano Maria de Abreu Beirão.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos Mantero Belard.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Diogo Pacheco de Amorim.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Frederico Maria de Magalhães e Meneses Vilas Boas Vilar.
Gaspar Inácio Ferreira.
Gastão Carlos de Deus Figueira.
Henrique Linhares de Lima.
Herculano Amorim Ferreira.

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Jaime Joaquim Pimenta Prezado.
João Caídos de Assis Pereira de Melo.
João Luís Augusto das Neves.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim de Pinho Brandão.
Joaquim dos Santos Quelhas Liana.
Jorge Botelho Moniz.
José Dias de Araújo Correia.
José Diogo de Mascarenhas Gaivão.
José Garcia Nunes Mexia.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Luís da Silva Dias.
Luís Maria Lopes da Fonseca.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Domingues Basto.
Manuel França Vigon.
Manuel Hermenegildo Lourinho.
Manuel José Ribeiro Ferreira.
Manuel de Magalhães Pessoa.
Manuel Maria Vaz.
Manuel Marques Teixeira.
Manuel de Sousa Meneses.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Mário Correia Teles de Araújo e Albuquerque.
Mário de Figueiredo.
Miguel Rodrigues Bastos.
Ricardo Malhou Durão.
Ricardo Vaz Monteiro.
Salvador Numes Teixeira.
Tito Castelo Branco Arautos.

O Sr. Presidente:-Estão presentes 64 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 16 horas e 12 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente:-Está em reclamação o Diário das Sessões n.º 151.

O Sr. Mendes Correia: -Pedi a palavra para fazer a seguinte rectificação:
A p. 718, col. l.ª, 1. 5.ª e 6.ª onde se lê: «indomináveis -vá o galicismo-, «incontroláveis», deve ler-se: «indomináveis, -vá o galicismo- incontroláveis».

O Sr. Presidente: - Como mais nenhum Sr. Deputado pede a palavra sobre este número do Diário das Sessões, considero-o aprovado com a rectificação apresentada.
Pausa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: passa hoje o primeiro aniversário do falecimento do marechal António Oscar de Fragoso Carmona.
O tempo, na sua acção piedosa e inexorável, atenuou sem dúvida aquela agudeza viva da dor que o acontecimento lutuoso produziu na sensibilidade nacional; mas não conseguiu apagar na nossa memória a recordação imperecível da sua figura de distinção e de bondade - de nobre distinção e de bondade irradiante-, das suas virtudes de homem, de cidadão e de Chefe de Estado, nem dos serviços que na alta magistratura, que durante muitos anos exerceu, prestou ao País. Foi um Chefe de Estado exemplar no exercício constitucional das suas elevadas funções: e isto, que parece muito pouco, é tudo para que os grandes órgãos da soberania nacional desempenhem com tranquilidade a sua função. No nosso sistema constitucional o Chefe de Estado é o árbitro supremo, independente e autónomo de qualquer outro poder, da vida política nacional.
Durante um longo período da nossa história contemporânea tudo dependeu dele. Uma palavra, um gesto, uma reticência, um encolher de ombros, e todo o curso da nossa vida política e todo o rio pacífico da nossa existência nas últimas décadas teriam seguido outros, diferentes e imprevisíveis rumos, e toda a Revolução Nacional podia ser comprometida ou subvertida em catástrofes incalculáveis. Mas a sua superioridade aos assaltos da intriga, a sua compreensão recta e ampla dos homens e das coisas, a sua fé simples e comunicativa dos destinos da Revolução e do Pais tornaram possível essa continuidade e essa eficiência governativa, cujos resultados estão patentes e são o orgulho legítimo de todos nós.
Esta Assembleia, que tantas vezes se honrou com a sua presença, que ele tantas vezes aqueceu com a sua voz, onde havia timbres paternais de bondade doce e ressonâncias augustas de toda uma história de heroísmos, não pode deixar de evocar neste aniversário da sua morte a sua figura veneranda, que parece ainda iluminar-se daquela irradiação da sua bondade interior, para a erguer uma vez mais perante o País como um dos seus protótipos morais mais acabados.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente:-Ao inclinar-me hoje, ao lado do actual Chefe do Estado, ante a uma que guarda os despojos mortais do que foi durante cerca de vinte e dois anos a personificação augusta da nossa pátria, não pude furtar-me também à evocação do ambiente de perturbação e, digamos tudo, de abatimento político e moral que a sua queda determinou. E não pude deixar de memorar que, em tão dramáticas circunstâncias, foi sobre esta Assembleia que impenderam as responsabilidades máximas duma crise grave, gravíssima, do regime. A Assembleia, justo é afirmá-lo, esteve à altura dos dramáticos acontecimentos de então. A lição não deve esquecer-se: de quanto uma alta assembleia política prestigiada e onde a nação se reveja pode ser instrumento decisivo nas grandes crises políticas dum regime ou de uma nação.

O Sr. Presidente: - Sirva isto para compensação mínima do muito que o regime deve a esta instituição política. Em nome dela me inclino de novo comovidamente ante a memória venerada do marechal Carmona, cuja figura sinto agora esvaecer-se na quase penumbra desta sala, para recolher ao culto e ao, afecto dos nossos corações, os corações de todos os Portugueses, onde viverá eternamente.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente:-Tem a palavra antes da ordem do dia o Sr. Deputado Pinho Brandão.

O Sr. Pinho Brandão: - Sr. Presidente: pedi a palavra para agradecer a V. Ex.ª e à Câmara os sentimentos de pesar formulados pelo falecimento de minha mãe.

O Sr. Pinto Barriga: - O Código Administrativo envelheceu precocemente: rugas de senectude económico-política estriam-lhe a sua orgânica. No Mundo renovado a administração local lusitana continua a reger-se por formas e normas ultrapassadas. O Código descentraliza mas vive na obsessão de uma tutela. Torna-a absolutamente necessária por insuficiência financeira e técnica, que se faz representar absorventemente pela presidência dessas autarquias, obscurecendo assim todas as velhas tradições municipalistas portuguesas; o caso avulta ainda

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mais nos municípios das nossas duas grandes urbes, em que, sem disprimor, vemos homens competentes e honestos excedidos pela pletora de poderes que esse código lhes concede generosamente e vivendo numa atmosfera quase ditatorial, que lhes deslustra o brilho de uma grande obra, recheada de boas intenções, repuxado inexoravelmente para soluções burocráticas, de espaldas para o conjunto económico. Toda essa obra é uma vistosa maqueta entretecida de sonhos de engenharia, mas acordada por pesadelos económicos.
Para realizar essa obra de ostentação urbana -a macro-urbe - transformaram-se os municípios em verdadeiros agentes prediais, adquirindo barato na expropriação e leiloando esses terrenos a preço de metro quadrado que, por si só, constitui um capital dificilmente remunerável num pais relativamente pobre como o nosso, com uma classe média mal remediada. Esses preços, exagerados por uma espécie de agiotagem predial urbana, suscitaram a necessidade de criar majestosos edifícios, ostentosamente marmorizados, recheados de estabelecimentos inalugáveis senão a rendas que tornam impossível a rentabilidade de um comércio que aí se estabelecesse. Alimentam um liberalismo de pim-pam-pum de feira que faz quebrar esses pobres comerciantes ou lhes faz evaporar as suas reservas, para alguns de tão difícil reaquisição.
Faltou-lhes uma orientação económica que lhe impedisse requeimar reservas. Rendas altas, dificilmente suportáveis para a mediocridade dos nossos meios, delapidação dos valores dos construtores, ou congelação dos capitais dos compradores,' por uma desvalorização de rendas. De tudo isso é responsável a imprevidência económica dum município que procurava numa ostentação urbana a imagem duma economia de prosperidade que era apenas o privilégio de uma plutocracia. Construía-se para volframistas, criava-se um proprietarismo de 2:000 contos para cima, em lugar de favorecer as aquisições ao capitalista médio, criando assim uma barreira à expansão do comunismo.
Uma macro-urbe de lojas aparatosas sem fregueses e multiplicadas em termos tais que ardiam na concorrência, que não resultava para o consumidor bairrista nem em redução de preços nem em apreciamento de qualidade; sonhou-se com uma Baixa nos bairros novos.
Alargou-se Lisboa, sem se inquietar com o problema dos transportes. Que vultosas despesas não acarretará essa urbanização extensiva! Admiram-na os meus olhos e temem-na a minha prudência e o meu instinto económico.
Não se procurou concentrar a cidade com vantagens económicas e estratégicas, não se puncionaram as mais valias interurbanas, traçaram-se planos da cidade ambiciosos, quase ia dizer megalomânicos, tudo isto saiu da pele do expropriado e dos arrendatários de modestas possibilidades; é só ver os preços das ofertas municipais em comparação com os que foram condenados a pagar pelos tribunais; e ai daqueles que não puderam defender-se judicionalmente. As praças dos terrenos eram um verdadeiro quadro rembrandtesco em que jogavam os construtores na alta, pagando terrenos perfeitamente iguais e de idênticas condições construtivas por preços que iam do singelo ao triplo. Programatizava-se com visões puramente liberais, em que só há que lhes perdoar pelas intenções e pela honestidade inconcussa de quem as dirigia. Essa alta de terrenos feria mortalmente as possibilidades económicas de uma classe média, quer para possuir, quer para alugar; abria as portas ao comunismo.

O Sr. Carlos Moreira: - V. Ex.ª está a pôr o problema no ponto de vista técnico ou no ponto de vista económico ?

O Orador:-Eu estou a colocar-me no ponto de vista económico, evidentemente.
Construía-se para volframistas, e só muito mais tarde se começou a construir para rendas limitadas. Foi uma febre plutocrática de blue-prints. Tecnicamente ...

O Sr. Mário de Albuquerque: - V. Ex.ª...

O Orador:-V. Ex.ª dá-me licença que acabe a frase, e depois interrompa.

O Sr. Mário de Albuquerque: - V. Ex.ª tinha acabado a frase.

O Orador:-Diria eu uma má mecânica ...

O Sr. Mário de Albuquerque: - A mecânica má é a de V. Ex.ª, pois deve expor de maneira que todos possamos saber quando terminam os períodos.

O Orador:-V. Ex.ª não é infelizmente meu professor de dicção ...
Eu dizia tecnicamente ..

O Sr. Mário de Albuquerque: - Pois é tecnicamente que V. Ex.ª expõe mal, porque está a ler precipitadamente, V. Ex.ª está sobre este assunto de urbanização muito mal informado ...

O Orador:- V. Ex.ª pede a palavra e depois contradita.
Tecnicamente os municípios vivem à sombra, tom mesmo de viver à sombra de certos ramos técnicos da Administração central.
A macro-Lisboa há-de pesar duramente nas finanças municipais. A par disto os serviços concedidos foram um tanto abandonados ao belo prazer dos concessionários; os relatórios são disto testemunho anual e eloquente, pela forma sucinta como tratam do assunto.
Nesta sala ainda há pouco tempo tive ocasião de notar que se tinha feito muito, e até muitíssimo, por Portugal, mas muito menos pelos Portugueses; parafraseando-me a mim próprio, direi que a Câmara Municipal fez muito por Lisboa, mas muito menos pelos Lisboetas e por Portugal.
Para os Lisboetas, porque não compreendeu que a urbanização se tem de conter adentro dum limite de transportes fáceis, de se fazer para o maior número, e não para uma plutocracia de dinheiro ou burocracia, e não deixar famílias inteiras expostas à promiscuidade das partes de casa, criar um lar. Ergueu ruas e arranhitos-céus para compradores milionários e para inquilinos com rendimento de 100 contos anuais e daí para cima.
Para Portugal, porque queimou, numa pira de falsa grandeza, capitais que poderiam desdobrar-se utilmente numa urbanização para todos, e não para privilegiados. Requeimaram-se capitais em ostentação e só tardiamente a Câmara Municipal de Lisboa se alinhou no problema das habitações económicas, só muito mais tarde procurando Vale Escuro em vale claro.
Os planos de urbanização não são controvertidos e as soluções de trânsito, que são caras e ineficientes, puras soluções ocasionais, sem perspectivar o futuro.
Neste urbanismo plutocrata teve um pouco de responsabilidade um estabelecimento de crédito do Estado, aliás muito bem administrado, que, em lugar de alinhar as suas hipotecas em volta de soluções medianas, se deixou arrastar por empréstimos sobre plantas vultosas. Agora que secou essa fonte de empréstimos, deixa-se ainda ficar com uma carteira cheia de papéis, financeiramente bons, mas em contrapartida paralisando outras

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aplicações de capitais de investimento socialmente mais útil.
O Código Administrativo fez dos presidentes das Câmaras de Lisboa e Porto os seus próprios julgadores, pois são eles quem dirige as sessões em que se discutem os seus actos.

O Sr. Carlos Moreira: - O Código Administrativo não contém disposições de tal natureza. Há outros órgãos de administração municipal.

O Orador:-Mas que têm uma ineficiência total.
É incrível tecnicamente, mas é assim mesmo. Para além dos presidentes e das obras incontestáveis que realizaram, ponho o merecimento económico do efectivado, que está muito longe das nossas possibilidades e conveniências.
O Código Administrativo instalou um tchin burocrático nessas câmaras que envolve e enfraquece o próprio poder do presidente e muito mais ainda a acção de presença dos vereadores, que deveriam ser lídimos representantes da urbe - imperium in império. Ao Porto, mutatis mutandis, se aplicam as críticas gerais que fiz ao sistema, sobretudo quando se ocupa de «palácios de cristal», dando-lhes soluções, sob os pontos de vista jurídico-administrativo e contabilístico, tecnicamente ... pouco cristalinas.
Ataco a interpretação do código que permite estas soluções de ditadurazinhas incipientes, larvadas. Por fora de tudo isto está o Sr. Ministro do Interior, para quem apelo, pedindo para reactualizar o nosso Código Administrativo de harmonia com as modificações operadas no conjunto económico nacional. Finalizando, faço justiça aos homens e às obras que realizaram, mas condeno toda a acção do Município de Lisboa, que pesa - oxalá que não desastrosamente- no problema económico-social português.
Faltam-me dados que pedi há mais de um ano, e por isso, e por agora, não encarei a possibilidade de um aviso prévio.
Refizemos vistosas cidades, mas não se resolveu o problema habitacional, que tanto tem preocupado e em que brilhantemente tem trabalhado e vivido o Sr. Dr. Manuel Vicente Moreira, um verdadeiro engenheiro social, no mais alto significado deste termo.
A leitura dos seus livros é concludente, sobretudo a notável obra Problemas de Habitação.
Inops potentem dum vult tmitare perit.
Que se lembrem desta sentença latina os que administram as grandes urbes portuguesas, para não fazerem uma urbanização associal com parasitismo dos arredores, com enquistamento dos bairros que nós chamamos de «lata», com zonas sociais que separam os ricos dos pobres, sem um definido critério de ordem espacial comandada por caracterizações profissionais, funcionais e de densidade, assegurar de antemão um princípio automático de auto-satisfação, sem boas localizações dos serviços públicos e semipúblicos, sem uma programatização de circulações do tipo biológico ou mecânico, de velocidades desiguais, de curta e longa distância, de pessoas ou mercadorias, sem respeito pelos princípios urbanísticos de convergência e de estrutura, com uma desigualdade de volumes de construção, com «planos-massas» que perturbam para os transportes as distribuições de densidades.

O resto ficará para o aviso prévio.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem !
O orador foi cumprimentado.

O Sr. Salvador Teixeira: - Sr. Presidente: terminado há muito o fragor da rija peleja travada nesta lídima representação nacional, na imprensa e na opinião pública, entre os partidários da representação equestre e da pedestre, para a estátua a erigir na capital do Império ao Santo Condestável, esbateram-se já mesmo os ecos desse vivíssimo prélio, de que não perdura mais do que o sentido alto da divida - ou, melhor, do seu reconhecimento- que permanece aberta para com aquele que, à parte raros topónimos em muito raros agregados populacionais, apenas, possui, do meu conhecimento, um modesto, mas notável, monumento, cuja fotografia tenho aqui presente e à disposição dos Srs. Deputados, lá para as bandas do planalto geresiano, em Salto, e um pequenino obelisco, a sul do Reboludo, na cerca do Colégio das Missões Ultramarinas em Cernache do Bonjardim, com a seguinte legenda:

«Local em que existiam
os Paços do Bomjardim
Solar da Família de
Nuno Alvares Pereira
que aqui nasceu
em 24 de Junho de 1360»

Em Lisboa há muito tempo que, no alto do Parque de Eduardo VII, em frente ao local destinado ao Palácio da Cidade, se encontra, triste e esquecido, guardado à vista por duas altas colunas, o pedestal destinado à estátua do Herói.
Dar-se-á o caso de ir repetir-se a demora havida para a conclusão dos monumentos que foram acabados de erigir pelo Estado Novo nos topos das Avenidas da Liberdade e da República?
Ou, como dizia há bastantes meses ao microfone da Rádio Renascença, o intemerato lutador Zusarte de Mendonça: «foi abandonada a ideia dessa homenagem, que todos os bons e sinceros nacionalistas reclamam como imperioso dever da Pátria a uma das suas mais gloriosas figuras» ?
Não quero acreditar que possa ser afirmativa a resposta a qualquer destas perguntas.
Porque assim é, e porque várias vezes e desde há bastantes anos, venho tratando deste assunto nesta Assembleia, apelo para o Governo, mais uma vez e sempre confiante, no sentido de que este, por si ou pela Câmara Municipal de Lisboa, rapidamente efective a conclusão e a inauguração do monumento e que nessa ocasião se faça uma romagem patriótica ao local onde nasceu o Herói e Santo, local que deve ficar assinalado por forma adequada.
Disse.

Vozes: - Muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: -Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Vai entrar em discussão a ratificação do Decreto-Lei n.º 38:704, relativo ao aproveitamento reprodutivo da sobrevalorização de alguns produtos ultramarinos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Mantero.

O Sr. Carlos Mantero: - Sr. Presidente: vou procurar falar com calma, muita calma, porque o assunto é sério, muito sério. Não se trata de defender interesses particulares, ainda que legítimos, mas de acautelar os in-

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teresses superiores da Nação no seu desenvolvimento histórico e manter entre os homens aquele mínimo de justiça sem o qual não há tranquilidade nos espíritos nem trabalho proveitoso.

Vozes:-Muito bem, muito bem !

O Orador:-Hei-de dominar a Veemência instintiva do meu fervor patriótico, que se levanta e fere quando sinto que algum mal pode vir ao meu Portugal maior, o grande Portugal de além-mar, a que me ligam tantas e tão nobres tradições, mas hei-de estar sempre entre os primeiros na luta pelo engrandecimento da Nação Portuguesa, que não é um pequeno povo que vive recluído entre o Minho e o Algarve, mas uma grande nação, que se espraia dos contrafortes do Marão até às ribas do Cunene, e mais além no Indico e povoa o imenso Brasil até às brenhas ignotas dos Andes.
Sr. Presidente e Srs. Deputados:
O meu objectivo hoje é procurar elucidar a Câmara sobre o problema que se debate, pondo ao serviço da verdade o meu limitado saber, amparado à vontade honesta e firme de acertar. Apresentarei os factos tais como são na sua nudez crua, sem artifícios que lhes alterem as verdadeiras formas.
Depois da guerra da Coreia os mercados das matérias-primas firmaram-se consideràvelmente e a alta pareceu em certo momento não dever parar. Alguns Estados começaram a preocupar-se com os perigos inflacionistas que a conjuntura altista envolvia e procuraram intervir, estabelecendo direitos de exportação sobre determinados produtos ou elevando os direitos existentes. Por seu turno os Estados Unidos decidiram pôr um freio à alta, fixando preços-tecto para muitos produtos essenciais.
As novas taxas de exportação tiveram repercussões inesperadas nos diversos países e criou-se um mau estar generalizado.
Os impostos sobre a exportação apresentam-se sob dois aspectos quanto à sua incidência: ou o país tem um quase monopólio do produto, e então o imposto incorpora-se no preço por adicionamento à cotação corrente e é o comprador estrangeiro quem o paga, como no caso da polpa para papel na Suécia ou no caso das grossarias de juta (hessian) na índia, em que cerca de metade do preço da exportação é constituída por impostos, e a alta, em vez de ser refreada, acentua-se no mercado internacional, ou então o país tem concorrentes poderosos e o produto ou se não exporta, por ser excessivamente caro, ou o imposto terá de ser suportado pelo produtor.
No primeiro caso, isto é, quando o país tem o quase monopólio, a inflação agrava-se e no segundo caso, quando há concorrência, a inflação mantém-se, pois, quer num quer noutro caso, o novo direito não implica uma redução ou eliminação de poder de compra, mas simplesmente a sua transferência dos particulares para o Estado, a não ser que o poder de compra adicional fique congelado para ulterior utilização quando o surto inflacionista tiver cessado.
Seja como for, a medida tornou-se rapidamente impopular, o cedo, até mais cedo do que se poderia supor, verificou-se ser antieconómica. A viragem de conjectura altista, aí por meados do ano passado, impôs a revisão da política penalizadora. A Austrália, que em 1950 incluíra no seu orçamento uma receita de 20 por cento sobre o preço da lã a cobrar dos produtores na ocasião da venda e a título de antecipação e por conta do imposto de rendimento, viu-se forçada a abandonar totalmente esta receita no orçamento de 19052. No Paquistão a taxa sobre o algodão, depois de ler subido até 300 rupias por fardo, baixou para 180 rupias, por se ter verificado que se tornara o algodão daquele país invendável no mercado internacional em concorrência com os algodões de outras proveniências.
Apesar da situação privilegiada que ocupa no mercado dos tecidos de juta, a Índia teve de reduzir a metade a taxa que incidia sobre este produto depois de ter verificado que estava enfraquecendo a sua capacidade de concorrência no mercado internacional, ao mesmo tempo que favorecia o desenvolvimento da produção noutras regiões e a introdução de sucedâneos. Com a Suécia sucedeu um caso semelhante, e pensa-se que a taxa sobre a polpa será brevemente reduzida a menos de metade.
Com a subida das matérias primas de 150,48 em Junho de 1950 para 215,43 em Fevereiro de 1951 segundo os máximos mensais dos índices comerciais Daw Jones, pensou-se inconscientemente que chega ao momento de lhes aplicar fortes taxas de exportação, mas, contrariando o optimismo dos governos, a alta foi efémera e a descida dos índices de 215,43 em Fevereiro de 1951 para 180,O9 em Julho do mesmo ano, cedo veio mostrar as coisas na sua verdadeira feição, impondo a necessidade de rectificar uma política inconsistente e errada.
Entre nós criou-se também, por força do Decreto n.º 38:405, de 25 de Agosto de 1951, o regime de sobretaxas de exportação, com base nas chamadas sobrevalorizações, e fixou-se o limite máximo do imposto em 60 por cento. A Portaria n.º 13:666 abrange as cortiças, os resinosos, o volfrâmio e a sucata de ferro. A Portaria n.º 13:778 inclui também o estanho, mas suspende a sobretaxa em certas especialidades de cortiça, redu-las noutras, nos resinosos e na sucata de ferro, nestes dois últimos produtos relativamente a mercadorias contratadas para venda antes de determinadas datas. Finalmente o despacho publicado no Diário do Governo n.º 182, de 6 de Setembro de 1951, exclui praticamente do regime de sobretaxas o volfrâmio, pois reduz as taxas da pauta de exportação de um montante igual às sobretaxas fixadas a título de sobrevalorização. No volfrâmio fica tudo como dantes. Não é afectado pela doutrina «moralizadora».
E, assim, ficou reduzido a bem pouca coisa o regime do sobretaxas de exportação na metrópole.
É nesta altura, quando ele é quase inoperante na metrópole, quando se verifica inconveniente no estrangeiro e se vão ateimando pouco a pouco, ou mesmo abolindo, as taxas, que se pretende iniciar a sua aplicação ao ultramar com o Decreto n.º 38:704, que institui o sistema mais complicado e aleatório ate hoje inventado na câmara de torturas do fisco.
Havemos de convir que, além de inoportuno, não considera a experiência alheia nem a nossa própria na metrópole, que não são de todo favoráveis à medida.
A meu ver, há fortes razões políticas, económicas e fiscais que a condenam, como procurarei demonstrar.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Entre os propugnadores da medida há quem procure encontrar no eacess-profit toas dos Estados Unidos ou da Inglaterra uma como que justificação para o imposto de sobrevalorização agora criado.
Sobre a natureza do excess-profit tax parece haver entre nós uma grande confusão. O nosso imposto é um imposto sobre presumidos «superlucros» brutos, arbitrariamente fixados, enquanto o excess-profit tax é um imposto sobre lucros líquidos verificados em balanço. Além disso o excess-profit tax é lançado conforme for mais favorável ao contribuinte, ou sobre o lucro em excesso do lucro líquido verificado no período-base, ou sobre o lucro em excesso de uma determinada percentagem-base sobre o capital invés-

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tido, entrando-se em linha de conta com inúmeros factores de correcção, como aumentos de capital ocorridos entre os dois períodos, etc., sempre na preocupação de proteger o contribuinte na medida do possível.
Assim, pode muito bem suceder que uma empresa que tenha um aumento considerável de lucros acima da base não seja abrangida pelo imposto.
Ao invés, o sistema instituído entre nós provocaria tremendas desigualdades de contribuinte para contribuinte, além dos riscos de se agravarem, em muitos casos, prejuízos na ilusão de se tributarem lucros.
Apesar de tudo o imposto sobre os superlucros provocou na Inglaterra graves repercussões económicas, sobejamente conhecidas de todos.
Se as simples taxas de exportação são condenáveis, se o imposto sobre o superlucro traz graves repercussões económicas, o que diríamos nós do sistema penalizador da sobrevalorização?
Este sistema penalizador é singularmente grave porque ao imposto, que não é o pior, se associa o bloqueio de uma parte substancial do preço, desviando-o do seu curso natural, e se entra de maneira decisiva no caminho de intervencionismo na vida privada das empresas, condenável em toda a parte e, com muito mais forte razão, nas regiões em formação, economias incipientes, em que a iniciativa privada carece de não ser entorpecida ou desalentada para se poder tirar dela o máximo rendimento. Só reconhecendo-lhe autonomia podemos esperar que ela tome riscos, os grandes riscos da economia tropical, e, por consequência, progrida rapidamente a colonização. O que se está a fazer contraria a iniciativa particular. Estamos agindo, sem querer, contra os nossos propósitos constitucionais, as nossas ideias-faróis, os nossos mais arreigados ideais, estamos a destruir a iniciativa privada e com ela o futuro da nossa colonização africana.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Ou acreditamos na economia de mercados, ou não.
Se acreditamos, temos de tomar as coisas como são, temos de aceitar o preço como uma função económica.
Se alterarmos artificialmente o comportamento da função, o das variáveis será viciado, e a produção e o consumo desviados do seu curso natural. For seu turno, o lucro, afectado na sua formação, deixará também de exercer utilmente a função económica que lhe corresponde, e, com ele, sofrerão as suas duas variáveis, produção de novos capitais e investimentos.
Temos de assentar ideias. Ou queremos ou não queremos a livre empresa em regime de iniciativa privada e de concorrência.
O sistema que poderíamos designar da concorrência económica, para não ferir os preconceitos dos que se assustam com palavras, que é um sistema essencialmente humano, submetido às leis psicológicas ou da vontade, só pode funcionar eficazmente se o deixarmos autodirigir-se, em vez de pretendermos conduzi-lo como se conduz uma máquina.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Se, porém, preferirmos o colectivismo à concorrência e assentarmos em que o que nos convém é uma economia mecanizada, então teremos de orientar de maneira diferente as coisas.
A forma híbrida que o decreto traduz é que não nos leva a parte alguma e nada de útil pode produzir. Se, afinal, queremos socialismo, teremos de estar dispostos a suportar todas as suas consequências sobre a posse da riqueza, sobre a produção, sobre a distribuição do rendimento social e sobre as liberdades humanas.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Iremos rindo para um mundo triste, sem estímulos e sem recompensas, um mundo burocratizado, em que tudo se passa lentamente, em que tudo está previsto e sucede ao revés, porque a realidade se compraz em contrariá-lo sistematicamente.
Mas esse mundo é possível, e, se a organização for perfeita e a tirania muita, pode viver algum tempo.
Voltemos, porém, ao imposto de sobrevalorização. Este imposto é, quanto ao preço das mercadorias, uma espécie de imposto de mais-valia. As mais-valias são os benefícios que não são ganhos pelo trabalho ou pelo investimento de capitais em actividades produtivas. O caso típico de mais-valia é a valorização de terrenos em consequência da expansão dos centros urbanos, portanto estranha à vontade e à acção do proprietário.
A sobrevalorização parece ser na ideia do legislador o excesso de preço para além de um nível ideal fixado arbitrariamente pelo Estado, nível de preço a que chamaremos «preço-base» e implica a consideração do « justo lucro». Para aqueles que perfilham a noção do «justo preço», e, portanto, do ajusto lucro», é necessário que o preço-base comporte esse justo lucro, e para que o contribuinte possa ser com justiça tributado em sobre-lucros é necessário que haja excesso de benefícios para além do justo lucro.
Por consequência, o preço, só por si, nada significa; o que é preciso é que o preço produza, além do justo lucro, sobrelucros. Se os não produzir, não há razão para se falar de imposto de sobrevalorização, e muito menos do congelamento de uma parte do preço.
Porém, o justo lucro e o superlucro, como qualquer lucro, não se podem calcular sobre o preço bruto antes de se conhecerem os encargos totais; por isso só em face do resultado final das explorações eles se podem apurar.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mantendo-me dentro da noção do justo lucro, e apenas para efeitos de argumentação, procurarei demonstrar que na província de S. Tomé e Principie, que aqui represento, não se realizou qualquer sobrelucro, isto é, qualquer benefício para além do justo lucro, em consequência dos preços do cacau e da copra a partir de 1949.
Apresentei na minha anterior intervenção o caso-tipo de uma determinada empresa agrícola, com custos de produção anormalmente baixos. Apresentarei agora os aspectos gerais da economia da ilha através dos índices de conjunto, que podem -trazer alguma luz sobre o problema. Mas continua a ser a realidade das empresas produtoras que expressa a posição positiva dos contribuintes em face do fisco por supostos sobrelucros. Esta realidade só pode verificar-se através da análise doa seus relatórios ou das suas contas. Tenho em meu poder os elementos de uma parte importante dos produtores de S. Tomé.
Comparando o valor das exportações totais de S. Tomé no quinquénio 1910-1914 com as de 1951, reduzidas a escudos de igual poder de compra dos de 1910-1914, verificamos que a exportação baixou sucessivamente de 8:094 contos naquele quinquénio para 4:160 contos em 1947, 2:370 contos em 1949 e 2:566 contos em 1951, menos de um terço do que fora de 1910 a 1914.

O Sr. Tito Arantes: - V. Ex.ª pode indicar esses números reportados a moeda-papel? E que V. Ex.ª fa-

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lou já de outra vez em «escudos de hoje», «escudos de agora». E esta é que é a moeda corrente ...

O Sr. Botelho Moniz:- Feitas as contas como o Sr. Dr. Tito Arantes quer chega-se a conclusões contrárias à sua.

O Sr. Tito Arantes: - Ver-se-á depois.

O Orador: - Entendo, Sr. Deputado Tito Arantes, que não se pode fazer análise económica sem reduzir todos os elementos a um factor comum que os expresse, que neste caso terá de ser «moeda de igual poder aquisitivo» moa diversos períodos em estudo.

O Sr. Tito Arantes: - Em todos os outros sectores da vida portuguesa, quer da indústria, do comércio ou da agricultura, se está a trabalhar com escudos-papel.

O Orador: - A análise económica não poderá fazer-se assim, porque chegaríamos a conclusões absurdas como a de termos de tributar em sobrevalorização os vencimentos de muita gente e, porventura até, nalguns casos, os salários.
Se compararmos os valores médios das exportações expressos em escudos-papel nos quinquénios 1910-1914 e 1947-1951 com o acréscimo das receitas orçamentais e dos salários a dinheiro, verificamos que as exportações subiram apenas vinte e três vezes, enquanto os salários a dinheiro subiram quarenta vezes (para não falar na parte do salário pago em espécie, que é a maior, e mais acentuaria o aumento), e as receitas públicas subiram cinquenta e cinco vezes, o que demonstra à saciedade que as despesas dos produtores cresceram mais do que as receitas e que, portanto, a posição não é de sobrelucro mas sim de sublucro.
Se, porém, a comparação for feita entre investimentos e lucros reduzidos a moeda do mesmo poder aquisitivo nos dois períodos, a situação ainda é mais séria, como demonstrei na minha anterior intervenção. Em 1908 tínhamos para um capital-ouro de 3:600 contos um rendimento de 440 contos, enquanto em 1951, para o mesmo capital, acrescido de todos os investimentos efectuados durante os quarenta e três anos subsequentes, só se haviam realizado 180 contos de lucros do mesmo poder de compra dos primitivos 440 contos.
No primeiro período o lucro correspondeu a 12 por cento do capital; em 1951 já não correspondia senão a 5 por cento do mesmo capital, sem falar dos investimentos posteriores, 5 por cento aos quais há a abater as reservas para reinvestimento, a actualização dos fundos de maneio em relação com a perda de poder aquisitivo da moeda e os vários impostos cobrados sobre os lucros distribuídos, deixando, finalmente, livres para o proprietário, se se tratar de accionista de uma sociedade anónima, pouco mais de 2 por cento. Para obter este rendimento em explorações agrícolas nos trópicos não se investem capitais privados em parte alguma do Mundo.
Se compararmos a relação entre as receitas públicas e as exportações, verificamos que no quinquénio de 1910-1911 a 1914-1915 elas andaram por 13 por cento do valor das exportações; em 1949, 27 por cento; em 1950, 22 por cento, e em 1951, 30 por cento, excedendo consideravelmente o limite máximo da fiscalidade, que se considera atingido ao tocar o nível dos 25 por cento do rendimento nacional, nível inultrapassável sem provocar sérias repercussões económicas. Sobre este ponto cito, por desfastio, a autoridade insuspeita do Prof. Colin Clark, da London School of Econornics. Ora a magnitude do rendimento nacional em S. Tomé coincide praticamente com o valor das suas exportações, visto não haver ali outro rendimento de qualquer importância, e as produções serem exportadas quase na sua totalidade, por se tratar de produtos sem consumo local. Quase tudo o que se consome vem de fora, incluindo os géneros alimentícios.
Os números apontados, graves como são, não expressam, porém, todo o peso da fiscalidade, porque às contribuições pagas em S. Tomé há que acrescentar as pagas pelos agricultores na metrópole por imposto sobre a aplicação de capitais, imposto profissional, imposto complementar e outros, num total de muitos milhares de contos, que, como é óbvio, saem do mesmo rendimento económico.
Acrescido dos impostos pagos na metrópole, o peso fiscal deve exceder em S. Tomé um terço do rendimento nacional da província.
Na excelente resenha estatística que o Sr. Ministro das Finanças distribuiu por ocasião da discussão da proposta de lei de autorização de receitas e despesas indica-se que o rendimento nacional foi, em 1950, de 33.000:000 de contos, ao custo dos factores. A receita ordinária em 1950 foi de 4.826:000 contos, ou cerca de 15 por cento daquele rendimento. Mesmo se entrar-mas em linha de conta com as receitas ordinárias e as extraordinárias provenientes de taxas e de diferenciais dos organismos corporativos e de coordenação económica não atingimos ainda na metrópole a alta fiscalidade de S. Tomé.
Nos Estados Unidos, onde a pressão fiscal é elevadíssima, a relação entre as receitas do governo federal e o rendimento nacional foi em 1949 de 18 por cento e, se incluirmos as receitas dos estados, dos municípios e de outras autarquias locais, 27 por cento. No ano de 1950 as receitas federais baixaram para 16,5 por cento do rendimento nacional.
Em S. Tomé estamos a naufragar no mar proceloso das finanças de César. Compreendo perfeitamente o alarme dos produtores. Em S. Tomé é urgente reduzir os encargos fiscais, sob pena de acabarmos por atrofiar a actividade produtora e dê criarmos ao próprio Estado graves problemas quando o infortúnio dos preços baixos forçar as receitas públicas para aquém dos encargos dos serviços da vasta máquina administrativa montada naquela província.

Vozes: - Muito bem, muito bem !

O Orador: - É numa altura destas que se pensa em aumentar os encargos tributários e congelar parte dos haveres dos produtores agrícolas! -
O problema, porém, é diferente de província para província. Os quadros que tenho à disposição da Câmara expressam com mais clareza do que as palavras a verdadeira situação. Em síntese, verifica-se que, enquanto o valor das exportações em escudos-papel subiu do quinquénio 1910-1914 a 1951 cerca de vinte e três vezes em S. Tomé, em Angola subiu quinhentas e quinze vezes e em Moçambique duzentas e catorze. Se reduzirmos os valores das exportações a moeda do mesmo poder aquisitivo e representarmos o quinquénio 1910-1914 por 100, a situação real passa a ter a seguinte expressão: baixa do valor real da exportação em S. Tomé de 100 para 32 e subida em Angola de 100 para 710 e em Moçambique de 100 para 322.
Por seu lado, os preços-dólares devidamente ponderados pelo índice de preços de consumo baixaram no período em referência de 100 para 96 no cacau e de 100 para 91 na copra. No decurso do ano corrente a copra baixou para novos mínimos, tendo o índice das últimas cotações ficado em 50.
E, pois, evidente que se não pode legislar em matéria fiscal e económica nas mesmas bases para todas as províncias ultramarinas.

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Os diagramas relativos a S. Tomé expressam uma situação de crise endémica, que nada tem que ver com a «excepcional prosperidade» de que no decreto se fala, quase como num lamento. Desgraçada «prosperidades»!
Em Angola deu-se, de facto, um extraordinário desenvolvimento das suas riquezas, que a exportação traduz no aumento das quantidades embarcadas, simultaneamente com crescente actividade no circuito interno de bens. Esta circunstância merece ser apontada aqui pelo que significa de acrescida intensidade pó voadora e de maior desenvolvimento das actividades produtoras destinadas ao consumo local.
O café é o grande produto do ultramar, o mais importante da exportação portuguesa, o nosso ouro negro. Em lugar de o temermos, deveríamos acarinhá-lo. Podemos afoitamente dizer que estamos na era do café. Ele representa cerca de 50 por cento da exportação total de Angola, e a quarta parte de toda a exportação das nossas províncias africanas. E um produto de alimentação que hoje se pode considerar essencial e que, pela universalidade dos seus mercados, não nos cria problemas difíceis como os que se nos defrontam na metrópole com a colocação de muitos dos nossos mais importantes produtos, ou com a necessidade em que nos situámos de manter em laboração certas actividades, cujas produções só à força de complicados equilíbrios e custosos sacrifícios podemos exportar.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Com a copra e o sisal sucede o que de um modo geral se passa com todos os produtos tropicais. A irregularidade das cotações e as prolongadas crises a que está sujeita levaram a agricultura ultramarina a procurar na policultura compensação não só para a inconstância das safras como também para a instabilidade dos preços, amparando os preços-baixos de umas culturas com os preços altos de outras. E assim o mesmo agricultor tem lavouras de diversos produtos - de sisal ou de café e oleaginosas, de copra e cacau, etc.
Se a nova lei, na sua aplicação, viesse agora anular este sábio plano, que a experiência de África tem vulgarizado entre os produtores, a estabilidade financeira das economias rurais de Angola, de Moçambique e de S. Tomé seria gravemente afectada.
Em Moçambique, por exemplo, é vulgar a associação das plantações de copra com as de sisal. O preço actual da copra mal cobre os encargos de exploração; por contra, o preço do sisal é ainda remunerador, apesar de os preços já terem também começado a baixar. Contou-se com os bons preços de um para fazer frente às eventuais insuficiências do outro.
Por isso, ignorar o conjunto da economia de cada exploração agrícola na tributação de lucros, escolhendo apenas os produtos mais remuneradores, sem entrar em linha de conta com os prejuízos ou a carência de lucros em outras safras, é não só injusto como económicamente perigoso e contrário às boas regras em matéria de impostos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mas há outros argumentos que têm aplicação à generalidade dos casos.
Disse há pouco que, doutrinàriamente, a lei girava um torno do conceito de justo preço e do seu corolário, o justo lucro, e que, para o apurar se deixava guiar pelas cotações das bolsas internacionais de produtos, que não expressam justos preços mas simplesmente «preços funcionais», pelo menos na medida em que elas operam livremente em concorrência e não são, como neste momento, artificialmente atingidas em muitos casos pela política dos preços-tecto. As oscilações expressam as alternativas da procura e da oferta, mas as baixas nos géneros coloniais são sempre muito duras e longas e por vezes a recuperação torna-se impossível e as terras são abandonadas.
Assim, o cacau, o café e a copra, após anos de relativa estabilidade a preços remuneradores, atravessaram um longo período de depressão, que durou dezasseis anos, de 1930 a 1945. Subsequentemente os preços do cacau melhoraram até quase atingirem, quando expresso em moeda do mesmo valor real, os níveis anteriores a 1930; os do café excederam-nos ligeiramente, mas a copra não voltou a atingi-los.
A contrapartida da sobrevalorização é bem a subvalorização. Se o Estado tributa o contribuinte pela primeira, deveria indemnizá-lo em equivalente valor quando a segunda ocorresse. Se isto se não faz, então o produtor não poderá nunca ressarcir-se, cobrindo com os lucros dos anos bons os prejuízos dos anos maus, e caminhará infalivelmente para a ruína.

O Sr. Melo Machado: - E pena que V. Ex.ª não possa fazer uma resenha de todas as pessoas que perderam os seus capitais trabalhando em África.

O Orador: - Desalentado, o colono descuidará as suas terras, baixando a produtividade, e com ela a produção, e, por sobre tudo isto, o nível de vida e o bem-estar geral em todos os territórios nacionais, incluindo a metrópole, que tão fortemente tem dependido do ultramar na aquisição de produtos alimentares e matérias-primas abaixo dos preços internacionais, na colocação acima dos preços da concorrência dos seus produtos agrícolas e industriais e no poderoso influxo de divisas para cobrir os deficits da balança comercial e valorizar em produtos essenciais a débil lista qualitativa dos nossos produtos de exportação.

Vozes: - Muito bem !

O Orador: - Por outro lado, a base da incidência do imposto, tornado dependente do apuro periódico das cotações de produtos que se caracterizam pela instabilidade tradicional dos seus preços, é tão incerta que torna impossível prever na data da venda qual será a sobrevalorização na data do embarque, que normalmente se efectua meses mais tarde.
Isto constitui um risco adicional que o comércio não poderá acrescer ao preço, por se tratar de produtos cujas cotações são fixadas em mercados internacionais, onde a nossa posição, por insignificante, pouco ou nada influi. Terá, por isso, de o abater no preço de aquisição dos géneros aos produtores.
Assim, a lei, criando novos riscos ao comércio, como se não fossem já poucos os desta hora incerta, acaba por agravar a situação do produtor, determinando, de facto, o aumento da margem de lucro do comerciante exportador e a redução do preço de venda dos produtores: repercussões económicas inesperadas para o legislador, que por certo as não previra!
Mas não são só as repercussões económicas que interessa considerar. Também importa a justiça fiscal, a equidade.
Os mesmos preços podem não traduzir os mesmos resultados de empresa para empresa. Assim, uma empresa pode ter tido uma boa colheita, enquanto outra, no mesmo ano, teve uma colheita má. Isto é frequente em S. Tomé, por exemplo, onde as condições climatéricas do Norte e do Sul variam consideràvelmente.
A um ano chuvoso no Norte corresponde habitualmente um ano excessivamente húmido no Sul e a um ano favorável de humidade no Sul corresponde um ano

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excessivamente seco no Norte, com as consequentes alterações de colheitas.
Mas não são só as condições climatéricas que contam. A idade das plantações, a distância dos portos de embarque, a disponibilidade de trabalhadores, cuja crescente escassez em África constitui um grave problema, a maior ou menor produtividade das terras, mesmo quando situadas em zonas contíguas, as diferenças de organização e métodos de exploração, o maior ou menor grau de mecanização, o maior ou menor avanço da amortização das instalações, podem alterar profundamente os resultados de fazenda para fazenda, verificando-se no mesmo ano empresas que dão bons lucros, enquanto outras que se dedicam às mesmas explorações pouco ou nada ganham.
Porque a instabilidade dos preços dos produtos ultramarinos é muito grande dentro do mesmo ano, com oscilações que frequentemente vão de 100 para 200 e mais, ou vice-versa, não é invulgar que uns produtores aproveitem os melhores preços, enquanto outros, menos afortunados ou sob a pressão de necessidades financeiras, vendem aos preços mais baixos. O café n.º 4 de Santos, por exemplo, oscilou na Bolsa de Nova Iorque entre 8,38 e 15,50 em 1932 e entre 20,50 e 48,50 em 1949. O mesmo se dá com os outros géneros do ultramar. Em todos os anos as oscilações são de grande amplitude. Assim os resultados financeiros das explorações variam grandemente de empresa para empresa e não reflectem de maneira alguma com qualquer espécie de unidade a situação relativa dos preços médios de ano para ano.
Mas há mais motivos de desigualdade. Pode suceder que uma venda efectuada quando a sobrevalorização esteja fixada em 100 venha a pagar na altura do embarque o imposto correspondente à sobrevalorização de 150. Pode também suceder o contrário e a sobrevalorização na altura do embarque não ser senão de 50 ou mesmo nenhuma.
Serão assim terríveis as injustiças da lei.
Por isso o imposto sobre o diferencial de preços e antieconómico e fiscalmente iníquo.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador:-Fala-se muito em emigração de capitais africanos e excessivas compras de automóveis, e com este pretexto pretende-se interferir na livre disposição do que cada um ganha, como se a iniciativa privada, que tem mostrado tão grande fecundidade em África e tem sabido conduzir-se com tanto acerto, tivesse, de um momento para outro, perdido a cabeça e carecesse de tutela.
Esquecemo-nos de que S. Tomé e Angola nos socorreram nos últimos treze anos com mais de 4.000:000 de contos dos seus saldos comerciais, que vieram atenuar os desmedidos deficits comerciais da metrópole, que no mesmo período cifraram 21.500:000 contos, permitindo-nos dar maior amplitude aos investimentos no continente e, acrescendo o poder de compra geral, elevar o nível de vida.
Na medida em que os saldos das balanças comerciais ultramarinas forem reinvestidos em África irão diminuindo as disponibilidades da metrópole em meios de pagamento exterior e, portanto, os recursos para mantermos aqui o nível de vida.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A balança de invisíveis da metrópole, segundo o Banco de Portugal, não apresenta sintomas de emigração de capitais, mas antes um saldo de entradas da categoria dos 2.093:000 contos nos anos de 1948 a 1950, e a balança de invisíveis do ultramar também não indica um movimento de emigração, mas antes uma forte posição a nosso favor, que cifra 1.740:000 contos, perfazendo uma balança total de invisíveis que atinge a alta quantia de 3.813:000 contos.
Não argumento propositadamente com a balança dos invisíveis de 1951, que atingiu a elevadíssima soma de 3.077:000 contos, pela controvérsia levantada em torno da natureza destes invisíveis. Em todo o caso, 1.205:000 contos representam saldos em dólares e noutras moedas de países não participantes da U. E. P.
Portanto o problema da fuga de capitais do ultramar não se põe e o alarme levantado em torno desta suposição não tem consistência quando observada a situação de conjunto, que é o que interessa sob o ponto de vista nacional.
Quando se estudam os motivos que impulsionam a actividade económica do ultramar há dois problemas distintos a considerar que não devemos confundir: um é o da formação de saldos exportáveis de produtos essenciais, para melhorar a composição das nossas exportações, facilitando a colocação lá fora dos artigos de sobremesa da metrópole e para facultar ao País poder de compra adicional no estrangeiro e, com ele, acrescer o nível de vida geral; o outro é a mais justa ou conveniente distribuição do rendimento social.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - O primeiro é um problema que só interessa pela quantidade de riqueza criada, é o problema do todo para com o exterior; o outro é um problema de distribuição interna da riqueza produzida e do uso que se lhe der. Ao querermos intervir no segundo nada devemos fazer que prejudique o primeiro, pela importância decisiva que tem na conservação e desenvolvimento do bem-estar geral.
É porque estou sinceramente convencido de que o decreto-lei nos pode trazer neste e noutros capítulos dias amargos em África que me oponho à sua doutrina fiscal e à sua mecânica.

O Sr. Melo Machado: - Dias amargos em África e na metrópole.

O Orador: - Tem V. Ex.ª razão, mas eu estou-me ocupando especialmente do problema em África.

O Sr. Botelho Moniz: - Talvez sejam mais graves para a metrópole.

O Orador: - Talvez tenha V. Ex.ª razão.
Diz o Decreto, e parece ser este o seu aspecto construtivo, que o intenso povoamento do ultramar deverá sobretudo ser feito através de obras de fomento.
Reputo esta política exacta desde que a sua aplicação não afecte sensivelmente o volume de capitais disponíveis para a iniciativa privada, que carece de ser amplamente alimentada, para levar a cabo com eficácia e rapidez a sua missão criadora de riquezas.
O que disse sobre o imposto e o congelamento de uma parte do preço dos produtos apenas significa discordância quanto à forma de obter os recursos para a realização daquele alto objectivo, porque, se é de fomento que carecemos, nada devemos fazer que afugente os investimentos particulares, que serão, queira Deus por muito tempo ainda, o grosso do caudal de capitais que irão fixar-se em África. Enquanto as actividades produtora e distribuidora estiverem nas mãos da iniciativa privada, a parte proporcional do Estado nos investimentos africanos irá diminuindo à medida que o ultramar for progredindo economicamente. Com efeito, em regime de

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iniciativa privada não poderá ser de outra forma. Se assim não fosse, teríamos economias arregimentadas de produtores funcionários.
Ha, porém, obras de fomento de utilidade geral, que compete ao Estado realizar, ou, pelo menos, colaborar na sua realização. É quanto a estas que se põe a questão do financiamento. Tratando-se de regiões ainda no período inicial da sua formação, e, portanto, na fase de 1.º estabelecimento, não poderá contar-se com grandes sobras dos particulares para financiar as obras públicas.
Entendo, por isso, que os capitais destinados às obras de fomento deverão vir principalmente de fora e, naquela medida fiscalmente justa e económicamente conveniente ou possível em que o imposto poderá facultar receitas extraordinárias, deverão elas ser colhidas sobre os lucros efectivamente -realizados, e não sobre lucros presumíveis, que muitas vezes se não realizam, provocando as mais iníquas desigualdades e atrofiando a iniciativa privada, declarada incompetente para a administração sem tutela da riqueza que produz. A excelência da administração privada reconhece-a, talvez sem querer, o legislador quando acentua a «excepcional prosperidade» das províncias ultramarinas, a não ser que ele a considere obra do acaso e que tudo o que existe em África é pura ilusão.
O decreto contém erros e imprecisões formais, que o tornam de difícil execução. Ao pretender basear a sobrevalorização na comparação das cotações de 1949 das Bolsas de Londres e Nova Iorque com as do período em que a exportação se efectiva desconhece que não existem naquelas praças bolsas que transaccionem a maior parte dos nossos produtos ultramarinos. Com efeito, não há em Nova Iorque bolsas onde se vendam sementes de algodão, copra, sisal, castanhas de caju ou manganês. Em Londres sucede o mesmo com grande número de produtos.
Noutros casos as bolsas estiveram encerradas em 1949, como se deu com a bolsa de cacau de Londres, por exemplo.

O Sr. Botelho Moniz: - E lá os preços são quase meramente teóricos.

O Orador: - São os preços-base, não são os preços reais.
Deve ter-se tomado a nuvem por Juno e confundido mercados com bolsas. Naqueles as cotações não têm carácter oficial. Passam de boca em boca e são conhecidas por transmissão oral entre o trads.
Não será possível, nos termos do decreto, fazer o confronto de muitos produtos nele previstos ou de outros a que o decreto não se refere especificadamente.
Diz também a lei que a sobrevalorização será determinada periodicamente, sem indicar quais os períodos ou datas a que se refere. Serão períodos semanais, mensais, trimestrais ou anuais? Será referida à data da venda ou à data do embarque? A alfândega fará a liquidação na base da sobrevalorização determinada para o período imediatamente anterior ao embarque ou será na altura do embarque feita uma liquidação provisória enquanto se não apura a sobrevalorização respeitante ao período em curso? Gomo poderão efectuar-se vendas a prazo se não pode prever-se qual a sobretaxa que estará em vigor no período em que o embarque tiver de realizar-se? E, no entanto, o escoamento normal das colheitas terá de ser escalonado durante o ano por vendas antecipadas nas ocasiões apropriadas. Se elas se não puderem efectuar nas oportunidades próprias, colocaremos os produtores na contingência de verem acumular-se os produtos nas fazendas na época das colheitas sem possibilidades de escoamento imediato ou a preços
convenientes, reduzindo o volume e protelando a entrada de divisas no País.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O Decreto n.º 38:405, relativo às sobrevalorizações na metrópole, não pode servir como antecedente, pois a base da tributação é inteiramente diferente.
Trata-se na metrópole de verdadeiros direitos de exportação, cuja liquidação é feita nuns casos pela aplicação de sobretaxas- específicas e noutros de sobretaxas ad valorem, todas elas referidas a unidades de peso ou volume ou a preços absolutos, e não a diferenças de cotações. Assim, cada província escolherá o período e, portanto, a base de incidência que lhe convier e poderá alterá-lo ad libitum, provocando não só desigualdades fiscais internas, como desigualdades entre os produtores do mesmo género nas diferentes províncias.
Será mais uma vez quebrada a unidade nacional.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - O decreto tem graves vícios orgânicos, que o tornam inexequível dentro da justiça fiscal e da conveniência económica. Visiona tributar sobrelucros e acaba afinal por tributar actividades que não só nenhuns sobrelucros têm, e é o caso dos produtores de cacau, e de copra, como ainda estão muito longe de ter recuperado a posição perdida.
Tomando mais pesada do que já é a fiscalidade no ultramar, agrava, em vez de atenuar, a desigualdade existente entre certas (provinciais e a metrópole, contrariando os novos investimentos em África e colocando o ultramar numa terrível e perigosa posição em face de regiões produtoras concorrentes.
Enquanto o café paga em Angola 14 por cento e passaria a pagar aos preços actuais cerca de 40 por cento na exportação, incluindo direitos, sobrevalorização e contribuição para o capital de fomento, no Brasil ele é apenas tributado em 3 por cento de imposto de vendas.
O decreto estabelece a chamada sobrevalorização em bases que, na maioria dos casos, se não verificam, pela inexistência em Londres e Nova Iorque dos organismos a que se refere.
O decreto ressuscita os condenados impostos de exportação e, penalizando os sobrelucros, não institui equivalente compensação para os sublucros quando eles ocorram, como ocorreram no passado, com mais frequência do que os sobrelucros e hão-de no futuro voltar a dar-se.
O decreto, pelas suas repercussões económicas, tão fundas e tão variadas, não realiza os propósitos que pretende atingir, cria o clima contrário às próprias intenções e, alterando profundamente a feição da conjuntura africana, faz nascer nos espíritos a dúvida que quebra os entusiasmos e assusta a iniciativa, tão afoita em correr riscos quando eles vêm da Natureza, mas tão tímida quando é chamada a sofrê-los contra a ordem natural das coisas.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Em conclusão:
Dizia eu no meu anterior discurso que o decreto continha em si o mesmo germe da própria destruição. Com efeito, ou ele se aplica à risca e desanima os colonos e os capitais e não há povoamento nem fomento privado, ou se não aplica à risca e não há receitas e, portanto, não há fundos para custear o povoamento e o fomento, que o Estado tomou a seu cargo. Não serve para ninguém

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e faz desvanecer as esperanças dos que confiaram na excelência da medida.
Por sobre tudo isto, acima de todas as ponderosas razões, lima há ainda que não pode deixar de calar fundo no ânimo dos que, como eu, preconizam o intenso fomento e o povoamento da nossa África continental: é que se não pode fundar a política de expansão nacional numa medida tão aleatória como esta, que se apoia em coisas efémeras como são as cotações altas de certos produtos coloniais. A breve trecho nos encontraríamos sem receitas desta proveniência, a colonização cessaria e as obras ficariam a meio, se é que tivesse havido tempo de lhes dar início.
O fomento e o povoamento da África Portuguesa são coisas muito sérias para ficarem assim entregues a uma medida transitória e contraproducente.
O Decreto-Lei n.º 38:704 contraria de desejos da Nação e os propósitos do Governo quanto ao fomento e povoamento do ultramar, à justiça fiscal e à utilidade económica, e ofende o desejo de progresso económico, tão claramente expostos pelo Sr. Presidente do Conselho no seu recente telegrama às associações patronais de Angola. Por isso, entendo, Sr. Presidente, que as questões postas pelo decreto carecem, pela sua transcendência nacional, de ser reconsideradas à luz das repercussões políticas e económicas que podem provocar, da incidência e justiça fiscal que envolvem.
É neste espírito que espero que a Assembleia, depois de ponderar a força das razões invocadas, se pronuncie pela não ratificação do Decreto-Lei n.º 38:704, significando assim estar ao lado do Governo no seu elevado propósito de fomentar a riqueza e promover o povoamento efectivo do ultramar português.

O Sr. Tito Arantes: - Quer dizer: no entender de V. Ex.ª quem reprovar o decreto vota a favor do Governo; e portanto quem o ratificar Vota contra!

O Orador: - Com efeito assim é. Quem votar pela ratificação pura e simples do decreto vota contra o Governo.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Pinto Barriga: - Sr. Presidente: ecos ainda o discurso do ilustre orador que me antecedeu, pelo seu brilho, que supervalorizou as mais valias, problema secundário em face do drama monetário.
Todo este problema foi posto pelo Sr. Deputado Carlos Mantero em torno do decreto, como se para além dele nada mais houvesse, como se o problema monetário não o dominasse. Fora deste aspecto há apenas pequenos detalhes que não se situam na perspectiva principal do problema.
Encontramo-nos em face de um excedente que não provocámos, mas que nos foi imposto pelas circunstâncias internacionais, que trouxeram momentaneamente para o Banco de Portugal divisas inconvertíveis.
Qual seria a nossa futura situação monetária se o Governo não tivesse acudido com o decreto que antecedeu este que estamos rectificando?
Interessa averiguar o problema, não como detalhe dos interesses de cada um, mas na posição de cada um no conjunto económico de Portugal.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Botelho Moniz: - E tudo uma questão de notas ...

O Orador:-As notas são realidades de uma situação económico-financeira que não pode ser vista através de pequenos detalhes, mas tem de ser analisada no seu conjunto. E tanto assim que o Sr. Deputado que me antecedeu fez uma contabilidade toda ouro; os seus raciocínios reportaram-se, não a um escudo que se foi desvalorizando, mas a um escudo comparativo.

O Sr. Botelho Moniz:-Também foram feitos escudos-papel. V. Ex.ª é que não ouviu bem.

O Orador:-Suponho que aquele Sr. Deputado fez uma oração-ouro, mas V. Ex.ª diz que foi papel ...
Risos.
O Governo entendeu que devia fazer a congelação e eu pergunto se essa congelação é inteiramente eficiente. Para mim é um mal menor do que desvalorização, mas tudo depende do seu regulamento, da forma como forem organizados os tais fundos.
Temos uma experiência dolorosa dos fundos e o Sr. Deputado que me antecedeu visivelmente se alarmou.
O problema não se põe tão singelamente, em vista do caso de S. Tomé; não se foca apenas em torno de raciocínios tão simples: equaciona-se em face dum problema nacional; ou se continua a exportação, sem olhar aos excedentes que possam vir sobrecarregar-nos na U. E. P., e então a desvalorização externa da moeda está à vista, pela decomposição que poderá provocar nas reservas do Banco de Portugal, incluindo nelas divisas de conversão diferida, que o nosso ilustre colega Sr. Engenheiro Araújo Correia fixava ontem em 68 milhões de dólares, divisas essas com cotação inferior no mercado livre, ou resistimos a essa tentação defendendo energicamente o escudo e o seu valor, que é o símbolo magnífico da nossa admirável ressurreição económico-financeira.

O Sr. Carlos Moreira: - V. Ex.ª afirmou que o Sr. Deputado que o antecedeu no uso da palavra pôs o problema sob um critério muito simples. Salvo o devido respeito, tenho a impressão de que V. Ex.ª o está a complicar.

O Orador:-Não estou a complicar o problema. A verdade é que esse Sr. Deputado colocou o problema apenas no aspecto de exportação e congelamento das mais valias. Não voltarei ao assunto da inflação portuguesa, que já tratei amplamente no aviso prévio.
O problema inflacionista português não é um caso monetário; é mais um problema de psicologia económica.
A inflação deu-se na macroeconomia, por poussées concentracionistas. Não se espalhou, não se difundiu em nódoa de azeite, localizou-se por plutocratização.
Daí os reflexos patológicos da nossa inflação, que em lugar de se reflectir na microeconomia, criando um bom de prosperidade, pelo contrário, deflacionou-se, originando, pelo menos, uma crise pseudodeflacionista. A nossa economia vive no regime de duche escocês: inflação na macro, deflação na micro, daí dificuldades destas tendências contraditórias. O concentracionismo não aumenta visivelmente o consumo; dá-se por consequência uma quebra, um décalage, entre uma abundância de capitais na macro e um nível de vida, sem acréscimo de possibilidades, na micro. Permitam-me este neologismo: os microeconómicos, por insuficientes monetariamente, criam um ambiente que a desvalorização recoeficientiza.

O Sr. Carlos Mantero: - V. Ex.ª dá-me licença?
O congelamento resultante do decreto em discussão não fica retirado da circulação, porque é destinado a ser reinvestido.

O Orador:-Em face das interrupções de VV. Ex.ªs, devo dizer, para que fique bem esclarecido, que não

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defendo inteiramente o decreto, mas as suas naturais intenções. A solução adoptada não será, nem é, porventura, a melhor, mas a verdade é que o problema se impunha de uma maneira percutante. Iam-se adensando no Banco de Portugal divisas inconvertíveis e não podíamos ficar de braços cruzados, e o Governo não ficou.
A solução do congelamento é uma solução perigosa, porque tem de ser oportuna, eficiente, e é como o sal: nem de mais, nem de menos.
Verifiquei das palavras do Sr. Deputado Carlos Mantero que havia um fundo de desconfiança... sobre esses fundos; o que é perigosa é a forma de aplicação dos reinvestimentos; se é reprodutiva ou não, isso é que a patologiza.
É possível realmente restabelecer, digamos assim, a equação das nossas trocas internacionais? É possível diminuir o saldo na U. E. P.?
Não ponho o problema como o pôs este decreto, mas, repito, defendo as suas, intenções e espero que a sua regulamentação tenha a elasticidade suficiente para não congelar senão no mínimo, porque o que me parece menos de aceitar será um congelamento, a dosagem forte com taxas fixas e invariáveis, porque a supervalorização se faz por escalões e dentro desses escalões há um décalage dos custos de produção, mas que em breve são reabsorvidos, deixando a supervalorização de ter as mesmas margens de benefício. Numa regulamentação...

O Sr. Melo Machado: - A não ser que essa regulamentação diga o contrário do que diz o decreto ...

O Orador:-Regulamentação, porque o decreto dá-me a impressão técnico-jurídica de estabelecer um plafond de congelação e portanto dá margens legais a uma larga regulamentação, que deve incidir sobretudo na difusão, na trasladação originada na punção congeladora.
A repercussão cria como que cadeias de refrigeração, a graus negativos diferentes.
A congelação excessiva cria o clima pneumónico, as correntes de ar económico, quando é feita sem habituação gradual de temperatura económica; quando é feita de surpresa dá lugar a um ciclo de depressão artificial, mais perigoso, porque fica para além da sua modificação legal.
Parece-me que por parte de alguns Srs. Deputados existe ainda um certo saudosismo liberalista, por apartes que me dirigem ...
A congelação perfilhada pelo decreto a ratificar, que não defendo, mas explico, não é de natureza socialista. O que o Governo podia era ter agido por uma forma mais persuasiva ...
Podia dizer-lhes que nas exportações que fazemos para a U. E. P. só recebemos, grosso modo, 46 por cento em ouro; o resto bilateraliza-se em divisas de conversão diferida. Podia dizer ao Banco de Portugal: «Pague a estes senhores esses 46 por cento, e quando recebermos o resto lhe daremos ».
A situação, como se vê, era totalmente diferente. Esperavam pelos 54 por cento restantes, e nem o Estado nem o Banco desembolsavam o preço sem warrantagem.
Congelar não é socializar as exportações; é, sim, socializar os riscos para comunidade económica portuguesa dos excedentes que não são avalizados pela U. E. P.; é corporativizar.

O Sr. Abrantes Tavares: - O corporativismo, qualquer que seja a forma como se realize, é sempre uma colaboração do Estado com a produção.

O Orador:-O corporativismo já o defini aqui, de uma forma caricatural, como sendo a colectivização dos prejuízos e a individualização dos lucros.

ondeno a congelação como solução unilateral; defendo uma decisão ecléctica para o problema. Percorramos os tipos de conclusão:
1.º Reservar para a zona do dólar as exportações. - Essa própria zona defende e guarda o necessário e exporta o supérfluo. Dá a impressão de que andamos num carnaval económico a trocar coufettis e serpentinas do supérfluo, procurando assim ludibriarmo-nos uns aos outros : o supérfluo para os outros, o necessário para nós;
2.º Defesa contra os invisíveis como elementos parasitários.-A defesa cambial contra os invisíveis pode ser um elemento precioso no equilíbrio económico-cambial. Fora dum avantajamento de preços, as colónias não são responsáveis pela totalidade do surto dos invisíveis.

O Sr. Botelho Moniz: - Então V. Ex.ª está a defender este ponto de vista: é que há uns que são culpados dos invisíveis e da infracção consequente e quem paga as favas são as províncias ultramarinas. Por culpa da administração pública deixou de se exportar para a Holanda a grande massa dos produtos coloniais, para que a Holanda arranjasse dólares na América, vendendo esses produtos mais baratos do que nos comprava a nós.

O Orador:-Eu defendo a Administração no que ela tem de superior e não reconheço esses meandros de baixo quadrante. Não posso acompanhar V. Ex.ª, porque não tenho os dados precisos que me permitam por essas premissas tirar conclusões para estabelecer responsabilidades.
O facto, porém, é que, se continuarmos a exportar assim, não sei em que situação ficaremos, e creiam VV. Ex.ª que a exportação é uma causa primacial de aumento dos excedentes uepianos.
3.º O equilíbrio das nossas contas nessa organização internacional ou pequenos saldos positivos ou negativos.- A dificuldade desta solução é a programatização hierarquizada do nosso comércio externo, a desquintacolunização das nossas importações e exportações, a desorganização comercial do Ministério dos Negócios Estrangeiros e do nosso corpo consular, perfeitamente burocratizado; resumindo : o nosso maior embaraço estaria em contingentar o exportável, quer como solução única, quer complementarmente ligada ou acompanhada pela liberdade de exportação em divisas, sem garantia da troca ao câmbio oficial do Banco de Portugal e, portanto, sujeitas inteiramente ao mercado livre.
A dificuldade desta solução complementar viria ainda a ser o engorgitamento de divisas mal apreciadas, sem possibilidade de câmbio, criando até, desonesta e sorrateiramente, um dumping para a nossa importação.
4.º Solução fiscal. - Essa punção chegaria a retardamento ; mas não pode o Estado desprender-se dela, usada com justiça e equilibradamente, não como meio violento de drenagem.
Têm-se aqui condenado, em termos curiosos, as disposições deste decreto, especialmente em relação a Angola.
Ora, meus senhores, se há províncias ultramarinas que merecem toda a minha simpatia, Angola é, sem dúvida, aquela a que me ligam os mais estreitos laços de carinho e de interesse, pois que desde a minha infância venho vivendo o seu desenvolvimento.
Meu pai, que esteve uma parte da sua vida como subdirector-geral do Ultramar, através de dezassete anos de trabalho nesse Ministério, desde novo me habituou a ter pelos problemas ultramarinos o maior interesse, fazendo desses assuntos tema de mesa. Podem VV. Ex.ªs calcular, portanto, a simpatia com que acompanho o desenvolvimento de Angola e o desejo que tenho em que

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a sobrevalorização que se pretende não venha a provocar problemas piores do que a própria desvalorização.
Vejamos agora se os custos de produção acompanharam a supervalorização :
Leu.

O Sr. Botelho Moniz: -Pelo critério de V. Ex.ª, quanto mais barato for o custo da exportação, mais rico se fica.

O Orador:-É que o custo de produção não acompanhou de momento a curva da sobrevalorização.
Os dados - que me foram fornecidos oficiosamente, e a meu pedido - que agora li e de que peço a sua inclusão no Diário das Sessões abertamente demonstram que o problema é muito diferente do que o que focou o Sr. Deputado Carlos Mantero.
«1) Exportação de Angola, de Moçambique e de S. Tomé. - De 1941 até 1951 a exportação do ultramar marcou uma ascensão nos preços muito alta.
Dentro do período de onze anos em referência, os números apurados da exportação de Angola, de Moçambique e de S. Tomé acusam as tonelagens e os valores indicados nos quadros I, II e III que seguem.

QUADRO I

Angola

Exportação total

[ver quadro da imagem]

Aumentos em onze anos:
Percentagem
Tonelagem ........................... 74.2
Valor ............................... 634.8

QUADRO II

Moçambique

Exportação total

Aumentos em dez anos:
Percentagem
Tonelagem .......................... 72.9
Valor .............................. 339.8

QUADRO III
S. Tomé

Exportação total

[ver quadro da imagem]

Aumentos em Oito anos:
Percentagem
Tonelagem ....................... 85,6
Valor ........................... 375,9

2) O ano de 1949. -Os números destes quadros indicam que em 1949 a exportação de Angola, de Moçambique e de S. Tomé marcava os seguintes aumentos em relação a 1943:

QUADRO IV

Aumentos de 1949 em relação a 1943

[ver quadro da imagem]

Quer dizer, de 1943 a 1949, em Angola e em S. Tomé, o valor total da exportação passou de triplicar e o valor médio dos produtos subiu para mais do dobro; em Moçambique o valor total da exportação de 1949 ficou em duas e meia vezes mais o de 1943 e o valor médio dos produtos aumentou de 73,2 por cento.

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O ano de .1949 assinala-se assim por um surto ascencional muito grande da valorização dos produtos exportados.

É neste ano de 1949 que em Angola o café atinge o valor total de exportação de 551:543 contos, com o preço médio de 11.891$ por tonelada, ou seja mais 8.932$ por tonelada do que em 1945 L; que a exportação de sisal se eleva a 154:889 contos, atingindo o preço por tonelada de 8.010$, ou seja mais 4.507$ do que em 1945; que a semente de algodão tem o valor de exportação de 1.165$ por tonelada, contra 500$ em 1945, e o manganês sobe para 711$ por tonelada, em vez dos 100$ de 1945.

Em Moçambique, a copra apresenta-se com o valor total de exportação da casa dos 172:551 contos e o valor médio da tonelada situa-se em 3.880$, contra 1.833$ em 1945; o sisal é representado por 134:502 contos na exportação total e por 7.263$ no valor médio da tonelada, ou seja mais 4.299$ do que em 1945; a exportação da castanha de caju vale 52:898 contos, com 1.234$ por tonelada, que em Í945 tinha o valor médio de 653$; a se-

1 A alta do preço do café, verificada nos últimos meses de 1949 - diz o Banco de Angola no seu relatório de 1950-, tem remunerado amplamente esses capitais (os investidos nas fazendas de europeus) e proporcionado inteiro desafogo a produtores e exportadores, contribuindo para o elevado índice que no ano findo atingiu a vida económica de Angola.

mente de algodão passa de 150$por tonelada em 1945 a 1.382$ em 1919, numa exportação de 26:470 toneladas.

Em S. Tomé o cacau sobe, em 1949, para o valor de exportação dos 97:814 contos e valor médio de 11.751$ por tonelada, mais do dobro dos valores de 1945; e a copra eleva a produção para 4:183 toneladas, de preço médio igual a 3.419$, contra 1:830 toneladas em 1945, de preço médio igual a 2.917$.

3) Situação em 1951.-Em 1951 a ascensão dos preços continua: em Angola o café tem o valor de exportação igual a 1.527:725 contos e o preço médio por tonelada é igual a 23.711$, ou seja oito vezes o preço de 1945 e o dobro do preço de 1949; o sisal apresenta-se com o valor de exportação igual a 328:799 contos, cotando-se a tonelada a 14.174$, ou seja quatro vezes mais a cotação de 1945 e quase 70 por cento mais do que a de 1949; a semente de algodão sobe para 1.346$ por tonelada, contra 1.165$ em 1949, e o manganês situa-se nos 743$ por tonelada, subindo a exportação de 11:855 toneladas, em 1949, para 44:640, em 1951.

Em Moçambique a copra vai para o valor médio de exportação igual a 6.608$; o sisal para 13.579$; a castanha de caju para 2.216$; a semente de algodão para 1.355$.
Em 3. Tomé o cacau sobe para o valor médio de 18.710$ por tonelada, ou seja mais 13.252$ do que em 1945, e a copra tem o valor de 5.999$. (V. quadros À, B e c).

[...Ver tabela na imagem]

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QUADRO C

S. Tomé e Príncipe

Exportações (metrópole e estrangeiro)

[ver tabela na imagem]

4) Situação em 1962. - Em 1952 as cotações continuam na alta; e, assim, as realizações acusam:

Moçambique:

Copra - 5.758$/t, em 7:847 toneladas (Março, 1952).
Sisal - 15.4610/t, em 2:278 toneladas (Março, 1952).
Castanha de caju - 3.3620/t, em 21:805 toneladas (Março, 1952).
Semente de algodão - 1.444$/t, em 8:602 toneladas (Março, 1952).

Angola:
Café - 26.104$/t, em 3:552 toneladas (Fevereiro e Março, 1952).
Sisal- 14.2770/t, em 988 toneladas (Abril, 1952).
Semente de algodão - 2.090$/t, em 697 toneladas (Março, 1952).
Manganês - 990$/t, em 10:769 toneladas (Abril, 1952).

S. Tomé:
Cacau - 20:739/t, em 1:423 toneladas (Março e Abril, 1952).

5) Encargos de mão-de-obra indígena. - Quanto a encargos de mão-de-obra indígena empregada na produção, os números referentes a 1947, 1949 e 1951 marcam o ano de 1949, em Angola, como o mais agravado.

De facto:

Angolares

[ver tabela na imagem]

6) Direitos. - Como foi acompanhada a subida dos preços da exportação pelos direitos e mais imposições cobradas nas alfândegas?

Os valores que seguem respondem:

Angola:

Café:

1949 - 12 por cento ad valorem, mais $20 por quilograma;
1952 -14 por cento ad valorem.

Sisal:

1949 e 1952 -12 por cento ad valorem.

Semente de algodão:

1949 e 1952 - 4 por cento ad valorem.

Manganês:

1949 e 1952 - 1 por mil ad valorem.

Moçambique:
Copra:

1949 - 6,5 por cento ad valorem, mais 12$50 por tonelada.
1952 - 8 por cento ad valorem, mais 2$50 por tonelada.

Sisal:

1949 - 4 por cento ad valorem, mais 12$50 por tonelada.
1952 - 3,5 por cento ad valorem, mais 2$50 por tonelada.

Semente de algodão:

1949 - 7,5 por cento ad valorem, mais 12$50 por tonelada.
1952 - 8 por cento ad valorem, mais 2$50 por tonelada.

Castanha de caju:

1949 - 8,5 por cento ad valorem, mais 12$50 por tonelada.
1952 - 9,5 por cento ad valorem, mais 2$50 por tonelada.

S. Tomé:
Cacau:
1949 e 1952 - 3 por cento ad valorem, mais $60(9) por quilograma.

Copra:

1949 e 1952 - 27,5 por cento ad valorem.

7) Angola: algumas receitas e alguns investimentos. Circulação fiduciária. - Nos três anos de 1949, 1950 e 1951 podem alinhar-se as seguintes somas quanto ao Valor da exportação, de algumas receitas cobradas, de investimentos de fomento e em automóveis, da circulação fiduciária:

a) Valor da exportação - 7.151:307 contos. 1

1 O café entra neste total com 2.825:842 contos.

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Sendo:

1949 - 1.793:012 contos.
1950 - 2.169:018 contos.
1901 - 3.189:277 contos.

b) Receitas cobradas de impostos e direitos de exportação e importação -1.243:894 contos.

Sendo:

[ver tabela na imagem]

Decomposição da receita de 1.243:894 contos, cobrada nos três anos:

Percentagem
Imposto de lucros sobre a exportação (até
1949) 1,5
Imposto sobre explorações agrícolas 2,3
Imposto de rendimento 6,2
Imposto do selo 8,5
Direitos de exportação 33,5
Direitos de importação 48
100

c) Investimentos de fomento e automóveis (1.230:245 contos).

Sendo:

[ver tabela na imagem]

Decomposição da despesa com investimentos de fomento e com automóveis, de 1.230:245 contos:
Percentagem
Agricultura 7,1
Industria 8,9
Diversos 46,1
Automóveis 37,9
100

d) De 1949 a 1951 a circulação fiduciária de Angola aumentou 56 por cento e os números, representados em angolares, são:

1949 - 409:439.600.
1950 - 491:071.171,50.
1951 - 640:000.000.

Vamos agora ver os sacrifícios da congelação.

Os assuntos que dizem ou podem dizer respeito aos meus interesses de lavrador não os trago a esta tribuna, ainda- que regionalmente sejam relevantes.

O Sr. Manuel Domingues Basto: - Então V. Ex.ª quer dizer que os Deputados estão inibidos de tratar aqui dos assuntos da sua região?

O Orador: - Não é isso que quero dizer. Pretendo marcar uma posição diferente: é que a minha região não se alarmou; suportou as consequências da venda por valor diminuto do azeite em face dos preços pagos nos mercados retalhistas para onde exportamos. No entanto agradeço a V. Ex.ª a sua observação na medida em que ela veio esclarecer o meu pensamento em face desta Assembleia.

Voltando às soluções positivas. Quais são as que tentou apresentar para o problema o Sr. Deputado Carlos Mantero? Salvo melhor opinião e o devido respeito, nenhumas; este nosso ilustre colega apenas se limitou a dizer que o decreto não pode servir.

O problema não se resolve desta maneira. Evidentemente, a cultura do Sr. Deputado Carlos Mantero e os seus conhecimentos da vida económica portuguesa deviam permitir-lhe apresentar uma solução que não fosse puramente negativista, pois não basta rejeitar o decreto, ignorar a existência dum sério problema monetário : a continuar a política dos excedentes, tornava-se necessário dar elementos valiosos, achegas para uma solução do reequilíbrio económico português, para reactivação das importações.

E preciso que as nossas províncias ultramarinas se convençam de que, se se fizer a retracção dos preços internacionais, no regime de clearings em que vivemos, não é uma centena de milhares de brancos que pode servir como importadores que compensem as exportações; são 8,5 milhões de continentais que o poderão fazer e até mesmo esponjar os supérfluos importados.

O problema é muito mais extenso ainda. Em Angola há duas regiões: uma rica de café e uma pobre de milho. A questão tem de pôr-se de forma diferente para cada uma dessas regiões.

Isto é que traz um grave desequilíbrio económico provincial!

O Sr. Deputado Carlos Mantero, em toda a sua exposição, não apresentou uma solução positiva nem aflorou este problema candente.

O Sr. Botelho Moniz: - E qual é a solução positiva de V. Ex.ª?

O Orador: - É precisamente uma solução mista que venho expondo. Uma solução entre o congelamento mínimo e o investimento bancàriamente dirigido ou sugerido, uma reactivação das importações, uma maior expansão para a zona dólar, um clearing apertado quanto aos países europeus e mesmo americanos.

O que o Estado tem de fazer é aceitar essas cambiais, mas integrando-as imediatamente depois na economia lusa.

O Sr. Abrantes Tavares: - Mas V. Ex.ª não deve ignorar que as importações e as exportações estão licenciadas.

O Orador: - O licenciamento do comércio externo não corresponde devidamente à fiscalização cambial, quase inexistente.

O que preconizo é uma solução ecléctica, o que defendo é a intenção do decreto, mas não a sua articulação. O que se apresenta é um disfarce de uma solução fiscal, é uma forma de eutanásia fiscal.

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O Sr. Melo Machado: - Eu pergunto a V. Ex.ª: neste decreto não está implicitamente um empréstimo forçado?

O Sr. Botelho Moniz: - Explicitamente!

O Orador: - Não há empréstimo forçado senão na concepção liberal de VV. Ex.ªs

Hoje ninguém pode exportar isoladamente. O homem isolado é um mito em face das organizações internacionais. Este aspecto, que é fundamental, VV. Ex.ªs querem ignorá-lo.

A iniciativa liberal na economia salazariana não é, nem pode ser, sinónimo de lucro, liberto do escrúpulo de peias legais ou morais. O lucro na economia de pré-guerra é um fenómeno que tem muito menos de iniciativa do que de chance. Não, Srs. Deputados, não um empréstimo forçado, senão do Estado e Banco de Portugal em relação aos exportadores e produtores coloniais, antecipando o que só mais tarde receberiam. Se há empréstimo forçado e financiamento, é aos exportadores, na medida em que se lhes paga as cambiais de vencimento diferido.
Inscrevendo-me a seguir ao Sr. Deputado Carlos Mantero, eu digo que S. Ex.ª trouxe realmente uma valiosa contribuição de dados que, muito embora fossem magníficos, apenas conduziram a uma conclusão negativa de rejeição pura e simples desse decreto, o que não pode ser, e S. Ex.ª, como distinto economista, compreende-o como ninguém, pois continuar o nosso comércio externo em regime de superavit na U. E. P. é dirigirmo-nos de olhos fechados para desvalorizações, para cotações itinerantes do escudo.

E este é que é o problema fundamental, e não o das sobre valias.

Eu não defendo o congelamento, mas sim uma medida ecléctica, e a solução é esta: congelar ao mínimo e equilibrar ao máximo.

O Sr. Botelho Moniz: - E aquecer ao máximo ...

O Orador: - Congelar ao mínimo, repito, procurando dirigir corporativamente os investimentos, aquecê-los, sim, no cadinho nacional, e não na forma anárquica individual, não criar sucedâneos das caixas de previdência continental.

A neutralidade do fisco colonial criou os penicilino-resistentes, a pagarem pelos seus rendimentos reduplicados.

O Sr. Melo Machado: - Mas todos nós sabemos bem que pagamos pelos nossos rendimentos.

O Orador: - Aqui, no caso, estamos a pagar todos nós pelos rendimentos dos outros!

O facto é que o ponto de vista unilateral do Sr. Carlos Mantero não é de admitir, pedindo-lhe que, se voltar a falar sobre este assunto, seja mais construtivo e nos traga uma solução clara sobre este importante problema, que não é das sobrevalorizações, mas o monetário - a defesa do escudo, que é de todos nós e até dos próprios que reclamam, a quem por ricochete esta desvalorização iria atingir mais do que o congelamento, que, repito, explico mas não defendo.

O Sr. Presidente: - Peço a V. Ex.ª o lavor de abreviar as suas considerações.

O Sr. Carlos Moreira: - Eu acho que realmente o Sr. Deputado Carlos Mantero fez uma construção.

O Orador: - Terminando: se não ratificar é uma construção, todas as formas negativistas o serão!

Depois do telegrama do Sr. Presidente do Conselho aos organismos económicos angolanos votarei a ratificação, com emendas ou sem emendas, com a certeza absoluta de que se fará justiça aos legítimos interesses dos coloniais, que pretendem:

1.º Equiparação dos comerciantes e agricultores no mesmo mecanismo tributário graduados pela , reaquivalência duma mesma taxa;

2.º Fácil mobilização por parte das actividades económicas da verba de retenção proposta no Decreto-Lei n.º 38:704;

3.º Fixação do valor-base para todos os produtos atingidos em termos de assegurar os encargos de produção, nos quais deverão incluir-se os impostos de toda a ordem que já os oneram ou venham onerar: mão-de-obra (brancos e indígenas), embalagens, capital investido, transportes até aos portos, comissões de venda, seguros, e os respectivos encargos bancários.

O Sr. Melo Machado: - V. Ex.ª diz que não concorda com a forma, mas vai aprovar.

O Orador: - As palavras do telegrama presidencial são um penhor certo de que o que se condena no decreto não ficará de pé. Se for aprovada a ratificação com emendas, terei, então o ensejo de as propor ou discutir.

As províncias ultramarinas merecem a nossa atenção económica, e o que sabemos estatisticamente delas só nos pode dar uma imagem deformada da realidade.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Botelho Moniz: - Sr. Presidente: não venho meter foice em seara alheia. Habitualmente escuso-me a versar assuntos ultramarinos, porque considero insuficientes, como experiência, quer o tempo que vivi em África, quer os cargos unicamente oficiais que ali desempenhei. Mas um grupo de importantes coloniais de Angola, das mais diversas actividades, aos quais não estou ligado por interesses económicos, solicitou-me que estudasse as suas reclamações relativas ao recente Decreto-Lei n.º 38:704, do qual poderá dizer-se que mais valia não ter sido publicado.

Encontram-se ausentes desta Assembleia os três Deputados por Angola. Um deles, o nosso ilustre colega Cardoso de Matos, gravemente doente, acha-se impossibilitado de assumir a defesa dos interesses legítimos dos seus eleitores. Os dois restantes, comandante Lopes Alves e capitão Teófilo Duarte, iniciaram há pouco, a bordo do Vera Cruz, a sua viagem de regresso do Brasil, desse Brasil maravilhoso e rico que o génio português descobriu, colonizou e lançou no caminho do progresso- desse Brasil para cuja recordação os Portugueses parecem ter criado expressamente a amargura da palavra «saudade».

Não possuo qualidades necessárias e suficientes para substituir os ilustres Deputados por Angola. Entretanto, procurei estudar o problema e fi-lo demoradamente. Depois de ouvir opiniões pró e contra, venho assumir atitude clara e franca, em voz alta mas sem violência contraproducente, sem palavras emocionais de revolta ou de aplauso, mas também sem tibiezas de expressão.

Considero o Decreto-Lei n.º 38:704 a ameaça mais grave e perigosa para o progresso económico e financeiro das nossas províncias ultramarinas.

Vozes: - Muito bem!

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O Orador: - Diz-se no seu preâmbulo, com optimismo exagerado e generalização menos certa, que as províncias ultramarinas estão a atravessar período de prosperidade excepcional. Acrescenta-se que se torna recomendável evitar perturbações que possam resultar de imperfeitas aplicações de ganhos inesperados e, ao mesmo tempo, acautelar, empregando-os para fins estáveis, uma parte dos lucros presentes.

Promulga-se a necessidade de aproveitar os excessos dos lucros, retirando deles pequena parte (este e pequena parte», apesar de escrito a sério, parece-o no sentido irónico) com a qual o Estado possa realizar obras de «fomentos» (no plural para reforçar a ideia), deixando o restante para o proprietário, embora com fracção sujeita a ser aplicada segundo planos aprovados pelo Governo.

Apresso-me a fazer justiça às boas intenções do legislador. Contudo, em matéria de administração de empresas agrícolas, industriais, comerciais ou mineiras - de boas intenções andam cheios os tribunais de falência.

Teorias, doutrinas e planos aliciantes, ideias sedutoras que iluminam estudiosos, não resistem, muitas vezes, à aplicação prática.

Fala-se muito em certos meios nos lucros mirabolantes realizados em café, sisal e outros produtos ultramarinos.

Há quem os inveje e quem os ache óptimos. Apesar de nunca ter ganho um ceitil naquelas mercadorias, honro-me de pertencer ao grupo de pessoas experientes e ponderadas que considera útil e justa uma retribuição, mesmo inesperada, mesmo aparentemente excessiva, àqueles que estão colonizando verdadeiramente e heroicamente a nossa África.

A alta de cotações não representa maná celestial caído por acaso sobre determinadas pessoas que não o merecem. É aguardada ansiosamente há muitos anos, como condição indispensável do progresso económico e fruto de todos os trabalhos realizados no passado..

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Os homens dinâmicos e ousados que os realizaram mereceram o prémio que hoje, e talvez por pouco tempo, estão recebendo. Forque?

Pelo simples facto de terem aplicado o seu esforço e arriscado os seus capitais em plantações ou explorações mineiras, lançando-se na colonização ou desenvolvendo as suas iniciativas em épocas de crise, de depressão, de desânimo ou de estagnação - exactamente quando os invejosos, os indiferentes, os cépticos e os preguiçosos dormiam o sono dos bem-aventurados.

Estão ganhando uma vez na vida, depois de muitos anos de sofrimento. Não lhes roubemos dos lucros mais do que o Estado já lhes leva. A existência daquele prémio constituirá incentivo forte a que sejam imitados, e fornecerá naturalmente às províncias ultramarinas novos colonos, novas energias, que se aplicarão e desenvolverão por forma gradual, à medida que o meio o aconselhe e o permita, sem sobressaltos, sem emigrações em massa ou excessivas, que tem sido sempre origem de desilusões e retrocessos.

Existem em Portugal muitos economistas teóricos e sonhadores. Gostaria que algum destes últimos se recordasse da história das vacas gordas e das vacas magras. E que a interpretasse como neste caso deve ser, isto é, partindo das vacas magras para as vacas gordas.

As nossas províncias ultramarinas agora atingidas, designadamente Moçambique, Angola e S. Tomé, sofreram crises económicas. Grande parte dos lucros ultimamente realizados tem servido para remediar as consequências dessas crises. Outra foi investida em novos empreendimentos, sem necessidade de patrocínio do Estado.

E graças a isso estava a fazer-se colonização. A população activa branca ia em aumento crescente. Angola passou de 44:083 europeus em 1940 para 78:903 em 1950. Moçambique contava 48:910 europeus em 1950, contra 27:438 em 1940.

Ainda com outra parte das receitas começavam a constituir-se reservas livres, voluntárias e prudentes, para quando voltar o tempo das vacas magras.

E só parcela insignificante se desperdiçou em melhoria do nível de vida, ou artigos de luxo, se acaso pode classificar-se luxo ou desperdício o colono português usufruir, finalmente, e talvez a curto prazo, aquelas regalias que se conquistam com a iniciativa e o esforço. Regalias que, afinal, se traduzem em trabalho concedido e remunerado a outrem. Porque convém não esquecer a velhíssima e exactíssima definição de que o luxo constitui imposto que os ricos pagam aos mais pobres.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mas acaso não recebia já o Estado a sua quota-parte, e bem avultada, destes lucros?

A reforma tributária de Angola rendeu, em 1951, além das receitas previstas, um excesso de 350:000 contos sobre a previsão orçamental. Porque não aumentar o Fundo de Fomento e Povoamento com estes saldos orçamentais, que são directa e indirectamente resultantes da sobrevalorização dos produtos?

Para que criar novos impostos contra a promessa categórica então feita pelo Estado?

As taxas aduaneiras de exportação para o estrangeiro são muito altas e estabelecidas ad valorem. Portanto, o Estado sempre tem ido a beneficiar com a maior valia dos produtos.

Mas nem toda esta sobrevalorização constitui lucro. Além do agravamento dos impostos já assinalado, houve enormes aumentos de encargos; visíveis e invisíveis. Em Angola - afirmam-no os organismos económicos da província - o custo da mão-de-obra, principal encargo da produção, é hoje três vezes superior ao de 1949. Este acréscimo de custo da mão-de-obra representa aumento do poder de compra do indígena, de que beneficiam largamente, não só o comércio local, mas também, e principalmente, a indústria metropolitana que o abastece. E, lá como cá, vamos matar a galinha dos ovos de ouro. Por isso, a solução do problema também interessa à metrópole.

Por outro lado, porque as cotações em 1949 de alguns produtos, como, por exemplo, o cacau, eram excessivamente baixas, a comparação com os preços actuais, conforme o podem certificar todas as pessoas que ainda não esqueceram a aritmética, torna-se nitidamente desfavorável aos produtores.

Em relação ao cacau, o preço de 1949 era de franco prejuízo ou pequeníssimo lucro, sob condição de se levarem em conta umas coisitas que certos economistas oficiais quase nunca consideram, e que se chamam «encargos de capital» e «amortização de instalações». Por consequência, há que deduzir à sobrevalorização aparente, não só o acréscimo de impostos, mas também o prejuízo anterior da mercadoria.

Claro está que, em presença destas alegações, logo os ilustres defensores do Decreto-Lei n.º 38:704 exigem, com ar superior, fero e tremebundo:

Indique custos de produção!

E pedem curvas de preços, paralelas, divergentes ou em ziguezague, aquelas curvas muito emaranhadas que usam os estatísticos para que ninguém os entenda, tão emaranhadas como carapinha de preto e outras coisas que VV. Ex.ªs adivinham.

Pois não faço a vontade aos ilustres arguentes. Não indico custos de produção, porque nem eu, nem SS. Ex.ªs,

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nem qualquer outra pessoa pode indicá-los com segurança. Todos os números que se generalizam oficialmente como custos de produção agrícola são falsos em economia prática, porque ou representam casos isolados, ou estimativas pouco seguras, ou médias que, exactamente por serem médias, não servem na cabeça de ninguém. Em 8. Tomé os custos de produção do cacau e da copra variam de roça para roça e de ano para ano. Em Angola sucede igual com o sisal e o café. Lá por Moçambique acontece a mesma coisa. Se a colheita de 1949 fosse dupla da de 1952, o menor preço de 1949 poderia haver sido mais lucrativo do que o de 1952.

Mas, parafraseando a regra universal de quem acusa prova, parece-me que aos instituidores ou defensores do princípio revolucionário da sobrevalorização pertence o dever de demonstrarem a sua viabilidade e indicarem com exactidão os números que serviram de base às disposições do legislador.

O Sr. Tito Arantes: - Quanto ao aspecto jurídico em matéria de prova, devo dizer que ao autor incumbe provar, os factos de que deduz o seu pedido e ao réu - embora - aqui não haja réus - incumbe provar os factos em que baseia a sua defesa.

O decreto faz a afirmação incontestável de que houve uma sobrevalorização e que os produtos se vendem hoje mais caros do que em 1949.

Quem combate o decreto alega que essa sobrevalorização não corresponde a um lucro líquido maior, porque o preço da produção também aumentou?

Pois, como matéria de defesa, é a quem faz esta afirmação que incumbe prová-la.

O Orador: - Não tenho, como V. Ex.ª, a experiência do foro, mas ...

O Sr. Tito Arantes: - Será a única que tenho a mais do que V. Ex.ª

O Sr. Pinto Barriga: - Tem sido um grande advogado oficioso!

O Sr. Tito Arantes: - Eu limito-me apenas a pôr a questão do ónus da prova. Quem alega que há um maior custo de produção é que tem de o demonstrar.

O Orador: - V. Ex.ª quer fugir à prova. Os partidários do decreto-lei devem fornecer a prova de que existe sobrevalorização inconveniente. E, por enquanto, não conseguiram fazê-lo.

O Sr. Tito Arantes: - Eu sómente pus uma questão jurídica.

O Orador: - Quando os partidários do decreto-lei me apresentarem números - rebatê-los-ei. E então se verá quem vai derrapar nas curvas ... de preços ...

Classifiquei de revolucionário o princípio da maior valia, e julgo que não me engano muito.

Dizem-me que foi enunciado pela primeira vez por economista muito distinto, que, conforme verifico, começa 4 a possuir adeptos nesta Assembleia: um senhor, chamado Karl Marx, que embirrava com o capital... dos outros. Lês beaux esprít» se rencontrent! Os campeões do espiritualismo de mãos dadas com o inventor do materialismo histórico!

Parece também que um político liberal inglês, Lloyd George, tentou pôr em prática o sistema. Mas os ingleses de então recordaram-se da história das vacas magras. Pensaram que o Estado não paga os prejuízos sofridos por comerciantes, industriais e agricultores, pois sempre alega que são riscos próprios das actividades económicas.

Portanto, também não deve levar-lhes todos os lucros, sob pena de estagnarem e de falirem nos anos maus.

Outro aspecto da questão a que voltarei a referir-me: muitas vezes os lucros do café, do sisal, da copra ou do cacau servem para compensar prejuízos noutras culturas ou actividades do produtor. É que às províncias ultramarinas tem sido imposto, desde há largos anos, o fornecimento à metrópole, a preços muito inferiores às cotações mundiais, de contingentes importantes de oleaginosas. É ainda que, graças a um daqueles bons contratos que os técnicos do Estado sabem impor e realizar, durante quase toda a segunda guerra mundial os americanos nos levaram o sisal de Angola a preço baixíssimo, que chegou a não pagar as despesas de exploração.

Uma espécie de negócio de Furness aplicado àquela fibra. Desta feita, em vez de navios, cordas para enforcamento da nossa economia.

Sr. Presidente: não haverá plataforma possível de entendimento ?

No caso presente, que pretendemos todos?

Canalizar para as províncias ultramarinas os excessos demográficos da metrópole, criar ambiente económico para o seu aproveitamento além-mar, explorar e dinamizar riquezas potenciais, tornar cada vez mais portuguesas as nossas províncias de África, da Ásia e da Oceânia, melhorar o nível de vida das suas populações nativas e colonizadoras, em suma, fazê-las progredir espiritual e economicamente.

Como consegui-lo?

Evidentemente atraindo a essas províncias, em vez de funcionários socializantes e atrofiadores, a activíssima iniciativa particular.

E como atraí-la?

Pela miséria, pelas peias burocráticas, pelas regulamentações excessivas, por intermédio de contribuições pesadíssimas, por meio de precedentes perigosos e ameaças latentes?

Não! Pela riqueza, pela esperança de melhores dias, pela liberalização do trabalho e da produção, pela isenção de impostos, pela administração simples, benévola, colaborante e incitadora.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Política de atracção e de fixação de capitais, em vez de medidas violentas.

Política económica tradicional, sem artifícios contraproducentes, em vez de exigência de sacrifícios incomportáveis.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Dinheiro para fomento oficial obtido não por impostos, mas por empréstimos, para não sacrificar apenas a geração actual a obras reprodutivas no futuro, e empréstimos realizados quanto possível fora da província para não retirar capitais à iniciativa privada local.

Ouvi aqui afirmar, com intenso espírito apostólico e não menor desconhecimento das realidades económicas, que a missão colonizadora e civilizadora dos Portugueses não deve ter como base o lucro comercial ou industrial. Não me atrevo a responder que os Americanos pagam o café com padre-nossos e o sisal com ave-marias. Mas sempre afirmarei que nem só de apostolado vive o homem, mesmo quando leva a cruz de Cristo nas caravelas.. E que todas as obras missionárias e todos os melhoramentos sociais são impossíveis, ou condenados ao fracasso, se não assentarem em firme alicerce financeiro e económico.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não vos arrepeleis contra o espirito d« lucro - porque o lucro transforma-se em riqueza e a

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riqueza, directa ou indirectamente, é a única fonte segura de melhor nível geral de vida.

Se as províncias ultramarinas estão, ou estavam, a atravessar período de excepcional riqueza - e a generalização do decreto foge à realidade, porque nem todas o estão -, abençoado seja esse período, e nada façamos para o perturbar!

Seria essa prosperidade o melhor atractivo para novos colonos, novas iniciativas, novos empregos de capital, novos dadores de trabalho.

Se a interrompermos, se criarmos desânimos, se suspendermos sobre o esforço titânico dos que produzem a espada de Dâmocles dum complicado e pesadíssimo imposto paralisador-,quem se atreverá daqui para o futuro a exercer em África as suas actividades ou a colocar ali os seus capitais?

O Sr. Mário de Figueiredo: - No movimento de ideias de V. Ex.ª desde que a sobrevalorização não seja uma consequência da própria exploração agrícola, o atractivo do lucro conduzirá a alargar desmedidamente a exploração, e assim, desaparecidas as circunstâncias excepcionais que o determinam, à criação, a breve trecho, de um estado de crise incomportável.

O Orador: - O fenómeno será precisamente igual quanto ao Estado. O emprego dessa sobrevalorização realizada pelo Estado através do tal Fundo de Fomento conduzirá aos mesmos resultados ...

O Sr. Mário de Figueiredo: - Não está a responder, mas suponho que V. Ex.ª pode responder. Uma coisa é empregar um sobrelucro em obras de fomento geral e outra coisa é ser atraído pelo rendimento excepcional de determinada exploração e alargar a sua extensão. O alargamento da extensão da exploração nessa hipótese pode conduzir precisamente - desde que o lucro não é uma consequência da própria exploração, mas de situação anormal- a que a um período bom se siga um período mau em que se assista ao desaparecimento de todos os capitais investidos.

O Sr. Proença Duarte: - Parece-me que para as colónias não se apresenta esse perigo.

O Sr. Carlos Moreira:-A observação do Sr. Dr. Mário de Figueiredo pode ser impressionante para quem não conheça as colónias, mas eu conheço o que é a vastidão das nossas possessões ultramarinas, e o seu desenvolvimento ainda pode ser maior, e muito maior, sem prejuízo de qualquer ordem. Quem comparar o pequeno território metropolitano com aquelas vastidões vê que não tem razão de ser as considerações que acaba de fazer o Sr. Dr. Mário de Figueiredo.

O Sr. Pinto Barriga: - O capitalismo não se inventou só para os territórios ultramarinos.

O Orador: - Concordo inteiramente com a observação do Sr. Dr. Carlos Moreira e desejaria acrescentar-lhe o seguinte: as exportações de sisal, de café e de outros produtos são parte ínfima da produção mundial. Evidentemente, mesmo que dupliquemos a nossa produção, ainda continuaremos a ser parcela muito ínfima do comércio internacional.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Estou de acordo com V. Ex.ª Quer dizer, esse é um princípio de resposta. Simplesmente, com a produção reduzidíssima que temos, já temos passado por crises graves. Seriam mais graves se a produção fosse maior.

O Orador: - Perfeitamente, de acordo. Mas porque atravessámos essa crise? Unicamente porque os produtores foram encontrados sem as reservas financeiras indispensáveis!

O Sr. Mário de Figueiredo: - Não pode responder assim se se lembrar que em certo momento, para se salvar o mercado do café, foi preciso queimá-lo ou mandá-lo para o fundo do mar.

O Sr. Carlos Mantero: - Parece-me que a grande produção de café nessa altura foi devida à interferência do Estado brasileiro na cotação do café, pois estimulou preços altos, que não puderam depois ser mantidos. Quanto à borracha, o facto deveu-se à entrada em exploração das instalações da Indonésia e dos próprios países onde a borracha é explorada.

No entanto, a situação agora é diferente.

O Sr. Proença Duarte: - Estou a ver é que a lavoura, lá, como cá, não pode ganhar dinheiro!

O Orador: - Pelo princípio do Sr. Deputado Mário de Figueiredo, é efectivamente assim. A lavoura e a indústria nunca mais poderiam desenvolver-se, por falta de reservas ou pelo receio da sobreprodução ou das crises futuras ...

O Sr. Mário de Figueiredo: - V. Ex.ª não tem o direito de me responder assim, porque sabe muito bem que eu não apostolizo esse princípio, assim como não apostolizo a inversa: o que entendo é que a agricultura deve, como as outras actividades económicas, propugnar pelo lucro legítimo correspondente ao preço justo. É a nossa doutrina constitucional.

Não se trata de ser grande o lucro, mas de só ò lucro se ter em vista, buscando-o seja como for. É a doença do capitalismo.

O Orador: - V. Ex.ª acusa a indústria e a agricultura de usufruírem lucros desmedidos ...

O Sr. Mário de Figueiredo: - Não estou a acusar. O que se não pode é afirmar, como se tem afirmado aqui, que se deve deixar ao mecanismo automático da concorrência dos mercados fixar os preços num meneado como o nosso. Tem-se afirmado aqui, inclusivamente através de apartes: «Deixem ganhar, deixem ganhar. O importante é ganhar».

O Orador: - Não digo, e V. Ex.ª não me ouviu dizer, deixem ganhar demasiadamente. Eu digo deixem ganhar como compensação de prejuízos passados. Deixem ganhar para criar reservas para o tempo das vacas magras. Nós não temos força, infelizmente, para dominarmos os mercados mundiais! Mas não podemos conceder ao estrangeiro o bodo de lhe vendermos os nossos produtos mais baratos que as cotações internacionais, simplesmente pela razão de estarmos a ganhar demasiadamente.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Não é disso que se trata.

O Orador: - Repare V. Ex.ª que quando fazemos importações de ferro, aço e mil e uma matérias-primas também as pagamos com sobrevalorização formidável. Isso nos leva grande parte dos lucros supostos!

Mas, se VV. Ex.ªs me dão licença, vou prosseguir nas minhas considerações.

Repare-se que as imposições do Decreto-Lei n.º 38:704, por enquanto restritas ao cacau e copra de S. Tomé, café, sisal, manganês e semente de algodão de Angola, copra, sisal, castanha de caju e semente de algodão de Moçambique, poderão estender-se, por simples portaria, a quaisquer outras mercadorias ou províncias.

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Significa isto que se encontra ameaçada toda a produção ultramarina, e que pode bastar uma alta de cotações internacionais, ou uma subida aparente dos lucros comerciais dos produtores, ou uma simples penada burocrática, para que grande parcela do produto das vendas constitua receita definitiva do Estado, e outra parcela ainda maior fique à ordem do mesmo Estado, congelada, imóvel, paralisada, apodrecida ou inutilizada, sem que a iniciativa particular possa aproveitá-la rápida e oportunamente.

E os industriais, os agricultores, os mineiros, os comerciantes serão forçados a aguardar que Sua Majestade o Estado omnisciente lhes ensine como se faz indústria, como se faz agricultura, como se exploram minas ou se realiza comércio.

Nunca, na ferra livre de Portugal, se foi tão longe em matéria de intervencionismo. E agora, não em nome de Angola, mas no de todos os industriais, comerciantes e agricultores da nossa pátria, daqui declaro aos burocratas que não lhes reconheço competência para nos ensinarem a exercer, no pormenor, as nossas profissões.

Quero abrir excepção muito honrosa relativa a grande número de funcionários de Angola, directamente em contacto com o meio, que, em cartas expressivas que tenho lido, mostram conhecer as realidades.

Salazar, que tanto tem condenado a hipertrofia do Estado, escreveu um dia algumas palavras no livro de honra de uma instituição privada que inesperada e demoradamente visitou.

Tenho-as de cor. Nunca as esquecerei:

O Estado deve aproveitar os ensinamentos da competência particular.

Esta declaração do grande Chefe fez terminar um período de incompreensão de certo departamento do Estado acerca duma iniciativa privada de utilidade geral. E a partir dela, graças à intervenção de Salazar, tudo começou a correr bem. Os dois serviços, oficial e particular, passaram a entender-se, a auxiliar-se e a colaborar com prontidão e eficácia.

O Estado procurara dominar, sem ter razão para isso. Salazar acudiu em defesa da iniciativa privada, depois de examinar cuidadosamente a questão.

Precisamos corrigir o nosso complexo de desconfiança em relação ao Estado. Mas também é indispensável que a administração pública nos ajude a isso e não se confine à burocracia. Procure a colaboração dos técnicos particulares, ouça-os - e, depois de ouvi-los, não os despreze como inúteis.

Assistimos há pouco, em grande país da Europa latina, ao milagre de um industrial, elevado à Presidência do Conselho, ter posto ordem financeira e económica no governo do seu pais, dilacerado pelos dissídios dos políticos. A voz da realidade conseguiu fazer-se ouvir - mas só depois de quantos prejuízos irremediáveis! Vemos, correntemente, nos Estados Unidos, que os dirigentes mais experimentados da administração particular são chamados ao exercício dos altos cargos públicos.

Portugal diz-se país corporativo. Entretanto, à agricultura, ao comércio e à indústria nem sequer se lhes deixa a oportunidade de administrarem os seus próprios bens! Os organismos corporativos estilo pejados de comissões administrativas, e os homens mais representativos e mais experimentados das actividades económicas nada valem em comparação com jovens teóricos e burocratas.

Chama-se a isto fomentar a iniciativa privada? Ou não será antes caminhar cada vez mais velozmente para o socialismo de Estado, isto é, para vida parasitária?

Sr. Presidente: expressas estas generalidades, vamos à especialidade.

Visa o Decreto-Lei n.º 38:704, segundo o preâmbulo respectivo:

1.º Evitar perturbações que possam resultar de imperfeitas aplicações de ganhos inesperados;

2.º Empregar para fins estáveis uma parte dos lucros presentes.

Quanto ao primeiro número, afirmam os colonos de Angola que não se registam ali quaisquer indícios de perturbação, o que pode ser confirmado pelos relatórios do respectivo Banco emissor.

Por minha parte acrescentarei que a inflação que se temia, a imperfeita aplicação de ganhos inesperados, foi substituída, nas províncias ultramarinas e na metrópole, por outras perturbações muito mais graves:

A simples publicação do Decreto-Lei n.º 38:704, ainda antes de entrar em execução, já está dando os resultados seguintes:

a) Queda acentuada e continuada de valores na Bolsa de Lisboa, sem exclusão dos próprios fundos do Estado-porque a economia particular se assustou;

b) Suspensão quase completa de encomendas das províncias ultramarinas na metrópole. (Estavam comprando aqui anualmente 1.700:000 contos de mercadorias. O sen poder de compra diminuiu, em prejuízo da indústria metropolitana) ;

c) Paralisação de todos os novos investimentos de capital em empresas ultramarinas, quer por não ser possível realizá-los a partir do momento em que o Estado congela forçadamente grande parte do produto das vendas, quer por se ignorar a aplicação que o Estado vai dar aos capitais que obriga a imobilizar;

d) Paralisação das transacções das mercadorias abrangidas pelo decreto-lei e retraimento da produção ou de compras nas que podem vir a sê-lo. Baixa de preços consequente no mercado interno ultramarino. Veja-se o que já aconteceu em Angola à cotação do café, segundo telegrama publicado no Jornal do Comércio e das Colónias.

Não abordo aqui as perturbações de ordem política - porque já ninguém as ignora hoje. No que respeita a tempestades económicas futuras, falarei a seguir.

Quanto ao n.º 2.º (emprego para fins estáveis de uma parte dos lucros presentes), esses fins, muitos dos quais são de estabilidade duvidosa, acham-se definidos no artigo 4.º, que cria o Fundo de Fomento e Povoamento, no artigo 7.º, que fixa as condições de emprego dos capitais particulares imobilizados à ordem do Estado, e no artigo 8.º, que declara quais são as obras de fomento e povoamento.

Desde que Daudet descreveu a tentativa memorável de colonização maciça realizada por Tartarin em Port-Tarascon, e desde que verifiquei os resultados da experiência romana de Calígula - sinto-me cheio de medo quando ouço falar em grandes obras reprodutivas de fomento e povoamento.

Ainda recentemente, segundo ouvi dizer, a tentativa efectuada pelo Caminho de Ferro de Benguela se malogrou, apesar de impulsionada com alma e seriedade.

O Sr. Carlos Mantero: - Nem todos os colonos que para lá foram estão independentes e florescentes ...

O Orador: - Fiz justiça à iniciativa do Caminho de Ferro de Benguela afirmando que se realizou com alma e seriedade. Talvez por isso, alguns dos novos colonos conseguissem ter subsistido.

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O Sr. Carlos Moreira: - A maioria dos colonos que foram para a Companhia de Benguela furam mal sucedidos. Só uma minoria conseguiu realmente ir para a frente.

O Sr. Melo Machado:-Não foram senão nove colonos, de modo que não podia deixar de ser como V. Ex.ª diz, Sr. Deputado Carlos Mantero.

O Orador:-Construir barragens e não ter colonos que as aproveitem.- não será obra reprodutiva. Armazenar água e não aproveitar a terra, como está sucedendo na Idanha - não ó, pelo menos por enquanto, obra reprodutiva. Efectuar trabalhos que oneram por tal forma o valor da terra que ou os proprietários ficam arruinados ou o Estado perde* grande parte do dinheiro que gastou - não é obra reprodutiva. Tentar colonizações de brancos em climas impossíveis para pretos - não é obra reprodutiva. E assegurar a defesa económica do colono, retirando-lhe os capitais, os meios de trabalho e os lucros que poderiam animá-lo a colonizar - parece obra ainda menos reprodutiva.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-No que toca aos capitais imobilizados forçadamente, mas que continuam em propriedade teórica dos exportadores particulares, a aplicação sómente poderá ser autorizada pelo Ministro do Ultramar ou por delegação deste, com a autorização do Governo da província.

Que resulta daqui? Que o alargamento ou aperfeiçoamento das instalações ou propriedades agrícolas, comerciais ou industriais, ou o emprego dos fundos cativos noutros empreendimentos de utilidade para a economia geral, passam a depender de licença governativa. E todos nós sabemos com que facilidade, rapidez e igualdade de critérios estas licenças costumam ser concedidas.

Toda a obra colonizadora de iniciativa privada demorará, se não parar por completo. A compra da mais simples máquina, as plantações, as edificações, tudo necessita da chancela oficial, que, para mais desespero, poderá ficar definitivamente em Lisboa. Quantas deslocações dentro das províncias, quantas viagens à metrópole, quanto dinheiro, quanto tempo, quantos trabalhos perdidos!

Mas, como se isto não bastasse, instituiu-se, para uso ultramarino, o princípio terrível do empréstimo obrigatório, por meio de subscrição forçada de títulos emitidos pelos governos provinciais. E daqui resultará, além da contribuição para a queda de valor dos títulos de Estado emitidos na metrópole, por menor procura, o desvio dos capitais particulares para obras impostas oficialmente, em detrimento das empresas privadas e do valor das acções respectivas.

Se as condições económicas e financeiras da província ultramarina forem sãs, não se tornam necessários empréstimos obrigatórios, porque os voluntários serão subscritos. Se se der o contrário, os títulos baixarão do tal modo, pela necessidade de realização de capitais, que assistiremos à repetição das artes mágicas de Law - o grande financeiro a quem a França ficou devendo o fomento e a riqueza do papel do embrulho em que as suas acções se transformaram.

Ficaram apontados, com muita brevidade, porque o tempo é escasso, os objectivos do Decreto-Lei n.º 38:704 e algumas das observações que eles me merecem.

Continuando ainda na análise da especialidade, vejamos agora quais os meios de execução do diploma.

A sobrevalorização das mercadorias consideradas, ou a considerar, para eleitos de imposto, é baseada na diferença entre as cotações das Bolsas de Londres e de Nova Iorque e o valor médio das cotações do ano de 1949.

Será determinada periodicamente pelo conselho técnico aduaneiro da respectiva província, ouvidos os organismos económicos designados em portaria pelo governador. Das resoluções desse conselho é admissível recurso.

Continua aqui a espada de Dâmocles suspensa sobre o exportador.

Em primeiro lugar não se definem, nem de resto podem definir-se, as durações dos períodos de fixação das taxas de maior valia. Acontecerá certamente, em épocas de variações bruscas de cotações internacionais, que o Estado não conseguirá acompanhar em velocidade essas variações, e fixará as maiores valias tarde e a más horas. O exportador viverá, permanentemente, em regime de incerteza, porque, dum momento para o outro, as taxas deverão ser modificadas. Toda a economia da província se ressentirá em prejuízo dos produtores, especialmente dos pequenos e médios, porque, por defesa natural, terá de haver nas compras internas grande margem de cobertura dos riscos.

Em segundo lugar, o que significa a expressão vaga «na base das cotações das Bolsas de Londres e de Nova Iorque» ?

Começo por fazer notar que estas duas cotações divergem enormemente. Em seguida, recordo que há que introduzir-lhes, como elementos de correcção, os valores dos fretes marítimos e dos seguros, que são muito variáveis. Finalmente, quanto a este detalhe, existem cotações, especialmente em Londres, que são puramente fictícias em relação às transacções normais, e mercadorias, como o manganês, que não são cotadas nas Bolsas de Londres e de Nova Iorque.

Claro está que eu não possuo a altíssima competência da burocracia em assuntos comerciais. Mas, mesmo que a possuísse, ver-me-ia em palpos de aranha para definir, de forma justa, rápida e oportuna, o quantitativo da sobrevalorização.

Quanto ao recurso admissível, a que com entusiasmo de advogado aqui se referiu o nosso ilustre colega Dr. Tito Arantes, já alguém pensou que é expediente demorado, incompatível com a variação diária das cotações internacionais?

Os negócios resolvem-se em minutos, ou horas, tratam-se por telegramas e não poderão esperar, sob pena de se perderem oportunidades que não voltam.

Já nos custa tanto exportar... Por Deus, não nos sobrecarreguem com novos trabalhos e demoras! Só quem conhece o tempo que se perde em coisas oficiais escusadas, pode dar valor aos escassos minutos que nos restam para o trabalho útil de cada dia -..

Continuemos na análise.

Sobre a importância da maior valia apurada ou fixada pelo conselho técnico aduaneiro recaem os encargos de 7õ por cento no caso de a exportação ser realizada pelo produtor da mercadoria, ou de 85 por cento se a mesma operação for efectuada por exportador comerciante.

Aqui arde Tróia. E arde com muito calor e muito fumo, porque é perigoso brincar com o fogo. Este diferencial de 10 por cento entre produtores o exportadores torna-se incompreensível e injustificável, por variadíssimos motivos que vou expor.

Diz-me a lógica que o beneficiário principal da maior valia prolongada ou constante dum artigo não pode deixar de ser o produtor respectivo. Se o custo de produção é inferior ao de venda, o primeiro a ganhar com isso será o produtor. O comerciante, exportador ou não, salvo casos esporádicos de especulação e dos riscos consequentes, só aumentou os seus lucros em função do resultado da percentagem que cobra. Portanto, sob este ponto de vista, não há que estabelecer diferencial de taxa entre produtor e comerciante.

Se a parte principal da maior valia coube ao próprio produtor, como pode o comerciante exportador, cuja

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margem normal de lucros é muito menor, pagar taxa superior? Este argumento seria bastante para condenar definitivamente o diferencial. Mas há outros - moral e económicamente mais graves.

Pela mecânica do decreto-lei o comerciante exportador entrega 17 por cento de sobrevalorização para o Fundo de Fomento e 42,5 por cento para depósito obrigatório. Indico estes números finais para clareza de exposição. Representam, respectivamente, 20 e 50 por cento de 85 por cento.

Ora, quanto aos 42,5 por cento imobilizados, fica com direito a recebê-los, quer sob a forma de títulos de empréstimo forçado provincial, quer para aplicação em obras próprias de alargamento agrícola, comercial ou industrial. Hás como não pode adivinhar quando receberá aquele depósito, ou por que valor real o receberá, é evidente que, nas compras de pequenas porções a produtores indígenas ou outros de fraca personalidade social ou económica, deduzirá pura e simplesmente os tais 42,5 por cento e comprará mais barato. Os produtores médios e grandes exportarão directamente ou contratarão com o exportador a restituição dos 42,5 por cento, quando este os houver do Estado.

Mas não é prático nem fácil tal contrato. E tudo redundará no seguinte: nalguns casos, o exportador beneficiará, indevidamente, dos 42,5 por cento extorquidos aos pequenos produtores incapazes de exportar de conta própria. Mas em relação aos grandes da terra o comerciante ficará gravemente prejudicado - porque a exportação passará a ser feita directamente pelos produtores. E, noutros casos ainda, veremos aumentar, por encanto, as produções agrícolas e mineiras: para fugirem ao pagamento do diferencial de 10 por cento, as exportações passarão a ser feitas em nome de produtores.

O comércio exportador ou se servirá da fraude e de cabeças-de-turco, ou ficará pura e simplesmente eliminado.

Ainda outro esclarecimento: em todas as províncias ultramarinas existem produtores poderosos que normalmente possuem serviços próprios de exportação.

As grandes empresas mistas poderão substituir automaticamente o simples comerciante exportador e apresentar como sua mercadoria adquirida a outrem.

Significa isto, sem rodeios, sem subterfúgios, como coisa inevitável e clara, que o Decreto-Lei n.º 38:704, principalmente instituído para assegurar a defesa económica do pequeno colono, para concorrer para o seguro social desse mesmo colono, para subsidiar pequenos empreendimentos, para ensinar e formar novos colonos nacionais, também económica e naturalmente frágeis, contraria a sua própria finalidade, e tende a entregar aos colossos já instalados o pluripólio das exportações, eliminando concorrentes, reduzindo preços no mercado interno, dificultando e complicando as transacções - em resumo, colocando cada vez mais os frágeis na dependência económica dos fortes.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Por isso eles não agradecem este folar de Páscoa. Mas há ainda mais: o comerciante, exportador ou não, sofrerá prejuízo importante em todas as existências actuais de mercadorias. Comprou-as na ignorância das taxas de sobrevalorização, que terá agora que entregar definitivamente ao Estado ou imobilizar por tempo indeterminado.

Paradoxo supremo: é a ruína criada oficialmente em período de excepcional prosperidade!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Os compradores de propriedades adquiridas nos últimos anos são duramente afectados pela baixa de valor consequente ao Decreto-Lei n.º 38:704.
Aqueles que para comprá-las tiveram de recorrer ao crédito poderão ficar arruinados, por não realizarem o bastante para liquidarem os seus débitos - com grave risco dos respectivos credores bancários ou particulares. E os que investiram capitais próprios já hoje se encontram amargamente arrependidos de o terem feito. Não cairão noutra...

Uma palavra basta para definir a situação: pânico.

O pânico económico é difícil de dominar. Em momento em que muitos olhares e iniciativas privadas estavam a dirigir-se, ou iam dirigir-se, para as nossas províncias ultramarinas, a publicação do Decreto-Lei n.º 38:704 criou gravíssimo retrocesso. E p retraimento, consequência do susto, poderá durar anos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Afirma-o a VV. Ex.ªs um homem que ouviu os interessados, e que, felizmente, soube compreendê-los, porque vive os mesmos problemas e tem certa prática económica.

Prosseguindo no exame pormenorizado do Decreto-Lei n.º 38:704, irei referir-me agora a algumas das mercadorias por ele visadas, às condições do seu comércio e às injustiças ou desigualdades estabelecidas.

Quanto à copra, por agora não há maior valia. O legislador não poderia ter escolhido oportunidade melhor para incluí-la na lista. Esqueceu-se de conferir as contas e não viu que a cotação actual é inferior à média de 1949.

Mas a ameaça fica pendente e traduz-se na certeza da impossibilidade futura de. boa remuneração.

Repito o que afirmei: se o produtor perde, o Estado deixa-o perder; se ganha, o Estado leva-lhe os lucros. Que lhe ficará então?

Curioso registar que nenhuma das oleaginosas restantes, salvo a castanha de caju, foi incluída por enquanto na relação. Porquê? Porque os coqueiros estão plantados, e já não podem deitar-se abaixo. Mas a mancarra da Guiné ou a jinguba de Moçambique, o coconote de Angola e da Guiné e o óleo de palma dependem de cultura anual ou de extracção - e a experiência da política de preços ruinosos demonstrou que as culturas deixavam de fazer-se, ou a apanha indígena não se efectuava, ou os produtos exportavam-se de contrabando.

Significa isto que o Estado se acha possuído de dois critérios: quando apanha feitas instalações definitivas ou plantações duradoiras - criva-as de taxas e imposições. Se se trata de culturas anuais, fecha os olhos .. por enquanto.

Resultado: de futuro só empregaremos capital em empreendimentos que possam produzir remuneração e amortização imediatas. Por outras palavras: premeia-se a aventura, a agiotagem, a instabilidade, o oportunismo, em vez de se promover o verdadeiro fomento, a instalação definitiva, durável e francamente colonizadora. Exactamente o contrário da finalidade que se diz visada.

Mas nem por isso podem efectuar-se descansadamente culturas anuais. Nada nos diz que b algodão, o milho, o feijão, o arroz, a mancarra, a jinguba, o tabaco, etc., não venham, num final de colheita, depois de todas as despesas efectuadas, a ser também sacrificados com novas taxas de exportação.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, o melhor será deixar de produzir, e pedir ao Estado que, à maneira russa, tome conta das explorações, e nos dê um empregozinho, mal remunerado;, é verdade, mas onde, ao menos, iremos dormindo descansados.

Ainda quanto à copra, notemos que as exportações pouco subiram de 1938 para 1950. As de Moçambique e S. Tomé foram de 40:781 toneladas em 1938 e ape-

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nas de 47:830 toneladas em 1950. Quer isto dizer que nos últimos doze anos os proprietários de palmares não tiveram recursos para desenvolver as suas plantações. Portugal produz apenas cerca de 2,5 por cento da copra mundial, e não tem podido produzir mais por impossibilidade de concorrer com os preços que lhe são impostos nos mercados estrangeiros.

Eis outra razão para que a copra não fosse incluída na lista das sobrevalorizações, que, já vimos, no momento actual, quanto a ela, não existem. Mas, se vierem a aparecer, deixemos que elas sejam empregadas voluntariamente em novas plantações, ou no melhor tratamento e aproveitamento das agora exploradas. Sem lucro não pode haver incitamento.

Na província de Moçambique a copra exportada paga de impostos 20 por cento do rendimento.

Em S. Tomé pagava- em 1949, incluindo também os direitos aduaneiros, 29,94 por cento e em 1952 passou a pagar 37,20 por cento. Em 1938 pagava apenas 8,75 por cento. Veja-se em que formidável proporção aumentou a parte de leão do Estado!

Da sobrevalorização de que tanto se fala - e que nem sequer existe na copra - o Estado beneficiou, na realidade, pela quase quadruplicação de impostos ad valorem de 1938 para cá, e, por consequência, em muito maior escala em número de escudos por tonelada de mercadoria.

Analisemos agora, rapidamente,- o caso do cacau. Em 1949 pagava de verba fixa $69(48) por quilograma e 4 por cento ad valorem sobre a cotação de Lisboa. Em 1952 paga $52(73) de verba fixa, mas a verba ad valorem subiu para 8 por cento. Traduzido em quantia, isto dava 1$15 por quilograma em 1949, contra 2$45 em 1952, sem contar o imposto de defesa de 1 por cento sobre o lucro das empresas e a contribuição predial urbana. Portanto, também aqui o Estado já recebe boa parte da maior valia. As exportações de cacau de S. Tomé, que eram de 7:935 toneladas em 1938, baixaram para 7:852 em 1950. Não tive tempo de obter números relativos à exportação de 1951.

Repare-se agora: num mercado mundial que consome 700:000 toneladas anuais, pouco mais produzimos que 1 por cento. Porque não vamos além? Porque houve crises graves e as condições económicas da cultura não no-lo têm permitido, quer em S. Tomé e Príncipe, quer no enclave de Cabinda. Agora, quando parecia possível progredir, a machadada sobrevalorização causa pânico e prejuízos não menores que a epidemia da rubrocinta.

Ainda quanto ao cacau, um apontamento curioso. O preço médio de 1949 foi de 11$50 por quilograma. O de 1952 computa-se em 24$. Portanto, a sobrevalorização será de cerca de 12/300 por quilograma, dos quais 75 por cento, ou seja 9$37(5), servem de base de cálculo rios valores a entregar ao Estado com destino ao Fundo de Fomento e Povoamento e ao congelamento.

As contas estabelecem-se desta forma:

Entrega pura o Fundo de Fomento:
20 por cento de 9$37(5) ............. .... 1$87(5)
50 por cento para congelação de
fomento .................................. 4$68(75)
Direitos e outros encargos ............... 2$44(75)
Frete, seguro e tráfego .................. 1$44
Comissão ao agente ....................... $24
Sacaria .................................. $30

Soma destes encargos e imobilizações...... 10$99

Depósito de 30 por cento (Decreto n.º 38:659). ....... 7$20

Total geral dos encargos e imobilizações. ........ 18$19

Significa isto que, no caso de exportação para os países da (J. E. P., o produtor de S. Tomé, vendendo o cacau a 24$ o quilograma, disporá apenas da diferença entre 24$ e 18$19 por quilograma, isto é, de 5£81. Menos de um quarto do valor da venda, e quantia manifestamente insuficiente para fazer face às despesas de laboração.

Mas a lei obriga que 50 por cento do produto bruto da venda entrem em S. Tomé, para serem efectivamente gastos nesta província. Portanto, 12$ por quilograma, para os quais só há realizados 5$81. Quem põe o resto? Parece brincadeira, mas não é.

Torna-se impossível manter a legislação vigente. É paradoxal que o produtor tenha de entregar em S. Tomé mais do que recebe ...

Vejamos agora o caso do café de Angola. Exportaram-se apenas 17:468 toneladas em 1938 e exportaram-se, graças a Deus e aos cultivadores, que não ao Estado, 46:550 toneladas em 1950. Houve progresso notável na cultura e nas vendas, mas pouco mais possuímos que 3 por cento da produção mundial. Subiram muito os preços? É altamente remuneradora a cultura? Em muitos casos, sem dúvida. Mas quanto haviam sofrido, durante longos anos, os cultivadores!

O Estado aumentou os impostos a ponto tal que, segundo as contas de duas propriedades que me foram facultadas, passou a cobrar em 1952 mais ang. 70,65 por arroba do que cobrava em 1949. O aumento deu-se em direitos de exportação (ang. 27,40) e contribuições de produção (ang. 43,25). Os direitos de exportação médios de 1949 foram de ang. 18,80 por arroba, e nesse ano não havia ainda contribuição de produção.

O total dos impostos em 1952 é de ang. 89,45 por arroba, ou seja cerca de 6$ por quilograma, dos quais 4$71 são de aumento em relação a 1949. Ainda alguém acha que estes impostos não são bastantes?

Outra mercadoria. Sementes de algodão.

Queixavam-se amargamente os produtores nacionais de algodão de que estavam sendo esbulhados pela metrópole por efeito da obrigatoriedade de venda a preço muito inferior às cotações mundiais.

Deles se fez eco nesta Assembleia o ilustre Deputado Vaz Monteiro, que há dias surgiu defendendo o Decreto-Lei n.º 38:704.

Compreendi então S. Ex.ª Francamente, não o compreendo agora.

O Governo, com senso prático, quando viu a cultura declinar, aumentou algo os preços do algodão colonial em fibra, mas deixou-os ainda muito aquém das cotações mundiais, com risco de continuarmos a importar algodão estrangeiro.

Como, salvo erro, a semente de algodão costuma ser um dos- produtos dessa cultura, pareceria lógico deixar aos produtores, em compensação da menor valia que sofrem na venda da fibra para a metrópole, a sobrevalorização da semente. E só assim seriam animados a cultivar.

Mas veio o decreto-lei em causa extorquir-lhes essa compensação, com a agravante de o fazer quando eles estavam confiados em promessa de preço remunerador e se tinham preparado para a nova cultura.

É isto obra reprodutiva de fomento?

Duas palavras quanto ao sisal.

Exportámos quase 40:000 toneladas, contra 340:000 de produção mundial, ou seja cerca de 12 por cento desta produção. Mas as nossas exportações pouco aumentaram de 1938 para cá: foram então de 31:764 e subiram apenas para 39:470 em 1950. Verifica-se que a cultura não se desenvolveu como devia, por motivo dos factos que já apontei. Talvez fosse agora a altura de conseguir recursos financeiros para progredir. Mas o Decreto-Lei n.º 38:704 veio destruir todas as esperan-

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ças. Ninguém mais investirá capitais em novas plantações de sisal.

Passemos ao caso do manganês. Em 1938 Angola nada exportava. Em 1950 exportou 9:653 toneladas. Em 1952 colocámos no estrangeiro; pagas em dólares pelos Estados Unidos da América, 45:000 toneladas provenientes de Angola.

A Índia Portuguesa exporta manganês desde 1907, tendo atingido cerca de 60:000 toneladas em 1951.

Angola, apesar de só começar agora a exploração intensiva do seu minério, viu-o ferido mortalmente pelo Decreto-Lei n.º 38:704.

Por enquanto, o Estado da Índia foi exceptuado e beneficiou de isenção.

Que razões existem pára esta diferença de tratamentos, que não têm justificação económica?

Se apenas se encarou o problema político - o precedente estabelecido é condenável, porque fomenta imitações perigosas. Ou esta espécie de fomento separatista será também obra reprodutiva?

A bom entendedor meia palavra basta.

Conforme já demonstrei, discordo totalmente da sobretaxa de maior valia. Portanto, nunca quereria vê-la aplicada ao manganês da Índia.

Mas, industrialmente falando, uma exploração que data de 1907 pode estar consolidada, fortemente amortizada e ser susceptível de suportar novo imposto.

O mesmo não acontece em Angola. A empresa mineira que cometeu o erro de requerer a concessão ao Estado e empregar ali avultadíssimos capitais foi fundada em 1 de Janeiro de 1950, há pouco mais de dois anos. E criou-se unicamente porque o preço do minério tinha tendência para subir e tornava possível a exploração.

Quer isto dizer que os técnicos e capitalistas sómente consideraram viável o negócio a partir do aparecimento de cotação animadora. Se ela não existisse, não poderiam ter fundado a sociedade.

Mesmo que a remuneração seja óptima hoje, a novel empresa necessita de criar reservas para os maus dias de amanhã, preparar-se tecnicamente para reduzir custos de exploração e resistir a crises futuras, concluir uma obra que só a maior valia tornou viável e que o Decreto-Lei n.º 38:704 pode fazer soçobrar.

Para tal empresa o ano de 1949 nunca poderia servir de base, porque ainda não existia nessa época.

Eis o exemplo flagrante da falta de carinho do Estado pelas iniciativas privadas, mesmo recentes. Em vez de auxiliá-las nos primeiros anos de vida, por meio de isenção de impostos, nem sequer lhes deixa tempo para acabarem a instalação ... e mata-as quase à nascença.

Além disso, a tributação do manganês, designadamente a congelação do produto da venda, é nitidamente contrária ao disposto na lei de minas (Decreto de 20 de Setembro de 1906) e às cláusulas consequentes do contrato de concessão, que prevêem regime tributário especial.

Este exemplo do manganês será catastrófico para a futura exploração mineira em Angola; Ninguém que seja prudente e sensato se arriscará a novos empreendimentos enquanto perdurar a lembrança do agora legislado.

E aqui está como poderá perder-se a obra de colonização realizada por uma iniciativa privada que ousou antecipar-se praticamente ao espirito colonizador teórico do Decreto-Lei n.º 38:704.

Desde 1 de Janeiro de 1950, a empresacitada estabeleceu em Angola setenta empregados europeus e cinquenta pessoas de suas famílias. Construiu casas de habitação, hospital privativo, escolas, abastecimento de águas, saneamento, além de armazéns e edifícios industriais. Criou assim, pelo seu único esforço, em dois anos devida, um núcleo de colonização importante, com tendência a desenvolvimento crescente.

Pela ordem natural das coisas, para realizar rapidamente os seus planos, esta empresa previra a elevação do capital de 20:000 até 100:000 contos.

Portanto, os accionistas iriam investir mais dinheiro, muito mais dinheiro, na ânsia de andarem depressa e aproveitarem a oportunidade actual.

Com o Decreto-Lei n.º 38:704 tudo se modificou. Nesta e em todas as empresas manda a prudência que se aguarde o custeio das novas obras através das autorizações de utilização da parcela congelada das maiores valias. E só deverão realizar-se obras até ao valor dessas parcelas, como única forma de obter a sua restituição.

Se se for além, corre-se o risco ou de perder mais dinheiro, ou de sofrer novas desilusões. Se se completarem as obras, em vez de continuarmos levantando as imobilizações em dinheiro, receberemos títulos de um empréstimo foiçado - só vendáveis a preço de miséria.

Às palavras inflamadas dos defensores do decreto-lei e aos tropos oratórios de quem não vive todos os dias a economia prática respondo em linguagem rude de trabalhador.

Não procuro efeitos fáceis sobre as turbas, não busco o aplauso das multidões, aliciadas para o combate a lucros pretensamente excessivos.

Cada vez mais me repugna a demagogia. Não aceito julgamentos efectuados sob pressão demagógica, filha da inveja, da incapacidade de realização e da falta de iniciativa pessoal. Acreditemos que para produzir obra útil não basta sonhar e idealizar. Não basta ver grande. É indispensável método, prudência, equilíbrio, noção das realidades. A primeira qualidade dos chefes consiste na ciência de escolha dos colaboradores. A segunda, fazer deles homens entusiastas, activos, dinâmicos, confiantes em si próprios.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Os dirigentes da Nação devem considerai* a generalidade dos Portugueses, e não apenas os funcionários públicos, como seus colaboradores. E, em vez de lhes criarem embaraços, ou de reprimirem o espírito de iniciativa privada - deixem que nós; homens da indústria, do comércio e da agricultura, possamos ser entusiastas, activos, dinâmicos, confiantes em nós próprios. Criaremos mais e melhor. Empregaremos mais gente em trabalho útil.

Compreendo, e acho convenientissimo, que o Estado elabore planos gerais de fomento. Mas já não aceito que os imponha por meios violentos-porque os processos indirectos, são afinal, os mais rápidos e eficientes. Colabore a administração pública com os interesses privados, procure convencer-nos-mas não deixe de ouvir com atenção os directores e técnicos das empresas. Nesta interpenetração de opiniões lucrarão uns e outros.

Terminando:

Se a Constituição permitisse que a ratificação com emendas de um decreto-lei, ao transformá-lo em proposta governamental, automaticamente suspendesse a sua execução eu não hesitaria em propor essa espécie de ratificação. Infelizmente, segundo a Constituição, o Decreto-Lei n.º 38:704 continuará em vigor com o seu texto actual mesmo que a Assembleia Nacional aprove a sua ratificação com emendas.

Por consequência, torna-se indispensável a rejeição pura e simples, até que o problema seja revisto cuidadosamente. Na hipótese de esta Assembleia negar a ratificação, o Governo poderá elaborar nova proposta, ou enviar o texto actual do Decreto-Lei n.º 38:704 à Câmara Corporativa.

A rejeição pura e simples travará, em grande parte, o pânico que o decreto produziu nos meios ultramarinos

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e metropolitanos. Haverá tempo para estudar as reclamações apresentadas e buscar as soluções convenientes. A meu ver, essas soluções encontrar-se-iam na fórmula média seguinte:

1.º Aceitação do principio da criação do Fundo de Fomento e Povoamento, com as finalidades expressas no artigo 4.º do diploma, acrescentadas explicitamente da de defesa e desenvolvimento das exportações ultramarinas. É justo que um Fundo alimentado com receitas de taxas de exportação ou dotações orçamentais provenientes de impostos criados em momento de euforia económica sirva também, em contrapartida, para evitar ou atenuar futuras crises de sobreprodução ou dificuldade de venda.

2.º Determinação das receitas do Fundo, não em função de maiores valias de produtos exportados, mas por meio de muito pequeno adicional ad valorem sobre a generalidade do comércio externo, sobretaxa que seria reduzida ou suprimida segundo o critério prudente do governo local ou do Ministro do Ultramar.

3.º Consequente supressão do depósito obrigatório ou imobilização de 50 por cento da maior valia, por ocasionar não só complicações à administração pública, mas também, e principalmente, grave embaraço e irremediável demora à execução das iniciativas privadas. Na verdade, estas iniciativas têm-se mostrado capazes de se administrar sem tutela.

4.º Isenção da sobretaxa ad valorem no caso de exportação para o Império, de forma a premiar e desenvolver as relações comerciais entre as províncias nacionais.

5.º Desaparecimento completo do diferencial de taxas entre exportações de produtores e exportações de comerciantes - única forma de se manter a função comercial, de evitar o sacrifício dos pequenos e médios produtores e de não se canalizar a exportação para as organizações comerciais dos produtores mais poderosos.

Pelo exposto, enviarei para a Mesa a moção seguinte:

A Assembleia Nacional não ratifica o Decreto-Lei n.º 38:704 e convida o Governo a transformar esse diploma em proposta de lei, nos termos constitucionais.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - O aviso prévio do Sr. Deputado Manuel Lourinho, sobre melhoramentos rurais, que tem estado inscrito na ordem do dia, foi até agora preterido pela discussão das Contas Gerais do Estado, cuja evidente importância é escusado assinalar, pela proposta de lei sobre a utilização dos automóveis do Estado e dos organismos corporativos, para a qual a Câmara votou a urgência, e pela discussão do decreto-lei relativo à sobrevalorização dos produtos coloniais, que, dado o seu carácter de emergência e acuidade actual do assunto, ou era discutido agora ou perdia a oportunidade. Mas era minha intenção iniciar na sessão de amanhã de tarde a realização desse aviso prévio.

Hoje, porém, o digno Deputado avisante informou-me da impossibilidade de estar presente numa das duas últimas sessões pelas quais provavelmente a discussão do assunto se estenderia e assim da conveniência de deixar a efectivação do aviso para o principio da próxima sessão legislativa.

Não se realizará por agora o aviso. E não há assim necessidade de dar sessão amanhã. A próxima será na segunda-feira, às 10 horas e 30 minutos, tendo por ordem do dia a conclusão da discussão das Contas Gerais do Estado e a das contas da Junta do Crédito Público, na qual só está neste momento inscrito para usar da palavra o Sr. Deputado Dinis da Fonseca, e a continuação do debate sobre a ratificação do decreto-lei; à tarde realizar-se-á a última sessão deste período legislativo, tendo por ordem do dia a continuação do debate sobre a ratificação referida, que deverá concluir-se então.

Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 32 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

António Jacinto Farreara.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Proença Duarte.
Délio Nobre Santos.
Jerónimo Salvador Constantino Sócrates da Costa.
Manuel Maria Múrias Júnior.
D. Maria Baptista dos Santos Guardiola.
D. Maria Leonor Correia Botelho.
Paulo Cancela de Abreu.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Abel Maria Castro de Lacerda.
Américo Coortes Pinto.
António Calheiros Lopes.
António Júdice Bustodf da Silva.
Artur Rodrigues Marques de Carvalho.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Carlos de Azevedo Mendes.
Carlos Vasco Michon de Oliveira Mourão.
Daniel Maria Vieira Barbosa.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Francisco Eusébio Fernandes Pijeto.
Henrique dos Santos Tenreiro.
José ALpoim Borges do Canto.
João Ameal.
João Cerveira Pinto.
João Mendes da Costa Amaral.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim de Moura Relvas.
Joaquim de Oliveira Calem.
José Cardoso de Matos.
José Gualberto de Sá Carneiro.
José Pinto Meneres.
José dos Santos Bessa.
Luís Filipe da Fonseca Morais Alçada.
Luis Maria da Silva Lima Faleiro.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Lopes de Almeida.
Pedro de Chaves Cymbron Borges de Sousa.
Sebastião Garcia Ramires.
Teófilo Duarte.
Vasco de Campos.
Vasco Lopes Alves.

O REDACTOR - Leopoldo Nunes.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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