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REPÚBLICA PORTUGUESA
SECRETÁRIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL
DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 159
ANO DE 1964 3 DE DEZEMBRO
ASSEMBLEIA NACIONAL
VIII LEGISLATURA
SESSÃO N.º 159, EM 2 DE DEZEMBRO
Presidente: Ex.mo. Sr. Mário de Figueiredo
Secretários: Ex.mo Srs.
Fernando Cid Oliveira Proença
Luís Folhadela de Oliveira
SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 15 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente.
O Sr. Presidente declarou que recebera da Presidência do Conselho, para efeitos do disposto no § 3.º do artigo 100.º da Constituição, os Decretos-Lei n.ºs 46042 e 46043.
O Sr. Deputado Agostinho Cardoso referiu-se aos morticínios praticados pelos extremistas em Stanleyville (Congo).
O Sr. Deputado Brilhante de Paiva falou sobre o incêndio no Teatro Nacional de D. Maria II.
Ordem do dia. - Prosseguiu o debate na generalidade sobre a proposta do Governo referente ao Plano Intercalar de Fomento para 1965-1967.
Usaram da palavra, os Srs. Deputados Alves Moreira, Vitória Pires. Teles Grilo, Francisco António Martins e Sousa Rosal.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 19 horas e 10 minutos.
O Sr. Presidente: Vai fazer-se a chamada.
Eram 16 horas.
Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Agnelo Orneias do Rego.
Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Agostinho Gonçalves Gomes.
Alberto Carlos de Figueiredo Franco Falcão.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Alberto dos Reis Faria.
Alberto Ribeiro da Costa Guimarães.
André Francisco Navarro.
Antão Santos da Cunha.
António Calheiros Lopes.
António Gonçalves de Faria.
António Magro Borges de Araújo.
António Manuel Gonçalves Rapazote.
António Maria Santos da Cunha.
António Moreira Longo.
Armando José Perdigão.
Artur Águedo de Oliveira
Artur Alves Moreira.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Artur Proença Duarte.
Bento Benoliel Levy.
Carlos Alves.
Carlos Coelho.
Carlos Emílio Tenreiro Teles Grilo.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
D. Custódia Lopes.
Domingos Rosado Vitória Pires.
Fernando Cid Oliveira Proença.
Francisco António Martins.
Francisco José Lopes Roseira.
Francisco Lopes Vasques.
Francisco de Sales de Mascarenhas Loureiro.
Jerónimo Henriques Jorge.
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João Mendes da Costa Amaral.
João Ubach Chaves.
Joaquim de Jesus Santos.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Jorge Augusto Correia.
Jorge de Melo Gamboa de Vasconcelos.
José Alberto de Carvalho.
José Augusto Brilhante de Paiva.
José Fernando Nunes Barata.
José Luís Vaz Nunes.
José Manuel da Costa.
José Manuel Pires.
José de Mira Nunes Mexia.
José Monteiro da Rocha Peixoto.
José Pinto Carneiro.
José Soares da Fonseca.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Luís Folhadela de Oliveira.
Manuel Amorim de Sousa Meneses.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel João Cutileiro Ferreira.
Manuel Seabra Carqueijeiro.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
D. Maria Irene Leite da Costa.
Mário Amaro Salgueiro dos Santos Galo.
Mário de Figueiredo.
Olívio da Costa Carvalho.
Quirinc dos Santos Mealha.
Bui de Moura Ramos.
Sebastião Garcia Ramires.
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
Virgílio David Pereira e Cruz.
O Sr. Presidente: - Estão presentes todos.
Está aberta a sessão.
Eram 16 horas e 15 minutos.
Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente: - Em satisfação do requerimento apresentado pelo Sr. Deputado Moura Ramos na sessão de 19 de Março último, estão na Mesa elementos enviados pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros. Vão ser entregues àquele Sr. Deputado.
Para cumprimento do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição, estão na Mesa os Diários do Governo n.08 276 e 277, 1.ª série, de 24 e 25 do corrente, que inserem os Decretos-Leis n.08 46 042, que dá nova redacção ao artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 45 323, que aprova o quadro orgânico do pessoal militar e civil do campo do tiro de Alcochete, e 46 043, que dá nova redacção à alínea b) do artigo 27.º do Decreto-Lei n.º 36933 (condições mínimas de admissão ao quadro de agentes técnicos de engenharia de 3.ª classe da Direcção-Geral dos Serviços Industriais).
Tem a palavra antes da ordem do dia o Sr. Deputado Agostinho Cardoso.
O Sr. Agostinho Cardoso: - Sr. Presidente: A hedionda, chacina de Stanleyville, pelo que representa como agressão aos sagrados direitos da pessoa humana, obriga todo o homem civilizado a uma atitude frontal de repulsa e condenação.
Nem o massacre de Katyn, o genocídio de Budapeste, a tragédia dos campos de concentração da última guerra ou as sanguinárias vinganças dos rojos na guerra de Espanha - nenhuma destas grandes nódoas da era contemporânea atingiu em tão curto período o requinte de barbárie que há muitos séculos o homem do tempo pré-cristão porventura viveu.
E, todavia, não esperemos que algum clamor unânime de reprovação se erga dos grandes prelos do inundo das poderosas câmeras de televisão ou se estampem em imagens nas revistas de aquém ou de além-Atlântico.
O mesmo aconteceu em relação ao terrorismo de Angola, que representou em palco mais reduzido o estilo de guerra subversiva preparado nos bastidores de Moscovo ou de Pequim. Não contemos, Sr. Presidente, com tais clamores de indignação, varrendo a testada de uma humanidade que considerava definitivamente conquistados direitos e liberdades que uma civilização acumulou penosamente ao longo dos tempos.
Quem convocará apressadamente a O. N.º U. para ali providenciar ou afirmar exacerbadamente repulsas em justas catilinárias? Não esperemos por tal.
Preparemo-nos antes para deixar morrer as centenas ou milhares de reféns ainda em poder dos homens de Molèle para ouvir reverberar que se haja acorrido a salvar prisioneiros ameaçados ou que o antigo presidente do Catanga, a quem os capacetes azuis arrancaram uma legítima independência, tente pacificar o seu pré-fabricado país.
Já nos chegou, de resto, o eco de manifestações dirigidas, apedrejando as embaixadas ocidentais nos países para lá da «cortina de ferro».
Stanleyville é um labéu e uma mancha de desonra sobre aqueles que a distância - no tempo e no espaço - são responsáveis pelo que ali aconteceu.
Stanleyville constitui um perigo que continua, experiência em grande escala de uma guerra subversiva fácil de manter e de que os casos de Angola e da Guiné constituem uma primeira edição.
Por isso, Sr. Presidente, eu quis nesta Assembleia deixar uma frase de solidariedade para com as vítimas de Stanleyville e de repulsa por quem fez acumular junto ao monumento de Lumumba muito sangue de sacrifícios humanos.
Uma frase que pretende apontar a responsabilidade a quem ela cabe, aos que no Ocidente abandonam a África aos novos senhores orientais num novo e duro colonialismo.
Porque, Sr. Presidente, vai-se cumprindo a profecia de Salazar, que previu as muitas guerras que no continente africano se fariam.
Vozes: - Muito bem. muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Brilhante de Paiva: - Sr. Presidente: Agradeço muito a V. Ex.ª o ter-me concedido a palavra, mesmo sem que eu para o seu uso tivesse qualquer espécie de preparação.
Foi súbito o acontecimento, foi inesperado; e, todavia, ele atingiu o País inteiro, aqui e onde quer que possa falar-se português e haver testemunho de uma cultura lusíada: o infausto incêndio do Teatro Nacional de D. Maria II.
Sofri a emoção hoje. Hoje aqui estou, certo de que, quer V. Ex.ª no seu alto espírito, quer as pessoas de tão alta cultura que esta Assembleia reúne, hão-de saber sentir, hão-de saber expressar e hão-de saber defender a adopção de remédio a melhor do que a pobre voz de
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um homem do povo que apenas pode trazer a esta Casa o testemunho de que Portugal não é só aqui.
Sr. Presidente: O incêndio do Teatro não pode, por imperativo nacional relacionado à cultura, deixar de merecer do Governo, de todas as entidades oficiais ou particulares, a maior atenção, o maior entusiasmo, a maior decisão de remediar e tão depressa quanto possível.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Habituámo-nos, todos os portugueses de aquém e de além-mar, a ver nele um dos mais sólidos e mais brilhantes veículos da nossa cultura desde o século passado. O Governo não o deixará ficar no império das cinzas.
Essa certeza tenho, temo-la todos; com ela me congratulo e se congratulam todos aqueles que pregam, a cultura nacional.
O Sr. António Santos da Cunha: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: Pareceria :útil adoptar para já uma sugestão. Esta sugestão não é minha, ouvi-a. E peco licença para ofender a modéstia da pessoa a quem a ouvi, o Sr. Francisco Rodrigues, jornalista muito distinto e muito considerado da nossa imprensa. Por que não utilizar, tão depressa quanto possível, o Teatro Nacional de S. Carlos?
Sei que generosamente a empresa do Teatro Monumental, e à sua frente o Sr. Vasco Morgado, se prontificou a, imediatamente e sem qualquer encargo em relação ao funcionamento do seu próprio teatro, ceder as instalações do Monumental.
Parece-me que o Estado deveria pôr e Vozes: - Muito bem ! O Orador: - Sei também que está ,em constituição uma comissão de largos poderes paira a reconstrução, tão urgente quanto possível, do Teatro Nacional de D. Maria II. Sr. Presidente: Que V. Ex.ª e todos os nossos colegas me perdoem a desordem e a pobreza da expressão. Vozes: - Não apoiado! O Orador: - Há alguma coisa que não posso dizer, mas que sinto e todos nós podemos senti: é que o Teatro Nacional de D. Maria II também é Portugal. Tenha dito. Vozes: - Muito bem, muito bem! O orador foi muito cumprimentado. O Sr. Presidente: - Vai passar-se à Ordem do dia O Sr. Presidente: - Continua em discussão na generalidade a proposta de lei relativa ao Plano Intercalar de Fomento para 1965-1967. Tem a palavra o Sr. Deputado Alves Moreira. O Sr. Alves Moreira: - Sr. Presidente: Ao tomar parte na apreciação do Plano Intercalar de Fomento, que agora se discute, faço-o movido pela intenção de contribuir, embora modestamente, para esclarecer, ou, melhor, dar a minha opinião quanto a algumas rubricas nele inscritas, já que a sua complexidade, e variedade tornam absolutamente impossível um profundo exame analítico do seu conteúdo. Acresce ainda que muitos dos assuntos versados tiveram já oportunidade de ser profundamente tratados com brilho pelos ilustres membros desta Câmara que me antecederam neste debate. Não quero, no entanto, deixar de sublinhar o quanto me é grato saber que é preocupação do nosso Governo, apesar das dificuldades financeiras com que luta presentemente, a fim de cobrir as despesas inerentes à manutenção da integridade do território nacional vilmente ameaçado, projectar com tempo e ordenadamente as suas obras e realizações, conjugando esforços no sentido de uma distribuição de investimentos o mais equitativa possível, atendendo sobretudo à posição que cada um ocupa na orgânica nacional com as repercussões externas que naturalmente implicam. O Sr. Sousa Meneses: - Muito bem! O Orador: - Assim compreendo o Plano Intercalar, elo de ligação entre o II, que está prestes a terminar, e o que se segue, estruturado nas bases que orientam este intermediário, a que na generalidade dou a minha inteira aprovação. E, como as disposições agora expressas definirão o futuro plano, disponho-me a fazer algumas considerações acerca de uma verba que se inclui, e que, apesar de ser uma gota de água na imensidão do global, tem particular interesse para a região que represento nesta Assembleia, pois grande parte da sua economia, se valorizará extraordinariamente se a dotação orçamental for mais condizente com as actuais e futuras necessidades. O Sr. Sales Loureiro: - Muito bem! O Orador: - Refiro-me à cifra que se pretende atribuir às obras do porto de Aveiro, na ordem dos 30 600 contos, a financiar pelo Orçamento Geral do Estado e por auto-financiamento da Junta Autónoma do Porto de Aveiro, que não é de molde a permitir caminhar-se rapidamente no sentido de tornar real uma latente fonte de riqueza que a Natureza oferece e que os homens não têm sabido aproveitar ainda na totalidade. O Sr. Homem Ferreira: - Muito bem! O Orador: - Não é porque se tenham alheado ou mostrado menos diligentes os responsáveis locais pela valorização e incremento dessa obra, que se antevê magnífica quando for completada, pois seria muito longa a sua história e muitas homenagens haveria que render aos seus precursores; e essas não há que as regatear, antes nunca será de mais exprimir o agradecimento que é devido ao seu labor e à sua persistência nem sempre devidamente compreendida, porquanto já há muito o porto de Aveiro seria uma realidade a pesar bem na valorização, não só da zona de influência distrital, mas até nacional, se porventura as obras se tivessem processado a ritmo normal. Vozes: - Muito bem, muito bem! O Orador: - E bem sabido que, pela sua situação geográfica e recursos naturais, o porto de Aveiro terá, num fu-
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turo que se não afigura longínquo, um relevante papel a desempenhar no conjunto portuário nacional e, sobretudo, como complementar do de Leixões, pois este não poderá bastar a todas as solicitações do hinterland nortenho, mesmo ampliado como se prevê, por ser de admitir que brevemente atinja a sua saturação. Restará, assim, a possibilidade de se recorrer ao de Aveiro, para o que há que se conjugar esforços no sentido de preparar este com o fim de suprir a insuficiência que se prevê para aquele.
Vozes: - Muito bem !
O Orador: - E há que trabalhar com tempo de maneira a preparar o futuro e de acorrer para já às necessidades, a fim de dar cumprimento às solicitações que a todo o momento lhe são feitas.
Para tal se prevê um certo número de trabalhos que, em resumo, poderão ser enunciados da seguinte maneira e de acordo com o parecer da administração portuária:
Construção de obras acostáveis;
Regularização e dragagem de canais;
Provavelmente dragagens na barra;
Construção de docas secas;
Construção de terraplenos e de arruamentos de acessos e de serviço;
Aquisição de equipamento terrestre e marítimo necessário ao bom funcionamento dos serviços;
Ampliação do porto de pesca costeira;
Continuação da execução dos planos de arranjo e expansão dos portos bacalhoeiro e industrial.
A estimativa prevista para estas realizações é de 170 000 a 200 000 contos, quantia esta muito superior àquela que se inclui neste Plano Intercalar. É certo também que estas obras, em parte, estão dependentes das conclusões que hão-de resultar do ensaio em modelo reduzido em estudo no Laboratório Nacional de Engenharia Civil, e, naturalmente, tal estudo será ainda demorado, havendo a lamentar que só em meados do corrente ano se tenha iniciado a sua construção, prevendo-se que sómente comece a funcionar na Primavera de 1965. Tal facto terá como consequência, se não se chegar a conclusões rápidas, a mais se atrasar ainda toda a vultosa obra que se prevê.
Para se ajuizar do estado actual do porto, quero fazer umas breves considerações e que dizem respeito sobretudo àquilo que é necessário executar para o elevar à categoria que há muito vem merecendo.
Quanto à barra, desde que se concluíram em 1958 as obras dos molhes exteriores, já apresenta fundos e características de molde a permitir a sua utilização por navios que os canais e instalações interiores podem aceitar presentemente, mas necessário se torna, para uma manutenção e até melhoria de tais fundos, uma dragagem com uma unidade apropriada como complemento indispensável dos molhes construídos.
Os canais interiores e bacias de manobra estão naturalmente dependentes da orientação a ser dada pelo modelo reduzido, embora se continuem a fazer as dragagens que vão sendo aconselhadas.
O porto bacalhoeiro, já muito aceitável quanto à utilização da frota de pesca local, tem sido progressivamente melhorado, mas ainda muito há a fazer para seu completo apetrechamento. A justificar uma atenção muito particular para a actividade desenvolvida neste sector do porto, poderei citar que o bacalhau fresco entrado em 1953 atingiu 21 625 t, no valor de 86 499 contos, e nos últimos três anos as seguintes cifras:
[...ver tabela na imagem]
Anos Toneladas Valor em contos
Estes valores dizem bem do rendimento estável de tal riqueza, para o que tem contribuído essencialmente a acção dos armadores e o número de barcos que constituem a frota bacalhoeira do porto, num total de 27 unidades no último ano.
O porto comercial apresenta já em construção o primeiro troço de 180 III de cais comercial, que se espera estar concluído num prazo curto, se bem que já muito atrasado em relação ao previsto de início. E é precisamente deste cais, que no futuro se prevê atinja 320 m, e do conjunto do porto comercial, que o virá a englobar, que depende o dar-se escoamento ao tráfego de mercadorias que a todo o momento afluam ao porto, e que já através dele se movimentam, embora em condições de mero improviso. Nestas circunstâncias, a fim de superar a falta de condições primárias deste porto, resolveu a Junta Autónoma, numa acertada medida de não perder posição, aproveitar provisoriamente as instalações do porto bacalhoeiro, provendo-o de apetrechamento mecânico, sem prejuízo da sua utilização futura já no local próprio. Conseguiu-se assim um movimento que poderá apreciar-se nos seguintes dados estatísticos referentes aos últimos dez anos:
[...ver tabela na imagem]
Anos Toneladas Valor em contos
Poderia ainda acrescentar que. até 31 de Outubro do corrente ano movimentaram-se já 83 793 t de mercadorias, no valor de 154 925 contos, o que denota um aumento de cerca de 20 por cento em relação ao total de 1963.
Da análise destes números resulta que a actividade do porto de Aveiro teve um surto de extraordinário desenvolvimento no período decorrido de 1954 a 1963, pois, se inicialmente não tinha significado aparente, por não ir além de 5826 t em 1954, atingiu a cifra de 71 830 t em 1963. E, se até à conclusão da 2.a fase das obras exteriores do porto o movimento nunca atingiu mais que as 9134 t, em 1958 esse valor elevou-se a 26 7911, para daí em diante continuar a crescer até atingir no ano findo a cifra de 71 830 t, correspondente ao valor de 149 520 contos. Verifica-se ainda que em 1963 foram movimentadas, em relação a 1962, mais 4330 t importadas e mais 20 724 t exportadas, o que evidencia bem uma extraordinária melhoria internacional em prejuízo do movimento interno, o que é paradigma de tendência exportadora do porto. Estão ainda de acordo com esta tendência as numerosas consultas feitas pelas agências de navegação e de importadores e exportadores sobre as possibilidades e facilidades portuárias e ainda pelos ensaios já efectuados.
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Desta breve apreciação se conclui facilmente do aumento crescente das quantidades e valores das mercadorias movimentadas, apesar das precárias condições de utilização, que SÃO, como já disse, de mero recurso. No entanto, são variadíssimos os produtos já exportados provenientes das indústrias em que é rica a região, como sejam madeiras, pasta de papel proveniente da fábrica de celulose de Cacia, produtos cerâmicos, o sal, os produtos metalúrgicos, o vinho, isto só para citar alguns entre tantos, além dos diferentes produtos importados e necessários à laboração das indústrias em que o distrito é rico e da pesca.
Existe, no entanto, o grande inconveniente apontado resultante das adaptações e da natural saturação do porto bacalhoeiro, já por si muito solicitado. E tal improvisação não poderá ser suportada muito tempo, pois vem-se verificando que o interesse pelo porto é cada vez mais crescente, o que, se por um lado é bastante animador, por outro lado vem criar embaraços à administração portuária, na impossibilidade de satisfazer todos os pedidos que constantemente lhe são dirigidos.
Esperemos; pois, que se possa ver desfeito tal desfasamento a breve trecho, de maneira a desaparecer o sacrifício que os utentes do porto vêm fazendo numa atitude digna de confiança e do interesse que mostram na colaboração com a junta portuária.
Outra aspiração de longa data é a existência de uma doca seca (das duas previstas), cujo projecto já deveria ter sido concluído há dois anos e que só agora foi iniciado, tudo levando a crer que tão cedo não poderão os usuários do porto dispor de uma das grandes obras fundamentais das suas instalações.
Vozes: - Muito bem !
O Orador: - A verba para a efectivação de tal obra já havia sido incluída no II Plano de Fomento, mas, precisamente por falta de projecto, não foi utilizada, transitando assim para este Plano Intercalar, e esperemos que não transite ainda para o III. Á sua conclusão, que se antevia para fins de 1965, está já prejudicada, pois o seu início está previsto para meados do próximo ano. É bem evidente que, além do cais comercial e da doca seca, há ainda a considerar, no porto comercial, os terraplenos e armazéns, abastecimentos de águas, arruamentos, apetrechamentos mecânicos e outros requisitos inerentes ao bom funcionamento do mesmo.
Merece ainda menção especial o seu porto industrial, situado numa zona que se prevê no plano director para a instalação de indústrias de interesse portuário, onde presentemente já existe uma grande unidade armazenadora e distribuidora de combustíveis líquidos da Sacor e onde igualmente se iniciaram recentemente obras provisórias para armazenamentos de vinhos com vista à exportação para o ultramar, a acrescentar àquelas que se prevê virem a ser estabelecidas, pois sabe-se da sua constante solicitação. Mas aqui surge novamente a falta de planos dependentes do estudo do modelo reduzido e ainda as limitações impostas à Junta Autónoma pela sua dependência de aprovações superiores, sempre demoradas, com os prejuízos inerentes às perdas de tempo, e à situação não menos delicada de tudo ser feito com carácter provisório.
Ligado intimamente a esta zona, e naturalmente motivado pelas condições já criadas quanto a acessos à ria, há a considerar o valor da indústria de construção naval de grande envergadura que constitui os estaleiros de S. Jacinto, onde se têm construído barcos de ferro de razoável tonelagem e que têm merecido até, por várias vezes, a honrosa presença de ilustres membros do Governo, a presidir aos actos de lançamento à água; e, ainda, indústrias conserveiras, como aquela de peixe em molhos dotada de equipamento moderníssimo, que há dias foi inaugurada com a presença de S. Ex.ª o Secretário de Estado da Indústria, e pertencente a uma empresa particular. Poderia ainda citar a indústria bacalhoeira e seus derivados, além da do sal, tão típica e característica da região. Paralelamente ao desenvolvimento do porto bacalhoeiro há ainda a anotar a realidade que representam, numa afirmação de valorização económica e social, as actividades de pesca da sardinha e arrasto costeiro, igualmente com instalação no seu porto e lota, que num dia de feliz acontecimento para a cidade de Aveiro foram inauguradas por S. Ex.ª o Chefe do Estado.
Em virtude de presentemente as actividades destas pescas serem consideráveis e evoluírem em ritmo de acentuado desenvolvimento, não desmerecendo até em relação à bacalhoeira, tem-se verificado que as instalações já são insuficientes para o movimento que têm. Por tal motivo, espera-se que tais instalações sejam convenientemente ampliadas, de harmonia com as necessidades actuais e futuras.
Vozes: - Muito bem, muito bem !
O Orador: - A fim de se ajuizar da importância que representa este sector ligado à vida portuária, com os inerentes reflexos no fomento das mais variadas fontes de riqueza comerciais e industriais da cidade e região, bastará dizer que o valor comparativo do pescado vendido pelas traineiras e arrasto costeiro nos quatro últimos anos é o seguinte:
1960 26 218 861$00
1961 29 353 200$00
1962 24 636 461$00
1963 31 279 415$00
correspondendo à laboração de traineiras e barcos de arrasto costeiro, que em 1963 atingiram os números, respectivamente, de 23 e 28 unidades.
Naturalmente que, a par destas necessidades de natureza propriamente portuária, há a encarar decididamente a construção de uma rede rodoviária e ramais ferroviários compatíveis com a utilização rápida e fácil de tais instalações, de maneira a permitir um escoamento dos variadíssimos produtos comerciais e industriais canalizados não só a partir do distrito, mas até das Beiras, para as embarcações que demandam o porto. Do plano director da cidade, que aguarda a aprovação superior, constam precisamente tais acessos devidamente estudados e que parecem vir a satisfazer o bom rendimento que se aguarda. Espera-se, pois, que tal aprovação não esteja sujeita a nefastas demoras, mas ainda que sejam criados meios financeiros de molde a poderem iniciar-se dentro de um curto espaço de tempo tais empreendimentos.
Uma vez executadas tais obras, ficaria então o porto de Aveiro preparado para as múltiplas funções de porto comercial, industrial, de pesca longínqua e de pesca costeira e do alto, servindo uma região de elevado potencial económico, de harmonia com o desenvolvimento comercial e industrial da mesma, e, ao mesmo tempo, pelas possibilidades de complemento ou alternância com o de Leixões, uma vasta zona de influência sobretudo do Norte e interior do País.
Vozes: - Muito bem !
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O Orador: -É, pois, convicto do valor que realmente desempenha na economia da Nação o porto de Aveiro que me atrevo a chamar a atenção do Governo para a sua situação actual, nada de harmonia com as suas reais potencial idades, e a pedir aos responsáveis a solução rápida dos problemas equacionados que actualmente se oferecem, não deixando, ao mesmo tempo, de agradecer o que já foi feito até este momento.
Vozes: -Muito bem!
O Sr. Sales Loureiro: - V. Ex.ª dá-me licença?
O Orador: - Faz favor.
O Sr. Sales Loureiro: - Considero da maior importância as palavras que V. Ex.ª vem proferindo quanto ao valor económico do porto de Aveiro, pelo que acho pertinentes as judiciosas considerações de V. Ex.ª Felicito-o, pois, pelo valor da sua intervenção e pela forma notável como está a defender os interesses não só dessa região como da própria Beira Alta, por uma parte a ela tão intimamente ligada.
O Orador: - Muito obrigado, Sr. Deputado. Sinto-me francamente desvanecido com o elogio .ao meu modesto trabalho.
Sr. Presidente: Passo agora a fazer algumas considerações, embora muito genéricas, em relação a outro capítulo do Plano Intercalar, este agora de características muito especiais, por dizer respeito a um sector de pobres recursos, mas que tem aspectos decisivos no bem-estar e nível social da população e que é pela primeira vez encarado: frontalmente pelo Governo, com o que muito me congratulo.
Quero referir-me aos projectos e verbas previstos para a saúde nas suas múltiplas rubricas, perfazendo um certo número de investimentos, num total de 356 000 contos, a distribuir pela duração do futuro triénio.
Começarei por dar o meu parecer no sentido de que tal verba não se me afigura suficiente para impulsionar no período citado a deficiente cobertura sanitária do País, pois está só nos três grandes centros de Lisboa, Porto e Coimbra é que existe a nível muito razoável.
Por conhecer bem o estado actual da assistência hospitalar, quero chamar a atenção, em primeiro lugar, para o facto de que a maioria dos hospitais regionais, já não falando nos sub-regionais, não está a trabalhar eficientemente, pois a finalidade que lhes é exigida é cada vez mais incompatível e superior ao seu condicionamento técnico e financeiro. Mesmo quanto a construções hospitalares., embora se reconheça o esforço feito nos últimos anos no sentido de se erguerem algumas unidades, sobretudo de natureza sub-regional, ainda se não conseguiu fazer uma cobertura em plano de igualdade de todo o País, havendo muitos hospitais regionais instalados em velhos edifícios sem condições mínimas ou em adaptação que não condizem com as atribuições que lhes são impostas, pois para eles convergem, além de todos os doentes da sua área, também aqueles que provêm dos hospitais sub-regionais, que não podem nestes ser tratados pelas suas escassas possibilidades de acção.
Da verba prevista para esta finalidade, no total de 140 000 contos, espero que seja feita uma distribuição de harmonia com tais necessidades, e desde já chamo a atenção para a construção do novo edifício destinado às instalações do hospital de Aveiro, que há tantos anos aguarda a sua vez, já que presentemente se acantona parte em velhas instalações a precisar de camartelo e parte num edifício construído com o fim de albergar doentes infecto-contagiosos e tuberculosos, cedido a título precário pelo Instituto de Assistência Nacional aos Tuberculosos. Já em intervenção anterior, que fiz há dois anos nesta Câmara, frisei tal aspecto, mas não quero deixar passar mais esta oportunidade para referir a citada carência e renovar o meu apelo. Pelo que diz respeito ao seu apetrechamento, embora tenha melhorado ultimamente, mercê de alguns subsídios oficiais o particulares, está ainda muito aquém daquilo que a população que a ele acorre necessita e em desacordo com as possibilidades que os médicos que nele trabalham oferecem, apesar das suas remunerações meramente simbólicas, na ordem de 100$ e 150$ mensais! ...
Dentro ainda do capítulo da assistência hospitalar, vejo com simpatia a inclusão neste Plano da criação de centro» de recuperação nos hospitais regionais, onde não existem, numa atitude bem louvável de favorecer os diminuídos físicos no sentido de melhor e mais rapidamente se tornarem total ou parcialmente aptos, contribuindo-se assim para uma valorização do material humano, o que é o mesmo da Nação. A instituição de tais serviços em interligação com os hospitais regionais, ou, melhor, a eles Intimamente ligados, só é de louvar, e, nesta ordem de ideias, espero que também chegue a vez ao hospital de Aveiro de possuir tão eficaz meio de recuperar os diminuídos fisicamente, sob o ponto de vista médico e funcional. Dá-se até o caso de, sendo a capital de um distrito bastante industrial, e, portanto, susceptível de ter muitos sinistrados, necessitar muito especialmente de um centro de reabilitação à altura do seu merecimento.
Dou ainda muito particular importância à nova orientação, prevista no sentido da criação de dispensários materno infantis, ...
Vozes: -Muito bem!
O Orador: - ... medica esta de um alcance extraordinário na certeza de que contribuirá não só para a baixa das cifras de mortalidade infantil, que, por serem elevadas, nos colocam num plano de inferioridade internacional, mas também pela possibilidade de criar no espírito das mães a ideia da vantagem que advém para elas e para os seus futuros filhos do seu internamento em maternidades onde nada lhes falta
Vozes: - Muito bem!
O Orador:-Naturalmente que esta medida implica outra, e que será o aumento do número de camas nos hospitais com tal objectivo, pelo que não deverá deixar de ser tomado em consideração tal aspecto.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Assim não só se evitaria o sacrifício de muitas vidas, pela falta de conhecimentos específicos e educação das mães, mas também se veria enriquecido sobremaneira o potencial humano nacional.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: -Nesta ordem de ideias, entendo que toda a unidade hospitalar devia ser provida de um serviço desta índole, pois os resultados comparativos entre as taxas de mortalidade infantil nos distritos que possuem tais serviços são muito menores do que naqueles onde não foi possível
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aluda instituí-los. Aliás, tal disposição, determinando a criação de dispensários materno-infantis a funcionar nos hospitais, teria outra consequência digna de nota, e que seria o evitar-se uma dispersão, sempre inconveniente, de multiplicações de instalações com o mesmo fim em meios em que as possibilidades materiais não são de molde a permitir tal exuberância.
Dou o meu inteiro apoio à reorganização dos centros de enfermagem, que deve merecer uma atenção especial, dado o diminuto número de profissionais, sobretudo com o curso geral, existente no País em relação à população e também ao número dê médicos e serviços (a que não é naturalmente alheio o seu baixo nível de remuneração), para o que se torna igualmente indispensável a criação de mais centros com tal finalidade. Sugiro mesmo a instituição de escolas de enfermagem adstritas aos hospitais regionais, de maneira a facilitar e a estimular a sua frequência; não só se evitaria o óbice apontado, mas ainda se disporia, durante a frequência de tais cursos, de bons auxiliares na colaboração e eficiência dos variados serviços hospitalares.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - A melhoria de transportes de doentes por meio de ambulâncias (já que outros processos mais modernos, como a utilização de aviões e helicópteros, nos parecem para já mera utopia, mas sem dúvida a encarar decididamente), que agora se prevê igualmente, é nota a registar com agrado, pois, na realidade, na orgânica actual torna-se imperioso que as interligações entre os hospitais sub-regionais e centrais, passando pelos regionais, se façam eficientemente sem perdas de tempo de molde a evitarem-se funestas consequências. O ideal seria para já que cada concelho, pelo menos, tivesse a sua ambulância, já não falando naquelas que os meios de maior densidade populacional devem possuir, numa organização perfeita de entre ajuda de que toda a população viria a usufruir vantagens evidentes.
Quanto à assistência médica, essa deverá ser encarada com particular cuidado, pois dela dependerá essencialmente a eficiência de todos os serviços de saúde. Necessário se torna antes de mais organizar tais serviços, sobretudo os hospitalares, de maneira a criar ambiente de confiança, ao médico pelas instituições e seus dirigentes. Dever-se-á quanto antes instituir as carreiras médicas hospitalares de acordo com o expresso no Estatuto de Saúde e Assistência, discutido e votado nesta Assembleia, a aguardar ainda execução plena. O relatório das carreiras médicas é documento de tão alto valor que deveria ser considerado na sua essência como o orientador básico para a solução mais perfeita dos problemas da classe, porque foi feito pelos seus legítimos representantes, os únicos que, pela sua esclarecida opinião, poderão contribuir para uma solução justa em matéria tão delicada.
Vozes: - Muito bem !
O Orador: - A não ser assim, tudo continuará na mesma, com os inerentes imponderáveis no exercício de tão nobre missão profissional, nem sempre compreendida tal qual é, pois muito lhe é exigido, sem a compensação a que tem incontestável direito.
A não se verificar uma solução para as suas reivindicações, se assim se lhes poderá chamar, o interesse pelo exercício da medicina decairá gradualmente, como o vem demonstrando o número decrescente de alunos que de ano para ano se vêm inscrevendo nas respectivas Faculdades.
Há ainda que criar condições permitindo a fixação de médicos em áreas do País que presentemente se apresentam hostis à prática da profissão, pela falta de meios não só de exercício mas também monetários, de molde a compensá-los e facilitar-lhes um nível de vida compatível com a profissão para que se sentiram atraídos. De contrário, assistir-se-á a uma concentração tal (aliás como já se vem verificando) nos núcleos populacionais mais favorecidos, em detrimento daquelas áreas que, por serem inóspitas, nem por isso deixam de ser habitadas por tantos seres que sofrem como quaisquer outros e que aspiram a um nível social igual ao dos seus semelhantes.
Vozes: -Muito bem!
O Orador: - Para obviar a tais inconvenientes há que remodelar completam ente os serviços dependentes do Ministério da Saúde e Assistência e do das Corporações e Previdência Social pelos seus Serviços Médico-Sociais, de maneira a permitir uma melhor cobertura sanitária do País e a criar aos médicos integrados nos seus quadros condições de ordem monetária que não lhes causem embaraços, pois assiste-se n, um «i absorção gradual por estes Ministérios das prestações médicas à população, o que, se por um lado é muito louvável, por outro não permite aos médicos outros proventos suplementares pelo consequente decréscimo gradual da chamada clínica livre.
Quanto àqueles que não estão integrados nos esquemas citados, há- que criar condições de molde a atraí-los para esses serviços, e não a que os repudiem, como se assiste na hora presente.
Estes e outros problemas afins terão de ser encarados decididamente, e confio em absoluto que os ilustres dirigentes! dos M mistérios que evoco, porque são responsáveis distintos, luto de encontrar as soluções adequada-se satisfatórias1 pai1 a resolução dos problemas equacionados, no mais curto espaço de tempo, d(c) molde que a Nação, agradecida, lhes renda as homenagens a que então terão jus.
Sr. Presidente: E a finalizar, e porque, como disse no início, não quero perder-me em mais considerações em matérias já muito tratadas por outros ilustres Deputados, somente queria acentuar que, a propósito do capítulo «Turismo» inserto no Plano Intercalar, mais uma vez se verifica que se consideram muito especialmente certas zonas do País como preferenciais, esquecendo-se assim que. ele é um todo, e dele fazem parte outras regiões de tanto ou maior interesse que as visadas, cada qual com requisitos próprios para secam explorados turisticamente.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Como exemplo, compete-me a mim, mais uma vez deste lugar, chamar a atenção dos responsáveis para o esquecimento a que continua votada, entre outras zonas do País de características requisitos muito particulares, aquela que é dominada pela ria de Aveiro, que oferece condições ímpares como pólo de incalculável vaiou turístico na panorâmica nacional, pois ali quis a Natureza caprichar e oferecer aos homens requisitos únicos para um» exploração a todos os títulos rentável.
Vozes: -Muito bem!
O Orador: - Esperemos que não venha longe o dia em que a citada zona seja alvo de atenções muito par-
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ticulares, que há muito vem merecendo e a que tão pouco tem- atendido. Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Vitória Pires:-Sr. Presidente: As minhas primeiras palavras são para dirigir a V. Ex.ª respeitosos cumprimentos e com eles os protestos da mais alta admiração por quem orienta e dirige com inexcedível aprumo os trabalhos desta Assembleia.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Ao iniciar as considerações que desejo fazer sobre alguns sectores do projecto de Plano Intercalar de Fomento para 1965-1967 desejo prestar homenagem a quantos contribuíram para a realização dos objectivos do I e do II Planos de Fomento, dedicando-lhes o melhor cio seu esforço, com o qual o País atingiu um nível superior àquele que se havia previsto e cuja dimensão merece os maiores louvores.
Quer isto dizer que dispomos de elementos capazes de dar execução às directrizes marcadas num planeamento económico e que para aplicação dos meios atribuídos à sua realização não falta nem competência, nem dedicação, nem experiência.
Poderemos assim concluir que o factor limitante não será, pois, a falta de conhecimentos de quem executa e que, se os meios postos à disposição dos executores forem largos, vasta será a projecção da obra na economia nacional.
Posto isto, Sr. Presidente, quero também prestar homenagem a todos os que contribuíram com o seu saber, dedicado esforço e tenacidade para a elaboração do projecto de Plano Intercalar de Fomento. É sem dúvida um documento notável, onde se esquematizam legítimas aspirações e se apresentam concepções bem estruturadas, com larga projecção em vastos e profundos horizontes, que não podem deixar de despertar entusiasmo e esperança.
Pena é que as verbas atribuídas, pelo menos aos sectores que melhor conheço, não sejam de molde a permitir o desenvolvimento que o Plano lhes deseja dar. Na realidade, torna-se premente que tenham dotações mais adequadas.
Vou primeiramente referir-me ao sector da agricultura, silvicultura e pecuária.
Pelos números constantes do projecto de Plano, verifica-se que o produto agrícola bruto subiu à taxa média anual de 1,2 por cento no decénio de 1953-1962, mas que a contribuição do sector primário para o produto nacional bruto diminuiu 8,4 por cento no mesmo período.
Atribui-se este facto às péssimas condições de clima dos últimos seis anos agrícolas, que têm vindo a piorar sucessivamente, e ainda a «insuficiência do investimento e certas deficiências de estrutura ligadas com o problema de ordenamento agrário, rotação de culturas, técnicas de cultivo, formas de exploração e circuitos de comercialização».
Considero perfeita a enumeração destes factores; desejo contudo fazer uma rápida e breve análise de cada um.
Não temos forma de modificar ou dominar as más condições de clima agravadas nos últimos seis anos, pois nesse campo só podemos inclinar-nos perante a sua fatalidade. Vejamos, no entanto, os outros factores, entre os quais figura, em primeiro lugar, insuficiência do investimento.
Julgo que se pensa em investimentos que a lavoura não tem feito e deveria realizar para actualização de explorações e melhoria dos rendimentos.
Este aspecto, que constitui uma realidade, continuará sem solução enquanto se não modificarem as possibilidades financeiras da actividade agrícola.
O Sr. António Santos da Ganha: -Muito bem!
O Orador: - Os agricultores não têm capital para fazer os investimentos que seriam necessários nem conseguem obtê-lo dados os ónus que incidem sobre as suas propriedades.
O Sr. António Santos da Cunha: - Muito bem!
O Orador: - No entanto, no projecto de Plano alimentam-se grandes esperanças quando se diz: «além dos investimentos públicos e sem públicos , considera-se que também a iniciativa privada da lavoura não deixará de realizar um volume apreciável de investimentos, conduzida pela preocupação de obter mais altos índices de produtividade nas explorações».
Afigura-se-me que se deposita demasiado optimismo no volume dos investimento» por parte da lavoura. É indispensável encarar a realidade das coisas. A lavoura não tem possibilidades materiais para o que se pode classificar de mais trivial.
O Sr. António Santos da Cunha: -Muito bem!
O Orador: -Não exagero se disser a VV. Ex.º, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que muitas são as searas que este ano foram semeadas sem adubo, o que aliás se fez sentir, de modo acentuado, nas vendas em relação às efectuadas nos anos anteriores.
O próprio projecto de Plano refere que «a evolução do índice ponderado de salários rurais mostra no quadriénio dê 1959-1962 um acréscimo de 40,4 por cento para os homens e 36,6 por cento para as mulheres».
Embora os adubos azotados tenham sofrido importante baixa de preço - 16 a 18 por cento de 1959-1960 para 1964-1965-, os fosfatados, que são os de consumo mais elevado, subiram 16 por cento no mesmo período e os potássicos tiveram o aumento mínimo de 7 por cento.
A todos eles porém foi dificultado o acesso aos agricultores, pela exigência feita do pronto pagamento, quando nos anos anteriores se facilitava a liquidação na altura da colheita, embora com acréscimo de juros. Subiram os preços das ferragens, das máquinas agrícolas e, por forma geral, de tudo o que a lavoura tem de adquirir. Em contrapartida, os preços à produção ou se mantiveram estáveis ou tiveram aumentos insensíveis, quando não chegaram mesmo praticamente a diminuir.
O Sr. António Santos da Cunha: -Muito bem!
O Orador: - Apesar de tudo, os preços ao consumidor continuaram a agravar-se.
Neste estado de coisas, salvo raríssimas excepções, que nada irão influir no incremento do produto agrícola bruto, como se pode contar com o «volume apreciável de investimentos» por parte da lavoura?
Diz-se e repete-se que «é ao sector privado da lavoura que continuará a caber o principal papel no processo de desenvolvimento da agricultura nacional. Da adesão da lavoura aos objectivos preconizados e da colaboração entre
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esta e o sector público dependerá, em larga medida, a aceleração do ritmo de crescimento que virá a processar-se no sector agrícola».
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Não tenho dúvidas de que os agricultores estão desejosos de obter soluções para o estado caótico em que se encontram e de que aceitam com o melhor agrado indicações orientadoras.
O Sr. António Santos da Cunha: -Muito bem!
O Orador: - A experiência da minha longa carreira de técnico e agricultor que nunca deixou de ter o mais íntimo contacto com as necessidades da lavoura, adquirida durante uma vida inteira a trabalhar com ela e para ela, leva-me a não acreditar no espírito rotineiro, desde que se demonstre cabalmente a vantagem de qualquer modificação de técnicas e de processos.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - O que, porém, é preciso não esquecer é que os conselhos são fáceis de dar, mas que a sua execução carece de capitais a obter pelo agricultor.
Vozes: -Muito bem!
O Orador: - E muitas vezes vem daí a cómoda, mas injusta, classificação de rotineiros, quando se não quer ver as verdadeiras causas do atraso.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Indicam-se seguidamente deficiências de estrutura relacionadas com problemas de ordenamento agrário. E assunto, na maioria dos casos, de solução muito lenta, mas que, evidentemente, tem de ser considerado.
Entra-se depois na rotação de culturas, técnicas de cultivo e formas de exploração. Tudo isto é função do desenvolvimento que se der à assistência técnica e chegámos a um dos pontos que reputo da maior importância para se alcançarem as metas apontadas no projecto de Plano, embora os outros tenham também muito valor, pois não podemos deixar de considerar o conjunto de todos aqueles factores que estão a entravar o incremento da agricultura nacional.
Sem dúvida, a actualização das explorações agrícolas depende dos conhecimentos que os agricultores tiverem ao seu alcance, e a melhor forma de lhos fornecer é através de uma assistência técnica bem organizada, com pessoal competente, descentralizada, embora coordenada por centros de experimentação regional, com mobilidade suficiente para poder ocorrer rapidamente às necessidades dos diversos agricultores.
Vejo que o projecto em apreciação refere por mais de uma vez a necessidade de se proceder na vigência do Plano Intercalar de Fomento à «reforma dos serviços de assistência técnica no sentido de uma acção coordenada para maior eficiência e ajustamento às características das diferentes regiões agrícolas».
Enquanto, porém, não se fizer essa reforma, a «assistência técnica e extensão agrícola», como se define no projecto, far-se-á estabelecendo centros de gestão e explorações agrícolas de demonstração. Estas explorações de demonstração serão estabelecidas em diversas regiões agrícolas «com o fim de se ministrar a devida assistência técnica às empresas e se recolherem elementos para a instituição de um sistema integral de extensão agrícola».
Atribui-se a este sector a verba de 10 000 contos, sendo 4000 para centros de gestão e 6000 para explorações agrícolas de demonstração.
Considero estas importâncias reduzidíssimas para se conseguirem resultados eficientes na economia nacional e não se correr o risco de tudo resultar em pura perda de tempo e dinheiro.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Em Dezembro de 1957 foi publicado o Decreto-Lei n.º 41 473, que promulgou o regime para a intensificação da assistência técnica à lavoura.
A estrutura ali adoptada, e que .ainda está em vigor, consiste no estabelecimento, por três fases, de uma rede nacional de assistência técnica ao nível concelhio. A acção dos técnicos distribuídos pelos diversos concelhos é coordenada e orientada pelas várias estações agrárias e outros organismos regionais já existentes, nos quais se faz toda a experimentação regional, que terá naturalmente ramificações nas casas dos agricultores.
O Sr. Amaral Neto:- V. Ex.ª dá-me licença?
O Orador: - Faz favor!
O Sr. Amaral Neto: - V. Ex.ª falou em estrutura. A estrutura está em vigor, .está em vigor algures que não seja no Diário do Governo?
O Orador: - Se V. Ex.ª quiser fazer o favor de aguardar um pouco, ficará, completamente elucidado no decorrer das minhas considerações.
Estabelecia-se nesse decreto ligação com os «agricultores guias» e com os núcleos de ensino complementar de aprendizagem agrícola que fossem criados pelo Ministério da Educação Nacional.
O esquema baseou-se no sistema americano, considerado no Mundo o processo mais eficiente de assistência técnica, e houve o cuidado de enviar previamente aos Estados Unidos alguns técnicos que se identificaram com ele para o poderem aqui orientar.
Nunca chegou a saber-se se o processo dava ou não resultado, porque, mercê de circunstâncias várias, ele ainda não foi experimentado nesta ou naquela região.
Felizmente, em meados de 1958, por iniciativa particular da Shell Portuguesa, foi feita a «Experiência agrária de Sever do Vouga», levada a efeito pelo engenheiro agrónomo Vital Rodrigues, que trabalhou como autêntico técnico concelhio.
Não vou tomar tempo a VV. Ex.ªa com descrições minuciosas sobre aquele trabalho, que considero notável, realizado com a maior competência. De resto, os resultados encontram-se publicados e são altamente elucidativos.
Apenas direi, Sr. Presidente, que em 1958 o técnico encarregado do trabalho realizou o inquérito ao concelho de Sever do Vouga e só começou a fazer assistência técnica no ano agrícola de 1958-1959. Pois em cinco anos - 1958-1959 a 1962-1963 - houve um acréscimo de rendimento bruto de 7 155 280$, a que correspondeu o rendimento líquido de 2 961 009$, ou seja a média anual superior a 740 contos.
E curioso observar o gráfico que acompanha os resultados publicados anualmente, pois nele se vê como a despesa feita com a assistência técnica se mantém praticamente constante a partir do segundo ano, enquanto o aumento do rendimento líquido sobe vertiginosamente, o
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que fará diluir cada vez mais a despesa com a assistência técnica à medida que os anos vão decorrendo.
A despesa com a assistência técnica sobe insensivelmente de 130 697$ em 1958 até 265 020$ em 1963, enquanto o rendimento líquido parte do zero naquele primeiro ano e atinge o valor de 1 134 770$ em 1963.
Num concelho onde 90 por cento das explorações agrícolas têm área inferior a 3 ha e mais de metade menos do 1 ha, este acréscimo de rendimento representa uma melhoria considerável.
A acção desenvolvida incidiu principalmente sobre a cultura do milho, a vitivinicultura, a avicultura, a cultura de citrinos, a maior mecanização e a melhor preparação técnica profissional.
Para esta preparação técnica profissional levaram-se a efeito cursos temporários, sendo um de contabilidade agrícola global, com a colaboração do Centro de Estudos de Economia Agrária da Fundação Calouste Gulbenkian, e outro de podadores, com a colaboração da Estação Agrária de Viseu
Além destes funcionaram outros cursos de carácter permanente, quatro complementares de aprendizagem agrícola, cuja frequência foi de 100 alunos do sexo masculino e 27 do sexo feminino, instituídos pelo. Direcção-Geral do Ensino Técnico Profissional, e um de extensão agrícola familiar, com a frequência de 30 alunas, realizado pela Direcção-Geral dos Serviços Agrícolas.
Na introdução do folheto que reproduz os resultados económicos até Dezembro de 1962, o Prof. Castro Caldas
escreve:
Experiência difícil e não desprovida de riscou, teve o condão de ser, em Portugal, o primeiro ensaio de investimento intelectual indirecto e específico, que representa um custo que só teoricamente se avaliava como susceptível de alcançar segura reprodutividade.
Para calcular esta reprodutividade não se pode contestar a importância, que têm os acréscimos de receita obtidos pelos agricultores no decurso da experiência, nem o valor acrescentado à economia regional e global pelo aumento das colheitas ou variações nos consumos de meios de produção resultantes do uso de novas técnicas que dinamizam outros sectores da actividade económica.
Mas deve ter-se como certo que, para além deste impulso conferido aos alicerces básicos da economia, existe um terreno imensamente fértil onde o estímulo investido numa comunidade agrária tradicional vai construindo novas forças humanas que, a longo prazo, darão seus frutos.
Mau grado as dificuldades oferecidas pelo ambiente pouco favorável onde a experiência propositadamente se implantou, ambiente eram que estuo patentes sérios estrangulamentos característicos das regiões deprimidas, que só um auxílio exterior poderia rapidamente remover, a presença do agrónomo, esclarecido quanto às possibilidades oferecidas pela modernização da agricultura, vai criando, especialmente entre os jovens, nova atitude mental pronta a dar resposta a qualquer bom programa regional de desenvolvimento que se pretenda, possa e saiba propor aos interessados.
E, assim que os números apresentados não podem exprimir, nem medir, o que pensam os agricultores de Sever do Vouga, não só a respeito das técnicas que utilizam e das estruturas económicas e sociais em que se movimentam, como também da imperiosa e inadiável necessidade de organizar as actividades produtivas com base em esquemas válidos e genuínos? de cooperação. E no entanto, este pensamento
é condição prévia para que a vontade de todos, agora mais dinamizada, remova obstáculos tradicionais e se torne em acção.
O Sr. Pinto de Mesquita:. - V. Ex.ª dá-me licença?
O Orador: - Faz favor.
O Sr. Pinto de Mesquita: - Num caso destes, a personalidade do agrónomo que interveio e tomou a iniciativa de um esforço desses .só é compatível com uma devoção particular ao exercício dessa actividade e dessas soluções.
Já se vê, porém, que não se pode pretender generalizar a toda a gente. Em todo o caso, é um exemplo notável a seguir e, mesmo sem se poder atingir esse expoente pessoal, constitui um precedente e uma grande esperança.
O Orador: - É uma questão de orientação e de direcção, porque, feitos os inquéritos, depois é seguir com o trabalho de assistência técnica e por isso mesmo se criou nesse diploma um serviço de inspecção.
Era este o objectivo que o Decreto-Lei n.º 41 473, de 23 de Dezembro de 1957, pretendia alcançar em todos os concelhos do nosso país. É assim que trabalham os serviços de extensão agrícola dos Estados Unidos da América, cuja eficiência e projecção na economia americana são de incontestável valor.
A experiência está felizmente feita com o mais completo êxito, demonstrando a razão que assistia ao Governo quando publicou aquele Docreto-Lei. Afigura-se-me que a sua generalização aos outros concelhos seria de indiscutível vantagem.
Vozes: -Muito bera, muito bem!
O Orador: - Analisemos agora outro ponto: O Plano Intercalar de Fomento tem dois objectivos fundamentais para o sector primário, que são:
a) Aumento do produto bruto agrícola e elevação do nível de vida das populações rurais;
b) Valorização económica e social das regiões menos evoluídas.
Para alcança o primeiro objectivo procurar-se-á aproveitar melhor o território, fomentando principalmente a fruticultura, a horticultura, a floricultura e a pecuária; aumentando as áreas de regadio; fazendo o povoamento florestal das terras de menor aptidão cultural; e intensificando as culturas bem focalizadas, entre as quais as cercalíferas.
Sem dúvida que o desenvolvimento das culturas de maior rendimento e da pecuária convenientemente orientada para se tornar lucrativa, o aumento das áreas de regadio sujeitas a explorações económicas, a mecanização praticada no mais alto grau possível com máquinas criteriosamente ensaiadas e escolhidas, o povoamento florestal, acompanhado de medidas que .permitam vender os produtos a preços remuneradores, e a intensificação de culturas bem localizadas hão-de por certo provocar no seu conjunto as condições que conduzam a alcançar o primeiro objectivo do projecto de Plano.
Para tal se conseguir, afirma-se no Plano que será necessário em muitos casos «uma profunda reconversão cultural de acordo com a capacidade de uso dos solos, tom as características climáticas, com a técnica e com os factores de produção disponíveis».
Já tive ocasião de dizer nesta sala o ano passado, quando me foi dada a honra de tomar parte no debate
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sobre o aviso prévio do Sr. Deputado Amaral Neto acerca da crise da agricultura nacional, que «esteve sempre no meu espírito o melhor ajustamento das culturas às condições dos solos portugueses» e, portanto, todos os objectivos expostas no projecto de Plano e meios de os conseguir estão na linha do meu pensamento e coadunam-se perfeitamente com a minha orientação. Considero, no entanto, que há factores limitantes de ordem política e social, e isso poderá impor-nos a necessidade de não sermos demasiado extremistas e não condenarmos pura e simplesmente a cultura dos cereais, mormente a do trigo, nas terras que lhes não sejam francamente favoráveis, uma vez que a dura experiência durante as duas grandes guerras não deve ser esquecida.
Vozes: -Muito bem!
O Orador: -Além disso, as importações anuais médias de trigo atingiram a ordem dos 500 000 contos no último quadriénio e este ano é possível que se situem acima dos 700 000, o que não parece muito brilhante.
Mesmo que o País tenha de despender com trigo nacional importâncias superiores às das cotações mundiais, isso será o preço da tranquilidade política e social e talvez não possa considerar-se encargo demasiado alto.
Vozes: -Muito bem!
O Orador: - Por isso mesmo, ao terminar nesse aviso prévio as minhas considerações, afirmei que devia haver muita prudência na reconversão. Volto a insistir neste ponto, pois, de .contrário, pode tornar-se necessário preparar para breve a segunda campanha do trigo, situação paradoxal que talvez seja conveniente prevenir.
Todos os outros meios para atingir este primeiro objectivo enumerados no projecto de Plano respeitantes ao apetrechamento técnico das empresas agrícolas, à adaptação social do sector a inovas condições de produção e à melhoria da qualidade da produção têm perfeita justificação e estão absolutamente certas. O mesmo se pode dizer quanto à valorização económica e social das regiões menos evoluídas, que é o segundo objectivo do projecto do Plano.
Apenas se me afigura que não se conseguirão alcançar esses objectivos, por forma a terem efeito económico sensível, com os investimentos que se lhes atribui. Compreendo, no entanto, que, mercê das circunstâncias do momento, eles tenham alcançado o máximo possível, o que não quererá dizer que nos orçamentos do triénio não possam ser admitidos reforços nalguns casos.
Como considero a assistência técnica um dos factores de maior importância no desenvolvimento agrícola, solicito para ela prioridade, com plena execução do esquema estabelecido no Decreto-Lei n.º 41 473, de 23 de Dezembro de 1957.
Não quero com isto dizer que simultaneamente e dentro das possibilidades, não sejam, montadas explorações agrícolas de demonstração e centros de gestão de evidente utilidade.
Afigura-se-me, contudo, que essas explorações de demonstração podiam ser estabelecidas nas propriedades particulares, passando os seus proprietários a ser considerados «agricultores guias», como se estatui no artigo 12.º do mencionado decreto-lei.
Seria mais económico e mais eficiente do que instalá-las e explorá-las a expensas do Estado.
O Sr. Amaral Neto: - Mas isso com toda a certeza.
O Orador: - Sr. Presidente: Não alongarei mais as minhas considerações sobre o sector primário, pois quero ainda dizer alguma coisa acerca da investigação científica.
Desejo, no entanto, recordar as palavras que no seu notável discurso foram pronunciadas pelo Sr. Ministro de Estado, Dr. Correia de Oliveira, ao apresentar ao País o Plano Intercalar de Fomento, quando se referiu à agricultura:
Ela é hoje, mais do que nunca, objecto das preocupações e da atenção do Governo, quer no que se refere à sua situação no momento, quer no que toca à transformação da sua estrutura.
O Plano, que, por definição, só visa a política estrutural, procura, nesta aspecto, dar uma contribuição substancial para os problemas da lavoura portuguesa.
Apesar disso, mão pode esperar-se que esta acção de fundo possa produzir efeitos imediatos, pelo que, neste sector mais do em qualquer outro, os objectivos que o Plano define e procura alcançar terão de continuar a ser acompanhados pela execução daquela política de conjuntura que for julgada mais conveniente.
Esta a palavra do Governo, sobre a qual todos temos de depositar fundamentadas esperanças.
Vozes: -Muito bem !
O Orador: - E para terminar o que desejava dizer sobre a agricultura apenas acrescentarei que a secção de Lavoura da Câmara Corporativa faz judiciosos reparos ao projecto, os quais, se ene afiguram pertinentes e merecedores da melhor atenção.
Vozes: -Muito bem!
O Orador: -,Sr. Presidente é srs. Deputados: Distingue o projecto de Plano «investigação fundamental», cujo objecto é a ciência, e «investigação aplicada», cujo objecto é a técnica.
Diz que se verifica «por vezes o ilogismo de organismos de investigação aplicada se consagrarem a certas formas de investigação fundamental, por os centros onde esta deveria fazer-se não disporem de todos os necessários meios ou não se tornarem conhecidos os resultados das suas pesquisas. Há que contrariar esse estado de coisas para que uns e outros possam ser verdadeiramente profícuos».
«Um ponto comum às duas espécies de investigação que deve merecer atenção particular é a necessidade de estimular os investigadores e coordenar os seus esforços na medida em que essa coordenação se mostre viável.»
Salvo melhor opinião, mão posso considerar ilogismo que em determinados casos organismos de investigação aplicada consagrem também a sua actividade a algumas formas de investigação fundamental.
Cito apenas um exemplo dos muitos que poderia referir.
A genética e a citologia são ciências fundamentais e o melhoramento de plantas ciência aplicada. Pois bem: quem pode admitir que os organismos destinados ao melhoramento de plantas trabalhem conscientemente sem fazerem genética e citologia?
Afigura-se-me, pois, que deverá haver alguma prudência ao pretender-se separar por forma rígida e categórica, como parece depreender-se do projecto, a ciência fundamental da ciência aplicada.
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De resto, a segunda é consequência lógica da primeira e, assim, não parece que se possa colocar uma barreira entre as duas, impedindo que os investigadores da ciência aplicada cultivem a ciência fundamental, quando dela necessitem para esclarecimento de muitos aspectos dos vários problemas que se lhes deparam no decorrer das suas investigações.
O douto parecer da Câmara Corporativa é pouco detalhado no que respeita a investigação e talvez se situe num plano que não encara o aspecto real dos factos. E mais elucidativo o parecer da secção de Interesses de ordem cultural, subsecção de Ensino. Se, na verdade, for possível dar execução ao que propõe a subsecção de Ensino da Câmara Corporativa, alcançaremos, sem dúvida, uma posição muito mais perfeita, mas, enquanto não atingirmos esse ponto, parece-me que terá de haver uma certa prudência na limitação das funções quanto à investigação fundamental e à aplicada, porque, se é certo que a Universidade, à qual incumbe, sem dúvida alguma, fazer investigação fundamental, não poderá alhear-se da investigação aplicada e não convirá afastar-se dos problemas económicos e sociais, ponto de vista a que damos todo o nosso apoio, não é menos certo que os organismos de investigação aplicada, e neste momento refiro-me em especial aos do sector agronómico, não podem deixar de dedicar-se também, por vezes, à ciência fundamental, porque, se a não fizerem, ficarão com os seus problemas por esclarecer e sem possibilidades de prosseguirem.
São exemplos desta afirmação o que se passa no Instituto de Melhoramento de Plantas de Savalõf, na Suécia; no Centro de Investigações Agronómicas de Versailles; no Instituto Max Planck para a Investigação do Melhoramento de Plantas, em Vogelsang, na Alemanha; no Instituto de Melhoramento de Plantas de Wageningen, na Holanda; no Instituto de Genética de Roma; no Instituto Nacional de Investigações Agronómicas de Espanha, que, apesar de não estarem integrados nas Universidades, embora com elas tenham estreita colaboração, todos fazem ciência fundamental, quando tal lhes é necessário. Como estes, muitos outros casos poderíamos citar. Sr. Presidente: Foca-se ainda neste capítulo a necessidade de estimular os investigadores.
O parecer da subsecção de Ensino da Câmara Corporativa salienta que o pessoal docente, principalmente o dos lugares mais modestos, dispondo de quadros restritos e vencimentos baixos, acaba por procurar situação mais lucrativa e abandonar essas funções.
É precisamente o que se passa, e talvez em maior escala, com o pessoal dos organismos de investigação do sector agronómico.
O Laboratório Nacional de Engenharia Civil foi criado em Novembro de 1946. Passados quinze anos, o Governo reconheceu, e muito bem, que era necessário actualizar a sua estrutura, os seus quadros, as categorias e os vencimentos do seu pessoal. Foi assim publicado em Julho de 1961 o Decreto-Lei n.º 43 825, que promulgou a lei orgânica daquele Laboratório.
As razões que levaram à publicação do referido decreto-lei estão expressas nas seguintes palavras que o antecedem:
Nas últimos anos começaram a observar-se no Laboratório os alarmantes sintomas que têm conduzido à desagregação e à inoperância muitos organismos similares de outros países: a saída de funcionários em ritmo crescente e o abaixamento do nível das classificações escolares dos candidatos a concurso de admissão.
Uma instituição de investigação vale o que valerem os, seus elementos e não pode sobreviver se não conseguir recrutar e manter uma elevada dosagem de indivíduos com méritos excepcionais. De outro modo, só se desprestigia a própria investigação e se parasita o erário público.
Por isso, no presente diploma foram previstas diversas disposições com as quais se procura atrair e manter ao serviço do Laboratório indivíduos com as necessárias aptidões, fazendo-se depender, em contrapartida, a admissão no quadro e as promoções de exigentes concursos de provas práticas.
Ê este critério que julgo necessário tornar extensivo quanto antes a todos os organismos de investigação cientifica, nomeadamente aos que, tendo sido criados há muito mais de quinze anos e nos quais se estabeleceram logo de início concursos de provas públicas idênticos aos das Universidades, continuam com a mesma orgânica, os mesmos quadros, as mesmas categorias e, portanto, com os problemas que tão oportuna e inteligentemente foram resolvidos no prestigioso Laboratório Nacional de Engenharia Civil.
Se não se encarar rapidamente este assunto relativamente aos outros organismo de investigação, eles em breve ficarão com muitas das suas secções paralisadas, por não terem nesses sectores pessoal especializado que prossiga o trabalho.
Assistimos, Sr. Presidente, a uma verdadeira debandada dos cientistas, uns para organismos estrangeiros, outros para actividades nacionais, indo desempenhar, na maior parte das vezes, funções fora do âmbito da investigação.
Em qualquer dos casos, verifica-se que o País perde para a investigação elementos de primeira grandeza, cuja preparação levou muito tempo e custou muito dinheiro.
Mesmo que dispuséssemos de número suficiente de técnicos, o que infelizmente não se verifica, seriam necessários vários anos para se voltar a ter pessoal devidamente preparado com a categoria daqueles que agora abandonam os serviços.
Não podemos esquecer que os investigadores não se improvisam ou formam em meia dúzia de meses.
Damos, por isso, pleno apoio ao projecto de Plano e à Câmara Corporativa quando diz que é preciso estimular os investigadores. Esse estímulo terá de consistir em se lhes assegurarem condições materiais de vida e meios de trabalho indispensáveis tios seus estudos.
O que se passa nos organismos que tenho a honra de dirigir é altamente preocupante, pela saída de elementos categorizados que abandonaram ou estão procurando abandonar os lugares, não hesitando solicitar a demissão do quadro.
Alguns desses elementos encontram-se há mais de 20 anos na situação de estagiários de 3.a, cujo vencimento é de 4900$.
Outro ponto a considerar, e que foi igualmente apontado tanto no projecto de Plano como no parecer da Câmara Corporativa, é o da necessidade de coordenar a investigação.
Ë uma medida que se impõe e deverá realizar-se com a maior brevidade possível.
A coordenação do trabalho dos diferentes centros de investigação virá trazer uma considerável eficiência na sua actuação e permitirá um melhor aproveitamento de verbas.
Entendemos, no entanto, que os vários organismos científicos podem ser coordenados sem no entanto saírem do ambiente que é mais propício ao seu trabalho e sem os privar do íntimo contacto com outros serviços, que hão-de ser os disseminadores dos resultados das suas investigações.
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Assim, o Laboratório de Engenharia Civil está muito bem situado no Ministério das Obras Públicas, como o Instituto de Investigação Industrial e a Estação Agronómica Nacional têm o seu ambiente próprio na Secretaria de Estado da Indústria e na Secretaria de Estado da Agricultura, respectivamente.
Tive a honra de participar, como delegado português, nos trabalhos da 2.ª Conferência Parlamentar e Científica, realizada em Viena, nos fins de Maio deste ano.
Essa Conferência, organizada pelo Conselho da Europa e O. C. D. E., tinha por fim promover a aproximação de parlamentares e cientistas, de provocar troca de impressões e procurar atingir uma mútua compreensão dos trabalhos e desejos dos elementos dos dois sectores.
Entre as conclusões dessa Conferência figuram as seguintes recomendações:
1.º Que nos parlamentos exista uma maior percentagem de parlamentares com formação científica ou que estejam interessados nas questões da ciência;
2.º Que se procure estreitar a cooperação entre cientistas e parlamentares;
3.º Que exista em cada país um ministro encarregado de impulsionar e coordenar a política sob todos os seus aspectos.
O Presidente Eisenhower nomeou em 1957 o seu primeiro assistente especial para a ciência e tecnologia. Em 1959 o Reino Unido nomeou um ministro da ciência.
Noutros países, como a França, a Alemanha e a Itália, o Primeiro-Ministro considera necessário que através do seu gabinete se faça a coordenação dos programas e acções científicas dos centros de investigação situados nos outros departamentos ministeriais.
Na Conferência a que me referi o Ministro de Estado da França, Gaston Palewski, encarregado da investigação científica e das centrais atómicas especiais, afirmou que uma política da investigação científica é indispensável à independência de um país; acrescentando que, ao fazer esta afirmação, não se referia em especial às armas modernas, mas falava em sentido mais lato, ou seja no sentido da possibilidade de os países erguerem a sua voz e fazerem-se ouvir no conceito mundial.
Pode dizer-se que o pensamento dominante da Conferência foi o de que um ministério próprio ou um ministro procedesse à coordenação dos vários ramos da ciência.
Como se vê, é geral o pensamento de realizar a coordenação dos diferentes sectores da ciência nos vários países da Europa ocidental, o que se me afigura também urgente em relação ao nosso país.
Sr. Presidente, alguém disse que «investigar é construir para o futuro, porque não há futuro sem investigação».
Na realidade, os países que marcharam sempre na vanguarda do progresso dedicam à investigação especial cuidado, no sentido de promoverem o seu incremento. E o caso da Suécia, da Alemanha, da Inglaterra, da França e de tantos outros.
A subsecção de Ensino da Câmara Corporativa afirma que «a investigação, em geral muito reduzida e desorganizada, precisa de um vigoroso impulso, porquanto teremos de contar normalmente com resultados lentos».
Concordamos inteiramente com este pensamento, e oxalá a aspiração se transforme em realidade sem demora.
Sr. Presidente: Vimos atravessando há bastantes anos um período de marcado desenvolvimento económico, temo-nos lançado em arrojados empreendimentos, muitos dos quais já estão reflectindo o seu valor e outros hão-de evidenciá-lo logo que entrem em funcionamento. Impuseram-nos uma guerra que temos sabido aguentar com os nossos próprios recursos financeiros, dando ao Mundo lições do muito que é possível fazer quando se tem a casa em ordem, e tudo isto graças à superior visão e excepcional clarividência dó homem a quem a Providência tem dado, e tenho fé que continuará a dar, a energia necessária à direcção dos nossos destinos.
Vozes: -Muito bem, muito bem!
O Orador: - Desejaria que o Plano Intercalar de Fomento, embora se refira apenas a um triénio e constitua um período de estudo e preparação para se elaborar o III Plano de Fomento, seguramente com maior grandeza e mais largas possibilidades, desejaria, dizia eu, que os investimentos deste Plano Intercalar fossem de molde a permitir a realização dos objectivos que nele se definem. Certamente feria sido desejo do Governo uma projecção de maior amplitude, e se o não fez foi por realismo e prudência e por segurança no planeamento.
Não há, por isso, motivo de desânimo, e eu continuo a ter confiança e fé no futuro, certo de que a vasta obra há anos iniciada e em pleno desenvolvimento há-de ter brilhante sequência com a mais firme e a mais eficiente repercussão no progresso da economia nacional. Por isso, Sr. Presidente, dou a minha aprovação à proposta do Governo, pedindo, contudo, que sejam ponderadas as recomendações da Câmara Corporativa e aquelas que esta Câmara vier a formular.
Vozes: -Muito bem, muito bem! O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Teles Grilo: -Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vão para V. Ex.ª, Sr. Presidente, as minhas primeiras palavras. Palavras de muito respeito, de sempre aumentada consideração e apreço, de nunca diminuído regozijo por V. Ex. continuar a presidir, meritória e dignamente, aos destinos desta alta Câmara.
A todos VV. Ex.º, Srs. Deputados, lídimos representantes, ao mais alto nível, de complexos interesses nacionais ou regionais, estrénuos e tantas vezes mal compreendidos defensores das causas decisivas, das soluções últimas e implicantes com o amanhã da Pátria - e sempre assim, não obstante a impaciência e intolerância de alguns, a acrimónia e a não aceitação ou forçada aceitação de outros, e até a estultícia e ignorância de mais uns tantos, que, não descortinando outra forma de patentear recalcados azedumes e despeitos, engendram os mais caricatos e desconchavados arranjos em matéria protocolar , a todos VV. Ex.ªs, Srs. Deputados, dirijo as melhores saudações e os cumprimentos mais amistosos.
Sr. Presidente: O meu depoimento sobre o Plano Intercalar ora em discussão na generalidade não passará de um alinhavo de encómios com ligeiríssimas reservas, de solicitações com algumas esperanças, de esperanças com alguns receios, de uma ou outra abreviada crítica e de uma ou outra talvez descabida sugestão.
Toda esta gama de sentimentos díspares se revelará, e logo aí se confinará, ao analisar algumas das rubricas contidas no capítulo I dos programas sectoriais, ou seja, no capítulo referente à agricultura, silvicultura e pecuária.
Eu sou da terra. E sou pela terra.
Reconhecendo embora que a minha formação jurídica, e consequente deformação profissional, seja de molde a propiciar fáceis evasões do espírito, e o seu embrenhamento, por sistema, nas plagas aliciantes da especulação pura, o certo é que, por força de uma inexorável ances-
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tralidade, canalizada através de gerações sem conta, e toda ela amalgamada em sonhos e desilusões, em expectativas fagueiras e lastimosos soçobros, em lutas pertinazes de renovado ânimo e em amargos travos de derrota sempre certa, sinto que estou ligado à terra, prosaicamente e sem remédio, e que a ela devo tributo de defesa estável, permanente.
Eu sou da terra. E sou pela terra.
E, porque o sou, alinho, nesta emergência, e quase sem condições, ao lado dos que proclamam a insuficiência dos investimentos previstos no Plano Intercalar para a agricultura em geral.
Sem dúvida que o Plano em apreciação representa, no processo de desenvolvimento económico do País, uma etapa de; transição para o III Plano de Fomento, o que, em boa verdade, e também em boa justiça, logo impõe a adopção de especiais critérios de tolerância, quando haja de fazer-se a sua análise ou haja de entrar-se na sua discussão.
Considerado assim, como elo de ligação entre dois planos de fomento, como esforço sério para o ajustamento do condicionalismo que o precede ao condicionalismo que 1-he há-de sobrevir, temos de reconhecer que, para além da necessária precariedade de tal ajustamento, dada, sobretudo, a dificuldade de prever o sentido de evolução do processo da integração económica europeia, ou mesmo só da unificação do espaço económico português, o Plano Intercalar constitui seguramente, no decorrente transe nacional, uma resposta construtiva aos nossos anseios mais imediatos.
E nisso se descobrirá já um forte motivo de louvor, que não é único, pois de louvar é sempre, na actual e difícil conjuntura do País, a preocupação e a decisão de planear e executar um programa de tão vultosos investimentos. Creio, no entanto, que, se o escopo visado foi essencialmente o do aludido ajustamento, e visto que é de todos por de mais conhecida a chocante disparidade entre o -ritmo da expansão da agricultura e b dos restantes sectores da actividade nacional, deveriam ter-se programado investimentos em maior escala para determinados ramos do sector primário, o que f autorizaria a atenuação do desfasamento apontado, até um mínimo possibilitaste de recuperação total, ou seja, do ajustamento que há-de estar na base do desenvolvimento global e harmónico da Nação.
Pois, se se reconhece que a agricultura jamais poderá acompanhar a cadência do crescimento dos sectores secundário e terciário, e assim deixar de constituir um «estrangulamento ao processo de desenvolvimento em curso», sem que se adopte um complexo de medidas capazes, de provocar uma profunda alteração nas condições de produção agrícola e, por conseguinte, na vida das populações rurais, tal como se lê no projecto de Plano um apreciação, por que razão não há-de actuar-se, adentro das- possibilidades financeiras que ali se patenteiam, por uma forma corajosa e decisiva, no sentido de prosseguir os efeitos que se reputam indispensáveis à debelação do mal crónico nacional?
Não pode estar-se à espera de uma cada vez mais problemática colaboração da iniciativa privada no arranque inicial e urgente que se impõe, pois todos sabemos que os investimentos privados só por raríssima excepção poderão desempenhar o papel de criadores de infra-estruturas económicas, já que nesse caso a reprodutibilidade é duvidosa ou tardia e o grande, o enorme, problema que urge resolver é precisamente o de criar as novas estruturas em que o sector primário há-de assentar, com vista a iniciá-lo naquela autêntica corrida contra relógio que o levará a aproximar-se consoladoramente, confortavelmente, dos sectores que ora seguem na vanguarda a uma distância quase abissal!
Não sou técnico nestes assuntos, como por mais de uma vez tenho referido. Nem a um Deputado deve exigir-se que o seja, quando tenha de abordar nesta tribuna qualquer problema de interesse nacional e o faça procurando apenas sugerir, adentro de determinado pensamento ou doutrina política, as linhas gerais em que, a seu ver, melhor se acomodarão as soluções de tais problemas.
Julgo, assim, não ser ousado afirmar que em vão será á espera de que o investimento privado, em termos de eficiência no contexto económico nacional, venha a operar-se no sector agrícola durante a fase eriçada de obstáculos, pejada de receios, a transbordar de dúvidas, em que se processará a reestruturação do agro português, logo embora seguida de uma alteração de fundo nas condições de produção agrícola, com inevitáveis e, benfazejos reflexos na vida das populações rurais.
Estabeleçam-se primeiro e alguns já foram estabelecidos e vamos encontrá-los, por exemplo, nas leis sobre o emparcelamento, parcelamento e arrendamento da propriedade rústica os princípios definidores das bases mestras em que há-de assentar o novo edifício da nossa agricultura, e só então poderão ter plena viabilidade as medidas que vierem a adoptar-se no sentido de impulsionar o ritmo de crescimento do sector primário.
E ao Estado que competirá dar esse passo gigantesco, até porque, como bem se frisa no projecto, não pode aguardar-se a adaptação espontânea, dê um sector que apresenta tão especiais características sem correr o risco de se agravarem as assimetrias sectoriais que se registam no desenvolvimento económico do País.
Logo que se criem novas perspectivas para a nossa agricultura, logo que outras condições e possibilidades despontem no céu plúmbeo que hoje a cobre e amarfanha, logo que se vislumbre ao menos a esperança fundada de um porvir compensador para as desacreditadas coisas da lavoura, então, sim, apele-se para o investimento privado e confie-se que ele colaborará generosamente na prossecução do muitíssimo mais que estará para além dessa primeira esperança, dessas primeiras condições, perspectivas e possibilidades.
Não haja ilusões: ninguém, com bom juízo, aplicará capitais em empresas falidas ou arruinadas!
E a agricultura pátria salvo num ou noutro aspecto, assemelha-se, na verdade a, uma empresa não exactamente à beira da falência e há quem assim a considere , mas sem dúvida distante, muito distante mesmo, do alto grau de prosperidade a que tem incontestável jus.
Reafirmo, no entanto, o meu louvor ao Governo pela intensidade dos bons propósitos que evidenciou ao incluir no projecto intercalar toda uma série de medidas de política económica conducentes a estimular e orientar a iniciativa privada na lavoura, embora continue a entender que tais medidas: só se afirmariam inteiramente válidas após a execução, pelo Estado, das infra-estruturas e de outros empreendimentos de base que assegurassem o desabrochar virulento, mas ordenado, das forças internas da produção.
Louvor com pequena reserva, portanto.
E tanto mais pequena quanto1 é certo que o meu ponto de vista aparece afinal-perfilhado, pelo menos em parte, no próprio projecto, quando aí se afirma que, «reconhecida a impossibilidade e atender de forma imediata e satisfatória ã todas as condições de base do desenvolvimento da agricultura, pretende-se que o triénio de 1965-1967 constitua uma fase preparatória de esquemas que
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venham a conjugar, por um lado, no sistema horizontal, o melhor aproveitamento das características e possibilidades das diversas regiões do País e, por outro, as condições de organização vertical, especialmente a relativa aos serviços oficiais, de molde, a permitir uma coordenação, orientação e apoio do desenvolvimento regional em condições mais> adequadas às exigências do próprio crescimento económico e social do País».
Aguardemos que assim seja e que o Plano Intercalar de Fomento, se aprovado e executado, venha a constituir, de facto, o esperançoso ponto de partida para uma vida melhor nos vastos domínios da agricultura pátria.
Na elaboração do plano para a agricultura, silvicultura e pecuária foram considerados dois objectivos fundamentais: o aumento do produto agrícola e elevação do nível de vida das populações rurais e a valorização económica e social das regiões menos evoluídas.
Prevê-se que o primeiro destes objectivos possa alcançar-se mediante «a prioridade atribuída a investimentos de maior e mais rápida reprodutividade racional das explorações agrícolas», e para tanto se preconiza, em primeiro lugar, um melhor aproveitamento do território com o fomento da fruticultura, da horticultura, da floricultura e da pecuária, com a intensificação das culturas correctamente estabelecidas e com trabalhos de reconversão e reestruturação cultural; em segundo lugar, o apetrechamento técnico das empresas agrícolas, com o fomento da motomecanização e a realização de melhoramentos fundiários indispensáveis ao aumento da rentabilidade das explorações; em terceiro lugar, a adaptação social do sector a novas condições de produção, com a criação de centros de gestão e explorações piloto como base para a montagem de um vasto serviço de extensão agrícola e assistência técnica e com o recurso ao emparcelamento e outras formas de actuação no domínio da reorganização agrária, e, em último lugar, a melhoria da qualidade da produção, mediante a defesa sanitária das plantas e dos animais, a melhoria das condições de armazenagem, a conservação e transporte da produção, a criação de instalações para escolha, calibragem, acondicionamento e venda dos produtos agrícolas e a revisão dos circuitos de distribuição de alguns dos mesmos produtos.
Acentua-se, a finalizar, que a expansão da produção destinar-se-á a satisfazer tanto as exigências crescentes do mercado interno como as solicitações do mercado externo, e que estudos já realizados demonstram que o consumo interno e a exportação absorverão facilmente toda a produção, desde que a respectiva comercialização seja orientada em moldes modernos e eficientes. .
Quanto à realização do segundo objectivo fundamental, ou seja, a valorização económica e social das regiões menos evoluídas, afirma-se que ela assentará num conjunto de investimentos a tornar possível a execução de obras de viação rural, de abastecimento de água e de electrificação.
Constata-se assim que o Plano Intercalar tomou em consideração plena todas as necessidades, todas as falhas, todos os problemas que assoberbam a nossa agricultura, o que é inteiramente de aplaudir; mas não estabeleceu, por forma demarcada e imperantes, a prioridade que, volto a repeti-lo, se me afigura vital para a consecução de melhores resultados práticos.
E essa prioridade seria a da criação, em moldes acabados, e não, apenas timidamente anunciados ou tentados, das novas infra-estruturas da agricultura portuguesa, fautorizantes do seu autêntico desenvolvimento e crescimento.
A revolução, no bom sentido da palavra,! há-de fazer-se da base para o cume. E estou em crer que só por não se ter nunca encarado bem de frente, e corajosamente, este magno problema nacional é que as variadíssimas soluções que lhe tem sido apontadas acabam sempre por se revelar deficientes ou, mais precisamente, impotentes. E pergunto: toda a vasta programação insista no Plano Intercalar, abrangendo um conjunto de medidas complexas destinadas prioritariamente a uma reprodutividade imediata e com maiores taxas de crescimento, não estará na iminência, mau grado o seu realismo e validade indiscutível, de mais uma vez claudicar e não alcançar em termos definitivos a meta última que se propõe e toda u Nação ambiciona?
Não quero ser o Velho do Restelo ... Pressinto, no entanto, que o investimento de milhares de contos no fomento da fruticultura ou da pecuária, na assistência técnica ou na extensão agrícola, na sanidade das plantas ou na armazenagem dos produtos, nos melhoramentos agrícolas ou na viação rural e isto para citar alguns exemplos, apenas- se pode interessar, e interessa certamente, a uma determinada conjuntura actual e de sua natureza sempre efémera, já não se imporá como contributo decisivo para o futuro de sólida prosperidade agrícola com que todos nós sonhamos, se antes não forem investidos muitos mais milhares, mesmo milhões, de contos no firme estabelecimento de diferentes e novas infra-estruturas, e, portanto, de uma nova dimensão da agricultura, em que surjam, como realidades operantes, o emparcelamento integral possível da propriedade rústica, a reconversão agrária total possível, a reestruturação total possível das culturas fundamentais, etc.
Adentro da tese que defendo, estes receios tinham necessariamente de ser postos.
Eles aí ficam, na certeza, todavia, de que a execução do Plano Intercalar, na plenitude do seu significado de «operação de ajustamento» do ex ante ao ex post, assume particular importância neste difícil transe nacional, pois dele resultarão sempre inegáveis benefícios para todos os sectores da vida portuguesa, sem curar de saber se tais benefícios revestirão carácter transitório já que atidos a uma estreita dependência do Plano em si mesmo con- siderado, ou carácter duradouro, já que gerados, sempre renovadamente, nas reais potencialidades surgidas e destacadas desse próprio Plano.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - E é sobre o capítulo dos benefícios que deterei agora a minha atenção, uns momentos mais, para a circunscrever, aliás, a alguns daqueles que directamente interessam ao involuído Noroeste Transmontano, que tenho a honra de representar nesta Câmara.
Esta atrasadíssima região tem, na realidade, muito a esperar dos investimentos de maior e mais rápida reprodutividade, dos investimentos para a intensificação racional das explorações agrícolas e dos investimentos para a valorização rural.
Em boa verdade tem a esperar tudo, porque em boa verdade nada ou quase nada possui!
E a pergunta ansiadamente feita pelos que ali vivem com amargura a sua sujeição ao agro brota, irreprimível: quantos dos quase 3 milhões de contos programados para a agricultura, silvicultura e pecuária virão a caber à destroçada terra transmontana do Noroeste?
Muitos, sem dúvida, porque a Administração conhece de sobejo as faltas e necessidades de toda a ordem que por lá campeiam!
Mas não tantos, sem dúvida também, quantos seriam indispensáveis para. realizar o mínimo de condições de
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base essenciais à valorização dessa zona. como passo primeiro do seu desenvolvimento económico regional.
O caminho aí a percorrer é demasiado longo para ser vencido por um plano intercalar de fomento, que é afinal considerado no respectivo projecto como mera fase de um planeamento económico-social a mais largo prazo.
Apesar de tudo, reacendeu-se uma esperança que parecia já perdida.
Desde que se anuncia a «necessidade de eliminar ou atenuar as disparidades regionais do crescimento que se verificam na metrópole, favorecendo a evolução económica e social das regiões menos evoluídas, de modo a atingir-se um melhor desenvolvimento global do território e o adequado equilíbrio demográfico»; desde que se garante que «importa proceder, sob o ponto de vista social, à gradual revisão das condições de trabalho e de previdência social no campo, de forma que o trabalho agrícola deixe de ser encarado como uma actividade em situação de inferioridade em relação às outras, contrariando-se assim, em larga medida, o fenómeno do êxodo rural excessivo que se vem verificando em algumas regiões do País»; desde que se preconiza ainda a «estruturação de uma agricultura fortemente empresarial», e «a preparação especializada de empresários e trabalhadores agrícolas», e a «elevação da produtividade da terra e do trabalho agrícola», e «o aperfeiçoamento contínuo e rentável das técnicas», e «a melhoria das condições de comercialização e de industrialização dos produtos agrícolas», e «a revisão das condições de concessão de crédito agrícola» então é imperioso concluir que, ao elaborar-se este Plano Intercalar de Fomento, no capítulo respeitante à agricultura, silvicultura e pecuária, teve-se em vista acudir de urgência, e sobretudo, à agonizante lavoura transmontana, pois é nela que se vêem reflectidos, com mais chocante agudeza, os graves problemas a que o Plano pretende dar algum remédio.
E conclusão de resto confirmada pelo facto de, sob a rubrica «reorganização da estrutura agrária», fazer-se directa referência à veiga de Chaves e à várzea de Campeã, próximo de Vila Real, para se revelar que aí se executarão trabalhos de emparcelamento.
Além disso, e sob a rubrica «Armazenagem de produtos agrícolas», também se anuncia o intento de construir dois armazéns de concentração e retém de batata de consumo, com a capacidade de 900 t a 1200 t cada um, a integrar nos mercados centrais de Lisboa e Porto, e ainda nove unidades de 600 t cada uma, que serão localizadas de acordo com as solicitações das organizações de produtores. No que se refere à batata-semente, prevê-se a construção de um armazém, com a capacidade de 600 t, em local a determinar oportunamente.
São perspectivas agradáveis, estas, para o problema da batata- em geral, aquele que, de longe e no imediato, mais assoberba a região de Chaves e limítrofes.
E agradáveis porque uma rede eficiente de armazéns de concentração e retém da batata de consumo ou de semente constitui um passo decisivo na solução daquele problema, já que assegurando, por um lado, a regularização dos mercados quanto ao produto armazenado, assegura, por outro, e decadentemente disso, a estabilização e defesa dos respectivos preços, que é o que interessa ao lavrador.
Simplesmente, as unidades previstas não se afiguram bastantes, em atenção à média anual de produção de batata, e isso mesmo, segundo informações não oficiais chegadas até mim, teria já sido considerado pela Junta Nacional das Frutas, que, em conformidade, teria decidido construir não 12, mas 21 das referidas unidades.
Seja somo for, estas e outras medidas de boa e oportuna política económica, que, estou certo, a Câmara não desaprovará, fizeram rejubilar as desesperançadas gentes do Noroeste Transmontano, e da região de Chaves em particular. E quero desde já, em seu nome e em meu próprio, significar daqui ao Governo da Nação o mais vivo reconhecimento por tudo quanto, ao abrigo do Plano Intercalar de Fomento, possa ser realizado em prol da vasta e necessitada zona em referência.
Há que não esquecer, porém, que a armazenagem só se afirmará vantajosa e útil por completo quando for instituído, simultaneamente, um sistema adequado e próprio que vise o subsídio (não o imediato e integral pagamento) do produto armazenado na colheita, à semelhança do que é feito pela Junta Nacional dos Vinhos; nem esquecer, no que a Chaves se refere, que o emparcelamento da sua exuberante veiga será sempre obra inacabada sem a instalação de uma unidade industrial para desidratação de produtos agrícolas, como desde há tanto vem sendo reclamado e como de resto se contém perfeitamente no espírito do Plano Intercalar.
Terminarei com uma breve referência à rubrica «restruturação da vitivinicultura».
Reconhece-se que em relação à vinha se impõe, a par de outras medidas, uma profunda reestruturação cultural, tendo em vista, fundamentalmente, permitir a generalização do emprego de maquinaria vitícola e a consequente redução dos custos de produção, e isto porque se tende, cada vez mais, «para uma economia de grande concorrência entre países ou áreas geográficas».
Acrescenta-se, todavia, que se procederá «ao estudo das modalidades de estabelecimento de novos vinhedos e da adaptação dos existentes às condições determinadas pela utilização da maquinaria e pela conservação dos solos».
Ora, se nenhuma objecção há a fazer, e antes aplauso a expressar, pelo conjunto de medidas destinadas a conseguir a aludida reestruturação, e medidas cujo estudo se iniciaria na vigência do Plano Intercalar, impõe-se, todavia, e desde já, formular uma reserva séria quanto ao projectado estabelecimento de novos vinhedos, seja em que modalidade for.
Com efeito, não se descortina precisão de tal, a não ser longinquamente, quando a efectiva generalização do uso da máquina nas vinhas e a incidência de novos factores da produção operarem uma redução do custo capaz de suportar a concorrência mais desregrada e não houver então que recear os efeitos de uma sobreprodução.
Para já, porém, há vinho e vinhas que bastam e sobram!
Considere-se o panorama vitivinícola do País, ameaçado já por nuvens negras despontando ao longe; repare-se nos imensos stocks a que a Junta Nacional dos Vinhos não sabe ou não pode dar destino; anote-se a curva de crescimento do produtos vínicos, mau grado a estabilização ou mesmo o aumento dos preços de cultura; recorde-se a legislação repressiva sobre plantio da vinha e pasme-se com a expansão desse plantio verificada nos derradeiros anos; atente-se em tudo isto e em muito mais a constituir motivos de séria inquietação e reconheça-se que o anunciado estudo das modalidades de estabelecimento de novos vinhedos é de molde a causar, por si só, um verdadeiro pânico nas hostes viticultoras!
Por não se me afigurar inteiramente oportuno, julgo que esse estudo não deveria talvez iniciar-se por enquanto.
Não o justificando, cabalmente, as condições vigentes na nossa vitivinicultura, o seu adiamento, pelo menos, parece ser recomendável.
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Sr. Presidente: Os ligeiros reparos e reservas que acabo de fazer no tocante à agricultura não anulam e nem sequer abalam a minha firme esperança de que o Plano em discussão -a que, aliás, dou o meu voto na generalidade alcançará de facto, e adentro do quadro de possibilidades imediatas que lhe foi traçado, o alto escopo de carácter económico-social que presidiu à sua elaboração.
No seu conjunto, na sua completeza, ele contém as virtualidades necessárias para a realização de uma obra vultosa e de verdadeiro interesse nacional, não obstante eu continuar a defender que tal obra se revestiria de aspectos ou características decisivas no atinente ao futuro se fosse delineada e executada a partir de uma premissa diferente, e que seria a de uma agricultura já sólida e integralmente reestruturada, como todos desejam e como todos reconhecemos necessário.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador fui muito cumprimentado.
O Sr. Francisco António Martins: - Sr. Presidente o Srs. Deputados: Mandou o Governo à Assembleia Nacional para apreciação a proposta de lei referente ao Plano Intercalar de Fomento relativo ao triénio de 1965-1967. Sobre ele já informou a digna Câmara Corporativa um substancial e muito extenso parecer.
Compete agoira a esta Câmara ,pronunciar-se e decidir sobre o diploma e as sábias considerações formuladas pelo Governo e pela Câmara Corporativa.
Trata-se, como é óbvio, de um exame de todos os problemas da metrópole e do ultramar ligados ao seu desenvolvimento económico-social.
A extensão da toda(r) as considerações mandadas para a apreciação desta Assembleia não permite que todas elas sejam analisadas com a amplitude que merecem.
Ambos os trabalhos, curiosíssimos e plenos de ensinamentos, que muito ilustram os seus autores, revelam propósitos de valioso alcance e que fazem compreender todo o conjunto de soluções propostas para vários problemas que, como já disse, «e acham ligados ao progresso do nosso país.
Afirma1 o Governo ter escolhido os investimentos a realizar, pela aplicação de um critério selectivo que se poderá caracterizar, em «síntese, pela forma seguinte:
1. Preferência pelos empreendimentos de mais acentuada, directa e imediata reprodutividade;
2. Preferência pelas- actividades de produção de bens e serviços susceptíveis de satisfazer a procura nos marcados externos ou de substituir a importação de outros bens e serviços originários, do estrangeiro;
3.º Preferência pelas infra-estruturas que mais directamente contribuam para o alargamento e melhoria rio potencial produtivo da população».
Das observações da Câmara Corporativa sobre problemas comuns a várias províncias ultramarinas e quanto às proporções do Plano e disponibilidade do pessoal técnico e científico, chamo a atenção para os seguintes passos de grande aplicabilidade a Cabo Verde:
a) Dividir atribuições Para o mesmo trabalho passarão, em certos casos, a ser necessários menos técnicos, podendo, portanto, os existentes dar maior rendimento ou evitar-se a procura de mais especialistas;
b) Exercer-se maior fiscalização sobre as actividades dos técnicos, em especial dos que constituem brigadas ou missões temporárias;
c) Chamar a colaboração de técnicos estrangeiros nos casos em que seja necessário, sem a preocupação de ofensas a um mal entendido orgulho nacional;
d) Criar subsídios universitários para o ingresso de maior número de estudantes aos cursos universitários Para o fim considera-se aconselhável uma verba de 100 000 contos e o número de 1000 estudantes ultramarinos durante a vigência do Plano e através de institutos de crédito, como, aliás, existiu na índia, pela Caixa Económica.
E ainda para mais este passo:
E pena que o projecto de Plano Intercalar não venha acompanhado de apreciação sucinta e concreta dos governos ultramarinos e do parecer do Conselho Superior do Fomento Ultramarino e da informação da Direcção-Geral de Fazenda do Ultramar.
Também seria muito útil que o projecto elucidasse sobre utilização das dotações dos planos anteriores, pelo menos nos empreendimentos mais vultosos, com a indicação das dotações utilizadas e com os resultados obtidos.
Os pareceres da Comissão de Contas desta Assembleia Nacional, como já afirmei mais de uma vez em intervenções aqui produzidas, fotografam a situação económica de Cabo Verde, em face do I e II Planos de Fomento. Esses pareceres têm feito apreciações com perfeito conhecimento de causa.
Sem ensombrar carregadamente o quadro, eles insistem «em que se trata de situação de certo modo grave que não podemos nem devemos ocultar».
Reconhecem «que do emprego de vultosos investimentos a resposta é a quase absoluta negatividade quanto a reprodutividade».
Temos de arrepiar caminho e adoptar as providências da Câmara Corporativa e já transcritas.
Julgo também aconselhável pôr em prática aquelas que no relatório do Governo se preconizam, umas e outras postas em foco nas referidas transcrições.
Tenho a certeza de que o Governo, sempre animado do melhor propósito de bem servir, fará aplicar na administração os princípios indicados, a fim de não continuarmos a assistir à negatividade dos resultados da aplicação dos capitais investidos em fomento de Cabo Verde.
Acrescente-se que a boa vontade do Governo tem-se manifestado claramente, não. se furtando a emprestar à província o bastante para que todos os desígnios apontados no I e II Planos de Fomento pudessem ser cumpridos. Mas tanto não tem acontecido e o facto ficará comprovadíssimo para quantos seguem de perto a evolução da economia de Cabo Verde e para os outros que possam ter lido os vários pareceres emitidos pela Comissão de Contas desta Câmara, manifestando estranheza pela diminuta reprodutividade dos investimentos, chegando mesmo a propor «que se fizesse um. inquérito» para bem se aquilatar das causas do esbanjamento de tanto dinheiro (não estará hoje muito longe dos 500 000 contos) sem resultado.
Volto a patrocinar a ideia luminosa desse inquérito.
A parte certas infra-estruturas, absolutamente indispensáveis, como sejam a construção de dois cais acostáveis, de vários aeroportos e algumas estradas, casos a que me referirei em devido tempo, quero destacar poder-se assegurar que o programa de política económica subordinado
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a determinados objectivos não tem sido devidamente cumprido, porquanto se verifica que:
1.º Não se vê aumentada a riqueza de Cabo Verde e, como consequência, não tem melhorado r nível de vida dos cabo-verdianos, antes se tem degradado;
2.º Não se lhes tem proporcionado mais trabalho, maior número de empregos e de oportunidades;
3.º Tem-se importado mais, mantendo-se quase estagnada a exportação.
De tudo isso parece concluir-se que a ineficiência subverteu as intenções realizadoras do Governo.
No programa provincial de investimentos e na parte referente a estrutura económica, quando trata da agricultura, o relatório do Governo, entre outras afirmações, diz que
Considerando os elementos da estatística das exportações e, por outro lado, o ritmo crescente das importações de géneros alimentícios de primeira necessidade, parece poder-se concluir que, nas condições actuais, a produção agrícola é incapaz de satisfazer as necessidades alimentares da população em aumento.
Há, certamente, um complexo conjunto de factores explicativos desta evolução.
Cita o facto de estar ainda pouco difundido o ensino agrícola em Cabo Verde, justamente com a defeituosa estrutura agrária, apesar do esforço feito, no sentido de a corrigir, com a publicação do Decreto-Lei n.º 42 390, de 15 de Julho de 1958.
E, mais adiante, considera que a escassez e o regime errático das chuvas, as temperaturas elevadas, o vento intenso e persistente durante a maior parte do ano, o extremo acidentado do terreno e a reduzida extensão de terras com vocação agrícola e, finalmente, a defeituosa estrutura agrária são factores que não permitem alimentar grande ilusão sobre as fraquíssimas possibilidades agrícolas da província.
A parte algumas inexactidões contidas nesta parte do relatório e que poderiam ser esclarecidas, no domínio dos factos, pelos que vivem em contacto com a vida agrícola da província, temos de assentar em dois princípios:
1.º O que interessa é assegurar à terra condições com as quais possa ser permanentemente utilizada como fonte de produção. Temos de pensar em regiões como Israel e outras, onde o homem vai levando de vencida as precárias condições naturais.
2.º Em todas as regiões áridas e semiáridas (caso de Cabo Verde) o denominador comum da seca é a água.
«Dada a importância e a variabilidade desse factor, a agricultura caracteriza-se por produções muito flutuantes e imprevisíveis».
Assim sendo, tem de admitir-se que, não havendo possibilidade de conseguir «água» para a agricultura, que tem sido desde a descoberta do arquipélago a base do seu desenvolvimento económico, o problema agrário deixaria de interessar.
Confirma-se assim a opinião do Governo neste passo do seu relatório quando afirma que, «dados determinados factores existentes, estes não permitem alimentar grande ilusão sobre as fraquíssimas possibilidades agrícolas».
Mas, se assim é, por que se despendeu no I Plano e até ao ano de 1962 (inclusive), no sector «Agricultura» (excluindo os 23 276 contos para pesquisa de água doce), a substancial quantia de 97 816 contos, sem levar em conta os 42 000 contos com que o Plano Intercalar dota a rubrica «Agricultura, silvicultura e pecuária»?
A água para a agricultura só pode vir da terra ou do céu.
Que experiências, que trabalhos intensivos nos sectores hidrológicos se realizaram e que garantam ser impraticável a obtenção de água do subsolo?
Sendo ela quase o único elemento capaz de obstar aos efeitos das secas, não se compreende que no I e II Planos de Fomento, e em especial neste Plano Intercalar, não apareça nenhuma referência à seca, com o realce devido, ao fenómeno mais grandioso e .negativo da história económico-social da província.
As secas são um fenómeno normal da vida Cabo-Verdiana, fenómeno cuja incidência trágica e antieconómica terá de repetir-se não se sabe até quando.
Por isso mesmo me parece que qualquer plano de fomento teria de tomar como base o fenómeno periódico, com uma organização permanente, isto é, a guerra contra as secas, que não pode consistir apenas em batalha contra a seca, quando ela surge em um ou anais anos seguidos ou intercalados, como a que foi posta em prática em 1959-1960 pelo governador Silvério Marque», evitando a morte de dezenas de milhares de habitantes.
Foi ganha uma batalha num belo esforço, nas suas implicações humanas, mas que nem por isso deixou de constituir, como todas as batalhas, um sorvedouro improdutivo, do ponto de vista económico.
No Nordeste Brasileiro existe desde 1954 um departamento nacional de obras contra as secas, cuja função especifica é combater por todas as formas as secas, também, ali flagelo cíclico.
Nenhum organismo tem em Cabo Verde a função específica de luta contra as secas.
As brigadas de trabalhos hidráulicos e de melhoramentos hidroagrícolas, na medida em que construíram levadas e- melhoraram as condições de aproveitamento de algumas nascentes, terão concorrido para a economia da água, o que representa uma achega à luta contra as secas.
Mas estão longe de funcionar como órgãos específicos de luta.
Indubitavelmente que a seca é um fenómeno meteorológico e, no entanto, não se fizeram, integrados naqueles» Planos, nem estão .previstos no Plano Intercalar, trabalhos intensivos de investigação meteorológicos, nomeadamente nos domínios da hidrologia, experiências de estimulação da precipitação, a tão falada chuva artificial, estudo do regime torrencial e de prevenção da evaporação, à parte os estudos feitos* pela Missão Agronómica de Cabo Verde e Guiné, que por certo se sentiu ma necessidade de fazer alguns, dada a grande lacuna existente.
Desde o século passado que a importância dos estudos e trabalhos meteorológicos em Cabo Verde vem sendo posta em relevo, dada a influência trágica das secas.
E que o Governo tinha em grande conta o conhecimento meteorológico do arquipélago com vista à assistência agro-meteorológica é comprovado pelos vários relatórios publicados pela Direcção-Geral do Fomento do Ultramar e pela nomeação de dois meteorologistas (engenheiros geógrafos), um na Praia, outro no Mindelo, incumbidos de dar assistência ao governo local em assuntos de meteorologia.
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Suponho ter sido o governador João de Figueiredo um dos maiores propulsionadores da cobertura agro-meteorológica das ilhas, mas foi sol de pouca dura o impulso que ele deu a esses serviços.
Não quero deixar de me referir neste momento, e a propósito, a um problema que altamente interessa a Cabo Verde e sempre me entusiasmou: a provocação da chuva, aspiração muito antiga do povo do arquipélago.
As técnicas de ataque às nuvens para provocar aumento de precipitação, pelo que tenho lido, têm sido usadas em França, Estados Unidos, Marrocos, Tunísia, ex-Africa Equatorial Francesa, Uganda, Israel, Austrália, etc.
O nosso país também se interessou, a ponto de, em 1953, a Junta de Investigações do Ultramar ter enviado a França um bolseiro para estudar este problema que abria novos horizontes de esperança para Cabo Verde, terra onde «a chuva equivale a vida e a seca equivale a morte».
O bolseiro enviado foi, por curiosa coincidência, um filho de Cabo Verde, o Eng. Humberto Fonseca, que de há muitos anos a esta parte vem dedicando grande esforço no estudo dos problemas relacionados com as secas de Cabo Verde.
No seu relatório, que foi mandado publicar pela Junta de Investigações do Ultramar em 1954, preconizava, abertamente, a necessidade de se realizarem as experiências
E que eu saiba nisso se ficou. Pelo menos em Cabo Verde, terra nossa que mais precisa dessas experiências, elas não foram feitas. E nunca dei fé de que em qualquer parte do nosso vastíssimo território as experiências tenham sido realizadas.
Outro tanto não sucede em terras estranhas.
No Congresso Mundial de Energia, em Madrid (1960), o chair man do grupo de cientistas da Commonwealth Scientific and Industrial Research apresentou uma tese intitulada «Rain making and Prevention of evaporation as mean of increasing the water resource of Austrália», com as seguintes conclusões:
As quedas de chuva são variáveis e pouco abundantes sobre a maior parte da Austrália, e existem poucas possibilidades de desenvolver a irrigação e os projectos hidroeléctricos. (Parece, meus senhores, que falavam de Cabo Verde). A organização da Commonwealth para as investigações científicas e industriais (C. S. I. E. O.) conduziu, em consequência, um programa intensivo de investigação sobre a precipitação artificial.
Experiências de fecundação de nuvens foram efectuadas ao mesmo tempo sobre nuvens isoladas e sobre vastas extensões nebulosas. Numa das séries de experiências conduzidas durante quatro anos e tende por objectivo a fecundação de uma região de captação de água situada nas montanhas, ganhos notórios de quantidade de precipitação caída foram registados.
Como a evaporação anual normal é muito elevada sobre a maior parte da Austrália, a C. S. I. E. O. estudou igualmente métodos permitindo reduzir esta evaporação.
Dizem aqueles categorizados cientistas:
Os resultados destas investigações sobre chuva artificial e controle da evaporação sugerem que importantes aumentos nas disponibilidades de água para produção de electricidade e irrigação podem ser conseguidos pelos métodos indicados ...
... Um aumento de precipitação sobre a área de captação, igual ao obtido na área das experiências, durante o programa, corresponderia a um suplemento em água equivalente a 660 milhões de kilowatts-hora por ano. Os resultados obtidos na área de ensaios sugerem que mesmo mais largos aumentos seriam possíveis.
Uma entidade como a Commonwealth Scientific and Industrial Research não iria para um congresso internacional apresentar falsos resultados.
Estou batendo com certo pormenor neste assunto, pois trata-se do problema de mais vital interesse para o povo de Cabo Verde.
No Congo ex-Francês o Prof. Desseins, director do Instituto de Física do Globo, de Clermont-Ferrand, fez nascer uma nuvem em plena época seca, em dia de céu totalmente limpo, tendo obtido um pequeno aguaceiro.
Que resultados se obteriam em Cabo Verde aplicando a mesma técnica, não em dia de céu limpo, mas naqueles muitos dias da época das chuvas em que as nuvens se formam espontaneamente, mas não chegam a precipitar sobre os campos, trágica e irrisòriamente ressequidos, chovendo no mar à vista da população desalentada?
O meteorologista francês E. du Chaxel, que desde 1955 vem efectuando experiências de chuva artificial na ex-Africa Equatorial Francesa, depois de descrever as experiências por ele realizadas nos Camarões com a ajuda dá aviões das forças aéreas locais, diz, em conclusão:
Do conjunto das experiências efectuadas a norte dos Camarões e diversas regiões da África Equatorial Francesa pode destacar-se um certo número de conclusões. A primeira é que a inseminação de cúmulos, com um produto higroscópico ou de água, é susceptível de desencadear precipitações.
Se bem que este assunto seja objecto de controvérsias, ele é inegável, tanto para o experimentador como para as equipas diferentes que trabalham com ele.
Mais adiante ele diz:
Eu penso ter mostrado, pelo que precede, que o desencadeamento artificial das precipitações é possível nestas regiões e que pode apresentar um interesse económico certo.
Estas campanhas visam campos de algodão da Companhia Francesa para o Desenvolvimento das Fibras Têxteis.
No relatório da comissão americana que foi incumbida pelo Congresso Americano, em 1953, de investigar sobre os resultados obtidos nos Estados Unidos pelas técnicas de inseminação artificial de nuvens as conclusões foram de que um aumento de, pelo menos, 10 a 15 por cento na precipitação foi obtido nas áreas onde se efectuaram experiências.
Por outro lado, técnicos da F. A. O. entendem que um aumento de 15 por cento na pluviosidade de uma região pode corresponder a um aumento de 50 por cento na produção!
Pelo exposto, parece-me que, ainda que tardiamente, é chegado o momento de iniciar uma série de realizações, entre as quais a provocação de chuva.
Seria, pois, acertado que ficasse bem assente a imperiosa necessidade da realização de experiências de provocação da chuva em Cabo Verde.
Façam-se experiências e decida-se sobre os resultados obtidos.
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A Junta de Investigações promoveria á realização efectiva de tais experiências, de acordo com os Institutos Geo-físicos de Lisboa, Porto e Coimbra, que foram justamente criados para auxiliarem a resolver problemas delicados como este.
O primeiro aspecto possibilidade de obter «água» do céu parece suficientemente esclarecido, restando agora aludir ao que se prende com a existência de água nos subsolos do arquipélago.
Em 1958 o Governo contratou os serviços de um perito israelita, o Sr. Mitchel, que percorreu todas as ilhas, tendo elaborado um trabalho intitulado «Hidrologia do Arquipélago de Cabo Verde».
Nas suas conclusões recomendou vários empreendimentos, entre eles a abertura de muitos poços, mas afirmou que seria inútil fazer prospecção geofísica de águas, dada a natureza vulcânica das ilhas. Não se realizaram os empreendimentos por esse especialista recomendados, mas foi constituída uma missão e começou-se a fazer prospecção geofísica! De duas uma: ou se desperdiçaram centenas de contos com o envio a Cabo Verde de um técnico estrangeiro incompetente, ou foi certo esse envio, mas não foi justificável a constituição de uma missão para se realizar tal prospecção geofísica de águas, contra-indicada por Mitchel.
Este facto é mais um a juntar a tantos outros que documentam bem a necessidade de uma drástica mas criteriosa revisão da forma como se têm despendido verbas do Plano de Fomento, como neste caso de pesquisa de águas.
Sendo as ilhas unidades espaciais relativamente pequenas, é fora de dúvida que uma rede de uma ou duas dezenas de «furos» teria múltiplas vantagens, pois forneceria dados importantes sobre a desconhecida estrutura geológica das ilhas em profundidade e indicaria se há ou não lençóis de água com interesse económico.
A orientação de um geólogo seria suficiente e necessária neste empreendimento.
Se em Portugal não houver quem possa de tanto se ocupar, por que não proceder como em Moçambique, onde, quando governava essa província o comandante Gabriel Teixeira, a uma companhia estrangeira foi dado o encargo de proceder ao estudo hidrogeológico da província do Sul do Save, culminado pela publicação de um famoso relatório, digno de ser lido por especialistas na matéria. Nele se afirma a grande importância dos- resultados obtidos. Nesse caso não houve, como muito bem diz a Câmara Corporativa, «um mal entendido orgulho nacional» e foram-se buscar ao estrangeiro técnicos que nos faltavam. Mas talvez que nem isso seja preciso, pois é natural que tenhamos já hoje quem possa resolver o problema.
Não será simples e rápida a solução da maior parte dos problemas apontados no relatório A Agricultura em Cabo Verde, redigido por dois técnicos que foram enviados a essa província justamente para estudar os seus problemas agrícolas.
Nesse relatório afirmam:
Sabe-se, embora muitas vezes se esqueça, que a aquisição de conhecimento e, portanto, a capacidade de modificar, introduzir, dirigir e realizar pressupõe o exercício de uma actividade única: «a investigação científica».
Sem essa investigação, sem trabalho experimental, continuaremos em Cabo Verde dominados por uma rotina agrária primitiva, trescalando o século XVI. Ainda se não houvesse consequências .., mas há-as. Milhares de cabo-verdianos têm pago este pecado de omissão, periodicamente, com o que têm de mais caro: a própria vida; e o Estado, em pura perda, é desfalcado de algumas dezenas de milhares de contos.
Ao terminar a apreciação do segundo sector («Agricultura») do Plano Intercalar, quis deixar transcritas estas palavras da autoria de técnicos que aprofundaram os estudos sobre a agro-pecuária da província, estudos até então (1956) nunca devidamente feitos:.
Trata-se de uma judiciosa prevenção que o Governo vai, decerto, tomar em revida conta.
Terminada esta insuficiente exposição sobre a água e o problema agrícola, insuficiente porque o tempo de que disponho não permite que eu possa expandir-me em mais considerações, iniciarei de seguida um sucinto relato sobre energia, que pela primeia vez vem marcada nos planos de fomento de Cabo Verde .como empreendimento.
O Governo afirma no ,seu relatório, em referência ao aproveitamento de energia, o seguinte:
Não há rios mo arquipélago dignos desse nome, mas simplesmente alguns caudais diminutos e irregulares. Em contrapartida, o arquipélago parece oferecer boas possibilidades de aproveitamento das energias solar e eólica. As instalações de energia eléctrica a província são constituídas na sua totalidade por geradores Diesel, eléctricos.
A potência instalaria em Cabo Verde em 1963 era de 993 kW, assim distribuídos: Praia, 368 kW; Mindelo, 432 kW; restantes (sete localidades), 193 kW.
Num total podem contar-se ainda quatro ilhas sem abastecimento público de energia eléctrica.
Prevê-se que a potência a instalar possa atingir, na vigência do Plano Intercalar, 1553 kW. Se assim acontecer, a potência total será de 2550 kW.
Para abastecimento de pequenas povoações sem meios de produção próprios conta-se ainda com a instalação de redes de distribuição de média tensão na Praia, Mindelo, Vila Maria Pia, Nova Sintra e Sal Rei.
E o Governo quem insiste, quanto a energia eólica e solar, nestes termos (p. 62, n.º 22):
Para aproveitamento da energia eólica e da energia solar, torna-se necessário proceder a estudos com o apoio do Laboratório Nacional de Engenharia Civil.
Não posso deixar de realçar a quantia atribuída à energia. São 23 000 contos - muito ou pouco não interessa de momento. O que vale é a iniciativa do Governo, que merece o meu incondicional apoio e aplauso, porquanto a energia é um dos primordiais factores do desenvolvimento de uma região.
Cabo Verde não dispõe, infelizmente, de fontes clássicas de energia, nem florestas, nem rios, nem carvão, nem petróleo.
Preocupado com este outro aspecto da aparente avareza da mãe-natura para com Cabo Verde, o ]á referido Eng. Fonseca vem de há vários anos para cá fazendo uma verdadeira campanha científica a favor do aproveitamento da energia do vento no arquipélago, mostrando também a grande riqueza dessa área em energia solar, campanha vivamente apoiada pela esclarecida opinião de mais alguns engenheiros de renome, como sejam o antigo Ministro do Ultramar Bacelar Bebiano, Teixeira Barbosa e Duarte Ferreira, da Direcção-Geral do Fomento.
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Fonseca descreve numa das suas publicações o que se vem fazendo em muitos territórios do Mundo sobre estas duas formas de energia, e em 1956 apresentou no Congresso de Africanistas Ocidentais, em S. Tomé, numa tese, os seguintes números:
Com base nos dados do anemógrafo do Mindelo enunciou que uma rede de 100 aeromotores podia produzir vários milhões de kilowatts-hora.
Quanto à energia solar, durante o ano de 1955 os dados actinográficos do Mindelo revelaram que sobre cada quilómetro quadrado incidia uma energia solar bastante superior à energia debitada durante o mesmo ano por todas as centrais hidroeléctricas da metrópole.
O V Congresso Nacional de Pesca recomendou, com base numa tese sobre energia do vento no litoral dos territórios portugueses, que se procedesse ao estudo e aproveitamento da energia do vento, particularmente nas regiões como Cabo Verde e litoral do Sul de Angola, onde escasseiam fontes clássicas de energia.
O governador de Cabo Verde interessou-se pelo problema e já se deram alguns primeiros passos no sentido do aproveitamento destas duas formas de energia.
Calculando o preço por que ficaria o kilowatt produzido pelo vento e por meios clássicos, o Eng.º Duarte Ferreira, que se deslocou à província para o estudo da electrificação, chegou às seguintes conclusões na tese apresentada aos colóquios cabo-verdianos:
Utilizada a energia do vento só para a iluminação, o que equivaleria a aproveitar apenas 30 000 kWh dos 80 000 kWh capazes de serem produzidos por um- aparelho de 25 kW de potência, já comercializado na Grã-Bretanha, o preço da energia eólica ficaria por 3 $60, enquanto que o da energia térmica por 3 $90. Isto é, valores próximos, embora o interesse eólico trouxesse vantagens na economia das divisas.
Mas, diz o mesmo técnico:
Se for possível aproveitar toda a energia produzida pelo aeromotor referido, quer dizer, se fossem utilizados os 80 000 kWh que o aparelho pode produzir, então o preço passaria para 1 $40.
Parece-me que estes números indicam e justificam o caminho a seguir, pelo que suponho ser indiscutível que, dos 23 000 contos com que o Plano Intercalar dota o empreendimento «Energia», desde já se utilize parte dessa dotação numa campanha de prospecção de sítios mais favoráveis à captação da energia do vento em Cabo Verde, trabalho já realizado nas Canárias pelos espanhóis, sempre mais apressados que nós na pesquisa de riquezas, como também aconteceu há poucos dias, segundo informam os periódicos, com os brilhantes resultados obtidos com a dessalinização da água do mar à custa de energia solar.
E urgente reiniciar e intensificar os estudos e trabalhos atinentes ao aproveitamento da energia solar em Cabo Verde com vista à sua aplicação económica, à secagem racional dos produtos agrícolas, secagem higiénica do peixe, destilação da água do mar, dessalobrização das águas dos poços, etc.
Se em Cabo Verde existem condições especiais quanto a estas suas formas de energia, temos de procurar, na melhor medida possível, tirar partido dessas condições.
Só podemos confiar na opinião dos cientistas que se interessam e mexem nestes assuntos, sejam eles nacionais ou estrangeiros (não parecendo que tenhamos de recorrer a estes últimos), e utilizá-los para a tradução prática de ideias ou processos.
A Junta de Investigações do Ultramar terá de desempenhar um papel primordial nestes assuntos.
Terra onde o vento é elemento de constante valia, porque sopra forte quase todo o ano, e em que o Sol, afora os três meses de chuvas, praticamente não deixa de lançar sobre a terra os seus raios luminosos e caloríferos, não é de aceitar que se- não use de todos os meios para que ela aproveite os benefícios que lhe são oferecidos por essas duas fontes de energia.
Se fosse preciso vincar fortemente a importância das energias atrás citadas, bastaria anotar o interesse que muitos países têm dedicado ao problema.
Indicarei apenas alguns desses países:
Espanha. - Comissão Nacional de Energias Especiais.
Israel:
Laboratório de Técnica Solar (Tecnion).
National Fisical Laboratory.
Comissão de Energia do Vento, pertencente à Israel Eesearch. Desde 1954 os trabalhos de prospecção de energia eólica passaram a decorrer em cooperação com o Comité da Energia do Vento da U. N. E. S. C. O.
Inglaterra. - Comissão de Energia Eólica.
França. - Comissão Técnica de Energia do Vento (desde 1948), estendendo a sua acção até à Tunísia, Madagáscar e antiga África Equatorial Francesa.
Rússia. - Instituto Central de Energia do Vento, em Moscovo (1933).
Grécia. - Sociedade Científica de Energia Solar e Eólica, presidida pelo presidente da Comissão Grega de Energia Atómica.
Dacar. - Secção de Energia Solar do Instituto de Física Meteorológica, anexa à Faculdade de Ciências de Dacar.
Repetirei, porque nunca é de mais fazê-lo, que a atenção dispensada pelo nosso Governo à energia, tão importante ramo de riqueza nacional, neste Plano Intercalar mostra bem o seu enorme interesse em propiciar à província de Cabo Verde as possibilidades de desenvolver todas as suas fontes de riqueza. Esse interesse tem falhado em alguns sectores da Administração, mas de modo nenhum se pode considerar essas falhas como significando falência daqueles em cujas mãos se acha entregue a gestão dos negócios públicos.
Insisto por que o Governo promova urgentemente que se proceda aos trabalhos de hidrogeologia do arquipélago, bem como quanto ao aproveitamento das energias eólica e solar.
O importante problema da pesca está agora posto para Cabo Verde como nunca o fora até ao presente. E, pois, altura de deixarmos as lamentações inerentes ao desperdício durante tantos anos de uma riqueza potencial enorme e procurarmos concretizar as aspirações do povo de Cabo Verde neste importante capítulo do seu fomento.
Dos 2500 contos de dotações autorizadas para a pesca no II Plano só foram utilizados, até 1962, 71 contos (66 contos em 1959 è 5 contos em 1960).
Não farei comentários a esta anomalia.
No Plano Intercalar aparecem inscritos 258 000 contos para três anos, o que mostra bem a importância não só local e nacional como- ainda internacional da verba atribuída agora à pesca em Cabo Verde. Digo internacional, pois dos 258 000 contos 258 000 correspondem ao investi-
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mento que vai ser financiado por capitais alemães através da Companhia de Pesca e Congelação de Cabo Verde, mais conhecida por Congel.
O Estudo, e muito bem, dá o seu apoio ao desenvolvimento da pesca em Cabo Verde e não hesita em avalizar o recurso ao capital externo. E uma atitude de largo alcance e vistas novas, de acordo, aliás, com o que se tem feito em muitos países em vias de desenvolvimento.
O capital externo, quando bem orientado e bem vigiado, pode ser tão útil ao fomento nacional como o interno.
Mas importa que o programa económico-social enunciado pela Congel, no seu prospecto Memória descritiva do empreendimento industrial da Congel, venha a ter realização efectiva.
É esse o aspecto da vigilância a que me referi atrás. Muitas vezes as empresas, enquanto procuram as facilidades inerentes à sua instalação ou à conquista de uma posição vantajosa no mercado de oferta de capitais, apresentam programas aliciantes de alcance social, programas que depois caem no esquecimento quando se trata de realização efectiva.
No programa da Congel contam-se:
No plano industrial:
a) Fábrica de conservas;
b) Fábrica de vazio;
c) Fábrica de farinha e óleos de peixe, com capacidade de 50 t diárias;
d) Estação de transformação de água do mar em água doce;
e) Construção de dez atuneiros, com capacidade de armazenagem de 3001 cada unidade.
No plano social:
a) Emprego para 2000 pessoas;
b) Construção de residências para todos os funcionários da Congel e respectivas famílias;
c) Infantário e escola infantil;
d) Um centro social com salão de reuniões, cinema e teatro, discoteca, biblioteca, salas de jogos, atletismo;
e) Serviços de saúde privativos com um hospital, que funcionará com consulta externa, um serviço de internamento e um serviço de urgência, hospital com 50 camas. Terá também um bloco operatório para grande cirurgia e serviços de obstetrícia, infecto-contagiosos, radiologia, electrocardiografia, fisioterapia, farmácia, laboratório, etc.
Até da assistência religiosa não descura o programa, que promete uma igreja com, possivelmente, capelão privativo.
E o programa de um verdadeiro complexo industrial, honroso para qualquer projecto de fomento no qual se integre.
Num dos discursos proferidos pelo governador de Cabo Verde coronel Silvino Marques foi reiterada publicamente a garantia de 2000 empregos prometidos pela Congel.
Importa, pois, que este programa não seja alterado e que os 2000 empregos, aureolados pelo cortejo de benefícios sociais prometidos, venham, na realidade, suavizar as duríssimas condições actuais do mercado de trabalho de Cabo Verde.
Faço votos por que se não concretizem certos receios e rumores que circulam sobre um novo projecto de organização quase automática, limitada principalmente no sector da congelação, o que importaria numa redução substancial e pouco justa das perspectivas de empregos para a gente da terra e dos possíveis lucros para a província.
No parecer da Câmara Corporativa e no ponto em que se ocupa da formulação do Plano Intercalar de Fomento das províncias ultramarinas informa que, ao abrigo do artigo 5.º do Decreto n.º 45 258, de 21 de Setembro de 1963, que define a orgânica da Comissão de Coordenação dos Serviços Provinciais do Planeamento e Integração Económica, o Ministério do Ultramar criou, a partir de 25 de Novembro de 1963, os dez grupos de trabalhos para o estudo do Plano Intercalar em apreciação, indicando no 6.º grupo: «migração, mão-de-obra e assuntos sociais».
A ilustre Câmara Corporativa, quando se ocupa da análise dos empreendimentos e realizações previstos no projecto de Plano referentes a Cabo Verde, escreve:
Anota-se que a emigração deve merecer cuidadosa atenção e todas as facilidades*
E já que a Câmara Corporativa exige para ela atenção e facilidades, farei sobre o assunto ligeiras considerações.
E de facto a emigração problema fundamental para o fomento de Cabo Verde, especialmente quando orientada para países ricos e evoluídos.
Porém, não é a já famigerada emigração para S. Tomé, de que o saldo é negativo na douta opinião do ilustre relator do projecto de Plano em discussão. Nem dinheiro, nem divisas, nem melhoria do saldo fisiológico, resulta para Cabo Verde de tal emigração.
Já o mesmo se não pode dizer da frutuosa emigração para a Holanda, França e Estados Unidos. As portas dos Estados Unidos estão semicerradas, mas as da Europa abrem-se cada dia mais à emigração cabo-verdiana.
Grandes benefícios já vão resultando do fluxo emigratório incipiente para a Holanda e França. Há que fomentar essa corrente até que atinja 3000 a 5000 emigrantes por ano, única maneira de se fomentar Cabo Verde eficientemente no capítulo da emigração. O aumento explosivo da população verificado naquela província assumirá carácter catastrófico se não houver um escoadouro compensador.
Num douto parecer é analisado o problema do crescimento populacional, para se chegar à conclusão de um aumento de cerca de 40 000 novos candidatos a empregos, em Cabo Verde, nos próximos três anos.
Ora, o mercado de trabalho naquela província vem estando de ano para ano mais que superlotado no tocante à oferta, pelo que a grande solução para o impasse económico-social, criado por essa emergência de mais 40 000 candidatos, terá de ser a emigração.
Dados os níveis actuais de desemprego e subemprego, a criação de 10 500 novos empregos nestes três anos - tarefa sobre-humana para as actuais condições económicas do arquipélago - não resolveria o problema, caso a emigração não alivie de 3000 a 5000 unidades trabalhadoras potenciais.
Está já provado que é a emigração para os Estados Unidos e para a Europa a que convém a Cabo Verde. Entram da Holanda muitas centenas do contos por mês, só na ilha de S. Vicente. E dá gosto vê-los (os emigrantes) regressar a férias com ar de gente que evoluiu positivamente, tanto cultural como materialmente. E que contraste com os contratados que regressam de S. Tomé.
Há, pois, que facilitar aquela emigração através de empréstimos aos emigrantes potenciais, encaminhando-os e ajudando-os.
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Sr. Presidente: Não me sobeja tempo para apreciar mais alguns empreendimentos programados no Plano Intercalar.
E porque qualquer deles deva considerar-se de grande relevância, numa próxima oportunidade farei nesta Assembleia mais uma intervenção com o fito de sobre esses empreendimentos produzir reflexões que a sua essência exige.
Por isso vou terminar, Sr. Presidente, apresentando a V. Ex.ª e a todos os ilustres Deputados os protestos da minha mais elevada consideração.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem !
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Sousa Rosal: -Sr. Presidente: Este Plano de Fomento para o período de 1965-1967. que ora temos em mão para apreciar e aprovar, segue a linha de rumo constitucional que dá ao Estado o direito e impõe a obrigação de coordenar e regular superiormente a ordem económica e social da Nação que está implícita no Plano.
Governar por planos não tem significado político, porque é sistema de actuação seguido, mais ou menos, em todos os regimes.
A sua arquitectura e orientação para determinados objectivos, essas, sim, devem ter sentido político no mais elevado grau e aprimorado sentimento.
Não estão em causa nem o direito nem o sistema.
Aquilo que efectivamente o pode estar é a sua essência política, que para nós está na doutrina corporativa que se tem vindo cada vez mais abastardando, com prejuízo da harmonia económica e da justiça social que defende.
A política, para ser virtude tem de ter cunho de verdade e de firmeza.
Nos tempos que correm, em que tudo é fluido, mercê da política de compromissos sem beleza de ideal nem nobreza de alma que governa o Mundo, compreende-se que nem sempre nos seja permitido manter e defender estimados princípios.
Temos, porém, sabido, apesar de tudo, conservar bem alto aqueles que são a raiz e o cerne do carácter português e da honra da Nação.
Quem governa ou dirige tem muitas vezes, para cumprir as suas altas missões, de cometer desvios de sentimento por imperativos de inteligência que lhe apontam o único caminho a seguir para servir o bem público.
Uma coisa, porém, é tomar atitudes de circunstância para dominar acontecimentos que inopinadamente surgem, outra é a condução económica não ter formação ou convicção política. Muitas vezes com a agravante de ser surda aos clamores vindos da parte daqueles que sentem as duras realidades do desacerto. Estas não são, evidentemente, produtos de laboratório nem matéria para especulação intelectual, nem tão-pouco se podem medir a compasso.
O facto é por de mais conhecido, pois é corrente ouvir da boca de pessoas escolhidas para orientar e dirigir departamentos de responsabilidade, da orgânica do Estado Novo, dizer mesmo em actos de posse: «Aceitei este lugar por isto e por aquilo, porque toma e porque deixa, mas não sou político». Isto é, como quem tira passaporte para passar, em qualquer altura e sem risco, para a outra banda.
Exalta-se, com fundamento digno de apreço, o crescimento do nosso desenvolvimento económico, baseado nos planos de fomento que o têm dirigido e medido pelos resultados visíveis dos índices de crescimento do produto nacional bruto.
Porém, é de desejar que este crescimento seja equilibradamente processado em todos os sectores económicos e distribuído por todos os seus factores - a propriedade, o capital, o trabalho - com equidade, para que o per capita possa, no seu rigor matemático, ter ao mesmo tempo melhor significado humano.
O esforço financeiro principal deste Plano de Fomento será exercido no sentido dos ramos mais desenvolvidos e fortalecidos da actividade económica, o que, até certo ponto e de certa maneira, se compreende, por ser da parte deles que se espera o maior apoio que lhe vem substancialmente da iniciativa particular, e não na direcção do mais necessitado e essencial.
Não pode dizer-se que não têm verdade e oportunidade as acentuadas e repetidas intervenções que tem chamado a atenção para os ramos de ensino e da agricultura, visivelmente menos dotados no Plano, e que são, sem sombra de dúvida, as mais autênticas fontes de progresso e bem-estar.
O ensino, porque, apesar do muito que se tem feito, ainda não atingiu o grau de desenvolvimento para colocar a investigação científica e a preparação técnica e profissional no plano que é indispensável atingir para nos qualificarmos para o desempenho de altas tarefas da hora presente.
É para nós doloroso verificar que pelo nosso atraso nestes sectores o País é escolhido como campo de recrutamento de emigrantes para trabalhos que os povos evoluídos já não aceitam sem constrangimento.
A agricultura, por ser nela que se ocupa a maioria dos portugueses e dela vem para todos o melhor ou o pior pão para a boca, encontra-se num impasse que traz descontente todo o seu mundo, os empresários, os obreiros e consumidores, ou seja toda a gente, porque todos temos esta qualidade. Apenas vive à grande um parasita que se lhe filou na ilharga e se chama intermediário, contra o qual ninguém se atreve, por mais que se aponte na sua direcção.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - E na fixação do preço justo para uma exploração economicamente viável que está a chave mestra do problema. Para o estabelecer tem de se planear para um nível de vida girando em plano mais alto, coisa difícil, e muito mais na presente conjuntura, mas que não deve ser arredada do nosso pensamento, desafiando a habilidade dos economistas e a arte dos políticos.
Se a indústria tem gozado para o seu fortalecimento de preços protegidos, mesmo com sobrecarga para o consumo e melhor vida para os empresários, não será de mais encarar os problemas que afligem a vida agrícola com mais coragem e outro entendimento.
Como consolação ouve-se dizer, com frequência, que o mal não é só nosso, citando-se países economicamente mais desenvolvidos. Pois sim, mas os males são diferentes. Entre nós são males crónicos generalizados, filhos do nosso subdesenvolvimento, minando um corpo já sem resistência, ao passo que os deles são simples crises passageiras próprias do crescimento potente em corpo forte e que se manifestam sectariamente.
Sr. Presidente: Seja-me permitido acrescentar alguma coisa de objectivo às simples considerações que tenho vindo a fazer a propósito do Plano de Fomento que o Governo enviou à Câmara para tão transcendentes fins e devidamente informado.
Palavras que se dirigem ao fomento de turismo, categorizado no Plano como elemento valioso para atingir os fins que se têm em vista.
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Veio a ele com foros, de realeza, anãs ainda sem poderes suficientes para reinar com a melhor autoridade e força nos vastos e formosos domínios que voluntariamente lhe prestam vassalagem.
Não vou fazer perder tempo à Câmara, de mais elucidada e consciente sobre o seu valor, tantas vezes focado em intervenções que têm tido com frequência lugar nesta Câmara. Agora amplamente informada pelo (relatório que .antecede a lei básica submetida à aprovação da Assembleia e pelo parecer da Câmara Corporativa.
O País também já deu sobejas provas de que está esclarecido sobre a importância do turismo no conjunto das actividades económicas, como que foi dado apreciar no último Congresso Nacional de Turismo, no qual tomei parte por amável convite da sua digna comissão organizadora. A ele vieram autorizados representantes de todas as regiões do Pais com valiosos trabalhos e nele se debateram com viva objectividade os seus problemas mais aliciantes.
As suas judiciosas conclusões endereçadas ao Governo são bem conhecidas pela publicidade que lhe deu a imprensa.
O apontamento que vou fazer é guiado pelo parecer da Câmara Corporativa e foi tão somente por causa dele que me dispus a falar. Este, pela secção de Transportes e turismo, confirma a fé e a esperança que todos depositamos nas virtudes do turismo para um Portugal melhor.
Porém, com algumas objecções que me atrevo a aplaudir e reticências que me suscitam alguns reparos.
Não tem o parecer como boa, e com fundamento, a orientação de preferência que. se deseja dar ao incremento das construções para hotelaria de luxo com prejuízo das destinadas ao chamado turismo das massas, que sejam no social a sua mais numerosa clientela, mercê do crescente nível de vida das classes trabalhadoras. Entre os ricos e a si massas há a classe média, que também é cliente de respeito nas andanças do turismo e que não suporta as diárias dos hotéis de luxo, tal como a não suporta o turista nacional, que não pode ser ignorado. Na construção para os menos abastados tem de se contar com as. exigências quanto à higiene e comodidade que devem apesar no estudo da sua economia. A solução pode ser encontrada na criação de núcleos turísticos diferençados para turistas de maior e menor poder financeiro. Também é de contar com alguns destinados ao campismo, que é uma forma de fazer turismo praticada por muitos. A todos que nos desejem visitar temos de abrir a porta, com o melhor dos sorrisos e franca hospitalidade.
Em regiões como as do Algarve não haverá qualquer dificuldade, porque há espaço que chega para tudo e para todos e ainda não há obstáculos de vulto que impeçam o seu delinear com a mais simpática ambientação para cativar os turistas de todas as condições e categorias.
São prementes as recomendações para actualizar a legislação que regula o crédito externo e o regime de propriedade para o incentivar, por ser dele que se espera a maior ajuda para as grandes realizações turísticas. É conveniente conterem providências que evitem a desnacionalização de determinadas regiões onde empresas estrangeiras adquiram grandes áreas de terreno e ainda que condicionem a utilidade turística para evitar que esta seja elemento de especulação nas transacções de proprietário para proprietário. Medidas tidas como urgentes e não eivadas de condicionalismo que seja impedimento que obrigue a mudar de rumo, e alguns já o têm feito, daqueles que lá de fora têm vindo e de quem necessitamos
não só para construir, mas também para orientar as correntes internacionais de turismo com o seu savoir faire.
O parecer não perfilha, abertamente, a ideia de que deve ser dada prioridade as regiões turísticas do Algarve e da Madeira, embora reconheça que são duas regiões que merecem todo o apoio.
Com argumentos subtis aflora-se a intenção de diminuir o valor das razões de prioridade que militam a seu favor, pelo que se depreende de uma passagem do parecer que vou ler com a devida vénia.
Diz-se que as principais correntes turísticas foram para a Madeira e o Algarve e por isso se deve olhar mais para estas duas zonas. Mas os números parecem demonstrar que Lisboa e seus arredores continuam a ser os pontos mais procurados, o que torna absolutamente necessário considerar cuidadosamente as necessidades dos Estoris, Cascais, restantes praias da Costa do Sol, Caparca, etc. Bem sabemos que o vento e ser fria a água do mar são grande contratempo nos «meses de ponta». Mas a existência de piscinas em número cada vez maior, abrigadas da ventania e com água temperada, está aumentando os atractivos desta zona. Nelas estão investidos muitos capitais, e é essencial não os desperdiçar.
Os números que levar ara a apontar, na ordem de preferência, para a região de Lisboa e arredores não tem mérito, por si só, para pôr em dúvida as razões de prioridade que a política de turismo no presente surto recomenda. A escala de preferência dedilhada na estatística fere um número que ao ser interpretado à luz de outros factores não tem o significado que se quer deduzir.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - O próprio parecer noutro passo ajuda a esclarecê-lo ao dizer «talvez a maior atracção turística por Lisboa e arredores se deva ao melhor apetrechamento em hotéis e pensões».
E esta a mais correcta conclusão.
O Sr. Jorge Correia: - V. Ex.ª dá-me licença?
O Orador: - Faça favor.
O Sr. Jorge Correia: - Penso que essa maior corrente para Lisboa e arredores também é consequência de haver um aeroporto próximo, porque, quando o nosso aeroporto do Algarve estiver aberto, com certeza que esses números sofrerão uma alteração grande.
O Orador: - Esses números sofrem já uma alteração grande em resultado de outras informações que vou agora indicar.
Para que a dúvida se transforme em certeza, eu direi que, por informações! que tem sido colhidass junto das gerências dos hotéis e pensões do Algarve e nas agências nacionais e estrangeiras de viagens e nas casas de Portugal no estrangeiro, o número de turistas que não visitaram o Algarve por (falta de alojamento foi, segundo cálculos, da ordem das dezenas de milhares, havendo quem os cifre em 50 000.
O Sr. Jorge Correia: - Muito bem!
O Orador: - Pana justificar a prioridade de um determinado passo, basta saber que ele pode ser dado com
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segurança para determinar do objectivo com evidente êxito. E este para o Algarve é dos mais certos e felizes para todo o País.
As tendências das correntes turísticas, que nesta conjuntura se dirigem seguramente para Portugal procuram o Algarve de maneira particular, numa marcha que ninguém, pode deter com motivo sério ...
O Sr. Jorge Correia: - Felizmente!
O Orador: - ... e tem o dom de ser de- interesse nacional, e .como tal se deve fomentar com a melhor inteligência, decisão e mais compreensiva colaboração de todos os portugueses.
O Sr. Jorge Correia: - Muito bem!
O Orador: - O potencial turístico do Algarve é avaliado pelo interesse de des-tacados empresários desta industria no mundo do turismo habituados a ver, comparar e avaliar das dimensões e da viabilidade dos empreendimentos que procuram ali instalar-se, não por efeito de especiais meios de propaganda e enganosamente, mas sim feita petos, que o visitam e vão. dizer maravilhas por todos os cantos do Mundo, com a noção perfeita do seu excepcional valor.
E porquê?
Porque Deus o dotou com uma costa da mais variada e requintada beleza, com praias de areia limpa e fina, banhadas por um mar tranquilo de água naturalmente acolhedora em todas, as épocas do ano, tudo ambientado por um clima agradável.
O que ali é prodigioso, por não o haver em qualquer estância balnear de categoria mundial são os benefícios que lhe vêm da permanência dos dias de sol. O número de horas de sol de que desfruta é em média, por ano, mais de 3000, chegando a atingir a cifra das 3400 horas na região de Tavira. Este é o motivo principal da sua excepcional atracção para receber turistas de qualidade em todas as estações do ano.
Por mais piscinas de água temperada, abrigadas e localizadas em bonitos e distintos lugares que se façam não é possível tentar os nórdicos a vir até nós chamados por elas, que as têm mais perto e alguns na sua própria casa. Podem constituir um aumento de atractivos, como se diz no parecer, mas não de tal maneira que substituam o prazer de tomar banhos em vastas ou pequenas praias espalhadas por cerca de 150 km da costa de variado matiz e recorte, com água naturalmente temperada pelo sol criador.
Pode encontrar-se a explicação do que se diz aliás muito louvável, mas mal fundamentada, para puxar a brasa a outra sardinha, isto é, chamar a atenção para a defesa dos capitais investidos na zona da Costa do Sol, Caparica, etc.
Pode-se julgar que neste insignificativo, etc., que não é meu, se deseja englobar, e com razão, todas as restantes praias de Portugal, que são muitas e belas, e ainda outros locais onde está a nossa riqueza artística e também estão investidos outros capitais que merecem igual defesa e respeito. Temos, contudo, que entender que esses valores não são, só por si, suficientes para atrair grandes e contínuas correntes turísticas.
Direi que o desenvolvimento turístico do Algarve, com atractivos de renome mundial, que os nacionais tão tarde deram por eles, e alguns mesmo ainda os não entendem, devidamente equipado, será o mais útil e efectivo motivo para atrair e lançar sobre todo este pequeno e belo país uma onda permanente de turistas se forem melhoradas as comunicações com o Norte.
O desenvolvimento turístico do Algarve não requer só a prioridade de que se fala e em que se repara, mas sim que a palavra tenha significado físico. O seu movimento não exige só prioridade que se veja, mas também acção que se sinta.
Mas analisemos, afinal, aquilo que constitui essa chamada prioridade.
As leis que regulam o crédito e os incentivos fiscais não foram publicadas para servir só o Algarve e têm sido aplicadas em todo o País. E certo que o Algarve tem utilizado nos últimos anos uma maior percentagem de crédito e um consequente aproveitamento das facilidades fiscais. Mas só pelo facto de que é para ele que tem sido solicitado o maior número de empreendimentos com viabilidade económica. Não se trata de favor, mas de actos correntes de boa e sã administração.
Mereceu reparo no parecer o facto de se mencionarem designadamente para certas zonas do Algarve verbas destinadas a saneamento. Deve dizer que outras zonas, como a de Monte Gordo e Armação de Pêra, estão igualmente carecidas de verbas urgentes para o mesmo fim.
E necessário impedir que se torne insalubre uma região naturalmente saudável e onde se estão a investir capitais vultosos por iniciativa privada para fomentar e enriquecer a economia nacional, que para o efeito necessita da colaboração do Estado para erguer as infra-estruturas de interesse público que não cabem nas obrigações de empresas particulares e estão a ser prejudicadas por ausência e insuficiência dos esgotos.
Não será de mais repetir que as obras de saneamento devem ser conduzidas de maneira que não provoquem a poluição e a conspurcação das águas do mar.
Mas haverá de facto prioridade com esta decisão do Governo?
Não há. O precedente foi desde há muito aberto para a Costa do Sol, para a qual o Governo fez inscrever, entre as dotações não abrangidas no Plano de Fomento anterior, uma verba de 38 000 contos para fins de saneamento e publicamente anunciado nos relatórios das Leis de Meios.
Também não se percebe por que razão se critica a acção do Governo de dar publicidade àquela determinação com o fundamento de que o facto tornaria, com certeza, o Plano mal recebido pelo País. Vejam lá que enormidade! Será porventura o Algarve filho ilegítimo do velho Portugal, que tanto tem honrado em passos brilhantes e decisivos da nossa história que não possa receber à luz do dia aquilo que por toda a parte e com os mesmos fundamentos o Governo espalha por todas as regiões do País. Felizmente que aquela ideia não encontrou eco nesta Câmara onde o País tem a sua mais autorizada e independente representação.
Será prioridade mandar construir um aeroporto no Sul quando desde há muito o Centro e o Norte, e agora a Madeira, já se encontram servidos, e que passará a constituir, sem sombra de dúvida, um aeroporto de segurança e de recurso para os de Lisboa e do Porto, dada a ausência quase total de nevoeiros na sua região?
O Sr. Jorge Correia: - Muito bem!
O Orador: - Será porventura prioridade, construir uma auto-estrada para o Sul da mesma categoria da que está caminhando para o Norte, agora mais do que nunca justificada pela construção da ponte sobre o Tejo, na previsão do substancial aumento das comunicações entre o Norte e o Sul, por via do turismo e da irrigação do Alentejo?
Ninguém pensa que a ponte sobre o Tejo se destina a servir apenas a Outra Banda e a península de Setúbal.
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Será prioridade fazer com que os caminhos de ferro do Sul ofereçam as mesmas condições de segurança, comodidade e velocidade que há muito tempo se desfruta nas linhas do Norte e transferir a estação término do Barreiro para o topo sul da ponto, enquanto as condições não permitirem que seja atravessada pela linha férrea, fazendo a ligação directa por caminho de ferro com o Norte. Será prioridade construir uma ligação com a Andaluzia por uma ponte, como o Minho tem, desde há muito tempo, com a Galiza, sabendo que por ali virão muitos milhares dos milhões" de turistas que percorrem o Sul de Espanha, com Gibraltar e Norte de África, para se espalharem por todo o território.
Toda esta série de realizações de que o Algarve necessita, com alto proveito para o País, são simples actos de justiça para que esta província se integre no surto de benefícios de que o resto do País goza desde há muito.
O único acto que se pode atribuir ao Governo do assinalada acção prioritária para o Algarve foi o referente à decisão de mandar elaborar o plano regional de urbanização para o seu desenvolvimento turístico.
Aias quem há que possa fundamentadamente pôr em causa essa decisão, que, sendo regional, tem efectivas repercussões na marcha do turismo nacional? Poderia o Governo deixar desenvolver in disciplinadamente uma actividade desta natureza e projecção num local onde foi encontrada a sua mais aliciante e prometedora matéria-prima, com perigo para o sucesso dos empreendimentos que para ali voluntariamente se dirigiram, sobretudo no momento em que o País necessita de mobilizar toda a sua potencialidade económico-financeiras, que ali tem uma fluente fonte de recurso?
O turismo, na presente conjectura, é o instrumento mais prometedor para estimular o desenvolvimento económico, pela movimentação que proporcionará a todos os seus sectores e para reforçar o poder financeiro com uma entrada substancial de divisas. Factos que se creditam para levar por diante o alto pensamento político anunciado no Plano de Fomento de coordenação das exigências da defesa com o prosseguimento da expansão e enraizamento da economia.
Não tememos contra a maré, que, no caso, é reinar contra o interesse nacional e contra os próprios interesses regionais e locais, que não podem ser esquecidos na estratégia da planificação turística nacional, que tem no Algarve, inquestionavelmente, o seu mais firme ponto de apoio, mas não nos esqueçamos dos ensinamentos da táctica que manda actuar de preferência nos locais c pelos caminhos que mais facilmente conduzem à vitória.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão.
O debato continua amanhã com a mesma ordem do dia.
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 10 minutos.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Aníbal Rodrigues Dias Correia.
António Augusto Gonçalves Rodrigues.
António de Castro e Brito Meneses Soares.
António Marques Fernandes.
António Martins da Cruz.
Armando Cândido de Medeiros.
Armando Francisco Coelho Sampaio.
Augusto José Machado.
Délio de Castro Cardoso Santarém.
Ernesto de Araújo Lacei da e Costa.
Fernando António da Veiga Frade.
Francisco António da Silva.
Henrique dos Santos Tenreiro.
James Pinto Buli.
Joaquim de Sousa Birne.
Jorge Manuel Vítor Moita.
José Dias de Araújo Correia.
José Maria Rebelo Valente de Carvalho.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Júlio Dias das Neves.
Manuel Herculano Chorão de Carvalho.
Manuel Nunes Fernandes..
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Beis.
Paulo Cancella de Abreu
Rogério Vargas Moniz.
Tito Castelo Branco Ar antes.
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Alberto Pacheco Jorge.
Alberto da Rocha Cardoso de Matos.
Alexandre Marques Lobato.
Alfredo Maria de Mesquita Guimarães Brito.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António Burity da Silva.
António Júlio de Carvalho Antunes de Lemos.
António da Purificação Vasconcelos Baptista Felgueiras.
António Tomás Prisónio Furtado.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Belchior Cardoso da Costa.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Henrique Veiga de Macedo.
Jacinto da Silva Medina.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
João Rocha Cardoso.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Pinheiro da Silva.
José dos Santos Bessa.
Manuel João Correia.
Manuel Lopes de Almeida.
Purxotoma Bamanata Quenin.
Urgel Abílio Horta.
Vítor Manuel Dias Barros.
Voicunta Srinivassa Sinai Dempó.
O REDACTOR - Leopoldo Nunes.
IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA