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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 185

ANO DE 1960 16 DE DEZEMBRO

ASSEMBLEIA NACIONAL

VII LEGISLATURA

SESSÃO N.º 185, EM 15 DE DEZEMBRO

Presidente: Exmo. Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior

Secretários: Exmos. Srs.
Fernando Cid Oliveira Proença
António José Rodrigues Prata

Nota. - Fui publicado num suplemento ao Diário das Sessões n.º 178, inscrindo o relatório das contas de gerência e exercício das províncias ultramarinas de 1959.

SUMARIO: - O Sr. Presidente declara aberta a sessão às 16 horas e 15 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente.
O Sr. Deputado Silva Mendes exaltou a acção do Sr. Deputado Jorge Jardim quando dos primeiros acontecimentos trágicos no Congo Belga.
O Sr. Deputado Antão Santos da Cunha falou sobre o acordo colectivo de trabalho da indústria têxtil.
O Sr. Deputado Cancella de Abreu tratou da indústria do sal.
O Sr. Deputado Amaral Neto pediu que seja cumprido o preceito regimental sobre a distribuição do Diário das Sessões.

Ordem do dia.- Prosseguiu o debate sobre a lei de Meios para o ano de 1961.
Falaram os Srs. Deputados
Melo Machado.
Franco Falcão.
Pinto de Mesquita.
Augusto Simões.
Armando Cândido.
Concluído o debate, o Sr. Presidente considerou a proposta de lei aprovada na generalidade.
Seguiu-se a votação na especialidade, tendo falado sobre o artigo 20.º os Srs. Deputados Camilo de Mendonça e Cota Morais.
A proposta de lei foi aprovada por unanimidade.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 19 horas e 10 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 16 horas e 5 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Afonso Augusto Pinto.
Aires Fernandes Martins.
Alberto Carlos de Figueiredo Franco Falcão.
Alberto Cruz.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto da Rocha Cardoso de Matos.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Américo Cortês Pinto.
André Francisco Navarro.
Antão Santos da Cunha.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António Bartolomeu Gromicho.
António Calapez Gomes Garcia.
António Carlos dos Santos Fernandes Lima.
António Cortês Lobão.
António José Rodrigues Prata.
António Maria Vasconcelos de Morais Sarmento.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Máximo Saraiva de Aguilar.
Artur Proença Duarte.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Avelino Teixeira da Mota.

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Belchior Cardoso da Costa.
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.
Carlos Coelho.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Domingos Rosado Vitória Pires.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando António Muñoz de Oliveira.
Fernando Cid Oliveira Proença.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Frederico Bagorro de Sequeira.
Jerónimo Henriques Jorge.
João da Assunção da Cunha Valença.
João de Brito e Cunha.
João Carlos de Sá Alves.
João Maria Porto.
João Mendes da Costa Amaral.
João Pedro Neves Clara.
Joaquim Pais de Azevedo.
Joaquim de Pinho Brandão.
José António Ferreira Barbosa.
José Dias de Araújo Correia.
José Fernando Nunes Barata.
José de Freitas Soares.
José Garcia Nunes Mexia.
José Hermano Saraiva.
José Manuel da Costa.
José Monteiro da Rocha Peixoto.
José Rodrigo Carvalho.
José Rodrigues da Silva Mendes.
José dós Santos Bessa.
José Sarmento de Vasconcelos e Castro.
José Soares da Fonseca.
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Laurénio Cota Morais dos Reis.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Manuel José Archer Homem de Melo.
Manuel Nunes Fernandes.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
D. Maria Irene Leite da Costa.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Reis.
Mário Angelo Morais de Oliveira.
Mário de Figueiredo.
Martinho da Costa Lopes.
Paulo Cancella de Abreu.
Rogério Noel Peres Claro.
Sebastião Garcia Ramires.
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães.
Tito Castelo Branco Ar antes.
Urgel Abílio Horta.
Virgílio David Pereira e Cruz.
Vítor Manuel Amaro Salgueiro dos Santos Galo.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 77 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 16 horas e 15 minutos.

Antes da ordem do dia

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Telegramas

Da viúva e filhos do Dr. Camarate de Campos a agradecer as referências feitas na Assembleia ao falecimento daquele antigo Deputado.

De Maria Teixeira Botelho acerca de um eventual pedido de substituição da direcção da Cooperativa Agrícola dos Produtores de Leite do concelho de Mafra.

O Sr. Presidente:-Tem a palavra, antes da ordem do dia, o Sr. Deputado Silva. Mendes.

O Sr. Silva Mendes: - Sr. Presidente: durante o intervalo entre esta sessão da Assembleia e a que terminou em Abril deram-se factos de enorme importância nacional e internacional, a que não desejo fazer referencia, neste momento, propondo-me apenas lembrar um desses factos, que teve particular relevância, para esta Assembleia, porque serviu para pôr em foco a coragem serena e consciente, aliada ao espirito humanitário, de um dos nossos mais ilustres colegas.
Refiro-me à acção do Sr. Eng.º Jorge Pereira Jardim, que arriscou heroicamente a sua vida para salvar numerosos portugueses e outros europeus da morte ou, pelo menos, das torturas, maus tratos e desonra que sofreriam, como muitos outros, quando a soldadesca do Congo ex-belga se revoltou e praticou contra os brancos as violências, crimes e horrorosas infâmias de que todos tivemos conhecimento e, como se isso ainda fosse pouco, se prestou também a transportar para Angola bastantes congoleses pretos e mestiços, fugidos ao verdadeiro inferno em que se transformou aquele país, demonstrando assim, mais unia vez, às jovens nações negras que hoje nos atacam que os Portugueses têm o mesmo carinho e interesse por todos os seres humanos, seja qual for a cor da sua pele.
O Sr. Eng.º Jardim e os seus heróicos companheiros sabiam bem a que se sujeitavam, sabiam que arriscavam deliberadamente a sua vida, mas não hesitaram e cumpriram a sua humanitária missão, abnegada e corajosamente.
Tendo tomado parte activa na guerra de 1914-1918 e lidado com numerosos militares de várias nações, tenho talvez um bocadinho de autoridade para apreciar, no seu justo valor, a acção desenvolvida pelo Sr. Eng.º Jardim, notando, com admiração, que este não foi compelido a fazer o que fez, não agiu como militar e não tinha portanto obrigação de ser corajoso e valente, como qualquer militar que luta pela honra e defesa, da sua pátria, e, por isso, o seu acto é ainda mais digno de apreço e louvor, porque agiu unicamente em obediência aos seus elevados e nobres sentimentos humanitários e à sua coragem de verdadeiro português, que se honrou, honrando também esta Assembleia, de que felizmente faz parte.
Já conhecíamos o Sr. Engenheiro como governante inteligente, sensato e competente, como parlamentar distinto e sabedor e como administrador e dirigente activo, empreendedor e de larga visão. Agora ficamos a conhecê-lo também como homem de coração sensível, alma generosa e comprovada coragem.
Desejo, por tudo isto, manifestar ao Sr. Eng.º Jardim os meus sentimentos de muita admiração, que, com certeza, são partilhados por todos os ilustres Deputados desta Assembleia.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Antão Santos da Cunha: - Sr. Presidente: têm-se ouvido, aqui e acolá, ecos do receio de que a seriedade e complexidade dos problemas maiores da vida nacional no momento presente possam de algum modo prejudicar o ritmo normal, a decisão necessária, com que haverão de ser encarados e resolvidos os pro-

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blemas do dia a dia mais de perto ligados ao viver de muitos e de cada um. A vida corrente é feita de pequenos-grandes problemas...
Estamos em crer ser infundado tal receio, pois que os responsáveis pelos diferentes sectores governativos hão-de certamente ter como pouco avisada a política que fosse buscar às dificuldades e preocupações desta hora cobertura para amolecimentos na acção, pretexto para retardar os assuntos ou desculpa para o desacerto das soluções.
Ecoam ainda nesta sala palavras de lúcido comando e corajosa disciplina: «A espada numa das mãos e na outra a charrua».
Se ainda não sabemos - com as almas e os corpos em permanente velada de armas - quando teremos de brandir a espada, sabemos já não poder retirar, um instante sequer, a mão da charrua.
E com firmeza e segurança temos de lavrar fundo e bem.
Não pode haver terras em pousio, nem os tempos consentem preguiças e desatinos.
Sr. Presidente: esta singela meditação está na base do brevíssimo apontamento que peço licença para fazer, perante a Câmara, sobre um acto de alto significado político e social que esta manhã teve lugar no Ministério das Corporações e Previdência Social.
Quero referir-me, Sr. Presidente, à assinatura da nova convenção colectiva de trabalho para a indústria têxtil, instrumento de disciplina social que abrange cerca de 90 000 trabalhadores.

li, se atentarmos nos elevados índices demográficos e familiares das regiões onde se exerce predominantemente aquela indústria - penso, sobretudo, no distrito de Braga e no distrito do Porto, a cuja representação parlamentar estou ligado -, talvez podamos dizer quo o acordo do trabalho, há pouco firmado, repercuto os seus efeitos em cerca de moio milhão do portugueses.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Através daquela convenção foi possível melhorar, em certa medida, a remuneração dos que prestam serviço em tão destacado sector da nossa indústria.
Poderá acontecer - como é de uso em casos desta, natureza - que os resultados obtidos sejam considerados beneficio insuficiente para uns e encargo demasiado para outros...
Mas, de qualquer modo, fez-se nova e relevante afirmação de colaboração, solidarizando interesses, num plano do paz social de a todos compete servir e defender.

Vozes: - Muito bem !

O Orador: - As melhorias agora, acordadas foram-no em intima dependência de também melhores condições que, no terreno económico, foi possível criar para a indústria, como já foi, autorizadamente, anotado nesta Casa.
Compreendeu-se de um lado e do outro, entidades patronais e trabalhadores, que se o progresso social deve estar condicionado pelo progresso económico, não pode este mostrar-se alheio à justa posição dos que, pelo seu trabalho, para ele contribuem decisivamente.
Os trabalhadores da indústria têxtil mereceram os benefícios que a partir de agora lhes estão concedidos, e mereceram-nos até pela tranquila disciplina e pela serena confiança com que souberam aguardá-los.
Pela sua parte, os industriais mostraram-se à altura das suas responsabilidades o foram até onde, neste momento, podiam ir.
Tudo está, afinal, certo e com todos nos devemos congratular.
Fazemo-lo sincera e jubilosamente, aqui deixando também uma palavra de apreço e louvor para todos quantos nos quadros do Instituto Nacional do Trabalho - sem esquecer o seu presidente, o ilustre Ministro das Corporações e Previdência Social - contribuíram para mais este passo do promoção humana e social dos trabalhadores da indústria têxtil portuguesa.

Vozes : - Muito bem, muito bem!

O Orador: - É que, Sr. Presidente, a felicidade e o bem-estar do muitos depende, não raras vezes, da autenticidade, da coragem e do carinho com que alguns se devotam à realização dos princípios sociais e políticos da nossa Revolução...
Tenho dito.

Vozes : - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito

O Sr. Paulo Cancella de Abreu: - Sr. Presidente: o assunto de que vou ocupar-me respeita directamente a algumas regiões, mas, pela sua importância, interessa à economia geral do Pais.
Propus-me tratar da grave crise da indústria do sal em Aveiro, crise que é extensiva ao salgado da Figueira da Foz e. porventura, aos do Tejo, do Sado e do Algarve. E fazia-o para apoiar e secundar as representações que a este respeito foram dirigidas ao Governo, em Setembro de 1959 e Julho do ano corrente, pelo Grémio da Lavoura de Aveiro e Ílhavo.
Porém, entretanto, chegou ao meu conhecimento que um despacho do Sr. Subsecretário de Estado do Comércio, proferido em 8 de Novembro último, autorizou, finalmente, um aumento provisório do preço da venda do sal pelo produtor; e esta circunstância não podia deixar de influir no meu espirito, não no sentido de pura e simplesmente pôr de lado a minha intenção, mas sim para registar com aprazimento o facto e louvar o Sr. Subsecretário do Comércio o nosso ilustre colega, Dr. João Dias Rosas. Referência merecem também as relevantes diligências empregadas para o iludido fim pelo governador civil, Dr. Jaime Ferreira da Silva.
O despacho em referência eleva de 200$ para 240$ o antiquado preço de venda do sal pelo produtor em Aveiro, Ílhavo e Figueira da Foz e promove o estudo da organização geral da indústria respectiva.
Uma e outra decisões eram das desejadas pelos produtores, mas a subida de apenas 40$ no preço da tonelada é inferior à actualização pretendida pelos interessados como necessária para a cobertura dos encargos progressivos da produção e legitima e justa retribuição do capital nela investido.
Sem embargo, não deixam todos os beneficiários que vivem da indústria salineira de revelar dois sentimentos: um de gratidão ao Governo por ter dedicado a sua atenção ao assunto concedendo aquele aumento no preço, embora insuficiente: outro de esperança em que o importante problema continuará a ser oficialmente considerado não só em relação ao preço do sal, mas também relativamente à organização privativa prevista no despacho, tudo com manifesto benefício para os interesses dos proprietários e exploradores das marinhas, e mesmo para a economia nacional; e, quanto a esta, também porque o sal é um género de primeira necessidade. Acresce, sob o primeiro aspecto, que é mínimo o reflexo do aumento do seu preço no custo da vida doméstica, porque se trata de um produto barato e a sua utilização no consumo caseiro atinge apenas 25 por cento da produção total.

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Sob o ponto de vista de valor económico é ainda de considerar que as marinhas do continente produzem, em unos de safra regular, uma média de 240 000 t (cabendo ao salgado de Aveiro 40 000 t a 60 000 t nas suas 270 marinhas), havendo, porém, anos em que chega a atingir mais de 300 000 t; e todos os salgados ocupam mais de 12 000 pessoas (cabendo ao de Aveiro de 1000 a 1500), entre proprietários, marnotos, contratados, encarregados, moços de faina, limpadores, carregadores, fornecedores, etc.
As causas principais da crise foram indicadas lùcidamente nas referidas representações do Grémio da Lavoura de Aveiro e Ílhavo e consubstanciam-se no baixo preço do sal pago ao produtor, no aumento constante do custo da produção, na falta de organização privativa e ainda nas fracas colheitas dos últimos anos.
O preço que tem vigorado foi revisto e fixado já há mais de sete anos e tem estado desactualizado de tal modo que pode suceder nem sempre chegar a cobrir o custo da extracção e os demais encargos, nomeadamente nas marinhas de fraca consistência económica, denominadas «marginais».
Por outro lado, era clamoroso obrigar o produtor a vender o sal pelo preço máximo de 2000$ o vagão de 10 000 kg, quando é certo que o consumidor o paga ao retalhista pelo triplo, pelo quádruplo e mais; preço este que não se justifica, tanto mais que o de venda pelo armazenista está tabelado com uma margem de lucro de apenas 10 por cento.
É também necessário não esquecer que a exploração das marinhas de sal é das mais contingentes que existem, não só porque apenas pode ser exercida no curto período de quatro meses e meio (de Maio ao equinócio), ou menos, e o volume da produção é função absoluta das várias condições climatéricas, por à escassez de sol e calor indispensáveis à evaporação no fabrico acrescerem a irregularidade dos ventos, a pressão atmosférica, a abundância de chuvas, as cheias e as marés vivas a aumentarem substancialmente a percentagem do derretimento, causando assim quebra apreciável no volume do sal empilhado em «montes», «serras» ou nas cristalinas pirâmides de 80 t a 100 t, que se estendem a perder de vista ao longo das margens da formosa ria, a formar aquele inigualado panorama que constitui um dos grandes cartazes de turismo naquela região, onde a natureza é tão pródiga em deslumbramento, pitoresco o originalidade.
Além da paralisação dos trabalhos, as chuvas diluvianas e as consequentes cheias produzem sérias avarias nas marinhas e causam nos montes do sal um desgaste semelhante ao da erosão das terras, não obstante a defesa com artística cobertura de bajunça que desde o Outono as resguarda. É ainda de notar-se a circunstancia de o salgado de Aveiro, apesar de ser o menos rotineiro em todo o País, ser aquele onde as condições climatéricas são mais desfavoráveis à exploração das marinhas.
Pode concluir-se que as quebras anuais em cada monte ou pirâmide chegam a atingir algumas toneladas. E não se deve menosprezar ainda o valor apreciável dos furtos muito frequentes, que ou são inevitáveis ou de difícil repressão.
Nos discursos proferidos na sessão de 8 de Abril de 1943 pelo Deputado Dr. António Cristo e nas de 7 de Fevereiro de 1940 e 13 de Março de 1947 pelo Deputado Dr. Madeira Pinto, que eu secundei, foi larga e proficientemente tratado o problema da salicultura. Revelaram eles a gravidade da sua crise, indicaram as causas e as soluções e apontaram entre estas, além do aumento do preço, a indispensável organização privativa.
O Dr. Madeira Pinto preveniu também do perigo da iminente concorrência do sal-gema, dada a circunstância de a sua exploração ser muito mais fácil, simples e económica e a menos contingente.
O sal, embora produto pobre, é, sem dúvida, entre aqueles que a Natureza nos prodigaliza, um dos mais indispensáveis, dada a multiplicidade das suas aplicações. E imprescindível na culinária e na conservação de numerosos géneros de consumo, especialmente o peixe e as carnes; e, ainda como matéria-prima, nas indústrias da soda, do cloro, do ácido clorídrico, do sulfato e do bicarbonato de soda e outros produtos químicos.
Como revelou o Dr. António Cristo, chegámos a exportar mais de 100 000 t de sal em 1923, para baixar a cerca de metade em 1930, numa produção total de cerca de 220 000 t nesse ano. E, presentemente, o problema da exportação não é de considerar, tão modesta ela se apresenta, devido a não podermos fazer concorrência no mercado internacional.
O emprego do sal como condimento vem dos tempos mais recuados e tem sido sempre expressivo o seu simbolismo mitológico e profano.
Já os Romanos o consideravam como uma das ofertas mais agradáveis aos Deuses.
O Dr. Madeira Pinto lembrou que ele é «produto tão excelso que se ministra logo no sacramento do baptismo como símbolo da sabedoria, que há-de manter integra a verdade revelada».
Ele preserva de vícios e impede o crescimento de más paixões nas almas.
Profanamente, o sal simboliza o espirito e a graça.
Mas como, por outro lado, era tradição espalhá-lo, para os tornar estéreis, nos terrenos onde se cometesse crime ou profanação, não vá, por falta de protecção, estender-se um dia tal malefício aos próprios salgados onde ele se fabrica, apesar de eles serem inocentes daqueles pecados...
Espera-se, porém, que assim não suceda, porque o Governo já começou a atender um pouco os justos clamores; e desta esperança se fazem eco estas minhas palavras, embora singelas e sem o «sal» que lhes sirva de condimento.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muita cumprimentado.

O Sr. Amaral Neto: - Sr. Presidente: algumas brevíssimas palavras para um brevíssimo pedido.
O nosso Regimento consigna no § 4.º do artigo 19.º que seja assegurada a distribuição gratuita do Diário das Sessões a todos os assinantes da l.ª série do Diário do Governo. Esta distribuição foi praticada em tempos. Depois que cessou há anos, vários Deputados, alguns deles mais que uma vez, dirigiram-se a V. Exa. deplorando essa cessação, expondo as vantagens que viam em que fosse dada mais larga divulgação ao Diário das Sessões.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-Agora que o nosso Regimento contém um preceito taxativo no sentido da prática anterior, permito-me pedir a V. Exa., na confiança de que muitos dos nossos colegas me acompanhem com o seu acordo tácito....

Vozes: - Expressamente!

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O Orador: -... para que sejam tomadas providências com vista ao cumprimento da referida disposição regimental a partir de l de Janeiro próximo.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem !

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continua em discussão na generalidade a proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1961.
Tem a palavra o Sr. Deputado Melo Machado.

O Sr. Melo Machado: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: há tempos, preocupando-me com algumas palavras que tinha dito nesta Assembleia, antes da ordem do dia, perguntei a um colega amigo se porventura elas não teriam sido demasiado violentas, e a resposta que obtive foi a de que, pelo que disse, não, mas pelas inflexões ... Desta vez, infelizmente, em virtude desta voz cavernosa, que me foi deixada por uma gripe de que só há poucos dias me restabeleci, nem inflexões haverá. Têm VV. Exas. de desculpar que esta oração seja certamente menos interessante do que é costume, se é que alguma vez o foi.
Sr. Presidente: será esta porventura a última vez que me ocuparei da Lei de Meios nesta tribuna e nesta Assembleia, a que não ligam a recordação e afectividade e labor interessado e activo desde os primeiros dias da sua instituição, ou seja há 27 anos, mas, ao fazê-lo, quero terminar como comecei, orientando as minhas considerações em defesa da agricultura.
E não o faço. Sr. Presidente, por outras quaisquer considerações - pois nem pelos próprios colegas lavradores tenho sido sempre compreendido-, mas apenas por um arreigado sentimento de justiça e a devoção a uma causa que, neste país, por enquanto, necessária ou forçadamente, mas com certeza ainda primacialmente, agrícola, se me afigura de importância capital, económica e social.
Dedica S. Exa. o Sr. Ministro das Finanças uma importante parte do seu, como sempre, magnífico o erudito relatório ao problema agrícola, e temos do confessar que, salvo um ou outro pormenor, o viu com superior inteligência e particular acerto.
Lamenta S. Exa., como atento e proficiente Ministro das Finanças que é, que a agricultura tenha decaído na percentagem com que concorre para a formação do produto bruto nacional 28 por cento em 1950-1951 e 24,9 por conto na média do quadriénio 1956-1959, o que demonstra, e S. Exa. o reconhece, como têm sido calamitosos para a agricultura os últimos anos.
Adiante analisarei o que a este respeito diz o Sr. Ministro das Finanças.
Pretendo agora afirmar que o cultivo da terra, porque é um esforço violento, incómodo e absorvente, está perdendo no mundo, porque não é aliciante economicamente, aquele atractivo e sedução cantados desde sempre pelos poetas e pelos escritores de todas as gerações.
No nosso tempo positivista, prático, turbulentamente apressado, as Éclogas, de Virgílio, já não encontram quem tenha tempo para as ler e, o que é pior, sequer para serem sentidas ou compreendidas.
Aqueles que ainda se dedicam à agricultura sentem uma quase revolta contra o acervo de dificuldades que defrontam, sendo as principais a incomodidade em que vivem, a falta de reconhecimento dos seus direitos de auferirem do seu esforço, tantas vezes ingente, um lucro compensador.

O Sr. Rodrigues Prata:- Muito bem!

O Orador:-A agricultura não deve ser. e mau será que seja, apenas o refúgio aprazível dos endinheirados, que tomam a terra como uma amante cara; tão-pouco a grilheta que prende os que, dentes cerrados, se entregam à dura e desesperada tarefa de a fazer produzir.
Quantos abordam a vida agrícola crentes ainda de que nela encontrarão repouso e abundância!
André Maurois, o ilustre académico francês, ao tomar a direcção, por morte de uma pessoa de família, de um domínio bastante vasto na região do Périgord, dizia há pouco num artigo publicado no nosso Diário de Noticias: s...devo confessar, porém, que os problemas agrícolas, tal como eu os conheci, são infinitamente mais complexos». E mais adiante: s...e até é verdade que a agricultura na economia francesa é muito pouco bem tratada. Não faltará mesmo quem responda que a agricultura não é bem tratada em qualquer país».
O arquiduque Otào afirmou também: «Nestes últimos tempos os agricultores da Europa têm-se mostrado seriamente preocupados com a sua sorte». Diz ainda: «em consequência de a percentagem da alimentação nos orçamentos médios decrescer, isto provoca um declínio constante da parte da agricultura no rendimento nacional, muito sensível numa época em que o nível de vida geral aumenta».
É isto precisamente o que diz S. Exa. o Sr. Ministro das Finanças, reconhecendo, todavia, que entre nós este facto provém das más condições climatéricas dos últimos anos.
Acrescenta, porém, S. Exa. em determinado ponto do seu relatório: «As condições climatéricas, particularmente adversas, verificadas no inverno o na Primavera passados foram responsabilizadas pelos resultados desfavoráveis ao ano agrícola agora prestos a findar.
Sem negar os efeitos prejudiciais desses factores conjunturais, parece, porém, ter de admitir-se também a existência do fundamentos de estrutura e de vícios de ordenação nu nossa actividade agrícola, a justificarem a relativa perda de posição que o sector está sofrendo no quadro económico da Nação».
Aqui me parece que S. Exa. não é inteiramente justo para com os lavradores portugueses, não que eu esteja convencido de que tudo na lavoura corre o melhor possível, bem sei que não é assim, mas não posso deixar de considerar que basta que o clima nos não seja adverso para que as nossas preocupações advenham da fartura, e não da carência, sinal de que cada ano se faz o melhor possível e, vamos com Deus, suficientemente bem para que assim suceda.
Mas S. Exa. viu o problema com justiça e não deixou de assinalar os verdadeiros males quo nos afligem.
Desculpem-me os colegas se anoto frequentemente passagens do relatório que todos leram, mas o anotá-las só nos proporcionará melhores possibilidades de as meditarmos como merecem.
Diz S. Exa.: «Paralelamente a esta queda de receitas, proveniente do menor volume de colheitas e da rigidez da maior parte dos preços agrícolas, verificou-se um sensível agravamento das condições de exploração, tanto como consequência da alta dos custos de alguns factores (mão-de-obra rural, adubos. etc. como também dos maiores investimentos que a lavoura tem vindo a realizar, nomeadamente no plano do seu equipamento mecânico e no das benfeitorias fundiárias».

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Podemos dizer que o problema actual está aqui sintetizado por forma clara e concludente, mas querendo trazer a minha achega para o estudo deste problema
organizei cuidadosamente um mapa que nos dará mais expressivamente o drama da vida agrícola no momento que passa:

[Ver Tabela na Imagem]

(a) Média dos oito primeiros meses.

Está muito longe de estar completo este mapa, mas tal como está chega, para demonstrar que a lavoura tem razão quando se queixa e ainda os motivos de certas anomalias que todos estranhamos.
Não há dúvida de quo os preços dos produtos industriais se não distanciam muito, mas estão na sua quase totalidade acima dos preços agrícolas.
Onde porém as distâncias nos são particularmente adversas é na mão-de-obra. Sabemos que os distritos de Lisboa e Santarém não são o Pais, mas talvez, possamos dizer que é neles que a agricultura está mais evoluída e onde, consequentemente, seria de facto possível que a economia agrícola, até pela raridade dos produtos e proximidade da capital, poderia ter mais defesa, e, todavia, o panorama, que se nos oferece não é animador.
Já acima reconheci que seria estultícia pensar-se que no campo agrícola tínhamos atingido uma evolução satisfatória.; creio, porém, quo nesse capítulo há uma quota-parte de responsabilidade que pertence ao Estado.
Não há evolução agrícola conduzida com possibilidades de êxito sem assistência técnica.
Diz, o Sr. Ministro das Finanças: «De facto só da valorização técnica da lavoura, que já nos últimos anos tem sido encarada e levada a cabo com regularidade, de uma conveniente e dinâmica política de preços, poderá melhorar-se a posição que a lavoura ocupa no conjunto produtivo nacional».
Ora, que eu saiba, o que há de positivo em matéria de assistência técnica, ou pelo menos o que chega directamente à lavoura, é que ela foi prevista e dotada no actual Plano de Fomento.
Sucede, assim, que a assistência técnica ó nina espécie de «corro a salvar-te» do Tratador, e o que é preciso não é só anunciar que se corre a salvar, mas salvar efectiva e o mais rapidamente possível, uma vez que se concorda, e muitíssimo bem, que essa é uma forma adjuvante para modificar o actual estado de coisas.
Não pretendo minimizar as dificuldades do solução do problema, pretendo apenas afirmar quo se está longe, muito longe, da solução conveniente e eficaz.
E, porque S. Exa. o Sr. Ministro das Finanças encarou com inteligência, e decisão o problema dos preços voltemos ao meu mapa, que suponho esclarecedor.

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Queixa-se o País frequentemente de que não tem carne nem abundância nem na qualidade necessárias, mas, se olharmos para o mapa acima, logo encontraremos a explicação.
É que, na escala do aumento de preços dos géneros agrícolas, a carne e o trigo são os que menos têm subido.
Os preços dos produtos industriais são nitidamente superiores aos preços dos géneros agrícolas, mas onde a discrepância é aterradora é na mão-de-obra.
Enquanto no preço cujo índice actual mais alto é o do vinho (330) os Índices de elevação do preço de mão-de-obra chegaram a atingir mais do dobro (695-660) e só os trabalhos de Inverno, os mais baixos, se aproximaram (388), que dizer se os compararmos aos índices de todos os outros géneros, oscilando entre 200 para o trigo e 257 para o azeite?
Estes números são mais expressivos do que tudo o que se possa dizer e demonstram bem a necessidade que há de não criarem mais embaraços à lavoura, que tanto precisa de ser ajudada, para que se não agravem as dificuldades em que se debate.
Bom é que S. Ex.ª o Sr. Ministro das Finanças tenha nítida, consciência, como o demonstra através do seu relatório, do estado melindroso da economia agrícola, e isso nos dá esperanças de ver terminar certas desigualdades tributárias que têm flagelado algumas regiões do País e cujos ecos, por mais de uma vez, têm chegado a esta Assembleia.
A acção do Estado, diz S. Exa., «terá assim de continuar a fazer-se sentir cada vez mais na divulgação dos métodos destinados à conservação e aumento de fertilidade do solo, pela adopção de melhores práticas de rotações e de mais racionais o eficientes adubações: na investigação, através do melhoramento das plantas e dos animais; pela insistência no aperfeiçoamento técnico dos métodos de cultivo; no incremento das campanhas de sanidade pecuária e zootécnica; na introdução deliberada de novas culturas, nomeadamente as de carácter industrial; enfim, enfrentando decididamente as dificuldades iniciais que poderão resultar da orientação da lavoura para outros tipos de cultivos e explorações, escolhidas mais de acordo com as condições ecológicas, e que, embora já praticadas, não tem ocupado até agora a posição relativa que seria desejável».
Para quem em tantos anos vem advogando aqui a indispensabilidade das culturas de carácter industrial para os regadios é causa de satisfação ver esta necessidade reconhecida mesmo com maior amplitude. Ao terminar o seu relatório na parte que diz respeito à agricultura diz o Sr. Ministro das Finanças:
«Mas à própria lavoura caberá também desempenhar um papel activo e decisivo nesta tarefa de reconversão, preparando-se convenientemente para as novas exigências e solicitações que irão surgir, resultantes da revisão do condicionalismo da sua posição no quadro económico nacional.
O problema de maior receptividade às técnicas modernas, a criação de um espírito de empresa, a melhor consciencialização da sua missão, serão, entre outros, alguns dos parâmetros a que a lavoura terá de a ter-se para equacionar e resolver os seus problemas».
É evidente que, se a lavoura quiser defender-se economicamente e adoptar técnicas mais modernas, terá que mecanizar-se. Vemos, porém, no quadro acima apresentado, como subiram os preços das máquinas agrícolas, quase todas de importação; e quem a aconselha, quem experimenta por forma a poder com alguma segurança orientar-se na aquisição por entre a grande, e infinita variedade de marcas e modelos de que constantemente se reclamam as excelências?
Onde estão os concursos de máquinas agrícolas que em cada região possam demonstrar a sua adoptabilidade, a sua eficiência, os seus resultados económicos?
Não temos nada disto, e a lavoura, composta na sua grande maioria de pequenos lavradores, armados quase só da experiência do passado, da sua magnifica coragem e admirável resistência, da sua nunca enfraquecida esperança num bom ano, luta permanentemente contra o clima desconcertante, contra as doenças que não sabe combater, contra as epizootias que lhe dizimam os gados, contra os preços insuficientes e contra a carestia de tudo o que necessita adquirir, contra uma mão-de-obra que cada vez escasseia mais e mais se encarece, encontrando sempre muito quem lhe embarace o esforço e muito pouco quem, qual Cirineu, a ajude a levar a sua cruz.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E como se todas estas faltas não fossem suficientes, ainda aparecem, ao que parece com beneplácito superior, propagandistas que, sob o pretexto de fazer evoluir a agricultura, pretendem fazer tábua rasa do direito de propriedade, esse direito mais caro ao lavrador que qualquer outro, pois constitui para ele, como a própria essência do seu ser, o cerne da sua organização, o ponto firme em que se apoia solidamente, donde partiu para o muito que já fez e donde porventura partirá para o muito que terá ainda de fazer.
Cuidado, Srs. Governantes! As vezes as teorias, mesmo as aparentemente mais repudiadas, fazem o seu caminho, mesmo quando através dele vieram semeando o aniquilamento moral e a miséria económica, porque o acicato do mal sempre encontra engenho para se apresentar sob capa de inocência e de objectivos económicos felizes a alcançar.
Parece-me essencial, indispensável, evitar que esta corajosa população agrícola chegue um dia, ao seu non possumus, com todas as suas trágicas consequências, deixando-nos na consciência o travo amargo de não termos sabido, a tempo, evitá-lo.
Eu menos que ninguém posso ignorar o enorme esforço que o Governo faz através dos organismos de coordenação económica, esforço notável e orientado no sentido da melhor utilidade, ficando-mo, todavia, autoridade para afirmar que esse esforço se realiza no panorama normal da nossa agricultura., muito raramente lhes sendo possível forçar o meio ambiento.
E, para não terminar as minhas considerações sob estas pesadas preocupações, seja-me permitido regozijar-me, não só ao constatar que caminhamos deliberadamente para a industrialização do País, como por ver que, no quadro I do relatório que venho a apreciar, referente às origens do produto nacional bruto no sector indústria, não só tenham desaparecido os sinais de menos, como os aumentos sejam largamente positivos, dando lugar a que S. Exa. o Ministro das Finanças nos afirme que o acréscimo do produto nacional bruto em 1959 se elevou a 2 334 000 contos, enquanto que no ano anterior se situava, em 790 000 contos.
E é sob esta nota optimista quo encerro as minhas considerações, no desejo de quo ao esforço realizado pelo nosso Governo corresponda um sucesso, de quo o único beneficiário será o País..
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Franco Falcão: - Sr. Presidente: desde o momento em que me foi dado o privilégio e a honra do ingressar nesta muito digna Assembleia Nacional jamais

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deixei de tomar posição -embora modestíssima e despretensiosa - no debate sobre a lei de autorização das receitas e despesas.
E sempre o tenho feito com a séria, leal e clara intenção de fornecer sincero e honesto contributo para o encontro das soluções mais concernentes aos altos interesses nacionais.
A presente proposta da Lei de Meios, submetida com a tradicional normalidade à apreciação e aprovação desta Câmara, revela, como habitualmente, o notável esforço do Governo em valorizar todos os sectores da vida nacional.
De todas as oportunas providências tomadas naquele importante diploma, que é a base de toda a administração pública, merecem especiais aplausos as que se referem à saúde pública e assistência, à política de bem-estar rural e as que se destinam a garantir o equilíbrio das contas públicas.
Para que possa continuar a garantir-se o equilíbrio orçamental, em bases cada vez mais sólidas e com o aumento sempre crescente do rendimento nacional, interessa aproveitar o incentivar todas as fontes de riqueza, entre as quais ocupa na vida actual lugar da maior relevância, na produção efectiva de receitas, a chamada indústria de turismo.
Efectivamente, os problemas do turismo são daqueles que estão a despertar maior atenção e o mais devotado interesse, entre os povos civilizados, não só pelo que ele representa do valor positivo no intercâmbio cultural, mas ainda pela sua electiva influência no sector da economia.
Entre nós também o turismo está a atingir notável projecção, pois são já em grande número os estrangeiros que anualmente nos visitam, atraídos pela invejada paz em que vivemos, pelas maravilhas das nossas praias e belezas naturais, pelos encantos da nossa paisagem e, em suma, por um conjunto de circunstancias que levaram a inscrever o nosso país nos grandes roteiros e cartazes turísticos do Mundo.
O Secretariado Nacional da Informação, Cultura Popular e Turismo, à frente do qual se encontra o espírito activo, a inteligência brilhante e o engenho empreendedor do Sr. Dr. Moreira Baptista, reconhecendo que o turismo deve ocupar na vida económica nacional um lugar de especial relevo, tem procurado tomar oportunas iniciativas no sentido de fomentar e entusiasmar o sou progresso.
Todas as diligencias e esforços no sentido de uma propaganda bem orientada, procurando ao mesmo tempo dar ao visitante condições de conforto e de condigna hospitalidade, são requisitos primaciais que em muito poderão contribuir para o desenvolvimento económico e para o progresso do País.
Quanto mais aumenta a confusão no seio das nações e os povos mais ferozmente se debatem em sangrentas lutas estéreis maior é o número de estrangeiros que procuram no nosso pais o clima político e de cordialidade onde possam tranquilamente repousar e esquecer as amargas desilusões da vida.
Assim se compreende que no ano do 1959 tivessem passado as nossas fronteiras mais 32 052 turistas do que no ano anterior, perfazendo assim o número de
295 942, que produziram o apreciável rendimento de 713 000 contos.
Estes números demonstram por forma bem expressiva e lisonjeira que o turismo é já hoje uma das nossas mais concretas fontes de riqueza, que convém aproveitar e explorar em todos os seus pormenores.
O afluxo de turistas desejosos de conhecerem a beleza, o clima e as maravilhas de Portugal é uma consoladora realidade, que muito nos honra e desvanece.
Com efeito, o número dos nossos sempre bem-vindos visitantes quase quadruplicou no decénio que vai do ano de 1950 a 1959, porquanto, tendo-nos visitado 76 307 turistas no ano de 1950, este número quase que atingiu no ano de 1959 a casa dos 300 000, o que produziu no mesmo período de tempo um acréscimo de rendimento de cerca de 500 000 contos.
Entre os países que mais nos visitam ocupa o primeiro lugar a vizinha e cavalheiresca Espanha, à qual nos unem os mais sinceros e fraternais laços de amizade, que garantem aos dois destemidos povos peninsulares a defesa dos seus inabaláveis direitos do nações livres e os impõem como os mais seguros e válidos pilares na salvaguarda dos valores morais e da civilização cristã.
Seguem-se os Estados Unidos da América, a França, a Inglaterra e a Alemanha, sendo digna de nota a extraordinária concorrência de turistas alemães, que nos últimos 10 anos passou de 1276 em 1950 para 15 559 em 1959, representando assim um aumento 12 vezes maior, que bem exprime as boas relações e o proveitoso intercâmbio cultural e económico entre Portugal e aquele admirável e progressivo país, que, tendo sido esmagado pela força destruidora da guerra, vai firmemente ressuscitando das próprias cinzas, reacendendo no coração do mundo ocidental a esperança de que será a mais poderosa barreira contra o comunismo moscovita.
A afluência, de turistas aumentou, de l950 para 1959, em cerca de 534,2 por cento, percentagem que constitui poderoso estimulo para que se desenvolva diligente e profícua acção que proporcione aos nossos hóspedes uma permanência afectuosa e confortável nesta abençoada terra portuguesa.
Possuímos muitas belezas escondidas, vastas relíquias históricas e arqueológicas que é preciso dar a conhecer, muitas paisagens ignoradas e aliciantes miradouros que urge tornar acessíveis e divulgados.

O Sr. Silva Mendes: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, temos de fazer reviver tradições condenadas por falsos ideais ou por delirantes modernismos despidos de espirito e sem qualquer significado.
Temos de dar vida às nossas aldeias, encher os céus com os cantares do nosso povo, reanimar usos e costumes adormecidos, pôr em movimento as diversões e as danças regionais, encher de entusiasmo e colorido as nossas romarias e festas populares.
Temos, enfim, que aproveitar tudo o que possa contribuir para a alegria do povo, para a vitalidade dos meios rurais e constitua permanente motivo de atracção para nacionais e estrangeiros.
É preciso que a propaganda não cesse, que os estudos de planificação se não atropelem ou entorpeçam e que o ambiente para bem receber se valorize cada vez mais, para que o nosso país continue a despertar justificadas atenções, a merecer a preferência dos estrangeiros e se transforme em florescente centro de expansão turística.
Portugal, graças à superior direcção política o administrativa, que tem com a maior ponderação e segurança presidido aos seus elevados destinos, possui no turismo uma das suas principais e poderosas fontes de riqueza.
Torna-se, todavia, necessário organizar um largo campo de acção e estruturar toda a actividade turística em bases que permitam aproveitar todos os nossos excepcionais valores regionais, históricos, folclóricos e artísticos.

O Sr. Silva Mendes: - Muito bem, muito bem!

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O Orador: - O turista, ao ultrapassar as nossas fronteiras, não deve ter como única directriz alcançar Lisboa ou o Estoril.
A província deve ser o seu primeiro contacto, por que é nela que encontrará a expressão máxima das virtudes e do labor do povo português, a franqueza da sua tradicional hospitalidade, o garrido dos trajes populares, os cambiantes e o pitoresco das nossas paisagens e, até em certas regiões, o conforto e o bom gosto decorativo das nossas pousadas e hotéis.

O Sr. Augusto Simões: - V. Exa. dá-me licença?

O Orador: - Com todo o gosto.

O Sr. Augusto Simões: - Seria, muitíssimo útil que se retomasse o ritmo da construção das pousadas, que tão bom resultado deram e cuja falta, nas nossas Beiras, tanto se faz notar.
Desculpe-me V. Ex.ª esta breve interrupção, mas eu gostaria que ficassem registadas no Diário das Sessões estas palavras de concordância com V. Exa.

O Orador: - Agradeço muito a V. Exa. a sua interrupção e, de resto, sinto-me sempre muito honrado com as interpelações de V. Exa. a quem me liga uma velha amizade. A sugestão de V. Exa. está absolutamente conforme com o meu ponto de vista, permitindo-me, no entanto, acrescentar que o que interessa é que os preços dessas pousadas e hotéis sejam acessíveis a toda a espécie de turistas.
A iniciativa particular, neste como em tantos outros sectores da vida nacional, começa a dar provas insofismáveis da sua capacidade realizadora e da sua pujante vitalidade, como o atestam as magníficas realizardes levadas a efeito no terreno fértil do turismo, das artes, da cultura e da indústria.
Não se escondam ao turista as nossas vilas e aldeias, mas antes se procure dar-lhe a conhecer os seus encantos, as suas lendas, as suas tradições e os seus exemplos de lealdade, proporcionando assim às respectivas populações possibilidades de darem satisfação aos seus legítimos anseios de convivência e mais favoráveis recursos para valorização do seu nível social e económico.
No que se refere ao desenvolvimento da indústria hoteleira, vasta acção há ainda a desenvolver numa compreensiva conjugação de esforços entre o listado e a iniciativa particular.
Uma bem apetrechada rede de hotéis espalhados pelas nossas ridentes províncias é condição primacial para que os problemas do turismo se completem na sua estruturação e divulgação.

O Sr. Augusto Simões: - Apoiado!

O Orador: - Convém, no entanto, não esquecer que é fundamental impulsionar a construção de instalações hoteleiras que, sem perderem de vista os elementares requisitos de higiene, comodidade e arte de bem receber, permitam a nacionais e estrangeiros de reduzidos meios económicos conhecer as surpreendentes belezas que o nosso acolhedor país lhes oferece sem terem de levar na bagagem o incómodo e clássico farnel.
Mas não bastam instalações hoteleiras, mais ou menos luxuosas, capazes e suficientes para albergarem os muitos veraneantes que percorrem o nosso cada vez mais tentador pais.
É necessário oferecer-lhes boas vias de comunicação, que lhes assegurem viagens confortáveis e, ao mesmo tempo, lhes garantam a necessária segurança no trânsito.

Vozes: - Muito bem !

O Orador: -Deste modo, o alargamento da rede rodoviária do País, bem como a sua cuidadosa conservação e renovação, devem estar sempre presentes nos planeamentos dos organismos responsáveis por este importante sector da vida nacional.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-Não podemos esquecer que é o automóvel o meio de transporte mais frequentemente utilizado, não só como instrumento de recreio o desporto, mas muito principalmente como indispensável agente de trabalho.
Para se aferir da importância que as estradas desempenham no desenvolvimento turístico interno bastará relatar que, dos 295 942 turistas entrados em Portugal durante o ano de 1959, apenas 115 500 entraram por mar e pelo ar, tendo entrado por terra 180 442.
No aspecto económico são ainda as estradas as grandes vias, por onde o extraordinário incremento da camionagem e da viação acelerada faz circular toda a vida moderna e conduz aos seus destinos os diferentes produtos afectos aos domínios da agricultura, do comércio e da indústria.
Tem de reconhecer-se, em nome dos mais elementares princípios de justiça, que muito tem melhorado, em extensão e qualidade, a nossa rede de estradas, nos últimos 30 anos.
O Governo, reconhecendo a necessidade de dotar os meios rurais com as convenientes vias de comunicação, que lhes tornem mais acessíveis as relações de convivência e lhes facilitem o transporte de pessoas, dos bens de produção e das diferentes mercadorias, organizou planos de viação rural, os quais representam um louvável esforço, que muito poderá facilitar a vida das zonas mais desfavorecidas.
Todavia, os prazos são por vezes longos e as verbas limitadas, pelo que não será possível acudir com a desejada celeridade, aos anseios e às necessidades das populações.
De resto, a intensidade do tráfego rodoviário e o peso de transportes colectivos o de mercadorias exigem traçados e pavimentos cada vez mais cuidados, mormente se atendermos a que no fim do ano de 1959 havia em circulação no País 226 803 veículos motorizados.
No entanto, existem ainda algumas povoações tristemente isoladas, onde, os seus habitantes não podem usufruir os benefícios do automóvel ou da camioneta que os desloque à, vila ou a cidade mais próxima e lhes proporcione melhores possibilidades de tratarem da sua vida e dos seus negócios.
Deste modo, a actividade económica daqueles povoados está condenada a um natural entorpecimento e as suas populações só poderão deslocar-se ao médico, à farmácia e às repartições concelhias ou comarcas vencendo montes e vales, lutando contra a chuva impiedosa ou suportando a torreira do sol ao longo do caminhos estreitos e sinuosos, onde a lama ou o pó lhes torna mais espinhosa e torturante a caminhada.
O notório aumento de veículos dos mais diversos tipos e o afluxo cada vez maior de turistas que nos visitam exibem uma rápida e substancial melhoria da rede rodoviária, por forma a garantir maior segurança no trânsito, a permitir condições de comodidade e rapidez e a tornar mais agradável a circula-lo, em harmonia com os imperativos do mundo contemporâneo.
Os Invernos extremamente chuvosos que nos tem flagelado e, por outro lado, a falta de um serviço de conservação pronto e eficaz, motivado certamente pela falta de pessoal cantoneiro que possa acudir imediatamente aos primeiros estragos ou danos cansados nos pavimentos, parece-me serem razões que cabalmente

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demonstram o estado de ruína em que presentemente se encontram algumas das nossas estradas.
Neste estado se encontram, por exemplo, a quase totalidade das estradas do concelho de Penamacor, principalmente as que ligam os vizinhos concelhos do Sabugal, do Fundão e da Idanha-a-Nova, não obstante o reconhecido dinamismo, o assinalado interesse e as invulgares qualidades de trabalho do Sr. Director de Estradas.
É que as dotações atribuídas à Junta Autónoma de Estradas -cuja acção é, aliás, digna dos maiores louvores não chegam para o muito que neste sector há a construir, a renovar e a conservar, e menos chegarão ainda se continuarem a ser desviadas das suas receitas e comparticipações ordinárias verbas para a construção de obras volumosas, como as pontes de Vila Franca de Xira e da Arrábida, que, não produzindo qualquer benefício ou compensação financeira para aquele organismo, lhe desfalcam seriamente o seu património.
Neste aspecto, o problema das estradas municipais reveste-se ainda de maior acuidade, pois as finanças municipais, fortemente depauperadas com encargos de assistência, educação, justiça, fiscais, corporativos, vencimentos a funcionalismo e outros ónus da mais variada espécie, não podem fazer face às despesas resultantes da construção e conservação de estradas.
Assim se compreende que muitas das estradas municipais se apresentem esburacadas e praticamente abandonadas, como que a reflectirem e a testemunharem a angustiante situação com que se debatem os municípios a que pertencem.
No concelho de Penamacor, a que acabo de referir-me, existe, por exemplo, uma estrada concelhia que mais parece uma caricatura do que uma artéria por onde têm de circular pessoas e veículos e à qual só por simples ironia se poderá chamar estrada.
Com efeito, esta, rodovia municipal, não obstante constituir a ligação directa entre a sedo de dois concelhos de grande valor agrícola, está entregue ao mais completo desinteresse, constitui uma autêntica ratoeira para o trânsito e em certos pontos já só existe parte do pavimento, pois tudo tem sido consumido pelas enxurradas e pelo abandono de dezenas de anos, que penosamente a tornaram intransitável, com grave prejuízo para a economia da região.
Isto apesar de tratar-se de concelho que apenas possui 30 km de estradas municipais, pelo que bem pode aquilatar-se das dificuldades financeiras com que se debate o respectivo Município.
Em meu entender, parece-me que a extensão da rede rodoviária de cada concelho está na razão directa da capacidade financeira da respectiva câmara municipal.
Com efeito, referindo-me ainda ao distrito de Castelo Branco, verifica-se que os concelhos cujos municípios têm finanças mais débeis são precisamente aqueles onde a rede rodoviária municipal é de mais reduzidas proporções.
Assim, o pobre concelho de Oleiros não possui um só palmo de estradas municipais e os concelhos de Belmonte, Vila Velha de Ródão, Vila de Rei e Idanha-a-Nova possuem apenas e respectivamente 3,643 km, 6,701 km, 8,753 km e 24,5 km, não obstante ter este último concelho uma área de 1417 km2, distribuídos por dezassete freguesias, ocupando assim o terceiro lugar entre os concelhos metropolitanos de maior extensão territorial.
Nesta conformidade, poderá facilmente concluir-se que, com a comparticipação e a colaboração efectiva dos municípios, regra geral de finanças enfraquecidas, não será possível acelerar o desenvolvimento rodoviário do País, de harmonia com a intensidade do tráfego e com as exigências de uma vida moderna em constante evolução.
O Governo da Nação, que tão exuberantemente tem sabido elevar o nível de engrandecimento nacional, tem de encarar muito a sério a situação financeira dos municípios, pelo que deverá libertá-los, quanto antes, da preocupação e do pesadelo das estradas municipais, a bem do progresso regional, no interesse geral ido desenvolvimento económico e no desejo premente de facilitar e de entusiasmar a circulação turística.
É tempo de se acabar com a distinção entre estradas nacionais e estradas municipais, pois umas e outras pertencem à Nação, estendem-se e ramificam-se pelo mesmo território nacional e servem os legítimos anseios e, as justas aspirações da mesma colectividade.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Seria esta uma oportuna e proveitosa medida, que em grande escala viria reforçar as benéficas providências estatuídas na Lei de Meios a favor de uma política de bem-estar rural.
É certo que os dinheiros públicos não são elásticos e que a Administração, não querendo tornar mais onerosa a carga tributária, não pode acudir com a mesma intensidade e rapidez a todas as necessidades gerais e locais, mormente se atendermos a que um mundo desvairado e materialista nos obriga a despender verbas volumosas com compromissos de ordem militar que temos de assegurar e manter, em defesa da honra e do corpo sagrado da Pátria.
Assim, na distribuição das receitas públicas deve dar-se preferência a todas as obras e empreendimentos que se traduzam em efectiva utilidade e mais instantemente sejam reclamadas pela ânsia de acelerar o ritmo de crescimento económico e de engrandecimento material do País.
Por outro lado, devem «reduzir-se ao mínimo os gastos de carácter sumptuário», e bem assim as despesas com missões e congressos, não obstante constituírem estes um verdadeiro desaforo universal, dos quais muitas vezes não resulta qualquer outro benefício que não seja o de proporcionar aos congressistas fáceis passeios e o suculento prazer da arte culinária internacional.
Esta tem sido, de resto, a superior orientação e a preocupação dominante do Sr. Prof. Pinto Barbosa, muito ilustre titular da pasta das Finanças, a cuja inteligência, muito saber e reflectida autoridade quero render as minhas muito respeitosas e sinceras homenagens.
Bem pode Sua Excelência considerar-se digno intérprete e continuador da firme política financeira instituída pelo Sr. Prof. Oliveira Salazar, esse mestre insigne e estadista de excepcionais virtudes, que, iniciando e consumando o milagre dos orçamentas equilibrados, tornou possível dar aos Portugueses um invejado nível de prosperidade e de confiança e elevar bem alto o nome e o prestígio de Portugal.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Simeão Pinto de Mesquita: - Sr. Presidente: desta vez foi meu propósito inicial alargar um pouco mais, embora com continência, as minhas considerações relacionadas com a proposta da Lei de Meios para 1961. Quis sorte mofina surpreender-me com intempestiva gripe que nos passados dias me inibiu de qualquer prepararão profícua. Alguns pontos -poucos - não queria deixar passassem em claro, que mais não

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seja por lembrança para esta Assembleia, e por detrás dela -o que sobretudo imporia- para o Governo da Nação. Será por isso a sorte menos mofina com VV. Exas., Srs. Deputados, de que comigo, pois por pouco tempo terão que me ouvir; à quelque chose malher est bom.
Na merecida sequência de louvores ao Sr. Ministro das Finanças não faltará aqui o meu, não só pelos discretos toques de aperfeiçoamento que imprimiu ao articulado do texto da proposta, como, sobremaneira, pelo amplo, estruturado e elucidativo relatório de que a precede e com que a justifica. Ainda um passo para a consolidação da boa tradição em que temos prosperado desde a viragem decisiva de 1928 operada pela histórica iniciativa do Sr. Presidente do Conselho. A almejada «Vida Nova» de Oliveira Martins, finalmente convertida em realidade! Isto tem particular sentido para nós, que somos da época -e mesmo quando aprovado a tempo- do orçamento- labirinto para manejo equívoco de raros apenas e explosiva matéria para as oposições políticas.
E entremos no primeiro dos pontos a que pretendo hoje aludir - o da actual posição do Entre Douro e Minho dentro da crise geral da lavoura que o relatório da proposta analisa e que quase todos os Srs. Deputados que me precederam nesta tribuna têm ilustrado panorâmica e convincentemente e para os quais têm vindo lembrando remédios e paliativos dignos de reflexão, mas sempre morosos.
Trago também aqui, à colação, o meu depoimento quanto à terra minhota.
Sabido é que, como culturas fundamentais, essa região produz cereal de base, o milho associado ao feijão, e complementarmente o vinho - o vinho verde.
Quanto ao milho de regadio, ainda previa o relatório da proposta em discussão relativa normalidade de produção, em contraste com o já então verificado desastre com o trigo e o centeio. As calamitosas circunstâncias climáticas, de uma nunca vista pluviosidade, praticamente ininterrupta desde meados de Setembro até agora, tiraram-nos todas as ilusões. Repetição das calamidades que o Sr. Deputado Santos Bessa nos referiu do baixo Mondego. A acrescentar ao desastre definitivo do milho que, imaturo em grande parte, não foi possível recolher do campo, ocorre o do milho que, embora colhido, não tem sido possível secar por falta de sol. As chuvas prematuras vieram precisamente coincidir com um ano em que, pelo menos no Norte do País, as sementeiras das terras funda;- haviam sofrido, geralmente, atraso pelo seu encharcamento, determinado pela persistência das chuvas primaveris.
O problema da seca artificial é, decerto, um daqueles para que é preciso encarar solução adequada, pois se a possibilidade de seca pelo simples recurso dos meios naturais se reduz a extremos calamitosos em anos excepcionalmente húmidos como este, mesmo em quase todos os outros anos é origem de prejuízos consideráveis. É a broa a saber a saibro e que, no entanto, não deixa de se comer ... e até com subentendida satisfação dos chefes de família, de assim ser porventura melhor, porque se come menos! ...
Certamente problema a só poder ser resolvido em áreas de minimifúndio, ou mesmo de propriedade média, pelo recurso à união e cooperação da lavoura. Mas se, como muito bem disse o Sr. Dr. Peres Claro, precisamente a sua falta é o maior dos males de que a mesma sofre! ...
E lembrarmo-nos de que este produto vegetal - e mesmo para conservar o actual preço é protegido - perdeu cerca de 30 por cento do seu valor de 1914 na equivalência do ouro!
Vejam agora o outro grande produto da clássica lavoura do Noroeste: o vinho.
Aqui verificou-se este ano uma anómala abundância, que, longe de beneficiar, ameaça deveras prejudicar o lavrador, que não estava para ela preparado com o necessário vasilhame. As calamidades do tempo também concorreram para largos prejuízos nas vindimas, feitas com escassez de braços e com as dificuldades resultantes da chuva, sobretudo nos altos enforcados, que são a forma ali dominante da armação da vinha. Bem podiam os vindimadores repetir, embora com sentido diferente, o que Sá de Miranda- dissera desses enforcado na carta ao Senhor de Basto:

Nunca vi, disse, enforcado
Que a forca assi merecesse

Sei que em zonas, por exemplo, precisamente em Basto, houve vindimas prolongadas até fins de Novembro!
Já se vê que vinhos assim colhidos houveram de sofrer na quantidade e, sobretudo, na qualidade.
No entanto, de uma maneira geral, o vinho, que se anunciava até à chuva deveras prometedor, parece dar ainda assim, em média, prova razoável.
Como íamos dizendo, a falta de vasilhas trouxe ao lavrador a urgência de se entregar por todo o preço a quem se lhe apresentasse com elas. O preço do vinho, que andava no ano anterior pela ordem média de 1600$ por pipa, desceu verticalmente na vindima nestas condições para 800$, 700$, 600$, menos ainda.
É bem certo que o benefício para o consumidor, como sempre, quase se não deu por ele.
Isto põe o problema do crédito ao viticultor que lhe facilite a resistência a uma subversão destas. Esse crédito não existe como na zona da Junta Nacional, no Douro ou no Dão. O organismo representativo da região dos vinhos verdes, a respectiva Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos Verdes não tem poderes legais para tanto. O velho regulamento de 1928 está antiquado neste ponto, como noutros. Seria uma medida urgente e fácil conceder-lhe meios legais que noutras regiões já têm dado as suas eficientes provas. É certo que essa Comissão por vezes tem usado, no sentido de desencharcar o mercado, do processo indirecto da queima do vinho. Esse recurso, embora útil, é insuficiente, pela sua limitação e morosidade.
Aqui fica a sugestão ao Sr. Ministro da Economia de que me parece, se poderia tirar proveito ainda em tempo útil para a presente colheita, se aplicado rapidamente.
Sr. Presidente: vou passar para o segundo dos pontos a que me propus aludir a propósito da Lei do Meios:
Electricidade. - No respectivo artigo 16. º, alínea a), continua a pôr-se à cabeça dos financiamentos destinados ao bem-estar rural. No entanto, mais uma vez há que insistir que, quanto à distribuição da energia nos meios rurais, se deva considerar ultrapassado de longe a fase municipal, só aceitável hoje um grandes meios urbanos: Lisboa, Porto e, talvez, Coimbra, Braga. Setúbal ...
Só dessa maneira se conseguirá, quanto à distribuição, pôr-se o consumidor de todo o País em justa imunidade perante a electricidade, como perante o imposto e perante a lei. O que não quer dizer que os municípios não aufiram indirecta percentagem do consumo verificado.
Mas é precisamente da electricidade rural que me vou trasladar para um aspecto do consumo urbano de energia: o da minha terra. E digo especialmente urbano porque só por graça se poderá insistir nessa

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espécie de autocrítica de Garrett, que tripeiro era, a de «esse fraude aldeão que chamam Porto».
Este caso de electricidade citadina resulta do despacho ministerial de 11 de Maio passado, que vem consequentemente agravar os consumos, sobretudo os consumos domésticos, que, por virtude das vantagens tarifárias baixas, se tinham generalizado e representam cerca de 70 por cento do consumo total. O aumento médio de tarifa doméstica está calculado que suba a 14 por cento.
Aludo ao assunto independentemente do recurso interposto pelos serviços de gás e electricidade, ou seja a Câmara do Porto, para o Supremo Tribunal Administrativo, pois os aspectos de equidade que assistem aos consumidores citadinos processam-se inteiramente à parte das razões formais que possam emprestar viabilidade ou não a esse recurso. Esses aspectos são sobremaneira dois, e, sustentando-os, não estou a contrariar o grande principio da igualdade perante a electricidade, que supra invoquei a favor dos rurais.
Filiam-se essas razões em antecedentes:

1.º A propaganda das tarifas degressivas domésticas - o 3.º escalão - foi sobretudo inspirada pelo Sr. Eng. Ferreira Dias, ilustre Ministro da Economia, quando, como presidente da Junta de Electrificação Nacional, em acordo com a Câmara do Porto, em 1939- ao tempo eu era vereador desta e intervim na discussão do caso -, se instituíram tais tarifas. Em grande parte eram oferecidas ao consumidor como compensação da supressão do fornecimento de gás, que de então por diante só passou a existir como saudade no nome do respectivo serviço.
2.º A economia doméstica passou toda a processar-se nessa forma de aproveitamento: compraram-se fogões, ferros de engomar, enceradeiras, etc., mas, sobretudo, os fogões e aquecedores de água, lançando-se os antigos, de carvão ou lenha, para a sucata. Fosse outra a orientação tarifária e boje acorreriam as donas de casa, como em Lisboa, ao mais em conta gás Cidla, por exemplo.

É em nome desses interesses legítimos que eu reclamo, pondo de parte quaisquer considerações jurídicas, marginais à minha intervenção.
Sr. Presidente: o terceiro ponto é ainda atinente aos interesses do meu burgo. Falo da projectada Faculdade de Letras. Disse o Sr. Deputado Urgel Horta que «a Universidade do Porto se enriqueceu ... com a restauração da sua velha e prestigiosa Faculdade de Letras». Inteiramente de acordo quanto à directriz das suas palavras: não tanto quanto ao tempo verbal empregado, como se a restauração da Faculdade fosse já facto consumado. Nós, juristas, tendemos, por formação e experiência, naturalmente a prudente desconfiança. Decerto que inteiramente confiamos na honradíssima palavra de promessa do venerando Chefe do Estudo, a quem presto as minhas homenagens, homologada pela do muito ilustre titular da pasta da Educação Nacional.
E, a propósito, não posso esquecer a persistente insistência com que pugnaram pela restauração dessa Faculdade o magnífico reitor Dr. Amândio Tavares, coadjuvado pulo ilustre vice-reitor Dr. Magano, Dr. Luís de Pina e. outros, sem falar do veemente arauto, que dessa persistência tem sido nesta, casa, o Sr. Dr. Urgel Horta.
Mas, como dizíamos, verba colant, e tudo que delas não voe tom que se encontrar consignado leplaysianamente no orçamento do Estado. Estará essa promessa de restauração já em condições de ter seu início real para o próximo ano lectivo?
Não existe ainda qualquer ponto de partida legislado que autorize afirmá-lo. Nada é impossível ainda, mesmo dentro dos meios financeiros possíveis. Mas a nós só fica bem lembrar realisticamente o caso.
E ainda a propósito da Faculdade de Letras, uma observação: através de umas palavras do Sr. Ministro da Educação, quando procurado em Outubro por eborenses desejosos também da restauração da sua Universidade, depreendi que à Faculdade do Porto se pretende atribuir apenas a segunda secção dos correspondentes estudos segundo o respectivo decreto orgânico das Faculdades de Letras (Decreto n.º 41 341, de 30 de Outubro de 1957), ou sejam as ciências históricas, geográficas e filosóficas.
Decerto que de entre os estudos humanísticos estas são as ciências que- menos especificamente o são. Filosofia e geografia caberiam perfeitamente numa Faculdade de Ciências, e a história - a mestra da vida - cabe em toda a parte. Agora ciências filológicas, e especialmente para nós, neo-latinos, o latim, é que não cabem senão nele próprio. E por isso ouso pedir ao alto cientista, doublé de humanista, que é o Sr. Ministro da Educação Nacional que não se esqueça de fazer constar do elenco da futura Faculdade se não a primeira, pelo menos a segunda secção de ciências filológicas - a de filologia românica.

O Sr. Peres Claro: - Muito bem!

O Orador: - E ouso lembrar que a extinta Faculdade, nesse particular, teve um tão ilustre professor como o foi o Dr. Canuto Soares.
Sr. Presidente: o quarto e último, ponto que versarei respeita aos encargos de ordem militar.
Aqui, inteiramente de acordo com n Sr. Dr. Urgel Horta, não posso deixar de estranhar a orientação da Câmara Corporativa quanto a este ponto. No clima de paz armada - si ris pacem ... - para que o Sr. Presidente do Conselho com tão calma energia nos chamou a atenção na sua memorável mensagem a esta Câmara, é para nós estranhável realmente a argumentação da Câmara Corporativa para se baixar o plafond de confiança financeira que o Governo pede, e indiscutivelmente melhor que ninguém sabe porque o pede.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - As palavras ouvidas nesta Assembleia por parte dos oradores que comentaram a dita mensagem e, outrossim, as que a propósito vário - mas sempre a propósito - ouvimos da boca, por exemplo, dos Srs. Deputados André Navarro e Águedo do Oliveira, no rebusco das raízes dos ataques que internacionalmente nos são dirigidos, essas palavras assaz contribuem para nos esclarecer da dureza dos tempos que vivemos e donde não há - oh! melindrosos rebuscadores de quintescência!- evasão possível.
Alma grande. Confiemos do Governo, neste particular sem mesquinhez;, a prudente utilização dos meios que se lhe se concedem.
Nós, os desta Casa, que não deixamos de ser ciosos daquilo que tradicionalmente é apanágio das assembleias representativas - e o Governo já teve ocasião de o experimentar -, neste capítulo das coisas militares e internacionais, em tempos destes, temos que lhe prestar toda a nossa confiança.
Da sua meticulosidade no emprego dos meios concedidos dá-nos o Governo, na redacção do artigo 9.º, medida da sua prudência quando, ao texto de rotina que

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detrás vinha, acrescenta na proposta que «o Governo providenciará no sentido de reduzir ao mínimo despesas de carácter sumptuário». Muito bem! Corresponde isto precisamente no clima dum em que vivemos e a que já correspondeu a iniciativa desta. Assembleia quanto a remunerações exageradas e acumulações.
As razões contabilísticas da Câmara Corporativa, em clima normal, poderiam, porventura, convencer. Admito-o. Mas no clima em que vivemos as razões do Governo vencem. E em matéria militar é isso que interessa.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Augusto Simões: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: subo a esta tribuna ainda dominado pela emoção profunda que nos causou a reconfortante oração do Sr. Presidente do Conselho aqui proferida no findar do mês de Novembro.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Disse V. Exa. Sr. Presidente, ao encerrar essa memorável sessão, que se havia escutado na voz do homem abnegado que se devotou inteiramente às tarefas do engrandecimento da Pátria a voz da própria Nação.
Parece-me apropriado recordar neste momento as nobres e cabidas palavras de V. Exa. É que, ao ouvir a expressão serena de Salazar, todos os portugueses de hoje escutaram não só a voz das suas almas, como ainda toda a estrutura da nossa história multissecular, em cujas páginas está escrita uma epopeia tão grande e tão assombrosa que não a podem desconhecer, ainda que alguns ostensivamente o tentem, os governantes e os governadores do Mundo de hoje.
«Uma mão na espada e outra no arado», na expressiva afirmação do Sr. Presidente do Conselho, assim pudemos criar, desenvolver e consolidar toda a grandeza da nossa Pátria, juntando-lhe os territórios que fomos adquirindo, não a título gratuito, mas pelo elevado preço do sangue dos nossos mártires, da abnegação do grande escol dos nossos guerreiros, da devoção inconcussa dos nossos santos ou, numa palavra, pelo labor esforçoso de gerações e gerações de portugueses.
Atingimos, assim, este século de tão adiantada civilização, não como meros beneficiários do trabalho alheio, mas como cabouqueiros dos nossos próprios destinos, como honrados operários da nossa própria civilização.
Alvos de uma torpíssima incompreensão por parte dos povos havidos como amigos e de outros que tínhamos como indiferentes ...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - ... e de calculado ataque dos mais desvairados e insaciáveis bebedores de lágrimas que a humanidade já possuiu ...

Vozes: - Muito bem !

O Orador: - ... por nos saberem colocados na torre de menagem onde se defende a civilização cristã contra a criminosa acomodação dos tíbios e contra a odienta arremetida dos prosélitos do neobarbarismo, os Portugueses de hoje têm plena legitimidade para lembrar a todos esses povos que, se continuarem a postergar, como tão impudicamente o estão a fazer no areópago internacional, os valores morais e os princípios imutáveis da justiça, sobre os quais se ergueram as pátrias e se cimenta a dignidade da pessoa humana, não poderão sobreviver, e não sobreviverão, a esse nefasto procedimento.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A condenação que decretarem ou consentirem, na ânsia de atingirem a radiosa integridade da grande pátria portuguesa, será baldada, mas não deixará de fazer ricochete na forte estrutura da alma lusíada, e então, retornada à origem, será tremenda condenação de quantos a subscreveram.
Grande é, Sr. Presidente, a lição que os Portugueses dão ao Mundo no honrado exemplo da sua inabalável fraternidade - tão ampla e comovedoramente demonstrada ultimamente-, na integralidade do respeito pelos direitos alheios e no seu esforçadíssimo trabalho de defesa dos grandes primados da civilização ocidental. Todos estes valores e serviços, se não valem qualquer recompensa - nós não andamos habituados a pedir que no-los paguem -, merecem, pelo menos, o respeito daqueles muitos a quem nós, os Portugueses, nunca ofendemos e... antes, temos procurado servir ao longo dos séculos, cooperando no seu engrandecimento.
O notável discurso do Sr. Presidente do Conselho, abonado na sua inabalável autoridade de destacada figura do Ocidente que o mundo civilizado respeita e bem conhece, marcou a nossa firme determinação de não alienarmos qualquer dos nossos valores tradicionais. Nada ganharão em duvidar disso os que se comprazem em nos ofender.
Sr. Presidente: temos perante nós, em cumprimento dos preceitos constitucionais, a Lei de Meios para 1961. Diploma de transcendente importância, nele se estruturam os planos para mais um ano de governo, rumo ao bem-estar e engrandecimento da Nação. Como é louvável hábito do Ministério das Finanças, a que deu inicio o titular daquela pasta e hoje nosso ilustre colega Sr. Deputado Águedo de Oliveira, a quem saúdo, a proposta de lei de autorização das receitas e despesas não é um documento árido e frio, povoado de constelações de números, mas sim um documento conscienciosamente elaborado, em que, com a afirmação das linhas mestras da nossa situação económica e financeira, se demonstram as direcções a seguir.
Continua no Ministério das Finanças a mesma política de sanidade financeira que Salazar ali implantou há três décadas, e mercê da qual as receitas e despesas reflectem, sem artifícios, um equilíbrio a todos os títulos notável.
Têm variado muito as condições de vida nacionais e internacionais depois que essa abençoada política de equilíbrio começou; ela, porém, mantém-se invariável nos seus comandos, por serem sólidos os seus fundamentos orientadores.
.Não se tem projectado, para os Portugueses, uma vida artificial cujas consequências se sentiriam nas gerações futuras. Bem ao contrário, estas - e talvez seja o maior defeito da política actual - vão receber grandes empreendimentos e vultosíssimas realizações, completa ou quase completamente liberadas de passivos, e que, pelas suas específicas condições de rentabilidade, lhes propiciarão condições de vida bastante melhores do que as que nós temos tido para lhas podermos criar.
A proposta de lei em apreciação é, assim, um documento de alto merecimento, mercê do qual nos é dado conhecer que as funções do Governo não encontrarão dificuldades de maior, na estrutura geral da política traçada, dentro da normalidade prevista. De muito valor é também o erudito parecer da Câmara Corporativa

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(...) em que a Lei de Meios se aprecia, e se reforçam, na generalidade, as conclusões de normalidade que ela contém.
Há, porém, que ler em conta que se desenha, e já com bastante nitidez, um ano agrícola com as mais desfavoráveis perspectivas e, por isso, muito pouco tranquilizador. Dir-se-ia que estamos em pleno período cíclico das «sete vacas magras»!
As condições do tempo têm sido de tal maneira adversas pelo desornamento elementos, traduzido especialmente por abundante quantidade de chuvas, que em muitas regiões não se puderam fazer as colheitas, aliás também atrasadas e comprometidas pelo atardamento provindo da pluviosidade, do ano anterior. Ouve-se por esse País fora o clamor das grandes perdas, motivado por não haverem chegado a maturação muitos dos produtos agrícolas, cuja colheita constituiria a débil remuneração de muitos dias de trabalho e de avultadas despesas.
Por outro lado, grandes calamidades flagelaram o Pais, e não posso deixar de evidenciar os graves prejuízos sofridos em todo o distrito de Coimbra, e nomeadamente na sua zona ribeirinha, onde os concelhos de Coimbra, Figueira da Foz, Montemor-o-Velho e Cantanhede tiveram, na hora trágica da fúria dos elementos, tremendas devastações aos arvoredos, nos campos, nas culturas e colheitas, que levaram à ruína grande número de remediadas economias e a um sério empobrecimento muitas outras de maior teor económico.
Para o distrito de Coimbra, já tão sacrificado e empobrecido pelo conhecido déficit ariano da sua agricultura e pelo acanhamento da sua indústria, a expectativa não é das mais, animadoras, até porque a sua importante região dos famosos campos do Mondego, outrora tão fértil e tão viçosa, cada vez mais se esteriliza com os repetidos alagamento e com a impiedosa invasão das areias que o rio vem carreando desde os alcantis que o marginam, quase, desde a sua origem, bem como dos seus afluentes.

Este tão importante problema, que a Assembleia conhece, perfeitamente através das notáveis s repelidas exposições aqui feitas pulo Sr. Deputado Santos Bessa, que anteontem ouvimos com o maior interesso referir, ainda não foi encarado como cumpria, a despeito dos muitos e muitos desvairados estudos a que vêm procedendo os organismos oficiais desde há recuados anos.
Não se pode deixar de ter em conta que, quando uma região tão importante, como é a dos campos do Mondego, pelas grandes facilidades de produtividade que ofereceu, e poderá voltar a oferecer, se deixa empobrecer até ao ponto de desolação que hoje apresenta, por não se lhe conferir a defesa apropriada contra a indisciplina dos elementos e contra a persistente invasão das areias, empobrecida fica a própria economia nacional. É que esta não poderá ressarcir-se facilmente desses vultosos prejuízos materiais, morais e sociais com um aproveitamento de outras áreas em zonas distantes, em que se começa uma produção que nunca poderá atingir o valor daquela que só perdeu nos campos tornados estéreis.
O problema dos campos do Mondego é, portanto, um dos importantes problemas a que tem de ser dada urgentemente solução conveniente, para bem na economia distrital e nacional.

O Sr. Melo Machado: - Há cerca de 24 anos, salvo erro, quando veio a esta Assembleia a proposta da hidráulica agrícola, tive ocasião de me ocupar dos campos do Mondego e logo vaticinei que seria difícil resolver o problema, porque havia duas repartições. E, de facto, ainda não e está resolvido.

O Orador: - Agradeço a intervenção de V. Ex.ª e o seu esclarecimento, mas parece-me que não são só duas repartições; são tantas que é impossível resolver o problema.
Veja V. Ex.ª como estão os campos do Mondego, há tantos anos flagelados.
Dou, por isso, o meu condicional apoio às cabidas considerações que. foram aqui proferidas pelo Sr. Deputado Santos Bessa e de que o Governo não poderá alhear-se.

Não me proponho, Sr. Presidente, no âmbito do meu depoimento, considerar com o desenvolvimento costumado a política rural e a posição das câmaras municipais perante ela, assuntos que já ouvi tratar com a mais alta proficiência.
Bastar-me-á afirmar, quanto à primeira, que me não satisfaz inteiramente o seu ordenamento já clássico na Lei de Meios, justaria de ver bastante mais concretizadas as directrizes da política que se pensa seguir em tal sentido, com mais pormenorizada indicação dos meios e medidas do seu desenvolvimento.
Eu conheço perfeitamente o mundo de dificuldades das autarquias locais, cada vez mais aumentadas e mais prementes, para que me possa conferir tranquilidade o sistema à sombra do qual os auxílios do Estado têm sido e continuarão a ser prestados ao meio rural.
Estamos a assistir ao temível engrossamento do êxodo dos povos rurais para as cidades ou para o estrangeiro. Os campos e as nossas vilas e aldeias apresentam o desolado aspecto da deserção, porque os braços dos homens válidos que trabalhavam a terra, cedendo perante o aliciamento da urbe, fugiram da empobrecida e estagnada vida rural.

A grave erosão humana - como se chamou, com muita propriedade, ao flagelo do abandono da terra - é cada vez mais premente e mais forte, pelo que impõe soluções,- de igual poder para ser sustada. Não basta planear e prescrever, mais ou menos teoricamente, é imperiosamente necessário e urgente tomar medidas operantes, a curto e a longo prazo; de contrário, o agravamento sucessivo do mundo de problemas que formam e dificultam o problema central levará a situações que podem ser catastróficas.
A industrialização só será verdadeiramente florescente na medida em que a agricultura não tenha de considerar-se a arte de empobrecer irremediavelmente.
Sem a terra nada vale a máquina, que só pode transformar aquilo que esta criou.
É por isso, Sr. Presidente, que julgo do mais alto valor e do maior interesse para a estabilidade política e económica da Nação todo o operante conjunto de medidas que venham a ser tomadas na defesa da nossa depauperada agricultura e tendentes a aliciar para o retorno ao trabalho dos campos aqueles que agora dele fogem desabridamente, como de labor maldito que traga incita a ideia trágica de permanente servidão.
Quanto ao angustiante problema das finanças das autarquias locais, sempre direi uma palavra.
Raiou uma aurora de esperança quando foi anunciada para o fim deste ano a publicação de um novo Código Administrativo. Conhecidos os vários e muito valiosos estudos sobre a calamitosa situação das finanças locais, de que »e destaca, pela justeza da sua. completa apreciação, o que foi elaborado pelo Sr. Deputado Nunes Barata, ficou a saber-se que os departamento, do Estado aos quais incumbirá a reforma desse diploma têm já seguras guias de orientação para resolverem os tremendos problemas que afligem as autarquias.
Sem embargo, chegou até mim o desencorajante rumor de que ainda por muito tempo vigorará o di-

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(...) ploma actual, desactualizada estrutura consente e impõe as mais nefastas anomalias.

O Sr. Nunes Barata: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faz favor.

O Sr. Nunes Barata: - A propósito da nova publicação do Código Administrativo devo dizer, pelo que sei que realmente não é por culpa do Ministério do Interior que não é publica até fins de Dezembro, como previa o decreto. Eu gostaria de prestar homenagem aos serviços e às diligências feitas pelo Ministério do Interior nesse sentido.

O Orador: - É realmente de enaltecer o Ministério do Interior pela sua dedicarão, que. aliás, não é nova, porque conheço um estudo já completo, feito pelo Sr. Dr Director-Geral e por um Sr. Inspector, em que o problema das finanças locais Foi convenientemente tratado e planeado. Simplesmente, não alcançou solução, porque parece que encalhou onde o Ministério das Finanças não permite que passe. Mas também será bom lembrar que o Ministro das Finanças afirmava que não era difícil resolver o problema das finanças das. câmaras municipais, mas essa afirmação não se concretizou e parece que só tarde se concretizará.

O Sr. Melo Machado: - Parece que, afinal, não raiou a esperança em que V. Ex.ª falou.

O Orador: - Muito embora me não proponha evidenciá-las neste momento, quero, no entanto, chamar a atenção do Governo para este grande problema nacional, da mais alta transcendência.
Sem organismos da administração local que possam desenvolver uma actividade eficiente, os recursos materiais que a Nação coloca ao dispor do Estado sofrem um encurtamento da sua alta utilidade.
Na verdade, não basta para que o binómio de realizações Estado-autarquias possa funcionar equilibradamente que só o Estado tenha os recursos financeiros indispensáveis.
O desenvolvimento e engrandecimento das nossas vilas e aldeias, que constituem as tarefas específicas da administração local, é exigente de uma considerável e crescente actividade, que terá de ser facilitada e não comprometida.
Tal incrementação, porém, porém só se tornará possível e será efectiva na medida em que as autarquias locais possam dispor dos meios indispensáveis a prestá-la.
Tenho advogado sempre a necessidade de se não igualizarem matematicamente os concelhos na distribuição dos subsídios e comparticipações do Estado.
Há, a meu ver, uma saliente necessidade de se fazer um inventário consciencioso das necessidades de cada concelho, ordenando-as segundo a sua premência.
Essa necessidade mais avulta nos nossos dias, dado que o actual regime de curta duração do mandato dos presidentes das câmaras exige um planeamento cuidadoso em que e possa garantir a continuidade da mesma acção.
Esta forma que se me afigura útil ajuda aos municípios mais desprovidos de técnicos seria a eficiente colaboração dos organismos oficiais do distrito com a respectiva câmara municipal, no sentido de, em conjunto, fazerem o estudo das necessidades concelhias e o planeamento económico para a sua satisfação.
Esse estudo, que forneceria os índices de possibilidade de realização do corpo administrativo, poderia servir de base à fixação do montante dos auxílios do Estado, que deveriam poder cobrir o custo total daqueles empreendi mentos que se mostrassem fundamentais para a dignidade da vida local.

O Sr. Franco Falcão: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faz favor.

O Sr. Franco Falcão: - Era justamente para corroborar aquela opinião há pouco emitida por V. Ex.ª
De facto, estudos e planeamentos há muitos; o que é preciso é estudar a forma de lhes dar execução.

O Orador: - Agradeço a V. Ex.ª. Há ainda muitas e muito imperiosas obras a executar no primeiro escalão das necessidades de maior amplitude que sentem os meios rurais.
Sr. Presidente: vou dar por findas as minhas considerações.
Tenho ouvido neste debate as mais judiciosas e pertinentes afirmações sobre os problemas encarados.
Vincou-se - e muito bem - a generalizada ideia de (pie se torna imprescindível propiciar à nossa agricultura o substancial auxílio de que ela tanto carece o criar, concomitantemente, um clima de vida mais aliciante nos nossos meios rurais, para que a eles retornem os que. os abandonaram em busca de vida de melhores perspectivas, ou não as abandonem os da geração que desponta.
Não deixará o Governo de encarar com o maior cuidado o sumário das apreciações aqui feitas e de equacionar os problemas postos, com o fim de lhes procurar as ajustadas soluções.
A proposta que nos foi submetida não tolhe qualquer iniciativa em tal sentido, e, por isso lhe darei o meu voto na sua generalidade.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Armando Cândido: - Sr. Presidente: as minhas primeiras considerações relacionam-se naturalmente com o momento que estamos vivendo.
Na verdade, para podermos estar atentos aos manejos daqueles que procuram arrancar pedaços da nossa vida para fartarem a sua ambição teremos de possuir força. E possuir força, no mundo de hoje não é só possuir as armas de paz. Também é, infelizmente, possuir as armas de guerra.
O certo é que no quadro da vida financeira do País este conceito de força tem acentuada expressão. Vejamos, por exemplo, o ano de 1960 em que a verba orçamentada de 260 000 contos para satisfazer os nossos compromissos internacionais de ordem militar sofreu um agravamento de 300 000 contos, elevando-se assim a 460 000 contos, uma das maiores somas anuais despendidas até agora, como se acentua no relatório que precede a proposta do lei de autorização de receitas e despesas que estamos a discutir na general idade.
O mesmo agravamento se repetirá no próximo ano de 1961 e tanto que se propõe um acréscimo de 500 000 contos à verba total de 3 000 000 contos que constituía o limite máximo autorizado para o conjunto das despesas de tal natureza realizadas desde 1952, como se esclarece no referido relatório. E não hesito em aprovar o acréscimo proposto, pois as circunstâncias que caracterizam a vida internacional manifestamente assim o impõem.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

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O Orador: - Quer dizer que continuarmos a colaborar na defesa, comum, mas na defesa integral. É que não existe só um compromisso de ordem pecuniária: existe um compromisso inefável de conveniência mútua, um compromisso de honra e de vontade - ia a dizer um compromisso de sobrevivência.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - A frente em que tomamos parte com o resoluto propósito de não fugir a todas as responsabilidades assumidas não pode acusar uma brecha, um desvio de amizade, uma quebra de juramento.
Juntos teremos de resolver e juntos teremos de caminhar em tudo quanto diz respeito à segurança geral.
Jamais deverão surdir injuries deslizes ou aqueles lapsos de acção que por vexes comprometem a solidariedade, nem sempre tão respeitada quanto reclamada.
Acresce que na altura em que reforçamos a verba destinada aos nossos compromissos militares nos vemos obrigados a aumentar as verbas com a defesa da comunidade nacional, agora ameaçada pelos mesmos que não cessam de ameaçar o dispositivo ocidental.
E eu pergunto:
Que seria de nós nesta grave emergência se não tivéssemos um Governo que sabe qual é o verdadeiro interesse nacional, um Governo que teve mão nas finanças, na ordem, no equilíbrio dos valores internos, que tem usado e usa os dinheiros públicos com inexcedível escrúpulo?
Que seria de nós?
Poderíamos ter as atitudes de independência que mantemos nessas assembleias políticas dispostas a entregar o Mundo aos caprichos da aritmética e às heresias do número?
Como português dou graças a Deus por lermos tomado pé na história a tempo de nos segurarmos na história do nosso tempo.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: os elementos que o Sr. Ministro das Finanças nos
enviou para nos podermos pronunciar sobre a presença proposta de lei são a demonstração plena da honestidade e da alta proficiência com que se trabalha, naquele importante sector governamental. Neles encontrei tudo quanto a minha atenção exigiu e até tudo quanto a min lia curiosidade desejou. E se vou limitar a segunda parte das minhas considerações à rubrica «política de bem-estar rural» é porque, desejando ser breve no debate, desejo ser útil nu intervenção escolhendo o tema porventura mais aliciante e, certamente, mais grato ao meu espirito.
já por mais de uma vez nesta tribuna me ocupei da vida rural com a maior devoção. Não admira! Sou um intransigente defensor da terra e não escondo o ardente desejo de regressar a ela quando for a hora de deixar os lugares que sirvo. Levarei então na consciência a certeza do dever cumprido e na alma o alvoroço de ir cumprir outro dever não menos sagrado.
Foi o poder irresistível da terra que fez exclamar a Miguel de Unamuno, nas suas Andanzas y Visiones. «junto a las rias hajas de Galicia - Nada que no seaverdad puede ser de reras poético!» e eu não sei como há homens negam esta associação da verdade com a poesia.
Tragam-me um pensador, um operário, um obreiro dos campos, umas mãos que desbastam e enriquecem a pedra, que espalham vida na tela, que decoram, que constróem, que desbravam, e eu hei-de ver sempre, necessariamente, a centelha poética, que iluminou os cérebros e aqueceu as mãos a ponto de as dotar com o sentido de acção no alcance da verdade.
A poesia, afinal, é a, grande e nobre realidade de que os homens se afastam tragicamente.
Sr. Presidente: no relatório da proposta de lei estão definidos os três objectivos essenciais da política de bem-estar rural que o Governo se propõe efectuar.
Melhorar a produção com vista ao aumento dos recursos da população, transformar o quadro rural, dotando-o com o mínimo das facilidades e comodidades que as cidades oferecem, e educar socialmente as populações de modo a levá-las a adaptar-se às normas e exigências do progresso são, com efeito, os objectivos principais de toda a política de bem-estar rural. No relatório dá-se rápido balanço aos recursos dedicados até hoje à maioria dos aglomerados rurais, e é justo que se faça aqui alusão à soma desses recursos distribuída por subsídios e financiamentos de vária natureza e por verbas inscritas no Orçamento Geral do Estado. Não se diga, pois, que os objectivos enunciados só agora constituem preocupação do Governo. Simplesmente chegou a altura de lhes poder ser dispensado maior carinho. E o que claramente transparece das medidas constantes da proposta de lei um discussão.
Dir-se-á que nos demorámos a pôr cobro à centralização das indústrias nos grandes meios populacionais?
Que as medidas de largo e imprescindível apoio ao desenvolvimento e consolidação das empresas agrícolas chegaram a tal ponto de necessidade e urgência que sem elas pode correr verdadeiro risco de existência o próprio pão que se come?
Que o planeamento regional deveria ter já vencido todas as dificuldades teóricas e passado à fase da execução na devida escala?
Que neste e naquele caso não se reconheceu à iniciativa privada o legítimo direito de intervir no desenvolvimento económico da Nação, mesmo quando assistia ao Estado a faculdade de impor as suas condições por meio de cadernos de encargos?
Também penso nisto tudo, mas sei que caminhamos, que o tempo não foi perdido e que se deixamos empolar erradamente este ou aquele acontecimento, em compensação não descuramos muitíssimo do essencial e estamos ainda na hora de remediar decidida e activamente o que falta.
Para tanto o Governo pretende, como declara no artigo 17.º da proposta, favorecer, «nomeadamente pela concessão de incentivos de ordem fiscal e de facilidades de crédito ao investimento nas regiões rurais economicamente mais desfavorecidas, a instalação de indústrias de aproveitamento de recursos locais e, bem assim, a descentralização de outras localizadas em meios urbanos».
Ao mesmo tempo vê-se através do relatório que precede a proposta de lei, designadamente na explanação do capítulo dedicado à política de bem-estar rural, que o Governo possui já elementos que o habilitam a dar início ao programa enunciado.
E não será fácil a tarefa. Estou mesmo em dizer que o Governo só por si não a poderá levar até ao fim de modo eficiente e completo.
A todos os que o puderem auxiliar caberá então uma, parcela no trabalho de esclarecimento e de preparação psicológica indispensáveis.
O sociólogo terá de explicar os inconvenientes de ordem social resultantes da concentrarão industrial, dissertando sobre os problemas sanitário e habitacional das populações urbanas sujeitas, na vizinhança das instalações fabris, ao polui mento do ar e aos ruídos, inimigos da saúde e do bom rendimento do operário.
O economista não poderá fugir à obrigação de expor os inconvenientes de ordem económica, como sejam,

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(...) entre outros, os que já vi enumerados, a saber (vide Princípios Práticos de la Localizacion Industrial - José Luís Sampedro-Aguilar - Biblioteca de Ciências Sociales).

a) Pesadas cargas financeiras, principalmente como consequência do alto valor dos terrenos;
b) Perdas de tempo devidas à congestão do tráfego nas cidades grandes, que não podem compensar até certo ponto u vantagem dos custos de transporte mais reduzidos;
c) Risco de efeitos adversos sobre o rendimento e a produção como consequência, da fadiga dos operários, por terem que percorrer longos trajectos diários entre o lar e o local de trabalho, frequentemente em condições de considerável incomodidade.
O militar intervirá com os decisivos argumentos de ordem estratégica, reclamando a dispersão da indústria por causa dos bombardeamentos aéreos em tempo de guerra, cuja terrível possibilidade revolucionou toda a técnica de localização das unidades fabris.
O político falará dos perigos a que ficam expostas as massas proletárias urbanas pela maior - permeabilidade à corruptora - e venenosa sedução marxista.
O escritor, nos seus contos, novelas e romances, aproveitará os dramas do urbanismo industrial para os descrever de modo a que todos possam extrair a lição salutar do apego à terra.
E o poeta, esse cantará, como ninguém, a canção da aldeia-mãe.
É que o problema da industrialização das áreas rurais apresenta muitas dificuldades para a sua resolução.
Não se deverá, por exemplo, fazer com que desapareça, por completo o ambiente rural e as suas vantagens.
Terá de se verificar antecipadamente a extensão de fenómeno em cada área através dos seus reflexos prováveis da própria estrutura agrícola.
Há que contar, sobretudo, com o factor tempo, por a industrialização rural, como anotam, os especialistas na matéria, significa um passo para um novo género de vida que só pude dar-se lentamente, sob pena de não se chegar a resultados seguros.
Por tudo e por isto mesmo não bastará a mobilização dos recursos materiais. Teremos, e quanto antes, de nos lançarmos com força numa ardente a extensa campanha para a mobilização dos recursos espirituais.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Precisamos de vencer a barreira psicológica, de formar o clima mental.
Este amor à terra que sinto e não escondo não é, por exemplo, unicamente atávico. Tive na minha juventude - não me canso de o repetir - quem me doutrinasse no apego ao torrão natal e nunca esqueci pela vida fora as limões que acrescentaram em mim o sentimento da ruralidade. Ainda há pouco. Sr. Presidente, antes de subir a esta tribuna, reli um opúsculo que guardo religiosamente que foi escrito pelo meu grande e saudoso mestre P. Ernesto Ferreira e tem precisamente o título de Regresso à Terra.
Ia acesa em França e em outros países a luta contra o urbanismo. René Bazin e Henry e Bordeaux figuravam entre os mais valorosos combatentes. Com que devoção e sentido de oportunidade o meu inolvidável mestre nos dá nas adoráveis páginas que escreveu o impressionante relato dessa luta de gigante
Lá encontramos aquele «dasenraizado» - personagem do romance de Bordeaux Le Pays Natal - que, ao olhar um dia para a ociosidade que lavava em Paris e pensando nu sua terra, disse para consigo próprio:

A minha vida natural era aqui. Aqui, amado e respeitado de todos pelos séculos de benefícios (pie representava, mantinha eu o respeito e o amor do nome que uso. Retomava e continuava a obra benéfica dos meus.

Lá encontramos este exemplo e outros, vivos, aliciantes, irrecusáveis.
Não quero com esta gratíssima evocação dizer que se paralise a liberação da mão-de-obra realmente disponível e que tem, e terá, de ser transferida para as ocupações extra-agrícolas, no movimento de transformação demográfica que se tiver por benéfico e necessário à própria elevação da vida rural e industrial.
Subi a esta tribuna, para fazer um apelo a todos os homens de inteligência para que empenhem a sua vontade nesta batalha que o inverno se dispõe a travar e há-de levar a cabo até à vitória final com a sua determinação e a nossa ajuda.
Sr. Presidente: a proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1961 traz em si mesma o significado daquelas palavras-sintese, daquelas palavras de indiscutível comando que o Sr. Presidente do Conselho proferiu há dias nesta Assembleia:

Não vejo que possa haver descanso para o nosso trabalho nem ou outra preocupação que a de segurar com uma das mãos a charrua e com a outra a espada, como durante séculos usaram os nossos maiores.

Por um lado as verbas que serão empregadas na valorização da terra; por outro o reforço das verbas destinadas à defesa do Ocidente - à nossa defesa.
A fidelidade aos verdadeiros, condutores da Nação é da nossa história, é do nosso exemplo.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Não está inscrito mais nenhum Sr. Deputado para o debate na
Na generalidade e durante a sua discussão não foi apresentada qualquer questão prévia, pelo que considero aprovada, na generalidade, a proposta de Lei de Meios para 1961.

Vai passar-se, portanto, à discussão da mesma proposta na especialidade.
Ponho à votação os artigos 1.º, 2.º, e 3.º, que vão ser lidos.

Foram lidos. São os seguintes:

Artigo 1.º É autorizado o Governo a arrecadar um 1961 as contribuições e impostos e demais rendimentos e recursos do Estado, de harmonia com os princípios e as leis aplicáveis, e a empregar o respectivo produto no pagamento das despesas legalmente inscritas no Orçamento Geral do Estado respeitantes ao mesmo ano.
Art. 2.º Durante o referido ano ficam igualmente autorizados os serviços autónomos e os que se regem por orçamentos cujas tabelas não estejam incluídas NO Orçamento Geral do Estado a aplicar as receitas próprias em pagamento das suas despesas, umas e outras previamente inscritas orçamentos devidamente aprovados e visados.
Art. 3.º O Governo tomará as providências que em matéria de despegas públicas, se tornem necessárias para garantir o equilíbrio das contas públicas e o regular provimento da tesouraria.

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234 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 185

O Sr. Presidente: - Estão em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se nenhum Sr. Deputado deseja Iludir a palavra, vau votar-se.

Submetidos à votação, foram aprovados.

O Sr. Presidente: - Ponho agora à discussão os artigos 4.º, 5.º, 6.º, 7.º e 8.º da proposta sobre política fiscal e que constituem o capítulo 2.º, os quais vão ser lidos.

Foram lidos. São os seguintes:

Ari. 4.º No ano de 1961, enquanto nau entrarem em vigor os diplomas de reforma do imposto profissional, da contribuição predial, do imposto sobre a aplicação de capitais, da contribuição industrial o do imposto complementar, serão aplicáveis os seguintes preceitos:

a) As taxas da contribuição predial serão de 10.º) por cento sobre os rendimentos dos prédios urbanos e de 14,5 por cento sobre os rendimentos dos prédios rústicos, salvo, quanto a estes, nos concelhos em que já vigorem matrizes cadastrais, onde a taxa será de 10 por cento se as matrizes tiverem entrado em vigor anteriormente a l de Janeiro de 1958 e de 8 por cento se a sua vigência for posterior àquela data;
b) O valor dos prédios rústicos e urbanos para efeitos da liquidação da sisa e do imposto sobre as sucessões e doações ficará sujeito ao regime estabelecido no corpo do artigo 6.º da Lei n.º 2038, de 28 de Dezembro de 1949, continuando também a observar-se o disposto nu § 2.º do mesmo artigo;
c) O adicional sobre as colectas da contribuição predial rústica que incidem sobre prédios cujo rendimento colectável resulta de avaliarão anterior a l de Janeiro de 1940 ficará sujeito ao preceituado no artigo 7.º da Lei n.º 2038, de 28 de Dezembro de 1949;
d) As disposições sobre o imposto profissional constantes do artigo 9.º da Lei n.º 2038 de 28 de Dezembro de 1949, e do segundo período do artigo 8.º da Lei n.º 2079, de 21 de Dezembro de 1955 permanecem em vigor;
e) São mantidas as disposições das alíneas c), f) e g) do artigo 5.º da Lei n.º 2095 de 23 de Dezembro de 1958, bem como as do Decreto n.º 42 101 de l5 de Janeiro de 1959.

§ 1.º Os preceitos das alíneas a), c), d) e e) deixarão de ter aplicação à medida que entrarem em vigor as disposições de cada um dos diplomas que com eles se relacionem; e o da alínea b) manter-se-á até à actualização dos rendimentos matriciais que vier a ser estabelecida nos respectivos diplomas.
§ 2.º Continuarão isentos da taxa de compensação criada pelo artigo 10.º da Lei n.º 2022, de 22 de Maio de 1947, os rendimentos dos prédios rústicos inscritos nas matrizes cadastrais, qualquer que seja a taxa da contribuição predial que lhes corresponda.
Art. 5.º São mantidos no ano de 1961 os adicionais discriminados nos n.(tm) 1.º e 3.º do artigo 6.º do Decreto n.º 35 423, de 29 de Dezembro de 1945.
Art. 6.º Fica o Governo autorizado a prorrogar, com as alterações que se mostrarem convenientes, as providências de ordem fiscal em vigor até 31 de Dezembro de 1960 destinadas a favorecer os investimentos que permitam novos fabricos, redução do custo e melhoria de qualidade dos produtos.
Art. 7.º É o Governo também autorizado a proceder no decurso de 1961, à remodelarão da tabela geral do imposto do selo e seu regulamento, bem como das leis que estabelecem regimes tributários especiais, nomeadamente para o efeito de ajustar os seus preceitos, à tributação directa dos rendimentos.

Art. 8.º Durante o ano de 1961 é vedado criar ou agravar taxas e outras contribuições especiais não escrituradas em receita geral do Estado, a cobrar pelos serviços do Estado, pelos organismos de coordenarão económica e pelos organismos corporativos, sem expressa concordância do Ministro das Finanças.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se nenhum Sr. Deputado deseja usar da palavra, vão votar-se.

Submetidos à votação, foram aprovados.

O Sr. Presidente: - Vai agora pôr-se em discussão o artigo 9.º, sobre funcionamento dos servidos, que vai ser lido.

Foi lido. É o seguinte:

Art. 9.º Durante o ano de 1961, além da rigorosa economia, a que são obrigados os servidos públicos na utilização das suas verbas, principalmente na realização de despesas de consumo corrente, o Governo providenciará no sentido de reduzir ao mínimo os gastos de carácter sumptuário e limitar as despesas fora do País com missões oficiais aos créditos ordinários para o efeito concedidos.
S único. Estas disposições aplicar-se-ão a todos os serviços do Estado, autónomos ou não bem como aos organismos de coordenação económica e nos corporativos.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

O Sr. Presidente: - Se nenhum Sr. Deputado deseja pedir a palavra, vai votar-se.

Submetida à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Ponho agora à discussão o artigo 10.º, relativo a providências sobre o funcionalismo, que vai ler-se.

Foi lido. É o seguinte:

Art. 10.º Durante o ano de 1961 o Governo prosseguirá, de harmonia com as possibilidades do Tesouro, na política de revisão das condições económico-sociais dos servidores do Estado.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

Pausa.

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O Sr. Presidente: - Se nenhum Sr. Deputado deseja usar da palavra, vai votar-se.

Submetida à votação, foi provado.

O Sr. Presidente: - Ponho agora em discussão os artigos 11.º e 12.º, sobre saúde pública e assistência, que vão ler-se.

Foram lidos, são os seguintes:

Art. 11.º No ano de 1961 o Governo continuará a dar preferência, na assistência à doença, ao desenvolvimento do programa de combate à tuberculose, para o que serão inscritos no orçamento Geral do Estado as verbas consideradas indispensáveis.
Art. 12.º O Governo iniciará em 1961 a execução de um plano de reapetrechamento dos hospitais, de modo a que estes possam cumprir eficientemente a sua missão assistêncial.

§ único. Para os efeitos deste, artigo, será inscrita na despesa extraordinária do Ministério da Saúde e Assistência a dotação considerada necessária, com cobertura no excesso das receitas ordinárias sobre as despesas da mesma natureza ou nos saldos de contas de anos finitos de anos económicos findos.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se nenhum Sr. Deputado deseja fazer uso da palavra, vão votar-se.

Submetidos à votação, foram aprovados.

O Sr. Presidente: - Ponho seguidamente em discussão os artigos 13.º, 14.º e 15.º que constituem o capítulo 6.º, relativo a investimentos públicos.
Vão ler-se.

Foram lidos. São os seguintes:

Art. 13.º O Governo inscreverá no orçamento para 1961 as verbas declinadas à realizarão de obras, melhoramentos públicos e aquisições previstas no Plano de Fomento ou determinadas por leis especiais e, bem assim, de outras que esteja legalmente habilitado a inscrever em despesa extraordinária, devendo, quanto a estas, e sem prejuízo da conclusão de obras em curso, adoptar quanto possível dentro de cada alínea a seguinte ordem de preferência:

a) Termo da concessão do porto e caminhe de ferro de Mormugão:
b) Fomento económico:

Aproveitamento hidráulico de bacias hidrográficas;
Fommento de produção mineira e de combustíveis nacionais;
Povoamento floresta] e defesa contra a erosão, com modalidades não previstas pelo Plano de Fomento;
Melhoramentos rurais e abastecimento de água.

c) Educação e cultura:

Reapetrechamento das Universidades e escolas:
Construção e utensilagem de edifícios para Universidades;
Construção de outras escolas.

d) Outras despesas:

Edifícios para serviços públicos;
Material de defesa e segurança pública;
Trabalhos de urbanização, monumentos e construções de interesse para o turismo: Investimentos de interesse social, incluindo dotações para as Casas do Povo.

S único. O Governo inscreverá no orçamento para 1961 as dotações necessárias para ocorrer às despesas de emergência no ultramar e bom assim, a verba indispensável para pagar a The West of Índia Portuguese Guaranteel Railway Company LAD.. a quantia a que esta tiver direito, nos termos do contrato autorizado pelo Decreto-Lei n.º 39 950, de 14 de Maio de 1954, em virtude da denúncia do contrato de concessão do porto e caminho de ferro de Mormugão, efectuada em 31 de Março de 1959, com efeito em 31 de Março de 1961.

Art. 14.º No ano de 1961 o Governo prosseguirá na execução do plano de apetrechamento em material didáctico e laboratorial das Universidades e escolas.
§ único. Para esse efeito será inscrita na despesa extraordinária do Ministério da Educação Nacional a verba considerada indispensável, com cobertura no excesso das receitas ordinárias sobre as despesas da mesma natureza ou nos saldos de contas de anos económicos findos.
Art. 15.º O Governo inscreverá como despesa extraordinária em 1961 as verbas necessárias para pagar ao Instituto Geográfico e Cadastral os levantamentos topográficos e avaliações a que se refere o Decreto-Lei n.º 31 075 de 20 de Abril de 1942.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se nenhum Sr. Deputado quer pedir a palavra, vão votar-se

Submetidos à votação, foram aprovados.

O Sr. Presidente: - Segue-se, agora a discussão do capitulo VII - Política de bem-estar rural - que compreende os artigos 16.º, 17.º e 18.º Vão ler-se.

Foram lidos. São os seguintes:

Art. 16.º Os auxílios financeiros destinados a promover o aumento do bem-estar rural, quer soja m prestados por força de verbas inscritas no Orçamento Geral do Estado quer sob a forma de subsídios ou financiamentos de qualquer natureza, devem destinar-se aos fins estabelecidos nas alíneas seguintes, respeitando quanto possível a sua ordem de precedência:

a) Abastecimento de água, electrificação e saneamento;
b) Estradas e caminhos;
c) Construção de edifícios para fins assistenciais ou para instalação de serviços e de casas, nos termos do Decreto-Lei n.º 34 486 de 6 de Abril de 1945;

d) Matadouros e mercados.

§ 1.º As disponibilidades das verbas inscritas no Orçamento Geral do Estado para melhoramentos rurais ou para qualquer dos fins previstos no corpo

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236 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 185

(...) deste artigo não poderão servir de contrapartida para reforços de outras dotações.

§ 2.º Nas comparticipações pelo Fundo de Desemprego observar-se-á, na medida aplicável, a ordem de precedência do corpo deste artigo.
Art. 17.º O Governo favorecerá. nomeadamente pela concessão de incentivos de ordem fiscal e de facilidades de crédito ao investimento nas regiões rurais e economicamente mais desfavorecidas, a instalação de indústrias de aproveitamento de recursos locais e, bem assim, a descentralização de outras localizadas em meios urbanos.

Art. 18.º O Governo inscreverá como despesa extraordinária a dotação indispensável à satisfação das importâncias devidas às Casas do Povo, nos termos do decreto-lei n.º 40 199, de 23 de Junho de 1955, com a redacção dada aos seus artigos 2.º e 3.º pelo decreto-Lei n.º 40 970 de 7 de Janeiro de 1957.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se nenhum Sr. Deputado deseja usar da palavra, vai passar-se à votação dos artigos 16.º, 17.º e 18.º

Submetidos à votação, foram aprovados.

O Sr. Presidente: - Segue-se a discussão do capítulo VIII - Encargos dos serviços autónomos com receitas próprias e fundos especiais - que compreende o artigo 19.º Vai ler-se.

Foi lido. É o seguinte:

Art. 19.º Enquanto não for promulgada a reforma dos fundos especiais, a gestão administrativa e financeira dos mesmos continuará subordinada às regras 1.ª a 4.ª do § 1.º do artigo 19.º da Lei n.º 2045, de 23 de Dezembro de 1950, igualmente aplicáveis aos serviços autónomos e aos dotados de simples autonomia administrativa.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se nenhum Sr. Deputado deseja fazer uso da palavra, vai votar-se o artigo 19.º

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Ponho agora em discussão o capítulo IX - Compromissos internacionais de ordem militar - que compreende o artigo 21.º Vai ler-se.

Foi lido. É o seguinte:

Art. 20.º É autorizado o Governo a elevar em mais 500 000 contos a importância fixada pela Lei n.º 2095, de 23 de Dezembro de 1958, para satisfazer necessidades de defesa militar, de harmonia com compromissos tomados internacionalmente, devendo 260 000 contos ser inscritos no orçamento Geral do Estado para 1961, de acordo com o artigo 25.º e seu § único da lei n.º 2050, de 27 de dezembro de 1951, e podendo essa verba ser reforçada em 1961 com a importância destinada ao mesmo fim e não despendida durante o ano de 1960.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Sr. Presidente: o problema dos encargos militares com a defesa comum foi discutido largamente nas comissões parlamentares a que, por direito próprio, tem presidido o nosso ilustro o querido colega Dr. Águedo de Oliveira, presidente da Comissão de Finanças. Com vénia, de S. Ex.ª permito-me chamar a atenção da Câmara para que não só este ano, mas nos anos anteriores, se tom debruçado e meditado sobre este problema, procurado colher esclarecimentos e sempre foram amplamente esclarecidos os Srs. Deputados acerca da justificação destes encargos, originados em compromissos internacionais que o Governo assumia e lhe cumpre - todos o entendemos bem - respeitar.
Compreendemos o peso que representam na vida económica nacional. Compreendemos, porém, também que o Governo os não aceitou de ânimo leve.
Temos aqui, em ocasiões várias, apreciado e discutido a intensidade com que procura o Governo canalizar os disponíveis recursos para os investimentos. Se de alguma crítica o nosso Ministério das Finanças tem aqui sido passível não é a de não procurar, por todos os meios, incentivar o investimento; tem sido as vezes, a de, por mor dessa intenção e desse esforço, ter porventura deixado de atribuir a alguns sectores da Administração aquilo que alguns têm como indispensável aos consumos normais dos serviços. Sabemos, por isso, que todos estes aspectos foram ponderados e pesados e por esse motivo nunca se pensou trazer esta questão a debate. Mas se alguma vez, a nosso aviso, o problema não podia nem devia ser levantado, era nesta altura...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - ...em que paira no Mundo um perigo maior e uma preocupação que mais directamente nos atinge.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Estamos aqui conscientes da nossa responsabilidade e do nosso dever. É em nome dessa consciência do dever que, neste momento, me pareço que só podemos dizer que não temos o direito de regatear ao Governo a autorização de que carece para fazer face às exigências da defesa ocidental, que é indispensável à defesa do Ocidente, à nossa defesa.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Cota Morais: - Sr. Presidente: pedi a palavra para manifestar a minha satisfação em dar o meu voto a este artigo 20.º da proposta apresentada pelo Governo, porque, na realidade, não posso concordar, de maneira alguma, com a proposta de alteração apresentada na Câmara Corporativa, por duas razoes capitais:
A primeira, porque se S. Ex.ª o Ministro propôs a elevação do plafond legal relativo às despesas com os compromissos internacionais de ordem militar é porque tinha razões profundas para o fazer.
A inteligência, a competência e a dedicação com que S. Ex.ª tem actuado no seu Ministério dão-nos a garantia absoluta de que u fixação dessa verba é indispensável.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - A segunda razão é porque no momento actual, como muito bem frisou há pouco o ilustre Deputado que acabou de falar, num momento de crise internacional, num momento em que há uma campanha

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16 DE DEZEMBRO DE 1960 237

(...) de injúrias contra Portugal, a defesa nacional deve merecer toda a nossa atenção.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Como todos sabem, o plafond legal não indica que só trata de uma despesa obrigatória, ou de uma despesa que tenha forçosamente de se fazer, pois constitui apenas um limite máximo, que temos a certeza o Governo com a preocupação costumada procurará não atingir, mas que o habilita a fazer face a qualquer eventualidade quo possa surgir.
Pela primeira vez que apareceu um aumento substancial nas verbas da defesa nacional o decreto respectivo. referindo-se a essas verbas, dizia: «Podemos lamentar a necessidade, mas não se poderá negar a aprovação de tais verbas, isto é, os encargos que elas nos trazem».
Portanto, é de toda a justiça a aprovação do artigo 20.º tal como consta da proposta do Governo.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - Continua em discussão o artigo 20.º

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como mais nenhum Sr. Deputado pediu a palavra, vai votar-se.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Solicito de V. Ex.º
que fique consignado no Diário das Sessões que o artigo 20.º foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - O pedido de V. Ex.ª será atendido.

Vão agora discutir-se os artigos 21.º e 22.º
Vão ser lidos.

Foram lidos. São os seguintes.

Art. 21.º são aplicáveis no ano de 1961, as disposições dos artigos 14.º e 16.º da Lei n.º 2038, de 28 de dezembro de 1949.

Art. 22.º o regime administrativo previsto no decreto-Lei n.º 31 286 de 28 de Maio de 1941, é extensivo às verbas inscritas no Orçamento Geral do Estado com destino á manutenção do ultramar e á protecção de refugiados.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como nenhum Sr. Deputado deseja fazer uso da palavra, vai proceder-se à votação dos artigos 21.º e 22.º

Submetidos à votação, foram aprovados.

O Sr. Presidente: - Está concluída a discussão da proposta de lei de autorização de receitas e despesas para 1961.

Como a Câmara vai suspender os seus trabalhos é urgente que a nossa Comissão de Legislação e Redacção elabore a última redacção do texto acabado de votar.
Julgo interpretar o sentimento da Assembleia propondo e dando um voto de confiança a essa Comissão para a realização desse trabalho.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - Oportunamente será anunciada a data da reabertura dos trabalhos da assembleia, bem como a respectiva ordem do dia.

Cumprimentos de boas-festas a todos VV. Ex.ªs
Está encerrada a sessão.

Eram 15 horas e 10 minutos.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Adriano Duarte Silva.
Agnelo Orneias do Rego.
Agostinho Gonçalves Gomes.
Alberto Pacheco Jorge.
Américo da Costa Ramal lio.
António Calheiros Lopes.
António de Castro e Brito Meneses Soares.
António Jorge Ferreira.
António Pereira de Meireles Bocha Lacerda.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Francisco José Tasques Tenreiro.
Henrique dos Santos Tenreiro.
João Augusto Marchante.
João Cerveira Pinto.
Joaquim Mendes do Amaral.
Jorge Pereira Jardim.
José Gonçalves de Araújo Novo.
José Guilherme de Melo e Castro.
Luís Maria da Silva Lima Valeiro.
Luís Tavares Neto Sequeira de Medeiros.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel Maria de Lacerda de Sousa Aroso.
Manuel Maria Sarmento Rodrigues.
Manuel Seabra Carqueijeiro.
Manuel Tarujo de Almeida.
Purxotoma Ramanata Quenin.
Ramiro Machado Valadão.

O REDACTOR - Leopoldo Nunes

Imprensa Nacional de Lisboa

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