O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 447

REPUBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.° 124

ANO DE 1956 8 DE FEVEREIRO

ASSEMBLEIA NACIONAL

VI LEGISLATURA

SESSÃO N.° 124, EM 7 DE FEVEREIRO

Presidente: Ex.mo Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior

Secretários: Ex.mo Srs.
Gastão Carlos de Deus Figueira
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues

SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 35 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foi aprovado o Diário das Sessões n.º 123.
O Sr. Presidente informou estar na Mesa um oficio de S. Ex.ª o Ministro das Comunicações em resposta ao requerido pelo Sr. Deputado Santos da Cunha na sessão de 12 de Janeiro último. Foram recebidos na Mesa os elementos fornecidos pelo Ministério das Comunicações relativos ao requerimento do Sr. Deputado Daniel Barbosa apresentado na sessão de 6 de Dezembro último. Estes documentos foram entregues aos Srs. Deputados indicados.
Para cumprimento do disposto no § 3.º do artigo 109.° da Constituição, foi recebido na Mesa o Diário do Governo n.º 24, 1.ª série, de 1 do corrente, inserindo os Decretos-Leis n.os 40 516, 40 517 e 40 518.
Deu-se conta do expediente.
O Sr. Presidente usou da palavra para se referir à presença da missão que representou o nosso país nas cerimónias investidura do Presidente Dr. Kubitschek de Oliveira, no Rio de Janeiro, missão a que presidiu.
O Sr. Deputado Paulo Rodrigues usou da palavra também sobre o mesmo assunto, realçando a forma altamente brilhante como o Sr. Presidente da Assembleia Nacional chefiou a missão.
O Sr. Deputado Mário de Figueiredo congratulou-se, em nome da Assembleia, pelo êxito da missão, felicitando o Sr. Presidente pela forma como a dirigiu.
Os Srs. Deputados Jorge Pereira Jardim, Pinto Barriga e Melo Machado enviaram requerimentos para a Mesa.

Ordem do dia.- Prosseguiu o debate sobre o aviso prévio do Sr. Deputado Abel de Lacerda acerca da situação dos museus, palácios e monumentos nacionais.
Usou da palavra o Sr. Deputado Águedo de Oliveira.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 16 horas e 25 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Abel Maria Castro de Lacerda.
Adriano Duarte Silva.
Agnelo Orneias do Rego.
Alberto Henrique» de Araújo.
Alberto Pacheco Jorge.
Albino Soares Pinto dos Beis Júnior.
Alexandre Aranha Furtado de Mendonça.
Alfredo Amélio Pereira da Conceição.
Américo Cortês Pinto.
André Francisco Navarro.
Antão Santos da Cunha.
António Abrantes Tavares.
António de Almeida.
António de Almeida Garrett.
António Augusto Esteves Mendes Correia.
António Bartolomeu Gromicho.
António Calheiros Lopes.
António Camacho Teixeira de Sousa.
António Carlos Borges.
António Cortês Lobão.
António Júdice Bustorff da Silva.
António Pinto de Meireles Barriga.
António Raul Galiano Tavares.
Artur Águedo de Oliveira.

Página 448

448 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 124

Artur Proença Duarte.
Augusto Cancella de Abreu.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Camilo António de Almeida Gama Lemos Mendonça.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos Mantero Belard.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Carlos Tasco Michon de Oliveira Mourão.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Daniel Maria Vieira Barbosa.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco Eusébio Fernandes Prieto.
Gaspar Inácio Ferreira.
Gastão Carlos de Deus Figueira.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Herculano Amorim Ferreira.
Jerónimo Salvador Constantino Sócrates da Costa.
João Alpoim Borges do Canto.
João Ameal.
João da Assunção da Cunha Valença.
João Luís Augusto da» Neves.
João Mendes da Costa Amaral.
João de Paiva de Faria Leite Brandão.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim de Pinho Brandão.
Joaquim de Sousa Machado.
Jorge Botelho Moniz.
Jorge Pereira Jardim.
José Dias de Araújo Correia.
José Garcia Nunes Mexia.
José Maria Pereira Leite de Magalhães e Couto.
José Sarmento de Vasconcelos e Castro.
José Soares da Fonseca.
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Luís Filipe da Fonseca Morais Alçada.
Luís Mana Lopes da Fonseca.
Luís Maria da Silva Lima F ai eiró.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel de Magalhães Pessoa.
Manuel Maria de Lacerda de Sousa Aroso.
Manuel Maria Miarias Júnior.
Manuel Maria Vaz.
Manuel Marques Teixeira.
Manuel Monterroso Carneiro.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Manuel Trigueiros Sampaio.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Reis.
Mário de Figueiredo.
Paulo Cancella de Abreu.
Pedro de Chaves Cymbron Borges de Sousa.
Ricardo Malhou Durão.
Ricardo Vaz Monteiro.
Sebastião Garcia Ramires.
Teófilo Duarte.
Venâncio Augusto Deslandes.

O Sr. Presidente:-Estão presentes 82 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 16 horas e 35 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente:-Esta, em reclamação o Diário das Sessões n.° 123, de 3 do corrente,

Pausa

O Sr. Presidente:-Visto nenhum Sr. Deputado desejar fazer qualquer reclamação, considero aprovado aquele Diário das Sessões.

Pausa.

O Sr. Presidente:-Enviada pela Presidência do Conselho, está na Mesa uma cópia do ofício n.° 111, de 11 do corrente, do Ministério das Comunicações, em que se transcreve a resposta do ilustre Ministro daquela pasta ao requerido pelo Sr. Deputado Santos da Cunha em sessão da Assembleia Nacional de 18 de Janeiro último. Vai ser entregue àquele Sr. Deputado.
Estão na Mesa os elementos fornecidos pelo Ministério das Comunicações relativos ao requerimento do Sr. Deputado Daniel Barbosa apresentado na sessão de 6 de Dezembro último. Vão ser entregues no mesmo Sr. Deputado.
Para cumprimento do disposto no § 3.° do artigo 109.° da Constituição, está também na Mesa o Diário do Governo n.° 24, 1.ª série, de 1 do corrente, que insere os Decretos-Leis n.os 40 516, 40 517 e 40 518.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Exposição

De donos de pequenos moinhos e engenhos do concelho de Ovar a apoiar as considerações do Sr. Deputado Augusto Simões acerca da sua situação em face da tributação a favor da Comissão Reguladora das Moagens de Ramas.

Telegrama

De Manuel P. Pimenta de Castro a apoiar as considerações do Sr. Deputado Pinto Barriga acerca da necessidade de melhoramentos na aldeia de Monsanto.

O Sr. Presidente:-Srs. Deputados: deixei os trabalhos desta Assembleia no dia 27 de Janeiro, no meio de votos de boa viagem ao Brasil, na chefia da missão especial de Portugal à posse do Presidente Kubitschek de Oliveira; e ao voltar a assumir a presidência desta Câmara quero dizer-lhes que esses votos se cumpriram inteiramente, não só quanto à viagem em si, que foi excelente, mas, creio-o bem, quanto ao objectivo dela - a de assinalar a presença de Portugal naquela soleníssima posse. E quero dizer-lhes que em nenhum momento pude esquecer a qualidade especial que determinara a minha escolha para o honroso cargo - a de Presidente da Assembleia Nacional - e que me conforta ao voltar ao seu seio a consciência de que fiz o possível para que nem o País nem ela ficassem apoucados ou diminuídos.

Vozes: - Muito bem, muito bem !

O Sr. Presidente:-E não devem ter ficado. Para tanto concorreram decisivamente os ilustres membros da missão.
Permitam-me não desenvolver mais este assunto, cuja apreciação excede, neste momento, o âmbito desta Câmara.

Vozes: - Muito bem, muito bem !

O Sr. Presidente:-Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Rodrigues.

O Sr. Paulo Rodrigues: - Sr. Presidente: regressou ontem a Lisboa a missão especial que representou o nosso pais na posse do novo Chefe do Estado do Brasil,

Página 449

8 DE FEVEREIRO DE 1956 449

missão a que V. Ex.ª presidiu e da qual tive a honra de fazer parte.
Como V. Ex.ª afirmou já, a missão tem consciência de ter cumprido com dignidade e sento-se feliz pelo ambiente de extraordinário carinho de que sempre se sentiu rodeada.
A Câmara ouviu com vivo interesse as palavras que V. Ex.ª acaba de dirigir-lhe.
E eu quisera -por dever de justiça- dar aqui testemunho da forma, verdadeiramente extraordinária, como o Presidente da Assembleia Nacional chefiou a missão portuguesa.
Nós trazemos ainda nos olhos e no coração -trazemos já na saudade- a visão magnifica dessas terras de Santa Cruz, onde os Portugueses levaram um dia os primeiros alvores da mensagem cristã e que do génio luso houve, em essência e raiz, o milagre da sua unidade, unidade que se projecta na sua grandeza continental e, assim, faz do Brasil uma das maiores nações do orbe.
Dos laços de mútua compreensão e amizade que nos unem e fazem que os dois países independentes se integrem numa só comunidade, da presença no Brasil de tantos e tão esforçados portugueses resulta, necessariamente, um sentido especialíssimo para a presença da missão portuguesa entre as que, de cerca de sessenta países, ali foram levar os votos comuns de grandeza e prosperidade neste novo período de vida política que tão auspiciosamente se inicia.
Quase vencendo os limites do tempo, a missão pôde ter contacto com as figuras mais representativas de todos os sectores da vida brasileira: da Igreja e das forças armadas, da Universidade, da política, da vida social, cultural e económica.
Desse convívio com a gente brasileira se tomou e firmou consciência do imenso destino histórico que aguarda, nos séculos vindouros, esse grande pais. E em toda a parte se sentiu, bem vivo, o interesse e o carinho dos Brasileiros pelas coisas da vida portuguesa, de tal modo que de cada conhecimento nascia ou se confirmava uma amizade.
Daquela mesma simpatia compreensiva e viva admiração pelas realidades portuguesas encontrámos eco nas palavras dos ilustres representantes de tantas nações amigas.
Mas, se no alvoroço de tantas emoções alguma poderia ainda ir vibrar mais fundo na nossa alma, tal foi certamente a que colhemos na visita a essa magnifica colónia portuguesa.
Superando a extraordinária dignidade e aprumo e a subtil inteligência com que presidiu a todos os actos da missão, o conselheiro Albino dos Reis, num esforço admirável de dedicação e espírito de servir - para além de todos os limites previsíveis de resistência física e, quantas vezes, contra o conselho prudente dos restantes membros da missão -, quis visitar todos os lugares onde uma voz portuguesa pedia a sua presença.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador:-No Rio de Janeiro e em S. Paulo, na Embaixada de Portugal e na sede de inúmeras associações portuguesas, em toda a parte, insensível à fadiga e aos rigores do clima, incansável, ele atendeu com igual interesse os portugueses que lhe falavam das suas grandes empresas económicas e os que, modestamente, lhe pediam apenas que trouxesse um abraço à velha mãe, que, deste lado do Atlântico, por eles chora e reza sua saudade.
Em todos os lugares e sempre o nosso Presidente soube dizer com perfeita oportunidade e equilíbrio a palavra justa da mensagem que de Portugal ali levávamos.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador:-E o seu discurso brilhantíssimo no banquete do Clube Ginástico, em que nos despedimos da colónia portuguesa, ficará a marcar uma das horas mais altas da vida dessa boa gente, dessa comunidade admirável. Garantem no - ainda para além dos aplausos vibrantes com que Portugueses e Brasileiros o secundaram- as lágrimas incontidas que lhes saltaram aos olhos.
Por tudo quanto hei dito, sei que interpreto o pensamento de todos os elementos da missão e creio que exprimo o sentir da Câmara manifestando a V. Ex.ª, Sr. Presidente, as nossas mais vivas homenagens.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador:-Ao regressar a Portugal e rememorando o preito consolador ao nome português que, constantemente, testemunhamos nas terras do Cruzeiro do Sul, quero saudar o nosso venerando Chefe do Estado -cuja visita ao Brasil se aguarda com alvoroço- e o insigne Presidente do Conselho- o «nosso Salazar», como, em expressão carinhosa, Brasileiros e Portugueses o designam, na fórmula mais simples e mais alta que encontraram para consagrar o seu imenso prestígio.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador:-Sejam para o Brasil as minhas últimas palavras.
Num alvorecer de esperança, um novo presidente toma em suas mãos firmes os destinos da grande pátria irmã.
Permita Deus que, na prosperidade e na paz, possa conduzi-la na senda gloriosa dos seus grandes destinos.
Estes votos, que quase todos os países lhe exprimiram, mais que de nenhum outro são os nossos - deste pilar europeu da grande comunidade luso-brasileira, cuja projecção e firmeza (sagradas e provadas nas horas da ameaça injusta contra a integridade e a liberdade da província portuguesa de Goa) constituem já uma das grandes forças morais e políticas do Mundo.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Sr. Presidente: ainda mais do que pela presença de V. Ex.ª, que nos é sempre muito querida, parece-me que a Assembleia deve congratular-se pela maneira como a missão encarregada de representar o Pais na posse do Presidente Kubistchek de Oliveira se desempenhou da sua incumbência. E particularmente da maneira como V. Ex.ª se conduziu na chefia dessa missão, tanto em face das autoridades oficiais brasileiras como em face da querida colónia portuguesa no Brasil.
É claro que, tratando-se de uma missão ao Brasil, para a circunstancia, ela devia naturalmente ser composta por nomes prestigiosos, quer considerados na sua qualidade pessoal, quer considerados na sua qualidade funcional. Assim foi - e muito bem - composta a missão.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador:-Pelo que respeita à qualidade funcional, bastava ir a chefiá-la o Presidente da Assembleia Nacional para isso lhe emprestar a mais alta, a mais acabada categoria; mas quando à qualidade funcional se juntam as qualidades pessoais de V. Ex.ª a coisa aparece particularmente realçada.

Vozes: - Muito bem!

Página 450

450 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 124

O Orador:-É claro que para acompanhar V. Ex.ª importava procurar pessoas que, de alguma maneira, lhe fossem proporcionais. O cuidado que houve em as escolher atingiu completo êxito. Eis porque me parece que fica bem à Assembleia congratular-se com o êxito da missão e agradecer a V. Ex.ª e a todos os que a compuseram os sacrifícios a que de tão boa vontade se submeteram para a desempenharem cabalmente.
A afirmação das nossas congratulações.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente:-Em meu nome e em nome da missão que tive a honra de chefiar, agradeço as palavras que acabam de ser proferidas e os apoiados com que a Câmara as sublinhou.

Pausa.

O Sr. Presidente:-Tem a palavra, para um requerimento, o Sr. Deputado Pereira Jardim.

O Sr. Pereira Jardim: - Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa o seguinte

Requerimento

«Desejando voltar a ocupar-me, no seguimento de anteriores intervenções, de certos aspectos relativos ao empreendimento hidroeléctrico do Revuè, requeiro que, nos termos regimentais, me sejam fornecidos pelo Ministério do Ultramar os seguintes elementos:

a) Cópia do contrato celebrado entre a Sociedade Hidroeléctrica do Revuè e a Electricity Supply Commission, da Rodésia do Sul;
b) Programa de realizações adoptado, seus fundamentos económicos e esquema de financiamento previsto;
c) Trabalhos e estudos efectuados desde Janeiro de 1954 a Dezembro de 1955».

O Sr. Pinto Barriga: - Sr. Presidente: pedi a palavra para enviar para a Mesa o seguinte

Requerimento

«Os concelhos de Oleiros e Pampilhosa da Serra, da província da Beira Baixa, absolutamente abandonados e esquecidos até 1928 no que respeita a obras públicas, e mormente a estradas, começaram a sentir, a partir dessa data, a acção benemérita do Ministério das Obras Públicas, mas, como ainda continuam algumas das freguesias desses concelhos sem quaisquer meios de comunicação por estrada, e na certeza de que se estão efectuando trabalhos nesse sentido, requeiro que pelo Ministério das Obras Públicas me seja facilitada nota e informação dos trabalhos realizados ou a realizar para abertura de estradas nas freguesias dos concelhos de Oleiros e Pampilhosa da Serra que ainda não estejam ligadas por esse meio u rede geral de vias de comunicação do Pais».

O Sr. Melo Machado: - Sr. Presidente: envio para a Mesa dois requerimentos: um dizendo respeito ao Ministério da Economia, outro respeitante ao Ministério dos Negócios Estrangeiros. São os seguintes:

«Requeiro que pelo Ministério da Economia (Repartição do Comércio Externo) me sejam fornecidos urgentemente os seguintes elementos em relação aos tratados de comércio com os países da U. E. P. recentemente findos ou prestes a atingir o seu termo:
Utilização potencial (boletins emitidos) e, na medida do possível, a utilização que tiveram e que já foi conhecida do Ministério da Economia».

«Requeiro que pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros me seja fornecida nota elucidativa sobre a execução dos tratados de comércio com os países da U. E. P., no sentido de saber se se cumpriram integralmente de uma e de outra parte e, em caso contrário, as falhas encontradas e as mercadorias principalmente atingidas».

O Sr. Presidente:-Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente:-Continua o debate sobre o aviso prévio do Sr. Deputado Abel de Lacerda acerca da situação dos museus, palácios e monumentos nacionais.
Tem a palavra o Sr. Deputado Águedo de Oliveira.

O Sr. Aguedo de Oliveira: - Sr. Presidente: não desejo retribuir as amabilidades que o Sr. Deputado Abel de Lacerda desperdiçou comigo.
Desta sorte os cumprimentos que vou dirigir-lhe são sinceros.
A museologia vive do gosto refinado, da carolice, da dedicação total, da generosidade dos amadores e coleccionadores de obras-primas.
A história daquele gosto -a que agora vejo chamar ciência- acompanha o desenvolvimento da consciência pátria, os seus mais acrisolados sentimentos.
Este aviso prévio deve-se assim a um qualificado coleccionador de objectos artísticos, a um entendido, de grande dinamismo, consagrado nas lides da estética e que, sozinho, realizou obra meritória, criando um museu.
O Sr. Abel de Lacerda é um novo, assiste ao triunfo fácil da sua geração e não lhe foi dado ver como a geração de sen pai lutou na adversidade. Com obras de arte fez profissão; isso não poderia ser realizado sem conhecimento, sem experiência, sem vocação.
De uma colina de Atenas se afirmava estar consagrada às musas e ai, asseguram, se gerou a palavra «museu».
Como as musas eram belezas antigas, dotadas de graças e feminilidade, servidas de imaginação, devem datar dessa altura os discussões, desentendimentos e diversidades de pontos de vista que caracterizam, hoje e sempre, a república das belas-artes e os arraiais artísticos.
A estética é um principado buliçoso, e cada escritor, critico, historiador de arte ou artista um fogoso combatente, raramente de acordo com o sen vizinho.
O estrépito das armas e os arruídos no areópago das musas abafam as recordações de Tróia.
Estas discussões são eternas e reverdecem na frescura perene daquelas damas.
Já alguém lhe chamou Vanity Fair, comparando-a na inanidade às lutas do egoísmo e na desproporção às dissonâncias de uma feira.
Não é preciso ser profeta na nossa terra: se criarmos um órgão supremo e poderoso, as discussões, nada pacíficas já nesta altura, subirão de tom e a orquestração jamais igualada.
Como ia dizendo, a história da museologia é recente, mas o gosto de coleccionar e organizar galerias começou com o alvorecer das civilizações.
Verres, Cícero e Augusto foram coleccionadores de preciosidades, apaixonados, viciosos e exclusivistas - sacrificavam tudo a uma nova peça ou aquisição, não descansavam enquanto não incorporassem a obra-prima apetecida na sua galeria.

Página 451

8 DE FEVEREIRO DE 1956 451

Alguns generais da antiguidade, com Alexandre à cabeça, como os marechais de Napoleão, sabiam com segurança arrecadar as colheitas dos despojos das batalhas, dos saques e requisições; encheram assim o bornal e dotaram o erário.
Porém, a ideia de serviço público desponta com a queda dos Capetos e desabrocha plenamente, reverberada pelo facho da Revolução.
Claro que os reis, os senhores feudais, os bispos acarinharam os artistas, amontoaram preciosidades, encomendaram trabalhos singulares, acumularam tesouros, mas a afectação das colecções e galerias ao exame e instrução pública, o valor cultural e educativo e a explosão artística desses tesouros só começam na Idade Moderna.
Sr. Presidente: no tempo de Luciano Cordeiro, Silva Passos e Rodrigues Sampaio começou a bem dizer a obra de recuperação do património artístico nacional.
Tinha-se assistido nos vandalismos das destruições ou ao abandono desleixado dos padrões de glória imorredoura da raça.
Alexandre Herculano apostrofava, anos antes, em 1838, com a violência e a indignação de um Ezequiel, o alheamento e a incultura.
Sobre os terramotos, a Usurpação, as invasões e a guerra civil, instalaram-se, para diminuir o minguado tesouro artístico, a exportação e o contrabando, novos estragos irreparáveis por falta de uma disciplina do gosto, e erguiam-se os padrões da fealdade e da ausência de estética das habitações, cópias servis dos cottages do Surrey ou dos chalés dos Quatro Cantões.
Que se fez por essa altura?
Travou-se o vandalismo, procurou-se salvar o que restava. Organizar as colecções, preencher as lacunas, melhorar o sen nível histórico e crítico, acabar com a grande piedade, a grande miséria, o sudário do Portugal monumental.
Instituiu-se o museu nacional, como desenvolvimento de sentimentos estéticos, do apego pelo passado e de lição perene de história artística.
Edifícios, igrejas, mosteiros, ruínas que representassem o modo de ser português, que pudessem avivar a memória dos seus feitos, foram salvos da devastação, do opróbrio e do luto.
Mas isto não chegou, porque os estragos da fortuna e dos homens e as depredações continuaram, embora em menor escala.
Já no nosso tempo, na sagração das primeiras horas da renovação, a obra recuperadora, floresceu plenamente e frutificou - diga-se o que se disser.
José de Figueiredo, a quem a museologia mais deve, grande amigo esbatido na bruma da saudade, Columbano, Lúcia no Freire, Virgílio Correia, Vasco Valente, Ricardo, Raul Teixeira, já em nossos dias, pugnaram, lutavam, fizeram esforços obscuros mas sobre-humanos para restaurar os valores danificados, repatriar as obras portuguesas erradias, introduzir as novas técnicas na exposição museológica, reconhecer os tesouros artísticos nos distritos, desde a arquitectura, à ourivesaria, da tapeçaria aos gradua mentos - em que floresceram também os felizmente vivos, como Carneiro Pacheco, Reinaldo das Santos, com a Academia Nacional de Belas-Artes, Mardel, Reis Santos e outros também dignos de menção.
Sr. Presidente:- esta obra formidável não era, espontânea, nem desconexa; não era mosaico de iniciativas puras, nem apanágio dum ou outro esteta- era actuação de muitos, a que presidia a palavra de ordem, nítida, formal, inabalável, de S. Ex.ª o Presidente do Conselho.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Defendamos o nosso património artístico, brasão das gerações.
Não transformemos os artistas em burocratas, que se extraviam dos intuitos criadores.
Sejamos sinceros, antes do mais, porque seremos verdadeiros e justos.
Esta obra cimentava-se no apuro do gosto, na subordinação a fins ideais, na suprema relevância da obra de arte como embelezando a vida e distraindo-a das preocupações excedentes de lucratividade e cálculo.
O Sr. Dr. Mendes Correia fez já resenha completa do que poderia, na ordem dos factos, ser abonado como demonstração da minha tese.
Está realizado tudo?
Podemos descansar; estugar o passo?
As discussões que ouço, as vozes nem sempre conformes não têm significado pejorativo; mostram que há inquietações filosóficas, novos problemas, dúvidas graves que convém aquietar.
Sem pruridos de erudição, vou mostrar alguns paradigmas de discussão e solução, não como temática erudita ou sinal de bastas leituras, mas com o fito de que rapidamente se faça uma ideia da ordem destas questões em nossos dias:
Reconstituição do enquadramento histórico e exactidão de ambiente da obra de arte;
Extensão cultural e artística da museologia;
Continuidade histórica deste país através dos museus;
Os problemas e perplexidades da arte moderna ao ingressar ao lado, ou no meio, das colecções tradicionais ;
Formação de pinacotecas para descongestionar os museus;
Museu único?
Reservas e sua qualificação.
Faço este apontamento para mostrar que a vida não pára, que resta muito para fazer, que novos problemas surdem de vários lados e que é preciso acto de consciência para não perder o pé nestes problemas.
Por isso a museologia do nosso tempo foi assinalada por um escritor como laboratório e teatro - fruto de labor científico e obra dirigida à comoção das massas contemporâneas.
Todos sabemos o que um museu não deve ser:
Não deve ser um armazém, não deve ser uma necrópole, não deve ser uma repartição de objectos perdidos.
Será armazém se as obras se amontoarem sem ordem, sem critério, atabalhoadamente; será uma necrópole se não for conhecido, visitado, ou se vir votado ao abandono pelos estudiosos e pelo público, ou ainda vivendo e progredindo distante dos verdadeiros artistas; será um parque de coisas perdidas se guardar aquilo que os coleccionadores privados enjeitam ou não consideram digno de si.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: -Todos sabemos o que deve ser um museu, pelo arranjo ordenado ao encontro das suas finalidades sociais; pela organização e favores de análise e possibilidades de nobre conhecimento das suas colecções e salas; pela selecção que logre cristalizar em obras-primas representativas as celebridades criadoras que o mereçam.
Portanto, da primitiva colecção de arte para a galeria de obras-primas, desta até ao centro de cultura polarizante e de difusão, com suas lições, conferências, publicações, atracção de turistas e extensão à vida social, vai quase invencível distância.
Temos de reconhecer que há defeitos e insuficiências nos museus - problemas e problemas de delicada solução.

Página 452

452 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 124

Falta constantemente espaço; as colecções e obras não podem ser mostradas devidamente; algumas permanecem nos depósitos ou encaixotadas, como num desterro intelectual; outras são expostas com vizinhança tão promíscua que faz lembrar a técnica comercial, de grande composição, dalguns expositores comerciais da Baixa lisboeta, a qual não tem nada de parisiense.
E daí resulta da visita aos museus uma fadigo irresistível e esmagadora; mas, se é assim, não me resta dúvida de que só por demasiada severidade se podem taxar os nossos museus, com seus problemas materiais e espirituais, como jazigos ou casas sem ordem.
Desde as Janelas Verdes ao Museu Abade de Boçal se vê em desenvolvimento um trabalho desconforme mas beneditino, constante mas ingrato - trabalho que merece respeito e admiração - e, além disso, um jeito, um gosto, uma nova ciência, que surpreendem.
São deficientes os quadros do pessoal, não está feito o que deveria esperar-se, quer-se marchar mais longe no caminho da perfeição? For certo está no ânimo de todos.
Para facilidade de orientação e para uma maior clareza no que vou expor, reporto-me, desde já, às três grandes linhas de solução encontradas no debate:

1.ª Unificação dos textos, no sentido da simplicidade de regulamentação da matéria legislativa, que forma um conjunto disperso e incoerente;
2.ª Concentração de atribuições hierárquicas e serviços, a fim de se obter unidade de pensamento e direcção artística, em benefício do Ministério da Educação Nacional;
3.ª Aperfeiçoamento da nossa organização de serviços pela introdução duma simples direcção ou repartição que superintenda sobre os problemas e questões de belas-artes.
A primeira solução em debate foi trazida à tribuna pelo meu ilustre condiscípulo Dr. Bustorff da Silva.
Creio que merece a adesão da Câmara e que dispensa discussão ulterior. Há, como proclamou vigorosamente, demasiada e dispersiva regulamentação, que carece de ser compilada e sistematizada num ou mais diplomas, mas que seria vantajoso codificassem os verdadeiros princípios da política artística a seguir.
Temos realmente à nossa vista uma montanha, e bem difícil ela é de escalar quando os grandes advogados se queixam.
Mas também entendo que a regulamentação adequada dos diferentes elementos do todo não fere nem altera os intuitos duma legislação unitária.
Em país algum, nem mesmo para além da «cortina», seria possível estabelecer um padrão jurídico único aplicável, por exemplo, a três museus: o etnológico, o dos coches e um de província.
Portanto, estatuto de belas-artes, com mais ou menos regras, mas sem renunciar às exigências de regulamentação.
A segunda solução, de concentrar hierarquias e funções num só órgão e departamento, parece ser a do ilustre autor do aviso prévio.
Na verdade, o ilustre Deputado avisante começou por considerar a política de belas-artes um problema de organização. Esta mão falta, mas, no seu entender, encontra-se «desarticulada».
Mostrou os elementos do património artístico - quatro museus nacionais, sete museus regionais, dez provinciais ou municipais, outros de situação menos definida, uma fundação, casas-museus, palácios e setecentos e quarenta e três monumentos nacionais - e mostrou-os como reclamando unidade de critérios e de esforços.
Mostrou ainda que estavam repartidos por vários ministérios - e desta fornia de distribuição, que é puni matéria governativa, tirou a noção de dispersão, de menor rendimento e de enfraquecimento dos seus valores morais. Falou ainda ma desigualdade de dotações. Considerou que seria o Ministério da Educação Nacional o beneficiário natural de uma política de concentração e que a intervenção dos outros departamentos ministeriais lhe parecia intrometida. Deu outros elementos de observação e acabou por afirmar:

Verifica-se, por outro lado, que o património artístico nacional se encontra disperso por todo o País. E assim a solução integral do problema das belas-artes afigura-se-me residir na unificação dos elementos que nele interferem (museus, palácios e monumentos), através de um único departamento de Estado, quer ele seja uma direcção-geral ou, como julgo preferível, um subsecretariado, a integrar no Ministério da Educação Nacional.
Só assim será possível de facto unificar, coordenar, impulsionar e fiscalizar tão importante sector da vida da Nação.
Portanto, o facto universal de existirem museus e outros elementos de riqueza artística das gerações, de diferente origem, espécie, categoria e finalidade, foi dado como contrário à unidade de regime e de políticas - o que pode ser e pode não ser. Nós veremos a lição de outros países.
A organização dos serviços por Ministérios foi criticada por simples aparências de emulação burocrática, sem se atender às tradições dos serviços, à sua exigência técnica, à especialização adequada aos fins de departamentos, como a Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais; porém, não me custa reconhecer que a Câmara deva examinar os prós e contras dum problema assim posto.
Quanto à ideia fulcral, de solucionar os problemas por uma forma integradora e unificadora, a não ser que as palavras ultrapassassem o seu motivo temático e se não quisesse ir tão adiante, não posso aderir a ela, pois que se me afigura demasiado estatista, contrária à orientação saudável das grandes fundações e casas-museus, etc., como procurarei demonstrar adiante.
O estatismo não está nos nossos quadros de construção política e as centralizações excessivas de poderes e atribuições também não. Trata-se, porém, de um problema de organização de serviços, em que a lei terá a última palavra.
A última solução, menos enérgica e também menos revulsiva, resultará, naturalmente, desta intervenção.
O apontamento deficiente que me foi possível organizar sobre países estrangeiros vai mostrar à Câmara a complexidade dos regimes estabelecidos, a sua visível elasticidade, o recurso á forma autónoma e individualizada e a desconcentrarão prática, resultante de uma disciplina legal discreta - e não constritora.
Começo pelo país vizinho, e quero deixar nesta tribuna a minha gratidão ao ilustre embaixador em Madrid, que ainda esta manha me distinguiu com os seus distintos favores e esclarecimentos.
Ali há, em primeiro lugar, monumentos nacionais, afectos ao património nacional, que se encontram integrados no Ministério da Presidência - La Granja, Palácio do Oriente, o Escurial, se não estou em erro, etc.
Os outros museus e monumentos nacionais, quando declarados, estão subordinados ao Ministério da Educação - Direcção-Geral das Belas-Artes.

Página 453

8 DE FEVEREIRO DE 1956 453

Os museus agrupam-se em cinco categorias - estando a cargo do Estado ou simplesmente ... - repartem-se assim: do Estado, arqueológicos, de belas-artes. de escultura e particulares, com estatuto.
Dependem de entidades várias, conforme a categoria, têm uns receitas estaduais e recebem outros subvenções para obras, reparações e compras.
Levaria muito longe expor o sistema em todos os seus detalhes, mas devo chamar a atenção da Câmara para, o seguinte: em muitos casos os conservadores são eleitos livremente, à margem de intervenção oficial; o recurso a patronatos assegura-lhes grande autonomia técnica e económica.
Alguns museus espanhóis dispõem de grandes meios - as receitas de entrada, o as vendas do livros nos milhares e milhares de turistas que ali acorrem asseguram disponibilidades que chegam a revestir formas de depósito bancário.
Vejamos o que se passa em Itália:
Os museus, galerias ou pinacotecas são mais de trezentos.
Destas, somente trinta e cinco pertencem ao Estado, pois que a maioria são propriedade das comunas, províncias e instituições religiosas e civis.
Há ainda palácios, solares, galerias privadas e colecções famosas, como o Palácio Colona e Dora-Pamphili, que rivalizam e suplantam os verdadeiros museus.
O património artístico da Itália é descomunal, inexaurível, maravilhoso, em todos os capítulos.
Desde 1878 que os museus do Estado dispõem de um quadro único.
Em 1895 foi estabelecida uma orgânica geral.
As situações eram numerosas e dispersivas, e por isso de 1902 a 1904 alcançou-se a unificação da legislação de tutela e defesa dos monumentos artísticos.
O Ministério da Instrução Publica considera que o museu apresenta fundamentalmente carácter educativo e organizou uma tríplice superintendência, que engloba monumentos, arqueologia e escavações e galerias e museus.
Creio -não asseguro- que as superintendências abrangem zonas dispondo de vasto cabedal do obras-primas, correspondendo às antigas repúblicas.
A de Florença apresenta mais riqueza do que o património de uma nação inteira.
Dizem-me que o sistema funciona bem, porque os superintendentes são pessoas de escol, gosto apurado e entranhada dedicação. Têm planos, dirigem obras, utilizam faculdades que dão a impressão de se tratar de verdadeiros almoxarifados.
É o país da arte; de uma opulência sem limites, não tem, ao que me consta, subsecretariado nem organismo centralizador desconforme.
O quadro do pessoal, restrito ao sector nacional, abrange, quatro categorias: científico e técnico; técnico-executivo; administrativo; de guarda.
Porque alguns elementos facilitam o estudo e apreciação dos problemas em causa, importa considerar o exemplo que nos é fornecido pela França, o país que esteve sempre na vanguarda deste capítulo histórico e artístico.
O sistema legal francês mostra-se naturalmente complexo, os elementos do todo apresentam posição destacada c especializada, carecendo de ser vistos em detalhe.
Surgem em primeiros lugar os museus nacionais, colocados sob uma alta autoridade central e onde as características essenciais reflectem o domínio pleno da lei, e não o capricho dos fundadores.
Mas estes mesmos distinguem-se cm classes.
O Louvre e as instituições museológicas que lhe estão ligadas formam um grupo à parte e distinguem-se do conjunto.
Depois encontramos o que se chama o «departamento», acervo de castelos principescos, colecções singulares, pertencentes au Estado. Por último, entre os museus nacionais encontramos vários ligados a certas divisões dos serviços públicos.
Como são dirigidos?
Por administração directa de alguns organismos apropriados, que lhe deferem assistência ou que juridicamente os tutelam; por um conselho de museus nacionais ajudado por técnicos; por um conselho de conservadores, que associa todos os directamente responsáveis na vida dos museus.
Encontram-se depois, em segundo lugar, os museus de província, que dependem, pela ordem administrativa francesa, das municipalidades e que, antes da última guerra, estavam isentos de qualquer contrôle.
Um novo estatuto legal de 1945 dividiu estes em museus classificados e museus fiscalizados.
No primeiro caso, o conservador é nomeado e pago pelo Estado. No segundo, só a nomeação depende deste, o qual se arroga, entretanto, uma fiscalização.
O sistema legal novo permitiu juntar sob a autoridade do mesmo conservador vários museus locais.
Aguarda-se em França a reforma dos conservadores para aperfeiçoamento do seu sistema legal.
Há uma Inspecção-Geral dos Museus da Província, com liberdade de movimentos e funcionalismo especial para a pré-história e o folclore.
Vêm em último lugar os monumentos históricos e os museus independentes.
Nos primeiros compreendem-se, além dos monumentos como tais. os museus do Instituto de França e os de administração autónoma.
Ao todo novecentos museus - e eu peço para confrontarem esta imensidade com os apontamentos já dados neste aviso prévio.
Qual a autoridade superior?
O Ministro da Educação Nacional, apoiado na Direction des Musées de France.
Mas nem todos os museus e institutos museológicos são dominados por esta Direcção, ficando a sua disciplina em oitocentos e dez, mais ou menos.
Ainda deve notar-se o seguinte:
O Louvre, com seus anexos, não tem unidade administrativa.
Algumas colecções que foram legadas ao Estado regulam-se juridicamente pelas disposições de última vontade.
Outros chateaux e colecções de arte pertencem aos departamentos que os administram.
Portanto, o sistema francês revela cuidado de subordinação ministerial quanto aos museus nacionais apenas.
Não apresenta subsecretariado, apesar da sua enorme riqueza.
Dispõe de uma direcção-geral, quase exclusivamente competente em assuntos artísticos.
Mas bem entendida mostra-se, funciona e depõe apesar disso contra a tentativa da unificação e da centralização. Estas ideias são contrárias ao pensamento museológico francês, complexo, elástico e repartido.
Na verdade, escreve Georges Poisson:

Sistema híbrido, certamente, no espírito dos seus autores, provisório, mas suficientemente elástico para respeitar os vários interesses em jogo e da livre carreira, por um lado, aí directivas centrais, e, por outro, as iniciativas municipais e, antes do mais, preocupado com o respeito da longa e tradicional liberdade de acção, deixada ao conservador, cujo papel permanece bastante subtil para ser tratado apenas como um juiz de paz ou um louvado.

Página 454

454 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 12

Portanto a elasticidade e complexidade do sistema francês, a liberdade de acção e as variantes do regime não dispõem a favor da centralização, mesmo quando colocado sob a alta autoridade de uma direcção-geral apropriada.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Uma cidade tão populosa e rica como Nova Iorque apresenta elementos, neste debatido capítulo, que merecem ser considerados, ainda que com brevidade.
Vejamos um por um:
Museus de arte - pertencem à, municipalidade e ás academias de arte e letras; erguem-se outros à ordem de fundações de grandes financeiros, como Guggenheim e Pierpont Morgan.
Galerias de arte - são propriedade de particulares, coleccionadores e donos de venda de bricabraque.
Museus históricos - têm origem variada, destino e propriedade diversa. Pertencem a sociedades de numismática, a delegação da tesouraria, ao município, a sociedades históricas e a seminários de teologia judaica.
Há ainda solares e residências históricas, museus científicos, sociedades de geografia e de história natural que sustentam e estadeiam museus particulares.
Quase todos estes museus são generosamente suportados por fundadores e grupos de amigos, cobram taxas dos seus membros e recebem alguns subsídios governativos.
Apesar de a América do Norte não ser muito dada a intromissões nem a fiscalização, os administradores daquelas instituições mantêm, a despeito disso e sem estorço, altos ideais educativos e sociais que reforçam o alto e generoso pensar dos proeminentes coleccionadores que os dotaram originariamente.
De todos, o mais recente e interessante é The Cloisters, nos arrabaldes, sobre o Hudson, que se deve à liberalidade dos Rockefellers, mas, por vontade destes, integrado no Metropolitan Museum.
Como se vê, não há unidade, nem dominação de sector ministerial, nem um regime simplificado. Há estatutos, regulamentos e normas especiais de harmonia com a natureza e fins institucionais.
Sr. Presidente: como não tenha havido tempo para pormenores nem sido inteiramente explicado, parece-me indispensável dar um breve esclarecimento sobre o que poderei chamar a superintendência dos valores estéticos, para se ajuizar da especialização de funções em face das leis portuguesas.
Ela permitirá esclarecer até que ponto se torna vantajosa a concentração de competências em órgãos exuberantemente poderosos. Até aqui uma lei fatal leva as funções do Estado moderno para a divisão do trabalho e para a especialização de objectivos - e esse fenómeno de ordem social apresenta razões profundas e vantagens indiscutíveis, como se verá.
Enumeremos, por isso, pela sua importância, os institutos e órgãos em que se desdobra esta superintendência de ordem burocrática e estética, seguindo um escalonamento de predomínio:

1.º - 6.ª secção da Junta Nacional da Educação (no Ministério da Educação Nacional). - Organismo composto de pessoas altamente competentes e com funções relevantes, entre elas a de inventariação artística, cujo laudo, autorização, consulta e intervenção se tornam indispensáveis, na maioria dos problemas relacionados com o aviso prévio.
2.° - Direcção-Geral do Ensino Superior e das Belas-Artes. - Pela sua tradição entre nós, competência burocrática e função adequada, é este serviço público
o que concentra as faculdades de coordenação e inspecção superior e os quadros burocráticos.

3.º - Academia Nacional de Belas-Artes. - Pela relevantes atribuições de orientação e instrução [...] este organismo desenvolve acção dilatada e colectiva, embora não se enquadre na burocracia do Estado.
4.º - Direcção do Museu Nacional de Arte Antiga - Pela sua projecção na vida nacional e pelo prestígio, que vem do tempo em o director Dr. [...] de figueiredo valorizou esta instituição, a direcção, ou melhor, o seu ilustre director, Dr. João Couto, [...] natural projecção, que uma noção realista dos factos não deverá esquecer.
5.º - Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais (no Ministério das Obras Públicas). As obras de restauro dos castelos e monumentos nacionais têm sido certamente louvadas cá dentro e [...] reuniões internacionais, como a da Suíça; o seu boletim acreditou a grande tarefa realizada com maior autoridade - sendo certo que não há mais [...] lição que a dos factos que estão à vista de todos.
6.º - Commissão das Noras Instalações para os serviços Públicos.- Presidida, pelo engenheiro Espregueiro Mendes, organiza e determina o mobiliário e decoração das novas instalações. É constituída por pessoas de apurado gosto.
7.º - Secretariado do Nacional da informação, [...] Popular e Turismo. - Encarrega-se da difusão e popularização de certos valores estéticos, livros. catálogos etc., e superintende no Museu de Arte Popular.
Pertence à Presidência do Conselho e dirige-se camadas mais numerosas da população e aos núcleos portugueses no estrangeiro e a todos os que lá fora interessam por nós.
Realizou uma obra de consagração das tendências gerais do esteticismo português e procurou estabelecer o contacto entre o mundo oficial e os artistas.
8.º - Administração dos Próprios da Fazenda Nacional. - Superintende e administra os Palácios Nacionais e, além destes, outros bens.
Não tem ainda um superintendente artístico, mas o hábito ali consultar as pessoas de mais escolhido e cultivado critério, como o arquitecto Raul Lino.
Compreende-se que a administração dos Palácios Nacionais, porque destinados à alta representação S. Ex.ª o Chefe do Estado e chefes de missão estrangeiros, não possa obedecer a concepções exclusivamente estéticas e burocráticas, nem obedeça a fins de [...] pedagogia.

O Sr. Abel de Lacerda: - Dentro do enquadramento geral da valorização das belas-arte em Portugal, Ministério das Finanças tem vendido obras de ar dos seus palácios, das quais algumas se encontram agora na exposição de Londres, porque pertencem Fundação Espírito Santo, tendo mandado depois faz cópias - como já tive ocasião de referir- para o Palácio de Belém.

O Orador: - Segundo as minhas informações, a Administração e a Fundação da Casa de Bragança venderam objectos, que não tinham realmente qualificação, era de [...] gosto duvidoso e quebravam a linha de nobreza Palácio.

O Sr. Abel de Lacerda: - E também de Sintra.

O Orador: - O exemplo trazido ao debate não [...] o alcance nem a importância que poderá [...] Foram outro organismos que se desinteressaram [...] vário mobiliário, porque não tinha, na verdade, [...] artístico ou histórico. Em Sintra não sei mas [...]

Página 455

8 DE FEVEREIRO DE 1956 455

que, há bastantes anos, se tivessem desfeito do que nada aconselhava a guardar ao lado do que está exposto.

O Sr. Abel de Lacerda: - Entendo que é da especial competência das belas-artes, e não do Ministério das Finanças, pronunciar-se obre o assunto.

O Orador: - 9.° - Deixo de lado os problemas de ensino, mas devo referir-me ao Instituto de Alta Cultura e ao Instituto de Educação Física, que promoveram a bem organizada elaboração de relatórios sobre os problemas museológicos.
Na prática administrativa não é esta multiplicidade exemplo que não se repete, singularidade que não se compreenda. Outros exemplos existem de multiplicidade de órgãos trabalhando para a realização de fins sanitários.
Cito apenas dois exemplos:
A política monetária, no seu aspecto de capacidade com repercussão no nível geral da vida e dos preços, reparte-se pelos seguintes órgãos: Banco de Portugal, Ministério das Finanças, Intendência-Geral dos Abastecimentos, organismos de coordenação económica, bancos, Comissariado do Desemprego, etc.
A justiça realiza-se pelos tribunais civis, criminais, administrativos, aduaneiros, de contas, contencioso das contribuições, espalhados por diferentes Ministérios.
Portanto, existe competência repartida de vários órgãos, que não são concorrentes ou lutadores, mas aos [...] as leis impõe unidade de princípios superiores da [...] do Estado.
Mas aqui importa destacar, como organismo superior capaz de estabelecer os ditames da política artística,
6.ª secção (belas-artes) da Junta Nacional de Educação.
Ela define, sistematiza, orienta, promove o desenvolvimento, estabelece providências, faz por conservar e assegura o património artístico da Nação.
Dispõe de grandes poderes.
Não se pode dar um passo, neste capítulo, sem a sua concordância.
Tem realizado obra meritória e extensa.

Vozes : - Muito bem!

O Orador: - Discutida por alguns coleccionadores, trabalhando mais ou menos fulgurantemente, realizou [...] Maio de 1936 para cá obra acentuada.
Qualquer reforma no sentido de criar órgão novo [...] ou sistematização total será, obviamente, [...] seu prejuízo e deverá apeá-la do pedestal da hierarquia artística.

O Sr. Abel de Lacerda: - A Junta Nacional da Educação tem uma função consultiva, não tem faculdade [...] intervir no assunto.

O Orador: - Uma das sugestões que me foi dada [...] um concelho nacional das belas-artes também significava que se tratava de um conselho consultivo, mas [...] autoridade nos dois casos é bastante.

O Sr. Abel de Lacerda : - A centralização não [...] diminuição de rendimento da Junta Nacional da Educação.

O Orador: - Eu estou a dizer exactamente o contrario. Se for lícito centralizar, isso só resultará em juízo da Junta Nacional da Educação.
Quanto à Direcção-Geral do Ensino Superior, a não [...] que se crie uma repartição no seu âmbito, as propostas apresentadas no curso do debate levam à cisão e desfalque dos seus poderes.
Quanto a outros órgãos postos em xeque, vale a puna um exame mais demorado.
Nos últimos dias tem chegado até mim a sugestão de um conselho de museus ou de belas-artes - o que não é novidade na história legislativa.
Não devemos insistir sobre o que consta das leis.
A complexidade e especialização de funções estaduais, o plano cada vez mais avançado da acção governativa, as técnicas novas do serviço público, não podem ser apontados como afrontas ao espírito de unidade desejável - como dispersões de serviço ou fragmentação da política cultural.
O que são vias e processos do Estado moderno e realizações de fins legais pode o legislador tê-los concatenado perfeitamente, dirigindo-os para objectivos claros.
Um exemplo:
O provimento de lugares dos conservadores dos Palácios Nacionais, segundo os Decretos-Leis n.ºs 31 364 e 31 317, será ,por concurso, devendo ser vogais do júri o director do Museu Nacional de Arte Antiga e um vogal da Junta Nacional da Educação, 6.º secção.
Portanto, estes problemas têm de ser vistos juridicamente, e menos sentimentalmente, porque é mais poderosa e expressiva a vontade do legislador, patente nos textos e na sua realização, do que todas as operações e diligências administrativas de traspasse que possam tentar-se.
Uma inspecção-geral?
Haveria então entre nós, como em Itália, superintendentes acompanhados de inspectores que pugnassem pela beleza, arranjo, propriedade e geral segurança das mesmas colecções oficiais.
E também pelas dos templos?
E também pelas dos particulares que possuem galerias de vulto e mérito?
Quem conhece a riqueza espantosa do património artístico italiano, esparso pelos perímetros das velhas repúblicas, estranhará n aproximação e a cópia de métodos, havendo entre aquele e o nosso tão apreciável distância.
Nos termos do § 2.º do artigo 1.° do Decreto-Lei n.º 26 115, seria pois uma nova inspecção-geral a criar e organizar.
Mas não deixo de perguntar - e sentimentalmente o faço: os carolas da arte portuguesa e dos museus receberiam em bem e acima deles um inspector-geral com seus inspectores adjuntos e chefes?
Acaso não há neste capítulo de inspecções superiores exemplos que não ajudam a decidir?
Não será o melhor inspector o público, que é quem segue a vida dos museus?
E pode uma missão de contrôle resolver os problemas e dúvidas positivos de cultura e defesa do património artístico?
Confesso que nutro as maiores dúvidas e que uma direcção-geral ou repartição parecem mais adequadas aos objectivos sociais e à organização desse serviço público que um corpo, pequeno ou grande, de inspectores e legais.
Ainda que nos países latinos se espera tudo de fiscalizações severas e profundas.

O Sr. Cortês Pinto: - V. Ex.ª falou dos inconvenientes de uma direcção-geral.

O Orador: - Pelo contrário: fiz a defesa de uma repartição.

Página 456

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 124 456

O Sr. Cortês Pinto: - V. Ex.ª disse que, se houvesse uma inspecção, os museus particulares não veriam com bons olhos que alguém se fosse intrometer na sua organização.

O Orador: - Estou apenas a perguntar e a observar que não veriam isso com bons olhos.

O Sr. Abel de Lacerda: - Por isso é que os nossos museus não têm os seus inventários.

O Orador: - Não têm inventários porque não se pode fazer tudo de um momento para o outro. Se os conservadores dos museus portugueses entenderam que não é possível fazer um inventário com o pessoal de que dispõem, tem de se dar um alargamento de quadros. Dentro de uniu repartirão nova de belas-artes é evidente que já não sucede isso. Mas não com inspectores, porque estes não vão fazer o inventário, mas apenas pedir contas por ele não estar feito, o que é realmente diferente.

O Sr. Cortês Pinto: - A existência de uma inspecção nada tem que ver com a liberdade que existe para um museu particular.

O Orador:- Na legislação italiana, só depois das fundações e igrejas é que se chegou à disciplina das colecções particulares.

O Sr. Cortês Pinto: - O que se faz lá fora não impõe que se faça o mesmo cá dentro.

O Orador: - Suponho que com uma nova direcção-geral ou repartirão esses problemas de disciplina geral ficarão solucionados.
Sr. Presidente: a ordem administrativa português prevalece contra as soluções desproporcionadas e de rasouro.
A autoridade do Estado, na organização dos serviços, conta sempre com a colaboração dos particulares e o desenvolvimento das, suas actividades singulares que, pela capacidade de associação, possam ascender a actividades públicas e quase públicas.
A máquina administrativa integra no seu jogo as pessoas colectivas de utilidade pública - as pessoas morais, na nomenclatura do Código Civil.
Por outro lado, a organização política e administrativa, com largas raízes no passado, desde Afonso III até Seabra da Silva, assenta em pilares inabaláveis, como a autarquia e os institutos regionais, que não cedem a coletes-de-força.
As nações civilizadas, longe de evoluírem para a coagulação, tendem geralmente para a desconcentração, sobretudo a personalizarão moral dos interesses permanentes, da arte da dedicação pela obra-prima, que têm como exemplos relevantíssimos, à nossa vista, as Fundações Ricardo Espírito Santo e Gulbenkian. Ajustando-se àquela ordem, ao equilíbrio português, voltam-se para as gerações e para os séculos, como obras a desenvolver ao jeito dos seus ilustres construtores, sem sujeição a disciplinas forçadas.
Que dizer da passagem de dois departamentos famosos?
A medida preconizada que desanexa dos Ministérios das Obras Públicas e das Finanças - em obediência a critérios e orientações estéticas de natural fragilidade - a Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais e os Palácios Nacionais, para os subordinar ao da Educação Nacional parece-me arriscadíssima e de tuna violência, inaudita.

A Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais tem-se mostrado um organismo altamente qualificado; na Suíça e na Inglaterra foi afirmado que nada se podia pôr em confronto com o que mostra o seu boletim; os castelos, palácios e igrejas dizem por eles mais do que o necessário.
Coroa-se uma obra formidável, um trabalho [...] de perto de trinta anos, com uma transferência [...] parece uma penalidade?

O Sr. Abel de Lacerda: - V. Ex.ª dá-me licença. A transferência a que V. Ex.ª se refere tem apenas o fim de produzir mais, e melhor, V. Ex.ª sabe muito bem que, se há coisas que estão muito bem feitas, [...] há que têm sido muito mal realizadas.

O Orador: - É muito possível!

O Sr. Abel de Lacerda: - Só não percebo é a razão porque V. Ex.ª entende que o Ministério das Finanças há-de ser competente para se pronunciar sobre assuntos de arte e o Ministério da Educação Nacional [...] há-de ter igual competência para se pronunciar sobre assuntos de finanças.

O Orador: - Perdão! A delicadeza da intervenção não me permite ir mais longe...

O Sr. Abel de Lacerda: - Eu preocupei-me apenas com a alusão por V. Ex.ª feita. Eu sei que devia ter pedido licença para interromper V. Ex.ª ...

O Orador: - À vontade...

O Sr. Abel de Lacerda: - Mas eu prefiro manifestar desde já o meu desacordo com V. Ex.ª do que [...] manifestá-lo apenas aos colegas.

O Orador: - Mas continuando:
Vai a direcção-geral abandonar as suas funções [...] construtivas e realizadoras, para ser [...] apenas em homenagem às, suas manifestações, artísticas.
Quanto aos palácios nacionais:
Sou do tempo em que lavrava ali a confusão e o desleixo. Os reposteiros caíam aos bocados. As [...] mostravam os seus «por dentro».
Hoje está tudo alindado, mobilado, organizado irrepreensível - um brinquinho!
Viajantes muito ilustres dizem-me não se achar melhor, em países onde a arte se cultiva com esmero.
Pois é nesta altura, quando era preciso [...] um pouco da caminhada, que se proclama novo [...] e nova vassalagem?
É isso justo?
Além disso, o Ministério da educação Nacional sofre de inflação. Não tem mãos a medir, mesmo [...] dispusesse de tantos braços como o Buda famoso.
Compreendo, admito, posso conceder que serviços trabalham mal, que realizam ineficientemente, por ser deslocados e enxertados - mas serviços [...] como dificilmente se encontram?!
Enfim, não se esqueça que o engenheiro Gomes Silva partiu do deserto para chegar onde está [...] alguns palácios reais, como o de Mafra, se [...] na triste modéstia da vivenda destinada à pequena freguesia.

Vozes : - Muito bem!

O Orador: - Ao Governo compele a reorganização dos serviços, mas em normal competência a Assembleia também pode fazê-la por medida legislativa.

Página 457

8 DE FEVEREIRO DE 1056 457

Segundo o artigo 93.º da Constituição actual, as matérias exclusivas da competência da Assembleia vêm a ser: organização da defesa; peso, valor e nomenclatura monetária; pesos e medidas; bancos de emissão; e organização dos tribunais.
Ora o artigo primitivo, o artigo 93.°, na sua alínea b), dizia constituir necessariamente matéria de lei u criação e supressão dos serviços públicos e, por analogia, a sua reorganização de maneira profunda.
Mas esta alínea foi suprimida e a competência da Assembleia, mais do que necessidade, foi elevada a exclusivo de poderes intransmissíveis.
E portanto a criação de um serviço específico de belas-artes, a sua reorganização em novos moldes, podendo estar na competência da Assembleia, se houver um projecto de grandes bases jurídicas, julgo estar agora, mais propriamente, na competência do Governo.
Mas isto não subtrai o valor do aviso prévio nem diminui o significado político, que o Governo considerará como melhor for seu entendimento e justiça.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Abel de Lacerda: - Podia enaltecer a acção pessoal de V. Ex.a, que está acima de toda a crítica. Discute-se o princípio, mas não a acção pessoal, e o princípio, a meu ver, é arriscado.

O Orador: - É sobre o princípio também que vou dar explicações.

Sr. Presidente: uma. leitura apressada pode conduzir à suposição de que as compras de preciosidades pela Fazenda resultaram de simples e esporádicas iniciativas e foram executadas com um grande à-vontade. Se há alguém que esteja apertado nas malhas legais, é o Ministro das Finanças.
Erro, engano e ilusão se supõe que alguma coisa pode diligenciar-se livremente e sem pelas.
As iniciativas partiram doutros Ministérios, de agentes diplomáticos no estrangeiro, das Universidades e de proposta originária da Junta Nacional da Educação.
De resto, o Decreto-Lei n.° 36 764 manda comprar o mobiliário artístico através da já citada 6.ª secção.
Houve o cuidado de fazer intervir os peritos mais capazes, como Raul Lino, de ouvir todas as instâncias necessárias, designadamente o correspondente a superintendente artístico dos palácios nacionais.
O que não faltou foram demoras e até obstáculos que serram dispensáveis.
Por acaso na Câmara encontra-se um professor muito distinto e ilustre, o Doutor Lopes de Almeida, que está capacitado, pela proximidade dos factos, a dizer como se trabalhou na aquisição de livros raros e preciosos com cuidado e meticulosidade.
Vamos renunciar a urgências fatais a imperativos de catálogos, leilões, propostas de vendas, etc., só para se dizer que todos são competentes e eruditos menos os órgãos tradicionais?

O Sr. Mário de Figueiredo: - O que V. Ex.a adquiriu foi muito bem adquirido; simplesmente, quanto a alguns objectos, há muitos anos que se reclamava do Ministério da Educação Nacional a verba indispensável para se fazer a aquisição, mas nunca se obteve. Quanto a outros, o caso passou-se sem ter sido ouvida, como é de lei, a Junta Nacional da Educação.
Existe uma disposição legal exigindo que o mobiliário artístico seja adquirido sob parecer da Junta Nacional da Educação. Na hipótese, e nalguns casos, isso não se passou. Também se exige o parecer da Junta em casos que não são propriamente de mobiliário.
Seja como for, as aquisições não se fizeram por virtude desse parecer, que era de há anos, mas sim, em virtude de circunstâncias exteriores, tomando-se também em conta o parecer.

O Orador: -V. Ex.a, Sr. Dr. Mário de Figueiredo, está tão pouco seguro da sua justiça que, sendo naturalmente fluente e fácil, aparece agora um bocadinho ensarilhado na sua lógica.
Mas vou dizer porquê, e deixo a consciência da Câmara apreciar o facto tal como ele se passou.
É claro que esta intervenção do Sr. Sr. Mário de Figueiredo é muito delicada, mas tenho em minha consciência a segurança de uma tranquilidade tão grande quanto é possível a quem passa pelas cadeiras do Poder. Não posso, no entanto, levar esta garantia até ao infinito.
Se for convencido de que realmente as coisas funcionaram de uma maneira perfeitamente impecável sob o ponto de vista burocrático, isso me basta, porque na altura tinha de ficar satisfeito.
E estão aqui alguns colegas meus, muito ilustres, que passaram pelas cadeiras do Poder, que poderão confirmar o facto.
O que se passou numa certa altura foi que, por iniciativa do Governo, se comprou uma obra de arte notabilíssima, famosa, de um valor, de um mérito e de um autor de uma relevância extraordinária.
Essa obra, como digo, foi adquirida nestas condições, o que, aliás, me absolvia da crítica tão impiedosa e percuciente do Sr. Dr. Mário de Figueiredo.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Não tive intuito de que essa crítica fosse impiedosa e percuciente.
Tenho a responsabilidade de ser presidente da Junta Nacional da Educação, e apesar disso, e talvez por isso, tenho-me mantido calado.

O Orador: - Por iniciativa de entidade da maior força, pois era de todo o Governo, fizeram-se as diligências necessárias para que viesse para Portugal tão importante obra-prima.
Acontece que havia um processo, e que nele apareciam dois ofícios da Junta Nacional da Educação, que tinha sido ouvida e que dizia que era merecida a aquisição daquela obra de arte, a qual se encontrava no estrangeiro e era delicadíssimo trazer para Portugal, porque estava num banco de um país neutral.
Não se ouviu a Junta Nacional da Educação pela terceira vez, mas, repito, ela já tinha sido ouvida por duas vezes.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Isso já vinha de longe e de forma alguma estão, como já disse, em causa as aquisições feitas por V. Ex.a Comecei exactamente
por dizer isso: que não estavam em causa as aquisições que V. Ex.a fez.

O Orador: - Ainda que propensas a interpretações e dúvidas, as discussões de verbas não possuem o significado e autoridade política que geralmente se supõe.
A verba inicialmente inscrita está subordinada ao peso da tradição financeira das gerências próximas.
Depende das propostas dos serviços, raramente isentas de ambições, da justificação apresentada, dos trabalhos, monografias consultadas, dos cálculos e despachos do Ministro do departamento respectivo, dos informes e cálculos da contabilidade central e, só ao fim e ao cabo, da autoridade financeira.
Em regra, as grandes obras, as grandes compras, as grandes alterações de estrutura são recomendavelmente levadas a cabo, na técnica financeira, por meio de ré-

Página 458

458 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 124

forços e créditos especiais, abertos por medida legislativa que põe em jogo várias competências e obriga a fundamentar expressamente o que se pretende.
Verbas que parecem inscritas a favor do Ministério das Finanças são apenas inscrições destinadas a obviar a urgentes necessidades ou exigências dos outros departamentos. O que poderia consumir três meses, e até mais, torna-se assim questão de dias.

O Sr. Abel de Lacerda: - Só tenho uma objecção a opor às considerações de V. Ex.a
Há verbas inscritas no orçamento da Direcção-Geral do Ensino Superior e das Belas-Artes para aquisição de obras de arte. Essas verbas podem naturalmente ser sempre reforçadas; logo, não é forçoso que elas existam no orçamento do Ministério das Finanças, especificada mente, paru compra de obras de arte.

O Orador: - A hipótese última era de inscrição especial, que é coisa diversa.

O Sr. Abel de Lacerda: - Mas é que as obras de arte adquiridas pelo orçamento do Ministério das Finanças não são depois incorporadas no património dos museus, mas depositadas ali.

O Orador: -Normalmente podem ser integradas.

O Sr. Abel de Lacerda: - São depositadas.

O Orador: - Está bem, porque são património da Fazenda Pública. Mas isso não tem interesse para o ponto de vista artístico aqui trazido. Estão lá com função social, com as exigências da museologia, estão lá para fins educativos, para aqueles fins pêlos quais V. Ex.a se bate, e não entendo bem porque lhe dá tanto cuidado a situação jurídica.
... Esperemos que o Sr. Dr. Mário de Figueiredo se pronuncie.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Já me saí mal há pouco! ...

O Orador: - Estou autorizado, a este respeito, a trazer o depoimento do ilustre e consagrado director do Museu das Janelas Verdes, que afirma: «Nunca me dirigi ao Estado que me não valesse».

(Nesta altura o Sr. Melo Machado assume a presidência).

Sr. Presidente: em conclusão: não se negam, não podem negar-se, os problemas parciais postos e, no meu entender, o nosso sistema legal carece apenas de ser aperfeiçoado e completado, não devendo ser objecto de reforma de grande envergadura, que comportaria os maiores riscos.
Tem funcionado bem e permitiu melhorias de que as pessoas com dilatado conhecimento da vida se puderam facilmente aperceber. Não carece de reformas profundais. Estas resultariam num salto sobre o abismo, em risco gravíssimo, num geometrismo burocrático e administrativo contrário às nossas concepções actuais e à própria experiência da Renovação Nacional - à sua sensatez!
A obra de restauro e construção, as melhorias, as aquisições, aã Fundações Ricardo Espírito Santo e Gulbenkian, que acrescentam nova e importantíssima trajectória política, os novos museus e institutos locais, obedecem a ideias e princípios, registam iniciativas que não se ajustam à centralização excessiva, a reformas fulgurantes e deslocações, em favor de um novo departamento todo poderoso - da burocratização contra a experiência!
Sabemos onde estamos e o que foi conseguido em anos e anos de campanha, pelo gosto das coisas belas e Juta pelo património nacional!

O Sr. Cortês Pinto: -V. Ex.a dá-me licença? Mas o aviso prévio refere-se apenas à situação dos museus, palácios e edifícios nacionais. E, portanto, parece-me que V. Ex.a está a ir para além da MUI letra e do seu espírito.

O Orador: - Estamos no domínio tia política artística, e não posso estar a desenvolver ainda pontos tão distanciados. Desta maneira, só poderia responder cabalmente a V. Ex.a se fôssemos para uma sessão de estudo. Nela, sim, poder-se-ia apreciar e discutir os assuntos expostos em detalhe. Poderia então dar a V. Ex.a todas as explicações necessárias, o que não posso fazer do cimo desta tribuna, nesta altura, para se chegar ao urso da fábula.

O Sr. Cortês Pinto: - Limitei-me apenas a chamar a atenção de V. Ex.a para a letra do aviso prévio, e para isto não há necessidade de sessões de estudo, como V. Ex.a referiu. O aviso prévio, repito, trata da situação dos museus, palácios e edifícios nacionais, e não pretende que o Estado se imiscua nos museus particulares.

O Orador: - Creio que a criação de um estatuto legal está perfeitamente dentro da letra do aviso.

O Sr. Cortês Pinto: -Mas V. Ex.a não me deixa falar porque prossegue no uso da palavra, levando a questão tratada no aviso prévio para um ponto completamente diferente.

O Orador: - Já fiz um depoimento demorado sobre o que é a ordem jurídico-administrativa da Nação Portuguesa. Disse como ela integra as forças locais as autarquias, as pessoas colectivas de utilidade pública, as colecções particulares, mas dentro de princípios diferentes e dentro de uma ordem administrativa sensata, que não implica nem uma direcção muito forte, nem uma fiscalização muito acentuada. Pergunto se estou a explicar bem. Portanto, se é assim, se há essa ordem administrativa e se, sobretudo, a nossa vista, há nesta altura duas fundações particulares que vão ter unir amplitude rasgada, que têm fins culturais e educativo, e que têm irradiação artística notável, essas fundações representam um capítulo novo na nossa política.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Ninguém pensa em tocar na vontade dos instituidores dessas fundações; ao contrário, o que se pretende é que se realize completamente essa vontade.

O Orador: - A vontade de um fundador tem de se respeitada. É compromisso de nobreza da Nação inteira E digo mais: essa vontade pode ser elemento de
orientação futura.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Eu digo antes que na deve ser atingida a vontade do instituidor.

O Orador: - O que eu digo está de harmonia com que se passa, por exemplo, em Itália e noutros países civilizados.
A política a seguir tem de ser de uma certa composição, e não pode ser uma política de moldes apertados

Página 459

8 DE FEVEREIRO DE 1956 459

Portanto, o coeficiente a considerar é em benefício daquilo que afirmo, e não do que afirma o avisante.

O Sr. Cortês Pinto: - Está muito bem; mas, repito, creio que as considerações de V. Ex.a estão fora do aviso prévio, porque aí se fala em museus nacionais, e não em instituições particulares.

O Orador: - Realmente há que alargar os quadros do pessoal, humanizar o seu regime, dotar de harmonia com os fins, realizar um esforço adicional, que tem de ser bem compreendido pelo País e secundado pêlos carolas, amadores qualificados e possuidores de galerias.
Para todos há deveres indeclináveis.
Mas tomar novos caminhos, desfraldar as velas para o ignoto, é o que, no meu entender, parece contra-indicado.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - A próxima sessão será amanhã, à hora regimental, com a mesma ordem do dia.
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 30 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

João Afonso Cid dos Santos.
D. Maria Leonor Correia Botelho.
Mário Correia Teles de Araújo e Albuquerque.
Tito Castelo Branco Abrantes.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Alberto Cruz.
Amândio Rebelo de Figueiredo.
António da Purificação Vasconcelos Baptista Felgueiras.
António Rodrigues.
António Russell de Sousa.
António dos Santos Carreto.
Armando Cândido de Medeiros.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Caetano Maria de Abreu Beirão.
Carlos de Azevedo Mendes.
Eduardo Pereira Viana.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
João Carlos de Assis Pereira de Melo.
João Cerveira Pinto.
João Maria Porto.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim de Moura Relvas.
José Gualberto de Sá Carneiro.
José dos Santos Bessa.
Luís de Azeredo Pereira.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Maria Sarmento Rodrigues.
Miguel Rodrigues Bastos.
Pedro Joaquim da Cunha.
Meneses Pinto Cardoso.
Rui de Andrade.
Urgel Abílio Horta.

O Redactor - Luís de Avillez.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

Página 460

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×