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REPÚBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL
DIÁRIO DAS SESSÕES
N.º 182 ANO DE 1957 28 DE FEVEREIRO
ASSEMBLEIA NACIONAL
VI LEGISLATURA
SESSÃO N.º 182, EM 27 DE FEVEREIRO
Presidente: Exmo. Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior
Secretários: Exmos. Srs. José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues
Alberto Henriques de Araújo
SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 15 minutos.
Antes da ordem do dia. - O Sr. Presidente comunicou que recebera, para efeitos do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição o Decreto-Lei n.º 41 011.
Foi negada autorização para o Sr. Deputado Elísio Pimenta depor na delegação da Procuradoria da República de Braga.
O Sr. Deputado Águedo de Oliveira falou sobre estradas de Bragança e a política de crescimento económico nas áreas atrasadas provincianas.
O Sr. Deputado Bartolomeu Gromicho requereu informações sobre ao licenças de estacionamento para pescar.
Ordem do dia. - Prosseguiu a discussão da proposta de lei que cria o Instituto Nacional de Investigação, Tecnologia e Economia Industrial.
Faltaram os Srs. Deputados André Navarro e Russel de Sousa.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 17 horas o 15 minutos.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Eram 16 horas e 5 minutos.
Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Abel Maria Castro de Lacerda.
Adriano Duarte Silva.
Angelo Ornelas do Rego.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Pacheco Jorge.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alexandre Aranha Furtado de Mendonça.
Alfredo Amélio Pereira da Conceição.
Américo Cortês Pinto.
André Francisco Navarro.
Antão Santos da Cunha.
António Abrantes Tavares.
António de Almeida Garrett.
António Bartolomeu Gromicho.
António Calheiros Lopes.
António Camacho Teixeira de Sousa.
António Carlos Borges.
António Cortês Lobão.
António Júdice Bustorff da Silva.
António Pinto de Meireles Barriga.
António Raul Galiano Tavares.
António Rodrigues.
António Russell de Sousa.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Proença Duarte.
Augusto Cancella de Abreu.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Caetano Maria de Abreu Beirão.
Camilo António de Almeida Gama Lemos Mendonça.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Carlos Vasco Michon de Oliveira Mourão.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Daniel Maria Vieira Barbosa.
Eduardo Pereira Viena.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
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Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco Eusébio Fernandes Prieto.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Jeróuimo Salvador Constantino Sócrates da Costa.
João Afonso Cid dos Santos.
João Alpoim Borges do Canto.
João Ameal.
João da Assunção da Cunha Valença.
João Cerveira Pinto.
João Luís Augusto das Neves.
João de Paiva de Faria Leite Brandão.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim de Moura Relvas.
Joaquim de Pinho Brandão.
Joaquim de Sousa Machado.
José Dias de Araújo Correia.
José Garcia Nunes Mexia.
José Maria Pereira Leite de Magalhães e Couto.
José Sarmento de Vasconcelos e Castro.
José Soares da Fonseca.
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Luís de Azeredo Pereira.
Luís Maria Lopes da Fonseca.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel Maria de Lacerda de Sousa Aroso.
Manuel Maria Sarmento Rodrigues.
Manuel Maria Vaz.
Manuel Monterroso Carneiro.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Manuel Trigueiros Sampaio.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Reis.
Mário de Figueiredo.
Ricardo Malhou Durão.
Ricardo Vaz Monteiro.
Rui de Andrade.
Teófilo Duarte.
Venâncio Augusto Deslandes.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 77 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 16 horas e 15 minutos.
Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente:-Está na Mesa, enviado pela Presidência do Conselho e para efeitos do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição, o Diário do Governo n.º 42, 1.ª série, de 22 do corrente, que insere o Decreto-Lei n.º 41 011.
Está também na Mesa um ofício da delegação da Procuradoria da República de Braga a pedir autorização para o Sr. Deputado Elísio Pimenta, provedor da Santa Casa da Misericórdia e Hospital de S. Marcos, daquela cidade, poder comparecer naquela delegação no próximo dia 28 do corrente, às 11 horas, a fim de prestar declarações. O Sr. Deputado Elísio Pimenta considera inconveniente para a sua actuação parlamentar a concessão da autorização pedida.
Consultada a Assembleia, foi negada a autorizarão.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra antes da ordem do dia o Sr. Deputado Águedo de Oliveira.
O Sr. Águedo de Oliveira: - Sr. Presidente: a minha intervenção hoje, antes da ordem do dia, tem, pela sua natural disciplina, de comportar-se em limites muito genéricos.
O assunto requeria e merecia grandes desenvolvimentos.
Incidentalmente, e a pedido de alguns conterrâneos, vou solicitar das instâncias competentes a aceleração de três trabalhos públlicos do meu distrito que se arrastam há anos.
Depois terei ocasião de ventilar um problema que está na ordem do dia nos escritores e nas assembleias representativas a política de crescimento económico nas áreas atrasadas, provincianas, mercê de plano ou planos de desenvolvimento local.
Suponho que se trata dum capítulo novo que merece ter lugar no futuro Plano de Fomento.
Sr. Presidente: assuntos de economia regional levam a dirigir-me hoje à boa vontade dos servidos responsáveis do Ministério das Obras Publicas e ao poder construtivo e proverbial benevolência do ilustre titular da respectiva pasta, que mantém os pergaminhos gratíssimos de Duarte Pacheco, esperando da sua actividade impulsionadora e dinamismo a aceleração de três obras do meu distrito que ninguém desejará que se arrastem ou eternizem.
São eles: a ligação transversal de Vimioso ao coração do distrito da Bragança, a estrada nacional n.º 317; o alcatroamento da estrada de Milhão à ponte internacional, n.º 218, e a entrada da Lomba, no concelho de Vinhais.
Estes três melhoramentos locais não têm acompanhado e não seguem o ritmo vivo das obras e trabalhos públicos, do Governo, sendo saliente a demora na realizarão da ponte, do rio Maçãs e os muitos anos despendidos na construção da estrada da Lomba, à qual falta apenas, para concluir-se, um troço de 8 km.
Já o ano passado me referi ao desequilíbrio entre a faixa litoral e a faixa interior nos melhoramentos locais de grande e pequena envergadura.
A realização de grandes empreendimentos públicos perto das duas capitais acentuou desequilíbrios já notados e acarretou inesperadamente não sei se derivarão se estreiteza de verbas.
Vozes:- Muito bem!
O Orador: - Sou agora levado a produzir algumas considerações sobre um problema que carece ser enfrentado resolutamente e em conjunto. Há nas zonas interiores do continente e ilhas locais e regiões onde o crescimento económico e o desenvolvimento social, a despeito da grande obra nacional de reconstrução realizada, como que estagnaram ou são de tal maneira lentos que reclamam um despertar do seu turpor se não aceleramento se veja.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - A política económica na sua base científica e em termos de saliente actualidade põe aos governantes instrumentos de grande delicadeza política e de objectivos generalizados como formas novas do realização colectiva - os planos de desenvolvimento local.
Tem-se feito da formação do capital o foco de convergência desta óptica aperfeiçoada, que permite distinguir os contornos, isolar no mapa e definir com propriedade as áreas atrasadas dentro dum país, por avançado que este seja.
Tal teoria acentua nelas a fraca acumulação do capital e a debilidade do consequente investimento. Como características essenciais não escondem, porém, a marca da sua terminologia e não ajudam a compreender as-
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pectos tais como os do trabalho, da terra, da profissão, do lar, da ausência do lucro, da expatriação e do regresso que uma economia humana explicam - economia humana que está nas tradições portuguesas e na letra e espírito da Constituição.
Tem de pedir-se à geografia económica noções mais completas.
A caracterização das áreas subdesenvolvidas, com o seu lento crescimento ou o seu peso retardado, apresenta assim múltiplas facetas.
Faltam ali estímulos e horizontes económicos para o produtor. O rendimento per capita - mas o do chefe familiar - anda por baixo da média genérica.
Há dificuldade em vencer o circuito: pequena remuneração, fraca capacidade de consumo raro e tardo aforro e industrialização incipiente.
Como as disponibilidades são escassas, o investimento do sector privado é, para além das benfeitorias agrícolas, demasiado pequeno e só compensado pelo Estado ou pelas entidades colectivas se faz notar.
A mão-de-obra parece abundante, mas falta-lhe qualificação profissional e não lhe sobram os conhecimentos técnicos; dirige-se à produção alimentar, da qual não extrai o bastante para sustentar-se e pagar também o essencial.
As técnicas de cultivo e a comercialização dos produtos permanecem sem progresso acentuado, ostensivo, a despeito de naturais melhorias.
Na maioria das actividades, a rentabilidade limita-se e o aforro desviado para fora da área ou oculto não encontra estímulos para além das colocações generalizadas.
A mão-de-obra parece abundante, mas pelo subemprego, e tende para a emigrarão e para o urbanismo.
Se acrescentarmos a isto um solo pobre e descarnado, com cultura intensa nalgumas manchas, o quadro ficará esboçado. Mas não chega.
Temos de salientar acima deste esquiço o desequilíbrio de meios e de padrões de vida entre os grupos sociais; porém este não será tão grave como é o das cidades e meios industriais, visto que a aspereza da luta, a magra colheita dos resultados e as concepções idealistas e estabilizadoras solidarizam mais o consumo e irmanam os sacrifícios.
Estas áreas, que importa definir e reclamar, estão chutando e exigindo política económica renovada e melhorada, para serem desenvolvidas e industrializadas e vencer-se, destarte, o atraso e a estagnação secular.
Ao esforço de recomposição e equilíbrio entre as regiões favorecidas e as desfavorecidas chama-se «arranjo» do território.
A política de melhoria o avanço a instalar chama-se «crescimento económico».
Vejamos isto rapidamente.
O problema põe-se assim: a economia liberal deixou várias zonas provincianas na obscuridade e no adormecimento, excepto o que fez pelas ligações por estrada e por caminho de ferro e o que con»t>guiu realizar através da acção das empresas agrícolas ao alargar a área cultivada e aperfeiçoar e intensificar as explorações.
A economia das crises mundiais não permitiu avançar, embora estabelecesse comemos dum princípio de coordenação e equilíbrio que melhorasse o poder de consumo e que os empresários agrícolas se refizessem das naturais dificuldades e prejuízos dos anos estéreis e calamitosos nessas áreas subdesenvolvidas.
A Revolução Nacional realizou, todavia, uma obra de progresso incontestável e esplendida com a aplicação de instrumentos complexos - novas estradas, fundo de benfeitorias agrícolas e crédito com esse nome, obras de rega, construção de edifícios escolares, empréstimos às câmaras municipais, isenções fiscais para socalcos, plantações e obras de irrigação, etc., subsídios e comparticipações, etc.
Mas esta obra notável, notabilíssima mesmo, não chegou para vencer o marasmo de certas áreas e para que o Estado promovesse as condições e oportunidades de trabalho e realização aos homens por formas justas e melhor remuneradas, ao atender-se o que se passa em outros meios, de sorte a fazer da carta continental e insular de geografia económica um todo equilibrado.
Havia um instrumento maravilhoso quando de aplicação superior e mais vasta e servido pela técnica financeira os melhoramentos rurais.
Muito genèricamente direi a este propósito:
Claro que a pulverização de verbas e desposas desagrada à primeira vista e apresenta, inconvenientes que não podem esconder-se, mas seria de lamentar que neste capítulo se estacasse ou retrogradasse à medida que as exigências sociais ascendem.
As verbas desta natureza não são apenas reforços de excepção, política de defesa contra as crises no campo. São despesas normais, destinadas a vencer o atraso, a equilibrar com os excedentes das zonas demogràficamente concentradas e a estimular o poder de consumo local.
Além deste valor técnico-financeiro, reactivam o circuito económico.
Esta Câmara e a província têm os olhos postos nos melhoramentos rurais e vêm reclamando com constância.
O seu significado político não precisa de ser encarecido.
Vozes: - Muito bem!
Orador: - Sr. Presidente: vou referir-me agora a algumas das orientações teóricas mais marcantes e capazes de presidir ao planejamento do crescimento económico na» área> provincianas subdesenvolvidas. Há outras, mas os limites regimentais à minha intervenção antes da ordem impõem-me que não passe das noções genéricas e que me retira apenas a dois ou três critérios básicos.
A primeira orientação marcante é a do que posso chamar «ruralismo italiano».
De harmonia com as tradições milenárias e com o avanço técnico e social tomado no passado distante pela vila romana, o ruralismo italiano anda espalhado por vários capítulos, valorização do solo, comparticipação e auxílio técnico, defesa contra a erosão, secagem dos pântanos, etc.; estes trabalhos baseiam-se agora sobretudo nos grandes progressos técnicos e económicos da arquitectura rural. É a engenharia agrícola e, sobretudo, a arquitectura rural italiana que têm a primeira e a última palavra, sem se afastar das criações do génio histórico no sentido da racional idade, da especialização e da estética.
Mas tanto na casa rural como nas dependências agrícolas, como nos edifícios e construções provincianas, dominam interpretações claras e lógicas.
Casas e dependências não devem custar demasiadamente e obedecem por igual a critérios avançados de higiene, conforto e agronomia.
Os teóricos italianos confiam bastante na colonização, ensilagem, mecanização e irrigação agrícola, na defesa contra o regime torrencial e sobretudo nos projectos e estudos e nos esquemas das construções provincianas, para o que deve ser feita campanha intensiva.
Assim, muito ligeiramente dou este apontamento, se fará da «ruralística» - o termo é um italianismo - a orientação preferencial da política de crescimento nos concelhos atrasados.
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Uma segunda orientação é dada pelo Instituto de Investigação de Economia Agrícola dos nossos velhos aliados, em Oxónia, sobre planificação rural.
Aqui a combinação Estado, autarquias e entidades autónomas é menos acentuada e a planificação central mais forte, altamente dirigida e sujeita, a planos técnicos e económicos detalhados.
É claro que os Ingleses estabelecem nesta orientação planos de crescimento económico, tendo por base um vale, um cantão distrital, a estrutura das quintas, o seu reequipamento e os salientes aspectos da vida do homem do campo ao explorar a terra.
Casa, serviços de saúde e higiene, conforto e recreio, actividades sociais, acesso à civilização, são estudados tanto para o efeito de desenvolvimento económico como para o efeito de reconstrução social.
Em Oxónia os novos planificadores da vida rural preocupam-se com a maior eficiência na utilização do solo e com as superiores de vida e de oportunidades dos rurais.
O programa é vasto e abrange reorganizações, reequipamento, alojamento racional e barato, circunstâncias estas que deverão alterar profundamente as relações económicas e a repartição de encargos entre as finanças do Estado e as finanças locais.
Desde 1943 que arquitectos, planificadores e cientistas sociais estabelecem contributos e esquemas sobre a casa mais perfeita com mínimo dispêndio, sobre a Quinta, que deverá atingir alto padrão económico e técnico, e sobre a aldeia que, sem perder o encanto proverbial das pequenas povoações britânicas, deve melhorar socialmente bastante.
Desde essa data que o Reino Unido vem publicando uma série de actas legislativas e medidas capazes de acudir às áreas «deprimidas» - chamam-se assim - daquele esplêndido país.
A França, por outro lado, procurou construir todo um capítulo de arranjo rural e de arranjo do território.
Decretou em 1946 uma lei sobre emparcelamento. Criou em 1954 vários fundos destinados a melhorar a vida nos departamentos onde o crescimento económico é lento, o que os reduz à condição de atrasados no progresso geral.
Em 1 de Julho de 1955 estes fundos foram unificados num fundo de desenvolvimento económico e social e acompanhados de medidas legislativas sobre arranjo regional.
Não me refiro agora aos planos parciais de regiões determinadas, como certos vales muito estudados e discutidos.
Basta este rápido esboço para que seja de notar a importância candente e actualização do problema que está posto aos construtores do futuro Plano de Fomento.
Vozes : - Muito bem !
O Orador: - A meu ver, a política de crescimento económico local encontra algumas dificuldades e terá de caminhar entre dois escolhos.
A primeira dificuldade consiste no seguinte: o crescimento demográfico e a necessidade de elevar os estalões de consumo requerem, exigem e impõem investimentos intensivos e extensos de rentabilidade não imediata. O trabalho é fonte primária da riqueza e a exportação de mão-de-obra não é uma solução: é, infelizmente, uma necessidade incontrastável sob certos aspectos.
Não haverá capitais e investimentos públicos na escala que as necessidades requerem.
Depois, o crescimento económico deve tender para a equiparação, para a distribuição justa, de maneira a não estabelecer discriminações e hostilidade entre as várias formas de empreendimento e de mão-de-obra.
O plano ou planos de desenvolvimento local pressupõem a existência duma planificação justa e racional das actividades industriais.
Os planos de crescimento local devem, pois, corrigir e completar a implantação geográfica das populações e a distribuição natural dos recursos aproveitáveis.
A estrutura liberal dos Estados e ao sistema capitalista da economia se deve a desarmonia geral e o atraso sobretudo da faixa interior.
A falta de compensação com melhoramentos locais e rurais se pode atribuir o agravamento dos males existentes.
Por outro lado, é sabido que, nessas áreas deprimidas, a poupança, mesmo pequena, não se dirige ao investimento senão na medida em que se determina por benfeitorias agrícolas.
A meu ver ainda, a política de crescimento local tem de singrar evitando dois escolhos mais impressionantes do que os dois turbilhões clássicos do estreito de Messina - Cila e Caríbdis.
Um será constituído pelas ambições excessivas dos técnicos e dalguns burocratas seus aliados; ambições demasiadamente planificadoras e que os impelem à invasão e instalação no domínio jurídico livre e privado, onde sobrevive o instituto da propriedade.
Outro, não menos perigoso, é o que o relatório da O. E. C. E. do último ano referia como necessidade de alterar a mentalidade de certas camadas de população.
Para se chegar ao planejamento do progresso social dos concelhos atrasados, para se promover assim o seu crescimento económico, é necessário começar com tempo uma série de estudos e inquéritos.
Os problemas têm de ser inventariados e depois postos em série, que o êxito dum planejamento agrário depende do conhecimento analítico da vida material e moral nos campos e nas áreas em atraso e duma política económica, não direi quantitativista, mas fundamentada e em moldes actuais.
Um inquérito pelo Comissariado do Desemprego, o trabalho de actualização dos planos e objectivos do Ministério das Obras Públicas, os depoimentos das câmaras, a precedência dum plano de localização industrial, o estudo prévio das pequenas industriais, obras de rega, etc., têm de constar de documentos ao alcance desta Câmara e de todos, porque vai nisso o maior cuidado e preocupação do país que representamos.
Merece os maiores louvores que se tenha adoptado o procedimento de dar conhecimento público de alguns trabalhos oficiais de alta envergadura intelectual e política, findando aquela zona de silêncio que só pode ser cara a certa burocracia.
Vozes: - Muito bem !
Orador: - Sr. Presidente: haveria vantagem que a Câmara, representante verdadeira dos interesses indistintos do País e do bem geral, não abandonasse este capítulo, velho nas exigências e ideais, mas novo na técnica social.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bom!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Bartolomeu Gromicho: - Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa o seguinte
Requerimento
«Requeiro, nos termos constitucional, que, pelo Ministério das Comunicações, me sejam fornecidos os se-
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guintes elementos, que respeitam à Administração do Porto de Lisboa:
a) Desde quando a Administração do Porto de Lisboa exige licença de pesca, actualmente sob a designação de «licença de estacionamento para pescar»?
b) Qual a taxa e adicionais exibidos para ser passada essa licença, bem como quais os documentos que se devem juntar ao requerimento em que se solicita a licença?
c) Em que disposições legais ou qual o diploma legal em que a Administração do Porto de Lisboa se fundamenta para exigir a referida licença de estacionamento para pescar?
d) Qual tem sido o montante da receita proveniente da taxa dessas licenças, por anos, desde que ela existe?
e) Quantas licenças têm sido passadas, por anos, desde que foi estabelecida a actual norma de «licença de estacionamento para pescar»?
O Sr. Presidente: - Vai passar-se à
Ordem do dia
O Sr. Presidente: - Continua em discussão, na generalidade, a proposta de lei relativa, à criação do Instituto Nacional de Investigação, Tecnologia e Economia Industrial.
Tem a palavra o Sr. Deputado André Navarro.
O Sr. André Navarro: - Sr. Presidente: apenas algumas ligeiras notas sobre a discussão na generalidade da proposta de lei relativa à criação do Instituto Nacional de Investigação, Tecnologia e Economia Industrial. E apenas, como disse, ligeira nota, porque o tempo disponível para a necessária preparação para a intervenção que desejaria fazer não me permitiu ir mais além.
Por isso sinto, sinceramente, que a contribuição que me proponho dar ficará, de facto, muito aquém do merecimento do diploma que o Governo da Nação, através do Ministério da Economia, enviou a esta Assembleia para a devida apreciação.
O mesmo defeito o salientou o ilustre relator do parecer da Câmara Corporativa, Eng. Frederico Ulrich, quando afirma num dos passos do seu operoso trabalho: «... que não foi possível, no curtíssimo prazo legal para a elaboração deste parecer, coligir elementos rigorosos sobre as importâncias efectivamente atribuídas entre nós a trabalhos de investigação aplicada ...».
Fica, porém, aqui, no pouco que poderei e saberei dizer, todo o sincero desejo de contribuir, por qualquer forma, para dar o devido realce a tão importante diploma, direi mesmo instrumento legal, que o será decerto dos mais importantes para o progresso da nossa indústria nascente. E por isso direi desde já que sou partidário na discussão na especialidade deste diploma, se não coarete a estrutura fundamental que constitui a economia da lei, restringindo a sua acção à imagem, a meu ver mal vista, de uma instituição laboratorial, embora de facto justamente prestigiada, mas cujo horizonte de acção de forma alguma se poderá comparar com o previsto para a instituição nascente.
Por isso, como ia dizendo, para mim constitui ponto fundamental aceitar como base de discussão o texto apresentado por S. Ex.ª o Ministro da Economia.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - E assim iniciamos as nossas breves considerações apreciando na generalidade o texto da proposta de lei n.º 43. E desde logo as minhas sinceras felicitações para S. Ex.ª o Ministro da Economia pela intenção que o diploma revela em todas as suas bases de combater alguns dos principais defeitos e omissões que têm dificultado o progresso da indústria portuguesa, e direi mesmo de ver rectificada recente orientação, quando afirma entre as causas da nossa debilidade industrial que:
Na verdade, independentemente da fragilidade do mercado que lhe serve de suporte, a grande massa das actividades industriais portuguesas sofre ainda no geral de um grave defeito: o de um perigoso e antieconómico superequipamento, associado a uma extrema pulverização de fabricos e unidades.
Daí a situação paradoxal em que essas unidades se debatem, necessitando, para poderem concorrer no mundo de hoje, de altos níveis técnicos em instalações e pessoal, mas cujas potencialidades são contrariadas por uma dimensão e exploração que, não só não permite as amortizações de maquinismos e instalações ao ritmo das actividades similares estrangeiras, como ainda, o que é mais grave, não consente sequer a investigação e a assistência técnica privativas que estão na base de todo o progresso industrial moderno.
E disse:
Apraz-me ver rectificada directriz que, com intenção de manter saudável concorrência, se iniciara prematuramente, delapidando algo já feito, no domínio de certas indústrias progressivas, no sentido de se constituírem unidades com uma harmónica estrutura e equilíbrio de possibilidades económicas e técnicas e com características dimensionais que garantissem possibilidades de resistência aos inevitáveis embates que se desenham com a criação do mercado comum europeu.
E acrescenta ainda o ilustre titular da pasta da Economia, completando o actual modo de pensar sobre tão importante aspecto das nossas maleitas industriais, que:
São, com efeito, infelizmente frequentes os casos de indústrias - como a algodoeira, a dos lanifícios, a do papel, a da borracha, a dos resinosos, a metalomecânica e a de fundição de ferro - em que as possibilidades de produção nacional excedem largamente as necessidades do consumo; e mais frequentes são ainda os casos de maquinismos em que os tempos de utilização anual representam apenas uma fracção diminuta da verificada em indústrias similares estrangeiras.
Pelo que respeita a laboratórios e pessoal técnico, o exemplo do sector algodoeiro - de longe uma das nossas actividades industriais mais relevantes - ilustra bem a nossa situação sob tal aspecto. Num total aproximado de quatrocentas e cinquenta unidades de fiação e tecelagem, acenas cerca de 10 por cento dispõem de instalações laboratoriais e de pessoal técnico adequado, não excedendo o número de engenheiros umas escassas dezenas, dos quais a maior parte não possui qualquer curso superior de indústrias têxteis.
Estas palavras vêm-nos, por isso, dar medida exacta do pensamento que actualmente norteia o Ministério da Economia, quanto aos frutos ainda a esperar do
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importante diploma aprovado por esta Assembleia sobre o condicionamento industrial.
E não se poderá de facto afirmar que nos faltam totalmente possibilidades de real progresso das actividades industriais.
Na verdade, a tradição de um artesanato medieval, que se prolongaria pelos tempos modernos, criou por cá raízes fundas. E, assim, foram inúmeros os centros de labor oficinal que se constituíram em todo o território. E foram notáveis, em numerosas modalidades, mestres prestimo os, criadores de verdadeiras escolas de aprendizagem, que nada ficaram a dever, nesses tempos, ao melhor que se realizava então em terra estrangeira.
E se isto se verificou no artesanato urbano e que deixou até na taponímia citadina numerosos testemunhos, não foi menos marcante o progresso verificado nas artes agrícolas, ocupando-se lugar de igual realce no mundo civilizado.
Bastará lembrar que fomos, quanto a este aspecto, os pioneiros da pomicultura e da horticultura industriais com o carácter que ela hoje revela de nítida fáceis internacional. Laranja, maçã, uva e tantos outros frutos como cebola, melão e demais produtos hortícolas, foram de cá remetidos durante largos anos para os mercados mais exigentes da Europa de então.
E ainda hoje, como vago, embora enganoso, testemunho, aparecem nos grandes centros consumidores «Sando Michael» e «Setúbal oranges», de várias partes, excepto é claro, como é bem conhecido da nossa ilha de S. Miguel e da célebre região citrícola de Setúbal.
Disse, e provo aasim a verdade de afirmação feita, que não nos falta ainda hoje a tradição industrial como melhor raíz do que se desejou ver crescer.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Também não nos falta energia criadora.
Para o manufactureiro e similar lá se vai aproveitamento como se pode e sabe a torrencialidade ingrata do fluvial e sonha-se, melhor direi, antevê-se, para época próxima os frutos da cisão nuclear.
Outros não mais dotados, como a Suiça, lá vão singrando entre os primeiros postos da indústria, embora deficitários e importantes de energia. E o mesmo direi quanto à indústria nos domínios do agrário e do florestal.
Se algo nos falta de água e solo, e quanto a água apenas má distribuição estacionar, não temos, porém, deficit, antes, pelo contrário, notável superatit, de energia solar, responsável em larga escala pelas possibilidades de fomento das indústrias da terra.
Não será, possìvelmente, a fécula do cereal a matéria-prima cuja produção esteja mais adaptada ao nosso meio. Poderemos, porém, afirmar que aqui se encontram condições excepcionais de utilização da fonte de energia solar, na obtenção da fibra, ou melhor, da celulose, e de tudo o que se afine com as radiações do astro rei - aroma, perfume e paladar. E assim floresta, pomar, vinha, hortaliça e flor ou similares encontrarão, decerto, em Portugal, quer vigore o regime de mercado comum europeu ou de autarquias nacionais, condições de perfeito sucesso.
E assim, resumindo, direi:
Se não fomos, por má orientação ou incúria, talvez mesmo por doença infecciosa de política que nos atacou prematuramente, dos que acompanharam o movimento industrial dos dois séculos passados, estamos hoje em condições, decerto em face das novas possibilidades de energia criadora e de condições naturais que possuímos, de acompanhar o movimento de desenvolvimento económico e social do Mundo.
Para tal, porém, teremos de nos desligar de vez de complexos que nos diminuíram e nas atrasaram no passado. E um deles, senão talvez o mais importante, será, fora de dúvida, o afastamento das grandes e progressivas correntes do ensino técnico nos seus diferentes graus.
Por isso aplaudo quando na proposta do Governo irão se desliga a investigação aplicada da de fundo; o progresso da técnica industrial da do ensino; isto é, em síntese, quando se preconiza intensa ligação entre a escola e a fábrica.
Esta uma das notáveis funções que caberá ao inluto que a proposta de lei n.º 43 se propõe realizar. E para tal direi que não será necessário fazer tudo de novo nos domínios do material e da preparação científica do pessoal investigador e executante.
A prospecção que se faça neste sentido e que urge dar-lhe realidade demonstrará, estou disso convicto, que a situação não será das piores, e com alguns anos de persistente trabalho se atingirá, dentro das nossas possibilidades financeiras, o fim desejado.
Haja em vista, como exemplo, o trabalho magnífico feito no capítulo do aperfeiçoamento tecnológico acompanhado pelo da investigação e da preparação do pessoal técnico e operário, entre outros, por algumas das nossas mais importantes indústrias, como a Companhia União Fabril, a indústria das moagens, a das cervejas e tantas outras, significativos exemplos, digo, de anulação dos complexos de rotina a que fiz referência.
E quanto à acção dos estabelecimentos de investigação aplicada, realizada à margem da iniciativa privada, há também que realçar numerosos exemplos de nítido progresso.
E, assim, além do que é justa e repetidas vezes citado pelo ilustre relator da Câmara Corporativa, o Laboratório Nacional de Engenharia Civil, cujo benéfico labor a favor das actividades nacionais não custou «15 por cento das economias que para a Nação resultaram da sua intervenção no delineamento de obras sobre as quais foi consultado», e que hoje apresenta já «destaque internacional em certos sectores da sua actividade», direi, e apenas como passageira nota que se deve recentemente ao notável Laboratório de Medicina Veterinária e aos serviços pecuários do Ministério da Economia, e com projecção notável de benefícios no país vizinho, a admirável luta contra a difusão da doença conhecida vulgarmente por «língua azul», que começara a destruir o nosso armentio ovino, como há poucos anos a campanha de igual valia realizada sob a égide da Estação Agronómica Nacional na luta contra a praga de acrídeos, cujos perigosos focos já se encontravam solidamente instalados em algumas das principais regiões do celeiro português, verdadeiras catástrofes que ameaçavam duas das mais importantes actividades da indústria agrária nacional e que foram assim vencidas pelo íntimo contacto que se verificou existir entre o Laboratório e as actividades, entre a investigação fundamental e a aplicada.
E o mesmo se poderá afirmar quanto ao notável esforço que vêm realizando com êxito os laboratórios e serviços da Direcção-Geral dos Serviços Florestais e Aquícolas no debelar das pragas que atacam presentemente montados, soutos e pinhais.
Eis porque insisto que na acção coordenadora de actividades que se prevê para o Instituto Nacional de Investigação Tecnológica e Economia Industrial nunca se poderá perder de vista o que já existe de bom nas actividades oficiais e privadas, de investigação e de ensino e se procure assim levar a cabo útil acção coordenadora das mesmas.
Vozes: - Muito bem!
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82 DE FEVEREIRO DE 1957 289
O Orador: - Outro importante ponto focado no diploma em discussão, mas que é observado por prisma diferente pela Câmara Corporativa, refere-se à amplitude de actuação do Instituto em referência quanto ao território onde virá a exercer a sua acção. Julgo que o assunto focado deverá merecer também uma ligeira nota na discussão na generalidade do diploma n.º 43.
Na, realidade, embora não se possa nem seja mesmo de desejar, e a Constituição a isso se opõe, de levar determinadas missões do Instituto ao vasto horizonte das províncias de além-mar, nada impede, porém, antes pelo contrário, que os estudos a efectuar tenham, como não- podem deixar de ter, um campo de investigação que abranja o temperado e o tropical.
De resto como é sabido, é esta uma das principais raízes da existência nacional; muitas das matérias-primas - óleos, fibras, cacaus, açúcares, féculas e outras mais produzidas numa província - sofrem transformação industrial em província distante do mesmo território pátrio. E isto mesmo foi igualmente condição do sucesso económico do Reino Tinido e de outros países de projecção universal.
Não queiramos, por isso, criar embaraços legais ao natural e lógico desenvolvimento dos estudos e investigações tecnológicas e económicas que urge fazer no domínio das indústrias. E direi mesmo: acabem-se progressivamente, ou, pelo menos, restrinjam-se ao mínimo, em que o burocrático é saudável, as pelas que ainda dividem o que é e será sempre uno.
E para conseguir este desiderato não haverá que fazer mais do que continuar a estimular o que vem sendo realizado, com pleno êxito, pela Junta das Missões Geográficas e de Investigações do Ultramar, coordenando trabalhos de investigação de laboratórios oficiais de vários departamentos, incluindo os das Universidades, com a investigação aplicada realizada no domínio de várias províncias de além-mar.
Haja, por exemplo, em vista os benefícios conseguidos nestes aspectos, e isto como simples passagem, no desenvolvimento dos estudos de solos ultramarinos e de combate à erosão realizados por iniciativa da referida Junta com a colaboração dos laboratórios de pedologia e de química do Instituto Superior de Agronomia e cujo campo de acção nas nossas províncias de Angola e de Moçambique se vai dilatando de ano para ano.
Não será, por isso, de desejar, neste como em outros campos de investigação, multiplicar o número de estabelecimentos já existentes, e isto especialmente num país que não dispõe de largas possibilidades financeiras nem de pessoal para criar novas unidades.
Por isso insisto nesta nota, de que é de aconselhar que não se limite à metrópole, a acção do Instituto que o diploma em discussão prevê criar. Apenas, e nisso estou plenamente de acordo, que se ressalvem as intromissões a que a Constituição, e muito bem, obvia.
De resto, isto especialmente importa a missões que o parecer da Câmara Corporativa, e a meu ver muito bem, deseja ver eliminadas do texto do diploma e que constam, entre outras, da alínea f) da base IV e da base XIII do referido projecto de instrumento legal.
Disse.
Vozes: - Muito bem, muito Bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Russel de Sousa : - Sr. Presidente: completar-se-á com a publicação da lei que cria o Instituto Nacional de Investigação, Tecnologia e Economia Industrial, em apreciação nesta Assembleia, o plano do Governo, concebido com as melhores intenções, no sentido de melhorar as condições de vida à indústria nacional.
Já quis o Governo, com a publicação do Decreto-Lei: n.º 40874 - louvável iniciativa -, activar o reapetrechamento industrial, permitindo assim novas possibilidades, às unidades existentes de obterem redução importante nas suas contribuições industriais, destinadas à modernização das instalações fabris e métodos de trabalho, com o fim primordial de aumentara produtividade e concorrer para melhorar o nível de vida da população portuguesa.
Creio ser este um dos pontos fundamentais da questão, enquanto não for possível elevar o poder de compra do nosso povo, a produção nacional continuará sujeita-a uma mediania que não haverá automatização que resolva os seus problemas, que não são só de produzir, mais e melhor, mas principalmente de colocar no mercado interno a maior parte daquilo que produz. Se com o diploma promulgado, se reconhece a necessidade de acarinhar iniciativas, com raízes na vida nacional, no sentido de se lhes proporcionar a sua modernização e permitir assim que não sejam tão fàcilmente ultrapassadas por instalações fabris de recente data, que, sem tradições nem responsabilidades podem, com certeza, muitas vezes competir, fazendo uma concorrência desregrada e desleal, contribuindo para criar dificuldades, se não a ruína de muitas famílias portuguesas, procura-se com a nova lei em estudo criar ambiente mais propicio e seguro no caminho a percorrer de futuro pela indústria nacional.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Já tive a honra de me referir a leis em vigor noutros países que isentam de contribuição, as reservas destinadas à aquisição de novos maquinismos, e entendo, mesmo que deveria Constituir obrigatoriedade, pelo menos para as sociedades anónimas, cuja administração vive mais afastada dos capitalistas nelas interessados, a constituição de uma reserva anual bastante destinada exclusivamente à renovação dos seus equipamentos fabris.
Tal medida teria evitado aquelas dificuldades a indústria portuguesa, nomeadamente à indústria, têxtil, que, se houvesse acompanhado os progressos que se vão verificando, não se teria distanciado tanto das unidades mais modernas, que lhe fazem sombra assustadora.
Não basta, porém, promulgar diplomas; por mais úteis, que estes sejam, não poderão ter execução se não existirem as condições mínimas que o permitam.
No caso presente continua a verificar-se a exagerada pulverização da indústria, sem condições que á recomendem, sistema que vejo muitas vezes contrariado por abalizadas opiniões como nocivo e prejudicial a economia nacional, como acontece na nova proposta de lei n.º 43, onde o caso é focado com perfeito e objectivo conhecimento de causa, e ao mesmo alude o douto parecer da Câmara Corporativa: e um perigoso e anti-económico sobreequipamento, donde resulta, em muitos casos, uma capacidade de produção excedendo largamente as necessidades de consumo, com o consequente mau aproveitamento de maquinismos, cuja utilização fica muito aquém do seu rendimento económico».
Não será, portanto, de permitir que tal situação continue; de contrário, conduzir-nos-á à impossibilidade de se utilizarem às vantagens indiscutíveis com quê o Governo procura concorrer para uma sensível melhoria de técnica no trabalho nacional.
Terá o Governo de actuar, e sem demora, pelos meios de que dispõe, para acabar com este estado de coisas: Comecemos imediatamente por limitar as indústrias cuja produção excede já as necessidades do consumo interno, reorganize-se a Direcção-Geral dos Serviços Industriais no sentido de este organismo não ser promotor de concorrência, pelas facilidades que concede para novas mon-
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tagens, mas, antes, orientador do desenvolvimento industrial, aconselhando novas modalidades, para dar satisfação às iniciativas que vão surgindo, conduzindo-as para terrenos mais propícios a resultados remuneradores, seja pela lei existente ou por outros regulamentos económicos, por cada ramo industrial.
Cumpro ao Governo actuar pelos meios que lhe permitam orientar o desenvolvimento industrial, mas no sentido construtivo a que se propõe, o não o poderá fazer se não usar francamente de um regime de condicionamento, seja pela lei existente ou por outros regulamentos económicos, por cada zona industrial. Parece que nos acanhamos de nós mesmos ao desinteressarmo-nos do uma orgânica que não deve concorrer para monopólios, mas que tem obrigação de defender interesses criados, que devem servir o bem comum, e que é necessário que contribuam assim para melhorar o nível de vida da população portuguesa.
Se discordo de grandes concentrações, que só em casos especiais poderão ser consideradas no nosso país, contrárias à nossa mediania e até ao nosso espírito de administração, também não posso conceber que continuemos dispostos a esta pulverização de indústrias, o de tal ordem que, atropelando tudo o todos, nos conduza a uma situação insustentável.
Vozes: - Muito bem!
O Orador:- Noutros países exerce-se o equilíbrio de produção por formas diversas, através do próprio comando da indústria existente ou de controle bancário, que contraria ou aprova novas instalações.
A baixa de preços artificialmente conseguida com unia concorrência desregrada não é uma solução, e menos uma vantagem, para a economia nacional.
A nossa indústria só em casos muito especiais pode contar com a sua expansão nos mercados externos, e compreendo-se que assim aconteça, mais por dificuldades económicas do que por deficiências técnicas.
Sr. Presidente: a maior parte das indústrias portuguesas luta, não só nas nossas províncias ultramarinas, mas até mesmo na metrópole, com sérias dificuldades perante a concorrência estrangeira; é necessário que o Estado, pelos seus principais organismos, dê a preferência ao que se produz em Portugal. Para competir não basta pagar salários mais baixos, haverá que dispor do matérias-primas a preços mínimos e, principalmente, obter todo o rendimento dos maquinismos montados.
Acrescentaremos à desproporção do nosso consumo, comparativamente com o de outros países, base principal para manter unia regular produção, os prémios que os industriais estrangeiros recebem em beneficio dos produtos de exportação, sistema talvez artificial, mas que, sem dúvida, representa um auxílio positivo sobre o excesso da sua produção, o que lhos facilita assim grandemente a concorrência.
É necessário, sem dúvida, melhorar os nossos métodos de fabrico, para que possamos competir, mas é, preciso dispor também da compreensão de todos para que o nosso esforço resulte útil e benéfico.
Conjuguemos as nossas vontades à volta das nobres intenções do Governo, não permitindo que a burocracia as deturpe; habilitemos os nossos trabalhadores, que melhores não há, com os conhecimentos básicos dos materiais com que trabalham e do melhor rendimento que deles podem obter.
Teremos de pôr de parte os nossos maquinismos antiquados, mas é necessário que seja terminantemente proibida a importação de outros já desactualizados e postos de parte por organizações estrangeiras e que continuam diariamente a passar pelas nossas alfândegas, o que constitui sério pesadelo para a nossa pequena economia.
Sr. Presidente: creio firmemente que a ciência o a técnica são indispensáveis para realizar a grande obra tio conjunto que se planeia, obra que deverá ser conduzida pelo Governo com a representação efectiva dos organismos corporativos e com a experiência dos que têm dado o seu esforço e as suas provas de bem servir o Estado, a bem da Nação.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - O debate continuará na sessão de amanhã.
Está encerrada a sessão.
Eram 17 horas e 15 minutos.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Herculano Amorim Ferreira.
João Maria Porto.
José dos Santos Bessa.
Manuel Maria Múrias Júnior.
D. Maria Leonor Correia Botelho.
Mário Correia Teles de Araújo e Albuquerque.
Paulo Cancella de Abreu.
Tito Castelo Branco Arantes.
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Alberto Cruz.
Amândio Rebelo de Figueiredo.
António de Almeida.
António Augusto Esteves Mendes Correia.
António da Purificação Vasconcelos Baptista Felgueiras.
António dos Santos Carreto.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Carlos de Azevedo Mendes.
Carlos Mantero Belard.
Gaspar Inácio Ferreira.
Gastão Carlos de Deus Figueira.
João Carlos de Assis Pereira de Melo.
João Mendes da Costa Amaral.
Jorge Botelho Moniz.
Jorge Pereira Jardim.
José Gualberto de Sá Carneiro.
Luís Filipe da Fonseca Morais Alçada.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Colares Pereira.
Manuel de Magalhães Pessoa.
Manuel Marques Teixeira.
Miguel Rodrigues Bastos.
Pedro de Chaves Cymbron Borges de Sousa.
Pedro Joaquim da Cunha Meneses Pinto Cardoso.
Sebastião Garcia Ramires. Urgel Abílio Horta.
O REDACTOR - Leopoldo Nunes.
IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA