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10 DE DEZEMBRO DE 1953 40-(7)

e, em contrapartida, quando esta bruscamente determina oscilação de vulto na política orçamental, a perturbação causada em tão vasto domínio pode abalar os fundamentos da segurança e progresso nacionais.
Não é fácil de dizer até que ponto uma tão profunda transformação operada na doutrina financeira vem dos males do mundo. O pior talvez ainda sejam os variados males que a doutrina, embora firmada no génio inovador, mas traduzida em vulgar no mundo político por inesperadas facilidades de gasto, pode trazer consigo. É assim que, por deturpada derivação de muitos, não lhes basta, para além do equilíbrio das contas públicas, visar o equilíbrio económico: querem contabilizá-lo, como se contabiliza o orçamento do Estado Pretende aproveitar-se-lhe, talvez perigosamente, a virtude e o mérito do nome ... e chama-se à tentativa penosamente arquitectada de equilibrar a prazo longo ou prazo incerto bens e serviços com necessidades - orçamento nacional. Até aqui, em todo o caso, empresa meritória. Mas não se limita o propósito a uma extensão um tanto arriscada do sistema preciso e claro das contas do Estado. Sacrifica-se ao equilíbrio conjecturado do orçamento nacional o próprio equilíbrio das contas públicas. Portugal, por felicidade, tem-se sistematicamente recusado a ler por essa cartilha.

12. Antes de considerar os embaraços atinentes ao exame da conjuntura e vindos da vertiginosa mutabilidade que desde a última guerra caracteriza a evolução económica do mundo, atentemos, porém, ainda em três pontos que prèviamente se nos apresentam como dominando o debate que neste momento se pode abrir.
1) O primeiro ponto vem justamente do que dissemos já e tem o valor de interessar, através do caso português, à própria fixação da doutrina.
Perante as possibilidades consideráveis do País. deverá, para se defender o equilíbrio do orçamento o as pretensas finanças clássicas, sacrificar-se ou demorar-se investimentos de primeira importância, quer dizer, os que vão actuar substancialmente sobre a economia nacional e promover os progressos decisivos? Deve-se prolongar, em nome desse equilíbrio, o período de privação do essencial, de carestia até, dado que se vai pagar mais caro o que a tempo, por não se haver investido, se não produziu em melhores condições de preço? Numa palavra, a quem devo ser dada a precedência, ao País ou ao orçamento?
A questão, para nós mal posta, é muitas vezes posta assim.
Dois caminhos para investir só apresentam à nossa escolha: ou investir sem prejuízo das finanças sãs, para edificar sobre elas, ou, com o pretexto de ir ao mais apressado (e quantas vezes ao mais vistoso), investir sem outra preocupação que não seja a de fazer investimentos ... admitamos até que os mais recomendáveis, os mais reprodutivos. Pouco importa, dir-se-á, o desequilíbrio orçamental ... Não será isto construir sobre a areia? Ponhamos o caso em Portugal, que melhor o esclarece. Uma tal prática depressa nos conduziria à instabilidade monetária e ao enfraquecimento do crédito: quer dizer, a comprometer os elementos com os quais capitalmente é preciso contar para investir. Depressa se desceria o perigoso declive.
Uma vez comprometido o equilíbrio orçamental, já se não pára fàcilmente. A desconfiança, faz andar mais depressa do que a confiança. É que a primeira precipita a descida; a segunda apenas ajuda a subir. Singular desacerto! Quando acordássemos e quiséssemos arrepiar caminho, teríamos, na melhor hipótese, de tornar a vencer as dificuldades já vencidas ... para chegar outra vez à situação em que nos encontramos. Como perder de vista - da nossa vista nele concentrado- um ponto de referência que nada substitui como garantia da Administração? Não basta falar em Lord Beveridge. Será bom traduzi-lo do inglês. E quando ele fala na imoderada necessidade de gastar, talvez valha melhor, pelo menos, para mais de um país meridional e onde são aprazíveis os excesso, dizer-lho então, como aqui felizmente se tem dito, que as nações como os homens não devem viver acima das suas possibilidades. Está hoje a dizer-se o mesmo noutros países. Mas um pouco tarde.
2) O segundo ponto tom o valor da actualidade. Não se tem dito que o planismo vem necessariamente pôr de parto as regras orçamentais, designadamente a da anualidade? Todos reconhecem as dificuldades de manter integras algumas dessas velhas regras em países onde o planismo tem outra extensão e a aprovação do orçamento obedece a outros requisitos constitucionais. Mas aí mesmo se estão intentando esforços vários para não pôr de parte o que possa ser salvo e importa salvar de orgânica nascida em França, com os excelsos financeiros da Restauração, há bem mais de cem anos, e que foi por toda a parte preciosa defesa contra desregramentos ... ainda maiores.
Em Portugal, felizmente, o problema não tem acuidade. O mesmo já aconteceu com a Lei de constituição Económica (Lei n.º l 914, de 24 de Maio de 1935): embora nos quinze anos da sua vigência se gastassem cerca de 13, em vez dos 6,5 milhões de contos previstos, nem o equilíbrio mem as regras orçamentais, passadas à Constituição, sofreram qualquer atropelo. A Lei de Reconstituição Económica representa decerto um ensaio, embora feliz, em relação ao Plano de Fomento. Mas no Plano de Fomento, apesar de outra consistência, nada existe, por sua voz, que possa afectar o equilíbrio orçamental, há um quarto de século convertido em pedra de toque da nossa política financeira o sempre inflexível e triunfantemente mantido, sem uma só interrupção.
Em qualquer ano da execução do Plano nenhum gasto se poderá sobrepor ao equilíbrio orçamental.
As previsões, verdade seja. foram feitas com a cautela necessária para tornar a colisão improvável.
3) O terceiro ponto vale para defesa contra fáceis equívocos. O contágio porventura activado pela entrada do País para os grandes organismos de cooperação internacional levou a uma produção de dados numéricos sem precedente entre nós. Ainda não chegámos à profusão alheia: é inconcebível o que vai pelo mundo em números escritos sobe o papel por milhares de organizações empenhadas no desempenho dessa tarefa, para elas, tantas vezes, prova de existência e atestado de comportamento. Mas parece-nos tempo do acolher, pelo menos com a devida reserva, improvisações - representativas, aliás, de tentativas meritórias, mas baseadas sobre notações estatísticas incipientes e que só devem merecer crédito quando ... envelheçam um pouco.
Há dias ainda, um homem de letras considerado - o Sr. Jules Romain - deu liberdade à sua cólera para fulminar um bem pequenino opúsculo, de vinte e oito páginas, editado pelo Ministério das Finanças francês, intitulado Método do estabelecimento das contas provisórias da nação e dos orçamentos económicos. O considerado escritor não teve em linha do conta o intento vulgarizador do Ministério. E com uma linguagem dissonante do seu grémio, o académico verbera o livrinho como «uma falsa ciência e um charlatanismo do Estado, destinado a, servir qualquer tirania, da direita ou da esquerda...», que teria ai um excelente instrumento de arbitrário domínio.
Não fazemos nossas as palavras do Sr. Jules Romaim.
Mas não renegamos o que, antes de as referir, dissemos por nossa conta. Há estimativas que obedecem