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REPUBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 133

ANO DE 1956 23 DE MARÇO

ASSEMBLEIA NACIONAL

VI LEGISLATURA

SESSÃO N.º 133, EM 22 DE MARÇO

Presidente: Ex.mo Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior

Secretários: Ex.mos Srs.
Gastão Carlos de Deus Figueira
Armando Cândido de Medeiros

SUMARIO:-O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 20 minutos.

Antes da ordem do dia. - O Sr. Deputado Pinto Barriga usou da palavra para enviar um requerimento à Mesa; o Sr. Deputado António de Almeida congratulou-se com a criação do Centro de Estudos Políticos e Sociais na Junta das Mísseis Geográficas e de Investigações do Ultramar.

Ordem do dia. - Continuou o debate sobre o aviso prévio do Sr. Deputado Melo Machado acerca do comércio externo.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Alberto de Araújo, Botelho Moniz, Pereira Viana o Sousa Machado.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas e 50 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 16 horas e 5 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Abel Maria Castro de Lacerda.
Adriano Duarte Silva.
Alberto Cruz.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Pacheco Jorge.
Albino Soares Pinto dos Beis Júnior.
Alexandre Aranha Furtado de Mendonça.
Alfredo Amélio Pereira da Conceição.
Amândio Rebelo de Figueiredo.
Américo Cortês Pinto.
André Francisco Navarro.
Antão Santos da Cunha.
António Abrantes Tavares.
António de Almeida.
António Augusto Esteves Mendes Correia.
António Bartolomeu Gromicho.
António Camacho Teixeira de Sousa.
António Carlos Borges.
António Cortês Lobão.
António Júdice Bustorff da Silva.
António Pinto de Meireles Barriga.
António da Purificação Vasconcelos Baptista Felgueiras.
António Raul Galiano Tavares.
António Russell de Sousa.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Águedo de Oliveira.
Augusto Cancella de Abreu.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Caetano Maria de Abreu Beirão.
Camilo António de Almeida Gama Lemos Mendonça.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos Mantero Belard.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Daniel Maria Vieira Barbosa.
Eduardo Pereira Viana.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco Eusébio Fernandes Prieto.
Gastão Carlos de Deus Figueira.
Henrique doa Santos Tenreiro.
Herculano Amorim Ferreira.
João Ameal.

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João da Assunção da Cunha Valença.
João Luís Augusto das Neves.
João Maria Porto.
João Mendes da Costa Amaral.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim de Moura Relvas.
Joaquim de Pinho Brandão.
Joaquim de Sousa Machado.
Jorge Botelho Moniz.
Jorge Pereira Jardim.
José Gualberto de Sá Carneiro.
José Maria Pereira Leite de Magalhães e Couto.
José Sarmento de Vasconcelos e Castro.
José Soares da Fonseca.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Luís de Azeredo Pereira.
Luís Maria Lopes da Fonseca.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel Maria de Lacerda de Sousa Aroso.
Manuel Maria Vaz.
Manuel Marque» Teixeira.
Manuel Monterroso Carneiro.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Manuel Trigueiros Sampaio.
Mário Correia Teles de Araújo e Albuquerque.
Mário de Figueiredo.
Pedro de Chaves Cymbron Borges de Sousa.
Sebastião Garcia Ramires.
Teófilo Duarte.

O Sr. Presidente:- Estão presentes 74 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 16 horas e 20 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente:- Tem a palavra, para um requerimento, o Sr. Deputado Pinto Barriga.

O Sr. Pinto Barriga: - Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa o seguinte

Requerimento

Tendo-se acentuadamente agravado em 1955 o déficit comercial metropolitano, devido a movimentação e comportamento das trocas com o bloco da U. E. F., acompanhado de quebra do comércio com as outras áreas, e, consequentemente, tudo se traduzindo por uma forte pressão na balança geral de pagamentos da zona do escudo, tenho a honra de requerer, nos termos regimentais e constitucionais, que pelos serviços dependentes da Presidência do Conselho e de outros departamentos ministeriais competentes me seja enviada uma súmula das providências tomadas e dos estudos e relatórios elaborados tendentes a reduzir ou mesmo a eliminar o déficit comercial da metrópole por uma adequada coordenação económica».

O Sr. António de Almeida: - Sr. Presidente: foi recentemente publicada pelo Ministério do Ultramar uma portaria criando n» Junta das Missões Geográficas e de Investigações do Ultramar o Centro de Estudos Políticos e Sociais - mais um elo importante naja extensa e notável cadeia de organismos oficiais destinados a promover as investigações científicas nas províncias portuguesas de além-oceano.
Semelhantes pesquisas têm-se alargado e desenvolvido extraordinariamente no nosso século; todos os países possuidores de territórios ultramarinos se empenham em valorizá-los intensa e fecundamente, recorrendo aos métodos mais actualizados da ciência.
É que, em nossos dias, a ocupação cientifica parece ter-se alçapremado à categoria de direito novo de posse das terras de além-mar - quantas vezes invocado por instituições estrangeiras para mascarar intenções de expansão política e económica -, ao lado dos verdadeiros direitos de descobrimento, mas, por vezes, esquecidos, firmados por ingentes e pertinazes esforços de toda a índole, realizados pelos primeiros ocupantes europeus.
Seja como for, mais por tendência inata do que para obedecer à moda vigente, Portugal podo envaidecer-se de, actualmente, caminhar no campo científico colonial ao lado das nações mais progressivas.
Os Ministros Dr. Francisco Machado, Prof. Doutor Marcelo Caetano, capitão Teófilo Duarte e comandante Sarmento Rodrigues fundaram e reorganizaram a Junta das Missões Geográficas e de Investigações do Ultramar (sucessora da gloriosa Comissão de Cartografia), instituíram ou ampliaram numerosas missões do geografia, hidrografia, botânica, fitopatologia, zoologia, biologia marítima, pedologia, antropologia e etnologia, linguística, medicina, etc. - a maior parte promovidas pela Junta de Investigações do Ultramar e as restantes pelo Instituto de Medicina Tropical e Instituto Superior de Estudos Ultramarinos -, e criaram também os Centros de Botânica, de Zoologia e de Geografia.
O inteligente desejo de dotar a Nação, na metrópole e no ultramar, com os principais agentes de investigação cientifica levou o Sr. Comandante Sarmento Rodrigues a fundar o Centro de Estudos de Timor - a exemplo do que instituíra na Guiné Portuguesa durante a sua brilhante administração -, o Centro de Estudos de Etnologia do Ultramar, o Centro de Estudos Históricos Ultramarinos, a Comissão de Nutrição, os Institutos de Investigação Médica de Angola e Moçambique e os Institutos de Investigação Científica de Luanda e Lourenço Marques.
Com estes indispensáveis e excelentes instrumentos de ocupação cientifica das nossas províncias de além-mar já não tememos os reparos ou confrontos alheios no que respeita às respectivas actividades especializadas, cujos resultados estão patentes nos múltiplos e valiosos estudos publicados ou em via disso.
Sr. Presidente: deste balanço sumaríssimo das nossas instituições estaduais que se votam a investigação científica ultramarina tira-se a conclusão de quo dispomos, ou disporemos a curto prazo, de meios eficientes para estudar, tanto no campo científico propriamente dito como no económico e utilitário, a terra e o mar, as plantas o os animais e a história da nossa presença nus terras de além-oceano, e, bem assim, as populações nativas, no que interessa à pré e proto-história, à antropobiologia e a etnologia, mormente no Âmbito da ergolo-gia e da animalogia.
Conquanto entre nós se tenham efectuado alguns trabalhos meritórios sobre problemas políticos e sociais do ultramar português, tais obras ainda não atingiram o incremento desejado pelas nossas responsabilidade» de nação que trouxe para a civilização ocidental e cristã povos das mais diversas regiões, origens e tipos de cultura. Têm-se feito coisas admiráveis, mas mais por intuição do que pelo estudo objectivo e metódico como hoje se requer.
O exame dos fenómenos políticos o sociológicos ultramarinos está na ordem do dia de muitas e grandes reuniões internacionais onde temos assento ou nos chamam interesses capitais. Ainda há pouco mais de uma semana, Paul Henry, secretário-geral da C. C. T. A., numa conferência dita no Instituto Superior de Estudos Ultramarinos, afirmou que a importância pelas ciências

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humanas n» cooperação técnica em África, depois da última guerra, se deve em grande parte à acção do Portugal.
Foram por certo as mencionadas e ponderosas razões e ainda a execução imediata das recomendações da Conferência Internacional de Ciências Sociais e do Conselho Científico Africano, reunidos respectivamente em Bukavu e em Luanda, que conduziram D Ministro do Ultramar, Sr. Prof. Dr. lïaul Ventura, a criar o Centro de Estudos Políticos e Sociais, cujos objectivos principais consistem em «coordenar, estimular e promover o estudo dos fenómenos políticos e sociais verificados em territórios ultramarinos ou relacionados com estes, observando e expondo especialmente os fundamentos, características e métodos da acção desenvolvida pelos Portugueses no ultramar»; entre estes nobres propósitos salientam-se os estudos de demografia do ultramar português, das doutrinas e orientações estrangeiras ou internacionais que visem territórios de além-mar ou neles possam ter projecção o os de antropologia cultural», estes de feição essencialmente social, como é óbvio. Este organismo não deixará de procurar a cooperação e o entendimento em relação a outros já existentes entre nós, com objectivos afins ou conexos.
Tão belo e patriótico programa é digno do mais caloroso aplauso; da sua efectivação prática esperam-se os melhores êxitos, para honra e proveito da Nação.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continua o debate do aviso prévio apresentado pelo Sr. Deputado Melo Machado sobre o comércio externo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Alberto de Araújo.

O Sr. Alberto de Araújo: - Sr. Presidente: antes de entrar no assunto das minhas considerações desejo felicitar o Sr. Deputado Melo Machado pela oportunidade do seu aviso prévio e prestar homenagem ao interesse que S. Ex.ª dedica sempre ao estudo e discussão dos problemas que mais directamente respeitam à economia do País.
Sr. Presidente: para bem se ajuizar do volume e da natureza do nosso comércio externo nos últimos anos convém referir os números que melhor o exprimem.
Nos cinco anos que vão de 1950 a 1954, inclusive, o nosso comércio de importação não sofreu alteração sensível nu seu volume quantitativo, pois andou sempre à volta de 3 milhões de toneladas.
Em 1950 as importações somaram 3 048 000 t e, depois de ligeiras baixas nos três anos seguintes, totalizaram em 1954 3 298 000 t, ou seja um aumento de cerca de 8 por cento relativamente a 1950.
Quanto a valeiros, o aumento foi muito mais sensível. Em 1950 as importações atingiram o montante de 7 879 000 contos e, depois de se terem mantido na ordem de grandeza dos 9 milhões de contos, atingiram um 1954 o total de 10 085 000 contos, ou sejam um aumento de 28 por cento relativamente a 1950.
Neste período foram as matérias-primas que mais pesaram na nossa importação. Em 1052 e em 1954 atingem cerca de 50 por cento do valor total. Vêm depois as máquinas, aparelhos, etc., as substâncias alimentícias e as manufacturas diversas.
Em 1950 as substâncias alimentícias corresponderam a 25 por cento do valor da importação total do País. Em 1954 baixaram em cerca de 800 000 contos relativamente a 1950 e corresponderam a 11 por cento da importação total.
Se as importações não acusaram alteração sensível no seu volume quantitativo no período 1950-1954, o mesmo não aconteceu às exportações, que, de 1 669 000t em 1950, chegaram a atingir 2 389 000 t no ano seguinte. Em 1954 estavam em 2 173 000 t. As mesmas variações acusou o respectivo valor.
Em 1950, 5 334 000 contos; em 1951, 7 555 000 contos; e, depois de um declínio nos dois anos seguintes, em 1954 voltaram a aproximar-se do valor de 1951, ou seja 7 292 000 contos.
Se em volume quantitativo são as matérias-primas que neste período atingiram maiores percentagens da nossa exportação (cerca de 75 por cento em 1954), em valores, matérias-primas e substâncias alimentícias quase, se equiparam, contribuindo cada um dos grupos com cerca de 30 por cento para o valor da exportação total do País.
Neste ano vêm a seguir as manufacturas diversas (19.72 por cento) e os fios, tecidos, feltros e respectivas obras (16 por cento).
Acaba de publicar-se o Boletim Mensal do Instituto Nacional de Estatística relativo a Dezembro último, que insere assim os dados respeitantes ao nosso comércio externo em 1955. E acaba, do publicar-se também o relatório anual do Banco de Portugal, que é um repositório valiosíssimo de elementos relativos aos sectores fundamentais da economia interna e externa.
Pelos elementos agora publicados verifica-se que o comércio externo, quer em tonelagem, quer em valor, excedeu o do ano anterior. O peso das mercadorias importadas quase atinge os 3,5 milhões de toneladas, com um valor de 11 444 000 contos; a exportação sobe para 8 143 000 contos, registando-se um deficit de 3 300 000 contos, ou seja superior em cerca de meio milhão de contos aquele que se verificou no ano anterior.
Aumentaram, é certo, as exportações, relativamente a 1954, com cerca de 850 000 contos, mas este aumento não foi suficiente para contrabalançar o aumento verificado nas importações.
Não houve aumento no valor das substâncias alimentícias importadas em 1950, relativamente ao ano anterior. São quase iguais os valores respectivos, com uma diferença apenas de 3000 contos.
Mas, se não subiu o valor das importações de substanciar, alimentícias, o mesmo não aconteceu com as matérias-primas, as máquinas e veículos e as manufacturas diversas.
Na exportação aumentaram as vendas das matérias-primas, das substâncias alimentícias e dos produtos englobados na designação de manufacturas diversas. Desceu em cerca de 140 000 contos a exportação de fios, tecidos, feltros e respectivas obras.
Dos 11 444 000 contos importados no País no ano último coube ao ultramar português uma percentagem de 13,8 e aos países estrangeiros uma percentagem de 86,2, da qual 62,8 cabem aos países participantes da O E. C. E.
A Alemanha e a Inglaterra foram grandes fornecedoras do País em 1955, cabendo à primeira 14,5 por cento e à segunda 14,1 por cento da nossa importação total, com o valor aproximado de 3 200 000 contos.
Dos países estrangeiros vêm depois os Estados unidos, com 1 101 000 contos (9,6 por cento das importações totais); a França, com 877 000 contos (7,7 por
cento), e a Bélgica-Luxemburgo, com 807 000 contos (7,6 por cento). Ocupam ainda lugar de relevo no nosso

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comercio importador a Suíça, a Itália, a Holanda, a Suécia e os países produtores de combustíveis líquidos.
Do Brasil importámos em 1955 mercadorias num total de 236 000 contos, ou seja aproximadamente 2 por cento da importação portuguesa.
Quanto à exportação, num total do 8 143 000 contos, o ultramar absorveu no ano último 1 912 000 contos, ou seja 23,5 por cento. Houve no nosso comércio com o ultramar português um saldo a favor da metrópoles de 342 000 contos.
Foram também as nações participantes da O. E. C. E. que nos absorveram a maior percentagem da exportação: 51,8 por cento, num total de 4 218 000 contos. Todos os outros países estrangeiros, juntos, compraram-nos sensivelmente o mesmo que as nossas províncias ultramarinas. Dos países não participantes, o nosso maior comprador foram os Estados Unidos, com 838 000 contos, ou seja 10,3 por cento da nossa exportação total. Hm segundo lugar, e a grande distância, vem a Argentina, com 163 000 contos (2 por conto da exportação total).
Dos países europeus, a Inglaterra foi o nosso primeiro país comprador, com 1 263 000 contos, correspondentes a 15,5 por cento da nossa exportação total.
A Alemanha adquiriu-nos cerca de metade da Inglaterra, ou fossem 638 000 contos. Os países que ocuparam em 1955 na Europa os lugares a seguir na nossa exportação foram a França, que nos comprou mercadorias correspondentes a 5,4 por cento a exportação total, a Itália e a Bélgica-Luxemburgo, com uma percentagem, respectivamente, de 4,3 e 3,7. São de referir, pela sua importância no nosso comércio de exportação, a Holanda, a Dinamarca e a Noruega, e, fora da Europa, entre outros, certos territórios africanos.
É, em regra, deficitária a nossa posição relativamente aos países com os quais mantemos mais importantes relações comerciais. Tivemos em 1905 saldo positivo com a Argentina, a União Sul-Africana. os territórios franceses na África e, na Europa, entre outros, com a Irlanda, a Dinamarca, a Grécia e a Itália.
Mas são bastante volumosos os deficits do comércio que a balança comercial registou relativamente a curiós países.
Foi de 1 024 000 contos o saldo negativo do nosso comércio com a Alemanha, de 568 000 contos com a Bélgica-Luxemburgo, de 438 000 contos, com a Franca, de 350 000 contos com a Inglaterra, de 262 000 contos com os Estados Unidos e de 258 000 coutos com a Suíça.
Relativamente aos países da Europa Oriental, dizem as estatísticas que importámos daqueles países em 1955 mercadorias no valor de 63 000 contos, tendo a exportação atingido 206 000 contos. A nossa balança comercial com a Europa Oriental foi-nos favorável em 143 000 contos.
Em 1955 os cinco maiores valores da nossa exportação foram as cortiças (1 709 000 contos), as conservas de peixe (935 000 contos), os vinhos (682 000 contos), os tecidos de algodão em peça (573 000 contos) e os minérios (536 000 contos).
Apesar do elevado saldo negativo da balança comercial no ano último, a balança de pagamentos do País apresentou um saldo credor de 629 000 contos. Mas em virtude, principalmente, do excesso das importações sobre as exportações da metrópole e da quebra no excedente; comercial da balança comercial das províncias ultramarinas e que o saldo positivo da balança de pagamentos foi, em 1955, menor em cerca de 760 000 contos relativamente a 1954.
O facto, se é motivo de cuidado, não é razão de alarme.
Sempre que se fala da balança comercial alude-se à necessidade de o Estado fomentar a propaganda dos produtos portugueses no estrangeiro. Ainda ontem este assunto foi abordado na Assembleia Nacional pelo Sr. Prof. José Sarmento, com o interesse e carinho com que o ilustre Deputado trata sempre dos problemas do Douro.
Não tem o problema da propaganda sido depurado. Já aqui me referi à acção do Fundo de Fomento de Exportação, que continua a dedicar uma parte importante das suas receitas e da sua actividade é, propaganda e expansão dos produtos portugueses nos diversos mercados externos.
As receitas do Fundo para o próximo ano estão orçadas em 60 000 contos, e, lendo as diversas rubricas da despesa, pode avaliar-se da larga assistência que aquele organismo presta ao comércio externo do País.
É através do Fundo de Fomento de Exportação que, em grande parte, se mantém no estrangeiro diversos serviços e missões que exercem funções de estudo, informação e observação dos mercados. Verbas avultadas são absorvidas também pela normalização e fiscalização de certos produtos, pela compensação do preço de produtos importados com o objectivo de facilitar a exportação de produtos nacionais, com a constituição de reservas nacionais de vinhos, com a selecção de frutas e outros produtos de exportação, com a comparticipação portuguesa nas feiras internacionais de Bruxelas, Paris, Milão e Viena a realizar no corrente ano.
Subsidiadas integralmente, ou em grande parte pelo Fundo, estão neste momento a realizar-se em determinados países da Europa campanhas organizadas de propaganda, abrangendo um certo número de anos de alguns dos nossos mais valiosos produtos de exportação.
Deve destacar-se, pelos benefícios já alcançados e que serão ainda maiores quando os planos estiverem executados, a propaganda dos vinhos generosos portugueses, absolutamente necessária e indispensável em face da larga e dispendiosa propaganda que estão fazendo alguns vinhos concorrentes dos nossas, como sejam os vinhos do Xerez e da África fio Sul.
Para a participação portuguesa nas quatro feiras internacionais a realizar no corrente ano estão previstas quantias no montante de 2400 contos e para as campanhas de propaganda do vinho do Porto, vinho da Madeira, vinho de mesa, conservas de peixe e outros produtos verbas que totalizam 16 610 contos, ou seja mais de 25 por cento da receita do Fundo de Fomento de Exportação.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - A aprovação de verbas tão avultadas para a propaganda de determinados produtos da nossa exportação, nomeadamente conservas e vinhos, relaciona-se com a efectivação de um largo plano de propaganda desses produtos no mercado americano.
A Assembleia Nacional por mais de uma vez teve oportunidade de se referir à importância dos Estados Unidos como grande mercado do consumo e onde podiam, porventura, ter colocação importante alguns dos produtos tradicionais da nossa exportação. E o Governo, atento a essa possibilidade e sem desconhecer certamente, as dificuldades do problema, fez inscrever no orçamento do Fundo de Fomento de Exportação para 1955 verbas que se destinavam já a custear um primeiro ano de publicidade e propaganda de dois dos mais valiosos produtos da economia nacional: os vinhos e as conservas de peixe.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

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O Orador: - Apesar de um ano decorrido, não se iniciou ainda a propaganda projectada. Mas a prova de que não se pôs de parte a ideia inicial é que o orçamento do Fundo para 1956 continua a dotar essa propaganda das verbas necessárias à sua realização. E não se julgue que se perdeu tempo ou se afrouxou no propósito de tentar abrir nos Estados Unidos mais amplos horizonte à exportação portuguesa.
Simplesmente, não é tarefa fácil organizar, com as verbas de que dispomos, e que, se são grandes para as nossas possibilidades, são pequenas para a extensão do mercado a conquistar, uma propaganda eficiente e cujos resultados correspondam ao sacrifício que vai fazer-se.

Vozes: - Muito bem!.

O Orador: - Houve que pedir propostas e planos às organizações especializadas, dá-los a conhecer às entidades directamente interessadas, para finalmente, escolher o que se afigurasse mais consentâneo com os fins um vista.
Sendo Os Estados Unidos um grande país, convirá, certamente, concentrar a propaganda nas regiões ou cidades para isso julgadas mais convenientes, e, sendo o povo americano extremamente sensível à publicidade, escolher as modalidades mais susceptíveis de o impressionarem.
É uma obra de técnicos e sobre a qual só as entidades competentes se podem pronunciar. Cremos que o assunto está neste momento sujeito à apreciação do Governo.
Não basta, porém, votar as verbas para a propaganda, estudá-la e adjudicá-la depois a uma grande firma publicitária. Sabemos ser pensamento e objectivo do Governo criar previamente as condições de organização e de disciplina comerciais que são indispensáveis para que paralelamente com a propaganda, a economia do País tire dela os benefícios que pretendem atingir-se e não seja puramente perdido o dinheiro que vai gastar-se.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Se isso implica uma certa demora denuncia um cuidado e um interesse por sectores fundamentais do nosso comércio externo, que só podem ser recebidos com louvor. É de supor que durante o corrente ano fiquem definitivamente elaborados e postos em execução os planos do propaganda comercial nos Estados Unidos, cujos resultados todos desejamos correspondam às esperanças fundadas de expansão de alguns dos mais valiosos produtos portugueses nesse grande mercado consumidor.
A nossa balança comercial continua a ser caracterizada por um excesso volumoso de importações sobre as exportações, saldo pago à custa dos excedentes positivos da balanço, geral de pagamentos do País.
Várias vezes o problema tem sido posto, sem que, afora anos excepcionais, tenha sido possível equilibrar o que a Nação compra nos mercados externos com o que lá consegue vender. E não só temos conseguido, felizmente, saldar pontualmente iodos os nossos compromissos, como acumular reservas importantes em divisas e em ouro, que são garantia valiosa de segurança e estabilidade.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Mas é natural que esta situação da balança comercial seja como já, disse, motivo constante de preocupação e ansiedade, não só pelo desequilíbrio que revela, mas também pela mudança que razões de ordem interna ou externa podem operar, repentinamente, no sinal da balança de pagamentos.
Isso impõe-nos a, obrigação e o dever do intensificar ao máximo a produção e ao mesmo tempo, mercê de uma política comercial adequada, elevarmos as cifras e valores representativos da nossa exportação.
É um objectivo fácil de enunciar mas difícil de atingir, não só porque não está unicamente nas nossas mãos resolvê-lo, mas também porque, no fundo, é o problema da capacidade da Nação para bastar-se, tanto quanto possível, a si própria, e procurar vender o que produz em excesso, para suprir a sua insuficiência em determinados sectores da produção e do consumo.
A balança comercial portuguesa não é só a expressão da nossa economia interna. Reflecte a tendência expansionista da economia mundial.
Depois dos anos de penúria da guerra, das fracas produções industriais e agrícolas, das faltas de alimentação, das restrições nos consumos, a Europa, com a ajuda dos Estados Unidos, lançou-se abertamente no caminho da recuperação.
Reconstruíram-se fábricas, fundaram-se indústrias novas, melhoraram os rendimentos, elevaram-se os salários, aos acordos bilaterais substituiu-se um comércio multilateral e as práticas discriminatórias foram gradualmente abolidas, para darem lugar a uma ampla política de liberalização.
Segundo dados recentemente publicados, a produção europeia atingiu no ano último quantitativos que excedem os de 1953 e 1954. Este aumento de produção, combinado com um aumento geral de rendimentos e salários, não pôde fatalmente deixar de reflectir-se no consumo.
Conforme se diz no último relatório da O. E. C. E, referente a 1955, nos últimos três anos uma gama muito variada de artigos, sobretudo de bens duráveis, foi pela primeira vez posta ao alcance de um número importante de consumidores. Daí resultou, no conjunto dos países europeus, um aumento médio de consumo total por habitante da ordem de 14 por cento.
Calcula-se que essa taxa de aumento foi em 1955 de 5 por cento. Para este aumento geral de consumo não foram indiferentes as largas medidas de crédito pela primeira vez oferecidas ao público desde a guerra.
No relatório da O. E. C. E. atribui-se, entre os anos de 1948 e 1955, um aumento em Portugal de cerca de 8 por cento no consumo privado por habitante.
O aumento nos índices de consumo nos países ocidentais da Europa atingiu diversos géneros e produtos, mas foi especialmente caracterizado por uma expansão de compras de bens duráveis.
Essa expansão foi, sobretudo, devida às vendas de au-fiiiiifivcib e

As cumpras de aparelhos eléctricos viveram .menor impurtâucia em valor absoluto, mas o aumento foi .linda mais considerável, pois atingiu 100 por cento para ss refrigeradores máquinas de lavar e aspiradores.

Prngrediram também muito rapidamente, em percentagem, as veadas de a.paielhus de televisão, e o aumento da cuii.slruc.uo em toda a parte favoreceu a venda de artigos de mobiliário.
A liberalização de trocas intereuropeias, a diminuição do desemprego, a ânsia geral de todas as classes conquistarem melhores condições de vida, as baixas de preços verificadas em certos produtos, como, por exemplo, os automóveis e ainda, a variedade e diversidade de artigos referidos ao público - todo esse conjunto de circunstâncias aumentou as procuras e os consumos e pesa fortemente nas balanças de comércio.

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«Não podemos também em Portugal, embora em melhor países, fugir a esta tendência geral da nossa época, e daí, em parte, o aumento verificado em certos sectores da nossa importação.
Por outro lado, está o País fazendo um esforço sério o sentido da sua industrialização, com o objectivo, precisamente de diminuir a sua dependência do estrangeiro.
Essa industrialização obriga, porém, à compra de maquinismos e equipamentos e não pode deixar de traduzir, como está acontecendo, muita importação cada, vez mais volumosa de determinada matérias-primas.
Juntem-se a isso as deficiências verificadas em certos sectores agrícolas a necessidade de termos de comprar lá fora produtos e géneros indispensáveis para satisfazer necessidades primordiais da subsistência pública e teremos enumerado, embora muito genérica a sucintamente, as causas principais do ritmo crescente das nossas importações.
Compreende-se à importância do problema e a preocupação de um déficit de comércio que no timo ano se aproximou dos 3,5 milhões de contos.
Mas, se o problema é grave e deve, evidentemente, ser seguido no seu desenvolvimento e evolução. Todos estamos de acordo em reconhecer a sua complexidade e a impossibilidade de o resolver enquanto não estiverem solucionados outros problemas que visam dar à Nação uma maior autarquia e. à sua economia uma mais sólida e equilibrada estrutura.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Podem, de momento e a título transitório, tomar-se medidas destinadas a restringir as importações, e fazer, em consequência, baixar o seu montante.
Não as substâncias alimentícias necessárias à alimentação pública, nem as matérias-primas indispensáveis à indústria, nem os maquinismos destinadas ao seu apetrechamento.
Mas há, na variedade dos artigos que importamos do estrangeiro, muitos deles que podiam, porventura, ser objecto de medidas restritivas.
A questão que se põe, porém, é esta: quando se caminha para uma política de liberalização quase geral de trocas, que é considerada como elemento indispensável à prosperidade e ao bem-estar geral dos povos europeus, podemos nós voltar às restrições quantitativas na importação, embora a coberto de cláusulas de salvaguarda, quando é certo que da abolição das práticas discriminatórias tem também beneficiado a exportação nacional? Parece-nos bem que não é fácil.
De resto, outros países lutam com as consequências de uma balança comercial desequilibrada, e muitos economistas autorizados entendem que esses desequilíbrios internos não podem ser resolvidos com meras restrições na importação. Exigem, ao contrário, outras soluções de fundo que não essas.
Podiam também lançar-te impostos ou taxas sobre determinadas mercadorias importadas. Mas isso era iludir o princípio da reciprocidade na liberalização de trocas, que ainda recentemente defendemos com sólidos argumentos e razões. E era abrir o caminho a novas discriminações e represálias.
Tem de reconhecer-se, todavia, que, sem deixarem de manter-se fiéis ao princípio da liberalização do comércio, diversos países têm por medidas puramente internas, tentado contrariar o aumento geral de procura e a elevação progressiva dos consumos. A essa medidas se refere também, desenvolvidamente, o último relatório da O. E. C. E.
Foi a Dinamarca o país que em 1954 adoptou as primeiras providências desta ordem, seguida depois, no ano seguinte, pela Noruega, Suécia, Reino Unido, Áustria, etc.
A natureza dos métodos empregados, variou segundo a situação particular de cada país e o carácter das suas instituições. Os instrumentos mais largamente utilizados foram a política de crédito e determinadas providências fiscais.
Em matéria de crédito usaram-se métodos: por um lado, restringiram-se os créditos bancários; por outro, elevou-se a taxa de desconto. A Alemanha elevou em 1955 a taxa de desconto ao nível em vigor em Janeiro de 1954; no Reino Unido os bancos restringiram os seus créditos e tornaram-se ainda mais severas as restrições adoptadas em Fevereiro de 1955 relativas a vendas e prestações. Na Holanda o banco central fez uma pressão junto dos bancos comerciais, para que limitassem os chamados créditos de consumo.
Mas países escandinavos, assim como a Holanda, além dessas providências, tomaram medidas de carácter fiscal.
A Dinamarca, a Noruega e a Suécia impuseram certas taxas sobre as compras de automóveis e a Inglaterra aumentou as taxas que incidem sobre a venda de grande número de artigos e produtos e na mesma orientação, limitou os subsídios à construção e diminuiu o montante dos investimentos a realizar pelo Governo, pelas municipalidades e pelas empresas nacionalizada.
O último relatório da O. E. C. E., aludindo a estas medidas, diz que elas se justificam pelo facto de a procura exceder a oferta global, com as suas consequências na balança exterior de diversos países.
É cedo, porém, ainda para se julgar - afirma esse relatório - se essas medidas teriam sido realmente, as mais adequadas para atingir o fim em vista.
O relatório da O. E. C. E. admite que um desequilíbrio interno pode justificar a intervenção do Estado, mas receia que as medidas adoptadas por certos países pesem relativamente de mais sobre o investimento e não tenham influência bastante sobre o consumo. Este tende desenvolver-se, e só há uma maneira de o satisfazer: aumentar a produção.
A economia europeia tem necessidade de mais investimentos industriais -, e nalguns países a tendência para aumentar estes investimentos e ainda bem recente.
Por isso, conclui o relatório da O. E. C. E., se se tornarem necessárias novas medidas restritivas, elas devem procurar travar o aumento de consumo, de preferência ao aumento do investimento.
Aqui está um princípio sóbrio de orientação, traçado pelo mais alto órgão de cooperação económica europeia.
Sr. Presidente: nesta fase da reconstituição europeia, tem o Governo Português estado sempre atento posição do comércio externo perante a evolução da conjuntura e dos princípios que procuram impor-se nesse importante sector da vida internacional.
Do comércio bilateral passou-se às práticas multilaterais e a um sistema mais amplo de pagamentos, numa trajectória que por vezes foi difícil e em que teve gradualmente de substituir-se o sistema dos contingentes às fórmulas da liberalização, sem descuidar as necessidades do consumo e os interesses da exportação, fazendo face às deficiências da produção, procurando adquirir determinados produtos, na mira de vender produtos nossos, orientando as nossas importações das áreas mais convenientes, sob o ponto de vista cambial e monetário, sacrificando tantas vezes, interesses particulares e só tendo em vista os superiores interesses da economia nacional.

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É natural que num período tão difícil, em que o Mundo saiu de uma convulsão para iniciar um período novo de ajustamento e recuperação, tenha havido errou e deficiências.
Mas o activo de serviços prestados à Nação por quem tem dirigido os departamentos e os sectores vitais da nossa economia supera, de longe, quaisquer erros praticados e tem a sua melhor expressão na posição de prestígio e de crédito conquistada pelo País nos grandes centros económicos e financeiros do Mundo.
É muito difícil enunciar as medidas a pôr em prático para melhorar a posição da balança comercial do País a aproximá-la, tanto quanto possível, de uma situação de equilíbrio.
Quando se fomenta a produção e se protege a criação do indústrias com viabilidade económica, isto é, em condições de produzirem aos níveis aproximados da concorrência mundial, procura-se precisamente dar uma maior solidez à nossa estrutura económica e reduzir as nossas compras lá tora.
O que se tem feito em matéria de produção de energia, na refinação de petróleo, na produção de sulfato de amónio, de papel e de outros produtos não constitui apenas uma magnífica afirmação de capacidade realizadora.
É a Nação a afirmar tendências e possibilidades de suficiência em sectores fundamentais da sua economia, o mesmo é que dizer da sua vida colectiva.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Não se pode nem se deve esperar que o Enfado tudo faça nos domínios da exportação. O Estado cria as condições favoráveis à expansão económica através da estabilidade financeira e monetária e da organização de serviços prantos a defenderem os interesses económico, da Nação onde e sempre que seja necessário.
Creio que o Estado Português, que é dominado por princípios de austeridade financeira e que restituiu à moeda a solidez indispensável à segurança das transacções comerciais - com a sua benéfica influência no sistema de câmbios pode nesta matéria ser apontado como exemplo entre os Estados que melhor procuram assegurar às suas, actividade económicas condições fundamentais de desenvolvimento e de expansão.

Vozes: - Muito bem !

O Orador: - A estas cumpre também largo papel no desenvolvimento são comércio externo, conquistando mercados, impondo marcas e produtos, vencendo concorrências, afirmando, em suma, o valor da iniciativa privada, como factor decisivo do progresso económico.
Sr. Presidente: um dos objectivos dominante de todas as economias é o do aumento da produtividade. Nem a indústria nem a agricultura de qualquer país poderão concorrer no mercado externo, quando o seu custo de produção for superior ao dos outros países concorrentes.
Esta ideia do aumento da produtividade, ou seja a diminuição dos custos de produção, surgiu, como já aqui tive ocasião de referir, da comparação do rendimento das indústrias europeias com o rendimento das indústrias americanas e tem-se generalizado nas nações ocidentais, podendo considerar-se hoje uma finalidade comum a todas elas.
Quanto maior é a capacidade produtora de um país maiores são as possibilidades de dominar os mercados. É o caso, por exemplo, dos Estados Unidos, onde as exportações não representam, além disso, para a quase totalidade dos artigos manufacturados, senão uma parte ínfima da produção.
Segundo dados publicados em 1953 pelas Nações Unidas, para os automóveis, por exemplo, a proporção destinada, à exportação é de 3 a 4 por centro na América do Norte, contra 60 por cento na Inglaterra; para as locomotivas, a exportação atinge no máximo 15 por cento na América, contra 60 por cento na Inglaterra; para os têxteis, a proporção é de 5 a 8 por cento nos Estados Unidos, contra 20 a 30 por cento nos países europeus grandes exportadores destes produtos.
Produzindo em larga escala e em série e tendo a exportação de artigos manufacturados um carácter marginal, os fabricantes americanos podem, à custa de sacrifícios mínimos para o conjunto da sua posição, oferecer os seus produtos em condições especiais de preço e de entrega.
Algumas fábricas americanas produzem mais de 700 000 refrigeradores por ano, enquanto que a maior fábrica europeia só produz 65 000. Duas sociedades (a (General Motors e a Ford) produzem cada uma só mais automóveis que as dezanove principais sociedades europeias reunidos.
Foi a grande produtividade da indústria americana muitas vezes dupla e tripla da produtividade europeia, que levou as nações ocidentais a estudarem e a dedicarem maior atenção aos problemas da produtividade, do melhor rendimento e dos melhores custos.
Abrangem esses problemas um conjunto vasto de questões, a formação de élites e de dirigentes de empresas, o aperfeiçoamento da técnica, o desenvolvimento da investigação científica, a divisão do trabalho, a criação de escolas, todo um conjunto de processos e de métodos racionais, tanto na indústria como na agricultura, tendentes a diminuir o custo de produção e a dar ao trabalho nacional condições para concorrer vantajosamente nos mercados consumidores.
Este problema da produtividade deixou de ser um motivo de literatura e transformou-se numa preocupação de dirigentes e governantes em todos os países.
Em 1950 o Conselho da O. E. C. E. recomendava aos países que não tinham ainda centros nacionais de produtividade a criação de organismos deste género e em 1953 aquela organização criou a Agência Europeia de Produtividade, que tem precisamente por objecto investigar e promover os melhores métodos de aumentar a produtividade das empresas industriais e agrícolas e de toda a economia dos países membros.
Num debate suscitado por um aviso prévio sobre comércio externo não deixa de ser oportuno referir a importância desse problema.
Bem sabemos que somos um país que agora lança as bases da sua industrialização e onde, dada a grande divisão da propriedade rústica, se torna difícil pôr em execução alguns dos processos reputados como mais convenientes para aumentar a produtividade.
Mas há, mesmo assim, largo campo de acção a empreender, tanto mais que Portugal não é apenas o território metropolitano, como aqui acentuou anteontem tão brilhantemente o Sr. Deputado Engenheiro Vieira Barbosa, mas sim um vasto império, cujos produtos só poderão concorrer nos mercados externos se adoptarmos os métodos e processos das nações mais prósperas e progressivas.
Temos, numa palavra, de baratear a produção se quisermos exportar e vencer a concorrência.
Esta ideia de que somos realmente um grande país, de territórios vastos, de produções variadas, ricos na produção de matérias-primas e de produtos alimentares deve dominar o comando da nossa economia !

Vozes: - Muito bem, muito bem!

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O Orador: - Os países pequenos são, em regra, obrigados a importar uma grande diversidade de géneros e produtos e só podem exportar um número muito restrito. Os países de larga extensão territorial podem bastar-se a si próprios a uma mais larga escala, exportando grande número de produtos e dispensando a importação de muitos. Esta não é uma vantagem de que efectivamente dispomos.
Longe vão os tempos do colonialismo e da posição de inferioridade atribuída por alguns autores às terras de além-mar.
O célebre economista Ricardo pensava que era necessário regular o comércio de maneira que este seja menos vantajoso para as colónias e mais lucrativo para a metrópole do que um comércio puramente livre. E List, se queria tarifas protectoras para a Alemanha, desejava também que os países tropicais não pudessem industrializar-se, a fim de ficarem num estado de dependência perante as nações de clima temperado.
Na evolução lógica da nossa acção ultramarina, Portugal e as suas províncias de além-mar constituem uma unidade política, que exprime uma profunda solidariedade económica. Os interesses económicos metropolitanos e ultramarinos estão no mesmo plano do igualdade. Simplesmente, a vastidão dos territórios, a importância das populações e a diversidade de produção devem permitir a constituição de um grande mercado interno, susceptível de abrir maiores possibilidades de expansão e valorização, tanto à produção metropolitana como à produção ultramarina.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

Orador: - É um voto que julgo também conveniente formular neste debate.
Sr. Presidente: quando a escola liberal apregoava os méritos do livre-cambismo defendia, no fundo, os interesses das nações industrializadas, que podiam, sem o obstáculo das, barreiras aduaneiras, impor em toda a parle a colocação dos seus produtos. £ quando os economistas americanos apregoavam o mérito do proteccionismo o que desejavam, acima de tudo, era fazer dos Estados Unidos um país economicamente forte e poderoso.
Temos, portanto, de estar atentos aos fins ocultos das teses e escolas.
Apregoa-se muito hoje o comércio livre, a liberalização, e condenam-se as práticas discriminatórias, a concorrência desleal e a política das tarifas e das pautas.
Temos dado com sinceridade a nossa adesão a todo os princípios e instituições que visem melhorar a economia geral dos povos e desenvolver entre eles as trocas e o comércio.
Mas, atentos às particularidades de cada um, não estamos dispostos, certamente, a renunciar à defesa natural da nossa economia e a conceder benefícios ou vantagens que não se baseiem numa, reciprocidade sincera e efectiva.
Temos todos de continuar a lutar - Governo e actividades produtivas da metrópole e do ultramar- para criar melhores condições de vida ao nosso povo, produzindo o que é economicamente aconselhável e procurando colocar nos mercados externos uma parte apreciável do que produzimos em matérias-primas. substâncias alimentícias e produtos manufacturados.
Não o fazemos por ambição desmedida. Dar-nos-emos por muito satisfeitos quando, com o que vendermos ao estrangeiro, pudermos pagar o que temos de adquirir-lhe.
Não será também ousado formular este voto.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Percorrendo as estatísticas da nossa importação, verificando a variedade dos produtos que compramos lá fora um matérias-primas, substâncias alimentares, máquinas, aparelhos, toda uma gama numerosa de artigos de consumo, podem verificar-se as nossas faltas e deficiências.
Mas, passando os olhos pelas principais rubricas da exportação, consola-nos o que ainda assim produzimos e conseguimos, através de todas as dificuldades, colocar em tão variados e longínquos mercados onde conseguiram chegar e impor-se as marcas portuguesas. As cortiças da planície alentejana, os minérios, as madeiras, as conservas de peixe, os vinhos, as faianças e barros dos nossos artistas e oleiros, as rendas preciosas das nossas bordadeiras humildes, todo esse conjunto de trabalhos e de sacrifícios constitui preciosa riqueza da Nação. Coordenando a actividade nacional, metropolitana e ultramarina, aumentando a sua produtividade, atentos à evolução dos consumos e às possibilidades dos mercados, conscientes das nossas riquezas, seguros dos recursos que conseguimos acumular, um país que nos últimos trinta anos o por entre o respeito do mundo escreveu uma página admirável de recuperação e de. ressurgimento pode e deve olhar o futuro com confiança e com optimismo.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: -É esse Sr. Presidente, o meu voto final perante o aviso prévio do Sr. Deputado Melo Machado.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Botelho Moniz: - Sr. Presidente: anteontem, na Câmara dos Comuns, em Londres, o Governo Conservador britânico foi atacado rudemente pela oposição socialista a propósito da crise de sobreprodução de algumas indústrias provocada pelas medidas anti-inflacionistas e por dificuldades de exportação.
Arauto do Estado-Providência, o deputado trabalhista George Brown condenou a indiferença, inércia ou carência de intervenção que atribuía aos governantes.
E logo o Ministro do Trabalho, San Mac Leod com coragem exemplar, respondeu que só à indústria competia resolver as dificuldades próprias.
No mesmo dia, à mesma hora, o Sr. Deputado Melo Machado, presidente ilustre da Comissão de Economia desta Assembleia, apresentou e, desenvolveu perante nós um utilíssimo aviso prévio que, só por modéstia excessiva, se diz confinado a questões de comércio externo.
Salvo erro de interpretação, a tese exposta. além de abranger toda a vida económica portuguesa, vai mais-longe ainda, porque alcança vários aspectos sociais, metropolitanos e ultramarinos. Conclui pela necessidade de remodelar métodos administrativos, no sentido da maior coordenação das actividades oficiais e privadas.
Objectivo óptimo, se não conduzisse a dirigismo económico mais acentuado.
Foi intenção declarada do interpelante agitar ideias, provocar discussão e, através desta, auxiliar o aparecimento de soluções que conduzam à melhoria do nível geral de vida do povo português, em especial do trabalhador agrícola.
Bem haja pela intenção. É comum a todos nós, sem excepção, bem haja pelo respeito evidenciado pelos bens adquiridos, mantidos ou acrescentados legitimamente pela propriedade e pela iniciativa privadas, bem haja pela condenação categórica da utopia de que

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o progresso de todos só se consegue através da espoliação da riqueza particular.
Até aqui todos os elogios são poucos a uma intervenção que possui o mérito de desprezar fórmulas demagógicas tão em moda nalguns parlamentares de todo o Mundo.
Mas não há rosa sem espinhos, nem beldade sem senão. Por isso o ilustre interpelante não ficará surpreendido pelo facto de correspondermos ao seu convite de agitação de ideias por meio de algumas discordâncias.
A primeira que apresento é fundamental: o domínio económico há que condenar a tendência de, a propósito de tudo ou nada, apelarmos para a intervenção do Estado.
Dizemo-nos corporativistas e negamos a própria essência da corporação ao irmos solicitar dos Governos soluções para problemas que nós próprios criámos ou agravámos. Afirmamo-nos campeões da iniciativa privada, mas quando nos excedemos ou atrasamos nas iniciativas vamos pedir ao Estado que nos dê uma mezinha providencial. Responsabilizamos os Ministros pelas consequências das secas, pelos estragos do frio e das chuvas; porque plantámos demasiado ou colhemos pouco; porque instalámos fábricas a mais; porque há monopólios ou porque, a indústria está demasiadamente dispersa; porque se consente a produção cara, como único meio de salvar pequenas indústrias, ou, ao contrário, porque se provoca a ruína de pequenas indústrias quando, através dos equipamentos modernos, se barateia a produção.
Queixamo-nos de estatismo e somos nós próprios que criamos o estatismo. Dizemo-nos anti-socialistas e somos nós próprios que advogamos soluções socializantes. Combatemos doutrinàriamente o comunismo e aconselhamos os métodos de dirigismo económico aplicados na Rússia Soviética e nas suas colónias europeias e asiáticas.
Exigimos do Estado aquilo que ele não pode dar-nos. Divinizamos o Estado, impomos-lhe tarefas sobre-humanas, como se os governantes, por melhores que sejam, pudessem igualar Deus.
Na verdade, já manifestamos preguiça: pretendemos que outrem resolva os nossos próprios problemas e, se não podemos ser atendidos, choramos, gritamos ou protestamos como as crianças pequenas, que são o símbolo vivo da dependência inconsciente e desorganizada.
Para coordenação económica não faltam organismos em Portugal: nas actividades agrícolas, industriais e comerciais especializadas, comissões reguladoras, juntas e federações. De nenhuma pode dizer-se que trabalhe mal. Arriba delas, a, Comissão de Coordenação Económica. Mais acima, o Ministério da Economia, com os Subsecretariados de Estado da Agricultura e do Comércio e Indústria. Mais alto ainda, o Conselho Económico e o Conselho de Ministros para o Comércio Externo.
Também não faltam fundos: para regularização de preços (Fundo de Abastecimento), para incremento do comercio exportador (Fundo de Fomento de Exportação) e para investimentos industriais (Fundo de Fomento Nacional).
É indiscutível que possuímos órgãos de coordenação mais que suficientes. Até, às vezes, acontece que, por serem tantos órgãos e tão numerosos os problemas de pormenor do dirigismo oficial, se torna materialmente impossível atendê-los na oportunidade melhor. E as resoluções tardam nuns casos dias, noutros semanas, meses ou anos.
Mal das pessoa? Não. Mal do sistema, mal da necessidade de coordenação ou mal dos excessos de coordenação. Coordenar significa substituir a decisão individual, que poderia ser imediata, por resolução individual ou colectiva realizada após série mais ou menos longa de consultas, negociações e discussões.
Para coordenar os países entre si já há quem proponha e até quem aceite autoridades supranacionais. Na ânsia de atingir-se o céu do óptimo acabaremos por construir a Torre de Babel.
Nos negócios internos julga-se encontrar remédio por meio de um Ministério supraministerial.
Quanto mais alto nível atinge a coordenação de pormenor mais demorada se toma a decisão final.
As grandes empresas privadas no estrangeiro e em Portugal encontram-se perante problema semelhante.
Quanto mais grave quanto maior for a vastidão do empreendimento. Simplesmente, souberam resolvê-lo graças a sistemas de organização que permitem assegurar a ligação entre serviços sem impedir a rapidez de decisões.
É caso para dizer que to Estado deve aproveitar os ensinamentos da concorrência particular» ...
Recentemente, o despacho conjunto dos Srs. Ministras da Economia e do Ultramar relativo a exportação de oleaginosas e óleos das províncias ultramarinas para a metrópole foi publicado com cerca de dois meses de atraso, por efeito de ser absolutamente indispensável coordenação ou acordo entre os dois Ministérios. Desta demora resultou que as compras de oleaginosas e óleos estrangeiros, necessárias este ano para cobrir o déficit de azeite, foram e vão ser feitas com milhares de contos de prejuízo em relação às cotações internacionais de Janeiro último.
Outra exemplo: por proposta muito lógica e salutar do Sr. Ministro da Economia, o Fundo de Abastecimento passou, já há anos, a ter orçamento anual, aprovado em Conselho de Ministros e visado pelo Tribunal de Contas. Entrou, assim, em regime de coordenação.
Resultado: estamos no final de Março e os serviços ainda não receberam o orçamento aprovado, com sacrifício grave das empresas que não têm podido cobrar os seus créditos já conferidos e vencidos.
Nem o próprio Plano de Fomento Nacional, cuja execução terminará em 1958, escapa aos inconvenientes que a coordenação apresenta, mesmo quando, como neste caso, ela é indispensável. Tem funcionado como retardador da instalação já prevista de duas indústrias-base - adubos azotados e siderurgia - essenciais à vida económica portuguesa.
Os exemplos citados pelo ilustre interpelante não invalidam o que acabo de dizer. Pelo contrário, parecem condenar excessos de dirigismo de pormenor.
O caso da manteiga é típico: em consequência de se ter criado oficialmente a ilusão de que a zona abastecedora de leite de Lisboa a ser o paraíso das vacas e dos proprietários respectivos, nasceu forte sobreprodução de leite, acrescida, para efeitos de manteiga, com a desnatação parcial de um produto que deveria ser entregue ao consumo em estado natural.
Sobrou leite, sobrou manteiga, houve que armazenar esta em frigoríficos e houve que vender parte dela, rançosa, ao preço do sebo, às fábricas de sabões.
A única solução possível, naquele momento, era efectivamente a exportação da manteiga. Entretanto baixara o preço do produto no mercado interno de 40$ para 35$ o quilograma. Exigiu-se aos produtores leiteiros o sacrifício incomportável de entregarem parte do leite, para a indústria, a preços ruinosos.
Desfez-se a ilusão, procedeu-se ao massacre dos inocentes, que nesta história são apenas as vacas e as vitelas, faltou leite para o consumo, passou a faltar leite paru a indústria e houve que importar manteiga estrangeira, o que também foi a única solução possível nesta emergência.

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Entretanto os produtores de leite e de manteiga continuam em crise. Era fatal que isto acontecesse. Nenhum mérito tive no prevê-lo, há mais de dois anos, nesta Assembleia.
Na melhor das intenções, quiseram fazer-nos felizes u força, e aqui estamos, graças ao dirigismo mui conduzido, mais infelizes do que éramos.
Talvez seja viável, em nações ricas, que o Governo continue a comprar e armazenar os excedentes de produção. Estou desconfiado de que, com o andar dos anos, este processo democrático de aquisição de votos acabará por se tornar ruinoso e impraticável. Deus nos livre de vê-lo implantado em Portugal.
Pode aceitar-se, como medida excepcional, a cumpra e imobilização dos excedentes, pelos organismos próprios da lavoura ou da indústria, com financiamentos bancários ou oficiais, quando se preveja colocação em futuro próximo. Não é sistema capaz de resolver crises de abundância permanente. Pelo contrário, tende a agravar a sobreprodução enquanto se mantiverem preços remuneradores.
É muito mais fácil realizar dirigismo económico no comércio ou na indústria que na agricultura. Não necessito explicar porquê. Mas, em todos os casos, como muito bem acentuou aqui o nosso distinto colega engenheiro Camilo Mendonça, o dirigismo económico só deve ser exercido em alto nível, na generalidade, na orientação superior e nunca nos pormenores. Acrescentarei, como corolário, que convém ser tanto quanto possível indirecto e maleável.
No sector do comércio externo, são exemplos clássicos de dirigismo em alto nível, exercido de fornia indirecta, as quebras de valor da moeda nacional, voluntárias ou consentidas, como fórmula de redução de déficit das balanças de pagamentos, isto é, para fomento de exportações e de turismo e para redução de importações.
É exemplo de dirigismo em alto nível, mas directo, a proibição pura e simples de importações ou de exportações, de que tanto se tem usado e até abusado entre nós.
Frequentemente, queixamo-nos da perda de mercados estrangeiros que outrora adquiriam produtos nossos. E queixamo-nos também, com justiça, de termos u nossa exportação metropolitana e ultramarina concentrada sobre número escasso de produtos tradicionais - vinhos licorosos, conservas, cortiça, cacau, café, etc.-, quando deveríamos multiplicar o número de produtos exportáveis, a fim de dividirmos melhor os riscos naturais do comércio externo.
Ora, na verdade, por medidas de dirigismo directo e de pormenor, perdemos totalmente os mercados estrangeiros compradores de primores agrícolas e já não possuímos organização comercial para os readquirir. Nem valerá a pena ressuscitá-la se, ao mais pequeno prenúncio de carência no mercado metropolitano, surgirem as proibições de exportação.
A Grã-Bretanha, depois da última guerra, adoptou processo inverso: quer o Governo Trabalhista, quero Conservador, para reconquistarem os mercados fizeram exportar para o estrangeiro, durante anos, produtos que ficavam faltando, total ou parcialmente, ao consumo interno.
A opinião pública britânica aceitou corajosamente as privações consequentes, porque, depois de ganha a guerra militar, era preciso vencer a batalha económica. Aqui, em Portugal, a mentalidade é outra: continua, infelizmente, aquela que o Prof. Armando Marques Guedes definia magistralmente em frase lapidar: «Vida barata e algibeira vazia».
Se os ovos sobem dez tostões em dúzia, por efeito da exportação para Espanha, logo a fiscalização intervém para impedi-la. Se o café, que agora abunda no Mundo, viaja para o país vizinho, logo surge um complicado mecanismo que dificulta a exportação e obriga as populações dos concelhos fronteiriços a só poderem adquirir café moído, com mais grão e cevada que café.
Matou-se a produção de batata para exportação na Moita e arredores. Chegou-se, num ano que parecia de falta de fruta, a proibir a exportação de melões, e estes acabaram por ser vendidos aqui mais baratos que as abóboras para consumo de porcos. Lembro-me de ter comprado algumas camionetas a tostão o quilo.
E o que tem sucedido com o azeite português, até mesmo para os mercados ultramarinos e do Brasil?
Conclusão deste capítulo: há que criar espírito comercial, tanto nos governantes da economia como nos governados.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Para reduzir ou eliminar o deficit da balança comercial aconselhasse a realização de operações de compensação. Esta formula surgiu, como se fosse novidade, em consequência da última guerra e deu origem ao aparecimento de uma fauna especial de traficantes internacionais com maiores ou menores aparentamentos políticos. Trata-se, afinal, do sistema primitivo do toma lá dá cá, usado nos tempos em que o dinheiro ainda não estava inventado.
Admita-se, como inevitável ou quase inevitável, nas relações comerciais com países para além da «cortina de ferro». O facto de, fora dessa zona, havermos realizado algumas transacções deste género não deve animar-nos a dar-lhes foros de sistema sempre vantajoso e corrente. A compensação directa não passa de mero expediente ocasional.
Anuncia-se agora como quase concluída uma operação deste tipo entre Portugal e a República das Filipinas, mercê da qual exportaremos entre 14 000 t e 20 000 t de arroz, em troca de quantidade igual de açúcar filipino.
Como medida de emergência para escoamento momentâneo de excedentes, parece, bem. Sob o ponto do vista de encargos não possuo elementos que me permitam pronunciar-me. Mas os orizicultores não podem basear o seu futuro em esperanças de continuidade de compensações. Está sucedendo na cultura do arroz o que acontece em muitos sectores da vida económica nacional.
Os preços acham-se estabelecidos de fornia a assegurarem algum lucro aos agricultores menos favorecidos pelas condições regionais. Portanto, garantem remuneração superior aos das regiões onde a produção é mais económica.
Se se reduzir o preço do arroz, impede-se o cultivo em grandes áreas do Centro do País, onde sai mais caro, e criam-se dificuldades graves aos agricultores respectivos.
Se não baixa o preço do arroz, continuará a sobreprodução e cria-se outro problema que inquietará permanentemente os governantes e os governos.
Há que escolher entre dois males, mas torna-se preciso escolher enquanto é tempo. Racionalmente, as regras de produtividade conduziriam à baixa de preço. Social e politicamente, há que evitar a ruína dos orizicultores da Beira Litoral, onde a crise agrícola é neste momento mais acentuada que noutras regiões.
Entretanto, não desanimemos em relação ao aproveitamento das grandes obras de irrigação concluídas ou em curso. Hão-de ser úteis. Hão-de constituir título de glória do Estado Novo.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

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O Orador: - Simplesmente, por agora, tal qual já sucedeu noutros países que as realizaram antes de nós, encontramo-nos no período de transição ou de adaptação, que é uma espécie de parto doloroso. Mas sem rato nem gato.
Terminando o comentário ao sistema de coordenação que seria preciso impor para generalizar a prática, de compensações, acrescentarei ainda o seguinte: estas operações são, por si próprias, inevitavelmente mais demoradas que as transacções correntes. Em vez de um só comprador e um único vendedor, exigem, pelo menos, dois compradores e dois vendedores, além dos intermediários habilidosos que aparecem pelo meio.
Se às demoras próprias juntássemos as provenientes da intervenção ou coordenação oficial, destinada a obter o comprador e o vendedor adicionais, indicados pelos Governos, complicaríamos ainda mais a transacção, atrasaríamos as decisões e talvez acabássemos por perder oportunidades.
Suponhamos o caso citado de uma grande, barragem. Em geral os equipamentos adquirem-se, não num único país, mas em diversos. E dentro de cada país compram-se a vários fornecedores. Numa compra normal, só é indispensável coordenar os prazos de entrega das fracções encomendadas, de forma que o atraso de um fornecedor não provoque o retardamento geral da colocação em marcha do empreendimento, juntando-se a isto a complicação dos entendimentos com cada país e cada fornecedor acerca de pagamentos em mercadoria, conclui-se pela inviabilidade do sistema.
Além disso, em muitos casos os equipamentos são pagáveis em prestações, a prazos que atingem anos. Como conciliá-los com troca de produtos? Que organismo especial haveria que criar ou aproveitar para o efeito?
Por último, em regime, do compensação os equipamentos sairiam mais caros, fariam aumentar os encargos de 1.º estabelecimento e o custo de produção. Porquê? Porque, em operações deste género, Portugal achar-se-á sempre, inevitavelmente, em condições de inferioridade em relação aos países vendedores das máquinas e acessórios. Nós precisamos desses equipamentos; eles não precisam dos nossos produtos.
Para que no-los comprem teremos de aceitar, explícita ou veladamente, o encarecimento daquilo que nos vendem.
No decorrer do debate ouvi oradores infinitamente mais categorizados do que eu preconizarem a criação ou elevação de taxas sobre vinhos na zona da Junta Nacional, a queima dos vinhos de várzea, a ressurreição do Ministério da Agricultura ou a instalação em plano infraministerial, de um novo órgão coordenador das actividades agrícolas.
Quanto a organismos novos, já opinei pela negativa, porque quantos mais forem mais dificultam e demoram a coordenação. Quanto aos vinhos de várzea, já escutámos as vozes dos Deputados do Ribatejo a demonstrarem que, quantitativamente, são muito menos do que o vulgo supõe. E quanto às taxas, não compreendo como possam suportá-las, produtos francamente desvalorizados e já, talvez, excessivamente onerados.

O Sr. Proença Duarte: - Mas os vinhos de várzea também suportam taxas porque a Junta Nacional do Vinho vive precisamente das taxas que os retalhistas cobram sobre cada litro de vinho, à custa da produção.

O Orador: - O orador a que me estava referindo falou sobre a necessidade de imobilização dos vinhos de várzea, a fim de declinar esses vinhos exclusivamente à queima para aguardente.

O Sr. Melo Machado: - O que era preciso era consumir a aguardente em excesso que já se acha imobilizada, sem necessidade de novas imobilizações.

O Orador: - Permito-me não acreditar na eficiência das taxas como remédio para a crise vinícola, a não ser que lhes acrescentemos um d e um a ...
Entretanto, consolemo-nos com a notícia de que vai ser autorizada a instalação de uma nova fábrica de cerveja ...
Para terminar a ideia mestra do aviso prévio do ilustre deputado Melo Machado é melhorar o nível de vida da população portuguesa, em especial do trabalhador braçal agrícola, que está sendo, normalmente, o pior remunerado entre todos os operários. É indiscutível que, se lhe aumentarmos o poder de compra, crescerá o consumo de géneros agrícolas e industriais, o que permitirá desenvolver a produção.
Todos sabemos que existe diferença fundamental entre «aumento do poder de compra» e «aumento de salários».
De nada serve elevar salários se por efeito de agravamento de custo de produção, ou em consequência de fenómenos inflativos, os preços de venda subirem na mesma escala.
Foi aqui citado o exemplo revolucionário de Henrique Ford I, a que será justo acrescentar outra citação: a do actual esforço reformador de seu neto. Henrique Ford II.
Em princípio, advogo sistemàticamente o aumento de salários e vencimentos como forma de desenvolver a produção. Mas há necessidade de distinguir entre as possibilidades das industrias fortemente mecanizadas o as doutras indústrias, como as agrícolas, que empregam volume grande de trabalho manual.
Entretanto, se estudarmos com olhos de ver a influência dos salários nos custos de produção, concluiremos que, como regra geral, à elevação dos salários corresponde elevação relativamente menor dos preços de venda e, por consequência, melhoria geral do poder de compra.
Portanto, no mercado interno nenhum inconveniente aparece à primeira vista. Mas como fomentar a exportação se elevarmos os preços?
A pequenez do mercado lusitano força-nos a trabalho escravo em favor do estrangeiro. Por mais duro que seja confessá-lo, o problema não pode obter solução rápida. Mas gradualmente, talvez me«mo em progressão constante, atingiremos o objectivo comum de elevação do poder de comprar e do nível de vida graças à instalação de fontes de energia e de indústrias novas bem apetrechadas.
Algumas, como a de azotados, promoverão directa e indirectamente, pela redução dos preços actuais de vida, rendimento melhor na agricultura. Todas absorverão braços e obrigarão a elevar salários até aos trabalhadores da terra.
Mas então os empresários agrícolas já poderão suportar esse acréscimo de encargos, por estar compensado, quer pela redução doutras despesas, quer pela mecanização provocada pela falta de trabalhadores, quer ainda pela maior produtividade das empresas.
Atingiremos com segurança o nosso objectivo se não nus preocuparmos com críticas demagógicas. Não aceitemos como verdadeira a divergência de interesses entre produtores e consumidores. Condenemo-la como mentira económica.
Todos os homens que trabalham são produtores. E, como tal, pelo aumento voluntário ou involuntário da produtividade própria, e até indirectamente, pelo acréscimo dos rendimentos alheios, conseguirão realmente ganhar mais poupar mais e consumir mais, melhorando assim as condições de vida das famílias a

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seu cargo e contribuindo para o progresso seguro da Nação inteira.
A economia de um país corporativo e cristão constitui conjunto interdependente que conduz, natural e benèficameute, a mais ampla distribuirão da riqueza: o benefício de uma parcela gera automaticamente o benefício de todas. Os lucros aplicados em novo investimentos económicos vão subindo continuamente e criam novos dadores de trabalho. Mesmo os lucros gastos em bens de consumo tornam possível o progresso doutros trabalhadores.
Tenhamos fé no futuro económico de Portugal. O que está feito respondo cada vez melhor pelo que somos capazes de fazer.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Pereira Viana:- Pelo ilustre Deputado Sr. Melo Machado foi trazido à Assembleia e anunciado em aviso prévio um assunto de extraordinária importância para a economia do País.
Tratou-o S. Ex.ª com aquela competência o clareza que sempre põe nos assuntos que discute nesta Câmara, contribuindo para o completo esclarecimento da maioria com um estudo amplo, profundo e completo.
Outros Srs. Deputados, igualmente ilustres, fizeram ouvir a sua esclarecida voz nesta tribuna, desfiando através dos seus magníficos discursos toda a emaranhada teia em que o problema do comércio externo anda envolvido.
Não tenho pretensão de entrar na análise do assunto, cuja transcendência é superior aos meus conhecimentos, mas entendo não dever perder esta oportunidade, para trazer uns apontamentos à Câmara sobre o papel que uma marinha mercante organizada em moldes eficientes pode desempenhar na realização das operações do comércio externo, e as vantagens que do eficaz aproveitamento dos seus navios podem resultar para a economia nacional.
Conhecem VV. Ex.ªs - e eu próprio já tive oportunidade de a ela me referir aqui - a forma como alguns países marítimos utilizam os seus navios, quer no comércio externo, quer ao serviço do estrangeiro, para a angariação de divisas com que mantém o equilíbrio das suas balanças comerciais.
Já aqui mencionei também a contribuição dos nossos navios para a balança de pagamentos e a forma como ela tem vindo a aumentar à medida que o desenvolvimento da frota se vai operando.
Convencido que estou de que a renovação da marinha mercante nacional foi uma das iniciativas de maior envergadura e que de forma bem acentuada pode contribuir para o progresso económico do País, sem falar mesmo no valor político da frota, que si últimos acontecimentos da Índia se têm encarregado de patentear, ou na sua importância económico-social, sustentando milhares de famílias que vivem da própria indústria dos transportes marítimos ou das actividades a ela ligadas, procurarei referir-me agora à sua valorização no duplo papel de abastecimento do País e de contribuirão para o equilíbrio da posição cambial.
Para tal começarei por lembrar a VV. Ex.ªs que 99 por cento do movimento de importação e exportação, isto é, a quase totalidade do comércio externo, se faz por via marítima. Quer isto dizer que se não dispuséssemos de navegação própria teríamos de confiar inteiramente a estrangeiros o transporte das mercadorias, pagando os respectivos fretes em moeda que viria do País.
E sabem VV. Ex.ªs a quanto isso corresponderia?
Não é fácil encontrar o número exacto, mas poderemos ter uma ideia aproximada do seu valor se tomarmos para ponto de partida o montante dos fretes brutos cobrados pela navegação nacional.
Está apurado, com efeito, que no ano de 1954 as receitas brutas dos navios do longo curso e cabotagem totalizaram 1 482 131 contos e que o movimento de mercadorias efectuado pela navegação nacional andou por cerca de 40 por cento do movimento total dos transportes por mar.
Atribuindo uma importância igual aos fretes a pagar aos navios estrangeiros, que movimentaram 60 por cento das mercadorias entradas e saídas, não andaremos longe da verdade e firmando, para não pecar por excesso, e tendo em conta que nas receitas brutas da navegação nacional estão, incluídas as receitas relativas ao transporte de passageiros que o valor anual dos fretes absorvidos no tráfego relativo ao comércio externo deve representar um mínimo de 3 milhões de contos.
E como as importações são superiores às exportações, a grande maioria da importância correspondente a estes fretes é da conta do País. Quanto maior for, portanto, a capacidade de transpor-te da navegação nacional menor será o frete a pagar aos navios estrangeiros, isto é, a importância a sair do País sob forma de dívidas.
Poderão parecer exagerados os números apresentados, mas essa impressão desaparecerá se pensarmos que o custo dos fretes marítimos assume valores elevados, em geral desconhecidos.
Para mais perfeito esclarecimento basta considerar que um simples carregamento de 10 000 t de trigo dos Estados Unidos para Portugal, ao frete actual de 12 dólares por tonelada, paga de transporte 120 000 dólares, ou sejam: 3430 contos.
Num mau ano agrícola é normal a importação de 300 000 t ou mais, e teremos que contar então, só para frete, com a despesa de 104 400 contos, importância esta bem superior ao custo de um bom navio de carga, e que ficará em grande parte no País e dispusermos de navegação própria, mas que será totalmente exportada se tivermos de recorrer à navegação estrangeira. Só nas importações feitas no ano findo, através da navegação nacional, de alguns produtos, como óleos minerais em rama, combustíveis líquidos, carvão, folha-de-flandres, ferro, aço, material de guerra, asfalto, papel de impressão, fosforites, adubos, açúcar, bacalhau, etc., despenderam-se em fretes mais de 435.000 contos.
As verbas citadas dão-nos uma ideia mais nítida do custo dos fretes marítimos e também dos cambios exportados, sempre que há necessidade de recorrer aos navios estrangeiros. E, infelizmente, essa necessidade, ou, antes, esse recurso à navegação estrangeira, verifica-se todos os dias, por, como se verá, no comércio externo a comparticipação da navegação nacional ser bem inferior à da navegação estrangeira.
Ora a renovação da marinha de comércio, fazendo parte da reconstrução económica do País, foi uma das iniciativas de grande vulto, em que se gastaram já mais de 4 milhões de contos. Na organização do respectivo plano contou S. Ex.ª o Ministro da Marinha com a possibilidade de acorrer a, pelo menos 60 por cento das necessidades de transporte por mar.
A tonelagem correspondente a esse plano foi já concluída e, apesar da expansão comercial que se vem notando, aquela percentagem não foi ainda atingida.
Significa isto que há ainda tonelagem desaproveitada ou, o que é o mesmo, que as possibilidades que os navios nos oferecem não estão a ser devidamente utilizadas.

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Ora, estando o tráfego entre portos portugueses reservado à navegação nacional, e sendo desviada para este tráfego apenas a tonelagem que dá satisfação às necessidades correntes, deve ser a tonelagem que anda no tráfego com o estrangeiro que não é completamente aproveitada nas importações normais.
É, de facto neste tráfego que se desperdiçam por vezes os serviços da frota nacional, por se desviarem para navios estrangeiros fretes que a navegação portuguesa poderia fazer, o que, se torna precária a exploração desta, é evidentemente prejudicial à economia do País.
A contribuição que a marinha mercantil pode oferecer para o equilíbrio cambial assume, de facto, dois aspectos: primeiro diz respeito à poupança de divisas correspondente ao pagamento dos fretes, um escudos, aos navios nacionais que se encarregam dos transportes. A falta desses navios implicaria, o recurso à navegação estrangeira e, por conseguinte, o pagamento dos fretes em moeda estrangeira também.
O segundo diz respeito a real entrada de divisas estrangeiras ganhas pelos navios portugueses nos transportes efectuados entre portos estrangeiros.
Nem sempre é possível trabalhar nesta última modalidade, que exige, por um lado, navios disponíveis e, por outro, taxas compensadoras no mercado internacional de fretes.
A primeira modalidade, porém, proporciona oportunidade manifesta de evitar saída de divisas, aproveitando os navios nacionais afectos a carreiras regulares que trabalham em concorrência com a navegação estrangeira e oferecem as mesmas taxas de frete.
É certo que o auxílio com que a marinha mercante vem contribuindo para a balança de pagamentos no que respeita a transporte de mercadorias tem estado a aumentar de ano para ano, conforme se verifica do quadro junto:

Em contos
1951 ................. 423 000
1952 ................. 453 000
1953 ................. 461 000
1954 ................. 440 000
1955 ................. 569 000

Como se vê, de 1951 a 1955 houve um aumento de 35 por cento no valor da contribuição bruta oferecida pela navegação nacional.
Se a estas verbas juntarmos as receitas do transporte de passageiros, de e para portos estrangeiros, receitas que significam divisas poupadas, quando as passagens são adquiridas em Portugal, e cambiais entrados, quando as passagens são adquiridas no estrangeiro, e que devem computar-se em perto de 200 000 contos no ano de 1955, no transporte de 25 000 passageiros na carreira da América Central e de 24 000 na carreira do Brasil podemos concluir que a marinha mercante representa uma importante actividade económica, cujos serviços muito interessa aproveitar.
Será a contribuição actual suficiente?
Poderá tirar-se da marinha mercante um maior rendimento na chamada exportação e invisíveis?
Vejamos o que se passa em outros países.
Na Inglaterra a navegação contribui anualmente com mais de 200 milhões de libras para a balança dos pagamentos externos. Mais de 80 por cento do movimento dos seus produtos é efectuado pelos seus navios.
No ano findo, e devido à alta dos fretes, a contribuição líquida para a economia do país andou pelos 250 milhões de libras, ou sejam 20 milhões de contos.
Na Noruega a indústria dos transportes por mar é de longe a maior indústria nacional.
País pequeno, com pouco mais de 3 milhões do habitantes, possui a terceira frota mundial, na qual emprega 45 000 homens.
Os seus navios correm todos os mares do Globo, angariando divisas de que depende o equilíbrio da balança comercial.
Calcula-se em 80 milhões de libras, ou sejam mais 6 milhões de contos, a sua contribuição no ano de 1955.
A Suécia teve no ano findo um excedente de importação sobre a exportação da ordem dos 1345 milhões de coroas. Espera-se que a contribuição da navegação atinja 1030 milhões (cerca de 4 milhões de contos) e compense assim, em parte, o deficit da balança.
Na Dinamarca, também as receitas da navegação permitem cobrir cerca de 40 por cento do deficit na balança de pagamentos.
A marinha mercante nacional não tem ainda desenvolvimento para que as suas receitas em divisas possam influenciar de forma sensível o equilíbrio da balança de pagamentos.
Está, evidentemente, a dar bom rendimento do avultado encargo do seu custo, mas está longe de poder considerar-se ainda um dos pilares sobre que há-de assentar a economia do País para cobrir o deficit provocado pelo excesso da importação sobre a exportação.
Não devemos, porém, esquecer que Portugal é um país marítimo, por tradição, e que o recurso ao mar poderia constituir, além de uma necessidade política e uma solução para o emprego do excedente populacional, um meio fácil de angariação de cambiais para auxílio do equilíbrio monetário.
Ao contrário do que acontece em outros países, temos uma disponibilidade de inscritos marítimos que daria para guarnecer uma frota três ou quatro vezes superior à que possuímos.
E o facto de dos 865 000 contos emprestados pelo Estado terem sido já amortizados 81 500 contos e recebidos juros no total de 142 500 contos poderia levar à ideia de insistir na expansão da frota, com o sentido de utilizar maior número de navios nas transacções comerciais com o estrangeiro, aumentando de forma substancial as receitas de divisas.
Não bastará, porém, o aumento de tonelagem. Necessário é também criar a mentalidade favorável à navegação marítima, o espírito mercante, como lhe chamou S. Ex.ª o Ministro da Marinha no seu notável despacho n.º 50. de 18 de Setembro de 1955, sem o qual a expansão dos transportes marítimos poderia ficar condenada a um fracasso.
É que as resistências para canalizar as mercadorias para o* nossos navios existem ainda, o parte da rapacidade global da actual trota mercante é desperdiçada.
Segundo os elementos estatísticos coligidos pela Administração-Geral do Porto de Lisboa referidos ao ano de 1953, a movimentação de mercadorias entradas e saídas dos portos comerciais portugueses, tanto no continente e ilhas como do ultramar (comércio geral), foi de 10 824 000 t, das quais apenas 5 917 893 foram transportadas em navios nacionais.
A posição assumida pela nossa frota no comércio geral foi, portanto, apenas de 35 por cento, isto é, pouco mais de um terço.
Desdobrando estes números, para melhor análise da situação, verifica-se que nos portos da metrópole a posição no que respeita ao comércio externo, não melhorou sensivelmente, e segundo os números oficiais tirados da estatística comercial da metrópole, a percentagem da comparticipação da navegação nacional foi a seguinte:

Percentagem

1951 ......... 44
1952 ......... 48
1953 ......... 47
1954 ......... 44

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Mas já em Angola o movimento tem evoluído desfavoravelmente e a posição da marinha mercante nacional, segundo ainda o Boletim do Porto de Lisboa, passou de 53,64 por cento em 1951 e 53,64 por cento um 1952 para 44,52 por cento em 1953.
A situarão é pior no que respeita a Moçambique. Praticamente, só o movimento de mercadorias entre a metrópole e aquela província é feito sob pavilhão nacional, e isso, certamente, porque a reserva de tráfego o exige.
Em 1951 a movimentação realizada pelos nossos navios foi de 14,87 por cento do total; em 1952 chegou a 16,43 por cento, para em 1953 descer de novo para, 14,98 por cento.

O Sr. Pereira Jardim: - Eu queria perguntar se essa percentagem que a marinha mercante tem sobre o tráfego local de e para os portos de Moçambique se refere também ao tráfego vindo de portos estrangeiros e em trânsito por Moçambique para os territórios vizinhos.

O Orador: - A marinha mercante nacional não pode fazer tráfego de Moçambique para o estrangeiro.
O Sr. Pereira Jardim: - Portanto, os números não são tão graves e não podem ter o significado de revelar desinteresse pela marinha mercante nacional, uma vez que não podemos comandar ou influir nos afretamentos das mercadorias que por Moçambique só passam em trânsito.

O Orador: - Exactamente, porque todo o tráfego entro portos do território nacional é feito obrigatoriamente em navios portugueses.

O Sr. Melo Machado: - Portanto, a responsabilidade de que sejam só 14 por cento que vêm na marinha nacional não é uma questão de desinteresse; há outros factores que influem nesses números. Foi isto, creio eu, que se quis dizer há pouco, se bem compreendi.

O Orador: - Já várias circunstâncias que impedem a navegação nacional de fazer esse transporte para o estrangeiro.

O Sr. Melo Machado: - V. Ex.ª pode indicar-me as causa» o as determinantes dessa baixa percentagem?

O Orador: - As causas residem no facto de a navegação nacional se limitar ao tráfego entre os portos de Moçambique e a metrópole, não transportando, por isso, carga para o estrangeiro.
Não há ainda elementos estatísticos concretos para verificar a evolução destes tráfegos, mas as perspectivas não são favoráveis.
De facto, referindo-nos propriamente ao comércio especial da metrópole, as estatísticas fornecem-nos os seguintes elementos (importações e exportações reunidas):

Toneladas
1951 ................ 5 311 830
1962 ................ 5 082 879
1953 ................ 4 784 325
1954 ................ 5 472 300

Deduzindo destes números a parte relativa ao tráfego entre portos metropolitanos e ultramarinos, por lei reservado à navegação portuguesa, obteremos as seguintes percentagens, que dizem respeito apenas às transacções comerciais da metrópole com o estrangeiro efectuadas através da marinha nacional:

Percentagem
1951.............. 38
1952.............. 39
1953.............. 41
1954.............. 36

No que respeita ao comércio externo de Angola com o estrangeiro apenas, apuram-se, os seguintes números relativos à participação da navegação nacional:

Percentagem
1951............ 28
1952............ 18
1953............ 15
1954............ 17

Para Moçambique não há dificuldade em fazer apuramentos: a navegação nacional não participa no tráfego do comércio externo de ou para o estrangeiro.
Somos assim tristemente levados a concluir que a participação da marinha mercante nacional na movimentação geral das cargas de e para o estrangeiro está longe de atingir os 60 por cento que se previam no plano de renovação e não chega mesmo aos 40 por cento.
Se formos examinar o que se passa em outros países marítimos que se servem da navegação própria, para a consolidação da sim estrutura económica, verifica-se que a percentagem relativa à utilização dos seus navios é bastante superior e atinge, por vezes, mais de 80 por cento.
Se considerarmos ainda que, como se disse, o tráfego comercial é feito na quase totalidade por mar, teremos de reconhecer que a participação dos navios nacionais nesse tráfego é bastante reduzida.
E como aumentá-la? Levando naturalmente os carregadores a, patriòticamente utilizarem a navegação portuguesa; mas logo que acabam as guerras, vêm novamente as conferences e o Governo torna a fazer novo contrato. Nos termos deste contrato, como aconteceu ùltimamente com o material de caminho de ferro, só são utilizados os navios das conferences. Os nossos não são admitidos por não estarem filiados.

O Sr. Carlos Borges: - Mas não se pode revogar?

O Sr. Melo Machado:- A isso não pode o Sr. Deputado responder.

O Sr. Carlos Borges:- Perfeitamente, mas o que eu queria dizer é se conhece
Qualquer preceito legal que o impeça !

O Orador: - Não conheço; mas, como estava a dizer, no caso de haver necessidade de transportar mercadoria para os caminhas de ferro, essa mercadoria é entregue aos navios da conference, os quais devolvem depois um bónus de fidelidade, que torna mais barato o frete. Devo, no entanto, dizer, por outro lado, que os fretes da conference não são os da concorrência, isto é, os fretes do mercado internacional.

O Sr. Carlos Borges: - Assim já se pode compreender ...

O Sr. Manuel Vaz: - Compreende-se, mas o que não se percebo é que, apesar de tudo isso, o Governo da província continue a manter o contrato, visto de um contrato se tratar.

O Orador: - A reciprocidade das transacções comerciais tem de admitir-se certamente. E se os países que compram os nossos produtos enviam os seus navios para os transportar, porque não há-de Portugal fazer o mesmo aos produtos que importa do estrangeiro?
A cortiça e o vinho do Porto saem na grande totalidade sob bandeira estrangeira, mas porque, não hão-de ser conduzidos em navios nacionais alguns milhares de automóveis e de scooters que anualmente se

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importam? Porque não há-de ser permitido aos navios nacionais participar livremente no transporto de material dos caminhos de ferro adquirido no estrangeiro por Moçambique? Porque se não aproveita a navegação nacional para o transporte do material importado para o reequipamento industrial do País?
Fere a nossa sensibilidade patriótica ver que muitas vezes em igualdade de condições, se dá preferência à navegação estrangeira, aduzindo razões que de forma alguma podem merecer consideração.

O Sr. Manuel Vaz: - Podia V. Ex.ª informar porque é que não se realiza essa política que acaba de preconizar?

O Orador: - O caso deponde do patriotismo das pessoas que importam mercadorias. Se o consignatário do transporte tem habilidade para levar o carregador a preferir os navios estrangeiros, os barcos portugueses perdem esses transportes. Há milhares de toneladas de material que vêm do Norte da Europa para os caminhos de ferro, barragens e metropolitano; pois para se conseguir que ele venha em navios portugueses nas mesmas condições em que é transportado nos navios estrangeiros torna-se preciso andar a pedir de chapéu na mão.

O Sr. Pereira Jardim: - Há formas indirectas de estimular o patriotismo dos consignatários. V. Ex.ª sabe que já se fez assim. Portanto, parece que há maneira de o conseguir.

O Orador: - Efectivamente, isso já se fez quando V. Ex.ª esteve no Governo.
Do relatório do Banco de Portugal referente ao ano findo, que tantos dados interessantes à vida económica nacional contém sempre, conclui-se que houve uma acentuada subida da importação, tendo-se comprado no estrangeiro 3 446 000 t de mercadorias.
Destas, foram as matérias-primas e as máquinas, aparelhos, veículos, etc., que atingiram números mais altos. São importações que o País não pode dispensar, quer para a laboração das suas indústrias, quer para o seu equipamento industrial.
Ora, sabido como é que a participação da marinha mercante nacional no nosso comércio externo é mais avultada nas importações que nas exportações, pois os países importadores reservam aos seus navios, tanto quanto possível, o transporte de mercadorias que importam, logo salta à vista que. sendo nós um país essencialmente importador, não faríamos nada de extraordinário sendo idêntica política, que está de harmonia com os nossos interesses.
Procedendo assim pouparíamos cambiais, que bem preciosos nos são para as importações que temos necessidade de fazer, daríamos condições de vida mais desafogada à nossa marinha mercante, que se debate no tráfego com os portos estrangeiros com a dificuldade proveniente do acentuado desequilíbrio entre as cargas de ida e as de retorno, que torna a exploração mais onerosa, e nem sequer seria de invocar o estafado argumento da diferença de fretes, visto que os nossos navios praticam nesse tráfego os do mercado internacional.
Para Portugal, que, realça quase 100 por cento do seu comércio externo por mar, a independência económica implica, naturalmente, o uso da navegação própria, a libertação da dependência de navios estrangeiros, que em momentos de emergência nos abandonam para servir os seus países e no tempo de paz escolhem os tráfegos que lhes dão maiores rendimentos.
Uma marinha, mercante forte e desenvolvida constitui, indiscutivelmente, um dos pilares da independência económica, e a utilização dos navios nacionais deveria estar sempre na mente daqueles que gozam da prorrogativa de exercer o comércio com países estrangeiros.
A expansão comercial exige, naturalmente, transportes, mas, se tivermos de pagar os seus serviços um moeda estrangeira, perde-se parte dos benefícios que o incremento das transacções nos pode trazer. E, justamente no desenvolvimento da frota e na utilização dos seus serviços procura a economia nacional garantir os transportes por mar com o menor dispêndio de cambiais.
O Governo Português não pratica a discriminação da bandeira nem impõe, como tantos outros, embora encapotadamente, vendas C. I. F. e compras F. O. B. ou ainda a condição de só conceder licença do importação quando o transporte for efectuado em navio nacional.
Este facto, porém, não pode servir de pretexto para que se sacrifiquem os interesses do Estado às conveniências particulares e se desperdicem valores que podem e devem ficar no País.
É dever patriótico de todos os portugueses secundar o elevado critério que preside à nossa administração política e contribuir desta forma para a prosperidade da Nação.
E como complemento de todas as medidas que têm sido superiormente adoptadas para aumentar o nível do rendimento nacional, a utilização integral da marinha mercante não pode deixar de se impor.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Sousa Machado: - Sr. Presidente, Srs. Deputados bem haja o nosso ilustre colega Melo Machado pelo seu oportuno aviso prévio, porque veio agitar problemas, focar situações e apontar aspectos da vida económica da Nação que impõem estudo imediato e soluções urgentes.
Efectivamente, é estranha a sensibilidade da nossa economia, que nas suas reacções nos apresenta a cada momento aspectos deveras singulares, tais como caso da manteiga, ainda há pouco em crise de excesso do produção, que levou a provocar a baixa do seu preço (medida que julgo discutível), para pouco depois passarmos ao inverso isto é, a uma carência que a tudo causou fortes preocupações, obrigando a Administração a recorrer à importação do produto.
Também a produção do arroz começa a tornar-se embaraçosa com o seu excesso de produção, problema que tende a agravar-se com a extensão que vim tomando a área. destinada à sua cultura e que as obras de hidráulica agrícola mais virão a acentuar.
Não falo do problema do vinho, mais complexo, porque se tornou, por assim dizer, universal, uma vez que grande número de países passaram de importadores e exportadores.
Defendeu o nosso ilustre colega que se procure fazer a exportação dos nossos excedentes de produção. Nada mais legítimo nem mais lógico: mas também apontou as dificuldades com que esbarramos nesse domínio, dificuldades que nem sempre é possível dominar.
Dentro dessas dificuldades temos preços, que paradoxalmente, se apresentam baixos lá fora se tentamos exportar e altos quando importamos.
O nosso ilustre colega Eng. Camilo Mendonça fez notar ainda, entre as dificuldades com que deparamos, a qualidade inferior dos nossos produtos em relação aos estrangeiros. Quanto a mim, isto não apre-

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senta uma regra absoluta, pois muitos artigos produzimos já que nem em qualidade nem em apresentação são inferiores aos que no estrangeiro se encontram. O que se verifica muitas vezes é que, apesar dos baixos preços da mão-de-obra nacional em relação aos da maioria dos outros países, nem mesmo assim, dispondo de iguais progressos técnicos, conseguimos, fabricar pelo mesmo preço.
Para ilustrar a minha afirmação posso apresentar a VV. Exas. um exemplo típico.
Fabricando-se em Portugal bolacha nas mesmas condições técnicas que em Inglaterra, não conseguimos concorrer com ela no mercado da nossa província de Angola, apesar dos seus altos salários em relação aos nossos, e isto porque as matérias-primas fornecidas à nossa indústria são mais caras do que as inglesas. A farinha, que lá custa cerca de 2$70 o quilograma por condicionalismo criado, a nós custa-nos em média 4$00; o açúcar para a indústria em Portugal é agravado ainda com uma taxa de 2$25 em quilograma (e isto não é nada em comparação com o que foi durante a guerra, em que tivemos de suportar uma taxa de transporte que ia a 6$ por quilograma).
Com os óleos comestíveis sucede o mesmo, e ainda agora na importação da manteiga, pois, apesar de à indústria se ter destinado um produto de segunda qualidade, nem por isso beneficiou da diferença de preço, pagando-a à tabela, isto é, a 31$60.
Nestas condições, não é possível concorrer com o estrangeiro, mesmo que a nossa qualidade seja igual ou até melhor, porque o preço o não consente.
Não devemos, porém, esquecer que as nossas exportações (metrópole) se situam na ordem dos 5 milhões de contos, isto é, cerca de 12 por cento do produto bruto nacional (as dos Estados Unidos ascendem apenas a 5 por cento, salvo erro), o que me leva a crer que, antes daquelas, nos deve merecer particular atenção o comércio interno, e este só pode evoluir favoravelmente desde que se criem as condições necessárias para um mais elevado poder de consumo.
Tem sido esta, de resto, a política seguida em quase todas as nações do hemisfério ocidental.
Por outro lado, temos de nos capacitar de que, dada a tendência claramente manifestada por todos os países de procurarem bastar-se a si mesmos na produção de artigos de consumo corrente, poucas ilusões podemos ter quanto à possibilidade de conseguirmos modificar ;a nossa situação à custa dos mercados externos.
O que importa, fundamentalmente, é:

1) Equiparmo-nos em qualquer caso o melhor possível ;
2) Desenvolvermos ao máximo o nosso poder de consumo.

Relativamente a este segundo ponto da questão, conhecem VV. Exas. a minha maneira de pensar, que já tive oportunidade e a honra de expor nesta Assembleia.
O nosso principal problema económico é o de conferir à grande massa populacional um razoável poder de compra, que hoje está longe de possuir. Entre as massas fortemente diminuídas de recursos encontra-se a população rural, cuja situação continua a pedir remédio em primeiro lugar.
Conseguido esse remédio, facilmente nos será possível também obter os meios para lançar no mercado externo os excedentes que venham a aparecer, usando dos mesmos processos que os outros países utilizam.
Haja em vista, por exemplo, a França, glande país agrícola, com excepcionais condições de solo e clima, única nação europeia a ocupar lugar entre os países exportadores de trigo. Ora o preço deste cereal em França é superior ao nosso; não obstante, não deixa de concorrer com os seus excedentes de produção ao comércio internacional, acompanhando os respectivos preços, que se situam na ordem dos 2$.
Isto, porém, não é possível sem que internamente se crie uma economia suficientemente robusta para suportar operações desta natureza.
Para atingir este objectivo recomenda-se à produção, particularmente à agricultura, que evolua no sentido de obter maiores produções unitárias à custa de um mais racional aproveitamento da terra e de processos técnicos adequados.

O Sr. Melo Machado: - V. Exa. está convencido de que isso se possa obter sem assistência técnica?

O Orador: - Ainda não cheguei a esse ponto. No entanto, devo dizer que nas minhas considerações há um ponto que se refere a um mais racional aproveitamento da terra, mediante processos técnico adequados.

O Sr. Melo Machado: - Mas para isso precisamos de assistência. A própria América tem uma assistência técnica permanente. Ora, se não temos nada disso, como havemos de evoluir?

O Orador: - Não vejo a forma de conseguir este objectivo partindo de uma carência confrangedora de meios; os técnicos, porque as organizações oficiais não dispõem do desenvolvimento preciso para atingir todos os sectores, apesar de lhes não faltar boa vontade e pessoal capaz, mas insuficiente em número; os financeiros, porque a lavoura, e refiro-me particularmente à que só situa ao norte do Tejo, vive em grande penúria.
Sem dinheiro, ou sem perspectivas de um rendimento seguro, não pode haver investimentos que criem progresso e riqueza.
Julgo, pois, e isto sabemos nós ,que se fez lá fora em larga medida, ser indispensável dar à vida agrícola a garantia de desafogo económico e, depois, estejamos certos de que ela prontamente corresponderá com entusiasmo e brio à chamada.
Ao fazer estes comentários, de forma alguma deixo de ter presente que produtos temos que só a exportação pode absorver, como sejam os vinhos licorosos e, em certa medida, os comuns, as nossas conservas, a cortiça, resina, etc., e não basta, pelo menos para os vinhos e as conservas, cruzar os braços à espera que no-los retirem: é indispensável continuar a activar por todas as formas, como nesta Câmara múltiplas vezes se tem recomendado, uma propaganda intensiva, bem dirigida e racional, pois ela é uma forca de primordial importância para a expansão da venda de qualquer produto. Sabemos que é um expediente caro, mas não pomos em dúvida a sua eficiência quando oportuna e inteligentemente conduzida.
Termino, pois, Sr. Presidente, por fazer votos tão sinceros como ardentes para que deste debate resultem novas directrizes, novos processos que dinamizem ;as nossas faculdades criadoras para atingirmos no mais breve prazo um nível económico que dê a todos os portugueses uma vida, embora modesta, desafogada e digna de ser vivida.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

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23 DE MARÇO DE 1956

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O Orador: - Somos um país pobre e por isso se torna indispensável que, mesmo que tenha de haver menos riscos, passe a haver mais remediados.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente : - Vou encerrar a sessão.
Amanhã haverá sessão, a hora regimental, com a mesma ordem do dia.
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 50 minutos.
________________

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

António Calbeiros Lopes.
Artur Proença Duarte.
João Alpoim Borges do Canto.
João Carlos de Assis Pereira de Melo.
João de Paiva de Faria Leite Brandão.
Joaquim Dinis da Fonseca.
José Dias de Araújo Correia.
José Garcia Nunes Mexia.
Manuel de Magalhães Pessoa.
D. Maria Leonor Correia Botelho.
Paulo Cancella de Abreu.
Ricardo Malhou Durão.
Ricardo Vaz Monteiro.
Tito Castelo Branco Abrantes.
Venâncio Augusto Deslandes.

Srs. Deputados que faltaram à sessão-

Agnelo Ornelas do Rego.
António de Almeida Garrett.
António Rodrigues.
António dos Santos Carreto.
Carlos de Azevedo Mendes.
Carlos Vasco Michon de Oliveira Mourão.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Gaspar Inácio Ferreira.
Jerónimo Salvador Constantino Sócrates da Costa.
João Afonso Cid dos Santos.
João Cerveira Pinto.
José dos Santos Bessa.
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues.
Luís Filipe da Fonseca Morais Alçada.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Manuel Maria Múrias Júnior.
Manuel Maria Sarmento Rodrigues.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Reis.
Miguel Rodrigues Bastos.
Pedro Joaquim da Cunha Meneses Pinto Cardoso.
Rui de Andrade.
Urgel Abílio Horta.

O REDACTOR - Luís de Arillez.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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