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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 124

ANO DE 1959 19 DE JUNHO

ASSEMBLEIA NACIONAL

VII LEGISLATURA

(SESSÃO EXTRAORDINÁRIA)

SESSÃO N.º 124, EM 18 DE JUNHO

Presidente: Exmo. Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior

Secretários Exmos. Srs
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues
Júlio Alberto da Costa Evangelista

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 10 minutos.

Antes, da ordem do dia. - Usaram da palavra os Srs. Deputados Jerónimo Jorge, para se referir às comemorações do Dia da Marinha; Amaral Neto, sobre problemas de habitação económica; Melo Machado, acerca de assuntos ligados à indústria algodoeira, e Silva Mendes, que se congratulou com medidas recentemente tomadas por S. Exa. o Ministro das Obras Públicas em satisfação de interesses do distrito de Leiria.

Ordem do dia. - Iniciou-se a discussão na especialidade da proposta e projectos de lei de alteração à Constituição Política.
A discussão foi feita com base na proposta de revisão apresentada pelo Governo.
Usaram da palavra no decorrer da votação os Srs. Deputados Proença Duarte, Nunes Barata, Soares da Fonseca, Camilo de Mendonça, Bagorro de Sequeira, Cid Proença, Mário de Figueiredo, Paulo Cancella de Abreu, Sarmento Rodrigues, Carlos Moreira, Cortês Pinto, Nunes Fernandes, João do Amaral e José Saraiva.
Discutiram-se e votaram-se os artigos 20.º, 21.º e 53.º da proposta do Governo e 72.º da proposta do Governo com emendas do Sr. Deputado Mário de Figueiredo e da Comissão Parlamentar do Ultramar.
O Sr. Presidente encerrou à sessão às 19 horas e 15 minutos:

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 16 horas.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Afonso Augusto Pinto.
Agnelo Ornelas do Rego.
Agostinho Gonçalves Gomes.
Aires Fernandes Martins.
Alberto Carlos de Figueiredo Franco Falcão.
Alberto Cruz.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto da Bocha Cardoso de Matos.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alfredo Rodrigues dos Santos Júnior.
Américo Cortês Pinto.
Américo da Costa Ramalho.
André Francisco Navarro.
Antão Santos da Cunha.
António Bartolomeu Gromicho.
António Calapez Gomes Garcia.
António Carlos dos Santos Fernandes Lima.
António de Castro s Brito Meneses Soares.
António Cortês Lobão.
António Jorge Ferreira.
António José Rodrigues Prata.
António Maria Vasconcelos de Morais Sarmento.
António Pereira de Meireles Rocha Lacerda.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Máximo Saraiva de Aguilar.
Artur Proença Duarte.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Avelino Teixeira da Mota.
Belchior Cardoso da Costa.
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.

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Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos Coelho.

Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Fernando António Muñoz de Oliveira.
Fernando Cid Oliveira Proença.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco José Vasques Tenreiro.
Frederico Bagorro de Sequeira.
Jerónimo Henriques Jorge.
Jerónimo Salvador Constantino Sócrates da Costa.
João da Assunção da Cunha Valença.
João Augusto Dias Rosas.
João Augusto Marchante.
João de Brito e Cunha.
João Carlos de Sá Alves.
João Cerveira Pinto.
João Maria Porto.
João Mendes da Costa Amaral.
João Pedro Neves Clara.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim Pais de Azevedo.
Joaquim de Pinho Brandão.
Jorge Pereira Jardim.
José António Ferreira Barbosa.
José Dias de Araújo Correia.
José Fernando Nunes Barata.
José de Freitas Soares.
José Garcia Nunes Mexia.
José Gonçalves de Araújo Novo.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Hermano Saraiva.
José Manuel da Costa.
José Monteiro da Rocha Peixoto.
José Rodrigo Carvalho.
José Rodrigues da Silva Mendes.
José dos Santos Bessa.
José Sarmento de Vasconcelos e Castro.
José Soares da Fonseca.
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Laurénio Cota Morais dos Reis.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Luís Tavares Neto Sequeira de Medeiros.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel Maria de Lacerda de Sousa Aroso.
Manuel Maria Sarmento Rodrigues.
Manuel Nunes Fernandes.
Manuel Seabra Carqueijeiro.
Manuel Tarujo de Almeida.
D. Maria Irene Leite da Costa.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Reis
Mário Angelo Morais de Oliveira.
Mário de Figueiredo.
Martinho da Costa Lopes.
Paulo Cancella de Abreu.
Ramiro Machado Valadão.
Rogério Noel Peres Claro.
Sebastião Garcia Ramires.
Tito Castelo Branco Arantes.
Venâncio Augusto Deslandes.
Virgílio David Pereira e Cruz.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 96 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 16 horas e 10 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Tem a palavra antes da ordem do dia o Sr. Deputado Henrique Jorge.

O Sr. Henrique Jorge: - Sr. Presidente: despertaram amplo interesse e tiveram a mais profunda projecção as comemorações do Dia da Marinha de 1959, terminadas ontem, data do trigésimo sétimo aniversário da chegada ao Rio de Janeiro dos gloriosos aviadores navais Gago Coutinho e Sacadura Cabral, após a sua histórica travessia aérea do Atlântico Sul.
Decorreram estas comemorações, assinaladas por cerimónias diversas, em ambiente de inexcedível sentimento patriótico e de elevada camaradagem, rodeadas do carinho, do confortante entusiasmo e da admiração do público.
Entre as cerimónias que as marcaram registam-se como as de maior relevo as da Escola de Mecânicos e Marinheiros de Vila Franca de Xira, o desfile de um contingente de forças da Marinha na Avenida da Liberdade perante o Governo e altos comandos militares, os significativos cumprimentos a S. Exa. o Ministro da Marinha pelos comandos navais e pelos mais categorizados representantes dos organismos das marinhas (mercante, de pesca e de recreio), pelos conselhos de administração das companhias armadoras e direcções dos sindicatos dos homens do mar e tantas outras individualidades ligadas ao meio marítimo.
Merecem ainda especial realce a grandiosa parada naval de Cascais, onde representações de unidades de todas as marinhas fundearam a entrada do estuário do Tejo para serem solenemente passadas em revista pelo Chefe do Estado, e mais tarde o imponente desfile da mesma força naval, e as solenes sessões realizadas no Clube Militar Naval e na Sociedade de Geografia, a última das quais presidida por S. Exa. o Presidente da República.
Não interessa entrar em pormenores sobre cada uma destas cerimónias, analisá-las ou compará-las, mas sim, e quanto a mim, interessa sobremaneira salientar o seu patriótico significado e o entusiasmo com que decorreram.
O Dia da Marinha é, de certo modo, um dia de festa nacional, um dia que todos os portugueses devem viver evocando as glórias do passado e encarando a situação prestigiosa do presente e as páginas em branco de um futuro que nos não amedronta nem deprime.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:- A história da Nação está, em grande parte, ìntimamente ligada à nossa história marítima.
A Marinha ajudou a edificar a Pátria Portuguesa dando-lhe, no mundo de ontem como no de hoje, projecção internacional e brilho esplendoroso.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:- Tendo contribuído com o melhor do seu esforço para o engrandecimento da Nação, ficou estreitamente ligada às páginas mais gloriosas da nossa história. Os descobrimentos e a expansão ultramarina foram sobretudo obra de marinheiros. Cedo aprendemos ser o mar condição vital da nossa independência.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:- A extensa orla de costa que possuímos, com numerosas reentrâncias, fundeadouros e portos naturais, convidava-nos à grande aventura marítima, que era também condição de vida para importarmos as mercadorias necessárias à nossa subsistência, para expor-

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tarmos os excessos da nossa produção, para aos defendermos contra os inimigos que invadiam e talavam as terras ribeirinhas.
Depois foi a expansão, a gloriosa expansão, mediante a qual demos mundos novos ao Mundo e levámos o nome português e a civilização cristã a vastas parcelas do mundo desconhecidas. Marrocos, as ilhas do Atlântico, o Brasil, a costa da Guiné, Angola, a África Oriental, a índia, a Pérsia, o Extremo Oriente, são palavras que têm para nós uma ressonância singular, pois falam-nos de uma página maravilhosa de gesta, cujo cenário é sempre o mar e nele as frágeis embarcações onde marinheiros esforçados arriscavam a vida heròicamente pela grandeza de Portugal!
E quando, devassados os continentes, nada mais havia por descobrir pelo mar, dir-se-ia que as caravelas, as velhas caravelas do Infante, tomaram asas, para mais depressa poderem levar ao povo irmão, portentosa criação e projecção de Portugal além-Atlântico, o abraço fraternal de uma solidariedade que nada poderá romper, porque ir contra ela seria uma traição à nossa alma comum. E mais uma vez foram marinheiros que renovaram, no nosso século, as proezas dos portugueses de antanho.
Por isso, Sr. Presidente, as comemorações do Dia da Marinha não podiam deixar de ter eco nesta Casa, onde, tradicionalmente, todos os factos de interesse nacional, vêm sendo destacados com a maior vibração, em ambiente patriòticamente compreensivo e entusiasta. Por isso, Sr. Presidente, me permiti usar da palavra para, focando o ocorrido, patentear a rainha esperança de que, ligado ao engrandecimento da Pátria, continue e prossiga o engrandecimento das nossa marinhas, que é imperativo do interesse nacional, como a história sobejamente nos esclarece.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Amaral Neto:- Sr. Presidente: vão passados um ano e um trimestre desde que saiu no Diário do Governo a Lei n.º 2092, que veio regulamentar em novas bases a cooperação das instituições de previdência na resolução do problema habitacional.
Creio poder dizer que a proposta depois tornada nesta lei foi aqui recebida com simpatia, e muitos de nós a votámos com o entusiasmo de quem via nela instrumento poderoso para a resolução de um dos males sociais mais graves do nosso tempo.
Aconteceu, depois que para acompanhar certo projecto algumas vezes visitei a Federação de Caixas de Previdência, dita das Habitações Económicas, onde se estão traçando os planos, organizando programas e elaborando os projectos de construção das casas a erigir ao abrigo dos financiamentos feitos pelos fundos das caixas de previdência.
Pareceu-me que estes projectos são estudados com zelo, carinho e interesse, tendo em vista atingir as soluções mais económicas e mais adequadas aos meios em que hão-de ser realizados.
No seguimento do meu interesse por este problema quis averiguar do volume do trabalho feito, e recebi agora números relativos ao montante em que já podem exprimir-se os planos elaborados à sombra da referida lei; estes números são curiosos, sobretudo pela circunstância de ter naturalmente demorado a regulamentação da lei, o que significa que só há relativamente pouco tempo foi possível começar com regularidade a atender os pedidos feitos e ordenar o despacho deles.

epois da leitura daqueles números tenho muito gosto em comunicar à Câmara que, desde a afinal bem recente promulgação da Lei n.º 2092, e à sombra dela, estão em estudo, em negociações, com inicio previsto para breve, ou mesmo já em execução, obras que hão-de envolver o total de trás mil setecentas e trinta e seis habitações, para as quais se calcula o investimento total de 231 000 contos. Estas obras repartem-se por beneficiários das caixas, na base de empréstimos directos, para construírem ou repararem as suas habitações, por sócios das Casas do Povo - até hoje registam-se pedidos de vinte e três Casas do Povo que desejam construir bairros para os seus associados - e por várias entidades patronais que pretendem construir casas para os seus empregados; igualmente se projecta a construção de casas de renda económica a distribuir pelos filiados dos organismos de previdência.
Repartem-se por todo o País, de norte a sul, os muitos projectos já em andamento, servindo vilas e cidades; na relação dos lugares só uma falta se torna notável, e esta é a da própria capital do País, onde todavia tão sérias são as dificuldades e a carestia do alojamento.
Por isto, fui levado a perguntar, quando vi que nem ama só de tantas casas viria a erguer-se na cidade de Lisboa: então, Lisboa?
Penso que, porventura, alguém me responderá que, sendo eu Deputado por um distrito rural, impertinência acaso será dedicar-me a problemas da capital do País; mas tenho defendido e sustento que o problema dos investimentos prediais na capital é um verdadeiro problema nacional.
Eles funcionam como uma espécie de abcesso de fixação dos capitais disponíveis, e não é difícil calcular que vários milhões de contos têm, desde o inicio do I Plano de Fomento, sido aplicados na construção de prédios de grande volume e de grande rendimento nesta cidade, no desenvolvimento de uma pressão inflacionista, que, aliás, tem feito aumentar as rendas das casas e, porventura, as margens de lucros dos construtores, em vez de serem encaminhados para iniciativas de maior reprodutividade. Não julgo que a situação actual possa contribuir, assim, para a melhoria da saúde social, tanto como a julgo perniciosa para a vida económica do País.
Por outro lado, lembro-me de que há pouco mais de três anos, precisamente em 22 de Maio da 1956, segundo a imprensa então largamente noticiou, o presidente da Câmara Municipal de Lisboa recebeu representantes dos jornais da capital para explicar o que se tinha feito no preparo da urbanização das zonas dos Olivais e da última parte do Restelo, manifestando-se convencido de que essa urbanização iria contribuir grandemente para um abaixamento do nível das rendas em Lisboa e afirmando esperar que as negociações em curso com o Ministro das Corporações levassem o Estado a autorizar que com o dinheiro das caixas de previdência se desse um impulso em massa à realização das obras nas duas zonas.
Bastante mais tarde, em 23 de Setembro de 1957, o Ministro das Corporações, que então já não era a mesma pessoa, em discurso público disse ter a esperança de que fosse possível celebrar com a Câmara Municipal de Lisboa um acordo destinado a permitir pelos fundos da Previdência a construção de cerca de 7000 habitações nas zonas dos Olivais e do Restelo, referindo que as negociações entre o seu Ministério e o Município lisbonense haviam sido dias antes retomadas.
Ora, peço a VV. Exa. que atentem nestes dois factos: primeiro, o intervalo de cerca de ano e meio entre as duas notícias e, segundo, o de na mais recente se dizer que as negociações entabuladas com o Município de Lisboa haviam sido retomadas, o que significa, terem sido há algum tempo suspensas.
Não sei os motivos que forçaram a essa suspensão. Resta-me apenas registar o facto e notar que quem quer

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que faltou à resolução de tão instante problema da cidade de Lisboa com aquela soma, de carinho, dedicação e boa vontade que ele, pela sua natureza e importância, exigia serviu mal neste campo a função que lhe cabia exercer.
E a verdade é, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que foi possível arreigar-se em alguns espíritos a convicção: de que não teria sido indiferente à suspensão dessas negociações - suspensão ou suspensões, pois mais dois anos quase passaram e nenhuns resultados se vêem ainda - a pressão ou influencia dos interesses ávidos de obterem tão bons terrenos para campo dos seus negócios, suspeitando-se até de que em tais influências, se as houve, pesariam não só os industriais do fabrico de prédios para venda com margens apreciáveis de lucro, mas até sociedades cooperativas de construção, que não andam todas livres da pecha de à sua sombra alguns beneficiários também terem feito a sua especulaçãozinha com as casas e as facilidades que noutra intenção lhes foram concedidas.
Mais, Sr. Presidente e Srs. Deputados: também transpirou que, enquanto no Ministério das Corporações se gizava esta lei que votámos há um ano e pouco, não faltaram lá representações discretas de interesses criados à volta da capitalização em imóveis de rendimento, fazendo ver que a promulgação de tal diploma, pelo abaixamento das rendas que acarretaria, poderia ser prejudicial aos investimentos já feitos e, porventura, lesivo de interesses, respeitáveis, decerto, tomados um por um, mas permito-me duvidar que o sejam quando em conjunto representam obstáculo do vulto que podemos pressupor pelos efeitos à vista.
Sr. Presidente: seria caso de escândalo e uma vergonha que se deixasse prevalecer a oposição de qualquer cabala de interesses quando há possibilidades técnicas e financeiras para dar um decidido impulso à mineração do problema da carestia habitacional em Lisboa, carestia cujos maus reflexos tom incidido sobre todo o País; seria um escândalo e até vergonha que se perdessem tantos esforços e tanta energia, que não se levassem as decisões até à última dinamização para criar todas as condições de conseguir aquilo que ainda não foi possível.
O exemplo da cidade do Porto, ao encontro do qual o Governo soube ir, assim como iria ao de Lisboa se reconhecesse essa necessidade, não é para nós, Lisboetas, no simples tampo do amor-próprio, motivo para satisfação nem para contentamento, ao vermos o que lá souberam fazer e cá não conseguimos.
Sejam estas considerações de bairrismo, Sr. Presidente e Srs. Deputados, uma vez que este bairrismo poderá agir em bom sentido, a reforçar o voto que desejo exprimir no sentido de que a nova administração do Município de Lisboa e a vontade que parece ser pensamento do Ministério das Corporações encontrem terreno comum de entendimento e campo seguro para realizações imediatas e profícuas.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Melo Machado: - Sr. Presidente: por várias vezes tem sido tratada nesta Assembleia a posição dos fabricantes de tecidos de algodão, no propósito de demonstrar a crise que atravessam em virtude de várias dificuldades que tem surgido nos últimos anos.
Os Srs. Deputados João Rosas, Rodrigo Carvalho e Duarte do Amaral expuseram, com minúcia e profundo conhecimento de causa a situação dessa indústria, citando números que nos revelaram a sua excepcional importância económica e social.
Se o assunto já foi aqui tratado por quem dele tem profundo conhecimento, a que titulo virei agora trazer também a minha achega, se não tenho nenhum conhecimento especial do assunto?
Este meu interesse, aliás justificado, por se tratar de importante sector da nossa economia, que nela pesa suficientemente para despertar o interesse de quem por curiosidade se debruça sobre questões económicas, foi despertado por uma carta de um comerciante de Angola, que por acaso chegou às minhas mãos, embora me não fosse dirigida.
Esta carta põe em relevo o facto, já, aliás, apontado aqui pelo nosso colega Rodrigo Carvalho, de, a sombra das disposições do Decreto n.º 41 026, estarem a dar entrada nas nossas províncias ultramarinas, principalmente em Angola e Moçambique, tecidos de algodão de origem oriental, que, não pagando direitos, fazem uma concorrência aniquiladora, no que respeita a preços, aos nossos produtos similares.
As disposições daquele decreto são perfeitamente razoáveis; mais do que razoáveis: louváveis.
Efectivamente, parece que nada se deve opor ou dificultar a livre circulação entre as nossas províncias ultramarinas dos produtos delas originários.
Não se contou, porém, com a utilização capciosa por parte daqueles que, sempre despertos e atentos a todas as fissuras da lei, aproveitaram em Macau a oportunidade, por forma a desse oportunismo poderem resultar os mais graves inconvenientes para a nossa economia.
Todos conhecemos as razões por que a China, o Japão e a Índia podem fazer concorrência esmagadora aos produtos do Ocidente.
O pensamento que ditou o Decreto n.º 41 026 foi o de facilitar as trocas, entre as diversas províncias ultramarinas, mas não podia nunca ter sido realizar através dele um ataque perigoso à economia metropolitana e, consequentemente, à economia nacional.
Estará a economia metropolitana em condições de deixar perder os seus melhores clientes neste ramo, que são Angola e Moçambique?
A exportação dos tecidos de algodão para todas as nossas províncias ultramarinas cifra-se em 800 000 contos, sendo os principais importadores Angola e Moçambique.
Haverá algum país que deixe de estar atento a um movimento de exportação que, segundo as autorizadas afirmações do nosso colega Rodrigo Carvalho, se acerca dos 6 por cento da nossa exportação total?
Eu suponho que não, e estou certo de que providências irão ser tomadas no sentido de obviar a este grande inconveniente.
Mas vejamos o que diz o Decreto n.º 41 026 no seu preâmbulo:

A Lei Orgânica do Ultramar, ao ocupar-se das relações económicas das províncias ultramarinas entre si, com a metrópole e com o estrangeiro, estabelece dois grandes princípios: unificar quanto possível em todo o território nacional os direitos aduaneiros nas relações comerciais com os países estrangeiros, reduzir gradualmente até à sua completa supressão, à medida que sejam substituídos por outras receitas, os direitos aduaneiros nas relações comerciais entre a metrópole e as províncias ultramarinas e nas destas entre si.

Como vêem, o pensamento do decreto é perfeito e nele se suprimem, efectivamente, os direitos sobre a circulação entre as províncias ultramarinas de mercadorias delas originárias ou nelas nacionalizadas pelas alfândegas.
Esta expressão «nacionalizadas pelas alfândegas» tem necessàriamente um significado e pressupõe natural-

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mente que as mercadorias nacionalizadas sofram qualquer alteração ou fabrico para que adquiram esse direito.
Nada, porém, me leva a crer que as mínimas possibilidades fabris de Macau possam justificar o movimento que vou referir.
Encontrei-o no relatório do Banco de Angola, cujo regular recebimento devo à requintada amabilidade da sua direcção e que constitui um repositório de dados, de números e de considerações do mais alto interesse para quem careça de ocupar-se destes assuntos.
Pois lá encontrei que Macau, que em 1957 exportara para Angola 4311, no valor de 21 922 contos, logo em 1958 passou para 873 t, com 38 231 contos de valor, atingindo assim o décimo lugar entre os principais fornecedores.
Eu não sei se vêem bem onde isto poderá chegar sé as coisas continuarem com este desembaraço e esta celeridade de desenvolvimento.
Como já referi, quase tudo isto foi já aqui dito por ilustres colegas nossos, e a razão da minha intervenção está em pedir que se não demorem as providências necessárias.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:- Deixar passar tempo, nestas circunstancias, é agravar seguramente a economia nacional, e para as transacções com Angola bem bastam para tal as dificuldades de transferência.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador:- Em face do mercado comum não sabemos ainda para que dificuldades estamos guardados, mas a essas não poderemos porventura obviar com facilidade.
O que não fará sentido é deixar criar dentro do nosso próprio território dificuldades que não têm razão de existir.
É natural que a China, o Japão e a Índia procurem, expandir os seus produtos, mas dos nossos teremos nós de cuidar, e é isso que desta Assembleia solicito a Srs. Exas. os Srs. Ministro do Ultramar e Secretário de Estado do Comércio.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Silva Mendes: - Sr. Presidente: os Deputados pelo distrito de Leiria foram, em Outubro, gentilmente recebidos por S. Exa. o Ministro das Obras Públicas, a quem expuseram várias necessidades do distrito, focando em especial a dragagem da famosa concha de S. Martinho do Porto e a construção de um porto de abrigo na Nazaré.
S. Exa. demonstrou o maior interesse pela resolução de todos os pedidos que lhe foram apresentados, que estudou com o cuidado que lhe merecem todos os problemas de cuja resolução dependam o fomento do Pais e o bem-estar das populações, e, quanto aos dois pedidos principais que os representantes do distrito lhe fizeram, sei que, depois dos necessários estudos preliminares que é possível fazer nos gabinetes de trabalho, uma brigada de técnicos está estudando a melhor forma de se conseguir o desassoreamento do porto de S. Martinho do Porto e a sua dragagem, que será iniciada este ano, tudo de harmonia com as ordens dadas por S. Exa. o Ministro.
Fui ainda informado de que estão adiantados, os estudos para a construção do porto de abrigo da Nazaré, e a brigada que se encontra em S. Martinho do Porto
seguirá depois para a Nazaré, esperando que à Direcção-Geral será possível terminar os estudo sem curso antes do fim do corrente ano.
Estão de parabéns as duas lindas povoações do meu distrito, e eu não sei que palavras hei-de empregar para agradecer a S. Exa. o Ministro, em meu nome pessoal, no dos meus colegas e no das populações interessadas. Limito-me, por isso; a dizer simplesmente: muito obrigado, Sr. Ministro.
Seria agora oportuno fazer o elogio de S. Exa. e dirigir-lhe algumas palavras amáveis e inteiramente justas, mas a verdade é que eu nada poderia dizer que não estivesse na alma e no coração de todo o povo português, que sente pelo Sr. Eng.º Arantes e Oliveira a maior gratidão, estima e admiração, que difìcilmente poderão ser ultrapassadas. Ele é sempre o amigo compreensivo, bom, inteligente e dinâmico que Portugal conhece, estima e admira em todo o continente e ilhas adjacentes, desde a capital até às mais remotas aldeias das nossas serranias.
É de toda a justiça salientar também a boa vontade com que os técnicos da Direcção-Geral têm cumprido as ordens de S. Exa. o Ministro, pondo no seu cumprimento um interesse e diligência que me foi muito grato constatar, pelo que a todos estou muito reconhecido, e em especial ao Sr. Eng.º Matias, distinto e competente chefe da Repartição de Estudos.
Sr. Presidente: para que a Assembleia fique devidamente elucidada e tenha conhecimento de que os Deputados por Leiria se interessaram por uma causa justa, vou fazer um breve resumo das razões que nos levaram a procurar S. Exa. o Ministro das Obras Públicas.
Começando pela encantadora baía de S. Martinho do Porto, informo os que a não conheçam que é uma das mais maravilhosas estancias de veraneio que existem em toda a costa portuguesa e que já foi um porto de mar de grande movimento, podendo voltar a ter o antigo esplendor quando for possível fazer as difíceis e dispendiosas obras necessárias para tornar o porto acessível a navios de maior calado.
É actualmente uma encantadora praia de banhos - a praia das crianças, por excelência, onde estas podem brincar e banhar-se sem o mínimo perigo - e é também uma admirável estância de turismo, que o Estado, a Camará Municipal de Alcobaça, as entidades locais e os particulares têm alindado e feito progredir cada vez mais, dê tal forma que o número de banhistas têm aumentado todos os anos, e hoje é um ponto obrigatório de passagem de turistas, nacionais e estrangeiros, que se não cansam de admirar as suas belezas naturais.
Todo esse progresso e beleza desapareceriam se a baia não fosse convenientemente dragada e efectuadas as obras necessárias para evitar o seu assoreamento, pelo que é digna do maior apreço e gratidão a ordem que S. Exa. o Ministro se dignou dar e que aqui lhe estou agradecendo.
Sr. Presidente: tem o Governo da Nação feito melhoramentos de altíssima importância em portos comerciais e de pesca em todo o País e no meu distrito tem beneficiado imenso o importante porto de pesca de Peniche, pelo que é digno do maior reconhecimento por parte das populações interessadas, mas neste capítulo, como em muitos outros, ainda existem aspirações legítimas a satisfazer, uma das quais - e das mais justas - é a construção de um porto de abrigo na Nazaré, obra cara, sem dúvida, mas que me parece viável, oportuna e necessária.
O Governo já satisfez, pelo menos em grande parte, as legítimas aspirações de alguns portos de pesca, nomeadamente os de Sesimbra, Peniche e Póvoa de Varzim, mas a Nazaré, apesar das condições excepcionais que tem para ser um óptimo porto de pesca, ainda não con-

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seguia que o Governo estendesse os benefícios da sua inteligente acção à numerosa população piscatória desta vila, bem digna de melhor sorte, pela sua coragem, pelas suas comprovadíssimas aptidões e pelo elevado número de pescadores que naquela praia ganham o pão de cada dia e cujo número se tem reduzido, por muitos se terem visto obrigados a deixar a sua terra, para irem trabalhar onde ganhem o suficiente para eles e suas famílias se alimentarem, sem terem a vida em risco constante, como acontece na Nazaré.
A decisão de S. Exa. o Ministro das Obras Públicas veio lançar um clarão de esperança na alma atribulada dos pescadores da Nazaré. Talvez agora seja possível obter a construção de um simples porto de abrigo, que permita aos pescadores da vila continuarem a exercer a sua benemérita profissão na sua terra, mantendo as suas características especiais e as condições que tem leito da Nazaré um dos mais valiosos cartazes turísticos de todo o País, onde nacionais e estrangeiros continuem a deliciar-se com a vista das suas magníficas belezas naturais e a observação dos seus interessantes costumes e trajos regionais.
Não sei ainda se seria possível a construção do almejado porto de abrigo, ou se a sua construção ficará tão cara que se torne necessário adiar, mais uma vez, a satisfação das legítimas aspirações da gente da Nazaré.
Sei bem que um porto de abrigo, se for viável a sua construção, ficará muito caro e mais caro ainda ficará um porto de pesca ou um porto comercial e de pesca, podendo parecer que, a tão pequena distância dos portos de Peniche e da Figueira da Foz, se não justificará, sob o ponto de vista nacional, um novo porto de pesca e ainda menos um porto que servisse para a pesca e movimento comercial, mas seja-me permitido discordar um pouco desta respeitável opinião.

Sr. Presidente: penso que um porto de mar é sempre um elemento de progresso e de riqueza para uma região e, portanto, em grau mais ou menos elevado, para todo o País.
Nações há, como as pequenas Dinamarca e Grécia, dotadas de numerosos portos e onde estes têm servido, incontestàvelmente, para o progresso, enriquecimento e desenvolvimento dessas nações.
Lembro-me neste momento de que se discutiu muito há umas trás dezenas de anos se conviria ou não gastar dinheiro com os dois portos de Aveiro e Figueira da Foz, ou se bastaria apetrechar devidamente só um deles.
O Governo, inteligentemente, tem gasto muito dinheiro com ambos, e ninguém poderá hoje afirmar, com verdade, que esse dinheiro não foi útil e conveniente para o progresso das duas cidades, das regiões em que se situam e, portanto, de todo o País.
O porto de pesca, da Nazaré é necessário, e até por estudos que fiz quando governador civil do distrito cheguei à conclusão do que se justificaria a sua adaptação a porto de comércio, servindo uma região riquíssima, em que abundam as essências florestais, resina, cortiça, vinho, azeite, frutas e outros produtos agrícolas, mármores, cantarias e pedras rijas, produtos vidreiros, óleo de bagaço, cimentes, tijolo, telha, produtos de cerâmica vulgar e artística, etc.
Talvez hoje o porto comercial se não justifique tão evidentemente como então, porque só a exportação de cimento da fábrica da Maceira para as províncias ultramarinas portuguesas e para o Brasil daria, nessa altura, um grande movimento ao porto, mas continuo convencido de que ainda hoje se podia justificar a sua adaptação.
Eu nunca concordei, não concordo nem jamais concordarei com as pessoas que entendem que a Portugal bastavam apenas dois grandes portos comerciais: o de Lisboa e o de Leixões. Os portos mais pequenos, a meu ver, também tem missões úteis a desempenhar no conjunto do progresso geral da Nação.
Penso que o porto da Nazaré, uma vez construído, daria ampla compensação ao Estado das despesas que para isso tivesse de fazer, e não perco a esperança de que o Governo, reconhecendo a justiça, a oportunidade e a conveniência de o construir, o venha ainda a incluir num futuro plano de fomento.
Em defesa do meu ponto de vista não apresento dados, estatísticos, nem quadros comparativos, porque tudo isso consta das várias representações que tem sido entregues ao Governo e são elementos que não pedi ao Ministério, mas que constam dos respectivos serviços,
No caso de não ser viável a construção do simples porto de abrigo e de não ser considerada justificável a despesa a fazer com a construção de um porto de pesca, atrevo-me a solicitar ao Governo que, pelo Ministério da Economia, seja feito um inquérito a respeito de tudo o que seria possível exportar e importar pelo porto da Nazaré, e parece me que, depois de um estudo consciencioso, se poderia chegar à conclusão de que era útil e compensadora a sua construção com as duas modalidades: pesca e comércio.
Resta-me encarar o problema pelo lado sentimental e humano, tão grato às nossas almas sensíveis de verdadeiros portugueses.
É triste, é doloroso e é deprimente ver aquela pobre gente da Nazaré, velhos, mulheres e crianças e até homens, a pedir pelas ruas da vila, de Alcobaça e de outras povoações dos arredores, quando o mar está bravo e não permite aos valentes pescadores que vão exercer a sua arriscada e útil missão, obrigando-os a passar uma vida de miséria e de fome, que se reflecte, lamentàvelmente, na sua saúde e na de suas famílias.
Todos, ou quase todos, procuram trabalhar, especialmente nos campos, onde geralmente há falta de braços, mas os pescadores, que são mestres na sua profissão, têm imensa dificuldade em se adaptar a outras ocupações é pouco podem ganhar, acrescendo ainda a circunstancia de nem sempre poderem trabalhar no campo, por o tempo o não permitir e terem de recorrer à caridade pública para não morrerem de fome, apesar de o Estado, através das Casas dos Pescadores, ter procurado remediar este estado de coisas; mas o que tem feito não é suficiente, apesar dos louváveis e meritórios esforços do nosso ilustre colega Sr. Comandante Tenreiro, a quem os pescadores estão reconhecidíssimos.
Podem dizer-me que devem sair, em massa, da Nazaré e irem estabelecer-se em outros portos de pesca. Muitos já o têm feito, indo para Peniche, Matosinhos e outros portos, mas essa transferência é cara e dolorosa, deprime-lhes o moral, e se a Nazaré, pela força das circunstâncias, perder as suas características de povoação de pescadores, perderá um dos seus principais atractivos, como cartaz turístico internacional de grande relevo, e a economia do concelho e da região será, lamentavelmente, afectada.
As vidas dos pescadores que quase, todos os anos, se perdem na praia da Nazaré também têm valor, e muito grande, e a economia de vidas humanas e as desgraças que se evitariam se existisse um porto de pesca também são dignas de serem tomadas em consideração.
Eu era ainda muito pequeno, teria talvez quatro ou cinco anos, quando assisti a uma das tragédias, infelizmente bastante frequentes naquela infeliz povoação, e ainda hoje sinto o horror dos gritos das mulheres e crianças e a aflição dos homens, de mãos dadas, agarrados uns aos outros, metendo-se pelo mar dentro, na ânsia de salvar os pobres tripulantes de um barco de pesca que o mar embravecido tinha voltado e alguns dos quais morreram à vista dos filhos, das mulheres e dos amigos, que os não puderam salvar.

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Ainda hoje, cerca de sessenta anos passados, ecoam nos meus ouvidos os gritos de aflição e vejo os corpos dos homens, nadando corajosamente, aproximando-se da praia, quase salvos, quando uma nova onda altaneira os levava violentamente para o largo, uma e mais vezes, até que desapareciam n» seio das águas, completamente exaustos e incapazes de lutarem contra a morte, que inexoràvelmente os arrebatava.
Sinto, Sr. Presidente, porque a conheço bem, a tragédia que constitui a vida dos pescadores da Nazaré, e, porque a sinto e tenho a convicção de que defendo uma causa justa, atrevo-me a pedir ao Governo, e em especial ao estadista eminente que o chefia e cujo elogio é desnecessário fazer, porque a sua obra formidável é bem conhecida no País e no estrangeiro, e ao distinto Ministro das Obras Públicas, a quem a Nação já hoje deve inestimáveis serviços, que olhem para os pescadores da Nazaré com os olhos das suas almas sensíveis e boas e façam o que os pescadores há tantos anos vêm pedindo. Deus os abençoará e as preces daquela gente, tão boa e tão religiosa, lhes darão felicidade nesta vida e recompensa eterna na outra.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

rdem do dia

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à discussão na especialidade da proposta e projectos de lei de alteração à Constituição Política.
Começaremos pela discussão na especialidade da proposta de revisão apresentada pelo Governo, visto que foi esta a primeira proposta.
Vai discutir-se o artigo 1.º da proposta de revisão apresentada pelo Governo, que se refere ao artigo 20.º da Constituição. Para esse efeito vão ler-se o artigo 1.º desta proposta e o texto do referido artigo 20.º da Constituição. Para esse efeito vão ler-se o artigo 1.º desta proposta e o texto do referido artigo 20.º da Constituição.

Foram, lidos. São os seguintes:

«ARTIGO 1.º

O artigo 20.º da Constituição Política é substituído pelo seguinte:

Art. 20.º Nos organismos corporativos estarão orgânicamente representadas todas as actividades da Nação e compete-lhes participar na eleição das câmaras municipais e das juntas distritais e na constituição da Câmara Corporativa».

«ARTIGO 20.º

Nos organismos corporativos estarão organicamente representadas todas as actividades da Nação e compete-lhes participar na eleição das câmaras municipais e das juntas de província e na constituição da Câmara Corporativa».

O Sr: Mário de Figueiredo:- Sr. Presidente: se V.º Exa. me dá licença, este artigo 1.º está relacionado com os artigos 2.º, 20.º e 21.º da proposta do Governo e ainda com ele está relacionada também uma proposta de alteração, referida exclusivamente aos artigos 125.º e 126.º da Constituição, de modo que parece deverem aqueles artigos da proposta ser discutidos conjuntamente.

O Sr. Presidente: - Agradeço muito a sua observação, e, sendo assim, os Srs. Deputados que desejarem usar da palavra ficam, desde já, esclarecidos de que estão em discussão os artigos 1.º, 2.º, 20.º e 21.º da proposta governamental, relativamente aos quais foi apresentada uma proposta de emenda pelo Sr. Deputado Simeão Pinto de Mesquita.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Peço a V. Exa. que mande ler a proposta de alteração do Sr. Deputado Simeão Pinto de Mesquita.

O Sr. Presidente: - Vai ser lida, bem como os artigos. 2.º, 20.º e 21.º da proposta governamental e os artigos 21.º, 125.º e 126.º da Constituição.

Foram lidos. São os seguintes:

«ARTIGO 2.º

O artigo 21.º é substituído pelo seguinte:

Art. 21.º Na organização política do Estado concorrem as juntas de freguesia para a eleição das câmaras municipais e estas para a das juntas distritais. Na Câmara Corporativa haverá representação de autarquias locais».

«ARTIGO 20.º

O corpo do artigo 125.º é substituído pelo seguinte:

Art. 125.º Sem prejuízo da designação regional «província», o território do continente divide-se em concelhos, que se formam de freguesias e se agrupam em distritos, estabelecendo a lei os limites de todas as circunscrições».

«ARTIGO 21.º

O artigo 126.º é substituído pelo seguinte:

Art. 126.º Os corpos administrativos são as câmaras municipais, as juntas de freguesia e as juntas distritais».

«ARTIGO 21.º

Na organização política do Estado concorrem as juntas de freguesia para a eleição das câmaras municipais e estas para a das juntas de província. Na Câmara Corporativa haverá representação de autarquias locais».

«ARTIGO 125.º

O território do continente divide-se em concelhos, que se formam de freguesias e se agrupam em distritos e províncias, estabelecendo a lei os limites de todas as circunscrições.
§ 1.º Os concelhos de Lisboa e Porto subdividem-se em bairros e estes em freguesias.
§ 2.º A divisão do território das ilhas adjacentes e a respectiva organização administrativa serão reguladas em lei especial».

«ARTIGO 126.º

Os corpos administrativos são as câmaras municipais; as juntas de freguesia e as juntas de província.

«Proposta de substituição apresentada pelo Deputado Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães à alteração proposta pelo Governo dos artigos 125.º e 126.º da Constituição:

Art. 125.º O território do continente divide-se em concelhos, que se formam de freguesias e se agrupam em circunscrições ou autarquias regionais e eventuais zonas urbanas a regular em lei especial.

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Art. 126.º Os corpos administrativos são as câmaras municipais, as juntas de freguesia e os organismos dirigentes das autarquias regionais ou zonas urbanas previstas no artigo 125.º

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 16 de Junho de 1959.- O Deputado, Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães».

O Sr. Presidente: - Estão em discussão.

Pausa.

O Sr. Cid Proença: - A Comissão de Legislação e Redacção votou os artigos 1.º, 2.º, 20.º e 21.º constantes da proposta de lei.

O Sr. Carlos Moreira: - Sr. Presidente: no artigo 2.º da proposta de lei do Governo propõe-se a substituição do artigo 21.º da Constituição e diz-se que na Câmara Corporativa haverá representação de autarquias locais. Pela redacção dada parece-me concluir-se que não é obrigatória a representação de todas as autarquias, mas simplesmente a de algumas.
Como tenho dúvidas acerca da infecção da proposta, desejava ser esclarecido, para efeito de dar o meu voto.

O Sr. Soares da Fonseca: - Sr. Presidente: é para dizer a V. Ex.ª e à Câmara que a alteração constante dos artigos em discussão consiste propriamente no seguinte: extinguir-se a província como divisão administrativa e restaurar-se o distrito na plenitude da sua função como circunscrição administrativa do País, ao mesmo tempo que a respectiva junta distrital, em substituição da antiga junta geral, reaparece como autarquia local, desaparecendo portanto a província como divisão administrativa e a respectiva junta como autarquia local.
A província tradicional, por um lado, não corresponde, nem na sua área geográfica, nem nas atribuições, à actual província, e, por outro lado, esta não eliminou a anterior divisão administrativa.
Por outras palavras: a Constituição de 1933 e o Código Administrativo em vigor não restauraram a província tradicional, instauraram um tipo novo de província; mas ao cabo de duas dezenas de anos verifica-se que a província, no sentido novo da Constituição e do Código Administrativo, não vingou, mal vegeta. O País não a sente.
Quer dizer: o distrito, que era a divisão administrativa superior ao concelho que tinha já alguma tradição, a de um século de existência na história da administração pública portuguesa, permanece, e o País contínua a dar por ele.
Melhor parece, por isso, ajustar - embora discorde da fórmula que por vezes vejo empregada - o Pais legal ao País real.
A província, segundo o conceito tradicional, com limites algo indefinidos, em certos casos, continuará a existir; eu continuarei a ter honra em dizer que sou da província. Conheço, amo e sinto a minha província, mas não como divisão administrativa.
Bem parece, portanto, que sob este aspecto a Constituição lhe preste a homenagem da consagração da palavra no artigo 125.º, como homenagem ao real sentido que esta expressão tem.
Ao apontamento feito pelo Sr. Dr. Carlos Moreira desejava dar esta explicação: não há qualquer alteração ao texto constitucional; a expressão é a que está nesse texto.
Tenho dito.

O Sr. Carlos Moreira: - Muito obrigado a V. Exa.

O Sr. Proença Duarte: - Sr. Presidente: efectivamente, o artigo 1:º da proposta de alteração à Constituição Política colide com os artigos 20.º e 21.º, e, por isso, V. Exa., muito acertadamente, como sempre, pôs todos os artigos em discussão.
Da nova redacção dada ao artigo 125.º verifica-se que desaparece a província como autarquia local, e, portanto, o respectivo corpo administrativo, para se regressar à autarquia local do distrito, com o respectivo corpo administrativo, a junta distrital.
Votei a Constituição de 1933 e aqui discuti e votei as alterações que posteriormente lhe foram feitas. Criou-se pela Constituição de 1933 a província como autarquia local. O processo foi suficientemente instruído e produziram-se argumentos de um lado e de outro sobre a supressão do distrito como autarquia local para dar lugar à criação da província.
As províncias e o seu respectivo corpo administrativo, como se diz no parecer da Câmara Corporativa, já tiveram um período de experiência, e, segundo o referido parecer, essa experiência não se mostra muito feliz.
Não vejo vantagens, Sr. Presidente, eu, que desempenho quase desde a primeira hora as funções de presidente da Junta de Província do Ribatejo, em se modificar o regime vigente para dar lugar à inclusão dos distritos como autarquias locais, e até me parece que a coisa se não harmoniza inteiramente com os artigos 134.º e 135.º da Constituição, que mantêm a divisão dos territórios ultramarinos em províncias.
Quer dizer, quando nós nos encaminhamos no sentido de fazer uma perfeita integração da nossa organização continental e ultramarina, de fazer uma integração de maneira que haja uma maior proximidade e semelhança de organizações administrativas, suprimimos as províncias do continente, mas subsistem as províncias ultramarinas, que não têm, portanto, correspondência na divisão administrativa continental.
Depois, também não vejo vantagem de ordem política, nem de outra natureza, em se regressar à junta distrital, em vez da junta de província, pois isto só daria lugar à criação de mais secretarias, aumento de funcionalismo público, etc., porque todos os distritos passariam a ter a sua junta distrital, com a respectiva secretaria. Aumentavam, portanto, as despesas e diminuíam as receitas com que contavam estas autarquias locais.
Daí, Sr. Presidente, me parecer que, desde que não há vantagem, nem de ordem económica, nem de ordem social, nem de ordem moral, nem mesmo de ordem política, não existe conveniência em modificar a nossa organização administrativa, e votarei, portanto, pela manutenção das províncias como autarquias locais, nos termos em que elas funcionam actualmente.
Tenho dito.

O Sr. Nunes Barata: - Sr. Presidente: pedi a palavra para marcar a minha posição relativamente aos artigos em discussão.
Afigura-se-me que seria mais conveniente para a necessária maleabilidade da estruturação administrativa que a lei ordinária estabelecesse quais as circunscrições que constituem autarquias locais.
Mas, uma vez que se vem fazendo tradição manter estas disposições no texto constitucional, e convencido, como estou, de que assim pensa a maioria da Câmara, limito-me a afirmar que, se a junta geral de distrito for restaurada nos mesmos moldes em que tem estado estruturada a junta de província, está condenada à falência.

O Sr. Carlos Moreira: - Muito obrigado a V. Exa.

O Sr. Augusto Simões: - Muito bem!

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O Orador:- Mais do que a experiência falhada das runtas de província nas últimas décadas, temos a experiência do liberalismo em relação às autarquias distritais.
A organização distrital deverá ter uma base municipal, constituindo uma federação de municípios.
A federação distrital de municípios deveria exercer uma função complementar dos municípios da respectiva área naquilo que ultrapassasse a força financeira e técnica de cada um ou o limite geográfico e especial das respectivas atribuições.
É, pois, nesta medida que voto os textos, sem mais discussão, numa fidelidade ao princípio do mal menor.
Tenho dito.

O Sr. Soares da Fonseca: - Sr. Presidente: estou de acordo, em substância, com as palavras do Sr. Dr. Nunes Barata, quando ele defende a federação de municípios, tanto mais que pertenço a uma região em que de há muito se fez a experiência de uma federação de municípios, com felizes resultados.
Mas o que está agora em discussão é outro problema: o da extinção das províncias e respectivas juntas e o da criação nos distritos de juntas distritais. A este respeito o Sr. Dr. Nunes Barata trouxe um valioso contributo, que por si responde ao Sr. Dr. Proença Duarte.
Se a junta geral for igual à junta de província que agora há, disse o Sr. Dr. Nunes Barata, não valerá nada. Isto diz da eficiência que têm tido as juntas de província. Quanto ao ultramar, ali a designação «província», não tem nada com as províncias do continente. Na nossa província de Angola, por exemplo, haverá vários Minhos, vários Algarves, várias Beiras e até alguns Ribatejos. É uma província que têm muitas províncias e à frente da qual se encontra um governador, o que não me parece que aconteça com nenhuma das províncias da metrópole. Isto é só para dizer que não podemos argumentar com a palavra «provincia» aplicada ao ultramar, para a transpor para um significado muito diferente na metrópole. Suponho que não vale a pena gastar mais palavras para elucidar a Assembleia.
Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Continuam em discussão.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Sr. Presidente: pedi a palavra para acentuar que, ao contrário do Sr. Deputado Proença Duarte, entendo que os inconvenientes apontados às autarquias distritais podem 'bem resultar em vantagens, atenta a necessidade de dar vida às cidades capitais de distrito, sem que necessàriamente tenham de advir ainda maiores dificuldades financeiras para estas autarquias, desde que a definição de competência venha a ser feita com critério e sentido do revigoramento indispensável da vida local.
Mas o objecto da minha intervenção era outro. Era quanto à proposta de alteração do Sr. Deputado Pinto de Mesquita, proposta de alteração que, como acentuou o Sr. Deputado Nunes Barata, seria contrária à tradição do novo texto constitucional de incluir essas disposições por remeter para lei ordinária estas questões.
Estas razões, que levaram o Sr. Deputado Nunes Barata a não formular a sua proposta de alteração, suponho serem as mesmas que, neste momento, militam em contrário do ponto de vista do Sr. Deputado Pinto de Mesquita. Demais, sem os esclarecimentos necessários, não aparece, creio, com suficiente nitidez para que a Câmara pudesse ao votar a proposta tomar posição precisa.
Tenho dito.

O Sr. Bagorro de Sequeira: - Era para prestar um esclarecimento à Câmara, de certo modo em resposta à observação feita pelo Sr. Deputado Proença Duarte, sobre a designação de «província» que aindas e adopta no ultramar. Ainda hoje se diz «província de Angola» e «província de Moçambique», é facto, mas esta designação envolve todo o território de Angola e de Moçambique. É verdade que Angola já foi dividida em províncias e estas em intendências ou distritos. Porém, na última reforma administrativa foram suprimidas as províncias e reconstituídos os distritos.
Hoje existe na província de Angola uma designação que engloba todo o território: a designação de «província». A província é dividida em distritos, e não em províncias.
Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Continuam em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente:- Vai proceder-se, conjuntamente, à votação dos artigos 1.º, 2.º, 20.º e 21.º da proposta de revisão apresentada pelo Governo. Estes artigos visam a alterar os artigos 20.º, 21.º, 125.º e 126.º da Constituição.
Se a Câmara aprovar aqueles artigos, ficará prejudicada a proposta do Sr. Deputado Simeão Pinto de Mesquita relativamente aos artigos 125.º e 126.º da Constituição.
Submetidos à votação, foram aprovados os artigos 1.º, 2.º, 20.º e 21.º da proposta do Governo.

O Sr. Presidente:- Ponho agora em discussão o artigo 3.º da proposta do Governo, que vai ler-se.

Foi lido. É o seguinte:

«ARTIGO 3.º

O corpo do artigo 53.º é substituído pelo seguinte:

Art.º 53.º O Estado assegura a existência e o prestigio das instituições militares de terra, mar e ar exigidas pelas supremas necessidades de defesa da integridade nacional e da manutenção da ordem e da paz públicas».

O Sr. Cid Proença:-Sr. Presidente: quero apenas dizer à Câmara que a Comissão de Legislação e Redacção concorda com a redacção proposta pelo Governo quanto a este artigo.

O Sr. Soares da Fonseca: - Quero apenas dizer que não há nenhuma alteração de fundo neste artigo; mantém-se integralmente a doutrina. Simplesmente se ajusta o texto da Constituição à criação, posteriormente à última redacção, da Constituição, das instituições militares do ar como instituição com carácter autónomo. Por isso se passará a dizer «instituições militares de terra, ar e mar».
Neste simples ajustamento do texto da Constituição à criação da Aeronáutica está o significado da alteração referida.

0 Sr. Presidente: - Visto mais nenhum dos Srs. Deputados fazer uso da palavra, vai votar-se o artigo 3.º da proposta do Governo.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão o artigo 4.º da proposta de lei, que visa a alterar o artigo 72.º da Constituição, sobre o qual há na Mesa uma proposta do Sr. Deputado Mário de Figueiredo, o artigo 1.º do pro-

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jecto do Sr. Deputado Cerqueira Gomes, a proposta da Comissão do Ultramar e a proposta do Sr. Deputado José Saraiva. Vão ser lidos o artigo 4.º e as propostas referidas.

Foram lidos. São os seguintes:

«ARTIGO 4.º

O artigo 72.º e seus parágrafos são substituídos pelo seguinte:

Art. 72.º O Chefe do Estado é o Presidente da República, eleito por um colégio eleitoral constituído pelos membros em exercício efectivo da Assembleia Nacional e da Câmara Corporativa e pelos representantes municipais de cada distrito da metrópole e das províncias ultramarinas ou de cada província ultramarina não dividida em distritos.
Os representantes municipais serão designados pelas vereações eleitas nos termos da lei, a qual fixará o número que deve caber a cada distrito ou província ultramarina em correspondência com o numero das respectivas câmaras.
§ 1.º O Presidente é eleito por sete unos improrrogáveis, salvo o caso de acontecimentos que tornem impossível a reunião do colégio eleitoral referido no corpo deste artigo, terminando, em tal caso, o mandato logo que tome posse o seu sucessor.
§ 2.º Para efeito da eleição, o colégio eleitoral reúne por direito próprio, sob a presidência do Presidente da Assembleia Nacional, no décimo quinto dia anterior ao termo de cada período presidencial.
§ 3.º A eleição recairá em candidatos propostos pelo mínimo de vinte eleitores e o máximo de cinquenta.
§ 4.º A eleição far-se-á por escrutínio secreto, considerando-se eleito o candidato que no primeiro escrutínio obtiver dois terços do número legal dos membros do colégio eleitoral.
§ 5.º Se nenhum candidato obtiver a maioria prevista no parágrafo anterior, proceder-se-á a segundo escrutínio, ficando eleito o candidato que obtiver a maioria absoluta dos votos a que se refere o mesmo parágrafo.
§ 6.º Havendo de proceder-se a terceiro escrutínio, será eleito o candidato que obtiver maior numero de votos».

«Proposta de alteração

Proponho que ao artigo 4.º da proposta n.º 18 (alteração da Constituição) sejam feitas as seguintes alterações:

1.º O primeiro período do artigo 72.º da Constituição passe a ter a seguinte redacção:

Art. 72.º O Chefe do Estado é o Presidente da República, eleito pela Nação por intermédio de um colégio eleitoral constituído pelos membros da Assembleia Nacional e da Camará Corporativa em efectividade de funções e pelos representantes municipais de cada distrito ou de cada província ultramarina não dividida em distritos.

2.ª O § 4.º do mesmo artigo 72.º da Constituição passe a ter a seguinte redacção:

§ 4.º A eleição far-se-á sem prévio debate, por escrutínio secreto, considerando-se eleito e sendo como tal proclamado o candidato que no primeiro escrutínio obtiver dois terços de votos do número legal dos membros do colégio eleitoral.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 17 de Junho de 1959. - O Deputado, Mário de Figueiredo».

«ARTIGO 1.º

O corpo do artigo 72.º é substituído pelo seguinte:

Art. 72.º O Chefe do Estado é eleito por um colégio eleitoral constituído pelos membros em exercício efectivo da Assembleia Nacional e da Câmara Corporativa não designados pelo Governo, por membros da hierarquia eclesiástica (cardeais, arcebispos e bispos de cidades da metrópole e províncias ultramarinas a designar por lei), representantes da magistratura, comandos superiores do Exército, da Armada e da Aeronáutica e representantes do ensino superior e das instituições de alta cultura.

«Proposta de aditamento

Propomos que a alteração constante do artigo 4.º da proposta de lei n.º 18 seja aditada nos seguintes termos:

Art. 72.º O Chefe do Estado é o Presidente da República, eleito por um colégio eleitoral constituído pelos membros em exercício efectivo da Assembleia Nacional e da Câmara Corporativa, pelos representantes municipais de cada distrito da metrópole e das províncias ultramarinas ou de cada província ultramarina não dividida em distritos e ainda pelos representantes dos conselhos legislativos das províncias de governo-geral e de governo simples, respectivamente. Os representantes municipais serão designados pelas vereações eleitas, nos termos da lei, a qual fixará o número que deve caber a cada distrito ou província ultramarina em correspondência com o número das respectivas câmaras; os representantes dos conselhos legislativos e de governo serão designados por estes órgãos nos termos da lei, a qual fixará o número que deve caber a cada conselho em correspondência com o seu carácter representativo.

Os Deputados: Sarmento Rodrigues - Frederico Bagorro de Sequeira - Avelino Teixeira da Mota - Alberto da Rocha Cardoso de Matos - Castilho de Noronha - Martinho da Costa Lopes - Artur Águedo de Oliveira - Jerónimo Henriques Jorge -Manuel de Lacerda de Sousa Aroso - Jorge Pereira Jardim».

«Proposta de alteração do artigo 4.º da proposta de lei n.º 18

Proponho que o artigo 4.º da proposta de lei em discussão passe a ter a seguinte redacção:

Art. 4.º O artigo 72.º e seus parágrafos são substituídos pelo seguinte:

Art. 72.º O Chefe do Estado é o Presidente da República, eleito por um colégio eleitoral constituído por representantes das freguesias em que se acha dividido o território continental e insular e pelos membros dos conselhos legislativos das províncias ultramarinas de governo-geral e pelos membros dos conselhos do governo das províncias de governo simples.
Os eleitores indicados em primeiro lugar serão eleitos por sufrágio dos chefes de família

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residentes nas respectivas freguesias, devendo esta eleição estar concluída seis meses antes do último, dia de cada período presidencial.

O Deputado, José Hermano Saraiva.

O Sr. Cid Proença: - Sr. Presidente: pedi a palavra somente para informar a Assembleia de que a Comissão de Legislação e Redacção apreciando este artigo, deu a sua concordância ao texto da proposta de lei, excepto quanto ao primeiro período do corpo do artigo 72.º da Constituição e quanto ao respectivo § 4.º, em relação aos quais perfilhou as sugestões da Câmara Corporativa.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Sr. Presidente: é conhecida a solução vigente relativamente à eleição do Chefe do Estado. São conhecidas e já foram profusamente expendidas as razões por que se entendeu dever mudar de solução nesta matéria.
A solução da proposta do Governo é, como V. Ex." e a Assembleia sabem, fundamentalmente, a seguinte: o Chefe do Estado será eleito por um colégio constituído pelos membros da Assembleia Nacional, da Camará Corporativa e por representantes das camarás, agrupadas por distritos.
Esta é fundamentalmente a solução proposta. O resto das disposições corresponde a arranjos que estão na sequência lógica desta solução. Não vale a pena, portanto,. estar a aludir circunstanciadamente a cada uma das disposições que são consectário da disposição fundamental, na qual se estabelece como e em que termos deverá ser feita a eleição do Chefe do Estado.
Porque se foi para este sistema?
Entendeu-se, em primeiro lugar, não dever manter o regime vigente, próprio das formas presidencialistas, nem o regime generalizado da eleição pelas câmaras legislativas, próprio das formas parlamentares.
Procurou-se, além do voto daquelas camarás, mais o voto de um grupo de eleitores, representantes dos municípios, e procurou-se um arranjo tal que não pudesse qualquer dos grupos que intervêm na eleição decidir definitivamente da eleição.
Assim, nunca poderá dizer-se que- o Presidente tem um poder delegado das assembleias' políticas, mas um poder independente dessas assembleias, visto que nem a Assembleia Nacional nem a Câmara Corporativa podem, por si, como disse, decidir da eleição do Presidente.
Entendeu-se isto, por um lado.
Entendeu-se, por outro lado, que esta forma de eleição ou de designação do Chefe do Estado se apresentava como podendo exprimir (emprego a palavra quê aqui tem sido frequentemente repetida) por forma, digamos, mais autêntica o pensamento nacional.
Suponho que não pode deixar de reconhecer-se aos Deputados, eleitos pela Nação, representantes da Nação, qualidade para. intervirem na escolha do mais alto representante dela. Mas os Deputados, a manter-se o sistema de eleição para eles vigente, como se propõe, intervém como representantes do interesse nacional, como interesse indiferenciado, e não como representantes de interesse* sectoriais ou diferenciados. São, se posso usar a fórmula, representantes do interesse geral do consumidor.
Não é, porém, esse o único interesse que pode apresentasse como integrando o interesse nacional; são os vários, direi, interesses sectoriais em que se organiza a Nação: interesses económicos, interesses morais, interesses espirituais. Esses interesses, de um modo geral representados na Camará Corporativa, integram também o interesse nacional, e não pode, por isso, deixar de reconhecer-se qualidade aos Procuradores à Camará Corporativa para intervirem na eleição do Chefe do Estado.
Aparecem depois as câmaras municipais, e, se estas são expressão do interesse local,, direi que também o são do interesse nacional.
Porque me permito afirmar isto? É que, guardadas as proporções, no plano municipal, os interesses que se prosseguem, os interesses que se defendem, são interesses no domínio local do mesmo tipo daqueles que se defendem no plano nacional.
São, de um modo geral, interesses indiferenciados, precisamente como aqueles que são representados no cume da organização do Estado pela Assembleia Nacional.
Entendeu-se, portanto, que assim se conseguia obter uma representação, se é possível, e creio que sim, mais autêntica do interesse nacional, uma representação mais autêntica da Nação, do que a representação obtida através do sufrágio directo do cidadão eleitor, que não exprime senão o interesse individual, sem consideração pela estrutura orgânica da Nação.
Procurou-se obter, por outro lado, que a eleição fosse feita não só por um colégio eleitoral único, mas por uma. única assembleia de voto.
Porque se foi para esta solução? Foi-se para. esta solução por duas razões fundamentais: primeira, porque era a que dispensava a apresentação de candidaturas fora do ambiente da assembleia de voto e, portanto, a discussão em volta dos candidatos; segunda, porque esta solução se apresentava como uma afirmação inequívoca da unidade nacional, considerada toda a extensão dos territórios que esta unidade abrange.
Pretendeu evitar-se que a discussão e a escolha do candidato se fizessem em termos de poder vir marcar-se contra o Chefe do Estado afinal eleito posição aberta em alguma província portuguesa da metrópole ou do ultramar.
Convenceu-se naturalmente o Governo de que seria gravemente perturbador da unidade nacional o saber-se, o conhecer-se, por exemplo, que uma provinda tinha votado num nome diferente do do Chefe do Estado afinal eleito.
Isto era ou podia ser gravemente perturbador da unidade e do interesse nacional. Estas, segundo creio, as duas razões fundamentais que levaram o Governo a sugerir uma solução capaz de conduzir a um resultado não só através de um colégio único, mas de uma assembleia única de voto.
Por outro lado, procurou-se ainda afirmar a unidade nacional através de uma solução em que metrópole e ultramar fossem colocados em posição paralela. E se se admitiu a emenda ou a proposta de aditamento feita pelos Srs. Deputados que representam o ultramar português, foi ainda em homenagem ao princípio de pôr em posição paralela metrópole e ultramar.
Como no ultramar o número de câmaras eleitas não é em cada distrito o mesmo que o número de camarás, eleitas na metrópole, entendeu-se que isso devia de alguma maneira ser corrigido através da possibilidade de terem também representação no colégio os concelhos legislativos e de governo das províncias ultramarinas.
Procurou-se evitar, por outro lado, que (à parte uma pequena inflexão sem importância de maior quanto aos representantes dos municípios) os eleitores, membros do colégio, fossem exclusivamente escolhidos para intervir na eleição do Chefe do Estado.
Isto quer dizer que a- eleição pode ter na base razões de carácter político, mas não é uma eleição expressamente feita para que os eleitos tenham como função eleger o Chefe do Estado. Pode acontecer que venham a colaborar na eleição do Chefe do Estado. Pode acontecer, mas também pode acontecer que não.

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Por outro lado, como não são eleitos exclusivamente para eleger o Chefe do Estado, não há que pôr-se, a propósito da sua eleição, a campanha política que naturalmente teria de pôr-se se eles fossem exclusivamente eleitos para eleger o Chefe do Estado.
A pequena inflexão a esta ideia relativa aos delegados dos municípios ao colégio eleitoral é realmente uma pequena inflexão. Na verdade, se os delegados ao colégio são eleitos só para esse fim, os seus eleitores -as vereações- foram-no para desempenhar as suas funções gerais como vereações, entre as quais estará ou não a de escolherem os delegados ao colégio.
Estas, de modo geral, as razões concretas - sem procurar agora entrar no domínio da teorização- que determinaram o Governo a ir para a solução que está proposta à consideração da Assembleia.
Suponho que, realmente, foi encontrada uma fórmula que conduz a que é a gente particularmente qualificada que vai intervir na eleição do Chefe do Estado- e que tem qualidade para exprimir o pensamento mais autenticamente nacional.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Paulo Cancella de Abreu: - Sr. Presidente: a apreciação e votação do artigo 72.º põe em foco a atitude de alguns Deputados revelada durante a discussão da generalidade, que, incompreensivelmente,, causou certos engulhas, não se atribuindo a esta expressão qualquer sentido pejorativo que. porventura, pudesse ser-lhe atribuído; reacção esta a que não houve oportunidade de oferecer réplica, u não ser numa breve resposta a um aparte que me foi' dirigido. São, portanto, necessárias, e agora oportunas, mais algumas palavras para que de vez cessem erradas interpretações e juízos temerários.
Intervim no debute da generalidade da proposta e dos projectos de lei tão-somente com estas finalidades:
1.º Marcar a minha posição em. referência aos artigos que se ocupam da eleição do Chefe- do Estado; posição bem evidente de recusa;
2.º Demonstrar que esta posição era especial e única em confronto com a de todos os outros Deputados, sem exclusão dos que são monárquicos inscritos ou filiados; e isto porque,
3.º Como nenhum outro, vivi mais, tempo ou mais intensamente o passado longínquo do regime que ainda vigora, conheci a inépcia da sua administração, os seus erros, os seus crimes e os seus escândalos, e comparticipei intensamente e com inquebrantável tenacidade e intransigência, nesta Camará e lá fofa, pela palavra e pela escrita, na dura campanha em que nos envolvemos e empenhámos, assumindo assim atitudes, compromissos e responsabilidades que seria indigno enjeitar ou esquecer;
4.º Desviando-me do campo exclusivamente pessoal, justificar mais uma vez a posição dos monárquicos na Assembleia Nacional e acentuar que, ao sermos propostos, não nos foram impostas condições ou qualquer filiação, nem tão-pouco temos deixado de gozar de liberdade de critica e de voto;

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador:-5.º Declarar-me disposto a colaborar nas alterações da Constituição, desde que não dissessem respeito à chefia do Estado;
6.º Concordar que não estava posta a questão do regime,, porque nenhum projecto de alteração foi apresentado a tal respeito, a começar pelo artigo 5.º, onde se determina que ò Estado Português é uma República, e, acrescento agora, podíamos, mas, em contrário do que lá fora muitos imaginam, não devíamos fazê-lo, pois tal procedimento constituía deslealdade para quem propôs a nossa candidatura e para com os republicanos nacionalistas, que, confiando em nós, nos deram o seu voto;

ocorre mesmo ao meu espirito o qualificativo de «traição».

Vozes: - Muito bem, muito bem,!

O Orador:- Por último, entendi que guardar mistério do meu voto podia importar falta de cortesia e de grata camaradagem, de que os meus prezados colegas se me tornaram credores.
Fui sincero e esforcei-me por ser claro e preciso, mas, infelizmente, por complexo meu, não o terei conseguido, pois nem todos reconheceram a delicadeza e os propósitos que me animaram e visavam especialmente à justificação de um natural e possível voto isolado, se, porventura, outros Deputados não pretendessem proceder do mesmo modo.
Quase no final das minhas breves palavras tive a honra de ser interrompido pelo Sr. Doutor Mário de Figueiredo, em termos muito delicados e penhorantes. S. Ex.ª disse, em síntese, que eu, rejeitando o novo artigo 72.º da Constituição, aprovava, implicitamente, o antigo, que também rejeitara em 1951, isto é, votando contra, votava por ...
Ora, salvo o devido respeito, Seguindo por eliminatórias a cadeia de tal raciocínio, também em 1951, votando, como votei, contra o novo artigo 72.º, votava pelo da Constituição de 1933, e votando no plebiscito desta também contra o mesmo artigo 72.º votava pelo correspondente da Constituição de 1911, e, se fosse Deputado às Constituintes deste ano, votando contra o artigo da Constituição de 1911, votava pelo correspondente da Carta Constitucional!
E, é claro, se a maioria dos Deputados votassem no mesmo sentido, teríamos, praticamente, restaurada a Monarquia!
O que, em boa verdade, seria fácil, pois a República, cega pelo delírio fugaz do entusiasmo, esqueceu-se de revogar a Corta Constitucional e alegou que ela o fora pela revolução quando, mais tarde, meu saudoso pai e outros magistrados igualmente Íntegros, aplicaram disposições, dela aliás estranhas a forma política do Governo, por entenderem que as leis não se revogam a tiros de canhão. Do que resultou a sua transferência, como degredados, para as Relações de Goa e Luanda, num manifesto atentado contra a independência do poder judicial.
Mas prossigamos.
Faço ao meu ilustre interpelante a justiça de acreditar que não foi aquele o seu pensamento, assim como S. Ex.ª me fará a de não acreditar que o meu espirito não se poderia deixar arrastar por deduções tão desconcertantes, mas resultantes lógica do seu raciocínio.
Certamente o Sr. Doutor Mário de Figueiredo quis referir-se á consequência directa e objectiva que adviria se a minha atitude fosse adoptada pela maioria dos Deputados, ou seja a prevalência de um artigo mau que se pretendia substituir por outro melhor.
Entrou assim o ilustre. Deputado no domínio da fantasia, e a ela pretendeu sacrificar ideias, princípios e coerência a que uns tantos não estivessem dispostos a renunciar.
E isto depois de, tornando-se mais compreensivo -ia a dizer mais «realista» -, confessar que compreendia a minha posição, fazendo-me, assim, justiça, a que lhe sou grato.
Eis a razão por que guardo para mim a mágoa de, apesar disso, me suporem capaz de vergar a consciência perante o inverosímil ou ao peso de conjecturas mais

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ou menos fantasistas ou de simples hipóteses, que até já ouvi classificar de absurdas! O absurdo com primado sobre a razão moral!
Meu Deus!
Não saberei compreender. Terei o cérebro esvaído pelos azares da vida ou pelo andar dos anos. Mas devo à Providencia a infinita graça de ainda não ter a alma vazia!
Tenho dito, Sr. Presidente.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Sarmento Rodrigues: - Sr. Presidente: a minha ausência desta Camará, durante alguns dias, em serviço no Brasil, não me permitiu acompanhar, como seria meu desejo, os debates sobre a proposta e os projectos de-lei de alteração à Constituição Política.
Desta maneira, não me sentiria qualificado para agora levantar a minha voz se não fosse a grande amabilidade dos meus colegas da Comissão do Ultramar, e muito especialmente do ilustre colega Bagorro de Sequeira, cuja modéstia não lhe permitiu, como parecia ser lógico, tomar agora a defesa de uma proposta de que ele teve a principal iniciativa.
A proposta que foi enviada para a Mesa pela Comissão do Ultramar, e que eu tive a honra também de subscrever, nasceu do interesse dos Deputados eleitos pelo ultramar, em presença da provável alteração da forma de eleição do Chefe do Estado, que era objecto de uma proposta dó lei do. Governo, do interesse que teriam em que o ultramar participasse, na mais larga medida, nesse acto fundamental.
E, assim, limitaram-se a acrescentar à proposta enviada pelo Governo a inclusão no colégio eleitoral de representantes dos conselhos legislativos nas províncias de governo-geral e dos conselhos de governo nas outras províncias. ....
É que esses organismos, os conselhos legislativos e os conselhos de governo, são verdadeiramente representativos dos interesses económicos, espirituais e morais das províncias ultramarinas, e, portanto, é perfeitamente justo que eles tenham também intervenção na eleição do Chefe do Estado.
Desejaria ainda acrescentar que, convencido da aprovação desta alteração, que com muito prazer vi ter o ,apoio do representante do Governo nesta Assembleia, o ilustre leader Prof. Mário de Figueiredo, convencido da aprovação deste nosso aditamento, confio, como todos os Deputados pelo ultramar, em nome de quem neste momento falo, que a lei venha a consignar uma representação não apenas proporcional ao número de eleitores das províncias ultramarinas, mas proporcional ao seu valor potencial expresso nas áreas geográficas, nos recursos económicos, na tendência felizmente marcada para o crescimento e, direi ainda, na própria qualidade dos eleitores.
Como tive ocasião de em outros actos eleitorais dizer, dirigindo-me ao ultramar e sabendo previamente que os seus votos não iriam decidir do resultado das eleições, era grande o- meu interesse pelos seus votos, dizendo-lhes expressamente que os votos eram sobretudo votos de qualidade.
Neste momento, eles nem sequer serão conhecidos, pois que vão integrar-se no mesmo e único colégio eleitoral. E por isso mesmo confio que a lei geral os torne mais numerosos.
O ilustre Prof. Mário de Figueiredo, nas suas tão doutas considerações, justamente repetiu que se queria dar ao ultramar uma posição paralela àquela que se dava às províncias continentais europeias e aos arquipélagos do Atlântico. Paralela não significa igual; pode significar, como desejo e creio que todos nós desejamos, uma posição favorecida que é justificada pelos grandes valores que' essas províncias representam.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - Continua em discussão.

O Sr. Carlos Moreira: -Sr. Presidente: ouvi com toda a atenção as considerações produzidas a propósito do artigo em discussão, e muito particularmente o depoimento pessoal do Sr. Deputado Paulo Cancella de Abreu. Farei também o meu mais ou menos rápido, em obediência a considerações semelhantes. Di-lo-ei mais rapidamente porque cometi a falta de me alongar, demasiadamente na intervenção na generalidade.
Ai deixei ditas, Sr. Presidente, as razoes fundamentais que determinariam a minha posição ao discutir e votar estes dois artigos da proposta do Governo.
Quero só acrescentar, Sr. Presidente, um voto, e esse será o seguinte: que actualizássemos quanto antes o Regimento desta Assembleia no artigo 52.º, que não permite aos Deputados não votarem, quer dizer, absterem-se em relação a determinados assuntos. É que, Sr. Presidente, essa é a posição que define crucialmente a minha atitude. A lei dá-nos dois caminhos, Sr: Presidente: ou votar ou rejeitar.
Não é culpa minha que me não sejam dados outros caminhos que possa escolher, porque entre dois caminhos há sempre um terceiro, um quarto ou um quinto, e que seria aquele que se poderia escolher, não votando nem tomando parte na discussão.
Nestas circunstancias, porque não entro na discussão, visto ser, in limine, contra qualquer processo de eleição do Chefe do Estado, não seria lógico nem mesmo obediente à minha consciência política se votasse qualquer . das fórmulas. Não é que seja melhor uma ou outra. Só significa que, não votando, não perfilho nenhuma, mas afirmo a minha consciência política, que me impõe que siga este caminho.
Tenho dito.

O Sr. Cortês Pinto: - Era apenas para dizer a V. Exa. que faço minhas as palavras do Sr. Dr. Carlos Moreira, porque representam e exprimem exactamente aquilo que eu desejaria dizer.

O Sr. Nunes Fernandes: - Sr. Presidente: também quero marcar posição neste debate. Já na generalidade tive oportunidade, de dizer qual será a minha linha de conduta nesta votação. E, se alguma dúvida tivesse no meu espírito, ela teria desaparecido com a brilhante justificação e exposição que o nosso decano teve oportunidade de fazer.
Sr. Presidente: se efectivamente o Regimento me permitisse uma abstenção, ficaria muito mais satisfeito com essa solução. Mas, desde que assim não é, e a saída da sala seria uma cobardia, quanto a mim ...

Vozes: - Muito bem!

O Orador:- ... declaro que não dou o meu voto ao artigo 72.º Por outra, votarei contra.
Tenho dito.

O Sr. João do Amaral: - Devo dizer a V. Exa. e à . Câmara que, como nacionalista que não considera resolvido em Portugal o problema da melhor forma de governo, isto é, como nacionalista monárquico, entendo que à eleição é uma forma ilegítima e nociva da designação do Chefe do Estado. O problema da legitimidade

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não pode ser resolvido de maneira nenhuma por processo eleitoral.
Creio, porém, como nacionalista e colaborador, defensor da ordem social existente, que me devo pronunciar por um processo menos nocivo do que aquele que actualmente a Constituição consagra.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Inclinar-me-ia pura outro processo, mas não tomo, nem tomarei, a iniciativa de propô-lo. Penso que um discípulo de Augusto Comte, por exemplo, inclinar-se-ia para a redução maior do colégio eleitoral, para uma espécie de sacro colégio que designasse o novo Chefe do Estado pelo processo a que Augusto Comte chamava «da hereditariedade sociocrática». Seria uma forma mais próxima da que eu considero legitima.
Mas dado o desinteresse que tenho pelo processo da eleição do Presidente da República, votarei pelo menos nocivo.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Carlos Moreira: - E uma situação respeitável para- o positivismo comtiano.

O Sr. José Saraiva: - Pedi a palavra para explicar a intenção e o alcance de uma proposta de alteração que fiz ao artigo 4.º da proposta, na medida em que este da nova redacção ao corpo do artigo 72.º
Esclareço já que, dizendo-se na minha proposta que o artigo 72.º e seus parágrafos seriam substituídos por outro texto, e indicando depois apenas o corpo do artigo, isto representa, na minha parte, a aceitação dos parágrafos constantes da proposta do Governo, recaindo as alterações exclusivamente sobre o corpo do artigo.
Qual é a razão de ser desta minha proposta ?
Tive de ser longo na ocasião da minha intervenção na generalidade, e não .voa agora fatigar a Camará com a repetição de razões e motivos que então extensamente tive ensejo de submeter à consideração de todos. Seria pura repetição, porque não vi, de então para cá, que qualquer dos argumentos expendidos por mim houvesse sido atingido ou abalado.
Ouvi com respeitosa atenção a exposição, tão equilibrada, tão inteligente, tão primorosa nos seus termos, do Sr. Prof. Mário de Figueiredo, e é manifesto que à solução que o Governo apresenta na sua proposta não faltam possibilidades lógicas de justificação; o que ela não consegue é trazer a resposta a uma dúvida e a uma interrogação, que não duvido de que está no fundo da consciência de todos nós: é a questão de saber se o colégio que por essa via se constitui tem a amplidão suficiente para dar ao Presidente da República aquela base de prestigio que lhe é indispensável para o exercício das suas funções.
Não poderia deixar de confessar que comungo com V. Exa., Sr. Prof. Mário de Figueiredo, quando diz que é indispensável que haja um colégio único e uma assembleia única. Estamos inteiramente de acordo.
O problema, porém, é saber qual deve ser a constituição desta única assembleia. Nós estamos tranquilos, a Nação estará convencida de que um colégio formado por trezentas ou quatrocentas pessoas será bastante para outorgar ao supremo guia dos interesses nacionais aquele mandato de prestigio, de confiança plena, que lhe permita exercer amplamente, completamente, as altas funções de verdadeiro guia da Nação ? Esse é que é o problema!
É manifesto que todos nós sentimos a exiguidade do colégio. Se fosse possível, através da linha de raciocínio seguida pelo Sr. Prof. Mário de Figueiredo, chegar a uma solução composta por alguns milhares de eleitores que viesse a substituir aquela outra multidão de eleitores que até aqui votava o nome do Chefe do Estado, eu poderia estar de acordo com ela; mas a verdade é que isso se não consegue e que se abandona uma solução extremamente ampla para adoptar uma outra extremamente restrita. E logo na passagem de um a outro extremo há um inconveniente em que teremos de reflectir.
Que é que eu pretendo?
Pretendo um colégio de dimensões modestas que na sua totalidade andaria, pelos quatro milhares de pessoas, que no seu conjunto funcionariam em assembleia única, porque o seu número não excederia os das vontades de qualquer das assembleias que todos temos visto funcionar em Lisboa. Mus esses quatro mil eleitores seriam eleitores qualificados. Seriam pessoas eleitas por um vota prévio, já portadoras de um mandato que os acreditava, seleccionados pelos seus concidadãos nas pequenas unidades humanas que são as freguesias e que pelos seus méritos nos dariam a garantia que elegeriam a pessoa que deveria ser o intérprete da vontade de todos e que deveria ser o activo guia da Nação.
Quais os inconvenientes que até agora se apontaram a uma tal solução? Creio que tudo quanto se disse foi que, ao fim e ao cabo, sendo eu contra o voto directo, pelo sistema que proponho se iria cair no voto directo.
A objecção, de infundada que é, é quase burlesca.
O que afirmo é que o voto directo não se pode aceitar quando se trata de problemas da amplitude da designação do Chefe do Estado, isto é, problemas em que o votante não conheça a questão sobre a qual vai votar.
O voto directo não serve para perguntar ao chefe de família de qualquer paróquia quem é que ele entende dever ser o Presidente da República, ou qual deva ser a melhor fórmula política. Mas necessariamente que ó o meio indicado se se trata, apesar de pedir que constitua um procurador bastante, se sé truta de ele dizer, entre os vizinhos que moram na sua aldeia, entre este, que é proprietário, ou aquele, que é o sacerdote que o orienta espiritualmente, ou o médico, com quem se encontra nas más horas, qual é á pessoa que quer que vá por si escolher o supremo magistrado da Nação.
Contra o voto directo nesse primeiro grau não vejo críticas procedentes. Há, de facto, uma sinonímia que se explora, mas retirando toda a eficácia lógica ao argumento, quando sé diz que isto vem a recair em voto directo. Lê-se, realmente, nos tratadistas que se ocupam desta matéria que o regime de voto indirecto levou, no sistema americano, a recair no do voto directo.
É um perigo que existe quando votem os eleitores com os olhos já postos em algum dos candidatos à eleição final. Mas, pergunto: como seria possível a um ano de distancia, não havendo organizações partidárias constituídas, proibindo-se toda a agitação política justamente em nome da genuinidade que essa eleição devia de ter, saber-se se os eleitores iriam votar em A ou em B, quando ainda nem sequer se sabe quem virão a ser A ou B? Como seria isto possível se todos nós temos a experiência de termos estado já a um mês das eleições sem sabermos quem é o nosso próprio candidato?
Não se pode, portanto, pretender que o sistema que defendo levasse a recair no voto directo. Pode dizer-se, sim, que isto representa ainda uma aplicação do sufrágio universal. Certamente, é uma aplicação daquele universalismo que a dignidade da função presidencial exige e postula na sua base. E com a vantagem de, por esta forma, se obter um colégio de características relativamente estáveis. Sabemos bem como a demagogia pode nas cidades falsificar resultados, mas sabemos como nas paróquias é realmente o mérito dos homens, traduzido nos seus actos, nas virtudes de ama vida inteira, que

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conseguem determinar o seu prestigio ma i to mais do que as palavras sonoras dos programas políticos.

O Sr. Melo Machado:-V. Exa. está convencido de que isso não é uma ilusão?

O Orador: - Quero, portanto, acentuar que não vi ainda que os inconvenientes desta solução pudessem superar as suas vantagens. De qualquer modo, nenhuma dúvida há de que esta ideia de ampliar a base de eleição do Presidente da República vai ao encontro de uma aspiração nacional, que está sendo vivamente sentida, por todos os portugueses.
O que ninguém põe em dúvida é que nos dias que hão-de vir, depois destes que estamos a viver, o Chefe do Estado pode vir a ter de exercer um poder mais forte e decisivo, e então não deixará de se sentir a falta de autoridade resultante da restrição da base da sua eleição.
São estas algumas das muitas razões que me levaram a apresentar esta proposta de alteração.
E, agora, se mo consentem, só uma palavra de justificação pessoal.
Ao apresentar-se qualquer proposta comete-se um acto em que poderá parecer que o que nos deve decidir é unicamente a possibilidade de ela chegar a ter êxito.
Convenci-me de que esta alteração poderia vingar por maioria na votação que vai seguir-se? Mentiria se o dissesse. E, todavia, apresentei-a.
Para mim, estes trabalhos decorreram sob uma responsabilidade que é, realmente, excepcional. Não era só estarmos aqui reunidos em nome da Nação a discutir um problema que a toda a Nação extraordinariamente preocupa: era sobretudo o sentir a enorme responsabilidade que sobre todos nós impendia, por se ter proposto a declaração preambular de uma altíssima invocação, que assume, para todos aqueles para quem a fé é mais que palavra vã, o sentido de um, grave imperativo de consciência. É que, perante a invocação do mais alto de todos os nomes, não são legitimas as pequeninas considerações que às vezes a política inspira: nem os respeitos humanos, nem os temores reverenciais, nem as reservas mentais, nem as pequenas razoes de cada um. Há só o caminho de proceder em absoluto respeito com a verdade ou com aquilo que pensamos ser a verdade. E foi esse o meu caminho.
Assim, se amanhã votar, que foi sob a invocação de Deus que esta Assembleia aprovou as modificações à Constituição, poderei faze-lo com toda a sinceridade, quero dizer, sem nenhum temor, de ter jurado o Seu Santo Nome em vão.
Tenho dito.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Agradeço ao Sr. Deputado José Saraiva o favor das suas simpáticas palavras a respeito dos esclarecimentos que prestei à Assembleia sobre os motivos que teriam determinado o Governo a apresentar esta solução, e não outra, para a eleição do Chefe do Estado.
Agradeço-lhe, muito sinceramente, essas palavras, que representam ama forma de simpatia perfeitamente independente do valor que as palavras possam ter. Muito obrigado.
Não me demoro em outras considerações sobre o resto do que disse o Sr. Deputado José Saraiva. Suponho mesmo que algumas dessas considerações já foram respondidas pelas que tive ocasião de fazer no primeiro discurso que proferi.
Não vejo bem como, marcando o Sr. Deputado José Saraiva a posição que marcou relativamente não só ao colégio único, mas à assembleia única, poderia, com a dignidade de que a eleição do Chefe do Estado naturalmente deve revestir-se, constituir-se em assembleia única um colégio que podia ser constituído por representantes em número de quatro mil. Mas isto não é uma consideração essencial.
Pode dizer-se, para tocar as considerações acabadas de produzir pelo Sr. Deputado José Saraiva, que ele alargou em quantidade o número de representantes ao colégio eleitoral; mas já não poderia dizer-se que o alargou em qualidade.
Não quero ofender ninguém; não quero, sobretudo, ofender os homens bons das nossas freguesias, da nossa terra.
Suponho que os não ofenderei dizendo que o colégio composto nos termos previstos pela proposta do Governo é, sem dúvida, menos numeroso e, portanto, quantitativamente valerá menos; mas creio que não pode pôr-se a questão nos mesmos termos se for considerado não o aspecto quantitativo, mas o aspecto qualitativo.
Sobretudo creio que neste caso já não é preciso ir o eleitor perguntar ao pároco da freguesia ou ao médico da aldeia - por um. e por outro, mas sinceramente, tenho o maior respeito, porque ambos de um modo geral neste pais desempenham funções de um verdadeiro sacerdócio ...

Vozes: - Muito bem!

O Orador:- ... não é preciso ir perguntar, enfim, a estes por quem é que há-de pronunciar-se.
O defeito mais grave que vejo na solução proposta pelo Sr. Deputado José Saraiva ainda não é este. É o seguinte: o facto de a eleição dos representantes se fazer exclusivamente para eles desempenharem a função de vogais do colégio eleitoral.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-:É transportar, mesmo sem a indicação do candidato, para a escolha desses eleitores todas as querelas que agora se põem para a eleição do Chefe do Estado.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-É- não só isto, mas provocar em volta • dos eleitores das freguesias, dos chefes de família das freguesias, a necessária formação de partidos que tornarão, pelo menos durante algum tempo, a vida destas freguesias incómoda, para não dizer tempestuosa.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - É atentar contra aquilo que neste pais se chama sentimento de boa vizinhança, que faz com que todos se dêem bem, sejam quais forem as idealidades políticas ou religiosas que sigam, que fazem com que todos se ajudem sem se procurar saber se são amigos ou inimigos, se têm as mesmas crenças, os mesmos credos políticos ou se diferentes.
Esta é que eu suponho ser uma razão forte, uma razão séria, no sentido de não ser votada a solução sugerida pelo Sr. Deputado José Saraiva.
Concluo agradecendo as boas palavras que teve a amabilidade de me dirigir, endereçando-lhe eu mesmo a afirmação da minha simpatia pelos talentos que constantemente revela.
Ao Sr. Deputado Paulo Cancella de Abreu agradeço da mesma maneira, comovidamente, os termos em que quis ter a amabilidade de se referir ao meu aparte. Disse então que compreendia a sua posição e compreendo-a.
Disse-lhe ainda o que agora lhe digo: uma coisa é compreender a posição e outra coisa é entender justifi-

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cada essa posição. S. Exa. manteve a sua posição e eu respeito-a. ...
Eu mantenho quanto à sua atitude a. mesma posição que afirmei e tenho a certeza antecipada de que também sou respeitado pelo Sr. Deputado Paulo Cancella de Abreu, a quem renovo as palavras que lhe tenho dirigido pela sua vida de batalhador e pela sua inquebrantável coerência.

Tenho dito.

O Sr. José Saraiva:- Sr. Presidente: quero essencialmente dizer que as palavras do Sr. Prof. Mário de Figueiredo me recordaram a- primeira vez em que subi àquela tribuna e~ em que- usei de uma expressão que nessa altura pode Ter parecido tropo nascido do pendor retórico, ou primor brotada do fundo da simpatia. O que acaba de se passar mostra se eu então tinha ou não razão.
Disse nessa altura que, quando S. Exa. fala, este hemiciclo parece que se faz maior porque dobra; em vez de um hemiciclo, ele é um circulo completo, o circulo da simpatia e da admiração com que todos ouvimos as palavras de S. Exa.
O Sr. Prof. Mário de Figueiredo acaba de dar uma nobilíssima lição de quanto a serenidade, a elegância, a elevação e finura convencem e quase perturbam as opiniões de quem, todavia, está seguro nelas.
Aditarei apenas que não fui alheio à preocupação de ir instilar um fermento de divisão e de mal-estar na pacatez das aldeias portuguesas. Eu bem sei que as eleições locais podem levar a cisania, a perda da paz, a perturbação dos laços da amizade que nasce da vizinhança, do convívio. Também sei que á proposta de lei é uma forma dê estimular a vida política local, que é como a irrigação que leva a vitalidade e a crença nas ideias a todas as extremidades do organismo político.
Redigi a minha proposta em termos que vejo agora terem sido de certo modo subtis, pois passaram despercebidos até à subtil inteligência do Sr. Prof. Mário e Figueiredo.
É que os eleitores indicados em primeiro grau são eleitos por sufrágio dos chefes de família residentes nas respectivas freguesias, processo que como se sabe, é o seguido para a designação das juntas de freguesia.
Bastaria, pois, que a lei eleitoral conferisse a tais juntas a faculdade de elegerem o Chefe do Estado para resolver a questão, mantendo-se, assim, as vantagens a que aludi, sem que surjam os inconvenientes apontados por S. Exa.
Peço desculpa se acrescento- este remate singelo: quando se houvem mestres como S. Exa., em lições de compostura como aquela que St Exa. nos deu, a tendência mais forte é de agradecer e não de retrucar.
Tenho dito.

O Sr. Presidente: -Vai passar-se à votação. Quero, antes, dar conhecimento à Camará de que a contagem a que se procedeu, há momento, verificou a presença de 96 Deputados; e faço-o por se tratar da votação de um ponto da maior importância na revisão constitucional.
Foi para mim extremamente agradável registar da parte de todos os membros desta Assembleia a consciência nítida do seu dever, comparecendo em tão grande número, muitos deles fazendo, com certeza, grandes sacrifícios de ordem pessoal.
Pausa.

O Sr. Presidente:-Vai votar-se, em primeiro lugar, o artigo 4.º da proposta do Governo, relativo ao artigo 72.º da Constituição, com as alterações introduzidas pelas propostas do Sr. Deputado Mário de Figueiredo e da Comissão do Ultramar, uma vez que se completam e integram no mesmo pensamento da proposta do Governo.
Se a Camará as aprovar, serão necessariamente rejeitadas as. propostas de emenda apresentadas pelos Srs. Deputados Cerqueira Gomes e José Saraiva.
Submetida à votação, foi aprovada por maioria a proposta do Governo, com as emendas já referidas.

O Sr.. Presidente: - Está aprovado o artigo 4.º da proposta dó Governo, com as alterações introduzidas pelas emendas do Sr. Deputado Mário de Figueiredo e da Comissão do Ultramar, ficando, portanto, rejeitadas todas as outras propostas de alteração, isto é, as que foram apresentadas pelos Srs. Deputados Cerqueira. Gomes e José Saraiva.
Vou encerrar a sessão.
Amanhã haverá sessão, à hora regimental, com a mesma ordem do dia.
Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 15 minutos.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Adriano Duarte Silva.
Alberto Pacheco Jorge.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António Calheiros Lopes.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Domingos Rosado vitória Pires.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel José Archer Homem de Melo.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Purxotoma Ramanata Quenin.
Simeão Pinto, de Mesquita Carvalho Magalhães.
Urgel Abílio Horta.
Vítor Manuel Amaro Salgueiro dos Santos Galo.

O REDACTOR - Luís de Avillez.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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