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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 68

ANO DE 1963 11 DE JANEIRO

ASSEMBLEIA NACIONAL

VIII LEGISLATURA

SESSÃO N.º 68, EM 10 DE JANEIRO

Presidente: Ex.mo Sr. Mário de Figueiredo

Secretários: Ex.mos Srs.
Fernando Cid Oliveira Proença.
Luís Folhadela de Oliveira.

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 10 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-te conta do expediente.

Foi concedida autorização ao 8r. Deputado Cardoso de Matos para depor, como testemunha, no 4.º juiso criminal do Lisboa.

Foi negada autorização para o Sr. Deputado Nunes de Oliveira depor, como testemunha, no Tribunal do Trabalho do Porto.

O Sr. Deputado Carlos Coelho agradeceu ao 8r. Presidente e à Câmara as expressões de pesar pela morte de sua mãe.

O Sr. Deputado Jorge Correia tratou do problema, dos diplomados pelas escolas médias de Engenharia o solicitou a criação de um instituto industrial em Faro.

O Sr. Deputado Gamboa de Vasconcelos descreveu a situação difícil das populações dos Açores g congratulou-se com a próxima construção do aeródromo de S. Miguel.

O Sr. Deputado António Santos da Cunha referiu-se à visita do Sr. Dr. Kubitschek de Oliveira, de quem fés caloroso elogio.

Ordem do dia. - Continuou a discussão do aviso prévio do Sr. Deputado Nunes Barata sobre o aproveitamento das potencialidades económicas do rio Mondego.

Usaram da palavra os Srs. Deputados Mário Galo, Carlos Coe-lho, Marques Fernandes e Engrácia Carrilho.

O Sr. Presidente encerrou a sessão às 19 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai fazer-se a chamada.

Eram 16 horas.

Fez-se a chamada, á qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Alberto dos Beis Faria.
Alberto Ribeiro da Costa Guimarães.
Alexandre Marques Lobato.
Alfredo Maria de Mesquita Guimarães Brito.
André Francisco Navarro.
Aníbal Rodrigues Dias Correia.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António Burity da Silva.
António Gonçalves de Faria.
António Júlio de Carvalho Antunes de Lemos.
António Magro Borges de Araújo.
António Maria Santos da Cunha.
António Marques Fernandes.
António Martins da Cruz.
António Moreira Longo.
António da Purificação Vasconcelos Baptista Felgueiras.
Armando Francisco Coelho Sampaio.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Alves Moreira.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Augusto José Machado.
Belchior Cardoso da Costa.
Bento Benoliel Levy.
Carlos Alves.
Carlos Coelho.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
D. Custódia Lopes.
Délio de Castro Cardoso Santarém.
Domingos Rosado Vitória Pires.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.

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Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando Cid Oliveira Proença.
Francisco António Martins.
Francisco António da Silva.
Francisco José Lopes Roseira.
Francisco Lopes Vasques.
Henrique Veiga de Macedo.
Jacinto da Silva Medina.
Jerónimo Henriques Jorge.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
João Bocha Cardoso.
João Ubach Chaves.
Joaquim de Jesus Santos.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Joaquim de Sousa Birne.
Jorge Augusto Correia.
Jorge de Melo Gamboa de Vasconcelos.
José Alberto de Carvalho.
José Augusto Brilhante de Paiva.
José Dias de Araújo Correia.
José Fernando Nunes Barata.
José Luís Vaz Nunes.
José Manuel da Costa.
José Manuel Pires.
José Maria Rebelo Valente de Carvalho.
José de Mira Nunes Mexia.
José Monteiro da Bocha Peixoto.
José Pinheiro da Silva.
José Pinto Carneiro.
José dos Santos Bossa.
José Soares da Fonseca.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Júlio Dias das Neves.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Luís Folhadela de Oliveira.
Manuel Amorim de Sousa Meneses.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Herculano Chorão de Carvalho.
Manuel João Cutileiro Ferreira.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel de Sousa Rósal Júnior.
D. Maria Irene Leite da Costa.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Beis.
Mário Amaro Salgueiro dos Santos Galo.
Mário de Figueiredo.
Olívio da Costa Carvalho.
Paulo Cancella de Abreu.
Quirino dos Santos Mealha.
Rogério Vargas Moniz.
Sebastião Garcia Ramires.
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães.
Vítor Manuel Dias Barros.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 84 Srs. Deputados.

Está aberta a sessão.

Eram 16 horas e 10 minutos.

Antes da ordem do dia

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Ofícios

Do Grémio Distrital dos Comerciantes de Carnes de Santarém a apoiar a intervenção do Sr. Deputado Gaiteiros Lopes sobre a industrialização daquele distrito.

Do Grémio da Lavoura de Santarém no mesmo sentido.

Do Sindicato Nacional dos Operários da Construção Civil e Ofícios Correlativos do Distrito de Santarém ainda no mesmo sentido.

Telegramas

Do Rev.º P.º Diogo, de Vila Verde, a apoiar a intervenção do Sr. Deputado António Santos da Cunha sobre a grave situação da lavoura na região.

Do presidente do Grémio da Lavoura de Fafe no mesmo sentido.

Dos regentes escolares do concelho de Felgueiras a apoiar à intervenção do Sr. Deputado José Alberto de Carvalho sobre a situação da classe.

Vários a apoiar as intervenções dos Deputados pelo círculo de Coimbra no debate sobre o aviso prévio acerca do aproveitamento da bacia hidrográfica do Mondego.

O Sr. Presidente: - Está na Mesa um pedido do 4.º juízo criminal de Lisboa a rogar a comparência do Sr. Deputado Alberto Cardoso de Matos a fim de depor, como testemunha, no dia 18 do corrente mês, naquele tribunal.

Ouvido o mesmo Sr. Deputado, este declarou não ver qualquer inconveniente em ser autorizado.

Consultada a Assembleia, foi concedida a autorização solicitada.

O Sr. Presidente: - Normalmente, como VV. Ex.ªs devem ter notado, estes ofícios pedem à Presidência que mande comparecer, para depor em julgamento, determinados Srs. Deputados.

O Presidente não pode mandar comparecer os Srs. Deputados. O que pode é pôr à consideração da Câmara se é ou não de autorizar o que é solicitado. No entanto, parece que não é das atribuições da Presidência estar a corrigir a forma de pedir ...

Está também na Mesa um pedido do Tribunal do Trabalho do Porto de autorização para o Sr. Deputado Joaquim José Nunes de Oliveira depor naquele Tribunal no próximo dia 16 do corrente, pelas 14 horas.

Ouvido o Sr. Deputado Nunes de Oliveira, este informou que vê inconveniente para a sua actuação parlamentar em ter de deslocar-se ao Porto a fim de depor no referido Tribunal.

Consultada a Assembleia, foi negada a autorização solicitada.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho: - Sr. Presidente: pedi a palavra para significar a V. Ex.ª o meu sincero reconhecimento pelas expressões de pesar com que V. Ex.ª e a Câmara quiseram associar-se ao meu recente luto.

O Sr. Jorge Correia: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: algumas reflexões sobre o problema dos diplomados pelas escolas médias de Engenharia.

Julgamos vantajosas algumas considerações por quem, sem quaisquer afinidades profissionais ou interesses, outra intenção não tem que não seja a solução equilibrada e justa dos anseios de uma classe, hoje ainda mais do que ontem, absolutamente necessária para o prosseguimento da industrialização do País.

Cremos que terá chegado a hora propícia a um exame de consciência de todos quantos podem ou devem, directa ou indirectamente, intervir no assunto, na certeza de que

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realmente na vida de todos os dias cada um se há-de situar no seu lugar!

E outra ilação não podemos tirar, aliás conciliatória, de uma notícia inserida no Boletim da Ordem dos Engenheiros que diz textualmente o seguinte:

O caso dos diplomados pelas escolas médias de . Engenharia. Numa das últimas reuniões do conselho geral foi tomado conhecimento de uma carta publicada no Diário da Manhã com o título "O caso dos diplomados pelas escolas médias de Engenharia". Depois de longa troca de impressões sobre tão momentoso problema, ficou assente dever contribuir a Ordem, no que lhe possa ser possível, para o estudo da solução de alguns dos pontos focados, entre outras o que diz respeito & designação de agente técnico de engenharia, que poderá vir a ser substituída por outra mais expressiva e correcta.

Baseiam-se as nossas considerações no estudo atento de várias teses, treze exposições do Sindicato Nacional dos Engenheiros Auxiliares, Agentes Técnicos de Engenharia e Condutores feitas a altas entidades de governação no espaço que decorre de 9 de Outubro de 1944 a 3 de Agosto de 1962 (quase vinte anos!) e ainda no contacto directo com algumas figuras destacadas da nossa engenharia.

Pudemos verificar pela clareza e insistência dos argumentos, alguns deles aliciantes, a necessidade de uma revisão do problema, quer nas suas incidências materiais, quer ainda do ponto de vista da ordenação na escala de valores da sociedade, faceta tão humana e, vamos lá, tão característica do temperamento da nossa gente e à qual teremos consequentemente de atribuir real valor ao equacionar-se a questão.

Não podemos deixar de lamentar, porém, que se deixem arrastar os problemas tanto tempo sem solução!

Se dominamos os assuntos, se temos deles completo conhecimento, se reconhecemos a necessidade de os resolver, porque não agimos?

Porque não os solucionamos com oportunidade, dando a uns satisfação e a todos a noção de que tudo é objecto de estudo ponderado a tempo e horas?

Lemos e ouvimos por toda a parte, e não é portanto segredo para ninguém, que a Mocidade Portuguesa não deu os frutos que esperávamos, mas todos havemos de constatar que só depois de mais exemplos se há-de à pressa procurar nova estruturação!

Todos sabemos que cada vez se matriculam menos alunos na Faculdade de Medicina (e com as perspectivas actuais nem sabemos como ainda se matriculam alguns!), todos sabemos, e naturalmente por razões que não serão de todo dissemelhantes, que não há técnicos médios de engenharia que cheguem, pois, apesar do conhecimento exacto, persiste-se em manter as condições que levam a estas carências!

Sabemos todos que o turismo é uma fonte de divisas de incalculável valor, temos noções exactas e bem assentes da matéria, mas- vamos ver quanto tempo levaremos a pôr em prática aquilo que já deveríamos ter feito!

Recusamo-nos, por imperativos de consciência e dever de patriotas, a ficar com aqueles que fingem desconhecer ou procuram desvirtuar o mandato que o 28 de Maio confiou à geração presente.

Eis porque, se não negamos aplausos e apoio, e antes os manifestamos abertamente, quando justos, não deixaremos perder a oportunidade de fazer crítica construtiva.

Somos assim mesmo na nossa vida particular, como na oficial i e não costumamos deixar para amanhã o que podemos ou devemos fazer hoje; daí este nosso permanente desejo de tudo resolver e de tudo actualizar, desejo que não briga nem com a gratidão que devemos pela obra realizada, nem com o caminho portuguesíssimo do nosso ideário.

Governar é, em certa medida, prever e antecipar as soluções, e nós bem poderíamos, pelo conhecimento perfeito que delas temos, executá-las com maior proveito político e melhores resultados práticos se nos demorássemos menos tempo nos estudos, se desburocratizássemos mais a Administração, se, numa palavra, nos não prendêssemos com tantas vénias onde deve haver apenas respeitosa rapidez e acção!

Queixa-se a indústria da falta de pessoal técnico qualificado, e em especial daqueles técnicos com preparação suficiente para a condução de pessoal, interpretação e análise dos projectos no momento em que estes vão dar lugar a obra viva e palpável. Não vale a pena enumerar quem e quais as entidades que em congressos, colóquios, relatórios, etc., o têm afirmado. Importa, isso sim, dizer que o Governo tem. desse facto plena consciência. Provam-no as últimas medidas tomadas pelo Ministério das Corporações e Previdência Social quanto à formação profissional acelerada dê operários e a instituição, pelo Ministério do Ultramar, de estágios pagos nas províncias ultramarinas de África aos alunos acabados de sair das escolas técnicas superiores e dos institutos industriais.

Quanto a estes, isto é, aos diplomados pelos institutos industriais, a sua reduzida produção anual justifica minucioso estudo e medidas rápidas, tanto mais que nos países fortemente industrializados o fenómeno se passa de maneira diametralmente oposta. Vejamos o mapa inserto no relatório da Conferência sobre a Formação Técnica e a Indústria, realizada, em Baden-Baden, de 11 a 13 de Abril de 1961, pela Organização Europeia de Coordenação Económica:

[Início de tabela]

Country Population in millions Year Technical - Universities Colleges - Graduates

[Fim de tabela]

e seguidamente reflectir que, nos últimos anos, em Portugal a produção de técnicos pelas escolas médias de Engenharia (institutos industriais) e as escolas de nível universitário se tem feito inversamente, conforme poderemos constatar do quadro seguinte:

[Início de tabela]

Anos lectivos

[Fim de tabela]

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Poder-se-ia dizer que se formam mais oficiais generais do que oficiais subalternos!

Desta situação certamente vamos sofrer as suas consequências, por falta de técnicos para a execução dos grandiosos planos de fomento que se hão-de suceder no continente e nas províncias ultramarinas.

Quando comparamos o nosso panorama de formação de quadros técnicos com o de outras nações, que já há muito encontraram o caminho da industrialização e que, como nós, empregam profissionais preparados durante um tempo de escolaridade semelhante ao que se encontra estabelecido para os nossos institutos industriais, damo-nos perfeitamente conta da acuidade do problema e de quanto importa dar-lhe conveniente solução.

Aqui ao lado, a nossa vizinha Espanha, que, por exemplo, em matéria de turismo já a perdemos de vista, estruturou com largos horizontes e a tempo, em 1956, o seu ensino técnico, e o resultado pode agora apreciar-se pelos seguintes números, colhidos de uma notícia de Madrid:

A lei de ordenação do ensino técnico entrou em vigor em 1956. No curso final da etapa imediatamente anterior havia matriculados, por exemplo, em todas as escolas de Engenharia e Arquitectura um total de 4426 alunos. No citado curso das mesmas escolas acham-se agora matriculados 57 463 alunos. O número de alunos admitidos em 1956 fora de 897, ao passo que no ano lectivo de 1961-1962 esse número foi de 1891.

O quadro de matrícula nas escolas de ensino médio é, porém, ainda mais revelador do progresso conseguido. No ano lectivo de 1956-1957 ingressou nessas escolas o total de 18 811 alunos, contra 157 925 no ano lectivo actual.

Fará cada técnica criaram-se, entretanto, diversas especialidades: nas escolas superiores, 36, e nas escolas técnicas de ensino médio, 29. Estas cifras dão um total de 65 especialidades, contra 10, por cada grau de ensino, que existiam há 5 anos.

O acesso do ensino técnico médio ao superior é possível hoje em todas as escolas, qualquer que seja a especialidade. Recentemente criaram-se também as facilidades necessárias para que os diplomados saídos das Universidades do trabalho tenham acesso às escolas superiores e organizaram-se cursos especiais para os diplomados do ensino médio que queiram frequentar os respectivos estudos superiores.

Simultaneamente, os alunos que frequentam o ensino universitário podem transitar para o ensino técnico com a mesma facilidade com que podem transitar para o ensino universitário os que frequentam o ensino técnico; dentro de cada grau de ensino dão-se as mais amplas facilidades a quem quiser mudar de curso.

Uma carta que nos dirigiu um distinto agente técnico de engenharia a comentar precisamente estes números dizia:

São impressionantes, mas peço licença para salientar que o seu significado aumenta ainda de valor quando os comparamos com os nossos. À frequência total actual do Instituto Industrial de Lisboa não excede 1161 alunos, dos quais apenas 334 se matricularam no corrente ano lectivo. E o panorama moçambicano é ainda menos reconfortante - 42 alunos na totalidade e 33 em primeira matrícula no Instituto Industrial de Lourenço Marques.

O que se passa relativamente aos institutos industriais que determina o fraco poder de atracção destas escolas?

Rebuscando informações ultimamente vindas a público no Diário da Manhã de 27 de Março último, numa carta que mereceu ser integralmente transcrita no número de Março-Abril do Boletim da Ordem dos Engenheiros, encontramos a indicação de que entre os largamente excedidos 2000 diplomados que constituem a população associativa do sindicato nacional onde se agrupam não vai além de três o número de filhos que seguiram a profissão paterna, e que tudo se prepara para que as coisas continuem a seguir como até agora demonstra-o o facto de se ter encontrado entre os 319 alunos ouvidos num inquérito realizado em 1958 no Instituto Industrial do Porto apenas um que era filho de antigo diplomado.

Por outro lado, verifica-se que o corpo docente do Instituto Industrial de Lisboa no último ano lectivo se compôs de 52 elementos (13 professores efectivos, 37 auxiliares e 2 mestres), mas os diplomados não foram além de 37 em 1961 e a quantidade de alunos que no ano lectivo de 1961-1962 ficaram aptos foram apenas 34 (12 do curso de Electrotecnia e Máquinas, 15 do de Construções Civis e Minas e 7 do de Química).

O Diário da Manhã de 9 de Setembro de 1962, noutra carta a que deu publicidade, parece responder a esta pergunta quando apresenta as razões determinantes da actual situação e que, em resumo, são:

1.º Uma designação profissional que, sendo pelo menos inexpressiva e incorrecta, não satisfaz ninguém.

2.º Remunerações e hierarquias oficiais situadas em planos muito inferiores ao que seria justo, e que por isso mesmo:

a) Levam, por um lado, os diplomados pelos institutos industriais a abandonar os quadros do Estado e, por outro, a ficarem desertos os concursos sucessivamente abertos para preenchimento das vagas deixadas por aqueles;

b) Diminuem fortemente a desejável atracção que os institutos industriais deveriam exercer sobre a juventude, por virtude da poderosa influência que tem nas actividades particulares a maneira como os organismos oficiais remuneram e graduam os seus servidores.

O Sr. António Santos da Cunha: -Muito bem, muito bem!

O Orador: - 3.º Os cursos-base actuais das escolas médias de Engenharia só por si não correspondem as necessidades da indústria nem satisfazem as exigências da técnica, e que deriva da aglutinação daqueles "cursos de base" e da inexistência de cursos de especialização.

4.º Falta de articulação, aliás de uma melhor articulação, entre os institutos industriais e as outras escolas de Engenharia de grau mais elevado.

Ainda a propósito dos vencimentos pagos pelo Estado aos agentes técnicos de engenharia, e fixados pelo Decreto-Lei n.º 26 115, diz o Ex.mo Sr. Eng.º José do Nascimento Ferreira Dias, ex-Ministro da Economia, o seguinte:

Discordo dos vencimentos que foram atribuídos e defendo o princípio de que deveria restabelecer-se a antiga equiparação, visto que entendo que nenhum engenheiro ao sair da escola e ingressando no serviço do Estado se deverá sentir vexado por ganhar menos do que um agente técnico de engenharia de 1.ª classe já com mais de 30 e até mais de 40 anos de serviço, etc.

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Sr. Presidente e Srs. Deputados: razões ponderosas levam-nos à certeza da falta de técnicos, e em particular de diplomados pelas escolas médias de Engenharia.

O Governo por isso mesmo tem procurado canalizar as grandes massas escolares, para o ensino técnico, e neste pendor se criaram e criam todos os dias escolas técnicas.

O Sr. Martins da Cruz: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faz obséquio.

O Sr. Martins da Cruz: - Desejo fazer uma ligeiríssima rectificação a uma afirmação de V. Ex.ª Infelizmente não se criam todos os dias, nem todos os meses, escolas técnicas no nosso país. E oxalá tal acontecesse!

O Orador: - Mas ainda se criam bastantes.

O Sr. Martins da Cruz: - Nos últimos anos, mercê do incentivo dos planos de fomento, o ritmo da sua criação terá crescido, mas, ainda assim, não atinge a dúzia de escolas técnicas por ano. Para que no ano 2000 possamos alcançar a situação actual da Europa será necessário criar anualmente pelo menos 20. Só nesta proporção estaremos então ao nível em que hoje se encontram esses países que V. Ex.ª referiu. Acrescentarei ainda: segui com o maior empenho as considerações de V. Ex.ª quanto à falta de técnicos de grau médio e verifiquei que V. Ex.ª apontou como causa da nossa deficiência os vencimentos, a qualificação da denominação e outras razões que se me afiguram, de algum modo, causas secundárias. Por isto: é porque nesses países que V. Ex.ª citou, como a Bélgica, a Holanda, a Alemanha e a Bússia, essas razões existem também.

O Sr. António Santos da Cunha: - Mas não tão frisantes.

O Sr. Martins da Cruz: - Algumas não too frisantes, mas outras mais frisantes ainda. Não tão frisantes como são essa da denominação de engenheiros e ajudantes técnicos de engenharia. Apesar disso, esses povos têm um número muito elevado de técnicos de grau médio. E V. Ex.ª apontou números elucidativos a esses respeito. Nós estamos ao contrário.

Como disse muito bem o Sr. Deputado André Navarro, temos aí mais "oficiais que sargentos". Porquê? Não sei se V. Ex.ª sabe - talvez não tenha reparado - que os dois únicos institutos industriais de que dispomos na metrópole foram criados por el-rei D. Luís em 1864, se não erro. E de 1864 a 1968 a população deste país duplicou, triplicou talvez. Além do aumento da população, dá-se um fenómeno verdadeiramente consolador: a actividade económica aumentou extraordinariamente. Mas até hoje não fomos capazes de aumentar o número de institutos industriais criados em 18641

O Orador: - Mais adiante darei a resposta a V. Ex.ª No entanto, continue, que estou encantado a ouvi-lo.

O Sr. Martins da Cruz: - Também no que toca a técnicos de grau superior, há mais de 50 anos que, em Portugal, não é criada nenhuma escola de carácter técnico de grau superior. A última foi o Instituto Superior Técnico, em 1911, se a memória me ajuda. E quero anotar que, se mais nenhuma dessas escolas foi criada, esse facto não se deve a menor interesse dos responsáveis, pois a própria Universidade de Coimbra vem, desde há muito, a pugnar pela criação da Faculdade de Engenharia. Mas a sua solicitação aguarda a desejada "fecundação" financeira! (Risos).

O Orador: - Agradeço muito a V. Ex.ª as suas considerações, as quais só vieram reforçar as minhas palavras. Mas, como ia dizendo, não é só de agentes técnicos que o País necessita. Igual falta se nota quanto a engenheiros agrónomos e silvicultores. E o nosso país necessita muito de florestação. É um dos problemas fundamentais do País, e cada vez se há-de verificar mais a falta de técnicos para a sua efectivação.

O Sr. Martins da Cruz: - Se Y. Ex.ª me permite ainda nova interrupção, direi: quanto à falta de engenheiros agrónomos e silvicultores, o Instituto Superior de Agronomia tem visto aumentar de ano para ano a sua frequência, mas numa percentagem que não acompanha a verificada nas restantes escolas superiores do País. Mas quanto à silvicultura, a frequência nem sequer acompanha esse ligeiro acréscimo, pois ela vem diminuindo nos últimos anos, o que representa um grave prejuízo para a riqueza nacional, que em breve verá a economia florestal comprometida no seu progresso.

As três escolas de regentes agrícolas têm mais de 40 anos de existência, mas parece que nada de novo se passou no decurso desses anos, se avaliarmos a vida nacional por um tal critério de estagnação ...

O Sr. Presidente: - Não queria servir-me do Regimento para retirar a palavra a V. Ex.ª, mas a verdade é que os Srs. Deputados, quando usam da palavra, se devem dirigir à Presidência.

O Sr. Martins da Cruz: - Peço a V. Ex.ª muita desculpa de não ter tomado essa atitude, mas fi-lo apenas pela força de um hábito profissional, isto é, de me dirigir à pessoa com quem dialogo ...

O Sr. Presidente: - De acordo, mas creio que quem de alguma maneira representa a Assembleia é a Presidência.

O Sr. Martins da Cruz: - Apresento as minhas desculpas a V. Ex.ª e prometo não reincidir.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado!

O Orador: - Criada a Escola Técnica de Portimão, solicitada há bem pouco tempo ao Governo pelas mais representativas autoridades do distrito e do concelho, a que jubilosamente nos associamos, e que neste momento lembramos a S. Ex.ª o Ministro da Educação Nacional tão imperiosa necessidade, ficará o Algarve a dispor da mais perfeita cobertura de ensino técnico.

Não seria então oportuno, mas evidentemente só depois de satisfeitas as sugestões apontadas de maneira a interessar a juventude pelos referidos estudos, que, como cúpula desta magnífica rede escolar, e ainda tendo em atenção a falta de diplomados pelos cursos médios de Engenharia, se fundasse um instituto industrial em Faro, que numa melhor articulação coroasse o ensino técnico ao sul do Tejo? ...

Certos de que seria uma auspiciosa realização para a província e para a Nação, aqui deixamos a ideia e os votos mais sinceros da sua consecução.

Não queremos, porém, deixar de chamar a atenção para uma solução, que parece ter obtido largos aplausos no recente Congresso do Ensino de Engenharia, que seria

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o estabelecimento, dentro da mesma Universidade, de vários graus de engenharia, com a consequente integração num desses graus dos diplomados pelos institutos industriais.

Razões ponderosas levam-nos também a pedir ao Governo as medidas que atrás formulamos, a fim de que se desperte na juventude o interesse pelos cursos médios de Engenharia, tão necessários para o desenvolvimento industrial na "hora certa de Portugal".

Ao tratarmos de problemas do ensino técnico, constituiria imperdoável ingratidão se neste momento não prestássemos as homenagens do concelho de Tavira a dois grandes estadistas - o Prof. Engenheiro Leite Pinto e o Prof. Doutor Lopes de Almeida -, felizmente entre nós para honra desta Assembleia.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Ao primeiro deve Tavira a fundação da sua escola técnica, ao segundo o prosseguimento das suas actividades escolares, com a criação dos cursos profissionais e de formação feminina.

Por estes inestimáveis benefícios aqui deixamos a SS. Ex.ªs os nossos mais rendidos agradecimentos.

Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Gamboa de Vasconcelos: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: na sessão de 16 de Fevereiro do ano findo, desta mesma bancada, ergui um brado de inquietação e de angústia, chamando a atenção da Assembleia e do Governo para as múltiplas agruras que o isolamento e a distância causavam à vida dos habitantes dos Açores.

Coloquei então na base das suas necessidades mais instantes a resolução do problema das comunicações aéreas, fortemente agravado, a partir dos últimos meses de 1961, pelo abandono, quase completo, da escala de Santa Maria pelos aviões das linhas da América do Norte e, desde há muito, prejudicado pela precariedade de condições do aeroporto de S. Miguel e inexistência de qualquer pista de descolagem ou aterragem em toda a metade ocidental do arquipélago.

Os Açores - todos o sabem - são aqueles minúsculos pontos que os mapas indicam, como acidentes geográficos de somenos importância, no meio do Atlântico.

O que muitos, porém, parecem ignorar é que esses diminutos pontos correspondem a outras tantas ilhas habitadas, cuja superfície anda por metade da área territorial do Algarve e cuja população, de 336 000 almas, excede, de alguns milhares, as 320000 desta província.

Tão grande densidade demográfica bastaria para aumentar, em regime assencialmente agrícola, a acuidade dos problemas económicos e sociais de qualquer agregado humano do continente.

Mas no caso especial das ilhas açorianas um outro elemento surge a onerar e dificultar o labor da sua gente - o mar.

O mar fragmenta o seu pequeno território em nove pedaços, que se espalham dispersos por mais de 200 milhas.

O mar separa-os da Mãe-Pátria por distância superior a 1500 km.

O mar afasta-os do resto do Mundo por rotas que parecem infindáveis.

A vida em semelhantes condições torna-se, assim, incómoda e difícil, exigindo de cada ser não só vigor e coragem para os combates de cada dia, mas resignação e fé para os desanimes de cada hora.

Particularmente em S. Miguel, onde se concentra mais de metade da população do arquipélago e onde, depois da saída de cerca de 20 000 emigrantes, nos últimos dez anos, ainda se regista, no momento presente, a densidade de 229 indivíduos por cada quilómetro quadrado de campo arável ou de serra inacessível, a luta pela sobrevivência é dura em demasia.

Mais de 60 por cento dos homens são compelidos a aceitar a simples condição de assalariado agrícola a troco de reduzido salário, que mal chega para as despesas elementares da manutenção do lar.

A parte restante esfalfa-se na actividade contínua de variadíssimos misteres, sem curar do direito das horas de repouso.

Por mais que o habitante da ilha se debruce, porém, sobre a terra fértil e generosa, esta só por si não basta para a satisfação de todas as suas necessidades pessoais.

Há que trocar o que lhe sobra por tudo o que lhe falta. E, para isso, ele tem de galgar o mar. Tem de vencer u enorme distância que o separa dos centros industriais, comerciais ou educacionais para neles vender ou obter o trabalho, o produto ou o saber que o ajuda a suprir, no regresso, todas as carências que o envolvem.

O Sr. Sousa Meneses: - Muito bem!

O Orador: - E o mar, meus senhores, não é fácil de galgar.

Não é a pé nem mesmo de automóvel que Neptuno deixa invadir os seus domínios.

Para vencer a extensão do seu poder são indispensáveis gigantes bem armados, e os actuais gigantes, quer se chamem navios de turbina, quer se chamem aviões a jacto, necessitam de vastos campos de manobra para que neles se trave, vitoriosa, a batalha do progresso.

Eis, Sr. Presidente e Srs. Deputados, porque em Fevereiro do ano findo aqui me bati, com veemência, pela solução do problema das comunicações dos Açores, problema este que implica, como é óbvio, melhor apetrechamento dos seus portos e construção imediata de mais aeroportos.

O brado quase não foi meu.

Não passei de simples arauto do clamoroso estado de desgosto e de cansada expectativa que então perpassava pela alma dos ilhéus. Quando em Julho próximo passado ouvi que S. Ex.ª o Sr. Presidente da República havia aceitado o convite que lhe havia sido dirigido para visitar as ilhas adjacentes, confesso-lhes que tremi pelos Açores.

Sabia que todos os açorianos estavam profundamente gratos ao antigo e eminente Ministro da Marinha pelo despacho n.º 100, que havia convertido o "zero naval" em 600 000 t de bons navios.

Não ignorava que todos eles se haviam conscientemente decidido pelo seu nome nas últimas eleições presidenciais, oferecendo-lhe, sem reserva, a mais alta percentagem dos seus votos.

Eu não podia desconhecer tudo quanto os Açores deviam, como parcela da Nação, aos ilustres Ministros do seu Governo e ao génio do seu Chefe.

Mas temia que a depressão que avassalava nessa altura os seus habitantes pudesse, por qualquer forma, impedir a exteriorização dos verdadeiros sentimentos de respeito, de admiração e de gratidão que traziam no âmago da consciência.

E à mente, receosa, aflorou-me então o seu comportamento em anteriores acontecimentos semelhantes.

Revi o que havia sido em 1901 a visita do rei D. Carlos e deparei com o povo, que pouco antes protestara energicamente contra a decadência geral, a exigir a sua auto-

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nomia administrativa, converter em apoteose a recepção ao seu rei e demonstrar-lhe, à plenitude do sentimento e da razão, que outra não era a sua causa, nem outra a sua bandeira, senão a de Portugal.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Rememorei a viagem do general Carmona em 1941 e encontrei o mesmo povo, que ainda se não havia refeito totalmente das desordens e dos estragos causados por quinze anos de desgraçada política demagógica, vibrar de entusiasmo à passagem da sua figura insinuante e nela celebrar com verdadeira admiração e confiança as novas perspectivas do ressurgimento nacional.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Recordei a jornada do general Craveiro Lopes em 1957, e mais uma vez vi este povo, já então habituado as exigências de "mais e melhor:", acorrer em massa, com palmas de alegria e de reconhecimento por tudo quanto de benéfico havia em sua volta.

E todas estas visitas, quer fossem colocadas a distância de 460 anos do primitivo povoamento dos Açores, como a primeira, quer fossem a espaços mais curtos de 40 e de 16 anos, como a segunda ou a terceira, me deram u certeza de que os insulares, bem mais do que as contingências dos regimes ou da política e até bem mais do que as próprias conveniências locais ou pessoais, prezavam a honra de ser portugueses e, como tal, jamais poderiam deixar de pôr a fidalguia da sua origem ao serviço dos indefectíveis sentimentos de fidelidade ao seu país.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Não me admirei, pois, quando no dia 5 de Julho de 1962 encontrei enorme multidão a pejar as ruas e as praças da cidade de Ponta Delgada.

O Chefe do Estado, pela quarta vez, iria desembarcar dali a pouco, e isso bastava para que todos sentissem a obrigação não só de estar, cortesmente, presentes à chegada, mas ainda de levar àquele que detinha em suas mãos as maiores responsabilidades do rumo da Nação, em momento tão grave para a sua história, a certeza da sua inteira solidariedade e o calor da sua mais viva devoção.

Quando S. Ex.ª o Sr. Almirante Américo Tomás apareceu, pela primeira vez, na tribuna, não foram só os soldados que se perfilaram e lhe apresentaram armas da ordenança - foram as almas de todos nós.

O Sr. Santos Bessa: - Muito bem!

O Orador: - Os passos que depois deu não encontraram apenas as flores que em chuva ininterrupta lhe atiravam por toda a parte as mãos patrícias das senhoras açorianas - encontraram os nossos próprios corações.

Neles não havia somente a alegria do encontro: havia fé e firmeza a alicerçarem os destinos de uma pátria.

Nos breves quatro dias que durou a curta estada de S. Ex.ª em S. Miguel ninguém lhe formulou qualquer pedido. Todos sentiram que a honra e a transcendência da visita sobrelevava o valor de qualquer aspiração material.

Mas o Sr. Almirante Américo Tomás não quis ser, perante os 171 000 habitantes da minha ilha, um simples magistrado de feição dura, que parecesse arrancado às tábuas de Nuno Gonçalves.

Ele teve sempre nos lábios um sorriso ou uma frase carinhosa para todos.

Ele nunca negou a sua mão ou o seu abraço fosse a quem fosse.

Sentia-se que a sua alma andava enlevada na contemplação de tanto entusiasmo e de tanta dedicação; percebia-se que o seu desejo era poder corresponder a tanta sinceridade e a tanta simpatia, mas não se esperava que a sua generosidade pudesse sair do círculo apertado das cautelas oficiais para vir ao encontro das nossas mais instantes necessidades.

Foi, pois, com imensa satisfação e surpresa que no final do banquete de despedida pudemos ouvir de S. Ex.ª estas alentadoras palavras ao erguer a sua taça:

Bebo pela satisfação das vossas justas e legítimas aspirações, das quais a primordial, para S. Miguel, terá de ser, posso dizê-lo, realizada durante os próximos anos de 1963 e 1964.

Era a promessa velada, mós peremptória, da construção do novo aeroporto por que S. Miguel se batia há mais de dezoito anos!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Era o cessar de uma angústia que tantas vezes se expressava com esgares de desespero frente a impossibilidade de sair da ilha em momentos de grave ou fatal imperiosidade!

Era até o cessar de uma situação de injustiça para com todos os proprietários das terras do antigo e precário campo de Santana, e que a ninguém honrava!

O imenso júbilo que se apoderou de todos quantos puderam ouvir semelhante afirmação só no outro dia pôde chegar ao conhecimento do público pelos jornais.

A essa hora, porém, S. Ex.ª o Presidente da República desembarcava do Pêro Escolar na ilha Terceira, onde, na "mui nobre, leal e sempre constante cidade de Angra do Heroísmo", iria receber novas demonstrações de fé e de patriotismo.

Daí seguiria para o Faial, onde se repetiriam as mesmas palmas, os mesmos vivas e os mesmos sentimentos, e depois para a Madeira, onde, alfim, terminaria com o maior esplendor essa verdadeira viagem triunfal.

S. Miguel não teve assim ensejo de juntar ao agradecimento que tributou a S. Ex.ª pela visita presidencial, na manhã do dia 9 de Julho, todo o reconhecimento que ficava a pairar-lhe na alma por tão excepcional prova de carinho.

Mas desde então não deixou de sentir, como imperativo de consciência, ter de fazê-lo em qualquer outra ocasião.

Na sequência da declaração então proferida cinco meses se passaram sem que fosse possível saber-se ao certo quando se tornaria realidade aquilo que parecia atreito ao campo da utopia.

Porém, em 28 de Dezembro próximo passado, S. Ex.ª o Sr. Ministro das Comunicações quis ter a amabilidade de nos participar telegraficamente que as verbas necessárias para a aquisição dos terrenos e para o início dos obras do nosso aeroporto acabavam de ser incluídas no Orçamento Geral do Estado para o ano de 1963..

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Isto equivalia a possibilidade imediata da materialização da promessa.

Isto tornava inadiável o dever de agradecer.

É esta, pois, a agradável missão de que hoje me incumbo nesta Assembleia, daqui dirigindo, em primeiro lugar, a S. Ex.ª o Sr. Presidente da República - a quem os Açores ficaram a dever em Julho passado tão altas

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horas de exaltação e de fé nos destinos da Pátria - a expressão do mais profundo respeito e o preito da mais rendida gratidão do povo de S. Miguel.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Em seguida, quero também manifestar a todos os Ex.mos Membros do Governo - mormente àqueles que, como S. Ex.ª o Sr. Ministro das Obras Públicas, conhecem de perto os problemas das ilhas e a eles têm votado, pela vida fora, boa parte da sua atenção e do seu carinho - o maior reconhecimento dos micaelenses pela decidida boa vontade que revelaram com o deferimento de obra tão cara em conjuntura financeira tão difícil.

Finalmente, desejo agradecer a S. Ex.ª o Sr. Ministro das Comunicações todas as diligências que sempre fez, através dos anos, para que o aeródromo de S. Miguel fosse um facto e todos os bons propósitos em que se encontra para que as comunicações aéreas dos Açores sejam, dentro em breve, tão amplas e perfeitas, quanto amplas e perfeitas são na actualidade as comunicações telefónicas e telegráficas saídas da sua acção.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. António Santos da Cunha: - Sr. Presidente: não resisto à tentação - a gratíssima tentação!- de dizer aqui algumas breves mas sentidas palavras a propósito da visita que o antigo Presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira vai agora fazer às cidades de Guimarães e de Braga.

Sei bem que as autoridades e as populações locais, vincando de modo expressivo os seus sentimentos de admiração e de reconhecimento, hão-de tributar ao grande amigo de Portugal a carinhosa, a vibrante, recepção que ele merece; mas entendo que devo sublinhar nesta tribuna, sem dúvida a mais alta e representativa da Nação, o significado tão oportuno dessa honrosíssima visita.

A figura de Kubitschek de Oliveira, que está já definitivamente ligada à história do Brasil moderno, graças a essa extraordinária realização de Brasília, a nova e pujante capital do leader da América do Sul, entrou há muito no nosso coração, e dele nunca sairá.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Apaixonado da comunidade luso-brasileira, não só pelo imperativo da sua lúcida inteligência, mas também pela voz ancestral do seu sangue e da sua alma, obreiro e signatário do Tratado de Amizade e Consulta, que infelizmente, não tem tido, no terreno prático, a aplicação por todos esperada, ele é um dos mais brilhantes, operosos e prestigiosos vultos da política brasileira.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Para nós, portugueses, o Dr. Juscelino, como singelamente gostaríamos de o tratar, é, acima de tudo, hoje como ontem, e como amanhã, um dedicadíssimo, um lealíssimo, amigo e servidor de Portugal nas horas boas e nas horas más, que é quando se mede a extensão e a profundidade das amizades.

O Sr. Elísio Pimenta: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Com todo o gosto.

O Sr. Elísio Pimenta: - Não sei se V. Ex.ª, na sequência das suas considerações, se irá referir a um facto que merece ser posto em relevo para bem se Avaliar o amor do antigo Presidente Juscelino à nossa pátria. Julgo que ninguém esquece que há anos, suponho que três, quando o Ministro Conselheiro Donatello Grieco, actualmente na Embaixada de Lisboa, fez na O. N. U. um notável discurso em defesa de Portugal, dos direitos de Portugal no ultramar, perante o ataque dos comunistas e dos afro-asiáticos, u posição amiga do irmão Brasil foi directamente recomendada e inspirada pelo Presidente.

Eu próprio tive ocasião de lho ouvir dizer quando, em nome da cidade do Porto, o visitei e saudei no Palácio da Alvorada, nessa portentosa Brasília, obra do maior brasileiro dos nossos tempos, orgulho dos portugueses, a quem ele tanto quer. Se essa nota não estava inserta na intervenção de V. Ex.ª, ela aí fica registada.

A Juscelino Kubitschek devemos, sobretudo, essa lúcida e extraordinária compreensão do direito de Portugal, feroz e fortemente atacado pela primeira vez, atitude que coerentemente a sua inteligência e o seu amor à justiça o forçaram a manter até hoje.

O Orador: - Muito obrigado a V. Ex.ª.

Quando a União Indiana invadiu o Estado Português da índia, calcando aos pés, com a perfídia e a cobardia que o Mundo já condenou, os mais elementares direitos jurídicos e espirituais, em nome da mais absurda e monstruosa ambição territorial, o Dr. Juscelino foi dos que, na sua pátria, mais veementemente se insurgiu contra essa iníqua usurpação. E vimo-lo presente, como se fosse um simples português, na grande manifestação de protesto e de repúdio organizada então no Rio de Janeiro pelas associações portuguesas radicadas na grande nação irmã.

Em toda a sua fulgurante carreira jamais desmentiu o seu amor pela nossa terra; e quando exerceu, com superior dignidade, a mais elevada magistratura do seu glorioso país bem podia repetir as memoráveis palavras que um antecessor proferira em 1934 ao visitar o Real Gabinete Português de Leitura do Rio de Janeiro:

Entendo que se não pode ser Chefe de Estado no Brasil sem ser um grande amigo de Portugal.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Mantendo-se fiel a esta nobre directriz, ele desenvolveu sempre os maiores esforços para estabelecer e aprofundar uma verdadeira fraternidade entre os dois povos, baseada em mil laços de nascimento, de idioma, de tradições seculares e de interesses morais e materiais, que nenhuma aberração, nenhum capricho, dos homens ou das circunstâncias ou das instituições lograrão jamais destruir.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - De nada valerá, efectivamente, a comunidade luso-brasileira se ela não transpuser com firmeza o texto dos tratados e dos instrumentos diplomáticos e a oratória inflamada dos discursos, por mais eloquentes. Do que ela carece, substancialmente, é de afecto, é de comunhão, é de consciência, é, em suma, de coração - e esse tem-no demonstrado sempre o Dr. Juscelino nas suas acções de homem público e na própria conduta da sua vida privada.

Por isso, neste momento, desejo saudá-lo comovidamente em legítima representação das gentes do meu distrito e ainda em nome daqueles milhares e milhares

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de laboriosos minhotos que em terras de Santa Cruz têm edificado o seu destino, contribuindo ao mesmo tempo para a grandeza da imensa e acolhedora nação que lhe abriu os braços promissores.

Quando esteve em Portugal como Chefe de Estado, ele devia então visitar o distrito de Braga, que o esperava ansiosamente paru o florir com a sua ternura agradecida; mas as exigências e responsabilidades do seu cargo não consentiram que promovêssemos a festa da nossa alegria, e ele teve de regressar ao Brasil mais cedo do que conta vamos.

Foi pena, foi muita pena, que assim sucedesse - dissemos com muita tristeza, sentindo perder-se a hora singular em que poderíamos aclamá-la em pessoa dentro dos nossos próprios muros.

Quis a Providência - e quis também a sua inesgotável bondade - que essa visita se vá efectivar agora, já não como Chefe de Estado, mas como cidadão, como senador, como camarada e amigo, a quem não suo necessárias credenciais para entrar faustosamente na nossa casa entre palmas e reverências.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Para nós, ele é sempre o Dr. Juscelino; não importam os títulos, importa a sua condição de brasileiro insigne que vai em peregrinação pelos lugares sagrados da Pátria: pelo Castelo e pelos Paços do Duque de Guimarães; pela capelinha onde se baptizou o nosso primeiro rei; pelo campo de S. Mamede, onde se travou a batalha decisiva que definiu as linhas seguras da personalidade nacional; pelo templo da Sé Primaz, em Braga, que guarda os túmulos de D. Teresa e do conde D. Henrique, os primeiros soberanos de Portugal, e onde tantos prelados eminentes têm orado pela salvação e pela glorificação de Portugal.

Peregrinação de saudade será essa, porque o Dr. Juscelino, como todos os brasileiros, proveio do mesmo tronco robusto e altivo, e tanto que ao beijar, em Brasília, no dia grande da sua inauguração, a cruz de Frei Henrique de Coimbra, que serviu no altar improvisado em que foi rezada a primeira missa após a descoberta do Brasil, ele não conteve as lágrimas, segundo o testemunho de S. E. o Cardeal-Patriarca, que ali a transportou como legado pontifício.

Essa cruz vai agora decerto ser de novo por ele beijada no ambiente tão empolgante de espiritualidade da catedral bracarense, padrão imortal que não se contempla sem um estremecimento de orgulho. Ela parece afirmar que, à sua sombra, o Brasil o Portugal oferecem um espectáculo de confiança no futuro dos seus destinos - confiança que, sem em burgo das angustiosas preocupações sobre a marcha da humanidade, dá, todavia, a ambos os países o máximo possível de serenidade e de coragem neste lance dramático da História. É que o Brasil, como Portugal, será sempre cristão.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Não escondo que foi com a maior alegria e até o maior orgulho que recebi a notícia da ida do Dr. Juscelino a Braga, que me foi transmitida, quando acompanhava o delegado do Aeroclube daquela cidade, por outro grande amigo de Portugal e também apaixonado da plena, efectivação da comunidade luso-brasileira - o embaixador Negrão de Lima, diplomata eminente, a quem tanto deve a causa das relações e do intercâmbio entre os dois povos irmãos.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Pedro Calmon celebrou um dia a cidade de Braga como a raiz da religião do Brasil, e assim é. Está a afirmação registada no livro de ouro da sua Câmara Municipal. Depois de atravessar essa Beira magnífica de paisagens severas e bucólicas, de gente sã e leal, o Dr. Juscelino desce às terras onde Portugal surgiu para a civilização. As raízes da religião e da Pátria estão ali realmente na sua catolicidade e no seu indefectível patriotismo, tão heroicamente assinalado no sangue moço vertido no ultramar na luta contra os bárbaros de várias cores.

Em Braga reavivará, como unte as muralhas do Castelo de Guimarães, as profundas razões que o determinam a amar Portugal. O grande brasileiro ali afervorará as suas crenças mais íntimas e todos nós sabemos que, partindo delas, muito poderá ainda contribuir pura a aproximação, não verbal nem académica, mas sim concreta e frutuosa, entre os dois países das margens do Atlântico que Deus fadou para cabeças de dois mundos iguais.

Sr. Presidente: já nesta Assembleia a comunidade luso-brasileira foi brilhantemente enaltecida pelo ilustre Deputado Dr. Júlio Evangelista, e ainda parecem nela reboar os ecos do notabilíssimo discurso que o Deputado Prof. Doutor Lopes de Almeida proferiu ao saudar o Presidente Café Filho. São bem despretensiosas e bem pálidas as minhas palavras em confronto com as que então se pronunciaram, mas o coração - esse é o mesmo. O coração dos bons portugueses que amam ternamente as terras de San tu Cruz.

Vem aí o "Voo du Amizade". Juscelino está a caminho das costas de Portugal. Nunca a palavra "amizade" teve tão alto significado. E de tristeza, porque de invernia, a época em Portugal, mas temos a certeza de que o coração de todos os portugueses estará em festa para festejar o grande amigo que chega.

Tenho dito.

Vozes:-Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: a primeira parte da ordem do dia é a votação sobre o pedido de renuncia apresentado pelo Sr Deputado Gonçalves Rodrigues. A votação vai ser feita por escrutínio secreto, por meio de esferas brancos e esferas pretas.

A esfera branca exprime o voto de não aceitação da renúncia; a esfera preta exprime o voto de aceitação da renúncia.

Para efeito da votação estão na mesa que se encontra diante de mim duas umas: a n.º 1 e a n.º 2 uma n.º l é aquela em que se exprime o voto; a n.º 2 funciona como contraprova.

A cada um de VV. Ex.ªs vão ser distribuídas duas esferas: uma branca e outra preta.

Creio que disse o suficiente para VV. Ex.ªs ficarem devidamente esclarecidos. Noutras votações anteriores tem havido enganos, por vezes. Espero que desta vez não suceda o mesmo, e que, repito, VV. Ex.ªs tenham ficado perfeitamente esclarecidos.

Vai, pois, iniciar-se a votação.

Fez-se a votação.

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O Sr. Presidente: - Está terminada a votação e convido para escrutinadores os Srs. Deputados Carlos Alves e Moreira Longo.

Fez-se o escrutínio.

O Sr. Presidente: - Na urna n.º l entraram 89 esferas, 80 brancas e 9 pretas, e na uma n.º 2, a da contraprova, 89 esferas, 80 pretas e 9 brancas.

Não foi aceite a renúncia, como resultado da votação que acaba de ser feita.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à segunda parte da ordem do dia, que é constituída pela continuação do debate sobre o aviso prévio do Sr. Deputado Nunes Barata, relativo ao aproveitamento da potencialidade económica do rio Mondego.

Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Galo.

O Sr. Mário Galo: - Sr. Presidente, prezados Colegas: subo a esta tribuna para prestar também a minha colaboração, dar o meu modesto contributo para o estudo do assunto em debate, e sinto-me feliz por mais uma vez ter oportunidade de vos vir falar num problema que deve exigir a maior atenção dos nossos governantes e de todos nós e ao qual tenho dedicado grande parte da minha vida oficial.

Deveria encontrar-se neste momento e neste mesmo lugar a dirigir-vos a sua palavra, tão natural como convincente, um colega ilustre a quem a morte muito cedo arrebatou do convívio dos seus amigos e admiradores. Profundo conhecedor dos problemas da bacia hidrográfica do rio Mondego era o engenheiro Egberto Rodrigues Pedro, e se a sua memória já aqui foi exaltada em sentidas palavras por V. Ex.ª, Sr. Presidente, e em exposição tão fluente e tão eloquente do nosso ilustre colega Dr. Pinto Carneiro, eu não posso deixar passar a oportunidade que agora se me depara sem prestar também a minha homenagem de muita saudade ao companheiro e amigo que perdi, o meu preito de profunda admiração e reconhecimento pelo trabalho que com tanta capacidade realizadora desenvolveu nos serviços florestais portugueses.

Se ainda tivéssemos a dita da presença do engenheiro Egberto Pedro entre nós, ouvi-lo-íamos dissertar cuidadosa e profundamente sobre às questões que se relacionam com o integral aproveitamento das riquezas da bacia, hidrográfica do rio Mondego, muito principalmente sobre aquelas que se prendem com o seu tão necessário quão indispensável repovoamento florestal. Esse seria o complemento essencial dos extensos e intensivos estudos aqui expostos por outros ilustres colegas desta Assembleia, que eu não poderei, infelizmente, vir apresentar.

Nas minhas ligeiras observações abordarei mais uma vez nesta Casa o problema da erosão, irei, por certo, repetir-me nalgumas das considerações que vou efectuar e, mais falando propriamente em generalidades, poderão os meus comentários ser extensivos, com a mesma propriedade, a tantas outras bacias hidrográficas da parcela europeia do nosso país, onde numerosos aproveitamentos hidroeléctricos e hidroagrícolas correm o risco de se vir a perder totalmente ou de ver muito rapidamente reduzida a sua capacidade de utilização.

Sr. Presidente: o caudal sólido que anui aos cursos de água provém principalmente de duas formas de erosão: uma, que se manifesta sobre toda a área das bacias de recepção - erosão laminar -, outra, que se produz normalmente ao longo das linhas de água - erosão concentrada; uma e outra dependendo, em intensidade e valor, principalmente da constituição geológica dos solos, do declive dos talvegues e da inclinação e forma de utilização dos terrenos.

A água que escorre ao longo das encostas dos montes e das serras, obedecendo à lei da gravidade, anima-se normalmente de grande velocidade; desagrega e corrói os solos que não se encontram protegidos; arrasta a terra que serve de apoio às pequenas e às grandes pedras, obrigando-as a perder o equilíbrio, e precipita todos estes materiais no fundo dos talvegues. Os materiais arrastados Tia queda também, por seu turno, provocam o movimento de muitos outros que constituem o terreno das encostas, e estas começam por escavar-se em pequenos sulcos que podem transformar-se em grandes barrancos e ravinas.

É este, em linhas gerais, o fenómeno da erosão, que arranca do terreno quantidades enormes de materiais, que, despenhando-se com forca nos talvegues muito declivosos dos cursos de água de montanha, lhes escava os leitos, origina o desmoronamento dos taludes marginais e provoca o serpentear da corrente, que, por seu turno, mais terreno vai erosionar.

O caudal líquido e sólido assim formado chega à planície, os materiais erosionados depositam-se nos leitos dos rios, assoreando-os, e estes, não dando vazão as águas, fazem-nas transbordar para os campos vizinhos.

Prosseguindo a erosão, os leitos dos rios chegam mesmo a atingir cotas superiores às dos campos marginais e são artificialmente encaminhados até ao mar com a construção de elevadas e dispendiosíssimas motas laterais." Estas, muitas vezes, não comportam todo o caudal, ou são enfraquecidas pelo contínuo corroer da corrente, rompendo-se; e então as águas invadem os campos, destroem as culturas e inutilizam os terrenos em exploração agrícola, sepultando-os muitas vezes sob espessas camadas de areias estéreis. As águas, na sua fúria devastadora, não poupam as pontes nem as vias dê comunicação, e muitas vezes atingem os centros populacionais, inutilizando em algumas horas o esforço construtivo de gerações inteiras. O assoreamento chega a atingir os portos de mar, tornando-os impraticáveis à navegação, e de tudo isto resultam incalculáveis prejuízos para o País.

Os desastrosos efeitos das cheias são rápidos, mas as causas que lhes dão origem progridem muito lentamente, sem quase nos apercebermos da sua existência; e quando elas se verificam é já normalmente muito tarde para completamente serem eliminadas. Recorre-se então a medidas ocasionais, muitas vezes na ilusão de que poderão ser definitivas. Constroem-se grandes represas para acumular os grandes caudais de Inverno, e obras de defesa ao longo dos cursos de água; mas, passado algum tempo, verifica-se que essas represas se encontram também grandemente assoreadas, com notável redução da sua capacidade armazenadora, e que as dispendiosas obras efectuadas ao longo das margens dos rios não apresentam segurança suficiente, pois o constante depósito de novos carrejos faz subir cada vez mais as cotas dos talvegues.

É à destruição da vegetação, principalmente da que cobre as regiões montanhosas, que se deve a maior parte das vezes a única origem dos desastres provocados pelo assoreamento dos cursos de água e pelas cheias, pela destruição de campos de cultura agrícola, de vias de comunicação, de portos de mar, de povoações e de vidas humanas. E é quase sempre o homem que imprevidentemente dá causa a estas devastações, ou por necessidade ou por incúria. Por necessidade, porque devido ao aumento populacional se vê obrigado a arrotear novos solos para cultura agrícola; por incúria, porque muitas vezes destrói florestas inteiras sem se preocupar com o rearbo-

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rizar dos terrenos e sem se lembrar de que assim os deixa livremente entregues à força erosiva das águas.

Sr. Presidente: o solo do globo terrestre era outrora quase inteiramente coberto por densa vegetação, na qual as florestas se encontravam largamente representadas. As águas corriam límpidas para os mares e as cheias não se faziam sentir com violência, podendo mesmo talvez afirmar-se que não existia erosão apreciável.

O homem primitivo vivia nas florestas, alimentava-se dos frutos silvestres e da caça, e só muito mais tarde, talvez com os ensinamentos da natureza e com os necessidades impostas pelo aumento populacional, começou a exercer a cultura agrícola.

Desbravou primeiro os terrenos ribeirinhos que se situavam nas proximidades dos locais onde se fixara, foi-os pouco a pouco alargando e, quando, em resultado de lutas com outros homens, teve de procurar refúgio nas montanhas, viu-se obrigado a derrubar também ali o arvoredo e a criar novos terrenos agrícolas para satisfação das suas necessidades alimentares.

A população humana do globo terrestre aumentou em ritmo acelerado, mais numas regiões do que noutras, normalmente mais onde a vida era mais fácil e simples, e por ai muitas mais florestas foram derrubadas, novos campos de cultura agrícola surgiram.

As relações entre povos permitiram troca de conhecimentos e melhores condições de vida, mas também maiores necessidades surgiram, e já o corte de florestas não teve só o fim de alargar a área da cultura agrícola, mas também o do aproveitamento mais intensivo de lenhas e de madeiras. Muitas e muitas florestas foram assim derrubadas, e também muitas delas tinham já desaparecido em consequência da vida pastoril; imensas áreas arborizadas foram também destruídas pelo fogo, lançado e ateado muitas vezes pelo homem para obtenção de maiores espaços livres para cultura agrícola, ou para afastar para longe os animais selvagens, ou ainda pelo simples prazer de destruir.

Foram assim, no decorrer dos tempos, arrasados grandes massas de arvoredo, imprevidentemente ou premeditadamente, mas quase sempre sem que o homem desse qualquer passo para reconstituir a riqueza florestal perdida e sem se lembrar de que pouco a pouco ia destruindo a afinidade existente entre clima, solo e seres vivos, que tinha levado séculos a constituir-se.

Os rios deixaram de correr límpidos para os mares e iniciou-se um período de intensa erosão, que deu origem a enormes áreas de terrenos de aluvião.

O uso e o abuso da exploração da terra rompeu, contudo, o equilíbrio inicialmente mantido pela vegetação, e daí resultaram prejuízos consideráveis.

Diminuíram os reservas de água armazenada no solo e a possibilidade de se reconstituírem, o que originou uma' maior concentração dos caudais de esgoto; e se o homem desde que ocupou a superfície da terra sempre mais ou menos se teve de preocupar com as secas e com as cheias, com a sede e com a abundância de água, mais viu agravadas as suas preocupações à medida que ia destruindo as florestas.

Não só a água lhe faltava nas ocasiões em que mais dela necessitava e era em excesso quando a não desejava, mas também os bons terrenos de cultura agrícola começavam a ser assoreados ou lavados pelas águas das cheias, quando não eram arrastados, tornando-se estéreis e tendo de ser abandonados ou reconstituídos à custa de muitos e penosos esforços.

Os efeitos desastrosos da destruição de grandes superfícies arborizadas, apesar de lentos, foram-se fazendo sentir tanto mais rapidamente quanto mais velozmente se fazia a colonização, e, se a princípio o homem com eles

não muito teria de se preocupar, porque não faltava nova terra para ocupar, chegou mais tarde a ocasião em que, com o aumento populacional, se viu obrigado a procurar remediar a situação criada, porque lhe estava faltando o solo que o sustentava.

Nas regiões de densa população, em que a intensiva exploração da terra, além de se tornar necessidade imperiosa, era de algum modo remuneradora, o homem construiu socalcos com que impediu que o solo agrícola fosse arrastado pelas águas, mas nas regiões de cultura extensiva viu-se obrigado, muitas vezes, a abandonar muitos dos campos que com tanto trabalho e suor tinha arroteado.

Assim sucedeu em todas as regiões do globo onde a população humana se desenvolveu, onde ela tão imprevidentemente abateu a floresta que com o seu manto protector cobria o solo.

Sr. Presidente: não posso deixar de citar aqui, e faço-o com a devida vénia, uma pequena passagem de uma notável conferência proferida em Junho de 1961 pelo Prof. Joaquim Vieira Natividade, em Mirandela. No seu estilo pessoal, tão puro e tão característico, falou 'assim o Prof. Vieira Natividade sobre a erosão, que tanto ò impressionou na terra quente transmontana:

O desmoronar da floresta desencadeia fenómenos regressivos contra os quais a cobertura vegetal protegia a montanha. Destruído o manto arbóreo e arbustivo, o solo nu e superficialmente desagregado pelo pisoteio dos rebanhos torna-se fácil presa da erosão, que pouco a pouco arrasta a fecunda camada vegetal que cobria o esqueleto rochoso e consentia o vicejar dos grandes arvoredos.

Por sua vez, sob a pressão do pastoreio, a vegetação degrada-se e só a flora proletária, sóbria e rústica, é capaz de enfrentar a ardência das estiagens e as ásperas e cruéis invernias. O bosque dá lugar ao matorral que as grandes queimadas periodicamente percorrem; e fica, por fim, a charneca de mato rasteiro e áspero, entre o qual a rocha a cada passo aflora, essa paisagem monótoma, pobre, desolada e triste, tão típica das serranias mediterrâneas.

Não ficou, todavia, por aqui a espantosa obra destrutiva. Em tempos mais modernos, e por imposição do crescimento demográfico, a relha do orado começou a desbravar os imensos montes maninhos, aço* meteu as ondulações dos planaltos, afoitou-se às ásperas vertentes e surge a seara de centeio o revestir muitas serranias desnudes. Já o verde mimoso do cereal cobre os montes na Primavera. E uma paisagem nova, embebida da presença humana, e que vem quebrar a rudeza bárbara das imensas solidões.

Tarefa trágica foi esta, no entanto. A árdua conquista do pão mais veio descarnar as encostas. A montanha é entregue sem defesa à agressividade dos factores naturais, e desencadeiam-se trágicos fenómenos erosivos.

No seu curso tumultuário as enxurradas rasgam o solo declivoso; reduz-se cada vez mais a espessura da camada arável, até que surge a rocha, agressivo e estéril. Mas o homem continuou empenhado nesta sombria tarefa, sem talvez dar fé de que cada pedaço desse pão negro arrancado à montanha, amassado com o suor de mil fadigas, numa luta heróica pela sobrevivência, deixa mais pobre a terra transmontana e agrava, sem remédio, a sua própria pobreza . . .

E ainda:

... E compreendo então o sentimento de melancolia que invade o naturalista enamorado da natu-

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reza em face da impressionante nudez destas vastidões desoladas, quando o sol abrasador da canícula calcina os magros restolhos de centeio e, de longe em longe, pelos vales mais fundos, débeis regatos coleantes, perdidos em leitos cascalhentos, como que procuram furtar-se às carícias brutais do Sol. E onde os fraguedos irrompem e se acastelam tem-se a sensação angustiosa de presenciar a agonia de um mundo; sentimos dolorosamente que a vida se apaga e a paisagem mineral ressurge, morta, fria, estática, sinistra como um panorama lunar ...

As palavras do Prof. Vieira Natividade têm inteira e completa aplicação a vastas áreas da bacia hidrográfica do rio Mondego, onde se assiste a um uso no aproveitamento dos solos que pode comprometer gravemente todas as grandes iniciativas de melhoramento das condições de vida das populações, se severas medidas restritivas de abusos cometidos na exploração da terra não forem rápida e rigidamente adoptadas.

Referi que a erosão do solo se apresenta principalmente sob dois aspectos distintos: erosão laminar e erosão concentrada.

Direi que na bacia hidrográfica do rio Mondego estas duas formas de erosão se acham bem representadas, a primeira, a laminar, espalhada sobre toda a vasta área desta bacia hidrográfica, mas mais intensamente verificada no alto e médio Mondego, a segunda, a erosão concentrada, mais se localizando no baixo Mondego, mas apresentando também certa importância em algumas das linhas de água afluentes do Mondego médio.

Sr. Presidente: já de há muito que os serviços florestais portugueses vêm combatendo a erosão concentrada por meio de trabalhos especiais e a erosão laminar por intermédio da arborização de vastas áreas onde ela se vem produzindo.

Os primeiros trabalhos de correcção de torrentes pelos métodos florestais datam em Portugal de 1904, realizaram-se na bacia, hidrográfica do rio Lis e traduziram-se quase imediatamente pelo desaparecimento das cheias que periodicamente invadiam a cidade de Leiria, e que tão avultados prejuízos ocasionavam nas pessoas e nos haveres dos seus habitantes.

Foi nos alvores do nosso século que uma onda de renovação técnica e administrativa varreu o nosso país e, dos seus principais impulsionadores, os governantes de então, não posso deixar de destacar os nomes prestigiosos dos conselheiros Hintze Ribeiro, Presidente do Conselho de Ministros, Manuel Francisco Vargas, Ministro das Obras Públicas, Comércio e Indústria, e ainda de Alfredo Lê Cocq, director-geral da Agricultura.

A estes homens se ficaram devendo as reformas agrárias então decretadas, que com tão larga repercussão se haviam de projectar em tempos vindouros.

Contam-se por dezenas os regulamentos e diplomas de organização ou reforma dos serviços públicos que se promulgaram no findar do ano de 1901 e tantos deles tão perfeitos se mostraram que ainda hoje, mais de 60 anos volvidos, são de total aplicação, são quase tão actuais como naqueles já tão distantes tempos em que el-rei D. Carlos I reinava em Portugal.

Data precisamente de 24 de Dezembro de 1901 um dos decretos que mais profundamente refundiu os serviços florestais portugueses e lhes facultou os meios de expansão e de actuação que até ali lhes estavam vedados, tendo uma das suas mais eficazes inovações consistido na criação dos serviços de hidráulica florestal, que ficaram a formar um dos grandes grupos em que assentava a reforma orgânica dos mesmos serviços.

Bem hajam os homens dos governos de então, que tantos e tão relevantes préstimos de ordem técnica e administrativa dispensaram ao nosso país e que ainda maiores e melhores frutos poderiam ter produzido se a sua administração se não tem seguido um período conturbado da nossa história, uma época que os portugueses tão mal souberam aproveitar, uma quadra de perturbações e discórdias em que os nossos maiores valores espirituais se diluíram ou mesmo se perderam completamente.

Foi mesmo só já praticamente em nossos dias que se pôde assistir à mais intensa e cabal aplicação dos diplomas promulgados em 1901, foi só agora que se começaram a colher os seus benefícios, que mais e melhor se visiona o que virá a ser no futuro da terra portuguesa o lugar da floresta e das técnicas florestais.

Até 1940 foram escassas as dotações orçamentais dos serviços florestais e, por consequência, não puderam ser atribuídas verbas vultosas para trabalhos de correcção torrencial; mas, mesmo assim, procedeu-se na bacia hidrográfica do rio Lis à execução de trabalhos de correcção torrencial em 33 cursos de água, onde se construíram 316 barragens de alvenaria, cuja altura total ascendeu a cerca de 470 m.

Na bacia hidrográfica do rio Mondego, na região da Lousa e outras, também importantes trabalhos de correcção torrencial se empreenderam a partir do ano de 1926. Foi autor dos projectos e dirigiu esses trabalhos o engenheiro silvicultor Filipe Jorge Mendes Frazão, que foi saudoso director-geral dos Serviços Florestais e Aquícolas; a sua competência .e ao seu saber se ficou devendo o completo desaparecimento do fenómeno erosivo em 11 linhas de água, onde se construíram 160 barragens de alvenaria com a altura total de 355 m.

O melhoramento das condições económicas do País, a era de paz e progresso que atravessámos, permitiram, a partir de 1941, dar novo e grande impulso aos trabalhos de correcção torrencial.

Destaco, e com inteira justiça, que, para o efeito, muito poderosamente tem contribuído o clima de entendimento e de mútua compreensão em que têm vivido os serviços especializados das Direcções-Gerais dos Serviços Hidráulicos e dos Serviços Florestais e Aquícolas.

Tem produzido os melhores frutos a colaboração estabelecida neste campo entre técnicos das duas Direcções--Gerais, sendo-me grato render aqui justa homenagem aos feitores de tão útil e profícua cooperação, a SS. Ex.u o Ministro'Arantes e Oliveira e o nosso ilustre colega desta Assembleia Prof. Vitória Pires, que, quando Subsecretário de Estado da Agricultura, subscreveu em 1955 um despacho em que os Ministérios das Obras Públicas e da Economia oficializaram a criação do Gabinete de Estudos e Obras de Correcção Torrencial, organismo que ficou directamente subordinado íi Direcção-Geral dos Serviços Florestais e Aquícolas e a quem compete a realização de trabalhos de correcção torrencial, tanto no continente como nas ilhas adjacentes.

Tem este Gabinete trabalhado, o continuará a trabalhar, em íntima e profícua colaboração com a Direcção-Geral dos Serviços Hidráulicos, no seguimento das normas superiormente estabelecidas, e desta Direcção-Geral e dos seus técnicos tem continuado a receber o maior apoio, o que também muito me apraz aqui registar.

Está, portanto, em vias de completa resolução o problema da erosão concentrada, tanto no nosso território continental como insular, e muito resumidamente darei conta do que já tem sido a acção dos trabalhos de correcção torrencial na bacia hidrográfica do rio Mondego.

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Além daqueles que já citei, empreendidos pelo saudoso engenheiro silvicultor Mendes Frazão, estão sendo levados a cabo, com verbas e técnicos das Direcções-Gerais dos Serviços Florestais e Aquícolas e dos Serviços Hidráulicos, importantes trabalhos de correcção torrencial nas bacias hidrográficas dos rios Alva e Ceira, do rio do Pranto, e em numerosas linhas de água da região de Montemor-o-Velho.

Nos cursos de água que fazem parte destas bacias hidrográficas acham-se já erguidas mais de 500 pequenas barragens de alvenaria e lajes, cuja altura total ultrapassa 1100 m, e tanto nestes trabalhos como noutros indispensáveis para o eficaz combate à erosão já se despenderam cerca de 5000 contos.

É essencial não parar agora no caminho trilhado e ter confiadamente esperança em que se mantenham as condições que permitiram o arranque de 1941. Assim será possível continuar com os trabalhos empreendidos e iniciar outros ainda em algumas linhas de água da bacia hidrográfica do Mondego onde é necessário que actue a correcção torrencial.

Se as disponibilidades financeiras o continuarem a permitir, creio bem que, à semelhança do Lis, dentro em breve será também completamente dominado o problema de erosão concentrada na bacia do rio Mondego e que largas áreas de terrenos dos vales seroo completamente recuperadas para a agricultura, não mais sofrendo a invasão das areias estéreis arrastadas pelas enxurradas.

Urgente é enfrentar também o gravíssimo problema da erosão laminar na bacia do Mondego, e será, sem dúvida, o revestimento florestal o meio mais seguro, mais eficaz e mais económico para n combater.

Verificámos já que foi a destruição do revestimento vegetal, principalmente do florestal, que provocou o aparecimento do fenómeno erosivo sobre a terra, e desnecessário será, portanto, procurar demonstrar que é a floresta que devemos ir pedir a protecção e reconstituição dos solos degradados. É mesmo fácil verificar nas nossas serranias a diferença que existe entre uma região onde frondosa floresta viceja e a aspereza de uma terra descarnada e nua onde, no dizer do Prof. Vieira Natividade, "sentimos dolorosamente que a vida se apaga e a paisagem mineral ressurge, morta, fria, estática e sinistra como um panorama lunar ...".

É que a floresta regulariza também o clima, diminuindo as temperaturas extremas, tanto no dia como no ano; facilita a condensação do vapor de água e a formação de chuvas, tornando-as mais frequentes, menos abundantes e mais regulares; protege o terreno impedindo, com n folhagem e com a manta morta, a acção directa da chuva sobre o solo; aumenta a infiltração de água na terra e, assim, regulariza os caudais dos ribeiros e rios, permitindo o seu melhor aproveitamento durante todas as estações do ano; exerce uma benéfica influência sobre as regiões vizinhas, moderando a acção dos ventos violentos e muito secos e melhora a sua salubridade; reúne, enfim, todas as condições óptimas para a protecção e defesa do solo e da vida.

A acção benéfica da floresta não se limita, contudo, só ao que acabo de expor, pois além de proteger o solo também o restaura e enriquece.

Ao contrário das culturas agrícolas, que esgotam o terreno, e para a existência dás quais se torna necessário fornecer ao solo os elementos fertilizantes essenciais ao seu desenvolvimento vegetativo, a cultura florestal dispensa qualquer beneficiação anterior ou posterior da terra, desenvolvendo-se mesmo até em terrenos já gastos por outras culturas, em solos pobríssimos, e, findo o seu ciclo vegetativo, verifica-se mesmo considerável melhoria na constituição da camada arável.

Uma grande parte dos elementos nutritivos que a árvore extrai, tanto das camadas profundas do solo como da atmosfera, são depositados na superfície do terreno, por intermédio da manta morta. Os detritos que a constituem renovam-se constantemente, fragmentam-se, apodrecem e transformam-se em húmus, que a análise mostrou conter elementos minerais diversos: carbono, hidrogénio e ma1 terias azotadas.

Sob a acção das bactérias de que o solo florestal favorece consideravelmente a existência, e devido à presença de vários reagentes, o húmus torna-se um dos principais elementos de fertilidade dos terrenos, tendo além disso a .faculdade de tornar mais compactas as terras ligeiras e mais soltos os solos consistentes, melhorando consequentemente as suas propriedades físicas.

A impregnação do solo mineral pelo húmus dá origem à formação de nova terra vegetal. As raízes das árvores introduzem-se pelas mais ligeiras fendas do solo, atacam--no por intermédio dos sucos ácidos que segregam e fragmentam-no mecanicamente por acção do crescimento, favorecendo, portanto, também a formação de novos solos.

É assim que a floresta intervém no melhoramento dos terrenos, tanto em qualidade como em quantidade, não devendo pois restar qualquer dúvida quanto à sua eficácia pura protecção e recuperação de tantos milhares de hectares de solos onde livremente campeia o fenómeno erosivo.

E também a floresta é fonte permanente de rendimento directo, mas não nos devemos esquecer de que ela não se forma, não se cria, de um momento para outro, e de que muitos anos são por vezes necessários para fazer brotar a vida onde só há desolação e morte. Os florestais portugueses continuam, como até aqui, prontos a acorrer ao chamamento, e a dar todo o seu melhor esforço para modificar a feição do delapidado solo português, mas é necessário não lhes regatear os indispensáveis meios de trabalho, facultar-lhes pessoal e material e não lhes exigir num só dia o que só é possível, realizar em longos prazos de tempo.

Sr. Presidente: a bacia hidrográfica' do rio Mondego desenvolve-se por 660 000 ha, dos quais pouco mais de 270 000 ha se encontram arborizados, havendo mais de 100 000 ha de terras incultas e cerca de 80 000 ha de olivais, restando, consequentemente, 210 000 ha ocupados pela área social, terrenos agrícolas e outros. Impressiona o valor da área de incultos, sabe-se que a grande maioria da área de olival se desenvolve por terrenos alcantilados, e que a cultura agrícola se estende em grande parte por terras declivosas impróprias para a suportarem.

Tudo isto, aliado ao facto de cerca de uma terça parte da bacia hidrográfica do rio Mondego atingir pendores superiores a 25 por cento, explica a intensidade do fenómeno erosivo de acção laminar e as suas consequências, que se traduzem pelo volumoso depósito de carrejos que se verifica onde o rio apresenta mais fraco declive.

Ainda é de citar que, como em muitos outros rios, também na bacia do Mondego o agricultor ignorante e ambicioso reduz muitas vezes a secção de esgoto das linhas de água a valores insignificantes e, quantas vezes a custa de penosos fadigas, estabelece dispendiosos campos de cultura agrícola nas margens dos ribeiros e regatos.

Julga ter criado riqueza para si e para os seus, pode mesmo durante algum tempo, anos talvez, viver na doce ilusão de que o seu ribeiro ou seu regato bem comporta as águas pluviais, mas um dia surge violenta trovoada e, numa só enxurrada, num só momento, vê desaparecer o fruto do seu trabalho, a ilusória fortuna que julgava ter alcançado.

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E, o quê é pior, é que muitas e muitas centenas de metros cúbicos de materiais sólidos são assim arrastados e vão contribuir poderosamente para aumentar o volume de assoreamento dos rios, mais e maiores prejuízos causando nos férteis campos marginais dos vales.

Sr. Presidente: conforme já tive ocasião de referir, a erosão laminar mais intensa concentra-se no Médio e Alto Mondego, consequentemente quase com pie tumente puni montante das grandes barragens projectadas, pelo que indispensável se torna tomar as necessárias providências para reduzir consideravelmente a afluência de caudal sólido às albufeiras que se projecta criar.

Sem isso, a sua capacidade de utilização será bastante limitada dentro de relativamente curto prazo de tempo e, ainda que não disponha de elementos concretos para a tal respeito formular sólida opinião, o que é para ponderar é que quase no período de um rio imo de pluviosidade limitada se verificou a reposição no leito du rio, em frente de Coimbra, dos muitos milhares de metros cúbicos de areia que uma draga durante meses e meses andou a extrair para efectuar um importante aterro ao longo da sua margem esquerda.

E creio também que não será de pensar, pelo menos completamente, que a capacidade morta das albufeiras poderá resolver o problema do seu assoreamento durante algumas décadas. Em primeiro lugar porque aquela capacidade é evidentemente limitada e em segundo lugar porque os materiais carrejados não se irão depositar em estratos horizontais nessas zonas mortas.

É sabido que a capacidade de transporte sólido dos cursos de água depende das dimensões dos materiais carrejados e da velocidade da água.

Mesmo em igualdade desta circunstância os materiais mais grosseiros depositam-se sempre segundo maiores declives, e, como nas zonas mortas das albufeiras a velocidade da água é nula ou de valor muito reduzido, eles raramente até ali chegarão.

Entre os volumosos materiais arrancados das encostas e as mais finas areias toda uma gama imensa de perfis de compensação se estabelece ao longo dos talvegues, que dá origem a depósitos sólidos cada vez mais volumosos no tempo e que se dispõem desde o mais afastado limite da linha de regolfo até às maiores profundidades das albufeiras. E assim se vai reduzindo cada vez mais consideravelmente, de montante para jusante, a capacidade de armazenamento do elemento líquido que os lagos artificialmente criados pelo homem deveriam conter e com o qual se contava para produção de energia e para rega de sequiosas terras de cultura agrícola.

Creio bem que não haverá que hesitar em diligenciar obstar imediatamente a que tal estado de coisas se continue a verificar. Os remédios para tal soo conhecidos e resumem-se no seguinte:

Disciplina na actividade agrícola, de forma a conseguir que os indispensáveis campos de cultura não se transformem em fontes de material sólido, que, empobrecendo os seus proprietários, ainda mais fortes prejuízos causam n terceiros;

Correcção torrencial de todas as linhas de água onde exista erosão concentrada;

Manutenção de leitos de rios, ribeiros e regatos convenientemente dimensionados e disciplinados;

Arborização de todos os terrenos que não sejam susceptíveis de cultura agrícola.

Para a efectivação deste programa essencial se torna uma íntima colaboração dos proprietários dos terrenos com o serviço público, aqui representado pelos organismos especializados dos Ministérios da Economia e das Obras Públicas. Todos deverão cooperar com boa vontade e entusiasmo para conduzir a bom termo uma obra que é de primordial interesse para a economia do País.

Sr. Presidente: não seria talvez necessário deixar aqui um apontamento tão particularizado em alguns dos seus aspectos, pois que técnicos distintíssimos se têm debruçado sobre os problemas hidroeléctricos e hidroagrícolas da nossa terra e os nossos governantes estão atentos às exigências das obras que fomentarão melhores meios de subsistência e mais alto nível de vida para os povos de Portugal. Faço-o pois apenas em descargo de consciência e solicitando a V. Ex.ª, Sr. Presidente, e a todos os meus ilustres colegas as minhas desculpas por ter sido tão longo, o meu perdão por ter sido tão enfadonho.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Carlos Coelho: - Sr. Presidente: trazemos ao debate deste aviso prévio sobre o aproveitamento das potencialidades económicas do rio Mondego, da muito louvável iniciativa dos ilustres Deputados pelo círculo de Coimbra, um limitado e modestíssimo apontamento.

Mas, furtando-nos embora ao exame sistemático do esquema tornado conhecido aquando do anúncio deste aviso prévio e já agora exaustiva e brilhantemente desenvolvido pelo seu ilustre apresentante, Dr. Nunes Barata, o outros daqueles nossos colegas, pareceu-nos, no entanto, que a responsabilidade de certa posição a que nos achamos vinculados nos obrigava n aproveitar este ensejo para reafirmar e reforçar propósitos e juízos já por nós expendidos aqui e noutras circunstâncias e se integram na matéria em debate.

Queremos referir-nos a um aspecto, aliás localizado no conjunto das amplas perspectivas turísticas que nos oferece a zona central do País, em que o Mondego nasce e desenvolve o seu curso, até se extinguir nas águas do Atlântico.

Cuido não havei- exagero ao afirmar-se que o turismo pode servir expressivamente o fomento económico das regiões beiroas inclusas na bacia do Mondego.

Repare-se que paralelamente- àquele rio correm as vias de penetração rodoviária e ferroviária, por onde flui a mais forte corrente do turismo externo que nos procura, através da fronteira de Vilar Formoso, junto ao Mondego, e beneficiando do sortilégio das suas lendas e encanto das suas margens está Coimbra, a genuína, a antiga e sempre remoçada cidade universitária, clarão de espiritualidade u refúgio de belezas que a mão do homem e a natureza criaram, cada vez mais atraente e deslumbrante para nacionais e estrangeiros; e na sua foz, a Figueira da Foz, a praia da claridade e rainha das nossas praias, também outro grande cartaz de atracção interna e internacional.

Bastaria o enunciado destes pontos, mas poderíamos acrescentar-lhe Buçaco, Luso, Cúria, Conímbriga, Penacova, Viseu, e sei lá quantos outros de indiscutível interesse, para se avaliar da importância, dos motivos que na bacia do Mondego se oferecem ao fomento das actividades turísticas.

Mas é para a sua origem, para a altaneira serra da Estrela, onde nasce e toma forma o nosso rio nacional" que se volverá a nossa atenção.

Efectivamente, o maciço central da cordilheira da Estrela centra e comanda uma vasta região de turismo, de características muito peculiares e únicas no Paia.

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Estas características de excepção, resultantes da existência de uma matéria-prima turística de primeira grandeza, que se chama neve, e ali, e só ali, existe no País, fazem com que a região turística da serra da Estrela deva ser encarada não apenas no seu valor turístico intrínseco e absoluto, mas, sobretudo, no papel relativo que lhe cabe desempenhar em face de uma realidade actual do turismo português, resultante precisamente do impulso e desenvolvimento que se tem procurado e conseguiu imprimir-se-lhe.

Essa realidade, e bem amarga realidade, é uma consequência inevitável num período de arranque em que o mais fácil e acessível é o que aflora. Mas há que atenuá-la e corrigi-la para se avançar e atingir uma fase de uniforme e consolidada expansão.

Refiro-me ao acentuado desfasamento agora existente entre o nosso já promissor turismo de Verão e o débil turismo de Inverno, melhor diria, o inexistente turismo de Inverno.

Este desequilíbrio, este largo hiato, quebra o ritmo de actividade, quase obrigando em cada ano a renovar esforços de propaganda e captação, num empenhamento que, carecendo de ser contínuo, deverá subtrair-se à influência frenadora de prolongadas soluções de continuidade.

Este ocaso hibernal desde logo risca durante um longo período dos roteiros do turismo internacional o nome de Portugal, com a imediata e consequente ausência de turistas e reflexos mediatos, também não desprezíveis, no movimento futuro; por outro lado, repercute-se desfavoravelmente na política de investimentos, pois, como é compreensível, a legítima rentabilidade dos capitais afectos à estruturação do equipamento turístico não se alcança num limitado período de exploração, a que agora tem de confinar-se, na grande maioria dos empreendimentos.

Isto mesmo é reconhecido pelo departamento de Estado responsável pela superior condução dos negócios turísticos, que presentemente dirige a sua atenção e os seus esforços no sentido do preenchimento desta lacuna.

Para já, no conjunto das possibilidades metropolitanas, existem duas regiões com condições ideais à consecução daquele objectivo.

Uma, o Algarve, que, pela suavidade do clima, pode movimentar durante quase todo o ano as maravilhosas praias' do seu litoral e para ali canalizar alguma parte da grande corrente turística europeia dos países mais fustigados pelos rigores do Inverno e que nessa época procura o agasalho do clima ameno dos países meridionais.

Outra, a serra da Estrela, rica de multiformes potencialidades turísticas e que, para além de todos os encantos e atracções que a montanha permanentemente oferece, possui ainda a neve, com características de queda e perdurabilidade que permitem confiadamente encarar o lançamento de uma estação de turismo e desportos de Inverno.

Poderá objectar-se que a incomodidade da nossa posição geográfica, à periferia do continente europeu, ou a modéstia das pistas da Estrela, em confronto com a magnitude das pistas alpinas, não é de molde a favorecer uma corrente turística externa. Poderíamos retorquir que à região, que é pobre, já conviria a drenagem de uma corrente interna oriunda dos centros populacionais de mais elevado nível de vida. O' excedente dos que mais podem gasto no seio dos mais desfavorecidos já seria um lampejo numa tendência de uma mais equitativa distribuição de riqueza.

Mas acrescentaremos ainda convictamente: o fenómeno actual da neve por essa Europa fora, e cuido que em todo o Mundo, criou uma indústria turística poderosíssima, que se reveste de aspectos verdadeiramente impressionantes. As estações de montanha existentes intensificam continuamente o seu equipamento. Ao lado destas nascem muitas outras em moldes técnico-urbanísticos cada vez mais aperfeiçoados, e tudo isto em ritmo vertiginoso. Há números que nos deixam estupefactos! Um ao acaso: na quadra do Natal e Ano Novo de 1961, quase sem neve nas montanhas, com a neve com quinze dias de atraso, como diziam as revistas francesas, deixaram Paris com destino as estações de Inverno 600 000 parisienses! Nesse período organizaram-se 2200 comboios especiais. A saturação das estacões é a regra, sobretudo nas épocas de ponta. O desportista, ou o amante do espectáculo da neve, determina-se, na escolha do local da sua vilegiatura, já não tanto pelas suas preferências, mas muito pela maior probabilidade de conseguir alojamento.

Por isso não tenhamos dúvidas. Ao anúncio da existência de uma estação de desportos de Inverno na Estrela corresponderá desde logo o assalto dos praticantes das modalidades turístico-desportivas da neve.

Mas entendamo-nos: estação pressupõe estruturas e organização impecáveis.

Para esta indústria a natureza oferece-nos generosamente a matéria-prima - a neve. O homem, terá de montar a máquina com que trabalhá-la.

Comunicações fáceis e sempre permeáveis; plano urbanístico de montanha; equipamento hoteleiro; lojas, lugares de convívio e distracção; meios mecânicos de acesso a neve e de arrasto sobre a neve; preparação e sinalização das pistas; escolas de esqui; serviço de socorros, são, entre outros, os requisitos indispensáveis numa estação de Inverno.

Esboçadas as premissas, façamos agora o ponto da posição em que nos encontramos.

A Lei n.º 2082, decretada pela Assembleia Nacional e destinada a promover a expansão do turismo nacional, reestruturou em novos moldes os órgãos locais da Administração com competência em matéria de turismo. Deste modo poderão ser criadas as regiões de turismo, nos casos especiais em que duas ou mais zonas de turismo devam ser consideradas complementares, para a exploração ou valorização dos seus recursos de interesse turístico.

As regiões de turismo são administradas pelas comissões regionais de turismo, que gozam de autonomia administrativa e financeira.

Esta dupla autonomia era uma fundada aspiração dos administradores dos órgãos locais de turismo à data da promulgação daquela lei.

Não avançarei sem um reparo a uma situação que está na base da sobrevivência e eficiência das comissões regionais de turismo.

Legalmente gozam de autonomia financeira, mas na prática esta autonomia pode ser mais aparente do que real.

O grosso das receitas das comissões regionais é votado anualmente pelos municípios integrados na região e entre limites que se distanciam substancialmente.

Na plena legitimidade das deliberações municipais, pode, assim, acontecer que os impostos de turismo, votados pelo mínimo, comprometam à nascença as possibilidades de realização das comissões regionais. Se, votados de início com espírito de largueza, vierem a sofrer uma ulterior redução, avalie-se a situação delicada das comissões regionais, se se comprometeram num plano de acção cuja

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satisfação de encargos fosse escalonada por um período de anos, na previsão de determinadas receitas.

Pelo que conhecemos até aqui, têm os municípios oferecido as mais louváveis e prestimosas facilidades à acção das comissões regionais. Mas nem por isso me julguei dispensado de apontar a fragilidade da sua autonomia financeira.

Com desculpas, fecho este parêntesis e retomo o curso do meu raciocínio.

Com um comum e dominador motivo turístico, que é o maciço central da Estrela, não surpreende, pois, que a primeira região de turismo a ser criada fosse a da serra da Estrela, que compreende os concelhos, genuinamente serranos, da Covilhã, Gouveia, Manteigas e Seia e abrange ainda os concelhos circunserranos de Belmonte e Fundão.

A comissão que a administra e está ainda na fase ingrata de semear sem nada haver colhido previu de início um plano de acção que, procurando, como é óbvio, a valorização global da Estrela, tende primordialmente ao desenvolvimento das práticas turísfcico-desportivas de Inverno.

Visava uma finalidade que, há-de agora reconhecer-se, se integra perfeitamente numa das prementes necessidades da actual panorâmica do turismo português, ou seja o preenchimento do largo hiato que de Verão a Verão se insere na nossa actividade turística.

No conjunto de realizações, a comissão reservou para si aquelas que considerou decisivamente impulsionadoras 011 de menor atracção para a iniciativa particular, confiante em que esta se interessará por outras, nomeadamente no sector do equipamento hoteleiro.

Que a orientação está certa, decorre da aprovação e patrocínio que lhe deu o Secretariado Nacional da Informação, consubstanciado, além de outras facilidades, na concessão de um vultoso auxílio financeira.

Mesmo assim, tudo o que há a pôr de pé, e que atrás esquematicamente enumerei, para fazer da Estrela um centro turístico de Inverno de feição cosmopolita, transcende as magras receitas da comissão regional, e que já hoje se arrecadam ao máximo das possibilidades contributivas dos concelhos interessados.

Por outro lado, também julgo ter demonstrado que o empreendimento excede o cariz regional, para se situar ao nível do plano nacional.

Além do mais, urge andar depressa e que o conjunto das realizações surja em globo. A satisfação destas constantes só é possível se se dispuser de uma franca base financeira.

Estamos confiados em que o Estado, através do Secretariado Nacional, pelo Fundo de. Turismo, ou mediante outros auxílios, reforçará a ajuda e o contributo até agora concedidos.

Simultaneamente, espera-se que o Ministério das Obras Públicas, aliás já com compreensiva e interessada posição assumida perante o conjunto de necessidades que tempestivamente lhe foi posto, acelere o plano de construção e reparação, e até de integração na rede nacional, das estradas de acesso e penetração do maciço central da serra da Estrela.

Trouxe a este debate um apontamento de cunho restritivo e talvez se repare em ter demasiadamente, desculpe-se a expressão, puxado a brasa à minha sardinha. Mas se a valorização turística da Estrela se reflectir beneficamente nos minguados réditos das sacrificadas populações serranas, parece que apesar de tudo me terei integrado no espírito e na finalidade deste aviso prévio, que outra coisa não visa que não seja a criação de maior riqueza e sua equilibrada distribuição pelas gentes beiroas.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Marques Fernandes: - Sr. Presidente: quando pela primeira vez me foi concedida a palavra nesta Assembleia enderecei a V. Ex.ª respeitosos cumprimentos e efusivas saudações. Fi-lo sincera e sentidamente. Não se tratou de mera cortesia.

Se de então para cá algo se modificou no conceito e respeito pela alta figura moral e intelectual de V. Ex.ª foi no sentido da maior admiração e respeito.

Por isso, daqui renovo, com mais fervor ainda, as saudações que então tive a honra de dirigir a V. Ex.ª

Sr. Presidente e Srs. Deputados: o interesse nacional e regional do aproveitamento da bacia hidrográfica do Mondego tem tal acuidade, representa tão grande fonte de potencialidades económicas e de sérios motivos atinentes ao bem-estar rural que bastaria o lúcido, brilhante e exaustivo trabalho do nosso ilustre colega Nunes Barata para realçar, em todos os seus aspectos, as vantagens daí resultantes e, consequentemente, a adesão desta Assembleia, sobretudo dos Srs. Deputados que aqui representam os interesses dos três distritos especialmente interessados: Coimbra, Viseu e Guarda.

Desnecessária seria, por isso, esta minha curta e descolorida intervenção, tanto mais que seriamente receio ensombrar o que com tanta clareza e limpidez foi tratado pelo autor do aviso prévio e secundado pelos ilustres Deputados que me precederam no debate.

O nosso silêncio podia, no entanto, ser interpretado como alheamento e desinteresse e até como menos consideração pelo autor do aviso.

A verdade é que, além do grande apreço e alta estima que ao ilustre Deputado Nunes Barata votamos e da gratidão pelos serviços agora prestados a toda a região mondegueira, grande também é a esperança em que do aproveitamento da bacia do Mondego resulte aumento de nível de vida, possibilitando melhor nivelamento das classes rurais com as outras classes trabalhadoras.

O motivo determinante do aproveitamento da bacia hidrográfica cio Mondego é a potencialidade energética, fortemente robustecida por múltiplos fins resultantes de obras de regularização, de regadio extensivo a cerca de 50 000 ha de terreno, de abastecimento de água para uso doméstico a meio milhão de habitantes, divididos por 21 concelhos, etc.

Parece, no entanto, poder dividir-se o aproveitamento integral da bacia do Mondego em dois sectores, designados um por Baixo Mondego, com características predominantemente hidroagrícolas, e outro por Médio e Alto Mondego, em que as características hidroagrícolas, importantes para os campos de Celorico da Beira e vale do Mondego, do concelho da Guarda, são sobrelevadas pelo interesse e importância da produção energética.

Ao percurso do rio Mondego dentro do distrito da Guarda, de que me ocuparei, cabe, sem dúvida, lugar destacado no armazenamento de água e consequente produção de energia eléctrica e na regularização do rio, sobretudo nas épocas de estiagem e de cheias a montante do escalão de Ervedal, com benéficos efeitos na regularização de todo o rio.

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Duas empresas, a Companhia Eléctrica das Beiras e a Hidroeléctrica do Zêzere, estão empenhadas em conseguir a concessão do aproveitamento da bacia do Mondego.

Por confissão, constante de p. 14 da exposição dirigida ao Secretario de Estado da Indústria em 22 de Novembro de 1961, aquela, a Hidroeléctrica do Zêzere, declara não se encontrar habilitada a tomar posição no que se refere ao aproveitamento hidroeléctrico dos Cursos médio e superior do Mondego. Nesta conformidade, só nos estudos e planos da Companhia Eléctrica das Beiras se baseiam as minhas próximas considerações. Através destes estudos foram concebidos dois sistemas. Acontece, no entanto, que os escalões previstos no distrito da Guarda mantêm as mesmas características nos dois sistemas estudados. Pode, pois, dizer-se que no único plano geral do aproveitamento dos recursos hidráulicos do rio Mondego, efectuado pela Companhia Eléctrica das Beiras, surge como a mais importante barragem do Mondego a de Asse Dasse. Com um volume de água da ordem dos 500 000 000 m3, que a mais alta barragem do Pais, com 170 m de altura, armazenará e cujas águas serão turbinadas na central de Melo, concelho de Gouveia, depois de percorrerem 7750 m de túnel, terá o superior mérito de servir de fonte abastecedora e regularizadora de todo o rio e, consequentemente, das outras barragens.

Com uma área inundável de 1000 ha, o seu custo está estimado em l 000 000 de contos. Além dos benefícios da sua construção, colocados em plano nacional e mesmo regional, resultaria no concelho da Guarda a beneficiação da estrada n.º 338, que, partindo da estrada n.º 16, serviria as povoações de Maçainhas, Corugeira, Trinta e Videmonte, além de que permitiria fácil acesso a uma região privilegiada de caça e de pesca as trutas, que, juntamente com motivos paisagísticos, representaria apetecível zona de visita de nacionais e estrangeiros.

O 2.º escalão, o de Vila Soeiro, com armazenagem de 12 000 000 m3 de água na albufeira do Caldeirão, retidos por uma barragem de apenas 40 m de altura, com um custo provável de 50 000 contos, localiza-se a cerca de meia dúzia de quilómetros da cidade da Guarda.

A sua importância, que no ponto de vista nacional fica algo minimizada pela modéstia das suas proporções, agiganta-se nos benefícios dela resultantes para os concelhos da Guarda e de Celorico da Beira.

Na verdade, da albufeira do Caldeirão resultam benefícios regionais, que se poderão enquadrar, sobretudo, em três sectores: abastecimento de água as populações, regularização de regadios e centro turístico.

Analisemos, embora a traços largos, cada um dos objectivos enunciados.

O abastecimento de água às povoações, colocado em primeiro plano na política do bem-estar rural, conforme constava da Lei de Meios ultimamente discutida e aprovada nesta Assembleia, vem representando um sorvedouro das verbas concedidas ao Ministério das Obras Públicas.

Chamo-lhe sorvedouro porque, depois de tais obras se encontrarem concluídas e os gastos efectuados, é certo e sabido que, na generalidade dos casos, em breve se impõem outras obras destinadas ao reforço de caudais. Ou porque os mananciais abastecedores se vão esgotando, ou porque as capitações vão subindo e as mais das vezes por um e outro motivos, a verdade é que, em tantos casos do meu conhecimento, basta uma estiagem um pouco mais prolongada para se entrar em regime de racionamento do água.

Os dinheiros consomem-se, as necessidades dos povos não são satisfeitas de modo perdurável e a insatisfação das populações renova-se. Novas obras e novos gastos que, na generalidade dos casos, não serão ainda os últimos.

Como exemplo, poderia indicar a VV. Ex.ªs o caso do abastecimento de água à cidade da Guarda. Iniciadas as obras por volta de 1930, só no reforço do caudal se vão consumindo já cerca de 5000 contos. Tem a Câmara da Guarda catorze obras de abastecimento de água em curso, sem que se vislumbrem possibilidades de conseguir caudais satisfatórios. Desnecessário se torna pormenorizar estes casos, pois, como eles, tantos outros serão do conhecimento pessoal de VV. Ex.ªs.

A albufeira do Caldeirão viria tornar fácil a resolução de problemas de abastecimento de água, cuja solução, apesar dos dedicados esforços das edilidades e do sacrifício das finanças camarárias e nacionais, não se descortina a curto prazo.

Assim como a grande albufeira de Asse Dasse poderia abastecer boa parte dos concelhos de Gouveia, Seia, Oliveira do Hospital e Tábua, também a do Caldeirão abasteceria, por gravidade, parte dos concelhos da Guarda e de Celorico e, através de centrais elevatórias, a própria cidade e outras povoações concelhias.

Grande parte dos problemas actuais de abastecimento de água deixariam de existir. Acresce que o estudo das capitações prevê já o pequeno regadio da cultura, que, embora de dimensões reduzidíssimas, muito contribuiria para uma melhor economia familiar, ao mesmo tempo que facilitaria a preconizada política governamental de abastecimentos de água em plano regional.

Quanto à regularização de regadios e ao estudo económico das suas possibilidades, não consegui grandes elementos de estudo. Sabemos, no entanto, que mais de 1000 ha de boa e produtiva terra, com regadio insuficiente e sujeito aos elementos da natureza, esperam no concelho de Celorico que a água, verdadeiro sangue da terra, venha aumentar a sua produtividade, tomando mais compensador o trabalho e o esforço dos que a agricultam.

Esperam estes que o contar dos alcatruzes e o ranger dos picanços e cegonhas sejam substituídos por canais e levadas, que facilitem e garantam a irrigação dos campos nos momentos em que as culturas se estiolam por falta de regas. Os estudos efectuados para o efeito garantem anualmente, na albufeira do Caldeirão, a disponibilidade de 8 000 000 m3 de água para a irrigação dos campos de Celorico.

Finalmente, a albufeira do Caldeirão oferecerá aos centros populacionais das redondezas, mormente a própria cidade da Guarda, uma esplêndida estância que permita recrear os espíritos, após uma semana de trabalhos absorventes, no campo, no comércio ou nas repartições. Sobretudo aos domingos, nas horas de ócio, antevemos as suas margens coalhadas de gente, ávida de repouso, de tranquilidade e de meios recreativos. Ali serão atraídos pela pureza do ar, pela benéfica acção dos raios solares, pelos desportos náuticos e pela pesca.

A albufeira do Caldeirão passará a ser o atractivo certo e passeio obrigatório para a população citadina.

Desempenhará papel fundamental no prolongamento da estada na Guarda de enorme quantidade de estrangeiros que, entrando por Vilar Formoso, fronteira com maior movimento de turistas, tomam o primeiro contacto com o País e dele colhem as primeiras impressões, sempre perduráveis, na altaneira cidade da Guarda. Interessa à própria Nação que a Guarda se enriqueça em atractivos. Que como hall deste Portugal acolhedor, juntamente com a dureza da paisagem serrana, aos turistas estrangeiros seja

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oferecida uma estância aquática que, embora de modo um tanto longínquo, lhes torne apetecível a beleza das nossas praias.

A albufeira do Caldeirão, com o seu lençol de águas límpidas que antecipadamente contemplamos, com a paisagem serrânica que da barragem se desfrutará, com a delícia das suas trutas e o recreio dos seus barcos, servirá, em escala apreciável, o turismo egitaniense.

Para não prolongar esta intervenção e para evitar repetições não me referirei ao escalão de Girabolhos, porque os benefícios de ordem regional dele resultantes se projectam na sua quase totalidade sobre o distrito de Viseu.

Sr. Presidente: o ilustre Deputado Nunes Barata ao anunciar o aviso prévio agora em discussão admite que do aproveitamento da bacia hidrográfica do Mondego resulte grande incremento na obra de repovoamento florestal. Certo de que os frutos da obra daquele aproveitamento muito dependem do repovoamento florestal, não deixarei de chamar a atenção dos respectivos serviços para o estado em que se encontra a região designada por Alto Mondego.

Começarei por afirmar que em toda a área dos concelhos da Guarda e de Celorico não existe qualquer zona sujeita ao regime florestal. No entanto, naquele concelho só os baldios de Videmonte, Famalicão e Fernão Joanes montam a 2047 ha de terrenos florestais. No concelho de Gouveia só a histórica freguesia de Folgosinho tem 1960 ha de baldios apropriados à florestação.

Nas vertentes da serra viradas n poente, praticamente desde Gouveia, atravessando todo o concelho de Celorico da Beira até ao limite do concelho da Guarda, o aspecto de falta quase total de floresta é verdadeiramente confrangedor. Uma ou outra mancha, sobretudo no concelho de Gouveia, não justifica mesmo que se fale em repovoamento, mas em autêntico povoamento. A falta de floresta nas regiões indicadas escancara as portas ao pernicioso fenómeno de erosão, com todo o cortejo de inconvenientes e prejuízos, que danificam, empobrecem e arruinam.

Atenda-se, no entanto, a que, dada a circunstância de boa parte desses territórios se situarem na zona de produção do queijo da serra, terão os respectivos serviços que proporcionar vegetação forraginosa nalgumas áreas a florestar no sentido de satisfazerem interesses silvo-pastoris.

Dado que nas regiões indicadas, salvo o caso de Folgosinho, não abundam os baldios, pertencendo a quase totalidade das vertentes serranas ao domínio particular de economias debilitadas, seria talvez de aconselhar que através da Junta de Colonização Interna fossem estipuladas rendas, reembolsáveis a longo prazo, sobretudo nas zonas de pastorícia proibida.

Embora a cultura do centeio, exclusiva daquelas paragens, seja francamente ruinosa, a verdade é que os cultivadores não a dispensam, pela necessidade do grão e das palhas. De resto, como não valorizam o trabalho pessoal e familiar, que investem em épocas em que os jornais escasseiam, a aparência remuneradora é evidente.

De qualquer modo, a defesa das terras chãs e até a própria longevidade das albufeiras no. seu poder de armazenamento de volume de águas impõem que as vertentes declivosas e desnudadas sejam revestidas de arborização, futura fonte de riquezas e garantia contra os malefícios dos assoreamentos.

Por outro lado, a florestação daquelas terras pobres garante trabalho, calculado em cinco vezes mais do que o gasto a agricultá-las, o que representa valioso auxiliar de estabilidade social.

A produção energética do Alto Mondego abre ainda novos horizontes às suas actividades agrícolas.

Em grande parte do distrito da Guarda, como se sabe, uma das principais fontes de receita foi a cultura da batata.

Digo "foi" porque nos últimos anos os baixos preços de compra ao produtor fazem pensar em novas culturas de maior rentabilidade. Natural é imaginar a industrialização da produtos agrícolas que, em substituição da batata, melhor remunerem os trabalhos e canseiras dos pequenos proprietários, rendeiros e meeiros.

Também no domínio da fruticultura, que tão elevado incremento está a tomar no distrito da Guarda, se espera que o aproveitamento hidroeléctrico do Mondego facilite a industrialização dos seus frutos, de superior qualidade.

Finalmente, Sr. Presidente e Srs. Deputados, as populações que represento nesta Assembleia exigem que aqui deixe um breve e cauteloso apontamento sobre as suas apreensões referentes ao deferimento do pedido de concessão e aos monopólios que às empresas são concedidos dentro de certas zonas.

No concelho da Guarda é a Companhia Eléctrica das Beiras que em baixa tensão fornece energia eléctrica, comprada em alta a outra empresa produtora.

Este concelho é, assim, como uma ilha encaixada dentro da zona de influência da empresa produtora.

Sabe-se que os preços das tarifas praticadas no concelho em referência não são compensadores para a empresa distribuidora. Igualmente se não ignora que a Guarda é das cidades onde os rigores do Inverno mais se fazem sentir, pelo que o aquecimento domiciliário, longe de ser considerado um luxo, é uma necessidade imperiosa e imprescindível.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - As economias familiares, em grande parte sofrendo da debilidade própria dos meios que à agricultura se dedicam, foram estruturadas à base de tarifas que, repete-se, não são compensadoras para a Companhia Eléctrica das Beiras, justamente pela circunstância de ter de comprar em alta a energia que distribui. E natural supor, assim constou já, que, se a Companhia Eléctrica das Beiras produzisse energia no escalão de Vila Soeiro, manteria os preços que benevolentemente tem praticado no concelho da Guarda.

De outro modo, com um aumento substancial de tarifas vai criar-se um grave problema de incidência em débeis economias familiares, que foram estruturadas na base de preços que a Companhia, só poderá manter se à sua função distribuidora juntar a de produtora.

O contrato entre a Câmara Municipal e a Companhia vai terminar em 1969.

As autoridades responsáveis da Guarda receiam já que, ao elaborarem novo contrato - quem sabe se com a mesma ou com outra empresa - sejam forçadas a aceitar preços e disposições de certo modo impostos.

De resto, não ignoram que os organismos oficiais, em vez de operarem numa posição arbitrai de justo equilíbrio entre os interesses particulares das empresas e o interesse público do consumidor, que as câmaras municipais representam, francamente se colocam em posição favorável ao apoio das exigências de empresas, exigências de cuja justificação, em tantos casos, há sérias razões para duvidar. A continuarem a verificar-se tais atitudes pelos organismos oficiais, só na concorrência o consumidor e as câmaras municipais poderão encontrar a defesa dos seus interesses e os justos preços orçamentais a praticar na electrificação de pequenos agregados populacionais onde, no século das luzes, impera ainda a luz do petróleo e do azeite.

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Termino, juntando os meus anseios aos do mui ilustre Deputado Nunes Barata, certo de que do aproveitamento da bacia do Mondego hão-de resultar melhores dias para as suas populações e valioso contributo para a riqueza nacional.

Tenho dito.

Vozes: -Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Engrácia Carrilho: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: segundo M. Philippe Lamour, um dos maiores defensores do planeamento regional em França, planeamento regional é a reorganização racional e completa de uma região pelo equipamento e modernização das suas diversas actividades económicas e sua coordenação com as condições demográficas, sociais, humanas e culturais, com o objectivo da elevação geral do nível de vida dos seus habitantes.

A reorganização racional e completa de uma região não pode, naturalmente, ser empreendida pela exclusiva iniciativa dos seus habitantes, que não dispõem de meios financeiros e técnicos a que obrigam empreendimentos dessa natureza. Dai a intervenção do Estado, não só para que o planeamento regional se integre harmonicamente no planeamento nacional, mas também para que, por meio de empréstimos e subvenções e pela cedência dos meios técnicos necessários, a obra possa ser levada a bom termo.

O papel do Governo no planeamento é, modernamente, organizar os programas numa base nacional e, de acordo com uma política geral bem concebida, pôr à disposição das comunidades ou organizações privadas a ajuda material básica e os serviços técnicos indispensáveis para a sua reorganização.

Sendo possível reconhecer num país regiões perfeitamente distintas, não só pela localização geográfica como pelas condições agro-climáticas, densidade populacional, vias de comunicação, recursos energéticos, costumes, tradições, etc., também se depreende que a reorganização dessas regiões deverá ter as suas características próprias e a ela ser condicionada.

O planeamento, no que tem de desenvolvimento das actividades produtivas de uma região, é, podemos dizer, a infra-estrutura do bem-estar rural. Ora a bacia do Mondego oferece sem dúvida condições indispensáveis a uma obra de planeamento, e eis porque acolhemos com a maior simpatia e a mais fundada esperança o aviso prévio que o nosso ilustre colega Nunes Barata anunciou em nome dos Deputados pelo círculo de Coimbra. Presto as minhas homenagens a todos os ilustres colegas do círculo de Coimbra pela iniciativa que inteligentemente tomaram em favor do bem-estar de todos os povos que formam a bacia do Mondego, contribuindo assim para agitar problemas do mais alto interesse económico-social para a região das Beiras, e que urge resolver com a possível urgência.

Desde o instante em que o homem lançou à terra a primeira semente, com o objectivo de, associando à natureza o seu trabalho, produzir conscientemente tudo quanto necessita, não mais a cultura do solo deixou de estar na base da subsistência da humanidade.

Parte muito apreciável do agrupamento humano faz mesmo dessa actividade a. sua ocupação predominante; a extensão da superfície cultivada alastra e assume aspectos muito variados, consoante as condições do meio físico o grau de desenvolvimento técnico da população interessada. A agricultura é ainda hoje, e há-de provavelmente lê-lo por longos anos, o principal esteio da economia portuguesa.

Por isso, a valorização da nossa agricultura e das populações rurais continua e continuará a ser o problema económico de primeira grandeza.

Com efeito, nunca será de mais insistir para:

Que se procure elevar o rendimento originado no sector agrícola e se defina uma política económico-agrária racional e justa, onde desníveis de garantias deixem de ter lugar;

Que se promova uma melhor distribuição de rendimentos no sector;

Que se melhore o nível técnico da produção agrícola e se habilitem devidamente para o exercício da sua missão os trabalhadores agrícolas portugueses.

Todos sabemos que muitas das nossas populações rurais ainda vivem privadas de muita coisa necessária à vida, de muitas facilidades que a outras se prodigalizam.

Não vamos certamente pretender que aos meios rurais se proporcionem todos os progressos exigidos pelos meios citadinos. Não. Mas é de inteira justiça que se lhes prodigalizem ao menos aqueles melhoramentos que afectam profundamente a saúde e a vida.

Abastecimento de águas, saneamento, serviços assistenciais, estradas e caminhos deverão ter prioridade sobre tantas iniciativas de menor urgência, porque estes melhoramentos contribuem poderosamente para a saúde e vida dos povos.

O êxodo rural continua a processar-se assustadoramente, sem que se criem as necessárias condições, não somente em valores relativos, mas também em valores absolutos, orientando-os de preferência no sentido de actividades económicas criadoras dos bens materiais mais desejáveis.

O fenómeno do êxodo rural é, no fundo, um problema duplamente material e psicológico; psicológico na medida em que os centros populacionais, pelas belezas que mais facilmente se gravam nos olhos ávidos dos rurais, pelas distracções e comodidades que lhes oferecem, pelo género de vida que os surpreende primeiro e os conquista depois, estão aptos a exercer todo o seu poder de sedução.

A migração das populações rurais é particularmente intensa na região do Norte do País e faz-se em grande parte dos concelhos que marginam os grandes rios, por cujos vales passam em geral os caminhos de ferro e as grandes estradas nacionais. Por eles correm não só as águas límpidas das regiões serranas, que se mancham ao contacto das aluviões de planície, mas também os caudais humanos, que saem ingénuos e são das aldeias mais remotas e vão sujeitar-se nos bairros infectos das cidades que lhes ficam na foz.

São as camadas mais jovens da sociedade camponesa, e por conseguinte as mais válidas, aptas e com maior capacidade de trabalho e de maior iniciativa, que o mundo rural vê partir e de que o sector agrícola terá de se privar.

Há, portanto, que contrariar o êxodo tal qual hoje se vem processando no País, criando nos meios rurais melhores condições de vida humana, pois só assim se fixarão à terra as populações rurais.

Sr. Presidente: o aproveitamento integral das potencialidades económicas do rio Mondego poderá ser um grande passo no sentido da intensificação da vida dos povos das Beiras, não apenas pelo suplemento da energia eléctrica de que poderá dispor, mas pelas facilidades de natureza diversa que lhes poderão ser asseguradas.

Deputado da Noção eleito por um distrito do qual nove dos seus concelhos serão largamente beneficiados pelo aproveitamento integral do rio Mondego, aqui estou nesta tribuna a prestai: a minha modesta, mas sincera e calorosa, contribuição em benefício dos povos que tanto prezo, estimo e admiro.

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A Companhia Eléctrica dos Beiras, através dos seus serviços técnicos, mandou executar vários estudos e projectos sobre o aproveitamento dos recursos hidráulicos do rio Mondego, que vão desde o projecto do aproveitamento hidroeléctrico do Alto Mondego até ao anteprojecto do escalão Caneiro-Dão, no Baixo Mondego.

Do estudo atento destes projectos e anteprojectos obtêm-se preciosos elementos que permitem avaliar a dimensão dos benefícios que no aspecto social, económico ou turístico resultam para a região das Beiras uma vez executadas as obras previstas. Referir-me-ei apenas aos empreendimentos previstos no troço do Mondego que decorre no distrito de Viseu, ou seja entre os concelhos de Mangualde e Santa Comba Duo.

Nas proximidades da vila de Mangualde está estudado o aproveitamento do rio Mondego através da construção da albufeira designada por Girabolhos.

Quanto ao local da implantação da respectiva barragem, não se levanta qualquer problema de ordem técnica, económica ou social.

Para o local designado por Foz do Dão, freguesia de Óvoa, concelho de Santa Comba Dão, existem estudos já feitos quanto ao ponto onde deverá ficar situada a barragem. Todavia, as suas conclusões não são unânimes. Uns inclinam-se que deveria ficar situada a jusante da povoação da Foz do Dão, no local designado por Aguieira. Outros são de opinião que ela deverá ficar situada a montante .da Foz do Dão, designando-se o aproveitamento por Caneiro-Dão.

Os trabalhos feitos revelam que quer o aproveitamento da Aguieira, quer o do Caneiro-Dão, estão em condições de desempenhai- eficientemente as funções que lhes estão destinadas. Há, pois, que decidir se a barragem deverá ser construída a montante ou a jusante da povoação da Foz do Dão.

A escolha de um destes dois locais terá de ser feita tomando em linha de conta não só o custo e a segurança das obras, como também os problemas sociais que estas suscitam.

Quanto ao custo destes aproveitamentos, não há dúvida que na sua avaliação têm uma decisiva influência as fundações das barragens, tendo os respectivos anteprojectos de ser baseados em estudos geológicos muito completos, levados a efeito por especialista de reconhecido mérito.

Estes estudos geológicos têm de ser muito completos, pois são sobejamente conhecidos os graves inconvenientes e os elevados prejuízos que resultam de reconhecimentos geológicos menos ponderados e incompletos.

Estudos muito recentes levados a efeito pelos serviços técnicos da Companhia Eléctrica das Beiras fornecem-nos elementos muito preciosos e que nos habilitam a afirmar não haver dúvidas de que os terrenos de fundação das barragens do Caneiro e do Dão têm menos problemas a resolver do que o terreno de, fundação da barragem da Aguieira. Isto significa que o orçamento daquelas barragens deverá ser por isso mesmo menos aleatório do que o desta.

A estimativa de custo do escalão Caneiro-Dão, considerando os mesmos encargos indirectos que foram contemplados no orçamento da Aguieira, apresentado no Plano geral do Mondego, da Direcção-Geral dos Serviços Hidráulicos, atinge 530 000 contos, isto é, menos 20 000 contos do que o custo estimado para o aproveitamento da Aguieira.

Esta diferença parece, resultar do menor custo das expropriações e do restabelecimento de comunicações do escalão Caneiro-Dão, que, não inundando a povoação da Foz do Dão nem a Ponte Salazar, importam, de facto, em menos 20 000 contos.

Quanto aos problemas sociais que as obras do aproveitamento da Aguieira suscitam, entre vários aparece em primeiro plano a submersão total da povoação da Foz do Dão.

Já em 1940 a extinta Junta Autónoma das Obras de Hidráulica Agrícola, e sobre a orientação do insigne técnico engenheiro Trigo de Morais, elaborou um projecto em que se previa a construção de duas barragens, uma no rio Dão e outra no Mondego, exactamente para evitar a destruição da Ponte Salazar e a inundação da povoação da Foz do Dão.

Esta pitoresca povoação, dotada de raros encantos naturais - tem 56 fogos, com uma- população total de cerca de 200 habitantes -, é considerada a sala de visitas de Santa Comba Dão.

A submersão desta população conduz aos mais elevados prejuízos, tanto de ordem material como de ordem moral.

Com efeito, serão mais umas dezenas de famílias que ficarão privadas das suas casas, das suas ínsuas e dos seus moinhos, não se fazendo esperar a tentação ao êxodo a que têm estado sujeitos tantos dos nossos rurais considerados os mais aptos e mais valiosos.

O êxodo destas duas centenas de pessoas é certo praticar-se, pois que, por muito bem pagos que sejam os terrenos e as casas inutilizadas, não receberão na sua maioria senão umas escassas dezenas de contos, que dificilmente lhes permitirão reconstituir a sua vida.

Mas, Sr. Presidente, com a implantação da barragem da Aguieira, não só a povoação da Foz do Dão ficará submersa, mas também terá o mesmo destino a Ponte Salazar, sobre o Mondego, magnífica obra realizada há cerca de 30 anos.

Se os prejuízos causados pela submersão da Foz do Dão se podem estimar em certa medida, os resultantes com a destruição da Ponte Salazar não têm possibilidade de cálculo, mesmo aproximado, pois que para o concelho de Santa Comba Dão e para o País ela representa um símbolo, que deverá permanecer através das gerações vindouras.

Assim, Sr. Presidente, parece não haver dúvidas de que tanto a economia da obra como os problemas sociais que ela possa suscitar aconselham que seja implantada a montante da povoação Foz do Dão, continuando esta ligada à Ponte Salazar, formando o encantador conjunto que muito bem é designado por "a sala de visitas de Santa Comba Dão".

Os escalões de Girabolhos e Caneiro-Dão irão contribuir para o distrito de Viseu com relevantes benefícios, entre os quais salientamos os seguintes:

Possibilidades de realizar em boas condições técnicas e económicas o abastecimento de água abundante e potável aos concelhos de Nelas, Carregai do Sal, Mangualde, Viseu, Tondela, Penalva do Castelo e Sátão, a partir de Girabolhos, e aos concelhos de Santa Comba Dão e Mortágua, a partir das albufeiras do Caneiro-Dão, Se a região das Beiras tivesse uma constituição geológica diferente, que permitisse grandes reservas aquíferas subterrâneas, é provável que a solução de recorrer as águas superficiais armazenadas em albufeiras se não apresentasse como a única solução capaz de garantir um conveniente abastecimento desta região, pois poder-se-iam talvez conseguir soluções parciais satisfatórias; mas, em face da improdutividade das formações geológicas que constituem a bacia superior e média do Mondego, tais soluções parcelares estão, na generalidade, condenadas insucesso. A principal razão de insucesso nos abastecimentos que se têm feito na região das Beiras e que condena o recurso à utilização das reservas aquíferas sem dúvida de natureza geológica. Apesar de a parte su

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perior e média da bacia do Mondego se encontrar situada muna zona relativamente pluviosa, verifica-se que as reservas aquíferas subterrâneas são insuficientes e, mais do que isso, não se renovam com a rapidez indispensável.

A região das Beiras no que respeita a águas de origem subterrânea é considerada como uma zona francamente improdutiva.

Sendo assim, temos de reconhecer que só o recurso a utilização das águas superficiais recolhidas em albufeiras poderá dotar toda a grande parte das Beiras de água potável abundante e barata. Facilitando a sua utilização na indústria e no pequeno regadio, melhorando com ela as condições sanitárias dos povos, facultando a estes a comodidade, que a vida moderna não dispensa, da distribuição domiciliária, estabelece-se a primeira das condições necessárias para a fixação à terra das populações e para a melhoria do nível de vida da gente das Beiras.

O turismo na região das Beiras será impulsionado de uma forma decisiva se, na verdade, as albufeiras projectadas no Mondego e no Dão forem dentro em breve uma consoladora realidade.

A região da Beira Alta, tendo como capital a formosa e progressiva cidade de Viseu, enriquecida com grandes lagos artificiais, será motivo de atracção para a prática dos desportos, como a vela, o remo, a pesca à linha, etc.

A região da Beira, dotada de belezas naturais sem igual, dispõe de condições maravilhosas para o desenvolvimento do turismo, tanto mais que já existem nesta região algumas boas instalações hoteleiras. Havia, e há ainda - mas por curto período de tempo -, uma grande lacuna a preencher: a construção de um hotel, em Viseu, digno da cidade, a todos os títulos nobre e gloriosa.

Dentro de um ano o Hotel Grão-Vasco será uma realidade. A cidade de Viseu bem merecedora é dele. Com efeito, a cidade de Viseu é um importante centro rodoviário, onde se cruzam variadíssimas estradas nacionais. É servida pelas linhas férreas do Dão e do Vale do Vouga, tornando-se urgente o seu equipamento com material moderno, de modo a oferecer as mínimas condições de conforto e comodidade.

Tudo isto e a sua privilegiada situação, ponto de partida para as mais belas excursões turísticas, o seu folclore, as suas paisagens, a sua história e os seus monumentos constituíram sem dúvida os factores justificativos 'que habilitaram S. Ex.ª o Sr. Presidente do Conselho a proferir um despacho segundo o qual é declarado previamente de utilidade turística o Hotel Grão-Vasco, que o Sr. Eng.º Artur de Noronha Campos e outros pretendem mandar construir em Viseu.

Desta tribuna presto as mais calorosas homenagens a todos os que por qualquer forma contribuíram para que a breve trecho o Hotel Grão-Vasco, de Viseu, seja uma feliz e autêntica realidade.

Mas, Sr. Presidente, entre todos, desejo destacar o nome de S. Ex.ª o Sr. Presidente do Conselho, pelo alto serviço prestado à vetusta cidade de Viseu e seus habitantes. Aqui fica, pois, a expressão do mais vivo e sincero reconhecimento.

Sr. Presidente: o aproveitamento das potencialidades económicas do rio Mondego, além de fornecer água potável para consumo e para os pequenos regadios a nove concelhos do distrito de Viseu e de contribuir fortemente para o desenvolvimento do turismo, irá também imprimir um grande impulso à economia da região, quer pelo contacto com novas técnicas, novos métodos de trabalho, novo ambiente de realizações, quer por se facultarem, através das obras, meios de pagamento que se hão-de cifrar em muitas dezenas de milhares de contos.

O Governo, sempre atento aos grandes empreendimentos nacionais, não deixará, estou certo, de incluir no programa do III Plano de Fomento, que se avizinha, o aproveitamento dos largos recursos que o rio Mondego oferece.

Faço votos para que assim seja.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão.

Amanhã haverá sessão, com a mesma ordem do dia da de hoje.

Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 30 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Alberto da Bocha Cardoso de Matos.
Antão Santos da Cunha.
António Calheiros Lopes.
António de Castro e Brito Meneses Soares.
Armando José Perdigão.
Francisco José Vasques Tenreiro.
Francisco de Soles de Mascarenhas Loureiro.
João Mendes da Costa Amaral.
José Guilherme de Melo e Castro.
Manuel Augusto Engrácia Carrilho.
Manuel Seabra Carqueijeiro.
Manuel Tarujo de Almeida:.
Tito Castelo Branco Arautos.
Virgílio David Pereira e Cruz.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Agnelo Orneias do Rego.
Agostinho Gonçalves Gomes.
Alberto Carlos de Figueiredo Franco Falcão.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Pacheco Jorge.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
António Augusto Gonçalves Rodrigues.
António Manuel Gonçalves Rapazote.
António Tomás Prisónio Furtado.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Proença Duarte.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Carlos Emílio Tenreiro Teles Grilo.
Fernando António da Veiga Frade.
Henrique dos Santos Tenreiro.
James Pinto Buli.
Jorge Manuel Vítor Moita.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel João Correia.
Manuel de Melo Adrião.
Manuel Nunes Fernandes.
Purxotoma Ramanata Quenin.
Bui de Moura Ramos.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortas.
Urgel Abílio Horta.
Voicunta Srinivassa Sinai Dempó.

O REDACTOR - Leopoldo Nunes.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

Página 1812

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