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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 164

ANO DE 1960 7 DE ABRIL

ASSEMBLEIA NACIONAL

VII LEGISLATURA

SESSÃO N.º 164, EM 6 DE ABRIL

Presidente: Exmo. Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior

Secretários: Ex.mos Srs. Fernando Cid Oliveira Proença
António José Rodrigues Prata

SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 35 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente.
O Sr. Presidente comunicou que recebera da Presidência do Conselho, para efeitos do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição três decretos-leis.
O Sr. Presidente informou também que recebera o parecer da Comissão de Contas Gerais do Estado de 1958.
O Sr. Deputado Ramiro Valadão falou sobre as comunicações aéreas com os Açores e pediu a restruturação das comarcas de Vila da Praia da Vitoria e Angra do Heroísmo.
O Sr. Deputado Cerveira Pinto requereu informações sobre o atraso na regulamentação da lei ao fomento piscícola nas águas interiores do Pais.
O Sr. Deputado Alberto de Araújo requereu elementos sobre a viabilidade técnica da construção de um aeródromo na ilha da Madeira.

Ordem do dia. - Prosseguiu o debate na generalidade acerca da resposta de lei do Sr. Deputado Camilo de Mendonça relativo as remunerações dos admiradores de certas empresas.
Falaram os Srs. Deputados Homem de Melo e Sá Alves.
O Sr. Presidente encerrou a sessão ás 17 horas e 40 minutos.

O Sr Presidente: - Vai proceder-se á chamada.
Eram 16 horas e 25 minutos.

Fez-se a chamada, á qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Adriano Duarte Silva.
Afonso Augusto Pinto.
Agostinho Gonçalves Gomes.
Aires Fernandes Martins.
Alberto Carlos de Figueiredo Franco Falcão.
Alberto Cruz.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Pacheco Jorge.
Albino Soares Pinto dos Beis Júnior.
Alfredo Rodrigues dos Santos Júnior.
Américo Cortês Pinto.
André Francisco Navarro.
António Bartolomeu Gromicho.
António Calapez Gomes Garcia.
António Calheiros Lopes.
António Cortês Lobão.
António Jorge Ferreira.
António José Rodrigues Prata.
António Maria Vasconcelos de Morais Sarmento.
António Pereira de Meireles Rocha Lacerda.
Artur Águedo de Oliveira.
António Carlos dos Santos Fernandes Lima.
Artur Máximo Saraiva de Aguilar.
Artur Proença Duarte.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Belchior Cardoso da Costa.
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Domingos Rosado Vitória Pires.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando António Muñoz de Oliveira.

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Fernando Cid Oliveira Proença.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Frederico Bagorro de Sequeira.
João Augusto Marchante.
João de Brito e Cunha.
João Carlos de Sá Alves.
João Cerveira Pinto.
João Mendes da Costa Amaral.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim Pais de Azevedo.
José Dias de Araújo Correia.
José Fernando Nunes Barata.
José de Freitas Soares.
José Garcia Nunes Mexia.
José Gonçalves de Araújo Novo.
José Hermano Saraiva.
José Manuel da Costa.
José Monteiro da Rocha Peixoto.
José Rodrigo Carvalho.
José Rodrigues da Silva Mendes.
José dos Santos Bessa.
José Sarmento de Vasconcelos e Castro.
José Soares da Fonseca.
Laurénio Cota Morais dos Reis.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Luís Tavares Neto Sequeira de Medeiros.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel José Archer Homem de Melo.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel Maria Sarmento Rodrigues.
Manuel Seabra Carqueijeiro.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Mário Angelo Morais de Oliveira.
Mário de Figueiredo.
Martinho da Costa Lopes.
Paulo Cancella de Abreu.
Purxotoma Ramanata Quenin.
Ramiro Machado Valadão.
Rogério Noel Peres Claro.
Sebastião Garcia Ramires.
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães.
Tito Castelo Branco Arantes.
Urgel Abílio Horta.
Virgílio David Pereira e Cruz.
Vítor Manuel Amaro Salgueiro dos Santos Galo.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 81 Srs. Deputados.
Está aberto a sessão.
Eram 16 horas e 35 minutos.

Antes da ordem do dia

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Ofício

Do S. Exa. o Encarregado de Negócios do Brasil a agradecer a intervenção do Sr. Deputado Sarmento Rodrigues relativa às inundações ocorridas no Nordeste brasileiro o voto de pesar da Assembleia por esse acontecimento.

Telegrama

Do Dr. Matos Gomes a apoiar a intervenção do Sr. Deputado Camilo de Mendonça referente ao seu projecto de lei sobre as remunerações dos corpos gerentes de certas empresas.

O Sr. Presidente : - Enviados pela Presidência do Conselho e para cumprimento do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição, estão na Mesa os n.ºs 72, 74 e 75 do Diário do Governo, 1.ª série, respectivamente de 28, 30 e 31 de Março último, que inserem os, seguintes Decretos-Leis: n.º 42 890, que determina que o estudo da construção de um estaleiro naval na área do porto de Lisboa seja assegurado por uma comissão, de carácter eventual, que se denominará «Comissão de Estudo para a Construção da Doca e Estaleiro Naval», subordinada ao Ministro das Comunicações; n.º 42 893, que autoriza o Governo, pelo Ministro da Educação Nacional, a aceitar uma quantia para fundo de manutenção de uma cantina escolar anexa às escolas do núcleo de Vila Nova de Taxem, concelho de Gouveia, a qual se designará «Cantina Escolar D. Maria Emília Pais Borges Artiaga». e n.º 42 896 que estabelece o modo de fixação e de distribuição da contribuição dos organismos de coordenação económica para os orçamentos das corporações.
Está na Mesa o parecer, emitido pela Comissão de Contas Públicas desta Assembleia, sobre as Contas Gerais do Estado, para o qual chamo a atenção da Assembleia.
Pausa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra autos da ordem do dia o Sr. Deputado Ramiro Valadão.

O Sr. Ramiro Valadão: - Sr. Presidente: frequentes vezes aqui tenho falado - solicitando a atenção do Governo para a imperiosa necessidade de resolver o problema das comunicações aéreas entre Lisboa e o aeroporto das Lajes, na ilha Terceira, e novamente o faço hoje, na esperança de serem atendidas as juntas aspirações dos povos do meu distrito.
Uma vez mais insisto em acentuar as dificuldades que têm de vencer aqueles que pretendam ir à minha ilha através do magnífico aeroporto onde está instalada a base aérea n.º 4. A esses viajantes não resta outra alternativa que não seja a de utilizar o aeroporto do Santa Maria, servindo-se dos aviões que da Europa se dirigem à América do Norte, e aguardar em Vila do Porto que haja lugar nos, pequenos aviões comerciais portugueses que estabelecem a ligação com o aeroporto das Lajes.
E quando o tal lugar existe, muitas vezes sucede: que o mau tempo, menino quando não seja excessivo, impede a viagem daqueles bimotores que não podem, sem risco sério, vencer obstáculos que nada representariam para mudados de maior envergadura.
E então, quase com desespero, vêem-se passar os dias sem que seja possível chegar a minha ilha, e a tal ponto que já uma vez me sucedeu pensar no imediato regresso a Lisboa sem chegar às Lajes, pois não podia durante muito mais tempo aguardarem Santa Maria uma ventura meteorológica, sempre de tão difícil previsão. Caberá aqui uma palavra de reconhecimento à Sociedade Açoriana de Transportes Aéreos, que assegura essas ligações mais por amor às terras do que por benefícios, que, segundo julgo, não existem.
Esse reconhecimento a ninguém pode, todavia, impedir de verificar as incomodidades e os pré juízos materiais e morais que resultam da situação que a traços muito largos descrevi.
Só o Estado poderá resolver o problema, promovendo, por exemplo, que algumas das carreiras internacionais transatlânticas utilizem o aeroporto das Lajes na ida para a América do Norte e no regresso. E se outras soluções houver tendentes à conquista do mesmo objectivo, escolha-se uma delas pois qualquer serve as populações que interessam.

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Problema de transporte de passageiros e problema também de transporte de carga e de correio, que, muitas vezes, também fica durante bastantes dias retido na pobre estação postal do aeroporto de Santa Maria.
Daqui apelo, em especial para o Sr. Ministro das Comunicações que gostosamente veria no meu distrito para que prontamente resolvesse uma situarão penosa. E se aquele ilustre membro do Governo tivesse oportunidade de pessoalmente sentir quão desagradável é estar tão perto e afinal, tão longe do término de unia. viagem, estou seguro de que em melhores condições de receptividade estaria para clara compreensão das dificuldades que apontei. Em qualquer circunstância, amplamente confio numa acção, que urge seja desenvolvido, para pronta realização de um acto de justiça e razão de louvor para quem o cometer.
Com que júbilo, Sr. Presidente, eu aqui me ergueria para agradecer ao Governo a satisfarão do que referi. Por ora e infelizmente, tenho de limitar-me a mais uma vez pedir o que frequentemente tenho solicitado.
Para outro problema solicito a atenção do Governo, e em especial a do Sr. Ministro da Justiça, a caju alto critério submeto a apreciação de uma viva aspiração e clara necessidade da ilha Terceira.
Creio que S. Exa. em breve visitará aquele distrito, para inaugurar a bela obra do Palácio da Justiça, e ouso daqui dizer-lhe que melhor nova não poderia dar no decurso - da sua viagem que não fosse a da restauração da comarca de Vila da Praia da Vitória.
Vejo transparente empenho em alguns pareceres e relatórios do Conselho Superior Justiça que, em tempo, me foram prontamente fornecidos pela Secretaria de Estado da Justiça, em seguimento do requerimento que aqui fiz.
Diz aquele Conselho, com a alta responsabilidade e isenção que o caracterizam, que só actual julgado municipal de Praia da Vitória, em contacto permanente com as autoridades militares açorianas, tem hoje um movimento grande e de sério responsabilidade. Bem merecia - acrescenta-se no relatório que cito - a restauração da comarca, tanto mais que Angra do Heroísmo não suporta o trabalho do julgado».
E em parecer que também me foi entregue, o mesmo Conselho afirma ser aquele julgado municipal «o que em todo o País movimenta maior número de processos».
Na verdade, Sr. Presidente e Srs. Deputados, e em referência apenas - aos últimos 20 anos, os processos crimes infelizmente aumentaram mais de 33 vezes e os cíveis 5 vezes no referente ao citado julgado.
Relativamente à comarca de Angra do Heroísmo, o fenómeno é semelhante.
Se a estes factos juntarmos o da comodidade das populações; se conhecermos as suas aspirações e recordarmos as suas tradições, julgo termos encontrado razão sobeja para que o Governo providencie no sentido de restaurar a comarca extinta em 1927, ainda que logo em 1931 pelo Decreto n.º 19 578 tenha sido criado o julgado municipal.
A proximidade de uma imensa base aérea e a modificação do viver das gentes extraordinariamente acentuaram a necessidade de restauração da comarca, para o que à providência legal que o fizer bastará inspirar-e no mesmo espírito do citado Decreto n.º 19 578, que, quatro anos volvidos sobre a extinção da comarca reconhecia ser indispensável criar o julgado municipal, que então, de algum modo atenuava as dificuldades já existentes. Há apenas que dar um novo passo, até para que a justiça possa ser mais pronta e portanto, mais eficaz.
Desfilam na minha imaginação os homens grados do meu distrito no instante em que refiro este problema e insensivelmente, evoco a época, já longínqua, em que
nesta mesma, tribuna houve quem promovesse a criação da comarca em 1927 extinta. Foram então coroados de êxito os esforços desse homem de há um século e não sou indiferente à homenagem que os de agora devem aos esforços tenazes dos que nos antecederam e quiseram o que nós queremos - o progresso e o bem-estar da Pátria Portuguesa.
Estas raízes no passado, que são as felizes tradições dos povos que as possuem, também são argumento de invocar, pelo menos para aqueles que, como nós, respeitam valores que não são apenas os materiais.
Por isso é também em louvor aos que, por vários modos, tanto têm sonhado com a solução do problema que para o Governo apelo, na firme esperança do ser ouvido. pois mais não fiz que reproduzir aspirações colectivas e imperiosas necessidades.
Para elas e uma vez mais solicito a esclarecida atenção do Sr. Ministro da Justiça.
Tenho dito.

Vozes : - Muito bem, muito bem !
O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Cerveira Pinto: - Sr. Presidente: mando para, a Mesa o seguinte

Requerimento

«Na base XXX da Lei n.º 2097, de 6 de Junho de 1959, que promulgou as bases do fomento piscícola nas águas interiores do País, ficou previsto que: «O Secretário de Estado da Agricultura determinará que, pela Direccção-Geral dos Serviços Florestais e Aquicolas seja estudada a regulamentação desta lei, a publicar depois de ouvidos os Ministros das Obras Públicas, da Educação Nacional e das Corporações e Previdência Social».
Como faz hoje precisamente dez meses que a referida lei foi publicada, requeiro, nos termos regimentais, que pela Secretaria de Estado da Agricultura me sejam fornecidas informações sobre se o estudo a que a Direcção-Geral dos Serviços Florestais e Aquicolas não deixará de se ter aplicado está ou não concluído e sobre se é ou não licito ter esperança na publicação, a breve termo, do regulamento da Lei n.º 2097.
Na base XXXII da mesma lei prevê-se que «uma comissão, a nomear pelo Ministro da Economia, proporá, no mais curto prazo, as providências a tomar, em diploma, contra a poluição das águas interiores pelos afluentes industriais e mineiros e estudará os casos em que possa vir a ser considerada inviável a defesa das espécies piscícolas».
Porque assim é requeiro também que o Ministério da Economia me informe se a comissão nomeada já se desempenhou do encargo que lhe foi cometido e se se aproxima ou não a data em que verá a luz da publicidade o prometido diploma sobre assunto de tanta importância.
E porque se trata de problema, afim, requeiro ainda que pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros e pelo Ministério da Marinha me seja dada informação sobre o andamento cias negociações para a celebração da convenção entre Portugal e Espanha na qual se estabeleça o regime de pesca no rio Minho».

O Sr. Alberto de Araújo: - Sr. Presidente: mando para a Mesa o seguinte

Requerimento

«Continuando a ser problema fundamental para a ilha da Madeira o problema das ligações aéreas daquela ilha que é, sem dúvida, o mais importante centro de turismo nacional, e atendendo a que a opinião pública,

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insular está a este respeito profundamente inquieta, correndo sírio risco de perder-se politicamente todo o beneficio resultante do notável conjunto de obras realizadas naquela ilha com o interesse constante e sob a égide de Salazar, que todos os madeirenses respeitosamente admiram e veneram, requeiro que pelo Ministério das Comunicações me seja fornecida, com a maior urgência, uma cópia, das conclusões a que chegaram os laboratórios estrangeiros encarregados de estudar a viabilidade técnica da construção de um aeródromo em Santa Catarina, próximo de Santa Cruz, na ilha da Madeira conclusões essas que deviam ter sido apresentadas até ao fim de Marco último.
No caso de as referidas conclusões não terem ainda sido formuladas roqueiro que seja informado da data provável em que, como Deputado da Nação, delas posso ter conhecimento, a fim de, nesta Assembleia, me poder ocupar novamente do problema que neste momento mais interessa no futuro e ao progresso da Madeira».

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continua em discussão na generalidade o projecto de lei do Sr. Deputado Camilo de Mendonça sobre remunerações dos corpos gerentes de. certas empresas.
Tem a palavra o Sr. Deputado Homem de Melo.

O Sr. Homem de Melo: - Sr. Presidente: afigura-se-me ocioso referir que a Assembleia Nacional está em presença de um debate da mais alta importância. Não lhe nego a minha modesta participação.
Julgo todavia que após o magistral discurso do engenheiro Camilo de Mendonça - que constituiu a meu ver uma das mais notáveis intervenções parlamentares dos últimos tempos - pouco terá ficado para dizer: Roma locuta est causa finita est.
Apesar de tudo decidi-me a correr da comparação desfavorável e uma vez mais subo degraus desta tribuna para falar ao meu pais a linguagem clara embora rude que deus me ajudará a encontrar.
Sr. Presidente: uma assembleia essencialmente política. Um deputado que humildemente embora diligência ser homem político - mau grado a escandalosa intenção proclamada num pais em que a política sofre os mais variados anátemas - um homem como eu dizia não poderá em circunstancia como era pronunciar palavras que não sejam da marcada intenção política. E porque logo no inicio da sua experiência governativa. Salazar proclamou o direito á política de verdade cuidarei acima de tudo de falar verdade doa a quem doer.
Não sei bem porque recordo neste momento um velho conceito que ensina assim: «Se queres viver faz de morto». Ainda há poucos dias um dos nossos mais ilustres colegas antigo ministro alta figura da nossa vida pública aqui referia o brocarda talvez desgostoso com a marcha de certas coisas. A verdade porém é que o «não fazer ondas» se tornou lugar-comum mas manda a justiça que se afirme não ser o conceito e a atitude monopólio português. Trata-se de um sinal dos tempos: não o classifico uma vez que nunca aderi.
Isto significa que ao agitar as aguas superficialmente tranquilas da nossa vida pública corro o disco de me afogar salvando embora a minha consciência o meu patriotismo e o meu amor á verdade. O facto só teria graves consequências pessoais se procurasse posições,

certas coisas. A verda-de, porém, é que o «não fazer ondas» se tornou lugar-comum. mas manda a justiça que se -afirme não ser o conceito e a atitude monopólio jxuiiiguês. Trata-se de um sinal tios t-empos: não o classifico, unia vez que nunca aderi. Ixto .liguifica que ao agitar as águas, siipe-rficialmenti-; tranquilas, da niissü vida pública corro o ri lugïires ou benesses, e cnmo. graças a Deus, .nada busco 'de inconfessável ou mesquinho, não -chego a preocupar-me com a ameaça e passo adiante.
Insensivelmente, porém, toquei no aspecto que reputo fundamental para o debate: a política é a arte de servir (quando se considera a arepi;fto nobre e generosa do termo); mas a política (em sentido adulterado, prostituído) [iode tornar-se na arte de nos servirmos.
Ora, do projecto de lei n.º 27, o que mais me interessa são as razões políticas que o justificam, e será através da respectiva análise que poderemos concluir da sua oportunidade ou inoportunidade.

O Sr. Carlos Moreira: - Muito bem!

O Orador: - Para apreciar, todavia, as circunstâncias que acaso o tenham justificado, torna-se mister projectar certas imagens da vida portuguesa, em rápida apreciação de um passado recente, da época em que vivemos e dos dias que se aproximam.
Quero, porém, fazer uma ressalva provia: o que vou dizer será de minha inteira responsabilidade, e a interpretação de certos factos só poderá imputar-se ao exame a que procedi. Desde já lamento que não venha a ser possível contar com o aplauso unânime da Câmara - mas não podia nem saberia fugir à verdade, pelo menos, à minha verdade.
Sr. Presidente: foi já em 28 de Maio de 1926 - vão portanto completar-se 34 anos - que Gomes da Costa interpretou a reacção nacional contra o que hoje parece licito apodar de «tirania da liberdade».
Tornava-se imperioso oferecer ao País nova orientação, dando-lhe garantias efectivas de paz política, estabilidade económica e progresso social. Mas ninguém, naquela época, acreditava em revoluções, tantas se haviam já sofrido, tão habituado a elas o País se encontrava.
O difícil era assim, que a Nação compreendesse que a arrancada de Braga não era mais uma entre tantas revoluções, mas que se afirmava como um movimento de carácter patriótico, diligenciando identificar-se com os superiores interesses da grei.
A 34 anos do distância ninguém pode duvidar do fracasso da Revolução se não tivesse aparecido, na hora própria, o doutrinador esclarecido, o mestre respeitado, numa palavra: o homem de Estado.

Sr. Araújo Novo: - Muito bem!

Orador: - Salazar surge e ilumina as sombras da vida pública portuguesa: dois anos após a Revolução, o Pais habituado, enfim, a um estilo novo de governo e sentindo um clima de trabalho, o Pais obedecia e tinha fé. A inquietação nos espíritos dissipara-se: a tranquilidade regressara à rua.
Mais ao mito da liberdade desenfreada e pecaminosa (recordo, amargurado e envergonhado, o 19 de Outubro, como símbolo trágico de uma época que não podia deixar saudades) foi-se insensivelmente sucedendo o mito da intangibilidade, porventura menos grave, mas ainda preocupante. É que criticar passara a ser sinónimo de combater, e instituída a censura, organizados certos métodos de larga eficiência, à custa daquela o destes se conseguiu o desinteresse de uns e o receio de outros, pelo que alguns, agindo â sombra das circunstâncias e do prestígio do homem que salvara o País, verificaram com relativa facilidade, que chegara a sua hora e cuidaram de se servir proclamando que serviam.
O rodar dos anos só poderia ter agravado a conjuntura, porque à medida que o tempo passa falece a

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energia, afrouxa a pureza de ideal e esbater-se, mesmo, o poder de decisão de quem comanda.
E embora o País não ignorasse o que se passava, a verdade é que as circunstancias apontadas contribuíram em larga medida para que, adoptado o spoils system (caracterizado por premiar mm empregos remunerados a prestação do serviços públicos), dele se viesse a abusar desmedidamente.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Socorrendo-se do manto impenetrável que a censura, não raras vezes, estabeleceu entre o Poder e a opinião pública, muitos foram prosperando à custa de situações políticas e os governos sucederam-se, sem que se verificasse o regresso à pureza do sistema.
Efectivamente, o que merece reprovarão não é o spoils system qua tal mas os abusos a que o seu uso desordenado pode conduzir.
É de todos os tempos e de todas as latitudes a concessão de privilégios, e benesses aos que um dia prestaram, pelo seu valor, pela sua lealdade, pelo seu mérito profissional ou artístico, assinaláveis serviços. Outra origem não teve a nobreza, quando os reis concediam títulos, honrarias e até fazenda e terras aos homens bons que arriscavam a vida pela Pátria e pela coroa.
Mas os tempos mudaram e os costumes sofreram alterações. A preocupação do social o acesso das massas à cultura e a consequente democratização da vida tornaram reprováveis e inaceitáveis métodos outrora seguidos. Foi assim que se processou a separação entre o triunfo político, - o sucesso económico, porque os povos continuaram a compreender que o valor, a lealdade e o mérito merecessem honrarias, glorificação, privilégios até - mas deixaram de aceitar que o servir a causa pública fosse motivo de recompensa económica.
A crescente intervenção do Estado no comércio e na indústria veio, todavia, a criar uma nova realidade: tornado patrão em várias- empresas, interveniente principal em outras, supervisor ainda de algumas, o Estado passou a nomear empresário, a designar corpos gerentes, numa palavra: acabou por ler não só a faculdade, mas a obrigação, de escolher os administradores capazes de gerir os negócios a que estivesse vinculado. E, sendo assim, é manifesto que as nomeações passaram a recair em entidades que merecessem, por parte de quem governa, confiança pessoal s política.
Ora, quando chegam até nós os mais variados clamores contra a nomeação de individualidades políticas para cargos de gerência económica que ao Estado cumpre preencher, apetece perguntar se os que clamam desejariam que o Governo nomeasse, por exemplo, para o conselho de administração da Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência a comissão da candidatura do general Delgado à Presidência do República ... Mais um passo e teríamos n referido general Ministro do Interior!
Ingenuidade ou má fé?
A política, Sr. Presidente, não deve servir para arruinar ou transtornar a vida dos homens que a seguem, designadamente daqueles que prestam assinaláveis serviços - mas não pode, sob pena de exautoração pública, constituir motivo de enriquecimento ou recompensa para presumíveis «lucros cessantes».
É que não só se afigura destemperado o triunfo económico à sombra fio sucesso político, como mais fortemente se impõe que a esse triunfo económico não suceda o tráfego de influências por mor de posições governativas um dia ocupadas.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Para tanto dois caminhos parecem indicado: limitar, ao nível de Ministro, os vencimentos dos corpos gerentes das empresas directamente ligadas ao Estado e evitar acumulações.
E porque o projecto de lei n.º 27, se bem interpretei os propósitos dos ilustres Deputados que o subscrevem, procura encaminhar as coisas naquele sentido, devo dizer que o aplaudo as mãos ambas. Mas não posso omitir certas reservas.
Quando atrás afirmava que ao mito da liberdade desenfreada sucedera o da intangibilidade, embora menos grave que aquele, pretendia significar que na política, como na vida, e no meio termo que está a virtude: os extremos acabam sempre por trocar-se e a autoridade crítica falece de ambos os lados das barricadas.
Efectivamente se, em vez de se ler suprimido e vilipendiado a política, como de início, se houvesse procurado prestigiá-la; se ao longo dos anos se tivesse gradualmente cedido naquilo que só pudesse considerar acidental, sem transigir no essencial, as correcções artificiais que o projecto de lei n.º 27 se propõe fazer ter-se-iam processado naturalmente.
Com um certo âmbito de apreciação; com uma lei de imprensa que liberalizasse, mas responsabilizasse: ...

o Sr. Carlos Moreira: - Muito bem!

O Orador: - ... com uma renovação mais frequente dos canais humanos (evitando permanências demasiadas para além da única que a si própria se legitimou e à Nação se impôs), estou certo. Sr. Presidente que o projecto agora em análise não teria chegado a justificar-se.
Nem parece de aceitar o possível argumento de que lá fora, onde se vive em plena euforia demo-liberal, a corrupção política e a imoralidade administrativa não têm paralelo com os termos limitados em que entre nós se verificam - porque, ao defender a liberalização do Regime e certos ajustamentos tornados necessários mercê do rodar dos anos, eu ponho como condição da vivência e utilidade do processo a existência de um Estado forte.
Num país em que a liberdade desenfreada campeie, em que os mais altos valores sejam susceptíveis de discussão, a crítica deixa de se revestir de autoridade e de interesse e perde mesmo a utilidade que a meu ver terá num país em que haja um governo que governe e governantes com o poder suficiente para dizer «Basta!» no momento em que à liberdade necessária e possível suceda a libertinagem antinacional e pecaminosa.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Efectivamente, os tempos perturbados que vivemos, as ameaças que pesam sobre o conjunto nacional, o vulcão de inveja que a decisão inabalável de defendermos tudo quanto seja português provoca, não consentem que o País se desgoverne e um Poder estável e forte ceda o lugar a um sistema de características exclusivamente partidárias. Isto significa que é essencial um esforço supremo de unidade em torno da grandeza e da integridade da Pátria.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mas significa lambem que para esse esforço e essa unidade serem sentidos e vividos por toda a Nação, os que detêm a chefia política hão-de transigir no acidental, de forma que legitimamente se possa impor a todos os portugueses unidade à sombra da bandeira da Pátria. Numa palavra: a autoridade só é indiscutível desde que se apresente ao serviço do interesse.

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nacional, e não apenas como fórmula de permanência no Poder por parte de um grupo ou clientela.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Seria utópico pretender realizar a unidade nacional à custa do sacrifício ideológico de uns, sem a contrapartida dos outros: poder-se-á - poder-se-á - conseguir submissão; não cuidemos de encontrar entusiasmo e vivência patriótica.
Concluindo a matéria: só depois de mostrar que é capaz de transigir no acidental é que o Poder terá indesmentível e indiscutível autoridade para impor união em torno do essencial.
Isto tudo, que parece afastar-se da ordem do dia, tem sérias implicações com o projecto de lei n.º 27.
É que não só além-fronteiras se apresentam ameaçadores os dias que se aproximam.
Habituadas á chefia política de um homem que a historia demonstra não ser possível encontrar senão de século si século, nós temos de nos preparar para o futuro, isto é, temos de nos acostumar à ideia de que a autoridade necessária há-de buscar-se e encontrar-se numa mística de acção política e nos sucessos da sua aplicação, independentemente de alguém que pelas suas virtudes, genialidade e prestígio se identificou com a própria, nacionalidade.

Vozes : - Muito bem!

O Orador: - Ora, salvo melhor opinião, o Regime só terá hipótese de vencer a batalha do futuro se conseguir antes que desapareça o homem que o identifica, impor-se à consciência do País através da pureza e vivência de ideal, do amor aos princípios um dia proclamados, além de uma constante adaptarão que o vertiginoso rodar do tempo a todo o tempo impõe.
Assim, destruir a ideia de que o Regime se confunde com os grandes interesses, e que o Poder actua, por vezes coagido pelos mesmos surge como condição sine qua non de sobrevivência política. Não é, pois, lícito recusar aplauso a uma medida que, embora limitadamente, poderá contribuir para o saneamento da conjuntura.
Contribuição limitada - porquê?
É que o estabelecimento de fronteira para a remuneração dos corpos gerentes de certas empresas só parece justificável à, luz de um critério de moralização que evite a lamentável confusão entre a prosperidade económica e o sucesso político. já que visando-se apenas as empresas directamente ligadas ao Estado, não está em causa qualquer propósito de intervir deliberadamente no âmbito da iniciativa particular (consagraria nos textos constitucionais), já que a estatura moral do
autor e dos co-signatários do projecto repelem a exteriorização de desígnios menos elevados.
Ora desde que nas empresas com estreitas ligações com o Estado os corpos gerentes não possam ter vencimentos superiores, ao de Ministro é de supor que estes, enquanto exercem os respectivos cargos, não sonhem com a possível colocação, como recompensa económica dos servidos prestados ao Pais, não sonhem com a possível colocação em conselhos administrativos onde poderiam auferir lucros desrazoáveis.
Trata-se, porém, de uma medida que só ilusoriamente poderá desejar extinguir os vícios de que enferma sob este aspecto a nossa vida pública. Mas é um primeiro passo sem duvida - e como tal carece de ser aproveitado.
E o trafego de influencias?
E a confusão do sucesso político com o económico?
Manda a verdade dizer-se que onde mais será possível verificar e condenar o aproveitamento de individualidades políticas é nas empresas de caracter particular uma vez que nas concessionárias do Estado e sociedades para-estaduais os corpos gerentes são praticamente funcionários públicos, embora de circunstancia.

Vozes: - Muito bem !

O Orador: - Mas porque se me afigura de todo ilegítimo que o Estado intervenha na vida, no dia a dia, das sociedades privadas, impondo-lhes limites de vencimentos ou disposições que briguem com a iniciativa particular, o processo a usar deverá ser de outra ordem.
Um país como o nosso em vias de desenvolvimento e sob regime capitalista (que não só não parece estar em causa, como se afigura mister defender), um país como o nosso carece de criar riqueza, pelo que cada um deve ser tão livre de agir quanto a complexidade da vida o permita e o interesse de todos não venha a ser ferido pelo interesse de alguns.
Compreende-se, assim, que uma determinada empresa, comercial ou industrial, pague aos que a servem e a ela dediquem o melhor do seu esforço o que for considerado justo pelos detentores do capital e que poderá muito bem ser superior ao vencimento dos Ministros de Estado.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Porque estes constituirão bitola, ou padrão administrativo, mas nada têm que ver com a actividade económica privada.
Como efectivar, então, o combate ao tráfego de influencias e à confusão do político com o económico?
Primeiro que tudo, tudo dependerá da vivência dos princípios, do espírito de servir e da nobre/a de sentimentos com que os políticos se dediquem às tarefas em que sejam investidos. Desde que faltem aqueles pressupostos (com que saudade verificamos como existiam generalizados nos alvores de Revelação!) o plano inclinado que conduz à misciginação do económico com o político afigura-se fatal.
Daí os apropositados apartes do nosso ilustre colega Carlos Moreira, ao indagar se o projecto de lei viria satisfazer a apetência nacional de sobriedade administrativa e de independência do poder político em face da oligarquia económica.
Preferível a todos os diplomas será a decisão inabalável que o Executivo revele de liquidar os focos de tráfego de influências, eliminando do xadrez político os que a ele comprovadamente se dediquem. Porque, se o Governo não se dispuser a actuar -cessem as dúvidas, sejam de quem for - nós bem poderemos aprovar agora o projecto de lei n.º 27 e apresentar e aprovar depois toda uma série de diplomas com o mesmo sentido que a situação permanecerá idêntica nas suas linha gerais.
É que estamos em face de circunstâncias de ordem moral e de costumes há muito vividos: a lei, por si só, não se afigura suficiente, porque a moralização dos costumes não pode processar-se apenas através da frieza dos diplomas legais.
Sr. Presidente: vou entrar na fase final das minhas considerações.
Tenho ouvido proclamar que um dos bens inestimáveis do Regime é a ordem em que felizmente vivemos.
Pai de quatro filhos, homem pacífico por idiossincrasia, com alguma fazenda a preservar e a defender, aprecio as virtudes da ordem pelo menos tanto quanto os que a empregam como bandeira de vitalidade política.
Mas se a ordem se transformar apenas em medo do medo, em fim quando deverá ser meio de atingir de-

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terminado objectivo -designadamente o bem comum a ordem, Sr. Presidente, deixa de ter significado e desce vertiginosamente na escala dos valores.

O Sr. Cortês Pinto: - Muito bem!

O Orador: - De mãos dadas com uma alta figura da nossa época, eu diria que a ordem deverá confundir-se com a verdade e com a justiça, pelo que parece evidente que a ordem que buscamos não pode resumir-se à tranquilidade nas ruas. Tranquilidade nas ruas há em Moscovo e em Leninegrado houve em Berlim e em Munique - e, todavia, nós podemos afirmar que não é aquela nem era esta a ordem que procuramos.
A nossa ordem, para ser legítima e fecunda, tem de assentar na justiça, na seriedade de processos, na pureza de atitudes, porque «não ha verdadeira ordem sem justiça e a ordem ideal dos povos reside no bem comum».

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Isto significa que não é lícito invocar a necessidade de ordem para impor a vontade de alguns: não é preciso tão-somente exigir a ordem para bem governar; é mister governar bem para realizar a única ordem que tem justificarão. «É que não é a ordem que reforça a justiça, mas esta que dá a sua certeza à ordem».

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Julgo, Sr. Presidente, que o facto de me ter socorrido de ideias expressas por Albert Camus (que, aliás, nem sempre, ao longo de toda a obra que deixou, merece o meu aplauso e concordância), o facto, dizia, não tirará valor ao que acabo du acentuar, porque se trata de verdades universais, que. sem dúvida, nos cumpre orgulhosamente adoptar e defender.
Para tanto, há que trabalhar no sentido indicado, qual seja o de justificar, sem sofismas ou tergiversações, a ordem que mercê de Deus há 34 anos o Pais desfruta.
E porque o projecto de lei n.º 27 se apresenta como achega ao clarão de justiça política e social que afanosamente nos cumpre proclamar e estabelecer, não posso deixar de o aplaudir.
Uns minutos mais e terei chegado ao fim.
Desejaria referir e iluminai- aquilo que considero o vértice do que acabo de dizer:
1.º O projecto de lei em discussão traduz propósitos que vêm de encontro não apenas ao clamor de uma opinião pública que aliás, só difusamente pode manifestar-se, mas que se enraizam no tronco dos princípios ao sabor dos quais Salazar desfraldou a bandeira do Regime;
2.º Embora se afigure lícito que os resultados não venham a corresponder às intenções que animaram o seu autor, porque se trata de um passo em frente, dar-lhe-ei o meu voto na generalidade, reservando-me para discordar de certos pormenores aquando da discussão na especialidade, se até lá não forem limadas as arestas que ferem a minha sensibilidade;
3.º As perspectivas que o futuro apresenta, aquém e além-fronteiras, são escassamente animadoras, pelo que é essencial prepará-lo o melhor que humanamente for possível.
Para tanto, há que cuidar na ordem interna da continuidade do Regime após as necessárias adaptações que o rodar do tempo aconselha, as mais prementes das quais se me afiguram ser o termo da confusão entre o puder político e o económico e a liberalização, cautelosa, mas sensível, de forma a que todos os verdadeiros portugueses possam participar na vida pública, de sorte que na ordem externa, «todos não sejamos de mais» para defender o prestígio e a integridade da Pátria.
Sr. Presidente: vou abandonar a tribuna. Procurei ser claro - mas temo não o ter conseguido. Diligenciei ser justo, sem ser escandaloso. Gritei a minha verdade, na persuasão de ser a própria verdade.
Não me pesa a consciência. Permita Deus que a V. Exa. e à Câmara não tenha demasiadamente pesado o tempo que consumi.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Sá Alves: - Sr. Presidente: simples curioso dos intrincados problemas de crescimento económico, não me atreveria a intervir neste debate se como em determinados sectores se proclama de tal natureza considerasse o conteúdo e objectivos do projecto de lei em discussão, admitindo, todavia, que apesar de nele se visarem essencialmente fins ético-políticos não deixarão de surgir implicações com os regimes e regras da crematística. Afigura-se-me, porém, de tal magnitude e premência u problema submetido à nossa apreciação que reputo imperioso dever de consciência o contributo geral da Assembleia para o clarificar e resolver. E assim, ciente de todas as insuficiências que me limitam, aqui venho trazer desvaliosa achega e justificar o meu voto tanto mais que esta justificação se torna mais necessária perante as aleivosas malsinações que já começam a ser desferidas sobre os motivos determinantes das nossas atitudes neste prélio.
Sr. Presidente: neste mundo conturbado por ideologias dissolventes e apetites desenfreados torna-se cada, vez mais difícil afastar a vista das solicitações da riqueza e dos prazeres materiais que da oferece. Aos governantes impende, por isso a obrigação de por todos os meios legítimos, obstar e prevenir excessos impressionantes, perdularismos ofensivos de tanta miséria que ainda existe, para que o contágio não seja fonte de corrupção das almas som fé ou desamparadas de autoridade e a revolta veneno mortífero dos espíritos fracos ou desprovidos de sentimentos morais suficientemente fortes para manter a criatura no caminho da virtude.
No eterno manancial de sabedoria que são os Discursos do Sr. Presidente do Conselho encontra-se a seguinte lição, bem digna de meditação e acatamento nesta hora incerta:

A vida humana tem exigências múltiplas e é de desejar que cada vez tenha mais. Mas nesta via ascendente de necessidades e de riquezas acumuladas não deve esquecer-se que não há progresso quando a vida é mais rica. Mas nesta via ascendente de necessidades e de riquezas acumuladas não deve esquecer-se que não há progresso quando a vida é mais rica e só quando é mais alta mais nobre na sua chama interior e na sua projecção externa.
................................................................................
O critério puramente utilitário amesquinharia a vida social e não seria digno do homem.

Se este mandamento fosse ouvido, a concentração do riquezas, em vez de perigo, constituiria autêntico benefício, pois favoreceria potencialidades de progresso e bem-estar geral, satisfaria necessidades e carências e criaria o ambiente de paz e harmonia social, que desde o princípio dos séculos, constituem a máxima aspiração dos agregados humanos. Mas o demónio do ouro e a sedução dos puderes que em si encerra têm sido e continuam a ser o Moloch das velhas mitologias, a que os

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povos sacrificam a felicidade nos seus sonhos de poder e grandeza. Por isso a prevenção é cada vez mais necessária, não contra a corrida para o aumento das riquezas, mas sim contra a sua má distribuição a defeituosa aplicação.

Vozes: - Muito bem. muito bem!

O Orador: - Todo que sirva para elevar o número dos ricos e diminuir o dos pobres deve ser feito e merece aprovação e ajuda. E, porque me parece que o projecto de lei pode contribuir, mesmo que apenas de maneira indirecta, para este fim meritório, tem o meu aplauso e o meu voto.
Mas, Sr. Presidente, os seus objectivos imediatos merecem também o meu encómio e plena concordância.
Os preceitos que o seu articulado contém reeditam princípios firmados em legislação que vem dos primórdios da vivência do Estaco Novo. Simplesmente, procura-se esclarecer incertezas suscitadas no domínio da sua aplicação e alargar o seu âmbito, a novos factos que vinham permitindo desvios clamorosos, Resume-se, pois toda a sua finalidade em três palavras de muito lato sentido e grande alcance: justiça, eficiência e moralidade.
Começa o normativo pela fixação de um limite para a remuneração dos administradores das empresas de interesse colectivo ou a estas presas por laços de subordinação, acessoriedade ou complementaridade, e fixa-se esse limite num quantitativo máximo igual ao quantitativo que constitui a remuneração de um Ministro de Estado. Haverá injustiça neste normativo?
Afoitamente responde pela negativa, pois não posso considerar as funções de administrador de uma empresa seja ela de que volume e natureza for, de maior responsabilidade, sob qualquer aspecto, do que as de membro do Governo.

O Sr. Paulo Cancella de Abreu: - Muito bem!

O Orador: - Não concebo mesmo que elas exijam mais inteligência capacidade de realização e firmeza, de vontade, nem que demandem mais iniciativa e previsão.
Acresce ao referido outra circunstância, imperante na vida pública, e que não pode deixar de estender-se também aos sectores da vida privada, porque importa fundamentalmente ao ordenamento social: é a hierarquia das funções em todas as suas modalidades, determinada não só por exigências de natureza funcional, mas também por requisitos de maior competência e cultura. E nada pode ferir mais esta hierarquia do que qualquer desproporção no montante da respectiva remuneração, visto que actuará logo em diminuição do prestígio correspondente à categoria do serventuário.
Mas não me convenço de que a retribuição atribuída a um Ministro de Estado esteja em desconformidade com o nível de vida que a economia nacional aconselha e consente, neste momento. E para alguns se afigura diminuto, apraz-me pensar que isso é já o efeito de noutros sectores se estarem a conceder remunerações mais avultadas, que pela ostentação que imprimem ao viver dos beneficiados, vêm criar, perante as vistas do público, situações de inferioridade, que minimizam e desprestigiam. Justo e equitativo me parece, pois, que a remuneração correspondente ao cargo de Ministro seja suficiente para pagar os serviços de qualquer administrador de empresa, pela maior projecção e importância que a esta se possa atribuir, sobretudo se atendermos a que orça por cerca de metade o vencimento dos mais altos funcionários de carreira da nossa, Administração - juízos conselheiros, generais, etc. ... .

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - ... todos pessoas da maior categoria na hierarquia social. E feridos só sentiriam até os mais elementares sentimentos de justiça se este limite não fosse atingido apenas em casos raros e plenamente justificados por excepcional condicionalismo, pois que é do conhecimento geral que grande número de presidentes de conselhos de administração de empresas quase publicas da maior importância, recebem remunerações e quantitativo equivalente ou muito aproximado das atribuídas aos funcionários de carreira acima mencionados. O limite estabelecido tem mesmo a sua grande defesa em constituir somente um máximo e permitir, consequentemente gradações que não ofendam o equilíbrio hierárquico nem sejam atentatórias da equidade e da capacidade económica do País.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

Orador: - Sr. Presidente: apontam certos opositores objecções várias aos propósitos do projecto de lei, entre as quais se destaca a que respeita à existência entre nós de um reduzido escol de indivíduos dotados de competência pura o exercício da difícil tarefa de assalariado de circunstância. Feriu-me esta objecção pelo que representa de injustiça para o labor das nossas escolas superiores e para o valor da nossa juventude, que física e intelectualmente se cultiva com afinco, debaixo da preocupação das responsabilidades que lhe cabem no futuro da vida nacional.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - A Universidade portuguesa acha-se hoje dotada de um potencial docente que a impõe à nossa admiração e não desmerece no confronto com a dos povos de maior nível económico e muito mais evoluídos; e os novos, a quem ela tem conferido os seus graus, vêm dando provas positivas nos cargos já assumidos e anseiam apenas por que a porta se lhes abra para a ascensão aos postos de direcção em que se há-de ferir a batalha do futuro. Não os desencorajemos, pois, e facilitemos-lhes a entrada, segundo a escala dos méritos e mentalidade construtiva de cada um, como é também, objectivo do projecto de lei e teremos praticado obra de indiscutível interesse para o progresso da Nação.
A gente moça manifesta aspirações que por vezes se chocam com as nossas, dando a impressão superficial de que nos situamos em mundos diferentes. Mas isto não passa de aparência, se considerarmos que onde nós encontrámos ruínas e misérias ela encontrou sólidas estruturas em que pode firmar os alicerces de um porvir rico de esperanças. Não podemos estranhar, portanto, que não se conforme com a mediania do presente quem não conheceu a indigência do nosso passado. Nem devemos surpreender-nos com os seus sonhos de grandeza porque sem eles não seria mocidade.

Vozes: - Muito bem. muito bem!

O Orador: - Nós também sonhámos um Portugal maior, por ele nos batendo com a galhardia de ânimo que dá a certeza de uma ideologia assente nas realidades - e desfrutamos agora a alegria deste surto de ressurgimento, que é a glória do homem eminente que o dirigiu o prémio da nossa mais ou menos profícua colaboração.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

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O Orador: - A proclamada penúria de elites parece-me, pois, uma daquelas verdades feitas com que se procura encobrir a verdade verdadeira, mas que os factos desmentem e só a pertinácia de uns tantos mantém.
Sr. Presidente: o que acabo de expor não exclui ou atinge a legitimidade da consecução de lucros avultados em empresas privadas, desde que esses lucros sejam o resultado de um grande risco imposto ao capital investido ou de uma iniciativa arrojada ou de uma previsão feliz, e bem assim, que desta forma se constituam grandes fortunas. Aceita-o a moral e sanciona-o o direito, desde que não haja fraude à lei ou locupletamento à custa alheia.
Este problema, porém, é diferente do que constitui objecto do presente debate, não sendo descabido, contudo, ancilar que a parte do produto nacional que tem sido distribuída ao capital, a título de lucros, constitui percentagem demasiadamente elevada em relação à que tem competido ao trabalho sob a forma de salários.
O problema é porém, diferente - repetimos -, porque os assalariados de circunstancias e muito especialmente os que servem as empresas de interesse colectivo, não correm, como tais quaisquer riscos, excepto quando são também capitalistas, caso em que, relativamente aos mesmos riscos, haverão a compensação proveniente, da participação nos lucros. E sucede até que em grande parte das empresas que o sector público estimula são dos organismos estaduais as iniciativas de partida, só ao seu impulso se devendo a marcha inicial e por vezes, a realização completa do empreendimento. Haja em vista o que no País tem acontecido com as chamadas indústrias de base todas financiadas com importantíssimos capitais de estabelecimentos públicos ou do próprio Estado ou de êxito garantido com privilégios ou monopólios por este concedidos.
Sr. Presidente: nós não nos podemos permitir luxos exagerados e esbanjamentos irritantes, porque listamos ainda muito longe de um nível de produtividade que tal consinta. Temos muita miséria a debelar, temos ainda salários muito inferiores ao mínimo indispensável para satisfazer as mais elementares exigências vitais. Portanto enquanto estas situações subsistirem a justiça social postula que se castigue e onere o supérfluo com favor do necessário. E isto além de ser justo é economicamente conveniente.
Com efeito se procuramos o desenvolvimento industrial e agrícola do País, precisamos de elevar o poder de compra das massas trabalhadoras, porque só elas podem animar o consumo dos géneros colhidos e produtos fabricados. Objectar-se-á que o reforço do puder de compra das massas trabalhadoras depende essencialmente do aumento do rendimento nacional, o que eu aceito no campo da doutrina. Na realidade dos factos, porém, se os que ganham muito passarem a receber menos, haverá um saldo a repartir, que em boa justiça deve caber aos mais necessitados. Não é raciocínio de economista, concordo, mas as contas simples também podem conduzir a resultados certos.
Sr. Presidente: ainda no aspecto que venho debatendo, quereria referir-me também ao alegado perigo de quebra do ritmo do investimento.
Este perigo é manifestamente ilusório, visto que. diminuindo as remunerações dos administradores, libertar-se-ia riqueza que normalmente, entraria no círculo do aforro.
Desde há muito tempo que aos brados de maior justiça social que vimos lançando os entusiastas do corporativismo, se responde que não é possível cercear os lucros das empresas em virtude da necessidade de intensificar o investimento, para assim levar a seu termo a tarefa de crescimento económico em que nos achamos empenhados.
O nosso desacordo afigura-se, pois, total.
No entanto, eu vou mais longe, discordando mesmo dos que pretendem colocar os imperativos de mais justiça social na dependência do desenvolvimento económico levado a efeito pelo impulso exclusivo dos capitais privados. É que o Estado tem meios ao seu alcance para intensificar a poupança e pode impulsionar o crescimento económico com os recursos próprios, colhidos através do imposto. E pode também influenciar o sector privado, planificando, dando garantias e privilégios, criando ambientes de segurança e confiança.
Não será este o caso português?
Quando Salazar, partindo do nada, iniciou a reconstituição económica do País, não foi com os saldos de gerência acumulados no decurso de sábias e austeras gestões financeiras que se lançou no portentoso empreendimento?
Não quereria Sr. Presidente, diminuir de forma alguma o valioso contributo que os capitais privados vêm dando à expansão da economia nacional, nem beliscar de qualquer maneira o direito de propriedade privada, que desejaria ver cernido de garantias que lhe permitam exercer com a maior eficiência a sua importantíssima função social. Mas quereria que o produto da expansão em curso não servisse apenas para alimentar os egoísmos de um novo poder económico e, sim, para melhorar o nível de vida de todo o povo português e obviar a que o termo catastrófico do dilema em que as sociedades se debatem pendesse para o lado da subversão.
Sim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, porque ou dignificamos o homem, libertando-o da degradação em que o lançou uma economia sem peias, ou caminhamos para o ocaso da civilização ocidental e dos valores: em que se firma tornando-nos réus de um crime sem nome perante a história. A hora que vivemos reclama unidade e congregação total de esforços para enfrentar a tormenta que paira sobre o Mundo, e, especialmente sobre as terras do nosso império, e resistir vitoriosamente às forças do mal que procuram minar os alicerces da nacionalidade. E porque a justiço é a grande arma dos fracos contra a violência dos fortes, façamos dela o escudo que apare todos os golpes dos inimigo - os de dentro e os de fora - erguendo cada vez mais alto o nome de Portugal.
Sr. Presidente: propõe-se ainda o projecto de lei em discussão proibir acumulações de cargos e definir incompatibilidades reputadas indispensáveis a eficiência administrativa e á autoridade do Governo.
Também me merece plena aprovação nestes objectivos.
Devo dizer, antes de mais, que é para mim ponto de fé que o Governo a que Salazar preside, quando encarrega um funcionário qualificado do exercício de um cargo de responsabilidade na gerência de qualquer empresa, o faz com a melhor intenção de servir o interesse público, por meio de uma mais eficaz fiscalização ou de melhor intervenção nas actividades respectivas. A necessidade de obstar a desvios prejudiciais ou impor nova direcção a estas actividades é, sem dúvida, a causa determinante da escolha.
Mas o Governo sabe que tem sempre opositores, ainda que sejam somente aqueles indivíduos que nunca souberam fazer mais do que dizer mal da obra dos outros. Para estas pessoas, realizações da maior relevância e projecção económica, social ou política são sempre negócios escuros, interesses particulares acobertados com o selo do interesse nacional. E estas gentes de má fé ou sem fé nenhuma, com diabólica habilidade, arrastam

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por vezes a opinião pública, nem sempre devidamente prevenida contra tais perversões, criando mal-estar e desassossego no seio da comunidade.
É necessário, portanto, estabelecer defesas contra tais deturpações; e não há defesa mais adequada do que aquela que possa impedir situações susceptíveis de interpretações erradas. Em política, o que parece, é disse uma vez Salazar, com a reconhecida agudeza do seu pensamento. Não devemos, portanto, sujeitar-nos a que as aparências se transformem em miragens capazes de arrastar as multidões emocionais atrás de fumos e fantasmagorias de que só se vê a vacuidade quando a tragédia está consumada.
Podem estas medidas preventivas criar dificuldades operacionais em ocasiões de emergência, admito; mas a sabedoria está em escolher entre as duas faces do problema a que melhor satisfaça as necessidades do momento. K neste momento político não posso conceber divergências desinteressadas sobre qual é a solução de maior oportunidade e eficácia.
A matéria das acumulações, Sr. Presidente, está ligada também ao aspecto que já referi da justiça que impõe o chamamento à actividade política e económica do escol juvenil. Apresenta, porém, outra face que é mister olhar igualmente com cuidado e ponderação.
Os altos postos, tanto lia administração pública como na gerência económica, são sempre de molde a consumir toda a energia dos seus serventuários. Não é admissível, portanto, que possa a mesma pessoa servir eficientemente outro cargo, quanto mais múltiplos cargos. Para exercer duas funções, por vezes de natureza totalmente diferente, ou se há-de descurar os serviços da primeira ou dar à segunda um concurso meramente platónico; e para exercer mais de duas terá de se escurar o serviço de todas. Ë que a actividade humana tem limites físicos que não é permitido ultrapassar. Surgem então espontaneamente interrogações deste jaez: porque não pode um juiz, que carece da mais absoluta independência económica, acumular com o seu o mais insignificante cargo e há-de ser permitida a. acumulação a outro funcionário melhor remunerado e cuja função exige igual ou maior dispêndio de energia? Além dos inconvenientes de ordem funcional, as acumulações criam desta maneira situações de desigualdade que se tornam irritantes e conduzem a desalentos prejudiciais. Só muito excepcionalmente se podem justificar, portanto; e só devem ser autorizadas sob a condição de não perturbarem notavelmente o equilíbrio hierárquico das remunerações.
O exemplo do mal é contagioso!
Há necessidade, por isso, de dominar esta ânsia de ganhos ilimitados que o progresso material, desacompanhado de correspondente progresso moral, espalhou lias sociedades contemporâneas. Para tal efeito procuremos dignificar a vida. profligando com dureza as clamorosas exibições de sumptuosidade, em que se desperdiçam energias e riquezas, com grave dano dos sãos costumes e das virtudes ancestrais. Considere-se que não são o luxo e a ostentação que proporcionam felicidade duradoura e alegria perene, prazeres que só dá, com plena satisfação da alma, a consciência do dever cumprido na prática da missão que nos coube na efémera passagem por este inundo terreno.
Sr. Presidente: com pouca ou nenhuma convicção levantaram-se dúvidas sobre a competência desta Assembleia para estatuir um regime legal minucioso ou de execução regulamentada. Não me parece que haja necessidade de discutir esta questão, atentos os termos em que é apresentada e atenta a probidade com que se apontam razões de contrariedade suficientemente convincentes.
Parece-me necessário dizer, porém, que, havendo esta Assembleia aceitado a iniciativa do projecto de lei em discussão, decerto no entendimento de que ia ao encontro de uma reclamação imperiosa da consciência nacional, renunciando agora à sua competência e relegando a solução para o Governo faltaria às suas responsabilidades na ordem política e praticaria uma autêntica deserção, que creio bem, não estará no ânimo de ninguém desta Câmara.

Vozes:-Muito bem, muito bem
!
O Orador: - Entendo ainda ser de acentuar também que reputo nosso dever auscultar as aspirações e anseios da Nação, dever que resulta da qualidade que temos de seus directos e lídimos representantes. E porque a Nação reclama com impressionante unanimidade providências pertinentes à solução dos problemas em que se espraia este debate, estamos obrigados a ouvi-la, afrontando respeitos humanos e conveniências sociais.
Atendamos, pois, a que a Nação olha e espera.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão.
A discussão continuará na sessão de amanhã.
Está encerrada a sessão.
Eram 17 horas e 40 minutos.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Agnelo Orneias do Rego.
Alberto da Rocha Cardoso de Matos.
Américo da Costa Ramalho.
Antão Santos da Cunha.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António de Castro e Brito Meneses Soares.
Armando Cândido de Medeiros.
Avelino Teixeira da Mota.
Carlos Coelho.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Francisco José Vasques Tenreiro.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Jerónimo Henriques Jorge.
João da Assunção da Cunha Valença.
João Maria Porto.
João Pedro Neves Clara.
Joaquim de Pinho Brandão.
Jorge Pereira Jardim.
José António Ferreira Barbosa.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Maria de Lacerda de Sousa Aroso.
Manuel Nunes Fernandes.
Manuel Tarujo de Almeida.
D. Maria Irene Leite da Costa.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Reis.

O REDACTOR - Leopoldo Nunes.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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