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REPÚBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL
DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 175
ANO DE 1960 29 DE ABRIL
ASSEMBLEIA NACIONAL
VII LEGISLATURA
SESSÃO N.º 175, EM 28 DE ABRIL
Presidente: Ex.º Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior
Secretários: Ex.mos Srs.
Fernando Cid Oliveira Proença
António José Rodrigues Prata
SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 35 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente.
O Sr. Presidente informou que se encontravam na Mesa os elementos fornecidos pelos Ministérios das Obras Públicas e das Comunicações em satisfação de requerimentos dos Srs. Deputados Virgílio Cruz e Alberto de Araújo, a quem foram entregues.
O Sr. Presidente deu conhecimento que aguardava, em nome da Assembleia, S. E. o cardeal-patriarca de Lisboa, legado do Papa à inauguração de Brasília, à sua chegada hoje a Lisboa.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Paulo Cancella de Abreu, para se congratular com a acção que o Srs. Ministro da justiça vem desenvolvendo na gerência da sua pasta; Santos Bessa, sobre aspectos luta antituberculosa e para pedir a restauração da Faculdade de Farmácias da Universidade de Coimbra; Augusto Simões, na mesma ordem de ideias, Cardoso de Matos, acerca do problema das estradas em Angola; Bagorro de Sequeira, que enviou um requerimento à Mesa; Melo Machado, que se referiu aos inquéritos à Cooperativa dos produtores de Leite de Mafra; Tarujo de Almeida, que enalteceu os serviços da policia Judiciaria no esclarecimento de um crime recente, e Agnelo Rego, sobre problemas de interesse para os Açores.
Ordem do dia. - Conclui-se a discussão na especialidade do projecto de lei n.º 27.
Usaram da palavra no decorrer do debate os Srs. Deputados Camilo de Mendonça, Mário de Oliveira, Carlos Lima, José Saraiva, Amaral Neto, Melo Machado e Carlos Moreira.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Eram 16 horas e 25 minutos.
Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Adriano Duarte Silva.
Afonso Augusto Pinto.
Agnelo Orneias do Rego.
Aires Fernandes Martins.
Alberto Carlos de Figueiredo Franco Falcão.
Alberto Cruz.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Pacheco Jorge.
Alberto da Rocha Cardoso de Matos.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Américo Cortês Pinto.
André Francisco Navarro.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António Bartolomeu Gromicho.
António Calapez Gomes Garcia.
António Calheiros Lopes.
António Carlos dos Santos Fernandes Lima.
António de Castro e Brito Meneses Soares.
António Cortês Lobão.
António Jorge Ferreira.
António José Rodrigues Prata.
António Maria Vasconcelos de Morais Sarmento.
António Pereira de Meireles Bocha Lacerda.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Aguedo de Oliveira.
Artur Máximo Saraiva de Aguilar.
Artur Proença Duarte.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Avelino Teixeira da Mota.
Camilo António de A. Gama Lemos de Mendonça.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos Coelho.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
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Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Domingos Rosado Vitória Pires.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando Cid Oliveira Proença.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco José Vasques Tenreiro.
Frederico Bagorro de Sequeira.
Jerónimo Henriques Jorge.
João da Assunção da Cunha Valença.
João Augusto Marchante.
João de Brito e Cunha.
João Carlos de Sá Alves.
João Mendes da Costa Amaral.
João Pedro Neves Clara.
Joaquim Pais de Azevedo.
Joaquim de Pinho Brandão.
Jorge Pereira Jardim.
José António Ferreira Barbosa.
José Dias de Araújo Correia
José Fernando Nunes Barata.
José de Freitas Soares.
José Garcia Nunes Mexia.
José Gonçalves de Araújo Novo.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Hermano Saraiva.
José Manuel da Costa.
José Monteiro da Rocha Peixoto.
José Rodrigo Carvalho.
José Rodrigues da Silva Mendes.
José dos Santos Bessa.
José Sarmento de Vasconcelos e Castro.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Laurénio Cota Morais dos Reis.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Luís Tavares Neto Sequeira de Medeiros.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel José Archer Homem de Melo.
Manuel Maria de Lacerda de Sousa Aroso.
Manuel Nunes Fernandes.
Manuel Seabra Carqueijeiro.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Manuel Tarujo de Almeida.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Reis.
Mário Angelo Morais de Oliveira.
Martinho da Costa Lopes.
Paulo Cancella de Abreu.
Purxotoma Ramanata Quenin.
Rogério Noel Peres Claro.
Sebastião Garcia Ramires.
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães.
Urgel Abílio Horta.
Virgílio David Pereira e Cruz.
Vítor Manuel Amaro Salgueiro dos Santos Galo.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 89 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 16 horas e 35 minutos.
Antes da ordem do dia
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Telegramas
Vários a apoiar a intervenção do Sr. Deputado Sá Linhares relativa ao porto de pesca de Leixões.
Do Grémio da Lavoura Aleanena a apoiar a intervenção do Sr. Deputado Neves Clara em defesa dos produtores do figo.
Da Cooperativa dos Olivicultores de Zibreira (Torres Novas) no mesmo sentido.
O Sr. Presidente: - Estão na Mesa os elementos fornecidos pelo Ministério das Obras Públicas, em aditamento aos que foram remetidos em ofício n.º 2133, para satisfação do requerimento apresentado na sessão de 29 de Março último pelo Sr. Deputado Virgílio Cruz.
Vão ser entregues àquele Sr. Deputado.
Estão também na Mesa os elementos fornecidos pelo Ministério das Comunicações em satisfação do requerimento apresentado na sessão de 6 do corrente pelo Sr. Deputado Alberto de Araújo.
Vão ser entregues àquele Sr. Deputado.
Srs. Deputados: duas palavras para pedir desculpa à Assembleia de ter chegado hoje um pouco mais tarde. Mas entendi que correspondia aos sentimentos da Assembleia aguardando a chegada de S. E. o Sr. Cardeal-Patriarca de Lisboa, delegado do chefe da cristandade à inauguração de Brasília, para lhe apresentar, em nome da Assembleia, os nossos cumprimentos pela forma como, do mesmo passo que se desempenhou do mandato que lhe foi confiado por Sua Santidade, representou da maneira mais honrosa pura Portugal a nossa presença naquele país irmão.
Tem a palavra antes da ordem do dia o Sr. Deputado Paulo Cancella de Abreu.
O Sr. Paulo Cancella de Abreu: -Sr. Presidente: justifica-se que, antes do encerramento deste ano legislativo, eu, jurista como qualquer outro que melhor o fizesse -, me refira, em breves palavras compatíveis com o escasso tempo de que dispomos, a notável acção que tem desenvolvido, e de certo continuará a desenvolver, na pasta da Justiça, o Prof. Doutor Antunes Varela, sem dúvida um dos mais altos espíritos da actual geração.
Num profundo estudo e em aturado trabalho, antecipadamente concebido e planeado, o Sr. Ministro da Justiça publicou os três novos Códigos do Registo Civil, do Registo Predial e do Notariado, diplomas notáveis, onde substancialmente reorganizou os serviços e os simplificou, os actualizou e compilou ou substituiu toda a legislação que andava dispersa sobre tão importantes matérias, de elevado interesse na vida civil da Nação.
Reformou e regulamentou os serviços do registo comercial, do Instituto de Medicina Legal e de Identificação, etc.
Fez activar a construção do grande e esplêndido edifício da Polícia Judiciária e nele instalou, e, como já tive ocasião de dizer aqui, de forma ordenada, modelar, prática e eficiente, não só todos os serviços a ela referentes e derivados especialmente da notável reforma empreendida pelo seu antecessor e de diplomas subsequentes, mas também os dela acessórios, como os daquele Instituto, os da identificação, adaptados aos processos mais modernos de arquivo, informação e exame, etc.
Os laboratórios de exames, de análise; e pesquisas são dotados do que há de mais moderno e perfeito, e isto, ligado à parte cultural e instrutiva, mediante uma escola prática de ciências criminais e outros meios de ensino, fornia um conjunto perfeito, inexcedido ou mesmo inigualado.
Por outro lado, o Prof. Antunes; Varela tem dado notável impulso ao complemente e à construção de número apreciável de novos tribunais magníficos e de edifícios prisionais e correccionais, de reformatórios e hos-
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pitais-prisões, o que vem inaugurando sucessivamente em sessões solenes sempre realçadas por notáveis orações, onde o Ministro revela a sua envergadura mental e um alto nível de jurisconsulto e mestre.
Tudo isto, a que se alia um cada vez maior aperfeiçoamento da composição e acção rios tribunais e dos serviços prisionais - a cuja organização, de projecção internacional, ligada ficou para sempre a memória de Manuel Rodrigues -, culmina com um facto cuja transcendente importância é desnecessário encarecer, como meio, sem outro igual, de recuperação e ensino dos prisioneiros.
Refiro-me à continuação, cada vez mais frequente e eficaz, da utilização destes mis obras de construção dos novo? tribunais e noutras obras. Trabalho remunerado, é bem de ver.
Não há dúvida de que a «Revolução continua» também no Ministério da Justiça e até com a perspectiva da breve satisfação de grandes anseios, como os das importantes alterações ao Código de Processo Civil e do novo Código Civil, que, por mercê de Deus, já há-de existir quando o actual alcançar o seu próximo século de vida, sem dúvida gloriosa, mas, actualmente, já antiquada e dispersa.
Por tudo o exposto, s pelo mais que, por forçosa brevidade, tenho de omitir, o ilustre Ministro da Justiça fez-se credor das homenagens que exprimo neste breve apontamento.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Santos Bessa: - Sr. Presidente: pedi a palavra para tratar de dois assuntos que têm certa urgência.
Dadas as condições especiais de trabalho do período que estamos atravessando, procurarei ser o mais breve possível.
O primeiro diz respeito aos elementos referentes ao meu requerimento apresentado na sessão de 10 de Março do corrente que me foram enviados pelo Ministério da Saúde e Assistência e pelo das Corporações e Previdência Social.
Quero, em primeiro lugar, agradecer a SS. Ex.ª os Ministros respectivos a prontidão com que foram enviadas as respostas e a clareza do que nelas se contém.
Justifiquei o requerimento pela necessidade que tenho de possuir elementos oficiais que me habilitem a considerar certos aspectos da luta antituberculosa entre as classes activas do nosso país, problema da mais alta importância para o êxito da campanha em marcha, pois da sua resolução depende a de muitos outros. Não é hoje o momento azado para explanar este assunto perante a Câmara, mas sempre recordarei que no Boletim dos Actuários Portugueses se afirmou que a cada tuberculoso falecido corresponde um prejuízo médio de 29 anos de trabalho, ou sejam 230 contos de salário, tomando por base o vencimento dos trabalhadores abrangidos pelos organismos da previdência em 1951. Ao total dos óbitos por tuberculose nas populações abrangidas por esses organismos (então 625 000 trabalhadores e suas famílias - 14,7 por cento da população portuguesa) correspondem 440 000 contos de salários. Se lhes juntarmos os prejuízos resultantes da doença, atingem-se os 500 000 contos, que são o verdadeiro prejuízo que a tuberculose causa em cada ano à população trabalhadora de Portugal abrangida pela previdência.
Isto era o que se passava há nove anos, segundo o cálculo feito pelas actuários. Suponho que o panorama se não apresenta hoje com aspectos menos desagradáveis. Estas são as razões por que desde há vários anos vimos pugnando pelo estabelecimento de um plano de luta autituberculosa, eficiente dentro daquele sector e que me levaram, mais uma vez, a levantar este problema, na esperança de conseguir algum dia vencer as incompreensíveis resistências que ali tenho encontrado. Vem de longe esta minha atitude - não nasceu agora nem visa outro objectivo que não seja o desejo de ver instalar entre os trabalhadores abrangidos pela previdência e suas famílias um sistema de Juta que seja eficiente, que nos poupe os enormes prejuízos que a doença e a morte por tuberculose ali produzem e que não comprometa o êxito da campanha nacional em marcha.
Pelas mesmas razões, o Instituto de Assistência Nacional aos Tuberculosos, desde longa data, tem feito numerosas diligências para obter uma colaboração efectiva da previdência na luta autituberculosa, de acordo com o disposto no n.º 1.º da base IV da Lei n.º 2044.
Felizmente, no ano passado conseguiu-se reunir uma comissão para estudo das bases de colaboração entre os serviços médico-sociais e o Instituto de Assistência Nacional aos Tuberculosos, comissão constituída por três elementos daqueles serviços e um do Instituto de Assistência Nacional aos Tuberculosos, que terminou os seus trabalhos em 21 de Julho.
O acordo estabelecido visa quatro capítulos!
A) Vacinação pelo B. C. G.;
B) Radiorrastreio ;
C) Tratamento ambulatório e em regime de internamento ;
D) Readaptação.
Quanto às três primeiras alíneas, ficaram estipuladas as bases de uma imediata colaboração efectiva; pelo que respeito à readaptação, ficou resolvido estabelecer essa colaboração logo que o Instituto de Assistência Nacional aos Tuberculosos complete os seus planos, agora em estudo.
Os textos foram enviados aos dois Ministérios interessados.
Segundo a informação que me foi fornecida, essas bases foram aprovadas pelo conselho técnico das caixas de previdência e mereceram um voto de louvor do Prof. João Porto. Foram igualmente aprovadas pelo conselho técnico do Instituto de Assistência Nacional aos Tuberculosos.
S. Ex.ª o Ministro da Saúde e Assistência aprovou-as, no que respeita ao seu Ministério, em 9 de Setembro de 1959.
Faltava, portanto, a aprovação de S. Ex.ª o Ministro das Corporações para que o referido acordo pudesse começar a ter execução.
Não deve, por isso, causar estranheza a ninguém que eu pretendesse saber quais as razões que impediam u sua aprovação por parte deste Ministério e fizesse o meu requerimento.
Recebi logo após as férias da Páscoa a informação, enviada pelo Ex.mo Chefe de Gabinete do Ministério das Corporações em 11 de Abril e expedida pela Secretaria-Geral da Presidência do Conselho em 16.
Nela se referem as razões que têm impedido «até agora tomar posição definitiva sobre os trabalhos elaborados pela comissão encarregada de estudar o assunto» e afirma-se que «enquanto a proposta (proposta de lei sobre a reforma da previdência) não for convertida em documento com força de lei não se vê como possa enca-
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rar-se o problema» no tocante a alguns dos seus aspectos, que colidem caiu o disposto na legislação actual e com o espírito da proposta sobre a reforma da previdência.
Mas também se afiram que «considerando, porém, que independentemente destes aspectos, outros Lá de interesse, sobretudo no referente à conjugação de esforços na luta contra a tuberculose, recomendou-se já aos Serviços médico-sociais - Federação de Caixas de Previdência que estabeleça contacto com as entidades competentes em ordem a poder celebrar-se o desejado acordo de cooperação».
Efectivamente, a Federação recebeu essa ordem há cinco dias.
Cumpre-me louvar a atitude assumida por S. Ex.ª o Ministro das Corporações no reconhecimento do interesse da conjugação de esforços para a luta antituberculosa. Entendo, porém, dever aguardar as condições em que vai propor-se a celebração desse acordo - se naquelas que foram estabelecidas por unanimidade entre os membros da comissão e aprovadas por S. Ex.ª o Ministro da Saúde, se noutras que possam traduzir os objectivos que se pretende alcançar. Por isso mesmo, julgo dever ficar por aqui na apreciação do caso.
E já agora, como um dos obstáculos parece ser o da conversão da proposta sobre a reforma da previdência em documento com força de lei, que me seja permitido o voto de que a Câmara Corporativa dê sobre ela o seu parecer, para que possamos discuti-la o mais depressa possível. Este e outros problemas estão a ser altamente prejudicados com essa demora.
Sr. Presidente: o outro assunto que me obrigou a pedir a V. Ex.ª que me concedesse a palavra diz respeito a uma causa que se me afigura da mais elementar justiça e do maior interesse - o da restauração da Faculdade de Farmácia da Universidade de Coimbra.
Se venho aqui tratar deste assunto e chamar para ele a atenção de S. Ex.ª o Ministro da Educação Nacional, é porque estou convencido de que há razões de sobra para que o caso seja revisto e porque me quero juntar ao coro daqueles que desde há muitas semanas, numa campanha bem fundamentada e cheia de elevação, reclamam aquela restauração. Nela depuseram pessoas responsáveis, que conhecem profundamente o problema e que o analisaram sob múltiplos aspectos.
Essa campanha teve o apoio de entidades representativas do meu distrito. Eu, no exercício do mandato que me foi conferido, entendo de meu dever dar-lhe o meu apoio e trazer o assunto a esta Assembleia.
A velha e gloriosa Universidade de Coimbra ufana-se de ter feito o ensino da Farmácia, sem interrupção, desde os recuados tempos em que reinava neste país o Sr. D. Sebastião até aos nossos dias. Durante mais de dois séculos foi a única a fazer esse ensino. Seguiu-se-lhe depois Lisboa, e quando o ensino da Farmácia nasceu no Porto já em Coimbra se fazia há três séculos.
A reforma de 1921, tendo em consideração os progressos daquele ramo de ensino e as necessidades do País, elevou à categoria de Faculdades as três escolas.
Assim se mantiveram as coisas até 1938, data em que o então Ministro Alfredo de Magalhães extinguiu, de um golpe, uma delas - a de Coimbra - e também a Faculdade de Direito de Lisboa e a de Letras do Porto.
A de Direito de Lisboa encontrou defensores que criaram o clima indispensável à sua ressurreição imediata.
A de Letras do Porto tem tido aqui nesta Câmara um acérrimo e infatigável defensor - o Dr. Urgel Horta -, que por ela se tem batido com o bairrismo, o ardor e o entusiasmo que lhe são tão peculiares. Recentemente, foi a Universidade do Porto recompensada com a criação da sua nova Faculdade de Economia, sem que com isto se queira negar a justiça da causa por que se bate aquele nosso ilustre colega.
Só Coimbra não teve ainda a mais leve compensação!
Apesar de extinta a Faculdade de Farmácia de Coimbra em 1928, o ensino continuou sob o mesmo regime até 1932. Entretanto, quando Ministro da Instrução o Dr. Gustavo Cordeiro Ramos, em 25 de Julho de 1932, foi nomeada uma comissão para o estudo da revisão do ensino da Farmácia. De nada valeram as razões então apresentadas e o ardor que pôs na defesa dos direitos que- assistiam à Universidade de Coimbra para a restauração daquela Faculdade o seu delegado, o Prof. Bissaia Barreto.
A reforma de 1932 foi publicada, mantendo a Faculdade 110 Porto e as duas escolas de Lisboa e de Coimbra.
A Faculdade de Farmácia do Porto ficou a funcionar com dois ciclos (24 disciplinas em 5 anos, sendo 4 delas cursadas na Faculdade de Ciências) e cada uma das outras 2 escolas só com o 1.º ciclo (14 disciplinas em 3 anos). Assim se mantêm as coisas, tal como dispôs a reforma de 1932.
O ensino da Farmácia foi em Portugal objecto de múltiplas reformas desde 1528 até 1932 - nada menos que doze estão referidas (pêlos estudiosos destes assuntos. Todas elas até 1928 tiveram a preocupação de melhorar o ensino, de lhe dar melhores condições, de harmonia com os progressos da ciência e com as necessidades do País.
A de 1928, baseada em razões puramente conómicas da época, amputou-nos duas Faculdades; a última, a de 1932, que tem características regressivas, como já alguém o afirmou, nem isso invocou.
São passadas quase três décadas sobre essa última reforma. Durante este tempo operou-se uma verdadeira revolução no campo das ciências de que se socorrem a Farmácia, a Química, a Física v a Biologia e criaram-se outras necessidades neste país no domínio da assistência aos doentes e na defesa da saúde pública. Suponho, além disso, não esta nuas em condições de invocar as mesmas razões de ordem económica que então pareceram aceitáveis para a execução da primeira dessas reformas.
Por outro lado, o corpo docente da Escola de Farmácia de Coimbra tem dado provas de uma- competência e de uma dedicação verdadeiramente admiráveis, tanto no campo do ensino como no da investigação. O esforço por ele despendido para obter instalações, para exercer o ensino, para realizar cursos de extensão universitária e para promover u investigação científica pode ser considerado extraordinário.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Para o afirmar documento-me nas publicações do seu Boletim ao longo dos seus dezanove anos de existência, nos trabalhos arquivados na revista didáctica -Notícias Farmacêuticas-, nos artigos assinados pelos seus professores e assistentes e insertos em tantos jornais e revistas, nos colóquios e conferências em que participam, nos cursos práticos de especialização que têm organizado e que são frequentados por tantos e tão variados diplomados por várias Faculdades e institutos, etc. Não me cumpre ir mais além. O meu objectivo é chamar para o assunto a atenção do ilustre titular da pastada Educação Nacional, em cuja inteligência brilhante, admirável espírito de justiça e inexcedível dedicação pelos grandes problemas nacionais do ensino e da educação confio abertamente.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
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O Orador: - O seu interesse pelo progresso do ensino da Farmácia em Coimbra está, aliás, bem afirmado.
O Sr. Augusto Simões: - Muito bem!
O Orador: - As nossas condições actuais não se compadecem com o regime de cursos que se professam nas Escolas de Farmácia de Lisboa e Coimbra.
O Sr. Augusto Simões: - Muito bem!
O Orador: - Os farmacêuticos - imprescindíveis colaboradores dos médicos na defesa da saúde do seu semelhante e na defesa, da saúde pública - carecem de ter todos uma formação universitária, uma preparação cientifica, que aquele curso reduzido lhes não pode dar. E não é só isso! A nossa indústria farmacêutica reclama técnicos competentes ...
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - ... que nos ponham ao abrigo de múltiplas especialidades farmacêuticas - algumas, infelizmente, de inferior qualidade! - que nos sugam as divisas e que oneram a nossa economia.
O Sr. Augusto Simões: - Muito bem!
O Orador: - O panorama da nossa Farmácia é desolador sob muitos aspectos, mas não é este o momento propício para encarar os problemas do seu funcionamento, da verificação da actividade das drogas, da conservação dos produtos biológicos, da composição das especialidades farmacêuticas e de tantos outros.
Carecemos de mais farmacêuticos. Mais e melhores! Não nos convém o curso reduzido que desde há 23 anos se mantém em Lisboa e em Coimbra.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Aguardo confiante a acção do ilustre titular da pasta da Educação Nacional. Julgo poder deduzir que o Governo de Sal azar se preocupa seriamente em reparar aquela monstruosa mutilação de que foi vítima a velha e gloriosa Universidade de Coimbra, já que está demonstrado que o encargo da restauração da Faculdade ascende a pouco mais de 500 contos, que esse encargo será amplamente coberto por uma receita específica o que até está feito o anteprojecto para a instalação do ensino farmacêutico, elaborado de acordo com as instruções dadas pelo ilustre Ministro das Obras Públicas, anteprojecto que até tem a aprovação do conselho escolar.
Os elementos que possuo animam-me a confiar.
Por isso espero que a reforma do ensino deste tão importante sector se não faça esperar e que o novo ano académico traga à velha Universidade a Facilidade que lhe amputaram há 28 anos.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito compartimentado.
O Sr. Augusto Simões: - Sr. Presidente: quero felicitar o Sr. Deputado Santos Dessa pelo seu brilhante discurso e associar-me inteiramente, como Deputado por Coimbra, ao justo pedido nele formulado. Efectivamente, a restauração da Faculdade de Farmácia na gloriosa Universidade de Coimbra é uma necessidade que a todos os títulos urge satisfazer, por emergir de um incontestável direito. Secundo, por isso, com o maior empenho o pedido que em tal sentido acaba de ser feito ao Governo.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Sr. Cardoso de Matos: - Sr. Presidente: impedido por doença de comparecer à Assembleia, não me foi dado assistir ao debate sobre o aviso prévio do ilustre colega Sr. Melo Machiado relativo ao problema das estradas em Portugal, de que resultou uma moção unanimemente aprovada, a que sinto não ter podido concorrer com o meu voto, que agora aqui expresso, com a relevância da oportunidade que lhe reconheço.
A propósito, não posso deixar de chamar a atenção do Governo para a situação em que se encontram as províncias ultramarinas neste sector, especialmente Angola, cujo desenvolvimento se acentua cada vez mais, O que implica dizer que o problema das suas estradas cada vez se torna mais acuído e grave.
Como já se demonstrou neste Casa, está verificado e unanimemente reconhecido que a falta de estradas e o mau estado em que se encontram as existentes pode trazer inconvenientes e prejuízos de ordem vária, a que urge pôr cobro, a bem do interesse da Nação, mesmo com a sua comparticipação em mais um sacrifício que lhe seja pedido, mas que também entendo dever ser considerado na medida em que as obras desta natureza - que tanto beneficiarão as gerações vindouras - possam constituir encargo também para elas, já que os benefícios que daí lhes advirão mais facilmente lhes proporcionarão os meios de liquidação de tal encargo.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Mas, se o problema assim se põe na metrópole, que já tem uma rede de estradas, embora muitas a necessitarem de reparação, o que dizer de Angola, tantas vezes maior do que a metrópole e que, não tendo a mesma densidade de população, tem uma premente necessidade de povoamento e vê o seu desenvolvimento retraído porque as suas riquezas, espalhadas na imensidade do seu território, nem sempre encontram vias de escoamento permanente capazes de satisfazer às suas mínimas necessidades.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Se olharmos o mapa de Angola, verificamos com facilidade que, salvo raríssimas excepções, é ao longo das linhas férreas - únicas vias de comunicação que funcionam sem interrupções - que o povoamento se fez mais intensamente; porém, não só ao longo dessas vias se encontram as riquezas a explorar e as necessidades de povoamento, como ainda é impossível sem as estradas acessórias e conducentes a essas vias principais promover o desenvolvimento e aproveitar cabalmente os investimentos de toda a natureza que constantemente são solicitados e aplicados em Angola.
Esta província, dada a sua situação geográfica, suporta anualmente um período de chuvas tropicais, que, na sua intensidade e violência, quase destroem a totalidade das estradas, que todos os anos são reconstruídas, como sempre, a título precário e, portanto, sujeitas a novas destruições. Fogem o seu tanto a esta regra aquelas vias que, pela sua melhor construção, mais podem resistir. Mas todas elas em conjunto têm o desgaste natural do seu intenso tráfego, e, além disso, aquelas que de estradas quase só têm o nome em períodos de chuvas obrigam ao recurso a correntes e a cantoneiros improvisados, do que resulta uma
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maior destruição, ao mesmo tempo que um desgaste de material, com o que anualmente se perdem elevadíssimas quantias. Duplos círculos viciosos de que tem de se sair, sob pena de comprometer gravemente o progresso da nossa maior província ultramarina.
O Sr. Melo Machado: - Muito bem!
O Orador: - Estradas destruídas pela pressão de chuvadas tropicais na sua pouca robustez, reconstrução improvisada, por falta de meios que a tornem definitiva, quanto o pode ser; por outro lado, necessidade de circular em estradas péssimas, impondo o recurso aos únicos meios que permitem a sua utilização e que, mais as destruindo, não impedem graves desgastes do material dos utentes.
Conquanto possa parecer de somenos importância, há que ter em consideração ainda o desenvolvimento que se processa no turismo em Angola, cujas possibilidades são suficientemente grandes para que se imponha a atenção para esta fonte de receita, que pode e deve tornar-se muito importante. Haja em vista os resultados já obtidos, embora as iniciativas postas em marcha tenham sofrido a falta dos meios adequados a uma maior e mais convincente execução.
Com estradas já não digo boas, mas em que se possa ao menos transitar em condições razoáveis - estou certo de que a partir dos nossos e excelentes portos se canalizaria apreciável torrente turística daqueles turistas, em número bem grande, que apreciam o sugestivo das belezas naturais de Angola, em que ela é tão pródiga, e que infelizmente estão tão pouco divulgadas e acessíveis em razoáveis condições de comodidade e segurança.
A 2.ª fase do Plano de Fomento, presentemente em execução, previu e está aplicando nas estradas de Angola uma verba que, tomada em si própria, poderemos considerar realmente importante. Todavia, se atentarmos na grandeza do que há a fazer, a importância dessa verba fica tilo aquém das necessidades que receamos se venha a perder uma grande parte dos investimentos devido aos factores já indicados, que em Angola concorrem para uma maior destruição das estradas, impondo cuidados de conservação enormemente onerosos.
A Junta Autónoma de Estradas na metrópole tem exercido uma meritória acção, que se verifica não poder ir mais além, por falta de recursos que lho permitam. Melhor dotada ninguém pode duvidar de que a sua missão prosseguirá a contento, com os consequentes benefícios.
Em Angola são as obras públicas que, dentro das suas possibilidades, muito têm feito, porém, a experiência dos bons resultados obtidos na metrópole não aconselhará a criação naquela província do um organismo do mesmo género, que tome a seu cargo igual tarefa ? Lembremos a ideia, que não é nova, formulando o voto de que, com ou sem o organismo técnico devidamente apetrechado, se promova ao necessário, se estabeleçam as dotações, se criem, em resumo, as condições que tornem possível a existência em Angola das estradas que permitam acompanhar o progresso que ali se verifica, considerando que tudo o que se faça no campo da exploração das suas riquezas, todas as formas de povoamento que se entenda promover, todos os recursos de qualquer natureza que se queiram aproveitar não o serão, no poderão existir e correm o risco de se perder em parte se se não contar com as vias de comunicação indispensáveis ao seu prosseguimento.
Registo com prazer que a moção resultante do debate que referi foi aprovada por unanimidade. E com entusiasmo que apresento os meus parabéns por essa moção e faço votos para que o nosso Governo não deixe de a considerar - como é devido - em todo o nosso ultramar.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Bagorro de Sequeira: - Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa o seguinte
Requerimento
«Quando da discussão na Assembleia do projecto do II Plano de Fomento Nacional, apresentado pelo Governo, tive ocasião de fazer algumas considerações a respeito do fomento da introdução e exploração do caracul na província de Angola.
Disse então:
«Sobre o problema de exploração do caracul, o panorama é o seguinte:
No início da introdução em Angola desta actividade pecuária tudo se apresentava rodeado das mais aliciantes perspectivas, principalmente com o fundamento de que os nossos vizinhos do Sudoeste tinham na exploração do caracul uma das suas principais fontes de exportação.
Reservaram-se-lhe enormes áreas na zona e desértica e semidesértica do Sul; importaram-se repetidas vezes reprodutores de origem; construiu-se um dispendioso posto experimental e até se criou uni grémio de criadores do caracul.
Como remate de todas esta actividade, vão gastos para cima, de duas dezenas e meia de milhares de contos e nada de concreto se conseguiu ainda, como expressão económica, em tal exploração.
O assunto requer, pois, uma revisão de fundo, definitiva, para ficarmos sabendo se devemos ou não prosseguir em maiores investimentos».
Assim, desejando novamente ocupar-me do fomento do caracul em Angola, requeiro que, pelo Ministério do Ultramar, mu sejam fornecidos os seguintes elementos de informação:
a) Número e data do diploma legal que criou em Angola o Posto Experimental do Caracul;
b) Área oficialmente reservada à ocupação e exploração do caracul, separadamente, nos distritos de Moçâmedes e de Huíla;
c) Arca efectivamente ocupada nesta data com exploração do caracul, destrinçando a que pertence ao Posto Experimental e a que globalmente ocupam os criadores;
d) Discriminação nominal das empresas que presentemente se dedicam à, criação do caracul, com indicação das áreas de que são concessionárias ;
c) Indicação do número de ovinos existentes na zona do caracul, separadamente os que pertencem ao Posto Experimental e a cada um dos criadoras. Nesta indicação devem ser especificados os animais puros, os mestiços e as ovelhas destinadas a cruzamento;
f) Número total de animais existentes de outras espécies do Posto e dos criadores, com indicação da função económica que caracteriza a sua exploração;
g) Indicação, tão aproximada quanto possível, da despesa global efectivada até ao fim de 1959 com o fomento do caracul, especificando, se for possível fazê-lo, em relação às principais rubricas de despesa, construções, abasteci-
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mento de água, estradas e vedações, aquisição e importação de reprodutores puros, aquisição de ovelhas para cruzamento, na província e no exterior, viagens de técnicos ao estrangeiro e outras despesas dignas de referência ;
h) Interesse manifestado até agora pelas iniciativas e capitais particulares relativamente à exploração do caracul, resultados económicos já obtidos e perspectivas de exploração da exploração em curso para um futuro relativamente próximo;
i) Indicação nominal dos criadores do caracul que iniciaram e prosseguiram nas suas explorações e indicação dos que começaram e abandonaram o empreendimento;
j) Número e data do diploma legal que criou o Grémio dos Criadores do Caracul;
k) Indicação genérica sobre a acção do Grémio no fomento do caracul;
O Sr. Melo Machado: - Sr. Presidente: tenho, finalmente, em meu poder as conclusões do inquérito realizado por um magistrado a solicitação de S. Ex.ª o Sr. Secretário de Estudo da Agricultura a S. Ex.ª o Sr. Ministro da Justiça junto da Cooperativa dos Produtores de Leite de Mafra.
Também, e gentilmente, todo o processo foi posto à minha disposição como solicitara.
Devo dizer que tanto o processo como as conclusões do digno magistrado me deixaram perfeitamente identificado com a necessidade, direi mesmo indispensabi-lidade, de se dar uma solução radical a este assunto.
Por agora, e porque estão em curso, ao que me consta, dois inquéritos -mais dois- à administração daquela Cooperativa, vou limitar-me a comunicar à Assembleia as conclusões que me foram enviadas, esperando que desta vez aquele malfadado raso tenha a solução necessária, dispensando-me assim de transmitir a esta Assembleia os pormenores do inquérito.
Diz o magistrado inquiridor:
Chegado a esta altura, cumpre-me descrever o ambiente formado na Cooperativa e à sua volta, tal como superiormente se deseja, a que, naturalmente, se acrescentarão as razões que a determinaram e as medidas que parecem indispensáveis para a sanar.
1) O ambiente da Cooperativa, devido a tudo o ficou relatado, denota, sobretudo, uma grande desorientação interna, e o organismo encontra-se envolvido numa atmosfera de suspeições.
A massa associativa, que compreende duas camadas diferenciadas, a das pessoas com certo grau de cultura e a dos modestos produtores (estes na maioria), mostra-se, de um modo geral, dividida, predominando entre os primeiros a facção mais adversa ao presidente da direcção.
Tal estado de espírito patenteou-se inconvenientemente nas últimas reuniões da assembleia, que foram tumultuosas, tendo-se desenhado já verdadeiros conflitos pessoais.
Estas questões não se limitam às paredes da Cooperativa, pois alastram por todo o concelho, onde o leite é o produto n.º l da riqueza regional, e começam a ter reflexos no tribunal, tendo-se entrado num período de vindimas e retaliações.
2) Estou firmemente convencido de que a Cooperativa não poderá, pelos seus actuais órgãos dirigentes, inconciliáveis, estabelecer a indispensável atmosfera de confiança, calma, disciplina e ordem administrativa para prosseguir na sua vida normal.
Por outro lado, há vícios de administração que carecem de ser corrigidos, novas regras de conduta a estabelecer, problemas a estudar e soluções a rever.
Esta tarefa só poderá, creio, ser confiada a uma comissão administrativa, de harmonia com o Decreto n.º 31 551, de 4 de Outubro de 1941, composta de elementos estranhos aos conflitos e aos seus causadores.
Torna-se ainda necessário, a meu ver, estruturar por uma outra forma a assembleia geral.
...............................................................................
Uma assembleia geral de 3000 pessoas é um meio de que não poderá sair trabalho útil.
É de notar que cada uma destas reuniões da assembleia geral, quando isso convém ao presidente, custa muitos contos de réis à Cooperativa, pois são postos à disposição dos sócios abundantes meios de transporte.
................................................................................
A ser digna de estudo esta sugestão, ela constituiria outro fundamento para a nomeação imediata da comissão administrativa, evitando-se a próxima assembleia geral, que, nos termos legais, terá de realizar-se até ao fim do corrente mês de Março e que, certamente, pelo que deixo exposto e o mais que mostra o processo, não pode ser proveitosa nem prestigiante para a Cooperativa.
Lisboa, 9 de Março de 1959.
Por estas conclusões se verifica que o magistrado inquiridor, com grande correcção, imparcialidade e delicadeza, disse o suficiente para se verificar que eu tinha plenamente razão quando levantei aqui a questão, na firme convicção de que havia de terminar com aquele tristíssimo espectáculo.
Fazer inquéritos, sobretudo em momentos agudos e a pessoas de feitio dominador e prepotente, sem previamente os afastar, para que o inquérito possa fazer-se com serenidade e imparcialidade, sem que os depoentes sejam sujeitos a pressões morais, é certamente correr o risco, neste caso grave, de não se conseguir esclarecer a verdade.
No concelho de Mafra, numa espécie de visita da «velha senhora», está-se fazendo uma acção social nefasta, à custa de afirmações menos verdadeiras, pondo uns contra os outros, os que têm menos e os que têm mais, divisão que normalmente não existe nos nossos meios rurais e que seria altamente inconveniente criar.
Tenho pelo Sr. Eng.º Quartin Graça, ilustre Secretário de Estado da Agricultura, a consideração e o apreço de que S. Ex.ª é plenamente merecedor.
O Sr. Vitória Pires: - Como V. Ex.ª sabe, o Sr. Secretário de Estado da Agricultura já tomou providências para que o assunto chegasse a bom termo, e se ele se não encontra ainda resolvido foi porque se entendeu que, estando para se realizar uma assembleia geral pouco depois de ter sido entregue o inquérito, se devia aguardar que nela o caso fosse resolvido com o bom senso de todos os intervenientes.
A assembleia geral não se realizou, como V. Ex.ª sabe, porque, entretanto, foi mandado fazer pelo Sr. Secretário de Estado da Agricultura uma inspecção.
O Orador: - Aguardo, pois, os resultados do inquérito mandado fazer pelo Sr. Secretário de Estado da Agricultura.
São pontiagudas, acerados, perigosas, as hastes dos touros no nosso Ribatejo, mas quando é preciso pegá-los é precisamente por ali que se agarram.
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Este não é um assunto perigoso, mas convenho sem dificuldade em que é um assunto aborrecido.
Quando, porém, há tantas razões para considerar a necessidade ri e o sanear, não interessam os incómodos, só não a certeza de prestar um bom, um útil serviço, que prestigiaria à organização cooperativa e devolveria o sossego social o político a um concelho como o de Mafra.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador fui muito cumprimentado.
O Sr. Tarujo de Almeida: - Sr. Presidente: a Polícia Judiciaria acaba de prestar mais um relevante serviço ao País, conseguindo, numa investigação espectacular, identificar e capturar os criminosos e apreender todos os instrumentos do crime cometido na pessoa do oficial cujo corpo foi há semanas encontrado nas areias da praia do Guincho.
O simples facto de a actuação policial ter permitido a acção punitiva da justiça, num caso que desde início u sob diversos aspectos se apresentava eriçado das maiores dificuldades e possivelmente destinado à impunidade, seria suficiente para garantir à prestigiosa corporação o reconhecimento e o apreço dos que, como nós, homens do foro, na modéstia das nossas forças, servem o difundem a realização da justiça, como factor essencial da vida das sociedades civilizadas.
Mas outras circunstâncias importantes concorreram neste caso para realçar o mérito do trabalho da investigação criminal o para amplamente justificar o pequeno apontamento que me decidi trazer a esta Câmara.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - A participação activa que o militar assassinado tivera no frustrado movimento de 11 de Março, a forma como posteriormente conseguiu evadir-se do Forte de Elvas, onde se encontrava em regime de prisão preventiva, o mistério que um seguida cobriu o paradeiro do fugitivo e dos que com ele colaboraram na evasão, tragicamente quebrado mais adiante pela simples identificação do cadáver soterrado na praia do Guincho, fizera que este caso tivesse um eco enorme na opinião pública e permitiram que à volta dele, principalmente pelas suas implicações de carácter político, se arquitectassem as mais variadas e absurdas conjecturas.
A própria circunstância de, durante algum tempo, continuar a ser desconhecida tanto a existência como o paradeiro dos companheiros de evasão da vítima mais contribuiu ainda, para o estado de alarme e de inquietação que o tenebroso crime criou, não apenas em Lisboa, mas em todo o Pais, que acompanhou com o maior interesse e expectativa o desenvolvimento da investigação policial.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Não faltou inclusivamente quem, neste país, e até fora dele, em declarações que envergonhariam um modesto cidadão sem qualificação especial (quanto mais um homem colocado no mais alto posto da hierarquia militar e candidato recente à mais alta magistratura da Nação), procurasse imputar às forças da ordem, incumbidas de assegurar a tranquilidade e a paz pública, a autoria de um crime, que a nossa razão o a nossa infeliz e dolorosa experiência política de há recuados anos levariam a situar imediatamente nas alfurjas secretas e nas forças ocultas da desordem e da subversão.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - É a conjura internacional há muito movida contra nós - e que tão desastrados sinais tem dado de si na invenção de movimentos subversivos nas nossas províncias ultramarinas e ainda agora na interpretação da decisão da Haia- o na história dos acontecimentos que a precederam - uma vez mais se denunciou, dando guarida, numa revista americana de responsabilidade, a essa infame atoarda, habilmente retocada por informador ou correspondente, que nem se mostra digno da nobre função que exerce, nem merecedor da hospitalidade, da paz e da tranquilidade de que certamente goza à sombra das nossas instituições.
Vozes: - Muito bera, muito bem!
O Orador: - Também entre nós não faltou, como é natural, quem se empenhasse em fazer circular, apoiado no pretenso conhecimento de factos que escapavam à percepção do grande público, a indigna e precipitada versão dos acontecimentos que no Brasil foi posta a correr pelo Sr. General Delgado.
Ninguém, entre as pessoas de boa fé, que, graças a Deus, ainda constituem a esmagadora maioria da Nação, duvidava da natureza dos meios onde a liquidação do transviado oficial deveria ter sido planeada e perpetrada. Mas foi com um senti- mento de grande e justificada satisfação que as pessoas de bem viram os investigadores, através dai provas esmagadoras acumuladas contra os arguidos, desmascarar por completo a farsa, revelando a identidade o as tendências políticas dos assassinos e seus encobridores. Um daqueles é um aspirante miliciano, envolvido na tentativa revolucionária do Março do ano findo, parecendo igualmente comprometido nesse movimento o outro aspirante miliciano que acompanhou a condução do cadáver ao local onde se pretendeu ocultá-lo.
A Policia Judiciária prestou deste modo um excelente serviço, não apenas à acção da justiça que, aliás, muito tem ainda que investigar, para completo esclarecimento dos antecedentes da ocorrência), mas ao País inteiro, na medida em que restabeleceu a confiança do público na eficiência do nosso sistema de repressão da criminalidade, e ainda às próprias instituições vigentes, ao libertá-las de uma calúnia infamo, que nem por ser indigna e absurda deixava de ser incómoda e desagradável.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Sabe-se ainda que para alcançar os resultados obtidos a Polícia Judiciária leve de vencer os maiores obstáculos, desde a dificuldade da identificação da vítima e a completa ocultação dos instrumentos do crime até às falsas declarações de algumas das pessoas inquiridas o aos hábeis expedientes usados, quer de dentro, quer de fora do País, para ocultar o paradeiro dos assassinos.
Para lograrem tal êxito tiveram os investigadores de desenvolver um esforço insano durante algumas semanas, sacrificando o repouso de dias e noites ao exercício da sua tarefa. Mas o trabalho realizado, com uma persistência e um método exemplares, honra a corporação n que pertencem e que tantos êxitos tem, aliás, contado nos últimos anos da sua actividade.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
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O Orador: - Julgo, pois, interpretar os sentimentos desta Casa endereçando à Polícia Judiciaria ao distinto magistrado que a dirige o testemunho do apreço e do louvor que lhes são devidos pelo alto serviço que acabam de prestar à colectividade.
Vozes: - Muito bem, muito bem !
O Orador: - E não só a estes.
O elevado grau de eficiência conseguido assenta, necessariamente, no particular cuidado e acertada orientação superior que o ilustre Ministro da Justiça tem sabido imprimir, valorizando-os, a todos os sectores do seu importante departamento ministerial.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - A S. Ex.ª, pois, igual testemunho de apreço e de louvor.
Vozes: - Muito bem, muito bem !
O Orador: - E que os tais que não acreditam na existência do Partido Comunista Português nem nos métodos brutais da sua actuação vão pondo os olhos a tempo nestas tristes realidades ...
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - ... nesta, que a Polícia Judiciária acaba de pôr a descoberto, na forma como há pouco foi planeada e levada a cabo a evasão de alguns dos reclusos de Peniche e em tantos outros factos que parecem apostados em abrir os olhos aos mais cegos e em despertar os mais incrédulos e apáticos.
Tenho dito.
Vozes: -Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Agnelo do Rego: - Sr. Presidente: pelo Decreto-Lei n.º 42 935, que acaba de ser publicado no Diário do Governo, finalmente, criada a Circunscrição Florestal de Angra do Heroísmo, antiga aspiração por diversas vezes formulada e agora convertida em realidade, de consequências manifestamente benéficas pura a economia local.
Por tal motivo, antes de iniciar as considerações que vão seguir-se, gostosamente, como Deputado pelo circulo de Angra do Heroísmo, dirijo ao Governo as homenagens do devido reconhecimento.
Neste momento assumiu a presidência o Sr. Cotta Morais
Sr. Presidente: depois da existência e da Fé, um dos maiores dons de Deus aos Portugueses é sem dúvida, o mar. Através dele se dilatou a própria Fé e o Império, se fez cristandade e lusitanidade, se realizou Portugal ... Mas o mar não foi só o caminho aberto pelo infante navegador para dar no Mundo novos mundos: passou a ser a natural comunicação de Portugal com o mesmo Portugal que ficou vivendo nos novos mundos. Entre estes se contam os pequenos mundos que são as nossas queridas ilhas adjacentes, de cuja vida administrativa peço licença para me ocupar hoje.
A organização administrativa das ilhas adjacentes caracteriza-se pela descentralização de certos serviços públicos que no continente, dependem directamente do Governo.
Por virtude de tal descentralização -justificadamente baseada no particular condicionalismo criado e imposto, precisamente pelo mar, entre o continente e as ilhas e estas entre si - confere a lei aos distritos insulares a designação de «distritos autónomos das ilhas adjacentes», título porventura pomposo e pouco feliz, pelo equívoco que relativamente ao seu verdadeiro significado ...
O Sr. Carlos Moreira:-Muito bem!
O Orador: - ... pude originar no espírito de quem não estiver advertido de que através da descentralização o legislador Ceve em vista apenas «dar solução justa e prática às dificuldades da administração insular», respeitando «o imperativo de diferenciação resultante da diversidade de condições e circunstâncias».
O Sr. Sequeira de Medeiros: - Muito bem!
O Orador: - Melhor fora, por isso, empregar a simples expressão « distritos das ilhas adjacentes» ou «distritos insulares» ou ainda qualquer outra que, não deixando de implicar a ideia de um regime especial, não ferisse, contudo, uma nota tão terminante de autonomia, já que, sendo embora certo que as juntas gorais - órgãos da administração daqueles distritos- deliberam definitivamente sobre a maior parte das matérias das suas atribuições, não é menos certo que nas suas actividades estão sujeitas à inspecção e assistência técnica do Governo, ao qual lambem compete a aprovação dos planos de administração das mesmas juntas, e são permanentemente fiscalizadas pelo governador do distrito, como representante do Estado.
Em consequência da descentralização, foram atribuídas aos referidos distritos as contribuições directas arrecadadas pelo Estado nos mesmos distritos e os rendimentos dos serviços descentralizados, constituindo as receitas principais com que as juntas ocorrem a todas as despesas que lhes incumbem e nas quais se compreendem as relativas a serviços do Estado que «embora hierarquicamente dependentes do Governo, são, todavia, custeados pelos distritos».
Este regime administrativo - que só encontra consignado no chamado «Estatuto dos Distritos Autónomos das Ilhas Adjacentes» e que tantos benefícios tem originado, derivados da inegável facilidade e presteza na administrarão, proporcionada pela descentralização ...
O Sr. Sequeira de Medeiros: - Muito bem!
O Orador: - . . . de cujas vantagens as ilhas já não poderiam hoje prescindir, sob pena de retrocesso e até de incompatibilidade com a celeridade da nossa época - foi, e continua a ser, verdadeiro e eficaz instrumento de progresso para os arquipélagos da Madeira e dos Açores, que se deve à compreensão do Governo e ao estudo do Prof. Marcelo Caetano, que, propositada e devotadamente, visitou as ilhas.
Decorridos, porém, vinte anos, não admira que algumas circunstâncias tenham sofrido alterações dignas de ponderação.
Assim, a par do desenvolvimento dos serviços privativos das juntas gerais, em que avultam os agrícolas, os pecuários, os de saúde e os de obras públicas, acentuou-se notavelmente o dos serviços do Estado a cargo das mesmas juntas, isto é, o dos atrás referidos serviços do Estado, a cargo, «embora hierarquicamente dependentes do Governo, são, todavia, custeados pelos distritos», ou sejam, nomeadamente, os do ensino secundário, técnico e primário (particularmente este) e da delegação do Instituto Nacional do Trabalho e Previdência e Tribunal do Trabalho, cujas despesas têm elevada e pesada expressão nos orçamentos distritais.
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Certo é que o Governo tem procurado remediar a dificuldade, através de um subsídio destinado a auxiliar as juntas a suportar as despesas com o pessoal dos servidos do Estado a cargo delas, mas não pode deixar de reconhecer-se, por um lado, que tal subsídio (não obstante o aumento decretado no ano findo) está em constante e gradual desactualizarão, devida ao sempre crescente desenvolvimento daqueles servidos, designadamente os do ensino, e, por outro lado, que é em geral exígua, depois de satisfeitos os encargos com a manutenção dos mencionados serviços do Estado e a dos seus próprios, a margem orçamental sobrante com que as juntas gerais podem contar para as importantes obras de fomento incluídas na lista das suas atribuições.
Ao princípio, no entanto, não era nem foi assim.
Lê-se, efectivamente, no lúcido relatório do Decreto-Lei n.º 30 214, de 22 de Dezembro de 1939, mostrando a larga e cuidadosa visão do legislador, o seguinte:
Foi por isso, preocupação dominante na elaboração dos presentes diplomas atribuir receitas aos distritos autónomos e fixar-lhes encargos tais que deixassem disponibilidades de modo a permitirem uma obra de fomento, se não grandiosa, ao menos bastante para auxiliar o incremento da riqueza e o melhoramento da economia local, sem que seja necessário implorar continuamente o auxílio do Estado ou recorrer sistematicamente ao crédito.
E, assim, tomou o Estado para si as despesas com a Polícia de Segurança Pública, pelo Decreto-Lei n.º 29 940 de 20 de Setembro passado, embora fique a receber uma subvenção dos distritos do Funchal e de Ponta Delgada, cujo relativo desafogo lhes permite arcar com tal encargo, aumentaram-se ligeiramente as percentagens máximas dos adicionais que podem ser lançados sobre as contribuições gerais do Estado e proporcionaram-se as atribuições e respectivos serviços às forças de cada distrito, de modo que no distrito autónomo da Horta continua dependendo do Governo tudo o que respeita a obras públicas.
Graças a estas providências, todos os distritos autónomos ficam em condições de curar eficazmente das suas necessidades mais urgentes, quer pelo emprego criterioso dos seus meios próprios, quer prestando-se a receber a comparticipação do Estado.
A meditação das palavras que ficam reproduzidas revela com toda a nitidez o alto espírito de equilíbrio de que está informado o Estatuto dos Distrito Autónomos das Ilhas Adjacentes e a própria excelência do regime de descentralização no mesmo estatuto consagrado e cuja vigência é de desejar perdure, mas, feita essa meditação diante das dificuldades do presente, simultaneamente patenteia com luminosa evidência que, afinal, o que é necessário é simplesmente assegurar a subsistência ou efectuar a restauração daquele espírito, em face das actuais circunstâncias, através de adequada revisão do citado estatuto, por forma que o proporcionamento das atribuições e respectivos serviços às forças de cada distrito seja hoje tão verdadeiro e efectivo quanto foi na mente do legislador e na realidade iniciada há vinte anos, a fim de que todos os distritos autónomos estejam e fiquem sempre sem condições de curar eficazmente das suas necessidades mais urgentes », como se escreveu no mencionado relatório.
(Reassumiu a presidência o Sr. Albino dos Reis)
E é este o meu voto e o meu instante pedido ao Governo.
Tal revisão teria flagrante oportunidade aquando da publicação do Código Administrativo reformado, mas teria, com certeza, o mais elevado significado se realizada neste ano do 5.º centenário da morte do Sr. Infante, que foi dono daquelas ilhas de encanto, como que postas por ele entre o velho e o novo mundo, a lembrar ao novo as glórias do velho.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem !
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Vai passar-se à
Ordem do dia
O Sr. Presidente: - (Continua em discussão na especialidade o projecto de lei n.º 27.
Como ontem foi votado o artigo 4.º do projecto de lei, passamos agora à discussão do artigo 5.º, que terá, na nova numeração, o n.º 6.º
Sobre o artigo 4.º há na Mesa uma proposta de aditamento, apresentada pelo Sr. Deputado José Saraiva, e há ainda uma proposta de um artigo 5.º novo, apresentada pelo Sr. Deputado Camilo de Mendonça e outros Srs. Deputados. Parece-me que, para maior brevidade dos nossos trabalhos, será conveniente deixar a discussão daquelas propostas de criação de novos artigos para o final da discussão do projecto de lei.
Passaríamos assim à discussão do artigo 6.º do projecto de lei, que terá o n.º 6.º na nova numeração. Sobre ele há na Mesa uma proposta de substituição, apresentada pelo Sr. Deputado Camilo de Mendonça e outros Srs. Deputados.
Vai ser lido o artigo do projecto de lei e a proposta a que acabo de referir-me.
Foram lidos. São os seguintes:
Art. 5.º Todos aqueles que hajam exercido as funções de Ministro, Secretário ou Subsecretário de Estado ou de governador das províncias ultramarinas não poderão, durante os cinco anos posteriores à exoneração do cargo, exercer quaisquer funções administrativas, executivas, directivas ou fiscais, por escolha ou eleição, nas sociedades, companhias ou empresas abrangidas por esta lei sempre que estas sejam, ou tenham sido, dependentes dos respectivos Ministérios ou governos ultramarinos ou sujeitas à fiscalização dos mesmos.
Proposta de substituição
Propõe-se que o artigo 6.º do projecto de lei seja substituído pelo seguinte:
Art. 6.º Todos aqueles que hajam exercido as funções de Ministro, Secretário, Subsecretário de Estado, governador das províncias ultramarinas ou dirigentes de organismos de coordenação económica não poderão, durante os três anos posteriores à exoneração do cargo, exercer quaisquer funções administrativas, executivas, directivas, consultivas ou fiscais, por escolha da empresa ou eleição, nas sociedades, companhias ou empresas abrangidas por esta lei, sempre que estas sejam ou tenham sido dependentes dos respectivos Ministérios, governos ultramarinos ou organismos de coordenação económicas ou sujeitas à fiscalização dos mesmos.
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§ único. A idêntica incompatibilidade ficam submetidos os funcionários públicos compreendidos nos grupos de A a F referidos no artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 26 115 e dos organismos de coordenação económica equiparáveis.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Abril de 1960. - Os Deputados: Camilo Lemos de Mendonça - António Carlos dos Santos Fernandes Lima - Paulo Cancella do Abreu- Manuel Nunes Fernandes - António Pereira de Meireles Rocha Lacerda - José Monteiro da Rocha Peixoto - António José Rodrigues Prata - António Cortês Lobão - António Calapez Gomes Garcia - João Carlos de Sá Alves.
O Sr. Presidente: - Estão em discussão.
O Sr. Camilo de Mendonça: - Pedi a palavra para explicar as alterações introduzidas no artigo 6.º do projecto de lei pela proposta de substituição que se apresentou e também se sugere passe a ser o artigo 6.º
São de duas ordens essas alterações. A primeira reduz de cinco para três anos a duração da incompatibilidade pretendida. E isto porquê? Forque de três anos é, de facto, o prazo estabelecido noutros diplomas para idênticas incompatibilidades, nomeadamente no Decreto-Lei n.º 40 833 para os administradores por parte do listado ou delegados do Governo poderem ser eleitos para cargos de gerência, em qualquer empresa a que tenham estado ligados. Pareceu, assim, que não deveria neste caso dispor-se diferentemente, por se não ver razão especial para essa diferença- de prazo.
O prazo de cinco anos tinha sido adoptado por similitude com legislações estrangeiras análogas, nomeadamente a francesa, que estabelece, de facto, cinco anos para esta incompatibilidade.
A segunda ordem de alterações refere-se ao alargamento da disposição aos dirigentes dos organismos de coordenação económica e aos funcionários públicos e daqueles organismos de dadas categorias.
Estas são as duas diferenças essenciais entre o projecto de lei e a proposta de substituição.
Todavia, não desejava deixar de anotar, a propósito, que incompatibilidades precisamente como estas são disposições existentes nas legislações dos mais diversos países, mais severas por vezes, nomeadamente na França e na Bélgica, e de destacar que visam apenas a defender as pessoas que exerceram determinadas funções de suspeitas que costumam vicejar em certos ambientes, ainda quando cada um, por conhecimento directo, tenha a garantia bastante para julgar semelhantes suspeitas como de todo infundadas e inadmissíveis, devo manifestar o maior respeito e admiração pelas pessoas concretas e reconheço, mesmo, não serem objectivamente necessárias.
Ao tratar desta questão, não posso também, Sr. Presidente, deixar de acentuar termos, ao longo dos últimos trinta anos, visto passar pelo Poder homens que têm constituído um exemplo de sacrifício da saúde, da vida e da fazenda, um exemplo de dedicação e esforçado labor no serviço do País, um exemplo que faz parte do imenso património moral do Regime. E não devemos deixar de apresentar orgulhosamente esse património, nem de o defender firmemente, já que aceita, sem sombra, de dúvida, paralelo e confronto com os costumes políticos de qualquer outra época na nossa terra, como com os de outros países.
Vejo, com a maior satisfação, nesta Assembleia, algumas dessas personalidades que desde as primeiras horas do Regime o serviram dedicada e sacrificadamente e, desde então, continuaram inteiramente, fiéis ao mesmo ideal de servir, livres de outros compromissos que não os da própria consciência, iguais a si próprios, exemplo de total independência e completa isenção.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Já tive ocasião de, naquela tribuna, prestar homenagem a V. Ex.ª, Sr. Presidente, apresentando-o como exemplo de sacrifício e renúncia, de modéstia isenção, de lealdade e devoção ao Regime e ao seu espírito, a Salazar e á sua exemplaridade, e de evidenciar os altos e constantes serviços por V. Ex.ª prestados ao País.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Igual homenagem desejo hoje prestar ao Prof. Mário de Figueiredo, que, com não menor isenção, sacrifício, devoção e fé, tem servido o Regime e a sua doutrina, Salazar e o seu exemplo, o País e as suas aspirações.
Não cedendo nem transigindo no domínio dos princípios, obedecendo apenas nos imperativos da sua consciência, tem cabido, no decurso de uma longa carreira política, prestar os mais relevantes serviços ao País e ao Regime, mantendo-se sempre igual a si próprio, capaz de se dar inteiramente aos ideais que abraçou e exemplarmente sempre tem servido.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: vejo na minha frente o Sr. Eng. Araújo Correia, também Ministro nos primeiros tempos do Regime, exemplo de sacrifício de uma vida, de total independência e de inteira devoção ao estudo consciencioso e persistente dos problemas portugueses, quando a comodidade das situações se lhe abria com tal facilidade que o mais difícil era recusá-las.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Vejo também o Sr. Doutor Aguedo de Oliveira, Subsecretário de Estado das Finanças nos primeiros tempos e, anos mais tarde, Ministro, outro exemplo de inteira isenção e completa dedicação à causa da Revolução Nacional, que sempre soube servir em todas as emergências, sacrificando tudo quanto se lhe oferecia, exemplo de trabalho probo, de perseverança e renúncia.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Não podia deixar de prestar esta justiça aos nossos governantes, personificando-a em VV. Ex.ª justiça que devo estender a tantos e outros antigos Ministros e aos nos seus colaboradores nas Secretarias e Subsecretárias de Estado, nem de acentuar visar a medida proposta não a evitar situações que a consciência de cada um não consentiria fossem criadas, não a impedir atitudes que nunca tomariam, mas a defender os governantes das suspeições criadas em ambiente malsão, que não respeitam os homens nem o seu labor nesta época de uma economia orientada e de um Estado invasor.
Prestar homenagem ao sacrifício, isenção e labor dos nossos governantes, entendo, repito, ser da mais elementar justiça e dever ser manifestada claramente ao discutir esta proposta, que, sendo objectivamente tão desnecessária como inútil, é porém, justificada em determinadas circunstâncias e, em certos ambientes, conveniente para varrer suspeitas e desfazer estados psicológicos.
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Que a medida defenda o sacrifício comprovado, a isenção demonstrada e a hombridade indiscutida, que nau serão facilmente atingidas em qualquer outro País ...
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - ... e ter-se-á assegurado a consagração dessas virtudes e justificado suficientemente a adopção da proposta.
Disse.
O Sr. Mário de Oliveira: - Sr. Presidente: pedi a palavra para significar expressamente, e de viva voz, o meu apoio à proposta de substituição do Sr. Deputado Camilo de Mendonça, na parte que respeita à sua extensão aos dirigentes dos organismos de coordenação económica, até porque, sendo, como sou, dirigente de um desses organismos, conheço bem a delicadeza política que as funções revestem por terem de lidar directamente com interesses económicos. Por isso devem ser resguardadas de qualquer suspeição.
E era isto que queria dizer, repito, bom expressamente.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, apenas duas palavras para agradecer ao Sr. Deputado Camilo de Mendonça à referência amável que quis fazer no Presidente da Assembleia Nacional, para me associar à justiça que prestou a alguns antigos Ministros que viu aqui presentes e para acrescentar, meus senhores, que igual manifestação de justiça, graças a Deus, pode ser prestada a tantos e tantos que têm servido o País nos altos postos do Estado.
Felizmente, ao longo da vida do Regime, e neste momento, ainda há quem considere como maior título de orgulho o servir a sua Pátria com isenção nos postos superiores da administração pública.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Sr. Presidente: - É justa que esses serviços sejam reconhecidos, mas seria lamentável que, efectivamente, não se considerasse como a maior honra para um homem público atingir os altos cumes da hierarquia política e servir aí dedicadamente o País.
O bom exemplo, aliás, vem-nos de muito alto!
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Sr. Presidente: - Continua em discussão.
Pausa.
O Sr. Presidente: -Se mais nenhum Sr. Deputado deseja fazer uso da palavra, vai passar-se à votação da proposta do Sr. Deputado Camilo de Mendonça relativa ao artigo 5.º, que passará a figurar como artigo 6.º
Submetida a votação, foi aprovada.
O Sr. Presidente: - Ponho agora em discussão o artigo 6.º do projecto de lei, sobre o qual há na Mesa uma proposta apresentada pelo Sr. Deputado Camilo de Mendonça e outros Srs. Deputados. Vão ler-se.
Foram lidas. São os seguintes:
Art. 6.º Exceptuam-se do disposto nesta lei os representantes eleitos de organizações económicas estrangeiras, quando não tenham a nacionalidade portuguesa de origem, em todos os casos em que o Conselho de Ministros, em despacho fundamentado, considere a participação dessas organizações de muito interesses para o desenvolvimento económico do País.
Proposta de substituição
Propõe-se que o artigo 6.º do projecto de lei seja substituído pelo seguinte:
Art. 7.º Exceptuam-se do disposto nesta lei ou representantes eleitos de organizações económicas estrangeiras, quando não tenham a nacionalidade portuguesa.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Abril de 1960. - Os Deputados: Camilo Lemos de Mendonça- - António Carlos dos Santos Fernandes Lima - Paulo Cancella de Abreu - Manuel Nunes Fernandes - António Pereira de Meireles Rocha Lacerda - José Monteiro da Rocha Peixoto - António José Rodrigues Prata - António Cortês Lobão - António Calapez Gomes Garcia - João Carlos de Sá Alces.
O Sr. Presidente: - Está em discussão.
O Sr. Camilo de Mendonça: - Sr. Presidente: só um brevíssimo esclarecimento. A intenção do artigo 6.º do projecto de lei, agora artigo 7.º, é a de não criar quaisquer dificuldades ao a fluxo de capitais estrangeiros, pelas restrições ao nosso nível dos seus representantes, capitais que se dispuseram a contribuir para o desenvolvimento e progresso do País. Pareceu, porém, ser desnecessária a pormenorização da última parte do corpo do artigo e, consequentemente, a alteração proposta visa a manter o mesmo princípio, desligando-o da enumeração do condicionalismo dispensável que só provia na redacção inicial.
O Sr. Carlos Moreira: - Não sei se V. Ex.ª atentou numa outra faceta do problema: assim os estrangeiros passam a ter situação de privilégio em relação aos nacionais.
O Orador: - Eu esclareço. Tal como nenhum de nós iria facilmente nas mesmas condições em que trabalha na sua terra prestar o concurso do seu trabalho noutra, nomeadamente só tivesse apenas um fim lucrativo e a intenção de regressar à sua terra, o problema põe-se, inversamente, nos mesmos termos.
Por sobre tudo tem-se um vista facilitar tudo quanto possa contribuir para o desenvolvimento do País, reconhecer que a vinda de capitais estrangeiros pode ter a maior importância para esse desenvolvimento, e admite-se que o nível de vida nesses países é diferente do nosso, além de se pesar o sacrifício, repito, da emigração temporária.
O Sr. Carlos Moreira: - Muito obrigado, mas continuo com as minhas razões.
O Sr. Presidente: - Continua em discussão.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Se mais nenhum dos Srs. Deputados deseja usar da palavra, vai votar-se a proposta do Sr. Deputado Camilo do Mendonça.
Submetida à votação, foi aprovada.
O Sr. Presidente: - Ponho agora em discussão o artigo 7.º do projecto, sobre o qual há na Mesa uma
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proposta de substituição apresentada pelo Sr. Deputado Camilo de Mendonça e outros Srs. Deputados.
Vão ler-se.
Foram lidos. São os seguintes.
Art. 7.º Para todos os efeitos desta lei, consideram-se os serviços autónomos, os organismos corporativos ou de coordenação económica, bem como as instituições de previdência e os capitais de qualquer deles, equiparados, respectivamente, ao Estado ou a capitais do Estado.
Proposta de substituição
Propõe-se que o artigo 7.º do projecto de lei seja substituído pelo seguinte:
Art. 8.º Para todos os efeitos desta lei, consideram-se os estabelecimentos do Estado, os organismos corporativos ou de coordenação económica, bem como os corpos administrativos e as instituições de previdência social e os capitais de qualquer deles, equiparados, respectivamente, ao Estado ou a capitais do Estado.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Abril de 1960. - Os Deputados: Camilo Lemos de Mendonça - António Carlos dos Santos Fernandes Lima - Paulo Cancella de Abreu - Artur Aguedo de Oliveira - António José Rodrigues Prata - João Carlos de Sá Alves - Afonso Augusto Pinto-Manuel Nunes Fernandes - António Pereira de Meireles Rocha Lacerda - António Cortêz Lobão.
O Sr. Camilo de Mendonça: - A alterarão neste artigo é muito simples, é de pormenor.
Substituiu-se a expressão «serviços autónomos», que se prestaria a interpretações divergentes, por «estabelecimentos do Estado», até por ser esta a que consta de outros artigos, e incluíram-se também os corpos administrativos na enumeração das entidades que são equiparadas ao Estado, como se recomendara no parecer e parecia indispensável.
O Sr. Presidente: - Continua em discussão.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Se mais nenhum Sr. Deputado deseja usar da palavra, vai votar-se.
Submetida à votação, foi aprovada.
O Sr. Presidente: - Passamos agora à discussão do artigo 8.º do projecto.
Sobre este artigo há na Mesa uma proposta de substituição do Sr. Deputado Camilo de Mendonça.
Vão ser lidos o artigo e a proposta de substituição.
Foram lidos. São os seguintes:
Art. 8.º São revogados o artigo 27.º do Decreto-Lei n.º 26 115 e o § 1.º do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 40 833, bem como todas as leis especiais que disponham diferentemente.
Proposta de substituição
Propõe-se que o artigo 8.º do projecto de lei seja substituído pelo seguinte:
Art. 10.º São revogados o artigo 27.º do Decreto-Lei n.º 26115 e o § 1.º do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 40 833, bem como todas as leis que disponham diferentemente do estabelecido nesta lei.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Abril de 1960. - Os Deputados: Camilo Lemos de Mendonça - António Carlos dos Santos Fernandes Lima - Paulo Cancella de Abreu - Artur Aguedo de Oliveira - António José Rodrigues Prata - João Carlos de Sá Alves - Afonso Augusto Pinto - Manuel Nunes Fernandes - António Pereira de Meireles Rocha Lacerda - António Cortês Lobão.
O Sr. Camilo de Mendonça: - Sr. Presidente: a alteração é de mera redacção.
O Sr. Presidente: - Vai votar-se.
Submetida à votação, foi aprovada.
O Sr. Presidente: - Vai passar-se à discussão do artigo 9.º, sobre o qual há na Mesa uma proposta de substituição, que vai ser lida juntamente com aquele artigo.
Foram lidos. São os seguintes:
Art. 9.º Esta lei aplica-se:
a) Quanto aos vencimentos fixos, desde o mês imediato ao da sua publicação;
b) Quanto às demais retribuições, desde o começo do ano social em curso naquela data.
Proposta de substituição
Propõe-se que o artigo 9.º do projecto de lei seja substituído pulo seguinte:
Art. 11.º Esta lei entra em vigor:
a) Quanto aos vencimentos, desde o mês imediato ao da sua publicação;
b) Quanto ao mais que dispõe, decorridos 30 dias sobre a mesma publicação.
§ único. A aplicação imediata da presente lei, nos termos deste artigo, às sociedades, companhias ou empresas por ela abrangidas não é prejudicada pela circunstância de à data da sua promulgação terem estatutos homologados pelo Governo ou contratos celebrados com o Estado donde resulte possibilidade de se verificarem situações em desconformidade com o que nela se dispõe.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Abril de 1960. - Os Deputados: Camilo Lemos de Mendonça -- António Carlos dos Santos Fernandes Lima - Paulo Cancella de Abreu - Artur Aguada de Oliveira - António José Rodrigues Prata - João Caricia da Sá Alves - Afonso Augusto Pinto - Manuel Nunes Fernandes - António Pereira de Meireles Rocha Lacerda - António Cortês Lobão.
O Sr. Presidente: - Está em discussão.
O Sr. Carlos Lima: - No projecto do Sr. Deputado Camilo de Mendonça regulava-se em determinados termos o momento da entrada em vigor da lei em que viesse a transformar-se.
Afigurou-se que, em relação a certos casos, o texto inicial era redundante, por se limitar a consignar aquilo que já resultava dos princípios sobre aplicação das leis no tempo, podendo, além disso, suscitar aten-
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díveis dificuldades na sua execução, o que poderia repercutir-se na eficiência desta.
Julgou-se, por isso, que, podendo manter-se a disposição, convinha, no entanto, introduzir-lhe algumas modificações.
Assim, tendo em conta que, para efeitos do limite legal das remunerações fixado no artigo 1.º, há que considerar tanto a sua parte fixa como a variável, pareceu que devia suprimir-se na alínea a) do texto inicial a expressão «fixos», dizendo-se simplesmente que, no que respeita a vencimentos, a lei entrará em vigor no moa seguinte ao da sua publicação.
Por outro lado. desaparecido por tal modo o conteúdo inicial da alínea b), pensou-se que nela se podia estabelecer, como estabeleceu, o princípio de que as demais disposições da lei entrariam em vigor decorridos 30 dias sobre a sua publicação.
Além do mais, afigurou-se ser tal prazo o razoável para permitir aos interessados harmonizar com o disposto na lei situações actualmente existentes em desconformidade com ela, mormente no que respeita a acumulações.
Finalmente, pareceu que convinha acrescentar o que consta do novo § único, embora se deva entender que o que nele se dispõe já resultava dos princípios da teoria da aplicarão das leis no tempo.
Tenho dito.
O Sr. Presidente : - Continua em discussão.
Pausa.
O Sr. Presidente : - Se mais nenhum Sr. Deputado deseja fazer uso da palavra, vai votar-se a substituição do artigo 9.º do projecto pela proposta do Sr. Deputado Camilo de Mendonça e outros Srs. Deputados.
Submetida à votação, foi aprovada.
O Sr. Presidente: - Conforme disse ao iniciar hoje os nossos trabalhos sobre a discussão na especialidade, neste projecto há ainda dois artigos avulsos que têm de ser apreciados. Há uma proposta pura um novo artigo 4.º, apresentada pelo Sr. Deputado José Saraiva durante a discussão na generalidade. Há também uma proposta para um novo artigo 5.º. sugerida pelo Sr. Deputado Camilo de Mendonça e outros Srs. Deputados.
Na ordem da apresentação dessas propostas, passamos a considerar a do Sr. Deputado José Saraiva, que vai ser lida na Mesa.
Foi lida. É a seguinte:
Proposta de aditamento no projecto de lei n.º 27
Proponho que ao projecto de lei n.º 27 seja aditado o seguinte:
Artigo 4.º
As participações dos corpos gerentes nos lucros das empresas a que se referem os artigos 1. e 2.º do presente diploma ficam dependentes da atribuição de idêntico benefício ao pessoal em serviço nas mesmas, pela forma e na. medida consideradas socialmente justas.
Lisboa, 22 de Abril de 1960. - O Deputado, José H Hermano Saraiva .
O Sr. Presidente : - Está em discussão.
O Sr. José Saraiva : - Sr. Presidente : poderei ser extremamente breve na justificação desta proposta, porquanto, além de que já demoradamente a fundamentei na minha intervenção na generalidade, acontece que o princípio nela implícito se acha já nesta altura aprovado por uma das disposições precedentemente votadas pela Assembleia. A matéria contida na disposição proposta é esta: naqueles casos em que se entenda que é justo remunerar o trabalho dos corpos gerentes com uma participação nos Lucros do exercício social deverá estender-se benefício idêntico a todos quantos cooperaram no labor da empresa. É, como W. Ex.ª sabem, doutrina que foi sugerida pela Câmara Corporativa e que constituía o essencial de uma das bases que vinham propostas no seu contra projecto.
Como já disse, ao votar-se uma das disposições que preenchem o diploma que acabámos agora de discutir, a Assembleia aprovou texto cujo sentido é o de que o limite fixado só podia ser transposto quando se verificassem determinadas circunstâncias, entre elas a de todos os trabalhadores da empresa terem participação nos lucros.
Quer isto dizer que essa questão da participação de todos os elementos humanos nos lucros da empresa constitui já caso julgado, não interessando voltar agora a discuti-la. É coisa decidida, e penso que bem decidida.
Poderá dizer-se que a matéria da minha proposta perdeu, pois, a maior parte do seu interesse. Há certa razão na observação, mas creio que ela não retira completamente à proposta uma esfera de aplicação própria. A participação deverá ter lugar, penso eu, não apenas naqueles casos em que o limite de vencimentos seja excedido nos termos desta lei, mas em todos aqueles em que os corpos gerentes participem nos lucros sociais. E isto em virtude da própria intenção social da medida, que é a de estreitar as relações humanas dentro do seio da empresa.
Recordo-mo de que numa intervenção a propósito do aditamento ao artigo 1.º se disse que, não obstante a simpatia da ideia da participarão, esta suscitava alguma apreensão no que se refere à possibilidade de a mesma vir diminuir os lucros reservados para dividendos. Receio que isso signifique que se permanece na posição de pôr o assunto dentro da ordem económica, quando é certo que este problema, muito antigo na preocupação dos sociólogos e economistas, reveste presentemente interesse como método de acção social, e não como procedimento económico.
Sob o ponto de vista económico, o que remunera o trabalho é o salário, e aqueles antigos e generosos propugnadores da ideia da participação, que viam nesta um complemento ao salário injusto, deslocavam em pura perda o essencial da questão: ou o salário é justo, e não tem de ser completado, ou é injusto, e tem de ser corrigido.
A questão que hoje se põe, e a razão por que em todos os países o problema reverdeceu em nova actualidade, é não de dar uma subvenção de carácter económico, mas estabelecer um novo vínculo que prenda o trabalhador à empresa, como membro da grande família que tende para o labor comum, terminar com a ideia do trabalho como coisa forcada e odiosa e poder, enfim, restabelecer aquele nível de indissociável harmonia que tem sido reconhecido como um dos factores dominantes da produtividade das empresas.
Este é um problema que se infere do conjunto mais amplo da questão da reforma da empresa. Manifestamente o não resolve; mas, por mais longas que sejam as estradas a percorrer, nunca é inútil dar nelas o passo inicial.
E a intenção que preside à proposta agora em exame ó a de constituir um passo no longo caminho que conduzirá àqueles resultados que estão na essência do pen-
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samento social do Regime, claramente afirmado em textos legais e noutros que já na discussão da generalidade relembrei.
Aliás, a ideia de se interessar todo o elemento produtivo no resultado final, de fazer sentir que os lucros apurados no exercício exprimem o somatório de muitos esforços individuais, e que, por isso mesmo, todos são chamados, como numa grande mesa de comunhão, à participação no corpo dos lucros da empresa, não é coisa desconhecida em Portugal; ela vai sendo praticada em algumas empresas, e de forma alguma isto consiste numa inovação.
Tenho conhecimento de que em alguns casos, e sob formas diversas, que, todavia, há conveniência em disciplinar, essa participação já está a ser considerada.
Há um exemplo, do qual se deu público conhecimento pelos jornais, de uma grande empresa que já distribui pelo seu pessoal uma percentagem de lucros que se aproxima dos 13 por cento, valor muito elevado nestas comparticipações, e que, por isso, considero que será justo sublinhar com uma palavra de incentivo e de aplauso. Trata-se da Companhia do Açúcar de Angola, empresa onde, aliás, suponho que não conheço ninguém. Esse desconhecimento é, porém, o que me autoriza a deixar esta breve referência no assunto.
Poderia dizer-se que, tal como vem proposta, a medida teve o carácter de uma recomendação, de uma instância vaga, por isso que se diz que a participação nos lucros se fará sempre que os corpos gerentes neles participem, e nisto se usa a própria redacção da Câmara Corporativa. É talvez um defeito, mas foi a reflectida, prudência que assim o aconselhou. Penso que nesta matéria das empresas não se deve proceder com minúcias discricionárias, porque as características são muito diferentes de caso para caso, e há que respeitar a individualidade de organizações produtivas, cujos problemas, por vezes, se não podem resolver de fora, mas o que importa, dar é o primeiro passo em relação a uma meta que não tardará a ser atingida, e à qual, tenho a certeza, outras novas realizações se vão seguir.
Tenho dito.
O Sr. Amaral Neto: - Sr. Presidente: a formosa intenção do Sr. Deputado Dr. José Saraiva e a bela forma literária com que acaba de a justificar começaram por me dar o receio de ter parecido à Assembleia um tanto ou quanto sórdido, se não mesquinho, o apontamento que fiz há dias, de que, na vida das empresas, também o capital precisa de ser retribuído e respeitado.
Não acompanharei o Sr. Dr. José Saraiva nas suas considerações, porque me falta talento e informarão, mas a escassez da informação não é tanta que não possa dizer que o problema da participação dos operários nos lucros das empresas oferece os maiores melindres, até mesmo porque há que os convencer de que quando lhes é concedida é na medida, justa.
A desconfiança desta justiça de medida poderá vir a criar dificuldades às empresas, especialmente quando é preciso reintegrar fundos, constituir reservas, etc., que apareçam no espírito dos operários como restrições da sua parte.
Mas, felizmente, o Sr. Dr. José Saraiva pôs a sua proposta em termos tão gerais que quase a situou no domínio do ideal, e nesse ideal não tenho a menor dúvida de acompanhar os seus desejos e dar-lhe o meu voto, se os autores do projecto de lei, melhor conhecedores da sua economia, me demonstrarem primeiro que a introdução de uma disposição que carece de ser regulamentada não será factor de atraso para a aplicação das restantes medidas.
Tenho dito.
O Sr. Camilo de Mendonça: - Sr. Presidente: pedi a palavra, primeiro, para responder à pergunta do Sr. Deputado Amaral Neto.
É evidente que a adopção da proposta do Sr. Dr. José Saraiva não traz qualquer inconveniente à economia do projecto. Não afecta as suas disposições, não as prejudica, nem as beneficia; constitui outra matéria, se bem que importante.
Em segundo lugar, para me referir ao problema propriamente dito. Evidentemente que com o princípio tenho de estar de acordo de uma forma total. Há, porém, uma preocupação importante que não posso deixar de evidenciar: a participação dos operários nos lucros das empresas constitui um problema candente em todo o Mundo e, como o Sr. Dr. José Saraiva acentuou, um dos aspectos de um problema mais vasto, o da reforma da empresa. Tem, de resto, a maior utilidade considerar o problema no conjunto das várias soluções que estão sendo adoptadas em vários países e segundo os diferentes ramos das actividades.
Tem-se visto, no domínio positivo, que, a participação nos lucros tem interesse, é real, é significativa, quando se trata de empresas industriais com alto grau de mecanização, quer dizer, de empresas em que o número de trabalhadores é escasso em relação ao capital fixo e aos lucros da empresa. Não conduz a quase nada em empresas do tipo dos serviços, actividades chamadas do terciário, em que o número de empregados é muito grande em relação ao produto final a repartir, Para estas, cedo se viu que a solução não podia ser a participação nos lucros e que qualquer gratificação habitual do fim do ano podia representar mais do que esta participação. Esta faceta tem tido, por vezes, como consequência, parecer a participação uma frustração aos olhos do operário a quem se concede. É claro, nos sectores de fraca mecanização ou grande número de trabalhadores em relação no produto ao empresa.
O Sr. Amaral Neto:-Muito bem!
O Orador: - Por isso se tem enveredado, em certas situações dessas, lá fora, por dois caminhos diversos: um, de comissões da empresa ou de jurados da empresa, que até na nossa vizinha Espanha já existem, diga-se que quase sempre com também bem poucos resultados: o outro, o da participação na própria administração.
Mostra também a experiência que, frequentemente, quando se decretou a participação, e sob qualquer das formas referidas, os resultados não foram brilhantes, e apenas quando, por meios indirectos, se propiciou às empresas esse caminho, com a contrapartida de dados benefícios ou concessões, se entrou francamente no domínio positivo.
Devo esclarecer, Sr. Presidente, que o caso da Alemanha, muito falado, é bastante diferente dos restantes, porquanto aí operaram-se, transformações económicas paralelas, em consequência das vicissitudes de certos industriais, imposições dos vencedores e até da reentrega do comando económico outra vez ao povo alemão.
Mas, dizia eu, Sr. Presidente, que só quando a solução adoptada o foi por forma indirecta, de sorte que veio a ser adoptada por opção da empresa - a empresa que conceder participação dos seus empregados nos lucros, em conselhos sociais, na administração, terá o direito consequente a constituir caixa de previdência da própria empresa, de beneficiar de determinadas deduções fiscais, etc. - só nessas condições è que nesta matéria se entrou no domínio de efectiva aplicação destes princípios, tornados social e psicologicamente operosos. Não aceito, porém, a objecção corrente de que não temos nem mentalidade nem nível económico adequado para tentar essa experiência. Recordo-me, a propósito, da
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uma série notável de artigos escritos numa revista de doutrina económica e social, o Fomento Social, revista dos jesuítas espanhóis, onde, a esse propósito, se conclui não ser licita a argumentação da falta de mentalidade, que não pode haver enquanto se não criar pela própria experiência; sem experimentar não pode haver experiência.
Não podem estar os empregados preparados sem primeiro se prepararem, utilizando a experiência.
Seja como for, Sr. Presidente, alheámo-nos e saímos do ambiente do que se está a discutir. Em relação ao propósito, não posso deixar de dar a minha inteira concordância. Tenho, porém, medo da fórmula genérica por que a questão está posta e da dificuldade extraordinária que há em destrinçar aqui o modo de aplicar, conforme o grau de produtividade das empresas, etc., que pode constituir uma frustração do princípio que não pode deixar de ser concebido e apoiado pela inteligência e pelo coração de cada um de nós.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Sr. Carlos Lima: - Sr. Presidente: não pretendo envolver-me em considerações de pormenor sobre a discussão em aberto. Pretendo tão sòmente ordenar questões para meu próprio esclarecimento.
A proposta do Sr. Deputado José Saraiva suscita duas questões fundamentais. Uma questão de fundo: é ou não de admitir o princípio da participação dos operários nos lucros, nos termos consagrados na proposta. E uma questão de ordem técnica: ajusta-se bem à mesma proposta à economia, teor geral e limites do projecto de lei em discussão?
Quanto à primeira questão - a de fundo -, não tenho qualquer dúvida de que o princípio é bom, e, por isso, a ele adiro sem a mais ligeira hesitação.
Quanto à segunda questão - a de ordem técnica , tenho de reconhecer que o mesmo princípio se não ajusta perfeitamente adentro da economia e âmbito do projecto.
No entanto, porque a deficiência de ordem técnica resultante da inclusão do princípio na lei não tem como argumento um mínimo de valor atendível, mormente em face do profundo significado do princípio, darei a minha aprovação à proposta do Sr. Deputado José Saraiva.
Aliás, esta posição já resultava das considerações que fiz no debate na generalidade.
Posto isto, quero acentuar o que segue.
Vê-se ter sido o projecto de lei concebido e gizado com a preocupação de que a lei em que viesse a transformar-se fosse exequível por si, imediatamente, sem necessidade de qualquer outra regulamentação
Ora, pode pretender-se que a proposta do Sr. Deputado José Saraiva, tal como está formulada, não é exequível por si, pressupondo antes adequada regulamentação.
Todavia, a entender-se assim, é claro que isso em nada prejudica a execução imediata das restantes disposições da lei.
A meu ver, constitui esta afirmação a própria evidência.
Tudo, pois, me conduz a votar a proposta em discussão.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Sr. Presidente: - Continua em discussão.
O Sr. Melo Machado: - Sr. Presidente: a proposta do Sr. Deputado José Saraiva apresenta-me algumas dúvidas quanto à sua execução. Elas, aliás, foram já expostas e ditas com tanta proficiência pelos oradores que me antecederam que não valerá muito a pena estar a insistir nelas. Pode mesmo acontecer que nas empresas de pessoal muito numeroso aquilo que se viesse a distribuir fosse até um motivo de descontentamento, em lugar de ser um motivo de contentamento. Porventura aconteceria aquilo que se conta da história de um milionário que, interpolado por um cidadão sobre a afronta que constituía a sua fortuna, respondeu: «Está bem, a minha fortuna é de tanto, são tantos os habitantes, cabem-lhe tantos cêntimos; aqui está a sua parte, não vale a pena insistir mais» Isso poderá suceder com empresas de muito pessoal, em que aquilo que cada um virá a receber será tão insignificante que daí resultará mais um motivo de crítica do que e aplauso. De resto, foi aqui aprovado um aditamento ao artigo 1.º em que mais ou menos se fala nesse princípio.
Leu.
Parece-me que o princípio já estava atendido e não valeria a pena reincidir nele, com os inconvenientes vários que, aliás, foram apontados.
Tenho dito.
O Sr. José Saraiva: - Sr. Presidente: não se pode negar procedência a algumas das considerações que acabei de ouvir. Alegro-me por ter havido unanimidade quanto à existência do princípio. Só alguns reparos terei ainda a fazer. Ouvi as considerações expendidas pelo Sr. Eng.º Camilo de Mendonça, e, como esta desassombrada maneira que tenho de sempre dizer radicalmente a verdade, não esconderei que elas me pareceram deslocadas na ordem lógica do debate. Penso que a sua oportunidade teria sido a do debate na especialidade do aditamento ao artigo 1.º, visto que nessa altura se aprovou o princípio da participação; todas as objecções ao teor do princípio, parece-me, deveriam ter sido então deduzidas.
Quanto ao mais, louvo a erudição das razões apontadas; mas penso que não poderemos continuar a recorrer à bula da grande complicação das coisas como desobriga de dar os passos mais simples na sua resolução. E evidente que não se pode entrar por um caminho sem fazer os primeiros ensaios, e é temerário, num país que não tem, por ora, em matéria social, suficiente experiência, vir com doutrinas de pormenor, que podem comprometer as melhores intenções.
Quanto à objecção de que, com este aditamento ao corpo da lei, se lhe compromete a unidade e se lhe pode frustrar a imediata eficácia, não deixo de sopesar o peso do argumento. Mas também pondero que o mesmo se poderia ter dito, e se não disse, da participação prevista no aditamento ao artigo 1.º
O Orador: - Disse-se que tècnicamente suscita dificuldades quanto à sua exequibilidade ...
O Sr. Carlos Lima: - Eu não disse que a proposta suscitava dificuldades. Disse que apoiava a proposta, e acresceitei, porque me pareceu conveniente, que algumas dificuldades a que se poderia aludir não eram na realidade dificuldades.
O Orador: - Disse-se que em vários casos de empresas de certos sectores a medida pode trazer alguns prejuízos. Com certeza que pode, mas pergunto: e quem conhece, melhor as características de cada empresa? Não são os gerentes que a conduzem? Por isso só se
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torna a medida obrigatória quando os próprios gerentes participem nos lucros: eles poderão, um nome do interesse geral, não dividir lucros, mas terão de comungar no sacrifício.
Mais do que um interesse de carácter económico, mais do que uma directriz de ordem social, procuro vincar uma séria preocupação essencialmente moral. O que não me parece justo é que, no seio das empresas, o produto do trabalho, que é comum, venha a cair, em prebendas pingues, nas mãos só de alguns, quando o resultado alcançado se deve a todos.
O Sr. Carlos Moreira: - Não quero saber disso, porque tal não me interessa. O princípio da participação em lucros foi estabelecido, embora limitadamente, numa proposta do Sr. Deputado Tarujo de Almeida. V. Ex.ª, em vez de apresentar um artigo novo, fazia uma intervenção que não fosse serôdia e então tratava do assunto.
O Orador: - Mas há que reconhecer que este objectivo, a que ninguém negaria adesão, já está em grande parte atingido pelo disposto no aditamento ao artigo 1.º
O Sr. Paulo Cancella de Abreu: - Eu pedia a V. Ex.ª que me esclarecesse sobre o problema posto pelo Sr. Eng.º Amaral Neto.
Não pode a proposta de V. Ex.ª ter o grave inconveniente de servir de pretexto - digo «pretexto», e não «razão»- para que se diga que a lei tem de ser regulamentada?
O Orador: - Inclino-me a provar que não pode, porque a disposição diz unicamente que quando os gerentes participarem nos lucros as empresas têm de dar também participação nos lucros aos empregados. Isto é simples, claro, e não vejo que careça de regulamentação.
O assunto terá, em todo o caso, de ser muito seriamente ponderado, e declaro já que, por minha parte, não quereria dificultar ou suscitar pretextos para dificuldades na execução da lei a cujo nascimento acabamos de assistir, mas não creio que esse perigo exista.
Tenho dito.
O Sr. Amaral Neto: - Sr. Presidente: pus a dúvida de a aprovação do novo artigo proposto pelo Sr. Deputado José Saraiva poder atrasar o efeito dos demais, na expectativa da regulamentação de que será o único a carecer.
Vários espíritos familiarizados com as práticas jurídicas nos disseram que o pretexto não pode ser invocado. Mas eu continuo a perguntar: e se for invocado, como podemos obstar a isso?
Eu, repito, estou disposto a votar como o principal autor do projecto, e, portanto, se ele não vê esta espécie de perigo na proposta do Sr. Dr. José Saraiva, aprová-la-ei também.
Quanto ao mais, move-me, como a nós todos os que vimos vir com satisfação e votámos com convicção o projecto do Sr. Deputado Camilo de Mendonça, o desejo de evitar as colusões da política com o capital; não obstante, muitos de nós, decerto, não veríamos com satisfação que com este pretexto se negasse ao capital o seu justo papel na vida económica e o direito a retribuição, também, por ele.
Talvez seja banalidade de palavras, mas não deixa de vir a propósito lembrar que o capital vem também do trabalho; afinal, é trabalho cristalizado em economias e valorizado pela prudência - portanto, há que respeitá-lo, enquanto respeitável. E não digo mais.
O Sr. Presidente : - Interrompo a sessão por uns minutos.
Eram 10 horas e 5 minutos.
O Sr. Presidente : - Está reaberta a sessão.
Eram 10 horas e 15 minutos.
O Sr. José Saraiva : - Sr. Presidente : um debate há-de por força ter alguma utilidade, e essa utilidade reside na permuta das razões, na transmissão das apreensões que a cada um pode inspirar o mérito ou demérito das soluções que porventura à inteligência própria se apresentem mais fecundas.
Do rumo tomado por esta discussão pareceu-me, pois, que é entendimento desta Câmara que o essencial da proposta de aditamento por mim subscrita já está claramente afirmado no texto da lei e que o aflorai em termos de generalidade poderia suscitar embaraços futuros e trazer algum impedimento à rápida e efectiva aplicação de um conjunto de medidas de cuja eficácia todos muito esperamos.
Estas apreensões, que vejo suscitadas no espírito de tantos dos meus dignos pares, por força hão-de ter algum fundamento. E eu, que entro nas discussões muito menos para convencer que para me elucidar, não receio nunca sair delas convencido.
Neste cago, persuado-me de que o essencial do meu intuito se realiza através da participação nos lucros já estabelecida no texto anteriormente aprovado; é a clara afirmação do princípio, e é também a sua aplicação efectiva no domínio que mais importaria considerar.
E por isso mesmo peço a V. Ex.ª autorização para retirar a minha proposta, visto que a sua matéria já está afirmada no diploma, substituindo-a por uma moção em cujos termos se tem em vista ampliar e classificar o sentido da disposição votada e em que se alude precisamente ao facto de este princípio já ter sido votado, o que vem prejudicar a proposta em discussão, mas onde também se pondera que o interesse social da participação dos trabalhadores nos lucros, de resto já afirmado no artigo 36.º da Constituição e em disposição expressa do Estatuto do Trabalho Nacional, é tão grande que justifica que se entre pelo caminho de uma regulamentação mais efectiva, em vista à amplitude da sua eficácia legal. Os termos desta moção serão lidos na Mesa, e por isso me limitei a dar ideia geral do seu teor.
Tenho dito.
Vozes : - Muito bem !
O Sr. Presidente : - Consulto a Câmara sobre a retirada da proposta do Sr. Deputado José Saraiva.
Consultada a Assembleia, foi concedida autorização.
O Sr. Presidente : - Ponho agora em discussão o artigo 5.º novo, proposto pelo Sr. Deputado Camilo de Mendonça e outros Srs. Deputados. Vai ler-se.
Foi lido. É o seguinte:
Proposta de aditamento
Propõe-se que seja aditado ao projecto de lei um artigo novo, nos termos seguintes:
Art. 5.º A remuneração correspondente ao exercício por uma empresa abrangida por esta lei de cargos em corpos gerentes de outra empresa constitui obrigatoriamente receita da empresa sócia.
§ único. A pessoa ou pessoas que, nos casos abrangidos por este artigo, exercerem a representação da
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empresa sócia, desde que façam parte dos corpos gerentes desta, não pode ser abonada por qualquer das empresas seja que quantia for a título de tal representação.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Abril de 1960. - Os Deputados: Camilo Lemos de Mendonça - António Carlos dos Santos Fernandes Lima - Paulo Cancella de Abreu- - Manuel Nunes Fernandes - António Pereira de Meireles Rocha Lacerda - José Monteiro da Rocha Peixoto - Afonso Augusto Pinto - João Carlos de Sá Alves - António Calapez Gomes Garcia- Carlos Monteiro do Amaral Neto.
O Sr. Presidente: - Está em discussão.
O Sr. Camilo de Mendonça: - Sr. Presidente: esta disposição que se propõe é sugerida pela Câmara Corporativa; apenas se lhe alterou a redacção, que não era feliz, para a tornar mais clara.
Creio que este princípio é geralmente praticado. Todavia, têm-se levantado por vezes dúvidas ou questões a este respeito, e nada repugna que, no regulamentar matéria conexa com esta, também este princípio fique inteiramente precisado.
Tenho dito.
O Sr. Presidente: Continua em discussão.
Pausa
O Sr. Presidente: - Se mais nenhum Sr. Deputado deseja usar da palavra, vai votar-se este artigo 5.º novo, proposto pelo Sr. Deputado Camilo de Mendonça.
Submetido à votação, foi aprovado.
O Sr. Presidente: - Está na Mesa a moção anunciada pelo Sr. Deputado José Saraiva. Vai ser lida.
Foi lida. É a seguinte:
Moção
Considerando que o princípio da participação do pessoal das empresas nos lucros das mesmas já foi adoptado pela Assembleia na aprovação dada ao aditamento ao artigo 1.º do projecto em discussão, o que prejudica a proposta no mesmo sentido apresentada, e considerando igualmente o alcance social daquela Participação, a Assembleia Nacional exprime o voto que, no prosseguimento de uma directriz já afirmada no artigo 30.º da Constituição e também no Estatuto do Trabalho Nacional, se preste ao problema toda a atenção que ele justifica e requer, traduzindo-se em regulamentação concreta, socialmente útil e produtiva aquele mesmo princípio.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 28 de Abril de 1960. - O Deputado, José Hermano Saraiva.
O Sr. Presidente:- Está em discussão.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Se nenhum Sr. Deputado deseja usar da palavra, vai votar-se esta moção.
Submetida à votação, foi aprovada.
O Sr. Presidente: - Está assim concluída a discussão e votação do projecto de lei do Sr. Deputado Camilo de Mendonça.
Amanhã haverá sessão, à hora regimental, tendo por ordem do dia a discussão das Contas Gerais do Estado, da metrópole e das províncias ultramarinas, e as da Junta do Crédito Público referentes ao ano de 1958.
Está encerrada a sessão.
Eram 20 horas.
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Agostinho Gonçalves Gomes.
Alfredo Rodrigues dos Santos Júnior.
Américo da Costa Ramalho.
Antão Santos da Cunha.
Belchior Cardoso da Costa.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Fernando António Muñoz de Oliveira.
Henrique dos Santos Tenreiro.
João Cerveira Pinto.
João Maria Porto.
Joaquim Mendes do Amaral.
José Soares da Fonseca.
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel Maria Sarmento Rodrigues.
D. Maria Irene Leite da Costa.
Mário de Figueiredo.
Ramiro Machado Valadão.
Tito Castelo Branco Arantes.
O REDACTOR - Luís de Avillez.
IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA