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25 DE FEVEREIRO DE 1964 545

O Sr. Alberto Cruz: - Sr. Presidente: na sessão de 29 de Janeiro findo requeri às entidades competentes que me fornecessem uns esclarecimentos que desejava, respeitantes ao fornecimento de sopas e pão aos pobres de Lisboa.
A resposta a esse requerimento chegou já há dias, emanada do gabinete do ilustre Subsecretário da Assistência, conforme o carimbo aposto, e assinada pelo mesmo, Exmo. Sr. Dr. Ribeiro Queirós.
Desejo, pois, agradecer a rapidez com que foi atendido e fazer algumas considerações acerca do conteúdo do documento em questão.
Para que V. Ex.ª, Sr. Presidente, e os ilustres Deputados possam esclarecer-se devidamente, peço também a V. Ex.ª a graça de mandar inserir no Diário das Sessões, antes da transcrição das minhas palavras, o documento que origina esta minha intervenção.
A primeira e a mais importante das quatro perguntas formuladas foi esta: porque é que foram encerradas as cozinhas da Misericórdia que forneciam dopa e pão aos pobres? Resposta de S. Ex.ª a esta primeira pergunta: as cozinhas da Misericórdia que forneciam sopa e pão aos pobres não foram encerradas, e, logo adiante, diz que só foram encerradas as Cozinhas Económicas e as sopas de Caridade.
As Sopas dos Pobres até foram aumentadas substancialmente.
Isto vem escrito no primeiro capitulo da resposta que encerra mais três capítulos.
Ora no fim do primeiro capitulo vêm umas frases que desejo esclarecer, por as julgar ofensivas da minha dignidade de homem e de Deputado da Nação, que, no pleno uso das faculdades fiscalizadoras que a lei confere e do que nunca abdiquei nem abdico, e com a independência que usufruo nesta Assembleia, igual à que usufruem todos os seus membros sem excepção, pedia para ser esclarecido e não pediu mais nada.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - A tradução dessas frases é esta: ou fui ludibriado por informadores pouco ilustrados ou servi de intermediário para especulações mal intencionadas.
O ilustre subscritor da resposta enviada não é obrigado a conhecer-me e, por isso, pode fazer da minha inteligência o conceito que quiser que nenhuma perturbação dá aos órgãos da minha economia. Mas já outro tanto se não dá com a segunda hipótese posta, que implica com a minha dignidade, e essa não permito eu a ninguém que a belisque sem que lhe sofra as consequências.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Para esclarecer as pessoas que se julgam atingidas pelo meu requerimento vou explicar a razão da sua apresentação. No mesmo dia em que formulei aqui o pedido de esclarecimento encontrava-me num ponto da periferia da cidade aguardando transporte para o centro da mesma.
Junto de mim conversavam dois homens pobremente vestidos e que se queixavam amargamente de lhes terem tirado a regalia de, por pouco dinheiro, compatível com os seus ganhos, se fornecerem de sopa e pão nas cozinhas da Misericórdia, onde se abasteciam há anos, e que tinham fechado não sabendo por ordem de quem, nem as razões desse encerramento.
Ouvi atentamente essas lamentações, fingindo-me alheio à conversa, e resolvi colher informes imediatos.
Consegui saber que em 7 de Fevereiro de 1952 o ilustre Subsecretário de Estado da Assistência Social deu um despacho mandando estudar a forma de passarem
a funcionar as cozinhas metade em actividade de culinária e a outra metade somente na distribuição das refeições.
Feito esse estudo mandou encerrá-las e, por despacho de 9 de Junho do mesmo ano de 1952, determinou que, em coordenação com os serviços da Fundação Nacional para a Alegria no Trabalho e da Legião Portuguesa, e em novas bases, se estudasse a reorganização das cozinhas da Misericórdia, fixando-se-lhes a localização que mais conviesse.
Já lá vão quase dois anos e nada foi feito para substituir o que foi extinto, embora se diga na resposta enviada que vários organismos burocráticos, como o Instituto de Assistência à Família, aumentaram os subsídios que normalmente distribuíam e outros, como a Fundação Nacional para a Alegria no Trabalho e a Legião Portuguesa, estão a estudar o assunto.
Sr. Presidente: eu perguntei porque é que foram encerradas as cozinhas da Misericórdia que forneciam sopa e pão a pobres, não lhes chamei «Sopa dos Pobres» nem disse que as refeições eram fornecidas gratuitamente.
As cozinhas a que me queria referir foram efectivamente encerradas em princípios de 1952, e até esta data não foram substituídas, embora S. Ex.ª me informe que as cozinhas que forneciam sopas e pão aos pobres não foram encerradas e que só o foram as Cozinhas Económicas e as Sopas de Caridade.

O Sr. Amaral Neto: - Consta que esse encerramento prejudicou milhares, senão dezenas de milhares de pobres e necessitados.

O Orador:- Tem V. Ex.ª razão.
Sr. Presidente: não venho fazer a análise do documento enviado, mas não posso deixar sem leves reparos algumas das afirmações contidas nos seus quatro capítulos. Uma delas é de que constituíam pesado encargo para a Misericórdia, por os preços das refeições serem inferiores aos do seu custo. Se este argumento
pudesse ser levado ao conhecimento da Augusta Rainha D. Leonor, que em hora de inspiração divina fundou as Misericórdias, como sentiria a Excelsa Senhora amargurado o seu coração por ver deturpadas as suas caritativas intenções.
Julgo que no cérebro e no coração dessa rainha só germinou a ideia de a Misericórdia dar saúde física e moral aos Portugueses e que não a instituiu somente para dar a «taluda» todas as semanas.
Outro argumento é de que os mecanismos culinários estavam antiquados e servidos por combustíveis de elevado custo. Outro argumento infeliz, pois bastava gastar alguns milhares de escudos na sua modernização, dinheiro aliás bem empregado, sabendo nós todos como muitas vezes se gastam somas em pura perda ou sem proveito de ninguém.
Outro argumento era o das irregularidades cometidas em todas as cozinhas, que deram origem a inquéritos ainda em curso e que se presume muito complicados, ou feitos por pessoas com um horário de trabalho muito restrito, notando-se que as cozinhas estão fechadas já há dois anos.
Que falta de fiscalização por lá ia e como estavam a ser administradas, que nem uma se salvou, segundo a resposta que recebi! Este argumento ainda é mais infeliz, pois se algum ou alguns ou até todos os funcionários de uma repartição prevaricarem, não é costume fechar-se a repartição, mas sim substituí-los e meter na cadeia os delinquentes. Parece-me ser este o critério adoptado até hoje.
Ainda outro argumento, e com este fecho a análise da argumentação apresentada: é de que estavam condenados três dos cinco edifícios onde estavam instaladas