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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 102

ANO DE 1963 5 DE DEZEMBRO

VIII LEGISLATURA

SESSÃO N.º 102 DA ASSEMBLEIA NACIONAL

EM 4 DE DEZEMBRO

Presidente: Exmo. Sr. Mário de Figueiredo

Secretários: Exmo. Srs.Fernando Cid Oliveira Proença
Luís Folhadela de Oliveira

SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 10 minutos.

Antes da ordem do dia. - O Sr. Presidente referiu-se à morte do Sr. Coronel Lobo da Costa, Deputado na I Legislatura, sugerindo que ficasse exarado na acta um voto de pesar.
O Sr. Deputado Amaral Neto anunciou um aviso prévio sobre a crise agrícola nacional e as medidas tomadas para a enfrentar.
O Sr. Deputado Moura Ramos tratou do problema relativo à situação do pessoal de vigilância dos serviços prisionais.
O Sr. Deputado António Santos da Cunha falou sobre a morte do Sr. D. António Bento Martins Júnior, arcebispo de Braga, cuja obra enalteceu.
O Sr. Presidente prestou homenagem ao Sr. D. António Bento Martins Júnior, dizendo interpretar também os sentimentos da Câmara.

Ordem do dia. - Terminou o debate na generalidade do projecto de lei do Sr. Deputado Amaral Neto, procedendo-se à discussão na especialidade e votação das cinco bases constantes da proposta de substituição apresentada pelo mesmo Sr. Deputado e outros, as quais foram aprovadas sem alterações.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Virgílio Cruz e Amaral Neto.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas e 35 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai fazer-se a chamada.

Eram 16 horas.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Agostinho Gonçalves Gomes.
Alberto Alaria Ribeiro de Meireles.
Alberto dos Reis Faria.
Alberto Ribeiro da Costa Guimarães.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alexandre Marques Lobato.
Alfredo Maria de Mesquita Guimarães Brito.
Aníbal Rodrigues Dias Correia.
Antão Santos da Cunha.
António Augusto Gonçalves Rodrigues.
António Burity da Silva.
António Calheiros Lopes.
António de Castro e Brito Meneses Soares.
António Gonçalves de Faria.
António Júlio de Carvalho Antunes de Lemos.
António Magro Borges de Araújo.
António Manuel Gonçalves Rapazote.
António Maria Santos da Cunha.
António Marques Fernandes.
António Martins da Cruz.
António Moreira Longo.
António da Purificação Vasconcelos Baptista Felgueiras.
Armando Francisco Coelho Sampaio.
Armando José Perdigão.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Alves Moreira.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Artur Proença Duarte.
Augusto José Machado.
Belchior Cardoso da Costa.
Bento Benoliel Levy.
Carlos Alves.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Délio de Castro Cardoso Santarém.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.

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Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando Cid Oliveira Proença.
Francisco António Martins.
Francisco António da Silva.
Francisco José Lopes Roseira.
Francisco Lopes Vasques.
Henrique Veiga de Macedo.
Jacinto da Silva Medina.
James Finto Buli.
Jerónimo Henriques Jorge.
João Mendes da Costa Amaral.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
João Rocha Cardoso.
João Ubach Chaves.
Joaquim de Jesus Santos.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Joaquim de Sousa Birne.
Jorge Augusto Correia.
Jorge de Melo Gamboa de Vasconcelos.
José Alberto de Carvalho.
José Augusto Brilhante de Paiva.
José Fernando Nunes Barata.
José Manuel Pires.
José Maria Rebelo Valente de Carvalho.
José de Mira Nunes Mexia.
José Monteiro da Rocha Peixoto.
José Pinheiro da Silva.
José Pinto Carneiro.
Júlio Dias das Neves.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Luís Folhadela de Oliveira.
Manuel Herculano Chorão de Carvalho.

anuel João Cutileiro Ferreira.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel de Melo Adrião.
Manuel Nunes Fernandes.
Manuel Seabra Carqueijeiro.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Mário Amaro Salgueiro dos Santos Galo.
Mário de Figueiredo.
Olívio da Costa Carvalho.
Quirino dos Santos Mealha.
Rogério Vargas Moniz.
Rui de Moura Ramos.
Virgílio David Pereira e Cruz.

O Sr. Presidente: - Estão, presentes os Srs. Deputados.

Está aberta a sessão.

Eram 16 horas e 10 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: morreu o Sr. Coronel Lobo da Costa. Deputado nesta Assembleia durante a ] Legislatura, antigo governador civil de Lisboa, Porto, Coimbra e Leiria, todos lamentamos a morte de tão ilustre p. antigo membro desta Casa. Por isso sugiro que fique exarado no Diário das Sessões um voto de sentimento pelo seu passamento.
Tem a palavra antes da ordem do dia o Sr. Deputado Amaral Neto.

O Sr. Amaral Neto: - Sr. Presidente: vai para dois anos que sopram fortes na nossa política agrícola ventos de mudança, enquanto ressoam cada vez mais alto, mais fortes P mais plangentes - como, aliás, por toda a: Europa, anote-se de passagem - as lástimas dos lavradores queixosos dá contínua deterioração das suas condições de produção.
Certamente ninguém duvida de que alguma mudança é necessária, pertença ou não ao número dos muitos que, segundo o Sr. Ministro da Economia, pensam que a grande vantagem da política económica reside em variar.
Filha aquela deterioração do embate do contínuo crescer de encargos contra á relativa estabilidade dos rendimentos, urgente se torna, com efeito, agir sobre estes últimos, pois a tendência daqueles parece indomável e nem ninguém a deseja invertida no factor substancialíssimo das retribuições do trabalho.
As mudanças desenhadas, porém, ou o jeito de as propor, não tiveram, todavia, ainda o condão de acalmar as preocupações da lavoura, cujas queixas redobram; e esta descrença ou temor parece-me de suma importância, pois o sucesso de qualquer reforma exige a adesão daqueles a quem se dirige.
Raras vezes, porém, se terá estabelecido um clima de tão confiante expectativa nos governantes da economia como o que reinou entre os homens da terra nos começos do corrente ano. Justificavam-no as reputações desses governantas, de inteligência, de estudo, de juventude prometedora de inovações, de trato íntimo da vida agrícola, p determinaram-no logo as suas primeiras palavras e actos.
Entre estes contou-se como o mais saliente o propósito de dar audiência à lavoura para tomar conhecimento da crise em que esta se encontra e das soluções que considerasse convenientes para a mesma ser debelada. Decerto igual propósito tem animado todos os dirigentes da nossa economia, mas nunca fora afirmado com tão convidativa solicitude, e eis o que logo impressionou favoravelmente. Essa solicitude foi ao ponto de animar, se não mesmo instigar, os agricultores a reunirem-se para o exame público dos seus problemas e eventuais soluções, sem sombra de dúvida no desejo de fazer participar a opinião geral no conhecimento da gravidade daqueles e na compreensão destas; e aqui estava mais uma posição nova e aliciante, pois anteriormente até congressos de limitado objecto tinham encontrado desfavores, particularmente sensíveis quando toda a sorte de outras actividades se reuniam com frequência, abundância e variedade nunca dantes vistas.
Logo na sua primeira conferência de imprensa o Sr. Ministro da Economia prometeu todo o apoio aos congressos nacionais de agricultura, abertamente declarados necessários - e creio que muito o eram, de facto, para ventilar questões e esclarecer divergências -, e pouco depois vinha o anúncio de se irem realizar, organizadas pela Corporação da Lavoura, jornadas cerealíferas e leiteiras. Foi abertamente dado a saber, sem o menor desmentido, que estas eram promovidas, a sugestão dos Srs. Ministro da Economia e Secretário de Estado da Agricultura, para exame das dificuldades mais instantes e enquanto não era possível organizar o primeiro verdadeiro congresso agrícola. Naquela sugestão ficou clara, para os que a receberam e realizaram, a vontade de criar condições intelectuais e psicológicas para uma valorização dos cereais e do leite, e a mesma urgência recomendada (está escrito que se pedia, a realização a prazo de um mês) prendia-se com a aproximação da oportunidade indeclinável de legislar sobre tais assuntos.
Estas jornadas realizaram-se nos começos de Junho, c foram um incontestável êxito de organização e de expressão, que só por isto mereceria registo congratulatório nos nossos anais. No curto prazo marcado e respeitado obteve-se a reunião em Lisboa de muitas centenas de agricultores provindos de todos os cantos do País e que encheram durante três dias, de manhã e de tarde, a

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maior sala da capital para ouvirem atentos substanciosas comunicações e as discutirem com elevação e interesse. Foi, repito, um êxito de que a imprensa de todos os matizes deu largamente notícia, trazendo o grande público ao conhecimento e compreensão das dificuldades da agricultura. Mas é inegável que para o êxito concorreu essencialmente a convicção de todos os participantes de que desta vez a reunião era para valer a pena, pois o Governo se mostrava disposto a tomar em conta as suas conclusões.

Vozes: -Muito bem, muito bem!

O Orador: - Ora o novo regime cerealífero surgiu, não pelo anunciado final de Junho, mas já bem dentro de Setembro, e surgiu para demolir todas as expectativas fundadamente postas na valorização dos cereais, cuja cultura, por se processar em condições de sequeiro, indefesas contra as variedades da meteorologia, é notoriamente a mais sacrificada de todas quantas se fazem na terra portuguesa e, portanto, a mais urgentemente carecida de reanimação.

Vozes: -Muito bem, muito bem!

O Orador: - Já correu bastante que entre as conclusões das jornadas e a publicação do regime cerealífero interveio, pelo menos, uma consulta ao Ministério da Economia, por parte dos representantes dos organismos corporativos da agricultura - e não só do central -, que não se desenrolou no mesmo clima anterior da afabilidade. E se então, segundo parece, a expressão mais nítida de mudança foi a queixa expressa de que os agricultores estão sempre a reclamar, importa sublinhá-la em quanto manifesta ignorância de uma verdadeira constante da civilização industrial, que todavia não requer só complacência, mas substancial deferimento.
Ora foi este deferimento, na resolução imediata do mal-estar aliás reconhecido, que faltou ao novo regime cerealífero, antes o substituíram cerceamentos de facilidades anteriores, que no mesmo domínio do imediato agravaram a situação, em vez de a aliviar, como tão forte e fundadamente se esperava.
Daqui um estado de profundo desânimo e desapontamento entre, pelo menos, grande parte dos agricultores portugueses, cujas implicações económicas, e até políticas, não podem de modo algum ser ignoradas.
Porque até o modo de dizer as coisas não foi o melhor 1 A lavoura reconhecera, francamente, ter sido impelida a cultivar cereal, onde não deveria, por facilidades animadoras; e aceitara que estas lhe fossem retiradas se os preços pudessem ser melhorados. Ora, procedeu-se exactamente ao contrário, mas não faltou a nota de que assim se ia ao encontro dos desejos expressamente manifestados pela lavoura trigueira! Isto, no português antigo, chamava-se fazer o mal e a caramunha: e se traduz uma tendência de espírito para a ironia, convém lembrar que esta figura de retórica é de manejo delicado em política económica, de natureza tão concreta.
No aspecto positivo, porém, o regime cerealífero vem acompanhado da primeira exposição de um plano de reconversão agrária de largo fôlego, de certo modo oferecendo as promessas deste como lenitivo dos desapontamentos daquele. O plano tem sido saudado, como cumpre, pelas tubas da propaganda oficial, mas a verdade é que tem merecimento a mais aplauso do que o dos simples apologistas automáticos, e vem ao encontro de ideias de longe defendidas.
Todavia, a reconversão é, como logo ali se reconhece, operação gradual e custosa e o próprio plano aparece dependente de muitas premissas ainda por apurar. No seu despacho de 7 de Novembro, o Sr. Secretário de Estado da Agricultura, a quem o sentimento de algumas dúvidas não me impede de render as homenagens devidas à sua limpa intenção, não ocultou a falta ou atraso na preparação de elementos essenciais de estudo e de decisão, quase só nos oferecendo, como medida para efeitos imediatos, a importação de 500 bovinos" reprodutores, quantidade que não deixou, todavia, de impressionar quantos supunham a inseminação artificial definitivamente acreditada ...
O sentido fundamental da reconversão é o de viragem de uma economia do abastecimento para economia de mercado. A. preocupação do abastecimento dominou profundamente os espíritos de quantos sofreram as vicissitudes das duas guerras mundiais e decerto só os deixará quando puder ser substituída pela certeza de não ocorrência de terceira; a abertura do mercado - presumivelmente o mercado crescente dos produtos mais ricos - vai exigir grande esforço e acerto na competição com os que já o assaltaram primeiro. E aqui estão as duas grandes ordens de interrogações que se podem oferecer aos anunciados planos, cuja plena aceitação carece porventura de mais largo exame das perspectivas e das opções.
A verdade é que sempre se produziu para algum mercado, mas na produção agrícola o mercado não pode ser deixado em inteira liberdade, tão fortes são as pressões a que anda sujeito. E se esse mercado for o internacional, então há que ter em conta o facto certo de muitos preços oferecidos neste não terem relação com os praticados no interior dos mesmos países exportadores. Tais não são preços fixados pelos Ministérios da Economia: são-no pelos das Finanças, em obediência àquilo que a F. A. O. eufemlsticamente chama «a acção enérgica dos países exportadores para aumentarem as suas receitas, em divisas». E os países que se nortearem por eles na vida interna hipotecarão os interesses dos produtores seus nacionais às políticas financeiras dos fornecedores.
Estará bem que nos voltemos nós mais para as condições dos mercados, mas sempre com prudência. Outra coisa não faz, aliás, a Europa -exceptuada só a Grã-Bertanha: essa, depois de ter morto a sua agricultura, tem tido que a fazer reviver por altíssimo preço-, toda a Europa, que insiste em produzir o seu próprio trigo e a sua própria carne e lhes defende ciosamente os preços nessas árduas batalhas diplomáticas de que os jornais nos dão frequentes notícias.
Na apresentação da viragem há, pois. certo risco de se iludirem os governantes e o público, e a mim parece-me que se está a preferir esse risco ao de pôr francamente a necessidade e a justiça das valorizações de alguns produtos.
Aliás, a reconversão que se anuncia .com a viragem é essencialmente dirigida às regiões do Sul do País, tradicionais e principais cultivadoras de cereais a seco, principalmente do trigo, e procura, repetirei, oferecer praias propícias aos agricultores, que agora são deitados ao mar para se ver quais sobrenadam, na execução de uma táctica já antes sugerida, mas logo repelida com horror pelos sectores então visados.
Mas a crise agrícola e a necessidade de reconversões importantes não são de modo algum exclusivo daquelas regiões. Aliás, o mesmo regime cerealífero que a estas desgostou não menos desagradou a outras: a Trás-os-Montes, por exemplo, que vai deixar de receber os 16 000 contos de subsídio no preço do trigo que o ano passado ainda teve, e às regiões leiteiras do Minho e Douro-Litoral, afectadas pela subida do preço da sêmea

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para rações, que os entendidos dizem mais do que absorver a contemporânea valorização do leite. E o magro tostão de benefício concedido no preço do centeio perde-se ao lado dos 60 ou 70 centavos que o Ministério da Economia cobrará para os seus fundos em cada quilograma desse cereal fornecido às moagens ...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Porque é no Sul que ainda se encontram em maior número pessoas mentalmente evoluídas vivendo só da agricultura, de lá vêm mais frequentes, mais constantes e mais sonoros os protestos contra as situações que a afectam, e o facto não tem deixado de ser explorado psicologicamente em seu detrimento. No entanto, afigura-se-me que no Norte as queixas não são menos fortes, se mais caladas: lá. as pessoas pura e simplesmente abandonam, em massas crescentes, para as cidades ou para o estrangeiro, o modo de viver que se lhes tornou insuportável!

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Reconhecidíssimo está que a crise é geral o, bem vistas as coisas, afecta mais de metade da nossa população, pois se da agricultura vivem ainda hoje directamente cerca de 40 por cento dos portugueses activos, dos demais, pelos serviços e fornecimentos àqueles prestados, ainda dependem da sua prosperidade tantos que essa metade é decerto largamente excedida. Aliás, qualquer comerciante ou industrial atestará quanto sente sempre as vicissitudes de colheitas e preços, e o Sr. Ministro da Economia, que nestes curtos meses da sua gerência tem dito ou reavivado muitas verdades, já pôs abertamente a pergunta se a estagnação relativa do sector agrícola não constitui hoje travão do nosso crescimento.
Por todas estas considerações, e perante medidas que, no imediato, receio ainda agravam mais a crise, parece-me chegado o tempo de o País ser convidado a debruçar-se abertamente sobre os problemas da agricultura e de ser esclarecido por um exame generalizado das queixas e dos remédios, que decerto não podem limitar-se só aos tónicos ou a novos preceitos de higiene.

O Sr. António Santos da Cunha: - Muito bem!

O Orador: - Arredada provavelmente por muito tempo a possibilidade de um congresso agrícola, pela desilusão que coroou a primeira experiência, afigura-se-me que no seio desta Assembleia se podem realizar as necessárias largueza de auditório, seriedade de informação e prudência de juízos.
Tenho, pois, a honra de anunciar o seguinte

Aviso prévio

Desejo ocupar-me em aviso prévio da crise agrícola nacional e das medidas tomadas para a enfrentar.
Admitindo a gravidade desta crise como geralmente reconhecida, procurarei mostrar que ela não é especificamente portuguesa, na larga medida que resulta da deterioração dos termos de troca entre produtos agrícolas e industriais, que aflige igualmente os agricultores de toda a Europa e do resto do Mundo.
Defenderei a necessidade de a resolver como condição de equilíbrio e progresso da nossa vida económica e social, dadas a capacidade potencial para o consumo de produtos industriais da população rural e a justa e veemente aspiração desta à paridade com as dos demais sectores na partilha dos frutos do desenvolvimento geral.
Perante a anunciada viragem de uma economia de abastecimento para economia de mercado, lembrarei a falsidade de muitos preços internacionais e os perigos de ordem financeira e de outras que acarretaria uma exagerada dependência dos mercados estrangeiros de produtos agrícolas, quer por busca de talvez ilusórias- economias, quer por quebra da produção nacional em consequência do desalento ou fuga dos nossos agricultores. Lembrarei ainda como já se desenhou internacionalmente uma revalorização dos produtos agrícolas, quanto ela é fortemente defendida como o melhor meio de ajuda às nações subdesenvolvidas e como, progredindo estas e os seus consumos, pode pôr-se a hipótese de próximas carências contra as quais não deveremos desarmar-nos.
Reconhecendo a necessidade de modernização da nossa lavoura, apontarei a indispensabilidade de a recapitalizar para as transformações necessárias, o que o crédito estatal certamente não pode só por si assegurar.
Finalmente, considerando - sem discordar muito deles - que os planos desde há tempos propostos pelos departamentos responsáveis são quase todos para efeitos a largo prazo, não tendo ainda realizadas ou encaminhadas algumas condições prévias de execução e de sucesso, como, por exemplo, as tocantes à reocupação das pessoas dispensadas pelas reconversões culturais, insistirei na indispensabilidade de providências que, entretanto, reanimem económica e moralmente a agricultura portuguesa.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Moura Ramos: - Sr. Presidente: pedi a V. Ex.ª a palavra para me ocupar do problema da situação do pessoal de vigilância dos serviços prisionais.
Procurarei não me alongar em demasia, sendo apenas meu intento chamar a atenção do Governo para um assunto que se me afigura merecedor de estudo e de resolução rápida, tal a dose de justiça e razão que o acompanha.
Os guardas dos serviços prisionais constituem uma corporação composta de mais de 800 elementos, dedicados e sacrificados servidores do Estado sobre quem impende, dentro de uma actual concepção penitenciária, a tarefa de readaptação social dos delinquentes confiados à sua guarda, exercendo sobre eles uma influência moral que os valoriza, tornando-os em elementos socialmente úteis ou, pelo menos, inócuos.
Esta tarefa da recuperação social dos delinquentes, «mais bela do que "fazer levantar os mortos dos seus túmulos», na famosa frase de Channing, fez pôr de parte o conceito clássico que só via os guardas prisionais pelo prisma acanhado da vigilância, de «guardadores de presos», para reclamar deles a actuação própria de um monitor, de um educador, implicando isso um verdadeiro desdobramento da missão e exigindo-os guarnecidos de qualidades humanas e competência técnica para o cabal desempenho da sua missão árdua e eriçada de particulares dificuldades.
Tornou-se, por isso, o problema do recrutamento do pessoal de vigilância um dos que mais passaram II afligir a administração penitenciária.

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Isto porque o recrutamento actual destes servidores sofre limitações de vária ordem, entre as quais se avoluma e toma prioridade a questão dos vencimentos, pois é por de mais sabido que, não sendo adequadas as remunerações, não se podem obter e conservar ao serviço unidades que dêem rendimento capaz.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - Desde há tempos que nas colunas do Diário Popular se vem dando relevo à situação classificada de «precária» destes modestos funcionários, pugnando-se por uma solução que concilie os interesses dos serviços que deles tanto exige com os direitos e regalias que, num bem aferido critério de justiça, eles deveriam usufruir.
Quando se atenta na necessidade de seleccionar o pessoal para este serviço, logo se depara o problema da revisão das remunerações correspondentes aos vários graus da hierarquia. Efectivamente, não basta tornar mais rigorosas as condições de admissão aos concursos e criar cursos especializados para que q nível intelectual dos candidatos se eleve e a corporação passe a ser constituída por elementos profissionalmente aptos, com uma bem definida noção do desdobramento da missão que se lhes exige - a de guarda e a de educador - dentro da nova ideia penitenciária.
Para além do gosto que preside à escolha de uma profissão, a forma como esta é remunerada constitui ainda o melhor atractivo, pelo que a remuneração deve ser suficientemente elevada para atrair e conservar ao serviço as pessoas mais classificadas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Ora os guardas prisionais, vivendo na sua quase totalidade apenas da profissão que escolheram, trabalhando em condições excepcionalmente apertadas e duras, permanecendo anos e anos junto de delinquentes muitas vezes perigosíssimos, expondo a vida (como ainda não há muito tempo aconteceu com o homicídio de um elemento da Colónia Penal do Bié e de outro na Cadeia Penitenciária de Coimbra) e num estado de permanente tensão nervosa, por causa do risco das fugas e de manter a disciplina entre os presos, bem merecem ver ponderadas as suas aspirações mais instantes.
Com um horário de trabalho diário extenuante, que chega em alguns estabelecimentos a atingir doze a catorze horas, estes servidores só teriam possibilidades de beneficiar de um horário de trabalho idêntico ao dos guardas da Polícia de Segurança Pública se a corporação fosse aumentada com cerca de duas centenas de unidades, o que acarretaria para o Estado um apreciável encargo. É certo que para compensar as horas de trabalho extraordinário lhes é abonado um suplemento diário de 6$, com excepção da Colónia Penal de Pinheiro da Cruz, onde o suplemento é de 8$.
Sucede, porém, que este suplemento ou subsídio de alimentação não conta para efeitos de aposentação e é perdido em várias hipóteses de ausência, estando o seu quantitativo desactualizado, pois, fixado em 1948, nunca mais se procedeu ao necessário ajustamento, não obstante o custo de vida ter subido de modo considerável de há quinze anos para cá.
Muito embora façam parte de um quadro único, verifica-se falta de uniformidade na fruição de certos direitos por parte dos elementos da corporação, quer no que respeita à licença anual, quer pelo que toca à folga semanal. Assim é que, variando a escala de serviço de estabelecimento para estabelecimento, varia também o número de dias de licença que lhes são atribuídos, havendo estabelecimentos onde os guardas gozam apenas dez dias de licença, enquanto outros beneficiam da totalidade da licença.
Ora, sem discutir que o gozo da licença é um direito do funcionário ou uma concessão não discricionária da Administração, o que podemos dizer é que a falta de uniformidade a este respeito constitui uma injustiça relativa, agravada pelo facto de ser também no interesse dos serviços que as licenças são concedidas. Quanto às folgas a que têm jus por motivo da prestação do serviço nocturno acontece outro tanto, havendo estabelecimentos que a concedem semanalmente e outros até que, por imperativo do serviço, a não concedem.
Pelo que concerne às regalias que desfrutam os guardas que pertencem a oim quadro único, também é flagrante a falta de uniformidade, que, tal como acontece com a desigualdade verificada na fruição de certos direitos, resulta, não de qualquer arbitrariedade, mas das condições especiais de serviço em estabelecimentos prisionais diferentes Assim: enquanto há estabelecimentos prisionais, poucos, onde a faculdade concedida pelo § único do artigo 44.º do Decreto n.º 38386, de 8 de Agosto de 1951, é utilizada (permite que se forneça do rancho, ao preço do custo, alimentação aos funcionários), noutros essa faculdade não funciona; o mesmo acontece com as cantinas e as messes.
Mas a maior desigualdade é a que resulta de terem ou não habitação em casas do Estado. São óbvias as vantagens da sua existência em bairros junto aos estabelecimentos: vantagens que se traduzem em interesse de ordem económica para os guardas e conveniência para o serviço resultante da proximidade das residências.
Anunciado no relatório da Lei de Meios para 1958 o primeiro esquema de providências sociais a favor do funcionalismo, tem o Ministério da Justiça desenvolvido uma acção notável no sentido de concretizar a que respeita à execução de uma política habitacional, melhorando a situação dos funcionários dele dependentes.
Efectivamente, o Sr. Prof. Antunes Varela, com uma rasgada visão política e cima dominante preocupação de fazer justiça, vem desde há tempos incentivando a solução do problema habitacional dos seus modestos servidores, pois considera a casa o meio indispensável à dignificação da família e esta o mais poderoso instrumento de formação do homem no complexo rico da sua personalidade.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Por virtude dessa orientação, vai hoje em quase todos os estabelecimentos prisionais e tutelares de menores um movimento, uma azáfama, no sentido de se alcançar o ideal - dar habitação junto dos estabelecimentos a todos os seus funcionários.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: -Mas é evidente que as casas não se constróem de um momento para o outro, até porque o são sómente com mão-de-obra prisional de que se dispõe e, o que é mais, em regime de aprendizagem. Daqui o criar-se uma inconveniente situação de desigualdade entre guardas que prestam serviço no mesmo estabelecimento e entre os dos diferentes estabelecimentos, havendo apenas um - a Cadeia Central de Mulheres - onde as casas são em número bastante para todos os guardas.
Mas, enquanto não se atinge o objectivo ideal e com vista a atenuar a injustiça que ressalta desta desigualdade de situação, poderia talvez fazer-se incidir na fixação do subsídio ou abono de alimentação o factor importante de o funcionário ter ou não ter casa do Estado, atendendo-se

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ao preço médio das rendas das casas particulares existentes à volta dos estabelecimentos.
De resto, a solução não era novidade, porque, segundo nos parece, nas gratificações atribuídas aos guardas que prestam sor viço nas brigadas de trabalho talvez se tivesse levado em conta esse facto (o de não terem casa), dado que a transitoriedade do lugar e as diferenças de horas de trabalho ou a sua dureza não justificam, por si sós, os 300$ que o guarda das brigadas ganha a mais do que os outros.
Mas há mais: se compararmos a situação dos guardas prisionais com a dos outros corpos de tropas, nomeadamente com os guardas da Polícia de Segurança Pública, notamos também que aqueles se encontram em situação de inferioridade.
Senão, vejamos: os guardas da Polícia de Segurança Pública têm um subsídio para fardamentos, enquanto os guardas prisionais fardam-se unicamente a expensas suas; enquanto um chefe da Polícia de Segurança Pública ganha 2000$ mensais, um chefe de guardas dos serviços prisionais ganha 1600$ (vencimento ilíquido) e recebe um suplemento diário de 10$, que não conta para efeitos de aposentação. Mas a maior lacuna é a que respeita à falta de um regime especial de contagem de tempo para aposentação.
Justificam, esse regime especial as condições excepcionalmente duras de serviço, o risco de vida e também o facto de os guardas a partir de certa idade não possuírem a mobilidade indispensável para o exercício da função e, ao contrário do que acontece na Polícia Judiciária, Polícia de Segurança Pública e Guarda Nacional Republicana, não haver possibilidade de os retirar da vigilância para outros serviços. Constitui tal regime especial de contagem de tempo para efeitos de aposentação uma regalia de que goza algum pessoal da Polícia Judiciária, dos Sapadores Bombeiros (Decreto-Lei n.º 35892), da Polícia de Segurança Pública e ainda recentemente, pelos Decretos-Leis n.08 43 906 e 43 907, de 12 de Setembro de 1961. foi concedido a pessoal da Guarda Nacional Republicana e Guarda Fiscal.
Ora, considerando que as condições em que são desempenhadas as funções dos guardas prisionais de certo modo se identificam com as daqueles corpos de tropas, a quem o -Governo procurou, e muito justamente, concretizar o reconhecimento pelo esforço para além do normal do serviço, esforço que forçosamente consome e desgasta a vida de uma maneira diferente do normal das profissões, parece rios que bom seria ponderar a justiça que assiste à corporação dos guardas prisionais nesta pretensão.

antemos a esperança de que a questão venha a ser, no plano adequado, solucionada tão rapidamente quanto possível. É que a não se satisfazerem esta e outras justas e prementes aspirações destes modestos servidores, dentro em breve ver-nos-emos a braços com uma crise, que já se esboça, pelo êxodo dos melhores elementos, que abandonam o exercício destas funções públicas, e na aceitação forçada de elementos menos válidos e capazes, que acabarão por emperrar o bom andamento dos serviços.
Diimos por findas as nossas considerações, apelando para o Governo da Nação e, em especial, para os Srs. Ministros da Justiça e das Finanças, no sentido de ser melhorada a situação dos guardas dos serviços prisionais,. equiparando-os em direitos e regalias a outros que, pelo paralelismo no serviço que desempenham, já as usufruem.

Tenho dito.

Vozes: -Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. António Santos da Cunha: - Sr. Presidente: peço a muito especial atenção de V. Ex.ª e a dos demais ilustres membros desta Câmara para as palavras que vou pronunciar e estou certo vão ser escutadas com o recolhimento respeitoso devido a um dos mais egrégios portugueses do nosso tempo e que foi durante mais de três décadas pontífice da igreja primacial, deixando atrás de si uma obra sem par nos fastos da Igreja portuguesa.

Vozes: -Muito bem, muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: ao fazê-lo, faço-o possuído daquela viva emoção que se apoderou de todos nós, os filhos da igreja bracarense. quando os sinos de Santa Maria Maior anunciaram a má nova, logo secundados pelos campanários que se estendem pelo Minho além e constituem essa admirável unidade espiritual que o saudoso arcebispo, homem inteiramente devotado ao serviço de Deus, homem para quem não havia outro interesse que não fosse o interesse da Igreja, desde o princípio sempre soube com firmeza defender.
Deixa o Sr. D. António Bento Martins Júnior uma obra grandiosa a todos os títulos. Mas a nota destacada, paru mim, da sua acção como Pastor foi sem dúvida a caridade de que sempre soube polvilhar os seus actos. Não creio que ha a obra que se imponha se a ela não estiver a presidir um coração bondoso.
Tomou a Arquidiocese de Braga das mãos do seu glorioso antecessor, D. Manuel Vieira de Matos, e seguiu as suas pisadas.
Ainda eram vivos os sinais do furacão que em 1910 tinha destroçado tudo, aniquilado tudo, absolutamente tudo.
O Sr. D. António Bento Martins Júnior começou por erguer os seminários, e não só os edifícios que hoje enriquecem a Bracara Augusta, mas reformando e ampliando os estudos, criando devotadamente um corpo de professores, que é hoje lustre da Igreja portuguesa. A catequese, o cinema, a imprensa, a reforma da legislação diocesana, tudo isso mereceu especial cuidado ao meu saudoso e querido arcebispo. Uma magnífica rede de colégios afirma-o como prelado do nosso tempo e diz do cuidado que lhe mereceu a grande necessidade da época em que vivemos: a educação da juventude.
Formado em Direito Canónico, senhor de um profundo espírito jurídico, soube bem discernir dos homens e das coisas.
E foi por isso um prelado que na devida altura sempre soube prestar justiça ao homem que permitiu que durante estes anos se estabelecesse o clima necessário ao florescimento da Igreja em Portugal, o Sr. Presidente do Conselho.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: -Recordo dois factos apenas. Primeiro, numa hora má em que alguém pretendeu perturbar a paz religiosa neste país, o Sr. D. António Bento Martins Júnior, em plena catedral de Braga, por ocasião da comemoração do Estatuto do Trabalho Nacional, sendo Ministro das Corporações o nosso ilustre colega Sr. Dr. Veiga de Macedo, ergueu a sua voz para prestar justiça a quem a merecia e repor as coisas no devido lugar. Já morreu o Sr. Arcebispo e não fica por isso mal que traga para aqui uma conversa particular que então tive com S. Ex.ª Rev.ma Eu sou, Sr. Presidente, já o tenho dito muitas vezes, um produto da Igreja; à sua sombra formei o meu espírito. Tenho pela hierarquia e pela sua opinião o profundo respeito a que todos os católicos são obrigados.

Vozes: - Muito bem!

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O Orador: - Comentava um acontecimento triste que então se tinha passado no Norte do País, e comentava-o, porque não hei-de confessá-lo?, no sentido desfavorável à posição do Governo. Logo o Sr. Arcebispo me veio cortar as minhas considerações, lembrando que nem eu nem o autor do incidente que se estava processando tínhamos passado o que ele tinha passado, porque senão não falaríamos daquela maneira.
Sr. Presidente: deve ser agradável a V. Ex.ª, que foi um dos obreiros da Concordata portuguesa, saber que o Sr. D. António Bento Martins Júnior, embora entendesse que esse instrumento jurídico tinha aspectos que precisavam de ser revistos, nomeadamente no que se refere à educação, o considerava como modelo que no futuro deveria presidir em todo o Mundo às relações entre o Estado e a Igreja.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: o meu saudoso prelado, disse-o há pouco, era sem dúvida um grande servidor da Igreja. Mas nunca esqueceu a tradição dos arcebispos de Braga, a tradição dos bispos portugueses, e era também um grande, um egrégio patriota. Nós vimo-lo sempre acompanhar os Chefes de Estado, os Ministros, dar a sua presença em todas as manifestações cívicas. Quero recordar, e recordá-lo com grande saudade, o momento em que o Sr. Presidente do Conselho atravessou as naves da. Catedral de Braga numa cerimónia a que V. Ex.ª, Sr. Presidente, deu também à minha terra a honra de assistir. E quando os crentes que enchiam a catedral perturbavam a paz própria do templo, erguendo-se em aplausos ao Sr. Presidente do Conselho, estou a ver o espelho da sua bondade e da sua indulgência - o sorriso que lhe aflorou aos lábios.
Era desejo do Sr. Arcebispo Primaz que as suas cinzas repousassem ao lado do seu ilustre antecessor, que considerava como seu mestre, à sombra dos muros da Sé de Braga.
O Governo tem obrigação e é dever de justiça fazer com que se cumpra a vontade do Sr. Arcebispo e o venerando cabido primacial quer sem demora satisfazer.
Neste momento e neste lugar, apelo para o Sr. Ministro das Obras Públicas, por quem o seu saudoso prelado tinha muita especial consideração, no sentido de se fazerem na Sé os obras necessárias, e imediatamente, de modo que no 1.º aniversário do passamento do Sr. Arcebispo, todos nós, todos os de Braga, e Braga, volto a repeti-lo, vai do Minho até ao Ave, possamos, com Portugal inteiro, prestar homenagem ao Sr. Arcebispo, ao grande patriota, ao homem que sempre soube honrar a tradição dos seus antecessores, João Peculiar Pais Mendes e o Beato Lourenço, que repousa também numa capela da Sé de Braga, ao lado dos primeiros valores de Portugal, o conde D. Henrique e a rainha D. Teresa.
Deste último se diz que D. João I, no fragor de uma batalha -a de Aljubarrota- perguntou: «Quem é aquele audaz e tão destemido cavaleiro?» E responderam-lhe: «Não sabemos senão que se chama Lourenço e que é de Braga».
Sr. Presidente: vou terminar as minhas considerações. Eu tinha, e tenho, pela figura do meu saudoso prelado, veneração carinhosa muito especial; senti muitas vezes estender-se para mim a sua mão amiga, sempre cheia de compreensão e afecto, e quando recebi a notícia da sua morte, a notícia de que a orfandade me tinha de novo batido à porta, corri, como era meu dever, cheio de dor, ao Paço Arquiepiscopal.
Na sala estavam ainda poucos: o venerando bispo auxiliar, hoje. administrador apostólico, membros do El mo Cabido e outros membros do clero, e já alguma gente humilde, gente que ele soube sobremaneira amar. Filho da Dia cepa rural, o Sr. Arcebispo sabia com a mesma naturalidade pisar os tapetes de veludo dos palácios dos grandes, como os caminhos humildes das aldeias sertanejas, que todas se cobriam de festa para o receber. Era o Pastor amado que vinha em nome do Senhor.
Eramos poucos, ouvia-se soluçar, e as minhas lágrimas molharam as. mãos venerandas daquele santo, que da penitência fazia regra de vida. Ele, que era tão bondoso, sem esquecer a justiça, sem a qual não pode haver santidade, devia, nessa altura, estar contente, por ver na minha dor testemunho de fidelidade mantida na vida e que continuava assim depois da morte.
Muito o amarguraram as desditas e injustiças que nesta hora chovem sobre a nossa pátria. Na pátria celeste não deixará de rezar por Portugal, que sobremaneira amou. Eu acredito que assim é, e daqui, desta tribuna, para os altos dos Céus, lhe dirijo uma palavra: meu querido e venerando prelado, nós continuamos fiéis ao teu testamento - por Deus e pela Igreja, pela Pátria, pelo nosso Portugal e pela grandeza da Arquidiocese de que somos filhos.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr.. Presidente: - Srs. Deputados: creio interpretar os sentimentos da Câmara afirmando a minha e a sua homenagem ao grande português que foi o Sr. D. António Bento Martins Júnior.

Vozes: -Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - Vai passar se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continua em discussão na generalidade o projecto de lei do Sr. Deputado Amaral Neto sobre o reembolso, pelos subsequentes usuários, dos custos de linhas ou instalações novas que os consumidores de energia eléctrica hajam pago às entidades distribuidoras.

Tem a palavra o Sr. Deputado Virgílio Cruz.

O Sr. Virgílio Cruz: -Sr. Presidente: ao encerrar o debate deste projecto de lei, quero testemunhar ao ilustre Deputado proponente o meu apreço pela sua eficiente actuação parlamentar, uma vez- mais demonstrada neste trabalho que apresentou e defendeu com inteligência, senso realista e espírito construtivo, qualidades bem características do nosso distinto colega Sr. Eng.º Amaral Nefco.
A Assembleia Nacional, sempre atenta aos problemas do País, vai agora debruçar-se sobre este, de interesse para muitos futuros consumidores de electricidade, e sobre ele fazer considerações que traduzam o bem comum, de que devemos ser nesta Câmara os intérpretes e defensores.

Sr. Presidente e Srs. Deputados: o princípio preconizado no projecto de reembolso, pelos subsequentes usuários, dos custos de linhas ou instalações novas que os consumidores de energia eléctrica hajam pago às entidades distribuidoras é justo e fomentador da electrificação.

Vozes: -Muito bem!

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O Orador: - Justo porque durante um certo prazo reparte os encargos da obra por todos os que dela beneficiam, e é fomentador da electrificação porque, garantindo que os encargos da instalação virão a ser repartidos por todos os consumidores que a ela se venham a ligar durante um prazo determinado, desencoraja aqueles que tentariam colocar-se à espreita até que o primeiro fizesse a obra para logo em seguida dela beneficiarem sem dispêndio. -
Nos termos da legislação em vigor, as instalações, mesmo pagas pelos consumidores, ficam fazendo parte integrante da rede; isto além de muitas vezes desagradar às concessionárias, visto a dádiva reverter gratuitamente para o Estado ao terminar a concessão, dádiva que lhe acarreta encargos anuais da ordem dos 7 por cento do custo da instalação integrada na sua rede, ainda faz com que as distribuidoras não possam recusar as ligações de novos clientes a esta instalação, nem evitar que quem requisitou a obra suporte a totalidade da despesa sem que seja compensado pelos que a seguir dela beneficiam; este estado de coisas constitui grave injustiça; urge, pois, modificá-lo.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - O projecto de lei em apreciação virá acabar com esta possibilidade injusta e, por isso, ele vem de encontro aos desejos dos consumidores, dos serviços oficiais e das distribuidoras.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Na pequena distribuição o princípio já faz parte dos cadernos de encargos recentes, onde o direito à indemnização vigora durante cinco anos, a partir da data do início da exploração das linhas, sendo a indemnização assegurada por intermédio da concessionária, que cobra dos novos utentes as quantias de que deverão ser reembolsados os consumidores iniciais.
Como este projecto de lei engloba a pequena e grande distribuição, em muitos casos, principalmente nas altas tensões, o prazo de cinco anos poderá ser insuficiente para desencorajar aqueles que, desejosos de fazerem economias,, esperariam os cinco anos para, sem quaisquer encargos, se ligarem às instalações pagas pelos outros. Por isso, parece-nos de aceitar como prazo de reembolso os dez anos preconizados no projecto de lei, o que funcionalmente é aceitável, visto a vida física das instalações ser superior a este período e ser já de dez anos o prazo de que as concessionárias beneficiam na garantia de pagamento do encargo de potência e do mínimo de consumo quando, ao abrigo da hipótese II do artigo 118.º do Decreto-Lei n.º43335, fazem um ramal.
Feitas estas considerações sobre as vantagens do projecto que levaram a Comissão de Economia a pronunciar-se favoravelmente sobre a sua admissão quando em Abril próximo passado foi, nos termos regimentais, convocada para o examinar e sobre ele se pronunciar, vamos passar agora a debruçar-nos sobre o parecer da Câmara Corporativa.
Trata-se de um documento de grande interesse técnico, de que é relator um engenheiro distinto, o Sr. Procurador Paulo de Barros. Ao ilustre relator dirijo, por isso, desta tribuna, uma palavra de admiração e apreço.
A Câmara Corporativa é um órgão técnico, e este seu parecer é muito técnico e bastante regulamentar.
Ora, como o artigo 92.º da Constituição nos diz que «As leis votadas na Assembleia Nacional devem restringir-se à aprovação das bases gerais dos regimes jurídicos, ...», surge a primeira dificuldade em adoptar a redacção da Câmara Corporativa, bastante regulamentadora, porque penso que o Deputado se deva colocar na posição de atento observador e zeloso defensor dos preceitos constitucionais.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Mas isso não nos impede de aproveitar as sugestões do referido parecer que possam beneficiar o projecto de lei em debate é com os articulados do projecto e do parecer fundir um projecto de lei remodelado.
A Câmara Corporativa procura, no parecer emitido, simplificar em vários aspectos as atribuições que a execução do novo projecto acarretará às concessionárias ou distribuidoras, e nesse sentido faz várias sugestões visando a aplicação de métodos práticos e aproximados para a pequena distribuição e de sistemas mais perfeitos só na grande distribuição.
Assim, para a pequena distribuição rural considera que o reembolso pelos subsequentes usuários cesse logo que o número de consumidores ligados à instalação iguale o número de hectómetros da extensão do traçado.
Este critério, embora simplificador, afasta-se dos objectivos do projecto, porque por um lado converteria o sacrifício de um ou dos primeiros utentes em sacrifício de três, quatro, etc., consumidores, conforme o número de hectómetros do ramal, além de poder tornar ilusório o prazo fixado para o direito ao reembolso. Parece-nos que isto só garante meia justiça e que os primeiros consumidores se não contentariam com ela; eles querem a maior justiça possível e que não sejam beneficiados aqueles que se colocariam à espreita e esperariam para não pagar.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Sugere que na baixa tensão o reembolso seja independente da potência instalada. Este princípio, já implícito no projecto, é de aceitar, porque na baixa tensão as potências utilizadas pela maioria serão pouco diferentes umas das outras e por isso não serão prejudicados os consumidores médios.
Considera que no cálculo da parte da instalação a pagar por cada cliente se faça sempre o arredondamento para o hectómetro superior.
Na alta tensão faz-se assim por ser de lei, mas este critério, que é mais cómodo, se for aplicado ao caso dos reembolsos sucessivos, poderá conduzir a que o montante dos reembolsos assim calculados exceda, por acumulação dos excedentes pagos, o reembolso que na realidade é devido; portanto, parece mais justo ou fazer a conta certa, embora seja mais trabalhoso, ou então fazer o arredondamento para o número inteiro de hectómetros mais próximo, o que seria mais simples, embora só atenue o erro.
Nas instalações de valor reduzido (não superior a 1500$) pretende o parecer que seja dispensado o reembolso.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Ora quem conhece bem a vida da gente rural sabe que para muitos deles este limite já representa sacrifício; e embora a verba referida só dê para a construção de um ramal curto, mesmo assim ele pode, nalguns casos, vir a alimentar mais que um cliente, e se só o primeiro paga pode acontecer que ninguém queira ser o primeiro.
Propõe que só o consumidor inicial seja reembolsado pelos utentes seguintes.

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Este critério obrigaria o primeiro a ser o único financiador de todos os seguintes, além de, nos casos de um número de utentes inferior ao número de hectómetros da instalação (o que pode acontecer nas zonas do êxodo rural) , conduzir a reembolsos inferiores à proporção do comprimento das linhas por cada qual utilizado, o que não parece suficientemente justo para essas zonas pobres.
Sugere ainda o parecer que nas zonas rurais e para instalações de baixa tensão que não excedam 10 hm o reembolso seja determinado por uma tabela que propõe.
Esta tabela considera o reembolso unicamente ao primeiro consumidor; ela simplificaria muito o cálculo das indemnizações, mas, como faz a repartição dos encargos a priori, conduziria a diferenças que por vezes podem ser sensíveis, principalmente em zonas de economia estagnada ou deprimida em que o ramal tenha menos consumidores do que hectómetros.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: -Ao analisar a pequena distribuição urbana, o parecer preconiza que em zonas onde haja possibilidade de prever o número de consumidores a ligar à nova instalação o financiamento das obras seja feito pela distribuidora e que a indemnização da parte que lhe é devida (aquela que não for comparticipada nem imposta pelo caderno de encargos) seja dividida em partes iguais por todos os consumidores inicialmente previstos, devendo cada um pagar a sua parcela à medida que se forem fazendo as ligações.
O financiamento pela distribuidora sugerido no parecer é fomentador da electrificação e por isso de aceitar e até de aplaudir; quanto à obrigação de os consumidores pagarem todos o mesmo, isso poderia contrariar a intenção do projecto.
E, finalmente, ao tratar da grande distribuição, propõe o parecer não só que o reembolso a fixar seja função do traçado a utilizar, o que já especificava o projecto, mas que se considere ainda um novo parâmetro: a potência contratada.
Na grande distribuição é absolutamente justo que assim se proceda, porque as potências contratadas por cada consumidor podem apresentar grandes diferenças.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: para além dos casos contemplados no projecto e no parecer, parece útil alargar o seu âmbito à segunda hipótese do artigo 118.º do Decreto-Lei n.º 43 335, às modalidades de compensação possibilitadas pelo seu § 2.º e à electrificação agrícola, ainda incipiente no nosso país e tão carecida de auxílio.

O Sr. Reis Faria: - Na realidade, há três hipóteses a considerar: as dos n.º* 1 e 2 e a do § 2.º, que é, efectivamente, a mais usada. Há a possibilidade de um acordo entre o distribuidor e o consumidor, muito diferente das hipóteses previstas nos n.ºs 1 e 2.

O Orador: - Muito obrigado a V. Ex.ª, e, por isso, peço aqui o alargamento da lei a esse e outros casos.

O Sr. Reis Faria: - E que, realmente, nas zonas muito pobres qualquer das condições dos n.ºs 1 ou 2 constitui um pesado encargo para as câmaras municipais ou para quem tiver feito essa despesa. Além disso, há ainda a possibilidade de uma comparticipação de 40 por cento da Junta de Colonização Interna, o que muito vem ajudar às soluções nas zonas rurais.

O Orador: - Inteiramente de acordo com V. Ex.ª e muito obrigado pelo apoio às minhas considerações.
Nesse sentido se sugere que as obras de electrificação ligadas à exploração agrícola e que, ao abrigo do Decreto n.º 43 661, de 4 de Maio de 1961, a Junta de Colonização Interna comparticipa até 40 por cento do seu custo sejam também englobadas no âmbito da nova lei ...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - ... e que para esse efeito os reembolsos funcionem apenas entre os consumidores, visto a comparticipação da Junta de Colonização Interna ter sido dada para auxiliar a obra.

Vozes: -Muito bem, muito bem!

O Orador: - Por estas e outras razões devidamente ponderadas na Comissão de Economia, foi nela decidido apresentar à votação da Assembleia um projecto de lei remodelado e que corresponde aos objectivos do projecto inicial, a algumas sugestões do parecer da Câmara Corporativa e ainda a outras que foram apreciadas nessa Comissão.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: vou terminar felicitando o Sr. Deputado Amaral Neto pela iniciativa do projecto, que, embora de âmbito limitado, será fomentador da electrificação e ajudará a levar os benefícios da electricidade a muitas casas e utilizações privadas ainda do seu uso.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Eu não queria declarar que se ia entrar na especialidade sem saber se algum de VV. Ex.ª requer qualquer coisa relativa ao texto sobre o qual há-de incidir a discussão na especialidade.
Ponho este problema à consideração da Câmara: como VV. Ex.ª não ignoram, as emendas ao texto sobre que se há-de fazer a discussão na especialidade, sendo apresentadas durante a discussão na generalidade, podem sê-lo por um Sr. Deputado apenas, mas as apresentadas na especialidade têm de ser subscritas pelo menos por cinco Srs. Deputados.
Se realmente se pensa requerer qualquer coisa relativamente ao texto sobre o qual deve incidir a discussão na especialidade, é bom fazê-lo agora.

O Sr. Amaral Neto: - Sr. Presidente: porque sou um dos seus subscritores, sei estar presente na Mesa uma proposta que visa à substituição integral do projecto de lei por um outro texto. Posso aliás acrescentar que já foi sugerido na discussão do debate, pelo Sr. Deputado Virgílio Cruz e por mim próprio, que essa substituição pretende enriquecer o projecto inicial com a inclusão de algumas das sugestões da Câmara Corporativa. V. Ex.ª é o juiz que há-de decidir se essa proposta de substituição total do texto primitivo, que está subscrita por mais de um Deputado, deve ser apresentada à aceitação da Câmara no período da ordem do dia e depois de entrada a discussão na especialidade. Quero pedir a atenção de V. Ex.ª para este aspecto. Há realmente uma proposta de substituição integral do projecto, firmada por sete Srs. Deputados, entre os quais tenho a honra de me incluir. Suponho que a

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informação da existência desta proposta responde à pergunta esclarecedora que V. Ex.ª dirigiu à Assembleia. Tenho dito.

O Sr. Presidente: -Interpreto a proposta que tenho na Mesa, subscrita pelo Sr. Deputado Amaral Neto e mais seis Srs. Deputados, como significando que se quer substituir o projecto inicial por este texto e se foi conduzido a não haver nada expresso sobre a matéria, que ao Presidente cabe decidir sobre se pode admitir-se que o projecto primitivo seja substituído pelo novo projecto organizado segundo as sugestões da Câmara Corporativa. Suponho que sim, e a minha insistência no sentido de este problema ser resolvido na generalidade, apesar de estar assinado por mais de cinco Deputados, é esta: ao projecto podem ser apresentadas propostas de alteração, e estas, apresentadas na generalidade, podem ser assinadas só por um Deputado, e na especialidade têm de sê-lo pelo menos por cinco.
Isto me conduz à conclusão de que o problema deve resolver-se agora.
Pensei em consultar sobre ele a Assembleia, mas desisto de o fazer, para não estabelecer o precedente de que é u Assembleia, e não ao Presidente, que cabe interpretar ou integrar o Regimento.
Nesta orientação, vou declarar admitido este projecto de substituição do projecto inicial e mandá-lo ler, para VV. Ex.ªs dele terem conhecimento.

Foi lido. Ê o seguinte:

Proposta de substituição

Propomos que o projecto de lei em discussão seja substituído pelo seguinte:

BASE I

Os consumidores de energia eléctrica que tiverem suportado encargos de estabelecimento de linhas ou instalações destinadas ao seu abastecimento deverão ser indemnizados desses encargos, sucessivamente e nos termos das bases seguintes, pelos demais consumidores que, antes de decorridos dez anos, a contar do início da exploração, pretendam obter ligação a essas linhas ou instalações.

BASE II

Em zonas em que possa prever-se o número de futuros consumidores, os encargos de estabelecimento das redes de baixa tensão serão suportados pela entidade distribuidora. Porém, com observância dos termos e condições referidos no respectivo caderno de encargos, se houver concessão, e do pleno benefício das disposições da Lei n.º 2075, de 21 de Maio de 1955, e do Decreto n.º 40 212, de 30 de Junho de 1955, à medida que se fizerem as ligações será a entidade distribuidora indemnizada, pelos consumidores, da. parte que a estes deva competir na despesa realizada.

BASE III

1. Tratando-se de linhas ou instalações de alta tensão, as indemnizações serão fixadas pelos concessionários, na proporção das potências contratadas e dos desenvolvimentos dos traçados aproveitados pelos novos consumidores.
2. Nas linhas ou instalações de baixa tensão a indemnização será fixada, pelo distribuidor, em função da extensão do traçado que for utilizada por cada novo distribuidor.

BASE IV

1. Não poderá ser feita, pelas entidades concessionárias ou distribuidoras de energia eléctrica, a ligação das linhas ou instalações a, novos consumidores antes do pagamento das indemnizações previstas nas bases anteriores.
2. A entidade concessionária ou distribuidora deverá cobrar as importância das indemnizações e entregá-las aos consumidores que a elas tenham direito.

BASE V

Os casos duvidosos serão resolvidos pela fiscalização técnica do Governo.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 3 de Dezembro de 1963. - Os Deputados: Carlos Monteiro do Amaral Neto - Alberto Ribeiro da Costa Guimarães - António Martins da Cruz - Alberto Maria, Ribeiro de Meireles - Rogério Vargas Moniz - Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Virgílio David Pereira e Cruz.

O Sr. Presidente: - Está admitido o projecto apresentado em substituição do projecto inicial, depois de verificar que nele não se trata de matéria que não tenha sido submetida à consideração e parecer da Câmara Corporativa.
Se algum dos Srs. Deputados deseja fazer qualquer alteração na generalidade a este projecto, nos termos em que acaba de ser- lido, é altura de o fazer.

O Sr. Amaral Neto: - Sr. Presidente: se V. Ex.ª mo permite, desejo acentuar que, segundo me parece, não há dúvida nenhuma possível de que o projecto de substituição não contém qualquer matéria que não haja sido contemplada na Câmara Corporativa. E se V. Ex.ª e a Assembleia me consentirem, farei uma pequena história das razões da apresentação deste projecto de substituição.

Como VV. Ex.ª já puderam aperceber-se, o projecto original era extremamente simples: reduzia-se a duas bases. A primeira referia-se ao pagamento, pelos usuários subsequentes, dos custos de estabelecimento suportados pelo primeiro usuário. A segunda base referia-se ao processo de cálculo e cobrança das indemnizações.
Sobre este projecto a Câmara Corporativa fez um estudo minucioso e profundo na secção chamada a pronunciar-se sobre ele, e, devido aos conhecimentos especializados que alguns dos seus componentes, em especial o relator, têm dos problemas da distribuição, resolveram apresentar um contraprojecto que apresentava sugestões que, como bem disse o Sr. Deputado Virgílio Cruz, são bastante pormenorizadas e muito regulamentares.
A nossa Comissão de Economia debruçou-se sobre o parecer da Câmara Corporativa e pensou que, justamente pelo aspecto excessivamente regulamentar, e até, como na especialidade acrescentarei, pela possibilidade de interpretações perigosas de certas fórmulas apresentadas pela Câmara Corporativa, haveria vantagem em aproveitar algumas das sugestões apresentadas para enriquecer o projecto original, de forma a tornar o projecto da Câmara Corporativa mais conforme com o espírito e a letra da Constituição, que prescreve em princípio nos restrinjamos a formular as bases gerais dos regimes jurídicos.

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Fará apresentar ao debate e à discussão na especialidade esta matéria havia vários caminhos. Havia o caminho de propor emendas ao projecto inicial. Havia a forma de alguém adoptar a solução dá Câmara Corporativa e para ela propor emendas.
Haveria a terceira fórmula, que pareceu mais clara e mais apta a informar a Assembleia, de condensar o estudo da Comissão de Economia, que, tendo a aparência de um projecto novo, de um projecto de substituição integral do meu, era apenas, na verdade, o enriquecimento deste com pormenores sugeridos pela Câmara Corporativa. Devo dizer a V. Ex.ª e à Câmara, para atestar a delicadeza de espírito dos nossos colegas, que a esta modalidade ouvi só levantar um reparo, o de que perante os observadores menos prevenidos a posição do proponente poderia ficar diminuída, visto que, tendo sido apresentado um determinado projecto, era depois submetida nada menos nada mais do que uma substituição total desse projecto.
Ora, Sr. Presidente e Srs. Deputados, se há pessoa sempre disposta não só a reconhecer os seus erros, como a aceitar as melhorias possíveis às suas iniciativas, é este criado de VV. Ex.ª Creio não haver nada mais pernicioso, como diziam antigos teólogos, nada mais diabólico, do que perseverar em erro, insistir numa posição menos perfeita quando se pode adoptar outra que lhe é superior. E nesta ordem de ideias pedi aos nossos colegas da Comissão de Economia que fizessem o favor de não pôr mais obstáculos desta natureza subjectiva à propositura de um novo projecto de substituição, porque, se eles o quisessem assinar, eu me sentiria muito honrado em assinar com eles.
O Sr. Presidente da Comissão quis, em face disto, fazer o favor de assinar o projecto de substituição, assim como todos os Srs. Deputados que intervieram no debate, e eu também, com muito gosto.
Temos a plena consciência de que não há neste projecto de substituição qualquer ponto ou pormenor não considerado pela Câmara Corporativa, o que não quer dizer que não haja a versão que a Comissão entendeu dar às sugestões, pormenores e aspectos contemplados pela Câmara Corporativa. Considerou a sua discussão, apreciou a sua análise, moldou-a pela sua própria crítica e, sem alterar, sem elevar, a substância da matéria, apresenta a VV. Ex.ªs a fórmula que lhe parece a mais própria para ficar definitivamente a constar dos nossos anais legislativos.
Haveria, dizem-me alguns Srs. Deputados que não participaram das reuniões ou que não fazem parte da Comissão de Economia, outra modalidade, que era a de votar o projecto inicial e deixar para medidas regulamentares o que se introduziu agora no novo projecto de lei.
Só há um reparo a este entendimento e que é o que afinal norteou a nossa Comissão de Economia, que, posso aliás afirmar a VV. Ex.ª, não se decidiu sem ter obtido primeiro o juízo e a informação dos serviços competentes do Ministério da Economia. E que a nossa história legislativa está cheia de leis mortas pela falta de regulamentação, e, embora neste caso não seja muito de recear que a falta do apêndice regulamentar tire vida e força imediata ao projecto de lei, ele nada perderá em incluir algumas disposições regulamentares que a Câmara Corporativa lhe ofereceu.
Eis aqui, Sr. Presidente, a história da propositura da substituição do projecto original e, se VV. Ex.ª me permitem, vá lá, para que eu não apareça perante VV. Ex.ªs, ou perante algum observador externo desprevenido, como sujeito que volta com a palavra atrás, concluirei com o reforço da afirmação de que toda a ideia primitiva está lá, apenas o que está é também mais alguma coisa a completá-la. Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado a V. Ex.ª
Vai passar-se à discussão na especialidade. Está em discussão a base I do projecto de substituição. Vai ler-se.

Foi lida. É a seguinte:

BASE I

Os consumidores de energia eléctrica que tiverem suportado encargos de estabelecimento de linhas ou instalações destinadas ao seu abastecimento deverão ser indemnizados desses encargos, sucessivamente e nos termos das bases seguintes, pelos demais consumidores que, antes de decorridos dez anos, a contar do início da exploração, pretendam obter ligação a essas linhas ou instalações.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

O Sr. Amaral Neto: - Sr. Presidente: esta base I do projecto de substituição é o englobamento dos artigos 1.º e 2.º das sugestões da Câmara Corporativa com a observação do princípio fundamental da essência da base I do projecto primitivo.
Como VV. Ex.ª podem reconhecer pela leitura do articulado, continua a afirmar-se aqui o princípio essencial de que os consumidores de energia eléctrica que tiverem suportado encargos de estabelecimento de linhas ou instalações destinadas ao seu abastecimento deverão ser indemnizados desses encargos pelos subsequentes usuários. Ora a Câmara Corporativa, no artigo 1.º, começava exactamente com as mesmas palavras e referia-se em especial àqueles consumidores em alta tensão abrangidos pelas disposições apresentadas em primeiro lugar no artigo 118.º do Decreto-Lei n.º 43 335. Estes são os que hajam pago integralmente o custo das linhas de alta tensão que os alimentem.
Esse artigo 118.º, como ontem tive ocasião de dizer a VV. Ex.ª, contempla duas hipóteses em matéria de indemnização às empresas concessionárias pelos beneficiários das linhas novas construídas para seu abastecimento.
Na primeira hipótese, que é precisamente a contemplada no artigo 1.º do projecto da Câmara Corporativa, os consumidores em proveito de quem essas linhas tenham sido estabelecidas inicialmente pagarão o custo integral delas, pura e simplesmente.
Na segunda hipótese é que então intervirá um subsídio, a garantia de consumo e a garantia do encargo de potência.
O artigo 1.º da Câmara Corporativa dirige-se realmente só aos consumidores da primeira hipótese, mas os da segunda têm efectivamente, se não na interpretação prática que ultimamente se está a dar àquela disposição legal, pelo menos na precisa interpretação do seu articulado, o desembolso do subsídio considerado na alínea a) da parte II do tal artigo 118.º, subsídio que está indicado que terá de ser de uma certa ordem, mas que não vale a pena indicar agora numericamente, embora seja inferior ao custo da linha. Ora, se nós adoptássemos a redacção da Câmara Corporativa, aconteceria que os consumidores, nesta segunda hipótese do artigo 118.º, não teriam direito a ser reembolsados pelos subsequentes usuários do subsídio que tivessem pago.

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Nada no espírito das conclusões da Câmara Corporativa permite considerar que tenha sido intencional a omissão dos consumidores apenas sobrecarregados com os subsídios de linha. Quando muito, pode supor-se que a Câmara Corporativa não achou necessário considerar esse encargo, talvez porque na prática os distribuidores de alta tensão se têm estado a contentar com as garantias de encargo de potência e de consumo mínimo anual, e assim não valeria a pena pensar na hipótese de um subsídio que a prática tem feito cair em desuso.
Mas a verdade é que, se subsiste esta fórmula na disposição legal, qualquer consumidor pode ser chamado a tal pagamento, e como o princípio que se defende é o de os subsequentes usuários reembolsarem sempre o primeiro do que ele houver despendido, é necessário prever o caso. Além disto o n.º 2 do artigo 1.º do texto da Câmara Corporativa contém uma precisão perfeitamente ociosa e que poderia produzir, mesmo com boa intenção, uma duplicação de pagamento.
Esse n.º 2 preceituava: «... independentemente do pagamento da indemnização prevista no número anterior, deverão os novos consumidores pagar ao distribuidor o que for devido ...». Ora este «independentemente do reembolso, pagar o que for devido» é, rigorosamente, pagar o que for devido a mais. Mas quem nos livra de amanhã uma pessoa menos atenta ao sentido da disposição viva interpretar que esse pagamento é o que competir pela instalação toda, além do reembolso ao primeiro usuário? Será um risco muito remoto, convenho, mas perigoso.
Aproveitou-se, portanto, para a nossa base I apenas o n.º 1 do artigo 1.º da redacção da Câmara Corporativa.
Quanto ao artigo 2.º da redacção da Câmara Corporativa, que também está englobado no conteúdo desta base i, ele visa especialmente o reembolso dos encargos de estabelecimento de linhas ou instalações de baixa tensão em zonas rurais onde não seja possível prever o número total de futuros consumidores e quando se verifiquem as seguintes condições: não ser a despesa suportada inferior a 1500$; não ser o prazo decorrido desde a entrada em serviço das instalações superior a oito anos; o número de consumidores não exceder o número de hectómetros percorridos pela instalação.
Quanto ao prazo, já ontem me referi a ele para pedir a atenção de V V. Ex.ª para a falta de razões concretas para o reduzir de dez anos para oito e o Sr. Deputado Virgílio Cruz também defendeu hoje a prevalência do prazo de dez anos.
Quanto ao reembolso sómente de quantias superiores a 3500$, ponderou a Comissão de Economia que esta soma. nas zonas rurais, não é tão pequena quanto pareceu- aos grandes distribuidores de energia e Dignos Procuradores que firmaram o parecer da Câmara Corporativa.
Portanto, o que se fez foi o regresso do artigo 2.º das sugestões da Câmara Corporativa à base I da nossa redacção.
Transformou-se o prazo de oito em dez anos, eliminando-se a questão de os encargos suportados terem ou não excedido 1500$.
E bem possível que num hectómetro de linha, se sobretudo ela for conduzida ao longo de um caminho público, marginado por pequenas propriedades, surja mais do que um consumidor a pretender ligar-se-lhe depois de ela estabelecida.
Na redacção da Câmara Corporativa só o primeiro destes a servir-se desse hectómetro da linha reembolsará o usuário que tiver suportado inicialmente os encargos, e os demais servir-se-ão gratuitamente.
Pareceu, pois, que seria ofender as aspirações de justiça comutativa dominantes no projecto aceitar aquela sugestão da Câmara Corporativa e; por isso, ela foi eliminada no projecto actual.
Aqui está o movimento intelectual que levou à redacção da base I do projecto de lei como está em exame.
Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão.

O Sr. Virgílio Cruz: - Sr. Presidente: depois das considerações produzidas pelo ilustre Deputado Amaral Neto, apenas acrescentarei que esta base I alarga o âmbito do projecte inicial e do articulado proposto pela Câmara Corporativa à hipótese II do artigo 118.º do Decreto-Lei n.º 43 335, às outras modalidades de compensação referidas no § 2.º do mesmo artigo e às obras de electrificação agrícola que, ao abrigo do Decreto n.º 43 661, de 4 de Maio de 1961, a Junta de Colonização Interna comparticipa até ao limite de 40 por cento do seu custo.
Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como mais nenhum Sr. Deputado deseja fazer uso da palavra, vai votar-se.

Submetida à votação foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Vai agora ler-se a base II.

Foi lida. É a seguinte:

BASE II

Em zonas em que possa prever-se o número de futuros consumidores, os encargos de estabelecimento das redes de baixa tensão serão suportados pela entidade distribuidora. Porém, com observância dos termos e condições referidos no respectivo caderno de cargos, se houver concessão, e do pleno benefício das disposições da Lei n.º 2075, de 21 de Maio de 1955, e do Decreto n.º 40 212, de 30 de Junho de 1955, à medida que se fizerem as ligações será a entidade distribuidora indemnizada, pelos consumidores, da parte que a estes deva competir na despesa realizada.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

O Sr. Amaral Neto:-Sr. Presidente: esta base II do novo projecto é a matéria do artigo 5.º, n.ºs 1 e 2, das sugestões da Câmara Corporativa.
Neste artigo 5.º da Câmara Corporativa, agora base II do nosso projecto, apresenta-se a hipótese de nas zonas que não sejam as consideradas no artigo 2.º da mesma Câmara, isto é, naquelas em que possa; prever-se o número de futuros consumidores, os encargos dê estabelecimento da rede de baixa tensão serem suportados pela entidade distribuidora à medida que se fizerem ligações, sendo esta entidade indemnizada, pelos consumidores, da parte que a eles deva competir na despesa realizada.
Assim, a empresa concessionária faz a linha, paga-a e vai cobrando o reembolso de cada um dos usuários, o que pode fazer com certa segurança, dada a certeza de quantos virão a ser estes consumidores.
No entanto, a Câmara Corporativa, na sua redacção, introduziu a menção de dois diplomas legais, menção essa que pode contribuir para tornar confuso o entendimento do seu artigo. E porquê?

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Esses diplomas legais são aqueles que concedem a comparticipação do Estado para determinados tipos de instalações eléctricas em baixa tensão, especialmente para as electrificações de pequenos povoados. Essas comparticipações são dadas naturalmente com o fim de serem em benefício dos consumidores.
O valor dessas comparticipações tem sempre de ser deduzido dos encargos de estabelecimento que hajam de reembolsar a empresa concessionária pelo facto de ter construído a rede.
A menção destes diplomas não consente outra interpretação, mas também não a precisa para se saber que quando entrassem em jogo se haveria de proceder assim. Respeita-se, no entanto, o cuidado que a Câmara Corporativa teve em lembrar-se deles, dizendo apenas que há-de ser observado o pleno benefício das suas disposições. E para chamar aberta e claramente a atenção para a circunstância de que quando o Estado comparticipar as redes de baixa tensão é para beneficiar os consumidores.
Alguns reembolsos que hajam de fazer-se à concessionária serão sempre satisfeitos depois de descontado o pago pelo Estado como subsídio. Mais ainda: em muitos cadernos de encargos está previsto que, se as obras de electrificação forem subsidiadas por alguma entidade, em determinada percentagem, a concessionária é obrigada a fazer a electrificação, pondo do seu bolso o restante.
Nesta hipótese não há lugar a qualquer indemnização dos consumidores. Foi por isso que pareceu bem adoptar totalmente as palavras de sugestão da Câmara Corporativa, acrescentando-se-lhes estas duas pequenas excrescências esclarecedoras: entende-se que vai ser dado aos consumidores o pleno benefício dos diplomas legais, especificando-se que a parte que eles devem reembolsar há-de ser a que lhes compita na despesa realizada.
Está rigorosamente respeitado o espírito da disposição da Câmara Corporativa.
Está esclarecido para evitar interpretações que, aliás, não é possível conceber que existissem no ânimo da Câmara Corporativa. Apenas se eliminou o n.º 3 do artigo 5.º, que estabelece para os consumidores responsabilidade igual na indemnização dos encargos, por se entender que nas redes há diversidades de situações que talvez não fosse muito da tal justiça comutativa transformar em igualdade de pagamento.
Aqui têm V V. Ex.ª o raciocínio que conduziu à formulação da base n, com aproveitamento do melhor das ideias da Câmara Corporativa.

O Sr.- Presidente: - Continua em discussão.

O Sr. Virgílio Cruz: - Nesta base aceita-se a sugestão do parecer da Câmara Corporativa segundo a qual, nas zonas em que possa prever-se o número de futuros consumidores, os encargos de estabelecimento das redes de baixa tensão passam a ser suportados pela entidade distribuidora.
A sugestão foi aceite por ser favorável ao consumidor e ser fomentadora da electrificação.
Como há casos em que os consumidores terão de pagar toda a extensão da rede e outros casos em que só lhes cabe pagar a baixada, procurou-se que na redacção da base ficasse ressalvado com toda a clareza que o custo da parte comparticipada das instalações, e, portanto, já paga pelo Estado, câmara municipal e concessionária (na parte a que é obrigada pelo caderno de encargos), nunca possa recair sobre os consumidores.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum Sr. Deputado deseja fazer uso da palavra, vai passar-se à votação. Vai votar-se a base II do projecto.

Submetida à votação foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Vou pôr em discussão a base m, que vai ler-se.

Foi lida. E a seguinte:

BASE III

1. Tratando-se de linhas ou instalações de alta tensão, as indemnizações serão fixadas pelos concessionários, na proporção das potências contratadas e dos desenvolvimentos dos traçados aproveitados pelos novos consumidores.
2. Nas linhas ou instalações de baixa tensão, a indemnização será fixada, pelo distribuidor, em função da extensão do traçado que for utilizada por cada novo consumidor.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

O Sr. Amaral Neto:-Sr. Presidente: esta base III do novo projecto é o artigo 3.º das sugestões da Câmara Corporativa, apenas rectificado conforme as harmonias da integração no texto.
Na verdade, o n.º 1 é precisamente o n.º 1 desse artigo 3.º, apenas com a supressão da referência ao artigo 1.º, que já não tem razão de ser, porque não só não funciona na redacção do projecto, que substitui artigos por bases, como porque esse artigo 1.º está incluído na matéria da nossa base i.
Quanto ao n.º 2, é também o n.º 2 do artigo 3.º da Câmara Corporativa, apenas com a supressão da excepção de que a extensão das linhas não haja de exceder 10 hm. É certo que não é frequente as ampliações de linhas de baixa tensão excederem 10 hm de desenvolvimento, mas também não deixa de ser verdade que, em certas circunstâncias, as linhas poderão ser mais compridas. Pareceu por isso à Comissão de Economia que não havia lugar para manter aqui a ressalva de a extensão ser inferior a 10 hm. Foi a única supressão que se fez no texto do n.º 2 do artigo 3.º da Câmara Corporativa.
O n.º 3 do artigo 3.º da Câmara Corporativa desaparece pura e simplesmente, porque se refere ao caso de linhas com mais de 10 hm (caso que fica englobado na generalidade no novo n.º 2), remetendo o cálculo das indemnizações para aprovação da Direcção-Geral dos Serviços Eléctricos. Tem uma vantagem muito grande a supressão, a de não sobrecarregar esses serviços, já tão cheios de trabalho, com mais uma minúcia perfeitamente irrelevante ao alcance do projecto de lei.
O processo de cálculo há-de ser sempre o mesmo e não vale a pena remetê-lo para a Direcção-Geral. O que acontecia é que, segundo a Câmara Corporativa, até aos 10 hm as indemnizações deviam ser calculadas segundo uma tabela fixa. É por isso que se propõe a supressão da tabela, que, sendo uma tabela simplificativa, considerava, pela sua mesma simplificação, situações esquemáticas diversas de uma infinidade de situações possíveis em que poderia levar a situações de injustiça completamente opostas ao espírito do projecto de lei.
Basta referir a VV. Ex.ª que no caso de uma linha que tivesse de ter 1 km de extensão e a que se ligassem só dois consumidores, um no final da linha e o outro dentro do último hectómetro, e mais nenhum aparecesse, o segundo consumidor indemnizaria o primeiro apenas de

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10 por cento do custo da linha, quando a justiça mandaria que fossem 50 por cento.
A tabela, para o ser, teve de simplificar situações e na figuração das hipóteses teve de ir para casos esquemáticos . em que não cabem sempre os casos reais. Sendo esta tabela uma manifestação de espírito excessivamente regulam entaclor, como frisou o Sr. Deputado Virgílio Cruz, pareceu à Comissão de Economia, não só por este facto, mas também pelo afastamento das realidades a que poderia conduzir, que era melhor não falar nela, e daí a supressão.

Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão.

O Sr. Virgílio Cruz: - A base III estabelece os critérios que servirão de base ao cálculo dos reembolsos.
O n.º 1 da base considera as linhas ou instalações de alta tensão. Como aí as potências utilizadas podem ser muito variáveis de cliente para cliente, as indemnizações a pagar serão função da potência contratada e do desenvolvimento do traçado que cada um utilizar. A Câmara Corporativa sugeriu que na alta tensão o reembolso seja função destes dois parâmetros.
O n.º 2 trata- das instalações de baixa tensão, onde as indemnizações serão fixadas tendo em conta unicamente a extensão do traçado que cada novo consumidor utilizar. Este princípio é de aceitar, porque na baixa tensão as potências utilizadas pela maioria serão pouco diferentes umas das outras, e por isso faz-se justiça ao consumidor médio.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum Sr. Deputado deseja fazer uso da palavra, vai passar-se à votação. Vai votar-se a base III do projecto de lei.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente:

Vai ler-se.

Vou pôr em discussão a base IV.

Foi lida. É a seguinte:

BASE IV

1. Não poderá ser feita, pelas entidades concessionárias ou distribuidoras de energia eléctrica, a ligação das linhas ou instalações a novos consumidores antes do pagamento das indemnizações previstas nas bases anteriores.
2. A entidade concessionária ou distribuidora deverá cobrar as importâncias das indemnizações e entregá-las aos consumidores que a elas tenham direito.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

O Sr. Amaral Neto: - Sr. Presidente: se as bases anteriores se aproximavam do essencial das sugestões da Câmara Corporativa, esta base IV então é a transcrição quase que pura dos dois números do artigo 4.º das sugestões da Câmara Corporativa. Apenas se suprimiu no n.º 2 um pormenor que pareceu perfeitamente superabundante, pareceria mesmo implícito. Esse pormenor era o seguinte:
Estabelece o n.º 2 que a entidade concessionária ou distribuidora cobraria dos segundos usuários a indemnização a entregar ao primeiro, salvo se esses segundos usuários lhe tivessem efectuado directamente o pagamento.
É evidente que nunca a entidade distribuidora poderia, pelo menos com resultados práticos, aproximar-se dos segundos usuários para lhes reclamar as indemnizações se eles pudessem apresentar recibos comprovativos de haverem liquidado as suas contas directamente.
No mais os dois números da base IV são perfeitamente a redacção dos dois números do artigo 4.º da Câmara Corporativa.
O Sr. Virgílio Cruz: - Sr. Presidente: o n.º 1 torna o reembolso pelos subsequentes usuários obrigatório.
E, para comodidade dos consumidores, o n.º 2 da base estabelece que o reembolso seja cobrado pela concessionária ou distribuidora, que é quem faz a obra e já mantém contactos periódicos para leitura de contadores, cobrança, etc., com os seus consumidores.
É cómodo para o consumidor e dá pouco trabalho à distribuidora.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão. Pausa.

O Sr. Presidente: - Como mais nenhum Sr. Deputado deseja usar da palavra vai votar-se a base IV.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Vai ler-se a base V. Foi lida. É a seguinte:

BASE V

Os casos duvidosos serão resolvidos pela fiscalização técnica do Governo.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

O Sr. Amaral Neto: - Sr. Presidente: esta base V é a reprodução fiel do artigo 6.º da Câmara Corporativa. Aparece clara a intenção com que este há-de ter sido proposto pela Câmara Corporativa, e foi, portanto, perfilhado pela Comissão de Economia. 35 que, remetendo uma das bases anteriores para os concessionários ou distribuidores de energia o cálculo das indemnizações, é possível levantarem-se reparos sobre esse cálculo. Quis-se aqui dizer que a fiscalização técnica do Governo deverá resolver as dúvidas levantadas. Mas o que não se quer dizer, e chamo a especial atenção para isto, é que fique prejudicada a jurisdição dos tribunais, na qual necessariamente o projecto de lei não tem a menor intenção de intervir, para se pronunciarem em última análise na matéria das dúvidas ou pleitos que a interpretação destas disposições possa fazer surgir entre consumidores e concessionários ou distribuidores de energia eléctrica.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum Sr. Deputado deseja fazer uso da palavra, vai passar-se à votação. Vai votar-se a base V do projecto de lei.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: -Está concluída a discussão e votação do projecto de lei.
Srs. Deputados, a próxima sessão plenária será na segunda-feira, dia 9,. e terá como ordem do dia a discussão da proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1964. Até lá continuarão, naturalmente, a funcionar

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as Comissões de Economia e Finanças, que, suponho, poderão, a partir de amanhã, ter à sua disposição, em provas, o parecer da Câmara Corporativa. Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 35 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Alberto Carlos de Figueiredo Franco Falcão.
André Francisco Navarro.
Armando Cândido de Medeiros.
Carlos Coelho.
Domingos Rosado Vitória Pires.
Francisco José Vasques Tenreiro.
Francisco de Sales de Mascarenhas Loureiro.
Jorge Manuel Vítor Moita.
José Dias de Araújo Correia.
José Luís Vaz Nunes.
José Manuel da Costa.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Manuel Amorim de Sousa Meneses.
Manuel Augusto Engrácia Carrilho.
D. Maria Irene Leite da Costa.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Reis.
Paulo Cancella de Abreu.
Sebastião Garcia Ramires.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Agnelo Orneias do Rego.
Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Pacheco Jorge.
Alberto da Rocha Cardoso de Matos.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António Tomás Prisónio Furtado.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Carlos Emílio Tenreiro Teles Grilo.
D. Custódia Lopes.
Fernando António da Veiga Frade.
Henrique dos Santos Tenreiro.
José Guilherme de Melo e Castro.
José dos Santos Bessa.
José Soares da Fonseca.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel João Correia.
Purxotoma Ramanata Quenin.
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães.
Tito Castelo Branco Arantes.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
Urgel Abílio Horta.
Vítor Manuel Dias Barros.
Voicunta Srinivassa Sinai Dempó.

O REDACTOR - António Manuel Pereira.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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