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REPUBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 143

ANO DE 1956 19 DE ABRIL

ASSEMBLEIA NACIONAL

VI LEGISLATURA

SESSÃO N.º 143, EM 18 DE ABRIL.

Presidente: Exmo. Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior

Secretários: Ex.ª
Gastão Carlos de Deus Figueira
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues

SUMARIO: - O .Sr. Presidente declarou alerta a sessão às 10 horas e 15 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foi aprovado o Diário das Sessões n.º 111

Deu-se conta do expediente.
O Sr. Deputado Cortes Lobão recordou o movimento militar de 18 de Abril de 1925 a figura do marechal Carmona.
O Sr Deputado Manuel Arosa referiu-se à passagem do caminho de ferro e perto de Mormugão para a administração portuguesa.
O Sr. Deputado Sá Linhares aponta a justiça da eleração de categoria do Licen da Horta.
O Sr. Deputado Bartolomeu Cromicho referiu-se à situação de funcionários que a companhia dos caminhos de ferro Portugueses se propõe deslocar.

Ordem do dia. - Prosseguiu a discussão dos pareceres sobre as Contas Gerais da Junta do Crédito público e das províncias ultramarinas referentes a 1954.
Faliram os Srs. Deputados D. Maria Leonor Correia Botelho, Pacheco Jorge, Duarte Silva e Monterroso Carneiro.
O .Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Eram 16 horas e õ minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Abel Maria Castro de Lacerda.
Adriano Duarte Silva.Alberto Cruz.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Pacheco Jorge.
Albino Soares Pinto dos Beis Júnior.
Alexandre Aranha Furtado de Mendonça.
Alfredo Amélio Pereira da Conceição.
Amândio Rebelo de Figueiredo.
Américo Cortês Pinto.
Antão Santos da Cunha.
António Abrantes Tavares.
António de Almeida.
António de Almeida Garrett.
António Augusto Estevas Mendes Correia.
António Bartolomeu Gromicho.
António Cortês Lobão.
António Pinto de Meireles Barriga.
António da Purificação Vasconcelos Baptista Felgueiras.
António Rodrigues.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Proença Duarte.
Augusto Cancella de Abreu.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Caetano Maria de Abreu Beirão.
Carlos de Azevedo Mendes.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Ernesto de Araújo Lacerda e Gosta.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco Eusébio Fernandes Prieto.
Gaspar Inácio Ferreira.
Gastão Carlos de Deus Figueira.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Jerónimo Salvador Constantino Sócrates da Costa.

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João Ameal.
João Luís Augusto das Neves.
João Mendes da Costa Amaral.
João de Paiva de Faria Leite Brandão.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim Mendes do Amaral.
Jorge Botelho Moniz.
Jorge Pereira Jardim.
José Dias de Araújo Correia.
José Garcia Nunes Mexia.
José Sarmento de Vasconcelos e Castro
José Soares da Fonseca.
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Luís de Azeredo Pereira.
Luís Maria Lopes da Fonseca.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel de Magalhães Pessoa.
Manuel Maria de Lacerda de Sousa Aroso.
Manuel Maria Múrias Júnior.
Manuel Maria Vaz.
Manuel Marques Teixeira.
Manuel Monterroso Carneiro.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Manuel Trigueiros Sampaio.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Reis.
Mário Correi n Teles de Anníjo e Albuquerque.
Mário de Figueiredo.
Ricardo Mamou Durão.
Tito Castelo Branco Arantes.
Venâncio Augusto Deslandes.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 67 Srs. Deputados.

Está aberta a sessão.

Eram 16 horas e 15 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Está em reclamação o n.º 141 do Diário das Sessões.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como nenhum Sr. Deputado deseja apresentar qualquer reclamação, considero-o aprovado.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Exposição

De José de Portugal F. Dias sobre vários aspectos rio problema das sociedades por quotas.

Oficio

Do presidente do Grémio da Lavoura do Crato a apoiar a intervenção do Sr. Deputado Mendes Correia a remi da província na divisão administrativa do Luís.

Telegramas

Vários a apoiar as considerações do Sr. Deputado João Valença acerca do hospital de Viana do Castelo.
Do presidente da Câmara Municipal da Sertã a apoiar a Assembleia Nacional no problema da distribuição de energia eléctrica nos meios rurais.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra antes da ordem do dia o Sr. Deputado Cortês Lobão.

O Sr. Cortês Lobão: - Sr. Presidente: passa hoje uma data que deve ser recordada por todos os portugueses, e muito especialmente por aqueles que conheceram os dias tristes e sombrios do passado.
Alguém nesta Assembleia poderia, com mais brilho do que eu, recordar esta data.
Foi nesse dia, 18 de Abril de 1920, que o Pais acordou da sonolência em que vivia há muitos anos. Acordou e reagiu. E, se não venceu então, foi pelo convencimento em que todos estavam de que não podia haver resistência contra a vontade da Nação.
Seria este movimento uma simples demonstração militar, esquecendo, na sua preparação, alguns detalhes que não faltaram meses depois.
Não venceu o movimento de 18 de Abril, mas preparou o campo, limpou todos os obstáculos, deixou germinada a semente salvadora que vingou e cresceu em 28 de Maio do 1926.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O que foi esse movimento de 18 de Abril, o que foram essas horas de ansiedade, o que foi para o Pais a surpresa da derrota está ainda bem vivo na memória de todos os portugueses que acompanharam o gesto patriótico do Exército.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Hoje, à distancia de muitos anos, pensamos que melhor foi não ter sido o vencedor naquela data, porque os treze meses seguidos até 28 de Maio mostraram grandes valores, trouxeram à colaboração valorosíssimas dedicações. Permitiram ao Pais assistir a esse julgamento da Sala do Risco, onde um júri de cinco austeros generais, não se curvando às ameaças da fera que à solta uivava, perante os desassombrados depoimentos dos réus, que, como militares briosos, assumiram toda a responsabilidade do movimento, soube nobremente, patrioticamente, fazer justiça, absolvendo-os.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Permitiram mais que o Pais conhecesse a têmpera, o valor, a grandeza de alma, o patriotismo dessa figura extraordinária de militar e de português que foi o promotor de justiça desse julgamento, começando a sua acusação com estas significativas palavras:

Quando se vêem no banco dos réus militares tão distintos, a explicação só pode ser uma - a Pátria está doente.

Sr. Presidente: foi esta figura extraordinária que uniu todo o Exército para o 28 de Maio.
Foi a sua firmeza, e por vezes a sua dureza, que venceu algumas dúvidas, nos primeiros momentos do movimento.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Foi a sua delicadeza e cativante simpatia que ligou muitas indiferenças.
Foi a sua inteligente e patriótica maneira de dirigir o País que permitiu a estabilidade do Governo desde 1028.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Não é possível falar do movimento de 18 de Abril sem recordar essa grande alma de português que foi o nosso saudoso marechal Carmona.

Vozes: - Muito bem, muito bem !

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O Orador: - Foi um exemplo vivo para todos nós e deverá sê-lo para aqueles que nos vierem render.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - E para mais o ligar a. esta data histórica quis Deus chamá-lo à sua divina presença no dia 18 de Abril de há cinco anos.
Perante a vontade divina, curvamo-nos comovida e respeitosamente, pedindo a paz parra a sua alma.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem !
O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Manuel Aroso: - Sr. Presidente: em nota do Ministério do Ultramar, hoje publicada, foi dado conhecimento ao País acerca da fornia como se procedeu quando da passagem do caminho de ferro e porto de Mormugão para a administração portuguesa, em 31 de Dezembro do ano passado.
O acerto e oportunidade das medidas tomadas são completa e claramente demonstrados naquele pormenorizado documento, em que o Sr. Ministro do Ultramar quis também, em acto de justiça que importa ser sublinhado, destacar alguns aspectos notáveis na realização dos objectivos que o Governo determinou à «brigada técnica de alta qualidade» que foi encarregada de receber o montar aqueles serviços.
Fazem parte dessa brigada, além de pessoal da C. P. e do Estado da índia, um grupo de ferroviários de Moçambique, a um deles pertencendo a sua chefia.
Duas horas após a entrega dos caminhos de ferro pela Southern Maharatta Eaihvay Company, Ltd., que o explorava, dominando todas as dificuldades criadas propositadamente, pois não havia, nem há, bilhetes, nem óleos, nem carvão, partiu pontualmente o primeiro comboio da estação de Vasco da Gama.
Todos nós que vivemos em Moçambique já estamos habituados à maneira, verdadeiramente excepcional, como os agentes dos serviços dos portos e caminhos de ferro sabem desempenhar a sua missão. Os resultados obtidos na exploração do caminho de ferro da Beira e a rapidez da construção do caminho de ferro do Limpopo afirmaram amplamente a competência técnica e dedicação dos engenheiros e do pessoal dos caminhos de ferro de Moçambique e honraram a grande escola a que pertencem, que ó orgulho daquela província e da Nação.
Entendi, por isso, que devia trazer a esta Assembleia uma palavra de apoio e louvor àqueles homens, que para além de todos os sacrifícios pessoais, sob a orientação desse grande português que é o Sr. General Bénard Guedes, souberam atingir na índia os magníficos resultados de que todos nos podemos felicitar. tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bom !
O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Sá Linhares: - Sr. Presidente: min o objectivo de tomar conhecimento directo dos problemas relacionados com o sen departamento, acaba de visitar o arquipélago dos Açores o Sr. Subsecretário de Estado da Educação Nacional.
Noticias vindas daquelas ilhas revelam que a honrosa visita vai deixar na sua população as mais gratas recordações e as maiores esperanças na realização de algumas das suas velhas aspirações.
Entre as que existem há longos anos no distrito da Horta, ocupa um dos primeiros lugares a elevação do grau de instrução do seu liceu.
O pedido daquela elevação, ainda há poucos meses formulado ao Governo pelas forras vivas daquele distrito, foi renovado àquele membro do Governo e estou certo de que, depois de o ter ouvido e examinado directamente em toda a sua extensão, não deixou de verificar a sua legitimidade.
O Liceu da Horta foi criado por Decreto de 20 de Setembro de 1844, tendo por consequência mais de um século de existência.
Os seus primeiros anos de funcionamento foram irregulares por falta das mínimas condições de instalação e de um corpo docente completo. No entanto, tudo se remediou e aquele liceu passou a cumprir a sua missão, com incontestável proveito para a população do distrito, até ao ano de 1882.
Neste ano, por uma remodelação de ensino, foram os liceus do Pais classificados conforme o valor da sua frequência, e, não tendo sido considerado nesta remodelação qualquer outro elemento, ficou o Liceu da Horta com a categoria mais inferior.
Isto levou a Câmara Municipal daquela cidade a lazer uma representação ao Governo, em Abril do mesmo ano, pedindo categoria idêntica à dos Liceus de Angra o de Ponta Delgada.
Alegava-se naquela representação que «nenhum dos distritos açorianos tem mais extensão que o da Horta nem representa uma superior actividade intelectual em associação e movimento literários».
Nem esta representação nem outros clamores então apresentados levaram o Governo a modificar a lei, e lá continuou o Liceu da Horta com o seu grau mais interior até 1804, data em que se efectuou nova reforma.
Passaram então os liceus a ser classificados de nacionais e de centrais.
Continuando a manter-se dispersa a população daquele distrito, por imperativos da geografia, e não sendo, assim, acessível o ensino a muitos que o desejariam, de novo o volume da sua frequência se apresentou diminuto e o Liceu da Horta foi classificado de nacional.
Vem o ano de 1926 e pelo Decreto n.º 12425, de 2 de Outubro, passou o Liceu da Horta a ter as classes complementares de Letras e Ciências.
A alegria e o contentamento da população da ilha do Faial foi tão grande ao receber a notícia que quase se esqueceu, por momentos, da horrível catástrofe provocada meses antes pelo violento terramoto que na noite de 31 de Agosto fez tremer aquela ilha, derrubando casas e fazendo vítimas na sua população.
A frequência do liceu aumentou de tal forma que se tornou necessário o desdobramento de algumas classes.
Esta situação é, porém, efémera.
O Decreto n.º 15365, de 12 de Abril de 1928, suprimindo alguns estabelecimentos de ensino, abrange o Liceu da Horta.
Novas representações se fazem e o Governo, reconsiderando o assunto, publica três meses depois o Decreto n.º 15747, que, no seu artigo único, dizia apenas: «É restabelecido o Liceu da Horta».
Seria interessante reproduzir os considerandos destes dois diplomas, mas, não o julgando indispensável, frisarei apenas que o principal fundamento invocado no primeiro daqueles decretos foi o da necessidade de redução de despesas e que o segundo foi assinado pelo Sr. Prof. Doutor Oliveira Salazar, que dias antes iniciava no Ministério das Finanças a sua grandiosa obra, que é hoje orgulho de todos os portugueses.
Eis, Sr. Presidente, algumas breves notas sobre a vida de um liceu que a geografia e a estatística nunca permitiram que justiça lhe fosse feita.
A situação especial em que se encontra aquele distrito requer que a mesma seja examinada em todos os seus

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aspectos, puis só assim o problema do seu liceu pudera ter a solução mais justa.
Embora já hoje o volume da sua frequência (trezentos e quarenta e três alunos no actual ano lectivo) não aconselhe tratamento desigual ao de outros liceus, não é essa a razão principal que justifica a elevação da sua categoria.
Ás quatro ilhas que constituem o distrito da Horta são, de todo o arquipélago, as que vivem mais isoladas.
Deixaram de escalar o magnifico porto da Horta os navios estrangeiros que o faziam em tempos passados, quando a sua autonomia não lhes permitia ligar directamente a Europa à América.
Os Cliffers da Pan American que a seguir à primeira guerra mundial faziam escala pelo porto da Horta deixaram de existir, e não há em nenhuma daquelas ilhas um único campo de aterragem.
Como resto daquelas comunicações existem hoje apenas os velhos barcos da Empresa Insulana de Navegação, quo de quinze em quinze dias escalam os seus portos.
Não há indústrias e o seu comércio gira apenas à volta da sua limitada economia agrária.
Não há pobres, mas também rareiam os ricos, e, entre estes, poucos são aqueles que escolhem para futuro dos seus filhos um curso superior.
Todos lá ficam, fechados e isolados, limitados ao grau de cultura que o 2.º ciclo dos liceus lhes proporciona.
Os poucos alunos que nos outros liceus se habilitam com o 3 º ciclo e seguem para as Universidades raramente lá regressam e, assim, verifica-se que a população daquelas ilhas se encontra em situação de inferioridade cultural, se a compararmos com a de qualquer outro distrito açoriano ou mesmo continental.
Os efeitos desta situação não se reflectem apenas no campo espiritual do problema, pois estendem-se também aos interesses materiais daquele distrito, com a ocupação dos modestos lugares preenchidos por concurso por indivíduos naturais de outras terras, povoadas de mais habitantes.
Sr. Presidente: por todas as razoes que acabo de expor a V. Ex.ª, e ainda porque um estabelecimento de ensino com mais de um século de existência constitui, para a terra que o possui, um precioso tesouro, onde se guardam as mais gratas recordações do passado e as mais prometedoras esperanças do futuro, não há naquele distrito um único habitante que, ao enumerar as suas aspirações, não coloque em primeiro lugar a criação do 3.º ciclo para o seu liceu.
O Sr. Dr. Baltasar de Sousa, ilustre Subsecretário de Estado da Educação Nacional, acaba de visitar aquele distrito e teve, assim, a oportunidade de tomar conhecimento directo dos seus mais importantes problemas e verificar a legitimidade de algumas das suas aspirações.
Ao visitar o velho e impróprio edifício da nobre cidade de Angra do Heroísmo e ao ver escritas num quadro, pelos alunos, as palavras «Queremos um liceu», escreveu aquele membro do Governo: «Têm razão».
Este gesto, revelador do mais alto critério de justiça, é a firme indicação de que os Açores passarão a ter mais um defensor das suas legitimas aspirações.
Como representante do distrito da Horta nesta Assembleia Nacional, apenas me cumpre congratular-me pela honrosa visita daquele membro do Governo, na certeza antecipada de que os problemas açorianos dependentes do Ministério da Educação Nacional irão ter ali a sua melhor solução.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Bartolomeu Gromicho: - Sr. Presidente: venho abordar um problema que emergiu de uma deliberação da Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses.
O conselho de administração desta importante empresa resolveu concentrar em três zonas - Barreiro, Lisboa e Campanhã - as dezanove secções de via e obras, que se encontravam espalhadas pelas principais estações ferroviárias do Pais.
Desconheço as razões técnicas ou económicas que levaram a C. P. a esta solução. Não é, pois, minha intenção tomar uma atitude de crítica a uma deliberação tomada livremente por uma empresa particular, embora muito ligada ao Estado, possivelmente para defesa dos seus legítimos interesses.
Em todo o caso, sei que dessa concentração do pessoal das dezanove secções em três zonas resulta a deslocação de umas centenas de famílias, que assim foram atingidas de surpresa.
Parece que essas secções perduram nas actuais condições de estabilidade desde que existem caminhos de ferro. Por isso, os funcionários de escritório que a esses lugares concorreram fizeram-no na convicção de estabilidade nessas localidades. Assim acontece que muitos desses funcionários têm mais de vinte e alguns até trinta anos de permanência nessas localidades.
É evidente que ali enraizaram interesses familiares e de tal natureza que, nesta altura da vida desses funcionários, a deslocação lhes causa os mais graves transtornos.
Muitos desses funcionários adquiriram casa própria à custa de penosas economias e até ao abrigo do plane das casas económicas.
Não é difícil imaginar as preocupações desses chefes de família para constituírem, muitos no fim da carreira, novo lar em ambiente de carência e carestia de habitações, como sejam o Barreiro, Lisboa e Porto.
Ainda ressoam nesta sala os ecos da discussão, tão oportuna, à volta do aviso prévio do ilustre Deputado Sr. António de Almeida Garrett, sobre o triste problema da habitação para as classes menos abastadas.
Os funcionários em questão enquadram-se, perfeita mente, na legião dos que não tom as desafogadas possibilidades económicas para obterem, em condições acessíveis, um novo lar nas localidades superpovoadas par onde lhes ordenam a deslocação.
Não será possível à C. P. sobrestar nesta deliberação ou criar as três zonas com o chamamento dos funciona rios que, voluntariamente, queiram transferir-se e preencher os lugares nessas zonas à medida que forem vagando os lugares das actuais secções?
Que o caso apontado merece ponderação ú fora de dúvida.
Aqui formulo a minha petição ao ilustre conselho d administração da Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses no sentido de que sejam considerados e prejuízos que ameaçam esses funcionários, que têm ser vido a Companhia com todo o zelo e dedicação.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador fui muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à.

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continuam em discussão as Coitas Gerais do Estado, da Junta de Crédito Público e d ultramar referentes ao ano de 1954.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada D. Maria Leon Correia Botelho.

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A Sr.ª D. Maria Leonor Correia Botelho: -Sr. Presidente : tenho de começar por pedir desculpa a V. Ex.ª, Sr. Presidente, e à Câmara, da minha ousadia em tomar lugar neste debate, que é sem dúvida um dos mais importantes anualmente travados nesta Casa.
Sem intuito de querer sequer realçar o valor e os méritos do documento todos os anos apresentado a esta Assembleia, com largueza e impressionante regularidade, podemos talvez afirmar que o parecer das contas, através da sua critica construtiva e séria, será no futuro um dos mais nobres e eficazes meios de comprovar o enorme trabalho de reconstrução realizado nas últimas décadas. Ele é, além disso, como que sentinela vigilante a lembrar a imensidade da obra que é ainda necessário executar.
Assim, o documento agora em apreciação cada ano vem indicando às novas gerações uma tarefa magnifica, embora árdua.
As nações vivem do esforço de seus filhos, do amor dos que as formam. E não há melhor e mais consoladora tarefa do que a de contribuir com um pouco ou um muito para a dignificação da nossa Pátria.
Por sentir nas páginas do parecer das contas a sinceridade e devoção do seu relator ao bem comum e à obra que ele próprio corajosamente iniciou e manteve em alto nível nos últimos dezoito anos me atrevo a trazer também a esta tribuna um desvalioso contributo ao esclarecimento de um problema que sinto ser preocupação dominante, e talvez dolorosa, de algumas páginas do mesmo parecer.
Escreve o Sr. Deputado Araújo Correia:

Para que Portugal possa desempenhar a sua função histórica, necessita de uma população sadia e em número crescente, tanto na metrópole como no ultramar. O próprio país metropolitano ainda não está ocupado devidamente. Muitos dos seus recursos económicos esperam aproveitamento, que há-de necessitar de maior densidade demográfica.
Por outro lado, são velhas as normas da política nacional que impelem ao povoamento de novos países ou a manutenção da influência do sangue nacional em nações de origem portuguesa, como o Brasil. O recrudescimento da emigração para este país e para Angola e Moçambique, acentuado nos últimos anos, comprova esta antiga tendência.
Como será possível atender às exigências metropolitanas e ultramarinas, afora as necessidades de além-Atlântico, com o decrescimento da taxa da natalidade acusada nos últimos tempos?

Neste simples trecho está implícito o futuro do nosso país na metrópole e no ultramar. E a resposta à angustiosa interrogação vem logo a seguir, com as seguintes palavras, que desejo sirvam de base às considerações que me proponho fazer.
Escreve ainda o mesmo Sr. Deputado:

Devem tentar-se todos os esforços no sentido de impedir agravamentos na taxa da natalidade, por medidas eficazes que tendam a proteger as famílias numerosas.
Não se consideram nesta análise aspectos morais do problema, por serem óbvios.

Estas considerações sugerem um certo número de problemas de natureza moral e social e encerram, se me é permitido dizê-lo, um problema político na verdadeira acepção da palavra.
Foi milagre esta pequena faixa de terra do extremo ocidental da Europa viver independente e livre por oito séculos; foi milagre descobrir o Mundo numa época em que fazê-lo era ser pioneiro audaz; foi milagre desbravar, povoar, defender, dar vida, corpo e alma cristã, a um dos maiores países do Mundo; foi milagre manter através dos tempos territórios em África e na Ásia, e ainda foi milagre, como nos acentua o ilustre relator, na introdução do parecer do ultramar, localizar em África os melhores portos, a melhor posição geográfica, vastas zonas susceptíveis de povoamentos europeus, embriões de futuros países, Intimamente ligados à Mãe-Pátria. Foi milagre, digo eu, a Divina Providencia querer dar ao povo português tantas e tão grandes virtudes. E todos os que crêem, como eu, não podem deixar de estar agradecidos por graças tão especiais. Não podem e não devem.
Se Deus nos cumulou de tantos favores, é mister que todos, no silencio e na humildade, cumpram o seu dever - o dever de continuar uma obra que tem oito séculos, dever de projectar no futuro a herança do passado, de elevar a melhor nível o País, que é de nós todos, dever de ser digno, no presente, dos que sacrificaram a saúde e a vida na defesa e na integridade de preciosos legados em longínquas terras.
Alguns aspectos da nossa posição actual precisam de ser cuidadosamente estudados, de modo a determinar causas que possam levar a males maiores, e um deles é o da população - do seu aumento, da sua vitalidade, da sua cultura e educação.
Todos os que, por dever de ofício, têm de estar atentos ao movimento demográfico do Pais, examinar as cifras da natalidade, da mortalidade e da emigração sentem haver indícios de fraquezas que é indispensável corrigir.
O Sr. Deputado Araújo Correia, num dos seus livros, baseado em elementos de especialistas, indicou como possível aumento da população do continente e ilhas para perto de 10 milhões de almas em 1960. O cálculo foi feito na base dos números da emigração e nos índices da natalidade do período da guerra e dos anos que a precederam. Mas a partir de 1948, sempre em grau crescente, se acentuou a emigração, e o índice da natalidade, como nos informa o parecer, tem vindo a diminuir continuamente.
Deixo na acta das sessões os números relativos a 1920, 1930, 1040, 1900 e anos que se seguiram.

Ver tabela na imagem.

Quer dizer, a taxa da natalidade, que atingia 33,63 em 1920, diminuiu para 22,72 trinta e quatro anos depois, e embora no mesmo período a mortalidade descesse de 23,68 para 10,94, o que é notável - e assim compensasse nos saldos fisiológicos a diminuição da natalidade -, nós vemos acentuar-se a baixa desta última, desde 1900, sem correspondência na primeira.
A agravar este sintoma demográfico, o exame dos números mostra um grande aumento da emigração, que atingiu, só para o estrangeiro, a cifra de 41 700 em 1954, semelhante, aliás, à dos últimos quatro anos.
Não admira, pois, que os saldos líquidos, até sem contar com a corrente humana para o ultramar, viessem a decrescer e da cifra de 84250 em 1950 passassem para pouco mais de 63 000 em 1954. E, se forem contados para o cálculo do saldo líquido no continente e ilhas os que se fixam no ultramar, a cifra de 63 420 em 1954 desce

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ainda para 51679, sensivelmente metade do saldo fisiológico, que neste ano foi de 102448.
E um sintoma digno de ser vigiado, porque significa que metade da diferença entre os nascimentos e os óbitos - o saldo fisiológico - sai anualmente do Pais.
Se forem agora examinados os grupos de idades dos emigrantes - e só tenho dados para os que vão para o estrangeiro -, nota-se que cerca de 30000 estão compreendidos entre os 14 e os 40 anos, num total de 40700.
Não admira, pois, que, na base dos elementos acabados de enumerar, o cômputo da população agora se afaste muito do de há uma dezena de anos. Os elementos obtidos mostram que a população portuguesa será de 9 500 000 em 1960, de 10700000 em 1965 e de 10700000 em 1970.
Os saldos fisiológicos desceram de 113400 em 1948 para 102 400 em 1954 e a emigração subiu, só para o estrangeiro, de 12 300 em 1948 para 40700 em 1954. Estes dois fenómenos retardaram o natural crescimento da população, apesar dos progressos feitos nas taxas da mortalidade. Numa palavra: a diminuição nas taxas da natalidade de cifras inferiores a 30 por mil para menos de 23, com tendência para agravamento, constitui, em conjunto com a emigração, a causa fundamental do menor ritmo de acréscimo da população.
No Anuário demográfico de 1940, ao examinar-se estes fenómenos da população, escrevia-se:
Não pode ver-se sem apreensões que em 1928, quando Portugal tinha menos um milhão de habitantes do que em 1040, tivessem nascido 211 314 portugueses e que neste último ano apenas nascessem 187 892.

Podíamos nós agora acrescentar que em 1954 havia mais 2 milhões de habitantes, o que em 1928 e nasceram apenas 197 437, menos portanto do que em 1928
O fenómeno reveste pois, aspectos sérios, dignos de serem examinados cuidadosamente. Os números indicados acima para as populações de 1960,1965 1970, amavelmente cedidos pelo Sr. Relator das contas e calculados pelo Instituto Nacional de Estatística, já são consequência da gradual diminuição da taxa da natalidade e do gradual recrudescimento dos índices da emigração.
Justificam eles, sem dúvida, apreensões sobre a população nacional, sobre o povoamento ultramarino e sobre as necessidades derivadas de mais intensivo desenvolvimento económico-social, sem ter em conta as vantagens assinaladas no parecer das contas dum influxo de sangue nacional na grande república irmã da América do Sul.
As densidades demográficas, na base dos números do 1960, 1965 e 1970, seriam respectivamente de 103, 108 e 116, comparadas com 94 em 1954. Seriam inferiores às que já hoje prevalecem na maior parte dos países europeus, que não desempenham no concerto mundial da política o papel de criadores de novos países, de civilizadores de regiões primitivas, e que não possuem, enfim, a missão que Deus nos confiou de propagar a fé e povoar novas terras.
Peço desculpa a V. Ex.ª Sr. Presidente, de ter tomado tanto tempo à Câmara com a exposição naturalmente enfadonha de desvaliosas considerações, ...

Vozes: - Não apoiado!

O Orador: - ... carregadas de cifras sobre um tão importante problema nacional. As cifras também têm a sua poesia, que pode ser lírica ou revestir tragédia, que pode ser épica ou bucólica. Mas a culpa não é minha;
é talvez do ilustre relator das contas, que nos habituou a ler por detrás dos números as cruas realidades humanas.
O problema da natalidade não ressaltaria tão vivo se não se enumerassem as cifras e se não nos curvássemos sobre elas para ler e compreender o seu significado.
Dessa leitura e da compreensão do que ela encerra sobressai um facto, e é a ele que desejo chegar.
E indispensável fazer um esforço sério no sentido do parar a gradual diminuição das taxas da natalidade, que, repito, vieram de mais de 30 por mil habitantes em 1920 para menos de 23 em 1934.
O exame, ainda que superficial, do panorama demográfico do Pais nos seus diversos distritos, logo nos revela considerável discrepância entre uns e outros.
Recorremos ainda aos pareceres das contas para obter os dados, e completámo-los com elementos colhidos na estatística e em substanciosos estudos publicados na Revista de Estudos Demográficos.
Pode talvez dividir-se o continente em duas zonas perfeitamente distintas. No Norte, nos distritos de Braga, Bragança, Vila Real e Porto, as taxas da natalidade, apesar de inferiores às do passado, ainda parecem ser satisfatórias - idênticas às dos Açores e da Madeira, quase sempre com cifras altas.
São ainda superiores a 28. Mas à medida que se desce para o Sul, até atingir o Alentejo e o Algarve, as taxas enfraquecem. Beja, Évora, Portalegre, Setúbal e Faro têm cifras inferiores a 20, e entre elas situa-se também Coimbra, com menos de 19.
Para vincar ainda esta anomalia entre zonas vizinhas, há o caso paradoxal de Lisboa e Porto. Enquanto que esta última cidade ainda em 1954 teve a taxa de 24,6, Lisboa pouco passou de 15.
No Centro do País os números cifram-se entre 20 e 25.
Se forem comparadas estas taxas com as de 1928 ou até de 1940, nota-se enorme diferença para menos, e há certos casos que até escapam à análise.
Em 1928 só os distritos de Lisboa. Faro e Coimbra, no continente, tinham taxas inferiores a 30, e apenas a do de Lisboa era menor do que 25. As ilhas, com 34.6 em Ponta Delgada e 37,9 no Funchal, assemelharam-se a Bragança, que quase atingiu 39.
Doze anos depois, em 1940, apenas Braga e Bragança, Ponta Delgada e Funchal se situavam acima de 30. O resto descera para cifras bem menores, e Lisboa caiu para menos de 16.
Notam-se nestes doze anos graves diminuições no Sul, difíceis de explicar, pois. por exemplo, Portalegre veio de 31 em 1928 para menos de 23, outro tanto acontecendo a Santarém, Setúbal e Faro.
O quadro continua a escurecer, se agora forem comparadas as cifras com 1954. As taxas no Sul já não se fixam à roda de 30. como em 1928, ou até acima de 22, como em 1940. Descem para valores da ordem de 16,6 em Portalegre, 16,3 em Faro e 15,8 em Setúbal, sem mencionar Lisboa, com 15,26 - o mais baixo de todos.
Não tenho competência nem saber para analisar esta extrema divergência entre o Norte e o Sul, nem tão-pouco para encontrar as razoes que levaram, entre os anos extremos de 1928 e 1954, à diminuição abrupta da taxa da natalidade no Sul, com a excrescência de Coimbra no Centro e os valores bem mais altos nos distrito do Norte, sobretudo em Braga e Trás-os-Montes. Mas o que não há dúvida é de que essas causas existem e não podem fugir aos imperativos de ordem moral, económica, social ou fisiológica.
É verdade que a taxa da mortalidade também se fixa em cifras muito mais baixas no Sul - em valores inferiores a 10 em Beja, Évora, Portalegre, Santarém e Setúbal. Mas a mortalidade em 1928 já era inferior, de um

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modo geral, nos distritos do Sul e a sua diminuição não compensou o grau de declínio da natalidade.
Estamos, pois, perante um fenómeno que convém indagar e que cabe dentro de duas perguntas:

1) Que razões impulsionaram a diminuição da natalidade no Sul entre 1928 e 1954, em proporção superior à do Norte?
2) Que motivos concorreram também para a gradual diminuição da natalidade no Norte?

A resposta a estas duas perguntas dar-nos-á a chave de um problema importante. Se for possível achar remédio para reduzir a negrura dos números, a missão colo-nizadora de Portugal poderá continuar a espargir largamente em terras africanas os benéficos efeitos da civilização cristã, que foi a glória dos nossos maiores e esperamos continuará a ser a nossa.
As apreensões sobre esta matéria, visíveis nos pareceres das contas, poderiam ser atenuadas, com o caminhar dos tempos, se houvesse meio eficaz de resolver este grave problema da natalidade.
Sr. Presidente: o meu modesto conhecimento destas matérias e a experiência adquirida em anos de serviço social dizem-me que o primeiro passo a tomar deveria ser o de um meticuloso inquérito, que permitisse formar uma ideia geral sobre as causas imediatas do decrescimento da natalidade: se de natureza moral, se de natureza económica e social ou outra.
Esse inquérito poderia também ser orientado no sentido de nos fornecer elementos sobre as causas da uniformidade das taxas em 1928 em quase todo o País, como se viu acima, e a grande diferença notada em 1954.
Deu-se certamente no intervalo qualquer fenómeno de natureza económica, moral ou social que levou a tremendas diminuições dos nascimentos no Sul, que no caso de Portalegre transparecem na diminuição das taxas de 31 para 16,6, no de Évora de 31,3 para 16,8 ou ainda no de Faro de 28,8 para 16,3.
O inquérito teria de ir mais longe, de modo a averiguar o que se passa no Centro, como em Castelo Branco, Viseu e Guarda, onde taxas superiores a 30 baixaram para 25 ou menos.
Há poucos assuntos que tenham interessado tanto o pensamento moderno como este. Sociólogos eminentes, economistas de vasto saber, teólogos de grande profundeza, políticos, escritores, ensaístas, pensadores e biologistas tentaram erguer da caótica miscelânea dos factos a natureza das causas do gradual decrescimento da natalidade.
Poderíamos talvez segui-los, passo a passo, mas julgo não haver grande proveito para a discussão em trabalho de análise.
Prefiro circunscrever-me apenas á observação directa, àquilo que pude observar em anos de lides no serviço social.
As causas fundamentais são de duas ordens, no meu entender, embora haja outras, de natureza humana, filiadas no egoísmo das sociedades modernas.
Queria, em primeiro lugar, deixar uma nota sobre uma objecção que infelizmente nos chega até dos espíritos mais bem formados e dos que se arrogam paladinos do social, defensores das classes menos abastadas.
Refiro-me aos que entendem que proteger a natalidade é aumentar a miséria, uma vez que as subsistências são aparentemente insuficientes para satisfazer as necessidades vitais da população. O seu slogan é o de que, segundo o manifesto da American Birth Control League, as famílias numerosas e a pobreza são inseparáveis. Só o birth control- dizem - podo lutar eficazmente contra a miséria das classes trabalhadoras; a redução da natalidade aumentar-lhes-á o bem-estar e dar-lhes-á a parcela de gozo a que têm direito.
Cobarde atitude esta a dos partidários do birth control que explicam desta maneira simplista a causa do mal-estar económico, em vez de lutarem contra o pauperismo e a miséria e procurarem uma melhor distribuição dos bens materiais e aproveitamento de matérias-primas e potencial humano.
Lia-se há dias num jornal francês o seguinte título: « La Parenté planifiée dissimule incapacité ou le refus d'organiser la lutte contre Ia faim». E o artigo continua numa judiciosa série de considerações contra esta espécie de gigantesco alibi, que quer assim dispensar os homens de um esforço criador para lutar contra a fome e as dificuldades da vida.
Esquece-se que nas últimas décadas os meios de subsistência estão em vias de crescerem numa proporção superior à população. Logo, não existe excesso de população nem falia de meios do subsistência. As causas da pobreza são decerto de outra origem. Aliás, a introdução do parecer das contas, síntese esplêndida de sérios problemas económico-sociais, não nos deixa dúvidas de que a solução do aumento de nível de vida é bem outra do que a preconização de um birth control.
Ao debruçar-me agora mais profundamente sobre este problema verifiquei com tristeza que em muitos países permitem a limitação da natalidade, mesmo como remédio contra a pobreza, guardando silencio acerca do problema do justo salário, das medidas de protecção efectiva às famílias numerosas. È esta assim unia situação mais cómoda. Não a aceitaremos nós nunca, pois, além do mais, é incompatível com os superiores interesses espirituais e materiais da Nação. Lê-se no relatório da National Birth Rate Commission.
É melhor política adaptar as condições do meio as necessidades da família do que diminuir o número de filhos para se acomodar a uma organização social defeituosa e imoral.

Esta é a única política aceitável.
Não resisto ainda, e a este propósito, à tentarão de recordar uma página de Chesterton publicada numa revista americana:

Meditem neste exemplo muito simples e farão ideia do que se passa nos cérebros modernos. Aí estão dez rapazitos a quem determinámos dar um chapéu ; mas reparamos que há oito chapéus disponíveis. Um espírito simplista não acharia impossível arranjar os dois que faltam: informar-se-ia primeiro de quem fez os chapéus e encomendaria mais dois; protestaria contra uma demora injustificada na entrega; castigaria quem só comprometeu apresentá-los e não cumpre a promessa.
O espirito moderno, esse raciocina de outra maneira: se cortarmos a cabeça de dois rapazes já chegarão os chapéus. A ideia de que as cabeças valem mais do que os chapéus deita-a para trás das costas, por ser coisa metafísica. A persuasão de que os chapéus são feitos para as cabeças e não as cabeças para os chapéus rejeita-a como dogma arcaico. O texto poeirento que lhe diz que o corpo supera em dignidade ao vestuário; o preconceito secular que prefere a vida das crianças ao arranjar sistematicamente os chapéus, tudo isso é desprezado e esquecido. O espírito moderno tem uma lógica implacável: o carrasco é que tem de remediar as culpas do chapeleiro.
Importa muito pouco á lógica das coisas que falemos de casas ou chapéus. O erro fundamental é o mesmo: começamos às avessas, porque nunca nos demos ao trabalho de nos perguntar por onde convém principiar.

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Sr. Presidente: tudo isto é verdadeiro. E nós somos dos que queremos soluções de vida. Mas se é certo que não podemos procurar a melhoria da sorte das classes trabalhadoras com medidas restritivas, não é menos verdade que se não devem deixar entregues a todas as contingências económicas as famílias numerosas. O Estado tem de criar condições gerais e especiais, permitindo a expansão normal das famílias. E necessário prever uma compensação real dos encargos familiares.
Há que criar condições ao menos vitais para as famílias numerosas. Segundo os elementos fornecidos pela Obra das Mães pela Educação Nacional, são em número de 8939 as famílias numerosas inscritas nos seus ficheiros das quais correspondem apenas 532 aos distritos de Évora, Beja e Portalegre.
Como é sabido, premeia a Obra das Mães anualmente famílias que, vivendo uma vida exemplar, tenham um elevado número de filhos. Louvável iniciativa esta de galardoar o heroísmo dos pais que souberam cumprir.
Mas pergunto: corresponde esta medida a um apoio, a uma protecção, a ajuda efectiva a essas famílias? Perdoem-me, mas estes prémios, dados, embora, com o justo critério e sentido social, mais não resultam do que num certame de natalidade. E as famílias têm direito a mais do que ao galardão moral e material, furtuito e provisório. Onde estão as garantias de emprego para os membros dessas famílias, onde as regalias (diminuição dos impostos directos e indirectos, redução dos encargos fiscais, etc.)?
Já Pio XI no-lo recomendou em palavras lapidares na Casti Connubii: Devem os (governantes) ter especial empenho em remediar a penúria das famílias pobres, quer quando legislam, quer quando impõem tributos; devem considerar esta missão como uma das primeiras? responsabilidade do poder.

Decerto, quando Sua Santidade aludia a famílias pobres, queria referir-se a famílias necessitadas, a todas as famílias em necessidades económicas. E que estou a lembrar as tremendas dificuldades de classe média para educar os filho. - lodo os filhos que Deus lhe queira dar.

Quem segue de perto a vida deites grupos sociais tem de concluir que eles só podem viver ou no heroísmo dos santos - o que nem sempre é fácil - ou numa luta sem tréguas, que p levar aos mais angustiosos resultá-los, até de harmonia familiar.
A chamada «classe média» é realmente a que mais sofre a dureza dos encargos familiares, por motivos óbvios e bem conhecidos de todos nós: salários proporcionalmente mais baixos, encargos proporcionalmente mais elevados, ele.
Instituição familiar sem garantias de concreta ajuda aos seus encargos é negação dessa mesma instituição. Mas não são de urdem económica as razões que afectam a na natalidade.
Confirma-o a observação directa dos factos.
As razões de ordem moral têm neste problema uma importância de ordem primacial.
Não é em certas classes economicamente mais estáveis que se dá em grande parte; o fenómeno de famílias pouco numerosas? Não estão ao alcance directo da nossa observação os factos, diariamente, entrevistos, de pequenas famílias em muitas das classes mais abastadas:
É evidente que generalizações neste assunto são descabidas, porque também a inversa se pode dar, isto é: a imersa da existência de classes remediadas, ou até ricas, com famílias numerosas.
Neste caso a baixa natalidade não provém de dificuldades de natureza económica. Pode derivar - e certamente assim acontece muitas vezes de egoísmos pessoais, provenientes da intensidade da vida moderna, que afasta muitas vezes a mulher do lar, para fins que não são na maior parte dos casos o do angariamento de meios de subsistência para a família, como pode: acontecer nalguns casos, ou para. complemento do salário familiar.
O mal está na sede ou no abuso de divertimentos e de outras ocupações exteriores ao lar que assoberbam a mulher moderna.
Nestes casos, mais frequentes do que se julga, não há tempo para cuidar dos filhos, que passam a ser na vida mais um estorvo do que uma consolação ou - digamos a palavra - um dever.

Vozes: - Muito bem!

A Oradora: - Os problemas que decorrem deste estado de espírito não são fáceis de resolver. Eles não são inerentes apenas a Portugal. Podemos talvez dizer eu m propriedade, terem lançado alicerce" mais fundos noutros países, como já se disse, e serem neles próprios as causas da baixa natalidade.
O único remédio para este mal é do urdem ética ou religiosa: o avigoramento da moral católica, u defesa integral dos seus princípios, eternamente verdadeiros, até neste aspecto da sociologia contemporânea.

Vozes: - Muito bem!

A Oradora: - O mal que deriva da existência de famílias pouco numerosas nas classes abastadas tem ainda outro aspecto pernicioso, de natureza psicológica, Reflecte-se nas classes menos cultas e menos abastadas. Serve de exemplo. É um espelho onde. se miram os que., lutando com dificuldades., encontram nesse exemplo desculpa para os seus desatinos ou a desculpa de dificuldades materiais.
Que responsabilidade* tremendas têm as classes chamadas dirigentes neste particular?
Sr. Presidente: não tem o Estado de. intervir nem a impor nem a propor um óptimo de natalidade A sua tarefa consiste em seguir a evolução demográfica da Nação, estudando as suas consequências e difundindo os resultados dos estudos que se fizerem nesse sentido.
Sublinhando assim num traço modestíssimo e quase imperceptível este grave problema, tão bem apontado no parecer das contas, mais não pretendi do que fazer-me eco do alerta que assim se lança para os vários sectores responsáveis. E aqui concluo. Há que estudar as causas da nossa baixa de natalidade por meio de um inquérito, que seria de fazer já, para se poder acudir-lhe com remédios que directa e imediatamente as solucionassem.
Há que pôr barreiras à onda- de desnatai idade que ultrapassou já as nossas fronteiras. Ainda vamos a tempo, estou certa.
As apreciações feitas no parecer das Contas Gerais do Estado, que agora analisamos, põem-nas bem em frente dos valores espirituais e humanos da Nação que as mesmas contas traduzem. Espero que no capítulo que tão imperfeitamente me propus abordar nós saibamos dar-nos conta desses mesmos valores p envidarmos todos os esforços para que as forças da Nação apresentem, assim, um saldo sempre credor perante Deus e perante o Mundo.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bom!

O Sr. Almeida Garrett: - Muito bem! E, se o Sr. Presidente me permite, acrescentarei: a protecção

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das famílias numerosa tem, além do aspecto moral, um interesse nacional, que os governantes de grande parle dos países do Ocidente não compreenderam, para defesa da nossa civilização. Já no século XVIII o nosso grande pioneiro da higiene social. Ribeiro Sanches escreve que a grandeza e a força dos Estudos está na multidão dos súbditos e seu aumento.

A oradora foi muito cumprimentada.

O Sr. Pacheco Jorge: - Sr. Presidente: é da maior relevância, que não será de mais salientar, o facto de pela primeira vez, e em cumprimento de preceito constitucional, se tomarem nesta Assembleia as contas públicas das nossas províncias ultramarinas.
Na verdade, sendo n metrópole, as ilhas adjacentes e o ultramar um todo ano e indivisível que constitui a Nação Portuguesa interessa ao País conhecer, através dos números, a situação de cada uma das parcelas do seu território, por forma a poder avaliar-se da sua posição económica e financeira, do seu grau de progresso e das necessidades de cada uma delas. Deste modo, a apreciação em conjunto de todas as contas da Nação dará uma visão exacta e completa das finanças nacionais em todos os seus aspectos e dos diversos problemas que lhes são inerentes.
Frisa o ilustre relator, Sr. Deputado Araújo Correia, no seu interessantíssimo e magistral parecer sobre as contas gerais do ultramar as dificuldades encontradas na sua elaboração e preconiza medidas várias tendentes a uniformizar e facilitar a compreensão das mesmas contas.
De facto, dada a vastidão e dispersão geográfica das nossas províncias ultramarinas, as características próprias que as distinguem, a diversidade da legislação ainda existente em relação à metrópole na arrumação das contas ultramarinas, facilmente se poderá avaliar o extenuante trabalho produzido pelo ilustre relator, em ordem a oferecer a esta Assembleia o bem gizado parecer, que muito honra quem o subscreve. A S. Ex.ª, pois, presto desta tribuna a? minhas melhores homenagens.
Quero crer que, com o decorrer dos anos e removidos os principais obstáculos apontados as contas ultramarinas ficarão perfeitamente integrados no cômputo geral da Nação o a Mia apreciação se tornará gradualmente mais acessível.
Seria omissão imperdoável, ao entrar na apreciação das contas do ultramar, não me referir também ao relatório das contas de realização orçamental das províncias ultramarinas relativas ao exercício de 1934, da autoria do ilustre e mui competente director-geral de Fazenda do Ultramar. Sr. Mário Marques Pinto.
Prevendo S. Ex.ª si natural dificuldade no entendimento dessas contas, quis na introdução do seu perfeito e elucidativo relatório dar algumas explicações acerca dos princípios que as informam relembrando normas basilares da contabilidade pública ultramarina e da sua aplicação prática. Avisadamente andou S. Ex.ª em assim proceder, pois, eram a autoridade e o perfeito conhecimento que tem da mataria veio apresentar em termos claros e concisos assuntos de maior especialização técnica.
A S. Ex.ª desejo igualmente apresentar minhas homenagens e felicitações pelo valioso contributo que trouxe esta Assembleia com o seu primoroso trabalho.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente ao comentar as contas de exercício do ano de 1954 relativas à mesa província de Macau não me deterei na sua apreciação técnica, pois tal trabalho acha-se proficiente tratado no parecer e no relatório já atrás referidos e nada de novo iria trazer a esta Assembleia; julgo preferível referir-me a certos fenómenos político-sociais, em meu fraco entender, poderiam ter tido influência nos que constituem o fruto da observação e estudo de quem nasceu e tem vindo com permanência nessa longínqua província e que, mercê da profissão que ali exerce, mais de perto os sentiu.
Será certamente modesta a minha contribuição, mas não lhe faltará aquela sinceridade e honestidade que muito prezo possuir.
Sr. Presidente: segundo se verifica da conta em apreciação, foi ela encerrada com o saldo positivo de 676.747,42 ou sejam 3:270.607$66 ao câmbio oficial de 3$30 por pataca.
É de salientar-se o resultado obtido, não só pelo facto de no ano anterior de 1953 se Ter verificado um déficit na respectiva conta, como ainda e talvez principalmente porque o resultado obtido se conseguiu sem ser preciso como ainda o Sr. Director interino dos serviços de Fazenda da província, lançar mão das medidas excepcionais mais referidas no Decreto n.º 22793, mas antes, pelos processos clássicos ao maior cuidado e zelo na cobrança das receitas de uma severa compressão das suas despesas.
Contudo, querer-me parecer que a apreciação duma conta desta natureza não se pode limitar à verificação do seu resultado, sem se atender aos factos ou fenómenos que o determinaram.
Na verdade, não interessa o saldo positivo quando ele não representa estabilidade e prosperidade nas fontes de receita e implica, pelo contrário, uma tendência acentuada para uma diminuição progressiva. O que interessa, o que importa, é assentar a economia em bases solidas e permanentes, que permitam a previsão de saldos estáveis e duradouros, ainda que modestos, consequência dum equilíbrio adequado.
Ora. Sr. Presidente dentre as receitas ordinárias cobradas pela província de Macau no ano de 1954 figura em primeiro lugar, grandemente destacada da que imediatamente se lhe segue com excepção apenas da receita do capítulo 8.º «Consignação de receitas», a receita inscrita no capítulo 4. «Taxas-Rendimentos de diversos serviços», com o montante global de $ 4:815.361.12 ou sejam 26:484.486$16. E desse capitulo sobressai, em flagrante desproporção com as demais rubricas, a das «Receitas eventuais e não especificadas, que absorve ou sejam 24:392.568$91(3), ficando o exíguo saldo de $380.348,59, ou sejam 2:091.917$24(5), para ser distribuído pelas restantes onze rubricas do mesmo capítulo!
Acresce ainda, Sr. Presidente, que estas receitas, as eventuais e não especificadas, representam mais de um quarto de todas as receitas cobradas na província e pouco menos de um terço das suas receitas ordinárias.
É deveras impressionante o facto verificado e já nesta Assembleia tive ocasião de a ele me referir, frisando que. enquanto as finanças públicas de Macau se alicerçarem em receitas de tal natureza, não haverá a garantia da sua estabilidade, nem se poderá tão encarar com confiança o futuro!
Sr. Presidente: seguem-me na ordem do seu montante as receitas incluídas no capítulo 3.º Indústrias em regime tributário especial», com a cifra de $ 2:835.360.40 ou sejam 15.594.$20
Destas, importa salientar a receita cobrada sob a rubrica Imposto de consumo de 5 por cento ad valorem sobre os materiais importados ao abrigo do Diploma Legislativo n.º 1207, de 23 de Janeiro de 1932» no montante de $710:339.00 ou sejam 3:906.864$50, inferior em $489.661.00 à previsão ornamental e que mesmo assim constitui cerca de um quarto do total da receita cobrada nas suas dezasseis rubricas.

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Este imposto de consumo de 5 por cento aã valorem foi criado como consequência da situarão internacional do Extremo Oriente e teve a sua origem directa ou imediata no embargo imposto à China e de que Macau foi uma das vítimas!
Sr. Presidente: a política, de embargos como sanção económica tem provado sempre mal, por se mostrar contraproducente.
Foi o embargo votado pela hoje desaparecida Sociedade das Nações que produziu de certo modo a hecatombe da segunda guerra mundial, pois levou a Itália, atingida pelo referido embargo, a aproximar-se da Alemanha, passando ambas a praticar uma política económica que resultou absolutamente prejudicial ao equilíbrio europeu.
Sr. Presidente: presentemente ninguém pode, em boa verdade, afirmar, e muito menos provar, que o embargo imposto a determinado? territórios ultramarinos contra a China Comunista tenha evitado ou de qualquer modo impossibilitado a consolidação do armadura económica desse país.
Pelo contrário, esse embargo veio forçar os seus dirigentes a pôr de parte mercados e pontos de abastecimento tradicionais, recorrendo a outros fora do bloco ocidental - que ávida e astutamente, havia muito esperavam tal oportunidade - onde fácil lhes foi encontrar auxílio e meios para se lançarem numa febril e espantosa industrialização do seu vastíssimo território t- no aproveitamento intensivo dos seus praticamente inexauríveis recursos naturais.

Sr. Presidente: a lição do pausado de pouco ou nela serviu para evitar a repetição de lamentáveis erros.
O regime comunista já existiu na China, como é certamente do conhecimento geral, e o seu aparecimento ali foi possível, não por tendência pró-comunista do povo chinês e dos seus dirigentes políticos de então, mas apenas como único recurso ou única solução que a estes se oferecia para debelar a trágica situação em que o pais se encontrava perante a invasão japonesa da Mongólia Exterior e a indiferença da Liga das Nações, em face dos repetidos e angustiosos apelos do Dr. Sun Iat-Sen chefe da nação chinesa.
Vendo comprometidas a unidade da China e a vitória da Mia revolução, que ali implantara a república, ameaçado pela revolta que estalara no Norte do país e que alastrava rapidamente para o Sul. Sun lat-Sen viu-se obrigado a aceitar o único auxílio que se lhe oferecia - o soviético!
Em breve o Kuo Miu Tang - Partido Republicano Democrático da China - viu os seus princípios básicos tinto* de vermelho, cor representativa de ensinamentos que sempre repudiara; e aquele digno e bem intencionado homem de Estado sucumbiu à crescente força dos falsos amigos, que por toda :i parte arvoravam a bandeira comunista.
E aquilo a que estamos, infelizmente, assistindo agora, de uma profunda e íntima ligação entre a China e a Rússia Soviética, não se tornou então realidade por se ler dado n falecimento de Sun lat-Sen, após ter anunciado publicamente a projectada união dos dois países, morte esta que veio a produzir profundo golpe nos bastidores políticos da China com o desaparecimento do chefe supremo, que conseguira, com o seu indiscutível prestígio, manter a paz entre as facções rivais.
Sr. Presidente: a história repetiu-se e novamente a atitude, por parte de certas potências, de quererem isolar a Clima veio apenas favorecer os ambiciosos desígnios da Rússia Soviética, que sonha envolver o Mundo com a auréola vermelha com que se revesti, cobrindo-o de sangue!
O Mundo livre recusou-se a compreender o significado da revolução chinesa de 1911, lançando a China nos braços moscovitas, e toma agora atitude idêntica em presença da profunda convulsão social que se desenrola naquele país, sem tentar impedir por outros meios mais diplomáticos e menos económicos aquela consequência já observada no passado, como dissemos, o que redunda em prejuízo de todos.
Sr. Presidente: é evidente que o actual estado de coisas se repercute de pleno na situação económica e política de Macau. E não se liga que as dificuldades que ali estamos atravessando se filiam numa crise passageira, de maior ou menor duração, pois que tis consideramos representativas das novas condições adentro das quais temos de fixar um novo equilíbrio que determinará doravante a vida de Macau, a não ser que um melhor entendimento das nações estrangeiras com a China venha melhorar o ambiente actual.
Mas, mesmo nesta hipótese e pelas razões expostas, é pouco provável o regresso ao antigo desafogo, ainda que admita uma melhoria substancial em relação ao presente, pois que o embargo imposto a Macau nu exportação de determinados materiais paru a China, ainda que de insignificante influência na economia chinesa, veio, em contrapartida, representar profundo golpe na economia da província, que se viu facilmente substituída no seu papel de secular entreposto mercantil do Sul da China por outras regiões, algumas das quais situadas no litoral da própria China e que a torça das circunstâncias levou a serem adaptadas àquela função por meio de dispendiosos apetrechamentos, que nos levam à conclusão certa e irrefutável de que se manterão para sempre, em manifesto o prejuízo de Macau.
Sr. Presidente: feitas estas breves considerações a propósito da política do embargo, retomo os comentários sobre as receitas de Macau.
Merece ainda referência especial a receita inscrita no capítulo 1.º Impostos directos gerais, por constituir uma das tradicionais fontes de receita e que na conta em apreciação, ocupa o terceiro lugar na escala de valores. Cobrou-se neste capítulo a importância de $ 1:827.723,60, ou sejam 10:052.479$$85(5).
Destes impostos importa destacar:

a) A contribuição industrial, com a importância de $ 567.135.60 ou seja 3:119.245$80:
b) A contribuição predial, no montante de $ 1:014.828.60, ou 5.381.357$30;
c) O imposto sobre as sucessões e doações, com a importância de $34.779,91 ou 191.289$50(5);
d) A sisa sobre a transmissão de imobiliários por título oneroso, que somou $ 200.716,40, ou 1:103.940$20.

Em todos eles se verificaram quebras, tendo, no entanto, sido salientado que a sisa, embora não tivesse atingido a previsão orçamental, aumentou cerca de $ 40.000.000, ou 220.000$ em relação à cobrança do ano de 1953.
Sobre este imposto ocorre-me deixar o seguinte apontamento: Macau, como oásis de paz e de ordem nesse conturbado Extremo Oriente, tem sido procurado desde a segunda guerra mundial como porto de abrigo seguro pelos capitalistas das regiões próximas, que, fugidos dos pavores da guerra e da incerteza do momento, ali procuram salvar não só n sua integridade física como ainda o seu património, amealhado à custa de longos anos de trabalho e sacrifícios.
Não encontrando em Macau, Infelizmente, um mínimo de condições necessárias para continuarem as suas actividades indústrias ou iniciarem outras que porventura lhes parecessem tentadoras ou rendosas, estes.

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capitalistas têm aplicado parte do seu capital na aquisição de bens móveis, prédios urbanos, como meio que lhes pareceu mais simples e seguro para conseguirem remuneração ao seu capital que lhe permitisse, pelo menos, viver sem desfalcar os bens monetários que consigo traziam.
Daí o incremento que se tem notado, deste a última guerra, nas compra e vencias de imóveis e a repercussão no valor da sisa arrecadada.
Porém esse fenómeno, nos últimos anos, não tem conseguido manter manter o seu anterior, apesar ido esporadicamente se notar, de tempos a tempos, um certo aumento de volume nas transações derivado de Situações - excepcionais e que por isso mesmo se não mantém, notando-e pelo contrário, e com certa intensidade, um retraimento por parte dos potenciais compradores na aquisição de prédios.
Sr. Presidente: entre outras razões de tal retraimento julgo dever poupar um dos primeiros lugares a circunstância de os proprietários aos prédios em Macau, arrendado por rendas relativamente baixas, só em condições muito onerosa poderem conseguir o despejo dos arrendatários que estejam em dívida de renda para com eles.
Na verdade, o único meio legal de se conseguir tal despejo é o estabelecido no processo especial nos artigos 970.º o seguinte do Código de Processo Civil.
Ora uma acção de despejo proposta nessas condições, sem contestação por parte do inquino, o que mais vezes sucede, importa mesmo assim, em custas e elos do processo, em cerca de 1.100$, não se influindo as custas de parte nem os honorários do advogado do autor.
Estas custas e selos são, em via de regra, suportados pelo mesmo autor, porque, não os pagando o inquilino nem possuindo este normalmente bens por onde se pudesse obter o pagamento coercivo, é o senhorio quem terá de os pagar para poder conseguir a execução do desejo ordenado.
Existem em Macau um glande número de prédios e andares cujas rendas orçam, em números redondos, entre 100 e -400$ mensais, e os senhorios de tais prédios, tendo de recorrer aos meios judiciais para despejar o inquilino que esteja em dívida de rendas, ficarão prejudicados com esta demanda em um ou mais anos do valor da renda.
E por isso que em Macau certos inquilino, conhecedores dessa situação, dela se aproveitam, pagando o primeiro mês de renda adiantadamente e a caução de mais um mês, que quase sempre lhes é exigida, para deixar de a pagar no fim do terceiro mês, até que o deitando contas à a vida e porque lhe é mais vantajoso o rápido assim proceder, propõe indemnizá-los em três ou mais meses de renda, para que deixem vago desde logo o andar ou prédio que ocupam.
Sr. Presidente: esta situação anómala tem contribuído em apreciável escala para o retraimento na aquisição de prédios, em Macau. Situarão idêntica existiu na vizinha colónia de Hong-Kong, mas o Governo Inglês prontamente a remediou, estabelecendo um processo sumaríssimo e económico para o despejo, por dívidas de renda, de prédios ou andares arrendados até determinado montante.
Ouso pedir a atenção do ilustre Ministro do Ultramar para a atrás exposta, certo de que S. Ex.ª, na posse dos elementos necessários s dentro do alto critério que sempre demonstrou, não deixará de lhe dar a conveniente solução. Rendimento mal e limitadas as excessivas avaliações ordenadas pela Fazenda do concelho para efeito do se conseguir o pagamento da sisa adicional, o volume das compras e vendas em Macau será acentuadamente aumentado, com o correspondente reflexo na arrecadação do imposto devido.
E é quanto se me oferece dizer no capíto-lo das receitas.
Sr. Presidente: quanto ás despesas nota-se uma acentuada compressão na maioria delas, tendo de notar que as despesas ordinárias do ano de 1954 foram inferiores às mesmas do ano anterior em $ 3:178.336.71, ou sejam 17:480.961$90(3), o que é apreciável.
No entanto, de entre as despesas ordinárias que sofreram permito-me destacar a- que dizem respeito aos estabelecimentos de ensino -liceu e ensino primário- e aos serviços de saúde para sobre eles fazer umas brexas considerações de carácter muito geral, em me referir a rubricas nem a números.
Quanto ao ensino, quer-me parecer que do redime da maior economia e austeridade, levará ser ele o menos sacrificado, especialmente na parte respeitante ao apetrechamento escolar, tão necessário para a sua eficiência.
Quanto aos serviços saúde, permito-me lembrar a importante obra assistência que os mesmo serviços realizando, com a assistência médica, hospitalização e funcionamento gratuito de medicamentos vários à população pobre e aos funcionários públicos.
A redução de despesas nestas rubricas virá necessariamente o campo de acção dos serviços de saúde e também necessariamente se reflectirá na vida económica do pequeno funcionalismo público, que não podendo obter gratuitamente muitos medicamentos anteriormente existentes na farmácia do Governo (que por falta de verba não renovara as suas reservas que só vê compelido a adquiri-los do seu próprio bolso, no mercado local, o que indirectamente redunda, num corte dos seus já parcos vencimentos.
Sr. Presidente: algumas palavras mais sobre o Plano de Fomento, incluído nas despesas extraordinárias da província.
Nota-se uma certa demora, ia dizer hesitação, na sua execução, e os pagamentos feitos no ano de 1934 de $ 1.247.167,38, ou sejam 6:859.420$39 constituem pouco mais de uma sétima parte da verba autorizada, que é 7:103.018,73 ou sejam 94:066.603$01(05)
Dadas as condições especialissimas da província, a execução do Plano de Fomento ali deverá revestir-se da maior prudência, a fim de se evitarem gastos imiteis e extravagantes, que jamais serão recuperáveis e, por isso, virão afectar a posição financeira da província.
A economia de Macau liga-se intimamente à, da vizinha colónia inglesa de Hong-Kong. Nesta também se fizeram sentir os perniciosos efeitos do embargo a China, e a mudança de regime neste país também lhe não foi indiferente, especialmente no campo das importações e exportações.
Todavia, as excepcionais condições deste território permitiram-lhe uma reacção eficiente e uma- admirável adaptação às novas condições, por meio de diversas providências, entre as quais se destaca o espantoso incremento das indústrias já exigentes e de muita outras novas que ali foram introduzidas por industriais chineses fugidos de Xangai à onda comunista.
Devem notar-se também as especiais fácil idades concedidas pelo Governo local a esse influxo de capitais e de actividades, que ali encontram, não só uma eficiente, organização bancária, mas ainda a quase ausência de impedimentos burocráticos à sua laboração.
Ora, é verdade que Macau não dispõe, como Hong-Koug de uma apreciável extensão territorial nem de tão esplêndido porto marítimo (o terceiro do Mundo:), mas não é menos certo que a maioria dos empreendimentos industriais que alguns têm querido realizar em Macau sucumbem às pelas burocráticas e legislativas - deficiência que vem de há muito -, as quais só muito recentemente, por feliz iniciativa do actual Ministro do

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Ultramar foram abolidas em grande parte, mas porventura demasiado tarde, pois não aproveitámos o influxo fugido da China a que Hong-Kong tão bem soube atrair com as facilidades oferecidas.
Como tantas vezes tem sucedido, também desta «perdemos o comboio»!
Todavia, ainda me parece ser de tentar esse caminho, como sendo o melhor e o mais seguro para st; conseguir o renascimento de Macau, em vista n obtermos substanciais fontes de receitas com a produção industria], que poderá encontrar mercados compensadores no, nossos outros territórios ultramarinos e até na metrópole, onde já surgem, em apreciável quantidade, artigos oriundos da China e de Hong-Kong, alguns dos quais de possível produção em Macau, desde que para tanto se concedam facilidades e garantias compensadora», acompanhados de adequadas pautas aduaneiras proteccionais das mercadorias ali fabricadas.
Por outro lado, urge, de qualquer modo, a exemplo do que se observa nas relações comerciai» de Portugal com certos países com os quais não mantemos relações diplomáticas, conquistar o mercado chinês para alguns produtos nacionais, que ali seriam colocados por intermédio de Macau, até mesmo em regime de permuta directa, como ainda recentemente fizemos com as Filipinas trocando arroz por açúcar.
Sr. Presidente: vou terminar. As previsões, por mais optimistas, condizem-me o- considerar a actual situação de Macau como estabilizada em relação às condições do Extremo Oriente, condições essas em que não é lícito esperar grandes mudanças nos tempos mais próximos.
É enquadrados nessa convicção e nesses limites que temos de assentar as directrizes da futura vida económica n financeira de Macau, aceitando as realidades e procurando soluções adequadas, sem optimismos enganadores nem pessimismos derrotistas.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem! O orador foi muito cumprimentada.

O Sr. Duarte Silva: - Sr. Presidente: entre as atribuições que competem às assembleias políticas assumem especial relevo aã que respeitam a fiscalização da administração financeira, do Estado: a autorização da cobrança de receitais e da efectivação de despesas e, depois, a apreciação das contas públicas.
São prerrogativas que as mesmas assembleias ciosamente conservaram através dos tempos, prerrogativas que se tornaram tradicionais nos regimes parlamentares e que o nosso sistema político entendeu dever manter nos artigos 91.º, n.º 3.º, o 171.º da Constuição.
No entanto, este é o primeiro ano em que as coutas respeitantes às províncias ultramarinas são submetidas u apreciação da Assembleia Nacional.
A explicação do facto consta do relatório que as acompanha e, por isso, nos limitando-nos de a reproduzir, limitando-nos a expressar a nossa satisfação pelo cumprimento do preceito constitucional e a afirmar que são dignos de louvor os serviços que se não pouparam a esforços para conseguir esse objectivo.
De facto, nesse documento, elaborado pela Direcção-geral de Fazenda do Ultramar, documento de tal clareza que faz desaparecer quaisquer dúvidas que pude sem surgir no exame de coutas desta natureza, estão relatadas ai» não poucas diligências que foi necessário levar a cabo para se conseguir a desejada uniformidade das coutas e a sua apresentação a tempo de serem tomadas conjunta mente com a conta geral da metrópole.
Desta forma, compulsando um único documento fácil é acompanhar a marcha das cobranças realizadas no ultramar português, saber a quanto montam as receitas de cada uma das suas parcelas em que foram aplicados os recintos em cada uma cobrados.
Não me proponho fazer o exame das contas apresentadas, trabalho que foi longa e proficientemente realizado no relatório já referido, no não menos interessante relatório que precede a declaração do Tribunal do Coutas e ainda no douto parecer da nossa ilustre Comissão de Coutas.
Quero apenas trazer para aqui alguns apontamentos que a leitura desses documentos mo sugeriu, mais particularmente no que respeita a província de Cabo Verde, que tenho a honra de representar nesta Assembleia.
Os resultados gerais apurados no quadro v do relatório citado mostram-nos:

Que as receitas gerais do ultramar subiram em 1954 a 3.607:319.610$49
Que as despesas realizadas 110 mesmo ano atingiram 4.180:681.085$15
resultado daí um saldo positivo de ................. 1.488:638.531$34
concluindo-se destes resultados que no exercício de 1904 foi respeitada, a tradição de muitas províncias ultramarinas, tal como na metrópole, se não fazerem despesas superiores às possibilidades das correspondentes receitas.
No que toca às receitas, nota-se, do exame detalhado do quadro n, que, com excepção da província de Macau, que tem uma estrutura fiscal muito própria, não silo grandes as diferenças na distribuição por capítulos das receitas ordinárias das diversas províncias ultramarinas.
Assim, em relação ao total das receitas ordinárias, os impostos directos representam, em regra, cerca de 20 por cento, atingindo 38 por cento em Timor e 34 por cento na Guiné, enquanto em Moçambique não passam de 14 por cento e em Macau 10,7 por cento.
Os impostos indirectos representam em Angola 40 por cento, em Cabo Verde 30 por cento, na índia 30 por cento, na Guiné e em S. Tomé 27 por cento em Timor 23 por cento, em Moçambique 21 por cento e um Macau 4,6 por cento.
As diferenças que se notam devem-se, quer-nos parecer, à diversidade dos regimes fiscais, aliás explicável pelas características próprias da economia de cada província.
O quadro IV dá-nos, por capítulos, a nota das despesas ordinárias e extraordinárias efectuadas em cada um dos territórios ultramarinos.
Do total geral de 4 180 681 contos, já indicado 3071108 contos representam as despesas ordinárias o 1109573 contos respeitam a despesas extraordinárias.
Se computarmos a população do ultramar em 11866000 habitantes, servindo-nos dos números fornecidos pelo censo de 1950, teremos uma capitação de 352$ (259$ de despesas ordinárias e 93$ de despesas extraordinárias).
Examinando os números, referentes a cada uma das províncias verifica-se que S. Tomé o Príncipe, Macau. Moçambique e Angola excedem a referida média, enquanto Timor, Guiné, Cabo Verde e o Estado da índia a não atingem.
A capitação que corresponde a Cabo Verde é de 241$ em relação às despesas ordinárias e do 41$0111 relação às extraordinárias.
A capitação mais elevada pertence à província do S. Tomé. onde as despesas ordinárias orçam por 692$ por habitante, facto que deve ter a sua explicação na

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circunstância de ser S. Tomé, de longe, a província de menor população, sem que isso queira significar a possibilidade de menores despesas ou encargos.

Com excepção da de 8. Tomé, todas as capitações são inferiores à da metrópole, que foi de 589$, como se vê de fl. 90 do douto parecer da Comissão de Contas.

Nos resultados gerais, atrás apontados, a província de Cabo Verde entrou com a

Receita de...........48:663.769$31
Fez a despesa de........41:838.874 $95
E apurou o saldo de....... 6:824.894$36

Este saldo é tanto mais de apreciar quanto é certo que se trata de uma província cujas receitas são de montante muito reduzido e cujas despesas poderiam ser de verba muito inferior se não fora a necessidade de manter em cada uma das ilhas quase todos os serviços públicos, embora, em alguns casos, a pequena importância de certos concelhos pudesse dispensar parte desses serviços se o território da província fosse contínuo.

Essa é, de resto, a grande dificuldade da administração de Cabo Verde, onde as despesas com o pessoal absorvem cerca de 60 por cento das receitas ordinárias, o que — devemos concordar — é percentagem demasiado elevada.

No entanto, o funcionalismo de Cabo Verde é, sem dúvida, o mais mal remunerado e devo dizer que há necessidade de rever os vencimentos e ajustá-los às condições de vida.

Contos

Verifica-se que o excesso da cobrança sobre a previsão orçamental foi de......5 310
e que a economia nos gastos autorizados subiu a............... l 514
o que perfaz o valor do saldo já apontado, ou sejam............6 824

A responsabilidade pelo excesso da cobrança sobre a previsão cabe principalmente

Contos

A contribuição industrial........ l 128
A sisa................. 179
Aos direitos de importação....... 3 539
Aos direitos de exportação........ 284
Ao imposto do selo........... 514

O excesso na cobrança da contribuição industrial e do imposto do selo deve-se ao agravamento das respectivas taxas, e não, como seria para desejar, ao alargamento da matéria tributável. Não houve maior produtividade das fontes de receita, mas tão-sòmente uma elevação das taxas.

Se compararmos as cobranças de 1954 com as do ano anterior, vemos que, enquanto a contribuição industrial variável (cobrada nas alfândegas) havia produzido em 1953 apenas 2022 contos, em 1954 rendeu 3104 contos, ou sejam mais 1082 contos, isto é, um aumento superior a 50 por cento; e a estampilha fiscal, que em 1953 havia produzido, como de costume, 832 contos, rendeu 1071 contos, tendo, pois, um aumento de cerca de 30 por cento.

Diga-se, de passagem, que o rendimento desses impostos não foi muito maior porque as novas taxas só começaram a vigorar quando o. ano ia já bastante adiantado. Tanto assim, que as previsões para 1956 passaram a ser de 3800 contos para a contribuição industrial variável e 1400 contos para a estampilha fiscal, o que representa um aumento de 90 por cento e 70 por cento, respectivamente, em relação a 1953.

A rubrica " Selos diversos ", que em 1953 rendeu 322 contos, figura no orçamento para 1956 com uma previsão de 800 contos, ou seja, mais de 100 por cento de aumento.
Isso justifica plenamente os reparos que, em devido tempo, se fizeram à nova tabela do selo, que fixou taxas, em muitos casos, exageradas e incomportáveis, muito superiores às que pelos mesmos actos se cobram na metrópole e nas outras províncias ultramarinas — que, na mais pobre de todas, não parece ser razoável.
O excesso da cobrança nos direitos de importação o de exportação justifica-se:
Quanto à importação, por esta ter sido superior em 57 por cento à realizada em 1953, contribuindo para tal aumento:

Toneladas

O carvão de pedra com mais...... 4 869
O cimento com mais.......... 343
A gasolina com mais.......... 161
O petróleo com mais.......... 129
O óleo combustível com mais......281 793
O açúcar com mais........... 235
No que se refere à exportação nota-se que saíram em 1954 mais que em 1953 as seguintes mercadorias:
Toneladas
Óleos combustíveis fornecidos à navegação 236 792 Água para abastecimento à navegação . . 13 886
Purgueira.............. 911
Peixe em conserva........... 225
A balança comercial, como de costume, apresenta-se deficitária, não obstante dela constar uma apreciável diferença entre a quantidade de combustíveis fornecidos à navegação e a quantidade entrada.
Torna-se necessário estimular a exportação de alguns produtos, como a purgueira, o rícino e as conservas de peixe, que parece terem boa aceitação no exterior.
Há que favorecer a intensificação da cultura da banana, da laranja e do café, cuja colocação cremos assegurada.
Há que facilitar e até estimular, com a concessão de isenções, a instalação de todas as indústrias que apresentem condições de viabilidade, evitando, ao mesmo tempo, a concorrência injustificada, que aparece, movida apenas pela emulação, sempre que qualquer iniciativa começa a prosperar.
Há que rever quanto antes as pautas aduaneiras, não com objectivo simplista de conseguir de momento maiores receitas pelo agravamento das taxas, mas com uma visão mais larga, sem a preocupação da arrecadação imediata de uma receita um pouco mais avultada.
Ouço, por exemplo, dizer que a exportação das pozo-lanas, ainda na sua fase inicial, tem possibilidade do colocar em países esliaugeiros quantidades importan-tes, mas que o produto, que é pobre e se acha sobre-carregado com transportes vários e correspondentes tráfego e armazenagem, não consente a taxa de exportação, que para o estrangeiro é mais elevada.
Será assim?
Não o posso garantir; mas se for impõe-se a modificação da taxa.
Não será, utilmente, mais proveito-so, mesmo no ponto de vista estritamente fiscal, receber o produto mais ou menos volumoso de uma taxa pequena do que manter uma taxa elevada, que nada produz porque não consente a exportação?
Interessa ainda salientar que do mapa das principais mercadorias importadas nos anos de 1953 e 1954 se verifica que não houve neste último anos necessidade de se importar milho, o que libertou a balança comercial de um peso superior a 2000 contos.

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Não deixar de lamentar que numa despesa ordinária autorizada no montante de 34:999.931$63 só tivessem sido consignados 300 contos para obras noras e 2030 contos para a conservação e aproveitamento de imóveis, isto é, somente 6,7 por cento daquela verba.
Há muito que fazer em Cabo Verde. Quase se pode dizer que está tudo ainda por fazer. É, porém, imprescindível dotar a província de estradas, se se pretende tirar todo u rendimento das outras obras que porventura se façam.
Sem estradas perderão grande parte da sua utilidade as obras de hidráulica agrícola e até mesmo as obras portuárias.
Quando a Assembleia apreciou o Plano de Fomento tive ocasião de me pronunciar sobre o assunto e até apontei as estradas que me pareciam de mais premente necessidade, lamentando que na proposta do Governo se afirmasse que as estradas ficariam a cargo dos recursos do orçamento normal, pois me parecia que o orçamento normal não comportava tal possibilidade. E a verdade é que, tendo as receitas ordinárias subido de 35000 contos em 1954 para 43000 contos em 1956, continuamos na mesma em matéria de estradas.
Há ainda uma observação que não quero deixar de fazer os saldos dos exercícios anteriores apresentavam em 31 de Março de 1955 uma disponibilidade de 10:348.5961132, vendo-se do documento n.º 25 junto às coutas qual a aplicação que a tais saldos tem sido dada desde 1941 a 1954.
Pena é que, por vezes, tenha havido necessidade de lançar mão desses saldos não para fazer face somente às despesas que, por sua natureza, devam ser por eles cobertas, mas para reforçar despesas ordinárias insuficientemente dotadas na tabela orçamental, o que, nos referidos catorze anos (1941 a 1954), reduziu o saldo de exercícios findos na importante cifra de 7844 contos, que melhor aplicação teriam tido em despesas de carácter reprodutivo.
Feitos estes reparos, que, aliás, na sua maior parte, se não referem à administração actual, e que formulo não com o propósito de criticar e condenar, mas no intuito de contribuir, quanto possa, para a melhoria das condições de vida da minha terra, não desejo terminar nem uma palavra de justiça para o Governo de Cabo Verde.
Se as contas são, como cremos, o espelho de uma administração, as que foram submetidas à nossa apreciação mostram que a província de Cabo Verde foi, durante o ano de 1954, governada com superior critério e honestidade e dentro das normas legais.
Apraz-nos fazer justiça a quem tem dado a província o melhor da sua inteligência e boa vontade.
Durante o ano de 1954 prosseguiram muito lentamente, em Cabo Verde, as obras custeadas pelo Plano de Fomento.
A obra mais importante - o Porto Grande - requeria estudos e sondagens prévias, que tomaram algum tempo, mas, graças à boa vontade do Ministério do Ultramar, já está adjudicada.
Estou certo de que o ritmo dos trabalhos se vai modificar para que a província possa em breve ver realizadas as obras previstas no referido Plano e que para ela constituem a base de unia vida nova.
Encaremos com confiança o futuro.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Dando o meu voto u aprovação das contas de realização orçamental doa províncias ultramarinas relativas ao exercício de 1954 desejo terminar estas despretensiosas considerações manifestando o meu subido apreço venerando Tribunal de Contas e à nossa Comissão pelos valorosíssimo elementos de estudo que nos proporcionaram e também à Direcção-Geral de Fazenda do Ultramar pelo importante trabalho que apresentou e pelo esforço despendido para o ter presente a Assembleia dentro do prazo legal.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem !

O orador fui muito cumprimentado.

O Sr. Monterroso Carneiro: - Sr. Presidente em primeiro lugar desejo apresentar a V. Ex.ª, Sr. Presidente, os meus respeitosos cumprimentos e os protestos da minha mais rendida homenagem às suas altas qualidades e virtudes.
Sr. Presidente: só o facto de subirem à apreciação desta Assembleia Nacional, e pela primeira vez, as contas das províncias ultramarinas me encorajou a vir à presença de VV. Ex." apresentar alguns apontamentos sobre as contas de realização orçamental de Angola, província de que tenho a honra de ser um dos representantes, o mais modesto, sim, mas muito dedicado.
A apreciação de contas desta natureza exige comentador especializado em preceitos de contabilidade, que reconheço não possuir, contra-indicando-me assim para a elas me referir.
Poderá até ser levado a impertinência minha o manifestar-me de qualquer maneira sobre elas depois de compulsado o brilhante e esclarecedor parecer da Comissão de Contas Públicas da Assembleia Nacional, onde o seu ilustre relator, Sr. Engenheiro Araújo Correia, se pronuncia por aquela forma tão proficiente, detalhada e esclarecedora a que nos vem habituando desde há anos nos seus pareceres sobre as Contas Gerais do Estado.
Mas o carinho que Angola me merece venceu a hesitação; apenas tenho a meu favor o largo tempo que dediquei a diversas actividades nesta magnífica província (onde tantos portugueses ganham e perdem a sua vida), muito embora sabendo que este facto não seja o bastante para me autorizar a versar com profundeza a questão económica e financeira de Angola através dos resultados das contas do primeiro exercício trazido à apreciação desta Assembleia.
Por isso o farei modestamente, mas com espírito construtivo e sentido nacional, que são norma desta Assembleia.
Perdoar-me-á, pois, V. Ex.ª, Sr. Presidente, e VV. Ex.ª, Srs. Deputados, relevar-me-ão a singeleza das minhas considerações. Estas serão breves.

Começo por me congratular com os resultados das contas de exercício do ano fiscal trazidas à consideração da Assembleia Nacional e permito-me julgar de muito apreço o relatório das contas de realização orçamental das províncias ultramarinas relativas ao exercício de 1954, organizadas pelo seu signatário, o actual director de Fazenda do Ultramar.
Das contas em exame verifica-se que a receita ordinária prevista para o ano de 1954 foi orçamentada em 1.131:661.507$47, destinada a custear a respectiva despesa ordinária, orçada, por seu lado, em 1.000:680.307$47, donde resultaria um excesso na previsão de 130:981.200$. Este excesso, porém, destinar-se-á a cobrir o déficit previsto na realização da despesa extraordinária, para a qual apenas foro orçamentada uma receita de 484:000.000$.
Deste modo, a despesa extraordinária orçamentada elevar-se-ia a 614:981.200$, verba esta que seria destinada à dotação de obras vultosas de um largo plano

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de fomento, com apreciável projecção na economia da província:

Vara Plano de Fomento ............ 442:000.000$00
Para Fundo de Fomento ............ 140:000.000$00
Para outras despesas
extraordinárias .................. 32:981.200$OO

e nestas regas e enxugos que se bem estudadas as condições climáticas, a fertilidade das terras, a facilidade de escoamento de produção e as condições locais para a adaptação saudável da colonização europeia, são de especial interesse nacional.
Aproveitamentos hidroeléctricos, prospecções geológicas mineiras, caminhos de ferro, portos e seus apetrechamentos, aeródromos e estradas, estas problema número um de Angola e dotadas com 100:000.000$ no orçamento de 1954, são outras tantas realizações absolutamente necessárias ao rápido e eficaz desenvolvimento.
Participações no Banco de Fomento, na companhia de navegação aérea, edifícios e monumentos, tudo formando um plano de conjunto visando a valorização de Angola, onde os Portugueses continuam demonstrando n tenacidade da Baça e as suas altas qualidades de povo colonizador.
A preocupação de se dotarem condignamente obras e empreendimentos de tal envergadura nesta província reflecte bem o interesse que o Governo da Nação e os seus altos representantes na província têm posto ao serviço do Império e dos seus povos.
A traços largos e muito ao de leve aludimos aos meios postos à disposição do Governo da província, em previsão prévia, é verdade, para durante o exercício de 1954 poder enfrentar e realizar o programa a que, também em linhas gerais, fizemos referência e já vem pesando desde atrás e em anos sucessivos na responsabilidade do Poder Executivo da província.
As previsões, porém, raramente se subordinam à realidade, e pelos números que o mapa das receitas nos oferece se verifica que na verdade a administração e execução do plano orçamental excederam o cálculo mais optimista.
Para o confirmar bastará notar que a previsão da cobrança a realizar pelas oito grandes divisões do orçamento da receita ordinária foi largamente ultrapassada, elevando-se o excesso das cobranças a 344:621.205$42.
Ao contrário, porém, constata-se que o capitulo da receita extraordinária acusou uma diminuição em relação à previsão de 269:715.556$20.
Destes números se conclui que o excesso da cobrança das receitas sobre a respectiva previsão foi então de 74:905.649
Adicionando, porém, a esta importância os saldos das pontas de exercícios findos, a importância dos saldos dos créditos revalidados, a dos créditos abertos com contrapartida em recursos alheios à cobrança das refeitas ordinárias - e extraordinárias, cujo somatório totaliza 515:868.376$43, pode determinar-se o volumoso excedente total da receita em relação à previamente orçamentada, de 590:774.025$65.
A totalidade das receitas ordinárias e extraordinárias atingiu a verba global de 2.206:435.533$12, pela qual se deveriam custear todos os encargos da província.
Estes atingiram, na realidade, a elevada soma de 1572:319.385, e estão devidamente discriminados no mapa da despesa do relatório a que nos vimos referindo, tendo ficado aquém da despesa prevista a realizar em 43:342.121$67. A avaliação da despesa pôde ser feita com mais aproximada previsão do que a da receita.
O excedente da receita adicionado do saldo da despesa a menos realizada (590.774.025$65 + 43:342.121$67)
leva a ler de determinar-se que os resultados do exercício de 1954 apresentam um saldo de 634:116.147$32.
A este, ainda, porém, terão de ser reduzidos os saldos das cotações do Plano de Fomento a transferir para o ano de 1955, no montante de 293:640.080$78. reduzindo, assim, o saldo efectivo do exercício a 340:476.066$54.
Nada de novo trouxe à Assembleia, bem o sei; citei apenas os números que comandam. Seria difícil fazê-lo, pois as contas de Angola estão tão detalhadamente analisadas e comentadas no parecer sobre as contas gerais do ultramar que nada, julgo, se lhe poderia acrescentais.
Depois do breve depoimento que acabo de fazer sobre as contas da província de Angola relativas ao exercício de 1954 e agora submetidas à apreciação da Assembleia Nacional, que me parecer virão a merecer a sua aprovação, declaro que por minha parte com elas concordo e desde já expresso o meu voto de aprovação.
Aproveitando, ainda, a oportunidade desejo referir--me a alguns pontos que me parecem de interesse serem focados e merecerem a atenção da Assembleia.
Assim:
À desafogada situação financeira de Angola, cujas receitas públicas tão elevadas se apresentam, deveria ser um índice de igual prosperidade na sua economia privada, e, portanto, das suas actividades agrícolas, comerciais e industriais.
Porém tal não se verifica na realidade, porque no momento actual abstraindo numa parte do sector agrícola referente ao café, do qual o Estado também colho benefícios com o imposto da sobrevalorização - as restantes actividades não atravessam uma época desafogada, antes, pelo contrário, estão sofrendo uma crise, que faço votos seja passageira.
Alguns anos de más condições climatéricas influenciando menores produções; crises de baixas cotações p consequente menor abundância de numerário ou talvez também um esgotamento proveniente de excessiva cargo de impostos, filha da reforma tributária que há seis anos vem pesando sobre a província de Angola, contribuem para ela.
Numa província como esta -grande e extenso território em formação- onde há campo para todos os empreendimentos, grandes ou pequenos, que é de interesse nacional fomentar, onde existem imensos territórios desde o Congo ao México, no Cubango, no Cuanhama, na Lunda, entre o Cuanza e o Bengo, às portas de Luanda, todos a pedirem iniciativas, não me parece que para as estimular se comece desde o início da mais pequena tentativa a sujeitá-las imediatamente a impostos gravosos, que, em vez do necessário incitamento, servem apenas para causar apreensões e desunimos n todos os que animosa e confiadamente a eles se abalançam, atrofiando-os e não servindo de estímulo n novas e necessárias iniciativas.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Para desenvolver um território grande e prometedor como Angola e do seu desenvolvimento conseguir mais tarde fontes de impostos de que o Estado naturalmente carece e lhe são devidos é necessário, primeiramente, amparar e estimular todo e qualquer empreendimento nascente.
Para tanto deveria ser missão do Estado, através dos seus serviços técnicos já montados ou de novos serviços que seja mister criar, prestar auxílio aos empreendimentos honestos desde o seu início, determinando a sua grandeza pelo capital à surpresa, indicando as zonas apropriada ao fim em vista, guiando os processos de trabalho a pôr em prática, ministrando ensinamentos

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892 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 143

e até fornecendo sementes seleccionadas, se de tal for o caso, em vez de querer ser logo desde início - o que actualmente se verifica, - como que um sócio sem capital, exigindo comparticiparão em lucros inexistentes, o que faz colectando-os com pesadas taxas de imposto.

Vozes : - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Se for uma realidade a anunciada criação de um Banco de Fomento, cuja falta de há muito se vinha sentindo em Angola, o se este tiver capital correspondente à grandeza da obra a realizar e ao muito que já está feito, será indubiàvelmente um grande passo dado a favor da economia da província e um valioso auxiliou todos quantos ali actualmente trabalham e aos muitos mais que ainda ali cabem e é necessário acorram para cooperar com o seu esforço e capital no ansiado desenvolvimento de Angola.
E o Estado, comparticipando, como consta, com a maioria do seu capital, prestará assim já um primeiro o decisivo auxílio às suas actividades, o que muito me apraz registar.
Abordarei ainda dois casos que julgo deverem merecer a consideração da Assembleia, porque, prendendo-se com as contas orçamentais de Angola, pois são delas um fonte de receita e outro motivo de maior despesa, me parece não ser deslocável referir.
É sabido que vigora em Angola desde 1948 a nova reforma tributária, cujo projecto foi elaborado por ordem do então Ministro do Ultramar e dele encarregado um dos mais competentes funcionários superiores daquele Ministério.
Este orientou certamente o seu trabalho mais em função do progresso e desenvolvimento aparentes da província, em face dos números e elementos colhidos junto das estâncias oficiais, do que em face dos resultados de um rigoroso e demorado inquérito a que, em nosso modesto entender, deveria ter procedido junto de cada modalidade de contribuintes.
Não ignoro as dificuldades que se lhe teriam levantado para se orientar convenientemente, mas n sua larga experiência e faculdades de trabalho e saber tudo saberiam ter vencido.
Nunca é tarde de mais para dar remédio ao que não estiver bem. De lamentar foi apenas que o mesmo funcionário se não tivesse demorado mais na província para acompanhar de perto a reacção do contribuinte, remediar o que estivesse errado ou deficiente e aperfeiçoar ou, melhor, promover a alteração do que de tal fosse susceptível e necessário.
E ele melhor do que qualquer outro, como autor que foi do projecto e estudando cada caso de per si, seria a pessoa indicada para o fazer nas justas condições.
Assim se teria evitado, por exemplo, que na ânsia de aumentar receitas - como há bem pouco tempo ali se verificou - se agravassem impensadamente as taxas que pesam sobre as actividades agrícolas, que hoje na sua maioria mal suportavam já aquelas que a lei facultava como máximas. E outros casos há, certamente, que bem mereciam o seu estudo e a sua esclarecida atenção.
É, pois, muito urgente que o autor do projecto ou outro funcionário superior ali se desloque para tal efeito.

Vozes : - Muito bem!

O Orador: - O outro caso refere-se aos vencimentos dos funcionários da província de Angola.
O custo de vida tem-se agravado ràpidamente nos últimos anos e sem esperança de retrocesso. Em conformidade, a vida torna-se cada vez mais difícil para todos os que só contam com vencimentos fixos quando estes não acompanham esse encarecimento.
E os funcionários de Angola, cujos vencimentos não foram ainda aumentados em proporção com as actuais circunstâncias, têm uma tarefa cada vez mais penosa para se manterem e sustentarem a família adentro daquela dignidade que a sua função requer e é necessário garantir-lhes.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Há mais de um ano que se encontra pronto e entregue a quem de direito o projecto do revisão dos vencimentos dos funcionários do ultramar.
Reputo da maior urgência que essa reforma seja posta em execução e que a actualização dos vencimentos dos funcionários ultramarinos soja dentro em pouco uma realidade.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Assim termino e, fazendo votos pura que estes dois casos que referi - revisão da reforma tributária em vigor em Angola o aumento de vencimentos aos seu funcionalismo - mereçam a atenção do Sr. Ministro do ultramar, fico ao mesmo tempo certo de que S. Ex.ª, com o interesse que costuma dispensar a todos os assuntos que o seu Ministério orienta e comanda, não deixará de promover e resolver com rapidez.
Fazendo-o praticará um acto do justiça o prestará mais um alto serviço aos que em Angola trabalham.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão.
O debate continuará na sessão de amanhã, à hora regimental.
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 30 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

André Francisco Navarro.
António Calheiros Lopes.
António Camacho Teixeira de Sousa.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos Mantero Belard.
João Alpoim Borges do Canto.
Joaquim de Sousa Machado.
D. Maria Leonor Correia Botelho.
Paulo Cancella de Abreu.
Pedro de Chaves Cymbron Borges de Sousa
Teófilo Duarte.

Srs. Deputados que faltaram à sessão.

Agnelo Ornelas do Rego.
António Carlos Borges.
António Júdice Bustorff da Silva.
António Raul Galiano Tavares.
António Russell de Sousa.
António dos Santos Carreto.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Camilo António de Almeida Gama Lemos Mendonça.
Carlos Vasco Michon de Oliveira Mourão.
Daniel Maria Vieira Barbosa.
Eduardo Pereira Viana.

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19 DE ABRIL DE 1956 893

Herculano Amorim Ferreira.
João Afonso Cid doa Santos.
João da Assunção da Cunha Valença
João Carlos de Assis Pereira de Melo..
João Cerveira Pinto.
João Maria Porto.
Joaquim de Moura Relvas.
Joaquim de Pinho Brandão.
José Gualberto de Sá Carneiro.
José Maria Pereira Leite de Magalhães e Couto.
José dos Santos Bessa.
Luís Filipe da Fonseca Morais Alçada.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Maria Sarmento Rodrigues
Miguel Rodrigues Bastos.
Pedro Joaquim da Cunha Meneses Pinto Cardoso.
Ricardo Vaz Monteiro
Rui de Andrade.
Sebastião Garcia Ramires
Urgel Abílio Horta.

O REDACTOR - Leopoldo Nunes.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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