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REPÚBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL
DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 102
ANO DE 1959 1 DE MAIO
ASSEMBLEIA NACIONAL
VII LEGISLATURA
(SESSÃO EXTRAORDINÁRIA)
Sessão N.º 102, EM 30 DE ABRIL.
Presidente: Exmo. Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior
Secretários: Exmos Srs.
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues
Rogério Noel Peres Claro
SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-te conta, do expediente.
Foi aprovado o Diário doe Sessões n.º 99.
O 8r. Deputado Silva Mendes falou sobra a» estradas do distrito de Leiria.
O Sr. Deputado Nunes Barata ocupou-se também das estradas e do turismo das Beiras.
Ordem do dia. - O Sr. Deputado Pereira da Crus concluiu a rua intervenção sobre a proposta de lei relativa ao plano director de urbanização da região de Lisboa.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 17 horas.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada. Eram 16 horas e 10 minutos.
Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Adriano Duarte Silva.
Afonso Augusto Pinto.
Agnelo Orneias do Rego.
Agostinho Gonçalves Gomes.
Aires Fernandes Martins.
Alberto Cruz.
Alberto Pacheco Jorge.
Albino Soares Pinto dos Beis Júnior.
Américo Cortas Pinto.
André Francisco Navarro.
António Bartolomeu Gromicho.
António Galapes Gomes Garcia.
António Calheiros Lopes.
António Carlos dos Santos Fernandes Lima.
António de Castro e Brito Meneses Soares.
António Cortês Lobão.
António Jorge Ferreira.
António José Rodrigues Prata.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Máximo Saraiva de Aguilar.
Artur Proença Duarte.
Avelino Teixeira da Mota.
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos Coelho.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando Cid Oliveira Proença.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco José Vasques Tenreiro.
Frederico Bagorro de Sequeira.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Jerónimo Henriques Jorge.
Jerónimo Salvador Constantino Sócrates da Costa.
João Augusto Dias Rosas.
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João Augusto Marchante.
João de Brito e Cunha.
João Cerveira Finto.
João Mendes da Costa Amaral.
João Pedro Neves Clara.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim Pais de Azevedo.
Jorge Pereira Jardim.
José Dias de Araújo Correia.
José Fernando Nunes Barata.
José de Freitas Soares.
José Garcia Nunes Mexia.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Hermano Saraiva.
José Manuel da Costa.
José Monteiro da Bocha Peixoto.
José Rodrigo Carvalho.
José Rodrigues da Silva Mendes.
José Sarmento de Vasconcelos e Castro.
José Soares da Fonseca.
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues.
Laurénio Cota Morais dos Reis.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Luís Tavares Neto Sequeira de Medeiros.
Manuel José Archer Homem de Melo.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel Maria de Lacerda de Sousa Aroso.
Manuel Seabra Carqueijeiro.
D. Maria Irene Leite da Costa.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Beis.
Mário Angelo Morará de Oliveira.
Mário de Figueiredo.
Martinho da Costa Lopes.
Paulo Cancella de Abreu.
Ramiro Machado Valadão.
Rogério Noel Feres Claro.
Sebastião Garcia Ramires.
Tito Castelo Branco Arantes.
Venâncio Augusto Deslandes.
Virgílio David Pereira e Cruz.
Vítor Manuel Amaro Salgueiro dos Santos Galo.
O Sr. Presidente: Estão presentes 77 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 16 horas e 20 minutos.
Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente:-Estão na Mesa os elementos fornecidos pelo Ministério do Interior em satisfação do requerimento apresentado na sessão de 27 de Março último pelo Sr. Deputado Carlos Coelho.
Vão ser entregues àquele Sr. Deputado. Está em reclamação o Diário das Sessões n.º 99, referente à sessão do dia 24.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Como nenhum dos Srs. Deputados deseja fazer uso da palavra sobre este Diário das Sessões, considero-o aprovado.
Tem a palavra antes da ordem do dia o Sr. Deputado Silva Mendes.
O Sr. Silva Mendes: - Sr. Presidente: a pedido dos povos interessados, venho, mais uma vez, chamar a atenção do Governo para o problema premente e angustioso da reparação das nossas estradas.
Queixam-se os habitantes das freguesias de Turquel e Benedita, do concelho de Alcobaça, e de algumas, outras do concelho das Caldas da Bainha, porque a estrada, que, passando por Santa Catarina e outras povoações, liga os dois concelhos a que acabo de me referir, está. verdadeiramente intransitável e a Direcção de Estradas, de Leiria apenas dispõe de uns 8.000,5 para fazer uma reparação da ordem dos 500 contos, ou mesmo muito mais, se toda a estrada fosse devidamente reparada.
Devo informar o Governo de que esta via de comunicação, além do seu interesse comercial, tem um valor turístico de muito grande importância, por atravessar uma região de grande beleza e ligar entre si os concelhos das Caldas da Rainha e Alcobaça, que, com Óbidos.. Nazaré, Porto de Mós, Batalha, Leiria e Vila Nova de Ourem, constituem uma das mais interessantes regiiões turísticas do nosso pais
Também o troço da estrada de Lisboa ao Porto que, partindo de Montejunto, passa a Rio Maior, Turquel, e Alcobaça, encurtando a viagem cerca de 12 km, se encontra, na sua maior parte, em muito mau estado, e, se lhe não acudirem urgentemente, dentro de alguns meses não será possível lá passar sem grandes inconvenientes para as viaturas automóveis que o fizerem.
Em todas as estradas de Portugal, e devido ao progresso que devemos à acção do Governo, o transito tem aumentado extraordinariamente, e o montante das verbas destinadas às grandes e pequenas reparações não tem acompanhado esse feliz ritmo de desenvolvimento económico e turístico, e até tem sido consideravelmente demonstrado, como já foi demonstrado nesta Assembleia.
Torna-se portanto necessário que o Governo tome a. acertadíssima resolução de aumentar substancialmente a. dotação da Junta Autónoma de Estradas para que esta possa cumprir a sua utilíssima missão.
Se isso não for possível, espera-se que, pelo menos, seja concedida, urgentemente, uma verba extraordinária para a Junta poder fazer as reparações que julgar mais. necessária.
Sr. Presidente: talvez V. Ex.A já tivesse notado que sou o terceiro Deputado pelo distrito de Leiria que vem chamar a atenção do Governo para o problema da reconstrução e reparação das estradas portuguesas. Isso deve-se a que, sendo representantes de um distrito dotado de admiráveis belezas naturais - campos produtivos. e bem tratados, florestas, lindíssimas praias, termas fre-quentadíssima, serras majestosas, castelos e outros monumentos, a importante barragem do Cabril e fábricas, dignas de visita e observação, e que é anualmente percorrido por centos de milhares de turistas nacionais e estrangeiros, que, vindo, a imensa maioria deles, admirar o Santuário de Fátima, aproveitam a ocasião para visitar o distrito onde tantos encantos vem encontrar e onde os estudiosos e artistas podem elevar o seu espírito percorrendo os monumentos históricos e museus, especialmente o admirável Museu Malhoa, nas Caldas da Rainha, todos nós, Deputados pelo distrito, sentimos e constatamos a necessidade premente e inadiável de serem devidamente reparadas as estradas do nosso distrito, assim como as de todo o Pais.
Vozes: - Muito bem!
O Orador:-À frente da Junta Autónoma de Estradas e chefiando uma plêiade brilhante de técnicos distintíssimos encontra-se um general cheio de patriotismo, boa. vontade e competência, que só deseja trabalhar em beneficio do nosso pais; à frente do Ministério das Obras Publicas está, felizmente, um homem extraordinário, cujo elogio é desnecessário fazer, tão conhecido e admirado é de norte a sul de Portugal; chefia o Ministério dás Finanças um novo cheio de talento, que se está impondo à consideração pública pelas altas qualidades que já tem. revelado, e, finalmente, chefia o Governo um homem pro-
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videncial a quem se devem os imensos benefícios de ordem moral e material quê toda a Nação bem conhece e devidamente aprecia.
Nestas condições, e sendo a construção e reparação
de estradas um problema de altíssima importância nacional, que nesta Assembleia tem sido focado várias vezes, nenhuma dúvida tenho de que ele vai ser resolvido inteligentemente, ainda que para o resolver seja necessário adiar, para um pouco mais tarde, a execução de alguma das grandiosas obras que vão ser executadas e
cuja efectivação não seja de tão premente necessidade. Sr. Presidente: a Assembleia, pela voz de alguns dos meus muito ilustres colegas, cumpriu o seu dever de chamar a atenção do Governo para o problema que também acabo de focar, embora sem brilhantismo nem competência.
Vozes: - Não apoiado!
O Orador: - O Governo está elucidado. Agora resta-lhe satisfazer os desejos da Nação, tão claramente expostos pelos seus representantes.
Se o fizer, como confiadamente todos nós esperamos, será credor da gratidão e louvor de todo o povo português.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Nunes Barata: - Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa o seguinte
Requerimento
«Toda a zona da serra da Estrela oferece largas possibilidades ao desenvolvimento do turismo. A beleza das paisagens, a excelência do clima de altitude, as estâncias termais, os desportos de Inverno, etc. constituem outros tantos cartazes de atracção turística desta privilegiada região.
Ora, afigura-se-me que adviriam grandes vantagens para a efectivação destas potencialidades turísticas se procurássemos ligar mais intensamente o turismo da serra da Estrela e Coimbra.
A capital do Mondego é uma realidade do turismo internacional, ao mesmo tempo que constitui uma escala obrigatória na encruzilhada dos caminhos da Beira.
Porém, para que Coimbra possa beneficiar totalmente da singular posição geográfica que desfruta e, simultaneamente, concorrer para a valorização da serra da Estrela, torna-se indispensável atender às exigências da rede rodoviária, que hoje está longe de ser satisfatória.
Conviria mesmo escolher acessos que, por serem menos acidentados, encurtarem percursos, permitirem o périplo da serra e, por outro lado, estarem menos interrompidos durante o Inverno, facilitassem tal desígnio.
A estrada que melhor poderia servir a zona mais visitada da serra (Lagoas, Poças, Torre, Cântaros, Covões, etc., e a cidade da Covilhã) é a que vai de Seia à Covilhã. Está, porém, intransitável entre S. Romão e Loriga, por ser estreita, de curvas apertadas e nunca ter sido reparada. Também está em mau estado em todo o limite de Alvoco da Serra, entre Portela da Salada e as Pedras Lavradas.
Impõe-se, pois, uma urgente reparação.
Nesta conformidade, pretende-se saber se o Ministério das Obras Públicas projecta a reparação da E. N.º n.º 231-2º., e quais os períodos em que essa reparação se realizará».
O Sr. Presidente: - Vai passar-se à
Ordem do dia
O Sr. Presidente: - Continua em discussão na generalidade a proposta de lei acerca do plano director do desenvolvimento urbanístico da região de Lisboa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Virgílio Cruz.
O Sr. Virgílio Cruz: - Sr. Presidente: as velocidades mecânicas, transformaram completamente o meio urbano.
No século XX, desabou, como um cataclismo, a massa de veículos mecânicos, com suas velocidades inesperadas. O crescimento fulminante do seu número em certas cidades, como por exemplo Nova Iorque, onde circulam diariamente para cima de milhão e meio de automóveis, levantou problemas de trânsito difíceis, devido aos afluxos desmedidos em certas zonas e em certas horas.
Os veículos mecânicos deviam ser um agente libertador do homem e pela sua velocidade trazer um ganho apreciável de tempo, mas a sua acumulação e concentração em certas ruas tornou-se uma tortura para a circulação e motivo de perigos que determinam no homem um estado de nervosismo permanente.
A insuficiência de largura das vias, as pequenas distâncias entre cruzamentos, a falta de sinalização sincronizada, obrigam a paragens sucessivas (sucedendo até frequentemente a quem se desloca em automóvel do Terreiro do Paço aos Eestauradores receber ordem de paragem sucessivamente de todos os sinaleiros, isto por falta de sincronização entre eles), o que retarda o movimento e adensa o trânsito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador:-A circulação torna-se hoje uma função primordial da vida urbana, requer um programa cuidadosamente estudado, estabelecendo ligações por meio de uma rede circulatória onde se separem as vias de trânsito rápido das de trânsito lento, se faça uma classificação das velocidades disponíveis, onde se regularizem débitos, se criem escoamentos indispensáveis e se suprimam os engarrafamentos.
A tendência moderna é para que o peão possa seguir caminhos diferentes do dos automóveis.
A procura da tranquilidade e equilíbrio na vida das grandes cidades e na sua região de influência orientou o urbanismo moderno para a sua divisão em zonas com existência própria e, tanto quanto possível, independente. Dentro deste rumo, procura converter-se cada zona numa pequena cidade dentro da região, com excelentes comunicações entre si, ocupando posição tal que ocasione o mínimo de inconveniente a todo o aglomerado urbano e às zonas contíguas.
Dentro da região de Lisboa há que criar pequenas cidades e fixar em cada uma delas actividades locais capazes de garantir emprego às suas populações e construir nelas aquilo de que mais carecem os habitantes de uma subcidade: escolas técnicas, liceus, repartições públicas e administrativas, filiais de bancos, igrejas, hospitais, centros comerciais, cinemas, bibliotecas, etc. Deste modo se evitará que a periferia de Lisboa e os bairros satélites, por estarem desprovidos de vida própria, sejam verdadeiros dormitórios de muita gente que diariamente aflui à capital para exercer nela a sua actividade.
Isto aliviaria certas zonas de Lisboa de tanta gente e de tantos carros, abrandaria a acuidade do problema habitacional e as dificuldades da circulação.
Desde há anos que se observa em Lisboa notável diminuição da população dos bairros centrais. As casas do centro são adaptadas a escritório.
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Este fenómeno é comum a muitas cidades; por exemplo: na City de Londres habitam cerca de 13000 indivíduos, enquanto durante o dia trabalham e afluem ali
à volta de meio milhão, e em Nova Iorque, no arranha-céus da R. C. A., trabalham cerca de 16 000 pessoas, e a média do público que ai acode diariamente anda pelas 60 000 possoas. Nessa cidade, até para estacionamento de automóveis aproveitam o espaço em altura; a garagem Kent, por exemplo, tem vinte e cinco andares com monta-cargas.
A rapidez e segurança de comunicações facilitam não concentrar tudo em Lisboa e evitam, assim, que venham a causar-se adensamentos e ingurgitamentos excessivos. O Brasil está a construir e espera inaugurar dentro de um ano a nova capital administrativa, Brasília, para aliviar o Rio de Janeiro, como Washington é uma válvula de escape de Nova Iorque.
No crescimento dos aglomerados urbanos, o desejo de proporcionar à vida quotidiana o contacto com a natureza o aduziria à primeira vista a uma grande extensão horizontal das cidades, em residências unifamiliares com jardim e, se possível, quintal, disseminadas em superfície. Mas a amplidão das áreas requeridas, as distâncias a percorrer, o tempo perdido nos percursos e o encarecimento das redes de água, energia eléctrica, gás, esgoto:, etc., em que os gastos de instalação e conservação são proporcionais à superfície servida, enquanto as receitas são proporcionais ao número de usuários, ou faria pagar muito caro o conforto, ou acumularia descosfortàvelmente a população em lotes exíguos de zonas remotas e casas mínimas que se devassassem mutuamente.
A sabida do nível de vida exige cada vez mais e melhores serviços municipais e públicos.
Foi estas razões, tem-se caminhado nos últimos tempos para a construção de unidades de vizinhança, concentrando residências em blocos multifamiliares tendo instalados os serviços e comodidades requeridos pelos núcleos das famílias que as constituem, conferindo-lhes o carácter de foco natural de atracção e espontânea convergência das famílias que nelas residem. Criam-se, para isso, no próprio imóvel, creches, jardins de infância, escolas primárias, cinema, piscina, etc.
Nestas construções pratica-se a normalização e pró-fabricação de cozinhas, casas de banho, escadas, etc., a junção de canalização e chaminés e de todos os factores de economia, que, somados ao racional aproveitamento do espaço, permitem preços baixos de construção sem sacrificar a qualidade.
O Sr. Melo Machado: - O que é pena é que cá não se possa fazer disso, porque a construção parece sempre cara.
O Orador: - Nas casas desta unidade de vizinhança as rendas praticadas são de 75, 100, 115 e 130 pesos mexicanos. O peso mexicano está ao câmbio de 2$20. São rendas muito baratas, visto cada habitação ter cozinha, sala de estar e de jantar, instalações sanitárias, arrumações, acrescidas respectivamente para cada um dos quatro tipos de um, dois, três e quatro quartos, alguns com alcova e zona de vestir. Mas para esta unidade de vizinhança tiveram a vantagem de conseguir o terreno muito barato.
O Sr. Melo Machado: - Em Lisboa, os terrenos, em geral, são da Câmara e podem ser tão baratos quanto se quiser. Até mesmo para casas de pobres, ainda hoje não foi possível convencer o Governo de que, fazendo uma casa para cada família, isso custa um dinheirão.
O Sr. Duarte do Amaral: - É estranho que num país o ide a burguesia não pode viver em moradias se persista em que os operários possam viver nelas. Todos conhecemos a vantagem social da casa isolada ...
O Orador: - Mas para eles os serviços de higiene e conforto ficam muito caros.
O Sr. Brito e Cunha: - V. Ex.ª dá-me licença?
O Orador: - Faz favor.
O Sr. Brito e Cunha: - Essas vantagens são incontestáveis, mas não parece a V. Ex.ª que há um bocadinho de exagero numa densidade de 1800 habitantes por hectare? Se em 4 ha temos 6000 habitantes, o que dá portanto 1500 habitantes por hectare, não se lhe afigura que essa densidade é excessiva e os inconvenientes são de censurar e criticar?
O Orador: - Tenho aqui uma revista de arquitectura, de Outubro de 1951, que, ao descer da tribuna, emprestarei a V. Ex.ª e onde se vê que, apesar da grande densidade de população, nesses 4 ha fica 80 por cento da superfície para espaços livres.
O Sr. Melo Machado: - Quer dizer que a construção está feita em altura, e se não fosse assim não seria possível toda essa comodidade.
O Orador:-A concentração nessas unidades de vizinhança liberta grandes áreas de terreno à sua volta, garantindo a todos desafogo visual e sensação de intimidade, apesar da continuidade que as irmana em unidades de uma nova ordem de grandeza.
Nessas unidades de vizinhança fazem-se categorias diversas de alojamentos, estabelecidas segundo a escala dos salários, num harmonioso doseamento dos tipos.
Dentro desta orientação, foram já construídos em vários continentes diversos centros de habitação. Vamos referir-nos a um - o centro urbano Presidente Alemán - construído há dez anos no México para os servidores do Estado, que na pequena área de 4 ha, isto é, um rectângulo de 225 III X 180 m, aloja com todas as comodidades e asseio 6000 habitantes em 1080 habitações cheias de ar e sol e rodeadas por verduras e flores, visto 80 por cento do terreno desse rectângulo ter ficado livre para jardins e fins de carácter social e colectivo. Nos jardins e recinto há piscina, jardim de infância, creche, escola primária para 1200 alunos, auditório, cinema, dispensário médico, estabelecimentos comerciais, mercado, posto dos CTT, etc.
Os 6000 habitantes estão alojados em seis edifícios de treze andares e seis edifícios de três andares; os inquilinos são de modestos recursos, e, embora tenham todo o conforto, as rendas são módicas e na renda está já incluída água quente e fria, telefone, telefonia, o uso da piscina e duches, a creche e jardim de infância para as crianças, escola primária, etc.
Dizem os autores do projecto que se a cidade do México fosse toda feita em quadros com esta concepção seria seis vezes menos extensa e teria a possibilidade de dedicar 80 por cento da área ocupada na nova concepção a jardins e parques, reduzindo o preço dos serviços municipais, com uma economia enorme de tempo e dinheiro no transporte dos seus habitantes, com benéfica incidência na vida e economia familiares.
É preciso que a Câmara Municipal de Lisboa e a Federação das Caixas de Previdência se lancem ao ataque do problema da habitação por estes processos novos, proporcionando à classe média alojamentos a rendas módicas e com todo o conforto, realizadas dentro desta nova concepção.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
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O Orador: - Dentro da área do plano director haverá que promover a defesa das áreas próprias para a agricultura, a protecção e expansão das áreas arborizadas, a valorização das zonas de interesse turístico, a defesa das belezas naturais, dos valore» históricos, monumentais e artísticos. Haverá que promover os futuros parques urbanos e periféricos e a zona rural de protecção, que serão os verdadeiros pulmões da cidade, onde os habitantes poderão ir facilmente descontrair os nervos em conversa amena com a natureza; deverão também ser previstas instalações desportivas, zonas verdes para passeios e campismo, instalações militares, recintos para exposições e feiras, etc.
Há zonas do plano director, como o Portinho da Arrábida - em que se aliam a serra e o mar - e Sintra, que devem ser fortemente auxiliadas pelo turismo.
Várias cidades têm e defendem tenazmente da invasão pela construção, extensos parques: Nova Iorque, o Central Park, com 320 ha; Londres, o Hyde Park e o Kensington Garden, com 250 ha; Berlim, o Tiergarten, com 270 ha; Amsterdão, o Vondel Parque, com 56 ha, etc.
Nas proximidades do centro das grandes cidades e com fácil acesso são muito benéficos os grandes parques periféricos: Viena tem o Prater, com 700 ha, a 3 km da sede da Câmara Municipal; Paris tem o Bois de Boulogne, com 872 ha, a 5,5 km da Câmara Municipal, etc.
São também indispensáveis boas ligações às zonas verdes turísticas e panorâmicas de interesse colectivo; é preciso salvaguardar as áreas de particular beleza panorâmica, podendo algumas dessas áreas vir a ser ocupadas por clubes, restaurantes, pousadas ou hotéis.
O tratamento da parte agrícola da zona rural de protecção de Lisboa deve ser encarado com o mesmo interesse e cuidado que o tratamento das zonas residenciais e industriais. O seu aproveitamento deve ser feito em unidades agrícolas com dimensões que garantam uma exploração eficiente.
O Sr. Dias Rosas: - V. Ex.ª dá-me licença?
O Orador: - Faz favor.
O Sr. Dias Rosas: - Nessa ordem de considerações de V. Ex.ª, quero fazer uma pergunta para me esclarecer. Julgo que a resposta virá no pendor dessas afirmações que está a produzir.
A proposta actualmente em discussão tem um aspecto mais de ordenamento do que de desenvolvimento regional, visto que se trata justamente de uma região que poderá estar desequilibrada na distribuição das suas fontes de riqueza, mas que no seu conjunto contém a maior parte das fontes de riqueza do território nacional. Sendo assim, eu perguntava a V. Ex.ª se não haveria conveniência em, de qualquer modo, salientar a necessidade de ao lado deste aspecto de ordenamento, que se contém fundamentalmente na proposta, e indo até ao encontro do que consta no relatório da proposta, se promoverem medidas no sentido de facilitar, de estimular essa descentralização, quer no aspecto industrial, quer no aspecto da valorização agrícola a que V. Ex.ª tem estado a referir-se.
O Orador: - Estou inteiramente de acordo com V. Ex.ª Na primeira parte do meu discurso, a certa altura eu disse que há que determinar quais as actividades que mais convém desenvolver na região de Lisboa, e, para aquelas que forem consideradas inconvenientes a esta zona, orientar a sua localização no sentido mais útil ao desenvolvimento nacional. Se V. Ex.ª continuar a ouvir-me com a atenção com que me tem honrado, constatará que eu, daqui até ao fim desta intervenção, ponho o acento tónico nessa tecla.
Para afrouxar o crescimento urbano há que não perder nunca de vista que se torna urgente enraizar na província muitos dos que vêm fixar-se em Lisboa. Para isso é necessário lançar mão de uma série de factores capitais ao ressurgimento da vida rural, factores que afrouxarão as formidáveis solicitações que impulsionam os fluxos humanos e que provocam a corrida vertiginosa do campo para a cidade. É indispensável a boa conservação e aumento da rede rodoviária e de viação municipal, a electrificação rural, o abastecimento de água salubre suficiente às zonas rurais, a expansão do turismo, a criação na província de estabelecimentos de ensino e de clínicas, a reorganização de algumas indústrias regionais e a instalação de indústrias novas..
É preciso criar aí novas ocupações e melhor remuneração para o trabalho, conseguir que se produza mais, que se possa trabalhar mais e que o trabalho tenha maior rendimento.
A localização de indústrias modifica de forma decisiva as estruturas regionais, mas como lutamos ainda com falta de infra-estruturas, a orientação de indústrias para a província terá de ser precedida da criação nessas zonas de província das condições indispensáveis para que a indústria vá ocupar os terrenos que lhe sejam destinados nos diversos planos de urbanização.
Muito se aliviará Lisboa e a sua região se forem orientados para as pequenas cidades da província pólos de atracção que fixem a operários, empregados e funcionários, que lá encontrarão ambiente mais propício à saúde do corpo e do espírito.
As sedes das empresas eléctricas da rede primária poderiam muito bem estar localizadas em cidades da província: a sede da Hidroeléctrica do Zêzere, em vez de estar em Lisboa, poderia ter ficado em Tomar, próximo do rio Zêzere, onde construiu os seus aproveitamentos, de que agora faz a exploração; a sede da Hidroeléctrica do Cávado poderia ter-se instalado em Braga, próximo dos rios Cávado e Rabagão, em vez de estar no Porto.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - A sede da Hidroeléctrica do Douro poderia estar em Trás-os-Montes, em vez de se instalar no Porto, e a sede da Companhia Nacional de Electricidade poderia ter ficado em Coimbra, em vez de Lisboa.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Aceitamos que para as suas administrações seria menos cómodo, mas seria mais consentâneo com o interesse nacional.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Certas leis têm poderes para guiar a indústria para situações desejáveis e restringi-la onde haja congestão e supercentralização.
A política de energia, a política fiscal, as tarifas ferroviárias, a supressão do pagamento de orna portagem, o estabelecimento de uma via franca, a abertura de uma estrada ou canal, determinam profundas alterações nos módulos locacionais.
O Banco de Fomento, se der maiores facilidades de financiamento aos casos de vincado interesse nacional, poderá contribuir para orientar para determinados locais certas origens de atracção populacional.
É necessário que a vida rural estiolada renasça, embelezando a civilização da máquina com a presença da natureza.
Só um arranjo do espaço nacional que conduza ao desenvolvimento harmónico urbanístico e rural será ca-
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paz de proporcionar a maior soma de bens e de os tornar acessíveis ao maior número de portugueses.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Não está mais ninguém inscrito para a sessão de hoje. Vou, portanto, encerrar a sessão.
A próxima será na terça-feira, dia 5, com a mesma ordem do dia da de hoje.
Está encerrada a sessão.
Eram 17 horas.
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Alberto Carlos de Figueiredo Franco Falcão.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto da Rocha Cardoso de Matos.
Alfredo Rodrigues dos Santos Júnior.
Américo da Costa Ramalho.
Antão Santos da Cunha.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António Maria Vasconcelos de Morais Sarmento.
António Pereira de Meireles Rocha Lacerda.
Armando Cândido de Medeiros.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Belchior Cardoso da Costa.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Domingos Rosado Vitória Pires.
Fernando António Munoz de Oliveira.
João da Assunção da Cunha Valença.
João Carlos de Sá Alves.
João Maria Porto.
Joaquim de Pinho Brandão.
José António Ferreira Barbosa.
José Gonçalves de Araújo Novo.
José dos Santos Bessa.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel Maria Sarmento Rodrigues.
Manuel Nunes Fernandes.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Manuel Tarujo de Almeida.
Purxotoma Ramanata Quenin.
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães.
Urgel Abílio Horta.
O REDACTOR - Leopoldo Nunes.
IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA