O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 425

REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 198

ANO DE 1961 10 DE FEVEREIRO

VII LEGISLATURA

SESSÃO N.º 198 DA ASSEMBLEIA NACIONAL

EM 9 DE FEVEREIRO

Presidente: Exmo. Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.

Secretários: Exmos. Srs.
Fernando Cid Oliveira Proença
António José Rodrigues Prata

SUMÁRIO: - O Sr. Presidenta declarou aberta a sessão às 16 horas e 40 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foi aprovado à Diário das Sessões n.º 197.

Deu-se conta do expediente.

Acerca do caso do Santa Maria, dos acontecimentos de Luanda e do comunicado de alguns representantes da Oposição falaram os Srs. Deputados Júlio Evangelista, Alberto Cruz, André Navarro e Camilo de Mendonça, que mandou para a Mesa uma moção, também assinada pelos outros oradores.

A moção foi aprovada por unanimidade.

Sobre ela também usou da palavra o Sr. Presidente.

O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas e 13 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 16 horas e 35 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Afonso Augusto Pinto.
Agostinho Gonçalves Gomes.
Aires Fernandes Martins.
Alberto Cruz.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Pacheco Jorge.
Alberto da Rocha Cardoso de Matos.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Américo Cortês Pinto.
André Francisco Navarro.
Antão Santos da Cunha.
António Calapez Gomes Garcia.
António Calheiros Lopes.
António Carlos dos Santos Fernandes Lima.
António de Castro e Brito Meneses Soares.
António Cortês Lobão.
António Jorge Ferreira.
António José Rodrigues Prata.
António Maria Vasconcelos de Morais Sarmento.
António Pereira de Meireles Rocha Lacerda.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Máximo Saraiva de Aguilar.
Artur Proença Duarte.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Avelino Teixeira da Mota.
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos Coelho.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Domingos Rosado Vitória Pires.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando António Munoz de Oliveira.
Fernando Cid Oliveira Proença.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco José Vasques Tenreiro.
Frederico Bagorro de Sequeira
Henrique dos Santos Tenreiro.
Jerónimo Henriques Jorge.
João Augusto Marchante.

Página 426

426 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 198

João de Brito e Cunha.
João Carlos de Sá Alves.
João Cerveira Pinto.
João Pedro Neves Clara.
Joaquim de Pinho Brandão.
Jorge Pereira Jardim.
José António Ferreira Barbosa.
José Dias de Araújo Correia.
José F amando Nunes Barata.
José de Freitas Soares.
José Garcia Nunes Mexia.
José Gonçalves de Araújo Novo.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Hermano Saraiva.
José Manuel da Costa.
José Monteiro da Rocha Peixoto.
José Rodrigo Carvalho.
José Rodrigues da Silva Mendes.
José dos Santos Bessa.
José Sarmento de Vasconcelos e Castro.
José Soares da Fonseca.
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Laurénio Cota Morais dos Reis.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Luís Tavares Neto Sequeira de Medeiros.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel Maria Sarmento Rodrigues.
Manuel Nunes Fernandes.
Manuel Seabra Carqueijeiro.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Manuel Tarujo de Almeida.
D. Maria Irene Leite da Costa.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Reis.
Mário Ângelo Morais de Oliveira.
Mário de Figueiredo.
Martinho da Costa Lopes.
Paulo Cancella de Abreu.
Rogério Noel Peres Claro.
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães.
Tito Castelo Branco Arantes.
Urgel Abílio Horta.
Virgílio David Pereira e Cruz.
Vítor Manuel Amaro Salgueiro dos Santos Galo.

O Sr. Presidente: - Estão presente 86 Srs. Deputados.

Está, aberta a sessão.

Eram 16 horas e 40 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Está em reclamação o Diário das Sessões n.º 197.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como nenhum dos Srs. Deputados deseja fazer qualquer rectificação, considero aprovado aquele número do Diário.

Deu-se conta do seguinte.

Expediente

Ofício

Do Grémio da Lavoura de Montemor-o-Velho a apoiar a intervenção do Sr. Deputado Santos Bessa sôbre a calamidade que em Outubro de 1960 assolou os campos do Mondego.

Telegramas

Vários a apoiar as intervenções dos Srs. Deputados Santos Bessa e Augusto Simões referentes à proposta de lei relativa ao plano de viação rural.

O Sr. Presidente: - Estão inscritos para usar da palavra sôbre o caso do paquete Santa, Maria, sôbre os acontecimentos de Angola e sôbre o comunicado de alguns representantes da Oposição os Srs. Deputados Júlio Evangelista, Alberto Cruz, André Navarro e Camilo de Mendonça.

Vou dar a palavra a estes Srs. Deputados, pela ordem que acabo de indicar, e, dada a importância do assunto, convido esses Srs. Oradores a subirem à tribuna.

Tem a palavra o Sr. Deputado Júlio Evangelista.

O Sr. Júlio Evangelista: - Sr. Presidente: não foi por acaso que surgiu, nesta eventualidade da vida nacional, o comunicado dos comissionados recebidos na Presidência da República em 6 do corrente. Também não foi por acaso que os signatários o fizeram distribuir, de preferência, pelas agências noticiosas, pelos correspondentes da imprensa estrangeira, pelas missões diplomáticas acreditadas em Lisboa.

Tudo isto se enquadra perfeitamente na linha de sucessos que - recobrando alento após as famigeradas votações de Novembro passado nas Nações Unidas - já conta no seu activo criminoso, contra a Pátria Portuguesa, o assalto ao paquete Santa Maria e os graves acontecimentos provocados em Luanda. Nada acontece por acaso nesta hora em que a traição ascendeu na ordenança, justificando-se com a proclamada «força invencível de novas ideologias em marcha»!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Em tal ordem de ideias, ao assassínio e ao roubo chama-se «início de revolta política»; ao que foi mandado executar pelo Directório Revolucionário Ibérico - segundo declarações dos próprios executores - diz-se que foi um «acto político revolucionário, chefiado por um português, sob a bandeira portuguesa».

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Oculta-se que o Directório é ibérico, e não português; oculta-se que o bando de larápios e matadores - aparentemente capitaneado por um indivíduo nascido em Portugal - era na quase totalidade constituído por estrangeiros a soldo de uma organização terrorista internacional!

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Diz-se despudoradamente que foi um acto praticado sob a bandeira portuguesa aquilo que se executou sob o signo da Ibéria: a bandeira do Directório, Revolucionário Ibérico de Libertação nunca foi, nem será nunca, a bandeira de Portugal!

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Manifesta-se certa espécie de solidariedade com o terrorista confesso que, em entrevista concedida a um diário parisiense e reproduzida hoje na imprensa portuguesa, se vangloria de ter ordenado atentados à bomba em Espanha nos meses de Janeiro e Junho do ano passado!

O que se pretendeu, afinal, com este comunicado? Entre outros desígnios, houve seguramente o de forne-

Página 427

10 DE FEVEREIRO DE 1961 427

cer argumentos aos inimigos de Portugal. E só por isso houve tanta diligência em dá-lo a conhecer à imprensa estrangeira e às missões diplomáticas.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Alguém duvida de que este comunicado vai dar pasto sinistro a longos ataques contra Portugal? Alguém duvida do deliberado, propósito com que nele se emprega a expressão «administração colonial» e se lança o epíteto de «imperialista» sobre a política ultramarina portuguesa? Alguém duvida de que este documento vai ser explorado contra Portugal, pelos nossos mais rancorosos inimigos, em longos ataques a lançar da tribuna das Nações Unidas? E alguém duvida de que isso esteve na primeira linha de intenções dos seus autores?

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Alguém terá a ingenuidade de supor que, no referente ao acórdão do(r) juizes da Haia sobre os territórios portugueses do Indostão, foi por acaso que os signatários falaram pela boca da União. Indiana? Não! Não foi apenas para efeitos políticos internos que se pretendeu minimizar essa vitória do direito sobre a força e o reconhecimento iniludível pela mais alta instância internacional dos nossos títulos de soberania. Não foi por acaso que se repetiu a argumentação improvisada pela União Indiana, depois de refeita do desespero que o acórdão lhe havia provocado. E não será descabido lembrar que, em toda a trama contra Portugal, aparece, de braço dado com os outros traidores, um tal Caracciolo Cabral, funcionário do Alto Comissariado da Índia em Londres; e não será também descabido lembrar o papel que a própria União Indiana vem desempenhando no insidioso ataque à Pátria. Portuguesa!

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Parece que a traição pretende cativar os Governos inimigos de Portugal! E ajunte-se a agravante de os comissionados saberem que «deflagram sobre Portugal, para os aspectos dos territórios ultramarinos, campanhas internacionais portadoras do maior descrédito»! Mas essas campanhas - eles o sabem - não se dirigem particularmente contra este ou aquele Governo, suo dirigidas frontalmente contra a própria Nação e, portanto, contra todo e qualquer Governo - seja qual for a sua feição política - que se recuse a transigir sobre os sagrados e inalienáveis interesses de Portugal!

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Essas campanhas de descrédito só deixarão de se fazer sentir perante um Governo que se disponha a retalhar a Pátria e a trair Portugal!

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Será essa a eventualidade enxergada pelos signatários?

De qualquer modo, o que ressalta do comunicado é extremamente grave, nesta hora crucial da vida da Nação. Entre os Portugueses alguns traidores houve algumas vezes, asseverava o cantor das nossas glórias. E o certo é que a traição anda à solta, nesta hora cinzenta, neste medonho mar dos interesses e heresias que desvairam o Mundo. Mas a traição teve sempre um preço - em qualquer pátria e sob qualquer governo!

Sempre, nas épocas de crise da história do Mundo, ou das nações, a certos espíritos hão-de soprar, com maior ou menor vigor, os ventos da desorientação e da dúvida. E também a receptividade a esses ventos será maior ou menor, consoante a estrutura interior dos homens e dos povos.

Hoje, soprantes de desvaire e subversão, pretendem negar a própria verdade, trair soberanias, cortar de um golpe os caminhos abertos pela História, ao serviço da Pátria - para louvar a Deus! E em tais momentos não estranhemos se eles cruzarem os nossos próprios e experimentados caminhos.

É alucinante, nesta hora da História, a subversão de conceitos e valores. Chesterton - o predilecto e sempre rejuvenescido Chesterton - referia-se àquelas virtudes desvairadas que, deslocadas ou separadas umas das outras, causam piores males do que muitos vícios. E falava de G. B. Shaw, dizendo que tinha um grande coração, mas fora do seu lugar!

O Mundo de hoje, acicatado por hábeis criminosos, vai muitas vezes atrás de ideias que lhe apresentam como generosas, e, todavia, causam piores males du que muitas injustiças e revoltas e subversões. As virtudes entoleceram, e também o Mundo traz o coração fora do seu lugar!

O Sr. André Navarro: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: «Fora a política!». Foi este grito que serviu de título a um histórico artigo de António Enes, o vigoroso director de O Dia, espírito multiforme, que foi jornalista, dramaturgo, estadista, comissário régio e diplomata; homem de carácter, firme como poucos, fiel à sua pátria e às suas convicções políticas, exemplo singular de quem serviu devotadamente, nas horas mais ingratas, o interesse nacional.

O Sr. Pinto de Mesquita: - Muito bem!

O Orador: - Nunca escolheu os postos; disciplinadamente, aceitava aqueles que o serviço da Pátria lhe ia destinando.

O editorial de O Dia de 9 de Fevereiro de 1890 - hoje precisamente se cumprem 71 anos sobre esse artigo - intitulava-se «Fora a Política!». Atravessávamos uma das crises mais difíceis da vida portuguesa, derivada dos eventos ultramarinos; a ameaça era constante; a conjura internacional da força e da mentira tentava, como hoje, enlear-nos de forma avassaladora; a crise política interna ia-se processando aos tropeções. Sem força, com o vírus das dissidências a corroer a união política, tornava-se indispensável um aviso viril e quiçá demagógico.

Tem tal actualidade o artigo de António Enes que não resisto a ler perante esta Câmara alguns dos seus passos: «Sacrifiquem ao patriotismo o seu partidarismo, que pouco sacrificam - dizia ele - e incorporem-se no movimento nacional sem intenções reservadas, sem programas de exclusão ou de demolição, sem gritos que afugentem condições alheias. Todas as bandeiras políticas se devem abater diante da bandeira da Pátria. Só seremos fortes sendo Tinidos e só poderemos ter união esquecendo-nos de que somos monárquicos ou republicanos, regeneradores ou progressistas, para só nos lembrarmos de que somos Portugueses!».

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Era naturalmente qualquer coisa assim que o venerando Chefe do Estado esperava escutar dos comissionados.

Vozes: - Muito bem!

Página 428

428 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 198

O Orador: - Julgou que haviam sido tidos em devida conta os seus repetidos apelos à unidade de todos os portugueses, sob a bandeira da Pátria, que de todos é

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Julgou que recebia gente correcta. Mas ainda aqui o Sr. Presidente da República usou da nobreza que todos os portugueses lhe reconhecem, teve um procedimento irrepreensível, que nos leva a reafirmar-lhe o nosso extremo respeito. O Chefe do Estado ainda uma vez cumpriu o seu dever!

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - O denominador comum, hoje como ontem, é o interesse nacional: à volta dele, e contra o inimigo, qualquer que seja, temos de unir fileiras como um feixe indestrutível e como um luminoso raiar, do Sol! Ceda cada um de nós no seu partidarismo, que pouco sacrifica, e incorpore-se patriòticamente no movimente nacional exigido por esta hora! Quando a conjura internacional se dirige contra o nosso ultramar - é dever de todos os portugueses sacrificar ao patriotismo as suas predilecções ideológicas.

O Sr. André Navarro: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Neste sentido temos de bradar, como António Enes: «Fora a política!».

A história é construída em gerações solidárias, em comunidade de pessoas, ideais, vontades, para a acção criadora e dinâmica. A história é a marca do homem no Mundo, é o espírito harmonizando e libertando, é o esforço épico para sair do egoísmo e da fatalidade material. Na história se afirmam os povos e se distinguem, isto é, honram-se! Portugal, fonte de espírito, madre bendita onde os povos se prolongam, consciencializam ascendem na civilização e na cultura; Portugal, nação atlântica e anunciadora de universalismo; Portugal disciplinado e idealista, amante da justiça, cadinho secular onde as raças se caldeiam e fraternalmente comungam; Portugal, lírica epopeia a repercutir-se pelos continentes e pelas campinas celestes - ah! Que não podemos deixar de obedecer a este ancestral destino!

Para Portugal é a hora da vigília. Unidos em todas as latitudes, como ala escorreita e irresistível das antigas batalhas: um pensamento a mandar; órgãos a executar; e o corpo a obedecer! Na unidade reside o segrede da nossa vitória. É a hora da vigília!

Vigília de fé, e não de pessimismos, de esperança, e não de receios, ousada e viril, mas em todo o caso vigília! Quanto aos problemas que nos dividem, o nenhum é tão urgente nem tão exaltado quê não possa aceitar umas tréguas da Pátria, como dantes os campeões aceitavam tréguas de Deus!».

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador foi muito cumprimentado.

O S:. Alberto Cruz: - Sr. Presidente: como é meu hábito vou exprimir em poucas palavras o meu pensamento sobre recentes factos que são objecto de preocupação na hora presente.

Noticiam os jornais que três chefes ou pseudocheïes da oposição à actual situação política solicitaram uma audiência a S. Ex.ª o Presidente da República.

Julgava eu, ingenuamente, e como eu muitas pessoas, que essa entrevista tinha por finalidade manifestar ao venerando Chefe do Estado a repulsa dos oposicionistas que se dizem portugueses às declarações, feitas lá fora pelos que se arvoraram em chefes de bandos internacionais, que assaltaram um pacífico barco de passageiros que arvorava a bandeira de Portugal, que assassinaram e feriram alguns dos seus tripulantes, que mantiveram durante muitos dias homens, mulheres e crianças sobre a ameaça de morte por armas de fogo ou por afundamento do navio.

Nas suas declarações, feitas exclusivamente com fins de baixa propaganda política, também não se insurgiram contra os que em terras portuguesas de África, que viviam em paz e sossego, atacaram agentes da ordem e, mancomunados com mercenários estrangeiros, atentaram contra a nossa indiscutível soberania, servindo-se de todos os meios para a consecução dos seus torpes desígnios.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - É simplesmente revoltante que estes homens, aproveitando-se das dificuldades da hora presente e da ofensiva de todas as alfurjas mundiais contra o nosso país, queiram estabelecer a confusão nos espíritos e cavar fossos entre todos os que sentem na sua alma o amor a Portugal, a esta pátria que, no momento actual, assombra o Mundo com a sua atitude firme e decidida de defender todos os seus territórios de aquém e de além-mar, contra tudo e contra todos.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Não precisavam de vir a público com tal nota para ficarmos a saber o que já era do nosso inteiro conhecimento, isto é, que tais senhores se solidarizam inteiramente com todos os inimigos da Pátria, levados só pelo ódio aos que têm sacrificado a sua vida ao serviço da Nação, dando-lhe a prosperidade que todos conhecem, transformando totalmente a sua fisionomia, testemunhada por portugueses e estrangeiros, cujas afirmações são objecto diariamente de espontâneas declarações em todos os órgãos de informação nacionais e estrangeiros.

Ao que pode levar a cegueira das paixões políticas, ou, melhor, o ódio e a ambição do mando de tais senhores! ...

Depois do que escreveram, venham ainda dizer que em Portugal não há liberdade, apesar de lhes terem consentido fazer circular tão infeliz e antipatriótico documento.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Mas descansem todos os portugueses dignos deste nome. O património nacional está confiado em boas mãos, e tanto a bordo do Santa Maria como em terras de Angola foi imediata a reacção, embora preciosas vidas humanas fossem sacrificadas em holocausto à integridade da Pátria.

Mas descansem todos os portugueses, que as forças directamente encarregadas da manutenção da ordem - o Exército, a Marinha e a Aviação, como demonstraram agora em Angola e o demonstrarão onde for preciso - são compostas só de portugueses, herdeiros de gloriosas tradições, que jamais consentirão, sem o devido e imediato castigo, sacrílegos atentados à integridade da Pátria e à bandeira que a simboliza, desfraldada em todas as terras que os nossos maiores legaram e fertilizaram com o seu suor e o seu sangue generoso.

Página 429

10 DE FEVEREIRO DE 1961 429

Honra a todos os que cumprirem galhardamente o seu dever, aos que sobreviveram e aos que caíram vítimas das balas dos sicários a soldo do comunismo.

Honra também à imprensa portuguesa, que tem demonstrado, sem quebra das ideologias políticas que professe ...

Vozes:- Muito bem, muito bem!

O Orador: - ...o seu patriotismo e incitado todos os portugueses a cerrarem fileiras em torno do Governo da Nação, que tem provado de forma, insofismável bem zelar os interesses da Pátria, o seu bom nome ...

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - ... a sua integridade, e trabalhado sempre para a sua grandeza e prestígio no concerto mundial das nações.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. André Navarro: - Sr. Presidente: através da imprensa diária, cuja admirável lição de patriotismo e de independência neste período conturbado de vida internacional me apraz realçar, teve o País conhecimento da nota antipatriótica subscrita por um grupo de indivíduos que se intitula representativo da oposição à actual situação política.

Vejo, pelas afirmações expressas nesse incrível comunicado, que o grupo tão representativo da Oposição, como se afirma, procura mantê-la inteiramente divorciada dos superiores interesses da Nação, ...

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - ... tentando minar apenas a resistência deste admirável povo sujeito hoje aos embates de uma guerra fria, vigorosa ofensiva de uma força internacional que tem como único fito a destruição de um dos mais sólidos baluartes da defesa do Ocidente.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Confunde-se nesse escrito, e com o único propósito de desvirtuar factos, dando declarado apoio a um acto criminoso praticado por um bando de gangsters internacionais chefiados por um pirata, acto de verdadeiros corsários, como era comum em épocas recuadas da nossa história, quando mareantes portugueses torneavam as costas do Norte da Europa e mais tarde das Américas e do Extremo Oriente, pretende confundir-se, digo, esse nefando crime com uma bravata revolucionária realizada em território nacional sob a protecção da bandeira das quinas! Esqueceram-se, porém, esses qualificados representantes da Oposição, de mencionar as nacionalidades da maioria dos componentes do bando criminoso e até as cores e símbolos da bandeira empunhada orgulhosamente pelo seu famigerado chefe. Definem-se assim, como dizia lapidarmente um dos órgãos da imprensa portuguesa, «perante os oposicionistas de são patriotismo, que não podem, evidentemente, numa hora grave de apelo à unidade nacional, acamaradar com estes fantasmas da desgraça, soturnos pescadores de águas turvas».

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Vemos ainda, acrescentaremos nós, esses dirigentes, que se designam representativos de massas compactas da população, darem inteira solidariedade política a posições antinacionais de uma união ibérica, com o ferrete marcadamente comunista. Vemos ainda, insisto agora, confirmado pelos próprios, as conclusões apresentadas nesta Assembleia na última sessão legislativa, quando demonstrei, em face de inúmeros documentos, a inteira submissão de Delgado e dos seus acólitos as forças do comunismo internacional.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - A finalidade desta actuação dos três dirigentes máximos da Oposição está, pois, bem patente - conseguiram apenas, marcando posição, as boas graças dos Kruschtchevs nascidos para cá dos Pirenéus.

Pretende-se também neste execrando documento, e com clara finalidade de criai- no espírito público, neste momento grave de desorientação internacional, atmosfera de derrotismo, fazer crer que as forças armadas deixaram de ser o grande sustentáculo da ordem e do progresso nacionais. Confunde-se assim, propositadamente, uma atitude de união de todas as forças nacionais em volta da única e sagrada bandeira com uma ridícula posição de desapoio a uma situação que é expressão dos anseios e das virtudes admiráveis que sempre ilustraram as nobres forças armadas de Portugal.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - E são estes signatários de tão ridículo documento, agora, pelo visto, aduladores das forças da ordem, os mesmos que apoiam o grupo de conspiradores que conspurcam terras do Brasil, atacando sistematicamente o nobre exército de Portugal em linguagem que faz coro com a de um já cómico palhaço do trabalhismo inglês.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - E, a propósito da forma como esses uivos são recebidos pela patriótica colónia portuguesa do Brasil, não deixarei de citar as seguintes palavras, pronunciadas há dias pelo ilustre presidente da Federação das Associações Portuguesas do Rio de Janeiro. Ao referir-se a Salazar, dizia este ilustre português: «Um homem que se dá totalmente ao seu país, que continua com todas as horas tomadas pela governança da Nação, que ao longo de toda a sua vida se tem dedicado exclusivamente a conduzir Portugal aos seus altos destinos. Ele é bem merecedor do respeito e da admiração de todos nós e tem-na, sem reservas, nem limites. Toda a colónia portuguesa do Rio, como todas as outras colónias portuguesas espalhadas pelo Brasil, repudiam, abertamente, o acto de Galvão e as atitudes de Humberto Delgado».

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - «Este, aliás, está completamente à margem dos núcleos portugueses, como o estará Galvão, como estão todos os poucos que navegam nas mesmas águas turvas que estes dois indivíduos. Constituem para nós simplesmente motivo de tristeza e para os brasileiros nossos amigos - que são a grande maioria - motivo de escárnio. Desrespeitando todas as regras de hospitalidade - e, creio bem [dizia esse ilustre português], embora não seja jurista, que as normas reguladoras do asilo político -, Humberto Delgado fala como se fosse o chefe de uma grande revolução vitoriosa, e não de uma quadrilha de gatunos internacionais».

Vozes: - Muito bem, muito bem!

Página 430

430 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 198

O Orador: - Não hesitam também os três da Oposição em se associar a vários Gaitandós, pondo em dúvida até a veracidade dos textos das decisões do Tribunal da Haia, decisões que tanto engulho causaram a um número, felizmente restrito, de traidores nascidos em paragens do Indostão. E, querendo completar o seu inqualificável acto, o trio representativo dá ainda o seu apoio aos ideais separatistas dos Galvões, não hesitando em manchar com os seus odiosos escritos os corpos, agora inanimados, desses admiráveis heróis da África Portuguesa, negros e brancos, que de peito descoberto souberam morrer no seu posto pela Pátria querida, como só portugueses de lei sabem morrer.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Em suma, Sr. Presidente, pretendem esses oposicionistas fazer de novo a apologia de todos os miseráveis actos que, em épocas de um passado já felizmente morto, ridicularizaram e desacreditaram a Nação perante as democracias europeias e americanas. A bondade e atitude de íntegra independência do venerando Chefe do Estado, a quem rendo aqui as minhas respeitosas homenagens pelas suas lídimas virtudes e exemplar patriotismo, responderam assim os comissionados com um insulto da mais baixa propaganda e clara expressão do desconhecimento dos mais rudimentares deveres da civilidade.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Foi bom que assim se esclarecesse a posição dos três comissionados.

Assim saberemos já que do lado dos patriotas não alinhará jamais o grupo dos três e assim poderemos, mais afoitadamente, dar a mão a todos aqueles que, nasce ido neste sagrado torrão, desejem, até à morte, dar o seu sangue pela independência e integridade da patria lusa.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Sr. Presidente: mal se encerrara o triste episódio do Santa Maria logo a consciência nacional foi alertada pelos acontecimentos ocorridos na portuguesíssima província de Angola.

O nexo entre os dois acontecimentos é por de mais evidente para que possa passar despercebido aos espíritos mais cândidos ou ingénuos.

Conjuradas as tentativas de alteração da ordem e restabelecida a calma da população, logo surge na imprensa diária um comunicado de três oposicionistas, pelo qual, tão cedo quanto lhes foi possível, procuram enxertar-se na cadeia dos acontecimentos, não fossem perder o comboio, já que não haviam tomado o barco (risos). Triste sinal dos tempos!

Sr. Presidente: o episódio do Santa Maria já foi apreciado, cuido que até excessivamente, nesta Câmara, pelo que só dele me ocuparei na medida em que a conexão da atitudes e dos procedimentos a tal me obrigue.

Não posso, porém, deixar de acentuar que só nos diz respeito na medida em que a vítima do assalto foi um barco, propriedade de uma companhia portuguesa, que navegava em águas distantes sob a bandeira portuguesa e ainda porque, entre os assaltantes, alguns - mas em qualquer caso uma minoria - tinham nascido um Portugal.

O Sr. André Navarro: - Muito bem!

O Orador: - Em todos os outros aspectos mais diz respeito aos países em que o assalto foi preparado, em cujas águas territoriais e zonas de influência se deram os acontecimentos ...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - ... às nações a que, nessas paragens, cumpre assegurar a defesa da liberdade dos mares, da segurança da navegação, dos direitos das gentes.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Os sofrimentos das centenas de passageiros, a angústia de toda uma tripulação, os prejuízos materiais e o sacrifício do sangue ficam a atestar como neste mundo em que vivemos se defendem as liberdades que se proclamam e como o culto do sensacionalismo e a tara da publicidade podem levar a minimizar os dramas humanos sacrificados à morbidez de uma opinião a quem sobretudo interessava apresentar o episódio do Santa Maria como o caso do século.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Reconhecer esta situação - reconhecer e lamentar esta situação - não deve, porém, fazer com que nos quedemos em estado de justificada revolta de alma, mas que nos convençamos ser este e assim o mundo em que vivemos.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Seja como for, as repercussões internas e externas dos acontecimentos, as intenções confessais dos assaltantes, a estreita correlação que umas e outras guardam com as tentativas de alteração da ordem em Angola e, por fim, o bem expressivo comunicado dos três democratas comportam, porém, algumas lições e impõem, alguns comentários. E é isso que essencialmente importa neste amamento, e importa que se faça com clareza e sem reticências, já que o País atravessa uma das épocas anais difíceis da sua vida histórica.

Sr. Presidente: afirmaram os assaltantes ter a sua aventura um duplo objectivo - combater o regime político português e preparar a independência das nassas províncias africanas. E, mão fosse haver dúvidas, tão depressa se verificaram as tentativas de alteração da ordem em Angola, apressaram-se a apontar os acontecimentos como parte integrante da sua luta contra o regime político português

Assim, tudo fim claro, não fossem outros chamar a si as honrais de uma tentativa de desordem que fez correr sangue de portugueses, brancos e negros, vítimas do cumprimento dos seus deveres para com a função, e para com a Pátria.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Passo em claro a classificação e o juízo sobre uma atitude dessas, aliás desnecessários: a qualquer consciência bem formada.

Constatam os três democratas comissionados, baseados na, leitura da livre imprensa estrangeira - e em mais nada? -, constatam os três democratas a legitimidade do assalto ao Santa Maria - pois não têm eles a revolta política como legítima? -, legitimidade reconhecida pelos países intervenientes, e o desprestígio internacional do Governo, consequente destes acontecimentos.

Página 431

10 DE FEVEREIRO DE 1961 431

Pelo que respeita aos factos recentíssimos passados, em Luanda, certamente por não estarem esclarecidos através da livre imprensa estrangeira, não puderam aqueles democratas constatar mais nada do que o reforço, do estado de alarme e das apreensões públicas.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Cuido, Srs. Deputados, ser difícil ser mais claro em tão poucas palavras - disseram tudo, explicaram-se bem. Resta-nos extrair as lições, fazer os comentários que o brio nacional impõe e a consciência lusíada exige.

O episódio do Santa Maria constitui um acto político legítimo, legítimo e natural, conforme as regras da moral e do direito, uma questão entre portugueses divididos sobre o regime político do seu país, uma questão de família - os passageiros das várias nacionalidades, os assaltantes das mais diversas origens, mas quase todos apátridas, também fazem parte da família (risos) -, e da gravidade do acontecimento resultou um aumento de desprestígio para o Governo Português. Para o Governo ou para o País?

Sr. Presidente: noutros passos do comunicado dos três comissionados - como tentando provar não poder a sua presença ser aferida nem pela quantidade nem pela qualidade - constata-se, não sei se pela livre imprensa estrangeira, se pela dependente imprensa portuguesa, deflagrarem sobre Portugal campanhas internacionais de descrédito para os aspectos dos territórios ultramarinos e impressionar a opinião pública a marcha das votações sobre as questões ultramarinas no areópago da O. N. U., para depois se concluir estar no fundo desse descrédito, e quiçá desse abandono, tanto a força invencível de novas ideologias, como graves responsabilidade da nossa Administração.

Risos.

E como se tudo isto não bastasse ou não sobrasse mesmo para nos convencer a pactuar com a tal força indomável de novas ideologias - ideologias? -, talvez entregando à cobiça do capitalismo mundial populações e territórios, para depois entoar aqui, nesta capital de uma nação multirracial e pluricontinental, hinos à liberdade, à santa liberdade (risos) ... como se tudo isto não bastasse, desce-se ao atrevimento de acusar o Governo de, nas questões fundamentais, falsear a verdade, iludindo o País, como acontecera com a sentença do Tribunal da Haia!

Sr. Presidente e Srs. Deputados: neste ponto devemos todos parar um momento para constatarmos (também temos o direito de constatar!), para constatarmos não ser a acusação diferente, ser a acusação estranha e gravemente igual, precisamente igual, a formulada pelo Sr. Nehru! E basta! O País que o julgue!

Quos Júpiter vult perdere prius dementat.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Feito este pequeno mas significativo parêntesis, retomemos o fio das nossas considerações ...

A tese do comunicado, que o episódio do Santa Maria documenta e os acontecimentos de Luanda ilustram, parece ser mais ou menos esta: o regime político português e o Governo estão desprestigiados, abandonados pelos amigos, no campo internacional, sem autoridade para enfrentar os problemas nem responder às exigências dos tempos de hoje.

Perante tal situação impõe-se constituir um Governo capaz de inspirar a confiança, do País, liberto das actuais responsabilidades.

Risos.

O assalto ao Santa Maria, a luta «heróica» dos assaltantes, as desordens tentadas um Angola - e Deus sabe se estão a ser activamente premeditadas em outras províncias ultramarinas -, são actos que preparam esse promissor momento e, por meio dele, a prenhe felicidade de continentais e ultramarinos. Também em Varsóvia reinou a paz!

Sr. Presidente: esta é a tese, esta é a táctica, esta é a manobra grosseira.

Vejamos.

De há anos vem a desenvolver-se no Mundo uma campanha, dita auticolonialista, que tem por objectivo amputar a Europa dos seus territórios africanos e asiáticos, revistam-se estes da forma de domínio, de colónia, protectorado ou mesmo de províncias, que nem pelo facto de não serem contíguas com as demais deixam de ser iguais em direitos e deveres, de participar das mesmas responsabilidades dentro do todo nacional.

Por muito que se estranhe a tese, se lhe note a falta de fundamento sério ou se repare na sua incapacidade para distinguir situações estruturalmente diversas, por mim mete-me mais confusão a competição americana e russa na chefia de um movimento que, tem-se visto, tem resultados diferentes para os dois corredores ...

Risos.

Em consequência, uns países após outros vão cedendo, negociando, abdicando, vendendo territórios e populações, e com tal precipitação que, pode dizer-se, salvo pelo que diz respeito a Portugal, a corrida chegou à meta.

Todos sabem isto, todos conhecem sobejamente esta situação. E não creio que o simples invocar a qualidade de democrata altere a verdade dos factos nem as coordenadas dos lugares.

Faço justiça de reconhecer expressamente, em homenagem à verdade e aos testemunhos que conheço, haver muitos e muitos adversários do nosso regime político que justificadamente se intitulam democratas e nem por isso deixaram de ser patriotas, de defender intransigentemente os direitos da Pátria, de reconhecer com clareza as raízes da campanha que contra nós se alevanta e de apoiar a firmeza, da posição do Governo.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - À medida que uns após outros foram cedendo, aumenta naturalmente a intensidade da campanha contra nós, já que simbolizamos a resistência obstinada, total, da campanha a que até não deixam de ajudar aqueles que, mais tíbios ou menos firmes nas suas razões, cederam e abdicaram. Mal de muitos gozo é!

Vem, pois, a adensar-se a campanha contra nós, contra o País, contra Portugal.

O ultramar é a causa e o objectivo; nós, os teimosos e os obstinados, que urge, cada vez mais urge, fazer ceder.

Também isto não constitui nem segredo nem novidade.

O que está em causa não é o regime político, mas o País.

É da mais elementar hombridade reconhecê-lo, é da mais estreita obrigação patriótica não deixar estabelecer confusões, nem cortinas de fumo, a este respeito, sob pena de sacrificar a ódios pessoais interesses vitais, de sacrificar a paixões a segurança de territórios e populações, de sacrificar, enfim, a ambições a integridade da Pátria.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Como hão-de votar connosco no areópago da O. N. U. quantos, por mor de concepções tão ingénuas como perigosas, por força, de uma política

Página 432

432 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 198

de domínio mundial ou por mercê de um ódio rácico insistentemente cultivado, têm como bandeira e objectivo afastar da África a Europa? Como, Srs. Democratas comissionados? Como?

Desprestígio do regime político ter, apesar de tudo, apesar I e alguns democratas como estes e de outros comunistas não muito diferentes destes, ter conseguido resistir vitoriosamente ao assalto de tudo e de todos às províncias portuguesas dispersas pelo Mundo? Desprestígio do Regime ou do País?

Desprestígio do Ocidente, Sr. Presidente e Srs. Deputados!

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Porque se procura então apresentar as questões como se de desprestígio do regime político se tratasse? Porquê?

Cuide não ser necessária grande meditação nem muita inteligência para o descobrir. A questão é nítida, tragicamente nítida.

Sem menosprezo pelo patriotismo de ninguém, o regime político e, especialmente, o Sr. Presidente do Conselho simbolizam perante o Mundo a intransigência obstinada, a preço da fazenda ou do sangue, do País perante a cobiça que paira sobre as nossas promissoras províncias ultramarinas.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Vai daí que pode ser conveniente a aventureiros e cómodo a sectários confundir as dificuldades do País com as do regime político para, sem necessidade de revelar ao povo português toda a verdade das suas intenções ou das suas disposições - seria perigoso, demasiado perigoso - quanto ao nosso ultramar, aproveitar algumas conivências mais do que suspeitas para tentar desprestigiar primeiro o Regime e depois alcançar o Poder.

Atira-se aos quatro ventos, mentindo, confundindo deliberadamente, como se a culpa fosse do Governo, com as atitudes e consequências que bem se sabe resultarem lê uma firme determinação do País que ao Governo cumpre honradamente sustentar - a intransigente defesa do ultramar.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Será honesto o procedimento? Será digna a atitude? O País que julgue.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Mas ainda não disse tudo - e não desejo furtar-me a nenhum problema ou dificuldade, já que a hora que vivemos assim o exige.

Há mais. O facto de o regime político português não vestir pelo figurino standard constituiria, em maior ou menor grau, causa das dificuldades do País no actual momento histórico da vida nacional. A circunstância de não se revestir, da forma de uma democracia pluripartidária, com muitos partidos e não menor número de chefes, entre os quais o partido comunista e o potência. Kruschtehev, a circunstância de o regime político português ser de feição autoritária e, por obra e graça da patriótica e desinteressada colaboração de alguns democratas ou pseudodemocratas e também, devo confessá-lo, de algumas excrescências inúteis, tão inúteis como escusadas, estar de novo a criar-se em certos meios estrangeiros a ideia de que é ditatorial, dificultaria o c poio internacional de que carecemos e estimularia a campanha contra nós.

Esta a acusação.

Como reconheci haver excrescência inúteis, e desde logo inconvenientes, como não é segredo para ninguém não poderem merecer a minha concordância algumas atitudes e procedimentos, especialmente certos sectarismos que tenho como contrários aos princípios políticos do Regime e aos supostos doutrinários que o informam, reconheço também não ser o ambiente do mundo, do mundo mais evoluído economicamente, propício ou muito favorável a regimes marcadamente autoritários.

Mas, além de não admitir que tenham, o direito de nos impor um figurino político, de partir, sem a menor hesitação, do princípio de que a cada um cabe escolher o figurino que mais lhe convenha, sem sujeição a outras razões que as próprias do país, observo que mesmo entre as grandes nações ainda não há muitos anos se verificou fenómeno inverso.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Pois não vimos a França ter de apelar para o prestígio e autoridade de um homem quando a traição dos partidos e a ineficácia do sistema a iam atirando para o descrédito e incapacidade, de que procura agora refazer-se?

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Pois não são os governos de autoridade, no dizer do maior número dos doutrinadores políticos insuspeitos, exigidos pela necessidade de processar o desenvolvimento nos países subdesenvolvidos, onde a alternativa para um governo de autoridade é outro governo de autoridade, e pela grandeza dos problemas a resolver?

Pois não será claro ser a autoridade mais necessária quanto maior for a desproporção entre a potência económica e militar do país e a magnitude dos problemas que tenha de enfrentar?

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Então haveria de ser no momento em que os problemas portugueses de defesa da integridade da Pátria exigem maior disciplina, vigilância e firmeza que teria justificação institucionalizar a divisão, fazer do dissídio meio de combate contra nós próprios?

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - O momento, a gravidade do momento, - todos desapaixonadamente o entendem, toda a Nação o compreende -, exige unidade, unidade firme, decidida, à volta da defesa da integridade da Pátria.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - É momento em que se impõe a todos o sacrifício de ideologias, de questões de processo ou de esquisitices de gosto, esquecer ressentimentos e acalmar paixões - é momento em que a todos, qualquer que seja o seu quadrante político ou a particularidade do seu modo de ver, se exige, por igual, o afastamento de quanto nos divida, para poder ser defendido eficazmente o essencial que nos une - a integridade do País.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - E depois, acreditaria alguém de boa fé que, se o País se reduzisse a este rincão continental, algum país se poderia algum dia mostrar cortês ou

Página 433

10 DE FEVEREIRO DE 1961 433

complacente para com qualquer aventureiro só pelo facto de se dizer cavaleiro de qualquer liberdade ou de qualquer democracia?

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Seria ingenuidade demasiada, para ser tomada .a sério, admiti-lo. Não. Todos nós sabemos bem, e sem possibilidade de controvérsia, que qualquer apoio, ou mesmo a simples complacência internacional, ainda, poderia ser obtido por um aventureiro a troco da cedência de uma posição estratégica ou da transigência em matéria ultramarina, nunca em nenhum outro caso.

A suspeição seria pelo menos tão forte que a qualquer patriota digno não seria nem legítimo aceitá-la, nem sequer apreciá-la. Os tempos das guerras santas já lá vão. Nem os Árabes parecem já capazes de a fazer, nem os Russos se atrevem a proclamá-la, embora a pratiquem.

O Sr. Pinto de Mesquita: - Muito bem!

O Orador: - Há conivências que são mais do que suspeitas, que em tempos como os que vivemos só podem merecer um nome - traição ...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - ... traição dos que as buscam ou aceitam, traição dos que lhes emprestam solidariedade, ainda que seja apenas por ódio ou por paixão.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: de tudo isto hei-de concluir que a campanha contra o País tem uma raiz única e bem definida - a defesa intransigente do ultramar. De tudo isto hei-de concluir procurar-se dentro e fora do País desvirtuar o objectivo e a razão de ser da campanha com uma finalidade evidente - dividir os Portugueses, com o fim claro e nítido de favorecer a subida ao Poder de governantes mais «compreensivos» ou menos intransigentes no que respeita à defesa da integridade da Pátria ou, pelo menos, fazer com que as energias necessárias ao progresso do País e à defesa do ultramar se consumam em lutas fratricidas que nos enfraqueçam e tornem em presa fácil de um capitalismo e de uma política internacionais tão ávidos como despropositados.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Não pode permitir-se por mor de questões do regime político ou de modo de governar que deixemos entrar na fortaleza, em que temos podido resistir, enquanto os outros baquearam, o cavalo de Tróia do dissídio e da divisão.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E mister que o País compreenda com toda a violência que comporta. É necessário que não nos prestemos, em qualquer caso ou por qualquer forma, a deixar corroer a nossa unidade, que antes é preciso reforçar todos os dias e por todos os meios.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: as intenções confessas dos assaltantes do Santa Maria e os acontecimentos de Luanda são bem a medida de que a traição à Pátria pode andar paredes meias com os ódios pessoais ou as ambições frustradas.

Nem podemos iludir-nos nem adormecer. Há factos que são traição à Pátria, mas há também solidariedades que comprometem. Impõe-se denunciar uns e outras - não permitir que por qualquer deles se adulterem os factos, confundam os Portugueses ou tornem instrumento de conveniências alheias.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: vem tudo isto por causa do infeliz comunicado de três democratas, que, começando por ser descorteses e deselegantes, pela forma como procederam, pela unilateralidade - e quiçá antecipação aos factos - com que o elaboraram, acabam por se solidarizar com os assaltantes do Santa Maria; sem terem uma palavra que mostre compreensão do momento que o País vive, e cuido ser dos mais difíceis da sua história, marque, par qualquer forma, firmeza aia defesa intransigente do ultramar, apoio nesse ponto, e só nesse, à política do Governo.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Prestaram, porém, um serviço - foram claros para o País -, e o julgamento a que devem sujeitar-se toma-se extremamente simples, embora tenha de ser tão severo como consideram ser apanágio da sua crítica.

Compreender-se-ia que tivessem neste momento condenado a atitude dos aventureiros, a quem não custa mercadejar a Pátria, significado apoio à atitude firme e intransigente do Governo, embora sem abdicar das suas concepções ou pontos de vista partidários.

Teriam merecido a simpatia do País e criado até ao Governo a obrigação de, pela sua parte, tomar as possíveis disposições para que uma mais ampla colaboração dos Portugueses, que se tem como fundamental à defesa da Pátria, pudesse realizar-se.

E nem se diga que podem justificar-se com motivos de queixa pessoal ou em discordâncias que sobrelevem o dever primeiro dos Portugueses nesta hora.

De maneia-a nenhuma. Queixas todos as temos, em maior ou menor grau. Eu também tenho as minhas. Discordâncias todos as têm, e, por temperamento e natureza, todos somos levados a dar-lhes excessiva relevância. Por mini não tenho deixado de as levantar perante o País e sem reticências quando as condições da nossa vida o consentem.

Compreenderia mesmo que se insistisse pela necessidade de procurar certas reformas ou de rever certos procedimentos. Pois não tenho eu próprio lutado por que cessem certas prepotências oligárquicas, se pratique deliberadamente uma política vincadamente social e se acabe com certos sectarismos despropositados?

O que eu não compreendo - e cuido que estou em boa companhia - é que se condicione o apoio, e até a cooperação à defesa da integridade do País, a questões de facção, de grupo ou de sectarismo. Isso não, isso nunca!

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - A imprensa portuguesa não se dispensou de tomar posição - honra lhe seja! ...

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - ... apontando ao País o caminho que importa que cada um e todos percorramos de mãos dadas, conscientes da força da nossa razão e também da força da nossa unidade.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

Página 434

434 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 198

O Orador: - Sr. Presidente: já me alonguei de mais - faltou-me o tempo para ser breve. É tempo de concluir.

Não o poderei fazer sem me referir a outra afirmação grave, de nítidos objectivos políticos partidários, que atinge o Exército, na medida em que se permitem afirmar não estar mais disposto a ser o sustentáculo da situação política.

Por esta afirmação pretende-se insinuar estar o Exército descontente com o Regime, mas também que o Regime era sustentado pelo Exército.

Que a situação política resultou de uma atitude do Exército, varrendo a desordem, em cuja nostalgia ainda parecem viver alguns respeitáveis democratas; que o regime político foi o resultado e a sequência de uma revolução militar a dar expressão aos sentimentos do País, todos o sabemos bem e o recordamos com satisfação na medida em que sempre vimos no exército português um reservatório de energias e de virtudes da Raça.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Agora que se pretenda com qualquer finalidade apresentar o exército português como sustentáculo de um regime, como elemento de facção ou mês no como partido político, isso é que tenho e reputo como ofensivo da sua independência, da sua dignidade, do seu orgulho e do seu brio.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Não, Srs. Comissionados, o Exército nunca foi nem nunca pode ser uma facção - é sim a representação viva da Pátria, o garante supremo da sua, integridade, a sentinela vigilante da consciência nacional, a garantia da legitimidade da governação e do respeito pelas leis do País.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - O Exército não é, nem foi, nem será nunca uma facção ou um partido, um elemento de divisar, mas a expressão viva da unidade da Pátria.

Vezes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Daqui e neste momento devo, em desagravo pela ofensa dos comissionados, movidos por ódios mesquinhos e sem a consciência do respeito pelas instituições em que todos fiamos a defesa da Pátria, daqui e neste momento devo ao exerécito português uma palavra de vivo agradecimento pelo seu garbo, pela sua disciplina e pelo seu aprumo, pela firmeza com que sempre soube pôr acima de tudo os superiores interesses do País, ...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - ... pela galhardia com que sempre soube dar-se quando as fronteiras ou a ordem foram postai em causa, fosse por quem fosse, uma palavra de agradecimento e de serena confiança na sua unidade o no seu espírito, garantias superiores da unidade da Pátria, e do respeito pelos seus direitos.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Sirva-nos o seu exemplo, confiemos na sua alma - a alma da Pátria, espelho das suas virtudes depositária da sua consciência histórica.

Sr. Presidente: é grave a hora quê vive o País. Correu já sangue português de brancos e de negros, de europeus e de africanos, como há anos correu também de brancos e de amarelos, de europeus e de asiáticos, como no decurso de toda a nossa longa história tantas vezes foi generosamente derramado em defesa da Pátria e da Fé, dos direitos de Deus e da Pátria.

Bem pode acontecer que mais venha a correr ainda.. Recordemos os nossos heróis, roguemos aos nossos santos, lembremos os nossos mártires, e ao fazê-lo, e com o fazê-lo, firmemos no exemplo de todos e de sempre a serena, a intransigente, a decidida disposição de sermos iguais a eles, dignos do seu sacrifício e da sua fé, leais à Pátria e aos seus direitos, leais ao País e às suas responsabilidades, leais ao Governo e à sua política de obstinada defesa da nossa integridade.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Caiam bandeiras, cessem questões de família, apaguem-se divergências de ideologia ou condição social, e todos como um só, como a Pátria, reunamo-nos em torno da bandeira do País, unamo-nos em volta do Chefe do Estado, símbolo da unidade da Pátria.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Chegaram os tempos em que mais não é lícito dividirmo-nos sobre a melhor forma de servir a Pátria, chegaram os tempos em que o inultrapassável abismo se estabelece entre os que afirmam a Pátria e aqueles que a negam ...

É mister saber quem a nega, negociando-a, desprestigiando-a, prestando-se a ser elemento de intriga e tio divisão. É mister que todos assumam a sua responsabilidade perante a consciência nacional ...

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - ...já que esta se definiu de forma inequívoca e indiscutível, e o sacrifício do sangue a cimenta já.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: usei nas minhas palavras da mesma independência e rudeza com que sempre me pronunciei mesta Câmara.

Falei a mesma linguagem da verdade que sempre usei, criticando ou louvando, apontando erros ou preconizando soluções, com a mesma independência, com a mesma rudeza, com a mesma verdade.

Pois é ainda com esse mesmo espírito que sempre e em todos os casos usei para com o Sr. Presidente do Conselho que concluirei dizendo-lhe, daqui e neste momento, que sei bem - e sabe bem o País - representar, simbolizar a intransigência da Pátria, serena e obstinada, firme e intransigente, à cobiça e à conjura contra a nossa integridade, que é como quem diz contra a nossa independência.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Acima de quaisquer divergências, fora de quaisquer preconceitos, Salazar simboliza neste momento histórico a firmeza da Pátria, a sua decidida atitude de intransigência.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

Página 435

10 DE FEVEREIRO DE 1961 435

O Orador: - Nesta hora os ataques que se lhe dirijam, os sofrimentos e amarguras que se lhe inflijam, dirigem-se assim à sua corajosa e obstinada defesa da nossa integridade.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Com a mesma independência que sempre usei para com os problemas e a mesma clareza de linguagem, imposta até pela lealdade, que sempre usei para com Salazar, quero daqui e nesta hora dizer-lhe que tem o direito à nossa cabal solidariedade, ...

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - ... à nossa completa dedicação e nossa dádiva total, que tem o direito a que o tenhamos como depositário dos nossos direitos históricos e o declare como encarnação viva da Pátria.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Fiamos-lhe a defesa dos nossos direitos, sabemo-lo símbolo da nossa intransigência, segui-lo-emos na defesa da Pátria, mas pedimos-lhe também que aja com prontidão, dando forma e expressão à unidade nacional, propiciando o modo de melhor a corporizar e, desfazendo os motivos de desagrado ou de mal-estar, possibilite que a coesão nacional, tão viva e decidida quanto possível, possa encontrar meio de se realizar em impressionante unidade - por sobre divergências de credo, ideologia ou condição social -, unidade da consciência nacional que tem de exprimir-se perante o mundo que nos não entenda, o mundo que nos combata, o mundo que nos apoie.

Não lhe faltará o apoio dos Portugueses, já que os Portugueses nunca souberam trair a Pátria.

E adiante, que sempre soubemos ser dignos de nós próprios e nas horas cruciais da nossa vida encontrar os homens, as instituições e o ânimo para dar uma lição ao Mundo.

Pois daremos mais uma lição ao Mundo!

Vozes: - Muito bem, muito bem!.

O Orador: - Sr. Presidente: peço licença para ouvi ar para a Mesa a moção que; passo a ler:

A Assembleia Nacional, tendo vindo a seguir emocionada com o País as recentes tentativas de pôr em causa, o prestígio português no Mundo ou perturbar a ordem que reina em todos os nossos territórios, e a viver com natural preocupação as investidas contra, a integridade da Pátria, acompanha o Governo, e especialmente o seu Chefe, na sua serena, firme e intransigente defesa dos nossos direitos e expressa-lhe a sua viva solidariedade, segura de que exprime o sentir de todos os portugueses que legitimamente representa.

Ao mesmo tempo, tendo tomado conhecimento, pela imprensa, de um documento unilateralmente preparado por alguns elementos oposicionistas: exprime a sua repulsa pelo que representa de manifesto sectarismo e inqualificável incompreensão dos deveres que nesta hora incumbem a todos os portugueses; proclama perante o País a sua inalterável confiança no povo português, no seu espírito de unidade e na viva consciência das suas responsabilidades; reafirma perante o Mundo a sua inabalável disposição de defender a integridade do seu território, o património moral que gerações sucessivas criaram e engrandeceram, e presta homenagem ao venerando Chefe do Estado, símbolo daquela unidade.

Os Deputados: Júlio Evangelista - Alberto Cruz - André Francisco Navarro - Camilo Lemos de Mendonça.

Vozes: - Muito bem, muito bem !

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Informo a Assembleia de que neste momento estão na sala 85 Srs. Deputados.

Certamente, a Câmara, pela atenção que dedicou à leitura da moção, dispensará nova leitura. Vai votar-se a moção apresentada pelo Sr. Deputado Camilo de Mendonça.

Submetida à votação, foi aprovada, por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: terminado com a nota oficiosa do Governo o incidente criminoso do paquete Santa Maria, logo se seguiram os assaltos e lamentáveis incidentes em Luanda, claramente destinados a provocar o sobressalto e a inquietação naquela província portuguesa. Ambos os acontecimentos já tinham merecido a veemente reprovação de alguns Srs. Deputados, com o caloroso aplauso da Assembleia. Mas creio que a Câmara fez bem em passar para além das intervenções singulares para afirmar, pela forma expressa por que acaba de o fazer, a sua atitude colectiva sobre os mesmos acontecimentos e sobre a actuação do Governo na inconcebível emergência.

E uma vez que a Câmara por unanimidade se manifestou, posso eu, e faço-o com o mais vivo prazer, felicitá-la pela moção em que traduziu os seus sentimentos e os do País. Foi para dar a minha inteira adesão a esses sentimentos que quebrei o silêncio em que devo manter-me enquanto a Câmara se não pronuncia.

Mas já agora, se a Câmara me permite, acrescentarei que, entre todos os gestos do Governo, merece ser salientada a referida nota oficiosa pela serenidade, em meio de tanta perturbação, pela perfeita noção das responsabilidades do Governo, pela moderação imposta a justos impulsos de indignação, em holocausto a preservar o essencial nos permanentes e superiores interesses do País.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - Esta lição merece ser posta em relevo, paia contraste flagrante e activai com certos desvairamentos inadmissíveis em que a paixão política pode lançar alguns espíritos e obscurecer-lhes lamentavelmente o verdadeiro sentido dos altos interesses da Pátria.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - Eles impõem a todos os que ainda a não renegaram, e independentemente dos métodos que julguem mais adequados à sua salvaguarda, uma estreita união e solidariedade, mesmo com sacrifício de pontos de vista pessoais.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - Porque, se a paixão política pode explicar certas atitudes, não pode justificá-las nem absolvê-las.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

Página 436

436 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 198

O Sr. Presidente: - Estão em causa valores de tal magnitude que seria inadmissível aproveitar as conturbadas circunstâncias decorrentes para inferiores recriminações políticas de sector. «Pátria ao alto!», proclamou há muitos anos neste mesmo hemiciclo um nobre parlamentar, leader da oposição ao regime republicano: grande e eloquente e oportuna divisa para o presente.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - Em nome da Câmara, e sentindo que traduzo os votos profundos do País, saúdo daqui respeitosamente o Sr. Presidente da República, expressão suprema da unidade nacional.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - Em vista da emoção que domina a Câmara, levanto a sessão, designando a próxima para o dia 16 do corrente, com a mesma ordem do dia.

Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 15 minutos.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Adriano Duarte Silva.
Agnelo Ornelas do Rego.
Alberto Carlos de Figueiredo Franco Falcão.
Américo da Costa Ramalho.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António Bartolomeu Gromicho.
Armando Cândido de Medeiros.
Belchior Cardoso da Costa.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
João da Assunção da Cunha Valença.
João Maria Porto.
João Mendes da Costa Amaral.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim Pais de Azevedo.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel José Archer Homem de Melo.
Manuel Maria de Lacerda de Sousa Aroso.
Purxotoma Ramanata Quenin.
Ramiro Machado Valadão.
Sebastião Garcia Ramires.

O REDACTOR - Leopoldo Nunes.

Rectificação

No Diário das Sessões n.º 185, 3.º suplemento, p. 239-(29), col. 2.ª, onde se lê: «b) Mobiliário e apetrechamento - 15 000 salas de aula, a 14 000$ - 210 000», deve ler-se: «b) Mobiliário e apetrechamento - 15 000 salas de aulas, a 10 000$ - 150 000».

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×