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REPÚBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA - GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL
DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 101
ANO DE 1963 4 DE DEZEMBRO
ASSEMBLEIA NACIONAL
VIII LEGISLATURA
SESSÃO N.º 101, EM 3 DE DEZEMBRO
Presidente: Exmo. Sr. Mário de Figueiredo
Secretários: Ex.mos Srs.
Fernando Cid Oliveira Proença
Luís Folhadela de Oliveira
SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 16 minutos.
Antes da ordem do dia. - O Sr. Presidente comunicou que estavam na Mesa as contas das província ultramarinas relativas ao exercício de 1962.
Por proposta do Sr. Presidente foram aprovados votos de pesar pelas mortes dou antigos Deputados António de Almeida Silva e Cristo e Álvaro Henriques Perestrelo de Favila Vieira.
Deu-se conta do expediente.
O Sr. Deputado Veiga, de Macedo, em. seu nome e no de outros Srs. Deputados, anunciou um aviso prévio de apoio à. política ultramarina, do Governo na defesa, da integridade do território nacional.
O Sr. Deputado Alves Moreira falou sobre o naufrágio da barra de Aveiro.
O Sr. Deputado Elísio Pimenta ocupou-se de melhoramentos na- cidade dó Porto.
O Sr. Deputado Calheiros Lopes tratou de problemas do distrito de Santarém.
O Sr. Deputado Olivio de Carvalho referiu-se às instalações do museu, e biblioteca da. Figueira da Foz e á Fundação Gulbenkian.
Ordem do dia. - Discutiu-se o projecto de lei do Sr. Deputado Amaral Neto sobre reembolsos dos custos de linhas de distribuição de energia electrica. Falaram os Srs. Deputados Amaral Neto, Alberto de Meireles e Martins da Cruz.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas e 40 minutos.
O Sr. Presidente: - Vai fazer-se a, chamada.
Eram 16 horas e 5 minutos.
Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Agostinho Gonçalves Gomes.
Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Alberto dos Reis Faria.
Alberto Ribeiro da Costa Guimarães.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alexandre Marques Lobato.
Alfredo Maria de Mesquita Guimarães Brito.
André Francisco Navarro.
Aníbal Rodrigues Dias Correia.
António Augusto Gonçalves Rodrigues.
António Burity da Silva.
António Carneiros Lopes.
António de Castro e Brito Meneses Soares.
António Gonçalves de Faria.
António Júlio de Carvalho Antunes de Lemos.
António Magro Borges de Araújo.
António Manuel Gonçalves Rapazote.
António Maria Santos da Cunha.
António Martins da Cruz.
António Moreira Longo.
Armando Cândido de Medeiros.
Armando Francisco Coelho Sampaio.
Armando José Perdigão.
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Artur Águedo de Oliveira.
Artur Alves Moreira.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Artur Proença Duarte.
Bento Benoliel Levy.
Carlos Alves
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Délio de Castro Cardoso Santarém.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando Cid Oliveira Proença.
Francisco António Martins.
Francisco António da Silva.
Francisco José Lopes Roseira.
Francisco José Vasques Tenreiro.
Francisco Lopes Vasques.
Francisco de Sales de Mascarenhas Loureiro.
Henrique Veiga de Macedo.
James Pinto Buli.
Jerónimo Henriques Jorge.
João Mendes da Costa Amaral.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
João Rocha Cardoso.
João Ubach Chaves.
Joaquim de Jesus Santos.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Joaquim do Sousa Birne.
Jorge de Melo Gamboa de Vasconcelos.
José Alberto de Carvalho.
José Augusto Brilhante de Paiva.
José Fernando Nunes Barata.
José Manuel, da Costa.
José Manuel Pires.
José Maria Rebelo Valente de Carvalho.
José de Mira Nunes Mexia.
José Monteiro da Rocha Peixoto.
José Pinheiro da Silva.
José Pinto Carneiro.
José Soares da Fonseca.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Júlio Dias das Neves.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Luís Folhadela de Oliveira.
Manuel Amorim de Sousa Meneses.
Manuel Augusto Engrácia Carrilho.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Herculano Chorão de Carvalho.
Manuel João Cutileiro Ferreira.
Manuel de Melo Adrião.
Manuel Seabra Carqueijeiro.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
D. Maria Irene Leite da Costa.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Reis.
Mário Amaro Salgueiro dos Santos Galo.
Mário de Figueiredo.
Olívio da Costa Carvalho.
Paulo Cancella de Abreu.
Quírino dos Santos Mealha.
Rogério Vargas Moniz.
Rui de Moura Ramos.
Sebastião Garcia Ramires.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
O Sr. Presidente: - Estão presentes os Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 16 horas e 15 minutos.
Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente: - Estão na Mesa, relatadas pela Direcção-Geral de Fazenda do Ministério do Ultramar, as contas das províncias ultramarinas relativas ao exercício de 1962.
Estão também na Mesa elementos pedidos pelo Sr. Deputado Ferreira na sessão de 25 de Abril último, os quais vão ser entregues ao mesmo Sr. Deputado.
Estão ainda na Mesa elementos pedidos pelo Sr.. Deputado Alexandre Lobato na sessão de 27 de Abril último, que também lhe serão entregues.
Durante o interregno parlamentar faleceu o antigo Deputado á III Legislatura Dr. António de Almeida Silva e Cristo, eleito pelo círculo de Aveiro, que afirmou, desde muito novo, através da sua vida. a adopção dos princípios fundamentais do Estado Novo.
Deve ficar exarado na acta de hoje um voto de sentimento pela sua morte.
Também faleceu ontem o Sr. Dr. Álvaro Henriques Perestrelo Favíla Vieira, que foi Deputado durante no quatro primeiras legislaturas eleito pelo círculo da Madeira.
Teve durante a sua vida uma actividade política que o prestigiou, desempenhando cargos políticos da maior relevância no Funchal.
Igualmente deve ficar exarado no Diário as Sessões de hoje um voto de sentimento pela sua morte. Tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Macedo.
O Sr. Veiga de Macedo: - Sr. Presidente: o ultramar português tem sido nos últimos tempos objecto preferido de atenções e actividades - quase sempre mal intencionadas e, por vezes, criminosas - de variados sectores internacionais. Temos sofrido,- na carne e no espírito, . as campanhas que tenebrosas forças políticas ou pluto-cráticas nos movem apostadas em desalojar-nos da nossa própria casa, como se fora lícito atentar contra a soberania de um estado, que, como nenhum outro, se identifica com a Nação - perfeitamente definida e constituída e esclarecidamente cônscia dos seus direitos e da sua missão.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Ao fenómeno se chamou, e continua a chamar, a questão da política ultramarina portuguesa. Seria, no entanto, mais apropriado chamar-lhe o problema da integridade da Pátria Portuguesa.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Este, entre todos, o maior e mais agudo problema posto á nossa inteligência e si nossa vontade, ao nosso patriotismo o à nossa consciência de homens livres. Este o problema que o Governo, com a certeza de trilhar o caminho da verdade o da razão e de defendei-os mais lídimos interesses da grei, vem enfrentado vitoriosamente, sem tibiezas ou desfalecimentos, que, a existirem, o condenariam de maneira irremediável perante o juízo da Nação e da história.
Vozes: - Muito bom, muito bem!
O Orador: - Todos aqui sabemos, e sentimos, Sr. Presidente - e o povo sabe-o e sente-o como nós -, que
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o Governo não pode ter outra conduta que não seja a de preservar, até ao extremo limite dos nossos recursos, a inviolabilidade do País tão gravemente ameaçada.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Afigura-se, assim, oportuno e aconselhável que, do alto desta tribuna, se proclame, uma vez mais, com a solenidade e a veemência requeridas, que a Nação está ao lado do Governo na decisão de manter a intangibilidade da Terra Portuguesa e de salvaguardar a dignidade de um povo que, se não pretende dar lições aos demais, não as aceita de ninguém quando se trata de viver a sua vida colectiva e de marcar a sua posição no plano das relações com os outros povos.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Por isso, um grupo de Deputados, a que me honro de pertencer, quer reafirmar, através de um aviso prévio, em uníssono com a Assembleia e o País, o claro e total apoio à política interna e externa do Governo na defesa da integridade, do território pátrio.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Graças à pluricontinentalidade da sua configuração geográfica e à multirracialidade dos seus povos, tem Portugal uma fisionomia verdadeiramente singular. Mas nem por isso deixa de ser uma nação una e indivisível, na expressão gregária do seu forte querer e na floração admirável do seu génio civilizador.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - O que. na realidade, define e individualiza uma nação não é a continuidade geográfica do seu território nem a homogeneidade rácica da sua população. O que, acima de tudo, aglutina e unifica um povo são as tradições comuns, a identidade dos seus anseios e a prossecução dos mesmos fins. já que todos estes valores constituem a sua forma de estar no Mundo e de olhar a vida.
Todos nós, portugueses, seja qual for a nossa origem ou o lugar em que nascemos e trabalhamos, sentimos bem que estamos indissoluvelmente ligados por um passado vivido em conjunção de esforços e do pensamento, por aspirações idênticas e por uma mesma concepção do homem na sua personalidade e liberdade. E isto nos dá o direito, que é também indeclinável dever, do sermos nós a decidir dos nossos destinos.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Somos uma nação cuja unidade e integridade importa defender, se quisermos ser fiéis a nós próprios e dar cumprimento às normas irrecusáveis do nosso estatuto fundamental.
Daqui decorre que todas as parcelas do nosso território, quer se situem na África ou na Europa, na Ásia ou na Oceania, integram a Nação, formando-a na sua expressão geográfica e social, e todas têm de ser acauteladas de cobiças estranhas ou de arremetidas e violências, venham donde vierem e como vierem.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador! - Mais: por essas mesmas razões, todas as suas gentes têm direito, segundo os méritos e aptidões, no progresso económico, à ascensão social e ao acesso à cultura, em posição de completa e perfeita igualdade.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Não são outros, de resto, os anelos mais fortes e puros de todos os portugueses, fisicamente pelo Mundo repartidos, mas psicológica e moralmente coesos em volta da Pátria e dos seus superiores e permanentes interesses. Não são outros, como felizmente se verifica, os objectivos essenciais da acção governativa, a qual, neste domínio tão melindroso da política nacional, todos temos o dever de apoiar e do aplaudir, revigorando-a e legitimando-a, dia a dia. com a nossa adesão convincente e o nosso labor construtivo.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - E porque todos desejamos que seja assim, não há que medir a extensão dos sacrifícios que venham a recair sobre nós. Cumpre-nos, sim e tão somente, aceitá-los, com naturalidade e dignidade, para podermos merecer da Providência continuarmos a ser portugueses na unidade moral e material do corpo da Nação tal como hoje se apresenta ao longo dos muitos mares do nosso destino histórico.
Há que insistir sempre: ás diatribes, as mentiras, as hipocrisias e os ataques vindos de além-fronteiras contra nós e a nossa política de verdade, de justiça e de paz só contribuirão para fortalecer a nossa fé, para afervorar o nosso espírito de sacrifício, para reforçar a nossa determinação na luta pela salvaguarda de direitos sagrados.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Depois, importa, salientar aqui factos recentes, de transcendente significado nesta fase decisiva da batalha que se trava pela nossa sobrevivência e pela perenidade, em todo o mundo lusíada, do espírito ecuménico, que está na base de toda a nossa gesta descobridora e evangelizadora. Referimo-nos à impressionante declaração de 12 de Agosto, em que o Sr. Presidente do Conselho definiu, com vigorosa clarividência,- os fundamentos históricos, jurídicos e morais da nossa posição, declaração essa logo seguida do frémito avassalador e patriótico que, irrompendo no Terreiro do Paço, se repercutiu por todo o espaço português, numa reconfortante afirmação de vitalidade cívica e de confiança no futuro.
Referimo-nos ainda à triunfal viagem do Sr. Presidente da República a Angola e a S. Tomé e ao apoteótico acolhimento que, por toda a parte, as populações, sem qualquer distinção de origem, de condição ou de credo, dispensaram ao supremo magistrado da Nação, vendo na sua nobilíssima figura, de tão irradiante simpatia e enternecedora bondade, a incarnação da Pátria: da Pátria, com o seu passado e o seu presente, com os seus mortos e os seus vivos, com a sua indómita vontade de sobreviver, com a majestade dos valores morais e espirituais que sempre tem servido.
Tudo isto deve ter condigna ressonância nesta Assembleia. Por isso, grato me é partilhar, com os ilustres Deputados que subscrevem, como eu, o presente aviso prévio, a honra de o enviar para a Mesa, na ideia de que tal fórmula de intervenção parlamentar bem se ajusta à índole e à grandeza dos acontecimentos e à imperiosa necessidade de extrair deles, nesta hora crucial, mas bela, da vida portuguesa, as lições que comportam, para não nos desviarmos, em nada, dos rumos da honra e do dever.
Vozes: - Muito bem!
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O Orador: - Sim, Sr. Presidente, e Srs. Deputados, as pátrias, como os homens, só terão o seu Tabor de luz e de glória se souberem enfrentar, com estóica coragem, as dores e angústias dos calvários que o destino lhes depara, para que, se realmente o quiserem, possam escolher os caminhos de salvação!
Sala das Sessões da Assembleia Nacional; 3 de Dezembro de 1963. - Os Deputados: Henrique Veiga de Macedo - José Soares da Fonseca - Joaquim de Jesus Santos - Carlos Alves - Francisco José Vasques Tenreiro - Alexandre Marques Lobato.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Artur Alves Moreira: - Sr. Presidente: ainda não secaram as lágrimas das famílias enlutadas dos infelizes pescadores do Praia da Atalaia que pereceram à saída da barra de Aveiro, nem. tão-pouco se desvaneceu a emoção que a todos envolveu ao tornar-se conhecida a triste ocorrência da tarde do último dia 24, e eis-me neste lugar a evocar a sua memória, que, por certo, perdurará como recordação bem amarga e triste no seio da grande família piscatória portuguesa por largo tempo.
De facto, não poderia ter ficado indiferente ao angustiante- desespero que envolve as 26 famílias de outros tantos pescadores que, de várias regiões piscatórias do País, constituíam a maior parte da tripulação da citada traz que, ao demandar o mar em busca do produto do trabalho que permitisse o seu sustento e dos que deles directamente dependiam, perderam a vida em circunstâncias que são do conhecimento geral, pois foram largamente noticiadas pelos jornais diários e outros órgãos informativos com maior ou menor minúcia.
Quero, pois, manifestar, como representante da região mais afectada pelas consequências da catástrofe, o pesar que a todos vai na alma por tão nefasto, quanto inesperado, acontecimento.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Lamento, pois, e estou certo que comigo todos os Srs. Deputados presentes, o sucedido, motivo pelo que proponho seja expresso o pesar bem sentido por tamanha tragédia, que, pelas suas dimensões, ultrapassa a simples vulgaridade.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - E só ao acaso se deve o não ter sido maior ainda o número de vítimas, mercê da circunstância meramente acidental de doze tripulantes não terem embarcado e de um único se ter salvo quase milagrosamente, quando a seu lado os colegas não puderam dominar a fúria brava das águas revoltas que os envolveram, sem que recursos de salvamento chegassem até eles, pois estes eram escassos e impotentes para a circunstância. Foi junto ao molhe norte do porto da barra e a poucos metros da costa que esses denodados homens do mar acabaram a sua tarefa bem árdua e dura na luta pela sua subsistência.
Sr. Presidente: a propósito desta tragédia marítima oferece-se ocasião para algumas considerações, que, embora breves, me parecem oportunas, e que são do teor seguinte:
A apreciação da maneira como ocorreu o trágico sinistro denota claramente que o mestre da tráineira Praia da Atalaia, mostrando, som dúvida, valentia, apanágio dos homens do mar, levou longe de mais a sua imprevidência ao sair barra fora, em desacordo com a avisada opinião do outros mestres de outras tantas embarcações semelhantes, algumas até porventura mais resistentes, em condições de tempo e de raiva marítima nada de acordo com a sua segurança e da tripulação que tinha sob as suas ordens. Menosprezou assim os conselhos avisados de seus colegas, tanto ou mais experimentados, que não se aventuraram prudentemente e que hoje de igual modo lastimam sinceramente a sorte dos desventurados pescadores que foram vitimados pelo terrível sinistro. Menosprezou igualmente o sinal de prudência que a Capitania do Porto de Aveiro, em tal circunstância, havia tido por bem tornar bem evidente.
Deduz-se assim que o responsável pelo comando da embarcação tinha de obedecer as condições técnicas que lhe eram impostas e teria de ter o senso bastante para se não aventurar a riscos que normalmente são grandes e que nas circunstâncias do momento maiores se tornavam.
É precisamente para esse bom senso, em que se não confunda coragem e valentia com negligência e imprevidência, que me atrevo a chamar a atenção para as entidades que supervisionam o recrutamento de tais marítimos responsáveis, seleccionando-os cuidadosamente o exigindo-lhes condições psicotécnicas e de conduta, irrepreensível, tanto na sua vida privada como em sociedade, de molde a salvaguardar, tanto quanto possível, qualquer acidente por indesculpável incúria.
Esse condicionamento deveria estar dependente de exames e testes periódicos que decidiriam da aptidão actualizada de cada um.
Entendo que essa observação tem toda a razão de ser e chamo para ela a boa aceitação do departamento adequado.
E ainda de aconselhar que não seja permitido, igualmente, que se sobrelevem interesses de ordem material dos armadores à indispensável segurança daqueles que arriscam as vidas no cumprimento de ordens que deverão ser devidamente condicionadas e ponderadas.
Outro aspecto a considerar diz respeito aos precários meios de assistência e possível salvamento de vítimas no local do sinistro em referência e na área abrangida pela Capitania do Porto de Aveiro.
Os tempos evolucionam e a actualidade reclama processos mais modernos e eficientes que os que aquela entidade dispõe para prestar urgentes socorros a náufragos, pois não pode de maneira nenhuma limitar-se a um já antiquado salva-vidas, que para se deslocar à saída da barra tem de percorrer longo trajecto, e uma vez aí encontra naturalmente as dificuldades que o mar revolto lhe oferece como naquela tarde fatídica, tornando-se impotente para participar eficazmente na salvação das vítimas.
Impõe-se naturalmente que se criem condições de maneira a permitir uma maior garantia, assegurando-se um relativo, se não absoluto, êxito.
Sugere-se assim um serviço bem organizado de helicópteros, com equipas adestradas para tal fim, prontas a intervir eficazmente em tais acções; e para isso bastaria que fosse concedida a cooperação da Força Aérea, que naturalmente não se negaria a tão honroso empreendimento. E há que anotar que, precisamente junto ao local apontado da barra de Aveiro, em S. Jacinto, existe uma base aérea, e implicitamente com condições e requisitos ímpares para tal organização.
É evidente que esta forma de salvamento tomaria uma latitude tal que seriam muitos a lucrar efectivamente com
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um meio seguro, rápido e relativamente económico, se ajuizarmos dos benefícios que proporcionaria ao garantir a assistência aos sinistrados em locais como este, de tão difícil acesso, sobretudo com condições de tempo desfavoráveis.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Apresento aqui a sugestão, ou antes, formulo o melhor dos .votos, para que se encare de frente esta necessidade, que considero imperiosa, dada a finalidade a que se destina e que se traduz na salvação de vidas humanas, tão preciosas elas são, e, neste caso especial, por delas dependerem famílias que vivem em difíceis- circunstâncias, mercê da instabilidade da sua condição.
E devo acrescentar que não é a primeira vez que sucedeu perderem-se tantas vidas de um só golpe à saída da barra em ocasião de mar revolto e indomável. Não há ainda muitos anos que também a tripulação de outra traineira se perdeu ingloriamente na teimosia da luta com a fúria das ondas no mesmo local e sem possibilidades de ser socorrida.
Oxalá sejam estes os últimos mortos que lamentamos em tais transes de aflição, ou pelo menos que não fique a dúvida na consciência dos homens por não terem feito tudo por aqueles que tanto se arriscam na missão que escolheram para angariar o pão de todos os dias.
Sr. Presidente: quero ainda ter uma palavra, esta de simpatia e de louvor, para com os dirigentes do Grémio e da Mútua dos Armadores da Pesca da Sardinha, e em especial para com S. Ex.ª o Presidente da Junta Central das Casas dos Pescadores e delegado do Governo junto destes organismos, Sr. Almirante Henrique Tenreiro, ilustre membro desta Câmara, que, uma vez conhecedores da catástrofe e da sua amplitude, procuraram por todos os meios ao alcance, e sem perda de tempo, minorar a situação das famílias enlutadas, proporcionando-lhes rápido amparo material e, ainda mais, o amparo moral, que nestes transes de aflição é tanto mais de agradecer quanto é sabido que a boa gente do mar, humilde sim, mas de bom coração, necessita, mais do que qualquer outra, de lenitivo para o seu sofrimento e infortúnio.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Também SS. Ex.ªs o Governador Civil u o Capitão do Porto de Aveiro, além de outras entidades oficiais, manifestando o seu interêsse na solução imediata dos problemas humanos que afectaram as famílias dos inditosos pescadores, são dignos do maior apreço e consideração por parte da população, que viveu intensamente, e ainda vive, as circunstâncias dramáticas de uma das maiores catástrofes marítimas do historial da barra de Aveiro.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Elísio Pimenta: - Sr. Presidente: nunca é tarde para se exaltar os grandes acontecimentos nacionais.
Nem será de mais repetir louvores, sempre que a ocasião se ofereça, àqueles que por obras duradouras puderam deixar ligados os seus nomes a padrões definidores de uma época na vida das nações ou das cidades.
A Câmara Municipal do Porto, para comemorar a inauguração da ponte da Arrábida, publicou recentemente um álbum de 50 belas gravuras de vistas antigas da cidade, precedidas de estudo do Prof. Damião Peres sobre a luta secular dos homens com o rio, que, no seu dizer, «pode considerar-se desafio lançado pela Natureza ao Homem; e os esforços para a sua transposição resposta do Homem a esse desafio».
E desde os tempos remotos em que o rio era transposto por barcos, uma primeira ponte de barcas, sobre a qual teriam passado em 1372, com a sua comitiva, o rei D. Fernando e Leonor Teles, a caminho de Leça do Bailio, e aquela outra ponte fatídica que, rompendo-se sob a multidão que fugia desvairada dos franceses de Soult, causou a morte a tantos portuenses, à ponte pênsil e às de D. Luís I e de D. Maria Pia, chegamos à ponte da Arrábida, que não é apenas um meio de transpor o Douro perfeitamente adaptado às necessidades económicas e urbanísticas da nossa época, mas motivo de orgulho pura os homens que, vivendo apaixonadamente o progresso e valorização estética da sua cidade e da sua região, não deixam de ligar essa bula obra, àqueles que u conceberam e àqueles que criaram ao País as condições para o seu levantamento.
Coisa curiosa, talvez por influência dessa luta do Homem com a Natureza, para a transposição do rio, a que se refere Damião Peres, nenhum monumento está mais no coração e no orgulho dos portuenses do que as suas pontes.
Podem ignorar o nome de Nazzoni, construtor da Torre dos Clérigos, esse monumento que continua .a ser o ex-líbris da cidade, mas a ninguém é desconhecido o nome de Eiffel, ligado à Ponte de D. Maria Pia.
stou certo de que, assim, pelos tempos fora, perdurarão na memória dos homens os nomes daqueles a quem se deve a ponte da Arrábida, não apenas do engenheiro que a traçou e construiu, mas do Ministro que a concebeu e à custa de uma vontade decidida e de sacrifícios, que algumas vezes me foi dado aperceber, soube manter a confiança necessária para que a grande obra chegasse ao fim, ao seu glorioso termo, perante a surpresa dos descrentes e dos cépticos.
Posto isto, Sr. Presidente, e com a certeza de que a vontade, quando impulsionada pela visão política dos empreendimentos, que muitas vezes falta aos técnicos, mas deve existir necessariamente como virtude nos estadistas, existe em alto grau no caso presente, quero dizer que o Porto nunca teve motivos para duvidar do interesse do Sr. Ministro das Obras Públicas pelos seus problemas, antes pelo contrário, e tanto assim é que muito justamente e com aplauso geral o adoptou como filho, mesmo quando se torna preciso vencer obstáculos não propriamente do seu Ministério ou dos seus serviços.
Por isso mesmo é que me quero referir, já que vem a propósito, a um problema cuja demorada solução não se harmoniza, antes destoa, da que tem sido dada a outros problemas fundamentais da cidade.
Surpreende, na verdade, como se conseguiu terminar rapidamente a construção do edifício dos Paços do Concelho, se entrou francamente no caminho acidentado da solução do problema vergonhoso das «ilhas», se ergueu o Palácio da Justiça e, desafiando a própria técnica generalizada, se lançou sobre o Douro a nova ponte.
Surpreende, por motivos inteiramente opostos, que continue em andamento lento, embora um tanto acelerado a partir de 1961, a construção do Palácio dos Correios, no alto da Avenida dos Aliados, ao lado do Município.
Não sei se o Porto necessita de um Palácio dos Correios. Estou certo que sim. o aumento extraordinário do tráfego e a dispersão dos serviços locais dos CTT recomenda-o, certamente, mas, quanto mais não houvesse, encontraríamos justificação suficiente para o empreendi-
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mento na. necessidade de valorização estética e urbanística da primeira praça da cidade, muito embora não tivesse havido a mesma preocupação em relação ao lado oposto da mesma praça.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Mas longos anos, que creio da ordem das dezenas, no alto da Avenida dos Aliados, face ao edifício majestoso dos Paços do Concelho, e como única mancha negra num conjunto de que a cidade se orgulha, se estendeu extenso matagal que o muro de cercadura mal encobria das vistas de quem passava, com protesto de quantos amam a sua terra e prezam o prestigio do Estado, agravado ainda pela tabuleta anunciadora de Casa dos CTT.
Felizmente que desde 1861 a obra começou a mostrar-se. Apontam já neste ano de 1963, por cima dos muros, as hastes férreas das fundações, a anunciar trabalho. Naquele ano de 1961 foi adjudicada a 2.ª fase, fundações interiores, e, segundo informações que em 14 de Janeiro do ano em curso S. Ex.ª o Ministro das Obras Públicas teve a amabilidade de me enviar por escrito, e que muito me obsequiaram, em 10 do mesmo mês foi aberto concurso para a 3.ª fase, que compreende as estruturas resistentes de cimento armado, obra essa orçamentada em perto de 13 000 contos. Segundo a mesma informação, o termo do prazo da empreitada das estruturas é, conforme o compromisso contratual, 15 de Abril de 1964, Os serviços responsáveis prevêem a conclusão definitiva do empreendimento para 1965.
Pois bem, não quero terminar estas breves palavras de louvor e de esperança - sem, todavia, considerar o optimismo da previsão -, esquecendo de dizer do júbilo que motivaria o termo de uma longa espera, ao ver-se finda uma obra de urbanização quo, com os seus defeitos e as suas inúmeras virtudes, abriu largo e desafogado espaço no centro da velha urbe portuense, que hoje, graças à ponte da Arrábida e à sua notável rede de acessos, se expande livre e confiadamente em busca de um progresso que foi sempre o ideal e a característica dominante dos seus laboriosos habitantes.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Calheiros Lopes: - Sr. Presidente: pedi a palavra para, em breve referência, deixar aqui registados o grande regozijo e sincero agradecimento da população do distrito de Santarém que, juntamente com os meus ilustres colegas do mesmo distrito, tenho a honra de representar nesta Assembleia, pela visita de trabalho que ali realizou há pouco o Sr. Ministro das Obras Públicas.
Caracteriza-se a acção governativa do Sr. Engenheiro Arantes e Oliveira pela incansável preocupação de se inteirar pessoalmente e orientar, activar e vigiar superiormente os trabalhos em curso dependentes do seu Ministério.
Vozes: -Muito bem!
O Orador: - Dentro deste espírito deslocou-se mais uma vez o Sr. Ministro das Obras Públicas ao distrito de Santarém para verificar no local algumas obras projectadas e outras, em curso que a região fica devendo à empreendedora e vasta acção do seu Ministério, servido por um brilhante corpo de técnicos, que tão eficientemente sabem corresponder à iniciativa e dinamismo do Ministro.
Passou S. Ex.ª algumas horas na cidade de Santarém, onde, em reunião de trabalho com os técnicos e diversas entidades locais, deu directrizes e marcou as soluções para vários problemas que se revestem da máxima importância para a cidade e para a região, tais como a consolidação das muralhas das Portas do Sol, a construção do quartel dos bombeiros e outras obras. Há ainda a reparação de diversas estradas, de que citarei, como das mais necessárias, a de acesso a Beguengo de Alviela -que se encontra intransitável, resumindo-se a obra ao calcetamento de 900 m-, a de Abra e outras não menos solicitadas pelos povos, para as quais se torna necessário a comparticipação do Estado, visto a Câmara de Santarém, de receita relativamente pequena, não ter meios suficientes para fazer face à conservação da sua vasta rede de estradas.
Foi nessa sessão de trabalhos posto em relevo o alto benefício que representou para o trânsito a utilíssima obra de alargamento da ponte de Santarém - aliás, a juntar, na valorização rodoviária do distrito, à não menos útil obra da ponte da Vala Nova, assim como II do Porto Alto.
Permitir-me-ei, entretanto, Sr. Presidente, ao recordar os problemas tratados pelo Sr. Ministro das Obras Públicas em Santarém, destacar o da Escola Industrial, que carece urgentemente de um edifício novo, próprio e dotado das condições pedagógicas exigidas pelas necessidades modernas do ensino a que a importância populacional e valor económico-social da cidade e distrito de Santarém inegavelmente justificam.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Efectivamente, entre o muito que há a fazer para a valorização da capital do Ribatejo, penso que deve considerar-se como um dos pontos fundamentais a melhoria e expansão do ensino técnico, tanto agrícola, já hoje funcionando em condições satisfatórias, como o comercial e, sobretudo, o industrial.
O progresso económico e social da região ribatejana tem de assentar, simultaneamente, na melhoria das condições económicas do sector agrícola, pelo aumento sensível da produtividade e pelo estabelecimento de preços justos e remuneradores para os produtos agrícolas, e, como digo, simultaneamente, na aceleração do ritmo, até agora demasiado lento, da sua estruturação industrial.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Lembremo-nos, todavia, de que não pode obter-se verdadeira expansão industrial, nem pela modernização e aumento das unidades existentes, nem pela criação de novas unidades, sem cuidarmos da preparação activa e séria do indispensável pessoal técnico.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Sem gente nova, bem preparada tecnicamente, não conseguiremos desenvolver, actualizar, ampliar, o sector industrial, nem melhorar, por reflexo, a posição do sector agrícola. É hoje universalmente reconhecido que um dos grandes factores do crescimento económico é o factor mão-de-obra especializada, quadros, dirigentes, isto é. instrução e formação profissional. Não pode haver verdadeira e eficiente formação profissional sem uma ampla facilitação. para as camadas juvenis da nossa província, de cursos e escolas técnicas elementares e médias bem localizadas, satisfatoriamente apetrechadas e servidas por pessoal docente que possa dedicar-se exclusivamente à sua tão melindrosa e útil função.
Vozes: - Muito bem!
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O Orador: - Ora, Sr. Presidente, se verificarmos é que se passa com a Escola Industrial e Comercial de Santarém, reconheceremos como se encontra abaixo do mínimo de condições exigidas pelas necessidades do ensino que lhe cabe ministrar e á que a cidade, capital do distrito, tem incontestável direito. Teve essa Escola início no ano lectivo de 1956-1957, instalada precária e provisoriamente nos antigos Paços do Concelho. A população escolar era então de 145 alunos, mas subiu logo no ano seguinte para 280 e de então para cá foi aumentando gradualmente, a ponto de atingir no último ano lectivo o número considerável de mais de 1200 alunos. As várias turmas dos diversos cursos e anos têm aulas superlotadas, funcionando sim em locais distantes, mal instaladas, ressentindo-se, evidentemente, de tais deficiências funcionais todos os aspectos do ensino.
De tudo isto se conclui quão urgente é a construção de um edifício próprio para a instalação da escola técnica de Santarém.
Dentro das justas aspirações da cidade e, aliás, de todo o distrito, considero esta obra como um dos factores mais importantes do seu progresso futuro.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Como atrás disse, penso que sem ensino técnico eficiente e sério, aberto às camadas trabalhadoras, não conseguiremos a verdadeira industrialização do País 1 e ainda um apreciável desenvolvimento do sector agrícola, isto é, o incremento de toda a economia nacional.
Vozes: -Muito bem, muito bem!
O Orador: - No que respeita a Santarém, é evidente que a população da cidade sente a urgência e a importância deste problema. Por isso, viu, com satisfação e confiança, que ele constituiu um dos motivos dos trabalhos e estudos realizados na visita do Sr. Ministro das Obras Públicas.
Como Deputado pelo distrito e presidente da Comissão Distrital da União Nacional, tive a honra de acompanhar o ilustre visitante e de verificar o interesse que dedica à projectada escola técnica de Santarém.
Por tal motivo, quero registar o reconhecimento e confiança com que todos nós, os ribatejanos, ficamos aguardando mais essa valiosa prova da incansável acção do Sr. Ministro das Obras Públicas, a quem a nossa província, como, aliás, todo o País, tanto devem já em melhoramentos de toda a ordem.
Tenho dito.
Vozes: -Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Olívio de Carvalho: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: a cidade da Figueira da Foz tem manifestado, nestes últimos dias, o seu justificado entusiasmo por saber que vai finalmente tornar-se realidade uma das suas mais instantes aspirações no domínio da cultura: a instalação condigna, em edifício próprio, da sua biblioteca e do seu museu municipais.
Vivendo principalmente do seu porto, de algumas indústrias limitadas, como a exploração da pesca, as marinhas de- sal, os cimentos, a indústria vidreira, a construção naval e outras de menor vulto, só durante os escassos meses da época balnear a sua praia, ruas. praças e jardins se animam e alegram com a presença dos veraneantes que ali vão repousar das suas fadigas, retemperar forças ou renovar energias.
A sua fisionomia citadina, quase paralisada na maior parte do ano, renasce e revigora-se com a aproximação da estação calmosa, durante a qual se transfigura em força estuante, na plenitude dos seus recursos e possibilidades de terra tradicionalmente agradável, atraente e aprazível.
Mas, se a Figueira se apresenta, para quantos a procuram no Verão e a preferem e desejam para repouso e descanso, como a praia mais apetecida, de maiores atractivos e de frequência mais cosmopolita de entre as praias do Centro e Norte do País, as suas tradições culturais exigem que ela corresponda efectivamente ao conceito que dela fazem nacionais e estrangeiros.
A rainha das praias de Portugal, na preocupação de se alindar, de se tornar mais desejada, de seduzir pelo encanto das suas belezas naturais, de prender pelo cativante acolhimento que proporciona a todos aqueles que a visitam, não esquece o seu passado, nem se alheia das responsabilidades que lhe cabem para manter, conservar e valorizar o património artístico que homens da estirpe de Santos Rocha recolheram com devotado amor e carinho, com sacrifício e abnegação, entregando-se uma vida inteira à tarefa árdua e tantas vezes incompreendida de salvar da voragem do tempo e dos desmandos dos homens as riquezas sem par que se foram acumulando no precioso museu arqueológico, considerado de entre os melhores do País pela raridade e valor histórico, documental e artístico das espécies conservadas.
Instalados em edifícios impróprios e em condições precárias, para cabal desempenho da missão que lhes compete, o Museu Arqueológico Dr. Santos Rocha e a Biblioteca Municipal, muito rica em quantidade e qualidade das obras nela depositadas, há muito que aguardavam melhores, dias, nu esperança de instalações mais apropriadas.
Ao apelo persistente das forças vivas da cidade e às instâncias do devotado director do Museu e Biblioteca, Prof. Vítor Guerra, que têm fundamentado, com perfeita objectividade e sem preconceitos bairristas, a urgente necessidade de serem transferidas para edifício condigno aquelas duas instituições culturais, respondeu agora, num gesto magnânimo e de larga compreensão, a Fundação Calouste Gulbenkian, com a proposta generosa do estudo imediato da localização e construção dos edifícios próprios onde vão ser instalados museu e biblioteca.
Não é de estranhar, por isso, que a imprensa local, fazendo-se eco do entusiasmo em que vive a cidade e o seu concelho, tenha posto a correr a notícia dos propósitos da benemérita instituição.
Exaltar e louvar a Fundação, que tão prontamente e dentro do âmbito dos seus estatutos e planos de actividade vai possibilitar um tal empreendimento, seja embora de interesse regional o valor da obra a construir, é não só um acto de gratidão colectiva, mas também o manifesto reconhecimento das responsabilidades que cabem às entidades incumbidas de darem expressão, e corpo aos nobres propósitos das missões que elevam e engrandecem os valores culturais dos povos que ciosamente velam pela sua manutenção, conservação e divulgação.
Um museu é um instrumento de cultura, onde tudo deverá ser apresentado em condições de poder dar à obra de arte o máximo do seu valor espiritual.
Para sobreviver e progredir, deverá fazer parte integrante e activa de uma política acentuadamente turística e aliar o gosto da educação estética do público ao surto permanente de novas fontes de interesse.
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Um museu pertence à Nação: destina-se a servi-la e existe para lhe dar uma imagem da vida mais optimista e mais nobre, presta-se a ajudar o homem a compreender-se melhor e a compreender o seu semelhante, a conhecer os valores permanentes que constituem o substrato do meio em que se educou e formou espiritualmente. Um museu, ao mesmo tempo que instrumento de ciência, é fundamentalmente um meio de integração do homem na sociedade de que faz parte, um complemento da sua educação moral e intelectual, um meio de ligação entre o passado e o presente, uma forma de continuidade entre o que foi e o que é, entre o (que é e o que há-de vir a ser. E dentro desta concepção que deve entender-se a definição do museu moderno dada pelo crítico francês Bivière:
Um museu é um estabelecimento permanente, constituído no interesse geral para conservar, administrar, permitir a consulta, difundir e essencialmente expor um conjunto limitado ou crescente de. elementos de valor cultural.
O Museu Arqueológico Dr. Santos Rocha e a Biblioteca Municipal pretendem desempenhar exactamente essas funções, mas a riqueza e volume das suas espécies e colecções, que enchem as salas impróprias onde foram depositadas, obriga-os a viver como que atrofiados, impedindo uma acção mais vasta e de mais útil expansão e valorização cultural.
Ao sentir o calor da vibração emocional que nesta altura anima a maior parte da gente culta da Figueira ou a ela ligada por motivos sentimentais, julgando interpretar, também como figueirense, o impulso de gratidão que uns e outros querem exteriorizar tão sentidamente, seja-me permitido deixar aqui uma palavra de vivo aplauso ao emérito presidente do conselho de administração da Fundação Calouste Gulbenkian, Sr. Dr. José de Azeredo Perdigão, que, com uma proficiência de indiscutível acerto, tem sabido respeitar, com escrupuloso critério, a vontade expressa, em testamento, pelo venerando filantropo que, em boa hora, escolheu o insigne jurista para tarefa tão grandiosa e de tão elevada projecção na vida artística, científica, cultural e educativa do nosso país. Tendo-se devotado com o maior carinho e desvelo ao trabalho penoso de dar forma jurídica ao pensamento e vontade de Galouste Gulbenkian, que considerou «a mais nobre causa da sua vida profissional», o Sr. Dr. Azeredo Perdigão é bem digno da nossa admiração, do nosso respeito e reconhecimento. Por isso, aqui lhe rendemos as nossas homenagens.
Na a cláusula 10.ª do seu testamento publico, exarado em 18 tle Junho de lüSí), deixou Caloustr Gulbenkian assim expressa a sua vontade:
Pelo presente testamento é criada, nos termos da lei portuguesa, uma fundação que deverá denominar-se «Fundação Calouste Gulbenkian»: os seus fins são caritativos, artísticos, educativos e científicos.
Não cabe neste momento e nesta circunstância traçar o perfil moral e intelectual da personalidade vigorosa que foi Calouste Gulbenkian, nem para tal empresa nos julgamos competentes e aptos, mas são conhecidas as palavras que. a seu respeito, escreveu, na sessão comemorativa do 1.º aniversário da morte do benemérito instituidor, o presidente da Fundação, Sr. Dr. Azeredo Perdigão, que o definiu em termos precisos e inequívocos, com o profundo conhecimento pessoal de uma intimidade e convivência de treze anos consecutivos.
Parece-nos, no entanto, oportuno reproduzir a parte do Decreto-Lei n.º 40 690, de 18 de Julho de 1956, que aprovou a Fundação, naquilo que se refere à pessoa de Calouste Gulbenkian:
Estamos em frente de um belo exemplo de compreensão da função social da riqueza, a opor ao egoísmo que parece assenhorear-se do Afundo e que tende a sacrificar a noção superior de que a fortuna tem deveres na ordem moral, que não pode esquecer nem declinar. Ninguém mais claramente o terá compreendido do que esse grande criador de riqueza que foi Calouste Sarkis Gulbenkian. O que a sua inteligência, a sua energia e o seu trabalho acumularam durante muitos anos reverte, afinal, para a colectividade em benesses materiais e espirituais.
O instituidor escolheu Portugal para instalar a sede da Fundação e quis que ela se constituísse de harmonia com as nossas leis, o que, antes de mais nada, vale como prova de afecto e de preferência pelo País a que se acolheu em momento delicado da situação internacional, onde passou os últimos anos da sua operosa vida e onde fixou o seu domicílio. Por essa distinção lhe ficam gratos todos os portugueses.
Mas não poderiam apenas os motivos sentimentais determinar uma escolha em matéria tão importante e, necessariamente, outras razões, mais ponderadas e reflectidas, pesaram no ânimo do testador. Bem sabia ele o valor da paz portuguesa e a garantia que ela representava para a obra que iria- prolongar o seu pensamento. Sobejamente apreciava a tranquilidade que entre nós se desfruta e estimava o que há de estável nas instituições e no equilíbrio social, que são o espelho da nossa- personalidade, assim como conhecia o grau de respeito que em Portugal se professa, em casos destes, pela vontade dos instituidores. Por tudo isto, a resolução que tomou foi também um acto de fé e de confiança.
Estas palavras são naturalmente o reconhecimento oficial das razões que levaram Calouste Gulbenkian a preferir o nosso país coimo o mais digno para merecer a honra de tão generosa instituição. Elas exprimem, ao mesmo tempo, o conceito do Governo sobre a personalidade moral do instituidor e traduzem, em termos claros, a dívida de gratidão que ficou a pesar sobre todos os portugueses.
Não foram certamente apenas razões sentimentais que determinaram a resolução do grande filantropo.
A sua atitude definiu-se, sobretudo, por um «acto de fé e de confiança», não sómente pela seriedade e espírito de isenção que reconheceu no povo português, mas também pela certeza de que o País assentava a sua estrutura política, social e económica em bases sólidas, em princípios doutrinários imutáveis que quadravam à mentalidade do homem prático, conhecedor dos povos e das nações, das suas lutas e ódios, que comprometem os valores mais sagrados, num desafio insensato às tradições, à história e às riquezas morais e espirituais que fizeram nascer as nações civilizadas.
O estudo psicológico que terá feito do carácter da Nação Portuguesa, que, através da sua longa história, permaneceu sempre igual à si mesma, vivendo e lutando por nobres ideais, deve ter pesado profundamente no seu espírito lúcido e esclarecido.
«Pessoa dotada de rara sensibilidade, Calouste Gulbenkian não foi um vulgar conquistador de fortuna para satisfação da sua vaidade ou das suas necessidades e caprichos individuais», diz-nos o Sr. Dr. Azeredo Perdigão, que acrescenta: «Para Calouste Gulbenkian a legitimidadeda riqueza assentava, exclusivamente, por um lado, no esforço e no sacrifício que representa conquistá-la e. por outro, no bom uso que é possuidor dela faz em vida ou
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do destino que lhe dá por morte: Estes dois conceitos
- obrigação moral e social de trabalhar e obrigação de bem aplicar o produto disponível do trabalho -, que na sua formação espiritual e intelectual tinham o valor de verdadeiros postulados, explicam, da primeira à última página, as disposições do seu testamento».
Por isso mesmo, nenhum português digno desse nome poderá ficar indiferente e deixar de se sentir lisonjeado com a escolha de Calouste Gulbenkian instituindo uma Fundação no nosso país, para seu benefício e determinando que a sua regulamentação obedecesse às leis portuguesas.
Como também assinalou o dedicado presidente da, Fundação., «constitui justo motivo de orgulho nacional verificar que um homem com a experiência, a cultura e a natural- prevenção- de Calouste Gulbenkian - de formação essencialmente cosmopolita - tenha, depois de treze anos de residência em Portugal, seleccionado o nosso país para nele fundar uma das mais extraordinárias instituições de fim ideal que fica existindo no Mundo».
O Sr. Brilhante de Paiva: - Muito bem!
O Orador: - Têm realmente todos os portugueses uma grande dívida de gratidão para com o homem que, podendo dispor livremente da sua enorme fortuna, a entregou quase exclusivamente ao nosso país, para nele se estabelecer a Fundação, que, nos seus escassos sete anos de existência, distribuiu em subsídios (de Julho de 1056 até ao fim de 1962) o valor total de 965 589 contos, assim discriminados: 572 586 contos despendidos até ao fim de 1960; 199725 contos gastos em 1961, e 193228 contos em 1962.
A percentagem de distribuições autorizadas para os fins específicos da Fundação no último ano foi de 67,6 sobre as receitas totais no valor de 286066 contos. Em relação a Portugal, foram distribuídos naquele ano 92 225 contos pelos quatro grandes grupos de subsídios: fins lucrativos, 12 833 contos.; fins artísticos, 14 952 contos; fins educativos, 36725 contos, e fins científicos, 27 715 contos Os subsídios destinados a fins caritativos têm beneficiado albergues, asilos, casas de caridade, casas de trabalho, centros de assistência, .colónias de férias, institutos, lares, patronatos, ligas e recolhimentos.
Os subsídios destinados a fins artísticos têm sido aplicados em exposições de artes plásticas e outras, festivais, comemorações de centenários, alargamento de museus, exibições artísticas, publicações ligadas u arte, concursos internacionais, etc.
Os subsídios para fins educativos e científicos atingiram quase todos os sectores das actividades escolares, institutos e centros de investigação, laboratórios, bibliotecas itnerantes, etc., com vista ao fomento da investigação científica ou aquisição de livros ou aparelhagem laboratorial ou técnica.
O nome de Calouste Gulbenkian, se não estamos em erro, figura apenas, no nosso país, ligado à Fundação que instituiu.
Pareceu-nos da maior justiça divulgar o seu nome por todas as terras de Portugal, particularmente em ruas, avenidas, praças, largos e jardins, ...
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - ... o que daria mais- um testemunho do sentimento- de gratidão que o País tem peto homem generoso que tão grandemente contribuiu para a elevação do nível científico, artístico e educativo da Nação Portuguesa.
Vozes: -Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Vai passar-se à
Ordem do dia
O Sr. Presidente: - Está em discussão o projecto de lei do Sr. Deputado Amaral Neto sobre o reembolso, pelos subsequentes usuários, dos custos de linhas ou instalações novas que os consumidores de energia eléctrica hajam pago às entidades distribuidoras.
Tem a palavra o Sr. Deputado Amaral Neto.
O Sr. Amaral Neto: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: pela primeira vez em catorze anos de um mandato que nunca solicitei e que tenho procurado exercer até ao limite das minhas forças, e, portanto, em bem fraca medida, ...
Vozes: - Não apoiado!
O Sr. Amaral Neto: - ... mandato que tenho procurado exercer no sentido da colaboração com o Governo, para o advertir de falhas ou procurar soluções no sentido dos interesses das populações rurais a que a minha vida está particularmente unida; pela primeira vez venho exercer um direito que nos é dado, aos Deputados, direito que talvez seja o mais alto, mas que é também o mais difícil. Porque este intento de fixar as obrigações e determinar direitos, por mais simples que seja p intento, por mais modesto que seja o objecto, é muito difícil de conseguir, tantas são as implicações que a variedade dos casos reais acarreta.
Tenho, portanto, de pedir a VV. Ex.ªs toda a benevolência, para o meu propósito, afirmando-vos que nunca a atenção com que sempre me têm favorecido me foi tão necessária como hoje e agradecendo-a de antemão de todo o íntimo, do meu ser..
Sr. Presidente: trouxe perante V. Ex.ª um projecto de lei extremamente simples, que visa conseguir que os consumidores de energia eléctrica que hajam suportado os encargos de estabelecimento de linhas ou ramais para seu abastecimento sejam reembolsados, pelos subsequentes usuários, dos custos dessas linhas ou ramais.
Qual é o quadro em que este .problema se integra? Qual é o fim da solução que procurei dar? É muito simples, repetirei uma e muitas vezes.
Hoje em dia as redes de distribuição de energia eléctrica são estabelecidas de acordo com planos oficialmente aprovados ou com contratos previamente elaborados. O projecto ou o contrato determina o âmbito da instalação que há-de ser feita pelo concessionário. Põe-se a seguir, com o correr do tempo, o problema das evoluções dos consumos e da localização de novos consumidores afastados das redes, reclamando potências superiores às capacidades- destas nos pontos de consumo ou linhas novas para ligar estes às redes construídas. E até agora tem sido norma seguida, e não há razão para que deixe de continuar a sê-lo, que o consumidor que- requer para sua satisfação o reforço ou a ampliação das linhas ou das instalações pague do seu bolso, a expensas suas, os respectivos custos.
Apenas cadernos de encargos recentes tom ressalvado, para os aglomerados urbanos, a hipótese do crescimento
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das povoações. E, à, medida que se vão estendendo canalizações da distribuição de água ou as redes dos esgotos a novas ruas, igualmente os concessionários das instalações eléctricas têm de estender as suas próprias linhas de distribuição da energia, acompanhando o desenvolvimento da urbanização.
Mas, tirando este caso particular, o normal é que todos os consumidores tenham de pagar do seu bolso os acréscimos das instalações, das quais requererem abastecimento. Já uma vez paga a nova linha ou instalação, ela entra- imediatamente no conjunto da rede distribuidora e passa a ser utilizada por qualquer que a ela queira ter acesso, e a consequência é que, se há aqui ou acolá um indivíduo que queira dispor de energia eléctrica, terá de pagar ele, do seu bolso, as ampliações, havendo depois uma série de pessoas que podem utilizar essas instalações sem pagarem nada do seu custo.
É uma situação que tem revelado duas ordens de inconvenientes: em primeiro lugar, acontece com frequência que o conhecimento de um consumidor potencial, e potencialmente disposto a suportar o encargo da ampliação da rede, serve de prevenção para os demais que desejam ser intercalados desde o princípio até ao fim dessa ampliação e fá-los ficar de reserva, aguardando que o primeiro pague a instalação para depois se aproveitarem do que ele pagou. Mas se esta primeiro sabe da reserva dos demais, é frequente que, numa posição de defesa, contra o que legitimamente considera abuso das suas intenções, ele espere, aguarde, paru não ficar na situação de só ele ter pago do SHU bolso uma vantagem comum. E, assim, é frequente demorar, esperar e não fazer a instalação enquanto não vença, os demais interessados, enquanto os não canse, para que, que também querem tirar proveito da nova instalação, não deixem de contribuir para o seu custo.
O resultado prático é que, devido a isto, há um prejuízo para o desenvolvimento da electrificação, sobretudo para o desenvolvimento da electrificação rural e para o bem estar das pequenas populações que desejam ser electrificadas, prestando-se esta situação a que sejam empregados por certos processos arteiros que só redundam em prejuízo, pela, demora dos benefícios que essas populações poderiam colher da electrificação.
É frequentíssimo verem-se por aí resistências e terras e povos ou bairros ou pequenas zonas bem determinadas, com núcleos interessantes de consumidores, ficarem indefinidamente a aguardar que cessem as resistências, que amoleçam as durezas, que se atenuem os egoísmos, ou daqueles que não querem ser gratuitamente sobrecarregados, ou daqueles outros que quereriam gratuitamente aproveitar e da sobrecarga dos primeiros. É uma situação de retardamento da electrificação.
Outro aspecto das consequências do regime é uma ofensa u justiça comutativa. É evidentemente injusto que alguns sejam chamados a participar dos encargos de estabelecimento das instalações de que vão beneficiar outros que as utilizam sem terem de participar nesses encargos. A situação é velha e há muito tempo que determina reparo? e críticas.
Eu poderia citar a VV. Ex.ªs e, aliás, vem citado no parecer da Câmara Corporativa - uma das conclusões da comissão de estudo do fomento da electrificação rural, que há cerca de seis anos funcionou junto do Ministério da Economia, e da qual tive a honra de fazer parte como representante dos municípios rurais, assim como pelas empresas distribuidoras fez também parte dela o relator do parecer da. Câmara Corporativa, meu colega de escola o velho amigo.
Assentámos, nessa comissão, entre .outros pontos, pela necessidade de «regular a situação dos consumidores que pagam um ramal à sua custa e ao qual se vêm depois ligar outros consumidores sem qualquer obrigação legal de comparticiparem na despesa de estabelecimento já feita», acrescentando que «este problema, embora de carácter geral, tem nas electrificações rural e agrícola uma especial importância», e destacamos este ponto na série das nossas conclusões finais. Alguns cadernos de encargos recentes, outorgados nos últimos dois ou três anos, já tomaram em consideração estes inconvenientes e começou a ser determinado nesses grupos de cláusulas que os novos usuários participem nos encargos das linhas em instalações para que outros particulares tenham concorrido.
No entanto faltam disposições de ordem geral. Há manifestação de intenções, há realizações recentes, mas o comum dos consumidores continua sujeito ao desembolso dos custos de instalações de que outros irão beneficiar. No caso das linhas de alta tensão, já começou a ser contemplado por via legislativa justamente aquele aspecto de justiça comutativa, que torna desejável que todos concorram na medida do seu interesse para as despesas suportadas por algum.
E assim já está entendido no Decreto-Lei n.º 43 335, que regula há três anos a produção, o transporte e a grande distribuição de energia eléctrica, que, nos .casos de consumidores desejarem linhas novas, deverão indemnizar os concessionários dos encargos do seu estabelecimento segundo uma de duas modalidades, e a segunda destas comporta o pagamento de um subsídio em função do desenvolvimento linear do traçado, acrescido de uma garantia de consumo e de encargo de potência.
Isto é, o consumidor nessas circunstâncias, além. de subsidiar com uma quantia relativamente modesta a empresa concessionária que lhe monta a sua linha de alta tensão, garantirá também uma Certa potência e ainda um consumo de uma certa soma de unidades por ano.
Mas a lei já prevê e consigna que, se novos consumidores vierem a utilizar essa linha, a garantia anual de consumo, assina como a garantia de potência, seria reduzida para o primeiro na proporção em que os seguintes puderem substituir-se-lhe ou participar. B mais um reconhecimento do princípio geral que informa o meu projecto.
E agora concluo a narração do caso, clrego ao termo dela, reconhecendo mais uma vez quanto fui atrevido em propor a VV. Ex.ª um projecto de lei em que quase não encontro substância sequer para o descrever e justificar. E tão simples, tão modesto, o escopo está à vista, expõe-se tão rapidamente, que. por mais que eu queira honrar o lugar donde falo e prestar homenagem a VV. Ex.ª, procurando apresentar o problema e a intenção em termos dignos deste sítio e deste auditório, não consigo, decerto por falta de capacidade inventiva, ...
Vozes: - Não apoiado!
O Orador: - ... dar-lhe o desenvolvimento que permita alargar-me nesta matéria extremamente simples e que, na sua própria simplicidade e nudez, reconheço poder ser ligeiramente maçadora para quem a escuta.
Julgo ter feito aquilo de que sou capaz, aquilo que sei, para apresentar a VV. Ex.ª a raiz e a intenção do meu projecto. Nele ainda não encontrei qualquer reparo de divergência, e. como já disse, aliás, ele insere-se na linha de um desenvolvimento de ideias que já vêm, a pouco e pouco, em comissões, em disposições contratuais e até, ultimamente, em preceitos de lei a tomar corpo o a. tender para a realização.
A Câmara Corporativa debruçou-se sobre este projecto de lei. aprovou-o na generalidade e, mais do que isso,
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deu-lhe imediatamente uma força ampliada além do que estava no meu propósito. Na verdade, se VV. Ex.ª se dessem ao incómodo de ler a redacção original, verificariam que a faculdade de indemnização pelos usuários subsequentes era concedida como um direito que os primeiros financiadores das instalações poderiam reclamar em seu proveito. Mas a Câmara Corporativa, ao propor em alternativa ao projecto de lei uma nova redacção, taxativamente escreveu que os usuários subsequentes ao primeiro deverão indemnizá-lo.
Aquilo que eu considerava uma providência cautelar, a proibir nos casos visíveis e nítidos os abusos, mas deixando-lhe, abertas as generosidades que tão facilmente se desenvolvem nos pequenos meios devido ao espírito de vizinhança e boa contiguidade, essas generosidades entendeu a Câmara Corporativa que deveria restringi-las e tornar obrigatória em todos os casos, na sua proposta de contra projecto, a indemnização dos segundos aos primeiros usuários.
Não seria eu que quereria, neste caso, desistir da vantagem de uma ampliação da força da disposição que havia proposto, e portanto defenderei mais adiante que a faculdade que eu havia previsto se transforme efectivamente em obrigação.
Tendo apoiado na generalidade o alcance do projecto, a Câmara Corporativa apresentou como sugestão um novo articulado, certamente mais extenso, mas que em nada diminui nem altera a intenção que propus a VV. Ex.ª; apenas a enriquece com toda uma série de disposições de carácter regulamentar que aperfeiçoa e simplifica a aplicação do articulado que eu propusera.
Talvez valha a pena dar aqui uma rápida noção do alcance das novas sugestões da Câmara Corporativa.
Debruça-se a Câmara Corporativa, em primeiro lugar, sobre a questão do prazo durante o qual será válido o princípio da indemnização. É fácil de ver que o direito à indemnização não deve prolongar-se indefinidamente pelo tempo fora, e, entre outras razões, porque ao fim de certo período à despesa inicial do estabelecimento de uma linha suportada pelo particular vêm sobrepor-se encargos de renovação que já são encargos da empresa e suportados pela distribuição geral.
Por outro lado, não haverá vantagem, na maioria dos casos, em que o prazo de indemnização seja muito curto. O propósito do projecto é, precisamente, prevenir a resistência provinda do egoísmo ou má compreensão, que podem manter-se por algum tempo, mas decerto não indefinidamente.
Propus um prazo de dez anos e a Câmara Corporativa contrapropôs um prazo de oito anos. VV. Ex.ªs sabem que raras serão as circunstâncias em que o prazo de tempo para a execução de qualquer contrato ou utilização de qualquer direito possa ser definido indiscutivelmente em número de anos ou noutra unidade. Em geral, a tendência, quando há que fixar um prazo, é aderir a números habituais, ou que representam qualquer ligação com a base da nossa aritmética, ou com costumes anteriores, ou com durações perfeitamente, definidas e reconhecidas dos elementos intervenientes na operação para que se determina prazo.
Não é este último, evidentemente, õ caso aplicado aos ramais de linhas eléctricas. O direito de indemnização tanto poderá ser garantido por cinco, por oito, por dez anos, como por mais, como por menos. E absolutamente impossível defender em bases estritamente racionais a prevalência do prazo de oito anos sobre o de dez. Já em relação ao prazo de cinco anos se pode dizer que é excessivamente curto.
Fixemo-nos, portanto, na dúvida entre o prazo de oito e dez anos. Confesso que não tenho argumentos convincentes para uma opção para preferir os dez ou os oito anos. A Câmara Corporativa, para reduzir o prazo de dez para oito anos. também não encontrou outro exemplo que. não fosse a legislação alheia, a prática de outro país.
Por tudo isto, parece-me que poderemos continuar a aderir ao prazo de dez anos, que é razoável. Tem pelo menos, o mérito de se ligar à base do nosso sistema de contagem, como ao critério adoptado naquela disposição do decreto-lei que há pouco referi para duração das garantias de pagamento de encargo de potência e de mínimo de consumo.
A Câmara Corporativa quis considerar mais de uma hipótese para o direito à indemnização para os consumidores de baixa tensão. Então, distingue, por um lado. os consumidores de zonas rurais em que não for possível prever o número total de novos consumidores e. por outro lado, os demais casos, isto é. as zonas urbanas ou as que permitam aquela previsão. Estabelece para estas regimes um tanto diversos, mas confesso que me é difícil encontrar razão profunda para a distinção.
No espírito da Câmara Corporativa estaria o seguinte raciocínio: nas redes ou nas ampliações de redes em que não é possível prever o número de futuros consumidores convém precatar-se contra a excessiva proliferação deles. Segundo o espírito do projecto, pagariam só aquela parte que lhes caberia, mas sobre as partes de ramais de cada um deles podem-se estabelecer novos ramais e sobre esses outras derivações, de maneira que ao fim de certo tempo pode tornar-se moroso o cálculo da participação dos mais recentes usuários (embora este cálculo seja simples, por não passar de uma série de regras de três), quando estes aproveitem vários troços de uma linha ou de uma rede que se foi ramificando.
No espírito da Câmara Corporativa isto requer uma simplificação de trabalho, e propôs, então, que não se reconhecesse ao primeiro usuário o direito de receber a indemnização, a não ser de só um dos seguintes por cada hectómetro; e provinde ainda, que não tivessem direito a indemnização os que tivessem despendido menos de 1500$ e que tudo isto se tivesse passado em menos de oito anos. Suponho eu e também a Comissão de Economia, que foi talvez excessivamente regulamentar o seu critério, pois não se pode assim tratar toda a infinita variedade de casos que podem verificar-se na prática, e portanto, poderão vir a suscitar-se injustiças, precisamente aquelas injustiças que se pretendem evitar, por exemplo, quando num só hectómetro de linha se liguem vários consumidores.
Por outro lado, os casos em que pode prever-se o número dos futuros consumidores são essencialmente os de zonas urbanas ou em que a urbanização está definida e que irão beneficiar de extensão a fazer.
Esta hipótese tem utilidade prática o na sugestão da Câmara Corporativa conduzirá a que a entidade distribuidora suporte os encargos da instalação, cobrando depois a parte que a cada um dos usuários compita nas despesas de instalação. Mas essas redes são muitas vezes objecto de comparticipação do Estado ou das autarquias e é necessário salvaguardar a hipótese, para os subsídios nunca entrarem na conta da indemnização a pagar, como alívio desta.
A Câmara Corporativa, apertadamente e dentro da competência que é própria de uma câmara técnica, propõe que se adoptem critérios de indemnização diferentes, conforme se trate de redes de baixa ou de alta tensão.
Nisto não posso senão aderir às normas a este respeito sugeridas pela Câmara Corporativa, a respeito da qual devo ainda dizer que. como sempre, produziu um trabalho notável e apresentou um estudo minucioso e inteligen-
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temente feito por técnico experiente e, como tal, capaz de figurar uma multidão de hipóteses que na minha visão mais larga da questão nem poderiam ocorrer-me. A Câmara Corporativa enriqueceu com algumas das suas sugestões o que aqui- propus, e é bem merecedor de homenagem o estudo dedicado e atento que o ilustre relator do seu parecer fez acerca do projecto de lei, homenagem- esta. que lhe presto gratamente.
E, se VV. Ex.ªs mo permitem, findarei com esta nota o rápido exame que estou a fazer do parecer, não querendo, rio entanto, deixar de vincar no vosso espírito que ele completou muito a intenção inicial do projecto.
E se algumas das sugestões da Câmara Corporativa não mereceram o pleno apoio da nossa Comissão de Economia, não é porque se não tivesse concordado com elas, mas, sim. porque se eu tendeu que tem carácter excessivamente regulamentar ou correm o risco de serem interpretadas em detrimento daquela entidade que, acima de todos, nós quisemos defender e proteger, ou seja o consumidor de energia eléctrica.
Sr. Presidente: vou acalmar, por saber estarem outros oradores inscritos para o debate e por eu estar ansioso por os ouvir e por colher nas suas razões novos alentos para as minhas razões, podendo assegurar-lhes, de todo o coração, que os acompanharei em tudo quanto possa melhorar as vantagens inicialmente fixadas no meu projecto de lei. Do fundo da minha alma lhes agradecerei, rejeito, toda a ajuda que me derem, tanto mais que bem pobre foi a defesa que fiz do meu intento, torturado pelo receio de empanar uma ideia límpida com desenvolvimentos que. pela simplicidade do assunto, todos me pareciam ociosos.
Uma intenção comum unirá decerto esses outros oradores comigo: o desejo de tornar por uma pequena ajuda mais fácil e mais pronto o acesso dos pequenos povos deste país ao benefício da forma maravilhosa e preciosíssima de energia que é a electricidade.
Será este, penso eu, o mais substancial mérito deste projecto de lei. Foi sobretudo com ele em vista que me animei a trazê-lo até à Assembleia.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Alberto Meireles: - Sr. Presidente: sinto que não devo iniciar a minha primeira intervenção nesta sessão legislativa seria dirigir ao Venerando Chefe do Estado e ao Sr. Presidente, do Conselho as minhas homenagens de português e de Deputado.
Foram tão grandes e densos de sentido nacional os factos ocorridos no interregno parlamentar, a que V. Ex.ª se referiu na sua bela alocução inaugural, que não poderia calar os meus sentimentos em relação àqueles que, sendo o símbolo e a expressão viva da Nação, souberam mais uma vez estar bem à altura da sua grandeza e da sua missão no momento, histórico que vivemos.
A declaração sobre política ultramarina do dia 12 de Agosto, mais ainda do que a lúcida e corajosa exposição sobre problemas que tocam o cerne «da existência e identidade da Nação Portuguesa», constituiu, como V. Ex.ª aqui disse, «a interpretação verídica, autêntica, do sentir da generalidade, dos portugueses», a «interpretação de um estado de alma colectivo».
Daí o ter feito deflagrar, naturalmente, espontaneamente, essa «euforia contagiosa» de adesão e aplauso entusiástico da Nação, que teve o seu momento mais alto na jornada histórica de 27 de Agosto.
Foi bem a voz autêntica de todo «um povo unido e fraterno», num empolgante movimento de mobilização de almas, a dizer da sua «determinação de defender a integridade nacional» em «valorosa e gritante afirmação da vontade de viver do nosso povo».- Salazar, atento às lições da história, sabe que as grandes causas se vencem pela firmeza com que são sustentadas; nunca pelas concessões ou transigências que as comprometeriam irreversivelmente.
E a Nação, a Nação autêntica, mais uma vez o compreendeu, vitoriou e consagrou, como guia seguro dos destinos nacionais, condestável intemerato desta nova cruzada pela sobrevivência de Portugal como nação independente, livre e fiel à sua vocação histórica.
A viagem, do Chefe do Estado às províncias portuguesas de Angola e de S. Tomé e Príncipe foi, afinal, a indesmentível afirmação desse estado de alma colectivo.
Por toda a parte a mesma onda de entusiasmo das populações, sem divisão de cor.
Virmo-lo todos, e não apenas os que tiveram o privilégio de estar lá.
Os relatos da imprensa, e mais flagrantemente as imagens filmadas que a Radiotelevisão Portuguesa diariamente nos fazia chegar, num alarde de capacidade técnica digna do melhor aplauso, foram e são o documentário vivido dessa extraordinária viagem, que fica como mais um altíssimo serviço prestado à Nação pelo venerando e querido Chefe do Estado, Sr. Almirante Américo Tomás.
Parece que só o não quiseram ver (não há piores cegos do que os que fecham os olhos à realidade) algumas agências noticiosas e órgãos de informação estrangeiros. Embora! Mesmo nas zonas que ainda sangram das feridas do mais implacável terrorismo, que do exterior se infiltrou entre as populações pacíficas do nosso Congo, em Carmona, no- Zaire, no próprio euclave de Cabinda, a presença serena, confiante, do Chefe do Estado, tantas vezes entregue indefeso ao entusiasmo das multidões que o aclamavam, foi uma afirmação triunfal da soberania portuguesa que perdurará. Mas no seu alto sentido de servir, que foi e é lema da sua vida exemplar, o Sr. Almirante Américo Tomás mal compreenderá que se enalteça essa serena coragem, que é afinal o maior dos heroísmos, ou o estoicismo com que cumpriu tão pesado programa.
Certamente lhe basta a certeza de que também nesta emergência fez, com naturalidade, o que é timbre dos marinheiros de Portugal, de que é o primeiro por direito próprio e pela dedicação de toda uma vida. V. Ex.ª o disse, encontrando as palavras mais simples, mas aqui de tão profundo e alto significado: «serviu bem».
Sr. Presidente e Srs. Deputados: diante de tudo isto, que «foi belo, e grande, e único», temos o dever de nos orgulharmos dos chefes que a Providência nos deu.
Sr. Presidente: ao renovar a V. Ex.ª, nesta oportunidade, as minhas saudações, correspondo a um grato impulso de admiração, pela dignidade sem rigidez, pela autoridade sem violência, pelo perfeito equilíbrio e compreensão humana com que V. Ex.ª vem dirigindo os trabalhos da Assembleia Nacional.
E constituirá legítimo motivo de satisfação, compensador certamente das tão pesadas responsabilidades e exigências da função, o saber V. Ex.ª que os sentimentos de admiração e respeitosa estima que em plena sinceridade lhe reafirmo são compartilhados por todos os membros desta Câmara.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: o projecto de lei apresentado em 19 de Abril passado nesta Assembleia pelo nosso tão esclarecido colega Kng. Carlos Amaral Neto revela desde logo, e num primeiro exame, três qualidades, qual delas mais digna de apreço: a justiça no que
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se, propõe; II clareza no enunciado da apresentação; a. brevidade do articulado. Não carece de demonstração, por evidente, o propósito de justiça assinalado: que para o custeio das linhas e instalações eléctricas que qualquer se afoite a fazer venha a concorrer quem delas ulteriormente se queira aproveitar e na medida da extensão utilizada.
Da clareza com que o projecto foi justificado se apercebeu a Câmara, como eu próprio.
E quanto à brevidade do articulado, não é certamente Ligeireza ou minimizarão do assunto, antes a segurança de quem, sabendo o que quer, se atém a síntese suficiente, sem temor de que se ajuíze do mérito do projecto de lei pela contagem das linhas tipográficas que o contém.
E se a esses predicados, tão raramente reunidos, acrescer a utilidade e oportunidade do projecto de lei em debate, então nenhuma reserva haverá que formular à sua aprovação na generalidade.
Considerou o ilustre autor do projecto que «para os esclarecidos espíritos» que compõem esta Assembleia desnecessária seria qualquer justificação da sua utilidade.
Longe de mim pô-lo em dúvida.
Tão sòmente me convenço de que poderá ter algum interesse para quem viva menos na intimidade dos problemas da electrificação nas zonas rurais uma breve ilustração da vantagem e oportunidade do projecto de lei sob apreciação.
Para tal nos ateremos aos elementos constantes da Estatística das Instalações Eléctricas em Portugal, ano de 1962, excelente publicação da Direcção-Geral dos Serviços Eléctricos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: a generalização do consumo de energia eléctrica, como dinamizador da vida económica e pressuposto de conforto e comodidade, constitui uma das realidades contemporâneas e legítimo anseio dos povos.
Os consumos específicos médios por habitante traduzem um dos mais salientes índices pelos quais se afere geralmente o desenvolvimento económico e social das nações.
Portugal acompanhou este surto de desenvolvimento energético, que tomou foros de competitivo, procurando vencer o atraso realmente desencorajador a que chegara neste domínio.
O programa de fomento de produção eléctrica à escala nacional começou verdadeiramente a dar os seus frutos a partir de 1951, ano em que se ultrapassou pela primeira vez o milhar de milhões de kilowatts-hora na produção de energia eléctrica e o meio milhão de kilowatts de potência instalada.
Mas apenas doze anos volvidos, em 1962, a produção atingiu 3833 G Wh (superior três vezes e meia à de 1951) e a potência, instalada subiu para quase milhão e meio de kilowatts. dentro de meses substancialmente acrescida com a entrada ao serviço da central da Bemposta (210 000 kW), o último escalão do troço do Douro internacional reservado a Portugal.
Os consumos específicos médios subiram de 52 k Wh em .1962 para 141,8 em 1952 e 398,8 em 1962! Assim, a capitação de consumo de energia eléctrica teve um acréscimo superior a sete vezes nos últimos vinte anos.
Mas, não obstante tão espectacular e meritório esforço, uma sombra se projecta ainda para a nossa insatisfação neste luminoso quadro.
Das 3777 freguesias rurais do território continental que não são sedes de concelho estavam ainda por electrificar 3416, ou sejam 41,9 por cento, ao findar o ano de 1962.
E todos sabemos o que isso representa para essas freguesias e povos.
Valerá a pena referir que em cinco distritos, precisamente os de Bragança, Viana do Castelo, Vila Real, Guarda e Beja, a percentagem de freguesias não electrificadas (excluindo sempre as sedes de concelho) é superior a 50 e apenas- um quarto das freguesias do distrito de Bragança e menos de um terço das dos distritos de Viana do Castelo e Vila Real dispõem de energia eléctrica? Somente nos distritos de Aveiro, Porto. Setúbal, Lisboa e Coimbra atinge percentagem superior a 80 o número de freguesias electrificadas..
E se confrontarmos esta, situação com os consumos específicos médios por distrito, verificaremos que precisamente aqueles e ainda os de Faro, Portalegre e Évora têm capitações inferiores a 100 k Wh por habitante de facto, com especial e triste nota para os de Viana do Castelo e Beja, que os tiveram mesmo inferiores a 50 kWh anuais.
A expansão da electrificação rural tem-se processado ao ritmo médio anual de 02 freguesias no septénio de 1956-1962, mas subiu para. 105 no último quinquénio.
Mesmo que consideremos o número máximo atingido de 108 freguesias por ano, chegaremos à desencorajadora conclusão de que sómente em 1976, isto é. daqui a 13 anos, estarão electritícadas todas as freguesias .do continente.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: muitas e autorizadas têm sido as vozes, dentro e fora desta Assembleia, ta oxprimir o generoso desejo de que se acelere decididamente a electrificação rural do País.
Que outra mais alta poderia trazer em meu apoio do que a do próprio Chefe do Estado, o Sr. Almirante Américo Tomás?
Pois foi S. Ex.ª quem, ao encerrar a sessão inaugural do 2.º escalão do Douro internacional, em Miranda do Douro, no dia 7 de Julho de 1961, exprimiu o seu desejo e esperança de que fosse possível reduzir, a metade o prazo para levar a energia eléctrica a todas as povoações do País, anunciado no brilhante discurso do então Ministro da Economia, Sr. Eng.º Ferreira Dias, sem dúvida o mais esforçado paladino da electrificação portuguesa.
Assim o queria, na sua espontânea e constante solicitude, o Chefe do Estado.
Razão de sobra para que decididamente se tente fazê-lo.
Por mim, e sem ignorar algumas das dificuldades e obstáculos que vêm sendo apontados, e entre eles a carência de pessoal para a elaboração, estudo e fiscalizaçãodos projectos, insuficiência das dotações, que se traduzem em cepticismo quanto à viabilidade de execução de um programa acelerado, quero exprimir a minha confiança na capacidade da Direcção-Geral dos Serviços Eléctricos para dar satisfação aos anseios gerais neste domínio, desde que lhe sejam facultados adequados recursos em pessoal e dotações.
E já agora uma pequena nota de observação pessoal.
Habituados ao aspecto sólido e definitivo das nossas linhas eléctricas, mesmo secundárias e de mera distribuição, surpreende-nos forçosamente o contraste com a aparência, de modéstia (se não de pobreza e improvisação) de muitas das linhas que marginam as estradas espanholas, tantas vezes apoiadas em simples postes de madeira, nem sempre aprumados, mas que, pelos vistos, lá vão cumprindo a sua função.
E fica-nos a dúvida ... Não será também nisto, como noutras coisas, a preocupação do óptimo, do tecnicamente perfeito e acabado, obstáculo a que em Portugal se ande mais depressa?
Vozes: - Muito bem!
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O Orador: - Não seria viável um aligeiramento de exigências e consequente redução do custo do instalação inicial como forma de atingir, sem prejuízo da segurança, mais rapidamente, e dentro das dotações globais disponíveis, o objectivo de electrificação total tias zonas rurais?
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Apenas me afoito à interrogação, porque esta é coutada de técnicos vedada a leigos.
Vou concluir.
As situações que o projecto de lei sob debate se propõe resolver, a situação dos particulares que pagam as extensões de redes, de que outros poderão posteriormente vir a utilizar sem compartilharem ou reembolsarem o encargo inicial, «constitui um elemento retardador no desenvolvimento da electrificação nas zonas arrabaldinas».
Assim o consideraram, e fácil é compreendê-lo, os membros da comissão nomearia, um 3956, para o estudo do problema da electrificação rural, como se refere no claro parecer da Câmara Corporativa.
E por estranho que pareça, esse «elemento retardador», tão autorizadamente reconhecido e apontado já em 3956, não foi afastado até agora, pelo menos com a amplitude desejável, através da medida legislativa postulada.
O projecto de lei do distinto Deputado Eng.º Amaral Neto, que, por coincidência, era com o competente relator do parecer da Câmara Corporativa um dos membros da referida comissão, propõe-se fazê-lo.
A utilidade a oportunidade do projecto de lei de que nos ocupamos são assim manifestas, na medida em que arreda «um obstáculo para o desenvolvimento da electrificação rui ai», que, como vimos, carece de aceleração de ritmo.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - A Assembleia Nacional lhe irá dar, certamente, II merecida aprovação na generalidade, e nesse sentido exprimo, sem hesitação, o meu voto.
Tenho dito.
Vozes: -Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Martins da Cruz: - Sr. Presidente: quando os meus eleitores, na sua grande maioria a viverem a sua vida de todos os dias. do todos os anos, nos nossos abandonados meios rurais, me outorgaram o mandato, que tanto me enobrece, de representá-los na Assembleia Nacional, assumi expressa e declaradamente perante eles o encargo de nesta alta e honrosíssima tribuna, que também é voz da Nação, pugnar quanto em mim coubesse para que as instâncias responsáveis acudissem quanto antes as suas mais prementes e angustiosas necessidades, o que tantas são.
De entre elas referi então, a meu ver, como principais, as da saúde, as da educação e das relativas ao bem-estar rural, as da electrificação.
Sempre que me tem sido possível, e até correndo por vezes o risco da impertinência, delas tenho falado nesta Câmara, mais II apontar efeitos que urge evitar do que a sugerir soluções, que para estas penso mais aptos os serviços e os elementos de que a Administração dispõe.
Na sequência, deste meu procedimento, não iria desperdiçar a oportunidade da apreciação do projecto de k1 I apresentado pelo nosso Exmo. Colega Eng.º Carlos Amaral Neto, antes logo me propus aproveitá-lo para secundar os objectivos específicos daquele projecto e na ordem de considerações que u esse respeito tecesse dar o relevo possível ao momentoso problema da electrificação rural.
As razões de justiça sobre que assenta o projecto de lei em causa são evidentes, e a esse propósito não é fácil acrescentar seja o que for de útil ao que mui doutamente afirmou aquando da apresentação do projecto o seu ilustre autor e ao que se lê no parecer da Câmara Corporativa, que nesse aspecto retoma as razões aqui ditas, desenvolvendo-as na sua fundamentação.
Mas, a par de razões da mais elementar justiça, correm outras que tocam no próprio fomento da electrificação rural.
Poderiam supor-se de simples carácter acessório se não se prendessem, como prendem, à raiz do problema nacional que é aquele mesmo fomento.
E hei-de dizer que foi até esta faceta do projecto, a de obviar a causas que também viriam contribuindo para a situação que detemos quanto à electrificação das zonas rurais, que maior impressão me terá feito, já que aquela outra da injustiça que visa eliminar só me parece estranho que até ao presente se tenha consentido.
A energia eléctrica, em condições de ser utilizada nas diferentes e múltiplas funções da vida, é uma fonte imprescindível, e por ora entre nós insubstituível, de progresso e de bem-estar. Ë, como se diz na fala técnica e concreta dos economistas do fomento, uma infra-estrutura para a conquista de um melhor- e geral teor de vida.
Com a minha inata predisposição para confiar na técnica quando ela tem plena consciência da sua natureza e função de meio e não aspira a, de per si mesma, definir os fins que apenas deve servir, acredito que assim seja, e neste, caso sem esforço de fé ou de inteligência, já que a evidência por todo o Mundo civilizado o confirma.
E, na verdade, a energia eléctrica uma das primeiras condições de progresso e de bem-estar e apraz-me a esse respeito anotar que o facto tem expressão legislativa pelo que toca aos meios rurais, logo nos alvores da Revolução Nacional.
No recuado ano de 1932, se não erro quando os responsáveis se afadigavam por levar aos diversos sectores da vida nacional a indispensável sistematização que permitisse um trabalho sério e fecundo, apareceu em lugar cimeiro todo um vasto programa de melhoramentos rurais, que, infelizmente, anos volvidos, viria a ser sacrificado à tentação de certa espectacularidade, mais atreita a obras mais dispendiosas.
Mas, justiça é dizê-lo, naquele inicial programa de melhoramentos rurais enxertava-se já a electrificação dos pequenos povoados perdidos na loujura das planícies ou alcandorados nas encostas das serranias. Ignoro até onde terão alcançado os propósitos do legislador. É de crer que a incipiente electrificação nacional, então de escasso volume e de soluções técnicas pouco evoluídas, e então a preocupar reduzido número de pessoas, por um lado, e, por outro, a rotina da gestão dos negócios públicos locais, que via na electrificação melhoramento de alto significado e, por isso, de uso exclusivamente citadino, não houvessem permitido vasto percurso. Más ficara já, 710 entanto, a afirmação de um propósito de ver nativo a marcar benéfica orientação.
É esta que reaparece, embora envolta em novas perspectivas, quando, já no pós-guerra, a política da electricidade então desenvolvida vem mudar, nesse sector, a face da vida nacional.
Os grandes empreendimentos hidroeléctricos, o estudo dos consideráveis recursos nacionais nesse sector, o interesse que o problema desperta em toda a Nação e outros factores, sobretudo doe domínios do fomento econó-
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mico e social, geraram por todo o País o culto da electricidade, o anseio do seu uso e do seu consumo.
A esta expectativa psicológico-política correspondia a produção hidráulica em grande escala, agora a permitir se encarasse de vez a electrificação rural, em termos de dar satisfação ao que se definia como uma aspiração geral.
E nasceu a esperança contra as trevas.
E vieram novas leis, novos decretos, novos regulamentos - como expressão de uma nova concepção quanto à repartição da energia eléctrica pelos meios rurais.
E vieram também as verbas, sobretudo a partir de 1955. ano em que é atribuído à electrificação rural o montante de 132 000 contos, em regime de comparticipação, para o quadriénio 1055-1958, com anuidades de 33 000 contos, cabendo 20 000 ao
Orçamento Geral do Estado e 13 000 ao Fundo de Desemprego.
O II Plano de Fomento representa certamente o primeiro estudo aprofundado das possibilidades nacionais daquela electrificação, postas as condições de abastecimento permitidas pela produção hídrica, pelo transporte e pela grande distribuição - fases de todo um conjunto para que fora possível encontrar soluções técnicas e financeiras ao nível de idênticas realizações em países que iam de longe à nossa frente.
E assim, no programa dos seus investimentos, dos 4 500 000 contos destinados à electricidade, 600 000 contos cabiam à electrificação rural, na média anual de 100 000 contos.
Era desde sempre a maior verba votada àquela rubrica.
O Estado, pelo seu orçamento geral e pelo Fundo do Desemprego, contribuiria com 50 000 contos anuais, no total de 300 000 contos nos seis anos de prazo do Plano de Fomento. Aos municípios, suas federações ou concessionários caberiam os restantes 50 000 contos por ano.
A comparticipação do Estado, sob a forma de subsídio não reembolsável, não poderia em cada ano exceder 50 por cento do total do custo das obras executadas. Daqui resultava que aqueles subsídios seriam concedidos e sobretudo aplicados desde que os municípios pudessem, pela forma que referi, suportar, no seu conjunto, dispêndio idêntico - 50 000 contos anuais.
Nas entrelinhas do II Plano de Fomento aflora por vezes o receio de tal não ser possível e daí o ter-se julgado suficiente o montante fixado para os subsídios do Estado, duvidando-se, como parece, que os interessados na electrificação rural pudessem mesmo acompanhar a generosidade da Administração.
Contra semelhante suposição, talvez lógica, ocorreu o imprevisto: a electrificação rural não vence a lentidão por que está a processar-se apenas por carência de comparticipações do Estado.
À Secretaria de Estado da Indústria afluem pedidos do todas as partes do País.
Os processos de electrificação rural pendentes neste momento na Direcção-Geral dos Serviços Eléctricos e remetidos pelas câmaras municipais excedem 800!
O seu custo vai além de 450 000 contos. E podemos ter como certo que todos os meses continuarão a chegar novos pedidos.
Não sendo possível ao Estado, na presente conjuntura, aumentar aquela anuidade de 50 000 contos, logo se alcança que ao ritmo permitido por aquele montante de subsídio levará longos anos a completar a electrificação rural, mesmo que restrita a sedes de freguesia, como sucede em relação aos números dados.
Mas porque não pode nem deve retardar-se para mais de cinco ou seis anos a execução de tão decisivo melhoramento nas zonas rurais, haverá que procurar os meios financeiros necessários à margem de maior sobrecarga dos subsídios oficiais? assunto II que espero voltar brevemente e de forma diferente.
E que das 4000 sedes de freguesias rurais estão electrificadas cerca de 2400 e aguardam a civilização as 1600 restantes, isto é, cerca de 40 por cento da população rural portuguesa não conhece a electricidade!
ritmo da electrificação na vigência do II Plano de Fomento, o maior de sempre, é da ordem das no freguesias por ano, isto é. a manter-se esta cadência, só muito próximo de 1980 - quando por essa Europa já não houver nem lugarejo nem quintarola sem electricidade - chegaríamos a todas as sedes de freguesia, com o que nem eu nem os meus eleitores nos conformamos.
O Sr. Alberto de Meireles: - O número de freguesias que V. Ex.ª referiu ainda não foi atingido em ano nenhum.
O Orador: - A média é de 109, mas por comodidade falei em 110.
O Sr. Alberto de Meireles: - Eu só tenho 108 na estatística. Os números que citei referem-se não às freguesias todas, mas excluindo as sedes de concelho. Daí a divergência entre os números que V. Ex.ª acaba de citar e os 3377 que apresentei. E que estas freguesias que constam do quadro demonstrativo da electrificação rural excluem as freguesias sedes de concelho.
O Orador: - Não sei se na estatística de V. Ex.ª estão consideradas as ilhas adjacentes.
O Sr. Alberto de Meireles: - Não estão.
O Orador: - Eu incluí na estatística que mencionei as freguesias rurais das ilhas adjacentes. Portanto, quando digo 4004 freguesias estou a referir-me também aos Açores e Madeira.
O Sr. Sousa Meneses: - Se V. Ex.ª me permite, eu queria dizer ao Sr. Deputado Alberto de Meireles que o critério de V. Ex.ª é talvez um critério mais justo dentro da nossa pluricontinentalidade. Devemos pensar que este país não é só o continente, é também as ilhas e o ultramar.
O Sr. Alberto de Meireles: - A Estatística das Instalações Eléctrica* em Portugal, publicada anualmente pela Direcção-Geral dos Serviços Eléctricos, diz respeito sómente ao continente. As ilhas adjacentes estão noutra estatística que não tenho.
O Sr. Sousa Meneses: - O que me parece é que não existe nenhuma estatística relativa às ilhas.
O Sr. Alberto de Meireles: - A estatística referente ao ultramar liá-de correr pelos serviços de fomento do Ministério do Ultramar, mas trabalhei sómente com os distritos continentais, em que os problemas de electrificação são para nós mais conhecidos que os do resto do território.
O Orador: - Com certeza. Servi-me, porém, de estatísticas que englobam também os Açores e a Madeira. Daí a divergência.
Mas o quadro não ficará ainda em condições de conhecimento completo se não se acrescentar que mesmo nos 60 por cento das sedes de freguesia já electrificadas vivem cerca de 1200000 famílias. Pois, destas, apenas um terço, cerca de 400 000, é consumidor de energia eléctrica.
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Quererá isso significar desinteresse pela sim utilização: Erraria quem assim o julgasse.
Tão reduzido número de consumidores encontra explicação no custo da electricidade, mas- sobretudo nos custos das baixadas e da instalação, que, por isso, terão de ser revistos em função dos motivos que obstam, e não deverão obstar, a que, se não a totalidade, pelo médios a grande maioria das famílias rurais possa dispor de energia eléctrica na sua vida de todos os dias.
Se com providências adequadas a esse objectivo pode admitir-se só criem encargos às empresas abastecedoras da pequena ou da grande distribuição sobretudo, não parece que deva recear-se ir aí levantar-se motivo de sensível alteração do desejado equilíbrio económico das mesmas empresas, já que os primeiros grandes beneficiários de tal solução hão-se ser elas mesmas, na medida em que, triplicando consumo, se lhes avantajam por igual forma, nessa parte, seus merecidos réditos.
Essas e outras providências têm, pois, de ser tomadas em ordem a apressar a electrificação rural, levada, numa 1.ª fase. a todas as sedes de freguesia e, depois, a todas as restantes localidades e simultaneamente posta, sem incompreensíveis complicações, ao serviço da agricultura.
Se ela constitui, como disse, uma das infra-estruturas de progresso e bom estar, mais avultará a sua falta se a grande solução para o problema da instrução secundária - a televisão escolar que aí vem- não puder chegar a 40 por cento dos portugueses dos meios rurais, pôr estes não disporem da energia eléctrica.
Seria de gravíssima responsabilidade para todos nós se frente a uma tal expectativa nada mais fizéssemos que lamentar a situação.
Importará, pois, estudar, quanto antes e afincadamente, as providências a considerar para que a expansão da electrificação rural alcance uma dimensão maior e com ela se obtenha em breves anos a cobertura de todo o território da metrópole e simultaneamente se logre criar, com adequada legislação, o condicionalismo que possa garantir aos portugueses- de todas as condições a fruição dessa maravilhosa e extraordinária força que é a- electricidade.
No ponto que considera, o projecto de lei em discussão parece-me orientar-se nessa intenção. Por isso lhe dou o meu voto. com as homenagens que bem merece o seu ilustre autor.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão. Amanhã haverá sessão à hora regimental. A ordem do dia será continuação da discussão, na generalidade, do projecto de lei em discussão e u sua discussão II a especialidade.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas o 40 minutos.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Alberto Carlos de Figueiredo Franco Falcão.
Alberto da Rocha Cardoso de Matos.
António Marques Fernandes.
Augusto José Machado.
Carlos Coelho.
Domingos Rosado Vitória Pires.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Jorge Augusto Correia.
Jorge Manuel Vítor Moita.
José Dias de Araújo Correia.
José Luís Vaz Nunes.
José dos Santos Bessa.
Virgílio David Pereira e Cruz.
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Agnelo Orneias do Rego.
Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Pacheco Jorge.
Antão Santos da Cunha.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António da Purificação Vasconcelos Baptista Felgueiras.
António Tomás Prisónio Furtado.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Belchior Cardoso da Costa.
Carlos Emílio Tenreiro Teles Grilo.
D. Custódia Lopes.
Fernando António da Veiga Frade.
Jacinto da Silva Medina.
José Guilherme de Melo e Castro.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel João Correia.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel Nunes Fernandes.
Purxotoma Ramanata Quenin.
Simão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães.
Tito Castelo Branco Arantes.
Urgel Abílio Horta.
Vítor Manuel Dias Barros.
Voicunta Srinivassa Sinai Dempó.
O REDACTOR - Leopoldo Nunes.
IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA