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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETÁRIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 153

ANO DE 1964 20 DE NOVEMBRO

VIII LEGISLATURA

(SESSÃO EXTRAORDINÁRIA)

SESSÃO N.º 153 DA ASSEMBLEIA NACIONAL

EM 19 DE NOVEMBRO

Presidente: Exmo. Sr. Mário de Figueiredo

Secretários: Exmo. Srs. Fernando Cid Oliveira Proença
Luís Folhadela de Oliveira

SUMÁRI0: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 10 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foi aprovado o Diário das Sessões n.º 151.
Deu-se conta do expediente.
O Sr. Deputado Cutileiro Ferreira requereu informações sobre efectivos bovino c ovino no Alto e Baixo Alentejo.
O Sr. Deputado António Santos da Costa falou sobre a rodovia para o Bom Jesus, de Braga, e o monumento ao marechal Gomes da Costa.
O Sr. Deputado Pinto de Mesquita evocou a memória do falecido Deputado Melo Adrião, de quem fez o panegírico.
O Sr. Deputado Elísio Pimenta tratou da política aérea e do aeródromo do Porto.
O Sr. Deputado Alberto de Araújo ocupou-se da visita do Chefe do Estado à Madeira e das comunicações aéreas c marítimas com aquele arquipélago.
O Sr. Deputado Artur Pimentel referiu-se às visitas do Chefe do Estado a Trás-os-Montes e à navegabilidade do rio Douro.

Ordem do dia. - Prosseguiu a discussão do projecto de proposta de lei do Governo referente ao Plano Intercalar de Fomento para o triénio de 1965-1967.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Henrique Tenreiro e André Navarro.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas e 50 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai fazer-se a chamada.

Eram 16 horas.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Agostinho Gonçalves Gomes.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Alberto dos Reis Faria.
Alberto Ribeiro da Costa Guimarães.
Alexandre Marques Lobato.
Alfredo Maria de Mesquita Guimarães Brito.
André Francisco Navarro.
Aníbal Rodrigues Dias Correia.
António Augusto Gonçalves Rodrigues.
António de Castro e Brito Meneses Soares.
António Júlio de Carvalho Antunes de Lemos.
António Magro Borges de Araújo.
António Manuel Gonçalves Rapazote.
António Maria Santos da Cunha.
António Marques Fernandes.
António Martins da Cruz.
António da Purificação Vasconcelos Baptista Felgueiras.
Armando Francisco Coelho Sampaio.
Armando José Perdigão.
Artur Alves Moreira.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Artur Proença Duarte.
Augusto José Machado.
Bento Benoliel Levy.
Carlos Alves.
Carlos Coelho.
Carlos Emílio Tenreiro Teles Grilo.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
D. Custódia Lopes.
Délio de Castro Cardoso Santarém.

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Domingos Rosado Vitória Pires.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando António da Veiga Frade.
Fernando Cid Oliveira Proença.
Francisco António Martins.
Francisco António da Silva.
Francisco José Lopes Roseira.
Francisco Lopes Vasques.
Francisco de Sales de Mascarenhas Loureiro.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Henrique Veiga de Macedo.
Jacinto da Silva Medina.
Jerónimo Henriques Jorge.
João Mendes da Costa Amaral.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
João Rocha Cardoso.
João Ubach Chaves.
Joaquim de Jesus Santos.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Joaquim de Sousa Birne.
Jorge Augusto Correia.
José Alberto de Carvalho.
José Augusto Brilhante de Paiva.
José Fernando Nunes Barata.
José Luís Vaz Nunes.
José Manuel da Costa.
José Manuel Pires.
José Maria Rebelo Valente de Carvalho.
José Monteiro da Rocha Peixoto.
José dos Santos Bessa.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Luís Folhadela de Oliveira.
Manuel Amorim de Sousa Meneses.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel João Cutileiro Ferreira.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Beis.
Mário Amaro Salgueiro dos Santos Galo.
Mário de Figueiredo.
Olívio da Costa Carvalho.
Quirino dos Santos Mealha.
Rogério Vargas Moniz.
Rui de Moura Ramos.
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães.
Tito Castelo Branco Arantes.
Virgílio David Pereira e Cruz.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 79 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 16 horas e 10 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Está na Mesa o Diário das Sessões n.º 151, correspondente à sessão de 17 de Novembro. Se algum dos Srs. Deputados tiver alguma reclamação a deduzir, é favor fazê-lo agora.

O Sr. Jesus Santos: - Sr. Presidente: Pedi a palavra para apresentar as seguintes rectificações ao Diário das Sessões n.º 151: na p. 3803, 1. 29.ª, 1.ª col., onde se lê: «projectaram», devo ler-se: «projectar», e na p. 3804. 1. 26.ª, 1.ª col., onde se lê: «seguidamente», deve ler-se: «seguramente».

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como mais nenhum Sr. Deputado deseja fazer uso da palavra, considero aquele número do Diário das Sessões aprovado com as rectificações apresentadas.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Exposição

Da Associação dos Inquilinos Lisbonenses sobre problemas habitacionais.

Telegramas

Do Grémio da Lavoura do Funchal pedindo a reorganização da indústria de lacticínios da Madeira.
Da comissão administrativa da Cooperativa Agrícola do Funchal no mesmo sentido.
Do Sindicato Nacional dos Profissionais de Telecomunicações e Radiodifusão pedindo que no anunciado diploma sobre o trabalho nacional não seja esquecida a situação especial dos trabalhadores de laboração contínua.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para um requerimento o Sr. Deputado Cutileiro Ferreira.

O Sr. Cutileiro Ferreira: - Sr. Presidente: Pedi a palavra para apresentar o seguinte

Requerimento

«Nos termos do Regimento, requeiro do Ministério da Economia que, pela Secretaria de Estado da Agricultura, me sejam fornecidos, actualizados tanto quanto possível, com urgência, os números relativos aos efectivos bovino e ovino nos distritos que constituem as províncias do Alto e Baixo Alentejo.»

O Sr. António Santos da Cunha: - Sr. Presidente: Antes de iniciar as considerações que motivaram o pedido que dirigi a V. Ex.ª para usar da palavra nesta sessão, quero, com viva saudade e bem profundo sentimento, referir-me à morte do nosso muito ilustre colega Prof. Doutor Melo Adrião.
Não foi só na sua cátedra da Faculdade de Medicina do Porto, que soube iluminar sobremaneira com a sua serena inteligência e muito saber, que aquele eminente mestre e ilustre Deputado exerceu o seu magistério.
Acima de tudo, ele fê-lo pelo seu admirável porte cívico e moral, tornando-se assim para todos exemplo do que vale um homem que vive em toda a sua extensão os preceitos evangélicos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Bem serviu a Pátria, que amou devotadamente, e bem serviu a Igreja, de que era filho dedicado.
Que Deus já o tenha acolhido na sua infinita misericórdia, são os votos que faço, curvando-me reverentemente perante a sua excelsa memória, e comigo, disso estou certo, mais uma vez e muito saudosamente, toda a Câmara.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: Pedia palavra para assinalar aqui a última visita que fez a Braga o Sr. Ministro das Obras Públicas e agradecer-lhe desta tribuna os frutos

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prometedores que dessa visita advieram para a minha terra natal.
O Governo, pelo Ministério das Obras Públicas, e como o vem fazendo em todas as décadas da Revolução Nacional, entendeu erguer em Braga um padrão que fique a assinalar o quadragésimo aniversário da Revolução de Maio, cujas consequências para o levantamento desta Nação, em todos os aspectos, ninguém de boa fé e são critério poderá hoje em boa verdade negar.
Entendeu o Governo que uma larga avenida que ligasse o velho burgo arcebispal à incomparável estância do Bom Jesus do Monte - o maior monumento no Mundo à paixão de Cristo Nosso Redentor - seria solução ideal para o fim em vista.
Divergiram os técnicos quanto à forma de objectivar o empreendimento, e logo os que o não são por igual tomaram o seu partido, como é próprio dos Portugueses e de uma maneira especial das gentes do Minho.
Serenamente, e depois de largos e cuidadosos estudos de gabinete, o Sr. Eng.º Arantes e Oliveira - que, sendo técnico eminente, é também uma das potências mais válidas da política nacional - dirigiu-se a Braga e ali, in loco, após ter corrido num dia cheio de sol os belos campos que a nova grande artéria vai atravessar, tomou a decisão que se impunha e que dado o incomparável prestígio de quem a ditava, foi fácil ser unânime e gostosamente por todos aceite.
Vai pois ser inaugurada na terra, do 28 de Maio, em Maio de 1966, uma via que será padrão a. honrar a cidade, o Regime e a engenharia portuguesa, de uma maneira especial o Ministro que a concebeu, ficando a servir largamente as muitas e incomparáveis possibilidades turísticas da região.

O Sr. Costa Guimarães: - E justo que se acrescente o merecido louvor à actuação de V. Ex.ª Compreendo que V. Ex.ª não o possa referir, já que o elogio em boca própria é vitupério, mas entendo dever realçar a acção de V. Ex.ª em prol das justas aspirações da cidade de Braga.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Agradeço a V. Ex.ª, mas devo dizer que tudo se deve ao Governo e a mais ninguém, e já agora devo dizer que espero que essa acção do mesmo se venha a estender a outras estâncias turísticas do Minho, como seja a nossa formosíssima Penha, que necessita de uma estrada à altura da cidade de Guimarães e que todos esperamos será o segundo empreendimento turístico, no campo das rodovias, a enriquecer a nossa província.

O Sr. Costa Guimarães: - Bem haja V. Ex.ª pela oportuna referência, e muito obrigado.

O Orador: - Espera-se que na mesma altura seja inaugurado o novo Hotel Bom Jesus, sendo de justiça neste momento dirigir uma palavra de simpatia à mesa regedora da confraria que administra a estância pela firmeza e clarividência com que está encarando o assunto, para o que não lhe tem faltado o apoio do Secretariado Nacional da Informação e o do muito ilustre Subsecretário de Estado da Presidência do Conselho.
Fica aqui, pois, exarado o agradecimento de todos os bracarenses ao Governo e, de uma maneira muito especial, ao Sr. Presidente do Conselho, que Braga quer receber, com o entusiasmo com que o fez sempre, em 1966 - fazendo disso ponto de honra -, e ao grande Ministro Arantes e Oliveira, que no seu constante peregrinar por esse País além, tem sabido conquistar para o Regime um somatório incalculável de simpatias, o que se lhe torna sumamente fácil, dadas as qualidades humanas que possui e fazem dele uma das mais prestigiosas figuras do Regime.
Sr. Presidente: Se me fosse permitido fazer um pedido ao Sr. Ministro das Obras Públicas, seria o de que, na alameda que precederá a grande via, fosse desde já destinado lugar próprio para que oportunamente seja erguida a estátua que todos devemos ao grande marechal Gomes da Costa.
Gostava de ver em bronze, agora que estou quase velho, a figura do valente cabo de guerra na minha cidade como a vi em vida, era então quase criança, nas horas incertas e aflitas de Maio de 1926, perfilada perante o andor da Virgem Mãe de Deus Senhora Nossa e Glória do nosso Povo, consoladora dos aflitos, Mãe da Igreja e medianeira dos que nela crêem.
A homenagem ao marechal não seria só aos revolucionários do 28 de Maio, mas também ao soldado de África e da Flandres e ao capitão da índia, da Índia que foi, é e será portuguesa enquanto o direito existir à face da Terra.
Seria, enfim, uma homenagem merecida da Nação às virtudes que caracterizam as forças armadas, forças armadas que em 28 de Maio de 1926, como hoje e sempre, são as supremas fiadoras da grandeza e integridade da nossa pátria.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Pinto de Mesquita: - Sr. Presidente: Pedi a palavra, de certa maneira comissionado pelos Deputados pelo círculo do Porto, para, através da minha pessoa, se prestar preito saudoso à memória do Prof. Melo Adrião, nosso colega nesta Assembleia e a que V. Ex.ª e a Câmara já prestaram a devida homenagem. Em todo o caso, directamente, nós, Deputados do Porto, mais atingidos, não poderíamos deixar de marcar aqui a grande perda que aquela figura representou genericamente para a Nação e particularmente para cidade do Porto e para a sua Universidade, para o seu ensino e até para a quotidiana assistência médica.
Se aqui pudesse estar presente, o nosso colega Dr. Urgel Horta, como decano dos Deputados pelo círculo do Porto, por um lado, e por outro lado como médico, seria a pessoa indicada para a homenagem a prestar ao Prof. Melo Adrião. Na sua falta, que todos esperamos seja já por pouco tempo, pois tenho informações de que são grandes as suas melhoras, tenho eu de o fazer.
Continuando as minhas considerações sobre o Dr. Melo Adrião, tenho a dizer que se tratava de uma personalidade excepcional.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Era uma pessoa em que as qualidades de modéstia se associavam maravilhosamente com faculdades de invulgar inteligência e profícuo trabalho. Além das suas verdadeiramente excepcionais qualidades de honra e carácter, temperadas por grande bondade, era um exemplo ainda de qualificada capacidade científica, aliás, perfeitamente compatível com a mais vincada e vigorosa fé religiosa, como o demonstrou dirigindo o semanário católico A Ordem.

Vozes: - Muito bem!

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O Orador: - Esta síntese de personalidade humana, no seu polimorfismo de facetas, é rara.

O Dr. Melo Adrião, em todo o caso sempre cativo da sua actividade de professor que ele era acima de tudo, não pôde, até pela doença que o assaltou desde o ano passado, prestar a esta Gamara aquela assiduidade e trabalho que noutras circunstâncias se poderia esperar dele. Mas a medida desse trabalho foi bem marcada pelas poucas intervenções que teve.
VV. Ex.ªs estão decerto recordados de uma vez em que ele teve de intervir de improviso a propósito do banco dos olhos; a sua intervenção, nada preparada, espontânea e imediata, foi brilhantíssima.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, este professor ilustre não prescindia de ser o mais atento, cuidadoso e devotado médico assistente de toda a gente que dele precisava, sobretudo os mais pobres.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E uma coisa sabida que, vivendo ele durante muito tempo em Aldoar, povoação suburbana - ultimamente, por necessidade pedagógica, vivia perto do Hospital Escolar do Porto -, assistia cuidadosamente com a maior devoção aos doentes pobres, de que não cobrava qualquer remuneração.
Esta forma exemplar de humanidade, de caridade, cristã, é preciso vincá-la, porque demonstra que, para além da fé religiosa que certamente lhe não era alheia, um grande professor pode ser simultaneamente, como direi, um verdadeiro médecin de campagne, ou seja como um médico de alto valor só realça esse valor desempenhando com devoção as suas funções até ao fim.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - São estas razões, Sr. Presidente, que colocam a figura do Dr. Melo Adrião num lugar destacado da nossa memória. Estas razões certamente hão-de sobrar para nos dar a confiada esperança de que a misericórdia divina não deixou de recolher dilectamente no seu seio alma tão nobre.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Elísio Pimenta: - Sr. Presidente: Peço licença para me associar, comovido, ao voto de pesar da Assembleia pelo passamento do nosso colega e meu companheiro pelo círculo do Porto Prof. Manuel de Melo Adrião.
Há sentimentos, Sr. Presidente, que só se podem exprimir verdadeiramente pelo silêncio, e este é um deles.
Silêncio para meditação nas virtudes singulares de um homem, em todo o sentido da palavra, que foi um grande professor universitário e um cientista, um médico, um clínico, de tão altas qualidades que Gregório Maranon recomendava-o aos seus doentes, um coração aberto a todas as dores e solicitações dos infelizes, e que na sua humildade cristã levou a vida a fazer o bem ao próximo.
Silêncio na prece, para que possamos melhor pedir a Deus. que ele tanto amou. o seu repouso eterno junto de si.
Sr. Presidente: A imprensa refere-se com certa frequência ao aeroporto do Porto.
Ainda recentemente o O Primeiro de Janeiro publicou uma série de artigos sobre o aeroporto do Porto e os seus problemas, que obtiveram I melhor aceitação pública pela oportunidade, valor dos elementos revelados e objectividade das conclusões.
Quero associar-me aos aplausos que recebeu, acrescentando algumas considerações às produzidas nesses excelentes artigos sobre o único aeroporto, ou aeródromo de tráfego comercial, que serve o Norte do País e que na descoordenada orgânica dos transportes nacionais constitui um elemento importantíssimo da sua economia.
A afirmação não é gratuita. Demonstra-se pela potencialidade revelada através do excepcional aumento do seu tráfego de ano para ano e principalmente nestes últimos tempos. Todavia, não dispondo ainda de alguns dos meios operacionais favoráveis ao ritmo de desenvolvimento observado, excede, em número e em valor, todo o tráfego somado dos restantes aeroportos ou aeródromos da rede nacional, com excepção do de Lisboa, como é de ver, três deles classificados de 1.ª classe, por um decreto recente, quando o do Porto foi deixado na classe inferior, a par de um outro ainda não inaugurado, e com objectivos essencialmente turísticos, de um segundo sem movimento e de um terceiro por construir.
Pena é que aceitando-se, como se aceita, a verdade da afirmação, sem possível desmentido, nem sempre as realizações correspondam às palavras e os problemas continuem ano após ano por resolver ou subordinados a um ritmo que contraria a rapidez vertiginosa do progresso aeronáutico.
Será pedir de mais que, nas vésperas do supersónico, se continue a viver a idade da hélice, sem se satisfazerem as exigências do jacto?
E que a razão está do Indo do articulista de O Primeiro de Janeiro, e de alguns outros que têm versado o assunto, mostra-o a atitude louvável da companhia concessionária do serviço público de transportes aéreos nacionais, dirigindo ao jornal um esclarecimento, de que me permito ler os seguintes passos, publicados no número do dia 31 de Outubro:

... A este propósito recebemos da T. A. P. alguns comentários que merecem ser ponderados. Depois de louvar a iniciativa, «visto tratar-se de um assunto que quanto mais se discute mais aumenta o interesse» ... acentua- que «como da discussão nasce a luz, a publicação dos citados artigos vem dar azo a que fiquem esclarecidos alguns pontos focados».

E a terminar:

A T. A. P. está mais interessada que ninguém em proporcionar ao Porte- uma rede aérea que possibilite à sua população, essencialmente à que se dedica ao comércio e indústria, os mais rápidos contactos com os principais países.

Outra coisa não era de esperar de uma empresa que presta ao País assinalados serviços, na paz como na guerra, e de cujo prestígio além-fronteiras se pode dar testemunho.

Estou certo, Sr. Presidente, de que os nossos aviões são o meio mais eficiente- de lembrar a presença de Portugal no Mundo, na Europa como nas Américas, ou em qualquer outro continente, quando levados em carreiras regulares às grandes capitais.
Já vamos a Madrid, a Paris, a Londres, a Genebra, a Francoforte e a Munique. Aparecemos, embora acompanhados, no Rio de Janeiro e em S. Paulo. O prestígio de Portugal e as necessidades do turismo exigem que voemos para muito mais cidades, que nos mostremos em outros continentes.

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A propaganda feita através das companhias de aviação é hoje uma das mais penetrantes e persuasivas formas de dar a conhecer o nome de um país e os seus atractivos turísticos. E se essa propaganda pelos inúmeros processos de publicidade conhecidos e através de técnicas extraordinariamente sugestivas se completar com a presença das cores nacionais nos lemes dos nossos aviões, confortáveis e seguros, não tenhamos dúvida de que Portugal será mais conhecido e até melhor compreendido.
Sr. Presidente: Creio na utilidade de se definir, sem demora, uma política aérea nacional e fazê-la acompanhar dos meios indispensáveis à sua execução. São os problemas de tráfego internacional e a opção entre as restrições provenientes dos tratados bilaterais em vigor, ou a estabelecer, sobretudo num país como o nosso, que detém na Europa e na África alguns dos pontos dominantes desse tráfego, e a sua liberalização, o que só será possível, sem dúvida, quando a companhia nacional alcançar uma dimensão capaz de se colocar a par das grandes companhias estrangeiras; suo os problemas das carreiras não regulares, os voos I. T. (inclusive tours) e de fretamento, que se devem fomentar, pelo contributo que dão ao turismo, transportando nas melhores condições de rapidez e preço um volume de estrangeiros que as condições geográficas de Portugal por outra forma afastariam para países mais acessíveis; são as facilidades de desembaraço do tráfego aéreo e dos seus utentes, elemento fundamental de um turismo bem compreendido; é a planificação e construção das infra-estruturas, por forma a servir todo o território português com carreiras aéreas, e tantos e tantos outros problemas, que estão certamente na linha das preocupações do Ministério das Comunicações e de outros sectores governativos.
Quanto a este ponto, é indiscutível que o Governo tem feito um grande esforço no sentido de dotar o território do País com as infra-estruturas indispensáveis à eficiente expansão das carreiras aéreas comerciais.
Pelo que respeita ao território metropolitano e insular, são exemplo desse esforço louvável a adaptação do aeroporto de Lisboa ao tráfego de jactos intercontinentais; a construção dos dois aeroportos da Madeira e do de Faro; a nova pista dos Espargos, na ilha do Sal, « o prolongamento da pista norte-sul, reforço do seu pavimento, a nova placa de estacionamento e as obras na aerogare do Porto e ainda, (nesta, a melhoria dos sistemas de ajudas.
Há, todavia, que ir mais longe na cobertura do território metropolitano, permitindo a criação de novas carreiras aéreas, nomeadamente para os pontos em que o acesso por via férrea ou rodoviária é precário quanto a rapidez e comodidade e não haja possibilidade prática de melhoria sem o recurso à via aérea.
A facilidade de transportes e comunicações é elemento fundamental para o desenvolvimento económico do País. Não promover a solução das dificuldades provenientes do afastamento, no tempo que não da distância quilométrica, em que se encontram as regiões do interior dos centros populacionais do litoral é contribuir para o seu empobrecimento ou para um ritmo de desenvolvimento que não está de harmonia com as necessidades presentes e futuras do País.
E se nos aflige uma emigração de braços que vão favorecer o suprimento de carências alheias, igualmente nos devemos perturbar com o êxodo dos valores de estabilidade social que se não conformam, justificadamente, com o esquecimento a que parecem condenados sem culpa sua!
Poderão, porventura, esses mesmos, e nós com eles, conformarem-se com o dispêndio de tanto tempo de Bragança a Lisboa, em caminho de ferro, como da capital portuguesa ao Rio de Janeiro, em avião convencional?
E que se estiverem bastante mais perto, em Viseu, por exemplo, demorem tanto a Santa Apolónia como da Portela de Sacavém a Luanda?
Mais felizes os do Sul, pois dentro em breve, de Faro, ou talvez de Beja, ficarão a alguns minutos do Tejo.
E se o turismo algarvio ditou, ou apressou, a construção do aeroporto dessa província a tantos títulos privilegiada, quem nos diz que o leste transmontano, com a sua paisagem rude, ou o verde Minho, com os seus rios e as suas albufeiras, se não transformariam também num rico manancial turístico?

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O meu propósito, Sr. Presidente, ao fazer uso da palavra, foi referir-me especialmente ao aeroporto do Porto, cuja função no plano aeronáutico nacional, e na economia de uma cidade com núcleos urbanos que, na sua unidade, comportam para cima de 600 000 habitantes, sofre limitações, para mim, resultantes da ausência de definição de uma política aérea.
Já se fez a definição legal da sua junção no panorama nacional?
O projecto de Plano Intercalar de Fomento parece dizer-nos alguma coisa a esse respeito, mas não é ocasião aqui para o apreciar e discutir.
É evidente que um país como o nosso não pode ter a pretensão de dispor de mais do que um grande aeroporto internacional.
Lisboa fica na rota das grandes linhas aéreas que atravessam o Mundo e, além disso, a importância que lhe dá o facto de ser uma capital europeia, em todo o sentido da palavra, tornaria absurda a existência de uma competência.
Mas isso não significa que ao aeroporto do Porto deixe de se reconhecer a função específica que efectivamente exerce na economia do País e cuja potencialidade é por tal forma sensível que seria erro dar-lhe apenas o papel apagado de terminal da única carreira interna metropolitana de que dispomos e alternante esporádica do aeroporto de Lisboa quando as condições meteorológicas não permitem que este seja utilizado.
É certo que existe uma carreira internacional Porto-Londres, que se efectua apenas em sete meses do ano, e de noite, mas os seus resultados e o facto de constituir uma excepção só servem para confirmar a regra.
Os diplomas legais não são feitos sobre o joelho, e as suas disposições, por estranhas ou absurdas que nos pareçam, têm uma razão de ser. Pena é que nem sempre venham acompanhados de relatório capaz de, por si só, esclarecer essa razão de ser e desfazer todos os juízos que se possam formular sobre a intenção do legislador.
Tem-se perguntado por que motivo na classificação feita recentemente dos aeroportos da rede nacional metropolitana e insular em duas categorias, que constituem por isso discriminação, o aeroporto do Porto foi considerado de 2.a, quando se incluíram na categoria superior, ao lado do de Lisboa, outros aeroportos que no presente, e potencialmente, pelas infra-estruturas e pelo volume do tráfego, como já o disse, lhe ficam muito aquém.
É claro, repito, a classificação não se fez arbitrariamente, e por isso seria útil, perante os reparos que apareceram na própria imprensa, um esclarecimento do Sr. Director-Geral da Aeronáutica Civil, cuja actividade inteligente, e equilibrada, tantas vezes em condições difíceis, merece respeito e homenagem.

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Cremos que a discutida classificação não visa diminuir as funções que ao aeroporto do Porto têm sido atribuídas em declarações responsáveis, e isso seria mais um motivo justificado para o esclarecimento.
Analisemos essas funções tendo portanto em conta a situação de facto existente.
O aeroporto dispõe de duas pistas, uma delas, a de leste-oeste, com 1200 m, raras vezes utilizada pela aviação comercial, dados os ventos dominantes, e outra, principal, a pista de instrumentos, norte-sul, com a extensão de 2000 m, 45 m de largura e dotada de um pavimento flexível com a espessura de 0,74 m. que corresponde às exigências resultantes do peso de qualquer avião actualmente em serviço nas linhas de todo o Mundo.
A pista principal permite a aterragem de qualquer desses aviões e a descolagem até um determinado peso, o que afasta da sua utilização os quadrirreactores americanos de longa distância e os birreatores Caravelle, de média distância, com a carga máxima.
Isso cria situações deveras curiosas. Numa carreira, que existiu, Lisboa-Porto-Londres, a T. A. P. fazia o serviço de volta com os seus Caravelle, mas tinha de recorrer aos Comet, de reacção, da B. E. A., que podem descolar com toda a carga, para transportar, na ida, os seus passageiros.
Por aqui se concluirá, imediatamente, da necessidade imperiosa, do prolongamento da pista dos 2000 m para os 2400 m ou 3000 m, tanto mais que todas as expropriações se encontram já feitas e o respectivo terreno nas mãos do Estado. E pode até perguntar-se porque em vez de uma placa de estacionamento de aeronaves, sem qualquer utilidade presente, ou nos tempos próximos, se não prolongou a pista, como esperavam todos quantos se interessam pelo progresso do aeroporto, entre os quais me posso contar desde há muitos anos.
O prolongamento da pista teria resolvido já alguns dos problemas mais importantes que impedem a sua utilização para todo o tráfego, se não talvez o único de valor que obsta a que tal aconteça imediatamente ou dentro de poucos meses.
A aerogare e o respectivo edifício, mau grado todas as críticas que se possam fazer ao seu aproveitamento, não têm problemas, e o mesmo acontece com o despacho alfandegário, este graças à compreensão de um alto funcionário, o ilustre director-geral das Alfândegas, que ontem no Porto e agora no lugar que tão merecidamente ocupa mostra sempre uma visão excepcionalmente larga dos problemas que é chamado a resolver - e o mesmo se pode dizer quanto à polícia e ao turismo.
Por outro lado, e isto é muito importante, as ajudas visuais, sistema de luzes de pista e de aproximação de alta intensidade e dos Vasi - Visual Approach Slop Indicator - da pista de instrumentos 18/36, são iguais ou idênticas às do aeroporto de Lisboa e as ajudas rádio, logo que esteja instalado o novo sistema electrónico lis, o que se espera venha a acontecer em Dezembro ou Janeiro próximos, colocarão em paralelo, sob esse aspecto, os dois aeroportos metropolitanos.
E para que o desembaraço de aviões de todas as categorias, mesmo os quadrirreactores de longa distância, se possa fazer, falta, apenas, a entrega de um carro de arranque, já encomendado.
Isto é, uma vez prolongada II pista principal e completado o equipamento de ajudas e de assistência, o aeroporto das Pedras Rubras ficará em condições de exercer a sua função no tráfego interno e internacional e a de aeroporto alternante à altura das necessidades da cidade, da região e do País.
Tem-se falado muito, a propósito do cancelamento dos serviços da carreira regular Lisboa-Porto-Lisboa, das condições meteorológicas da zona do aeroporto, e nem sempre com a verdade e com a justiça devidas. Ainda nos princípios de Outubro findo um jornal da capital informava, com título a duas colunas, que o avião da manhã chegara a Lisboa cerca das 13 horas, porque as condições do tempo, no Porto, não haviam permitido a descolagem. Nada menos verdadeiro. Viajaram nesse aparelho alguns jornalistas que puderam verificar que no Porto fazia um tempo excelente e que o avião se atrasara porque havia neblina em ... Lisboa. Um lapso, acredito, mas a verdade é que se procura com frequência fazer acreditar que as coisas acontecem dessa maneira. E estas coisas não acontecem só com os aviões ...
Segundo os números que me foram dados por entidades responsáveis, e aproveito e, oportunidade para agradecer, muito penhorado ao Sr. Ministro das Comunicações a prontidão com que me foram fornecidos, há meses, determinados elementos pedidos sobre o assunto, segundo esses números, dizia, em 1963 foram cancelados 234 serviços da linha em questão, dos quais 144 por mau tempo em Lisboa, 40 por mau tempo no Porto e 50 por razões resultantes de deficiências nas ajudas radioeléctricas no aeroporto das Pedras Rubras.
Felizmente, a situação melhorou extraordinariamente de Janeiro a Outubro do ano corrente, pois em 1220 serviços previstos sómente se cancelaram 79, dos quais 28 por condições não operacionais no Porto e 3 em Lisboa, devendo notar-se que as ajudas rádio, como tive ocasião de dizer, ainda não são iguais ou idênticas nos dois aeroportos. Quando isso acontecer, é possível que os números se invertam.
Ainda ultimamente o aeroporto da Portela esteve encerrado, devido às más condições de tempo, desde a manhã do dia 3 de Novembro até ao dia seguinte, e mesmo durante este a neblina não permitiu qualquer movimento regular, o que deu origem a que .alguns aviões que procuravam Lisboa tivessem vindo descer no Porto. É pena que a função de alternante não seja utilizada mais vezes, dado que as condições de mau tempo raras vezes coincidem nos dois aeroportos. Aquele facto provocou grandes incómodos nos passageiros dos aviões, que foram obrigados a desviar-se da sua rota normal e II aterrar em Madrid, onde deixaram os passageiros destinados a Lisboa, ou sujeitaram-se a atrasos consideráveis na chegada.
Ora os incómodos foram menores e os atrasos muito reduzidos para os passageiros dos aviões que recorreram ao Porto pela utilização de outros meios de transporte de ou para Lisboa. Madrid está situada a 600 km de Lisboa, o Porto apenas a 300 km, e não é fácil ou rápido transportarem-se dezenas ou centenas de pessoas de caminho de ferro ou por estrada de uma para outra capital. Do Porto a Lisboa, por qualquer dessas vias, são menos de cinco horas.
Para não prolongar mais esta minha intervenção, quero pedir licença, Sr. Presidente, para me referir, muito sucintamente, a outros dois problemas que me parece estarem na linha das considerações que tenho feito e da conclusão a tirar delas.
Além da sua função de alternante do aeroporto de Lisboa, que se não exerce com a frequência que seria para desejar, por falta de meios facilmente supríveis, e lembramo-nos dessa coisa simples que é um carro de arranque, já antes referido, sem o qual os aviões intercontinentais americanos não podem levantar voo; do aproveitamento do aeroporto pela aviação de turismo, e cabe aqui falar no Aeroclube do Porto, entregue a um escol de desportistas e de portugueses de têmpera verdadeiramente

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excepcional, que tantos pilotos deu já ao País e cujas iniciativas em matéria de propaganda da aeronáutica nacional, aquém e além-fronteiras, são merecedoras de reconhecimento público, que o Governo, aliás, já lhe manifestou; de uma carreira internacional nocturna Porto-Londres-Porto, começada em 1960 sob excelentes auspícios, mas reduzida no ano imediato a dois serviços semanais nos meses de Abril a Outubro; aos voos de fretamento e aos I. T. (inclusive tours), a verdade é que o movimento do aeroporto fica confinado, na prática, à linha Lisboa-Porto-Lisboa.
Regularizada a função de alternante, fomentados os voos de fretamento e I. T., que, depois de uma queda vertical, a partir de 1960, de 2769 turistas, hóspedes durante meses dos estabelecimentos hoteleiros do litoral nortenho, para 1493, em 1962, voltaram a subir no ano corrente, por forma verdadeiramente prometedora, mercê da decisão louvável de os favorecer, autorizando todos os pedidos formulados, o que se integra, aliás, na política de fomento do turismo, impõe-se a criação de uma carreira regular para a Europa central.
A importância comercial e industrial da região justifica, em passageiros e carga, a existência dessa carreira.
Veja-se que na carreira Porto-Londres-Porto, a que aludi, bissemanal, e durante sete meses, foram transportados no ano corrente 4361 passageiros, além da carga, número superior ao do ano anterior.
E durante os meses de Janeiro a Outubro, inclusive, embarcaram nas Pedras Rubras, com passagens compradas para outros pontos do Mundo, através de Lisboa, 4143 pessoas. Se a estas juntarmos as que nas mesmas condições desembarcaram no Porto e as outras que adquiriram os seus bilhetes nos escritórios da companhia nacional ou de qualquer companhia estrangeira na capital, fica demonstrada a necessidade de se estabelecerem novas carreiras nacionais e internacionais, ou de as Pedras Rubras servirem de terminal ou de escala a carreiras já existentes para a Europa, África ou Brasil.
O Governo não deixará de encarar o problema com verdadeiro espírito de satisfazer uma legítima aspiração de progresso da cidade e de todo o Norte.
Sr. Presidente: A partir de 1 de Setembro findo o preço das tarifas da linha Lisboa-Porto-Lisboa foi aumentado. Confesso que o facto não "me impressionou grandemente, pois ainda há pouco tempo foram aumentados também os preços de outros transportes e há dois dias anunciado o das comunicações telefónicas.
Pareceu-me excessivo que o preço do quilómetro tivesse passado de $90 para 1 $16, superior na generalidade à tarifa adoptada nas linhas internas de alguns países cujo nível de vida se pode comparar com o nosso.
Mas a verdade, porém, é que se essa alteração na tarifa, proposta pela companhia concessionária e autorizada pelo Governo, corresponder uma melhoria no sentido da criação de mais uma carreira de ida e volta, que o movimento actual da linha justifica plenamente, e uma diminuição do tempo de desembaraço dos passageiros, nitidamente excessivo, quando nos lembramos que estes se têm de, apresentar nos aeroportos de partida com meia hora de antecedência, tempo que acresce ao gasto no transporte da ou para o centro das cidades, isto em viagens que variam, entre 50 minutos nos aviões Super G e 30, ou menos de 30, minutos, nos Caravelle. e ainda os cancelamentos dos serviços, como está a suceder, se reduzirem a proporções razoáveis, deixando de provocar tantos prejuízos aos utentes da linha, então o aumento não. terá deixado de ser considerado como justificado.
Com certeza que o Sr. Ministro das Comunicações, ao conceder a referida autorização, estabeleceu também condições, e a T. A. P., no seu desejo de servir o público, e neste caso especial a cidade do Porto, não deixará de as cumprir, mesmo como sugestões, pois não esqueço uma reunião realizada há anos no Governo Civil do Porto, sob a minha presidência e com a presença honrosa do ilustre presidente do conselho de administração daquela companhia, durante a qual, com o melhor espírito de compreensão, se debateram alguns dos problemas objecto desta intervenção.
E não tenha a T. A. P. receio de que o esforço para melhorar os seus serviços deixe de ser compreendido.
O número de passageiros que viajam na linha Lisboa-Porto aumenta dia a dia em ritmo excepcional. Nos dez primeiros meses deste ano esse número foi de 72 596, o que representa um acréscimo de 17 573 em relação a igual período de 1963. A carga subiu de 3401 para 4601. Num e noutro caso, um aumenta superior a 30 por cento. Aumentará no mesmo ritmo até ao fim do ano.
Sr. Presidente: Os problemas do aeroporto do Porto, a que se referiu O Primeiro de Janeiro, não são muitos, não são grandes, não são insolúveis. São sobretudo problemas de compreensão do que representa para o Norte a existência de um verdadeiro aeroporto, com capacidade para servir a sua economia, que é como quem diz a economia da Nação.
Confiemos, por isso, em que o Governo assim o entenderá.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Alberto de Araújo:- Sr. Presidente: No dia 8 de Julho último esteve de passagem na Madeira o Sr. Almirante Américo Tomás, que, a bordo do Príncipe Perfeito, seguia para Moçambique em visita oficial àquela nossa província ultramarina. Duplamente grato foi a todos os madeirenses receberem a visita do mais alto magistrado da Nação. Primeiro do que tudo, tiveram a oportunidade de saudar o Chefe do Estado, cuja personalidade insinuantíssima se impõe ao respeito e ao afecto do País inteiro, e desejar-lhe o melhor êxito no desempenho da sua nova missão a terras de África. Ao mesmo tempo quis o Sr. Almirante Américo Tomás associar-se ao júbilo da população madeirense honrando com a sua presença a inauguração da pista de Santa Catarina, em Santa Cruz, que, com a pista do Porto Santo, constitui o aeródromo da Madeira.
Sabem VV. Ex.ªs quanto os Madeirenses admiram e prezam a sua terra, que, na vanguarda de todos os nossos valores turísticos, conquistou há muitos anos renome internacional como estância digna de ser visitada e conhecida, dados os seus recursos naturais, benignidade de clima, deslumbramento e beleza das suas paisagens sem par.
E compreende-se que, tendo os Madeirenses lutado pela solução do problema das comunicações marítimas e aéreas como condição indispensável para a estruturação de um turismo regular, e não apenas limitado à época de Inverno, compreende-se, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o seu júbilo e a sua emoção ao assistirem, na manhã radiosa do dia 8 de Julho, à aterragem de um Super Constellation dos Transportes Aéreos Portugueses em terras de Santa Cruz na pista acabada de construir.
Foram momentos inesquecíveis para todos quantos os viveram e que esperamos correspondam ao início de um período de maior progresso para o arquipélago madeirense, pela valorização que possa imprimir a determinados sectores da sua economia.

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Dispõe agora a Madeira, efectivamente, de um conjunto de comunicações marítimas e aéreas que constituem a base de um turismo em mais larga escala.
As comunicações marítimas para aquela ilha que mais interessam o seu incremento turístico são actualmente as escalas regulares de certos barcos estrangeiros e as que são asseguradas, de Lisboa, pelos navios portugueses, nomeadamente pelo Funchal, que realiza três viagens mensais à Madeira.
O número de passageiros em trânsito no Funchal - e isso dá uma ideia da importância do nosso porto - passou de cerca de 125 000 em 1950 para 225 000 em 1963.
Em 1962 o número total de estrangeiros entrados na Madeira foi de 13 259, por via aérea e por via marítima. Em 1963 esse número foi de 18 210, dos quais 7021 por via marítima e 11 189 por via aérea.
Até Outubro do corrente ano o número de passageiros estrangeiros desembarcados no Funchal por via marítima excedia já o total de 1963.
Para se avaliar da importância da nova pista de Santa Catarina bastará dizer o seguinte: em 1962, estando a funcionar apenas a pista do Porto Santo, o número total de 65 passageiros nacionais e estrangeiros embarcados e desembarcados no arquipélago por via aérea foi de cerca de 16 000, apesar das contrariedades da ligação marítima entre as duas ilhas. Em 1963 esse número subiu já para perto de 28 000 e até Outubro do corrente ano ultrapassou já os 32 000, ou seja, mais do dobro do registado em 1962.
No 1.º semestre do corrente ano foi de 2670 a média mensal de passageiros embarcados e desembarcados por via aérea no arquipélago. No 2.º semestre, ou seja depois da inauguração da pista de Santa Catarina, essa média, mensal subiu para 4131 passageiros. Aumentou também sensivelmente o número de passageiros em trânsito e o tráfico do correio e de carga.
Para fazer face a este aumento de tráfego turístico, está-se realizando na Madeira um esforço interessante no sentido de proporcionar alojamento a todos quantos desejam visitar aquela ilha. Os particulares estão dando provas de um largo espírito de confiança no futuro, não só construindo novas unidades hoteleiras e residenciais, mas adaptando casas e quintas particulares a fins turísticos. Urge acarinhar e proteger tais iniciativas, por pequenas que sejam, tornando conhecidos lá fora os nomes e endereços dos hotéis, pensões, estabelecimentos residenciais e casas particulares onde o visitante pode ficar confortavelmente instalado.
E evidente que o desenvolvimento turístico da Madeira terá o seu reverso se não se adaptar a economia do arquipélago às novas circunstâncias. O custo da vida far-se-á sentir na situação das classes médias, nomeadamente do funcionalismo público, se não for criada uma sólida estrutura económica que possa ser base de uma ampla estrutura turística. É por isso que os Deputados pela Madeira têm, por mais de uma vez, insistido na necessidade de um planeamento que oriente o fomento do arquipélago no sentido de se obter uma produção conveniente e racional. E há aspectos de franquia aduaneira a prever e realizar.
No início dos trabalhos legislativos não quero deixar de agradecer ao Governo o cuidado que lhe tem merecido o problema turístico da Madeira e a construção da pista de Santa Catarina, em que o Sr. Ministro das Comunicações pôs devotado interesse, e, neste momento, de uma maneira especial, ao Sr. Presidente da República a sua presença na cerimónia inaugural daquela pista.
Sr. Presidente: Em 18 de Agosto S. Ex.ª o Sr. Presidente da República passava outra vez na Madeira, depois da sua triunfal viagem à província de Moçambique. Teve o Chefe do Estado a gentileza de desembarcar novamente no Funchal e subir ao alto da cidade para visitar a Escola Salesiana de Artes e Ofícios, que a alma generosa do P. Botelho anima com a força admirável da sua vontade e da sua fé. Receberam-no as crianças, na sua pureza e candura, com as mais lindas flores dos jardins da sua escola e com os mais espontâneos sorrisos da sua alma. Pôde o Sr. Almirante Américo Tomás viver esses momentos enternecedores, em que, grandes e pequenos, juntaram os seus aplausos e fundiram os seus corações agradecidos para saudarem a figura veneranda do Chefe do Estado. Era, afinal, o prenúncio da apoteose que, no dia seguinte e à sua chegada, lhe havia de prestar esta nobre e magnífica cidade de Lisboa!
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Artur Pimentel: - Sr. Presidente: Após o encerramento desta Câmara, e, assim, durante as últimas férias parlamentares, verificou-se uma série de acontecimentos de larga projecção, dos quais não posso deixar de me referir a dois deles, em face da relevância de que se revestiram - o primeiro, segundo a sua ordem cronológica, integrado no quadro da política regional; o segundo, pelo significado e expansão que teve, situado no âmbito das relações luso-espanholas. Quero, deste modo, aludir à visita que o Chefe do Estado fez ao distrito, e muito especialmente à cidade, de Bragança por ocasião do encerramento das comemorações do seu 5.º centenário, e à conclusão do aproveitamento hidroeléctrico do Douro internacional, marcada pela presença significativa dos Chefes de Estado de Portugal e da Espanha nos termos das povoações portuguesa de Bemposta e espanhola de Aldeadávila da Ribeira.
Decorreu o primeiro facto de 29 a 31 de Agosto último, tendo sido iniciado com a entrada do Chefe do Estado no distrito de Bragança pela ponte do Pocinho. Depois de ali ter sido recebido pelas autoridades distritais e por outras pessoas de representação, seguiu rumo a Moncorvo, em cujas ruas e praça pública foi aclamado, outro tanto sucedendo em todas as povoações por onde passou ou à beira das estradas percorridas naqueles locais, onde as populações se concentraram para o saudar, recepção que de igual modo foi calorosa em Macedo de Cavaleiros, tendo atingido o seu auge na multissecular cidade de Bragança, que se alindou, vestindo as suas melhores galas, e inflamou a alma dos seus habitantes para render justa homenagem ao primeiro magistrado da Nação. Prolongaram-se essas festas pelo dia seguinte, tendo culminado com a inauguração solene da estátua de D. Fernando II, duque de Bragança.
A cidade soube, por esta forma, assinalar com uma pedra branca o conjunto das cerimónias que se propôs realizar no acto de encerramento das festas do seu 5.º centenário, tendo, assim, patenteado todos quantos contribuíram com o seu esforço, inteligência e sacrifício para que as comemorações tivessem resultado brilhantes serem dignos daqueles que os antecederam e souberam lutar, através dos tempos, pelo engrandecimento da sua terra, tendo mostrado, ainda, serem credores do reconhecimento das gerações vindouras. Na elevação com que estas festas decorreram, no brilho e primor que o respectivo Município lhes soube imprimir, actuando em íntima colaboração com a comissão que tomou a cargo a

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realização das mesmas, Bragança - a vetusta cidade -, em galhardia e vitalidade, em fidelidade aos seus princípios e esperança no futuro, em beleza de alma e nobreza de sentimentos, não desmereceu dos tempos de antanho. Bragança foi igual a si mesma.
Encerradas, assim, as festas centenárias, o Chefe do Estado, sempre acolhido com o mesmo respeito e carinho que lhe foi dispensado desde o início da visita ao distrito, prosseguiu esta com a sua ida a Mirandela, Vila Flor e Carrazeda de Ansiães, cujas populações se dirigiram ao seu encontro para, como aconteceu nas outras localidades, lhe tributarem as suas homenagens, correspondendo por esta forma singela, mas significativa, à irradiante simpatia que, com tanta naturalidade, transborda da sua alma de homem simples e afável, mas que, com firmeza e elevação, tão bem encarna os desígnios de Portugal - de Portugal uno e imperecível.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O outro facto digno de nota a que me referi decorreu ainda no distrito de Bragança, no seu Nordeste - precisamente no concelho de Mogadouro - e, ainda, na zona fronteiriça de Aldeadávila, da província espanhola de Salamanca, e teve lugar a 17 de Outubro findo, a propósito da conclusão do aproveitamento hidroeléctrico do Douro internacional.
O simples facto da inauguração do escalão da Bemposta, ainda que se não revestisse de outro conteúdo, constituiria só por si motivo suficiente para se festejar condignamente tal acontecimento, pelo alcance que a obra representa como mais um passo - e de suma importância - para a melhoria de vida das populações, para a prosperidade e engrandecimento do País. A entrada em funcionamento dessa central constitui mais um padrão que veio afirmar, a par da técnica que presidiu à concepção e execução da obra, a aquisição de mais um multiplicador de riqueza e de novos meios de trabalho, que irão, sem dúvida, proporcionar maior conforto e bem-estar aos Portugueses. Este é o primeiro significado que emerge do acto com que se festejou solenemente a entrada em funcionamento da central da Bemposta, o qual se situa no plano económico.
Todavia, a par dele, um outro significado transparece do momento alto que ao País foi dado viver, o qual se estrutura na política actuante e positiva, compreensiva e amiga, firmada em boa hora pelas duas nações peninsulares. Essa realidade, traduzida pela amizade luso-espanhola, evidenciou-se nesse dia, mais uma vez, com a inauguração das centrais de Aldeadávila e da Bemposta, sob a alta presidência dos Chefes de Estado de Portugal e de Espanha, com cujo acto se caldeou mais um elo da sólida corrente que une os dois povos vizinhos e irmãos, que cada vez se estimam mais e melhor se compreendem.
Festejou-se nesse memorável dia 17 de Outubro a conclusão do aproveitamento hidroeléctrico do troço internacional do Douro.
Do ponto de vista geográfico, este rio nasce na serra de Urbião; depois de contornar Sória, levando a sua corrente numa extensão de mais de 900 km, vai desaguar em S. João da Foz, no Porto. Calmo e manso quando percorre os campos abertos de Espanha, onde denota as características de rio de planalto, torna-se impetuoso e de feição turbulenta quando atinge as regiões montanhosas de Portugal, onde corre num vale profundamente encaixado e comprimido por vertentes abruptas. Mas, como alguém escreveu, «na autêntica história de um rio, o que acima de tudo interessa é o homem que ele serve - o homem que o usa e doma às suas necessidades, dispõe dele como de via natural de comunicações, utiliza-o como elemento fertilizante da terra, aproveitando-o na energia do caudal das suas águas, fazendo com elas mover a roda dos rústicos moinhos ou as turbinas das modernas centrais eléctricas, capta-o para as suas culturas de regadio, deita-lhe as redes nos pesqueiros, atravessa-o nas barcas, numa palavra, faz desse rio elemento fundamental de riqueza, de desenvolvimento social e económico. Nisto está a parte viva da sua história, da história que não cessa de evoluir, se continua e projecta abençoadamente no futuro».
E assim, em um destes aspectos, que o Douro, depois de submetido mais uma vez a cuidadosos estudos no campo da técnica e no plano económico, surge ante os nossos olhos com proporções de gigante, detentor de vasta riqueza, que ainda está longe de se encontrar completamente aproveitada na medida integral da sua potencialidade.
Servindo de fronteira natural entre os dois países - a mais antiga fronteira do Mundo -, é, como tal, invocado no tratado de limites entre Portugal e Espanha assinado em Lisboa a 29 de Setembro de 1864 em nome de SS. MM. El-Eei de Portugal e dos Algarves e a Bainha das Espanhas, no qual se reconheceu, o que, aliás, estava fora de discussão, se considerasse comum o treco deste rio compreendido entre as proximidades da ribeira de Castro até à confluência com o Águeda.
Em consequência do estabelecido neste tratado, foram trocadas notas entre os Governos de Portugal e da Espanha, de 29 de Agosto e 2 de Setembro de 1912, aprovando as regras para o aproveitamento industrial da água dos rios nos troços fronteiriços dos dois países, a que se seguiu, quinze anos depois, o Convénio para regular o aproveitamento hidroeléctrico do troço internacional do rio Douro, completado mais tarde pelo estatuto de funcionamento da comissão internacional criada por este Convénio e, ainda, pelo regulamento para execução das obras, mercê do que puderam ser realizados os cinco grandiosos aproveitamentos -três portugueses e dois espanhóis -, entre os quais os inaugurados naquela data, com o que bem se comprova quanto vale e pode e merece o respeito pelos tratados firmados, o mútuo reconhecimento dos direitos de cada um e a correlativa obrigação no cumprimento dos deveres assumidos.
Numa palavra: a estreita e leal colaboração de dois Governos ao serviço de regimes afins e que prosseguem nos mesmos ideais; a seriedade de dois povos que, vivendo ao lado de paredes meeiras, se compreendem e entreajudam como irmãos que na verdade se estimam.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: Como se dizia nas citadas palavras de há pouco, a parte viva da história deste rio não terminou na Bemposta, pois terá de se continuar e projectar no futuro, não apenas pela continuação do aproveitamento dos seus enormes recursos energéticos, mas também pela sua transformação e integração no sistema de transportes da vasta região que ele serve, utilizando-o como via de navegação interior.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: -A navegação fluvial, que outrora desempenhou papel de relevo na economia das zonas atravessadas pelo Douro e que ao presente quase não existe, aguarda se gere o seu renascimento mediante a transformação deste rio em via navegável, em condições técnica

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e econòmicamente favoráveis, de molde a servir de factor preponderante do desenvolvimento da região.

O Sr. Virgílio Cruz: - Muito bem!

O Orador: - Como muito bem salientou o dinâmico órgão de informação O Século, em artigo de fundo publicado ontem, «a navegabilidade do Douro é um problema nacional [...]. É um problema que tem de ser considerado e resolvido». Num país que não é rico, no qual o que essencialmente conta é o homem e o seu trabalho, ...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - ... não poderão deixar de se utilizar, de se aproveitar em extensão e profundidade todos os recursos com que a Natureza nos dotou, modificando-os e adaptando-os com esse trabalho do homem e colocando-os ao serviço do seu conforto e comodidade, dando-se, deste modo, mais um passo seguro na construção da estrutura económica nacional.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continua em discussão na generalidade a proposta de lei acerca do Plano Intercalar de Fomento para 1965-1967.
Tem a palavra o Sr. Deputado Henrique Tenreiro.

O Sr. Henrique Tenreiro: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando, em 1958, subi a esta tribuna para pronunciar algumas palavras sobre o II Plano de Fomento, tive o ensejo de prestar a minha homenagem ao Governo e a quantos participaram na elaboração desse instrumento da nossa política económica.
Seis anos volvidos, não poderei começar por forma diferente a minha intervenção.
O Governo apresenta um novo plano, que, embora de prazo mais curto, prevê investimentos e taxa de crescimento do produto de grandeza muito maior do que nos planos anteriores.
He vela a preocupação, que a todos nos absorve, de realizar mais e mais depressa, para não perdermos a nossa posição num mundo onde o desenvolvimento económico constitui uma das preocupações dominantes.
Elaborado em obediência aos modernos princípios e técnicas de planificação, o Plano considera, pela primeira vez, projecções sectoriais, concede a mais larga audiência ao sector privado e chama à íntima colaboração todas as forcas produtivas do País.
O Plano Intercalar, que o Governo, com o aval prestigioso do seu Presidente, traz à apreciação desta Assembleia, é acompanhado de um notável parecer da Câmara Corporativa, análise portadora de uma crítica construtiva exposta com a elevação e o alto conhecimento técnico que todos lhe reconhecem.
A nossa ambição de realizar poderia levar-nos a traçar um plano mais vasto, mas reconhece-se que é preferível traçá-lo à nossa verdadeira dimensão, exequível na medida do esforço que o País é capaz de dar nos próximos três anos, nos diversos. sectores da actividade, sem esquecer a prioridade das obrigações da defesa nacional.
E por esta óptica que deve ser encarado o projecto do Governo. Possa o País daqui a três anos, liberto já das preocupações que neste momento o absorvem, estabelecer novos programas de desenvolvimento em moldes mais amplos.
Sem deixar de dedicar o maior interesse aos vários aspectos do desenvolvimento nacional, seja-me permitida uma apreciação dirigida especialmente ao sector da pesca, que o Plano individualiza, pela importância que reveste no quadro das nossas actividades económicas.
Circunstâncias da minha vida têm-me permitido sentir o pulsar das actividades da pesca; acompanhar de perto o seu crescimento; assistir à profunda renovação técnica destes últimos anos que incrementou de forma extraordinária a exploração dos recursos marítimos.
A pesca, para além de satisfazer a nossa capitação de pescado, quase o triplo da média dos países da Europa ocidental, fornece matéria-prima para outras importantes indústrias, como a das conservas de peixe, congelados, farinhas e óleos, cujo valor é importantíssimo para a economia nacional.
Também é fundamental a sua influência no volume de emprego, computando-se em mais de 100 000 as pessoas cuja actividade está ligada à produção, transformação e distribuição do pescado.
O sector das pescas pode orgulhar-se de ter conseguido, embora partindo de estruturas muito fracas, um desenvolvimento notável, que tem permitido atenuar no País a carência de alimentos de origem animal. O processo de expansão desta actividade deve-se em grande parte aos programas de reapetrechamento iniciados em 1935, através dos seus organismos corporativos e com a ajuda financeira do Estado.
Portugal tem acompanhado, nos últimos anos, o aumento das produções da Europa ocidental, onde ocupa o oitavo lugar, sendo, no entanto, o primeiro produtor europeu de sardinha e o segundo de bacalhau.
A produção elevou-se de 430 000 t de peixe em 1953 para 529 000 t em 1963. O valor do peixe desembarcado passou de 1 078 000 contos para 1 670 000 contos.
Somos o primeiro exportador de conservas de peixe entre os países membros da O. C. D. E.
Em 1962 as indústrias conserveiras adquiriram cerca de 317 000 contos de peixe, e o valor da sua exportação foi de cerca de 1 200 000 contos.
As pescas exportaram no mesmo ano cerca de 74 000 contos de peixe fresco e congelado, e as importações atingiram aproximadamente 215 000 contos, dos quais 208 000 contos foram de bacalhau, em virtude da grande procura deste produto, verificada principalmente pelo seu baixo custo.
Para bem se compreenderem as realizações programadas no Plano Intercalar, será conveniente uma breve alusão aos programas anteriores.
Entre 1942 e 1952 realizou-se a 1.º fase da renovação e reapetrechamento das frotas, com o investimento de mais de 440 000 contos na substituição e melhoramento de muitos navios de pesca, tendo a Caixa Geral de Depósitos financiado 75 por cento daquela importância.
A partir de 1953, data da criação do Fundo de Renovação e de Apetrechamento da Indústria da Pesca, este programa continuou a fundamentar importante modificação dos meios de produção da indústria, que se afirmava dia a dia mais necessária, à medida que o progresso tecnológico, a corrida à exploração dos recursos do mar e a diminuição do rendimento dos pesqueiros tradicionais obrigavam a pescar o peixe cada vez mais longe e portanto à utilização, de unidades de preço muito mais elevado..

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Entre 1953 e 1958 ultrapassaram 536 000 contos os investimentos financiados pelo Fundo. Os armadores participaram com 42 por cento, excedendo assim substancialmente a participação obrigatória de 25 por cento que lhes competia.
As embarcações de pesca construídas no continente e nas ilhas adjacentes no referido período totalizaram 36 000 t de arqueação.
Prosseguiu também a construção de instalações de secagem e frigoríficas, refinaria para óleos, farinação, depuração de ostras, e dotaram-se muitas embarcações com equipamento radiotelegráfico e sondas electrónicas.
Na 3.ª fase deste programa, que cobre o período do II Plano de Fomento (1959-1964), o investimento total nas pescas tem-se processado ao ritmo médio de 150 000 contos anuais.
Até final de 1963 as realizações atingiram 750 000 contos, somando 394 000 contos os empréstimos feitos pelo Fundo de Renovação e de Apetrechamento da Indústria da Pesca e 356 000 contos a comparticipação dos armadores, isto é, 47 por cento do investimento total. As embarcações de pesca construídas de 1959 a 1963 totalizaram 25 500 t de arqueação.
No Plano Intercalar de Fomento para 1965-1967, aparece um programa de investimentos prioritários de 318 160 contos, a realizar com financiamentos em que intervém o Estado.
Segundo a economia do Plano, o produto interno originado na pesca crescerá à taxa anual de 3,7 por cento e atingirá 1 milhão de contos em 1967. Em 1961 esse produto foi de 817 000 contos.
Referirei em seguida alguns aspectos mais salientes das diversas modalidades das nossas pescas relacionados com os investimentos programados.
A partir de meios de produção inadequados, com que em 1938 se produziu apenas 11 por cento de um consumo de 38 000 t de bacalhau seco, a frota bacalhoeira acha-se hoje em posição de aumentar aquela percentagem para 75 por cento, o que corresponde a cerca de 70 000 t. A plena utilização da capacidade produtiva da frota é cada vez mais difícil de verificar em consequência da quebra nas capturas.
Já há alguns anos que se processa a substituição dos navios bacalhoeiros de pesca à linha por arrastões, imposta por razões de ordem económica e social, o que aumenta a produção de peixes de tamanho pequeno. Aliás, o mesmo fenómeno se verificou em todos os países em que a pesca do bacalhau é uma actividade longínqua.
O esforço de pesca foi muito agravado, devido, principalmente, à concorrência das poderosas frotas de outros países nos mesmos pesqueiros. Em 1958, no Noroeste do Atlântico, a média diária internacional de capturas era de 40 t e em 1963 foi de cerca de 15 t. Também o alargamento das águas reservadas à pesca já começou a fazer sentir os seus efeitos, que se agravarão no decorrer dos anos.
Tudo isto veio aumentar o custo de exploração, impondo a construção de navios de arrasto pela popa, com equipamentos para a congelação, farinação e extracção de óleos, de modo a permitir o integral aproveitamento das capturas. Assim, um arrastão que há alguns anos atrás custava 20 000 contos importa hoje em mais de 45 000.
Estão em construção, fazendo já parte do Plano Intercalar, três grandes arrastões pela popa, os quais ficarão concluídos em 1966.
Para a pesca de arrasto longínqua está prevista no Plano a transformação de cinco arrastões convencionais em congeladores.
Estas unidades, bem como os cinco arrastões congeladores para 600 t de pescado que se encontram em fase de acabamento e cuja construção foi incluída no programa do II Plano de Fomento, destinam-se à pesca em mares distantes, e a sua actividade exige a construção em breve de um navio transportador frigorífico, com capacidade, para 1500 t de produtos congelados, primeira unidade daquele tipo que irá servir também o nosso ultramar.
Para a pesca de arrasto costeira, além dos quatro navios-programados, deverão ser construídas mais sete unidades.
Dois arrastões para a pesca de crustáceos encontram-se já em construção e irão brevemente juntar-se aos cinco navios do mesmo tipo que recentemente iniciaram a actividade.
As embarcações lagosteiras encontram-se em fase adiantada de projecto, mas, por se tratar de um novo tipo de navios, apresentam ainda problemas que vamos procurar solucionar.
Tem sido notável Q desenvolvimento da produção sardinheira em toda a costa, mercê da modernização que vem sendo introduzida nas traineiras, em especial no que se refere às sondas e outro equipamento electrónico e a adopção de redes de fibras sintéticas. Os investimentos previstos no Plana Intercalar destinam-se a continuar esta renovação, esperando-se que o investimento real ultrapasse bastante a verba indicada no Plano.
Mas para a renovação da frota está a ser considerada a introdução de importantes melhoramentos nas traineiras que vão ser construídas em 1965, beneficiações que visam especialmente as operações de alagem das redes, com meios mecânicos, o que permite dispensar mão-de-obra não qualificada, diminuir os custos de produção, aumentar a capacidade de captura e os proventos dos pescadores.
Esta actividade, tem sido a única que no continente não tem conhecido o desejável desenvolvimento. Os processos tradicionais da captura dos tunídeos por artes fixas apresentam rendimento decrescente.
O enquadramento corporativo desta pesca só há poucos anos se tornou possível, mercê do relativo desenvolvimento que vem conhecendo nas ilhas adjacentes, onde é exercida com artes móveis e tem carácter regional.
Importa, porém, imprimir decidido incremento à captura oceânica dos tunídeos, uma vez que estes têm colocação assegurada na indústria conserveiro nacional e nos mercados externos, onde a procura continua firme. Para isso, foram incluídas no Plano a construção de quatro atuneiros congeladores oceânicos e instalações frigoríficas para as pescas longínquas, factor indispensável para a expansão da pesca do atum.

O Sr. Rocha Cardoso: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Rocha Cardoso: - Não pretendo ensinar o padre-nosso ao cura. Sei quanto V. Ex.ª conhece esses assuntos como ninguém, o carinho e o estudo que lhes tem dedicado, o valor que todos lhe dão, exactamente porque às pescas V. Ex.ª tem dedicado toda a sua inteligência e esforço.

O Orador: - Muito obrigado.

O Sr. Rocha Cardoso: - Como. Deputado pelo Algarve, que aliás também me honra de V. Ex.ª o ser, não posso

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deixar passar sem louvar a atenção que a V. Ex.ª tem merecido a pesca do atum, interessando-se pela construção de atuneiros, dada a crise grave que as armações de atum vêm de há anos atravessando, pois estão, por assim dizer, numa situação absolutamente caótica, e a criação dos quatro atuneiros a que V. Ex.ª se referiu são uma esperança algarvia. Por isso, como Deputado pelo Algarve, agradeço a referência que acaba de fazer e a esperança que nos dá numa pesca que é uma verdadeira fortuna algarvia.
V. Ex.ª referiu que já foram gastos 340 000 contos na percentagem dada pelos industriais da pesca, mais os 75 por cento da Caixa Geral de Depósitos. Não há dúvida que as traineiras no Algarve têm uma frota de que nos orgulhamos.
Mas há um problema que V. Ex.ª conhece e que já deu ao Algarve este ano 46 000 contos. Não posso referi-lo aqui novamente, mas V. Ex.ª sabe quanto o Algarve lhe deve nesse sentido; trata-se de uma pesca que necessita de um apetrechamento que não se pode fazer com os 5000 e tal contos incluídos no Plano Intercalar de Fomento.
Continuamos, porém, a ter confiança na acção de V. Ex.ª; esperamos que o Sr. Almirante Henrique Tenreiro faça o milagre da multiplicação dos bons barcos para a pesca, para continuar a repetir-se o milagre dos peixes, que são pão de tantos milhares de portugueses que trabalham no mar.

O Orador: - A poluição das águas do Tejo e do Sado, derivada da instalação de várias indústrias junto das suas margens, vem afectando grandemente os viveiros naturais de ostras e outros moluscos bivalves.
A poluição das águas constitui problema da maior gravidade, pois pode conduzir à extinção das espécies ou à sua inutilização para consumo humano. E indispensável que o Governo tome as necessárias medidas para o resolver e que as indústrias que utilizam as águas marítimas ou fluviais para esgoto das fábricas cumpram rigorosamente o que for determinado.
O aumento da procura nos. países grandes consumidores tem favorecido a exportação das nossas ostras de pequeno tamanho, que só são lançadas no mercado depois de conveniente estágio em parques de crescimento, afinação e engorda.
A recente criação de uma cooperativa de ostreicultores vem melhorando consideràvelmente a exploração e a exportação dos apreciados moluscos e, apesar de todas as dificuldades de poluição já apontadas, espera-se que da construção dos parques de crescimento e afinação programados resulte também o aumento da procura interna.
Até 1958 a nossa pesca artesanal era feita com embarcações à vela e a remos. A partir desse ano foi tomada a decisão de criar uma organização para venda do peixe nos portos de descarga destas pescas, que, nessa altura, se cifrava à volta de 5000 t anuais.
Livraram-se os pescadores da especulação dos vendedores do seu próprio peixe e garantiu-se-lhes o recebimento do produto da venda.
Criada esta organização, foi possível iniciar a modernização progressiva das embarcações, por meio de um sistema de crédito para a compra de motores, casco e redes, e facilitar aos pescadores a propriedade dos seus instrumentos de trabalho.
Os empréstimos são concedidos com as mais amplas facilidades, muitas vezes sem qualquer juro, e a sua amortização processa-se pelo desconto de 10 por cento sobre o valor das vendas, quando estas ultrapassavam o mínimo indispensável para a manutenção do pescador e da sua família.
O êxito deste sistema pode avaliar-se pelo volume das pescas do ano de 1964, que até Setembro já atingiu cerca de 50 000 t.
As condições em que se exercem as pescas longínquas obrigam hoje à existência de bases de apoio em terra para reabastecimento, descanso e mudança de tripulações e pana o armazenamento das capturas, até que as mesmas possam ser embarcadas em navios transportadores frigoríficos.
Para este efeito dispõe o nosso país de territórios para a instalação de bases que permitirão às frotas operar em todos os mares.
A cobertura frigorífica das pescas de arrasto e de atum poderá ser satisfeita inicialmente com instalações de apoio localizadas em Vila real de Santo António, Madeira, Açores, Cabo Verde, S. Tomé, Angola e Moçambique, que constituirão elementos de ligação entre as pescas metropolitanas e ultramarinas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: A distância geográfica que nos separa dos países grandes produtores e as dificuldades de conservação constituíram, no passado, factores suficientes de protecção do mercado interno, mas a liberalização do comércio e a técnica da congelação do pescado vêm contribuindo para tornar o nosso mercado vulnerável, principalmente à concorrência dos excedentes da produção dos países do Norte da Europa, África e Ásia.
Se é certo que a dimensão do nosso mercado e o custo da montagem de uma rede de frio impediram, até certa altura, a invasão maciça dos produtos congelados estrangeiros, a verdade é que, presentemente, essas condições tendem a alterar-se e a concorrência do produto importado pode ameaçar as pescas nacionais, se estas não se defenderem e forem defendidas com medidas idênticas às empregadas por esses países.
Desde o fim da segunda guerra mundial alguns países marítimos vêm construindo frotas cada vez mais poderosas, quer em número de navios, quer em aperfeiçoamento técnico, para satisfazer o consumo interno e principalmente para, através da exportação, desenvolverem não só as pescas como ainda as indústrias relacionadas.
Esse aumento foi estimulado por subsídios à construção naval e prémios de desarmamento, de produção e de exportação, medidas necessárias para fazer frente à concorrência internacional, facilitada ainda por acordos de desmobilização aduaneira e liberalização do comércio.
A política de alargamento das águas reservadas à pesca, além de nos impedir o acesso a zonas onde tradicionalmente os navios obtinham mais de 1/5 dos carregamentos e a outras em que carregávamos mais de 3/4 já nos obrigou a transformar em navios de arrasto as melhores unidades que construímos para a pesca à linha, que capturavam peixe de maior tamanho, a demandar os pesqueiros dos mares sul-africanos, a construir novas unidades e a transformar em congeladores alguns dos arrastões clássicos que actuavam na costa do Noroeste africano.
Esse alargamento das águas estimulou o aparecimento de uma nova forma de concorrência internacional, que se exprime na constituição de sociedades, bases de apoio e empreendimentos mistos.
Embora sob a aparência de cooperação, estes acordos destinam-se apenas a permitir, por meio do embandeira-

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mento dos navios e de outros processos, a infiltração de empresas de pesca estrangeiras e das organizações comerciais a elas ligadas.
Estes factos deverão ser tomados em consideração ao definir um regime de pesca de carácter permanente.
As águas do nosso planalto continental, embora abundantes em espécies pelágicas, como a sardinha, não podem fornecer as elevadas quantidades de espécies demersais que o País necessita.
Tivemos por isso de desenvolver as pescas longínquas e criar uma forte organização industrial, que já dispõe de frotas bem apetrechadas para ir capturar essas espécies aos mares mais afastados. Esta política tem de ser prosseguida, para evitar a importação de peixe e, com ela, a ruína de uma indústria estritamente nacional, onde o País tem investido consideráveis valores humanos e materiais.
O preço mais elevado dos navios destinados à pesca longínqua deve-se ao seu maior porte, à numerosa e complexa aparelhagem com que são apetrechados e Um grande navio-fábrica custa mais de 100 000 contos; um arrastão congelador para a pesca do alto 35 000 contos e um arrastão bacalhoeiro cerca de 45 000 contos, enquanto há apenas cinco anos os valores dos arrastões eram da ordem dos 15 000 e 20 000 contos. Igual proporção de aumento se verifica também nos navios mais pequenos.
Mas outros factores, além do preço dos navios, agravam o custo da produção, em especial a remuneração da mão-de-obra, que vem aumentando continuamente.
Convém referir que a nossa importante indústria de construção naval deve em grande parte a sua expansão às encomendas proporcionadas pelos sucessivos programas de renovação das frotas de pesca. Em especial os estaleiros da província e os seus numerosos operários vivem quase exclusivamente da construção de embarcações de pesca, tanto de ferro como de madeira.

O Sr. Rocha Cardoso: - Inteiramente certo.

O Orador: - E tanto assim é que lhes cabem 85 por cento dos investimentos programados para o sector da pesca.
Há cerca de vinte anos que deixámos de comprar lá fora, quase sempre em segunda mão, os navios das nossas frotas de pesca.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Poupámos divisas e ocupamos mão-de-obra que se afirma hoje perita numa arte em que sempre fomos mestres, com vantagem manifesta para o desenvolvimento regional e para a fixação de populações.
Orgulhamo-nos de construir navios que obtêm as mais altas classificações das sociedades de registo mundiais, e é consolador verificar que a última unidade de pesca construída em estaleiros nacionais é das mais evoluídas no Mundo.
Como acentua o projecto do Plano de Fomento, é indispensável rever, urgentemente, a tributação da indústria da pesca, que vem pagando contribuições em duplicado.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Ao contrário do que acontece noutros países, tem sido ainda a própria indústria a assumir, algumas vezes, o pesado encargo de certas obras marítimas e de apetrechamento portuário, precisamente no momento em que a renovação das frotas, exige avultados investimentos.
O esforço despendido pela produção tem sido grande, e já no corrente ano a pesca não só garantiu o normal abastecimento em peixe fresco, como pôde, pela primeira vez, constituir importante reserva em armazéns frigoríficos, destinada a ser lançada no mercado quando os temporais do Inverno reduzirem a actividade das frotas costeiras e artesanais, ou sempre que a procura de bens alimentares o torne necessário. Para um melhor aproveitamento, a produção deverá desenvolver idêntica acção no sector da comercialização.
Com efeito, se a indústria vem investindo avultadas somas para apresentar o pescado à descarga em condições ideais, não se compreende que a qualidade do peixe se perca só porque um sistema inadequado de comercialização e distribuição, agravado pela falta de melhores instalações e docas, não permita aos navios uma rápida descarga, abastecimento e beneficiações, de forma a regressarem aos pesqueiros com a mínima perda de tempo.
O maior volume do pescado distribuído pelo País é constituído por peixe fresco. Esta distribuição é feita com o emprego dos mais variados meios, num comércio repartido por parcelas tão pequenas que encarece um produto inicialmente barato.
A distribuição e a expansão dos produtos de natureza perecível, como o pescado, são muito dificultadas, logo em primeiro lugar, pelo transporte, com a fixação de zonas de camionagem. Os sucessivos transbordos não só agravam o preço do produto como prejudicam a sua qualidade.
No Plano que agora termina encarou-se uma acção destinada a melhorar a infra-estrutura comercial da pesca, a qual se acentua no Plano Intercalar, especialmente dirigida à montagem de uma rede de frio fixa e móvel, de modo a coordenar a distribuição do pescado, fazendo-o chegar ao interior do País nas melhores condições de frescura.

O Sr. Jorge Correia: - Muito bem!

O Orador: - A armazenagem frigorífica nos principais portos de descarga, que são simultaneamente os que servem os grandes centros consumidores - Lisboa e Porto -, já se encontra em plena realização com as construções das docas de pesca de Pedrouços e de Matosinhos, que ficarão com uma capacidade total de armazenagem de cerca de 10 000 t, a temperaturas de conservação que vão até 25º negativos.
Mas as necessidades estão a revelar-se superiores ao que se esperava, motivo por que foram já considerados, neste Plano, novos investimentos destinados à ampliação daqueles elementos da rede de frio, bem como dos que se encontram localizados nos restantes portos piscatórios, como Viana do Castelo, Aveiro, Figueira da Foz, Vila Real de Santo António e outros, sem esquecer os da Madeira e Açores.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O público raras vezes beneficia dos baixos preços que o peixe alcança nos locais de descarga. No Verão, por exemplo, o preço do pescado pode aviltar-se, mas o consumidor continua a pagar valores desproporcionados.
Poderá parecer simples a solução de fixar preços-base, mas essa aparente facilidade desaparece quando se verifica que são à volta de 180 as classificações por espécies é tamanhos do peixe no nosso mercado.

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Em toda a orla marítima se vende peixe proveniente de milhares de barcos da pesca artesanal, em que na maior parte das vezes não é possível escolher as espécies ou determina: o seu peso.
Daí a dificuldade que tem de vencer-se na marcação de preços-base, que, na fase da venda a retalho, são fáceis de iludir ou de muito difícil contrôle. Acresce ainda a falta de colaboração do comprador, que raramente procura abastecer-se nos postos de venda, aos preços fixados, preferindo comprá-lo à porta a qualquer preço.
A rede frigorífica servirá para melhorar a distribuição do pescado fresco, congelado, inteiro ou em filetes, e ainda para constituir reservas que garantam, no defeso ou nos períodos de mau tempo, a normalização do abastecimento diário.
A organização de transportes móveis que possam levar o peixe, em boas condições, ao interior do País, a diminuição dos intermediários e vendedores ambulantes e o
aumento das vendas poderão ser a solução ideal deste difícil problema.
No pescado congelado, hoje um dos mais importantes produtos alimentares do comércio internacional, verifica-se que as frotas têm sido acrescidas por navios-fábricas, que, além de capturarem o pescado, o congelam, transformam e embalam. O peixe assim transportado é descarregado em portos apetrechados com armazéns frigoríficos e movimentado, à medida das necessidades, por uma rede de frio onde circula sem perda de qualidade até ao consumidor.

O Sr. Sá Linhares: - Muito bem!

O Orador: - Este mesmo sistema, embora sem possuirmos dispendiosos navios-fábricas, está a ser ensaiado no nosso país. Pescamos, congelamos, fazemos filetes e, embora em pequena escala, utilizamos uma rede de frio de armazenagem e distribuição.
Há, porém, que vencer a rotina dos consumidores habituados a adquirir peixe inteiro, demonstrando que os filetes congelados são efectivamente económicos.
Embora sejam vendidos por um preço mais elevado do que igual peso de peixe inteiro, deve ter-se presente que a operação de filetagem já beneficiou a sua apresentação, excluiu todo o desperdício e facilitou consideràvelmente a preparação culinária.
Sr. Pesidente: Recomenda o projecto do Governo a necessidade de reorganizar as estruturas do sector e das próprias empresas armadoras para se alcançar mais elevado nível de produtividade.
Aquela reorganização terá de iniciar-se nas infra-estruturas científicas e técnicas, dotando-as com os meios indispensáveis para o tipo de investigação aplicada de que as pescas carecem.
Entre eles, são fundamentais o navio de pesquisas e a construção de uma estação de tecnologia piscatória.
A defesa dos interesses e pontos de vista nacionais, na discussão de medidas regulamentadoras da actividade das pescas em águas internacionais, no âmbito das convenções a que Portugal está vinculado, só poderá ser eficazmente empreendida quando apoiada em conhecimentos obtidos por meios de investigação especializada, que necessita de maior desenvolvimento.
Ocioso se torna salientar que essas infra-estruturas são condição fundamental para a utilização racional dos meios de produção.
O Instituto de Biologia Marítima e o Gabinete de Estudos das Pescas necessitam de aumentar os meios humanos e materiais pára a realização dos tipos de investigação de que as pescas carecem.
Também é indispensável ampliar a acção das escolas de pesca que temos em funcionamento, aumentar o número de alunos pescadores e ministrar-lhes os conhecimentos exigidos pelas novas técnicas e pelo manejo dos modernos equipamentos dos navios.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E, principalmente, nos sectores da investigação aplicada e da preparação profissional que se pede ao Estado mais larga acção impulsionadora, como sucede em todos os países em que as pescas constituem indústrias básicas, ou os meios indispensáveis para que seja a própria indústria a promover a sua realização.
Sem deixar de reconhecer que é ainda baixo o nível económico de muitas empresas e deficiente a organização de outras, deve salientar-se a acção das sociedades armadoras constituídas nestes últimos anos para a realização de empreendimentos que requerem a mobilização de avultados meios financeiros. Constituíram-se também mútuas e cooperativas de armadores e pescadores e empresas distribuidoras de produtos da pesca. Os empreendimentos de muitas dessas organizações e a sua contribuição para a produção atingem já valores que justificam o acerto das iniciativas e atestam a capacidade de organização que o sector da pesca tem revelado.
O Plano propõe, finalmente, que se adoptem medidas com vista à racionalização dos circuitos de distribuição do peixe no mercado interno e a promoção de vendas nos mercados externos a que já nos referimos.
Quanto às exportações de peixe fresco, elas têm sido provenientes quase exclusivamente das pescas artesanais, e de espécies que o nosso mercado não aprecia, ou que pelo seu elevado preço não são essenciais ao abastecimento público.
Justifica-se, pois, ampliar esta valiosa fonte de divisas com os produtos de maior interesse para os mercados externos. Daí não resultarão carências no consumo interno, dado que os novos navios planeados não só aumentarão as quantidades de peixe desembarcado em nível muito superior às prováveis exportações como assegurarão maior regularidade no abastecimento, visto uma parte importante da sua produção se apresentar sob a forma congelada; mas aqui também o Estado tem de ajudar a exportação, como o fazem os outros países, na procura dos mercados e na colocação dos excedentes de peixe.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O facto de a execução dos programas anteriores ter ultrapassado as previsões não significa que aqueles programas foram sistematicamente estabelecidos por defeito. Pelo contrário, os mesmos foram inicialmente considerados ambiciosos no que respeita ao número e ao valor dos empreendimentos, à capacidade financeira da indústria e até quanto à própria, capacidade do mercado.
O prestígio adquirido pelo sector com a execução dos seus programas de desenvolvimento reflectiu-se na própria banca privada, que actualmente financia parte importante dos investimentos, o que possibilita melhor repartição do esforço financeiro.
A experiência do sector das pescas e a capacidade realizadora de que tem dado provas permitem antever que

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os investimentos prioritárias inscritos no Plano Intercalar de Fomento sejam integralmente realizados, e até antecipados outros empreendimentos, que não têm aquele carácter sem contudo deixarem de apresentar grande interesse para o progresso das pescas nacionais.
Sempre se acentuou a necessidade de ir além das realizações de primeira prioridade e insistir, de modo especial, nas que se prendem com os sectores da investigação e da preparação profissional, que não foram consideradas neste Plano Intercalar mas que apresentam o maior interesse para a expansão das pescas nacionais.
Só teremos vantagem em antecipar essas realizações, para não sermos ultrapassados na corrida aos recursos do mar e melhorarmos as condições de defesa perante uma concorrência internacional cada vez mais agressiva.
Quem estudar as características das pescas e se debruçar sobre os relatórios da execução dos seus programas de desenvolvimento verificará que além da fortuna do mar e das dificuldades em manter a frescura, de um produto que se inutiliza rapidamente, a indústria é afectada por circunstâncias adversas, como pesados encargos fiscais, restrições nas áreas de pesca, assoreamento dos portos e a falta de uma melhor investigação científica à altura das necessidades.
Fácil será verificar que a alavanca impulsionadora do todo o desenvolvimento foi a considerável ajuda dos Planos de Fomento, que tornou possível abastecer o País com um alimento barato, em tal quantidade que a nossa capitação de peixe só é ultrapassada, na Europa, pela Islândia e Noruega. Foram ainda e por mais de uma vez as pescas que resolveram ocasionais situações de carência de outros produtos alimentares, constituindo assim um recurso para tais emergências.
Ninguém poderá contestar que essa posição se deve à inteligente orientação do Sr. Ministro da Marinha, que há longos anos vem dedicando o seu melhor esforço à organização corporativa das pescas.
O Sr. Ministro da Economia tem dado também o seu melhor apoio às actividades das pescas, valioso contributo que esperamos continue a ser dispensado para o melhor aperfeiçoamento, dos circuitos de comercialização.
Se não fora também o apoio dado pelo Sr. Ministro das Finanças aos planos de desenvolvimento, as nossas pescas apresentariam ainda hoje característica nitidamente artesanal e o País estaria a despender vultosas divisas para a obtenção de um produto que é indispensável na sua dieta alimentar.
Por tudo o que acabo de expor, dou o meu entusiástico voto de aprovação ao projecto de Plano Intercalar de Fomento para 1965-1967, o qual exprime a continuidade de uma política, séria e fecunda, que há 30 anos vem sendo definida por um chefe de incontestável visão e do mais alto espírito patriótico. Esta política tem-nos orientado nos caminhos que conduzem aos padrões de vida que ambicionamos e alcançaremos se pusermos nu sua execução aquela dedicação que se deve a todas as obras dirigidas ao engrandecimento do País.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Este Plano surge como manifestação de vitalidade e de força. Pode proclamar-se que o País sabe conciliar o esforço de defesa do seu património com o esforço de fomento. Nunca houve retraimento para defender a integridade nacional. Não o tem havido na execução dos Planos de Fomento. Bem pelo contrário, a Nação inteira tomou plena consciência de que a luta só será vitoriosa no campo militar se nas oficinas, nos campos, nos lares e nos mares os corações só tiverem um pensamento: continuar Portugal!
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. André Navarro: - Sr. Presidente: As minhas primeiras palavras são de respeitosa saudação para a prestigiosa figura nacional que preside a esta alta assembleia política.
Está em discussão na generalidade um diploma de notável projecção política e económica, o instrumento legal relativo a um novo plano de fomento para um período d? três anos, a iniciar em Janeiro de 1965.
A forma criteriosa como foram elaborados os relatórios sectoriais e os estudos complementares, por grupos de trabalho e por departamentos especializados, envolvendo centenas dos mais destacados valores da intelectualidade portuguesa, dispensam-me, nesta discussão na generalidade, de entrar em desnecessários pormenores.
Quero deixar, ainda, nesta tribuna, ao iniciar as considerações que me proponho fazer, mais uma palavra, esta de apreço pelo elevado nível do parecer da douta Câmara Corporativa e pela forma criteriosa e inteligente como o ilustre presidente da Comissão de Economia e nosso muito distinto e ilustre colega, Dr. Ulisses Cortês, conduziu as trabalhosas sessões do estudo da Comissão que foi designada para o estudo deste diploma.
1. Situa-se a proposta de lei em discussão relativa ao Plano Intercalar de Fomento para 1965-1967 na sequência do II Plano de Fomento Nacional e antecedendo, como prólogo, o planeamento em estudo, para vigorar a partir de 1967, com a designação de III Plano de Fomento.
O Plano Intercalar, compreendendo um conjunto de medidas financeiras e económico-sociais sugeridas pelo Governo, incidindo sobre os sectores público e privado, reflecte, entre outros, dois aspectos que lhe imprimem feição peculiar.
Em primeiro lugar, a curta dimensão do espaço de tempo em que se projecta limita, como é óbvio, a amplitude de certos empreendimentos.
Como segundo aspecto a considerar, e digamos corolário do primeiro, a técnica de planeamento económico-social denunciada nas suas linhas fundamentais e as estruturas qualitativa e quantitativa das fontes de financiamento previstas terão de ser, em larga escala, definidas pelas coordenadas da actual conjuntura, quer as relativas ao espaço económico português, quer as referentes a espaços maiores em que o ambiente nacional se projecta e integra.
Por tudo o que fica dito, o Plano Intercalar de Fomento é assim, tipicamente, um plano de conjuntura, modelo de planeamento de resto já hoje seguido em algumas nações mais evoluídas da Europa ocidental. É o caso da França, entre as mais destacadas.
2. A intenção dominante que revela o diploma em discussão de aceleração, a todo o custo, do ritmo de acréscimo do produto bruto nacional, diz-nos que o Governo, com a proposta em discussão, preconiza uma política económica no sentido de se conseguir acréscimo significante dos recursos necessários para manter, em condições de êxito, a luta que o País está travando, em várias frentes, contra inimigos de diversas matizes, num mundo de incompreensões, dominado por imperialismos e despotismos dos mais violentos.
Assim, o Plano Intercalar é, de facto, um planeamento com características conjunturais, de feição eminentemente

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nacional, e com larga contribuição, quanto ao investimento, do sector privado.
3. Porém, o acréscimo desejado do produto bruto nacional como sustentáculo na manutenção da luta que nos foi imposta na defesa do património secular da Nação, acompanhado de uma repartição mais equitativa do rendimento, não altera, contudo, de qualquer forma, a directriz que tem comandado o desenvolvimento económico e social em que toda a Nação anda empenhada desde os alvores da Idade Nova.
Campanhas de produção agrícola, repovoamento florestal das serras, das dunas e dos baldios, realização maciça de infra-estruturas em sectores extensos da metrópole e do ultramar, melhoramentos agrícolas, largamente difundidos, etc., digamos este extenso caminho já percorrido e que tem permitido, ao longo de mais de um trinténio, a melhoria económica e social da Nação, continuará a ser o rumo a nortear o acréscimo do nível de existência do povo português.
O total dos investimentos previstos, ultrapassando, mesmo, por forma marcada, os anteriormente despendidos, em períodos mais latos, correspondentes ao I e II Planos de Fomento, mostra, assim, por forma iniludível, a solidez financeira da Nação, delineada e consolidada pela sábia política de Salazar.
E essa política - que alguns teóricos da ciência económica julgam ultrapassada, apresentando «elixires» mais ou menos socializantes para estímulo das economias subevoluídas, admitindo mesmo, alguns deles, desequilíbrios saudáveis, segundo dizem, de despesas e de receitas, com pendor marcado para as primeiras - tem acabado, porém, sempre, por se impor como a única política séria para conseguir o real desenvolvimento económico das nações.
De resto, faz parte do arsenal dos nossos inimigos, digamos melhor, dos inimigos da civilização ocidental, como arma das mais perigosas nas suas ofensivas da guerra fria. a largamente empregada pelo comunismo internacional, ao pretender atingir o mais seguro fundamento financeiro e económico das nações capitalistas - a solidez e o consequente prestígio das respectivas moedas. E a mais recente ofensiva contra a Nação Portuguesa -- a de 1961 - continuou a encontrar o mesmo forte baluartti a contrariar os desígnios dos nossos inimigos, não passando, como disse o Sr. Ministro da Economia, de uma forte sacudidela, a que a economia da Nação, saudàvelmente e valorosamente, resistiu. O escudo português mais uma vez protegeu e salvou a Nação, nos momentos mais graves da crise angolana.

4. O Plano de Fomento, cujo instrumento legal está em discussão nesta Assembleia Política, é, como disse, um planeamento de carácter conjuntural, em que se dá prioridade absoluta aos encargos da luta armada que somos obrigados a manter na defesa dos superiores interesses da Nação.
Para melhor fazer alguns apontamentos sobre sectores do maior interesse no planeamento económico-social previsto, será mister definir primeiro, em breve síntese, as características políticas e económicas da actual conjuntura, na qual se irá enquadrar, no próximo triénio, o planeamento a executar nos sectores primário, secundário e terciário da Nação.
«Coexistência pacífica» é talvez a expressão que corre mundo e que melhor define um estado de espírito que a propaganda soviética, cientificamente concebida segundo as normas derivadas dos mais avançados conhecimentos da ciência psicológica, tem sabido incutir na alma dos povos dê todos os recantos do mundo civilizado. Digamos, por outras palavras, e já dilatando o sentido inicial dessa propaganda, corre também o mundo o slogan que dominou, largamente, durante semanas, a atmosfera política eleitoral nos Estados Unidos da América - «a paz a todo o casto por qualquer custo».
Foi esta atitude do comunismo russo, aceite pelas altas esferas ocidentais, a que os marxistas ortodoxos da China vermelha não aderiram, diga-se de passagem, que tem permitido à Rússia Soviética os indiscutíveis êxitos nas ofensivas da guerra fria, alargando em curto período a sua área de influência política e económica a extensas zonas do Médio Oriente e do continente negro.
Zauzibar constitui, por exemplo, neste momento, o ponto de partida mais saliente de novas ofensivas russas, agora dirigidas para o Sudeste africano e tendo como objectivo final a África do Sul, melhor diremos, as riquezas incomensuráveis desse jovem país, destacado da coroa britânica por influência da propaganda anticolonianista, apoiada e dirigida pelo comunismo internacional e socialismo dos povos nórdicos, com o apoio declarado da América do Norte.
Cuba e Zanzibar serão, assim, num futuro próximo, os dois maiores porta-aviões em que o império moscovita se apoiará para tentar dominar, no epílogo da sua histórica luta pelo domínio do Mundo, o espaço, anglo-americano, depois de reestruturada e vigorizada a sua economia segundo modelo mais próximo do capitalista e que já hoje se pode desenhar nas suas linhas mestras. E o que é interessante apontar é que os dois núcleos de expansão política e económica russa, a que a China comunista se pretende associar como parceiro mais pobre, é certo, embora potencialmente mais valioso, foram erigidos com o indiscutível auxílio das duas nações de língua inglesa.
Esses dois gigantescos porta-aviões, fáceis de minar, para a instalação subterrânea de mísseis, de todos os tipos, constituirão, de facto, ponto de partida de armas das mais destruidoras, apontadas com perigo iminente, não só para a África portuguesa, no caso de Zanzibar, rnas especialmente para a África do Sul, e para os Estados Unidos e Canadá, no caso de Cuba.
Em relação à África portuguesa, digamos de passagem, o interesse russo-chinês não residirá, propriamente, só na aquisição de novos territórios, potencialmente ricos, mas muito para além desse objectivo material a destruição de um regime político que, pela clarividência do seu Chefe e valimento do seu povo, soube erguer-se ao lado da nação espanhola como o mais sólido guardião da civilização ocidental, neste momento culminante da história contemporânea.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O flanco sul da Europa ocidental, já neutralizado, em grande parte, pela comunicação da Argélia, está agora também na iminência de ser atingido pela passagem do Chipre para a órbita comunista, abrindo definitivamente as portas do Mediterrâneo ao espraiar da onda eslava.
E para todo este descalabro político que se vem verificando desde o desastre do Suez contribuem, poderosamente, dentro e fora do reduto comunizante da O. N.º U., responsáveis anglo-americanos que fazem parte de várias organizações políticas e apolíticas do Ocidente e cujos vultos mais activos, alguns já identificados como verdadeiros militantes comunistas, foram os principais instigadores das malfadadas decisões das conferências interaliadas reunidas no epílogo da última conflagração mundial. Isto quanto a posições estratégicas conquistadas recen-

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temente, pelo mundo comunista, não referindo mais em destaque, por ter sido, felizmente, subjugada, a sub-versão da América do Sul, quando se adivinhava já a queda da mação brasileira, entregue nas malhas dessa rede bem estruturada do comunismo internacional, subjugada, digo, pelas forças armadas da nação lusíada, que souberam expulsar a tempo os criminosos agentes socialistas e comunistas que cavariam a ruína da nação irmã. Aqui foi, talvez, a precipitação dos agentes da China vermelha a causa desta significativa derrota.
Não menos importantes para a estratégia da guerra fria são, contudo, os complexos problemas correlacionados com o abastecimento dos povos para além da «cortina de ferro», naqueles géneros duráveis e de maior potencialidade nutritiva e que constituem suprema garantia de salvação para o sustento das populações em épocas de crises graves. Entre todos os alimentos deste tipo, destacam-se os cereais panificáveis - especialmente o trigo.
A necessidade de reforçar com mão-de-obra especializada a indústria pesada russa, trabalhando, fundamentalmente, esta, para equipamentos de guerra e para as infra-estruturas correlacionadas com o mesmo objectivo, levou a Rússia Soviética e alguns países satélites a descurar a produção cerealífera, entregue, nas explorações colectivistas, aos menos aptos e menos interessados, por falta quer de incentivo do lucro quer pela ausência da iniciativa privada, circunstâncias fundamentais ao progresso de quaisquer actividades produtivas.

O Sr. Virgílio Cruz: - Muito bem!

O Orador: - Este facto, conjugado com anos cerealíferos normalmente deficientes devido a um irregular decorrer da meteorologia estacionária, deu como resultado uma quebra significativa na produção de cereais, especialmente no ano de 1963, no grande celeiro que foi o da Europa inteira.
Logo, porém, que o facto se deu, esta brecha perigosíssima de material estratégico, aberta na defesa do mundo soviético, foi, imprudentemente, colmatada pelos exportadores americanos do Norte e do Canadá. E assim o trigo transitou rapidamente dos silos do Ocidente para os do mundo comunista, muito dele transportado em barcos russos, estando agora bem guardado contra explosões atómicas em instalações subterrâneas a prova de radiações.
E quando é necessário prover ao alimento dos vários Fidéis esfomeados pela insensatez das suas políticas agrárias, lá vai o trigo americano e canadiano mitigar a fome esses pobres desgraçados, pelo visto merecedores do maior respeito dos responsáveis máximos pela política do Ocidente nesta amistosa coexistência pacífica.
São aspectos dessa coexistência que só os acordos que não vieram à luz do dia poderão um dia revelar, no revolver dos arquivos, explicando muito do que agora é, politicamente, incompreensível.
Ficarão essas explicações, certamente, para definir, perante a história, como até na concepção da política da mentira é necessário, com verdade, urdir planeamentos, científicos e técnicos, seguros e insusceptíveis de serem alterados e diminuídos, na sua efectividade, pelas discussões prolongadas e estéreis nas instituições que constituem a base do processo político das democracias ocidentais.
E já não falo do neutralismo positivo, fórmula mágica achada por países subdesenvolvidos, satélites da Rússia Soviética, e que têm interesse em continuar a receber o auxílio material do Ocidente.
É o caso da Índia, da, B. A. U., da Argélia, da Abissínia, da Jugoslávia e do inúmeros pseudo-estados do continente negro.
Este é, em suma, nas suas linhas gerais, o fácies político da presente conjuntura.
5. Vejamos agora o que será possível dizer, como antevisão, da conjuntura económica que enquadrará o planeamento intercalar português.
Quatro grandes espaços económicos, em ritmo de progressivo crescimento, evidenciam-se no momento presente.
Um, caminhando, demogràficamente, a passos largos, para o bilião de habitantes. É potencialmente, decerto, o mais forte. Aí reside e residiu, desde longa data, um perigo que já antepassados de várias gerações do Ocidente chamaram o «perigo amarelo». Realizando uma profunda, revolução nas suas estruturas política, económica e social, segundo o modelo mais ortodoxo do marxismo-leninismo, a China vermelha, dominando a relutância da grande maioria agrária do seu povo. implantou, por forma das mais violentas, um regime de acentuada ditadura de elites urbanas, intelectualizadas pelos métodos russos de assimilação da juventude.
E caminhando num rumo paralelo ao da Rússia Soviética, a China vermelha encaminhou, desde logo, as suas energias, potencializadas em imenso território, para um rumo dirigido, fundamentalmente, para as infra-estruturas de uma economia orientada no sentido de criar, em curto espaço de tempo, meios poderosos de acção bélica.
População paciente e sofredora, de poucas exigências alimentares e- em bens de consumo sumptuários, a China continental, lutando com a pobreza de um território largamente delapidado pela erosão vai arrastando, assim, a sua triste sorte, queimando, neste sacrifício inglório, a totalidade de uma geração agrária em holocausto a ideais já ultrapassados pelos seus pares da revolução comunista.
Surge, porém, como era de esperar, nesse espaço imenso uma nação que, acordando de um sono letárgico de milénios e a braços com um território empobrecido, tem o seu pensamento político fortemente influenciado pelo vírus da conquista de terras mais úberes.
E, por isso, as suas vistas se voltam, desde logo, para o Norte russo, ferindo a sensibilidade patriótica do seu parceiro comunista, fazendo, por outro lado. experiência das suas forças militares, pondo, em fuga desordenada os exércitos do Indostão, e embarca, permitam-me a expressão, pois já- oceanos separam, de facto, o ponto de partida da suas investidas, digo, para perigosas empresas ultramarinas, africanas e sul-africanas.
A explosão da sua primeira bomba atómica é a declaração universal de que a China é também candidata aos frutos do neocolonialismo russo e de outros países que se têm destacado nesse ambicioso caminho e que reflectem os seus desejos de conquista nas assembleias sui generis da O. N. U. e nas conferências neutralistas de Adis Abeba e do Cairo.
Não é possível, porém, para definir o estádio actual da sua economia, apresentar números-índices das principais actividades produtivas. Continua, de facto, todo esse extenso espaço oriental mergulhado na mais densa neblina, caracterizada, por um ocultismo impenetrável.
Vejamos então o que se refere aos três restantes espaços económicos do inundo contemporâneo - os Estados Unidos, a Europa ocidental e a Rússia Soviética - e façamos rápida comparação das suas potencialidades produtivas, para aferir dos respectivos valores, e algo sobre A relatividade das suas posições na economia mundial.

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[Ver Tabela na Imagem]

Com populações comparáveis, os «dois blocos ocidentais equivalem-se, de facto, assim, nos domínios da economia, dominando por forma nítida o bloco russo em potencial produtivo.
Apenas a fraqueza da Europa se salienta quanto a algumas matérias-primns e alimentos de base do homem e dos animais domésticos, compensada, contudo, largamente pelas ligações ainda existentes com os centros produtores africanos e a de outros continentes.
Contudo, enquanto a economia americana se desenvolve em espaço nitidamente mais amplo do que a europeia, as actividades económicas deste último bloco têm ainda a diminuí-las em dimensão de mercado as inúmeras fronteiras que o parcelam em espaços significativamente menores.
O Mercado Comum constitui, porém, a primeira, grande e bem sucedida tentativa para acréscimo do ritmo de desenvolvimento das actividades industriais da Europa ocidental, estabelecendo regras seguras para a integração progressiva das economias dos países mais evoluídos da Europa industrial, ficando, porém, ainda de fora, além da Espanha, os países associados que constituem a zona de comércio livre.
Natural é, porém, que os níveis já atingidos de melhoria sensível das condições de existência dos povos da Europa, dos Seis e os progressos evidentes dos resultados obtidos na Europa dos Sete, agora em crise passageira pelas medidas unilaterais levadas a cabo pelo Governo Britânico, determinem a generalização da integração económica europeia a todos os países industriais e agrícolas do velho mundo. E não será mesmo de considerar fora da linha de rumo o que já hoje se adivinha, como tendência, em alguns países socialistas localizados para lá da «cortina de ferro», que esse movimento de integração económica os venha também abranger num futuro próximo.
Difícil é, na realidade, admitir, por exemplo, que a diferença de condições de existência dos povos altamente evoluídos das duas Alemanhas e de outros países comunistas europeus se mantenha por virtude da força de uma situação artificial que, na própria Rússia, será impossível de continuar a ignorar e manter - isto é, o domínio de densas massas populares, de reduzido poder de compra, por minorias dos partidos comunistas e por sectores restritos do funcionalismo militar, técnico e administrativo, actuante nos sectores de defesa nacional, das indústrias e dos serviços.
A grave crise da agricultura soviética e de outros países balcânicos situados nos territórios férteis do Sudeste europeu não tem outra causa determinante. E, especialmente, ela é evidente quando comparamos o declínio da produção cerealífera colectivizada com a produção de géneros hortícolas, produção leiteira e de ovos, concedida, no período khruschtchevieno, aos agricultores russos, em regime de economia de mercado.
Assim, cerca de 70 por cento destes géneros, fundamentais à alimentação dos povos eslavos, são hoje, na realidade, conseguidos nas explorações privadas pertencentes a famílias camponesa» que trabalham nas propriedades colectivas e do Estado.
Circunstância semelhante se verifica noutros sectores de economia dos países comunistas, onde já estão dados os primeiros passos para restabelecer a liberdade de iniciativa das empresas dentro de um planeamento relativamente elástico e restabelecido mesmo, em algumas delas, o incentivo do lucro, por enquanto a título experimental.
Não nos devemos, pois. admirar assim que, com ou sem o apoio dos ortodoxos do marxismo estaliniano, a economia da Rússia Soviética e dos seus satélites europeus venha a ultrapassar, dentro em breve, no seu regresso a normas capitalistas, o socialismo nórdico, no caminhar para uma economia mais evoluída de mercado, em que será reservada, certamente, à iniciativa privada, dentro dos limites do interesse colectivo, aquela liberdade que constitui o fulcro do progresso dos países ocidentais.
A «Bonda Kennedy», como é designada a tentativa do falecido presidente americano de liberalizar, por diminuição progressiva dos direitos de importação, inúmeros bens, que marcam real destaque no comércio internacional do Ocidente, representa medida que constituirá, sem dúvida, ponto de partida efectivo para a constituição de um forte bloco económico-social do Ocidente.
Contudo, todos os países procurarão ainda manter, no que se refere a produtos agrícolas fundamentais, a defesa da economia do sector agrário e com particular destaque para o cultivo dos cereais panificáveis e forraginosos, produção de proteínas animais e outros géneros agrícolas de largo consumo. Não tem sido outra, por exemplo, a este respeito, a posição da Alemanha Federal perante as recentes dificuldades intestinas do Mercado Comum, e a luta dura travada recentemente pela Roménia com a Rússia Soviética na defesa da sua produção cerealífera, subestimada, no seu valor, pelo vizinho russo.
Com o progressivo crescimento económico dos países ocidentais, mais evoluídos debaixo do ponto de vista industrial, constituindo pólos bem destacados de desenvolvimento económico, irá manifestar-se um outro fenómeno que já hoje começa a verificar-se em alguns países da orla mediterrânea e do ocidente peninsular e que é mister referir - o desenvolvimento industrial cada vez mais acentuado dos países agrários, tomando frequentemente como ponto de partida dessa evolução sectorial o progresso das indústrias, como a dos têxteis e outras de menor rentabilidade, colmatando assim vácuos deixados no mercado internacional pelos países altamente industrializados, onde os investimentos procuram benefícios cada vez mais avultados, ou então actividades em que a cobertura agrícola e florestal desses países agrários faculte condições de mais baixo custo da produção, como a tecnologia da pasta do papel, do milho, dos sumos de frutos, etc., e outras actividades industriais do mesmo tipo. E, ao mesmo tempo que se opera este, migração centrífuga de actividades, a partir desses pólos de desenvolvimento económico, dar-se-á movimento centrípeto da população activa, procurando nos países mais evoluídos colmatar o vácuo deixado pelos trabalhadores mais qualificados que se deslocam para indústrias de maior rentabilidade e de mais

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elevados salários e para os serviços menos pesados ou mais atraentes.
Não é outra a origem nem o sentido da migração dos trabalhadores, que já hoje se verifica com excepcional intensidade do Sul, do Sudoeste e do Oeste da Europa para os países industriais da bacia do Ruhr, deslocando-se essas centenas de milhares de indivíduos não só para os centros industriais mais evoluídos, como ainda para zonas agrícolas progressivas, onde o trabalho braçal ou os cultivos pouco mecanizados exigem ainda, em larga escala, mão-de-obra menos qualificada.
Julgo que nesta breve síntese fica suficientemente exposto o panorama da conjuntura económica do mundo em que vivemos, no que se refere aos grandes movimentos que é mister denunciar para melhor definir as coordenadas do actual momento económico, e estabelecer assim o verdadeiro sentido da sua evolução nos tempos mais próximos.
Digamos, resumidamente, em conclusão. Desenvolvimento industrial no sentido de uma maior rentabilidade dos investimentos nas regiões mais evoluídas, com transferência progressiva de actividades industriais menos rentáveis para zonas agrárias mais atrasadas, e movimento inverso das populações operárias menos qualificadas dos sectores primário c secundário dirigindo-se para os centros de actividade mais progressivos, colmatando vácuos de mão-de-obra. Por outro lado, eliminação progressiva dos artifício? que dificultam ainda hoje a circulação das gentes e dos bens e todo este movimento realizado com a- defesa cautelosa daqueles bens de consumo, fundamentais à vida dos povos, e considerados elementos destacados da sua resistência e segurança, nos períodos de maiores vicissitudes.
Eis, em conclusão, as características que julgamos definir a actual conjuntura.
Quanto aos movimentos económicos alternantes e cíclicos no seu arfar, assistimos hoje a mais uma situação marcadamente inflacionista que os grandes espaços económicos tendem a generalizar, quanto a amplitude e intensidade, mas que a técnica económica e financeira permite também reduzir nos seus perniciosos efeitos, especialmente nas condições de existência, das classes menos resistentes da população.
6. São estas considerações prévias definidoras da conjuntura que permitirão melhor apoiar, agora, o que julgo ser de interesse tratar na análise de aspectos muito gerais, políticos e económicos, do diploma posto à superior consideração desta assembleia, política.
Encontra-se o País, como se depreende da leitura do plano trienal intercalar, perante um novo planeamento económico-social em que se prevê um vultoso investimento público e privado, da ordem dos 34 milhões de contos para a metrópole e, de 14 milhões de contos para as províncias do ultramar.
Não é minha intenção, até porque ultrapassaria, certamente, o tempo regimental, procurar fazer uma análise profunda de todos os sectores planificados das economias metropolitana e ultramarinas. Apenas me ocuparei, assim, em rápida análise, de alguns aspectos mais salientes das actividades que maior influência poderão vir a ter no desenvolvimento económico do País.
Como prólogo do que se segue, direi, desde já, que, na orientação da minha exposição, parto do princípio de que a Nação terá de seguir, com a necessária cadência, os passos sucessivos de uma contínua integração económica. Inicialmente a integração do todo nacional de aquém e de além-mar, depois a integração peninsular, que julgo terá sido já, brilhantemente, iniciada pelos ilustres Ministros da Economia e das Comunicações, a quem presto desta tribuna as minhas homenagens. E todo este difícil caminho antes de se atingir a integração no complexo europeu.
Na realidade, não teria significado compreensível se, em pleno movimento de integração ocidental, os dois países peninsulares continuassem a ignorar-se mutuamente, no que se refere às suas economias, intimamente interdependentes nos seus processos de desenvolvimento.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Que não se considerasse, por exemplo, que os rios que nascem na vizinha Espanha e vão desaguar nas costas portuguesas não fossem todos hidrográficos, no sentido económico e social dos seus aproveitamentos, a que, por exemplo, a energia hidroeléctrica sobrante de um país ou o alimento que cresce em relação ao consumo de qualquer deles não pudesse ser utilizado, nas melhores condições, pelo seu vizinho. Se assim não fosse, decerto não acreditaríamos também no êxito conseguido já, há muitos anos, no aproveitamento económico das bacias hidrográficas do Tenessi e do Missuri, nos Estados Unidos da América, ou então que a Bélgica, a Holanda ou o Luxemburgo, a França, a Alemanha e a Itália, não teriam já tirado largos benefícios, económicos e sociais, da sua, boa vizinhança económica.
E, ainda mais, que indústrias ou aproveitamentos energéticos, que exigem mercados mais amplos, como as unidades produtoras de energia nuclear, petroquímica e outras, não pudessem contar, em qualquer dos países vizinhos, com um mercado dotado da necessária dimensão económica.
E se assim entendemos, com as restrições já postas para as fases de passagem nesta integração progressiva, teremos talvez forma de, em poucas palavras, definir o nosso modo de ver acerca do planeamento projectado.
Direi então:
O movimento de integração em curso levará a Nação a uma economia de mercado de espaços amplos. Terão, assim, de se evitar todos os artifícios que conduziriam, certamente, mais cedo ou mais tarde, o País a uma delapidação dos seus capitais e a uma consequente redução da rentabilidade dos investimentos.
Sendo Portugal uma nação plurirracial e pluricontinental, é mister procurar ainda, por prospecção adequada, escolher em cada caso, com grande discernimento, os locais para o estabelecimento de novos núcleos do desenvolvimento económico, por forma que os custos da produção não determinem preços que se afastem muito dos níveis da concorrência internacional.
Dentro das possibilidades e potencialidades de nova economia, é mister continuar também a polícia de equilibração do crescimento económico, reduzindo as assimetrias espaciais, por regionalização adequada dos planeamentos, evitando os actuais ressaltos, quer na metrópole quer no ultramar. Não devemos esquecer, contudo, que já hoje somos entre os países menos dotados econòmicamente dos que mais contribuem para o desenvolvimento das regiões menos evoluídas, ultrapassando mesmo outros países, como a França, que dispõem da recursos económicos muito mais avultados.
Por outro lado, como cada fase do crescimento tem o seu período próprio de maturação, não se poderá também olvidar, sob pena de não se aproveitar, na íntegra, possibilidades de crescimento económico; que não se deixe, assim, para amanhã o que se deve fazer hoje.
E o caso, por exemplo, entre outros, do revestimento florestal dos territórios do Sul ou o do cultivo frutícola

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extensivo, ameaçados já, no seu fomento, pelo fatal rareamento da mão-de-obra rural.
Ainda mais: quando houver de orientar investimentos vultosos, só procure, sempre para melhor harmonia na distribuição dos rendimentos, actividades que, naturalmente, pela sua estrutura distribuam pelo maior número os respectivos benefícios. Quanto a este aspecto, tem particular realce a indústria do turismo.
E ainda necessário evitar, a todo o custo, as duplicações que delapidem capitais e mão-de-obra. É o caso gritante de actividades rodoviárias e ferroviárias, totalmente dissociadas, embora percorrendo caminhos justapostos ou paralelos, mas ignorando, mutuamente, problemas nascidos de tão íntima vizinhança e que seriam, decerto, no interesse das duas actividades, resolvidos segundo fáceis esquemas de inteligente cooperação.
Que se procure também na resolução dos mais variados problemas técnicos e económicos as soluções mais práticas, que serão, decerto, as mais viáveis e adequadas ao nosso meio económico e social, embora se afastem, por vezes, dos modelos estrangeiros. É o caso dos emparcelamentos de glebas rurais, que fere, por vezes, a sensibilidade do nosso camponês e que uma conveniente solução cooperativa, nos domínios da produção e do comércio, resolveria, em grande parte, por forma mais satisfatória. Haja em vista as múltiplas mútuas de gado que proliferam, com êxito quase geral, neste país, que dizem alguns estar tocado por individualismo exagerado. Ainda, e agora em referência àqueles primores que são obra de gerações, como os generosos vinhos do Porto, os alvos amendoais do Algarve e do Douro, os preciosos vinhos verdes do nosso Minho ou os maduros do Dão e tantos outros, que se racionalize a sua produção após estudo adequado de mecanização, e outros, relativos aos seus circuitos comerciais, sem que, contudo, se diminua a virtuosidade que os tornou célebres no mundo consumidor.
E se assim procedermos, haverá apenas que continuar, e continuar, sim, mas permitindo que os técnicos das repartições, das estações e postos agrários possam dirigir-se aos locais onde se travam os combates da produção, assistindo tecnicamente e procurando realizar verdadeira extensão do que se concluir pela investigação aplicada. E que esta seja fruto de um trabalho ordenado e coordenado, e não, como é hoje. dispersa e confusa ...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - ... frequentemente especulativa e sem qualquer interesse leal, nem para o progresso da ciência nem para o objectivo de generalizar conhecimentos fundamentais.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E, principalmente, que não se investigue o que já está investigado, nem se procure inventar o que já está inventado.
Tomemos, neste campo, como exemplos salutares o trabalho do Laboratório Nacional de Engenharia Civil e o da célebre Estação de Melhoramento de Plantas, de Elvas, cuja estruturação se deve ao nosso ilustre colega Prof. Vitória Pires ...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - ... e alguns departamentos destacados da Estação Agronómica Nacional, não esquecendo a actividade, bem merecedora de elogio, de inúmeros laboratórios e institutos das nossas velhas e gloriosas universidades.
E, finalmente, falemos daquele investimento que, depois do que se destina a manter a integridade do território pátrio, figura como o mais destacado.
A educação e a instrução das gerações que hão-de constituir o sólido fundamento do nosso porvir.
Estão em boas mãos, as de um ilustre professor universitário, as reformas urgentes que se impõem para a estruturação do nosso ensino nos seus diferentes graus. Competirá, assim, ao grande mestre de Direito o Prof. Galvão Teles essa obra que o País reclama. E temos entre os nossos pares um responsável máximo por bem sucedida campanha, vitória que foi ímpar no mundo educacional - a da alfabetização do nosso povo -, o ilustre Deputado Dr. Veiga de Macedo.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Tenhamos, assim, esperança, julgo que bem fundamentada, de que, com tão destacado exemplo e com tão ilustre Ministro testa de nova campanha da educação nacional, acabaremos, de vez, com as chagas que continuam a diminuir o valor da nossa juventude, e cujas qualidades natas têm ficado bem realçadas na virilidade o patriotismo das nossas gloriosas forças armadas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E que, assim, se acabe, definitivamente, com os inúmeros cursos livres ou presos sem alunos, e com outros sem mestres à altura da sua missão, e isto para melhor se poder ensinar naqueles cursos da maior utilidade em que é, pelo contrário, demasiada a densidade do discente em relação ao docente.
Que se generalizem também ao sector docente as palavras que o ilustre Ministro pronunciou recentemente em relação ao perigoso rumo sindicalista no campo educacional, e que assim só sejam de respeitar os direitos de propriedade das cátedras quando são exemplarmente cumpridos pelos seus proprietários os respectivos deveres docentes.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Que se verifiquem igualmente sem restrições de qualquer espécie as causas do fraco rendimento do nosso ensino nos diferentes graus, para se estabelecer, com a indispensável segurança, se esse baixo nível será fruto da má preparação dos elementos do sector discente, ou se deve ser atribuído apenas a falhas inadmissíveis do. docente, ou ainda à estrutura defeituosa do ensino e respectivos programas.
E que no recrutamento do pessoal docente que mais de perto acompanha a preparação profissional dos futuros técnicos (refiro-me em especial ao pessoal assistente) se procurem sempre os mais habilitados e competentes dentro da profissão, embora haja que modificar os actuais sistemas de recrutamento e de acesso aos graus da hierarquia do professorado. E que não se despreze, porque cedo se pagará caro, neste como em outros graus do ensino, o aproveitamento dos elementos mais válidos que actuam nos sectores especializados das profissões, embora trabalhando nos domínios do privado.
E que se atribuam ao sector privado ainda grandes parcelas do ensino que hoje está a cargo do Estado, tornando impossível a resolução de graves problemas do desenvolvimento educacional, de forma a dar possibilidades de êxito a todas as meritórias iniciativas particulares que surjam para preencher as lacunas hoje existentes. Será,

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apenas, necessário estimular e fiscalizar, para depois exigir com justiça, mas por forma compreensiva. Assim se obterá preciosa colaboração para o enorme esforço financeiro do Estado, que é mister fazer para o fomento educacional da juventude.
E agora vou terminar este já longo arrazoado e, como diria Vieira, falar mais depois do que disse, quando haveria ainda tanto a falar, é nada mais dizer.
Dou o meu voto, na generalidade, à proposta do Governo, com as emendas sugeridas pela Câmara Corporativa.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão.
O debate continuará amanhã, à hora regimental.
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 50 minutos.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Alberto Carlos de Figueiredo Franco Falcão.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Antão Santos da Cunha.
Armando Cândido de Medeiros.
Jorge Manuel Vítor Moita.
José Dias de Araújo Correia.
José de Mira Nunes Mexia.
Júlio Alberto da Gosta Evangelista.
Júlio Dias das Neves.
Manuel Herculano Chorão de Carvalho.
Manuel Seabra Carqueijeiro.
Paulo Cancella de Abreu.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Agnelo Orneias do Rego.
Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Alberto Pacheco Jorge.
Alberto da Rocha Cardoso de Matos.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António Burity da Silva.
António Calheiros Lopes.
António Gonçalves de Faria.
António Moreira Longo.
António Tomás Prisónio Furtado.
Artur Águedo de Oliveira.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Belchior Cardoso da Costa.
James Pinto Bull.
Jorge de Melo Gamboa de Vasconcelos.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Pinheiro da Silva.
José Pinto Carneiro.
José Soares da Fonseca.
Manuel João Correia.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel Nunes Fernandes.
D. Maria Irene Leite da Costa.
Purxotoma Ramanata Querin.
Sebastião Garcia Ramires.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
Urgel Abílio Horta.
Vítor Manuel Dias Barros.
Voicunta Srinivassa Sinai Dempó.

O REDACTOR - Leopoldo Nunes.

Requerimentos enviados para a Mesa durante a sessão:

Nos termos do artigo 19.º, § 3.º, do Regimento da Assembleia Nacional, requeiro que pela Imprensa Nacional me seja fornecido um exemplar do III volume do Livro Dez Anos de Política Externa, visto tratar-se de uma publicação oficial.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 19 de Novembro de 1964. - O Deputado, Fernando Cid Proença.

Nos termos do artigo 19.º, § 3.º, do Regimento da Assembleia Nacional, requeiro que pela Imprensa Nacional me seja fornecido um exemplar do III volume do livro Dez Anos de Política Externa, visto tratar-se de uma publicação oficial.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 19 de Novembro de 1964. - O Deputado, Luís Folhadela de Oliveira.

Requeiro que me seja distribuído o III volume da obra Dez Anos de Política Externa, ao abrigo do § 3.º do artigo 18.º, capítulo I, do Regimento.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 19 de Novembro de 1964. - O Deputado, Jorge Augusto Correia.

Nos termos regimentais, requeiro que me seja fornecida a obra Dez Anos de Política Externa, vol. III.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 19 de Novembro de 1964. - O Deputado, Francisco Lopes Vasques.

Nos termos regimentais, requeiro que me sejam fornecidos os volumes I, II e III da obra Dez Avos de Política Externa.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 19 de Novembro de 1964. - O Deputado. António de Castro e Brito Meneses Soares.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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