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REPUBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 210

ANO DE 1953 4 DE MARÇO

V LEGISLATURA

SESSÃO N.º 210 DA ASSEMBLEIA NACIONAL

EM 3 DE MARÇO

Presidente: Exmo. Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior

Secretários: Exmos. Srs. Gastão Carlos de Deus Figueira
José Guilherme de Melo e Castro

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas.
Antes da ordem do dia. - Foram aprovados os n.ºs 207 e 108 do Diário das Sessões.
Deu-se conta do expediente.
O Sr. Deputado Carlos Moreira agradeceu o voto de pesar pela morte de seu pai.
O Sr. Deputado Oliveira Calem tratou do problema de exportação do vinho do Porto.

Ordem do dia. - Continuou a discussão na- especialidade da proposta de lei relativa à tributação das mais valias dos produtos ultramarinos.
Foram aprovados os artigos 1.º e 2.º do parecer da Câmara Corporativa, o último com substituição do § 1.º por outro proposto pelo Sr. Deputado Lopes Alves e outros Srs. Deputados.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 15 horas e 50 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Adriano Duarte Silva.
Afonso Enrico Ribeiro Cazaes.
Alberto Henriques de Araújo.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alexandre Alberto de Sousa Finto.
Américo Cortês Finto.
André Francisco Navarro.
António Abrantes Tavares.
António de Almeida.
António Augusto Esteres Mendes Correia.
António Bartolomeu Gromicho.
António Calheiros Lopes.
António Jacinto Ferreira.
António Júdice Bustorff da Silva.
António Maria da Silva.
António de Matos Taquenho.
António dos Santos Carreto.
António de Sousa da Câmara.
Caetano Maria de Abreu Beirão.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos Mantero Belard.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Délio Nobre Santos.
Diogo Pacheco de Amorim.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco Eusébio Fernandes Prieto.
Frederico Maria de Magalhães e Meneses Vilas Boas Vilar.
Gaspar Inácio Ferreira.
Gastão Carlos de Deus Figueira.
Herculano Amorim Ferreira.
Jerónimo Salvador Constantino Sócrates da Costa.
João Alpoim Borges do Canto.
João Ameal.
João Luís Augusto das Neves.

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Joaquim de Oliveira Calem.
Joaquim de Pinho Brandão.
José Dias de Araújo Correia.
José Diogo de Mascarenhas Gaivão.
José Garcia Nunes Mexia.
José Gualberto de Sá Carneiro.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Luís da Silva Dias.
José dos Santos Bessa.
Luís Maria Lopes da Fonseca.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Domingues Basto.
Manuel França Vigon.
Manuel Hermenegildo Lourinho.
Manuel José Ribeiro Ferreira.
Manuel de Magalhães Pessoa.
Manuel Maria Vaz.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Mário de Figueiredo.
Paulo Cancela de Abreu.
Bicar do Malhou Durão.
Ricardo Vaz Monteiro.
Salvador Nunes Teixeira.
Teófilo Duarte.
Vasco Lopes Alves.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 62 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 16 horas.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Estão em reclamação os n.ºs 207 e 208 do Diário das Sessões.
Pausa.

O Sr. Presidente: - Visto nenhum Sr. Deputado pedir a palavra sobre estes números do diário das sessões, considero-os aprovados.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Telegramas

Vários a apoiar o decreto que regulamentou a assistência de menores aos espectáculos públicos.
Da direcção do Sindicato Nacional dos Jornalistas a manifestar o seu aplauso às palavras proferidas pelo Si. Deputado João do Amaral acerca da. missão do jornalismo e da posição que compete aos jornalistas.
Dos Srs. Luís Teixeira, Aprígio Mafra e Artur Maciel, antigos presidentes do Sindicato dos Jornalistas, no mesmo sentido.

Exposição

Da Associação do Fomento do distrito de Quelimane a pedir a revogação do Decreto-Lei n.º 38 704, acerca da tributação das mais valias dos produtos ultramarinos.

O Sr. Presidente: - Estão na Mesa os elementos fornecido? pelo Ministério da Educação Nacional em satisfação do requerimento apresentado pelo Sr. Deputado Paulo Cancela de Abreu em 12 do mês passado, me vão ser entregues àquele Sr. Deputado.
Estão também na Mesa os elementos fornecidos pelo Ministério da Educarão Nacional em satisfação do requerimento apresentado pelo Sr. Deputado Galiano Tavares na sessão de 16 de Janeiro último, que também vão ser entregues àquele Sr. Deputado.
Está na Mesa um ofício, enviado .pela Presidência do Conselho, com referência ao ofício n.º 692, que transcreve um requerimento do Sr. Deputado Pinto Barriga, a informar que os trabalhos ali referidos estão a cargo da comissão especial de literatura e espectáculos para menores, onde, por despacho de S. Ex.ª o Ministro da Presidência, aquele Sr. Deputado pode colher as informações e elementos existentes.
Estão ainda na Mesa os elementos fornecidos pelo Ministério da Educação Nacional em satisfação do requerimento apresentado pelo Sr. Deputado Santos Bessa em 18 de Dezembro último; vão ser entregues àquele Sr. Deputado.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra antes da ordem do dia o Sr. Deputado Carlos Moreira.

O Sr. Carlos Moreira: - Sr. Presidente: sendo esta a primeira sessão a que assisto após o rude golpe que sofri pela perda do meu querido pai, desejo exprimir a V. Ex.ª, Sr. Presidente, e a VV. Ex.ªs, Srs. Deputados, pelo voto de pesar aprovado nesta Assembleia, os meus sentimentos de gratidão e profundo reconhecimento.

O Sr. Oliveira Calem: - Sr. Presidente: no dia 6 de Fevereiro publicou a Harper's Gazette, de Londres, a exposição enviada ao chanceler do Tesouro Britânico sobre a situação crítica do comércio importador de vinhos licorosos naquele país.
Nesse importante documento a Wine & Spirit Association expõe claramente a situação e sugere as medidas que reputa necessárias à solução da crise. Este estado de coisas provém, a seu ver, do extraordinário aumento de direitos aduaneiros, que passaram de 8 xelins por galão em 1939 para 50 xelins durante a última guerra, encargo que actualmente se mantém.
Dada a proximidade em que nos encontramos da publicação do orçamento britânico, entendo que a nota enviada ao Ministro Sr. Butler é particularmente importante. É também particularmente feliz a argumentação empregada, justificando esse novo apelo ao Secretário do Tesouro, no sentido de serem reduzidos para uma proporção mais justa os direitos que pesam sobre os vinhos de graduação elevada, entre os quais, como é evidente, figura o nosso vinho do Porto.
Ao mesmo tempo que calorosamente, devemos apoiar tão feliz como clara, exposição, não quero deixar de destacar da mesma aquilo que se encontra sublinhado no texto e que é o seguinte:

O preço de custo actual nos países de origem é baixo e, por conseguinte, baixo é também o quantitativo de moeda, estrangeira a depender.

E mais adiante:

Os direitos antes da guerra eram de 8 xelins, tendo passado depois para 50 (o que equivale a cerca de 22 contos por pipa).

Desse facto resulta que o preço de retalho subiu numa proporção completamente diferente daquela que regulou a subida de todos os outros artigos de luxo. Estes, de uma maneira geral, oscilam entre duas e três vezes os preços médios de antes da guerra, o que não acontece com o vinho do Porto, cujo preço anda à volta de cinco ou seis vezes o seu custo em 1939.

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Devo fazer realçar da primeira passagem citada a justiça que se faz ao preço do vinho do Porto nu origem, pois ali se diz clara e insofismavelmente que não foi o preço da origem que fez declinar as vendas naquele mercado, mas sim os direitos aduaneiros, quase proibitivos, com que foi onerado.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Estou certo de que seria muito proveitoso juntar, na medida do possível, os nossos esforços aos dos importadores ingleses, e certamente o nosso Governo não deixará de o fazer por intermédio das respectivas entidades oficiais. No caso de sermos bem sucedidos, veríamos, em parle, solucionado, ou pelo menos reduzido, um dos males que neste momento preocupam os nossos exportadores.
Para melhor elucidação de VV. Ex.ªs será, no entanto, conveniente frisar que, para a quebra na exportação total do ano findo, contribuiu a Inglaterra com 7 000 pipas a menos do que em 1951.
A. qualidade não está em causa, e apraz-me realçar a acção do Instituto do Vinho do Porto pelo muito que tem contribuído para lhe conferir, no País e no estrangeiro, a categoria a que indiscutivelmente tem direito, ao contrário do que parece acontecer com outros vinhos, segundo aqui foi dito há dias, pelos nossos ilustres colegas Srs. Melo Machado e Alberto de Araújo.
A fiscalização exercida no Douro junto dos produtores, pela Casa do Douro, e no momento da sua exportação, pelo Instituto do Vinho do Porto, pode considerar-se perfeita. Deve-se isto à organização corporativa feita há cerca de vinte anos pelo Sr. Engenheiro Sebastião Ramires, então Ministro do Comércio e Indústria.
E evidente que se impõem aqui e além rectificações, que a experiência de tanto tempo aconselha e torna agora bem mais fáceis. É essa, de resto, a opinião do próprio legislador, e não esqueçamos, porém, que, destes vinte anos, os últimos catorze não podem ser considerados como normais.
Se a exportação fosse de 70000 ou 80000 pipas, como normalmente acontecia até 1939, não haveria, certamente, tanto a criticar.
Há que fazer todo o possível para conquistar novos mercados e reconquistar os que estamos em riscos de perder, como o do Brasil. O Brasil era dos mercados tradicionais e há meses que a exportação su encontra reduzida, praticamente, a zero. Bem sei que são muitas as dificuldades a vencer, mas ouço dizer que o Governo não se tem poupado a esforços nesse sentido, e faços votos para que essas negociações cheguem a bom termo.
Quanto a mercados novos, entendo que devemos tentar uma propaganda bem orientada nos Estados Unidos da América, porque ali, mais do que em qualquer outro país, a propaganda é da maior importância, e o potencial económico que a América representa hoje no Mundo é, com certeza, um factor a considerar; e tudo parece indicar que, pelo menos, valha a pena experimentar.
Vem a propósito agradecer ao Sr. Ministro da Economia o auxílio concedido para que na Inglaterra a tão reclamada propaganda seja hoje uma realidade. Já chegam de lá notícias animadoras dos resultados da propaganda iniciada em fins do ano passado. Faço votos para que as verbas vão saindo com a regularidade necessária e que não haja solução de continuidade, por forma a não arruinar, em pouco tempo, o esforço e dinheiro despendidos.
Sr. Presidente: vou terminar mas, antes, devo ainda chamar a atenção do Sr. Ministro da Economia para um facto que reputo da maior importância neste momento e que muito preocupa os exportadores. Possui a Casa do Douro um stock de vinhos, cujo escoamento deverá ser feito na proporção de 10 por cento sobre as exportações do ano anterior. A crise que o comércio atravessa é grande, como todos sabem, e essas retiradas teriam de ser efectuadas e pagas até ao fim do corrente mês de Março, o que representaria para a maioria dos exportadores um sacrifício quase incomportável.
Consultando os Cadernos Mensais do Instituto,, do Vinho do Porto, poderemos avaliar a difícil situação do comércio de vinhos, pelo facto de só em certificados de. existência haver encargos no montante de cerca de 100 000 contos.
Embora os exportadores por forma alguma entendam dever furtar-se a essa obrigação, seria justo o seu adiamento para ocasião mais oportuna. Assim o esperam da elevada compreensão de S. Ex.ª o Sr. Ministro da Economia.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continua em discussão na especialidade a proposta de lei relativa à tributação das mais valias dos produtos ultramarinos.
Na última cessão discutiu-se o artigo 1.º do contra-projecto da Câmara Corporativa, visto que a Assembleia tinha votado que a discussão corresse sobre esse texto.
Continua em discussão o artigo 1.º
Sobre este artigo não há na Mesa qualquer proposta de alteração.
Tem a palavra o Sr. Deputado Mascarenhas Galvão.

O Sr. Mascarenhas Gaivão: - Sr. Presidente: quando dei o meu voto favorável à «ratificação com emendas» do Decreto-Lei n.º 38 704, fi-lo na convicção de que com tal atitude não levantava dificuldades ao completo esclarecimento do problema, que então, com tanto calor, foi debatido.
Passaram-se alguns meses, quase um ano. o novamente temos diante de. nós o mesmo problema, concretizado, porém, na proposta de lei n.º 219. Foi aqui esclarecido que, nos termos do Regimento desta Assembleia, não é possível voltar a discutir o problema na generalidade, mas isso não impede, assim o creio, que ao ser apreciado na especialidade, e relativamente a cada artigo, se façam as considerações correlacionadas com os textos dos mesmos artigos e que como tal se mostram pertinentes.
Por mim, entendo que o voto dado não significou concordância com qualquer dos princípios em que se estruturava o decreto inicial, mas sim, e apenas, o desejo sincero de se obterem «emendas» que pudessem dar satisfação às dúvidas que durante o debate foram levantadas.
Sem outro intuito que não seja o de construtiva colaboração, sem outro interesse que não seja o de prestigiar esta Assembleia e o Governo, entendo que não ficaria bem com a minha consciência, e que não cumpriria inteiramente o meu mandato, se não dissesse deste lugar que a maioria, dos princípios em que se informa esta lei continuam a ser tão impopulares como o eram no momento da sua promulgação.
A «maior valia» e a «sobrevalorização» são expressões com as quais os sentimentos das gentes rias actividades económicas do ultramar não se podem compenetrar.

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Direitas de exportação, fixos ou progressivos, impostos de rendimento ou outros desta natureza suo compreensíveis e nunca encontraram por parte daquelas populações a reacção que a nova modalidade tributária provocou.
Falo à vontade neste assunto porque não tenho em jogo, interesses materiais a defender. Não sou exportador de géneros coloniais nem tão-pouco estou interessado na produção de produtos abrangidas pelo decreto. Sou um velho colono e um bem intencionado, e como tal não só procurei dar o meu honesto contributo na apreciação do decreto quando foi discutido nesta Assembleia, como segui depois atentamente a sua aplicação prática no período experimental que de então até ao presente tem decorrido.
Pude, assim, verificar que aqueles receios que dominavam o meu espírito vieram, infelizmente, a traduzir-se em realidades. Com efeito, vimos concretizar-se a queda das cotações nos mercados externos, de que resultou não ter sido por ele abrangida a maioria dos produtos que foram sujeitos ao seu regime; presenciámos um desfalecimento geral das iniciativas particulares, que, em grande parte, contribuiu para agravar o estado de crise que se mostra latente em Moçambique e de que é índice claro a quase paralisação das transacções comerciais.
No que respeita a esta província apenas um produto foi praticamente abrangido no período da. experiência: a castanha de caju. Produto, na sua quase totalidade, de cultura dos indígenas, exportado para a índia.
Como eu já aqui havia previsto, foram os indígenas que no final pagaram os poucos milhares de contos, talvez uns 5 000, até agora arrecadados pelo Governo.
As cotações do sisal baixaram para cifras que mal compensam, se é que Compensam, os custos de produção. A sua cotação, que antes da desvalorização da libra (1 de Setembro de 1949) era de 9.600$ C. I. F. e antes da guerra da Coreia (Junho de 1950) era dei 10.400$ C. I. F., subiu durante o ano de 1951 para 20.000$, tendo, porém, atingido, no fim de Dezembro de L952, o preço ruinoso de 7.500$!
O chá atravessa também uma grave crise, que não se sabe até onde poderá arrastar esta cultura.
A copra, sujeita às mais bruscas oscilações, impossíveis de prever e controlar, teve um ano de 1952 nitidamente desfavorável, pois a sua cotação chegou a cair para 4.600$ C. I. F., preço este insuportável para a produção.
Agora, felizmente, as cotações tiveram apreciável melhoria, mas nestes últimos dois meses os produtores já têm tido os seus lucros de venda cerceados com a aplicação do Decreto-Lei n.º 38704.
Assim, se para aqueles dois produtos (sisal e chá) a expectativa da incidência do decreto, quando um dia melhorarem as cotações, os desencoraja e desanima, quanto à copra, que já está a pagar as taxas sobre uma suposta sobrevalorização, vive-se a situação iníqua de os seus produtores não poderem beneficiar integralmente, como seria legítimo, dos preços actuais para com eles se ressarcirem das «menos valias» que suportaram e para as quais não receberam qualquer compensação.
É no meio deste panorama, Sr. Presidente, que as actividades económicas de Moçambique vivem e sentem os princípios do decreto em discussão. E, porque tal decreto, na sua concepção e na sua forma, ignora as épocas difíceis, para só considerar as de prosperidade, esquecendo ainda que foi com os lucros obtidos nas épocas de prosperidade que se levou a cabo a obra de que todos nos orgulhamos, não posso deixar de mais uma vez manifestar o meu desânimo perante a confirmação desta inovadora medida.
A Câmara Corporativa, no seu parecer, deixa perceber que compreendeu e que quis acautelar muitas das dúvidas e sugestões que foram levantadas durante o debate travado quando da discussão do Decreto n.º 38 704. Compreendeu e acautelou efectivamente algumas dessas dúvidas, pois não só aconselha a banir o capital de fomento e povoamento, como aconselha a abolir também a distinção entre produtores-exportadores e comerciantes-exportadores.
Subsiste, porém, a ideia da sobrevalorização - ideia que, como já referi, não se coaduna com a maneira de sentir da gente da actividade privada do ultramar, exactamente porque não assenta em razões concretas e reais. Tributar sobre lucros de exploração efectivamente apurados é coisa que todos compreendem, mas tributar sobre hipotéticos excessos de lucro é coisa que só forçadamente pode ser compreendida e de boa vontade aceite.
O produtor, o comerciante, o industrial só no fim de cada ano podem saber qual foi o lucro obtido na sua exploração; a nova forma de tributar parece esquecer que só é lucro o que se obtém no apuramento final das contas do exercício, e não aquele que, periodicamente, pode ser alcançado em certas e determinadas transacções comerciais. Há ainda a notar que são poucos os produtores do ultramar que se dedicam à monocultura.
Aqui também a nova modalidade de imposto pode conduzir a graves riscos para o contribuinte, pois pode muito bem suceder que aquele que obteve em certo momento um preço favorável para um produto da sua exploração verifique na mesma ocasião uma quebra na cotação de outro. É caso corrente em Moçambique as empresas serem simultaneamente produtoras de sisal e copra. Enquanto que um dos produtos dá presentemente prejuízo na exploração, o outro serve, sem dúvida, para compensar.
Mas com o novo imposto este aspecto do problema não é considerado assim, como também não o é para os comerciantes que adquiriram certo produto a determinado preço, em certa ocasião, com vista à execução de um negócio a prazo. Este negócio, o mais corrente no ultramar, terá de desaparecer, uma vez que o comerciante não pode correr além do risco próprio da transacção ainda aquele que lhe poderá advir se na altura da exportação a cotação tiver subido.
Poderia citar muitos exemplos demonstrativos dos inconvenientes desta forma de tributar. Não vale a pena insistir em detalhes, já que basta a linha geral para mostrar o panorama e a impraticabilidade do disposto no artigo 1.º do decreto em discussão.
Mas, além do aspecto económico, há que olhar para o político. Quanto a este. Sr. Presidente, não me alongo em considerações, exactamente porque sou de opinião que um tal sistema de tributação leva, inevitavelmente, ao desânimo todos aqueles que vinham fazendo investimentos em África, isto porque o sistema não oferece garantias de estabilidade nem deixa à iniciativa privada aquele mínimo de liberdade que tanto serviu para se fazer tudo quanto se tem feito.
Pelo exposto, Sr. Presidente, não dou o meu voto ao artigo 1.º do decreto.
Quanto ao § único, Sr. Presidente, apenas desejo esclarecer a Assembleia que os preços a que se refere são preços de favor, inferiores não só às cotações dos produtos, mas até, em alguns casos, ao seu próprio custo de produção.
Quero, agora, apenas frisar que um produto de Moçambique, a copra, tem no momento presente a cotação mundial de 6.800$ C. I. F... e, no entanto, foi-lhe fixado oficialmente, para a venda na metrópole, o preço de 4.000$ C. I. F. Mal iria se ainda tivesse de pagar taxa de sobrevalorização.

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O § único em discussão pode fazer supor que os exportadores colocam a produto na metrópole voluntariamente. Tenho a frisar que se trata de uma requisição por via de contingentes oficialmente fixados, tendo sido atribuído para a província de Moçambique, e relativamente ao período de 1953-1954, um contingente de 6 300 t.
Os exportadores, ao cumprirem este contingente, não têm apenas os seus lucros cerceados. Têm, sim, uma perda real, pois o preço oficialmente fixado não cobre o custo do produto na origem, acrescido depois de despesas de transporte e seguro e, o que é mais ainda, de direitos de exportação.
O benefício que o § único do artigo 1.º parece conceder não tem conteúdo prático pela simples razão de não' se poder conceber que um produto vendido obrigatoriamente a um preço inferior do seu valor real de base ainda fosse onerado com uma taxa de «excesso de lucro»...
Justo seria que, relativamente aos produtos que já estão sacrificados com o regime dos contingentes, esse sacrifício fosse levado em devida linha de conta e, porque já contribuem generosamente para a economia geral da Ilação, fossem pura e simplesmente isentos da aplicação do artigo 1.º
Para que V. Ex.ª, Sr. Presidente, ajuíze com rigor da situação basta citar os números seguintes:

Valor de venda no estrangeiro das 6 300 t requisitadas ............... 42:840.000$00
Valor do contingente ao preço oficialmente fixado ................ 25:200.000$00
Prejuízo ........................... 17:640.000$00

Tenho dito.

O Sr. Mário de Figueiredo: - A discussão, Sr. Presidente, nos termos em que tem sido posta, significa que os Srs. Deputados que têm intervindo no debate se não conformam com a orientação expressamente fixada no Regimento, segundo a qual não podem ser discutidos, relativamente a um diploma que foi ratificado com emendas, os princípios fundamentais informadores desse diploma.
Isto quer dizer que, na verdade, a discussão tem decorrido fora do plano em que, a adoptar-se o Regimento da Assembleia, devia decorrer. Não quero já referir-me a um ou outro princípio menos geral, menos dominador de toda a economia do decreto; quero referir-me só àquele que está implícito e logo salta desta pergunta: é ou não é legítimo tributar sobrevalorizações?
Posta esta questão, a resposta, dentro da economia do decreto que foi ratificado com emendas, não pode ser senão uma: é admissível, é legítimo que se tributem sobrevalorizações.
Isto está definiu vãmente fixado pela Assembleia e não pode, por isso, discutisse agora. O que pode ainda discutir-se é isto: assente que é legítimo tributar sobrevalorizações, como hão-de estas determinar-se? Quais os critérios de tributação, etc.? É outra série de problemas que podem discutir-se a propósito dos artigos subsequentes que ainda não estão em discussão.
Mas eu realmente não tenho visto discutir senão a questão que envolve o princípio fundamental do decreto: é admissível tributar sobrevalorizações? Tem-se, pois, estado fora. do Regimento, num plano em que já não é admissível a discussão. Também eu então posso pôr-me fora do Regimento...
Porque não é legítimo tributar sobrevalorizações?
As razões essenciais, se bem as recordo, que aqui VI produzir são estas:
Não é legítimo tributar a sobrevalorização de produtos, porque à sobrevalorização no momento A pode suceder uma subvalorização no momento B, durante o mesmo exercício, e se a subvalorização absorve a sobrevalorização, não deve ser tributada, porque de outra forma estaríamos a tributar não o rendimento, mas o capital.
Suponho que pus em termos apreensíveis um dos argumentos que têm sido aqui produzidos sobre a tributação da sobrevalorização.
Diz-se então: na generalidade dos impostos isto não se passa, e assim vamos agora criar um tipo novo de tributação, que repugna aos princípios económicos.
Não conheci nunca nem conheço hoje muito de matéria tributária. Sei, no entanto, que, por exemplo, se tributam em contribuição industrial as sociedades anónimas, sem consideração de rendimentos. Sei, por exemplo, que se tributa o proprietário agrícola, sem consideração de que tenha ou não produção, de que faça ou não produzir os seus bens.
Isto para me referir só a dois dos impostos fundamentais do nosso sistema tributário. De sorte que não vejo onde é que é possível ir descobrir o tal princípio segundo o qual só se podem e devem tributar os rendimentos que foram apurados no fim do exercício.

O Sr. Melo Machado: - V. Ex.ª dá-me licença? Não se esqueça V. Ex.ª de que este imposto de que estamos tratando é um imposto por cima de todos os outros.

O Orador: - Ou ao lado de todos os outros.

O Sr. Melo Machado: - Por cima de todos os outros, porque é pago além dos outros.

O Orador: - Mas eu não vou entrar agora na apreciação desse ponto - suponho que o Sr. Melo Machado quer referir-se ao problema da duplicação do imposto -, quero apenas dizer que realmente o princípio deve ser o de tributar os rendimentos. Simplesmente, o que na nossa legislação e nas legislações em geral muitas vezes sucede é que, em vez de se fazerem incidir as taxas do imposto sobre rendimentos apurados ou declarados, se adopta o sistema indiciário, podendo o índice do rendimento ser o próprio capital, como sucede no caso já apontado da contribuição industrial.
Isto mostra que não é tão estranho, não é tão extraordinário como isso, que se procure atingir a chamada sobrevalorização sem que se esteja à espera do termo dos exercícios para, pelos resultados dos balanços das respectivas empresas, se verificar se ganharam, demais ou não e se tributar então o que fosse considerado como excesso de lucros.

O Sr. Mascarenhas Galvão: - E se perderem?

O Orador: - Perderam mesmo. E a empresa agrícola que tem ide pagar a sua contribuição e que, em consequência de um cataclismo, perde a sua colheita ? Não se pode construir nada sobre o nada.

O Sr. Carlos Mantero: - Eu suponho que o que se discute é, sobretudo, se existe ou não sobrevalorização.

O Orador: - Isso é outro problema. Eu ainda aí não cheguei. O que estava discutindo era isto: é ou não legítimo tributar a sobrevalorização?

O Sr. Carlos Borges: - Mas isso já está decidido.

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O Orador: -Pois está. Mas V. Ex.ª discutiu-o. Eu já uma vez disse a alguém numa assembleia geral (e não aqui, na Assembleia Nacional, porque não me atreveria, a tal), quando esse alguém afirmou que eu não podia falar, porque estava fora da ordem, o seguinte: quando os outros estão eu ponho-me também. Não há outra maneira de reagir. Eu sei muito bem que estou fora do Regimento, que estou a discutir um problema que não tem cabimento neste debate, mas, quando os outros se põem fora do Regimento, eu também me ponho - claro está, com vénia do Sr. Presidente.

O Sr. Carlos Borges: - Eu peço desculpa, mas não queria que V. Ex.ª fizesse essa confusão.

O Orador: - De resto, o único problema que se põe com relação ao artigo 1.º é o da legitimidade de tributar as sobrevalorizações.

O Sr. Carlos Mantero, que o discutiu assim, vem agora dizer que o põe de outra maneira...

O Sr. Carlos Mantero: - De maneira nenhuma. Mantenho o meu ponto de vista. Entendo que não se pode avaliar a matéria tributável pela forma prevista no decreto-lei nem pela forma da proposta em discussão.

O Orador: - Pode ou não saber-se, en determinado momento, se os preços dos produtos, nos mercados internacionais, são uma consequência de qualquer esforço particular da produção ou do comércio? Pode, evidentemente!

O Sr. Carlos Mantero: - Eu acho que não!

O Orador: - E, se se pode, é legítimo tributá-los, porque então estamos em presença de uma sobrevalorização que é uma mais valia autêntica, que resulta de fenómenos exteriores ao próprio esforço da produção e do comércio. Esta é uma razão evidente de tributação da sobrevalorização que ainda não foi posta aqui, se eu bem ouvi.

O Sr. Carlos Mantero: - Eu entendo que não há lugar à maior valia relativamente a preços de mercadorias vendidas em mercados funcionais onde opera a livre concorrência, porque assim como em certas alturas os preços excedem determinados níveis, noutras descem muito abaixo deles. Logo, tem de atender-se à média dos preços em prazos longos.

O Orador: - Para o meu raciocínio ficar completo falta apenas observar o seguinte: pode-se sempre, em determinado momento, com maior ou menor exactidão, fixar aquilo que, no valor do produto, representa esforço da produção ou do comércio, e o que é exterior a esse esforço.

O Sr. Carlos Mantero: - Não há medida para esse esforço.

O Orador: - Não me diga V. Ex.ª que não há medida para esse esforço, porque eu não sou comerciante nem produtor e vejo com perfeita clareza que essa medida existe.
Se, em certo momento, se sabe que certo preço que o produto atinge é fortemente compensador, podem, com base nesse preço, considerado já fortemente compensador, considerar-se outros preços maiores, mais elevados, como passíveis de tributação. Porque não assim? Não vejo como isto possa, sequer, discutir-se.

O Sr. Melo Machado: - O que se não sabe é quando esse preço resulta do esforço do produtor e quando não resulta dele.

O Sr. Botelho Moniz: - Resulta sempre do esforço do produtor e do comércio.

O Orador: - Tenho uma certeza completa de que VV. Ex.ªs não podem deixar de aderir ao desenvolvimento do pensamento que estou a pôr diante dos vossos olhos, justamente porque VV. Ex.ªs sabem que há momentos em que, na verdade, os preços dos produtos se elevam enormemente e sem que para isso tenha contribuído o esforço da produção ou do comércio.
Se não tivéssemos vivido em Portugal invadidos pelo «mercado negro», e se VV. Ex.ªs não tivessem conhecimento do que ele foi, ainda podiam duvidar do rigor das notas que estou a fazer; mas VV. Ex.ªs assistiram a tudo o que se passou.

O Sr. Carlos Borges: - E os stocks que existiam quando se declarou a guerra?

O Sr. Botelho Moniz: - Se o Estado, no momento em que o produtor está perdendo, colaborassse por qualquer forma...

O Orador: - Perdão, isso é outro aspecto da questão.

O Sr. Botelho Moniz: - Temos de chegar à conclusão de que, pelo facto de, num dado instante, o preço ser excessivo, isso não quer dizer que a média do preço seja excessiva.

O Orador: - Não se pode raciocinar assim.

O Sr. Botelho Moniz: - Não há nada que compense a produção e o comércio se a produção sofrer prejuízos.

O Orador: - Suponho que as considerações que acabo de fazer são suficientes para justificar que, na verdade, pode ser tributada a sobrevalorização.
Como se determina a sobrevalorização? E matéria que não pode ser discutida a propósito do artigo em debate, mas sim de outras disposições da proposta.
E, por agora, fico-me por aqui.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vou submeter a votação o artigo 1.º do contraprojecto da Câmara Corporativa.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Carlos Mantero (para um requerimento): - Sr. Presidente: requeiro que fique consignado no Diário das Sessões que este artigo foi aprovado por maioria.

O Sr. Mário de Figueiredo (para um requerimento):- Desejo requerer também que fique consignado que o número de votos contrários foi de quatro.

O Sr. Carlos Mantero: - Eu vi seis Srs. Deputados rejeitarem o artigo 1.º

O Sr. Mário de Figueiredo: - Pois sejam seis votos.

O Sr. Botelho Moniz: - Parece-me que o artigo 1.º foi rejeitado por sete Srs. Deputados.

O Sr. Presidente: - Creio ser útil proceder de novo à votação, para saber o número dos Srs. Deputados que rejeitaram.

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4 DE MARÇO DE 1953 753

Os Srs. Deputados que rejeitam o artigo 1.º do contraprojecto da Câmara Corporativa têm a bondade de se levantar.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Rejeitaram esse artigo oito Srs. Deputados.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 2.º, sobre o qual existe na Mesa uma proposta para a substituição do seu § 1.º
Vai ser lida esta proposta.

Foi lida. É a seguinte:

Propomos que o § 1.º do artigo 2.º tenha a seguinte redacção:

A sobrevalorização será determinada periodicamente pelo conselho técnico-aduaneiro da respectiva província, ouvidos os organismos e associações económicas designados pelo governador, e nela se tomará em conta o agravamento de impostos.

Os Deputados: Vasco Lopes Alves, Adriano Duarte Silva, Manuel Maria Múrias, Alexandre de Sousa Pinto e Castilho Serpa do Rosário Noronha.

O Sr. Mascarenhas Gaivão : - Sr. Presidente: quero dizer mais uma vez a V. Ex.ª, como já disse no ano passado, aquando da discussão do decreto, que o ano de 1949 representa um ano de depressão de preços e que, por consequência, não pode ser considerado como base para o efeito.
Pretendo declarar ainda a V. Ex.ª que dou o meu inteiro apoio à inclusão feita na proposta da Comissão do ultramar das associações económicas. Quero referir-me às associações comerciais e às associações de fomento agrícola de toda a província, as quais deverão ser ouvidas para poderem dar o seu parecer conjuntamente com os organismos económicos, ou, melhor, de coordenação económica.
Tenho dito.

O Sr. Carlos Mantero : - Uma vez que a Câmara aprovou o artigo 1.º, acato a sua decisão e procurarei dar a minha colaboração no sentido de atenuar os efeitos de uma deliberação que não posso deixar de considerar da maior gravidade.
O artigo 2.º é. pela sua importância, o artigo-chave da nova lei recomendada pela Câmara. Corporativa. Permita-se-me por isso, Sr. Presidente, que me atarde um pouco sobre ele.
Parece-me que não é de aceitar a forma vaga em que se deixa um ponto essencial: o cálculo da sobrevalorização. É evidente que, relegando para o regulamento a escolha dos elementos e o método do cálculo, ficamos todos sem saber - legisladores e contribuintes - como será aplicada a lei, em que bases será feito o cálculo da sobrevalorização. Serão aplicadas as cotações de Nova Iorque? Serão as de Lisboa? Será a cotação das alfândegas? Serão ora umas ora outras? Serão simultaneamente as cotações de diversas origens? Serão os preços C. I. F., F. O. B. ou F. A. Q.? Serão considerados os agravamentos dos custos de produção? Será considerada a desvalorização da moeda? Serão atendidas as circunstâncias peculiares de cada região e os casos particulares? É tudo impreciso. A lei não define as regras que vagamente enuncia.
Julgo, por isso, que deveria ficar expresso na lei que a comparação se fará entre as cotações C. I. F. do principal mercado comprador (entendendo-se por principal mercado comprador aquele país para onde se exporia a maior quantidade) e que a cotação do mês da exportação deverá ser corrigida, não só tomando um conta o agravamento do impostos, mas também a variação do valor da moeda o os factores do custo de produção que no regulamento fossem especificados, tais como mão-de-obra, fretes, seguros, encargos dos investimentos, etc.
É este, de resto, o espírito do decreto-lei, conformo está expresso no pequeno preâmbulo do Governo, quando diz: «Tendo em consideração o custo da produção...».
Seria também preferível, por constituir parte da definição da sobrevalorização, que no corpo do artigo ficasse integrada, a última, parte do § 1.º
A redacção do artigo 2.º e seu § 1.º passaria assim a ser a seguinte:

Art. 2.º A sobrevalorização por unidade de peso ou de volume das mercadorias submetidas ao regime instituído por esta lei determinar-se-á pela diferença entre a média anual das cotações do produto no seu principal mercado comprador relativamente a 1949 e ao mês em que se fizer a verificação, e nela se tomará em conta o agravamento dos impostos que entretanto tenha havido, a variação do valor da moeda referida no número-índice dos preços por grosso e outros elementos do custo que no regulamento forem especificados.
§ 1.º O conselho técnico-aduaneiro da respectiva- província reunirá mensalmente para verificar, ouvidos os organismos e associações económicas designados pelo Governo, se há ou não sobrevalorização e designar o seu montante.

Se os ilustres Deputados que apresentaram a proposta pudessem aceitar esta sugestão, perfilhando-a, creio que se salvaguardaria o espírito com que o Governo legislou e se acalmaria, pelo menos em parte, o justificado alarme dos contribuintes.
Não tenho nada a dizer em relação aos restantes parágrafos deste artigo, conforme constam da proposta em discussão.
Tenho dito.

O Sr. Botelho Moniz: - Sr. Presidente: de maneira geral, concordo com a exposição do Sr. Deputado que me precedeu, mas quero chamar a atenção da Assembleia para perigo enorme que representa a comparação entre preços C. T. F. É que, por efeito das variações de frete marítimo, pode acontecer que o preço C. I. F. tenha subido muito em relação ao ano de 1949, enquanto que o preço F. O. B. é inferior ou igual ao de 1949; e, então a mais valia dá-se no frete, e não no preço da mercadoria para o produtor; portanto, há que entrar sempre em linha de conta, para o cálculo da mais valia, com o frete marítimo nas épocas em que haja que o considerar.
Tenho dito.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Sr. Presidente: pedi a palavra para dizer que a questão que está posta foi discutida na Comissão do Ultramar. Esta Comissão tomou sobre ela a posição que está exteriorizada na proposta do alteração que se encontra na Mesa e fui apresentada pelo Sr. Deputado Vasco Lopes Alves.
Não posso discutir neste momento, porque isso é impossível, quando se está num debate de especialidade e prestes a entrar na votação, não posso discutir, dizia eu,

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em todos os seus pormenores a proposta sugerida pelo Sr. Carlos Mantero.
Devo, no entanto, de um modo geral, observar o seguinte: como V. Ex.ª sabe, no parecer da Câmara Corporativa expressamente se aludia às variações ou agrava mentos do misto da mão-de-obra e à desvalorização da moeda, como elementos a tomar em conta na determinação das sobrevalorizações.
Porque se entendeu dever eliminar-se essa passagem - «agravamento do custo da mão-de-obra e desvalorização da moeda».
Entendeu-se que se devia eliminar não por motivos de princípio, pois todos nós aceitamos de boa vontade que o agravamento da mão-de-obra e a desvalorização da moeda podem e devem ser considerados para efeitos de determinar o montante «da sobrevalorização.
Simplesmente isso irão é prático, isso não conduz a uma solução de certeza fiscal, e por tal motivo se procura através da alteração de outra disposição compensar o facto de não se mandar ter em conta, para efeito da determinação da sobrevalorização, o agravamento do custo da mão-de-obra e a desvalorização da moeda.
Procurou, por isso, organizar-se um sistema prático que, de alguma maneira, conduzirá as coisas à mesma solução a que se seria conduzido se se atendesse ao agravamento da mão-de-obra e à desvalorização da moeda.
Uma proposta que está na Mesa conduz a essa solução, porque não considera para efeito da incidência da taxa todo o montante da sobrevalorização, mas apenas 80 por cento dela.
De resto, tratando-se de territórios geogràficamente separados uns dos outros, com economias diferentes, é de admitir que as oscilações da mão-de-obra e as oscilações do valor da moeda possam ser aí também diferentes.
Mas tudo isto poderia considerar-se se em todas as províncias houvesse elementos objectivos precisos a que recorrer para determinar o quantitativo do aumento do custo de vida ou do aumento da mão-de-obra e da desvalorização da moeda.
A verdade, porém, é que os não há, pelo menos em todas as províncias e os que há em alguma, ou em algumas províncias, não atingem aquele grau de segurança que possa permitir-nos que os adoptemos como base para sobre eles construir qualquer sistema.
Aqui tem V. Ex.ª, Sr. Presidente, as razões por que a Comissão eliminou da redacção da Câmara Corporativa estas palavras finais: «custo da mão-de-obra e desvalorização da moeda». É que se entendeu que elas seriam, na determinação da sobrevalorização, um elemento que não consentiria que se chegasse a qualquer resultado.
É claro, pode dizer-se: mas é que a desvalorização da moeda e o aumento do custo da mão-de-obra podem ser tais que anulem toda a sobrevalorização e até representem de facto um prejuízo.
Não há dúvida nenhuma de que isso é possível.
Isso, porém, acontece em períodos longos, e não no recurso de um ano, como no artigo 3.º se diz:

Art. 3.º É autorizado o Ministro do Ultramar a tributar a sobrevalorização das mercadorias produzidas o exportadas pelas províncias ultramarinas, não devendo a taxa exceder 50 por cento das sobrevalorizações.

O Ministro, que naturalmente não vive fora das realidades do Mundo, e, designadamente, o Ministro do Ultramar não vive curta mente fora das realidades do ultramar, tem sempre na mão a disposição do artigo 3.º, que lhe permite estabelecer: este ano a taxa de 50 por cento, de 40 por cento, de 10 por cento, ou não existe mesmo, porque as cotações dos produtos sobre os quais há-de incidir a tributação não permitem que sobro eles se aplique qualquer tributação, dados o custo da mão-de-obra ou a desvalorização da moeda.
De sorte que, Sr. Presidente, eu não vejo nenhuma razão suficientemente forte para se buscar, nesta altura do debate, uma solução diferente daquela que está prevista no contraprojecto da Câmara Corporativa e na proposta de alteração apresentada pelo Sr. Deputado Lopes Alves. Não vejo, confesso.

O Sr. Lopes Alves: - Sr. Presidente: a primeira ideia que, naturalmente, surge ao procurar-se o encontro duma forma de calcular o valor da taxa em relação à sobrevalorização é a da exactidão do cálculo. Por consequência, é natural que apareça - a mim próprio apareceu - a ideia de se irem buscar todos os factores que influam sobre a sobrevalorização, não se desprezando, porém, nem o custo da mão-de-obra, nem a desvalorização da moeda, nem o custo dos transportes. nem, dentro de certos limites, a evolução geral dos preços, que, limitando a sobrevalorização, faz com que parte dos lucros que provêm dela tenha de ser empregada noutras coisas que, por qualquer forma, a diminuem.
Mas a verdade é que todos esses elementos, para serem reduzidos a uma fórmula, dão um trabalho praticamente inexequível, e a questão foi, a meu ver, resolvida duma forma muito mais simples, e que de resto já está experimentada: pela audição dos organismos económicos, que deverão levar perante quem governa todos os elementos, de modo a que a taxa possa ser calculada com o rigor possível.
A outra circunstância que pode levar ainda a proteger suficientemente o cálculo da tributação é a interferência do Ministro do Ultramar, o qual, além do mais, pode dar uma uniformidade de critérios para os vários territórios.
Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Visto mais nenhum Sr. Deputado desejar fazer uso da palavra, vai votar-se o corpo do artigo 2.º tal como consta do contraprojecto da Câmara Corporativa.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se a proposta de substituição do § 1.º, assinada pelos Srs. Deputados Lopes Alves, Duarte Silva e outros, da qual a Câmara já tem conhecimento.

Submetido à votação, foram aprovados.

O Sr. Presidente: - Vão votar-se os §§ 2.º e 3.º do artigo 2.º tais como constam do contraprojecto da Câmara Corporativa.

Submetida à votação, foram aprovados.

O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão.
A discussão continuará na sessão de amanhã e para segunda parte da ordem do dia marco a efectivação do aviso prévio do Sr. Deputado Paulo Cancela de Abreu sobre a execução da lei de amnistia.
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 30 minutos.

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Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

António Carlos Borges.
António Joaquim Simões Crespo.
Artur Proença Duarte.
João Mendes da Costa Amaral.
Joaquim Mendes do Amaral.
Jorge Botelho Moniz.
Manuel Maria Múrias Júnior.
D. Maria Baptista dos Santos Guardiola.
D. Maria Leonor Correia Botelho.
Mário Correia Teles de Araújo e Albuquerque.
Pedro de Chaves Cymbron Borges de Sousa.
Sebastião Garcia Ramires.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Abel Maria Castro de Lacerda.
Alberto Cruz.
António Cortês Lobão.
António Pinto de Meireles Barriga.
António Raul Galiano Tavares.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Rodrigues Marques de Carvalho.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Avelino de Sousa Campos.
Carlos de Azevedo Mendes.
Carlos Vasco Michon de Oliveira Mourão.
Daniel Maria Vieira Barbosa.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Jaime Joaquim Pimenta Prezado.
João Carlos de Assis Pereira de Melo.
João Cerveira Pinto.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim de Moura Relvas.
Joaquim dos Santos Quelhas Lima.
José Cardoso de Matos.
José Pinto Meneres.
Luís Filipe da Fonseca Morais Alçada.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel Marques Teixeira.
Manuel de Sousa Meneses.
Miguel Rodrigues Bastos.
Tito Castelo Branco Arantes.
Vasco de Campos.

O REDACTOR - Leopoldo Nunes.

IMPRENSA NACIONAL. DG LISBOA

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