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REPÚBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL
DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 129
ANO DE 1964 15 DE FEVEREIRO
ASSEMBLEIA NACIONAL
VIII LEGISLATURA
SESSÃO N.º 129, EM 14 DE FEVEREIRO
Presidente: Ex.mº Sr. Mário de Figueiredo
Secretário: Ex.mºs Srs.
Fernando Cld Oliveira Proença
José Pinheiro da Silva
SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a acessão às 16 horas e 10 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se couta do expediente.
O Sr. Presidente disse estarem na Mesa os documentos fornecidos pelo Ministério da Economia em satisfação do requerimento apresentado pelo Sr. Deputado Agostinho Cardoso, os quais lhe serão entregues.
O Sr. Deputado Agostinho Gomes falou sobre a indústria de lacticínios da Madeira.
Ordem do dia. - Prosseguiu o debate sobre o aviso prévio do Sr. Deputado Amaral Neto relativo à crise agrícola nacional e às medidas tomadas para, a enfrentar.
Usaram da palavra, os Srs. Deputados Nunes Mexia, Rocha Cardoso, Cutileiro Ferreira e Calheiros Lopes.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 10 horas e 20 minutos.
O Sr. Presidente: - Vai fazer-se a chamada.
Eram 16 horas.
Fez-se a chamada, a qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Agostinho Gonçalves Gomes.
Alberto Carlos de Figueiredo Franco Falcão.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Alberto Pacheco Jorge.
Alberto da Bocha Cardoso de Matos.
Albino Soares Pinto dos Beis Júnior.
Alfredo Maria de Mesquita Guimarães Brito.
Aníbal Rodrigues Dias Correia.
Antão Santos da Cunha.
António Augusto Gonçalves Rodrigues.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António Burity da Silva.
António Calheiros Lopes.
António Magro Borges de Araújo.
António Manuel Gonçalves Rapazote.
António Maria Santos da Cunha.
António Marques Fernandes.
António Martins da Cruz.
António Moreira Longo.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Augusto José Machado.
Bento Benoliel Levy.
Carlos Alves.
Carlos Coelho.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Délio de Castro Cardoso Santarém.
Domingos Rosado Vitória Pires.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando Cid Oliveira Proença.
Francisco António Martins.
Francisco António da Silva.
Francisco José Lopes Roseira.
Francisco Lopes Vasques.
Francisco de Sales de Mascarenhas Loureiro.
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Henrique Veiga de Macedo.
James Pinto Bull.
Jerónimo Henriques Jorge.
João Mendes da Costa Amaral.
João Bocha Cardoso.
João Ubach Chaves.
Joaquim de Jesus Santos.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Joaquim de Sousa Birne.
Jorge de Melo Gamboa de Vasconcelos.
José Augusto Brilhante de Paiva.
José Luís Vaz Nunes.
José Manuel Pires.
José Maria Rebelo Valente de Carvalho.
José de Mira Nunes Mexia.
José Pinheiro da Silva.
José Soares da Fonseca.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Manuel Augusto Engrácia Carrilho.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Herculano Chorão de Carvalho.
Manuel João Correia.
Manuel João Cutileiro Ferreira.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel Nunes Fernandes.
Manuel Seabra Carqueijeiro.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Mário Amaro Salgueiro dos Santos Gaio.
Mário de Figueiredo.
Paulo Cancella de Abreu.
Quirino dos Santos Mealha.
Rogério Vargas Moniz.
Rui de Moura Ramos.
Sebastião Garcia Ramires.
Virgílio David Pereira e Cruz.
Vítor Manuel Dias Barros.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 71 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 16 horas o 10 minutos.
Antes da ordem do dia
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Telegrama
Do Grémio da Lavoura de Montemor-o-Velho a apoiar o aviso prévio do Sr. Deputado Amaral Neto sobre a crise agrícola nacional.
O Sr. Presidente: - Estilo na Mesa os elementos fornecidos pelo Ministério da Economia em satisfação do requerimento apresentado pelo Sr. Deputado Agostinho Cardoso na sessão de 14 de Dezembro do ano findo. Vão ser entregues àquele Sr. Deputado.
Tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Gomes.
O Sr. Agostinho Gomes: - Sr. Presidente: há perto de dois anos fiz uma intervenção nesta Assembleia pedindo ao Governo que fossem revogados os Decretos n.º 48 418, de 21 de Dezembro de 1960, e 44 188, de 9 de Fevereiro de 1962, que determinavam uma reorganização da indústria de lacticínios da Madeira em moldes inaceitáveis.
Não vou repetir o que então disse, mas, para compreensão do problema, principiarei por fazer um pequeno resumo dos factos.
A produção actual de leite na Madeira para industrialização - quase exclusivamente para fabrico de manteiga - é de cerca de 14 milhões de litros por ano.
A indústria de lacticínios é explorada por 4 cooperativas, com 3 fábricas e por 25 empresas privadas.
Os industriais laboram 58 por cento da produção e as cooperativas os restantes 42 por cento.
Todos estavam e estão de acordo que se impõe uma reorganização desta indústria, quer pela escassez da matéria-prima em relação as dezassete fábricas existentes, matéria-prima com tendência a diminuir de ano para ano, por falta, sobretudo, de um plano de desenvolvimento pecuário, quer pela necessidade de utilização de métodos modernos, exigidos pela higiene e saúde pública, no fabrico de manteiga. Pretende-se também com uma exploração mais racional valorizar o leite para que o produtor possa obter melhor compensação, estimulando-o, assim, a uma maior produção.
Conforme o disposto na base XVII da Lei n.º 2005, o Governo nomeou uma comissão para proceder ao estudo da reorganização da indústria de lacticínios da Madeira, tendo-se chegado a conclusão de que se impunha uma concentração dos industriais numa ou duas unidades fabris e das cooperativas numa única fábrica.
O relatório da referida comissão foi submetido ao Conselho Superior da Indústria e mereceu, a 4 de Novembro de 1958, a concordância do então Ministro da Economia, Sr. Eng.º Ferreira Dias, que ordenou fosse redigido pela Direcção-Geral dos Serviços Industriais o respectivo diploma legal.
No entanto, tal diploma nunca foi elaborado. Não obstante a comissão nomeada ter o carácter muito especial que lhe era conferido pelo Lei n.º 2005, reguladora geral das reorganizações industriais, o seu relatório foi dormir sono profundo numa gaveta de secretária de uma direcção-geral, fazendo companhia a tantos outros seus pares ...
E o seu sono foi de morte ...!
Em Março de 1960 - dezasseis meses, portanto, após o despacho ministerial que aprovava o relatório da comissão - foi enviado ao Funchal, pelo Ministério da Economia, o médico veterinário Sr. Dr. Pereira de Matos, que se apresentou com a missão de actualizar o estudo da reorganização da indústria local de lacticínios.
É curioso como estudos, que tanto demoraram a fazer, tão rapidamente se desactualizaram! Em pouco mais de um ano é necessário rever todo o problema e solucioná-lo sob perspectiva totalmente diferente!
E, como anotei na minha intervenção anterior, o novo estudo (não sei se deva classificar assim uma solução que se quis impor) prevaleceu a todo um relatório de uma comissão legalmente constituída.
Poderemos até perguntar por que só fez despesa com a deslocação à Madeira do referido técnico, se a solução já havia sido tomada em definitivo, como o demonstraram os factos?
Entendíamos dialogo quando ainda se admitissem hipóteses, e não quando um só era o caminho aceite: a isto deve chamar-se imposição drástica de uma solução que se deseja atenuar com especiosidades que revoltam.
Vejamos o que se passou.
Duas eram as hipóteses apresentadas pelo enviado ministerial para a solução do problema cios lacticínios: concentração em duas unidades fabris, uma para as cooperativas e outra para industriais, ou concentração numa só
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fábrica, que cooperativas e indústria privada explorariam em conjunto.
À primeira concentração era, aliás, a propugnada pelas cooperativas.
Sobre a segunda as cooperativas expuseram "que dada a conjuntura internacional e nacional dos lacticínios a fábrica, única seria a solução mais económica e aquela que estaria mais de acordo com a situação actual. Todavia, a solução envolve para as cooperativas problemas de maior importância que podem afectar os fundamentos e finalidades destas associações que interessam e defesa da produção e estímulo ao produtor no sentido de tirar o maior partido económico na valorização dos seus produtos, defendendo-os da presença de intermediários dispensáveis. Nestes termos, entendem os dirigentes das cooperativas desta ilha que só baseados num parecer da Direcção-Geral dos Serviços Agrícolas, a quem compete a organização das associações agrícolas e sua orientação, poderão pronunciar-se sobre as duas hipóteses apresentadas".
Ninguém poderá negar que a exposição feita pelas cooperativas assenta em critérios absolutamente válidos, com espirito objectivo e com total lealdade. No entanto tudo se vai processar de maneira diferente daquela que a prudência e, sobretudo, que os princípios de direito aconselhavam.
Não se dando tempo às cooperativas para se pronunciarem em definitivo, como propunham, o Ministro da Economia exarou, a 14 de Junho de 1960, um despacho, publicado no Boletim da Direcção-Geral dos Serviços Industriais, que estabelecia a reorganização da indústria de lacticínios da Madeira por uma concentração numa só unidade fabril, reunindo cooperativas e industriais.
Mais tarde, a 21 de Dezembro de 1960, com aprovação do Conselho de Ministros, foi publicado o Decreto n.º 43 418, que fixava a mesma doutrina do despacho e regulava o processamento da concentração.
Como era lógico, as cooperativas não aceitaram a concentração industrial imposta pelo Governo e interpuseram recurso do despacho e decreto, continuando ordeiramente a lutar, por todos os meios ao seu alcance, por que lhes sejam reconhecidos os seus legítimos direitos.
Anotemos o facto de a União das Cooperativas Agrícolas de Lacticínios e Produtores de Leite da Ilha da Madeira haver comprado já o terreno para a instalação de uma unidade fabril comum a todas as suas associadas. Requereu a S. Ex.ª o Ministro da Economia a necessária autorização, a 9 de Julho de 195.8, tendo enviado ao mesmo tempo o projecto e memória descritiva da construção da fábrica.
Escusado será dizer que esto requerimento, apesar das insistências feitas, caiu propositadamente no olvido e só foi lembrado quando o Ex.mº. Director-Geral dos Serviços Industriais o sujeitou ao seguinte despacho de 12 de Maio de 1961:
Vista a publicação do Decreto n.º 43 418, de 21 de Dezembro de 1960, arquive-se o presente processo.
Um ligeiro, mas talvez oportuno, apontamento para vermos como os serviços de comunicação interna dos nossas repartições são, por vezes, tão morosos que batem aos pontos, por muito, os O. T. O despacho da Direcção-Geral foi de 12 de Maio de 1961 e a comunicação aos interessados é datada de 7 de Novembro de 1962 - somente dezoito meses de demora ...
Não quero voltar os considerações e argumentos que aduzi na minha intervenção de 22 de Fevereiro de 1962 para demonstrar que os princípios gerais do direito em que deve assentar toda a lei, e que a nossa Constituição Política reconhece como limite da acção do Estado, foram violados na elaboração- dos diplomas que pretendiam reorganizar a indústria de lacticínios da Madeira.
Toda a norma jurídica que se desvia das grandes e seguras linhas traçadas pela lógica do direito não tem em si mesma é por si mesma a força obrigatória que lhe é inerente como ordenação racional que deve ser e tão-somente poderá manter-se por uma prepotência do legislador.
Ora os decretos que impõem a concentração industrial de lacticínios da Madeira, infelizmente, estão neste caso.
As cooperativas de produção têm por finalidade valorizar os produtos da lavoura, procurando para eles, de todas as formas lícitas, permitidas por uma sã economia, um maior preço; os industriais, por outro lado, pretendem comprar a produção pelo menor preço, na defesa dos lucros dos seus capitais.
Como podem duas entidades que buscam ao mesmo tempo para a mesma matéria-prima maior preço uma e menor preço a outra se fundirem numa só empresa industrial?
Que implicações e gravíssimas dificuldades não deverão surgir de uma tal concentração?
Não sendo objectivo da organização cooperativa a obtenção de lucros, mesmo quando entra no sector secundário da industrialização e comercialização, mas sim conseguir que os produtos da lavoura tenham na origem os melhores preços, relegando para plano secundário o lucro da exploração industrial, como poderiam as cooperativas unir-se a industriais que têm por fim específico somente o lucro, à custa, naturalmente, do menor preço da matéria-prima?
Na exploração industrial privada a matéria-prima entra sempre em função do lucro, condicionada, portanto, a este no seu preço; na exploração industrial cooperativa a matéria-prima é tomada no máximo da sua valorização, sem nenhum outro condicionalismo que não seja obter uma exploração de equilíbrio.
Dois aspectos económicos totalmente diferentes que nenhum bom economista deverá esquecer nem muito menos poderá consociar numa mesma empresa.
No entanto foi este absurdo que se pretendeu construir com os decretos acima referidos.
Não admira, pois, que as cooperativas de lacticínios da Madeira se tenham recusado a aceitar a concentração que lhes fora imposta, já que por elas estão a razão e o direito.
Além de tudo isto, que é o mais, convém considerar, e atentamente, que o económico não pode nem deve ser resolvido com menosprezo dos factores de ordem social e política, sob pena de as soluções adoptadas redundaram em autênticos fracassos, quando não pior.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Mal de nós se os problemas que surgem no domínio económico fossem exclusivamente resolvidos pelas leis e princípios que dita a economia ciência! Ter--se-ia até de sacrificar a própria moral mós seus aspectos fundamentais.
Os problemas económicos deverão ser equacionados tendo em vista as suas relações com a moral, o social e a sã política.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Soluções economicamente aconselháveis mas impolíticas devem ser tidas como soluções antieconómicas.
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E por isso que eu temo o domínio da técnica, da pura técnica, fria e sem alma!
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Tenho informação de que para a ilha de S. Jorge (Açores) se está adoptando a solução que se pede para a Madeira: duas unidades, f abris, uma para industriais e outra para as cooperativas.
É de notar que a produção total de leite nesta ilha anda à volta dos 7 milhões de litros, o que representa pouco mais de metade da produção da Madeira.
Se para lá se admitem duas fabricas, por que não na Madeira?
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Argumentava-se que tínhamos de enfrentar dificuldades criadas pelos grandes espaços económicos, devendo, por isso, a nossa indústria estar preparada para poder concorrer nos grandes mercados mundiais.
Custa-me a acreditar que numa visão objectiva e, portanto, verdadeira da economia madeirense se possa conceber a sua industria de lacticínios e concorrer com industrias similares dos mercados internacionais!
Uma produção de manteiga de 694 t, com um excedente, retirado o consumo local, de 248 t, que significado terá nos grandes espaços económicos?
A solução do problema da indústria de lacticínios da Madeira, prevista pelos Decretos n.ºs 43 418 e 44 183, só trouxe profundo descontentamento a uma grande parte da população madeirense, aquela população que moureja dura e heroicamente na terra e que vá, no entanto, os seus direitos mal assegurados e os seus legítimos interesses mal defendidos.
Encontro-se esta Assembleia no debate do aviso prévio do nosso ilustre colega Sr. Eng.º. Amaral Neto, a quem presto a minha homenagem de louvor e admiração pelo magnífico trabalho apresentado, sobre os problemas ingentes e prementes que afectam a agricultura portuguesa. Estou certo que o que foi e será dito sobre o assunto terá profunda repercussão na vida nacional e ajudará sobremaneira o Governo na elaboração e efectivação de planos tendentes a resolver a grave crise de lavoura nacional.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Uma coisa, porém, urge que se reconheça desde já: o direito que têm os lavradores de se organizarem com o fim de melhor se ajudarem e defenderem em tudo que diga respeito à sua vida, em especial a valorização dos seus produtos. 13 um dever do Estado reconhecer-lhes este direito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Nunca pude compreender a política seguida pelo Ministério da Economia não deferindo os pedidos que lhe foram feitos pelas cooperativas de lacticínios da Madeira em 1956 e 1957 para alargamento das suas áreas sociais.
Deste injusto procedimento fiz-me eco também na minha anterior intervenção.
Graças a Deus, por despacho de S. Ex.ª o Secretário de Estado da Agricultura de 21 de Agosto de 1963, foi rompida a barreira existente e hoje mais dez freguesias da Madeira beneficiam das vantagens da organização cooperativa. É digno, por isso, o Sr. Eng.º Luís de Azevedo Coutinho do nosso grande reconhecimento.
Como, naturalmente, deste alargamento resultaria uma diminuição de matéria-prima para a indústria privada, um novo despacho de 8 de Outubro do mesmo ano determinou que os industriais continuariam a receber as natas provenientes das Áreas alargadas, sob condição de pagarem aos sócios das novas áreas um "bónus" idêntico ao distribuído pelas cooperativas no ano anterior.
Qual o resultado prático deste alargamento?
Os industriais que pagavam ao lavrador somente o preço fixado pela Junta de Lacticínios - l $175 pela nata de l1 de leite, passaram a pagar, não só aos produtores das áreas sociais alargadas, mas a todos os seus fornecedores, um maior valor de $14 pela nata de 11 de leite.
Como interpretar esta generosidade tão vasta dos industriais?
Talvez alguém possa vir a tirar ilações várias.
Para mim interessa-me pelo que significa de confissão de que poderiam ter pago melhor, há mais tempo, o leite no lavrador.
O Sr. Virgílio Cruz: - Muito bem!
O Orador: - E, assim, se o pedido de alargamento das áreas sociais tivesse sido logo concedido, a lavoura, que forneceu à indústria privada para mais de 43 milhões de litros desde 1957 a 1962, teria recebido a mais para cima de 7 200 contos, o que representa um prejuízo anual da ordem dos 1 200 contos.
O Sr. Pinto de Mesquita: - Isso é uma lição para todo o País.
O Orador: - Muito obrigado.
A lavoura madeirense não terá razão de fazer sentir a sua mágoa?
Sr. Presidente: uma das disposições gritantes dos diplomas em causa é a transferência para fábrica única - misto de cooperativas e indústria privada, como ficou dito - do exclusivo do abastecimento de leite à cidade do Funchal.
Também aqui precisamos de um pequeno enquadramento histórico.
A Junta dos Lacticínios, que na Madeira tem desenvolvido uma obra a todos os títulos notável, em 1950, pelos seus serviços laboratoriais, efectuou o estudo da genuinidade e salubridade do leite à venda no Funchal, com o fim de determinar, com maior rigor, a extensão das fraudes e avaliar do estado higiénico do leite de consumo. Chegou à conclusão de que 89 por cento dos leites analisados se apresentavam defeituosos ou impróprios para consumo.
Imediatamente a Junta Geral do Distrito, com a colaboração da Junta de Lacticínios, iniciou uma intensa campanha de sanidade pecuária e de fiscalização na zona de abastecimento de leite ao Funchal.
Entretanto, porque se impunha uma central leiteira para tratamento e higienização do leite para consumo, a Cooperativa Agrícola dos Produtores de Leite do Funchal obteve a concessão do exclusivo do abastecimento de leite & cidade, por deliberação da Câmara Municipal de 21 de Agosto de 1958, deliberação aprovada por portaria de 9 de Janeiro de 1959.
A central leiteira ficaria a funcionar no mesmo edifício da fábrica das cooperativas. Como, porém, a construção desta estava pendente de despacho ministerial favorável, que nunca fora dado, impossível se tornou abastecer devidamente de leite o Funchal.
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Pelo Decreto n.º 43 418 este abastecimento pertenceria à empresa única, constituída por cooperativas e indústria privada; Entregava-se deste modo aos industriais, em pé de igualdade com as cooperativas, os lucros que certamente adviriam da exploração da central leiteira.
Estou certo que a maior parte dos industriais de lacticínios da Madeira nunca tinha pensado que lhe fossem atribuídos tão vastos benefícios.
Como se admite que seja dada uma exploração de mera comercialização de um produto da lavoura a industriais que jamais intervieram em tal negócio?
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Como se compreende que uma administração pública que se propõe, em vasto plano, valorizar a nossa depauperada lavoura decretasse distribuir por alheios um maior valor dos produtos que exclusivamente pertencem à mesma lavoura?
Só o poderemos admitir por ter sido mal informada e mal fundamentada sobre o assunto.
Hoje o consumo na Madeira de leite em natureza é de cerca de 7 300 000l anuais, aliás modestíssimo número numa distribuição per capita.
Este leite é pago a lavoura a 2 $30 por litro e vendido ao público a 3$; em contrapartida, o preço do leite para industrialização é de l $70-1 $80, tomando em conta o valor do leite desnatado, que é sempre superior a $60.
For estes números se vê quanto interessava à lavoura possuir ela própria uma central de abastecimento de leite 11 população. E a procura de leite em natureza é já relativamente grande, havendo até dificuldade, na cidade, em obtê-lo. Parte da população, não só em razão desta dificuldade, mas ainda mais pela falta de higiene com que se apresenta o leite à venda ao público, lança mão do leite em pó, que já tem um consumo notável. De Janeiro a Novembro do ano findo foram importadas 150 t de leite em pó, o que representa cerca de l 650 0001 de leite preparado.
Numa terra turística como é a Madeira, a não existência de uma central leiteira, onde os leites para consumo em natureza sejam convenientemente tratados, reflecte, perante os estrangeiros, o atraso em que nos encontramos.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Há dias foi-me proporcionada a oportunidade e o prazer de visitar a fábrica de lacticínios da U. C. A. L., em Loures. É uma exploração digna da cidade de Lisboa. Constitui um empreendimento grande em volume e grande pela maneira eficiente e racional como trabalha. Só é de desejar que lhe não falte nunca o apoio das entidades superiores e que as repartições, através dos seus funcionários, lhe não entravem as suas óptimas iniciativas com peias e exigências para além do que é justo e comum fazer-se.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - O Funchal também precisa de uma central leiteira; mas que sejam os lavradores, através da sua cooperativa, a usufruírem as vantagens que advenham dessa exploração, e nunca por nunca se dêem a terceiros lucros que, por natureza, de nenhum modo lhes podem pertencer.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - A lavoura madeirense, mais pobre do que toda a outra lavoura nacional pelas condições difíceis em que se processa, é, contudo, o sector que mais contribui para o equilíbrio económico da ilha; no entanto é sobre ela que mais pesam os encargos exigidos a população.
Ainda há bem pouco tempo foram aumentados os fretes da carga para as ilhas da Madeira e Açores, com o fim de atenuar o déficit da Empresa Insulana de Navegação, déficit resultante sobretudo da compra e exploração do paquete Funchal. Sobre este assunto já o nosso ilustre colega Dr. Agostinho Cardoso falou, em brilhante discurso, nesta Assembleia. A lavoura madeirense é que suportará, em grande parte, directa ou indirectamente, o peso deste aumento.
Há que rever o problema, e não serão só "pontos de pormenor" que devem ser reconsiderados.
Analisando os elementos de apreciação que possuímos sobre o aumento de fretes agora imposto, temos infelizmente de concluir que o seu estudo não se fez com a atenção dos diferentes aspectos políticos e económicos das ilhas que o melindre do assunto exigia.
Não foram ouvidas nem a administração nem a política locais, nem as entidades de carácter corporativo e associativo que velam pelos interesses da população. Consta publicamente que o representante do Ministério da Economia na Junta Nacional da Marulha Mercante opôs-se, até, a tal aumento.
Nem se julgue que este se impunha pelo facto de os fretes estarem muito desactualizados; em Junho de 1957 o então Ministro da Marinha, Sr. Almirante Américo Tomás, em notável despacho, no qual apreciava, de uma maneira profunda e clara, os males em que a Empresa Insulana de Navegação se debatia, propondo ao mesmo tempo o remédio aconselhável, escrevia que sas tarifas não podem ser consideradas baixas, sobretudo as de carga".
Mas dado que de momento o único meio de salvar críticas situações de que a população madeirense nenhuma culpa tem, seria o aumento de fretes, ainda assim tal como foi feito para a Madeira não é de aprovar.
Parece-me que o critério a seguir deveria ter sido totalmente diferente. E como a nota da Junta Nacional da Marinha Mercante sobre o assunto, publicada nos jornais da Madeira, termina afirmando que "quaisquer alvitres ou sugestões que se apresentem serão bem acolhidos e cuidadosamente estudados, a fim de se dar satisfação tios legítimos interesses de todos", referirei aqui a observação que fiz a S. Ex.ª o Sr. Ministro da Marinha quando se dignou receber os Deputados pela Madeira que lhe foram expor as apreensões e descontentamento que as novas tarifas causaram a todos os madeirenses.
São duas as empresas de navegação directamente ligadas a Madeira no tráfego de carga: a Empresa Insulana, que tem uma exploração deficitária, não em razão dos barcos cargueiros da sua frota, mas em consequência dos navios de passageiros, e a Empresa Madeirense, que mercê de uma boa administração e, sobretudo, pelas características da sua exploração - somente possui navios de carga - goza de uma situação financeira desafogada.
Ora pela nova tabela de fretes ambas as empresas vêm a beneficiar, o que representa para a empresa economicamente forte um aumento de lucros que lhe são atribuídos sem uma razão proporcionada ou correspondente.
Numa economia beneficamente dirigida esta solução está errada.
Evidentemente que não se poderiam fixar tarifas diferentes para uma e outra empresa, mas não creio seja impossível estabelecer um equilíbrio justo entre o fim que
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se pretende obter e os interesses de todos, em especial da população a onerar.
Não se encontrou, infelizmente, outra solução para resolver a situação da Insulana que não fosse aumentar os fretes, agravando ainda mais a pobre vida das gentes das nossas ilhas.
Confiamos que S. Ex.ª o Ministro da Marinha, Sr. Almirante Quintanilha Mendonça Dias, dará mais uma vez o melhor da sua atenção a tão complexo problema, resolvendo-o de forma a satisfazer os interesses económicos da Madeira.
Ventos contrários, mas sempre adjacentes, levaram-me, por alguns instantes, rumo ao mor ...
Regresso já à terra e termino.
Sr. Presidente: não creio se continue por mais tempo a manter entre os lavradores da minha terra o clima de descontentamento que os Decretos n.ºs 43 418 e 44 183 criaram.
Não pode a doutrina de tais diplomas ser aceite e, por consequência, as soluções propostas devem considerar-se anómalas e até absurdas.
Não se recuse reconhecer às cooperativas de lacticínios da Madeira o direito que lhes assiste de possuírem a sua própria fábrica onde industrializem a matéria-prima que é sua.
Por isso, peço a SS. Ex.ª o Ministro da Economia, e Secretário de Estado da Agricultura que o problema dos* lacticínios da Madeira seja urgentemente revisto e enquadrado dentro da orientação válida que o Ministério está a seguir de valorização da lavoura pela organização dos próprios lavradores.
Estou certo, Sr. Presidente, que a voz da lavoura madeirense, porque apoiada na razão e no direito, será ouvida pelo Governo da Nação.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Vai passar-se à
Ordem do dia
O Sr. Presidente: - Continua o debate sobre o aviso prévio do Sr. Deputado Amaral Neto acerca da crise agrícola nacional e as medidas tomadas para a enfrentar.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nunes Mexia.
O Sr. Nunes Mexia: - Sr. Presidente: ao tratarmos aqui da crise agrícola não posso deixar de dar o meu pequeno contributo para maior esclarecimento do problema, se tal for possível depois da forma brilhante como foi efectivado o aviso prévio pelo Deputado Amaral Neto. A crise agrícola é uma realidade já conhecida, sobre que muito se tem falado, mas as soluções adoptadas para a resolver não têm dado resultados positivos. A situação é hoje pior do que há um ano, e cada dia que passa torna mais difícil a solução de um problema que, em verdade, podemos dizer, afecta todo o País.
Posta de lado a situação presente, procuram-se soluções para daqui a anos, esquecendo-se que sem confiança, sem meios, sem ser sanada a situação de momento, não é possível construir para o futuro.
Dos aspectos económico, financeiro e de confiança de que se reveste a crise no momento actual há que esperar agravamento dos reflexos políticos próprios caso não se actue prontamente.
Já há um ano - Março de 1963 - chamei nesta Câmara a atenção do Governo para o problema agrícola, e infelizmente tudo quanto foi dito tem hoje mais actualidade do que então.
Tem a lavoura pleno conhecimento dos responsabilidades que lhe competem neste momento difícil da vida da Nação, sabe bem que é pilar básico da frente interna e só lamenta que não se lhe possibilite cumprir como desejava.
O seu mal-estar tem já reflexo no complexo da economia nacional e as faltas de produtos alimentares básicos são cada vez uma maior fonte de gastos de divisas.
Só nos últimos três anos importámos de trigo, milho, arroz, batatas e carne mais de 2 milhões de contos, e os valores vão em escala crescente.
Parece que uma política cujos efeitos nos conduzem a aumentos de importação de géneros que em parte poderíamos produzir uma vez criados as condições mínimas solicitadas, sem contrapartida de já termos outras exportáveis e de mais rendosa exploração, não é de aceitar no momento presente, em que a Nação mobiliza todos os seus recursos para a defesa e reapetrechamento.
Mas quando essa política conduz ao abandono ou falta de crescimento na produção de alimentos básicos com o argumento que se compram mais barato mercê de dumping - ainda é mais de ponderar.
O mundo de hoje e a nossa própria situação no concerto das Nações não são de molde a tranquilizar ao ponto de se poder contar como certo não só um preço conveniente, como mesmo um fornecimento garantido. Talvez por se ponderarem estes factos é que a Suíça mantém a sua produção de trigo pagando 4$80 por quilograma e não a abandona, pois poderia comprar a l$80 por quilograma. Aliás, é um exemplo em que é seguida por toda a Europa e nos deverá fazer pensar.
Sabendo-se que os países exportadores promovem hoje uma redução de culturas e constatando-se o aparecimento de novos e grandes importadores - como a Rússia -, não será. de estranhar alteração no preço de oferta.
Recordando que já tivemos de importar trigo a 5$15 por quilograma e tendo presente que pelo valor actual de l $80 por quilograma neste ano agrícola a verba gasta em importação se cifra em cerca de 500 000 contos, não serão de temer os riscos de uma política de desencorajamento?
A avaliar pela redução de alqueires que há um ano se fez que creio não andar longe da verdade se a cifrar entre 20 e 25 por cento - só por não ter havido uma garantia de subida, embora ainda se mantivesse essa esperança, qual será a redução no ano presente em face da certeza de condições piores?
Conjugados estes dois factores, preço e quantidade, para que valores iremos de importação?
Deixo a V. Ex.ª o cálculo da importância, não me atrevo a enumerá-la.
Quanto ao segundo ponto - fornecimento garantido -, pergunto: o que nos teria sucedido se não tivéssemos incentivado a cultura do trigo e ao contrário a tivéssemos restringido antes da últimu guerra?
Será que os produtos que de futuro iremos oferecer no mercado mundial têm colocação assegurada e, além disso, pela sua indispensabilidade a outros, nos assegurem, em todo o transe, a troca por produtos alimentares que nos abasteçam?
São questões que deixo postas, mas recordo que em agricultura não se improvisa e que, a dar-se o cano de a última pergunta não ter resposta afirmativa, iremos em última análise ficar, mais na dependência de outros
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quando já sabemos, infelizmente, pela experiência dos últimos factos, não haver penhor seguro da sua actuação nos momentos em que deles mais necessitamos.
Em produtos alimentares básicos ainda não vi aplicar-se à escala supranacional aquilo a que hoje se chama economia de mercado e também não vejo praticar-se aquilo que tanto nos vem sendo apontado como absolutamente necessário: produzirmos a preços competitivos.
Constato que os preços dos produtos que estamos tratando são diferentes de país para país e não coincidem com os do mercado mundial, sendo em regra muito superiores a estes. De facto, os produtos alimentares básicos que aparecem a venda no Mundo provém, no caso geral, de excessos, beneficiando de fortes dumpings, e são esses os preços que nos apresentam como de competição.
Há poucos meses ouvi ao ministro da Agricultura francês - Mr. Pisani - a afirmação de que não havia competição entre agricultores dos diferentes países, mas sim entre os seus ministros das Finanças, e ouvi também que a melhor maneira de manter um país subdesenvolvido era fornecer-lhe produtos agrícolas a preços baixos, pois assim se evita o desenvolvimento da sua agricultura, se não for mesmo caso de provocar a sua ruína.
Não comento, limito-me a chamar a atenção de V. Ex.ª para quanto de verdade se encerra nas suas afirmações.
Sr. Presidente: disse atrás que uma das facetas da crise era a falta de confiança, e para isso vem contribuindo uma certa desorientação no encaminhar do problema.
O facto em si mesmo não é de estranhar se analisarmos o que se tem passado.
Muitos e variados caminhos vêm sendo sucessivamente apontados para debelar os males que afectam a agricultura, mas de positivo só tem resultado um agravamento dos mesmos. Orientações dispersas e até antagónicas, com resultados que muitas vezes mais complicam soluções possíveis, desculpas, até com o clima, como se não fosse necessário tê-lo em conta ao planejar, enfim, um sem-número de razões, das quais já aqui referi as principais há um ano, tudo a pouco e pouco vem contribuindo para uma desorientação que se vai transmitindo e que, estabelecendo um estado de desânimo, cria um clima de incompreensão que gera a desconfiança.
As medidas ultimamente tomadas ou anunciadas mais desorientam. Pelo que é do meu conhecimento, julgo interpretar a incompreensão que a lavoura mostra através dos seguintes pontos principais:
Não compreende a lavoura que para resolver uma situação que dia a dia mais se vem agravando se insista em apresentar apenas soluções a darem efeito daqui a anos. Tanto mais que para isso lhe são pedidos novos e vultosos investimentos, e, embora se prometam créditos para esses fins, sabe bem que, se não tornar rentável a sua exploração desde já, não tem forma de responder aos encargos actuais ou já contraídos, quanto mais ir aceitar novos.
Não compreende que, conhecendo-se, como se afirmou, a sua situação, se aumentem ou deixem subir custos de factores de produção e se retirem subsídios sem se terem primeiro revisto os preços, e isto com o fim de constituir fundos para lhe emprestar quando disposta a aceitar novos encargos. Se estava mal, é evidente que ficou pior.
Não compreende que seja justamente no momento de crise agrícola que se vai aumentar a sua carga fiscal, actualizando as matrizes, pois, se, por um lado, é justo que todos paguem da mesma forma, e há muito existem regiões do País a pagar segundo as novas bases - as cadastradas -, por outro, parece não carecer de demonstração que estas não realizam o rendimento colectável,
pois, a não ser assim, não seria explicável a sua situação presente. Justo parecia antes aliviar quem estava sobrecarregado, o que talvez ainda viesse, no fundo, a ser mais vantajoso para o Tesouro, pois, possibilitando-se meios de acção, incentiva-se a produção, o que neste campo se traduziria numa economia de divisas.
Também não compreende a lavoura que seja nesta altura que se vá lançar o imposto de indústria agrícola. Ainda não se encontra esclarecida e tem mesmo dúvidas sobre vários pontos, tais como rendimentos florestais. Ainda não se disse de quanto se baixa o rendimento colectável, pois a lei prevê-o, e a não se dar, ir ter uma duplicação de imposto no que respeita ao lucro. Também não se percebe bem que seja quando se reconhece que há crise, e portanto falta de lucro, que se vá criar um imposto para o tributar.
Não pode igualmente compreender que, tendo, com o maior dos sacrifícios, respondido a uma mecanização indispensável, se venham já criar uma série de dificuldades e encargos novos a veículos ao seu serviço, quando seria antes de esperar apoio e estímulo. Toda esta incompreensão desorienta e tira fé, tanto mais que se havia já dado um mau passo no sentido de se criar confiança.
Refiro-me à resposta dada às Jornadas Cerealíferas e Leiteiras.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Num ambiente de justificado optimismo, porque finalmente ia ser ouvida a lavoura nacional em reunião magna, disse o que julgava indispensável e mais urgente fazer-se.
Teve sempre presente a realidade do momento difícil que nos é imposto, e por isso, e porque, sobretudo, queria que fossem facultadas as possibilidades mínimas para poder cumprir a sua missão, a assembleia foi prudente, ficando até aquém do que pela razão seria lícito esperar.
A lavoura ponderou a situação do consumidor, dando provas de que é realista, atendeu a necessidade de estender esquemas de protecção e assistência ao trabalhador rural, mostrando que está consciente da sua função social. Pensadamente escolheu os cereais e o leite como produtos a serem atendidos, pois são os que melhor repartiriam os benefícios por todo o País. Também procedeu a uma análise profunda das soluções apresentadas para uma evolução com vista ao futuro, tendo apreciado as suas viabilidades e feito sugestões para os casos que achou de interesse, mostrando assim que também é progressiva.
Que obteve como resposta?
Um atrasado regime cerealífero pior que o anterior.
Unicamente foi considerada uma subida de $10 por quilograma no preço de garantia mínima do centeio, preço que, mesmo assim, ficou em muito inferior ao do mercado. Em contrapartida foi retirado o subsídio aos adubos - 80 000 contos. Foi também suspenso o subsídio que há dois anos vinha sendo dado ao trigo e que podemos cifrar em cerca de 150 000 contos. Só destas duas verbas, números redondos, menos 200 000 contos. Igualmente viu reduzido o empréstimo de cultura, invocando-se até que era vontade da própria lavoura, mas não se disse que havia uma premissa para que isso fosse assim, isto é, argumentou-se ocultando parte da verdade ...
Quanto ao leite, permitiu-se uma subida de $20 por litro no Porto e em Lisboa. Mas em Lisboa foi retirado um subsídio de $20 por litro que era dado, pelo que se ficou, quanto à lavoura, na mesma situação ou, antes, pior, pois, como paralelamente a sêmea subiu $80 por quilograma, aumentaram as despesas. Podemos avaliar este agravamento se dissermos que na área do Porto o prejuízo,
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pela subida das sêmeas, é três vezes superior ao benefício da subida do leite.
Aumentou-se $05 por quilograma no arroz, o que, praticamente, não tem significado.
Toda esta actuação que deixamos exposta, pelos últimos factos mais representativos, não é de molde a restabelecer confiança, antes, pelo contrário, contribui para que mais se radique uma falta de fé nos destinos da actividade, que leva muitos ao seu abandono e se traduz por uma contracção da produção, na maioria dos casos forçada por falta de meios, noutra seguida por se entender ser esse o caminho indicado - caso dos cereais.
Urge pôr fim a tal situação, pois sem confiança, sem estímulo, não é possível realizar, não se constrói para o futuro.
O Sr. Pinto de Mesquita: - Muito bem!
O Orador: - É preciso responder prontamente com factos concretos aos pedidos conscientemente feitos por uma actividade básica da Nação.
E preciso dar meios de acção, atender àquelas medidas de carácter imediato para que há um ano aqui chamei a atenção - medidas que afectam directamente os preços e a comercialização.
Não se sai de uma situação como a actual sem promover uma certa recapitalização, e essa só é possível pagando-se o que de momento se produz. O crédito para futuros empreendimentos, afirmações feitas de que se vai atender aos preços do arroz e milho, não são aceites nem suficientes para quem está no estado de espírito que se mostrou. Só estabelecendo-se, e desde já, qual o preço do arroz para o ano se pode evitar o prosseguimento da contracção da cultura e até incentivá-la se o preço for aliciante; só tornando rentável a exploração no momento actual se cria estímulo e confiança que possibilitam a aceitação de novos encargos para realizações futuras.
Há que contar com o factor humano, á preciso restabelecer a fé nos destinos da actividade. Pelas suas realizações a lavoura tem provado que sabe ser necessário evoluir, sempre reconheceu o muito que é preciso fazer-se e que eu me lembre nunca- negou a necessidade do incremento florestal e pecuário. Mas compreende-se ser difícil que aceite como boas para males actuais soluções que só darão resultado a longo prazo.
Quem se preocupa e aceita sacrifícios com vista ao futuro, sem ter assegurada no mínimo a sobrevivência no presente?
Será de estranhar que a lavoura duvide e hesite em se lançar francamente numa florestação, enquanto atenta a realidade, como é natural a quem paga, vá que muitos não encontram hoje compradores para as suas matas ou só conseguem rendimentos e preços em nada aliciantes?
Parece que ai está o maior travão ao encaminhar no sentido que se pretende, não sendo para admirar que pouco venha a influir no problema e estabelecimento de créditos fáceis, enquanto este ponto não for resolvido.
A actividade agrícola, como económica que é, visa o lucro e por isso sempre responde quando vê possibilidade de aumento de rendimento.
A reconversão operada nalguns dos nossos regadios a favor da cultura do tomate é um exemplo de entre muitos que poderíamos apresentar, provando o que dissemos.
Pretender levar a uma reconversão cultural pela diminuição de rendimentos, embora já se saiba serem negativos nuns casos e insuficientes nos outros os resultados das culturas que se desejam restringir, não me parece válido.
À necessidade de recorrer a tal sistema só prova, ou que ainda não se conseguiu levar ao convencimento da maior rentabilidade das novas culturas, ou que os seus efeitos são tão1 longínquos que nada resolvem para a situação presente.
Assim consegue-se restringir a cultura afectada, até para além do que possivelmente se deseja, mas talvez sem que se realize a substituição.
Lógico parecia apresentar comprovadamente uma cultura mais rendosa que a actual, pois então nem havia perigo de subir esta para valores justos, de rendimentos, que permitissem a sua concentração nos termos próprios.
Nesta rápida análise procurei chamar a atenção para os factos principais que conduziram a situação de desconfiança, pois estou certo de que do seu conhecimento e interpretação fácil será concluir como se impõe actuar para resolver esta determinante da crise actual.
Quanto aos aspectos económico e financeiro, furam largamente debatidos, durante as jornadas levadas a efeito pela lavoura, os problemas referentes aos cereais e ao leite, pelo que me limito aqui, quanto a esses, a chamar a atenção para as conclusões apresentadas e que necessitam de resposta.
Acrescento só que, por a demora já ter sido muita, há valores apresentados que necessitam de correcção. De então para cá deu-se uma subida nos preços dos adubos e igualmente nos da mão-de-obra, não referindo outras, e isto não pode deixar de se reflectir nos preços finais que se apontavam.
Não foi tratado o problema das carnes, embora uma das conclusões se indicasse, como necessário, atender ao desenvolvimento pecuário. Creio, pois, que será útil deter-mo-nos um pouco neste campo.
Ao abordarmos o problema pecuário, ressalta logo a carência do sector perante as necessidades de abastecimento do País.
Só de carne congelada, no período de 1947 a 1962, as importações do estrangeiro levaram a uma saída de divisas que monta a cerca de 900 000 contos. De peles e couros, no período referido, foram importados l 810 000 contos e de lãs, no mesmo período, gastaram-se mais de 3 milhões de contos. Atendendo só a estes três produtos e à evolução que se vem processando, podemos estimar no presente um gasto anual de divisas de cerca de 800 000 contos. Simultaneamente, o Fundo de Abastecimento vem suportando prejuízos avultadíssimos, não só para regularizar o abastecimento, mas, principalmente, para manter no consumo os níveis de preços.
Só para cobrir o prejuízo da come importada de 1947 a 1959 gastaram-se 134 000 contos, e o subsídio que é dado em Lisboa e no Porto, visando a manutenção de preços da carne na venda ao público, anda hoje por 45 000 contos por ano.
Esta situação não é nova, não surpreende em si mesmo, mas é de estranhar o pouco que se tem feito para a melhorar.
É evidente que não será possível colmatar de todo esta saída de divisas, até porque há produtos, como os couros, e a lã de determinados tipos, em que nunca nos bastaremos, mas muito se pode e deve fazer para que tenhamos um quadro completamente diferente do apresentado.
Só pretendo tratar alguns pontos mais salientes do problema das carnes, pois não quero abusar da paciência de VV. Ex.ª com repetições de assuntos já debatidos - como binómio leite-carne e outros -, e igualmente só abordarei a questão sobre o problema na metrópole, por ser a parte que julgo agora em causa. Tenho, contudo, bem presente, quanto podem auxiliar as províncias ultramarinas na solução total do problema e espero que alguém mais conhecedor do que eu dos problemas das ilhas venha completar ideias com a apreciação dos casos que
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lhe são específicos e que também não tratarei. Delimitado, assim, o campo que iremos tratar, podemos dizer: desde há muito que o assunto vem sendo debatido e variados caminhos já foram apontados, mas sempre tem faltado uma acção de continuidade, e até porque riflo raro se tomaram soluções antagónicas, nunca se puderam produzir reflexos, positivos. Dos caminhos indicados, alguns mereceram ao tempo plena concordância, mas nem por isso tiveram continuidade. Vejamos:
Para não recuar muito tempo, e por ser um dos mais representativos do que disse, lembro o despacho de 18 de Novembro de 1955, do Ministério da Economia, que, a ter tido pleno cumprimento na doutrina e continuidade na acção, certamente nos teria conduzido a situação diferente no presente. Á importância e a oportunidade da doutrina exposta é-nos traduzida pelo parecer da Assembleia Nacional que, na sua sessão de l de Fevereiro de 1956, aprovava por unanimidade a moção de que oito os passos mais salientes:
A Assembleia Nacional, efectivado o aviso prévio e a sua discussão sobre o problema nacional do abastecimento de carnes, considerando:
Considerando também quanto para esse fim pode contribuir a execução da doutrina do despacho do Ministério da Economia de 15 de Novembro, publicado no Diário ao Governo de 18 do mesmo mês, uma vez reorganizados e dotados os serviços oficiais para melhor a realizarem;
Considerando ainda a necessidade de levar a efeito um plano de produção:
Emite o voto de que não só se dê inteiro cumprimento a esse despacho, como de que o Governo promova as demais medidas necessárias para se atingir a melhoria pretendida.
Um despacho, uma moção por unanimidade da Assembleia Nacional como resultado de um aviso prévio, e não houve seguimento.
Ao ser elaborado o II Plano de Fomento, 1959 a 1964, não foi considerado o plano de produção que havia sido recomendado. Só em 1962 é anunciada ao Pais uma campanha de fomento pecuário, estabelecendo o Decreto-Lei n.º 44 419 a verba de 120 000 contos a ser despendida durante três anos.
Já pelo Decreto n.º 44 524 só é autorizado o dispêndio da 10 000 contos durante o primeiro ano, ficando, contudo, os restantes 110 000 contos para 1963 e 1964. Em 1963 só foram autorizados 14 000 coutos, tendo-se dado uma paragem.
Como se vê, é bem patente só nestes factos o que dizia quanto a caminhos aceites e à falta de continuidade na execução.
Vejamos agora o que se passou quanto & continuidade dos métodos.
Numa análise sumária das doutrinas e. métodos preconizados ficamos com a noção de que, embora haja pontos comuns, nem sempre se consideraram da mesma importância para o desenvolvimento do problema e daí métodos diferentes.
Assim, no primeiro caso, despacho de 1955, considerava-se que o problema de fundo das nossas produções animais -o de fomento- envolvia essencialmente, além da acção estimulante dos preços, maiores disponibilidades forraginosas. O despacho para além da doutrina era unicamente dirigido à Junta Nacional dos Produtos Pecuários.
Por isso o aviso prévio, pois era impossível obter os efeitos desejados sem uma ampla colaboração de outros serviços. O voto, já referido, da Assembleia Nacional é o que prova quando diz: que se dê inteiro cumprimento a esse despacho e que o Governo promova as demais medidas necessárias para se atingir a melhoria pretendida, e isto depois de já 'ter afirmado ser necessário dotar os serviços oficiais, o .que mostra estar implícita a colaboração de vários.
No segundo caso referido, campanha de fomento pecuário, consideravam-se os seguintes aspectos:
1.º Melhoramento animal, cometido a Direcção-Geral dos Serviços Pecuários.
2.º Melhoramento das condições do meio, compreendendo: uma campanha de produção forrageira a cargo das Direcções-Gerais dos Serviços Agrícolas e Florestais e Agrícolas e a orientação, disciplina e controlo de produção de rações compostas a cargo da Direcção-Geral dos Serviços Pecuários.
3.º Armazenamento e conservação pelo frio de produtos animais, que incumbiu a Junta Nacional dos Produtos Pecuários.
4.º Acção de esclarecimento e divulgação ou propaganda como meio de melhorar o factor humano, repartido pelas três Direcções-Gerais já referidas, coda uma no seu sector.
5.º Instalação de crédito apropriado, que seria tomado a cargo da Junta de Colonização Interna.
6.º Instalação de seguro pecuário, assunto ainda a estudar.
Neste enunciado de propósitos está amplamente considerado o que se pretendia no aviso prévio de 1956 e era proposto pela moção da Assembleia, mas só aparece seis anos depois - continuidade nas intenções, mas não na acção. Há, contudo, uma lacuna: nada se diz quanto ao ponto que era considerado fundamentalmente em 1955, refiro-me à alavanca dos preços, mas isso resulta não dependerem esses da Secretaria de Estado que lançou o presente plano e a quem compete o fomento. E grave a falta, pois, a não ser atendida, pode invalidar toda a acção, como referirei adiante, mas não comento a causa.
Feita esta chamada de atenção, convém ainda ver como se distribuem as verbas, pois daí pretendo tirar mais uma conclusão:
[Início da tabela]
Designação
[Fim da tabela]
Como se vê, o acento tónico cabia à Direcção-Geral dos Serviços Pecuários, e, se estão recordados, em 1955 era a Junta Nacional dos Produtos Pecuários, o que já mostra uma falta de continuidade nos métodos, pois cada serviço tem fins, possibilidades e processos diferentes de actuar.
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Das palavras de esclarecimento que o Ministra da Economia nos dirigiu há dias somos levados a concluir ser certo o que já suspeitávamos. Passado pouco mais de um ano sobre o anúncio de um programa, já se vão rever e modificar orientações, o que nos oferece mais uma confirmação do que atrás deixamos dito acerca da precariedade da continuidade da acção. Pelo que é do meu conhecimento, julgo poder dizer que o acento tónico virá a recair agora na Junta de Colonização Interna.
O Sr. Engrácia Carrilho: - Posso informar V. Ex.ª de que não corresponde à verdade a afirmação de que o acento tónico vai recair sobre a Junta de Colonização Interna.
O Orador: - Baseio-me no que sei.
O Sr. Engrácia Carrilho: - V. Ex.ª não está actualizado sobre esta matéria.
O Orador: - V. Ex.ª tem conhecimentos para além do que eu sei. O que eu digo baseia-se num projecto de diploma que está para sair.
O Sr. Engrácia Carrilho: - Confirmo que não corresponde a verdade a afirmação feita.
O Sr. Pinto de Mesquita: - Até em ortografia os acentos tónicos estão em crise.
O Orador: - Com este saltar contínuo cria-se uma insegurança que dos serviços se transmite à produção e não se obtém resposta no incremento desejado, até porque a cada transferência corresponde uma paragem e sempre desvio no modo de actuar. Mesmo pondo de lado a desorientação que resulta de pelo menos se dar a entender, com estas transferências continuas, que não estão delimitados os campos de acção de cada departamento referido, e sem discutir de momento qual ou quais devem interferir neste problema, e em que medida, pelo facto de nunca haver sido cumprido qualquer dos programas, não é lícito julgá-los, donde todas as modificações que constituam em si novos programas basearam-se em suposições mais ou menos subjectivas, e nunca em resultados apreciados com o mínimo de espírito científico.
Nada se consegue assim, a não ser prejuízos para a produção e consumo, e logo para a Nação. A prová-lo tornos o facto de a situação actual a ninguém satisfazer e, embora se haja gasto tempo e dinheiro, o constatar-se que a posição continua semelhante h de 1956, se não mais agravada.
No aviso prévio de 1956, depois de se evidenciar a nossa carência em proteínas de origem animal, lamentava-se o gasto de divisas e dizia-se que o abastecimento era mau e que todos se queixavam. Transcrevo:
... a situação presente não satisfaz o consumidor, a indústria, o comércio e a produção. Não satisfaz o consumidor pela falta de garantia, de abastecimento, pela qualidade e pelo preço, em função da qualidade. Não satisfaz a indústria e o comércio pela mesma razão de falta de sequência de abastecimentos ... Não satisfaz a produção, porque lhe não dá o preço justo ...
Hoje, até pelo que a imprensa diária nos traduz, refiro-me ao artigo de fundo do jornal O Século de 20 de Janeiro findo, é do domínio público ser idêntica a situação.
Também se recorda a nossa deficiência em proteínas de origem animal o se afirma que, embora os dados do problema já muitas vezes tivessem sido postos; se continua na mesma. Transcrevo:
... escassa produção pecuária, porque os preços pagos ao produtor nacional não são suficientemente remuneradores e, apesar disso e em consequência da escassez, preços de venda ao público que estuo em desacordo com os vencimentos e salários; importações maciças com sangria de divisas ...
Mesmo nas intenções, no que se pretendia e hoje se deseja, há semelhanças. No aviso prévio pretendia-se que fossem criados os meios necessários para a execução da doutrina de fomento que havia sido expressa num despacho.
No artigo referido chama-se a atenção para a paragem observada na execução do plano de fomento pecuário, no qual o consumidor e a lavoura depositavam grande esperança.
Oxalá dê fruto a chamada de atenção feita por O Século, pois assim será mais um serviço prestado ao País.
Do que ficou dito já algumas conclusões podemos tirar. A primeira, é de que sem uma acção contínua nada se consegue. Ou com um plano de produção, como se chamava em 1956, ou com uma campanha de fomento, nome que foi dado em 1962, o necessário é que exista uma orientação e que seja cumprida sem paragens.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Do grande dispêndio de divisas e do volume dos restantes encargos a que propositadamente me referi logo de início, parece que devemos concluir ser em absoluto necessário dar carácter de prioridade aos investimentos previstos para melhoria do sector, tanto mais que a situação desagrada a toda a gente, como foi dito.
Não se compreende que tal não tenha sido considerado em 1959 ao ser elaborado o n Plano de Fomento, e muito menos que, havendo sido previstos, em 1962, 120 000 contos para três anos, só tenham sido atribuídos, até fins de 1968, 24 000 contos, que nem sequer foram integralmente gastos, mercê das faltas de orientação a que me venho referindo, e para 1964 só estejam previstos outros 14 000 contos.
De tudo quanto há muito vem sendo' dito, do que foi afirmado sobre a campanha de fomento pecuário, parece concluir-se que n Só haverá dúvidas da rentabilidade do investimento quando bem conduzido neste campo. As verbas primitivamente estimadas, de 40 000 contos por ano, não pareciam exageradas em face dos gastos que se pretende reduzir e da persistência destes.
Então por que se faltou aqui, quando é certo que outros investimentos cuja rentabilidade tem sido objecto de muito maiores dúvidas, e só a prazos mais longos possivelmente serão reprodutivos, não deixaram de ser dotados?
35 uma pergunta que carece de resposta, pois a paragem feita é grave pelo que desacredita, pelas esperanças e boas vontades que desalenta, porque o tempo que se perde não é facilmente recuperável.
Outra conclusão a tirar é que, sendo semelhantes as situações em 1955 e 1964, necessariamente muitas das causas determinantes persistem e convirá numa breve análise recordá-las.
Em 1955 afirmou-se que o problema de fundo das nossas produções animais envolvia essencialmente dois fac-
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tores: acção estimulante dos preços e maiores disponibilidades forraginosas.
A campanha de produção forrageira estava em curso em 1962 e tinha sido feita a previsão de verbas a atribuir-lhe para 1963 e 1964, como referi. Dada a redução de verbas em 1963 e a paragem subsequente, não sei como se está processando.
Quanto à acção estimulante de preços, parece, pelo menos, a avaliar pelas queixas, que nunca foi suficientemente usada.
Em 1962 foi estabelecido um novo condicionalismo para a carne de bovinos, por despacho da Secretaria de Estado do .Comércio com data de 11 de Abril.
Na introdução afirma-se que, dada a persistência, por longos anos, de tabelas rígidas de preços de venda du carne, desconhecendo a evolução ascensional dos preços de gado, se conduziu a um profundo desfasamento entre os preços legais e aqueles que passaram efectivamente a praticar-se.
Esta afirmação por si é bastante para provar a falta anterior de preços estimulantes, pois até diz que os preços legais são em muito inferiores aos do mercado.
Vejamos o que estabeleceu, para avaliarmos se conseguiu criar finalmente preços de estimulo.
Estabelece-se um preço médio ponderado de garantia à produção de 20$50 e 20$30, respectivamente em Lisboa e no Porto.
Atende-se em parte a reparos feitos em 1956, tais como a necessidade de um maior leque de preços tendo em vista a qualidade, é criado um subsídio sazonal para descongestionar a oferta e igualmente outro subsídio para o novilho com fim de incentivar a recria.
Na venda mantém-se a tabela para o preço médio ponderado de 16$66 em Lisboa e 16$40 no Porto.
A diferença entre o preço de garantia na compra e o que se debita no talhante, em Lisboa e no Porto, é suportada pelo Fundo do Abastecimento e cifra-se, como já dissemos, actualmente em cerca de 45 000 contos por ano.
Nos restantes concelhos do País o preço de venda da carne é condicionado ao princípio de um preço de compra do godo, que resulta do de garantia referido, diminuído o valor das despesas estimadas necessárias, para pôr esse gado em Lisboa. Temos, portanto, preços diferentes conforme a distância e que ainda variam segundo as taxas aplicadas pelos respectivos municípios.
Nesta diferença de critérios quanto a Lisboa e Porto e ao resto da País reside a causa de hoje a carne ser mais cara, no geral, fora de Lisboa, e aqui uma incongruência - preços mais altos onde existe menor poder de compra e se situam as classes mais débeis.
O montante do subsídio sazonal, que se estendia a todo o País, estava calculado em 30 000 contos.
O subsídio de novilho, mais complicado na mecânica, só considerava para os precoces, em que se estabelecia um bónus de 3$ por quilograma, os matadouros de Lisboa, Porto e Cascais; para os restantes novilhos só era possível receber subsídio de 2$ por quilograma em dezoito ou dezanove matadouros. Estimava-se a verba de 10 000 contos como limite para este subsídio.
Temos, assim, definido o sistema de 1962, que é ainda o vigente. Para avaliarmos se os preços eram de estímulo, basta referirmos que no próprio projecto do despacho já se dizia que, dada a evolução de preços, se previa que, mesmo sem a saída de novas tabelas, o valor do godo bovino seria de 20$50 por quilograma.
Mais uma vez se procedia em atraso; se estas medidas tivessem sido tomadas dois anos antes, seriam de facto
de fomento. Mas, mesmo assim estabeleceram confiança, evitaram o abate de muitas vacadas e provocaram mesmo um pequeno incremento.
De uma consulta da tabela-base do preço do gado, pareço estranho que o preço médio ponderado seja de 20$50, quando a primeira é de 21$70, mas o facto deve-se a um artificialismo que, aliás, se pratica com o fim de esconder que os preços são baixos. Consiste em classificar cerca de 80 por cento do gado como de primeira, para que assim acorra ao matadouro, mas esta disposição como artificialismo que é contraria imediatamente e tira todo o efeito ao leque de preços. Melhor seria ter logo subido a tabela, para não serem necessários estes recursos que em si mesmos invalidam as intenções.
Quanto ao novilho, saliento aqui uma experiência que mostra bem quanto a lavoura se encontra disposta a colaborar e mesmo a participar em estudos para esclarecimento do problema. Refiro a experiência realizada na Chamusca, que, embora dado o escasso número de animais que envolveu não nos possa dar directrizes certas, já nos dá indicações e tem pelo menos o mérito do exemplo, quer quanto a entusiasmo, quer pela abertura traduzida no acesso franco a todos os dados, para quem se interessou.
O Sr. Amaral Neto: - V. Ex.ª dá-me licença? O Orador: - Faz obséquio.
O Sr. Amaral Neto: - Se V. Ex.ª e a Assembleia mo permitem, gostaria de dar um pequeno esclarecimento a respeito dessa experiência feita na minha terra. A experiência foi conduzida com o máximo rigor de observação e de direcção alimentar quanto aos animais. Escolheram-se doze animais em seis pares de raças diferentes. Foram levados para um estábulo onde estiveram em regime de engorda, sob a orientação de um veterinário, com determinação extremamente cuidada, quer dos produtos consumidos segundo rações cuidadosamente estabelecidas de acordo com os melhores critérios que se conhecem, quer dos subprodutos obtidos. Tudo foi valorizado e tudo contribuiu para o resultado final, que demonstrou não serem suficientes os preços actualmente em vigor.
O Orador: - Muito obrigado V. Ex.ª pela sua valiosa contribuição. Os preços de custo a que chegou são bastante superiores aos de venda, só vindo confirmar aquilo que alguns entusiastas, que se lançaram numa recria intensiva, já tinham concluído. Isto é, que o preço era insuficiente para o fim que se pretendia. Também demonstrou que a reposição do novilho castrado era menor que no inteiro e com valores tanto mais significativos quanto maior a precocidade, isto até a idade considerada no ensaio, dois anos. Provou-se que dentro destas idades a carne, quanto a tenrura, não apresenta diferenças sensíveis por o animal estar inteiro, e isto, conjugado com o que atrás se disse, quanto a reposição, leva a admitir que, pelo menos por agora, haveria vantagem em tirar a obrigatoriedade de castração no novilho para concessão de subsidio.
Digo por agora, porque se o plano se processar como vinha sendo idealizado, quando estiverem feitos os livros genealógicos, já se compreende que nestas idades haja obrigatoriedade de castração para todos os animais não inscritos.
Quanto a preços, convirá ainda fazer uma comparação com os praticados noutros países, não os do mercado mundial, mas sim com os recebidos pelos produtores.
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Os preços médios de carne de bovino recebidos pelos produtores na Europa em 1962-1968 foram:
Itália .................. 31$50
Suíça .................. 29$50
Alemanha ................ 82$30
Espanha ................ 28$05
Suécia ................. 27$58
Finlândia ................ 26$82
Holanda ................ 26$70
Bélgica ................. 25$89
França ................. 25$82
Reino Unido .............. 23$46
Grécia ................. 22$39
Áustria ................. 21$86
Portugal ................ 20$60
Dinamarca ............... 18$96
Como se vê, só a Dinamarca tem preços inferiores aos nossos e a Áustria pouco superiores. Todos os outros países apresentam grandes diferenças para mais, e nomeadamente a Espanha, 28$05, a Itália, 31$50, e a França, 25$82.
Referi em especial estes valores, porque de um estudo realizado pelo Eng.º Sousa Catita em 1960, justamente nestes países, se conclui que da aplicação dos nossos preços, quer de mão-de-obra, quer de forragens, mesmo aos casos mais vantajosos das explorações que visitou, chega-se sempre a resultados negativos perante os nossos preços da carne.
Creio, pois, ficar demonstrado que para serem estimulantes os preços oficiais terão de ser aumentados na produção.
À situação hoje é muito semelhante à de 1956 e 1962, pois também, por carência de carne, se estão praticando preços muito superiores aos previstos oficialmente.
Até nos gados entregues em Lisboa por intermédio da organização da lavoura há um novo subsídio de 2$ por quilograma, mas, como foi anunciado tarde e dito que era de curta duração, não poderá ter efeito para além da possibilidade de trazer de momento algum gado ao matadouro.
Ao estabelecerem-se preços de estímulo, é preciso ter em conta a situação actual e ponderar o que sucedeu em 1962. Os valores que hoje se estão processando no mercado de gado, para as diferentes espécies, poderiam ser de estímulo, se garantidos no tempo. Sem isto trabalham £o contrário, pois, na dúvida do preço de amanhã, levam, em alguns casos, a um abate prematuro e a um sacrifício de fêmeas, que contraria o aumento de pecuária desejado.
É preciso que sejam os preços a comandar pelo estímulo, e não as faltas a determinar os preços.
O Sr. Amaral Neto: - Muito bem!
O Orador: - Que se actue prontamente, em atenção ao que ficou dito, é em absoluto necessário, para se vencer neste campo, como tanto desejamos.
Quanto à comercialização, também haverá bastante que fazer. Fomos informados pelo Sr. Ministro da Economia de que se pretende acabar com o subsídio diferencial estabelecido para Lisboa e Porto. Assim terminará aquela incongruência que referimos e que, sem beneficiar no fundo o consumidor, pois é por de mais conhecido que hoje grande parte da população, destas cidades se abastece na periferia ou a preços iguais aos que aí vigoram, acarreta grandes encargos ao Fundo de Abastecimento, sem contrapartida de benefícios para a produção.
É preciso atender às queixas dos talhantes que podem ter justificação, dado o volume das suas operações e o montante dos seus encargos. Num estudo realizado em 1960, para a área de Lisboa, e tomando em atenção a venda de carne de vaca, vitela e carneiro, constata-se que existem 61 talhos com uma venda média diária de 47 kg de carne, tendo dois empregados, e 162 talhos com a média de venda de 73 kg diários, tendo três empregados; não se compreende como podem viver, sendo de 6 por cento o lucro líquido permitido na venda da carne.
É preciso que, finalmente, se decida qual a política a seguir para os matadouros. Já em 1956 se chamava a atenção para o problema e creio que desde há três ou quatro anos existe uma comissão a estudá-lo, mas ainda não está definido. Num estudo de 1960 verificamos que dos 273 concelhos do continente 85 por cento abatem menos de 2 000 cabeças normais por ano, e destes 205, ou sejam 75 por cento, menos de 1 000. Há mais de 90 matadouros que não chegam a matar uma cabeça normal por dia.
Como o abastecimento funciona em unidades independentes, base concelhia, resultam taxas e critérios diferentes.
Assim em Lisboa o encargo geral sobre quilograma de carne de bovino anda hoje por 5$30 e os encargos para as câmaras nos diferentes concelhos têm um valor médio de $485 e vão até 4$29 por quilograma.
Quanto a critérios, basta referir que, no que diz respeito ao enxugo, há quem não desconte, há quem desconte somente em certas espécies e há quem desconte nas reses de todos as espécies. Nos descontos uns usam peso fixo por rês, independentemente do peso desta, outros utilizam o sistema de percentagem.
De tudo isto resulta desorientação e, como é fácil de concluir, cria-se um grande número de encargos que a ninguém aproveita, só agravam a situação. Aqui se deverá ir buscar parte da compensação, para que os aumentos necessários dos preços na produção .não tenham reflexo demasiado forte no consumidor.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Com matadouros que não matam uma cabeça por dia, com talhos que vendem 47 kg de carne por dia, com tudo o mais, compreende-se qual é o aumento de preço de venda que resulta e a distância que tem de haver entre o que a produção recebe e o consumidor paga.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Parece-me que o abastecimento de carne é hoje um problema que transcende o âmbito local, devendo tender-se para uma solução nacional. Haverá que dar compensação das receitas que hoje alguns municípios vão buscar às carnes, mas não julgo possível manter o sistema actual.
O Sr. Pinto de Mesquita: - Muito bem! Esse problema tem de ser resolvido por matadouros regionais, fora do âmbito municipal. É exactamente como a electricidade que ultrapassou o regime municipal.
O Orador: - Também o julgo.
Muito, creio, está reservado neste campo à organização corporativa de lavoura, quer através de matadouros regionais, se vier a ser essa a solução, quer na organização e comando do circuito dos gados, mas para isso é preciso possibilitarem-se meios de acção.
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É necessário resolver a situação, mas para já, e como os efeitos não podem ser rápidos, impõe-se o recurso a subsídios, para que não se entrave o fomento pecuário, por falta de preços estimulantes, e se possibilite carne a preços convenientes ao consumidor; contudo, só como transitórios os devemos aceitar, pois é preciso tender-se para o que a realidade impõe.
Quanto à diferença de métodos preconizados para o fomento, referir-me-ei aqui apenas à discordância nalguns conceitos básicos.
Na campanha iniciada em 1962 dava-se um passo no sentido de uma pecuária progressiva. Conduzia-se a agricultura à criação dos seus próprios reprodutores, substituindo-se ao Estado, a quem ficava competindo não só a criação dos livros genealógicos, como o papel orientador de todo o desenvolvimento, pois até pelo critério dos subsídios, na compra de reprodutores, se encaminhava a produção só para aquela raça que pretendia, e isto com manifesta economia para o erário público.
Era um comando que se aceita, pois é lógico que só se fomenta o que interessa.
Alguns resultados positivos deu o sistema, e embora se não tenha colhido todo o fruto esperado, isso não admira, pois não era possível cumprir o programa preestabelecido com a redução de verbas que se verificou.
Praticamente importaram-se os reprodutores e os estudos subsequentes não puderam ser feitos, tendo mesmo faltado a assistência técnica prevista, o que n fio pôde deixar de se traduzir por alguns insucessos.
Contudo, alguma coisa ficou, alguns núcleos de raças puras, que já permitem a venda de reprodutores inscritos nos livros de origem, a lavradores portugueses por criadores portugueses, a preços que andam de um terço a um meio do de importação e sem a correspondente saída de divisas, a certeza das vantagem de alguns cruzamentos industriais; a prova de que a lavoura acorre quando compreende as soluções, apesar da situação financeira que atravessa, e também que já tem capacidade técnica para a produção de reprodutores de qualidade. Para o mostrar basta referir as negociações em curso para a venda de 100 reprodutores da raça merino precoce ao Estado espanhol.
Depois da paragem da campanha de 1963, pelo que é do meu conhecimento, prebende-se rever esta orientação, alegando-se deficiências ao sistema, e não a falta da sua completa realização.
Assim, pretende-se acabar com o regime de subsídio na compra de reprodutores, efectuada pelos lavradores, e prefere-se a compra de núcleos puros, a fornecer à Junta de Colonização Interna, que se tornará de futuro a fornecedora de reprodutores, por empréstimo à lavoura, que depois os irá pagando através de um certo número de anos. O sistema é complexo e não há tempo para o descrever, mas convém reter o que no fundo se deseja conseguir.
Através da concessão de um preço mais barato e a pagar a prazo, pretende-se um comando total da exploração pelas obrigatoriedades que se impõem. Estas vão desde os processos de exploração até aos melhoramentos fundiários, sem esquecer mesmo a venda dos futuros produtos. Quem fiscaliza e dita as condições compreende-se que seja a Junta, visto ser quem empresta o gado. Assim ao menos não haverá dúvidas em quem comanda o desenvolvimento. Mas há dúvidas, e muitas são se isto é lícito e desejável.
Primeiro anda-se para trás, caminha-se para uma pecuária de país subdesenvolvido. Volta-se ao sistema de ser o Estado o único fornecedor de reprodutores, contrariando-se tudo quanto se havia fomentado.
Caminha-se para um comando que dificilmente se aceita, estabelecem-se obrigações sem garantir rendimentos, há um sem-número de problemas que se criam. Exemplifico:
Mesmo que admitíssemos ser válido este processo, seria à Junta que competiria o papel descrito ou à Direcção-Geral dos Serviços Pecuários, que é quem superintende no melhoramento animal e dispõe das estações zootécnicas?
Não vale a pena continuar, nem o tempo no-lo permite, mas creio que não é útil este caminho e temos esperanças não venha a concretizar-se.
O Sr. Sousa Meneses: - Não haverá aí a ideia, da parte do Estado, da inseminação artificial?
O Orador: - Sobre esse ponto não há dúvida, por isso não o abordei.
O Sr. Sousa Meneses: - Mas por que é que não está em execução?
O Orador: - Importaram os touros para a estação de inseminação, mas depois faltou a verba e hão se pôde continuar.
O Sr. Sousa Meneses: - Mas seria muito mais económico o Estado ou os seus órgãos de execução possuírem os reprodutores.
O Orador: - Para as vacas leiteiras está em estudo a inseminação.
Julgo que até pela continuidade de acção necessária, para se poderem produzir reflexos positivos, convirá antes manter os conceitos que já haviam sido aceites e completar métodos de acção que se mostraram eficientes.
Assim, para o gado bovino, depois de serem estabelecidos com garantia no tempo preços de estímulo, há que pensar se o sistema que vinha sendo seguido não se pode acelerar sem que, contudo, se exijam gastos incomportáveis.
Está certo o método usado para os reprodutores machos, mas para as fêmeas, e porque de momento se exige um rápido adensamento pecuário, não será de admitir, para além das medidas que levem a recria do maior número de fêmeas e evitem o seu abate, mesmo a compra de animais não inscritos em livros genealógicos ou até de raças semelhantes às nossas, para um rápido crescimento em número?
A diferença de preços por animal será de 30 a 20 contos para 8 a 5 contos, e assim com o mesmo dinheiro se aumentará o volume de cabeças e mais rapidamente, se conjugarmos ao subsídio o dar a possibilidade de crédito pecuário, que deve estar implícita em toda a campanha de fomento.
Para os ovinos, creio que se vai no caminho certo, interessando completar o sistema com os estudos necessários e a assistência técnica indispensável; demonstrada a vantagem, em certas circunstâncias, dos cruzamentos industriais, convém, através do estudo, ver e definir melhor quais as raças que levam a maiores rendimentos e a melhores carcaças, para que pela divulgação e assistência técnica se encaminhe a produção no bom sentido de exploração.
Quanto aos suínos, há primeiro que afastar a sombra do vírus, que, por si só, contraria de momento muitas das possibilidades do progresso. Podemos definir os problemas
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fundamentais criados pela peste suína africana da forma seguinte:
1.º Occisão de grandes efectivos, cujos pagamentos estão atrasados mais de um ano.
2.º Diminuição substancial por morte ou sacrifício de parte da população suína do 'Sul com correspondente diminuição de rendimentos privados e da impossibilidade prática do aproveitamento dos montados pelos suínos.
3.º Perda de confiança na viabilidade da exploração suína e perplexidade, não só quanto à, forma, mas também quanto a vantagem, de refazer os efectivos dizimados.
Parece-me, em face da situação criada, sor necessário para já, o seguinte:
1.º A criação de um serviço temporário da peste suína africana, suficientemente dotado em recursos de vária ordem, ao qual seriam cometidos todos os trabalhos atinentes ao estudo da enfermidade, sua erradicação e terapêutica. Seria um serviço temporário de campanha dentro da Direcção-Geral dos Serviços Pecuários;
2.º Que o Ministério das Finanças habilite os serviços a liquidar a dívida em atraso e tome em atenção a impossibilidade de se realizar um rendimento que continua sendo tributado.
E passo a frente, para não falar das causas que nos levaram a esta situação.
Quanto ao crédito pecuário, a que atrás me referi, julgo indispensável dar alguns esclarecimentos. Perante a situação actual e dada a necessidade de investimentos para o fomento no campo pecuário, é preciso criar-se um crédito com base no penhor mercantil, representado pelo próprio gado, pois a base tradicional, o valor terra, já está em muito comprometido e nem permitiria estender benefícios a rendeiros.
O principal obstáculo que se nos depara para a sua aceitação é a necessidade indispensável da existência de um seguro pecuário. Desde há tempo que a organização da lavoura pôs o problema ao Grémio dos Seguradores, e embora se tenham efectuado várias reuniões, apesar das boas vontades recíprocas, o assunto ainda não pode ser estruturado a moldes exequíveis, principalmente porque não se dispõe do apoio financeiro inicial, tanto mais necessário quanto é certo que não é fácil obter o resseguro no mercado internacional. Parece que seria conveniente que se habilitasse financeiramente a organização da lavoura por forma que se pudesse por ela própria resolver o problema, se bem que não se afaste a natural colaboração com a indústria seguradora.
Sr. Presidente: procurei trazer perante V. Ex.ª o meu contributo para o esclarecimento deste gravo problema - que nos preocupa - a crise agrícola. Termino afirmando a esperança de que urgentemente se tomem agudas medidas de carácter imediato que a situação impõe.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Rocha Cardoso: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: apesar de singela e modesta a minha intervenção neste aviso prévio sobre os problemas agrícolas nacionais, em hora bem oportuna trazido a esta Assembleia pelo nosso ilustre colega Amaral Neto, não podia deixar de nele tomar parte como Deputado pelo círculo de Faro, como Deputado algarvio.
O Sr. Serras Pereira: - Muito bem!
O Orador: - E isto porque o Algarve representa um valor grande agrícola na economia nacional, produzindo não só quase todos os géneros agrícolas que produzem as outras regiões do continente, mas ainda outros produtos ou, melhor, outros frutos, que são um poderoso factor económico nas exportações do País, contribuindo grandemente para a aquisição de divisas estrangeiras, e assim dando um forte auxílio ao equilíbrio da balança de pagamentos.
Além do mais, o Algarve também vem de há muito sendo atingido pelas crises que tão poderosamente atacam a lavoura nacional. E interessante é de salientar, que, à frente e em defesa dos interesses da lavoura, tem estado na presidência da sua corporação precisamente um homem, filho do Algarve e dos seus mais ilustres valores, o Sr. Eng.º Caldas de Almeida, que tão incansável tem sido na defesa dos interesses de toda a agricultura, conduzindo-se sempre e até nos momentos dos mais inconcebíveis desenganos com o maior civismo, e até mesmo com o maior patriotismo, não deixando nunca resvalar para a falta de ordem e de compostura o desespero de não serem atendidos interesses inteiramente justos e, aliás, por todos mesmo reconhecidos.
Sem dúvida, honrando-se pessoalmente, esse ilustre algarvio que é o Sr. Eng.º Caldas de Almeida tem honrado e dignificado, neste difícil momento em que a Pátria defende a terra bem portuguesa de Angola, a lavoura nacional. Não têm sido tratados com a mesma elevação, com a mesma ordem, com a mesma ponderação, iguais crises agrícolas em outros países do Mundo, nomeadamente na própria Europa, e isto, só por si mesmo, mostra a força da razão que assiste à lavoura portuguesa, ao desejar esclarecer, ponderadamente, as suas crises económicas, talvez das maiores que em todos os tempos a atingiram.
Sabemos bem quanto este problema é vasto e difícil de solucionar a contento de todos e do próprio interesse geral da Nação. Temo-lo visto de há muito equacionado por altas individualidades de forte saber e competência administrativa, económica e política, e até pela última vez posto com a maior elevação e inteligência pelo muito ilustre economista que actualmente dirige a difícil pasta da Economia, sem que contudo tenhamos visto resolvidos alguns dos mais instantes problemas que dificultam de há muito a vida da lavoura.
Contudo, e após tantos desenganos, devo confessar muito sinceramente que depois de ter ouvido a brilhante exposição do Sr. Ministro da Economia perante a comissão dos interesses económicos desta Assembleia senti reviver a esperança de ver solucionados os vastos problemas da lavoura nacional. E por que não?
Outros, maiores e mais difíceis, têm sido resolvidos pelos homens do Estado Novo, por que não se resolver também este?
Como português e como algarvio, começo fortemente a ter esperança e, por isso, venho deixar neste debate um Ligeiro apontamento da economia agrícola do Algarve, dos factores que presentemente a trazem em crise e o que é necessário e urgente fazer para os solucionar, salvando-se assim o muito que o Estado Novo já fez no Algarve para a sua valorização agrícola.
Refiro-me às barragens do Arade e de Odiáxere.
Em todos os sectores agrícolas nacionais o Algarve tem uma palavra a dizer, ato mesmo naqueles como o trigo
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e o milho, que dão a ideia de não terem qualquer significado na lavoura algarvia, por serem valores grandes do Alentejo, do Ribatejo e do Minho.
Mais conhecido o Algarve pelas suas belezas naturais, pela amenidade do seu clima, pelas flores da sua fruticultura, pela quentura da água do seu mar e pelo valor e sabor do seu peixe e, digamos, descoberto agora para o maior valor do turismo nacional, pode parecer a muitos de insignificante valor os produtos da terra colhidos pela lavoura algarvia, alam dos seus primores agrícolas, como as tenras favas ou as saborosas ervilhas, a que nós damos o nome de griséus e que a técnica agrícola dos Algarvios quase consegue fazer produzir já durante todo o ano.
Até mesmo no trigo, o Algarve consegue ser a quinta província na sua capacidade de produção, como passo a indicar, extraindo os dados e cimentando a minha afirmação em relatórios bem elaborados e documentados pela Federação Nacional dos Produtores de Trigo, sem dúvida o organismo que melhor tem elevado e dignificado a organização corporativa da Nação.
Em primeiro lugar o Baixo Alentejo, como celeiro maior do trigo em Portugal, com 152 775 435 kg, em segundo lugar o Alto Alentejo, com 98 585 203 kg, em terceiro lugar a Estremadura, com 45 379 692 kg, em quarto lugar o Ribatejo, com 38 961 573 kg, e em quinto lugar o Algarve, com 26 536 315 kg, que, ao preço da tabela em vigor, representa um valor económico de 79 600 contos. E para que se veja bem quanto a produção de trigo interessa ao Algarve, necessário é afirmar que há ali, depois de Beja, o maior número de produtores de trigo do País; havendo ali em Beja 20 741 e no Algarve 20 149, número muito superior ao de qualquer das outras regiões produtoras de trigo.
Isto mostra bem que o Algarvio não descura o pão para a sua boca, pois até 1 000 kg de produção. de trigo existem no Algarve, no distrito de Faro, nada menos de 11 736 produtores, de 1 000 kg a 1 500 kg 3 622, de 1 500 kg a 2 500 kg 2 781 e de 2 500 kg a 5 000 kg 1483.
Quanto ao outro produto da lavoura algarvia, o milho, também comercialmente movimentado na sua quase totalidade pela Federação Nacional dos Produtores de Trigo, constatamos que o Algarve é a segunda' província do continente produtora de milho, figurando a seguir ao Minho, se bem que seja o Algarve a província que mais milho entrega para venda à Federação, e isto porque no Minho a reserva para consumo alimentar é sem dúvida muito mnior.
Que assim é basta dizer que até 14 de Janeiro findo a Federação Nacional dos Produtores de Trigo adquiriu 14 850 189 kg de milho da produção de 1963, correspondendo ao Algarve 9 792 524 kg, ou seja 65,94 por cento da produção total do País, tendo o Minho entregue apenas 437 818 kg, ou seja 2,95 por cento. Assim, e até àquela data, o Algarve vendeu de milho quase 20 000 contos.
Quanto a pecuária, o Algarve figura, como já aqui afirmei nesta Assembleia, em intervenção antes da ordem do dia, como um dos maiores centros pecuários nacionais, pois só em gado bovino possui para cima de 28 000 cabeças, número superior a cada um dos distritos de Beja, Évora e Setúbal, criando-se no Algarve dos melhores vitelos do País, destinando-se o maior número deles ao abastecimento de carne a cidade do Porto, sendo por isso mesmo uma das razões por que ali se come da melhor carne, pois devem sair anualmente dó Algarve para o Porto para cima de 25 000 vitelos.
Passando agora a tratar dos frutos do Algarve, vão VV. Ex.ªs verificar quão grande é o seu valor na economia portuguesa, merecendo, por isso, a melhor e a maior atenção do Ministério da Economia.
Em 1962 as quantidades de frutas secas saídas do Algarve para os mercados interno e externo foram as seguintes: miolo de amêndoa 3 092 635 kg; amêndoa em casca 291010 kg, tendo saído para o mercado externo, respectivamente, 3 011747 kg e 286 375 kg; figo;; 5 808 010 kg, tendo-se exportado 2 958 816 kg; pasta de figo 1984 885 kg, que foi totalmente exportada para a América do Norte; alfarroba 18 768 817 kg, tendo-se exportado apenas 657 587 kg e saído para o mercado interno 18 110 730 kg.
Quer dizer: os valores dos frutos secos do Algarve atingiram em 1962 153 121 256Ï40, rendendo até mais do que a pesca, que teve o valor de 114 683 554$. Se somarmos estas duas verbas ao valor da exportação de conservas de peixe do Algarve, que foi de 406 848 205$, encontraremos um total de 674 653 015$40, que mostra bem o valor do Algarve na economia portuguesa.
O Sr. Alberto de Meireles: - V. Ex.ª dá-me licença?
O Orador: - Faça favor.
O Sr. Alberto de Meireles: - Aí só tenho uma dúvida: é somar ao preço do pescado o valor da exportação das conservas'. Porque, como o pescado vai dentro das conservas, pareço .que tecnicamente terá a sua dúvida na soma.
O Orador: - Toda a pesca foi de 114 000 contos. A venda de conservas para o estrangeiro foi de 464 000 contos. São dois valores diferentes. Às conservas levam sardinhas e não levam figos.
Risos.
O Sr. Alberto de Meireles: - A soma é que ...
O Orador: - À soma não tirei a prova real; foi só a dos nove.
Risos.
Quem nos tenha ouvido até aqui terá colhido a impressão de que no Algarve se vive agricolamente em maré de fortuna, era bem-estar económico, em plena (prosperidade da sua lavoura.
Sem dúvida, a lavoura, ou melhor, a agricultura algarvia, é muito diferente da de qualquer outra região, pois, produzindo, como já disse, os mesmos produtos, tem- outros, os frutos secos, quase só de valor exportativo, pelo que pode colher em divisas estrangeiras um valor económico superior ao de qualquer outra região agrícola.
Contudo analisarei a situação de todos os produtos agrícolas, e verificar-se-á que nos assoberba uma forte crise, de há muito apontada e concretizada, sem que a tenhamos visto devidamente apreciada no sentido de a solucionar. Que assim é, começo por apontar o fenómeno principal que afecta de uma maneira geral todos os produtos agrícolas algarvios e que de ano para ano mais a preocupam, sem se, vislumbrar a forma para a sua solução. Refiro-me & falta de mão-de-obra, ao afastamento quase total do trabalhador rural dos serviços do campo.
Tal fenómeno, que se nos apresenta já de muito difícil, se não mesmo de impossível, solução, tem destruído a economia da lavoura do Algarve e não sabemos como poderá recompor-se.
O baixo valor dos produtos agrícolas tabelados, trigo, milho, arroz, azeite e carne; o baixo, senão ridículo, valor dado nos últimos anos ao figo, inferior a muito mais de um terço do que era habitual; o ridículo valor dos produtos
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hortícolas e o baixo, ou melhor, o insignificante, preço da laranja e da tangerina dos nossos pomares, nos quais tantas o tilo grandes esperanças havíamos posto, levaram a afastar-se do campo o trabalhador rural, na impossibilidade de um melhor nível de vida, de um salário igual ou semelhante ao do operário, deixou o campo e ou emigrou para o estrangeiro ou abalou para a construção civil nos grandes centros populacionais. E, presentemente, aquele que ficou no campo exige um salário tão elevado que os produtos que colhe ou os frutos que apanha mal chegam no seu valor para a paga do seu salário.
O conhecido parceiro agrícola e pecuário pode dizer-se que já desapareceu. Os figos, as alfarrobas, as azeitonas, que apanhava ao sexto ou ao quinto, já não lhe compensam os salários, e o proprietário tem agora que colhê-los com trabalhadores que exigem jornas tilo elevadas que terá de abandonar as colheitas.
A muita mão-de-obra na colheita dos frutos, por exemplo no figo: apanho na figueira, transporte para o almanxar, trabalhos neste, com o entender do figo na esteira, esverdeá-los, enrolar e desenrolar as esteiras ao sol-posto e de manhã, escolher os figos, flor, tulha e industrial, levá-los depois à câmara de expurgo, tudo fica ao fim e ao cabo, por não dar o mel para o guloso, como soe disser-se. E o figo, que era dos frutos de rendimento anual mais normal para o proprietário algarvio, pois que as colheitas de alfarroba e, sobretudo, de amêndoa sito incertas, passou quase a niïo pesar na sua economia.
As laranjas, sem saída para o mercado externo e vivendo quase exclusivamente do mercado abastecedor de Lisboa, quase não têm valor. Pode dizer-se, e os organismos oficiais sabem do que se passa, que os proprietários algarvios de pomares oferecem, dão as laranjas, e os consumidores de Lisboa têm de comprá-las caríssimas. Este ano Taro é o cabaz de laranjas que, vendido no mercado abastecedor, dá líquido ao produtor algarvio 25$, pois, em quase uma centena de facturas em meu poder, os cabazes deram ao produtor, depois de pagas todas as despesas de venda, as quais atingem um valor quase igual ao do preço do próprio produto, verbas como as seguintes, por cabaz, nos meses de Dezembro e Janeiro últimos: 23$15 - prejuízo de $80, em seis cabazes de laranja que haviam sido vendidos por 75$ e tiveram de despesa 75$80 - 21 $33, 22$75, 18$75, 15$40 e 10$24, o mesmo ou pior acontecendo com a venda dos cabazes de tangerina. Estes valores, sujeitos ainda às despesas com o apanho e o encabazar da laranja, dão como consequência que o produtor algarvio não chega a vender cada laranja por mais de $10 ou $20.
Assim, não podemos compreender como o consumidor de Lisboa não obtém uma laranja por menos de 1$ e até por 2$50, custando uma pequena laranja para sumo mais de $00.
Ouvimos o Sr. Ministro da Economia afirmar ser urgente eliminar a série de intermediários que influem comercialmente no preço dos produtos e cremos estar aí, sem dúvida, o mal do preço inferior da laranja para o produtor e o elevadíssimo preço para o consumidor. Fará a laranja torna-se necessário criar a sua rápida industrialização em sistema corporativo, mas integrado na organização corporativa, não várias, mas uma cooperativa única para o Algarve, para a comercialização e industrialização de toda a laranja e tangerina e até de outras frutas verdes, cooperativa que poderia ter delegações nos vários e maiores centros produtores.
Em Espanha, no formidável desenvolvimento assumido pela agricultura pelas inúmeras barragens, o problema foi encarado na origem. Por exemplo, no grandioso plano
de rega de Badajoz, no qual após 10 anos do seu início só construíram já três barragens e está uma quarta em acabamento, 160 km de canais, 1889 km de regadeiras, 25 povoações, mais 7 em acabamento e 17 pendentes, transformaram-se em regadio 46 697 ha, mas ao mesmo tempo construíram-se 81 fábricas de produtos agrícolas e estão mais 3 em construção. Assim, foi possível empregar no campo e na indústria agrícola mais de 20 000 trabalhadores rurais, quando antes do plano aquela mesma área em sequeiro não empregava mais de 3400 trabalhadores. Vêem-se ali fábricas de beterraba, sumos, tomate, tabaco, algodão e outros produtos da terra, tendo aumentado em 5 932 milhões de pesetas o valor dos produtos obtidos pelo cultivo em regadio das superfícies transformadas.
No Algarve, com as suas bem construídas barragens do Arade e do Odiáxere, que honram os serviços hidráulicos portugueses e que irrigam quase 4 000 ha, não se construiu uma única fábrica e cultivam-se ainda ali os mesmos produtos que se cultivavam com as velhas noras que nos ficaram dos Mouros, apenas tendo-se começado a cultivar mais alguns hectares de arroz, mas que, pela tabela do preço actual e pelos salários exigidos, terão de ser abandonados, dada a insuficiência económica da sua cultura.
Temos aguardado no Algarve o início do plano forrageiro, mas até hoje apenas e somente temos sido auxiliados pela Federação Nacional dos Produtores de Trigo, que nos vende as sementes de forragens por um preço muito inferior ao do mercado comercial. Pode afirmar-se que, se não fora aquele organismo, continuávamos a olhar para o papel dos comunicados oficiais e pelas descrições nos jornais de alguns esperançosos discursos.
Não podemos compreender a demora em iniciar-se este plano, tanto mais que já foi criada, e está em funcionamento, a Estação de Fomento Pecuário do Algarve, com sede no Odiáxere, sob a hábil e dinâmica acção do intendente da pecuária do distrito de Faro, Eng.º Manuel Elias Trigo Pereira. Já ali existe gado bovino adquirido no estrangeiro, já se fazem cruzamentos com a raça bovina algarvia, e não demorará muito, talvez, a distribuição à lavoura do gado ali obtido, a qual o receberá com esperança de um melhor rendimento, se for aumentado o preço da carne e o seu comércio se livrar dos inúmeros intermediários parasitas, como nos disse desejar fazer o Sr. Ministro da Economia.
Não queremos ser pessimistas, mas tudo se processa por forma que a alfarroba, um valioso fruto da economia regional, veja diminuído o seu valor. A massa da alfarroba começa a ser pouco procurada, e já em 1962 - não tenho ainda elementos de 1963 -, dos 18 744 959 kg de triturado de alfarroba, apenas saíram para o mercado externo 644 981 kg. Tal facto, a pouca procura do triturado de alfarroba, já se notava há anos, e houve alguém com verdadeiro sentido prático do problema, o nosso distinto colega nesta Assembleia Ubach Chaves, que, quando Secretário da Indústria, quis inteligentemente evitar a desvalorização daquele fruto, a que no Algarve costumávamos chamar a nossa cortiça.
Então, foi pelo Dr. Ubach Chaves concedida uma licença para a instalação no Algarve de uma fábrica de álcool de alfarroba, mas quis o destino ou o demo que, contra a expressa vontade do nosso colega e com amargura para toda a lavoura algarvia, fosse anulado o despacho que concedera a autorização. Se tal fatalidade não se tivesse dado, o Algarve tinha há muito tempo evitado perder um seu valioso produto. Além de que - e isto enchia de ânimo os Algarvios - viam instalar na sua província e pertença dos seus filhos uma indústria agrícola, ao contrário do que
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contra a vontade de toda a população algarvia veio a acontecer com a indústria de álcool de figo.
Para uma verdadeira reconversão de culturas na lavoura algarvia, para uma nova e melhor vida agrícola, precisamos antes de mais fazer regressar a terra o homem do campo, dando no agricultor uma maior e mais segura rentabilidade agrícola, para que este assegure ao trabalhador um melhor salário e, consequentemente, um melhor nível de vida.
Urge estancar a emigração, a emigração algarvia. Só em 1962 emigraram oficialmente 1 045 indivíduos, pertencendo só ao concelho de Loulé 461. Isto oficialmente, pois não se pode calcular ou avaliar com precisão o número dos que emigram clandestinamente.
Sem a necessária mão-de-obra, dada a especial agricultura algarvia, mormente pelos seus frutos secos, não é possível obter-se uma maior produção, tanto mais dado o exagerado custo da mecanização agrícola, que tanta ruína já causou por falta de boa organização colectiva. É urgente, á absolutamente necessário, criar-se no Algarve, junto de cada uma das suas escolas técnicas, cursos elementares de instrução agrícola, criando-se também dois cursos complementares nos mais importantes centros agrícolas, Silves e Tavira.
Não se compreende como achar colocação na indústria e no comércio nacional de tantos e tantos milhares de rapazes que frequentam as escolas técnicas. Só no Algarve e nas suas sete escolas técnicas a frequência deve ascender a 4 000 rapazes, e, não tendo aumentado a indústria algarvia e não sendo diferente a sua vida comercial, como colocar e onde os rapazes que vão saindo das escolas técnicas?
Há que criar ainda no Algarve, pelo menos, três fábricas de álcool para figo e alfarroba, uma em - Silves, outra em Loulé e outra em Tavira. Proteger devidamente a indústria da pasta de figo, valor importante de exportação para a América do Norte e que cada dia mais se torna a melhor aplicação para o figo comestível do Algarve.
Uma fábrica de celulose em Monchique, cuja serra tem condições climatéricas excepcionais para a florestação e onde já existe a maior zona de floresta do Algarve. Demais ao abrigo da Lei n.º 2 069 e da Lei n.º 2 017, começaram já os serviços florestais a instalar viveiros, a projectar zonas de arborização, algumas já com parecer favorável da Câmara Corporativa e outras até com a aprovação do Conselho de Ministros, como as dunas da Carrapateira.
Se nos lembrarmos de que há no Algarve uma área de 248 400 ha por arborizar, nomeadamente nas serras do Espinhaço de Cão, Monchique, Caldeirão, Monte Figo, em barroca! e terrenos arenosos, e de que apenas se encontram arborizados 18 por cento, vemos a extensão deste importante problema agrícola do Algarve.
Vou terminar, Sr. Presidente, fazendo votos para que este aviso prévio sobre os problemas agrícolas seja escutado e apreciado pelas entidades oficiais, por forma a encontrarem-se as melhores soluções, já tanto prejudicadas pela grande demora havida, e que venham ainda a tempo de não se perder de todo o melhor sentimento das gentes portuguesas: o amor a terra.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Cutlieiro Ferreira: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: quis a lúcida inteligência do nosso brilhante colega Eng.º Amaral Neto levantar nesta Câmara, através de um oportuníssimo aviso prévio sobre a crise agrícola, a discussão dos actuais e prementes problemas que afectam um dos mais' sacrificados, sectores da economia nacional - a lavoura.
Bem haja,. Sr. Deputado Amaral Neto, peia justeza dá sua intenção e pela esperança que todos depositamos nos resultados benéficos deste debate.
Porque represento, nesta Câmara, um distrito essencialmente agrícola - o distrito de Évora -, muito embora outros ilustres colegas, certamente mais qualificados, possam, brilhantemente, apresentar suas queixas, suas dúvidas, seus aplausos e suas soluções, não devo eximir-me a dar o meu contributo e colaborar, como posso e sei, na discussão das causas e efeitos da crise que, tão gravemente, afecta a minha região. Já por várias vezes, sempre modestamente é certo, me tenho ocupado dos problemas causadores e resultantes dessa crise do alto desta tribuna, que deveria ser, e nem sempre é, escutada com interesse por quem de direito, porque aqui se exprime a vontade da Nação. Mesmo quando se critica, e essa missão é tão honrosa como a de louvar, se pode, e deve, proceder de conformidade com os sagrados interesses da Pátria. Nessa disposição aqui estou.
Que existe uma grave crise agrícola, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é já um lugar-comum nas constantes afirmações de todos os sectores da vida nacional e pelas mais autorizadas vozes dos nossos governantes e governados.
Mas, antes de tudo, por que existe essa crise?
São fundas, longos e envelhecidas as raízes dessa crise. Há culpas dos homens, do clima, dos sistemas ...
As culpas dos homens começaram quando estes não se aperceberam da evolução que a exploração racional da terra os obrigava ao estudo, à experiência, à luta permanente com os elementos, as pragas e as doenças. Quando o homem se esqueceu, como dirigente, da existência de outros homens e não agiu em jeito de ser útil a si e, mais ainda, ao seu semelhante.
Quando o homem, por falta de directrizes superiores, abandonou a terra, muitas vezes na falsa miragem de outros bens mais fáceis de adquirir, mas também mais fáceis de perder.
Quando o homem, desamparado, se esqueceu de que é um ser sociável e não actuou dentro do meio social, procurando, com exagerado individualismo, resolver todos os seus problemas com exclusão da ajuda dos seus concidadãos porque lhe faltou a orientação superior. E é tão verdade que o homem aparece como o maior culpado quanto é certo que todas as doutrinas, tanto emanem de órgãos políticos ou religiosos - caso das mais recentes encíclicas -, culpam o homem, criticam o homem, ensinam o homem e aconselham o homem.
Perante esta culpa só resta melhorar o homem.
Como? ... Certamente pela educação, pela instrução e, sobretudo, pela aceitação das mais elementares normas de respeito pelos interesses de todos, qualquer que seja a sua posição na ordem geral da sociedade humana. Atingida esta meta, muito teremos conseguido em benefícios, tanto morais como reais.
As culpas do clima, tão sobejamente conhecidas, agravam, na mais larga escala, as possibilidades, a existência e a duração da crise agrícola. Inconstâncias de temperatura, pluviosidade incontrolada, secas, ventos nocivos e mutações, inteiramente imprevisíveis, das estações do ano dificultam, impossibilitam até sementeiras, mondas, adubações de cobertura, ceifas, debulhas, carregos, etc. . Contra esta culpa, talvez a mais grave, pouco pode a astúcia do homem. O clima constitui, certamente, o factor decisivo no carácter aleatório que predomina na agricultura.
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Medidas contra esta culpa ... esta máxima culpa ... poucas há.
Sistemas de regas, florestações, culturas adaptadas, curvas de nível ... são simples acessórios que não resolvem, em definitivo, as graves consequências da causa primária.
As culpas dos sistemas, entendendo-se por sistemas as normas jurídicas e técnicas impostos pelo Governo à Nação, suo das mais graves. Quero, desde já, esclarecer que as culpas dos sistemas resultam mais, muito mais mesmo, dos aspectos negativos da sua aplicação que dos positivos. Leis, decretos, portarias, suo o nosso forte, mas esta é a verdade cruel, a sua regulamentação, a sua aplicação à vida real, são muitas vezes desejo, esperança e anseio. E desta culpa até nós, Deputados desta Assembleia Nacional, temos parcela mais ou menos grande.
Tomámos parte em debates e votações, não vale lembrar quais, que muita confusão trouxeram as populações, alguns malefícios causaram e em pouco, direi mesmo quase nada, beneficiaram a grei.
Verificada a existência da crise, irei fazer ligeiras considerações sobre aspectos específicos da mesma para os comentar, esclarecer e, se possível, propor soluções.
Começarei pela crise que afecta o sector da cultura do trigo.
É sabido que este cereal desempenha desde sempre a função básica da alimentação dos povos na maior parte do nosso país.
Pode considerar-se a cultura do trigo como elemento estratégico na economia geral da Nação e, mais ainda, como factor essencial da própria independência nacional. Um país sem pfio é um país conquistado.
É tão certo o que afirmo que todos os países procuram, mesmo com elevados sacrifícios, manter a cultura do trigo. Citarei apenas alguns dos mais evoluídos industrialmente e com balanças de pagamentos nitidamente favoráveis - Suíça (4$72 por quilograma), Finlândia (4$72 por quilograma), Noruega (4$18 por quilograma), Luxemburgo (3$22 por quilograma), Alemanha (3$10 por quilograma). Não se acredita que estes países cultivam o trigo a preços elevados por motivos meramente sentimentais ou de arranjo paisagístico. Cultivam trigo, embora possuam divisas estrangeiras abundantes ou mercadorias apetecidas para compensações, porque, acertadamente, não desejam ficar dependentes, exclusivamente, da importação senão na medida mínima possível. São prudentes e realistas. É certo que não vão ao exagero de cultivar trigo em terras absolutamente inadequadas, mas cultivam-no mesmo quando o seu preço excede em muito os preços internacionais.
Cabe aqui, e desde já, afirmar que os chamados preços de mercado internacional do trigo são muitas vezes inexplicavelmente alterados tão profundamente que, todos nos lembramos, já Portugal o pagou a mais de 59 por quilograma, quando agora o seu preço orça por cerca de 50 por cento menos. Mas nada nos garante que não volte o preço anterior, ou até maior, se novos compradores aparecerem no mercado, e já apareceu a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, se as colheitas forem afectadas e ainda se o comprador estiver absolutamente necessitado de comprar. Alguém poderá duvidar de que tudo se passará assim?
Mas no momento presente, e para este cereal, quais, as medidas tomadas pelo Governo da Nação? Permito-me insistir sempre em Governo da Nação e não citar qualquer Ministério em particular, porque, assim o creio, a política geral, sob qualquer aspecto, económico ou social, é do inteiro conhecimento e responsabilidade de todo o Governo da Nação.
Pois, para o trigo, e na sequência da chamada política de reconversão agrária que se pretende impor, é minha convicção, e de muitos comigo, que se pretende, na verdade, uma reconversão às épocas em que quase õ não produzíamos. São usados para conseguir esse fim vários meios que procurarei sintetizar em dois: aliciamento para outras culturas e asfixia económica do cultivador do trigo. Aceito o primeiro meio, e até o aplaudo, antecedido da demonstração rigorosa, real, verídica e comprovada de que a rentabilidade da terra aumenta, de que nenhum dos estádios do circuito económico é afectado em benefício exclusivo de outro e, ainda, que me garantam a sobrevivência, que não vejo garantida, do reconvertido, tanto o empresário como os seus assalariados.
Não aceito, repudio até, o segundo meio - a asfixia económica do cultivador de trigo. Essa política não terá, jamais, o meu acordo. Vejo, infelizmente, que se pretende enveredar por ele, e digo como: o preço do trigo é, desde 1948, com ligeiras correcções, de 3$ por quilograma. Preço fixado há dezasseis anos, foi, indirectamente, melhorado com a concessão de bónus nos preços dos adubos e, nos> anos de 1961 e 1962, com um subsídio de $30 por quilograma (valor médio).
Contudo, hoje, desapareceram o bónus no preço do adubo e o subsídio dos anos de 1961 e 1962, pelo que o preço reverteu, pura e simplesmente, ao preço fixado há dezasseis anos. Não vale a pena referir tudo o que subiu, e quanto subiu de preço nestes últimos dezasseis anos. Um deles, e foi o que menos subiu em relação as necessidades dos que o prestaram, foi o trabalho. Infelizmente, só desceu o seu rendimento, até porque está a ser feito pelos menos capazes, por causas que adiante referirei.
E contudo, Sr. Presidente e Srs. Deputados, por estudos económicos feitos pela Federação Nacional dos Produtores de Trigo, chegou-se a conclusão de que só custo médio compensador para a esmagadora maioria da produção seria de 3$55 por quilograma".
Se eu conheço, e decerto muitos de VV. Ex.ªs, os números que acabo de referir, devo pensar que o Governo da Nação, igualmente ou até melhor, os conhece também.
Por que procede, na conjuntura presente, em razão inversa da razão directa a que o mais simples critério conduziria?
Eu não o sei.
Sei, e já em anteriores intervenções nesta Câmara disse, sem qualquer sucesso, seja dito em desabono das minhas possibilidades parlamentares, que os agricultores e seus assalariados - essas eternas vítimas - chegaram aos limites das suas possibilidades financeiras.
Se não fora a complacência, direi, a magnânima complacência da banca, haveria, todos os dias, na minha região, desastres económicos em cadeia. Mas agora, pelo que me dizem, com uma reconversão agrária em moldes revolucionários, iremos florestar, atender ao problema pecuário e frutícola, mas, até que essas actividades tenham a rentabilidade indispensável, como viveremos?
Florestar ... palavra que aparece, para alguns, com aspecto miraculoso, mas que, na minha região, já muitos conhecem ... e bem.
Vou referir-vos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, tirados ao relativo ocaso, dois factos concretos de florestações a que procederam lavradores do meu distrito: os Srs. Eng.º Vasco Maria Eugênio de Almeida (conde de Vilalva) e Comendador João Lopes Fernandes. Ambos procederam, há anos, e sem espírito de se considerarem pioneiros, ao plantio de extensos olivais.
Usaram técnicas afins e conseguiram, como é óbvio, resultados semelhantes. Têm obtido colheitas normais, de acordo com a qualidade dos solos, têm sofrido os ataques
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do clima e das pragas e, igualmente, lutam com relativa escassez de mão-de-obra.
Deram um exemplo. a todos e serviram, de modelo a alguns. Eu direi que supriram os serviços técnicos oficiais. A mais fácil dedução foi a de que, para o plantio de um olival de tipo basicamente industrial, é necessária uma cobertura económica longe do alcance do maior número dos agricultores.
Guardemos a recordação de que, já no olival -, é precisa uma potencialidade económica que vai até aos oito ou dez anos para começo de rentabilidade. Mas parece que assim será agronòmicamente mais correcto, a florestação não engloba o olival e vamos considerar o que se passa com o eucalipto: o primeiro agricultor citado florestou, com eucaliptos, uma vasta zona de terra típica do Alentejo - terra fria, delgada e cansada - e teve, passados treze anos, um primeiro corte. Das árvores plantadas só 50 por cento chegaram a um relativo desenvolvimento e a' massa arborícola vendável, com extrema dificuldade, não cobriu o rendimento colectável cobrado durante esse período, mas, e reparem V. Ex.ª ao que já chegamos, o proprietário sente-se satisfeito por não ter havido o prejuízo de semear trigo - e foi um dos maiores produtores de trigo de Portugal.
Não tirem os partidários da florestação a conclusão simplista de a florestação se sobrepor h seara. Não!
Considerem o que socialmente se perdeu em jornas não pagas, adubos não comprados, alfaias não consumidas e, sobretudo, em divisas despendidas para cobrir esta falta na produção nacional de trigo. Haver uma receita com prejuízo dos sectores complementares intervenientes não é haver uma receita, é, certamente, um prejuízo de carácter social. Das graves consequências deste facto falarei quando me referir ao êxodo da população rural alentejana.
O outro agricultor atrás referido levou a sua florestação a mais vastos limites. Na subericultura aplicou o plantio e transplantação. Neste último capítulo conseguiu, pelo seu saber e dos técnicos seus colaboradores, êxitos absolutamente espectaculares. A F. A. O. acompanhou estes trabalhos, estudou-os, e tirou deles conclusões de retumbância internacional. Creio também que os serviços estatais terão aproveitado de tão vasta experiência, na justa medida em que ela pode, e deve, servir a economia da Nação.
No plantio de choupos, a mais recente novidade arborícola nacional, também o mesmo senhor levou a cabo experiências notáveis. Afectou terras de regadio, antigas terras de arroz abandonadas por fraco rendimento económico, ao plantio da referida espécie com notáveis resultados, para já, no crescimento. Mas, e isto importa à generalidade dos agricultores, quando começa o rendimento dessas explorações?
Qual a protecção tributária que têm?
A resposta, por hoje, é apenas uma: só economias de excepção, como as apresentadas, alicerçadas em réditos florestais seguros, fruto de longos e antecedentes anos de estruturação ancestral, podem suportar uma espera de 10, 20 e 30 anos de rentabilidade da floresta, e, mesmo assim, com o abandono quase sistemático da cultura trigueira. Outros lavradores tentaram seguir estes exemplos, e todos o desejariam, mas a verdade é que uma coisa é o desejo e outra, bem diferente quase sempre, a realidade.
Volta a ser pertinente a pergunta ... como sobreviveremos durante o longo período de reconversão?
Muito se fula também no desenvolvimento da pecuária. Parece-me mais viável essa fórmula de proceder a valorização da nossa economia agrária. O binómio leite-carne é mais rapidamente solucionado, em tempo, em moldes rentáveis.
Forque este problema já mereceu valioso estudo de um nosso ilustre colega - o Eng.º José Mexia -, referirei, sumariamente, que se deve proceder com cuidada atenção e, sobretudo, com carácter de permanente fixidez nos objectivos a atingir. Mudanças de critérios, de meios, sobretudo de directrizes, só podem conduzir a confusão e à maior ruína. Há espécies pecuários já adaptadas aos nossos meios e climas, e essas, com boa razão, devem merecer o melhor estudo, no sentido do seu aproveitamento mais intensivo e rentável.
Não duvido dos benefícios da adaptação de novas raças, mas sempre feitas com base em estudos calmos e serenos. A saúde dos nossos efectivos pecuários deve merecer o melhor cuidado. Já tive, por duas vezes, oportunidade, oportunidade que não desejaria ter tido, de vos falar nessa grave epizootia, provocada pelo vírus L, que quase dizimou os nossos efectivos de gado suíno. O mal não esto. passado, as consequências da doença e do remédio já custaram milhares de contos a economia nacional. Que nisto atentem os responsáveis.
Gabe agora uma palavra ao lugar que a reconversão agrária reserva ao regadio. Sou dos que acreditam nos benefícios que a água pode trazer à rentabilidade da terra, mas por isso mesmo sinto-me confuso no verificar que verbas astronómicas estão sendo investidas na minha província sem que se saiba concretamente as culturas que iremos fazer. Não se conhecem, a par das sementeiras, as providências tomadas para a cobertura industrial das áreas a irrigar. Estas lacunas causam apreensões e não são de molde a deixar encarar a solução do problema com optimismo. Acresce a circunstância, quê já referi nesta Câmara, de o regadio Vir encontrar a lavoura em dificuldades financeiras tais que será muito problemática a sua indispensável acção. Esta, já aqui o disse, é a razão da aparente apatia da lavoura pelo regadio.
O desenvolvimento do regadio, entre muitos outros problemas, traz consigo o de fertilização das terras, que pelo regadio- mais facilmente se empobrecem dos produtos nutritivos para as sementeiras. O recurso aos adubos químicos não é suficiente, porque estes não podem dispensar grandes massas de matérias: orgânicas sobre as quais inclusivamente actuem. Não conheço estudo ou solução para este magno problema e, dado o adiantado das obras de irrigação, não podem as autoridades competentes faltar com essa poderosa achega, da qual podem depender o sucesso ou o insucesso do empreendimento.
E porque falei em fertilizantes, talvez valha a pena trazer ao conhecimento desta Câmara alguma coisa de muito que sobre adubos havia a dizer. E sabido que a agricultura se não pode fazer com resultados rentáveis sem o recurso a essa fonte de energias suplementares a fornecer à terra. Mas procederá a nossa lavoura nesse capítulo dentro das melhores normas?
Terá à sua disposição os adubos químicos de produção nacional que necessita?
A primeira pergunta responde-se que a lavoura mais evoluída, aquela cujos empresários atingiram mais alto nível intelectual, já recorre à análise das terras para escolha do seu adubo e procede assim pela melhor forma. Os menos evoluídos são arrastados a usos de adubos indevidos, por pressões de vendedores ocasionais, por cópia do que faz o vizinho ou o amigo e até por moda.
É certo que a escolha de uma àdubação química pressupõe estudos dos climas, dos solos e das culturas, e isso, como se compreende, não está ao alcance da maioria dos lavradores. Uma boa carta de solos, mas uma verdadeira carta de solos, não uma improvisação, é uma das necessidades indispensáveis. O estabelecimento de postos meteoro-
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lógicos, numa rede relativamente densa, impõe-se. Outro factor que não pode esquecer-se é a criação, por parte do Governo, de campos experimentais. O que nesse capítulo BB tem feito merece as mais sérias críticas. No meu distrito têm sido abandonados campos experimentais antes de se conhecerem os resultados finais. Campos de ensaio de trigo têm sido abandonados antes das mondas. Neste particular são dignos de louvor os campos experimentais mantidos por empresas produtoras de adubos químicos, tendo só uma das mais importantes empresas portuguesas instalados e disseminados, pelo País, 121.
Mas o problema dos adubos tem implicações diversas na economia nacional. Não só o interesse da lavoura está em causa. Quando se trata, por exemplo, de azotados surgem problemas graves, que importa equacionar e resolver. É sabido que estes- adubos são, em Portugal, em grande maioria, produzidos por processo electrolítico, o mais caro, ao contrário do que acontece 14 por fora, em que o processo químico é utilizado.
Daqui resulta um mais elevado custo de fabrico do azotado nacional, em comparação com o estrangeiro, pelo que a lavoura, ao preferi-lo, paga mais do que devia por não se ter ainda, afoitadamente, enveredado por uma modificação do condicionalismo industrial existente que liberte as unidades fabris do consumo do fluido eléctrico caro e, no caso vertente, desactualizado e necessário para outros fins.
Sei que essa modificação dê sistemas pode afectar altos interesses, mas, o bem geral assim o ordena, não haja hesitações. Só com esta modificação a indústria nacional de adubos poderá suportar, como suporta com os superfosfatos e potássicos, a concorrência estrangeira, e a lavoura poderá usar integralmente, como convém, adubos feitos por portugueses, para terras portuguesas, sem pensar que de fora poderá vir melhor ou mais barato, o que não é de desejar. Já basta que o subsídio na compra de adubos teria sido suprimido em 1968 em nome de uma reconversão e pelo processo, que reprovo, da asfixia económica.
Já fui longe de mais, Sr. Presidente e Srs. Deputados, e vejo que pouco disse do muito que deveria dizer.
Não desejo, porém, terminar sem mais um reparo, que julgo de meu dever:
Refiro-me às implicações político-sociais que advêm da crise agrária que atravessamos e da reconversão que se promete. A crise está provocando o êxodo das populações rurais. A fuga para as cidades e para as indústrias segue-se, e num ritmo alarmante, a saída para o estrangeiro. Só na passada semana e no concelho de Évora, que, diga-se, é dos menos afectados pela crise, dada a existência de uma importante cidade, se inscreveram, para ir trabalhar em França, 416 varões até aos 45 anos. Se juntarmos a este impressionante número o daqueles que defendem a Pátria, nas suas fronteiras africanas; poderemos compreender por que baixa o rendimento do trabalho, efectuado pelos menos capazes, como atrás já referi. Para que o Alentejano emigre, podereis estar certos, é porque algo de grave se passa ... e passa!
Há falta de trabalho; porque a empresa não progride e empobrece. À empresa empobrece porque os custos de produção aumentam e os valores de venda, da maioria dos seus produtos, não. Que o Governo da Nação atente nestes factos.
A passagem, brusca, da política de abastecimento para a política de mercados já deu dois frutos:, a elevação do preço da carne (pela concorrência do gado ovino aos mercados externos) e a adesão da mão-de-obra nacional não à E. F. T. A., não ao Mercado Comum, mas, mais simplesmente, à internacionalização. Alguns julgam o facto benéfico, pelo afluxo de divisas. Eu não o creio assim.
Por cada português que parte, a Pátria fica mais pobre e a economia nacional, com reconversão ou sem reconversão, perde um valor activo insubstituível.
Creio que há, nos factos apontados, motivo para apreensões nos campos político-sociais. Enquanto ainda temos homens válidos, portugueses, cuidemos de os ligar à terra em que nasceram.
Como?
Pela única forma possível, valorizando a terra e os seus produtos. Não creio, senão como solução transitória, na política de subsídios. Acredito, e aceito, na baixa dos preços de produção pela benevolência tributária ao trabalho, em todos os escalões, pela baixa das alfaias, das máquinas, dos carburantes, das sementes e de tudo o que onera- os circuitos económico-agrários. Isto no plano económico, pois no campo político-administrativo entendo ser urgente - inadiavelmente urgente - a reconversão a um Ministério da Agricultura, provido de todos os órgãos de comando e fiscalização e, por direito próprio, com acesso, em plano de igualdade, a Conselho de Ministros, sem subordinação congénita a outras actividades.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Criação de um conselho superior permanente económico, como órgão que garanta continuidade nos processos da reconversão, de que não discordo em tese, para além da duração das actividades pessoais de cnda Ministro.
Transformação da Federação Nacional dos Produtores de Trigo em Federação Nacional dos Produtores de Cereais, com acção sobre todos os cereais, panificáveis ou não, e leguminosas, de forma a garantir preço justo aos principais produtos da terra.
Regulamentação da prestação do trabalho agrícola e cobertura, pela previdência, dos trabalhadores rurais.
Organização, e disseminação orientada, de matadouros industriais, com participação da lavoura, apetrechados com frigoríficos polivalentes pura recebimento e distribuição dos produtos alimentares, tanto animais como vegetais.
Criação de mútuas pecuárias.
Promoção imediata, com participação dos serviços oficiais, de um congresso nacional agrícola.
Assim poderemos fazer uma reconversão agrária, que se impõe e deseja, mas em moldes evolutivos, e não precipitadamente, para que as estruturas, todas as estruturas, sobrevivam ao período da adaptação, porque, e nisto reside a maior dúvida da lavoura, falta saber como pode uma economia debilitada por sucessivos anos maus resistir, transformar-se e não morrer. Pode pensar-se que o princípio da reconversão agrária já fora enunciado no preâmbulo do diploma que estabeleceu a campanha do trigo, pode filiar-se esse enunciado no I ou II Planos de Fomento; o que é certo é terem os governos, todos os governos até hoje, incentivado a cultura do trigo, que ora, em grande parte, se condena.
Isto é o que preconizo para realização imediata. Se assim se não fizer, creio bem, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que os que labutam na agricultura, como empresários ou como assalariados, só terão, agindo pacificamente, que voltar-se para Lisboa, reverenciar e, tal como os lutadores do circo romano, exclamar: "Ave César! Os que vão morrer te saúdam."
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
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O Sr. Calheiros Lopes: - Sr. Presidente: como prefácio às breves considerações que pretendo fazer, quero, antes de mais nada, felicitar o nosso colega Deputado Amaral Neto pela sua iniciativa de trazer à Assembleia Nacional, Através do aviso prévio fim discussão, o momentoso assunto da situação da agricultura nacional.
Na verdade, penso também que a crise da lavoura é um grave problema, que o Governo não >pode deixar de enfrentar e resolver. E desde já me permito afirmar a minha convicção de que, pela contribuição que aqui dermos ao amplo debate da- magna questão, como intérpretes que somos do ambiente político nacional, asseguraremos ao Governo, em nome do País, o apoio necessário para as providências e soluções que estuo certamente nos seus propósitos e que urge adoptar sem mais delongas e hesitações, se não queremos ver agravado um mal-estar já visível e que pode tornar-se bastante prejudicial.
Os sintomas de crise da lavoura são de tal modo conhecidos que não vou aqui alongar-me sobre eles. As exposições e relatórios apresentados directamente ao Ministério da Economia pelos organismos representativos, à cabeça dos quais a Corporação da Lavoura, as entrevistas concedidos à imprensa e televisão e - quanto a muitos de nós o saber de experiências feito do que se passa nas nossas próprias casas agrícolas autorizam-nos a pensar que tudo ou quase tudo está dito sobre as causas e os efeitos da precária situação atravessada pelo importante sector económico que a actividade agrícola representa na vida portuguesa.
A verdade, Sr. Presidente, é que, apesar de todo o esforço com que se tem pretendido incrementar nos últimos anos a industrialização do País, o sector agrícola constitui ainda, tanto no aspecto económico como no aspecto sociológico, um valor considerável, e, se me é permitida a afirmação, no ultimo dos dois aspectos citados, mais que considerável, primacial.
Efectivamente, sou dos que julgam que para se ajuizar com realidade da situação de um povo em cada momento, ou seja das conjunturas que se vão sucedendo na sua vida nacional, temos de ver bastante para além dos números frios apresentados pelas estatísticas; há que investigar com espírito cie pesquisa social o que os números não traduzem, ou por desfasamento tecnológico ou por inevitável atraso nas expressões estatísticas em relação ao evolucionar das massas populacionais.
E por este motivo, para além dos valores numéricos e dos índices estatísticos, eu continuo a pensar que a agricultura é entre nós a actividade com mais influência no nível económico-social da nossa gente, mesmo daqueles sectores populacionais que se julgue serem completamente independentes dessa mesma actividade agrícola.
Aliás, para assim pensar apoio-me em opiniões autorizadas dos economistas que se debruçam sobre o estudo destes problemas e que mantêm a opinião de que a nossa economia tem por base a agricultura. Embora esta contribua para a formação do produto interno bruto com uma percentagem que não ultrapassará um quarto do total, a verdade é que a actividade agrícola concorre para o movimento e riqueza de vários outros sectores, por meio das compras que faz de máquinas, adubos, viaturas, etc. Assim, contribui em altíssimo grau, não traduzido estatisticamente, para o volume global das transacções e, portanto, para o conjunto da economia nacional.
Por outro lado, se considerarmos o que representa, no plano sociológico, como potencial humano, como gérmen e alicerce de nacionalismo, como fermento das virtudes e aptidões específicas da raça, o homem do campo, a boa e sã gente das nossas províncias, encontramos mais um motivo, para além da linguagem meramente tecnológica, & confirmar os nossos propósitos e decisão de proteger a agricultura como um dos mais seguros meios de defendermos o povo português das ameaças externas que sobre ele pairam.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Creio, pois, que é hoje verdade já por todos aceite a existência de uma séria crise da agricultura nacional, assim como é propósito dos responsáveis na administração pública acudir-lhe urgentemente, salvando da ruína, além dos milhares de portugueses que da terra mais ou menos directamente vivem, a própria estabilidade e o futuro da sociedade nacional.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Têm-no apregoado aflitivamente ao País os órgãos da lavoura. Reconheceu-o o Governo publicamente em diversos documentos e exposições, como, para citar somente os mais significativos e recentes, o despacho do Sr. Secretário de Estado da Agricultura de princípios de Novembro último, e a entrevista concedida, na mesma altura, à televisão, pelo Sr. Ministro da Economia. Ainda mais recentemente, e com motivo no aviso prévio que estamos debatendo, teve o Sr. Ministro da Economia n atenção de se reunir com a Comissão de Economia desta Assembleia, a quem fez uma larga, profunda e clara exposição sobre o pensamento do Governo e as medidas projectadas para enfrentar os momentosos problemas agrícolas, exposição essa confirmada pelo documento lido ontem nesta Assembleia.
E, se me é permitido um comentário ou desabafo, direi apenas que temos de lamentar a demora, o tempo que esta verdade da existência e da gravidade da crise levou a ser considerada.
Efectivamente, Sr. Presidente, vêm de há anos os toques a rebate, as solicitações, os clamores, não apenas directamente da lavoura, mas de todos os sectores, para que se acudisse à crise. Entre muitas outras, também a minha desvaliosa voz se ergueu nesta Assembleia, há já cerca de três anos, a secundar pedidos gerais de atenção do Governo para a situação da lavoura. Na sessão de 27 de Abril de 1961, tive ocasião de salientar a urgência de se alargar, facilitar e reduzir as taxas do crédito agrícola, assim como a revisão dos preços dos produtos agrícolas sujeitos a tabelamento. E acrescentei, nomeadamente:
Esta é a intervenção de urgência, a transfusão de sangue de que carece a grande doente - a lavoura - para se salvar da crise presente. Ela não dispensa, como é óbvio, a aplicação, a mais largo prazo, de toda a série de planificações e reformas de estrutura, visando substituições de culturas, novas actividades pecuárias, etc. Todas essas medidas legislativas, assim como a mais directa e imediata acção de assistência técnica que se está exercendo, não nos devem impedir de considerarmos necessária e justa a revisão dos preços dos géneros, tais como o trigo, o milho, o centeio, a cevada e o arroz, assim como um sério estudo e actualização do regime de transacções e preços relativos ao abastecimento de carnes ...
E no final das minhas considerações de há perto de três anos, dizia eu:
Dentro desta ordem de ideias e de acordo com o princípio da justa retribuição das actividades, penso
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que devemos começar por salvar a lavoura da crise que lhe ronda a porta, consequência tanto dos maus anos agrícolas últimos como da desactualizarão dos preços de venda dos produtos, que não acompanharam, a maior parte deles, nem se aproximaram, do nível de aumento dos custos reais de produção. E isto que me parece prático, realista e conveniente ao conjunto da nossa economia.
Estas considerações foram aqui exaradas, como disse, vai para três anos. E, lamentavelmente, temos de reconhecer que a situação, de modo geral, piorou. E senão, vejamos:
O preço do trigo, apesar de todos os estudos técnicos sobre os custos de produção e a despeito dos apelos da lavoura, entre outros os que foram expressos nas Jornadas Cerealíferas e Leiteiras, de Junho do ano passado, mantém-se tal como foi estabelecido em 1948, há quinze anos.
O centeio subiu, em 1963, uns parcos $10 para a compra ao produtor - embora a venda à moagem seja feita por mais $60, vendo-se, portanto, que do aumento total o lavrador somente beneficia de um sexto.
Quanto ao milho, é legalmente livre o seu preço, mas os organismos que regulam o comércio e o abastecimento deste cereal têm actuado de maneira que, mesmo em anos de escassez, como o último, o lavrador se vê forçado, por muitos motivos, entre os quais a falta de meios financeiros e de armazenagem, a entregar o cereal à Federação pelo preço mínimo - e praticamente fixo - por esta estabelecido.
Com o arroz a política de preços seguida nos últimos quatro anos é também digna de reparo.
A queda das produções, resultante da insuficiência dos preços, que desencoraja a lavoura de cultivar mais, oferece, entre muitos, dois inconvenientes essenciais, de tal modo graves que aconselham, a meu ver, a imediata adopção da providência que melhor pode saná-los: o aumento dos preços para nível justo e remunerador.
Os inconvenientes que pretendo salientar são:
De ordem económica: o dispêndio de divisas com as importações efectuadas e que muito provavelmente aumentarão se não for adoptada nova orientação quanto à política de preços. Estas importações têm ainda o aspecto pouco razoável de pagarmos aos estrangeiros preços superiores aos concedidos aos produtores nacionais, sobrecarregando, com as compensações necessárias para não aumentar os preços ao consumidor, os fundos do Estado ou das entidades corporativas - quando seria mais justo aplicar esses mesmos fundos em benefício do produtor nacional.
Dá-nos ideia da extensão deste aspecto do problema o exame das importações efectuadas na campanha última:
Cerca de 12 000 t de arroz em branco, com o dispêndio de divisas da ordem dos 47 900 contos;
Cerca de 6 700 t de arroz em película, em que se despenderam 29 100 contos de divisas. E ainda a importação de 1 000 t de trincas (arroz partido), que ocasionaram a saída de divisas no valor de uns 3 000 contos.
Vê-se, portanto, que o País despendeu qualquer coisa como uns 80 000 contos de divisas comprando mais caro que os preços internos e concedendo ao estrangeiro como que um bónus que se não tem dado ao produtor nacional e que encorajaria este a produzir as quantidades de arroz suficientes para o abastecimento interno, que, diga-se de passagem, visto que interessa igualmente para apreciação do problema, está aumentando de forma considerável as suas necessidades, principalmente por ser um dos produtos baratos.
Assim, o consumo anual, que se situou, nas campanhas de 1955-1956 a 1958-1959, entre 90 000 t e 100 000 t (arroz branco), passou a atingir os seguintes números: ?959-1960, 104 600 t; 1960-1961, 107 000 t (das quais apenas 95 900 t do nacional e o restante estrangeiro); 1961-1962, 104 000 t.
Além dos aspectos de ordem económica apontados, a manutenção dos preços & lavoura inferiores ao que uma justa actualização aconselhava reflecte-se prejudicialmente no campo social, acarretando crises de desemprego, mal-estar e insatisfação tanto no sector patronal como entre os trabalhadores.
Esta é, de resto, a orientação seguida nos países europeus, Espanha, Itália e França, onde a orizicultura tem progredido extremamente, graças à actualização dos preços, à produção, hoje muito superiores aos que se praticavam há anos e que excedem já os vigentes em Portugal.
Todos os que conhecem, mesmo superficialmente, estes problemas, sabem que se tem mantido para os géneros agrícolas, de forma geral, uma estabilização de preços forçada, que, além das ruinosas consequências que teve na crise da, lavoura, originou, pelas volumosas importações a que obrigou o País, de trigo, arroz, milho, carnes, batatas, etc., uma saída de ouro verdadeiramente astronómica, que muito contribuiu para o desequilíbrio da balança de comércio externo.
Mas um outro aspecto bastante Injusto e impressionante do problema é que esta desastrosa norma somente sobre os géneros agrícolas tem incidido, pois todos sabemos que muitos produtos têm subido de preço, mesmo na classe dos produtos alimentares.
Não vemos essa orientação aplicada nos numerosos produtos que a lavoura se vê obrigada a utilizar, tais como os adubos, o ferro, as máquinas e utensílios, as sementes e tantos outros. E, por outro lado, não é justo, nem oportuno, que, quando a lavoura se encontra atravessando uma grande crise por não terem sido devidamente considerados os seus problemas e quando se lhe preconiza uma mecanização eficiente e a utilização de técnicas mais aperfeiçoadas, impendam sobre ela novos encargos fiscais, como o imposto sobre a indústria agrícola, e se lhe dificulte ou impossibilite o uso dos meios mecânicos de trabalho, lançando sobre os tractores com reboque, too utilizados hoje nas casas agrícolas, um novo imposto de 8 000$ anuais por cada um.
Perante o aumento dos factores que entram na formação dos custos dos géneros, como é possível conservar sempre o mesmo resultado dessa simples operação de aritmética? Aumentar os números das parcelas e manter o número do resultado constitui um processo em que a matemática cede o lugar a política, mas que somente na actividade agrícola se vê aplicado.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: os resultados desta desactualização dos preços dos géneros e agravamento de encargos que pesam sobre a agricultura estão à vista: grandes e pequenas propriedades oferecem-se quotidianamente a venda e outras são executadas pelos tribunais para pagamento aos credores. Os débitos da lavoura ao Estado e as instituições de crédito ascendem a verbas consideráveis. E ao passo que outras actividades económicas alcançaram uma prosperidade cujas demonstrações são bem patentes, a lavoura, mais do que em qualquer outra época, continua a ser a melhor arte de empobrecer alegremente".
Todavia, hesito em declarar que, neste momento, e depois de profícua acção de fomento do período de 1950
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a 1958, uma certa esperança parece despontar no horizonte da nossa lavoura.
Através das últimas declarações do titular da pasta da Economia, que - é justo salientar.- apenas há um ano se encontra à frente desse importante e difícil posto, nenhuma responsabilidade tendo, portanto, nos factos que conduziram à situação presente, através, pois, do que por S. Ex.ª nos foi recentemente exposto, parece que devemos sentir-nos habilitados a confiar nas medidas que vão ser adoptadas para, não de um golpe, porque isso seria impossível, mas com a urgência que as circunstâncias impõem, assegurar à agricultura as indispensáveis condições de vida.
Acho que podemos afirmar que o ilustre economista e professor hoje responsável pelos destinos da economia portuguesa se mostra perfeitamente inteirado dos problemas que afligem a lavoura e firmemente disposto a enfrentados e resolva-los. Que isso lhe seja facilitado pelos elementos, dentro e fora da máquina estadual, sem cuja colaboração a obra salvadora será impossível, soo os meus mais ardentes votos e, de certo, os da Assembleia e do País. E já agora, sem pretender intervir na planificação das medidas a adoptar, pedirei licença para formular uma sugestão:
Tenho como essencial e possível pagar a lavoura preços justos pelos seus produtos, como sucede com outras actividades económicas, sem aumentar os preços ao consumidor, isto é, mantendo estabilizado sensivelmente o custo da vida.
Penso que poderia criar-se um fundo destinado a assegurar às explorações agrícolas uma rentabilidade equivalente às outras actividades. Assim, conseguir-se-ia manter estáveis os preços ao publico, deixando de contribuir para isso apenas uma só actividade - a agricultura. Esta passaria, sem onerar o consumidor, á receber pelos seus produtos o preço justo, como acontece com a maioria dos outros sectores económicos. E desde que para tal objectivo algum sacrifício de carácter tributário se torne indispensável, esse sacrifício deve ser exigido às actividades e sectores económicos a que atrás aludi, e cuja prosperidade visível lho permitirá sem risco para a solidez financeira de que desfrutam. Poderia, creio, lançar-se um adicional a contribuição industrial sobre os lucros que excedam determinada percentagem do capital, sistema que teria ainda a vantagem de levar as empresas a actualizar os seus capitais nominais.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Como disse, trata-se apenas de uma sugestão, havendo certamente outras modalidades- para se atingir o mesmo fim, ou seja o necessário equilíbrio no. distribuição dos sacrifícios sociais.
Sr. Presidente: entendo que os meios essenciais de dar condições dó vida à lavoura e de a fazer progredir são:
1.º Estimular a produção pela garantia dos- preços e da colocação dos produtos.
2.º Auxiliar o aperfeiçoamento da técnica agrícola, facilitando a vulgarização 'dos meios a processos mais adequados -, às circunstâncias específicas da nossa agricultura e encorajando a formação profissional.
3.º Facultar, em moldes positivos e práticos, o crédito agrícola.
4.º Desenvolver e valorizar certas culturas, como a fruticultura e a horticultura, e ainda estimular a introdução dê novas culturas: a beterraba sacarina, a soja, o tabaco, o algodão, o linho, etc. Não creio que só neste cantinho da Europa não haja solos e condições apropriados às nossas culturas que acabo de mencionar. Alguns destes produtos constituiriam matérias-primas para novas indústrias, que dariam novos produtos para a alimentação a entrar no mercado.
5.º Deve dar-se a necessária protecção à pecuária, desenvolvendo a cultura de forragens e assegurado colocação e preços dos gados, de forma a produzirmos carne suficiente para o abastecimento do País e acabarmos com a enorme drenagem de divisas que anualmente despendemos na importação de carne congelada.
Estou convencido de que com as obras de hidráulica agrícola realizadas, com aquelas que estão em execução ou projectadas e com o estudo e aplicação dos soluções encontradas para o problema das inundações das vastas áreas, como o Ribatejo, evitando-se as cheias ali verificadas em série, como nesta Assembleia, na sessão de 8 de Janeiro último, referi e para que, mais uma vez, peço a boa atenção do Governo, estou convencido, repito, de que conseguiremos modificar grandemente a situação da nossa agricultura. Daí resultará, simultaneamente, obtermos aumentos de produção de géneros para abastecimento da população e ainda a possibilidade de exportar certos produtos excedentários. Aliás, já assim aconteceu com o arroz, os melões e presentemente com a produção de tomate.
Temos de aproveitar, ao máximo todos os recursos do País, evitando o desperdício, o tempo gasto inutilmente e as perdas por falta ou má organização. Devemos lançar-nos no caminho de uma mais alta produtividade, pela modernização dos processos de cultura, pelo uso apropriado de maquinaria, fertilizantes, insecticidas, etc., e pela escolha criteriosa das culturas mais adequados a cada solo.
Apoiados.
Outro ponto que considera importante é a melhoria dos circuitos de comercialização, de forma a torná-la menos dispendiosa. Em certos casos, as actividades comerciais trabalham ainda com métodos muito empíricos e não tomam, suficiente consciência das possibilidades abertas pelas modernas técnicas de vendas. Noutros casos, torna-se necessário reduzir os encargos no circuito da distribuição, pois é inconcebível que, como acontece com muitos produtos, estes sejam vendidos ao público pelo dobro e mais do preço de custo na origem.
Sr. Presidente: as condições naturais que regem a produção agrícola (solo, clima, topografia, etc.) variam consideravelmente de região par a região e têm, por isso, uma acentuada influência, não apenas na estrutura da produção, mas ainda sobre o nível de produtividade das diferentes regiões. E é, aliás, necessário acrescentar que a produção è produtividade agrícolas são fortemente influenciadas pelo desenvolvimento económico geral de cada país. E geralmente nos países que conheceram uma mais importante expansão económica que a produtividade agrícola é mais elevada. Daqui se conclui que a modernização da agricultura e a adaptação das estruturas económicas e sociais devem caminhar a par com uma industrialização verdadeiramente racional.
Se nos debruçarmos, realisticamente, sobre a vida actual, verificamos que, na ordem económica, a condição essencial de uma perfeita e coordenada inter-relação das actividades e interesses reside em que as funções de cada
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sector, seja o agrícola, o industrial ou comercial, se mantenham dentro da missão que lhes compete.
Desordenar-se-á toda a vida económica tanto pelo encerramento de cada sector em compartimento estanque, como se se permitir que cada um abarque, invada ou prejudique de qualquer modo, em posições relativamente desproporcionadas, até dentro da nossa economia geral, as actividades aos outros destinadas.
É assim:
Tem-se dado e continua a dar-se - pela força das circunstâncias - uma autêntica reforma agrária, mas a favor de entidades que nos últimos anos engrandeceram consideravelmente as suas posições, sem contudo terem fomentado e criado riqueza que o justifique, normalmente, nem tão-pouco contribuído para uma melhoria no sentido social.
Ao mesmo tempo, sem uma estruturação produtiva quanto possível eficiente, nenhuma nação pode possuir economia sã nem dispor de um conjunto económico verdadeiramente sólido.
A agricultura e a indústria - assim como as actividades que dela dependem1- devem ser fontes primaciais da riqueza e progresso, e, portanto, há que fomentar, de forma intensiva, o seu desenvolvimento. É inegável que o progresso económico e a sua integração harmónica e equilibrada na vida da nação só são possíveis através de uma mais intensa industrialização e maior desenvolvimento da agricultura. Indispensável como é para a vida do homem a alimentação, a existência, a utilidade e a importância da actividade agrícola não sofrem contestação. Elas devem, pois, logicamente, ocupar um dos primeiros lugares, se não o primeiro, nas actividades económicas do País.
Dentro desta ordem de princípios, compete ao Estado a supervisão das principais fontes de riqueza: a agricultura, indústria e outras actividades - das quais dependem, essencialmente, as condições de vida da população.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Na actualidade, entende-se que o desenvolvimento económico de um povo é principalmente definido, não somente pela sua produção agrícola, mas igualmente pelo seu desenvolvimento industrial. Logo, na criação e modernização das empresas agrícolas ou industriais destinadas a satisfazer as necessidades humanas está o verdadeiro progresso da Nação. Para que elas, pois, constituam verdadeiras fontes de riqueza é necessário o máximo aproveitamento dos factores da produção de que dispõem, utilizando os recursos que a ciência e a tecnologia moderna lhes oferecem. Encontra-se nestas condições o factor humano, que é, realmente, primacial para o progresso de todas as instituições idealizadas pelo homem.
Ora o dinamismo que caracteriza o século presente não deixou de manifestar-se no nosso país. E se corrermos uma vista de olhos pelo passado, verificaremos que houve razoável desenvolvimento em muitos sectores. Todavia, nalguns deles a evolução tem-se dado sem prévia planificação e noutros em ritmo demasiado lento. Sem dúvida, as perspectivas do futuro apresentam-se melhores, mas não podemos perder de vista o que se passa para lá das fronteiras, principalmente quando os nossos produtos tiverem de entrar em concorrência aberta com os de outras nações. Por tal motivo, não nos devem restar dúvidas de que chegou o momento inadiável de nos prepararmos para estar aptos a enfrentar as situações que o futuro próximo nos pode trazer.
A exploração dos recursos naturais, metropolitanos e ultramarinos, o aumento do aproveitamento dos que estão já a ser explorados e a consequente diminuição do volume das importações dar-nos-ão, como resultado, o seguro melhoramento da nossa economia, a criação de maior número de empregos e a elevação de nível de vida dos nossos territórios, tão necessária não só para dar satisfação ao aumento geral demográfico que se verifica, mas ao crescente número de homens e mulheres com preparação para o trabalho em todos os níveis.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: o mundo de hoje caracteriza-se, antes de tudo, pelo impulso da ciência e o desenvolvimento do progresso técnico, assim como pelas suas repercussões, cada vez mais profundas, sobre as sociedades nacionais e toda a humanidade. Esta evolução traduz-se em todos os sectores da vida nacional pela necessidade premente de dispormos de pessoal com aptidões e devidamente qualificado, cada vez mais numeroso e em todos os escalões profissionais.
O nível de potencial de trabalho alcançado por um país resulta dos efectivos envolvidos e está também em relação com o grau de formação profissional e com o valor dos quadros e das elites. Depende, além disso, do grau de eficiência e da capacidade dê absorção do equipamento técnico e económico adoptado.
Sem pessoal técnico qualificado em todos os níveis, tanto nas explorações agrícolas e industriais, como na própria administração pública, não há programas de investimentos nem planos de expansão económica que possam a longo termo contribuir e assegurar o progresso. Por isso, a tarefa de todos os portugueses tem de ser um esforço permanente para alcançar os objectivos apontados, fazer deles os altos ideiais que, sendo de todos, são os ideais da Pátria.
Sr. Presidente: para terminar: todos nós avaliamos o peso e a gravidade dos problemas que no plano internacional e na vasta amplitude da extensão ultramarina portuguesa estão, por influências alheias à nossa vontade, assoberbando o Governo.
Todavia, julgo que a maior prova que podemos dar ao Mundo (e à nossa própria consciência nacional) da tranquilidade e firmeza com que enfrentamos as complicações, consiste em prosseguirmos serenamente, seguramente e sem desfalecimentos de qualquer ordem, a obra de consolidação e progresso da vida portuguesa, levando a todos os sectores da nossa actividade económica e social os benefícios do regime de ordem, de desenvolvimento, de consolidação de estruturas de que o País vem beneficiando.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Os factos mostram-nos como as actividades agrícolas de há anos para cá estão pagando um pesado ónus a colectividade, mediante o sacrifício das suas necessidades económicas às exigências políticas da estabilização de preços.
O peso deste sacrifício tem sido demasiado e o seu prolongamento ameaça a própria existência da lavoura, cuja ruína não podia deixar de ter repercussão na ordem e na paz social de que a Nação tem desfrutado e que cada vez se tornam mais necessárias.
Pela manutenção da paz social e através de uma política sã, equilibrada, de justa harmonia entre todos os sectores e de boas relações entre empresários e empregados, confiemos em que o nosso país continuará a progredir económica e socialmente, aqui, na metrópole, e
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em todas as parcelas ultramarinas que constituem Portugal.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão. A próxima será na terça-feira, dia 18, com a mesma ordem do dia.
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 20 minutos.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão.
Alexandre Marques Lobato.
Armando José Perdigão.
Artur Alves Moreira.
Artur Proença Duarte.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Belchior Cardoso da Costa.
D. Custódia Lopes.
Fernando António da Veiga Frade.
Henrique dos Santos Tenreiro.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
Jorge Augusto Correia.
Jorge Manuel Vítor Moita.
José Alberto de Carvalho.
José Dias de Araújo Correia.
José Fernando Nunes Barata.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Manuel da Costa.
José Monteiro da Rocha Peixoto.
Luís Folhadela de Oliveira.
Manuel Amorim de Sousa Meneses.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
D. Maria Irene Leite da Costa.
Olívio da Costa Carvalho.
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães.
Tito Castelo Branco Arantes.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Agnelo Orneias do Bego.
Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Alberto dos Reis Faria.
Alberto Ribeiro da Costa Guimarães.
André Francisco Navarro.
António de Castro e Brito Meneses Soares.
António Gonçalves de Faria.
António Júlio de Carvalho Antunes de Lemos.
António da Purificação Vasconcelos Baptista Felgueiras.
António Tomás Prisónio Furtado.
Armando Cândido de Medeiros.
Armando Francisco Coelho Sampaio.
Artur Águedo de Oliveira.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Carlos Emílio Tenreiro Teles Grilo.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Jacinto da Silva Medina.
José Pinto Carneiro.
José dos Santos B essa.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Júlio Dias das Neves.
Manuel de Melo Adrião.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Beis.
Purxotoma Bamanata Quenin.
Urgel Abílio Horta.
Voicunta Srinivassa Sinai Dempó.
O REDACTOR - António Manuel Pereira.
Quadro a que se referiu o Sr. Deputado Nuners Mexia no seu discurso:
Preço do gado
Preço-base
1.ª categoria ..................... 20870
2.ª categoria ..................... 19370
3.ª categoria ..................... 17800
De época:
Subsídios
16 de Dezembro a 31 de Março...............2$00
1 de Abril à Páscoa .......................1$50
Páscoa a 30 de Abril ......................1$00
l de Maio a 15 de Maio .................... $50
16 de Maio a 14 de Setembro................ -$-
15 de Setembro a 30 de Setembro............ $50
1 de Outubro a 31 de Outubro...............1$00
1 de Novembro a 15 de Dezembro.............1$50
IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA