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REPUBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL
DIÁRIO DAS SESSÕES
N.º 82
ANO DE 1955
II DE FEVEREIRO
ASSEMBLEIA NACIONAL
VI LEGISLATURA
SESSÃO N.º 82, EM 10 DE FEVEREIRO
Presidente: Ex.mo Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior
Secretários: Ex.mos Srs.
Gastão Carlos de Deus Figueira
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues
SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas 30 minutos.
Antes da ordem do dia. - Foi aprovado o Diário das Sessões n.º 80, com rectificações dos Srs. Deputados José Sarmento e, Amândio de Figueiredo.
Deu-se conta do expediente.
O Sr. Presidente congratulou-se com o regresso aos trabalhos parlamentares do Sr. Deputado Joaquim Mandes da Amaral, após uma longa doença.
Usou da palavra o Sr. Deputado Camilo Mendonça, que se referiu, com louvor, à proposta de lei sobre classificação rural; o Sr. Deputado Elísio Pimenta enviou um requerimento para a Mesa.
Ordem do dia. - Continuou o debate sobre o aviso prévio do Sr. Deputado Paulo Cancella de Abreu acerca de problemas vitivinícolas.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Amaral Neto, Furtado de Mendonça, Pinho Brandão e Amândio de Figueiredo.
O Sr. Presidente declarou encerrada a sessão às 19 horas e 40 minutos.
O Sr. Presidente : - Vai proceder-se à chamada.
Eram 16 horas e 20 minutos.
Fez-se a chamada, â qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Adriano Duarte Silva.
Alberto Cruz.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Pacheco Jorge.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alexandre Aranha Furtado de Mendonça.
Alfredo Amélio Pereira da Conceição.
Amândio Rebelo de Figueiredo.
Américo Cortês Pinto.
André Francisco Navarro.
Antão Santos da Cunha.
António Abrantes Tavares.
António de Almeida.
António de Almeida Garrett.
António Bartolomeu Gromicho.
António Calheiros Lopes.
António Camacho Teixeira de Sousa.
António Carlos Borges.
António Cortês Lobão.
António Pinto de Meireles Barriga.
António da Purificação Vasconcelos Baptista Felgueiras.
António Bani Galiano Tavares.
António Rodrigues.
António dos Santos Carreto.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Proença Duarte.
Augusto Cancella de Abreu.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Baltasar Leite Rebelo de Sousa.
Caetano Maria de Abreu Beirão.
Camilo António de Almeida Gama Lemos Mendonça.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Eduardo Pereira Viana.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
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Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco Eusébio Fernandes Prieto.
Gaspar Inácio Ferreira.
Gastão Carlos de Deus Figueira.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Herculano Amorim Ferreira.
João Alpoim Borges do Canto.
João Ameal.
João Cerveira Pinto.
João Luís Augusto das Neves.
João Maria Porto.
João de Paiva de Faria Leite Brandão.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim de Pinho Brandão.
Joaquim de Sousa Machado.
Jorge Botelho Moniz.
José Dias de Araújo Correia.
José Maria Pereira Leite de Magalhães e Couto.
José Sarmento Vasconcelos e Castro.
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Luís de Azeredo Pereira.
Luís Maria Lopes da Fonseca.
Lufe Maria da Silva Lima Faleiro.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel de Magalhães Pessoa.
Manuel Maria Múrias Júnior.
Manuel Maria Vaz.
Manuel Marques Teixeira.
Manuel Monterroso Carneiro.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Manuel Trigueiros Sampaio.
D. Maria Leonor Correia Botelho.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Reis.
Mário de Figueiredo.
Paulo Cancella de Abreu.
Pedro de Chaves Cymbron Borges de Sousa.
Pedro Joaquim da Cunha Meneses Pinto Cardoso.
Ricardo Malhou Durão.
Ricardo Vaz Monteiro.
Sebastião Garcia Ramires.
Tito Castelo Branco Arantes.
Argel Abílio Horta.
Venâncio Augusto Deslandes.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 81 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 16 horas e 30 minutos.
Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente: - Está em reclamação o Diário das Sessões n.º 80.
O Sr. José Sarmento: - Sr. Presidente: desejo fazer as seguintes, rectificações a esse número do Diário das Sessões: na p. 545, col. 2.º, suprimir o que está nas 1. 10 a 17, substituindo-o por estas palavras: «Sobre o alto preço da aguardente do Douro, a que V. Ex.ª se refere, informo que no ano de 1952 o preço da referida aguardente foi unicamente 20 por cento superior à que foi fornecida pela Junta Nacional do Vinho. Se atentarmos no preço do custo dos vinhos da região do Douro e daquela onde se colheu o vinho queimado pela Junta Nacional do Vinho, conclui-se que a aguardente do Douro ficou barata, comparada com aquela». Na p. 550, col. 2.ª, deve acrescentar-se, a seguir ti 1.13, o seguinte: «Para dar uma ideia da exiguidade da superfície ocupada por aqueles terrenos, aponto que, em cerca de 141 milhões de cepas existentes no Douro, menos de l milhão se encontram nos tais terrenos».
A seguir devem antepor-se ao que está escrito as palavras e O Orador:-», visto que essas palavras seguintes já não suo minhas, mas do orador que estava no uso da palavra.
O Sr. Amândio de Figueiredo: - Desejo também fazer uma pequena rectificação no referido Diário.
A p. 545, col. 2.º, 1.39, deve intercalar-se a palavra «somente» entre as palavras «diz» e «respeito».
O Sr. Presidente: - Com o mais nenhum Sr. Deputado pede a palavra, considero aprovado o Diário das Sessões n.º 80, com as rectificações apresentadas.
Vai ler-se o
Expediente
Telegramas
Diversos, a apoiar as considerações feitas na sessão de ontem pelo Sr. Deputado Daniel Barbosa em defesa da resolução da crise vinhateira do Douro, entre os quais se destacam um da Associação Comercial do Porto e outro do Grémio dos Exportadores de Vinho do Porto.
Da Associação Industrial Portuense, a apoiar as considerações feitas pelos Srs. Deputados durante o debate do aviso prévio realizado pelo Sr. Deputado Paulo Cancella de Abreu, mormente as que se referem à região do Norte, pela influência que podem ter no desenvolvimento das actividades industriais.
O Sr. Presidente: - Chamo a atenção da Câmara.
Regressou ontem aos trabalhos desta Assembleia, dos quais esteve ausente durante muito tempo, por motivos de saúde, o Sr. Deputado Joaquim Mendes do Amaral, digno vice-presidente desta Câmara.
Eu, que tinha manifestado a VV. Ex.ªs, quando soube da sua doença, os melhores votos para que regressasse brevemente aos nossos trabalhos, julgo que interpreto os sentimentos da Assembleia transmitindo ao Sr. Deputado Joaquim Mendes do Amaral o regozijo que sentimos por vê-lo regressar à nossa camaradagem.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra antes da ordem do dia o Sr. Deputado Camilo Mendonça.
O Sr. Camilo Mendonça: - Sr. Presidente: não poderia deixar de me referir desde já à proposta de lei sobre a electrificação rural, que os Srs. Ministros das Obras Públicas e da Economia acabam de enviar a esta Assembleia; de me referir a essa proposta de lei para louvar os seus propósitos e regozijar-me com a sua oportunidade. Bem hajam os Srs. Ministros que a subscrevem. Bem hajam, pois vão ao encontro de uma necessidade indiscutida e visam um dos objectivos mais necessários ao progresso das nossas gentes do campo, que bem o merecem. Bem hajam, Srs. Ministros, são as palavras que desde já sinto dever dizer-lhes.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: quem se detiver na observação dos consumos de energia eléctrica por habitante nas diferentes regiões do País, rapidamente verificará encontrar-se o distrito de Bragança no fundo da escala, com uma capitação interior duas vezes e meia à de Beja - que imediatamente se lhe segue - e cerca de quinze vezes à de Aveiro, que se situa numa posição média, embora tenha um consumo mais de cinco vezes menor do que o Porto.
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Quer dizer: nos começos deste ano de 1955 o consumo de energia eléctrica em Bragança é ainda praticamente nulo! A electricidade continua, pois, a ser para aquelas longínquas terras simultaneamente um sonho e um luxo.
Não obstante ... não obstante dispõe da nossa maior fonte de energia: o Douro - o Douro, a que, enfim, acabou por chegar a vez de ser aproveitado, de ser posto ao serviço do progresso económico do País.
Mas, Sr. Presidente, a situação de Bragança no que respeita à electricidade não se notabiliza apenas por ocupar o último posto dos consumos per capita. Igual glória lhe cabe quanto a percentagem, das freguesias rurais electrificadas, distinguindo-se por apresentar uma percentagem (melhor seria falar em permilagem...) vinte vezes inferior à de Évora (!), que ocupa o penúltimo lugar da escala.
Se a isto acrescentarmos que toda a sua energia é de produção local, por se encontrar desligado da rede geral, terei dado um quadro expressivo da situação: o distrito de Bragança constitui uma mancha escura na geografia do consumo de energia entre nós!
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: Bragança vive, de há unos a esta parte, o sonho da sua electrificação. Tem esperado paciente e resignadamente a sua hora, que por vezes chegou a julgar próxima. De quando em quando surgia uma esperança, pronunciava-se uma possibilidade, mas ... era sol de pouca dura, esperança que rapidamente se desfazia ..., por isto ou por aquilo, por tudo e por nada, mais parecendo já por anátema do que por quaisquer dificuldades materiais concretas.
Entretanto, rodaram os anos e a esperança ia-se convertendo em descrença, o sonho só podia constituir uma manifestação de sebastianismo, porque luz, luz clara, nunca se conheceu outra que a do Sol que Deus nos dá.
Entretanto ... o mês de Setembro de 1952 faz renascer a esperança: o Pais toma conhecimento da proposta de lei do Plano de Fomento e... Trás-os-Montes vê incluída a electrificação da província nas tarefas a executar.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: posso dizer, com verdade, que tudo se alvoroçou: a esperança ia converter-se em realidade, o sonho ia materializar-se. Descrente não sei se ficou ainda a haver algum. Se ficou, emudeceu. Trás-os-Montes ia ser ligada à rede geral e, para além disto, via ainda inscrita uma verba de 200 000 contos na rubrica «Rede de pequena distribuição das zonas rurais e das urbanas dos concelhos pobres». Rejubilou. Rejubilou e ... aguardou. E ... aguarda já há mais de dois anos a hora da sua electrificação.
É certo que o Plano do Fomento diz respeito a seis anos e que a todas as tarefas há-de chegar a vez, mas também ú verdade que nem faltam disponibilidades de energia ou de dinheiro, nem planos, nem empresas interessadas.
Não ignoro - e seria injusto se o não referisse expressamente - estar o Sr. Ministro da Economia empenhado na pronta solução do problema, com que por mais de uma vez se tem preocupado, mas sei também ser ao Conselho Económico, nos termos da base m do Plano de Fomento, que incumbe a resolução dos problemas nele incluídos.
Por isso, daqui apelo para o Governo para que não demore a satisfação desta nossa aspiração - a concretização desta nossa urgente necessidade-, atrevendo-me a pedir no Sr. Ministro da Economia que para além dos esforços já despendidos, não deixe de se interessar pela electrificação de Trás-os-Montes, pois não deixará de encontrar no nosso anseio motivos para redobrado ânimo na definição da almejada solução do problema.
Sr. Presidente: a solução urge, dizia eu, urge porque dela depende a possibilidade de desenvolvimento económico e de melhoria social de uma região que, nem por ser longínqua, nesta pequena faixa continental, poderia ser votada ao esquecimento, continuar no ostracismo em que muitos e muitos anos a deixaram.
Mas urge também por razões de facto e de circunstância, que elevam ao paroxismo a desproporção entre o potencial da natureza e os meios de que os homens dispõem para o dominar e aproveitar. E não se faça a observação - descabida dentro dos princípios de acção governativa que definimos - de que, quem esperou até hoje, esperou muito, pode esperar mais algum tempo ... E não se faça essa observação, porque não pode nem deve esperar mais!
Para além das imposições de justiça distributiva e do dever de solidariedade nacional, indiscutidos e indiscutíveis, há, dizia, razões de facto e circunstância que multiplicam a urgência e tornam a resolução inadiável.
De facto ... enquanto nos últimos anos as soluções se entreabriam como clareiras e depois o Plano de Fomento deu corpo ao anseio, as câmaras municipais ficaram impossibilitadas, por uma simples questão de elementar principio de sã administração, ficaram inibidas de melhorar as suas centrais para acompanhar o ritmo de desenvolvimento do consumo de energia. Doutra forma teriam realizado vultosos investimentos (vultosos para as suas possibilidades financeiras...) que breve - tão breve quanto o distrito fosse ligado à rede geral - se perderiam, passando a constituir pesadíssimo ónus para a sua já trágica situação financeira.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: -Ainda se os municípios não tivessem acreditado nem antevisto a próxima realização do sonho ... talvez o problema não tivesse piorado, porque não teriam deixado de encontrar, mesmo com os cofres vazios, na coragem e na boa vontade de todos os meios necessários para não consentirem o agravamento da situação, mas ... acreditaram e ... esperam confiados.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Direi a V. Ex.ª, Sr. Presidente, que, mercê destas circunstâncias, há hoje em Bragança concelhos em que a iluminação pública se resume a uma dúzia de candeeiros ... uma dúzia que, no Inverno, não pode estar acesa sequer até a meia-noite; outros onde, com frequência, a luz pública tem de ser inteiramente sacrificada às exigências da iluminação particular; outros em que as soluções de emergência são de empréstimo e favor de empresas, etc., e todos vêem, de ano a ano, agravar-se a situação no que respeita a energia eléctrica.
Seria caso para dizer: como é possível piorar ainda uma situação que de começo classifiquei como de consumo de energia praticamente nulo? Seria, mas é verdade: a situação piorou e tornou-se insustentável. A população cresceu, as exigências da vida aumentaram e a produção de energia - produção cara e deficiente - não progrediu. Eis tudo.
Sr. Presidente: Trás-os-Montes continua a confiar e ... a esperar. Confia na acção do Governo e espera a rápida solução do seu problema.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - E, se tem razões para confiar, não encontra motivos para esperar ...
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Por mim. que, tantas vezes, não sei esmerar - a esperança dá frequentemente lugar ao desespero - e ... aguardei ato hoje .... daqui apelo para o Governo e. em especial, para o Sr. Ministro da Economia, pedindo-lhe a sua atenção para o problema, e termino lembrando, ao nosso jeito de transmontanos: «Ao rico não devas e ao pobre ... não prometas».
Disse.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Elísio Pimenta: - Sr. Presidente: pedi a palavra para enviar para a Mesa o seguinte
Requerimento
«Em aditamento aos meus requerimentos de 24 de Março e de 9 de Setembro findos, e com o propósito de completar e esclarecer as respostas que amavelmente foram dadas a esses requerimentos, tenho a honra de solicitar que, pelo Ministério da Economia, me sejam fornecidos os seguintes esclarecimentos:
1.º Se da documentação existente nos respectivos serviços consta alguma referência à circunstancia de haverem eido montados maquinismos nas fábricas de cerveja, antes de 5 de Maio de 1954, sem a competente autorização;
2.º Qual a capacidade de produção da indústria da cerveja no mês de Julho dos anos de 1947, 1948 e 1949;
3.º Quais as razões, e não os efeitos, de que, sendo pública e notória a situação de monopólio em que vive há anos a indústria da cerveja no continente, tenha continuado sujeita a condicionamento pelo quadro I do Decreto-Lei n.º 39 634 a montagem de novas fábricas e se haja libertado do condicionamento a montagem de maquinismos nas fábricas existentes, isto é, nas fábricas que precisamente desfrutam de monopólio».
O Sr. Presidente: - Vai passar-se à
Ordem do dia
O Sr. Presidente: - Continua o debate sobre, o aviso prévio do Sr. Deputado Paulo Cancella de Abreu.
Tem a palavra o Sr. Deputado Amaral Neto.
O Sr. Amaral Neto: - Sr. Presidente: nesta altura do debate, em que oradores tão distintos e experimentados em problemas vitícolas, quer pelo estudo, quer pelo í rato quotidiano deles, nos disseram da sua ciência e da sua experiência, eu, que como agricultor nem sequer sou muito amigo de vinhas mão teria nada de novo a trazer a consideração de VV. Ex.ªs se me não ferisse, e profundamente, o sentimento de ser vantajoso corrigir certas unções aqui expostas, ou, ante», produzidas, em estudos claramente aproveitados por alguns Srs. Deputados e presumivelmente por isso demoradas nos seus espíritos, as quais não se conformam com o meu conhecimento de algumas realidades da viticultura no Ribatejo- do Ribatejo que, como Deputado pelo distrito de Santarém, tenho a honra de representar nesta Assembleia.
Sempre que há alguma crise vitícola, como, aliás, já foi aqui apontado, costuma manifestar-se muito interesse pela vida ribatejana, parecendo revelar-se como que uma verdadeira obsessão do Ribatejo, ou, melhor, uma obsessão dos vinhas nas terras baixas do Ribatejo.
Em directos termos ou claras alusões culpam-nas do excessivamente favorecidas pela natureza o ate pela lei, acusando-as de perturbarem a economia geral da viticultura na competição alentada por esses favores.
Vejo, porém, as argumentações expendidas em boa parte prejudicadas pelo que tomo por desconhecimento de muitos pormenores dos verdadeiros factos, e sinto que o debate ficaria falseado se estes não fossem apresentados na sua exacta natureza e mostrados à luz própria.
É ao que venho, e só ao que venho; e, embora sem contribuir para a discussão do fundo do problema, penso não ser de mais, porque as assembleias políticas determinam-se por forcas de razão, mas também por estados de emoção, poderá acontecer que, formando-se esta ou desenvolvendo-se aquelas sobre noções imperfeitas, a visão de alguns elementos do problema se deforme.
Vou ter de socorrer-me de números que se encontram divulgados, mas que nenhum de nós sabe até que ponto são rigorosos.
As primeiras palavras que tenho agora de proferir serão, pois, para deplorar que o inquérito para a execução da carta agrícola, em que se trabalha há alguns anos - anos de mais para quem a espera ansiosamente -, não esteja ainda completo, pois nos daria os únicos elementos para podermos determinar exactamente qual é a área e a natureza dos terrenos que tomo como objecto das minhas considerações.
Bem faríamos talvez todos os Deputados interessados nos problemas da economia portuguesa, problemas (pui têm de ser sempre em alguma medida problemas de economia agrária, se seguíssemos o exemplo do grande romano que, enquanto não viu a sua velha república contra Cartago, no fim de cada oração lembrava a necessidade de destruir essa rival perigosa. Bem andaríamos, penso, se nunca- esquecêssemos nas nossas intervenções a necessidade de ultimar os estudos sobre o ordenamento agrícola.
Efectivamente, Sr. Deputados, se dispuséssemos dos ensinamentos deste ordenamento, outra seria a feição do debate e outro o sentido das medidas que viessem a tomar-se sobre o problema.
Mas, voltando ao Ribatejo, queiram VV. Ex.ªs considerar, antes de mais nada. como a sua vida está estreitamente relacionada com a vida do Tejo. Uma canção popular, que andou há anos de boca em boca, estabelecia a intimidade dessa relação, mas fazia-o ao invés da natureza, porque o Ribatejo é nitidamente filho do Tejo, obra sua, pois o rio o formou e o domina ainda.
E pela situação que o Tejo pode criar àquelas extensas baixas que inunda que eu julgo dever começar os meus esclarecimentos à Assembleia.
Como VV. Ex.ªs não ignoram, o Tejo corre na primeira parte do seu curso nacional entre rochas de formação antiga e tem um leito inclinado, estreito e profundo. Ao chegar a Tancos desemboca no Golfo que ele próprio abriu e encheu, entra na verdadeira planície ribatejana e, tomando o jeito do seu troço conhecido por Tejo médio, espraia-se por larguras atingem 6 e 8 km.
Assim, acontece que os águas das enchentes do Tejo, correndo entre margens estreitas e velozes no seu apertado leito, ao chegarem o jusante de Tancos. encontrando aquela vastidão a que não vinham afeitas, se alargam consoante as particularidades do leito, que então pode ser toda a planície, e o acidental dos obstáculos, produzindo os efeitos mais variados.
Em pontos chegam as águas de estocada ou agitam-se nos redemoinhos dou filetes entrechocados, e, encontrando a terra mais fraca rui menos protegida, arrancam por dentro dela e abrem canais, que chegam quase novos brutos do rio.
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Noutras zonas as águas remancham, e na sua calma depositam as matérias sólidas que carreiam, e ura são partículas esterilizantes de areia ou rocha, ora são - cada vez menos - os autênticos nateiros, todos carregados de detritos orgânicos fertilizantes e correctivos.
Ainda noutras partes correm nem tão lentas que deixem depósito, nem tão rápidas que. rasguem o chão, mus sempre afogando as searas, matando as plantações herbáceas.
Na sua invasão as águas das cheias formaram o continuam modulando a planície ribatejana, estando calculada em 40 000 ha a área sobre que podem espalhar-se, só naquele troço do Tejo médio, entre Tancos e a foz do canal da Azambuja, ao longo de 72 km, em cujas aluviões se encontram quase todas as vinhas ... não chegarei a dizer incriminadas.
E é tempo de referir que as estimativas de que pude socorrer-me me não computam em mais de 10 000 ha a parte desta superfície plantado de vinhas, sendo, pois, oportuno pôr a pergunta: porque cultura dita tão boa e tão fortemente ligada em muitos espíritos, segundo parece, ao aproveitamento das várzeas ribatejanas só ocupa efectivamente uma quarta parte da sua totalidade, se é que a, tanto chega?
Direi que por, na verdade, só excepcionalmente SB plantarem no Ribatejo vinhas em terrenos efectivamente dotados de outras possibilidades económicas de exploração.
Um exame mais aproximado mostra que nas zonas das terras do Ribatejo onde o terreno é mais fértil pouco se encontra vinha.
E rara nos campos da Golegã, escassa nos campos da Chamusca; pouca se encontra nos de Salva terra ou Benavente e na melhor parte dos da Azambuja. Onde há vinha com dominância cultural é no concelho de Alpiarça, no de Almeirim, em campos de Vaiada e alguns de Santarém, nas manchas de aluviões fracas, onde a baixa produtividade não permite contrabalançar a incerteza de as culturas arvenses chegarem a termo, pelo risco das cheias.
Esta é que é a verdade sobre a cultura da vinha no Ribatejo.
Ali, como por toda a parte, ama-se a terra e respeita-se pelos frutos que pode dar; onde ela ú realmente capaz de criar pão raros se têm atrevido a desviá-la para a vinha, e esses mesmos só em tempos recentes, sob a influencia das circunstâncias em que os homens e a natureza todos pareciam votados a desanimai- a cultura cerealífera. Mas depressa descobriram que nessas terras, de que a vinha não será digna, também o vinho não é o melhor.
O Sr. Camilo Mendonça: - V. Ex.ª dá-me licença?
Muito agradecia a fineza de me responder a estas duas perguntas: primeiro, se de há quatro anos a esta parte V. Ex.ª tem verificado qualquer aumento nas plantações naquelas áreas que aqui têm sido condenadas como indicadas para a vinha; segundo, se a plantação nestas zonas não teria sido preterida por outras culturas na hipótese de os preços nu de os rendimentos que o agricultor pudesse auferir estarem proporcionado.
O Orador: - Posso responder que na área das minhas observações mais imediatas só tenho visto fazer plantio de vinha em terras fracas e depois de se verificar em anos sucessivos que as culturas arvenses não eram satisfatórias.
Onde a terra é rica e fértil disputam-na quase com violência; que o digam os proprietários, muitas vezes pouco menos que insultados se não se prestam a arrendar ou dar de parceria, para o melão, para o tomate., para o pimento e ainda há pouco - mas já não infelizmente! - para o cânhamo, os terrenos que lhes silo propícios.
Tanto quanto eu sei, há zonas do Ribatejo que estão de facto plantadas de vinha, porque o rendimento em face dos preços das retribuições concedidas à cultura cerealífera, não aconselha esta cultura.
O Sr. Camilo Mendonça: - V. Ex.ª dá-me licença?
Há uma coisa que eu não percebo. Se cada uma das zonas afirma não ter excedido o limite devido na plantação, como é que no conjunto se tira a ilação de que o equilíbrio não foi respeitado?
De duas uma: ou a conclusão geral que cada um tira não está certa, ou varia zona tem plantado mais do que seria consentido pela persistência do equilíbrio da produção.
Ora, se esse limite não foi excedido, então há um exagero na conclusão que se tem alardeado ...
O Orador: - Eu já disse a V. Ex.ª que não venho aqui contribuir para o estudo geral rio problema vitícola. Desejo apenas restabelecer n verdade o apresentar algumas considerações que possam evitar que sejam prejudicados as soluções a dar à crise vinícola. Este ó que é o meu discurso.
O Sr. Camilo Mendonça: - ... mas se os limites foram excedidos, não percebo como é que dentro de cada zona só afirma que não se plantou em demasia. De resto, a viticultura não é nem pode sor um caso â parte na agricultura portuguesa.
O Orador: - Nesse ponto posso estar de acordo com V. Ex.ª e, de facto, estou.
Mas V. Ex.ª tem todo o direito, como ou, do vir a esta tribuna apresentar os sons pontos do vista, e estou convencido até de que o discurso de V. Ex.ª ganharia muito mais em ser feito duma só vez do que a prestações.
O Sr. Camilo Mendonça: - Posso colaborar das duas formas.
O Orador: - Na minha convicção do que se passa no Ribatejo, a propósito venho pedir a vossa atenção para algumas fotografias, que melhor do que as minhas palavras mostram que o Tejo pode ser duro, embora só se tenha querido falar dele como pretenso elemento fecundante das terras.
A vista desses extensos areais, obra de poucos e recentes Invernos, desses largos canais rasgados, dessas árvores derrubadas, dessas hortas perdidas, em que o assoreamento chega a encher até aos bordos os próprios tanques de rega, é que quero a afirmar e levar à consciência de VV. Ex.ªs e à vossa inteligência a noção do contrário daquilo que é frequentemente afirmado: a inundação não é só melhoradora, nem os seus danos são todos de fácil ou rápida reparação.
O decantado nateiro, suposto fautor principal da riqueza do vale do Tejo, essa terra gorda arrancada às chãs, às encostas e às várzeas das Beiras e do Alto Alentejo, quase tem desaparecido com a própria fertilidades dessas terras, pela intensidade da erosão e da cultura, despojadas quase até aos ossos, que são as lajes penedos do Centro, como, a propósito, escreveu um clássico seiscentista. Já não vive o Ribatejo da carne do outras regiões, que a não tom mais para lhe dar com a generosidade de outrora.
Hoje são limitadas as áreas áreas se deposita verdadeiro nateiro e alargou-se: constantemente aquelas onde só fica areia, vinda de longe mi arrancada de alguma alverca rasgada pouco atrás.
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Que eu creio, aliás, não dever atribuir-se só no nateiro a permanência da fertilidade no Ribatejo, em sensível decréscimo de resto, mas também, e muito, à estrumação verde, à verdadeira sideração que resulta do enterro mento das searas mortas pelas cheias. Mas este é outro problema, cujo estudo seria, todavia, interessante.
A inundação, pois, não é assim tão benéfica; e a inundação causa erosão de duas maneiras. Os americanos chamam-lhes erosão em ravina e erosão em folha. Nalguns pontos é erosão em ravina, que cava, mas na maioria é a erosão alastrada em larga folha - pacífica, mansa, discreta, que a pouco e pouco vai levando as matérias mais férteis dos solos.
Nestas áreas é que a vinha oferece boa maneira de fixação, e, ao contrário do que alguns têm mostrado pensar, é um elemento de fixação não tanto pelas suas raízes, mas pelos seus troncos e ramos, que reduzem a velocidade de curso cias águas e, portanto, a sua capacidade de fazer erosão, erosão em folha; esta a fixação que a vinha produz, porquanto, e evidentemente, não há árvore ou arbusto que resista à força da água quando ela é muita e rompe fundo.
Em suma, e insistindo: não é pelo seu sistema radicular que a vinha fixa a terra inundada, é pela sua rama, e pela diminuição que esta impõe à velocidade das correntes, que a defende à superfície - e aqui está a grande, a certa, a bem conhecida e largamente patente acção da vinha como elemento protector das terras erosionáveis. E depois a vinha resiste ao assoreamento melhor do que qualquer cultura herbácea: onde morre a seara resiste a vinha.
Andou acertadamente o legislador que previu o uso da vinha como defesa contra a erosão e contra os prejuízos do assoreamento, como meio de fixação da terra que pode ser deslavada e desgastada em superfície.
O Sr. André Navarro: - Julgo que essa argumentação, que é justificável, pode aplicar-se a todas os bacias hidrográficas que estão erosionadas. E o caso da bacia do Mondego, onde a erosão é mais intensa que na do Tejo e onde a vinha não foi utilizada ainda como elemento fixador.
O Orador: - Em relação ao Mondego não tenho de fazer críticas, pela não utilização da vinha, pois penso que será uma questão relativa aos habitantes dessa região, que não a quiseram empregar.
O Sr: Camilo Mendonça: - Não a deixaram plantar, o que é diferente. Houve uma razão técnica, pois os serviços entenderam -bem ou mal, mas entenderam - que naquela zona o vinho não era de qualidade e, consequentemente, não deviam autorizar o plantio.
Eu não sei o suficiente para dizer se os serviços agiram bem ou mal; apenas posso afirmar que foram razões técnicas que determinaram essa atitude, isto porque esse malfadado Decreto n.º 38 225 é mais restrito quanto às plantações nestes casos do que era o anterior, o de 1944.
O Orador: - Não sei se o decreto ó malfadado, se apenas mal aceite.
Agradeço ao Sr. Deputado Camilo Mendonça o ter respondido por mini ao Sr. Deputado André Navarro, e aceito a resposta.
O Sr. André Navarro: - Com a qual não estou de acordo.
O Orador: - A este respeito foi todavia aventada a ideia de ter a vinha o exclusivo dos merecimentos, citando-se designadamente os choupos como plantas também fixadoras.
Sem dúvida, mas creio não se dever pôr com tanta, simplicidade a alternativa. Raros serão, decerto, as terras ou as regiões que não aceitem senão uma espécie de plantação de interesse agrícola; o que compete ao agricultor é escolher, de entre aã várias possibilidades culturais, a de maior vantagem económica, que só a lei lhe deve dizer onde se opõe ao interesse geral.
Que se tenham plantado nestas terras do Ribatejo antigamente e agora, vides em vez de choupos ou outras espécies arbustivas ou florestais é simples acto de administração, de boa administração, que não merece críticas.
Doutro modo o argumento, que tem para isto dois gumes, autorizaria qualquer a discutir a legitimidade da viticultura em qualquer das regiões que clamam ser esta o seu melhor recurso, sempre que se pudesse apurar não ser o único, atenta sobretudo n hipótese de povoamento florestal.
O Sr. Daniel Barbosa: - V. Ex.ª dá-me licença P Tenho uma dúvida muito grande no meu espirite e desejaria que fosse esclarecido um ponto. A defesa de V. Ex.ª para esse plantio, que eu compreendo, estriba-se mima questão de qualidade ou, principalmente, numa questão de defesa da manutenção da terra para outras culturas?
O Orador: - Não estou a defender o plantio do Ribatejo no sentido de justificar que aí se tenha plantado maior ou menor número de pés em maior ou menor número de anos. Estou expondo as razões por que, ao contrário do que se tem dito aqui, não se leve entender que as inundações depositam só matérias férteis; e que as terras plantadas de vinhas são susceptíveis de serem economicamente aproveitadas para outras culturas.
O Sr. Daniel Barbosa: - Quer dizer: V. Ex.ª situa-se na análise restrita da província do Ribatejo.
O Orador: - Não estou fazendo uma análise; estou fazendo uma exposição de factos que, devido u minha experiência e conhecimentos de habitante da região, me parecem exactos, em oposição a noções que aqui foram apresentadas.
O Sr. Carlos Borges: - E que se aplicam a todas a regiões do País.
O Orador: - V. Ex.ª, Sr. Deputado Daniel Barbosa parece-me que entrou já depois de eu ter iniciado esta fala, e por isso repetirei para si que não estou aqui para tomar posição sob: e o fundo do debate, acerca do qual posso, no entanto, dizer que tenho, apenas por sentimento, que não por um estudo actual ou por experiência passada - um e a outra escassíssimos - , a noção de que a proposição fundamental do ilustre Deputado avisante é oportuna, de que, por agora, se deve para com a plantação da vinha. Somente entendo que, se [...] preciso suspender esta plantação, tal não deverá fazer-se com carácter ou efeito discriminatório, mas eu igualdade para todas as regiões, até revisão do condicionamento vigente, que não poderá esquecer as necessidades e particularidades de cada qual.
O Sr. Daniel Barbosa: - V. Ex.ª dá-me licença?
Eu aceito o problema como V. Ex.ª o põe, e a minha pergunta de há pouco visava esclarecer-me, pois compreendo que as várias regiões possam apresentar argumentos para a defesa do plantio, mesmo naquela em que na sua policultura a plantação da vinha representa um complemento de interesses.
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Tem-se verificado que u erosão e menor naquelas terras em que a vinha está plantada.
O Orador: - Agradeço o aparte de V. Ex.ª, porquanto, repito, já aqui foi dito que vinha se acreditava que a vinha oferecesse defesa à erosão.
O Sr. José Sarmento: - Mas do que surge ó a dúvida se esses vinhos poderão ser tratados no mesmo pé dos vinhos das encostas.
Admitindo que a produção é superior ao consumo, o vinho das várzeas, produzido a baixo preço de custo, vai .provocar uma baixa de preços. Por isso os vinhos das várzeas terão de ser tratados diferentemente.
O Orador: - V. Ex.ª está querendo defender o vinho de encosta, que não é do que eu estou a tratar, embora, só quisesse, pudesse dar-lhe alguma resposta.
O Sr. Presidente: - Temos necessidade de caminhar com certa brevidade para o fim deste debate. Deve, por isso, introduzir-se uma certa disciplina nas interrupções que constantemente se estão fazendo ao orador, para que ele possa chegar ao fim da sua intervenção dentro da hora regi mental. Portanto, peço aos Srs. Deputados que façam ais suas interrupções nos termos regimentais, isto é, breves e oportunas.
O Orador: - Agradeço a observação do V. Ex.ª, mas não está na minha mão abreviar essas interrupções.
Voltando ao meu assunto, recordarei que também foi dito que o perigo das cheias no Ribatejo desapareceria praticamente com a regularização das a>lbufeirns construídas nos afluentes do rio, aqui e em Espanha. Foi afirmado isto lá fora e aqui retomado com vivacidade num aparte que me traz a pedir a atenção de VV. Ex.ªs para este outro ponto.
Ora atentemos na realidade dais coisas: com o represa meu to do Zêzere, da ribeira de Ocreza e dos rios espanhóis, onde estão sendo construídas albufeiras, vai conseguir-se um efeito regularizador sobre as inundações do Tejo, enquanto, mas só enquanto, as albufeiras não estiverem cheias.
Essas albufeiras são construídas ou para servir a rega ou para produção da energia eléctrica, e não apenas para fins de regularização, pelo que creio que não haverá nenhum responsável pela gerência de qualquer das ditas albufeiras que, chegadas as chuvas de Novembro a Fevereiro, deixe de armazenar quanto possa, das suas águas e de guardá-las ciosamente, sem cuidar mais em novas mas incertas afluências. De ânodo que, se sobrevierem fortes chuvadas de Primavera, a sua água, no caso de as albufeiras já estarem repletas - e será o mais normal, há-de passar os descarregadores e vir nos campos como se nada estivesse no seu caminho.
Ora as cheias de Março, Abril e, até, Maio são cousabidamente as mais danosas para o Ribatejo, e contra essas não deve contar-se com a regularização pelas albufeiras.
Aliás, ainda há dias, e no termo do primeiro período chuvoso do Inverno, tivemos os campos alagados: mais vinte e quatro ou quarenta e oito horas de chuva e seria uma grande cheia. Não há argumentos contra este facto.
Ainda lembrarei outra, demonstração do meu asserto de que ao longo do vale do Tejo varia enormemente a qualidade das terras, para chegar até àquelas que só a vinha; aproveitai economicamente: nas que continuam entregues à cercalicultura o valor do campo, reputado em função das quotas das searas dadas em parceria, varia do simples a mais do triplo.
Com efeito, dão-se na Golegã searas a um sétimo, enquanto em Sal vá terra se dão ao terço com menos sementeira. Quer dizer: além o senhorio recebe seis partes da produção, que pagam a terra, e o seareiro a sétima, para lhe pagar o trabalho; aqui são duas partes para o dono, apenas, e uma para o empresário.
Esta redução traduz o decréscimo da qualidade com u variação média da fertilidade das aluviões, prova provada da variabilidade dos depósitos.
Não, Sr. Presidente, se a vinha fosse no campo do Ribatejo aquela monstruosidade de benefícios que se tem insinuado, não seria só uma quarta parte dos terrenos que ela ocuparia!
Creio que nesta zona de clima já seco a vinha representa o aproveitamento lógico e natural das terras fracas e é o seu elemento fixador por excelência onde inundáveis. Nessas condições, parece que, como aliás reconhece o Sr. Deputado avisante, a disposição do decreto condicionante do plantio que autoriza a plantação onde a vinha tenha possibilidades fixadoras é em si mesma justa.
Não estou aqui para julgar se tem sido interpretada lata ou estritamente. É possível que se tenha exagerado um pouco - mas, em boa verdade e se tanto foi, muito pouco - perante as atracções da conjuntura, o que só seria humano; anãs isto .não quer dizer que em disposições futuras sobre plantio da vinha se deixe de providenciar adequada e justamente sobre as terras fracas, sujeitas a erosão e a assoreamento, dos vales dos nossos rios transbordantes.
Esta é a conclusão essencial que quero tirar.
Há outro ponto sobre que se fala frequentemente com alusões, se não ilusões, dirigidas aos vinhos de terras baixas: é o da qualidade. Qualidade considerada em absoluto e invocada neste dilema, posto como ponto final, têm-na os vinhos de encosta, não sei se os de charneca, mas não a têm, pura e simplesmente, não possuem o dom de qualidade, os vinhos de várzea.
Dilema terminante, fatal, decisivo, não o admito; repugna-me à inteligência e ao sentimento aceitar que a qualidade, como merecimento absoluto, esteja indissoluvelmente na dependência da orografia.
É decerto difícil discutir a qualidade, noção em parte de carácter subjectivo, que já a sabedoria popular entende não poder ser susceptível de argumentação; pura muito liga-se aos gostos, e estes não se discutem.
O Sr. Camilo Mendonça: - É uma questão subjectiva ... relativa.
O Sr. Mário de Figueiredo: -Na teoria de V. Ex.ª, é cada um de nós que cria a qualidade, portanto; o vinho do Porto não é do Douro, é feito por cada um de nós.
O Orador: - V. Ex.ª está a confundir qualidade com tipo.
O Sr. Mário de Figueiredo: - Eu não estou a discutir o problema em si mesmo, mas apenas certa maneira de o pôr. Se os gostos não se discutem e a qualidade é uma coisa que não tem consistência objectiva, por resultar da maneira como se comporta o sujeito a respeito da matéria, a qualidade, digo, somos nós que a fazemos.
Logo, não se pode falar de vinho do Porto, do Dão ou do Douro, visto que cada um de nós é que põe no vinho n qualidade que entende que ele deve ter, ou, só quiser, que cria o tipo.
Não é maneira de pôr uma questão aquela como a pôs - e digo isto com simpatia.
De resto, isto integra-se na teoria muito conhecida e de há muito discutida e que se exprime assim: é cada um de nós que cria o Mundo ou o Mundo existe mesmo
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(...) contra nós? O gosto, o paladar, a estética, a moral, somos nós que os criamos ou existem fora de nós? Há bom paladar e mau paladar, e, assim, o gosto subjectivo, no sentido de que Lá quem tenha bom gosto e mau gosto; mas até o facto de haver quem tenha bom gosto e mau gosto implica o reconhecimento de que a qualidade é alguma coisa exterior a nós: é objectiva, e não subjectiva.
O Orador: - Não pretendo, de forma alguma, nem estar a ensinar a V. Ex.ª o que é a qualidade, nem estar a expor uma teoria de qualidades em abstracto, e, por isto. se agradeço a lição de V. Ex.ª, Sr. Deputado Mário de Figueiredo, não a aceito como aplicável ao meu tema.
Falo da qualidade em absoluto: da bondade ou da ruindade, puras e simples, que em matéria de vinhos se persiste - persistem alguns - em deixar dependentes da topografia, em primeiro e essencial lugar.
E entendo que nesta matéria há que distinguir primeiro tipos, tão diversos que são, e só dentro destes a qualidade.
Parece-me evidente, para exemplificar, que há vinhos do Porto, como tais, de qualidade nitidamente inferior a vinhos lisos, por exemplo, do Dão ou do Ribatejo, como tais também.
Na preferência por uns ou outros tipos é que intervêm os gostos pessoais, e na aceitação mais generalizada dos paladares mais experientes, ou educados, é que se estabelecem as qualidades relativas de uns e de outros, mas sempre qualidades relativas.
O Sr. Carlos Moreira: - Não suo as qualidades as condições essenciais para um tipo?
O Orador: - V. Ex.ª fala das qualidades, mas aqui fala-se de qualidade. .Não se discutem tipos de vinho; u dentro de cada tipo de vinho é que a qualidade resulta do concurso ou da ausência de um certo número do características, virtudes, propriedades específicas que o definem e distinguem. Temos, por exemplo, o aroma, a força alcoólica, o sabor, a cor; são factores de qualidade relativa, dentro do tipo. Agora pretender que a qualidade é virtude intrínseca e privativa em absoluto fie vinhos criados em certas condições topográficas e que, por outro lado, falta a vinhos criados noutras condições topográficas é que não compreendo nem aceito.
E, comercialmente - o que certamente importa perante uma crise de vendas-, qualidade é o gosto do público, como afirmou algures um francês bem experimentado e feliz no negócio de bebidas.
Qualidade, considerada em absoluto, a meu ver só pode afirmar-se ou negar-se acerca de um vinho com base na sanidade da uva e do fabrico:, então o vinho ó mau ou não é, e, nesta hipótese, melhor ou pior, segundo o grau das suas virtudes características.
Tudo, em suma, é assaz delicado e, repetirei, tem muito de subjectivo.
O Sr. Daniel Barbosa: - V. Ex.ª dá-me licença?
Eu suponho que tudo gira à volta disto: o vinho apresenta-se com determinadas características que em grande parte os laboratórios são capazes de determinar, e, portanto, a qualidade é, por assim dizer, ar consequência dessas características.
O Orador: - O que eu pretendo é protestar contra o conceito que nega aos vinhos de campo, só por o serem, a possibilidade de atingirem bom grau do qual idade e o direito a ser-lhes reconhecida.
Aliás, vejam VV. Ex.ªs o que pensava o nosso tratadista agrícola visconde de Vila Maior, citado - através da referência dum autor estrangeiro, que não se dedignou de l lie transcrever o juízo - no parecer da Câmara Corporativa sobre o projecto do último decreto condiciona dor do plantio.
Ele procurou determinar as influências relativas dos factores da qualidade e achou que poderia sintetizá-las assim:
Da casta das cepas depende a qualidade, por 5/20;
Do clima depende a qualidade por 5/20;
Do terreno depende a qualidade por 1/20;
Da exposição depende a qualidade por 1/20;
Dos amanhos dependo a qualidade por 3/20;
Da vinificação depende a qualidade por 2/20.
Quer dizer: segundo este tratadista, considerado bastante digno de atenção, os factores topográficos entram na constituição da qualidade com um quarto apenas daquilo que se pode considerar como os elementos dessa qualidade.
O Sr. Daniel Barbosa:- Isso deve ser uma lamentável tecnolocalização.
O Orador: - V. Ex.ª pode chamar-lhe o que quiser.
Pois que os vinhos das terras baixas do Ribatejo aparecem assim eivados do defeito insanável de qualidade, permitam-me VV. Ex.ªs que lhes fale um pouco dos da minha própria terra, dos vinhos da Chamusca, criados nos areneiros baixos, e próximos do Tejo, do Sul do concelho, que gozaram da melhor fama em Lisboa até à destruição das vinhas pela filoxera. Fama tamanha que após o alvará pombalino de 1765, bem conhecido, essas vinhas que os produziam foram dispensadas da obrigação geral de arranque, para que não se perdessem esses vinhos, que tiveram importância durante séculos no mercado de Lisboa, com reputação de serem dos melhores que aqui se encontravam à venda. E não me vão VV. Ex.ªs recordar o Gil Vicente, porque ato nessa citação há um penico de parcialidade contra o Ribatejo, porque Gil Vicente, pela boca, da sua heroína, mostrou quo conhecia bem toda a topografia dessa, região, e os vinhos nomeados foram os de Óbidos e os de Santarém.
Ora Santarém tem duas faces vitícolas, e a que vira para Óbidos é a das terras de encosta, precisamente. Entre Santarém e Óbidos há extensos vinhedos: os do Bombarral, Cadaval, parte até de Caldas da Rainha.
Não seria aos vinhos daí que aludiria a graciosa bêbeda? Parece-me que, citados os dois pólos de tal área, a melhor interpretação tom de ser esta.
Que se lhe desse a outra pareceu-me toque de parcialidade, que da parte de pessoa tão ilustre e do meu respeito, como o Sr. Deputado Paulo Cancella de Abreu, confesso que me chocou.
O Sr. Paulo Cancella de Abreu: - V. Ex.ª quer referir-se à Maria Parda...
Não fui parcial. Citei os «Prantos» dessa mulher imaginada por Gil Vicente para estabelecer o contraste entre o que era o vinha de Óbidos e de Santarém, no tempo dela, e o que é o vinho de hoje, graças ao esforço do Ribatejano. Eu seria parcial se, como ela era uma ébria dissesse: in vino veritas ... E acrescentaria que ela, por outro lado, elogiou o vinho de Alcobaça e o de Leiria.
O Orador: - Não digo que V. Ex.ª lenha sido voluntariamente parcial, mas achei que fez de certo modo figura disso, o que mo penalizou, pois ninguém gosta de encontrar jaça nos modelos que adopta. E a pessoa e a acção parlamentares de V. Ex.ª, Sr. Deputado
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Paulo Cancella de Abreu, tomei-as eu para uni dos meus modelos desde que entrei nesta Casa, pois V. Ex.ª, herdeiro desse nome de boas tradições e ligações políticas, que com seus irmãos só tem exaltado, figura destacada duma corrente de ideias para que vão l min s as minhas simpatias, tem-me seduzido sempre pela elevação das suas atitudes e pela galhardia com que as mantém.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Que diria a Maria Parda, se hoje vivesse, de certos vinhos do Porto que encontraria agora por aí nos botequins da sua natural frequentação? Aceitaríamos que daqui a quatro séculos isso caísse como labéu sobre tilo magnifico produto?
Não, eu tenho melhor, e até mais antigo que a Maria Parda, para recordar créditos dos vinhos de Santarém.
Vai o tempo adiantadíssimo para que eu leia todo um molho de citações que coligi, mas que se me aceite em exemplo só este passo da carta de el-rei D. Fernando aos do concelho de Santarém, datada de 18 de Fevereiro de 1364: «... sendo os vossos vinhos muitos e dos melhores que há ...».
O Sr. Daniel Barbosa: - Sou das pessoas pouco conhecedoras do assunto, mas que acreditam que há óptimo vinho no Ribatejo. Ora, pela mesma razão com que V. Ex.ª não quereria que se pensasse mal dos vinhos do Ribatejo que são falsificados, também V. Ex.ª não pode citar como argumento contra u vinho do Porto alguns vinhos falsificados.
O Orador: - Eu não falei em vinhos falsificados: aludi a vinhos medíocres de preço mais baixo. E o argumento só me servia em demonstração por absurdo.
Vozes: - Isso não é argumento.
O Orador: - Ás demonstrações por absurdo estão consagradas. Mas, voltando ainda aos vinhos da minha terra e à sua fama antiga - apesar de provirem de terras baixas e até inundáveis - direi ainda a VV. Ex.ªs que o próprio Filinto Elísio os cantou ifin três passos meus conhecidos, que de outros árcades se conhecem igualmente referências laudatórios, que até no laudatórias popular encontraram aquela referência de simpatia que traduz consagração. E sempre, notai bem, e é o que; importa realmente, sempre a par dos melhores e com estes enumerados.
Aos autores das três memórias premiadas pela Academia Real das Ciências entre 1788 e 1790 sobre a cultura das vinhas e sobre os vinhos não escapou também citarem abundantemente, como bons exemplos, as práticas e os produtos da Chamusca.
É agora queiram VV. Ex.(tm) contemplar essas ilustrações, que passo às vossas má os e que porão o ponto final e o pitoresco nesta exposição. São caricaturas de há pouco mais de cem anos, dirigidas cernira certo político destacado da época, que, para os seus adversários, tinha o defeito de gostar de vinho.
Vozes: - Defeito não, virtude.
O Orador: - Defeito, porque abusava. Mas vejam, vejam de que vinhos diziam que ele abusava e em que rara e ilustre companhia de ambas as vezes o caricaturista figurou os do Ribatejo.
Isto serve para demonstrar que os vinhos do Ribatejo também têm tradição histórica.
Vou concluir. Não quero deixar de exprimir a minha concordância na generalidade, o meu apreço pela forma como foi posto este aviso previu e o meu convencimento da sua oportunidade.
Mas peço ao Sr. Deputado avisante que no fim deste debate, em que se têm esquecido um tanto as muitas noções modernas sobre produtividade, nos esclareça sobre como, em seu entender, se pode conciliar a necessidade de fazer aumentar o consumo do vinho, tão geralmente reconhecida, com a exigência do direito de o produzir caro.
Tenho dito.
Vozes : - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Furtado de Mendonça: - Sr. Presidente : antes de iniciar as minhas considerações, peço vénia a V. Ex.ª para felicitar o nosso ilustre colega Sr. Deputado Paulo Cancella de Abreu, pela feliz iniciativa do seu aviso prévio, já classificado de exaustivo - porque o é na verdade - , revelador dos seus conceituados méritos de grande e experimentado parlamentar, que desde tenra idade me habituei a admirar pelas suas firmes e desassombradas ideias, quão firmes e desassombradas foram sempre as suas nobres atitudes políticas.
O País fica-lhe a dever mais este relevante serviço.
Vozes : - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: hesitei em intervir na discussão da matéria deste aviso prévio por verificar, desde o início, que se haviam inscrito numerosos e ilustres colegas, de sorte que o assunto seria certamente debatido com largueza suficiente e a Assembleia ficaria habilitada com elementos bastantes para apresentar ao Governo as suas sugestões. E de agradecer n atitude do Sr. Ministro da Economia anunciando que elas serão ponderadas em conjunto com as providencio s tendentes a solucionar a crise vinícola e que estão a ser estudadas pela comissão pura esse fim nomeada.
Receando, porém, que o meu silêncio pudesse ser interpretado como significando menos interesse por uma causa que tanto aflige a lavoura, cujos problemas eu sinto, não só como técnico e lavrador, mas ainda como presidente dum município rural que sempre tem vivido com a boa gente dos campos, receando, digo, ser acusado de não cumprir devidamente o mandato, subi a esta tribuna para me associar aos notáveis oradores que me precederam.
Não faltará quem entenda que num estado corporativo a solução dos problemas desta natureza deve ser encontrada de preferência no seio dos organismos onde estão representadas, disciplinadas e coordenadas todas as actividades intervenientes no ciclo económico do produto em questão. Não faltará quem acrescente: mal vai quando assim não seja; estará então em causa o prestígio dos organismos corporativos competentes e até o prestígio da própria organização corporativa, ou, melhor, por enquanto, pré-corporativa!
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Sou daqueles que entendem que os interessados devem estudar os seus problemas e o seu autorizado depoimento deve servir de conselho junto do Governo, embora possam prevalecer ponderosas razões de ordem política ou social, princípios de política geral (pie nos cumpre definir.
O Governo - supremo árbitro - tudo considerará na resolução a tomar com vistas ao bem comum. Sr. Presidente: o assunto do aviso prévio é para mim duplamente delicado, em virtude da formação agrária
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que possuo e do esforço a fazer para não me deixar dominar por uma natural deforma-lo profissional.
Espero, no entanto, formular as minhas considerações sem paixão, mas com independência, e desta maneira merecer a atenção de VV. Ex.ªs e do Governo, de um governo que preside aos destinos de um estado corporativo - melhor direi: que procura instaurar um corporativismo e que pretende ser uni corporativismo associativo», como a cada passo nos recorda o nosso competentíssimo leader, Prof. Mário de Figueiredo.
Não pode, pois, um tal estado deixar de procurar a harmonia dos interesses: no campo social, entre, patrões e operários, em que os contratos colectivos são chamados a desempenhar um importante papel; no campo económico, coordenando os interesses da agricultura, da indústria e do comércio, ajustados, quando seja caso disso, por acordos intercorporativos sem menosprezo do interesse dos consumidores.
Além de presidir a um município, mino disse, lambem sou vogal duma junta nacional, isto é, dum organismo de coordenação económica ou pré-corporativo, Num e noutro caso habituei-me a considerar os vários interesses e a julgá-los, por igual, dignos de atenção e, assim, sinto-me prevenido quer contra indesejáveis antagonismos, quer contra desvios de direitos adquiridos por regiões tradicionalmente vitícolas, cuja demarcação se justifica, para prestígio das designações de origem.
Certo é que os grémios da lavoura e os grémios de viticultores das regiões vitivinícolas tradicionais se reuniram em Coimbra, no dia 8 de Janeiro último, para concretizarem os seus pontos de vista, e foram todos concordes - como dizem na sua mensagem ao Governo - em considerar que a crise da vitivinicultura nacional impõe medidas de emergência que a atenuem, as quais já obtiveram parcial deferimento, mas - acrescentam - a verdade é que essa crise se integra num mundo de dificuldades em que se debate praticamente a lavoura inteira».
E mais adiante insistem: «urge considerá-la de mais alto, de onde se abarque, não um, mas todo o conjunto de problemas agrários, há muito pendentes de solução».
Aqueles representantes da lavoura, em referência, delinearam as bases a cuja luz entendem que é instante encarar-se a solução, não acenas da crise vinícola, mas da crise da lavoura portuguesa, e clamam pela conclusão da organização corporativa da lavoura.
Cabe aqui acrescentar, do acordo com o Ur. Castro Fernandes:
Afigura-se-nos essencial a organização completa de cada domínio. Acontece fatalmente, quando si procede doutra maneira, resultarem embaraços que prejudicam a eficiência dos organismos criados.
Por outro lado, gera-se um estado de desequilíbrio e de flagrante injustiça na concorrência entre os interesses organizados e aqueles que o não estão.
E esclarece:
Dadas duas categorias afins, uma pode pôr claramente os problemas, enquanto a outra se encontra privada de qualquer forma de expressão. Em todos os casos em que os seus interesses se mostrem antagónicos, a primeira terá imensas probabilidades de fazer vingar o seu ponto de vista, ainda mesmo que não tenha por si as mais sérias razões de justiça.
Portanto, a organização corporativa não deve limitar-se ti da lavoura.
Desejo frisar quanta atenção me merece aquela exposição dos grémios a que h« pouco me referi e que se prende com a matéria do aviso prévio; por isso, as minha s considerações tendem a destacar alguns dos seus pontos.
Sr. Presidente: muito se disse já relativamente à crise vinícola e sobre os meios de a debelar, podendo mesmo concluir-se que nada mais haveria a dizer.
Todavia, já que resolvi subir a esta tribuna, pelas razões há pouco confessadas, procurarei atenuar as repetições; no entanto, recordarei que para apreciar a situação, convém ter presentes, em resumo, os seguintes números: a produção mundial, de 140 milhões de hectolitros produzidos por alturas de 1914 atinge médias de 190 milhões nos anos que precederam a conflagração de 1939 e ultrapassa 200 milhões no ano de 1954; em Portugal, no decénio de 1915 a 1924, a produção média anual - se nos pudéssemos fiar nos dados estatísticos desses tempos - teria sido duns 4 800 000 hl e no de 1945 a 1954 numeres de maior confiança acusam cerca de 9 milhões; mas tendo sido ligeiramente superior a 11 milhões em 1954; prevê-se que possa, em breve subir a 14 milhões ou mas, quando as recentes plantações estiverem em plena produção.
Em suma: embora da leitura do relatório do Decreto-Lei n.º 38 525 se deduza que o seu espírito se harmoniza com os princípios definidos nos congressos internacionais vitivínicolas, verificou-se que a sua execução não permitia realizar os objectivos desejados; e, se o consumo do vinho ou as exportações não aumentarem, na medida em que a produção vai crescendo, a crise agravar-se-á.
E evidente que àquele diploma, datando de 1951, não se pode atribuir culpas na crise actual.
Em face da situação, enquanto uns preconizam o arranque imediato de vinhas contínuas situadas em terrenos de várzea, próprios para outras culturas, outros entendem que para já, basta a supressão de novas, plantações, visto o problema ser de subconsumos p poder resolver-se aumentando não só as exportações - mercê duma. propaganda e acordos comerciais eficientes -, como, elevando o consumo interno, mercê de medidas adequadas para melhorar o nível de vida dos Portugueses, melhoria essa dependente da valorização dos restantes produtos agrícolas, com vistas a tornar a sua exploração tão interessante como a da vinha, enveredando, embora, pelo círculo vicioso do agravamento do custo de vida e dos salários.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Outros vão mais longe e pretendem obter uma possível paridade do rendimentos do capital e do trabalho agrícola com o dos restantes sectores económicos; outros, ainda, dizem que se trata de atingir o equilíbrio desfeito e que tudo se resume na difícil tarefa de alcançar maior rendimento nacional, tanto na metrópole como no ultramar, isto é, não só obter maiores e melhores produções das nossas explorações agrícolas como também melhor rendimento das nossas indústrias. E, concluindo: duma indústria próspera dependerá a possibilidade de compra dos produtos agrícolas por preços mais elevados e o consequente aumento dos réditos fiscais, necessários, por sua vez, à realização dos melhoramentos rurais e aos crescentes benefícios a receber do Estado e das câmaras municipais.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Para tanto carece o Estado, carecem as câmaras de receitas suficientes, e por isso dificilmente, poderão prescindir de quaisquer impostos ou contribui-
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(...) ções, nem sequer dos dos grémios da lavoura ou das cooperativas, se as suas actividades comerciais e industriais tenderem a desenvolver-se e si substituir as das iniciativas individuais.
Assim, dado o fraco rendimento económico da lavoura na maioria dos casos, a solução da sua crise estaria dependente do seu progresso, da eliminação das deficiências provenientes das baixas produções unitárias, dos seus métodos de cultura, pouco racionais, e até do próprio regime do direito de propriedade ou dos sistemas da sua exploração, ate.; enfim, a solução estaria dependente da execução de todo um plano de fomento agrário baseado nu intensificação do ensino agrícola e na assistência técnica à lavoura.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Por um lado, a solução implicaria ainda toda a série de melhoramentos rurais, que vão desde a electrificação das nossas aldeias até u satisfação de todas as suas necessidade» em estradas e caminhos, fontes e escolas, etc., de tudo que possa melhorar a sua vida e contribuir para a prudente constituição de casais agrícolas mais equilibrados e, portanto, mais rendosos.
Em suma: bem vistas as coisas, trata-se nada mais nada menos que da intensificação da obra grandiosa que o Estado Novo vem realizando, sistematicamente, através de mil contratempos de ordem interna e externa - obra incontestável, que a nossa impaciência e os nossos anseios desejariam ver acelerada; obra colossal, visto que a do actual Plano de Fomento Nacional constitui apenas nina parcela, uma fase do necessário desenvolvimento económico do Puís.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Devo confessar que. apesar da obra magnífica da reconstrução nacional, tem-me impressionado a falta de um programa conhecido de política agrária e que esta, tendei de assentar na formação profissional dos que se dedicam à exploração da terra, carece duma conveniente intensificação do ensino agrícola médio e elementar ou prático, duma eficiente difusão dos métodos mais progressivos e capuzes de permitir colher melhores resultados da exploração agrícola.
O esforço teria de se estender desde os estabelecimentos de investigação até à própria escola primária, ajustada aos meios rurais; mas falta ainda formar muitos mestres com a preparação indispensável.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Segundo vi escrito, no ano escolar de 1953-1904 frequentaram o Instituto Superior de Agronomia mais de 400 alunos; ao passo que o ensino elementar agrícola do nosso país, ministrado apenas nas escolas de Santo Tirso e da Paia, tem tido uma frequência de cerca de 250 alunos, os do ensino liceal ultrapassam 50 000 e os do ensino comercial e industrial atingem cerca de 40 000! Tais números são desconcertam t es num país que se diz essencialmente agrícola...
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Devemos confessar que para a batalha do maior rendimento económico da produção agrícola; estão-se formando muito mais chefes do que subalternos! Talvez seja por isso que os primeiros se acotovelam neste quartel-general que é a capital, discutindo vastos planos enquanto esperam pela criação dos soldados a comandar...
Mas, Srs. Deputados, países há, como a modelar pequena Suíça, em que a situação é diferente: lá, segundo li há dias, existem quatro escolas superiores de agricultura e trinta e nove escolas cantonais para camponeses e camponesas.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: a apreciação da crise vinícola, que se atribui, afinal, à crise da lavoura portuguesa, levou-me a estas considerações; mas nem por isso julgo a situação desesperada, antes acredito que esta pátria de esforçados heróis e navegadores, que venceu a imensidade dos mares e confundiu os velhos do Restelo, passando o cabo das Tormentas, não pode deixar de vencer uma onda ... de vinho!
Não! Se nos dermos todos as mãos, com vontade firmo de triunfar, a crise vinícola será dominada, como outras o foram já. Que digo? A crise será vencida mais facilmente do que as anteriores - mesmo sem o auxílio do lento rejuvenescimento da lavoura -, embora se apresento, porventura, mais vultosa, pois dispomos hoje de meios mais fortes, capazes de dominar melhor a situação do que outrora; dispomos de organização mais perfeita, de técnica mais experimentada, de recursos financeiros mais abundantes.
Ponto é que queiramos empenhar a fundo as nossas possibilidades e tomar as necessárias medidas já aqui enunciadas - umas de carácter urgente, a completar por outras de carácter definitivo.
Urge retirar do mercado os vinhos de pasto excedentes, utilizando os recursos da Junta Nacional do Vinho, forçando as exportações dos que mais se recomendem - sem esquecer as largas possibilidades das nossas províncias ultramarinas, onde os vinhos verdes têm procura-, ainda que à custa de eficaz propaganda e prémios suficientes, transformando em aguardente parte dos restantes e reservando-a para oportuna venda ou exportação, mesmo depois de envelhecida.
Tudo medidas já aqui preconizadas, como, aliás, outras, tais como: revisão de preços dos vinhos engarrafados nos hotéis, restaurantes, etc.; incremento das vendas de uvas frescas e passas, etc.; criação de adegas cooperativas de feição facultativa; intensificação da fiscalização dos vinhos de pasto e fixação das suas características, por forma a impedir a prática fraudulenta do desdobramento de mostos demasiado açucarados ou dos vinhos excessivamente alcoólicos, com a intenção de transformar vinhos próprios para queima em vinhos de consumo, afinal adulterados com água...
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Por último direi que sou daqueles que acreditam na possibilidade de se aumentar sensivelmente as exportações de vinho do Porto, mercê duma propaganda inteligente e aturada; o seu montante já vai crescendo animadoramente, pois, tendo baixado para cerca de 16 000 pipas em 1941, atingiu 42 000 pipas em 1914, indo a caminho das 73 000 pipas exportadas em média, por ano, no quinquénio de 1936 a 1940 e podendo ser ultrapassadas.
Muito há a esperar dum esforço de propaganda persistente o duma guerra senil quartel a desenvolver no estrangeiro contra os fabricantes de vinhos de imitação, vendidos sob o nome de «Porto» - e são legião! -, sem respeito pelos acordos relativos às marcas de origem, indústria que em alguns países atinge uma importância semelhante ou superior à dos autênticos vinhos do Porto!...
Convém ter sempre presente que, como, aliás, tem sido repetido, a solução da crise vinícola nacional reside em grande parte no incremento dado à exportação dos vinhos do Porto, pois que cada pipa deste precioso vinho
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pode conter na aguardente nele incorporada cerca de outras duas pipas de vinho inferior. Portanto, quando o Douro exportar uma pipa de vinho do Porto, o Sul pode exportar duas pipas do seu vinho, se for possível voltar a utilizar a sua aguardente.
Sendo assim, não é necessário procurar outros motivos para justificar a estreita colaboração que sempre deve existir entre a viticultura do Norte e a do Sul e se impõe por motivos de ordem económica e social. Podemos afoitamente declarar: unidos, venceremos!
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - De resto, a concorrência ruinosa seria inadmissível numa ordem corporativa e não estaria conforme com o seguinte princípio salutar, expresso na encíclica Quadragésimo Ano:
O fim natural da sociedade e da sua acção é coadjuvar os seus membros, não destruí-los nem absorvê-los.
Meus senhores: estou abusando da atenção de VV. Ex.ªs (não apoiados). Vou terminar com um expressivo reparo de Salazar:
Os que, cegamente impelidos pela lógica de seus falsos princípios, quiseram ir até às últimas conclusões montaram a máquina com o espavento dos grandes planos, o rigor aparente da ciência e da melhor técnica; mas o trabalhador livre, o «homem», esse desapareceu, arrastado na colossal engrenagem, sem elasticidade e sem espírito, mobilizados os trabalhadores como máquinas ou transferidos como rebanhos de gado, porque numa região se acabou a erva dos pastos.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Pinho Brandão: - Sr. Presidente: o aviso prévio sobre a crise vinícola do País, apresentado e efectivado pelo ilustre Deputado Sr. Dr. Paulo Cancella de Abreu, tem suscitado o mais vivo interesse a esta Assembleia, como se verifica pelo número de Deputados que têm intervalos no debate; e não só à Assembleia Nacional como ao País, a avaliar pelo desenvolvimento que ao debate parlamentar a imprensa diária lhe vem dando.
O assunto, de resto, é do maior interesse nacional, dado que a maior parte da população Portuguesa labuta na agricultura e sesta exerce papel de relevo a viticultura.
O digno Deputado avisante merece sem dívida felicitações sinceras, não só pela oportunidade da apresentação do aviso prévio, mas ainda pela elevação, profundidade de conhecimentos s larga visão com que tratou o problema vinícola português.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Por mim, apresento-lhes deste lugar com a mais viva sinceridade; e deve notasse desde já que o simples anúncio do seu aviso prévio teve logo em todos as regiões vinícolas do País, e até naquelas que não são essencialmente vinícolas, a mais larga repercussão e em todas despertou grande interesse.
O próprio Governo, atento ao interesse nacional, anunciou já medidas de vasto alcance tendentes a atenuar a crise vinícola, tendo entrado mesmo no campo das realizações pela publicação dos Decretos n.(tm) 40 030 e 40 037, motivo por que o Sr. Ministro da Economia merece o nosso decidido aplaudo, particularmente no que diz respeito à difusão das adegas cooperativas.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - A este propósito, Sr. Presidente, desejo lembrar que já, aquando da discussão nesta Assembleia, na passada legislatura, do Plano de Fomento Nacional, alguns Deputados, lamentando que dele não fizesse parte um plano de fomento rural, afirmaram ser urgente e necessária a difusão de adegas cooperativas nas regiões vinícolas do País, preconizando para isso o auxílio e a assistência do Estado.
É que já então era convicção profunda nesta Casa, pelo menos em alguns dos seus membros, que as adegas cooperativas constituíam um dos meios mais eficazes para elevar a qualidade dos nossos vinhos e para evitar, em épocas de abundância excessiva, preços aviltantes ou de miséria.
Urge, pois, promover a extensão da rede das adegas cooperativas, devendo o Estado prestar o auxílio possível à criação das mesmas e a assistência técnica indispensável ao seu funciona incuto e interessar-se para o efeito os grémios da lavoura ou das regiões vitivinícolas. E, porque o Sr. Ministro da Economia, numa larga visão do problema vitivinícola nacional, em afirmações feitas à imprensa diária se declarou resolvido a estabelecer no País uma ampla rede de adegas cooperativas, destinadas porventura a proteger os interesses da pequena lavoura vitivinícola, não posso neste momento deixar de render-lhe as minhas homenagens.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: nesta altura do debate não posso já, certamente, trazer ao conhecimento desta Assembleia factos, sugestões ou problemas novos.
Do assunto se ocuparam já alguns dos melhores elementos desta Câmara, que a ele prestaram a sua cuidadosa atenção e lhe deram o brilho da sua inteligência e da sua palavra, ilustrando e realçando as suas interessantíssimas sugestões com números estatísticos relativos à produção vínica, ao alargamento do plantio da vinha, à exportação do vinho v ao seu consumo interno, em suma, a todos os factos que se relacionam com a produção do consumo do vinho.
 minha intervenção no debate, na qual, pelos motivos expostos, não lançarei mau demasiadamente das estatísticas, não poderá trazer qualquer interesse a esta Assembleia (não apoiados), e sinto, por isso, que somente o largo espírito de compreensão e de tolerância de V. Ex.ª, Sr. Presidente, e os sentimentos de amizade encontrados nos Srs. Deputados, os quais tenho no maior apreço e estima, me animaram a ocupar hoje esta tribuna.
Sr. Presidente: o desequilíbrio entre a produção, de um lado, e o consumo interno e a exportação, do outro lado, é a causa imediata, como todos sabem, da actual crise vinícola. Crise de abundância a que se chegou por várias causas, suponho eu.
De certeza, uma das causas está no progressivo desenvolvimento da produção vínica, revelada não só através de um longo período de anos, mas ainda e com mais intensidade nas duas últimas colheitas. Mas esta causa não é exclusiva. Outras acrescem, como seja a diminuição da exportação e do consumo interno.
A exportação dos nossos vinhos comuns e generosos tem vindo gradualmente a diminuir de ano para ano. O nosso preciosíssimo vinho do Porto ocupava outrora lugar destacado na nossa exportação, sendo seus priu-
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(...) ripais merecidos consumidores a Inglaterra e a França, sobretudo o primeiro destes dois países.
A exportação média anual no período de 1935 a 1939 foi de 420 938 hl e no quinquénio de 1945 a 1949 baixou para 210 507 hl - média anual.
Para a Inglaterra, no período de 1936 a 1940. exportaram-se, em média anual, 333 323 hl, e no período de 1946 a 1950 apenas se exportaram 91 000 hl, em média anual.
Para a Frauda exportaram-se, no período de 1936 a 1940, em média anual, 88 670 hl, e no período de 1946 a 1950, em média anual, apenas 11 725 hl.
As razões do facto encontram-se, como sabem, no profundo abalo sofrido nas economias destes dois países por virtude da última grande guerra: e o vinho do Porto, tido como artigo de luxo, passou a ser onerado com pesados encargos.
Basta dizer que uma garrafa de vinho do Porto sai de Portugal ao preço de 2 xelins e 5 dinheiros (misto e lucro do produtor e exportador português) e chega a Inglaterra, ao respectivo consumidor, por 18 xelins, sendo o lucro do retalhista de 3 xelins e 2,5 dinheiros e os impostos aduaneiros de 8 xelins e 6 dinheiros.
Para França dá-se o mesmo fenómeno aproximadamente: uma garrafa de vinho sai daqui ao preço de 114 francos e chega ao consumidor francês ao preço de 560 francos, pagando no país importador perto de 192 francos de impostos alfandegários e deixando ao importador-armazenista o lucro de 107 francos e ao retalhista o de 92 francos.
Todavia, Sr. Presidente, a exportação do nosso vinho do Porto é problema que deve merecer toda a atenção do Governo, não só pela sua profunda influência na nossa balança comercial, como ainda pelo notável reflexo no conjunto da economia vinícola do País.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - E agora, que a Inglaterra SP encontra fortalecida na sua economia, é possível que a exportação do vinho do Porto para esta nossa antiga aliada se vá gradualmente restabelecendo até ao montante que existia anteriormente à última grande guerra.
Este restabelecimento não pode deixar de ser encarado c Este delicadíssimo problema, de tanto relevo na economia da Nação e com profundos reflexos sociais na região do Douro, não deixará, certamente, de merecer a mais cuidadosa atenção ao nosso Governo, sempre pronto a servir os altas interesses nacionais, conseguindo, além do mais que os direitos aduaneiros sejam reduzidos ao montante de outrora. Vozes: - Muito bem! O Orador: - E é de recear, suponho, que, mantendo-se por muitos anos o reduzido consumo do vinho do Porto na população inglesa, esta acabe por afeiçoar o seu gosto e paladar a outras bebidas, apesar das superiores e inigualáveis qualidades deste nosso vinho. É claro que somente o Governo Português, no aspecto das possibilidades futuras da exportação do vinho do Porto para a Inglaterra, está senhor de todos os elementos que permitam dominar o problema em toda a sua extensão. Mas não há dúvida de que a exportação em larga escala do vinho do Porta não é uma simples questão local a resolver, que interesse somente à região do Douro: é um caso que interessa a toda a Nação. Vozes: - Muito bem! O Orador: - Sr. Presidente: a exportação dos nossos vinhos comuns, que outrora se verificava principalmente para a França e para o Brasil, tem diminuído em larga escala, encontrando-se agora praticamente anulada para estes dois países. E estou convicto de que dado o desenvolvimento do nosso ultramar, sobretudo ti e Angola, o montante da exportação dos nossos vinhos para aí virá a subir nos anos posteriores, sobretudo se, por um lado, for encarada a sério a necessidade da redução dos encargos que pesam sobre o vinho entre os portos de embarque do continente e os locais de venda ao público no ultramar e se, por outro lado, se tomarem medidas necessárias e eficazes que garantam a genuinidade dos nossos vinhos nos locais de consumo. Vozes: - Muito bem! O Orador: - E sobre aquele primeiro aspecto - o da redução dos mencionados encargos - não será de tentar, 8r. Presidente, o transporte do vinho em navios- tanques? Bem sei que no notável parecer da Câmara Corporativa, emitido em 1951, a respeito do projecto de decreto que depois se converteu no Decreto-Lei n.º 38 525, parecer esse de que foi relator o Sr. Dr. Rafael Duque, se afirma que «o perigo de alteração das grandes massas vínicas transportadas e armazenadas sob a influência do clima tropical e outras dificuldades de ordem técnica fizeram pôr de parte esta ideia, sobretudo perante o insucesso da experiência, tentada em França, de transportar em navios-tanques o vinho destinado à Indochina». Vozes: - Muito bem! O Orador: - Sr. Presidente: ao enumerar algumas das causas da actual crise vinícola apontei a diminuição
Para a França pode dizer-se. extinta actualmente a exportação fios nossos vinhos comuns, e tem sido tão elevado o desenvolvimento da produção vinicar nesse país que não podemos pensar no restabelecimento da antiga exportação dos nossos vinhos. A crise vinícola de que sofre a França é em tudo semelhante à nossa: superprodução vínica.
Para o Brasil, enquanto se mantiverem as suas actuais condições económicas o dado o desenvolvimento em que no Rio Grande do Sul se encontra a produção de vinho, não me parece que se possam alimentar esperanças de exportação dos nossos vinhos comuns.
Há, porém, que desenvolver ainda mais o escoadouro dos nossos vinhos comuns para o ultramar português, como proficientemente preconizou o ilustre Deputado avisante.
A exportação fios vinhos para o ultramar, sobretudo para a nossa importantíssima província de Angola, tem vindo a aumentar de ano para ano e ficou em 1954 em perto de 864 000 hl.
Mas é necessário rever o problema com o seu estudo perfeito, minucioso e profundo, pois, salvo o devido respeito por tão douta e proficiente opinião, atrevo-me a supor que o perigo de alteração por efeito do clima tropical poderá ser evitado pela aplicação dos meios fornecidos pela ciência e pela técnica.
Insisto neste ponto, Sr. Presidente, porque entendo que a resolução das actuais dificuldades que levam à carestia do vinho nos locais do ultramar pode assegurar por muitos anos a colocação dos nossos vinhos comuns e consequentemente firmar a solidez da nossa economia rural.
As possibilidades de expansão económica de Angola e Moçambique permitem fazer esta previsão.
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(...) do consumo interno do vinho. Ocorre, com efeito, este subconsumo, porque vem diminuindo o poder de compra, sobretudo nos nossos meios rurais, onde os salários são baixíssimos.
Por outro lado, verifica-se que o vinho é vendido ao público a preços que vão, muitas vezes, além do triplo e até do quádruplo dos preços pagos ao produtor. Isto sem falar nos vinhos engarrafados, pois nestes verifica-se que o preço de 7 dl oscila, nos restaurantes, pensões e boteis, como se vê das respectivas listas, entre 10$ e 20$. Ora nós vivemos em período de economia dirigida e não é livre para o produtor, como todos sabem, fazer a venda directa dos seus vinhos para os grandes mercados consumidores de Lisboa e Porto, e, pelo contrário, é ele obrigado a fazer a venda dos seus vinhos aos armazenistas; mas estes compram-nos no produtor a preços baixos e vendem-nos depois com avultados lucros ao retalhista, que, por sua vez, os vende ao público a preços elevadíssimos. Se vivemos neste talvez exagerado dirigismo, não é de mais por isso que o Estado intervenha e ponha cobro aos exageradíssimos lucros dos intermediários. Se houver neste sentido uma eficaz intervenção, certamente se verifica expansão no consumo do vinho.
Vozes: - Muito bem!
...........................
O Orador: - Sr. Presidente: aludi atrás ao progressivo desenvolvimento da cultura da vinha no nosso país e apontei-o como uma das causas do desequilíbrio entre a produção e o consumo. Limitei-me então a apontar um farto e para o evitar não sugeri quaisquer medidas.
Antes de mais quem dizer à Câmara que não creio que o alargamento do plantio da vinha verificado após a publicação do Decreto-lei n.º 38 525, de Novembro de 1951, tenha para já ocasionado uma maior produção, causadora da crise de abundância que se verifica.
Este alargamento de plantio, nas áreas referidas à imprensa diária pelo Sr. Ministro da Economia, virá com certeza a ter grande influência na sobreprodução vínica, e para se fazer ideia exacta dessa influência bastará referir que a área do País cultivada em vinha era em 1948 de 250 000 ha e que de 1949 até 1954 foram autorizados, segundo informação do Sr. Ministro da Economia, 44 132 ha e somente nos anos de 1952, 1953 e 1954, ou seja depois da publicação do mencionado decreto, 22 902 ha.
Ora é evidentíssima a influência, enorme que semelhante alargamento de área plantada de vinha - quase o quinto da área que existia em 1948 - vem a ter na produção vínica do País.
Mas os 22 902 ha autorizados para vinha nova, na vigência do Decreto-Lei n.º 38 525, ou ainda não tiveram influência na produção vínica ou tiveram-na em reduzido grau, e isto porque ainda não houve tempo suficiente para que as plantações feitas de há três anos para cá, com as necessárias enxertias, produzissem quantidades apreciáveis de vinho.
Sr. Presidente: neste já longo debate sobre a crise vinícola do País tem-se afirmado a necessidade da redução ou restrição do plantio da vinha e apontaram-se possíveis fraudes ao respectivo decreto regulador nas plantações já efectuadas.
Todos ou quase todos os oradores que têm intervindo neste interessante debate defendem com entusiasmo o princípio do condicionamento do plantio da vinha, o que, aliás, já se vem praticando em Portugal desde 1932 e acaba de ser recentemente adoptado em alguns países europeus onde a cultura da vinha exerce um papel de relevo na sua economia.
A este respeito e antes de mais, Sr. Presidente, quero lembrar aqui os ensinamentos sábios e sempre profundos do grande Chefe doutrinário e político da Revolução Nacional. Salazar, que em Março de 1933 afirmava:
O Estado deve manter-se superior ao mundo da produção e igualmente longe da absorção monopolista e da intervenção pela concorrência. Quando pelos seus órgãos a sua acção tem decisiva influência económica, o Estado ameaça corromper-se.
Há perigo para a independência do Poder, para a justiça, para a liberdade e igualdade dos cidadãos, para o interesse geral em que da vontade do Estado dependa a organização da produção e a repartição das riquezas, como o há em que ele se tenha constituído presa da plutocracia dum país.
O Estado não deve ser o senhor da riqueza nacional nem colocar-se em condições de ser corrompido por ela. Para ser árbitro superior entre todos os Interesses é preciso não estar manietado por alguns.
Parece-me, pois, Sr. Presidente, que a intervenção do Estado em matéria económica tem de ser muito cautelosa e a sua função, neste aspecto, deve ser predominantemente orientadora, deixando-se o resto à iniciativa privada, pois o Estado não deve «... colocar-se em condições de ser corrompido».
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Ora, se examinarmos as estatísticas da produção do vinho desde 1032, verificamos que, apesar de todos os condicionamentos, restrições e limitações de plantio legalmente impostos desde aquele ano, a produção vínica desenha uma curva acentuadamente ascendente, donde se pode concluir com algum acerto que a legislação nesta matéria tem sido impotente para contrariar certas leis económicas inexoráveis e possivelmente deu lugar a violências injustificáveis e a injustiças clamorosas e trouxe como consequência a beneficiação de algumas regiões do País em detrimento doutras, que devem merecer ao Estado igual atenção e protecção.
E o aumento constante da produção vínica deu-se.
Sr. Presidente, porque, conforme se tem acentuado e o afirmou o Sr. Ministro da Economia, o vinho ainda é o produto agrícola mais valorizado.
A nossa lavoura, apresar de todos os condicionamentos e restrições de plantio, refugia-se na cultura da vinha, porque é esta que lhe vem dando melhores compensações para o seu trabalho.
Se porventura se criarem à lavoura portuguesa condições que permitam a cultura dos outros produtos agrícolas em igualdade ou superioridade de valorização em relação ao vinho, é certo, Sr. Presidente, que isso terá mais forte e decisiva influência na produção vínica que todos os condicionamentos e restrições de plantio.
Ora. a verdade é que, Sr. Presidente, a lavoura atravessa uma grave crise e é nesse campo que tem de situar-se a crise vinícola.
O problema, pois, é mais vasto e abrange toda a cultura agrícola, excepção feita certamente para a cultura do arroz, que me dizem ser amplamente remuneradora. E o que é necessário sobretudo é que o Estado enfrente, o problema agrícola nacional, criando melhores condições de vida às populações rurais e estabelecendo para isso um vasto plano de fomento agrário.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Sabemos, Sr. Presidente, que em 1949 foi ordenado que pela Junta de Colonização Interna e outros serviços do Estado se recolhessem os elementos precisos para a elaboração daquele plano, tendente com
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certeza ao melhoramento das condições da nossa tão atrasada economia agrária.
Q que é indispensável, pois, é que se elabore o plano de conjunto do fomento agrário do País, de conteúdo técnico, económico e social, estabelecendo um sério e equilibrado ordenamento na nossa economia agrária, e se entre, depois de devidamente estudado e pensado, na sua execução.
Até à elaboração desse plano, afigura-se-me arbitrário e portador de graves injustiças o condicionamento do plantio da vinha, como infelizmente tem vindo a suceder.
Com efeito, Sr. Presidente, o Estado, dominado pelos princípios da limitação do plantio da vinha e do melhoramento ou qualidade dos nossos vinhos, vem, desde 1932, estabelecendo o condicionamento neste sector da economia agrária.
E assim, em 13 de Abril de 1932, sendo então Ministro da Agricultura o que foi nosso saudoso colega nesta Assembleia, coronel Henrique Linhares de Lima, o Governo, pelo Decreto n.º 21 080, proibiu a plantação da vinha em todo o País, enquanto essa plantação não fosse legalmente condicionada nas diversas zonas vitivinícolas do País, e ordenou que o então Conselho Superior de Viticultura procedesse no estudo das bases do diploma legal que regulasse o plantio da vinha naquelas zonas.
Posteriormente, publicou-se o Decreto n.º 23 590, de 23 de Fevereiro de 1934, que proibiu, em princípio, novas plantações, mas, além de estabelecer várias excepções a esse princípio, determinou que a proibição do plantio não abrangia as regiões vinícolas demarcadas que estivessem, ou viessem a estar, organizadas corporativamente, quando tivessem legislação especial aplicável.
Certamente porque se agravara a crise, vinícola, o Governo entendeu não serem bastantes para atenuarem os efeitos dessa crise as disposições deste decreto e, então, publicou o Decreto n.º 24 976, de 28 de Janeiro de 1935, que proibiu toda a plantação de vinha no continente, exceptuando somente a retancha de videiras mortas ou doentes e as plantações nos estabelecimentos do Estado para estudo.
Entretanto é publicada a Lei n.º 1891, de 23 de Março do mesmo ano, discutida e aprovada nesta Assembleia, que igualmente proibiu a plantação de videiras até ao condicionamento legal da sua cultura nas diversas regiões vitícolas, mas preceituou que eram permitidas a retancha e a substituição de videiras mortas ou doentes, mediante autorização do Ministro da Agricultura, que, ao concedê-la, teria em vista a eliminação progressiva da cultura da vinha nos terrenos de várzea e de aluvião e a conservação dos enforcados e ramadas em bordadura, e estabeleceu a obrigatoriedade do arrancamento, no prazo de três anos, de 10 por cento das vinhas em plena produção em terrenos de várzea ou aluvião de cota igual ou inferior a 50 m referida ao nível do mar.
A obrigatoriedade do arranque de 10 por cento das vinhas em terreno de várzea ou aluvião, votada, repete-se, nesta Assembleia Nacional, teve, porém, pouca duração - foi suspensa pelo Decreto n.º 27 285, de 24 de Novembro de 1936, enquanto o Governo o julgasse conveniente.
A razão desta suspensão estava, segundo se invoca no relatório do respectivo decreto, na escassez das últimas colheitas vínicas, mas o certo é que logo se previu a inexecução permanente do preceito que obrigava ao arranque de 10 por cento das vinhas em terrenos de várzea ou aluvião, pois nesse decreto se diz que se essa «disposição (a do arranque) não vier a ser executada será concedida aos proprietários que lhe deram cumprimento autorização para plantarem em terrenos especialmente apropriados um número de cepas igual ao que tiverem arrancado».
E o princípio da eliminação progressiva da vinha em terrenos de várzea ou aluvião, o qual podia ir até ao arranque de 10 por cento das vinhas respectivas desde que esses terrenos estivessem u uma cota igual ou inferior a 50m referida ao nível médio do mar, principio este discutido e votado nesta Assembleia, desapareceu da nossa legislação e parece que para sempre; e pelo Decreto-Lei n.º 33 544 de 21 de Fevereiro de 1944, até se permitiram novas plantações nesses terrenos de várzea ou aluvião, com o fundamento de serem convenientes como elemento fixador das terras sujeitas a erosão. E, como apesar dos preceitos legais em contrário, se fizessem largas plantações, o Decreto n.º 34055, de 26 de Outubro de 1944, veio permitir a sua conservação.
E chega-se finalmente, Sr. Presidente, ao Decreto-Lei n.º 38 525, de 23 de Novembro de 1951, que é o diploma vigente sobre plantio da vinha, e aí se estabelece, sem limitação de número de pés, a faculdade de plantação de vinha, mediante autorização, nos terrenos de várzea ou aluvião, sem sujeição a qualquer cota relativa ao nível do mar.
A razão é sempre a mesma: esses terrenos são frequentemente inundáveis e sujeitos a erosão e a vinha intervém como elemento fixador das terras.
Nesta altura assumiu a Presidência o Sr. Deputado Augusto Cancella de Abreu, vice-presidente.
O certo é que não me parece, apesar de doutas opiniões em contrário, que esses terrenos, que destinados à cultura de vinha contínua, terão de ser mobilizados mais do que uma vez por ano, possam ser fixados pelas videiras. E não me parece ainda, Sr. Presidente, que, na hipótese de a vinha trazer resultados sob este aspecto, seja ela o único meio eficiente para o efeito de lixar as terras, evitando a erosão.
Todavia, o Decreto-Lei n.º 38 525 determina que as plantações nestes terrenos só serão autorizadas onde outras culturas não tenham possibilidades económicas de exploração, e convém saber-se até que ponto nas autorizações concedidas foi respeitada esta determinação.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Outro reparo que nos merece o decreto que regula actualmente o plantio da vinha é a permissão que estabelece, vinda aliás já da legislação anterior, para a plantação ilimitada de vinha destinada à produção de uvas de mesa, pois os produtores destas uvas, sendo geralmente também produtores de vinho facilmente e sem possibilidades de fiscalização destinam essas uvas a produção de vinho.
Afirma-se no relatório do Decreto-Lei n.º 3852-5 que a vinha condiciona a vida económica e social dos agregados humanos nas regiões em que, mercê das condições naturais e económicas, ela se adensou e mantém, e que terá de haver um condicionamento para se evitarem os prejuízos de ordem económica e social determinados por uma desordenada plantação; e pelo decreto permitiram-se plantações livres e plantações mediante autorização, conforme os casos nele previstos.
Todavia, Sr. Presidente, vai um clamor público pelo País além sobre os abusos praticados no plantio de vinha depois da publicação deste decreto.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - E não há dúvida de que os números vindos a público relativos à área das novas plantações
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são efectivamente elevados, e, embora, como já frisei, estas plantações não tenham até agora influído na produção vínica, o certo é que no futura elas terão grande influência na produção.
E o condicionamento do plantio, enquanto existe, terá de ser sério e acto honesto da administração pública, e a lei que o regula deve impor-se igualmente a todos, para que não haja ingénuos que a cumpram e espertalhões que fujam ao seu cumprimento.
Parece-nos, pois, necessário que, para prestígio da Administração, se revejam as autorizações concedidas e a sua rigorosa conformidade com os preceitos legais vigentes, inquirindo-se dos abusos e subterfúgios praticados pelos requerentes o, apurados eles, cassando-se as respectivas autorizações, com as necessárias consequências.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: em 1950, salvo erro, foi publicado na imprensa diária o .projecto de decreto regulador do plantio da vinha, do qual saiu o Decreto-Lei n.º 38 525. Publicado na imprensa esse projecto, alguns Deputados, na sessão legislativa que se seguiu, pediram ao Governo que o mesmo fosse submetido à discussão e aprovação desta Assembleia.
O projecto não foi enviado a esta Casa e por isso não foi aqui discutido e aprovado e o Governo transformou-o, com algumas alterações, no mencionado decreto, que veio a ser publicado em 23 de Novembro de 1951, ou seja dois dias antes daquele em que, por imperativo constitucional, abria a Assembleia Nacional.
Gabe ao Governo velar pelo rigoroso cumprimento desse decreto, pura que o mesmo atinja os objectivos que se teve em vista e que vêm expressos no respectivo relatório.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Mais duas palavras e termino.
Sou Deputado por um distrito cuja área em parte pertence à região demarcada dos vinhos verdes, outra parte pertence à região demarcada dos vinhos da Bairrada e a restante parte não se encontra incluída em qualquer região demarcada de vinhos.
A minha modesta intervenção neste já longo mas interessante debate sobre a vitivinicultura nacional não faz a defesa directa dos interesses daquelas duas regiões demarcadas, porque entendo, como já afirmei, que no fundo, bem no fundo da questão que aqui se debate, o que, sobretudo, interessa é a resolução do problema agrário no seu conjunto, com um vasto e prudente plano de fomento.
Disse.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador fui muito cumprimentado.
O Sr. Amândio de Figueiredo: - Sr. Presidente: falando pela primeira vez nesta sessão legislativa, apresento a Onde é que tu queres chegar, não te estou a perceber, o que é que queres com isso V. Ex.ª, com os meus cumprimentos, homenagens respeitosas e os protestos da mais elevada admiração e apreço pelas altas e nobres virtudes de V. Ex.ª.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: os problemas da lavoura, pela importância social e económica que revestem, pois dela vive cerca de metade da população portuguesa, exigem ponderado e sério estudo e o dever de encontrar as soluções adequadas para resolver a situação de desfavor em que se encontra em confronto com outros sectores económicos, especialmente o industrial, de forma a dar-lhe as possibilidades necessárias para que as suas actividades resulte o lucro legítimo que permita uma vida decente e digna a todos quantos exploram a terra.
No quadro das suas actividades ocupa lugar de relevo a cultura da vinha, não só porque dela vive um sexto da nossa população agrícola, mas muito especialmente pela função social que desempenha, pois tornou possível a fixação à terra de grandes massas humanas e realizou o milagre da colonização em terras pobres, onde outra qualquer cultura era impossível, permitindo assim o aproveitamento de grande parte dos nossos excedentes demográficos.
As crises que atingem este sector da produção reflectem-se sobre toda a economia nacional, pois u diminuição da capacidade de compra dos 200 000 trabalhadores ligados à cultura da vinha e dos 104 milhares de pequenos proprietários que possuem produções iguais ou inferiores a cinco pipas, com um nível de vida semelhante, afectam fortemente outros ramos de produção agrícola e industrial, pois deixam de encontrar colocação para os seus produtos.
A crise de um ramo importante da lavoura ou da indústria atinge, como é fácil demonstrar pela estagnação das respectivas explorações, toda a Nação, razão por que aos Governos incumbe o dever de encontrar os remédios julgados mais convenientes para debelar o mal.
No cumprimento do mandato que tão digna e inteligentemente exerce nesta Câmara, o ilustre Deputado Paulo Cancella de Abreu trouxe a esta Assembleia um problema vital da lavoura nacional, da maior acuidade e actualidade, e de perspectivas, quanto ao futuro, bastante sombrias, se não forem devidamente equacionados os seus problemas e encontradas as soluções convenientes.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Desde o anúncio do seu aviso prévio ata à sua efectivação, a lavoura aguardou com ansiedade o debate e espera confiadamente as soluções que aqui possam ser preconizadas e confia inteiramente no Governo, certa de que melhores dias hão-de chegar para a sua difícil situação e que toda a lavoura nacional há-de ocupar entre as outras actividades .nacionais o lugar a que tem jus pelo seu labor, pela acção social e patriótica que desveladamente, através de todas as vicissitudes, exerceu e exerce, apesar dos sacrifícios e incompreensões em que tem vivido.
Estou firmemente confiado em que chegou a hora da lavoura e que esta compartilhará da valorização, do progresso e do bem-estar que, mercê da sábia orientação do Governo no último quarto de século, já hoje desfrutam muitos dos sectores económicos da Nação.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: importa rever toda a nossa política agrária, tendo em vista a melhoria da produção e o aumento do consumo, valorizando os produtos agrícolas na origem para níveis que remunerem condignamente o trabalho e o capital investidos na propriedade, partindo das realidades quanto ao estado actual do parcelamento da terra, à pobreza dos nossos solos, suprimindo ou limitando a cadeia de intermédia, rios, que duplica, triplica mais o custo dos produtos no consumidor, de forma a conseguir melhorar as condições de vida da nossa laboriosa população rural.
E este objectivo só poderá ser alcançado com preços mais altos para a produção, de forma a possibilitar-lhe
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melhor e mais segura situação económica u a permitir salários mais elevados para os trabalhadores, que continuam, na sua grande maioria, a viver cheios de privações.
A melhoria já alcançada no nível de vida em Portugal no último quarto de século não caminhou no sector agrícola no mesmo ritmo que se verificou em outros ramos da produção, mormente no industrial, sendo maior a diferença nas regiões onde predomina a cultura da vinha.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Os factores que mais concorrem para a crise da lavoura vitícola e que criaram a situação de emergência em que se debate o País são essencialmente os seguintes: aumento de produção, diminuição no consumo interno e queda acentuada das exportações.
A produção aumentou, excedendo o consumo; este o facto perante o qual o País se encontra. As duas últimas colheitas, boas, associadas ao aumento com que as novas plantações já contribuíram, são a causa do desequilíbrio que se verifica entre a produção e o escoamento.
É certo que grande parte das plantações, especialmente as que se fizeram ao abrigo do Decreto-Lei n.º 38 525, que as permitiu nos terrenos baixos e alagadiços dos vales do Tejo e do Sado, ainda não entraram em plena produção, e as consequências do aumento que daí advirão podem criar sérios e graves problemas se a tempo não se encontrarem as soluções convenientes.
É que a área dos novos povoamentos diz essencialmente respeito a terras fundas e férteis, nas quais a produtividade é muito elevada, e aos 3 por cento do aumento médio anual da área, segundo as estatísticas publicadas referentes aos últimos anos, corresponderá uma produção de mais do dobro, ou seja, mais de 6 por cento.
Logo, neste particular, além das medidas imediatas que o ilustre titular da pasta da Economia houve por bem promulgar, em face dos primeiros sintomas de desequilíbrio entre a produção e o consumo, há que tomar outras, de forma a evitar que o volume de vinhos oferecidos ao comércio não seja muito superior às necessidades, provocando o aviltamento dos preços, mas também para que os vinhos de inferior qualidade e baixos custos de produção sejam os comercializados e provoquem a ruína dos vinhos de qualidade e, consequentemente, a das populações que há séculos, nas encostas das regiões vinhateiras tradicionais, só na cultura da vinha encontram a possibilidade de vida e os meios para manterem os seus agregados familiares.
Como resolver este aspecto do problema? Julgo que só bloqueando esses vinhos incaracterísticos, normalmente de teor alcoólico alto, e destinando-os a queima para álcool e aguardente, para os quais se procuraria nos mercados internos e, principalmente, externos a sua colocação. Só desta forma conseguiríamos, sem prejuízo, assegurar o equilíbrio à economia vitivinícola.
A diminuição do consumo interno, que vem acentuando-se nos últimos anos, tem como causas, entre outras, a sua qualidade dos vinhos oferecidos ao consumidor e o baixo nível de vida das classes trabalhadoras, especialmente do meio rural, onde seria fácil aumentar largamente a capitação.
O sistema em vigor, quanto u forma como se faz o comércio de vinho, contribui grandemente para estar estado de coisas. Todas as transacções da lavoura eram feitas por intermédio do comércio armazenista.
A produção - especialmente o médio e pequeno produtor - deixou de poder vender directamente os seus vinhos ao retalhista.
As transacções são feitas pelos intermediários, que, por sua vez, os vendem aos armazenistas, e aqueles e estes o que procuram são vinhos baratos, que, como é fácil de prever, são frequentemente os defeituosos e de pior qualidade, que, depois de lotados e preparados, são lançados no comércio de retalho, para venda ao público.
O Sr. Melo Machado : - V. Ex.ª, com essa consideração, parece que condena a organização corporativa, tal como existe no próprio comércio. V. Ex.ª não se esqueça de que agora mesmo, com as últimas medidas de economia, se não tivéssemos um comércio organizado, seria muito difícil cobrar a taxa de $05 que se destina a auxiliar - a exportação e propaganda do vinho.
O facto de o retalhista poder comprar directamente na produção tinha como contrapartida uma desvantagem manifesta e não há nada que impeça a venda dos vinhos das regiões demarcadas, uma vez que seja feita um garrafões.
O Orador : - Eu, de facto, não condeno a organização, mas a organização permite um sistema que nós nau podemos aceitar, porquanto permite que o comércio se faça através dos maus vinhos, e dos vinhos defeituosos. É essa anomalia que é preciso corrigir, e a má qualidade do vinho contribuiu para a diminuição do consumo.
O público tinha, preferência pelos vinhos da encosta. Eu não condeno a organização que permitiu num momento de emergência recorrer a ela, e no prolongamento das minhas considerações vou indicar a solução.
O Sr. Melo Machado : - V. Ex.ª talvez encontrasse uma solução mais clara no facto de se poder considerar o vinho como um produto químico que tivesse certas características. A lota é uma operação perfeitamente legítima.
O Orador: - Eu defendo n princípio de que os vinhos regionais devem vender-se ao público com as suas características.
O Sr. Melo Machado : - Os vinhos regionais podem ser vendidos se o forem em garrodões.
O Orador: - V. Ex.ª não esqueça que 80 por cento dos vinicultores produzem menos de cinco pipas. Logo não possuem condições económicas para recorrerem a tal sistema.
Como ia dizendo, desta forma deixaram de aparecer os vinhos típicos das diferentes regiões - os bons vinhos do Dão, do Douro, os brancos da Bairrada, etc. - , para aparecerem somente, de forma genérica, vinhos maduros e vinhos verdes. A fiscalização exercida na defesa da qualidade dos vinhos expostos à vencia é nula ou quase e respeita somente ao teor alcoólico e à acidez volátil. Os restantes elementos característicos dos vinhos de cada região não contam e a fraude, facilitada com tal sistema, é cada vez maior, e, o que mais grave, o consumidor deixa de beber a mais salutar, higiénica e nutritiva de todas as bebidas, por intragável, e vai insensivelmente substituindo o vinho por outras bebidas, tantas vezes nocivas para a própria saúde.
Impõe-se por isso opor a este estado de coisas normas de disciplina, de firme e enérgica repressão da fraude, rigorosa fiscalização da qualidade dos vinhos, indo até ao ponto de não permitir a saída, das regiões tradicionais, de vinhos defeituosos, em mau estado de conservação, autorizando apenas a dos vinhos saudáveis, bem equilibrados, perfeitos representantes dessas regiões, destinando os maus à caldeira. Não deve continuar a ser permitido que os melhores vinhos tenham o destino
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da caldeira, enquanto que os maus, u.-, de qualidade inferior, sejam aqueles que o País bebe.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Além das medidas destinadas a reprimir a fraude o defender n qualidade, lia que manter um boas condições o normal fornecimento do mercado. Para tanto é necessário imobilizar grandes volumes de boas massas vinárias nos anos de abundância, para os lançar no mercado nos anos de menores colheitas. Este objectivo só pode ser alcançado através do organismos dispondo de meios financeiros, capacidade de armazenamento e apetrechamento técnico convenientes.
A forma de o concretizar encontra campista satisfação no plano cooperativista em marcha entre nós, que deve sofrer poderoso impulso, Ac forma n construir uma rede de cooperativas que possam armazenar algumas centenas de milhares de pipas. Operar-se-ia assim a regularização do mercado e a melhoria da própria qualidade, pois os vinhos lucrariam com o envelhecimento de um ou mais anos.
A técnica e a experiência têm demonstrado as vantagens das cooperativas nestes sector da produção; logo, o que é preciso é acelerar a marcha iniciada, dar a este movimento o apoio que ainda lhe falta, em matéria de crédito cooperativo, com investimentos que permitam a construção, em curto prazo, em verdadeiro regime de campanha, de uma extensa rede de cooperativas com capacidade de armazenamento para essas imobilizações, sem prejuízo do seu regular funcionamento.
A Espanha, onde o número de cooperativas vinícolas abrange extensas áreas, no ultimo ano, só nas regiões de Albacete, Cuenca o Toledo, iniciou e construiu, no curto prazo de seis meses, vinte e duas cooperativas, que foram concluídas e inauguradas na última vindima e laboraram já nossa colheita.
Sr. Presidente: reconhecidas as suas vantagens, mormente num país, como o nosso, em que 80 por cento dos vinicultores produzem em média menos de cinco pipas, sem. condições económicas nem instalações que lhes permitam boa vinificação, o aumento progressivo das adegas cooperativas nas regiões tradicionais contribuirá grandemente para resolver o problema vitivinícola. Basta para o conseguir que à Junta de Colonização Interna sejam atribuídos os meios financeiros para as construções e aos organismos corporativos as facilidades de crédito que lhes permitam imobilizar, quando for julgado conveniente, os volumes necessários à normalização do mercado.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - A queda das exportações tem como causa principal a intensificação da cultura da vinha em todo o Mundo, a concorrência que novos países, que de importadores passaram a grandes exportadores, fazem em todos os mercados, o regime de economia fechada que a maioria das nações adoptou após a última grande conflagração, a perda do mercado brasileiro. São estes os principais factores que causaram a descida das nossas exportações de vinhos de consumo correntes.
O Brasil, quo foi durante muito tempo um grande mercado para os vinhos de mesa. devido às dificuldades ali criadas ao nosso comércio, baixou verticalmente. Embora ocupemos ainda em lugar entre os principais países exportadores, como o Chile, a Espanha, a França e a Itália, a queda foi muito acentuada.
Não devemos, no entanto, esquecer que no Brasil trabalha cerca de 1 milhão de portugueses e que aquela gloriosa e próspera nação é filha do nosso sangue, para podermos confiadamente esperar o regresso a melhores dias e que a preferência e aceitação que os nossos vinhos sempre encontraram naquele mercado possa continuar a verificar-se.
Nos restantes mercados devemos procurar colocar os nossos excedentes, mas fazê-lo com vinhos que se imponham pela sua qualidade, usando, quanto a preços, os mesmos métodos que os países concorrentes. Só assim conseguiremos realizar, ainda que em nível modesto, as nossas exportações e manter o seu bom nome.
No entanto, esta reduzida exportação de vinhos de pasto só se consegue, e com dificuldade, a preços muito baixos, pregos estes que não podem nem devem comandar o seu nível no mercado interno. Estes, pulo contrário, devem manter-se em nível compensador para a produção, e bastará um pequeno agravamento de 2 ou 3 por cento para criar um fundo de compensação, que permitirá fomentar a exportarão dos excedentes.
Isto quanto às nossas exportações para outros países. Quanto à exportação para o ultramar, aumentou muito, especialmente no último decénio, pois de 203 000 hl passou para 528 000 hl.
O progresso que nessas parcelas da Nação se verificou nos últimos anos em todos os seus vastos territórios e o aumento sempre crescente da população branca, principalmente nas províncias de Angola e de Moçambique, contribuíram de forma decisiva para essa melhoria. Este mercado, segundo a opinião unânime daqueles que de perto estudam as suas possibilidades, está ainda muito longo de atingir o nível do consumo possível.
Uma cuidadosa política de propaganda, de defesa da finalidade e de preços deve ser desde já estabelecida, pois é nestas grandes parcelas do território nacional que, em grande parte, se encontrará a solução para o escoamento dos nossos vinhos.
Campanhas de propaganda bem conduzidas e o estabelecimento de medidas atinentes a tornar extensivo o consumo de vinho às populações nativas, em detrimento das bebidas e cafreais em uso, levem desde já ser iniciadas.
Vozes: - Muito bem !
O Orador: - Assim, ao apelo que desta tribuna dirigiu ao Sr. Ministro do ultramar o nosso ilustre colega nesta Câmara Sr. Melo Machado, vigoroso defensor de todos os problemas da terra, junto o meu, solicitando a revisão urgente de toda a legislação sobre vinhos e bebidas alcoólicas nas terras portuguesas de África, com objectivo de facilitar que o vinho seja bebido por todas as suas populações, em prejuízo de outras bebidas, nomeadamente as alcoólicas de origem não vínica, sabido como é que no uso do vinho se encontra a melhor forma de combater o alcoolismo.
Da acção conjunta dos Ministérios do Ultramar e da Economia muito haverá a esperar para a solução definitiva deste problema.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Impõe-se que pelos organismos competentes só exerça rigorosa fiscalização dos vinhos exportados, não permitindo a saída do continente daqueles que não se apresentem de boa qualidade, e que, desde já, se revejam os encargos que pesa e no custo do vinho, de forma a embaratecê-lo, tanto quanto possível, sem que para isso, haja de sofrer a lavoura, que, de unia maneira geral, está a vendê-lo a preços inferiores ao custo de produção.
De um vinho que em Lisboa custa 2$35 o litro e se vende em Luanda ao preço de 6$ parece possível conseguir o seu embaratecimento.
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A revisão destes encargos, mormente no que diz respeito aos direitos aduaneiros, que não estrio de harmonia com a nossa política de unidade nacional, julgo ser de molde a conseguir tal objectivo.
É no mercado interno e no mercado do ultramar que se situa, em meu entender, a única e estável solução para este ramo tão importante da nossa economia.
Devemos, contudo, manter com persistência a presença em todos os grandes mercados consumidores dos nossos vinhos de qualidade, pois dessa persistência e duma propaganda inteligente e continuada muito se pode esperar para a colocação em maior volume de tais vinhos.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: todos os países só defendem economicamente, fechando o seu mercado às importações, aceitando apenas as matérias-primas ou os produtos especiais. No caso presente, são os vinhos de alta qualidade que têm maior possibilidade de colocação.
Entre os vinhos portugueses, o Porto - acreditado internacionalmente como um vinho regional com características próprias inconfundíveis, que a idade sublima, e que no decorrer de séculos tem ocupado com constância notável o primeiro ou um dos primeiros lugares dos produtos exportados - é um dos. vinhos mundiais que mais se destacam pela nobreza das suas qualidades enológicas.
Ainda actualmente, apesar da baixa sofrida para quase metade do que se exportava antes da última guerra, o vinho do Porto aparece, com a cortiça e as conservas, à cabeça das nossas exportações, cabendo-lhe, em divisas, cerca de 300 000 contos.
Ao depauperamento económico dos seus principais mercados - a Inglaterra e a França, que a sua parte levam 75 por cento do total exportado -, à mudança de hábitos, à instabilidade do padrão de vida das populações mais directamente atingidas pelo conflito, às intervenções dos governos, restringindo as importações, quer por direitos exagerados, quer por contingentes, se deve a diminuição das vendas do vinho do Porto para os países consumidores.
A reconquista da posição que ocupávamos e a conquista de novos mercados deve, desde já, preocupar o Governo e aqueles a quem incumbe tal função.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - O vinho do Porto, pela excelência da sua qualidade, é um vinho inconfundível. De produção limitada e muito inferior, no estado actual da cultura da vinha no Douro, ao volume que internacionalmente se vende como Porto, é na defesa da qualidade - que, quanto mais elevada for, mais se distância das imitações - que reside a melhor forma de o impor à aceitação geral. Nesta e na defesa da marca de origem, que leis de direito internacionalmente aceites garantem e que a moral dos povos segue como princípio de seriedade nas relações comerciais entro si, está grande parte da solução do problema.
Não é um problema de preço que está em causa. A disciplina imposta ao comércio exportador nesta matéria pelo Instituto do Vinho do Porto permite firmar com segurança que o que interessa fundamentalmente é manter em bom nível a sua qualidade com vinhos suficientemente envelhecidos, e não o seu embaratecimento.
O simples conhecimento dos pesadíssimos encargos que o oneram nos diferentes países, especialmente em Inglaterra, onde os direitos de importação representam
cerca de quatro vezes o preço por que são vendidos, é suficiente para destruir toda a argumentação de rebaixamento que possa defender-se.
Para um vinho que paga de direitos aduaneiros 33 contos, qualquer descida na origem não tem significado à não altera o preço por que o consumidor o paga. Ainda que em escala menor, em todos os países os encargos são pesados. Ora, como o vinho do Porto é um produto cujo custo de produção é elevado, o seu preço justo deve ser mantido em firmeza.
Da sua estabilidade surgirá maior confiança para o seu comércio e, com esta, maior expansão nas transacções. Qualquer tentativa de baixa, que só poderia conseguir-se à custa da qualidade, exportando vinhos mais novos, serviria apenas para aumentar os lucros dos intermediários, que a absorveriam, sem qualquer vantagem nem para o consumidor nem para o produtor.
Vozes: - Muito bem !
O Orador: - Dos elementos colhidos nos diferentes mercados só conclui, sem optimismos exagerados, ser possível aumentar bastante as exportações. O mercado inglês, apesar da preferência que dá aos vinhos secos, como o Xerez, mantém fiel ao velho Porto grande número de apreciadores, e mais terá se ali se levar a efeito uma forte n bem conduzida campanha de propaganda. Há quase um século que foram escritas as palavras seguintes:
Pelo que respeita a Portugal, o interesse do vinho, que é o único grande interesso nacional e a principal fonte de riqueza e empório da indústria, nas províncias mais importantes, não está agrilhoado e restringido no entanto, mas exposto a grande risco duma ruína eventual.
O gosto pelo vinho do Porto neste país está decididamente declinado: e uma sua pensão ou restrição de importação por alguns anos seria quase suficiente para dar aos vinhos de França, Espanha e Sicília tal consideração que não poderia pois ser destruída!
A ascendência do vinho do Porto declinou quando o costume de ficar por muito tempo à mesa. depois do juntar, foi abandonado pelas pessoas das classes mediu e alta da sociedade.
Vinhos delgados e animadores são muito mais conformes ao tom dos jantares modernos; e os vinhos de Portugal (fortes e ebriativos) só poderiam ter saída estendendo o seu consumo à classe baixa, o que não poderia efectuar-se sem uma redução de preço e esta não pode ter lugar com os altos direitos que actualmente os sobrecarregam.
Logo, o problema vem de longe e a Inglaterra continuou a ser o nosso principal mercado.
O vinho do Porto apresenta-se, no que respeita a cores, aromas e sabores, das mais variadas formas. O que há necessidade é de as torna conhecidas e obrigatório que nos rótulos das garrafas se mencionem.
Desde o vinho doce ao seco, existe uma gama de variedades quanto a cores e aromas, que, infelizmente, são pouco conhecidos. O Porto seco é um grande aperitivo, que bem poucos conhecem, estrangeiros e portugueses. Há que divulgá-lo, em virtude da preferência que os mercados manifestam para as bebidas fortes e secas. Inicialmente o vinho do Porto conquistou a sua reputação como vinho seco. Logo, não teremos de mudar o tipo de vinho do Porto. O que há necessidade é de apresentar o mercado essa variedade, que sempre existiu e é sem dúvida um bom vinho aperitivo.
O problema do vinho do Porto é um problema nacional pela contribuição que pode dar, aumentando subs-
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tancialmente as exportações, para o equilíbrio da balança do comércio externo. A nobreza do produto e a aceitação nos mercados, desde que saibamos torná-lo conhecido, são a garantia do êxito.
Impõe-se entretanto, que a defesa da qualidade, intransigentemente seguida pelo organismo competente - o Instituto do Vinho do Porto -, continue em normas cada vez mais apertadas, levando aos grandes mercados consumidores a sua acção, através de entrepostos nu outras modalidades de actuação que inibam que ao vinho do Porto seja adicionado qualquer outro vinho, nacional ou estrangeiro, dando ao consumidor a certeza de que bebe o produto de origem.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Manter e revigorar a campanha de repressão da fraude nos mercados onde ela exista, pugnando pelo direito ao uso exclusivo de uma marca que se fez por si, com as virtudes e qualidades que só as condições econológicas da região onde se produz - o Douro.- lhe conferem.
Ao problema do vinho do Porto está ligada toda a economia vitivinícola nacional. O valor do produto e o volume de massas vinárias nele incorporadas - mosto e aguardente viníca - resolverão, com o aumento das exportações, a maioria dos problemas que preocupam o País, pois a cada pipa exportada correspondem duas e meia na produção.
As grandes marcas regionais constituem inestimáveis valores para os países de origem e devem ser considerados, produção e comércio, no dizer do distinto economista Guerra Tenreiro, para além do seu valor venal, como as grandes colecções de arte, verdadeiros patrimónios nacionais. Assim, incumbe ao Estado conservar e proteger este património - o vinho do Porto -, que através de séculos trouxe ao País grande volume de riqueza.
As crises sucessivas que têm atingido a sua economia reflectem-se duramente nas populações da região demarcada do Douro, onde o nível de vida do trabalhador rural é o mais baixo do País e talvez do Mundo.
Numa região onde a cultura da vinha é extraordinariamente cara, tem para viver de estabelecer uni sistema com normas próprias que permitam subordinar, tanto quanto possível, aos custos de produção os preços dos seus vinhos. Estes, segundo o estudo feito pelo engenheiro Henrique de Barros em 1939, aos quais se aplicou o respectivo coeficiente de actualização, são os seguintes:
(Ver tabela na imagem)
Os elementos que serviram de base a este estudo encontram-se à disposição de VV. Ex.ªs, se julgarem conveniente consultá-los. Devo, no entanto, esclarecer que os pregos de custo apresentam gradações várias, que foram devidamente consideradas, na região foi dividida nas duas sub-regiões existentes - Baixo Corgo e Cima Corgo. As classes dizem respeito às hipóteses mais favorável, intermédia e menos favorável.
Da produção regional sòmente 20 por cento é destinada a vinho do Porto, ficando os restantes 80 por cento em vinho de pasto. Daqui se conclui da situação difícil que, atravessa a lavoura duriense pois esses 80 por cento recebem pelos seus vinhos preços muito inferiores aos custos de produção.
Apesar das intervenções oportunas da sua Federação, à qual o Governo tem facultado os meios para o fazer, o que é certo é que, ano após ano, a sua situação se vai agravando, e tem ela o viver das suas gentes, por falta de venda para vinho do Porto dos mostos susceptíveis de benefício.
As intervenções são realizadas desde há longos anos dentro de um sistema de tabulas com gradações e preços que variam com a qualidade do vinho e a época de escoamento.
Assim mesmo, numa política de sacrifício que a falta de exportações provoca, quanto a preços, auferem-nos melhores os vinhos de superior qualidade e mais equilibrados, mantendo-se, entretanto, durante as intervenções o regular fornecimento ao comércio, sem sacrifício para a lavoura, pois os vinhos que mais tarde são entregues à Casa do Douro para escoamento, por falta de comprador, recebem o aumento correspondente, aos encargos de conservação e manutenção.
Foi-se no ano corrente mais longe e os preços de escoamento sancionados pelo Governo para a presente campanha introduzem novos factores a produtividade e o grau alcoólico mínimo -, com o objectivo de provocar mais acentuada melhoria de qualidade. As produções unitários do Douro são baixas. Nos últimos nove anos a média geral foi de 585 l por milheiro de cepas, assim discriminados:
(Ver tabela na imagem)
A circunstância de se encontrarem cadastradas pela Casa do Douro as 78 000 propriedades vitícolas da região tornou possível a determinação da produção média regional.
O Douro é a única região do País que tem o seu cadastro organizado e actualizado. Os elementos e números que se apresentam são rigorosos, o que não acontece com o resto do País, em que se trabalha com mi meros estimados, portanto susceptíveis de erro.
Desde 1945 a 1953 as plantações aumentaram no Douro uns 12 500 000 cepas, ou seja pouco mais de 1 por cento.
Alguns oradores referiram-se a excessivas plantações no Douro. O caso está suficiente esclarecido e a confusão veio de tais elementos dizerem respeito a autorizações concedidas pela 4.ª brigada do plantio, com sede na Régua. Ora a área desta diz respeito a todo o distrito de Bragança, todo e distrito de Vila Real e grande parte dos distritos de Viseu e da Guarda. Daí a confusão.
O Douro, antes e depois do Decreto-Lei n.º 38 525 - e digo antes porque já eram permitidas desde 1936 as plantações ali em terrenos susceptíveis de produzirem vinhos de superior qualidade -, não aumentou a sua produção.
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As duas últimas colheitas abundantes corresponderam às condições favoráveis dos anos de 1953 e 1954 na cultura da vinha e foram gerais no País. Nesta região, no entanto, a última colheita foi fortemente influenciada pelo tratamento eficaz para a maromba pelo boro.
Aos serviços oficiais dirijo os meus cumprimentos e louvores pela forma inteligente como conduzem os seus trabalhos em favor da agricultura, quer na investigação científica, quer na assistência técnica, que muito honram os seus servidores e a própria Nação.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - O tratamento encontrado para a maromba do Douro resolveu um dos mais gravas problemas da viticultura daquela região.
Está bem longe esta região - única para a cultura da vinha - de atingir o aumento que se verificou no resto do País, o que, por certo, traduz o índice do resultado económico que a lavoura ali encontra na exploração da terra.
A suspensão do plantio da vinha, oportuna e justamente determinado pelo Sr. Ministro da Economia, pondo termo a plantações que vinham fazendo-se em todo o País, especialmente em terrenos férteis em volumes, que provocaram a situação de emergência em que nos encontramos, estabelece tratamento desigual para os terrenos de encosta das regiões tradicionalmente vitícolas, nos quais o ciclo vegetativo da videira é mais curto. Como no Douro, em que a média não ultrapassa normalmente os vinte e cinco anos, fica em situação de desfavor em relação com os terrenos fundos e férteis, onde a cepa tem vida muito mais longa, se não forem estabelecidas com urgência as normas de condicionamento que tenham em vista resolver este importante aspecto do problema.
Por isso, permita-me desde já chamar a atenção para o assunto, de forma a evitar que o desequilíbrio económico em que vivem essas regiões seja agravado pela falta, durante largo período, de disposições legais que autorizem a manter os actuais povoamentos em bom nível de exploração com os aumentos correspondentes ao desaparecimento das cepas que morrem e a baixa da produção que se verifica a partir de certa idade, e que no Douro, por exemplo, começa normalmente aos quinze anos.
Nesta altura reassumiu a Presidência da Mesa o Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Conhecida a produção geral do Douro e a sua a receita pelo destino que lhe é dado, conclui-se com relativa facilidade que o rendimento é deficiente para uma população de 215 620 habitantes, dos quais 35 658 são trabalhadores rurais em idade de exercerem a sua actividade, (censo de 1950), motivo por que é muito baixo o seu nível de vida.
O salário que auferem os trabalhadores rurais situa-se, segundo os elementos colhidos pela secção de acção social da Federação, em menos de 12$, e o número de dias de trabalho, que nem sempre conseguem, em 250 n minis. Daqui resulta que o rendimento anual de cada trabalhador não atinge 3.000$. Deste rendimento tem de sair a alimentação, o vestuário, para si e para os seus, e a renda da casa. Julgo desnecessário fazer comentários para poder afirmar que a sua situação toca as raias da miséria. Não vivem, vegetam, «como elemento espontâneo gerado pelas fragas», segundo a expressão feliz do ilustre duriense Dr. Mário Bernardes Pereira.
Vozes: - Muito bem, muito bem !
O Orador: - Ao problema económico da salvação de um património nacional, da criação de riqueza para o País, há que juntar e resolver, por humanidade até, um problema social da maior importância, a situação angustiosa dessa boa gente, que no seu patriotismo conserva integras as crenças, o seu patriotismo e a fé em Salazar e no seu Governo.
Ao autor do aviso prévio, modelo das mais altas virtudes de homem e de parlamentar distinto, presto as minhas homenagens e dou a minha adesão às medidas propostas, tendo em vista que n situação especial do vinho do Porto, no estudo das soluções, merece, pela sua feição própria, ser considerado no âmbito do seu sector económico, a cuja organização se devem, na dura crise que atravessamos, as medidas que evitaram a ruína total da sua produção e comércio.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Foi com a maior satisfação que a Assembleia Nacional recebeu a informação, dada pelo nosso ilustro colega Alberto Araújo, de o Governo, pelo Fundo de Fomento de Exportação, ter atribuído determinada verba para propaganda dos vinhos do Porto e da Madeira. No que respeita ao vinho do Porto, pelo conhecimento e estudos realizados sobre o assunto nos diferentes mercados, até por determinação das disposições legais, é ao Instituto do Vinho do Porto que compete realizar e organizar toda essa propaganda.
O Douro, que no dobrar do tempo tem passado horas de prosperidade e de miséria, a cuja história estão ligados homens de Estado da envergadura de Pombal e João Franco, não esquece quanto deve ao distinto homem público s nosso ilustre colega nesta Câmara engenheiro Sebastião Ramires, que, em hora feliz, interpretou a doutrina e o pensamento de Salazar criando a organização do vinho do Porto em 1932, pondo cobro a uma das maiores crises dos últimos tempos, apesar de SB exportarem nessa altura cerca de 100 000 pipas de vinho. Nem só as quedas de exportação originam as crises; o aviltamento de preços também as provoca, e bem mais graves, porque, além do mais, desacreditam o produto.
O Douro não esquece quanto deve ao Sr. Engenheiro Sebastião Ramires e eu, como duriense, aproveito esta oportunidade para apresentar-lhe as mínima homenagens de muito reconhecimento.
Tenho dito.
Vozes: - Minto bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão.
A próxima será amanhã, à hora regimental, com a mesma ordem do dia da de hoje. Está encerrado a sessão.
Eram 19 horas e 40 minutos.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
António Augusto Esteves Mendes Correia.
Daniel Mana Vieira Barbosa.
João Afonso Cid dos Santos.
Joaquim Mendes Ao Amaral.
Manuel Colares Pereira.
Rui de Andrade.
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Abel Maria Castro de Lacerda.
Agnelo Ornelas do Rego.
Página 600
600 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 82
(...)bustorf da Silva.
(...)de Sousa.
(...)Cerqueira Gomes.
(...)Azevedo Mendes.
(...)Mantero Belard.
Carlos Vasco Michon de Oliveira Mourão.
Jerónimo Salvador Constantino Sócrates da Costa.
João da Assunção da Cunha Valença.
João Carlos de Assis Pereira de Melo.
João Mendes da Costa Amaral.
Joaquim de Moura Relvas.
Jorge Pereira Jardim.
José Garcia Nunes Mexia.
José Gualberto de Sá Carneiro.
José dos Santos Bessa.
Luís Filipe da Fonseca Morais Alçada.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Maria de Lacerda de Sousa Aroso.
Mário Correia Teles de Araújo e Albuquerque.
Miguel Rodrigues Bastos.
Teófilo Duarte.
O REDACTOR - Luís de Avillez.
IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA