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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 136

ANO DE 1964 28 DE FEVEREIRO

VIII LEGISLATURA

SESSÃO N.º 136 DA ASSEMBLEIA NACIONAL

EM 27 DE FEVEREIRO

Presidente: Exmo. Sr. Mário de Figueiredo

Secretários: Exmos. Srs.Fernando Cid Oliveira Proença
Luís Folhadela de Oliveira

SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas c 10 minutou.

Antes da ordem do dia. - Foi aprovado o n.º 133 do Diário das Sessões.
Deu-se conta do expediente.
O Sr. Deputado Sales Loureiro apresentou um requerimento em que solicita variou elementos a fornecer pelos Ministérios das Finanças, do Interior e da Saúde e Assistência.
O Sr. Deputado Moura Ramos referiu-se à sessão de trabalhos que os Srs. Ministro das Obras Públicas e Subsecretário de Estado da mesma pasta foram realizar à vila da Batalha.
O Sr. Deputado Elísio Pimenta produziu algumas considerações sobre os meios de informação, a propósito do II Encontro da Imprensa não Diária, realizado no Porto.

Ordem do dia. - Efectivou o seu aviso prévio sobre turismo nacional o Sr. Deputado Nunes Barata.
Além do Sr. Deputado avisante, usou da palavra o Sr. Deputado Jorge Correia., que requereu a generalização do debate.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas e 45 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai fazer-se a chamada.

Eram 16 horas e 5 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Agnelo Orneias do Rego.
Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Agostinho Gonçalves Gomes.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Alberto Pacheco Jorge.
Alberto dos Reis Faria.
Alberto Ribeiro da Costa Guimarães.
Alberto da Rocha Cardoso de Matos.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
André Francisco Navarro.
Aníbal Rodrigues Dias Correia.
Antão Santos da Cunha.
António Augusto Gonçalves Rodrigues.
António Burity da Silva.
António Júlio de Carvalho Antunes de Lemos.
António Manuel Gonçalves Rapazote.
António Maria Santos da Cunha.
António Marques Fernandes.
António Martins da Cruz.
António Moreira Longo.
António da Purificação Vasconcelos Baptista Felgueiras.
Armando Cândido de Medeiros.
Armando José Perdigão.
Artur Alves Moreira.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Artur Proença Duarte.
Augusto José Machado.
Bento Benoliel Levy.
Carlos Alves.
Carlos Coelho.
Carlos Emílio Tenreiro Teles Grilo.
D. Custódia Lopes.
Délio de Castro Cardoso Santarém.

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Domingos Rosado Vitória Pires.
Elísio de Oliveira, Alves Pimenta.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando António da Veiga Frade.
Fernando Cid Oliveira Proença.
Francisco António Martins.
Francisco António da Silva.
Francisco José Lopes Roseira.
Francisco Lopes Vasques.
Francisco de Sales de Mascarenhas Loureiro.
Henrique Veiga de Macedo.
James Pinto Bull.
Jerónimo Henriques Jorge.
João Mendes da Costa Amaral.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
João Rocha Cardoso.
João Ubach Chaves.
Joaquim de Jesus Santos.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Joaquim de Sousa Birne.
Jorge Augusto Correia.
Jorge de Melo Gamboa de Vasconcelos.
José Alberto de Carvalho.
José Augusto Brilhante de Paiva.
José Fernando Nunes Barata.
José Luís Vaz Nunes.
José Manuel Pires.
José Monteiro da Rocha Peixoto.
José Pinheiro da Silva.
José Pinto Carneiro.
José dos Santos Bessa.
José Soares da Fonseca.
Júlio Dias das Neves.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Luís Folhadela de Oliveira.
Manuel Amorim de Sousa Meneses.
Manuel Augusto Engrácia Carrilho.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel João Correia.
Manuel João Cutileiro Ferreira.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel Seabra Carqueijeiro.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Mário Amaro Salgueiro dos Santos Galo.
Mário de Figueiredo.
Olívio da Costa Carvalho.
Paulo Cancella de Abreu.
Quirino dos Santos Mealha.
Rogério Vargas Moniz.
Rui de Moura Ramos.
Sebastião Garcia Ramires.
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães.
Virgílio David Pereira e Cruz.
Vítor Manuel Dias Barros.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 89 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 10 horas e 15 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Está na Mesa, para efeitos de reclamação, o n.º 133 do Diário das Sessões.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como nenhum dos Srs. Deputados deseja deduzir qualquer reclamação, considero-o aprovado.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Telegramas

Vários a aplaudir o discurso do Sr. Deputado Alfredo Brito sobre adegas cooperativas.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para um requerimento o Sr. Deputado Sales Loureiro.

O Sr. Sales Loureiro: - Sr. Presidente: pedi a palavra para enviar para a Mesa o seguinte

Requerimento

«Ao abrigo do n.º 1.º do artigo 95.º da Constituição e de acordo com as normas regimentais, requeiro que, pelos Ministros das Finanças, do Interior, p da Saúde e Assistência, me sejam fornecidos, com a brevidade possível, os seguintes elementos:

1.º Nota discriminativa das câmaras municipais do continente que nos anos de 1957 a 1962 solicitaram o pedido de lançamento de derramas para fins assistenciais;
2.º Referência nominal das petições deferidas, valores monetários arrecadados e verbas em débito aos vários estabelecimentos de saúde e assistência por todos os municípios continentais durante igual período;
3.º Determinação, em cada caso, e ano por ano, no sexénio em causa, da percentagem do ónus assistencial em relação ao valor global das receitas ordinárias de cada município.»

O Sr. Moura Ramos: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: como já tivemos o ensejo de dizer nesta Câmara, os aplausos a tudo quanto se tenha como verdadeiramente útil à sociedade ou a reprovação de medidas que se considerem como prejudiciais são atitudes de elevado e indiscutível interesse para a Nação, desde que haja a preocupação de abordar os problemas com objectividade, seriedade, isenção e sentido construtivo.
Nesta ordem de ideias, não devemos hesitar em chamar a atenção do Governo para o que julgarmos caminhar mal, mas também não devemos poupar louvores aos governantes quando disso sejam dignos e merecedores.
E se lamentamos o surgir de oportunidades para censurar uma que outra decisão ou medida governamental, apraz-nos sempre vivamente quando há lugar para pôr em evidência, o interesse, o entusiasmo e a dedicação com que vemos os homens de Estado actuarem nos departamentos que lhes estão confiados.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Vem este intróito a propósito da sessão de trabalhos que os Srs. Ministros das Obras Públicas e Subsecretário de Estado da mesma pasta foram realizar à vila da Batalha no passado dia 22 do corrente mês, com vista ao planeamento urbanístico definitivo da vila heróica.
Em 19 de Janeiro de 1962, na primeira intervenção feita nesta Assembleia, solicitámos do Governo a valorização urbanística da zona do Mosteiro da Batalha, o que, disse-

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mós, não se cifra num problema de bairrismo, mas sim no da integração, do sou majestoso monumento num cenário que o valorizo e dignifique como convém.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E depois de fazermos uma resenha das tentativas feitas baldadamente desde 1896 para resolver o problema, pusemos em relevo a clarividência a vontade e o espírito empreendedor com que o actual Ministro das Obras Públicas, Eng.º Arantes e Oliveira, o havia enfrentado, abrindo uma clareira, de esperanças em todos quanto se interessam por tão magno problema e que já haviam desesperado de vê-lo a caminho de solução.
Cabe efectivamente ao ilustre homem público a honra de o ter encarado de frente, com a inteligência, o carinho e a competência de que sobejas provas tem dado e sabido colocar na direcção operosa, progressiva e cheia de vitalidade de um Ministério que, no decorrer do tempo, se tem imposto à admiração do País e, até, além-fronteiras.
Por isso, terminávamos a nossa referida intervenção de 19 de Janeiro de 1962 apelando para que S. Ex.ª não deixasse esmorecer em si o entusiasmo e a dedicação com que se havia votado a tão patriótica obra como a da valorização do Mosteiro de Santa Maria da Vitória.
Graças a Deus e ao patriotismo, tenacidade e capacidade realizadora do Sr. Eng.º Arantes e Oliveira, o nosso apelo foi ouvido, começando a ganhar foros de realidade o planeamento urbanístico da vila da Batalha. Em 10 de Fevereiro corrente, o ilustre Ministro das Obras Públicas proferiu um despacho no sentido de ser dado «o remate devido à elaboração do plano de urbanização da vila, por força a encerrar-se de vez esta famigerada tarefa, que, salvo erro, foi abordada já há cerca de quinze anos».
Pelo tom decisório deste despacho, bem como pelas palavras incisivas que proferiu à chegada aos Paços do Concelho da Câmara Municipal na manhã do dia 22, palavras em que sublinhou que «o problema não está resolvido, mas está encontrado rumo seguro para o resolver», e em que lembrou aos técnicos que o acompanharam o dever de serem generosos e pródigos «na criação de amplas possibilidades de existência de uma zona turística local e de ambiente propício para a realização de cerimónias de significado nacional, dado o valor arquitectónico, artístico e histórico do local», bem se poderá aquilatar da firme determinação e interesse do Sr. Ministro das Obras Públicas na realização da grandiosa obra, sem esquecer nenhum dos seus aspectos, mesmo o que ressalta do desejo manifestado pelo Sr. Presidente do Conselho quando, a 14 de Agosto de 3935, disse que «os sítios de Aljubarrota e a Batalha, devem ser os lugares de entre todos eleitos para as grandes peregrinações patrióticas ...».

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Na aturada e fatigante sessão de trabalhos, pôs S. Ex.ª todo o empenho e interesse para que, de vez, ficasse arredado para sempre tudo quanto se tem oposto à elaboração do plano urbanístico da vila.
Desde os problemas rodoviários, de que sobressai a variante à estrada nacional n.º 1, já em execução; aos acessos à vila: ao já quase concluído bairro para os desalojados por efeito da construção da estrada nacional n.º 1; ao estudo do arranjo circundante do Mosteiro e definição da zona de protecção respectiva; ao estudo dos tipos de habitação a construir de futuro e que devem ser consentâneos com a grandeza do Mosteiro que circundam; à definição e implantação da célula A - ponto de partida para a valorização do aglomerado -, bem como muitas outras questões que se tornaria exaustivo enumerar, tudo foi debatido com a minúcia, o interesse, o carinho e a ponderação requeridos por obra de tão grande envergadura.
E sendo a personificação dinâmica e competente da política de realizações que a sábia, prudente e firme orientação do Sr. Presidente do Conselho tem condicionado, o Sr. Eng.º Arantes e Oliveira revelou, nesta sessão de trabalhos, aquele dom precioso no homem público - o de saber dialogar com as populações, ouvindo e atendendo as necessidades reais e as legítimas aspirações dos habitantes da pequena vila.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Entendi, por isso, que o País devia conhecer o carinho e o interesse consagrados pelo Sr. Eng.º Arantes e Oliveira às soluções estudadas e adoptadas para tantos dos problemas equacionadas, a fim de lhe testemunhar o seu vivo apreço por este grande serviço que fica a dever ao Ministro a quem também já se deve, na expressão de outro ilustre governante, o Prof. Doutor Antunes Varela, «um novo espírito das obras públicas em Portugal».

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Que Deus guarde, pois, a vida de S. Ex.ª e que o labor, entusiasmo e dedicação com que se entregou à obra tão necessária e grandiosa não esmoreçam e que, dentro do mais curto espaço de tempo, a vila da Batalha tenha elaborado definitivamente o seu plano urbanístico e apressadas as obras para emoldurar dignamente o Mosteiro, que é o primeiro monumento espiritual da Nação.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Estes as nossos mais sinceros e veementes votos, com os protestos do maior reconhecimento ao ilustre Ministro das Obras Públicas, Eng.º Arantes e Oliveira, por mais este serviço prestado à Nação.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Elísio Pimenta: - Sr. Presidente: uma palavra sobre a imprensa dita nesta Assembleia tem sempre um significado muito especial.
Devemos-lhe o inestimável serviço de levar ao País o relato dos nossos trabalhos. Relato sucinto, é certo, por subordinado à tirania do espaço, mas sempre de uma objectividade exemplar.
E maior é o serviço quando pensamos que se criou, à generalidade das pessoas, a impossibilidade, prática de conhecerem as actas oficiais das sessões de uma assembleia com características predominantemente políticas e, como tal, intérprete da opinião pública, que, por isso mesmo, também informa e orienta cada um dos seus membros, que, colectivamente, constituem um dos órgãos da soberania da Nação.
E, pelo menos, o que diz a Constituição e se aprenda no Direito Constitucional ...
Tempos houve, não muito distantes, em que o Diário das Sessões se ligava umbilicalmente ao Diário do Governo. Isto quer dizer que a sua expansão era grande e fácil, pois quem assinava o último adquiria o direito de receber graciosamente o primeiro.

[Ver Figura na Imagem]

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Quebrado, assim, o vínculo que alimentava a fácil expansão da publicidade dos trabalhos Já Assembleia Nacional, por vazões nunca explicadas, que o saiba eu, certamente porque não tinham explicação, viveríamos como que segregados, quase a fazer crer que numa zona de silêncio, discutindo em segredo problemas da Nação, se não fora aquilo a que o grande jornalista Pedro Correia Marques chamou há dias o «quarto poder do Estado», a imprensa.
Mas, apesar da competência profissional e da boa vontade de quem procura informar bem os leitores, ou os ouvintes, e, por amabilidade, ultrapassar a tal tirania do espaço, muitas vezes essa tirania insuperável impede que quem lê ou ouve fique com a ideia precisa e o sentido exacto do que se disse ou pretendeu dizer.
Não será isso motivo para se deixar de agradecer.
Sr. Presidente: o ilustre Subsecretário de Estado da Presidência do Conselho, Sr. Dr. Paulo Rodrigues, nosso querido colega nesta Assembleia, em discurso notável proferido na sessão de abertura do II Encontro da Imprensa não Diária, anunciou estarem em estudo providências sobre o desenvolvimento dos meios da informação e a valorização do quantos a servem.
Não estamos habituados a ouvir prometer sem que se cumpra o prometido. Fazemos, por isso, votos por que nesse estudo colabore, a respectiva Corporação, que, através dos Grémios da Imprensa, diária e não diária, e do Sindicato Nacional dos Jornalistas, dará certamente sério contributo à estruturação de actividade considerada constitucionalmente como exercendo uma função pública.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O problema é difícil e apresenta aspectos de sua delicadeza. Não me restam d Lívidas, todavia, de que da inteligência, autoridade e sentido político do esclarecido membro do Governo virá a sair a orientação precisa para que dos estudos em curso resulte um autêntico estatuto da imprensa, definidor e garante dos direitos e das obrigações daqueles a quem compete colaborar primacialmente na formação da opinião pública por meio de informação verdadeira e objectiva.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: a vida da imprensa portuguesa é cada vez mais difícil.
Difícil, não apenas pelos entraves que lhe são postos - e nem sempre deles é responsável o Governo, embora tudo faça para o fazer acreditar a nacionais e estrangeiros-, em relação à informação propriamente dita, sujeita a limitações que por vezes não obedecem a critérios facilmente aceites, ou à apreciação dos actos da Administração. Difícil, também, por concorrências impróprias e injustas, no expressivo dizer do jornal O Século, em dois importantes artigos de fundo publicados nos dias 26 e 27 de Novembro findo.
O Governo não terá deixado de lhes prestar a melhor atenção, pois denunciam um estado anómalo de coisas que exige correcção. Existe - entre outras - uma abusiva invasão do domínios que lhes não pertencem por parte de determinados organismos e serviços estatais e paraestatais e particulares; a publicidade vive uma verdadeira anarquia, por falta de conveniente regulamentação, o que tudo cria graves perturbações à vida económica de uma imprensa que deseja ser e continuar livre.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Os jornais portugueses, na sua generalidade, mantêm um nível de dignidade exemplar, cumprem com o seu dever de bem esclarecer e orientar a opinião pública nos problemas fundamentais da Nação, colaboram com o Governo na sua política de defesa intransigente da integridade geográfica e moral da Pátria, estimulam a confiança na justiça dos valores a acautelar contra a fúria dos inimigos e a tibieza dos amigos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não desejam certamente agradecimentos, pois quem serve o País não faz mais do que o seu dever, mas precisam de maior confiança na sua actividade crítica e informativa e menores entraves à sua actividade económica.
Sr. Presidente: tudo quanto acabo de dizer vem apenas a propósito, ou a despropósito, da realização no Porto, nos passados dias 21 e 22, do FE Encontro da Imprensa não Diária, que melhor se poderia designar por Imprensa Regional.
Este importante acontecimento, promovido pelo respectivo Grémio, teve o patrocínio do Secretariado Nacional da Informação, ao qual são devidas, por isso, honras e louvores. E, na verdade, digno de especial atenção o carinho e o sentido de oportunidade com que está a ser estimulada a actividade da chamada «pequena imprensa», que, pelo número dos seus leitores, que se estima em 2 milhões, e pelos serviços prestados ao País com a dedicação e o sacrifício dos seus proprietários e colaboradores, bem merece o qualificativo de «grande».
E quase centena e meia de jornais que se publicam periodicamente de norte a sul da metrópole, e oxalá o Grémio possa chamar a si, dentro de pouco tempo, os de todo o território português. É um pouco do concelho, da vila ou da cidade onde se publicam, da pequena pátria de muitos que, por razões várias, dela se tiveram de afastar, e que por essa imprensa podem sentir os seus problemas do dia a dia, do seu progresso e desenvolvimento, as manifestações do seu prestígio, a vida dos parentes, dos amigos, dos simples conhecidos, enfim, alimentar o amor ao torrão natal e sofrer a saudade, que nunca se afasta do coração dos Portugueses.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Bastaria isso para justificar a existência dos pequenos jornais da província.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Há que salientar, todavia, que nas conclusões do Encontro, em que estiveram presentes todos os jornais, com meia dúzia de excepções, ficou expresso o desejo da sua valorização colectiva, através de facilidades a que não pode deixar de se dar todo o aplauso, pela sua evidente justiça. Mas ressalta também, como primeira afirmação, votada por unanimidade, o propósito de continuarem a contribuir para a solução dos problemas nacionais, unidos à volta dos grandes ideais de Deus, da Pátria e da Família.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - E porque o voto saiu da alma de quantos estiveram presentes na sessão de encerramento, presidida pelo Sr. Dr. César Moreira Baptista, outro voto foi formulado: o de que o III Encontro da Imprensa não Diária

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se realize no próximo ano na portuguesíssima província de Angola.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para efectivar o seu aviso prévio sobre o turismo nacional, o Sr. Deputado Nunes Barata.

O Sr. Nunes Barata: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: será de justiça prestar homenagem a quantos se têm preocupado com os problemas do turismo em Portugal.
Deputados, jornalistas, homens do Governo ou simples funcionários, homens de negócios ou modestos cidadãos amantes da beleza e do progresso das suas terras, a todos, como português, testemunho o meu reconhecimento pelo seu esforço e de todos espero benevolência se este aviso prévio não estiver à altura da oportunidade e importância do tema abordado.
Quando, em Abril do ano findo (cf. Diário das Sessões, de 27 de Abril de 1963), enviei para a Mesa desta Assembleia Nacional a nota de aviso prévio que agora me é dado efectivar, salientei as razões que fundamentam a actualidade dos problemas do turismo, de forma a colocar este aspecto da vida portuguesa na primeira linha das nossas grandes preocupações.
O turismo serve interesses humanos mesmo para lá e acima da sua expressão monetária: com ele abrem-se os povos a um melhor conhecimento recíproco, cujos frutos só traduzem num enriquecimento do património cultural da humanidade, num fortalecimento da solidariedade e da paz.
Mas, restrito ao plano económico, o turismo abona-se não só com o caudal de divisas que nos pode proporcionar, como, ainda, por constituir apoio às mais variadas actividades, desde a indústria hoteleira aos transportes.
Valerá a pena deter-me com mais pormenor na importância destes aspectos económicos (cf., por exemplo, o estudo Plano do Desenvolvimento Turístico para o Período de 1964-1968, editado pelo Gabinete de Estudos e Planeamento Turístico do Secretariado Nacional da Informação).
A posição da balança de turismo na balança de pagamentos de alguns países é já hoje notável e acusa sensíveis aumentos nos últimos anos.
O turismo tem constituído meio para obter divisas de uma ou outra zona monetária, divisas essas que de outro modo talvez não se tornassem acessíveis aos países beneficiados.
É natural que o processo de desenvolvimento de alguns territórios os force a substanciais importações,» com notável desequilíbrio da balança comercial. Pois o turismo poderá proporcionar um apoio decisivo à correspondente balança de pagamentos e, consequentemente, ao prosseguimento do esforço de desenvolvimento.
Comparado com outras futuras indústrias de exportação, o turismo avantaja-se pela possibilidade de mais fáceis sucessos. De facto, «as dificuldades técnicas e comerciais que surgem na concorrência internacional com países já industrializados, de maior experiência, maiores aptidões técnicas, maior capacidade financeira, melhor organização de vendas e de reputação já firmada nos mercados compradores, não podem ser vencidas senão ao fim de prazos necessariamente longos». Ora o turismo não tem de vencer os complexos problemas técnicos de produção e de organização, não exige mão-de-obra extremamente qualificada. A sua rápida expansão e a natureza, dos seus atractivos (sol, mar, paisagem, evasão) libertam-no «Io monopólio dos países altamente industrializados, inutilizando as exigências de uma. concorrência que se apoia na força técnica comercial ou financeira.
O afluxo de turistas repurcute-se no processo de desenvolvimento interno.
As exigências na capacidade hoteleira, com sua projecção na construção civil, no emprego de mão-de-obra menos qualificada e na utilização de equipamentos (mobiliários, louças, roupas, etc.) produzidos pela própria indústria nacional, o incremento nos transportes, nos circuitos comerciais, nos espectáculos, etc., tudo desencadeia outros efeitos secundários de interesse não despiciendo para o produto nacional.
Acontece que à sombra do turismo se constróem infra-estruturas ou se realiza uma valorização social que, em última análise, beneficia o bem-estar das populações rurais.
Este aspecto alarga-se mais, permitindo relacionar o turismo com o desenvolvimento económico regional.
Muitas vezes as zonas de interesse para o turismo são aquelas onde a Natureza é pródiga em cambiantes de luz e de cor, em contrastes de acidentes, na doce paz de ambientes que o homem ainda não imolou ao furor da vida urbana ou ao fumo dos aglomerados industriais.
A localização de centros de actividades turísticas transforma-se, assim, em pólos de desenvolvimento económico. Os fluxos turísticos fortalecerão a agricultura, o comércio, o próprio artesanato local, atenuando-se seculares desequilíbrios regionais.
Poderei concretizar um pouco sobre esta importância económica do turismo recordando o que se passa em alguns países da Europa (cf. Le Tourisme dans les Pays de V O. C. D. E., 1962).
Na Áustria, as receitas do turismo permitiram, em 1961, cobrir 79 por cento do déficit da balança comercial.
Na Bélgica, essas receitas igualaram as de exportação d u máquinas eléctricas, de produtos carboníferos ou de manufacturas metálicas.
Na Espanha, o déficit de 300 milhões de dólares da balança comercial, em 1961, foi mais do que coberto pelos 385 milhões de dólares que rendeu o turismo nesse ano.
Em França, o turismo ocupou o 2.º lugar nas indústrias de exportação, logo após os produtos siderúrgicos e antes, portanto, dos produtos químicos, dos automóveis e das máquinas e aparelhos.
Na Itália, constituiu M principal rubrica da balança de pagamentos, igualando, sensivelmente, o montante do superavit dessa balança, ou seja, ainda em 1961, 643 milhões de dólares.
A análise da balança de pagamentos da zona do escudo em 1961 (cf. o Relatório do Banco de Portugal de 1962) revela que o saldo da balança do turismo foi de 379 000 contos (890 000 contos no crédito e 511 000 contos no débito).
Trata-se pois de uma situação modesta, tanto no seu montante global como na posição relativa da rubrica do turismo perante as outras rubricas da balança de pagamentos.
De facto, o montante das transacções correntes foi, em 1961, de 22 160 000 contos no crédito e 18 006 000 contos no débito, o que se traduziu num saldo negativo (e nesta medida um tanto anormal) de 4 154 000 contos.
Mesmo nos invisíveis correntes, cujo saldo positivo de 1 123 000 contos resultou da diferença entre 5 259 000

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contos do crédito e 4 136 000 contos do débito, os transportes (1 842 000 contos no débito t. 471 000 contos no crédito), as transferências privadas (303 000 contos no débito e 1 173 000 contos no crédito) e os «diversos» (1 490 000 contos no débito e 1 173 000 contos no crédito) movimentaram montantes superiores ao turismo.
E embora em 1962, como se acentuou na proposta da Lei de Meios para 1964, as receitas do turismo tenham aumentado 63 por cento, relativamente ao ano anterior, encontramo-nos infelizmente a grande distância dos outros países da Europa.
Já em 1960 a balança do turismo proporcionava à Suíça 34,6 dólares por habitante, à Áustria 24,4 dólares por habitante, à Itália 11,2 dólares por habitante e à Espanha 8,2 dólares por habitante. Pois em Portugal anilaria à volta de 2.5 dólares por habitante se contabilizássemos os valores do crédito (678 000 contos) e menos de metade se operássemos apenas com o saldo da balança do turismo (305 000 contos).
A evolução do número global de turistas estrangeiros que nos têm visitado, em confronto com o que se tem passado nos outros países da Europa, é igualmente ilustrativa sobre o nosso atraso relativo [cf. as publicações Le Tourisme en Europe (O. E. C. F., 1960) e Le Tourisme dans les Pays de l'O. C. D. E., 1962].
Portugal recebeu, em 1950, 70 307 turistas e, em 1961, 375 450.
Pois neste entretempo a evolução processou-se nestes termos nos outros países da Europa:

[Ver Tabela na Imagem]

As percentagens de crescimento relativo deveriam acusar entre nós índices elevados, dada a modéstia do ponto de partida. Mas mesmo assim os números não nos são favoráveis no confronto com outros países.
Entre 1960 e 1961 o número de turistas aumentou em Portugal 6,5 por cento. Pois nesse entretempo e expansão foi de 37,2 por cento na Turquia, de 28 por cento na Grécia, de 23,6 por cento na Jugoslávia e de 22,4 por cento na Espanha.
Alargada a análise a um período mais dilatado (1953-1962) - em que se esbate o processo de «explosão» turística dos últimos anos -, o acréscimo foi de 20 por cento na Espanha. 19 por cento na Jugoslávia, 16 por cento na Grécia e só 12 por cento em Portugal. Deste modo, pode dizer-se que os nossos companheiros de infortúnio na Europa menos desenvolvida, [cf., por exemplo, Besoins et Moyens de l'Europe (Tendance et perspectives de dix-huit pays,). Paris, 1962 ainda no turismo têm conhecido maiores sucessos do que Portugal.
A própria duração média de permanência de turistas, que em 1961 foi, em Portugal, de 3,5 dias, atingia na Áustria 6 dias, na Itália 5,2 dias e na Jugoslávia 4,2 dias (cf. Le Tourisme dans les Pays de l'O. C. D. E., citado).
A importância e actualidade do turismo encorajam-me a deter-me com mais algum pormenor no que se tem passado no país da Europa a que por todas as razões nos encontramos mais ligados: a Espanha.
O desenvolvimento económico social de Espanha, nos últimos anos, deu lugar a que se falasse num «milagre espanhol».
O «Plan de Desarollo», que agora começa a executar-se e se segue ao «Piau de Urgência», prevê para o quadriénio, 1964-1967 um crescimento anual à taxa de 6 por cento, devendo no final deste período obter-se uma renda nacional de 905 000 milhões de dólares, ou seja uma capitação de rendimento de 469 dólares.
Os investimentos públicos, que no período de 1959-1962 atingiam cerca de 172 000 milhões de pesetas, passarão, no quadriénio 1963-1967, para 335 000 milhões, ou seja o dobro.
Ora o turismo continuará a constituir um dos principais apoios desta situação progressiva de Espanha.
Em 1962 as exportações espanholas atingiram cerca de 750 milhões de dólares e o turismo rendeu 475 milhões, ou seja quase 65 por cento. No ano findo, e até 30 de Novembro, os 10 milhões de turistas que tinham já visitado a Espanha proporcionaram à balança do turismo 600 milhões de dólares, ou seja à volta de 16,8 milhões de contos.
Prevê-se que em 1967, último ano de execução do «Plan de Desarollo», a Espanha receberá mais de 13 milhões de turistas.
Qual a proveniência destas correntes turísticas?
Se nos reportarmos u 1961, verifica-se a grande preponderância dos Franceses (3 332 032, ou seja 44,6 por cento do total), seguidos a distância pelos Ingleses (740052. ou soja 9,9 por cento do total), pelos Alemães (480 549, ou seja 6.4 por cento), pelos Norte-Americanos (459 771 ou seja 61 por cento), pelos Portugueses (381 636) o pelos Italianos (258 467).
Que procuram os estrangeiros em Espanha.
O turismo estrangeiro (especialmente nórdico e centro-europeu) - escreve-se na primorosa publicação Espana (edição do Serviço Informativo Espanol)- busca fundamentalmente em Espanha as águas cálidas do Mediterrâneo, podendo afirmar-se que quatro quintos dos turistas se dirigem para a beira-mar. Madrid, como cidade capital do país e terminal de inúmeras linhas aéreas, constitui um núcleo cada dia mais importante, que se projecta na cintura turística dos seus arredores - Ávila, Segóvia, Toledo, Escoriai, Vale dos Caídos e Arranjuez. As ilhas Baleares e as Canárias acusam as maiores permanências nas duas temporadas turísticas. O chamado triângulo bético (Córdova, Sevilha e Granada) desfruta de um turismo de passagem, com permanências de uma semana, o qual costuma desembocar na chamada Costa do Sol, cuja expansão turística revela cada ano maior impulso. A costa do Norte vê-se apenas povoada no período do Verão, constituindo a região mais estacionária do país turístico.
Que fez a Espanha para merecer este boom turístico?
Naturalmente que Deus dotou-a com o sol e o mar, mas os Espanhóis souberam colaborar na obra de Deus, tirando das generosas dádivas da Natureza o melhor proveito.
Pode dizer-se que na estrutura orgânica da administração pública o turismo ocupa em Espanha um lugar de relevo compatível com a sua importância.
O Ministério da Informação e Turismo dispõe de uma Subsecretária de Turismo. Como organismos autónomos existem a Administração Turística Espanhola e a Administração da Polícia de Turismo. Como serviço com carácter especial, o Instituto de Estudos Turísticos. Além da Secção de Obras e Construções de Interesse Turístico e

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da Secção Administrativa, a Subsecretária do Turismo dispõe de duas direcções-gerais: a Direcção-Geral de Promoção de Turismo e a Direcção-Geral das Empresas e Actividades Turísticas. A Direcção-Geral de Promoção de Turismo é constituída por três serviços: Serviço de Propaganda Turística (projectos; propaganda e publicidade); Serviço de Informação Turística (documentação e estatística; oficinas de turismo); Serviço de Fomento Turístico (coordenação turística; formação turística; infra-estruturas turísticas). A Direcção-Geral das Empresas e Actividades Turísticas dispõe de três serviços: Serviço de Alojamento Turístico (hotelaria; crédito hoteleiro; acampamentos turísticos); Serviço de Actividades Turísticas (agências de viagens; profissões turísticas; assuntos vários); Serviço de Inspecção Turística.
Creio merecer destaque a atenção dada em Espanha à informação turística, à propaganda, à política de alojamentos e aos transportes.
O labor das oficinas de informacion de turismo estende-se não só a todo o território nacional, como a mais de vinte das principais cidades da Europa e da América.
Ainda no ano de 1963, o Ministro da Informação e Turismo, ao inaugurar em Munique a Oficina Espanola de Turismo, acentuava que a mesmo, se destinava a encaminhar para Espanha o turismo dos estados da Baviera e de Baden-Würtemberg, assim como o da Áustria, enquanto não fosse aberta uma repartição em Viena. E logo anunciou outra repartição a abrir em Düsseldorf.
Mas esta multiplicação de oficinas pelo estrangeiro é acompanhada de uma intensa propaganda da Espanha, realizada com o apoio dos inúmeros meios hoje disponíveis. Basta referir: o plano da Subsecretária de Turismo, para 1964, relativo à campanha de publicidade turística a realizar nas principais revistas e diários dos Estados Unidos, América Espanhola, Inglaterra, Itália. Alemanha, Bélgica, Holanda e Escandinávia; os prémios de turismo para periódicos, revistas e periodistas nacionais e estrangeiros (50 000 pesetas o 1.º prémio, em cada caso, relativamente a 1963); ou, ainda, a profusão de sugestivas publicações em que se enaltece, o património monumental e artístico, o sol, o mar, as frutas ou os festivais de Espanha.
Em Janeiro de 1962 a capacidade hoteleira do Espanha traduzia-se em 1520 hotéis e 620 pensões (de luxo e de 1.ª classe), com um total, respectivamente, de 68 717 e 10 039 quartos. Isto sem incluir as pensões de 2.ª e 3.ª categoria, as casas de hóspedes e pousadas, num total de 13 520 estabelecimentos, com 141 626 quartos (cf. a citada publicação Espana).
Para se ter uma ideia do caminho percorrido neste sector deve esclarecer-se que em 1901 o número de hotéis era de 1038, com 43 599 quartos, e as pensões de luxo e de 1.ª classe totalizavam 280 estabelecimentos, com 4627 quartos.
Mas já nos primeiros nove meses de 1963 se abriram em Espanha mais 459 estabelecimentos hoteleiros, num total de 13 580 quartos e 23 591 camas.
A capacidade hoteleira de Madrid é hoje. do 33 452 camas. Assim se compreende que a capital de Espanha tenha recebido nos dez primeiros meses do 1963 cerca de 768 000 turistas.
Só os paradores e álbergues do Estado, num total de 38 estabelecimentos espalhados por toda a Espanha, alojaram, em 1962. mais do 300 000 pessoas, tendo proporcionado a sua exploração um rendimento líquido de 8,5 milhões de pesetas.
É claro que o crédito hoteleiro apoia este desenvolvimento. Instituído em 1942, com um fundo de 25 milhões de pesetas, eleva-se hoje esse fundo II 1400 milhões. Mas já «uma nova dinâmica no crédito hoteleiro» se anuncia.
Vão destinar-se 117,5 milhões de pesetas à- construção de hotéis em determinadas regiões de Espanha até agora menos favorecidas pela iniciativa privada no que respeita à promoção do turismo [Cervera (Lérida), Almeria, Lugo, Lagunas de Ruidera, Punta Umbria (Huelva), Badajoz, Cáceres, Ribadesella (Oviedo). etc.]. O Estado oferece créditos aos possíveis construtores e empresários, condicionando a sua concessão a uma série de requisitos relacionados com a categoria do hotel, o número de quartos, a localização, etc. Estes empréstimos, anunciados para concurso público no Boletim Oficial do Estiado, serão concedidos a espanhóis que disponham de terrenos convenientemente localizados, se comprometam a iniciar as obras no prazo de três meses e a terminá-las volvidos dezoito meses. Os prazos de amortização variam entre 20 e 25 anos.
No que respeita a transportes, limitar-me-ei a referir dois aspectos: a renovação dos caminhos de ferro, estradas, transportes marítimos o aéreos processada em Espanha: o sentido prático e empreendedor que tem fomentado iniciativas de forma a canalizar os estrangeiros para este país.
O «Plano de Modernização da R. E. N. F. E.» de 1959 marca um momento decisivo na valorização dos caminhos de ferro. A rede electrificada já atingia em 1963, em Espanha, 4136,5 km, com uma potência de 466 823 kWA.
O «Plano Geral das Estradas» pretende até 1977 actualizar a rede espanhola, prevendo-se um investimento de 177640 milhões de pesetas. De resto, o número de veículos em circulação no país subiu de 122 653 em 1941 para 1 004 700 em 1960, ou seja quase dez vezes mais.
A lei de protecção e renovação da frota mercante- espanhola data de 1956.
Com cerca de 2 milhões de toneladas (das quais 700 000 necessitadas de rápida substituição) e 45 estaleiros navais, com uma capacidade de produção anual de 450 000 t, a Espanha encara, como foi patenteado, no ano findo, no seu I Congresso Nacional da Marinha Mercante a renovação da frota.
Os três primeiros reactores DC-8 da companhia Ibéria (Linhas Aéreas de Espanha, S. A. do 1. N.º L.) entravam ao serviço na Primavera de 1961. Primeiro na linha de Nova Iorque, depois na das Caraíbas (México e Venezuela) e finalmente na América do Sul (com prolongamento até Santiago do Chile), este foi um grande sucesso da aviação comercial espanhola. Logo em 1962 quatro Caravelle da Ibéria passaram a ligar Madrid, Barcelona e Palma aos principais centros europeus.
A primeira parte desta modernização da frota- aérea espanhola, que inclui mais três reactores, além dos sete referidos, impôs um investimento de 32 milhões de dólares (cf. a citada publicação Espana}.
A isto se juntou, de resto, a modernização do tráfego aéreo interno, também realizado pela Ibéria e pela Aviaco.
Mas logo em 1961 se colheram os frutos deste esforço. O número de passageiros-quilómetro foi de 969 milhões, ou seja mais 22 por cento do que no ano anterior.
Uma política de largas concessões ao tráfego aéreo internacional permitiu, de resto, elevar o tráfego não regular (charter) a 436 000 passageiro, ou seja cerca de metade do tráfego regular (934 000). Em 1961 os aeroportos internacionais espanhóis registavam 1 390 000 passageiros.
O aeroporto de Barajas que nas estatísticas europeias ocupava já em 1901 um lugar de relevo, com um movimento de chegadas e partidas superior a 1 100 000 con-

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tabilizava em Novembro do ano findo mais de 1 300 000 viajantes, num total de 37 582 aviões, ou seja, em média, 112 aparelhos por dia.
O tráfego aéreo encontra-se, de resto, repartido pelos vários aeroportos de Espanha. Em 1961, no que respeita ao tráfego de passageiros, Madrid teve 29,3 por cento do total, Palma 21,9 por cento, Barcelona 21,6 por cento, Lãs Palmas (Tenerife) 10,7 por cento, Valência 3,7 por cento, Málaga 3,2 por cento. Sevilha 2.8 por céu to e os restantes aeroportos 6,8 por cento.
O Plano Nacional de Aeroportos (1958-1961) custou 1490 milhões de pesetas e o novo plano, que completará o primeiro no desenvolvimento da rede interior, importará em cerca de 2174 milhões de pesetas.
Mas, ao lado deste fomento das infra-estruturas, a Espanha tem estimulado (libertando-se de um ancilosamento burocrático ou de um proteccionismo indevido) e utilizado os mais variados meios que possam fomentar o transporte de turistas. Refiram-se as facilidades aos tours das organizações de viagens ou aos voos não regulares dos aviões (por exemplo ilhas Baleares); o caso de uma linha de autocarros que liga Barcelona à Bélgica e à Holanda ou a utilização dos Caravele da Ibéria no voo Málaga-Londres-Málaga; a ligação La Corunha-Madrid, da Aviaco, ou as possibilidades de navegação aérea do arquipélago canário.
Mas será altura para nos debruçarmos mais concretamente sobre o caso português.
A primeira questão consiste em saber das possibilidades de atracção turística do nosso país.
Creio ser mais objectivo lançar mão de um depoimento de estudiosos estrangeiros - o Rapport d'Expertise, publicado pelo Gabinete de Estudos e Planeamento Turístico, do S. N. I., de que são autores os suíços Kurt Krapt e Oscar Michel.
Portugal dispõe de uma série de factores de atracção, fundados no clima, na topografia variada do País, no património histórico e cultural, no folclore, e na mesa. A atitude simpática e prestável da população ajuda a manter uma atmosfera favorável. O desenvolvimento prodigioso do turismo internacional nos últimos tempos exige novas zonas de expansão, o que permite considerar o nosso território comum mercado potencial, uma grande reserva para o turismo. De resto, o desejo de descobrir novos horizontes, a evasão que leva a deixar as encruzilhadas turísticas mais batidas, favorecerão ainda as nossas perspectivas.
O Europeu - nomeadamente o homem do Norte - tem a nostalgia do sol, do calor, do céu azul, das praias de. areias, cintilantes e águas límpidas. Daí o prodigioso incremento do turismo italiano, espanhol, jugoslavo e grego, atrás referido. Daí ainda, e perante a saturação dos outros territórios, a necessidade de Portugal jogar a sua oportunidade, de reafirmar a justiça da sua cantada vocação de «jardim da «Europa à beira-mar plantado».
A compreensão das realidades actuais do turismo em Portugal e, sobretudo, a ordenação do futuro desenvolvimento recomendam uma atenção detalhada pelos números.
Acontece, infelizmente, que os elementos estatísticos disponíveis são escassos, o que torna menos completo tal propósito.
Com base nos elementos do Plano de acção para 1963, da Direcção dos Serviços de Turismo do S. N. I., pode elaborar-se um rusumo sobre os turistas que visitaram Portugal continental no decénio de 1953-1962.

[Ver Tabela na Imagem]

Em 1963, segundo recentes declarações do Subsecretário da Presidência do Conselho, o número elevou-se a 520 000, ou seja um acréscimo de 24,3 por cento relativamente a 1962.
Mas qual a proveniência destes turistas?
Baseio-me ainda nos elementos do já citado Plano de acção turística de 1963 ao referir os principais países que alimentam as nossas correntes turísticas:

[Ver Tabela na Imagem]

A presença dos estrangeiros ganha maior sentido se aferirmos da sua permanência no país visitado.
Um elemento que poderá ter certo interesse para esta avaliação diz respeito às noites dormidas em hotéis e pensões.
Nos anos de 1960, 1961 e 1962 (cf. os respectivos Anuários Estatísticos) tais dormidas de hóspedes com residência habitual no estrangeiro foram, respectivamente, de 1 246 028, 1 333 799 e 1 357 515.
Poderíamos agora comparar o número de dormidas com o número do turistas. Para isso bastaria aproximar o seguinte quadro daquele que incluímos atrás sobre os principais países que alimentam as nossas correntes turísticas (cf. os Anuários Estatísticos de 1960, 1961 e 1962):

[Ver Tabela na Imagem]

O número médio de dormidas dos turistas no continente tem acusado uma tendência pelo menos estacionária, se

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não decrescente. Eis o que se podo deduzir dos seguintes índices (cf. Elementos Preparatórios de Um Plano de Desenvolvimento Turístico para o Período de 1964-1968, ed. do Gabinete, de Estudos e Planeamento Turístico do S. N. J.): 1952, 4.4 noites: 1953, 3.4; 1954, 3.8; 1955, 3,5: 1956, 3.5: 1957, 3.6; 1958, 3.6; 1959, 3.4; 1960, 3,1; 1961. 3:2; 1962, 3.3.
Este comportamento, que, aliás, é comum a vários países, devido à maior utilização do automóvel, à maior proporção de viagens organizadas por agências (cerca de 50 por cento relativamente aos turistas de algumas nacionalidades) e à generalização do camping e do caravaning no turismo internacional, poderá ser contrariado em Portugal na medida em que aumente o número de visitantes escandinavos, alemães e ingleses.
Os elementos referidos devem, aliás, conjugar-se com um aspecto mais geral, que é o da duração média de estacionamento.
Ainda segundo a exposição do Subsecretário da Presidência do Conselho, a duração média da permanência de turistas, que em 1961 fora de 3.2 dias, passou, em 1962, para 3.3, crescendo 3,1 por cento, e cifrou-se no primeiro semestre de 1963 em 3,8 dias, subindo, relativamente a igual período de 1962, de 11,8 por cento.
Afirma-se que a permanência se relaciona com a distância que o turista terá de percorrer. Esta regra tem hoje a contrariá-la factores que já referimos, mas ainda assim as taxas de duração média em Portugal em 1961 parecem confirmá-la (cf. o Rapport d'Expertise citado): Espanha, 1,1 dias; França 3,5 dias; Alemanha, 4,6 dias; Reino Unido, 8.6 dias.
Mas qual o nível económico dos turistas que nos visitam?
As taxas de permanência poderão ser ainda aqui um índice. Outro residirá na categoria dos estabelecimentos hoteleiros utilizados.
Assim, em 1962 (cf. Anuário Estatístico respectivo) das 1 357 515 noites dormidas, 1 065 987 foram em hotéis e 291 528 em pensões. A distribuição nos hotéis foi a seguinte: 152 265 em hotéis de luxo; 588 790 em hotéis de 1.ª classe; 237 951 em hotéis de 2.ª classe; 86 981 em hotéis de 3.ª classe. No que respeita às pensões, 9364 dormidas foram assinaladas nas de luxo, 164 489 nas de 1.ª classe, 69 963 nas de 2.ª classe e 47 712 nas de 3.ª classe.
Terá interesse analisar o comportamento por nacionalidades. É esse o intuito do seguinte quadro relativo a 1960:

[Ver Tabela na Imagem]

A receita média por turista subiu de 2370$ em 1961 para 3540$ em 1962, o que representa um acréscimo de quase 50 por cento.
Como se repartem regionalmente estes turistas?
Ainda aqui poderemos lançar mão das noites dormidas nos hotéis e pensões, reconhecendo, embora, a fragilidade do expediente, na medida em que se generaliza o camping ou formas similares.
Os vários distritos do continente e ilhas adjacentes acusaram, nos respectivos hotéis o pensões, o seguinte movimento no ano de 1962 (cf. Anuário Estatístico de 1962): Aveiro, 20 793 dormidas; Beja, 3907 dormidas; Draga, 13 683 dormidas; Bragança, 1 180 dormidas; Castelo Branco, 4895 dormidas; Coimbra. 56 379 dormidas; Évora, 4321 dormidas; Faro. 52828 dormidas; Guarda, 14 914 dormidas; Leiria, 43 960 dormidas; Lisboa, 825 026 dormidas; Portalegre, 5149 dormidas; Porto, 76 854 dormidas; Santarém. 12 965 dormidas; Setúbal, 36 736 dormidas; Viana do Castelo, 10773 dormidas; Vila Real, 2332 dormidas; Visem, 4096 dormidas; Angra do Heroísmo, 1403 dormidas: Horta., 262 dormidas; Ponta Delgada, 10 354 dormidas; Funchal, 155 085 dormidas.
Se descermos a uma análise regional mais cuidada poderemos salientar o seguinte, relativamente aos distritos onde a afluência dos turistas foi maior:
Lisboa. - O maior número de dormidas foi de norte-americanos (179 051), ingleses (117 730), franceses (109 987), espanhóis (75 606), alemães (60 621) e holandeses (32 835).
As terras do distrito que acusaram maior afluência foram a cidade de Lisboa (613 308 dormidas), o Estoril (155 096), Cascais (17575), Ericeira (11526) e Sintra (7389).
Funchal. - O maior número de dormidas pertenceu aos ingleses (96 652), seguidos pelos franceses (21 873), alemães (10 367) e norte-americanos (6 980).
Porto. - Os franceses (26 363 dormidas) ocuparam o primeiro lugar, seguidas dos espanhóis (14 318), dos alemães (7828), dos ingleses (7828) e dos brasileiros (5376).
As terras do distrito que acusaram maior afluência foram a cidade do Porto (55 701 dormidas) e Matosinhos (2493).
Coimbra. - O maior número de dormidas .pertenceu aos franceses (21-237). aos espanhóis (9577), aos ingleses (7298) aos americanos (4410) e aos alemães (2876).
A cidade de Coimbra (33 859 dormidas) e a da Figueira da Foz (22 167) acusaram as maiores afluências.
Faro - No Algarve a maior afluência foi de ingleses (22 148 dormidas), de franceses (12 305 dormidas), de alemães (4771 dormidas), de americanos (3012 dormidas) e de espanhóis (1685 dormidas). A presença dos escandinavos foi quase nula: suecos com 626 dormidas e dinamarqueses com 582 dormidas.
A Praia da Rocha, com 21 050 dormidas, ocupou o primeiro lugar entre os locais, preferidos pelos turistas estrangeiros, seguida de «Monte Gordo (10 866 dormidas) e de Lagos (6046 dormidas).
Leiria. - Neste distrito o maior número de dormidas pertenceu aos franceses (29 134), seguidos, muito à distância, pelas ingleses (3213 dormidas) e pelos alemães (2276 dormidas).
A Nazaré situa-se a grande distância dos restantes centros (18 709 dormidas, das quais, aliás, 12 623 de franceses).
E como se distribuem os turistas no decorrer do ano?
Se recorrer-mos à estatística dos automóveis estrangeiros entrados no País verificamos que dos 64 816 veículos registados no decorrer de 1962 pertenceram ao mês de Agasto 14 258, ao mês de Julho 10 091 e ao mês de Setembro 7208.
Do mesmo modo, do 1 357 515 dormidas registadas nos hotéis e pensões 233 156 foram em Agosto, 167 709 em Setembro e 161 164 em Julho. Os meses de Inverno

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apenas contaram com 57 201 dormidas em Janeiro, 61 186 em Dezembro e 68 400 em Fevereiro.
Será agora altura de pôr um pouco mais de ordem nos números referidos, sintetizando assim as ilações que os mesmos permitem tirar:

E modesta a posição de Portugal em confronto com os outros países europeus, nomeadamente os de condicionalismos geográficos e económicos idênticos aos nossos, no que se refere, tanto no plano absoluto como no plano relativo, ao turismo.
A taxa média anual de acréscimo de turistas tem conhecido entre nós oscilações muito variáveis, embora pareça ter atingido em 1963, relativamente a 1962, o aumento mais espectacular (24,3 por cento).
Os maiores contingentes turísticos têm sido, em valores absolutos, fornecidos pela Espanha, seguida a grande distância pelos Estados Unidos, França, Inglaterra e Alemanha.
A presença de turistas escandinavos é muito reduzida.
O enfraquecimento nos índices de permanência de turistas, enquadrado numa tendência geral, poderá ser contrariado entre nós, na medida em que se estimule o turismo nórdico.
Tal facto está, de resto, relacionado com a receita média por turista, que tem certa expressão entre nós e revelou tendência para crescer.
A repartição geográfica do turismo revela uma grande concentração na zona de Lisboa. Funchal, Porto e Coimbra situam-se a grande distância. O Algarve usufrui relativamente uma posição muito modesta.
Finalmente, no que respeita à distribuição anual dos turistas, a concentração segue a regra comum na Europa: valores elevados nos meses de Julho, Agosto e Setembro, sendo relativamente insignificante a presença do turismo de Inverno, sector onde, aliás, as possibilidades de algumas zonas do País são grandes.

Como se processará o desenvolvimento do turismo nos próximos anos em Portugal?
Creio não ser seguro fazer afirmações muito decisivas.
Referi atrás argumentos que podem justificar boas perspectivas. Tudo dependerá ainda da forma como soubermos estar à altura de uma actuação inteligente e operosa, corresponder às exigências dos novos afluxos de gentes sequiosas de sol, de mar, de natureza livre e de ... comodidades.
Um boom turístico pode contrariar previsões baseadas em taxas normais de crescimento. Os índices acusados pela Espanha são testemunho de tal facto.
Convirá, por outro lado, contar com os riscos da moda turística. Tal como as outras modas, poderá ser passageira, embora se me afigure menos provável que isso aconteça entre nós nos anos mais próximos.
No trabalho Elementos Preparatórios da Um Plano de Desenvolvimento Turístico para o Período de 1964-1968 faz-se uma estimativa da evolução global e por países do número d« turistas que visitarão nos anos próximos Portugal.
Analisemos a situação relativamente, a cada um dos países que têm dado maior contributo ao desenvolvimento do nosso turismo:
Espanha. - Sabe-se que a Espanha tem fornecido o maior contingente de turistas que nos visitam (embora seja muito maior o número de portugueses que vão a Espanha - 381 636 em 1961). Os Espanhóis não são contudo dos que mais gastam em Portugal. Vimos mesmo como é diminuta a sua taxa de permanência no nosso país.
Tenderá a aumentar o número de espanhóis?
Embora a sua presença global seja grande, a taxa de crescimento nos últimos anos, como atrás vimos, é irregular.
É natural que a relativa semelhança entre os dois países não estimule um incremento na visita dos Espanhóis. Creio que Fátima e Lisboa serão ainda assim os dois grandes cartazes que lhes poderemos oferecer. Muitos deles utilizarão as facilidades da proximidade fronteiriça para ao menos poderem dizer como o desiludido Miguel Unamuno (Por Tierras de Portugal y de Espana) relativamente à cidade da Guarda: «Também já lá estive!».
O desenvolvimento económico de Espanha a que atrás me referi pode constituir um incentivo à maior mobilidade dos Espanhóis, na medida em que aumente o seu nível de vida. Por outro lado, surtos inflacionários na moeda espanhola constituirão uma possibilidade que poderá ainda aqui ter a sua projecção.
Mas no caso do encarecimento da vida na Espanha o que nos interessará são os milhões de turistas que hoje a visitam. O que importa, em suma, é diligenciar para estender a Portugal a permanência destes.
Estados Unidos - Pela primeira vez, em 1962, o número de norte-americanos ultrapassou os franceses na visita a Portugal.
A melhoria nas condições de exploração dos transportes aéreos poderá ainda incrementar a deslocação dos Norte-Arnericanos. De facto já hoje 70 por cento utilizam o avião na sua vinda ao nosso país.
A própria tendência que se afirma de os turistas americanos fazerem grandes circuitos pela Europa poderá constituir um estímulo a que pugnemos para que Portugal (até agora visitado por menos de 10 por cento dos americanos que vêm à Europa) seja incluído nesses cruzeiros.
A presença dos turistas americanos é altamente valiosa, pela percentagem dos gastos que habitualmente realizam e pelo interesse que resulta da obtenção dos dólares.
Franceses. - Depois da Espanha (25 por cento) e da Jugoslávia (22 por cento), foi Portugal o país que acusou maior, taxa de acréscimo de franceses nos últimos anos (15 por cento).
O turismo francês não é dos mais rendosos, podendo dizer-se que uma boa parte busca os países onde a vida é barata, de forma a realizar econòmicamente umas férias.
Fizeram-se em França sondagens sobre as férias dos respectivos nacionais (cf. a revista Études et Conjoncture n.º 5, de Maio de 1962). Tais elementos revelam a partida para férias segundo as idades, a categoria sócio-profissional dos respectivos chefes de família que se deslocam, as comunas de origem, etc., esclarecendo ainda sobre a duração das férias, as épocas do ano em que se gozam, os alojamentos e meios de transporte utilizados e as regiões ou países preferidos.
Refiro estes trabalhos por duas razões: o interesse que há em conhecer o comportamento dos Franceses em matéria turística, até saber do que poderemos esperar quanto a evolução das suas visitas a Portugal; o desejo de entre nós se fazerem idênticas sondagens ou estudos.
No trabalho citado, as férias de franceses no estrangeiro representaram 13 por cento do seu total, ou seja um pouco mais de 2 milhões de indivíduos, assim distribuídos: Itália, 710 000; Espanha e Portugal, 430 000; Suíça, 240 000; Países Baixos, Bélgica e Luxemburgo, 150 000; Alemanha, 140 000; Grã-Bretanha e Irlanda, 110 000; outros países ou circuitos não localizados num único país, 290 000.

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É natural que nos próximos anos um maior número de franceses procure Portugal. Contribuirá para isso o conhecimento ou saturação de outras regiões do Sul da Europa, o nosso baixo custo de vida e o aumento dos seus rendimentos individuais.
Alemães. - Também o «milagre alemão» apoiou uma expansão das correntes turísticas oriundas deste país.
Por exemplo, antes da segunda guerra mundial, mais concretamente em 1937, o tráfego turístico de fronteira assinalava, no total dos estrangeiros, em Itália, 12,4 por cento de alemães. Pois em 3961 eles elevaram-se a 25,5 por cento dos turistas que visitavam a Itália, com 30 por cento de ocupação, em dormidas, nos hotéis e pensões (cf. «Statistica del turismo», Bolletino Técnico Trimestrale de ll'Ento Nazionale Italiano por il Turismo n.ºs 49 e 50).
Por outro lado, os 732 000 alemães que em 1961 visitaram a França representaram 12 por cento do turismo gaulês (cf. Le Tourisme en France, 1961, ed. Comissariat General au Tourisme).
Mas os números relativos a outros países da Europa são igualmente ilustrativos. A Áustria recebeu, ainda em 1961, 3 201 522 alemães, ou seja mais 19,9 por cento do que no ano anterior; a Espanha 480 549. ou soja mais 46,5 por cento do que em 1960; a Noruega 71 000, ou seja mais 42 por cento do que no ano anterior: a Holanda mais 9,9 por cento do que em 1960. num total de 493 625; a Suíça 1 453 635, ou seja mais 15,8 por cento; a Jugoslávia 256 390, ou seja mais 12,3 por cento (cf. Le Tourisme dans les Pays de l'O. C. D. E., já citado).
Com pouco mais de 20 000 turistas alemães em 1961 e um acréscimo inferior a 32 por cento, relativamente a 1960, seria de esperar, dada a sedução dos Germanos pelo sol e pelo mar, que os índices de crescimento fossem mais elevados em Portugal nos anos próximos. Para isso poderia ainda contribuir o aeroporto de Faro e o desenvolvimento turístico do Algarve (cf. quanto ao planeamento do Algarve, o estudo do arquitecto Paulo Cunha, Plano do Valorização Turística do Algarve, publicado pelo Gabinete de Estudos e Planeamento Turístico do S. N. I.).
Ingleses. - No período de 1954-1962 parece que só a Espanha nos excedeu quanto à taxa média no crescimento do número de turistas ingleses (19 por cento para a Espanha, 16 por cento para Portugal).

[Ver Tabela na Imagem]

O significado destes números é, porém, relativo se considerarmos a modéstia do ponto de partida.
Também o turismo inglês, pela média das suas permanências e despesa por turista, justifica os esforços que façamos para o intensificar.
Em números absolutos a nossa posição é hoje modestíssima. Recebemos, em 1961, menos de 34 000 britânicos, quando os números foram de 70 000 na Jugoslávia. 320 000 na Áustria., 690 000 na Suíça, 720 000 na França, 740 000 na Espanha e 1 600 000 (incluindo os excursionistas) na Itália.
A distribuição europeia do turismo britânico revela que ele oscila entre a montanha e a praia, os desportos de Inverno e as águas cálidas do Sul da Europa.
De resto, cerca de 26 milhões de ingleses deslocam-se anualmente para férias, mas no interior das suas ilhas, o que demonstra patriotismo e ... espírito de economia. Assim, a própria irregularidade do clima inglês poderá afectar o afluxo do velho globe-trotter ao continente.
Mas os números continuam a confirmar, nesta heterogeneidade de comportamentos, uma predilecção pelo sol e, pelo mar. Recentemente uma agência de viagens internacional salientava, que a Espanha tinha sido, no ano findo, o país mais popular entre os turistas britânicos, e Palma de Maiorea, visitada por mais de 300 000, tinha substituído Paris como o centro mais procurado pelos britânicos na Europa.
Escandinavos. - É ainda modestíssima a presença de escandinavos em Portugal. Os 5265 suecos que nos visitaram em 1961 representaram apenas um acréscimo de 0,5 por cento relativamente ao ano anterior. No entanto, já em 1961 a Espanha recebia 85 670 suecos, ou seja mais 21,3 por cento do que em 1960, número esse bastante suplantado pelos 100 000 suecos que estiveram no país vizinho em 1962.
No trabalho que tenho citado, Elementos Preparatórios de Um Plano de Desenvolvimento. Turístico para o Período de 1964-1968, aceitam-se possíveis índices de crescimento no afluxo de turistas dos vários países a Portugal, tentando assim estimar-se a sua evolução futura.
Creio revestir-se de interesse dar aqui conta desse cálculo, através do seguinte quadro:

[Ver Tabela na Imagem]

Mas estaremos nós preparados para. um hipotético incremento nos afluxos turísticos? Disporemos de instrumentos externos que o desencadeiam e de infra-estruturas internas que o justifiquem e acolham?
Os meios de política turística desdobram-se habitualmente em aspectos internos (controle, auxílio e execução directa, investigação e ensino, etc.) e externos (propaganda, informação, etc.).
Concretizo, salientando dois conjuntos, cuja importância resulta não só das relações entre os elementos constitutivos, como ainda da posição funcional que um assume perante o outro: os serviços turísticos e os bens turísticos. Os serviços turísticos dependem das infra-estruturas materiais ou burocráticas em que se apoiam. Teremos, no primeiro caso, o exemplo dos transportes ou dos alojamentos e no segundo os serviços propriamente ditos, desde as agências de viagens aos guias-intérpretes. Ora será ainda todo este conjunto que afectará o êxito da política relacionada com os bens turísticos [política cultural, turismo artístico, histórico, científico ou docente, política, de espectáculos ou de diversões, política de negócios (exposições, feiras ou congressos), política balnearia ou, até, política desportiva].
Dentro desta orientação, passo a abordar, sucessivamente, os seguintes pontos: órgãos de política turística; meios de política turística; intercâmbio turístico entre

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a metrópole e o ultramar; planos do fomento turístico; infra-estruturas ao serviço do turismo (transportes ferroviários, rodoviários, navegação marítima, aérea e política de coordenado de transportes); alojamento e alimentação (política hoteleira, outros tipos de alojamento, restaurantes e gastronomia); aproveitamento turístico dos valores culturais; relações entre o embelezamento nacional e o turismo; importância do artesanato para o turismo; turismo de negócios; o desporto e o turismo; política balnearia: a actividade particular e o turismo.
Fora desta sistematização, mas facilmente ligada a muitos dos aspectos referidos, há uma questão prévia que reputo essencial: aquilo que se tem designado por arte de bem receber toda a gente.
No I Colóquio Nacional de Turismo, que sob o patrocínio do S. N. I. se realizou em Lisboa, em Janeiro de 1961, constitui este problema tema de oportuna intervenção.
A nossa candidatura a «país de turismo» liga-se profundamente ao grande problema nacional da educação e do nível do vida.
Referi atrás que as virtudes amoráveis do português constituem um elemento nada despiciendo no cartaz da atracção da nossa terra. Num mundo egoísta e grosseiro, apraz recordar a luminosa síntese do Sr. Presidente do Conselho sobre «aquelas qualidades que se revelaram e se fixaram e fazem de nós o que somos e não outros; aquela doçura de sentimentos, aquela modéstia, aquele espírito de humanidade, tão raro hoje no Mundo; aquela parte do espiritualidade que, mau grado tudo que a combate, inspira ainda a vida portuguesa; o ânimo sofredor; a valentia sem alardes; a facilidade de adaptação e ao mesmo tempo a capacidade de imprimir no meio exterior os traços do modo de ser próprio; o apreço dos valores morais; a fé no direito, na justiça, na igualdade dos homens dos povos». Mas a criação de um ambiente de recepção turística impõe igualmente a eliminação de deficiências vergonhosas, como aquelas que ainda no I Colóquio Nacional de Turismo foram sintetizadas nestes termos:

A mão que se estende à caridade pública, quantas vezes por vício ou artimanha; o espectáculo de indignidade do vultoso carrego à cabeça ou da tracção humana, pelas ruas ou estradas de pesados veículos; a prática, perigosa e anti-higiénica, do pé descalço; o gesto repelente de cuspir para a via pública ou para o chão de edifícios públicos, praticado até por agentes da autoridade; o exercício aviltante de demonstrações pseudo-acrobáticas, como à volta dos paquetes chegados ao Funchal, na colheita submarina de moedas arremessadas pelos passageiros; a indiferença perante os enxames de moscas, a conspurcarem alimentos, louças e roupas e a assaltarem o visitante; a multidão, sobretudo nas duas principais cidades do País, de homens, mulheres e crianças na venda ambulante de jornais, de lotarias, de revistas, de mapas, de lâminas de barbear, de sabonetes, de pentes, de escovas, de esticadores para colarinhos, de canetas, de brinquedos, de lenços o de tantas coisas mais, até de comestíveis, em especial o peixe, expostos ao sol e às poeiras, em miseráveis padiolas; a frequência de engraxadores ambulantes de aspecto indecoroso, agravada pela insistência na oferta dos seus serviços; as inscrições murais, a que não falta, por vezes, a nota de obscenidade - tudo isto, e não é pouco, constitui exemplo do elementos perturbadores, alguns deles fortemente perturbadores, de ambiente de recepção turística nacional e que encontram a sua origem primária no nosso nível de educação.
Não se poderá dizer que são exíguos em Portugal os órgãos de política turística.
No sector central existe o Secretariado Nacional da Informação, Cultura Popular e Turismo, o Fundo Nacional de Turismo e; noutros planos, o Conselho Nacional de Turismo e a Corporação de Transportes e Turismo.
No sector regional ou local destacam-se, como órgãos de turismo, as comissões regionais, municipais e as juntas de turismo.
A estrutura corporativa conhece ainda o Grémio Nacional das Agências de Viagens, o Sindicato Nacional dos Guias e Intérpretes de Portugal, a União dos Grémios da Indústria Hoteleira e Similares do Norte e a União dos Grémios da Indústria Hoteleira e Similares do Sul.
Outras duas organizações públicas, a Mocidade Portuguesa e a Fundação Nacional para a Alegria no Trabalho, embora em domínios especiais, dão o seu contributo ao turismo.
Finalmente, no estrangeiro, há, por um lado, a salientar a existência das Casas de Portugal e centros de informação e, por outro lado, o recurso a organizações especializadas, como a U. I. O. O. T. (União Internacional dos Organismos Oficiais de Turismo), a F. I. A. V. (Federação Internacional das Agências de Viagens) e a Associação Internacional de Hotelaria.
Poderia dizer-se que com todo este cabedal de organismos e recursos as coisas corressem o melhor possível; mas talvez seja também por tamanha multiplicidade que o nosso esforço é descoordenado e incompleto.
Estou convencido de que uma direcção de serviços com a estrutura e os recursos de que dispõe a Direcção de Serviços de Turismo, do Secretariado Nacional da Informação, Cultura Popular e Turismo, é insuficiente para se desempenhar capazmente das incumbências postas na base III da Lei n.º 2082.
Nesta solução deficiente de uma direcção de serviços, o turismo em Portugal conta apenas com duas modestas repartições (Repartição do Turismo Geral e Repartição da Indústria Hoteleira). O director dos Serviços de Turismo acumula, de resto, a chefia da Repartição do Turismo Geral.
Cada repartição é constituída por duas secções (Repartição de Turismo Geral - Secções de Turismo Nacional e das Relações Internacionais e Estudos; Repartição da Indústria Hoteleira - Secções de Assistência e Inspecção Hoteleira e de Planificação e Contencioso) a que incumbem numerosas actividades.
À Secção de Turismo Nacional pertence o que se relaciona com os órgãos locais de turismo, as agências de viagens, os transportes e comunicações, os parques de campismo, os concursos e iniciativas turísticas, os postos de turismo, os guias-intérpretes, os subsídios, prémios e publicidade, os serviços gráficos, os serviços de expedição, a edição de publicidade turística, o material de propaganda e os demais assuntos relativos à actividade do turismo interno.
À secção das Relações Internacionais c Estudos ocupa-se dos organismos internacionais do turismo, dos organismos oficiais no estrangeiro (Casas de Portugal, centros e representações diplomáticas), do serviço de recepção a estrangeiros, da assistência a congressos e reuniões internacionais, da assistência a férias e exposições no estrangeiro, do serviço de traduções, das estatísticas, dos estudos e inquéritos, da publicidade no estrangeiro, do arquivo de publicações estrangeiras e dos assuntos diversos relativos a actividades do turismo externo.
À Secção de Assistência e Inspecção Hoteleira pertencem as atribuições ligadas à assistência aos estabelecimentos hoteleiros do Estado, à assistência aos estabele-

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cimentos hoteleiros particulares, ao serviço de inspecção, licenciamento e classificação de hotéis, no equipamento hoteleiro, às reclamações e sugestões e ao serviço de tabelamento.
Finalmente, a Secção de Planificação e Contencioso ocupa-se dos serviços de planificação, dos projectos e financiamentos de utilidade turística, do serviço contencioso, da secretaria da comissão de obras e melhoramentos da zona de jogo do Estoril e ainda de outras actividades.
Não admira assim que, perante a magnitude destas tarefas, as quatro secções se reconheçam impotentes ou prisioneiras de uma burocracia a que não poderão dar tempestivo andamento.
Impõe-se, assim, rever a estrutura central do turismo, dar-lhe uma dignidade compatível com a sua importância e dotá-la de pessoal em número e aptidões capaz de se desempenhar das múltiplas e cada dia. renovadas exigências que o turismo nos anos futuros porá.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Referi atrás a organização central do turismo espanhol com o Ministério da Informação e Turismo e, dentro deste, a Subsecretária do Turismo, com duas direcções-gerais. Poderia ainda salientar a atenção que este problema mereceu em França ou até, num plano mais modesto, mas igualmente mais semelhante ao condicionalismo português, o que se passa na Grécia. Com as suas catorze divisões e repartições, integradas por várias secções e serviços, a organização nacional do turismo grego poderia ser uma base de trabalho para o estudo da renovação dos nossos serviços centrais.
Não obstante esta deficiência estrutural e as muitas limitações que os serviços centrais de turismo têm conhecido, não se devem minimizar as realizações que, mesmo para além das actividades de rotina, se têm desenvolvido ultimamente entre nós. Exemplifique-se com o já referido I Colóquio Nacional de Turismo (Janeiro de 1961) a Campanha do Turismo de Inverno (Setembro de 1961), o Concurso Nacional de Cozinha e Doçaria Portuguesa (Junho-Julho de 1962), a Reserva Experimental de Caça do Escatelar, o I Concurso de Recepcionistas, o Concurso da Melhor Refeição ao Melhor Preço, a Campanha de Valorização Turística dos Moinhos de Portugal, a Exposição de Equipamento Hoteleiro, a criação, em Agosto de 1962, do Gabinete de Estudos e Planeamento Turístico, as festas da Páscoa de 1963 (Abril em Portugal), o início do Plano de Assistência Técnica da O. C. D. E. (Junho de 1963), a participação da Reunião Internacional da U. I. O. O. T. em Roma (Setembro de 1963), a assembleia geral da Academia Internacional do Turismo, em Setembro de 1963, em Lisboa, e o Congresso da F. I. A. V., também realizado em Lisboa (Outubro de 1963).
Embora noutro plano e com a grande projecção que resulta da responsabilidade do seu autor e dos propósitos então referidos, cabe ainda aqui destacar a circunstanciada exposição que o Subsecretário da Presidência do Conselho fez, no dia 7 de Janeiro findo, sobre o desenvolvimento do turismo em Portugal.
Mas também no plano regional ou local as insuficiências do actual sistema são notórias.
Concebidas há algumas dezenas de anos para o nosso turismo caseiro e dando satisfação a devotamentos, vaidades ou rivalidades locais, as comissões e juntas de turismo acusam a inclemência da própria evolução da vida.
A modéstia da sua actuação pode relacionar-se com a exiguidade das disponibilidades financeiras, a falta de servidores devotados ou especializados, a, visão acanhada, por demasiadamente regional, dos responsáveis. Mas todos estes defeitos atestam que o fomento do turismo se deve enquadrar nos propósitos de ampla regionalização que hoje se impõem às mais variadas actividades económico-sociais.
A Lei n.º 2082 (4 de Junho de ]956), ao considerar a criação de regiões de turismo, e o Decreto n.º 41 035, ao regulamentar mais pormenorizadamente a matéria, atestaram um esforço que seria injusto silenciar.
Mas logo surgiram dificuldades no que respeita à, delimitação das zonas, à exiguidade das receitas dos novos organismos, à colaboração com as câmaras municipais, aos conflitos de competência.
Creio existirem actualmente em Portugal 30 juntas de turismo, 48 comissões municipais e apenas 8 comissões regionais (Chaves, Leiria, serra da Arrábida, serra da Estrela e serra do Marão, no continente; Horta, ilha Terceira, ilhas de S. Miguel e Santa Maria, nas ilhas adjacentes).
O Algarve, com os seus modestos 5450 km2, a sua relativa unidade turística, mesmo na complementaridade das zonas da serra, do barrocal o do litoral, é um exemplo da desordem em que se tem vivido de excessiva proliferação, se considerarmos os onze organismos locais de turismo aí existentes.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Jorge Correia: - Fazem falta, apesar disso!

O Orador: - Mesmo quando na organização turística se consagrem soluções regionais mais adequadas, haverá ainda que evitar os conflitos que resultam da intervenção de variados serviços públicos.
Trata-se de uma praia? Pois não se encontrarão ainda com o direito de dizer uma palavra, para afirmar a sua autoridade, a capitania do porto, os serviços hidráulicos, a Junta Autónoma dos Portos, a Junta Autónoma de Estradas, os serviços de urbanização, os monumentos nacionais, etc.?
Creio, em suma, que neste domínio deveríamos ter presente:

1.º Uma definição geográfica da respectiva zona turística, provavelmente em correspondência com a região aceite para um plano de desenvolvimento económico-social;
2.º A outorga à respectiva comissão regional de maior autoridade, melhor ligação aos serviços centrais de turismo, possibilitando-lhe ainda uma intervenção mais eficaz naquilo que, pela natureza dos problemas, não se pode confinar a um restrito âmbito local;
3.º A possível manutenção de órgãos locais, com mais esbatida intervenção nos problemas regionais, mas ainda assim colaborantes ou delegados do esforço de desenvolvimento turístico regional e nacional.

Além da actividade dos serviços de turismo, definida nos seus planos anuais de acção, e do Fundo de Turismo, expressa nos respectivos relatórios, os últimos tempos têm dado oportunidade ao recurso, entre nós, a meios especiais de fomento da política turística. Além dos trabalhos do Gabinete de Estudos e Planeamento Turístico, do Secretariado Nacional da Informação, várias vezes referido, poderíamos destacar a tal propósito os programas de assistência técnica estabelecidos com a O. C. D. E., a Comis-

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são Mista Luso-Suíça, a Comissão de Cooperação Económica Luso-Alemã e, no plano interno, a possível acção do grupo de trabalho de turismo integrado no Secretariado Técnico da Presidência do Conselho.
Vou recorrer a alguns números paia se ter uma ideia da projecção dos serviços centrais do turismo.
O orçamento da Direcção dos Serviços para 1963 totalizou 11 000 contos, o do Fundo de Turismo 50 000 contos e o dos serviços oficiais no estrangeiro 12 000 contos. Um montante de 73 000 contos por ano não se poderá dizer exagerado, se considerarmos a importância económica do turismo e sobretudo o muito que há a fazer para o seu desenvolvimento.
O Fundo de Turismo tem sido, de resto, um grande recurso, dada a exiguidade das dotações da Direcção dos Serviços.
Desde 1957 a 1962 movimentou cerca de 135000 contos.
Por seu intermédio - de 1957 a Novembro de 1963 - fizeram-se 131 700 contos de financiamentos à indústria hoteleira. Das suas receitas saíram, desde 1957 a Outubro de 1963, 2281 contos para publicidade turística.
E que dizer da presença do turismo português nos centros estrangeiros?
Que eu saiba, dispomos de um Centro Português de Informação em Genebra, da Casa de Portugal em Londres, do Centro Português de Informação em Bona, da Delegação do Centro de Bona em Hamburgo, da Casa de Portugal em Nova Iorque, da Casa de Portugal em Paris, de Centro Português de Bruxelas, do Centro Português de Informações de Roma e do Centro de Turismo de Portugal no Rio de Janeiro.
Trata-se de uma presença modesta, se a compararmos com o que atrás referimos relativamente à Espanha, ou ainda, por exemplo, com o que se passa em França. Já em 1961 (cf. Le Tourisme en France, cit.) os serviços franceses de turismo no estrangeiro tinham representação em dezasseis grandes cidades da Europa, dezoito da América, duas da Oceânia, duas da Ásia e uma da África.
É certo que os nossos serviços de representação diplomática no estrangeiro poderiam prestar o seu contributo à propaganda turística de Portugal. De qualquer modo, uma presença mais efectiva nos países escandinavos, no Canadá, noutras regiões dos Estados Unidos, ou até nos grandes centros turísticos da Europa, poderia fomentar o afluxo dos turistas ao nosso país.

O Sr. Gamboa de Vasconcelos: - Muito bem!

O Orador: - A informação e propaganda de Portugal no estrangeiro é, de resto, um desafio ao nosso engenho e, capacidade de acção. Creio ser este um dos sectores fundamentais para o desenvolvimento do turismo em Portugal. Revistas, boletins de informação, folhetos e prospectos, artigos em jornais e revistas, anúncios, cartazes, selos, documentários cinematográficos, rádio e televisão, montras, conferências, fotografias, visitas de jornalistas, de agentes de viagens ou de outras personalidades, tudo são expedientes utilizados em larga escala pelos países preocupados com o turismo.

O Sr. Manuel João Correia: - Muito bem!

O Orador: - Todo o nosso esforço sairá diminuído se não o apoiarmos na publicidade do que poderemos oferecer aos estrangeiros.
Deve, de resto, merecer a melhor ajuda a propaganda turística feita pelas entidades particulares.
O artigo 24.º do Decreto n.º 34 143, de 26 de Novembro de 1944, determinou que nenhuma publicação de turismo pudesse circular sem o visto prévio do Secretariado Nacional da Informação, Cultura Popular e Turismo. A defesa da ética e forma das publicações tem, de facto, o seu interesse. Mas esta exigência não se deve transformar em prepotência. Por outro lado, os serviços públicos deverão dar o melhor estímulo ao bom gosto através das suas próprias edições.
Mas esta intensificação publicitária assume mesmo no interior de Portugal um aspecto que merece especial atenção: o da propaganda do ultramar na metrópole ou, ainda, o contrário.
Tal sugestão aconselha ainda que me detenha com mais largueza na importância do intercâmbio turístico entre a metrópole e o ultramar.
A política turística destas duas partes da Nação Portuguesa é orientada por organismos diferentes (o Secretariado Nacional da Informação e a Agência-Geral do Ultramar), motivo por que não tem existido um plano de acção conjunta. A própria cooperação dos dois organismos no estrangeiro tem visado mais objectivos políticos, de defesa da posição de Portugal no ultramar, do que turísticos.
Ainda assim o agente-geral do Ultramar é convidado nas reuniões do Conselho Nacional de Turismo e no Palácio Foz foi, há algum tempo, instalado um posto de informação da Agência-Geral.
Tudo isto, contudo, é muito insuficiente.
O Decreto-Lei n.º 42 194 criou nas províncias ultramarinas os centros de informação e turismo.
Mas quem visita Moçambique ou Angola facilmente se apercebe do muito que há a fazer para tornar eficaz uma intervenção oficial na valorização o desenvolvimento do turismo.

O Sr. Manuel João Correia: - Muito bem!

O Orador: - Os centros de informação e turismo têm-se ali dispersado em actividades impostas, é certo, pela delicadeza do momento que vivemos. As disponibilidades em pessoal à altura das exigências do turismo, em matéria de controle, investigação, ensino, estímulo, auxílio, propaganda e acção directa, são praticamente inexistentes.
No entanto, Moçambique, mercê da proximidade da República da África do Sul e das Rodésias, da excelência das suas condições naturais e da iniciativa particular, já hoje ocupa uma posição de relevo no turismo africano.
A balança do turismo deu um contributo positivo a balança de pagamentos nos anos de 1957, 1958 e 1959, respectivamente de 35 000, 48 000 e 26 000 contos. Mesmo os saldos negativos acusados posteriormente são mais resultado de uma fuga ao controle cambial, do que de uma diminuição no afluxo de estrangeiros.
Toda a costa de Moçambique é uma sucessão de praias maravilhosas.
Ponta do Ouro, a baía de Lourenço Marques, S. Martinho de Bilene, João Belo, Zavora, Vilanculos, Inhassoro, ilhas do Bazaruto e Santa Carolina, Beira, Pebane, Mossuril e Porto Amélia poderiam ser recordadas como testemunho desta afirmação.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Mas também as regiões de meia altitude, como a Namaacha, ou de montanha, como Tsetserra, Penha Longa, Angónia (Domué), Milange, Gorué (Namuli), Ri-

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baué ou Malema, constituem cartazes iuvulgares e inolvidáveis.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O parque da Gorongosa, o empreendimento de Vilanculos, os safaris, os hotéis do Lourenço Marques, da Beira e de João Belo, a excelente exploração das linhas da D. E. T. A., os serviços de táxis aéreos o voos não regulares, a experiência de Bilene, constituem já hoje valiosas infra-estruturas turísticas da África Oriental Portuguesa.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mas, tal como Moçambique, também Angola se pode abonar com as suas riquezas cinegéticas, a exuberância da vegetação, a majestade das quedas de água, a sugestão éden iça da região da Gabela, a aprazível actividade humana de Nova Lisboa, a estranha sedução do deserto de Moçâmedes, o inesquecível espectáculo da Tundavala e toda a formosura de Sá da Bandeira.
E recordando ainda a Guiné, com o seu matiz de raças e folclore, a beleza de Peeixe ou o ineditismo dos Bijagós, Cabo Verde. S. Tomé ou as distantes terras portugueses da Ásia e Oceânia, surge naturalmente a pergunta:
Quando se disporão os Portugueses a conhecer melhor Portugal? Quando trocarão as suas viagens na Europa por uma visita ao Portugal de além-mar?
Não se pode dizer insignificante o número de portugueses que se deslocam ao estrangeiro. Já atrás salientei que em 1961 a balança do turismo acusou no débito um montante de 511 000 contos. O seguinte quadro indica, ainda para 1961, o número de. turistas portugueses que visitaram os países que no mesmo se assinalam ou aí utilizaram hotéis (cf. Le Tourisme dans les Pays de l'O. C. D. E., cit.):

[Ver Tabela na Imagem]

Este reparo deve, aliás, ser extensivo às preferências nas visitas dos Portugueses do ultramar.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Convirá evitar o que &e passou com os Brasileiros. Tudo poderia levar a supor que os laços de história, raça- e linguagem constituíssem incentivo para que os Brasileiros visitassem Portugal. No entanto, a sua preferência por outras centros de turismo europeu, nomeadamente Paris, é uma realidade que já vem, pelo menos, do tempo em que o nosso Eça de Queirós escrevia.
Quando há anos se discutiu na Assembleia Nacional a lei de autorização do II Plano de Fomento, defendi a importância e oportunidade de se considerar também o planeamento do turismo. As realidades continuaram a dar-me razão e os serviços oficiais parece estarem agora mais atentos a este problema. A criação do Gabinete de Estudos e Planeamento Turístico, a cujo labor se ficam devendo já alguns trabalhos que tenho citado [Rapport d'Expertise. Plano de Desenvolvimento Turístico para II Período de 1964-1968, Plano de Desenvolvimento Turístico do Algarve (estudo preliminar) e Subsídios para Uma Análise da Oferta e da Procura], foi uma medida oportuna, pela importância de que se pode revestir o seu contributo. De igual modo, a instituição de um grupo de trabalho de turismo no Secretariado Técnico da Presidência do Conselho poderá completar, em certo sentido, os propósitos de planificação.
Sabe-se estar ainda em curso a elaboração de um plano de valorização da Madeira, a que se seguirão outras planos de aproveitamento turístico à escala regional, e a realização de um grande inventário turístico. Será de grande interesse a inventariação das características turísticas do território, considerando os pólos de atracção turística actuais e potenciais, as redes de comunicação e transportes, o equipamento de recepção e o equipamento termal, o equipamento de distracção e a possibilidade, com base nestes elementos, de se proceder a uma correcta divisão do território em regiões turísticas.
A importância dos preços não deve ser igualmente minimizada. Daí a vantagem em estudar a nossa capacidade de concorrência turística, comparando os preços da oferta turística portuguesa com a de outros países - custos de chegada à fronteira, de alojamento, de alimentação, de transportes no interior do País, de distracção, etc.
No decorrer desta intervenção tenho salientado alguns números relacionados com o turismo externo.
Creio também que o esforço de inventariação se deve alargar a um estudo circunstanciado deste turismo. Assente uma definição de turista e um período de análise, convirá elaborar estatísticas e interpretar os seus elementos.
Mas o turismo interno não pode igualmente ser descurado. Já atrás referi estudos realizados em França em que este importante aspecto também é considerado. Ora a programação do desenvolvimento turístico preocupar-se-á não só com os movimentos turísticos dos Portugueses entre as várias partes do território nacional (continente, ilhas adjacentes e ultramar), como com as deslocações dentro de cada território.
Tudo isto nos permitirá, em suma, formular uma política turística nacional onde se definam os objectivos, se equacionem os meios actuais ou previstos, se afirme a importância do turismo para a economia (contribuição do turismo para o rendimento nacional, contribuição do turismo estrangeiro para a balança de pagamentos, investimentos em turismo, incidências no emprego, recursos fiscais provenientes do turismo e incidências gerais sobre a agricultura, indústrias e serviços).
Um exemplo do interesse votado pelo planeamento económico ao turismo reside no TV Plano francês (1962-1965).
Inserindo-se numa continuidade iniciada pelo I Plano (1946-1952-1953), cujos objectivos foram de reconstrução e renovação, e prosseguida pelo II Plano (1954-1957), distinguido pela produção de qualidade e competitiva, e III Plano (1958-1961), que se revelou numa expansão dentro do equilíbrio financeiro, o IV Plano francês é deliberadamente económico-social, dando uma especial priori-

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dade à educação nacional, ao equipamento urbano o rural, à saúde, à cultura e à investigação (cf., por exemplo, 1eme Plan, número especial de La Documentation Française Illustrée. Outubro-Novembro de 1962).
O IV Plano asseguram apoio à possibilidade de um aumento anual de 4 por cento no número de franceses que fazem viagens de férias (40 por cento da população em 1963, contra 30 por cento em 1958), permitindo ainda em 1965 um afluxo de 7 milhões de turistas estrangeiros, o que representará um saldo na balança do turismo do 290 000 milhões de dólares.
O reconhecimento do tempo perdido ou deterioração, relativamente ao equipamento turístico, conduziu a uma acção mais directa do Estado.
Tal intervenção pode sintetizar-se nestes termos:
1.º Desenvolvimento da capacidade hoteleira, aumentando o acréscimo anual dos quarto? de 3000-4000 para 4500-5000, e remodelação do equipamento existente de 12 000 - 13 000 quartos para 18 000 - 20 000, também anualmente.
Os processos utilizados são as facilidades de crédito, as isenções fiscais ou ainda fórmulas mais directas, como as sociedades de economia mista ou a construção pelo próprio Estado e autarquias locais.
2.º Fomento do turismo social mediante a criação de casas familiares, colónias de férias, acampamentos, albergues e centros para a juventude, hospedarias rurais, etc.
O seguinte quadro dá uma ideia dos propósitos neste sector (cf. número citado de La Documentation Française Illustrée):

[Ver Tabela na Imagem]

3.º Abertura o equipamento de novas regiões ou centros de turismo.
A montanha ocupa o primeiro lugar, com as estações de alta altitude de Briançonnais e Alpes do Sul. Criar-se-ão três novas estações de primeira categoria em Flaine (Alta Sabóia), Saint-Martin de Belleville (na Sabóia) e o conjunto de Ubaye-Verdon (nos Baixos Alpes).
Nas costas francesas construir-se-ão portos e abrigos para a navegação desportiva e de recreio, começando pela Bretanha do Sul e Costa Azul.
A saturação da Costa Azul, prevista para 1970, conduz à criação de novas estações balneares no Var, nas costas do Languedoc e de Landes e ao arranjo de estações de águas interiores. Aix-les-Bains, Vichy, Divonne-les-Bains e sobretudo os locais das barragens da Electricité de France, como Serre Ponçon, poderão ser referidos a tal propósito.
Eis os investimentos estimados para estas estações de turismo (em milhões de NF):

Planos de aproveitamento das zonas de
águas interiores ....................... 18
Estabelecimentos termais ............... 32

ar .................................... 50
Montanha ............................... 55

Podemos ainda concluir que o desenvolvimento turístico previsto, constitui, pela sua repartição geográfica, um elemento de alto interesse para a reanimação económica de certas regiões francesas hoje mais desfavorecidas.
Os transportes, na variedade das soluções ferroviárias, rodoviárias, fluviais, marítimas e aéreas, constituem factor de primordial importância para o desenvolvimento do turismo.
Ora a natureza das realizações em curso, no que se refere a este aproveitamento ou valorização com fins turísticos, é muito incipiente entre nós.
O inventário turístico que está projectado realizar-se não deixará, portanto, de se preocupar com a melhor articulação em sector de tanto relevo.
Outros testemunhos da mesma preocupação residiram em algumas teses apresentadas ao E Colóquio Nacional do, Turismo, como a do nosso antigo e ilustre colega Eng.º Neves Clara sobre «Estrada, fonte de turismo» e as relativas ao «Interesse turístico da ponte sobre o Tejo, com ligação ferroviária» e a demonstração de que «as tarifas aéreas para Portugal são mais caras por milha/passageiro do que para Espanha».
Ainda nas relações entre os transportes rodoviários e o turismo seria mister ter presente o que se refere ao excursionismo (cf. o Decreto-Lei n.º 44 781, de 7 de Dezembro de 1962, sobre a autorização de autocarros de matrícula estrangeira), ao aluguer de automóveis sem condutor (cf. o Decreto n.º 41 806, de 8 de Agosto de 1958) e aos circuitos turísticos.
O número de automóveis de aluguer sem condutor licenciados é de 869 e os circuitos turísticos no ano findo atingiram 33 explorações.
Em matéria ferroviária poderá ainda citar-se a acção desenvolvida através da Euraipass; em matéria do navegação marítima, a colaboração com as empresas de navegação para a propaganda turística (v. g. a Campanha de Publicidade Conjunta da Madeira, com o apoio da Casa de Portugal em Londres); e, finalmente, em política de transportes aéreos, o recurso ao I. T. A. (Instituto do Transporte Aéreo) e a cooperação com as companhias de navegação aérea, traduzida na montagem de exposições e de montras, organização de festivais de folclore, programas de visitas de agentes de viagens e jornalistas especializados em turismo.
Mas qual será concretamente o panorama quanto a caminhos de ferro, estradas, transportes marítimos e aviação?
Já há anos o saudoso Prof. Amorim Girão (cf. Geografia de Portugal) acentuava que a análise em globo do nosso mapa das estradas e vias férreas faz ressaltar antes de tudo a importância das zonas de contacto da terra e do mar que polarizam os maiores feixes da circulação. Em Portugal não há propriamente um sistema centralizado de comunicações, como sucede em Espanha ou na França: Estado periférico, foi a costa marítima que se tornou elemento natural de atracção das regiões situadas mais no interior.
Não se poderá dizer que esta predisposição contrarie os movimentos turísticos, na medida em que o mar constitua o nosso principal cartaz. Outra coisa será, contudo, saber se tais infra-estruturas serão suficientes quantitativa e qualitativamente. Acresce, de resto, que também as regiões do interior têm os seus cartazes a oferecer e alguns deles de bastante interesse.

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A dimensão da rede dos transportes interiores do continente pode apreender-se dos seguintes números (cf. Anuário Estatístico de 1962):

Caminhos de ferro: 3597 km explorados, dos quais 3571 km pela Companhia. Portuguesa e 26 km pela Sociedade Estoril.
Estradas: 28 329 km, dos quais 37 626 km de nacionais e 10 703 km de municipais.

Quanto às vias aquáticas interiores, calcula-se em 532 km a extensão que permite navegabilidade a barcos até 10 t de carga.
A debilidade da nossa infra-estrutura ferroviária era aqui há anos (cf. o trabalho de Faria Lapa e Torroais Valente sobre Industrialização e Transportes no Continente Português, apresentado ao II Congresso dos Economistas Portugueses) objecto do seguinte comentário:

De facto, com os 52,1 m/km2, situa-se o País em plano bastante inferior a um elevado número de países europeus, detentores estes de redes, na verdadeira acepção da palavra. Repare-se no Sarre, Bélgica, Grã-Bretanha, Alemanha Ocidental, Luxemburgo, Holanda, Suíça o França - para não citar outros países - todos eles dispondo de redes mais densas que a de Portugal um apreciável número de vezes [...]. O sistema ferroviário português tem por conseguinte uma característica marcadamente lacunar, o que bem se pode avaliar ao analisar-se o relatório da comissão encarregada da elaboração do Plano geral da rede ferroviária do continente (1927), no qual se previa a construção de 3700 km de linhas a adicionar a 3411 km então existentes.

A distribuição regional é, de resto, bastante desequilibrada. Enquanto a densidade ferroviária (metros de via por quilómetro quadrado) é de 139,4 no Porto, 139,4 em Aveiro e 121,5 em Lisboa, desce para 25,6 em Castelo Branco, 33,8 na Guarda e 37,8 em Faro.
Estas insuficiências reafirmam-se, de resto, no tráfego de passageiros.
O seguinte quadro, relativo a 1957, indica os passageiros-quilómetro nos vários países da Europa (cf. Besoins et Moyens de l'Europe, cit. capítulo «Révolution des Transports»):

[Ver Tabela na Imagem]

O tráfego de passageiros é mais pronunciado nas linhas da região litoral, nomeadamente nas afluentes a Lisboa e Porto.
Já no trabalho citado sobre a Industrialização e Transportes no Continente Português se afirmava que «com base nos elementos de que se dispõe, pode verificar-se que a parte do tráfego de passageiros em todo o País, atribuível à linha do Norte e às linhas suburbanas de Lisboa e Porto, atinge cerca de 50 por cento».
Números mais recentes, embora de significação reduzida, são os publicados no Anuário Estatístico de 1962 sobre o tráfego de passageiros nas linhas da C. P. As linhas do Oeste. Norte, Sul e Minho detêm forte percentagem de bilhetes vendidos, como se pode aperceber do seguinte quadro:

[Ver Tabela na Imagem]

Com os seus 42 000 km de vias férreas, as suas 10 000 locomotivas e auto-rails, os seus 600 milhões de passageiros transportados anualmente e os records de velocidade (BB 9004, com 331 km/h), a França utiliza largamente o caminho de ferro como transporte de turismo. Dos viajantes provenientes do estrangeiro, com destino à França, 3 513 000 utilizaram, em 1961, o caminho de ferro. Quem. de resto, não sabe que o Mistral cobre os 512 km que separam Paris de Lião a 128 km à hora, ou que o Snd-Express, tão lento na Península Ibérica, percorre os 780 km de Paris à Costa Basca a 121 km à hora, ou ainda que entre Paris e 100 cidades de interesse a velocidade média dos trens é superior a 100 km/h?
O exempo da Suíça é também significativo. A riqueza do país em energia hidroeléctrica, o perfil das estradas, desfavorável aos transportes automóveis, estimularam o desenvolvimento das vias férreas. Uma exploração rentável tem permitido a substituição do material antigo. A coordenação do rail e da estrada realiza-se graças a um acordo de cartel que prevê uma repartição das mercadorias a transportar (cf. «La Révolution des Transports», in Besoins et L'Europe, cit.).
O fomento do turismo põe aos caminhos de ferro particulares obrigações (cf., por exemplo, Arrillaga. Sistema de Política Turística, pp. 116 e segs.). Sem pretender uma enumeração exaustiva, poderia aqui falar-se de um aumento de velocidade (apoiada na electrificação, na utilização de locomotivas mais potentes, na melhoria das vias, na existência de vagões adequados, na diminuição no número e duração das paragens, nas composições invariáveis); de uma maior comodidade e segurança para o passageiro (harmonizada com um sistema automático de sinais, com a utilização de bons freios, com as multiplicações de modernos e confortáveis vagões metálicos, com a valorização dos vagões-restaurantes, vagões-camas e pull-mans, com os vagões directos nas formações compostas, com o aumento na frequência dos serviços e sua regularidade, com a utilização de automotoras, etc.); e de maiores

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rendimentos na exploração ainda com um apoio no aumento das receitas e diminuição das despesas.
O cabo do Algarve pode ser apresentado como exemplo do que há a fazer entre nós.
No Plano de Valorização Turística do Algarve escreveu, a tal propósito, o seu autor:

Das localidades algarvias com interesse turístico é Albufeira a que melhor e mais directamente é servida pelos comboios, tendo em consideração os traçados actuais e os horários que se praticam. Considerar-se-ia, pois, que as praias que se localizam no âmbito do terminal de Times deveriam, no aspecto das disposições a tomar quanto ao aproveitamento do tráfego por via férrea, merecer imediata atenção, para que este meio de transporte contribua de forma aceitável para a movimentação de turistas. Só nesta base se julga que deveria assentar a publicidade da C. P., apoiando-se nas localidades deste sector central da região algarvia, e não indiscriminadamente, como hoje se propõe no esplêndido folheto de propaganda que está em distribuição.
Com efeito, constatamos que são três os comboios que, diariamente, partem de Lisboa (Terreiro do Paço) para o Algarve, a que corresponde, em sentido inverso, número igual.
Só um destes comboios faz o trajecto Lisboa-Albufeira, incluindo a travessia do Tejo, em 5 horas e 25 minutos; os outros dois excedem 7 horas e 30 minutos. Registam-se, portanto, médias muito baixas, inferiores a 60 km/h., o que não pode, nestas condições, interessar à criação de afluxo turístico sem que se promova a melhoria geral necessária. Há, portanto, toda a conveniência em, numa primeira fase, encurtar o tempo do percurso no troço Lisboa-Albufeira, se não for possível servir bem, ferroviàriamente, todo o Algarve. Cuidar-se do sector central da região algarvia, compensá-la-ia de ser pouco favorecida pelas condições de tráfego por estrada.
As tarifas combinadas e as de bilhetes quilométricos, estes apenas vendidos no estrangeiro, são disposições correntes que muito beneficiariam o turismo no Algarve se as condições de penetração ferroviária nesta província fossem melhoradas. Assim, parece que a C. P. pensa na criação de uma tarifa de concepção revolucionária, Eurail Pass. Esta tarifa foi acordada entre as principais administrações ferroviárias europeias o é destinada «exclusivamente ao turista americano, e por isso os bilhetes ao seu abrigo só podem ser adquiridos pelos residentes nas Américas». «A criação desta tarifa traduz notória preocupação das caminhos de ferro europeus em incrementar o afluxo turístico americano, conscientes do seu alto valor como divisas, e da importância da sua repercussão na economia europeia».
Esta fórmula de tarifa assegura a viagem por caminho de ferro, em 1.ª classe, por um, dois ou três meses, válida em todas as vias férreas comparticipantes da Eurail Pass, num total superior a 140 000 km de percurso. O passe por um mês custa no dólares, ou seja, cerca de 3000$.

E que dizer das estradas em Portugal?
O incremento do tráfego automóvel é ura dos acontecimentos mais notáveis na Europa das últimas décadas.
Nos anos de 1950 a 1957 o número de carros de turismo aumentou de 153 por cento e o dos camiões e autocarros de 71 por cento, para atingir, respectivamente, os totais de 15,6 e 4,9 milhões de unidades. A estes números haveria, de resto, a acrescentar os 39 milhões de veículos de duas rodas que em 1958 utilizaram as estradas da Europa ocidental.
Pode dizer-se que os índices de expansão dos veículos ultrapassaram em muito os índices de expansão do produto nacional bruto e da produção industrial. Se nos reportarmos ao citado período de 1950-1957, poderemos assinalar as seguintes percentagens de acréscimo (cf. «Révolution des Transports», cit.):

[Ver Tabela na Imagem]

As estradas da velha Europa, concebidas para outras épocas ressentem-se profundamente dos novos condicionalismos. Dos 2 100 000 km de estradas existentes apenas 1 230 000 km são macadamizados ou alcatroados. Acresce que muitas delas são sinuosas e quase todas estreitas. Ainda em 1957 eram apenas 3400 km os percursos da circulação rápida o sete os países detentores de auto-estradas que de resto, na sua maior extensão pertenciam à Alemanha. Quando em 1959 foram abertos à circulação alguns troços da Auto-Estrada Londres-Birmingham, podia recordar-se que nos últimos 80 anos não tinha sido construída qualquer nova via de acesso à grande metrópole da Inglaterra.
Eis um dilema a que a Europa não pode fugir: o da modernização das suas estradas e construção de novos traçados.
Ora esta regra é particularmente imperiosa para Portugal.
A densidade rodoviária do nosso país é modesta no conjunto europeu, a distribuição regional é desequilibrada, o estado das estradas é menos do que regular.
Há poucos anos a Bélgica tinha 3015 III de estrada por quilómetro quadrado de superfície, a Dinamarca 1348, a França 1306, a Grã-Bretanha 1240, a Suíça 1218, a Holanda 1188, a Irlanda 1153, a Alemanha Ocidental 1011 e Portugal sòmente 335.
Mas a própria densidade rodoviária dos diferentes distritos do continente é muito variada (cf. o citado trabalho Industrialização e Transportes no Continente Português). Se o Porto tinha 996 III de estrada por quilómetro quadrado de superfície, Aveiro 803, Braga 707 e Lisboa 701, já os números eram modestíssimos para Beja (161), Évora (171), Portalegre (202) e Setúbal (208).

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No esforço europeu de construção ou reparação das estradas de grande circulação ocupamos, de resto, mesmo proporcionalmente, uma posição modesta.
O seguinte quadro, relativo a 1958, é, a tal propósito, ilustrativo ao indicar as despesas feitas (cf. «Révolution des Transports» já citado) com a construção e reparação destas estradas:

[Ver Tabela na Imagem]

A Itália do Norte tinha uma densidade rodoviária de 760 m/km2 e a Itália do Sul 360 m/km2.
A própria literatura, numa obra cuja tradução portuguesa é recente - Cristo Parou em Eboli, de Carlos Levi -, nos dá uma imagem impressionante das condições de vida no Sul da Itália; nos anos. de 1930. Pois já em 1950 se planeou a melhoria de 10 000 km de estradas secundárias e a construção de 7200 km de novas estradas, dos quais 5000 km nas regiões agrícolas atrasadas. Para a realização deste programa recorreu-se ao Banco Internacional.
Também o recurso a modalidades especiais de crédito teve lugar nos Estados Unidos, para a construção de pontes, túneis e auto-estradas. A conhecida New Jersey Turnpike, com uma extensão de 190 km, custou 255 milhões de dólares, obtidos através de uma emissão de títulos realizada por sindicatos bancários com o acordo do estado de Nova Jérsia.
O incremento do turismo em Portugal fará largo apelo à construção de novas estradas, renovação, melhoria e reparação dos traçados existentes, supressão de passagens de nível, sinalização perfeita e completa, embelezamento das estradas e seu enquadramento na paisagem, proliferação de eficazes estacões de serviço, restaurantes decentes e até telefones, construção de centrais de camionagem e parques de estacionamento o, sobretudo, generalização de medidas que aumentem a segurança na circulação e façam cair os altos índices de acidentes.
Independentemente do maior afluxo de estrangeiros, o próprio incremento da circulação interna far-se-á sentir agudamente.
Partindo de 1955 e realizando uma extrapolação razoável, fundada no crescimento dos últimos anos, chegou-se à conclusão de que só o número de viaturas de turismo atingirá, em Portugal, por alturas de 1970. as 221 000 unidades, ou seja 1 automóvel por 44,8 habitantes. Esta situação será, de resto, das mais modestas no conjunto europeu, conforme se pode apreender do seguinte quadro (cf. «Révolution des Transports», in Besoins et Moyens de l'Europe, cit.):

[Ver Tabela na Imagem]

O tempo e as disponibilidades imporão uma ordem de prioridades na construção de novas estradas e grande reparação dos traçados existentes.
Haverá que harmonizar as grandes linhas de circulação interna com a rede intereuropeia de estradas.
De resto, mesmo entre alguns países da Europa, a colaboração tem-se traduzido em notáveis realizações. É o caso do túnel do monte Branco, inaugurado no ano findo.
A projectada ponte sobre o rio Guadiana, entre Vila Real de Santo António e Ayamonte, será um frutuoso marco da colaboração luso-espanhola.
Permitirá, além do mais. criar uma rota turística que ligará o Algarve a Ayamonte e ilha Cristina, o daí a, Huelva, Sevilha, Cádis e Málaga.
É natural que alguns novos empreendimentos justifiquem o recurso a modalidades especiais de crédito e imponham o pagamento de portagens. Mas estas soluções não serão novas, como o testemunha a ponte sobre o Tejo, cuja projecção turística não deveremos minimizar. Também na vizinha Espanha o famoso túnel de Guadarrama, cuja abertura ao tráfego se efectuou em fins de 1963, constitui «la; primera carretera de peaje que se construye en Espana, según se recuerda a los usuarios en una lápida colocada en un monolito a la entrada de este paso, que ha costado 500 millones de pesetas, cantidad aportada totalmente por particulares».
As grandes vias de acesso serão completadas pelo respectivo esquema regional. Ainda aqui poderia exemplificar com a região das Beiras.
O plano rodoviário nessa zona deveria, além do mais, considerar urgentemente:

1.º A construção ou grande reparação das vias de penetração na serra da Estrela e a grande reparação da estrada da Beira, desde Coimbra até à fronteira;
2.º A construção das projectadas estradas n.08 343 [entre a estrada nacional n.º 112 (alto da Cerdeira) e Paul] e 344 (entre as proximidades de Avô e Alvares). Estas duas estradas são de importância fundamental para a cordilheira cen-

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tral, não só pelos pontos extremos que servem, como ainda pelas regiões que atravessam, de incontestável interesse turístico;
3.º O prosseguimento de Alvares até ao rio Zêzere da estrada nacional n.º 2;
4.º O completo alargamento e rectificação da estrada de Coimbra à Figueira da Foz;
5.º A construção de adequados, acessos a Coimbra, com nova ponte sobre o Mondego, na estrada Lisboa-Porto;
6.º A ligação Curia-Praia de Mira (estrada nacional n.º 834), com as recíprocas vantagens de uma proximidade de pouco mais de 30 km entre as termas, com o seu equipamento hoteleiro, e o mar.

A Europa tem mantido a sua posição de principal metrópole marítima com cerca de metade da tonelagem bruta da frota mercante do Mundo. Roterdão, Antuérpia, Londres ou Hamburgo situam-se entre os principais portos do Mundo. Mas o acréscimo de tonelagem depois da segunda guerra está ligado à frota petroleira. Enquanto o acréscimo da tonelagem da frota mercante da Europa, entre 1027 e 1957, foi de 30 por cento, para os seis principais países marítimos da Europa a tonelagem dos petroleiros mais do que quadruplicou entre 1929 e 1958.
Não deixará, de resto, de ter interesse anotar aqui. por países, a evolução da sua frota (em milhares de toneladas brutas matriculadas) nos anos de 1929 e 1957.
É o que ressalta do seguinte quadro:

[Ver Tabela na Imagem]

Mas este acréscimo na tonelagem não tem acusado igual evolução na intensificação das linhas de transporte marítimo de passageiros.
Segundo os elementos da Conferência Atlântica, relativamente a 1961, os transportes marítimos, com 781685 passageiros transportados nos dois sentidos - América-Europa e Europa-América, acusaram nova baixa, relativamente ao ano anterior (9 por cento, contra 2 por cento). A capacidade de transportes reduzida, ainda em 1961. de 4 por cento, relativamente a 1960, acusou igualmente decréscimo na taxa de ocupação - de 67 para 63 por cento no sentido América do Norte-Europa e de 68 para 64 por cento no sentido contrário (cf. Le Tourisme dans les Pays de l'O. C. D. E., cit.).
A via marítima não ocupa, relativamente aos grandes países de turismo da Europa, um lugar de relevo, como meio de afluxo de turistas. E isto por duas razões: a natureza intereuropeia do turismo (cada vez, mais ligado ao automóvel) e a preferenciados Norte-Americanos pela aviação (em 1961 o tráfego no Atlântico Norte pertenceu à aviação, com 71 por cento das travessias, contra, aliás, 67 por cento no ano anterior).
Podemos, de resto concretizar com o que se passa em França e na Itália.
Dos 36 816 000 estrangeiros que, em 1961, entraram pelas fronteiras francesas 33 238 000 utilizaram as fronteiras terrestres, 1 953 000 o tráfego aéreo e só 1 625 000 vieram por mar (cf. Le Tourisme en France, cit.).
Mais: os números do tráfego marítimo são obtidos a custa dos passageiros provenientes das Ilhas Britânicas (1 538 586). Os que vieram da América do Norte (55 306), do Canadá (11 291) e da América Latina (9481) constituíram uma presença relativamente modesta.
Quanto à Itália, dos 18 935 242 estrangeiros que em 1961 entraram no país, 4451133 utilizaram os transportes ferroviários, 13 323 712 as estradas, 807 065 os aeroportos e só 353 332 os portos. No que respeita particularmente aos Norte-Americanos, 212 324 chegaram de avião e s,ó 54 466 de barco (cf. «Statistica dei Turismo», in Bolletino Técnico Trimestrale dell'Ente Nazionale Italiano per il Turismo n.º 49/50).
Não se julgue, contudo, que os transportes marítimos são um processo ultrapassado no turismo. Antes pelo contrário.
Poderia ilustrar esta afirmação transcrevendo alguns passos da comunicação do director da Casa de Portugal em Paris, no E Colóquio Nacional de Turismo:

Com que joga a Grécia, além de um passado admirável que se traduz em vestígios de pedra e numa forma de espírito que veneramos? Ela joga com o mar, como nós podemos jogar (mas ela tem mais, tem ás ilhas próximas e ligadas ao continente com facilidade); joga com o equipamento hoteleiro, que se dispersa pelas regiões turísticas e que se adapta a todas as bolsas. Depois, tendo compreendido que o inimigo a vencer é a distância e que, embora península, a política fez dela uma ilha, com acesso fácil pelo mar, os dirigentes do turismo helénico e os armadores famosos [...], uns e outros, estabeleceram uma ligação rápida e sensacional entre a Itália e a Grécia, graças a um ferry-boat, o Egantia, que é nada menos o maior do Mundo e que custou 3 200 000 dólares. De Brindisi, na Itália, a Corfu são sete horas de viagem, pára 700 passageiros, e 115 automóveis, três snacks-bars, uma loja com artigos sem pagamento de direitos alfandegários (um negócio nos dois sentidos); bureau de informações, outro para as formalidades alfandegárias e de polícia. Ao lado do Egantia (6185 t), que entrou em serviço no dia 1 de Agosto de 1960, em Maio de 1961 um outro ferry-boat, o Appia, com idênticas características, fará a mesma carreira, noite e dia ... Assim, o turista que, de automóvel, visita a Itália pode bem ser tentado a tomar o ferry - nocturno ou diurno, há sempre um a chegar ou a partir - que o levará à Grécia.

Valerá a pena, ainda aqui, alinhar alguns números ou tecer algumas considerações relativamente ao nosso país.
Os transportes marítimos ocupam posição de algum relevo no capítulo das contas nacionais relativo aos transportes e comunicações.
Creio não ser despiciendo transcrever aqui os elementos sobre essa presença no conjunto do produto interno bruto ao custo dos factores (preços de 1958).

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[Ver Tabela na Imagem]

Por outro lado, no que respeita às embarcações entradas nos portos da metrópole, verificou-se a seguinte evolução: em 1960, 14 766 embarcações, a que corresponderam 35 802 039 t (arqueação bruta) e 20 335 010 t (arqueação líquida); em 1961, 1541 embarcações, a que corresponderam 38 889 362 t (arqueação bruta) e 22 112 172 t (arqueação líquida); em 1962, 35 459 embarcações, a que corresponderam 40 971 950 t (arqueação bruta) e 23 277 628 t (arqueação líquida).
Dos navios entrados em 1962, eram portugueses 9012, a que corresponderam 13 910 925 t (arqueação bruta) e 8 085 986 t (arqueação líquida).
Destes navios portugueses, 1877 [com 7 761 400 t (arqueação bruta) e 4 555 308 t (arqueação líquida)] pertenciam à navegação de longo curso e de pesca longínqua, 3114 [com 5 204 253 t (arqueação bruta) e 2 947 183 t (arqueação líquida)] à cabotagem e pesca do alto e 4021 [com 945 272 t (arqueação bruta) e 583 495 t (arqueação líquida)] à navegação costeira nacional e internacional.
Não deixará também de ter importância saber da orientação dos barcos estrangeiros que entraram nos portos da metrópole. É esse o objectivo dos seguintes números:

[Ver Tabela na Imagem]

Para os nossos propósitos de análise dos aspectos turísticos têm maior interesse as estatísticas do movimento dos passageiros. Os números relativos aos últimos três anos podem resumir-se assim para os portos da metrópole:

[Ver Tabela na Imagem]

Os passageiros embarcados, desembarcados ou em trânsito nos navios estrangeiros que em 1962 entraram nos portos nacionais distribuíram-se assim:

[Ver Tabela na Imagem]

É claro que o significado destes números sai extraordinariamente minimizado se tivermos em conta que eles revelam principalmente o movimento emigratório de Portugal e, sobretudo, a passagem de emigrantes de outros países da Europa para a América.
É certo que Lisboa e Funchal constituem dois portos de nomeada em alguns cruzeiros turísticos. E esto será um aspecto em que nos devemos aplicar com afinco.
Em 1962 entraram em Lisboa 24 navios estrangeiros de turismo (300 624 t de arqueação bruta e 169 966 t de arqueação líquida), dos quais 15 ingleses e 3 franceses.
Para finalizar, relativamente aos transportes marítimos e ao turismo, ainda aqui poderia perfilhar as respectivas conclusões do 1 Colóquio Nacional de Turismo no sentido de se completarem algumas grandes obras portuárias; se equiparem os mais importantes portos, como os de Lisboa, Luanda e Lourenço Marques, com gares marítimas turísticas e instalações para desportos náuticos; se promover o aproveitamento turístico dos pequenos portos; se continuar a renovação da marinha mercante, de modo a obterem-se cada vez melhores ligações entre todas as parcelas do território nacional e com os países de grande emigração e de intenso intercâmbio.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Já atrás referi a extensão navegável das nossas vias aquáticas interiores. Os 532 km possivelmente

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existentes traduzem a modéstia da nossa situação se os compararmos com as extensões navegáveis (em canais, rios e ribeiras) da França (12 887 km), da Holanda (6770 km), da Alemanha Ocidental (4858 km), do Reino Unido (3740 km) ou da Bélgica (1777 km). De resto, se tomássemos como critério de apuramento da extensão navegável a utilização de barcos comportando cargas de mais de 40 t, os 532 km baixariam para 260 km.
Permito-me transcrever aqui alguns passos do já citado estudo Industrialização o Transportes no Continente Português, que duo uma ideia mais concreta de nossa situação:

Acresce ainda que, à parte algumas valas, em regra de pequena extensão, de acesso das localidades aos rios, não se dispõe, ao contrário de vários países, de canais para transportes, especialmente delineados para satisfazer várias finalidades isolada ou conjuntamente: a realização do trajecto mais curto, em relação ao curso dos rios. o contacto perfeito com povoações importantes não banhadas pelos rios. a intercomunicação de dois ou mais sistemas hidrográficos, a criação de navegabilidade r uma zona banhada pelo rio inavegável, etc. [...].
Além de ser, em regra, modesta a extensão navegável, verificam-se nos nossos rios determinadas circunstâncias que os desvalorizam de maneira sensível para efeitos de transporte.
Assim, o Douro, pela estreiteza do seu leito, formação de rápidos o outras particularidades, não permite a montante de Pedorido (a 30 km do cais da Ribeira, no Porto) a utilização de barcos de mais de 40 t de carga e a montante de Entre-os-Rios (a 50 km do cais da Ribeira, no Porto) não permite permanentemente a navegação de barcos superiores a 20 t de carga [...].
Além de Entre-os-Rios, até Barca de Alva, as condições de navegabilidade tornam-se mais difíceis e para certas tonelagens não é possível a utilização do rio mais do que durante seis meses. É o troço em que a partir de Fevereiro de cada ano mais são postas à prova as características dos típicos barcos rabelos [...].
O Tejo é, sem dúvida, o rio mais importante do País do ponto de vista da navegabilidade e embora o troço navegável permanente que permite deslocação de tonelagens apreciáveis represente cerca de metade da, extensão total navegável, é nesse troço (Baixo Tejo ou Tejo marítimo) que se realiza um tráfego importante, quer de passageiros, quer de mercadorias. E neste troço que fica compreendido o magnífico esteiro que ladeia Lisboa, com a largura de cerca de 13 km, em frente de Sacavém.
É de notar ainda que a extensão navegável do rio propriamente dito é acrescida com a do sistema que está adjuvante (vala da Azambuja, rio Trancão, vala do Carregado, rio Sorraia e valas complementares, vala de Salvaterra de Magos, vala de Muge e rio Coina), de cerca de 65 km, de que resulta serem valorizados, apreciavelmente, além do rio em si. também as vilas e povoações directamente servidas, desta forma aproximadas do Tejo.
Apesar de tudo é notória a fraca navegabilidade do rio além de cerca de 80 km acima de Lisboa: para tonelagens apreciáveis, a navegabilidade não vai além de dois escassos meses, em regra. Por outro lado, o regime de cheias anuais perturba nessas épocas a vida económica regional e, por forma especial, a navegabilidade no troço afectado.
E que dizer do Mondego?
Ouçamos um depoimento esclarecedor (Alfredo Fernandes Martins, O Enforco do Homem na Bacia do Mondego):

O Mondego, desde tempos remotíssimos, foi uma artéria aberta ao tráfico.
Estrabão, numa passagem da sua Geografia [...] referiu-se ao movimento das embarcações, embora dissesse ser diminuto o trânsito.
Também Edrisi, quando fala de Coimbra, diz que, p:ira seguir desta cidade até Santiago de Compostela, o viajante deve alcançar Monte Mayor (Montemor-o-Velho) e aí tomar navio que o leve ao seu destino.
Antes que se fundasse a monarquia, Montemor, Coimbra e até Soure eram portos flúvio-marítimos, onde ancoravam barcos de mercadorias árabes e normandos. Ainda no tempo de D. Afonso Henriques chegaram a Coimbra navios de pequeno calado, conforme se depreende de documentos coevos [...].
Com o decorrer dos anos, o progressivo assoreamento do rio reduziu as possibilidades de navegação, a qual se limita hoje a barcos de pequeno calado; à vela, à vara e muitas vezes à sirga, o tráfico mantém-se, mais acentuadamente nas secções do rio compreendidas entre Coimbra e a Raiva, Figueira e Montemor [...].
No século passado, Adolfo Loureiro chegou a projectar um canal que, paralelamente ao Mondego, faria a ligação Coimbra-Figueira, bem como um túnel que, aberto entre os dois pontos mais próximos do meandro da Raiva, encurtaria consideràvelmente o percurso do rio, com o consequente benefício para a navegação.

Outros projectos de navegação interior têm, de resto, sido ventilados nas últimas décadas. O conhecido anteprojecto do canal Tejo-Sado, que estabeleceria a ligação da região do Montijo com a península de Mitrena, junto do porto de Setúbal, é um exemplo.
É claro que o aproveitamento para. fins múltiplos das potencialidades dos nossos rios não poderá silenciar este importante aspecto da navegabilidade. O Douro, o Tejo e o Mondego devem precisamente evidenciar tal aptidão e oportunidade.
O nosso ilustre colega Eng.º Araújo Correia, nos pareceres das contas públicas, nomeadamente nos relativos aos anos de 1943 e 1950, tem chamado as atenções para a importância destes problemas. O canal entre Almourol e Muge, integrado no esquema Almourol-Rïbatejo, teria por objectivo, além da rega, o abastecimento de água às povoações limítrofes da margem esquerda do Tejo e alimentação de uma central Almourol-Muge, bem como a satisfação das necessidades de navegação entre Lisboa e Almourol.
Ora o interesse turístico dos rios, dos canais e dos lagos é extremamente importante.
A prática de desportos ou a simples realização de viagens e pequenos cruzeiros encontram aqui ambiente adequado.
Quem não recorda os passeios u o Sena, em Paris, nos canais da Holanda, em Amsterdão, ou no Malar, em Estocolmo? Poderemos dissociar os castelos e as vinhas do Reno do seu percurso em barcos adequados? De Montreux a Genebra o trajecto mais sedutor não será ainda aquele que de barco nos permite mesmo tocar na costa francesa do lago Léman, em Évian-les-Bains?

Vozes: - Muito bem!

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O Orador: - O engenho do homem tem assim utilizado, nos locais mais famosos da velha Europa, as suas toalhas líquidas para. as associar às outras prodigalidades da Natureza, multiplicando a atracção turística.
E nós, que temos feito? Creio que muito pouco.
Os rios de Portugal têm o seu ex-libris mais maravilhoso nos próprios barcos que os sulcam. Os rabelos, os moliceiros, as fragatas, são a sugestão de um povo que alia a arte ao trabalho.
Mas já há anos o Sr. Presidente do Conselho se entristecia de ver vazio de presenças desportivas este belo estuário do Tejo.
Anuncia-se agora uma iniciativa na ligação de Lisboa à Costa do Sol. Outras se poderiam multiplicar ainda no estuário do Tejo, na ria de Aveiro e no aproveitamento turístico das barragens.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Era precisamente para este último aspecto que desejaria chamar as atenções. Já atrás referi o interesse pelas barragens da Electricité de France, no IV Plano Francês. Não vejo que o aproveitamento do Cávado ou do Zêzere tinha conduzido a uma exploração turística das belas represas criadas. Fixemo-nos, por exemplo, na Barragem de Santa Luzia, no concelho de Pampilhosa da Serra. 12 um dos locais mais belos de Portugal, onde uma gigantesca muralha de 75 III de altura fecha por completo a profunda garganta do Cabril do rio da Pampilhosa, dando origem a uma albufeira de 6 km de comprido.
«A grandiosidade da obra humana - na expressão do Prof. Amorim Girão -, por muito que avulte aos nossos olhos, não logra diminuir, entretanto, a imponência das cintas rochosas do Cabril.»
Ora aqui estaria um cenário adequado para as organizações sociais dos trabalhadores portugueses constituírem uma colónia de férias. Este seria o início de um belo pólo turístico.
Penso que o turismo interno e o turismo social devem ser orientados para estes locais esquecidos de Portugal, onde a beleza, o clima e a paz são o melhor antídoto para os elementos negativos que tão duramente afectam as nossas classes operárias.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Será errado persistir um localizações junto dos grandes centros, impondo-se antes que o turismo social se enquadre nos propósitos de desenvolvimento regional, tantas vezes enaltecidos nesta Assembleia.
Mas são os transportes aéreos um dos meios mais ligados à revolução turística moderna. Embora a sua presença pese fundamentalmente nas ligações intercontinentais, não podemos, por exemplo, esquecer que as principais linhas aéreas europeias servem mais de uma centena de cidades, em percursos de 264 000 km de extensão, tendo transportado já em 1957 cerca de 6,5 milhões de passageiros.
Mais: o desenvolvimento da aviação comercial abriu mesmo novas perspectivas, quebrando o isolamento interno do pequenos países, como a Islândia.
A Islândia não tem caminhos de ferro, as suas estradas são más e de um custo de construção proibitivo. A construção de pistas de aterragem afigurou-se, pelo contrário, económica, ao mesmo tempo que Se verificou ser fácil o recurso a hidroaviões que poderiam utilizar os fiordes. As localidades isoladas recebem hoje, por via aérea, tudo o que necessitam, inclusive tractores. Os produtos agrícolas c o gado são enviados para os mercados por avião. A Islândia possuía assim, em 1957, 25 linhas aéreas interiores e 17 linhas internacionais.
O tráfego dos principais 34 aeroportos dos países europeus da O. C. D. E. conheceu, por exemplo, em 1961, um acréscimo total no movimento de passageiros de 21 por cento relativamente ao ano anterior.
Talvez não deixe mesmo de ter interesse salientar aqui os aeroportos que nosso ano conheceram mais de 1 milhão de passageiros (segundo o serviço estatístico do aeroporto de Paris):

[Ver Tabela na Imagem]

a) Os passageiros em trânsito só se contam uma vez.
b) Inclui os aeroportos de Heathrow e Gatwich.
c) Inclui os aeroportos de Orly e Le Bourget.
d) Inclui os aeroportos de Ciampino o Fiumicino.
e) Inclui os aeroportos de Broma e Arlanda.

Os voos não regulares, a que, aliás, já me referi a propósito da Espanha, de importância fundamental para o desenvolvimento do turismo, também conheceram neste período notável incremento. Só para as linhas aéreas transatlânticas dos países membros da I. A. T. A., o número de passageiros transportados nos dois sentidos por charters atingiu mais de 250 000, o que se traduziu num aumento de 58 por cento relativamente ao ano anterior de 1960.
A colaboração intereuropeia no sector dos transportes aéreos tem assumido, de resto, variadas expressões. Embora correndo o risco de uma referência não exaustiva e mesmo já desactualizada, poderia transcrever aqui, a tal propósito, o seguinte passo da obra Besoins et Moyens de 1'Europe:

Uma evolução da mesma ordem (cooperação internacional) teve lugar para os transportes aéreos graças a organismos como a Associação Internacional de Transportes Aéreos e o Centro Europeu de Investigações Aéreas. Sob os auspícios da Comunidade Económica Europeia, quatro companhias aéreas (Sabena, Alitália, Air-France e Lufthansa) criaram uma associação aérea para a Europa. Esta organização tem por fim realizar em comum a utilização e manutenção das instalações de terra e as representações comerciais. A Noruega, a Suécia e a Dinamarca criaram uma empresa única, a Scandinavian Airlines. Por sua vez esta Scandinavian Airlines e a Swissair concluíram um acordo para utilização conjunta das frotas de Caravelles, de Convair 800 e de DC, com o propósito de cada um destes tipos de

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avião poder ficar adstrito aos respectivos especialistas. Uma outra etapa para a integrarão das linhas aéreas europeias reside na criação de um controle da navegação aérea: Eurocontrol.
Como se passam as coisas um Portugal?
O movimento dos aeroportos de Lisboa e das Pedras Rubras, no período de 1960-1962, foi o seguinte (cf. Anuários Estatísticos respectivos):

[Ver Tabela na Imagem]

Estes números revelam a modéstia da nossa posição relativamente aos outros aeroportos europeus, se tivermos em conta as estatísticas já referidas dos serviços do aeroporto de Paris. Acresce que o número de aviões que utilizam Lisboa tem diminuído, o que em parte pode ser compensado pelas novos tipos de aeronaves utilizadas.
Desejaria referir aqui as observações formuladas numa comunicação apresentada, em representação das companhias aéreas, ao I Colóquio Nacional de Turismo. Eis o seu teor:

Não é certamente alheio ao conhecimento de todos os esforços e avultados capitais investidos nos países de origem pelos transportes aéreos que servem Portugal, a fim de canalizarem para o nosso país o maior número de visitantes. É óbvio que o interesse é mútuo, mas também é certo que nada obriga o transportador a investir esties capitais em determinadas rotas, como sejam aquelas que já hoje podem ser consideradas apenas de transito a caminho de centros muitíssimo mais divulgados, de maior interesse, e automaticamente mais procurados pelo turista.
Pela nossa, posição geográfica, Lisboa está tomando esse risco, até porque já hoje, por esta ou aquela razão, vários transportadores sobrevoam a nossa capital, em vez de, como habitualmente faziam, interromperem os seus voos para reabastecimento e, consequentemente embarcar ou desembarcar passageiros, correio e carga.
Este facto só é possível devido à alta velocidade e autonomia dos aparelhos a jacto, que hoje operam já em elevada percentagem em relação aos aviões convencionais.

E mais adiante acrescentava-se:

Estará Portugal a beneficiar proporcionalmente em função do aumento do passageiros de avião registados anualmente! É difícil dizer [...]; quer-nos parecer que muito mais se poderia obter se uma campanha de intensa propaganda divulgando a amenidade do nosso Inverno se desenvolvesse em países do Norte, do Inverno rigorosíssimo. Para isso, as quantidades do material produzido teriam de aumentar substancialmente para serem facultadas ao público desses países, divulgando sabiamente o nosso inverno excepcional [...].
Nós, transportadores aéreos, lançámos este Inverno (1960-1961) no mercado a tarifa reduzidíssima de excursão de dezassete dias e com enorme sucesso. Esta tarifa, válida apenas de Outubro a Marco, visa exactamente ao descongestionamento do tráfego de Verão, permitindo, simultaneamente, a criação de um novo mercado, aliás já existente em potência apenas, devido aos baixos recursos financeiros dos seus componentes. Assim, reduzidos os preços, já o trabalhador do continente norte-americano viaja de avião, em férias, para a Europa e vice-versa.

No que respeita às ilhas adjacentes, o movimento dos aeroportos foi o seguinte (cf. Anuários Estatísticos respectivos):

[Ver Tabela na Imagem]

Como é do conhecimento geral, a posição dos A coros nas rotas da aviação comercial também saiu enfraquecida com a utilização dos grandes reactores. Em 1960, o número de. passageiros «em trânsito» registados em Santa Maria fora de 90 377 e no ano seguinte de 108 691. Quanto à ilha da Madeira, a demora na construção do seu aeroporto e a tormentosa ligação marítima entre Porto Santo e o Funchal mais contribuíram para uma situação modesta, enquanto perto, no arquipélago das Canárias, os Espanhóis se multiplicaram em proveitosos esforços de valorização turística.
As medidas de política aérea dependem assim dos entes públicos e das companhias de aviação.

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Tem-se acentuado em Portugal o interesse em completar a rede das linhas de aviação, em construir ou valorizar aeroportos e aeródromos, dotando-os de instalações, material e pessoal adequados a uma eficiente exploração.
As dificuldades sentidas entre nós na altura da realização do I Colóquio Nacional de Turismo encontravam-se patentes nestes passos de uma comunicação aí apresentada:

Não obstante as dificuldades e os problemas de toda a ordem que a concretização de tal movimento - conhecido genericamente por Facilidades -, no plano internacional, arrasta, a verdade é que, desde a fundação, após a segunda guerra mundial, da I. C. A. O. (International Civil Aviation Organization) e da I. A. T. A. (International Air Transport Association), até agora, algo de importante se tem conseguido neste sentido, graças à cooperação efectiva da maioria, dos Estados.
O nosso país não tem sido indiferente a esta questão e, justo é confessar, alguns esforços se têm feito no sentido de seguir-se a sua evolução. Infelizmente, porém, não temos acompanhado o ritmo em que esta se tem vindo a desenvolver e daí o poder afirmar-se que o nosso caso. no respeitante a concessão de facilidades ao transporte aéreo, começa a tomar evidente posição de atraso.
No que se refere, por exemplo, ao aeroporto de Lisboa, nossa principal fronteira aérea, a situação é, em linhas muito gerais, esta:

As condições funcionais da aeragare são, de um modo geral, péssimas: instalações acanhadas, incómodas e deficientes; movimentação do tráfego ilógica, morosa, confusa; apetrechamento técnico pouco mais que rudimentar; e, caso que em aeroportos internacionais deve ser quase único, não existo no de Lisboa uma sala de trânsito;
Os procedimentos de despacho de passageiros, da bagagem e da carga, dos próprios aviões e dos seus tripulantes, são, na generalidade, complicados, pouco conformes com o espírito de simplificação lógica (pie deve estar na base de uma política sã de facilidades, porquanto se regulam, em grande parte, por regulamentos ultrapassados, cuja actualização é, consequentemente, urgente.

A utilização dos reatores impôs uma ampliação de pistas. Além da pista dos 3800 III no aeroporto de Lisboa, construiu-se no Porto uma nova faixa de 2000 m. De resto, um terço do empréstimo externo de 150 milhões de marcos a que se refere o Decreto-Lei n.º 44 693, de 16 de Novembro de 1961, destinou-se precisamente aos aeroportos de Lisboa, Porto e Funchal e à construção do aeródromo de Faro.
Impõe-se, de resto, a construção do um novo grande aeroporto de Lisboa. As razões que justificam esta medida têm sido tantas vezes salientadas que me dispenso de as repetir aqui.
A construção da ponte sobre o Tejo facilitará a nova localização. Teria sido de desejar uma coordenação de trabalhos que permitisse a inauguração simultânea destes dois grandes empreendimentos.
Penso ainda que se deveria elaborar um plano de aeródromos que constituíssem no País a desejada rede que permitiria o acesso do avião, ou a sua utilização em carreiras regulares, a algumas regiões ou centros urbanas. O exemplo da Espanha é, a este propósito, como já salientei, ilustrativo.
Mas a grande esperança numa maior utilização do avião pelos turistas e consequente multiplicação no seu afluxo a Portugal reside nos voos não regulares.
Permito-me, a tal propósito, transcrever a seguinte recomendação do Rapport d'Expertise do Prof. Krapf e Doutor Michel:

Para levar os turistas a Portugal, o avião constituirá o principal meio de transporte, principalmente na forma de charter [...].
Uma grande parte dos turistas, notoriamente em grupos, utilizarão, por razões de economia, as viagens por charter, e não os serviços aéreos regulares. Eis a razão pela qual os experts recomendam uma política aérea liberal susceptível de facilitar os serviços de charter. Deve mesmo salientar-se que os turistas que utilizam, estes voos não escolhem geralmente os serviços regulares, renunciando antes a visitar o país que põe obstáculos ao charter. O exemplo das ilhas Baleares, cuja prodigiosa expansão turística assenta principalmente no charter, evidencia a utilidade de uma política aérea liberal.

A valorização dos transportes depende ainda da sua eficaz coordenação e de uma harmonização com as políticas a seguir noutros sectores.
Tem-se acentuado que a intervenção estatal em matéria de transportes também procurará assegurar a utilização dos diferentes sistemas, evitando, por um lado, concorrências antieconómicas e, por outro, uma cristalização em situações de favor que impeçam o desenvolvimento da circulação, devendo ainda aqui atender-se aos direitos dos utentes a beneficiarem das conquistas do progresso técnico.
Não me vou deter na função económico-social dos transportes (cf., por exemplo, o capítulo sobro a «Função dos transportes» na obra de Michael Bonavia The Economic of Transports), nem tão-pouco analisar com mais pormenor a coexistência dos diversos meios de transporte no interior do território (cf., por exemplo, o respectivo capítulo do Traité d'Exploitation des Transports, de Paul de Groote).
Apenas desejo insistir na importância fundamental deste sector para o fomento do turismo; na necessidade de estarmos atentos e, de acompanharmos todos os movimentos e progressos internacionais, pois será ainda neste capítulo da concorrência internacional dos transportes que se realizará a própria concorrência turística.
Passo a outro grande apoio do turismo: o alojamento e alimentação.
Abordarei aspectos relacionados com a política hoteleira, outros tipos de alojamentos, restaurantes e gastronomia.
Existem elementos de interesse elaborados pelo Gabinete de Estudos e- Planeamento Turístico relativamente à situação e perspectivas da indústria hoteleira nos estudos que tenho referido. Integrado no programa, da O. C. D. E., anuncia-se um relatório sobre a rentabilidade da indústria hoteleira portuguesa, elaborado por um técnico suíço.
Desejo enaltecer o labor legislativo nesta matéria hoteleira, fundamento do progresso conhecido nos últimos anos neste sector.
Torna-se indispensável uma familiaridade com o Decreto-Lei n.º 31259, de 9 de Maio de 1941 (sobre o regime da exploração das pousadas), Lei n.º 2073, de 23

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de Dezembro de 1954 (sobre o fomento da indústria hoteleira), o Lei n.º 2082, de 4 de Junho de 1956 (sobre a estrutura orgânica do turismo).
Mais recentemente foi publicado o Regulamento das Condições Sanitárias a Observar nos Estabelecimentos Hoteleiros e Similares (Diário do Governo, 2.ª série, de 27 de Outubro de 1962) e anuncia-se um anteprojecto de diploma que será uma revisão da citada Lei n.º 2078.
Mas o auxílio à indústria hoteleira tem sido fundamentalmente assegurado pelo Fundo de Turismo.
Daí o interesse da Lei n.º 2081, de 4 de Junho de 1956, e dos Decretos n.º 40 912 e 40 913, de 20 de Dezembro do mesmo ano.
Para se ter uma ideia deste apoio, transcrevo os seguintes elementos, relativos aos financiamentos à indústria hoteleira concedidos directamente pelo Fundo de Turismo ou pela Caixa Nacional de Crédito (com fiança do menino Fundo) no período de 1957 a Novembro de 1963:

[Ver Tabela na Imagem]

Segundo a Repartição da Indústria Hoteleira, da Direcção dos Serviços de Turismo do Secretariado Nacional da Informação, Cultura Popular e Turismo, os objectivos da actual política hoteleira resumem-se assim:

Quanto ao equipamento hoteleiro procura-se orientar as novas iniciativas no sentido de apetrechar, com equipamento indispensável, as capitais de distrito, para assim se assegurar e valorizar a existência de circuitos turísticos por todo o País.
A intensificação do aproveitamento turístico é encaminhada para as zonas cujas condições naturais permitem uma melhor e mais segura rentabilidade (presentemente os casos do Algarve e da Madeira).
Ainda no que respeita à indústria hoteleira, tem-se actuado no sentido de contrariar a tendência inflacionista geral, não permitindo agravamento de preços, senão o que se justifique, em consequência de obras e melhoramentos introduzidos nas unidades existentes.
No que diz respeito ao problema da mão-de-obra - preparação profissional da indústria hoteleira -, está também a ser encarado através da assistência técnica da O. C. D. E. e da Comissão Mista Luso-Suíça.
Pensa-se, ainda, em colaboração com o Ministério das Corporações, instituir o sistema de formação profissional acelerada.

Não será despropositado referir alguns números relativos à situação da indústria hoteleira. Terão ainda o mérito de permitir ilações relativas às perspectivas do futuro. Sirvo-me, para isso, do estudo do Dr. Alfredo de Magalhães Coelho, Subsídios para Uma Análise da Oferta e da Procura, publicado pelo Gabinete de Estudos e. Planeamento Turístico do Secretariado Nacional da Informação, Cultura Popular e Turismo.
Escolhemos dois períodos para a análise da evolução da capacidade hoteleira da metrópole.
O primeiro, de 1958-1957, encontra no seguinte quadro a evolução do número de estabelecimentos existentes (hotéis, pensões, pousadas e estalagens) e de quartos (sem casa de banho e com casa de banho):

[Ver Tabela na Imagem]

Até 1957 as pensões de 2.ª classe não eram consideradas pelos serviços respectivos como capazes de assegurar condições de comodidade suficientes. Daí que só constem dos apuramentos a partir de 1958.
Entretanto começaram também a sentir-se os efeitos da Lei n.º 2073, de 23 de Dezembro de 1954, e da «utilidade, turística», consagrada no seu artigo 11.º
Tudo isto justifica o aumento verificado nos indicadores do período de 1958-1962 relativamente aos do período anterior.
Os números deste segundo período, para a metrópole, no conjunto dos hotéis, pensões, pousadas e estalagens, constam do seguinte quadro:

[Ver Tabela na Imagem]

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Terá mesmo interesse fazer uma análise mais pormenorizada dos efectivos hoteleiros da metrópole em 1962:

[Ver Tabela na Imagem]

Deste total pertenciam às ilhas adjacentes 14. hotéis (1 de luxo B; 3 de 1.ª classe A; 4 de 1.ª classe B; 3 de 2.ª classe; 3 de 3.ª classe) e 16 pensões (2 de luxo; 5 de 1.ª classe; 9 de 2.ª classe), com um total de 1066 quartos (2034 camas), dos quais 432 com banho.
É claro que estes efectivos se concentram sobretudo na Madeira. No arquipélago dos Açores existiam sòmente dois hotéis de 1.ª classe B, um de 2.ª classe, outro de 3.ª e uma pensão de 2.ª Todo o arquipélago dispunha de 231 quartos (446 camas), dos quais 82 com banho. Quanto à Madeira, era a seguinte a distribuição das camas: 969 em hotéis de luxo e de 1.ª classe, o que corresponde a 61 por cento das existentes; 143 nos hotéis de 2.ª classe, ou seja 9 por cento; 163 nos hotéis de 3.ª classe, ou seja 10,3 por cento; 124 nas pensões de luxo e de 1.ª classe, ou seja 7,8 por cento; 189 nas pensões de 2.ª classe, ou seja 11,9 por cento. Deste mudo. o número de camas nos hotéis era de 1275 (ou seja 80.3 por cento do total) e nas pensões 313 (19,7 por cento).
Qual a utilização do equipamento hoteleiro do continente e ilhas adjacentes?
Ainda aqui continuo a servir-me dos números constantes do trabalho Subsidio para Uma Análise da Oferta c da Procura, obtidos, segundo critério aí referido, para o ano de 1962:

[Ver Tabela na Imagem]

Interessará atender concretamente às taxas de ocupação. São elementos de importância fundamental para apreciação da rentabilidade da indústria e, sobretudo para projectar a futura necessidade de mais estabelecimentos.
Escreve-se a este propósito nos Subsídios para Uma Análise da Oferta e da Procura, reportando-se ainda a 1962:

A taxa de ocupação anual para o conjunto dos estabelecimentos hoteleiros (excepto as pensões de 3.ª

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classe), cifrando-se em 24,3 por cento, com 14,5 por cento para os nacionais e 9,8 por cento para os estrangeiros, assinala, além da situação insatisfatória da exploração hoteleira, a importância do turismo interno.
Da preponderância de estrangeiros cos hotéis de luxo e 1.ª classe (20,9 por cento é o valor da sua taxa de ocupação) passa-se para a maioria de nacionais nos hotéis de 3.ª classe (cuja taxa de ocupação é de 20 por cento), com uma quase igualdade de valores de ocupação nos hotéis de 2.ª classe. No total de hotéis, as taxas de ocupação apuradas são semelhantes para os nacionais e para os estrangeiros, embora com uma leve superioridade destes.
Nas pensões verificamos uma preponderância flagrante de nacionais, cujas taxas de ocupação são bastante superiores às dos estrangeiros, com 4,4 por cento, para estes e 16,9 por cento para aqueles.

E qual o mês em que os estabelecimentos hoteleiros acusaram maior frequência?
Para o conjunto do continente e ilhas adjacentes foi Agosto, com cerca de 50 por cento de ocupação, dos quais 32 .por cento obtidos à custa de portugueses.
Mas, se repartirmos a análise entre o continente e a ilha da Madeira, já as conclusões são diversas. Enquanto para o continente o mês de ponta, em 1962, continua a ser Agosto, para a ilha da Madeira foi Fevereiro. O seguinte quadro é, a tal propósito, ilustrativo:

[Ver Tabela na Imagem]

Esta panorâmica geral da indústria hoteleira da metrópole ficará mais completa se lhe juntarmos uma ou outra nota crítica e se nos preocuparmos com as necessidades futuras.
Quais os pontos merecedores de reparos na actual conjuntura?
Uma nota sobressai desde logo: o nosso bom equipamento hoteleiro concentra-se na região de Lisboa e em alguns pólos do litoral atlântico. O interior do País e mesmo o Algarve não dispõem de alojamentos satisfatórios em número e qualidade.
Recorro à lista de estabelecimentos publicada no Anuário de 1963 - Portugal, Pais de Turismo - e daí respigo três ou quatro exemplos:
Comecemos por Braga, velha metrópole dos arcebispos, a que os seus filhos mais devotados chamam a Roma portuguesa. Pois a cidade tem apenas dois hotéis, ambos de 3.ª categoria, com um total de 58 quartos, dos quais O apenas dispõem de casa de banho. E fácil fazer aí uma vida barata, se atendermos a que uma dormida em hotel pode custar apenas 22$, mas não creio que tais possibilidades satisfaçam os pergaminhos e aspirações da cidade.

O Sr. António Santos da Cunha: - Muito bem!

O Orador: - E nem a proximidade do Bom Jesus ou o apoio de Guimarães poderão ser invocados. Os três hotéis do Bom Jesus, todos de 3.ª classe, possuem, no seu conjunto, 11 quartos com casa de banho; em Guimarães dá-se conta de um único hotel, ainda de 3.ª classe, com 33 quartos, dos quais apenas um com casa de banho.
Desçamos a Évora, que nos guias turísticos figura como «cidade-museu de Portugal». O turista visitará aí o Templo de Diana (séculos II e III), a Catedral e Museu de Arte Sacra (séculos XII e XIV), a Igreja Real de S. Francisco (séculos XV e XVI), a Igreja-Panteão dos Loios (século XV), a Igreja de Santo Antão (século XVI), a Igreja de Nossa Senhora da Graça (século XVI), a ermida gótica de S. Brás, (século XV), a velha Universidade, as igrejas barrocas da Misericórdia, Santa Clara, Calvário, Colégio, Carmo, Santiago, Salvador, etc. E quando, cansado, procurar repouso, verificará, surpreendido ou talvez desesperado, que o Guia Turístico não lhe dá conta de qualquer hotel.
Admitamos, numa terceira hipótese, que o turista percorre a rota dos nossos santuários marianos - Alcobaça, Nazaré, Batalha e Fátima ... -, que pretende pernoitar na capital do distrito, em Leiria. Pois ainda aqui não encontrará um hotel que de guarida ao grupo de que faz parte.
Mas esta insuficiência das capitais de distrito é ainda notória em Bragança (onde apenas se dá conta da Pousada de S. Bartolomeu, com 10 quartos), Vila Real (com 1 hotel de 3.ª classe, que dispõe de 3 quartos com casa de banho), Viseu e Setúbal (que nem sequer figuram na lista donde tiro estes elementos) ou Beja (1 hotel de 3.ª classe, com 30 quartos, dos quais nenhum dispõe de casa de banho privativa).
Cabe aqui uma palavra de louvor para as pousadas. Além da já citada de S. Bartolomeu em Bragança, ocorre-me mencionar a de Alijo (Barão de Forrester), S. Gonçalo (no Marão), Santo António de Serem (vale do Vouga), S. Lourenço (na serra da Estrela), S. Martinho de Alfeizerão, S. João Baptista das Berlengas, Castelo de Óbidos, Santa Luzia (Eivas), Santiago (Santiago do Cacem), S. Brás (S. Brás de Alportel), do Infante (em Sagres), de S. Teotónio (em Valença do Minho), da Ria (Torreira) e de S. Gens (em Serpa). Mas as pousadas foram concebidas e realizadas para um fim especial de que não convirá desviá-las. De resto, no seu conjunto, disporão de pouco mais de 150 quartos.

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É justo realçar o apoio que a indústria, hoteleira tem encontrado no Estado, nomeadamente a partir da já citada Lei n.º 2073. Parece-me, contudo, que não temos dado suficiente publicidade no estrangeiro às facilidades prodigalizadas através das isenções fiscais, aduaneiras ou concessão de créditos. Ora, tal publicidade poderia atrair capitais estrangeiros ao nosso país para investimentos em hotéis ou estabelecimentos similares.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mas haveria igualmente que prosseguir uma política de adequada localização.
A propósito deste problema na ilha da Madeira, escreve-se no citado Rapport d'Expertise:

As virtudes do clima da ilha da Madeira não precisam de ser realçadas de novo. Portugal tem o grande privilégio de dispor de um centro turístico de reputação mundial que permite actividade hoteleira em qualquer época do ano. A possível intensificação do movimento turístico da Madeira dependerá da melhoria do acesso pelo ar e deverá ser acompanhada de uma descentralização dos serviços receptivos. Convirá assim encarar a criação de novos hotéis, para uma clientela menos rica, fora do centro do Funchal, escolhendo, por exemplo, povoações típicas de pescadores, como Gamam de Lobos.

Outro aspecto merecedor de atenções é o da criação de conjuntos hoteleiros, constituídos por estabelecimentos de diversas categorias que formem animados centros turísticos. Tal regra terá especial interesse para o Algarve.

O Sr. Jorge Correia: - Muito bem!

O Orador: - De resto, os restaurantes, bares, casinos ou outros locais de atracção, diversão ou comércio são complementares do sucesso dos estabelecimentos hoteleiros pela animação que proporcionam aos centros turísticos.
A monotonia dos grandes centros turísticos portugueses tem sido inúmeras vezes censurada poios estrangeiros. A dois passos de Lisboa, o Estoril, depois do cair da noite, é uma terra morta.
Devemos ter sempre presente a necessidade de baixos custos nas diárias nos nossos hotéis. A distância de Portugal do Centro da Europa recorda que o sucesso da nossa competição é contrariado pelos encargos das deslocações. Daí que o turista procure uma compensação em diárias acessíveis.
Mas esta regra impõe uma economia na construção dos hotéis, que não me parece ter sido sempre, observada. O sumptuário avulta em alguns estabelecimentos, e talvez só as facilidades fiscais e de crédito expliquem, ainda assim, o equilíbrio da exploração.

O Sr. Fernando Frade: - Muito bem!

O Orador: - Impõe-se evitar este sumptuário e, por outro lado, proporcionar maiores dimensões aos hotéis, tornando-os aptos para o turismo de grupos, que de futuro se deve incrementar em Portugal.
Mas o equipamento hoteleiro será completado por um maior recurso a outras modalidades de alojamento, hoje em voga ou mais de acordo com as possibilidades económicas dos respectivos utentes. Refiro-me particularmente às vivendas para turistas, aos alojamentos de montanha, aos motéis e aos parques de campismo.
Não creio que tais soluções tenham sido objecto de uma exaustiva atenção em Portugal.
Referi atrás a largueza com que no IV Plano Francês este assunto foi encarado.
As vivendas para turistas são entre nós controladas pelos órgãos locais de turismo, mas a sua suficiência qualitativa e quantitativa deixa muito a desejar.
Quanto aos motéis, a sua expansão é muito incipiente.
Esta fórmula intermédia entre o hotel e o campismo pode dizer-se de filiação americana (cf. Arrillaga, Sistema de Política Turística). A natureza sazonal do turismo origina, em muitas regiões, a incapacidade do equipamento hoteleiro para responder às épocas de «ponta». Daí os motéis.
Coadunam-se, de resto, com o carácter democrático do turismo moderno e com a modéstia das disponibilidades financeiras de muitos turistas.
As próprias empresas hoteleiras - como vi na Suíça - poderão criar e manter os motéis, que serão assim complementares da sua exploração principal.
Quanto aos parques de campismo, acentua-se na publicação Roteiro Campista a divisão do País em três zonas (norte, centro e sul). Na zona norte dá-se conta da existência de dezoito parques, dos quais oito aprovados pelo Secretariado Nacional da Informação: na zona centro, catorze parques, dos quais sete aprovados pelo Secretariado Nacional da Informação; na zona sul, vinte parques, dos quais cinco aprovados pelo Secretariado Nacional da Informação. Como se vê, um número reduzido.
Foi em 1957 que a Portaria n.º 16 334, de 26 de Junho, estabeleceu as normas a que deviam obedecer a instalação e funcionamento dos parques de turismo. Posteriormente, o Decreto-Lei n.º 43 505 e o Decreto n.º 43 506. ambos de 14 de Fevereiro de 1961, inseriram novos preceitos sobre a matéria. A importância do assunto exige, contudo, uma regulamentação mais actualizada e completa.
Mas qual será o equipamento hoteleiro indispensável para fazer face ao previsto afluxo de turistas estrangeiros a Portugal ou ainda ao natural incremento do turismo interno?
Eis um problema de grande interesse e para o qual existe um estudo que já tive ocasião de citar - Elementos Preparatórios de Um Plano de Desenvolvimento Turístico para o Período de 1964-1968.
Segundo o desenvolvimento do modelo aí adoptado, os investimentos a realizar em hotéis e pensões no período de 1964-1968 atingiriam 2 000 050 contos, assim distribuídos (milhares de contos):

[Ver Tabela na Imagem]

Se, por outro lado, admitirmos que os investimentos em hotéis representam cerca, de 70 por cento dos investimentos turísticos de um dado período, concluiremos que, processando-se o desenvolvimento nos termos do modelo citado, necessitaríamos de investir de 1964 a 1968 cerca de 3 milhões de contos no turismo.

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O alojamento completa-se com a alimentação. Isto me encoraja a referir ainda os restaurantes e a gastronomia.
Em Dezembro de 196Ü existiam na metrópole (e no distrito de Lisboa) os seguintes restaurantes e estabelecimentos similares:

[Ver Tabela na Imagem]

Como se vê, os efectivos são bastante modestos, acrescendo que uma boa percentagem dos estabelecimentos se encontram em Lisboa.
A concessão da «utilidade turística» a alguns restaurantes tem constituído um estímulo, bem como a utilização do crédito hoteleiro, para a sua construção e apetrechamento.
Os serviços oficiais promoveram há tempos um concurso - A Melhor Refeição ao Melhor Preço - e puseram em prática o sistema de «ementa turística». Ementas deste tipo foram utilizadas durante as «Festas da Páscoa - 1963», nas localidades onde estas tiveram lugar.
Tal como referi para a rede hoteleira, será necessário programar uma rede de restaurantes a abrir no País. A intensificação do turismo automóvel e o próprio interesse em criar circuitos turísticos regionais impõem que se estudem e promovam localizações adequadas.
Mas o restaurante não é apenas o edifício, talvez adequado às sugestões do ambiente onde está localizado. Valorizam-no aquilo que oferece aos seus utentes: a cozinha, os vinhos, as frutas, os queijos, o café ...
Em colaboração com a Radiotelevisão Portuguesa, promoveu r> Secretariado Nacional da Informação, em 1961, o Concurso Nacional de Cozinha e Doçaria Portuguesa, que permitiu reunir elevado número de receitas de cozinha e doçaria regional.
Em seguimento deste concurso foram postas em prática e controladas pelo Secretariado Nacional da Informação experiências de adaptação do receituário regional à cozinha hoteleira, o que teve lugar nas pousadas.
Ainda aqui se ensaiou a utilização dos vinhos portugueses adequados, corri a colaboração da Junta Nacional do Vinho.
Mas o que se tem feito é muito pouco relativamente ao que importaria consagrar.
Ainda aqui teriam cabimento as conclusões da tese apresentada pelo director da Escola Hoteleira de Lisboa ao I Colóquio Nacional de Turismo:

1.ª Intensificação, por todos os meios, da preparação dos profissionais da indústria hoteleira o similares. A planificação desses meios deve ser feita através de escolas hoteleiras entregues a técnicos de reconhecida competência;
2.ª A cozinha, a doçaria, os queijos e os vinhos regionais devem ser considerados elementos de propaganda turística, promovendo-se a sua divulgação;
3.ª Adaptação, dentro do possível, ao idioma português das designações da culinária estrangeira;
4.ª Promoção da adesão de Portugal ao movimento de intercâmbio internacional de estagiários da indústria hoteleira.

Este enunciado sugere-me ainda duas considerações complementares: uma relativa à formação do pessoal; outra à utilização dos produtos nacionais de alimentação como elementos da propaganda.
O Estatuto das Escolas Profissionais da Indústria Hoteleira foi publicado no Diário do Governo, 2.a série, de 16 de Outubro de 1957.
Em 25 de Setembro de 1958 foi aprovado, por despacho do Ministro da Presidência, o Regulamento Interno da Escola Profissional da Indústria Hoteleira de Lisboa.
Terá interesse verificar o movimento da Escola Hoteleira de Lisboa. E esse o objectivo dos seguintes números, relativos aos três últimos anos:

[Ver Tabela na Imagem]

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[Ver Tabela na Imagem]

(a) Houve um aluno que foi dispensado do exame do admissão.
(b) Trata-se do total tias inscrições iniciais
(b) Trata-se do total dos termos de matriculas.
(c) Neste ano houve dois alunos dispensados do exame de admissão.

O desenvolvimento futuro do turismo fará grande apelo a profissionais, quer em quantidade, quer em qualidade. Daí a urgência em encarar este importante problema.
Já atrás referi as possibilidades da preparação profissional da indústria hoteleira através dos esquemas da assistência técnica da O. C. D. E. e da Comissão Mista Luso-Suíça. bem como a instituição, em colaboração com o Ministério das Corporações, do sistema da formação profissional acelerada.
Segundo informações oficiais, parece poder-se desde já esperar a assistência suíça relativamente aos seguintes pontos:

a) Colocação em hotéis suíços, a partir de Abril de 1964, de um contingente de 500 a 1000 estagiários remunerados (na base dos salários praticados na Suíça) integrados num sistema didáctico visando a formação profissional ao nível intermédio;
b) Assistência técnica para a elaboração de um plano global para a formação profissional a todos os níveis no sector hoteleiro em Portugal;
c) Concessão de 10 bolsas de estudo para o aperfeiçoamento de profissionais de hotelaria em escolas superiores suíças de hotelaria e turismo (Glyon-Leysin, Lausana, etc.);
d) Colaboração da Associação Hoteleira Suíça para a parte secretarial da organização dos estágios previstos na Suíça, quer do nível superior (10 estagiários), quer ao nível intermédio (500 a 1000 estagiários).

Devemos ter presente o interesse do turismo como actividade que absorve quantidades de mão-de-obra relativamente importantes mesmo para lá da indústria hoteleira. No ano findo calculava-se que o número de pessoas empregadas na indústria turística em Espanha era de 336 000.
E passo ao segundo aspecto.
Comecemos pelo vinho.
No I Colóquio Nacional de Turismo foi apresentada uma interessante comunicação sobre «Os Vinhos e o Turismo em Portugal», de cujas oportunas considerações me passo a servir. De resto, posteriormente, através da televisão, promoveu-se um programa de vulgarização, cujo interesse me apraz salientar.
O vinho e o turismo encontram-se ligados pela dominância que os vinhedos têm nalgumas das mais belas paisagens portuguesas, pela presença no folclore e pelo interesse das qualidades e variedades do próprio vinho.
As «Festas das Vindimas» constituem cartaz de primeiro plano em alguns países da Europa. Por outro lado, os «Roteiros do Vinho» permitem incluir determinadas regiões vinhateiras nos circuitos turísticos principais. Calcula-se que 150 000 turistas visitam anualmente, em Espanha, Jerez de la Frontera atraídos pelas suas adegas.
Impõe-se igualmente uma política de fomento do turismo vinícola em Portugal.
Na variedade dos meios de acção refere-se o seguinte aspecto:

Não pode [...] deixar de se assinalar a necessidade de, com a colaboração directa do Secretariado Nacional da Informação, se disciplinar o serviço de vinhos e a apresentação das respectivas «cartas» nos hotéis e restaurantes, para o que conviria ter em consideração os seguintes princípios, especialmente nos estabelecimentos considerados de utilidade turística:

Para os vinhos de «marca», incremento dos de real interesse, com base nos resultados do Concurso Nacional de Vinhos Engarrafados, disciplina dos preços, sem, todavia, dificultar a manutenção dos de «garrafeira»;
Para os vinhos «da casa», especialmente nos estabelecimentos situados nas regiões vinícolas, obrigatoriedade de servir os vinhos da região (das adegas cooperativas, quando as haja).

Como iniciativas de interesse nacional tem-se defendido:

A organização de uma «enoteca». verdadeira garrafeira nacional, para mostruário e prova dos melhores vinhos portugueses:
A criação de um museu nacional do vinho;
A realização periódica de um festival nacional do vinho, a efectuar de cada vez em sua região vinhateira.

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De resto, o estímulo da cultura vinícola e a promoção do interesse pelos vinhos de Portugal ainda, se conjugariam com:

A instituição de prémios para estudos de investigação histórica e sobre o valor alimentar e higiénico do vinho:
A divulgação de publicações onde se enaltecesse o o valor dos nossos vinhos, elucidando ainda sobro a «arte de beber» e o seu interesse para a culinária;
A organização de cursos especiais destinados a valorização profissional dos que se encontram ligados à produção, comercialização e consumo de vinho:
O estabelecimento de «roteiros do vinho» nos nossos circuitos turísticos e a conveniente publicidade dos mesmos u sinalização das respectivas estradas.

Assim, se os vinhos portugueses podem vir a ser um elemento de atracção dos estrangeiros convirá igualmente, e este é o último ponto que desejo salientar, que estes estrangeiros só transformem em elementos de propaganda dos nossos vinhos nos mercados externos. Para isso haverá que servi-los de forma a levarem do País vinícola as melhores recordações.
Esta última consideração aplica-se com grande, propriedade às conservas de peixe.
O País passou, nos últimos tempos, por alguns desgostos relativamente ao estado de conservas portuguesas exportadas. Mas há outro aspecto que nos deve preocupar: o das conservas que se vendem no mercado interno. Colhe-se, muitas vezes, a convicção de que Portugal consome o refugo da sua própria produção. Se persistirmos neste mau hábito, contribuiremos, além do mais, para que os estrangeiros que nos visitam levem daqui a pior impressão de um celebrado produto nacional.
E que dizer das frutas?
Vejamos o que se passa em Espanha. A laranja, por exemplo, ajuda hoje a compor os cartazes da atracção turística do país vizinho. Quem visita a região de Valência poderá recordar a feira de Julho, o teatro romano de Sagunto, a apoteose das falias, o Museu Nacional da Cerâmica, a pintura do retábulo de Frei Bonifácio Ferrer, do S. Bruno (Ribalta) ou do auto-retrato de Velázquez. Mas no fundo o ineditismo da huerta e da paella, e sobretudo o aroma e o perfume das laranjas da região valenciana perdurarão de forma a que ainda no sector das frutas se aceite o consagrado slogan de que «Espanha é diferente».
De facto, a superfície plantada de citrinos passou do 75 200 ha no período de 1931-l1935 para 105 100 ha em 1960-1961, donde um incremento de mais de 5 000 000 q na produção anual espanhola destes frutos
Quanto a Portugal, ainda há meses, em documento oficial, se denunciavam as grandes deficiências da nossa fruticultura: poucos pomares dignos de tal nome; persistência em plantio disperso ou promíscuo; vegetação de espécies desajudadas de cuidados de granjeio; flora frutícola pobre e desactualizada; baixa qualidade da produção; insuficiências no panorama fitossanitário.
Chega a parecer incrível que um país de tão reconhecida aptidão frutícola vegete em tamanho primarismo e desperdício de potencialidades.
Mas estas debilidades no sector da produção saem ainda mais agravadas numa comercialização que não existo ou num aproveitamento industrial que, à parte um ou outro sucesso, não nos permite, mesmo nos territórios nacionais, competir com a produção estrangeira.
Quando amanhã se desenvolver entre nós o campiny e o caravaniny, é natural que os estrangeiros procedam como já hoje acontece em Moçambique com os da África do Sul: que tragam de outros territórios todos os enlatados destinados à sua alimentação durante o período em que beneficiem do sol e do mar de Portugal e aqui deixem como única recordação as latas vazias das compotas que consumiram...
Nos guias turísticos salientam-se as variedades dos nossos queijos: «Queijo da Serra», «Queijo de Castelo Branco», «Queijo do Alentejo», «Queijo de Azeitão», «Queijo Cabreiro», «Queijo do Rabaçal», «Queijo de S. Jorge», «Queijo da Ilha do Pico», etc.
O incremento no afluxo de turistas trará ao nosso país gentes de regiões onde é notável o consumo de leite e seus derivados, pessoas que recorrem ao queijo com uma habitualidade que imporá, nos problemas de abastecimento, mais do que preocupações de qualidade.
Impõe-se, assim, por um lado, a valorização das especialidades tradicionais e, por outro, incrementar a produção, industrialização e comércio, de forma a abastecer convenientemente os futuros núcleos turísticos.
Ainda aqui serão oportunas as cooperativas. Talvez não seja despropositado recordar que, na Holanda, 85 por cento do seu apreciado queijo é fabricado em instalações do cooperativas.
Mas a metrópole deveria igualmente servir a propaganda dos produtos ultramarinas, através de um conveniente abastecimento aos turistas. E o caso do café, do chá, do cacau, da castanha de caju, das frutas tropicais.
Enaltecemos os Robustas de Angola e o Arábica de Timor. No entanto bebemos há anos na metrópole uma inacreditável chicória, como se lutássemos com grande escassez na produção de cafés.
Mas da «arte de comer» e da «arte de beber» passo agora à Arte, em sentido mais largo. Referirei sucessivamente, aspectos relacionados com o aproveitamento turístico dos valores culturais, a política de embelezamento nacional, e o turismo e a importância do artesanato para o turismo.
Não poderei dizer que os serviços oficiais do turismo tenham realizado aqui uma intervenção exaustiva ou esgotado o mundo de possibilidades que estes sectores oferecem.
No que respeita ao aproveitamento turístico das valores culturais será contudo de justiça dar conta: da adaptação de castelos e palácios a estabelecimentos hoteleiros; da obrigatoriedade de passagem, nos circuitos turísticos, por lugares históricos; da instrução dos guias-intérpretes com vista à divulgação dos nossos valores culturais; de algumas exposições artísticas; de espectáculos como o Som e a Luz dos Jerónimos, a exibição do Verde-Gaio em Alcobaça, o Auto do Descimento da Cruz na Semana Santa em Óbidos; da manutenção do Museu da Arte Popular; do Festival de Sintra, que vai na oitava realização; e dos Cursos de Férias Musicais, no Museu do Conde de Castro Guimarães, na Casta do Sol.
A política cultural alarga-se, de resto, a uma tal multiplicidade de sectores que seria aqui de desejar uma, eficaz coordenação na actividade dos vários serviços públicos e instituições privadas.
É indiscutível que a cultura e a arte constituem o principal cartaz turístico em alguns países.
Já há anos cerca de 70 por cento do turismo estrangeiro procurava na Bélgica as cidades de arte. É a sedução de Bruges, de Gand ou Antuérpia ...
A magia de Paris resulta de uma multiplicidade de atracções a que preside o espírito.

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De resto, as estatísticas de 1961 revelara o interesse pelos museus ou monumentos de França, através do número de entradas pagas em alguns desses estabelecimentos: Versalhes, 940 000; Louvre, 814 617; Sainte-Chapelle du Palais, 371 504; Abadia, do Monte de Saint-Michel (Mancha), 350 440; Fontainebleau, 292 092; Jeu de Paume, 242 303; Castelo do Haut-Koenigsbourg (Baixo Reno), 208 186; Trianons, 192 998; Castelo de Chambord (Loire-et-Cher), 190 468; Castelo d'If, em Marselha (Bocas do Ródano); 162 938...
Os números são igualmente expressivos para a Itália, conforme se pode concluir do seguinte quadro (cf. Statistica del Turismo, n.º 49/50):

[Ver Tabela na Imagem]

Ainda aqui, aliás, se pode exemplificar com a Espanha. «Espanha, compêndio de arte, é um cartaz tão válido como o da festa dos touros ou o das praias do Mediterrâneo. Do Pátio dos Leões do Alhambra ao Mosteiro de S. Lourenço, do Escoriai, do Templo da Sagrada Família, de Barcelona, ou à cripta do Vale dos Caídos, são séculos de arte e de história. Mais: este cartaz artístico regionalizai-se. Se, por exemplo, o Museu do Prado contém as melhores colecções da pintura espanhola, logo a propaganda turística nos adverte de que se é verdade que Velázquez tem a sua melhor luz em Madrid. El Greco se completa em Toledo, Murillo continua a compreender-se melhor em Sevilha ou Zubaran no Mosteiro de Guadalupe.
Dir-se-á que o nosso património artístico não constitui um conjunto de grande valia. Mas a atracção turística completa-se na variedade dos seus recursos. Mais: é susceptível de se valorizar através da propaganda.
As estatísticas, talvez mesmo com certa dose de optimismo, revelam o pouco interesse que os nossos museus despertam (cf. Estatística da Educação, 1959):

[Ver Tabela na Imagem]

Creio impor-se ainda uma política de descentralização quanto a estas manifestações culturais. Haveria, assim, toda a conveniência em estabelecer museus (ou estabelecimentos afins) em vários centros do País. O próprio recheio dos museus nacionais que hoje não é exposto poderia ser depositado nesses novos museus regionais.
Além da sua indiscutível projecção cultural, esta solução ajudaria a compor os cartazes de possíveis circuitos turísticos.

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Tenho presente uma pequena brochura de propaganda turística francesa - Les Musées de France (un répertorie sommaire des Musées d'Art et d'Histoire)- donde se verifica que mais de 270 cidades e vilas da França possuem museus, num total de cerca de 500 estabelecimentos.
Desejo deixar aqui uma palavra de reconhecimento e de louvor à Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais pela sua meritória tarefa de restauro dos nossos monumentos. A obra empreendida nas últimas décadas (que os respectivos boletins tão significativamente documentam) é notável, podendo o turismo congratular-se com tão estimável apoio.
Mas também os festivais, os cursos de férias e os congressos internacionais justificam uma referência.
Os festivais são utilizados em mu tos países como grande cartaz de atracção turística.
A Espanha, em 1963, levou a bom termo o décimo segundo ano de política de festivais. De facto, no ano findo, os festivais de Espanha tiveram lugar em 45 cidades (ou outros centros), com um total de 521 espectáculos (teatro, música, pintura, bailei, ópera, folclore, etc.), a que assistiram 1 milhão de pessoas. O empreendimento representou uma despesa de 100 milhões de pesetas (das quais 25 por cento recuperáveis através da venda de bilhetes), tendo a participação do Ministério da informação e do Turismo sido de metade.
Torna-se indispensável elaborar também para Portugal planos desta natureza, interessando nos mesmos não só os serviços centrais de turismo, como os órgãos regionais e locais e as instituições particulares e as actividades económicas.
Quanto aos cursos de férias para estrangeiros estamos igualmente longe, de esgotar as possibilidades de oportunas iniciativas.
Tenho presente o folheto de propaganda Cursos para Extranjeros, Espana - 1963, editado pelo Patronato de Cursos para Extranjeros, do Ministério da Educação Nacional do país vizinho. Por ele se vê que 24 cidades de Espanha organizaram em 1968 cursos para estrangeiros: dez na zona norte (Bilbau, Jaca, Leão, Oviedo, Orense, Pamplona, Santander, Santiago de Compostela, San Sebastian, Saragoça); quatro na zona levantina (Alicante, Barcelona, Palma de Maiorca, Peniscola); quatro na zona centro (Burgos, Madrid, Salamanca, Valhadolid); seis na zona sul [Cádis, Fuengirola (Málaga), Las Palmas (Grande Canária), Málaga, Sevilha].
No que respeita aos congressos internacionais, Portugal, pela sua localização e condições de ambiente, poderia aspirar a constituir uma encruzilhada para estes encontros. No ano findo, segundo elementos oficiais, a Direcção dos Serviços de Turismo deu apoio financeiro a dezoito reuniões internacionais de maior ou menor importância. Os congressos internacionais ligam-se a um turismo de élite, cuja importância, nestes tempos de turismo popular, não deve ser minimizada, quer no plano económico, quer no plano social.
As relações entre a política de embelezamento e o turismo traduzem-se, além do mais, na intervenção dos serviços de turismo no embelezamento geral, na defesa da paisagem e dos sítios naturais, na salvaguarda do património urbanístico, na educação das populações e no combate à mendicidade e formas de parasitismo social.
Não será difícil encontrar em alguns números da base III da Lei n.º 2082 uma atribuição de competência em ordem u realização de tais desígnios. De resto, os cursos de recepção turística destinados aos órgãos locais de turismo, a instituição do «Dia do turista», a valorização turística dos moinhos de Portugal, os concursos das estações floridas e os concursos das janelas e ruas floridas podem ser recordados a este propósito.
Penso que deveríamos progredir no culto da flor, da árvore, na valorização dos ordenamentos paisagísticos e na estima da floresta como factor de turismo. A oportunidade destes temas foi salientada numa comunicação ao I Colóquio Nacional de Turismo, sobre A Floresta e o Turismo.
O culto da flor constitui um testemunho de harmonia e de beleza. Países como a Holanda ou a Suíça poderiam ser recordados, a propósito do valor comercial da flor ou da sua utilização como elemento da atracção turística. A instituição da «Semana da flor», em Portugal, a divulgação de conhecimentos sobre a jardinagem nas escolas ou mesmo através de cursos especiais, o prosseguimento de iniciativas como as do Município de Lisboa ou as dos concursos atrás referidos, constituirão outros tantos caminhos para estímulo de grandes possibilidades que nos são prodigalizadas pelo próprio clima.
E que dizer das relações entre a urbanização e o turismo?
Eis um tema complexo, na multiplicidade dos aspectos que comporta e. sobretudo, das dificuldades de que se tem rodeado.
O turismo pode impor soluções que desagradam a um urbanismo tradicionalista, do mesmo modo que pode brigar com uma indiscriminada planificação. É natural, por exemplo, que o desenvolvimento turístico do Algarve recomende a criação de conjuntos, caracterizados por uma variedade de edifícios hoteleiros ou instalações afins e complementares que formem estações turísticas animadas, mas um tanto em oposição à paisagem tradicional. Por outro lado, a defesa das cidades de arte ou até de pequenos conjuntos históricos impõe particulares limitações a soluções mais ousadas ou modernistas.
As relações entre o turismo e a urbanização alargam-se, de resto, ao considerarmos o próprio planeamento das infra-estruturas turísticas (cf., por exemplo, a comunicação apresentada ao I Colóquio Nacional de Turismo sobre O Turismo e a Urbanização). O Plano de valorização turística do Algarve, que tenho referido, é um exemplo destes processos de trabalho.
Ainda aqui poderia invocar o testemunho do Prof. Amorim Girão (in Geografia Humana):

É sobretudo nos modernos trabalhos de urbanização que o poder do homem se afirma de maneira mais impressionante à nossa vista. E não precisamos de sair da terra portuguesa para encontrar um exemplo bem sugestivo desse facto. Quem compara o panorama que nos oferece actualmente a nossa bem conhecida Costa do Sol, com o que nos apresentava, ainda há poucas dezenas de anos, não deixará de confessar-se maravilhado e de sentir bem ao vivo todo o papel geográfico reservado à actividade humana.

Cabe aqui uma palavra de louvor à Câmara Municipal de Lisboa, pela forma como tem prosseguido na valorização turística da capital. Tenho presente a primorosa publicação Lisboa, Cidade de Turismo, que é uma das muitas edições da Direcção dos Serviços Centrais e Culturais. Nela são invocados temas e se dá conta de realidades de alto valor turístico: a cidade e a sua história; a cidade antiga; Alfama, onde cada pedra fala do passado; velhos monumentos da cidade; museus de Lisboa; o Tejo, espelho de Lisboa; jardins de Lisboa; Estufa Fria, um recanto do paraíso no coração, de Lisboa; zona flo-

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restal de Monsanto e o parque de campismo e de turismo; miradouros, janelas sobre a cidade; Lisboa de noite; Lisboa centenária, capital moderníssima; viagem à roda de Lisboa; monumentos nos arredores de Lisboa ...
A salvaguarda das cidades de arte ou de simples povoações típicas ou históricas deverá manter-se na primeira linha das nossas preocupações.
A iniciativa da aldeia mais portuguesa de Portugal poderia ter sido prosseguida e valorizada. Quando, por exemplo, nas encostas da serra da Estrela, visito Linhares da Beira e Folgosinho da Beira., entristeço-me, ao ver o abandono a que estes preciosos testemunhos do passado têm sido votados. Os serviços centrais deveriam chamar a si a defesa destes velhos burgos, enquadrando-os posteriormente em circuitos turísticos, que sairiam valorizados pelo ineditismo destes cartazes. No caso concreto, impor-se-ia, de resto, a construção da correspondente estrada de penetração na serra da Estrela.
Mas o nosso desleixo ou incompreensão feriu jóias preciosas, como a própria cidade de Coimbra.
Já noutra oportunidade me referi nesta Assembleia (cf. Diário das Sessões de 12 de Fevereiro de 1958) ao que aconteceu com Coimbra.
O meu primeiro apelo foi então a favor da paisagem tradicional da região.
Não raro, numa consternação toda feita de mágoa, se ouve perguntar: que resta dos celebrados choupais dos campos do Mondego?
Em alguns pontos, confrange dizer que apenas uma ou outra relíquia, talvez prestes a ser sacrificada à intensiva agricultura, à defeituosa expansão urbana, ao progressivo assoreamento.
O que fizeram dos famosos olivais, que, em sua dolente nostalgia, constituíram fonte de inspiração poética a tantas gerações?
Sacrificaram-nos a uma uniformidade de telhados em presenças mortas de caricato geometrismo.
A própria sinfonia dos inigualáveis matizes verdes de Coimbra, que, em sua orquestração de tonalidades múltiplas e gritantes, constituiu, certamente, estímulo aos almejos do poeta do Só, para que os pintores deste belo País viessem pintar, tem corrido graves riscos.
Impõe-se, na verdade, não afastar Coimbra da sua vegetação secular, mas antes devolver à paisagem regional um possível sentido de natureza intacta ou, ao menos, um equilíbrio biológico que se oponha à degradação de um utilitarismo grosseiro, de uma desordenada presença do exótico ou até a prenúncios de uma monotonia pré-desértica.
À volta do centro universitário de Coimbra, ou até antecipando-se-lhe, desenvolveu-se um conjunto monumental e urbanístico inigualável em sua variedade, riqueza e equilíbrio.
Pois este tesouro foi, em parte, sacrificado a uma «urbanização de caliça», que todos condenam, mas ninguém soube evitar.
Importa, ao menos, defender o que resta, dar efectiva aptidão funcional a alguns valores desse património.
Exemplifico com alguns monumentos. A Igreja de S. Salvador, contemporânea da Sé Velha e profundamente alterada nos séculos XVIII e XIX, bem merece as melhores atenções. Manuelino e de decoração naturalista, o Palácio de Sub-Ripas, hoje propriedade particular, é outro elemento essencial da Coimbra artística. Confrange o abandono a que está votado. Não poderia a Fundação Gulbenkian adquiri-lo e instalar nele um museu? A Torre do Anto, bem próximo, não deveria, por seu turno, ser dedicada à evocação de António Nobre, ou da Coimbra estudantil e poética do seu tempo?
Cuidar do património artístico de Coimbra não seria, de resto, só isto. Santa Clara-a-Velha, os claustros e o Parque de Santa Cruz, as capelas transformadas em agências funerárias, armazéns de mobílias ou garagens, os velhos palácios residenciais ou simples casas seculares, clamam igualmente reintegrações e restauros.
Mas o nosso esforço, em Coimbra, deveria prosseguir na criação de novas formas de arte ou estima de presenças culturais.
Não poderia o Governo oferecer à cidade uma estátua de João XXI, a erguer no lugar entre a Sé Nova e a Faculdade de Medicina?
Embora estranho a Coimbra, Pedro Hispano, como Santo António de Lisboa e S. Teotónio - estes dois historicamente tão ligados à cidade do Mondego e infelizmente sem nela também terem a devida consagração pública -, representa, com os primórdios da nacionalidade, um dos maiores luminares da nossa cultura. Papa, sábio mestre e médico famoso, ficaria bem lembrá-lo no solar da cultura portuguesa, num local onde a Igreja e a Medicina se encontram.
Casa-mãe da poesia, Coimbra evoca o amor, a grandeza ou até a desventura de tantos altos espíritos que no recolhimento das arcadas dos seus templos, no isolamento de miradouros famosos ou até nos ardores de um bulício todo feito de inconformismo juvenil abriram os caminhos da cultura, compuseram as mais belas páginas de uma literatura poética que não é pobre. Eis um mundo de razões para ainda aqui renovar o voto para que se erga em Coimbra «uma memória» que consagre os poetas de Portugal.
Mais. A coincidência das festas do Centenário da Reconquista Cristã da Cidade com os 75 anos do Sr. Prof. Oliveira Salazar animam-me também a sugerir que Coimbra preste ao Sr. Presidente do Conselho aquela grande homenagem que desde sempre lhe deveu. A Praça da República, enquadrada, além do mais, pela Quinta de Santa cruz e sua formosa fonte do Jogo da Péla, seria o local indicado para Coimbra erguer uma estátua ao primeiro português do nosso século. Culminaria na sua inauguração todo um conjunto de expressões culturais que testemunhariam a continuidade de um espírito que só tem uma palavra para o definir: Portugal.
E passo a outro capítulo: o do artesanato e do folclore.
A importância, do artesanato recomenda que se defina uma política artesanal delineada com intuitos turísticos, se incremente a protecção e o estímulo das actividades artesanais, se proteja a comercialização dos produtos do artesanato e se realize a sua expansão no estrangeiro. A recente exposição espanhola de recursos turísticos, realizada em Paris, Exportur, e que posteriormente irá a Francoforte, Munique, Roma e Londres, é igualmente um completo mostruário das artesanias do país vizinho.
Iniciou-se, em 1959, um inquérito para localizar os vários núcleos de artesanato popular dispersos pelo nosso país. Conviria acelerar os trabalhos em curso, pois este reconhecimento geral constituirá uma base para o planeamento da valorização futura.
A assistência técnica a olarias como a de Nisa, de Modelos e uma de Barcelos constitui uma experiência quanto ao estímulo a prestar pelo S. N. I. às indústrias populares decadentes. De igual modo, a criação do Museu de Cerâmica. Regional de Barcelos poderá, além da sua função turística geral, ajudar a impedir a degenerescência do artesanato. Justifica-se, na verdade, a multiplicação destes museus de arte popular, convindo que se

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de vida a projectos em estudo, como os dos Museus de Estremoz e de Nisa.
Mas o artesanato é apenas uma das expressões da alma do povo. Ora este povo que vive a Feira do Ribatejo, a Festa do Colete Encarnado, de Vila Franca, a Feira de S. Martinho, da Golegã, a Festa do Senhor do Castelo de Coruche, este povo que ama a «festa brava», com o mesmo entusiasmo com que dança os «viras» no Minho ou os «corridinhos» no Algarve, é o grande cartaz turístico de Portugal. As ideias, as vivências, as sugestões, acumulam-se intensamente no meu espírito para que lhes possa pôr ordem ou realizar uma simples enumeração. Eis o autêntico «festival português», na sua pureza (que é preciso defender) e ineditismo (que importa propagandear). É a alma de um povo generoso 3 fraterno que levará o turista estrangeiro a repetir a confissão de Miguel Unamuno:

Que terá este Portugal para que assim me atraia?
Que terá esta terra por fora risonha e branda, por dentro atormentada e trágica? Não sei. Mas quantas mais vezes lá vou mais desejo voltar.

Mas se, como escreve Eça de Queirós em A Ilustre Casa de Ramires, o português possui, igualmente, um espírito prático, sempre atento à realidade útil, dediquemos também uma palavra ao turismo de negócios.
É ainda a literatura que nos evoca as grandes exposições universais do século passado: a de Londres, de 1861, a que assistiram 6 milhões de pessoas; a de Paris, de 1867, com 11 milhões de visitantes, ou a de 1889, ainda na Cidade da Luz, que atraiu mais de 33 milhões de franceses e estrangeiros (cf., por exemplo, René Duchet, Le Tourisme à travers les Ages).
Mais perto de nós, a Feira Universal de Nova Iorque (1939-1940) recebeu 48 milhões de visitantes. Mais recente ainda foi a Exposição Universal de Bruxelas, testemunho de como é possível a um país pequeno organizar grandes empreendimentos.
As exposições e feiras constituem, na verdade, grande apoio para o fomento do turismo de negócios. Cidades como Milão, Hanôver ou Barcelona ligam o seu nome a certames famosos. De resto, uma acentuada especialização revela-se, actualmente, em certas feiras, como os famosos salões automóveis de Paris, Turim ou Genebra, ou as 23 feiras de Londres.
Ligados a feiras estão os congressos profissionais e económicos.
Ainda aqui poderia invocar o exemplo da Bélgica. No ano de 1952-1953 realizaram-se aí 94 congressos (20 em Antuérpia; 4 em Bruges; 13 em Bruxelas; 34 em Gand; 7 em Knokkle; 11 em Ostende, e 5 em Namur), que proporcionaram aos respectivos hotéis 107 000 noites de dormidas (cf. Arrillaga, Sistema de Política Turística).
Quanto a Portugal, merece destaque o esforço relativamente à Feira Internacional de Lisboa e ao aproveitamento, para outros certames, das respectivas instalações da Junqueira.
Mas ainda aqui, além de uma colaboração entre os serviços de turismo e os organismos ligados às actividades económicas ou sua representação, mesmo no exterior, importaria estar atento às possibilidades de incrementar em território nacional a realização de exposições, feiras comerciais e congressos profissionais e económicos.
Esta internacionalização dos encontros ou das atracções tem hoje profunda retumbância nos desportos. A informação mundial fala com frequência dos Jogos Olímpicos, da Taça do Mundo de Futebol, da Taça dos Campeões Europeus de Futebol, do Rally de Monte Carlo, da Taça Davis, da Volta à França, do Derby de Epson, do Grande Prémio de Deauville ... Aficionados ou curiosos, tal como os desportistas com seus séquitos, acorrem à Áustria ou a Tóquio, numa afluência nada despicienda para as reservas cambiais dos respectivos países. Mais: estes desportistas são os embaixadores do seu próprio país, em grandes camadas da opinião pública mundial: a Finlândia foi revelada pelo seu atletismo vai para três décadas.
Deveríamos ter mais presente o interesse de organizações competitivas internacionais em Portugal. Seria injusto silenciar alguns esforços, nomeadamente os respeitantes aos rallies automóveis, a que, aliás, o S. N. I. tem dado o seu patrocínio, e aos campeonatos da vela efectuados na baía de Cascais (sobre a política de desportos na Costa do Sol podem ver-se os números da interessante revista da Junta de Turismo da Costa do Sol, Cascais e Seus Lugares).
Mas para lá deste aspecto competitivo de primeiro plano está a necessidade de prodigalizar ao turista comum a prática dos seus desportos habituais ou de pôr ao serviço do turismo desportivo algumas possibilidades naturais das regiões.
O equipamento desportivo da Costa do Sol é já um exemplo do aproveitamento que se pode fazer em ordem a servir o primeiro aspecto. Três piscinas (uma das quais de água salgada), extensos campos de golf, numerosos courts de ténis (entre eles sete no parque), picadeiros com cavalos alugados, 71 pesqueiros oficialmente demarcados entre Cascais e o Guincho e principalmente o famoso cenário de uma baía aberta aos mais variados desportos náuticos, tudo isto constitui um conjunto que deverá estar à altura daquela observação de um estrangeiro: «O Estoril é de todos os pontos de vista superior a Biarritz, Nice ou Catânia. O facto é que, tendo procurado em toda a zona ocidental e meridional da Europa um bom clima para nele fixar a minha residência, nenhum ainda encontrei que pudesse sofrer comparação com o Estoril durante os meses de Novembro a Março, tanto pela pureza da atmosfera, igualmente de temperatura e secura comparada, como pela ausência de ventos» (cf. a publicação Estoril, caderno n.º 8 da Colecção Turismo).
A criação de estações turísticas em Portugal imporá assim a construção de parques desportivos complementares.
Há, de resto, um aspecto a que desejaria dar particular relevo: o das piscinas.
Penso que se deveria elaborar um esquema geral de ocupação dó País por piscinas, de forma a dotar com tal melhoramento os principais aglomerados da costa e do interior.
O desenvolvimento do turismo «fora de estação» recomenda que nas estações balneares do litoral ocidental do continente se construam piscinas, libertando deste modo o estrangeiro, habituado às águas cálidas do Mediterrâneo, das frias águas do Atlântico.
A legislação sobre turismo actualmente em vigor prevê, fundamentalmente, o crédito aos estabelecimentos hoteleiros e similares.
É certo que já se subsidiaram, através do Fundo de Turismo, instalações como as piscinas de Braga e de Tomar.
Convirá assim que novos diplomas considerem a possibilidade de crédito a outras infra-estruturas turísticas, além das hoteleiras.
Outros desportos de interesse turístico são a caça, a pesca, o excursionismo (pedestrianismo, ciclismo, moto-

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rismo, automobilismo, navegação e aviação desportiva), o montanhismo e o alpinismo, o campismo e, finalmente, os desportos da neve.
Já no I Colóquio Nacional de Turismo foram apresentadas várias comunicações acentuando a riqueza de alguns dos nossos recursos naturais para estes desportos e insistindo pela necessidade de lhes dar um conveniente aproveitamento: «Defesa e aproveitamento dos valores turísticos nacionais», «A caça como fonte de turismo», «A caça como elemento de valorização do turismo nacional», «A importância do chamado desporto submarino no desenvolvimento do turismo em Portugal», etc.
Os desportos de Inverno revestem-se de importância fundamental para o turismo em alguns países europeus. A Suíça, a Áustria, a França, a Itália ou a Noruega exploram, com largo proveito, as aptidões que a neve e a montanha lhes prodigalizam. Nestes países desenvolveram-se actividades múltiplas fundadas em tais atracções: meios de comunicação (caminhos de ferro, teleféricos, telesquis, etc.), hotéis, refúgios, albergues, equipamentos desportivos e vestuário, serviços de guias e de escolas de aprendizagem, etc.
A França, mesmo na multiplicidade dos seus recursos turísticos, não tem minimizado o interesse das estações de Inverno. Uma propaganda bem organizada (cf., por exemplo, a brochura Sports d'Hiver en France) salienta a atracção e as comodidades das estações dos Alpes (75), dos Pirenéus (3), do Jura (2) e do Maciço Central.
Na época de Dezembro de 1960 a Março de 1961, os hotéis das estações de Inverno francesas acusaram 2 063 453 dormidas, das quais 152 826, ou seja 7,4 por cento, pertenceram a turistas estrangeiros. Os departamentos da Alta Sabóia (42 por cento), da Sabóia (28 por cento), de Isère (13 por cento) e dos Altos Alpes (7 por cento) tiveram o maior número de presenças. No que respeita a estrangeiros, foram os Belgas e Luxemburgueses (25,5 por cento), os Ingleses (15,6 por cento), os Alemães (11,5 por cento) e os Americanos (9,6 por cento) que ocuparam os primeiros lugares (cf. Le Tourisme en France, 1961).
Naturalmente que em Portugal, neste sector, as possibilidades serão relativamente reduzidas. Há no entanto que louvar os meritórios esforços da Comissão Regional de Turismo da Serra da Estrela. A construção do teleférico da serra da Estrela tem, além do mais, o objectivo de aproveitar, para a prática do esqui, as pistas de maior altitude, oferecendo-se assim a possibilidade de se alargar o período daquele desporto.
Creio, de resto, que a valorização turística de outras zonas montanhosas do País poderia ser apoiada com a construção de outros teleféricos.
Bem perto de Lisboa, o caso de Sintra e da sua prodigiosa serra é um exemplo de velhas aspirações que não se têm realizado. Quando, às vezes, do Palácio da Pena, contemplo os horizontes que proporcionam um dos mais belos recantos da Europa e sinto como toda esta estância famosa parece esquecida ou vivo adormecida, ganham para mim ressonância amarga as estrofes de Lord Byron, em Childe Harold: «Oh! Em que variegado labirinto de montes c vales surge agora o glorioso Éden de Sintra! Ai de mim! Qual a pena ou pincel que reproduzir pode metade sequer das suas belezas, mais ofuscantes a olhos mortais que as descritas pelo bardo que abriu ao Mundo, tomado de espanto, as portas do Elísio?»
Tenho salientado no decorrer deste aviso prévio que as praias constituirão o principal cartaz turístico de Portugal.
Já na comunicação «O Turismo e a Urbanização», atrás referida, se salientava com oportunidade:

Parece não haver dúvida de que os núcleos urbanos existentes no litoral são hoje os que maior interesse despertam para o turismo. Com efeito, as nossas praias, de norte a sul do País, apresentam uma gama completa de estâncias balneares, desde as que se situam em centros urbanos de denso povoamento (Póvoa e Figueira da Foz), até às praias de maior isolamento, como as de Sines, de Sagres, etc. Além das praias características pelo seu meio pitoresco, a Nazaré e a Ericeira, por exemplo, apontam-se, ainda, os poéticos trechos da. costa de S. Pedro de Muel e, por fim, as ridentes praias de Setúbal e do Algarve, pelo colorido forte das suas arribas. É esta diversidade que acrescenta, ainda, uma maior riqueza a esse filão, praticamente inexplorado, do turismo em Portugal.

Penso que está por fazer, relativamente às nossas praias, um estudo sistemático das suas realidades e possibilidades, em ordem a programar, também conjuntamente, o seu aproveitamento turístico.
Não poderemos, por exemplo, desconhecer as particularidades geográficas e climatéricas. Já há anos, o Prof. Orlando Ribeiro, num apreciado estudo, Portugal, o Mediterrâneo e o Atlântico, salientava:

E no litoral português que se extremam duas regiões climáticas diferentes: a mediterrânica e a oceânica. A primeira, com as afinidades tropicais do seu Verão quente e seco, seus Invernos doces, atravessados por fugazes perturbações vindas do Ocidente. A segunda, sujeita já ao influxo permanente dos ventos de oeste, ventos húmidos do Atlântico, onde nascem os ciclones que rumam a leste. A aragem marítima tempera o clima e faz descer a amplitude anual. Mas o Inverno já se sente, com temperaturas baixas, noites frias, muitos dias consecutivos de chuvas, neves nas montanhas. No Verão, o clima mediterrânico reina por toda a parte, no litoral e no interior, na terra chã e nas serranias.

Um esforço de sistematização quanto às praias portuguesas poderá permitir o seguinte enquadramento (cf. O Turismo e a Urbanização, cit.):

1) Praias de clima atlântico. - Situadas na linha do litoral orientada na direcção norte-sul e onde as praias se expõem a oeste (Póvoa, Figueira, Caparica, Sines, etc.).
2) Praias de clima mediterrânico. - Situadas nas costas orientadas na direcção este-oeste, beneficiando de uma exposição a sul. Não será difícil referir aqui quatro regiões: Costa do Sol, Outão a Sesimbra; Sagres a Faro; Faro a Monte Gordo.

Ora o aproveitamento turístico não poderá esquecer estas realidades, devendo as próprias infra-estruturas ser concebidas e realizadas de acordo com as exigências que as mesmas põem.
No seguimento desta orientação recomendar-se-ia ainda uma propaganda conjunta, no exterior, das praias de Portugal.
Ainda aqui poderia referir o exemplo da França (cf. a publicação Les Plages de France).
As praias do Norte e da Normandia, as praias da Bretanha, as praias do Atlântico e as praias do Mediterrâneo são lembradas em conjunto ao turista. É a variedade de

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um cartaz que oferece toda a gama de climas marítimos, aliados à pesca submarina, aos desportos náuticos, aos castelos da Normandia, aos calvários da Bretanha, às igrejas de Saintonge, às danças do país basco, à cobla do Rossilhão, aos monumentos da Provença ou às batalhas de flores da Costa Azul.
O turista escolherá assim os locais de repouso ou os centros mundanos, as pequenas aldeias de pescadores ou os portos de grande movimento, as praias cosmopolitas ou os areais quase selvagens. O ar puro, o iodo, o sol ou o vento marítimo virão ter com ele junto de falésias abruptas ou nas extensões de praias de areias finas, à sombra dos pinheiros que cobrem a duna ou na contemplação da silhueta de uma serra onde a própria luz se compraz em tons de doçura e nostalgia.
E que dizer das nossas termas?
Creio constituírem um dos sectores mais votados ao abandono em Portugal.
A técnica moderna de equipamento turístico recomenda, desde logo, a realização de um reconhecimento geral das nossas estâncias termais.
Elaborar-se-ia depois um programa de valorização tendo em conta: o estudo, conhecimento e divulgação das propriedades das águas mineromedicinais e das suas possíveis aplicações; a dotação dos balneários com as convenientes instalações terapêuticas e pessoal técnico especializado; a construção, renovação e melhoria das instalações hoteleiras e complementares; a dotação das termas com centros de recreio e desporto, e. a melhoria nos respectivos meios de acesso.
Justifica-se que a lei do crédito turístico seja alterada de forma a apoiar também o equipamento termal. Recomenda-se, por outro lado, uma ligação à Fédération Internationale du Thermalisme et du Climatisme a fim de se promover internacionalmente uma divulgação das características e possibilidades das nossas termas.
A França tem realizado no estrangeiro uma publicidade conjunta das suas estâncias termais (cf. por exemplo, a publicação em espanhol Estaciones Termales) e, embora a percentagem dos estrangeiros, relativamente aos Franceses, seja modesta na utilização das fontes hidrominerais, não se pode dizer tal presença absolutamente despicienda.
Eis os números relativamente à frequência dos estabelecimentos termais franceses em 1961 (cf. Le Tourisme en France, cit.):

[Ver Tabela na Imagem]

As estações termais, pela sua localização, poderão ainda apoiar o desenvolvimento de regiões atrasadas do nosso país. Convirá, por outro lado, ter presente que os portugueses do ultramar constituirão de futuro um maior mercado para esta oferta.
A última referência que desejo fazer neste aviso prévio é às agências de viagens e aos guias-intérpretes.
Estou convencido da grande importância que umas e outros têm para o desenvolvimento do turismo em Portugal. Daí, ainda, que me pareça sempre meritório o esforço de valorização destes sectores dos serviços turísticos.
De acordo com o Decreto-Lei n.º 41 248, de 31 de Agosto de 1947, os alvarás das agências de viagens estão divididos em duas classes.
As agências da classe B podem exercer as seguintes actividades:
1.º Obtenção de passaportes ordinários, certificados colectivos de identidade e viagens e respectivos vistos;
2.º Aquisição ou venda de bilhetes de passagem em qualquer meio de transporte, reserva de lugares, expedição e transferência de bagagens que se relacionem com esses bilhetes;
3.º Realização, por conta do cliente, em companhias autorizadas, de seguros contra riscos de viagens, quer pessoais, quer pertinentes às respectivas bagagens.
As agências da classe A podem, além das actividades referidas para as da classe B, exercer ainda:
4.º Reserva de quartos em hotéis e estabelecimentos similares;
5.º Recepção de turistas e sua assistência durante a viagem ou permanência no País, incluindo a venda de senhas para refeições e a aquisição de bilhetes ou reserva de lugares para espectáculos;
6.º Representação de agências similares estrangeiras;
7.º Organização de cruzeiros e de viagens e excursões individuais ou colectivas no País ou no estrangeiro, com ou sem inclusão de serviços acessórios, por sua iniciativa ou de outrem, utilizando meios de transporte próprios ou alheios.
Por este simples enunciado se vê qual poderá ser o grande papel desempenhado pelas agências de viagens no incremento do turismo em Portugal.
Ainda quanto às agências de países estrangeiros, parece-me louvável que os nossos serviços oficiais de turismo mantenham um contacto permanente, convidando os respectivos agentes a visitarem-nos, organizando a programação e efectivação dessas visitas; convirá ainda que ofereçam todo o apoio (inclusive financeiro) a outras organizações nacionais que realizem idêntica política de atracção.
Os guias e intérpretes encontram-se organizados num sindicato nacional, constituído ao abrigo do Decreto-Lei n.º 23 050. Data, de resto, de 27 de Julho de 1924, o Decreto n.º 10 292, que regulamentou a sua actividade.
No I Colóquio Nacional de Turismo o Sindicato apresentou uma comunicação sobre a situação e problemas da classe.
O incremento do turismo em Portugal fará maior apelo a servidores deste tipo. Parece-me, por outro lado, de insistir, nos esforços para a sua constante valorização profissional.
Sr. Presidente: chego assim ao termo desta longa exposição.
As recentes declarações do nosso antigo colega nesta Assembleia Nacional, hoje muito ilustre Subsecretário de Estado da Presidência do Conselho, Dr. Paulo Rodrigues, trazem, pelos propósitos que evidenciam, muito de reconfortante à panorâmica do turismo português.
Deus queira que o ânimo de travar nos tempos próximos uma batalha decisiva ganhe a compreensão e o apoio de todos.
Por mim, e como modesta colaboração, permito-me oferecer à consideração desta Assembleia Nacional as seguintes conclusões:
I) Impõe-se dar novo sentido à actuação em prol do desenvolvimento do turismo em Portugal. Este desígnio harmoniza-se com:
1.º A reorganização dos serviços centrais de turismo.

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Uma nova lei orgânica deverá proporcionar uma estrutura compatível com a importância e projecção futura do turismo, dotando os serviços com quadros de pessoal suficiente, quer no aspecto de qualidade, quer no de quantidade.
2.º Uma coordenação dos vários serviços ligados, directa ou indirectamente, ao turismo, por forma a evitar conflitos de competências, duplicações de esforços ou desperdícios de actuações.
3.º Uma revisão na estrutura, competência e âmbito territorial dos órgãos regionais ou locais de turismo, cuidando ainda da sua eficaz ligação aos serviços centrais.
4.º Um estudo pormenorizado dos vários aspectos do turismo em Portugal, tendo em conta a detalhada inventariação dos recursos existentes, considerando os pólos de atracção turística reais ou potenciais, as redes de comunicações e transportes, os equipamentos de recepção balnear, distracção, etc., de forma a, ainda com base nestes elementos, proceder a uma correcta divisão do território em regiões turísticas;
5.º A definição, através de um plano nacional de fomento turístico, integrado por planos regionais, de uma política nacional de desenvolvimento, onde se definam os seus objectivos e se equacionem os meios previstos para tal realização.
Esta programação terá em conta as conexões entre o turismo e a economia, nomeadamente a contribuição do turismo para o rendimento nacional, o apoio do turismo estrangeiro à balança de pagamentos, os investimentos a realizar no turismo, as incidências no emprego, os aspectos fiscais e a projecção geral sobre a agricultura, a indústria e outros sectores dos serviços.
II) Convém nos domínios das realizações práticas:
1.º Intensificar, por todos os meios possíveis, a propaganda de Portugal no estrangeiro, nomeadamente nos países da Europa, Estados Unidos e Canadá;
2.º Ligar a nossa atracção turística à Espanha, de forma a prolongar até Portugal a presença dos estrangeiros que visitam o país vizinho;
3.º Intensificar o desenvolvimento do turismo de Inverno;
4.º Criar uma mentalidade turística, facilitando a entrada, deslocação e comodidade dos turistas estrangeiros, desenvolvendo a arte de bem receber e combatendo formas de parasitismo social;
5.º Recorrer ao apoio externo em matéria de assistência técnica e financeira e processos de publicidade e atracção de turistas;
6.º Intensificar o intercâmbio turístico entre a metrópole e o ultramar e desenvolver as possibilidades turísticas das províncias ultramarinas;
7.º Cuidar dos transportes como infra-estrutura essencial ao fomento turístico, tendo, nomeadamente, em atenção:

a) Quanto ao caminho de ferro, a possível eliminação das características lacunares da rede nacional, a conveniente ligação aos sistemas internacionais nos percursos e nas tarifas e um aumento na velocidade, comodidade e segurança dos passageiros;
b) Quanto às estradas, uma construção de novos percursos (tendo em conta as grandes artérias internacionais), renovação, melhoria e reparação dos traçados existentes e dotação de apoios complementares desde as eficazes estações de serviço aos telefones;
c) Quanto aos transportes marítimos, a realização de obras portuárias, o equipamento dos portos com gares marítimas e a valorização dos serviços da frota mercante;
d) Quanto às águas interiores, o incremento das estações desportivas, realização de pequenos cruzeiros e o aproveitamento turístico das barragens construídas nos últimos anos;
e) Quanto à aviação, a construção do novo aeroporto de Lisboa, a criação de uma rede de aeródromos na metrópole, a multiplicação das explorações de voos regulares internos e internacionais e, sobretudo, uma política de liberalização que nos permita beneficiar das vantagens do charters;
f) Finalmente, uma coordenação eficaz nos transportes que deverá assegurar uma utilização eficiente e económica dos diferentes sistemas.

8.º Assegurar o sistema hoteleiro que responda em quantidade, qualidade e economia às exigências dos novos afluxos turísticos. Convirá prosseguir na política de financiamento oficial, atrair capitais estrangeiros, realizar uma rede distrital de bons hotéis, criar conjuntos hoteleiros apoiados por instalações complementares em pólos de atracção turística e preparar pessoal competente.
9.º Recorrer à generalização de outras formas de alojamento hoje em voga, dada a democratização do turismo e a existência de modalidades como o turismo social e o turismo juvenil.
10.º Realizar uma cobertura do país turístico com restaurantes, defender a cozinha tradicional e fomentar a valorização de produtos nacionais, como o vinho, as conservas, as frutas, os queijos, o café, o chá e o cacau.
11.º Fomentar o aproveitamento turístico dos valores culturais.
12.º Ter presente a importância das relações entre a política de embelezamento nacional e o turismo.
13.º Defender, desenvolver e propagandear, com intuitos turísticos, o artesanato e o folclore.
14.º Aproveitar as possibilidades que oferece o turismo de negócios, procurando extrair o melhor proveito de iniciativas relacionadas com feiras, exposições, congressos profissionais e económicos.
15.º Desenvolver as relações entre o desporto e o turismo, não só através da realização de competições de grande cartaz, como prodigalizando ao turista facilidades para a prática de desportos ou tirando partido das possibilidades naturais.
16.º Realizar uma eficaz política balnearia, inventariando, valorizando e propagando as disponibilidades do País nestes sectores.
17.º Apoiar, estimular, sanear e valorizar as actividades privadas que se ocupam com o turismo. E é tudo, Sr. Presidente.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Jorge Correia: - Sr. Presidente: peço a palavra para um requerimento.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Jorge Correia: - Requeiro a generalização do debate.

O Sr. Presidente: - Está deferido o requerimento do Sr. Deputado Jorge Correia.

O Sr. Jorge Correia: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: eu sabia que a superior inteligência e probidade

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intelectual do Sr. Dr. Nunes Barata havia de oferecer-nos trabalho notável. Em boa verdade, porém, além da elevação com que tratou o problema, teve ainda o mérito de esgotar o assunto.
Os meus cumprimentos!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: ao intervir neste debate faço-o não só com a viva noção de que algo de muito importante para os destinos do País se trouxe a esta Câmara, mas ainda com a consoladora alegria de termos aqui trazido também o incitamento e a palavra esclarecedora sobre algumas facetas da vida nacional consideradas básicas no fenómeno turístico ou que com ele vivem paredes meias.
Desde a extensão a preços acessíveis da energia que ilumina e aquece as nossas casas e hotéis, proporcionando conforto aos nossos hóspedes, à arborização criadora de paisagens e regularizadora de climas, desde as comunicações rápidas e cómodas à primacial educação, mãe das mais requintadas manifestações de sensibilidade e sem a qual seria impossível criar-se uma mentalidade turística na nossa gente, tudo intervém de maneira apreciável no êxito daquele fenómeno que há-de servir-nos como veículo de valores materiais e ao mesmo tempo contribuir para um melhor conhecimento universal da bondade inata deste povo que recebe com fidalguia e sabe viver e amar, lutar e morrer pelos princípios sagrados e eternos à sombra dos quais se fez nação!
Fá-lo cumprindo um mandato histórico cheio de interesse e carinho pelos povos que assimilou, e não por imperativo comercial ou imperialista que abomina!
Ao compulsar a súmula das conclusões do Congresso de Turismo de 1936, e já por essa altura havia, com lamentável inconsciência, quem afirmasse que nesta matéria a maior parte do caminho já havia sido percorrido, verifico com mágoa que muitas delas só ultimamente tiveram solução e outras estão ainda infelizmente muito longe disso.
Mau serviço à Nação esse de nos enganarmos a nós próprios, convencendo-nos de uma situação que a breve trecho se desnuda e revela insuficiente!
São, portanto, passados 27 anos, andados vagarosamente nesta matéria e tão devagar que nos deixámos surpreender pelos gigantescos surtos turísticos de outros países, que, por trágicas vicissitudes de sua vida interna, não nos deveriam ter precedido, quanto mais ultrapassado de maneira tão retumbante!
Refiro-me particularmente à Espanha, que, apesar de ter saído de uma guerra civil, com todo o seu cortejo de misérias, destruições e inibições, soube, mercê de uma visão esclarecida, guindar-se ao segundo lugar, imediatamente a seguir à Itália, no turismo europeu! A própria Suíça e a França foram ultrapassada».
A coisa é de tal monta que no decénio que terminou em 1961 a indústria do turismo se afirmou em Espanha como a primeira fonte de energia e com a qual nenhuma outra indústria pôde sonhar comparar-se.
Em 1962 o turismo rendeu aos espanhóis 475 milhões de dólares, ou seja mais de 14 milhões de contos! ...
E nós que fizemos durante todo este tempo?
Fomos, é certo, realizando alguma coisa, mas, havemos de convir, a passos muito lentos, o que nos não permitiu jogar plenamente na bolsa do turismo com aquele valor inestimável que em determinada época do Mundo com raros partilhámos - a paz interna e externa!
Havia paz e abundância, mas não havia hotéis suficientes! Havia sol, mas não havia aeroportos que abrissem as portas das regiões turísticas mais afamadas! Havia boa gente e óptimo ambiente, mas faltavam boas comunicações, etc.! Numa palavra, não tínhamos percorrido a maior parte do caminho, tínhamos apenas começado a gatinhar!
Como admitir, portanto, sem apreensões e sem um mea culpa sincero a diferença tão impressionante entre os 10 milhões de turistas deles e os nossos escassos 500 000?!
Oportunas, objectivas e ponderadas, sem deixarem de reflectir entusiasmo, foram as palavras que o Sr. Dr. Paulo Rodrigues proferiu na reunião do Conselho Nacional de Turismo nos primeiros dias do ano que decorre, a marcar de uma maneira inequívoca e pela primeira vez uma orientação séria ao nosso turismo.
Das considerações formuladas ficou-nos a certeza do exacto conhecimento pelo Governo das nossas coordenadas no mundo do turismo e do seu reconhecimento, até porque os números não admitem controvérsia, quanto ao seu valor material; mas mais do que isso do que pode representar para nós um movimento de compreensão e simpatia que, na balança mundial, podem amanhã fazer pesar muitas centenas de milhares de pessoas que daqui saiam com reservas de sol e boa vontade.
Agora não me restam dúvidas de que com a ponte sobre o Tejo, já em franca construção, os aeroportos, nomeadamente do Algarve e da Madeira, a decisão de se edificar a ponte sobre o Guadiana e um maior incremento do fomento hoteleiro - a maior parte do caminho está em vias de percorrer-se!
Mas só agora, e não em 1936!
E mesmo assim teremos de remover muitos entraves e anacronismos, rever muita legislação que se nos afigura obsoleta e que por isso está a contrariar seriamente o desenvolvimento turístico do País. Não se compreende, por exemplo, como para desafectar do domínio público uma parcela de terreno que uma câmara queira alienar intervenham apenas e com a maior simplicidade a câmara, o conselho municipal e o Ministro do Interior, e para desafectar uma parcela do litoral do mesmo concelho se tenha de pronunciar uma comissão altamente especializada, e não só a mesma câmara, o mesmo conselho municipal e o mesmo Ministro! E a diferença é, mesmo num bom sucesso, apenas esta: o primeiro caso resolve-se num mês e o segundo pode levar anos!...
Como português encheu-me de alegria e orgulho a afirmação de que ganharíamos este ano a batalha do turismo, mas como observador atento e habituado a medir as palavras pelo valor das realizações não posso deixar de comentar que nunca VI ganhar batalhas com exércitos tão diminutos e com tão poucas disponibilidades. Refiro-me aos exíguos 50 000 contos, que é a quanto monta em 1964 o Fundo de Turismo, e ao pouco menos que insignificante crédito concedido pela Caixa Nacional de Crédito à indústria hoteleira, 336 000 contos em seis anos e para todo o País!
Assim, pode realmente haver boa vontade, conhecimento exacto das coisas, mas ficaremos por aqui!
E não entendo que assim seja se chegámos já à conclusão de que, mesmo no nosso incipiente turismo, as divisas por ele carreadas excederam as provenientes da exportação da cortiça e das conservas.
Então se assim é, se está provado que o turismo é uma indústria das mais rentáveis, por que esperamos?
Por que não havemos de lançar-nos em grande força com os nossos dinheiros e com todos os dinheiros possíveis provindos de empréstimos exteriores na grande obra que há ainda a realizar?
As futuras gerações, quando se fizer a história, hão-de abençoar-nos por termos providenciado de maneira a fazê-las surgir no seio de uma abundância e comodidade que

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28 DE FEVEREIRO DE 1964 3437

as gerações mais velhas não puderam suspeitar sequer quanto mais gozar, e nós os novos de hoje estamos dispostos ainda que com sacrifícios a edificar, mas a fruir!
É evidente que ao formular as minhas considerações me situo na posição de quem, longe do período de decadência, se habituou a olhar mais para o que é preciso fazer do que para aquilo que se fez, sem de modo algum deixar de lhe render o verdadeiro apreço, pois se não fora o mérito incontestável de algumas realizações em todos os sectores não poderíamos agora sequer aspirar e projectar para o futuro.
Vibrando mais pela obra que se segue do que por aquela que acabamos de conquistar, satisfaz-me mais o momento em que eliminamos da nossa agenda um problema do que ficar a olhar a solução embevecido numa atitude narcisista!
A insatisfação é, quando perfumada pelo espírito construtivo e leal, uma arma de alerta que não deixa mergulhar os povos na ilusão enganadora de um dolcc farniente tão prejudicial aos seus destinos. Eis por que as gerações mais novas parecem às vezes irreverentes e inconformistas.
E se do seu coração generoso ressuma por vezes certa inquietação, a verdade é que tem sido do seu seio que têm saído os homens que de armas na mão defendem a integridade do mundo português, e não creio que os conformistas por excelência os possam exceder naquela glória!
Temos de, seguros de que quando queremos somos capazes de fazer, estudar com rapidez e siso os problemas, planificando-os com verdade e justeza, sem gongorismos que escondam nos rendilhados dos relatórios a oportunidade e extensão das questões!
E se na gestão de um problema acaso se tope com uma lei obsoleta ou instituição que estorve os sagrados interesses da Nação, devemos removê-las com a mesma rapidez e serenidade como se de tumores malignos se tratasse!
Tenho pensado algumas vezes se não seria oportuno, dado o desejo e a necessidade de nos elevarmos econòmicamente com o turismo, mandar afixar em todas as repartições e por toda a parte a seguinte legenda: «Tudo pelo turismo, nada contra o turismo», posto que não o ajudar a fomentar por todas as maneiras ao nosso alcance é contribuir para um menor afluxo de divisas tão úteis quão necessárias ao País.
Ainda em relação à Espanha, e não deixando de considerar a nossa posição excêntrica, sabemos que o seu património artístico é superior ao nosso, mas também não é menos verdade que a Natureza foi para nós mais pródiga em muitos aspectos, e, consequentemente, na medida em que formos capazes de valorizar cada um desses aspectos teremos diminuído ou anulado aquela desvantagem.
Tem havido demasiada preocupação de circunscrever o turismo nacional ao célebre triângulo Cascais-Lisboa-Sintra. E ainda há pouco, inexplicàvelmente e perante o pasmo geral, se não incluiu o Algarve, precisamente a região onde o clima é mais ameno e se contam por dias de sol a quase totalidade dos dias do ano, nos programas de carácter turístico para os meses de Abril, Maio, Outubro e Novembro!
Quem tenha viajado alguma coisa não se surpreende com o justificado orgulho por aquele magnífico conjunto, em cujos cenários paisagísticos se podem descortinar dos panoramas mais belos!
O turista, porém, é vário, e uma vez saciados os sentidos, de beleza e fragrância, sente necessidade de evadir-se do que ontem lhe enchera a alma de prazer!
Não tenhamos a veleidade de prender o turista a Lisboa ou à praia da Rocha, a Viana do Castelo ou a Monte Gordo. Portugal, todo ele, do Minho a Moçambique, de S. Tomé a Macau, tem primores dignos de se admirarem e toda essa gama de belezas há-de constituir variada ementa que temos de o levar a percorrer, proporcionando-lhe desde os perigos da caça grossa em África à meditação de uma quaresma em Braga, desde o deslumbramento de uma noite de S. Silvestre na Madeira às aliciantes carícias das praias algarvias, desde a visão de ouro de um poente nas Penhas aos cantares dolentes dos ranchos alentejanos!
Do ponto de vista histórico não teremos a exuberância de motivos milenários ou as preciosidades renascentistas de uma Itália, nem a majestade subtil dos monumentos de Paris, mas temos todo um passado que se atarda na sobriedade arquitectónica dos nossos castelos, que desde Guimarães povoam as nossas terras, se espelha na votiva sumptuosidade gótica da Batalha e se projecta no Mundo pela falésia épica de Sagres!

O Sr. Gamboa de Vasconcelos: - Muito bem!

O Orador: - Temos a garridice das nossas paisagens, a doçura da nossa gente, a tepidez e o perfume do ar que respiramos, a mansidão do nosso mar, um céu azul, a fragrância dos nossos apetitosos frutos e o néctar delicioso das nossas incomparáveis uvas! O que é preciso é oferecer todos estes manjares com simplicidade, elegância e conforto, sem perda de tempo.
Temos, portanto, de organizar uma propaganda que atinja todos os países, criando-se em cada um deles verdadeiros núcleos capazes de proporcionar aliciante conhecimento das nossas belezas, da originalidade da nossa gente e da nossa incomparável afabilidade.
Tudo isto, porém, no mais curto espaço de tempo.
Lembro aos vagarosos ou menos voluntariosos que Napoleão perdeu a batalha de Waterloo porque o general Grouchy, a quem entregara o comando de um exército, não soube manobrá-lo no minuto decisivo!
Temos de obedecer a um comando único, vigoroso, decidido, mas descentralizado.
Em cada capital de distrito ou província ou zona de turismo, pouco importa a designação por que se pretenda arrumar uma vasta região de interesse turístico, deveria haver um gabinete com representantes do turismo, urbanização, comunicações, monumentos nacionais, etc., para resolução de todos os seus problemas, sem a obrigação de, por dá cá aquela palha, passarem pelo filtro superlotado de Lisboa!
E não só por isto, mas ainda para coordenação de todas as manifestações artísticas, diversões, feiras, etc., estabelecendo-se circuitos próprios das várias épocas do ano, mas sempre idênticos a fim de se poderem anunciar com certeza em programas que corram Mundo.
O gabinete a que acabo de referir-me teria, porém, de ter necessàriamente poderes para resolver e não vir a breve trecho constituir mais uma metamorfose pela qual o projecto teria de passar. Que fique isto bem esclarecido, pois de organismos para exigir e empatar já estamos fartos.
É evidente que a necessidade imperiosa de um representante do turismo à escala regional não dispensa de maneira nenhuma as comissões ou subcomissões locais, pois só estas sabem o que convém fazer em pormenor, tal qual como só as donas de casa sabem colocar com arte e distinção uma jarra de flores num recanto da sua casa.

O Sr. Gamboa de Vasconcelos: - Muito bem!

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O Orador: - Alguns daqueles circuitos poderiam mesmo sair da própria zona, oferecendo aos turistas motivos renovados de recreio e cultura.
Beja e Évora, mas muito em especial Évora, essa nobre, vetusta e sempre saudosa cidade onde passei parte da minha juventude e cujo recheio artístico só por si constitui um pólo de atracção turística de permanência, poderiam, com vantagem para todos, ser incluídas nas digressões mais extensas a proporcionar aos visitantes instalados no Algarve.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Lembro-me de que durante a Exposição de Bruxelas se organizavam passeios todos os dias à Holanda, com saída pela manhã cedo e regresso à noite. Julgo que para as cidades citadas poderiam estabelecer-se critérios semelhantes. Nada de bairrismos estultos quando constituímos um conjunto que a todos convém valorizar e aproveitar.
Na impossibilidade, porém, de tudo desenvolvermos ao mesmo tempo, isso seria o ideal, convém do ponto de vista utilitário aproveitar já, e nisso o Governo mostrou sábio conhecimento das circunstâncias e sentido objectivo das realidades, aquelas zonas que, pelos seus atractivos particulares e pela moda, se tornaram mais afamadas e, por isso, constituam prato mais apetecido!
Estão nestas condições a Madeira e o Algarve, e, vamos lá, temos sido em tantas coisas preteridos e até desconhecidos que seria injusto discutir-se esta merecida prioridade!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: -- O problema reside, porém, fundamentalmente em deixarmos realizar o muito que urge fazer, facilitando, não emperrando a ponto de desalentar a iniciativa particular, que eu sei muito interessada nalguns empreendimentos que de perto conheço, e criarmos a mentalidade, aliás comprovadíssima, de que - em turismo quanto mais mais!
Quero dizer, a multiplicidade de pensões, hotéis, motéis, parques, etc., não criam problemas de concorrência do ponto de vista, de exploração, antes se integram como peças convergentes para a mesma finalidade.
É assim que o fenómeno tem evoluído nas consagradas estâncias de renome universal e não há-de processar-se de maneira, diferente em Portugal. E mesmo sob o aspecto dos desportos, do jogo e outras diversões, havemos de convir, será muito mais fácil estabelecer e manter programas onde houver maior aglomeração de turistas.
Especificadamente não compreendo que se não possa vir a consentir ou desde já prever zonas de jogo no Algarve e na Madeira, posto que não temos culpas nos hábitos ou gostos que a humanidade contraiu desde que é humanidade e não será apenas com a abstinência a que se condene o Algarve que ela virá a redimir-se!
Entretanto, se o não consentirmos, poderemos dificultar a progressão do turismo, de certo turismo melhor, naquelas regiões, quando é certo que outro critério se adoptou para o Estoril, Figueira da Foz e Póvoa!
Do ponto de vista das comunicações e dando ao aeroporto o lugar cimeiro que neste aspecto lhe cabe, não deixaremos de chamar a atenção para as vantagens que resultariam da modernização do material circulante nos caminhos de ferro do Sul e Sueste, bem como o estabelecimento de melhores horários e ainda de um melhor aproveitamento, com vista à eliminação das curvas do traçado da estrada nacional da serra do Caldeirão, quer com pequenos túneis, quer com obras de arte, oferecendo acesso fácil e central à província.
No que toca às telecomunicações há também uma palavra a dizer, pois que estas são ainda bastante deficientes, obrigando a longas esperas, o que é manifestamente incompatível com a necessidade de comunicação urgente entre o mundo da finança ainda que em férias.
Antes de terminar quero ainda fazer um apelo a todos quantos possam intervir na repressão da mendicidade, desde o escalão governamental à última das autoridades locais, para que se acabe de vez em todo o País com o espectáculo degradante e impróprio da nossa época, qual é o da exposição, com fins de pedincha, das misérias físicas do homem, denotando inexplicável incúria das autoridades.
Ainda há bem poucos dias assisti em plena Avenida da Liberdade a uma dessas cenas desagradáveis e que na minha terra já não seria consentida.
A mendicidade é incompatível com o turismo!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: mais uma vez, com o indeclinável desejo de que o País se erga ao mais alto nível do progresso e se apresente aos nossos olhos e aos olhos de quantos nos visitem como terra de bem-estar, formulei sugestões e verberei conceitos, aliás sem pretensão de falar de cátedra, porém, em boa verdade, com a esperança de que o meu trabalho, porventura o mais modesto, não venha a resultar em tarefa inteiramente inútil.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão. O debate continuará amanhã sobre a mesma ordem do dia.
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 45 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Alberto Carlos de Figueiredo Franco Falcão.
Alexandre Marques Lobato.
António Carneiros Lopes.
António Gonçalves de Faria.
António Magro Borges de Araújo.
Armando Francisco Coelho Sampaio.
Artur Águedo de Oliveira.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Belchior Cardoso da Costa.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Jorge Manuel Vítor Moita.
José Dias de Araújo Correia.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Manuel da Costa.
José de Mira Nunes Mexia.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Manuel Herculano Chorão de Carvalho.
Manuel de Melo Adrião.
Manuel Nunes Fernandes.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Reis.
Tito Castelo Branco Arantes.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.

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Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Alfredo Maria de Mesquita Guimarães Brito.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António de Castro e Brito Meneses Soares.
António Tomás Prisónio Furtado.
Jacinto da Silva Medina.
José Maria Rebelo Valente de Carvalho.
D. Maria Irene Leite da Costa.
Purxotoma Ramanata Quenin.
Urgel Abílio Horta.
Voicunta Srinivassa Sinai Dempó.

O REDACTOR - António Manuel Pereira.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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