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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETÁRIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 150

ANO DE 1964 23 DE MARÇO

VIII LEGISLATURA

SESSÃO N.º 150 DA ASSEMBLEIA NACIONAL

EM 21 DEI MARÇO

Presidente: Exmo. Sr. Mário de Figueiredo

Secretários: Exmos. Srs.Fernando Cid Oliveira Proença
Luis Folhadela de Oliveira

Nota. - Foi publicado o S.º suplemento ao n.º 132 do Diário das Sessões, que insere o parecer sobre as Contas Gerais do Estado de 1963 (ultramar).

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 15 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foi aprovado o n.º 146 do Diário das Sessões.
Para cumprimento do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição, recebeu-se na Mesa o Diário do Governo n.º 61, 1.ª série, que insere o Decreto-Lei n.º 45 610.
Enviados pela Presidência do Conselho, foram recebidos na Mesa os elementos requeridos pelo Sr. Deputado Cutileiro Ferreira, a quem foram entregues.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Lopes Roseira, acerca do custo de vida em Angola; Cutileiro Ferreira, para se congratular com a criação, em Évora, do Instituto Económico e Social; Pinto de Mesquita, sobre museus e palácios nacionais, e Burity da Silva, que se referiu à instituição que se projecta do Centro Social de Angola.

Ordem do dia. - Concluiu-se a discussão das Contas Gerais do Estado e da Junta do Crédito Público referentes a 1962.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Francisco António Martins, Vaz Nunes e Pinto Bull.
Encerrado o debate, o Sr. Deputado Jesus Santos enviou para a Mesa duas propostas de resolução, uma respeitante às Contas Gerais do Estado e a outra às da Junta do Crédito Público.
Postas à votação, foram aprovadas.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas e 25 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai fazer-se a chamada.

Eram 16 horas.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Agnelo Ornelas do Rego.
Alberto Carlos de Figueiredo Franco Falcão.
Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Alberto Pacheco Jorge.
Alberto dos Reis Faria.
Alberto Ribeiro da Costa Guimarães.
Alberto da Rocha Cardoso de Matos.
André Francisco Navarro.
Aníbal Rodrigues Dias Correia.
António Augusto Gonçalves Rodrigues.
António Burity da Silva.
António Gonçalves de Faria.
António Júlio de Carvalho Antunes de Lemos
António Magro Borges de Araújo.
António Manuel Gonçalves Rapazote.
António Mana Santos da Cunha.
António Martins da Cruz.
António Moreira Longo.
Armando Cândido de Medeiros.

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Armando Francisco Coelho Sampaio.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel
Augusto Duarte Henriques Simões.
Augusto José Machado.
Bento Benoliel Levy.
Carlos Alves.
Carlos Emílio Tenreiro Teles Grilo.
Fernando Cid Oliveira Proença.
Francisco António Martins.
Francisco António da Silva.
Francisco José Lopes Roseira.
Francisco Lopes Vasques.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Henrique Veiga de Macedo.
James Pinto Bull.
Jerónimo Henriques Jorge.
João Mendes da Costa Amaral.
João Rocha Cardoso.
João Ubach Chaves.
Joaquim de Jesus Santos.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Joaquim de Sousa Birne.
Jorge de Melo Gamboa de Vasconcelos.
José Alberto de Carvalho.
José Luís Vaz Nunes.
José Manuel da Costa.
José Manuel Pires.
José Maria Rebelo Valente de Carvalho.
José Monteiro da Rocha Peixoto.
José Pinheiro da Silva.
José Soares da Fonseca.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Luís Folhadela de Oliveira.
Manuel Amorim de Sousa Meneses.
Manuel Herculano Chorão de Carvalho.
Manuel João Correia.
Manuel João Cutileiro Ferreira.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
D. Maria Irene Leite da Costa.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Reis.
Mário Amaro Salgueiro dos Santos Galo.
Mário de Figueiredo.
Olívio da Costa Carvalho.
Paulo Cancella de Abreu.
Quirino dos Santos Mealha.
Rogério Vargas Moniz.
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães
Tito Castelo Branco Arantes.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
Virgílio David Pereira e Cruz.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 71 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 16 horas e 15 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Está na Mesa o n.º 146 do Diário das Sessões, correspondente à sessão de 17 de Março.
Está em reclamação. Se nenhum dos Srs. Deputados produzir qualquer reclamação, considero-o aprovado.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Está aprovado.
Para efeitos do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição, está na Mesa o Diário do Governo n.º 61, 1.º série, de 12 do corrente, que insere o Decreto-Lei n.º 45 610, o qual dá nova redacção a vários artigos do Decreto-Lei n.º 26 643, que promulga a reorganização dos serviços prisionais.
Enviados pela Presidência do Conselho, estão na Mesa os elementos fornecidos pelo Ministério da Educação Nacional em satisfação do requerimento apresentado pelo Sr. Deputado Cutileiro Ferreira na sessão de 15 de Janeiro do ano corrente. Vão ser entregues àquele Sr. Deputado.
Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Roseira.

O Sr. Lopes Roseira: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: não vou fazer perder muito tempo a VV. Ex.ªs a escutarem-me. Ocupar-me-ei apenas de dois assuntos e serei breve.
Creio não constituir novidade para ninguém que, a partir de 1961, o custo de vida em Angola, principalmente nos maiores centros populacionais, tem vindo a agravar-se surpreendentemente. E os que mais sentem as duras consequências do já angustiante agravamento são, como sempre acontece, aqueles que vivem exclusivamente dos seus vencimentos, salários e pensões.
São os trabalhadores por conta de outrem, os pequenos e médios empregados e funcionários públicos civis e militares e as classes inactivas do Estado - aposentados, jubilados, pensionistas e reformados. Os proventos que essas pessoas auferem estão ficando cada vez mais abaixo do indispensável, já não direi para manterem um nível digno de vida, por ser coisa muitíssimo relativa, mas para não sofrerem carências do essencial à manutenção de um viver saudável e são.
Em Angola está-se vivendo mal, mesmo muito mal. Os ganhos já não chegam para se fazer face àquilo que possa ser considerado indispensável e essencial à vida.
Das causas influentes em tão destravado agravamento do custo de vida algumas haverá que não poderão colher justificação plausível e legítima. A ambição e a ganância não foram travadas a tempo. É desmedida a ânsia de realização de lucros, enquanto dura esta maré de vigília de armas em que toda a Nação está empenhada.
Até parece que para certa espécie de pessoas quanto mais longe vier a paz, tanto melhor; e que o gigantesco esforço que o Estado está a desenvolver não está sendo compreendido com devoção patriótica por todos, para que por todos seja compartilhado e aceite o sacrifício. O mal de milhões de criaturas é, nesta fase crucial, largo conforto de umas centenas para as quais é indiferente o bem comum.
Era fatal que o impacto populacional a que a província foi subitamente submetida, em militares e colonos, uma vez que as fontes de produção não estão apetrechadas para acompanhá-lo, provocasse um enormíssimo desequilíbrio entre a oferta e a procura. Daí a escandalosa subida dos preços dos consumos, da habitação, do vestuário e calçado, perante o ar mais cândido e tranquilo dos responsáveis. Quem acode àquela gente, cujo único meio de defesa está no trabalho do dia a dia?
Chega a assumir aspectos de verdadeiro milagre o ser possível a subsistência de uma família composta de quatro ou, mesmo, três pessoas, cujo chefe ganha apenas 1800$ a 2500$ mensais, quando só a renda da casa lhe absorve 40 a 60 por cento daquele ganho. Começa a haver fome em Angola; principalmente nos centros onde tem sido maior o súbito acréscimo populacional, ainda que esta afirmação muito contrarie os homens de espírito ilusionista mascarado de optimismo convincente.

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Ora, para que nem tudo resvale para um estado de miséria sem remédio, pois não nos interessa o remédio dos hospitais e dos cemitérios, peço aos Srs. Ministro do Ultramar e Governador-Geral de Angola que analisem atentamente a situação e tomem providências urgentes para ser detida a alarmante subida do custo de vida naquelas terras, usando dos meios mais enérgicos ao seu alcance, certos de que não é a população, que está sofrendo, a causadora do estado de guerra gerado na província; mas é a que está a suportar as mais duras consequências de tal situação.
Penso, para já, que, no sector do Estado, deveriam ser igualadas as remunerações dos servidores de Angola às dos de Moçambique, por não se justificar a actual diferenciação dos vencimentos complementares, aliás deprimente para os de Angola, qualquer que seja o aspecto por que queiramos encará-la; que deveriam ser revistas e actualizadas as pensões das classes inactivas, actualmente mergulhadas em situação de grande lástima, definindo-se novas normas que comportem ampla elasticidade para que as pensões possam acompanhar sempre o custo de vida.
Bastaria que fosse registado o número-índice do custo de vida no momento do termo das funções activas e tornar a pensão passível de aumento ou diminuição em função da subida ou descida daquele índice-base para além dos limites fixados. Com procedimentos não conducentes a uma atitude semelhante apenas se arremeda a justiça.
Em segundo lugar, e concomitantemente, impõe-se um consciencioso e rigoroso tabelamento de todas as essencialidades de consumo e a revisão dos preços de aluguer das habitações, criando-se brigadas de fiscalização, constituídas por pessoas idóneas, impregnadas da consciente noção do dever cívico que as torne impassíveis ante o suborno e o compadrio, e estabelecendo-se severíssimas sanções a açambarcadores e especuladores.
A situação é bastante grave. Não vale a pena encarecê-la mais. Ela é patente a quantos lá vivem numa entrega total. E olhar para ela com o espírito decidido a resolvê-la é também ganhar a paz no campo das consciências. Aqui deixo, pois, o meu alerta e a minha sugestão.
Sr. Presidente: passo agora ao segundo assunto, que é bastante curioso e serve para ilustrar a opinião, que tenho defendido, de que só deve existir um quadro de funcionalismo público.
Nos quadros de pessoal dos C. T. T. do ultramar existe a categoria de condutor de máquinas e electricidde.
Os técnicos que desempenham essas funções são todos diplomados com o mesmo grau e, até há poucos anos, não tinham direito de acesso nos quadros. Só a partir de 4 de Maio de 1961, com a publicação do Decreto n.º 43 657, lhes foi reconhecido aquele direito. E juntamente com o direito de acesso outro direito mais justo e significativo lhes foi reconhecido: o de preferência sobre os demais funcionários, tendo em atenção a superioridade de habilitações científicas de ordem técnica.
Parecia que esta garantia de justiça expressa na lei seria o sinal iniludível de que iria cessar o ostracismo a que tinham sido votados os condutores de máquinas e electricidade dos C. T. T. de Angola. Mas isso não aconteceu.
Esta categoria de técnicos tanto existe no quadro do pessoal contratado como no quadro do pessoal privativo de cada província. Entre estes dois quadros não há confusão possível, gozando os contratados, exclusivamente, dos direitos taxativamente expressos nos respectivos contratos.
Um facto aberrante, porém, veio a ser motivo de logro daqueles técnicos que, desprezando a vantagem imediata de um benefício material, quiserem permanecer no seu quadro privativo: foi o facto de, no quadro do pessoal contratado, ter sido criada e inscrita a categoria de chefe de serviços técnicos, sem igual correspondência no quadro privativo.
E aconteceu então este caso curioso: os condutores de máquinas e electricidade dos C. T. T. de Moçambique, vinculados ao quadro privativo, atraídos pelo acesso à categoria imediata, de chefe de serviços técnicos, que lhes proporcionou o Decreto n.º 43 657, passaram voluntariamente para o quadro dos contratados, desertando do privativo; e os condutores de máquinas e electricidade dos C. T. T. de Angola mantiveram-se indiferentes à ucharia que o decreto lhes proporcionou, certos de terem assegurado no seu quadro privativo o acesso à categoria de director de 3.ª classe, que é a imeditamente superior, por não existir neste quadro a de chefe de serviços técnicos.
Quer isto dizer que o expediente a que se recorreu para expurgar dos quadros privativos os condutores de máquinas e electricidade não resultou.
Mas saiu-lhes cara essa atitude de fidelidade ao seu quadro privativo: sem respeito pela preferência estabelecida, e posteriormente à publicação do Decreto n.º 43 657, que a reconheceu, foi publicada a lista da classificação para a promoção a directores de 3.ª classe e nela não figuraram os condutores de máquinas e electricidade dos C. T. T. de Angola do quadro privativo, pois ao quadro privativo pertence a categoria de director de 3.º classe. E mais uma vez se frisa: fora dos respectivos quadros não há competição legal possível entre funcionários contratados e de nomeação definitiva, que são os do quadro privativo.
Era curial que essa lista tivesse sido modificada e posta de harmonia com o estatuído no aludido decreto, uma vez que a sua publicação foi posterior à promulgação deste. Mas não foi; e o seu prazo de validade já caducou. É de esperar que nova lista venha a ser publicada. E é de esperar também que, desta vez, seja considerado o direito dos condutores de máquinas e electricidade dos C. T. T. de Angola e não venham a ser preteridos na promoção pelos seus pares de Moçambique.
Só poderá acontecer isto à custa de uma disposição excepcional que lhes reconheça, não obstante estarem agora vinculados ao quadro do pessoal contratado, o direito de promoção a directores de 3.ª classe, que é uma categoria do quadro privativo a que são estranhos os chefes de serviços técnicos dos C. T. T. de Moçambique. É uma hipótese e um aviso.
Conhecido o processo de ultrapassagem com postergação dos direitos de outrem, uma solução se impõe: a de proceder .com justiça, respeitando os direitos dos condutores de máquinas e electricidade dos C. T. T. de Angola.
E, para finalizar, uma pergunta de quem não sabe e não entende: tanto no quadro do pessoal contratado dos C. T. T. de Angola como no de Moçambique foi incluída a categoria de chefe de serviços técnicos - por que razão em Moçambique ficou esta categoria, para efeito de vencimentos, classificada na letra G e em Angola ficou na letra H? Não bastaria a diferença dos vencimentos complementares, se tivessem ficado classificados na mesma letra?
Por aqui se prova que basta um rato no porão para atirar com um barco ao fundo. Deixo, por isso, ao conhecimento e consideração do Sr. Ministro do Ultramar estas anomalias, só possíveis devido à inexistência de um quadro único de funcionalismo do Estado.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

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O Sr. Cutileiro Ferreira: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: julgo, Sr. Presidente, que o importante acontecimento que neste fecho de período legislativo trago ao conhecimento desta Câmara será grato a todos os Srs. Deputados e, particularmente, ao vosso sentimento de ilustre professor universitário.
O Sr. Ministro da Educação Nacional, por despacho de 19 de Março de 1964, homologou o parecer, emitido pela secção do ensino superior, da Junta Nacional da Educação, que autoriza a criação, em Évora, de um estabelecimento de ensino superior - o Instituto Económico e Social - destinado à preparação de administradores e gerentes de empresas. A criação deste Instituto foi requerida pela Província Portuguesa da Companhia de Jesus, que, deste modo, se propõe retomar, com o auxílio da Fundação de Eugénio de Almeida, as suas tradicionais actividades universitárias na cidade de Évora.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Évora foi grande. Atesta-o a história. E a sua grandeza não ficou confinada aos limites espacialmente reduzidos do território continental, chegou aos vastos domínios ultramarinos e, podemos afirmá-lo, ao Mundo inteiro. Esta projecção deve-a à sua Universidade, facho que D. Henrique acendeu um dia no céu de Portugal e que durante dois séculos atraiu os olhares dos estudiosos. Mestres insignes de Teologia e Escritura formaram numerosos alunos e difundiram o seu saber em livros ainda hoje apreciados. Mas, numa hora fatídica para o Alentejo, para a Pátria e para a cultura, a luz que irradiava de Évora deixou de irradiar, o facho apagou-se: tinham-se cerrado as portas da Universidade.
Profundo letargo...
Passaram 200 anos.
No Outono de 1959 celebrava-se na capital alentejana o 4.º centenário da fundação da sua Universidade.
Está ainda na memória de todos a repercussão internacional atingida pelas comemorações centenárias da Universidade eborense. Todo o mundo culto se associou àquelas cerimónias, representado pela mais brilhante e digna embaixada de eminentes filósofos e humanistas que jamais havia transposto as portas seculares do velho burgo alentejano.
Na era de materialismo em que vivemos, Évora experimentou, naqueles dias históricos, momentos do mais elevado espiritualismo e recordou, saudosamente, o período áureo da sua qualidade de grande centro de irradiação cultural, espraiando salutares ensinamentos pelas cinco partes da Terra. Vibrou de emoção ao avivar-se em sua consciência a noção de quanto andou sempre ligada à expansão da lusitanidade e soube reafirmar, no calor com que acolheu tão ilustres visitantes, que hoje, como outrora, pretende lugar de primazia na magna tarefa da organização de uma humanidade mais justa, mais esclarecida, para segura construção de um mundo melhor.
O Governo soube compreender os seus anseios, que são afinal os de todos nós, e se a honrosíssima presença de S. Ex.ª o Chefe do Estado, na sessão solene de encerramento daquelas comemorações, constituiu então prometedora esperança, o grande acontecimento que hoje assinalamos é passo decisivo no caminho do progresso e glória de Portugal.
Os factos resumidamente relatados despertaram - direi que despertaram mais uma vez - a benemerência de dois ilustres portugueses, que são Vasco Maria Eugénio de Almeida e sua esposa.
Com magnanimidade foi criada e dotada a Fundação de Eugénio de Almeida, que, além de outros fins estatutários, determina no seu artigo 4.º, alínea c), "auxiliar a criação e manutenção de um Instituto de Estudos Superiores, orientado pela Companhia de Jesus, de acordo com as tradições universitárias da cidade de Évora".
À generosidade dos titulares da Fundação correspondeu a Companhia de Jesus com a elaboração de um programa de estudos perfeitamente ajustados aos nossos tempos. No programa, superiormente apresentado, referem-se as matérias que serão objecto dos cursos, das quais destacarei, além de outras: Política Económica, Previdência Social, Organização de Empresas, Direito Comercial, Fiscal e Corporativo, Matemáticas e Álgebra Financeira, Empresa Rural e Trabalho Agrícola, Técnica Rural, isto no curso de Economia, pois que no curso social, além de cadeiras comuns, destacarei: Sociologia Industrial e Rural, cadeiras da maior actualidade na minha região.
Limitei-me, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a ligeiríssimas notas, as únicas possíveis no limitado âmbito desta minha intervenção.
Os programas apresentados mereceram um parecer, douto parecer, da ilustríssima secção do ensino superior, da Junta Nacional da Educação. Dele referirei algumas passagens que julgo mais pertinentes:

A localização em Évora é justificada pela profunda remodelação económica que, diz-se, está prevista para a vida alentejana.

Sobre a entidade que solicitou a criação dos Estudos afirma-se:

É já longa a tradição da invulgar idoneidade da instituição impetrante no sector da cultura científica e também no da actividade didáctica. Tanto basta para esperar que, como orientadora do Instituto, mais uma vez confirme o seu prestígio e imponha à consideração geral os futuros educandos. Para estes, é bem de prever, bastará a invocação da qualidade de diplomados pelo Instituto para atestarem a alta qualidade da sua formação escolar.

Igualmente a Inspecção Superior do Ensino Particular disse:

Julgo que pode ser autorizada a criação, dentro do quadro dos estabelecimentos de ensino particular, de um Instituto Económico e Social em Évora destinado à formação de dirigentes de empresa. O apoio financeiro da Fundação de Eugénio de Almeida, além de constituir um contributo permanente para a manutenção do referido Instituto, deve permitir que sejam satisfeitas todas as condições exigidas para a sua conveniente instalação e apetrechamento. A entidade que se propõe orientá-lo - a Companhia de Jesus - é, na minha opinião, inteiramente idónea.

As palavras que acabo de referir são honrosas; muito mais que isso, obrigam!
É óbvio que o Governo da Nação, com a aprovação do restauro dos Estudos Superiores de Évora, não pode, e creio não o fará, manter-se na posição de simples espectador.
Além das fórmulas legais que imporá, dos preceitos que desejará ver cumpridos, terá de prestar colaboração mais efectiva e eficiente.
Deseja-se que crie estudos de veterinária e agronomia e, para já, que pela pasta das Obras Públicas sejam encarados os problemas de instalações, para o que, desta tribuna, convido o ilustre Ministro Arantes e Oliveira a ir à nossa casa, comer do nosso pão, beber da nossa água e ouvir as nossas falas.

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O Governo, estou convencido, não regateará a ajuda que se lhe pedir e estará inteiramente dentro das razoáveis possibilidades do momento e dos factos.
O que acabo de vos dizer, Sr. Presidente e Srs. Deputados, enche de satisfação a cidade de Évora...o Alentejo...Portugal inteiro.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Haver mais estudos superiores é enriquecer a Nação.
As populações corresponderão, em maior medida, tanto nos crescimentos intelectuais como nos económicos, quanto maior for a disseminação do ensino e mais fácil o acesso às escolas.
Abrir - considero que se abriu - mais uma Universidade é dispor, até à morte, de capitais que não serão delapidados e sempre renderão juros para inteira utilização da grei.
Estamos satisfeitos, nós, os Eborenses, e isso nos faz desejar que outras cidades, Braga nomeadamente, sintam, em breve, igual satisfação.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Creio, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que neste fecho de trabalhos legislativos ficou bem a notícia que vos dei, como ficarão os meus agradecimentos ao ilustre Ministro da Educação Nacional.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Pinto de Mesquita: - Sr. Presidente: intervenção quase telegráfica esta, compatível com a escassez do tempo.
Tema: museus e palácios e monumentos nacionais. Foi este assunto fundamental da política das belas-artes objecto do bem fundamentado aviso prévio realizado na sessão desta Assembleia de 1 de Fevereiro de 1956 pelo Dr. Abel de Lacerda, a cuja memória presto saudosa homenagem. Esse aviso fechou pela moção aprovada por esta Assembleia em 8 do mesmo mês.
É notório que o assunto tem implicação com diversos departamentos administrativos, mas depende essencialmente do Ministério da Educação Nacional.
Ora, o que então deduziu o Deputado avisante, e corroboraram os demais, perdura exactamente tal qual descoordenado e fraccionário. Não obteve ainda qualquer eco jurídico-administrativo a dita moção, onde se reconhece e preconiza:

1.º Que muito se tem feito em favor do mesmo - seja o património artístico;
2.º Que os males apontados são principalmente consequência da dispersão de competências por vários departamentos do Estado ou da impossibilidade prática da sua eficiente coordenação.
Nestas condições, emite o voto de que, na medida do possível, aquelas competências se integrem num único departamento do Estado, ou, nos casos em que isso não puder fazer-se, a orientação superior das obras de que o referido património careça e de quanto seja necessário ou útil à sua valorização pertença também ao mesmo departamento.

Pela leitura da correspondente discussão na Assembleia é palpável que a matéria do aviso de 1956 se insere, por nexo de necessidade, na abrangida pelos avisos aqui acabados de discutir sobre educação e sobre turismo.
Recorde-se a função altamente pedagógica dos museus e congéneres e, outrossim, o chamariz de atracção para o turista que esses estabelecimentos representam, mais até que o valor e número das suas espécies, pela valorização que delas se pode obter através de sua sábia e criteriosa exposição.
Esquemàticamente, o Dr. Abel de Lacerda referiu-se:
1.º À necessidade de superar a respectiva desorganização, o que foi objecto da sugestão unificadora da moção votada.
2.º Deficiência de verbas, para efeitos de aquisição aconselhável de obras de arte, melhoria de instalações, etc., invocando-se como exemplo a seguir neste capítulo o do critério do Sr. Deputado Águedo de Oliveira quando Ministro das Finanças.
3.º Preparação de pessoal, com cultura ao mesmo tempo geral e especializada, que haja de dedicar-se com exclusivismo devoto a tão delicadas tarefas. É óbvio que para tal é preciso pagar-lhe razoavelmente, para que o não distraiam actividades parasitárias e até para que se abra estímulo a vocações.
A remuneração dos funcionários desses serviços, directores ou conservadores, não obstante, a melhoria ulterior a 1956, por promoção do grupo por letras, segundo o Decreto n.º 42 046, de 23 de Dezembro de 1958, mantém-se ainda abaixo daquilo que deveria ser. Tais vencimentos, atendendo à índole e parentesco das respectivas actividades e à dignidade de que devem ser revestidas, deveriam tender a aproximar-se mais do que hoje se vê dos do professorado universitário, embora devidamente respeitadas as categorias e antiguidades.
Sr. Presidente: em conclusão: as coisas respeitantes a museus, palácios e monumentos nacionais mantêm-se nos termos em que, em 1956, mereceram o aviso prévio Lacerda. Ora, inserindo-se estreitamente tal sector com os da educação e de turismo, deverá a respectiva moção ser considerada ainda actual e pendente para efeito de ser agregada às que esta Assembleia acabou de aprovar sobre educação e turismo.
Assim, cuidamos tempestivo chamar para o problema as atenções esclarecidas do Sr. Ministro da Educação Nacional e, subsidiàriamente, do Sr. Ministro das Finanças, ou vice-versa se o preferirem.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Burity da Silva: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: a promoção da verdadeira personalidade cristã tem por ideal defender não só a alma como a condição física do ser humano; a sua saúde sob todas as formas; o seu ambiente familiar; a sua sociedade, a instrução e a educação concreta na vida cristã, aliada à objectividade da vida quotidiana inspirada na lei de Cristo.
Estes são os problemas de que a nossa consciência católica se não pode alhear e que no domínio político-social têm relevância no nosso ultramar.
Os inimigos da paz que sempre desfrutámos têm-se servido capciosamente dos problemas sociais como processos de aliciamento das populações autóctones, proporcionando a estas cuidados no plano social, de aparente filantropia.
Sabe-se até que ponto, e em casos concretos desmascarados e reprimidos, certas missões estrangeiras, não católicas, actuaram sob assistência social efectiva, que impres-

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siona as massas, e sob pretexto religioso, mas com fins políticos de desnacionalização das populações incautas. Os católicos não podem deixar de estar atentos a estas realidades, compenetrando-se de que a causa da fé que professamos e propagamos, que é também a causa da Pátria, exige de nós a maior atenção e o máximo esforço e solidariedade no sentido de substituirmos os desvelos alheios por uma acção operante não só religiosa como no domínio social.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A missiologia católica incumbe assim agir patriótica e cristãmente junto das massas populacionais, não só no comportamento estritamente evangélico, mas em união da vida cristã interior e exterior.
Esta, é a nova etapa da contribuição missionária realizada no ideal nacional e da fé, na cristianização de tantas almas constituídas pelas populações aborígenes, que tia união dos corações e na caridade nos cumpre preservar do negativismo e dos desvios da fé e do dever.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mas esse ideal não se poderá realizar se todos - missionários e leigos - não dermos a nossa quota-parte moral e material para a sua perfeita concretização.
São de meditar as palavras esclarecidas o que definem a plena noção cias realidades proferidas há dias pelo Sr. Ministro do Exército e dirigidas aos estudantes universitários membros da Acção Académica quando lhe foram agradecer a colaboração e o apoio dados à realização de duas visitas a Angola e Moçambique no ano passado o pedir-lhe o patrocínio para novas viagens ao nosso ultramar.
Disse o Sr. Ministro do Exército, e bem, que, "quanto à, questão ultramarina, só parcialmente poderá ser resolvida no plano militar, pois se trata de um problema mais amplo, que impõe uma conjugação de esforços de todos os outros sectores, tendo em vista que se trata de uma luta que não poderá ser vencida exclusivamente no campo militar".
Por isso é que a Nação tem de completar o seu sacrifício, empregando-se na batalha do futuro, porque é vital, e esta ganhá-la-emos, sem dúvida, na edificação da mensagem de unidade viva e da caridade estruturada nos princípios espirituais, morais e sociais ou, numa palavra, nu doutrina social cristã.
Está lançada aqui na metrópole uma fervorosa campanha em favor de um importante Centro Social de Angola em Nova. Lisboa, com vista a aquisição de meios materiais para este concretizar o seu humanitário e patriótico programa de acção, chamando a si aspectos formativos da infância, da juventude e da mulher angolanas para a sua promoção social e encarando os problemas educacionais e assistenciais inspirado num ideal positivo e atento às realidades humanas.
Já me tenho referido, através dos vários órgãos de informação do País, a esta magnífica obra social já em actividade em Angola nalguns aspectos, mas que só poderá vingar nos seus excelentes objectivos com a caridade e a ajuda de todos.
Quanto à obra social em causa, é extremamente relevante e oportuna, melhor do que eu poderia dizer, e com autoridade indiscutível a documentam a opinião de S. Ex.ª o Chefe do Estado, afirmando "tratar-se de uma obra de verdadeira misericórdia bem enraizada nas tradições portuguesas" e fazendo votos por que "se consiga realizar toda a obra que se pretende erguer, que seria, além de uma obra esplendorosa, uma prova magnífica de que continua vivendo na nossa terra o melhor espírito cristão", e a opinião do Sr. Ministro do Ultramar, que, exprimindo a sua simpatia por aquela instituição, a considera "de alta e humanitária finalidade", afirmando que "da sua realização excelentes frutos se esperam nos domínios social e educacional".
O patrocínio que aquela obra social tem dos Srs. Bispos da Diocese de Nova Lisboa e o beneplácito do Sr. Arcebispo de Luanda, que exalta a finalidade do Centro Social de Angola, que, em seu dizer, "propõe-se beneficiar as classes mais carecidas de auxílio sem discriminação de cores, evidenciando assim um dos traços mais salientes da fisionomia de Portugal cristão".
Estes títulos justificam, além do conhecimento directo que tenho sobre a obra social em causa, o meu empenho, o meu inteiro apoio, que tenho dado francamente e por todos os meios ao meu alcance, à referida instituição, crente de que cumpro um dever para com Angola.
O referido Centro Social, verdadeira cruzada patriótica e de fé, tem já uma parte das obras em construção adiantada- e em funcionamento a cantina escolar, que beneficia há três anos duas centenas de crianças pobres. Pretende realizar todo o seu plano de acção, que compreende:

Jardim-escola, salão recreativo, casa das raparigas, com vista a promover a educação para a vida doméstica, a instrução primária, o ensino secundário, a estimular e conceder meios (bolsas de estudo, extensivas a rapazes) às mais aptas para o seu ingresso nas Universidades. Como toda a obra social, esta secção é acessível a todas as raparigas sem qualquer discriminação, ressalvando o interesse especial pela promoção social da mulher angolana, cujo desnível cultural é mais acentuado;
Património dos pobres e secretariado do desemprego;
Casa das religiosas encarregadas das secções femininas e infantil e do património dos pobres;
Cine-teatro, com salão de festas para sessões culturais;
Emissora católica, filial da Rádio Eclésia de Luanda, visando a cobertura de toda a província;
Igreja paroquial, tipografia, parque destinado a diversões de crianças e de jovens.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: entendi que a mensagem que venho dirigindo ao País, de solidariedade para com o Centro Social de Angola, cabe também nesta Câmara, donde, do mesmo modo como tenho feito publicamente, reafirmo as minhas esperanças de que o apelo lançado em prol de tão meritória e patriótica obra social merecerá a generosidade do nosso povo e que os órgãos de informação continuarão, decerto, a dar o seu valioso contributo para que o valor do empreendimento seja conhecido em todos os sectores da Nação, para que se apela.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se, à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continuam em discussão as Contas Gerais do Estado e da Junta do Crédito Público referentes ao ano de 1962.
Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco António Martins.

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O Sr. Francisco Martins: - Sr. Presidente: a apreciação das Contas Gerais do Estado de 1962, que tem de ser firmada no parecer emitido pela Comissão de Contas, continua, como todas as demais que têm sido apresentadas nesta Assembleia Nacional, a merecer dessa Comissão um esforçado e minucioso estudo, que muito enaltece os signatários do parecer. Folgo imenso por que tanto venha sempre acontecendo, dado que essa actuação é prova segura do alto interesse posto ao serviço da Nação por quantos tomaram sobre os seus ombros a responsabilidade de ter o País, ano a ano, a par da sua situação económica e financeira, apreciando, criticando e apontando soluções para alguns males que é indispensável serem banidos.
Procurarei dar um feição sintética às considerações que vou produzir e que incidirão especialmente sobre a província de Cabo Verde, que tenho a honra de representar nesta Assembleia.
Antes, porém, não quero deixar de me referir a alguns comentários criteriosos da Comissão de Contas quando, logo de começo, põe em foco "o decorrer da evolução dos territórios de além-mar", afirmando "não se poder considerar com olhos optimistas essa evolução no último ano", mas que "não é motivo para insatisfação o modo como se processaram os diversos factos que caracterizam a situação económica e financeira das províncias ultramarinas vistas no seu conjunto".
E, no prosseguimento desse exame, o parecer indica toda uma série de fenómenos que influíram na evolução do comércio externo, das receitas e despesas ordinárias e extraordinárias, do fundo de saldos de anos económicos findos, da dívida do ultramar, etc., apresentando, por fim, um mapa das receitas e despesas, a fim de se ter uma ideia de consinto da estrutura e vida financeira de todos os territórios nacionais, e cujas importâncias ficam assim expressas:

Receitas ordinárias

[ver tabela na imagem]

Despesas

[ver tabela na imagem]

No tocante ao comércio externo, afirma o parecer que se verificou:

Diminuição do deficit metropolitano e agravamento do deficit ultramarino (2 566 000 contos em 1961 e 3 085 000 contos em 1962).
É escusado tentar resolver um e outro problema dos saldos negativos pela diminuição de importações, que tem tendência para se alargar, como é natural em países em crescimento. A solução para o problema está na intensificação do desenvolvimento económico, tanto no ultramar como na metrópole.

E mais adiante:

Aconselham-se as províncias ultramarinas a orientar o maior somatório possível do investimento para fins altamente reprodutivos, a reduzir ao mínimo despesas sumptuárias, a escolher de entre as potencialidades internas as que interessem mais vivamente os consumos correntes e a utilizar de preferência, nas importações, a entrada de produtos nacionais, quer da metrópole, quer do ultramar.

Sr. Presidente: começa o parecer, quanto às contas das províncias ultramarinas, por apreciar as referentes a Cabo Verde no ano de 1962, e ajuntando para tanto, como não podia deixar de ser, judiciosas considerações que a paralisada posição económica da província impõe.
Já na sessão de 25 de Fevereiro findo, em intervenção proferida nesta Assembleia, transcrevi ipsis verbis os primeiros comentários do parecer. Deles voltarei a respigar algumas passagens, que nunca é de mais relembrar.
Pelo facto de se terem investido na província desde o início dos planos de fomento quantias bastante elevadas, afirma-se:

Como tantas vezes aqui se recomendou, essas quantias deveriam, de preferência, ser orientadas num sentido utilitário, num sentido de reprodutividade, deixando para melhores dias melhoramentos que pudessem ser adiados e utilizando até ao máximo de produtividade as obras já feitas e que possam dar melhores rendimentos que os actuais.

Até fins de 1962, só através dos planos de fomento, consumiram-se 384 840 contos no arquipélago de Cabo Verde. A influência do gasto desta elevada quantia, se forem tidos em conta a modéstia do território e os gastos anteriores, deve ou devia ter produzido resultados que se pudessem traduzir na economia provincial, quer pelo aumento dos consumos derivados de maiores rendimentos, quer por melhores receitas.
O espaço que decorreu entre 1954 e 1962 já é suficiente para os investimentos produzirem resultados.
O exame das Contas não revela melhoria sensível: grande desnível negativo no comércio externo e receitas em pequeno aumento (entre 1957 e 1962 o aumento foi apenas de 10 000 contos).
Como aconteceu em pareceres anteriores, volta-se a preconizar "a necessidade de fazer um estudo cuidadoso da orientação dada aos investimentos e dos seus resultados económicos, de modo a procurar soluções adequadas à economia provincial".
Esse estudo (a que noutros relatórios se chamou "inquérito"), "é indispensável (o sublinhado é meu) e poderá levar à descoberta de causas que impedem melhores rendimentos".
Ocupa-se de seguida o relatório do comércio externo, de que, melhor que quaisquer palavras, o quadro que segue mostrará a desoladora realidade:

[ver tabela na imagem]

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É de anotar que apenas 11,3 por cento das importações totais são pagos pela exportação.
Parece que se deveria tentar por todas as formas obter um aumento da exportação. De momento não parece fácil.
A grande esperança da Comissão de Contas concentra-se especialmente na "resolução do problema do aproveitamento dos recursos piscatórios", exprimindo a opinião de. que esse aproveitamento "reduziria muito o deficit comercial", além de outros elementos que a tal fim poderiam conduzir, como sejam: "pozolanas, derivados do sal e até industrialização de alguns produtos agrícolas susceptíveis de auxiliarem a balança do comércio externo". Adiante comentarei todos os elementos que o parecer dá conta de poderem aumentar o montante da exportação e indicarei outros que me parecem de enorme interesse.
As rubricas pautais que mais pesadamente figuram nas importações são as seguintes:
Contos
Produtos do reino vegetal ...................................... 30 588
Produtos das indústrias alimentares, bebidas, etc. ............. 26109
Produtos minerais .............................................. 13 055
Matérias têxteis e respectivas obras ........................... 27 561
Metais comuns e respectivas obras .............................. 11 252
Máquinas, aparelhos e material eléctrico ....................... 29 391
Material de transporte ......................................... 11 426

Quanto às exportações, a quebra foi sensível (5600 contos), se nos reportarmos ao pequeno volume daquelas: passaram de 27 800 contos em 1961 para 22 200 contos em 1962.
Pràticamente, dos produtos principais de exportação só aumentaram o peixe e o sal, baixaram bastante o café, a purgueira e o rícino, e não se verificou o grande aumento que se esperava da exportação da banana.
A metrópole continua como o mais forte importador, logo seguida do ultramar, representando 78,4 por cento do total.
A balança de pagamentos tem em 1962 um saldo positivo de 5559 contos, saldo para que concorrem especialmente .os subsídios da metrópole para financiamento de despesas extraordinárias (Plano de Fomento).
Enquanto a entrada de cambiais em escudos foi de 116 200 contos, a de moeda estrangeira não foi além de 31 300 contos.
No capítulo de receitas ordinárias, os impostos directos e indirectos aumentaram, com referência aos de 1961, em 854 contos, à custa do domínio privado e participações de lucros e indústrias em regime especial, com um aumento de 1591 contos.
"O índice das despesas ordinárias não acompanhou o de outras províncias. Arredonda-se em 354, na base de 1938 igual a 100. É o índice mais baixo dos territórios nacionais. O aumento da despesa ordinária foi de 4078 contos."
A receita extraordinária provém, num total de 67 281 contos, de empréstimos da metrópole (61 436 contos) e dos saldos de exercícios findos (5845 contos).
O total da receita foi de 132 316 contos, menos 461 contos que em 1961, sendo constituída em mais de 50 por cento por importâncias com origem em recursos de natureza extraordinária.
As despesas extraordinárias dizem respeito a diversos fins, entre os quais avultam as obras do II Plano de Fomento, as que mais interessam, por isso que outras despesas, num total de apenas 5845 contos, foram liquidadas por saldos dos anos económicos findos.
É de interesse apresentar um único quadro para bem se apreciarem as somas utilizadas em cada um dos anos de 1959, 1960, 1961 e 1962 e onde se gastaram.
As despesas do II Plano de Fomento, sumariadas, tiveram a aplicação seguinte:

[ver tabela na imagem]

No ano de 1962 despenderam-se 61 436 contos pelo plano de fomento e mais 6023 contos, dos quais por saldos de exercícios findos 5845 contos e pelo excedente de receitas ordinárias 178 contos. Até 1958 (I Plano de Fomento) consumiram-se 96 789 contos, que, somados aos 288 051 contos despendidos nos quatro anos que decorreram até 1962, quase atingem os 400 000 contos, que, segundo a Comissão de Contas, "é soma de relevo na economia da província", insistindo em que "há razão para proceder a inquéritos sobre a eficiência das verbas gastas em matéria de melhoria de rendimentos".
Isto mesmo tem sido repetido nos relatórios desde 1958, e, infelizmente, sem que a sugestão feita nos pareceres haja sido considerada.
Nos comentários sobre as verbas despendidas diz-se que "tem havido preocupação na construção de estradas e portos, que consumiram perto de 70 por cento das verbas".
De novo destaca que "algumas das estradas mais dispendiosas poderiam esperar e concentrar verbas na parte industrial, que pode produzir rendimentos adequados e produtos de exportação. A pesca continua a ser uma esperança!".
Mais uma vez merece reparos à Comissão de Contas a verba despendida com o aproveitamento de recursos, especialmente no plano agro-pecuário. Ascende essa verba a mais de 100 000 contos, e o comércio externo continua a revelar condições precárias idênticas, se não piores, às as que prevaleciam anteriormente. Quais os resultados do consumo de tão elevadas verbas?
À pergunta feita apenas se pode responder que, além das aplicadas em infra-estruturas, não é fácil descortinar esses resultados.
Procurei dar conta do que me pareceu essencial e vem expresso no relatório sobre as Contas Gerais do Estado de 1962 (ultramar) referente à província de Cabo Verde.
Creio de certa utilidade concentrar num pequeno resumo as principais observações expostas pela Comissão de Contas e que definem claramente a situação da província:
a) Das grandes somas despendidas em investimentos para os planos- de fomento não tem resultado aumento de consumos, quer de maiores rendimentos, quer de melhores receitas;

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b) De cerca de 100 000 contos gastos no plano agro-pecuário não adveio reflexo benéfico derivado desse volumoso investimento;
c) É notável o desnível negativo da balança comercial. Em 1961 o saldo negativo foi de 157 700 contos, num total de 185 500 contos de importações, e em 1962 de 175 000 contos, num total de importações de 197 200 contos.
Só 11,3 por cento das importações totais são pagos pela exportação, visto esta atingir apenas 27 800 contos e 22 000 contos, respectivamente em 1961 e 1962;
d) De 1957 a 1962 o aumento das receitas não foi além de 10 000 contos;
e) A balança de pagamentos está equilibrada, o que não denuncia a gravidade da situação criada pelo descalabro da balança comercial;
f) O índice das despesas ordinárias é o mais baixo de todo o território português.
Destas observações quero destacar duas que merecem alguns comentários.
Dos números oferecidos pelos mapas de importação e exportação verifica-se que se consome muito mais do que se produz, circunstância fortemente agravada pelo aumento explosivo da população.
O desnível negativo tão considerável faz-nos supor que a situação prevalecerá angustiosa até que se possa produzir e exportar muito mais. Não prevejo outro remédio para tão grande mal, já que não se deverá pensar numa sensível diminuição da importação, dada a sua característica especial; e mesmo que isso pudesse acontecer, o problema das exportações manter-se-ia premente, dado que está intimamente ligado ao das produções, que é mister aumentar, e muito, sem o que não há economia que resista.
É certo que a diminuição da importação teria reflexos sobre a balança de pagamentos, mas em tão pequena escala que essa diminuição não teria muito interesse.
Quanto à balança de pagamentos, nota-se que está equilibrada e até com saldo de 5559 contos neste ano de 1962. A do ano transacto fechou.com um saldo negativo de 18 891 contos, por diminuição de entradas de moeda metropolitana. Logo que se deu essa diminuição, o desequilíbrio foi imediato.
O quadro seguinte elucida devidamente:

[ver quadro na imagem]

Tem o maior interesse transcrever, mais uma vez, já que assim procedi em anterior intervenção, o que o parecer das contas exprimiu em 1961:

O auxílio da metrópole, sob forma de empréstimos e subsídios reembolsáveis ou não, tem amparado a província nestes últimos anos. Ainda que fosse possível manter ininterruptamente esse auxílio, não parece que seja forma própria de existência. A instalação de todas as possíveis actividades económicas, como as já mencionadas, é condição do progresso da província.

De facto, como já afirmei nesta Câmara, é de admitir a hipótese de que o Governo não deva ou não possa continuar a auxiliar a província com empréstimos sem medida de quantidade e tempo. Poderá também acontecer que os cambiais estrangeiros venham a sofrer baixa considerável.
Como medida de previsão, estas duas hipóteses têm de ser postas.
É por isso mesmo que tudo se deve processar no sentido de se instalarem todas as possíveis actividades económicas, como muito bem afirma o parecer de 1961.
Entrarei agora na indicação daquelas possibilidades económicas que suponho capazes de contribuírem para o desanuviamento do panorama sombrio que tanto apavora o arquipélago, pedindo a esclarecida atenção do Governo para a premente necessidade de essas possibilidades serem aproveitadas.
Não me proponho embrenhar-me no estudo total do problema agrário de Cabo Verde, possuidor de soluções um tanto difíceis de serem postas em prática.
Todavia, direi que o fomento agrário tem sido, bem ou mal, a base em que se tem apoiado mais insistentemente a organização económica da província.
De momento quero referir-me ao que da agricultura se pode esperar, neste momento de emergência, desde que soluções práticas sejam devidamente consideradas.
Do relatório de Teixeira e Barbosa, A Agricultura do Arquipélago de Cabo Verde, desejo dar a conhecer o que dele consta quanto às plantas hortícolas e frutícolas:

Não há dúvida de que, apesar da área reduzida dos regadios de Cabo Verde, se poderiam produzir quantidades avultadas de frutas e hortaliças.
E se essa produção se não efectiva, deve-se o facto à deficiência de organização, à dificuldade de comunicações, ao primitivismo dos transportes e à inexistência ou irregularidade de mercados.

E assim, por força destas circunstâncias e outras mais, se verifica que não tem sido possível intensificar devidamente a exploração de produtos tais como a banana, a laranja, os ananases, a papaia, a manga, a goiaba, o coco, tâmaras e algumas mais variedades que em tempos idos chegaram a merecer o entusiasmo de bastantes agricultores. De todos os produtos, apenas as bananas pesam mais na balança dos géneros exportados (com excepção do peixe e do sal) e mesmo assim com valores diminutos, se verificarmos que em 1960, 1961 e 1962 esses valores foram, respectivamente, de 2370, 2061 e 2058 contos, quando poderiam ter ascendido já a dez vezes mais.
Devo acrescentar, para esclarecimento, que há quinze anos passados, e ultimamente há uns dois ou três anos, procurei saber dos países do Norte da Europa se lhes interessaria a importação de frutas cabo-verdianas. Não se fez demorar a resposta: que não punham limite à quantidade a importar e, na hipótese de haver produção certa e em quantidade econòmicamente exportável, man-

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dariam vapores fruteiros à província para por eles se fazer essa exportação!!
Veja-se bem o que se poderá ter perdido para a economia da província só no tocante à exportação de frutas por virtude de uma administração um pouco descuidada.
Outro produto da terra que poderia ser exportado em palpável quantidade, o café, dos melhores do Mundo, não tem merecido a honra de ver aumentada a área da sua cultura.
É triste ter de se. afirmar que em 1962 apenas se exportaram 22 t.
O mesmo sucede com a purgueira e o rícino, cuja produção vem decaindo dia a dia.
Nunca se tentou uma campanha a favor da cultura do cajueiro, apesar das suas imensas utilidades e de essa cultura representar apreciável quota nas exportatações de Moçambique e conhecendo-se que a sua vizinha Guiné Portuguesa, não tem poupado esforços para que ela se torne, pelo menos, regular manancial de riqueza.
Em 1963, o notável engenheiro agrónomo brasileiro Pimentel Gomes, numa pequena monografia intitulada O Cajueiro, escreveu, a p. 8, o seguinte:

O cajueiro encontraria no simpático arquipélago de Cabo Verde condições ecológicas que permitem o seu desenvolvimento.
................................................................................
A agricultura está mais adiantada nas ilhas de Santiago, Santo Antão, S. Nicolau, Fogo e Brava. E, porém, uma agricultura muito atrasada, pois os problemas económicos do arquipélago têm sido bastante descurados. Faltam obras contra as secas periódicas a que estão as ilhas sujeitas. Falta, de maneira absoluta, o ensino técnico. O crédito agrícola está por ser organizado. O fomento agrícola é descurado. O fundo do pessimismo dos Cabo-Verdianos tem razões bem fundadas.
Encontrariam eles no cajueiro uma árvore frutífera extremamente rústica, muito resistente às secas, capaz, talvez, de vestir as encostas desnudas e cinzentas das suas montanhas, fornecendo frutas abundantíssimas, deliciosas e riquíssimas de vitaminas, capazes de concorrer para a industrialização do arquipélago.

E mais adiante, a p. 10:

O cajueiro é uma planta preciosa como fruteira, e deve a sua cultura tomar grande incremento no Brasil. Utilíssimo por toda a parte, mais útil é ainda na região semiárida, que nos seus trechos não irrigados é pobre em frutas. O cajueiro aí tem um grande papel a desempenhar, pois, além de outras virtudes, resiste bem ao rigor das estiadas.
................................................................................
A mesma medida deve ser tomada nas ilhas de Cabo Verde, cuja pluviosidade é pequena e muito irregular, variando muito de um ano para o outro.

Assim escreve um brasileiro sobre Cabo Verde. Esse opúsculo é de há doze anos. E, que eu saiba, nunca alguém se ocupou de tal assunto nesta província. Cabo Verde não tem tentado uma experiência de que poderia resultar uma palpável melhoria do seu problema económico.
É tempo de se começar, mas com execução pronta, demais muito facilitada por recursos limitados de que necessita essa experiência.
Se o caso merecer o interesse da Administração, Cabo Verde só pede que não lhe mandem mais uma missão ou brigada para estudos e execução. Seria mais um pesadelo a ajuntar a quantos que de há muito a vêm atormentando.
Enviem-lhe 3 t ou 4 t de boas sementes, que, quanto ao resto, a província tem francas possibilidades de executar tecnicamente o ensaio com o pessoal lá existente.
Se se verificar a possibilidade de grande expansão da arborização do arquipélago pelo cajueiro, além desse enorme benefício, a feição comercial e industrial dos seus produtos seria forte e salutar vantagem, de que pouca gente se apercebe, e só assim se explica que até hoje não se tenha lançado mão dessa tentativa.
A Comissão de Contas opina, em mais de um passo do seu parecer, haver imperiosa necessidade de se "tentar a industrialização de recursos potenciais que existem, como o peixe e outros".
Quanto à indústria do peixe, farei desde já algumas referências para o seu quase completo esclarecimento.
Pràticamente, desde que começou o povoamento do arquipélago se verificou a grande riqueza piscatória dos seus mares, riqueza que os primeiros povoadores aproveitaram para seu sustento e fornecimento de barcos que demandavam os portos das ilhas então descobertas.
Só muito mais tarde, em fins do século XVIII, o Governo se apercebeu da necessidade de olhar a sério para o problema, fazendo publicar decretos e portarias e nomeando comissões de estudos e inquéritos, com o fim de aproveitar devidamente a riqueza do mar. A certa altura o entusiasmo sumiu-se. O Governo desinteressou-se e a população seguiu na sua esteira.
Em 1957 foi mandada ao arquipélago a Missão de Biologia Marítima, que começou a prospectar as suas águas e a sua fauna, em especial o atum e a lagosta, com vista à sua industrialização.
Essa Missão trabalhou a bordo do navio Baldaque da Silva cerca de quatro meses em 1968 e três meses no ano de 1959, tempo escasso para uma prospecção perfeita, mas que no entanto deve ter permitido a colheita de elementos que novas prospecções aumentariam, de modo a tirarem-se conclusões certas quanto às possibilidades piscatórias dos mares de Cabo Verde e outros circunvizinhos. O relatório dos seus trabalhos foi publicado no volume Estudos de Economia, da Junta de Investigações do Ultramar, em 1961.
Dele transcrevo a primeira conclusão, do teor seguinte:

A situação geográfica do arquipélago e a riqueza da fauna ictiológica dos seus mares são elementos promissores da viabilidade económica de indústrias extractiva e transformadora da pesca do atum e similares.

Muito antes dessas prospecções, várias empresas piscatórias se instalaram em algumas das ilhas, quase todas com pouca viabilidade de sucesso, dado que não conceberam um devido planeamento nem as dimensões que a exploração deveria ter, em face da riqueza que o mar lhes propiciava.
Uma empresa, a Congel, lançou ombros em S. Vicente a empreendimento que pode vir a ter forte repercussão na economia da província. Sabe-se que obteve grande financiamento proveniente da Alemanha, o que poderá garantir uma exploração segura e em grande escala.
Sabe-se ainda que outra empresa, também financiada por alemães, conta poder estabelecer cometimento igual na Praia.

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Parece pois estar em vias de efectivação a indústria que a Comissão de Contas crê; e com razão, constituirá pilar forte em que vai assentar um possível e substancial desenvolvimento, económico da província.
Mas essa fonte de riqueza será ou não de dimensões muito apreciáveis, conforme o plano de exploração que fora adoptado, que terá de ser orientado no sentido do aproveitamento maciço da mão-de-obra local e de serem devidamente acautelados os interesses da província.
Reservo-me para futura apreciação, tendo em conta o que for superiormente definido.
Outro recurso potencial de que em Cabo Verde se fala constantemente, com a esperança de que seja realidade num prazo relativamente curto, mas que infalivelmente terá de ser longo, é o turismo.
Seria fora de propósito abordar o assunto neste momento, visto que esta Assembleia há poucos dias dele tratou com uma exaustiva e brilhante apreciação sob todos os aspectos em que esse problema possa ser encarado:
Por isso poucas palavras direi sobre o turismo no arquipélago como fonte potencial de riqueza.
Hoje, além das condições naturais que na província abundam, não pode ela ter ambições no sentido de possuir uma verdadeira indústria turística, porque lhe faltam estradas, hotéis, pensões, restaurantes, moradias isoladas, aldeamentos simples, mas confortáveis, parques de campismo, praias, com instalações próprias e luz, água encanada, esgotos, etc. Por isso apenas, me limito a dar a conhecer a opinião expressa no arquipélago pelo Dr. Cornelius Greenway Rafferty, graduado pelas Universidades de Notre Dame, (Estados Unidos da América), Salamanca, Sevilha e Cambridge, quando em 1961 visitou S. Vicente vindo de Las Palmas, aonde fora a um concurso internacional de turismo, e que me parece dever ser anotada. Disse ele:

a) Estar maravilhado com as condições locais para turismo;
b) Ter apreciado a calma e a paz locais;
c) Que vinha de uma missão de estudos a Las Palmas relacionada com o turismo, mas que depois de ver S. Vicente era de opinião de que esta ilha oferecia melhores condições que Las Palmas para aqueles milhares de americanos que andam à busca de uma estância de repouso, já cansados de visitas aos locais habituais, desejosos de mudar temporariamente das suas residências para estâncias de serenidade e paz como esta, onde nem o frio nem o movimento turbulento dos grandes meios os incomodam;
d) Que iria contactar com as autoridades portuguesas para a hipótese de serem permitidos investimentos em terrenos e construção de moradias isoladas e um hotel:

Este é um exemplo concreto entre muitos.

Os franceses de caça submarina ficaram encantados com as possibilidades das ilhas e um especialista deste ramo de turismo, que os acompanhava, disse que, feita boa propaganda e depois de construídas as instalações necessárias mínimas, Cabo Verde se encheria de caçadores submarinos e os respectivos acompanhantes. Que o arquipélago era um verdadeiro paraíso para os caçadores submarinos.

(transcrito da p. 19 da mensagem entregue ao Ministro do Ultramar pelas forças vivas da cidade do Mindelo).

Estranho que pouco ou nada se tenha interessado a Administração, no sentido de serem melhoradas as condições de saneamento da cidade do Mindelo (a mais populosa do arquipélago) e até de outros burgos.
Nos planos de fomento referentes a S. Tomé, Macau e Timor, dotações especiais se destinam ao saneamento urbano. Impõe-se que em Cabo Verde outro tanto suceda. Confiadamente espera a população que c Governo promova a inscrição no seu plano de fomento de verbas suficientes para esse fim.
E nada mais tenho a dizer sobre turismo como fonte de riqueza.
Ainda quanto a indústrias: refere-se o parecer às pozolanas, derivados do sal e até industrialização de alguns produtos agrícolas susceptíveis de auxiliar a balança do comércio.
Porém, se nos reportarmos ao mapa publicado no relatório de contas de gerência e exercício das províncias ultramarinas do ano de 1962, e em que se dá a conhecer o quantitativo da exportação das principais mercadorias, verifica-se que não é nada animador o que se passa quanto a essa exportação.
Um pequeno quadro confirmará o que acabo de afirmar:

Exportação das principais mercadorias

[Ver quadro na imagem]

A industrialização de alguns produtos agrícolas, suponho, devido a vários motivos já expostos nas minhas anteriores intervenções, que não será, pelo menos nos tempos mais próximos, factor com que possamos contar, dado que a terra não possui matéria-prima bastante para a industrialização.
Outro produto de que já se perdeu memória em Cabo Verde, pelo menos do ponto de vista económico, e que importa repor em condições de voltar a contribuir como outrora decisivamente para a economia da província, é o algodão.
Sob o ponto de vista de interesse económico da produção de algodão em territórios nacionais serão desnecessárias quaisquer considerações.
Um problema que se poderia levantar é o da sua adaptabilidade às condições climáticas do arquipélago, mas a isso a história económica da província responde positivamente, pois desde os primórdios da ocupação o algodão produzido em Cabo Verde constituiu uma das bases da economia daquele território, tão importante que um dos nossos reis estabeleceu a pena de morte para quem exportasse ou vendesse aos estrangeiros esse algodão, que alimentou a importante indústria de panos que tiveram ao tempo larga exportação para o continente africano.
Não parece que a concorrência actual das fibras sintéticas conduza à não consideração deste problema.

A organização económica da província

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3788 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 150

E já que de indústrias estou tratando, sou forçado, pela importância decisiva do assunto, a voltar a bater na tecla da refinaria de petróleo, para dizer que a inauguração da nova refinaria do Porto veio avivar a ferida que se mantém aberta na alma de todos os cabo-verdianos, desde que caiu um tão pesado quão misterioso silêncio sobre tão transcendente problema; ferida- tanto mais viva quanto é certo que há cerca de três anos houve promessas públicas de entidades oficiais responsáveis e foi do conhecimento geral a estada em S. Vicente de técnicos, creio que da Sorefame, que foram ali estudar aspectos relacionados com a construção, então iminente, da já bastante falada refinaria.
Indicados e apreciados, ainda que sem aquele desenvolvimento de que seriam merecedores, alguns problemas que muito interessam à vida económica da província e que o parecer das contas públicas fotografa com rigor, terei de voltar a repetir que de ano para ano continua o agravamento da situação económica.
Não podemos nem devemos ocultar esse agravamento, sem que, contudo, se vá ao ponto de ensombrar carregadamente o quadro, justamente porque os males apontados têm remédio, se lho quisermos dar.
Não quero esquecer o carinho e cuidados que o Governo da Nação vem dispensando a Cabo Verde, especialmente propiciando-lhe os meios financeiros, a fim de lhe ser fácil enveredar, ainda que vagarosamente, no caminho de um desenvolvimento económico que possa satisfazer os mais exigentes. Os cuidados da metrópole merecem, pois, da província o maior reconhecimento e gratidão.
Todavia, têm-se despendido os empréstimos da metrópole, que ultrapassaram já a ordem dos 400 000 contos, mas a relativa inutilidade dos planos de fomento quanto a fins reprodutivos é patente.
Tanto veio dar razão às apreensões por mim manifestadas por mais de uma vez nesta Câmara.
Há qualquer coisa que está profundamente errada. Urge que se desfaça o erro.
Sr. Presidente: lamento não ter sido possível abordar um palpitante problema bastante complexo: a posição do comércio perante a nova reforma tributária.
A única razão de tal omissão filia-se na grande dificuldade de obter um suficiente número de elementos seguros em que terão de apoiar-se as considerações a formular.
Por isso, reservo para momento próprio as apreciações que a magnitude do problema exige.
Também circunstâncias muito especiais não permitem que eu possa expor com desenvolvimento o que se relaciona com dois serviços públicos: saúde e instrução, que, quanto a mim, merecem ocupar posição cimeira perante todos os problemas que preocupam fortemente os governantes de todo o Mundo.
A saúde implica, na sua essência, a defesa e conservação do capital humano.
Nada há, quanto a mim, que possa sobrepor-se a esta cruzada, que todas as nações tentam levar a cabo quase sem olhar às despesas que ela possa acarretar.
Em Cabo Verde a ocupação sanitária, quanto a pessoal, material e construção de instalações hospitalares e congéneres, não atingiu a posição que o interesse público reclama.
Justo é que se destaque a iniciativa do ilustre Ministro do Ultramar mandando a Cabo Verde pessoa qualificada em alto grau, o director-geral dos Serviços de Saúde do Ultramar, a fim de colher todos os elementos que habilitem esse Ministro a resolver o caso da melhor forma. É de agradecer a prontidão com que S. Ex.ª tomou tal iniciativa.
Os serviços de instrução, evidentemente com outras características diferentes das da saúde, também necessitam de maior protecção por banda do Governo; porque se verifica que o ritmo de construção de escolas especialmente destinadas ao ensino primário não acompanhou o do crescimento da população, com as consequências fáceis de deduzir. E assim se explica o subdesenvolvimento actual em matéria do ensino primário.
Seria injustiça não afirmar, contudo, que o vigor posto pela Administração, dentro dos limites das verbas dotadas, tendente a melhorar o status quo, merece forte louvor.
Tem a província fundadas esperanças de que muito em breve o fomento do ensino conduzirá a plena satisfação do desejo de todos.
Sr. Presidente: cheguei ao fim de mais uma enfadonha intervenção, com o abuso da atenção de V. Ex.ª e dos dignos Deputados.
Espero que me absolverão.
Praza a Deus que de quanto disse possa resultar ao menos algum benefício para a província de Cabo Verde.
E não peço de mais.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Vaz Nunes: - Sr. Presidente: é bem conhecida a imagem que compara a Conta Geral a uma espécie de radiografia da actividade dos órgãos de administração pública - imagem feliz, até porque, nos dois casos, não é do simples processo de observação directa que resultará o interesse do objecto; exige-se ainda uma interpretação especializada.
Mas não me parece que se deparem dificuldades grandes a quem pretenda acompanhar a vida financeira do Estado.
Todos os que não tenham profundos conhecimentos de natureza económica e financeira ou que não possam demorar-se numa aturada pesquisa de análise encontram boa ajuda no parecer da Comissão das Contas Públicas desta Assembleia e nos relatórios divulgados, a propósito, pelo Ministério das Finanças. São elementos sérios: esclarecem e orientam com equilíbrio. E testemunham uma política financeira à altura das circunstâncias, que prestigia Portugal no Mundo.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: a previsão orçamental para 1962 definia um sentido de evolução que a análise da Couta confirma.
Esperava-se um acréscimo menos acentuado dos gastos com a defesa nacional, e assim aconteceu; contava-se com um sensível incremento da actividade financeira, que de facto se verificou; e garantia-se uma conta equilibrada, apesar da maior participação do Estado no financiamento do desenvolvimento económico, o que realmente se conseguiu.
A despesa com os serviços militares e de segurança atingiu cerca de 6 milhões de contos, o que equivale a 36 por cento dos gastos totais da administração central. Contudo, enquanto de 1960 para 1961 as despesas militares extraordinárias cresceram a uma taxa de 60 por cento, de 1961 para 1962 o seu ritmo foi três vezes e meia mais reduzido; e daí também resultou que os 36 por cento acima referidos significaram apenas dois pontos de acréscimo relativamente a 1961, ao passo que o agravamento

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na percentagem de despesas militares em relação às despesas totais, de 1960 para 1961, correspondeu a nove pontos.
Para o incremento da actividade financeira do Estado concorreram a expansão da matéria colectável (resultante do acréscimo do produto nacional bruto e das medidas fiscais adoptadas) e o elevado montante de empréstimos.
Em 1962 foram publicados quase todos os novos diplomas da reforma fiscal.
Apesar das circunstâncias anormais em que vivemos, é de salientar que a renovação do sistema tributário não foi comandada por desequilibrados propósitos de aumento de receitas; assenta, sim, em princípios lógicos e obedece a louváveis critérios de justiça social.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Muito embora continuemos sujeitos a vários impostos parcelares que se completam por um imposto de sobreposição, parece que o novo sistema poderá ser considerado como trampolim para uma fase posterior de imposto único. Julga-se também que deixará de subsistir a desaconselhável instabilidade dos sucessivos regimes fiscais, cujas regras eram anualmente inscritas nas disposições da lei de meios, mas talvez tenhamos de suportar certas medidas fiscais transitórias, próprias da situação de guerra em que nos encontramos.
A procura interna, em 1962, acusou ligeira variação negativa, conquanto o consumo público tenha registado um aumento de 7,2 por cento. É que se verificou uma dupla contracção no sector privado, quer no consumo, quer na formação bruta de capital fixo.
Todavia, há outros indicadores que merecem referência, e esses favoráveis e bem mais significativos.
Ficou restabelecida a normalidade e a confiança no mercado monetário e de capitais, que fora abalado no ano anterior por factores de ordem psicológica originados pelo surto terrorista em Angola. Por isso aumentaram apreciavelmente as disponibilidades à vista e a prazo e melhorou o grau de liquidez da banca comercial. Observou-se também um menor ritmo do crescimento da emissão fiduciária.
O valor das exportações para o estrangeiro expandiu-se 15 por cento, verificando-se acréscimos nos produtos industriais, o que é de destacar.
As despesas extraordinárias aumentaram 20,1 por cento em relação a 1961, taxa de crescimento esta que é superior à das despesas militares. Isto quer dizer que os pagamentos efectuados, como despesa extraordinária, para a execução do Plano de Fomento voltaram ao elevado nível de 1960, após a quebra do ano seguinte, e retomaram um salutar cunho expansionista.
A preocupação de se afectar pouco o ritmo de crescimento da economia nacional, aliada à necessidade de cobertura dos vultosos gastos com a defesa das províncias ultramarinas, obrigou a um elevado montante de empréstimos.
E porque os capitais privados internos não acorreram (nem têm acorrido) como se previra aos financiamentos do II Plano de Fomento, aumentou assim a participação do Estado não só nesses financiamentos como também nos que, à margem do Plano de Fomento, satisfazem um conjunto de programas de desenvolvimento de
infra-estruturas económicas e sociais, inscritos na planificação anual das sucessivas gerências.
Escuso-me de citar factos reveladores das condições, hoje pouco satisfatórias, que têm sido oferecidas aos capitais privados. Mas creio que de uma conveniente revisão dessas condições poderia resultar um favorável alívio à já bem pesada intervenção financeira do Estado.
A dívida pública elevou o seu ritmo de crescimento a partir de 1960, quando se começou a sentir o peso crescente dos encargos de amortização, derivado de um recurso mais intensivo ao mercado de capitais. Esses encargos atingiram em 1962 uma quantia da ordem dos 850 000 contos, ou seja mais de 10 por cento do valor das despesas ordinárias.
De 1961 para 1962 foi acentuado o aumento da dívida pública, que atingiu 22 600 000 contos; e a sua relação com o rendimento nacional passou de 29,1 para 32,9 por cento.
Desde 1958, quando se fizeram os estudos preparatórios do II Plano de Fomento, que estava previsto o recurso ao crédito externo. No quadro do funcionamento do Plano contava-se com a participação de 6 milhões de contos de capitais estrangeiros.
Durante o ano de 1962 tiveram lugar operações de dívida externa nos valores de 66 milhões de dólares e 150 milhões de marcos.
Este substancial recurso ao crédito externo não era habitual entre nós e do seu uso e abuso temos velhas e más recordações.
Mas deve acrescentar-se que o recurso ao crédito externo tanto pode ser perigoso como absolutamente recomendável; tudo depende dos critérios seguidos na sua aceitação e aplicação.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Se estivermos prevenidos contra o mascaramento de condições económico-políticas desfavoráveis, se evitarmos também, na medida do possível, taxas de juro superiores às correntes (dadas as perturbações que poderão advir para o mercado de capitais nacional) e se formos aplicar o crédito externo com elevada garantia de reprodutividade na exploração da riqueza, se assim procedermos, serão recolhidos benefícios no futuro.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Devemos reservar os capitais externos obtidos por empréstimo para fomento de empresas altamente reprodutivas donde resultem vantagens que cubram os compromissos contratuais assumidos.
Creio firmemente que a nunca desmentida seriedade e proverbial cautela da nossa administração financeira, que é orgulho dos Portugueses nos últimos 35 anos, servem de incontestável garantia do êxito nos resultados das operações de crédito externo.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: é justo dar realce às atitudes do Governo, por ter vindo a conceder sucessivos benefícios aos servidores do Estado.
Em 1959 fez o reajustamento de vencimentos dos funcionários públicos e já havia anunciado no ano anterior o propósito de lhes assegurar habitação adequada. Desde então activou e mandou executar, vários programas de construção de casas em regime de arrendamento e de propriedade resolúvel.
Lembremos ainda os esforços em matéria de assistência, que é concedida agora em todas as formas de doença e tornada extensível na tuberculose aos cônjuges e filhos dos servidores do Estado.

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Estas iniciativas representam valioso contributo para uma mais favorável situação económica dos funcionários; mas facto é que, depois de 1959, os benefícios não têm sido gerais e só do forma indirecta se repercutiram na efectiva melhoria das condições de vida de um limitado número de felizes contemplados.
Se analisarmos a evolução do nível dos preços no consumidor, a estatística oficialmente adoptada dá-nos os seguintes índices de percentagem (tomando como base o ano de 1948):

1959 .....................................108,6
1960 .....................................110,8
1961 .....................................114,4
1962 .....................................116,6
1963 (1.º semestre) ......................118,9

Quer dizer: desde a última correcção dos vencimentos do funcionalismo público até há cerca de um ano houve uma subida de dez pontos no nível de preços.
Todavia, o poder geral de compra melhorou.
Melhorou para os trabalhadores rurais, porque não cessa a forte tendência ascendente das suas remunerações, o que não deixa de ser, em termos de justiça social, calorosamente admissível.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E melhorou também, de um modo geral, nas profissões, como nos demonstram os respectivos índices ponderados de salários; até 1963 as percentagens de incremento desses índices eram superiores às da subida do custo de vida.
Mas não podemos assim falar dos funcionários públicos. Eles constituem excepção e têm suportado nos últimos quatro anos um contínuo abaixamento do seu nível de vida.
As estatísticas que conheço ainda não cobrem o fim do ano passado e os primeiros meses do ano corrente. Haverá, contudo, dona de casa que negue a variação ascensional e escandalosamente rápida dos preços de alguns géneros alimentícios?
O Governo tem de estar atento e agir com oportunidade e eficácia.
Os funcionários, se forem realistas, não devem pensar em nítidas melhorias de condições de vida, mas ninguém estranhará que se preocupem com um agravamento que ultrapasse razoável limite.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Em face de acréscimos excessivos nas despesas essenciais dos orçamentos familiares, o Governo pode ver-se obrigado a rever a situação económica dos seus servidores e, consequentemente, a aumentar as remunerações estabelecidas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E pergunta-se: em que medida seriam afectadas as reais possibilidades do Tesouro?
Não há dúvida de que o reajustamento global dos vencimentos e pensões do funcionalismo provocaria sensível acréscimo nas despesas públicas, obrigando a maior prudência na aplicação de investimentos no fomento económico.

O Sr. Burity da Silva: - Muito bem!

O Orador: - Parece, portanto, que será preferível rever-se a política de estabilização do custo de vida.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Se os responsáveis pela Administração reconhecem, em público, incorrecções nos circuitos de distribuição e distorções evidentes no fluxo de lucros, pois bem, ficamos aguardando e aplaudiremos todas as iniciativas que venham a tomar para a racionalização desses circuitos e para a equilibrada repartição dos frutos da actividade económica.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - O Governo tem de aplicar-se resolutamente em suster os efeitos inflacionistas que o processo de desenvolvimento económico simultâneo ao esforço de defesa possa provocar. De outro modo, o investimento fugirá para sectores não essenciais e veremos proliferar práticas de operações especulativas.
No capítulo da repressão de delitos antieconómicos, creio que o Governo ainda não quis, ou não soube, usar a seu favor essa poderosa arma psicológica que é, quando se vive em situação de emergência, o castigo exemplar; ...

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - ... nem me parece que a brandura das penas aos impostores, oportunistas e sabotadores seja o melhor processo para os reconduzir ao bom caminho e para lhes desenvolver uma melhor consciência do sacrifício que a Nação suporta.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Será assim que se pode cultivar, na opinião pública, um forte ambiente de repulsa moral onde passem a respirar com dificuldade esses maus elementos sociais?
Quando a guerra nos leva vidas e nos gasta a fazenda, que dúvidas pode haver para o emprego decidido dos poderes disciplinadores do Estado no expurgo dos quistos e no combate aos cancros do circuito económico?

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Não podemos permitir que uns poucos engordem de mais, à custa do sangue dos que combatem e do suor dos que labutam com seriedade.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: os imperativos da conjuntura condicionam a actividade financeira do Estado por forma a exigirem uma escala de prioridades nos gastos públicos e uma sã execução.
Há dois pólos fundamentais que comandam o esforço financeiro: a defesa militar e o desenvolvimento económico.
A integridade dos nossos territórios e a segurança das pessoas e bens é primordial para a vida da Nação.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Por isso respondemos à guerra que nos fazem e damos preponderância, no conjunto das despesas, aos encargos militares.

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Mas é a própria natureza dessa guerra que não nos garante uma decisão rápida, mesmo que apliquemos um esforço financeiro total na luta armada.
O esforço de guerra que se pede à Nação parece destinado a prolongar-se; e para se sustentar haverá que baseá-lo num conveniente desenvolvimento económico.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - São, pois, as necessidades das forças armadas que, muito embora retardem o ritmo do progresso económico, acabam por determinar que ele não deve ser impedido.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Repetindo uma ideia que vi algures expressa, direi que a desejável zona de equilíbrio entre o esforço financeiro para a defesa e o esforço financeiro para o fomento se situa no campo das possibilidades de desenvolvimento económico, visto que a estagnação neste sector comprometeria de forma irreversível o esforço militar.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - As naturais limitações financeiras e o antagonismo de exigências da defesa e de fomento dificultam bastante as decisões orçamentais.
Temos de manter actualizada uma criteriosa reavaliação das disponibilidades para daí partirmos ao encontro da melhor maneira de se cobrirem os mais amplos limites do essencial. A escala de preferências resultante satisfaz o que for possível, mas os espíritos bem formados não poderão esperar que o Estado dê o que não tem.
Agrade ou não a estranhos - por muito que nos pese -, queremos a sobrevivência de Portugal. Em linguagem de finanças, este nosso querer implica a inflexível estabilidade monetária e financeira, a cobertura de despesas militares com excedentes de receitas ordinárias, o financiamento do progresso da economia com recursos extraordinários, tanto quanto possível de origem interna, e o respeito da prioridade dos encargos com a defesa nacional sem desatender o fomento económico.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Se assim é, então devemos possuir uma, noção exacta da gravidade da hora que passa e esperar sacrifícios maiores.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Obedeceremos ao princípio da austeridade, como se impõe.
E saberemos temperar a expressão dos nossos anseios, entre os muitos anseios justos ainda há que distinguir os que podem ser satisfeitos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A execução disciplinada da actividade financeira do Estado ultrapassa a seriedade e exactidão contabilista e a simples obediência a limites de verbas inscritas no Orçamento.
O Sr. Ministro das Finanças nunca perde oportunidades para recomendar que se suprimam gastos de carácter sumptuário e que se utilizem verbas com base num vincado senso de economia. Isto significa, que, nos diferentes escalões hierárquicos da administração pública, deve imperar uma preocupação constante e activa rio sentido da melhoria do rendimento das actividades.

O Sr. Pinto de Mesquita: - Apoiado!

O Orador: - Em muitos casos a eficiência há-de impor, através da simplificação e da coordenação, uma reforma de mentalidades e de estruturas e desafiar velhos hábitos; mas não há outro caminho a seguir. Direi melhor: é este o caminho que temos de seguir.
E já que estou a falar de senso de economia, recordo .linda que o mais firme alicerce dos nossos planos futuros é a capacidade interna de financiamento.
Todos os que podem, mas todos sem excepção, devem preocupar-se em economizar para produzir. A poupança só é louvável desde que seja fonte de investimentos de carácter reprodutivo. Nesse ciclo contínuo de produtividade e poupança, cada qual servirá o seu próprio interesse sem deixar de concorrer para o benefício geral.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Na hora que passa, esbanjamento é crime. Não esqueçamos as palavras de Salazar quando afirmou:

Todos devem convencer-se de que somos bastante pobres para poder gastar mal o que temos.

Sr. Presidente: nos tempos que correm, o culto dos falsos ídolos generaliza a tentação do êxito fácil. Por isso não me espanta que, em plena luta armada contra declarados inimigos da Pátria, haja quem proclame fórmulas geniais onde as soluções vitoriosas dispensam sacrifícios.
Só uma dúvida me fica: é a de saber distinguir, nesses assombrosos mágicos, os traidores e os inconscientes.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - A serena percepção dos perigos que nos envolvem não esmorece os espíritos resolutos e dispostos a servir o ideal da Pátria una. Creio, pois, que a vitória estará ao nosso alcance se demonstrarmos firme vontade de vencer.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Nesta guerra a luta não é só de soldados, mas de todos os portugueses, em toda a parte e em todos os instantes.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Nas retaguardas a melhor arma é o trabalho profícuo e persistente. E também aqui se faz uma guerra, guerra à negligência e à perfídia, essas fontes venenosas de desanimes e de interesses egoístas.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Tenhamos confiança na nossa capacidade. Mas não fiquemos à espera de que nos bata à porta o futuro que os nossos inimigos nos querem preparar.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

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O Orador: - Se nos lançarmos, em dádiva generosa, ao trabalho e à luta, o futuro que desejamos dir-nos-á que o soubemos merecer.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Pinto Bull: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: vai já longa a apreciação e o exame do extenso e muito bem elaborado parecer sobre as Contas Gerais do Estado referentes ao ano de 1962 e por isso reduzirei ao mínimo a minha intervenção, não só para facilitar a tarefa de V. Ex.ª no encerramento dos trabalhos da presente sessão legislativa, prestes a terminar, mas também porque depois das intervenções tão valiosas dos Srs. Deputados que me precederam pouco mais me restará dizer sobre a matéria em debate, e, por todas estas circunstâncias, circunscreverei a rápida análise à província da Guiné.
Quero, porém, deixar bem expresso, antes de mais nada, o preito da minha homenagem à Comissão de Contas Públicas desta Câmara pela pontualidade e seriedade com que continua apresentando o habitual e bem elaborado parecer, homenagens que endereço especialmente ao relator das mesmas Contas, nosso mui ilustre e estimado colega Eng.º José Dias de Araújo Correia, pelo seu brilhante e exaustivo trabalho, com que mais uma vez põe em evidência as suas altas qualidades de saber e de ponderação e que muito dignificam esta Câmara.
Não posso também deixar de me referir neste momento a todos aqueles que, directa ou indirectamente, concorrem para a elaboração das contas de gerência e exercício das nossas províncias ultramarinas e assim quero desta tribuna prestar as justas homenagens a esses incansáveis servidores do Estado que tanto na Direcção-Geral de Fazenda do Ministério do Ultramar como nas direcções e repartições de Fazenda e contabilidade das respectivas províncias de além-mar se dedicam ao exaustivo trabalho de fecho e elaboração das contas de gerência e, no caso especial da província da Guiné, que tenho a honra de representar nesta Assembleia, quero destacar a personalidade do grande funcionário que dirige a respectiva Repartição Provincial de Fazenda, bem como a valiosa cooperação dos seus mais directos colaboradores, os quais, neste momento difícil da vida nacional, sobretudo naquela província sem olharem a canseiras nem a horários, se dedicam de alma e coração à espinhosa missão de acompanharem a execução do orçamento, com todas as suas implicações próprias dos tempos de guerra, e no final procederem à elaboração das contas de gerência.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: três laços me ligam, à província da Guiné: sou natural daquela província, tive o privilégio de merecer a confiança da sua boa gente para a representar nesta Câmara e por fim quis o Governo distinguir-me com o honroso convite, que aceitei com grandes apreensões e exacta noção das responsabilidades do momento, para ir ocupar o lugar recém-criado de secretário-geral da província.
Por todos estes motivos me merecem especial atenção, e sou obrigado a encará-los com realismo e objectividade, os problemas que hoje, mais do que nunca, causam preocupação a todos aqueles que, por força das circunstâncias, são chamados a colaborar na governação das nossas províncias ultramarinas.
Como todos VV. Ex.ªs sabem, a Guiné encontra-se muito abalada nos seus alicerces e na sua estrutura em geral por essa guerra sem quartel que nos é movida por elementos com base nos vizinhos territórios do Senegal e da, República da Guiné e que corporizam o movimento do rapina com que os nossos inimigos pretendem atingir os seus objectivos que, em última análise, se resume na subtracção pura e simples, no todo ou em parte, do património que os nossos maiores nos legaram.
Esta subtracção, que se pretendeu concretizar com as selváticas barbaridades que caracterizaram o início do terrorismo na mártir província de Angola em 1961 e que, embora com características diferentes, penetrou na nossa sacrificada Guiné em 1962, visa sobretudo abalar a confiança que sempre existiu entre as várias etnias que compõem o mundo português, espalhado por quatro continentes do Globo e assente nessa interessante e sã política multirracial que os nossos detractores procuram ignorar.
Por acção armada nos dois focos criados em Angola e na Guiné e por ataques sistemáticos nas tertúlias internacionais, os nossos inimigos não desarmam e continuam a criar-nos situações pouco agradáveis nos campos político, militar, económico e social e obrigam-nos a desviar as nossas potencialidades humanas e financeiras do verdadeiro caminho que o desenvolvimento dos nossos territórios impunha para rumos diferentes exigidos pela defesa da integridade da Pátria, com a canalização de todos os recursos disponíveis para as despesas de guerra.
Estas circunstâncias e o desassossego em que a província vem vivendo desde o ano de 1962 impossibilitaram a realização de planos de desenvolvimento
pré-estudados, facto que mereceu o arguto reparo do Exmo. Relator das Contas ao afirmar que:

E até certo ponto de surpreender que se não tivessem alterado as condições de vida desta província durante o ano de 1962 e que, pelo contrário, prosseguissem o trabalho de renovação agro-pecuária e a obra de melhorias nas comunicações o outras, encetadas anteriormente.

Foi sob este signo que se processou a execução do orçamento para o ano de 1962, cujas contas estamos analisando.
Um rápido exame mostra uma acentuada subida nas importações em relação ao ano de 1961, passando de 32 667 t, no valor de 297 169 contos, para 33 195 t, no valor do 327 267 contos, o que dá uma diferença para mais do 527 t e 30 098 contos.
Quanto à exportação, verifica-se fenómeno inverso, baixando de 80 488 t e 211 187 contos para 77 522 t, no valor do 188 868 contos, o que equivale a uma diferença para menos de 2996 t, no valor de 22 319 contos.
Verifica-se assim um deficit na balança comercial de 138 399 contos, como resultado da diferença entre a importação e a exportação desse ano, respectivamente de 327 267 para 188 868 contos.
Este comportamento deve-se ao aumento gradual do valor das importações e à queda também gradual do das exportações e que se vinha justificando nos últimos oito anos.
A que atribuir a acentuada subida na importação?
Para mim dois factores podem ter concorrido para a verificação do facto: a melhoria de consumo e o aumento da população chamada para esse consumo não só pelo aumento real da população civilizada devido à convergência de elementos das forças armadas na província, mas também pela educação do nativo para novas dietas mais consentâneas com as exigências de uma, racional nutrição.
Tiveram certa relevância na importação durante, o ano de 1962 os produtos têxteis, seguidos dos industriais ali

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mentares, materiais de transporte e as mercadorias cujas necessidades se fizeram sentir devido às anormalidades nas fronteiras.
A distribuição da importação durante o ano em referência foi:

[Ver quadro na imagem]

Quanto à exportação, tiveram maior relevância o amendoim, o coconote e as madeiras. O valor total das exportações durante, o ano de 1962 foi de 188 868 contos, respeitantes a 77 522 t assim distribuídas:

[Ver quadro na imagem]

Constata-se que, além dos três produtos acima referidos, continuam tendo predominância nas exportações da província as madeiras em bruto e serradas, que ocupam o terceiro lugar, com 17 156,7 t, valorizadas em 8 241 200 contos, e o óleo e bagaço de amendoim, com 658,9 t, no valor de 920 100 contos.
Verifica-se ainda que o grosso das exportações se destina à metrópole, como se exemplifica:

Destino das exportações:
Contos
Metrópole .................................169 100
Ultramar ....................................2 200
Estrangeiro ................................17 600

Como se vê, as exportações para as restantes províncias ultramarinas são bastante diminutas, o que é de lamentar, e convém estudar a melhor forma de se estabelecerem novos contactos ou relações comerciais que permitam um desenvolvimento de trocas entre as parcelas portuguesas do ultramar.
Há produtos que a Guiné necessita e não produz, podendo por isso importar. Temos neste caso, por exemplo, o café, o tabaco manufacturado e o açúcar, em relação a Angola; o açúcar, o tabaco manufacturado e as bolachas, em relação a Moçambique; o café e o sal, em relação a Cabo Verde.
Em contrapartida poderia fornecer amendoim e óleo e bagaço de amendoim a Angola; em pequena escala para já, mas susceptível de rápido aumento num futuro próximo, a castanha de caju para Moçambique; e arroz, madeiras e lenha para Cabo Verde.
As relações com os mercados estrangeiras quanto a exportação já foram mais brilhantes na Guiné. Hoje esses mercados pouco compram à província, o que vem criar um deficit relativamente elevado em virtude de as importações do estrangeiro serem palpáveis.
No que diz respeito ao ano de 1962, importaram-se do estrangeiro mercadorias no valor de 75 257 contos e o valor dos produtos exportados foi de 17 658 contos, do que resulta um deficit de 57 599 contos, bastante elevado e que merece uma solução urgente para um maior equilíbrio da balança, de pagamentos.
Na arrecadação e utilização dos cambiais verifica-se a seguinte distribuição:

Arrecadação:
Contos

Saldo que transitou de 1961 ............ 18 996
Cambiais arrecadados .................. 262 648
Total ............ 281 644

Distribuição:

Cambiais utilizados ....................271 043
Saldo para 1963 .........................10 601
Total .............281 644

A utilização dos cambiais distribuídos em 1962 obedeceu aos seguintes fins:
Contos
Transferências concedidas ao Estado,
a funcionários o a particulares .......................66 966
Transferências concedidas ao comércio ...............189 291
Diversos (motivos de saúde e outros) ..................14 786
Total ...........................271 043

Embora os recursos da província não sejam muito elevados, a Guiné tem conseguido manter equilibrado o seu orçamento e é das províncias que menos vem recorrendo a empréstimos para fazer face às suas despesas.
Em relação a 1962 a distribuição das receitas foi a seguinte:
Contos
Receitas ordinárias ...................................134 946
Receitas extraordinárias:

Empréstimos ............................................27 700
Saldos de exercícios findos .................................1
Rendimentos das concessões petrolíferas..................1 982
Total ..............................164 629

As despesas em relação ao mesmo ano atingiram as seguintes somas:
Contos
Despesas ordinárias ...................................131 456
Despesas extraordinárias ...............................31 743

Saldo do exercício.......................................1 430
Total...............................164 629

A acumulação dos saldos de anos anteriores atingiu em 1962 a soma de 323 352 contos, dos quais foram utilizados 319 007 contos nas seguintes aplicações:
Contos
Fomento económico .......................................143 400
Despesas de exercícios findos ............................21 465
Encargos de dívida da província ...........................7 868
Portos, transportes e comunicações .......................50 660
Construção de edifícios e apetrechamento .................22 909
Missões científicas ......................................12 904
Missões católicas .........................................1 076
A transportar .............................260 282

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Transporte .....................260 282
Instrução pública ....................................900
Saúde pública .....................................14 913
Fomento agro-pecuário ..............................1 860
Assistência, subsídios, pensões
e indemnizações ....................................4 502
Serviços militares .................................6 307
Serviços de marinha ................................1 032
Melhoria concedida aos funcionários (suplemento, abono de família, etc.) ...............6 776
Abastecimento de água e saneamento .................2 950
Serviços estatísticos (censo da população)..........1 450
Empréstimos concedidos à Câmara Municipal de Bissau ..........................................6 000
Padrões e monumentos .................................210
Melhoria das condições de habitação dos naturais da província ............................662
Diversos ..........................................11 168
Total .....................319 007

tendo ficado um saldo disponível no valor de 4345 contos.
Um exame atento ao aproveitamento dos saldos mostra que não foram esquecidos alguns sectores de importância capital, tais como a saúde pública, instrução pública, fomento agro-pecuário e fomento habitacional, respectivamente com 14 913, 900, 1860 e 662 contos, dando-se assim seguimento à política de melhoramento das condições de vida das populações nativas, como vem sendo característica do Governo.
Como se depreende pela análise em curso, a vida económica da província não tem grande desafogo e está assente na agricultura, com predominância dos dois produtos de exportação - o amendoim e o coconote -, sendo de lamentar que não- tenha sido possível até à data garantir novas culturas para uma melhor distribuição de riqueza.
E de toda a vantagem que se continue dispensando o maior carinho ao desenvolvimento do sector agrícola, dado que é apoiado nele que gravita toda a economia da província.
Sei, por conhecimento directo, que o Governo nunca descurou o assunto e que, pelo contrário, tem constituído grande preocupação dos dirigentes da política ultramarina e dos governadores locais o aproveitamento das potencialidades agro-pecuárias da Guiné.
Contudo, o que se tem feito ainda é pouco em relação às dispendiosas somas que alguns serviços e brigadas têm consumido em estudos e projectos, sem, na maior parte das vezes, chegarem a entrar, propriamente, no âmago dos problemas e, muito menos, pô-los em boa execução.
Poderia citar uma série de casos concretos; porém, não venho aproveitar esta tribuna para lançar a confusão ou apregoar os lapsos ou irresponsabilidades de alguns técnicos menos escrupulosos e que, por sorte, ainda conseguem escapar à sanção que mereciam por não cumprirem com as suas obrigações ou por desbaratarem as verbas que lhes foram entregues para finalidades tão importantes para o desenvolvimento económico e social das nossas províncias ultramarinas e das suas, gentes.
Aproveitarei, sim, a oportunidade para lembrar aos dirigentes da administração ultramarina, e pôr-me, eu mesmo, de sobreaviso, dado que estou incluído nesse número, da conveniência de se apertar um pouco mais a malha da fiscalização das brigadas técnicas que trabalham no nosso ultramar para que apresentem, dentro do mínimo de tempo que se achar conveniente, os resultados dos seus estudos e planeamentos e que aquelas que tiveram de entrar no campo da execução dos estudos e projectos realizados que o façam com a consciência e dinamismo e não pretendam fazer «render o peixe», como vulgarmente se diz, evitando, assim, que se continue verificando o descontentamento hoje existente entre oficiais do mesmo ofício, por uns serem «brigadeiros» e outros funcionários dos quadros estabelecidos por lei, estando muitas vezes estes últimos numa situação material bastante precária em relação aos primeiros, sem se atender aos longos anos que, nalguns casos, terão de aguardar a possibilidade de uma promoção.
Cometeria, no entanto, uma grande injustiça se não deixasse uma palavra de apreço, e mesmo de louvor, para aqueles técnicos, e felizmente ainda são alguns, que, embora façam parte e beneficiem das vantagens materiais concedidas às brigadas, cumprem com consciência, competência profissional, e muitos deles até com sacrifício, a importante missão que lhes é incumbida.
Que o seu sacrifício e verdadeiro sacerdócio continuem servindo de incentivo aos apáticos ou àqueles que vêem na função apenas um meio de amealharem os benefícios materiais que a lei concede.
É que, Sr. Presidente e Srs. Deputados, hoje, mais do que nunca, a função de todo aquele que aceita ou é impelido a aceitar uma comissão civil no ultramar deve ser de um verdadeiro voluntário da paz, embora beneficiando das compensações próprias do cargo em que tiver sido investido.
Não quero ter a veleidade de esperar que os nossos licenciados, diplomados ou finalistas dos cursos superiores se ofereçam como voluntários da paz, na verdadeira acepção em que, por exemplo, esses voluntários são tidos nos Estados Unidos da América e na Inglaterra. Gostaria, sim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que a nossa juventude acusasse mais o toque e desse mostras de uma maior consciência e mentalidade ultramarinas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Gostaria, sim, que não esperassem apenas pela imposição dos deveres militares para irem tomar contacto com as portuguesíssimas terras do Portugal de além-mar, que deles tanto precisam.
Gostaria, repito, que atendessem aberta e voluntariamente, por exemplo, ao. convite que, anualmente, o Ministério do Ultramar faz para estagiários remunerados nos vários sectores da actividade técnica e científica nas várias províncias ultramarinas.
Não compreendo que, apesar do esforço titânico dos respectivos directores-gerais do Ministério do Ultramar, e com publicidade de toda a ordem, não se consiga preencher os muitos lugares em aberto nos quadros do ensino primário e secundário, das várias especialidades médicas, na magistratura, na agronomia, na veterinária e tantos outros quadros técnicos do nosso ultramar.
As portuguesíssimas terras do nosso ultramar precisam de técnicos para o seu desenvolvimento e para a elevação do nível intelectual e económico dos colonos e nativos.
Lanço, pois, um veemente apelo à juventude, aos nossos licenciados e a todos os técnicos em geral, para que tenham a consciência do perigo que a Nação atravessa e de que a integridade da Pátria depende não só daqueles que heroicamente e de armas na mão cumprem o seu dever nas frentes de combate, como também daqueles que na retaguarda souberem dar o seu contributo para o desenvolvimento e consolidação do nosso património ultramarino.

Vozes: - Muito bem!

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O Orador: - Mas, Sr. Presidente, sem querer desviei-me um pouco da matéria do debate em curso. As minhas desculpas.
Dizia eu, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que a agricultura na Guiné espera que os homens de boa vontade decidam fazer alguma coisa por ela.
Até aqui toda a actividade agrícola da província é feita única e exclusivamente pelos autóctones não distribalizados, os quais, na maioria dos casos, utilizam processos primitivos e de fracos rendimentos.
Sendo este sector o que condiciona, de uma maneira geral, a vida económica da província com as suas implicações no comércio externo, merece ser focado com detalhe para que se fique com uma ideia clara da verdadeira situação da agricultura guineense.
Como se sabe, os dois principais produtos que anualmente pesam na agricultura local são o amendoim e o arroz, tendo qualquer deles uma grande influência no bem-estar das respectivas populações, dado que o primeiro constitui a principal fonte de riqueza dos nativos e o segundo a sua base alimentar.
Por isso, tudo o que se fizer para melhorar as condições qualitativas e quantitativas destes dois produtos será contribuir para desenvolver a economia da província.
Continue-se, pois, a trabalhar com persistência na selecção das respectivas sementes, sua conservação nos bons celeiros que o Governo em boa hora mandou construir e a sua distribuição na devida altura para que os interessados possam preparar os seus campos de cultura a tempo de receberem as sementes no momento oportuno.
Estudem-se as possibilidades de se introduzirem métodos técnicos adequados e modernos na cultura destes dois produtos, tendo em atenção o que se passa nos territórios vizinhos, onde os nativos conhecem há já algum tempo métodos racionais de cultura e que lhes têm permitido alcançar rendimentos em sementes muito superiores aos verificados no nosso território. Como exemplo basta citar o amendoim, em que a produção por hectare excede em mais do que o dobro a que se verifica entre nós.
Além do amendoim e do arroz, um outro produto pesa na economia da Guiné. Refiro-me ao coconote, cuja exportação no ano de 1962, em análise, excedeu as 17 000 t, com o valor de cerca de 38 000 contos. Convinha que os estudos levados a cabo pela brigada de estudos agronómicos para a obtenção de sementes de palmeiras de Samatra melhoradas fossem concretizados pelos serviços de agricultura da província com o estabelecimento de muitos mais palmares em prosseguimento dos trabalhos já iniciados.
A intensificação da cultura do cajueiro, em boa hora iniciada na província, poderá fazer com que um novo produto venha num futuro muito próximo melhorar a balança comercial da Guiné.
A aptidão dos solos da província e o entusiasmo das populações pela cana sacarina aconselham que se estudem as possibilidades de tornar racional a sua cultura e se acarinhe a hipótese, já ventilada pelo meu antecessor nesta Câmara e que eu também perfilho com todo o interesse, do seu aproveitamento para o estabelecimento de uma açucareira na Guiné para abastecer o mercado local e contribuir para solucionar as dificuldades da metrópole, que, como todos sabem, continua importando grandes quantidades de açúcar do estrangeiro.
Fala-se de novo na instalação de- duas- novas indústrias açucareiras em Moçambique, e á Guiné, que há mais de dez anos vem lutando por igual regalia, continua e continuará a esperar que deixe de ser considerada enteada e
passe a merecer o tratamento de bom filho, que, mesmo nestes tempos conturbados que estamos atravessando, todos os que ali nasceram e vivem continuam a ser, excepção feita, bem ententido, a meia dúzia de transviados que ainda são capazes de reconhecer a tempo a ilusão em que vivem.
O actual Ministro do Ultramar conhece bem a situação e. após a sua investidura, conseguiu dar um grande passo para melhorar o statu quo ante pela fixação de uma quota reservada à Guiné na importação de açúcar por parte da metrópole, facto que poderia animar os interessados se a demora não tem feito desesperar os capitalistas e financiadores, que, segundo me dizem, chegaram a ter realizada a verba necessária para a montagem da indústria.
Hoje, com a situação anormal que a província atravessa, só com o aval do Governo alguém se abalançaria a meter ombros a tão pesado fardo.
Tenho, contudo, fé em que ainda havemos de utilizar um dia açúcar produzido na província portuguesa da Guiné.
A fruticultura constitui para mim outra fonte de riqueza que se está desprezando. Já em 1956, num relatório apresentado ao Governo da Guiné, eu dizia:

Que se procure dar aos indígenas da região de Cacine, agora por mim visitada, uma assistência mais completa, tanto no campo espiritual, sanitário, comercial e agrícola; que se estude a maneira de auxiliar os indígenas daquela região no aproveitamento e colocação da enorme quantidade de fruta variada de que a região é fértil.

Mantenho hoje o mesmo ponto de vista e mais uma vez peço a costumada atenção do Governo e das organizações privadas para que, logo que as condições anormais da província melhorem, se estudem as possibilidades de a Guiné vir a ser um abastecedor do mercado metropolitano de frutas, dada a sua proximidade.
No prosseguimento da sua política de facilitar o progresso intelectual a todos aqueles que tiverem condições para isso e frequentarem o ensino primário e o secundário na província, o Governo tem criado ultimamente uma série de bolsas de estudo, que têm permitido a um grande número de estudantes virem completar os seus estudos na metrópole. Nesta oportuna política educacional em que colaboram pari passu, o Governo Central e o da província não quiseram deixar de comparticipar outros organismos oficiais, como a Câmara Municipal de Bissau e a Caixa Económica Postal, e ainda a Associação Comercial da Guiné e a Fundação de Calouste Gulbenkian, concedendo todos eles bolsas de estudo com o mesmo fim. Esta Fundação já vinha ajudando a Guiné na campanha contra a tuberculose.
A Liga dos Amigos da Guiné, ultimamente fundada naquela cidade, quis também colaborar nessa grande obra de elevação das massas nativas e filhos de colonos e, assim, lançou uma campanha junto das grandes empresas radicadas na província.
A compreensão das organizações abordadas foi altamente simpática e não resisto à tentação de me referir à espontânea colaboração que imediatamente concederam, tendo a Empresa António Silva Gouveia, S. A. R. L., oferecido duas bolsas para cursos superiores e médios e prometido mais uma oportunamente; a Sociedade Comercial Ultramarina igualmente ofereceu duas bolsas para cursos superiores que indicou, e o Banco Nacional Ultramarino, num gesto simpático do seu conselho geral, «no desejo de colaborar numa ideia que considera do mais alto significado e da maior utilidade», instituiu igualmente duas bolsas de estudo para os estudantes da Guiné que pretendam seguir os estudos na metrópole.

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A campanha continua e a Liga dos Amigos da Guiné conta com o apoio moral e material de todos os bons portugueses que vivem ou viveram na Guiné e daqueles que estão ligados à província por laços económicos para levar a cabo esta grande obra, que outro fim não tem senão ajudar todos aqueles que desejam e não podem melhorar o seu nível intelectual, facilitando assim a formação de elites dentro da nossa mentalidade para se contraporem à activa campanha que os nossos inimigos iniciaram com o aliciamento da juventude guineense com ofertas de bolsas de estudo para cursos superiores, médios e práticos no estrangeiro.
Outro problema que anda ligado às contas públicas, no que respeita à Guiné, pois nelas foi focado, é o problema habitacional. Este magno problema, que tanto na metrópole como em Angola e Moçambique tem merecido grande atenção do Governo, tem igualmente relevância na Guiné. Durante a vigência governativa do almirante Sarmento Rodrigues foi construído o Bairro de Santa Luzia, destinado às classes menos favorecidas de entre os assalariados do Estado. O bairro teve continuidade durante o governo do actual Ministro do Ultramar, que também facilitou a melhoria das condições habitacionais dos nativos, concedendo-lhes chapas de zinco para cobrirem as suas casas. O actual governador da província também tem dispensado a este problema todo o seu interesse e tem entre mãos a construção de um pequeno bairro nos arredores da cidade de Bissau.
Parece-me, no entanto, que o problema deve ser encarado em profundidade, e com auxílio do Governo ou financiamento particular dar-se início a um plano de trabalhos a realizar em meia dúzia de anos e que pudesse melhorar grandemente o problema habitacional junto dos grandes centros para as classes mais débeis.
No que toca à riqueza do subsolo da Guiné nada há de concreto. As prospecções: levadas a cabo pela Esso Exploration para a pesquisa do petróleo nada revelaram e dentro da maior reserva suspendeu os trabalhos e recolheu todo o pessoal.
A N. V. Billiton, que também iniciou a pesquisa da bauxite, também suspendeu os trabalhos, parece que por o minério não ter o teor desejado e as dificuldades de transporte não compensarem as despesas a efectuar. Os resultados obtidos por esta companhia deixam pelo menos a certeza de que existe bauxite na região oriental fronteiriça com a República da Guiné e no Boé.
Aguardemos, pois, que melhores dias surjam e que estas ou outras companhias retomem as pesquisas ultimamente interrompidas.
A industrialização da Guiné deve começar a merecer a atenção das entidades oficiais e das organizações privadas ali radicadas ou de outras que para ali desejem ir trabalhar, passado que seja este período de anormalidade que estamos vivendo. Existem na província algumas indústrias de pequena importância, entre as quais sobressaem as que se destinam ao aproveitamento das essências florestais.
Como verdadeiros complexos industriais existem dois em toda a província, pertencentes respectivamente à Empresa António Silva Gouveia, S. A. R. L., e à Sociedade Comercial Ultramarina, instalações que se podem classificar de bem apetrechadas em qualquer parte e que se destinam ao descasque do arroz, descasque do amendoim e a industrialização deste produto para a obtenção do óleo do mendobi.
Creio, no entanto, ser oportuno o estudo a sério das possibilidades industriais da Guiné, em especial no que respeita à instalação de uma indústria açucareira para o aproveitamento da enorme quantidade de cana sacarina que ali se produz e das condições favoráveis que a província tem para essa cultura, segundo opinião de alguns técnicos.
Outra riqueza que já hoje pesa na balança comercial da Guiné é constituída pela exploração das boas essências florestais que abundam na província, e de que o bissilon é o mais apreciado.
A exportação de madeiras em bruto e serradas ocupou, tanto em tonelagem como em valor, o 3.º lugar no ano em análise.
A borracha da Guiné chegou a ter em tempos recuados muita procura. Mais tarde deixou de ter interesse e só há pouco tempo começou de novo a merecer a atenção dos compradores, em virtude da instalação de uma unidade fabril para o aproveitamento desse produto em Bissau.
Quanto à riqueza pecuária da província, os elementos mais recentes que tive oportunidade de compulsar mostram que em 1961 existiam as seguintes espécies e quantidades:

Espécies: Quantidades:

Bovina ...........................................230 286
Arietina ..........................................53 859
Caprina ..........................................143 712
Suína .............................................98 206
Asinina. ...........................................3 858
Equina.................................................64
529 985
Galináceos .......................................492 865
Palmípedes .........................................7 566
Perus ................................................210
Pintadas ...........................................2 571
Coelhos ..............................................137
503 349
Total ................................1 033 334

Com números tão interessantes e apurados pelos serviços competentes pode-se afirmar que a potencialidade pecuária da Guiné é uma realidade e que vale a pena encarar-se as possibilidades da sua melhoria qualitativa e quantitativa não só para acudir às necessidades locais, como para uma futura tentativa de fornecimento de carnes à metrópole, onde cada vez se sente mais a sua falta.
Outra riqueza em potencial e que não tem sido aproveitada é a pesca.
O crescimento cada vez maior dos núcleos populacionais da província e a presença das forças armadas, que de um momento quase fizeram triplicar a população branca da Guiné, aconselham que se olhe com objectividade o problema dos abastecimentos locais.
Segundo elementos oficiais de que disponho, a quantidade de pescado vendido nos mercados municipais durante o ano de 1961 foi de 658 337 kg, com o valor de 4279 contos.
A potencialidade das riquezas atrás referidas leva-me a aceitar como promissora a formação de uma organização agro-pecuária e industrial que reunisse capitais da metrópole e da Guiné, das grandes empresas e dos pequenos comerciantes, apoiada e financiada pelos Bancos Nacional Ultramarino e de Fomento Nacional, acarinhada pelos Governos Central e Provincial englobando elementos metropolitanos e ultramarinos tanto na constituição do capital como no sector do trabalho.

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Enfim, uma organização que retratasse a nossa política multirracial e de perfeita coexistência pacífica em todos os campos de actividade.
E para aproveitar as verdadeiras revelações que existem na Guiné entre os elementos evoluídos e os colonos metropolitanos e cabo-verdianos torná-se mister a criação, o mais urgentemente possível, da tão falada, mas talvez já um pouco adormecida, Caixa de Crédito Agro-Pecuário que para mim continua sendo único meio capaz de interessar os elementos mais evoluídos da província no apego à terra, e que fogem dela porque não possuem capacidade financeira bastante para se meterem em experiências ou explorações dispendiosas.
A criação dessa caixa teria um grande alcance político e colocaria a Guiné em pé de igualdade com as províncias de Angola, Moçambique e Cabo Verde, onde já existem, e com frutuosos resultados, estas instituições de crédito, e ainda com Timor, que, segundo que consta, vai ter muito brevemente a sua caixa.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Tive oportunidade de sondar o Banco de fomento Nacional sobre um possível apoio no caso de se concretizar a iniciativa, e apraz-me salientar que encontrei a melhor boa vontade e espírito de colaboração do Exmo. Governador daquele estabelecimento bancário desde que o Governo desse o impulso inicial. É pois de esperar se possa concretizar desta vez tão importante quão oportuna ideia, tanto mais que da parte do Governo Central pode a província, contar com o costumado apoio a todos os empreendimentos que, como este, visem melhorar as condições de vida das populações e colonos das nossas províncias ultramarinas.
Uma outra indústria que talvez pudesse ser encarada logo que as condições anormais o permitam é a dó aproveitamento das frutas para conservas e sumos para consumo local e exportação.
As condições frutícolas do Sul da província garantem matéria-prima para a laboração de uma fábrica de capacidade média.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: não quero abusar da vossa paciência, e por isso vou terminar.
Desejava, porém, lançar um último apelo desta tribuna, para fechar, o ciclo das minhas intervenções na presente sessão, com uma palavra de apreço para os funcionários e demais servidores do Estado que labutam nas terras da Guiné em condições materiais muito inferiores às dos seus colegas de Angola e Moçambique.
Escutei ontem mui atentamente a intervenção do meu ilustre colega Deputado Cardoso de Matos e registei com satisfação a esperança em que vivem os funcionários de Angola por uma possível e breve equiparação de vencimentos com os seus colegas de Moçambique.
Faço os mais sinceros votos para que tal equiparação se concretize o mais rapidamente possível, mas desejo também ardentemente que os dirigentes da Nação não se esqueçam também dos funcionários das outras províncias bem portuguesas como as duas grandes e nas quais os funcionários continuam vegetando com vencimentos que não acompanharam a carestia de vicia.
A subida vertiginosa do custo de vida que se vem registando na Guiné nos preços correntes dos bens de consumo obrigatório faz com que eu possa classificar a vida naquela província como das mais elevadas em todo o território português.
Este facto tem levado a um verdadeiro êxodo de funcionários da Guiné para as províncias de governo-geral, e ninguém pode levar a mal tal atitude.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Em nome daqueles que não querem ou não podem sair da província ou preferem ficar firmes no seu posto, aqui deixo o apelo, na certeza de que eles serão lembrados na devida altura.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E para findar quero pedir a todos os portugueses, metropolitanos e ultramarinos, que tenham consciência do perigo que a Nação corre e que para fazer face às dificuldades do momento precisamos de nos unirmos cada vez mais para levarmos a cabo a defesa intransigente do nosso património pelas armas nas frentes de combate e por uma política de desenvolvimento intelectual, económico e social na retaguarda.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador fui muito cumprimentado.

O Sr. Jesus Santos: - Sr. Presidente: pedi a palavra para enviar para a Mesa duas propostas de resolução: uma respeitante às Contas Gerais do Estado e outra respeitante às contas públicas a cargo da Junta do Crédito Público.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Não há mais nenhum orador inscrito.
Declaro encerrado o debate e vou submeter à votação da Câmara as propostas de resolução apresentadas, e que vão ser lidas.

Foram lidas.

São as seguintes:

Propostas de resolução

A Assembleia Nacional, tendo examinado os pareceres sobre as Contas Gerais do Estado da metrópole e das províncias ultramarinas relativos ao exercício de 1962 econcordando com as conclusões da Comissão das Contas Públicas, resolve dar a sua aprovação à Conta Geral do Estado e às contas das províncias ultramarinas referentes ao ano de 1962.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 21 de Março de 1964. - O Deputado, Joaquim de Jesus Santos.

Tenho a honra de submeter à Assembleia Nacional a seguinte base da resolução:

A Assembleia Nacional, depois de tomar conhecimento do parecer da sua Comissão de Contas Públicas relativo às contas da Junta de Crédito Público, resolve dar-lhe a sua aprovação.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 21 de Março de 1964. - O Deputado, Joaquim, de Jesus Santos.

O Sr. Presidente: - Vou submeter à votação as propostas de resolução que acabam de ser lidas.

Submetidas à votação, foram aprovadas.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: estão concluídos os trabalhos correspondentes ao exercício normal de funcionamento da Assembleia e ao mês de prorrogação.
Ao terminar estes trabalhos, não quero deixar de exprimir a VV. Ex.ªs os melhores votos de que durante o interregno parlamentar tudo lhes corra pelo melhor, e ainda os meus agradecimentos pelas demonstrações de consideração e direi mesmo de estima com que sempre me distinguiram. Ao mesmo tempo, quero agradecer aos representantes dos órgãos de informação e aos próprios órgãos de informação a colaboração que nos prestaram e ainda pedir desculpa a todos por qualquer impertinência que, contra, a disciplina que a mim próprio impus e tenho o dever de me impor, às vezes possa ter havido da minha parte. (Não apoiados).
A todos, os meus agradecimentos e os melhores votos.
Depois disto resta-me solicitar de VV. Ex.ªs um voto de confiança à nossa Comissão de Legislação e Redacção para dar redacção definitiva às propostas de resolução que acabam de ser aprovadas.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Interpreto o silêncio da Assembleia no sentido de que esse voto de confiança que peço está aprovado.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão. Ainda que pudéssemos funcionar na próxima segunda-feira, os trabalhos da Assembleia estão esgotados.
Está encerrada a sessão e até à próxima.

Eram 18 horas e 25 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão

Alexandre Marques Lobato.
António Calheiros Lopes.
António Marques Fernandes.
Armando José Perdigão.
Artur Proença Duarte.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Carlos Coelho.
D. Custódia Lopes.
Délio de Castro Cardoso Santarém.
Domingos Bosado Vitória Pires.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Francisco de Sales de Masearenhas Loureiro.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
Jorge Augusto Correia.
José Augusto Brilhante de Paiva.
José Dias de Araújo Correia.
José de Mira Nunes Mexia.
Júlio Dias das Neves.
Manuel Augusto Engrácia Carrilho.
Manuel Seabra. Carqueijeiro.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Agostinho Gonçalves Gomes.
Alberto Henriques de Araújo.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alfredo Maria de Mesquita Guimarães Brito.
Antão Santos da Cunha.
António Barbosa Abranches de Soveral
António de Castro e Brito Meneses Soares.
António da Purificação Vasconcelos Baptista Felgueiras.
António Tomás Prisónio Furtado.
Artur Alves Moreira.
Belchior Cardoso da Costa.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Fernando António da Veiga Frade.
Jacinto da Silva Medina.
Jorge Manuel Vítor Moita.
José Fernando Nunes Barata.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Pinto Carneiro.
José dos Santos Bessa.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel de Melo Adrião.
Manuel Nunes Fernandes.
Purxotoma Ramanata Quenin.
Rui de Moura Ramos.
Sebastião Garcia Ramires.
Urgel Abílio Horta.
Vítor Manuel Dias Barros.
Voicunta Srinivassa Sinai Dempó.

O REDACTOR - Luiz de Avillez

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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