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REPÚBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL
DIÁRIO DAS SESSÕES N.° 68
ANO DE 1958 13 DE DEZEMBRO
ASSEMBLEIA NACIONAL
VII LEGISLATURA
SESSÃO N.º 68, EM 12 DE DEZEMBRO
Presidente: Ex.mo Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior
Secretários: Ex. mos
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues
Júlio Alberto da Costa Evangelista
SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 15 minutos.
Antes da ordem do dia. - Leu-te o expediente.
Foram aprovados os n.ºs 66 e 67 do Diário das Sessões, com uma rectificação do Br. Deputado Cancella de Abreu, quanto ao n.º 66.
Para o cumprimento do disposto no § 3.° do artigo 109.º da Constituição, recebeu-se na Mesa, enviados pela Presidência do Conselho, os n.ºs 218, 219. 224, 226, 227, 234, 236, 357, 258 e 262, 1.ª série, do Diário do Governo, inserindo diversos decretos-leis.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Amaral Neto, para interrogar a Mesa; Bagorro de Sequeira, acerca do Congresso Nacional da Pesca, recentemente realizado em Luanda; Simeão Pinto de Mesquita, para um requerimento; António Lacerda, para chamar a atenção do Governo para, a situação de certos lavradores caseiros do concelho de Braga, e Carlos Coelho, que se referiu à recente visita do Ministro das Corporações ao distrito de Castelo Branco.
Ordem do dia. - Continuou a discussão na generalidade da proposta de lei de autorização das receitas e despesas para o ano de 1950.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Águedo de Oliveira, Melo Machado e Santos Bessa.O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas e 50 minutos.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Eram 16 horas e 10 minutos.
Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Afonso Augusto Pinto.
Agostinho Gonçalves Gomes.
Aires Fernandes Martins.
Alberto Carlos de Figueiredo Franco Falcão.
Alberto Cruz.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Pacheco Jorge.
Alberto da Bocha Cardoso de Matos.
Albino Soares Pinto dos Beis Júnior.
Alfredo Rodrigues dos Santos Júnior.
Américo Cortês Pinto.
Américo da Costa Ramalho.
Antão Santos da Cunha.
António Bartolomeu Gromicho.
António Calapez Gomes Garcia.
António de Castro e Brito Meneses Soares.
António Cortês Lobão.
António Jorge Ferreira.
António José Rodrigues Prata.
António Maria Vasconcelos de Morais Sarmento.
António Pereira de Meireles Bocha Lacerda.
António Sobral Mendes de Magalhães Ramalho.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Águedo de Oliveira.
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Artur Máximo Saraiva de Aguilar.
Artur Proença Duarte.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Avelino Teixeira da Mota.
Belchior Cardoso da Costa.
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos Coelho.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Domingos Rosado Vitória Pires.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando António Munoz de Oliveira.
Fernando Cid Oliveira Proença.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco José Vasques Tenreiro.
Frederico Bagorro de Sequeira.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Jerónimo Henriques Jorge.
João da Assunção da Cunha Valença.
João Augusto Dias Rosas.
João Augusto Marchante.
João de Brito e Cunha.
João Carlos de Sá Alves.
João Mendes da Costa Amaral.
João Pedro Neves Clara.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim Pais de Azevedo.
Joaquim de Pinho Brandão.
Jorge Pereira Jardim.
José António Ferreira Barbosa.
José Dias de Araújo Correia.
José Fernando Nunes Barata.
José Gonçalves de Araújo Novo.
José Hermano Saraiva.
José Manuel da Costa.
José Monteiro da Bocha Peixoto.
José Rodrigo Carvalho.
José Rodrigues da Silva Mendes.
José dos Santos Bessa.
José Sarmento de Vasconcelos e Castro.
José Soares da Fonseca.
José Venâncio- Pereira Paulo Rodrigues.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Laurénio Cota Morais dos Beis.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Luís Tavares Neto Sequeira de Medeiros.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel José Archer Homem de Melo.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel Luís Fernandes.
Manuel Maria de Lacerda de Sousa Aroso.
Manuel Maria Sarmento Rodrigues.
Manuel Seabra Carqueijeiro.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Manuel Tarujo de Almeida.
D. Maria Irene Leite da Costa.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Beis.
Mário Angelo Morais de Oliveira.
Mário de Figueiredo.
Martinho da Costa Lopes.
Paulo Cancella de Abreu.
Ramiro Machado Valadão.
Rogério Noel Peres Claro.
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães.
Tito Castelo Branco Arantes.
Urgel Abílio Horta.
Venâncio Augusto Deslandes.
Virgílio David Pereira e Cruz.
Vítor Manuel Amaro Salgueiro dos Santos Galo.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 96 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 16 horas e 15 minutos.
Antes da ordem do dia
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Telegrama
Do Grémio da Lavoura de Mirandela a apoiar a intervenção do Sr. Deputado Camilo de Mendonça acerca do problema do azeite.
O Sr. Presidente: - Estão em reclamação os n.ºs 66 e 67 do Diário das Sessões.
O Sr. Paulo Cancella de Abreu: - Sr. Presidente: pedi a palavra para fazer a seguinte rectificação ao n.° 66 do Diário das Sessões: intercalar entre a 56.ª e 57.ª l., col. 1.ª, p. 100, a seguinte frase: a Bem entendido que acima do rendimento de 1200 contos fica a ser aplicada sempre a taxa fixa de 60 por cento, mas incidirá apenas sobre a parte do rendimento que exceda esses 1200 contos».
O Sr. Presidente: - Como mais nenhum dos Srs. Deputados deseja fazer qualquer reclamação, considero aprovados os referidos números do Diário das Sessões com a rectificação apresentada.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Enviados pela Presidência de Conselho e pura cumprimento do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição, estão na Mesa os n.°" 218, 219, 224, 220, 227, 234, 296, 257, 258 e 262 do Diário do Governo, 1.ª série, respectivamente de 8, 9, 15, 17 18, 29 e 31 de Outubro passado, de 26 e 27 de Novembro findo e de 3 do corrente, que inserem os Decretos-Leis: n.° 41 895, que cria o lugar de adido aeronáutico junto da Embaixada de Portugal em Paris e considera válida para todos os efeitos legais a nomeação constante da portaria de 21 de Outubro de 1957, inserta no Diário do Governo n.° 248, 2.ª série de 24 do mesmo mês e ano, para o desempenho daquelas funções; n.° 41 896, que regula o abono de almoço por conta do Estado aos oficiais e sargentos em serviço nas unidades, estabelecimentos militares e outros serviços do Exército; n.° 41 897, que eleva à categoria de embaixada as missões diplomáticas de Portugal em Havana e Tóquio; n.° 41 898, que define a atribuições conferidas ao chefe do Estado-Maior do Exército; n.° 41 899, que adapta a aplicação das disposições do Decreto-Lei n.º 41 375 nas despesas cenouras ou com a aquisição de material a efectua pelos serviços dependentes do Ministério do Exército n.º 41 900, que autoriza a Junta Autónoma de Estrada e a Direcção-Geral de Transportes Terrestres, respectivamente, a promover a realização de estudos e trabalhos preparatórios do concurso para a execução da obras rodoviárias e ferroviárias para a transposição do Tejo em frente de Lisboa, incluindo as vias de acesso nas duas margens; n.° 41 901, que autoriza o Ministério da Educação Nacional a conceder a um empresário mediante, concurso público, a exploração do Teatro Nacional D. Maria II, pelo prazo de cinco anos; n.° 41 902.
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que autoriza o Ministro da Educação Nacional a elevar 110 ano lectivo de 1958-1959 o número de alunos previsto no artigo 9.° do Decreto-Lei n.º 32 243 e a nomear, em comissão, nesse ano o pessoal docente indispensável n.° 41 916 que designa as disposições do Decreto-Lei n.° 41 164 (fundos e orçamentos privativos das unidades da Força Aérea) tornadas extensivas ao Estado-Maior da Força Aérea, às Direcções dos Serviços de Material e de infra-estruturas e aos comandos de regiões e zonas aéreas; n.º 41 923, que dá nova redacção ao artigo 57.º do Regulamento da Escola Prática de Cavalaria, aprovado pelo Decreto n.º 18 916 (considera legais, para todos os efeitos, os abonos a dinheiro efectuados desde 8 de Setembro do 1957 aos oficiais e sargentos ou furriéis casados e correspondentes à diferença referida no S único daquele artigo); n.º 41 925, que considera organismos militares, enquanto se mantiver a excepcional emergência que tem vindo a verificar-se, no Estado da Índia, as corporações da Polícia e da Guarda Fiscal do referido Estado; n.° 41 920, que prorroga até 30 de Junho de 1959 o prazo para o levantamento das importâncias das viagens de regresso depositadas pêlos interessados nas companhias de navegação, por força do § 2.º do artigo 2.° do Decreto n.° 37 190, e a que se refere o artigo 10.° do Decreto-Lei n.º 40 610; n.º 41 928, que cria vários lugares no quadro do pessoal vitalício e contratado da Junta Geral do Distrito Autónomo de Ponta Delgada, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 37 051 (extingue o lugar de químico analista do laboratório distrital); n.º 41 934, que autoriza o Governo, pelo Ministro da Educação Nacional, a aceitar uma quantia para fundo de manutenção de uma cantina escolar na freguesia de Recardães, concelho de Águeda. a qual se designará «Cantina Escolar Dr. Júlio Afonso da Silva Tavares»; n.º 41 939, que permite que o saldo de gerência apurado no ano anterior seja aplicado em cada ano nas importâncias a despender pela Comissão Administrativa das Novas Instalações para o Exército, integradas nas despesas militares em harmonia com compromissos tomados internacionalmente; n.º 41 974, que aumenta de várias unidades o quadro do pessoal a Direcção dos Serviços de Identificação. Secção do Arquivo Geral de Registo Criminal e Policial, a que se refere o artigo 25.º do Decreto-Lei n.° 41 077 (permite ao Ministro da Justiça alterar, por portaria, a área da competência territorial para a passagem de bilhetes de identidade da Secção Central e das subsecções do Arquivo de Identificação); n.º 41 976, que aumenta em 7:342.640$ o limite estabelecido no Decreto-Lei n.° 39 849 para os encargos de construção e equipamento dos Hospitais Escolares de Lisboa e Porto; n.° 41 977, que autoriza a Câmara Municipal de Lisboa a .satisfazer as despesas com a realização, no ano de 1959, do Congresso Hispano-Luso-Americano-Filipino de Municípios; n.º 41 978, que eleva a sete o número de escolas do magistério primário autorizadas a criar, nos termos do artigo 6.° do Decreto-Lei n.° 33 019; n.° 41 979, que revoga o Decreto-Lei n.° 41 844, considerando-se como inalterada a. redacção primitiva do § único do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 40 322 (contingentes de energia eléctrica a fornecer pela Companhia Nacional de Electricidade à Chenop - Companhia Hidroeléctrica do Norte do Portugal); n.° 41 987, que uniformiza a classificação dos comandos navais e define as principais missões que lhes competem, e n.º 41 990, que cria os Comandos Navais de Goa e de Cabo Verde e Guiné o os Comandos das Defesas Marítimas de Cabo Verde, da Guiné, de S. Tomé, de Macau e de Timor, com sedes, respectivamente, em Goa, Mindelo, Bissau, S. Tomé, Macau e Díli, e define as suas atribuições.
O Sr. Amaral Neto: - Sr. Presidente: peço a palavra para interrogar a Mesa.
O Sr. Presidente: -Tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Amaral Neto: - Sr. Presidente: pedi a palavra para interrogar a Mesa, mas, com a devida vénia, creio indispensável referir sucintamente os factos que despertam a minha dúvida e suscitam, pois, a questão, para bom entendimento dela.
Foi promulgado pelo Decreto-Lei n.° 41 969 o novo Código da Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações, que veio publicado no Diário do Governo com data de 24 de Novembro último, isto é, anterior de um dia à entrada em funcionamento desta Assembleia.
Porém a imprensa noticiou largamente que no dia 2 do corrente mós, em conferência realizada no Secretariado Nacional da Informação, perante o próprio secretário nacional e numerosos jornalistas, um alto funcionário do Ministério das Finanças fez uma exposição pública das principais medidas do referido código, com carácter de anúncio o novidade, isto é, com reconhecimento, pelo menos implícito, de o dito código ainda não ter sido dado a conhecimento público. Disto há abundante prova testemunhal.
Por outro lado, qualquer assinante ou recipiendário regular do Diário do Governo, como muitos há nesta sala, poderá por sua parte dar Io de que o número deste Diário com o mencionado diploma não entrou em circulação antes do dia 5 de Dezembro, pelo que a sua data de 24 de Novembro tem de ser considerada arbitrária ou fictícia.
É com referência a este exemplo, Sr. Presidente, que rogo a V. Ex.ª me esclareça se o conceito de publicação dos decretos-leis, para os efeitos do disposto no § 3.° do artigo 109.° da Constituição, deve entender-se reportado à data de real entrada em circulação para conhecimento público do diário oficial - insisto no substantivo «diário» - que o dê à estampa, ou à data, porventura arbitrária ou fictícia, a esse jornal atribuída na impressão.
O Sr. Presidente: - A apreciação das considerações de que V. Ex.ª fez preceder a interrogação à Mesa não é de atribuição da Mesa da Assembleia; e nem sequer se trata de nenhum dos decretos-leis que acabei de comunicar à Assembleia.
Por isso - repito - o assunto daquelas considerações é estranho à competência da Mesa, embora o nau seja à da Assembleia, pois pode caber nas suas funções de controla político dos actos do Governo.
Quanto à interrogação em si, só posso esclarecer que, segundo a lei, os diplomas legislativos têm a data do Diário em que são publicados. Não posso partir doutro principio, que é o legal.
O Sr. Amaral Neto: - Muito obrigado a V. Ex.ª, Sr. Presidente, pelo esclarecimento que acaba de dar-me.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra antes da ordem do dia o Sr. Deputado Bagorro de Sequeira.
O Sr. Bagorro de Sequeira: - Sr. Presidente: pedi a V. Ex.ª para fazer uso da palavra a fim de me ocupar, em considerações muito breves, da realização do II Congresso Nacional da Pesca, recentemente levado a efeito em Angola, nos centros piscatórios de Luanda, Benguela e Moçâmedes, o a que se dignou dar maior relevo o Ex.mo Ministro do Ultramar, presidindo às respectivas sessões de abortara e encerramento.
Pelo seu alto significado, na ordem dos melhores propósitos de se fortalecerem cada vez mais as ligações morais, políticas e económicas entre a metrópole e as províncias do ultramar, e pela repercussão que os estu-
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(...) dos e trabalhos do Congresso vão certamente ter no desenvolvimento e aperfeiçoamento da indústria da pesca nacional não podia o caso passar sem uma referência de apreço nesta Assembleia, nem eu podia eximir-me a fazê-la.
Efectivamente, o II Congresso Nacional da Pesca foi um acontecimento da maior relevância e importância, principalmente para Angola, sobretudo por ter possibilitado, no ambiente próprio, um melhor esclarecimento de alguns problemas que respeitam à indústria da pesca naquela nossa província e um mais perfeito conhecimento, obtido pela observação directa de todos os congressistas, acerca da evolução e suas características que a referida indústria da pesca tem sofrido, desde o inicio da sua Instalação até aos dias de hoje, mesmo considerando algumas deficiências técnicas e de organização que a afectam e que, esperamos, venham a ser favoravelmente influenciadas pelas soluções preconizadas e que constituíram as principais moções e votos expressos pelo Congresso.
De entre essas moções, e que teve aprovação unânime na sessão de encerramento do Congresso, desejo salientar a que partiu da iniciativa do ilustre presidente da comissão executiva, nosso colega nesta Camará, comandante Henrique Tenreiro, que visa a dar aos futuros estudos e realizações da indústria da pesca um verdadeiro sentido de actividade nacional, através de uma comissão permanente de trabalhos, em que estão devida e justamente representados os interesses piscatórios da metrópole e de Angola.
Dos trabalhos dessa comissão não vamos esperar, necessariamente, uma uniformidade de pontos de vista aplicáveis à metrópole e a Angola, uma vez que os respectivos condicionamentos do exercício da pesca são diferentes e não haver sequer uma coincidência no objectivos industriais e comerciais a atingir, mas é legitimo que esperemos da sua actividade uma salutar e eficiente actuação colaborante, de parte a parte, de todas as formas útil, principalmente para Angola, nos aspectos impulsionadores da investigação e da técnica o, bem assim, no que respeita a certos sectores de organização financeira e administrativa, sem esquecer a acção social a dispensar aos pescadores, tendo como padrão a obra similar já realizada e em marcha aqui na metrópole.
Representa a actividade piscatória e a respectiva indústria transformadora do pescado em Angola um empreendimento económico da maior grandeza, pelo volume das iniciativas e dos capitais investidos; pela importância do seu contributo no abastecimento e dieta alimentar das populações; pela elevada participação que os seus produtos já atingiram no comércio de exportação da província e que nos últimos anos se cotaram como a segunda fonte de divisas a influenciar a balança de pagamentos, e, finalmente, pela sua enormíssima capacidade de emprego e acção social, que vem exercendo, como uma realidade do maior alcance, sobre o magno problema do povoamento, o maior de todos naquela nossa província.
Desta forma, pelas razões citadas e, ainda, pelo esforço desenvolvido por todos quantos à indústria da pesca têm dedicado as suas iniciativas, a sua coragem e os seus capitais a bem do engrandecimento de Angola, quero deixar aqui uma singela saudação do meu apreço e da minha estima pela obra, já grandiosa, que souberam e puderam levar a efeito e que aos olhos de todos os congressistas foi possível patentear.
À comissão executiva do Congresso, a todos os congressistas de Angola, da metrópole e das restantes províncias do ultramar, principalmente aos congressistas da metrópole, os agradecimentos de Angola inteira pela magnifica colaboração que prestaram aos trabalhos do Congresso, sobretudo no que respeita ao elevado espirito
de compreensão 'e melhor interpretação que souberam pôr nos seus juízos e apreciações sobre o verdadeiro problema da indústria da pesca em Angola.
Ao Sr. Governador-Geral de Angola e ao Ex.mo Ministro do Ultramar o reconhecimento de todos pelo carinho e apoio dispensados à organização e trabalhos do Congresso e a formulação de um voto, para que à indústria da pesca de Angola continuem a dedicar toda a atenção e auxílio que estejam ao seu alcance prestar-lhe, para que as iniciativas não esmoreçam e para que sejam cada vez mais fortes a confiança e a esperança nos destinos daquele magnífico empreendimento que é a indústria da pesca em Angola.
Tudo o mais farão os valorosos industriais, em cujas mãos a incumbência está bem entregue.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Simeão Pinto de Mesquita: - Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa o seguinte
Requerimento
«Nos termos da alínea c) do artigo 11.° e outras disposições do Regimento desta Assembleia, requeiro me sejam fornecidos pelo Ministério da Economia os seguintes elementos atinentes ao problema da siderurgia nacional, com início em 1055. ano em que o mesmo problema começou a ser fundamentalmente considerado pelo Governo:
1.° Pareceres do Conselho Superior da Indústria;
2.° Pareceres da Direcção-Geral de Minas;
3.° Pareceres da Direcção-Geral dos Serviços Industriais;
4.° Eventuais relatórios do respectivo delegado do Governo elaborados no desempenho legal da sua actividade;
5.° Informação sobre se o Governo já tomou ou não posição quanto aos preços de venda do aço nacional e, em caso afirmativo, o texto das correspondentes decisões;
6.° Informação, ainda, sobre se existe qualquer decisão governativa ou projecto concreto quanto à instalação siderúrgica prevista para o Norte do País, além da limitada unidade já instalada no Marão».
O Sr. António Lacerda: - Sr. Presidente: pretendo hoje, com esta simples e rápida intervenção, de acordo cora o meu feitio e também com o que a prática da vida, custosamente, me vai ensinando, chamar a atenção do Governo para factos que afectam grandemente a vida económica de alguns lavradores, proprietários e caseiros do concelho de Braga e documentar concretamente a lamentável falta de coordenação e solicitude de um certo número de serviços do Estado.
Há cerca de uma dezena de anos, vinha-se notando nas terras marginantes do rio Este, a jusante de Braga, e naqueles locais em que as águas do rio são aproveitadas para regar e limar e inundavam os terrenos laterais na altura das cheias, que diminuíam as produções, tanto dos cereais como das forragens. À vegetação luxuriante, maravilhosa, das veigas do Minho, tanto durante a quadra invernosa, em que a terra, ubérrima, está coberta de tapetes de forragem «limada», como durante o Verão, em que o milho é rei e se desentranha em frutos, que os maravilhosos milhos híbridos tanto vieram aumentar, sucede-se um panorama de triste miséria.
Parte desses magníficos campos marginais do rio Este deixou de produzir forragem abundante e fresca para
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(...) alimentação dos gados, uma das mais seguras fontes de receita do agricultor modesto, e deixou de produzir o milho que dantes enchia a arca do lavrador e era a sua moeda e a base do seu sustento e de sua família.
Á água vivificante dessas terras, a água que por toda a parte se procura, que constitui um dos principais problemas de uma agricultura progressiva, a água que desde sempre o rio fornecia, durante o Inverno como durante o Verão, parece que trazia consigo uma maldição.
Nos sítios em que entrava nas cheias o naqueles locais para onde cuidadosamente era levada, com prodígios de engenho e de saber acumulado ao longo de gerações criadas na condução do «sangue da terra», esse sangue ia, em vez de produzir benefícios, levar a destruição e a morte das plantas, miséria e fome aos que a utilizavam.
Os lavradores alarmaram-se e deram os passos que estavam ao seu alcance.
Dirigiram-se ao Grémio da Lavoura o este ao organismo regional da Direcção-Geral dos Serviços Agrícolas e, depois de estudado o assunto, pareceu poder concluir-se que todo o mal era proveniente da poluição das águas pêlos detritos de lavagem de fundições.
Os directores do Grémio da Lavoura e os técnicos daquela Direcção-Geral dirigiram-se às autoridades - governador civil e Guarda Nacional Republicana - no sentido de ser feita uma activa fiscalização para evitar os inconvenientes de tal lavagem, mas a fiscalização instalada mostrou-se ineficaz.
Foi também chamada a intervir no assunto a Direcção-Geral dos Serviços Hidráulicos, organismo que tem a seu cargo a fiscalização dos rios e que tão perfeitamente executa, além de outros, o complexo trabalho dos licenciamentos nos diferentes cursos de água e zela os direitos do Estado. Mas também este serviço se mostrou inoperante.
A Direcção-Geral dos Serviços Florestais e Agrícolas que deve velar pela fauna piscicola dos nossos rios, que completamente desapareceu do troço do rio Este, em questão, não pude actuar devidamente, por falta de meios e de legislação adequada.
Por outro lado, os tribunais, para onde foram mandados alguns homens que tinham sido apanhados a lavar detritos de metais, absolveram os réus, talvez porque os processos não fossem bem instruídos.
Tudo isto se passou, passa e continua.
As terras produziram e não produzem.
E os diferentes serviços do Estado continuam a pensar, ou não, em resolver o problema.
Mas, por outro lado, há um serviço que continua impávido e sereno - as finanças -, a receber as contribuições que pêlos donos das terras são devidas em função do rendimento que delas auferem. Mas, como essas terras pouco ou nada produzem, estará certo que o Estado continue a receber o mesmo? Parece-me que também se pode pôr este problema de consciência.
Aliás não é só ele que interessa. O que é indispensável e urgente é que, para já, se resolva o problema da poluição das águas criminosas do rio Este, depois o do regresso à cultura normal das terras afectadas, e, sempre, que o Estado não receba aquilo que em consciência não lhe cabe e os seus serviços - que o contribuinte paga, e, em muitos casos, paga bem - mostrem mais solicitude e interesse em resolver as justas reclamações e problemas que lhes são postos.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Carlos Coelho: - Sr. Presidente: no interregno que nos trouxe do termo da sessão extraordinária da Assembleia decorrida em Outubro para o inicio dos
trabalhos ordinários desta nossa segunda sessão legislativa, precisamente em meados do passado mês de Novembro, ocorreu em torras do circulo que aqui nos honramos de representar um facto da vida pública nacional de tão marcadas afinidades com tantas das preocupações que por lá vivemos, que desde logo se nos afigurou útil, se não mesmo imperativo dos interesses e fins que nesta Câmara nos cumpre servir, fazer-lhe deste lugar adequada e necessária referencia.
A possibilidade surgida hoje - e outra ainda não tivemos - de dar efectiva realização àquele propósito situa-se, no entanto, já a tal distância do sucesso que nos determina e era nosso intento comentar que hesitámos seriamente em fazê-lo, pensando se o tempo não lhe teria roubado de todo em todo a oportunidade.
Decidimo-nos, afinal, por nos parecer que as duas palavras que desejamos proferir, uma de justiça e outra de esperança, exprimem sentimentos que podem bem desafiar o desgaste do tempo o, resistindo-lhe, não perder, assim, em actualidade.
Sr. Presidente: o Ministro das Corporações e Previdência Social realizou, no intervalo dos nossos trabalhos parlamentares, como já disse, uma visita de alguns dias ao distrito de Castelo Branco.
Mais uma visita ministerial, dir-se-ia: um acontecimento de relevo, é certo, para as regiões visitadas, mas na aparência igual a tantos outros, a que desde há muito nos habituámos.
Seria esse o pensamento dominante.
Ora, tendo podido acompanhar de perto a actividade do Ministro Dr. Veiga de Macedo, nos quatro dias que permaneceu na Beira Baixa, e, de modo especial, na cidade da Covilhã, onde o governante que é hoje iniciou os primeiros passos da- sua vida pública, pode verificar na altura, e posteriormente em múltiplos depoimentos que chegaram ao meu conhecimento, quanto a personalidade do Ministro e os seus processos de actuação impressionaram vivamente os que o ouviram, ou, melhor direi, os que com ele trabalharam, pois foi em clima de autêntico trabalho, sério e exaustivo, que se gastaram os dias da sua jornada por terras beiroas.
Promovendo reuniões, em que foram abordados alguns dos mais candentes aspectos da vida portuguesa, nomeadamente os que se relacionam com o inundo do trabalho, o Ministro impressionou pela coragem, pelo desassombro, pela verdade das afirmações, e deu a todos uma lição de conhecimento profundo dos problemas que correm pelo seu Ministério.
Aceitou o diálogo, estimulou a discussão, livre, aberta, sem peias de qualquer espécie, e aproveitou-se dela para, com entusiasmo, com inteligência e saber, ensinar, corrigir, esclarecer: dar-nos as razoes das coisas e, com argumentos palpáveis, mostrar as possibilidades e limites no domínio das realizações sociais. Em muitos espíritos, estamos certos, se terá feito pela primeira vez alguma luz, na ignorância total em que viviam dos princípios e objectivos do corporativismo.
Sem premeditações, talvez quase sem do facto só ter apercebido, o Ministro produziu utilíssima obra do formação e divulgação social e corporativa.
Para além das soluções encontradas para algumas questões em aberto e do rasto de esperança que deixou para o remédio de tantas outras, aquele não terá sido o menor mérito da visita do Dr. Veiga de Macedo à Beira Baixa. Precisamente num período em que Salazar apela para um trabalho do «esclarecimento constante e actual dos problemas o das suas soluções» e nos incita a uma tarefa «de integração do espírito público no pensamento que conduz os governantes e na obra que servo a Nação».
Podem discutir-se algumas normas orientadoras do Ministério das Corporações, pode discordar-se de algum
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(...)rumo já trilhado ou de outros que se anunciam para futuros empreendimentos, mas, a par disso, tem de reconhecer-se no homem que o dirige uma preocupação constante de promover o equilíbrio e a justiça social, o desejo de tornar harmónicas as palavras com as obras e, sobretudo, uma impressionante convicção, uma fé inabalável na doutrina que proclama e no regime que serve.
O Dr. Veiga de Macedo assinalou a sua passagem pela Covilhã com o anúncio de medidas, imediatas umas, de futura realização outras, que hão-de possibilitar indiscutivelmente a valorização social dos trabalhadores da indústria de lanifícios. Aumento do limite mínimo dos subsídios por reforma, na velhice e invalidez; aumento dos subsídios por morte; intensificação das acções médico-sociais e materno-infantil, por elevação das percentagens de comparticipação para os respectivos fundos: concessão do subsídio por doença em novos moldes e seu alargamento nas enfermidades de curso crónico, como a tuberculose; regularização das condições do trabalho nocturno feminino; um largo plano de construção de habitações económicas, eis, entre outras, as realidades e promessas com que passamos a contar.
Subsiste, no entanto, na Covilhã e outros núcleos de afins actividades industriais um motivo de inquietação a carecer de eliminação pronta. Ao apontá-lo, ou melhor, ao reforçar perante os responsáveis que o hão-de enfrentar a importância de que se reveste no momento actual, julgamos contribuir para a manutenção de uma paz social que desejamos não ver perturbada.
Quero referir-me ao problema dos salários do pessoal da indústria de lanifícios. Não é segredo que o operário da indústria têxtil aufere hoje remunerações manifestamente insuficientes para a satisfação das suas necessidades elementares.
Situação lesiva, sobretudo para aqueles que directamente a suportam, mas com reflexos ainda para toda a restante massa populacional da Covilhã, que, amparada a uma actividade industrial unitária, é totalmente solidária com as oscilações a que essa mesma indústria está sujeita.
E o facto é tanto mais chocante quando nos lembramos que um sector laborativo com remunerações tradicionalmente altas, que sobressaia no conjunto da restante mão-de-obra, se encontra agora numa situação de manifesta inversão de posições.
Sabemos as dificuldades que o problema comporta, o não seriamos nós a agravá-lo, pelas perturbações a que daria lugar, equacionando-o em termos de solução inexequível. Donde nau o há é impossível tirá-lo!
Estando em jogo o equilíbrio dos factores sociais e económicos respeitantes à indústria de lanifícios, não quebraríamos ainda hoje o nosso silêncio sobre um facto que há muito nos preocupa se não soubéssemos que se vislumbram já as condições resolutivas do mesmo.
Com efeito, o Subsecretário de Estado da Indústria chamou o assunto a si. Não poderia cair em melhores mãos.
Aquele ilustre governante é quem melhor conhece, neste país, a situação da indústria de lanifícios, e vai por certo encontrar o justo ponto conciliatório, na mesma legitimidade de interesses, da entidade patronal e do braço trabalhador.
Confiamos no seu esclarecido critério e humana visão dos problemas, de par com a sua conhecida tenacidade, para que a prevista revisão do contrato colectivo do trabalho, a acordar entre as federações de grémios e sindicatos, da indústria de lanifícios, se faça com o devido ajustamento dos salários do pessoal e a necessária e possível brevidade.
É, sobretudo, no sentido de uma acção rápida que visa o> apelo que dirigimos a SS. Ex.ªs o Ministro das Corporações e Subsecretário de Estado da Indústria, na parte que a cada um compete decidir.
Melhor do que nós, sabem SS. Ex.ª que as medidas valem pela oportunidade com que são tomadas.
O acto da solidariedade e justiça social que se reclama implica pesados encargos para a entidade patronal. Queremos invocá-lo, para que não se suponha que do problema enunciado se conhece ou se aponta apenas um dos dados.
Ao lado das dificuldades do trabalhador existem, compreensivelmente, muitas preocupações do empresário. Preocupações em que há-de também atentar-se, para capaz satisfação daquelas, pois o comum dos mortais conhece não poder haver progresso social onde não exista prosperidade económica.
Guardemos o seu exame para outra oportunidade.
Por hoje, basta-nos insistir na palavra de esperança com que começámos, para que, de futuro, o lar dos trabalhadores da indústria de lanifícios ganhe em pão, em alegria, em tranquilidade.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Vai passar-se à
Ordem do dia
O Sr. Presidente: - Continua em discussão na generalidade a proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1959.
Tem a palavra o Sr. Deputado Águedo de Oliveira.
O Sr. Águedo de Oliveira: - Sr. Presidente: tornar-se-ia bastante fastidioso, estirando demasiadamente a minha intervenção no debite, discutir os métodos constitucionais de colaboração da Assembleia, fazer o ponto sobre o carácter mais ou menos expressivo da Lei de Meios, examinar as orientações tomadas pêlos pareceres da Câmara Corporativa e ensaiar uma vista de conjunto sobre o mandato representativo neste capítulo para referir-me ainda aos problemas particulares dos vencimentos e do agravamento do imposto complementar.
Matéria vastíssima, quer do ponto de vista da teoria e da prática constitucional, quer do ponto de vista da técnica jurídico-financeira, já aflorada no trabalho das comissões e valorizada no debate, espero que V. Ex.ª, Sr. Presidente, autorize que eu preste alguns esclarecimentos que me parecem úteis sobre o primordial tema político da reforma fiscal, preocupação à cabeça dos trabalhos parlamentares actuais.
Perde-se na bruma dos tempos a convicção que adquiri, pela experiência da vida pública e do direito fiscal, de que precisávamos de aperfeiçoar o nosso sistema, pondo-o, de acordo com as concepções de justiça e adaptando os seus processos e técnicas u evolução económico-social do nosso tempo. Era mesmo duvidoso que possuíssemos uma sistematização.
Era isto uma imposição da própria justiça - entre contribuintes, grupos, concelhos, regiões, actividades, havia diferenças gritantes, agravos clamorosos, benefícios de escândalo, e o conjunto precisava de ser harmonizado pelo principio da capacidade de pagar, da utilidade social máxima no largo prazo e da igualdade distributiva dos sacrifícios.
Era uma série de imperativos dos tempos.
Se as guerras, as inflações e reflações, a construção social c corporativa, o florescimento das sociedades, criavam novos planos de vida, fragmentavam aquela capa-
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(...) cidade, recorriam n receitas compulsivas ou apresentavam facetas novas DE capacidade que o sistema não acompanhava, também se impunha melhorar reformando, para além da própria justiça devida ao? contribuintes.
Era ainda uma exigência técnica.
A riqueza crescia, esparzia-se, derramava-se, subtilizava-se pela instrumentação dos títulos, da bolsa, da banca c dos seguros, o nosso sistema parecia retardado e arcaico para ir buscar o que lhe pertencia e colhê-lo no lugar mais seguro, que poderia ser recôndito ou dissimulado.
Era ainda uma exigência do próprio sistema.
Os impostos indirectos mostravam-se regressivos em relação com a capacidade e os sacrifícios tributários, exageravam a sua incidência sobre as camadas numerosas da população, dificultavam os consumos, aos quais faziam pagar gravosamente ao relacioná-los com o s, orçamentos domésticos, e careciam por isso de ser compensados, ou corrigidos pêlos impostos que se dirigiam imediatamente ao capital, ao enriquecimento e aos próprios réditos.
Por outro lado, as manobras e direcções de preços, o custo da própria expansão, as vagas altas e baixas do ciclo; as apreensões e ansiedades, contraindo ou demorando, tornavam mais exigente e instante o trabalho a empreender pelo legislador.
Simplesmente, as reformas fiscais desde Caillaux a Gladstone, de Von Miquel a Lloyd George, de Barros Gomes e Mariano de Carvalho a Afonso Costa, foram um estremecimento, um tremedal de queixas, um cataclismo político que desencadeava nos partidos a; mais funestas e ardentes paixões e tornava precária e acidentada a vida dos governos.
Somente as circunstâncias conhecidas, o mandato incondicional conferido, a impetuosidade das pressões construtivas, permitiram que a reforma de Abril de 1929 se fizesse de pleno acordo entre as exigências do estadista e o ânimo geral da Nação, sem ruído nem discussões apaixonadas.
Avancei, mesmo, que a reforma havia de vir, tinha de vir, não como uma reivindicação de teóricos, uma reclamação de grupos, um capítulo de programações políticas, mas como uma questão posta à própria consciência da Nação, a qual sentia, verificava e reconhecia a cada passo um somatório de injustiças e desperequações, onde devia reinar a adaptação das cargas, a distribuição equitativa do seu peso e a previsão, quase certeza, de efeitos finais úteis.
Portanto, o empreendimento de uma reforma fiscal, o meter-lhe os ombros, o rolar das suas pedras, o erguer do edifício, afigurava-se primeiramente uma questão de princípios; uma delicadeza de manobra política, dada a posição tradicional dos parlamenteis; uma sensatez que não despertasse as hidras policéfalas, adormecidas, das paixões sociais e políticas; uma construção de minúcia jurídico-financeira para especialistas e jurisconsultos, e uma técnica apurada, solícita às lições sociais do nosso tempo, sem deixar de atender aos rogos, queixas, reclamações, pretensões, daqueles que vão pagar e sempre foram ouvidos e achados.
Em 1950, pertencendo a um Governo que foi dos mais felizes desta nossa terra pêlos resultados, mereceu geral respeito e soube mostrar isenção de complicações e larga base nas escolhas o critérios, tive a ideia, que mereceu aprovação, de criar duas comissões encarregadas do estudo da reforma fiscal, da reforma necessária, precisa, exigente e tantas vezes reclamada.
Mas para melhorar estas observações façamos aqui ligeiro apontamento prévio sobre a reforma tributária de Abril de 1929
Um dos grandes esteios da reconstituirão financeira e da renovação político-social de 1928-1931 o maior esteio, como afirma o Doutor Mota veiga no seu esplêndido parecer - foi a reforma da nossa tributação directa, levada a cabo em Abril de 1929.
Pelo dedo se conheceu logo o gigante.
Ela se conserva e assinala ainda como uma obra-prima de clareza o precisão jurídico-financeira e um monumento de comodidade e moderarão, como é próprio da imensa sensatez e penetração do estadista que é o Sr. Presidente do Conselho.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Produção do receitas pouco sensibilizada, justiça e equidade imediatas, rigor técnico-legal, a reforma de Abril reduziu os contactos incomodativos ao mínimo e assegurou, sem ruído nem exagerações, quantiosos resultados, facilmente recolhidos.
Baseou-se no relatório de meses apresentado por irmã comissão de trabalhos a que presidiu o Sr. Presidente do Concelho e onde se encontram nomes respeitados: Silvino da Câmara e Belchior de Figueiredo, e depois Ministro Nunes Mexia, pai do nosso colega. Carvalho da Silva, etc., pronto e publicado em 18 de Junho de 1927.
A julgar por estes trabalhos, relatórios e resultados, não passaria pela cabeça de ninguém que em tal empreendimento se queimassem agora anos e anos.
Alguns escritores da escola de Estocolmo e tratadistas americanos são levados a reavivar como qualidade mestra deste sistema, o qual se baseava em presunções e indicadores externos da riqueza e numa concepção estável e estabilizada, do rendimento, respeitadora da liberdade de iniciativa, do segredo dos negócios e descontando a repetição corrente dos réditos, como qualidade mestra, a sua aparente neutralidade perante a marcha do factor governativo e social.
É preciso, porém, não esquecer que nas medidas financeiras e fiscais então expedidas havia patentes preocupações de ordem política, económica c social, manifesta preferências de técnicas e processos fiscais; além de um conjunto delicadíssimo de antecipações de efeitos u resultados, pautado pelas naturais concepções e previsões dessa época.
Portanto, o sistema historicamente existente, notavelmente aperfeiçoado, baseado no princípio das faculdades, vistas pelo prisma, dos rendimentos presumidos u do rendimento consumido, intervinha em vários capítulos da vida, mas fazia-o directa e comodamente, sem deixar de apresentar graves preocupações que não podiam ser de uma repartição de carácter socialista.
Passados vinte anos, onde estava a reforma magnífica e sensata, a melhoria jurídica e técnica empreendida, a defesa do Tesouro e a capacidade tributária?
As guerras, as crises mundiais, aã altas de preços, as perturbações catastróficas de mercado, alteravam a consistência e qualificação dos rendimentos, através das inflações, do dirigismo, das reflações e formas novas de colaboração social.
O sistema, não podendo acompanhar as velhas modalidades em transformação e as novas que não podia prever, sofria de actualizações e correcções que muitas vozes não passavam de simples adições, para não dizer de verdadeiros remendos.
Distanciado da tendência justa mas dificílima do imposto possível, corrigido pela agregação da complementaridade, no fundo, permanecia alheio às novas modalidades de tributação subjectiva e ao conhecimento realista das dificuldades em que SP debatia ou da prosperidade em que nadava o contribuinte.
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Assim, o imposto tão indiferente parecia aos desaires e prejuízos como alheio ao sobretudo, com excepção dos ganhos excepcionais de guerra. Nas más horas como nas boas o imposto ignorava a marcha geral dos réditos.
Crises e prejuízos, esterilidades e más colheitas, abundâncias inesperadas e grandes escassezes, o tributo as deixava no rol do esquecimento como se foram realidades estranhas e ele tivesse olhos vendados para o que todos viam.
Éramos assim um oásis no mundo ocidental, aferrados à comodidade e liberdade do contribuinte e professando estranhas delicadezas por parte do Estado e dos seus agentes, mas cujas vantagens não vale a pena encarecer.
Chocados pela sua consciência alta das coisas, que em certo prisma era padrão de injustiça, os especialistas, os governantes, os burocratas e os técnicos, arrastados pela tecnicidade, talvez pela deformação profissional, mas decerto pela vontade de acertar e servir, acantonavam-se na regulamentação e, nesta estranha farmacopeia, procuravam encontrar remédios para o que não estava nem parecia bem.
Viveu-se então no regime de circulares extravagantes, de lei e contralei, e foi preciso mesmo mandar ceifar esta nova messe de intrincadas ordenações.
Apontavam-se então pelo dedo os cultores de direito; como tantas vezes acontece, a casuística, o praxismo, a sofisticação legalista, valiam mais que a lei e os contribuintes debatiam-se na incerteza, nas discussões geradoras de inéditos atritos e nunca despidos de ameaça.
Era perfeitamente o estado antagónico aos claros e insofismáveis objectivos do legislador de 1929.
Havia mais - a sociedade anónima e por quotas não digo que tomasse couta do País, mas proliferara de tal maneira que o seu predomínio parecia inabalável.
Saía um homem dos confins das províncias do Sul ou das grandes Beiras com um cento ou dois de contos, acampava por aqui, pela Baixa pombalina, e, passados anos, girava com milhares e milhões, ditando também as suas leis.
Reservas ocultas, partes de fundador, créditos sonegados em sociedade, de dezenas de milhares, decisões abusivas, sociedades de fornecimentos, vales de antecipações, causaram gravíssimos prejuízos ao Tesouro por omissão ou fraude, tornaram iníqua a distribuição dos impostos, desfavorecendo os sérios, premiando os espertos, que sorriram do rigor redobrado das leis fiscais, não direi generosas, mas construídas sob o signo da reserva e da moderação, sob o signo de que o contribuinte seria poupado a rigores e intromissões na sua casa e nos seus negócios.
Assim foram criadas, de harmonia com a Lei de Meios para 1951, aqui estudada, explicada e servida com dados imparciais, duas comissões de estudo e reforma - a Comissão de Estudo e Aperfeiçoamento do Direito Fiscal e a Comissão de Técnica Fiscal.
A primeira - a de Direito Fiscal - tinha por missão compilar os textos, simplificar as regras e disposições, adoptá-las às circunstâncias e inovar o bastante para sistematizar de novo.
Composta de professores, especialistas, jurisconsultos e altos funcionários, a sua missão ostentava-se de elevado nível e de desmesurado alcance.
Teria de estabelecer, para jogar com ela, uma concepção rasgada e portuguesa capaz de abarcar os movimentos do rendimento e que atingisse também o capital e o enriquecimento.
Teria de adaptar a pressão fiscal à composição e distribuição do rendimento nacional, tarefa tanto mais difícil quanto é certo dispormos de estatísticas e conhecimentos fiscais incompletos.
Haveria que simplificar e recorrer a modalidades e processos de maior singeleza, sem deixarem de ser vigorosos.
Proporia medidas para se corrigirem os erros e desvios e alcançar-se uma distribuição equitativa.
Coordenaria a luta contra as distorções, a fraude, a evasão, que são o romance do fisco e onde não faltam os espertos e os malévolos cultores aprimorados da malícia legal.
A segunda - a de Técnica Fiscal - publicaria metodicamente os textos únicos que codificariam rapidamente a matéria, proporia fórmulas simples e eficientes de liquidação e cobrança e organizaria rapidamente o conhecimento único das contribuições directas para que o contribuinte pagasse no momento mais cómodo, o Tesouro não fosse abastecido nas pletoras de certas épocas e os papeluchos fossem substituídos por um cartão digno que contivesse ainda para consulta o essencial da fiscalização.
Empreendia-se para logo a mecanização dos serviços das direcções com o petrechal aperfeiçoado e por meio de experiências adequadas.
Presto aqui a minha homenagem aos trabalhos, enfados, buscas e estudos das comissões, onde ascendiam os nomes de dois notáveis especialistas - Teixeira Ribeiro e Fernando Seabra -, ambos professores universitários de raro quilate; especialistas, escritores do ramo como o Prof. Fortuna, o Dr. Adolfo Bravo e Oliveira Santos; directores de finanças de alta craveira profissional como Fernando Pena, Pinho, Bastos e Silva, Cardeiro e outros.
Como sempre sucede, os comissionados, já presos pela exclusividade das suas profissões, tinham longos deveres a cumprir.
Encontravam-se num terreno árduo e desprovidos de trabalhos, a não ser os elementos coleccionados pela Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, Inspecção-Geral de Finanças e Instituto Geográfico e Cadastral.
Ao ensaiar os primeiros passos começou logo a ver-se o labirinto de Creta.
Também, contrariamente ao que aconteceu com certas comissões do II Plano de Fomento, de revisão ao Código Civil e de estudos económicos, o Ministério, nas suas malhas tradicionais tão avaras, porque eram mais que severas, cortou sem querer as facilidades apropriadas a tão magna e desconcertante tarefa.
Puderam fazer-se ainda duas ou três missões ao estrangeiro e a Inspecção-Geral de Finanças apresentou trabalho apreciável quanto ao conhecimento único.
Não ficaram por aqui os obstáculos.
Porquanto a actividade das comissões foi perturbada profundamente e até alterada pela erupção, durante o período de estudos e de trabalhos, de um novo corpo de doutrina, a escola do crescimento económico, a qual, pelas suas predominantes exigências em escala iususpeitada, se apossou dos intuitos reformadores, substituindo-lhes novas preocupações e princípios e alçando em vez das práticas correntes acreditadas outras técnicas conhecidas mas que pareciam relegadas de vez.
Foi dado ver que à primazia jurídica e distributiva do imposto directo se substituíram, sob a bandeira o rendimento consumido, os impostos indirectos sobre as transacções.
O empréstimo foi considerado um meio tão capacitado como o imposto e levado para limites inverosímeis, admitido até como uma corrente sem fim.
A estabilidade financeira interna, dada de barato como velharia ou como aspereza desnecessária, cedeu o seu lugar aos propugnadores do déficit sistemático ou aos técnicos do desequilíbrio funcional.
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O novo código fiscal era obter ràpidamente o desentorpecimento económico dos países, industrializá-los à pressa, realizar por todos os meios o sobreemprego e a exploração descomedida dos recursos de toda a ordem.
Para tal fim não se podia olhar a meios e as preocupações de justiça, equiparações, igualdade de sacrifícios, pareceram trovas e música de outras idades em face da fraqueza, do atraso, do subdesenvolvimento, da penúria perante os países poderosos e fartos.
Numa quadra em que o dirigismo se via outra vez condenado e batido, não faltaram entusiastas que pretendessem regular directamente a criação e a circulação da moeda e os preços e sobre estes assentar uma inflação querida e manobrável.
Estes pontos devemos examiná-los mais de perto, abonando-os com a ordem respectiva dos factos e com o apuro doutrinário onde foi possível chegar.
Somente em grandes tragos e rápido bosquejo posso dizer a, V. Exa., Sr. Presidente, como cronologicamente esses capítulos de pensamento, doutrina e técnicas, da economia geral, com funda repercussão na actividade do Estado e nas suas finanças, evoluíram de há alguns anos a esta parte.
O raccourci não está feito responsavelmente e eu não posso nem devo passar além de um rápido o fugaz apontamento para a Câmara fazer o favor de considerar.
A ideia de cálculo a estimativa global das noções e relações económicas, subordinadas as preocupações de investir e fornecer trabalho a todos, data, como se sabe, de 1937, mas só bastante mais tarde os seus princípios e construções passaram dos meios restritos da literatura da especialidade à difusão geral e às políticas, pelo afã dos governantes.
Porém, o primeiro capítulo da política de fomento em moldes avançados começa verdadeiramente com a ideia de industrialização deliberada, como política apropriada a obter de modo rápido altos rendimentos, levantamento do poder de compra geral e em consequência, maiores alturas para os padrões de viver da comunidade.
Tal política remonta a 1944, mas nessa altura joga-se e constrói-se como progresso técnico, equilíbrio das forças económicas, nas crises de momento, tudo isto dentro do quadro dominante de bem-estar geral, política social e corporativa.
A maximalização do crescimento económico como princípio avassalador que a tantos, outros posterga, destinada a vencer o atraso técnico e a estagnação e capaz de orientar os planos de fomento, só verdadeiramente começa em 1952 com Nurske e outros.
Os trabalhos do Instituto Internacional de Finanças relativos aos aspectos financeiros e fiscais das áreas subdesenvolvidas obtém nessa altura, em 1952, a publicidade precisa, mas não se caracterizam ainda pelo isolamento de orientações e regras por forma insofismada ou indiscutível.
Havia esboços da O. N. U. do ano anterior, mas as suas recomendações padeciam de imprecisão ou confinavam-se numa generalidade tão vaga que pareceria sem qualquer significação para a técnica legislativa.
Dobb e outros, hipnotizados pelas vantagens obtidas na planificação integral na Soviética, não obtinham audiência além dos seus alunos.
Pregavam muito alto, mas sem aula pública ou auditório responsável.
O International Development Advisory Board é de Março de 1951, de Washington, mas campeando na plataforma dos auxílios internacionais e na dos rasgados auxílios americanos.
É em 1955, porém, que a doutrina dá os seus passos definitivos e apresenta renomes respeitáveis - Lewis, Lundberg, Myrdal -, subscrevendo construções económicas capazes de ideação legislativa indubitável.
O estudo da O. E. C. E., aliás difundido com largueza, é de 1957 sobre a essência de uma tal problemática.
Portanto, a existência de uma tendência doutrinária indiscutida para mobilizar os recursos naturais, conduzir a poupança, atrair os meios estranhos, planejar a utilização das forças, levantar os níveis, lutar nos mercados e subir os padrões só verdadeiramente se consagra tarde.
Nos primeiros tempos as recomendações são genérica tintura que tem em vista alargar o campo das instituições internacionais capazes de auxílio e financiamento e formular esquemas onde os técnicos e banqueiros internacionais tenham o seu lugar assegurado.
O influxo das doutrinas em vigor não obteve sempre a medida de assimilação e o doseamento que eram necessários.
Falou-se em industrialização, como se Ericeira, Pombal, Barjona não tivessem existido, como se um século de economia empresarial a de inovações úteis, de protecção pautal, de crédito oficial e de toda a gama de isenções e favores tributários fossem medidas de outro planeta.
Mesmo em pleno crescimento, com abundantes provas de que o dia de amanhã é superior ao dia de ontem, continuou raciocinando-se como se o País se mantivesse em porfiada e irremovível estagnação.
E afirmou-se que a política financeira não seria isenta de outras preocupações senão as de obter receita e fazer mínima despesa quando da representar anteriormente o desenvolvimento de políticas de arquitectura complexiva do ponto de vista jurídico, político-social e económico, para além das preocupações técnicas e da visão antecipada das consequências e efeitos.
Estava possuído da ideia de que haveria a máxima conveniência em que os estudos, propostas e antecipações de texto obtivessem a publicidade precisa.
Assim fui que os anteprojectos de texto único do imposto de sisa e sobre as sucessões, de imposto profissional e de aplicação de capitais foram, como documentos oficiais, enviados a todas as entidades e especialistas, para sobre elas se produzirem as observações e reclamações indispensáveis em assunto de tanta monta e que diziam respeito à capacidade de disposição de tantos.
É possível que as respostas não fossem muitas.
Levaram-se a cabo viagens ao estrangeiro, para mecanização das liquidações de colecta.
Vários trabalhos foram organizados.
Entretanto, como vamos ver, a política social de bem-estar e o pleno emprego começaram a ganhar expressão diversa dentro de um programa cerrado de intensificação rápida do ritmo da economia nacional, melhoria da sua estrutura e intensificação de circuitos que alteravam a precedência e a altura e os métodos tradicionais de tributação.
Temos de desculpar a morosidade dos trabalhos, de que a política pretendeu endereçar-me as responsabilidades, e não desprezar as alterações na ordem dos factos e da maneira de os conceber.
Portanto, enquanto os trabalhos das duas comissões de estudo e reforma demoram e se arrastam, irrompem impetuosamente outras concepções fiscais que não eram as primitivas de codificação em texto único, de realização de justiça tributária, de igualização dos sacrifícios e cargas tributárias e da efectividade de uma política de bem-estar e corporativa, em escala apreciável.
Eram agora outras - as de pôr a fiscalidade ao serviço do desenvolvimento económico de um país, como Portugal, que não lograra ainda a plenitude do domínio
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da técnica, não industrializara o mais-possível e não mecanizara a sua agricultura o bastante.
Por outro lado, os novos programas assentavam deliberadamente na coexistência, de um sector público e de um sector empresário e até num terreno intermédio de compromisso, o que tornava complicadas as posições de princípio e inflectia fatalmente sobre o carácter das técnicas a escolher, não obstante ao Estado pertencesse a primeira e a última palavra em matéria de planejamento.
Passo por cima das divergências de escola, dos choques de opinião, das variáveis de aliado e construção, para chegar a algumas proposições definidas ou das recomendações que caracterizam a nova política - a fiscalidade ao serviço do crescimento acelerado da economia nacional.
E reporto-me apenas às suas essenciais medidas, na ordem em que não sofrem grandes impugnação.
E são elas:
Favorecer a propensão ao aforro e a colocação em títulos da dívida pública como fonte perene e imediata de financiamento.
Desanimar ou levantar reais obstáculos às tarefas e empreendimentos considerados improdutivos.
Moderar os consumos supérfluos ou em demasia sumptuários.
Canalizar os meios disponíveis pura o apetrechamento básico, o reequipamento o investimento programado, de harmonia, pois, com uma ordem de prioridade antecipada.
Combater as operações especulativas e socialmente prejudiciais.
Atrair a colocação duradoura, dos capitais estrangeiros no sector a vivificar.
Facilitar a vida das empresas ligadas ao desenvolvimento harmónico.
Favorecer a constituição de reservas autênticas, o seu desdobramento em novos empreendimentos, mas sem permitir o alargamento da evasão fiscal e das fraudes.
Resistir às pressões inflacionárias.
Resumidamente, pois - promover a formação de capital e guiá-lo com segurança e segundo a experiência do próprio Estado; alterar a distribuição dos rendimentos disponíveis; promover a sua afectação aos empreendimentos relacionados com o progresso técnico, económico e social.
Portanto - problemas de escolha dos tipos de imposto, da reorganização do sistema, de estabelecimento de isenções, abatimentos na base e de complexos favores fiscais, de revisão de efeitos e taxas.
Para a herança do século, para as ideias da anterior geração, para as suas aspirações de equiponderação jurídica e social, não deixava de fazer espécie, de levantar gravíssimas dúvidas, de criar fundas hesitações, e preocupação de premiar a capitalização das empresas e sociedades poderosas, de pôr ao serviço da colectividade o seu progresso tentacular, de fazer dos fortes mais fortes ainda, o que deixaria, os fracos onde estavam se estes não melhorassem com a rápida acentuação do progresso geral; a de encontrar uma solução que não parecia programática, mas que poderia chamar-se a americanizacão da vida.
Por outro lado, parecia pedir muito à ordem natural e à política ao acreditar-se numa economia sempre expansiva, incapaz de retrocessos, de movimentos de marcha e contramarcha cíclica, de recessões e quedas, eliminando da vida humana a dureza dos sacrifícios e o inesperado das tarefas criadoras - eliminando da vida humana as predeterminações do Criador, que repartiu tão diferentemente os bens e as tarefas e a sua utilizarão, para deixar que o poder construtivo do homem as pudesse vencer e formar uma escala de aptidões novas e harmonia com as realidades duras que o rodeavam.
Por motivos óbvios, estou a discutir políticas e não quero discutir textos.
Em 1957. no II Congresso dos Economistas, realizado nesta cidade, foram expostas em todo o caso substancialmente diferentes ideias e lácticas, com a maior autoridade na especialidade científica.
Conheço sofrivelmente o que escreveram os professores Meier e Baldwin sobre o agravamento do imposto sucessório ao serviço do desenvolvimento.
Mas cita-se, por exemplo, G. Adler em contrário, que afirma ser mais recomendável um imposto proporcional, num país menos industrializado, do que a tributação progressiva da fortuna.
Esta última nem afastaria investimentos menos desejáveis, nem suspenderia certos consumos anti-sociais.
Pois bem: ao ventilar-se o problema da «industrialização e da política fiscal», foram preconizadas naquele Congresso, repito, com a maior autoridade, algumas ideias legislativas com as quais não posso pôr-me de acordo.
Que a progressividade, podia ser acentuada até 30 por cento do património recebido pelos filhos.
As mais-valias prediais, apesar de não consideradas como instrumento precioso do desenvolvimento que são, foram tidas como forma banal de enriquecimento e também não podendo ser poupadas.
A sisa, contràriamente, dada a sua fácil repercussão sobre o vendedor e as possibilidades de amortização, para se conseguir uma fácil mobilização seria favorecida.
Portanto, sem prejuízo de isenções básicas - agravamento do imposto sucessório pago pelos descendentes e reduções de sisa.
Que pensar desta orientação na medida em que o sector rural pode pagar para o desenvolvimento dos centros fabris?
Que pensar antes de saber que novos encargos e agravamentos trazem o Código da Contribuição Predial e o Código da Contribuição Industrial?
Pergunto à Câmara:
É legítimo em face da política nacionalista de protecção e defesa familiar, da perdurabilidade dos lares, da complementaridade da herança à pessoa do de cujus, que as heranças de pais para filho ou para outros descendentes de propriedade agrícola paguem por alguma, forma os encargos da aceleração industrial, muito embora se alarguem as isenções e os abatimentos basilares de taxa?
É legítimo que nos destroços das heranças se constituam pela protecção pautal garantias de preço, financiamentos, auxílios fiscais e isenções, protecções de toda a ordem a favor de novas potências industriais?
Devemos adoptar os métodos dos trabalhistas britânicos de conscrição das heranças, mas desprovidos dr uma tributação estadual de mais-valias e do enriquecimento e sem as nacionalizações que a completam?
E podemos achar bem que, depois de uma tributação progressiva de sisas, destinada a ilaquear o avanço do poder económico para as herdades e quintas e o afundamento da estabilidade rural, se favoreçam as condições fiscais dessas compras?
Compreendo que se tenha, em vista obter meios mais pronunciados, que se volte aos argumentos de Mouzinha da Silveira contra os bens de mão morta; mas que necessidade, que vantagem, que resultados poderiam esperar-se de uma política muito acentuada de tributação sucessória escudada em novas matrizes, novos aumentos e novas sobrecargas prediais?
Deixo estas perguntas à consciência dos que me escutam; pode ser que as propostas do II Congresso de
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Economistas tenham um interesse restrito Na ordem dos valores e que nem os beneficiários de heranças padeçam, nem os compradores de torras obtenham vantagem apreciável.
Pode ser que o Código da Contribuição Predial venha expedido na maré de benevolência.
Mas os princípios, em que todos falam, são os princípios... e também apresentam as suas exigências de conformidade.
Nem sempre o que é teoricamente certo, nem sempre o que parece cientificamente inabalável, pode ser acreditado como o mais justo ao relacionarem-se os campos com os centros fabris.
O problema não está esclarecido e tem de esperar-se.
No bosquejo rápido das tendências reformadoras do nosso tempo as atenções voltavam-se para dois pontos cardeais que abriam os caminhos do futuro:
Reforma fiscal ou código de investimento?
Até que ponto a progressividade tolera a formação do capital?
Sobre estes dois temas inquietantes produziram-se, em tempo oportuno, declarações políticas responsáveis, de que devemos tomar a devida nota.
Acentuarei que à Câmara, à sua função representativa, à construção da vontade legislativa, à sua ordem de autorizações e delegacias, à sua suprema fiscalização política, interessam as declarações que contenham autoridade e expressão política, porque essas podem concorrer para definir a sua posição constitucional e ajudar a construir e definir a vontade legislativa.
Nesta ordem de ideias, algumas vezes o Sr. Presidente do Conselho considerou que a progressividade excessiva podia ser de molde a prejudicar a formação de capitais em país como o nosso, que deles precisa com intensidade antes de outros instrumentos de melhoria económica.
Esta orientação correspondia à do professor Harris, que, na já citada reunião de 1951, combatera a acentuada progressividade para financiar o desenvolvimento das áreas a industrializar, porque fatalmente ele impediria a formação do capital.
O Sr. Prof. Marcelo Caetano, na inauguração do Centro de Estudos Político-Sociais, entendia, entre outros pontos versados, que ela não devia tolher ou dificultar a expansão no arranque, tornando-se necessário encorajar a formação de capitais o não fornecer motivos de apreensão.
Em 29 de Julho de 1958 o mesmo ilustre Ministro assegurava prepararem-se leis que diziam respeito à incentivação dos investimentos privados e à mobilização mais perfeita dos recursos financeiros.
Voltemos aos factos:
Quando dei posse às comissões, acentuei também essa posição, que era necessário não sobrecarregar para que a progressão não estancasse a criação de reservas de disponibilidades, tão salutares ao progresso económico e às imensas aplicações de que o País carecia.
Num trabalho sobre recursos, estrutura e métodos da O. E. C. E., publicado em Fevereiro de 1957, estudo crítico e balanço de possibilidades financeiras, confrontado na sua elaboração com trabalhos e estudos de origem americana, servido com documentação abundante, destinado a orientar governantes, financeiros e capitalistas, procuraram-se os meios próprios de resolver o problema da industrialização dentro do enquadramento do mundo livre.
Tinha-se em vista encontrar capitais e facilitar o investimento e proporcionar aos países menos avançados as vantagens inquestionáveis da industrialização.
Reconheceu-se que a técnica financeira deve variar institucionalmente de país para país.
Esses recursos ir-se-iam buscar principalmente ao mercado do crédito - entidades, bancos, bolsas de valores, instituições que dispunham de capitais, tais como caixas económicas, sociedades financeiras e companhias de seguros, organismos privados de crédito.
Como estas fontes não alcançassem ainda os forneci mantos na altura precisa, propunha-se contemporaneamente o recurso às sociedades financeiras e imobiliárias e a várias modalidades de empréstimos levantados no estrangeiro.
Uma última parte do trabalho dirigia-se ao autofinanciamento na acepção de formação de reservas e acumulação de lucros das sociedades e empresas, que tinham em vista reinvestimentos e criações de novas instalações e equipamento.
Depois do tão celebrado orçamento de capital e do seu fundo financeiro de equiparação orçamental, a Suécia estabelecera medidas tendentes a favorecer esse autofinanciamento e levar a cabo investimentos em escala desusada.
A lei fiscal consentia em desagravamentos das amortizações e até para avaliação de lotes de acções e carteiras, assim como de provisões financeiras sob forma de conta especial.
Mas os fundos acumulados tinham limites e haviam de ser escoados ao fim de certo período.
Não posso deixar de chamar a atenção da Câmara teria de suspender a sua acção e esconder as suas implícitas recomendações, que correspondem à orientação daqueles que acreditam no desenvolvimento da própria matéria colectável como resultado adquirido do próprio processamento do desenvolvimento e que estabelece uma espécie de financiamento fiscal automático.
Quer dizer: os técnicos internacionais acreditavam que o segredo financeiro da industrialização estaria no manejo do crédito e que o instrumento fiscal apenas teria que suspender a sua acção e esconder as suas prerrogativas, libertando os valores acumulados, isentando-os do peso dos tributos.
Empréstimos, autofinanciamento e isenções fiscais seriam meios bastantes para acudir às necessidades financeiras da industrialização europeia.
Empréstimos, autofinanciamento e isenções fiscais não eram perfeitamente adequados a tal fim.
Sempre as reformas fiscais foram acompanhadas de leis que definem o seu âmbito, definem com propriedade o seu campo de aplicação, autorizam o legislador e permitem a sua acautelada inserção no sistema tradicional; e estas medidas mostram-se de não apoucada envergadura.
Entendia por isso que havia alguns pressupostos necessários, destinados a facilitar a difusão dos princípios e técnicas inovadores.
Em primeiro lugar, convinha definir de novo o domínio vizinho ou coincidente de finanças gerais e locais, o qual, pelo jogo dos adicionais e novas incidências sobre a mesma matéria, carecia de ser esclarecido u sujeito a maior disciplina.
Havia a este propósito trabalhos realizados pela Inspecção-Geral de Finanças dignos de muito apreço.
Em segundo lugar, estavam adiantados os trabalhos da comissão respectiva destinados a simplificar e uniformizar as taxas, encargos e contribuições especiais corporativas, a jugular os seus exageros, de cujo peso o parecer da Câmara Corporativa dá vigorosa noção.
Uma terceira medida, reclamada mais de uma vez, esta também, pelas comissões dê reforma, consistia, com recurso amplo à fotogrametria, em levar o Instituto Geográfico e Cadastral a cadastrar o País no prazo de
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catorze anos, por muito dilatada que fosse a operação e a magnitude dos meios empenhados.
Se o cadastro se arrasta, os problemas de conservação o abalam e as desperequações no tempo lhe tiram o sentido de exactidão, criando-se dificuldades talvez maiores do que aquelas que havia a vencer.
Sobretudo, parecia-me imprescindível para enquadrar serviços nos critérios superiores de tributação que era necessário encarregar um órgão apropriado de proceder à equiparação das cargas apresentadas pelos concelhos, regiões, sectores ou grupos sociais, devido à maneira como se tem caminhado para diferentes horizontes.
As discussões sobre mais-valias de terrenos e construções remontam ao socialista, agrário Henry George, como exploração teórica, e as propostas de Lloyd George, como método fiscal.
Compreendo que, numa certa parte e numa medida, as câmaras municipais, com os seus trabalhos de urbanização, as promovam e facilitem e delas alguma coisa aproveitem pelo fisco e até pelo negócio.
Mas é demasiado que o preço da civilização, o aumento populacional, o governo, que as impulsionam e favorecem, também tenham de ser dados como seu domínio.
A maioria do valor, a quota essencial de enriquecimento, devia ser objecto de uma tributação estadual e o Estado não renunciar a esta fonte, que, assegurando a algumas câmaras meios copiosos, tem contribuído para da sua parte se fazerem dispêndios nem sempre defensáveis.
O problema é o mesmo em Luanda ou em Lisboa, em Lourenço Marques e no Porto, etc., e o Estado devia rever a sua posição de alheamento, se não de generosidade excedente e absurda.
Mais dia menos dia, uma reforma fiscal ou um código de investimento havia de vir, devia vir fatalmente.
Regozijemo-nos por a reforma não chegar envolvida no coro das imprecações, na vibração das paixões fragorosas, nas controvérsias azedas de facções exaltadas ou no egoísmo das classes, mesmo quando ele conduz a história.
Não é com cóleras ou ironias que as reformas se fazem.
Mas não deixemos também que o País se conserve distante ou alheio e afogue em insipidez colectiva os elevados intuitos do reajustamento e inovação fiscal, visto tratar-se de fórmulas que, pautando embora sacrifícios, são a base e alimentação da justiça distributiva de encargos e o custo das realizações colectivas. Não é na indiferença que as reformas podem ser feitas.
Desde sempre que a Câmara está nestes assuntos, não direi apenas com secular autoridade e sem ter de pedir vénia, mas como em coisa pública verdadeiramente sua.
Tenho- dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Melo Machado: - Sr. Presidente: sucedem às vezes destes percalços a qualquer e é melindrosa, neste momento, a minha situação. Depois de ter estado nesta tribuna um antigo Subsecretário de Estado das Finanças e ainda há pouco tempo ilustre Ministro da mesma pasta, tenho ocasião de vir falar a VV. Exas. sobre a proposta da Lei de Meios em discussão.
A respeito da técnica fiscal, devo dizer a VV. Exas. que não sei nada. Eu de técnica só conheço uma - a de pagar, e pouco, porque sou um pobre de Cristo. De maneira que VV. Exas. terão de me desculpar, sobretudo o Sr. Dr. Águedo de Oliveira, que acabou de produzir uma brilhante oração, cheia de interesse e erudição.
As barbaridades que, porventura, irei pronunciar serão, todavia, ditas com sinceridade e vamos indo com Deus, com algum conhecimento de causa, não me parecendo, por isso, inteiramente descabidas.
Lembro-me de que uma vez falei nesta Assembleia sobre o ensino liceal e uma professora do mesmo ensino, aliás muito distinta, que nesse tempo era nossa colega, chamou-me de parte e disse: «Qualquer dia vou aqui falar sobre agricultura».
Respondi-lhe: «Tem V. Exa. todo o direito, é uma consumidora como qualquer. Eu neste caso também sou um consumidor».
Relevem-me, pois, VV. Exas., a banalidade das minhas considerações, mas creiam que é com boa vontade que vou fazer o meu depoimento. Muito poucas palavras, porque, afinal de contas, aquilo que vou dizer poderia chamar-se, por assim dizer, uma declaração de voto.
Se não fora por coerência comigo próprio, com as opiniões aqui expendidas em tantos anos e com as posições tomadas desde sempre, não viria a esta tribuna para falar sobre a Lei de Meios, deixando aos novos colegas o encargo de darem sobre esta proposta de lei a sua opinião.
Julgo, porém, que não poderia ficar calado depois do ler sido aqui, durante tantos anos, o defensor dos contribuintes ao verificar que sobre eles se acastelam, neste momento, nuvens negras e pesadas e que, sobretudo, nos é pedida uma autorização cujo conteúdo ignoramos quase em absoluto.
Compreendo, suponho que compreendemos todos, a necessidade que o Governo tem de dispor de mais dinheiro.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: Esta Assembleia tem-se mostrado tantas vezes interessada na melhoria dos vencimentos dos funcionários públicos que não pode senão aplaudir a disposição em que o Governo se encontra e o propósito quo nos é revelado nesta proposta de lei do encarar esse magno problema, magno pelo volume de despesa que comporta e pela multiplicidade de interesses a que atende.
Mas não só ao aumento se refere e nos promete a proposta através do seu artigo 8.º, mas no brilhante relatório que o precede demonstra-se o propósito de providenciar no alargamento da assistência, tanto médica como cirúrgica, consultas e visita domiciliárias, tanto de clínica geral como de especialidade, meios auxiliares de diagnóstico, meios de terapêutica, internamento e intervenção cirúrgicas, materno-infantil, de enfermagem e medicamentosa. Enfim, uma assistência completa, quo representa para o funcionário um auxílio precioso.
Mais se prevê a solução do problema habitacional do funcionalismo, afirmando-se ainda que se fará uma revisão da orgânica das remunerações através de uma organização administrativa.
Não haverá sobre este assunto qualquer voz discordante nesta Assembleia, não falta, por isso, que louvar nesta proposta.
Todavia, como defensor do contribuinte, que sempre fui, e das prerrogativas desta Assembleia, que tenho procurado servir, não posso deixar de fazer o meu reparo vivo, incisivo, ao facto de através desta proposta se pretender que votemos uma autorização para cobrança de receitas que só é conhecida aproximadamente, enquanto não forem publicadas as sucessivas reformas dos
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impostos anunciadas. (Dizem os artigos 4.º e 5.º da proposta).
Quer dizer, enquanto não forem publicadas estas reformas, ou, melhor diremos, a reforma geral dos impostos, sabemos que não haverá alteração nas taxas estabelecidas, mas logo que sejam publicadas aquelas reformas cai-se no desconhecido, e não fica esta Assembleia habilitada a ajuizar das consequências, do alcance, da autorização que dá.
Será razoável que se peça isto à Assembleia? Poderá assim esta fazer uma votação consciente?
Conhecemos, se não em pormenor, ao menos na sua orientação geral, a anunciada reforma?
Diz-se no relatório da proposta que se espera promulgar ainda no mês de Novembro o código da sisa e do imposto sobre as sucessões e doações, e bem necessário era, pois que não só este imposto e o espírito mm que for encarado tem uma importância enorme, como a sua publicação nos poderia dar uma noção da orientação que vai seguir-se.
Diz-se ainda no relatório que, pelo facto de os códigos dos restantes impostos só poderem ser publicados a partir de Janeiro de 1959, vêm prestar-se, os esclarecimentos indispensáveis sobre as linhas gerais da reforma desses impostos.
S. Exa. o Sr. Ministro das Finanças diz isto, mas a verdade é que se esqueceu de o fazer, pelo menos, em termos suficientes, bastantes, para tornar consciente o voto da Assembleia.
Não quero com isto afirmar que não fosse esse realmento o propósito de S. Exa. mas, por intimamente familiarizado com o assunto, julgou ter explicado. O que disse foi, todavia, insuficiente para que pudéssemos abarcar o conjunto do medidas que se projectam, a possibilidade, sequer, de compreender o seu interesse.
A orientação geral, diz S. Exa., é remodelar, actualizar, mas não alterar de um ímpeto os quadros tradicionais.
Mas há afinal o intuito de alterar os quadros tradicionais, não de um ímpeto, mas em dois ou très?
Aqui começa, para não dizer que continua, a minha divergência formal.
Há muitos anos - e desculpe-me V. Exa., Sr. Dr. Águedo de Oliveira, o atrevimento - que venho afirmando o grande inconveniente de alterar profundamente o nosso sistema fiscal, antiquado embora, mas com a perfeita aceitação do contribuinte, o que me parece de particular importância.
Se a reforma de 1929, concebida, diz o relatório, «num período de graves dificuldades financeiras e executada quando se difundia por toda a parte a mais ameaçadora crise económica». não careceu de se desligar do condicionalismo da época e pôde, todavia, colher do contribuinte todo o dinheiro necessário não só para restabelecer as finanças e o crédito do País, mas ainda para realizar uma obra memorável de reconstituição nacional, que ficará como padrão imorredouro de glória do seu eminente autor, por que razão no período de «relativo desafogo para a tesouraria pública (frase do relatório) há-de ser necessário», ao que parece indispensável mesmo, alterar profundamente o sistema?
Reconhece o autor da proposta «as dificuldades, bem conhecidas, de ordem política, económica, jurídica, comum a todas as reformas tributárias, em qualquer época e em qualquer país» e pergunto se para enfrentar todos esses reconhecidos inconvenientes nos encontramos no momento óptimo, principalmente quando através do muito pouco que nos é dado saber se verifica que se vai seguir precisamente um caminho inteiramente avesso, não só aos nossos hábitos, mas à nossa índole, à nossa maneira de ser como se pode depreender da seguinte frase: «Com efeito, desde que vai promover-se uma tributação razoável e tecnicamente mais perfeita e mais equitativa, em larga medida, baseada nas declarações do próprio contribuinte...».
O Sr. Carlos Moreira: - V. Exa. dá-me licença?
O Orador: - Faz favor.
O Sr. Carlos Moreira: - Desejava apenas um esclarecimento. Tenho estado a seguir as considerações de V. Exa., e, se não estou em erro, creio ter afirmado V. Exa. que se vai para um caminho diferente e avesso à tradição. Compreende-se que possa ser diferente, mas afirmar-se que é avesso é porque V. Exa. conhece já qual é o caminho que se vai seguir ...
O Sr. Melo Machado: - Afirmei apenas que é avesso a nossa maneira de ser, como se pode depreender das palavras do relatório. Por isso legitimamente concluo que a reforma fiscal assenta nas declarações do contribuinte, e são essas declarações que considero inteiramente avessas ao nosso feitio.
Troca-se a plena tranquilidade e aceitação integral pelo gosto requintado de técnica mais perfeita, sabendo-se que tal técnica é particularmente detestada pelo contribuinte português, que a ela só muito difícil, muito relutantemente, se adaptará.
Diz-se ainda, certamente no intuito de tranquilizar o contribuinte: «Mas embora não seja objectivo fundamental desta reforma o aumento de receitas, prevê-se que venha a ser seu resultado, por virtude, quer de a tributação se aproximar mais dos rendimentos reais, quer da mais correcta determinação dos rendimentos normais». Delicioso eufemismo, não acham?
Ocorre-me agora comparar a extensão das explicações dadas sobre o imposto complementar e as alterações a que dá lugar e as que nos são fornecidas para compreendermos em que sentido se move a nova reforma tributária. Enquanto se dedicam sete páginas ao imposto complementar, poucos períodos efectivamente, se encarregam de nos explicar o sentido de reforma tributária que se projecta.
Deste modo, não fazemos qualquer ideia das receitas cuja aprovação nos é proposta.
Da que chegou ao nosso conhecimento quanto ao imposto complementar pela proposta e seu relatório e quanto ao imposto sucessório, por uma forma perfeitamente original no que diz respeito a assembleias legislativas como a nossa, pois apenas individualmente, até há dois ou três dias, cada qual tomou conhecimento dos tópicos essenciais dessa reforma pelos jornais, manda a verdade que se diga que parecem redigidos em termos sensatos que não alvoroçam os que deles tomam conhecimento. E digo parece, porque o fisco tem garras e colmilhos e nós não sabemos se, através da densa selva dos seus cento e oitenta e sete artigos o respectivos parágrafos, nalgum fojo não está escondida a fera que nos há-de saltar, não digo à garganta, mas às algibeiras.
Se isso pode tranquilizar, em certa medida, as nossas apreensões, não quer, todavia, dizer que nos habilite a emitir neste assunto um voto perfeitamente consciente, pois falta ainda conhecer a reforma de todos os demais impostos.
Registo ainda a seguinte declaração que consta do relatório: «Nos casos em que os impostos continuam a incidir sobre o rendimento normal - e são, pela força das circunstâncias, nomeadamente os das pequenas actividades industriais e os da propriedade da terra - não deixará de proceder-se à correcção sistemática para actualização dos respectivos valores».
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Se esta afirmação, por um lado, tranquiliza os que trabalham penosamente a terra, afirmando que não virão eles a sofrer da alteração do sistema tributário a que estão habituados, não posso, todavia, deixar de afirmar a minha, a nossa, preocupação quanto à, actualização dos valores, lembrados do que nos foi aqui relatado pelo nosso colega José Mexia quanto às avaliações e seu resultado no concelho de Montemor.
Uma das condições essenciais para que a lei seja bem aceite, compreendida e acatada é a da equidade.
Por isso se estabeleceu o princípio de que a lei deve ser igual para todos! Mas será igual se em bases desiguais se estabelecem os valores?
E pode pensar-se que na economia agrícola sejam suportáveis alterações súbitas de valores que fazem subir o montante das contribuições quatro vezes, isto por cima de avaliações relativamente recentes, quando se salte que na maioria dos casos essa economia é periclitante, incerta e varia, incapaz de suportar saltos bruscos de encargos?
Parece que ainda não entrou no ânimo e no conhecimento de todos que a nossa agricultura é a grande doente da nossa economia, carecendo de cuidados extremos, de amparos e solicitudes que nunca serão de mais perante o seu esforço hercúleo e persistente, a sua coragem indómita, o seu sacrifício ingente, a sua paciência e resignação.
Ela trabalha sem desânimo, dentes cerrados perante as dificuldades de toda a ordem, as agruras e o desconforto de todos os momentos, cônscia, todavia, de ser um dos pilares mestres da nossa economia, mas cônscia também de que não só entre nós, mas por toda a parte ela é na economia a parente pobre, a que tudo compra caro e tudo vende barato, parecendo que persistirá sempre a ideia de que é indispensável que, acorrentada à, obrigação de alimentar a população nacional, deva ser a eterna sacrificada, sendo-lhe apenas permitido rastejar enquanto os outros caminham a largas passadas.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Eis porque penso que na economia agrícola é indispensável tocar com cuidado, com cautela, com o respeito que merecem todos os que, pela grandeza do seu esforço e do seu sacrifício e, ao mesmo tempo, pela nobreza e grandeza de ânimo com que o suportam, o merecem inteiramente.
Eis, Sr. Presidente, as muitas razões por que não estou suficientemente esclarecido, o que me impedirá de votar no artigo 4.º, salvo se aparecer qualquer solução que possa de alguma maneira defender o contribuinte.
Quero ainda, antes de terminar estas curtas e desataviadas considerações, afirmar a minha estranheza por ter passado um ano inteiro sem encontrar a solução prometida, a questão candente e de extraordinária importância, das transferências de Angola.
A recente visita àquela província ultramarina de S. Exa. o Ministro do Ultramar, com o seu profundo conhecimento do facto e do meio, constitui um motivo de esperança que, estou certo, não será iludido, até porque não seria justo nem conveniente abandonar por mais tempo um problema gravoso para a economia de Angola e da metrópole, muito especialmente na medida em que, inexplicável e inacreditavelmente, através desta malfadada questão, se vão fomentando as importações do estrangeiro, as que sempre têm cobertura, em detrimento das da metrópole, cujo pagamento cada vez é mais difícil. E concluo, Sr. Presidente, afirmando que a proposta tem que louvar e que apreciar, e suponho que não deixei de fazer-lhe a justiça que merece, mas o que disse e a atitude que tomo brota do íntimo da minha consciência, a cujos ditames não costumo furtar-me.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Santos Bessa: - Sr. Presidente: como sempre o tenho feito, quero aproveitar a discussão da Lei de Meios para fazer breves considerações sobre alguns problemas nela encarados e sobre outros que lhes são afins.
Não posso deixar de confessar o prazer que ressalta da leitura do claro e expressivo relatório preambular do projecto. É uma informação preciosa, provinda de quem tem conhecimento perfeito dos múltiplos factores que interferem na vida nacional e exposta com notável inteligência. Agradeço-o ao ilustre Ministro das Finanças e testemunho-lhe as minhas homenagens.
O douto parecer da Câmara Corporativa, na sua ponderada e meticulosa análise, completa esta preciosa informação e esclarece largamente a Assembleia e o País sobre os problemas fundamentais versados na Lei de Meios, que agora discutimos.
Como já é meu hábito, limitar-me-ei a alguns aspectos desta lei que mais se relacionam com as minhas actividades habituais ou que mais incidência possam ter na região que aqui represento.
A saúde pública é, como calculam, aquele sector que mais prende a minha atenção. É, além disso, um dos aspectos fundamentais da vida da Nação, que tanta importância tem para os Portugueses e que condiciona tantos outros problemas vitais para o agregado nacional. Não se estranhe, por isso, que um médico, no exercício do seu mandato, a destaque dos demais e lhe dê prioridade.
Continua o Governo a afirmar o seu decidido propósito de assegurar as verbas indispensáveis à prossecução da luta contra o mais terrível flagelo social que tem açoitado os Portugueses - a túberculose, «o mais jurado inimigo do homem», segundo a frase de Ricardo
Jorge, já recordada nesta Câmara. Tem sido notável pela sua continuidade e pelo seu volume este esforço do Governo no sentido de facultar os meios indispensáveis ao combate ingente que estamos travando contra a peste branca.
Aqui, como nos demais países, o flagelo tomou tal incremento que não podíamos consentir que o seu combate continuasse confiado a uma instituição particular, embora largamente subsidiada pelo Estado.
Por isso mesmo, Salazar, com aquela superior visão que todos reconhecem, proclamou em 1937, perante os delegados da X Conferência Internacional contra a Tuberculose, reunida em Lisboa, que a luta antituberculosa era um problema de Estado e que devia dominar a orientação do Governo.
Na realização desta salutar orientação política deste sector da saúde pública têm sido tomadas várias medidas legislativas, asseguradas consideráveis verbas tendentes à sua execução e tem-se efectuado trabalho de vulto, que hão-de assegurar dentro em breve o nosso domínio sobre o flagelo.
Entre essas medidas destaco aquela que, em 1945, transformou a antiga Assistência Nacional aos Tuberculosos em Instituto de Assistência Nacional aos Tuberculosos.
Aquela prestimosa associação, que em tão boa hora tinha sido fundada pela rainha D. Amélia, carecia de ser substituída por um organismo que pudesse corresponder às necessidades do País o aos propósitos do Governo. Não se hesitou em dar o passo, e o futuro tem
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confirmado amplamente a excelência da medida tomada.
Seguiu-se-lhe, em 1950, a Lei n.º 2044, discutida e votada nesta Câmara, lei moderna e excelente para aquela época, que criou nova estratégia e deu mais modernos e mais eficientes rumos à luta contra a tuberculose. Desenvolveu-se e avolumou-se por meio dela o equipamento clássico e, sobretudo, criaram-se novas armas para o combate.
Mais tarde, a criação das enfermarias-abrigo e das consultas-dispensário veio alargar extraordinariamente a nossa capacidade para atender os tuberculosos que o rastreio da tuberculose pulmonar ia descobrindo.
Simultaneamente, de ano para ano, as verbas consagradas à luta antituberculosa foram crescendo, passando de 18 000 contos, em 1946, para 120 000 contos, em 1958. Nestes três últimos anos a soma das verbas concedidas ultrapassa os 300 000 contos!
Como tem sido aplicado esse dinheiro e quais os seus resultados - eis o que a Câmara e o País precisam de saber. O Governo sabe-o bem, através dos relatórios que recebe e dos esclarecimentos que lhe são fornecidos por quem o deve fazer.
No que respeita ao apetrechamento clássico, passámos de 1243 camas para tuberculosos em 1940 para 2713 em 1953 e para 11 395 em 1958. Isto é: nos primeiros quarenta anos de luta conseguimos pouco mais de 1200 camas; nos dezoito anos seguintes instalámos 10 000. No que respeita a dispensários, trouxemos o seu número de 6 para 54, em 1949, e nestes últimos dezoito anos elevámo-lo para 87. Mas tão importantes como o seu número são as condições de funcionamento que lhes criámos e o rendimento que estamos agora em situação de lhes poder exigir.
Como já aqui o disse, o dispensário era um dos pontos fracos do nosso equipamento, não só pela deficiência material da instalação de muitos deles, mas também pelas condições em que se encontrava o seu pessoal. Esperemos que pelas medidas já tomadas e por outras complementares o seu rendimento passe a ser inteiramente diferente.
A esses dispensários do Instituto de Assistência Nacional aos Tuberculosos podemos juntar agora mais 72 consultas-dispensário, conseguidas com notável economia, mercê dos acordos estabelecidos com várias Misericórdias do País.
Há que render aqui homenagem não só aos que conceberam a ideia destas consultas-dispensário e das enfermarias-abrigo, entre os quais me permito destacar o nosso colega Melo e Castro, então Subsecretário de Estudo da Assistência, mas também aos provedores, mesários e corpo clínico das Misericórdias, que se não têm poupado a esforços para transformar em útil realidade esta louvável iniciativa.
Fica o País dispondo de 157 serviços dispensariais, que deixam a perder de vista a meia dúzia de que dispúnhamos quando a Situação estabeleceu novos rumos à vida pública nacional. Atingimos, deste modo, a proporção de 1 dispensário para 55 000 habitantes. Se é certo que não atingimos aquela proporção apontada por Mac Doughal de 1 para 40 000 habitantes - proporção, aliás, discutível e que se não pode generalizar, já que é influenciada por muitos factores, entre os quais se coutam o grau da endemia, a densidade da população, as vias de comunicação, a existência de outros recursos sanitários, etc.-, também é verdade que ultrapassámos já aquela que existe em algumas regiões de certos países considerados dos mais progressivos e mais bem equipados. Pensamos mesmo que não haverá conveniência em despender mais verbas com a construção de novos dispensários - estes e aqueles cuja construção está em curso devem bastar-nos.
Um dispensário móvel, convenientemente apetrechado e cuja, aquisição já foi decidida, percorrerá o País, a colmatar algumas lacunas concelhias e a dar aos demais o necessário apoio técnico. Veremos se a experiência nos aconselha a seguir por este caminho.
As novas armas de que falei há pouco são os centros de diagnóstico e profilaxia, as unidades móveis de radiorrastreio, as brigadas móveis de vacinação, o laboratório central de produção de vacina B. C. G. e os novos medicamentos específicos.
Não é necessário alongarmo-nos sobre as vantagens de um diagnóstico precoce e de um tratamento precocemente iniciado e convenientemente conduzido. Também não devemos perder tempo a proclamar as excelências da protecção conferida pelo B. C. G., de tal modo ela está universalmente proclamada e com tanto carinho tem sido aceite pela população portuguesa.
Mas há que dar elementos que permitam fazer um juízo de como têm sido aplicados os dinheiros que foram confiados à administração do Instituto de Assistência Nacional aos Tuberculosos.
Os três centros de diagnóstico e profilaxia e as doze unidades móveis conseguiram realizar, até fins de Setembro do ano corrente, mais de 3 154 000 microrradiografias. Na zona centro, que me respeita, até ao fim do 1.º semestre de 1958 conseguimos obter perto de 450 000 microrradiografias.
A percentagem de tuberculosos por elas despistados em relação ao número total de exames feitos, e tendo em consideração o factor da correcção resultante dos diagnósticos confirmados pelos exames complementares dos dispensários, tem vindo a baixar continuamente, desde 0,62 por cento em 1954 até 0,29 por cento em 1958.
Quer dizer: a população sujeita a exames nos anos sucessivos vai-nos fornecendo cada vez menor percentagem de diagnósticos de tuberculose em actividade. Este elemento não pode deixar de ser interpretado como sinal da regressão da endemia.
Os centros e as brigadas móveis de vacinação conseguiram fazer, em cinco anos e meio, até fim de Setembro do ano corrente, 1 500 000 provas de tuberculina e 571 866 vacinações pelo B. C. G. Pode parecer, aos que não conhecem bem as nossas condições, que este meio milhão de vacinados não representa senão uma parcela ínfima da nossa população.
Há, porém, que esclarecê-los de que nem toda a gente se pode vacinar e que uma boa parte da população tem de ser eliminada da vacinação por se ter revelado já infectada pelo bacilo de Koch. As investigações realizadas em Portugal, quer em zonas rurais, quer em zonas urbanas, têm revelado que:
De O aos 4 anos, 7,5 a 15 por cento destas crianças não pode já ser vacinada; Dos 0 aos 9 anos, 15,5 a 52 por cento delas estão nas mesmas condições;
Dos 10 aos 14 anos, a zona rural revela-nos 30 a 42 por cento já infectadas e na zona urbana são 43 a 76 por cento as que estão nas mesmas condições;
Dos 15 aos 19 anos então as taxas sobem para 61 e para 93 por cento.
É por esta razão que fixemos 1 500 000 provas e só pudemos vacinar 571 866 pessoas. Este número, no entanto, é considerável e o ritmo com que agora estamos trabalhando, vencidas as dificuldades iniciais, dá-nos ânimo para pensar na sua rápida ascensão.
Os resultados da protecção específica conferida hão-de tornar-se evidentes dentro de pouco tempo.
Na cidade de Lisboa, por exemplo, as percentagens dos que se revelaram infectados ao rastreio tuberculínico em 1950 e em 1957 baixou sensivelmente: de O aos 4
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anos passou de 14,7 para 10,3 por cento; dos 5 aos 9 anos, de 52,1 para 43 dos 10 aos 14 anos, de 76,9 para 63,3 por cento, o no grupo dos 15 aos 19 anos, de 89,7 para 80,2 por cento.
Isto quer dizer que no espaço de sete anos passou a contagiar-se de tuberculose na cidade de Lisboa um número muito menor dos seus habitantes: a endemia está em regressão.
A distribuição dos medicamentos em 1957 pelo que respeita a hidrazida e à estreptomicina ultrapassou uma tonelada de cada e no que se refere, ao PAS andou por cerca de 9 t.
Quanto à mortalidade pela tuberculose, tínhamos em 1946 a taxa de 159 por 100 000 habitantes e conseguimos reduzi-la a 58 em 1957, redução que, aliás, podia ter sido mais notável, se outras tivessem sido as condições um que nos encontrávamos.
Parece-me poder, porém, afirmar, à luz dos elementos que forneço à Câmara, embora incompletos e mesmo sem considerar muitos outros valiosos, que o Instituto se tem mostrado à altura das circunstâncias, tem prosseguido uma campanha digna de elogio e tem sabido corresponder ao notável esforço financeiro realizado pelo Governo. O seu trabalho resiste bem às criticas que possam ser-lhe dirigidas.
A nova fase da luta há-de consagrar-se particularmente à concentração das nossas actividades no sentido de prosseguir na intensificação da preparação técnica do pessoal e do aperfeiçoamento funcional dos serviços, de modo a obter deles o maior rendimento, à campanha de educação sanitária da população e à recuperação dos antigos doentes.
Há, porém, um capitulo da assistência aos tuberculosos que ainda não foi devidamente encarado. Ele respeita tanto aos que são assistidos no domicílio ou no dispensário, como aos que são internados em enfermarias-abrigo ou em sanatórios. Refiro-me à cobertura económica dos agregados familiares a que eles pertencem.
Não é possível assistir convenientemente à grande maioria dos tuberculosos enquanto este problema não for corajosamente encarado e resolvido.
A situação económica do adregado familiar agravado dia a dia enquanto o chefe de família não retoma o trabalho. Daí a intranquilidade constante do doente, permanentemente angustiado pelos quadros negros de que s testemunha ou de que lhe dão conhecimento por qualquer meio.
Como consequência, ou o doente abandona o repouso e o tratamento, retomando o trabalho, se está em tratamento dispensarial ou domiciliar, ou então pede alta a breve trecho, quando ainda mal tinha começado o seu tratamento sanatorial. Desta atitude resulta que o doente compromete seriamente o seu tratamento e passa a ser um mais perigoso agente disseminador da doença.
Muitos recusam mesmo o tratamento, com receio de que à sua família venha a acontecer o que sabem já ter acontecido à do colega ou do vizinho.
Outra seria a atitude destes doentes se soubessem que durante o seu tratamento os familiares que dependem do seu trabalho e do seu salário teriam garantido o suficiente para fazer face às suas necessidades. Este aspecto económico da luta antituberculosa tem uma importância fundamental pura a boa condução da campanha um curso para dominar o flagelo.
Não está, porém, na alçada do Instituto de Assistência Nacional aos Tuberculosos atribuir os subsídios familiares aos doentes a que assiste - não há disposição legal que lho permita. Parece, pois, que o problema deve ser encarado ou pelo Instituto de Assistência à Família ou pela Previdência, quando se trate
de beneficiários a seu cargo. O Instituto de Assistência Nacional aos Tuberculosos tem feito diligências junto do um e de outro organismo, sem que lograsse obter a resolução destes problemas.
Na alínea c) da base XIV estipula, claramente a Lei n.º 2044 que os encargos da assistência aos tuberculosos relativamente aos beneficiários e aos seus familiares competem às instituições de previdência social previstas no artigo 1.º da Lei n.º 1884, de 16 de Março de 1935, ou às instituições nas quais estas se encontrem integradas, e que esses encargos serão regulados por acordo a estabelecer entre elas e o Instituto de Assistência Nacional aos Tuberculosos.
Em 28 de Maio de 1957, no relatório da proposta de lei da reforma da Previdência, escreveu o ilustre Ministro das Corporações que a reforma se propunha oferecer ao Instituto de Assistência .Nacional aos Tuberculosos uma colaboração relevante para conseguir o internamento ou o isolamento dos trabalhadores tuberculosos e «garantir ao mesmo tempo recuperação pecuniária do salário ou do ordenado perdido.
Por outro lado, e isto exprime uma realidade pungente, muitas vexes os trabalhadores não acoitam a sanatorização ou regressam prematuramente à actividade profissional, para não deixarem a família abandonada à sua sorte e talvez na miséria, por falta de salário.
A Previdência propõe-se preencher tão séria lacuna, concedendo, por período necessariamente longo, durante o internamento do trabalhador, tem como no decurso de comprovado tratamento ambulatório, subsídio pecuniário que auxilie a manutenção das pessoas a seu cargo. Só assim, de resto, poderá ter êxito qualquer campanha de combate ao terrível flagelo».
Estamos inteiramente de acordo com esta salutar orientação - ponto é que o subsídio seja de molde a garantir os fins em vista.
A base IV da lei diz-nos que: «a protecção na tuberculose será objecto de regime especial, competindo de inicio às caixas sindicais de previdência a concessão de subsídios aos seus segurados nos impedimentos resultantes daquela doença».
O que é certo, porém, segundo as informações que colhi, é que os beneficiários que são atingidos pela tuberculose têm, durante nove meses, baixa de serviço, com direito a assistência clínica e medicamentos, a cargo da federação, e a 70 por cento do salário médio do ano anterior, a cargo da caixa de previdência respectiva.
Não têm, porém, direito a internamento sanatorial, salvo alguns que pertencem a caixas que tomam a seu cargo, voluntariamente, o subsídio para internamento sanatorial. Volvidos os nove meses, aquelas caixas de previdência podem retirar as fichas e suprimir toda a assistência no beneficiário. É certo que algumas mantêm-nas, e assim se mantém a assistência medicamentosa e clínica, durante algum tempo; mas o subsidio é que acaba, inexoravelmente, a partir dos nove meses do inicie da doença.
Tem de encontrar-se forma de resolver este assunte se queremos vencer mais um forte obstáculo ao êxito do nosso combate. E não se pense que daí resultariam pesados encargos. Nalguns casos a medida traria até economia. No que respeita aos incuráveis que estão internados, por exemplo, o Instituto de Assistência Nacional aos Tuberculosos gasta com eles 1.050$ mensais Com um subsidio mensal inferior a esta quantia o doente podia ter alta, viver junto dos seus e ser vigiado pelos serviços dispensariais ou móveis do Instituto de Assistência Nacional aos Tuberculosos. A cama do sanatório que ele ocupava sem proveito poderia, assim, passar ser utilizada por um doente curável, destes tantos bacilíferos, com lesões incipientes, que aguardam vez par-
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serem sanatorizados e, enquanto a aguardam, agravam as suas lesões e comprometem, talvez definitivamente, a sua cura. Enquanto não tivermos camas para receber todos os bacíliferos curáveis não me parece justo que estejamos a ocupá-las por incuráveis.
Esperamos que o Governo, por intermédio dos Ministérios da Saúde e das Corporações, mande estudar urgentemente a forma mais conveniente de solucionar este delicado aspecto do problema.
Ao lado do problema da tuberculose, ainda, infelizmente, o nosso problema sanitário n.º 1, muitos outros problemas de saúde pública se podiam alinhar e reclamar medidas tendentes a modificar profundamente o seu estado. Está neste caso, por exemplo, o da assistência à maternidade e infância, tão grave e tão delicado que, em nome de princípios de humanidade, de uma política demográfica conveniente e da defesa da nossa posição internacional, exige urgentes medidas que garantam a sua profunda modificarão.
Mas não me parece conveniente voltar hoje à análise desse problema candente, nem alongar-me em considerações sobre os demais.
A política de saúde pública em Portugal vai com certeza tomar novos rumos, uma vez criado o Ministério da Saúde e Assistência e confiado a inteligência, vontade e dinamismo do seu titular. Tanto quanto nos é dado julgar pelo que até nós tem chegado, parecem-nos bem fundadas as esperanças que depositamos de que uma nova era vai surgir neste capitulo e que muitos dos nossos angustiosos problemas vão ter a solução conveniente, insistentemente reclamada pela classe médica e ansiosamente aguardada por muitos outros.
Não posso, no entanto, deixar de recordar a necessidade de resolver o problema que aqui levantei há um ano e que se mantém no mesmo pé, constituindo, sem dúvida, flagrante injustiça.
Refiro-me, Sr. Presidente, à situação em que se encontram os funcionários da Assistência, impedidos de ingressar na Caixa Geral de Aposentações e obrigados a manter-se numa caixa cujo regime lhes não assegura senão irrisórios benefícios, bem diferentes daqueles quo a Caixa Geral de Aposentações garante aos seus colegas funcionários públicos dependentes de outros Ministérios.
Não volto a repetir os argumentos que aqui aduzi e que se encontram no respectivo Diário das Sessões; mas não posso deixar de solicitar de SS. Exas. os Ministros das Finanças e da Saúde e Assistência a solução urgente desse problema, que há tanto tempo se arrasta, com evidente prejuízo daqueles dedicados funcionários públicos.
Não me demoro na análise de outros problemas encarados na Lei de Meios que estamos discutindo. Não quero, porém, deixar de louvar as medidas tomadas em relação ao abono de família aos funcionários públicos, encaradas na Lei de Meios do ano passado e realizadas depois através do Decreto-Lei n.º 41 523.
Pena foi que as providências igualmente anunciadas e respeitantes ao alargamento do esquema de assistência na doença o a facilidade na habitação não se tivessem concluído, de modo a vir reforçar aquelas a que acabo de referir-me.
Quero deixar aqui uma palavra de aplauso à decisão do Governo de melhorar os vencimentos do funcionalismo público. Oxalá ele o possa conseguir de molde a satisfazer as justas necessidades de tantos deles e a corrigir algumas anomalias apontadas à anterior reforma, tal como o anunciou o Sr. Presidente do Conselho no seu discurso de 1 de Julho - uma nova estruturação das classes do funcionalismo e respectivos vencimentos e a actualização destes em relação, pelo menos, com o custo da vida.
Mas, se não houver simultaneamente, da parte do Governo, uma série do severas medidas destinadas a impedir o agravamento do custo da vida, rapidamente os vencimentos se desactualizarão e serão anulados todos os benefícios quo o Governo se propõe conceder. Os rumores que chegam ato nós parecem demonstrar a urgente necessidade da sua aplicação.
Vejo com prazer que o Governo continua preocupado com os problemas da política rural, estabelecendo uma ordem de precedência das realizações a promover que está de acordo com a ordem das necessidades mais prementes das populações rurais.
Aquando da discussão do II Plano de Fomento expus claramente o meu pensamento sobre a necessidade de acudir com mais largas verbas às estradas e caminhos vicinais, ao abastecimento de água potável, ao fornecimento de energia eléctrica e à satisfação de outras imperiosas necessidades.
Por isso mesmo me congratulo com este artigo 13.º da Lei de Meios, fazendo os melhores votos para que as verbas destinadas à execução das obras nele previstas sejam reforçadas ainda com aquelas que possam ter sido atribuídas a outras que se reconheça estarem longe de ter a premência destas.
Quanto maior for o ritmo da transformação das condições em que se encontram as populações rurais, tanto mais rapidamente melhorarão muitos dos aspectos económicos, sociais e sanitários do Pais. E esse ritmo seria bem maior só houvesse a coragem de sacrificar uma parte do monumental e sumptuoso a estas coisas de aparência comezinha, mas, na realidade, fundamentais à vida da Nação, como, já há semanas, aqui afirmei.
Termino, Sr. Presidente, dando o meu voto na generalidade à proposta em discussão.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão.
Amanhã haverá sessão, com a mesma ordem do dia.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 50 minutos.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
António Calheiros Lopes.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Jerónimo Salvador Constantino Sócrates da Costa.
José Garcia Nunes Mexia.
José Guilherme de Melo e Castro.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Adriano Duarte Silva.
Agnelo Ornelas do Rego.
André Francisco Navarro.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António Carlos dos Santos Fernandes Lima.
Augusto Duarte Henriques Simões.
João Cerveira Pinto.
João Maria Porto.
José de Freitas Soares.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Nunes Fernandes.
Purxotoma Ramanata Quenin.
Sebastião Garcia Ramires.
O REDACTOR - Luís de Avillez.
IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA