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REPUBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL
DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 64
ANO DE 1955 12 DE JANEIRO
ASSEMBLEIA NACIONAL
VI LEGISLATURA
SESSÃO N.º 64, EM 11 DE JANEIRO
Presidente: Ex.mo. Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior
Secretários: Ex.mos. Srs.
Gastão Carlos de Deus Figueira
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues
Nota. - Foram publicados dois suplementos ao Diário das sessões n.º 6; inscrindo: o 1º o texto da Comissão de Legislação e Redacção, do decreto da Assembleia Nacional sobre autorização de receitas e despesas para 1995, e 2º, o texto da reabertura da Assembleia Nacional.
SUMARIO:- Sr. Presidente, declarou aberta a sessão às 17 horas.
Antes da ordem do dia. - Foram aprovados os n.º 62 e 63 do Diário das Sessões, com rectificaras, quanto a este último, dos Srs. Deputados Santos Bessa e Galiano Tavares.
Deu-se conta do expediente..
O Sr. Presidente informou estar na Mesa o parecer da Câmara Corporativa acerca do Protocolo adicional ao Tratado do Atlântico Norte para acessão da República Federal Alemã.
Foram recebidos na Mesa os elementos fornecidos pelo Ministério da Economia em satisfação de requerimentos do Sr. Deputado Pinto Barriga.
Também foram recebidos na Mesa os elementos fornecidos pelo Ministério das Corporações em satisfação de um requerimento do Sr. Deputado Santos da Cunha, que foram entregues a este Sr. Deputado.
Receberam-se da Presidência do Conselho os esclarecimentos prestados pela Junta da Marinha Mercante em satisfação de um requerimento do Sr. Deputado Pinto Barriga, elementos que foram entregues a este Sr. Deputado, e ainda os elementos fornecidos pelo Ministério das Corporações em satisfação de um requerimento do Sr. Deputado Furtado Mendonça, a quem foram entregues.
Em satisfação de um requerimento do Sr. Deputado Manuel Paz receberam-se na Mesa, enviados pela Presidência do conselho, elementos do Ministério dos Negócios estrangeiros, que foram entregues àquele Sr. Deputado.
Foram recebidos elementos através da Presidência do Conselho, fornecidos pelo Ministério da justiça, esclarecendo afirmações do Sr. Deputado João Valença.
Na Mesa receberam-se, enviados pela Presidência do Conselho, o texto e a proposta de aprovação do Acordo Cultural Luso-Britânico, recentemente assinado, que vão baixar à Comissão de Negócios Estrangeiros a ser remetidos à Câmara Corporativa para que emita o seu parecer.
Foi negada autorização para o Sr. Deputado António Felgueiras depor pela Presidência do conselho, para os efeitos do § 3.º do artigo 109.º da constituição, os n.os.273(suplemento),274,277,282,283,284,288,290 e 291 do Diário do Governo do ano findo e os n.os. 1 e 2 do ano corrente, contendo os Decretos-Leis n.os. 39957,39939,39963,39971,39974,39975,39976,39978,39979,39982,39983,39992,39993,39997,39998,39999,40010,40011,40025,40026.
O Sr. Presidente referiu-se à cixila que o Chefe de estado fizera à Assembleia em l do corrente retribuindo os cumprimentos apresentados no Palácio de Belém, e às comemorações levadas a efeito pela Câmara Corporativa solenizando a vigésimo aniversário da sua criação.
Igualmente se referiu ao falecimento do antigo Deputado Froilano de Melo, concedendo a palavra ao Sr. Deputado Mendes Correia, que recordou a vida daquele parlamentar e cientista; sobre o mesmo assunto falou o Sr. Deputado Castilho de Noronha: o Sr. Deputado Cerceira Pinto anunciou um aviso prévio fomento piscícola e pesca fluvial; o Sr. Deputado Santos Bessa falou sobre a sua última intervenção a propósito de considerações do Sr. Deputado Manuel Vaz proferidas numa das últimas sessões: sobre assuntos de interesse para o distrito do Porto usou da palavra o Sr. Deputado Daniel Barbosa; o Sr. Deputado Elísio Pimenta referiu-se à necessidade de intensi
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ficar a luta antituberculona; o Sr. Deputado Pacheco Jorge usou da palavra para, na sua qualidade de Deputado por Macau, se associar à atitude de todos os bons portugueses perante a questão da Índia: o Sr. Deputado Pinto Barriga enviou para a Mesa Requerimentos: os Sr. Deputado Teixeira de Sousa congratulou-se com a anunciada abertura do concurso para as obras de ampliação do porto do Funchal.
O Sr. Presidente declarou encerrada a sessão às 19 horas de 30 minutos.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Eram 17 horas.
Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Abel Maria Castro de Lacerda.
Adriano Duarte Silva.
Agnelo Orneias do Rego.
Alberto Pacheco Jorge.
Albino Soares Finto dos Heis Júnior.
Alexandre Aranha Furtado de Mendonça.
Alfredo Amélio Pereira da Conceição.
Amândio Rebelo de Figueiredo.
Américo Cortês Pinto.
André Francisco Navarro.
Antão Santos da Cunha.
António Abrantes Tavares.
António de Almeida.
António de Almeida Garrett.
António Augusto Esteves Mendes Correia.
António Bartolomeu Gromicho.
António Calheiros Lopes.
António Camacho Teixeira de Sousa.
António Carlos Borges.
António Cortês Lobão.
António Júdice Bustorff da Silva.
António Pinto de Meireles Barriga.
António da Purificação Vasconcelos Baptista Felgueiras.
António Raul Galiano Tavares.
António Rodrigues.
António Russell de Sousa.
António dos Santos Carreto.
Artur Proença Duarte.
Augusto Cancella de Abreu.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Baltasar Leite Rebelo de Sousa.
Caetano Maria de Abreu Beirão.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos de Azevedo Mendes.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Carlos Vasco Michon de Oliveira Mourão.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Daniel Maria Vieira Barbosa.
Eduardo Pereira Viana.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco Eusébio Fernandes Prieto.
Gaspar Inácio Ferreira.
Gastão Carlos de Deus Figueira.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Herculano Amorim Ferreira.
João Alpoim Borges do Canto.
João Ameal.
João da Assunção da Cunha Valença.
João Carlos de Assis Pereira de Melo.
João Cerveira Pinto.
João Luís Augusto das Neves.
João Mendes da Costa Amaral.
João de Paiva de Faria Leite Brandão.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim de Moura Relvas.
Joaquim de Sousa Machado.
Jorge Botelho Moniz.
José Dias de Araújo Correia.
José Garcia Nunes Mexia.
José Maria Pereira Leite de Magalhães e Couto.
José dos Santos Bessa.
José Sarmento Vasconcelos e Castro.
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Luís de Azeredo Pereira.
Luta Filipe da Fonseca Morais Alçada.
Luís Maria Lopes da Fonseca.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel Marques Teixeira.
Manuel Monterroso Carneiro.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Manuel Trigueiros Sampaio.
D. Maria Leonor Correia Botelho.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Reis.
Mário Correia Teles de Araújo e Albuquerque.
Mário de Figueiredo.
Miguel Rodrigues Bastos.
Paulo Cancella de Abreu.
Pedro Joaquim da Cunha Meneses Pinto Cardoso.
Ricardo Malhou Durão.
Ricardo Vaz Monteiro.
Rui de Andrade.
Sebastião Garcia Ramires.
Teófilo Duarte.
Tito Castelo Branco Arantes.
Venâncio Augusto Deslandes.
O Sr. Presidente: -Estão presentes 89 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 17 horas.
Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente: - Estilo em reclamação os n.º 62e 63 do Diário das Sessões.
O Sr. Santos Bessa: - Sr. Presidente: pedi a palavra para fazer algumas correcções ao Diário das Sessões n.º 03. Limitar-me-ei às duas mais importantes.
A primeira é a que respeita a uma lamentável troca da palavra «instituição» pela de «Constituição», donde resulta que o Diário me atribui a afirmação de que o trabalho dos nossos dispensários era de tal modo deficiente que comprometia a reputação desta última!... Ora, Sr. Presidente, o que poderia comprometer-se era a reputação da própria instituição dispensários. Foi isto o que eu disse.
A segunda é ama passagem que se refere à actividade do Dispensário Antituberculoso de Bruxelas: eu não disso que os 49 907 exames radioscópicos diziam respeito a «crianças entro os 2 e os 5 anos e os 16 anos», como ali está escrito, mas sim a «crianças entre os 2,5 e os 16 anos».
O Sr. Galiano Tavares: - Sr. Presidente: no requerimento que fiz quanto às Casas do Povo, e que vem publicado no Diário das Sessões n.º 63, p. 237, col. 1.ª, atribui-se como sendo o mesmo feito ao Ministério das Comunicações, quando é certo que ele fui dirigido, como aliás não podia deixar de ser ao Ministério das Corporações.
Pausa.
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O Sr. Presidente: Como mais nenhum Sr. Deputado pediu a palavra, considero aprovados os Diários das Sessões n.os. 02 e 63, com as rectificações apresentadas.
Vai ler-se o
Expediente Telegramas
Vários, 1 felicitar a Assembleia Nacional pelo seu vigésimo aniversário.
O Sr. Presidente: - Está na Mesa o parecer da Câmara Corporativa acerca do Protocolo adicional ao Tratado do Atlântico Norte para acessão da República Federal Alemã.
Este Protocolo já tinha sido mandado baixar à Comissão dos Negócios Estrangeiros e vai agora também baixar à Comissão de Defesa Nacional.
Peço a atenção destas Comissões para a urgência deste assunto, pedida pelo Governo, e que determinou ter-se lixado o prazo de quinze dias para a Câmara Corporativa dar o sen parecer, a fim de, logo que seja possível, o referido Protocolo poder ser marcado para ordem do dia.
Estão na Mesa os elementos fornecidos pelo Ministério da Economia em satisfação do requerimento apresentado na sessão de 24 de Março último pelo Sr. Deputado Pinto Barriga.
Também se encontram na Mesa os elementos fornecidos pelo Ministério da Economia em satisfação do requerimento apresentado pelo mesmo Sr. Deputado na sessão de 13 de Dezembro, com a informação de que no mesmo Ministério se encontram à disposição do mesmo Sr. Deputado vários documentos ou dados referidos, que. por intensa aglomeração de trabalhos, não foi possível fornecer em prazo útil. Esses documentos podem ser consultados na Comissão de Coordenação Económica.
Os documentos enviados vão ser entregues àquele Sr. Deputado.
Encontra-se na Mesa uma nota esclarecedora elaborada pela Administração-Geral da Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência acerca da matéria da intervenção do Sr. Deputado Sousa Rosal ocorrida no período durante a ordem do dia de uma das últimas sessões desta Câmara. Essa nota vai ser entregue ao mesmo Sr. Deputado.
Também se acham na Mesa os elementos fornecidos pelo Ministério das Corporações em satisfação do requerimento apresentado na sessão de 24 de Março último pelo Sr. Deputado Antão Santos da Cunha. Vão ser entregues a este Sr. Deputado.
Enviadas pela Presidência do Conselho estão na Mesa as informações prestadas pela Junta Nacional da Marinha Mercante e pelos delegados do Governo junto dos organismos do pescas e do Grémio dos Armadores da. Marinha Mercante em satisfação do requerimento apresentado na sessão de 13 de Dezembro pelo Sr. Deputado Pinto Barriga e ainda os elementos fornecidos pelo Ministério das Corporações satisfazendo o requerimento apresentado na sessão de 24 de Março pelo Sr. Deputado Furtado de Mendonça.
Estes elementos vão ser entregues a estes Srs. Deputados.
Pela Presidência do Conselho, em satisfação de um requerimento apresentado pelo Sr. Deputado Manuel Vaz, foi enviada cópia do ofício n.º 274 da Direcção - Geral dos Negócios Económicos e Consulares do Ministério dos Negócios Estrangeiros. Vai ser entregue a este Sr. Deputado.
Enviado pela Presidência do Conselho, está na Mesa ura oficio em que só informa o Sr. Deputado João Valença, a propósito de numa das últimas sessões da Assembleia Nacional ter chamado a atenção do Ministério da Justiça para a necessidade de regulamentar com urgência a Lei n.º 2030, na parte relativa à chamada propriedade horizontal ou propriedade por andares, de que, segundo comunicação recebida daquele Ministério, se encontra já em elaboração um projecto do referido regulamento, a publicar com a maior brevidade possível.
Também enviados pela Presidência do Conselho, estão na Mesa o texto e a proposta de aprovação do Acordo Cultural Luso-Britânico, recentemente assinado.
Vão baixar à Comissão dos Negócios Estrangeiros e ser enviados à Câmara Corporativa para esta dar o seu parecer.
Pelo tribunal judicial da comarca de Monção foi pedida autorização para a comparência naquele tribunal do Sr. Deputado António Felgueiras.
Informo a Câmara de que o Sr. Deputado António Felgueiras julga inconveniente para a sua actividade parlamentar depor como testemunha, não só por esta razão como ainda por se encontrar impedido de o fazer, em virtude de ter sido juiz. daquela comarca.
Vou consultar a Assembleia sobre se concede ou não a autorização pedida.
Consultada a Assembleia fui rejeitada a concessão da autorização pedida.
O Sr. Presidente: - Enviados pela Presidência do Conselho para efeitos do § 3.º do artigo 100.º da Constituição, encontram-se na Mesa os n.os. 273 (suplemento). 274, 277, 282, 283, 284, 288, 290 e 201 do Diário do Governo do ano findo e l e 4 do mês corrente, que inserem os decretos-lei n.os. 39 957, 39 959. 39 963, 39 971, 39 974, 39 975, 39 976, 39 978, 39 979, 39 982, 39 983, 39 992, 39 993, 39 997, 39 998, 39 999, 40 010, 40 011, 40 025 e 40 026.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Sabe a Câmara que em seu nome tive a honra de apresentar ao Sr. Presidente da República, no dia de Ano Bom, em Belém, os cumprimentos e os nossos mais ardentes votos pelas prosperidades pessoais e políticas de S. Ex.a. no novo ano. O Chefe do Estado teve a gentileza de vir pessoalmente a esta Casa retribuir os cumprimentos da Assembleia.
A alocução do Chefe do Estado e a que em resposta dirigi a S. Ex.a. serão publicadas no Diário das Sessões.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Sabe também que a Câmara Corporativa celebrou ontem o vigésimo aniversário da sua actividade, iniciada simultaneamente com a desta Assembleia Nacional em 10 de Janeiro de 1930. O facto a que a Câmara Corporativa deu justo relevo não podia, pela sua importância política, passar indiferente a esta Assembleia, nem deixar de ficar anotado nas suas actas.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Sr. Presidente: - Ninguém como a Assembleia Nacional pode prestar um depoimento e emitir um juízo de valor sobre a actividade e os trabalhos da Câmara Corporativa, visto que a maior parte dos seus pareceres têm sido objecto da apreciação dos dignos Deputados. E creio interpretar o pensar da Assembleia afirmando que muitos desses trabalhos são notáveis e, no seu conjunto, constituem um documento irrefragável do seu esforço em prol do País e do seu contributo utilíssimo ao labor legislativo da Assembleia Nacional.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
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O Sr. Presidente: - Já ontem, por telegrama, felicitei, na pessoa do seu digno Presidente, a Câmara Corporativa. Renovo hoje, em nome da Assembleia, as nossas felicitações e exprimo os melhores votos por que as esperanças de que falou o Sr. Presidente daquela Câmara desapareçam por se transformarem em realidades.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Sr. Presidente:-Exprimo ainda os nossos desejos de que a vida corporativa se afirme e se intensifique. Sem espirito e sem vida corporativa não se vê como possam radicar-se na consciência do País instituições que tom de ser a sua expressão jurídica e constitucional.
Vozes: - Muito bera, muito bem!
O Sr. Presidente:-Pelos jornais deve a Câmara ter tido conhecimento de que faleceu, em S. Paulo, o antigo Deputado a esta Assembleia Sr. Dr. Indalêncio Froilano de Melo.
Porque a Câmara desejará assinalar na acta de hoje o falecimento daquele antigo membro desta Assembleia, dou a palavra ao Sr. Deputado Mendes Correia.
O Sr. Mendes Correia: - Sr. Presidente: muito me comoveu esta manhã a notícia da morte de Froilano de Melo no Brasil.
Desapareceu com ele uma grande figura indo-portuguesa, que foi também uma grande figura científica internacional.
Desapareceu, porém, igualmente um excelente amigo e companheiro meu, com quem desde os bancos da escola tive o mais cordial e grato dos convívios.
A sua permanência, mais tarde, na índia durante longos anos não nos afastou, porque mantivemos sempre um intercâmbio de trabalhos, e nenhum de nós esqueceu a afectuosa camaradagem escolar de 1911, quando eu finalizava o curso médico na Faculdade de Medicina do Porto e ele, diplomado pela Escola Médico-Cirúrgica de Nova Goa, vinha repetir naquela Faculdade os seus exames.
Nunca esfriou a nossa amizade, renovada, aliás, nalguns encontros por ocasião de visitas suas à metrópole, e, ainda na penúltima legislatura, quando nos encontrámos juntos nesta Câmara, onde não faltam hoje colegas que se recordam, com saudade, do convívio aberto e franco de Froilano de Melo, das suas intervenções numerosas, sempre inspiradas no seu dedicado amor pela cultura e pela indestrutível solidariedade entre os bons Portugueses da índia e os do Mundo inteiro.
Vozes: - Muito bem!
O Orador:-Todos os que estivemos aqui com Froilano de Melo lembramos com saudade a sua personalidade, que se traduzia na claridade dos seus grandes olhos, na sua figura inconfundível, de tipo atarracado, de barbas ondeando e projectadas para a frente quando falava, erguendo o mento e lançando para trás a cabeça, a sua figura, repito, que era toda bonomia, confiança, galhardia, franqueza.
Não emudeceu, porém, de vez a sua palavra fluente e clara, sem antes, do Brasil - para onde fora viver com sua mulher e filhos e onde trabalhava no Instituto Biológico de S. Paulo -, fazer, a propósito dos recentes acontecimentos, nítidas e desassombradas afirmações a respeito da legitimidade e do valor da presença de Portugal na índia.
Vozes: - Muito bem!
O Orador:-Foram as últimas notícias que tivemos de Froilano de Melo antes da inesperada informação do seu falecimento.
O antigo professor e director da Escola Médico-Cirúrgica de Goa, o antigo director do Instituto Bacteriológico da mesma cidade, o antigo director dos Serviços de Saúde da índia Portuguesa, o grande parasitologista e epidemiologista, o antigo Deputado pela índia e membro do respectivo Conselho de Governo, o delegado de Portugal em tantas reuniões científicas internacionais, consagrou simbólica e expressivamente as últimas palavras da sua vida à proclamação, na terra amiga do Brasil, dos direitos sagrados do elevado papel universalista e cristão de Portugal no Mundo, e especialmente na índia, nessa índia de fascinante beleza e pensamento transcendente, que só um trágico erro de visão política, só um desorientado e ambicioso ímpeto poderá ligar ao pan-asiatismo sino-soviético, em vez de aproximar efectiva e ideologicamente da alma ocidental, especialmente de Portugal o maior pioneiro da solidariedade dos povos, da fraternidade entre o Ocidente e Oriente, sobretudo desde a gloriosa expedição de Vasco da Gama.
É simbólico, eloquente, o facto apontado de, antes de cerrar definitivamente as pálpebras para a eternidade, Froilano de Melo ter, no país irmão, erguido a sua voz em favor de Portugal na índia.
Louvores a sua memória pelo seu expressivo e oportuno gesto de verdadeiro e nobre indo-português, de grande português da índia.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador:-Do cientista e do intelectual falarei com o vagar necessário noutra oportunidade.
Aqui direi hoje apenas que Froilano de Melo foi um autentico sábio, com as encantadoras ingenuidades e fantasias do cientista que só vê diante de si a verdade e não sabe o que é o erro, a intriga, a mentira.
Ligou a sua existência a uma senhora de origem alemã, que, como Propércio de Figueiredo, Germano Correia e outros, se ocupou proficientemente da condição social da mulher hindu.
Ele próprio mostrou como esta é vitima do patriarcalismo ária, que se substituiu ao matriarcalismo pré-ariano, porventura dravídico.
Há poucos anos, na então Escola Superior Colonial, hoje Instituto Superior de Estudos Ultramarinos, num ciclo de conferências sobre a índia, Froilano de Melo pôs em relevo a situação desfavorável da mulher hindu, falando do sati, ou da queima das viúvas, e doutros factos que, como aquele, encontraram na acção portuguesa na índia, no Cristianismo que ali levámos, a mais nobre e benemérita das oposições.
O fundador e redactor assíduo dos Arquivos Indo-Portugueses de Medicina e História Natural, dos Arquivos da Escola Médico-Cirúrgica de Nova Goa e doutras publicações deixou um nome científico de destaque universal.
Mas a sua acção de professor notabilizou-se por ter criado escola, ter estimulado e aglutinado jovens investigadores em torno e em seguimento da sua figura, que na Faculdade de Medicina do Porto foi, a seu turno, discípulo dilecto do também saudoso mestre, o anatomista Joaquim Pires de Lima, cujo espírito, cuja flama, ele, como outros ilustres médicos Indo-Portugueses, levou para a Escola Médica de Goa.
Vozes: - Muito bem!
O Orador:-A vida de Froilano de Melo polarizou-se em redor da investigação científica, do benemérito combate h doença (como à terrível lepra, a micoses, etc.),
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do auxílio aos seus discípulos, da cultura era gera], sendo certo que não tinham limites as suas preocupações filosóficas, literárias e artísticas, especialmente em relação com a índia.
No Porto fez na sua última estada ali, na cidade de cuja Faculdade de Medicina era professor honorário e onde dirigira um curso de protozoologia módica, no Porto, repito, fez uma conferência sobre o poeta hindu Rabindranath Tagore.
Devemos à memória de Froílano de Melo, ao seu labor científico e patriótico, mais do que uma reverente manifestação de pesar pela morte do sábio e do médico; devemos-lhe um comovido testemunho de reconhecimento nacional pela altura magnifica a que ele fez ascender os seus sentimentos de patriotismo e de bondade, e pela luminosa e superior expressão que, por palavras e actos, ele deu, nestas horas inquietas, à unidade espiritual, indestrutível, entre o Estado da índia o todo o Portugal.
Evoco com saudade e admiração a fisionomia resplendente e rasgada do meu camarada de juventude, do meu confrade de sempre, a sua existência nobre e fecunda, a sua alma cheia das altas curiosidades de investigador e dos mais puros sentimentos humanos, o seu dedicado civismo de indo-português.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem! O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Castilho Noronha: - Sr. Presidente: poios jornais da manhã fiquei sabendo da morte do Prof. Froilano de Melo, ocorrida em S. Paulo, onde ultimamente passara a viver.
Não podendo, por escassez de tempo, encarar a sua egrégia figura sob os múltiplos aspectos que ela oferece, limito-me a prestar a minha sentida homenagem à memória de quem, pelas suas excelsas qualidades, tanto honrou a sua terra e a Nação, à qual serviu.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Na sua carreira, sempre ascensional, o Dr. Froilano de Melo atingiu os mais altos postos.
No Estado da índia exerceu cardos importantes, como lente e director da Escola Médica, director do Instituto "Bacteriológico, director dos Serviços do Saúde, membro do Conselho do Governo, presidente da Câmara do Goa, etc.
Foi principalmente pela sua prodigiosa actividade intelectual que ele conquistou uma situarão de destacado relevo.
As suas investigações científicas deram-lhe renome internacional. Os trabalhos a que ligou o seu prestigioso nome granjearam-lhe a reputarão de sábio.
A medicina portuguesa teve nele um dos seus mais lídimos ornamentos.
Orador de largos recursos, alguns dos seus memoráveis discursos são justamente considerados como verdadeiras jóias literárias, que só por si fazem e firmam uma reputação.
Esta Assembleia teve várias ocasiões do apreciar os seus excepcionais dotes oratórios. Não devo esquecer neste momento os esforços, que Froilano de Melo despendeu para a fundação dessa humanitária instituição que é a Leprosaria de Maca/anã.
Ser-me-ia impossível comprimir nestas breves palavras a biografia deste eminente homem público que acaba de tombar ao sopro da morte.
Gomo disse, cia apenas representa o meu preito de admiração e apreço por um tão ilustro filho da minha terra.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem! O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Julgo interpretar os sentimentos da Câmara resolvendo que fique exarado no Diário das Sessões de hoje um voto de profundo sentimento pela morte do antigo Deputado Froilano de Melo.
Vozes : - Muito bem, muito bom !
O Sr. Cerveira Pinto: - Sr. Presidente: pretendo versar, mediante aviso prévio, um assunto importante de administração pública u que dou o titulo de "Fomento piscícola e pesca fluvial".
Procurarei mostrar que, não obstante a acção benemérita realizada pela direcção-geral dos Serviços Florestais e Aquícolas no repovoamento dos nossos rios, é cada vez maior o empobrecimento das águas interiores do Pais, e que esto lamentável estado de coisas se deve. em parte, a antiquada legislação ainda hoje vigente, e muito principalmente aos vandalismos de toda a ordem que diariamente se praticam e que quase sempre ficam impunes, em virtude de a fiscalização dos serviços hidráulicos ser pouco menos do que inexistente.
Tentarei ainda pôr em evidência, no aviso prévio ora anunciado, que urge encarar a sério este problema, de modo u serem atingidos os seguintes fins :
a) Recuperar eficazmente uma grande riqueza nacional, hoje quase extinta;
b) Estimular a prática de um dos mais salutares exercícios físicos e que é a pesca desportiva;
c) Criar um forte motivo de atracção turística nacional, cuja utilidade para o Pais não precisa de ser demonstrada.
Rogo, pois, a V. Ex.a. , Sr. Presidente, que, nos termos do disposto no § 1.º do artigo 49.º do Regimento, se digne incluir este aviso prévio nu ordem do dia, logo que o julgue oportuno e conveniente.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bom!
O Sr. Presidente: - O aviso prévio de V. Ex.a vai ser transmitido ao Governo e oportunamente: será marcado para ordem do dia.
O Sr. Santos Bessa: - Sr. Presidente pelo último Diário das Sessões tomei conhecimento dos comentários aqui feitos pelo Sr. Deputado Manuel Vaz ao que eu havia dito na véspera acerca da Lei de Meios.
Entendo de meu dever dar à Câmara algumas explicações a tal respeito.
Nas considerações que eu fiz eu não quis trazer à Assembleia qualquer impressão de desalento, daquele "franco pessimismo" de que se deixou possuir a Sr. Deputado Manuel Vaz, e muito menos de falta de confiança nas instituições ou nos homens que têm tido a responsabilidade de marcar o rumo da Revolução Nacional.
Pretendi tão-somente, ao tratar da política do valorização humana, apontar a importância dos dois mais graves problemas sanitários nacionais para que o Governo não deixasse de os considerar devidamente no plano das nossas actividades assistenciais.
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Quis salientar a sua importância nacional e internacional em relação a novas modalidades assistenciais que se anunciam e quis mostrar não, só o perigo que adviria dum quebrantamento do ritmo com que vínhamos atacando esses dois problemas sanitários - o da assistência materno-infantil e o da tuberculose -, mas também demonstrar a necessidade de intensificar a nossa acção nesses dois sectores.
E para a demonstrar trouxe alguns números e alguns argumentos que me pareceram bastantes para atingir o meu objectivo.
Vejo, pelo discurso do Sr. Deputado Manuel Vaz, que não fui compreendido!
Em primeiro lugar, e antes de responder pelos exageros de que me julga, autor, quero agradecer u este ilustre Deputado as palavras amáveis que me dirigiu e que constituem o primeiro exagero do seu discurso.
Quero garantir ao ilustre Deputado que o facto de viver apaixonadamente, como ele diz, os dois mais importantes problemas sanitários nacionais não significa que eu considere que o eixo da saúde do povo assenta nesses dois pólos e que tudo o mais é secundário.
Só mo permite, direi que esse foi o seu segundo exagero.
O facto de insistir na necessidade de os resolver com urgência não me impede de encarar com calma, serenidade, justiça e interesse os demais, nem me leva a relegá-los para um plano tão secundário como julga.
A prova disto pode tê-la se ler o meu discurso do ano passado, aquando da discussão da Lei de Meios para 1954. Ali encontrará apontados, ao lado daqueles dois, vários problemas muito sérios, que já deviam ter tido solução. Também dessa vez não exagerei nada!
Quanto ao discurso de Dezembro último, nada tenho a corrigir aos escassos números que aqui citei. De resto, eles são conhecidos de toda a gente, e só os citei para demonstrar a necessidade de prosseguirmos com afinco a obra em curso e evitarmos distrair os nossos escassos recursos para outros problemas que nem de longe têm a importância e a, acuidade daqueles.
Quanto à mortalidade infantil, falei das nossas taxas, da sua evolução, do que significavam para nós e de como agravavam u nossa já muito delicada posição internacional a tal respeito.
As conclusões que ressaltam dessa análise não se destruem nem são abaladas com os números absolutos que aqui foram referidos em resposta.
Os casos da Espanha e da Itália também não sorvem para justificar o que se passa entre nós.
Aliás, segundo os números que possuo, a Espanha não leve subida alguma das suas taxas desde 1949 a 1952, inclusive, antes as trouxe nesse período em descida contínua para a casa dos 55 por mil.
A Itália, de 1946 a 1930, trouxe as suas taxas de 84.1 para 63,8 por mil. Segundo os elementos que tenho, houve de facto em 1952 uma subida para 66,5 (cujas causas ignoro), mas logo seguida duma descida para 63,4 no ano imediato e para 58.8 em IU33. Mas isso ó bem diferente daquilo que aqui foi apontado pelo nosso colega Rebelo de Sousa e recordado por mim. Por isso mantenho o que disse a tal respeito.
Quanto à lei n.º 2044, a que aludiu o nosso ilustre colega, quero tranquilizá-lo, dizendo-lhe que nunca me arrependi da colaborarão que dei à sua discussão nesta Câmara, nem dos elogios que dela tenho feito em Portugal e no estrangeiro, e muito menos do esforço que tenho consagrado a auxiliar a sua aplicação!
Aliás, nem a ela me referi na minha última intervenção, e, se o fizesse, não seria para. renegar o que disse e fiz, mas para lamentar que ainda não tivéssemos podido tirar dela todos os benefícios que ela comporta. Pode estar certo disto o Sr. Deputado Manuel Vais.
A obra realizada no sector da luta antituberculosa. como aqui tão brilhantemente! recordou este ilustro Deputado, é, de facto, já notável e .constitui uma das mais brilhantes realizações do Estado Novo. Reconheço-o e tenho-o afirmado em plena consciência. Se não voltei a referir-me a isso, na altura em que se discutia a Lei de Meios, foi porque me pareceu mais útil e entendi de meu dever insistir no que nesse campo se toma urgente realizar, guardam!" para outras ocasiões e outros locais a defesa da obra realizada.
Preferi este sistema de colaborarão.
Vejo com mágoa que o nosso ilustre colega pretende contestar o que eu disse sobre o problema da tuberculose em Portugal e sobre os novos apertos que ele reveste aqui e em todo o Mundo, com a citação da baixa contínua do número de mortos por tuberculose no nosso país. Lamento que não tenha podido seguir o que eu disse sobre o sentido divergente das curvas da morbilidade e da mortalidade por essa doença. Estamos de acordo sobre a redução contínua do número de mortos. Eu mesmo aqui o afirmei. Mas o que sucede e que eu também disse é que, a despeito dessa redução da mortalidade, não descia o número de doentes. Infelizmente, o processo que determinou aquela redução veio agravar a endemia. E é por isto mesmo que o problema é cada vez mais premente! E foi por isto mesmo que eu chamei a atenção do Governo para o fenómeno, não fosse dar-se o caso de julgar-se a nossa posição e avaliar-se das nossas necessidades nesse capítulo exclusivamente à luz da redução das suas taxas de mortalidade.
Dentro do problema da tuberculose destaquei u importância que tem para a Nação e para o meu círculo a construção dum sanatório marítimo. Aduzi as razões que me pareceram bastantes e contestei o argumento da "bicha" do I. A. N. T. pura impedir a construção desse sanatório na Figueira da Foz.
Apresentou-se novamente a "bicha" como contestação e fez-se a grave afirmação de que iam até fechar sanatórios marítimos por falta de doentes
Impõe-se-me, por isso, o dever de fazer uma mais clara demonstração das necessidades da construção desse sanatório marítimo e de provar que não procedi levianamente.
Nos países que mais carinhosamente estudam as soluções do problema da tuberculose houve sempre a preocupação 'de saber a quanto montava o número de pessoas que eram portadoras de formas activas e de formas contagiosas dessa doença, mesmo que não houvesse estatística resultante da declaração obrigatória da doença. É do conhecimento de todos que se dedicam a estes assuntos que nesses países se estabeleceu um coeficiente para, a partir do número de mortos pela tuberculose, avaliar o número dos que eram portadores da doença. Eram clássicos esses coeficientes antes da era dos antibióticos: Léon Bernard, em Franca, calculava o número de tuberculoses contagiosas multiplicando por 7 o número de mortes por tuberculose; Framingham, nos Estados Unidos, tinha o factor 3 para as tuberculoses abertas e o factor 9 para as formas activas da doença; em Basileia avaliavam-se estas servindo-se do factor 12, e Nederlulea, na Suécia, adoptava o factor 15 para calcular o número de formas activas de tuberculose. No nosso Instituto Nacional de Assistência aos Tuberculosos usou-se até há pouco o factor 7.1.
Hoje como ficou demonstrado na XIII Conferência Internacional da Tuberculose e já aqui afirmei, morrem menos tuberculosos, mas o número de doentes não marcha no mesmo sentido.
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Logo, parece lógico admitir que esses factores têm de ser mais elevados. E, uma vez que eles eram estabelecidos para todas as fornias de tuberculose, e como a tuberculose óssea é menos mortífera que a pulmonar, também é fácil demonstrar que paru a sua aplicação exclusiva aos rasos de tuberculose óssea esses factores têm de ser ainda mais elevados.
Mas ponhamos de lado os agravamentos resultantes dos antibióticos e do exclusivo da tuberculose óssea e adoptemos para os nossos cálculos, para não sermos apodados de exagerados, aquele factor 7,.l para estabelecermos o cálculo aproximado do número de casos de tuberculose óssea existentes em Portugal, tal como se estivéssemos seis anos atrás e u tratar de todas as forniu s de tuberculose.
Segundo os números que tenho, foram catalogados em Portugal nos últimos anos sob a rubrica "Outras formas de tuberculose" (além da tuberculose, pulmonar, claro está) 1608 e 1601 óbitos.
Se lhes aplicarmos aquele factor temos de concluir pela existência de 7500 a 11 500 doentes!
Procurei deduzir deste número o dos casos de meningite tuberculosa e o dos de tuberculose renal, para puder apurar os que indiscutivelmente beneficiariam de tratamento heliomairítimo.
O nosso Instituto Nacional de Estatística amavelmente me comunicou não estar habilitado a fornecer-me esses dados.
Mas, admitindo que essas duas rubricas podem representar um terço dos casos (este cálculo é, sem dúvida, exagerado), ficar-nos-iam cerca de 5000 a 7000 doentes a reclamar o tratamento heliomarítimo. Mas o número real deve ser ainda superior!
Estes números não se afastam muito, como voem. daquela estatística, do Departamento do Sena que aqui recordei há dias e que para uma população de - 5 milhões de habitantes havia catalogado em três anos 69OO casos de tuberculose óssea !
Como poderemos nós assistir convenientemente a. esses doentes não dispondo sequer do 700 camas nos sanatórios do Estado para tal fim? Como pode dizer-se que vão fechar-se sanatórios por falta de doentes de tuberculose osteoarticular?! Não será isto um exagero?
Mas eu apontei aqui também a vantagem de que o novo sanatório a construir o fosse junto da Figueira da Foz. já que toda a orla marítima do Centro do País, desde Francelos à Parede, está desprovida de qualquer instituição desta natureza e já que a Junta de Província da Beira. Litoral tem terreno, projecto e condições para realizar essa construção.
E poderá perguntar-se: há no Centro do País doentes para lá internar?
Eu respondo:
No pequeno hospital da Misericórdia da Figueira da Foz. que fica longe do mar, não puderam ser internados nos últimos três anos mais do que 66 doentes de tuberculose óssea; em duas freguesias do concelho estão identificados 73.
Nos Hospitais da Universidade de Coimbra, nos mesmos anos, foram internados nas suas várias clínicas 219 doentes com tuberculose óssea.
Dos doentes que passaram pela consulta externa de ortopedia, 370 têm o diagnóstico de tuberculoso óssea. Neste número não estão, porém, incluídos muitos casos que, embora sob a designação do artralgias, sinovites, etc., são também de tuberculose óssea articular.
E este número é igual a mais do dobro daquele! Ronda pelos 900 a totalidade!
Este é o ritmo com que afluem aos hospitais de Coimbra e da Figueira da Foz os doentes portadores de tuberculose óssea!
Seguramente, pelos demais hospitais do País ocorrerá coisa semelhante. Nesse, sentido já aqui depuseram os nossos colegas Rebelo de Sousa, Alberto Cruz e Miguel Horta.
Se fôssemos apurar os casos de tuberculose osteoarticular que nos últimos três anos passaram pelos hospitais de Lisboa, do Porto e da província, e limitando-nos mesmo somente aos que procuram o hospital, não andaríamos muito longe dos cálculos aqui estabelecidos, tomando por base o que se passa nos Hospitais da Universidade de Coimbra e o que acontece na Figueira da Foz.
Porque não procuram esses doentes inscrever-se nos serviços ,de admissão do Instituto de Assistência Nacional aos Tuberculosos?
Isso não interessa agora. já disse o bastante a tal respeito na última sessão.
O que me trouxe aqui foi demonstrar:
1.º Que a construção dum sanatório marítimo é duma necessidade premente;
2.º Que isso e de interesse nacional;
3.º Que ao indicar a sua implantação na Figueira da Foz não defendi um interesse regional que o não fosse simultaneamente da Nação;
4.º Que a ausência "bicha" na admissão dos doentes de tuberculose óssea no Instituto do Assistência Nacional aos Tuberculosos não resulta da inexistência de doentes, mas sim de outras causas, que se torna necessário averiguar:
5.º Que, por essa mesma razão, o argumento da "bicha" do Instituto de Assistência Nacional aos Tuberculosos para impedir a construção do sanatório marítimo não tem a mínima consistência (nem esse, nem o de que estes doentes não são contagiosos!);
6.º Que o encerramento de sanatórios, que aqui se aludiu carece de uma rectificação para que se distingiam sanatórios de casas de saúde particulares e para que se não confunda inexistência de doentes com falta de doentes em condições económicas para suportarem as despesas do seu internamento nestas últimas.
Julgo ter dito o bastante para o demonstrar e para provar que nada exagerei ao falar deste problema e que nada tenho também a corrigir no que disse.
E já agora também julgo ter demonstrado que ao contrário do que pensa o ilustre Deputado Manuel Vaz, não houve qualquer Dulcinea a guiar a minha conduta, nem o meu discurso teve nada de quixotesco !
E mais: que não atino como deduziu que eu procurasse mais uma folha de louros para a coroa da Junta de Província da Beira Litoral!
Não. Tive um objectivo mais alto!
Sr. Presidente: contra aquele sentimento pessimista de que se deixou possuir, sem razão, o ilustre Deputado que"> afirmar que sou dos que crêem firmemente nas nossas possibilidades, na nossa capacidade do resolver estes dois problemas sanitários, tal como muitos outros países já o fizeram. Dos que o crêem e dos que o desejam firmemente. Sou dos que esperam viver a glória de ver fechar sanatórios em Portugal por falta de doentes. E isso poderá acontecer em poucos anos, se nós o quisermos. E para vencermos o nosso atraso, paru acelerarmos a marcha, para lá chegarmos mais depressa, que nos batemos por esta causa e que procuramos evitar distracções comprometedoras.
E outra palavra de fé: a de que creio em que o Governo há-de prosseguir a sua política de luta antituberculosa e que espero que uma parte dos 10 000 contos
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com que fui reforçado o seu orçamento de 1955 há-de ser destinada a acudir u tantos doentes pobres atingidos pela tuberculose osteoarticular, e por isso creio que o sanatório marítimo da Figueira da Foz será a breve trecho uma esplêndida realidade! Nesse sentido, e em nome desses pobres doentes, daqui dirijo novamente o meu apelo a quem tem o direito e o dever de o resolver. Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem! O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Daniel Barbosa: - Sr. Presidente: tive ocasião, na passada sessão legislativa, de me ocupar nesta Câmara de assuntos que respeitam ao meu distrito do Porto, e mais particularmente ainda à sua prestigiosa capital; fi-lo no desejo de dar toda a contribuição que me coubesse a quantos procuram, pela sua persistência e seu esforço, defender, não favores que se não pedem, mas actos de equidade e de justiça que se tem direito a esperar.
£ ao fazê-lo subiu estar simplesmente cumprindo uma obrigação inalienável para com o velho burgo portucalense, paru com a sua gente, tão devotada ao trabalho, tão portuguesa e tão nobre: gente e burgo que, pelo valor que têm. na história e na vida nacional presente, bem merecem que, em relação a eles, se firme uniu mais forte atenção doa poderes públicos, com vista a fazer desaparecer comparações que diminuem ou u impedir que continuem preteridos insofismáveis direitos que deveriam ter em muitos casos lugar de absoluta igualdade, se não mesmo nalguns outros posição de destacada primazia.
Compete a nós, Portuenses, como se torna evidente, não deixar cair o entusiasmo com que temos de chamar a atenção governativa para as coisas da nossa terra; não podemos perder a autoridade de pedir o que nos devam, por deixar esmorecer essa acção de presença que nos cabe e nos leva a procurar, fora de utopias condenáveis, a estar sempre na primeira fila quanto às reclamações que houver mister.
Vozes: - Muito bem !
O Orador: - Temos de pôr à prova esse admirável bairrismo, que é orgulhoso apanágio da gente do meu distrito, pura viver sem descanso na persistência de atitudes que é indispensável manter: na imprensa, na rádio, no Parlamento, no Governo, onde estiver um portuense tem de estar, assim, um intransigente defensor da sua terra, com vista a tentar recuperar o tempo que se perdeu; sempre pronto, portanto, a louvar sem restrições quando o louvor for devido, sempre pronto a reclamar e a protestar, corajosamente e sem rebuço, quando tal preciso for.
Pode ser que para muitos este bairrismo forte, que nos une e se mantém, tenha o seu que de estranho, de criticável até; mas foi nele que sempre residiu uniu qualidade indispensável para que os Portuenses a si mesmo se impusessem, sem preocupações de recompensa, os mais duros sacrifícios, as maiores abdicações, sempre que através delas se tornava preciso contribuir para a maior segurança do País ou para a prosperidade da Nação.
Por isso mesmo o invocamos, não como desculpa de atitudes, mas como título da maior valia de gente que sabe querer.
Seja-me lícito, porém, Sr. Presidente, fazer votos para que essa acção de presença construtiva, que só pode, aliás, contribuir, se for equilibrada e se for justa, para auxiliar u função de quem governa, se mantenha e frutifique de acordo com a preciosa lição que se recolhe duma leitura atenta da magnífica parábola dos vimes: só dentro duma cooperação consciente entre as forças vivas da cidade, duma coordenação perfeita entre todos os que nela actuam, quer na administração, quer mi política, o Porto acabará por conseguir muito daquilo que preciso e a que tem indiscutível jus.
A não ser assim, topar-se-á, quando muito, com atitudes isoladas, que poderão apresentar-se simplesmente como ecos dos desejos da cidade ou do distrito, mas sem aquele valor de consistência que indubitavelmente lhe empresta a união de todos quantos os podem defender conscientemente, quer pelas funções que desempenham, quer pelos valores que representam.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Posto isto, Sr. Presidente, e dentro da missão que aqui me toca, quero voltar a ocupar-me dos diversos assuntos com que prendi a atenção dos Srs. Deputados nas sessões de 22 de Janeiro e de 9 de Março do ano findo, quando critiquei, em relação ao Porto, a falta de coordenação de muitas obras em curso e até a falta de entusiasmo com que as soluções se procuravam.
O que se passou desde então, há um ano precisamente?
No desejo de o salvar, e para que a minha pretensão se concretize, tenho a honra de enviar para a mesa o requerimento que segue, repetindo-me pari pass, em grande parte, nos assuntos que foquei.
Vou apresentá-lo através duma série de perguntas, tendo fundadas esperanças, por aquilo que tenho lido e por várias coisas que me constam, que algumas delas, pelo menos, vão ter resposta agradável ao sentir dos Portuenses; oxalá que seja assim, na certeza de que o Sr. Engenheiro Arandes e Oliveira, de quem há-de depender a solução de muitos dos problemas que entendo dever focar, bem ficará a merecer do Porto se materializar, em realizações, a vontade que o anima e o Porto já sentiu.
"Requeiro que me sejam fornecidas, com a possível urgência, as indicações relativas às perguntas seguintes:
a) Está ou não já aprovado o plano regulador respeitante à urbanização da cidade do Porto? Se está, qual a escalonamento assente, em volume e no tempo, para a realização das obras nele previstas que cubem à iniciativa pública e sem grande parte das quais muitas obras de iniciativa particular se não poderão desenvolver
b) Quanto à ponte da Arrábida, qual u situação do problema, no que respeita à elaboração e aprovação de anteprojectos ou projectos, à data do início da execução e ao prazo actualmente previsto para a sua entrada em serviço?
c) Em que se assentou finalmente quanto à ligação dessa futura ponte com as estradas nacionais do lado de Vila Nova de Gaia?
d) No que respeita à chamada "via rápida de Leixões", está ou não finalmente resolvido com a CP o problema relativo ao seu cruzamento com a linha férrea, via estreita. Senhora da Hora a Leixões, o qual torna só por si impeditivo a sua entrada em serviço? Assentou-se também já alguma coisa quanto ao quilómetro de via que ainda falta para a completar totalmente e dela tirar assim
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todo o proveito que a pôde justificar em grande parte?
c) O que se passa quanto à construção dos 5200 m já estudados para a via norte e ao estudo e construção dos 3200 relativos ao ramo de Barreiros?
f) ]£m que se assentou quanto ao estudo e a prazos para a construção da via nordeste, desde a Circunvalação à Palmilheira e da Palmilheira à Alfena, ou seja na sua totalidade, que há um ano estava por estudar ainda?
g) No que toca à chamada "estrada marginal", que assegurará a ligação com o Douro, o que há agora de definitivo quanto à construção do seu troço Lixa a Melres, na extensão de cerca de 9 km. e da ponte em rio Mau, sem a qual os quase 60 km construídos para pouco podem servir?
h) O que se resolveu quanto à forma de melhor estabelecer a comunicação rodoviária entre o Sul e o Norte do País, através da cidade do Porto, verdadeiro nó de ligações das grandes vias que passarão a servi-la?
i) O que se realizou das 314 moradias económicas que faltavam construir para efeito do cumprimento do decreto-lei n." 30 602, de 17 de Abril de 1946?
j) O que há de real e concretamente estabelecido quanto a um plano decente de construção de casas para famílias pobres, à elaboração de projectos, à aquisição de terrenos, aos indispensáveis subsídios, sem os quais se não pode resolver um dos mais cruciantes s prementes problemas da cidade, como é o da supressão a passos rápidos dessas "ilhas" vergonhosas, mas muito mais vergonhosas ainda para quem lamentavelmente as consente do que para os desgraçados que as habitam, por seu mal?
k] O que há quanto ao acabamento definitivo .do Palácio dos Desportos? Em quanto vai realmente importar a sua totalidade? Que planos há assentes para a sua exploração?
J) Quando acabam, na. verdade, as obras ainda em curso nos novos Paços do Conselho e quando passam para lá os serviços camarários?
m) Que há de assente, mas definitivamente assente, quanto ao arranjo que se impõe sem mais demora para a Avenida da Ponte. que. se agora já serve, está longe de embelezar?
n) Que há também de concreto quanto ao começo das obras do já célebre Palácio dos Correios, que há oito anos a cidade vem esperando em franca resignação?
o) Ponderou-se, como já se sugeriu e me parece ião justo, na vantagem de conferir à Câmara Municipal do Porto, dentro da necessária escala, possibilidades financeiras semelhantes aquelas que permitiram que a Câmara Municipal d
Quando se conta, iniciar as respectivas obras?
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - E, Sr. Presidente, porque os problemas por resolver do Porto são um pouco como cerejas em cesto, que logo que uma se puxa vem meia dúzia atrás,
não resisto à tentação de abordar também um outro que tanto interessa à cidade e ao Norte do País: trata-se do seu aeroporto, o qual com um pouco mais de dispêndio poderia facilmente cumprir a função que lhe foi destinada, isto é, a de servir como alternante do de Lisboa, a par dos de Casablanca, de Gibraltar ou de Madrid.
De facto, o Porto tem o seu aeroporto em Pedras Rubras, já com categoria de aeroporto internacional, visto que de lá podem partir aviões para qualquer parte e podem aterrar também aqueles que provenham do estrangeiro.
Mas esta possibilidade legal não se materializa, de facto, se não em casos raríssimos, muitas vezes motivados por circunstâncias de emergência,; faltam, na realidade, a este aeroporto algumas das condições indispensáveis para lho garantir mínimos de segurança e de interesse de utilização, sem os quais as diversas companhias o não poderão incluir nas suas rotas.
Isso teria, porém, a maior vantagem: ainda no passado dia 8 um Skymaster da T. A. P., no seu regresso de Paris, aterrou em Pedras Rubras, por se encontrar fechado o Aeroporto da Portela; em compensação, vários outros aviões, que sobrevoaram inutilmente Lisboa, acabaram por aterrar em Madrid, tal como semanas antes outros aviões o tinham feito por causa do espesso nevoeiro que cobria a capital.
Para estes aviões transoceânicos a utilização de Pedras Rubras está normalmente vedada, pelo que as diversas companhias nem sequer a consideram como possibilidade remota para a aterragem em Portugal.
E, contudo, .parece que só excepcionalmente as condições de mau tempo são, na realidade, coincidentes no Norte e no Sul do País: é preciso, para tanto, que o mau tempo se desloque no sentido leste-oeste. com uma frente paralela à nossa linha de costa, o que se apresenta invulgar.
Aeroporto de Lisboa fecha-se muito mais frequentemente de Inverno por motivo de nevoeiros do rio, deslocado por vento leste, sem que por isso as condições meteorológicas na zona de Pedras Rubras se tenham de mostrar necessariamente desfavoráveis à sua utilização.
Ora é curioso lembrar que as obras realizadas no Aeroporto do Porto foram muito para além daquelas que inicialmente se previam, quando se lhe destinava unicamente u função restrita, no que tocava à aviação civil, de procurar desenvolver o turismo local e manter ligações aéreas com o resto do País, muito particularmente com Lisboa. Por isso mesmo se fugia à instalação luminosa e às pistas pavimentadas, para se ficar simplesmente pelo arrelvamento geral da superfície, que o tráfego previsível, ligeiro de peso e limitado, permitia considerar.
Contudo, impôs-se a necessidade de se considerar o nosso aeroporto como de recurso do de Lisboa, n que imediatamente implicou uma alteração sensível nas obras que se tinham projectado; e mais tarde -já em 1946, salvo erro - acabou-se por se determinar superiormente que o Aeroporto de Pedras Rubras se apetrechasse com aquilo que indispensável fosse para ficar com as características de aeródromo de alternativa dos aeroportos transoceânicos. Modificaram-se, consequentemente, aã características admissíveis pari a plataforma de aterragem, impôs-se a sinalização luminosa. construiu-se uma esplêndida aerogare. etc., gastando-se, portanto, uns largos milhares de contos, nos quais a Câmara comparticipou em cerca de um terço.
Está, de resto, também já realizada uma grande parte das obras consideradas indispensáveis para manter uma ligação fácil e rápida entre o Aeroporto de
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Pedras Rubras, a cidade e a rede de estradas do Norte do País.
Mas dentro do sistema, (pie é infelizmente velha, pecha das obras feitas 110 Porto, falta, porém, ainda alguma coisa para se conseguir o desiderato em vista, ou seja, o de criar as condições necessárias para se dar ao seu aeroporto a categoria de alternante.
E pode perguntar-se então: mas será, de facto, preciso muita coisa ainda a traduzir-se em volume importante de obras ou de apetrechamento capaz de implicar um dispêndio demasiado de dinheiro para que de aeroporto em Pedras Rubras possa ser classificado dentro da categoria do de Lisboa - categoria C -, e dessa forma venha a poder ter utilização como aeroporto de alternativa a par do de Casablanca, do de Madrid e de tantos outros?
Não só é fácil responder negativamente - julgo eu -, como confessar o mais aberto espanto por tal se não encontrar ainda feito, deixando que os campos de alternância para os grandes aviões das companhias internacionais que demandam Lisboa se. vão buscar ao estrangeiro em vez de MB buscarem em Portugal.
Na realidade, já se encontram montadas as radioajudas precisas para tal utilização: dispõe-se de um ILS e de um gónio VHF. mas só funciona afinal um simples radiofarol. E o curioso é que se dispõe de pessoal técnico necessário, mas falta, em compensação, desarborizar para evitar interferências e o material de reserva que se torna indispensável para a continuidade do serviço.
Sem essa desarborização, de resto, não se podem evitar camelamentos que algumas vezes se dão; é simplesmente estranha a apatia condenável com que se encara, portanto, esta realização, tão simples mas tão fundamental também, e que. creio, levou a deixar sem aplicação, no ano que passou, uma verba de quase 300.000$ que se tinha destinado para tal fim.
No que respeita às suas pistas principais. Lisboa oferece duas pistas de 2080 m e. 2000 m. ao passo que em Pedras Rubras se encontram duas também, mas com 1500 m e 1250 m, muito embora, com a mesma consistência daquelas. Por tal razão se encontra o Aeroporto do Porto classificado na categoria d), bastando, porém, aumentar uns curtos 300 m à primeira das suas pistas, segundo estudo já feito, para que possa ser classificado com a categoria do da Portela; e, consequentemente, para que disponha das condições técnicas que o habilitem a ser utilizado pelos mesmos aviões que normalmente aterram ou deslocam em Lisboa, na certeza de que, em face da desarborização e da entrada em serviço da radioajuda já instalada, se poderiam diminuir francamente, depois, os seus mínimos de plafond, demasiadamente apertados.
E, em seguida, simples ajustamentos de natureza administrativa e policial - de natureza burocrática, poderíamos dizer - se encarregariam de facilitar o restante: o Aeroporto de Pedras Rubras precisaria estar permanentemente, aberto, por exemplo, e não das S às 20 horas somente, como actualmente acontece.
Só .assim, de resto, se poderão possuir em Lisboa informações meteorológicas precisas quanto a Pedras Rubras, no que respeita ao momento, e não, eventualmente, informações de Já muitas horas passadas a dizer como está o tempo em tempo que já lá vai ...; para tanto bastaria, talvez, o serviço permanente dum oficial de torre, dum radiotelegrafista e dum meteorologista: muito pouco, na verdade, .para as vantagens inegáveis que daí adviriam, no que toca à segurança de vidas e interesse nacional.
Resolvido isto, teríamos dado um grande passo para soluções mais importantes e m ais vastas, que o futuro se encarregaria de trazer depois; o que não está certo é que por desprendimento ou por incúria se deixe de fazer tão pouco quando disso tanto poderia resultar.
Mas a fim de que tudo fique devidamente esclarecido e possamos dispor de elementos correctos que nos permitam comparar, vou, Sr. Presidente, enviar para a Mesa um requerimento mais.
Requerimento
Requeiro que, com a maior urgência, me sejam fornecidas as seguintes indicações quanto ao Aeroporto de Pedras Rubras, no Porto:
a) Razões justificativas da .não entrada em serviço das radioajudas já instaladas; dispêndio anual previsto para a sua utilização permanente;
b) Despesa total prevista para a desarborização indispensável ; verbas inscritas, ano por ano, para o efeito e que nau foram utilizadas, bem como as razões que motivaram tão singular procedimento;
d) Custo do aumento de 300 m para a pista actual de 1500 m e tempo admissível para uma rápida execução;
d) Aumento de despesa anual com a utilização permanente do Aeroporto, em condições de servir de alternante para a maior parte dos aviões que se utilizam do de Lisboa tal como o de Madrid, Casablanca, etc.;
c) Aumento de despesa anual com serviços alfandegários que permitam imediatamente o transporte aéreo de mercadorias directamente do Porto para o estrangeiro ou vice-versa, com simples trasbordo na Portela.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem !
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Elísio Pimenta: - Sr. Presidente: impõe-se-me o dever, dever bem grato e bem sentido, hoje mais do que em qualquer outra ocasião, de exprimir s reafirmar peia pessoa de V. Ex.ª a minha mais elevada admiração e consideração.
Faço-o, meus senhores, sob os ecos das homenagens prestadas há poucos dias s111 Braga ao nosso i migue presidente, homenagens que, pela sinceridade, entusiasmo e vibração, tão características da velha cidade do 28 de Maio, onde o espírito da. Revolução Nacional continua vivo no seu inconformismo. na sua ânsia, de renovação constante e na sua confiança no futuro, devem ter sido bem gratas ao coração de S. Ex.a
Vozes: - Muito bem, muito bem !
O Orador: - E quero afirmar com profunda convicção que à Assembleia Nacional não podem ser i n diferentes tais homenagens, por .se dirigirem a V. Ex.ª antes de mais, mas também por aproveitarem ao prestígio dos seus membros, como intérpretes dos sentimentos da Nação.
Vozes: - Muito bem, muito bem !
O Orador: - Sr. Presidente: a discussão da Lei de Meios para 1955 foi dominada, mais do que em qualquer outro ano, pelos problemas da saúde pública.
Excelente sintoma de interesse por problemas da maior importância para a vida da Nação, que, se assinala, por um lado. a acuidade e a urgência da solução desses problemas, quer dizer também que as pessoas
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que os vivem no dia a dia das suas profissões ou na devoção pelo próximo não receiam trazê-los à discussão pública e à consideração do Governo, a quem compete resolvê-los.
Recordo que o nosso ilustre colega Sr. Dr. Baltazar Rebelo de Sousa manifestou a sua fé de que eu compartilho inteiramente na empolgante obra que o Governo poderá empreender quando se lançar nas duas campanhas que aguardam de há muito, na verdade, o seu momento - a da educação e a da saúde.
Meditando nas palavras de um novo, eu. que não sou velho, fiquei a pensar se não será tempo, talvez mais do que tempo, de se iniciarem as campanhas da educação e da saúde, mobilizando-se a consciência da Nação e concentrando-se nelas meio* dispersos noutros sectores da actividade, pública, que bem poderão aguardar ti solução dos seus problemas por mais algum tempo.
Eu sei que a tarefa é rude. Que ela exige; muita dedicação, muitos esforços, largos recursos financeiros, a boa compreensão de muita gente e até desilusões e desapontamentos. Que será preciso aceitá-la com verdadeiro espírito de sacrifício e mesmo de apostolado. Mas que bom seria podermos dizer dentro em pouco que a exemplo de outros aspectos da vida nacional, caminhamos na primeira fila entre os que se empenham na resolução dos mesmos problema.
E di-lo-iam, com legítimo orgulho, por termos resolvido problemas que pelo sim carácter essencialmente humano, não podem deixar de estar no pensamento e nas preocupações de um estado civilizado.
Eu sei, quanto a tuberculose, porque a esse flagelo social me quero referir em especial, que a luta exige um aumento do nível de vida de uma parte da população do País. para que todos tenham alimentação suficiente, a construção de muitas e muitas habitações salubres, para que tan1oj que vivem na escuridão possam receber no seu lar a luz ,e o calor do sol, e, sobretudo, uma acção profiláctica intensa, que não canse nem descanse ...
Mas acredito, também, que. continuar um esforço sério, o grave problema que tantas vidas e dinheiro rouba à economia do País poderá atenuar, ou mesmo resolver, dentro de poucos anos.
O que me dá fé é saber que a li evolução Nacional resolveu ato hoje problemas que se julgavam insolúveis. O que me dá esperança é o que se tem feito, nestes últimos anos e com tão poucos meios, na luta contra a tuberculose e o que se passa no Subsecretariado da Assistência Social desde que para lá entrou o Sr. Dr. José Guilherme de Melo e Castro.
Vozes: - Muito bem, muito bem !
O Orador: - Neste momento o ataque à peste branca constitui uma das grandes preocupações do Sr. Subsecretário de Estado da Assistência Social, e tudo quanto em poucos meses realizou nesse sector da saúde pública é garantia suficiente; de que o problema está finalmente a ser atacado de frente.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Oxalá tenha ao seu dispor os recursos financeiros suficientes, mesmo com sacrifício -e será sacrifício?- de certas realizações de carácter diferente, que bem poderão esperar a sua vez porque a S. Ex.ª não faltam nem competência nem entusiasmo.
Vozes: - Muito bem, muito bem !
O Orador: - Porque, Sr. Presidente, atacar decisivamente os problemas da saúde pública não é apenas construir para cem anos; poderá ser construir para sempre, porque se consolida o capital humano da Nação.
Vozes: - Muito bem, muito bem !
O Orador: - Devia estas palavras de justiça e de confiança ao Sr. Dr. José Guilherme de Melo e Castro.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - S. Ex.ª visitou recentemente Braga, e depois de Braga foi visitar o Sanatório Presidente Carmona, em Paredes de Coura. felizmente já reaberto - e por cuja reabertura bastante me bati, e que, pela competência e devoção do seu ilustre director, era de há muito o centro mais importante de combate à tuberculose no Alto Minho.
Quero daqui, em nome de tantos e tantos que já hoje voltaram a beneficiar desse excelente acto do Governo, agradecer a reabertura do Sanatório ao ilustre titular da pasta do Interior, que por ela tanto se interessou.
Vozes: - Muito bem, muito bem !
O Orador: - A visita a Braga do Sr. Subsecretário de Estado da Assistência foi breve, breve para os que o acompanharam, longa certamente para quem tem tantas e tão grandes tarefas, mas durante ela pôde resolver, com a sua magnífica formação, servida por lúcida inteligência, alguns dos problemas assistência is mais instantes da cidade.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Entre esses problemas citarei, de passagem, os relacionados com a mendicidade, com a assistência materno-infantil, com os inválidos, com o Hospital de S. Marcos, que tantos serviços presta a toda a províncias e que aguarda a vez de ver transformadas as suas instalações e o seu apetrechamento, urgente necessidade, mas também justa compensação para a dedicação do seu corpo clínico, entre o qual muito mo apraz destacar, por tantos e tão merecidos títulos, o nosso querido colega Sr. Dr. Alberto Cruz.
Vozes: - Muito bem, muito bem !
O Orador:- Mas de todos esses problemas quero referir-me àquele que considero, para já a problema de saúde pública número um da cidade, e tenho sobejas razões para assim o considerar: o da criação de uma enfermaria -abrigo lhe chamou, muito cristãmente, o Sr. Subsecretário - de estágio temporário para exame, repouso i1 observação clinica de tuberculosos, na qual dentro de algumas semanas se Deus quiser, e com o auxílio e a compreensão daquele membro do Governo, ficarão instalados, inicialmente, sessenta doentes, sob a direcção da Santa Casa da Misericórdia e que. retirados do convívio familiar, onde espalham o bacilo, aguardarão, devidamente assistidos a sua vez de entrada nos sanatórios.
bem haja, o Sr. Subsecretário, por ter dado realidade àquilo que para muitos era motivo de forte preocupação e até de descrença ...
Vozes: - Muito bem, muito bem !
O Orador: -Oxalá que a campanha da saúde não demore e que através dela se possa dar o golpe mortal a tantos problemas cuja resolução vai demorando.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado
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O Sr. Pacheco Jorge: - Sr. Presidente: usando pela primeira vez da palavra nesta sessão legislativa, quero renovar os meus cumprimentos de respeito e admiração por V. Ex.a, Sr. Presidente, e pelos ilustres colegas desta. Assembleia, a todos apresentando os meus melhores votos de um novo ano muito feliz.
Impossibilitado, por doença, de tomar parte no primeiro período de trabalhos da presente sessão legislativa, com grande pesar meu perdi a oportunidade de intervir no debate generalizado do aviso prévio sobre u presente situação do Estado da índia, realizado pelo ilustre Deputado Sr. Capitão Teófilo Duarte, a quem, deste lugar, rendo as minhas homenagens, pela forma brilhante, clara e patriótica por que tratou tão magno assunto, do qual vim a ter conhecimento através das respectivas actas.
Retomando hoje o meu lugar nesta Assembleia, entendi ser do meu dever trazer até ela a reacção dos portugueses de Macau perante o caso da nossa índia, o que irei fazer em breves e simples palavras.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: é a voz de um macaense que se ergue, é a voz de mais um português que se vai juntar ao coro de vozes de tantos outros portugueses de diversa- origem e espalhados pelo Mundo, a gritar em uníssono o seu mais veemente protesto contra o vil atentado à nossa .soberania no Estado da índia, a proclamar a sua fé ardente nos destinos da Pátria e seu absoluto apoio e solidariedade aos governantes neste momento crítico da vida nacional.
E do nosso inteiro conhecimento o ultraje à nossa soberania na índia por esse bando de malfeitores que, a coberto do manto de «libertadores», pretende tirar-nos os territórios que ali possuímos para os incorporar na União Indiana. Não desconhecemos também aqueles actos de heroicidade praticados por esse punhado de bravos portugueses que tombaram cobertos de glória em defesa da terra e da Pátria.
E assim. e antes de mais, eu quero render as mais respeitosas homenagens do povo de Macau a esses heróis que escreveram com o seu sangue mais uma página de glória da nossa história, fazendo votos para que o seu sublime sacrifício constitua um exemplo e um estimulo para todos nós, Portugueses, neste momento crítico em que a Nação se debate.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Pretendem os supostos «libertadores», com o apoio da União Indiana, fazer ver ao Mundo que os territórios que possuímos no continente indiano não devem, nem podem, continuar sob a nossa soberania e, à falta de melhores argumentos, invocam razões de ordem geográfica e étnica em defesa da sua tese.
Já S. Ex.ª o .Sr. Presidente do Conselho, no seu primeiro, magistral, ponderado e incontestável comunicado, deu a conhecer à Nação e ao Mundo qual a posição de Portugal na índia, quais os nossos direitos e interesses ali, rebatendo e pulverizando os frágeis e inconsistentes argumentos dos que pretendem a anexação desses territórios à União Indiana.
E. em complemento e reforço de tal comunicado, dignou-se S. Ex.ª expor no seio desta Assembleia, em 30 de Novembro findo, a posição do Governo perante os graves acontecimentos ocorridos na Índia, com aquele brilho, aquela serenidade e aquela firmeza que lhe são peculiares.
Quem tenha tido conhecimento destes históricos documentos, sendo português, não poderá deixar de vibrar de patriotismo e de se insurgir de indignação com a inqualificável pretensão da União Indiana.
Vozes : - Muito bem !
O Orador: - O Estado da índia é uma província portuguesa que se formou, durante quatro séculos e meio da sua existência, com a fusão generosa do sangue luso, com a introdução dos nossos usos v costumes, com a divulgação ,da nossa fé, e de que resultou um tipo social distinto dos demais existentes nos territórios circunvizinhos.
Permitir a sua incorporação na União Indiana seria um crime de lesa-pátria e nenhum português que o seja poderá deixar de sentir violenta indignação r repulsa perante semelhante ideia .
Os Portugueses de Macau, cônscios dos seus deveres e vibrando de verdadeiro patriotismo, vêm, por meu intermédio, protestar veementemente contra n assalto feito às terras cios seus irmãos da índia, afirmando a estes u sua mais completa solidariedade e manifestando ao Governo o seu incondicional apoio e a sua ardente fé na política seguida.
Disse.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Pinto Barriga: - Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa os dois seguintes requerimentos:
«Nos termos regimentais, tenho a honra do solicitar do Ministério da Economia e respectiva Junta Nacional dos Produtos Pecuários a informação circunstanciada da actuação desse Ministério em face do rebaixamento de preços para o produtor relativamente à carne de porco, mantendo-se inalterável o seu valor para o consumidor, prejudicando-se assim a lavoura, sem o mínimo benefício para o consumo, favorecendo apenas o comércio e indústria respectivos».
«Nos termos regimental, tenho a honra de solicitar pelos Ministérios competentes, informações dos motivos que impediram a extensão da última revisão de vencimentos, decretada pelo diploma legal n." 39 842, ao funcionalismo dos respectivos organismos de coordenação económica ».
Aproveito estar no uso da palavra para agradecer ao Ministério da Economia as informações que teve a amabilidade de enviar, embora lamentando ainda não ter recebido as que se referem ao problema do pão. Dentro desses documentos foram incluídos uns cadernos de recolha de dados para a construção dum mapa: estatístico sobre transgressões de caça. Como não me interessam directamente dentro da sua excessiva minúcia. permito-me oferecê-los à biblioteca da nossa Assembleia, onde podem ser utilizados, talvez com proveito.
O Sr. Presidente: - Peco ao Sr. Deputado Pinto Barriga, que, se efectivamente precisa de novos elementos, os requeira com inteira precisão, para depois não ter de os colocar na biblioteca desta Casa.
O Sr. Pinto Barriga : - Pedi com mais urgência elementos sobre o pão e foram-me dados elementos sobre a caça.
O Sr. Presidente: - Mas V. Ex.ª não tinha pedido elementos sobre a caça ?
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O Sr. Pinto Barriga: - Pedi s nota das medidas tomadas dentro da actual legislação para a preservação da caça, bem como das que foram utilizadas para evitar os prejuízos à lavoura nus locais onde excepcionalmente as espécies venatórias abundam».
Os volumosos cadernos enviados, e que resolvi oferecer à nossa biblioteca, eram muito mais uma recolha de dados do que uma estatística, e por isso resolvi oferecê-los, por poderem ali ser úteis e não terem interesse para o que eu tinha requerido.
Tenho dito.
O Sr. Teixeira de Sousa: - Sr. Presidente: é esta a primeira vez que uso da palavra nesta sessão Legislativa, e. começo por dirigir a V. Ex." os meus respeitosas cumprimentos.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Agradeço a V. Ex.ª o ter-mo concedido a palavra para me referir a um facto ocorrido recentemente, o qual tem a maior relevância para a vida económica da Madeira, e por isso merece ser aqui assinalado.
Quero referir-me à abertura do concurso, anunciado no dia 30 de Dezembro último, para na obras de ampliação do porto do Funchal, que vêm satisfazer uma justa aspirarão e correspondem a uma imperiosa necessidade.
Não é uma solução de emergência esta que agora foi adoptada. Ë o resultado de um estudo sério e os objectivos visados correspondem àquilo que os Madeirenses pretendem.
Em Abril de 1904. muna entrevista dada aos jornais da Madeira, o governador do distrito, segundo comunicação que havia recebido do engenheiro José Frederico Ulrich, então Ministro das Obras Públicas, anunciava que se iam realizar as obras do porto. Os representantes dos jornais, apercebendo-se da importância do acontecimento, alvitraram a realizarão do uma manifestação de agradecimento ao Sr. Presidente do Conselho. A ideia ganha vulto e imediatamente a comissão distrital da União Nacional, que também muito se interessou por esta realizarão, toma a chefia do movimento, e no dia 27 de Abril toda a população do Funchal, sem distinção de classes e de todos os sectores, sentindo a grandeza da notícia e o que ela representa para a vida do distrito, dirigiu-se, em massa compacta, ao Palácio do S. Lourenço para pedir ao governador, comandante Camacho de Freitas, que fosse interpreto junto do Sr. Presidente do Conselho do agradecimento da população da ilha pelo interesse que tomou na realização desta obra.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Foi uma das mais grandiosas e imponentes manifestações realizadas até hoje na Madeira.
Aspirarão antiga dos Madeirense, tem-se arrastado no decorrer dos anos em estudos, sem que os seus frutos fizessem sentir os .seus efeitos:
Em 1911 foi nomeada uma comissão para estudar o melhoramento do porto.
Em princípios de l926 larga discussão foi travada e duas correntes de opinião debutaram, estabelecendo-se critérios diferentes na realizarão deste objectivo.
Em Agosto de 1928 foi nomeada, pelo Decreto n.º 15 877, uma missão de estudo.
Com data de 30 de Outubro de 1930 existe uma memória descritiva e justificativa do projecto de melhoramento do porto do Funchal.
Completou-se em 1938 a ampliação de 32O m de cais, conhecido pelo molhe novo. mas esta obra foi sempre considerada insuficiente.
Seguiram-se vários projectos de ampliação:
Em 1937, do engenheiro Coutinho de Lima, remodelado em 1941;
Em 1943, do arquitecto Moreira da Silva;
Em 1944: do engenheiro Henrique Schreck;
Em 1947. do engenheiro Sena Lino.
Nestes últimos cinco foi o problema objecto de vários estudos e largamente; debatidas as diversa» hipóteses apresentadas. A Madeira só ganhou com esta demora, porque, afina, a obra que vai realizar-se tem a grandeza correspondente às nossas aspirações.
A partir de 1949 este estudo entra numa fase do maior interesse. A companhia- inglesa Union Castle Mail apresenta uma sugestão no sentido de inflectir o prolongamento do molhe novo no sentido oeste-leste.
Em Dezembro do mesmo uno o comandante Camacho de Freitas, então capitão do Porto do Funchal e actual governador do distrito, apresenta um estudo encarando esta questão com a largueza que o caso requeria.
Em Março de 1950 o Ministro das Obras Publicas, engenheiro José Frederico Ulrich, visitou a Madeira e estudou este problema in loco.
Em começos de 1951 foi nomeada uma comissão, em que estavam representados os Ministérios da Marinha, das Obras Públicas e das Comunicações.
Foram muito completos os pareceres e relatórios a que este problema deu lugar, até que em 28 de Agosto de 1953 o Conselho Superior de Obras Públicas, conciliando, até onde era possível, os requisitos de ordem técnica e económica. pronunciou-se, de. acordo com os estudos realizados pela Direcção-Geral dos Serviços Hidráulicos, no sentido de ser dada preferência a uma solução de tipo misto, consistindo em prolongar o molho na directriz actual por certa extensão, inflectindo-lho depois a directriz para oeste-leste, o que, conjugado com dragagens interiores, permitiria obter uma espaçosa área de manobra. Esta solução consegue satisfazer a necessidade de dar acostagem aos grandes navios e melhora muito as condições em que a área obrigada serve de aeroporto marítimo. Satisfazem-se, assim os requisitos que são de exigir a este porto para que possa inspirar confiança.
Foi dentro desta orientação elaborado o projecto de ampliação do porto do Funchal, considerando que nu última fase virá a ultrapassar o Forte de Santiago, estando previsto que, Já máximo prolongamento, a extensão do molhe a construir tenha o comprimento de 1590 m, a partir da actual testa.
Para a execução da 1.ª fase desta obra estava consignada a verba de 90 000 contos, fazendo-se o prolongamento de 300 m de molho novo, e no Plano de Fomento estava destinada a verba de 65 000 contos.
Em Agosto último o actual titular da pasta das Obras Públicas, engenheiro Arantes e Oliveira, visitou a Madeira e, nos escassos sete dias que durou a sua visita, inteirou-se de todos os problemas que, interessavam ao seu Ministério, desde os pequenos melhoramentos rurais e urbanos até ao plano da rede de estradas e às grandes obras dos aproveitamentos hidráulicos. Visitou os vários concelhos, dispensando um dia à ilha de Porto Santo.
O problema do porto do Funchal mereceu-lhe observação especial e, depois de devidamente ponderada, a questão, foi consignada a verba de 160 000 contos para este fim.
Como consequência, verificou-se que o molhe poderia ser prolongado nesta l.ª fase na extensão de 430 m. Porém, admite-se ainda a hipótese de prolongar além desses 430 m, se a economia da obra assim o permitir, dentro da dotação total que lhe foi consignada.
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Elaborado o respectiva projecto, este fui posto em praça no dia 30 de Dezembro, em conformidade com o desejo do Ministro das Obras Públicas de não passar u ano de 1954 sem a obra ser anunciada.
Foi do exame do respectivo projecto e do sen aditamento que respigámos os elementos de maior interesse aqui referidos.
Às obras a realizar constam do seguinte:
Alargamento do acesso ao molhe da Pontinha de 7 m para 15 m;
Alargamento do molhe velho de 17 m para 25 m a 35 m e aumento da profundidade do respectivo cais acostável para 6 m sob o zero hidrográfico;
Construção de um troco de cais, estabelecendo a continuidade entre os molhes velho e novo, na secção do Ilhéu, com a largura mínima de 7 m e a base às cotas (- 7,00) e (- 8,50);
Alargamento do molhe novo da Pontinha de 18 m para 40 m, ficando com a profundidade de acostagem à cota (-11,00);
Prolongamento do molhe novo numa extensão de 430 m, sendo cerca de 110 m na directriz actual e inflectindo depois na direcção oeste-leste numa extensão de, aproximadamente, 320 m.
Deste modo, o troço de cais entre o Ilhéu e o ponto de inflexão fica com 425 m, o que permite a acostagem em boas condições de dois barcos com cerca de 160 m, podendo no troço restante ficar um barco com mais de 200 m, mesmo tendo em atenção a conveniência de não utilizar o cais junto à extremidade em ocasião de temporal.
O ponto em que deve inflectir a directriz está dependente do resultado dos estudos cometidos no Laboratório Nacional de Engenharia Civil para averiguar da tranquilidade das águas na bacia abrigada do porto.
Parece que o ponto de inflexão deveria situar-se tão próximo da testa actual quanto o consentissem os requisitos de tranquilidade da área abrigada, mas, como é necessário dar a melhor utilização ao último troço de molhe existente, torna-se necessário prolonga-lo em certa extensão, seguindo a sua própria directriz.
Aumenta-se a área a dragar e a cota de dragagem. A área a dragar, que no primeiro projecto vinha só até ao enfiamento do cais de entrada da cidade. prolonga-se até mais 350 m paru leste e a cota de dragagem passa de (- 10,00) pura (- 13,00).
É de salientar a importância que representa o alargamento do molhe para 40 m. permitindo assim o estacionamento das mercai! i>rias, o trânsito de peões e veículos ligeiros e pesados, bem como o espaço necessário para a manobra dos guindastes e descarga das mercadorias.
Estes trabalhos têm tanto maior importância enquanto não for possível a construção de terraplenos na orla setentrional da bacia abrigada, os quais só serão realizados depois de prolongado suficientemente o molhe e anulada a agitação no fundo do 'porto. Isto é importante, principalmente no que respeita ao alargamento da estrada da Pontinha -considerado absolutamente indispensável- para uma largura tripla da actual a fim de permitir um conveniente acesso aos cais.
O alargamento do molhe para o lado de dentro permite estabelecer a continuidade da linha de cais acostável em frente do Ilhéu e, consequentemente, o seu melhor aproveitamento. Tem, todavia, o inconveniente de reduzir a largura da bacia abrigada, mas este inconveniente é compensado pela dragagem interior, que tem simultaneamente a vantagem de fornecer pedra para o enrocamento do molhe, influindo assim favoravelmente na execução da obra.
Temos a assinalar o cuidado de reduzir ao mínimo indispensável a altura do muro de cortina, atendendo ao facto de este se prolongar pela frente da cidade. Assim, o seu coroamento fica com 11 m, verificando-se o rebaixamento de 3,50 m, em relação ao do actual molhe novo.
O pé do muro-cais acostável fica, como dissemos, a 11 m, ou seja a unia profundidade total de 37 pés, o que dá margem suficiente para a acostagem de todos os navios que demandem o Funchal. Ba s tu referir que os maiores navios da Union Castle não excedem 32 pés de calado.
À cota do cais do actual molhe novo é de 6,57 m, mas é considerada muito elevada, motivo porque esta parte vai ser rebaixada até à cota de 5,10 m, com que vão ficar todos os cais a construir.
Ainda é de notar o cuidado com que foi elaborado o plano de trabalho, tendo em vista isto prejudicar o movimento do porto durante as obras. Assim, nas sucessivas fases de execução, realizar-se-á, em primeiro lugar, o prolongamento do molhe, e durante estas obras fica em serviço todo o cais actual. Depois de completados estes trabalhos entra em serviço o novo cais, podendo iniciar-se o alargamento do molhe novo e seguidamente, o troço de cais do ilhéu, o rebaixamento do antigo pavimento e do túnel e os alargamentos do molhe velho e do acesso.
E de salientar que, sendo o prolongamento do molhe o primeiro trabalho a realizar, estie vai mais cedo exercer a sua acção protectora na área que fica abrigada, e assim advirão logo as vantagem que resultam das melhores condições a utilizar como aeroporto marítimo.
Supomos que em breve serão estabelecidas as condições a que deve satisfazer o abastecimento de óleos à navegação e esperamos que imediatamente se iniciem os trabalhos para as respectivas instalações. É este também um importante factor a considerar pura que o Funchal readquira a sua importante posição de porto atlântico.
Para s verba de 160 000 contos consignada à ampliação do porto do Funchal a Junta Autónoma dos Portos do Arquipélago da Madeira contribui com 40 000 coutos, até ao prazo de execução das obras - seis anos na melhor das hipóteses. E certo que a Junta tem a despender quantias elevadas para o conveniente apetrechamento do porto, mas é de considerar que a construção deste constitui uma necessidade fundamental; o seu equipamento virá depois, consoante as possibilidades, começando por se adquirir aquele que for de maior necessidade. De pouco serve um equipamento perfeito e completo se a obra fundamental, que é o porto, não for satisfatória.
Sr. Presidente: alonguei-me mais do que desejava, mus a importância da obra que acabo de mencionar justifica a referência, embora sucinta, que lhe fiz.
Agora sim! A antiga aspiração dos Madeirenses - a construção de um porto com a largueza suficiente, com o abastecimento de óleos à navegação e devidamente equipado - vai ser uma realidade.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - É o turismo que vai ficar melhor servido. é a actividade económica que pode tomar maior desenvolvimento, e quem sabe até, se será possível a instalação de alguma indústria de transformação de produtos ultramarinos, aproveitando a mão-de-obra local e a energia disponível, quando estiver completada a instalação das centrais previstas no plano de aproveitamentos hidráulicos.
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Para terminar, desejo manifestar o agradecimento da madeira ao Governo, limitando-me a mencionar a deliberação tomada pela Junta Geral do Funchal em 31 de Dezembro ultimo:
A comissão executiva da Junta Geral, considerando a importância fundamental do porto do Funchal na vida económica do arquipélago e tomando conhecimento da abertura do concurso para A realização do seu melhoramento, sendo consignada a elevada verba de 160 000 contos, delibera manifestar o seu mais vivo reconhecimento: ao Sr. Presidente do Concelho, pelo interesse que este problema lhe mereceu por ter tornado possível a sua efectivação; ao Sr. Ministro das Obras Públicas, pela actuarão decisiva, como interveio e a forma interessada como orientou o seu estudo, procurando a solução mais conveniente; ao Sr. Ministro do Interior, pelo seu apoio de sempre na satisfarão desta grande aspiração madeirense, e ao Sr. Governador do distrito pela forma intensa como viveu este problema, pelo carinho e dedicação com que o acompanhou, dando o melhor do seu esforço e da sua inteligência.
Tenho dito.
Vozes : - Muito bem, muito bem !
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão.
Como a Câmara, terá notado, não chegámos a entrar em nenhum dos assuntos designados para a ordem do dia.
Quando lavrei o despacho de que resultou o aviso no Diário das Sessões designando para ordem do dia o aviso prévio do Sr. Deputado Amaral Neto e o Protocolo Adicional ao Tratado do Atlântico Norte, já tinha pressentido que não deveríamos entrar na ordem do dia. Mas eu tinha inteira necessidade, como VV. Ex.ª facilmente compreenderão, de recomeçar os trabalhos da Assembleia.
A discussão do Protocolo Adicional ao Tratado do Atlântico Norte não pôde iniciar-se no decurso desta sessão porque só hoje o parecer da Câmara Corporativa foi anunciado à Assembleia, e, portanto, as nossas Comissões de Negócios Estrangeiros e do Defesa Nacional precisam de examinar esse parecer e a própria Camará precisa também de tomar conhecimento dele para poder pronunciar-se em consciência sobro o Protocolo Adicional.
Quanto ao aviso prévio do Sr. Deputado Amaral Neto sobre a necessidade de se modificarem algumas disposições do Código da Estrada, entendi não ser conveniente paru a própria eficiência dos avisos prévios iniciar-se hoje a sua efectivação, sem deixar algum tempo útil ao digno Deputado avisante para ultimar a sua preparação.
Hoje, porém, o Sr. Deputado Amaral Neto disse-me que, como estava anunciado para ordem do dia o seu aviso prévio, se encontrava preparado para a sua efectivação.
Constituirá, pois, esse aviso prévio u ordem do dia da sessão de amanhã.
Precisava de dar esta justificação à Câmara sobre esta infracção do Regimento, que ti minha consciência não tinha sido indiferente, mas que todavia foi útil, porque tornou possível a realização, antes da ordem, de intervenções do muito interesse.
Seguir-se-á, nos trabalhos da Câmara, a discussão do Protocolo Adicional ao Tratado do Atlântico Norte.
Amanhã haverá sessão, tendo por ordem do dia a efectivação do aviso prévio do Sr. Deputado Amaral Neto. Está encerrada a sessão.
Eram l1 horas e 30 minutos.
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Alberto Cruz.
Alberto Henriques de Araújo.
Armando Cândido de Medeiros.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Camilo António de Almeida Gama Lemos Mendonça.
Carlos Mantero Belard.
Jerónimo Salvador Constantino Sócrates da Costa.
João Afonso Cid dos Santos.
João Maria Porto.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim de Pinho Brandão.
Jorge Pereira Jardim.
José Gualberto de Sá Carneiro.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel de Magalhães Pessoa.
Manuel Maria do Lacerda de Sousa Aroso.
Manuel Maria Múrias Júnior.
Manuel Maria Vaz.
Pedro de Chaves Cymbron Borges de Sousa.
Urgel Abílio Horta.
O REDACTOR - Luís de Avillez.
Alocução proferida por S.Ex.ª o Sr. Presidente da República no dia 1 de Janeiro, no Salão Nobre da Assembleia Nacional:
Vim a esta Casa para agradecer a gentileza que VV. Ex.as. tiveram de me levar a Belém os desejos de bom Ano Novo. Também aqui deixo votos muito sinceiros e calorosos por que o novo ano seja próspero para todos os portugueses. E a VV. Ex.as , que, nesta Casa, trabalham a bem da Nação, formulo os meus votos de completo êxito no vosso trabalho. E a todos VV. Ex.as. desejo também um novo ano muito feliz.
Reposta do Sr. Presidente da Assembleia Nacional:
É sempre para os representantes da Nação uma grande honra o receberem V. Ex.ª nesta Casa: e nem o facto de se tratar de um acto protocolar, com longa, tradição, diminui em nós o reconhecimento à gentileza, nem na Nação o seu profundo significado político. Os meus agradecimentos, pois. em nome da Assembleia Nacional.
Sr. Presidente: no mundo ocidental a que pertencemos parece certo que os povos celebraram com excepcional efusão e alegria o ciclo festivo em que se integra o dia de hoje, não faltando mesmo algumas notas profundamente simpáticas, de ternura e dê bondade.
Oxalá isso fosse o prenúncio de que os povos vão atinando a sua sensibilidade pela doce sensibilidade portuguesa e cristã, à qual repugna o ódio, a injustiça e a violência nas relações entre os indivíduos e entre as nações. .Oxalá assim tora ... e não teríamos a ensombrar o nosso espírito no dealbar do novo ano algumas graves preocupações pela integridade dos nossos legítimos direitos de soberania em pedaços do Império
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particularmente arreigados ao nosso afecto e justo amor próprio de povo civilizador. Pura aí vão, irresistivelmente, neste momento, os nossos pensamentos, os nossos corações, a nossa inteira solidariedade com os povos e com os soldados a quem tocou a honra de defender o direito e a integridade do velho Portugal.
E à volta de v. Ex.ª, como Chefe Supremo da Nação e sobre quem naturalmente incidem as maiores responsabilidades, formam todos os portugueses, naquela perfeita unidade moral e cívica que o dever para com a Pátria lhes impõe.
Paru todos os portugueses, na pessoa de V. Ex.ª, mas em especial para os que no Portugal de além-mar vão construindo, nos altos postos ou nos misteres humildes, o Império, e sobretudo para aqueles sobre quem paira uma ameaça iminente e injustíssima, vão este ano as nossas saudações e ou nossos votos de que, apesar de tudo, o ano que hoje se inicia seja um ano bom, um ano feliz.
Quem sabe?
Vale muito a força do direito e a firmeza inabalável em o defender.
Esperemos, Sr. Presidente, que o espírito (lê justiça penetre cada vez mais as relações dos indivíduos e dos povos. Sem viu não pode haver verdadeiramente nem paz social nem internacional.
Convenção Cultural Luso-Britânica
As excelentes e antigas relações e a multiplicidade de laços de ordem política, comercial e cultural existentes entre Portugal e a Inglaterra justificam plenamente a ideia que presidiu à feitura deste Acordo, que é a de intensificar os contactos entre os dois povos, a fim de melhor se tornarem conhecidas em cada um deles as manifestações do espírito e da técnica e as concepções de vida do outro. As relações culturais entre os dois países, que até agora se revestiam de carácter ocasional, é proporcionada uma continuidade sem a qual um perfeito conhecimento e entendimento não são possíveis, e esta circunstância reveste-se de uma importância especial para Portugal, cujos meios e disponibilidades de expansão são necessariamente mais limitados que os da Inglaterra.
A execução do Acordo e a sua efectivação prática parece ficarem asseguradas pela existência da Comissão Mista prevista no artigo x, a qual, sob a superintendência em Portugal do Instituto de Alta Cultura, se reunirá regularmente e elaborará propostas pormenorizadas para a efectivação da Convenção, constituindo assim garantia segura de que os seus fins se não destinam a cair no esquecimento.
Através da criação de leitorados para o estudo da língua, da literatura e da história dos dois países, da fundação de institutos culturais e das facilidades nele previstas para o intercâmbio de professores, concessão de bolsas de estudo, organização de cursos de férias, concessão de subsídios para visitas de estudo e organização de conferências, concertos e exposições se procurarão atingir os objectivos do presente instrumento.
A Convenção Cultural Luso-Britânica representa, assim, sem dúvida, uma importante contribuição para a expansão da cultura portuguesa no Reino Unido e para a alta finalidade de um melhor entendimento entre os dois povos, através de um mais perfeito conhecimento recíproco.
O Ministro dos Negócios Estrangeiros, Paulo Arsénio Viríssimo Cunha,
Cultural convention between Portugal and the United Kingdom of Great Britain and Northern Ireland
The Governmeut of the United Kingdom of Great Britain and Northern Ireland and the Government of the Republic of Portugal;
Desiring to conclude a Couvention for the purpose of promoting by friendly interchange and co-operation the fullest possible knowledge and understanding in their respective contries of the intellectual, artistic: and scientific activities as well as of the customs and social life of the other country;
Have agreed as follows:
ARTICLE l
Each Contracting Party undertakes to encourage as far as possible the creation in its universities and other institutions of Higher Education of Professorial Chairs, Institutes. Readerships and Lectureships for the study of the language, literature and history of the country of the other.
ARTICLE 2
Each contracting Party shall have the right to establish cultural institutes in the territory of the other provided that it compiles with the provisions of the local law about the establishment of such instituted. The term «institute» shall include in this case schools, libraries, film libraries. and other kinds of cultural centres intended to fulfil the objects of the present Couvention. In order to facilitate the establishment of such institutes the Contracting Parties will grant als facilities for importation of indispensable material such as books, gramophones, gramophone records, radio receivers, cinematographic films, projectors, and pictures for exhibitiou, provided that this material is ex-clusively for the use of the said institutes and not for re-sale.
ARTICLE 3
The Contracting Parties undertake to encourage the interchange of teachers, students and research workers in als branches of knowledge, not excluding scientinc activities and techniques, provided that these have an academic character and fit into the general conception of teaching.
ARTICLE 4
The Coutracting Parties shall arrange for the provision of scholarships or bursaries in such manuer as to enable nationals of each of them to pursue or undertake studies, technical training or research in the territory of the other.
ARTICLE 5
Each Contracting Party shall consider how far, and under what conditions, academic titles, degrees, diplomas and certificates conferred in the territory of one Contracting Party, including those connected with the exercise of the professions, shall be held to be equivalent to those conferred in the territory of the other.
ARTICLE 6
Each Contrating Party shall facilitate the developmeut of holiday courses for teachers, and for students and graduates of the institutions of Higlier Education of the other.
ARTIGLE 7
The Contracting Parties shall encourage by invitation or the grant of subsidies reciprocal visits of selected groups of scientists, artists and representatives of
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other professions and occupations in order to develop cultural relations in all the, fields covered by the present Convention.
ARTICLE 8
The Contracting Parties will assist each other in endeavours to make the culture of one Party better known in the territory of the other by means of cultural publicity such as:
(a) Books. periodicals and other publications;
(b) Lectures and concerts;
(c) Fine Art and other exhibitions;
(d) Dramatic performances;
(e) Radio, films, gramophone records and other mechanical means of reproduction.
ARTICLE 9
Subject to the provisions of Article 16, in order to carry out the objects mentioned in the present Convention each Contracting Party shall facilitate the grant of permission to enter and reside in its territory to the officials and technicians accredited by the other Contracting Party or its responsible organisation nominated in Article 14.
ARTICLE 10
For the purposes of this Convention a permanent Mixed Commission, consisting of three British and three Portuguese members, shall be set up. The three British members shall be appointed by and the terms of their appointment shall be fixed by the British Council and the three Portuguese members shall be appointed by and the terms of their appointment shall be fixed by the Instituto de Alta Cultura. The British Council and the Instituto de Alta Cultura shall each be authorised to appoint additional members without voting powers as advisers on specialist questions.
ARTICLE 11
The Mixed Commission shall meet within twelve months of the date on which the present convention shall enter into force, and thereafter, unless it shall be otherwise determined by agreement among its members, not less often than once every other year. Its meetings shall be held in Portugal and the United Kingdom in turn. For the purpose of these meetings the Commission shall In president over by a seventh member appointed when the meeting is to be held in Portugal by the Instituto de Alta Cultura, and when the meeting is to be held in the United Kingdom by the British Council.
ARTICLE 12
The Mixed Commission shall make its own rules of procedure.
ARTICLE 13
One of the first tasks of the Mixed Commission shall be to draw up detailed proposals for the application of the present Convention which will then be considered by the Contracting Governments. At its further meetings the Commission shall review the position and draw up further proposals or suggest modifications to its previous recommendations, for consideration by the Contracting Governments.
ARTICLE 14
On the United Kingdom side the British Council, and on the Portuguese side the Instituto de Alta Cultura, shall be the responsible organisation charged with the proper execution of this Convention and the realisation of its high purposes.
ARTICLE 15
In the present Convention the expression «territory» shall mean in relation to the Government of the United Kingdom, the United Kingdom of Great Britain and Northern Ireland and in relation to the Portuguese Government, the continental territory of Portugal and the Adjacent Islands.
ARTICLE 16
Nothing in the present Convention shall affect the obligation of any person to comply with the laws and regulations in force in the territory of either Contracting Party concerning the entry, resident and departure of foreigners.
ARTICLE 17
The present Convention shall be ratified. The ex-change of the instrument of ratification shall take place in London. The Convention shall enter into force on the l5th day after the exchange of the instruments of ratification.
ARTICLE 18
The present Convention shall remain in force for a minimum period of five years. Thereafter, if not denounced by either Contracting Party. not less than six months before the expiry of that period , it shall remain in force until the expire of six months from the date on which either Contracting Party has given notice of denunciation.
In witness whereof the undersigned. being duly authorised thereto by their respective Governments, have signed the present Convention and affixed hereto their seals.
Done in duplicate at Lisbon on the nineteenth day of November, 1954 in the English and Portuguese languages. both texts being equally authoritative.
For the Government of the United Kingdom:
N. Ronald.
For the Portuguese Government:
Paulo Cunha.
Convenção, cultural entre Portugal e o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte
O Governo da República Portuguesa e o Governo do Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte,
Desejando concluir unia Convenção com o fim de promoverem nos seus respectivos países, por intercâmbio e cooperarão amigáveis, um conhecimento o uma compreensão tão completos quanto possível das actividades intelectuais, artísticas e cientificas e dos costumes e da vida social do outro país,
Acordaram no seguinte:
ARTIGO I
Cada uma das Partes Contratantes compromete-se a fomentar, na medida do possível, a criação, nas suas Universidades e escolas superiores, de cátedras, institutos e leitorados para o estudo da língua, literatura o história do país da outra Parte Contratante.
ARTIGO II
Cada uma das Partes Contratantes terá o direito de fundar institutos culturais no território da outra Parte, sob condirão de serem observadas as disposições da lei
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local relativa à fundação de tais institutos. O termo «instituto» abrangerá, neste caso, escolas, bibliotecas, colecções de fitas cinematográficas e outras modalidades de centros de cultura que se destinem u realização dos fins da presente Convenção. No sentido de facilitar n fundação dos referidos institutos, as Partes Contratantes concederão todas as facilidades para a importação do material indispensável, como livros, gramofones, discos, receptores de rádio, fitas cinematográficas, maquinas de projecção e quadros destinados a exposições, contanto que tais objectos se destinem exclusivamente ao uso dos mencionados institutos e não a revenda.
ARTIGO III
As Partes Contratantes comprometem-se a fomentar o intercâmbio de professores, estudantes e investigadores de todos os ramos do conhecimento, sem exclusão das actividades e técnicas científicas, desde que tenham carácter académico e entrem no conceito geral de ensino.
ARTIGO IV
As Partes Contratantes providenciarão no sentido de conceder bolsas de estudo ou subsídios aos bolseiros, de fornia a permitir aos nacionais de cada uniu delas prosseguir ou iniciar estudos, estágios técnicos ou investigações no território da outra.
ARTIGO V
Cada Parte Contratante determinará até que ponto sob que condições poderão ser concedidas equiparações de títulos, graus e exames académicos obtidos ou feitos no território da outra, inclusivamente quanto aos relacionados com n exercício de actividade profissional.
ARTIGO VI
Cada uma das Partes Contratantes auxiliará o desenvolvimento de «cursos de férias» para professores e para diplomados e estudantes de escolas superiores da outra.
ARTIGO VII
As Partes Contratantes promoverão também, por meio fie convites ou pela concessão de subsídios, visitas recíprocas de grupos seleccionados de cientistas, artistas e figuras representativas de outras profissões e actividades, com o fim de desenvolverei)! as relações culturais em todos os domínios abrangidos pela presente Convenção.
ARTIGO VIII
As Partes Contratantes prestar-se-ão assistência mútua na» iniciativas tendentes a melhorar o conhecimento, no território de cada uma delas, da cultura da outra, através de meios de expansão cultural tais como:
(a) Livros, periódicos e outras publicações;
(b) Conferências e concertos; (r) Exposições de arte e mitras; (ti) Espectáculos teatrais;
(c) Rádio, fitas cinematográficas, discos de gramofone e outros meios mecânicos de reprodução.
ARTIGO IX
A fim de executar os objectivos mencionados na presente Convenção, cada uma das Partes Contratantes, com reserva do disposto no artigo XVI. facilitará a concessão de autorizações de entrada e permanência no seu território aos funcionários e técnicos acreditados pela outra ou pela entidade responsável designada pelo artigo XIV.
ARTIGO X
Para os efeitos desta Convenção, estabelecer-se-á uma Comissão Mista permanente, constituída por três membros britânicos e três portugueses. Os três membros britânicos serão nomeados, e as suas condições de nomeação fixadas, pelo British Council, e os três membros portugueses serão nomeados, e as suas condições de nomeação fixadas, pelo Instituto de Alta Cultura. O British Council e o Instituto' de Alta Cultura serão autorizados a nomear membros adicionais, sem poderes de voto, como consultores em assuntos especializados.
ARTIGO XI
A Comissão Mista reunir-se-á dentro do doze meses, a contar da entrada em vigor da presente Convenção, após o que, salvo determinação diferente acordada pelos seus membros, voltará a reunir-se, pelo menos, uma vez de dois em dois anos. As suas reuniões realizar-se-ão alternadamente em Portugal e no Reino Unido. Nestas reuniões a Comissão será presidida por um sétimo membro, designado pelo Instituto do Alta Cultura quando a reunião se realizar em Portugal e pelo British Council quando se realizar no Reino Unido.
ARTIGO XII
A Comissão Mista elaborará o seu próprio Regimento.
ARTIGO XIII
Um dos primeiros trabalhos da Comissão Mista será o de elaborar propostas pormenorizadas para a efectivação ida presente Convenção, que serão estudadas pelas Partes Contratantes. Nas suas reuniões subsequentes a Comissão examinará n situação e elaborará novas propostas ou .sugerirá modificações às suas recomendações anteriores, para consideração das Parles Contratantes.
ARTIGO XIV
O Instituto de Alta Cultura, do lado português, e o British Council, do lado britânico, serão as entidades responsáveis encarregadas da boa execução desta Convenção e da efectivação dos seus elevados fins.
ARTIGO XV
Na presente Convenção a expressão «território» designará, em relação ao Governo do Reino Unido, o reino unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte e em relação ao Governo Português, o território continental de Portugal e as ilhas adjacentes.
ARTIGO XVI
Nenhum dos preceitos contidos nesta Convenção poderá dispensar qualquer entidade do cumpri mento das leis e regulamentos em vigor no território de qualquer das Partes Contratantes, relativamente à entrada, residência e saída de estrangeiros.
ARTIGO XVII
A presente Convenção será ratificada. A troca dos instrumentos de ratificação realizar-se-á em Londres. A Convenção entrará em vigor quinze dias após a troca rios instrumentos de ratificação.
ARTIGO XVIII.
A presente Convenção permanecerá em vigor durante um prazo mínimo de cinco anos. Decorrido este prazo, se não tiver sido denunciada por nenhuma das Partes
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Contratantes pelo menos seis meses antes rio seu termo, continuará em vigor até seis meses depois da data em que qualquer das Partes Contratantes comunicar à outra a respectiva denúncia.
Em fé do que os abaixo assinados, devidamente autorizados para o efeito pelos seus respectivos Governos firmaram a presente Convenção e lhe apuseram os seus selos.
Feito em duplicado em Lisboa, no dia dezanove de Novembro de- 1954, em inglês e português, tendo ambos os textos igual valor.
Pelo Governo Português:
Paulo Cunha
Pelo Governo do Reino Unido:
N. Ronald
CÂMARA CORPORATIVA
VI LEGISLATURA
PARECER N.º 11/VI
Protocolo Adicional ao Tratado do Atlântico Norte
A Câmara, Corporativa, consultada, nos termos do artigo 103." da Constituição, acerca do Protocolo Adicional ao Tratado do Atlântico Norte para acessão da República Federal Alemã, emite pela sua secção de Interesseis de ordem administrativa (subsecções de Política e administração geral e Relações internacionais), a qual foi agregado o Digno Procurador José Caeiro da Mata, sob a presidência de S. Ex.ª o Presidente da Câmara, o seguinte parecer:
1. Não carece de larga explanação a matéria sobre n qual esta Câmara tem de se pronunciar. O facto que u Europa de hoje se apresenta como problema, neutral da sua vida política é, sem dúvida, o da consolidação da estrutura, tão fortemente abalada, da unidade do Ocidente; o que no aspecto militar mais importa é encontrar a fórmula para a inclusão da Alemanha Ocidental num bloco de defesa do Ocidente; o que juridicamente maior importância reveste é permitir à República Federal Alemã recuperar a sua soberania em condições que a liguem mais aos países ocidentais, sem outra limitação que não seja a que é imposta pelas condições geográficas.
2. A Europa Oriental, compreendida a Alemanha de Leste, está sob o domínio soviético; os exércitos russos estão instalados em Weimar. Não se poderá desconhecer a ameaça que esse bloco hermético de 25U milhões de homens, constituído pela Rússia e seus satélites - podendo, algumas semanas depois de abertas as hostilidades, traduzir-se 'por uma força de 440 divisões -, faz pesar sobre a parte ainda livre da Europa Continental a oeste, daquilo que o Sr. Winston Churchill, em fórmula hoje corrente, denominou de «cortina de ferro».
3. O Pacto do Atlântico Norte, assinado em Washington em 4 de Abril de 1949 - o primeiro acordo internacional inspirado na 'preexistência de uma comunidade, atlântica -, foi o fruto do trabalho das potências associadas no mesmo empreendimento de defesa comum, de que aquele histórico documento é instrumento e expressão. Trata-se de uma obra de defesa para fins de paz - nunca será demasiado repeti-lo, h ele traduz a vontade deliberada das potências ocidentais de resistirem pela força à agressão que pela força as ameaça. E, decerto, lamentável que as condições actuais do 'Mundo, em que há. porventura, menos tensão do que confusão, tenham tomado a preparação para a guerra a única forma possível de garantir a paz. Mas é dever dos homens aos quais incumbe a pesada responsabilidade da salvaguarda da civilização ocidental encarar de face aquela realidade.
4. Não se torna necessário analisar neste momento a acção desenvolvida pelas nações associadas no Pacto para realizar os seus objectivos. Mas uma certeza se nos revela já: a de que, a despeito de todas as dificuldades de ordem técnica ou material, de susceptibilidades nacionais que não seria lícito ignorar, de diferenças de mentalidade e de formação histórica, foi possível associar numa íntima aliança as duas grandes nações da América do Norte e a quase totalidade das nações livres da Europa, dispostas a defender a sua independência e a sua concepção da vida. O que está feito permite-nos esperar que cheguemos àqueles desenvolvimentos nas relações entre as potências a que tão incisivamente aludia o Sr. Presidente do Conselho ,no seu discurso de 25 de Julho de 1949 na Assembleia Nacional.
5. O problema da participação da Alemanha na defesa do Ocidente foi posto pela primeira vez em 1950,
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na reunião em Nova Iorque do Conselho do Pacto do Atlântico Norte. Já então Portugal se pronunciava a favor da admissão da Alemanha no Pacto, como o fez de novo em Fevereiro de 1952, na reunião de Lisboa. A aprovação pela Assembleia Nacional do documento que agora lhe é submetido não será senão a consequência da posição que o Governo Português rinha de há quatro anos considerando como iniludivelmente imposta pelas circunstâncias.
6. Na reunião do Conselho do Atlântico Norte em Paris, no passado mês de Outubro, a qual assistiram os Ministros dos Negócios Estrangeiros dos países membros da aliança defensiva criada pelo Tratado do Atlântico Norte, o Conselho ocupou-se do estudo das condições destinadas a garantir a plena associação da República Federal Alemã com os países ocidentais e a contribuição alemã para a defesa comum. A República Federal Alemã havia declarado em 3 do mesmo mês que aceitam as obrigações consignadas na Carta das Nações Unidas, no seu artigo 2.º, e que se comprometia a abster-se de qualquer acção incompatível com o carácter estritamente defensivo do Tratado do Atlântico Norte.
Diga-se, de passagem, que o Conselho notou, com aplauso unânime, que todas as decisões da Conferência de Londres s das reuniões subsequentes das conferências dos quatro e das nove potências (a primeira relativa à soberania da Alemanha Federal e a segunda à sua participação e à da Itália no Tratado de Bruxelas __ de 17 de Março de 1948) fazem parte de uma única solução geral, que interessa directa ou indirectamente todos os países membros da Organização do Tratado do Atlântico Norte.
7. Em 23 do referido mês de Outubro foi assinado pelos Ministros dos Negócios Estrangeiros um Protocolo Adicional ao Tratado do Atlântico Norte, convidando a República Federal Alemã a aceder ao Tratado. Este Protocolo entrará em vigor quando as Partes do Tratado do Atlântico Norte tiverem comunicado n nua aceitação ao Governo dos Estados Unidos da América, quando todos os instrumentos de ratificação do Protocolo que modifica e completa o Tratado de Bruxelas tiverem sido entregues ao Governo Belga e quando todos os instrumentos de ratificação ou aprovação da convenção sobre a presença de forças estrangeiras no território da República Federal Alemã ao Governo desta tiverem sido entregues. Os dois últimos casos não nos dizem, porém, directamente respeito.
Referência deve ser feita ao facto da aprovação pela Câmara dos Deputados italiana, em 23 de Dezembro findo, dos acordos de Paris que instauram a União Europeia Ocidental e admitem a entrada na O. T. A. N. da República Federal Alemã e a aprovação dos mesmos acordos pela Assembleia Nacional Francesa, em 27 do mesmo mês. Não será preciso notar que é essencial a maneira como a França e a Alemanha passem a considerar as suas relações recíprocas: sem a Alemanha, a linha de defesa da França passaria do Elba para o Reno; sem a França, seria bem mais difícil salvaguardar o Ocidente.
8. Como se nota em clara exposição feita pelo Sr. Ministro do» Negócios Estrangeiros, talvez valha a pena registar que uma contribuição militar da Alemanha, restituída à sua soberania no território em que é livre, pode, em dadas circunstâncias, ter para os nossos interesses nacionais uma decisiva importância. Se for directamente ameaçada, a Europa procurará defender-se o mais a leste possível - tal é o lema militar da O. T. A. N. E unia Alemanha, embora mutilada, mas de novo investida na sua maioridade política, constituirá em caso de guerra um obstáculo poderoso u submersão da Europa pelos exércitos do possível inimigo. Acentue-se que, tendo já a Assembleia Nacional, em sessão de 23 de Março de 1953 (após o parecer desta Câmara n.º 42/V, publicado no Diário da* Sessões n.º 218, de IS de Março de 19M), aprovado porá a ratificação o Protocolo Adicional ; no Tratado do Atlântico Norte sobre garantias dada* pelos Estados partes no Tratado aos Estados membros da Comunidade Europeia de Defesa, quando se pensava que seria a incorporação nesta com unidade o forma .preferível de integrar a República Federal Alemã no sistema de defesa do Ocidente, o processo de acessão directa da Alemanha a O. T. A. N. que, frustada essa primeira fórmula, agora é adoptado para conseguir o mesmo objectivo não altera, evidentemente, a posição portuguesa. Mesmo a decisão tomada na última reunião ministerial do Conselho em Paris, que coloca sob a autoridade do Comando Supremo Aliado na Europa todas as forças estacionadas na área daquele Comando, não modifica aquela posição. Por intervenção da delegação portuguesa, aceite pelo Conselho, ficou esclarecido que Portugal não está compreendido na zona daquele Comando.
9. Pelas razões expostas, a Câmara Corporativa é de parecer que o Protocolo Adicional ao Pacto do Atlântico Norte para acessão da República Federal Alemã deve ser aprovado pela Assembleia Nacional, para ratificação pelo Chefe do Estado, na forma da Constituição.
Palácio de S. Bento, 7 de Janeiro de 1955.
Afonso de, Melo Pinto Veloso.
Guilherme Braga da Cruz.
José Pires Cardoso.
Luís Supico Pinto.
Manuel Duarte Gomes da Silva.
António Faria Carneiro Pacheco.
Augusto de Castro.
Manuel António Fernandes.
José Caeiro da Mata, relator.
IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA