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REPUBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.° 123

ANO DE 1956 4 DE FEVEREIRO

ASSEMBLEIA NACIONAL

VI LEGISLATURA

SESSÃO N.° 123, EM 3 DE FEVEREIRO

Presidente: Ex.mo Sr. Augusto Cancella de Abreu

Secretários: Ex.mos Srs.
Gastão Carlos de Deus Figueira
Alberto Pacheco Jorge

SUMARIO:- O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 20 minutos.

Antes da ordem do dia.- Foi aprovado o Diário das Sessões n.º 122.
Deu-se conta do expediente.
Por proposta do Sr. Presidente foi aprovado um voto de pesar pela morte da esposa do Sr. Deputado Amândio de Figueiredo.
O Sr. Deputado Urgel Horta fez o elogio do discurso do Sr. Presidente do Conselho pronunciado em 19 de Janeiro na União Nacional.
O Sr. Deputado Manuel Vaz deu explicações sobre a sua última intervenção respeitante à siderurgia nacional.

Ordem do dia.- Continuou a discussão do aviso prévio do Sr. Deputado Abel de Lacerda sobre a situação dos museus, palácios e monumentos nacionais.
Falaram os Srs. Deputados Mendes Correia e Bustorff da Silva.
O Sr. Presidente encerrou à sessão às 18 horas e 45 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 16 horas e 10 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Abel Maria Castro de Lacerda.
Agnelo Orneias do Rego.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Pacheco Jorge.
Alfredo Amélio Pereira da Conceição.
Américo Cortês Pinto.
André Francisco Navarro.
António Abrantes Tavares.
António de Almeida.
António de Almeida Garrett.
António Augusto Esteves Mendes Correia.
António Bartolomeu Gromicho.
António Calheiros Lopes.
António Camacho Teixeira de Sousa.
António Carlos Borges.
António Cortês Lobão.
António Júdice Bustorff da Silva.
António Pinto de Meireles Barriga.
António Raul Galiano Tavares.
António Rodrigues.
Artur Aguedo de Oliveira.
Artur Proença Duarte.
Augusto Cancella de Abreu.
Caetano Maria de Abreu Beirão.
Camilo António de Almeida Gama Lemos Mendonça.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos Mantero Belard.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Eduardo Pereira Viana.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Gaspar Inácio Ferreira.
Gastão Carlos de Deus Figueira.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Herculano Amorim Ferreira.
Jerónimo Salvador Constantino Sócrates da Costa.
João Afonso Cid dos Santos.
João Alpoim Borges do Canto.
João Ameal.
João da Assunção da Cunha Valença.

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João Carlos de Assis Pereira de Melo.
João Luís Augusto da» Neves.
João Mendes da Costa Amaral.
João de Paiva de Faria Leite Brandão.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim Mendes do Amaral.
Jorge Botelho Moniz.
Jorge Pereira Jardim.
José Dias de Araújo Correia.
José Garcia Nunes Mexia.
José Gualberto de Sá Carneiro.
José Maria Pereira Leite de Magalhães e Couto.
José Soares da Fonseca.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Luís Maria Lopes da Fonseca.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Maria de Lacerda de Sousa Aroso.
Manuel Maria Vaz.
Manuel Monterroso Carneiro.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Manuel Trigueiros Sampaio.
D. Maria Leonor Correia Botelho.
Mário de Figueiredo.
Paulo Cancella de Abreu.
Ricardo Malhou Durão.
Ricardo Vaz Monteiro.
Rui de Andrade.
Sebastião Garcia Ramires.
Teófilo Duarte.
Tito Castelo Branco Arantes
Urgel Abílio Horta.
Venâncio Augusto Deslandes.

O Sr. Presidente:-Estão presentes 72 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 16 horas e 20 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente:-Está em reclamação o Diário das Sessões n.° 122, relativo à sessão de ontem.

Pausa.

O Sr. Presidente:-Se nenhum Sr. Deputado deseja fazer qualquer observação, considero aprovado o referido Diário dou Sessões.

Pausa.

O Sr. Presidente:-Está aprovado.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Oficio

Do Grémio da Lavoura de Setúbal a apoiar as considerações do Sr. Deputado André Navarro relativamente ao excesso de construções urbanas em terrenos agrícolas da melhor qualidade.

Telegramas

Da Associação Académica de Coimbra a apoiar :as considerações do Sr. Deputado Bartolomeu Gromicho acerca do uso obrigatório da capa e batina.
Do conselho das «repúblicas», de Coimbra, no mesmo sentido.
Do Grémio da Lavoura de Coimbra a apoiar as considerações do Sr. Deputado Sousa Machado sobre a criação de ama brigada técnica em Coimbra.
Do Grémio da Lavoura da Lousa, no mesmo sentido.
Do Grémio do Comércio do distrito de Viseu a apoiai-as considerações do Sr. Deputado Azeredo Pereira acerca da construção do edifício da Escola Industrial e Comercial de Viseu.

O Sr. Presidente:- Pela Presidência do Conselho foram enviados a Mesa os esclarecimentos pedidos pelo Sr. Deputado António Galiano Tavares na sessão de 24 de Janeiro lindo sobre casas desmontáveis e casas para famílias pobres. Esses elementos vão ser entregues ao referido Sr. Deputado.

Pausa.

O Sr. Presidente:- Srs. Deputados: faleceu há dias a esposa do Sr. Deputado Amândio de Figueiredo. Interpreto, com certeza, os sentimentos da Assembleia apresentando ao Sr. Deputado Amândio de Figueiredo as nossas condolências e a nossa manifestação de pesar por tão triste acontecimento.

Vozes: - Muito bem !

O Sr. Presidente:- Tem a palavra antes da ordem do dia o Sr. Deputado Urgel Horta.

O Sr. Urgel Horta: - Sr. Presidenta: pela primeira vez desde que participo nos trabalhos da Assembleia-Nacional tomo a palavra sob a presidência de V. Ex.
E ao fazê-lo não quero deixar de cumprir o grato de ver de lhe apresentar os mais respeitosos cumprimento e as melhores homenagens, saudando em V. Ex.ª o infatigável homem público que tão largo e desinteressado contributo tem dado à tareia renovadora da Nação, ré novação milagrosamente operada sob a égide do maio estadista dos nossos tempos - Salazar.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:- Sr. Presidente: ponderáveis motivos e razões contidas na presente intervenção, que encontrarar no meu espirito vivo sentimento de admiração bem justificada, observam-me não poder manter-me silêncios perante o pensamento do esclarecida orientação política definido por S. Ex.ª o Sr. Presidente do Conselho a seu memorável discurso de 19 de Janeiro passado, o acto de posse das comissões distritais e dos membro de outros órgãos superiores da União Nacional.
Eu compreendo com toda a clareza e aceito com evidência, sem reserva, o facto de não possuir no meu insignificante curriculum bagagem suficiente para arcar com a responsabilidade de poder bordar determinadas considerações, judiciosas e adequadas, fazendo um comentar profundamente criterioso e digno, como pretendo, acerca desse magnífico programa de acção política enunciado e desenvolvido com tanta objectividade e com tanta grandeza por quem tem consumido uma vida inteira à luta persistente, continua mas vitoriosa, pelo engrandecimento de Portugal.
Mas, posto que os meus recursos sejam extraordinariamente modestos, em plena consciência afirmo sob jarem-me em vigor, entusiasmo, em dedicação e na autoridade numa vida social, absolutamente sã e isenta mácula, predicados bastantes para poder, em meu norte pessoal, e só nossa qualidade, que sempre invoco, exteriorizar, em palavras singelas, os meus sentimentos acerca dessa bem-vinda exortação dirigida pelo Sr. Presidente do Conselho a todos quantos, de alma pura e coração

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aberto, vivem, perfilham e professam os princípios doutrinários definidos pelo génio criador e renovador do grande homem de Estado que nos orienta, nos guia, nos governa.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-Bem merecem, Sr. Presidente, ser destacadas e lembradas na Assembleia Nacional, como assembleia política que é, na sua mais alta representação, algumas afirmações, todas quantas foram feitas nessa magistral oração, que indica e aponta com a mais expressiva clareza e a mais notável verdade o caminho a trilhar, a orientação a seguir, trajectória luminosa de fé e de certeza nesta nova fase da União Nacional como «intensificação bem necessária da nossa actividade política».
São bem dignas de ser meditadas e seguidas toda essa série de indicações e considerações, elaboradas com o propósito de definir e compreender com a justeza e precisão necessária o que e política, qual o seu valor, o seu objectivo e a sua utilidade perante as necessidades e os problemas da Nação.
Sr. Presidente: Salazar é incontestavelmente a figura mais representativa da intelectualidade portuguesa na sua generosa actividade, possuidor de nina mentalidade tão superiorizada e tão distinta, digna da admiração do mundo inteiro, mentalidade inconfundível, que não pode aceitar confronto ...

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador:-... tão largamente se observa a sua projecção. Os seus discursos são modelares na forma, profundos nos conceitos, ricos nos ensinamentos; lições magistrais que orgulhosamente e embevecidos ouvimos e aprendemos.
Ao lê-los ou ao escutá-los, seja qual for o motivo superior que lhes der causa, o nosso espirito sente-se dominado pela verdade do sen raciocínio, pela acção doutrinária que exprimem e exercem com a claridade da fé, que a todos ilumina dentro do fervor refulgente da verdade, alheia a ficções. Ele é sempre o mesmo, e tão grande que o seu valor não sofre limitações, sabendo como ninguém ligar, separar e coordenar a administração com a política.
Infelizmente, Sr. Presidente, tem-se descurado esse aspecto em alguns sectores do Estado Novo, não lhe reconhecendo o seu verdadeiro significado, da mais alta nobreza humana. Só a política - que entra em todos os ramos da governação, mas política de interesse colectivo verdadeiramente nacional na sua actividade criadora e doutrinadora- pode manter bem vivos, bem presentes, os princípios inerentes às posições da ideologia que ocupamos, professamos e defendemos com todo o vigor do nosso entendimento.
Povo sem ideal político é povo sem alma, e Salazar restituiu a Portugal o orgulho, a grandeza e sublimidade dessa aluía, que fez a imortalidade da Pátria. Ele, nas considerações e nos conceitos expendidos sobre política, soube reabilitá-la de noções erradas, valorizá-la, engrandecê-la, colocá-lo na função que tem a desempenhar como factor necessário de engrandecimento e progresso, quando convenientemente compreendida e associada à administração pública e à técnica.
Assim, «governar representa afinal uma actividade empenhada numa realização política», diz Salazar. E numa síntese admirável do seu alto pensamento afirma o Sr. Presidente do Conselho:
«Ora o outro significado da política que eu desejaria reabilitar também é exactamente o da acção, tendente a criar a consciência nacional dos problemas e o convencimento geral da bondade das soluções, para que a acção governativa se desenvolva em ambiente esclarecido e favorável.
O estudo e discussão das questões, em formação dos factos que as originam ou condicionam, a sugestão de soluções possíveis ou convenientes, a defesa dos princípios em causa, a apreciação das limitações existentes - tudo isso é acção política, tudo isso é política.
Em tal sentido, em tais termos, com tal objectivo, a política foi sempre não só útil mas necessária, e é-o sobretudo no Estado moderno, seja qual for a sua constituição.
Se aos governos compete tomar conhecimento dos problemas, equacioná-los, definir as soluções, adoptar as providências atinentes a resolvê-los na ordem prática, é sobretudo aos organismos políticos que incumbe esta segunda missão. E se falham nela, ou o governo se lhes substitui, com prejuízo da actividade própria, ou a consciência nacional pode deixar de encontrar-se em condições de seguir e apoiar a acção governativa».
Verdades profundas, eloquentes, incontroversas, plenas de consciência, encerra este conjunto de considerações, que são factos bem demonstrativos da importância existente, no acto de fazer política, dentro dos moldes e princípios sãos, duma política verdadeiramente construtiva, eminentemente nacional, baseada no interesse da comunidade e nas aspirações e necessidades da grei. Essa tem sido sempre, desde a primeira hora, a política de Salazar. Sem ela não seria possível o milagre do nosso ressurgimento financeiro, económico, social e moral, obra digna dum inigualável chefe, realizada com aplauso unânime dum povo inteiro.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-E, considerando que a actuação do regime tenha sido «predominantemente governativa e deficientemente política», o Sr. Presidente do Conselho dirige-nos convite formal para uma intensificação bem necessária da actividade política, por razões e motivos que S. Ex.ª com toda a autoridade indica e perfilha.
Sr. Presidente: na essência da verdadeira política vivem, com toda a sua acuidade, todos os problemas em que a humanidade se debate: problemas económicos, sociais, religiosos, morais, e tantos outros em que estes se desdobram. Na política brilha como esperança a luz da Fé, que remove montanhas; facho que domina e ilumina o Mundo, que não pode nem quer viver alheado, divorciado dessa grande força que a política representa.
Salazar falou e todo o seu discurso é modelo de clareza, modelo de verdade. A sua palavra foi escutada e ouvida com a atenção dedicada a todas as portentosas manifestações do seu prodigioso espirito, donde irradia a chama que galvaniza o coração e a alma dos Portugueses, na plenitude de confiança nos destinos da Pátria, criados pela generosidade do seu esforçado labor.
«É necessária e útil a política». Pois façamo-la, dentro da maior compreensão e das directrizes estabelecidas, desprezando mesquinhos interesses, adoptando atitudes de isenção e nobreza, com dedicação e sacrifício, de que resulte engrandecimento e prosperidade para a Nação.
Sigamos, Sr. Presidente da Assembleia Nacional, a trajectória balizada pelas palavras com que V. Ex.ª, na sequência da orientação marcada pelo Sr. Presidente do Conselho, finalizou o discurso proferido no Porto:

Lancemo-nos à política de alma e coração. Salazar nos convidou, expressa e formalmente, para uma intensificação bem necessária da nossa actividade. E sejamos ambiciosos: continuemos a revolução em paz, sim, evidentemente em paz, em paz, mas agora mais depressa.

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E procedendo assim honramos os compromissos tomados cora Salazar, trabalhando a bem da Nação. Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Manuel Vaz: - Sr. Presidente: na minha intervenção de 1 do corrente a propósito da localização da indústria siderúrgica eu fizera a seguinte afirmação:

Entendo, por isso, que a solução do alto forno a coque, em principio, deve ser eliminada como parece ser a vontade do Governo, expressa no Plano de Fomento, nas condições do programa de concurso e segundo o parecer unânime do Conselho Superior da Indústria.

O nosso ilustre colega e meu querido amigo Sr. Engenheiro Calheiros Lopes, com a nobreza e lealdade que põe em todos os seus actos, teve a gentileza de me procurar para me lazer reparos aquela minha afirmação na parte referente ao Conselho Superior da Indústria, do que é membro destacado, afirmando que não corresponde à realidade, mesmo porque ela ainda é, neste momento, do exclusivo conhecimento do Governo.
Suponho que S. Ex.ª se quereria referir a qualquer parecer ultimamente emitido pelo aludido Conselho, cuja doutrina, exactamente porque ainda se conserva reservada, não é nem podia ser do meu conhecimento.
Devo-lhe por isso, e à Camará, uma explicação, para evitar mal-entendidos.
Não tenho por hábito fazer afirmações levianas.
Aquela minha afirmação foi feita com base no que se encontra escrito a fl.58 do parecer da Direcção-Geral de Minas, onde, depois de se apreciar desfavoravelmente a solução do alto forno a coque, citando um trecho da proposta de lei do Plano de Fomento, eliminando-a, por não aproveitar os carvões nacionais, insusceptíveis de coqueficação, se lê, textualmente, o seguinte:

Apesar de ter sido apresentado um pedido, posterior, diferente, cujo texto só conhecemos pela apreciação do engenheiro Vítor Pinheiro, num jornal, o Conselho Superior da Indústria reuniu e, por unanimidade, aprovou a obrigação de consumir combustíveis nacionais e o Governo assim concedeu o alvará.

Ao afirmar, portanto, que o Conselho Superior da Indústria excluíra por unanimidade a solução do alto forno a coque, não o fiz de animo leve, sem fundamento, porquanto, aprovando a obrigação de consumir combustíveis incoqueficáveis, implicitamente eliminava aquela solução, por o coque ser combustível estrangeiro, na minha opinião.
Não sei, porque não o posso advinhar, se o Conselho Superior da Indústria emitiu posteriormente parecer diferente daquele a que aludi, visto ser, por enquanto, secreto e não ter chegado ainda ao conhecimento público.

O Sr. Caldeiros Lopes: - Se V. Ex.ª me dá licença: antes de fazer uma pequena observação, quero agradecer a V. Ex.ª as palavras que proferiu a meu respeito, as quais se justificam apenas pela habitual gentileza de V. Ex.ª e a amizade que nos une.
Do relatório que V. Ex.ª mencionou não se deve depreender que a importação de coque não seja de considerar. Conclui-se que deve utilizar-se combustível nacional, mas sem excluir a importação de combustível estrangeiro, se tal for necessário.

O Orador:-Eu interpretei, salvo o devido respeito pela sua opinião, as coisas de uma forma inteiramente diferente, e interpretei-as por isto: o alvará da concessão, não sei se no artigo 8.° ou 10.°, impõe a obrigação de consumir carvões nacionais.

O Sr. Calheiros Lopes: - Compreendo perfeitíssimamente que o alvará fosse dado nossas condições, dando aplicação aos carvões nacionais, mas isso não impede que se importem carvões estrangeiros se for julgado conveniente.

O Orador:-Disso não percebo eu, porque não sou um técnico. Estou apenas a: constatar um facto, e no alvará há uma condição que impõe à empresa a obrigação de consumir carvões nacionais. Isso é com o Governo, que determinou essa obrigação, e desde que assim procedeu, e como os carvões nacionais não são susceptíveis de coqueficação, é evidente que o carvão de coque não pode ser importado para a indústria siderúrgica.

O Sr. Abrantes Tavares: - Há carvões coqueficáveis, mas em Moçambique, no Moatise.

O Orador:-Mas quero apenas referir-me a carvões metropolitanos.

O Sr. Calheiros Lopes: - Se há esses carvões nacionais, muito bem, mas, não sendo assim, não se deve proibir a importação dos carvões estrangeiros para lotar aqueles, na medida das justas necessidades.

O Orador:-Não sei se os há, mas o que sei, por o ter lido em diversas publicações e no parecer do Conselho Superior de Minas a que me referi, ó que só exclui a solução a coque, que ali se diz não ter sido aprovada.

O Sr. Calheiros Lopes: - Justamente no relatório a que V. Ex.ª se refere do Conselho Superior de Minas vem isso mencionado, mas há posteriormente um relatório do Conselho Superior da Indústria, o relatório final, que é bem diferente daquilo que apresenta o relatório do Conselho Superior de Minas relativo a esse ponto. Nada mais devo acrescentar neste momento.

O Orador:-Agradeço a informação de V. Ex.ª Trata-se de segredo e não pode ser divulgado; nós, os leigos, não podemos ter conhecimento dele. Do que temos conhecimento é daqueles pareceres que já não são secretos, daqueles de que todo o público pode ter e tem conhecimento.

O Sr. Pinto Barriga: - V. Ex.ª dá-me licença? O relatório do Conselho Superior da Indústria pode ser secreto, mas não as suas conclusões. A concessionária tinha um ano para apresentar a sua planificação, cuja elaboração nos termos contratuais era sujeita à superintendência governamental. Dessa planificação é que não conhecemos os precisos termos, apesar de ter decorrido um ano. Tudo o resto são detalhes, pormenores ...

O Orador:-Muito obrigado pela observação do V. Ex.ª
O que sei é que num caso idêntico ele emitiu aquela opinião e que a lógica ordena quo para casos semelhantes, idênticos, sejam semelhantes e idênticas as soluções adoptadas.
Do contrário não haveria coerência.
Como quer que seja, a afirmação que fiz foi extraída de um documento oficial emanado de uma repartição pública e referente a um voto que já não é sigilo para ninguém.

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Era a este voto que se referia a Direcção-Geral do Minas e a que, por minha vez, fiz também alusão.
E esclarecida assim a afirmação, renovo o testemunho da minha mais alta consideração pela fidalga gentileza do nosso ilustre colega Sr. Engenheiro Calheiros Lopes, que teve a bondade de para ela me chamar particularmente a atenção, permitindo-me desta forma esclarecê-la.
E termino reafirmando assim inteira confiança no Governo da Nação, que saberá encontrar para o caso siderúrgico português a solução mais justa e mais conveniente.
Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente:-Continua o debate sobre o aviso prévio do Sr. Deputado Abel de Lacerda, acerca da situação dos museus, palácios e edifícios nacionais.
Tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Correia.

O Sr. Mendes Correia: - Sr. Presidente: em 4 de Março de 1949, portanto numa anterior legislatura, tive a honra de intervir, nesta Assembleia, na discussão de um projecto de lei sobre protecção e conservação de valores monumentais e artísticos dos concelhos de Portugal, projecto que fora apresentado pelo saudoso amigo, que foi meu colega nesta Câmara, Deputado Rocha Páris.
Nessa ocasião, como noutras oportunidades - discussões sobre a investigação cientifica entre nós, sobre a repartição de dotações do Estado, etc. -, me foi dado ensejo de falar aqui de temas idênticos ou afins em relação aos que estão em debate, por virtude do aviso prévio do ilustre Deputado Dr. Abel de Lacerda.
Não voltarei, assim, hoje a espraiar-me em considerações já naquelas oportunidades feitas sobre alguns pontos que caberia versar a propósito do presente aviso prévio.
Limito-me a recordar que datam de 1721 as primeiras providências governativas no sentido de defender, preservar e proteger monumentos de valor nacional, mas que já os nossos humanistas do Renascimento, com especial relevo André de Resende, manifestaram interesse por esses monumentos, pelo seu alto significado, pela sua protecção e estudo.
Recordarei também o papel, na matéria, da Academia da História Portuguesa no século XVIII, o da Associação dos Arquitectos Portugueses -depois Associação dos Arqueólogos Portugueses - desde o meado do século XIX, o de Ramalho Ortigão, Gabriel Pereira, Martins Sarmento e, mais recentemente, José de Figueiredo, etc.
Sob o regime republicano, saia em 26 de Maio de 1911, com intervenção de José Relvas, um decreto-lei de protecção ao património artístico da Nação, no qual se criaram os Conselhos de Arte e Arqueologia. A Lei n.° 1700, de 1924, voltava ao assunto.
Mas é após o início da actual situação política que a legislação e o labor em tão importante domínio se desenvolvem de modo que, se não se pode dizer isenta de reparos a acção exercida, há motivo de sobra para que esta situação se orgulhe no conjunto dos esforços despendidos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-Os Ministros Antunes Guimarães, Alfredo de Magalhães, Cordeiro Ramos, Duarte Pacheco, engenheiro Ulrich, Sousa Pinto, Carneiro Pacheco e, mais recentemente, Aguedo de Oliveira ligaram os seus nomes, como outros, a uma tarefa de valorização e defesa do nosso património artístico, mas seria injusto esquecer a alta figura nacional do Sr. Presidente do Conselho, que, quer com intervenções directas, quer criando um clima favorável nos aspectos financeiro, moral e político, deu à tarefa bases e estímulos que nunca será demasiado enaltecer.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-Em matéria legislativa, vieram: em 1928 o Decreto n.º 15 216, em 1932 os Decretos n.os 20 985 e 21117, em 1933 o Decreto-Lei n.° 23 215, em 1936 o n.° 26 611, em 1952 o n.° 38 906, etc.
Criaram-se ou transformaram-se os organismos incumbidos da superintendência, fiscalização e consulta na matéria, melhoraram-se e criaram-se museus, instituiu-se pessoal permanente para alguns, facultaram-se meios para algumas aquisições, criaram-se estágios para preparação de pessoal, promoveram-se e custearam-se publicações, escavações, estudos.
À acção do Estado somou-se a de particulares, com doações, liberalidades, iniciativas, muitas das quais de elevado préstimo. Estenderam-se aos nossos territórios ultramarinos providências várias para defesa do património artístico e monumental correspondente.
Das iniciativas privadas devo realçar a Fundação da Casa de Bragança, a Fundação Ricardo Espirito Santo, a acção cultural da Companhia dos Diamantes de Angola, a Fundação Gulbenkian, em organização.
Só a explanação do que tem sido o labor artístico e cultural da Fundação da Casa de Bragança constituiria largo tema para um discurso ou uma conferência.
E, sobretudo, notável a acção por ela desenvolvida, sob a presidência culta, zelosa e dedicada do Sr. Dr. António Luís Gomes, no Palácio Ducal de Vila Viçosa, onde as reintegrações e restauros acompanham, sob a orientação de individualidades competentes, a instalação adequada Já biblioteca, do arquivo, dum museu, a realização de conferências, uma bela actividade editorial sobre temas artísticos - o Palácio, os seus azulejos, D. Carlos artista, livros de D. Manuel II, livros de música polifónica, os jardins do Paço, etc.
Volvendo aos serviços oficiais, verifica-se, de facto, que o labor realizado no último quarto de século no âmbito que nos ocupa tem sido levado a efeito por várias entidades: o Ministério da Educação Nacional, a sua Direcção-Geral do Ensino Superior e das Belas-Artes, a 6.ª secção da Junta Nacional da Educação, o Instituto de Alta Cultura (com bolsas de estudo, subsídios a centros de estudos, um centro de museologia no Museu de Arte Antiga, etc.), a Academia Nacional de Belas-Artes (com o seu boletim, os seus volumes publicados- entre os quais destaco os Inventários Artísticos -, as suas exposições, as suas conferências), os museus anexos ao Ministério, o Ministério das Obras Públicas e a sua Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, o Ministério das Finanças e a sua Direcção-Geral da Fazenda Pública (com numerosas iniciativas ou colaborações, como na aquisição de imóveis e móveis, na guarda de monumentos e palácios, na administração de fundos e fundações, na reorganização do Instituto Português de Santo António, em Roma, etc.), as juntas de província, com os seus museus provinciais, as câmaras municipais, com os seus museus locais, com outras iniciativas de interesse local, e o Ministério do Ultramar, com as suas providências de protecção de monumentos, com missões de investigação, com os museus e centros de estudos de Luanda, de Lourenço Marques e de Bissau. Precisamente no aviso prévio e no debate em curso tem-se salientado a desconexão e a dispersão dos esforços e actividades nestas matérias, e é para tal que se procura remédio. Reconheço sem hesitação que se veri-

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ficam frequentemente essas faltas, mas isso não invalida o mérito de muitos dos esforços desenvolvidos, sobretudo nos últimos trinta anos, nem colide com o principio da vantagem de não centralizar excessivamente as actividades na matéria, sob o risco de fazer estiolar iniciativas úteis e de prejudicar uma desejável e fecunda independência criadora, num mínimo indispensável de liberdade, critérios originais respeitáveis, que não excluem, entretanto, a coordenação dentro de certos limites necessários e uma fiscalização inteligente e cuidadosa, no sentido de evitar erros ou destruições irreparáveis.
Como disse aqui no meu discurso de 1949; não nos faltam; normas salutares na legislação vigente. O pior é que muitas vezes se não cumprem e não são apenas curiosos ou amadores que as infringem, mas até autoridades responsáveis.
Com resultados nem sempre brilhantes, não se tem por vezes cumprido o Código Administrativo no que respeita à criação de museus locais: não se tem ouvido por vezes, como a lei determina, o parecer prudente e esclarecido de entidades especializadas e de corpos consultivos oficiais. É certo que, como disse no discurso já referido, o êxito das providências para protecção do património artístico arqueológico e linguístico do País depende mais de boas vontades bem informadas, competentes; do que de mero formalismo legislativo.
Mas a lei manda ouvir entidades bem informadas, esclarecidas. Forque se não cumpre á salutar disposição legal?

O Sr. Abel de Lacerda: -V. Ex.ª dá-me licença?
Importa agora saber, o seguinte: não se cumpre a disposição legal porquê? A meu ver, exactamente pela desconexão, dos serviços; aliás, isso verifica-se num
exemplo que já ontem, particularmente, tive oportunidade de salientar a uns amigos e quê agora transmito à Camará.
A arte, no seu conjunto, é una- tanto importa que seja arquitectura, como ourivesaria, como cerâmica, como pintura. Ela constitui um todo. Este todo só pode ser, naturalmente, valorizado e aproveitado em todos os seus aspectos na medida em que haja uma sincronização perfeita de técnicos e de sistemas. Que ela se realize!
Como excepção da maior parte dos países da Europa, Portugal não tem qualquer cerâmica anterior ao século XVII. Porquê?
Verifica-se na vizinha Espanha que há uma continuidade absoluta na sua cerâmica, desde a romana à árabe e à gótica, dos séculos XVI, XVII e XVIII.
Em Portugal j só aparece no século XVII, o que é inaceitável. É evidente que sendo Portugal um dos países mais cultos da Europa de então, tendo nós uma pintura como a de Nuno Gonçalves e uma ourivesaria como a de Gil Vicente, a cerâmica deveria ter atingido entre nós um grau de brilhantismo semelhante. Não faz sentido. É porque se perdeu, devido à incúria dos homens. De contrário, seria possível encontrá-la; no restauro dos nossos palácios; quanto mais não fosse a cerâmica medieval.
Mas é evidente que, sendo os castelos propriedade do Ministério da Educação Nacional e não sendo esta matéria da competência desse Ministério, trabalha-se sem pensar nos contributos que essa mesma obra pode trazer para os vários ramos das belas-artes. Daí fazerem-se obras e inutilizarem-se possibilidades de documentação às que interessam às belas-artes no sen conjunto.

O Orador :-Ouvi com muito interesse, com muita atenção, as considerações que V. Ex.ª fez no seu aparte. Devo dizer, que as observações de V. Ex.ª condizem, nas suas linhas gerais, com a sequência do raciocínio que vou seguir na explanação que estou fazendo. Mas há qualquer coisa, que suscita, a meu ver, um reparo.
A arte, a história, a tradição, os costumes de um país têm uma certa unidade, uma certa continuidade, e merecem ser, evidentemente, apresentados e estudados da maneira mais integral e sistemática que seja possível; mas é impossível realizar: uma tarefa dessas simplesmente com uma entidade coordenadora de ordem geral, porque essa mesma entidade tem de se apoiar em vários sectores especializados.
V. Ex.ª afirmou que não há nos nossos museus cerâmica de datas anteriores ao século XVII.
V. Ex.ª sabe, tão bem como eu, que existem a cerâmica pré-histórica, a cerâmica romana, a cerâmica visigótica e a cerâmica árabe.

O Sr. Abel de Lacerda: - Eu queria referir-me àquela cerâmica que se poderia encontrar nos nossos castelos. Quis dizer que há nas nossas colecções um lapso entre a cerâmica antiga e da Idade Média e a cerâmica moderna.

O Orador:-Perfeitamente, há uma solução de continuidade.

O Sr. Abel de Lacerda: - Não há continuidade e não há possibilidade de encontrar essa continuidade.

O Orador:-Não sou tão pessimista como V. Ex.ª Eu creio nas possibilidades de êxito de algumas novas explorações. A questão é que com propaganda -e isto que nós fazemos nesta tribuna é útil propaganda- possamos suscitar um grande interesse de algumas entidades, até mesmo de sectores menos cultos do País, por estes assuntos.- Ainda recentemente a 2.ª subsecção da 6.ª secção da Junta Nacional da Educação solicitou a atenção das entidades competentes para a possibilidade de aparecerem restos arqueológicos interessantes nas- escavações para o metropolitano de Lisboa; já o fez também para as demolições na Mouraria.
Quanto aos arquitectos, sou dos que reconhecem o seu papel indispensável nos museus. Alguns grandes museus estrangeiros de arte e história natural possuem arquitectos no quadro do respectivo pessoal.
Quanto à colaboração das pessoas especializadas, ela é necessária. Cito, por exemplo, que em 1919, numa visita ao Museu de Saint-Germain, um grupo de visitantes teve os melhores guias que era possível existir naquele momento Assim, na parte pré-histórica até à Idade dos Metais teve o padre Henri Breuil; depois, na Idade dos Metais, teve o conservador Hubert; em seguida teve os esclarecimentos e informações dados pelo conservador principal, Salomon Reinach. Quer dizer: para cada época tinha um superintendente devidamente especializado e qualquer deles não hesitava em declarar que se considerava incompetente, para aquém ou além do período a que se limitavam os seus conhecimentos.
Os tópicos da intervenção de V. Ex.ª dariam motivo para largas considerações.
Mas vou prosseguir:
A colaboração das pessoas, especializadas é indispensável. É assim justificado que ao Ministério da Educação Nacional caiba o papel orientador e coordenador.
Os departamentos das Finanças e das Obras Públicas são cooperadores, quer promovendo o financiamento criterioso das actividades necessárias, quer a instalação adequada dos serviços e a conservação ou restauro de monumentos, sob as directrrizes dos especialistas em museologia, arte, arqueologia, etc. A ideia de um departamento especial do Ministério da Educação Nacional para a superintendência especializada ou no caso de entidades não estatais- para a fiscali-

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zação de servidos e actividades respeitantes a museus de arte, arqueologia, etnografia, folclore e história merece o meu aplauso.
Mas dou o primeiro lugar à criação, nos serviços oficiais responsáveis e no próprio público, duma mentalidade esclarecida que favoreça a execução, o cumprimento das disposições legais existentes no sentido de serem ouvidos os pareceres de pessoas ou entidades idóneas em qualquer iniciativa de criação, instalação ou remodelação de museus, de protecção a monumentos, de aquisição, tratamento ou apresentação de espécies. Tal mentalidade é, acima de tudo, função duma activa e esclarecida propaganda.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-Associo-me a tudo o que foi dito aqui sobre a boa selecção e devida retribuição do pessoal dos museus, sobre a conveniente dotação destes.
Quando me lembro de que a verba atribuída pelo Instituto de Alta Cultura ao Centro de Estudos de Museologia e Arte, anexo ao Museu de Arte Antiga, é da ordem de grandeza de pouco mais duma dúzia de coutos anuais, confrange-se-me a alma com esta indigência.
A culpa não é do Instituto de Alta Cultura, que tantos benefícios tem prestado a vários domínios da cultura portuguesa, mas da pobreza clamorosa da sua dotação orçamental respectiva.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-Mas julgo também necessário e urgente - tenho aqui falado no perigo que sofrem vários sectores da arte e tradições nativas de se extinguirem sem deixarem rasto, como também de salutares exemplos doutros países na matéria-, julgo também necessário e urgente, repito, estender e intensificar ao e no ultramar uma acção correspondeste à que se iniciou e se preconiza na metrópole.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-Devo dizer que me não parecem plausíveis certas restrições excessivas à liberdade de saída de alguns objectos etnográficos, como ultimamente sucedeu em Angola com peças colhidas pelo grande etnógrafo alemão Bauman. Porque não se ouvem sobre tais casos os pareceres de especialistas portugueses? Não devemos cair, depois de uma liberdade e indiferença totais, num regime oposto de exagero, que nos não nobilita do ponto do vista da cultura e da investigação cientifica.
Mas prossigamos:
O que mais desfavoravelmente me impressiona, entre nós, nesta matéria, é a frequência com que qualquer colecção fragmentária de um curioso ou de um amador sem critério aparece logo a muita gente - mesmo a gente responsável - como susceptível de constituir o fundo de um museu.
Não me cansarei nunca de considerar como indefensável, mesmo às vezes como perigoso, o coleccionismo puro, o bricabraquismo insciente e desordenado.
Os museus modernos não são armazéns frios, bolorentos e inexpressivos do peças ou objectos reunidos a esmo. São centros de convergência e irradiação culturais, núcleos vivos de divulgação educativa, de defesa de valores cuidadosamente seleccionados e de estudo e investigação de certos aspectos da cultura de um pais.
Não são meros arquivos documentais, desarmónicos, desconexos, desagradáveis, ou simples atracções de curiosidades heteróclitas. Têm um papel, um objectivo, obedecem a um plano, a uma concepção, a uma ideia superior, não a um coleccionismo dispersivo. Necessitam de meios de acção, em pessoal competente e bem pago, um instalações adequadas, em recursos financeiros usados não caprichosamente, mas segundo o critério dos competentes, em meios informativos do público (letreiros adequados e completos, roteiros e guias, monografias, etc.).

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-Estou recordando as visitas que tenho feito a museus da Espanha, da França, da Itália, da Inglaterra, da Bélgica, da Holanda, da Alemanha, da Áustria, da América do Norte, do Brasil e ainda do Egipto, do Quénia, da África do Sul e doutros territórios africanos.
Por entre algumas cristalizações de ultrapassados critérios, tanta inovação útil, tanta melhoria fecunda, tamanha compreensão da função dos museus! Visitei salas em que uma só peça, digna de valorização, aparece isolada, destacada.
Visitei conjuntos, núcleos significativos, sistematicamente ordenados. Admirei instalações auxiliares, laboratórios anexos, serviços complementares hoje indispensáveis, bibliografia, ficheiros, planos esclarecedores, filmes e diapositivos, cursos e conferências públicas ou para especializados, roteiros, guias explicativos.
No Museu Egípcio, no Cairo, dispensei os indivíduos que, em chusma, à porta, se me ofereciam para guias. Adquiri um livrinho, um plano, e lá fui sozinho ver o que queria, o que me interessava mais.
No Museu Árabe, também no Cairo, tive um guia, que era sobretudo um intérprete. Visitei as escavações e museus de Heliópolis e El-Maadi. Admirei os museus de Londres, Paris, Berlim, Munique, Viena, Antuérpia, Bruxelas, Amsterdão, Haia, Florença, Roma, Nápoles, Washington, Nova Iorque, Rio de Janeiro, S. Paulo, Dacar, Nairobi, Joanesburgo.
Por toda a parte, consciência da função do museu, planos, publicações, investigações de variada ordem, um critério de valor e de finalidade na disposição das peças.
O museu é o que está exposto nos salões públicos, mas é também o que está e se passa nos gabinetes de estudo, em salas de trabalho anexas, que são os bastidores e complementos indispensáveis de uma grandiosa tarefa cultural e social, direi mesmo de uma grandiosa tarefa de política nacional e de dignificação humana. Pessoal especializado competente.
Estive nos laboratórios e nalgumas secções do Museu Nacional dos Estados Unidos, em Washington, nas instalações correspondentes do Museu Americano de História Natural, em Nova Iorque.
Vi, neste último -que não é de belas-artes, mas de história natural-, o labor nos institutos anexos e, no enorme hall de exposições temporárias, as magnificas reconstituições da vida de animais selvagens no seu quadro natural, reconstituições obtidas por missões especiais ao coração da África, às selvas do Amazonas, às regiões polares, à Nova Guiné, à Austrália.
Quantos milhões de dólares e quantos esforços humanos para se obterem estas composições de museu! Salvas as proporções, só vi entre nós qualquer coisa de semelhante no Museu de Lourenço Marques. A museologia, Sr. Presidente, é coisa séria, não mero diletantismo, devaneio vago e insciente.
Como em 1949, noutro discurso neste lugar, afirmei, apontando factos do género dos que tem sido justamente lamentados, há a necessidade de criar entre nós a mentalidade a que me referi, de codificar e aperfeiçoar uma legislação talvez um pouco complexa, bastante difusa, porventura nalguns casos contraditória, e, acima de tudo, mal conhecida, e justifica-se a concentração de uma acção especializada, estimulante, orientadora, informativa, fis-

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calizadora, num departamento do Ministério da Educação Nacional, sem prejuízo da autonomia -dentro do razoável- de trabalhos e iniciativas de entidades não estatais e privadas, submetidas aliás a uma inspecção criteriosa tendente a evitar destruições ou deturpações inconsideradas e lamentáveis de um pecúlio sagrado para todos nós.
Vai custar mais; dinheiro ao Estado uma tal tarefa, o melhoramento indispensável da situação, formação e quadro de pessoal; especializado, os estudos conexos com a valorização de museus e monumentos, com o aproveitamento de mananciais ainda não explorados ou insuficientemente explorados, a melhoria de instalações, a criação de serviços complementares necessários, a propaganda educativa que se impõe, as publicações de vária ordem, etc.? Vai tudo custar mais dinheiro?
Decerto. Mas trata-se da defesa e valorização de um património que representa uma quantia incalculável. Trata-se da salvaguarda de uma coisa que não tem preço: o prestígio nacional a dignidade da nossa cultura perante o Mundo. Trata-se de valores espirituais; intangíveis, eternos.
Uma situação política que iniciou já com galhardia e decisão uma acção neste, sentido não se deterá, estou certo disso, no nobilitante labor empreendido.
Há defeitos a corrigir, males a evitar, aperfeiçoamentos a exigir, novos e grandiosos esforços a desenvolver?
Decerto. Mas o reconhecimento das imperfeições é, para os bem intencionados, o mais forte estímulo para perseverar na busca dos melhores Caminhos que conduzem a um ideal, mesmo na prévia certeza de que, por circunstancias irremovíveis, este nunca será atingido do modo integral que se deseja: E o ilustre Ministro da Educação Nacional já anunciou uma reorganização dos serviços respectivos, estando essa reorganização muito adiantada. Ainda bem. Tenhamos fé.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito, bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Bustorff da Silva: -Sr. Presidente: o aviso prévio do ilustre Deputado Sr. Dr. Abel de Lacerda sobre a situação dos museus, palácios e monumentos nacionais revelou incongruências e pôs em destaque anomalias que importa, em boa verdade, remediar sem mais detenças!
Efectivamente os factos, apontados por S. Ex.ª de os museus nacionais dependerem do Ministério, da Educação; os palácios e monumentos do Ministério das Finanças; os restantes monumentos do Ministério das Obras Públicas; as casas-museus e os museus municipais ou provinciais do Ministério, do Interior;: de não figurarem no orçamento do Estado os Museus de Braga e de Abrantes, apesar de serem do mesmo Estado e de ser, pelo menos, difícil a classificação do, regime legal do Museu de Castelo Branco revelam, sem contestação possível, uma desconexão ou confusão de competências de que não há que esperar nada de bom.
Por outro lado, mas cumulativamente, o absurdo das disparidades nas dotações orçamentais dos vários Ministérios, até mesmo no Orçamento. Geral para 1905 (o Ministério das Finanças com 500 contos para a aquisição de obras de arte, o das Obras Públicas com 400 contos para monumentos a erigir e o Ministério da Educação com uns ridículos e minguados 380 contos para as compras das obras, de arte, antigas e modernas destinadas a todos os museus), convence seja quem for que se debruce sobre o problema de que tudo isto, toda esta cadeia de incongruências e absurdidades, deve, lògicamente, provir da carência duma legislação clara e eficiente que consagre os princípio e fixe as directrizes indispensáveis para evitar os conflitos e as confusões de funções necessariamente resultantes desta proliferação de competências.
Pois tal convencimento é, em absoluto, erróneo!
Leis, leis às dezenas - para não dizer às centenas - temos: nós, publicadas no Diário do Governo e em pleníssimo vigor, mas quais se estabeleceram os melhores e mais elevados sábios princípios, estaticamente congelados na perfeição verbal dos textos, mas, como e viu, sem efeitos ou materializações de ordem prática

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Numa rápida e fugaz investigação a que procedi deparou-se-me, nada mais, nada menos, o seguinte:
Logo à primeira selecção apura-se que nem seque existe um texto base para regulamentação dos diversos museus: cada museu, cada regulamento particular.
Compreendia-se a existência de disposições especial para um ou outro caso especial, embora todos dentro de um regime geral comum.
Mas não.
Por cada museu novo criado, novo regulamento publicado.
E, assim:

A) Quanto a legislação referente à criação e regulamentação dos vários museus:

Decreto n.° 712 (Diário do Governo n.º 130, de 31 de Julho de 1914). - Aprova o Regulamento do Museu Nacional dos Coches.
Decreto n.° 1355 (Diário do Governo n.° 35, de 24 de Fevereiro de 1915). Cria o Museu Regional de Évora.
Decreto n.° 2042 (Diário do Governo n.° 231; de 11 de Novembro de 1915). - Cria em Faro um museu de arte e arquivo.
Decreto n.° 2119 (Diário do Governo n.° 248, de 4 de Dezembro de 1915). - Cria em Bragança um Museu de arte e arquivo.
Decreto no 2284-C (Diário do Governo n.° 51, de 16 de Março de 1916). -Cria em Viseu o Museu Grão Vasco.
Decreto n.° 2284-D (Diário do Governo n.° 51, de l6 de Março de 1916). - Aprova o Regulamento do Museu Nacional de Arte Antiga.
Decreto n.º 3026 (Diário do Governo n.° 38, de 14 de Março de 1917)- Aprova o Regulamento do Museu Nacional de Arte Contemporânea.
Decreto n.º 3074 (Diário do Governo n.° 53, de 5 de Abril de 1917). - Cria em Lamego um museu regional.
Decreto n.º 3553 (Diário do Governo n.° 199, de 15 de Novembro de 1917). - Cria em Leiria um museu de arte e arquivo.
Decreto n.º 3782 (Diário dó Governo n.° 20, de 29 de Janeiro de 1918). - Cria em Beja um museu de arte e arquivo.
Decreto n.° 7497 (Diário do Governo n.° 98, de 12 de Maio de 1921). - Aprova o Regulamento do Museu Grão Vasco.
Decreto n.° 7970 (Diário do Governo n.° 10, de 16 de Janeiro de 1922). - Aprova o Regulamento do Museu D. Lopo de Almeida, em Abrantes.
Decreto n.° 8410 (Diário do Governo n.° 209, de 6 de Outubro de 1922).-Cria um museu regional em Chaves.

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Decreto n.º 9327 (Diário do Governo n.° 64, de 22 de Março de 1924). - Cria um museu regional em Vila Real.
Decreto n.° 15 209 (Diário do Governo n.° 65, de 20 de Março de 1928). - Cria em Guimarães o Museu Regional Alberto Sampaio.
Decreto n.° 10 578 (Diário do Governo n.° 53, de 6 de Março de 1929). - Cria em Castelo Branco um museu regional.
Decreto n.º 17 927 (Diário do Governo n.° 30, de 6 de Dezembro de 1930).-Aprova o Regulamento do Museu Regional de Castelo Branco.
Decreto n.º 21 504 (Diário do Governo n.º 172, de 25 de Julho de 1932)- Reorganiza o Museu Nacional Soares dos Reis.
Decreto n.º 21 514 (Diário do Governo, n.º 173 de 26 de Julho de 1932). - Aprova o Regulamento do Museu Regional Alberto Sampaio, cm Guimarães.
Decreto-Lei n.° 23 625 (Diário do Governo n. 51, de 3 de Março de 1934). -Organista o Museu de Arte da Universidade do Coimbra.
Decreto n.° 23 232 (Diário do Governo n.° 81, de 9 de Abril de 1935). - Dá o nome de Museu Abade de Baçal ao museu Regional de Bragança.
Decreto-Lei n.º 27 273 (Diário do Governo n.º 276, de 24 de Novembro de 1936).-Incorpora no Museu Regional de Évora o museu arqueológico anexo à Biblioteca Pública e Arquivo Distrital de Évora.

Total: vinte e dois decretos!

B) Quanto a legislação do Ministério da Educação Nacional ou seus antecessores sobre museus e monumentos nacionais:

Decreto n.º 11 445 (Diário do Governo n.° 34, de 13 de Fevereiro de 1926). -Aprova o regulamento da Lei n.º 1700, que reorganiza o serviço de arte e arqueologia.
Decreto n.º 13 216 (Diário do Governo n.º 67, de 22 de Março de 1928). - Reorganiza os serviços artísticos e arqueológicos.
Decreto n.º 22 110 (Diário do Governo n.º 10, de 12 de Janeiro de 1933). - Regulamenta o estágio que os conservadores dos museus são obrigados a fazer no Museu Nacional de Arte Antiga.
Decreto-lei n.º 32 434 (Diário do Governo n.° 272, de 24 de Novembro de 1942). - Equipara os vencimentos dos directores dos Museus Machado de Castro, em Coimbra, de Évora e de Viseu ao de primeiro-conservador, o do director do Museu Alberto Sampaio, em Guimarães, ao de segundo-conservador e os dos directores dos Museus de Aveiro, Abade de Baçal, em Bragança, e de Lamego ao de terceiro-conservador.
Decreto-Lei n.º 33 267 (Diário do Governo n.º 256, de 24 de Novembro de 1943). - Desliga os Museus de Arte Antiga e dos Coches.
Decreto n.º 39 116 (Diário do Governo n.° 38, de 27 de Fevereiro de 1953). - Reorganiza o estágio de preparação dos conservadores dos museus e palácios e monumentos nacionais.
Portaria (Diário da Governo n.º 286, de 5 de Dezembro 1913). - Determina que os três conselhos de arte e a arqueologia procedam à revisão do inventário dos monumentos nacionais.
Decreto n.º 1563 (Diário do Governo n.º 90, de 7 de Maio de 1915).-Determina que os projectos de edifícios públicos de carácter artístico ou de monumentos comemorativos sejam sempre postos a concurso e regula a constituição do júri que deve apreciar esses projectos.
Lei n.º 483 (Diário do Governo n.° 27, de 15 de Fevereiro de 1916. Nova publicação, rectificada, no Diário do Governo n.º 31, de 19 de Fevereiro de 1916). - Proíbe os funcionários encarregados do arrolamento ou conservação de objectos artísticos pertencentes ao Estado, ou da sua aquisição para os museus nacionais, de negociar em objectos da mesma natureza.
Decreto n.° 3027 (Diário do Governo n.° 38, de 14 de Março de 1917). - Regula a classificação dos monumentos nacionais.
Decreto n.° 7591 (Diário do Governo n.° 139, de 9 de Julho de 1921. Nova publicação, rectificada, no Diário do Governo n.° 141, de 12 de Julho de 1921).- Regula o Decreto de 19 de Dezembro de 1910, a fim de não ser autorizada a particulares, indivíduos ou colectividades, a exportação de objectos artísticos ou arqueológicos.
Decreto n.° 8252 (Diário do Governo n.º 138, de 10 de Julho de 1922). - Determina que sejam classificados como edifícios de valor artístico, arqueológico e histórico e inscritos em cadastro especial, não podendo realizar-se neles nenhuma obra de conservação ou restauração sem que o respectivo projecto haja sido aprovado pela Comissão de Monumentos do Conselho de Arte e Arqueologia da 1.ª Circunscrição, vários imóveis situados nos distritos de Évora e Lisboa.
Lei n.° 1700 (Diário do Governo n.° 281, de 18 de Dezembro de 1924). - Reorganiza os serviços de belas-artes.
Decreto n.° 20 985 (Diário do Governo n.° 56, de 7 de Março de 1932). - Altera a organização da Lei n.° 1700.
Decreto n.° 21 117 (Diário do Governo n.° 91, de 18 de Abril de 1932). - Regulamenta a parte do Decreto n.º 20 985 respeitante a monumentos arqueológicos.
Decreto n.° 22 445 (Diário do Governo n.° 82, de 10 de Abril de 1933). - Considera feitos a título precário todos os arrendamentos efectuados pelo Estado de palácios e monumentos nacionais e seus anexos, e bem assim de edifícios e suas dependências onde funcionam estabelecimentos escolares ou hospitalares, asilos e Misericórdias.
Decreto-Lei n.° 23 125 (Diário do Governo n.° 232, de 12 de Outubro de 1933). - Cria uma junta nacional de escavações e antiguidades, que funcionará junto da Direcção-Geral do Ensino Superior e das Belas-Artes.
Decreto-Lei n.° 26 611 (Diário do Governo n.° 116, de 19 de Maio de 1936). - Aprova o Regimento da Junta Nacional da Educação.
Decreto-Lei n.º 27 633 (Diário do Governo n.° 77, de 3 de Abril de 1937). - Torna nulas e de nenhum efeito as transacções realizadas em território português sobre objectos de valor artístico, arqueológico, histórico e bibliográfico provenientes de país estrangeiro, quando realizadas com infracção das disposições da respectiva legislação interna, reguladora da sua alienação ou exportação.
Decreto-Lei n.º 28 468 (Diário do Governo n.° 37, de 15 de Fevereiro de 1938). -Regula o arranjo, incluindo o corte e a derrama das árvores em jardins, parques, matas ou manchas de arvoredo existentes nas zonas de protecção de monumentos nacionais, edifícios de interesse público ou edifícios do Estado de reconhecido valor arquitectónico.
Decreto-Lei n.° 31 467 (Diário do Governo n.º 192, de 19 de Agosto de 1941). - Revoga o artigo 2.° do Decreto n.° 21 875, que autoriza o Governo a estabelecer zonas de protecção dos edifícios públicos de reconhecido valor arquitectónico.
Decreto-Lei n.° 36 698 (Diário do Governo n.° 301, de 29 de Dezembro de 1947). - Permite ao Ministro

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das Finanças, ouvidos os Ministérios das Obras Públicas e da Educação Nacional, confiar a guarda, conservação e administração doa monumentos nacionais cujo valor o justifique, ou seus agrupamentos, estabelecidos de acordo com a respectiva importância e condições de localizarão, a conservadores nomeados nos termos deste diploma.
Lei n.º 2032 (Diário do Governo n.º 125, de 11 do Junho de- 1949). - Promulga disposições sobre protecção e conservação de todos os elementos ou conjuntos de valor arqueológico, histórico, artístico ou paisagístico concelhios.
Decreto n.° 38 888 (Diário do Governo n.º 191, de 20 de Agosto de 1952). - Dá nova redacção ao artigo 123.° do Regulamento Geral das Edificações Urbanas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 38 382.
Decreto-Lei n.° 38 906 (Diário do Governo n.° 201, de 10 de Setembro de 1952). - Insere disposições relativas à inventariação e alienação de móveis do valor artístico ou histórico.
Lei n.º 2065 (Diário do Governo n.º 133, de 25 de Junho de 1953). - Dá nova redacção ao artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 38 906 (inventariação e alienação de móveis de valor artístico ou histórico).

Total: vinte e seis diplomas, entre leis, decretos e portarias...

O Sr. Águedo de Oliveira: - V. Ex.ª informa-me se essa legislação está em vigor ou está revogada?

O Orador : - A quase totalidade desta legislação está em vigor. E, portanto, pràticamente impossível a aplicação de qualquer texto legal perante esta massa legislativa que apoquenta um parecer notável do Ministério da Educação Nacional, que vou ler dentro de pouco e cm que se reconhece a exactidão daquilo que acabo de dizer.
Pois nem estas duas dezenas e tanto de diplomas legais se reputou bastante, pois

C) Decretos sobre o mesmo assunto publicados pelo Ministério das finanças:

Palácios nacionais:

Lei de 24 de Junho de 1912.
Lei de 4 de Junho de 1913, artigo 10.º
Decreto-Lei n.° 22728, de 24 de Junho de 1933,
artigos 66.º e seguintes.
Decreto-Lei n.° 29 802, de 31 de Agosto de 1939.
Decreto-Lei n.º 31 317, de 13 de Junho de 1941(pessoal).
Decreto-Lei n.º 11 364, de 3 de Junho de 1945(pessoal).

Arquivo histórico:

Decreto-Lei n.º 28 187, de 17 de Novembro de 1937(criação).
Decreto-Lei n.° 37 249, de 28 de Dezembro de 1948(pessoal).
Decreto-Lei n.º 57 492, de 23 do Julho de 1949(pessoal).

Biblioteca do Palácio Nacional de Mafra:

Decreto-Lei n.º 28 107, de 23 de Outubro do 1937(abertura ao público).
Decreto-Lei n.° 37 248, de 28 de Dezembro de 1948(sobre pessoal).

Total: onze diplomas.

E, para remate:

D) Decretos sobre o mesmo assunto publicados pelo Ministério das Obras Públicas:

Lei n.º 1700, de 18 de Dezembro de 1924.
Decreto n.º 11 445, de 13 de Fevereiro de 1926.
Decreto n.° 18 123, de 20 de Março de 1930.
Decreto n.º 20 985, de 7 de Março de 1932.
Decreto-Lei n.º 23 122, de 11 de Outubro de 1933.
Decreto-Lei n.º 26 611, de 10 de Maio de 1936.
Lei n.º 2032, de 11 de Junho de 1949.

Total: sete diplomas.

Soma final, excluídos os decretos relativos a criação e regulamentação especial de vários museus: quarenta e quatro diplomas, entre leis, decretos e portarias.
Como se verifica, não é, pois, pela carência de preceito legal que o mal se agrava...
E não resisto a fazer uma nota respeitante a factos ocorridos no ano de 1932, limitando-me, para tal, a ler um erudito parecer de um dos mais categorizados e a todos os título douto funcionário do Ministério da Educação Nacional:

2. O artigo 45.º do Decreto n.° 20 985, de 7 de Março de 1932, atribuía ao Conselho Superior de Belas-Artes a competência para a fixação das zonas de protecção dos imóveis classificados como monumentos nacionais ou de interesse público.
O decreto n.º 21 875, de 18 de Novembro de 1932, previu, no seu artigo 1.º, o estabelecimento de «zonas de protecção dos edifícios públicos de reconhecido valor arquitectónico». E nos §§ 1.º e 2.º deste mesmo artigo preceituou que estas zona seriam fixadas pelo Ministro das Obras Pública e Comunicações, mediante parecer do Conselho Superior de Obras Públicas e sob proposta, devidamente fundamentada, da Direcção-Geral de Edifícios e Monumentos Nacionais, de juntas comissões administrativas autónomas ou de quaisquer organismos do Estado encarregados da construção e conservação de edifícios públicos. A propostas seriam acompanhadas do parecer do Conselho Superior de Belas-Artes quando se tratasse de monumentos nacionais.
Estas disposições reduziram, mas não suprimiram a competência do Conselho Superior de Belas-Artes para a fixação de zonas de protecção. O Ministro das Obras Públicas só passava a ser competente para estabelecer as «dos edifícios públicos de reconhecido valor arquitectónico». Relativamente aos monumentos nacionais e imóveis de interesse público que não fossem edifícios ou acções que, sendo-o, não devessem considerar-se edifícios públicos ou ainda aos que, sendo edifícios púbicos, não tivessem reconhecido valor arquitectónico- a classificação pode ser determinada só pelo valor histórico- as zonas continuavam a ser definidas por aquele Conselho.
O Regimento da Junta Nacional da Educação aprovado pelo Decreto-Lei n.º 26 661, de 19 de Maio de 1936, dispôs, no n.° 6.º do § 1.º do seu artigo 21.º, que «compete especialmente» à 1.ª subsecção da 6.ª secção «definir o perímetro de protecção estética dos imóveis classificados como monumentos nacionais ou de interesse público».
Vê-se, pois, que no mesmo ano de 1932, e a semana de intervalo, o Ministério da Educação Nacional e o das Obras Públicas concedem-se atribuições ou competências iguais ou cumulativas.

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Está-se a ver a série de desacertos e conflitos que o mais banal desenrolar dos acontecimentos poderia provocar.
Mais grave, todavia, é ainda a circunstancia de que desta cumularão de competências em departamentos do Estado independentes ou díspares resultam efeitos psicológicos os mais graves, mas de fácil compreensão.
Mais de uma vez aqui tem sido apontado e censurado o, digamos, «desvio profissional» que leva Ministros e seus funcionários ao estado de espírito de reputarem que a respectiva acção se exerce em compartimentos estanques.
Vai dai, o funcionário das Obras Públicas conhece os decretos emanados do seu Ministério, ignora ou faz por ignorar todos os demais e orienta-se e determina de olhos postos na legislação que supõe própria e única; os serviços do Ministério das Finanças actuam com idêntica rigidez de conceitos e os do Ministério da Educação Nacional não lhes ficam atrás, e pagam-se na mesma moeda.
Resultado final: o que se ficou vendo após as elucidativas intervenções de alguns dos colegas que me precederam!

Vozes: - Muito bem !

O Orador: - Qual o remédio a aconselhar?
Numa troca de impressões entre alguns Deputados que se reuniram após o encerramento da sessão de ontem, um dos mais brilhantes espíritos que distinguem esta Assembleia pôs, com a sua clarividência e senso comum de sempre, a questão nos seus devidos termos.
Isto que quer dizer?
Que nós, Assembleia Nacional, pretendemos que todos os serviços respeitantes a coisas de arte se concentrem num Ministério único, para o qual transitariam os serviços agora espalhados pelos vários Ministérios?
Claro que não!
O que se torna então indispensável?
Criar e forçar a que se acate e respeite uma orientação superior, da qual dimanem as instruções para os vários serviços, por forma a tornar impossíveis iniciativas isoladas, «criações» atentatórias de uma obra de conjunto.
Coordenar, mas não centralizar.
Estabelecer uma direcção idónea central, sem prejuízo da execução das respectivas directrizes pelos serviços especializados existentes.

O Sr. Aguedo de Oliveira: -V. Ex.ª dá-me licença?
Acho que o ponto de vista de V. Ex.ª propondo a codificação da diversa legislação dispersa sobre o assunto é perfeitamente compreensível, mas a verdade é que o debate não tem sido encaminhado nessa direcção ou nesse sentido...

O Orador: - E que culpa tenho eu disso? Como V. Ex.ª sabe, não sou eu o pai da criança...

O Sr. Águedo de Oliveira: - Não o ignoro. A verdade, porém, é que o debate tem sido conduzido no sentido de os diversos serviços e departamentos administrativos se concentrarem. Agora o problema aparece com uma faceta nova, e foi esse o motivo por que eu interpelei V. Ex.ª Interrompi V. Ex.ª para registar o facto, e nada mais.

O Sr. Mário de Figueiredo: - V. Ex.ª dá-me licença?
Uma coisa é a concentração de competências, outra é a concentração de serviços.

O Orador: - Pois claro.
Antes de mais nada. temos de partir para a arrumação, num texto único, deste infinito de diplomas; pois, a tal concentração de competências, que estabeleça directrizes, que dê instruções, que tome um comando único, deixando aos serviços existentes nos diferentes Ministérios -que já deram provas suficientes da sua competência- o encargo de satisfazer as diferentes aspirações dessa ordenação única e central do competências e acabando com todas aquelas notas do pretensa originalidade que o funcionário isolado e sem obediência às tais directrizes únicas e comuns vem praticando nos diferentes serviços do Estado e que, por vezes, nos deixam a impressão duma incompetência.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O primeiro passo para tal seria, possivelmente, a aglutinação ou concentração num diploma único -porque não o Estatuto Nacional de Belas-Artes sugerido pelo Sr. Deputado Abel de Lacerda?- de toda a legislação existente.
Dessa forma, forçando todos os Ministérios ou os diferentes serviços a consultar e a aplicar as disposições de um diploma único, estou certo de que se evitariam muitas complicações. Terei razão? Não terei?
O conhecimento dos homens leva-me à conclusão de que sim.
E tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - O debate continuará na primeira parte da sessão da próxima terça-feira; a segunda parte será constituída pela apreciação do Acordo Cultural entre Portugal e o Reino da Bélgica.
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 5 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Manuel Maria Múrias Júnior.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Beis.
Mário Correia Teles de Araújo e Albuquerque.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Adriano Duarte Silva.
Alberto Cruz.
Albino Soares Pinto dos Beis Júnior.
Alexandre Aranha Furtado de Mendonça.
Amândio Rebelo de Figueiredo.
Antão Santos da Cunha.
António da Purificação Vasconcelos Baptista Felgueiras.
António Bussell de Sousa.
António dos Santos Carreto.
Armando Cândido de Medeiros.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Carlos de Azevedo Mendes.
Carlos Vasco Michon de Oliveira Mourão.
Daniel Maria Vieira Barbosa.
Elisão de Oliveira Alves Pimenta.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Francisco Eusébio Fernandes Prieto.
João Cerveira Pinto.
João Maria Porto.
Joaquim de Moura Relvas.
Joaquim de Pinho Brandão.
Joaquim de Sousa Machado.

Página 446

446 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 123

José dos Santos Bessa.
José Sarmento de Vasconcelos e Castro.
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues.
Luís de Azeredo Pereira.
Luís Filipe da Fonseca Morais Alçada.
Luís Mana da Silva Lima Faleiro.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel de Magalhães Pessoa.
Manuel Maria Sarmento Rodrigues.
Manuel Marques Teixeira.
Miguel Rodrigues Bastos.
Pedro de Chaves Cymbron Borges de Sousa.
Pedro Joaquim da Cunha Meneses Pinto Cardoso.

O REDACTOR - Leopoldo Nunes.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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