O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 839

REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 114

ANO DE 1959 3 DE JUNHO

ASSEMBLEIA NACIONAL

VII LEGISLATURA

(SESSÃO EXTRAORDINÁRIA)

SESSÃO N.º 114, EM 2 DE JUNHO

Presidente: Exmo. Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior

Secretários: Ex. mos Srs. :
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues
António Calapez Gomes Garcia

SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 15 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foram aprovados os n.os 112 e 118 do Diário das Sessões, com uma rectificação do Sr. Deputado Paulo Cancella de Abreu quanto ao n.º 112.
Foi aprovado, por proposta- do Sr. Presidente, um voto de pesar pelo falecimento da mãe do Sr. Deputado Belchior, Cardoso da Gosta.
Sr. Presidente comunicou estarem na Mesa os elementos fornecidos pelos Ministérios da Economia e das Obras Publicas em satisfação de requerimentos, respectivamente, dos Sr a. Deputados Camilo de Mendonça e Santos Júnior. Esses elementos foram entregues a estes Srs. Deputados.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Proença Duarte, que se referiu à visita do Chefe do Estado à Exposiçao-Feira do Ribatejo; Manuel Nunes Fernandes, sobre a recente tragédia que enlutou a região de Rio Bom; José Sarmento, para se congratular com a anunciada construção do edifício da Reitoria da Universidade de Lisboa; Augusto Simões, para um requerimento, e André Navarro, sobre as actividades do Partido Comunista em Portugal.

Ordem do dia. - Continuou o debate sobre a proposta e projectos de emendas à Constituição Política.
Usou da palavra o Sr. Deputado Carlos Lima.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 19 horas.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Eram 16 horas e 5 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Afonso Augusto Finto.
Agnelo Orneias do Rego.
Agostinho Gonçalves domes.
Aires Fernandes Martins.
Alberto da Rocha Cardoso de Matos.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Américo Cortês Pinto.
Américo da Costa Ramalho.
André Francisco Navarro.
António Calapez Gomes Garcia.
António Calheiros Lopes.
António Carlos dos Santos Fernandes Lima.
António de Castro e Brito Meneses Soares.
António Cortês Lobão.
António Jorge Ferreira.
António José Rodrigues Prata.
António Maria Vasconcelos de Morais Sarmento
António Pereira de Meireles Rocha Lacerda.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Âguedo de Oliveira.
Artur Proença Duarte.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Avelino Teixeira da Mota.
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.

Página 840

840 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 114

Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos Coelho.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando António Munoz de Oliveira.
Fernando Cid Oliveira Proença.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Frederico Bagorro de Sequeira.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Jerónimo Henriques Jorge.
Jerónimo Salvador Constantino Sócrates da Costa.
João Augusto Dias Rosas.
João Augusto Marchante.
João de Brito e Cunha.
João Carlos de Sá Alves.
João Mendes da Costa Amaral.
João Pedro Neves Clara.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim Pais de Azevedo.
Joaquim de Pinho Brandão.
Jorge Pereira Jardim.
José Dias de Araújo Correia.
José Fernando Nunes Barata.
José de Freitas Soares.
José Garcia Nunes Mexia.
José Gonçalves de Araújo Novo.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Hermano Saraiva.
José Manuel da Costa.
José Monteiro da Bocha Peixoto.
José Rodrigo Carvalho.
José Rodrigues da Silva Mendes.
José dos Santos Bessa.
José Sarmento de Vasconcelos e Castro.
José Soares da Fonseca.
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Luís Tavares Neto Sequeira de Medeiros.
Manuel Colares Pereira.
Manuel José Archer Homem de Melo.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel Maria de Lacerda de Sousa Aroso.
Manuel Nunes Fernandes.
Manuel Seabra Carqueijeiro.
Manuel Tarujo de Almeida.
D. Maria Irene Leite da Costa.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Reis.
Mário Angelo Morais de Oliveira.
Mário de Figueiredo.
Martinho da Gosta Lopes.
Paulo Cancella de Abreu.
Ramiro Machado Valadão.
Rogério Noel Peres Claro.
Sebastião Garcia Ramires.
Tito Castelo Branco Arantes.
Urgel Abílio Horta.
Venâncio Augusto Deslandes.
Virgílio David Pereira e Cruz.
Vítor Manuel Amaro Salgueiro dos Santos Galo.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 85 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 16 horas e 15 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Estão em reclamação os n.os 112 e 113 do Diário das Sessões.

O Sr. Paulo Cancella de Abreu: - Paço a palavra, Sr. Presidente!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para uma reclamação o Sr. Deputado Paulo Cancella de Abreu.

O Sr. Paulo Cancella de Abreu: - Sr. Presidente: pedi a palavra para apresentar a seguinte rectificação ao Diário das Sessões n.º 112: na p. 826; col. 1.ª 1. 50, onde se lê: (professamos Salus populi.», deve ler-se: « professamos. Salus populi.».

O Sr. Presidente: - Continua em reclamação.
Pausa.

O Sr. Presidente: - Como mais nenhum Sr. Deputado deseja fazer aso da palavra sobre estes números do Diário, considero-os aprovados com a rectificação apresentada.
Comunico à Camará o falecimento da mãe do Sr. Deputado Belchior Cardoso da Costa. Julgo interpretar o sentir da Câmara exprimindo àquele ilustre colega o profundo pesar da Assembleia por esse infausto acontecimento.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - Estão na Mesa os elementos fornecidos pelo Ministério da Economia em satisfação do requerimento apresentado na sessão de 24 de Fevereiro último pelo Sr. Deputado Camilo de Mendonça. Vão ser entregues àquele Sr. Deputado.
Estão também na Mesa os elementos fornecidos pelo .Ministério das Obras Públicas era satisfação do requerimento apresentado na sessão de 8 de Maio último pelo Sr. Deputado Santos Júnior. Vão ser entregues àquele Sr. Deputado.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra antes da ordem do dia o Sr. Deputado Proença Duarte.

O Sr. Proença Duarte: - Sr. Presidente: nesta Câmara, de natureza essencialmente política, parece-me de registar os factos que através do País se vão produzindo e que revelam o ambiente político em que vivemos. E pedi a palavra, Sr. Presidente, precisamente para assinalar a visita do Sr. Presidente da República à inauguração da Exposiçao-Feira na capital da província do Ribatejo, Santarém.
O que nós pudemos, ali ver, Sr. Presidente, significa indiscutivelmente que a província do Ribatejo manifestou perante o Sr. Presidente da República inteira concordância com a forma como vêm sendo dirigidos os destinos deste país, com a acção governativa que vem sendo exercida.
Impressionou tão vivamente todos quantos viveram esse momento da visita presidencial a Santarém que posso dar aqui um apontamento da impressão manifestada por Deputado de nação amiga.
Assistia esse Deputado ao espectáculo tauromáquico que em Santarém se realizou, e, quando viu a espontaneidade, a sinceridade, a autenticidade da manifestação com que o Sr. Presidente da República foi acolhido, não pode deixar de exteriorizar a quantos dele junto se encontravam essa impressão viva que o acontecimento lhe estava causando. Disse que se sentiria feliz se pudesse apresentar pessoalmente ao Sr. Presidente da República a manifestação daquilo que lhe ia na aluía e no entendimento.
S. Ex.ª o Sr. Presidente da República, generosamente e com aquela bondade que o caracteriza, ...

Vozes: - Muito bem !

Página 841

3 DE JUNHO DE 1959 841

O Orador: - ... concordou imediatamente em receber os cumprimentos desse Sr. Deputado, e posso dizer que esse Deputado era um Deputado trabalhista brasileiro.
Ao Sr. Presidente da República manifestou a sua surpresa por ver o ambiente de carinho com que tantos milhares de pessoas daquela região o acolhiam, o saudavam e dele se acercavam, aquele ambiente de confiança, contrário ao que lhe tinham feito constar no Brasil, com que o Chefe do Estado português passava por entre as multidões, despreocupada e descontraidamente, e a forma respeitosa, vibrante e entusiástica com que por essas populações era saudado e acolhido. E porque nós somos uma Câmara essencialmente política e temos de recolher aqui os indícios da maneira como se porta e como reage a opinião pública perante a acção governativa; foi essa uma razão que me levou a assinalar aqui o facto; e ainda outra e talvez a mais forte: procurar que ficasse aqui registada a onda de ternura, de simpatia e de adesão com que o Sr. Presidente da República, pelo seu carácter e personalidade, é estimado e adorado por toda a população portuguesa.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Daqui quero, Sr. Presidente, testemunhar uma vez mais ao Sr. Presidente da República a honra e, mais direi, o inefável prazer com que toda a região ribatejana o viu visitar a nossa província e a maneira como S. Ex.ª soube acolher e entender as vibrantes manifestações que lhe foram dirigidas no exercício da alta função que com tanta dignidade desempenha.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Nunes Fernandes: - Sr. Presidente: ainda retenho nos meus olhos os olhares de pavor da laboriosa e pobre gente de Rio Bom, concelho de Lamego, e os meus ouvidos ainda guardam os gritos de angústia daqueles que, tocados pela desgraça, viram desaparecer entes queridos e arrastados pelas águas torrenciais os seus próprios haveres e as suas reduzidas economias.
Na noite de 27 de Maio as forças incontroláveis da Natureza levaram a miséria a muitos lares de Rio Bom.
Seis dos seus habitantes perderam a vida, levados, com as suas casas, pela corrente caudalosa.
Dez famílias ficaram sem lar e muitas mais viram destruídas as próprias hortas com que se alimentavam.
O quadro que se apresentava aos olhos das pessoas que iam medir a extensão da catástrofe era impressionante e aterrador.
Aquilo que, momentos antes, era o orgulho dos habitantes de Rio Bom, tudo desapareceu em pouco mais de dez minutos.
Hortas vicejantes, a atestarem a nobreza da terra, vinhas e pomares devidamente tratados pelas mãos carinhosas daquela gente de trabalho e agarrada ao seu torrão, foram levados pela corrente caudalosa da imensa mole de água, que tudo destruía na sua passagem.
Foram grandes e inexcedíveis os actos de solidariedade e de verdadeiro heroísmo que se praticaram nessa noite tremenda e notáveis os actos de caridade cristã exercidos junto dessa pobre gente.
São grandes os movimentos de carinho por esses desgraçados, enlutados pela morte e lançados na mais cruciante miséria.
Já o Governo, por intermédio do ilustre governador civil do distrito, que tanto honrou esta Câmara quando aqui ocupou o seu lugar de Deputado, tomou iniciativas, que bem demonstram o cuidado e atenção que é norma nestas emergências.

O Sr. Virgílio Cruz: - Muito bem!

O Orador: - Impõe-se, porém ir mais longe e conceder uma nova casa às dez famílias que viram arrebatados pelas águas os seus lares.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Temos, felizmente, à frente do Ministério da Assistência um homem dinâmico, empreendedor e compreensivo, que saberá dar a sua substancial contribuição para o efeito.
Também as trovoadas causaram enormes prejuízos nos ribeiros das freguesias de Sande e de Lazarim, do sacrificado concelho de Lamego, destruindo as margens e causando grandes prejuízos nos prédios marginais.
Espero que pelo Ministério das Obras Públicas, através dos serviços hidráulicos, se faça a correcção dos ribeiros destas localidades, levantando as paredes e expurgando o seu leito dos entulhos, de modo a dar livre curso às águas e permitir que os terrenos possam continuar a produzir os seus abundantes frutos, e a Repartição dos Melhoramentos Rurais possa dar o seu contributo para a restauração dos caminhos destruídos.
Ainda neste sector, não faltará o dirigente indispensável à consecução do fim em vista.
O ilustre titular da pasta não atraiçoará, por certo, a sua notável e bem conhecida missão de prover às notadas deficiências e males dos povos.
Finalmente, o ilustre titular das Finanças também não deixará de providenciar em ordem a isentar de contribuições os proprietários atingidos, para que eles possam recompor as suas propriedades.
Somam alguns milhares de contos os prejuízos sofridos.
O movimento de solidariedade e auxílio mútuo da região, sentimento vincadamente cristão, necessita do auxílio do Governo para que a pobre gente de Rio Bom se aperceba de que ele vai a toda a parte onde seja necessária a sua presença, pois é essa a linha de rumo do Estado Novo.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. José Sarmento: - Sr. Presidente: no passado dia 8 do corrente mês os jornais publicaram a notícia de que tinha sido aberto concurso público para a construção do edifício destinado à Reitoria da Universidade de Lisboa.
Essa notícia, que muito congratulou todos aqueles que a esta Universidade se encontram ligados, mostra que o nosso Governo continua debruçado sobre os seus anseios, e à medida que vai sendo possível vai dando satisfação aos seus desejos.
Bem sei que muito mais agradaria ao sector universitário se mais rapidamente o Governo atendesse às suas necessidades mais prementes, mas também se compreende que, devido às solicitações dos mais variados sectores, todas elas implicando um aumento de despesa, o nosso Governo se veja obrigado a escalonar os empreendimentos que é mister realizar.
Segundo se depreende das notícias publicadas, o novo edifício da Reitoria da Universidade de Lisboa ficará amplamente dimensionado, de maneira a poder desempenhar cabalmente e durante largo período a missão que terá de cumprir.
Para se fazer uma ideia do aumento de volume da população escolar da Universidade de Lisboa, e portanto

Página 842

842 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 114

da necessidade de amplamente se projectarem as suas instalações, destaco que, enquanto em 1911 a população escolar não atingia 220 alunos, em 1935 ultrapassava os 1000 e, mais recentemente, em 1958 já atingia os 6650.
O grande salão de recepção e festas do futuro edifício, com 48 m de comprimento, e a aula magna, com uma superfície de 1250 m2, dispondo de 1800 lugares, dão-nos uma ideia do que virá a ser essa magnifica construção, que se erguerá na Cidade Universitária ao lado dos belos edifícios das suas Faculdades: Medicina, Direito e Letras.
Sr. Presidente: impõe-se agora, para que toda a Universidade de Lisboa fique em condições de poder desempenhar a altíssima função que lhe compete, iniciar a construção do novo edifício da sua Faculdade de Ciências.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Como tantas vezes aqui foi dito, as suas instalações já há muito não permitem que o ensino laboratorial seja uma realidade viva. Dai resultam males incalculáveis, que se vão repercutir noutros sectores.
O papel que as Faculdades de Ciências têm hoje de desempenhar é bem diferente daquele que há meio século lhes competia. Hoje a sua principal missão consiste em preparar os matemáticos, físicos, químicos, geólogos e biólogos, que terão de desempenhar as suas profissões nos mais variados sectores das actividades económicas, de colaboração com engenheiros, agentes técnicos, etc. Sem aqueles não é possível conseguir um apreciável desenvolvimento económico e correspondente elevação do nível de vida da gente portuguesa.
Além deste principal papel, continuam as Faculdades do Ciências a preparar os professores de Ciências do ensino secundário.
Ora a exiguidade do actual edifício da Faculdade de Ciências de Lisboa, aliada ao seu precário estado de conservação, não lhe permite desempenhar as suas funções. Urge por isso que, sem mais delongas, se proceda a tudo o que for preciso para que a construção das suas novas instalações seja em breve uma realidade.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Que estas sejam dimensionadas largamente e com possibilidades de ampliações futuras são os mais ardentes votos de todos os que nelas trabalham. Se, porventura, por considerações de ordem económica, não for possível dar simultaneamente às novas instalações da Faculdade de Ciências a amplidão necessária e a grandiosidade das actuais Faculdades da Cidade Universitária e da sua futura Reitoria, sacrifique-se este último aspecto, pois, torno a repetir, o que pretendem em primeiro lugar aqueles que à Faculdade de Ciências se encontram ligados é que lhes dêem condições para poderem trabalhar eficientemente. Mas se além do essencial as novas instalações tiverem grandiosidade e simultaneamente trouxerem a professores, assistentes e alunos um mínimo de comodidades, que eles hoje não encontram no velho edifício da antiga Escola Politécnica, mais satisfeitos ficarão ainda.
Sr. Presidente: para terminar, só mais duas palavras.
Para que um serviço desempenhe a sua missão não basta, naturalmente, possuir instalações apropriadas. Além da matéria-prima humana - homens capazes e de valor efectivo real - é necessária uma organização adequada e actualizada, para que o serviço possa desempenhar a sua missão.
Ora, no caso das Faculdades de Ciências, como tantas vezes aqui foi dito, a sua presente organização nem é adequada nem actualizada. Ela remonta à distante era de 1911.
Nessa altura o desenvolvimento económico-científico do Mundo podia, de certo modo, dispensar os matemáticos, físicos, químicos, etc., substituindo-os, por vezes sem prejuízos de maior, por engenheiros. Mas hoje em dia, devido aos novos domínios das actividades económico-científicas e a uma mudança radical nos métodos de trabalho, eles tornaram-se imprescindíveis.
As nossas Faculdades de Ciências, quando em 1911 foram criadas, destinavam-se quase que unicamente a ministrar os preparativos para outras escolas - Medicina, Engenharia, etc. - e ainda a prepararem os professores de Ciências do ensino secundário.
De um modo semelhante ao que se passa nas escolas de Engenharia, em que os seus licenciados são engenheiros civis, electrotécnicos, etc., a futura organização das Faculdades de Ciências deverá permitir atribuir aos seus licenciados os títulos profissionais de físicos, químicos, etc.
Para se ajuizar da necessidade premente da reforma das Faculdades de Ciências, só aponto, de entre muitos factos, que ainda se encontram reunidas numa única licenciatura as ciências físicas e químicas. Parece-me que, entre os países com os quais nos poderemos comparar, somos hoje os únicos em que essa estranha associação se observa ainda.
Felizmente, a recente nomeação de uma comissão destinada a apresentar um projecto de reforma das Faculdades de Ciências, constituída pelos mais altos valores do nosso meio científico, garante-nos que, em breve prazo, tudo se vai conjugar para que as nossas Faculdades de Ciências possam preparar em qualidade e número aqueles técnicos científicos de que tanto necessitamos e simultaneamente melhorar o nível de ensino dos futuros professores do ensino secundário.
Sr. Presidente: termino agradecendo ao Governo o início da construção do magnifico edifício da Reitoria da Universidade de Lisboa.
Faço ardentes votos para que muito brevemente possa também agradecer a construção das novas instalações da Faculdade de Ciências de Lisboa e a promulgação da desejada reforma das Faculdades de Ciências.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Augusto Simões: - Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa o seguinte

Requerimento

«Com o fim de me esclarecer, por forma a poder aquilatar da justeza de certas críticas que tenho ouvido fazer ao regime de panificação vigente entre nós, requeiro que, pelo Ministério da Economia, me sejam fornecidos, com a possível brevidade, os relatórios elaborados nos últimos cinco anos pela direcção do Instituto Nacional do Pão, referindo não só a estrutura interna deste organismo de coordenação económica, como ainda a sua actuação, e bem assim quaisquer outros elementos indispensáveis ao exacto conhecimento do mencionado regime de panificação».

O Sr. André Navarro: - Sr. Presidente: está ainda bem presente na nossa retina a admirável manifestação da tarde de 28 de Abril, manifestação de fé nos destinos de Portugal, e será também difícil esquecer, nessa memorável jornada patriótica, a fisionomia de plena confiança no futuro dessa multidão infinda - fisionomia do mais puro e devotado agradecimento ao grande construtor do Portugal contemporâneo.

Página 843

843 3 DE JUNHO DE 1959

E quando nos lembramos de que nessa atitude colectiva de amor e de paz sé simbolizam as grandes virtudes do povo português, bem expressas nas admiráveis cerimónias em honra de Cristo-Rei, mais se desenha em todas as almas bem formadas o contraste com certas máscaras de ódio de conhecida populaça revolucionária e dos seus responsáveis instigadores- untes que, vivendo dentro ou fora dos nossos muros, realizam há muito, segundo normas e métodos dissolventes adequados, um profundo trabalho de dissolução social.
Têm-se imiscuído esses perniciosos agentes das forças internacionais comunistas e maçónicas no seio do honrado e devotado funcionalismo técnico e administrativo do Estado e das organizações corporativas e também ainda em algumas empresas privadas, especialmente - e parecerá esta verificação um contra-senso - naquelas que melhor vêm remunerando o seu pessoal, lançando e espalhando, sistematicamente, aleivosias e boatos, de mistura com anedotas de finalidade preconcebidamente demolidora; levam a cabo vasta acção psicológica, criando um clima de incertezas susceptível de provocar as fugas do capital, desviando este de investimentos de maior risco, anos de maior improdutividade, para outros mais seguros mas de menor interesse social; procuram também nos locais, de trabalho - escolas, oficinas e campos- provocar perturbações, dissídios e desordens e ainda movimentos precipitados de natureza reivindicativa; divulgam, por outro lado, através de publicações várias, as belezas enganadoras do paraíso soviético, de resto nunca por eles vivido, bem como das escravizadas comunas colectivizadas da China Continental ; propagam por via de edições de baixo preço erradas doutrinas, que conduzem à dissolução dos vários elementos de estrutura das sociedades; recitam incríveis poemas das glórias de lutas desleais que têm sacrificado muitas centenas de mulheres e de crianças indefesas nesse admirável país que é obra da imortal França nas paragens norte-americanas; cantam as vitórias de «fideis» e «infideis» vários que têm reconstituído, no século que decorre, bárbaras cenas do Coliseu de Roma, ultrapassando em muito os desvarios que dizem combater; servem-se dos escritos da imprensa clandestina, do Avante!, de O Militante e doutros pasquins, para divulgar escritos não menos irresponsáveis; utilizam o cinema, nos clubes ou fora deles, para confundirem, com belas imagens panorâmicas, o triste cenário da escravatura de todas as cores, e ainda a rádio, para o- sistemático elogio dos seus valores - digo melhor dos que dedicam a sua acção demolidora aos domínios das letras, das artes e das ciências; valores aparecidos, decerto, par via de geração espontânea, já que neste país, sujeito segundo afirmam a uma clorose, demolidora das manifestações do espírito, eles não poderiam ter evoluído até atingirem a maturação actual.

O Sr. Ramiro Valadão: - Muito bem!

O Orador: - Levam mesmo a cabo, quando o ambiente .é propício, acções subversivas de vária índole, como aquelas a que assistimos no decorrer do período eleitoral de Maio-Junho de 1958, seguidas pela vaga de greves de natureza política que surgiram em diferentes regiões do País e que abortaram, logo no seu início, um face da pronta reacção da grande maioria dos trabalhadores patriotas e de consciência sã.
Apertam ainda, como se fossem velhos amigos, as mãos honradas daqueles homens bons que lhas estendem, ingenuamente é um facto, numa atitude sincera de desejo de conquistar mais almas para o Reino de Deus, pois assim esperam conhecer melhor os recônditos das almas puras para, quando soar a hora da destruição, poderem vibrar golpes mortais no elevado mundo do espírito.
Tudo processos, em suma, para criar climas de agitação e situações emocionais das massas favoráveis aos seus desígnios estratégicos e tácticos.
Eis, em suma, a ofensiva a que estamos assistindo, ofensiva de uma guerra fria movida pelo império moscovita nos mais variados campos, concebida por diabólicos e hábeis estratagemas; guerra que tem consumido, nesta última década, somas avultadas de dinheiro dos trabalhadores, a maior parte dele sugado a essa multidão de escravos que labuta em cerca de um terço da superfície do globo - fruto, digo, da espoliação de operários húngaros, checoslovacos, polacos, búlgaros, romenos, lituanos, estonianos e letões e dessas dezenas de milhões de russos, ucranianos, arménios, caucasianos e tantos outros povos hoje vivendo vida mais dura que nos tempos ainda não esquecidos dos autocratas de todas as Rússias.
E já não falamos desse Celeste Império, submetido, em escala nunca vista, por leninistas ortodoxos preparados nas escolas soviéticas, a um sistema de industrialização forçada que toca as raias do desumano. colectivização e materialização da vida levada à última, expressão do retrógrado com a supressão dos próprios laços da vida familiar; regresso da vida humana u formas primitivas, acentuado aí, nas suas consequências trágicas, pela degradação do meio físico, sujeito, a milénios de intenso uso.
Eis a ofensiva monstruosa em que colaboram também, com quantias avultadas e achegas várias, alguns magnates do sórdido capitalismo internacional - o temos por cá alguns, embora felizmente raros, exemplares dessa fauna bem conhecida no mundo da iniciativa privada, esperançados talvez em conquistar a boa vontade da gente trabalhadora para a continuação da sua vil acção parasitária.
E, perante tais atitudes, apenas, como sempre tem acontecido, a nossa perigosa benevolência e o esquecimento a curto prazo, logo que as situações se tornam menos vivas, dos ataques desses lobos sequiosos de sangue e de outros, não menos perigosos, disfarçados de mansos cordeiros.
Destina-se este escrito a pôr de sobreaviso «neutralistas» - incautos uns, embora por vezes bem intencionados, e também alguns amantes da demagogia fácil, cujas atitudes têm concedido, por vezes, fortes- achegas ao inimigo. Os que lutam sempre cheios de fé do mesmo lado da barricada não necessitam da nossa palavra esclarecedora.
O que passamos a dizer demonstrará, porém, que é necessário combater sem descanso, numa frente bem unida, o inimigo-comum, nos mais variados sectores da sociedade. E preciso: o dos falsos intelectuais aparentemente inocentes, mas profundamente dissolventes do mundo do 'espírito, que assentaram já há longo tempo arraiais nas escolas, nos oficinas e no campo, com a satânica missão de deformar essa multidão de jovens indefesos, que o excepcional desenvolvimento cultural e económico do País atirou nestes últimos vinte anos para um nível onde a maturação intelectual e social, que exige sedimentação calma, não pode ainda ter dado expressão definitiva; são ainda esses ingénuos pastores também, apostados em constituir grandes rebanhos onde lobos- esfaimados, difíceis de saciar, possam viver em boa paz com a multidão de mansos cordeiros.
O mundo das gerações que despontam para a vida não admite, presentemente, na realidade, mais do que dois partidos, e estes não são também conciliáveis: o dos que são pela Nação e o dos que são contra ela.

Página 844

844 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 114

E neste momento o império soviético está desferindo os seus mais rudes golpes de uma guerra fria sobre os principais baluartes da defesa ocidental.
Vejamos, assim, para melhor compreensão da estratégia e dos noções tácticas do inimigo -única forma de se organizar solidamente a nossa defesa-, o processo evolutivo em que se enxerta a acção comunista contemporânea.
Não constitui segredo para ninguém a existência de um movimento de índole comunista em Portugal. Qualquer observador atento às nossas realidades político-sociais pode verificar, na verdade, diversas manifestações dessas actividades subversivas.
Da leitura, mesmo que superficial, da imprensa clandestina comunista reconhece-se também imediatamente o grau de subserviência em que se encontram os seus agentes perante os dirigentes soviéticos.
Os panfletos clandestinos são na realidade, salvo raras excepções, simples traduções, por vezes inadaptadas ao nosso ambiente político-social, de publicações congéneres soviéticas, e em todas as palavras de ordem que difundem, declarações que proferem ou comentários que contêm encontra-se sempre marca inconfundível da direcção suprema do Kremelin. Os comunistas em Portugal não tentam assim, no prosseguimento de uma política subversiva, utilizar uma táctica de acção própria, não tomando qualquer posição definida sem terem prévio conhecimento da aprovação dos seus chefes moscovitas. E essa dependência total tem-se manifestado tanto mais claramente quanto mais decisiva se tem revelado a política nacional na intransigente defesa da civilização do Ocidente.
Vejamos um pouco de história deste movimento, para melhor nos apercebermos do sentido actual da sua evolução.
Desde que se constituiu, em 1921, o movimento comunista português procurou ligar-se desde logo estreitamente a Moscovo. E, assim, durante o período de 1921-1929 foram várias as delegações que partiram com rumo à capital da Rússia Soviética, quer por ocasião dos congressos do Komintern, quer ainda dos aniversários mais destacados da história do bolchevismo. Aí beberam as primeiras palavras de ordem. Como pagamento de visitas, o nosso país foi também visitado algumas vezes por vários agentes do aparelho internacional do Komintern.
Em 1929, depois da reorganização que o então secretário-geral Bento Gonçalves imprimiu ao movimento . comunista, este começou a intitular-se oficialmente Secção Portuguesa da Internacional Comunista (S.P.I.C.). As principais organizações satélites que criou então eram apenas secções portuguesas de organizações satélites comunistas internacionais: Comissão Intersindical (C.I.S. - secção portuguesa da Profintern), Federação Juvenil Comunista Portuguesa (F.J.C.P. - secção portuguesa da Internacional Juvenil Comunista), Liga dos Amigos da U.B.S.S., Liga contra a Guerra e contra o Fascismo e Socorro Vermelho Internacional. E em grande parte estas organizações satélites foram estruturadas com a ajuda eficaz de agentes estrangeiros. Em 1934, uma delegação portuguesa, presidida por Álvaro Cunhal, então secretário--geral da Federação Juvenil Comunista Portuguesa, foi de novo a Moscovo participar no VI Congresso da Internacional Juvenil Comunista e no ano imediato uma delegação presidida pelo secretário-geral Bento Gonçalves deslocou-se à U. B. S. S. para assistir ao Vil Congresso do Komintern e recebeu então pessoalmente de Dimitroff as directrizes para o trabalho subversivo a realizar em Portugal e, em especial, as normas para a criação de uma Frente Popular e ainda para a infiltração de elementos comunistas nos sindicatos nacionais e em outras instituições recém-criadas. A leitura da imprensa comunista da época revela bem como este movimento antinacional procurou atingir estas finalidades.
Com o desencadeamento da guerra civil de Espanha este movimento antinacional adquiriu, como era de prever, uma importância bastante maior no seio do comunismo internacional. Assim, o Bureau Latino do Komintern impôs, instruções precisas a respeito das tácticas a seguir em Portugal durante este agitado e crítico período para a civilização ocidental, período que o comunismo russo antevia como muito frutuoso para a sua estratégia.
Eram elas, entre outras, as seguintes:
a) Criar na opinião pública nacional um estado de espírito de simpatia pela luta dos vermelhos espanhóis, procurando esconder a origem comunista do movimento, para apenas realçar a luta pelos ideais democráticos;
b) Ajudar por todos os processos as milícias armadas dos comunistas espanhóis e as brigadas internacionais;
c) Sabotar qualquer eventual ajuda às tropas nacionalistas ;
d) Procurar estender ao nosso país a guerra revolucionária que se desenrolava já no país vizinho.

Para dar maior força a estas instruções, deslocaram-se especialmente a Portugal alguns agentes importantes do comunismo internacional, entre os quais um de pseudónimo «Pavel», que tomou virtualmente nas suas mãos a direcção do movimento comunista português. Por outro lado, outros dirigentes comunistas continuaram a seguir clandestinamente para a Espanha vermelha, e entre eles o Dr. Álvaro Cunhal, este tendo ido a Madrid especialmente com a missão de reunir os emigrados políticos portugueses numa única frente a favor do que dizia «a causa dos republicanos espanhóis». Aí tomou parte activa na noção das criminosas brigadas internacionais, que prenderam e assassinaram milhares de nacionalistas espanhóis. Que conste, foi essa então a única missão realizada com êxito por esse destacado dirigente.
Porém, continuava a ser preparada pelos comunistas portugueses, em grande parte, a execução das ordens moscovitas. E, assim, na madrugada de 8 de Setembro de 1936, rebentou a revolta de duas unidades navais roo Tejo e verificaram-se os atentados bombistas do dia 20 de Janeiro de 1937, bem como o planeado para o dia 4 de Julho do mesmo ano, todos eles decididos pela direcção internacional do movimento comunista. Dizemos em grande parte, porque nos dois últimos actos subversivos colaboraram também alguns elementos anarco-sindicalistas.
Mas a Polícia de Defesa do Estado estava vigilante. Foi prendendo, sucessivamente, todos os dirigentes do movimento antinacional português, quer nascidos em território pátrio, quer estrangeiros, e assaltando as sedes do movimento e as tipografias clandestinas. E assim é que no final do ano de 1938 podia considerar-se de facto que o movimento comunista em Portugal estava em grande parte desarticulado e tinha deixado de existir como um todo orgânico. No ano de 1939 o Komintern constatava este facto, isto é, que o movimento comunista português não tinha cumprido as intruções que lhe tinham sido dadas e não pudera assim defender, com suficiente vigilância revolucionária, o seu aparelho clandestino, e como consequência dessas faltas expulsa este partido do movimento comunista internacional.

Página 845

845 3 DE JUNHO DE 1959

O que acabamos de expor mostra bem, como já afirmámos, n estreita dependência que sempre existiu entre o comunismo português e a direcção da Internacional Comunista dominada por Estaline.
Foram assim, em última análise, os dirigentes do Kremlin, por intermédio do aparelho comunista internacional, que tentaram espalhar a desordem e a subversão na nossa terra, e se essas finalidades falharam' isso deve-se unicamente a três factores dominantes: à alergia do nosso povo a movimentos antinacionais, à acção enérgica do nosso Governo e à perfeita eficiência de actuação da Polícia de Defesa do Estado:

Vozes: - Muito bem !

O Orador: - Ao deixarem-se manobrar deste modo por Moscovo, os comunistas em Portugal só mostraram mais uma vez serem apenas traidores à Pátria.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Depois de 1941, isto é, depois da segunda reorganização do movimento antinacional comunista, essa atitude de traição à Pátria ainda mais se acentuou. Na realidade, o movimento que surgiu da reorganização de 1941 executou ainda mais fielmente, se é possível, as ordens de Moscovo. E, assim, o perigo que representava para a unidade e progresso social da Nação aumentou na medida em que os seus métodos de acção se foram torna ado mais eficazes, adquirindo crescentes características leninistas.
O perfeito alinhamento da estratégia e da táctica deste movimento antinacional português com a política moscovita foi então posto em foco por S. Ex.ª o Presidente do Conselho ao escrever estas palavras lapidares: «Mandaram-nos ser aqui germanófilos no começo da guerra, e foram; mandaram-nos ser aliadófilos depois, e foram. Mandaram-nos admitir a independência das repúblicas soviéticas, e admitiram-na; mandaram-nos aceitar a absorção das mesmas repúblicas, e aceitaram--na. São colonialistas para engrandecer o Estado socialista nisso e anticolonistas para diminuir o seu próprio país. Não procuremos lógica, mas obediência; não esperemos patriotismo, mas serviços a uma política estrangeira.»
Partido nacionalista estrangeiro eis o que é e foi sempre o movimento comunista português.
Vejamos agora, com um pouco mais de pormenor, como o' movimento comunista executou nessa época subservientemente todas as viragens da estratégia soviética.
Assim, em manifestos comunistas aparecidos nos fins de 1940 e princípios de 1941 podem ler-se violentos ataques contra os imperialistas anglo-saxões e contra a guerra imperialista que a Inglaterra e a França estavam impondo à Alemanha nazi; pode ler-se ainda uma defesa calorosa da aliança germano-russa!
Porém, logo após os primeiros dias da invasão do território russo pelo exército alemão tudo se modificou como por encanto. O que interessava realçar agora eram apenas as virtudes tradicionais do povo russo e a ajuda que estava sendo dada pelas democracias ocidentais contra os tiranos nazis. Era assim necessário, segundo a propaganda russa, auxiliar por todos os meios os exércitos aliados e, em especial, o exército vermelho. E veja-se, por exemplo, apenas para notar o tom, o elogio póstumo do Presidente Roosevelt e do povo americano publicado no Avante! da 1.º quinzena de Maio de 1945.
Toda a propaganda comunista dessa época é feita assim- sob o signo da unidade aliada e, como a táctica do comunismo internacional preconizava a constituição de vastas frentes nacionais ou patrióticas de unidade antifascista, o movimento comunista português segue obedientemente essa linha de rumo e cria sob a sua direcção, em 1943, o Movimento de Unidade Nacional Antifascista, a que aderiram inúmeras personalidades demo-liberais e mais tarde os G.A.C. (grupos antifascistas de combate), verdadeiras milícias de choque preparadas para a insurreição armada e que o movimento comunista julgava então poder realizar- em Portugal, com êxito, uma vez terminada a guerra.
Todas as greves, tumultos e actos insurreccionais que se verificaram no nosso país no decurso dos anos de 1942, 1943 e 1944 podem atribuir-se assim, na realidade, a esta intenção. Em 8 e 9 de Maio deste último ano o movimento comunista português conseguia, de facto, mobilizar em grande parte a seu favor as manifestações da vitória.
Começam, porém, a surgir conflitos graves, logo após o findar da guerra, entre a U.B.S.S. e os seus aliados ocidentais. Os comunistas portugueses fazem-se imediatamente eco dessas desinteligências. E, assim, no Avante! começam a aparecer frequentemente ataques contra o imperialismo anglo-saxão e, especialmente, contra os mais destacados governantes ingleses e
Norte-americanos. Assim, por exemplo, no Avante! da 2f quinzena de Abril de 1946 lê-se: «A Grã-Bretanha impõe um governo fascista ao povo grego» e «Churchill e os seus amigos procuram fomentar uma nova cruzada anti-soviética».
Esta viragem táctica do comunismo internacional inaugura o período da guerra fria. Devemos situá-lo, no que se refere ao movimento comunista português, em Maio de 1947, quando da reunião do seu comité central.
O Governo da Nação, que durante a guerra era acusado de ser hostil às democracias ocidentais, passou então a ser criticado precisamente pelo contrário. No Avante! da l.ª quinzena de Julho de 1947 já se lia:
O Governo enfeuda-se aos monopólios anglo-norte-americanos, e não hesitará em recorrer cada vez mais à ingerência estrangeira contra o povo português».
A táctica da guerra fria em Portugal desfez, contudo, a fraca unidade oposicionista conseguida através do M.U.N.A.F. e, depois do período eleitoral de 1945, do Movimento de Unidade Democrática (M.U.D.). J H os dirigentes não comunistas do- M. U. D. eram atacados como traidores num curioso folheto comunista difundido em Dezembro de 1946 e intitulado «O Partido Comunista ante algumas tendências prejudiciais dentro do Movimento de Unidade Democrática».
E esses ataques aos políticos oposicionistas intensificam-se no decurso do ano de 1948, quando se desenrolavam os trabalhos preparatórios para a apresentação da candidatura oposicionista às eleições de 1949. E hoje está perfeitamente demonstrado que a escolha definitiva do candidato da oposição foi da exclusiva responsabilidade do movimento comunista.
Personalidades demo-liberais das mais destacadas no sector da oposição, como disse, foram então grosseiramente difamadas e insultadas nas colunas dos números do Avante! dessa época; assim, o Sr. António Sérgio, por exemplo, chega a ser acusado no Avante! da 2.º quinzena de Outubro de 1949 de ser «informador da Polícia de Defesa do Estado».
Findo este período eleitoral, quebrou-se, de facto, a unidade da oposição e o movimento comunista resolveu criar uma nova organização satélite, com aparência democrática, mas inteiramente dominada por ele: essa organização chamou-se «Movimento Nacional Democrático», organização que em todas as suas manifestações, até Janeiro de 1957, data em que a direcção do partido resolveu dissolvê-la, foi inteiramente dominada pelas

Página 846

846 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 114

palavras de ordem do comunismo russo. O M.N.D. foi assim apenas mais um instrumento da política da traição à Pátria dos comunistas nascidos no solo pátrio.
Mas o predomínio da política soviética em relação ao movimento comunista português vai-se revelando cada vez mais forte. Gomo nos fins de 1948 Estaline impusesse a todos os partidos comunistas do Mundo um acto de submissão absoluta, logo os seus párias portugueses escrevem no Avante! da 2.ª quinzena de Março de 1949:
« O povo português não pegará em armas contra a URSS e o exército soviético», e ainda o se o exército soviético, perseguindo agressores, atravessar as fronteiras de outros estados será recebido como libertador».
Assim, os comunistas portugueses não hesitaram em afirmar claramente que, se Portugal se erguesse com armas na mão para a defesa das suas fronteiras contra o imperialismo totalitário soviético, eles, digo, as hordas comunistas, estariam completamente ao lado desse imperialismo.
Em 1948 Moscovo, temendo, porém, os preparativos de defesa do Ocidente, que nessa altura se começavam a esboçar, lançou o primeiro movimento dos partidários, da paz por meio da organização satélite comunista: o Conselho Mundial da Paz. Logo também a propaganda da paz passa a ser a palavra de ordem do comunismo português e também das suas duas organizações satélites
- o M.N.D. e o M.U.D.J.
E em Julho de 1950 constituiu-se em Portugal a Comissão Nacional para a Defesa da Paz, após uma assembleia magna realizada numa escola particular de Lisboa.
E conforme um dos arautos dessa época, «o partido comunista português ... apoia sem reservas a comissão nacional para a defesa da paz e incita todos os seus militantes e simpatizantes a apoiarem igualmente sem reservas todas as iniciativas, etc.».
Foi de facto como candidato da paz que um antigo professor da Universidade do Porto se apresentou às eleições presidenciais de Julho de 1951, o que levou S. Ex.ª o Presidente do Conselho a declarar então:
«Como se explica ser a paz almejada por todos e constituir bandeira apenas de alguns?»
Não pode negar-se a ânsia s necessidade de paz sentidas em todo o Mundo. Quem fez a guerra, quem viveu a guerra, quem directa ou indirectamente lhe sofreu as repercussões económicas ou assistiu e participou nos inenarráveis sofrimentos a que deu causa não pode deixar de querer varrê-la da face do Mundo.
Com uma ingenuidade, porém, que abona os seus sentimentos pacíficos, mas não por igual forma a clarividência da sua política, as chamadas potências ocidentais pensaram atingir aquele objectivo desarmando e desmobilizando, enquanto a Rússia adoptara o processo mais realista e seguro de multiplicar as armas e reforçar as posições, não já como política de paz, mas como base de uma política de expansionismo e de hegemonia. E, tendo acontecido que muitos factos se encarregaram de matar as últimas ilusões acerca do que ela pretenderia, o Ocidente teve de rever as suas atitudes e começou o reforço intensivo dos seus meios de defesa. Então o objectivo russo da paz passou a ser prosseguido por duas políticas contrárias: uma por força da qual a Rússia comunista e os seus satélites se armam ; outra por meio chi qual se pretende que o Ocidente desarme. Esta é a política da paz, e quando prosseguida para cá do pano de ferro sinal do comunismo, bandeira da sua expansão.
E desta posição-base que havia de derivar a acção resta ate. Ninguém conhecedor dos dados fundamentais destas questões pode acreditar na .possibilidade de um governo comunista em Portugal. Pouco importa; havia de fazer-se o que se pudesse. O comunismo teria de ser um dos grupos aglutinados em Frente Popular e esforçando-se através dela por dissolver e fazer ruir, desde a moral à economia, as defesas da Nação. Sem falar em comunismo, sem decretar comunismo, sem operar, as grandes reformas agrárias, possivelmente mesmo evitando as nacionalizações, se não visse preferência em promovê-las para arruinar os respectivos sectores da produção, desviando o comércio para rumos convenientes, deixando cair a força armada, abrindo as portas à espionagem organizada através de representação diplomática e consular, a política do «candidato da paz» constituiria, com graves consequências imediatas ou futuras a que nem quero aludir, o grande serviço a Moscovo. Ela abriria uma falha no dispositivo ocidental de defesa e constituiria potencialmente séria ameaça para os planos desta.
O candidato da paz é também pela liberdade, sem dúvida a liberdade de preparar a sujeição a Moscovo. Mas, preparando e aceitando esta, evitaria ao menos a guerra? Meu Deus! Não. Tal política colocava-nos, pela sua cegueira, precisamente dos objectivos da luta, com o gravíssimo inconveniente de nos colocar do lado contrário àquele em que se situam os nossos interesses permanentes.
Contudo, a recolha de assinaturas para a propaganda da paz não foi apoiada com interesse por outros sectores da oposição demo-liberal e o Avante!, na sequência rígida da- política moscovita, inicia, como era fatal, o ataque contra todos os políticos que se recusaram, diga--se de passagem, patrioticamente, a fazer o jogo soviético.
A luta entre comunistas e não comunistas no seio da oposição acentuou-se então no período eleitoral de Outubro e Novembro de 1953. Novamente conhecidos oposicionistas são insultados no Avante! e entre eles o candidato às eleições de Fevereiro de 1949 e que se tinha submetido por completo ti sua política.
Entretanto tinha-se dado um facto da maior transcendência para o movimento comunista internacional: a morte do grande ditador de todos as Rússias, o marechal Estaline, anunciada ao Mundo em 5 de Março de 1953.
Em toda a imprensa clandestina portuguesa, exactamente como na, imprensa soviética, Estaline tinha sido até então incensado com os mas extravagantes elogios.
Na mensagem de condolências que o comité central do movimento comunista português enviou ao comité central do partido comunista da União Soviética e publicado no número especial dedicado a Estaline (n.º 176, de Março de 1953) lia-se, por exemplo:
A vida radiosa do grande e amado filho do povo soviético, do forjador, juntamente com Lenine, do invencível partido comunista da União Soviética, do seguro condutor das massas revolucionárias nos dias decisivos do grande Outubro, do genial estrategista do exército soviético na luta vitoriosa contra os intervencionistas, guardas brancos e invasores hitlerianos, do incansável defensor da pureza dos sólidos princípios do marxismo-leninismo e do internacionalismo proletário, do sábio construtor da sociedade socialista e genial construtor do comunismo - a vida de Estaline é um exemple magnífico, um incentivo poderoso e uma força mobilizadora das vastas massas populacionais na luta pela paz e pelo comunismo».
E na mensagem acrescentava-se:

«O partido comunista português garante aos trabalhadores portugueses e aos partidos comunistas irmãos que se manterá fiel aos ensinamentos de Lenine e de Estaline ... e que o povo português não participará numa guerra contra a União Soviética».

Página 847

847 3 DE JUNHO DE 1950

Mas em Fevereiro de 1056 realiza-se o XX Congresso do Partido Comunista da União Soviética e Krustchev é o novo chefe e o movimento comunista português procura logo mostrar v subserviência perante o novo secretário-geral, como se reconhece pelos artigos escritos nos n.os 209, 211 e 212 do Avante! Em todo o caso, o movimento antinacional procura ainda esconder os ataques que 110 XX Congresso se fizeram contra Estaline. Mas é inútil essa tentativa; no Avante! da 2.ª quinzena de Julho de 1056 já é clara a nova posição perante o novo ditador do império moscovita. E, assim, escrevia-se:
«O camarada Estaline não era um comunista modesto ... Estaline violou a legalidade socialista e permitiu que um bando de criminosos chefiado pelo traidor Béria (Béria, que o Avante! anteriormente tanto tinha, incensado) se servisse de uma tese falsa para cometer toda uma série de crimes e aniquilar bons militantes do partido e cidadãos soviéticos honrados, etc.»
Com a morte de Estaline terminou o período táctico do comunismo internacional que ficou sendo conhecido com u nome de «período de guerra fria»; isto não significa que ela ainda hoje nau se mantenha, embora com outros aspectos s designações. Mas os dirigentes do Kremlin, a pretexto da destalinização e da coexistência pacífica, estabeleceram um novo rumo táctico em que. procuram desagregar as potências ocidentais pela formação de amplos movimentos de unidade política e sob a direcção camuflada dos respectivos partidos comunistas locais. Essa nova táctica revolucionária foi iniciada pouco tempo depois da morte de Estaline e plenamente defendida por Krustchev no XX Congresso do Partido Comunista Russo.
Em Portugal o movimento comunista inaugura, também, logo que recebe instruções nesse sentido, um período táctico semelhante ao «de unidade ampla». Para esse «feito é convocada, em, Agosto de 1950, uma reunião clandestina do comité central, que os comunistas designam por TI Reunião Ampliada, a partir da qual começa de facto a viragem decisiva. Até essa data, como foi dito, os comunistas mantiveram uma política, de dureza dentro do movimento oposicionista; todos aqueles políticos oposicionistas que não estivessem resolvidos a aceitar o seu comando eram, como vimos, insultados na imprensa clandestina. A posição do movimento comunista português perante os netos eleitorais era sempre a mesma: abstenção! E todos os que não concordassem com esta posição eram denunciados como «inimigos do povo» e «agentes do fascismo ou do imperialismo norte-americano».
Depois da VI Reunião Ampliada a táctica modifica--se por completo. «O partido preconiza desde então a ida às eleições», e para ter êxito esta nova política aconselha um largo entendimento entre todas as correntes antinacionais, «com vistas á condução da batalha eleitoral».
«Que as massas populares, em especial a classe operária, se Lancem ardorosamente na batalha eleitoral», diziam, e «se organizem em comissões eleitorais nas cidades, nas vilas e aldeias, nas fábricas e nos campos, em toda a parte. A criação de uma vasta organização de massas constitui a mais sólida base de apoio de uma campanha eleitoral séria», afirmam os seus órgãos clandestinos.
«Que se trave desde já luta acesa pela mais ampla liberdade de propaganda e reunião durante a campanha eleitoral e pela fiscalização das eleições pula oposição».
«Que as massas populares se lancem abertamente na luta por reivindicações económicas e políticas de toda a espécie».
A reivindicação aparece assim unicamente como um simples método de agitação, e não como objectivo de obter qualquer melhoramento social. E, como era de esperar, começam também sensíveis corações neutralistas a pulsar em uníssono ao ritmo marxista. E em que condições se estabeleceria a desejada unidade?
Estas condições foram determinadas na reunião clandestina do comité central de Maio de 1956, após, como se disse na sua imprensa clandestina, «a luminosa análise do XX Congresso do Partido Comunista da União Soviética ter trazido uma contribuição decisiva», eufemismo, que significa apenas normas totalmente impostas por Moscovo.
Mas como seria possível atrair claramente os democratas oposicionistas não comunistas a este a vá s to movimento de unidade.» depois dos insultos que lhes foram dirigidos nas colunas do Avante!? O próprio Avante! reconhece que «a unidade não seria fácil, mas era necessária» (Avante!, 2.ª quinzena de Fevereiro de 1957). Para isso, o movimento antinacional tenta:
a) Desenvolver toda uma dialéctica de atracção - e é interessante a este respeito citarem-se algumas, das inúmeras palavras de ordem que aparecem na imprensa comunista para captar ingénuos e inocentes:

«A todos os democratas! A todos os anti-salazaristas! A união faz a força, o que divide enfraquece!» (Avante! n.º 226, 1.ª quinzena de Janeiro de 1957).
«Hoje e sempre lutaremos pela unidade nacional» (Avante! n.º 230, 1.ª quinzena de Março de 1957).
«A unidade da classe operária é uma necessidade histórica» (Avante! n.º 232, l.ª quinzena de Abri de 1957).
«Não nos deixemos arrastar para uma luta entre monárquicos e republicanos. Unamo-nos uns e outros contra Salazar» (Avante! n.º 237, 2.º quinzena de Junho de 1957).
«Por um bloco eleitoral anti-salazarista. A unidade é necessária. Organizemos a luta eleitoral. Em cada distrito uma só lista da oposição contra Salazar» (Avante! n.º 238, 1.ª quinzena de Junho de 1957), etc.
b) Fazer, por outro lado, uma «autocrítica» à sua actuação passaria, afirmando que errou e que esse erro se deve em grande parte ao «culto da personalidade», que em Portugal se traduziu pelo «culto do secretariado» e ainda pela «falta de direcção colectiva».
Nas «conclusões e decisões do comité central» na sua reunião clandestina nos princípios de 1907 e publicadas em O Militante de Fevereiro desse ano pode ler-se:
«O comité central conclui que no nosso partido existiu, a par do culto da personalidade em geral, o culto do secretariado em particular».
E esse artigo conclui que foi o culto da personalidade do secretariado o maior responsável pela atitude intransigente do partido perante os democratas, oposicionistas não comunistas desde 1948. São estes os primeiros acenos de amor ao demo-liberalisino republicano e monárquico.
Afirma-se mais nesse manifesto:

I) «Coube ao partido comunista da "União Soviética o grande mérito de contribuir decisivamente para a eliminação do culto da personalidade e das suas consequências ao descobrir e denunciar as raízes históricas e ideológicas deste fenómeno estranho do marxismo-leninismo. O grande mérito de armar ideologicamente os partidos comunistas e o movimento operário internacional contra esta grave deformação dos princípios do marxismo-leninismo coube ainda ao partido comunista da União Soviética com a discussão tra-

Página 848

848 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 114

çada no XX Congresso e a publicação da «Resolução sobre a eliminação do culto da personalidade e das suas consequências, cujo estudo atento se recomenda a todos membros do nosso partido».

II) «... o comité central do partido comunista, português aprova a declaração da comissão política do comité central do nosso partido que reafirma a sua confiança, no partido comunista da União Soviética e no seu comité central ante a sua posição leninista e mostra o seu reconhecimento pela sua preciosa contribuição ao movimento operário internacional e au nosso próprio partido ao denunciarem o culto da personalidade e as suas consequências e. au rectificarem-se algumas das suas teses que não eram acertadas»
III) «Coube ainda ao XX Congresso do Partido Comunista da União Soviética o mérito de não ter ensinado a compreender o erro dogmático ...»
Não se pode ser mais claro, de novo, sobre o comando que o partido comunista da União Soviética continua-a exercer em todos os movimentos dos comunistas portugueses.
E esta autocrítica foi a fornia hábil de se efectuar a viragem para a política de atracção dos oposicionistas demo-liberais. Foi o estender e o primeiro apertar de mão.
E como epílogo de um período táctico não se hesitou, como, de resto, é costume, em lançar às feras, como principal responsável pelo desvio, o Prof. Rui Luís Gomes, que, a como representante dos sectores mais radicais das forças democráticas, não podia, como não pode realmente, agrupar à sua volta todas as correntes políticas interessadas numa mudança de regime», segundo se diz em O Militante n.º 91. Em necessário, de facto, ampliar os horizontes do paraíso soviético até onde pudessem caber tantos democratas desejosos da paz social oferecida pela Rússia a todos os contrários ao culto da personalidade.
E assim se alargou o ambiente de recepção para mais umas centenas de candidatos suicidas.
O movimento comunista planeava assim o estabelecimento de «uma nova posição em relação aos próximos actos eleitorais», de harmonia com a qual, este movimento antinacional pudesse «aceitar a ida às eleições sem exigência prévia de condições mínimas», sendo ainda fundamental que se estabelecesse um largo entendimento entre todas as correntes oposicionistas, com vista à condução da batalha eleitoral. A criação de uma ampla frente eleitoral à volta de um programa mínimo, abarcando não somente os democratas da esquerda e da direita,- era assim a directriz da nova táctica do comunismo internacional.
E para tal era preciso que se desenvolvesse uma luta activa por reivindicações económicas e políticas de toda a espécie.
Surgiram assim palavras de ordem da seguinte índole:

Luta pelo aumento imediato de salários, jornas e vencimentos.
Luta contra os elevados impostos.
Luta contra os monopólios.
Luta pela elevação do bem-estar material do povo português.
Luta contra a censura.
Luta por uma amnistia imediata a todos os presos políticos e sociais.
Luta pela defesa da paz.

Sérgio Vilarigues, sob o pseudónimo de Amílcar, afirma que esta condição seria decisiva para elevar a combatividade das massas populares e para enfraquecer e desagregar a infra-estrutura nacional, garantindo assim a participação de uma larga massa de indivíduos no acto eleitoral.
Para realizar estes diabólicos desígnios o movimento decidiu, como disse em Janeiro de 1957, dissolver o desacreditado M.N.D. (Movimento Nacional Democrático), encabeçado pelo Prof. Rui Luís Gomes, instituído em Fevereiro de 1949, após a queda do Movimento de Unidade Democrática (M.U.D.).
Como; porém, o partido não poderia manter-se nem agir sem organização nem quadros, era necessário também estabelecer nova estrutura e enquadrar os seus elementos militantes. Assim, foi logo preconizada a formação de «comissões eleitorais nas cidades, vilas e aldeias, nas fábricas e campos, e em toda a parte», no decurso do espaço de tempo que medeia entre Outubro de 1957 e a campanha presidencial do Verão de 1958.

Foi assim que, num manifesto comunista publicado nessa altura, se dá notícia dos funcionários da nova estrutura orgânica das forças antinacionais.
Assim propunha-se:

1.º A imediata constituição de comissões cívicas eleitorais em todos os distritos;
2.º A promoção, em breve prazo, de assembleias distritais oposicionistas para a aceitação dos candidatos da oposição;
3.º A urgente organização dos serviços eleitorais de cada distrito;
4.º A constituição dê unia comissão cívica eleitoral nacional, formada por um candidato de cada uma das listas da oposição que forem apresentadas ;
5.º A oportuna convocação pela comissão cívica eleitoral nacional de uma assembleia oposicionista do escalão nacional.
Estas palavras constituem matéria elucidativa para definir as características indiscutivelmente comunistas do movimento oposicionista que haveria de arregimentar tantos e tantos demo-liberais das esquerdas e das direitos.
Terminada a campanha de 1907, o movimento comunista prepara-se para a nova campanha eleitora] de 1958, para ele a mais importante, pois tratava-se de conseguir êxito no golpe de Estado constitucional. A táctica continua, porém, a ser a mesma. Mas agora aparece um elemento novo - um militar já conhecido pela inconstância das suas ideias políticas, mas que tinha dentro da sua carreira exercido funções de algum vulto no País e no estrangeiro. E, assim, no decorrer do período de preparação eleitoral, e mais tarde no decorrer dele, realizou o movimento comunista um hábil trabalho de Aglutinação das forças dispersas do demo-liberalismo português.
Porém, num manifesto reproduzindo uma declaração da comissão política do comité central do movimento comunista, datada de 7 de Fevereiro de 1958, e intitulada «Ao povo português, sobre as eleições à presidência da República», a candidatura do referido militar ainda era severamente condenada, pelo movimento comunista, denunciando-a até como uma manobra de divisão das forças salazaristas.
Assim, podia ler-se nesse documento:

«O general Humberto Delgado é o tipo de candidato que não interessa às forças da oposição. Ele tem sido desde sempre adepto de Sal azar e defensor do regime fascista. Igualmente tem insultado e caluniado publicamente a democracia ...».

«Nestes últimos meses, depois do seu regresso dos Estados Unidos, onde ocupou altos cargos de confiança dos Governos norte-americano e Português, o general
Humberto Delgado foi empossado de novo em altos

Página 849

849 3 DE JUNHO DE 1959

cargos e missões que mostravam que continuava a ser homem de confiança do regime e dos imperialistas americanos e ingleses ...».
«O partido comunista português penso que a candidatura do Sr. General Humberto Delgado representaria um grande prejuízo para a causa democrática e anti-salazarista. Uma tal candidatura corresponderia aos objectivos divisionistas s antidemocráticos dos salazaristas e dos seus patrões americanos».
«Estas são as razões mais do que suficientes para que o partido comunista português se pronuncie contra a candidatura do general Humberto Delgado ...».
Neste documento, que se refere várias vezes ao «general fascista», o movimento comunista português sugeriu ainda a escolha de «um candidato democrático que se apoiasse num forte movimento eleitoral de massas, para cortar o passo aos aventureiros políticos e assegurar êxito às forças da oposição».
A atitude dos comunistas é então clara: contra o general fascista!
Há, contudo, neste texto a que acabamos de nos referir uma pequeno passagem sobre a qual convém chamar u atenção, porque, apesar dos ataques dirigidos contra o referido militar, entreabre uma parta para uma possível aproximação com ele. Assim, reza o texto referido.
«Se entretanto o general Humberto Delgado desejar enfileirar ao lado dos anti-salazaristas, se deseja uma mudança de regime e de governo, que o mostre publicamente, por palavras e netos ...».
Algumas semanas mais tarde, após várias tentativas de elementos grados do falhado demo-liberalismo português, o movimento de oposição democrática decidiu escolher como candidato da oposição às eleições para a Presidência da República um cidadão, advogado e artista - o Dr. Arlindo Vicente. E os comentários do Avante! continuam a manter-se desfavoráveis para o general. Censura-lhe entoo asperamente ter exercido «funções dirigentes na milícia fascista da Legião Portuguesa»: Todavia, a linguagem é já um pouco mais conciliante e os apelos mais insistentes: «Não quer em as atribuir-lhe intenções ditatoriais de tipo fascista - escreve-se -, mas 03 objectivos da sua candidatura não são claros». Mais adiante, em caracteres destacados: «Isto significa que, apesar de não ter sido possível um entendimento entre as força democráticas e anti-salazaristas para a apresentação de uni único candidato, é possível unirem-se agora na luta. por objectivos que sejam comuns às duas candidaturas e a todos os
anti-salazaristas».
O número seguinte do Avante! (n.º 254, da l.ª quinzena de Maio de 1958) não contém já um único ataque contra Delgado e renova, pelo contrário, os insistentes apelos para uma acção comum.
A estes apelos o já referido militar não ficou insensível e os necessários contactos foram estabelecidos para uma acção comum. Um bloco eleitoral único foi então constituído após a retirada estratégica da candidatura do Dr. Arlindo Vicente, e o movimento comunista apoia com calor esta decisão nos seguintes termos, que se lêem no Avante! da 1.º quinzena de Junho de 1958: «A patriótica decisão de unificar as duas candidaturas oposicionistas em apoio do general Delgado, combativo candidato, etc.».
Como vemos, a autocrítica e consequente expurgo fascista demorou pouco tempo.
E a partir de então o candidato único beneficiou em toda a sua campanha do apoio total do movimento antinacional. Por ocasião das suas reuniões eleitorais o movimento comunista pôs à sua disposição todo o seu experimentado aparelho subversivo e mobilizou as milícias do Porto, de Lisboa e de outras cidades e, aproveitando hábeis reacções psicológicas segundo as regras de uma técnica já largamente experimentada noutros países, provocou as explosões emocionais e os tumultos do Porto e de Lisboa.
Logo que terminaram as eleições o movimento comunista desejou consolidar os resultados e principalmente as suas ligações com as «massas». Tentou assim mobilizar grupos de trabalhadores por meio de greves gerais. A violência da acção originou os necessárias medidas de defesa da ordem pública e o candidato oposicionista mantém-se sempre solidário com os comunistas. Honra lhe seja feita. Paralelamente, o movimento comunista multiplica as suas tentativas para dirigir todo o movimento de resistência anti-salazarista.
Em l de Julho a comissão política do convite central do partido comunista português publica mais um apelo para a unificação da resistência e criação de uma direcção única e ao mesmo tempo provoca várias perturbações no decorrer do Verão e do Outono em todo o País:

Na reunião do comité central que teve lugar em Agosto de ]958 o «camarada Freitas», pseudónimo de Jaime Serra, membro do comité central preso depois, fez no seu relatório, a crítica das greves de Junho e julho nos seguintes termos: «a ordem de greve foi justa e oportuna, mas houve muitos erros na. sua apresentação». O movimento comunista português não podia, porém, apreciar o exacto valor da luta, das massas, porque untes de 8 de Julho não tinha organizado nenhuma luta reivindicativa de carácter económico. Além disso, a ordem de greve fez realçar, segundo Freitas, «falta de entusiasmo entre os militantes comunistas, e até nalguns quadros altamente responsáveis». Também alguns membros do partido manifestaram, segundo ele, «um sectarismo que impediu os trabalhadores de seguir em mossa o movimento». Finalmente, segundo o mesmo dirigente comunista, «o papel de motor dos comités de greve foi muitas vezes desconhecido e o movimento traduziu a grande fraqueza das organizações do partido, sobretudo na região de Lisboa».
Na l.ª quinzena de Agosto o Avante! publicava uma curta pessoal do general Delgado ao Ministro do Interior. Era o verdadeiro epílogo da triste aliança com os elementos da anti-Naçõo.
No começo de Dezembro o movimento comunista sofre mais um grande revés. A polícia prendeu numerosos instigadores dos movimentos do Verão e do Outono, entre os quais três membros do comité central: Pedro Soares, Joaquim Gomes e Jaime Serra (aliás Freitas), sendo este último o principal responsável pela agitação e pelas greves.
Numerosas casas clandestinas foram então também ocupadas no Porto, Coimbra e Lisboa, e entre elas um atelier tipográfico.
Entre os documentos apanhados encontravam-se listas de subscritores do partido e, facto característico, a documentação do M.N.I. (Movimento Nacional Independente), nova organização satélite comunista, que, em manifestos clandestinos, apontava como presidente o general Delgado.
O movimento comunista, deixado a si próprio, pouca importância teria ainda hoje em Portugal. O perigo reside apenas no facto de a Rússia se estar a interessar cada. vez mais pelo comunismo peninsular, e este interesse dá forças a movimentos subversivos e lança a confusão nos espíritos de alguns, atrai mesmo ingénuos e almas simples, que nada sabem sobre n espantosa tirania dos governos comunistas; desorienta alguns espíritos jovens ainda não completamente formados e alicia certos intelectuais desejosos de emoções fortes.

Página 850

850 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 114

Não é, pois, contra nacionais que teremos de lutar; é, sim, contra os agentes das escolas soviéticas, especialistas em técnicas científicas de agitação de massas e de propaganda, que se infiltram constantemente nos mais diversos meios, provocando climas emocionais favoráveis à subversão e à insurreição, e que só têm por objectivo único lançar-nos na escravatura do imperialismo soviético.
Depois da subida do general De Gaulle ao poder, grande parte do aparelho comunista internacional deslocou-se para Roma.
Correios misteriosos, constituídos por jovens ou intelectuais de que pouco se poderia suspeitar, fazem, com frequência, viagens entre essas capitais e Lisboa, levando informações e trazendo ordens, directrizes e dinheiro.
Nas escolas de subversão de Praga s da U.B.S.S., jovens nascidos em Portugal, alguns das nossas províncias ultramarinas, seguem os cursos de subversão e aprendem as técnicas insurreccionais para semear o ódio e a guerra civil entre irmãos.
Por vezes, agentes estrangeiros do aparelho comunista internacional continuam a deslocar-se também ao território nacional. Isto aconteceu, por exemplo, durante o período eleitoral de Maio de 1958, e a decisão tomada na reunião clandestina de 2 de Maio desse ano do comité central do movimento comunista português de apoiar a reunificação das duas candidaturas da oposição foi decidida após a aprovação de um dos tais agentes que se deslocou ao nosso país como caixeiro viajante de uma casa estrangeira de aparelhagem eléctrica.
A preparação das acções insurreccionais durante essa campanha eleitoral, principalmente a da noite de domingo 18 de Maio, a propósito da sessão de propaganda da oposição a favor da candidatura do general Delgado, foi tão minuciosa que bem denunciou a intervenção de verdadeiros peritos em tal matéria.
E a traição continua. Ao XXI Congresso do Partido Comunista da União Soviética, realizado nos princípios deste ano, assistiu uma delegação comunista portuguesa e grupos de jovens comunistas e criptocomunistas aqui nascidos vão todas as férias grandes aos países para além da «cortina de ferro», indo alguns até à China Popular beber as últimas novidades dessa escravatura amarela.
Tudo isto nos mostra que a acção soviética contra Portugal não revela tendência para diminuir, antes, pelo contrário, está a intensificar-se. S. Ex.ª o Sr. Presidente do Conselho, com o seu admirável poder de antevisão, pôs bem, em recente e notabilíssimo discurso, o dedo na ferida. E é esta acção que torna extremamente perigoso o movimento comunista português, que, deixado aos seus próprios meios, rapidamente se desagregaria.
Aliás, não temos de nos admirar com isso. O comunismo, impedido de penetrar frontalmente na Europa Ocidental, procura hoje actuar nos países periféricos deste continente. Assim se explica igual actividade na Finlândia, na Grécia e na Islândia.
Mas o caso português apresenta outras características que explicam a maior intensidade do ataque do comunismo internacional sobre o País.
O regime nacional é, por sua essência, pelos seus princípios e pela forma como conseguiu os êxitos indiscutíveis da sua política, profundamente anticomunista. Fomos doutrinàriamente os pioneiros do anticomunismo na Europa. Salazar é o representante máximo dessa luta. O seu exemplo é considerado, por isso, como muito perigoso para os sovietes. Daí a campanha anti-salazarista da oposição portuguesa.
Portugal não é também só esta pequena faixa atlântica da Península Ibérica. O território nacional estende-se largamente por mais três continentes. As .províncias ultramarinas de Angola e Moçambique, principalmente, são bastiões fundamentais contra a infiltração comunista em vasta zona africana. Há que derrubar esses bastiões. Mas isso será impossível enquanto a política do regime for uma política nacional. Este o motivo fundamental para os comunistas quererem por todos os meios desagregar a Nação Portuguesa.
E, enquanto actuam nesse sentido, vão procurando infiltrar-se nas províncias ultramarinas. Este aspecto será tema de uma próxima intervenção nesta Assembleia.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem !
O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Martinho Lopes: - Peço a palavra, Sr. Presidente !

O Sr. Presidente: -V. Ex.ª desejava falar sobre que assunto?

O Sr. Martinho Lopes: -Sobre a posse do novo Governador de Timor.

O Sr. Presidente: -Reconheço que esta era, efectivamente, a sessão oportuna para V. Ex.ª usar da palavra sobre o assunto. No entanto, como a hora já vai adiantada, V. Ex.ª fica com a palavra reservada para amanhã.
Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continuam em discussão na generalidade a proposta e projectos de lei de alteração à Constituição Política.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lima.

O Sr. Carlos Lima: - Sr. Presidente: são várias e incidem em aspectos diversos da nossa lei fundamental as alterações a. ela propostas, em natural sequência e desenvolvimento da deliberação tomada por esta Assembleia no sentido de proceder à respectiva revisão.
Pensei inicialmente em aproveitar este debate na generalidade para, tomando um por um os diferentes projectos de alteração apresentados, sobre eles mo debruçar ordenada e sucessivamente e fazer as observações que julgasse oportunas relativamente às ideias mestras e aos principias mais gerais que, porventura, os envolvessem e servissem de pano de fundo às soluções concretas directamente vertidas em cada uma das modificações propostas.
Depressa, porém, conclui não ser essa a melhor e mais correcta maneira de proceder, e isto não só porque me levaria demasiado longe num esforço de abstracção de duvidosa utilidade, mas ainda porque se me figurou ser contra-indicada por razões de ordem sistemática.
Por serem despidas de relevante interesse, dispenso--me de pormenorizar estas razões.
Direi apenas que, ponderando todas as circunstancias susceptíveis de interferirem ou condicionarem uma orientação no plano sistemático a que me tenho referido, acabei por estabilizar o meu pensamento numa posição que resumidamente pode definir-se assim:
Apreciar no debate na generalidade o projecto de alteração que eu próprio entendi deve apresentar, apreciação que, por natural reflexo e associação, implica

Página 851

3 DE JUNHO DE 1959 851

também tomar posição sobre as partes dos demais projectos que podem inserir-se no mesmo quadro de ideias fundamentais que o informam;
Devolver para a discussão na especialidade as considerações e reparos que julgue dever fazer sobre as várias soluções concretamente gizadas no articulado dos projectos.
Deste esquema de acção extraio e individualizo hoje, precisamente, o projecto por mim oportunamente enviado para a Mesa, com o objectivo de dizer alguma coisa sobre as ideias mais vastas que o suportam e com que implica.
Antes, porém, de me deixar envolver na teia de considerações que girarão à volta do projecto que apresentei, quero ainda tocar num ponto preliminar.
A propósito da deliberação tomada por esta Assembleia no sentido de antecipar a revisão da Constituição, foi suscitada a questão de saber qual o preciso alcance e exacta interpretação do respectivo artigo 176.º e seu § 1.º, que regulam precisamente a matéria da revisão constitucional.
Houve quem - contra a orientação pressuposta como boa e conforme à Constituição pela Assembleia Nacional - sustentasse, por um lado, que a deliberação tomada foi redundante, uma vez que, à face desse artigo 176.º, já dispunha a Assembleia de poderes constituintes independentemente de qualquer deliberação concretamente dirigida a assumi-los e, por outro lado, que, se porventura assim não fosse, isto é, se realmente devesse entender-se não dispor a Assembleia desses poderes por determinação do corpo do artigo 176.º, então a verdade é que não poderia assumi-los ao abrigo do respectivo § 1.º, e isto pela circunstância de se não verificar a situação de facto condicionadora da aplicação e funcionamento da revisão antecipada prevista e admitida nesse parágrafo.
Dada esta divergência de interpretações, chegou a pôr-se ao meu espírito a hipótese de procurar esclarecer o problema, suprimindo quanto possível a possibilidade de discussão mediante uma adequada e mais precisa redacção dos referidos preceitos.
No entanto, visto o texto constitucional mais de perto e mais atentamente, convenci-me sinceramente não só de que esta Assembleia tinha necessidade, à face da Constituição, de deliberar assumir - como deliberou - poderes constituintes, mas ainda de que podia fazê-lo precisamente com base no § 1.º do artigo 176.º
Quer porque o problema não apresenta de momento relevo prático, quer porque a sua análise em profundidade conduziria explicàvelmente a deslocá-lo para um plano acentuadamente técnico mais compatível com o respectivo estudo em revistas da especialidade, pareceu-me indicado que para estas fosse devolvida a sua análise e apreciação.

O Sr. Carlos Moreira: - Muito bem!

O Orador: - De qualquer modo - é este o ponto que pretendo deixar vincado - não me pareceu que a interpretação do artigo 176.º e § 1.º da Constituição suscitasse dúvidas suficientemente, consistentes. Daí ter-me abstido de propor alterações de redacção a tais preceitos.
Feitos os resumidos apontamentos preliminares que resultam do que fica exposto, é tempo, Sr. Presidente, de dizer alguma coisa sobre o projecto de lei de alteração à Constituição que apresentei.
Parece-me ser evidente o espírito que penetra e a orientação geral que molda esse projecto.
A ideia suporte e fundamental que com naturalidade e sem esforço dele se extrai é esta: alargamento do âmbito da competência e das possibilidades de acção da Assembleia Nacional.
É certo que, bem vistas e ponderadas as coisas, essa ideia apenas frutificou modestamente no limitado número de soluções concretas que integram o projecto.
Por isso mesmo é natural que, se me fosse possível reelaborá-lo neste momento, outras aplicações e desenvolvimentos fizesse da mesma ideia-base, com inevitáveis reflexos, é claro, no traçado constitucional da posição relativa, mormente no plano funcional, dos diversos órgãos da soberania.
Porém, o limitado prazo e as especiais circunstâncias da minha vida particular em que tive de conceber e apresentar o projecto não me deixaram a possibilidade de fazer aquele estudo e meditação que, em consciência, reputo indispensáveis para honestamente tomar posição em quaisquer problemas, e designadamente naqueles que, como o da revisão constitucional, se revestem de uma importância e melindre que se torna redundante vincar e pôr em relevo.
Assim, apenas propus alterações que se me afiguraram, desde logo e com espontaneidade, resultarem de elementares considerações de razoabilidade, de atendíveis exigências das realidades e até de naturais implicações de lógica jurídico-política.
E justamente porque tais alterações se alinham num plano de relativa modéstia é que, desde que entre nós existe - e deve continuar a existir - uma assembleia política, reputo a aprovação das minhas propostas ou de outras de significado semelhante, embora apresentadas sob forma diversa, como uma necessária contribuição mínima para o devido e justo relevo constitucional, indispensável força de convicção e desejável eficiência da Assembleia Nacional.
Todavia, para além do que as soluções concretas enquadradas no projecto possam valer pelo que envolvem e em si mesmas significam no plano de estrutura e coordenação dos órgãos da soberania, parece-me isento de dúvida que terão um outro alcance, o qual, conquanto reflexo, nem por isso deixará de ser porventura o mais relevante e significativo.

que, quer se queira quer não - é um ponto que ultrapassa os limites de comando e contrôle da vontade -, o projecto de lei que apresentei, como, aliás, os demais, terá ainda o específico alcance de implicações mais vastas, que lhe será emprestado por esta Assembleia ao tomar posição e ao votar sobre ele. Realmente, a orientação que vier a ser adoptada não esgotará os seus efeitos em aprovar ou rejeitar mais um projecto do lei, mas antes, e até por virtude da respectiva incidência em determinado condicionalismo de facto, ficará a constituir um índice ou sintoma que contribuirá para permitir inferir uma certa posição de princípio e um determinado espírito e concepção quanto à maneira de encarar dados e realidades que não podem deixar de ser meditados e tidos em conta.
Disse há pouco que a ideia directriz das soluções propostas se cifrava num alargamento das possibilidades de acção da Assembleia Nacional.
Quem desprevenidamente olhar esta afirmação pode ser, um tanto explicàvelmente, conduzido a supor que o projecto arrasta consigo e envolve um problema de formas políticas no sentido de poder pôr em causa a própria estrutura essencial e característica do sistema que entre nós foi adoptado como processo de repartição e exercício do poder político.
Tal visão não seria, porém, exacta, por lhe atribuir uma dimensão que, dados os termos em que está e teve de ser concebido, a sua recolhida importância não comporta nem legitima.
É que constitui a própria evidência ser possível introduzir alterações na contextura e potencialidades de acção

Página 852

852 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 114

dos órgãos da soberania, sem afectar as linhas essenciais e características dominantes do esquema político que estiver em causa.
Por outras palavras: as modificações constitucionais que afectam a posição relativa dos órgãos da soberania podem ou não, consoante os casos, ter virtualidade pura envolver diferenciação ou transformação da forma politica vigente.
Tudo depende da natureza, grau e intensidade dessas modificações.
Ora as propostas contidas no projecto de lei por mim apresentado são precisamente daquelas que, pelo seu atenuado e limitado alcance, não tem tal virtualidade, inserindo-se antes sem esforço adentro das traves essenciais dos nossos quadros políticos, que naturalmente as comportam e, sem se desvirtuarem, assimilam.
A existência das assembleias representatívas anda ìntimamente associada aos problemas da legitimidade do poder político e da sua necessária divisão por diversos órgãos, imposta por princípios doutrinais correntemente aceites e por claras e inafastáveis exigências de ordem prática.
É certo que no plano da especulação teórica muito se tem dito e discutido à volta da chamada «separação dos poderes», interpretada e concebida em termos diversos, a que não são alheios inevitáveis prejuízos do determinadas concepções e preconceitos em nítida conexão com certos condicionalismos políticos e sociais.
Independentemente, porém, das discussões e habilidades dialécticas que a tal respeito seja possível engendrar, existe um dado e ponto de partida que subsiste e sobre o qual tem de assentar toda e qualquer construção política aceitável: o de que a divisão do poder político entro diversos órgãos da soberania, actuando em coordenada colaboração para além dos alicerces teóricos em que possa radicar-se, constitui necessário elemento integrador de todo o processo técnico eficaz de pràticamente limitar o mesmo poder político em face daquela esfera de realidades humanas que legitimamente não pode absorver, mas antes deve respeitar como zona de acção imprescindível à afirmação do indivíduo enquanto tal.
Porém, porque é assim, para que o princípio - se se quiser, mais pragmàticamente, a técnica- da divisão de poderes desempenhe realmente a função limitadora que lhe está assinalada indispensável se torna, é claro, que a divisão seja verdadeira, equitativa e equilibrada.
Não basta, é evidente, como em todas as coisas, uma repartição de poderes meramente formal e aparente que redunde na efectiva atribuição da parte leonina do poder político a um dos órgãos da soberania, por modo a transformar-se da divisão em verdadeira concentração e absorção.
Ora nessa divisão de poderes apareceram, e não se vislumbra como possam deixar de aparecer, as assembleias representativas, natural e característica expressão da vontade das comunidades, como titulares e detentoras de uma quota-parte, geralmente substancial, do poder e comando políticos.
E, não obstante a divisão não poder ser, em regra, construída e moldada à base de rígidas e estanques classificações das chamadas funções do Estado, mas sim orientada por critérios pragmáticos determinadores de um doseamento adequado na intensidade política das posições relativas dos órgãos da soberania, doseamento feito à base de considerações de razoabilidade, oportunidade e bom senso, não obstante, portanto, essa interferência de critérios realistas, a verdade é que a função legislativa, como expressão jurídica mais relevante da actividade política, sempre tem competido, em princípio, às assembleias representativas, como espontânea e mais viva emanação da fonte legitimadora do próprio poder político.
Constitui isto um incontestável dado histórico que não é prejudicado, no que tem de essencial e mais significativo, pelas verdadeiras características e nuances de um determinado processo evolutivo que adiante se apreciará e que com frequência deformadamente é interpretado e descabidamente invocado como argumento em determinado sentido.
Por outro lado, até porque as demais actividades integradoras das funções básicas do Estado não parece poderem ajustar-se em condições aceitáveis e ser eficazmente exercidas por órgãos do tipo assembleia, a estas deverá ficar naturalmente reservado o essencial da função de legislar.
Quer dizer: em princípio a função legislativa tem entrado e deve continuar a entrar no círculo e âmbito da competência das assembleias representativas.
E é justamente à luz esclarecedora deste princípio temperado e coordenado com determinadas realidades, sem dúvida atendíveis, que de momento não importa referir, que se explicam e justificam as alterações por mim propostas à Constituição Política no sentido de reforçar um pouco a função legislativa da Assembleia Nacional.
Não vá, no entanto, pensar-se que essa justificação se circunscreve e detém no plano mais ou menos longínquo dos dados históricos e das abstracções doutrinais.
Muito pelo contrário, e não obstante o que por vezes é afirmado em diverso sentido, as soluções por mim propostas fundamentam-se também no próprio direito positivo, e isto na medida em que da nossa Constituição se extrai e infere, a meu ver claramente, a conclusão de que nela se acolheu e deu guarida no aludido princípio de que orgão essencialmente legislativo é a Assembleia Nacional.
Não tenho principalmente em mente, ao fazer esta afirmação, n circunstância de o artigo 91.º, em que se define a competência da Assembleia, enunciar logo no seu n.º l a função de fazer leis, revogá-las, etc., embora tal circunstância naturalmente insinue, como que numa preocupação de hierarquização de funções, que o fazer leis deve ser o objecto mais relevante e característico da actividade da Assembleia.
Porém, o que tenho mais em conta como fundamento da asserção agora em causa, de que, à face da nossa Constituição, a Assembleia Nacional constitui o órgão legislativo por excelência, é antes a resposta que me parece dever ser dada e ajustar-se às seguintes interrogações:
Porque é que determinadas matérias, precisamente das reputadas mais importantes, de maior interesse e significado para a Nação, são da exclusiva competência da Assembleia, não podendo, por conseguinte, o Governo sobre elas legislar mediante decretos-leis\e estando, portanto, quanto a este ponto, numa posição de inferioridade?
Porque é que, apesar de tudo, os decretos-leis publicados durante o funcionamento efectivo da Assembleia estão sujeitos a ratificação desta, à qual, por isso, cabe a última palavra sobre a respectiva bondade, justeza e oportunidade?
Porque é que, em regra, só a Assembleia Nacional, o de qualquer modo nunca o Governo, pode tocar e introduzir alterações na lei fundamental da Nação?
Porque é que à Assembleia é atribuída uma categoria constitucional que lhe permite conferir autorizações legislativas de que o Governo, em posição subordinada, beneficia, e aproveita?
Porque é que o Chefe do Estado não pode, cumprido o que dispõe o $ único do artigo 98.º, recusar, mediante um veto definitivo, a promulgação de leis aprovadas pela Assembleia e pode fazê-lo relativamente aos de-

Página 853

3 DE JUNHO DE 1959 853

cretos-leis provenientes da actividade legislativa do Governo?
Porque é que nos artigos 102.º e seguintes se organizam a estrutura e funcionamento da Câmara Corporativa fundamentalmente em função e tendo em conta o exercício da actividade legislativa pela Assembleia?
Porquê todas estas soluções constitucionais de que manifestamente resulta ser a produção legislativa mais categorizada, melindrosa e profunda da competência da Assembleia Nacional, de que se infere uma maior riqueza qualitativa no conteúdo dessa competência, de que se extrai, em certa medida, a natureza que a Assembleia tem de útimo contrôle legislativo e em que aflora a particular intensidade e incisiva força desta no desenvolvimento do próprio processo legislativo?
Porquê tudo isto?
Porque, por mais argumentos e esforços dialécticos que se façam para demonstrar o contrário, sempre está subjacente e vivo na nossa estrutura constitucional este dado, que, intocado, se impõe e ressalta a plena luz: o órgão legislativo entre nós é, em princípio, a Assembleia Nacional.
E, vá-lá, acrescente-se que nem sequer se descortina como poderia alterar-se tal princípio em termos de, neste aspecto, Assembleia e Governo serem colocados no mesmo plano, numa posição de igualdade qualitativa.
Contra o exposto nada vale, nada adianta, argumentar a propósito deste ponto com a maior quantidade de legislação emanada do Governo, nem com destrinças, só por si duvidosas e muito equívocas, entre uma verdade real consistente em ser o Governo quem mais legisla e a verdade formal, traduzida no texto constitucional, de que a Assembleia é o órgão legislativo, para a partir daí, dessa destrinça, através de um processo de raciocínio tortuoso, que condeno sem reservas, se pretender sobrepor situações de facto ao espírito e legalidade constitucional, como se essas situações de facto pudessem constituir alicerce legítimo - e único alicerce- de soluções políticas e não houvesse ideias e princípios respeitáveis a ter em conta.

O Sr. Carlos Moreira: - Muito bem!

O Orador: - Este género de argumentação, que já foi mais de uma vez utilizado em pareceres da Câmara Corporativa, e no qual se reincide no último, elaborado sobre o projecto de lei que apresentei, implica, ao fim e ao cabo, comprimir e despir de alcance prático um princípio cuja bondade, exactidão e, até, necessidade directamente e de frente se não tenta sequer pôr em causa.
No direito vigente e, de um modo especial, perante a lei fundamental da Nação, que não pode deixar de merecer um respeito particularmente vincado pelo qual se afira-a consistência da própria legalidade do Estado, só pode haver uma verdade, que é a verdade constitucional. Se esta não é boa, discute-se e altera-se pelos mais competentes, mas contra ela não se pode argumentar com situações de facto.
Para isso é que existe uma Constituição, e mal terão de ir as coisas se as suas bases forem afectadas por processos mais ou menos distorcidos.
Adiante voltarei mais detalhadamente a este ponto.
De momento importa apenas fixar: que, à face da nossa Constituição, a Assembleia Nacional é, em princípio, o órgão legislativo; que mesmo na hipótese de tal não suceder estaria indicado que as coisas se encaminhassem nesse sentido.
Deste ponto de partida impõe-se que sejam extraídas as suas naturais e lógicas consequências, e nunca neutralizá-lo e inutilizá-lo através de soluções concretas mais ou menos enviesadas e discretas.
O que acabo de dizer não significa, evidentemente, que o referido princípio haja de ser mantido, em todas e quaisquer circunstâncias, com uma rigidez absoluta, em homenagem a abstracções fantasistas, a preconceitos injustificáveis ou a deformações condenáveis.

Pelo contrário, também aceito, com um sentido das realidades que sempre me esforço por ter na devida conta, que as assembleias representativas, mesmo quando em condições de poderem concretizar todas as suas potencialidades de acção em termos de funcionarem em pleno rendimento não podem fazer face às múltiplas e prementes exigências legislativas de uma época cujas infra-estruturas sociais são imensamente complexas e caracterizadas por uma perturbadora mobilidade.
Aceito, portanto, restrições ao princípio de que às assembleias é que compete legislar, aceito que se não trata de uma regra absoluta e sem elasticidade, mas precisamente porque o exercício da função legislativa por outro órgão envolve restrições a um princípio dado como bom, só posso admiti-lo se e na medida em que for justificado e imposto por atendíveis exigências sociais.

O Sr. Melo Machado: -Muito bem!

O Orador: - Ora as alterações por mim propostas ao texto constitucional são, como melhor procurarei demonstrar, sem dúvida daquelas que, em nada paralisando a indispensável maleabilidade na acção do Governo frente às solicitações das realidades e das necessidades da Administração, contribuem - apenas contribuem- para salvaguardar o princípio, muito respeitável, de que é à Assembleia Nacional que compete legislar.
Assim, neste plano mais geral, a fundamentação das propostas surge com naturalidade através da consideração de que, por um lado, são lógico desenvolvimento do poder legislativo da Assembleia e, por outro lado, não colidem com as exigências práticas que justificam a abertura de restrições a esse poder.
Versadas deste modo as ideias mais vastas que me parecem poder implicar com o projecto de lei que apresentei e ter incidências dignas de ponderação no respectivo articulado, bem poderia encerrar aqui as minhas considerações, reservando para a discussão na especialidade a análise pormenorizada de cada uma das propostas.
Acontece, porém, que, ainda neste campo de generalidades, julgo ter apreendido algumas objecções, ora vagamente esboçadas, ora claramente formuladas, à orientação do projecto.
Delas me vou ocupar, até porque a sua apreciação permitirá desenvolver e acentuar determinados aspectos de maior interesse de ideias já expostas.
Essas objecções podem talvez enunciar-se assim: o espírito geral do projecto vai de encontro à evolução em curso no sentido de restringir os poderes das assembleias, designadamente no que respeita à função legislativa; além disso, esquece a conhecida insuficiência das assembleias políticas.
A alegação de que se caminha no trilho de limitar os poderes das assembleias assenta, quando referida ao nosso caso concreto, numa superficialíssima visão das coisas, e por isso mesmo revela-se inconsistente. Não podemos esquecer que a Constituição de 1933, surgindo após incontestáveis e desenfreados excessos parlamentares, não podia deixar de ser influenciada nas soluções que consagrou, e de um modo especial no doseamento da relativa força política dos órgãos da soberania, por uma explicável nota de reacção contra

Página 854

854 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 114

tais abusos, naturalmente conducente a circunscrever e a limitar acentuadamente os poderes e o relevo político da Assembleia Nacional.
E assim aconteceu na verdade. Seria fechar os olhos às realidades ou sofismá-las não reconhecer que, dentro da base da aceitação de uma assembleia política, a Constituição foi, sem dúvida, longe numa orientação limitadora da posição da Assembleia no quadro dos órgãos da soberania.
Precisamente por isso não se vê como poderia ser possível, sem aniquilar - mais ou menos lentamente - a própria Assembleia, sem negar, portanto, o princípio aceite da sua necessidade, processar-se qualquer evolução no mesmo sentido limitador.
Caminhar para este lado seria correr o risco da destruição do próprio orgão por sucessivos atrofiamentos radicados na sua inutilização funcional.

O Sr. Melo Machado: - Muito bem!

O Orador: - Basta esta observação para logo se ver como é completamente descabida a invocação como argumento com proveito para o nosso caso do teor e características que assume a evolução geral quanto aos poderes das assembleias em curso noutros países.
É que qualquer modificação na coordenação funcional e política dos órgãos da soberania não pode deixar de ter em conta que o nosso ponto de partida relativamente a esses países é, em certa medida, de sinal contrário.
Nestes parte-se ainda dos excessos parlamentares, associados a uma clara rotura, em benefício das assembleias, do equilíbrio na divisão do poder político e, por conseguinte, o curso natural das coisas, e até mesmo o único possível, por falta de margem para se processar em sentido diverso, não pode deixar de ser em ordem a limitar os poderes das assembleias. Trata-se de uma evolução compressiva ou restritiva desses poderes.
Entre nós o ponto de partida é precisamente o inverso: uma já esbatida consistência política e uma atenuada importância funcional da Assembleia Nacional.
Não pode, pois, argumentar-se com as tendências que, sob o aspecto em referência, podem constatar-se em outros países, por isso que, embora processando-se as coisas nesses países no sentido em que se operou a nossa evolução, a verdade é que, creio bem, ainda se está longe de atingir neles o grau de evolução alcançado pela nossa contextura constitucional.
Em outros países está-se a partir de uma situação paralela à nossa em 1926.
Apenas acontece que as transformações se configuram e desenvolvem em termos e estilo diferentes.
Os requintes inconcebíveis que atingiram os desmandos parlamentares, aliados, porventura, ao restante condicionalismo social e político da época, determinaram entre nós uma evolução de tipo reactivo, operando-se, digamos, por um salto.
E outros países, quer porque, apesar de tudo, os parlamentos- não caíram em tão extremos exageros, quer porque interferem e jogam circunstâncias próprias de natureza diferente, parece desenhar-se um processo evolutivo gradual e escalonado.
Daí que no sentido das restrições aos poderes das assembleias nós tenhamos caminhado mais, mais depressa e, portanto, há mais tempo.
Deste modo, segundo creio, o problema que, sob este prisma, a nossa estrutura política comporta não é o de saber se ainda é possível ou conveniente limitar mais os poderes da Assembleia, mas sim o de saber se, atenuadas as razões justificativas da orientação inicialmente fixada, e surgindo um novo condicionalismo com exigências próprias que se não eliminam com o facto de serem ignoradas, é ou não conveniente introduzir nessa orientação ponderadas modificações em vista de uma maior valorização política da Assembleia, uma vez que entre a posição por nós alcançada e o ponto até que presumivelmente se poderá ir em outros países deve ser possível encontrar uma margem de manobra adentro da qual possam ser ensaiadas soluções e fórmulas equilibradas e viáveis.

O Sr. Melo Machado: - Muito bem!

O Orador: - Seja, porém, como for, o certo é que a observação que tenho vindo a apreciar não tem qualquer consistência no sentido que se pretende, antes se revelando contraproducente.
Mas tal objecção assume uma configuração mais precisa na medida em que se concretiza na afirmação de que a função legislativa das assembleias se tem progressivamente atenuado e esbatido, ao mesmo tempo que se reveste de maior relevo e intensidade a sua acção de fiscalização política.
Não serei eu quem vai negar o fundamento desta observação quando olhada no plano mais vasto das tendências gerais que quanto a esta matéria se podem extrair do direito político dos diversos países.
No entanto, não hesito em afirmar, por um lado, que a observação, porque se constrói à base de dados políticos completamente diferentes dos nossos, em nada contribui para esclarecer a questão no nosso país e, por outro lado, que não tem, quando olhada em si mesma, o alcance nem a amplitude que correntemente se lhe atribui e empresta.
O argumento não vale para o nosso caso concreto porque, como, aliás, resulta do exposto, a função legislativa da Assembleia Nacional, dadas as largas facilidades sobre a matéria de que goza o Governo, já está, na realidade, circunscrita a limites tão estreitos que não só não deixam legítima margem para mais compressões, mas ainda permitem facilmente a intensificação dessa função, sem entrar em conflito ou contradição com a orientação geral restritiva que em outros estados se desenha e define.
A verdade, porém, é que a alegada atenuação da função legislativa das assembleias não se tem dado, em regra, em termos de afectar o que de essencial e mais significativo nela existe e, portanto, muito menos por modo a tal função competir em idêntico grau e igual intensidade ao chamado Poder Executivo.
Pelo contrário, essa evolução tem-se delineado antes com o objectivo de assegurar aos governos a mobilidade e elasticidade na acção necessárias à satisfação das múltiplas solicitações do meio social, mas também com o de, na moldura da actividade legislativa, manter uma clara, precisa e bem definida hierarquia, na qual, surgindo os governos numa posição qualitativamente subordinada, fica aberta às assembleias a possibilidade de interferirem, engrenando por uma forma ou outra no próprio processo legislativo, nas medidas pelo executivo adoptadas ou a adoptar.
Para se concluir que assim é basta olhar as concretizações e os afloramentos mais vulgares e típicos da evolução apontada.
Reconheceu-se que as assembleias menos em contacto com o conjunto das necessidades da administração pública nem sempre tomavam com presteza e oportunidade as iniciativas legislativas desejáveis, e, por isso, atribuiu-se aos governos a faculdade de tomarem a iniciativa de leis, mas estas continuaram a ser discutidas e aprovadas pelas assembleias.
Teve-se em conta que estas não raro adoptavam na apreciação dos assuntos uma ordem de trabalhos menos ajustada e consentânea com as exigências do interesse

Página 855

3 DE JUNHO DE 1959 855

público, e por essa razão deu-se aos governos a possibilidade de em certa medida interferirem na fixação da ordem do dia, mas as assembleias continuaram, é evidente, a discutir e a pronunciar-se sobre a ordem fixada.
Atendeu-se a que, por vezes, não era possível ou fácil submeter às assembleias os textos já elaborados relativos a matérias sobre que se impunha legislar e, em face disso, recorreu-se ao processo de conceder aos governos autorizações legislativas condicionadas por modos e em termos diversos, mas não só, é claro, á actuação governamental ficou dependente dessas autorizações das assembleias como ainda estas se reservaram a faculdade de apreciar os diplomas a publicar.
As realidades puseram à luz a necessidade de os governos, em emergências prementes e sérias, tomarem só por si determinadas medidas legislativas, e, por isso, foi-lhes concedida a possibilidade de o fazerem, mas às assembleias ficou a competir a posterior análise e exame das medidas legislativas em tais condições adoptadas.
A complexidade de certos assuntos tornava arriscada a fixação de preceitos legais rígidos e demasiado regulamentados, o que dificultava o devido ajustamento e adequação das soluções de pormenor, e por isso se admitiram em certos casos as leis integradas apenas por princípios gerais dotados de larga elasticidade, mas as assembleias, é evidente, não prescindiram da discussão e Anotação desses princípios.
As assembleias faziam por vezes verdadeiras guerrilhas de emendas às propostas governamentais, que não raro por elas eram desnaturadas e desvirtuadas nos seus objectivos, e por esse motivo condicionou-se em termos razoáveis e aceitáveis o direito de apresentar emendas às propostas dos governos, mas estas continuaram a ser discutidas nas assembleias, que, por outro lado, também não renunciaram ao direito de as emendar.
As assembleias nem sempre tinham na devida conta os aspectos técnicos das matérias objecto de discussão, o que levou a impor-lhes a assistência e colaboração de câmaras e conselhos técnicos, mas estes passaram a agir como órgãos meramente consultivos, subsistindo para as assembleias intacta a faculdade de resolverem e deliberarem.
Por vezes descambavam em exageros oratórios « dialécticos, não aprovando com a necessária rapidez e diligência certas leis fundamentais. Para o evitar foram-lhes impostos prazos razoáveis dentro dos quais deveriam resolver, sob pena de os governos se lhes substituírem, mas continuaram a ser as assembleias quem, em princípio, tinha competência para aprovar essas leis, etc.
Tudo isto - aliás, enumeração meramente exemplificativa - ilustra sem dúvida uma atenuação ou condicionamento, em certos termos, da função legislativa das assembleias, mas simultaneamente faz sobressair bem que estas continuam a ser o órgão legislativo qualitativamente mais forte e hierarquicamente superior, o contrôle último e decisivo da actividade legislativa do Estado.
Ressaltam também do que dito ficou os múltiplos e variados processos e expedientes que podem ser ensaiados, através de uma série enorme de equilibrados doseamentos, para, sem prejuízo do essencial da função legislativa das assembleias, assegurar ao Executivo a força e as largas possibilidades de acção exigidas pela complexidade da moderna administração pública.

ica, assim, esclarecido que, ao contrário do que já se tem escrito, a invocada limitação da função legislativa das assembleias não se desenvolve em termos de em tal campo lhes equiparar os governos, e sim no sentido de facultar a estes a possibilidade de, em certa medida, interferirem no campo legislativo, mas sempre numa posição subordinada e sujeita ao definitivo contrôle das assembleias.
E contra isto não se diga que, não discutindo muitas vezes as assembleias as medidas legislativas governamentais tomadas no uso de uma autorização ou com reserva de ratificação, tal contrôle é platónico, é uma fórmula que apenas serve para sofismar a verdade real, em homenagem a ingénuas e ultrapassadas abstracções.
Quem assim puser as coisas deixa-se dominar por primários e grosseiros critérios da apreciação.
É claro que ninguém - e, portanto, também não as assembleias - pode partir do princípio de que os governos fazem contínua e sistematicamente asneiras. Seria um exagero demasiadamente injusto.
Aliás, se tal sucedesse, a primeira atitude que se imporia seria a sua substituição.
De modo diverso, tem de assentar-se antes em que normalmente os governos adoptam as soluções legislativas mais indicadas e adequadas ao condicionalismo social e exigências de cada momento.
E, sendo assim, não faria sentido, nem nada verdadeiramente acrescentaria à valorização do princípio de que as assembleias são o órgão legislativo, a necessidade de serem discutidas em profundidade todas as medidas governamentais em matéria de legislação, só para discutir, ainda, que às mesmas nada se tivesse a opor, dada a sua evidente razoabilidade.
Todavia, vistas as coisas através da apurada sensibilidade que não pode deixar, de andar associada às coisas da política, já significa muito à luz do referido princípio de que as assembleias são o órgão legislativo a possibilidade de estas, tomando a iniciativa de intervir no próprio processo legislativo, dizerem o que se lhes oferecer como última instância de apreciação sobre as medidas legislativas governamentais quando entendam que realmente devem chamá-las ao seu exame e sobre elas fazer incidir discussão.
Nessa possibilidade, nesse «mas» que é possível opor à actividade governamental, e não propriamente na quantidade dos diplomas legislativos efectivamente discutidos, é que reside a mais profunda e significativa reafirmação do poder legislativo das assembleias, a pairar sempre como respeitável princípio muito acima das contas de somar que porventura se façam para determinar quem legisla mais, se as assembleias, se os governos, com o objectivo de daí inferir qual deve considerar-se o órgão legislativo normal.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - É que os problemas jurídicos, e mormente os constitucionais, não se reconduzem como que a uma aritmética de merceeiro, e a legítima atribuição do poder de legislar não pode ser feita a posteriori em função do resultado de uma competição ciclista em quilómetros legislativos, que, aliás, é evidente, estaria antecipadamente perdida pelas assembleias.
Em resumo, resulta do exposto não ser de invocar contra a orientação do meu projecto a chamada tendência geral restritiva dos poderes legislativos das assembleias, quer porque entre nós está ultrapassada a fase mais adiantada em regra atingida por esse processo evolutivo, quer porque essa tendência não atinge o dado essencial de que continuam a ser as assembleias, se não o órgão legislativo mais produtivo, pelo menos o órgão legislativo hierarquicamente superior.
Nem se diga, à laia de compensação pelo atrofiamento da actividade legislativa das assembleias que se defende, e como manifestação de uma consideração

Página 856

856 DIÁRIO DÁS SESSÕES N.º 114

que na realidade não tem base, que se valoriza e enriquece a sua função fiscalizadora.
Pela maneira como tenho visto acentuar esta nota parece querer dizer-se que a evolução em referência se orientaria por modo a, diminuindo o alcance da função legislativa das assembleias, se acentuar o da sua fiscalização política. Às vezes as coisas chegam ao ponto de se ficar com a impressão de que as actividades legislativa e fiscalizadora viveriam como que desprendidas, sem conexão, em compartimentos estanques, quase como se a respectiva intensidade variasse em sentido inverso.
Este ponto necessita também de alguns esclarecimentos, até porque as coisas podem passar-se precisamente ao contrário daquilo que acaba de ser referido.
É que, na verdade, dentro da ordem de ideias exposta por mim, não percebo bem o que é afinal a tal acção fiscalizadora que, ao fim e ao cabo, ficaria a constituir o feudo ou coutada privativa das assembleias representativas.
Não creio que se pretenda esgotar o conceito de fiscalização política na possibilidade de as assembleias, seguindo mais ou menos cuidada e atentamente a acção dos governos, sobre ela fazerem adequadas, oportunas o desassombradas críticas e reparos.
Sem dúvida que tal possibilidade, devidamente concretizada, não deixará por vezes, mas só por vezes, de exercer certa influência na correcção de orientações governamentais, porventura erradas ou menos acertadas.
No entanto, até porque é corrente fraqueza dos homens uma certa relutância em reconhecer os próprios erros e às vezes um orgulho exagerado que perturba a visão objectiva dos problemas e conduz como que a uma ideia de infalibidade nas respectivas decisões, não raro sucede ouviram mal e considerarem impertinentes as críticas dirigidas aos seus actos, por mais exactas e justas que sejam, fazendo por isso, com frequência, «ouvidos de mercador» a essas críticas.
Assim, parece-me pouco como conteúdo do conceito de fiscalização a possibilidade do as assembleias criticarem os actos do Governo.
Para ter verdadeiro alcance e eficácia a fiscalização supõe também a possibilidade, com um mínimo de consistência, de impor aos fiscalizados as conclusões porventura desfavoráveis a que se chegue quanto à respectiva actuação e maneira de proceder.
Fiscalização leva naturalmente associada a ideia de sanção, no mais lato sentido da palavra.
E não me parece ser sanção suficiente e dotada de um razoável mínimo de intimidação, nem harmonizável com a categoria constitucional das assembleias, o mero facto de, porventura, se determinar na opinião pública um movimento de desaprovação aos actos dos governos ou de algum dos seus membros.
A actividade fiscalizadora das assembleias deve implicar poderem os governos ser levados, dentro de determinados limites e ponderadas condições, a ter na devida conta as suas opiniões fundamentadas, não por exclusiva vontade e a bel-prazer dos mesmos governos, mas porque as assembleias disponham de adequados meios de persuasão e pressão.
Nos regimes parlamentares o principal, mais directo e radical desses meios é a possibilidade de as assembleias provocarem a queda dos governos.
Nos regimes não parlamentares o processo para o efeito eficaz afigura-se ser justamente uma acentuada e consistente supremacia legislativa que permita interferir e influenciar a orientação governamental, supremacia que seria inutilizada se as assembleias, desapoiadas de toda a organização e meios de acção da Administração, tivessem de travar um despique legislativo em pé de igualdade com os governos.
Vê-se, assim, como é inexacto dissociar com o alcance que se referiu as actividades legislativa e fiscalizadora das assembleias. Ao contrário, essas actividades vivem interligadas e em íntima conexão, por modo a a seguuda ir radicar a sua eficiência e força de convicção na primeira.

Mas contra as soluções consignadas no projecto de lei em análise pode observar-se que, além do mais, são ilógicas, uma vez que vão ao arrepio da evolução
- agora concretamente referida ao nosso país- operada entre nós de 1933 para cá, na medida em que se constata terem sido acrescidas e aumentadas as faculdades legislativas do Governo.
É mais uma observação sem ponta de valor.
É certo que se nos debruçarmos sobre as alterações introduzidas na Constituição de 1933 se pode verificar que, quanto a certos aspectos, foi sucessivamente reforçada a posição do Governo no que respeita ao exercício do Poder Legislativo, embora também se deva acrescentar que igualmente foi reforçada a da Assembleia na medida em que lhe foi atribuída competência exclusiva para legislar sobre determinadas matérias.
Seja, porém, como for, é evidente, antes de mais, que nada impõe deverem as alterações legislativas desenvolver-se uniforme e indefinidamente em dado sentido só porque anteriormente se escalonaram nesse mesmo sentido. Tal estilo de raciocínio conduziria lògicamente, no caso concreto, à supressão pura e simples da Assembleia ...
É claro que só o condicionalismo social de cada época ou momento e as circunstânticas especiais que em cada caso concreto devem ser tidas em conta podem fornecer indicações e directrizes úteis, capazes e aceitáveis para esclarecer e definir o sentido em que devem orientar-se as soluções legislativas.
Por isso, o que importa é não tanto saber se as modificações operadas no plano legislativo se fixaram em determinados termos, como apurar se essas transformações na superstrutura do direito se justificaram, foram efectivamente impostas e condicionadas por reais exigências do meio social ou se, ao contrário, tiveram o seu quê de arbitrário e surgiram sem cabal fundamentação e até mesmo sem suficiente explicação.
Ora, dado o carácter da Constituição de 1933, claramente limitador dos poderes da Assembleia, não vejo como seria possível descortinar razões e dados justificativos de algumas das alterações que posteriormente lhe foram introduzidas.
Vou procurar trazer à luz, através de exemplos concretos, os vícios dos raciocínios e o logicismo formalista com que, de um modo especial em pareçeres da Câmara Corporativa, se procurou alicerçar as modificações operadas sob o aspecto que agora interessa.
Inicialmente, consoante é sabido, à face da Constituição de 1933 o Governo só podia publicar decretos -leis nos chamados casos de urgência e necessidade pública. Posteriormente, porém, em 1945, foi feita uma alteração no artigo 109.º, de harmonia com a qual passou a poder fazê-lo independentemente da verificação de tal estado de urgência e necessidade pública.
Porquê esta alteração? Imposição de realidades dignas de serem tomadas em conta e de exigências atendíveis?
Vejamos:
A propósito deste ponto, fez-se mo respectivo parecer da Câmara Corporativa um balanço da actividade e rendimento da Assembleia em matéria legislativa, do qual resulta não só que nas sucessivas legislaturas foi diminuindo o número de projectos de lei apresenta

Página 857

3 DE JUNHO DE 1959 857

dos, mas também que igualmente foi diminuindo o número de propostas enviadas para discussão pelo governo.
A quebra foi vertical e flagrante da primeira para a segunda legislatura. Entre propostas e projectos de lei, naquela foram apreciados 122 e nesta 50.
Perante estes dados, e tendo em conta que não constou ter algum dos Deputados da primeira legislatura tuberculizado ou sofrido de enfarto do miocárdio por virtude de excesso de trabalho na Assembleia, eu inferiria muito naturalmente que a Assembleia tinha pelo menos, pelo menos, repito, capacidade para uma produção legislativa da ordem das cento e vinte e duas leis em doze meses, ainda deduzidos das muitas férias.
Depois, servindo-me também um pouco da aritmética, consideraria, por um lado, que o número de Deputados ia subir, como subiu, de 90 para 120, e, por outro lado, que a crescente intensificação da vida pública não podia deixar de reflectir-se na Assembleia, como nos demais órgãos e ramificações do Estado, e de constituir novo estímulo para um esforço suplementar da sua parte.
E, em face de tudo isto, concluiria que - passe a expressão - a capacidade de produção da Assembleia era, pelo menos, igual a 122 leis mais x.
Mas ao chegar a este ponto ficaria, sem dúvida, perturbado e sobressaltado perante a aludida quebra de produção legislativa nas sucessivas legislaturas e não deixaria de procurar indagar por que é que o rendimento real da Assembleia nem sequer atingia 50 por cento das suas apuradas e demonstradas possibilidades. Não podendo admitir que os Deputados de legislatura para legislatura fossem, sitemática e sucessivamente, baixando de nível intelectual, preparação e qualidades de trabalho, inclinar-me-ia para a hipótese e a Assembleia estar afectada de qualquer mal que a entorpecia, absorvendo-lhe as energias e reduzindo-lhe a actividade. Admitiria, portanto, a hipótese de a Assembleia estar realmente doente.
Procuraria então fazer um diagnóstico mais preciso e esclarecedor e as perguntas surgiriam sem esforço e espontaneamente: porquê tal perda de vigor numa entidade que parecia saudável? Será que se começaram a notar e a aflorar os efeitos de deficiências nas suas condições de trabalho, inclusive com reflexos psicológicos nos próprios Deputados? Será que às vezes uma série de soluções de pormenor, no entanto reciprocamente valorizadas nos seus efeitos pela actuação conjunta, dificultam e emperram a sua acção? Será que o Governo tem faculdades legislativas demasiado extensas que lhe permitem reduzir ao mínimo as propostas a enviar à Assembleia, com a consequência de esvaziar o âmbito de acção desta do seu conteúdo mais estimulante e característico? Será que, aliviada a Assembleia de muitas das suas responsabilidades, diminuiu a força impulsionadora da acção que reside na vinculação a deveres estritos e de grave relevância?
Obtidas as respostas a estas e outras perguntas, esforçar-me-ia por propor, através de alterações à Constituição o tratamento legislativo ajustado e capaz de restituir o perdido vigor.
Isto é o que, segundo suponho, eu faria, porque partiria do princípio constitucional de que a Assembleia tinha de existir e precisava, portanto, da necessária vitalidade.
Mas, pelo que me é dado ler, parece que procederia errada e ingènuamente. É, pelo menos, o que resulta da terapêutica que a Câmara Corporativa entendeu ser boa e cuja aplicação, por isso, aconselhou.
Na verdade, esta, constatando que a actividade legislativa da Assembleia decrescia e ia perdendo terreno, não se preocupou com a anormalidade do fenómeno, não se debruçou sobre as causas que o poderiam explicar, nem cuidou da respectiva correcção, como se impunha, uma vez que se devia partir do princípio de que nos nossos quadros constitucionais tinha lugar uma Assembleia Nacional como órgão da soberania.
Pelo contrário, limitou-se a constatar o facto, acentuando que se tratava de uma realidade a sancionar constitucialmente e, vai daí, não só não sugere um tratamento em via positiva vivificador da actividade da Assembleia, mas ainda, apoia a supressão de restrições aos poderes legislativos do Governo, com a inevitável consequência, que veio a produzir-se, de diminuir ainda mais a frutificação legislativa da Assembleia.
Se formos buscar um símile ao campo dos males físicos, poderemos dizer que a Câmara Corporativa não só se absteve de cuidar da anormalidade existente, mas ainda, colaborando no seu agravamento, fez aquilo que talvez possa classificar-se como «contribuição para uma eutanásia a prazo». (Risos).
Verdadeiramente, porém, esta maneira de proceder e entender nem chega a causar espanto, se se tiver em conta que a Câmara Corporativa já em 1935 opinava expressis verbis e sem reservas não haver conveniência em estimular as iniciativas dos Deputados.
E pelo visto, em face do último parecer, parece continuar a navegar nas mesmas ou semelhantes águas.
Com tal parti pris, com tal posição de princípio relativamente à Assembleia, que poderia esperar-se senão uma tendência para circunscrever cada vez mais ou, pelo menos, manter circunscritos os poderes legislativos da Assembleia?
Há, porém, mais dentro do mesmo estilo de argumentação.
A atribuição ao Governo da faculdade de legislar explicava-se pelo realista reconhecimento de que a Assembleia não podia satisfazer -pelo menos dentro do condicionalismo em que tinha de trabalhar- todas as solicitações legislativas implicadas pela satisfação do interesse público e a restrição de só poder fazê-lo nos casos de urgência e necessidade pública justificava-se pela circunstância, inteiramente exacta, de se assentar em que, em princípio o órgão legislativo era, como é, a Assembleia Nacional.
Eram e são essas as ideias directrizes que enformam neste aspecto o nosso regime constitucional.
Mas, sendo assim, logo se vê não ter havido motivo suficiente e convincente para a alteração realizada, uma vez que, sendo a Assembleia o órgão legislativo, só se justificava o exercício da função legislativa pelo Governo quando realmente isso fosse urgente e necessário.
Porém, a este respeito, não foi assim que a Câmara Corporativa viu e encarou as coisas. Antes definiu uma posição que pode talvez resumir-se pelo modo que segue.
Não obstante o condicionamento da acção legislativa do Governo à urgência e necessidade pública das providências a adoptar, é um facto que a maior parte da legislação ordinária constitui objecto de decretos-leis. Quer dizer: o Governo, como único juiz da urgência e necessidade pública - juiz em causa própria -, deixou de respeitar a condição de que constitucionalmente dependia o exercício por si da função legislativa e passou a legislar sem ter em conta tal condição.
Perante isto, raciocinou-se logo naquele curioso estilo, que parece ter feito escola e carreira: é um facto que o Governo legisla independentemente de qualquer urgente necessidade pública das medidas a publicar; há, pois, que atender a esta realidade, e, fazendo-o, cumpre sobrepô-la, como verdade real que é, à verdade meramente formal que consta do texto constitucional; consequentemente, há que suprimir neste a referida

Página 858

858 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 114

condição que limita a faculdade que o Governo tem de legislar.
Suponham VV. Ex.ªs que eram eliminadas as últimas restrições ao exercício do poder legislativo pelo Governo e que, em consequência, mais se esbatiam os resultados da actividade da Assembleia.
De harmonia com o tão curioso estilo de argumentar que ficou exposto dir-se-ia naturalmente: a realidade mostra que a Assembleia não funciona três meses, mas apenas um; há, por isso, que harmonizar a verdade formal com a real; logo deve consignar-se na Constituição que as sessões legislativas passarão a durar um mês.
A seguir, por sucessivos escalões, e sempre dentro de tal lógica, verifica-se que praticamente a Assembleia não funciona.
Novo argumento: a Assembleia não funciona, o Governo é que exerce todos os poderes; consequentemente, há que riscar a Assembleia do quadro dos órgãos da soberania, do texto constitucional, para que este se harmonize e respeite a tal verdade real.
A isto conduziria, segundo creio, a lógica do referido parecer da Câmara Corporativa, se fosse de aceitar.
As coisas não podem, porém, ser encaradas nos termos e com o espírito que ficaram expostos.
Realmente, assente como estava - e muito bem - que só era de admitir a publicação pelo Governo de decretos-leis nos casos de urgente necessidade pública, a circunstância de o Governo não respeitar tal limitação conduzia, logicamente, não a suprimi-la, uma vez que nada em vista disso se invocava como justificação a não ser a própria violação da Constituição, mas sim a procurar criar condições que, efectivamente, permitissem impor o respeito da lei fundamental da Nação, até porque o exemplo deve vir de cima.
A Câmara Corporativa entendeu antes que eram de premiar as consumadas violações, legitimando-as constitucionalmente para o futuro.
Em face de tudo isto cabe perguntar:
Que valor poderia ter o argumento que porventura se quisesse extrair de uma evolução, da Constituição, no sentido restritivo dos poderes legislativos da Assembleia, processada pelo modo e nas condições que ficaram referidos?
Contra o espírito geral do projecto agora em exame também se pode argumentar ser contra-indicado confiar largos poderes às assembleias representativas, uma vez que estas se revelam, pela sua própria contextura, incapazes de trabalho eficiente e rendimento satisfatório, mormente no campo legislativo.
O argumento só poderia valer, é evidente, para os casos em que, por virtude das suas muito largas atribuições, as assembleias não conseguem delas desempenhar-se capazmente. Não vale, por conseguinte, para o nosso caso concreto, em que tal se não verifica, como já mais de uma vez acentuei.
Além disso, a observação padeceria ainda de um outro vício, para o qual me não dispenso de chamar a atenção.
Admitindo que realmente as assembleias se revelam lentas, pouco eficientes e desorganizadas no seu trabalho, o que parece razoável e indicado, desde que se aceita a necessidade da sua existência, é procurar criar-lhes estímulos e condições de trabalho que atenuem e compensem quanto possível esses defeitos, por assim dizer originários. Proceder de modo contrário não pode deixar de redundar num agravamento e de fazer avultar tais defeitos.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Na verdade, e concretizando, se uma assembleia apenas funciona três meses no ano, se nesses três meses se incluem. ainda as férias do Natal e Carnaval, e até às- vezes as da Páscoa, se o âmbito da sua competência exclusiva é muito> limitada, se o Governo pode legislar a maior parte do ano sem possibilidade de os decretos-leis serem sujeitos a ratificação, se ainda por cima parece que se procura às vezes concentrar a publicação dos decretos-leis nesse período de liberdade legislativa, se, assim, não tem praticamente necessidade de submeter propostas de lei à Assembleia, se os Deputados não raro tomam conhecimento dos assuntos a discutir à última hora por modo a não poderem debruçar-se sobre eles com a devida atenção, se os elementos solicitados ao Governo são fornecidos muitas vezes tarde e a nas horas, se as condições de trabalho dos Deputados não são facilitadas e, vá lá - já é azar -, se nem as condições acústicas desta sala ajudam (risos), como é que a Assembleia, por muitas que sejam as suas virtualidades de acção e por maior que seja a sua boa vontade, pode produzir trabalho satisfatório? Só por milagre, evidentemente.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Este apontamento ajuda a mostrar que, se é exacto revelarem-se assembleias por vezes insuficientes para acompanhar as modernas exigências legislativas e, de um modo geral, pouco produtivas, também é verdade que essa insuficiência não reveste o grau que se insinua, ou claramente se diz, e que determinados estados de coisas aparentam.
É que não raro, começando-se por argumentar com a insuficiência das assembleias políticas, restringem-se os seus poderes e esbate-se a sua acção em tais termos que, para além e independentemente das respectivas deficiências congénitas, não podem mesmo produzir trabalho aceitável e rendimento que convença.
Quando tal sucede às deficiências naturais das assembleias acrescem outras, agora artificialmente criadas, passando, assim, aquilo que apenas, era insuficiente a apresentar-se como incapaz.
Assim se pode até gerar como que um complexo de inutilidade nos próprios membros das assembleias, determinador de um estado de espírito fatalista, de apatia e desinteresse, cujos reflexos e consequências nos corpos políticos se torna desnecessário acentuar.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Ainda contra a orientação do projecto, não pode dizer-se que a legislação, hoje mais do que nunca, implica com problemas técnicos e especializados para cuja apreciação e resolução as assembleias mão estão devidamente preparadas e apetrechadas.
É este hoje um dos mais estafados argumentos, que, com mais volta, menos volta, se acaba por trazer aos debates quando, por qualquer razão, e até sem razão, se pretende comprimir a posição das assembleias.
A cada passo se vê aflorar este argumento, como, por exemplo, no parecer da Câmara Corporativa sobre o projecto, designadamente a propósito da legislação tributária, chegando-se, ao ler o parecer, a ficar com a impressão de que as assembleias sofreriam como que de uma normal incompetência em matéria de impostos.
Disto, porém, se cuidará no momento oportuno.
Sem dúvida que a falada e apregoada técnica tem hoje roa papel de manifesto relevo e incontestável interesse em todos os sectores da vida moderna. Mas a partir daí não se pode ir, como às vezes se vai, até ao ponto de, colocando-a, mais ou menos discretamente, numa posição de supremacia, nela absorver tudo o

Página 859

3 DE JUNHO DE 1969 859

mais, inclusive a própria independência das orientações políticas.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Para que não sejamos ao fim e ao cabo dolorosamente asfixiados pelos seus vorazes tentáculos não podemos fazer inversões nas nossas hierarquias de valores nem esquecer que a técnica terá de permanecer no seu papel de instrumento e meio de conseguir algo que por isso mesmo a excede, está para além e acima dela.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - De um modo especial nas questões agora visadas há que ter em conta que, sem prejuízo do valor da colaboração e contributo da técnica, sempre em todos os problemas ficará à política a última palavra para se pronunciar sobre a oportunidade, conveniência e bondade das soluções, ainda que porventura tecnicamente perfeitas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O tipo de observação que se referiu, dado o dogmatismo e extremismo com que não raro é posto, cheira fortemente a uma concepção materialista e tecnicista da vida, que - já é um lugar comum afirmá-lo - é, sem dúvida, um dos grandes males do nosso tempo, que toda a minha formação repudia e que, inclusive, colide com o espírito e inspiração doutrinal do nosso texto constitucional.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Em tudo e, portanto, também nesta matéria é preciso ter a noção da justa medida e das proporções.
A técnica tem no mundo de hoje um brilhante lugar, mas acima dela pairam, têm de pairar, realidades e valores que não podem ser postos em causa e muito menos sê-lo de ânimo leve.
Particularmente tem de servir a política, e não servir-se da política.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mas o argumento, mesmo quando olhado em si mesmo, não oferece consistência. Desde logo prova de mais, uma vez que, inclusive, levaria a excluir dos governos os Ministros que não fossem especialistas.
No entanto, ninguém duvida de que é tantas vezes indicado e necessário que os Ministros não sejam técnicos.
E, sendo assim, pergunta-se: como é que os Ministros em tais condições gerem e orientam os seus departamentos? Por um processo muito simples: utilizando-se e servindo-se dos técnicos, mas dando em última instância às respectivas soluções a necessária maleabilidade política.
Como é que as assembleias políticas podem actuar e desempenhar-se das suas atribuições? Por processo semelhante: servindo-se das câmaras e conselhos técnicos.
Entre nós, por exemplo, em que o Governo tem - e muito bem - a iniciativa de leis, esta Assembleia dispõe, através das propostas do Governo e respectivos relatórios, da colaboração dos técnicos dos departamentos governamentais e dispõe ainda da assistência técnica da Câmara Corporativa.

O Sr. Melo Machado: - Muito bem!

O Orador: - Mas há mais.
Se se estudar a composição concreta das várias assembleias depressa se constatará que nelas tem existido, existem, técnicos e especialistas de todas as actividades.
Em relação a cada problema há sempre pelo menos meia dúzia de Deputados que com os seus conhecimentos especializados podem integrar e esclarecer o trabalho político da Assembleia e cujas opiniões, precisamente por virtude da sua qualificação, sempre são tidas na devida conta.
É claro que se não pode pretender que nas assembleias todos e cada um dós respectivos membros sejam especialistas em todos os assuntos. Tal pretensão, além de absurda, demonstraria que, afinal, a própria Câmara Corporativa nada tem de técnica. (Risos).
Não deixarei, finalmente, de anotar que já vi esta Assembleia não só criticar com razão a conveniência e oportunidade de certas medidas propostas pelo Governo, mas até introduzir justificadas correcções técnicas à obra peleis especialistas dada como acabada.
Sr. Presidente: as razões de pormenor em que se fundamentam as várias propostas de alteração à Constituição por mim sugeridas fluem com naturalidade e extraem-se em espontâneo desenvolvimento lógico das ideias, princípios e considerações que acabo de ter a oportunidade de expor.
Neste plano geral, comportado pela natureza e configuração regimental do presente debate, esforcei-me por salientar em via positiva o fundo comum de ideias, em que se projectam as soluções aventadas. Procurarei também, então em via negativa, rejeitar antecipadamente determinados tipos de objecções que porventura se poderia pensar opor à posição por mim defendida, quer chamando a atenção para o facto de essas objecções assentarem correntemente em dados deformados em certo sentido, quer vincando a circunstância de serem improcedentes enquanto especificamente referidas ao nosso caso.
Impõe-se agora descer ao plano mais preciso e definido em que se integram as propostas alterações, quer porque está indicada uma análise mais directa e pormenorizada dos problemas que suscitam, quer porque nesse plano, um tanto mais casuístico, melhor se localizam e integram as razões até ao presente formalmente invocadas em desabono da minha maneira de ver, razões, é evidente, a que se não poder deixar de fazer cuidadosa, atenta e bem adequada apreciação.
Para isso, porém, Sr. Presidente, oferece melhor oportunidade a discussão na especialidade, à qual, aliás de harmonia com o Regimento, rigorosamente quadram problemas com os contornos mais limitados e concretos que acabo de assinalar.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Convoco para amanhã, depois da sessão, os membros da Comissão de Política e Administração Geral e Local.
Amanhã haverá sessão, com a mesma ordem do dia da de hoje.
Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Adriano Duarte Silva.
Alberto Carlos de Figueiredo Franco Falcão.
Alberto Cruz.

Página 860

860 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 114

Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Pacheco Jorge.
Alfredo Rodrigues dos Santos Júnior.
Antão Santos da Cunha.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António Bartolomeu Gromiclio.
Artur Máximo Saraiva de Aguilar.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Belchior Cardoso da Costa.
Domingos Rosado Vitória Pires.
Francisco José Tasques Tenreiro.
João da Assunção da Cunha Valença.
João Cerveira Pinto.
João Maria Porto.
José António Ferreira Barbosa.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Laurénio Cota Morais dos Reis.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel Maria Sarmento Rodrigues.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Purxotoma Ramanata Quenin.
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães.

O REDACTOR - Luís de Avillez.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×