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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 171

ANO DE 1952 3 DE DEZEMBRO

V LEGISLATURA

SESSÃO N.º 171 DA ASSEMBLEIA NACIONAL

EM 2 de DEZEMBRO

Presidente: Exmo.Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior

Secretários: Exmos. Srs.Castão Carlos de Deus Figueira
António Pinto de Meireles Barriga

Nota. - Foi publicado um suplemento ao Diário das Sessões n.º 169, inserindo o relato da sessão plenária n.º 5 da Câmara Corporativa.

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou a sessão às 15 horas e 35 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foi aprovado o Diário das Sessões n.º 170.
Deu-se conta do expediente.

Ordem do dia. - Continuou em discussão na generalidade a proposta de lei relativa ao Plano de Fomento Nacional.
Falaram os Srs. Deputados Teófilo Duarte, Nunes Mexia e Marques Teixeira.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 19 horas e 10 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 15 horas.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Adriano Duarte Silva.
Afonso Eurico Ribeiro Gazaes.
Alberto Cruz.
Alberto Henriques de Araújo.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alexandre Alberto de Sousa Pinto.
Américo Cortês Pinto.
André Francisco Navarro.
António Abrantes Tavares.
António Augusto Esteves Mendes Correia.
António Cortês Lobão.
António Jacinto Ferreira.
António Joaquim Simões Crespo.
António Júdice Bustorff da Silva.
António de Matos Taquenho.
António Pinto de Meireles Barriga.
António Raul Galiano Tavares.
António dos Santos Carreto.
Armando Cândido de Medeiros.
Avelino de Sousa Campos.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Daniel Maria Vieira Barbosa.
Délio Nobre Santos.
Diogo Pacheco de Amorim.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco Eusébio Fernandes Prieto.
Frederico Maria de Magalhães e Meneses Vilas Boas Vilar.
Gastão Carlos de Deus Figueira.
Henrique Linhares de Lima.
Herculano Amorim Ferreira.
Jaime Joaquim Pimenta Prezado.
João Alpoim Borges do Canto.
João Ameal.
João Cerveira Pinto.

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João Luís Augusto das Neves.
João Mendes da Gosta Amaral.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim de Oliveira Calem.
Joaquim de Pinho Brandão.
Joaquim dos Santos Quelhas Lima.
Jorge Botelho Moniz.

osé Dias de Araújo Correia.
José Diogo de Mascarenhas Gaivão.
José Garcia Nunes Mexia.
José Gualberto de Sá Carneiro.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Luís da Silva Dias.
Luís Filipe da Fonseca Morais Alçada.
Luís Maria Lopes da Fonseca.
Manuel Colares Pereira.
Manuel França Vigon.
Manuel Hermenegildo Lourinho.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel de Magalhães Pessoa.
Manuel Maria Múrias Júnior.
Manuel Maria Vaz.
Manuel Marques Teixeira.
Manuel de Sousa Meneses.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Mário de Figueiredo.
Paulo Cancela de Abreu.
Pedro de Chaves Cymbron Borges de Sousa.
Ricardo Malhou Durão.
Ricardo Vaz Monteiro.
Salvador Nunes Teixeira.
Sebastião Garcia Ramires.
Teófilo Duarte.
Tito Castelo Branco Arantes.
Vasco Lopes Alves.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 73 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 25 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Está, em reclamação o Diário das Sessões n.º 170.

O Sr. Gastão Figueira: - Sr. Presidente: peço a V. Ex.ª o favor de mandar fazer a seguinte emenda ao Diário n.º 170, em reclamação, e que consiste no seguinte: a p. 17, col. 2.ª 1. 12.ª, suprimir as palavras «na Terra», quo estão entre parêntesis.

O Sr. Presidente: - Visto mais nenhum Sr. Deputado desejar fazer qualquer reclamação sobre o Diário, considero-o aprovado com a emenda apresentada.
Pausa.

O Sr. Presidente: - Estão na Mesa os elementos fornecidos pelo Ministério das Comunicações em satisfação do requerimento apresentado pelo Sr. Deputado Salvador Teixeira.
Estão igualmente na Mesa os elementos fornecidos pelo Ministério das Obras Públicas em satisfação do requerimento apresentado pelo Sr. Deputado Carlos Moreira.
Acerca dos elementos que este Sr. Deputado solicitou neste mesmo requerimento pelo Ministério do Interior cumpre-me informar que este Ministério comunicou que as únicas empresas concessionárias dependentes daquele departamento do Estado são as que têm o exclusivo da exploração de jogos de azar nas zonas do Estoril, Espinho, Figueira da Foz o Póvoa do Varzim, não existindo junto delas comissários ou delegados do Governo.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Telegrama

Da Câmara Municipal, da comissão concelhia da União Nacional e da direcção do Grémio do Comércio, todos de Póvoa de Varzim, a apoiar o parecer subsidiário da secção de Obras públicas e comunicações da Câmara Corporativa acerca do Plano de Fomento e no que importa a pequenos portos.

O Sr. Presidente: - Não havendo nenhum Sr. Deputado inscrito antes da ordem do dia, vai, pois, passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continua em discussão na generalidade a proposta de lei relativa ao Plano de Fomento Nacional.
Tem a palavra o Sr. Deputado Teófilo Duarte.

O Sr. Teófilo Duarte: - De entre as grandes coisas que nestes últimos vinte e quatro anos se projectaram ou fizeram, a proposta em discussão é das maiores. E isso devido ao montante que vai ser gasto - 13,5 milhões de contos -, à finalidade dos trabalhos mencionados - criação de riqueza- e à integração do ultramar - nosso principal elemento de valorização- num plano de obras para toda a Nação, o que sucede pela primeira vez, apesar de há muito se vir falando na tão apregoada unidade económica nacional.
Todas as obras mencionadas têm a sua defesa; todas elas contribuirão para a melhoria do rendimento nacional; e as únicas restrições que se compreende sejam postas à sua aprovação pêlos críticos de boa fé residem mais, a meu ver, na prioridade que se entenda dever dar às que se mencionam ou a outras que se omitiram e à forma do seu enquadramento numa ideia de conjunto. É natural que cada um de nós sinta maior simpatia por determinado género de trabalhos, a cujo estudo se dedicou toda a vida, e fique, pois, decepcionado por ver que a proposta não lhes ida o relevo que desejaria. Mas o que ninguém poderá negar é que se está em presença de um estudo sério, bem intencionado, e que procura resolver o problema candente, que é posto logo nas suas primeiras páginas com uma grande clareza e coragem e que se traduz na afirmação seguinte: a extraordinária inferioridade do nosso rendimento individual, mesmo em relação ao de outros países com o tipo de cultura semelhante ao nosso.
E, como o Governo mandou vir à apreciação da Assembleia tal trabalho, ninguém poderá estranhar que nela se manifestem discrepâncias baseadas nos modos de ser atrás mencionados, devendo elas ser tomadas à conta de espírito de colaboração, que não de obstrucionismo e crítica destrutiva, que não estão nas tradições das Assembleias saídas da Revolução do 28 de Maio. Bastaria, de resto, a convicção em que cada um de nós está de que as suas críticas não provocarão qualquer crise ministerial para que o Governo não as possa tomar senão como manifestações de leal cooperação.
Aspecto industrial metropolitano do Plano. - Um dos aspectos da proposta que reputo mais interessantes, e que me servirá de justificação para certas discrepâncias da minha parte, quando aludir a outros, é o que se refere à orientação de se procurar desenvolver na metrópole um certo número de indústrias - as básicas - que nos permitam dispensar importações estran-

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geiras. A efectivar-se tal, dentro em breve serão de origem nacional todo o sulfato de amónio destinado à lavoura, toda a folha-de-flandres requerida pela indústria das conservas e outras de menor projecção, toda a pasta de madeira necessária à do papel, a quase totalidade dos combustíveis líquidos e gasosos derivados do petróleo e de outras matérias-primas importadas, uma parte da gusa necessária à nossa indústria e, finalmente, a maior parte da energia eléctrica, a obter-se através do aproveitamento da capacidade energética dos nossos rios, com dispensa, portanto, da importação da correlativa massa de carvões estrangeiros.
Marca-se assim uma orientação que em princípio só me parece louvável: criar actividades que nos permitam utilizar certos recursos nacionais, dispensando-nos, pois, de recorrer a compras no mercado externo.
O preço de custo dos artigos produzidos virá a ser o dos seus similares de lá de fora? Ou a diferença contra eles será tão pequena que a criação de tais actividades represente para o consumidor nacional um pesado sacrifício e um erro económico? A proposta não nos fornece elementos para nos pronunciarmos a tal respeito, mas julgo que os projectos estudados terão conduzido a nina conclusão favorável ao estabelecimento das mencionadas indústrias.
Ao mesmo tempo a intensificação do reconhecimento mineiro em determinadas zonas do País permitirá fazer-se uma ideia segura sobre a possibilidade da montagem de novas indústrias tendo como base os recursos porventura aproveitáveis.
Aspecto agrícola metropolitano do Plano. - Pois bem. Dando a minha concordância a tal orientação, eu pergunto: abrangendo o Plano em discussão, não só o aspecto industrial da nossa economia, mas ainda o agrícola, porque não adopta ele para este último o critério seguido para o primeiro?
Porque não menciona ele também quais os principais produtos agrícolas, os básicos, chamemos-lhes assim, para efeitos de sistematização, que nós importamos, e não propõe, à semelhança do que fez para os industriais, a adopção de um conjunto de medidas respeitantes aqueles que entendesse deverem vir a ser produzidos em território nacional?
A metrópole normalmente não produz o trigo necessário ao seu consumo, vendo-se obrigada a fazer importações maciças do estrangeiro. Haverá possibilidade ou conveniência em modificar tal regime, intensificando aqui a sua cultura de modo a bastarmo-nos?
Com o milho dá-se outro tanto, vendo-se ela obrigada a recorrer a Angola. Poder-se-ia ou conviria fazer-se para ele o mesmo?
Quase todo o algodão, cerca de 20 por cento, consumido pela nossa indústria têxtil vem do ultramar. Conviria, à face dos seus preços de custo em épocas normais, manter tal regime, ou ir antes buscá-lo ao estrangeiro?
Cerca de 70 por cento do açúcar tem igual proveniência. Deverá fazer-se outro tanto?
Apenas 10 por cento da rama do tabaco utilizado pelas nossas fábricas é de proveniência ultramarina. Seria (possível ou conviria desenvolver a sua produção no nosso ultramar, tal qual se vem fazendo com o algodão, de modo a dispensar-se o recurso aos centros fornecedores actuais?
Em resumo: no campo agrícola haverá que encarar o estabelecimento de um regime em que se force a produção metropolitana de certos géneros, o trigo e o milho, por exemplo, para só falar nestes dois, ou em que ela seja completada pela ultramarina, no caso de aquilo ser inviável, assim como a importação do estrangeiro, ou então por ela substituída, como no que se refere no algodão, açúcar o tabaco?
Isto é, todo o trigo, milho, algodão, açúcar e tabaco, para só falarmos nestes géneros, poderão ser produzidos na metrópole e ultramar?
O facto de a proposta não abordar este aspecto- do problema representa para mim uma das suas deficiências fundamentais, agravada com a dúvida que nos deixa sobre o objectivo concreto a que viso, a política de regadio e de colonização interna que nela se detalha. Pretende ela, incrementar a produção do trigo e do milho, de que somos deficitários, ou a do arroz, de que já nos bastamos presentemente, ou ainda a tias frutas, em iguais condições? Ela nada diz a tal respeito, e é pena.
Interpendência metropolitana e ultramarina. - Mas há uma outra deficiência de não menor transcendência, correlacionada até certo ponto com esta. Ao fazer-se o exame do aspecto da, produção agrícola e do aproveitamento de parte dela para fins industriais, não conviria ir mais longe do que aquilo que fica exposto, e não se deveria abordar com audácia e inteligência o problema da interdependência estreita de todas as actividades agrícolas e industriais metropolitanas e ultramarinas? Assim, não se deveria encarar a eventualidade da diminuição gradual, embora lenta, até se chegar mesmo à supressão total, ida importação feita pela metrópole de certas matérias-primas, o algodão, o tabaco, as oleaginosas, por exemplo, a fim de se efectuar a transplantação das indústrias que as utilizam para as terras do ultramar em que aquelas sejam produzidas?
Angola e Moçambique têm já hoje fábricas de tecidos, tabacos, amido e óleos vegetais, trabalhando parte das suas matérias-primas, das quais, porém, a maioria vem para a metrópole e estrangeiro, não deverão elas passar a industrializá-las integralmente? Há mesmo certas indústrias, como as de cimento, cerveja, cutelaria, lusalite, etc., que ùltimamente se têm ali montado, que, tal qual sucede com as anteriores, umas vezes são custeadas por capitais locais, e outras por metropolitanos angariados nos próprios meios da especialidade. Quer dizer, são os nossos industriais daqui, de tecidos, cerveja, cimento, etc., que estão mantendo novas fábricas lá e não cá. Desta forma, eles julgam que poderão criar-se condições de resistência que lhes permitam suportar mais fàcilmente os efeitos da concorrência estrangeira, e os Poderes Públicos têm animado tal tendência, por entenderem que esta comparticipação íntima de interesses económicos metropolitanos- no ultramar e vice-versa, este entrelaçar das duas economias, só terá vantagens sob todos os aspectos, e muito principalmente no do robustecimento da unidade nacional.
Não deveria, pois, o autor da parte industrial do plano metropolitano, ao estudar a ampliação das instalações daqui para o tratamento do petróleo importado, abordar a vantagem de idênticas instalações em Moçambique, onde os recentes e intensos trabalhos de prospecção têm mostrado sérias; probabilidades de ali se encontrar tal produto?
E não deveria, fazer-se o mesmo no referente à possibilidade do fabrico da pasta para papel, em virtude de as experiências realizadas pela Junta das Missões Geográficas e de Investigações do Ultramar com as madeiras colonais terem conduzido a resultados animadores, em presença das amostras já fabricadas.?
E não deveria fazer-se outro tanto no que respeita à exploração dos jazigos de ferro contíguos aos dos de carvão de Tete - caso raro -, que chegaram a merecer a atenção da poderosa Société Générale du Congo Belge?
Assim, deveremos nós intensificar a política, ainda apenas ensaiada, mas que já vem de há anos, até no extremo limite atrás mencionado, passando a industrializar as matérias-primas nos locais em que se consiga obter um preço de custo mais favorável, sem curar de saber se elas estão situadas em território metropolitano

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ou ultramarino, ou deveremos regressar ao velho conceito de reservar ao ultramar a função de produtor de matérias-primas e à metrópole o exclusivo da sua industrialização?
Não seria esta a oportunidade de pôr em equação o problema que durante séculos caracterizou a nossa política económica nacional no referente às relações da metrópole e províncias ultramarinas e destas entre si? Nesses tempos atribuía-se a cada parcela do Império a função económica que mais ajustada se julgava, bem ou mal, às suas possibilidades próprias e aos interesses globais do mesmo. Por isso, à índia e às Molucas se reservava o exclusivo da produção das especiarias, como a pimenta, o cravo e a canela; ao Brasil a do açúcar e à metrópole a do sal, ferro e de quase todos os produtos manufacturados. E se tal critério não era tão rígido que impedisse certos desvios, o que é certo, porém, é que ele constituía uma directriz que impedia concorrências ruinosas entre os membros da mesma nação.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Ora, agora, que se elaborou um plano desta envergadura, em que pela primeira vez se tratam simultâneamente problemas congéneres metropolitanos e ultramarinos, embora sem a interdependência que vimos focando e que mais adiante detalharemos, julgo que não seria descabido marcar-se uma orientação no que respeita a um problema tão candente, que tem provocado tantas discussões e que requer a materialização do que se julgue necessário para a efectivação da tão apregoada unidade económica nacional. Constata-se, porém, infelizmente, que na parte do Plano que respeita à metrópole, nenhuma alusão se faz às possibilidades de coordenação das suas actividades industriais com as ultramarinas, o que parece marcar uma orientação de independência de umas em relação às outras; e quanto às agrícolas, a omissão, a que já aludimos, da produção concreta dos géneros básicos metropolitanos a conseguir aqui ou lá fora pode-nos levar a idêntica conclusão.
Julgo que o plano metropolitano, ao entrar no capítulo do exame das possibilidades do nosso abastecimento em produtos de natureza industrial e agrícola e ao propor as necessárias medidas para se conseguir tal, deveria ter encarado, não só as ditas possibilidades no que se refere à produção local, mas às importações ultramarinas e estrangeiras, enquadrando-as dentro de uma política de coordenação industrial e agrícola entre a metrópole e o ultramar. Estas duas circunstâncias (imprecisão de orientação no campo agrícola e falta de coordenação entre, as economias metropolitana e ultramarina) constituem a meu ver a grande falha do Plano. O problema não foi tratado com a amplitude necessária.
Verifico pois que ainda agora continua a observar-se a mesma falta de colaboração de sempre entremos dois Ministérios da Economia e do Ultramar. Há anos, da parte do segundo fez-se junto do primeiro uma diligência, que consta dos respectivos arquivos, no sentido de se pôr cobro a tal situação e definir uma política de coordenação. Aqui já existe o precedente de uma legislação restritiva do plantio da vinha em determinadas zonas, e outro tanto se achava já determinado em Moçambique para o algodão, após a conclusão do reconhecimento agronómico levado a cabo durante quatro anos pelo Centro de Investigação Científica Algodoeira. Tal reconhecimento fixara as áreas impróprias para uma cultura remuneradora e aquelas em que ela se devia intensificar, acabando-se assim com críticas que vinham de longe e que não deixavam de ter certo fundamento.
Entendia-se, pois, no Ministério das Colónias que se poderia ampliar a todo o Império e às suas principais produções o critério que, como fica dito, já existia numa ou noutra das suas zonas e para um ou outro dos seus géneros. Assim, examinar-se-iam as produções agrícolas metropolitanas e ver-se-ia se muitas delas não poderiam ser obtidas em melhores condições de preço no ultramar. A título de exemplo citaremos o arroz, objecto de grandes medidas de protecção aqui. Sendo o da Guiné, de Angola e de Moçambique já hoje mais barato que o metropolitano, apesar do primitivismo dos seus processos de cultura, não valeria mais a pena intensificar a sua produção nalgumas daquelas províncias e melhorar os ditos processos, de modo a fazer baixar ainda mais o seu preço de custo e fazer face às necessidades metropolitanas? Deveria prosseguir-se na realização da ideia, então em curso, do fabrico no continente do açúcar de beterraba, a cultivar nos nossos campos, em prejuízo do de cana sacarina no ultramar?
Passando a outro aspecto do problema, examinar-se-iam as produções industriais metropolitanas sob o mesmo prisma atrás exposto para as agrícolas, e assim:
Deveríamos consentir na ampliação ou na montagem de novas instalações têxteis aqui, quando havia a considerar a possibilidade de um rendimento mais económico desde que elas se estabelecessem no ultramar? Deveria fazer-se outro tanto para a indústria dos produtos derivados da pesca, assoberbada durante anos seguidos com as dificuldades inerentes à falta de peixe, quando o litoral angolano, em especial, se apresentava com perspectivas tão favoráveis? Examinar-se-iam ainda quais as importações metropolitanas de produtos agrícolas e industriais estrangeiros e ver-se-ia quais aquelas que porventura poderiam ser extintas ou, pelo menos, diminuídas, devido à produção nacional a criar ou a aumentar. E quanto se acaba de dizer para a metrópole se faria também para o ultramar.
O problema, apesar da sua vastidão e complexidade, parecia-me que merecia bem a pena ser estudado e resolvido; e julgamos que, se ele o fosse com dinamismo, dentro de poucos meses se poderia chegar a conclusões concretas, pelo menos em alguns dos seus aspectos que não requeressem a realização de demorados inquéritos. Julga-se que exageramos? O que se passou com a política do milho e do. algodão foi concludente e responde à dúvida que possa ser posta. Nos anos de 1947 e 1948 os deficits metropolitanos do primeiro foram principalmente cobertos pelas importações estrangeiras, visto do ultramar pouco se ter recebido. Pois bem: bastou que se determinasse que Angola retomasse a antiga política da sua intensificação para que não só aquelas desaparecessem como, inclusivamente, se passasse a exportar tal género em quantidades que atingiram 30 000 t.
Eis o quadro das importações, demonstrativo do que se acaba de dizer, não figurando ainda nele o abastecimento da Madeira, de Cabo Verde e de Moçambique:

Importação metropolitana

[Ver Tabela na Imagem]

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Mas não foi só a quantidade que aumentou; também a qualidade melhorou extraordinàriamente, pois, sendo a percentagem de milho seleccionado em 1949 de 10 por cento, ela é hoje de 67 por cento, o que tem uma enorme importância para a sua colocação no estrangeiro.
Também quanto ao algodão os resultados obtidos foram muito satisfatórios, pois chegou a haver um ano, o de 1950, em que a produção ultramarina quase abasteceu a indústria metropolitana. Eis os números demonstrativos do que fica exposto:

Importação metropolitana

[Ver Tabela na Imagem]

E se Moçambique tivesse tirado todo o proveito dos trabalhos de reconhecimento agronómico atrás mencionados estamos certos de que os resultados dos últimos dois anos teriam sido bem mais brilhantes.
Ganhas como foram as duas campanhas do milho e do algodão, lançou-se ombros à do açúcar, e a remodelação por que está passando a sua produção dá-nos a convicção de que dentro de poucos anos as necessidades metropolitanas serão integralmente cobertas pelo ultramar.
Ia-se lançar igualmente a do tabaco, e estamos persuadidos de que não levaria muito tempo a conseguirem--se os brilhantes resultados daquelas duas campanhas.
Por sua vez, no campo industrial, os incentivos de toda a ordem dados à indústria da pesca fizeram com que as exportações dos produtos a ela ligados aumentassem vertiginosamente, destacando-se em especial a da farinha de peixe, devido às perfeitas e numerosas instalações que se montaram, a ponto de nos últimos quatro anos ter duplicado a sua exportação.
Também a transformação por que passou a indústria da extracção do carvão de Tete, em Moçambique, fez com que ela saísse do ritmo das 15 000 t anuais de 1946 para um outro que deve atingir 200 000 t em 1953.
O que fica exposto mostra que há um certo campo da nossa economia em que os resultados de uma estreita ligação entre os sectores metropolitano e ultramarino se podem obter ràpidamente e sem necessidade de grandes estudos preparatórios. Isso permite que se vá trabalhando desde logo, muito embora haja necessidade de elaborar um plano de conjunto em que aqueles se integrem. Concluindo: a imprecisão do plano metropolitano no que se refere à parte agrícola e a falta de coordenação de todo ele com a produção ultramarina constitui, como atrás dissemos, uma falha, e grave, do dito plano, que deveria ser remediada no sentido atrás indicado.
Estas são as considerações que me sugere o exame na generalidade da parte da proposta que se refere à metrópole, não detalhando certos dos seus aspectos acabados de focar nem entrando na apreciação de outros, tais como os de transportes e energia, por desejar ocupar-me mais desenvolvidamente do que se refere ao ultramar.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Passando agora àquela que diz respeito ao ultramar, poderemos aplicar-lhe a mesma crítica atras feita - a da independentização e desligação de objectivos e medidas de lá e de cá -, apesar da afirmação da p. 37 de que os planos do fomento das (províncias ultramarinas estão em estreita ligação com as que foram elaborados para a metrópole. Neste caso do ultramar dá-se ainda a agravante da ausência absoluta de referências às suas possibilidades industriais, ao contrário do que se fez para a metrópole, o que dá a impressão de que nada há a realizar, por agora, neste campo. Se num caso se abordou o problema de meia dúzia de indústria-bases a lançar ou a incrementar, no outro nem sequer se tocou em tal. Ora a nós parece-nos que só haveria vantagem em a segunda parte do Plano, a do ultramar, ter seguido a mesma orientação da primeira, a da metrópole.
Aspecto industrial ultramarino. - Assim, Moçambique, por exemplo, importa anualmente uma massa enorme de tecidos. Ora ela já tem uma fábrica dos mesmos, embora sem capacidade para trabalhar todo o algodão ali produzido e para fazer face às necessidades do mercado interno, e, por isso, vê-se obrigada a importações que muito pesam na sua balança comercial. Julgo, pois, que não seria descabido pôr o problema em termos idênticos ao que se fez para a metrópole noutros produtos. Assim, deverá promover-se, indo mesmo, se for preciso, para a fórmula do financiamento, a instalação de novas fábricas, de modo a trabalhar toda a produção, ou, pelo menos, a necessária ao consumo interno?
A província tem também já um certo número de instalações trabalhando parte das suas oleaginosas, das quais, porém, a maioria segue para a metrópole e estrangeiro. Pergunta-se: deverá adoptar-se um critério em parte idêntico ao atrás exposto para os tecidos, passando a exportar-se toda a produção sob a forma de produtos industriais?
A província importa em grande escala os derivados do petróleo. Ora, dadas as perspectivas favoráveis que apresentam os trabalhos de pesquisas deste produto, pergunta-se: deverá ele ser refinado ali ou permitir-se-á a sua saída em bruto para aqui ou para o estrangeiro?
Ela importa ainda grande quantidade de metais. Ora os concessionários dos jazigos de carvão de Tete, entre as quais figura a poderosa Société Générale du Congo Belge, chegaram em tempos, como atrás dissemos, a pôr o problema da instalação de altos fornos junto deles, em virtude da existência contígua de ferro. Seria isso de consentir ou de incentivar?
Quer dizer: não se deveria ter marcado para o ultramar, pelo menos em certos aspectos, uma orientação, tal qual só fez para a metrópole vendo quais as importações de produtos industrializados a suprimir, mediante a forma de instalação local das respectivas indústrias?
Aspecto agrícola ultramarino. - E, passando ao campo agrícola, não se deveria fazer outro tanto para com o milho, de que é vulgar importarem-se enormes quantidades e de que estamos convencidos de que há possibilidade de produzir localmente o suficiente, para o trigo, de que a província quase não colhe um quilograma, para os lacticínios, de que ó deficitária, etc.?
De igual forma entendo que se deveria tratar o caso de Angola, no que se refere ao trigo e tecidos que ela importa, ao amido, que ela poderá obter do milho que deixaria de vir para a metrópole para igual destino, às conservas, etc.
E o mesmo para as restantes províncias.
Abordar-se-iam, pois; os diversos problemas de produção industrial e agrícola ultramarina primeiramente à face do espírito de coordenação entre a metrópole e

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cada província, e destas entre si, e depois à face das necessidades puramente locais.
Em lugar desta ideia mestra, a do incremento de certas e determinadas produções, a dominar todo o plano ultramarino verifica-se que este compreende um conjunto de obras para cada província que, na quase totalidade dos casos, não visam a alcançar os objectivos fixados de antemão. Poder-se-á alegar que em lugar de se ir para a política directa de produção industrial o agrícola que preconizamos se foi para uma outra de caminhos de ferro, de portos, de energia, que indirectamente contribui para resolver o problema da produção. Reconhecemos sem esforço que, em parte, tal sucederá, mas quando tais trabalhos não são enquadrados num plano dominado por uma ideia principal, os resultados são sempre inferiores ao que deles haverá a esperar.
O caso de alguns portos metropolitanos, em que se têm gasto milhões e continuam sem navegação porque não se efectivaram ao mesmo tempo os trabalhos de estradas, caminhos de ferro e de desenvolvimento de recursos económicos das regiões que servem, e o de alguns caminhos de ferro, cujo tráfego não tem aumentado, apesar das melhorias neles introduzidas, são exemplos que ilustram bem o que fica dito. Feitos estes reparos a orientação geral do plano ultramarino, reparos mais fundos do que os referentes ao metropolitano, entremos agora na análise pormenorizada dos seus diversos aspectos em cada província.
Começaremos por repetir aquilo que dissemos no princípio deste discurso. Reputamos úteis, consideradas de per si e isoladamente, apesar do aparente paradoxo desta afirmação com a conclusão anterior, quase todas as obras apontadas, e, porque temos ligada a nossa responsabilidade, quer ao princípio de execução, quer ao estudo de quase todas elas, e isso em todas as províncias, muito embora elas tivessem o seu lugar numa concepção diferente da exposta no projecto em discussão, não seria lógico que viéssemos agora reconhecer quer a sua inutilidade, quer mesmo o seu erro, e combater a sua execução.
Há, porém, uma província, a de Moçambique, para a qual abrimos uma excepção, em virtude de se terem dado certas circunstâncias de força maior, chamemos-
lhes assim, que nos levam a duvidar da conveniência da execução neste momento da maior parte das ditas obras. Ora vejamos se eu posso dar uma explicação satisfatória em assunto de tanto melindre, quer no aspecto administrativo quer no pessoal.
Moçambique. - A proposta consagra grandes verbas a vários caminhos de ferro e portos, com exclusão dos de Lourenço Marques e Beira, concentrando o seu esforço na continuação de alguns que sofreram certo incremento em 1948 e 1949 e no início de outros novos. Vejamos se o critério é de aceitar.
A situação geográfica dos três grandes portos da província - Lourenço Marques, Beira e Nacala - faz com que eles sejam as portas de entrada e saída mais vantajosas para certas regiões da África do Sul e para todas as da Rodésia e da Niassalândia.
Daqui resulta que, há muitas dezenas de anos, convenções internacionais nos levaram a montar, directa ou indirectamente, uma rede de transportes ferroviários e os consequentes serviços portuários, do litoral para o interior, para utilização quase exclusiva dos nossos vizinhos. É que o tráfego dos caminhos de ferro de Lourenço Marques para a África do Sul e da Beira para as Rodésias e Niassalândia acusa uma percentagem de cerca de 90 e tantos por cento de ou para aqueles países, o que nos mostra a pequena importância do nosso tráfego local.
Devido a tais circunstâncias, numerosos e dolorosos têm sido os transes por que passaram vários dos governos portugueses, quer perante as simples exigências de ordem técnica dos nossos vizinhos, quer perante outras mais sérias, que iam até reclamar o condomínio na administração de certos portos e caminhos de ferro.
Isto não é hoje segredo para ninguém. Filiavam-se, em geral, tais exigências nas deficiências dos serviços desempenhados directamente por nós ou por concessionários estrangeiros, de quem não conseguíamos uma exploração eficiente.
É certo que Lourenço Marques nos últimos anos vinha trabalhando com uma perfeição indiscutível, mas a Beira deixava muito a desejar. O surto, porém, que a África do Sul e as Rodésias vinham tendo depois da última guerra fazia-nos prever para breve a insuficiência dos nossos serviços de Lourenço Marques e agravava a má situação em que se encontravam os dirigidos pelos concessionários ingleses da Beira.
Estas circunstâncias e a necessidade delas resultante de não dar sequer pretexto a que sob a máscara da defesa de simples interesses económicos se apresentassem reclamações visando objectivos de outra natureza levaram o Ministério das Colónias em 1947 a consagrar uma atenção especial ao problema portuário e ferroviário, principalmente nas suas modalidades de ligações externas. E que a característica que sempre teve, e há-de continuar a ter, a nossa política portuária e ferroviária ali é a das suas repercussões internacionais.
a) Em Lourenço Marques, que serve a África do Sul, prolongou-se pois com mais 300 m o seu cais, compraram-se centenas de vagões, iniciou-se a substituição da central geradora de energia para o porto e cidade, e quase tudo isso se fez visando, como atrás dissemos, mais a satisfazer necessidades próximas dos nossos vizinhos do que as actuais.
Restava em 1950, e creio que a situação agora ainda é a mesma, fazer a substituição das suas actuais oficinas, incapazes de desempenhar a sua função, montar a rede de distribuição eléctrica na cidade, pois a central térmica está quase pronta, e resolver em grande escala o problema do fornecimento da água ao porto e à cidade. Só depois de executados tais trabalhos poderemos ficar descansados, pois não haverá razão para reclamações; mas, salvo melhor opinião, julgo que é necessário e urgente executá-los já, para que tudo corra como deve ser. Permito-me chamar pois a atenção de VV. Ex.ªs para tal necessidade e urgência, o que nos obrigará a um dispêndio de algumas centenas de milhares de contos.
Estará tal despesa e outras que adiante mencionaremos dentro das possibilidades financeiras dos caminhos de ferro ou do próprio Governo-Geral? Tenho sérias dúvidas a tal respeito. Porque não se incluíram elas, pois, no Plano, dada a importância internacional do porto e seu caminho de ferro?
b) Quanto ao caso da Beira, embora a responsabilidade directa das deficiências clamorosamente gritadas pêlos nossos vizinhos fosse dos concessionários ingleses, o Governo resolveu ir para a solução radical do resgate do porto e caminho de ferro; para a construção imediata de um novo cais, que está prestes a concluir-se; para o estudo de novas ampliações portuárias; para a compra maciça de material já concluída, e para outras medidas, enfim, que fizeram melhorar extraordinariamente o serviço.
As referências públicas e repetidas das autoridades das Rodésias a respeito da melhoria extraordinária dos serviços são a melhor compensação para quem gizou a operação e para os técnicos encarregados de montar o serviço.

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A repercussão interna e externa do resgate, derivada da sua projecção política e da inversão de capitais, foi o que VV. Ex.ªs sabem, e por isso numerosos foram aqueles que vieram a público arrogar-se o papel de seus autores. Só para não enxertar nesta discussão episódios mais ou menos ridículos da nossa política - todas elas têm os seus - é que não detalhamos quanto se passou a tal respeito.
Porém, na Beira, atém do que já se fez, há ainda muito a fazer para que o serviço seja o que deve ser, D serão necessárias, ainda para o porto, muitas dezenas de milhares de contos a gastar em oficinas, cais e material, para que a sua capacidade seja convenientemente aproveitada.
Também há ali ainda outros problemas prementes a resolver, como o dos esgotos e urbanização, que exigem somas enormes, que não cabem dentro das possibilidades da respectiva Câmara nem do próprio Governo-Geral, e que a categoria daquela cidade requer que sejam resolvidos com urgência e em grande.
Acresce ainda a circunstância de entendermos que a situação actual do caminho de ferro da Beira, propriedade do Ministério das Finanças, não pode continuar, e que ele deverá passar para a posse da província, que lerá de pagar o seu preço de custo e o do material adquirido, o que deve andar por uns 700:000 contos. Tudo quanto fica dito obrigará, tal qual expusemos quando tratámos de Lourenço Marques, ao dispêndio de muitas centenas de milhares de contos. Onde se conta também ir buscá-las?
Porque não se inclui tal despesa no plano?
Não se realizarão essas obras? Se assim for, verifica-se que se sacrificaram as necessidades de Lourenço Marques e Beira, que reputamos principais, ias de Tete e Moçambique, que temos como secundárias. O primeiro caminho de ferro - o de Tete -, desde que atingiu as minas do carvão, realizou o seu objectivo principal e o segundo - o de Moçambique -, desde que ainda não há a certeza da sua ligação aos da Niassalândia, não há urgência em o prolongar. Visa-se já a preparar as condições para o povoamento branco naquelas zonas? Mas não bastaria por agora dar execução ao que se projecta no Limpopo e Movene? Por que ir gastar, pois, com eles 350:000 contos desde já?
Mas, sejam quais forem as melhorias a introduzir no porto e caminho de ferro da Beira, entendeu-se então - e a proposta de lei adopta o mesmo critério - que elas não viriam a dar vazão ao tráfego a prever, e por isso o Ministério encarou naquela data duas soluções complementares da da via Rodésia e Beira.
c) A primeira consistia na derivação de parte do tráfego para o nosso caminho de ferro de Moçambique, que nós prolongaríamos até à fronteira, se os nossos vizinhos quisessem por sua vez fazer a ligação à sua rede, e que faríamos inflectir para o norte, zona apropriada à colonização branca, se não fosse aceite aquela nossa sugestão. E, como parte do trajecto era comum às duas hipóteses, em dois anos levou-se o dito caminho de ferro a mais 60 km do seu término de então.
A outra solução complementar consistia em derivar parte do tráfego para Lourenço Marques, através de uma ligação a efectuar no território da Rodésia do Sul, entre dois troços da sua rede, ou, no caso de isso não ser aceite pelos nossos vizinhos, mediante a construção por nós de um caminho de ferro destinado a tal derivação e que figura agora no projecto sob o nome de «caminho de ferro do Limpopo».
Pelo que se lê na proposta, verifico que os nossos vizinhos da Rodésia ainda se não pronunciaram pela ligação da sua rede com o nosso caminho de ferro de Moçambique, continuando, portanto, suspensa a adopção da primeira solução complementar, o que é pena, pois aquele bem precisa de tráfego.
Não obstante isso, ele vai ser prolongado, a meu ver inoportunamente, em virtude de lhe faltar o tráfego estrangeiro e de o do local não poder ser grande por agora, e custar-nos 222:000 contos, com prejuízo das soluções atrás apontadas e requeridas por Lourenço Marques e Beira.
d) Quanto à segunda solução, a de derivar o tráfego para Lourenço Marques, ela vai ser efectivada, mas não através da construção pelos nossos vizinhos, e à sua custa, do troço Beit-Bridge-Forte Nicholson, no sen território, que seria inferior a 100 km, mas sim da de 300 km, por nós, que nos custarão 572:000 contos, e que pouco valorizarão a nossa zona que atravessa, que é de poucos recursos.
Sempre me custou muito aceitar a inevitabilidade do sacrifício que para nós representaria esta última solução, e não sei se se terão esgotado todos os recursos para adoptar a primeira, em virtude de certos entusiasmos que nunca perfilhei. Mas, se não houver outra solução, é de aceitar a do projecto. Eis a concepção que presidiu, quer à execução, quer ao estudo dos trabalhos que se acabam de referir e que foi caracterizada pela necessidade imperiosa de darmos satisfação tão completa quanto possível às nossas obrigações de carácter internacional.
O que se fez e o que se pensava fazer pôr-nos-ia a coberto de reclamações e invectivas. Este era o conceito da política externa que entendemos devia informar os nossos trabalhos nos três caminhos de ferro de penetração - Lourenço Marques, Beira e Moçambique -, e ainda hoje penso que ele deve primar sobre todos os outros, visto que ali a nossa política ferroviária tem características internacionais que não podemos deixar de ter na maior conta, devendo, porém, ela ser condicionada à colaboração dos nossos vizinhos nos sacrifícios que tal política nos impõe, para que não se repitam casos como o do caminho de ferro da Suazilândia. Neste momento, pois, antes de nos abalançarmos a outros trabalhos, entendo que se deve completar o que se começou, e que se relaciona com Lourenço Marques e Beira, de modo a não dar azo a reclamações.
e) Tratados os casos dos caminhos de ferro de Lourenço Marques, Beira, Moçambique e Limpopo, todos de carácter internacional, vejamos agora o do de Tete, de carácter puramente local; e que a proposta projecta também prolongar.
Enquanto em 1947 não se definiam certos aspectos da política atrás enunciada, não se ultimavam negociações em curso e não se chegava à realização do grande objectivo atrás indicado, o resgate do porto da Beira primeiro e do caminho de ferro depois, entendeu-se conveniente fazer sair do ponto morto em que jazia há anos a construção do caminho de ferro de Tete, que, embora de importância meramente local, era, porém, de grande transcendência para a economia da província.
O carvão de Tete, durante anos e anos, não era extraído senão na ridícula tonelagem de 15 000 t anuais, e isso porque não havia outro meio de o transportar para o litoral que não fosse o da utilização do Zambeze, parte do ano impedido, porém, de ser navegável.
Havia necessidade de construir mais 150 km de via férrea numa região infestada de mosca do sono, e isso se fez em dois anos e meio.
A conclusão de tal trabalho, conjugada com a transformação da sociedade concessionária, em que passaram a participar capitais portugueses, fez com que presentemente o ritmo da extracção anual possa já atingir cerca de 200 000 t, esperando-se que nos próximos anos chegue às 300 000 t, o que permitirá que os três

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caminhos de ferro da Beira, da Niassalândia e de Moçambique, assim como as fábricas de cimento e muitas outras actividades do Centro o Norte da província, passem a utilizar o carvão nacional. Atingido, porém, como já foi, o objectivo principal de tal caminho de ferro, que eram as minas de carvão, para que prolongá-lo agora mais para o norte, em que ainda não há grandes interesses criados, indo-se gastar 127:000 contos, e quando me parece que haveria u satisfazer necessidades mais urgentes?
f) O que ficou exposto poderá dar a VV. Ex.ªs uma ideia do melindra que reveste a nossa política ferroviária e de portos em Moçambique, o que justifica quanto se fez há anos neste capítulo, uma ideia da situação relativamente boa em que nos encontramos perante os nossos vizinhos, cuja confiança conseguimos captar, devido às realizações efectuadas ou em curso, e, principalmente - e é para isso que eu chamo a vossa atenção -, dar-lhes ideia do que há ainda a fazer neste capítulo, e que requer o dispêndio imediato de somas importantíssimas.
Mencionámos já as requeridas pelos caminhos de ferro e portos de Lourenço Marques e Beira, pela operação da compra deste último e por certos serviços de inadiável urgência dessas cidades.
Consideremos ainda que, logo que a barragem do Limpopo, já em construção, esteja concluída, assim como a projectada para o Movene, haverá que reforçar com algumas centenas de milhares de contos - mais de 400:000 - os 220:000 agora previstos, apenas, para um terço das famílias a instalar, e gastar muitas outras centenas de milhares de contos - uns 700:000 o mínimo - com as que irão trabalhar os terrenos do Movene, pois não faz sentido que se façam obras para rega e não se instalem os regantes.
Nada do que fica exposto está incluído nas despesas previstas no Plano, e não creio, como já disse, que as primeiras e muito menos as segundas possam caber, quer dentro das possibilidades financeiras do serviço dos caminhos de ferro, quer do orçamento geral da província, em virtude da contribuição que a esta é exigida para aquele.
Aonde é que se vai buscar o dinheiro, pois? Em virtude de certas diligências mal sucedidas feitas pelas autoridades e autarquias locais para a obtenção na banca de umas centenas de milhares de contos destinados a pagar encargos contraídos, parece de aconselhar que se dê um balanço aos ditos encargos, creio que alguns deles aqui desconhecidos, e àqueles que se consideram ainda necessários e urgentes para satisfação daquilo que é fundamental na vida da província.
Só depois de isso revelar a possibilidade de custear ainda os trabalhos de Movene e dos caminhos de ferro de Teto e Moçambique, nos deveríamos abalançar a tais obras. E não falo da barragem do Limpopo, visto ela já estar em curso.
Em conclusão: julgo que seria prudente que as verbas destinadas no plano a Moçambique deveriam, antes de mais nada, concentrar-se na satisfação das necessidades dos portos e caminhos de ferro de Lourenço Marques e Beira, os pontos nevrálgicos da nossa política portuária e ferroviária, e só depois na satisfação dos outros objectivos.
Assim haveria que fazer a aquisição do caminho de ferro da Beira ao Ministério das Finanças; executar as diversas obras portuárias da Beira compatíveis com as suas possibilidades técnicas; montar as oficinas dos seus caminhos de ferro; resolver o problema dos esgotos e dos principais aspectos de urbanização; montar as oficinas de caminho de ferro de Lourenço Marques e a rede de distribuição de energia eléctrica; acabar os aeroportos e o caminho de ferro do Limpopo; fazer o
transporte de energia da Beira o realizar o programa de prospecções mineiras. A querer-se fazer tudo ao mesmo tempo, receio bem que Moçambique se venha a, encontrar em situação melindrosa quanto a disponibilidades financeiras, tal qual sucedeu há trinta anos a Angola.

O Sr. Carlos Moreira: - V. Ex.ª entende que as obras do Limpopo, dado o seu relevo e importância indubitáveis, devem ser prejudicadas em relação ao plano que V. Ex.ª apresenta?

O Orador: - Acho que não, pois já estão em curso e são de resto de grande transcendência, independentemente da questão do povoamento branco.
g) Mas haverá então e ainda que pôr de parte a ideia do povoamento branco, realizado através da execução de medidas directas, como transporte e fixação de colonos, e de outras indirectas, como a realização de determinados trabalhos complementares atrás referidos, ideia essa que afinal parece ser o principal objectivo do plano de Moçambique e Angola?
Ora vejamos o que se nos oferece dizer a tal respeito.
Quem ler as cinco páginas dos trabalhos projectados para Moçambique não pode deixar de admirar a largueza de vistas, a audácia e a consciência administrativa do seu autor, propondo o dispêndio de 2.342:000 contos, quantia esta que, segundo os seus dizeres, visa, em maior ou menor grau, a resolver o transcendente problema do povoamento branco. É a primeira vez que Moçambique ou qualquer outra província ultramarina dispõe de uma importância tão grande, e consagrada, como se diz, à resolução de um único problema: o povoamento.
O legislador é claro nas suas afirmações. Pretende ele:
Fixar já no vale do Limpopo 3 000 famílias da metrópole, ou sejam 9000 pessoas, a quem vai transportar, alojar, entregar 9 000 ha de terreno preparados (1/3 do total) e dar assistência técnica e crédito agrícola. Não se diz quanto será necessário para custear as despesas a realizar com o aproveitamento dos outros 2/3 da área prevista, mas, se o de 1/3 exigiu 220:000 contos, o da totalidade andará possìvelmente na ordem dos 660:000, a acrescentar assim aos 464:000 da obra de rega e enxugo, o que totalizará 1.124:000. Por agora consagram-se-lhe 684:000 contos;
Fixar em Movene um outro núcleo, cuja importância não indica, gastando já numa l.ª fase - a da construção da barragem e transporte de água e energia - 470:000 contos e depois, numa 2.ª fase - a da instalação dos colonos nos 30 000 ha a regar -, aquilo que venha mais tarde a reconhecer-se.
A quanto montará isso? O projecto não nos elucida a tal respeito, mas, tomando como base o que se previu para o Limpopo, embora tal elemento esteja sujeito a fortes correcções, já VV. Ex.ªs poderão fazer uma ideia mais ou menos aproximada de quanto virá a ser preciso para os 30 000.
Creio não ser absurdo fixarmo-nos na ordem dos 700 e tantos mil contos, o que, somados aos 470:000, totalizará 1.190:000.
Criar nas regiões ao norte de Tete as condições favoráveis à instalação de outros núcleos europeus, para o que se começará por prolongar o caminho de ferro de Tete, a que se destinam 127:000 contos.
Além destas medidas directamente relacionadas com o povoamento, apresenta outras, que ele diz que contribuirão indirectamente para o mesmo fim e as quais compreendem os trabalhos que, junto ao que fica exposto, custarão só agora os 2.342:000 contos atrás mencionados.

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Estes números dispensam-nos de justificar a asserção atrás formulada no respeitante ao arrojo da concepção do Plano.
Depois do exame já feito de alguns aspectos, passemos agora ao exame, feito embora a traços sucintos, da questão do povoamento, quer na sua concepção, quer na sua execução.
Ele orienta-se no sentido cie se repetirem as experiências feitas no tempo do liberalismo e de Norton de Matos, isto é: de se recrutarem e instalarem colonos à custa do Governo. É o que os tratadistas chamam a colonização directa.
Representa isto um volte-face em relação à política que se vem adoptando há bastantes anos, a qual tem consistido em o Governo se manter estranho ao recrutamento e colocação de colonos, limitando-se a dar facilidades de transporte àqueles que, de per si, tenham conseguido colocação nas actividades particulares que se procurava desenvolver ao máximo. É isto o que os mesmos tratadistas chamam a colonização indirecta, modalidade com raízes nos nossos processos históricos.
Teria tal política dado maus resultados? Certamente que ela foi menos espectaculosa que a executada pelos italianos durante o consulado de Mussolini, mas não julgamos que fosse menos eficiente.
Os incentivos dados a particulares, principalmente em Angola e Moçambique, para a montagem de fábricas de tecidos, de cimento, de derivados da pesca, de cerveja, e de tantas outras, provocaram a ida de engenheiros, mestres, operários especializados, enfim, que ali não se encontravam.
Os incentivos dados para o desenvolvimento de plantações e de actividades comerciais reforçaram a necessidade de recrutar aqui novas unidades.
Outro tanto se deu com o desenvolvimento dos serviços públicos.
Por outro lado, a obrigatoriedade imposta, e mais que isso, efectivada, aos concessionários algodoeiros de terem um mínimo de agrónomos, regentes agrícolas e capatazes brancos, destinados a orientar os produtores indígenas nos seus trabalhos; a ampliação deste critério aos milhares de agricultores de Angola que utilizem um mínimo de mão-de-obra; a adopção de uma política baseada no enquadramento desta, por capatazes europeus, de modo a aumentar o seu rendimento, que hoje é ainda insignificante; a substituição do indígena pelo europeu num certo número de trabalhos, como, por exemplo, os domésticos, que absorvem milhares de trabalhadores; a concessão gratuita de passagens às famílias daqueles que já ali trabalham por conta do Estado e de particulares; tudo isso, realizado em maior ou menor grau, tem contribuído para que Angola tenha hoje perto de 90000 brancos, quando em 1940 tinha 45000, e que em Moçambique trabalhem perto de 48000, quando em igual época havia cerca de metade. Quer dizer: em dez anos a população branca aumentou para o dobro. E julgamos que as possibilidades da adopção de medidas deste género, as de o Estado se limitar u contribuir para que o particular tente, de per si só, a ida para o ultramar, não estão ainda esgotadas; muito longe disso.
No dia em que aos médicos, engenheiros, bacharéis, enfermeiros, condutores e tantos daqueles, enfim, que na metrópole exercem funções liberais se garanta que os seus colegas do ultramar desempenhando funções públicas serão confinados rigorosamente no exercício das mesmas, aumentando pois o rendimento destas e permitindo àqueles exercerem a sua actividade remuneradoramente, estamos certos de que haverá uma enorme legião de diplomados que presentemente auferem aqui remunerações que roçam pela miséria que não hesitarão em procurar Lourenço Marques, Beira, Luanda o lautos outros meios ultramarinos, que hoje já não metem medo a ninguém.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - No dia em que se transplantar para Angola e Moçambique um certo número de instituições de assistência daqui, como asilos de raparigas órfãs ou abandonadas, que para ali irão, não com a mentalidade de que vão ser senhoras, dispondo de muitos criados pretos, como agora sucede, mas sim que vão desempenhar lá o papel que aqui lhes seria destinado, o de domésticas de outros brancos serão milhares de novas unidades europeias a fixar-se ali, que realizarão o duplo objectivo de incrementar o povoamento e de dispensar milhares e milhares de unidades masculinas negras para outros trabalhos. No dia em que aos funcionários públicos que ali trabalham, e são eles muitos milhares, se garanta uma aposentação em melhores condições do que aquela que usufruirão aqui estejamos certos de que muitos deles e as suas famílias se fixarão ali para todo o sempre.
Eu sei que muito do que se fez até agora baseado nesta concepção tem sido motivo de críticas, baseadas em pretensos abusos da concessão de passagens e no desemprego existente.
Realmente a falsificação aqui feita por uma agência clandestina deu origem ao logro de umas dezenas de emigrantes, que foram, porém, colocados em diversas ocupações pelos Governos de Angola e Moçambique, e o caso só teve uma certa retumbância nos mentideros, que costumam berrar porque não se povoa o ultramar, e, quando isso se tenta, fazem dos inevitáveis e pequenos argueiros gigantescos cavaleiros.
Também se tem dito que em Luanda e Lourenço Marques há brancos daqui idos, que, por se encontrar em desempregados, estão fazendo unia vida que nos deprime perante o preto.
Mas tais críticos esquecem-se de dizer que esses indivíduos recusam sistemàticamente todas as colocações que lhes oferecem no interior das províncias, naquilo que lá se chama o mato, pois a vida daqueles grandes centros tem atractivos que não possui o interior; que eles constituem a camada dos que em todos os tempos e em todos os lugares fracassaram e que são o tributo que sempre se paga quando se faz qualquer coisa de grande.
No estado de prosperidade que tem caracterizado até agora a vida económica de Angola e Moçambique, o meio tem tido capacidade de absorção, não só para quantos lá existem presentemente e que queiram trabalhar, mas ainda, para muitos outros. O essencial é que tenham aptidões e vontade de trabalhar. Quanto aos outros, aos vadios que iam para a África só para mandar pretos, não tenhamos dó deles. Falharam lá como cá e têm a sorte que merecem. De resto, se não estão contentes, utilizem a passagem que lhes foi garantida pelos seus empregadores, como era de lei. A não ser que a depressão económica, que se nota há meses, venha a acentuar-se e a tomar um carácter duradouro, não creio que as coisas se modifiquem, e que o desemprego do branco venha a constituir um problema sério.
Mas é hipótese que não convém deixar de prever, para que se adoptem com tempo as medidas necessárias.
Pelo que ficou exposto, já VV. Ex.ªs podem fazer uma ideia sucinta, mas clara, das características dos dois processos de colonização ou povoamento: o da proposta e o seguido nos últimos finos.
Qual deles será o preferível? Eu não vou maçar VV. Ex.ªs com uma exposição doutrinária sobre a preferência a dar aos métodos de colonização directa ou

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indirecta, isto é, da feita pelo Estado, como a proposta pretende fazer, ou da que é deixada ao livre jogo dos interesses particulares, como se tem feito nos últimos anos. Limitar-me-ei a fornecer-lhes uns tópicos de natureza histórica respeitantes a uns e outros, para concluir pela superioridade dos processos que caracterizaram a nossa actuação durante séculos. A história é uma grande mestra.
Comecemos, pelos processos directos.
Sá da Bandeira, Pinheiro Chagas, Júlio de Vilhena, Rebelo da Silva e Eduardo Vilaça, homens do liberalismo monárquico, e Azevedo Gomes, Freitas Ribeiro, José Barbosa e Norton de Matos, seus confrades do republicanismo, legislaram abundantemente sobre o magno problema e encararam-no sob as formas mais diversas, excepto sob a da tradição histórica.
Colonização de camponeses, a quem se promete pagar passagens, dar terras, habitação, sementes, alfaias agrícolas e sustento durante um ano; colonização de soldados europeus, que, depois de cumprido o seu tempo de serviço na colónia, gozam de idênticas regalias, eles e as suas famílias transportados pelo Estado; colonização penal, visando à selecção dos degredados, de modo a diminuir-lhes gradualmente as penas e a operar a transformação do trabalhador forçado em colono livre; colonização realizada, embora a título subsidiário, por grandes companhias coloniais, que, em troca de regalias e poderes mais ou menos majestáticos, se comprometiam também à fixação de europeus; todas essas fórmulas tão diversas e variadas, mas impregnadas sempre de um acentuado espírito estatista, foram previstas e regulamentadas por aqueles políticos.
Em sequência de tal actividade legislativa, numerosos foram os núcleos recrutados entre emigrantes transportados do Brasil para Moçâmedes, de soldados e civis para a Huíla, de degredados para Malanje, Caconda, Pungo Andungo, de poveiros para o litoral angolano, etc. Pois bem. Apesar dos milhares de unidades para ali transferidas, das enormes somas que tudo isso custou, em 1900 o número de brancos existentes em Angola era, segundo as estatísticas, de 9 000. Descontem-lhes VV. Ex.ªs os funcionários públicos e chegarão à conclusão de que tal número pouco representava em face do esforço despendido. Daí em diante, excepto no período de Norton de Matos, o Estado abstém-se de repetir os engajamentos e embarques do costume; deixa a emigração entregue a si própria e deriva o seu interesse, principalmente, para a realização de uma obra de ocupação militar, administrativa e de fomento. Ele acaba com a semi-rebelião em que viviam numerosos núcleos indígenas, mediante a actuação de forças militares importantes; completa e firma esse trabalho com a instalação de variadíssimos postos civis administrativos; rasga a massa compacta do continente angolano com numerosas estradas, que, em conjunção com os caminhos de ferro e portos melhorados, insuflam vida nesse organismo paralisado pela falta de meios de comunicação; abre a colónia às mais diversas actividades, provocando a constituição de novas e potentes empresas, como a dos diamantes, petróleos, etc.; facilita a actuação das já existentes, o que, aliado aos incentivos dados às culturas indígenas, acarreta um acréscimo de produção agrícola, que se repercute na intensificação das operações comerciais; e, finalmente, inicia a fase de industrialização, destinada a criar condições de resistência ao organismo económico angolano.
Toda esta actividade, porém, obrigou ao recrutamento de novos funcionários para os serviços recém-criados; de novos empregados para as empresas montadas, ou que tiveram de desenvolver os seus negócios, merecendo uma especial referência o caminho de ferro de Benguela; ela criou, enfim, aquilo a que os especialistas designam pelo nome de meio, que é o ambiente propício ao fluxo migratório livre.
Qual terá sido a repercussão que estas medidas tiveram no povoamento?
Nada menos que o aumento do número de europeus de 9 000 para 58 000. Este último número, apesar de oficial, deve ser superior ao real e corrigido possìvelmente para 45000.
Entrem, muito embora, VV. Ex.ªs em linha de couta com os elementos de correcção a que já se aludiu e verão que o incremento foi enorme, apesar da abstenção do Estado neste capítulo.
A conclusão a tirar destes números - 9 000 e 45 000 - é que o povoamento se conseguiu de uma maneira incomparàvelmente mais eficaz quando se substituiu o processo artificial do recrutamento e instalação dos colonos à custa do Estado pelo da criação do um ambiente susceptível de atrair gente.
Os partidários dos métodos directos pretendem filiar os fracassos citados em causas que são do conhecimento daqueles que, dentre VV. Ex.ªs têm tratado mais detalhadamente estes problemas de povoamento: a má qualidade dos colonos, recrutados muitas vezes em meios que não eram agrícolas; a deficiência de estudos sobre a instalação, feita muitas vezes em terrenos de mau clima ou de pouca fertilidade; o abandono a que foram votados, após o primeiro ano do seu estabelecimento; a falta de meios de transporte; a ausência de continuidade nos trabalhos, etc.
É certo que todas estas circunstâncias tiveram a sua influência no resultado apontado, mas a maioria delas era inerente à própria essência das concepções adoptadas, e, por conseguinte, tinham de se produzir fatalmente.
De resto, o resultado da colonização livre atrás citado não era mais do que a Confirmação do que só alcançara em tantos séculos da nossa actividade colonizadora. O infante D. Henrique e a Coroa mais tarde, em lugar de procederem de conta própria ao povoamento e exploração das ilhas que iam descobrindo, entregavam isso aos descobridores ou a servidores que queriam favorecer.
Não esperassem, porém, eles do Governo nem subsídios, nem ajudas, mas contassem apenas consigo próprios.
Então esses homens, futuros criadores de aldeias, vilas e cidades, liquidavam em Portugal os seus haveres, mobilizavam o seu crédito, fretavam um ou mais barcos, neles embarcavam família, servos e dependentes, todo o clan, enfim, que nos tempos medievais gravitava em volta dos grandes senhores, e ei-los que corriam à grande aventura. Os primeiros tempos da instalação e vida interna dessas colónias eram difíceis, devido aos terrenos a desbravar, às culturas a ensaiar, à dificuldade de abastecimentos, às questões de toda a ordem, enfim, que iam surgindo nessa colmeia incipiente. As regalias, porém, que, por sua vez, o donatário concedia aos colonos, que ele recrutava com o maior cuidado, pois deles dependia o progresso ou o fracasso da empresa em que comprometera todos os seus cabedais; a consciência que cada um tinha de estar trabalhando em excepcionais condições de independência e de favor, que lhe garantiam sérias possibilidades dum futuro desafogado; a vontade indomável de cada qual se adaptar a um meio, donde jamais sairia, visto antecipadamente ter quebrado os laços de família e interesses que o ligavam à metrópole, tudo isso levava esses homens a obrar prodígios. E assim é que a Madeira trinta anos depois do início da sua colonização coutava já 800 homens de armas e no século seguinte exportava 4 400 t de açúcar. Aquele simples número

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de guerreiros, correspondente a uma população de, pelo menos, 4 000 pessoas, fixada num lapso de tempo tão curto (trinta anos), mostra a, eficiência do processo adoptado e a energia daqueles nossos ancestros..
E não se diga que este exemplo da Madeira foi um caso esporádico, excepcional, que não autoriza generalizações e, muito menos, conclusões. O que aqui se deu repetiu-se nos Açores, não uma vez, mas nove, em todas as ilhas, que, à medida que iam sendo descobertas, eram entregues total ou parcialmente aos donatários.
As quilhas das nossas caravelas não deixavam, porém, de sulcar o Atlântico e as descobertas sucediam-se umas às outras. À medida que nos íamos aproximando do Equador, ao chegar-se a Cabo Verde e a S. Tomé, as condições climatéricas, tão diferentes das das ilhas adjacentes, impunham, porém, correcções e modificações aos processos empregados. Mantinha-se, sim, o regime dos donatários com atribuições idênticas aos seus iguais do Atlântico Norte, mas, atentos os inconvenientes que um clima deprimente criava ao trabalho braçal do branco, que não podia mourejar de sol a sol, e dadas as dificuldades cada vez maiores encontradas no recrutamento de colonos brancos, dentro de um país de tão escassa população, recorreu-se à aquisição de negros na Guiné, ao mesmo tempo que se lhes mandavam também degredados e inclusivamente os filhos dos judeus, que no tempo de D. Manuel tinham sido arrancados aos pais. Assim, as oito ilhas de Cabo Verde iam sendo ocupadas e, mercê da coexistência do branco metropolitano e do negro da Guiné, o povoamento perdeu a característica que se notava nos Açores e Madeira, a do exclusivismo da raça branca, para se caracterizar pelo aparecimento de um novo espécime: o mestiço. Este, produto do cruzamento do branco e do negro, proliferou de tal maneira que, quer devido ao seu maior poder de adaptação àquelas condições climatéricas, quer às dificuldades do recrutamento branco mencionadas, o mestiço, dizíamos, passou a constituir 60 por cento da população cabo-verdiana, enquanto que a percentagem dos brancos é hoje apenas de 3 por cento. O incremento do núcleo civilizado entretanto foi tão rápido que setenta anos depois da descoberta, em 1532, Cabo Verde já tinha um bispo.
Por sua vez, S. Tomé, apesar do seu clima extraordinàriamente doentio, que não permitia que ela fosse uma colónia de povoamento, mas sim de plantação, tinha em 1522, ou seja vinte e nove anos após o início da sua exploração, já 700 fogos, além dos habitantes residentes em sessenta engenhos, cuja produção se computava em 6 000 t de açúcar. Comparem VV. Ex.ªs este número com as 12 000 t de cacau que ela hoje exporta e verão quão extraordinário foi o progresso alcançado naquele lapso de tempo tão curto.
Porém, todos os trabalhos realizados até então nestas ilhas desertas, Madeira, Açores, Cabo Verde e S. Tomé, podem-se considerar simples ensaios e a consciente preparação paxá uma obra que, pela sua amplitude, tem foros de gigantesca: o povoamento do Brasil. Aqui não se trata já de pequenos blocos de 500 ou 800 km2, dispersos pelo Atlântico, com um clima mais ou menos parecido ao da metrópole, com possibilidades culturais idênticas às desta, e nos quais se vive em segurança absoluta, por não haver naturais a combater. Aqui, as extensões são infinitas, não se conhecendo os limites da nova terra, massa continental monstruosa, que levam séculos, não já a povoar, mas simplesmente o reconhecer.
O clima já não é o madeirense, tão benigno este que se prestará a instalações sanatoriais; não é o açoriano, em que o branco metropolitano se sente como em Portugal; não é, mesmo, o de Cabo Verde, temperados pelas brisas constantes. O clima brasileiro é para o português, recém-chegado, um inimigo pior que o próprio índio, habitante daquelas selvas. Por sua vez, este não tardará a reagir perante o invasor, dificultando em extremo a ocupação, pelo estado de guerra permanente em que o obriga a viver.
Também o corte do pau-brasil, que nos primeiros tempos constituiu a exclusiva actividade de negócios entre a nova colónia e a metrópole, não bastará, dentro em breve, para ocupar a febril actividade dos povoadores, e por isso será preciso ensaiar culturas acomodadas a condições agronómicas tão desconhecidas.
Por este ligeiro resumo, vemos que não se exagera classificando de gigantesca a tarefa a que se ia abalançar o Portugal de 2 milhões de habitantes, cuja actividade se dispersava, ao mesmo tempo, pelas ilhas do Atlântico, pelos presídios da costa norte e ocidental de África, pela índia e Oceânia. O nosso rei D. João III, a miem cerca um escol de homens de governo, guerreiros, navegadores e administradores, escol esse dotado duma rica, variada e velha experiência, esse nosso rei, que durante tanto tempo foi apreciado menos justamente, lança ao povo português a palavra de ordem, que vai criar um novo império. O país, que a esse tempo se apresenta povoado por tribos selvagens, erradias, que o escritor brasileiro Calogueras julga não abrangerem mais de 800 000 habitantes; o país que não possuía uma civilização como a que fôramos encontrar na índia, nem mesmo em Marrocos; esse país, que se oferecia aos olhos de todos sob o aspecto mesquinho de fornecedor de pau-brasil, vai ser, mercê da maravilhosa intuição dos nossos governantes, a maior obra dos portugueses, aquela que perdurará pelos séculos adiante, através da nossa língua, religião e raça, os três grandes atributos que definem uma nacionalidade.
Também aqui, como nas ilhas povoadas por nós até então com tão bons resultados, quem vai lançar os caboucos do grandioso edifício são, mais uma vez, os donatários. A cada um dá-se uma faixa de cinquenta léguas descontínuas de costa, e às vezes mais, com uma profundidade ilimitada.
Que cada qual se interne, pois, aio sertão, tanto quanto quiser, e tome, dentro da sua zona, a terra que puder. Eles têm, segundo diz Lúcio de Azevedo, o privilégio dos engenhos; 5 por cento da soma em que importasse o pau-brasil (que continuava a ser privilégio da Coroa); o dízimo das terras do pescado, das mercadorias importadas; o quinto dos metais. Por sua vez, o donatário faz aos sesmeiros abastados, que ele recrutou, pois o Estado não cura disso, concessões enormes (o mínimo de duas léguas em quadra para canaviais e dez para pastagens no dizer da época).
Assim se cria o tipo da grande propriedade, diverso do que existia nas ilhas, visto que aqui a terra não falta, existe a mão-de-obra indígena e a qualidade dos colonos é diferente (numerosos como são os fidalgos e gente abastada). Só com Martinho de Sousa tinham embarcado vinte filhos de nobres casas, e por isso Vahia Monteiro diz: «que os brancos, mesmo pobres, nunca trabalham com os seus braços na lavoura, visto que o trabalho enxadeiro é deprimente. Mercadores na cidade, mascates no interior, donos de pequenos rebanhos, em cada um há um pequeno aspirante à aristocracia rural».
O senhor do grandes recursos monta os seus engenhos em que mói a cana da sua lavoura e a dos vizinhos, acumulando assim a função de lavrador e industrial; o mais modesto cultiva, apenas com os seus negros, canaviais que vão fornecer a maior parte da matéria-prima laborada nos engenhos; há ainda os que se dedicam a criação de gado e que, deslocando-se léguas e léguas à procura de fartas pastagens, contribuem como ninguém para o conhecimento dos sertões. Os vaqueiros, como mais tarde os pesquisadores de ouro e dia-

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mantes, são os grandes exploradores do interior brasílico, aqueles a quem cube a glória de constituir as grandes forças de penetração de regiões insuspeitadas. Foi tão intenso o esforço realizado nos primeiros cinquenta anos de povoamento que o número de brancos em 1583 era, segundo Luís Amaral, de 25000, e só a exportação de açúcar subia a 2 800 000 arrobas, ou seja 42 0001, bastante mais, pois, que as 35 000 que Angola exporta hoje em dia.
Se Pernambuco, com os seus 2 000 colonos, dos quais 100 tinham rendas superiores a 5:000 cruzados, era a capitania mais rica, a Baía era, porém, a mais populosa, e nela havia nessa época 1G paróquias e 40 igrejas.
Como diz o brasileiro Lemos de Brito, as cidades e vilas dessas capitanias reluziam no fausto dos homens, que trajavam veludos e damascos, e das mulheres, que ostentavam sedas e jóias. Cruzavam as ruas cadeirinhas ou palanquins asiàticamente pomposos, que eram verdadeiras preciosidades, e o ajaezamento dos cavalos era de prata com incrustações de ouro. Os mais finos vinhos de Portugal enchiam as adegas e abundava toda a casta de baixelas de prata, o que dava à vida uma nota flagrante de fausto e opulência.
E não se julgue que estes resultados foram devidos à descoberta das minas, que em toda a parte provocam uma verdadeira corrida para tais países. Não; eles foram motivados apenas pelo desenvolvimento da actividade agrícola, principalmente na sua modalidade açucareira, pois a procura do ouro só começou em meados do século XVII, isto é, setenta anos mais tarde, e a descoberta dos diamantes fez-se em princípios do século XVIII. A exploração de uns e de outros não serviu para mais do que para reforçar o movimento que já vinha de trás e para dar um incremento enorme à riqueza e povoamento brasileiros. A produção do ouro, que nos primeiros treze anos era de 1224 kg, atingiu no período de 1752 a 1777 183 000 kg e está calculado que em cento e vinte anos o valor da sua extracção foi de 1.600:000 contos de hoje. O fomento brasileiro seguiu num ritmo cada vez mais acelerado, e assim é que, dinamizado pela permanência de quinze anos de D. João VI e dos 15 000 portugueses que o acompanharam em 1807, as terras de Santa Cruz contavam à data da sua independência 2500000 portugueses.
Eis, senhores, a súmula de uma obra formidável, que se executou, não em sossego, como nos Açores, mas tendo de combater toda a espécie de inimigos. Eram as incursões dos índios, que em semanas inutilizavam o trabalho de anos, como sucedeu na Capitania dos Ilhéus, que viu destruídos os seus oito engenhos e reduzidos a 30 os seus 500 colonos, mortos ou fugidos os restantes. Era a pirataria francesa, que devastava plantações, destruía fábricas e saqueava as cidades do litoral. Foram mais tarde os Holandeses, que conseguimos expulsar só após vinte e quatro anos da sua instalação em Pernambuco e que deixaram marcado o seu rasto pelas destruições feitas. Dos oito engenhos o quatrocentos currais instalados em Sergipe durante quarenta e sete anos de um trabalho persistente não restavam vestígios alguns após a sua expulsão.
Os donatários, não tendo forças para tais empresas, que requeriam a mobilização dos recursos de todo o país, foram desaparecendo a pouco e pouco, mas não só lhes pode negar a glória de terem sido os cabouqueiros gigantescos que, trabalhando entregues aos seus próprios recursos, lançaram os alicerces de tão grande obra. Mesmo quando, pela sua morte ou resgate das concessões feito pelo Estado, se deu a unificação política da colónia, o Poder Central absteve-se sempre de intervir no recrutamento dos colonos, deixando a emigração entregue a si própria.
Do que acabamos de desenvolver ressalta a conclusão de que, tanto no século de Quinhentos, como no de Novecentos, os processos que se revelaram mais eficazes para o povoamento foram os da acção indirecta do Estado.
¿ Deverá condenar-se in limine e em todas as circunstâncias a intervenção directa do Estado?
Não, mas só quando a indirecta não seja viável, em virtude de crises que impeçam o desenvolvimento económico dos países por elas devastados.
Terá o autor da proposta elementos que o levem a considerar seguro o desencadear de uma crise económica, com todas as suas consequências de despedimento de pessoal das empresas? Neste caso compreende-se o seu critério, mas creio bem que ele irá antas beneficiar os que já se lá encontram do que os que se tencionem recrutar aqui.
Concluindo:
1.º Os processos tradicionais de povoamento empregados pelos Portugueses até ao liberalismo tiveram como base as excepcionais regalias dadas aos donatários mediante a transferência para eles dos direitos da Coroa. Por sua vez, eles tomavam a seu cargo a execução de tal tarefa, fazendo à sua custa o recrutamento, o transporte e a instalação dos colonos, proporcionando-lhes enfim todos os meios de acção para poderem progredir. Os resultados de tal método foram os melhores possíveis, como provam o desenvolvimento populacional da Madeira, dos Açores, de Cabo Verde, de S. Tomé e do Brasil.
2.º Nos primeiros oitenta anos do liberalismo puseram-se de parte estes processos históricos, adoptando-se outros, que consistiam em todas as operações antigamente realizadas pelos donatários passarem a ser feitas directamente pelo Estado, por intermédio das suas autoridades. Esta alteração de critério conduziu a resultados medíocres, como o mostrou o exemplo de Angola referido ao ano de 1900.
3.º A partir dessa data até agora, de uma maneira geral, o Estado desinteressou-se, não obstante o legislado, da efectivação de medidas análogas às anteriores, concentrando a sua acção, principalmente a partir de 1920, na ocupação militar, na administrativa e no desenvolvimento dos recursos económicos, quer mediante a realização das mais variadas concessões a grandes companhias ou particulares, quer mercê do incentivo dado às culturas indígenas. A consequência de tal política traduziu-se no enorme incremento da população branca de Angola vivendo do exercício de empregos públicos e ido de actividades particulares, nas suas modalidades comerciais, industriais e agrícolas.
Consequentemente, os bons resultados obtidos durante os primeiros quatro séculos e os últimos cinquenta amos, fruto da adopção de processos de colonização indirecta, contrapondo-se aos medíocres da colonização directa, indicam-nos que a fórmula normal corrente a adpotar, deverá ser a primeira, e não a segunda. É, pois, na resolução dos problemas de carácter geral, e não daqueles que interessam mais à iniciativa particular, que o Estado deve fazer incidir a sua atenção.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Pois bem: a proposta, apesar de confiar mais nos resultados do povoamento indirecto que nos do directo, pois é ela que diz que a maior contribuição neste campo não provirá da intervenção de qualquer plano oficial, mas sim da acção espontânea e livre, como consequência natural e lógica do crescimento da província, a proposta, digo, abalança-se a uns trabalhos em escala nunca realizados entre nós, que vão custar milhões, os quais, aplicados em fomentar a economia,

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seriam, possìvelmente, de resultados mais eficazes, mesmo sob o ponto de vista do povoamento. Tal só se compreende, se da sua parte houver a convicção atrás mencionada. Feito o exame da política da proposta no aspecto da concepção, passemos agora ao da sua execução.
Escolheu-se para realizar esta grande experiência de colonização o vale do Limpopo, uma das zonas menos salubres da província e que nunca foi apontada como susceptível de ser colonizada. Eu sei que com o progresso dos meios profilácticos hoje se vive em toda a parte, mas isso não quer dizer que não haja vantagem, o mesmo necessidade absoluta, para evitar descréditos, de que para a primeira experiência em grande escala que se vai fazer não se devesse preferir uma zona das conhecidas em Moçambique como das mais salubres, mesmo que sejam menos ricas. Apesar do mau clima, haverá maneira de fazer subsistir o núcleo a instalar? Acredito, mas à custa de muito dinheiro e de maiores dificuldades a vencer durante muitos anos, para se realizar a adaptação da primeira geração que para ali vá.
Também o projecto não alude à natureza das culturas a fazer pelos colonos. Calculo, corem, que tal aspecto esteja devidamente estudado. Vai-se para o de produtos similares aos metropolitanos que já são do conhecimento dos futuros produtores? Apesar das diferenças de meio, a sua adaptação será fácil. Vai-se, porém, para a de outros que lhe sejam estranhos, como a cultura da cana sacarina, do algodão, etc.? Então o caso terá bem mais dificuldades, muito embora não tenha um carácter irremovível.
Mas há ainda um outro aspecto muito delicado nesta escolha da região do Limpopo. O que se vai fazer aos milhares de agricultores indígenas que já ali vivem e junto dos quais há anos se vem exercendo uma acção pertinaz no sentido de os agarrar à terra, fornecendo-lhes charruas, promovendo aldeamentos, etc.? Vão-se expulsar pura e simplesmente para outras zonas ?
Não vejo outra solução, mas ela é bem delicada. Parece-me, pois, que tanto a zona do Limpopo como a do Movene não são das mais indicadas para o povoamento branco e que haveria que preferir muitas outras mais saudáveis e em que, de resto, há possibilidades de cultivar produtos ricos, como o chá, no Gurué, etc. As duas indicadas no Plano poderiam servir para colonatos indígenas.
Não me alongo mais na apreciação de outros detalhes, por falta de tempo.
Angola. - Aqui o plano de trabalhos obedece à mesma orientação dos de
Moçambique, uns contribuindo directamente e outros indirectamente para o povoamento.
Pretende-se:
Fixar dois núcleos de povoamento em 24 000 ha da região do Cunene, em condições de instalação idênticas às enumeradas para Moçambique e servidas pela barragem de Matala, o que tudo custará 1.160:000 contos;
Fixar outros em centenas de milhares de hectares da região do Cuanza, logo que estejam concluídos os estudos das quedas do Duque de Bragança, destinando a estes últimos a importância de 10:000 contos. Ao lado destas medidas de carácter directo enumera outras de carácter indirecto, como sejam as de aproveitamentos hidroeléctricos, caminhos de ferro, portos e aeródromos.

O Sr. Melo Machado: - V. Ex.ª pode dizer-me se os 23 ha previstos, 3 de regadio e 20 de sequeiro, são suficientes para sustentar uma família europeia?

O Orador: - Confesso a. V. Ex.ª que, em presença da ausência de elementos, que não figuram na proposta, não me considero habilitado a poder dizer se realmente esses hectares são suficientes. De resto, o cálculo a atribuir a cada colono tem sido muito variado, como se pode verificar consultando a legislação do Sr. Engenheiro Vicente Ferreira, quando Alto-Comissário, a de Sá da Bandeira e a de tantos outros. Tudo depende do fim a que as terras se destinem, ou seja de produtos ricos ou pobres.

O Sr. Carlos Moreira: - O que parece que é fora de dúvida é que a natureza do terreno é muito importante para o emprego de culturas ricas.

O Orador: - De facto, assim é.

O Sr. Carlos Moreira: - Isso, indirectamente, responde à observação do .Sr. Deputado Melo Machado.

O Orador: - Devo dizer que o valo do Limpopo, por exemplo, já por alguns técnicos tem sido assemelhado ao vale do Nilo. A irrigação daquele vale causou entusiasmo no Ministério do Ultramar, e eu mesmo compartilhei desse entusiasmo.
Contudo, tenho bastantes apreensões quanto à fixação do europeu naquela região, havendo outras bem melhores, embora menos ricas. Em todo o caso, a obra de irrigação não deixará de ter enorme vantagem, pois mesmo que não sirva para brancos, servirá para o indígena, já ali aclimatado.
Reatando o Ao das minhas considerações, devo dizer que as que fizemos para Moçambique têm igual aplicação para Angola.
As considerações que fizemos para Moçambique, no referente à concepção teórica e à execução do povoamento, têm igual aplicação quanto a Angola. A própria escolha de um dos blocos, o principal, na região do Humbe dá lugar a certas dúvidas, por se tratar de uma zona que me dizem ser pouco salubre, de terrenos fracos e afastada centenas de quilómetros do caminho de ferro. Também os estudos que se vão fazer na zona do Cuanza sofrerão do mesmo inconveniente, por incidirem numa região igualmente insalubre.
Quanto aos restantes trabalhos mencionados, não posso deixar de os aprovar, porque à sua quase totalidade tenho ligada a responsabilidade do os ter mandado começar ou estudar, embora me pareça que há que tomar também em consideração os encargos deles resultantes, que me parecem bastante pesados para a província, que já tem uma dívida superior à de Moçambique, e cujas receitas não poderão deixar de se ressentir com a crise que parece avizinhar-se.
A única observação que tenho a fazer é a falta de ligação de certas medidas que deveriam tender para o mesmo fim, e, a título de exemplo, direi que há anos, ao estudar-se o problema do caminho de ferro de Moçâmedes e da zona por ele servida, se encararam ao mesmo tempo os aspectos do seu prolongamento, do alargamento da sua bitola, da sua ligação com as estradas que o deveriam servir, da construção do porto, e os do desenvolvimento ou mesmo criação de determinadas actividades económicas, tais como a pesca, indústrias dela derivadas, estudos oceanográficos, construção de matadouros, frigoríficos, estabelecimento de postos pecuários, etc.
Assim, o plano de trabalhos públicos atrás detalhados, que se estudou e começou a executar, tinha como complemento a instalação de fábricas de farinha de peixe e de matadouros frigoríficos, cujos projectos se fizeram e que se contava pôr em prática, a breve trecho, do modo a que tudo ficasse concluído aproximadamente na mesma altura. Desta forma, todas as medidas enumeradas estavam estreitamente ligadas e tenderiam para o mesmo fim, que ora a valorização da zona Moçâmedes - Huíla. Era a repetição do que se fizera em Moçambique, quando

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se tratou da aplicação do empréstimo de l milhão de contos. Julgo que tem sido a causa de muitos fracassos o tratarem-se certas questões parcelarmente e não em conjunto. Fomentar a produção sem lhe assegurar meios de escoamento, ou vice-versa, construir caminhos de ferro sem desenvolver paralelamente actividades económicas, à espera que aquele meio de transporte, por si só, o faça, em muitos e muitos casos traduz-se em fracasso.
Cabo Verde. - Aqui o Plano é dominado pela ideia do incremento da área do regadio e pela da execução de certas obras no porto de S. Vicente. Será acertada tal directriz?
Assim o julgo. Esta província é, de todas as que compõem a Nação, a mais desgraçada e infeliz, apesar de ser aquela que mais semelhanças tem com a metrópole, referente a costumes, cultura e sentimentos. Flagelada periòdicamente, e há séculos, por secas que ocasionam a perda quase integral das suas sementeiras de sequeiro, as quais depende principalmente a vida económica, a sua população, nesses anos, passa horrores. (Apoiados). Em tais ocasiões o Governo Central acode com socorros mais ou menos volumosos, mas como não é tarefa fácil o valer a 150 000 habitantes, quase todos caídos na mais negra miséria, eles não evitam as consequências atrás referidas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E como, por outro lado, o dinheiro gasto em tais ocasiões o é em trabalhos improvisados, dispersos e executados por uma mão-de-obra extraordinàriamente debilitada, deles pouco ou nada costuma resultar.
Há muito que venho defendendo a ideia de que os efeitos das perdas das sementeiras de sequeiro por falta de chuvas - fenómeno este que não está na nossa mão evitar - podem ser atenuados com o incremento a dar ao regadio, com o apetrechamento a ministrar ao porto de S. Vicente e com o desenvolvimento a fazer das pequenas, mas numerosas, indústrias já existentes.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Há cinco anos que uma brigada de técnicos vem dando execução ao plano elaborado para uma das principais ilhas - a de Santo Antão -, levantando represas, fazendo serpentear levadas, aproveitando, enfim, de todas as formas os lençóis subterrâneos que ali se encontram e melhorando o povoamento florestal e a pecuária. Há três anos que se deram as necessárias ordens no sentido de se elaborarem iguais planos para as outras ilhas mencionadas na proposta, e, consequentemente, entendo que só é de louvar o que nela se dispõe a tal respeito.
Mas, tendo em atenção que só numa delas se gastavam em cada um daqueles perto de 4:000 contos, que os trabalhos sofreram imenso com a exiguidade das dotações e que, consequentemente, o seu desenvolvimento foi muito pequeno, considero as verbas orçamentadas - uma média de 2:000 contos por ano e por ilha - extraordinàriamente insignificantes, e elas não permitirão que tais trabalhos, pela sua pequena projecção, exerçam uma influência sequer razoável na economia cabo-verdiana. É preciso, pois, duplicar ou triplicar pelo menos tais verbas e aplicá-las urgentemente para não suceder o que é costume: vir a gastar-se num ano de crise dez vezes, quase sem vantagem, o que se poderia ter despendido em dez anos regulares com melhores resultados.
Quanto ao porto de S. Vicente, a sua importância política, militar e comercial levou há anos o Ministério das Colónias a encarar a possibilidade do financiamento das obras de que precisa, pelo Plano Marshall, de modo a poder readquirir a posição que perdeu com a concorrência feita pelas Canárias e Dacar, portos mais bem apetrechados, embora mal situados geogràficamente.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Ele é para o Atlântico Sul o que os Açores são para o Atlântico Norte, e portanto não se reputava impossível interessar as Nações Unidas na execução do plano da sua valorização, que, julgo, deverá compreender trabalhos de muito maior vulto e mais dispendiosos do que os mencionados na proposta. Esta presume porém que, mesmo depois dos estudos em curso, se não deverá ir além dum simples cais de atracação e dum plano inclinado, para o que se inscreveram 20:000 contos. É esta uma ideia contrária a tudo quanto tenho lido sobre este assunto e que me parece pecar por demasiado restrita.
Quanto às outras verbas consignadas para as sondagens, transportes marítimos e aeródromos, têm elas plena justificação. Dando o meu acordo, e, mais que isso, o meu aplauso, à orientação tomada no referente à natureza das obras citadas, não posso entretanto deixar de lamentar que não se tome qualquer providência no referente ao incentivo das industriais locais já existentes e doutras que seja possível criar. Já tive ocasião de dizer que para mim o correctivo a adoptar para aã crises resultantes da perda do sequeiro estava no incremento a dar ao regadio e às várias indústrias.
Acrescentarei mesmo que a última medida será de efeitos mais amplos e vastos que a primeira. A pesca, as indústrias dela derivadas, o fabrico do sabão, da telha, do tabaco, do sal, das bolachas, tudo isso, que já existe num estado mais ou menos rudimentar, é susceptível dum certo desenvolvimento, julgando nós que a actividade piscatória e a que lhe é complementar podem empregar milhares de cabo-verdianos. Se já ali exitem, pois, várias indústrias que vivem há muitas dezenas de anos, o que, junto a outros factores, prova a favor da sua viabilidade, indústrias essas que só não tomam um grande desenvolvimento devido à falta de recursos financeiros e técnicos, porque não se encara a possibilidade de realizar o seu estudo e financiamento no caso de as conclusões se mostrarem favoráveis?
Se o Estado aqui na metrópole, directa ou indirectamente, vai financiar várias das indústrias mencionadas no Plano, porque não há-de ele fazer outro tanto em Cabo Verde? Pretende-se, como diz o Plano, que o seu desenvolvimento, tal qual o saneamento, as estradas, etc., fique a cargo do orçamento normal? Mas se este consigna para tudo verbas tão insignificantes que quase chega a ser vergonha falar delas! Para dar a VV. Ex.ªs uma ideia do que sucede em tal capítulo, dir-lhes-ei que para estradas e serviços agrícolas em oito ilhas a verba é de 1:145 contos. A não se fazer nada no capítulo industrial, três das ilhas que só têm possibilidades neste campo em nada beneficiarão do Plano, que nem sequer se lhes refere.
Comecei por dizer que Cabo Verde é a província mais desgraçada de toda a Nação. Ela merecia bem mais atenção que S. Tomé, por exemplo, que nunca lutou com as suas dificuldades, que se encontra numa situação de grande prosperidade e que é contemplada com 240:000 contos. Ela bem merecia que das verbas consignadas a Angola e Moçambique se distraísse umas dezenas de milhares de contos, que a elas pouca falta lhes fariam e que para o arquipélago eram de uma importância enorme. Ela bem merecia um especial carinho da parte da metrópole, pois, sejam quais forem as contingências que os séculos nos reservem, julgo que

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a sua situação geográfica, a sua pequena população e os sentimentos desta farão com que o arquipélago sempre faça parte da aglomerado nacional.
Esta seria uma ocasião única e excepcional para que nela se exercesse uma acção intensa, duradoura e inteligente que a pusesse a coberto de novas hecatombes. A ser, porém, aprovada a proposta tal qual lhe diz respeito, o seu martírio não terá fim. Entendo, pois, que se lhe deve atribuir uma dotação muito maior para o desenvolvimento do regadio, para a resolução do problema do porto de S. Vicente de uma forma muito mais ampla, para fomentar o desenvolvimento industrial, e diminuindo ao mesmo tempo os seus encargos com tal empréstimo, tal qual se fez para Timor.
A ideia mestra do plano é a do povoamento e fixação da mão-de-obra. Também a julgamos acertada. S. Tomé ainda há cinquenta anos tinha, através da sua exportação de 40 000 t de cacau, uma influência enorme na balança comercial da metrópole, contribuindo de uma forma muito importante para diminuir o desequilíbrio desta. E tal resultado conseguia-o ela mercê de uma intensiva exploração agrícola, levada a efeito por poderosas empresas capitalistas que ainda hoje dominam a vida económica da província. Mas, como os 25 000 habitantes das ilhas não podiam fornecer os 30 000 trabalhadores necessários as roças, recorria-se normalmente a Angola e Moçambique, que ali tinham permanentemente aquele número.
O problema fundamental da província era então, como ainda o é hoje, apesar da queda da produção, o angariamento de trabalhadores, e a situação chegou ùltimamente a ter um aspecto delicado, pois os governos daquelas duas províncias punham-lhe toda a espécie de dificuldades, devido à inviabilidade do recrutamento voluntário e às suas necessidades de mão-de-obra.
Era preciso, por motivos de ordem vária, acabar com a ideia de que quem ia para S. Tomé não voltava às suas terras, o que dificultava o recrutamento, e por isso, em três anos, se repatriaram 20 000, isto é, todos aqueles que tinham terminado os seus contratos. A luta a travar para conseguir a sua substituição foi dura, mas conseguiu-se organizar o regime de recrutamentos e repatriações em termos que permitem afirmar-se, com segurança, que hoje em dia ninguém está em S. Tomé depois de expirado o prazo do contrato.
Mas este era um dos aspectos da candente questão da mão-de-obra, e mão o principal, pois, enquanto S. Tomé estivesse dependente das entradas de trabalhadores estranhos, a situação não se resolvia de uma forma definitiva.
Havia que caminhar no sentido de a província se bastar a si própria, e por isso a solução era a fixação, a título definitivo, mas voluntário, do número de trabalhadores importados temporàriamente que bastassem às necessidades de S. Tomé. Mas isso só se resolveria, se se resolvesse, modificando estruturalmente tudo quanto até então regulava o regime de vida dos serviçais.
Estes odiavam a vida de S. Tomé, não porque tivessem uma alimentação pior que nas suas terras, porque as suas cubatas fossem menos confortáveis, que a indumentária deixasse a desejar, que a assistência clínica fosse deficiente, etc. Não; pois nesse capítulo tudo era melhor, mas o facto de deixarem lá longe mulheres, filhos e todos os parentes, de passarem a viver num regime de caserna, chamemos-lhe assim, com a sua vida regulada nos mínimos pormenores, de acabarem enfim de perder a esperança de voltarem a ver os seus e a sua terra, tudo isso explicava o ódio atrás mencionado. E assim se criou uma atmosfera a respeito de S. Tomé que era explorada contra nós até na imprensa estrangeira.
Na intenção de remover as causas atrás mencionadas publicou-se o decreto a que alude o parecer da Câmara Corporativa, no qual se encarava a fórmula, não do recrutamento individual que era o corrente, mas sim de famílias e até de povoações inteiras das regiões insalubres de Cabo Verde, de Angola e de Moçambique, a sua instalação em aldeias junto das propriedades, de modo a poderem os trabalhadores regressar diàriamente, terminadas as suas tarefas, ao seio da família, a instituição de um regime de trabalho livre, no género do seguido nas nossas explorações agrícolas daqui, a criação, mesmo, de explorações de conta própria, para os trabalhadores mais hábeis.
Dois aldeamentos foram construídos pelo Governo, uns dez pelos roceiros mais compreensivos, e pretende-se agora, neste projecto, dar uma grande amplitude àquilo que se iniciou com grandes cautelas e cuidados.
Só tenho de louvar tal orientação, e ouso afirmar que tudo quanto se tem feito ou venha a fazer em trabalhos públicos de outra natureza não terá na vida económica da província a projecção daqueles que visem a resolver o momentoso problema da fixação da mão-de-obra.
Este é o problema número um de S. Tomé, e a uma enorme distância de todos os outros, e, por isso, louvores são devidos agora ao Ministério em o ter encarado de frente e com uma grande largueza de vistas.
Parto do pressuposto, bem entendido, de que os trabalhos em projecto visam principalmente, e desde já, a resolver o caso da mão-de-obra dos plantadores, pois esta é a questão mais urgente e importante, e que a instalação de trabalhadores de conta própria em zonas afastadas das roças ficará para uma segunda parte. É que pretender explorar incultos mediante a instalação, sempre cara, de núcleos populacionais, demais a mais desconhecedores das culturas de S. Tomé, sem ter acudido às necessidades prementes de plantações em pleno desenvolvimento e com os seus serviços montados, não me parece razoável.
Eu preferia que o maior número de aldeamentos fosse feito directamente pelos roceiros, como preceitua o decreto, mas não deixo de concordar que a fórmula deste projecto é talvez a mais eficaz para combater resistências passivas que sempre surgem contra ousadas inovações como é esta.
Todos os outros trabalhos, e em especial os do porto, são de perfilhar, e se não fosse a necessidade imperiosa mencionada ao tratar de Cabo Verde de sacrificar as dotações destinadas às províncias em situações mais desafogadas como esta, Angola e Moçambique, em favor daquela desgraçada sua irmã, eu não ousaria lembrar a supressão da dotação de 80:000 contos consignados à estrada de cintura, e que não reputo de uma urgência tão flagrante como os trabalhos que se mencionaram para Cabo Verde.
De resto, é preciso entrar em linha de conta com os encargos futuros a criar para uma província que amanhã se poderá encontrar numa difícil situação financeira no género da de 1931, em que o Governo se viu obrigado a adoptar medidas tão draconianas que não sei se agora se poderiam repetir, sem nos trazerem complicações de ordem externa.
Guiné. - Nesta província considera-se o problema das comunicações marítimas e fluviais o fundamental.
Dou-lhe igualmente o meu acordo. Ela é o grande fornecedor de oleaginosas da metrópole; e, enquanto que a todas as outras províncias de África têm sido fixados contingentes que lhes permitem dispor de uma parte importante da sua produção para colocar no estrangeiro a preços que nos últimos anos eram muito superiores aos que a metrópole paga, a ela tem-se imposto a canalização quase integral da mesma para aqui,

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o que representou um grande sacrifício para a sua economia.
O plano é omisso no que respeita à possibilidade do incremento da dita produção, pois a recuperação de terrenos em que se fala visará naturalmente mais ao seu aproveitamento para a cultura do arroz do que para outros artigos. É pena que não se aborde o problema da contribuição que a Guiné poderia dar ao fornecimento da metrópole deste género, pois se ele sempre aqui podia ser posto por um preço inferior ao metropolitano, descontadas, bem entendido, as taxas aduaneiras, é absolutamente certo que com um trabalho mais intenso e mais perfeito no capítulo da produção e industrialização tal baixa ainda se pudesse acentuar mais, e então haveria de encarar uma alteração da política aqui seguida em tal ramo, aproveitando parte dos actuais terrenos para outras culturas.
Neste aspecto dá-se aquilo que já frisámos a propósito de outras - a falta de coordenação de uma política de produção, a qual nos parece deveria orientar-se no sentido de condicionar o aproveitamento dos terrenos de aquém e de além-mar às melhores possibilidades de cada qual, de modo a poder alcançar-se o seguinte resultado: produzir o necessário nas melhores condições de preços. Também é pena que não se ponha o problema da industrialização local das oleaginosas em que atrás se falou, embora me pareça que, devido às possibilidades e vantagens de ela se vir a fazer em Moçambique e Angola e à proximidade em que a Guiné se encontra da metrópole, a política mais conveniente talvez seja a actual - a da industrialização aqui, sem o que a laboração das actuais instalações industriais seria muito contingente.
Dentro da orientação geral do plano referente ao ultramar, que abstrai da concretização de uma política agrícola e industrial e se confina principalmente no aspecto de trabalhos públicos, o plano é, como ali se diz, dominado pelo problema dos transportes, de facto o mais importante. E por isso se dá um grande relevo a tudo aquilo que se liga com a navegação fluvial e marítima. Julgo que a orientação é a mais apropriada, sobrepondo tais comunicações às terrestres, e faço votos por que o cais de Bissau, começado há anos, termine brevemente e por que o estudo dos trabalhos a executar na grande via fluvial que é o nervo das comunicações da Guiné -o rio Gebal-, igualmente iniciados naquela ocasião, seja igualmente seguido da sua execução.
índia. - Sobre o plano deste nosso território oferece-se-nos fazer as seguintes observações: aquele nosso território tem como características uma grande densidade de população, ao contrário de todas as outras províncias, exceptuado Macau, e um fraco aproveitamento dói seus recursos naturais.
Daqui resulta que cerca de 150 000 Goeses vivem na União Indiana, no Paquistão, em (Moçambique e territórios limítrofes, em toda a parte emfim em que se vêem possibilidades; de ganhar a vida. Só em Bombaim existem 80 000, e tanto nos misteres mais humildes como nas situações de maior categoria, como, por exemplo, presidências de municípios, magistério universitário, etc., se encontram homens nascidos e criados em Goa. Parece-me que o problema fundamental a resolver é o de dar maior incremento à agricultura de regadio e desenvolver certas possibilidades industriais já verificadas.
O primeiro contribuiria para reduzir ao mínimo a dependência económica em que nos encontramos da União no referente ao abastecimento de arroz, alimento-base da nossa população, e facultaria trabalho a muita gente. O segundo contribuiria igualmente para empregar uma numerosa mão-de-obra e enriquecer o país. Presentemente a exploração mineira nas modalidades de ferro e manganês atingiu já um grande desenvolvimento, que se traduz numa exportação de algumas centenas de milhares de toneladas.
Parece-me, pois, que em lugar de nos cingirmos, apenas à execução de simples prospecções mineiras haverá que providenciar já no sentido de melhorar e desenvolver as actividades em curso, através duma intervenção estadual que aproveitasse esta boa oportunidade para não deixar estiolar e porventura perder um ramo de trabalho que tem dado nos últimos anos um grande desafogo à nossa economia goesa.
Outro tanto poderíamos dizer no que se refere à industrialização do seu caju e do comprado a Moçambique, a que o plano não faz qualquer referência. O estado rudimentar das nossas instalações não permite prepará-lo em grande escala, e daqui resulta que o melhor dos lucros obtidos com a industrialização da matéria-prima que nós fornecemos vai parar à União Indiana, a qual encontra na América do Norte um mercado seguro para as exportações de tal produto.
Quanto ao incremento do regadio, julgo que haveria possibilidade de lhe dar maior desenvolvimento do que o mencionado no plano, para o qual se consignam apenas 15:000 contos. A avaliar pêlos 24:000 contos gastos nos últimos anos com os dois canais, que representaram o início de uma política de rega, não creio que a verba acima mencionada permita fazer grande coisa.
Quanto aos 50:000 contos destinados aos trabalhos de abastecimento de água às principais povoações, julgo-os deslocados num simples plano de fomento, mas, dadas as circunstâncias de ordem vária que não vem a propósito focar, não me repugna admitir a excepção que se abre para a índia, pois os projectos elaborados há anos devem estar prontos.
Não conheço a situação actual em que nos encontramos no que se refere à exploração do porto e caminho de ferro de Mormugão, que tem estado a cargo de uma empresa estrangeira, para poder apreciar a ideia de melhorar o apetrechamento de um e outro.
Creio não ser esta a melhor oportunidade política de encarar, para os dois, soluções radicais idênticas às tomadas há anos para com os da Beira, mas, dadas as condições deficientes em que se exerce a sua exploração, não me custa admitir a adopção de quaisquer medidas que o Governo julgue convenientes para atenuar de momento os inconvenientes verificados.
Quanto a aeródromos, entendo que bastaria tratarmos do de Mormugão, com características internacionais, pondo de parte a febre que vai por todas essas províncias de os multiplicar até ao infinito. Pois se até o nosso Timor, com 300 km de comprido e 80 de largo, chegou a possuir doze campos e duas ou três carreiras! Quando nos lembramos que em Portugal temos apenas uma carreira (Lisboa-Porto), é caso paru espanto!
Timor. - Pelo que lhe diz respeito, não faço quaisquer observações, pois o que se projecta é o que se me afigura mais conveniente, esperando, porém, que a aplicação que o actual governador venha a dar aos recursos postos à sua disposição seja mais acertada que a feita anteriormente e cuja responsabilidade principal cabe a mim por me ter preocupado excessivamente com escrúpulos de ordem moral no que respeitava a certas entidades daquela província. Limitar-me-ei a dizer apenas que não creio que os 4:000 contos destinados ao porto de Díli cheguem para o que é indispensável fazer.
Macau. - Esta província teve durante séculos como característica ser um centro comercial de primeira ordem, desempenhando a função de entreposto entre o Extremo Oriento e a Europa. Ela vendia à China quanto

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as nossas naus e juncos chineses daqui ou doutras partes levavam e colocava na Europa as preciosidades que aquele país e o Japão queriam exportar.
O desaparecimento, porém, das limitações postas pela China a todos os povos europeus, a rapidez das comunicações e a fundação de Homg-Komg fizeram desaparecer o exclusivo quase absoluto de que aquela nossa província gozou durante séculos.
A sua feição comercial, que era o que lhe imprimia carácter, atenuou-se extraordinàriamente e a nossa antiga feitoria passou a ter a de todos os centros de turismo, de prazer, de luxo, que sempre enxamearam por um ou por outro canto do Globo.
Macau foi assim durante muito tempo uma linda cidade em que os sibaritas chineses se deliciavam, gozando de todos os prazeres, mais ou menos toleráveis, que se lhes ofereciam. Ela não era melhor nem pior que os centros mais requintados do litoral chinês, e, consequentemente, todos os apodos que lhe eram lançados a propósito do jogo e do ópio representavam apenas uma manifestação de má fé e de inveja.
Com o andar dos tempos acabou-se com o ópio e outro tanto quase sucedeu ao jogo, e, se o desaparecimento das receitas orçamentais a eles inerentes trouxe certas preocupações, nem por isso a vida económica da província soçobrou. O comércio do tabaco, do ouro, da gasolina, etc., trouxe certas compensações, que permitiram que o desafogo da população se mantivesse, com maiores ou menores oscilações, como sucede em toda a parte. Sempre me pareceu, porém, precário tal estado de coisas e entendi que se devia fortalecer ao máximo uma das mais sérias e fortes possibilidades da vida económica macaense, que é a actividade - industrial. A pesca e seus derivados, as fábricas de fósforos, de panchões, etc., proporcionam trabalho a milhares de pessoas.
Tudo quanto seja proteger tais actividades, desenvolvendo-as ao máximo, parece dever ter hoje em dia, tal qual sucede com o comércio, a primazia.
A cidade pròpriamente de Macau já não precisa de ser mais alindada, pois, com os trabalhos executados nos últimos anos, ela passa por ser a mais limpa e saudável daquelas paragens. Basta-lhe apenas, como diz o projecto, completar os seus aterros com os produtos das dragagens, requeridos pelo porto exterior, aumentando assim a área aproveitável da cidade.
A verba de 40:000 contos para urbanização visa principalmente a fazer das duas ilhas fronteiras mencionadas no plano um prolongamento da cidade, de modo a descongestionar esta, dando-lhes igualmente boas ruas asfaltadas, uma iluminação conveniente, um abastecimento de água impecável e criando-lhes ao mesmo tempo condições que permitam a instalação de indústrias e até de explorações hortícolas? É uma ideia interessante e possìvelmente viável, não tendo eu, porém, elementos para me pronunciar sobre os seus resultados.
Parece-me, porém, que, a par de tais trabalhos a executar com maior ou menor amplitude, haverá que encarar de uma forma concreta quais as medidas a adoptar para se conseguir o principal objectivo que deveria ser o deste plano: o desenvolvimento industrial.
Quanto ao futuro do porto exterior, depreende-se do plano que ele é considerado incapaz de desempenhar qualquer das funções para que foi feito, não valendo pois a pena ir além das dragagens mencionadas.
Não sei se tal conclusão tão peremptória é justificada pelos estudos de ordem técnica existentes ou a fazer, e como é difícil conformarmo-nos com a ideia de que 100:000 contos que se gastaram há dezenas de anos com a sua execução o tenham sido em quase pura perda, talvez não deixasse de convir que o problema fosse registo por especialistas.
Banco de Fomento. - Uma das disposições do Plano que certamente não merece as críticas de ninguém, mas apenas louvores, é a que cria o Banco de Fomento.
Vamos ver, porém, se, desta vez, tal tentativa é mais feliz que a sua congénere de há vinte anos e que não chegou a efectivar-se apesar da publicação do decreto criando tal estabelecimento de crédito.
Parece-me supérfluo entrar na sua justificação, principalmente para meios em que não há outras instituições deste género que não sejam os bancos emissores em que não medra o género do capitalista, mais ou menos encoberto, que nas metrópoles vive da usura, mas a quem tantos e tantos recorrem nas suas aflições, em que não existem em suma as numerosas modalidades afins dos países europeus.
Um dos factores que muito tem contribuído para o prodigioso e instantâneo desenvolvimento de várias colónias estrangeiras, e em especial do Congo Belga, tem sido a abundância de meios financeiros fornecidos principalmente pela banca particular, que têm feito surgir plantações, fábricas, todo o género enfim de actividades económicas.
Entre nós, tanto o Banco Ultramarino como o de Angola se confinaram principalmente em operações de carácter comercial, visto que pelos seus estatutos lhes era vedada a distribuição do crédito a longo prazo. Entretanto as administrações, tanto de um como de outro, mas principalmente as do primeiro, impelidas pelas reclamações locais e sugestionadas pela boa vontade dos seus órgãos coloniais, durante épocas mais ou menos longas tornearam as dificuldades de ordem estatutária e fizeram de tudo um pouco.
Empréstimos de carácter agrícola cuja liquidação se arrasta ainda há duas e três dezenas de anos e tendo como garantia hipotecas mais ou menos contingentes e empréstimos de carácter industrial em iguais condições, tudo isso figura no activo do primeiro daqueles bancos. Mas, porque não tinha sido criado para desempenhar tal função e porque não tinha, consequentemente, montado órgãos adaptados ao seu desempenho, os fracassos foram numerosos e contribuíram para desacreditar esta modalidade de crédito no ultramar e retardar a sua instauração ali.
Julgamos, porém, que não seria possível, sem graves protestos da opinião pública ultramarina, principalmente a moçambicana, demorar por mais tempo a entrada em função de tal regime de crédito, tanto mais que o Banco de Angola tem já em funcionamento desde 1946, mercê de uma imposição legal, um departamento autónomo especializado em operações de fomento.
Os 75:000 contos de que ele dispôs inicialmente foram, porém, ràpidamente absorvidos, apesar das dificuldades de toda a ordem que a escassez de fundos levava a sua direcção a criar aos numerosos pedidos.
Diversas forram as tentativas para aumentar aquela importância, insignificante para as necessidades angolanas e numa época de prosperidade para todos os colonos, o que só recentemente se conseguiu, atingindo ela presentemente 125:000 contas. Sendo isto assim, não podemos deixar de considerar muito escassa a importância de 200:000 consignada agora pelo Plano para as oito províncias. Como os depósitos do Estado são obrigatòriamente feitos nos bancos emissores e como os dos particulares a longo prazo não atingirão grandes importâncias, onde é que se calcula ir buscar o necessário para fazer face ao enorme movimento de pedidos que vai desencadear a criação do banco tão almejado? À emissão de obrigações? No estado em que se encontra o mercado parece-me difícil.
Ora julgo que não seria difícil chegar com o Banco Nacional Ultramarino a um acordo no sentido de se passar para o futuro banco um certo inúmero de activi-

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da dês agrícolas, industriais e comerciais que ele vem exercendo de conta própria em certas províncias de além-mar e que, passando a ser geridas pelo Banco de Fomento tal qual o faz agora o Banco Nacional Ultramarino, mas em melhores condições, ou alienadas a particulares, avolumariam enormemente o seu património.
Na Guiné, ele tem fábricas de arroz e concorre com os particulares na comercialização de vários produtos, o que tudo o obriga a uma imobilização normal e permanente de bastantes milhares de contos..
Em S. Tomé administra o maior núcleo de roças, que pràticamente são propriedade sua. Isso obriga-o igualmente a uma imobilização permanente de muitas dezenas de milhares de contos. Em Moçambique, o controle de muitas fábricas que financiou largamente criou-lhe uma situação de certa importância no sector industrial, visto que tem nisso imobilizados importantes somas.
Em Angola possui enormes concessões de terrenos, que utiliza para a criação de gado que fornece à Companhia dos Diamantes, e explora um serviço de camionagem, o que tudo o obriga a uma imobilização de certa monta.
Comparticipando ele - Banco Nacional Ultramarino - com tudo isso na constituição do banco em projecto, este teria logo de entrada um volume de negócios bastante importante; mas, se tudo isto ainda não chegasse e se se quisesse dar ao dito banco uma projecção digna das exigências requeridas principalmente por Angola e Moçambique, dois países com perspectivas enormes, haveria que encarar ainda a utilização de importantes recursos financeiros, cuja aplicação vem sendo pouco interessante para o Banco Nacional Ultramarino, e ainda menos para o País.
O Banque d'Outre-Mer, que tem a funcionar em Paris e de que é único accionista, absorve-lhe, entre capital e um depósito permanente, uma soma de certo valor.
Com um outro de Londres em. iguais condições dá-se o mesmo, mas em maiores proporções.
Julgamos que a aplicação destas somas no nosso ultramar seria mais rendosa para o banco, a avaliar pelo que agora sucede, e mais útil para a economia nacional. Mas como tal banco é uma instituição de recursos enormes, não queremos deixar de aludir ainda a outras suas actividades, como as bancárias, que desempenha no Brasil. É certo que a importância política e financeira da sua existência neste país, em que há tantos portugueses, é muito diferente da que mencionamos para Paris ou Londres. Mas, atenta a prioridade a dar-se a tudo quanto é nosso, entendo que no dia em que não haja outra solução para conseguir recursos para o desenvolvimento do ultramar português deveríamos utilizar aquela.
As dificuldades com que trabalhamos no Brasil são de toda a natureza e vão desde as limitações das transferências de lucros, que só se conseguem em volumes irrisórios, à ameaça de não podermos receber depósitos, para nos obrigarem à nacionalização. Todos os dias os jornais e até entidades oficiais o declaram alto e bom som. Ora, se nós liquidássemos tais actividades, o que é fácil, e conseguíssemos transferir o seu produto, o que é difícil, mas não impossível, isso, junto aos recursos atrás mencionados, totalizaria por baixo uns 600:000 contos, que iriam ... vivificar aqueles nossos organismos ultramarinos, debilitados por falta de recursos financeiros. Julgo que o período de depressão económica que já ali começou e que naturalmente se virá a acentuar cada vez mais deve levar o Governo a providenciar, já e sem demora, no sentido de preparar tudo para não deixar sucumbir actividades que constituem a ossatura da economia angolana e moçambicana. Entendo assim que os meios com que se quer dotar o futuro banco não estão em harmonia com a função que se lhe quer atribuir em nada menos que oito províncias e que os recursos de ordem vária atrás mencionados permitem reforçá-los substancialmente.
Financiamento. - Quanto ao financiamento do Plano, oferece-se-me fazer as seguintes considerações: concordo com o critério nele apontado no referente a Cabo Verde, Timor, Macau e índia.
Realmente creio que as duas primeiras não têm possibilidades orçamentais que lhes permitam chegar ao fim de cada ano com saldos aproveitáveis para custear as despesas previstas, como creio que, contràriamente a isso, Macau e Ilidia o possam fazer.
Quanto à Guiné discordo da afirmação de que ela não possa contribuir para isso. Desde que se ponha cobro à repetição da criação de despesas sumptuárias, no género das que se fizeram durante anos; desde que se corte nas despesas com missões científicas que prometem eternizar-se e cujo custeio é incompatível com as receitas orçamentais, julgo que ela poderá contribuir para o projecto em discussão.
Quanto a S. Tomé, se as cotações do cacau continuarem favoráveis durante os próximos seis anos, como julgo, calculo que as previsões se realizem na parte referente aos saldos, tendo, porém, sérias dúvidas no referente ao produto da cobrança da sobrevalorização. Por sua vez, Angola tem chegado, é certo, ao fim de cada ano com saldos muito volumosos, mas é bom contar que ao período de euforia económica deverá suceder outro de depressão, que já começou. Até que ponto irá ele? E quantos anos durará? Parece-me, pois, arriscado contar com uma média anual de 150:000 contos, visto que aos saldos anuais se costumava às vezes ir buscar 50:000 para a abertura dos créditos correntes, e mais arriscado ainda coutar com os 540:000 da sobrevalorização, visto que esta pràticamente desapareceu para todos os géneros da sua exportação, com excepção do café e manganês.
E outro tanto se poderá dizer para os 100:000 contos de saldos anuais e os 100:000 da sobrevalorização em Moçambique. Quanto aos 450:000 de empréstimo a obter da Segurança Mútua, imo tenho elementos para me poder pronunciar quanto à sua viabilidade.
Depois há que contar ainda com a seguinte circunstância de ordem geral: a experiência mostra-nos que as despesas efectivadas são sempre muito superiores às calculadas, e, portanto, num plano tão sujeito a imprevistos como são principalmente os que resultam da execução de trabalhos hidráulicos e no ultramar, haverá que ter isso em conta.
Concluindo: vou terminar como principiei, afirmando que estamos em presença de um plano gigantesco, que abrange um conjunto de obras de valor excepcional para a economia da Nação. Prejudica-o porventura a falta de integração de algumas delas num sistema caracterizado pela interdependência das economias metropolitana e ultramarina? É sujeita a grandes contingências a concepção do povoamento? E possível, mas não tenho dúvida em afirmar que os seus resultados serão benéficos e contribuirão para melhorar não só o nível da população portuguesa, mas, inclusivamente, o de países nossos vizinhos no ultramar; que a sua apresentação nos transporta aos tempos gloriosos em que a Nação, sob o impulso dos seus chefes, se empenhava na tarefa formidável da valorização dos seus recursos metropolitanos e dos do ultramar que ela ia descobrindo, conquistando e ocupando; que ele, enfim, é o produto de uma administração que se norteia pela mesma divisa daqueles séculos de ouro que tiveram como expoente máximo o Infante Navegador: cabeças frias e corações arden-

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tes. Cabeças frias, paru que as concepções sejam o resultado de laboriosos e calmos estudos, caracterizados por um rigor técnico incompatível com fantasias. Corações ardentes, para que a sua execução se realize com um entusiasmo tal que faça baquear obstáculos para outros reputados invencíveis. Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Nunes Mexia: - Sr. Presidente: ordenado por feitio, ligado pelo sentimento e inteligência à obra da nossa situação política, vivendo num meio e vivendo uma vida onde mais se sentem as realidades do que nos falta para que possamos resolver a sério os nossos problemas económico-sociais, eu não podia deixar de vibrar de satisfação, de esperanças, com o novo plano de obras, que, em sequência do ùltimamente executado, vem trazer mais possibilidades para o caminho do futuro, para a execução de um verdadeiro plano de fomento.
Sentindo assim, eu não podia deixar de vir trazer a minha modesta contribuição para o seu estudo, contribuição que apenas terá a valorizá-la, se o tiver, o desejo de perante V. Ex.ª Sr. Presidente, e a Assembleia Nacional vir trazer o pensamento, a apreciação, de quem vive bem arrumado à terra, dentro dos seus problemas vividos dia a dia, trazer mesmo uma noção de proximidade com as realidades da vida, realidades que distância, falsos pontos de observação ou apreciação, façam por vezes esquecer ou considerar de somenos importância, e por isso sem serem tomados na justa consideração.
Esta, pois, a intenção da minha intervenção, ditada por dever de consciência, de cargo e de vida.
Em cumprimento desse dever abandono hoje uma posição que aqui tomara, ditada pela dúvida da utilidade das intervenções, mesmo quando ditadas estas por verdadeiro espírito de justiça, de realidade ou discordância construtiva. Posição de perdido entre a doutrina e a execução, entre a teoria e a realidade.
O Plano de Fomento que apreciamos divide-se estruturalmente em duas partes:
Uma - as obras em si.
A outra - a parte técnica, tudo o necessário ao aproveitamento não só destas obras, como de tudo o que até aqui fizemos ou temos, para se conseguirem os fins que nele são definidos.
A primeira é o que constitui o verdadeiro significado do Plano de Fomento apresentado.
A segunda é posta como aspiração e relegada a sua execução para as possibilidades do orçamento ordinário do Estado.
Esta segunda fase das obras visa concretamente:

1) O desenvolvimento da agricultura;
2) Produção, transporte e distribuição de energia eléctrica;
3) As indústrias-base;
4) Os transportes e meios de comunicação;
5) As escolas técnicas;
6) Empreendimentos da mesma natureza no ultramar.

Pretende-se assim influir no desenvolvimento de todos os sectores, o que temos de considerar como essencial para o que se pretende. Tem evidentemente de ser do desenvolvimento simultâneo da agricultura e da indústria, como forças criadoras da riqueza, da fácil movimentação desta e sua distribuição, que terá de vir a subida de nível de vida a que todos aspiramos. E digo simultânea porque, apreciado o quadro que o Mundo nos oferece, temos de constatar a seguinte realidade:
Nível de vida alto nos países fortemente industrializados.
Nível de vida baixo nos países simplesmente agrícolas.
Estes ainda como feudos discutidos e apetecidos dos primeiros.
No primeiro caso temos quase sempre um nível de vida para além das realidades do meio conseguido pela, contribuição forçada dos outros. Temos a necessidade constante da existência de uma força para a defesa e conquista do mercados, para além, portanto, dos nossos sonhos ou possibilidades de tendência.
Não me cumpre discutir só o montante que o Plano envolve é pequeno pura o que precisamos fazer, se grande para as nossas possibilidades. Tenho do pensar que ó o possível no momento presente e que o Plano mais não pretende do que ordenar e esquematizar o seu emprego. Evitar assim caminhar sem meta a atingir no tempo tomado em consideração.
Penso, pois, que sobre a relatividade das verbas, sua melhor utilização e espírito do seu emprego só terá mais de encaminhar a nossa apreciação.
É esse o caminho que procurarei seguir, deixando para os que melhor o conhecerem a observação em profundidade de cada um dos outros problemas focados; limitar-me-ei a estudar em minúcia o referente ao desenvolvimento da agricultura.
Pròpriamente para esse desenvolvimento o Plano prevê o gasto das seguintes verbas:

Contos
Hidráulica agrícola ......... 496:000
Povoamento florestal ........ 464:000
Colonização interna ......... 330:000
1.290:000

Pretende-se com a execução das obras previstas no Plano promover o desenvolvimento da agricultura, para que por ele se atinjam os seguintes fins. em face da sua quota-parte no investimento:
Alimentar melhor a nossa população;
Baratear os custos de produção;
Resolver os problemas das crises de trabalho:
Aumentar o nosso poder de compra e, portanto, atingir mais alto nível de vida.
Vejamos em que relação as obras previstas para esse fim podem contribuir.
Posto o problema em face da realidade, temos que, para que a agricultura se possa desenvolver e cumprir a sua missão, são indispensáveis as seguintes condições:

1) Meio próprio ou modificação no meio para o fim a atingir;
2) Apetrechamento conveniente para que se consigam os melhores resultados;
3) Condições económicas da exploração.

Analisemos, primeiro do que tudo, o meio e os seus problemas:
A interminável controvérsia a que todos temos assistido - e não me refiro à denominação a dar ao nosso país de agrícola ou industrial, mas sim, dentro do campo mais restrito dos produtos da terra, se devemos descansar nas possibilidades florestais, nas de pastagem ou seara - é de molde a convencer-nos de que não há nem pode haver um exclusivismo de posição, de que não há possibilidades de limitar a nossa apreciação em face de tendências ou necessidades que tornem possível uma consideração unilateral do problema. Temos, pois, de o observar fora desse exclusivismo.

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Como factores naturais do meio, temos de considerar a terra e o clima - a terra e a água e a distribuição desta.
Quanto à terra todos conhecem a nossa riqueza em pedras, que tanto limita o campo que a natureza deixou à nossa actividade - tanta encosta íngreme! - e resistiu à nossa preocupação de ganhar sobre o espaço.
Encarada perante o que nos liça de terra arável e suas possibilidades produtivas não é fraca a nossa densidade populacional, como por vezes se procura frisar.
Pelo contrário, em face daqueles dois factores, terra arável e produtividade, ela exprime-se por uma média ponderada que é a mais alta da Europa, podendo-se definir na relação 412, seguida pela Suíça com o factor 405.
É francamente alta, comparada com o coeficiente médio da Europa, da ordem dos 215, e astronómica se a compararmos com a da Dinamarca, expresso pela relação 78.
Isto evidentemente tomado, não quanto à área total, mas quanto à relação mais real, área arável e condições de produtividade.
Quanto ao segundo elemento definidor de meio - condições pluviométricas - ninguém também desconhece a sua irregularidade, não só considerada esta de ano para ano como dentro do próprio, que podemos considerar variando entre dois limites tanta vez atingidos - falta e excesso absolutos.
Temos, pois, uma realidade que não podemos esquecer quando procuramos encarar a resolução dos nossos problemas. Um meio que nos aparece francamente ingrato.
Como não podemos, contudo, mudar ou enjeitar a parcela que Deus nos deu, penso que em dois sentidos convergentes temos de encaminhar a acção possível: adaptar ou modificar o meio tanto quanto possível às necessidades da vida; adaptar a vida tanto quanto possível às realidades do meio.
Se é certo ainda que o significado de independência de cada país está na razão directa da sua suficiência alimentar e a satisfação das suas maiores necessidades, tanto mais independentes seremos quanto mais nos aproximarmos da nossa auto-suficiência.
Não nos podemos assim deixar levar por considerações de momento, derivadas de facilidades de aquisição fora do que é básico para a garantia da nossa alimentação.
Temos, pelo contrário, que, jogando com toda a realidade do nosso império, procurar atingir dentro de nós mesmos um nível de vida que seja justo e o mais alto possível dentro das realidades do meio. Esta, creio, a acção que temos que pedir aos homens.
Encarado assim o problema - tendência total para a aproximação da nossa suficiência -, não nos ó possível encarar o óptimo no exclusivismo de qualquer cultura. Temos de prender-nos à quota possível a pedir, a exigir a cada possibilidade.
Para que se possa, pois, atingir os fins para que temos de tender, temos, por um lado. de estudar seriamente o meio, as suas necessidades, as suas possibilidades de modificação, para dele se conseguir o máximo de produção, e, por outro, de estudar sèriamente quais as nossas necessidades fundamentais, quais as que poderemos conseguir pelo aproveitamento máximo do meio.
Esta, creio, deverá ser uma linha de orientação a seguir sem hesitações, para ela encaminhando todas as nossas possibilidades, sem dela nos desviarmos por qualquer razão.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E aqui temos de constatar a nossa primeira falha.
Tudo ou quase tudo até aqui temos deixado ao improviso, ao sabor da corrente, à mercê da Providência.
Quem, com olhos do lavrador ou do prático, olhe a sério para os nossos campos não poderá deixar de se impressionar com o mau arrumo das nossas coisas em face do meio.
Terras limpas onde deveriam estar matas.
Matas onde deveriam estar terras limpas; culturas fora do ambiente próprio.
Mais profunda será a sua desolação quando verificar a ausência quase completa de estudos sobre os nossos gados ou culturas, feitos estes, quanto àqueles, na pretensão de defender o bom que temos, o seu estudo económico para o seu melhor aproveitamento, e, quanto a estas, na preocupação da sua melhor localização em função do real económico, de saber quais as possíveis e aquelas para que o meio mais se presta, para a resolução do que nos falta, ou mais nos valoriza no valor mundial de trocas.
Uma falta de sequência neste caminho - infelizmente o caminho que temos seguido até aqui, que nas suas consequências, muito caro temos pago - torna impossível admitir a possibilidade de o continuarmos a trilhar.
Reconhecer que por esta porta, pela falta de estudo sério dos nossos problemas, muitas das nossas possibilidades e economias se têm desfeito é uma realidade que cumpre ponderar quando sèriamente pomos planos de fomento para o futuro. Muito temos perdido em corrigir defeitos sem ir às causas.
Temos sèriamente de reconhecer os erros, para que se possam evitar, e ainda ter, além da pretensão de obras que tendam a modificar o meio, a preocupação de defender o que temos.
Ninguém ignora como o nosso regime de chuvas facilita a erosão, que todos os invernos larga parcela da nossa riqueza, do nosso património, vem desgastando. As nossas terras mais ricas estão justamente ao longo dos rios, que nas suas cheias incontroladas as inutilizam por cobertura ou lavagem.
Muitos destes defeitos podem ser corrigidos pelas obras, pelas barragens. Mas elas não vão ao fundo do problema. Uma extensão adequada dos serviços, pelo estudo, pelo conselho, pode em muito influir na sua resolução indo às causas.
O assoreamento tem origem nas torrentes que, vindo das encostas, delas vão arrancando o que de melhor lá havia e a ardia. Não se corrigem pela simples intervenção fiscal dos serviços nos poucos metros ao longo dos rios, sobre as quais se levanta uma discussão de direito de propriedade, traduzida em tanta licença, em papel selado e escudos.
Outro problema fundamental para a defesa e correcção necessária do meio - outra realidade, portanto, para um plano de fomento.
Penso que encarar sèriamente o assunto é uma obrigação, pois que se pode pôr a dúvida se o que ganhamos para o futuro, por um lado, com as obras será do facto uma realidade, quando, pelo outro, se continua a perder tanto do que temos. E nós necessitamos de um verdadeiro saldo positivo.
Todas estas considerações nos conduzem ao pensamento de que para uma acção verdadeiramente construtiva temos primeiro que tudo do conhecer a fundo o meio, as suas possibilidades e as suas necessidades.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Esta a primeira base séria para um verdadeiro plano de fomento.
A segunda tem de ser, evidentemente, o estudo do que necessitamos para que a preocupação de nos aproximarmos o mais possível desse necessário, trabalhando

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o meio ou, dentro do possível, modificá-lo para esse fim, seja a razão orientadora da nossa acção.
O primeiro trabalho sério para conhecer o meio, o que temos, onde o temos e o que pode ser possível vir a ter encontra-se em execução. Tão necessário o reputo, tão basilar para qualquer plano de fomento o considero, que não lhe ver consignada no documento que apreciamos a mais pequena referência, a consignação de uma larga verba, é, sinceramente, o meu mais profundo desapontamento quanto a este Plano. Refiro-me ao plano de fomento agrário iniciado em boa hora pelo despacho ministerial de 5 de Julho de 1949.
Poucos o conhecem no muito que já está feito. O que está feito não pode vir a público porque não tem verba para ser publicado. Não a tem também para uma sequência de trabalho. Vive a vida arrastada dos desconhecidos, vive da dedicação dos que nele trabalham, dedicação que é o seu maior, capital, das sobras ou desvio de técnicos dos vários serviços.
Prestar aqui uma sincera homenagem ao seu iniciador, o Sr. Engenheiro Pereira Caldas, aos técnicos que, vencendo todos os desânimos, nele trabalham com dedicação com o incentivo do dever cumprido, é um dever que cumpro não só com perfeito sentimento de justiça como com verdadeira admiração.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O plano de fomento agrário visa em primeiro lugar o conhecimento inteiro e em minúcia do nosso país. O que temos em seara, em floresta, em gados, pelo inquérito directo. O que temos o como o temos. Assim, por ele conseguiremos a nossa curta agrícola, carta florestal, carta pecuária e carta dos solos.
Uma fotografia minuciosa e uma radiografia exacta, como bem o definiu o Sr. Deputado André Navarro. O reconhecimento feito passo a passo do campo permitirá ainda um conhecimento prévio da possibilidade e utilidade das obras de hidráulica agrícola.
A segunda fase, o ordenamento, deverá definir o que podemos e devemos ter em relação às realidades do meio e aos problemas sociais.
Como basilar pois se apresenta para qualquer plano de fomento.
A execução completa deste plano, pode afirmar-se, põe-nos, quanto a este aspecto, a par de muitos países, acima de muitos outros, quanto ao verdadeiro estudo de possibilidades da resolução do problema em bases certas e não perante o abstracto.
Tem de ser uma das bases para que a nossa obra, para o futuro, saia do campo do virtuoso para o do clínico.
Desculpem VV. Ex.ªs a expressão com que procuro definir bom o meu pensamento.
Encarando. pois, sèriamente o meio no seu estado actual, o dentro do uso que dele fazemos, temos de o considerar agreste. Quem sabe se essa condição natural do meio não terá sido um dos estímulos para o nosso espírito de aventura, levando-nos à conquista, do novos mundos. Quem sabe se na razão do rendimento das descobertas não estará o motivo polo qual por tanto tempo nos alheámos da obrigação do o modificar.
Já vimos que em função da área ponderada não é escassa a nossa fixação de população. Pode-se contudo pensar que não esteja perfeito o seu arrumo, ou que ainda é possível cabermos mais e em boas condições no nosso canto. Para um esclarecimento perfeito destas dúvidas há que estudar profundamente quais as causas que levaram a esse arruino, a essa fixação.
Admiro sinceramente aqueles para quem o problema é uma simples questão de aritmética.
A realidade é que as populações tendem, quando deixadas a si mesmas, a fixar-se onde, primeiro que tudo, encontram o indispensável à vida. Assim, o milho e o trigo, nos seus significados de realidade e de artificialismo, da água e sequeiro, devem ter ditado e orientado a fixação. Para lhe dar outro rumo temos de ter em conta esta realidade. Se a não tivermos toda a fixação será artificial, criará a necessidade da resolução contínua de problemas, viverá dum artificio, e por isso será sempre cara. Isto em função simplesmente do factor agrícola, abstraindo por isso de outros conducentes à fixação ou manutenção desta. A fixação, além deste significado, diz o Dr. Fernando Alberto de Seabra no seu trabalho A Industrialização dos Países Agrícolas, é condicionada pelo desenvolvimento da técnica produtiva, pelo montante e carácter dos recursos económicos disponíveis e pela diversa utilização que deles faz o homem.
Conforme a actividade predominante seja a agricultura, a indústria ou o comércio, assim o número de pessoas que podem viver em determinada área varia largamente. A densidade é sempre incomparàvelmente maior nas regiões industriais e comerciais do que nas apenas agrícolas.
Procurei focar no início das minhas considerações que para se conseguir um arrumo tão perfeito quanto possível em dois sentidos temos de encaminhar a nossa acção.
Adaptar o meio às necessidades da vida.
Adaptar tanto quanto possível a vida às realidades do meio.
O nosso clima, mostra-se em condições de se poder considerar próprio para o milho e outras culturas de regadio. Quanto ao trigo há muito que se esclareceu que se é possível a sua cultura não é para ela zona cie eleição e que, por isso, a sua produção perante as contingências será sempre cara.
Não hesito mesmo em afirmar que, partindo do preço para as possibilidades de produção, o nosso panorama, quanto à cultura de trigo, se podo definir pelas seguintes proporções:
20 por cento da área cultivada pode produzir dentro do preço actual.
60 por cento por esse preço só se paga nos anos bons.
20 por cento restantes, nem nesses anos.

E isto será uma realidade a ter em conta e que, estou certo, verei confirmada pelo plano de fomento agrário.
Desviamo-nos, portanto, das condições do meio quando assistimos ao constante aumento do consumo do trigo e à diminuição do do milho. Continuar, por todos os meios, a facilitar esta tendência é caminhar para a obrigação do artificio. O pensamento de que de fora poderá vir sempre o correctivo para as nossas necessidades teve não há muito, e dentro da vida dos velhos como eu, um sério desmentido ou uma noção das suas dificuldades.
Um dos objectivos a atingir pelo Plano de Fomento é garantir a alimentação, alimentar melhor a nossa população. Vejamos as suas possibilidades em face das realidades do meio.
Não há dúvida de que. quanto a pão de trigo, é enorme a nossa falta.
Considerando, porém, o pão, sem nos prendermos ao melhor ou mais apetecível, não será atrevimento afirmar que caminhamos a passos largos para atingir o objectivo de nos bastarmos. Ele está francamente ao nosso alcance, sobretudo se contarmos com a realidade do nosso Império e utilização conveniente das obras feitas e projectadas.
Quanto a carne, penso que o problema se pode pôr precisamente nos mesmos termos. O que nos falta é sobretudo o que é melhor, mais apetecível ou mais recomendável. Aí o nosso grande desvio para as necessidades.

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Não filiemos contudo essa situação em falta estrutural de técnica ou de mecanização. Não obtemos médias inferiores às obtidas em zonas de características iguais, antes, pelo contrário, em muitos casos as excedemos. O que se pode e deve pôr em dúvida é se produzimos o que devemos, se o fazemos nas melhores condições e o preço por que o produzimos. Se aproveitamos convenientemente todas as possibilidades do meio.
Sr. Presidente: alonguei-me talvez demais na definição e apreciação do que considerei como o meio. Creio, contudo, que não perdi o tempo, porque cada vez mais, dentro do sentimento prático a que a terra nos conduz, sinto que o estudo profundo do meio e suas realidades é a base para qualquer estruturação séria dos problemas que nos interessam.
Não resta assim dúvida de que, para nos aproximarmos do que pretendemos, temos de defender o que temos e modificar, adaptar o meio para dele arrancar aquilo de que necessitamos.
As obras de hidráulica são uma das bases necessárias para a modificação do meio. São para isso indispensáveis. Não constituem, por si sós, contudo, um plano de fomento. Não resolvem só porque se fizeram os problemas, podem, por vezes, até criar outros.
Não compreendo assim a efectivação das obras sem que esta seja acompanhada simultâneamente de tudo o necessário para o seu aproveitamento. Elas têm de contribuir para produzir o que nos falta, têm de produzir em condições de criar riqueza, que na sua divisão traga a subida de nível de vida a que aspiramos.
Se não corresponderem a estes fins serão obras caras perante o investimento.
Outra das condições indispensáveis para que a agricultura possa progredir e cumprir a sua missão é o seu apetrechamento conveniente.
Por apetrechamento quero significar: a mão-de-obra, os meios, a máquina, a técnica e o capital-crédito.
Por técnica, propriamente dita: a ciência o sua extensão, os serviços, as estações de fomento zootécnico e agrícola, estações experimentais e laboratórios.
Mão-de-obra não nos falta, infelizmente, e digo infelizmente em perfeita consciência.
Pode faltar, em dado momento, num sítio ou noutro, mas a prova de que não falta é o seu fraco poder de remuneração, considerado este de uma forma geral.
A falta de braços pode ser suprida pela mecanização, pela melhor preparação e, portanto, melhor eficiência dos trabalhadores. Significa uma alta de salários que, vindo dum melhor aproveitamento, pode e deve significar um melhor nível de vida a partir da base do nosso conjunto económico.
Mão-de-obra a mais condena em muito as nossas aspirações de justiça geral.
Condena-nos à gravidade das crises de trabalho, agravadas pela fraca resistência económica do trabalhador, com todas as consequências que já nesta Assembleia foram tão largamente discutidas.
Seja-me contudo permitida uma nota de emoção neste momento, no qual, ainda que de passagem, eu toco no assunto. Que eu não possa deixar de lamentar que o problema continue a ser considerado como uma fatalidade e que, como tal, continue a não merecer um estudo sério, já por esta Assembleia Nacional pedido e recomendado ao Governo. Que eu não possa deixar de frisar o desespero, a vergonha que sinto, quando vejo as massas de trabalhadores desempregados, quando, conhecendo as suas necessidades, eu não veja ainda forma de lhes acudir senão por processos que uma sã justiça e uma sã economia têm que condenar.
E temos contudo um Comissariado do Desemprego, que o País paga.
A falta de mão-de-obra para trabalhar a terra, motivada na sua utilização noutras actividades, evita os grandes problemas sociais ou político-sociais em bases de verdadeira justiça. Leva ao parcelamento da terra, diminui o custo desta, diminuindo o valor do capital fundiário e, portanto, os encargos da sua remuneração. Limita a apetência da terra à parcela possível de trabalhar pelo agregado familiar, facilita assim, automaticamente, sem artifícios, uma das nossas pretensões. Foi esta a forma como, não há muito, vi posto em França o problema da terra.
A falta de mão-de-obra pode em muito ser suprida pela mecanização. A plena utilização desta deriva da necessidade de evitar quanto possível o encarecimento do produto, pela reflexa que nele tem a sua intervenção quando é cara ou deficiente.
Não é, infelizmente, ainda esse o nosso grande problema. E, se na mecanização formos para além do significado de simples meio de corrigir mais as nossas deficiências de tempo perante as variações do clima do que o emprego do trabalhador como acessório, pois criaremos porventura mais dificuldades do que resolveremos necessidades. Não nos devemos esquecer ainda que tudo para a mecanização importamos e que nos poderemos surpreender, parada a nossa máquina de produção, perante situações muito graves.
Não nos podemos prender à simples preocupação do preços, temos de pensar no poder de compra dos que só trabalhando na terra o conseguem. Temos de pensar ainda que, em contrapartida, temos todo o problema do aproveitamento do que podemos produzir e que dentro de uma agricultura sujeita a grandes dificuldades não podemos desperdiçar.
É difíciente o nosso abastecimento em carne da espécie, vacum.
É sabido que, perante o nosso poder de compra, não podemos encarar a defesa da sua criação ou fomento partindo da consideração do valor extreme da carne. Até aqui, o pouco e cada vez menos que vamos tendo, tem encontrado a sua defesa pelo binómio trabalho-carne.
Longe ainda virá o tempo em que na mais lógica compensação leite-carne se possa firmar. E a mecanização imponderada trará o golpe de misericórdia à criação bovina.
Não há problemas independentes na agricultura. Há um conjunto interdependente que só pelo estudo se pode ir transformando para melhor e mais conveniente aproveitamento.
Não temos condições, em face do clima, para produzir barato.
Outra realidade que não devemos esquecer.
Para aproveitar, portanto, o melhor possível o que temos é necessária a intervenção da boa técnica, das boas bases científicas.
É nessa base que o mundo hoje trabalha e nós não podemos contrapor, em concorrência ou comparação, a nossa produção, feita muito à base do improviso, à que é feita naquelas condições.
Uma necessidade, portanto, da extensão e utilização conveniente dos serviços.
Temos sobejas provas dos benefícios que são possíveis de conseguir sempre que lavoura e técnicos trabalham em perfeita conjunção de esforços.
Ninguém desconhece a melhoria conseguida nas nossas lãs e nas nossas ovelhas. Ninguém esqueceu ainda os resultados da Campanha do Trigo, do comando de Linhares de Lima, nosso ilustre colega, a qual tão bem aceite foi, tão brilhantes resultados conseguiu ...

Vozes: - Muito bem!

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O Orador: -... que se pode dizer que a ela até a Providência se quis associar, confirmando o velho provérbio popular «Faz da tua parte que eu te ajudarei».
Não há muito, li num relatório da E. C. A. uma apreciação quanto à nossa posição neste aspecto, que, descontando embora tudo quanto nela possa existir de exagero, traduz infelizmente muito de verdade:
«Portugal no campo do aproveitamento dos conhecimentos científicos da agronomia apresenta um aspecto inédito. Tem valores pessoais de consideração mundial, tem institutos bons em toda a parte e não tem ligação destas realidades para a vida prática, a não ser através de alguns grandes proprietários ou das obras de colonização interna».
Temos uma organização de serviços que, embora esteja longe da considerada no sector agrícola americano e doutros países, se pode francamente considerar suficiente; temos estações de fomento pecuário e agrícola talvez bastantes para esta primeira arrancada sobre o futuro. O que temos ó tudo isto condenado a uma vida vegetativa, que a melhor boa vontade dos serviços não consegue modificar. Estão condenados à estreiteza da verba e à necessidade do saldo.
E como a este saldo não pode ser levado em conta o avanço sobre o futuro, pouco mais podem fazer que simples administração financeira.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Reconhece-o o projecto do Plano de Fomento, dá-lhe o reconhecimento de verdadeira necessidade, para que, do que temos e das obras que fazemos, se consiga o resultado que desejamos, mas relega-o para a incerteza das possibilidades orçamentais, isto é, para o longínquo futuro, para a simples aspiração.
É desta posição que, para se caminhar decididamente para o futuro, temos de sair sem demora.
Outra das condições indispensáveis para que a agricultura se possa desenvolver é a facilidade de capital - facilidade de crédito.
Precisa-o ela por duas formas:
Capital de fomento - a longo prazo;
Capital de maneio - a prazos mais curtos, mas, em todo o caso, a prazos que correspondam ao tempo tomado por cada cultura.
A primeira condição indispensável para poder usar um e outro é a certeza da possibilidade do seu pagamento pelo rendimento da exploração em que o vai empregar. Todo um problema do preços de produtos, que se tem de basear sobre um estudo consciencioso do custo de produção o justo lucro, e não fixado à base de qualquer outra consideração, seja ela de ordem política, comparativa ou simples deliberação.
Creio que não haverá ninguém que possa afirmar que o nosso problema de preços esteja posto em termos de o podermos considerar resolvido nestas condições. Mas isto leva-nos para outro campo: o resultado económico da exploração agrícola, outra das bases indispensáveis para a sua possibilidade de cumprir, que focarei mais adiante. Volto ao problema do crédito.
Quanto a capital de fomento, seria injusto se não considerasse em primeiro lugar o facilitado para melhoramentos agrícolas através da Junta de Colonização Interna.
É de facto uma das grandes portas abertas sobre o futuro.
É pena que não tenha as possibilidades financeiras suficientes para tanto que há que fazer. Que seja uma porta aberta muito fechada.
Além deste, temos o das caixas de crédito agrícola, há muito, creio, esgotado.
Os fundos próprios dos organismos corporativos podem de alguma forma também ser considerados como de fomento. Têm, contudo, uma acção, ou podem ter quando existem, que definirei como mais de fomento indirecto do que directo. Destinam-se mais a um fim de defesa de economias, pela criação de possibilidades para remediar defeitos, do que pròpriamente a influir num plano de fomento que vá às causas. Isto, evidentemente, posto numa forma geral.
Como forma de crédito de maneio ou de exploração, não me consta que outro haja ou possa considerar além do fornecido pelos bancos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Se nada há a dizer quanto a taxas de juros, não há dúvida do que os prazos que adopta não se coadunam com as exigências da vida agrícola.
Dado a prazos curtos, obriga a uma movimentação de letras que altera a intenção e dificulta o seu aproveitamento.
Para além destes, o crédito hipotecário, com prazos curtos no geral também, constitui por isso um perigo para quem o aproveita, pois, ao mais pequeno sinal do depressão económica, pode matar o investimento e levar a propriedade.
Creio, pois, que para uma acção útil muito também haverá que fazer quanto a este assunto. Penso que haverá que dotar convenientemente o Fundo de Melhoramentos Agrícolas e que remodelar e dotar também convenientemente as caixas de crédito agrícola mútuo.
Sr. Presidente: a agricultura tem de ter, como todas as actividades úteis, uma finalidade económica. Sem ela não se poderá desenvolver nem cumprir a sua missão.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não ignoramos, porém, a sua posição especial de indústria-base, a sua obrigação de garantir a vida, pelo fornecimento do que é essencial a esta.
Assim, não hesitamos em lhe atribuir primeiro um dever, a seguir um direito, derivado do cumprimento daquele.
Um dever traduzido na obrigação de tirar da terra e nas melhores condições possíveis, de acordo com o meio e com as possibilidades que para isso lhe forem dadas, o maior rendimento para o bem geral. Um direito a um justo lucro, ao acompanhamento conveniente da sua acção, à orientação definida desta.
As realidades do momento presente levaram-nos já muito para além do antigo conceito da livre disposição da propriedade ou da actividade. Assim, cada vez mais temos de aceitar uma acção conducente a um fim determinado.
A acção, portanto, do Estado na indicação do que se deve produzir, limitação dos lucros, ao interesse do bem comum.
Temos o Estado na posição de fiel da balança, obrigado a uma acção imparcial, para isso, portanto, obrigado a um estudo sério dos preços de produção e da formação destes, em face do todas as realidades. A sua intervenção até ao limite do justo pode-se definir como uso legítimo do Poder; para além, abuso do Poder.
E a posição que o Estado tomar quanto a este aspecto pode definir uma política de fomento ou de desfomento.
Para uma acção útil de equilíbrio tem o Estado organização suficiente nos fundos de compensação:

Fundo de Abastecimento;
Fundo de Exportação;
Fundo de Fomento.

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Do bom ou num uso que deles se fará depende a sua utilidade, a justiça devida àqueles que para a sua formação contribuem.
Os fundos devem ser, por isso, destinados a corrigir desvios agudos de momento, não a manter posições artificiais para além da realidade.
Ninguém desconhece as perturbações que a guerra trouxe ao Mundo e que nós, mesmo dentro da nossa posição de neutrais, não deixámos de sentir. A guerra passou, passaram as perturbações mais graves, mas não acabaram as suas consequências. Simplesmente, há tanto tempo duram que temos de considerar que se estabeleceu como normal a anormalidade delas derivada.
Não me parece contudo que seja desde já possível abandonar o princípio da intervenção do Estado. Simplesmente há que modificá-lo na sua incidência para novos conceitos. Toca a noção das realidades.
Não o ter feito há muito, ter ficado amarrado ao princípio que ditou a finalidade da intervenção no início desta, o ter querido manter através de tudo uma situação artificial sobro o que tinha passado a definitivo, a preocupação do preço baixo e não o mais baixo possível dentro da realidade, muito deve ter custado à nossa economia geral, devo ser a razão de muitas das dificuldades presentes.
Muito lhe sacrificámos do benefício da nossa situação financeira, a ele sacrificámos quase todos os fundos que tínhamos acumulado, para a correcção das dificuldades que eram de esperar finda a guerra, e, creio poder afirmar, por ele fizemos um grande saque sobre o nosso futuro.
Outra conclusão não posso tirar da impossibilidade que todos sentimos para a continuação pelo Estado da acção contínua a que nos habituáramos, do poder tributário do País reconhecidamente esgotado, da enorme dívida do Fundo de Abastecimento.
Vivemos pràticamente da riqueza que havia e não da que criámos.
E ao focar agora esta situação não me sinto no papel de fácil crítico perante os resultados a que chegámos. Constato sim, e com desgosto, a inutilidade de muito passo dado, do muito tempo perdido em acção que foi inútil.
Não mo parecem também descabidas aqui estas considerações.
Elas servem para demonstrar que não andaremos francamente para um futuro melhor se nos continuarmos a alhear do resultado económico da exploração. Se continuarmos a ter o ódio ao lucro e não simplesmente a tê-lo ao exagerado lucro.
Não haverá possibilidade de êxito para um plano de fomento se estas realidades não forem tomadas na justa consideração. O reconhecê-lo é fundamental para que a agricultura, como as outras actividades, possa prosperar, para o resultado útil do que vamos fazer.
Com as considerações que acabo de apresentar quis examinar perante V. Ex.ª, Sr. Presidente, cada uma daquelas condições que são indispensáveis para que a agricultura, podendo cumprir a sua missão, possa trazer um aumento de riqueza que, chegando a todos, contribua de facto para o enriquecimento do rendimento nacional e, por ele, a subida do nível de vida em termos de realidade que todos desejamos.
Trouxe perante V. Ex.ª uma visão diferente da que geralmente é apresentada, trouxe-a a partir da periferia para o centro, bem sabendo, contudo, que a visão certa estará naquele ponto em que a apreciação de cima o a de baixo se confundam e justaponham. Contribuir para que se atinja osso ponto é a minha intenção. Trouxe ainda perante V. Ex.ª a noção de algumas falhas, pelas quais se escapam muitas das nossas economias, pelas quais se invalidam os resultados do Plano de Fomento.
As obras de hidráulica agrícola são indispensáveis para se poder avançar para um futuro melhor. Não descansemos, contudo, só na sua execução.
O nosso poder de investimento é pequeno, temos por isso que dele tirar o rendimento total. Eu não enfileiro ao lado dos que as receiam, na possibilidade de trazerem a saturação de alguns produtos; o que penso é que é indispensável estudar o que vamos produzir, o que necessitamos, as condições em que o podemos fazer.
Nós não podemos partir do conceito de que o poder de compra actual ditará as condições económicas do futuro. Temos de pensar que é necessário aumentá-lo para que se não limite ao poder de pagamento do que ó indispensável à vida. Temos de elevá-lo dessa situação para a de não só atingir a de possibilidade da compra do necessário mas até do supérfluo. Só nessa posição teremos atingido um nível de vida para que temos de tender.
Assim, só lamento não ser possível elevar para mais alto nível o nosso investimento em obras de hidráulica agrícola.
Antes de entrar na apreciação das verbas destinadas à colonização interna e repovoamento florestal desejo ainda focar um ponto.
O fazê-lo parece-me indipensável para se julgar da verdade das considerações que fiz, e ainda como necessário para o esclarecimento do caminho para o futuro.
Pela observação do campo, das vilas e aldeias, tenho de tirar a conclusão de que estão certas as considerações postas. Isto é, que não criámos riqueza e que não há uma subida de nível de vida, pelo menos na base do nosso edifício económico. Pela observação da vida das cidades pode-se tirar a conclusão de que de facto houve uma subida apreciável. Daí a necessidade, portanto, de esclarecer se se trata de um nível de vida real ou fictício, se derivado da movimentação da riqueza criada ou se do desgaste da que tínhamos.
A simples observação do que temos à vista e sentimos pode levar a uma conclusão precipitada e injusta, convindo por isso observar o problema em maior profundidade.
Temos, por um lado, como primeiro campo de observação:
O rendimento nacional não acompanhando o desenvolvimento demográfico da população;
A nossa fraca renda individual;
O limite tributário do País, pràticamente atingido;
A dificuldade de emprego das novas camadas da população;
A necessidade de um plano de fomento, pequeno para as necessidades que sentimos e para o qual se têm de movimentar verbas que a outras formas de capitação ou emprego seriam destinadas.
Pode aqui haver erro ou falta de inteira consideração de todos os dados.
Vejamos o que a observação do arrumo da população nas várias actividades nos poderá trazer como esclarecimento:
O primeiro campo fácil de estudos foi-me facultado pelo brilhante trabalho apresentado no último Congresso da União Nacional, sob o título «Para uma política económica», pelos Srs. Engenheiros Camilo Lemos de Mendonça, Augusto Alberto Henriques e Francisco Cruz Rodrigues.
As suas conclusões em faço do estudo dos censos da população, desde o de 1890 ao de 1940, e relacionados estes com o índice do produtividade e na sua comparação com a situação dos outros países, não podem deixar do nos abrir todo um panorama de dificuldades a vencer, não podem deixar de pôr perante os nossos olhos mais uma razão para a dúvida do real aumento do nível de vida. Tão grave considero a situação, tra-

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duzida por esses dados, que não hesitei em procurar a sua confirmação no desejo de garantir em seriedade as minhas considerações. Facilmente a encontrei e nas seguintes origens:
Portugal perante as Tendências da Economia Mundial, pelo Dr. Águedo de Oliveira.
Industrialização dos Países Agrícolas, pelo Dr. Fernando Maria Alberto de Seabra.
Do estudo dos mapas que ponho à consideração de V. Ex.ª e que, considerado, embora, todo o erro possível por diferença de critério no arrumo perante os censos, tomado portanto mais no significado de mostrar tendências, tenho de tirar a conclusão de que muito do que nos aparece como significando uma subida de nível de vida vem de um mau arrumo da população perante a sua utilidade para o bem comum.
Um nível de vida, portanto, fictício. Um arruino muito fora das reais possibilidades do meio, ou mesmo considerado por comparação com o verificado nos outros países. Para não maçar não lerei todos os números dos mapas; apenas lerei os mais expressivos.
Assim, em 1890 tínhamos, para uma percentagem de 48,1 por cento de população activa sobre a população total, a seguinte distribuição dessa percentagem:

Na agricultura e afins (primário) ..... 60,4
Na indústria (secundário) ............. 17,5
Nos serviços (terciário) .............. 21,9

Em 1930: percentagem da população activa, 58 por cento, dos quais:

Na agricultura e afins ................ 40,4
Na indústria .......................... 18,0
Nos serviços .......................... 35

Em 1940: percentagem total, 68 por cento, assim distribuídos:

Na agricultura e afins ................ 28,2
Na indústria .......................... 11,1
Nos serviços .......................... 60,6

De 1930 para cá agravou-se a tendência já verificada a partir do censo anterior, 1911, para que todo o aumento da população só desviasse da colocação nas actividades produtivas para as de distribuição, comando e utilização.
O grande saldo, contudo, foi verificado entre 1930 e 1940. Para ele deve ter contribuído toda a montagem do nosso serviço de coordenação económica e aumento de serviços, que provocou um aumento da ordem dos 300 por cento.
Comparemos, contudo, a nossa situação com a de alguns outros países:

Suíça (igualmente pelo censo de 1940):
Percentagens
Agricultura e afins .......... 20,9
Indústria .................... 45,8
Serviços ..................... 33,3

Itália:

Agricultura e afins .......... 47,8
Indústria .................... 26,8
Serviços...................... 25,4

Temos, portanto, uma realidade, considerando embora toda esta situação como significando simples tendência, que tomar em conta, da mesma forma quando estudamos os nossos problemas para o futuro: procurar contrariar esta tendência para melhor conjunto geral.
Desta situação diz o Dr. Águedo de Oliveira no livro atrás citado: "Enfim uma mão-de-obra assaz diligente e enérgica, de alta percentagem, pronta para trabalhar, dispondo de grande número de válidos, mas que abandona a agricultura, não corre para a indústria e se está comprazendo na ocupação improdutiva".
Não motivará esta situação muitas das dificuldades que sentimos?
Não se filiará nela a tendência de contrariar a frequência dos cursos superiores? A dificuldade de colocação para os formados? A impossibilidade de o Estado remunerar convenientemente os funcionários? Não estará nela também a tendência para a fixação do preço dos produtos a partir do consumo para a produção e não na inversa, em significado de realidade económica?
Uma série de perguntas que deixo à consideração de V. Ex.ª
Aqui fica contudo mais um problema de que não nos poderemos alhear e que tem de influir no estudo dos fins a atingir pelos planos de fomento.
Outra finalidade do Plano, e essa concretizada na verba que lhe é destinada - 330:000 contos -, é o melhor arrumo da população e sua quota para a resolução das crises de trabalho pela colonização interna.
É bem conhecida a obra já realizada neste aspecto. E por muitos posta em dúvida a sua vantagem real na forma como é praticada.
Ninguém duvida, estou certo, da sua necessidade de tendência. A dúvida surge quanto à sua localização, necessidade de acção directa do Estado, se o investimento corresponde inteiramente aos fins. Se é real e não artificial, e se por isso convirá seguir com cuidado o caminho aberto. Se deve ser um fim a atingir por acção directa ou em consequência de resolução de outros problemas.
A estabilidade da família é dada por uma garantia do salário justo, que permita fazer por si a reserva para o futuro, garantido na previdência e colocação das sobras. Não nos permite a nossa relação (área arável, coeficiente de produtividade, população), poder encarar a possibilidade de fazer esta estabilização da família pela entrega a cada uma da parcela do terreno que lhe garanta uma certeza para o futuro. Pode, quando muito, pensar-se, e o plano de fomento agrário o há-de definir, onde convirá fazê-lo, ou criar as condições para o conseguir, no significado de complemento de salário.
A terra, não o esqueçamos, tem como primeira obrigação contribuir com o máximo de possibilidades para a resolução de problemas gerais. A colonização interna se for implantada onde há problemas de crise de trabalho não influirá numa solução geral. Antes se poderá afirmar, perante as realidades verificadas, que influirá na resolução da situação de centenas, agravando problemas que envolvem milhares. Todos sabem que a parcela tem vincada tendência para aproveitar ao máximo o trabalho da família, pouco ou nada contribuindo para a absorção de mão-de-obra para além deste limite. E se não tiver uma situação que a diferencie do meio terá dentro de si a crise de trabalho própria das épocas, a necessidade de concorrer com os outros no complemento das suas economias.
A dúvida, portanto, surge quando analisamos o problema na forma de o resolver. Se pelo investimento do Estado, criando situações preferenciais, ou se devemos influir no problema económico de forma que este a traga como consequência.
A necessidade da colonização interna surge-nos nos países em que se não encontrou a compensação terra-indústria - outro modo de vida, diremos mesmo outro destino às populações que não seja a terra no significado de garantia de futuro, mais feito de uma ilusão do

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aumento do seu valor venda do que do real de rendimento.
E se nos debruçarmos sobre, o passado, analisando mesmo as regiões onde o problema, por exclusivismo de meio de vida, se põe em acuidade, estabelecendo a confusão entre o justo e o injusto, teremos campo de observação que nos leva a considerar a dúvida como possível.
Por efeito das possibilidades do aforamento, fez-se neste país muita colonização interna no Sul, núcleos que se mantêm onde as possibilidades económicas do momento as permitiram implantar e as realidades do meio permitiram a sua duração.
Ninguém ignora que sobro a primeira grande guerra, pelas possibilidades criadas à agricultura, muito avançámos também nesse caminho. Fez-se automaticamente a divisão de muitas propriedades, outras se arrumaram em melhores mãos na exploração directa.
Nestes núcleos fixaram-se, por facilidades de condições económicas, muitos dos que a terra de outros trabalhavam. Sem investimento do Estado, mercê, portanto, de condições criadas.
Outra realidade convém ter à vista. E que onde a propriedade vive do sequeiro, e por isso sujeita a grandes contingências, a situação de sã economia agrícola facilita e contribui para o seu parcelamento.
Quando, pelo contrário, a situação é de dificuldades, a propriedade pequena é a primeira a desaparecer, caminha-se para a concentração na defesa mais possível de garantia do rendimento por diversidade deste, por efeito até do poder de crédito.
A propriedade não é grande ou pequena no simples significado da sua área, mas em função do seu rendimento, das suas possibilidades de rendimento.
E se é assim no puro campo da economia privada, de igual forma só é grande ou pequena segundo a melhor forma pela qual contribui para os problemas gerais, postos estes em toda a sua extensão.
Ninguém ignora também como o regadio impõe o parcelamento ou fixação. Outro meio indirecto com que temos de contar para a resolução do problema.
Convirá, portanto, creio, não nos deixarmos desvanecer ou desorientar neste caminho por outro conceito que não seja a realidade. Convirá estudar o resultado em tempo do que está feito.
Não posso assim considerar como influindo directamente nos problemas da agricultura o investimento que por esta forma a ela se destina. Antes o creio em grande parte mais de incluir nas possibilidades normais do orçamento do Estado, jogando antes com toda a verba que lhe puder ser tirada para reforçar outras ou dotar as que mais possam influir na resolução de problemas mais instantes.
E entre esses não esqueço a defesa tão necessária da nossa matéria tributável - pela defesa dos nossos rendimentos. Penso nas nossas fruteiras, tão infestadas de parasitas. Nos montados de sobro e azinho, onde a limantria e o burgo todos os anos, largos prejuízos causam à economia nacional. Na nossa pecuária, tão mal defendida contra as epizootias.
Mais uma vez penso na necessidade da extensão dos serviços.
Quanto à verba para repovoamento florestal, direi somente que muito se deve lamentar que não possa ser maior. Neste campo muito temos ainda de fazer, quer quanto ao trabalho do Estado, quer quanto à necessidade de orientar e ajudar o trabalho dos particulares.
Sr. Presidente: ao dar início ao fim das minhas considerações e das conclusões que delas tenho de tirar, mais uma vez me vou reportar às opiniões dos outros, nas quais não vejo senão a confirmação da própria.
De um relatório da F. A. O., com a data de 4 de Julho de 1952, transcrevo os seguintes períodos:

O conselho da, F. A. O. indicou claramente aos Governos os três factores que têm importância primordial para o aumento da produção agrícola, que são:
1.º A segurança dos direitos da ocupação da terra perante a legislação;
2.º Uma garantia para o produtor de escoar os seus produtos a preços que lhe garantam o seu rendimento, cobrindo o custo de produção e o seu trabalho;
3.º A existência de um sistema de crédito ao alcance do produtor, em termos de ajustamento com as necessidades da sua vida.

Conseguidos estes três pontos, poderá então a agricultura aproveitar verdadeiramente os serviços de vulgarização, de consulta, para que, aproveitando os conhecimentos da ciência moderna, possa caminhar afoitamente para o futuro.
Corresponde o pensamento assim posto a uma realidade que temos de ter bem presente se quisermos sair das actuais dificuldades.
Necessitamos de um verdadeiro plano de fomento que tenha um verdadeiro espírito de fomento.
Temos de ter presente a acção do Estado na superior orientação do que vamos produzir, na defesa dos resultados do que colhemos. Não podemos compreender a sua acção a limitar a alta e a deixar consumar baixas de ruína. Nós não vivemos um tempo em que as oscilações se possam compensar por si próprias, visto que nos batemos com um mundo que, em defesa da própria economia, ataca tanta vez a dos outros.
Temos, para poder orientar esta acção, os organismos indispensáveis. O que é necessário é tirar deles, das suas possibilidades de estudo, de meios de compensação, todo o rendimento útil.
Refiro-me aos organismos de coordenação económica.
Não podemos continuar a servir-nos deles como simplesmente destinados a suportarem o peso das responsabilidades ou condenação, quando se lhes não deu maneira de evitar erros, ou não se ouviram as suas indicações.
Muitos têm conselhos técnicos, onde se encontram, representadas todas as actividades e serviços. Estão, portanto, em condições de ser ouvidos em perfeita consciência.
Necessário é evitar também todas as perdas, rever muito do que fizemos noutros sectores da nossa Administração e em que os encargos se podem mostrar superiores às nossas possibilidades. Temos de evitar que a nossa economia seja uma economia em cesto roto.
Temos ainda de, mudando de rumo, procurar que o aumento da riqueza venha desde a base do nosso edifício económico e talvez de rever o espírito dos nossos investimentos.
Cinquenta anos são muito na vida dos homens, pouco na das nações, e se queremos influir nos preços, que eles sejam os mais baixos possíveis, não podemos invalidar essa pretensão com grandes encargos de amortização ou de interferência. Um exemplo apenas:
Em 1940 o encargo sobre cada quilograma do carne em Lisboa, entre o matadouro e o consumo, era de 1$80; hoje é de 4$60.
Como conclusão das minhas considerações não posso deixar de sugerir outro arrumo para as verbas destinadas ao investimento na agricultura.
Que, por força do Plano, se dote em pleno o mais necessário, para se atingirem mais rapidamente os fins

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que temos em vista; que se aumente a verba do investimento, se for possível; que se deixe para as possibilidades normais do orçamento tudo o que não tenha um eleito mais rápido na resolução dos nossos problemas. Que se dotem, portanto, convenientemente:

O plano de fomento agrário;
Os serviços;
As obras de hidráulica agrícola;
O Fundo de Melhoramentos Agrícolas;
A verba do repovoamento florestal.

Sr. Presidente: sinto que tomei muito tempo com as minhas considerações (Não apoiados). É possível que com elas outro resultado não tenha conseguido do que o ficar de bem com a minha consciência. Se assim for, que me perdoem. Afirmo, contudo, com perfeita sinceridade, que as fiz com os olhos postos no futuro, com o sentimento da realidade.
Com a perfeita consciência de que só conseguiremos resolver o nosso problema de produção se lhe aplicarmos o mesmo princípio que nos levou a vencer o financeiro. Com finalidade bem definida, com caminho bem aberto dentro da realidade, com comando adequado.
Ditou-as o desejo de dar a minha contribuição para um melhor futuro, que para mim sinto já muito concretizado para além dos filhos, nos netos.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

Mapas a que se referiu o orador no decurso do seu discurso:

QUADRO I

Densidade comparativa

[ver quadro na imagem]

Population, n.º 1, Janeiro-Março de 1946.

QUADRO I-B

Distribuição da população activa

[ver quadro na imagem]

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Distribuição da população activa

[ver quadro na imagem]
[continuação]

[ver tabela na imagem]

QUADRO II

Portugal

Distribuição da população activa

[ver tabela na imagem]

[ver tabela na imagem]

O Sr. Manuel Marques Teixeira: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: continua a constituir matéria da ordem do dia de hoje a discussão do plano sexenal de fomento. É um imperativo do consciência que me conduz a subir à tribuna desta Assembleia. E ao fazê-lo, bem medindo o que representa de contributo notabilíssimo para o progresso do País a proposta do lei em apreciação, sobejam-me razoes para dirigir, desde já, palavras de aplauso ao Governo, e, mais do que palavras de louvor e de exaltação, exprimir sentimentos de perene gratidão, de que é credora maior a figura política e moral excelsa - glória de Portugal, orgulho do Ocidente latino e cristão - de S. Ex.ª o Sr. Presidente do Conselho.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Nas criadas e consolidadas condições de trabalho em que nesta Casa vimos exercendo a nossa função de Deputados, com inteira liberdade para expor, com desafogo, o que pensamos e o que sentimos, como lídimos representantes do País que nos elegeu, auto-limitados, apenas, pelo respeito que tributamos à verdade e pelas exigências do sagrado interesse nacional, na definição das nossas atitudes, nas posições que aqui tomamos, em frente aos problemas da administração, tanto somos abertos no louvor como desembaraçados na critica nos netos do Executivo - em qualquer dos casos, sempre espontâneos e francos, inalteràvelmente movidos por sérias preocupações de justiça e animados da ânsia de contribuir para a efectivação do bem comum. Pois, desta feita, Sr. Presidente, venho à tribuna para dar também expressivamente a aprovação do meu voto à presente proposta de lei, sendo, outrossim, firme convicção minha que ela possui títulos suficientes para, na sua generalidade, não deixar de merecer a plena concordância dos portugueses de boa vontade e sã consciência, a quem porventura os prejuízos do sectarismo político não hajam obnubilado a razão, entorpecido a imparcialidade dum critério julgador ou diluído o substracto mínimo de princípios de civismo inerentes à sua condição de nacionais.
Mas, Sr. Presidente, considerando o conteúdo denso do Plano do Fomento, tomando em linha de conta o acervo extraordinário de empreendimentos do carácter geral que resultarão da sua observância, logo ressalta, a plena luz, a excelência e a fecundidade dos princípios da nossa política e se destacam a nota de naturalidade e o cunho marcadamente pessoal da sua génese e da

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sua estruturação ao recordarmos as palavras lapidares em tempos proferidas por Salazar:

Para além do Estado está a Nação - a vida da comunidade nacional com as suas necessidades, o seu trabalho, as suas aspirações.
Para ela existe o Estado, isto é, em seu beneficio se organiza o Poder, se criam e funcionam serviços. Em nosso entender, a economia nacional deve servir a Nação: é o seu fim, é a sua razão de ser.

E ainda:

... é preciso acabar por definir o que se quer e por manter inalterado o que uma vêz se definiu.
... uma política é em si mesmo um plano, e um plano, mesmo medíocre, é sempre melhor do que a falta dele: porque o trabalho certo, com fito determinado, revela-o a experiência superior mesmo aos golpes de génio esporádicos e sem sequência.

E meditemos também sobre estas suas palavras esclarecedoras:

O caminho para o futuro pode ser traçado por dois processos: um seria a elaborarão duma nova lei de reconstituirão económica, que, por período mais ou menos longo, dominasse a actividade da Administração e, até certo ponto, a orientação da economia; outro, a meu ver, preferível, consistiria na definição de um plano de fomento, preciso e restrito, que se ativesse mais de perto às possibilidades financeiras e desse prioridade a alguns grandes empreendimentos de carácter mais vincadamente reprodutivo. Não se pode querer tudo ao mesmo tempo, e é a altura de definir critérios de preferência.

Estudar na dúvida, fugir às improvisações, ser prudente e atento às realidades, realizar com fé, método e persistência são normas seguras de sábia, pedagogia política, de que tem sido e é mestre inconfundível o alto e luminoso espírito do nosso eminente Chefe do Governo.
Com perfeita ilustração das virtudes do sistema da continuidade política, diga-se que na esteira dos seus ensinamentos, e sob o seu comando, é que se tem operado o milagre do ressurgimento português, impulsionado pela Revolução Nacional, partindo quase do zero e em meio de um condicionalismo internacional tão adverso - cito somente a terrível crise económica de 1929, o incêndio da guerra de Espanha e a hecatombo tremenda de 1939-1945 -, que sentimos, na realidade, um sentimento misto de orgulho e de pasmo ao pensarmos e reflectirmos não só na medida de grandeza da valorização do património nacional, mas como foi possível levá-la por diante em épocas estiradas de martírio, de horrores, de quase derrocada para tantas nações da Europa! E nós, graças a Deus e ao génio de Salazar, sobrevivemos, melhor, vivemos, pudemos trabalhar e progredir, havemos de durar com dignidade e com honra, cumprindo galhardamente o nosso destino e não traindo o mandato das nossas responsabilidades históricas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: podia ser agora a altura de, num olhar retrospectivo, celebradas que foram o ano passado as bodas de prata do regime, rememorar a triste situação donde partimos, depois exaltar as certezas do momento que decorre, por fim antever, com fé e confiança, as jornadas do futuro... Seria esta a altura, repito, de «fazer o ponto», mas não quero alongar-me demasiadamente.
Não me conterei, todavia, sem que faça uns ligeiros apontamentos para salientar, por meu turno, que na base do activo do Estado Novo está, como é axiomático, a sanidade das finanças públicas, o equilíbrio das contas, a robustez do crédito; para frisar que a Lei da Reconstituição Económica, em cuja execução se gastaram à roda de 14 milhões de contos, foi um forte elo da cadeia notável de empreendimentos de carácter colectivo que agora, através do Plano de Fomento, se continua e reforçará, por modo a interferir nos mais importantes sectores da economia nacional, em termos de plenamente se alcançar, ainda que ao longo do tempo, como é intuitivo, este objectivo-síntese: a elevação geral do nível do povo português.
É desvanercedor para o nosso nacionalismo lembrar neste momento, Sr. Presidente, os comentários que, há menos de um ano, o homem de letras francês Sr. François Baradez bordou no jornal Le Monde sobre os frutos da nossa administração pública neste último quarto de século.
Ao fazê-los ilustrou-os, para orgulho nosso, com a eloquência, dos números que vou reproduzir: revalorizaram-se 84 245 ha de terreno; foram fixados 26 627 ha de dunas; do trabalhos hidráulicos beneficiaram 45 456 ha de terreno: o aumento da produção de trigo enquadra-se na casa dos 26 por cento e o da do milho, arroz, batata, azeite e vinho atinge 160, 312, 278, 54 e 58 respectivamente - tudo referenciado, esclarece-se, ao ano de 1926.
E ainda, adoptando como ponto de partida esta data, acrescenta o citado jornalista e escritor: «foi de 153 por cento o aumento da produção mineira; hoje, a superioridade da produção da energia eléctrica é de 798 por cento; a produção de superfosfatos subiu, em 1949, a mais de 303 000 t».
Direi, era parênteses, que faz vibrar a nossa alma de portugueses, naturalmente ufana e feliz, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a verificação de como um estrangeiro de qualidade tem em alta conta e homenageia o esforço recuperador que a Nação vem afincadamente desenvolvendo sob a égide de um chefe incomparável.
Só para que por força dos contrastes tiremos mais uma meditação, um ensinamento e um estimulo da lição magnifica que é o todo harmónico da acção de Salazar como estadista insigne e patriota impar daremos mais só esta nota: o pesadelo do nosso déficit financeiro totalizava, desde o advento da República até ao ano histórico de 1928, 2.648:724 contos.
Particularmente, afirma-se que foram do 542:000 contos em 1926-1927! E admite-se perfeitamente que o espectro da bancarrota fosse então para muitos espíritos uma ameaça aterradora logo que pusemos os olhos pávidos neste quadro bem sintomático: os bilhetes do Tesouro estavam na casa de 1.246:000 contos; a circulação fiduciária em 1.990:000 contos; a dívida flutuante em nada menos de 178:000 contos.
Pois bem. Em 1928 começa a trabalhar o grande Ministro das Finanças e o seu primeiro orçamento aparece com a previsão de 1:576 contos de saldo positivo, para após o transcurso de um ano, o saldo positivo das contas públicas ser do montante de 275:000 contos. E de pronto, já vão decorridos vinte e quatro anos, começou o raiar de uma nova aurora - não seria ainda «o sol a pino do meio-dia»- na atmosfera caliginosa que até então vinha obscurecendo a precária vida económico-financeira do País.
Consideremos, agora, que, a par do que se gasta anualmente com a actividade normal dos serviços, no espaço dos seis anos subsequentes, a bem do povo trabalhador, a bem dos nossos filhos, numa palavra, a bem

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da Nação, vão fazer-se investimentos da ordem de 13 milhões e meio do contos!
Na impossibilidade de discretear sobre todo o conteúdo do Plano de Fomento, cujo magnifico relatório é, na verdade, impressionante de sistematizarão, de justa medida, de clareza, de equilíbrio, de objectividade, em suma, relatório leito, como sói dizer-se, por mão de mestre, pronunciar-me-ei somente acerca de algumas matérias nele vertentes.
Ora, como filho que sou de um distrito essencialmente agrícola, curial é que me detenha, em particular, na apreciação breve do que concerne à agricultura e naquilo que, pela sua especial natureza, mais de perto se ligue com o problema da terra e diga respeito à sorte dos que a amanham com prodígios de esforço, com abnegação, amorosamente.
Afirme-se já, em abono da verdade, que é manifesta a atenção que o Plano dispensa à agricultura, como se conclui do conhecimento o importância das verbas nele consignadas, visando beneficiá-la através de obras de hidráulica, de colonização interna e de povoamento florestal.
A grandeza desse auxílio traduz-se no calculado investimento de 1:290 mil contos, o qual não se nega que é generoso, grande e fecundo pela certeza das suas muitas consequências do ordem económico-social, mas se reputa insuficiente.
Não esqueço que a fixação de alguns processos do fomento da agricultura, por via da acção estadual, se encontra em alguns diplomas já publicados e se vem de há muito exercitando; o próprio Plano os aflora e evidencia a ideia da sua continuidade. No entretanto, diremos com franqueza que neste capítulo, se tivermos de ajuizar do que está para vir pelo que foi e pelo que é, não estamos cabalmente satisfeitos e queremos mais e melhor.
Reconhece-se, sem esforço, ao transcender a rubrica da presente proposta de lei no referente à agricultura, que a lavoura muito virá a beneficiar também da decisiva influência que noutros sectores da economia nacional resultará da execução do Plano, mais directamente nuns casos, noutros, porventura, mais indirectamente.
Não há dúvida de que é assim. Exemplificá-lo, pormenorizando o acervo de incontestáveis vantagens que lhe advirão de tudo o que irá fazer-se, durante os seis anos vindouros, em matéria de electrificação, extensificação das indústrias, melhoria de comunicações e transportes, siderurgia, intensificação do ensino técnico, etc., seria, Sr. Presidente e Srs. Deputados, verdadeiramente redundante.
Agradou-me ler no n.º 3.º da base VI que o Governo promoverá «a generalização e aproveitamento das pequenas e médias obras de regadio», tão certo é que, sendo mais economicamente exequíveis e de mais pronta realização, não é menor o potencial de benefícios que comportam.
Mas não deve deixar de merecer cuidada atenção o estudo do processo de elevação das águas dos rios e o da rega das terras altas pela retenção das águas pluviais caídas durante o Inverno.
Não é demais encarecer as vantagens que resultam do povoamento florestal, pois por meio dele se procura contrariar a acção terrível da erosão, se evita o assoreamento dos rios, se faz o aproveitamento das dunas, vem a possibilitar-se uma maior expansão da indústria de madeiras, se provocam consequências de ordem climática e até se valoriza paisagisticamente a Natureza.
Este o lado bom do anverso da medalha; mas a nocividade do seu reverso está e estará em, por vezes, ir-se longe de mais no revestimento florestal de certos baldios, abarcando terrenos com características de logradouro comum, de todo o ponto imprescindíveis para a utilização dos povos - imprescindíveis, insiste-se, para que neles se apascentem os gados, neles se cortem os estrumes que hão-de fertilizar as terras, aí se vão buscar as lenhas e esteja assegurado o aproveitamento das águas de rega que lá brotam.
Penso que tudo está, afinal, em que os serviços, em sua actuação, observem o conhecido aforismo latino: est modus in rebus.
Encarando o problema da intensificação do fabrico nacional dos adubos a preços de concorrência, é fácil concluir-se da grandeza dos benefícios a colher pela lavoura: adubos mais baratos hão-de permitir que deles se faça aplicação em mais larga escala, e daí maior fertilização dos nossos terrenos; mais produção por unidade de superfície, perspectiva feliz de uma justa e maior compensação para quem trabalha; aumento de volume de recursos alimentares, por um mais barato custo do produção; acréscimo do consumo; enfim, riqueza da economia nacional.
Sobre a evolução do consumo de adubos potássicos (sulfato e cloreto) pela nossa agricultura, a leitura, sempre útil, de A Voz dos Campos de 20 do mês findo forneceu-me estes dados curiosos:

Enquanto em 1938 o seu emprego não atingiu 3 500 t anuais, esse número regula actualmente por cerca de 14 000. Admite-se que a cultura da batata absorve 4 500 t; a da vinha 2 000; a do milho 2 000; a do trigo 1 500.

E S. Ex.ª o Subsecretário de Estado da Agricultura referiu que, «examinando o consumo dos adubos por hectare em elementos nobres nos anos de 1937 e 1950-1951, se notam os seguintes aumentos: azoto, mais 74 por cento; anidrido fosfórico, mais 59,5 por cento; potassa, mais 150 por cento».
Tudo conduz à ratificação da certeza de que a nossa lavoura se esforça por produzir mais e melhor e é, como sempre, tenaz e heróica na sua tradicional devoção de bem trabalhar o agro português em proveito da grei. Mas porque a nossa lavoura é assim, assim se vem comportando e da sua actividade resultam os mais amplos benefícios colectivos, é que entendo ser necessário realizar, com inteligência e afinco, uma racional política agrária.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Eu sei, todos sabemos, que o Governo de Salazar tem amparado a agricultura, vítima de vicissitudes de vária ordem, contribuindo para que as suas dificuldades se atenuem, quer através de bónus em adubos e sementes, quer por meio de financiamentos diversos, quer pelo processo de compra de produtos visando impedir a degradação dos preços, quer ainda pela adopção doutras medidas de evidente alcance e projecção.
Mas eu espero, creio e desejo que a acção fomentadora e proteccionista do Estado, neste capítulo da agricultura, vá mais além, completando-se quanto antes o plano de fomento agrário, tão razoavelmente louvado, generalizando-se a criação, junto das estações agrárias do País, de centros de preparação profissional para trabalhadores agrícolas; divulgando-se os processos técnicos que possibilitem o conhecimento e a prática de regras de sanidade vegetal e se faça a multiplicação de postos de sanidade frutícola; fomentando a criação dessas admiráveis e frutuosas organizações económico-

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-sociais que são as cooperativas do carácter agro-pecuário, de cujas altíssimas vantagens tenho conhecimento directo pela instalação e funcionamento no meu concelho, em S. Pedro do Sul, da Adega Cooperativa de Lafões - obra magnífica e nunca por demais agradecida da Junta Nacional dos Vinhos em harmonia com a subsequente colaboração dedicada de alguns carolas agrícolas da região; aumentando o número de brigadas móveis de técnicos com garantias de possibilidade de acção, por forma a dar-se o seu contacto assíduo com os trabalhadores da terra; enfim, decalcando a notável proposta de lei sobre a reforma do ensino técnico profissional, nesta Casa discutida e votada, que se proceda ao «alargamento e racionalização do ensino agrícola», consoante se preconiza no bem elaborado parecer subsidiário da Câmara Corporativa.
Sinto que estou a abusar da benevolência do V. Ex.ª, Sr. Presidente, e da paciência de VV. Ex.ªs, Srs. Deputados.
Não apoiados.
Vou, portanto, pôr já ponto final às minhas considerações. Com todo o meu apreço e respeito pelos Srs. Ministros signatários da proposta de lei que ora se discute, quero desta tribuna render as minhas particulares homenagens ao alto espírito do Sr. Ministro das Finanças, técnico distinto que sabe adoçar a aridez natural dos assuntos que superiormente versa com o aticismo da frase do mais fino recorte literário.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Ao Sr. Ministro da Economia, de cuja carreira brilhante de estadista me apraz assinalar as suas declarações à imprensa em Setembro de 1950, como acto confirmatório não só dos seus altos merecimentos de economista, mas também de uma inteligência desempoeirada e compreensiva que conhece e acata e não se desgosta de servir as altas e sérias razões da política.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: está prestes a fazer vinte e cinco anos que um lente muito ilustre da velha e gloriosa Universidade de Coimbra deixou, lá numa humilde aldeia do meu distrito, a sua santa mãe enferma para vir acudir à abalada saúde da Pátria - esta Pátria imortal que Salazar considerava e amava, considera e ama como sua segunda mãe. Que o verdadeiro amor nunca se esgota e só tem e só busca como recompensa o gosto íntimo de dar-se mais uma vez se confirma com a inspiração e autoria deste notabilíssimo Plano de Fomento, ao qual dou, em consciência, o meu voto.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão.
Amanhã haverá sessão com a mesma ordem do dia. Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 10 minutos.

Sr. Deputado que entrou durante a sessão:

Mário Correia Teles de Araújo e Albuquerque.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Abel Maria Castro de Lacerda.
António de Almeida.
António Bartolomeu Gromicho.
António Calheiros Lopes.
António Carlos Borges.
António Maria da Silva.
António de Sousa da Câmara.
Artur Proença Duarte.
Artur Rodrigues Marques de Carvalho.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Caetano Maria de Abreu Beirão.
Carlos de Azevedo Mendes.
Carlos Mantero Belard.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Carlos Vasco Michon de Oliveira Mourão.
Gaspar Inácio Ferreira.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Jerónimo Salvador Constantino Sócrates da Costa.
João Carlos de Assis Pereira de Melo.
Joaquim de Moura Relvas.
José Cardoso de Matos.
José Pinto Meneres.
José dos Santos Bessa.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Domingues Basto.
Manuel José Ribeiro Ferreira.
D. Maria Baptista dos Santos Guardiola.
D. Maria Leonor Correia Botelho.
Miguel Rodrigues Bastos.
Vasco de Campos.

O REDACTOR - Leopoldo Nunes.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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