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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.° 66

ANO DE 1958 II DE DEZEMBRO

ASSEMBLEIA NACIONAL

VII LEGISLATURA

SESSÃO N.° 66, EM 10 DE DEZEMBRO

Presidente: Ex.mo Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior

Secretários: Ex.mos Srs. José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues
Manuel José Archer Homem de Melo

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 20 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente.
Foi autorizado o Sr. Deputado José Ferreira Barbosa a depor como testemunha num tribunal do Porto.
O Sr. Deputado Ferreira Barbosa preconizou o estabelecimento de seguros de exportação.
Ordem do dia. - Continuou o debate sobre a proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1959.
Falou o Sr. Deputado Paulo Cancella de Abreu.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 17 horas e 15 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 16 horas e 10 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Afonso Augusto Pinto.
Agostinho Gonçalves Gomes.
Aires Fernandes Martins.
Alberto Carlos de Figueiredo Franco Falcão.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Pacheco Jorge.
Alberto da Bocha Cardoso de Matos.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alfredo Rodrigues dos Santos Júnior.
Américo Cortês Pinto.
André Francisco Navarro.
Antão Santos da Cunha.
António Bartolomeu Gromicho.
António Calapez Gomes Garcia.
António Calheiros Lopes.
António Carlos dos Santos Fernandes Lima.
António de Castro e Brito Meneses Soares.
António Cortês Lobão.
António Jorge Ferreira.
António José Rodrigues Prata.
António Maria Vasconcelos de Morais Sarmento.
António Pereira de Meireles Bocha Lacerda.
António Sobral Mendes de Magalhães Ramalho.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Máximo Saraiva de Aguilar.
Artur Proença Duarte.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Avelino Teixeira da Mota.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Domingos Rosado Vitória Pires.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando António Muñoz de Oliveira.
Fernando Cid Oliveira Proença.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco José Vasques Tenreiro.
Frederico Bagorro de Sequeira.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Jerónimo Henriques Jorge.
Jerónimo Salvador Constantino Sócrates da Costa.
João Augusto Dias Rosas.
João Augusto Marchante.

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João de Brito e Cunha.
João Carlos de Sá Alves.
João Cerveira Pinto.
João Mendes da Costa Amaral.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim Pais de Azevedo.
José António Ferreira Barbosa.
José Dias de Araújo Correia.
José Peruando Nunes Barata.
José Garcia Nunes Mexia.
José Gonçalves de Araújo Novo.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Hermano Saraiva.
José Manuel da Costa.
José Monteiro da Bocha Peixoto.
José Rodrigo Carvalho.
José Rodrigues da Silva Mendes.
José Sarmento de Vasconcelos e Castro.
José Soares da Fonseca.
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues.
Laurénio Cota Morais dos Reis.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Manuel Colares Pereira.
Manuel José Archer Homem de Melo.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel Luís Fernandes.
Manuel Maria de Lacerda de Sousa Aroso.
Manuel Nunes Fernandes.
Manuel Seabra Carqueijeiro.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Manuel Tarujo de Almeida.
D. Maria Irene Leite da Costa.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Reis.
Mário Angelo Morais de Oliveira.
Mário de Figueiredo.
Martinho da Costa Lopes.
Paulo Cancella de Abreu.
Rogério Noel Feres Claro.
Sebastião Garcia Ramires.
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães.
Tito Castelo Branco Arantes.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
Urgel Abílio Horta.
Venâncio Augusto Deslandes.
Virgílio David Pereira e Cruz.
Vítor Manuel Amaro Salgueiro dos Santos Galo.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 92 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 16 horas e 20 minutos.

Deu-te conta do seguinte.

Expediente

Representação

Na Mesa foi lida a cópia de uma representação, com setecentas assinaturas, enviada ao Sr. Ministro das Obras Públicas, acerca de uma exposição que a comissão executiva nomeada, pela Associação dos Regantes e Beneficiários do Vale do Lis levara à Assembleia Nacional, em aditamento à que à mesma Assembleia dirigira em 1957. Diz-se naquela representação: «Verificámos posteriormente que nesse aditamento àquela exposição, entre outras afirmações e comentários, se diz, em síntese, «que, no caso particular do Lis, a obra não cumpre, de qualquer forma, as funções para que fui concebida». Como beneficiários que também somos da obra do Lis, queremos dizer a V. Ex.ª que não concordamos com o
exposto, porque reconhecemos e é evidente que a obra está cumprindo com eficácia as suas funções de defesa e de enxugo. Se não cumpriu ainda, no grau que seria para desejar, a função de regar; se, sob este aspecto, existem deficiências, como de facto existem, entre outras razões por falia de água em quantidades suficientes, estamos convencidos de que V. Ex.ª as remediará por qualquer forma - por armazenamento ou captação de novos caudais, por alteração do rotineiro sistema de culturas ou por restrição da área de regadio, destinando determinadas parcelas ou zonas somente a tipos de cultura arbórea on arbustiva - em suma, enfrentando as realidades».

Telegramas

Da Federação dos Grémios da Lavoura do Alto Alentejo a apoiar as considerações do Sr. Deputado José Nunes Mexia.
Sobre a situação dos operários corticeiros do Seixal.

O Sr. Presidente: - Estão na Musa os elementos fornecidos pelo Ministério da Economia em satisfação do requerimento apresentado na sessão de 22 de Outubro findo pelo Sr. Deputado Manuel José Archer Homem de Melo.
Vão ser entregues àquele Sr. Deputado.
Está na Mesa um ofício do tribunal da 1.ª vara cível da comarca do Porto pedindo autorização para o Sr. Deputado José Ferreira Barbosa depor como testemunha naquele tribunal no próximo dia 2 de Fevereiro, pelas 14 horas.
Informo que aquele Sr. Deputado não vê inconveniente para a sua actividade parlamentar em fazer o depoimento a que se alude.
Consultada a Câmara, foi concedida autorização.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, antes da ordem do dia o Sr. Deputado Ferreira Barbosa.

O Sr. Ferreira Barbosa: - Sr. Presidente: por todo o mundo, em todos os países -grandes e pequenos - se afirma hoje a necessidade de exportar, exportar mais, cada vez mais.
Considerado tal lema como imperativo nacional, transformou-se em alvo da política económica de todas as nações.
Por toda a parte se doutrinam os exportadores, pressurosa e cuidadosamente se estudam meios de os apoiar, de lhes dar protecção e incentivo, de se colocarem ao seu dispor serviços perfeitos de prospecção e estudo dos mercados o meios seguros de informação.
Dessa corrente são entre nós intérpretes fiéis e entusiastas SS. Ex.ªs os Srs. Ministro das Finanças e Secretário de Estado do Comercio.
Ouso, assim, lembrar ao Governo da Nação, e em especial àqueles dois ilustres titulares, a conveniência que haveria em se estudar a possibilidade de estabelecimento de seguros do exportação como medida que se me afigura de largo alcance prático. Faço-o como simples representante da Nação, que não tem qualquer dúvida em afirmar que, pertencendo às classes produtoras e procura tido defender os seus interesses, julga assim defender igualmente o interesse geral.
De uma maneira geral, o seguro de exportação permite aos exportadores a protecção não só contra os riscos de crédito - falta de pagamento dos compradores - como ainda contra os riscos políticos - actos dos governos estrangeiros que possam ter repercussão impeditiva aos clientes do pagamento ou até da própria compra. Este último caso é muito de considerar quando se trate de fabricações especializadas com destino a um determinado mercado e que, em razão desse facto, cor-

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reriam o risco de se manter em stock por longo tempo ou de terem de ser vendidas com depreciação para outros destinos.
Os seus esquemas abrangem, porém, variadas modalidades, entre as quais se contam, por exemplo em França, o seguro-prospecção, o seguro-feira e o seguro contra aumentos dos preços de custo.
É de considerar que os sistemas desse seguro, hoje já em uso na maior parte dos grandes países, são geralmente administrados directamente pelos governos ou em cooperarão com agências semioficiais.
Entre nós, ao Fundo de Fomento de Exportação caberia possivelmente, essa função, que me parece enquadrar-se perfeitamente no âmbito da sim competência e fins.

O Sr. Dias Rosas: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Com todo o prazer.

O Sr. Dias Rosas: - É para esclarecer V. Ex.ª de que o Governo, justamente através do Fundo de Fomento de Exportação, está a estudar o assunto há já alguns meses.
Todavia, a circunstância de, como V. Ex.ª muito bem sabe, visto que já o demonstrou, o problema ser muito difícil e ter grande complexidade, faz que se tenha de ter muito cuidado na sua resolução. Isto para que, não se acrescente a todas as dificuldades da exportação mais uma, que se arriscaria a resultar de uma deficiente garantia da cobertura dos créditos em que descuidadamente viessem a querer descansar os exportadores.
É esta a razão por que ainda não foi possível resolver o assunto, apesar de, repito, estar já a ser estudado.

O Orador: - Acrescentarei que ainda muito recentemente, em uma reunião de peritos dos seis países do mercado comum, se constatou a existência do seguro de exportação em todos eles, com a única excepção do Luxemburgo, e se afirmou o grande interesse de que tal seguro se reveste para o desenvolvimento do comércio internacional, mesmo só no que se refere às relações entre esses países.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continua em discussão na generalidade a proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1959.
Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Cancella de Abreu.

O Sr. Paulo Cancella de Abreu: - Sr. Presidente: serão breves as minhas palavras. O tempo é escasso e, por isso, tenho o dever de deixar para os mais competentes e especializados a apreciação mais larga da proposta em discussão, no ponto de vista doutrinário e no seu conteúdo substancial.
Ponho mesmo de lado, a apreciação das dúvidas de ordem constitucional que pode sugerir a matéria vaga e importantíssima do seu artigo 4.º, que, aliás, está em
contradição com a do artigo 5.°, embora este seja de carácter provisório.
De resto, trata-se de assunto muito sério e transcendente, bem digno de ser contemplado na próxima revisão constitucional.
Por agora limito-me, pois, a algumas considerações objectivas sobre matéria tributária compreendida na proposta.
Entre as medidas que são objecto da importante proposta da Lei de Meios em discussão figuram, no capítulo referente à política fiscal, alterações na isenção e nas taxas a aplicar na incidência do imposto complementar.
Ora a este propósito, na sessão de 17 de Abril transacto, ao ocupar-me das relações entre o Estado e a Companhia de Diamantes de Angola, eu dissera que, para corrigir a condenável exorbitância das participações nos lucros sociais e consequentes acumulação de fortunas e concentração excessiva de rendimentos, se podia, para o efeito daquele imposto, fazer incidir sobre elas, somadas com os vencimentos fixos da mesma proveniência, taxas especiais privativas, mais elevadas nos últimos escalões da tabela de 1956 e com limite máximo muito superior ao actual, que é de 45 por cento.
Pareceu-me que, à falta de melhor solução, seria este o modo indirecto de reduzir e fazer reverter para o Estado grande parte das somas exorbitantes, e muitas vezes sem limite no total, que vêm sendo atribuídas aos membros dos corpos gerentes de algumas sociedades, entre as quais avulta, como padrão, aquela poderosa Companhia, como aqui se demonstrou com cifras impressionantes, que não foram contestadas; e se em alguma coisa pecaram foi por omissão, devido a o tempo, aliás largamente consentido, não me ter, todavia, possibilitado revelações complementares daquela natureza.
Permitia-mo o estudo circunstanciado e escrupuloso que fizera de um problema cuja oportunidade se tornara evidente, pois me propusera, e julgo ter conseguido por iniciativa e acção próprias, sem estímulo nem conluio de ninguém, desviar do alvo que notoriamente pretendiam atingir, na campanha eleitoral iminente, os paladinos do regresso a um regime sob cuja égide semelhante facto foi possível, e se gerou, e que estava, há meses, sendo objecto de especulação política contra o Estado Novo.
É claro que sou também daqueles que não têm a volúpia do sucesso, e seria, realmente, jactância da minha parte imaginar que o Governo, ao propor agora o aumento daquele imposto, se inspirou na minha sugestão ou foi influenciado pelas ideias que expendi. O contrário é que sucedeu, isto é, eu, sem o saber, é que fui ao encontro do pensamento do Governo e dos propósitos que o animavam.
Em todo o caso, a coincidência tem um significado, pois revela que na colaboração que nos esforçamos por dar lhe, dentro das nossas possibilidades e sem abdicação da independência pessoal e política, procuramos ser objectivos e não nos inspiramos em ideias falazes, nem preconizamos soluções injustas, inviáveis ou inoperantes.
De resto, as alterações propostas pelo Governo, nuns pontos não atingem aquela sugestão e noutros ultrapassam-na.
O artigo 5.° da proposta do Governo eleva de 50 para 60 contos a dedução mínima ou isenção estabelecida no n.° 1.° do artigo 2.° do Decreto n.° 35 594 e no n.° 2.° do § 1.° do artigo 21.° do Decreto n.°40 788, mas aumenta as taxas da tabela anexa a este último decreto e passa a máxima actual de 45 por cento, a partir do rendimento de 1400 contos, para 60 por cento a partir do de 1200 contos.
O Sr. Ministro das Finanças justifica lucidamente estas alterações, feitas, aliás, a título provisório, pois o imposto complementar, como imposto pessoal de sobre-

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posição e correcção que é dos restantes, carecerá de reforma que sem o remate da daqueles, já iniciada.
Também pelo mesmo motivo o relatório não faz uma estimativa dos resultados que vão derivar para o Tesouro destas modificares do imposto complementar, nem podia fazê-lo facilmente.
Todavia, a Câmara Corporativa elaborou uma nova tabela das taxas progressivas, calculada nos termos desta proposta de lei, partindo dos escalões que basearam a tributação de 1957, e apurou já um aumento de cerca de 50 000 contos sobre os rendimentos entre 100 e 1200 contos; e, como acima de 1200 contos os rendimentos globais daquele ano somaram mais de 230 000 contos, conclui que pode prever-se desde já um apreciável aumento resultante da aplicação das taxas respectivas da nova tabela, mesmo no caso de não serem aumentados os outros impostos directos.
Seja como for, eu, atendendo às condições actuais da vida, sou daqueles a quem se augura justo e conveniente elevar desde já aquele mínimo de isenção para os rendimentos até 150 ou 200 contos anuais, não obstante, como acentua o relatório da proposta, a elevação da taxa inicial de 4 para 5 por cento não consumir, até aos 100 contos, o beneficio que resulta da elevação para 60 contos do limite da isenção.
Como preferível seria, porventura, que o aumento das taxas se desse apenas a partir dos escalões superiores a 300 ou 400 contos de rendimentos, indo, neste caso, o Estado buscar compensação num aumento superior aos 3 por cento propostos na taxa dos rendimentos superiores, e nomeadamente a um aumento de 45 para 70 ou 80, e não apenas para os 60 por cento da taxa máxima aplicável aos rendimentos superiores a 1200 contos, como, aliás, é de aconselhar em qualquer caso.
A primeira vista afigura-se exorbitante a tributação com taxas de 80, 70 e mesmo 60 por cento. E isto realmente acontecia se a taxa incidisse sobre o total dos rendimentos superiores àqueles 1200 contos. Mas não sucede assim, pois, como diz o relatório da proposta, as taxas progressivas são aplicadas por escalões e unicamente aos rendimentos que excedem o termo do escalão anterior, sem afectação dos rendimentos compreendidos no mesmo escalão ou naqueles que o precedem. Isto independentemente de os 60 contos de isenção serem, como são, abatidos a todos os rendimentos; o que, aliás, a Câmara Corporativa não julga, e realmente não é, justificável relativamente aos escalões mais elevados.
Assim, não é á taxa máxima de 60 por cento que incide sobre o total de 1200 contos - o que daria 720 contos de imposto complementar -, mas, sim, em resultado daquele mecanismo, apenas uma taxa global média, que até agora era de 20,83 por conto sobre o rendimento anual de 1400 contos e passa a ser de 28,22 por cento sobre o do 1200 contos.
Fica assim ainda um saldo muito elevado a favor do contribuinte.
Aponta o Sr. Ministro das Finanças dois exemplos, num dos quais, os Estados Unidos, a percentagem do imposto pessoal de rendimentos chega a atingir 91 por cento, e no outro, a Holanda, excede também os 60 por cento, não obstante - acrescenta - nestes países não se tratar propriamente de um imposto único, pois único é, para comodidade do contribuinte, apenas o «conhecimento».
Como aqui, na proposta em discussão, se trata, porém, de uma medida transitória, até que, após a reforma completa dos outros impostos directos, se denuncie o grau de capacidade tributária dos contribuintes, confiemos em que o Governo reveja então o problema, tendo em vista o aumento do limite de não incidência do imposto e a elevação da taxa máxima, que agora se fixa em 60 por cento, mas ainda não é suficiente para abrandar os apetites insaciáveis, embora seja certo que, em grande número dos casos, esto imposto individual é injustificadamente pago pelos cofres das sociedades, com prejuízo de útil aplicação o a da retribuição do capital accionista; e, assim, não se evita aquele condenável excesso, contra o qual a opinião pública, justificadamente, há muito reclama medidas drásticas.
E não deve perder-se de vista que, além da incontestável moralidade de tal procedimento, tornar-se-á mais fácil aliviar a incidência de impostos elevados sobre valores derivados do produto do trabalho e sobre os bens patrimoniais, adquiridos e mantidos legitimamente, por esforço próprio ou herança dos ancestrais.
Foi até por reputar justa e conveniente esta distinção que, na sessão em referência, defendi o aumento do imposto complementar pela aplicação de uma taxa especial privativa sobre os vencimentos ou participações nos lucros dos corpos gerentes, quando excedessem certo limite, excepcionando, se possível, a parte comprovadamente investida em empreendimentos reprodutivos para o Pais, do que, agora, serviria de exemplo o louvável aumento das isenções ou reduções estabelecido no novo Código da Sisa.
Sr. Presidente: repetidamente, todos os anos, com pontualidade pendular, vem sondo submetida à discussão e votação da Assembleia Nacional a lei de meios para o ano imediato. E precedem-na, além de outros elementos valiosos de estudo, o relatório ministerial e o parecer da Camará Corporativa, que esclarecera desenvolvida e doutamente o conteúdo e iluminam o debate deste diploma fundamental na vida da Nação.
Discutida e aprovada esta lei, também sempre de seguida e em tempo, vem a público o Ornamento Geral do Estado para o ano futuro a que ela diz respeito. E, em remate e ainda no momento oportuno, são publicadas as contas públicas finais do ano anterior e mesmo as provisórias dos meses decorridos ato à data da publicação, como ainda agora sucedeu em referência às de 1957 e aos primeiros nove meses de 1958.
Tudo isto e os benefícios incalculáveis que daí resultam não surpreende quando verificamos que se deve à nova ética do Estado e a uma nova e mais eficiente estruturação dos serviços públicos, de que Salazar foi o fautor logo desde o instante em que, com a maior expectativa da Nação, sobraçou a pasta das Finanças: mas surpreende quando fazem o confronto com o passado os que o viveram ou o conhecem.
Sou dos que viveram esse famoso regime dos «duodécimos», que foram o testemunho fiel e expressivo de uma época e do caos, da desordem e da anarquia dominantes na administração financeira do Estado republicano anterior ao 28 de Maio.
Tratava-se, como sabem, de medidas ilegais de circunstância, de que se usou o abusou, e a tal ponto que se chegou ao cúmulo de se votarem, de uma assentada e de afogadilho, dois, três, quatro e mais «duodécimos», ou sejam autorizações mensais de receita e despesa, ora para abranger o período de encerramento do Parlamento, ora porque havia a antecipada certeza de que o orçamento do ano correspondente, como realmente muitas vezes sucedeu, não era votado ou nem sequer começado a discutir.
Além do péssimo sintoma e condenável expediente, os «duodécimos» traziam, como se acentuou no indispensável Decreto n.º 11 807, de 30 de Junho de 1926, maiores encargos para o Tesouro pela possibilidade de em cada um se rectificarem as dotações dos serviços públicos e se produzir uma natural perturbação na administração deles, nomeadamente nos de contabilidade.
Por brevidade, basta citar, como exemplo do recurso frequente a semelhante iniquidade, as Leis n.ºs 1449, 1663, 1676, 1824 e 1839. E, o que é pior, o arbítrio

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chegou ao cúmulo de contra a imposição expressa da Constituição de 1911, haver «duodécimos» promulgados por simples decretos, com manifesto abuso do poder, como sucedeu, por exemplo, com os destinados aos quatro últimos meses de 1925, estabelecidos pelo Decreto n.° 11 054, de 1 de Setembro do mesmo ano, julgando-se o Governo autorizado para tanto pela Lei n.° 1345, de 1924, quando é certo que esta autorização foi unicamente para regulamentar o comércio de cambiais e adoptar as demais providências que julgasse directamente úteis para melhorar a situação cambial: o que, como é óbvio, nada tinha com a fixação das receitas e despesas para cada mês. E isto com a agravante de o artigo 27.° daquela Constituição de 1911 só permitir ao Governo a utilização das autorizações por uma única vez.
Não bastará esta amostra para revelar, a toda a luz, o que foi a administração pública na era democrática anterior ao 28 de Maio?
Será necessário repetir o mais que ocorreu nesse período calamitoso, em que, não obstante a instabilidade governativa, um só partido foi o quase permanente detentor do Poder, e sob cujo domínio se cometeram os mais graves erros e praticaram e ficaram impunes crimes e escândalos cometidos e, com eficiência, nada se fez em beneficio da valorização económica do Pais e da melhoria do nível de vida e das condições sociais da população?
Será necessário relembrar assassínios, grupos, assaltos, tumultos e revoltas que enlutaram a Nação, como o 14 de Maio e o 19 de Outubro, que vitimou o próprio fundador da República?
Parece que sim.
Decorreram mais de trinta anos, mas existem ainda muitos dos que viveram, sentiram e sofreram essa época. Simplesmente há os que a esqueceram, outros preferem-na, pois nem de outro modo se explica que se esforcem por reconquistá-la, embora na consciência absoluta de que o triunfo não levaria só a isto, mas a muito mais, a muito pior do que isto, dado o seu conluio com os que negam a Pátria e apenas pretendem aproveitar, como degrau de conquista, a boa fé de alguns, a ingenuidade do outros tantos e a má fé, os ódios inveterados, a ambição desmedida, o anseio do mando do maior número; enfim, dos que esquecem ou não perdoam a ordem, os benefícios, o bem que eles próprios gozam e devem ao prestigio, ao progresso e à tranquilidade que o País tem conquistado como irradiação do esforço de muitos, à sombra o patriotismo, do prestígio, do talento, da competência, do sacrifício e da acção notabilíssima do maior estadista português das últimas gerações.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Sabem-no, reconhecem-no, e, por isso, ao mesmo tempo que porfiam na colheita do fruto da semente lançada à terra durante trinta anos por esse homem singular e seus colaboradores, pretendem baldadamente derrubá-lo, como roble frondoso quo lhes ensombra os desígnios, como se pudessem secar na alma da Nação as fundas raízes que nela criou.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - E só os velhos que restam pensam, sentem e procedem desse modo, se novos condenàvelmente os seguem e imitam, por ignorância do passado, desconhecimento das realidades e carência de formação moral e doutrinária, ou por inconsciente anseio de novidade ou por espírito de rebeldia, que dizer, meus senhores, dos republicanos conservadores ou de alguns, poucos, monárquicos imaginários, de que não me considero correligionário, e mesmo de homens quo se dizem da situação, mas, fazendo inconscientemente o jogo dos comunistas na propaganda e no voto, ou colaborando, pelas esquinas, nos cafés ou nas tertúlias, em campanhas de difamação e de boatos, inspiradas em espírito de maledicência, tão comum mesmo nos que mais têm a perder, ou movidos por malquerenças, vaidades, despeites, aspirações insaciadas, interesses feridos?! Do tal modo, com tal inconsciência, o fazem que nem reparam no que os próprios cegos voem!

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Estes são os piores, porque são os mais nefastos. São os piores, porque, além de votarem ao desprezo a verdade e esquecerem os elementares deveres de justiça, ofendem outro sentimento nobre que devia iluminar o espirito e palpitar no coração de todos os portugueses, à luz das inúmeras realidades das três décadas decorridas: o sentimento da gratidão.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: Deus livro o Estado Novo de certos amigos, pois dos inimigos podo ele livrar-se.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão.
Amanhã haverá sessão com a mesma ordem do dia.
Está encerrada a sessão.

Eram 17 horas e 15 minutos.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Adriano Duarte Silva.
Agnelo Ornelas do Rego.
Alberto Cruz.
Américo da Costa Ramalho.
António Barbosa Abranches de Soveral.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Belchior Cardoso da Costa.
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.
Carlos Coelho.
João da Assunção da Cunha Valença.
João Maria Porto.
João Pedro Neves Clara.
Joaquim de Pinho Brandão.
Jorge Pereira Jardim.
José de Freitas Soares.
José dos Santos Bessa.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Luís Tavares Neto Sequeira de Medeiros.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel Maria Sarmento Rodrigues.
Purxotoma Ramanata Quenin.
Ramiro Machado Valadão.

O REDACTOR - Leopoldo Nunes.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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