Página 593
REPÚBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL
DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 200
ANO DE 1957 10 DE ABRIL
ASSEMBLEIA NACIONAL
VI LEGISLATURA
SESSAO N.º 200, EM 9 DE ABRIL
Presidente: Ex.mos Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior
Secretários: Ex.mos Srs.
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues
Alberto Pacheco Jorge
SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas 15 minutos.
Antes da ordem do dia. - Foi aproado o Diário das Sessões n.º 198.
Leu-se o expediente.
Receberam-se na Mesa os elementos fornecidos pelo Ministério das Finanças em satisfação de um requerimento apresentado na sessão de 22 de Janeiro último pelo Sr. Deputado Amaral Neto e os elementos fornecidos pelo Ministério das Obras Públicas em satisfação de um requerimento apresentado pelo Sr. Deputado Azeredo Pereira em sessão de 27 de Março findo.
Remetido pela Presidência do Conselho, para os efeitos do disposto no n.º3 do artigo 109 da Constituição, receberam-se na Mesa os n.º" 74 e s6 tio Diário do Governo, inserindo os Decretos-Leis nº. 41 051 e 41 054.
Foi e ratado na acta, por proposta do Sr. Presidente, um voto de pesar pelo falecimento de um filho do Sr. Deputado Trigueiros de Sampaio.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Cid dos Santos, nobre o Hospital-Faculdade de Medicina de Lisboa, e Pinto Barriga, que r»rio u dois requerimentos para a Mesa.
Ordem do dia. - Continuou o debate sobre o aniso prévio do Sr. Deputado Daniel Barbosa acerca do problema económico português.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Alberto de Araújo, Manuel Vás e Há Linhares.
O Sr. Presidente encerrou a sessão ás 19 horas e 30 minutos.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada. Eram 16 horas e 10 minutos.
Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Adriano Duarte Silva.
Agnelo Orneias do Rego.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Pacheco Jorge.
Albino Soares Pinto dos Beis Júnior.
Alexandre Aranha Furtado de Mendonça.
Alfredo Amélio Pereira da Conceição.
Amândio Rebelo de Figueiredo.
André Francisco Navarro.
Antão Santos da Cunha.
António Abrantes Tavares.
António de Almeida.
António de Almeida Garrett.
António Augusto Esteves Mendes Correia.
António Bartolomeu Gromicho.
António Camacho Teixeira de Sousa.
António Carlos Borges.
António Cortês Lobão.
António Júdice Bustorff da Silva.
António Pinto de Meireles Barriga.
António Raul Galiano Tavares.
António Rodrigues.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Proença Duarte.
Augusto Cancella de Abreu.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Caetano Maria de Abreu Beirão.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos de Azevedo Mendes.
Carlos Mantero Belard.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Daniel Maria Vieira Barbosa.
Página 594
594 DIARIO DAS SESSÕES N.º 200
Eduardo Pereira Viana.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco Eusébio Fernandes 1'rieto.
Gaspar Inácio Ferreira.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Herculnno Amorim Ferreira.
Jerónimo Salvador Constantino Sócrates da Costa.
João Afonso Cid dos Santos.
João Alpoim Borges do Canto.
João Ameal.
João Luís Augusto das Neves.
João Mendes da Costa Amaral.
João de Paiva de Faria Leite Brandão.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim de Moura Relvas.
Joaquim de Pinho Brandão.
Joaquim de Sousa Machado.
Jorge Botelho Moniz.
Jorge Pereira Jardim.
José Dias de Araújo Correia.
José Garcia Nunes Mexia.
José Maria Pereira Leite de Magalhães e Couto.
José dos Santos Bessa.
José Sarmento de Vasconcelos e Castro.
José Soares da Fonseca.
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Luís de Azeredo Pereira.
Luís Maria Lopes da Fonseca.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Manuel de Magalhães Pessoa.
Manuel Maria de Lacerda de Sousa A roso.
Manuel Maria Múrias Júnior.
Manuel Maria Vaz.
Manuel Monterroso Carneiro.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
D. Maria Leonor Correia Botelho.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Reis.
Mário Correia Teles de Araújo e Albuquerque.
Mário de Figueiredo.
Pedro de Chaves Cymbron Borges de Sonsa.
Ricardo Malhou Durão.
Rui de Andrade.
Teófilo Duarte.
argel Abílio Horta.
Venâncio Augusto Deslandes.
O Sr. Presidente: - Estão presentes só Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 16 horas e 15 minutos.
Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente:- -Está em reclamação o Diário das sessões n.º 198.
Pausa.
O Sr. Presidente:-Como nenhum Sr. Deputado pede a palavra, considero-o aprovado.
Deu-se conta do seguinte
Expediente Telegramas
Da Federação dos Grémios da Lavoura da Beira Litoral a apoiar a intervenção do Sr. Deputado Magalhães Couto tendente a libertar aqueles grémios de encargos fiscais.
Dos Sindicatos Nacionais, dos Capitães, Oficias Náuticos e Comissários da Marinha. Mercante, dos Oficias Maquinistas, dos Maquinistas o Motoristas Costeiros, dos Oficiais Radiotelegrafistas, dos Marinheiros, dos Fogueiros e do Pessoal de Câmara, a apoiar as considerações do Sr. Deputado Pereira Viana, nomeadamente no referente a providencia e assistência clínica e outras melhorias sociais o económica.
O Sr. Presidente: - Estão na Mesa os elementos fornecidos pelo Ministério das Finanças em satisfação do requerimento apresentado pelo Sr. Deputado Amaral Neto em 28 do Janeiro último e os elementos fornecidos pelo Ministério das Obras Públicas em satisfação do requerimento apresentado na sessão de 27 de Março findo pelo Sr. Deputado Azeredo Pereira. Vão ser entregues a ostes Srs. Deputados.
Estão ainda na Mesa, enviados pela Presidência do conselho e para cumprimento do disposto n.º do artigo 109.º da Constituição, os n.º s 74 e 76 do Diário do Governo. 1.º série, de l e 3 do corrente, que inserem os Decretos-Leis n.1" 41 OM e 41 004.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Decerto a Câmara saberá que faleceu, vitima de desastre, um filho do nosso ilustre colega Sr. Deputado Trigueiros Sampaio.
Suponho interpretar os sentimentos da Assembleia mandando exarar na acta da sessão de hoje um voto de pesar pelo falecimento do filho do Sr. Deputado Trigueiros Sampaio.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra antes da ordem do dia o Sr. Deputado Cid dos Santos.
O Sr. Cid dos Santos: - Sr. Presidente: ao ler o documento relativo às minhas intervenções enviado a esta Assembleia pelo Sr. Ministro do Interior, reconheci, apesar da atenção que prestei quando da sua leitura nesta sala, que o sentido do algumas frases me tinha escapado. Especialmente a parte final da exposição quase constituiu para mini matéria nova.
É com relutância que volto a um assunto que considerava arrumado e do qual me encontrava já espiritualmente afastado. Mas os três pequenos esclarecimentos que prestei no próprio dia em que foi lida a exposição de S. Ex. ª não podem de modo algum constituir uma resposta suficiente ao conteúdo da nota. Posso, todavia, ser breve.
A maior parte do documento do Sr. Ministro refere-se ao aviso prévio e à revisão e conclusões a que procedi há poucos dias.
Nele são rebatidas ou negadas muitas das minhas críticas. Ora, quando se trava uma discussão pública è evidente que, por ser pública, a matéria dessa discussão é destinada a ser apreciada por todos ou por um sector maior ou menor desse público. E quem discuto em público tem por força de fazer confiança nos que ouvem, senão melhor seria discutir ao canto da lareira.
Por outro Lado, ó frequente deixar-se uma discussão degenerar facilmente numa polémica, na qual, sob formas diferentes, se repetem exactamente os mesmos factos e as mesmas razoes. A minha finalidade nunca foi uma polémica, e. como isso pode depender exclusivamente de mini, não haverá polémica. Se encontro naquilo que já disse nesta Casa razoes suficientes pura infirmar o que vem no documento do Sr. Ministro do Interior, não vejo necessidade de o repetir. De facto, creio que ficou tudo de pé. E fácil n qualquer chegar à mesma conclusão.
Página 595
10 DE ABRIL DE 1957 595
Àqueles que se interessam por esta questão, médicos ou não médicos, têm de possuir a educação geral suficiente para julgar o que está escrito. E quem não percebeu não perceberá. Repetir é, portanto inútil.
Creio que o documento do Sr. Ministro do Interior constitui um belo exemplo da forma a que aludi no meu último discurso: em como é fácil demonstrar que existe aquilo que julgamos não existir e como afinal está tudo certo.
A negação sistemática de quase tudo quanto eu disse, mesmo quando a verdade transparece a todos; a recusa repetida em aceitar qualquer crítica; a ideia de que a força do espírito reside em nunca dar razão - constituem um teste, terrível e infalível. Não se deve discutir nestas condições e o esclarecimento do pormenores, que se justificaria numa discussão leal, não tem agora qualquer utilidade. Fiquemos por aqui.
Mas o Sr. Ministro, na sua resposta, não contente em deitar por terra os meus três anos e meio de esforço como crítico, decidiu também atingir-me pessoalmente. O Sr. Ministro do Interior, saindo do plano da matéria em discussão, inclui na sua resposta dois aspectos que nada têm que ver com os princípios gerais debatidos e que se referem exclusivamente à minha pessoa como director do serviço de clinica cirúrgica.
Acusa-me S. Ex. ª de prejudicar os doentes pelo facto de manter no meu serviço o arquivo inerente. Já tive ocasião de expor a necessidade de um arquivo central onde vão parar as informações essenciais dos doentes, necessárias para o estabelecimento das estatísticas gerais e especiais do Hospital. Mas as observações e exames em si devem ficar no serviço, pois que, por pouco que um serviço trabalhe, o arquivo está sempre em constante movimento.
O arquivo é a alma do serviço, e sem arquivo organizado o serviço torna-se um mero posto de tratamento. Um arquivo central que recolha todas as histórias e observações num hospital de mil e quinhentas camas exigiria instalações vastas e complicadas e, apesar de todo o seu aperfeiçoamento, constituiria um grave obstáculo à consulta rápida e fácil do observações que no decurso de uma manhã são requisitadas pelos motivos mais variados. Só os homens como aqueles que citei no aviso prévio, e que dizem não precisar de arquivos, poderão apoiar uma medida tão esterilizante.
Quanto a prejudicar um só doente pelo facto de o arquivo se encontrar no serviço, onde a qualquer hora uma observação pode ser retirada imediatamente, situação que talvez não surja uma vez no ano, isso só pode ser dito por alguém que não é médico e nunca viveu a vida dum serviço hospitalar.
Pela fornia como Sr. Ex. ª se refere ao meu «arquivo privativo» dá a impressão a quem o ler que tenho esse arquivo aferrolhado para exclusivo uso próprio e que todos os outros directores de serviço enviam regularmente as suas observações completas para o arquivo central.
De facto, é com verdadeiro prazer que posso afirmar que no serviço de clínica médica, do Prof. Mário Moreira, no serviço de propedêutica médica, do Prof. Eduardo Coelho, no serviço de ginecologia e obstetrícia, do director clinico do Hospital, o Prof. Freitas Simões, no serviço de pediatria, do Prof. Castro Freire, no serviço de doenças infecto-contagiosas, do Prof. Morais David, e em todos os serviços restantes os arquivos se encontram tão retidos pelos seus directores, estão tão aferrolhados por eles e prejudicam tanto os doentes como os arquivos do serviço que dirijo.
O meu prazer em enumerar estes serviços provém de poder dizer que ainda há interesse pelos doentes, poios serviços, pela organização e pela investigação nos homens que dirigem a medicina do Hospital Escolar.
Para manter o meu arquivo organizado e utilizável gastei do meu bolso, em ordenados, desde 1948, a quantia que o Sr. Ministro do Interior conhece, cuja importância não tenho que declarar nesta Casa, mas que tive do ganhar com o meu trabalho. Digo isto apenas com o fim de demonstrar a que ponto um arquivo organizado é vital. Se fossem simplesmente paru um serviço centralizado as observações e radiografias de todos os serviços, isso corresponderia a contribuir apenas para a criação de mais um museu e para o estorvo constante à consulta fácil daquilo que constitui a base de trabalho clinico o cientifico.
No Mundo há de tudo. Mas o que é bom num sítio pode não o ser noutro e também nem tudo o que se faz de novo é forçosamente bom. Turnos cabeça para pensar e experiência para julgar.
O segundo aspecto pessoal sob o qual S. Ex. ª me honra com a sua atenção é o do meu valor como director de serviço. Pelo conteúdo da acusação, este aspecto é incomparavelmente mais grave 11 não menos injusto rio que o primeiro.
Começa S. Ex. ª por dizer que nem todos os serviços dão o rendimento que poderiam dar e ser esse o caso da clinica cirúrgica, isto é, do serviço que dirijo. E para demonstrar o desleixo aponta a média de dias de internamento por doente, que é superior no meu serviço às médias dos serviços de patologia cirúrgica e obstetrícia. E para demonstrar a minha incompetência compara a taxa de mortalidade do meu serviço (4,1 por cento) com as taxas de mortalidade dos dois serviços referidos, que são, respectivamente, de 1,0 por cento e 0,6 por cento.
Esta apresentação de números sem explicação do substrato de doentes em que se fundam ó inexpressiva, superficial - e não pode servir para condenar ou elogiar seja quem for. Posso assegurar que o mais mal intencionado dos médicos nunca ousaria produzir semelhante acusação numa sociedade cientifica, pela sensação nítida do fundo de má fé que isso traduziria perante os seus colegas. Mas não é preciso ser médico paru se compreender que, se os doentes a operar são escolhidos entre os riscos operatórios pequenos e se os doentes inspiráveis pelo seu estado suo rejeitados das admissões, uma estatística melhora logo, mesmo quando corresponda a cirurgiões de pouca experiência. E que, se é dada a preferência aos doentes portadores de afecções com risco operatório grande ou em situação desesperada, a mortalidade sobe a números impressionantes, mesmo nas mãos dos melhores cirurgiões do Mundo.
Finsterer, o grande vienense, dizia que a maior honra para um cirurgião consistia em salvar um doente em dez considerados perdidos e inspiráveis. Isto representa uma mortalidade de 90 por cento. Se no meu serviço se der a preferência de internamento às hérnias, apendicites crónicas e úlceras do estômago com excelente estado geral, posso muito facilmente produzir uma taxa de mortalidade inferior a 0,5 por cento. E se eu fizer admitir exclusivamente cancros do estômago em todas as sua fases de evolução não será fácil deslocar a taxa de mortalidade para baixo de 20 ou mesmo 30 por cento.
Da mesma maneira, se um serviço se encontra predominantemente ocupado por afecções crónicas ou de evolução lenta, a média de hospitalização será mais elevada do que se a maioria dos doentes sofre de doenças que permitem uma alta aos sete ou doze dias de internamento. Se aplicarmos estes princípios aos três serviços citados por S. Ex.a, podemos explicar facilmente os números apontados.
Na cirurgia ginecológica a mortalidade é geralmente baixa porque a maioria das afecções ginecológicas não correspondem a riscos cirúrgicos muito grandes. Isso explica a taxa de 0,6 por cento apontada pelo Sr. Ministro. E isso explica que a taxa de mortalidade da gine-
Página 596
596 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 200
cologia praticada no meu serviço, que é um serviço de cirurgia geral, seja de O por cento. E se é de O por cento não é porque se opere melhor no meu serviço do que no do Prof. Freitas Simões, mas é simplesmente porque se opera menos ginecologia do que no serviço que não opera outra coisa.
Bem mais difícil de realizar foi o estudo comparativo da actividade cirúrgica dos dois serviços de cirurgia geral mencionados pelo Sr. Ministro e interpretar as taxas de mortalidade correspondentes.
Durante três dias duas equipas de assistentes e outros colaboradores do meu serviço trabalharam sem parar no meu arquivo e no arquivo central, juntamente com o médico chefe desse arquivo, que se não poupou a esforços. Todos sacrificaram as suas vidas particulares. Se nos encontrássemos numa sociedade científica, faria uma rápida exposição dos números globais e parciais, taxas de mortalidade comentadas, médias de internamento correspondentes a doentes operados e não operados, classificação de mortalidade e média de internamento por afecções por estados gerais e fase de evolução das doenças no momento de internamento, por percentagens comparativas das doenças diversas nos dois serviços, por riscos operatórios, etc.
É evidente que a nada disso tenho de me referir aqui. E se todo este trabalho se realizou foi apenas para eu poder concluir, com base segura, mas sem estabelecer comparações inúteis e deslocadas, que os números apresentados correspondem exactamente ao que se poderia esperar do fundo de doentes dos dois serviços, isto é, que a taxa de mortalidade de 4,6 por cento do serviço de clinica cirúrgica é, vistas as coisas sem favor para ele, pelo menos comparável aos 1,6 por conto do serviço de patologia cirúrgica e que as médias de internamento correspondem à diferente percentagem o natureza dos doentes.
Quando me encontrei perante a comparação do Sr. Ministro pensei logo no prazer com que ele tomaria conhecimento, e como se apressaria a difundi-los, dos números que em 1944 publiquei com a estatística da minha equipa do banco de S. José, onde a mortalidade é sempre elevada. Essa estatística revela uma taxa de mortalidade operatória de 17 por cento. Mas verifica-se que ao dividir as operações em dois grupos, um deles operado por mini, como cirurgião do banco, e o outro pelos meus colaboradores, as taxas de mortalidade são, respectivamente, de 27 por cento e 12 por cento, o que, na conclusão do Sr. Ministro, não poderia deixar de demonstrar que eu só tinha uma coisa o fazer: procurar um posto qualquer através do Comissariado do Desemprego. Simplesmente, nessa estatística tudo está explicado, e assim torna possível uma apreciação crítica do conjunto.
Se atendermos agora a que o serviço de clínica cirúrgica é o único em que os assistentes fazem voluntariamente um serviço de vinte e quatro horas de enfermaria; a que, além da grande cirurgia, onde se realizaram 444 operações, trabalha constantemente uma sala de operações somente para a pequena cirurgia, onde no ano passado se realizaram 219 operações; a que no mesmo ano o número de doentes examinados na consulta externa foi de 8493, ou seja o dobro dos doentes examinados na consulta de patologia cirúrgica e, provavelmente, o número global mais elevado de todas as consultas do Hospital; a que se exige um esforço talvez maior que em' toda a parte para manterem completas e revistas as observações dos doentes; a que existem registos especiais para todas as intervenções, além das observações dos doentes; a que existe um departamento próprio de radiologia especialmente destinado ao prosseguimento do estudo e observação do sistema vascular o a que só em 19-06 se fizeram 74 arteriografias e 448 flebografias, exames que exigem uma técnica muito afinada e ocupam cada um cerca de meia a uma hora ou mais e fixam de três a sete pessoas; a que" todos esses exames são minuciosamente registados, de modo a tornar útil o maior e mais variado arquivo de angiografia do Mundo; a que a equipa de colaboradores que comigo trabalha é grande, não pelo que me é atribuído pelo Hospital, mas pelo número e qualidade dos voluntários que dela fazem parte; a quanto são constantes as operações de casos raros e delicados, que exigem enormes esforços de todos; a que alguns doentes se salvaram devido exclusivamente à qualidade cientifica e esgotaste dedicação da minha equipa; a que todos os anos são várias as sessões de demonstrações cirúrgicas e angiográficas a visitantes, pequenos grupos de cirurgiões ou congressos, o que exige muito esforço e tempo; a que a totalidade do serviço de urgências graves de todo o Hospital, com a natural excepção da obstetrícia, foi feito até hoje voluntariamente e com muita dedicação pelos mais categorizados elementos desta equipa; a que assim evitaram a utilização por esses doentes do serviço permanente de transportes para os conduzir ao serviço adequado, como o Sr. Ministro do Interior descreve em forma de parábola, o que em português corrente significa levar os doentes de maca para S. José - é natural que seja fundo o sentimento de indignação de todos os que foram injustamente visados pela crítica do Sr. Ministro, e, mais que todos, o seu director, que não ocupa o seu lugar com indiferença nem inferioridade profissional.
O que torna o aspecto pessoal que agora encarei particularmente digno de reparo é não ter ele qualquer relação com os grandes problemas encarados no aviso. A sua inclusão no documento do Sr. Ministro só pode ter como finalidade desprestigiar e ferir pessoalmente com acusações injustas um homem que, tendo sido solicitado a exprimir a sua opinião, manifestou o seu desacordo à orientação geral seguida pelo Governo sobre o problema da assistência e do ensino da Medicina e que julga fê-lo feito com justiça, muito trabalho e toda a lealdade.
Se duvido do êxito do Sr. Ministro no campo da critica e no da acusação pessoal, não há dúvida de que a finalidade evidente de me magoar pessoalmente com uma injustiça atingiu o seu fim, porque não há injustiça que não magoe, venha ela donde vier.
Todo o trabalho que produzi, fi-lo pelo meu país. Não estou disso arrependido. Mas este final constituiu para mi uma grande lição.
Se a posição do Sr. Dr. Trigo de Negreiros como Ministro do Interior me permitiu explicar em que consistiu a injustiça da ofensa, o respeito que lhe devo pelo cargo que ocupa inibe-me de o julgar. Mas creio ter fortes razões, neste momento, para declarar o seguinte: tal como há poucos dias encerrei o ciclo da minha actividade no campo da crítica parlamentar, igualmente posso fechar hoje o ciclo das minhas respostas.
Só desejo agora, se isso for possível, paz na minha vida e na minha actividade profissional.
Tenho dito.
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Urgel Horta: - Sr. Presidenta: peço a palavra para fazer algumas considerações sobre o assunto que acaba de ser tratado pelo Sr. Deputado Cid dos Santos.
O Sr. Presidente:-Não posso dar agora a palavra a V. Ex. ª porque temos de consagrar a maior parte desta sessão à discussão do aviso prévio do Sr. Deputado Daniel Barbosa. Todavia, fica V. Ex. ª inscrito, e na primeira oportunidade conceder-lhe-ei a palavra para falar sobro osso assunto.
Página 597
10 DE ABRIL DE 1907 597
O Sr. Urgel Horta: - Muito obrigado a V. Ex. ª
O Sr. Pinto Barriga: - Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa os seguintes
Requerimentos
"Verificando-se uma grande acumularão de serviço nos despachos aduaneiros das encomendas postais, apesar do selo dos respectivos funcionários, o que dá lugar a frequentes e involuntários erros de contagem nos impostos atribuídos, que só podem ser rectificados em demorados processos do indemnização e reembolso, tenho a honra de requerer, pelo Ministério das Finanças e direcção-geral das Alfândegas, as seguintes informações :
Se está em estudo a forma de obviar aos inconvenientes da acumulação de serviços das encomendas postais o também a aceleração do processualismo do indemnizarão e reembolso.
«Com relevância ao turismo nacional, tomei conhecimento dum preçário-base dos estabelecimentos hoteleiros, aprovado pelo Conselho Nacional do Turismo em Novembro passado e outorgado pelos serviços do turismo do Secretariado Nacional da Informação, acompanhado de novas modalidades de hospedagem, que fazem consistir a locação dum quarto por períodos de vinte e quatro horas, com início a partir das l2 horas de um dia e terminando até às 12 horas do dia seguinte, reputando a ocupação do quarto por tempo inferior a doze horas um período de locação e lixando, finalmente, n pensão completa como uma locação dum quarto por uma permanência mínima de três dias, com direito à utilização das refeições e dando inicio a essa contagem a primeira refeição a que o hóspede tenha direito após a sua chegada. Nestes termos, desejando avaliar as vantagens que tais medidas possam ter para os interesses nacionais do turismo, tenho a honra de requerer, pela Presidência do Conselho e Secretariado Nacional da Informação, autorização para consultar a documentação arquivada sobre a marcha administrativa destas determinações».
Para terminar, agradeço ao Sr. Ministro do Ultramar a resposta que ele próprio se dignou dar-me. Tenho dito.
O Sr. Presidente: - Vai passar-se à
Ordem do dia
U Sr. Presidente: - Continua o debate sobre o aviso prévio do Sr. Deputado Daniel Barbosa acerca do problema económico português.
Tem a palavra o Sr. Deputado Alberto de Araújo.
O Sr. Alberto de Araújo: -Sr. Presidente: ouviu esta Assembleia com o maior interesse o discurso do Sr. Deputado Eng. Vieira Barbosa, que correspondeu à efectivação do seu anunciado aviso prévio sobre o problema económico português.
Quero dirigir os meus cumprimentos àquele Deputado pelo trabalho que apresentou o que reflecte a grande cultura e inteligência do antigo e ilustre Ministro da Economia.
Sr. Presidente: não há dúvida nenhuma de que a experiência dolorosa das d uns guerras e as insuficiências que os povos foram obrigados a suportar em consequência da falta ou da escassez de determinados géneros e artigos deram origem a uma política económica no sentido de dotar as unções duma mais sólida estrutura e que diminuísse, na medida do possível, a sua dependência dos mercados externos.
Os velhos conceitos relativos à necessidade do equilíbrio das balanças de pagamentos e de as nações preservarem as suas riquezas e reservas em ouro fortaleceram esta tendência, que se traduziu num os esforço para aumentar a produção nos seus diversos sectores e modalidade Por outro lado, os anseios sociais da nossa época e o desejo de assegurar às grandes massas operárias K trabalhadoras melhores salários e maiores comodidades contribuíram para impulsionar o fomento industrial, dado que a experiência provara também que nas nações industrializadas era melhor e mais alto o nível geral de vida das respectivas populações.
A Europa saíra empobrecida da última guerra e algumas nações, para a vencerem, tiveram de endividar-se e de alienar parte valiosa da sua própria riqueza. Daí a necessidade dum considerável auxílio externo, que tornou possível a reconstituiçao europeia, o reapetrechamento industrial, a melhoria das condições de vida de núcleos importantes de população, que sem esse auxílio teriam sido atiradas para a miséria e para os piores caminhos da indisciplina e desordem sociais.
Mercê, em grande parte, do auxílio americano e das qualidades de iniciativa, tenacidade e poder criador que sempre distinguiram os povos europeus, puderam estes, nos últimos dez anos, realizar uma obra notável de ressurgimento e recuperação. Em Junho de 1947 Marshall, num discurso aos estudantes da Universidade de Harvard, anuncia o seu plano de ajuda à Europa, em Julho retinem-se em Paris representantes de dezasseis nações, entre estas Portugal, cria-se a Comissão de Cooperação Económica Europeia, encarregada de elaborar um relatório sobre as necessidades económicas dos diversos países europeus, e em Abril de 1948, depois de discutido pelo Congresso dos Estados Unidos, n presidente Truman assina o European Recovery Program.
Longo foi, desde então, o caminho percorrido, não só com o objectivo de aumentar a produção europeia a criar melhores condições de vida mas também de facilitar e intensificar entre os diferentes países fórmulas mais amplas de troca e de comércio. Se o auxílio americano tinha sido concedido no desejo de ajudar a Europa a vencer a crise da guerra e ficar, depois, em boas condições de sanidade económica e financeira, podendo, por si, viver e progredir, não se pode deixar de reconhecer que as nações europeias procuraram compreender a natureza excepcional e transitória do auxílio que lhes era prestado.
Logo em Abril de 1948, na segunda reunião da Comissão de Cooperação Económica Europeia, se instituiu a Organização Europeia de Cooperação Económica (O. E. C. E.), cujo objectivo era, precisamente, elaborar um programa de reconstituiçào com a finalidade de libertar, progressivamente, a Europa da necessidade do auxílio exterior.
Todos conhecem o que foi a acção deste organismo. Para a realização do seu objectivo fundamental procurou desenvolver ao máximo as trocas de bens e de serviços entre as nações que dele faziam parte, estabelecendo um regime de pagamentos multilaterais que facilitasse o movimento geral do comércio. E procurou também influir para que se estudasse uma baixa geral de tarifas aduaneiras e para que as nações associada» voltassem às boas práticas do equilíbrio orçamental e da sanidade na moeda e nos câmbios.
Mercê duma acção conjugada e persistente, entrou-se numa política de progressiva liberalização do comércio, impulsionou-se a produção, combateram-se as práticas discriminatórias, estabeleceram-se, primeiro, e ampliaram-se, depois, importantes acordos de compen-
Página 598
598 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 200
sacão monetária multilateral e que culminaram pela criação, em Setembro de 1950, da União Europeia de Pagamentos, cujo funcionamento e mecanismo já foram várias vezes referidos nesta Câmara e nos quais me dispenso, por isso, de fazer mais larga referência.
Um novo e importante passo se deu no raminho da cooperação europeia com a instituição, em Janeiro de 1955 do Fundo Monetário Europeu, destinado a conceder créditos, a curto prazo, aos países que deles viessem a necessitar e que deveria substituir-se à União Europeia de Pagamentos quando fosse possível regressar a um sistema geral de convertibilidade de moedas.
Mercê do seu imortal instinto de sobrevivência, dos méritos e riquezas reais dos povos que a constituem, da ajuda externa que lhe foi prestada e dum esforço sério no sentido do aumento da produtividade, a Europa pôde realizar uma obra notável de recuperação.
De 1948 a 1964 a produção industrial europeia aumentou em 58 por cento. Foram notáveis os aumentos verificados na produção do aço e da energia eléctrica - respectivamente de 66 e 67 por cento. Entre 1948 e 1953 a produção agrícola aumentou em 33 por vento, e entre 1948-1949 e 1954 duplicou o volume do comércio entre os países da O. E. C. E. e melhoraram também as suas reservas em dólares.
Apesar de todo este esforço gigantesco e desta melhoria geral na produção, no comércio, no fomento industrial, não falta quem procure demonstrar a necessidade de a Europa adoptar fórmulas mais amplas de colaboração se quiser dar ao progresso alcançado a continuidade indispensável para assegurar às respectivas populações altos níveis de comodidade e de bem-estar e terminar com a pobreza, o subdesenvolvimento e o atraso em que ainda se encontram muitas regiões.
Se a Europa se reergueu e reconstituiu, efectivamente, mercê dum louvável espírito colaborador, é necessário e vantajoso que se prossiga nessa mesma via de cooperação internacional.
E, para fundamentar uma orientação que se julga indispensável à sobrevivência da Europa e das suas próprias instituições, descreve-se o aspecto geral da economia contemporânea, com as novas e grandes nações continentes que dominam o Mundo, para tentar provar que a velha Europa não poderá competir com elas nem acompanhá-las no seu progresso económico e social se não enveredar por fórmulas mais íntimas de entendimento e cooperação, de maneira a ser, no seu todo. um grande centro produtor e, ao mesmo tempo, um vasto mercado de consumo.
Num livro recente e notável do economista belga Jacques Trempont, no qual colhi os elementos estatísticos e de informação que utilizo nas minhas considerações, traça-se, com grande brilho, o quadro evolutivo da economia europeia, para demonstrar que o velho continente não tem hoje a posição de hegemonia que durante séculos desfrutou no Mundo. Pelas regiões e países que dominava, pela sua produção, pelo poder da sua indústria e da sua técnica, a Europa, com o valor das suas elites, gozava, sem dúvida, de uma situação incontestada de superioridade e de comando relativamente aos outros continentes. Por toda a parte investiu capitais e trabalho, criando nações e riqueza, desfrutando de influência e prestígio, aproveitando matérias-primas cujo valor revelou e que, mercê do seu alto poder industrial, transformava e tornava a exportar, num circuito produtivo que contribuiu decisivamente para o seu progresso económico e social.
Duas guerras sucessivas contribuíram para alterar esta posição de comando económico e hegemonia política. Â Europa saiu da última guerra empobrecida; a oeste e leste formaram-se dois grandes blocos militares e económicos, e não só a profunda rivalidade que entre eles se estabeleceu contribuiu para o aumento da sua capacidade e das suas técnicas de produção, como procuraram captar ou dominar, directa ou indirectamente, aberta ou veladamente, povos e regiões que durante muitos anos, e mesmo séculos, viveram na órbita da influência europeia. Segundo os dados estatísticos da O. N. U., a indústria europeia, excluindo a Rússia, em 1913 produzia 52,4 por cento da produção mundial, a América do Norte 36,0 por cento e a Rússia apenas 4 por cento. Em 1952 a América do Norte tinha já elevado a sua percentagem na produção industrial mundial para 41,2 por cento, a Rússia para 15,8 por cento e a produção europeia tinha, neste conjunto, baixado para 32,8 por cento.
No sector agrícola, enquanto a produção americana aumentara 35 por cento relativamente à produção de 1939, o aumento verificado na Europa não ia além de 12 por cento.
Para esta deslocação do centro de hegemonia económica e financeira muito contribuiu também a substituição do carvão por outros combustíveis e é natural que se acentue o desequilíbrio se a Europa não acompanhar a América e a Rússia nos seus trabalhos e investigações para o emprego da energia atómica em fins pacíficos. Reproduzo também a este respeito uma cifra curiosa que consta de um relatório da Comissão Económica da O. N. U. para a Europa e que dá bem a medida do problema: 1 kg de urânio poderá um dia substituir 3000t de carvão.
A perda de posição da Europa no comércio mundial é também expressa por números elucidativos. A percentagem das exportações europeias no conjunto da exportação mundial baixou de 47 por cento em 1928 para 36 por cento em 1950, e a importação de 52 por cento para 39 por cento entre aquelas duas datas, tendo a balança corrente do conjunto das nações ocidentais, que apresentava em 1928 um saldo credor de perto de 500 milhões de dólares, registado já em 1938 um saldo devedor aproximadamente do mesmo montante.
Quanto à produtividade europeia, se ela. no conjunto, é superior à produtividade russa, está muito aquém da produtividade americana. E são também os Estados Unidos que, a grande distância, vão na vanguarda do rendimento por habitante.
Do ponto de vista demográfico, a população europeia, que em 1911 correspondia a 26 por cento da população total do Mundo, já em 1940 correspondia apenas a 18 por cento.
Esta perda de posição relativa ao conjunto da economia do Mundo não significa que a Europa não continue a ser dotada de grandes recursos e possibilidades. A massa de trabalhadores é sensivelmente igual na Europa Ocidental e nos Estados Unido: entre 60 e 70 milhões de indivíduos. A sua população densa é considerada também factor favorável para o fomento industrial, pelas despesas de deslocação e transporte que evita, dispondo, além disso, de uma mão-de-obra excepcionalmente qualificada.
Do ponto de vista da energia, possui a Europa meios de produzir 83 por cento das suas necessidades totais, havendo ainda importante margem para o aumento de energia hidráulica. Depende, é cento, o velho continente do exterior quanto a grande número de matérias-primas essenciais, mós a sua íntima comunicação geográfica e política com a África (Euráfrica) ainda lhe assegura neste aspecto especiais condições de vantagem.
Mas, se a Europa Ocidental possui mina população de perto de 300 milhões ide habitantes, ou seja tanto como os países de Leste, incluindo a Sibéria, e mais 125 milhões do que os Estados Unidos e o Canadá, se esta população dotada de excepcionais qualidades inventivas
Página 599
10 DE ABRIL DE 1957 599
e criadoras, se é rica um carvão, se paga com as suas exportações metalúrgicas o que precisa de importar em produtos alimentareis, se controla ainda alguns dos grandes centros mundiais de matérias-primas, porque é que a sua economia não progride' no mesmo ritmo com que evoluem outras economias da além-mar e a sua população não atingiu ainda aquele nível de vida que seria de desejar e (pie ú a mais segura garantia do progresso e da paz social?
Para uma corrente de economista modernos alentos, sem dúvida, aos problemas da nossa época e baseados Jias lições e nos resultados da colaboração europeia- posterior a 1948, a Europa só pode sair da rotina actual quando levar mais longe os princípios e a política de cooperação que vem praticando. Sem isso não haverá progresso económico e social e a velha nações europeias serão definitivamente condenados a uma situação de estagnação perante o grandes blocos políticos económico que se levantam a oeste e a leste.
Para estes economistas, todos eivados da doutrina do mais puro liberalismo, as últimas guerras modificaram a face do Mundo e só pela criação de grandes mercado internos se podem obter altos consumos, grandes produções e elevados níveis de bem-estar e comodidade. Segundo estes autores, que vêm tendo uma influência cada vez maior na opinião pública de certos países, os Estados Unidos da América, mais do que aos recursos, capitais e matérias-primas de que dispõem, devem o seu alto grau de progressividade económica ao facto de constituírem, por si, um grande mercada interno. Os Estados Unidos, com os seus 160 milhões de habitantes e com um território de 9 milhões de quilómetros quadrados, estendendo-se do Atlântico ao Pacífico, constituem um grande centro de actividade, em que o circuito contínuo da produção e do consumo constitui o factor principal de expansão e de progresso. E esse vasto e grande mercado consumidor que absorve e torna possível a produção em série, o investimento em larga escala, a paixão da produtividade e a concorrência que conduz ao sucesso económico.
Como se escreve, se os Estados Unidos fossem divididos em quarenta e oito estados, todos teriam uma vida medíocre e uma agricultura e uma indústria médias. Nesta mesma orientação, o também segundo estes economistas, a expansão russa deve-se, além de factores técnicos e demográficos, ao grande espaço em que a vida económica se desenvolve e que tornou possível, nos últimos quinze anos, aumentos substanciais na produção de matéria-prima e de energia, como sejam o carvão, o aço, o petróleo e a electricidade.
Postos assim em confronto estes dois grandes blocos políticos e económicos, de um lado os Estados Unidos da América, do outro lado a Rússia, na grandeza dos seus recursos e dos seus mercados internos, situa-se a meio a Europa, dividida em numerosos estados, com as suas fronteiras, as suas alfândegas, as suas dificuldades e restrições à livre circulação das mercadorias, dos capitais e das pessoas, para se concluir que essas barreiras político-económicas são o mais sério obstáculo á expansão económica e àqueles objectivos de bem-estar e de prosperidade que dominam a nossa época. Como nas economias dos grandes espaços e das quais a América do Norte é o exemplo típico, é necessário que os produtos fabricados na Europa possam circular livremente entre os diversos estados, que a mão-de-obra procure livremente as regiões onde maior ou mais estável seja a sua remuneração e que os capitais, circulando sem peias, possam favorecer o investimento nos países onde obtenham melhores condições de colocação.
Segundo esta escola, o proteccionismo fez o seu tempo e, se serviu utilmente para fortalecer indústrias nascentes, não pode servir para defender nos nossos dias economias decrépitas.
As economias nacionais substituem-se hoje as economias dos grandes continentes, desses países imensos em que u espaço é factor decisivo do progresso económico. Ora diz-se depois das grandes modificações que as duas últimas guerras operaram na fisionomia do Mundo e com a deslocação do eixo da sua economia, a Europa tem de constituir um grande mercado para os países que a formam, se quiser sobreviver e progredir. E preciso, em suína, criar na Europa aquilo que se chama o mercado comum.
Entre as obras aparecidas nos últimos anos que mais decisiva influência exerceram na consolidação desta ideia do mercado comum e nos relatórios e estudos oficiais que o procuraram justificar, pode e deve colocar-se o já citado livro do economista belga Jacques Trempont L'Unifcation de L'Europe. prefaciado por Paul van Zeeland, antigo presidente do Governo da Bélgica.
Pode expor-se, assim, o seu pensamento em matéria tão importante e actual:
O mercado comum corresponde e exprime uma unificação de economias e caracteriza se pela sua extensão e pela eliminação de todas as peias, tarifas, providencias discriminatórias, medidas preferenciais, que dificultem a livre circulação dos produtos, das pessoas, dos transportes e dos capitais.
Supõe a existência de organismos destinados a defender uma política comum e das regras adoptadas para a assegurar e supõe, igualmente, um espírito prévio de comunidade sem o qual é inútil a sua instituição.
Uma vez em funcionamento, o mercado comum tornará possível pôr à disposição da comunidade os recursos de todos, a formação de extensas áreas de vendas, a criação de grandes indústrias, com as suas vantagens de. menores custos de produção, de salários mais compensadores, de uma melhor produtividade e de mais altos níveis de vida. Seria, em suma, possível, em parte, transferir para a Europa as vantagens do circuito interno americano.
Por outro lado, o mercado comum operaria a divisão e a especialização do trabalho, as indústrias instalar-se-iam nas regiões mais apropriadas em razão da proximidade de matérias-primas ou de grandes centros de consumo e isso seria factor de paz, pela impossibilidade de cada nação possuir, por si só, o potencial industrial necessário para desencadear e manter uma guerra.
O estabelecimento de regras comuns e estáveis de política económica seria elemento de confiança e favoreceria também o investimento. E a concorrência sã só beneficiaria com o mercado comum, como beneficiariam, igualmente, o emprego, em virtude das facilidades concedidas à circulação das pessoas, e a produtividade, com a possibilidade de introdução de novas técnicas na produção.
Finalmente, o mercado romano permitiria agir com mais eficiência contra a depressão que do tem pôs a tempos ameaça de crise as economias nacionais e que é mais difícil de combater dentro de um só país e per medidas adoptadas por um só Estado do que por um esforço conjugado e harmónico de várias nações.
A criação dum mercado comum impõe como condições prévias a liberalização do comércio e a abolição das barreiras aduaneiras. Os construtores do sistema reconhecem, porém, a impossibilidade de passar por uma vez só o de um só jeito dos quadros restritos das actuais economias nacionais, fortemente defendidas o protegidas, para um vasto mercado comum, sem atravessar primeiro, um período transitório de gradual adesão as ideias, princípios e realizações que o próprio mercado comum implica. Esse período não pode ser
Página 600
600 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 200
tão longo que corresponda a uma estagnação da própria ideia em si; nem tão curto que traga à economia das nações associadas e à ideia do mercado comum prejuízos e inconvenientes que poderiam resultar no seu fracasso.
Cita-se, a este respeito, a frase dum economista americano: «o tempo não perdoa o que se faz sem ele».
E por etapas que, sobretudo em matéria de pautas alfandegárias, se deve partir do sistema actual pura um regime de igualdade de tarifas, até obter a sua supressão total, e formar, assim, uma verdadeira união aduaneira.
Esse período transitório servirá para as indústrias e diversas actividades que se desenvolvem no plano económico se adaptarem às novas condições de concorrência.
A formação de uma união aduaneira europeia dá lugar ao problema de saber como se comportaria essa união quanto a terceiros países em matéria de tarifas. Se, evidentemente, no propósito de aumentar as trocas entre si, as nações europeias acordavam em suprimir as tarifas alfandegárias, num pensamento de concessão recíproca, é evidente que tinha de haver uma defesa fender contra terceiras nações que continuavam a defender as suas economias através do mesmo sistema proteccionista. Simplesmente, se a Europa aplicar a esses terceiros países tarifas muito elevadas, contribuirá para dificultar o tráfego do comércio com o resto do Mundo e para a formação e isolamento de grandes blocos económicos, o que é contrário à circulação de bens e produtos e aos próprios princípios que dominam a constituição do mercado comum. Alguns dos seus mais directos inspiradores são de opinião que a união aduaneira europeia devia adoptar, ao nível da tarifa mais baixa, uma tarifa comum quanto a terceiros países.
O mercado comum não corresponde ao termo das relações comerciais com o resto do Mundo. Pelo contrário, a Europa tinha de continuar a importar matérias-primas e géneros alimentares de outros países e de contar com eles, sobretudo com certas regiões subdesenvolvidas de além-mar, para a venda e colocação dos seus produtos.
Constituída a união aduaneira, e simultaneamente com a liberalização de produtos, devia ser objecto do mercado comum a supressão gradual do controle de câmbios e uma maior transferibilidade das divisas dos estados integrados na nova comunidade, como elementos indispensáveis a uma mais activa circulação de capitais.
Providências adequadas deveriam também ser adoptadas para permitir a deslocação da mão-de-obra para onde esta encontrasse melhor remuneração, abolindo-se
todas as restrições e formalidades que dificultam o trabalho de estrangeiros.
Só assim se obtinham os três objectivos fundamentais do mercado comum: livre circulação de mercadorias, de pessoas e de capitais.
Condição necessária ao seu êxito seria a adopção por parte dos diversos países participantes de uma política comum em matéria de moeda, orçamento e impostos, legislação comercial e social, formação de preços e de salários. Sem isso é impossível falar de uma concorrência sã e equitativa na zona do mercado comum.
O fecho desta evolução seria a definição de uma política .económica supranacional.
Para a atingir seria necessário criar uma forte consciência de unificação e de comunidade e a Europa escolher entre as vias da desintegração que representam a sua ruína e o seu empobrecimento e as soluções de uma integração racional e progressiva que constituem, segundo os defensores do mercado comum, a única
forma de se obterem mais altos níveis de vida e uma expansão global da produção.
Esta ideia do mercado comum, defendida em numerosos livros e trabalhos, tem sido nos últimos tempos um dos mais apaixonastes assuntos da literatura .económica e dos gabinetes dos técnicos, passou para as tribunas das câmaras políticas, pura as revistas e jornais de todo o Mundo.
Levanta por si só um grande número de problemas f de questões e, se para uns é razão de esperança confiante, para outros é motivo de inquietação fundada. Como poderão as economias dos estados europeus, ou pelo menos de muitos deles, resistir a esta liberalização progressiva mas total de produtos, pessoas e capitais? Como poderão certas regiões agrícolas ou industriais, que, pela pobreza do seu solo ou pela sua deficiência de matérias-primas, vivem na dependência da protecção aduaneira, suportar o embate da concorrência livre?
Sendo em muitos países as tarifas alfandegárias fonte importante das receitas do Estado, que reflexo teriam nas finanças públicas e nos sistemas fiscais a criação de uma união aduaneira na Europa?
Todos estes problemas têm sido objecto de vasta discussão e literatura. Segundo uns, são vistos com pessimismo. Segundo outros, todos são susceptíveis de solução e esta tem de ser encontrada, se a Europa, como já se escreveu, não quiser ver transformada a sua posição de terra de comando que foi no passado em simples ponto estratégico que está, possivelmente, condenada a ser no futuro.
Em certos meios é tal o entusiasmo por esta ideia nascente do mercado comum que se defende à ou trance a sua criação, ficando para resolver, depois, muitas das questões que o seu funcionamento naturalmente suscita. São questões económicas que envolvem nalguns países o desaparecimento ou a readaptação de diversas indústrias, são questões sociais, como a deslocação maciça de núcleos importantes de operários e trabalhadores, com a natural influência dos seus hábitos, da sua maneira de ser e das suas ideias nas regiões onde se fixam; são questões monetárias, como as que dizem respeito à interconvertibilidade das moedas e, ainda, à uniformidade das taxas de desconto e da política de crédito; são, entre outras, questões financeiras, como as que se referem à necessidade de uma sã política orçamental, ao quantitativo das reservas dos bancos centrais, ao alinhamento dos impostos que influem no custo da produção, ao novo sistema cambial, se fixo, se variável, às compensações que os diversos estados terão de encontrar para suprir a deficiência proveniente da progressiva redução de tarifas aduaneiras, etc.
A formação do mercado comum põe a questão da diversidade de salários e de encargos sociais, influindo directamente no custo da produção dos vários países. Mas os defensores do mercado comum sustentam que o tempo e o livre jogo da lei da oferta e da procura igualarão os salários ao nível mais alto, o mesmo acontecendo aos encargos sociais, que, no fundo, não são mais do que salários diferidos.
Mas, a par dos problemas económicos, sociais e financeiros que a criação do mercado comum levanta, importantes 'aspectos políticos se suscitam, dada a necessidade da criação de organismos interestaduais, segundo uns, ou superestaduais, segundo outros, que assegurem o funcionamento do seu mecanismo e das instituições que este próprio pressupõe.
Os partidários do mercado comum sustentam, efectivamente, que a sua existência implica a criação 'de uma autoridade capaz de impor e de fazer respeitar as leis desta nova comunidade.
A tradicional mentalidade dos povos europeus, possuidores de longas tradições políticas e históricas.
Página 601
10 DE ABRIL DE 1957 601
causa, em regra, aversão a criação de organismos su-perestaduais que possam corresponder á limitação de uma soberania de que sempre tem sido tão ciosos.
Mas os mais entusiastas partidários do mercado comum procuram demonstrar, que no rigor das coisas a política de unificação o económica da Europa não colide com a soberania dos estados que a constituem, ou seja com a autonomia da sua política económica, social e financeira. E continuo a acompanhar o raciocínio do já citado autor, o economista Jacques Trempont, que argumenta assim:
Os estados' não dispõem actualmente de poderes discricionários a usar apenas na defesa dos seus próprios interesses. Pelo contrário, são limitados pelo direito internacional, que se eleva acima do direito interno de caída nação. A soberania absoluta é hoje tão inaceitável como a liberdade absoluta para os indivíduos.
Sendo o Estado moderno limitado pelas regras do direito internacional, nada impede também que, sem prejuízo da sua soberania, possa limitar a sua liberdade de acção, desde que o faça com toda a independência e por uma manifestação livre da sua vontade.
Nesta hipótese não há mais que uma deslocação no exercício da competência estática.
São múltiplos os exemplos de casos em que os estados limitam a sua soberania em beneficio de uma determinada disciplina internacional. Apontam-se, entre ou-1ron a O. N. U., a União Europeia de Pagamentos, a Organização Europeia de Cooperação Económica, a própria Organização do Tratado do Atlântico Norte.
O problema que se põe é de saber se a Europa, que possibilitou também a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço vai dar mais um passo no sentido da sua cooperação, organizando o mercado comum e as instituições que asseguram o seu funcionamento.
No fundo, o que se pretende é caminhar para formas mais definidas de unificação da Europa, em que os respectivos estados, como que constituindo uma confederação, deleguem em órgãos centrais uma parte da sua soberania com o objectivo de, em comum, serem geridos interesses da própria comunidade.
E na defesa desta ideia diz-se: se por um lado. O estados solicitados, para fazerem parte do mercado comum reduzem a sua autonomia, limitando, voluntariamente, não a própria soberania, mas o exercício de partes dela, desmembrando-a em benefício de autoridades supranacionais por outro lado eles adquirem direitos novos, que lhes são conferidos sobre os outros estados, pela sua participarão em órgãos comuns.
«Alargam os seus poder?» sobre o plano internacional na medida em que os diminuem no plano nacional: aumentam mais que diminuem.
Sr Presidente: todas estas ideias, todo este sistema de integração progressiva, defendido por técnicos e economistas, não pôde deixar de ter a sua influência nos meios políticos europeus e nos próprios organismos de cooperação internacional que visavam precisamente o estabelecimento de fórmulas mais amplas de comércio e de pagamentos. O mercado comum aparecia, assim, como mais um passo natural numa evolução que se vinha desenvolvendo para assegurar à Europa condições de progresso e bem-estar. No seio da O. E. C. E. tinham-se atingido altas percentagens de liberalização, mas no decorrer do ano passado reconheceu-se a impossibilidade de ir além de certos limites, nomeadamente em virtude das disparidades aduaneiras existentes entre as nações europeias. Por outro lado, a União Europeia de Pagamentos não tinha podido conter a inflação que se declarou em certos países e não só não abrangia os movimentos internacionais de capitais como deixava fora do seu circuito de pagamentos importantes zonas do Mundo, como sejam a América do Norte e a América do Sul.
O desejo de prosseguir numa política de mais ampla e intensa cooperação económica levou seis países da O. E. C. E. - a Alemanha, a Bélgica, a Franca, a Itália, o Luxemburgo e os Países Baixos - a estudarem entre eles a criação de um mercado comum, ou seja uma união aduaneira que pressuponha a abolição de todos os obstáculos tarifários e quantitativos que dificultem, por qualquer fornia, as trocas entre aqueles países.
Aprovados em Veneza, em Maio de 1956, os objectivos consignados no relatório que preconizava o mercado comum, logo se iniciaram negociações destinadas à celebração de um tratado entre as seis nações interessadas.
Mas o entusiasmo com que foi recebida em certos meios e o patrocínio que lhe deram economistas abalizados e alguns dos nomes mais prestigiosos da política europeia do nosso tempo não impediram que a ideia do mercado comum, tal como se apresentava concretizada, não fosse objecto de vivas críticas e duros reparos.
Durante algumas sessões o Parlamento franco* ocupou-se desse problema nacional, e simultaneamente europeu, pela sua importância e pela sua repercussão em todos os países do velho continente.
O antigo Presidente do Conselho Mendes Francês, que sempre se tem mostrado partidário de uma construção orgânica europeia, fez um longo e violento libelo contra o mercado comum, procurando demonstrar que as soluções adoptadas quanto à livre circulação de pessoas, mercadorias e capitais eram absolutamente contrárias aos interesses fundamentais da economia francesa.
A livre circulação de pessoas que se pretendo estabelecer, não só ameaça o trabalhador e o operário francês de sofrerem a competição de grandes massas de desempregados doutros países, como no seu entender, afecta os próprios conceitos de nação e de pátria.
Á livre circulação de mercadorias nas fórmulas de Bruxelas prejudica também gravemente os interesses franceses. Pôde sempre a França vencer e fazer face as grandes depressões dado o carácter misto da sua economia, simultaneamente agrícola e industrial. Essa vantagem vai desaparecer, relativamente aos outros países e como a sua produção é onerada com elevados encargos sociais, fiscais, militares ultramarinos e com salários mais altos dos que existem na Holanda, na Itália e mesmo na Alemanha, essas circunstâncias criam-lhe uma situação particularmente desfavorável no campo da concorrência.
Na sua opinião os povos de certas regiões subdesenvolvidas, como a do Loire, não poderão suportar a concorrência estrangeira e terão de optar pela expatriação ou pela sujeição a muito baixos níveis de vida. E citou casos de integração em que importantes núcleos populacionais ficaram prejudicados em beneficio doutros. Foi o que aconteceu às regiões meridionais da Itália, quando da unificação política daquele pai, e o que se deu na América do Norte, onde certos estados do Sul se consideraram prejudicados com a sua integração nos Estados Unidos.
A existência de elevados encargos fiscais e sociais, que é condição necessária de uma política social progressiva, afectará também a circulação de capitais, na opinião do antigo Presidente do Conselho da França. Estes procurarão fixar-se, sobretudo, nos países onde sejam menores os impostos e mais reduzidos os encargos de assistência e previdência. E a França corre o risco não ó de um êxodo de capitais, mas de assistir à montagem de indústrias poderosas e bem apetrechadas em outras regiões do mercado comum, para concorrerem, depois, em situação de vantagem e superioridade com a produção francesa.
Página 602
DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 200 602
Outras vozes se elevaram na França e noutros países contra o mercado comum tal como tinha sido delineado no relatório de Bruxelas, e isso levou os seus negociadores a procurarem conciliar, tanto quanto possível, a ideia fundamental da liberalização que se procura atingir com a necessidade de acautelar os interesses próprios das nações que deverão constituir a nova comunidade europeia. Mas essas transigência, ou têm natureza transitória ou carácter excepcional. O fim último é um verdadeiro mercado comum.
Poucas vezes uma organização tão complexa terá sido instituída tão rapidamente e sem ficarem resolvidos previamente problemas importantes que era de vantagem esclarecer.
Efectivamente, no passado dia 25 de Março concluía-se em Roma o Tratado do Mercado Comum, o qual foi assinado em primeiro lugar por Spaak, Ministro dos Negócios Estrangeiros da Bélgica, em homenagem ao grande impulsionador do Tratado e de quem o chanceler alemão disse então que sabem merecia da Europa».
Segundo o Tratado de Roma, o mercado comum é progressivamente estabelecido no decurso de um período de transição de doze anos, dividido em três fases de quatro anos, que podem ser prolongadas em certas condições.
As tarifas aduaneiras serão progressivamente diminuídas entre os países da união, devendo ficar completamente abolidas no fim do período de transição que se estabelece. No termo desse período deverá também vigorar uma tarifa única relativamente a terceiros países, que será igual à media aritmética dos direitos aplicado; pelos seis estados em l de Janeiro de 1957.
Estabelecem-se também disposições transitórias para os produtos agrícolas e estatui-se que o estabelecimento da união aduaneira quanto a estes produtos deve ser acompanhado de uma política agrária comum.
A livre circulação de trabalhadores, o direito de estabelecimento, a liberdade das trocas, de serviços e de capitais devem ficar assegurados, pelo menos, no fim do período transitório.
Proíbem-se os monopólios, certas formas de entende e dumping. As ajudas do Estado a este ou àquele ramo de produção deverão desaparecer, a menos que sejam de carácter social, que procurem remediar calamidades naturais ou concorrer para estimular a actividade económica em regiões afectadas pelo desemprego. Os estados signatários do Tratado comprometem-se a seguir uma política de igualdade de salários para homens e mulheres que se ocupem no mesmo trabalho. Cria-se um fundo social europeu, que entre outras finalidades, poderá financiar a reeducação profissional, as indemnizações de reinstalação, a atribuição de um salário aos operários que perderam o seu emprego em consequência, da conversão da empresa onde trabalhavam. Institui-se também um banco europeu de investimento, com o capital de l bilião de dólares, que financiará o fomento das regiões subdesenvolvidas, a modernização e conversão das indústrias, a criação de novas empresas e todos os 'empreendimentos de carácter comum.
São órgão desta comunidade a assembleia formada de delegados dos Parlamentos dos seis países associados, o conselho, que é o órgão de decisão e coordenação, e n comissão europeia, composta de nove membro, e que representam, não o estado que os designou, mas o interesse geral da comunidade.
São elementos ainda necessários ao funcionamento da união uni tribunal de justiça, que controla a legalidade dos actos do conselho, e um comité económico e social, composto de representantes dos diversos sectores da produção e que terá funções consultivas.
No dia da assinatura do Tratado do Mercado Comum. que Spaak disse considerar uma grande data da história da Europa, o representante do Luxemburgo afirmou que «a unidade europeia» será uma operação que não se fará sem dor e sem choque. Talvez daí a reacção que a ideia do Tratado Comum suscitou e que vai exprimir-se novamente quando os Parlamentos das seis nações que o assinaram tiveram de pronunciar-se sobre a sua notificação.
Tendo-se verificado a dificuldade de alguns países europeus, pela natureza e características cia sua economia ou pela sua dependência ou interdependência relativamente a regiões ou países de além-mar, aderirem à ideia do mercado comum, o Conselho da O. E. C. E., em sessão de Julho do ano passado, criou uma comissão especial para o encargo de estudar as formas e os métodos possíveis de uma associação sobre uma base multilateral entre os países que constituem a união aduaneira (mercado comum) e os países membros da O. E. C. E. que não fizessem parte daquela.
Entre os métodos possíveis de associação a comissão de estudo devia tomar em consideração a criação de uma zona de livre-câmbio que englobasse uns e outros.
E foi precisamente sobre a viabilidade de uma zona de livre-câmbio que essa comissão concentrou os seus trabalhos, cujas conclusões foram publicadas no me» de Janeiro último.
Essa zona de livre-câmbio será caracterizada pela abolição de tarifas e de restrições quantitativas preconizada para o mercado comum. Simplesmente, como aqui já disse o Deputado Sr. Melo Machado, enquanto os países que constituem o mercado comum ou união aduaneira adoptam uma mesma tarifa relativamente aos produtos originários de terceiros países, cada uma das nações da zona de livre-câmbio conserva uma tarifa própria relativamente aos produtos originários dos países que lhe são estranhos.
A abolição de tarifas entre os países que constituem a zona de livre-câmbio deve fazer-se gradualmente, sendo a referida comissão de parecer que seja adoptado, no tempo, um sistema paralelo ao da união aduaneira, a fim de se evitarem medidas discriminatórias entre as duas zonas.
Aquela comissão, considerando que embora no fim do período transitório todas as tarifas entre os países associados devam estar completamente suprimidas, ponderou se a redução gradual a efectuar previamente devia ser feita uniformemente ou se devia estabelecer um regime mais maleável que permitisse àqueles países não reduzir, num dado momento, na mesma percentagem, todas as suas tarifas. A mesma comissão examinou o problema dos direitos fiscais, concluindo que os governos dos diversos países devem conservar a possibilidade de lançar impostos de consumo sobre produtos importados que não tenham natureza proteccionista.
È também objectivo fundamental da zona do livre-câmbio a abolição das restrições quantitativas no prosseguimento da política da liberalização da O. E. C. E.
Admite-se que qualquer dos países que fazem parte dessa área possa encontrar-se no período transitório progressivo de eliminação de tarifas e de restrições quantitativas em situação difícil, em virtude da posição da sua balança de pagamentos ou de factos que afectam particularmente algum dos sectores da sua economia.
Por isso - como também acontece no mercado comum- se prevêem cláusula* de salvaguarda que permitem libertar temporariamente os países da comunidade das obrigações que lhes são inerentes, embora isso represente uma derrogação aos princípios da reciprocidade, do equilíbrio e da não-discriminação, que são condições essenciais ao bom funcionamento de uma zona de livre-câmbio.
Página 603
10 DE ABRIL DE 1957 603
Segundo o parecer do grupo de trabalho da O. E. C. E., a divisão de trabalho e as vantagens que se pretende obter com a criação de área de livre-câmbio não poderão ser atingidas se continuarem a praticar actos que falseiam o jogo normal da concorrência, como sejam as subvenções e ajudas à exportação, preços, duplos, o dumping, a política de monopólio e cartéis, etc. Como já referi, as nações da união aduaneira chegaram a certas conclusões nesta matéria, e de desejar seria - segundo o parecer do referido grupo de trabalho- que as soluções a adoptar nas duas zonas fossem idênticas.
Os mesmos problemas levantados no relatório de Bruxelas sobre a união aduaneira e relativos à harmonização da política económica, financeira e social dos governos, a necessidade de criar organismos comuns de investimento e cooperação e ainda aos movimentos de capitais, de invisíveis e de mão-de-obra - todos esses problemas são postos pelo grupo de trabalho da O. E.C.E.
A maior parte dos membros desse grupo foi de parecer que a zona do comércio livre deve compreender todas as categorias de mercadorias produzidas nos países da O. E. C. E, admitindo, embora, que se deva adoptar um sistema particular quanto aos produtos agrícolas. Alguns desses membros emitiram a opinião de que não será estabelecer uma verdadeira reciprocidade entre as nações da zona de livre-câmbio abolir as tarifas aduaneiras e as restrições quantitativas relativamente aos produtos industriais e mantê-los quanto aos produtos agrícolas.
Daí resultava que os países que são sobretudo exportadores de produtos agrícolas e importadores de produtos industriais aboliriam todos os obstáculos à importação, com prejuízo de determinadas receitas públicas e da protecção à sua indústria, e continuariam a lutar com graves obstáculos para colocar no exterior a sua produção agrícola. A questão assumiu tal importância que alguns membros do aludido grupo de trabalho da O. E. C. E. declararam que isso poria em risco a entrada dos teus países para a projectada zona de livre-câmbio.
Um problema também importante que se pôs foi o de certos países que se encontram «em via de desenvolvimento» e que manifestaram o seu desejo de fazer parte da zona de livre-câmbio, acentuando, porém, que de momento têm de manter a protecção existente sobre a totalidade ou grande parle das suas importações.
O grupo de trabalho limitou-se a enumerar as soluções que o problema comporta e a chamar para ela a atenção do Conselho.
Na zona de livre-câmbio deverão existir órgãos destinados a velar pelo respeito das obrigações assumidas pelos países membros e resolver eventuais dificuldades.
Simplesmente, essas instituições não poderão ser determinadas senão depois de fixadas a extensão e a substância da própria zona.
Alguns dos membros do grupo de trabalho foram de parecer que um empreendimento como a criação duma área de livre-câmbio devia ser concentrada na própria O. E. C. E. e considerada como um prolongamento natural da sua actividade. Resto, orientação um Conselho de Ministros dos diversos países seria o órgão supremo da administração, embora fosse necessário, possivelmente, criar outros organismos de carácter jurisdicional ou consultivo. Mas muitos dos trabalhos e tarefas da nova comunidade europeia poderiam ser confiados aos actuais quadros da O. E. C. E.
Qual será o futuro e a viabilidade destas novas modalidades de cooperação entre as nações?
O Tratado que organiza o mercado comum de seis países europeus vai agora ser discutido, para ratificação, pelos respectivos Parlamentos. O relatório do grupo de trabalho da O. E. C. E. foi presente em Paris à reunião dos ministros dos diversos países membros que ali leve lugar em Fevereiro passado.
Há quem defenda, com entusiasmo e ardor, que a melhoria do nível de vida das populações está intimamente dependente da criação de grandes mercados.
Mendès-France, no seu recente discurso sobre o mercado comum, procurou demonstrar que o nível de vida não é só função da extensão do mercado, mas também de outros factores que é necessário não menosprezar. E, em demonstração das suas afirmações, disse que os países que, a seguir aos Estados Unidos, têm mais rendimento por habitante são o Canadá, com um mercado de apenas 13 milhões de habitantes, a Suíça, com a milhões, a Suécia, com 7 milhões. Depois vêm o Reino Unido, com 50 milhões de habitantes, e o vasto mercado do Império Britânico, a Nova Zelândia, com 2 milhões, a Austrália, com 8 milhões, a Dinamarca, com 4 milhões, depois ainda a Bélgica, a Holanda, a Noruega, países de pequenos mercados, que precedem a Franca, apesar dos seus 43 milhões de habitantes e do seu mercado africano.
Isto para concluir que o nível de vida não é só função da extensão do mercado, mas de outros factores a tomar em consideração, devendo por isso haver todo o cuidado na ponderação das obrigações que um mercado comum internacional implica, para que os benefícios que dele possam resultar não sejam completamente anulados pelos seus desastrosos efeitos na produção e na economia internas.
E compreendem-se essas apreensões quando se atenda na concorrência que as nações mais bem dotadas em recursos materiais, em mão-de-obra e em técnica vão fazer às de mais fraca produtividade ou desvantajosas condições naturais.
Mas, por outro lado, em face de uma corrente geral de ideias e de um esforço entusiasta e confiante no sentido da integração económica europeia, as nações que se colorarem à margem deste movimento e ficarem isoladas, num espírito de autarquia, correm sérios riscos e perigos. Tanto mais que essas novas comunidades, quer se chamem mercado comum ou zona de livre-câmbio, pressupõem períodos longos de transição e adaptação.
Tendo o grupo especial de trabalho da O. E. C. E. concluído pela possibilidade técnica da criação de uma zona de livre-câmbio na Europa, deu o Governo Português, na reunião do Conselho de Ministros daquela organização, em Fevereiro último, o seu acordo de princípio a que se instituíssem órgãos apropriados para levarem a bom termo o exame dos variados aspectos que falta esclarecer a aprofundar quanto à criação e funcionamento da zona de livre-câmbio.
O ilustre representante do Governo Português subordinou, porém, essa adesão de princípio à condição de que nenhum dos países membros da O. E. C. E. fosse excluído das negociações que devem preceder a criação dessa zona de livre-câmbio e ainda à adopção do princípio da reciprocidade - entendido em termos hábeis - como fundamento das relações económicas internacionais.
Entre os problemas mais importantes ultimamente discutidos quanto à zona de livre-câmbio sobressaem os que se referem aos produtos agrícolas e ao comércio com o ultramar. Foi a Grã-Bretanha que tomou de início posição mais definida nestas matérias, pugnando pela exclusão do espaço da zona do mercado comum dos territórios ultramarinos e do seu campo de acção dos produtos agrícolas.
A última reunião do Conselho de Ministros da O. E. C. E. terminou os seus trabalhos encarregando o seu
Página 604
DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 200 604
presidente, o Chanceler do Tesouro britànico, de assegurar a coordenação dos trabalhos dos peritos, com vista à criação de uma zona de livre-câmbio. Segundo ele próprio declarou então, a realização desse objectivo põe três problemas principais:
A abertura de negociações gerais sobre a criação da zona; As questões agrícolas, que foi resolvido estudar em separado;
A situação dos países em via de desenvolvimento, cujos interesses devem ser salvaguardados.
Cada uma destas questões será objecto do estudo por parte de peritos, que deverão elaborar um projecto de convenção, a submeter, em Julho próximo, à apreciação do Conselho de Ministros da O. E. C. E.
Todos estes problemas nos interessam directamente, e particularmente os mencionados em segundo e terceiro lugares. O que respeita aos produtos agrícolas interessa-nos pela importância desses produtos no valor da exportação e do conjunto da economia nacional. O que se refere à situação dos países em via de desenvolvimento, porque correrá grave risco de perder-se o esforço industrial que vimos fazendo se no período transitório que precederá o funcionamento definitivo da zona de livre-câmbio não se estabelecer um regime preferencial para esses países, dando assim à palavra «reciprocidade» o sentido do justiça e de relatividade que é mister que tenha.
Sr. Presidente: o Sr. Eng. Vieira Barbosa, no seu aviso prévio, defendeu unia política larga e planificada de coordenação económica que, através de maiores investimentos e da obtenção de uma melhor produtividade, permita desenvolver a produção e aumentar a média geral dos rendimentos e dos consumos, assegurando assim ao conjunto da população portuguesa um nível mais alto de vida e de bem-estar.
Creio que estes objectivos são anseio unânime de todos os portugueses e preocupação constante do Governo da Nação. Na sua notável exposição feita, ao Conselho Económico em Janeiro último o Sr. Ministro da Presidência enumerou assim os objectivos que devem nortear a elaboração do novo Plano de Fomento:
Aumento do produto nacional numa cadência maior do que a registada até aqui, considerando que é nesse aumento que reside a base de toda a melhoria económica do País;
Elevação do nível de vida da população portuguesa;
Ajuda à resolução dos problemas do emprego;
Melhoria da balança de pagamentos metropolitana e sua repercussão sobre o nível da actividade económica interna.
Todos os objectivos que dominam o aviso prévio do Sr. Eng. Vieira Barbosa se me afiguram caber dentro das finalidades do futuro Plano de Fomento. O mérito do aviso prévio foi constituir um depoimento autorizado sobre problemas da maior oportunidade, permitindo a sua discussão num plano de elevação que muito honra esta Assembleia.
Mereceu especial interesse ao ilustre Deputado avisante a necessidade de nos prepararmos para, as novas perspectivas que se abrem à cooperação económica europeia, nomeadamente com a criação do mercado comum.
Ë evidente que a política económica portuguesa tem de ser, no futuro, estruturada tendo em vista as profundas modificações que se antevêem nas relações económicas intereuropeias, que podem, inclusivamente, levar-nos a abandonar empreendimentos até há pouco julgados remuneradores e vantajosos e que, afinal, não terão condições de viabilidade, em face das novas condições de concorrência.
Por isso mesmo na referida exposição do Sr. Ministro da Presidência dirigida ao Conselho Económico se preconizava a necessidade urgente de «imprimir à nossa economia um impulso decisivo, tendo em vista as perspectivas de concorrência futura e a impossibilidade de uma duradoura protecção pautal».
E daí a necessidade também de, a par de uma política de intensificação industrial, se cuidar, como se dizia naquela exposição, da situação da agricultura e de o novo Plano de Fomento dever prever investimentos consideráveis para a irrigação, povoamento florestal, colonização interna, armazenagem, conservação e transformação de produtos, mecanização, electrificação rural e investigação agronómica e extensão dos conhecimentos e ensino agrícolas.
Todas estas ideias do mercado comum e de uma zona de livre-câmbio têm progredido com excepcional rapidez, e quando ainda se discutem as suas vantagens ou inconvenientes logo se elaboram ou assinam os respectivos tratados.
Nesta corrida veloz para fórmulas novas de cooperarão as nações mais vulneráveis à concorrência têm, sobretudo, de obter soluções transitórias de protecção para a sua economia actual e adaptá-la depois à nova estrutura europeia. Creio ser esse o objecto dos estudos que estão a efectuar-se entre nós, e que, pela sua complexidade, demandam, efectivamente, ponderação e tempo para serem feitos com vantagem.
Disse-se recentemente no Parlamento francês, a propósito do mercado comum, que para fazer a Europa não era preciso desfazer a França. Tenhamos fé e confiança também em que providências serão acordadas para, sem prejuízo da nossa colaboração às novas fórmulas de cooperação europeia, serem acautelados os interesses fundamentais e permanentes da economia portuguesa.
O Sr. Pereira Jardim: - Tenho ouvido, com toda a atenção, as considerações de V. Ex.ª e julgo concluir que V. Ex.ª não admite outra hipótese que não seja a de aderirmos à zona livre. Parece, assim, que nos temos de orientar unicamente no sentido de sabermos como deveremos aproveitar o regime transitório, mas tendo como objectivo a nossa adesão a essa zona.
O Orador: - Essa questão envolve problemas tão transcendentes que só o Governo, na plena posse de todos os elementos, poderá definir.
Todas as negociações relativas à zona de livre-câmbio na Europa estão ainda por concretizar.
Quanto ao próprio mercado comum, apesar de já assinado o respectivo Tratado, muitos dos problemas mais importantes, como, por exemplo, a posição dos produtos agrícolas dentro desse mercado, estão ainda por acordar.
O Governo está certamente na posse de todos os elementos e pesando bem as vantagens que advêm da nossa adesão à zona; só ele poderá, oportunamente e quando o problema estiver mais adiantado, definir a esse respeito uma posição. Se viermos a aderir à zona de livre-câmbio - e tem sido essa a orientação oficial definida -, este período deve ser aproveitado para procurarmos, através de cláusulas especiais relativamente aos países em via de desenvolvimento, acautelar a situarão da economia nacional.
Como o período transitório para o mercado comum é de doze anos e o grupo especial de trabalho opta pelo mesmo prazo, esse período será certamente aproveitado para aumentarmos a nossa produtividade na indústria e na agricultura.
Página 605
10 DE ABRIL DE 1957 605
O próprio Ministro da Presidência na sua exposição ao Conselho Económico focou precisamente esse problema da necessidade de dar um impulso definitivo à nossa agricultura e indústria através das providências já mencionadas.
Devemos também, no meu parecer, aproveitar esse período para estudarmos e vermos quais são as actividades que têm condições de viabilidade económica, apetrechando-as e aumentando a sua produtividade, para poderem enfrentar as novas condições de concorrência.
O Sr. Pereira Jardim: - Agradeço a resposta de V. Ex.ª, mas permito-me insistir formulando a pergunta sob uma outra forma.
Não podemos conhecer neste momento com segurança o que se passará ao fim dos doze anos transitórios. Mas temos de prever, desde já, o que será possível fazer-se ao longo desses doze anos, para que não fosse acontecer que, na esperança de ser possível uma readaptação da economia portuguesa que consentisse a adesão à zona, fôssemos conduzidos a compromissos que depois se viesse a verificar serem incomportáveis para a economia portuguesa.
Pareceu-me das palavras de V. Ex.ª que havia a afirmação de que lhe fica a esperança de que seja possível aderir à zona sem sofrer pesado gravame a economia portuguesa. Quer V. Ex.ª dizer que tem essa esperança:
O Orador: - Todo o meu raciocínio estava assentando em que já tínhamos dado de início a nossa adesão à zona de livre-câmbio.
O Sr. Pereira Jardim: - Nós só demos a adesão aos estudos para a constituição da zona. A seu tempo decidiremos sobre a adesão à zona. Portanto, a minha pergunta é: V. Ex.ª mantém a posição de ter esperança de ser possível uma reconversão da economia portuguesa que nos permita aderir à zona sem grandes inconvenientes?
O Orador: - As perguntas de V. Ex.ª transcendem um pouco o âmbito das minhas considerações. Não posso por agora tomar posição nem lenho elementos de informação, que só o Governo possui.
Afirmo neste momento que, ao entrar o nosso país na zona, a nossa economia se deve orientar no sentido preconizado pelo Governo, conforme S. Ex.ª o Ministro da Presidência referiu ao enunciar o plano económico para 1959.
O Sr. Pereira Jardim: - Muito obrigado.
Não fiquei esclarecido sobre o problema, mas fiquei ciente do pensamento de V. Ex.ª
O Orador: - V. Ex.ª tem, com certeza, outros meios directos de se informar sobre o problema. Tenho muita pena de não poder adiantar mais, mas, como V. Ex.ª sabe, estão a fazer-se em Portugal estudos sobre a nossa adesão à zona de livre-câmbio. Todos esses estudos têm ainda um carácter confidencial e, portanto, não posso esclarecê-lo tão completamente como V. Ex.ª desejaria.
Sr. Presidente: no fundo, Nação, Governo, parlamentares, actividades económicas, todos estamos de acordo na necessidade imperiosa de aumentarmos o produto nacional e de obtermos melhores e mais altos níveis de produção, de rendimento e de consumo. O Sr. Eng. Vieira Barbosa veio exprimir um anseio de maior celeridade na execução da nossa política económica, e há também que fazer justiça ao entusiasmo e à sinceridade do seu objectivo.
E, se as suas últimas palavras foram de homenagem a Salazar, o nosso voto tem de ser de confiança integral na sua obra e no seu Governo.
Quando a Europa saiu enfraquecida e depauperada da guerra, diversos foram os objectivos prosseguidos pelas nações do velho continente. Umas, como a Inglaterra e os países escandinavos, procuraram, sobretudo, satisfazer as necessidades materiais da sua população, atingir o pleno emprego, nivelar, tanto quanto possível, os rendimentos na fórmula de social relfare. Outros, como a Alemanha e a Bélgica, esforçaram-se pela reconstituição activa do seu comércio interno e externo. Outros, como Portugal, procuraram, através de tudo, manter-se fiéis a uma política de rigoroso equilíbrio e estabilidade financeira.
O evolucionar dos tempos demonstrou a sensatez e o acerto desta orientação, e quando hoje se pretende defender as vantagens e os benefícios da integração económica europeia reconhece-se que essa integração não é possível sem a adopção prévia e generalizada de determinadas regras de sanidade financeira e monetária. Isso levou, recentemente, um articulista estrangeiro a afirmar que o senso comum seria talvez preferível ao mercado comum.
Foi essa obra de senso, de equilíbrio e de prudência, que abriu à Nação os caminhos do fomento e do progresso social.
O Sr. Eng. Vieira Barbosa pediu, como acabo de dizer, a adopção de um ritmo de maior celeridade na, política económica portuguesa e a mobilização plena e integral dos vastos recursos das nossas províncias ultramarinas. Nos tempos antigos de Roma dizia-se que a pressa é inimiga da justiça, e o mesmo que se dá no direito pode verificar-se na economia, sobretudo quando os problemas económicos tocam delicados aspectos políticos. Os arautos e defensores do mercado comum afirmam que uma das razões do êxito desse mercado são as grandes possibilidades e as enormes riquezas de que a Europa dispõe em África. Mas, porque vêem, de preferência, o interesse da comunidade e as vantagens duma política de integrarão, afirmam que os recursos desses territórios, embora no respeito da independência dos estados, devem ser postos, sem demora, à disposição de todos e que um investimento comum deve ser feito em África em benefício do conjunto da produção europeia.
Investir, desenvolver e fomentar são objectivos necessários. Mas com segurança e no respeito absoluto de uma soberania de que sumos tão ciosos e que o Governo tem sabido defender sempre com inexcedível firmeza.
Sr. Presidente: na paz, na disciplina e na ordem internas, realizou Portugal nestes últimos trinta anos um notável esforço de ressurgimento, a que em todo o Mundo se faz justiça e presta homenagem, como há poucos dias aqui tão brilhantemente afirmou o ilustre Deputado Sr. Dr. Bustorff da Silva. E os estrangeiros que nos visitam e tomam contacto com a nossa vida e a nossa gente, ao verificarem a obra de progresso realizada, os fins sociais que o Estado prossegue, as nossas tradições universitárias e científicas, a delicadeza de sentimentos deste povo, consideram-nos país de excepção e de privilégio, bem mais feliz do que outros onde os índices do nível de vida vão na vanguarda dos números e das estatísticas.
Nunca foram os desígnios materiais fim último deste povo, e isso talvez, em grande parte, explique a sua própria história. Esta foi sempre dominada por um alto sentido de idealismo, o por isso, quando actualmente em Portugal se prossegue uma política que procura atingir uma maior produção e mais altos níveis de bem-estar, nunca se perde de vista o objectivo de uma me-
Página 606
606 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 200
lhor justiça social e a natureza da missão que nos cumpre desempenhar em diversas, partes do Mundo.
Vivemos uma época difícil. As economias, que de regionais passaram a nacionais, tomam hoje uma expressão continental, e as novas ideias de comunidade e de integração colidem, sob certa forma, com os conceitos tradicionais da independência e da soberania dos estados. Aos povos com forte personalidade e com longa história custa sobrepor certas razões da lógica e do interesse aos impulsos do sentimento e do coração. Terão estes, porventura, de calar-se, na certeza de que a sobrevivência do Ocidente europeu não está dependente apenas do seu progresso material e económico, mas também da sua fidelidade ao idealismo e à civilização que asseguraram durante séculos a sua supremacia no Mundo e que são hoje, como sempre, património inseparável do seu génio e da sua cultura. Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Manuel Vaz: - Sr. Presidente: não é sem uma certa preocupação que subo a esta tribuna para intervir na discussão do problema económico português, que o aviso prévio do Sr. Prof. Daniel Barbosa pôs em causa.
Não tenho a veleidade de me considerar um economista, julgando-me apenas um simples curioso de assuntos económicos.
Não possuo, por isso, um cabedal de conhecimentos técnicos, tanto no que respeita aos princípios técnicos reguladores da economia pura, como à sua aplicação prática nos domínios da economia aplicada.
Confesso, humildemente, esta minha insuficiência e espero que a franqueza desta confissão sirva de absolvição indulgente para a ousadia que representa a minha intervenção, que não tem um fim diferente do de me esclarecer sobre alguns pontos que durante o debate me pareceram duvidosos, por contrariarem opiniões que tinha como certas.
O facto de o autor do aviso prévio ser um engenheiro distinto, um professor ilustre, um economista de créditos sólidos, um político com responsabilidades governativas, pois já passou pelas cadeiras do Poder, e ter no mundo industrial e comercial do País funções de direcção e comando confere-lhe uma autoridade especial, a que se alia um peso idêntico de responsabilidades.
Acresce que ele é, além disso, um orador de palavra fácil e viva, torrencial e brilhante, na posse duma cultura geral e especializada vasta e profunda.
Nestas circunstâncias, o simples facto de intervir na discussão não será apenas mero arrojo mas alguma coisa parecida com arriscada temeridade.
Apesar de tudo, atrevo-me.
Segui com a maior atenção e interesse a exposição que o Sr. Deputado Daniel Barbosa produziu nas sessões de 28 e 29 de Março último e de 2 do corrente mês de Abril.
E, à mediria que ela se ia desenvolvendo, foi surgindo no meu espírito a dúvida sobre a sua oportunidade política, dúvida que ainda neste momento subsiste, devido a algumas afirmações.
S. Ex.ª, reconhecendo a importância e delicadeza do assunto, a «contingência das interpretações» e a malevolência com que fàcilmente se deturpam intenções, entende que a política e a administração pública se devem apoiar corajosamente na verdade, como já o afirmara, havia trinta anos, o Sr. Presidente do Conselho.
É verdade isso.
A verdade deve-se em tudo ao País; mas a verdade toda, mas a verdade inteira, e não apenas a meia verdade.
A coragem é uma virtude magnífica, que não deve confundir-se com a imprudência, defeito grave que compromete muitas vezes os objectivos que com o bom uso daquela se poderiam alcançar.
E tenho para mim que vir dizer do alto desta tribuna, com o prestígio da autoridade que em matéria económica o Sr. Deputado Daniel Barbosa justamente desfruta, que o provento mensal dum agregado familiar de quatro pessoas teria de ser de 3.000$ - o mínimo ideal, embora -, para se poder manter dentro duma dieta rigorosamente equilibrada e viver com higiene e dignidade num meio citadino como o de Lisboa e Porto, será, de facto, um acto de coragem, mas nem por isso deixa de ser uma atitude que me atrevo a classificar de menos prudente. Quod volumus, facile credimus.
E o operário, o funcionário e servidor do Estado, o empregado, etc., podem julgar que, desde já, têm o direito de exigir esse mínimo ideal como verba indispensável do seu orçamento caseiro para poderem viver, escudando-se na autoridade do ilustre professor. E podem até ser levados a supor ser esse o mínimo do seu provento como chefes de família, embora alguns dos seus membros concorram também para a economia do agregado.
O Sr. Deputado Daniel Barbosa sabe muito bem que a política é a arte do possível, mesmo porque já a teve de exercitar quando sobraçou a pasta da Economia. Nem tudo o que desejou e entendia ser necessário fazer, como Ministro, conseguiu de certeza realizar. Deve ter ficado muito aquém dos seus bons desejos. E sabe também que neste momento e durante um tempo indeterminado mas necessàriamente longo é absolutamente impossível elevar a esse ponto os níveis de vida das classes a que se referiu. Não se mudam dum dia para o outro as condições de vida dum povo. Levam tempo, muito tempo. Mas, sendo assim, despertar ambições ou fazer acalentar esperanças de um bem apetecido, mas de impossível realização imediata, parece-me, salvo o devido respeito, atitude corajosa, mas de perigosas repercussões sociais, que, ao que me consta, já se começaram a registar.
Para chegar àquela conclusão o Sr. Deputado Daniel Barbosa tomou por base o cálculo daquilo que, em média, o Português consome, para buscar, em face do poder de compra do escudo, aquilo que ele poderia ou deveria consumir na realidade, segundo um orçamento que apresentou e que me abstenho de aqui reproduzir.
Passo em claro a questão das calorias necessárias para o viver sadio do elemento humano, aqui tão vivamente discutida e acerca da qual me considero suficientemente esclarecido ou, melhor, suficientemente confundido, dada a diversidade de critérios, métodos e opiniões acerca da sua fixação.
Uma conclusão, porém, julgo poder tirar de toda a discussão: é a de que ela não pode servir de base para se afirmar, com verdade, que a nossa gente vive em regime de subalimentação.
Exceptuadas certas zonas de limitada extensão nos aglomerados rurais, onde o exercício da actividade agrícola é do tipo da monocultura, com subemprego cíclico, o povo português alimenta-se com razoável suficiência, sem abundâncias que o enfartem, é certo, mas sem carências que fisiològicamente o definhem. Pode-se ainda acrescentar-lhes alguns sectores dos aglomerados urbanos.
Pelo conhecimento directo que tenho do viver dessas populações, em virtude dum convívio permanente e
Página 607
10 DE ABRIL DE 1957 607
íntimo, longo de quase meio século, julgo poder afirmá-lo sem qualquer hesitação.
Pobres ou famintos houve-os sempre, e sempre os há-de haver, aqui em Portugal, como de resto em todo o Mundo, sem exceptuar os países que blasonam de mais evoluídos, detentores de mais altos padrões de vida, como, por exemplo, a Inglaterra, a América, a França, etc. Mas isso não é regra, porque constitui simplesmente, a excepção.
Por isso não fio nada das afirmações que por vezes se lêem em publicações estrangeiras glosando o mote duma inexistente subalimentação de que padeceria o País e se fundamentaria apenas em conclusões tiradas do alinhamento de números extraídos de trabalhos estatísticos, que desconhecem as realidades humanas do viver português, inteiramente diversas das dos outros países.
Sr. Presidente: suponho que para se chegar à conclusão de que o nível de vida médio em Portugal é ainda, e infelizmente, bastante baixo, quando, sobretudo, cotejado com os altos níveis dos países mais evoluídos, não seria preciso carregar o quadro com as sombrias cores dum país deficientemente alimentado, aliás diferentes da realidade, como n simples aparência da nossa gente evidencia. O aspecto geral da nossa população facilmente o revela.
Todos sabemos, porque o vemos e sentimos, que o nível de vida da grande maioria da população portuguesa não é ainda aquele que desejaríamos que fosse, que, temos a certeza, pode vir a ter em breve, mas é muito superior ao que era antigamente.
Suponho que foi a premissa do relativamente baixo nível de vida português que o Sr. Deputado avisante quis estabelecer, para sobre ela assentar o desenvolvimento da sua tese, ou seja: baixo nível de vida--escasso poder de compra-consumo reduzido e fraca produção em quantidade e qualidade, para chegar à conclusão de que é indispensável elevar esse nível pelo incremento da produção a provocar maiores consumos, pois ninguém ignora que, se é necessário haver quem produza, não é menos necessário haver quem consuma. As duas coisas são interdependentes.
Sobre estas questões fundamentais em assuntos de natureza económica, S. Ex.ª produziu extensas e brilhantes considerações, que o tempo de que disponho não me permite analisar em pormenor e na extensão que mereciam.
Devo, no entanto, frisar uma nota.
Tão insistentemente nelas se referiu ao nosso atraso e tanto proclamou a necessidade urgente de rapidamente o recuperar, que quem o ouvisse desprevenidamente (já não falo dos que malèvolamente tudo desvirtuam em atenção nos seus interesses, ideias e paixões) poderia ficar com a falsa impressão de que nestes trinta anos últimos pouco se fez, ou não se fez tudo o que era possível, que pouco se progrediu no sentido de se assegurar para a nossa gente maiores garantias de riqueza, conforto e bem-estar. E quanto se não caminhou neste sentido!
Bem sei que não era esta, nem é, a intenção clara e repetidas vezes manifestada do Sr. Deputado avisante, no decorrer da sua magnífica intervenção.
Bem sei, mas em política o que parece é, e o povo afirma, com um saber de secular autoridade, que de boas intenções está o Inferno cheio.
Ninguém pode eximir-se à malevolência alheia e nem as mais puras e nobres intenções podem escapar à deturpação dos mal-intencionados: em política, como em assuntos que bulam com os nossos interesses.
Todos devemos fugir a ser apontados como pedras de escândalo, esforçando-nos por ser cautelosos.
Sr. Presidente: o que o País deve aos governos saídos da Revolução Nacional, só os cegos, os voluntàriamente cegos, o não vêem, porque se recusam a vê-lo; só os contumazes o negam, porque para eles só há uma verdade, a sua, de sistemática negação. Mas esses, felizmente, são poucos, porque o País sabe o que lhes deve, sabe o que deve principalmente a essa figura extraordinária de homem e de estadista que é o Sr. Presidente do Conselho, por quem sente, não simples gratidão, mas profundo respeito e comovida veneração.
Sabe o que lhe deve, em ordem interna e em crédito externo.
A ordem nas ruas e nos espíritos, que lhe permitiu durante estes trinta anos viver, trabalhar e progredir em paz, retomar a consciência de si mesmo e da perenidade dos seus destinos, pela afirmação da grandeza da Pátria e pela demonstração e aproveitamento das suas possibilidades materiais, até então desprezadas.
Partimos do zero, ou quase. Estávamos à beira da bancarrota. Não tínhamos dinheiro nem crédito. Vivia-se no desalento e na miséria, sem esperança de dias melhores. Compare-se a posição de então com a nossa situação actual e ver-se-á que se fez muito, muitíssimo, tudo quanto era possível fazer-se, com os recursos em dinheiro e a técnica de que se dispunha.
Houve erros? É possível. Tenho a certeza de que os houve. Mas é natural e humano errar quando se principia quase sem meios, sem experiência e desprovido de técnicos. Mas, louvado seja Deus, apesar de tudo e contra tudo, a obra é grande e está à vista. Só quem feche os olhos à realidade a poderá negar. E sente-se, para além dela, o pulsar de novas energias criadoras, num ritmo que se torna cada vez mais veloz.
O nível de vida actual da nossa gente, modesto embora, não sofre comparação com o daquela época. Anote-se e frise-se isto por uma forma que não dê margem a dúvidas. Temos o dever.
Mas poder-se-á perguntar: fez-se tudo o que é preciso fazer-se?
Ainda não, e creio mesmo que, por mais que se faça, nunca se poderá acabar com a eterna insatisfarão humana.
O que é indispensável é fazer-se sempre cada vez mais e cada vez melhor.
E feito este apontamento, que termina com a expressão da nossa ânsia de mais e melhor, tão nitidamente vincada na exposição do Sr. Deputado Daniel Barbosa, permitam-se-me mais alguns comentários acerca do programa definido na sua douta intervenção.
Não vou analisá-lo em pormenor. O tempo que V. Ex.a, Sr. Presidente, me poderia conceder, por escasso, não mo consentiria.
Limitar-me-ei, por isso, a anotar algumas impressões que a sua análise me suscitou.
No seu conjunto, deu-me a ideia de um sebastianismo económico, de tão ardentemente desejado, pelo menos quanto à rapidez da sua execução, se não integral viabilidade.
Na particularidade, defende-se nela a renúncia à severa austeridade das limitações orçamentais, que, diz-se, nunca foram capazes de criar riqueza. Talvez.
Mas no caso português, apesar dela, foi-nos possível lançar as bases do nosso ressurgimento e iniciar e desenvolver a obra de reconstrução económica, a um ritmo cada vez mais acelerado, como navios, estradas, pontes, edifícios, assistência, melhoramentos urbanos e rurais, adubos, electricidade, fomento agrícola e industrial, etc. Preconiza-se, porém, para lhe imprimir maior velocidade, dada a nossa insatisfação e inconformismo. o alargamento das dotações orçamentais, por um largo recurso ao crédito interno e, se necessário, externo, apesar de se reconhecer a pericolosidade deste. O re-
Página 608
608 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 200
curso, assim tão largo, parece-me um convite para su embarcar na aventura, que pode transformar em naufrágio de angustiosas dificuldades o encanto da viagem, iniciada sob os melhores auspícios.
Com as cautelas e limitações necessárias, julgo que, na verdade, se poderá utilizar, com a condição de não estancar as fontes da iniciativa particular, dada a pequenez do nosso mercado de capitais.
Afirma-se a necessidade de uma reforma bancaria pela qual se modifique a orientação actual da banca portuguesa, mais dada a operações comerciais do que ao abastecimento da indústria, em operações a largo prazo. Concordo com a criação de um Banco de Fomento, destinado a este fim dado que a banca particular não pode, por sua natureza e estrutura, aventurar-se no campo do financiamento a prazo largo.
Reclama-se a urgência de uma reforma fiscal destinada a proteger a indústria e os seus lucros, mesmo quando anormais e excessivos, desde que estes possuiu investir-se em novas indústrias, ou no reequipamento das já existentes, que ofereçam as condições óptimas da produção, determinantes dos mais baixos custos.
O Sr. Daniel Barbosa: - V. Ex.ª dá-me licença?
Vejo-me obrigado a uma rectificação. Eu não disse que era partidário duma reforma fiscal capaz de permitir lucros excessivos, mas sim duma reforma fiscal que saiba respeitar os lucros considerados justos e obrigar os excessivos, que eventualmente aparecem, a desviarem-se para investimentos e melhoria de condições sociais.
O Orador:- Como a certa altura da intervenção de V. Ex.ª há uma referência a lucros anormais e excessivos, eu interpretei-a no sentido que exprimi, mas, consultando o Diário das Sessões, que passo a ler naquela passagem, verifico que V. Ex.ª tem inteiramente razão na rectificação que acaba de fazer, e que muito agradeço.
Com lucros normais ou anormais, excessivos ou não, teríamos uma produção em cadeia em que esses lucros seriam sucessivamente investidos em novos empreendimentos, num arremedo de organização à americana, de grande e pura concentração capitalista.
Esquece-se que estamos num regime política, económica e socialmente corporativo, que a sua moral condena esses lucros anormais e excessivos e manda procurar o justo preço, o justo lucro e o salário justo.
Será isto de lamentar, do ponto de vista, económico, mas é doutrina aceite, e temos de respeitá-la.
A organização capitalista da empresa naqueles moldes conduz à, concentração da. riqueza nacional em poucas mãos, à formação das grandes organizações industriais, contra as quais é impossível lutar, e traz o desânimo à iniciativa privada, que se teme do seu gigantismo, impossibilita-a de entrar em concorrência com ela, por medo e debilidade financeira relativa, e por vezes pesa decisivamente na liberdade do acção do Poder Executivo, impondo-lhe a sua orientação.
Veja-se o que acontece na América.
Mesmo entre nós já temos organizações poderosas, algumas à escala mundial, cujos braços tentaculares, abraçando a metrópole, se estendem já para as nossas províncias de além-mar.
Mesmo entre nós já se assiste a uma perigosa concentrarão de capitais em meia dúzia de mãos e a uma lenta mas progressiva proletarização da classe média, o que, ao contrário do que o Sr. Deputado avisante, supõe, determinaria uma cada vez maior redução do poder de compra dessa classe, que é a mais numerosa do País.
Não.
Nós não queremos meia dúzia ou mesmo um cento de muito ricos; o que pretendemos é uma razoável mediania, que a todos - operários, funcionários e servidores do Estado, empregados e classe média permita, no mais curto prazo, um viver mais confortável e feliz.
Desta forma já emiti a minha opinião acerca da concentração industrial em larga escala que ali se defende e eu condeno. Ainda a poderia admitir, por uma reforma adequada, legal e funcional das nossas sociedades anónimas, se conseguíssemos nelas interessar, não os grandes lucros, mas as pequenas economias, que felizmente abundam, e limitássemos, não já os poderes, mas os lucros dos seus conselhos de administração, que são quase sempre de majestosa imponência e promovem a desconfiança e o descrédito da sua eficiência na grande maioria da população nacional.
E, para finalizar, uma palavra apenas sobre o problema da agricultura em Portugal - a filha enjeitada da nossa economia - e tal como é encarado no programa apresentado pelo Sr. Deputado avisante.
Esta terá do ser sempre, diz-se nele, a primeira sacrificada nos ramos da produção (p. 500), em consequência do nosso subconsumo.
«Para subsistir e trabalhar é preciso comer».
E é precisamente por causa desta necessidade fisiológica que o drama da lavoura se torna mais pungente. O consumo dos produtos agrícolas não é elástico, como acontece com os produtos industriais; não aumenta, como estes, numa proporção geométrica, mas simplesmente aritmética.
A lei de King domina inexoràvelmente toda a economia agrícola, e parece eterna porque assenta sobre uma das características da natureza humana: a capacidade limitada do nosso estômago, escreve Pierre Fromont.
E é assim mesmo.
Fala-se muito em aperfeiçoamentos técnicos da produção para aumentar a produtividade da terra e melhorar a qualidade dos produtos agrícolas, que trariam uma apreciável redução dos custos.
Está bem e está muito certo.
Mas esta possível redução de custos acarretará um incremento sensível do consumo que corresponda ao menos ao aumento da produção resultante desse aperfeiçoamento? Não o creio. Fala-se muito na mecanização da agricultura, para, dispensando o esforço humano, baixar ainda mais esses custos. Ainda que possível em certas regiões e apesar de a maquinaria entre nós ser extremamente cara, admitamo-lo. Produzimos mais, melhor e mais barato. E depois quem consome? Num país como o nosso, em que já temos largos excedentes de vinho, de arroz, de batata e em que o trigo, o milho, o feijão, o azeite e os demais produtos agrícolas, se normalmente não sobram muito, também normalmente não escasseiam: quando as perspectivas de aumentos substanciais da produção se antevêem, em face das obra de irrigação, que transformarão terras de sequeiro em regadio, de mais fartas produções, como absorver os excedentes que já existem e os que se prevêem? Este um dos aspectos do problema. Falta-nos um programa de fomento agrícola.
E não será suficiente o aumento do poder de compra resultante do mais altos níveis de vida, a absorção pela indústria do uma parte da população activa emprega-la na lavoura que resolverá esse problema. Da lavoura vivem cerca de 4 milhões de braços e da indústria 1 milhão. Ainda que esta viesse a absorver outro tanto, o que é uma perspectiva optimista, ficariam 3 milhões a cargo daquela, que continuariam a lutar, sem esperança de melhores dias.
O problema não é só de subconsumos. Ninguém come mais do que aquilo que é necessário. Não é de quantidades maiores de alimentos que a nossa gente carece.
Página 609
10 DE ABRIL DE 1957 609
Se deficiências existem, não são em quantidade, mas em qualidade. E o problema dos excedentes subsistirá, dado que nos será difícil exportá-los.
Acrescente-se a isto uma regulamentação rígida do preço dos géneros de primeira necessidade de natureza agrícola, por um tabelamento apertado, que é mais político, para atender às exigências citadinas do que económico, para cobrir os encargos da produção e permitir uma margem de lucro, ainda que pequena. E se lhe acrescentarmos uma ausência total de organizarão comercial, que permite aos intermediários locupletarem-se, sem proveito da lavoura e dos consumidores, com lucros excessivos e à custa de manejos de especulação, teremos definida a situação actual da lavoura portuguesa. O problema é grave e não vejo esboçado no programa do Sr. Deputado Daniel Barbosa qualquer indicação quanto à maneira possível de o resolver. É uma lacuna importante.
E fico-me por aqui.
Sr. Presidente: vou concluir pedindo desculpa do tempo que roubei, certamente sem proveito, mas formulando um voto: que desta discussão, em que se procurou estudar e apontar soluções para o problema económico português, resulte o incentivo para todos. Governo e particulares, na respectiva esfera de acção, trabalharem com mais energia, com mais obstinação, na construção dum Portugal melhor, como todos desejamos.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Sá Linhares: - Sr. Presidente: o aviso prévio do ilustre Deputado Sr. Daniel Barbosa obrigou-me a subir os degraus desta tribuna, no único intuito de fazer um modesto depoimento sobre a contribuição do mar na nossa economia nacional.
Ao tomar esta decisão não tive, portanto, o objectivo de intervir pròpriamente na apreciação das considerações feitas por S. Ex.ª no seu brilhante e exaustivo aviso prévio, pois, tratando-se de matéria tão complexa e especializada, os conhecimentos para a sua conveniente apreciação e discussão escapam às minhas possibilidades.
No entanto, Sr. Presidente, tendo verificado que o debate que está a decorrer nesta Assembleia Nacional sobre tão importante matéria é seguido com alvoroço por todo a comunidade portuguesa, julguei do meu dever, como Deputado da Nação, aproveitar esta oportunidade para, do alto desta tribuna, prestar ao Governo as minhas mais sinceras homenagens por tudo o que se tem realizado a bem do povo português.
A primeira parte da notável intervenção do Sr. Deputado Daniel Barbosa, ao contrário do seu objectivo - tenho disso a certeza - deu ao Pais a impressão de que a acção do Governo naquela matéria ia ser julgada por esta Assembleia Nacional; e, não sendo já possível desfazer aquela errada ideia, julgo necessário e indispensável não a repudiar e passarmos, com a liberdade e independência que temos, a fazer aquele julgamento.
Sr. Presidente: para podermos classificar de má ou de boa a situação económica e social do nosso país, não podemos nem devemos compará-la com a que desfrutam certos países, mas se o quisermos fazer, teremos então de recuar no tempo e apreciar as condições que lhes permitiram o seu desenvolvimento e as que obrigaram Portugal a estagnar ou mesmo a retroceder.
Entre os países que ocupam lugar de relevo na classificação da O. E. G. E. vêm a Noruega e a Dinamarca.
Países de escassos recursos primários, sem possuírem o condicionamento imperativo da nossa geografia e não tendo criado no Mundo, como nós o fizemos, pedaços da nossa terra, recorrem ao mar para os auxiliar, e, assim, exercendo intensamente a exploração dos seus recursos naturais e o comércio marítimo, conseguem ser orgulho da Europa e um exemplo do Mundo.
O que se passou em Portugal em relação ao mar?
Em 500, o génio do Infante ensinou aos Portugueses que a plena soberania de Portugal só poderia ser perpetuada através do mar. verifica-se, no entanto, a partir do alvorecer do século XIX, como advento da máquina a vapor e com as consequências da invasão francesa, o nosso abandono completo do mar.
Esse abandono chega aos nossos dias.
Nos próprios sectores administrativos responsáveis chega-se a aplaudi-lo, justificando-o com a existência de inúmeras frotas mercantes estrangeiras que, na labuta do comércio marítimo, enchem por vezes o belo vestuário do nosso Tejo.
Surge a primeira grande guerra, e com ela dá-se o aprisionamento dos navios alemães, acto este que origina a declaração de guerra pela Alemanha a Portugal. Sem recordar as consequências, daquela declaração, direi apenas que dos setenta e dois navios aprisionados, num total de 242 441 t brutas, quarenta e dois deles, com a tonelagem de 154 000 t, foram afretados à Inglaterra, ao preço de 14 xelins e 3 pence mensais a tonelada bruta, e a firma Furness With, ... a quem a Inglaterra entregara a exploração daquela trota, afreta-os, por sua vez, a outros países, por preços muito superiores, como, por exemplo, à França, a 50 xelins, e aos Estados Unidos da América, a 160 dólares a tonelada bruta, e a nós próprios, a 190 xelins, como sucedeu com o Goa, em 1920!
Com este negócio dizia-se então - e o nosso ilustre colega nesta Assembleia Sr. Deputado Dr. Paulo Cancella de Abreu o confirmou numa eloquente intervenção nesta legislatura - que o Estado Português teve uma perda superior a 8 milhões de libras, que ao câmbio médio da época correspondiam a cerca de 400 000 contos e ao de hoje a uma cifra astronómica.
Com relação aos trinta navios com que ficámos dá-se a tragédia dos Transportes Marítimos.
A administração ruinosa destes barcos transforma-os em agentes desprestigiosos para Portugal, pois espalham o nosso descrédito e enxovalham o seu nome por todas as partes do Mundo.
O País, segundo palavras dos próprios responsáveis pela sua administração de então, encontrava-se «a saque».
Foi esta a situação em que o Governo nascido da Revolução Nacional veio encontrar o País. Recordar estes factos no presente momento é, não só um dever, como ainda constitui a melhor forma de avivar a memória dos velhos o demonstrar aos novos que as coisas que não estão certas ou que evolucionam com certa lentidão se encontram mais que justificadas com a herança que o Governo de Salazar recebeu de um triste passado de Portugal.
Essa herança encontrava-se representada pelas finanças arruinadas e pelas desordens na ruas e nos espíritos.
Restaurar aquelas finanças e impor aquela ordem não era tarefa fácil para ninguém, pois dependia de inúmeras providências, tantas vezes apregoadas e nunca satisfeitas.
Só um milagre poderia salvar Portugal - e esse milagre deu-se quando Salazar surgiu da sua cátedra de professor de Finanças da velha Universidade de Coimbra e tomou conta das rédeas da governação portuguesa.
Página 610
610 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 200
Restaurar as finanças e dar paz ao povo português foi o seu primeiro objectivo, pois só depois seria possível melhorar as suas condições de vida.
Restauradas as primeiras e conseguida a segunda, estabeleceu o plano para conseguir o outro objectivo, que, embora colocado em segundo lugar pela inteligência, ocupa sempre o primeiro no seu coração.
Promulga a Constituirão, o Acto Colonial e o Estatuto do Trabalho Nacional. Define neste diploma as bases em que deve assentar o desenvolvimento político, económico e social da Nação - e estas são todas no sentido de dar ao povo português as melhores condições de vida.
Negando doutrinas vindas do Oriente, baseia a nossa no desenvolvimento da iniciativa particular, de forma que a mesma crie riqueza, mas riqueza socialmente útil.
Dá-se início à execução daqueles princípios e dá-se começo ao desenvolvimento dos nossos recursos; mas surge a última guerra, e tudo tem de parar.
Termina a guerra e volta-se u tarefa inicial, não alterando qualquer daqueles princípios.
Não vou enumerar nem apresentar a obra colossal já realizada e a que está em vias de conclusão, pois só os cegos não a vêem e os mal intencionados propositadamente ungem ignorá-la, mas direi apenas que ela inclui velhos sonhos dos Portugueses e que os seus reflexos na vida da Nação não podem ser imediatos.
Que há muito ainda por fazer ou que há deficiências na execução daqueles princípios: não deixarei de concordar, em parte, com os que assim pensam.
No entanto, a minha impaciência ou a minha discordância são quase desfeitas quando recordo o passado e vejo o muito que já se fez e se continua a fazer.
Sr. Presidente: continuando convencido de que nunca é de mais falar do passado, lembrarei a V. Ex.ª que, apesar da lição do Infante e do exemplo da Noruega e da Dinamarca, a marinha de guerra portuguesa chega a um ponto de ser classificada de «zero naval» e a bandeira de Portugal rareia nos mares que separam a Mãe-Pátria das suas filhas de além-mar.
É esta a situação, em relação ao mar, existente em 1926.
Se há sectores na vida de uma nação cujos problemas de apetrechamento, execução e exploração requerem tempo e dinheiro, são, sem dúvida, os que se encontram ligados ao mar os que ocupam o primeiro lugar. Apesar desta verdade, verifica-se que o Governo de Salazar não se nega, embora com grandes sacrifícios para os dinheiros da Nação, tão ciosamente defendidos e tão carinhosamente arrecadados, a dotar a marinha de guerra com novas unidades.
O «zero naval», com todas as suas consequências, impunha aquele sacrifício.
Quanto à marinha mercante, como aos navios da nossa frota, embora causados e velhos, ainda poderia ser exigido algum pequeno esforço, tudo aconselhou que se aguardasse a oportunidade para os substituir.
Foi esta a situação em que a última guerra veio encontrar a marinha mercante nacional.
Os velhos e cansados navios, sujeitos então a perigos constantes, percorrem as suas rotas sem interrupção e prestam ao País relevantes serviços no seu abastecimento.
ermina a guerra e aqueles navios encontram-se moribundos com o esforço e árduo trabalho que deles se exigem.
Estamos em Agosto de 1945 e o titular da pasta da Marinha é o antigo presidente da Junta Nacional da Marinha Mercante, a quem coube durante a guerra a orientação e coordenação das actividades daqueles navios.
Conhecedor, como ninguém, das dificuldades que teve então de vencer para que a nossa frota prestasse ao País aqueles relevantes serviços, e albergando na sua alma de marinheiro e na sua inteligência de grande estadista a lição do Infante, elabora, em Agosto do 1945, o seu notável e já histórico despacho n.º 100.
Neste despacho é delineado o programa de renovação daquela frota, o todos os que compreendiam o importante papel que a marinha mercante desempenha na vida económica de um país com as condições geográficas e políticas de Portugal assistem com entusiasmo à sua imediata execução.
Em 1955, isto é, dez anos depois da data daquele despacho, é festejada a chegada ao Tejo da última unidade da primeira fase do programa.
Com esta nova unidade, Portugal ficou dotado com mais cinquenta e nove navios, dos quais fazem parte o Santa Maria e o Vera Cruz, que enchem de orgulho e do alegria os Portugueses que os vêem chegar a paragens distantes da Pátria e a todos nós ao verificarmos que eles levam içada nos seus mastros a bandeira de Portugal, para o prestigiar e dignificar, quer nas rotas que percorrem, quer nos portos onde estacionam.
Sr. Presidente: esta modesta frota representa apenas uma fase do programa que o Governo pretende realizar, e este, não desconhecendo que 99 por cento das nossas importações e exportações se fazem pelo mar e que apenas 38 por cento são feitos em navios portugueses, como também não desconhece o importante e decisivo papel que a marinha mercante desempenha na vida económica do País, não se poupa a esforços para o dotar com mais unidades para a nossa frota mercante.
Como marinheiro, como Deputado e como português só tenho que me congratular com a acção do Governo de Salazar neste importante sector da economia nacional.
Bem haja, pois, o Sr. Presidente do Conselho por ter dado ao Sr. Ministro da Marinha as possibilidades de planear e ver executado o seu notável despacho n.º 100.
Segundo elementos obtidos na Junta Nacional da Marinha Mercante, estas unidades são as seguintes:
Navios em construção
Em estaleiros nacionais:
Navio-tanque Erati, de 16 800 t dw., para a Soponata.
Navio-tanque Shell Tagus, do 12451 dw., para a Shell Portuguesa.
Navio-motor Liazi, de 1000 t dw., para a Empresa do Limpopo.
Navios costeiros Mira Terra, Maria Cristina e Silva Gouveia, de 605 t dw. cada, para a Sociedade Geral.
Navios encomendados
Em estaleiro estrangeiro (Bélgica):
Navio-tanque Fogo, de 27 000 t dw., para a Soponata.
Em estaleiros nacionais:
Navio-motor Lobito, de 9500 t dw., para a Companhia Colonial de Navegação.
Navios-motores Chiado e Angoche, de 1300 t dw. cada, para a Companhia Nacional d» Navegação e destinados à cabotagem de Moçambique.
Página 611
10 DE ABRIL DE 1957 611
2 navios mistos, de 350 t dw. cada, para a Sociedade Geral e destinados ao serviço costeiro de Cabo Verde.
Navios cuja construção está prevista
2 navios-tanques de 40 000 t.
1 navio-tanque de 27 000 t.
2 paquetes de cerca de 20 000 t.
Sr. Presidente: depois das ligeiras considerações que acabo de fazer sobre a marinha mercante, julgo que não devo também deixar de me referir neste momento à pesca nacional.
Portugal continental dispõe de uma costa marítima com a extensão de 426 milhas, das mais ricas em recursos biológicos. Além disso, Portugal dispõe também de cerca de 92 000 ha cobertos pelas águas dos rios, rias, esteiros, etc., e, apesar de esta imensidade de águas albergarem, as mais variadas e ricas espécies da fauna marítima e serviram de pousada para outras que por elas passam, o nosso pescador, mais por espírito aventureiro do que por necessidade, faz rumo à Terra Nova e traz dos seus mares, para Portugal, uma espécie que não tinha o seu habitat no nosso planalto continental - o bacalhau.
Desde logo essa espécie conquista o paladar do povo português e entra tão triunfalmente na sua culinária quee Portugal tem hoje no Mundo o mais alto grau de consumo de bacalhau seco.
Passando a um exaram comparativo entre a situação da pesca nacional antes da organização corporativa e a actual, começarei pelas actividades da pesca do bacalhau.
Esta pesca foi, até à guerra de 1914, limitada a tão poucos navios e a tão pequena produção que, pràticamente, não tinha projecção na economia nacional.
Dá-se aquela guerra, e com ela a súbita alta de preços, as dificuldades de abastecimento e a inflação da moeda. Os grandes lucros então obtidos, embora em
grande parte ilusórios, levam-nos a dispor nessa altura e um grande número de pequenos navios na pesca da Terra Nova.
Em 1930 aquela pequena frota encontrava-se esfrangalhada, em consequência da grave crise económica que dominou o País e o Mundo, e a sua produção era apenas correspondente a 5 por cento da quantidade que era consumida no País.
A estatística mostra-nos que, de facto, naquele ano o consumo de bacalhau foi de 43 203 442 kg, dos quais apenas 2 372 958 kg foram pescados pelos barcos portugueses.
Esta situação obrigava a Nação a remeter para o estrangeiro em cada ano mais de 127 000 contos.
Era a época das falências, e os armadores da pesca do bacalhau não escapam da sua rede.
Em 1932 já muitos armadores tinham desaparecido, pois, para maior fatalidade, escasseava o bacalhau nos bancos da Terra Nova.
Os que conseguem ficar iniciam com os seus navios a pesca nos mares da Gronelândia, e o seu resultado é animador.
No entanto, Sr. Presidente, quando aqueles navios, carregados de bacalhau, produto dum arrojado e árduo trabalho, chegam aos portos de Portugal, encontram o mercado do País a trasbordar do bacalhau estrangeiro e os seus armadores e os seus pescadores assistem à venda da sua pescaria por um preço fixado pelo dumping dos exportadores estrangeiros, preço este que dá aos primeiros a falência da sua empresa e aos segundos a fome nos seus lares.
A indústria da pesca do bacalhau está à beira da ruína, mas o Governo da Nação não a deixa sucumbir.
Em 1934 publica o Decreto-Lei n.º 23 968, que cria a Comissão Reguladora do Comércio do Bacalhau, e inicia-se uma nova fase, caracterizada pela estabilidade de preços e certeza de venda e de cobrança, o que faz renascer o interesse dos nossos armadores da pesca do bacalhau por esta arriscada e árdua actividade.
No entanto, as feridas produzidas tinham sido tão profundas que se tornava necessário promover ainda outras providências. Estavam no começo de execução os princípios do nosso corporativismo, e, segundo eles, a riqueza deve ser fomentada sob a condição de ser socialmente útil.
É criado com este fim o Grémio dos Armadores da Pesca do Bacalhau e, em hora feliz para os armadores e para os pescadores, é nomeado delegado do Governo naquele organismo o nosso ilustre e meu muito querido camarada e amigo Sr. Comandante Henrique Tenreiro, o qual, interpretando com dinamismo, inteligência e devoção os princípios corporativos, consegue proteger os interesses do capital e do trabalho e leva a nossa frota bacalhoeira a ocupar em 1954 o 5.º lugar no conjunto mundial como produtora de bacalhau em fresco (Anuário Estatístico da F. A. O.), pois acima de nós encontram-se apenas a Rússia, o Reino Unido, o Canadá e a Islândia.
No período de 1939 a 1956 construíram-se em estaleiros nacionais 47 navios, no valor de 579 666 contos, e no estrangeiro 13 navios de aço, no valor de 247 371 contos.
A frota bacalhoeira tem hoje em actividade 30 navios de madeira à linha, 20 navios de aço à linha e 22 arrastões.
Os resultados da exploração desta frota e a sua influência na economia nacional encontram-se bem patentes nos seguintes números:
(ver tabela na imagem)
No entanto, para se fazer uma ideia da economia de divisas obtida com o aumento da produção nacional, basta dizer que em 1902-1953 e 1953-1954 foram despendidos com a aquisição de bacalhau estrangeiro respectivamente 106:000.000$ e 142:574.000$, e que a produção nacional neste último ano foi sete vezes maior do que a de 1934-1935.
Na campanha de 1955-1956 os navios da pesca do bacalhau empregaram 4950 tripulantes e pescadores, contra 2213 na campanha de 1936-1937.
Página 612
612 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 200
O número de trabalhadores empregados na seca foi de 5024 em 1955-1956. As soldadas e percentagens auferidas pelos 10 000 tripulantes, pescadores e trabalhadores das secas totalizaram na campanha de 1955-1906 cerca de 100 000 contos.
Além destas soldadas e percentagens, os pescadores do bacalhau, como, aliás, todos os pescadores das outras actividades, desfrutam hoje de todos os cuidados e protecção e da assistência de uma das mais grandiosas obras até hoje realizadas.
Os pescadores portugueses e as pessoas de sua família têm hoje à sua disposição: 8 centros de assistência social, 7 maternidades, 30 postos de puericultura, 7 creches, 2 lares de pescadores, 27 escolas primárias, 11 cantinas, 11 escolas de pesca, 26 casas de trabalho, 1 colónia de férias, 2 internatos, 2 asilos, 1 casa de repouso, 3 hospitais, 10 farmácias privativas, 21 Casas de Pescadores, 181 médicos, 174 enfermeiros e 29 bairros, tem 1664 casas já construídas e 1128 em construção.
No mar o pescador do bacalhau tem hoje à sua disposição a magnífica assistência do novo navio-apoio Gil Eanes.
Este navio, único no seu género, constitui a mais grandiosa realização da organização corporativa das pescas. Concebido e executado por técnicos portugueses, este navio está dotado de todos os requisitos modernos e necessários para apoiar eficientemente a nossa frota e prestar aos milhares de pescadores que todos os anos vão aos bancos da Terra Nova e Gronelândia as mais variadas modalidades de assistência.
Este navio, honrando a organização corporativa, deve constituir motivo de orgulho para todos os portugueses. Como disse o ilustre Ministro da Marinha, «a construção do navio-apoio foi mais uma página que se virou no livro de ouro, já famoso, que há mais de vinte e cinco unos alguém começou escrevendo».
Neste alinhamento de elementos do passado e do presente sobre a pesca nacional, entendi colocar em segundo lugar a pesca de arrasto, dado que algumas das espécies por ela capturadas são a causa dos grandes clamores que se ouvem de toda a parte contra os elevados preços por que é possível adquiri-las.
Vejamos o que se passa em relação a esta pesca.
Apenas em 1939 é esta pesca organizada corporativamente e os seus efeitos encontram-se traduzidos nos seguintes números:
a) Produção em 1940 - 22 300 t.
b) Produção em 1956 - 47 700 t.
Ao fim de dezassete anos de actividade corporativa deu-se um aumento na produção da ordem de 114 por cento.
O número de unidades em actividade em 31 de Dezembro de 1956 era de 80, sendo 42 do alto e 38 da costa.
Desta frota fazem ainda parte velhas unidades que necessitam de ser substituídas, bastando dizer que 23 utilizam a máquina a vapor, queimando carvão ou fuel-oil.
A estatística mostra-nos que no ano de 1949, por exemplo, o número de barcos em actividade era de 100 e que em 1956 aquele número era apenas de 80, mas que em contrapartida os 80 barcos de 1956 tiveram a maior produção até hoje registada nesta pesca, pois em relação a 1940 houve um aumento de 25 400 t e em relação a 1949 um aumento de 6000 t.
Este sensível aumento de produção deve-se ao facto de as antigas unidades terem sido substituídas por novas.
Desde 1940 a 1956 foram construídos e entraram em actividade para a pesca do alto 21 barcos e 25 para a pesca costeira, e uma vez executados os programas de renovação em curso eles originarão até 1958 a construção de mais 17 modernas unidades, o que contribuirá para um acréscimo na produção de 42 por cento em relação ao ano de 1955 e de 200 por cento em relação ao ano de 1940.
Se não fossem os benefícios da organização corporativa nesta pesca, nem a situação presente nem as perspectivas do futuro seriam tão animadoras.
Sabendo-se que os barcos da pesca do alto tiveram e têm necessidade de procurar cada vez mais longe novos pesqueiros, esta necessidade obriga a dotar as unidades com características que lhes permitam, com pouco consumo de combustível, uma maior velocidade e um maior volume de carga, pois de contrário o custo da produção teria de ser forçosamente cada vez mais elevado.
Embora a produção da pesca de arrasto corresponda a pouco mais de 10 por cento da produção total de todas as pescas, ela assume, como já dissemos, lugar de relevo pela circunstância de incluir as espécies mais desejadas pelas pessoas que possuem maior poder de aquisição, o que, dada a diminuta quantidade que é possível apresentar no mercado, provoca toda a espécie de irregularidade no seu comércio, a partir do momento em que o armador entrega ao comprador a sua pescaria.
Para o armador as coisas passam-se de forma diferente.
Embora o custo de um navio de arrasto fosse de 3500 contos em 1942 e tivesse subido para 14 000 contos em 1956; embora as despesas de exploração tenham aumentado com viagens mais longas e demoradas, devido a os pesqueiros serem também cada vez mais distantes, verifica-se que o preço médio da produção do arrasto foi de 4$30 ,por quilograma em 1942 e que em 1955 aquele preço foi elevado para 5$21, isto é, o armador tem apenas na sua produção um aumento de preço de 21,9 por cento.
Sr. Presidente: já vai longo este arrazoado sobre a pesca nacional e verifico que apenas tratei de uma parte das suas actividades.
O desejo de não roubar tempo a V. Ex.ª nem aos meus ilustres colegas com as minhas modestas palavras leva-me a encurtar as minhas considerações e vou, por isso, procurar resumir o que ainda queria e poderia dizer sobre as restantes actividades da pesca nacional.
No entanto, não resisto à tentação de fazer ainda uma referência especial à mais importante pesca da nossa costa - a pesca da sardinha.
Começarei por dizer que esta indústria foi organizada corporativamente em 1938, pelo Decreto n.º 28616, de 25 de Abril do mesmo ano.
Naquele ano a exploração da citada pesca foi feita por 36 armações fixas e por 281 embarcações, no número das quais se contam 58 velhos barcos a vapor e 223 traineiras, representando 115 destas pouco ou nenhum valor económico na frota.
A produção daquelas unidades foi de 105 869 t, no valor de 66 997 coutos, o que dá $64 por quilograma.
A indústria da pesca da sardinha atravessava nessa altura uma das suas maiores crises, a qual se arrastava desde, o tempo da crise económica que se seguiu à guerra de 1914, pois bastará dizer que em 1926 a produção total tinha sido de 72 824 t, no valor de 83 747 contos, o que dava o preço mediu de 1$15 por quilograma, isto é, mais $52 em relação àquele que se repintou doze anos depois.
Recuando ainda um pouco no tempo, constata-se que durante o período da guerra de 1914, e até ao início da crise económica que se lhe seguiu, a indústria da pesca da sardinha viveu horas de grandiosidade. Os
Página 613
10 DE ABRIL DE 1957
pescadores de Setúbal, então um dos maiores centros daquela pesca, para mostrarem aquela grandeza chegaram, segundo se diz, a queimar notas de escudo para acenderem cigarros.
Improvisam-se em barracões, e até em embarcações varadas nas praias, rudimentares fábricas de conservas.
Termina a guerra e a crise económica que se lhe seguiu dá o golpe de morte em toda aquela grandeza.
Antigos e improvisados armadores e fabricantes assistem ràpidamente à ruína das suas empresas e os pescadores à fome e miséria nos seus lares.
Era esta, com ligeiras flutuações, a situação da pesca da sardinha quando, em 1938, foi criado o Grémio dos Armadores da Pesca da Sardinha.
Vem a última guerra e com ela dá-se de novo uma melhoria na sua exploração. As fábricas de conservas, também já organizadas corporativamente, e as necessidades do abastecimento do País escoam toda a produção a preços vantajosos para os armadores e para os pescadores.
As 317 unidades existentes em 1938 aumentam para 416 em 1946.
A produção, que em 1938 tinha sido de 105 869 t é apenas aumentada em 1946 com mais 26 280 t, o que dá, para cada barco, uma produção média inferior à registada em 1938.
As despesas de exploração aumentam cada vez mais e o mar da nossa costa parece não conter mais do que uma determinada quantidade de sardinha.
Esta última conclusão, por todos aceite, levou, em boa hora, o Governo a limitar o número de embarcações e a proporcionar às existentes todos os requisitos modernos para que pudessem ter uma exploração mais rendosa.
A maior parte dos armadores encontrava-se em situação desesperada, mas aquela medida, o defeco da pesca e a organização corporativa da indústria das conservas de peixe, e, finalmente, o fácil escoamento da sua produção para o consumo, salvaram esta indústria.
No ano findo a produção desta pesca foi de 163 ... t. no valor de 464 189 contos, ao preço médio de 2$84 o quilograma.
A sardinha pròpriamente dita totaliza 93 172 t. no valor de 309 641 contos, ao preço médio de 3$32, e as outras espécies atingem 70 493 t. no valor de 154 548 contos, ao preço médio de 2$19, convindo registar que desta quantidade fazem parte 33 885 t de carapau, cujo valor médio por quilograma foi de l$87.
Mais de 50 por cento da sardinha pedrada em 1956 foi adquirida pelas fábricas de conservas, pois das 93 172 t capturadas apenas 41 970 t se destinaram ao consumo público e foram vendidas pelo armador ao preço médio de 2$43 por quilograma.
Com esta espécie não só resultam benefícios para a alimentação da população do País, pois ela contribui quase na sua totalidade para a laboração de 296 fábricas de conservas, que empregam cerca de 22 000 operários, os quais transformando-a, permitem que esta indústria ocupe lugar de relevo na economia do País, pois a percentagem em relação ao total das exportações para o estrangeiro foi, em 1955, de 14.8 por cento, a que corresponde um valor de quase 1 milhão de contos, somente ultrapassado pelas cortinas.
Sr. Presidente: a indústria da pesca da sardinha emprega nos seus barcos cerca de 15 000 homens e, se juntarmos a estes o pessoal da indústria transformadora, o pessoal dos estaleiros que constroem e reparam os seus barcos, o pessoal das lotas e dos cais que leva a sua produção às mãos do comércio e, finalmente, o pessoal por este empregado para a levar aos mais isolados lugarejos da nossa terra, não podemos deixar de constatar que a pesca da sardinha ocupa nos sectores económicos e sociais da Nação um lugar de primeira grandeza.
Sr. Presidente: tinha ainda desejo de fazer algumas referências às restantes pescas, que contribuíram para que a nossa produção em 1955 atingisse a cifra de 424 046 t, colocando assim Portugal em 3.ª lugar entre os países da Europa na capitação de peixe, mas os números já apresentados são tão eloquentes e tão esclarecedores que não julgo necessário prosseguir o meu depoimento.
Vou por isso terminá-lo, mas, antes, desejo formular um voto, e esse voto é para que alguém que se dê no trabalho de contabilizar o que se fizer de bem e de mal no quarto de século que vai seguir-se possa apresentar um tédio de contas tão honroso para o nome de Portugal e tão proveitoso para a sua população como aquele que resulta do sacrifício de alguém que há mais de vinte e cinco anos só trabalha para o bem do povo português.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão.
A próxima sessão será amanhã, à hora regimental, com a mesma ordem do dia de hoje.
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 30 minutos.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Abel Maria Castro de Lacerda.
Américo Cortês Pinto.
António Calheiros Lopes.
Camilo António de Almeida Gama Lemos Mendonça.
Manuel Maria Sarmento Rodrigues.
Paulo Cancella de Abreu.
Tito Castelo Branco Arantes.
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Alberto Cruz.
António da Purificação Vasconcelos Baptista Felgueiras.
António Russel de Sousa.
António dos Santos Carreto.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Carlos Vasco Michon de Oliveira Mourão.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
João da Assunção da Cunha Valença.
João Carlos de Assis Pereira de Melo.
João Cerveira Pinto.
João Maria Porto.
Joaquim Dinis da Fonseca.
José Gualberto de Sá Carneiro.
Luís Filipe da Fonseca Morais Alçada.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel Marques Teixeira.
Manuel Trigueiros Sampaio.
Miguel Rodrigues Bastos.
Pedro Joaquim da Cunha Meneses Pinto Cardoso.
Ricardo Vaz Monteiro.
Sebastião Garcia Ramires.
O REDACTOR - Luís de Avillez.
IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA