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REPÚBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL
DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 141
ANO DE 1964 7 DE MARÇO
VIII LEGISLATURA
SESSÃO N.º 141 DA ASSEMBLEIA NACIONAL
EM 6 de MARÇO
Presidente: Exmo. Sr.Mário de Figueiredo
Secretários: Exmos. Srs. Fernando Cid Oliveira Proença
Artur Alves Moreira
SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 25 minutos.
Antes da ordem do dia. - Foi aprovado n.º 138 do Diário das Sessões.
Deu-se conta do expediente.
O Sr. Presidente comunicou que recebera da Presidência do Conselho, para efeitos do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição, os Decretos-Leis n.ºs 45 576 e 45 577.
O Sr. Deputado Águedo de Oliveira requereu informações sobre a navegabilidade do rio Douro.
Ordem do dia. - Prosseguiu a discussão do aviso prévio do Sr. Deputado Nunes Barata acerca do turismo nacional.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Paulo Cancella de Abreu, António Santos da Cunha e Carlos Teles Grilo.
O Sr. Presidente, encerrou a sessão às 18 horas e 10 minutos.
O Sr. Presidente: - Vai fazer-se a chamada.
Eram 16 horas e 15 minutos.
Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Agnelo Orneias do Rego.
Agostinho Gonçalves Gomes.
Alberto Carlos de Figueiredo Franco Falcão.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Alberto Pacheco Jorge.
Alberto dos Reis Faria.
Alberto Ribeiro da Costa Guimarães.
Alberto da Rocha Cardoso de Matos.
Alfredo Maria de Mesquita Guimarães Brito.
André Francisco Navarro.
António Augusto Gonçalves Rodrigues.
António Burity da Silva.
António Gonçalves de Faria.
António Júlio de Carvalho Antunes de Lemos.
António Maria Santos da Cunha.
António Marques Fernandes.
António Martins da Cruz.
António da Purificação Vasconcelos Baptista Felgueiras.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Alves Moreira.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Artur Proença Duarte.
Augusto José Machado.
Bento Benoliel Levy.
Carlos Alves.
Carlos Emílio Tenreiro Teles Grilo.
Délio de Castro Cardoso Santarém.
Domingos Rosado Vitória Pires.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando António da Veiga Frade.
Fernando Cid Oliveira Proença.
Francisco António Martins.
Francisco António da Silva.
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Francisco José Lopes Roseira.
Francisco Lopes Vasques.
Jerónimo Henriques Jorge.
João Mendes da Costa Amaral.
João Rocha Cardoso.
João Ubach Chaves.
Joaquim de Jesus Santos.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Joaquim de Sousa Birne.
Jorge do Melo Gamboa de Vasconcelos.
José Alberto de Carvalho.
José Augusto Brilhante de Paiva.
José Fernando Nunes Barata.
José Luís Vaz Nunes.
José Manuel Pires.
José Maria Rebelo Valente de Carvalho.
José Monteiro da Rocha Peixoto.
José Pinheiro da Silva.
José Soares da Fonseca.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Manuel Amorim de Sousa Meneses.
Manuel Augusto Engrácia Carrilho.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Herculano Chorão de Carvalho.
Manuel João Correia.
Manuel João Cutileiro Ferreira.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Mário de Figueiredo.
Olívio da Costa Carvalho.
Paulo Cancella de Abreu.
Quirino dos Santos Mealha.
Sebastião Garcia Ramires.
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães.
Virgílio David Pereira e Cruz.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 70 Srs. Deputados. Está aberta a sessão.
Eram 16 horas e 25 minutos.
Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente: - Está na Mesa e vai ser submetido à aprovação da Assembleia o Diário das Sessões n.º 138, correspondente à sessão de 3 do corrente.
Está em reclamação.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Como nenhum Sr. Deputado deseja fazer qualquer reclamação, considero aquele número do Diário das Sessões aprovado.
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Telegramas
Da direcção do Grémio dos Vinicultores de Vila Real, a apoiar a intervenção do Sr. Deputado Alfredo Brito no debate do aviso prévio sobre a crise agrícola nacional.
Da Câmara Municipal de Viana do Castelo, a apoiar a intervenção do Sr. Deputado Folhadela de Oliveira no debate do aviso prévio sobre o turismo.
O Sr. Presidente: - Está na Mesa, para efeitos do disposto no § 3.º do artigo 109..º da Constituição, o Diário do Governo n.º 50, 1.ª série, de 28 de Fevereiro findo, que insere os seguintes Decretos-Leis: n.ºs 45 576, que promulga o novo regime de comercialização de plantas marinhas industrializáveis, e 45 577, que revoga o Decreto-Lei n.º 23 924, bem como as disposições por ele substituídas, contidas no Decreto n.º 10 563, na Portaria de 19 de Janeiro de 1909 (Regulamento para a Apanha de Vegetais Marítimos na Costa de Portugal), na parte relativa a plantas marinhas, e na Portaria de 6 de Novembro de 1909, sobre o mesmo assunto.
Tem a palavra para um requerimento o Sr. Deputado Águedo de Oliveira.
O Sr. Águedo de Oliveira: - Sr. Presidente: pedi a palavra para apresentar o seguinte
Requerimento
«Requeiro, nos termos regimentais, que me sejam fornecidos, pelos Ministérios da Economia, Obras Públicas e Comunicações, sobre a navegabilidade do rio Douro elementos de estudo e relatórios».
O Sr. Presidente: - Vai passar-se à
Ordem do dia
O Sr. Presidente: - Continua o debate acerca do aviso prévio do Sr. Deputado Nunes Barata sobre o turismo. Tem a palavra o Sr. Deputado Cancella de Abreu.
O Sr. Paulo Cancella de Abreu: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: razões de saúde obrigam-me, com proveito para VV. Ex.ªs, a ser muito breve (não apoiados), e além disso, eu nada de novo saberia acrescentar ao que já foi dito sobre os aspectos gerais dos problemas do turismo pelo autor do aviso prévio, num trabalho, como sempre, exaustivo e largamente documentado, e também sobre aspectos gerais e regionais encarados pelos restantes oradores que me precederam no uso da palavra.
Eu próprio já, por várias vezes, me ocupei do turismo com desenvolvimento, nomeadamente num aviso prévio que anunciei em 28 de Janeiro de 1950 e efectivei em 8 de Março seguinte, e deu origem a larga generalização, onde, entre outros, interveio relevantemente o nosso colega Sr. Conselheiro Armando Cândido.
Também na sessão de 3 de Fevereiro de 1954, antes da ordem do dia, se me ofereceu oportunidade para me ocupar deste assunto palpitante e insistir nas razões do seu grande relevo e da sua inestimável projecção na economia nacional.
Intervim ainda na discussão das leis protectoras da indústria hoteleira, cujos efeitos foram e continuam a ser de elevado alcance, bem evidenciado.
Por último, mais recentemente, na sessão de 27 de Abril de 1963, ocupei-me da feliz iniciativa que o Secretariado Nacional da Informação tomou de arvorar como cartaz de propaganda turística o título de uma linda canção portuguesa que fez sucesso e correu Mundo. Iniciativa esta que alcançou em muito o seu objectivo, não obstante os embaraços e as contrariedades que a irregularidade do Abril traiçoeiro originou.
E como nessa ocasião não seria possível ou oportuno alargar até às regiões turísticas do Centro e Ho Norte do País a revelação dos seus encantos paisagísticos e a beleza e a graça dos seus costumes tradicionais, bem como o encanto e a originalidade do seu folclore, sugeri que
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se empregasse ali aquele sugestivo meio de propaganda e de divulgação, levado a efeito nas épocas e pelos modos mais apropriados a cada região.
E a propósito referi a esquecida região do Centro como sendo, presentemente, aquela que possui melhores condições para tal fim. Com efeito, tirando Lisboa e o Estoril, ela é, entre todas, a que está mais bem apetrechada, sob múltiplos aspectos.
Basta dizer que desde Coimbra até Aveiro existem oito hotéis excelentes e muitos outros razoáveis, bem como inúmeras pensões, lindas pousadas, as afamadas estações termais da Cúria e do Luso, apreciáveis centros de campismo e uma boa rede de estradas. Como atractivos, enriquecem-na também as maravilhosas e típicas praias da Figueira da Foz, de Mira e da Costa Nova do Prado, a vastíssima e formosa ria de Aveiro, a pitoresca Pateira de Fermentelos, que tem a legítima aspiração de uma pousada. Existe também a exuberante Bairrada, com os seus vinhedos a perder de vista e os seus vinhos de boa casta, e, por isso, está naturalmente indicada para comparticipar em festivais que o Secretariado Nacional da Informação promova, especialmente no género dos da Vindima e do Vinho Novo, já anunciados apenas para o Douro e Estremadura.
Quase todos os oradores que me precederam no uso da palavra se ocuparam desenvolvidamente do turismo nas suas regiões ou nos círculos que representam e indicaram, especìficamente, as respectivas condições turísticas e as soluções ou realizações recomendáveis, sob este aspecto, para o seu desenvolvimento. Especialmente em relação ao distrito de Aveiro, foi cheio de verdade e justiça o modo como o nosso colega Dr. Alves Moreira revelou os seus múltiplos encantamentos.
Se fosse necessário e eu soubesse fazê-lo, este seria também o propósito especial da minha curta e modesta intervenção, certo como estou de que, fazendo-o, não pugnava apenas em benefício do meu formoso recanto natal, mas sim em benefício de toda uma rica e vasta parcela do território nacional e, portanto, em benefício do País.
Numa palavra: ocupando-nos todos e cada um de nós do turismo regional, pugnamos implìcitamente em benefício do turismo nacional.
Sr. Presidente: o turismo começa a ser uma realidade reconfortante entre nós, devido não só ao seu desenvolvimento geral atingido nos diferentes países, mas também ao impulso que lhe têm dado a paz e o sossego em que temos vivido e a intensa propaganda e outras acertadas providências tomadas para aquele fim.
Vão longe os tempos em que era uma utopia admitir a consoladora realidade de meio milhão de turistas em Portugal; e, entretanto, esta realidade já deve estar ultrapassada.
Os tempos mudaram.
Jamais será possível verificarem-se episódios semelhantes àquele que já aqui narrei e mostrou bem o descrédito a que chegou, noutros tempos, a reputação do nosso país, que reduzira pràticamente a zero a possibilidade de criar e desenvolver o turismo.
Vale a pena repeti-lo.
É prática frequente, quando os paquetes estrangeiros demandam a barra, afixar a bordo um programa de visitas e diversões aconselháveis aos passageiros, para ocuparem o seu tempo durante a estadia no porto.
Foi isto que sucedeu, em determinado dia, num navio em que viajou o conhecido jornalista português Sr. Luís Teixeira, que teve a natural curiosidade de ler o habitual programa afixado a bordo. E calcule-se a indignação que dele se apoderou quando viu indicada entre os divertimentos aconselháveis «uma revolução em Lisboa».
Risos.
Esta amostra é, só por si, elucidativa sobre o nosso panorama num passado felizmente já distante.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. António Santos da Cunha: - Sr. Presidente: a nova indústria dos tempos modernos, o turismo, despertou em todo o Mundo atenções e cuidados muito especiais, pois nela vêem os povos abundante fonte de divisas e ainda excelente meio de melhor se ficarem a conhecer, através de recíprocas visitas o do conhecimento que assim adquirem dos usos e costumes uns dos outros, dos monumentos, que dizem da cultura das nações, e ainda da paisagem, através da qual muitas vezes se afere do carácter das gentes que por ali habitam.
É, no entanto, não como factor de paz entre as nações - esse bem precioso que a humanidade teima em desprezar -, mas como fonte abundante de receitas que o turismo é acima de tudo encarado por esse mundo além. Na verdade, não precisamos de ir longe, para ver que assim é - se não quisermos olhar para dentro da nossa própria casa, pois, apesar da incipiéncia da nossa armadura turística, é já notável o papel que o mesmo representa na nossa balança de pagamentos, temos às portas a nossa vizinha Espanha, onde catadupas de visitantes, a que nós os Portugueses não deixamos de dar forte contributo, têm ajudado o pujante renascer económico da nossa irmã peninsular, que alguns já vão classificando do «milagre espanhol».
Não há, pois, que encarecer, por visível de mais, o que de meritório teve a iniciativa oportuníssima que levou à efectivação deste aviso prévio.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Impunha-se que a matéria fosse discutida nesta Assembleia, já que o País se habituou a vê-la ocupar de tudo que ao interesse do mesmo diz respeito.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Foi essa efectivação feita de modo singular, dizendo bem do carinho e inteligente estudo que o problema mereceu ao ilustre Deputado avisante, Sr. Dr. Nunes Barata.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Ao prestar sincera homenagem a este distintíssimo parlamentar, não devemos esquecer que o magno assunto agora em discussão foi por várias vezes abordado nesta sala e que foi mesmo já alvo de largo debate por ocasião do aviso prévio que o nosso muito digno e muito ilustre colega, a quem todos tributamos merecida veneração, Sr. Dr. Paulo Cancella de Abreu sobre o assunto efectivou.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - E não se pode dizer que foi em vão que o problema foi debatido, pois. de então até agora, sem dúvida que os problemas do turismo em Portugal ganharam uma maioridade, o que. por certo, não aconteceu por acaso, mas porque foi possível, através dessas e outras ini-
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ciativas, uma mentalização dos homens e das instituições, de modo a chegarmos ao clima que hoje se respira.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - É justo não esquecer os grandes pioneiros do passado, à frente dos quais, e em grande destaque, temos de colocar os que deram a vida durante longos anos à velha Sociedade de Propaganda de Portugal, que se albergou no prestígio glorioso desse honrado português, grande homem de bem, mestre de portugalidade e extraordinário jornalista, que foi o conselheiro José Fernandes de Sousa, que a tão benemérita instituição presidiu até à morte.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: é imperioso que se desenvolva o turismo em todo o nosso país. Há que ir de encontro às diferentes classes turísticas que o compõem, e começarei por dizer que não aceito, que repudio, certos narizes de cera que por aí estão demasiadamente crescendo - temos que ir direito às coisas e chamar-lhes pelo seu nome -, narizes que neste caso se chamam, por exemplo, província do Algarve.
Vozes: - Muito bem!
O Sr. Rocha Cardoso: - Perdão a V. Ex.ª O Algarve não é nariz de cera, porque foi criado por Deus tão lindo e tão grande que ali acaba o Mundo, porque Deus foi incapaz de fazer melhor, de alargar a terra depois daquela beleza.
O Orador: - Não deixo de dar apoio às palavras de V. Ex.ª no que se refere às belezas da província que o viu nascer.
V. Ex.ª verá mais adiante que não deixo de prestar a justiça devida ao Algarve, que para o termos no nosso coração basta ser a terra donde o Sr. Infante enxergou os mares e, através deles, as terras que de lado a lado foram e são a nossa glória.
O Sr. Rocha Cardoso: - Foi apenas a boca, e não o coração, que falou. Eu sabia.
O Orador: - Somos na Europa um país pequeno, pelo que o turista tem que ser interessado numa visita a todo ele. Só assim conseguiremos médias de demora compensadoras, e não devemos procurar, pelo contrário, encerrá-lo numa estufa à sombra da bananeira.
É crime esquecer que o Norte do País é indiscutivelmente - quem com verdade poderá afirmar o contrário!?- a região turística por excelência, dado o matiz e o contraste das suas paisagens, a riqueza da sua vegetação, o aveludado dos seus campos, a grandeza incomparável dos seus monumentos e o encanto da sua gente.
Fomos todos nós criados, e quando digo todos digo os do Norte e os do Sul, a ouvir dizer que Portugal é um jardim e o Minho o seu mais belo canteiro. Acaso não corresponde tal ditado a uma verdade que há que ter em conta? Acaso se esquece que é da beleza da paisagem e da riqueza dos monumentos que o viajante vem sequioso? Onde temos melhor cartaz turístico que o do nosso Minho? Por que maus fados na rota de slogans publicitários, que merecem sem dúvida apreço, se pretende esquecer esta realidade? Não! Não aceitamos como válido o argumento de que o clima é melhor no Sul do que no Norte, e isto porque, se o é, é o numa pequena parte do ano, e precisamente naquela em que a corrente turística é sempre incomparàvelmente menor.
Nos grandes meses de turismo o Norte, de uma maneira especial o Minho, está a longa distância de qualquer região do País em oferta de atractivos que constituam aliciamento para os turistas, e o seu clima é por igual acolhedor.
É a beleza incomparável dos seus campos, com a vinha de enforcado e o matiz das culturas variadas, que ali e acolá a mancha negra de pequenas florestas mais alindam, são as capelinhas e as igrejas que, aos montões, na graça do Senhor, se estendem por toda a parte; são os rios que Deus fez correr através dos montes e dos vales e as barragens com que a mão do homem enriqueceu a paisagem. Tudo é belo, tudo encanta, desde a alegria e a maneira de ser acolhedora do povo à grandeza maciça dos monumentos venerandos a que o granito empresta desusada majestade, monumentos de que o Castelo de Guimarães e a Sé de Braga são paradigma.
O Sr. Sousa Rosal: - V. Ex.ª dá-me licença?
O Orador: - Faz favor.
O Sr. Sousa Rosal: -Presto aqui justiça a V. Ex.ª, porque foi de facto em Braga que nasceu a revolução, mas foi o Algarve que viu partir os primeiros homens para ela, que, atravessando o Alentejo sem encontrar no seu caminho alguns que ali deviam estar, desembarcam no Terreiro do Paço, enfrentando a esfíngica guarnição de Lisboa, e alguns entram no Ministério do Exército, onde encontram á maior confusão, e conseguem arrancar dali o Sr. Almirante Cabeçadas, esse honrado e bom português que, levado pela sua bondade, se ia deixando arrastar por caminhos que podiam perder a revolução. E fomos nós que conseguimos levá-lo ao encontro de Gomes da Costa. Assim acabou a intriga e se ganhou a revolução.
O Orador: - Sabemos disso. Mas eu queria completar o esclarecimento de V. Ex.ª
Todos sabemos que um grupo de valentes moços oficiais, no número dos quais e em saliente posição se encontrava V. Ex.ª - e muitas vezes o tenho recordado -, arrancaram no Algarve, primeiro que em Braga, ...
O Sr. Rocha Cardoso: - Muito obrigado pela justiça de V. Ex.ª
O Orador: - ... firmes à sua palavra e que contribuíram imenso para o triunfo da revolução, porque estabeleceram, como hoje se podia dizer, uma segunda frente. Mas todos sabemos também que Gomes da Costa saiu de Lisboa e só em Braga a Porta Nova estava aberta para o receber.
O Sr. Sousa Rosal: - V. Ex.ª está encarando o problema do turismo com uma certa demagogia, esquecendo-se de que Portugal é tão bonito no Algarve como no Minho e todos devemos estar juntos nesta hora sublime em que é preciso resgatar o País através do turismo.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - V. Ex.ª, que é um ilustre militar, sabe muito bem que uma batalha não se ganha na defesa, mas no contra-ataque.
O Sr. Sousa Rosal: - Mas não contra os amigos! Risos.
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O Orador: - Como disse, os caminhos de Braga estiveram sempre à vista de toda a gente, e mais tarde Salazar encontrou esses caminhos para ir lá dizer solenemente um dia que Braga era «a cidade santa da Revolução Nacional» e, ainda mais tarde, afirmar que Braga era a «sua fiel e amiga cidade».
São os solares, que armas nobiliárquicas enfeitam, e são as casas pequeninas e humildes dos camponeses, caiadas de branco; são, depois, as feiras, esse espectáculo que só por si constitui um cartaz, como esse admirável mercado da quinta-feira em Barcelos, à espera de uma mão sapiente que lhe lime algumas arestas, onde mais de uma vez se me têm deparado grupos de estrangeiros perdidos de encanto perante uma bela junta de gado que uma moçoila sadia segura nas suas mãos fortes; são as romarias que na Primavera e no Verão fazem que o Minho seja todo ele uma festa constante, e que julgo - é possível que esteja enganado, pois, de tanto que tenho lido e ouvido, já não sei se tenho razão - não temos nada de tão característico e rico em folclore que se lhe possa opor.
Quererei eu com as minhas considerações desmerecer das belezas da nossa província do Algarve, ou da necessidade de apetrechar turisticamente aquela nossa província de praias acolhedoras e maravilhosas? Longe de mim tal intento! O Algarve é uma região que merece a atenção e carinho de quem se debruça sobre o problema turístico neste país. Mas o que eu quero e reclamo, e faço-o em nome de uma região que vê postergados os seus direitos, e com os dela os do País que assim põe de parte o seu mais rico património turístico, é que Portugal continental seja um todo turístico, que como tal tem e deve ser considerado, e ainda que se na verdade grandes empresas particulares estão interessadas, como parece ser certo, numa programação turística do Sul do País, deve-se dar a estas, e sem demora, todas as facilidades, de modo que o Estado possa assim reservar os meios de que dispõe para incentivar a cobertura turística onde, pelo visto, a iniciativa particular não aparece tão pressurosa. Daqui não há que fugir. Ao Estado compete auxiliar as regiões menos favorecidas, e não ir atrás da corrente das coisas que se apresentem fáceis.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: há que começar por estabelecer uma rede de estradas que permita a rápida e cómoda comunicação entre as diferentes regiões do País. É velho e revelho que sem estradas não há possibilidades de fazer turismo. E é também sabido que cada vez o turismo é menos parado, menos estático, ao contrário do que parece e pensam os meios responsáveis.
Ao falar de estradas, quero enaltecer o que se tem feito na estrada Lisboa-Porto, que na verdade, por este caminho, dentro de pouco ficará em condições de poder servir ao fim que temos em vista, e pedir a especial atenção do Sr. Ministro das Obras Públicas para a urgente e inadiável necessidade de reestruturar a estrada Porto-Braga, que tem troços verdadeiramente impróprios para o grande trânsito que a atravessa.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Trata-se de uma das estradas de mais movimento do País, servindo por igual, além de Vila Nova de Famalicão, três cidades de importância, todas elas de grande interesse turístico e económico: Braga, Guimarães e Barcelos. Julgo que em capítulo de estradas nada de mais proveitoso pode ser feito que ao mesmo tempo sirva tantas povoações e tantos interesses como o arranjo dessa verdadeira espinha dorsal do trânsito no Baixo Minho. A alta compreensão do ilustre Ministro e do Sr. Presidente da Junta Autónoma de Estradas entrego o assunto, na certeza de que não será esquecido, como se impõe, do que são vivo testemunnho os quase diários acidentes que ali se verificam. Sem estradas e sem hotéis não pode haver turismo.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Quanto a hotéis, quereria dizer, e julgo que como eu pensa o Secretariado Nacional da Informação, Cultura Popular e Turismo, que se torna necessário construir, a não ser num ou noutro caso, hotéis baratos. Construções que vão além de 80 000$ por média de quarto devem ser postas de parte, pois o nosso turismo não se compadece com sumptuosas edificações, que, consequentemente, obrigam a diárias pesadas e, assim, depenam o turista, que fica sem dinheiro para distribuir por outros sectores da indústria e do comércio, como é de desejar. A construção de unidades hoteleiras género ligeiro, mas de aspecto agradável, é o que se deve fomentar.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - No Minho, a não ser à beira-mar, pouco ou nada temos que preste. Nomeadamente Braga, Guimarães e Barcelos, precisam de ser suficientemente equipadas.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Manda a verdade que se diga que, quanto à minha cidade de Braga, não podem as entidades oficiais ser acusadas de falta de carinho pela deficiência que o ilustre Deputado avisante muito bem apontou. Na verdade, quer o Governo, através do Secretariado Nacional da Informação, quer a Caixa Geral de Depósitos, têm demonstrado uma ampla compreensão pelo problema. Braga necessita da construção imediata de dois hotéis; um - à altura da beleza e categoria da estância, que é sem dúvida um dos primeiros pontos turísticos do País, dado o conjunto paisagístico e arquitectónico que oferece - nesse incomparável Bom Jesus do Monte, que causa o assombro de quantos o visitam pela primeira vez e é como monumento, ramificando-se do templo através de toda a grande e vetusta mata, o maior que em todo o Mundo foi levantado à Paixão do Redentor.
Outro, mais comercial, digamos assim, em plena cidade.
Quanto ao hotel do Bom Jesus, o Governo e a Caixa Geral de Depósitos, volto a repeti-lo, e a agradecê-lo, colocou nas mãos da Mesa da Confraria que rege a estância os elementos necessários a que esta resolvesse sem demora o assunto, que neste momento devia estar já solucionado, ou seja estar em eficiente funcionamento o hotel que a cidade deseja e a assembleia geral dos irmãos da Confraria, na sua quase unanimidade, exigiu fosse construído. Por seu lado, a autoridade eclesiástica, compreensiva para com os interesses em jogo, não só autorizou, como incentivou, a realização da obra.
O Sr. Pinto de Mesquita: - Muito obrigado a V. Ex.ª pela informação, que me obriga a rectificar o comentário que aqui fiz há dias.
O Orador: -Talvez o comentário ainda tenha a sua oportunidade.
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Por que se continua a esperar, pois? Qual a má sina que impede que obra tão basilar, sem a qual pouco valerá falar em turismo na minha terra, se realize? Receiam alguns assumir responsabilidades que a prevista rentabilidade cobre abundantemente? Se assim é, volto a afirmá-lo - sem quebra da alta estima e do alto respeito que tributo a quem, pelo visto, as não quer assumir-, os interesses da cidade não podem ser filhos de tais tibiezas, e não falta, e eu estou entre esses, quem esteja resolvido a assumir essas responsabilidades.
Na cidade, e dado o condicionalismo que a lei estabelece, só a zona de turismo - julgo eu - poderá construir um hotel capaz, para o que já está prometido, de há longos anos, o auxílio do Secretariado Nacional e do Ministério das Obras Públicas. Não pode surgir qualquer dificuldade quanto à concessão do empréstimo que virá a ser necessário, visto a zona estar absolutamente liberta de encargos desse género e a Câmara Municipal ter margem livre para a concessão do mesmo. Estou certo, pois, de que o assunto está em vias de ter rápida solução, pois está em boas mãos e devidamente equacionado.
O Sr. Pinto de Mesquita: - V. Ex.ª dá-me licença?
O Orador: - Faça obséquio.
O Sr. Pinto de Mesquita: - Estando tão bem informado sobro os projectos regionais, para Guimarães não está previsto nada no género?
O Orador: - Tanto quanto sei, não há nada de imediato previsto para Guimarães. Eu gostaria de fazer aqui uma afirmação que me tem aflorado à boca desde o princípio deste debate. O Estado não pode transformar-se em hoteleiro. São as terras que têm de resolver o problema com a ajuda, o interesse e a protecção do Estado, Guimarães, que é uma cidade bairrista com forças morais e económicas de potência indiscutível, estou certo de que não se deixará mais uma vez ficar atrás de Braga.
O Sr. Gosta Guimarães: -Não posso deixar de agradecer a V. Ex.ª as referências feitas à minha terra e às suas gentes. Quero acrescentar, dando satisfação à pergunta do Sr. Deputado Pinto de Mesquita, que já há dois anos aqui levantei o problema da necessidade da construção de um hotel, para cuja efectivação deverá contribuir o interesse e a iniciativa de todo o concelho, pois, na verdade, não é exclusivamente ao Estado que a iniciativa deve competir. Por isso apoio as considerações que V. Ex.ª acaba de fazer e daqui apelo para os meus conterrâneos para que essa construção possa ser uma realidade a curto prazo.
O Orador: - É o que se impõe, para bem de todos nós e do turismo nacional.
Sr. Presidente: não quero, dado o melindre político do problema - e eu sou político -, tratar aqui em detalhe da maneira de se estruturar o turismo no meu Minho, mas não deixarei de dizer que o Minho, turìsticamente, é só uma região e que entendo que só poderá o mesmo ser encarado a sério, e os direitos da região serem devidamente respeitados, se um só organismo fizer a tutela dos interesses em causa, planificar as realizações e ordenar toda a propaganda.
Abandonemos de vez bairrismos estreitos. Atiremos a baixo capelinhas mais ou menos enfeitadas ao gosto de cada um e vamos pelo caminho largo da colaboração franca e leal. Construir um órgão federativo, que poderá ter a sua sede a espaços, nas diferentes cidades da região seria, para mim, uma maneira de resolver o que tem que o ser quanto antes a bem de todos. Há problemas comuns, e esses são os importantes a resolver, que só desta maneira o serão.
O Sr. Alberto de Meireles: - V. Ex.ª dá-me licença?
O Orador: - Faz favor.
O Sr. Alberto de Meireles: - Era para dizer a V. Ex.ª outra vez que estou de acordo, mas a conclusão ...
O Orador: - Se é para falar dos caminhos de Braga, devo dizer a V. Ex.ª que o tempo é pouco para voltarmos a esse assunto.
O Sr. Alberto de Meireles: - Não era para falar nos caminhos de Braga, mas, já que V. Ex.ª falou nisso, eu digo que ouvi a sua explicação com muito interesse sobre o caminho de Roma que levava a Braga, a Roma portuguesa. Mas para se lá chegar era certamente preciso ter boca. Lembra-se V. Ex.ª de que sem ter boca não se chega a Roma.
Mas os caminhos de Braga são principalmente sobrenaturais, e eu diria que eles levam ao céu ...
Mas as considerações do Sr. Deputado são muito importantes, porque conduzem à planificação regional do turismo de Entre Douro e Minho, como há dias preconizei.
O Orador: - Quanto aos caminhos de Braga e quanto à boca direi a V. Ex.ª que tenho medo das bocas maliciosas, como diz o povo.
Estou a lembrar-me de duas santas senhoras de uma família respeitável e velhíssima do nosso Minho que, se ouvissem falar de determinada maneira como eu ouvi, exclamariam: «se o mano António ou o mano Francisco ouvissem, o que diriam!» e deitavam pimenta na língua do menino da família, da tal velha e nobre família de que são hoje das mais velhas representantes.
O Sr. Alberto de Meireles: - Essas encontram Braga no caminho do céu ...
O Sr. Costa Guimarães: - Gostaria de que V. Ex.ª me explicasse como enquadra o seu pensamento no espírito da Lei n.º 2080, para que não haja centralização a sobrepor-se a outra superior.
O Orador: - Não estamos aqui para fazer uma lei, mas, para responder a V. Ex.ª, direi: se o Código Administrativo prevê a criação de federações de municípios, por que não se há-de neste caso criar uma federação?
O Sr. Martins da Cruz: - Se for preciso, faz-se uma lei.
O Sr. Costa Guimarães: - Se bem entendo, V. Ex.ª pugna por uma federação de regiões.
O Orador: - Não gostaria, confesso, de ver morrer os pequenos órgãos de turismo locais, até porque a tarefa é grande e devemos procurar empenhar nela o maior número. Mas entendo premente, como disse, encontrar-se uma forma que regionalize o turismo em todo o Minho.
Sugiro que os Deputados pelos círculos de Braga e Viana, em reunião conjunta, estudem o assunto, que ponham todo o seu prestígio na solução do mesmo, e quem sabe se, concluídos os estudos e consequentes diligências que estou pedindo, não poderíamos, o que seria na ver-
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dade bonito, todos, e com o apoio de toda a região, apresentar na próxima sessão legislativa um projecto de lei que desse cabal solução ao problema.
O Sr. Pinto de Mesquita: - Quando V. Ex.ª diz «dos distritos de Viana e Braga», por que não englobar toda a província de Entre Douro e Minho?
O Orador: - Adiro a essa ideia, que para mim seria excelente, mas, confesso, o óptimo muitas vezes é inimigo do bom.
O Sr. Costa Guimarães: - V. Ex.ª apelou para mim, e eu tenho que lhe dar o meu incondicional apoio para essa projectada iniciativa de estudo.
O Orador: - Muito obrigado; isso dá-me uma grande satisfação, pois V. Ex.ª é uma pessoa de real prestígio na sua terra.
Já aqui nesta Câmara abordei o assunto; há dias, num almoço regional na Casa do Minho, a que assistiram importantes individualidades dos dois distritos, defendi novamente a ideia. De uma e de outra vez encontrei a maior compreensão e simpatia.
Só assim, na verdade, seria possível uma valorização a sério do problema turístico do nosso Minho, que, para fazer valer o que vale, terá de ser uno e indivisível.
Há problemas comuns a resolver que só assim o poderão ser, volto a dizê-lo.
A cobertura hoteleira não poderá esquecer, para já, a região de Basto com uma pousada, e a Penha, a estância de largos e belos horizontes, com um bom hotel, bem como Barcelos, que se situa numa encruzilhada magnífica, com outra pousada.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Devem ser aproveitadas as estalagens que a Hidroeléctrica do Cávado construiu em tempos, apelando daqui para a sua administração, nomeadamente para o seu ilustre presidente, que à cidade do Porto prestou altos serviços - e quem diz ao Porto diz ao Norte -, pois entendo que a Hidroeléctrica do Cávado, permitindo a utilização das suas pousadas e das suas barragens e fazendo destas centros piscatórios, muito poderia fazer em prol do turismo no Norte, sem prejuízo de qualquer espécie para a função específica que lhe compete.
O Sr. Costa Guimarães: - Não esqueça V. Ex.ª a pousada sobranceira à albufeira da Caniçada, que está fechada.
O Orador: - Não me fale em coisas tristes Sr. Engenheiro!
Risos.
Temos de acautelar a cozinha portuguesa da invasão que a vai destruindo. O seu sabor inconfundível, a sua característica especial, não podem ser desprezados. O turista gosta de comer e de beber bem. Para tal deveriam os desdobráveis, que o Secretariado Nacional da Informação costuma editar, incluir gratuitamente reclamos aos restaurantes e hotéis que se comprometessem a incluir nas suas ementas pratos regionais e a apresentar, devidamente engarrafados, vinhos das respectivas regiões.
O Sr. Carlos Alves: - E cozinha vegetariana também!
Risos.
O Orador: - Este ponto dos vinhos tem grande importância. São sempre um cartaz a despertar interesse ao visitante e, no Verão - e é no Verão que eles mais aparecem-, os meus vinhos verdes não se aguentam muito tempo em pipa aberta. E por muito que isso doa aos devotos desse magnífico vinho que é o Dão, o vinho verde no Estio é aliciante, pelo muito que refresca a goela de turistas encalorados.
Risos.
Sr. Presidente: desejo também chamar muito especialmente a atenção das entidades competentes para a necessidade de activar a propaganda turística na nossa vizinha Espanha.
Há dias, alguém que ,aos problemas de turismo se tem dedicado apaixonadamente, com especial carinho e estudo, nomeadamente nas colunas do diário portuense Primeiro de Janeiro, refiro-me ao jornalista Daniel Constant, dizia-me: É ali, é na Espanha que temos o grande terreno onde podemos caçar grande número de turistas. É necessário - dizia-me ele - que em Madrid se estabeleça uma forte central que irradie por todos os centros do país vizinho e torna-se igualmente necessário -disse-o ontem .aqui de uma maneira admirável o meu ilustre colega e amigo Sr. Eng.º lieis Faria - que o Governo Português autorize os nossos cônsules em território espanhol a facilitar a entrada de estrangeiros que, de- visita a Espanha, queiram visitar Portugal.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Não me parece que nisso tenhamos inconvenientes, vista a comunidade de interesses culturais e ideológicos que unem as duas nações, pelo que deveríamos confiar na triagem que nuestros hermanos fazem à entrada das suas fronteiras (risos). Também deveria - tem isto o maior interesse - ser abolido o passaporte entre Portugal e Espanha, a exemplo do que sucede entre a França e a Inglaterra, com as reservas naturais, como seja a dos jovens em idade militar.
A corrente turística espanhola seria irreprimível, ninguém o duvide. Manifesto neste ponto a minha discordância com o ilustre Deputado avisante. É ainda dentro desta ordem de ideias, e repetindo o pedido de abolição do passaporte entre Portugal e a Espanha, que eu peco, e isto no interesse dos povos da região do Norte, que seja feita uma bem estudada propaganda em toda a Galiza, de modo a atrair os povos do lado de lá do Minho - não esqueçamos que a Galiza é das regiões espanholas uma das de maior densidade demográfica em visita ao Norte do País.
Para o efeito impõe-se também, como várias vezes tem sido pedido, a abertura da fronteira no Gores e em Lindoso. O Minho e a Galiza são irmãos, deixai-os livremente namorar, clamou o poeta, já que os pais não lhe deram licença para casar.
Dois povos que se respeitam, com destinos diferentes, mas que tudo aconselha bem se conheçam através de um melhor intercâmbio turístico. Para a propaganda turística na Galiza poderíamos desde já contar com a ajuda eficiente dos Centros Portugueses de Vigo e da Corunha e com a amiga Associação da Imprensa Luso-Galaica.
As autoridades da Galiza por mais de uma vez têm demonstrado desejos de franca colaboração nesse sentido, permitindo-me destacar de entre todas, e com real simpatia e saudade o faço, o actual ministro espanhol Solis Ruiz. quando exerceu as funções de governador de Pontevedra. O intercâmbio turístico entre a Galiza e o Minho poderá desenvolver-se, de preferência, em épocas fora de ponta, o que não seria difícil e seria extremamente
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vantajoso para as duas partes. Para isso, há que criar um organismo próprio do lado de cá que corresponda às delegações provinciais de turismo que existem em Espanha. Um só Minho, uma só região, com respeito pelos pequenos organismos locais.
Ainda para a boa cobertura turística do Minho teríamos de considerar o estabelecimento e manutenção de dois restaurantes folclóricos: um em Braga e outro em Viana do Castelo. Esses restaurantes não só teriam cozinha especificamente regional, como, pelo seu ambiente, seriam mostruários do muito que em artesanato a província é rica. A exemplo do que sucede com os restaurantes folclóricos de Lisboa, leriam de ser subsidiados pelo Fundo de Turismo, de modo a manterem uma permanente exibição das danças e cantares sadios que enriquecem o folclore minhoto. O Fundo de Turismo não deixará de acolher as iniciativas deste género.
Torna-se igualmente necessário que o Porto, metrópole nortenha, seja dotado de um organismo que dirija e impulsiono o turismo em todo o Norte.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - É necessário reestruturar e ampliar a delegação do Secretariado Nacional da Informação, aproveitar os elementos válidos que para o efeito ali conheço e dar-lhes meios de acção.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Não podemos fazer turismo senão em doses maciças, e uma repartição que na capital do Norte resolva e comande os problemas é urgente seja criada.
O Sr. Alberto de Meireles: - Vê V. Ex.ª como eu tinha razão?! ...
O Orador: - Desejo consignar nesta minha despretensiosa - intervenção uma palavra de apreço pelo trabalho que têm desenvolvido dentro e fora do País as agências de viagens, recordando o espírito de franca colaboração, e mesmo entusiástico apoio, com que os seus representantes intervieram no I Colóquio de Turismo.
A propósito, muito a propósito, julgo que seria este o momento de se efectivar um grande congresso nacional de turismo, cujos frutos, desde já se adivinha, seriam proveitosíssimos, contribuindo-se assim para uma perfeita e cuidadosa equação dos problemas, chamando à fala todos os interessados, todos os que sobre o assunto têm realizado estudos, e mentalizando-se mais ainda o País para a grande obra que se nos depara na nossa frente.
Ao Secretariado Nacional da Informação, a quem já largamente prestei homenagem nesta Assembleia pela obra que neste capítulo e dentro dos meios de que dispõe tem com entusiasmo e devoção sabido realizar, ou a qualquer outra entidade que a tão grandiosa tarefa queira meter ombros, deixo a ideia que me parece ser altura de levar por diante.
Sr. Presidente: falei há pouco na necessidade de incrementar o turismo fora dos chamados meses de ponta. No Norte do País a caça e a pesca são, se bem aproveitadas, factores de importância para o efeito.
Tem Portugal, e nomeadamente o Norte, condições admiráveis de caça para fins de turismo, apesar do verdadeiro desprezo a que se votaram os problemas venatórios.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Os verdadeiros caçadores desportivos têm feito todos os esforços para que seja reformada a Lei da Caça, adaptando-a às exigências actuais. Trabalho baldado, com grave prejuízo para a venatória nacional, com um rosário de inconveniências. Perdeu-se já o respeito pela lei, e a fiscalização é deficientíssima, por falta de recursos por parte das comissões venatórias. É certo que as comissões regionais, falando-se com mais conhecimento das do Norte, têm levado a efeito louvável trabalho de fiscalização, mas, apesar de a sua guarda ser a mais prestigiada, fica muito longe do necessário. As penalidades são tão pequenas que os transgressores riem-se delas, e transgride-se livremente. As licenças são tão baratas, e passadas sem quaisquer condições, que se fizeram caçadores indivíduos que nunca pensaram em tal, e daí se fizeram transgressores inveterados.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Graças à Providência tem Portugal ainda a perdiz vermelha, tão apreciada pelo caçador desportivo. Urge protegê-la, e então o turismo encontrará na caça elemento de valor. É urgente a publicação de um novo código, já apreciado pelas agremiações de caçadores e pelas comissões regionais. Onde está a alma caridosa que o vá arrancar ao sono dos justos?
Peço a criação de parques regionais de caça: dois na região do Norte, dois na do Centro e dois na do Sul, sob a direcção e fiscalização dos serviços florestais e com a indispensável colaboração das respectivas comissões regionais. A demarcação inteligente destes parques nacionais de caça em nada prejudica os caçadores locais, beneficiando até os montados vizinhos.
Quanto à pesca, a publicação do regulamento da Lei n.º 2097, da pesca desportiva, veio, através das suas medidas de protecção às espécies, abrir novos horizontes, e então se tornou legalmente possível o fomento da pesca com fins de turismo.
Para o efeito dois caminhos se apresentam: zonas de pesca reservada e concessões de pesca.
As primeiras sob a administração, fiscalização e conservação da Direcção-Geral dos Serviços Florestais e Aquícolas e as segundas podem ser permitidas a várias entidades, e entre elas os clubes desportivos e órgãos de turismo. Nada há feito, no entanto, em Portugal sobre a matéria.
A pesca à truta só é praticável em todo o Norte e parte do Centro. O Clube de Pesca Desportiva de Braga, com referência ao Norte, está naturalmente indicado, pela sua localização e pelos conhecimentos dos seus associados, a prestar larga colaboração para o efeito. Na sua sede, que já para o efeito modestamente montou, poderão os pescadores estranhos, nacionais e estrangeiros, colher as informações de que carecem sobre locais mais apropriados de pesca de harmonia com os desejos dos pescadores e até com a sua idade ou possibilidades físicas, além de outras indicações, como instalações e vias de comunicação.
No Centro, além da pesca da truta, há outras espécies de grande valor desportivo e, desde há cerca de dez anos para cá, o achigã. Além deste, fácil seria povoar algumas linhas de água com o lúcio, tão procurado pelos pescadores, dadas as dimensões que atinge e a luta que trava para a sua captura, o que torna a pesca mais emocionante.
O Clube de Pesca Desportiva de Braga ofereceu já os seus serviços para, em seu nome, requerer três concessões de pesca com o fim especial de turismo, se lhe for concedido um pequeno auxílio material.
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É tempo pois de dar execução ao regulamento, em boa hora publicado, tomando-se o caminho da criação dos organismos mencionados no artigo 22.º, e tratar a sério da fiscalização. Caso contrário, tudo se perderá.
Sr. Presidente: se é evidente a importância que para o desenvolvimento económico do País tem o desenvolvimento turístico do mesmo, há que, sem falta de tempo, nos equiparmos a sério de forma a aproveitarmos convenientemente as riquezas com que Deus nos dotou: uma paisagem cheia de beleza que no Norte do País ganha mais encanto; os usos e costumes da nossa gente, que constituem atractivo natural e, não podemos fugir a dizer, têm no Minho a sua mais álacre expressão, com os seus trajos, as suas romarias e os seus mercados.
A nossa cozinha, que o sabor das nossas avós souberam criar e que o nosso derrancado paladar não tem sabido defender, e com ela, com esses soberbos manjares e com os doces que nos ficaram das receitas dos conventos, os nossos capitosos vinhos.
E ainda e acima de tudo o espírito acolhedor do nosso bom povo, que bem merece por ele façamos tudo o que nos seja possível fazer.
Para isso, para o desenvolvimento turístico que se impõe, há que do Minho ao Sul cobrir de boas estradas e de acolhedores hotéis este país.
Não se hesite em buscar capitais onde os houver, porque a resposta será pronta e francamente compensadora.
Sr. Presidente: para terminar direi que numa intervenção que fiz, já o ano passado, se não estou em erro, teci o meu louvor às belezas do Algarve e recordo-me bem de que defendi então determinadas prioridades para investimentos turísticos no Algarve.
O que defendo e exijo é que o turismo se alargue a todo o País, para bem de todos e como uma das condições necessárias para sermos mais conhecidos e melhor compreendidos.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Teles Grilo: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: hesitei seriamente antes de subir a esta tribuna para fazer algumas breves considerações sobre turismo e assim prestar a minha modestíssima colaboração ao debate em curso.
E hesitei porque, afinal, o nosso ilustre colega avisante, Sr. Dr. Nunes Barata, ao efectivar o seu aviso prévio, fê-lo por maneira tão completa, exaustiva e proficiente que me deixou a impressão de ter dito tudo sobre o assunto, e que assim haveria de constituir pura redundância quanto demais fosse trazido a tal debate.
No entanto, passado que foi o ouramento inicial, logo ponderei que há sempre aspectos locais, particulares de cada região, que forçosamente não puderam ser considerados no magnífico trabalho daquele nosso colega, e que por isso mesmo ofereciam bons ensejes de permitir intervenções sem o risco ou o traço sempre desagradável da repetição.
Eis por que me animei a vir aqui, não para expender altos conceitos sobre as diversas formas de turismo, o seu planeamento e estruturação, a sua política, a sua possível, direcção a um nível ministerial, a sua disciplina e regulamentação, números e estatísticas, comparações com o quê se passa lá fora, para nós sempre tão desagradáveis, etc., nem sequer para fazer críticas e censuras ao que está mal podendo estar melhor, ou verberar entidades, instituições e organismos por atitudes e condutas nem sempre felizes quando equacionadas com os interesses desse mesmo turismo, mas tão-só movido por um insólito propósito, que nem sei bem como irá ser acolhido e compreendido por todos VV. Ex.ªs, a quem, receosamente, vou dar conta dele: é que, dentro de instantes, vou iniciar uma digressão turística ideal por terras de Trás-os-Montes, e sentir-me-ia honrado se VV. Ex.ªs condescendessem em acompanhar-me.
Como o menos que posso garantir é que nenhum se arrependerá de fazer essa viagem imaginária, estou certo de que não me faltarão bons companheiros para a jornada.
De resto, temos agora tempo de viajar, visto não haver mais nenhum aviso prévio para discutir.
Vamos, pois.
Estamos em Setembro, no Porto.
A essa hora matutina fervilha já um ror de gente pelas ruas da cidade a dirigir-se, apressada, aos seus empregos e ocupações.
A capital do Norte começa mais um dia de trabalho, enquanto os nossos carros, sem embaraços no trânsito, vão deslizando por Bonfim, S. Roque da Lameira e Rio Tinto, rumo a setentrião.
A estrada é boa, em paralelepípedos, e como o tráfego se processa em modelares condições, sem bicicletas lado a lado, sem camiões postados a meio da via e soberanamente indiferentes ao desejo ou necessidade de ultrapassagem por parte dos veículos ligeiros, sem o perigo de surgir pela frente, e fora de mão, sobretudo em curvas fechadas, qualquer dementado ás do volante em busca de perfomances e records, sem peões corajosos a atravessar a faixa de rodagem, deliberadamente esquecidos de dar uma olhadela para os lados, enfim, como tudo caminha em boa ordem, a evidenciar que não se torna necessário aumentar os efectivos da Polícia de Viação e Trânsito, breve atingimos Paredes, passamos a sempre gentil Penafiel, e deixamos para trás Amarante, com os seus famosos doces de ovos, começando a subir já o Marão, todo ele deslumbramento feito de verdes e lonjuras, de silêncios, de odores fortes a pinheiro e de paisagens que esmagam de tanto serem belas!
Alguém que segue a meu lado lembra que no Inverno, quando a neve se entretém a cobrir essas lonjuras, o espectáculo oferece aspectos ainda mais surpreendentes.
Marão: algo de diferente a considerar numa rota turística, com ponto de paragem obrigatória na excelente Pousada de S. Gonçalo, agora renovada e aumentada, com mesa farta e variada, quartos confortáveis, serviço isento de reparos, óptimo ambiente, e tudo isto alcandorado lá no alto, num ângulo feliz da serra, a dominar a imponência da paisagem!
Prossigamos, entretanto, que a nossa meta é do Marão para além.
Ultrapassado o Alto de Espinho, que assinala o limite entre os distritos do Porto e Vila Real, somos surpreendidos pelo súbito contraste oferecido por montanhas escalvadas, à espera de arborização florestal adequada, que aliás se iniciou já.
E vamos agora descer em direcção à capital do distrito, a princesa do Marão, a sempre senhoril Vila Real, berço do heróico marinheiro Carvalho Araújo, que na avenida do seu nome tem estátua condigna de justa consagração e homenagem.
Fazemos aqui o primeiro alto, para almoçar.
Nenhuma dificuldade na escolha do local para tomar a nossa refeição. Além de um excelente hotel de 1.ª classe, dotado de todos os requisitos para o impor ao turista exigente, Vila Real dispõe ainda de alguns bons restauran-
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tes, onde cardápios sugestivos fazem aguçar os apetites renitentes.
Após o almoço, em que foram servidos qualificados vinhos de mesa da região, com destaque para o roso da Quinta de S. Mateus e o branco maduro da Adega Cooperativa de Vila Real, visitámos a cidade, munidos de desdobráveis amàvelmente oferecidos pelas graciosas recepcionistas da comissão regional de turismo.
Na urbe, progressiva e limpa, e também nos arredores existem motivos de interesse turístico, com realce para alguns belos monumentos, como a Sé, o Palácio de S. Mateus, com o seu museu particular, a estação arqueológica romana de Panoias, etc.
Adquirimos postais e lembranças com motivos regionais, saboreámos as «viuvinhas», que são uma apetitosa especialidade doce, e, enquanto aguardávamos, pela tarde fora, o regresso daqueles que tinham optado por visitas a Mondim de Basto, a Alijo, à Régua, a Sabrosa e a Mesão Frio, ouvimos, com interesse, alguns vila-realenses relatar-nos o que havia sido o último grande circuito automóvel de Vila Real, que se realiza todos os anos em Junho, por altura das luzidas festas da cidade, e que aqui atraem milhares de entusiastas e forasteiros.
Já noite, chegaram os que haviam saído de Vila Real. Trocámos, impressões. Todos vinham encantados.
O panorama majestático, e único em Portugal, que se avista do monte da Senhora da Graça, em Mondim de Basto, a visão temerosa, esmagadora e imperecível das Fisgas de Ermelo, também em Mondim, o ambiente acolhedor da pousada de Alijo, e todo o manancial de inesgotável beleza que oferece, generosamente, a típica região do Douro, com os seus vinhedos sem fim a envolver, aqui e ali, em ternos amplexos de verdura, as suas casas solarengas, as suas quintas de renome mundial e os seus alvinitentes povoados - tudo isso vinha impresso, indelèvelmente, nos olhos deslumbrados dos que regressaram, tudo isso foi por eles descrito, enaltecido e cantado com sincero ardor!
Após o jantar alguns de nós foram ao cinema, que, segundo as informações colhidas, dispunha de uma sala de espectáculos ampla, moderna e confortável, onde os Vila-Realenses podiam passar agradavelmente algumas horas de ócio; outros espalharam-se pelos diversos cafés da cidade, quase todos de boa categoria; e outros, ainda, decidiram instalar-se no magnífico salão do hotel, e aí assistir, na televisão, a um programa de alto nível artístico, como habitualmente sucede.
Partimos rumo a Chaves na manhã seguinte, tranquila, amena, esplendorosa de sol!
A estrada larga, bem conservada o de bom traçado, incita a calcar rio pedal, e eis que num ápice, ao sair de uma curva, deparámos com as Pedras Salgadas, já no concelho de Vila Pouca de Aguiar.
Percorremos a estância termal, escondida entre arvoredo denso, a emprestar frescura e bem-estar aos que ali procuram repouso e cura dos seus males.
Os aquistas, em número elevado, encontram alojamento condigno nos vários hotéis e pensões disseminados pelo parque.
Não faltam diversões aos hóspedes: remo no lago, patinagem no rinque, dança no pavilhão de chá, equitação, ténis, cinema, etc. E no Hipódromo das Romanas realiza-se anualmente um categorizado concurso hípico, que reúne a fina flor dos cavaleiros portugueses e alguns estrangeiros.
Mas Vidago espera-nos, e temos de prosseguir. Em dez minutos vencemos os poucos quilómetros que separam as duas magníficas estâncias termais.
Logo à chegada foi-nos dito que estava a decorrer uma prova do Grande Torneio Anual de Golf. Curiosos, quisemos assistir, misturando-nos com a legião entusiasta de mirones que seguia o jogo. Pudemos assim fazer todo o percurso com os seus: nove bogeys, e como entre, nós havia alguns golfistas, ficámos a saber por eles que o campo de golf de Vidago, sem ser o maior, é o mais bonito, o mais cuidado e o mais aprazível dos campos de golf portugueses.
O Sr. Virgílio Cruz: - Muito bem!
O Orador: - Finda a prova oficial, os nossos golfistas quiseram também deliciar-se com uma volta, o que puderam fazer sem dificuldade, pois no pavilhão respectivo havia, para alugar, quatro sacos com jogos completos de clubs, bem como bolas e tees.
Entretanto, e para não perder tempo, outros de nós dirigiram-se à piscina do Grande Hotel, moderna, de linhas elegantes, com relvado e guarda-sóis, prancha de saltos, reservado para crianças e bar.
Outros passearam pelo vasto parque, frondoso, perfumado, tranquilo; e viram o grande lago, pejado de barcos de recreio, o campo de ténis, o campo do golfinho, o rinque de patinagem, o pavilhão de venda de lembranças e «recordações. Nas alamedas, nas esplanadas dos cafés e dos hotéis, em toda a parte, uma pequena multidão de aquistas, turistas, simples forasteiros e visitantes das redondezas, tagarelava, despreocupada, feliz, e por certo rendida ao encantamento desse ambiente excepcional!
E foi assim que, já sem espanto, soubemos que as centenas de quartos dos numerosos hotéis e pensões de Vidago estavam ocupados e já comprometidos até fins de Outubro!
Com a mais lisonjeira das impressões, deixámos a cativante estância para vencer os últimos 17 km da jornada que iria terminar em Chaves. Porém, alguns carros da caravana, um pouco à frente, na ponte de Arcossó, derivaram à esquerda, à conquista ide Boticas, Montalegre e Carvalhelhos, com a promessa de se nos juntarem à noite, no Grande Hotel de Turismo de Chaves, onde todos ficaríamos alojados. A nobre e vetusta Aquae Flaviae dos romanos surgiu-nos ao longe, com a sua torre de menagem a dominar o vasto casado em volta, espreguiçado pela veiga fora.
À entrada um túnel de verdura, com 2 km de extensão em recta, deixa logo o visitante embevecido pela rara beleza desse pórtico espectacular.
Toda a urbe, a mais populosa do distrito, é um modelo de limpeza, arrumo e compostura. Tem carácter. Os habitantes são afáveis na sua tradicional franqueza, solícitos, prestáveis, delicados. O trânsito nas principais artérias, que é já intenso, está devidamente disciplinado, vendo-se polícias sinaleiros em todos os cruzamentos perigosos.
Não se vê cuspir no chão; não há pedintes nas ruas; não se ouvem palavrões, e muito menos obscenidades.
Dirigimo-nos à sede da comissão regional de turismo, modelarmente instalada, e aí, tal como em Vila Real, foram-nos oferecidos desdobráveis muito sugestivos, bem como cartas turísticas da região, completas e bem elaboradas.
Soubemos que as recepcionistas eram poliglotas, o que é nota interessante a referir. Guiados depois por um cicerone que a dita comissão colocou ao nosso dispor amàvelmente, visitámos os monumentos e lugares históricos da cidade e arredores.
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E ficámos surpreendidos - porque não o esperávamos - de ver tanta coisa bela e de real interesse para o turismo nacional!
As igrejas de Santa Maria Maior, da Misericórdia, da Madalena e românica de Outeiro Seco, as capelas da Lapa, do Calvário, de S. Roque e da Azinheira, os Santuários de S. Caetano e de S. Pedro de Agostém, os Castelos de Chaves, de Monforte de Rio Maior e de Santo Estêvão, os Fortes de S. Neutel e de S. Francisco, a ponte romana sobre o Tâmega, tudo são jóias arquitectónicas, excertos da cultura, da arte e do engenho dos nossos maiores, pedaços da sua alma, fulgores do seu espírito, sinais perenes da sua vitalidade e potencialidade criadora, que, para regalo e êxtase dos nossos sentidos, puderam sobreviver ao dobar dos séculos e afirmar-se hoje como motivos sagrados da nossa contemplação e respeito!
Mas há também a Chaves actual, com aspectos modernos, progressivos, a tornar mais apetecida a estada do turista.
Abriram-se novas e amplas avenidas, acelerou-se a construção civil, fizeram-se parques e jardins, promovem-se todos os anos as grandes festas da cidade em honra de Nossa Senhora das Graças, lançou-se nova ponte sobre o rio Tâmega, cujas margens, adentro da cidade, foram embelezadas, desafrontou-se a velha ponte romana de todo o inestético casario que a asfixiava em ambas as extremidades, restituindo-a à sua majestosa traça primitiva, construíram-se bons hotéis, com capacidade para acolher, sem atropelos, o número sempre crescente dos frequentadores das águas termais, ergueram-se imponentes edifícios públicos, valorizou-se a estância termal com a construção da buvette, dos balneários, do parque relvado, das piscinas de água quente e fria, de campos para jogos, de pavilhão de dança e diversões e de um espelho de água no rio, a permitir a prática do remo. Por outro lado, existem na cidade vários cafés, restaurantes, pensões e snack-bars, além de uma estalagem de 1.ª classe e de um magnífico cine-teatro recentemente aberto ao público, e que é o maior e melhor de toda a província. À noite, luz eléctrica a jorros inunda a cidade inteira, com focos especiais a iluminar os monumentos, e tudo a provocar um feerismo de bom gosto, que a todos agrada e prende.
Mas quem não quiser sair à noite terá, do mesmo modo, assegurado em casa um bom divertimento: a televisão.
De nitidez incomparável, com programação da melhor e possibilidade de captação das emissões espanholas, a televisão em Chaves constitui um dos elementos de valorização turística da região.
Há depois a variada e bem abastecida mesa flaviense, que faz as delícias gastronómicas de quem visita e pára na cidade; Portugal, de lés a lés, conhece o seu presunto inconfundível, as suas típicas alheiras, os seus saborosos folares e pastéis de carne! E precisa de conhecer ainda os seus bons vinhos, as suas frutas e as suas hortaliças de qualidade.
Regalo dos turistas e tentação dos aquistas, esse primoroso lote de especialidades regionais impõe, na verdade, que a passagem por Chaves se faça com lentidão conveniente e por forma a permitir que decorram sempre pelo menos oito dias!
Outros aspectos, no entanto, merecem ser realçados, pelo que representam de atracção para o turista exigente.
Um parque de campismo com todas as comodidades e situado em local aprazível, à beira-rio, na periferia da cidade, aguarda aqueles que preferem gozar mais de perto as dádivas de uma natureza sempre pródiga e dia a dia a desfazer-se em amenidades de clima, em alvoreceres e entardeceres de surpreendentes efeitos, em incomparáveis luminosidades e transparências, em brisas suaves, quietude, paz!
Mas o turista, por via de regra, não se atém apenas a, contemplação e repouso. Ele é activo, dinâmico, descontraído - como agora sói dizer-se. Pois tem aqui as melhores possibilidades de dar largas à sua ânsia de movimento e desporto.
Pode nadar nas piscinas de Chaves e Vidago, pode jogar golf e ténis, pode praticar hipismo, pode patinar, pode remar, pode fazer montanhismo, pode caçar e pode pescar. Neste último capítulo da pesca, há de notável a dizer que todos os rios e ribeiros da região são truteiros, com apreciáveis contingentes das respectivas espécies, com repovoamentos periódicos, com fiscalização aturada e, sobretudo, com o povo educado no sentido de não matar o peixe com bombas e venenos!
E esta é, como não podia deixar de ser, outra das grandes atracções turísticas da zona.
Para completar o quadro deve referir-se que, com base de partida em Chaves, podem dar-se agradáveis passeios num raio de 50 km, por excelentes estradas alcatroadas, com visitas à famosa estância termal de Carvalhelhos, à simpática vila de Boticas - onde é quase obrigatório almoçar trutas fritas com toucinho, no típico Restaurante Santa Clara, à grande barragem dos Pisões, com a sua extensa e formosa albufeira, à progressiva vila de Valpaços, com os seus inigualáveis vinhos tintos de mesa, e a Montalegre, com as suas serras agrestes, as suas carnes verdes de qualidade sem par e a preciosa relíquia do seu castelo seiscentista. E isto sem falar em curtas digressões a Espanha, ali a 10 km, onde a convivência com nuestros hermanos fronteiriços se processa ao nível de muita compreensão e amizade.
Aqui se calou o nosso cicerone, conhecedor e amável, para nos lembrar que eram horas de jantar e sugerir que no dia seguinte, antes de partirmos, devíamos subir ao alto de S. Lourenço, na serra do Brunheiro, sobranceiro à cidade e à sua veiga, e dali, do miradouro que a comissão de turismo mandou construir, contemplar um dos mais extraordinários espectáculos que nos é dado apreciar em terras portuguesas.
Ao jantar, servido a primor, e que decorreu em maré alta de satisfação, os do grupo que tinham ido a CarvaIhelhos e outras povoações limítrofes relataram circunstanciadamente as suas visitas, sendo unânimes em afirmar que a região era digna de ver-se.
No dia imediato foi o regresso, péla estrada de Braga, a atravessar toda a zona das grandes barragens hidroeléctricas, numa sucessão de contrastes paisagísticos verdadeiramente surpreendentes, e assim a fechar um circuito turístico de eleição, que não receia confrontos com quaisquer outros, entre fronteiras, por mais afamados e propagandeados que sejam!
Resta acrescentar, numa última nota desta idealizada viagem, que alguns dos nossos companheiros ficaram em Chaves mais uns dias, porque, segundo confidenciaram, vinham sentindo desde há tempos algumas dores reumáticas e queriam aproveitar a oportunidade para se libertarem de vez desse quezilento mal, com o recurso às águas das famosas Caldas; outros preferiram regressar de comboio, e tomaram uma veloz automotora, que, em menos de duas horas, os transportou à Régua; outros, finalmente, optaram pela via aérea, dada a urgente necessidade de estarem em Lisboa na manhã desse mesmo dia, e foram tomar o respectivo avião ao aeroporto da Campina, que serve Chaves e todas as estâncias termais da região.
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3536 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 141
Sr. Presidente, Srs. Deputados: aqui termina o sortilégio!
Sei que aqueles de VV. Ex.ªs que me acompanharam nesta jornada admirável não estão arrependidos. E mais: sei que de bom grado voltariam te outra oportunidade surgisse como esta ...
Ora, era isso, precisamente, o que aconteceria com todos os turistas reais que fossem de abalada às mesmas regiões donde nós acabamos de regressar e aí encontrassem, vissem, admirassem e saboreassem tudo aquilo que há pouco foi razão e causa do nosso deleite e encantamento.
Eles iriam ávidos e pressurosos, eles voltariam uma e mais vezes, eles não esconderiam o seu entusiasmo perante amigos e conhecidos, eles carreariam multidões, e todos seriam os artífices de uma enorme corrente humana, do nacionais e estrangeiros, a culminar no estabelecimento do uma importante zona de turismo, com larga projecção futura!
O Sr. Gonçalves Rodrigues: - V. Ex.ª dá-me licença?
O Orador: - Faça favor.
O Sr. Gonçalves Rodrigues: - Fiquei com a impressão, ao ouvir V. Ex.ª, de que Dante teria tomado como tema da sua Divina Comedia o turismo e que neste momento não se trataria da descida de Dante aos Infernos, mas da subida de Grilo ao Paraíso.
Risos.
O Orador: - Muito obrigado.
Infelizmente, a realidade, a dura realidade, é bem diferente do sonho que descrevemos!
Tráfego disciplinado, todas as vias de comunicação, em perfeito estado, uma rede de hotéis, pousadas, estalagens, restaurantes e pensões a cobrir eficientemente, as regiões de turismo, serviços impecáveis, mesas fartas e variadas, limpezas sem mancha, pessoal correcto e lavado, povo educado e a revelar um alto grau de civismo, ausência de mendicidade, certas manifestações culturais e desportivas como meio de provocar afluxos turísticos, tudo isso são utopias, se não para todas, pelo menos para a maior parte dessas regiões de turismo.
Não: em Vila Real ainda não há hotel, nem uma boa casa de espectáculos, nem mais que um razoável restaurante, e deixou já de se realizar o seu circuito automóvel que tanta gente chamava à cidade, e tanto renome e prestígio lhe acarretava!
Não: em Chaves não há nenhum grande hotel do turismo, nem bons restaurantes, nem ainda a estalagem, nem ruas sem pedintes e palavrões, nem parque de campismo, nem o miradouro de S. Lourenço, nem o aeroporto da Campina, nem ainda a piscina e os balneários definitivos das termas, nem automotoras, nem féeries nocturnas, nem monumentos iluminados, nem festas da cidade, nem sequer televisão!
Em todo o distrito o que há, e sem dúvida do melhor, é a paisagem, as vistas! A paisagem que o turista vê uma vez e não tem interesse em tornar a ver, a paisagem que por si só, e embora magnificente, não pode justificar a criação de uma zona de turismo ao nível nacional, e muito menos ao nível internacional.
É preciso mais, muito mais! Aquele mais, por exemplo, que nós descobrimos há pouco, maravilhados, na nossa fantástica excursão por terras de Trás-os-Montes!
Quando as entidades responsáveis conseguirem oferecer-nos uma digressão no estilo da que descrevi de início, subirei então, uma vez mais, a esta nobre tribuna e daqui proclamarei, exultante de alegria: Sr. Presidente, Srs. Deputados: há turismo em Trás-os-Montes!
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: quando, usando da faculdade conferida pela Constituição, prorroguei o funcionamento da Assembleia não disse o prazo por que o prorrogava. Aclaro hoje que esse prazo é de um mês.
Na próxima semana, naturalmente, iniciar-se-á o debate sobre as Contas Gerais do Estado e das províncias ultramarinas. Não sei, ao certo, se se iniciará, porque ignoro, apesar de conhecer o número de oradores que ainda estão inscritos, se se conseguirá que estejam preparados para falar na altura em que lhes for dada a palavra.
E é claro que, naturalmente, o debate acabará quando não houver Deputados que, muito embora tenham manifestado o desejo de falar, não se disponham desde logo a fazê-lo. Por isso, insisto, não posso ter a segurança de que o debate sobre este aviso prévio se prolongue por toda a próxima semana. A seguir, ou mesmo durante, serão postas em discussão as Contas Gerais do Estado da metrópole e das províncias ultramarinas e o relatório da Junta do Crédito Público.
Vou encerrar a sessão.
O debate continuará na próxima terça-feira, dia 10, sobre a mesma ordem do dia.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 10 minutos.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Alexandre Marques Lobato.
Aníbal Rodrigues Dias Correia.
Antão Santos da Cunha.
António Calheiros Lopes.
António Manuel Gonçalves Rapazote.
António Moreira Longo.
Armando Francisco Coelho Sampaio.
Armando José Perdigão.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Carlos Coelho.
D. Custódia Lopes.
Francisco de Sales de Mascarenhas Loureiro.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Henrique Veiga de Macedo.
Jacinto da Silva Medina.
James Pinto Bull.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
Jorge Manuel Vítor Moita.
José Dias de Araújo Correia.
José de Mira Nunes Mexia.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel Nunes Fernandes.
Manuel Seabra Carqueijeiro.
Mário Amaro Salgueiro dos Santos Galo.
Rogério Vargas Moniz.
Rui de Moura Ramos.
Tito Castelo Branco Arantes.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
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Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António de Castro e Brito Meneses Soares.
António Magro Borges de Araújo.
António Tomás Prisónio Furtado.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Belchior Cardoso da Costa.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Jorge Augusto Correia.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Manuel da Costa.
José Pinto Carneiro.
José dos Santos B essa.
Júlio Dias das Neves.
Luís Folhadela de Oliveira.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel de Melo Adrião.
D. Maria Irene Leite da Costa.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Beis.
Purxotoma Ramanata Quenin.
Urgel Abílio Horta.
Vítor Manuel Dias Barros.
Voicunta Srinivassa Sinai Dempó.
O REDACTOR - Leopoldo Nunes.
Requerimento enviado para a mesa no decorrer da sessão pelo Sr. Deputado Alberto de Meireles:
«Nos termos regimentais, roqueiro que mo suja fornecido o Anuário Estatístico referente a 1902 ou ao último ano que tiver sido publicado (Instituto Nacional do Estatística) e ainda a Estatística das Instalações Eléctricas em Portugal (volume referente a 1962) esto edição da Imprensa Nacional.»
IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA