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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 178

ANO DE 1952 II DE DEZEMBRO

V LEGISLATURA

SESSÃO N.º 178 DA ASSEMBLEIA NACIONAL

EM 10 de DEZEMBRO

Presidente: Exmo.Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior

Secretários: Exmos. Srs.Gastão Carlos de Deus Figueira
José Guilherme de Melo e Castro

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente.
O Sr. Presidente comunicou que recebera, para o efeito do § 3.º do artigo 109.º da, Constituição, o Decreto-Lei n.º 39023.
O Sr. Deputado Carlos Mantero agradeceu o voto de pesar da Assembleia pela morte de seu irmão.

Ordem do dia. - Continuou o debate na generalidade da proposta de lei sobre o Plano de Fomento Nacional.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Pacheco de Amorim, Cortês Lobão, Sócrates da Costa e Armando Cândido.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Eram 15 horas e 50 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Adriano Duarte Silva.
Afonso Enrico Ribeiro Gazaes.
Alberto Henriques de Araújo.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alexandre Alberto de Sousa Pinto.
Américo Cortês Pinto.
André Francisco Navarro.
António Abrantes Tavares.
António Augusto Esteves Mendes Correia.
António Bartolomeu Gromicho.
António Carlos Borges.
António Cortês Lobão.
António Jacinto Ferreira.
António Joaquim Simões Crespo.
António Júdice Bustorff da Silva.
António Maria da Silva.
António de Matos Taquenho.
António Finto de Meireles Barriga.
António Raul Galiano Tavares.
António dos Santos Carreto.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Proença Duarte.
Caetano Maria de Abreu Beirão.
Carlos Mantero Belard.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Diogo Pacheco de Amorim.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco Eusébio Fernandes Prieto.
Frederico Maria de Magalhães e Meneses Vilas Boas Vilar.
Gaspar Inácio Ferreira.
Gastão Carlos de Deus Figueira.
Henrique Linhares de Lima.
Herculano Amorim Ferreira.
Jaime Joaquim Pimenta Prezado.
Jerónimo Salvador Constantino Sócrates da Costa.
João Alpoim Borges do Canto.
João Ameal.
João Luís Augusto das Neves.
João Mendes da Costa Amaral.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim de Oliveira Calem.
Joaquim de Pinho Brandão.
Joaquim dos Santos Quelhas Lima.
José Dias de Araújo Correia.
José Diogo de Mascarenhas Gaivão.

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José Garcia Nunes Mexia.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Luís cia Silva Dias.
José Pinto Meneres.
Luís Maria Lopes da Fonseca.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Domingues Basto.
Manuel França Vigon.
Manuel Hermenegildo Lourinho.
Manuel José Ribeiro Ferreira.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel de Magalhães Pessoa.
Manuel Maria Múrias Júnior.
Manuel Maria Vaz.
Manuel Marques Teixeira.
Manuel de Sousa Meneses.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Mário de Figueiredo.
Paulo Cancela de Abreu.
Pedro de Chaves Cymbron Borges de Sousa.
Ricardo Vaz Monteiro.
Salvador Nunes Teixeira.
Sebastião Garcia Ramires.
Tito Castelo Branco Arantes.
Vasco Lopes Alves.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 73 Srs. Deputados.

Está aberta a sessão.

Eram 16 horas.

Antes da ordem do dia

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Telegramas

Do Grémio dos Industriais de Conservas de Peixe do Norte, a aplaudir as considerações do Sr. Deputado Vasco Mourão, a respeito da necessidade de um porto de pesca em Leixões, no decorrer do debate sobre o Plano do Fomento.

Do Grémio da Lavoura de Cuba, a apoiar a defesa feita na Assembleia a favor dos interesses da lavoura a propósito da discussão do Plano de Fomento.

Exposição

Lisboa, 9 de Dezembro de 1952. - Sr. Presidente da Assembleia Nacional.- Excelência.-A secção de produtores de electricidade da Associação Industrial Portuguesa, em sua sessão de 27 de Novembro próximo passado, no intuito de contribuir para um amplo esclarecimento do problema da electrificação do País e para n adopção das soluções mais aconselháveis nessa matéria, no momento em que se discute o projectado Plano de Fomento Nacional, deliberou patrocinar um pedido das empresas Companhia Eléctrica, das Beiras e Hidroeléctrica Alto Alentejo relativo ao envio à Assembleia Nacional de elementos sobre aproveitamentos por elas projectados e não considerados concretamente no Plano de Fomento e no parecer da Câmara Corporativa.

Para este efeito, dirigiu-se à direcção desta Associação, que muito respeitosamente vem pedir a esclarecida atenção da Assembleia Nacional para os seguintes aspectos do problema eléctrico português:

1. A Câmara Corporativa aconselha o estudo do Alvito como albufeira de regulariza-lo interanual (pp. 1 127 e 1 138 do parecer sobre o Plano de Fomento).

Na verdade, as condições naturais permitem a criação de uma albufeira, até à capacidade de 2400 milhões de metros cúbicos (cota de retenção 260 m acima do nível do mar e barragem com 135 m de altura).

Alvito faz parte do conjunto dos aproveitamentos da bacia do Tejo, bacia que pode dotar o País com um volume e energia da ordem dos 1 800 milhões de Kilo-watt-hora e uma reduzida variação quantitativa de ano para ano, ao preço de $15 por kilowatt-hora (estudo apresentado pela Hidroeléctrica Alto Alentejo às entidades oficiais em 1954).

Alvito, em si, isoladamente, é uma albufeira de regularização interanual.

Construída com a capacidade de 2 400 milhões de metros cúbicos, esta albufeira permite a transformação da energia sobrante dos vários sistemas produtores em energia estival, por bombagem das águas do Tejo.

Para objectivamente demonstrar o valor desta albufeira com fonte de energia estival apresentam-se as suas produções para os dezoito anos (1932 a 1950), na hipótese de uma capacidade de armazenamento apenas de 1 700 milhões de metros cúbicos (cota 230):

Exploração do Alvito, dotada de uma albufeira com 1 700 000 m3, como central de energia estival, ao longo dos anos de 1932-1933 a 1949-1950

[ver tabela na imagem]

Anos heliânlteos Caudal armazenamento no início da estiagem - milhões metros cúbicos Caudal anual da Cereja - Milhões de metros cúbicos Caudal turbinado durante a estiagem para produzir os 133 000 000 kWh de produção garantida todos os anos - Milhões de metros cúbicos Caudal descarregado por ser superabundante - Milhões de metros cúbicos

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A produção de 155 milhões de kilowatts-hora de energia estival todos os anos está, portanto, demonstrada, visto que no grupo dos anos considerados no quadro anterior se inclui o biénio de 1943-1944 e 1944-1945, que é, sem dúvida, um dos mais secos registados.
O aproveitamento do Alvito para esta capacidade de l 700 milhões de metros cúbicos está orçamentado em. detalhe e apresenta, por capítulos, os seguintes valores:

Contos
Barragem (cota 250) ........... 245:100
Expropriações (cota 250) ....... 49:000
Derivação ...................... 66:000
Subestação do Alvito ........... 2:400
Equipamento electromecânico (100 000 kWh) .................. 90:000
Várias instalações definitivas . 3:000
455:500

O preço deste kilowatt-hora de estiagem garantida todos os anos será, pois, da ordem de

45.550:000$ = $29(3)
155 000 000 kWh

Assim, portanto, será de $29(3) o preço do kilowatt-hora desta energia, que é energia estival garantida todos os anos.
O preço desta energia baixará para $27 quando for feito Fratel, por aumento da queda em que as águas são aproveitadas.
Porventura este aproveitamento ainda poderá ser mais convenientemente concebido, em vista dos superiores interesses nacionais.

Nota 1.- Os preços unitários que entraram na elaboração deste orçamento são mais elevados do que os que se estão praticando nas obras de Salamonde e Caniçada, o que abona a este orçamento uma especial confiança.
Nota 2. - De uma forma geral os terrenos submersos não têm valor agrícola considerável.

2. A p. l 093 do Diário das Sessões n.º 168, datado de 21 do mês findo, mencionando-se as centrais eléctricas projectadas nos rios Zêzere, Cávado, Távora e Côa e aludindo-se ao aproveitamento hidroeléctrico do Douro internacional, afirma-se serem elas "as únicas de que existem projectos em termos de consentir a sua inclusão no Plano", pelo que "não fica margem para escolher".
A Associação Industrial Portuguesa pede vénia para lembrar que a Companhia Eléctrica das Beiras entregou em 9 de Outubro de 1949 na Direcção-Geral dos Serviços Eléctricos o projecto do aproveitamento hidroeléctrico do Alto Zêzere e do Alto Mondego.
Na elaboração deste projecto encarou-se apenas o aspecto da produção de energia com carácter permanente, único que interessa directamente aos fins para que foi constituída a Companhia Eléctrica das Beiras.
Admitia-se, porém, que fosse mais proveitoso para a economia da Nação condicioná-lo à irrigação dos campos da Cova da Beira e à produção de energia estival em grande volume, conforme foi exposto a S. Exa. o Ministro da Economia em Setembro de 1948, e assim estaria esta Companhia disposta a executar o aproveitamento com esta finalidade, aumentando a capacidade do embalse de Asse Dasse até cerca de 50 milhões de metros cúbicos e, consequentemente, a potência da central, desde que a Companhia Nacional de Electricidade lhe garantisse a recepção da energia (cuja produção fica condicionada pela rega) que não pudesse ser absorvida pelo mercado da Companhia Eléctrica das Beiras e que desta modificação do projecto não resultasse agravamento do preço do custo do kilowatt-hora.
Pelo projecto entregue às entidades oficiais verifica-se que a produção do aproveitamento Alto Zêzere-Alto Mondego se computa, em ano médio seco, em 23 milhões de kilowatt-hora de energia armazenada e em 58 milhões de kilowatt-hora de energia regularizada e que o preço médio do kilowatt-hora nas barras da central seria de $24.
Importavam as obras projectadas em 157:000 contos, número presentemente desactualizado devido ao encarecimento dos materiais e mão-de-obra verificado depois da entrega do projecto.
Um aumento de 8 por cento sobre o orça monto então apresentado não nos parece excessivo.
Teremos, assim, como custo actual do aproveitamento 170:000 contos e como preço médio do kilowatt-hora $260.
Se fosse superiormente aconselhada e convenientemente comparticipada a irrigação da Cova da Beira, haveria que aumentar o embalse da barragem de Asse Dasse de 20 para cerca de 50 milhões de metros cúbicos e a potência da central de 20 000 para 30 000 kVA, com um dispêndio para mais de cerca de 75:000 contos.
Conseguia-se assim a irrigação de 6 000 hectares da Cova da Beira, conforme parecer da Junta Autónoma das Obras de Hidráulica Agrícola, que avaliou também em 61:000 contos a água necessária à rega desses terrenos.
Com o aumento do embalse e da potência da, central poder-se-iam produzir em ano médio seco 52 milhões de kilowatts-hora de energia armazenada e 32 milhões de kilowatts-hora de energia regularizada.
Se aos 245:000 contos, custo do aproveitamento, deduzirmos os 61:000 com que a rega deverá coparticipar ficam-nos 184:000 contos como custo das obras destinadas a produção de energia eléctrica.
Admitindo para preço da energia regularizada o actualmente em vigor para o Castelo do Bode ($21), teríamos para preço, do kilowatt-hora estival:

184:000.0005 X 0,125 1 - 32 000 000 X $21 =
= 52 000 000
X = $31(3) = $31

É evidente que neste caso a produção de energia fica condicionada ao regime de rega a estabelecer. Dos 52 milhões de kilowatts-hora de energia armazenada só os 6 milhões de kilowatts-hora correspondentes ao embalse da Candeeiro não terão de obedecer a este regime, pelo que poderão ser produzidos quando melhor convenha ao sistema.
Se se pretender dar uma maior elasticidade à produção de energia eléctrica ter-se-á de aumentar o embalse da albufeira de Asse Dasse ou de diminuir a área regável.
Se optarmos pela primeira destas hipóteses verificamos que, elevando a barragem de 70 para 75 m, obteríamos um embalse de 63 milhões de metros cúbicos utilizáveis e uma produção de 63,5 milhões de kilowtts-hora de energia estival e 21 milhões de energia regularizada, com um acréscimo de despesa da ordem dos 25:000 contos. Nesta hipótese teríamos já 17,5 milhões de kilowatts-hora estivais, cuja produção não estaria condicionada à rega.
Admitindo, como já atrás fizemos, o preço de $21 para o kilowatt-hora regularizado e deduzindo a com-

1 Admite-se que os encargos anuais do aproveitamento andam à volta do 12,5 por cento.

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participação para a rega obtém-se para preço do kilowatt-hora estival $34. No quadro seguinte resumimos as três hipóteses atrás consideradas.
Juntam-se cópias da exposição feita a S. Ex.ª o Ministro da Economia e dos pareceres da Junta Autónoma das Obras de Hidráulica Agrícola, da Direcção-geral dos Serviços Agrícolas e da Junta de Colonização Interna e os mapas de produção em ano médio seco do aproveitamento do Alto Zêzere-Alto Mondego para as três hipóteses consideradas.

[Ver Quadro na Imagem].

3. No mês de Abril do corrente ano a Companhia Eléctrica das Beiras entregou também na Direcção-Geral dos Servidos Eléctricos o projecto de aproveitamento das águas do rio Mondego e do sen afluente Caldeirão na central de Vila Soeiro, previsto para uma produção em ano médio de 25 milhões de kilowatts-hora no caso de se executar o aproveitamento de na hipótese contrária. O custo total das obras deste aproveitamento, segundo a previsão, é de 40:000 contos. E o preço calculado do kilowatt-hora produzido nessa central é de para a produção anual de 25 milliões de kilowatt-hora. Este preço «não é mau», na opinião autorizada do muito ilustre relator do parecer da Câmara Corporativa sobre o Plano de Fomento Nacional. Centrais como a de Vila Soeiro, segundo o seu abalizado parecer, «não podem ser desprezadas, porque mio temos outras; há que as construir».

4. Por isso a Associação Industrial Portuguesa, fazendo suas estas últimas sensatas palavras, termina solicitando de V. Ex.ª que promova que a Assembleia Nacional inclua no Plano de Fomento em discussão estes três aproveitamentos hidroeléctricos, projectados por duas empresas suas associadas, que de tão benéficos resultados se mostrarão, depois de realizados, para o desenvolvimento da economia nacional.
Apresentamos a V. Ex.ª os protestos da nossa mais elevada consideração e subido apreço, subscrevendo-nos.

De V. Ex.ª M.to At.º V. e Obg.do, o Presidente da Direcção, Francisco Cortês Pinto.

Cópia. - Sr. Ministro da Economia - Excelência. - Na reunião da Comissão de Interligação das Centrais, do Norte de 21 de Julho de 1948, à qual V. Ex.ª deu a honra de presidir, foi reconhecida a necessidade premente de se dar á rede do Norte do País um forte apoio de energia e potência estivais, não só nos anos excessivamente secos como até no ano médio.
Sempre interessados em colaborar na resolução do problema nacional de produção e distribuição de energia eléctrica, demos início às obras do aproveitamento do Alto Ceira, que nos garante o enchimento da albufeira de Santa Luziu mesmo nos anos secos: o nosso apoio estival aos outros aproveitamentos passará assim a ser muito mais eficaz, por se tornar independente da pluviosidade do ano.
Este, aproveitamento entrará em servido em fins de 1949 e a sua acção terá um valor relativo importante até à entrada em serviço dos aproveitamentos em construção.
Com uma zona de distribuirão de energia de uma maneira geral pobre, apesar dos capitais investidos e facilidades concedidas nos últimos anos para o desenvolvimento do mercado, a nossa capacidade de produção é cerca, de três vexes superior ao consumo próprio; é natural por isso que querendo participar na obra de aumento de produção hidráulica, pela qual tanto interesse tem mostrado o Governo da Nação e em especial V. Ex.ª, o nosso pensamento se encaminhe para os aproveitamentos com grande predomínio de energia estival, de colocação assegurada nas outras redes.
O aproveitamento hidroeléctrico do Alto Z~ezere e do Alto Mondego, cujos estudos, concedidos a esta Companhia, terminarão em breve, tem grandes possibilidades de armazenamento de energia e o interesse especial de lançar no rio Zêzere, anualmente mais de 50Mm2 de água da bacia do Mondego que irão passar nas centrais do Cabril da Bouça do Castelo do Bode e de Constância.
No ponto de vista económico particular, parece ser aceitável a solução da regularização anual com um armazenamento máximo de 25 MkWh (30 por cento da energia produtível).
Mas, atendendo à falta do regularização dos outros rios, isto é, ao deficit de energia estival dos outros aproveitamentos, que neste momento tanto se faz sentir, parece ser do maior interesse nacional aumentar-se a capacidade de armazenamento para 50 Mm3, com uma produção estival de 55 MkWh, em prejuízo, evidentemente, da produção de energia regularizada; e, ainda que entrem em serviço os aproveitamentos regularizados do Zêzere e do Cávado e se complete a regularização do rio Lima, será sempre avisado aumentar as possibilidades de embalse de um aproveitamento quando isso for economicamente possível, pois são bem conhecidos o carácter torrencial dos nossos rios e a dificuldade de obter em muitos casos grandes bacias reguladoras.
Se atentarmos ainda na potência do conjunto, que passaria para mais de 40 000 kW, não se pode deixar de reconhecer o valor relativo deste aproveitamento, mesmo depois da entrada em serviço dos aproveitamentos em execução.
No caso presente o aumento do custo das instalações, resultante do aumento de custo da barragem e do consequente aumento de potência da central, está avaliado em cerca de 70:000 contos; e este encargo é demasiadamente pesado para ser suportado apenas pelo acréscimo de energia estival, pois não há aumento de produção total com a modificação do esquema.
Acontece, porém, que a jusante deste aproveitamento e a cota inferior se encontram mais de 20 000 ha de terrenos já preparados para o regadio - a Cova da Beira, à qual o caudal de 10 m3/seg. durante, o Verão, se for destinado à sua irrigação, poderá levar um aumento de riqueza bem mais valioso para o País que o aumento de encargos da obra.

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E, nestas condições, a realização do aproveitamento com características essencialmente estivais, inviável economicamente do ponto de vista eléctrico, poderá ser facilitada pela comparticipação financeira do Estado, comparticipação que em bom rigor deveria ser amortizada pelos beneficiários da irrigarão, possivelmente nas condições da Lei n.° 1 949.

Resolver-se-iam assim, simultaneamente, dois problemas importantes de fomento - a produção de energia estival e a irrigação de uma vasta zona de cultura, esta última suportando apenas os encargos que a primeira não pudesse comportar.

Qualquer que seja a solução técnica escolhida, a energia produzida no aproveitamento não poderá ser utilizada por largos anos, por falta de mercado próprio, na rede desta Companhia; deverá, portanto, entregar-se à rede geral do País e a sua execução deverá ser diferida até à realização da rede a 150 KVA concedida à Companhia Nacional de Electricidade.

A ligação do maciço da serra da Estrela a esta rede não poderá fazer-se, 60 kV, tensão que já não é económica para o programa em realização pela Hidroeléctrica da Serra da Estrela, a qual disporá em breve de breve d cerca de 50 MkWh com uma potência da ordem dos 20 MW.

Construindo-se o aproveitamento do Alto Zézere e Alto Mondego e outros que esta Companhia estuda na mesma região, a energia anual a transportar será superior a 150 MKWh, uma ponta de 60 MW, para a qual a fórmula de Still dá já valores da ordem dos 150 kV.

Com a construção de uma linha a 100 kV ligando aquele, centro de produção à subestação de Coimbra, da Companhia Nacional de Electricidade, resolver-se-ia por largos anos a ligação do maciço da serra da Estrela à rede do País, sem que os encargos do transporte fossem elevados no momento do seu estabelecimento (cerca de $02 por kWh); lançava-se nessa, rede, após a conclusão das obras, cerca de 130 MkWh, com uma potência da ordem dos 60 MW, e permitia-se a construção de outras centrais naquela zona por se lhes garantir a absorção da energia produtível.

Uma vez fixados as condições e o prazo de construção da linha a 150 kV e estabelecidas as bases de uma comparticipação financeira (subsídio ou empréstimo) que torne economicamente viável a exploração eléctrica do conjunto, seria possível ter em funcionamento em cerca de quatro anos a central de Vale Moreira, com uma potência superior a 30 MW e uma produção estival de 40 MkWh, desviando-se assim para o Zêzere toda a água da bacia do Alto Mondego, e dois anos depois poderia estar realizado todo o aproveitamento (Alto Zézere e Alto Mondego), o qual poderá substituir durante o verão uma central térmica de 40 MW, com uma economia de carvão equivalente a 55 MkWh, produzindo ainda nos restantes meses um mínimo de 25 MkWh de energia regularizada ou de compensação.

Conhecido o interesse de V. Ex.ª pela resolução do problema do apoio estival ao Norte do País e a atenção que tem dispensado à produção de energia hidroeléctrica e à agricultura, não quisemos deixar de apresentar a V. Ex.ª o esquema, de um aproveitamento que nos parece representar um valor económico apreciável sob aqueles três aspectos; e porque esta Companhia tem estado sempre interessada em colaborar na resolução dos problemas particulares ou gerais dos serviços públicos de que é concessionária, deseja também manifestar a V . Ex.ª a sua disposição de executar a obra em curto prazo e nas condições que se julgarem mais convenientes, desde que se resolvam as dificuldades apontadas.

O Sr. Presidente: - Está na Mesa, enviado pela Presidência do Conselho, para os efeitos do § 3.º do artigo 109.º da Constituição, o Diário do Governo n.º 272, de 4 do corrente mês, que contém o Decreto-Lei n.º 39 023.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continua em discussão na generalidade a proposta de lei relativa ao Plano de Fomento.

Tem a palavra o Deputado Pacheco de Amorim.

O Sr. Pacheco de Amorim: - Sr. Presidente: no laboratório do Governo sobre a execução lei de Reconstituição Económica, enviado a esta Assembleia em Novembro de 1950, diz o Sr. Presidente do Conselho:

A Lei n.º 1 914 deixou de vigorar no fim de Maio e o último orçamento que lhe deu execução é o referente a 1950. Uma pergunta deve, pois, ter ainda lugar: como trabalhar no futuro?

E acrescenta, como fecho da sua lúcida exposição:

O Governo estimaria encontrar com o auxilio da Assembleia, através da mais larga discussão destas questões, a orientação conveniente para a respectiva solução.

Estas palavras, escritas há dois anos, contêm um apelo a que esta Assembleia só agora tem a oportunidade de responder. E para o fazer tem atrás de si uma já larga experiência de dezassete anos, cujas lições se não podem pôr de parte se quisermos que a Nação venho a tirar todo o proveito dos dinheiros que vão ser invertidos em obras de fomento nos próximos seis anos.

Neste particular é esta Assembleia mais feliz do que teve de discutir a proposta de Lei de Reconstituição Económica, que trabalhou sem essas luzes, visto que se estava a começar. E não obstante a discussão por ela feita de tão importante documento, é cheia de ensinamentos, muitos dos quais não perderam ainda a oportunidade. O mesmo se diz do douto parecer da Câmara Corporativa.

O Sr. Águedo de Oliveira, já união ilustre ornamento desta Casa, focou um aspecto da proposta que merece ser recordado: o aspecto jurídico. Como sou leigo na matéria, apenas formularei as conclusões que me parece poderem tirar-se da doutrina exposta por aquele ilustre homem público, mais para chamar a atenção para o caso e ser esclarecido do que para esclarecer.

Depois de ler a definição de orçamento dada pelo Regulamento da Contabilidade de 31 de Agosto de 1881 (artigo 1.º) e pelo Decreto n.º 15 465, de 14 de Maio de 1928, disse o Sr. Dr. Águedo de Oliveira:

Portanto, como se vê, nós temos de um lado um plano de realizações de larga envergadura, que implica com o mecanismo essencial da vida financeira do Estado, para uma duração de quinze anos, e temos do outro um orçamento executado e elaborado ano a ano. Daqui - e porque é princípio fundamental em matéria jurídica orçamental - o poder dizer-se que esta proposta não tem

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valor jurídico ilimitado porque a ela se não segue, por parte desta Assembleia nem por parte do Ministro das Finanças, uma obrigação positiva, limitada e definida, que derive imediatamente dum redime jurídico .

Se entendi estas palavras, uma lei-programa, como a de reconstituição económica e o Plano de Fomento actualmente em discussão, não obriga, nem o Ministro das Finanças nem a Assembleia Nacional ao seu cumprimento estrito, quer no que respeita às obras enumeradas, quer no a verbas inscritas.

É o que me parece depreender-se não só das palavras transcritas como do resto do discurso. Foi, aliás, o que veio a suceder com a lei da Reconstituição Económica, e decerto sucederá o mesmo ao Plano de Fomento que estamos a discutir.

Seja ou não este o sentido que se possa dar às considerações do Sr. Ur. Águedo de Oliveira, a própria natureza das coisas exige que uma lei-programa, como todos os programas, seja flexível, para se poder ajustar às realidades e sobretudo aos imprevistos, e incertezas da técnica.

Por mais competentes que sejam os indivíduos e por mais bem estudados que sejam os assuntos, como já aqui disse o nosso distinto colega Sr Dr. Paulo Cancela de Abreu, há sempre o risco dum engano, nunca se evita a possibilidade dum desacerto. Como foi lembrado pelo então Deputado Sr. Franco Frazão no debate a que nos estamos a referir, as barragens Seminoe e Alcona, do North Plate River. tiveram de ser abandonadas.

Passou-se isto nos Estados Unidos da América, terra privilegiada da técnica, e não nos consta que por isso tenha havido crise ministerial . . . Como este muitos outros erros tem havido. e há-de continuar a haver, não só nos Estados Unidos, da América, como por toda a parte em que se façam projectos e se trabalhe.

Sendo assim as coisas, como pode um lei-programa ser taxativa, inflexível, rígida como as normais jurídicas? E verdade que em certos burocratas há tendência pura dar rigidez excessiva às decisões tomadas. É um erro, e erro que pode ficar muito caro à Nação.

Seja qual for a decisão tomada em matéria de fomento ou de obras públicas, logo que um desacerto se põe a descoberto há a estrita obrigação de lhe dar remédio, sendo possível, seja qual for a decisão que a esse respeito se tenha tomado. Errar é humano. Só o perseverar no erro é diabólico.

Vozes: - Muito bem !

O Orador: - Sr. Presidente: outros aspectos da proposta de lei de rei constituição económica foram encarados naquela discussão que não consideramos para não alongar demasiado esta exposição. Apenas lembraremos que então o ambiente internacional era ainda de crise e até de desorientação, devido ao aspecto novo e imprevisto que tomara o fenómeno do desemprego.

Nos grandes países industriais,, como a Inglaterra e a América do Norte, tudo sobrava - mão-de-obra, matérias-primas, maquinismos, produtos acabados, capitais de toda a ordem. Só não havia quem comprasse. Para tão grande mal apenas se via então um remédio eficaz: a chamada política de obras públicas.

Ao ciclo económico de actividade seguida de paralisia, de surto alternado de depressão, de altas e baixas. o Estado contraporia por meio de obras públicas um ciclo inverso, afrouxando a sua actividade construtiva nos períodos de alta para acelerar nos de baixa.

1 Diário das Sessões de 27 de Fevereiro de 1935,p.97.

Com a grande guerra que se seguiu ninguém mais si lembrou nem da política das obras públicas, nem mesmo da crise de 1929. Finda o guerra o que era preciso era refazer a Europa o mais depressa possível, e para tanto surgiram os grandes planos como meios mais apropriados.

A política das obras públicas recaiu no esquecimento, e ainda mal, porque também fomos arrastados aia corrente, nós que a podíamos ter feito como nenhum outro povo da Europa, porque tínhamos dinheiro e folga para isso.

Não digo isto tomo censura, que também a mini me atingira como Deputado, mas apenas para lembrar que a política de obras públicas não é incompatível com esto Plano de Fomento, logo que se lhe dê aquela elasticidade a que já nos referimos.

Também quero acentuar que a política de obras públicas não perdeu as suas virtudes e que merece ser lembrada nesta ocasião, em que estamos justamente num período de marasmo económico, que convinha espicaçar intensificando as obras do Plano.

Vozes: - Muito bem !

U Orador: - A proposta de lei de reconstituição económica continha um relatório ainda hoje impressionante que nos faz perguntar a nus mesmos como foi possível tudo que nele se contém apenas volvidos sete anos sobre a crise financeira aflitiva que nos levara ao desaire de Genebra.

Como foi possível tão grande melhoria em tão curto espaço de tempo?

E esse relatório, em que &e expõem e justificam as bases financeiras da proposta, que é verdadeiramente notável.

No seu conjunto, a Lei de Reconstituição Económica só tem de bem definido o plano de financiamento das obras a realizar.

Quanto a estas, «serão fixados os planos e projectos fundamentais a executar no período de quinze anos», diz-se no corpo do artigo 1.°, esclarecendo-se no relatório que só em relação a alguns problemas o Governo dispunha já destes planos e projectos. Planos e projectos estes respeitantes:

1.° A defesa nacional;

2.º A reconstituição económica, abrangendo:

a) As obras de viação;

b) As dos portos;

c) As da rede telegráfica e telefónica;

d) As da rede eléctrica nacional, etc.

Não concordou a Câmara Corporativa com esta enumeração, que aliás nada indicava que fosse ordem de prioridade, e propôs outra, em que aparece no primeiro lugar, e muito bem, o problema da energia:

a) As obras de aproveitamento das forças hidráulicas, dos combustíveis nacionais e de outras fontes de energia mecânica;

b) As obras da rede eléctrica nacional, etc.

No projecto apresentado então pelo nosso distinto colega Sr. Engenheiro Araújo Correia aparece outra variante digna de ser lembrada:

a) A irrigação por águas superficiais e subterrâneas, onde for possível;

b) A regularização dos rios com objectivo simultâneo de produção de energia, enxugo, rega e defesa, etc.

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A ideia do aproveitamento em conjunto do todas as possibilidades de cada uma das bacias hidrográficas era nova entre nós, embora na América do Norte já estivesse a ser posta em prática com grande sucesso. Em Portugal só muito depois começou a ser compreendida.

Este projecto do ilustre Deputado e economista, com o magnífico relatório que precede, bem como o plano director, que S. Ex.ª teve ocasião de apresentar em Paris, em Agosto de 1948, constituem os elos intermediários entre a Lei de Reconstituição Económica e o Plano de Fomento que estamos a discutir.

No Plano de Fomento agora em causa há que distinguir entre as linhas gerais que o estruturam, determinadas pelos fins um vista, e as soluções técnicas propostas para os diversos problemas especiais que o integram.

É principalmente sobre as linhas gerais que o Chefe do Governo deseja ouvir esta Assembleia, o que não quer dizer que uns desinteressemos sistematicamente dos problemas particulares. Ora aquilo a que poderíamos chamar a causa final do Plano é a, melhoria do nível de vida do povo português.

Foi bem escolhido o alvo a atingir? É evidente que foi, visto que o nosso nível médio de vida é dos mais baixos do Ocidente europeu, se não é o mais baixo.

Quer isto dizer que o nosso rendimento por cabeça é muito pequeno, o que equivale a afirmar que a produtividade por habitante é diminuta. E porquê? Esta produtividade é um quociente cujo dividendo é a produção total e cujo divisor é o número de habitantes.

Quanto ao dividendo, é ele pequeno entre noa, porque «a natureza foi avara connosco, pois nem nos deu um solo fértil, nem um subsolo rico». Quanto ao divisor, é grande de mais e tende a tornar-se maior. Só nos últimos cinquenta anos cresceu de 3 milhões de unidades.

Não obstante, diz o magistral relatório do Plano, o mal não é sem remédio, porque outras nações em circunstâncias idênticas às nossas têm níveis de vida elevadíssimos, graças à eficiência da sua técnica.

Nós poderemos fazer como elas, aumentando a nossa produção agrícola, intensificando as nossas indústrias transformadoras e meios de comunicação.

Mas est modus in rebus: melhorando, intensificando e desenvolvendo, na medida em que disso resulta um progresso no nosso nível de vida. É esta finalidade do Plano que tem do dominar toda a sua economia. A ela se em de subordinar a técnica, ou, melhor, as técnica, pois que é essa a directriz primária da política em vista.

Sr. Presidente: mas o nível de vida de uma população não depende só do que ela produz e consome, mas também do que permuta. O comércio internacional é um grande factor de melhoria do nível de vida de todos os povos. E nós temos de contar com de, porque as condições do nosso clima e situação geográfica a isso nos obrigam.

A nossa economia está estruturalmente ligada, pela própria natureza das coisas, ao comércio internacional.

Que seria de nós se está pudéssemos mandar para o estrangeiro o vinho do Porto, as conservas, os resinosos, as cortiças, as madeiras?

Corre entre nós um lugar comum que tem tanto de sugestivo como de infundado: produzir para poupar ouro. Que nós pensemos em produzir na metrópole e no ultramar aquilo que possamos obter mais barato do que nos fica no mercado internacional - está certo e é de sã economia. Mas produzir mais caro do que no estrangeiro, só para não importar - é loucura.

As grandes nações podem dar-se a esse luxo, por motivos especiais de ordem política ou estratégica. Os países pequenos têm de estruturar a sua economia para o tempo de paz; e para o caso de guerra têm de ter em conta o valor das suas alianças.

Nós, por exemplo, temos de dar como certo que em caso de guerra teremos o mar franco e abertos os mercados do Ocidente.

O que é preciso é ter navios e defesa para eles, ouro para pagar « pague e leve» e ter a boa vontade dos governos amigos, principalmente da nossa velha aliada, com quem sempre temos contado nas ocasiões difícies. O resto será o que Deus quiser, na certeza de que, para exportar teremos também de importar, quer queiramos, quer não.

Só nos resta a liberdade de escolha das mercadorias importadas. E, se não escolhermos o que há nos fica mais barato, teremos de importar mercadorias que poderíamos produzir a menos preço ou inutilidades que poderíamos dispensar.

Vozes: - Muito bem !

O Orador: - Acresce que o mercado internacional é complexo, e nunca é fácil de prever como ele reagirá as alterações que nele se pretendem fazer. Há na histó-
Ria económica portuguesa um caso curioso, que merece ser lembrado. Desde os tempos da primeira dinastia que o comércio do vinho e do peixe andam intimamente ligados. Como é sabido, nos primórdios da nossa nacionalidade os pescadores portugueses iam pescar às costas da Inglaterra, e eram eles que em grande parte abasteciam de peixe o mercado inglês. O britânico desse tempo não era ainda navegador, mas era já industrial e fabricava óptimos tecidos com as lãs criadas na Irlanda.

O Português pescava e trocara o peixe por essas manufacturas, que eram famosas em toda a Europa. Desse comércio nasceram amizades e obséquios, a que o Português correspondia com presentes de parte do vinho que levava para seu consumo. De dádiva, o vinho passou, com o tempo, a contrapeso nas trocas do peixe por fazendas; e de contrapeso a mercadoria autónoma, logo que o paladar inglês se habituou a ele.

Mas tarde o Inglês fez-se também navegante e pescador e passou ele a ser nosso fornecedor de peixe seco - o bacalhau - e a levar por sua conta o nosso vinho.

Ainda nos fins do século XVII a barra de Viana dava entrada a muito bacalhau inglês - o célebre bacalhau de Viana, - , cuja nomeada chegou ao princípio deste século e ainda se não apagou de todo, e dava saída a muitos vinhos do Alto Minho, entre os quais sobressaía o afamado alvarinho de Monção.

Por essa altura deram-se três sucessos, de cuja conjunção resultou a descoberta e o sucesso do vinho do Porto. E foram: um, a destruição dos vinhedos do Minho, a começar pelos do Norte, por uma doença cuja identidade ainda hoje se ignora: outro, uma mudança rápida do paladar do público inglês, que passou a preferir os vinhos fortemente alcoolizados aos vinhos frescos e leves de baixa graduação; por fim, uma queda brusca no consumo de peixe salgado na Inglaterra.

A Reforma Protestante tinha abolido o jejum um século antes, mas o público inglês continuou por hábito a consumir muito peixe salgado, sobretudo na Quaresma.

Esse hábito, porém, cessou bruscamente nos fins do século XVII e é de crer que foi esta, mudança de regime alimentar que trouxe como consequência a mudança de gosto no sentido de dar preferência aos vinhos mais alcoólicos, por mais apropriados aos climas frios e húmidos.

O caso e que as grandes empresas bacalhoeiras inglesas entraram em crise, ao mesmo tempo que a cultura da vinha no Douro se acelerava, para dar satisfação ao mercado inglês, que já se não podia abastecer no Minho. E como o Inglês preferia os vinhos mais fortes, diz-se que o comércio começou a alcoolizá-los para lhes aumentar o preço. E como o Inglês queria

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sempre mais e mais álcool, chegou-se aos 16 graus e descobriu-se a maravilha que é o vinho do Porto.

Foi o comércio deste vinho que salvou as empresas bacalhoeiras inglesas, porque a voga que alcançou em Inglaterra teve como contrapartida em Portugal a voga do bacalhau. E foi o bacalhau que fez a compensação do vinho do Porto. E não foi só em Inglaterra que o bacalhau e o vinho do Porto andaram ligados.

Foi também noutros países protestantes, como a Suécia e a Noruega. E a verdade é que, se agora importamos menos bacalhau, porque temos empresas nacionais que o pescam e preparam, também não é menos certo que estamos a vender menos vinho do Porto.

Não se pode concluir daqui que estes dois factos estejam ligados pela relação de causa-efeito, porque, de contrário, perguntaríamos: para que nos fadou melhor a natureza: para produzir vinho do Porto ou para pescar e curtir bacalhau?

Por isso digo: produzir para poupar ouro, não; para melhorar o nível de Vida, sim.

Vozes: - Muito bem !

O Orador: - Mas não pode bastir produzir mais e melhor, comprar e vender com sucesso nos mercados estrangeiros ligeiros, para aumentar o nível de vida da população. É preciso fazer tudo isto e alguma coisa mais: dar trabalho bem remunerado á população válida, ou, por outra, aumentar o poder de compra das massas. Só assim se poderá estabelecer o equilíbrio entre a população e as subsistências em nível mais alto.

Mas, como muito bem nota o relatório do Plano, o aumento da produção, tanto agrícola como industrial, pela melhoria da técnica, se por um lado aumenta a produtividade por habitante, por outro diminui o número de braços ocupados nessas profissões, e, muito ao contrário de aumentar o poder de compra das massas, a partir de certos limites vem a diminuí-lo.

Foi esta a razão profunda do desemprego permanente que na Inglaterra se iniciou em início em 1920 e da grande crise de 1929, que abalou a economia do Mundo inteiro e desorientou políticos e economistas pelos aspectos nunca vistos que apresentou.

Não podemos contar com a melhoria da técnica para dar trabalho a todos os braços disponíveis. Com a criação de novas indústrias, sim, podemos dar mais trabalho e aumentar o poder de compra; mas este meio não é saco sem fundo e as suas possibilidades diminuem rapidamente com o uso que dele se faça.

Vozes: - Muito bem !

O Orador:- O mesmo se pode dizer da colonização interna, de alcance muito limitado para o efeito de dar trabalho e aumentar a curto prazo o poder de compra das massas.

A emigração para o nosso ultramar, embora em progresso sensível, também não tem ainda, nem terá tão cedo, grande eficácia para a solução do problema que estamos a considerar.

A emigração para o Brasil, essa sim, se continuar a ser feita como antigamente, em que o emigrante ia e deixava cá a família. A emigração de famílias inteiras é um remédio para situações aflitivas, e nesse aspecto é digna do nosso acatamento; mas debaixo do ponto de vista económico não tem para nós grande interesse.

Todavia, é de ponderar que a nossa emigração para o Brasil, nem para Portugal nem para aquela grande nação é problema de mera economia.

O Brasil, pela sua língua, costumes, religião e história, faz parte integrante do grande império lusíada, e, como tal, se precisar do nosso sangue, devemos de lho dar, visto que Portugal é a Mãe-Pátria, a cabeça dessa grande comunidade espiritual que se ofende por todas as partes do Mundo.

Neste aspecto o Brasil está em pé de igualdade com o nosso ultramar. A todos nos prende e nos obriga a mesma fraternidade.

Mas independentemente destas razões de ordem espiritual, há outras de momento que nos forçam a aproveitar o melhor possível essa porta de saída para o nosso excedente populacional, que em alguns pontos cria situações verdadeiramente aflitivas! E não me refiro só ao trabalhador manual. Temos também excedente de trabalhadores intelectuais. Só de engenheiros há sem colocação mais de um milhar, segundo consta. O Brasil precisa de uns e de outros. Porque havemos nós de lhe negar tal auxílio, se também a nós nos convém a muito respeitos?

Dizem-me que está proibida a emigração de intelectuais e que só passaporte turístico podem obter. Há nisto uma grande crueldade. Pelo facto de terem um curso superior hão-de os jovens portugueses ficar amarrados à terra, como os antigos servos da gleba? Pior do que isto, porque estes não morriam de fome, porque tinham onde trabalhar.

Os intelectuais desempregados estoirarão de miséria se não tiverem família que os possa sustentar. Em qualquer caso viverão « uma apagada e vil tristeza».

Vozes: - Muito bem !

O Orador:- Acho horrível esta situação e imprópria de um país cristão.

E não se diga que o Estado tem direitos porque gasta muito dinheiro com as escolas superiores. E os pais não gastaram muito mais? E o que gastaram os pais não fica a menos aos filhos?

Repito: precisamos de mandar para o Brasil a maior parte do excedente da nossa população, mas de toda, que não só da mais inculta.

Vozes: - Muito bem !

O Orador: - Mas nem a melhoria da técnica, nem a criação de novas indústrias, nem a colonização interna, nem a emigração bastam para elevar o nosso nível de vida à altura em que para o dos povos do Ocidente europeu. E por duas razões: a primeira, porque o nível de vida não é somente um produto de bens materiais; e a segunda, porque, mesmo para a aquisição desses bens, não basta, a partir de certo momento da evolução, o poder de compra dado pelas actividades produtoras.

O nível de vida doa povos do Ocidente implica cultura, que não só abastança. Cultura intelectual e física. Cultura física, que é a saúde e vigor. Cultura intelectual, que é Religião, Arte, Letras e Ciências.

E esta cultura é ao Estado que compete, fomentá-la, que não monopolizá-la. E para isso tem de alargar os seus serviços, principalmente de educação e assistência, em escala mais do que proporcional ao crescimento da população, pelas razões que já aqui apresentámos quando, em Abril último, discutimos as contas públicas.

Sem este desenvolvimento dos serviços públicos não será possível aos povos cultos dar trabalho útil à população válida, nem criar nas massas aquele poder de compra necessário para dar escoamento aos bens materiais produzidos.

Poderá dizer-se que, dado o atraso da nossa técnica, bastará por agora que o Estado Português alargue os serviços de educação e assistência em escala proporcional ao crescimento da população.

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E para tanto o ritmo normal do aumento das receitas públicas bastará, para fazer face a essa necessidade. Mas não virá longe o tempo em que o Estudo se verá forçado a uma escala de crescimento das despesas públicas mais que proporcional ao da população e as suas receitas terão de ser fortemente aumentadas para lhes fazer face.

E de duas uma: ou o Estado vai desde já aumentando o seu património, de modo a ter num futuro próximo rendimentos próprios para cobrir esse acréscimo de despe-sas, ou não o faz e ver-se-á na necessidade, do lançar sobre o contribuinte impostos semelhantes aos que estão actualmente, a sobrecarregar o contribuinte inglês, francês e norte-americano, para citar só os casos mais notáveis.

Parece-me que nas obras que vai financiar por força deste Plano de Fomento o Estado deve ter em vista a marcha da evolução, dando preferência àquelas que venham por fim a entrar no património nacional.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O nível de vida implica cultura, diremos já, mas ainda se pode acrescentar que sem cultura não pode haver sequer abastança, porque um povo inculto terá sempre, baixo, produtividade. E, sendo o nível da vida material a resultante do equilíbrio entre a população e as subsistência, nunca este nível será alto se a razão não dominar os instintos.

E este domínio só será benéfico se for orientado pelos preceitos do catolicismo, que é, de todas as formas de cultura, a mais alta.

Sr. Presidente: o aumento de produtividade da agricultura integra-se no problema mais vasto do aproveitamento global da terra portuguesa, e este não se pode fazer cabalmente sem um estudo, também global e minucioso, das possibilidades do solo. Esse estudo está a fazer-se, como já foi dito nesta Assembleia, por diversos oradores.

Fazendo-me eco dessas vozes, mais autorizadas do que a minha, digo que é da maior urgência dotar tais serviços com os meios necessários não só para acelerar os trabalhos, de modo que o plano de fomento agrário seja ultimado o mais rapidamente possível, mas também para iniciar desde já a publicação dos resultados obtidos.

É manifesto que se o plano de fomento agrário não for publicado ficará esquecido nas gavetas de um arquivo. Para isso não valeria a pena fazê-lo. É preciso publicá-lo e começar sem demora.

A publicação imediata, de monografias de alguns concelhos do Algarve, por exemplo, onde já estão os trabalhos concluídos teria a vantagem de dar ocasião à crítica das pessoas conhecedoras das regiões estudadas, o que poderia ser de grande utilidade para os técnicos responsáveis.

Os serviços, como os homens, não nascem perfeitos e têm sempre a lucrar com a experiência alheia. Enquanto não houver a fonte de informações do plano agrário tudo que se faça para fomentar a agricultura será parcelar, desconexo e de resu-ltados por vezes incertos.

Vozes: - Muito bem !

O Orador: Os serviços do Instituto Geográfico e Cadastral são de certo modo afins dos do plano de fomento agrário. As vantagens dum cadastro geométrico bem organizado são inúmeras. A tributação torna-se objectiva, independente da vontade dos funcionários e comissões que lançam os impostos, quantas vezes arbitrariamente. As injustiças resultante? de diferenças de critério e de erros de avaliação, que se vêm acumulando há muitos anos, cessariam.

Por outro lado, um cadastro geométrico bem organizado facilita extraordinariamente a mobilização da propriedade rústica, quer para venda, quer para hipoteca, o que é da maior vantagem para efeito do aproveitamento do crédito agrícola pela pequena e média propriedade.

Também é de grande vantagem para o cadastro métrico para o estudo da divisão da propriedade, que quando excessiva é de consequências desastrosas. Se o latifúndio é socialmente um mal, a propriedade pulverizada é economicamente um desastre.

Vozes: - Muito bem !

O Orador: - Tanto o plano de fomento agrário como o cadastro geométrico lucram com a rapidez da execução. Para tanto os serviços cadastrais precisam de verba para aparelhagem. Os serviços do plano agrários, esses, precisam de verba para tudo, porque estão muito mal dotados. O dinheiro gasto com estes serviços é dos que rende cento por um.

Sr. Presidente: diz-se no plano de fomento em discussão que a baixa produtividade da nossa agricultura e consequente insignificância do poder de compra da lavoura são causa do atraso das indústrias. Textualmente:

De tudo isto deriva uma limitação do rendimento agrícola nacional e do nível de receitas da população rural, a qual se apresenta assim com baixo poder de compra, e, portanto, em condições de não garantir um mais intenso progresso das outras actividades económicas.

Salvo o devido respeito, parece-me que é precisamente o contrário que se está a dar. A população agrícola tem baixo poder de compra porque vende mal os seus produtos.

Não cuida da qualidade, nem nos vinhos, nem no resto, porque o mercado lha não aprecia.

Mão intensifica a produção dos artigos correntes, porque, se o faz logo os preços se afundam.

E porque? Justamente porque a população não agrícola nem tem gosto pela qualidade nem poder de compra para absorver mais produtos do que os habitualmente colhidos.

Instintivamente, a lavoura adapta-se às condições do mercado e produz em quantidade e qualidade aquilo que pode consumir ou vender com lucro. E não é só com o fomento agrícola que esta situação se melhora.

É também com o fomento das actividades não agrícolas que se pode criar o poder de compra para os produtos de lavoura.

Quereis desafogar o lavrador? Fomentai as indústrias em geral, desenvolvais ei os serviços úteis, melhorai os meios de transporte, numa palavra criai poder de compra para os seus produtos. E se quereis fazer subir o poder de compra da lavoura e pô-la em condições de poder exportar com abundância não a obrigueis a comprar o que precisa a preços superiores aos do mercado internacional nem a vender os seus produtos a preços de miséria.

Em todos os países do mundo culto a lavoura merece aos governos protecções especiais e as pautas jogam a seu favor, e não contra. Sem essa protecção, mesmo nos países mais adiantados, a lavoura europeia seria arruinada pela concorrência dos produtos similares dos países novos. Foi o que aconteceu na Inglaterra depois de estabelecido o livre-cambismo. Até na América do Norte a lavoura é objecto da maior vigilância e protecção por

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parte dos Poderes Públicos, não só por motivos, de ordem económica, mas também de ordem social.

A lavoura constitui uma reserva do população, sadia de corpo e alma, onde as fontes da vida se conservam puras, as almas lavadas, os costumes incorruptos, as ideias claras e justas, os corações tranquilos. E as elites americanas sentem a necessidade de manter e aumentar esta reserva de sangue puro e virtudes fortes. como substracto permanente dum povo excepcionalmente, aditado pelas ondas do tempo e da fortuna.

Em parte nenhuma do mundo culto a lavoura tomou a dianteira na criação do puder de compra. A revolução que a técnica e a ciência fizeram no mundo moderno não foi agrícola, mas industrial. E às indústrias que compete romper a marcha. porque são as mais favorecidas pelos progressos da técnica.

Por isso, dizimais e repetimos: tornem-se as nossas indústrias mais eficientes e mais numerosas e a lavoura seguir-lhes-á na peugada, a muito pequena distância.

Vozes: - Muito bem !

O Orador: - No que- respeita a parte e do Plano relativa a minas, só temos que aplaudir. Adiamos da maior urgência que se executem os trabalhos nela indicados, como adiamos excelente que se apresse a publicação da carta geológica.

Para este efeito, diz-se no Plano de Fomento, estrei-tar-se-á a colaboração entre os serviços geológicos e os centros universitários. Muito bem. Os serviços só tem a lucrar com isso e as Universidades também.

Num interessante artigo publicado no Boletim da Ordem dos Engenheiros de 15 de Novembro último, do meu velho amigo e antigo condiscípulo Sr. Engenheiro Albano Sarmento, diz-se:

Não tem faltado quem afirme, e pessoas com autoridade e larga audiência no País, que em matéria de aproveitamentos hidroeléctricos, tudo quando se tem feito no País são tolices sem desculpa, porque se não faz carrapatelo.

O autor deste artigo tem alguma responsabilidade no que se fez, porque, em 1945, quando se lançaram os aproveitamentos do Cávado-Rabagão o do Zêzere. apoiou essa solução e lhe deu todo o seu entusiasmo, colaborando na realização das condições que os tornaram possíveis.

Quando numa reunião realizada na Associação Industrial Portuense, destinada a apresentar o plano à indústria do Norte e a solicitar a colaboração desta, me referi aos motivos que tinham levado o Governo a dar prioridade ao Cávado-Rabagão e ao Zêzere, com prejuízo do Douro, declarei que o que havia estudado quanto ao Douro era insuficiente para realizar qualquer obra dentro da urgência que a salvação pública impunha, pois vários anos teriam de ser consumidos em estudos prévios e na elaboração dos projectos da execução.

Ainda hoje estou convencido de que só por paixão se poderá negar a verdade desta afirmação.

Não diz o Sr. Engenheiro Sarmento qual a razão que o forçou, em 1943, quando Subsecretário do Comércio e Indústria, a optar pelo Cávado-Rabagão e pelo Zézere, com prejuízo do Douro, nus devem ter sido as apontadas no douto parecer da Câmara Corporativa onde se diz, no anexo III:

... se pensarmos ainda que as centrais do Castelo do Bode e de Vila Nova tiveram por missão,

antes demais nada, substituir a energia térmica das principais contrais de serviço público, quo atingiu 438 milhões de kilowatts-hora em 1930 . . .

Esta razão é por si suficiente. A escassez de carvão no fim da última guerra tornou-se aflitiva o com perspectivas do servir a agravar com o tempo. Era por isso urgente reduzir o consumo deste combustível, o depressa .Para tanto só deve ter pensado na energia hidroeléctrica.

A urgência da solução e a falta de estudos do Douro impuseram a decisão tomada. O Sr. Engenheiro Sarmento tem toda a razão. Simplesmente, a questão não se pôs pela primeira vez para a Nação em 1940, mas muito antes.

A tese da prioridade do Douro foi posta ainda no tempo da monarquia pelo Sr. Engenheiro Ezequiel de Campos:, com uma visão do futuro, uma persistência e coragem dignas do maior apreço.

Pô-la de novo em 1931 a Iberian Electric, Ltd.. companhia com sede em Montreal, Canadá, o a que pertenciam entidades inglesas o norte-americanas, entre as quais a General Electric, quando apresentou ao Ministro do Comércio de então um relatório geral e propostas preliminares para a electrificação do Norte do Portugal.

Nestas propostas, a Iberian Electric comprometia-se a efectuar a electrificação do Norte do País, a começar pelo Douro internacional, cuja exploração efectuaria à medida que as necessidade do consumo o exigissem.

Nesse relatório diz-se, no período intitulado «Instalações sobre o Douro», a p. 21:

Logo após o nosso primeiro exame das possibilidades hidroeléctricas de Portugal setentrional, ficámos convencidos de que, sendo dadas as caracteristicas naturais desse grande rio, o próximo aumento de caudal de estiagem devido mesmo somente ao reservatório de Ricobayo sobre o Esta teria criado posições excepcionais no ponto de vista da produção de energia, tais que fariam passar a um segundo plano todas as outras instalações hidroeléctricas do País. Portugal possui no Douro uma riqueza, natural de primeira ordem; o problema consiste em utilizá-la do mudo mais racional possivel.

Visto que a Iberian Electric se propunha custear todas as despesas se nem o Governo, nem os municípios, nem os particulares quisessem concorrer para elas com seus capitais não podemos duvidar da sinceridade deste juízo de valor.

Por motivos que ignoro, mas que é de supor fossem razões de ordem estratégica contra o Douro internacional, então ainda, muito de considerar (quantum mutatus ab illo ), e talvez ainda pela duração do prazo da concessão que a Companhia sugeria (noventa e nove anos), a proposta foi rejeitada e a Iberian Electric fez uma nova, em que a preferência era dada, a uma barragem de 45m de altura, a construir em Nossa Senhora da Cárdia, 8 km acima de Bitetos. Esta central daria cerca de 500 milhões de kilowatts-hora anuais e seria paga em trinta anuidades de 32:500 contos.

Desta proposta, feita em 1935 ou 1936, tivemos conhecimento na ocasião e era acompanhada do outras destinadas ao aproveitamento da energia sobrante, para preparar hidrogénio e oxigénio sob pressão por meio du electrólise da água. Com os gases assim, preparados obtinham-se produtos azotados e energia mecãnica que podia ser utilizada em submarinos, camiões, etc. Do relatório apresentado em 1931 é que só agora tive conhecimento. As segundas propostas tiveram a sorte das

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primeiras e o grupo Anglo-americano retirou do País pelos fins de 1936 ou princípios de, 1937. se a memória me não falha.

Tratei deste assunto com certo desenvolvimento numa, série de artigos publicados no comércio do Porto no fim de 1936 e princípios, de 1937 o num discurso feito nesta Casa, em Dezembro de 1936. De novo voltei a ele em artigo de 6 de Maio passado, publicado no mesmo jornal. Por isso me não alongarei mais sobre o caso.

Todavia, uma passagem mais vamos citar do primeiro relatório da Iberian Electric, tirada das Conclusões (p. 35):

O nosso programa geral de electrificação para o Norte consiste:

a) Na construção de uma primeira central hidroeléctrica de uma capacidade de 200 a 250 milhões de kilowatts-hora contínuos, sobre o Douro internacional português, que, sem dúvida nenhuma, é do bem longe a mais económica, fonte de energia de Portugal e uma das fontes de energia mais económicas do Mundo.

Esta passagem é de considerar por duas razões: porque, dá com toda a clareza a opinião da Iberian Electric sobre o Douro internacional; porque mostra que o aproveitamento deste se podia fazer por fracções da mesma ordem de grandeza dos aproveitamentos do Zêzere e do Cávado-Rabagão.

A primazia do Douro internacional nem é mito nem avantesma de meter medo pelo seu tamanho, como se pretende fazer acreditar no aliás douto parecer da Câmara Corporativa.

Repetimos, a Iberian Electric propunha-se executar

os trabalhos do Douro internacional e fazer a electrificação do Norte do País por sua conta e risco, e portanto não podemos pôr em dúvida a sinceridade das suas conclusões quanto à excelência o prioridade daquela fonte de energia.

Mas isto são águas passadas. A realidade presente é bem mais consoladora, porque o ostracismo do Douro acabou, os estudos novos estão em vias de conclusão e, segundo nos consta, as obras começarão em breve. Só temos de felicitar por isso o Governo e a Nação.

Sr. Presidente: no que respeita a indústrias transformadoras no campo da pura economia o Estado deve intervir em pé de, igualdade com os particulares. Se entra com capitais para uma sociedade, os direitos que lhe competem devem ser proporcionais à sua quota .Apenas se impõe uma variante ao direito comum.

Pondo de um lado o Estado e do outro os restantes capitalistas, entre estes dois grupos, deve haver o princípio da representação das minorias nos corpos dirigentes das empresas. Quer disser: o Estado deve ter sempre representantes nos corpos gerentes das empresas a que forneça capitais, e os particulares, considerados como um só grupo, também.

Mas o mimem de representantes deve ter por base os capitais respectivos. Quanto ao mais, em tese, as sociedades mistas devem regular-se pêlos mesmos princípios económicos e financeiros das empresas particulares.

Ora, no que diz respeito às empresas em geral, há duas hipóteses a considerar: ou se trata de montar uma empresa nova, ou de melhorar as condições técnicas ou financeiras duma empresa já existente.

No primeiro caso o Estado, como qualquer outro capitalista, tem de ver bem se a empresa é viável, e para tanto o custo de produção e as possibilidades de venda são dados primordiais para se poder fazer um juízo com probabilidades de acerto.

Os preços de venda devem ser calculados em pé de igualdade com os do mercado internacional, se se quiser

que a nova empresa contribua para a melhoria do nível de vida da Nação. Se nestas condições for razoável contar com lucros, monta-se a empresa.

Na segunda hipótese trata-se da aquisição de novos capitais por uma empresa já montada. Esses novos capitais podem entrar como capital accionista ou obrigacionista.

Os obrigacionistas só têm um ponto a averiguar: o grau de solvabilidade da empresa . Está esta em condições económicas que dêem garantia de pagamento dos juros e amortização das obrigações e é o juro oferecido compensador? Está muito bem - os capitais podem ser cedidos.

Para o capital accionista o problema põe-se do mesmo modo, mas as soluções são mais variadas. A condição essencial de aquiescência dos accionistas é a viabilidade da empresa que há de resultar da aplicação dos novos capitais.

São Os lucros, prováveis da emproa renovada que dirão se as acções primitivas terão de contar-se pelo seu valor nominal ou deverão ser valorizadas ou desvalorizadas. Neste último se pode adoptar a forma do considerar privilegiadas as novas acções.

No caso extremo de a empresa, em causa ser inviável, mesmo depois de melhorada com a aplicação do novos capitais, então é pô-la, de parte, porque só servirá para gastar dinheiro. Não contribuirá para melhorar o nível de vida da Nação, mas para o piorar.

E à luz deste critério que devem ser estudadas as diversas empresas consideradas no Plano de Fomento, e para tanto não basta averiguar vagamente que a aplicação dos novos capitais fará baixar o preço de custo dos produtos !

Mas fará baixar de quanto? E essa baixa põe tais produtos ao nível de preços do mercado internacional? É isso que o Estado tem o estrito dever do averiguar antes de empatar mais dinheiro em quaisquer empresa nestas condições.

Deve-se notar, porém, que o Estudo pode ter responsabilidade, não só financeiras, mas também morais, em empregas já formadas, e para esses casos especiais os princípios que acabamos de expor têm de sofrer correcções adequadas. O Estudo deve ser «pessoa de bem».

Vozes: - Muito bem!

O Orador : - Sugere-se no douto parecer da Câmara Corporativa que o problema da siderurgia já está suficientemente estudado para se entrar no campo das realizações, ao contrário do que prudentemente se afirma na porte correspondente do Plano de Fomento.

Se este problema está suficientemente estudado, pergunto:

Qual o processo indicado para reduzir o minério de ferro ou para transformar a lupa em aço? Como dessulfurar a lupa? Quais as instalações industriais para transformar lupa em aço? Qual a quantidade de laminados: a produzir e qual o programa de perfis? Quanto vai custar? Quanto vai custar, por exemplo, o quilograma de varão do ferro para cimento obtido pela siderurgia nacional? Quanto vai custar a gusa de fundição nacional? para fazer panelas e fogões? Quanto custa a instalação da siderurgia? Onde vai ser montada?

De ciência certa creio que ninguém o sabe ainda, e enquanto se não averiguarem concretamente estes e outros pontos ainda duvidosos tudo que se faça será prematuro e arriscado.

Vozes : - Muito bem !

O Orador: - Sobre, transportes e meios do comunicação direi apenas que é preciso distinguir entre os

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servidos de ordem puramente económica e aqueles que têm também importância política, militar ou social.

listes, se precisarem de auxílio para se poderem aguentar, o Estado tem de lho dar, visto que precisa que eles existam. ou para a hipótese de conflito armado ou simplesmente para comodidade do público.

Adio, porém, que em tese, mais vale que o Estado lho dê esse auxílio directamente, por meio de um subsídio em dinheiro ou por meio do fornecimentos a preços de favor ou por nutro qualquer processo directo, mas nunca entravando o desenvolvimento de outras actividades mais eficazes ou mais económicas.

Por exemplo: os raminhos de ferro em toda a parte são vencidos pela concorrência da camionagem. Mas, como não só o Estado, mas o público, precisam dos seus serviços, o Governo tem de ajudar as empresas ferroviárias para que possam subsistir.

E, porém, parecer meu que o devem fazer directamente, como dissemos, e não pondo entraves ao desenvolvimento da camionagem. que é mais barata e mais do agrado do público. Por aquele modo contribuir-se-á para a melhoria, do nível de vida da Nação.

Pelo outro, entravasse a marcha natural do progresso, de que resulta espontaneamente a desejada melhoria.

Além disso, os serviços de camionagem prestam-se ao desenvolvimento de pequenas empresas, o que é de grande vantagem para o equilíbrio social, porque reabsorve nas camadas mais baixas da classe média uma parte do proletariado manual .O mesmo se diz dos transportes por automóvel, que ainda são mais, eficazes e mais adequados para este fim.

Sem desprimor para os autores dos restantes anexos do parecer da tâmara Corporativa, o que mais me satisfez, pela sua objectividade, riqueza de informações o adaptação ao fim em vista - esclarecimento deita Assembleia -, foi o relativo ao financiamento.

Depois de lido atentamente não fica dúvida do que as fontes nacionais, de financiamento do Plano têm, no geral, capacidade financeira para corresponder ao que dela se espera; têm possibilidade legal de fazer os financiamentos e têm vantagem em aplicar desse modo as suas disponibilidades.

Isto, já se vê, [...] próximos seis anos a evolução da nossa economia continuar a fazer-se sem surpresas internas ou externas. Todavia, é legítimo pôr uma dúvida. Não há memória, que eu saiba, de um país essencialmente agrícola e economicamente atrasado fazer a sua industrialização e obter o equipamento necessário pêlos seus próprios meios.

E sempre à custa de empréstimos externos que essa obra se realiza, ou, dum modo geral, de capitais vindos de fora. A razão e a história são conformes em nos mostrar que isto é assim, assim tem sido e será.

Ora, se rapararmos na lista do que o Plano espera das várias fontes de financiamento previstas, salta aos olhos a relativa pequenez do que é pedido ao crédito externo - 1.200:000 contos em 13.300:000- apenas 9 por cento. E o que é de admirar è que para o financiamento da Lei de Reconstituição Económica nada se pediu ao crédito externo. Como foi isso possível? Este ponto merece ser esclarecido por muitas razões.

Comecemos por fazer uma distinção. De dois modos podem os recursos externos, entrar num país: ou por meio de empréstimos públicos o privados, contraídos no estrangeiro, como sucedeu em Portugal no tempo do grande Fontes; ou por entrada espontânea desses mesmos capitais.

Basta considerar o Pais como um todo, como uma só pessoa moral, para se ver que estes dois processos são equivalentes.

Ora é nossa opinião que o financiamento da Lei de Reconstituição Económica se tornou materialmente possível graças ao volume extraordinário de recursos que nos vieram do fora espontaneamente, sobretudo a partir de 1940.

Contando apenas desde o fim de 1939 até ao fim de 1939, acha-se para balança do comércio com o estrangeiro durante todo este período o montante de 21.500:000 contos. O montante da balança do comércio com o ultramar é insignificante (mais 74:193: contos). Tudo isto foi pago.

Além disto. as reservas monetárias do Banco de Portugal e restantes disponibilidades em ouro e moeda estrangeira aumentaram naquele período d

Ao todo são mais de 33.000:000 de coutos em onze anos. o que dá uma média de 3.000:000 de contos por ano. Se entrarmos em linha do conta com a valorização do ouro e o alinhamento de câmbios realizados em Setembro de 1949. na importância de quase l 300:000 contos, esta média baixa de menos de 150:000 contos que pouco é em 3.000:000.

Esta afluência tem duas causas visíveis: o crédito de que Portugal tem vindo a gozar, devido à tranquilidade e segurança que nele se desfruta e o tornam lugar apetitoso de refúgio para pessoas e bens, é a primeira.

A segunda é a grande tributação que pesa nos países fortemente industrializados sobre os capitais o lhes reduz o rendimento a quase nada. Serão estas duas causas duradouras?

A segunda é de esperar que seja. ainda mesmo que a balança política continue a inclinar-se para as direitas. com vem sucedendo desde a vitória dos conservadores na Inglaterra. A necessidade do tão pesados impostos não deriva da política, mas da economia, como já aqui referimos. e é por isso duradoura.

A primeira das causas enumeradas - a confiança - , essa é de natureza puramente política, e por isso mesmo frágil, como tudo que depende da vontade e da vida dos homens.

Peçamos por isso a Deus que nos mantenha em condições de continuarmos a merecer a confiança do capital cosmopolita, a fim du podermos levar a cabo a grande obra delineada neste Plano de Fomento, a que dou com entusiasmo a minha plena aprovação.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado .

O Sr. Cortês Lobão: -Sr. Presidente: estamos felizmente longe daqueles tempos que muitos passaram, tempos incertos, em que o fatalismo dominava e o decánimo vencia todas as iniciativas.

Era impossível reparar as estradas, apetrechar os caminhos de ferro, concertar os barcos, moralizar a Administração.

Rodaram os tempos, mudaram os homens e os processos e hoje todos damos por bem empregado o sacrifício do seu sossego, o risco da própria vida, muitas vezes posta à prova, o esgotamento de muitas noites passadas em vigilância permanente até ser consolidado o Estado Novo.

Muitos dos beneficiados não avaliam o sacrifício feito.

Vozes : - Muito bem !

O Orador: - Vem isto a propósito do nos parecer ainda um sonho o que vemos realizado e o que está em realização.

Apresenta agora o Governo a l.º fase de um plano do investimentos, para ser realizado em seis anos, onde

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serão gastos 7.500:000 contos no continente e ilhas o 6.000:000 de contos no ultramar.

É a continuação da Lei de Reconstituição Económica, pela qual já se gastaram 14 milhões de contos em quinze anos.

Vasto plano do realizações nunca igualado.

Não vamos discutir os números, porque a nossa confiança é absoluta no autor e na obra.

Apenas iremos abordar alguns aspectos resultantes do Plano.

Olhando para a grandeza deste programa, que atinge todos os sectores do País, sentimo-nos felizes por vivermos nesta época.

Vozes : - Muito bem !

O Orador: - Porque é ainda a agricultura a nossa maior indústria, porque dela vive grande parte das outras indústrias, como homem com interesses ligados a ela não deixo neste momento de lhe fazer umas ligeiras referências.

Sr. Presidente: pela leitura do relatório vemos que o Governo considera às verbas mencionadas reservadas às grandes obras e destina para as necessidades correntes da lavoura, como complementares daquelas, as verbas que vierem consignadas no orçamento ordinário.

Quer isto dizer que, reservando 1.290:000 contos para os próximos seis anos, destinados às grandes realizações, continua a dar-lhe a sua assistência como até hoje.

Através do relatório o Governo aponta as necessidades da agricultura. O auxílio virá segundo essas necessidades.

Um País onde a irregularidade das chuvas, especialmente no Sul, é de tal ordem que as produções podem passar de quatro sementes para quinze ou vinte, bastando para isso umas horas de chuva num dia de Primavera, leva-nos a afirmar que esta agricultura não pode viver sem o amparo do Estado.

Vive em altas e baixas, em ciclos de abundância relativa alternando com outros de faltas.

Até já tivemos uma crise de abundância de trigo, que nos ficou bem caro por lembrança.

A agricultura no Sul esforça-se para produzir o máximo que pode.

Necessita de técnicos que lhe ensinem, na sua própria terra ou em campos experimentais, as rotações mais adequadas, de forma a tirar delas o maior rendimento em cereal e gado.

Os burros, as areias, os xistos, têm rotações diferentes.

Necessita de assistência na pecuária, que a defenda várias doenças noa gados e lhes melhore os cruzamentos: que se dotem os parques das brigadas técnicas com material moderno em abundância, onde o médio e o pequeno agricultor vão buscar o material de que necessitam.

É indispensável ensinar aos trabalhadores do campo os conhecimentos da máquina e da cultura, em escolas próprias, onde o agricultor irá buscar os encarregados e mecânicos.

Necessita de créditos para a sua exploração e de auxílio financeiro para a realização de obras de interesse económico e melhoramentos que sejam da sua iniciativa.

Precisa de garantia razoável para o preço dos seus produtos.

Lendo o relatório do Plano vê-se que tudo isto vem ali considerado; não foi, portanto, esquecido. Aguardemos apenas que as dotações a inscrever sejam suficientes para as suas necessidades.

A lavoura, no regime de sequeiro, tem limites mínimos de exploração para ser económica. Abaixo desses limites vegeta até desaparecer.

Tem de se apoiar no binómio cereal-gado.

Se temos de caminhar no sentido da sua mecanização, de forma a conseguir o barateamento da exploração - e eu julgo que em grandes áreas do Baixo Alentejo podê-lo-emos fazer -, não significa isto que nos desinteressamos do gado.

Não nos pude interessar para o trabalho ou, melhor, menos nos pode interessar para o trabalho, mas mais para a carne e restantes produtos, tão necessários à economia do País.

Quando pensamos na mecanização da agricultura surge-nos logo o problema gravíssimo da mão-de-obra dispensada.

Há que pensar onde empregar os braços vibrantes da mecanização da agricultura e os advindos do aumento da população.

Seria uma parte absorvida, pelas novas indústrias; procuraria outra lugar no ultramar, mas outra ainda teria de se fixar na terra.

O que ao sequeiro falta é evidente que só a exploração em regime de regadio pode dar.

Terra onde chega a água é terra enriquecida.

Têm então aqui lugar as grandes obras de hidráulica agrícola.

Ao Baixo Alentejo julgo que não chegará tão cedo o beneficio das grandes obras de hidráulica e que devemos enveredar pelo caminho dos pequenos regadios, aproveitando, por meio de albufeiras, todos os hectares de terra possíveis para esse efeito.

De resto esta orientação já é seguida por muitos agricultores, vendo-se no Alentejo, em vários sítios, manchas de regadio, devidas a obras feitas por particulares alguns com auxílio do Estado, pelos melhoramentos agrícolas.

Foi iniciado em 1949 um estudo, chamado «plano de fomento agrário», para reconhecimento do que temos e do que podemos fazer na agricultura. É um trabalho de altíssimo valor para a agricultura portuguesa. Uma vez terminado, esperemos pela sua publicação para podermos avaliar do seu interesse. Mas, pelo que já desse estudo conheço, será um grande auxiliar do agricultor português.

Iniciou o Governo, pela Lei de Reconstituição Económica, várias obras com o fim de tornar ao regadio muitos milhares de hectares de sequeiro.

Defina agora 496:000 contos para conclusão de umas e inicio de outras.

Algumas obras estão já terminadas, e em período experimental há alguns anos, sem o Estado ser reembolsado de parte da despesa feita.

A isto faz referência o relatório quando diz: «E indispensável, porém, rever o regime jurídico e as condições de financiamento e exploração destas obras, a fim de permitir a justa repartição dos seus encargos e habilitar o Estado a prosseguir na realização ao ritmo indispensável».

É justo que essa revisão se faça e o Estado receba, das obras já realizadas, aquilo a que tem direito, pelos investimentos que foram feitos à custa de todos e têm como fim repartir os benefícios, desde que esses encargos sejam compatíveis com a exploração.

A Câmara Corporativa dá todo o seu apoio a esta iniciativa, que a experiência, dos últimos anos ajudará a levar a bom termo, e mostra-nos que no total de cerca de 14 000 ha, dos quais 4 600 em regime normal de regadio, apenas os Regantes de 950 ha iniciaram já o reembolso ao Estado dos dispêndios realizados com a execução das obras.

É pouco, mesmo muito pouco, para a despesa feita, tanto mais que muitos hectares regados estão a dar lucros grandes, e ainda bem.

Infelizmente, o mesmo não pudemos dizer de outros.

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Só há que desejar a rápida realização das obras apontadas, de forma a serem em 1958 uma realidade económica e social, que transforme este País, como é desejo de todos.

Não duvidamos de que as obras de hidráulica agrícola fomentam riqueza. A variedade e a intensidade das culturas fixam mais braços, que podem ser ainda melhor remunerados.

Estamos certos de que sem a obra de hidráulica no vale do Sado, não teríamos hoje arroz em abundância no País para exportar, com a certeza do aumento da sua produção num futuro próximo. Enriqueceu a região.

Aumentou o trabalho e devem ter melhorado as condições económicas dos trabalhadores.

Aqui a transformação não levantem problemas, pelo menos até agora, e é de esperar que não se levantem no futuro, desde, que, com tempo, se estude a sua adaptação a outras culturas igualmente rendosas.

Só há aqui um problema, e é o Estado, naquilo a que tem direito, ser reembolsado das obras feita com o dinheiro da Nação, e do qual precisa para continuar os investimentos.

Certos estamos de que os 496:000 contos destinados à hidráulica agrícola irão beneficiar outras parcelas do País.

Sr. Presidente: inscreve o Governo 464:000 contos para povoamento florestal.

E mais um passo a dar nesta grande obra que os serviços florestais, com tanta competência e dedicação, têm realizado, e que todo o País admira e louva.

O parecer subsidiário da Câmara Corporativa faz referência ao revestimento florestal nas serras de Trás-os-Montes e, do Baixo Alentejo.

Bem merece o Baixo Alentejo que para ele se dirijam as atenções dos serviços florestais.

E verdadeiramente activa a forma absolutamente, condenável, antieconómica e ruinosa como se está a cultivar nas serras de Serpa e Mértola.

Percorrem-se dezenas de quilómetros sem se encontrar uma árvore, um poço, uma casa. Uma aridez arrepiante .Uma paisagem desoladora.

O terreno é acidentado o pobre.

Em grandes áreas os efeitos da erosão tem-se feito sentir, aflorando a rocha por toda a parte.

Pois, apesar desta pobreza de solo, continua o serrenho, ontem com boas parelhas, carros e algum capital, hoje com uns lazarentos burros, a lavrar qualquer canto onde encontre ainda um pouco de terra onde semeie uns grãos de trigo que no fim do ano não chegam para seu sustento e da família.

Impõe-se a atenção do Governo, de forma a dar uma solução lógica aos milhares de hectares abandonados, e que, arborizados, poderiam transformar toda a região e até melhorar o clima.

Oxalá que na continuação da obra do povoamento florestal possa caber uma parte a este canto do País.

Chego ao capítulo referente à colonização interna, à qual o Governo destina. 330:000 contos, que julgo serão empregados no vale de Campilhas, no enxugo das sapais de Faro, com a área aproximada de 3 000 ha. e na conclusão de umas começo de outras obras.

Iniciou a Junta a colonização em terrenos de sequeiro, e sabemos, pelo parecer da Câmara Corporativa, ter já adiantada a obra de Pegões para 600 rasais, seguindo-se Milagres, Marfim Rei, Gafanha, Alvão e Barroso.

Gastaram-se 68:802 contos, dos quais 52:980 são reintegráveis e compreendem 506 casais agrícolas.

A colonização dos terrenos beneficiados pelas obras da hidráulica agrícola está, porém, por iniciar.

Diz a Câmara Corporativa, e é bem certo: «é vasto e certamente difícil o trabalho a realizar neste sector, tão diferentes são os casos a considerar nas várias obras».

É evidente que em certos casos de regadio ele pode trazer como consequência o parcelamento da terra.

E é nestes casos que surgem as dificuldades.

Levantam-se séries de problemas novos, que só podem ser resolvidos com a boa compreensão das partes atingidas.

No estudo, separar o económico do social, ver até onde ambos se podem completar; qual dos dois deve ser preferido.

Tudo isto são problemas que têm de ser ponderados com prudência, mas com desejo de solução.

Não é só entre, nós que esses problemas estão postos.

A vizinha, Espanha, que, desde o tempo de Primo do Rivera, luta pela política de fomento hidroagrícolas, tem feito várias tentativas com alguns insucessos.

Hoje, porém, tem já larga, experiência destes problemas e parece que enveredou pelo caminho da solução.

Alguma coisa temos a aprender com ela neste capítulo.

A Câmara Corporativa transcreve vários artigos da lei espanhola de Abril de 1949 sobre colonização, lei que julgo estar em vigor, chamada «lei sobre colonização e distribuição da propriedade das zonas regadas».

Pela leitura que fiz dessa lei avalio as dificuldades que o Governo Espanhol teve de vencer para chegar às realizações actuais.

Entre nós, e depois do vale do Sado, onde, como já disse, não houve até hoje problemas porque as culturas, francamente remuneradoras,, garantem as taxas a cobra pelo Estado. temos o aproveitamento da campina da Idanha, com 8 000 ha, dominados pela barragem Marechal Carmona, onde me parece estarmos longe da solução.

Segundo a Câmara Corporativa, a primeira tentativa de colonização esbarrou com a legislação vigente, que não se adaptava a certos casos e aguarda uma revisão.

Entretanto, deixaram aos proprietários das terras beneficiadas completa liberdade na utilização da água posta à sua disposição.

No vale do Sado, logo que a obra terminou, as terras beneficiadas cobriram-se com culturas rendosas, por conta dos proprietários, em parceria ou por arrendamento.

Na campina da Idanha, ao fim de seis anos, a transformação do sequeiro em regadio apenas só encontra esboçada pela generalização das tradicionais culturas da Primavera nos alqueives de trigo.

Excluída a região do Ladoeiro, onde já existia a pequena propriedade, e uma pequena zona na várzea do Ponsul, parece não ter havido até hoje alteração no regime da exploração fias terras.

Continua a água a correr nos canais sem ser aproveitada.

Os proprietários das maiores zonas afirmam que não podiam suportar o pagamento das taxas exigidas pela Associação dos Regantes para custear os encargos de conservação da obra de rega.

Devem ter razão, pois, pelo conhecimento directo que tenho, as terras, em grande parle, são pobres e muito acidentadas, o que torna muito dispendiosa a sua preparação.

Aqui se nos apresenta um problema de difícil solução.

Deixar ao tempo a solução dos casos que forem surgindo?

Encarar este empreendimento sob o aspecto económico?

Encará-lo sob o aspecto social?

Até onde chega um e outro?

Tem o Estado de intervir?

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Estamos certos de que o Governo, sem ferir o justo interesse privado, há-de encontrar a solução mais adequada ao interesse nacional.

E aqui termino a análise feita ao sector agrícola da proposta.

Sr. Presidente, desejo ainda fazer um muito breve reparo ao capítulo que se refere nos caminhos de ferro.

A estes destina a proposta 300:000 contos.

Sr. Presidente: durante a minha vida tenho estado mais de trinta anos em contacto directo com os caminhos de ferro, através das tropas da especialidade.

Na guerra de 1914-1918, primeiro na antiga companhia de caminhos ferro, depois, em França, no batalhão de sapadores dos caminhos de ferro: em Portugal, e sempre na mesma unidade, ajudando a solucionar todas as greves ferroviárias e movimentos revolucionários a elas ligados que desde 1919 se deram no País; continuando depois do 28 de Maio nas mesmas tropas, eis a justificação do interesses que tenho por este sector dos transportes.

Sr. Presidente: o caminho de ferro serve na guerra e serve na paz.

Na guerra é um instrumento indispensável na posse do comando em chefe, que o utiliza para impor a sua vontade.

Para conhecer o que tem sido a sua utilização em campanha temos de recorrer à sua história; e por isso dela recordo algumas passagens muito curtas.

Desde que, em 1814, Stephienson inventou a locomotiva, teve o caminho do ferro um rápido desenvolvimento o logo uma eficaz aplicação na guerra.

Encontramos já a sua utilização na guerra da Hungria (1848-1849), dos austríacos contra os magiares.

Como primeiro exemplo de grande transporte aparece na guerra da Crimeia, em 1854.

Na campanha da Itália, em 1859, emprega-se pela primeira vez para grandes concentrações.

Já mais recentemente, em 1870, na guerra franco-prussiana, lê-se: «como Moltke conseguiu aproveitar a melhor orientação dos seus caminhos de ferro para vencer os franceses».

Na guerra russo-japonesa, a Rússia, apesar dos grandes recursos e porque as suas tropas tinham como único meio de transporte o transiberiano, em via simples na maior parte do percurso, resultando dali um fraco rendimento, com a demora de quase um mês até à Manchúria, viu o seu exército derrotado.

Mais recentemente, já nos nossos dias, no início da guerra de 1914-1918, na frente ocidental, na manobra do Marne, vemos Joffre, depois da batalha de fronteiras, e perante o flanco esquerdo de Von Kluck descoberto, reforçar essa esquerda; servindo-se para isso Galieni de todos os caminhos de ferro do norte da França ao seu alcance, reforçados com todos os outros meios de transporte, forçar Von Kluck à batalha de que resultou a vitória para o exército francês.

Na frente oriental, e feita a análise à manobra de Tannenberg, vemos, passada a fronteira alemã pelos exércitos de Remenkempf, o grande chefe militar que foi Hindenburgo, substituto de Priwitz, depois da primeira derrota alemã, assombrar todos na mobilidade que deu aos transportes por caminho de ferro, resultando a vitória para os exércitos alemães e o consequente recuo dos russos em Tannenberg, e mais tarde na conhecida manobra de Lodz.

Na última guerra não perdeu o caminho de ferro nada do seu valor, recebendo a mais todo o reforço que lhe foi dado pelo transporte rodoviário.

Por estes e muitos outros factos podemos afirmar que o caminho de ferro é na guerra um instrumento indispensável do comando em chefe, que deste se serve para tentar impor a sua vontade ao inimigo.

E como é na paz que se prepara a guerra, no ponto de vista militar está indicada a sua modernização, porque todos teremos a nossa quota-parte numa futura guerra, que Deus permita esteja muito longe.

Mas se na queria as coisas se passam assim, o que diremos do caminho de ferro na paz?

Na paz é um instrumento indispensável à economia do País.

Se olharmos para a Europa actual, encontramos todos os países procurando, pela modernizarão da sua exploração, reduzir deficit e ao mesmo tempo apetrechar os seus caminhos de ferro para todas as eventualidades.

Em França, na Itália, na Suíça, na Inglaterra, etc., sabemos que se luta dia a dia para que os seus caminhos de ferro correspondam às necessidades do momento, pela substituição da máquina a vapor pela locomotiva Diesel eléctrica e principalmente pela electrificação sempre e onde é possível economicamente fazê-lo.

E entre nós, o que se fez no passado?

Chegou a afirmar-se, depois de a rede de estradas ter certo desenvolvimento, que o caminho de ferro tinha perdido toda a sua importância.

Este erro de visão durou até no 25 de Maio.

Hoje, mercê de boa administração e muita dedicação, sentimos que se começa a olhar para o problema dos caminhos de ferro com o firme propósito de ganhar o tempo perdido.

A velha máquina a vapor começa a dar lugar à moderna Diesel, à automotora, ao tractor e avança-se mais falando-se de electrificação.

A proposta governamental lá nos diz: sem uma transformação e um reequipamento que permitam o equilíbrio financeiro da exploração não poderá a rede ferroviária prestar o serviço que deve exigir-se-lhe, em especial no momento presente».

Para isto destina o Governo 300:000 contos.

è já muito o que o Governo pretende realizar, neste sector.

Vivemos porém uma época de progresso, habituamo-nos, graças a Salazar e à sua sábia e honesta administração, a admitir serem possíveis nos nossos dias as grandes realizações, a grande transformação deste País.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A culpa é dele, porque nos mostrou o que pode fazer uma administração honesta, mesmo num país em ruínas e a cair de podre, como estava o nosso.

Temos desejo de andar depressa para ganharmos o tempo perdido.

É uma aspiração justa dos homens com fé.

Pela, leitura do parecer subsidiário da secção de Obras públicas e comunicações da Câmara Corporativa, sabe-se que a Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses, pela concessão única, se obrigou a apresentar o plano de transformação e reapetrechamento da rede, que deve conter o estudo da electrificação das linhar e troços de linha que se julga conveniente executar dentro de prazo curto.

E o programa saído desses estudos compreende a electrificação de Lisboa ao Porto e os subúrbios destas duas cidade, que, representando apenas 13 por cento da extensão de toda a rede, assegura praticamente 50 por cento do tráfego geral.

Não sendo prudente executar-se a electrificação de toda a linha Lisboa-Porto, já por insuficiência de energia, já por exigir verba muito elevada, poderíamos proceder como a Câmara Corporativa propõe, nesta 1.ª fase, para electrificação do ramal Lisboa-Sintra e do troço Lisboa-Entroncamento, visto que não consumiria mais de 34 milhões de kilowatts-hora no ano de 1956, data

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em que deveria estar pronta a receber a energia que a Câmara Corporativa considere absolutamente possível dispensar nessa data sem prejuízo das restantes necessidades.

Julgo que o seu custo se aproximaria dos 700:000 contos mas, como estes traços abrangeriam cerca de 20 por cento de tráfego geral daria uma economia da ordem dos 50:000 contos por ano. O Governo resolverá como for mais acertado.

Termino afirmando que apoio com entusiasmo a proposta governamental e faço votos para que, passados os seis anos e realizada esta 1.º fase do vasto programa. O mesmo autorm a figura extraordinária que a Província nos deu, venha submeter à Assembleia que aqui esiver a funcionar nessa data, a 2.ª fase, ainda grandiosa que a 1.ª.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Sócrates da Costa: - Sr. Presidente: associo-me, sinceramente, a tudo o que foi dito desta tribuna em louvor do plano de Fomento elaborado pelo Governo, pois não encontro palavras novas, e limito a« minhas considerações à parte «pie se refere ao Estado da Judia.

Naquela província, tal como nos territórios europeus de Portugal, nós somos em demasia para a fraca produtividade do solo.

De facto, a economia dos pequenos território, de Goa Damão e Dia é no actual momento, predominantemente agrícola, mas a pressão demográfica é grande (157 habitantes por quilómetro quadrado), e por isso emigra-se muito.

A nossa, gente encontra possibilidades de ganhar a vida no estrangeiro, tanto nos mistere mais humildes como nas situações de maior Categoria, como observou no decurso das suas brilhantes considerações n antigo Ministro .e ilustre Deputado Teófilo Duarte.

São esses emigrantes, Sr. Presidente, que contribuem em larga escala para o saldo da nossa balança comercial e equilíbrio do orçamento da província.

Mas vivem sempre na angústia dn voltar ao seu País porque não aceitam o critério degradante, de [...] pátria.

O incremento da agricultura de regadio facultará, até certo ponto, trabalho a muita gente, mas parere-me que o problema fundamental é o de desenvolver certas possibilidades industriais já verificadas, pois só estas darão novas e remuneradoras ocasiões de trabalho à população da Índia Portugal e, enriquecendo o País, abrirão um vasto campo de actividades lucrativas aos emigrantes cuja ambição suprema é regressar à terra e viver entre portugueses.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Constato com satisfação que é esta a orientação do Governo, pois vejo considerada no Plano a prospecção geográfico-mineira.

Há cerra de quarenta anos, pouco antes da primeira grande guerra, teve-se conhecimento de enormes jazigos de minério de ferro de alto teor no distrito di> (roa. As reservas na zona de Bicholim estilo avaliadas em -r)00 a (500 milhões de toneladas.

Além destes jazigos de ferro existem outros «lê manganês ao longo Já fronteira, alguns em exploração, e têm sido encontradas laterites «te elevado teor de alumínio e presença de cobalto e níquel.

Em suma, é muito apreciável a riqueza do subsolo de Goa .

Apartar de 1948 e - é justo que se diga graças à atenção dada ao problema pelo Comandante Quintanilha Dias, ao tempo governador-geral da índia, as explorações de minérios de ferro e manganês tomaram um grande desenvolvimento, que se introduziu nas seguintes exportações: em 1949, 7:OO cantos de ferro e 3:342 contos de manganês; em 1950. 10:453 contos de ferro e 7:170 contos de manganês. E, numa subida quase vertical, em 1951.47:627 contos de ferro e 45:427 contos de manganês.

É indubitável, perante estas cifras, a utilidade da verba «lê [...] contos inscrita para a referida prosperação geológico-mineira.

Mas, reportando-me «lê novo às douta» considerações do Sr. Deputado Teófilo Duarte, direi, como ele e servindo-me, até das suas palavras, que m p parece que em lugar de nos cingirmos apenas â execução de simples prospecções mineiras, haverá que providenciar já no sentido de melhorar e desenvolver as actividade em curso, através duma intervenção estatual que aproveitasse esta boa oportunidade para não deixar estiolar e porventura perder um ramo de trabalho que tem dado nos últimos anos um grande desafogo à economia goesa.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Assim deve ser porque, excepção feita a uma firma de Goa que ansinou no ano passado um contrato com um poderoso consórcio siderúrgico japonês para a mecanização das suas minas, o que lhe permitirá exporia r num período de três anos 1.5000:000t. de minério, os restante, exportadores trabalham por enquanto o plano comercial e de ocasião.

A actividade destes carece duma intervenção do Estado, para evitar que os jazigo fiquem abandonados logo depois de apressada e gananciosa exploração apenas na superfície.

As riquezas do subsolo, cuja exploração em curto espaço de três anos atingiu um grande desenvolvimento, devem aumentar através da intervenção do listado, no sentido de melhor fiscalizar, orientar e até financiar a actividades privada.

E então se reconhecerá, sem a mais leve sombra de dúvida, que a chave do problema do fomento do território de Goa e do aproveitamento dos recursos do Estado da índia é o «porto e o caminho de ferro de Mormugão».

É que as riquezas do subsolo só poderão ser aproveitadas na medida do sen escoamento por aqueles porto e caminho de ferro.

Actividade mineira ainda incipiente sobresta lurou o porto subitamente. Tendo consultado, por gentileza do Sr. Deputado Vaz Monteiro, os documentos que o Ministério do Ultramar enviou si Câmara Corporativa para estudo verifiquei que em 1950 -1951 se movimentaram pelo porto 600 000t em 1951-1952 a exportação ascendeu a 8OO 000 t, ou l 300 t. por metro de cais isto é, completa saturação.

Além disto, quanto ao caminho de ferro, há que contar com um aumento de tráfego avaliado em 350 000 t; por ano. O seu escasso material não comporta. Estas referências indicam a premente necessidade de se colocar o porto e o caminho de ferro de Mormugão em condições de servirem o escoamento dos minérios nacionais.

Sr. Presidente e Srs. Deputados: não vou coutar a triste história do caminho de ferro e porto de Mormugão a qual, de resto, se acha feita resumidamente no douto parecer da camara Corporativa.

Terei de reptil ir alguns dos factos que «li estão mencionados, apenas para poder conduzir o meu raciocino.

A concessionária do caminho de ferro e porto de Morgão é uma companhia com sede em Londres (West índia Portuguese,.Railway).

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Explorou o caminho de ferro e o porto até 1902 (o contrato de concessão por noventa e nove anos é de 18 de Abril de 1881). Mas em 21 de Agosto de 1902, em consequência do acordo que o Governo Português se viu forçado a aceitar, a exploração passou para uma outra companhia, não de Londres, mas da Índia Britânica.
Nesse ano, isto é, no fim de vinte e um anos da exploração feita pela companhia, os prejuízos do Governo Português atingem nina cifra quase igual ao capital investido pela companhia.
O Governo Português perdeu £ 1.238:265, quantia que a companhia ganhou a título de garantia de juros.
É certo que o acordo de 1902 teve como resultado o aumento de tráfego, que foi crescendo, mas só em 1927 o Governo Português foi dispensado, pela primeira vez, do pagamento de juros, e até creditado em £ 2:000 da comparticipação de lucros, que chegou a atingir £ 13:000 em 1929.
Mas logo a seguir deu-se uma, grande diminuição de volume de tráfego, devido à campanha de nacionalização na Índia, o que levou a abandonar os projectos de construção dos novos cais.
Olhando agora para o caminho percorrido no decurso de setenta e um anos de regime de concessão, vê-se que o Governo Português nenhum interesse leni tirado do porto e caminho de ferro de Mormugão, que está isento de impostos e que pouco tem também contribuído para o desenvolvimento do nosso território.
Mas o pior é que até 31 de Março de 1950 o Governo Português pagou só de garantias de juro £ 2.929:400, ou seja mais do dobro do capital sancionado da companhia concessionária, que é de £ 1.350:000.
E, se juntamos aos juros pagos outras despesas feitas pelo Governo, apura-se que as quantias desembolsadas atingem a cifra de £ 3.400:000.
E depois de tudo isto são insuficientes as obras portuárias para servir o escoamento das mercadorias nacionais, devido a deficiente exploração, que está a cargo hoje, não da companhia concessionária, mas do Governo da União Indiana.
A última, prorrogação do acordo de 1902 sobre a exploração foi feita por despacho ministerial de 15 de Dezembro de 1950 e deve terminar em 1955. Este despacho contém a condição expressa de que a West Índia Portuguesa Railway fica obrigada a pedir a revisão logo que o Governo Português o deseje.
Nesta última hipótese, e em conformidade com a cláusula 9.ª do contrato adicional de 1929, o Governo Português não terá de mobilizar muito mais de 80:000 contos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Nestas circunstâncias, deve ter merecido do Governo, como diz a Câmara Corporativa, o mais cuidadoso estudo do regime e das condições em que deverão ser realizados os melhoramentos na linha e no porto de Mormugão, aos quais se destinam, no Plano, 70:000 contos, quantia muito aproximada da necessária para o seu resgate.
Custa-me, por isso, admitir que nos limitemos a adoptar soluções provisórias para atenuar de momento as deficiências do porto, e não encaremos, antes, uma solução definitiva de harmonia com as necessidades do desenvolvimento e bem-estar da população do Estado da Índia, com justa reciprocidade entre ela e o país vizinho, e com os direitos e legítimas conveniências da Nação Portuguesa.
Para terminar, poucas palavras mais Sr. presidente, sobre o financiamento do Plano.

O financiamento do Plano de Fomento no Estado da Índia é assegurado pelas seguintes verbas:

a) 72:000 contos provenientes dos saldos de exercício findos, donde se considera possível retirar anualmente 12:000 contos durante o [...]:
b) 108:000 contos de empréstimo a contrair.
A Câmara Corporativa e de parecer que diminuídos de 12:000 contos os saldos de exercícios, findos, estes não poderão suportar os encargos com a instalação dos serviços, construções hospitalares, escolas, edifícios e monumentos, estradas, e pontes, campanhas sanitárias e de fomento agrícola e outros empreendimentos, que não podem ser dispensados.
É uma verdade que a Câmara Corporativa demonstra irrefutavelmente. Mas, além disto, temos de considerar a necessidade urgente e imperiosa de pelo menos duplicar o vencimento dos funcionários de primeiro-oficial para baixo, cuja situação é aflitiva, para não dizer miserável.
Sei que o Sr. Ministro do Ultramar tem ponderado o problema, que terá breve solução.
A despesa, que resultar reduzirá necessariamente os saldos de exercícios findos, enquanto se não possa recorrer a novas receitas a criar, que a exploração mineira permite encarar como viáveis.
Além disto o orçamento do Estado da Índia terá de suportar os encargos do empréstimo até ao montante de 40:000 contos, visto que o correspondente ao dos restantes 70:000 contos cabe por enquanto à metrópole.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Armando Cândido: - Sr. Presidente: esta segunda metade do século XX afirma-se cada vez mais carregada de interrogações e apelos.
Uma ansiedade feita de forças que desistem e de esperanças que lutam deu à vida do nosso tempo uma feição de desencontro e insegurança.
Quando o homem descrê do si próprio e esgota o dia de hoje porque não acredita no dia de amanhã, o Mundo deixa de ser um património que se transmite para ser um bem que se dissipa.
Restabelecer o valor de permanência ou a ideia do continuidade é uma tarefa do salvação.
Precisamente neste penoso remar contra a maré agitada seguramos o nosso batel, e, pela firmeza do rumo e inteligência do comando, estamos dando um grande exemplo de consciência e do perseverança.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O facto do nos encontrarmos aqui a discutir serenamente - ia a dizer: com a confiança habitual - um projecto que - e propõe satisfazer em medida impressionante as necessidades fundamentais da Nação é uma prova de que não nos abandonamos à sorte e de que consideramos o futuro sem o temor ou renegar.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Povo que não defendo o seu destino pouco se lhe dá sobreviver, e nós somos esta raça que sempre deu sinal de si pelo espirito nos padrões da sua vontade.
Sr. Presidente: dá gosto reconhecer, para louvar: acreditar, para prosseguir.

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Na sessão de 13 de Março deste ano na Assembleia Nacional aprovou unia moção em que lembrava ao Governo a necessidade de intensificar o mais possível «a valorização e o consequente povoamento da metrópole e ultramar».

Preocupado com o problema, trazendo na alma a angústia de o ter sentido na terra onde nasci o onde vivo, se, para a sua resolução, não depusesse nesta tribuna o meu contributo, ainda que modesto, faltaria gravemente no exercício do mandato que recebi como homem e como Deputado.

A moção encerrou o debate então efectuado à volta do meu aviso prévio, iniciado na sessão de 3 daquele mês, o confesso que nunca, até aí, me dispus a regressar aos meus afazeres profissionais e habituais com :i consciência de ter cumprido um dever tão imperioso e de ter pago uma dívida moral de tão forte obrigação.

Considero-me, pois, ligado ao número daqueles que têm sangrado no caminho pura alimentarem com a sua dor os esforços desenvolvidos no sentido de melhorar a vida dos Portugueses.

A minha dor não sem a mais eloquente de todas, mas nenhuma delas é, com certeza, mais sincera ou verdadeira.

E, porque trouxe aqui a questão, porque a tratei largamente durante algumas sessões, porque lhe dediquei uma atenção profunda e a estudei com todas as reservas da minha alma e todas as possibilidades da minha razão, porque relatei e aplaudi tudo quanto o Governo realizara já através de milhares de obras públicas que engrandeceram e transformaram o Pais, porque pedi soluções de fundo tendentes ao aproveitamento instante de todos os nossos espaços territoriais susceptíveis de aumentarem a produção com vista à suficiência económica», subi hoje a este lugar para exprimir ao Governo, antes de todas e quaisquer observações que me pareçam úteis, o meu reconhecimento compreensivo e a minha convicção, tão feita de esperança e confiança como a fusão do Sol com o Céu, que lhe desprende a luz.

Invocando a impossibilidade de prever em pormenor a evolução dos acontecimentos, a instabilidade e rarefacção dos mercados, a soma dos encargos a suportar com a defesa própria e a defesa comum, o Sr. Presidente do Conselho, ao findar o ano de 1900, anteviu a época que estamos vivendo, caracterizada pela fluidez, pela imprecisão nevoenta e a insegurança dos tempos provisórios e dos períodos de espera.

Apoiado neste seu raro dom de ultrapassar os horizontes antes que o futuro dê licença, Salazar anunciou «um plano modesto de fomento a executar em meia dúzia de anos e ordenado para satisfação do algumas das maiores e mais prementes necessidades do povo português».

O projecto que se discute agora nesta Assembleia não é mais do que o seguimento daquelas palavras.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Designadamente no que respeita ao continente e ilhas adjacentes poderá dizer-se que se trata, afinal, de um conjunto de obras sem a articulação propriamente de um plano tanto quanto possível completo, que, no fim de contas, se olhou mais e primeiro do que tudo ao aumento do que está pela conclusão de planos parcelares em curso; mas entendo que, dadas, na realidade, as circunstancias que nos são impostas pelo fatalismo internacional e a promência do nosso factor demográfico, relacionada com a insuficiência da nossa produção, temos de exaltar o esforço do Governo pela relevância da utilidade e pela transcendência da intenção.

São 13.000:000 contos a investir durante sois anos no continente e ilhas adjacentes e no ultramar. Isto há-de, necessariamente, trazer felicidade ao povo português.

Começo, Sr. Presidente, por destacar a franqueza usada no relatório da proposta. Aí se confessa que, não obstantente a acção desenvolvida nos últimos três lustros

- única na história do País -, o nível do rendimento nacional não é ainda satisfatório.

Supondo uma população do [...] habitantes em 1950, o rendimento individual médio teria sido de 3.900$, pelo que, transformando um dólares esse rendimento e comparando-o com o do vários países do Ocidente da Europa em 1049, Portugal não passaria do décimo lugar. Por um lado, a reduzida fertilidade do solo e a pouca riqueza do subsolo, e, por outro, o desenvolvimento demográfico, designadamente nos últimos trinta anos, explicam parte da posição. A outra parte pertence ao uivei da técnica e a eficiência da mão-de-obra e do equipamento com que os recursos materiais são utilizados.

O relatório abre com esta atitude e se não ó norma do Governo ocultar a verdade para a servir, dizer a verdade neste tom é uma garantia que dá ao momento um recheio do seriedade, quo não pode deixar de ser construtivo, e até um fundo de humildade, que não pode deixar de ser frutuoso.

Divido a proposta, à semelhança do que fez o Governo e do que fez a Câmara Corporativa, em duas partes: continente e ilhas e ultramar. Não me proponho apreciá-la demoradamente, dados os limites da tolerância regimental de que o Deputado dispõe nesta tribuna.

Desejaria apoiar com o desenvolvimento que merece a nota feita pela Camará Corporativa de que não se devo esperar que finde a execução dos trabalhos referidos no Plano para se entrar no estudo dos projectos quo se lhes deverão seguir. A investigação científica como elemento essencial do fomento que se pretendo também me levaria mais longe do que tenciono ir a propósito do ultramar, e a explicação do meu receio de que algumas obras agora dotadas possam, no futuro, prejudicar outras que venham a impor-se, ou serem por elas prejudicadas, constitui, por sua vez, assunto que me tomaria algum tempo.

Ao cabo de cada período de cinco anos dos quinze de «reconstituirão económica» da Lei n.° 1 914, não havia, como diz Ezequiel de Campos, esboço para o período imediato, nem, no fim dos três períodos, em Maio de 1950, um sistema ponderado de normas para continuação do que se fez.

Não se deve reincidir no erro?

E o delicado problema das relações entre ;i agricultura e as indústrias nascentes?

Problema vasto, oportuno, aliciante...

Vou apenas fazer algumas raras observações de incidência geral sobre o que está planificado em conjunto para o continente c para as ilhas, para depois me ocupar destas e a seguir do ultramar.

O primeiro objectivo enunciado é o desenvolvimento da agricultura. Neste campo as iniciativas, segundo o relatório da proposta, dirão unicamente respeito à hidráulica agrícola, ao povoamento florestal e à colonização interna. O resto confia-se à acção da Lei n.° 2 017, de 25 de Junho de 1946, às comparticipações do Fundo de Desemprego o às dotações a inscrever no orçamento ordinário.

Será o bastante?

Estou com o parecer da Camará Corporativa, estranhando, como nele se estranha, que se reconheça no relatório do Plano o baixo rendimento da nossa exploração agrícola, a sua incapacidade de alimentar em alguns sectores todo o consumo interno, o baixo poder de compra da população rural, c se não individualize uma campanha de reacção, dando-se ao fomento rural um programa definido, com personalidade e verbas especiais.

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Nu parecer subsidiário da secção de Produtos florestais (anexo 1.º Povoamento florestal e colonização interna»), relatado pelo engenheiro Luís Quuartin Graça, considera-se absolutamente indispensável que se incluam desde já no Plano verbas extraordinárias destinadas à conclusão rápida do o plano de fomento agrário» e doutros trabalhos tendentes à realizarão de um plano de produção; ao reforço dalgumas dotações orçamentais, como a das comparticipações ao abrigo da lei de melhoramentos agrícolas; à construção de instalações para a melhoria da preparação o conveniente conservarão dos produtos agrícolas, e ao reequipamento dos serviços técnico-oficial de investigação aplicada e assistência técnica nos sectores agrícola, pecuário e florestal.

São do meu aviso prévio de 3 de Março findo estas palavras, a que me reporto:

Tem-se dito que a agricultura constitui o mais poderoso osteio da nossa economia, aquele que ocupa mais de metade dos trabalhadores portugueses e mais enche o volume dos nossas exportações.

É de crer que ao Estado, no capítulo de assistência técnica e financeira à lavoura, caiba o maior quinhão do actividade. É então para desejar que essa assistência se afirme e traduza cada vez mais em realidades produtivas.

Quem disse isto não pode deixar de estar de acordo com as observações feitas pela Câmara Corporativa no sentido de se abrir no Plano de Fomento em debate lugar a «uma modalidade de actuação em prol da valorização da produção agrícola c dos meios rurais» como se acentua no parecer subsidiário (anexo i).

Já no decorrer da discussão e sem aludir à passagem deste parecer em que se lembra a conclusão rápida alguns trabalhos em curso do reconhecida, importância, como o inventário da riqueza agrícola nacional, alguns oradores falaram du plano de fomento agrário.

O que é este plano:?

Quais as suas razoes e objectivos?

Não obstante aquilo que já aqui se disse teimo na conveniência de uma explicação porventura mais demorada, para ser mais completa, como apoio das conclusões a tirar.

É sabido que poucos países apresentarão, como o nosso, estrutura agrária tão complexa.

Resumo alguns períodos de uma informarão que mo chegou às mãos. salientando que .desde a fértil veiga de Chaves às areias do litoral de Grãndola e Alcácer «encontram-se em Portugal solos de variadíssima constituição e aptidão variada», havendo a contar com o minimifúndio, que «é regra no Noroeste u Beira Alta, em contraste com os latifúndios alentejanos, em verdadeiro polimorfismo agrário», pá rã que contribuíram a »diferenciação climatérica, a variada constituição geológica o caprichoso relevo e, em grande- parte, causas históricas ligadas à forma por que fui conduzido » povoamento do Pais, após a conquista ao Árabe, e também razoes de ordem política que comandaram a Administração através da sua evolução.

Embora ninguém ponha em dúvida este »extraordinário polimorfismo agrário», luta-se ainda com a falta de «um estudo completo do País, através do qual se possa ter uma prospecção segura das causas o dos efeitos e da sua importância relativa nas várias-regiões».

Para melhor e mais eloquente elucidação leio estos dois períodos inteiros:

Quando se trata de estudar, propor ou determinar medidas atinentes a promover a melhoria das condições de produção, comércio ou consumo no campo agrário, lutam o técnico, os serviços e até o próprio Governo com falta de elementos concretos, sobre os quais possam confiadamente deduzir conclusões e alicerçar pareceres ou deliberações.

Falta ainda à nossa agricultura - que foi, é e será sempre o centro de gravidade da economia nacional- o exame conjunto e coordenado das condições fisiográficas, económicas e sociais inerentes a cada um dos sectores agrícola, florestal e pecuário.

Foi exactamente para eliminar semelhante lacuna, considerando que a interligação dos problemas agrário», se não compadecia com acções isolada* e que a falta de uma estreita colaboração entre as três Direcções-Gerais

- Gerais dos Serviços Agrícolas, Pecuários e Florestais e Aquicolas e a Junta de Colonização Interna dava lugar a muitas deficiências e anomalias, que. por meio de simples despacho do então Subsecretário do Estado da Agricultura, engenheiro Pereira Caldas, publicado no Diário do Governo n.° 158, 2.ª série, de 11 de Julho de 1949, se iniciou o plano de fomento agrária. com o País dividido em zonas e cada zona entregue a uma comissão de técnicos delegados daquelas direcções-gerais.

Gerais e da Junta de Colonização.

Moldada de começo na letra do despacho a execução du plano de fomento agrário fui-se adaptando, com o tempo, às práticas de funcionamento aconselhadas pela experiência, c há muito quo os serviços obedecem a processos e normas que revelam notável eficiência técnica.

Tem interesse reproduzir, ainda que sucintamente, os objectivos, a atingir, segundo os propósitos definidos pela comissão orientadora:

1.° Conhecer em todas as regiões du Pais o nos vários sectores agrícola, florestal e pecuário as condições técnicas, económicas o sociais em que é feito o aproveitamento do solo. averiguando das causas determinantes e da importância relativa de cada uma delas no» eleitos de conjunto, de modo a aquilatar-se do grau de ajustamento entre a actual localização das culturas e as condições do moio físico, económico e social.

2.º Determinar, com o objectivo de melhorar o nível de vida da população portuguesa, os locais em que, atendendo às condições atrás indicadas, se devem introduzir, alargar, intensificar ou restringir as principais culturas (arvenses, arbustivas ou arbóreas), a pecuária e a floresta, os regimes de cultura e de exploração mais adequados e as obras ou providências necessárias para tornar possível o reajustamento desejado.

Resumindo, sintetizando mais, através do Plano pretende-se saber:

1.° O que, onde e como produzimos;

2.º O que, onde e como podemos vir a produzir.

Não é isto imprescindível?

Não deverão estos objectivos figurar na base do todo e qualquer desenvolvimento das actividades agrícolas?

Fomento agrário e fomento rural sem isto?

Como?

Tive há poucos dias ocasião de observar pessoalmente os trabalhos que se estuo realizando:

a) A carta agrícola e florestal, que «tem por fim representar a utilização actual do solo pela localização das manchas ocupadas pelas várias culturas e pela densidade do arvoredo»;

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6) A amostragem, que é um estudo minucioso, sobre fotografias, de amostras de hectares, onde rigorosamente se medem as superfícies das culturas e o número de árvores das várias espécies agrupadas por classes de produtividade— novas, plena produção e caducas»;

c) A carta de solos do País «feita sobre fotografia aérea, com base no exame dos perfis do terreno» ;

d) () inquérito, compreendendo a realização do um inquérito técnico, económico e social para cada um dos concelhos de todo o Pais, através de três relatórios correspondentes a cada um dos sectores agronómico, florestal e pecuário ;

e) A carta pecuária, também elaborada por concelhos, consistindo «num conjunto de representações gráficas destinadas a objectivar a distribuição dos efectivos das diferentes espécies pecuárias, expressos om cabeças normais: na delimitação das zonas de criação e de dispersão das raras, tipos e variedades em que as espécies se diferenciaram; o reconhecimento «Nas doenças infecto-contagiosas e parasitárias tem repercussão económica sensível: e, por fim, a localização das indústrias que laboram os produtos de origem animal»;

f) O ordenamento, segunda fase dos trabalhos, desdobrada na carta do ordenamento e no relatório do ordenamento — abrangendo as possibilidades futuras num «plano ideal de exploração do território», segundo os factores de ordem fisiográfica, económica e social, «de forma u conseguir-se uma distribuição racional, não só das culturas, pastagens, gados e florestas, como até do próprio povoamento humano».

Os técnicos a quem estão confiados estes trabalhos foram destacados dos diferentes serviços chamados a colaborar. São pagos pelas verbas normais das respectivas direcções-gerais. Presentemente só a Direcção-Geral dos Serviços Agrícolas tem lá vinte agrónomos. Trabalham todos, estes e os mais, de alma e coração, mas trabalham em repartições muito dispersas e as verbas não chegam.

Em 1951 figuraram no orçamento normal 1:000 contos misturados na rubrica «Investigação das condições de cultura, estudos económicos, etc..».

Em l952 ainda nu orçamento normal da Direcção-geral dos Serviços Agrícolas, 600 contos para «Despesas com estudos e trabalhos para a elaboração do plano de fomento agrário».
Às vezes são os organismos de coordenação económica que subsidiam o plano.
Isto não dá. Os serviços andam, mas andam necessariamente de vagar.
Se não fossem os parcos subsídios eventuais já tinham parado.
Em todo o caso o que está feito é admirável.

Mas há o perigo de os estudos já realizados não chegarem a tempo de serem plenamente úteis. Podem desactualizar-se. A necessidade de os fazer concluir quanto mais cedo melhor é indiscutível.

E irá desactualizar-se, perder-se tudo quanto está feito?

Foi para pôr esta interrogação que me demorei a explicar o que eram os serviços em causa. Até há pouco não os conhecia. O mesmo deve ter acontecido a muita gente.

Ponho a interrogação e peço que meditem. Que meditem e decidam.

Separem:

O estudioso fica conhecendo o objectivo a atingir em cada região para nesse sentido orientar os seus estudos; os serviços ficam dispondo de um plano que comandará a sua actividade em todas as regiões ; o Governo poderá, através de legislação ou outras medidas de fomento, orientar a exploração da terra de modo u aproximá-la gradualmente da forma ideal.

E mais um período recortado da informação u que me referi. A sua clareza deverá iluminar o nosso voto, sem ofensa para o Governo, hipótese, aliás, sempre varrida dos nossos propósitos.

Sugere-se no parecer da Câmara Corporativa que a verba de 240:000 contos atribuída à colonização interna, na parte referente às áreas beneficiadas pelas obras hidroagrárias, seja reduzida para 140.000, e recomenda-se o emprego dos recursos disponíveis no acabamento da obra do vale do Sorraia e na assistência técnica à agricultura.

Sou um defensor da colonização interna. Fica muito caro, diz-se. Mas em matéria de fomento muitas vozes uma esplêndida aplicação de dinheiro é uma péssima operação política ou social.

A colonização interna tem a seu favor um sentido do epopeia, que vem de longe, na comoção do imperativo histórico que nos mandou ganhar a terra com o esforço do braço e o suor do rosto.

É um exemplo que vem de longe por continuidade de desígnio, mas que tem de vir de cima para que se não percam com a dispersão e as miragens da vida de hoje os incentivos da fidelidade à terra.

Infelizmente estamos a perder a nossa consciência rural. Carecemos já do exemplo, da escola, da demonstração ao vivo.

Sou um defensor da colonização interna no meu aviso prévio do Maio findo salientei, a propósito, a preciosa colheita de ensinamentos que poderão servir pura orientar obra igual no ultramar, e perguntei se não era fruto de inegável romantismo tudo o que possuímos neste Portugal trabalhado pela espada e pelo arado, mas, se os cálculos ou as contas dão que a soma de 330:000 contos atribuída àquele sector nào pode ter efectiva aplicação dentro de seis anos, nào tenho dúvidas em aprovar a sua redução nos termos sugeridos desde que se não esqueça a ajuda devida à execução do plano de fomento agrário e se ressalvo a posição das ilhas adjacentes tal como u vou pôr no decorrer das minhas considerações.

Outros grandes capítulos, como os que dizem respeito à siderurgia, refinação de petróleos, adubos azotados, fabrico de folha-do-flandres, celulose e papel e escolas técnicas enchem o Plano de Fomento de afirmações plenas na marcha decidida a bem do progresso económico do País.

Não me demoro a analisar essas iniciativas de projecção segura e larga na vida nacional, paru me ocupar das trôs que não referi: minas, energia eléctrica e comunicações e transportes.

A face do Mundo já não chega para dar rosto o expressão à vida das naçries. Empenhadas, cada qual. na descoberta de mais recursos, assiste-se a uma intensificação quase desesperada do reconhecimento do subsolo, através de frenéticas pesquisas e de ansiosos estudos. A questão das matérias-primas essenciais, transposta para o plano internacional do equilíbrio de forças, chega a ser tão grave que não se hesita em buscar soluções a mão armada.

O petróleo, os minérios de ferro, os minérios radio-uraníferos são terríveis argumentos de batalha.

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Esse Plano Schuman de que se ouve falar não consagra só a teoria dos grandes espaços económicos; representa um grande esforço para melhorar as relações políticas entre a Franca c a Alemanha, por causa da velha, disputa dos jazigos da Lorena em conjugarão com o aproveitamento dos depósitos carboníferos da bacia do Rur.

Compreende-se a importância que tem a devassa do subsolo e o seu consequente aproveitamento. Por is>o no Plano de Fomento t>o dá lugar à siderurgia, à refinarão de petróleo e se não esquece a prospecção dos jazigos que possam alimentar as experiências nucleares. Também na" é de estranhar que se encareçam no relatório do Plano os serviços prestados pelo Serviço de Fomento Mineiro, que na realização do plano delineado em 1030 tem vindo, através de um trabalho nem sempre compreendido c ajudado como devia ser. u assinalar as no>sas reservas de modo a corrigir «o conceito de extrema pobreza do subsolo».

Todavia, quantas minas abandonadas no Pais por falta do conhecimento do sen real valor?

Quantas ainda, por descobrir através de um estudo profundo e sistemático de subsolo?

Quantas em exploração sem o comando da boa técnica?

Urge acabar de todo e para sempre com o regime de pilha que derrota o património mineiro, aumentando nos serviços de fiscalização com o pessoal o as dotações suficiente.

No parecer subsidiário (anexo n.º l) afirma-se:

Ninguém duvida hoje do interesso que apresentou a criação do Serviço do Fomento Mineiro: os resultados evidenciados cabo de treze anos de trabalho, permitindo-nos ter uma noção bastante completa sobre os jazigos de carvão, ferro e algema e ter esclarecido ou estar em vias do esclarecer dúvidas antigas sobre muitos outros minérios, têm um valor inestimável nesta data em quo se pretendo começar a exploração racional de alguns produtos do subsolo.

Pois. não obstante o valor das prospecções mineiras o dos serviços dela» encarregados, o quadro dos técnicos e funcionários respectivos continua a ser preenchido por destacado e contratados.

Elaborou-se o esquema provisório, chamaram-se alguns funcionários para trabalharem do empréstimo, contrataram-se outros, e o esquema criou a patina das coisas indiscutíveis: existe e propõe-se continuar a existir, como se dissesse respeito a uma actividade a que pouco interessa. dar carácter permanente o organização definitiva.

Isto é que é de estranhar.

Nem »o diga que através do desenvolvimento mineiro o Estado não cobra receitas paru organizar, em moldes definitivos, o* serviços competentes. Leio os números:

Receitas provenientes do movimento da indústria mineira

Imposto sobre minas:

1951 .................. (a) 7.362.638$00

1952. ............... (a)15.267.861$00

Sobretaxas nos termos da Portaria n.º 13:66G, de 6 de Setembro de 1951, e despacho de S. Ex.ª o Ministro das Finanças de 6 de Setembro de 1951, publicados no «Diário do Governo» n.º 182, 1.ª série.

[...Ver tabela na imagem]

1951 Para Fundos de Abastecimento Total arrecadado

Será precisa maior eloquência?

O rendimento do trabalho produzido por gente que não sabe o que será o dia de amanhã, pela incerteza orçamental do próprio lugar que ocupa, é geralmente baixo, mas o Serviço do Fomento Mineiro tem cumprido dentro das circunstancias em que vive. Esta é mais uma razão pura si.' lhe conceder as garantias normais de um quadro definitivo. Até a oportunidade paru o fazer não podia sor melhor, visto o impulso que se pretende dar aos trabalhos e estudos em causa.

Já na sua conferência O estudo e aproveitamento do subsolo português», proferida na Sociedade do Geografia em 17 de Abril de 1934, o director-geral de Minas o Serviços Geológicos, engenheiro Luís de Castro e Sola, defendia a criação de um quadro definitivo do engenheiros e geólogos como meio de realizar os objectivos do Decreto de 31 do Dezembro de 1832 pela elaboração das cartas gerai -geológica, litológica e mineira e das cartas distritais mais detalhadas.

Diz-se no relatório que o programa de intensificação do reconhecimento mineiro durante os próximos seis anos. na parte que compete ao Estado, efectuar-se-á pelas dotações ordinárias do orçamento. O facto leva a crer que esta situação por mini exporta seja devidamente apreciada; no entanto, e salvo n devido respeito, entendo que é uma lacuna gravo do Plano o não ter sido nele consignada uma verba capaz do apoiar o esforço que se anuncia, tanto mais que a acção do Serviço de. Fomento Mineiro terá do e>tender-«o necessariamente ao reconhecimento de todos os minérios de interesse económico. Nem sequer valeu, para o efeito, o futuro acréscimo das receitas em consequência da maior utilização das reservas apuradas.

Ponho o caso à Assembleia e ao Governo com a serena esperança do que seja tomado em consideração. E não se esqueça que a geologia tem nos trabalhos de prospecção do subsolo interferência fundamental.

O geólogo é um elemento indispensável no estudo das possibilidades da terra.

A última edição da nos«a carta geológica data de 1800!

O reconhecimento mineiro, o plano de fomento agrário na elaboração da carta dos solos, a engenharia civil, principalmente na construção de pontes e barragens, o urbanismo, carecem de fundo geológico tanto quanto possível actualizado e seguro.

A carta de 1890 não está actualizada e só serve paro, dar uma ideia incompleta da geologia geral do Pais.

Pedir que se concedam aos serviços próprios os meios financeiros suficientes para prepararem, com a referência possível, uma carta geológica capaz não é pedir o necessário; é lembrar o imprescindível.

A propósito de electricidade, não vou agora desfiar os pormenores da competência dos técnicos que se encontram seriamente tratados nos pareceres da Câmara Corporativa-parecer geral e parecer subsidiário (anexo III).

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No relatório da proposta apresentam-se cifras de consumo naturalmente obtidas através de estudos aturados. Os dois pareceres discutem os números.

Sem os conhecimentos da especialidade e sem os dados precisos não mu atrevo a ter opinião.

Sei que a energia eléctrica é o alimento mais desejado do nosso século, e não tenho dúvidas em repetir esta frase do parecer subsidiário: «Um País não é susceptível de dar por finda a sua electrificação».

A verdade é que a própria Câmara Corporativa classifica de avasalador o ritmo crescente do consumo.

Escalonamento de obras, produções prováveis, custos de produção, são temas que não desenvolvo.

Mas há nesta palpitante questão do abastecimento de energia do País um ponto que não vi tratado nem referido, quer no Plano, quer nos pareceres, Esse ponto é o da .produção futura de novas formais de energia, a considerar no desenvolvimento dos actuais meios de obtenção de força motriz. Dir-se-á que se caminha ainda, neste terreno por entre possibilidades misteriosas, mas são uma realidade incontestável, ainda que trágica, as bombas de Hiroshima e Nagasnki; todos andam informador das experiências atómicas que se seguiram, e não é segredo para ninguém que nos. centros de investigação, designadamente dos listados Unidos, e da Inglaterra, se trabalha activamente, na desagregação nuclear para fins económicos.

Não se podará impor como realidade presente o que se advinha como realidade futura. Mas parece de toda a conveniência reparar na hipótese para a admitir nos projectos em elaboração ou sem vias de execução. Temos, assim, de rever os objectivos das obras em vista, para que permaneçam úteis, mesmo que outras realizações porventura mais comodas, surjam depois.

No aproveitamento dos caudais há por exemplo, que olhar à rega e à navegação sempre que seja, possível.

Pensava eu assim quando tive a sorti: de ver a questão posta pelo engenheiro Araújo Correia nas lições que proferiu na Associação Comercial do Porto. Escusado será invocar a sua autoridade. Todos a conhecem o bastante para lhe darem razão quando previne os políticos e economistas de que ao traçarem planos de fomento económico, considerem as enormes possibilidades que as novas fontes ide energia podem exercer no futuro, não apenas no bem-estar das sociedades de amanhã, mas até no delineamento dos esquemas a realizar agora.

Se este aviso não for atendido, uma dai consequências mais próximas e mais -fatais poderá ser a do confronto de preço entre a nova energia produzida suponhamos a baixo custo e a antiga energia ,vendida pela necessidade de pagar os encargos dos respectivos investimentos. E então - observa o engenheiro Araújo Correia - ou se (continuaria a fornecer energia aos preços exigidos pelo volume do capital empregado nas obras c- no apetrechamento das centrai- construída- só pura produzirem energia, ou se reduziriam esses preços, abatendo na soma consumida nas velhas construções n bastante para que o preço do .custo da unidade não fosse superior ao obtido nas centrais atómicas ou solares.

No primeiro caso teríamos, com o sacrifício da economia de toda a comunidade, um preço de energia fictício, fora das realidades mundiais, que nos excluiria da competição com a economia, externa; no segundo caso iríamos destruir, pela redução à força dos encargos do capital invertido, investimentos tão penosamente realizados.

Isto é: de qualquer das formas cairíamos ou no atraso inconcebível ou na operação desastrosa.

Não sei se nos projectos em curso estão ou não inteiramente previstas as consequências resultantes da provável utilização das novas possibilidades energéticas

Faço esta nota como quem descarrega a consciência de um sobressalto que a aflige.

E é com a correspondente sensação de alívio que separo das comunicações e transportes, que o Plano contempla com a verba global de 2.040:0(10 coutos, os portos, os aeroportos, a marinha mercante e a aviação civil, para lhes dedicar alguns comentários, ou melhor alguns instantáneos em muito poucas palavras:

1.º Aproveito, como contusão útil, o que se diz no relatório da proposta sobre a importância dos portos na economia nacional e a influência que a punção geográfica do País e a extensão da sua obra marítima têm nas actividades de uma parte considerável da população portuguesa -o aproveitamento do mar e o comércio marítimo.

Apoio decididamente, a redução de 30:000 contos na dotação do porto de Lisboa aconselhada pela Câmara Corporativa (parecer geral e parecer subsidiário, anexo vi) para melhoramentos nos pequenos portos de cabotagem e no continente e ilhas e para trabalhos preparatórios das futuras obras portuárias;

Os pequeno- portos podem não dar, individualmente considerados, rendimentos realmente grandes ou realmente vistosos, mas representam no seu conjunto um todo que não se pode desprezar constituem para as regiões que servem elementos de desatogo e progresso a atender sob o ponto de vista económico, social e político.

2.º Compreendo a primazia dada no Plano aos Aeroportos de Lisboa. Santa Maria e Sal. Sem eles as grandes rotas internacionais da navegação aérea comercial teriam insuperáveis dificuldades, com a agravante de nos condenarmos a um isolamento inadmissível. Cumpre manter actualizadas as respectivas instalações, por lógica indiscutível de continuação do estorço iniciado, para que o tráfego não diverte, e até por decoro nacional.

Todavia os pequenos aeroporto, como os pequenos porto de pesca e cabotagem cabotagem, têm também o seu interesse quando não reclamam por vezes medidas de carácter urgente e irremovível.

3.º Quanto à marinha mercante, só tenho de louvar o poder de multiplicação irradiado do simples despacho n.º 100, de 10 de Agosto 1945. Se tudo se pudesse fazer assim, com tanto silêncio e com tanto resultado, teríamos conseguido a norma ideal para a Administração.

Apoio, por constituir uma necessidade premente e corresponder a um grande interesse nacional, a construção de mais dois navio- de passageiro- para as carreiras de África.

Discordo do parecer da Câmara Corporativa no ponto em que se refere à desnecessidade do aumento da nossa frota petroleira. A discordância também não deixa de ser platónica pela razão de que as duas unidades (pie traduzem o aumento foram já encomendadas, mas o facto, aliás recordado por aquela Câmara,
de termos fretado durante a última guerra petroleiros estrangeiros a mais de 90 dólares por tonelada não se pode desligar das dolorosas perspectivas da hora presente.

4.º No que respeita à aviação civil, registo com satisfação as proporás do Governo reveladas no Plano de manter as linhas aéreas criadas para assegurar a ligação do continente com outros territórios nacionais, de adquirir aviões modernos que possam competir em preço e qualidade de serviço com as empresas estrangeiras e de conceder brevemente a uma sociedade Portuguesa, organizada com a provável comparticipação do Estado, a exploração daqueles serviços.

A Câmara Corporativa julga insuficiente a verba do 75:000 contos. Por mim defendo tudo o quo se puder

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aumentar a essa verba, tanto mais que não me limito, como explicarei, às linhas

Lisboa-Funchal;

Lisboa-Luanda-Lourenço Marfim;

Lisboa-Rio de Janeiro, com escala pela ilha do Sal;

Lisboa-Madrid;

Lisboa-Paris;

Lisboa-Londres.

Sr. Presidente: estamos em presença de uma forte demonstração. Portugal está neste Plano de Fomento vivendo a prova da sua unidade. Vingou o conceito dos espaços fundidos, dos limites redondos, do destino em conjunto, da soma sem reservas.

Sente-se, na verdade, que a preocupação do Governo se estende do Minho a Timor.

Todas as necessidades foram medidas, Sobressaíram as que se afiguraram maiores.

Sei que não devo, como ninguém deve, perturbar o momento com brados intempestivos.

Não cabe aqui o espírito que reclama o fontanário ao pé da porta como o acontecimento mais importante do Mundo.

Mas, se não devemos diminuir ou estragar o esforço com maus desvios de vontade, é lícito robustecê-lo com os reparos justos. Assim, e antes que a grande construção principie, é lícito rever-lhe o esquema.

A presença das ilhas na proposta que se discute é assinalada, quanto à Madeira, por 65:000 contos para o porto do Funchal (1.ª parte); 40:000 contos para os aproveitamentos hidráulicos (1750 ha-2.ª fase). e 64:000 coutos atribuídos em bloco no plano de povoamento florestal do Funchal e Ponta Delgada.

O porto do Funchal precisa quanto antes de ser ampliado e melhorado: as encostas da ilha carecem de arvoredo: a sua riqueza hidráulica não podia continuar desaproveitada.

Quanto á ilha do Faial. 6:000 contos para o porto da Horta.

O Decreto n.º 38997 de 18 de Novembro último, autorizou a Direcção-Geral dos Serviços Hidráulicos a celebrar contrato com um engenheiro pela importância de 172 contos pura a execução do projecto do aproveitamento hidroeléctrico da ilha.

Não sei se o projecto, uma vez concluído, terá de aguardar pelo espaço de seis anos nutro plano de fomento. Se assim for, é de lamentar.

Nada se determina a propósito da carência florestal das ilhas que formam o distrito.

A ilha Terceira não é mencionada no Plano.

E certo que estão por lá em curso interessantes obras de aproveitamento hidráulico, mas regista-se a ausência do empreendimento florestal e o silêncio sobre o porto de Angra, cuja 2.ª fase é orçada no plano de obras portuárias de 1944 em 30:000 contos.

Não represento o distrito de Angra, mas represento, como todos nós, a obrigação de prestar justiça a quem a merece.

Chegou-se ali aos últimos apuros em lenhas e madeiras e o porto é já uma questão nacional.

Ninguém ignora que a Terceira funciona como ponto de apoio de uma extraordinária actividade de segurança aérea no Atlântico.

Isto traz-nos responsabilidades.

O conjunto S. Miguel-Santa Maria participa da verba de 64:000 contos concedida ao plano de povoamento florestal do Funchal e Ponta Delgada, e dos 70:000 contos dados aos aeroporto:., a de Santa Maria receberá uma parte.

A ilha de Santa Maria não tem culpa alguma du lhe terem aumentado a importância. Base privilegiada da navegação aérea que cruza o Atlântico no seguimento de vários rumos, ou se apresenta devidamente apetrechada para o exercício pleno da sua função, ou terá, mais cedo ou mais tarde, de ser posta de lado, com grave prejuízo do capital já investido e do brio nacional posto no empreendimento.

A ilha tem fracos recursos. O seu cesso pelo mar não é só difícil; chega a ser proibitivo. O reabastecimento torna-se com frequência, impossível.

Já uma vez esta questão aqui antes da ordem do dia.

Sei que se está procedendo agora a alguns arranjos no pequeno cais de Vila do Porto.

Não se me afigura bastante.

Porque se não dá começo à execução do plano portuário já estudado?

Em breve estarão prontos os navios de 600 t para a comunicações entre as ilhas do arquipélago.

Nem se prevê, ao menos, para esses, navios um porto na ilha de Santa Maria que os receba e a abrigue?

S. Miguel, a ilha de S. Miguel, é essa terra que o mar aperta na angústia de um crescimento demográfico em desarmonia profunda com os recursos da produção.

No meu aviso prévio -nesse aviso prévio que me vejo hoje forçado a recordar de quando em quando pintei a vida ilha da ilha com as da verdade, e se algum pecado cometi foi o de deixar a minha alma impregnada de muita tinta que não pude gastar.

Não volto a dizer nesta tribuna o que já nela disse e repisei. Confio na memória do Governo, confio na memória da Assembleia Nacional. confio na memória de todos, na memória, na consciência, no Sentimento. Conto até mo ar por onde empalhei as palavras porque não creio que o vácuo ficasse como era. antes de o chamar em minha ajuda para que se comunica-se através dele a razão, o ardor, a veemência do meu apelo.

A colonização interna não tem em S. Miguel um telhado, uma horta, uma casal que seja obra sua.

D fomento agrícola não tem rumo seguro nem apoio conveniente.

A existência pecuária caminha sem uma norma de desenvolvimento lançada em directrizes de valor racional e progressivo.

As indústrias, quando avançam, em regra morrem; se não avançam, definham-se a breve trecho.

A balança comercial continua deficitária.

Os homens da Povoação -o celeiro da ilha - prosseguem no tráfego do mar à dura moda antiga, com a água pêlos peitos e o corpo magoado dos calhaus que o mar rola e atira.

Aqui e além pela costa todos pescadores que não desistem, vivem e morrem lidando sempre com os mesmos varadouros primitivos.

Metade da ilha está as escuras não tem energia eléctrica.

Tomando por base o censo definitivo de l950 - l64 221 habitantes- e abatendo à produção do energia, em 105l, 20 por cento de perdas no transporte em alta tensão, nu transformação para a baixa e na distribuição em baixa, o consumo específico médio foi de 44 kWh por habitante.

44 kWh por habitante em 1951!

Consultando a Estatística das Instalações Eléctrica em Portugal, que se serve do censo provisório de 1940, o consumo específico médio no continente, em 1900. foi do 108,7 kWh por habitante.

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Em 1951, com o censo definitivo de 1950 - 7856913 habitantes -, e graças ao desenvolvimento hidroeléctrico já conseguido, a capitação subiu para 109,7.
O aumento real deve ter sido maior, dado o facto de se ter tomado por base em 1950 o censo provisório de 1940 e em 1951 o censo definitivo de 1950.
Ainda assim, o confronto é este, em 1951:

Continente - 109,7 kWh por habitante;
Ilha de S. Miguel - 44 k Wh por habitante.

A diferença é esmagadoramente significativa.
O Decreto-Lei n.º 32 426 instituiu a missão de estudo dos aproveitamentos hidráulicos dos Açores. Essa missão entregou há muito o seu relatório. Consta de dois volumes. Depois disso foi ouvido o Conselho Superior de Obras Públicas (2.ª secção), que deu o seu parecer em 26 de Outubro de 1950. {A par do estudo dos aproveitamentos hidroeléctricos foi gizado um plano de rega.
Mais tarde, e por necessidade de se averiguar a situação jurídica das centrais existentes na ilha, por portaria de 9 de Maio de 1951, os Ministérios da Economia e das Obras Públicas nomearam, para o efeito, uma comissão. Esta comissão, por sua Vez, já entregou o resultado dos seus trabalhos. Sobre eles recaiu parecer da Procuradoria-Geral da República. As arestas que estão por limar são poucas.
Tudo aconselhava, salvo o devido respeito, que o coroamento natural de todo este longo e necessário esforço fosse a admissão, no Plano de Fomento, do caso hidroeléctrico da ilha de S. Miguel.
Os Srs. Ministros das Obras Públicas e da (Economia têm o maior empenho, justiça lhes seja feita. Resta que o seu empenho ganhe a concordância das verbas.
Faltaria ainda o célebre de malfadado Salto do Fojo.
À força de tanto se falar nessa ameaça tremenda, susceptível de ser convertida -eu sou dos que acreditam nessa possibilidade - numa grande {fonte de energia, chego, (por vezes, a pensar que se trata, afinal, de um problema imaginário.
Está ali, a par de uma necessidade candente, um dos maiores motivos de interesse para a engenharia.
Em cima de uma montanha de opiniões ,dorme um volumoso e exaustivo estudo do professor e engenheiro Alberto Abecasis Manzanares. E uma de duas: ou o problema tem solução pela parte hidroeléctrica, ou então venha a hidráulica florestal com todo o seu poder de correcção da bacia hidrográfica da Achada das Furnas.
Como está não pode ser. A água não só continua a correr sem ser aproveitada, como continua a correr perigosamente. E é assim há anos. Hoje, o próprio vale das Fumas, o seu agregado populacional, a sua riqueza em caldeiras, águas minerais e beleza panorâmica estão ameaçados como nunca.
Sr. Presidente: o relatório da proposta defende a intervenção rápida dos serviços da hidráulica florestal nas bacias hidrográficas, cujos cursos de água se encontram muito assoreados, e, no que respeita (a energia, salienta a urgência da electrificação das províncias metropolitanas, o onde se verificam as mais baixas capitações». Quanto aos portos, atribui-lhes a maior importância na economia nacional.
Recolho do parecer da Câmara Corporativa esta referência:

E interessa não esquecer que no domínio dos aproveitamentos hidráulicos e eléctricos, mais alguma coisa haverá que fazer nas ilhas adjacentes.
Pego nos Problemas de hoje, de Ezequiel de Campos - o seu último livro. Abro o capítulo «Tarefas Primárias nas Ilhas Atlânticas». Leio:

Em todas as nossas ilhas atlânticas, há muito que fazer para a natureza criar valores que permitam à gente maior ventura.

Mais um período:

O exame do estado actual das ilhas atlânticas tão estragadas pela gente, a consideração da sua potencialidade de riqueza, desde a situação geográfica ao clima e ao solo, com a sua orografia e geologia, demonstram que há nelas uma enorme potencialidade de riqueza, cujo aproveitamento requer muito mais que a tradicional espontaneidade de acção.

Não puxo pela razão das ilhas; são elas e n sua razão que puxam por mim.
Já e no decorrer deste debate se falou no problema dos transportes que ligam a metrópole aos Açores. Foi o Deputado pelo círculo de Angra, Dr. Sousa Meneses. Estimo, como sempre, a sua amizade, e respeito, como cumpre, as suas ideias.
Mas o problema é mais complicado do que parece. O público dói-se porque paga muito pêlos fretes. A empresa concessionária da carreira queixa-se da exiguidade das receitas.
Por mais estranho que pareça, o público e a empresa têm razão. Por um lado, as tarifas são difíceis para a economia açoriana; por outro lado, a exploração não tira delas o bastante para se desenvolver e melhorar.
Como subsídio para o estudo de tão importante e curioso problema ofereço os seguintes mapas:

MAPA I

Comparações do movimento de carga e passageiros com as respectivas receitas, entre vários paquetes, em 1949

[Ver Quadro na Imagem].

Observações

Estes dados foram tirados dos boletins da Junta Nacional da Marinha Mercante.
Pêlos números indicados, uma passagem na carreira dos Açores custa em média 365$. Nas outras carreiras custa 2.913$.
Os fretes nas outras carreiras custam em média, por tonelada, 530$. Na carreira dos Açores 307$.

MAPA II

Comparações de preços entre tarifas de passagens (Brasil e Açores)

Distâncias:

Lisboa-Rio de Janeiro - cerca de 4000 milhas, 8 dias (paquete Vera Crus, com escala pela Madeira).

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Lisboa-Flores (Açores) - cerca de 1400 milhas, 8 dias (paquete Carvalho Araújo, com escalas pela Madeira e portos os Açores).
Lisboa-Flores (Açores) - cerca de 1000 milhas, 3 dias (paquete Carvalho Araújo directo).

Custo das passagens por dia. - Comparação feita pelos dias que leva o Vera Crus ao Brasil com o Carvalho Araújo aos Açores.

[Ver Quadro na Imagem].

De qualquer das maneiras as passagens por dia na carreira dos Açores são sempre mais baratas em média 70 por cento.

Custo das passagens por milha:

[Ver Quadro na Imagem].

Na tarifa dos Açores as passagens por milha são mais baratas cerca de 60 por cento.

Custo e comparação das lotações:

A lotação completa do Carvalho Araújo é de:

10 lugares de luxo;
68 lugares de 1.ª classe;
78 lugares de 2.ª classe;
98 lugares de 3.ª classe;

no total 254 lugares, que de Lisboa às Flores custam .......... 352.151$20
A mesma lotação no Vera Cruz, na mesma distância, custaria .... 793.947$50

Mais do dobro que no Carvalho Araújo.

Comparações por classe:

2 camarotes de luxo (para 4 pessoas) no Vera Cruz custam de Lisboa para o Rio de Janeiro ...................................... 146.900$00
26 camarotes de 1.ª classe (para 68 pessoas) no Carvalho Araújo custam de Lisboa para as Flores ............................... 143.133$20

2 camarotes de luxo do Vera Cruz custam mais do que a lotação completa da 1.ª classe do Carvalho Araújo.

Comparações por classe:

10 lugares em camarotes de 2.ª classe no Vera Cruz, para oito dias de viagem, custam ....................... 107.500$00
78 lugares em camarotes de 2.ª classe no carvalho Araújo, ou seja a lotação completa desta classe, custam para o mesmo tempo ............. 107.897$40

A lotação completa da 2.ª classe do Carvalho Araújo custa tanto como 10 lugares de 2.ª no Vera Cruz.
10 lugares em camarotes de 3.ª classe no Vera Cruz custam ............ 67.800$00
98 lugares em camarotes de 3.ª classe no Carvalho Araújo custam ...... 65.816$80

A lotação completa da 3.ª classe do Carvalho Araújo custa menos que 10 lugares no Vera Cruz.

Crianças:
Tarifas das outras carreiras - Com mais de 10 anos, 1 passagem; de 5 a 10 anos, 1/2 passagem; de 1 a 5 anos, 1/4 de passagem.
Tarifa dos Açores - Com mais de 12 anos, 1 passagem; de 8 a 12 anos, 1/2 passagem; de 3 a 8 anos, 1/4 de passagem.

Observação. - Os preços foram tirados das tabelas em vigor.
Apesar das diferenças existentes entre as diversas categorias dos paquetes mencionados nestes mapas, os resultados obtidos através das comparações neles feitas dão que pensar, tanto mais que não foram consideradas as demoras imprevistas, muito frequentes na carreira dos Açores, por causa do mar e da insuficiência da maioria dos portos.
Outro ponto é o do número das viagens.
Ao contrário do que o Sr. Deputado Sousa Meneses pensa, sou de parecer que os novos navios de 600 t poderão resolver em parte a dificuldade, libertando os navios maiores de algumas escalas obrigatórias, que os forçam a demoras inconcebíveis. Os inconvenientes do transbordo para os portos de menor movimento serão compensados pela vantagem da maior rapidez ou da maior frequência das viagens da linha fundamental - Lisboa-Açores.
E já que estou a falar de transportes para os Açores e entre as ilhas dos Açores, não quero deixar de assinalar a conveniência de incluir a actividade da S. A. T. A. no domínio da companhia ou sociedade que o Governo pretende organizar, segundo se declara e anuncia na presente proposta de lei.
Nem só as grandes linhas e os grandes aeródromos devem ser considerados. Também as linhas e os aeródromos secundários não são tantos que não possam ser atendidos. Por outro lado, proporcionam benefícios que as populações e o próprio Governo já não podem dispensar.
Em S. Miguel, o Aeródromo de Santana, pelo mau estado das pistas, terá de ser qualquer dia abandonado.
Uma vez levantei nesta Assembleia a questão do pagamento ou da actualização das rendas dos terrenos dos Aeródromos de Santana e de Santa Maria. As minhas palavras podem não ter tido importância. A razão que as animou é que já não tem palavras que u traduzam.
Sr. Presidente: dando por findo o meu breve comentário ao Plano de Fomento no que interessa ao continente e ilhas adjacentes, vou dedicar a minha atenção a dois pormenores do que interessa ao ultramar:
1.º A Bélgica depois da guerra dotou largamente o Institut National pour l'Étude Agronomique du Congo Belge (I. N. E. A. C. B.), criado em 1934, e que já dispunha em cada ano de 120.000:000 de francos belgas, e fundou em 1947 o Institut pour la Recherche Scientifique au Congo (I. R. S. A. C.), habilitando-o de começo com 3:000.000:000 de francos franceses, para coordenar as actividades de todos os outros centros de investigação científica e promover ainda a criação das demais instituições que julgasse convenientes.
A França tem o Office de la Recherche Scientifique d'Outre-Mer (O. R. S. O. M.), ao qual estão ligados todos os institutos de investigação científica de além-mar, como o Institut d'Afrique Noire, em Dacar, o Institut des Études Centre-Africaines, em Brazzaville, e outros espalhados por todos os territórios franceses da África.

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dos açus territórios coloniais, que recebem para tal fim, anualmente, 2:500.000:000 de francos.

E nós?

Não será a altura de darmos um grande passo?

Temos em Angola alguns centros, estações e postos dispersos, como os dos serviços de agricultura, a Estação Zootécnica da Humpata, a Estação de Melhoramento de Plantas da Junta dos Cereais e os estudos patrocinados pela Junta do Café.

Em Moçambique, além dos serviços de agricultura, existe o Centro de Investigação Científica do Algodão (C. I. C. A.), com delegações naquela província e na de Angola.

Tratando do problema, o Prof. Eng. Sousa da Câmara defendeu a criação do Secretariado da Investigação Científica Agronómica do Ultramar Português (S. I. G. A. U. P.) -Boletim da Agência-Geral das Colónias, ano XXI, n.° 240.

Eu suprimia-lhe a palavra «Agronómica».

Mas repito: não será a altura?

O certo é que em África a investigação científica aumenta o seu esforço de integração, ultrapassando as fronteiras que a dividem. E uma necessidade que triunfa. Apregoou-a o Dr. Shõnland, director da Investigação Científica e Industrial da União Sul-Africana Reafirmou-a a Conferência Científica Regional Africana em Joanesburgo, em Outubro du 1949, e em Nairobi, em Novembro de 1950.

Não será a altura?

Faço a pergunta mais uma vez.

2.° Pondera-se, e muito bem, na proposta do Governo que o Plano em discussão, pela sua envergadura, seria insuficiente se, «paralelamente, não fossem criadas as possibilidades de crédito a médio e a largo prazo, o que, em boa razão, não pode julgar-se satisfeito pela existência de bancos comerciais ou dos bancos emissores».

Em satisfação, uma vez que vai ser revisto o contrato com o Banco Nacional Ultramarino, desviam-se do Plano tis verbas que, com a comparticipação das províncias interessadas, possam servir de base à organização de um banco de fomento para o ultramar.

Essas verbas aparecem no quadro de distribuição dos investimentos traduzidas na soma de 160:000 coutos, não coutando com os 20:000 contos que cada uma das províncias de Angola e Moçambique subscreve.

A Câmara Corporativa apoia entusiasticamente a medida, mas acha a verba exígua, no que tem razão, e, embora não tenha estudado profundamente o assunto, admite que um exame técnico de fôlego conduza à proposta de fundação de uni grande banco de fomento nacional pura operar na metrópole e no ultramar. Aponta a conveniência das maiores possibilidades na mobilização de capitais e no aproveitamento de peritos competentes.

Também gosto de me determinar pela reflexão aplicada ao resultado de estudos conscienciosos, mas, sempre que vejo conseguir-se penosamente alguma coisa do muito que se precisa, desconfio do êxito, quando se discute o pouco alcançado para se exigir o tudo desejado.

Sempre tenho defendido a unidade no desenvolvimento político, económico e social do espaço português; mas deixemos o ultramar com o seu banco de fomento, que bem carece dele mais do que a metrópole.

E passo agora, Sr. Presidente, a tirar algumas palavras do fundo de Inquietação com que no meu aviso prévio -hoje transformado em livro sob o título O Problema dos Excedentes Demográficos - tracei esta legenda:

Povo que meteu pé nas ilhas do Atlântico, que foi de Sagres à índia, à China, à Insulíndia, as

Américas, que não largou os rastos e os afrontou du novo e sempre, carreando almas para a construção de mais povos, tem o direito de continuar a sua missão sagrada.

Nesta posição sobre o Atlântico, sobre o mar, nem eu sei como seria se outra raça aqui vivesse sem a nossa coragem e a nossa fé, sem o nosso espírito de crescer para bem do Céu e do Mundo.

As vezes penso na imensa responsabilidade geográfica deste Portugal pequeno, e depois sossego, na, certeza de que nenhum outro país na situação do nosso alcançaria mais nos domínios da demonstrarão histórica.

Sempre nos soubemos medir com a craveira dos nossos desígnios.

Esses portugueses, que todos os anos, como se diz no relatório da proposta, atingem a idade de trabalho e se contam por dezenas de milhares em busca de meios de vida, têm de ser outros tantos factores de prosperidade da realidade portuguesa.

Sabe-se que «a evolução económica e política dos diversos países está em relação directa com a vitalidade demográfica de que dão prova».

O homem será sempre o primeiro valor a considerar em todos os programas de investimento e produção.

Este Plano de Fomento não foge a essa lei, consagra-a.

Foi a pressão demográfica a primeira e a grande determinante da resolução do Governo. Ele o confessa quando, ao esclarecer que não tem de modificar a sua política, se mostra disposto a prossegui-la:

. . . embora acelerando o ritmo dos investimentos públicos e provendo ou facilitando maiores investimentos privados, visto tornar-se indispensável elevar o nível de vida e ser cada vez mais intensa a pressão demográfica.

Nunca a questão do povoamento branco do ultramar foi encarada com tanta coragem e grandeza.

No meu aviso prévio defendi a preparação, por parte do Estado, das condições gerais do território para a ocupação étnica, mas fui mais adiante e disse:

Admito que o Estado exemplifique os diversos tipos de povoamento aconselhados, crie padrões, assistindo-lhes até atingirem a independência económica necessária, conceda créditos reembolsáveis, imprescindíveis ao desenvolvimento agrícola e industrial, e gaste verbas no estudo e no comando da produção.

Disse e não minto.

Ofereci então alguns argumentos. Nisto de povoamento branco do ultramar é a África que conta. Pois bem, hoje acrescentarei que o tempo não se compadece com a marcha lenta da nossa presença nesse continente. Não o podemos transformar depressa, mas podemos acelerar a sua grande transformação. É um dever imperioso, é uma necessidade da primeira linha.

Já vi aqui atacada a escolha das regiões a povoar, feita na proposta.

Não conheço essas regiões, mas confio nos técnicos, confio no arsenal da profilaxia moderna, confio na tenacidade portuguesa, na doação ardente da nossa, vontade e confio ainda nos altos dirigentes que desta vez puseram os ombros largos à formidável empresa.

Angola e Moçambique são promessas que o nosso sangue tem de cumprir.

Mais a mais entre o bloco eslavo que dia a dia vai avassalando a Ásia imensa e uma América que vigia o perigo, desdobrando-se por onde pode, a Europa só tem um caminho: unir-se e unir a África para, com a fusão

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dos recursos e das energias Aos dois continentes, entrar com peso de valor na balança das forças em jogo.

Não nos podemos separar da África sem o prejuízo de baquearmos por falta dela. Também a África não se pode separar de nós por velhas razões culturais, técnicas, administração, financeiras e económicas. Não há rivalidades ou imcompreensões que subsistam contra o argumento da salvação comum.

A Europa quer ressurgir. A África quer avançar. Estas duas grandes vontades não fé repelem, aproximam-se para resistir, conjugam-se para sobreviver.

Euráfrica - não é nova a concepção. Simplesmente é candente a necessidade de lhe obedecer.

A Rússia montou em temerosa escala a siderurgia do seu imperialismo. Pós nos fronteiras a cortina forjada com o ferro desta sua estranha indústria metalúrgica.

Se um dia as suas legiões armadas transpuserem a cortina em som de guerra, a Europa nem sequer tem espaço geomilitar para a sua estratégia.

A África é imprescindível. Dela partiria se necessário fosse, o impulso da reconquista, o arranco para o triunfo filial.

Mas é na ordem económica que mais se impõe ganhar a África para o nosso lado.

Essa descida de Estaline pelo Iraque, pela Pérsia, pêlos meandros tenebrosos da sua política de penetração no continente africano, é o alastrar do sonho de uma «Sibéria dos trópicos» preparada para fugir ao Ocidente.

A Europa tem do esmagar esse sonho na luz crua de uma realidade a seu favor. É batalha para políticos, diplomatas, economistas industriais, engenheiros e missionários.

Portugal percebeu na hora própria o que convinha realizar em tão vasto e complexo terreno de acção.

Não é só para continuar Portugal que Portugal está em África. E para prolongar a Europa.

Este grande esforço que se põe agora em movimento, através de um avultado plano de obras, não e só um sinal de consciência na administração interna, é um argumento de poder na projecção externa para um Ocidente mais próspero, mais feliz, mais vitorioso.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Eu peço à Providência que nos deixe continuar e peco-lhe ainda que dê vida sã e prolongada ao Homem que nos conduz por este caminho iluminado.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Quando formos mais e mais venturosos os nossos dias, quando neste Portugal renovado os lares tiverem mais pão e anais luz e nesse ultramar todo o sangue português cantar mais alto o mais forte, será justo que Salazar seja vivo, para quo na face da Nação se abra para ele o sorriso bom, o melhor de todos, da sua alma contente e agradecida.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muita cumprimentada.

O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão.

O debate prosseguirá na sessão de amanhã, de tardo, à hora regimental, e devora terminar no próximo saltado.

A partir de sexta-feira haverá sessões de manhã para apreciação da lei de autorização das receitas e despesas, cuja discussão se prolongará, provavelmente, até segunda-feira.

Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 30 minutos.

Srs. Deputadas que entraram durante a sessão:

António de Sousa da Câmara.
Carlos de Azevedo Mendes.
Daniel Maria Vieira Barbosa.
Délio Nobre Santos.
Jorge Botelho Moniz.
D. Maria Leonor Correia Botelho.
Mário Correia Teles de Araújo e Albuquerque.
Ricardo Malhou Durão.
Teófilo Duarte.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Abel Maria Castro de Lacerda.
Alberto Cruz.
António de Almeida.
António Calheiros Lopes.
Artur Rodrigues Marques de Carvalho.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Avelino de Sousa Campos.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos Vasco Michon de Oliveira Moreira.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Henrique dos Santos Tenreiro.
João Carlos de Assis Pereira de Melo.
João Cerveira Pinto.
Joaquim de Moura Relvas.
José Cardoso de Matos.
José Gualberto de Sá Carneiro.
José dos Santos Bessa.
Luís Filipe da Fonseca Morais Alçada.

O REDACTOR - Leopoldo Nunes.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

Página 292

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