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REPÚBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL
DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 75
ANO DE 1963 25 DE JANEIRO
ASSEMBLEIA NACIONAL
VIII LEGISLATURA
SESSÃO N.º 75, EM 24 DE JANEIRO
Presidente: Exmo. Sr. Mário de Figueiredo
Secretários: Exmos. Srs.
Fernando Cid Ollveira Proença
Luís Folhadela de Oliveira
SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 30 minutos.
Antes da ordem do dia. - Foi aprovado o Diário das Sessões n.º 73.
Foi lido o expediente.
O Sr. Deputado Reis Faria não foi autorizado a depor no tribunal da comarca de Valença.
Foi lido na Mesa um complemento de resposta à nota de perguntas formulada pelo Sr. Deputado Amaral Neto na, sessão de 12 de Dezembro findo.
O Sr. Deputado Alberto de Meireles ré quer eu que lhe fossem fornecidos pelo Ministério das Finanças diversos elementos.
O Sr. Deputado Augusto Simões tratou da situação de alguns funcionários da Comissão Reguladora das Moagens de Ramas depois da publicação do Decreto-Lei n.º 43 832.
O Sr. Deputado Paulo Cancella de Abreu sublinhou as vantagens dós Congressos de Pediatria e da União Internacional dos Advogados realizados no nosso país em 1962.
Ordem do dia. - Prosseguiu a discussão na generalidade da proposta de lei sobre saúde mental.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Moura Ramos e Alves Moreira.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas.
O Sr. Presidente: - Vai fazer-se a chamada.
Eram 16 horas e 25 minutos.
Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Agostinho Gonçalves Gomes.
Alberto Carlos de Figueiredo Franco Falcão.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Alberto Pacheco Jorge.
Alberto dos Reis Faria.
Alberto Ribeiro da Costa Guimarães.
Albino Soares Finto dos Reis Júnior.
André Francisco Navarro.
António Augusto Gonçalves Rodrigues.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António de Castro e Brito Meneses Soares.
António Gonçalves de Faria.
António Magro Borges de Araújo.
António Manuel Gonçalves Rapazote.
António Maria Santos da Cunha.
António Marques Fernandes.
António Martins da Cruz.
António Moreira Longo.
António da Purificação Vasconcelos Baptista Felgueiras.
Armando José Perdigão.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Alves Moreira.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Artur Proença Duarte.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Augusto José Machado.
Belchior Cardoso da Costa.
Bento Benoliel Levy.
Carlos Alves.
Carlos Emílio Tenreiro Teles Grilo.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
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D. Custódia Lopes.
Délio de Castro Cardoso Santarém.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando Cid Oliveira Proença.
Francisco António Martins.
Francisco António da Silva.
Francisco José Lopes Roseira.
Francisco Lopes Vasques.
Francisco de Sales de Mascarenhas Loureiro.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Henrique Veiga de Macedo.
Jacinto da Silva Medina.
James Pinto Bull.
Jerónimo Henriques Jorge.
João Mendes da Costa Amaral.
João Rocha Cardoso.
João Ubach Chaves.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Jorge Augusto Correia.
Jorge Manuel Vítor Moita.
Jorge de Melo Gamboa de Vasconcelos.
José Alberto de Carvalho.
José Augusto Brilhante de Paiva.
José Dias de Araújo Correia.
José Fernando Nunes Barata.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Luís Vaz Nunes.
José Manuel da Costa.
José Manuel Pires.
José Maria Rebelo Valente de Carvalho
José de Mira Nunes Mexia.
José Monteiro da Rocha Peixoto.
José Pinheiro da Silva.
José Pinto Carneiro.
José dos Santos Bessa.
José Soares da Fonseca.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Luís Folhadela de Oliveira.
Manuel Amorim de Sousa Meneses.
Manuel Augusto Engrácia Carrilho.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel João Cutileiro Ferreira.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Beis.
Mário Amaro Salgueiro dos Santos Galo.
Mário de Figueiredo.
Olívio da Costa Carvalho.
Paulo Cancella de Abreu.
Quirino dos Santos Mealha.
Rogério Vargas Moniz.
Rui de Moura Ramos.
Sebastião Garcia Ramires.
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães.
Vítor Manuel Dias Barros.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 89 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 16 horas e 30 minutos.
Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente: - Está na Mesa para reclamação o Diário das Sessões n.º 73, correspondente à sessão de 22 de Janeiro.
Se algum dos Srs. Deputados deseja fazer qualquer reclamação, tem o ensejo para isso.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Como nenhum Sr. Deputado deduz qualquer reclamação, considero aquele Diário aprovado.
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Ofício
Do Sindicato Nacional dos Operários da Indústria de Curtumes do Distrito de Santarém a apoiar o discurso do Sr. Deputado António Calheiros Lopes sobre a industrialização daquele distrito.
O Sr. Presidente: - Está na Mesa um pedido do juiz de direito da comarca de Valença para que o Sr. Deputado Alberto dos Reis Faria seja autorizado, no próximo dia 14, pelas 10 horas e 30 minutos, a comparecer naquele tribunal para ser ouvido em julgamento nos autos cie acção ordinária que é movida contra a Câmara Municipal de Valença.
Colhidas as informações necessárias chegou-se à conclusão de que há inconveniente para o exercício do mandato do Sr. Deputado Reis Faria em que a autorização seja concedida. Nestes termos, ponho o problema à Câmara.
Consultada a Câmara, foi denegada a autorização.
O Sr. Presidente: - Está na Mesa um complemento de resposta à nota de perguntas formulada pelo Sr. Deputado Amaral Neto em 12 de Dezembro do ano findo.
Vai ser lida a resposta àquela nota.
Foi lida. É a seguinte:
Informação n.º 1
«Em referência ao n.º 1 da nota de perguntas constante do ofício n.º 163/VIII, endereçado pelo Exmo. Presidente da Assembleia Nacional a S. Ex.ª o Presidente do Conselho, esta Repartição tem a honra de informar o seguinte:
A cultura do tabaco não tem tradição na metrópole, com excepção dos Açores, onde se efectua há longos anos, para abastecimento da indústria local. Somente durante o período de perturbação económica causada pela invasão da filoxera foi autorizada a cultura nas regiões do continente a que, hoje, correspondem, com excepção de alguns concelhos, as áreas das III, V, VI e VII regiões agrícolas, no Nordeste do País.
No estudo do aproveitamento dos novos regadios a sul do Tejo foi, no entanto, prevista a cultura do tabaco. Por isso, depois de um rápido reconhecimento dos actuais processos de cultura europeus, designadamente os italianos, através de curto estágio efectuado por dois técnicos desta Direcção-Geral, procedeu-se, desde 1959, ao ensaio sistemático de alguns tipos mais comuns de tabaco - cultivares italianas e algumas americanas, de Burley, Virgínia, Maryland e Kentucky.
Escolheram-se para o efeito os tipos de solo mais frequentes e teve-se em atenção as facilidades de rega e de acesso. Os ensaios realizaram-se nos perímetros do Caia, do Sorraia, de Campilhas e no Posto Experimental de Pegões.
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Se, no que respeita à produção de folha verde, os resultados obtidos se podem considerar normais, algumas dificuldades se apresentaram, contudo, no decorrer dos ensaios - a acção mecânica prejudicial do vento, a baixa percentagem de potássio e magnésio assimiláveis nalguns solos, a presença de cloretos nalgumas águas de rega em doses desfavoráveis a esta cultura, etc.
Só depois de devidamente completados estes ensaios, com adequados processos de cura e fermentação, o que se espera poder fazer este ano nas instalações experimentais em acabamento no Posto Experimental de Pegões, poderão obter-se indicações mais precisas sobre as qualidades dos tabacos ensaiados e, consequentemente, sobre as modificações a introduzir na técnica cultural.
Sabendo-se que o tabaco se cultiva desde o equador HO Sul do Canadá e à Suécia, é fácil admitir encontrar, entre as dezenas e dezenas de cultivares existentes, as que porporcionem tabacos de tipos mais aproximados das exigências actuais da indústria manufactureira as cultivarem-se entre nós.
Tal experimentação ainda não foi desenvolvida, dados os encargos particulares desta cultura, cujo produto final não é o que se colhe no campo, mas aquele que já sofreu todo o trabalho de cura e fermentação, cuja duração se prolonga por alguns meses.
Uma vez que a cada hectare de cultura deverão correspondei- de 200 m3 a 800 m3 de coberto, conforme o tipo de cura, e que são necessárias massas consideráveis de folhas de cada cultivar, para poderem ser curadas e fermentadas em unidades compatíveis com os processos tecnológicos aconselhados, só depois de se estudar o condicionalismo da cultura em face da possibilidade de abastecimento ultramarino, e de se conhecer o critério fiscal a adoptar pelo Ministério das Finanças, se deverá preconizar mais vasta experimentação, no caso de ser superiormente decidida a introdução da cultura no continente.
Em conclusão, não parece existir inviabilidade económica da cultura do tabaco no território continental português, tanto mais que se admite possível produzir alguns tipos de tabaco semelhantes aos actualmente consumidos.
Afigura-se que entre o custo de produção e o preço de compra pela indústria manufactureira poderá existir margem suficiente para uma tributação que talvez se possa aproximar daquela que actualmente incide sobre o tabaco importado.
A viabilidade económica da cultura resultará, como é óbvio, do conjunto destes três factores - custo de produção, preço de compra pela indústria, tributação -, qualquer deles ainda não conhecido.
Lisboa, 4 de Janeiro de 1968. - O Chefe da Repartição, António Corroía Conceição Silva.
Está conforme.
Secretaria de Estado da Agricultura, 19 de Janeiro de 1963. - O Chefe do Gabinete, Ruy Pereira e Alvim.»
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para um requerimento, o Sr. Deputado Alberto de Meireles.
O Sr. Alberto de Meireles: - Sr. Presidente: pedi a palavra para enviar para a Mesa o seguinte
Requerimento
«No uso do direito reconhecido na alínea d) do artigo 10.º do Regimento da Assembleia Nacional, requeiro que, pelo Ministério das Finanças (Inspecção-Geral de Finanças), me sejam fornecidos, e referidos aos últimos três anos em que estejam apurados, os seguintes elementos:
1) Número de autos levantados a portadores de acendedores e isqueiros não munidos de licença fiscal (Decretos-Leis n.ºs 28 219 e 32 934).
2) Importância de multas arrecadadas por infracção aos aludidos diplomas.
3) Número de autos e importância de multas arrecadadas em relação a infractores ao disposto nesses diplomas que fossem funcionários do Estado ou dos corpos administrativos.
4) Despesa anual (remunerações, despesas de transporte e ajudas de custo) com o pessoal incumbido da fiscalização do cumprimento dos citados diplomas.
5) Número de licenças passadas para uso de acendedores e isqueiros e importâncias arrecadadas pela Fazenda Nacional por essa rubrica».
O Sr. Augusto Simões: - Sr. Presidente: chega até mim a notícia da situação aflitiva em que se encontram alguns funcionários da Comissão Reguladora das Moagens de Ramas por virtude do seu afastamento deste organismo em consequência do cabido e necessário encurtamento de funções estatuído no Decreto-Lei n.º 43 832, de 29 de Julho do ano de 1961.
E essa notícia chega-me em tais termos que entendo não me ser lícito deixar de lhe fazer aqui uma referência, embora ligeira, ao abrigo do mesmo critério objectivo que presidiu às críticas que fiz a esta Comissão Reguladora e ao seu funcionamento, em repetidas intervenções nesta Câmara.
Então, como agora, apenas me dominava a preocupação de pedir justiça para os muitos que por ela clamavam e clamam.
Quando, repetidamente, me insurgi contra os despropósitos tributários deste organismo, afirmando que eles nunca estiveram na escala da sua pouca utilidade funcional e até da sua efectiva necessidade, sempre tive os olhos postos nos males que ele causou no avultado número das suas vítimas, os pobres moleiros das nossas aldeias, figuras típicas do nosso enquadramento rural, pomposamente havidos como grandes industriais de moagem! Pugnei então para que os mesmos fossem libertados de tão arbitrária suserania, que a ninguém justificava ou conferia justificável proveito.
Mas nunca deixei de pedir que se salvaguardassem os direitos dos funcionários dessa Comissão Reguladora, cuja sobrevivência estava edificada nos proventos que este organismo lhes pagava.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Para tanto me baseei no pensamento de que, não sendo estes funcionários - pelo menos os dos menores graus da sua hierarquia - responsáveis pelo desnecessário esbanjamento estrutural atingido por esta Comissão Reguladora, não devem eles ter de suportar as inevitáveis consequências das medidas tendentes a eliminá-lo.
Na verdade, havendo-lhe sido concedida uma inacreditável liberdade de acção, criou este organismo, a seu alvedrio, uma complicada máquina burocrática com milhentas implicações que muito cedo começou a dar testemunho da sua inteira desconformidade com os mandamentos de austera administração impostos a todos os serviços do próprio Estado.
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E tendo vivido um período de larga euforia administrativa, chamou esta Comissão um avultado número de funcionários para movimentação da sua pesada máquina burocrática, tornando assim existente um robusto montante de despesas, a que teve de fazer face lançando-se na odiosa tributação que tantas vezes aqui delatei.
Na verdade, essa tributação, longe de respeitar os mais rudimentares princípios da justiça tributária e da conformidade com os índices da sua disciplina legal, a todos ultrapassou largamente, transformando-se, desde o seu início, numa hibridação discricionária que ainda hoje, infelizmente, continua a projectar-se em muitas economias de famílias rurais, completamente destroçadas pelos seus inacabados malefícios.
Efectivamente, sob os auspícios das mais variadas e deturpadas interpretações, esta Comissão Reguladora acabou por criar, para seu uso, um autêntico «absolutismo administrativo», à sombra do qual se abonou dos mais latos poderes discricionários, quer na fixação das imposições tributárias, quer na sua cobrança coerciva nos tributais do trabalho, tornados inexplicavelmente passivos executores dos mandos e desmandos desse mesmo «absolutismo».
Emergiram deste clima singular consequências da maior gravidade, porque, não se reconhecendo qualquer direito de defesa ou de oposição aos executados, estes, ou pagam tudo quanto lhes é dogmàticamente exigido, ou vêem o seu património impiedosamente excutido até ao último dos seus valores, e ficam sem eira nem beira. Isto, e tanta vezes se tem repetido no distrito de Coimbra, tem causado as grandes perturbações políticas, económicas e sociais que todos conhecem, que vêm flagelando muitos moleiros c pequenos industriais do meu distrito, tanto quanto tem atingido os de outros, como, com sobrante autoridade, aqui já afirmou o Sr. Deputado Nunes Fernandes.
Conhecedor das grandes inconveniências da actuação desta Comissão Reguladora, nos moldes de descontrolada autonomia que lhe deixaram tomar, pareceu-me que a melhor maneira de os fazer terminar seria decretar a sua radical extinção. Por isso, tantas vezes aqui a tenho pedido. Pude, no entanto, aperceber-me mais tarde de que, se fosse totalmente remodelada a estrutura e corrigidos dràsticamente os seus grandes desmandos funcionais, ela ainda poderia prestar determinadas utilidades e ate resgatar muitos dos seus erros fundamentais.
Sei que se fizeram, em tal sentido, algumas operosas diligências, muito embora desconheça inteiramente qual a evolução deste problema. Tenho, porém, de reafirmar, uma vez mais. que, no seu estado actual e a despeito do seu delatado absolutismo, me não parece que esta Comissão Reguladora tenha, quaisquer condições de sobrevivência.
Parece-me ser este também o pensamento oficial. Daqui resulta, para o seu funcionalismo consciente, uma insegurança- verdadeiramente angustiosa, bem se compreendendo que assim seja.
Foi talvez por isso que procurando dar apropriado remédio a tal situação, se criou nessa Comissão Reguladora como que uma delegação do Governo, logo provida, e se ordenou, depois, em despacho de 18 de Setembro de 1961, na Secretaria de Estado do Comércio, a transferência de um certo número dos seus funcionários para a Intendência-Geral dos Abastecimentos e outros serviços, onde ingressaram na qualidade de adidos, mas sem verem claramente definida a sua situação, pois que os seus vencimentos têm continuado a ser pagos pela Comissão Reguladora donde saíram, mas sem os naturais acréscimos devidos pelas deslocações operadas.
Ora tal situação indefinida causa a esse grupo de funcionários e às respectivas famílias os graves contratempos e contrariedades que facilmente se adivinham.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Têm eles a justa aspiração de serem equiparados aos funcionários da sua categoria dos serviços que os acolheram, recebendo os vencimentos globais semelhantes aos daqueles. Nada me parece mais justo.
Sei que esses funcionários enviaram oportunamente Varias representações ao Ministério da Economia, vincando as odisseias das suas muitas dificuldades. Permito-me apoiar tais representações e manifestar a minha convicção de que o problema alcançará a devida consideração dos ilustres titulares a quem foram dirigidas, obtendo a solução mais apropriada.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Contudo, ao lado da solução deste caso incidental fica, no entanto, a pedir também o conveniente estudo toda a situação desta Comissão Reguladora e dos outros organismos de coordenação económica que muito dilataram as suas estruturas, abrigando-se em efémeras exigências de situações de reconhecido traço excepcional. Tendo-se procedido em tais organismos com demasiada leveza administrativa, não isenta de certa dose de negligência, ali se criaram despesas avultadíssimas que não encontram qualquer válida justificação nas utilidades económico-sociais que fornecem.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Vão-se acumulando e frutificando todas essas artificialidades, extrapolando quase todos os conceitos de forte austeridade que vêm dominando a própria estrutura dos serviços do Estado.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Ora isto há-de ter, necessàriamente, as mais perniciosas consequências. Caminhamos decididamente para novos rumos económicos em que tais procedimentos não encontram qualquer sombra de cabimento. De bom aviso será. portanto, começar a editar o conjunto de medidas tendentes a eliminar gradativamente essas distorções, evitando as funestas reacções no seu abrupto banimento. Este, se tiver de processar-se repentinamente, repercutir-se-á por forma tormentosa, gerando acentuado desequilíbrio social que muito convirá ser evitado.
Vozes:-Muito bem!
O Orador: - E, a finalizar estas minhas desvaliosas considerações, não quero deixar de referir também, por caber no mesmo sumário, a aflitiva e angustiosa situação dos regentes escolares.
Problema, ou conjunto de problemas, já magistralmente tratado nesta Câmara em brilhantes intervenções e estudado com largueza em impressionantes campanhas da imprensa, nomeadamente nos jornais O Século e Diário Popular, para citar apenas os órgãos da grande imprensa que agora me ocorrem, mas sem menosprezar todos os restantes, já ninguém neste país o ignora.
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São centenas, muitas centenas, de abnegados servidores do bem público, talvez humildes na sua condição, mas imensamente grandes no seu devotamento, aos quais a crueza de um inadequado sistema legal obriga aos mais torturantes sacrifícios para se manterem na função.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Entregou-se-lhes uma parte muito avultada das mais ingentes tarefas da escolaridade, exigindo-se-lhes trabalho sem limites e comprovada eficiência. Mas, em contrapartida, apenas se lhes confere uma remuneração irrisória e, mesmo assim, restrita aos períodos de trabalho escolar. Para além destes proventos não existe qualquer outra garantia de sobrevivência.
Desta sorte, se uma doença ou qualquer outro natural acidente acontece no mundo restrito de uma destas famílias, a perturbação e o desequilíbrio que se criam chegam a atingir as culminâncias de verdadeiras tragédias. É que a posição destas famílias situa-as no espaço vazio de toda a medida de socorro organizado.
Colocados no limiar da sofredora classe média, os regentes escolares, com as obrigações correspondentes a uma posição que tem certas exigências sociais, se não lhes ficaria bem - nem seria consentido - o recurso à mendicância, mais ou menos ostensiva, nos momentos de aflição, também se lhes não reconhece geralmente o direito ao benefício de uma ajuda eventual.
Resta-lhes então, na emergência, aquela caridade com que as almas boas costumam socorrer a grande legião dos que formam a pobreza envergonhada.
Mas as nossas estruturas económicas e sociais de povo civilizado e pioneiro de civilizações não são, louvado Deus, de tão fracos recursos que tornem indispensáveis e irremediáveis tão ingentes sacrifícios; bem longe disso!
Os nossos primados de justiça social, toda ela nimbada na mais pura fraternidade cristã, definida na letra autorizada das grandes encíclicas, aponta para a necessidade de resolver este e outros problemas de igual teor à luz dos mesmos primados e sem perda de tempo.
Espero, por isso, Sr. Presidente, que, ouvindo as vozes autorizadas daqueles que nesta Câmara tanto têm batalhado por essa digna solução, às quais faço acrescer, como disse, este meu descolorido apelo e as grandes solicitações da imprensa, o Governo queira colocar na agenda dos casos graves a resolver este caso tão importante em si mesmo e nas suas numerosas implicações, concedendo-lhe a prioridade que ele bem merece.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Paulo Cancella de Abreu: - Sr. Presidente: no decurso do ano de 1962, mais do que nos anteriores, realizaram-se no nosso país numerosas reuniões nacionais e internacionais, destacando-se destas vários congressos científicos e profissionais, notáveis pelo número e qualidade dos congressistas que a eles acorreram de todas as partes do Mundo e notáveis também pelos seus fins e resultados.
Estes acontecimentos são dignos de ficarem assinalados, porque, trazendo até nós milhares de estrangeiros categorizados e das mais diversas condições e proveniências, revelaram a toda a luz a irrelevância das campanhas movidas contra Portugal pelos seus inimigos externos e internos e o malogro das tentativas de descrédito sobre a ordem e a tranquilidade no País e as condições da vida nacional.
Basta mencionar, como exemplos, o Congresso de Pediatria, que reuniu mais de 3000 médicos provenientes de cerca de 60 países e compreendeu inúmeros cientistas de larga reputação, e o da União Internacional dos Advogados, onde, entre perto de 300 congressistas de 24 países, marcaram a sua presença numerosas figuras consagradas na jurisprudência e no foro internacionais.
O Sr. Pinto Carneiro: - Muito bem!
O Orador: - E que foram extremamente relevantes os resultados destas magnas assembleias de médicos e de juristas provaram-no também o número e a importância das teses apresentadas sobre as matérias dos seus programas e o interesse das discussões havidas e das conclusões emanadas das suas sessões de estudo e plenárias.
Reportando-me ao Congresso dos advogados basta, para demonstrá-lo, dizer que tiveram notável relevo, pelos assuntos e modo brilhante como foram versadas, a desenvolvida tese do congressista Dr. Azeredo Perdigão sobre a «Protecção das Minorias nas Sociedades» e as relativas a «O Advogado e a Vida das Sociedades», abrangendo o seu papel na constituição delas, na sua administração e nas falências e liquidações, etc.
É ainda de notar que, simultaneamente, foram postos importantes problemas de deontologia profissional, que importam princípios morais a respeitar e regras jurídicas a estabelecer. E assim, apesar de o programa do congresso se simular restrito, a publicação e divulgação dos debates e das conclusões são de molde a constituírem um inestimável repositório.
E, se aos congressistas estrangeiros que, porventura, nos ignorassem foi dado debruçarem-se sobre os princípios e regras fundamentais que informam o direito português, teria sido grande a surpresa mesmo dos pertencentes às grandes democracias.
Na verdade, além de uma organização prisional modelar, inigualada ou inexcedida, deparava-se-lhes um país que formou na vanguarda da promulgação de garantias individuais e do respeito pela vida humana, traduzidos especificamente:
- Na abolição da escravatura, por Sá da Bandeira, em 1836, portanto, antes, por exemplo, da Espanha (1860), dos Estados Unidos (1865), do Brasil (1888) e nos domínios franceses (1884);
- Na abolição, em 1852, da pena de morte para os crimes políticos e, há cerca de um século (1867), para todos os crimes comuns, pena aliás há muito em desuso, quando é certo que alguns países o fizeram depois e as grandes democracias ainda a mantêm;
O Sr. Pinheiro da Silva: - Muito bem!
O Orador: - Na abolição, em 1884, das penas perpétuas, hoje ainda prevalecentes em muitas daquelas nações.
- Na instituirão do Habeas Corpus, que apenas há na Inglaterra, no Brasil e poucos mais, se em mais existe.
- No direito de voto às mulheres.
E, quanto à organização profissional, encontraram uma Ordem dos Advogados bem estruturada e eficiente na sua acção assistencial cultural e disciplinar.
São também dignas de realce as excelentes impressões que os congressistas ostensivamente exteriorizaram sobre a óptima organização do Congresso e o magnífico acolhimento que, a par do nosso clima e das belezas naturais do País, os encantou.
E a nós foi particularmente grato ouvir, numa assembleia de tão alto nível e completamente estranha à política e onde eram muito diversos os ideais dos compo-
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nentes palavras extremamente lisonjeiras para Portugal, proferidas por figuras de grande categoria, como, por exemplo, o antigo presidente daquela União e insigne maître Robert Martin, ao referir-se à posição e à acção de Portugal no momento que atravessa, e do antigo vice-presidente e novo presidente e, a todos os títulos, eminente advogado e jurisconsulto alemão, Dr. George Wirz, dizendo que este esplêndido país é um dos mais belos do Mundo e a coragem e a tenacidade dos portugueses constituem símbolo da civilização ocidental moderna. E, aludindo à nossa história, o Dr. Wirz acentuou que «o Mundo deve a Portugal aquilo que é». Não podia dizer-se mais, nem melhor; e o depoimento de quem o disse, dada a sua categoria e a sua tradição, é insuspeito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Não é justo finalizar sem uma especial referência ao indispensável patrocínio oficial, à colaboração da Ordem dos Advogados e à notável e decisiva actividade do anterior presidente da União, professor Dr. Adelino da Palma Carlos, iniciador e impulsor do Congresso, e do secretário-geral, antigo Deputado, Dr. António de Sousa Madeira Pinto, cuja inexcedível e dinâmica actuação tornaram possível o grande êxito alcançado.
E assim, por todas as razões, o Congresso da União Internacional dos Advogados culminou em apoteose sob o signo Omnia Fraterne.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Vai passar-se à
Ordem do dia
O Sr. Presidente: - Continua em discussão na generalidade a proposta de lei sobre saúde mental.
Tem a palavra o Sr. Deputado Moura Ramos:
O Sr. Moura Ramos: - Sr. Presidente: subi a esta tribuna para fazer breves e despretenciosas considerações sobre a proposta de lei da saúde mental na parte tocante à zona de competência reservada aos serviços do Ministério da Justiça, isto é, aos serviços tutelares de menores e aos serviços prisionais.
Tendo desempenhado funções directivas num estabelecimento do reeducação de menores e dirigindo presentemente um estabelecimento prisional de tipo especial - Prisão-Escola de Leiria -, não desconhecemos a incidência que a falta de saúde mental tern sobre o comportamento dos internados, nem as desastrosas consequências que dessa incidência por vezes resultam.
É nessa experiência e nesse conhecimento pessoal e directo que fundamentamos as breves e simples considerações que passamos a expor sobre o delicado problema relacionado com a psico-higiene, que está a merecer a atenção desta Assembleia.
Os problemas da saúde mental excedem, como é sabido, a medicina e atingem de modo extenso a sociologia, a psicologia, a antropologia social, selecção e orientação profissionais, etc.
Interessam, assim, a médicos, psicólogos, sociólogos, pedagogos, sacerdotes, enfim, a todos quantos se interessam e têm a seu cuidado a valorização do homem.
Se foram os médicos quem primeiro se apercebeu da amplitude do problema dos males mentais, outros técnicos verificaram o interesse e a necessidade destes estudos. Assim, os psicólogos, que se viram embaraçados para delimitar o mal mental do estado de saúde; os pedagogos, que nas reacções dos jovens encontravam atitudes que provocavam nestes a falta de aproveitamento no ensino, a desaptação da vida escolar e profissional; os pais, que esbarravam com formas tão diversas de reacção dos filhos perante o mesmo ambiente familiar; os homens do direito, que sentiam a falta de eficácia e de lógica das penas aplicadas sem distinção a qualquer delinquente.
A partir do século XIX, a pessoa do menor inadaptado e a do delinquente passam a atrair sobre si as atenções de legisladores, julgadores e encarregados da sua reeducação social, que procuram não sómente diagnosticar as causas dos seus desvios de conduta para os valorizar, como também fazer o prognóstico das suas possibilidades de reincidência em função da forma de tratamento preconizado.
Assim se chegou à noção de observação prévia, estudando a personalidade dos menores inadaptados e dos delinquentes, com o fim de investigar as causas dos seus desmandos de comportamento e indicar os meios mais eficazes para o seu combate.
O problema da observação, como estudo metódico das condições físicas e mentais desses indivíduos, do seu carácter e inteligência, das condições económicas, familiares e sociais em que viveram, invadia assim o domínio de várias ciências, pelo que a apreciação de toda a anomalia de comportamento, a delinquência ou crime, começou a ser apreciada dentro de uma concepção global.
A luz desta concepção assumiu papel de maior relevo a observação psiquiátrica, considerada como adjuvante d u capital importância para que os serviços reeducativos de menores e os serviços prisionais pudessem alcançar a superior finalidade para que foram criados - a da readaptação social dos jovens e adultos que lhes estavam, confiados. E, se os resultados práticos do emprego de processos psicoterapêuticos ou psicanalíticos não são ainda tantos que justifiquem grandes optimismos no campo da reeducação social, a verdade é que a orientação fixada em vários congressos e estudos recentes é toda ela no sentido de considerar indispensável a participação da psiquiatria no estudo e diagnóstico dos diferentes casos de inadaptação dos jovens da delinquência e seu tratamento.
Com vista à observação dos internados para o estudo da sua personalidade, como fulcro da terapêutica a aplicar, foram criados vários organismos, tais como estabelecimentos de observação para os menores inadaptados institutos de criminologia, clínicas de criminologia, institutos de defesa social e anexos psiquiátricos para os delinquentes.
1) Entre nós, o primeiro estabelecimento de observação dos serviços tutelares de menores - o Refúgio da Tutoria Central de Lisboa - foi criado pelo Decreto de 27 de Maio de 1911, que estabelecia haver um posto antropométrico, dirigido pelo respectivo médico, criando-se, pela Lei de 24 de Abril de 1912, o Refúgio anexo à Tutoria Central da Infância do Porto.
Mas a preocupação de dar aos serviços dos refúgios certa orientação científica apenas se vem a verificar com o Decreto n.º 10 767 em cujo relatório se afirmava «a necessidade de sujeitar imediatamente a uma observação rigorosa de carácter psicológico e psiquiátrico os menores delinquentes».
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Em 1951, com a publicação do Decreto-Lei n.º 38 386, dá-se mais um passo em frente, definindo-se os refúgios como centros de observação e criando junto dos do Porto e de Coimbra os lugares de peritos orientadores para o desempenho das funções de observação psicológica e de orientação profissional.
Os estabelecimentos criados funcionavam, no entanto, em condições muito precárias, quer por falta de observação psiquiátrica, quer por insuficiência- ou inexistência de observação psicológica, quer ainda por falta de pessoal devidamente preparado para realizar uma observação directa, individual e de grupo. Os menores portadores de doenças mentais carecidos de tratamento adequado não o tinham em estabelecimento especializado, que não funcionava apesar de haver sido criado pelo Decreto n.º 18 375, de 17 de Maio de 1930.
Isto levava a que os estabelecimentos de reeducação não se pudessem libertar dos menores com taras mentais ali internados e que constituíam um peso morto, além de, na maior parte dos casos, representarem, factores de grave indisciplina e elementos altamente perturbadores, a quem não podia ser feito tratamento adequado.
Deve-se ao actual Ministro da Justiça, Prof. Antunes Varela, o preenchimento desta grave lacuna dos serviços, com a publicação do Decreto-Lei n.º 40 701, de 25 de Julho de 1956, permitindo a abertura de um serviço de grande alcance para o estudo e tratamento médico-psicológico dos menores delinquentes, indisciplinados ou em perigo moral, com deficiências ou irregularidades mentais. Efectivamente, com a entrada em funcionamento do Instituto Navarro de Paiva, novas perspectivas surgiram para a resolução do grave problema do estudo médico-psicológico dos menores do sexo masculino afectados de anomalias mentais, como também do internamento de muitos deles que, até àquela altura, eram entregues às famílias e que, agora, poderão ir ali receber, quer directa, quer indirectamente, tratamento conveniente.
Quanto aos do sexo feminino, mentalmente deficientes ou irregulares, também se dispõe agora de melhores meios para o seu tratamento e internamento depois do acordo realizado, através do Decreto-Lei n.º 43 167, de 19 de Setembro de 1960, com o Instituto Médico-Pedagógico Condessa de Rilvas. Porque a especialização do pessoal se considera como condição primeira da eficiência de um serviço, mormente numa instituição de tão vincada natureza médico-psicológica, o legislador de 1956 não deixou de considerar «a criação de lugares técnicos, como o de médico de psiquiatria infantil, ou de psicólogo, e ainda o recrutamento dos funcionários mais em contacto com os menores, em diplomados com o curso do magistério de anormais ministrado no Instituto António Aurélio da Costa Ferreira».
Para os restantes funcionários pré viu-se que seria organizado no Instituto um curso de preparação e formação do pessoal, orientado e presidido pelo director, com a colaboração do médico psiquiatra e do psicólogo, destinado a ministrar aos monitores-vigilantes, ao enfermeiro e aos contramestres os conhecimentos elementares que forem considerados indispensáveis sobre psicologia e pedagogia dos menores mentalmente deficientes ou irregulares.
Graças à iniciativa e ao esclarecido espírito do Sr. Ministro da Justiça e ao seu carinho e interesse pelos problemas da juventude inadaptada estão actualmente criadas as condições para que os menores mentalmente deficientes possam ser internados em estabelecimentos especializados a fim de receberem tratamento adequado que os possa converter em elementos socialmente úteis ou pelo menos, inócuos à vida social.
Mas o ideal seria que a pesquisa ou despistagem se iniciasse nas escolas primárias, nos colégios, nos estabelecimentos de ensino e assistência onde os menores atrasados, difíceis ou suspeitos aparecem, facultativa ou obrigatòriamente, e assim já os estabelecimentos tutelares de menores se não veriam a braços com uma população que, na maioria dos casos, é mais do foro dos Ministérios da Assistência ou da Educação do que do Ministério da Justiça.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - O novo Estatuto da Saúde e Assistência (há pouco aprovado nesta Câmara), as importantes obras realizadas nos estabelecimentos de reeducação e as reformas legislativas sobre os serviços tutelares de menores (recentemente elaboradas levando em conta os mais recentes conhecimentos científicos) contribuirão decisivamente, disso estamos certos, para um maior progresso, tanto no campo dos princípios como no da sua aplicação prática.
2) O problema, do internamento e tratamento dos delinquentes anormais é, de sua natureza, mais difícil, constituindo uma das mais graves preocupações dos nossos serviços prisionais, pela quantidade de anormais psíquicos e de doentes mentais que ainda vive nas prisões.
A reforma prisional de 28 de Maio de 1936, que reorganizou todo o sistema prisional português e alterou profundamente f» nosso direito penal, previa, entre a vasta rede dos estabelecimentos prisionais a construir, a existência de prisões-asilos e manicómios criminais. As prisões-asilos destinar-se-iam aos delinquentes portadores de anomalia mental que os não privasse de imputabilidade, mas a quem seria prejudicial o regime das prisões comuns e que, por isso mesmo, deviam cumprir as penas em estabelecimentos especiais onde o regime prisional se combinasse com a observação e a assistência médico-psiquiátrica; os manicómios criminais ficariam reservados aos delinquentes com anomalia mental que os privasse de imputabilidade.
Muito embora nos últimos anos os serviços prisionais tenham sofrido considerável evolução, não só pelo que respeita às inovações introduzidas na legislação, mas também aos numerosos estabelecimentos construídos e melhorados, aos sistemas ensaiados e praticados, o que é certo é que estamos ainda longe de ter chegado ao fim.
E a maior lacuna dos serviços é precisamente aquela que se refere à falta de estabelecimentos apropriados ao internamento do delinquentes que sofrem de anomalia mental, pois não possuímos ainda nem prisão-asilo nem manicómio criminal.
O facto é tanto mais grave porque, não estando os estabelecimentos preparados para receber doentes mentais, a permanência destes em regime de privação de liberdade - especialmente em isolamento celular - agrava, por vezes de forma irremediável, certas perturbações psíquicas que, estudadas a tempo e tratadas de modo conveniente, poderiam ter fácil cura. o que, além de injusto, é inconveniente.
Por outro lado, pode imaginar-se a perturbação causada, nos serviços pela permanência de anormais em cadeias que não dispõem das mais elementares condições, quer para o seu internamento, quer tratamento.
Mas a incompleta efectivação do esquema da assistência psiquiátrica do País tem agravado de modo relevante a situação. Estamos em crer que muitos anormais não teriam chegado a delinquir se tivessem sido internados e tratados a tempo.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
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O Orador: - O nosso ordenamento penitenciário é, presentemente, o seguinte:
Anexos psiquiátricos, com edifícios próprios e orientados por médicos especialistas com uma função de observação e exame dos suspeitos de anomalia mental. Actualmente existem anexos psiquiátricos junto da Cadeia Penitenciária de Lisboa e da Colónia Penal de Santa Cruz do Bispo, em Matosinhos, prevendo-se um terceiro junto da Cadeia Penitenciária de Coimbra, que entrará brevemente em funcionamento. O anexo psiquiátrico de Santa Cruz do Bispo, para além das suas funções próprias e graças à dedicação e competência do médico que o dirige, tem a seu cargo o tratamento de cerca de uma centena de inimputáveis perigosos, enquanto não é possível construir o manicómio criminal.
Prisão-asilo, a construir junto da Prisão-Hospital em Caxias, com lotação de cerca de 100 celas;
Prisão-manicómio - pavilhões para 300 doentes, a construir junto do Hospital Sobral Cid, em Coimbra (dois tipo vigilância, um tipo tranquilos e um ou dois tipo prisão);
E um pavilhão a construir junto da Prisão-Hospital em Caxias.
Na falta de manicómios criminais, os inimputáveis têm sido até agora, recolhidos em hospitais ou clínicas psiquiátricas comuns, com os inconvenientes graves que daqui resultam, até porque só o Hospital Miguel Bombarda possui um pavilhão com o mínimo de condições de segurança, e que tem sido destinado a reclusos.
Em hospitais psiquiátricos comuns, custeados pelo Ministério da Justiça, encontram-se presentemente 384 doentes, isto para um total de 426 reclusos declarados inimputáveis perigosos.
O problema da construção junto do Hospital Sobral Cid dos pavilhões para reclusos anormais perigosos tem sido objecto de diligências que se vêm arrastando há bastante tempo, não obstante o interesse, e a boa vontade havidas, por parte dos Ministérios da Justiça e da Saúde e Assistência, na sua resolução.
Considerando necessário um estudo prévio para a elaboração do programa e características da construção dos pavilhões deslocaram-se recentemente ao estrangeiro um membro da Comissão das Construções Prisionais e um médico especialista, que aproveitaram também a oportunidade para estudar o programa e características da construção dos pavilhões junto da Prisão-Hospital de S. João de Deus. em Caxias, destinado a prisão-manicómio e prisão-asilo.
Aguarda-se agora o relatório dessa visita e a apresentação do estudo que tem protelado a efectivação do esquema dos serviços dependentes do Ministério da Justiça necessário à promoção da saúde mental dos reclusos.
Que ele não tarde e que se possa dar cumprimento, o mais breve possível, ao programa das construções que vier a ser aprovado.
Assim o reclama a boa eficiência dos serviços, pois a promoção da saúde mental dos reclusos está na base do objectivo que esses serviços devem procurar prosseguir afanosamente - a recuperação do doente recluso para a complexidade da vida humana, alto ideal que ilumina as instituições penitenciárias..
Temos fundadas esperanças de que uma vez aperfeiçoada a observação inicial e observação psiquiátrica durante, a privação da liberdade, de construídos os estabelecimentos previstos e apropriados ao tratamento, e muito especialmente depois de completado o esquema da assistência psiquiátrica do País, agora em discussão, temos fundadas esperanças, dizíamos nós, de que o problema da criminalidade dos anormais mentais deixará de constituir o pesadelo que até agora tem sido.
E é baseado nessa esperança, Sr. Presidente, que dou o meu voto na generalidade à proposta de lei que esta Assembleia vem apreciando.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Alves Moreira: - Sr. Presidente: ao apreciar a presente proposta de lei sobre saúde mental, que vem largamente melhorar e ampliar o esquema assistencial constante na Lei n.º 2006 até agora em vigor, apraz-me fazer algumas despretensiosas considerações por oportunas e por mister do que me tem sido dado observar no dia a dia da minha profissão de médico e consequentemente, avaliar do alcance social das inovações agora largamente introduzidas.
De facto, se até este momento já no nosso país a assistência aos doentes do foro psíquico era de elevado nível, pelas disposições do presente diploma se antevê uma larga perspectiva de melhoria que nos colocará sem dúvida na vanguarda dos países que acompanham este movimento de humanidade.
Foi, portanto, em boa hora que o nosso Governo, pelo então Ministro da Saúde e Assistência, Dr. Martins de Carvalho, resolveu submeter à, apreciação das Câmaras a promulgação de um diploma regendo em novos moldes a saúde mental, com aquela superior visão que caracterizava bem aquele ilustre estadista.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Com as novas disposições legislativas na forma apresentada pela Câmara Corporativa, que em meu entender teve na comissão encarregada da sua elaboração uma colaboração merecedora dos mais elevados encómios - e permita-se-me destacar aqui o seu relator, o mestre eminente da Faculdade de Medicina de Coimbra, Prof. Doutor Bissaia Barreto ...
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - ... pela dedicação particular e atenção que sempre tem prestado ao estudo do assunto tão criteriosamente versado -, se obtém um diploma exemplar, a que nada falta para se instituir um padrão assistencial a alto nível e que será uma meta ideal a atingir, logo que as possibilidades de meios não só financeiros, mas também e sobretudo de pessoal técnico devidamente especializado, permitam pleno funcionamento.
Sem dúvida que tal objectivo não poderá ser atingido nos anos mais próximos, mas esperemos que todos os esforços em conjugação levem à sua execução plena no mais curto espaço de tempo possível.
O Sr. Jorge Correia: - Isso é que é pena não ser já.
O Orador: - Confiemos, pois, para bem de toda a comunidade, constituída por percentagem cada vez mais crescente de indivíduos com perturbações do foro neuro-psiquiátrico ou afins. Realmente, o estado actual de vida agitada que se é obrigado constantemente a viver vem criando condições propícias a um aumento crescente de
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indivíduos que precisam de ser devidamente amparados, de maneira a não serem a breve trecho francos doentes mentais.
Para tal há que considerar, antes de mais, o aspecto profiláctico das psicopatias, promovendo-se uma higiene mental a todos os títulos eficiente.
É este aspecto encarado com todo o cuidado e acuidade pela nova lei com disposições que conduzirão seguramente a resultados práticos de prevenção, diminuindo assim o número dos doentes e consequentemente, a necessidade de reabilitação das vítimas que tais padecimentos ocasionam.
Mas para se conseguir um tão lato objectivo há muito que organizar, constituindo-se dispensários e serviços sociais, hospitais psiquiátricos em larga escala para tratamento de casos agudos, centros de recuperação para os doentes de doença prolongada em regime de ergoterapia, centros de educação e assistência para crianças anormais, centros de observação, etc.
Toda esta grande estrutura implicará necessariamente não só a existência de centros adequados, mas também a colaboração activa de técnicos em número e qualidade que possam pôr em pleno funcionamento e consequente rendimento uma tão complexa organização.
Há, pois, que fomentar a criação de tais condições, em especial aquelas que dizem respeito ao estabelecimento de cursos adequados, de maneira a haver médicos psiquiatras, psicólogos, sociólogos e enfermeiros, além de outros, em número suficiente e em qualidade, para que se possa dar vida às perspectivas da assistência psiquiátrica que se pretende.
O Sr. Jorge Correia: - V. Ex.ª dá-mo licença?
O Orador: - Faz favor.
O Sr. Jorge Correia: - Tenho estado a ouvir com muita atenção a exposição de V. Ex.ª e devo dizer que não intervim neste debate precisamente porque li a lei e a considerei óptima. Mas onde eu tenho largas dúvidas é que se dê execução em breve trecho a tudo o que está na lei. E este é o meu desgosto, que não se dê execução rápida. Hospitais, pessoal técnico, não existem em quantidade suficiente, e é preciso que isto se diga para que o Governo o ouça, não há médicos especializados nem enfermeiros especializados. Estes são os problemas fundamentais: técnicos e meios de execução. É isto precisamente que não temos.
Não intervim porque a lei está primorosamente feita, mas do que duvido, com desgosto, é da sua execução.
O Orador: - Muito obrigado. O que V. Ex.ª acaba de dizer está precisamente de acordo com as minhas considerações.
Presentemente o número de tais técnicos é tão insuficiente que nada se conseguirá se não surgir o estímulo que conduza para tais cursos todos aqueles que se sintam atraídos para o exercício e desempenho cabal de tão nobre missão.
Atendendo precisamente a esta notória carência de médicos psiquiatras e de outros auxiliares absolutamente imprescindíveis para esta luta que se pretende activar contra as psicopatias, tanto no seu aspecto profiláctico e preventivo como também no recuperador, ouso sugerir que se criem brigadas de neuropsiquiatras que se desloquem dos seus centros até aos hospitais espalhados por todo o continente, a fim de contactarem com os médicos de clínica geral, facultando-lhes ensinamentos suplementares que, a acrescentar àqueles outros que a prática clínica já lhes tenha proporcionado, sirvam de algum modo para suprir o déficit actual de médicos especializados em psiquiatria, até que as nossas escolas médicas habilitem novas camadas de profissionais, e impõe-se que sejam muitos, já então com as possibilidades suficientes para arcarem com a tarefa árdua da luta a favor da saúde mental das populações, que, como é óbvio, se impõe.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Sugeria ainda, com o mesmo objectivo, a criação de cursos de aperfeiçoamento nesta delicada matéria, que envolve largos conhecimentos de psicologia e psiquiatria...
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - ... entre outros, a funcionarem periodicamente nos centros de assistência psiquiátrica das zonas estabelecidas...
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - ... ou até nas Faculdades do Medicina, de maneira a melhor divulgar as técnicas e práticas u adoptar.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Seria uma maneira prática, para já, de resolver um problema que, tal como se apresenta presentemente, se antevê de difícil solução, pelo menos para os anos mais próximos.
Aquilo que o médico família, que infelizmente tem tendência a desaparecer nos tempos que vão correndo, tem vindo a fazer é muito pouco para as necessidades actuais, em que a evolução natural dos problemas de psicologia, psiquiatria e sociologia caminha a passos agigantados para uma primeira linha do bem-estar dos povos.
Com certeza que os novos psiquiatras, ansiosos por mostrarem as suas aptidões e as suas reais qualidades de trabalho, seriam os primeiros a abraçar com simpatia esta cruzada.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Outra dificuldade imediata será. sem dúvida, a falta de pessoal de enfermagem à altura para uma boa eficiência dos serviços a prestar nos estabelecimentos de assistência psiquiátrica, e até fora deles, pois para tal missão requer-se uma vocação especial, além de uma rigorosa preparação e formação a adquirir em escolas de enfermagem psiquiátrica, que deverão ser criadas com urgência, embora se saibam de antemão os encargos financeiros que tais empreendimentos necessariamente envolvem.
A estruturação dos serviços mencionados na presente proposta de lei prevê uma apertada rede de assistência psiquiátrica no nosso país, parte da qual já em funcionamento, a que sómente há que dar maior amplitude e expansão. A divisão do País em três zonas, com os seus centros e hospitais psiquiátricos nas cidades do Porto, Coimbra e Lisboa, e a criação de dispensários regionais e sub-regionais, permitem uma íntima conexão entre os serviços e uma redistribuição de técnicos que entreajudando-se, conduzirão a eficazes resultados e à total cobertura sanitária nesta modalidade de assistência.
Reputo de grande importância a criação de tais dispensários, a funcionar junto dos hospitais regionais e
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sub-regionais, pois o actual regime em vigor de brigadas móveis tem-se mostrado pouco eficiente, como logicamente ressalta dos largos intervalos entre as consultas, dos elementos que constituem tais brigadas, do escasso tempo de que dispõem e do número bastante elevado de doentes que têm de ser consultados, etc.
Há que haver uma aproximação entre os enfermos e os psiquiatras e demais colaboradores, de maneira a ser considerado o doente no seu todo somatopsíquico e colocado no seu próprio ambiente, com aquela minúcia que os casos especiais reclamam.
Aquilo que me têm sido dado observar a tal respeito na área em que habitualmente exerço clínica tem-me mostrado sobejamente que pouco útil tem sido tal modalidade de assistência. São as consultas dadas no hospital de quinze em quinze dias indistintamente a primeiros e segundos doentes, em número tão elevado que não tem podido cumprir-se tudo aquilo que se apregoa como de, extrema necessidade para um estudo completo e consciente dos doentes do foro psiquiátrico, que requer uma atenção fora do habitual em medicina, dado que os diagnósticos terão de assentar em causas de ordem física, psicológica e social, ou até na combinação das três, o que necessàriamente, obriga a um esbanjar de tempo e paciência, incompatível com o tempo disponível. Mostra-se evidente concluir que o diagnóstico etiológico se torna difícil em tais condições, e o diagnóstico clínico não deve bastar ao médico psiquiatra. Este inconveniente virá a desaparecer ou atenuar-se muito, com certeza, com os dispensários, que se prevêem a funcionar com carácter de continuidade e com toda a plêiade de técnicos necessários ao cumprimento integral da nobre missão de tratai-os doentes do espírito e a fazer a sua profilaxia, mais vantajosa ainda para um sucesso nesta modalidade de assistência.
A acrescentar a estas dificuldades podem anotar-se aquelas outras que normalmente surgem quando há necessidade de internar um doente mental, pois as vagas nos respectivos centros poucas são, aguardando às vezes os doentes tempo suficiente para já nada lucrarem quando a sua vez chegar. Felizmente que com a expansão dos hospitais psiquiátricos já existentes e a criação de novos essa segunda lacuna que se verifica também desaparecerá a breve trecho.
São estes os meus votos, e anseio verdadeiramente pela criação de dispensários nos grandes centros populacionais do País, pelo menos, e, no caso particular que diz respeito à minha região, em Aveiro, de um dispensário regional em sede própria ou, de preferência, vivendo dentro do hospital local, directamente dependente do dispensário central anexo ao Hospital Psiquiátrico de Coimbra, o mais brevemente possível, já de harmonia com a presente disposição legislativa que neste momento aprecio. Deveria ainda criar-se uma clínica psiquiátrica de maneira a poderem ser internados os casos agudos de doença mental, não se perdendo desta forma tempo no tratamento, de certas psicoses infecciosas, delírios mentais,, excitações maníacas e de outras situações semelhantes, bem como serviços abertos para tratamento de psicóticos.
Também reputo da maior importância a criação de dispensários de higiene mental infantil, pois, começando por despistar precocemente as crianças suspeitas de alterações mentais, faz-se a melhor das profilaxias a favor do futuro mental da nossa gente.
Reconheço que as dificuldades que já se notam para a execução perfeita da cobertura sanitária sob o ponto de vista psiquiátrico do nosso país toma maior acuidade neste sector, pois, além dos técnicos habituais, há a acrescentar a necessidade da assistência de pediatras especializados em neuropsiquiatria infantil, de maneira a poderem actuar a tempo sobre todas as anomalias de ordem mental de que porventura as crianças sejam portadoras.
A propósito, quero manifestar o meu inteiro aplauso à brilhante exposição que neste mesmo lugar há dois dias o ilustre deputado Doutor Santos Bessa fez, referindo-se de maneira tão superior às necessidades e cuidados que este momentoso assunto requer. Tudo quanto se pretendesse dizer focando tais aspectos ficaria muito aquém das criteriosas e oportunas considerações então feitas de maneira magistral, mostrando muito bem o interesse que S. Ex.ª tem votado ao estudo de tais problemas.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: um flagelo social de grande actualidade e muito em voga nas nossas aldeias e atingindo uma grande parte dos nossos operários, mercê de várias circunstâncias a que a miséria social não é alheia, é o alcoolismo, com todos os danos inerentes e consequências, não só imediatas, mas também susceptíveis de largos e profundos prejuízos futuros, destacando-se sobretudo como podendo conduzir a crimes, a vítimas de acidentes de trabalho e viação, a doenças graves que poderão causar hospitalizações e morte, e até à loucura.
Ora é este um aspecto que deverá ser encarado, indicando-se normas a seguir e prevendo-se a criação de dispensários com serviços sociais respectivos, com o fim de não só curar os casos ligeiros, mas também facultar uma assistência psicológica e psiquiátrica, fazendo-se assim uma verdadeira desintoxicação mental dos alcoólicos. Dever-se-ia até instituir uma lei que permitisse capturar todo o indivíduo que se apresentasse em estado de embriaguez na via pública, isto no que diz respeito ao alcoolismo agudo, e hospitalizar obrigatoriamente os atacados de alcoolismo crónico, aliás como já se vem fazendo em alguns países.
Quantas e quantas consequências funestas se evitariam com tais disposições!
Diminuiria a proliferação em condições péssimas tantas das vezes causadoras de nados-mortos. de atrasados mentais, de epilépticos, etc.: a delinquência infantil; os dramas familiares; a vagabundagem; a vadiagem, e tantas manifestações patológicas, muitas das quais conduzindo à demência.
Diminuiria o número de acidentes de trabalho e sobretudo, o de acidentes de viação, pois estatísticas podem provar insofismavelmente a responsabilidade que cabe ao alcoolismo na maior parte dos acidentes. Deveriam mesmo ser tomadas medidas rigorosas no sentido de evitar os mais leves sinais de embriaguez, habilitando as autoridades a diagnosticar a intoxicação alcoólica e até a dosear a alcoolemia ou a colher sangue para a dosagem de álcool.
Enfim, conjugar todos os esforços no sentido de serem tomadas medidas enérgicas no sentido de diminuir, já que será quase impossível acabar, este flagelo social.
Sr. Presidente: como nota final, queria mais anotar a necessidade que há em considerar fazendo parte da educação sanitária do povo a higiene mental. Para tal há que introduzir princípios de saúde mental na prática dos serviços de saúde pública, de maneira que de uma estreita comunhão de esforços resultem indivíduos sãos de corpo e espírito para bem de todos os portugueses, que desejam sobretudo condições mínimas de protecção social contra flagelos, que. como estes mencionados na presente proposta de lei, são encarados com o temor natural que lhes é inerente. Tanto mais que se sabe ser a
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percentagem de alienação mental da população de 1 por cento e a percentagem de nevróticos incapacitados parcialmente subiu a 10 por cento, o que constitui grave preocupação comum a todos os povos.
Termino, pois, dando o meu apoio incondicional à presente proposta e formulando mais uma vez o melhor dos votos para que em breve todas as disposições estejam a vigorar, satisfazendo-se assim anseios que são comuns.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão.
A próxima sessão será na terça-feira, 29, à hora regimental, com a mesma ordem do dia de hoje. Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Alberto da Rocha Cardoso de Matos.
Antão Santos da Cunha.
António Carneiros Lopes.
Armando Cândido de Medeiros.
Armando Francisco Coelho Sampaio.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Carlos Coelho.
Francisco José Vasques Tenreiro.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
Júlio Dias das Neves.
Manuel Seabra Carqueijeiro.
Manuel Tarujo de Almeida.
D. Maria Irene Leite da Costa.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
Virgílio David Pereira e Cruz.
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Agnelo Orneias do Rego.
Alexandre Marques Lobato.
Alfredo Maria de Mesquita Guimarães Brito.
Aníbal Rodrigues Dias Correia.
António Burity da Silva.
António Júlio de Carvalho Antunes de Lemos.
António Tomás Prisónio Furtado.
Domingos Rosado Vitória Pires.
Fernando António da Veiga Frade.
Joaquim de Jesus Santos.
Joaquim de Sousa Birne.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Manuel Herculano Chorão de Carvalho.
Manuel João Correia.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel de Melo Adrião.
Manuel Nunes Fernandes.
Purxotoma Ramanata Quenin.
Tito Castelo Branco Arantes.
Urgel Abílio Horta.
Voicunta Srinivassa Sinai Dempó.
O REDACTOR - António Manuel Pereira.
IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA