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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 189

ANO DE 1965 18 DE MARÇO

ASSEMBLEIA NACIONAL

VIII LEGISLATURA

SESSÃO N.º 189, EM 17 DE MARÇO

Presidente: Exmo. Sr. Mário de Figueiredo

Secretários: Exmos.
Fernando Cid Oliveira Proença
António Moreira Longo

Nota. - Foi publicado um suplemento ao Diário das Sessões n.º 185, que insere o parecer da Comissão de Contas Públicas da Assembleia Nacional acerca das contas da Junta, do Crédito Publico referentes ao ano de 1963.

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta 16 horas e 40 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foram aprovados os Sessões n.ºs 185 e 186.
Deu-se conta, do expediente.
O Sr. Presidente informou haver sido recebido na Mesa um documento, através da Presidência do Conselho, que o Tribunal de Contas proferido a sua declaração geral de conformidade com as contas tanto da metrópole como do será oportunamente distribuída aos Srs. Deputados.
Para cumprimento do disposto no § 3.º do artigo (...) da Constituição, receberam-se na Mesa o Diário do Governo n.º 57, que insere o Decreto-Lei n.º 46 220.
Foram recebidos os elementos requeridos em 27 de Janeiro pelo Sr. Deputado Quirino Mealha ao Ministério Esses documentos foram entregues ao referido
Usaram da palavra os Srs Deputados Valente de te referir à passagem de mais um ano sobre a data do surto terrorista em Angola e a acção das nossas forças armadas Paulo Cancella de Abreu, sobre assuntos de a região da Bairrada, Cardoso de Matos, na mesma ordem de ideias do Sr. Deputado Valente de Carvalho, e Álvaro de Meireles, para um requerimento.

Ordem do dia. - Continuação da discussão das do Estado e da Junta do Credito Publico referentes a 1963.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Alexandre Lobato e Ernesto Lacerda.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas e 15 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai fazer-se a chamada.
Eram 16 horas e 30 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs Deputados.

Agostinho Gonçalves Gomes
Alberto Carlos de Figueiredo Franco Falcão
Alberto Henriques de Araújo
Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Alberto Pacheco Jorge.
Alberto dos Beis Faria
Alberto Ribeiro da Costa Guimarães.
Alberto da Bocha Cardoso de Matos
Albino Soares Pinto dos Beis Júnior
Alexandre Marques Lobato.
Alfredo Mana de Mesquita Guimarães Brito
André Francisco Navarro
Antão Santos da Cunha
António Burity da Silva
António de Castro e Brito Meneses Soares.
António Júlio de Carvalho Antunes de Lemos.
António Manuel Gonçalves Rapazote

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António Mana Santos da Cunha
António Marques Fernandes
António Martins da Cruz
António Moreira Longo
António da Purificação Vasconcelos Baptista Felgueiras
Armando Cândido de Medeiros
Artur Águedo de Oliveira
Artur Augusto de Oliveira Pimentel
Augusto César Cerqueira Gomes
Augusto José Machado
Bento Benoliel Levy
Carlos Alves
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
D Custódia Lopes
Délio de Castro Cardoso Santarém
Domingos Rosado Vitória Pires
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando António da Veiga Frade
Fernando Cid Oliveira Proença
Francisco António Martins
Francisco António da Silva
Francisco José Lopes Roseira
Francisco de Sales de Mascarenhas Loureiro
Henrique Veiga de Macedo
Jacinto da Silva Medina
James Pinto Bull
Jerónimo Henriques Jorge
João Mendes da Costa Amaral
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
João Rocha Cardoso
João Ubach Chaves
Joaquim de Jesus Santos
Joaquim José Nunes de Oliveira
Jorge de Melo Gamboa de Vasconcelos
José Alberto de Carvalho
José Augusto Brilhante de Paiva
José Fernando Nunes Barata
José Manuel da Costa
José Mana Rebelo Valente de Carvalho
José de Mira Nunes Mexia
José Pinheiro da Silva
José Pinto Carneiro
José dos Santos Bessa
José Soares da Fonseca
Júlio Dias das Neves
Luís de Arriaga de Sá Linhares
Luís Folhadela de Oliveira
Manuel Amorim de Sousa Meneses.
Manuel Colares Pereira
Manuel João Correia
Manuel João Cutileiro Ferreira
Manuel Lopes de Almeida
Manuel de Sousa Rosal Júnior
D. Maria Irene Leite da Costa
D Maria Margarida Craveiro Lopes dos Reis
Mário Amaro Salgueiro dos Santos Galo
Mário de Figueiredo
Olívio da Costa Carvalho
Paulo Cancella de Abreu
Quirino dos Santos Mealha
Rui de Moura Ramos
Sebastião Garcia Ramires
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães

O Sr. Presidente: - Estão presentes 80 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 16 horas e 40 minutos.

Antes da ordem do dia

O Si Presidente: - Estão na Mesa os Diários das Sessões n.ºs 185 e 186, correspondentes às sessões de 9 e 10 de Março.
Estão em reclamação.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como nenhum dos Srs Deputados deseja fazer qualquer reclamação, considero-os aprovados.

Deu-se conta do seguinte.

Expediente

Telegramas

Vários a apoiar a intervenção do Sr. Deputado Reis Faria sobre o no Lima.
Do governador civil de Coimbra a apoiar a intervenção do Sr. Deputado Nunes Barata no debate sobre as Contas Gerais, do Estado.
de Jacinto Santos Silva Rodrigues a expor algumas opiniões acerca do projecto de lei da caça, apresentada pelo Sr Deputado Águedo de Oliveira.

O Sr. Presidente: - Por despacho de S. Exa. o Presidente do Conselho, esta na Mesa um documento que informa ter o Tribunal de Contas proferido a sua declaração geral de conformidade com as contas tanto da metrópole como das províncias ultramarina? A demora no envio desse documento a esta Assembleia e a sua distinção por todos os. Srs. Deputados devem-se ao facto de ainda não ter podido ser feita a publicação oficial do Diário pela Imprensa Nacional Portanto, existe a declaração de conformidade proferida pelo Tribunal de Contas em relação às contas da metrópole e do ultramar, que espero possa ser distribuída dentro de breves dias a todos os Srs Deputados.
Para efeitos do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição, está na Mesa o Diário do Governo n.º 57, 1.ª série, de 9 do corrente, que insere o Decreto-Lei n.º 46220, que autoriza o Governo, pelo Ministro da Educação Nacional, a aceitai uma importância para fundo de manutenção da Cantina Escolar de Ana da Fonte, anexa às escolas do núcleo de Igreja, freguesia de Gueifães, concelho da Maia.
Em satisfação do requerimento feito pelo Sr. Deputado Quirino Mealha na sessão de 27 de Janeiro findo, estão na Mesa elementos fornecidos pelo Ministério do anterior. O requerimento é respeitante à localização de cada um dos edifícios que estão a ser construídos na Praia da Rocha destinados a hotéis.
Vão ser entregues estes elementos àquele Sr. Deputado.
Tem a palavra, antes da ordem do dia, o Sr. Deputado Valente de Carvalho.

O Sr. Valente de Carvalho: - Sr. Presidente e Srs Deputados: Mais um ano se passou sobre a data 15 de Março de 1961 em que o dinheiro e a cobiça estrangeira fizeram vítimas em portugueses inocentes nas terras nossas de Angola Comemorou-se essa trágica data em muitos lates portugueses, quer nas suas orações por alma de entes queridos, quer ainda na confirmação da fé inquebrantável de um Portugal que não consente

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que lhe roubem uma parcela sequer do seu território, que navegadores e missionários descobriram e evangelizaram.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E de que processos se serviu essa cobiça para tentar conseguir os seus fins? Os mais traiçoeiros, os mais bárbaros, não respeitando sequer as vidas puras de crianças inocentes dos ódios entre homens, e tudo isto, meus senhores, com a complacência e sem um mínimo de reacção salutar de uma organização que dá pelo nome de O N U , onde têm assento países que se dizem nossos amigos, que connosco têm tratados de amizade e aliança, honrosa excepção feita à Espanha, e, consequentemente, obrigações e deveres a cumprir e que de nós em situações graves e emergentes têm recebido favores e facilidades.

O Sr. Paulo Cancella de Abreu: - Muito bem!

O Orador: - Choramos como bons cristãos a sua morte e o seu sacrifício, mas orgulhamo-nos deles também pelo seu estoicismo e heroicidade, em que, com os poucos meios de defesa que tinham, lutaram até ao último alento da sua preciosa vida por aquilo que era legitimamente seu e que u sua e nossa pátria, de facto e de direito, pertence.

O Sr. Pinto de Mesquita: - Muito bem!

O Orador: - Dêmos graças a Deus de mais uma vez Salazar, com o seu génio inconfundível e seu patriotismo inconstestado, com um grupo valoroso de chefes militares, ter tomado a seu cargo a defesa imediata daquela parcela portuguesa ...

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - tão cara a todos nós, levando a confiança e oportuno auxílio em homens e armas aos habitantes de Angola, nossos irmãos no sangue e] na língua
Quatro anos são volvidos em que a nossa pertinácia, o sacrifício em muitos lares, o nosso dinheiro que tanta falta faz para empreendimentos pacíficos, a nossa fé tudo isto, enfim, é dedicado a esta cruzada de vencermos pela força, que é o nosso direito, pela persuasão e convicção, que é a nosso dever, e verdadeira fraternidade para com os nossos irmãos, que é o nosso apostolado, defendendo a sua vida e bens e ensinando os de raça, portugueses como nós, a amar cada vez mais este Portugal, terra de Santa Maria, que tão bela lição tem dado ao mundo indeciso, por vezes, pusilânime, em que nações têm deixado fugir das mãos aquilo que os bens antepassados conquistaram! e que, com certeza, não souberam ou não quiseram servir e civilizar.
Porém, se não me engano, há uns dois anos para cá, estamos assistindo à vinda aqui às nossas terras de aquém e de além-mar de vários grupos de senhores estrangeiros que vêm verificar in loco das nossas razões e direitos, como se não bastasse a nossa honrada palavra e o que de nobre e alevantado se tem dito e exposto pelos nossas lídimos representantes nesta tal O N U , e, depois da vários almoços e jantares com que a nossa proverbial a alguma e hospitalidade dispensa a todos os que nos visitam, sejam bons ou maus, e de percorrerem as zonas nevrálgicas da luta que ainda se trava e outras em que o negro, lado a lado com o branco, trabalha pacificamente, em que notam com os seus próprios olhos que o então a assistência social, a caridade e o conforto moral e material é paia todos igual, então sim, retiram-se penhorados com tanta
deficiência e confessam publicamente que julgavam outra coíba Enfim, ver e crer como S. Tomé. Que a lição lhes tenha aproveitado e que saibam combater a calúnia e a mentira que lá fora forjam contra nós, povo que não precisa de receber de ninguém quanto à honradez pôs seus processos e seu indefectível patriotismo.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Depois destas minhas modestas, mas bem sinceras, palavras em sentida homenagem aos que tombaram pela Pátria e de profundo respeito e veneração pelos meus irmãos de armas que se estão batendo e sem mantêm vigilantes, quer na Guiné, quer em Angola e Moçambique, legiões estas onde ainda se sente o terrorismo no seu estertor, não desejo deixar passar em julgado uma outra data ocorrida na semana passada o dia 11 de Março -, dia da Polícia de Segurança Pública. Não passou desapercebida à Nação essa data, pois a nossa boa imprensa lhe deu o merecido relevo.
Sinto-me à vontade em prestar a minha justa homenagem a tão valente e eficiente corporação, pois nunca nela prestei serviço, nem nas minhas funções de comando tive relações directas com tal força de segurança, mas como português amante da ordem, como militar disciplinado e disciplinador e com o direito que me concede a Constituição, permito-me proferir algumas palavras de louvor e apreço a tão valiosa força de segurança pública, que, em cooperação com a Guarda Nacional Republicana, Polícia Internacional e de Defesa do Estado e Legião Portuguesa, é a ossatura de uma retaguarda que as forças armadas que se batem exigem seja forte e coesa.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Já lá vai o tempo, meus senhores, em que infelizmente se consentia, em qualquer revista, a depreciação e o ridículo a que se sujeitava tão digna corporação, com assentimento de entidades oficiais responsáveis pela sua dignidade e prestígio.
Males que já passaram e que a nossa foi te determinação jamais consentirá.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não esqueçamos, meus senhores que a Polícia de Segurança Pública não limita a sua acção só na retaguarda, acção por vezes tão mal compreendida por alguns tão bem instalados na v da e por outros com o seu feitio indisciplinado e libertino. Ela, na sua alta missão, é a guarda fiel, quer no trânsito, quer dos bens e da própria vida dos seus concidadãos, protegendo-se e até dando o seu próprio sangue para salvar vidas em perigo.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E quando rompe a desordem nas ruas, ei-la presente, arriscando a sua vida e o futuro dos que lhe são queridos para. que a ordem se i estabeleça e volte a haver paz e sossego nos lares portugueses.
E quando jovens universitários, acicatados por elementos destruidores da sua pátria, encobertos cobardemente na sombra e com o consentimento da certos pais que nem a sua própria família respeitam e ainda Bem a reprovação de alguns diligentes e orientadores se manifestam com turbulência, chegando ao insulto contra os seus próprios mestres e, se me não engano, contra o próprio reitor, ei-la

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novamente na primeira linha, actuando cora eficácia e prontamente com risco da sua própria vida, enquanto muitos assistem comodamente à janela gozando tão miserável espectáculo, que fere uma pátria e causa nojo e desprezo aos soldados que se batem no ultramar.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - e que muito gostariam de ter esses jovens junto deles pata lhes ensinarem como se combate com honra e como se vive a verdadeira vida.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Não pára aqui a acção prestimosa da P S P. Vemo-la no nosso ultramar, batalhando com peida de vidas preciosas e alcançando honrosas e justas condecorações Soubemo-la na nossa índia mártir, sabemo-la nas nossas Guiné, Angola o Moçambique e noutros recantos onde flutua a bandeira de Portugal, sempre pronta, sempre vigilante.
E como é modesta a sua vida íntima e por vezes deficiente com os proventos que aufere.
Concluo, Sr. Presidente e Si s Deputados, prestando, como militar, como Deputado e como portuguès amante da ordem e da tranquilidade pública, a minha homenagem e o preito da minha maior admiração a tão valiosa quão intemerata P S P , desde o seu prestigioso comandante-geral.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - até ao mais modesto servidor, recordando com veneração o que foi em tempos conturbados seu glorioso e integro comandante coronel Ferreira do Amaral.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - com quem tive a honra de ser companheiro de armas nas terias da Flandres.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Paulo Cancella de Abreu: - Sr. Presidente La viam grande descontentamento e sérias preocupações na vasta região da Bairrada, pertencente ao círculo de que sou um dos Deputados e o único de ali natural, mas, a ela me ligam mais os sentimentos de carinho que o coração me inspira do que quaisquer interesses de ordem material. Estes tão modestos são que não pode julgar-se que, defendendo aqui os dela, estou a advogar em causa própria.
Compartilhando das alegrias, das amarguras e dos anseios da sua boa gente, não hesito em ocupar-me aqui dos seus interesses legítimos, tanto mais que, por se tratar de uma região muito vasta e importante, os seus problemas são problemas do País, sob os aspectos económico, social e político.
Como todos sabem, a cultura predominante na linda região da Bairrada é a vinha, e pode dizer-se que do granjeio desta, que é permanente, e do seu produto vive a grande parte da sua população agrícola. E, como importante região vinhateira que é, causou nela grande alarme a Portaria n.º 21 006, de 28 de Dezembro
último, que estabelece a taxa de $40 sobre cada ano de vinho da colheita de 1964 vendido pelos produtores da área da Junta Nacional do Vinho (excepto os da região demarcada dos vinhos verdes) e destinada a vários encargos desta Junta e aos investimentos a que obrigue sua intenção reguladora do mercado
Não obstante a sua justificada finalidade, esta medida controvérsia, pois, se é certo haver pessoas e organismos que a aplaudem pela sua projecção favorável no controle dos preços, por outro lado grande número de vinicultores das regiões abrangidas manifestam a sua apreensão, especialmente por terem como certo que, em última análise, serão eles os afectados por tão inesperada providência legislativa, e têm-no relevado ostensivamente em reuniões dos interessados e através da imprensa, mediante argumentos impressionantes e ponderáveis.
Por esta lazão, resolvi contemplai o problema nu sua projecção, e persuadi-me de que este reverso da medalha se apresentava justificado na medida em que, realmente, atinge os preços correntes do vinho da colheita de 1964 e, consequentemente, aumentar os já enormes dificuldades da vida dos modestos lavradores que, na Bairrada, são os predominantes.
E tão-sòmente esta pressuposição, e não qualquer outro motivo ou influência, que me leva agora a chamar a atenção do Governo para este momentoso assunto. E faço-o só agora porque, no início, pretendi auscultar a reacção dos interessados e depois houve duas interrupções prolongadas no funcionamento desta Assembleia
Embora achando sem dúvida necessário que sejam tomadas drásticas providências destinadas a evitar, quanto possível, a fraqueza do mercado dos vinhos e as suas vendas a preço vil, afigura-se-me que, na verdade, a solução que foi adoptada não é, sobretudo agora, a mais conveniente, e anula-se, porventura, a si própria com a sobrecarga com 8$ o almude da colheita do ano findo.
Na verdade, julga-se com razão que não colhe o argumento de que é o comprador e não o produtor quem paga a taxa em referência Pura ingenuidade Normalmente, pode mesmo dizer-se naturalmente, a oferta de preço pelo comprador baseia-se nos seus prudentes cálculos acerca dos encargos que para ele resultam da transacção, e, portanto levará em conta a taxa agora estabelecida pela Portaria n.º 21 006, sendo assim o produtor quem, de facto, suporta o encargo, de facto e também de direito, quando ele próprio seja também o circunstâncias indicadas nas alíneas b) e c) do n.º 5 dessa portaria.
Pode em princípio supor-se que, realmente o produtor, mesmo que não utilize os créditos e facilidades da Junta, é beneficiado indirectamente pela influência das intervenções desta, por que ela anima o mercado e impede a excessiva queda dos preços Mas, por outro lado, pensa-se que a projecção desse benefício, alcançado afinal, agora, à custa da própria lavoura, não será tão elevado que compense a colheita de 1964 com preço que a reembolse dos 8$ por almude que a sobrecarregam.
O problema reveste realmente a maior acuidade, mas afigura-se que a medida que foi adoptada não é aceitável no ponto em que favoreça a economia de uns à custa do sacrifício dos outros.
E, repito, necessário resolver ou atenuar quanto possível a grave crise vinícola que o País atravessa, mas resolvê-la mediante soluções que aumentem os sacrifícios, mesmo que transitórios, já incomportáveis dos produtores, parece injustificável. E nem sequer se atende à diferença de graduação alcoólica, que afecta os preços, à produtividade por unidade, ao maior custo do granjeio nas

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regiões não mecanizáveis, etc.. Todos pagam a mesma taxa, que peca também por ser excessiva.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A cultura da vinha é a mais dispendiosa, e decerto a de actividade mais permanente, difícil e contingente. Acabadas a vindima e a faina de adeja, logo começam os trabalhos da nova safra e as despesas do novo ciclo. Descava, poda, empa, retancha, lavra ou cava, adobação, tratamentos, arrenda, desgrama, por veras desparra, vindima, transportes, fabrico, trasfegas, etc., exigem vultosos desembolsos a todos, sem exclusão dos sócios das adegas cooperativas, as quais, por motivo da dificuldade de venda dos vinhos pelo melhor preço, acumulam colheitas, afectando-se assim inevitavelmente a grande utilidade que representam para a lavoura.
De tudo isto resulta falta de recursos para pagar em Janeiro as contribuições, agora agravadas, e para as despesas do novo ano decorrente.
É gravíssima a situação, não há dúvida, e resulta a toda a luz que só uma baixa do custo da produção, aliada ao aumento da exportação e do consumo podem vir a saná-la. E, entretanto, julgo que para já só o recurso ao crédito pelo Banco do Fomento ou outros avalizado pelo Estado e caucionado com o activo da Junta, podem de momento atenuá-la.
Impossível?
Só se os bancos e o Estado desconfiassem da Junta.
Julga-se que a solução que agora se adoptou, além de inconveniente, é manifestamente impolítica na presente conjuntura. E creio bem que esta razão de peso é mais do que suficiente para não a empregar.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Salazar, no seu magistral discurso de 18 de Fevereiro, cheio de verdade e de razão disse que «a terra é humilde, tanto que se deixa a cada momento pisar, o trabalho da terra é humilde, porque o homem a cultiva humildemente debruçado sobre as levas»
Bela expressão simbólica de uma realidade, e praza a Deus que daquela humildade resultem cada vez mais e melhores frutos para bem de todos e de cada um.
Ao fim e ao cabo, como agora, em redundância, é moda dizer-se, eu, julgando interpretar o pensamento e as razões da vasta região da Bairrada, e sem deixar de reconhecer os bons propósitos das entidade e corporações que sugeriram, perfilharam e adoptaram a solução empregada, concluo que, além de excessivo é incompreensivelmente igual para regiões e zonas muito diferentes na despesa da cultura, na produtividade das vinhas e na graduação, na qualidade, na acidez e nos mais predicados dos vinhos, a medida promulgada é inoportuna, é impolítica, é muito onerosa, é inoperante na medida em que não encontra contrapartida de que resulte equivalência ou reparação atinge total e inevitavelmente os produtores, e não os compradores aos quais se destina e afecta especialmente as modestas possibilidades económicas dos pequenos lavradores.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mas há mais!
A Portaria n º 21 006 determina, no capitulo único do n. º 4. º, que a taxa incidirá sobre todo o vinho constante do manifesto da produção, e, n.º12 refere-se à taxa ainda não paga respeitante a vinhos manufacturados.
O que foram fazer!
Não é segredo para ninguém que, geralmente, os produtores foram sempre refractários ao manifesto dos seus produtos. Evitavam-no ou reduziam-no quanto possível, na persuasão ou no receio de que ele se destinava a fins tributários.
Depois, confiados nos desmentidos e afirmações oficiais, resolveram-se a cumprir com a possível exactidão, tanto mais que o Regulamento da Estatística Agrícola de 9 de Março de 1936 (Decreto n º 26408) foi bem expresso ao declarar, logo no artigo l.º, que o manifesto anual feito pelos agricultores se destinava exclusivamente a fins estatísticos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mas como agora este preceito foi francamente desrespeitado na portaria em referência, daí vai resultar o renascimento da aversão aos manifestos e a fuga a eles ou a sua inexactidão. O receio e a desconfiança renascem, e de vez. E como o resultado, mesmo o moral, será desprestigiante e desastroso para o próprio Estado, é de esperar que o Estado, «pessoa de bem», reveja o problema e procure outro modo de o solucionar sem encargo para o produtor, e que não se fundamente nos manifestos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - De contrário, praticamente, o manifesto volta a ser, como já foi, sinónimo de «sofisma».
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Cardoso de Matos: - Sr Presidente: É esta a primeira sessão, após o 15 de Março, data em que se completou mais um aniversário - o 4. º - de acontecimentos que enlutaram a Nação e a encheram de espanto e horror, perante os relatos de selváticas atrocidades sofridas em Angola por pacíficos portugueses, que, tão traiçoeira quanto injustamente, foram imolados à cobiça, à insensatez, aos extremismos ignorantes e criminosos, que pretenderam quebrar o nosso ânimo a nossa firme vontade, a inquebrantável decisão de prosseguir na obra há séculos encetada - o expandir de uma civilização, que começou com a fundação da Nacionalidade e não mais foi interrompida, nem até nos momentos maus que a nossa história regista.
Os inimigos que nos atacaram não lograram êxito, não só por subestimarem o valor das nossas gentes, mas também por ignorância dos seus sentimentos e reacções, por desconhecimento da fraternidade cristã que nos une, em qualquer latitude, a todas as raças, constituindo o que pode parecer milagre - um Portugal uno e indivisível.
Ao contrário do que esperavam, mais unido se tornou o bloco português mais estreitamente nos sentimos ligados e mais boas vontades congraçámos em nosso redor. Com o tempo, com o passar do tempo, à medida em que a nossa razão melhor se evidencia, mais claramente o Mundo se vai compenetrando do seu erro, ao dar crédito a calúnias, quando em apáticas condescendências ou confortáveis abstenções.
Ao lembrar este aniversário, o meu propósito não foi tanto o de recordar o que se passou, mas o de rememorar e destacar a nossa reacção. E de aceitar que nos orgulhemos do esforço despendido, dos sacrifícios suportados, do muito que todos demos e continuamos a dar,

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para mantermos bem erguidas as nossas frontes, desassombradamente a reafirmar a justiça da nossa causa.
Foi exactamente a firmeza desta reacção que produziu o desenvolvimento substancial das nossas actividades, tomadas no seu conjunto, e continua a incrementar o progresso do todo nacional, com predominância para a província de Angola, cuja economia regista níveis nunca antes atingidos, resultantes da criação de novas indústrias, de mais intenso povoamento, do alargamento da rede de comunicações, de maiores investimentos, e, apesar de tudo, pelo resultado de explorações agrícolas que se processam em regiões atingidas mais gravemente pelos referidos acontecimentos.
Sr Presidente: Quando um povo encara a adversidade com a coragem com que nós vimos suportando tantos sacrifícios, há que ter fé nos seus destinos, podemos confiar que saberá vencer a crise, ressurgindo mais são e mais forte após a tormenta.
Aquela generosa mocidade que na primeira linha suporta os mais rudes e fortes impactes com admirável brio bem merece os nossos agradecimentos, somos igualmente devedores de imensa gratidão a todos os civis que, isoladamente ou incorporados como voluntários na manutenção da ordem, tanto se têm sacrificado por ela, de igual modo estamos, reconhecidos a todos os que, de qualquer forma, vão contribuindo com o seu melhor para o saneamento da situação e para o restabelecimento da paz.

O Sr. Gosta Guimarães: - Muito bem!

O Orador: - Porque o lembramos em mais este aniversário de uma luta que nos foi imposta, prestemos homenagens a essas mães que vêem partir os filhos, às mulheres e as noivas que se despedem dos seus entes queridos, a todos os que, no cumprimento de deveres sagrados, como tal os entendem e encaram sem desfalecimentos, sem hesitações.

O Sr. Costa Guimarães: - Muito bem!

O Orador: - Bem hajam por tudo.
Bem merecem da Pátria.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Alberto de Meireles: - Sr Presidente Pedi a palavra para apresentar o seguinte:

Requerimento

"Nos termos regimentais, requeiro que pelo Ministério das Finanças (Inspecção-Geral de Crédito e Seguros) me sejam fornecidos com urgência e referidos aos últimos cinco anos e ao território metropolitano os seguintes elementos:

1) Importância anual dos prémios de seguro de acidentes de trabalho e doenças profissionais cobrados pelas instituições seguradoras autorizadas a exercer a actividade no território metropolitano;
2) Importâncias despendidas anualmente pelas mesmas seguradoras no pagamento de pensões indemnizações e tratamentos em consequência do acidentes de trabalho e doenças profissionais;
3) Número de apólices em vigor no ramo de acidentes de trabalho e doenças profissionais;
4) Montante de salários seguros;
5) Lucros ou prejuízos atribuídos anualmente pelas instituições seguradoras na exploração do ramo de acidentes de trabalho e doenças profissionais;
6) Montante das comissões, prémios de produção ou remunerações equivalentes pagos anualmente a título de angariação ou corretagem no ramo de acidentes de trabalho e doenças profissionais pelas companhias seguradoras".

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continuam em discussão as Contas Gerais do Estado e da Junta do Crédito Público referentes a 1963.
Tem a palavra o Sr. Deputado Alexandre Lobato.

O Sr. Alexandre Lobato: - Sr Presidente: Vou frequentemente a Moçambique por largo tempo para ver e ouvir de forma a poder falar quando regresso. É um processo de tentar superar, por vivência, a impossibilidade de notar à distância os complicados fenómenos de Moçambique, tanto mais que luto contra a impreparação que me dificulta o claro entendimento das coisas. Julgo que estas sinceras palavras podem traduzir o sentimento de admiração que me deixa sempre o parecer do Sr. Eng.º Araújo Correia do exame das contas públicas de Moçambique.
De um modo geral, e de modo especial em certos casos, impressionam-me profundamente os juízos que S. Exa. Expende, o que é sinal de concordância evidente. Desta vez o parecer abre com uma clara sentença condenatória ao afirmar que "há diversos problemas na província de Moçambique que precisam ser atacados com energia". O primeiro que aponta é o da permanente insuficiência das exportações, que ficam sempre à distância de mais de 1 milhão de contos das importações devido ao "contínuo desenvolvimento dos consumos", pelo que sugere um programa de realização para o incremento das culturas tradicionais com a importante observação de que "a própria intensificação nas culturas gera indústrias e produções subsidiárias que também podem concorrer para a melhoria na exportação", porque, diz "é mais fácil fazer crescer as produções tradicionais para valores razoáveis do que novas iniciativas". E concluí que "a produção intensa deverá ser a base da economia de Moçambique".
Daqui resulta que há graves defeitos na estrutura económica de Moçambique, designadamente no sector primário, que está longe de traduzir em realidades as suas responsabilidades enormes, e no sector terciário, que tem contribuído para atrofiar os restantes, porque a vida da província, desde os fins do século passado, tem como fonte preciosa os serviços transitários que presta ao interior africano seu vizinho.
Não são defeitos de estrutura que se tenham criado agora, porque vêm de longe, e foram forçosos e inevitáveis, pelo que é preciso continuar a corrigi-los teimosamente.
A vida económica de Moçambique sofre de mazelas seculares que não há meio de se curarem e das quais as mais salientes são a prevalência do comércio com base na importação e que foi sempre o mais tenebroso obstáculo ao povoamento agrário europeu, o latifúndio comercial dos

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prazos da Zambézia, depois transformado no latifúndio de plantação e comércio, nos fins do século passado, ainda existente e radicado, e de que as últimas concessionárias algodoeiras serão até 30 de Junho deste ano o último detestável rebento, e a tendência geral para um espírito de estabilização e cristalização das situações sociais e económicas criadas e existentes devido às comodidades financeiras que os serviços transitários para o exterior têm oferecido à Administração, ao grande Comércio importador e ao pequeno comércio retalhista.
Trata-se de uma cadeia de actividades seguras e sem isco, com os pagamentos externos garantidos pelas divisas que entram, da exportação, da emigração e dos serviços de transportes. São os dois últimos rendimentos que garantem à província o seu clássico desafogo em coberturas externas. Nos áureos tempos do ouro, eram as pistas de Sena, o marfim e os escravos que aguentavam a vida económica da província. Desde os fins do século passado são os caminhos de ferro, os emigrantes para o Rand e a Rodésia, e os chamados génios coloniais, inicialmente apenas de Quelimane, e agora também de Moçambique, Porto Amélia e Inhambane, em especial.
A agricultura de povoamento tem sido um malogro, ou mais exactamente uma aventura em que só se metem os lunáticos.
O pior é que se não vê jeito de modificar a situação, e por isso Moçambique é uma província despovoada de brancos, que são por excelência os transformadores da vida social, os impulsionadores da vida económica os únicos agentes possíveis do progresso do Negro. É dogmático que sem brancos o Negro não evolui em África porque não tem a escola da iniciativa, capital acumulado em técnica adquirida para a produção e o comércio da produção, dinheiro líquido ou crédito para o motor económico.
Creio firmemente que se se quer efectivamente fazer progredir o Negro, como se quer, a base de arranque está na expansão acelerada do povoamento europeu misturado e conjugado com o reordenamento agrário do povoamento negro numa organização cooperativa da agricultura e da pecuária com seu crédito eficiente e alguma técnica indispensável, pelo menos alguma elementar orientação técnica e uma eficiente comercialização. O que tudo se consegue a partir do desenvolvimento comunitário, que é um mito em Moçambique, e com a planificação e execução do povoamento à escala nacional, segundo uma política nacional, como recentemente aqui defendi.
A meu ver está Moçambique numa situação de crise. Não é uma crise disto ou daquilo, mas uma crise geral, uma crise de crescimento, que só pode ser resolvida numa perspectiva de conjunto, por medidas gerais e globais que tornem possível a alteração das estruturas clássicas e arcaicas - as estruturas económicas, as estruturas sociais e as estruturas administrativas. Mas sem nos esquecermos de que se não vira tudo de um dia para o outro nem a província está toda num homogéneo amadurecimento para a alteração de estruturas, pelo que há a necessidade de forçar certas implantações por enquadramento.
Não é avaliável o que seria Moçambique se pudesse estar em relação à vizinhança na posição de Angola em relação ao Congo, e a uma igual distância. Mas decerto entregue a si própria teria hoje outros alicerces.
Assim, apenas Lourenço Marques e a Beira se desenvolveram, e mesmo assim não há paralelo entre a actual dimensão económico-social destes dois pólos, com forças de crescimento internas e próprias, e a que tinham quando dependiam inteiramente ou quase do Interland estrangeiro que servem. Por isso temos todos de lamentar que o portentoso distrito da Zambézia (que eu prefiro sempre designar por Quelimane, seu nome tradicional, porque Zambézia é toda a vasta região de um e de outro lado do grande rio) tenha permanecido latifundiário, tenha permanecido em prazos e se não povoasse com pequenas e médias plantações, em vez de quase tudo se reduzir a três ou quatro tentaculares empresas de tipo classicamente colonial e detestável. Era o que há 76 anos queria fazer o grande Augusto de Castilho. Talvez houvesse hoje um autêntico porto em Quelimane e também uma autêntica cidade em Quelimane.
A interdependência das várias perspectivas é iniludível. Sem povoamento branco a persistência de economia colonial de grande plantação é um facto irremovível, e os caminhos de ferro continuarão a ser o cancro de Moçambique, porque a província vive essencialmente deles e para eles. Donde resulta que fazer vingar qualquer coisa diferente é heroicamente trágico e tão impossível de realizar como simples de conceber.
A mentalidade estreita com que tem sido conduzida a vida económico-social de Moçambique está patente na inconstância das soluções para o problema das comunicações anteriormente à recente prevalência das estradas, nos casos típicos das linhas férreas de Quelimane e de Moçambique. Nunca houve uma lúcida política de transportes porque faltaram as pressões do povoamento, da agricultura e das minas. Ainda sou do tempo em que Moçambique era apenas a orla do litoral. No entanto, já no actual regime houve dinheiro em Moçambique para uma vasta obra de fomento e povoamento que se não fez em tempo.
A falta de visão é patente, por exemplo, na carência de povoamento ao longo da linha de Moçambique.
A falta de iniciativa na província é de facto enorme, mas isso deve-se a um tipo de mentalidade arreigada e secular, de que já falei, aos defeitos consideráveis da rede de comercialização dos produtos na mão de meia dúzia de exportadores poderosos que também são produtores ou formam cartel, e ao regime de quase-monopólio em que se encontra o crédito, e que é um monopólio de facto nas mãos do Banco Ultramarino.
A província debate-se com problemas graves que resultam, a meu ver, desta complexa fase de passagem em que se encontra, caracterizada pela abolição da sociedade colonial que não desapareceu, evidentemente, do dia 6 para o dia 7 de Setembro de 1961, da abolição da economia colonial, que também não desapareceu com o novo Código do Trabalho, da abolição da administração colonial, que também não desapareceu com os inoperantes retoques que se deram na lei orgânica. De facto, em Moçambique tudo continuou como se as medidas legislativas decretadas pela metrópole tivessem sido tomadas para inglês ver.
Atitude tanto mais cómoda quanto é certo que está absolutamente assente em Moçambique que na província não há dinheiro para nada e portanto nada se pode fazer enquanto a metrópole não mandar para lá alguns bons milhões, ou aparecerem os investidores com eles no bolso.
Arrancar o dinheiro da terra, desenvolver a agricultura indígena, dar a terra a quem a cultive, estruturar a propriedade indígena em regime de propriedade perfeita e tributá-la, pagar bem, comprar a pronto, são coisas que Moçambique considera os impossíveis trabalhos de Hércules, que se vão fazendo, mas lentamente de mais.
Moçambique continua muito confiada no advento messiânico dos capitais estrangeiros. Embora me pareça que são mais as vozes do que as nozes, e conheça casos de capitais volantes que foram recusados por comportarem encargos impossíveis, parece haver de facto grandes ofertas e existirem já grandes entradas ou pelo menos grandes contractos nesse sentido. É decerto pela minha deficiente

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licenciatura em Letras, mais propicia à poesia do que à economia ou à banca, que considero altamente perigosa a grande invasão de capitais estrangeiros em qualquer economia, quanto mais na de Moçambique para além de um mínimo que me não consta estar definido em proporção com os capitais nacionais. Se se quer manter nacional uma economia, é preciso acudir-lhe com capitais nacionais que restabeleçam a propursão que paralisa as ingerências estrangeiras.
Estas ingerências estrangeiras são perigosas porque fora do país de origem visam predomínios económicos, influências políticas e pressões sociais. No ultramar isto redunda na manutenção do statu quo que encontraram favorável à penetração.
A este respeito a lição dos Estados Unidos em todo o Mundo é eloquente, como o foi para nós, e na nossa carne a da Inglaterra no século XIX.
Do ponto do vista económico é de considerar que ao fim de poucos anos começarão a ir de Moçambique as amortizações, os lucros elevados e ou juros altos, pelo menos numa alta percentagem, porque os capitais aplicados noutros países se destinam a rendimento a regressar à origem. Se o afluxo for de invasão, a hemorragia será enorme poucos anos depois e o benefício económico-social durará o escasso tempo da montagem da produção. O inevitável reinvestimento parcelar dos lucros fará do sistema uma bola de neve capaz de esterilizar a economia em que se instala.
Em Moçambique é preciso cuidado com a panaceia dos capitais estrangeiros, a fim de se não hipotecar o futuro, e sobretudo o seu futuro português, pelo que talvez seja preferível caminhar mais devagar e com mais interesse social por nossa conta, já que em ambos os casos o risco é sempre nosso.
Moçambique tem sofrido e suportado este século os calamitosos efeitos da voragem estrangeira do fim do século passado, e eu já aqui disse que a metrópole e a província sabem bem o que isso lhes tem custado em dinheiros, complicações e atrasos. Todavia, o que penso não é o que opinam os economistas de Moçambique, nem todos quantos pedem capitais como quem pede água e ilogicamente se queixam dos que transferem lucros para a metrópole, que muitas vezes é apenas um ponto de passagem para os bancos estrangeiros.
Em virtude das modificações legislativas operadas em 1961, as pressões sociais sobre a Administração são enormes no sentido de se estender a toda a população da província uma administração que estava montada e fora concebida em dois graus diferentes, um de tipo rudimentar, de feição condal, feudal e paternal (a cause) para a população indígena, e outro de tipo normal, para a população não indígena. O que sucedeu foi que uma administração montada para 300 000 pessoas viu-se de repente a braços com 6,5 milhões e sem experiência nem dinheiro.
Assim nasceu o angustioso problema das receitas públicas para ocorrer às solicitações de uma população que não paga o suficiente para o que pede e não é posta em condições de poder pagar.
0 primeiro problema posto pelas reformas de 1961 exigia a básica solução da questão do aumento das receitas públicas, e que, portanto, a população indígena fosse posta a ganhar e a pagar ao menos progressivamente. Haveria que determinar a propriedade fixa e perpétua, o seu valor, a sua produção, a sua capacidade tributária geral ou especial no caso de produções muito ricas. Não estou a inventar nada, porque quem quer que consulte o Livro Auxiliar de Foros e Dízimos, de 1839 a 1854, que se encontra no Arquivo de Moçambique, encontrará lançamentos como estes

Enfiteuta Rosa - Palmar denominado Flor da Cabaceira, sito em Santa Cruz - Pagou de foro anual 135 reis e de dízimos 1280 réis de 32 palmenas a 40 reis - Enfiteuta Maria Leonarda, machamba sita na Caramba, distrito de Mossuril, confrontado pelo oeste com Augusto Garcia de Miranda, a norte com Teobaldo António da Gama e a leste com a preta Liberta Sarima - Pagou de dízimos 1680 réis de 42 palmenas a 40 reis e 1680 réis de 84 pés de cajueiros a 20 réis, em conformidade com a portaria em conselho de 12 de Fevereiro de 1852 sobre o projecto discutido e aprovado em sessão da Junta da Fazenda de 14 de Janeiro do dito ano.

A província atravessava nessa altura uma pavorosa crise financeira, a moeda provincial valia menos 80 por cento do que a da metrópole e um alferes no Reino ganhava efectivamente mais do que um major da província, consoante informações que podem ler-se nas actas do conselho do governo daqueles tempos, em declarações do secretário-geral Costa Mendes. Tal se não fez agora, porque as reformas tributárias não conseguem ir avante em Moçambique. As despesas é que vão.
Note-se o desequilíbrio sectorial dos contribuintes nestes números: 70 881 contos de contribuição comercial e industrial em 1963, 30 276 contos de contribuição predial, dos quais 28 169 contos são da predial urbana e apenas 2107 contos são da rústica, 26 105 contos de imposto profissional e 276 997 contos de imposto de rendimento. São mais de 400 000 contos pagos na quase totalidade pelo sector europeu ou muito evoluído contra 224 237 contos de imposto domiciliário, que é geral agora e corresponde à antiga taxa pessoal ou imposto de palhota, que dantes era paga apenas pelos indígenas a título de imposto directo único. Os antigos indígenas não devem estar a pagar mais de 200 000 contos deste imposto, e são 6 milhões.
E iniludível que há actualmente em Moçambique um sector social sobre o qual recai exageradamente a repartição tributária, pelo menos em relação a outro sector de imensa maioria que paga mal e pouco. Mas é também evidente que este segundo sector não está no geral em condições de pagar melhor, e, sobretudo, numa justa proporção dos benefícios que aufere.
Parece que é preciso olhar para o rendimento unitário da produção em espécie e em valor, que é preciso olhar ao preço dos produtos, expandir as áreas de cultura, fixar as propriedades, arrolá-las, medi-las, vigiá-las, para que produzam o que devem, estabelecer formas mais eficazes de recolha imediata e pagamento imediato da produção, em dinheiro de contado, acabando-se com os abusos de permuta, que é antieconómica.
A agricultura indígena, agora chamada «agricultura tradicional», vai muito mal em Moçambique. As suas principais produções lançadas no mercado cifram-se em 86 000 t de algodão caroço, 46 000 t de castanha de caju, 23 000 t de milho, 14 000 t de amendoim descascado, 13 000 t de mandioca seca, 10 000 t de copra, 9000 t do arroz em casca, 7400 t de trigo, 3800 t de mapua e 3400 t do nhemba, o que é francamente pouquíssimo (217 600 t nos dez produtos principais).
A agricultura empresarial, com 2706 explorações e l 704 000 ha, dos quais apenas 365 000 ha cultivados, ou seja a quinta parte, produziu para o mercado 1 736 300 t, sendo 1 500 000 1 de cana-de-açúcar, 43 000 t de folha verde para chá, 36 000 t de frutas frescas, 33 000 t de copra, 32 000 t de arroz em casca, 29 000 t de sisal, 23 000 t de

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milho, 11 000 t de produtos hortícolas, 10 000 t de batata e 6700 t de castanha de caju.
Nestas duas listas das dez principais produções de cada sector apenas se encontram comuns a castanha de caju, o milho a copra e o arroz, de que em globo o sector empresarial produz mais do que todo o sector tradicional.
Se considerarmos que segundo o uso e costume a copra e o caju não representam propriamente culturas no sector tradicional, mas, a simples colheita de produtos que Deus dá de árvores que produzem durante dezenas da anos, ficam as principais culturas indígenas lançadas no marcado reduzidas a 161 000 t de oito espécies, e as empresariais a 1 696 600 t. Se subtrairmos ao exame a cana-de-açúcar, visto ser cultura ainda em exclusivo desde há trinta e tantos anos, quando se proibiu a cultura livre por causa do alcoolismo e da fabricação clandestina de aguardente, e também a produção de folha para chá, que é uma cultura europeia, delicada, cara e trabalhosa, verifica-se que se equilibra o total da oferta ao mercado dos oito principais produtos da agricultura empresarial com os oito principais produtos da agricultura tradicional, pelo que, entrando em linha de conta com a relação popolação-capital-técnica, em cada sector, se descobre imediatamente que o factor de desequilíbrio está no produto capital-técnica do sector tradicional.
Desde já uma observação importante para a actualidade foi decerto por considerar que as colheitas do caju e dos cocos não davam propriamente trabalho agrícola e não implicavam risco para o agricultor que o governador-geral em conselho estabeleceu, 1952, imposição de 20 réis por cajueiro e 40 réis por coqueiro, aliás imitando apenas o que se fazia na Índia, e ainda hoje se faz. Estou, porém, convencido de que hoje, pelos milhões de coqueiros e de cajueiros que há em Moçambique na posse de empresas poderosas, especialmente na Zambézia, paraíso dos prazos, nenhum governador-geral, e muito menos um conselho, conseguiria lançar qualquer imposto idêntico ao de 1852. Mas seria justo, e seria útil, porque é necessário.
Todavia, ao que eu queria chegar com a expressão económica dos sectores sociais, de que esbocei o quadro, é o manifesto desequilíbrio de forças e de valores em que se encontram. Sei que se fazem pequenos esforços isolados nisto ou naquilo, para diminuir os desníveis, mas não está concebida pelo Estado, ou pelos economistas, ou pelos políticos, ou pelos sociólogos, ou melhormente por todos eles, uma política realista e barata que resolva o problema. Se a nossa política económica para o ultramar não fosse meramente burocrática e académia, talvez lá se chegasse. E não nos faltam exemplos vizinhos.
O Sr Eng. º Araújo Correia diz-nos, por exemplo, que Moçambique importa milho e tem condições para ser um grande exportador. Era exactamente a mesma posição potencial da Rodésia do Sul. Vai daí os Rodesianos puseram-se a estudar o problema e, tendo verificado a evidência de que o milho é uma exportação pobre, que economicamente não interessa, resolveram transformar o milho em gado e exportar carne, que rende cinco vezes mais do que o milho e tem, portanto, interessa económico.
No crucial problema do desenvolvimento económico-social de Moçambique debatem-se duas teses há longos anos: uma, a que chamo a tese colonial, americanófila, que mede tudo em dólares e compara alhos com bugalhos, como por exemplo o rendimento nacional da Suécia com o rendimento tribal da Basutolândia, é pela industrialização em grande estilo, a maciça exportação de minérios, as vastas plantações tropicais que necessariamente conduzem às grandes concentrações proletárias, aos baixos salários, aos exclusivos e à conservação do mato selvagem, outra, a que chamo a tese social, porque se não dirige à empresa, mas ao homem, preocupa-se mais com a família do que com o operário ou o trabalhador contratado, visa o casal de família, a empresa agrícola familiar, a cooperação social, e dirige-se predominantemente à agricultura como fonte formadora de capitais.
Nesta tese, como a vida é um complexo, as outras actividades que também existem, ou devem existir, são secundárias e complementares, são de 2.ª fase, são de evolução, logo que a sociedade global tenha atingido um mínimo de nível que permita sectorizá-la convenientemente e espontaneamente num complexo harmónico. Julgo que a tese oficialmente preconizada, como deduzi do Plano Intercalar de Fomento, que frustrou por completo, a meu ver, a fase preparatória dos futuros planos de fomento, é fazer tudo de afogadilho e ao mesmo tempo, e às pinguinhas por falta de recursos para tanta coisa simultânea.
O resultado é que estamos já a assistir a grandes empreendimentos industriais, pelo menos aos projectos e às sedutoras promessas de financiamento externo, com gravosa hipoteca da liberdade futura, e o essencial vai ficando para trás.
O essencial vai ficando para trás, quer dizer, que as fontes de receitas públicas se não desenvolvem nem manam dinheiro para os cofres do Estado, porque a única fonte possível de grande receita imediata, a propriedade indígena, não tem ordem, não tem cadastro, não tem produção, nem tem tributação. Amparem alguma coisa ao agricultor negro, orientem-no, comprem-lhe prontamente os produtos a preço compensador, tributem-lhe a propriedade consoante os ganhos, e estará resolvido um grande problema, pois, só desta forma, pode o Estado acudir às pressões que sobre ele se exercem, especialmente quanto às despesas com a saúde e a educação, que estão muito abaixo do necessário e, mesmo assim, representam já um esforço quase incomportável, ao nível do sacrifício.
Não nos admiremos, pois, de que no rumo vigente todo o sector económico de tipo empresarial reaja vivamente a todas as tentativas do Estado para o tributar ainda mais.
Conta-se agora em Lourenço Marques que a província está numa aflição de 60 000 contos, que normalmente seriam uma ninharia, mas não o são agora porque estão comprometidos todos os dinheiros reais e virtuais. Consoante o que se diz foram aumentadas umas percentagens para produzirem mais os 60000 contos. Vai daí reuniram-se logo todas as associações económicas das duas principais praças da província, que, depois de feitos os respeitosos cumprimentos de despedida ao governador-geral, se meteram no primeiro avião e, de conformidade com o prévio telegrama enviado ao Ministro, foram bater-lhe à porta do gabinete.
Dias depois disseram em Lourenço Marques os jornais do Banco Ultramarino, conforme li, que a comissão reclamante defendera briosamente os interesses económicos da província (que são obviamente os do sector representante) e tudo estava arranjado a bem de Moçambique, graças à prestante gentileza financeira do mesmo Banco, na distinta pessoa do seu ilustre governador, dado o seu alto interesse por Moçambique.
Em Lisboa vim a saber que afinal as coisas não estavam tão arrumadas como os jornais de lá faziam crer porém, tudo se encaminhava para substituir os 60 000 contos de impostos por 60 000 contos de empréstimos, ao juro de favor de 2.5 por cento, metade tomado pelo Banco Nacional Ultramarino por vinte anos, o resto pelas actividades económicas. E a gente pergunta e para o

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ano? Claro que isto não é processo, porque é claramente um subterfúgio. Mas não quero dizer mais nada.
Porém, se peço a severa atenção do Governo para estas coisas é por saber que o orçamento de Moçambique deixou de ser o límpido instrumento de administração que era.
Com efeito, estão aprovadas dotações anuais que chegam apenas para meses, há inscrições orçamentais que figuram de reserva e não serão gastas porque se destinam ab mitio a transferências de verbas durante o ano para ocorrer a despesas inevitáveis mal dotadas. Não é que as pessoas que administram os dinheiros públicos de Moçambique não saibam, porque sabem até muito bem, como é que se fazem as previsões das despesas. É apenas porque as dificuldades são de tal ordem que é forçoso o sistema dos expedientes financeiros.
Se falo nisto, creia-se que é apenas porque há num velho discurso do Sr. Presidente do Conselho algumas lúcidas palavras sobre a mentira e a verdade dos orçamentos.
O País sabe que S. Exa. estabeleceu regras definitivamente novas, quando foi Ministro das Finanças, com a intenção, que realizou, de tornar realista a administração financeira do Estado. Pois bem, tudo isso que a história regista já como um resultado nacional, está posto de parte em Moçambique, porque se pede à Fazenda mais do que ela tem, e se lhe pede de qualquer maneira. Mas acho que devo dar alguns exemplos. Assim, a Escola do Magistério Primário do distrito de Manica e Sofala sabe toda a gente em Moçambique que não existe senão no papel que a autorizou, mas está dotada no orçamento para sobras. Há também no orçamento uns dinheiros que constituem o chamado Fundo do crédito rural. A sua actividade está expressa nos seguintes números: transitaram da gerência anterior 4065 contos, recebeu de receita consignada ao Fundo 300 contos, mais 5 contos de compensação de aposentação de um funcionário e 178$50 do aluguer de alfaias. E assim totalizou 4370 contos e uma fracção. A despesa foi, exclusivamente, de 73 200$ de vencimentos ao pessoal e 3001$ do julgamento de contas pelo Tribunal Administrativo, transitando para 1964 4294 contos.
Como não foi feito um único empréstimo aos agricultores, há-de concluir-se que o Fundo é desnecessário ou a Administração não se interessa por ele, pelo que existe apenas para pagar 73 200$ ao ano do pessoal contratado para o empréstimo de alfaias, que rendem anualmente 178$50. Eis o que é o Fundo de crédito rural em Moçambique.
Mas deixemos isto porque é uma ninharia, cuja legalidade está garantida por acórdão do Tribunal Administrativo, e falemos de outras coisas. Uma delas é que não há gestão pública possível sem Fazenda organizada, com legislação eficiente, quadros suficientes e vencimentos razoáveis. Em Moçambique há, de um modo geral, burocratas a mais, funcionários a menos e uma burocracia complicativa e medonha.
Muito se escreve à máquina naquela terra para cada um levar tudo de chapa à consideração do respectivo superior. A decisão vai-se protelando na escala hierárquica e tudo se concentra em Lourenço Marques. Porém, pelo que respeita à Fazenda, há, obviamente, funcionários a menos. Basta saber-se que, havendo mais de 100 circunscrições e concelhos, há apenas 22 recebedorias.
É verdade que ninguém quer ser aspirante de Fazenda e há mais de 100 vagas, e se bem que o problema das remunerações do funcionalismo, especialmente nos escalões mais baixos, seja um problema geral e inquietante a tentar por uma redução de quadros, há que resolver urgentemente o da Fazenda e de todos os mais serviços que impliquem aumento das receitas públicas ou fomentem o rendimento económico da província. É evidente que nada é possível fazer pelo mato fora para se fomentar o rendimento particular se não trabalharem conjugadamente os sectores administrativo, agro-pecuário, comercial, de transportes, de crédito, de agrimensura, para que depois se lhes possa juntar o da Fazenda a reclamar a justa parte para as despesas públicas.
Tudo isto implica, a meu ver uma nova óptica administrativa para Moçambique, um novo espirito nas leis e um novo espírito nos homens, porque, em verdade, estão a manter-se, absurdamente, formas ultrapassadas e mecânicas inoperantes. O resultado é sentir-se o Estado esmagado, estar praticamente paralisado o fomento público e ser financeiramente impossível satisfazer as solicitações que convergem de todos os lados.
Há, de facto, uma crise paralisante no sector público, que o Estado não resolve, a não ser à custa da metrópole, enquanto não enveredar por novos caminhos, pelos quais tenho bradado no deserto.
Há em Moçambique um outro problema que está a exigir medidas drásticos. Não sei se hei-de rotulá-lo de desperdício ou de esbanjamento de dinheiros públicos. Julgo que a esse respeito o Ministério do Ultramar deveria fiscalizar, intervir e corrigir para impor uma educativa disciplina nos gastos públicos, mas sei quanto isso é difícil, porque os que estão na terra conhecem as fraquezas dos que vêm de fora, e estes, logo que chegam a Lourenço Marques, têm imediatamente à sua disposição um carro do Estado, com motorista fardado, porque são todos VIP têm muito que fazer e não dá categoria alguma a ninguém andar no autocarro da câmara.
Não sei se vale a pena abordar o problema, porque as contas de todos os serviços públicos estão legais, as despesas foram legalmente autorizadas, os papéis jogam certos e não falta um pataco. Porém, pela província toda, da ponta do Ouro ao Rovuma, não há quem não conheça histórias perdulárias. A dos automóveis do Estado é pública e anda nos jornais. Para o consenso geral constitui um escandaloso abuso, que é incompreensível. Se a época é de apertos e dificuldades para a generalidade dos contribuintes, não se compreendem as benesses para alguns. As pessoas mais moderadas não podem achar razoável que o Estado forneça carros para os altos funcionários, ou que se dizem tais, irem de casa para a repartição, da repartição para casa, uma veza por semana a despacho todos os dias a passeio, mais as voltas de família, à escola às compras e ao bazar. De um serviço sei eu onde há (ou havia recentemente) um carro que servia por escala em cada mês a cada chefe de repartição para ir de casa para o serviço e vice-versa.
Outro problema é o das casas do Estado e serviços autónomos, nas cidades, para funcionários, não porque tenham sido beneficiados com casas económicas em bairros populares os serventes, os contínuos, os aspirantes e outros amanuenses carregados de filhos apenas amparados ao bordão de um magro vencimento, mas porque em Moçambique a caridade bem planificada tem sempre começado por cima, e foram os altos funcionários, os mais categorizados e os mais bem pagos, que beneficiaram de belas moradias e dos ricos palacetes da Polana. E quem duvidar que vá ver e vá saber e se puder, saiba também quem pagou as mobílias e os adornos e examine a qualidade para conjecturar o preço. Já agora nada direi dos que, não tendo em Moçambique funções de representação nacional, também querem criados pagos com dinheiros públicos.
Grandezas de África, que são unicamente as aceitáveis em África. As misérias da metrópole é que não, e, por isso, continua a ser considerada subdesenvolvida e atra-

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sada. Com efeito, temos da vida, do seu conforto e da sua higiene, e mediante os dinheiros do Estado, uma ideia e uma prática a que reputamos mais saudáveis.
Achamos por isso natural e legítimo que por vezes a esposa do administrador transferido não queira na palaciana residência da capital das suas novas terras e novas gentes os colchões e os lençóis ou as mobílias, os cortinados, os azulejos e os bibclots usados pela antecessora, e por isso já vistos tanto pela mulher do cantoneiro como pela esposa do Sr. Governador do distrito. Não será fino, e o marido não é nenhum pelintra, porque há a verba da Administração. Vai tudo fora e vem tudo novo, portanto.
Parece-nos, por isso, efectivamente, digna de reservas aquela sentenciosa história que o Sr. Presidente do Conselho contou das altas personalidades britânicas que o visitavam para negócios graves com o fato velho coçado e fimbriado nas mangas. Ocorre-me, a propósito, a história, porque algumas pessoas em Lourenço Marques, aliás bem situadas na vida, desfrutando óptimos lugares políticos e altas posições em companhias importantes me fizeram severos reparos a essa sibilina história do Sr. Presidente do Conselho. Se aquilo era argumento que se fizesse ou coisa que se contasse.
Afinaram, sobretudo, com o comover-se S. Exa. ao «observar esses sinais de pobreza que não havia pejo em mostrar, porque representavam, afinal, o sacrifício conscientemente feito ao fim supremo da luta em que a sua nação se empenhava».
Tive de pôr a minha água na fervura, tanto mais que sei que em Moçambique, a não ser algum preço abaixo de servente, ninguém se apresentaria com o fato naquele estado a uma pessoa de qualidade e sei também que em Moçambique os visitantes de negócios graves (que lá são sempre perspectivas de lucros) se recebem com Whisky e aperitivos.
Para desculpar o Sr. Presidente do Conselho pelo sua reservada intenção naquela história do fato coçado, avancei que pelo princípio constitucional da especialidade das leis para o ultramar era óbvio que o Sr. Presidente do Conselho fizera a sua recomendação apenas para a metrópole, podendo, pois, o grã-fino de Moçambique continuar pinoca como anteriormente ao discurso.

Risos

E acrescentei que aquela fase de S. Exa. «em certos casos o espectáculo da riqueza e da alardeia» se não referia a Moçambique, à sua deliciosa capital de ambiente europeu, tão apreciado pelo Sul-Africano para nossa honra, nem ao sumptuoso Banco Nacional Ultramarino, e a outra também de S. Exa. da riqueza que «quase afronta pelo exagero com que se manifesta» também se não referia ao requintado, cosmopolitismo ultramarino, e muito menos ao citado Banco, não obstante ter um Sul-Africano, claramente estúpido, perguntando a um polícia se aquela nova casa era a Ópera.
E tive de provar aos meus interlocutores assomadiços que S. Exa. na metáfora do casaco coçado do inglês não pensara sequer em Moçambique, porque ao desejar «que fôssemos mais modestos e, sobretudo nestes momentos de crise, mais discretos também», pelo princípio da especialidade das leis, aplicável também aos discursos oficiais, voltara a referir-se exclusivamente à metrópole e ilhas adjacentes.
Todos concordámos, porque há condicionalismos especiais na província, que é uma frase feita que lá se usa, indiferentemente para o que deve ser e para o que não deve ser, maneira inteligente, aliás, de tapar a boca e as ideias aos insurrectos do conservantismo local.
Desejo acabar com um apontamento final quanto aos problemas que estão a acumular-se em torno das maiores cidades de Moçambique, já de tal envergadura que são de pleno âmbito nacional. Esperemos que o falado Plano Regional do Sul do Save estanque no mato o afluxo de populações negras aos subúrbios de Lourenço Marques.
Todavia, veja-se bem se o Município de Lourenço Marques pode por si só e com os meios ao seu alcanço resolver o grande problema da cidade do caniço, que não é um problema de casas de alvenaria por agora e para já, mas apenas um problema de escoamento de águas pluviais, esgotos, abastecimento de águas potáveis, arruamentos, transportes e electrificação, o que põe frontalmente o problema dos terrenos, todos particulares, e da sua expropriação, talvez só viável por meio de pagamentos com títulos da dívida pública, negociáveis e amortizáveis a longo prazo, realizando o próprio Município o com os terrenos os fundos de amortização. E o mesmo para a Bena.
O problema é social, o problema é nacional e o problema é grande e urgente.
Não desejaria que se visse nas breves palavras destas considerações gerais um pessimismo que não sinto, nem é meu timbre. Acredito seriamente no futuro de Moçambique, porque sei o que é Portugal. Se não acreditasse não faria os meus reparos. As minhas discordâncias e os meus avisos visam apenas fazer-se melhor e fazer-se mais, porque os homens que neste momento morrem no Norte do Moçambique o merecem de nós, ou então não tem sentido o seu sacrifício.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Eu que andei sete anos de correias às costas e fui mobilizado para o corpo expedicionário do Pacífico destinado à reocupação de Timor, e que pelo termo inesperado da guerra não chegou a combater, sei o que isso é.
Há 20 anos aguardava embarque em Lourenço Marques, com o meu pelotão de landins, 50 e tantas vidas em cima dos meus galões de tenente.
20 anos depois são outros e neles sou eu ainda, com os mortos do passado e os mortos do futuro. Por isso, na humildade do inútil que sou hoje, vai para esses bravos do mato, que em Moçambique arriscam e oferecem as vidas para se protegerem as pessoas ameaçadas e se perpetuar Portugal, também ameaçado, o preito da minha homenagem, num pensamento do respeito, de saudade e de orgulho.

O Sr. Brilhante de Paiva: - Muito bem!

O Orador: - As minhas palavras também só têm sentido porque são eles que garantem em Moçambique o futuro de Portugal e a liberdade das populações de Moçambique.
Gostaria, pois, que se eliminassem algumas das contradições que afectam a grandeza histórica da vida nacional na hora presente, que vai no limiar do ano V, e se praticasse na vida corrente a mística humildade que domina o pensamento do Presidente do Conselho.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - É preciso que todos os portugueses contribuam para o milagre português, para que a esperança não seja vã e se realize como é preciso. Confesso que não vejo fáceis os dias futuros de Moçambique se se não modificarem as mentalidades no sentido do estoicismo nas ideias.

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e nos factos. Estão consignados na lei os claros poderes necessários para isso, sem o mínimo prejuízo das autonomias estabelecidas. Aliás, não servem para nada as autonomias que não assentam nas disciplinas paralelas das ideias e dos factos, fontes da justiça e do bem.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Ernesto Lacerda: - Sr. Presidente: Ao apreciar o parecer sobre as Contas Gerais do Estado do ano de 1963, e antes de fazer algumas breves, considerações sobre determinados problemas que mais preocupam o meu espírito de observador directo, ou me inquietam por os viver no ambiente em que se equacionem e evoluem, eu desejo salientar quanto me impressionou a profundeza deste notável documento e, sobretudo, a independência de critério o desassombro de comentário que presidiram à sua elaboração.
A vulgaridade que lhe pode ser atribuída nascente da rigidez e fria interpretação dos números, desvanece-se mercê da superior apreciação dos casos, para se transformar num estudo elevado, judicioso e profundo da transcendente administração dos réditos nacionais.
Se esta tarefa ingente se pode considerar, até certo ponto, facultada pela acção disciplinadora e saneante que se vem operando através de uma política financeira, concebida, orientada e mantida firmemente por esse homem extraordinário que há perto de quatro décadas conduz, com rara mestria, a Nação Portuguesa, não podemos menosprezar o valor, olvidar o saber, regatear o nosso direito à inteligência brilhante do ilustre relator.
Homem público dos mais destacados na Nação guindou-se ao mérito nacional no exercício dos mais altos cargos, tanto na governação do País como na administração de outros importantes departamentos do Estado, em que a sua notável actividade sempre sobressaiu com impressionante eficiência e largamente prestigiada.
O Sr. Eng.º Araújo Correia, rubricando o parecer ora presente nesta Assembleia, alcançou, para ele, logo de início, não só o meu voto de confiança, mas também o meu pleno acordo à crítica, aliás construtiva, a alguns sectores da Administração e, até, a alguma situação paradoxal resultante da verificação atenta de alguns factos expendidos.
Não me recuso, por isso, de dirigir-me a S. Exa. as mais distinguidas felicitações pela relevância do seu trabalho e por mais um contributo inestimável a bem da Nação.
Sr. Presidente: Põem-se fundadas esperanças nos elevados rendimentos da indústria do turismo, actividade florescente e de aliciantes perspectivas, que vai sendo estimada em muitos países do Mundo como um dos maiores factores de prosperidade económica e que em Portugal começa a ser olhada pelo mesmo prisma, embora com certos retraimentos sempre inerentes às novas iniciativas, pela imprevisão de resultados e pela descrença pelo que se desconhece, mas que envolve, para se alcançarem os efeitos magníficos da sua produtividade, a concretização do outros empreendimentos e realizações que estão na base do seu êxito.
Não podemos confiar, unicamente, no sol acariciador das nossas Primaveras, nas condições excepcionais das nossas praias, na beleza sedutora das nossas panorâmicas na arte admirável dos nossos monumentos.
É necessário fomentar a criação de outros factores também de importância e incrementar outros, por igual influentes neste surto de divisas que unanimemente se reconhece de especial conveniência acolher.
Mas o problema tem sido amplamente discutido e, certamente, consideradas as providências tendentes à sua solução.
Quero, no entanto, referir-me, em especial, às condições em que actualmente se encontram algumas estradas nacionais, por as considerar pouco de harmonia com o que lhes é exigido para comodidade e segurança dos seus utentes, tanto nacionais como estrangeiros.
O que existe e como existe pode constituir o indispensável, mas consideramos que está longe de corresponder às necessidades presentes, sobretudo quando associamos esta ideia à palavra turismo.
Recordemos o que se passa com a estrada Lisboa-Porto; há longos anos foram iniciados trabalhos de alargamento, rectificação de traçados e pavimentação de molde a torná-la uma via aceitável, capaz de suportar o intenso trânsito a que está sujeita.
É do nosso conhecimento estarem todos estes trabalhos, a executar por troços, formalmente adjudicados, encontrando-se alguns deles em plena execução. Outros, como os que se situam além do Carregado, por Alenquer, e por alturas de S João da Madeira, esperam, ainda, a sua vez.
Contudo, afigura-se-nos que tanto as formalidades necessárias aos actos de adjudicação e dotação como o decorrer dos próprios trabalhos se processam com uma morosidade que não descortinamos onde se filia.
Não é compreensível que se atribua este estado de coisas à falta de dotações da Junta Autónoma de Estradas, se considerarmos que as receitas da actividade rodoviária vêm subindo muitos milhares de contos por ano, cifras que já em 1968, como se refere no parecer, eram quase cinco vezes maiores do que as despesas extraordinárias utilizadas na construção e grande reparação de estradas.
Por outro lado, tais dotações, segundo o que se infere dos elementos estatísticos apresentados, pouco têm aumentado neste capítulo de estradas, verdade que tem a sua explicação no facto - que, aliás, não podemos aceitar inteiramente - de a Junta Autónoma de Estradas, certamente em obediência aos superiores interesses da Administração, ter realizado despesas com empreendimentos que deferiam custear-se por outros fundos e que se traduzem na absorção de uma boa parte das suas receitas.
Parece-nos que tais receitas deveriam estar, exclusivamente, consignadas às despesas da mesma natureza, embora à face da técnica orçamental e financeira seja legalmente correcto dar-lhes outros destinos.
Porém, seguindo a liberalidade do nosso pensamento, suprimiam-se justos reparos a situações paradoxais e prestava-se, sem dúvida, um grande serviço ao País neste sector das comunicações.
Nem por isso tem também menos relevância para nós o critério que poderemos estabelecer de conceder às actividades fontes das receitas rodoviárias que a sua aplicação se faça naquilo que precisam de usufruir em perfeitas condições de utilização.
Quem planta as árvores tem direito de colher os frutos.
A utilização deste saldos em empreendimentos de maior vulto - mas quem sabe de menor relevo para o desenvolvimento económico do País - relegam para segundo plano a evidente necessidade de atentarmos, decididamente, na ampliação, rectificação e restauro da nossa rede de estradas.
Arrastam-se, penosamente, como referimos, os trabalhos de diversos troços da estrada Lisboa-Porto. Urge acelerar a sua conclusão

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As estradas que podemos identificar por estradas de penetração turística, designadamente as de Vilar Formoso até ao escoamento para a de Lisboa-Porto, a de Valência de Alcântara-Castelo de Vide-Lisboa, a de Badajoz-Elvas-Lisboa, de Vila Verde de Ficalho-Beja-Lisboa e a de Lisboa-Algarve, carecem também da urgente atenção do departamento a que incumbe especialmente a missão de assegurar não só a circulação do tráfico rodoviário mas, nos casos particularmente referidos, redobrar de esforço no sentido de conseguir elevar ao nível internacional o cumprimento dessa missão.
Nestas circunstâncias, impõe-se dotar vias com faixas de rodagem e pavimentos condignos, desembaraçá-las de curvas, alterar os perfis, alindá-las, sobretudo diligencial flori-las ao longo dos seus percursos.
Resta-me salientar, e faço-o com alguma inquietação que, na generalidade, o problema das estradas nacionais se pode pôr com a mesma acuidade.
Ouso, por isso, rogar a esclarecida atenção do Governo paia as conscienciosas e oportunas considerações que a tal respeito se expendem no parecer.
Sr. Presidente: Ainda mais uma palavra, e essa há-de ser para colocar em evidência e confessar a minha simpatia por tudo que possa conduzir ao bem-estar e prosperidade, das populações rurais deste País, no seio das quais, sentindo e vivendo o seus problemas, tenho passado a maior parte da minha vida.
Mas impressiona-me agora a mentalidade que se vai criando entre essas mesmas populações têm alguma coisa do que ambicionavam, reclamam com urgência o que ainda precisam, e quase exigem o que principalmente lhes não interessa.
Quero relacionar estes anseios com a fascinação produzida pelo ressurgimento português, operado durante estes anos áureos de grandes realizações e desculpo esta sua ânsia de progresso, que reivindicam como direito que não lhes pode ser negado, em face das consoladoras realidades, nacionais.
Como disse inicialmente, vivo no ambiente onde se gera e evolui este fenómeno social e devo interpretá-lo nas suas justas proporções.
Então tenho de afirmar existirem ainda muitas povoações privadas de acesso à viação automóvel, aldeias onde o abastecimento de água se faz em precárias Condições de higiene e salubridade, povoados que ignoram os mais rudimentares princípios da sanidade pública. Anseiam, contudo, por um rápido melhoramento de electrificação!
Há, pois, necessidade de disciplinar as suas aspirações escalonando-as por ordem de interesse geral.
Consideramos que a estrada é o melhoramento a situar em primeiro plano. Sem ela, os povos estão inibidos de ascender a nível de vida apreciável e, o que é mais grave, de poderem colaborar no engrandecimento económico.
Há-de haver outras causas que o determinem, mas a ausência de vias de comunicação nos meios rurais é contributo muito influente na verificação do momentoso problema que constitui o êxodo das populações.
A fragilidade económica depressa se rasteia e perdura com todas as suas tristes e funestas consequências a traduzirem-se no desconforto, na doença e na miséria. A miragem dos grandes centros logo se impõe como único lenitivo para dissipar tão sombrias situações.
Começa, então, o abandono da terra, quantas vezes o desapego da família, quantas vezes apenas a transformação de um mal em males maiores.
Por isso, a abertura de estradas e caminhos municipais considera-se, além do mais, um elemento valioso para proporcionar o bem-estar social e não deve ser menosprezado com excessivas delongas na execução de planos ou com a redução das respectivas dotações.
Conhecida a proverbial debilidade financeira da maioria dos municípios, entidade a que compete mais particularmente impulsionar e realizar estes melhoramentos, não devia o Governo tornar exclusivamente dependentes dessa precária situação os altos interesses que esses mesmos melhoramentos representam.
Preconiza-se então que continue a efectivar-se a entrega ao Estado das estradas municipais que, pelas suas características ou pelas suas condições de utilização, se podem integrar, sem esforço, na rede nacional.
Alargar-se-iam, assim, as possibilidades financeiras dos corpos administrativos com a redução considerável de despesas normais de conservação e grande reparação, aproveitando essa economia para fazerem face às comparticipações concedidas com destino à abertura de novas vias.
Esta solução tem tanto mais de aproveitável quanto é certo existirem municípios que, por falta de recursos, deixam perder essas comparticipações.
Tais situações, que com mais ou menos frequência se verificam, constituem outros tantos motivos para que se possa apreciar, com certa apreensão, o panorama da viação rural.
Se por um lado se reconhece o esforço desenvolvido neste sector da Administração, convém não esquecer que alguma coisa há ainda a aperfeiçoar.
Sei das preocupações e dos graves problemas que a cada hora se deparam ao Governo da Nação, sobretudo os relacionados com a guerra que nos movem nas províncias ultramarinas, onde os nossos inimigos, apoiando o arvorar da falsa bandeira de reivindicação de direitos e de territórios, pretendem apenas dar largas às suas desmedidas ambições.
Apesar dessa luta, em que nos obrigam a consumir boa parte dos nossos recursos, não conseguiram perturbar a serenidade dos nossos governantes, sendo consolador verificar que, não obstante a distracção forçada de avultadas somas na repressão do assalto, nem por isso deixam de atentar e resolver com a mesma solicitude, com a mesma dedicação e eficiência os complexos problemas dos seus departamentos.
Destas realidades, que não podem ser desmentidas, tiramos a ilação de que também há-de ser possível conseguir-se maior incremento neste importante sector dos melhoramentos rurais e, particularmente, no que diz respeito à abertura de novas estradas e caminhos municipais.
Sr. Presidente: Ao terminar estas minhas breves considerações, desejo congratular-me por mais uma vez se poder verificar o que, aliás, tem sido possível há dezenas de anos que as contas públicas encerram, também em 1968, com um saldo positivo de 151 769 contos.
Constatamos, porém, que para fazer face às despesas extraordinárias teve de recorrer-se a empréstimos do montante de 2 799 824 contos e de utilizar, ainda, da receita ordinária, cerca de 3 milhões de contos.
Deduzimos que houve necessidade de satisfazer elevados encargos, entre os quais, certamente, avultam os imprescindíveis à defesa do ultramar, que reputamos amplamente justificados e do maior interesse para a Nação.
Convém, entretanto, meditar detidamente sobre o desnível da balança do comércio e estimar o benefício que representaria para o País se estes montantes pudessem ter sido aplicados em empreendimentos de alta e acelerada reprodutividade, de molde a atingir-se a sensível daquele desnível.

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Temos por isso que estar bem atentos aos acontecimentos de África e sobretudo permanentemente atentos à palavra de ordem de Salazar.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr Presidente: - Vou encerrar a sessão.
O debate continuará amanhã, à hora regimental, sobre a mesma ordem do dia.
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 15 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Aníbal Rodrigues Dias Correia.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António Magro Borges de Araújo.
Armando José Perdigão.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Belchior Cardoso da Costa.
Carlos Coelho.
Francisco Lopes Vasques.
Henrique dos Santos Tenreno.
Joaquim de Sousa Birne.
Jorge Augusto Correia.
Jorge Manuel Vítor Moita.
José Dias de Araújo Correia.
José Luís Vaz Nunes.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Manuel Herculano Chorão de Carvalho.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel Nunes Fernandes.
Manuel Seabra Carqueijeiro.
Tito Castelo Branco Arantes.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.

Srs. Deputados que faltaram à sessão

Agnelo Orneias do Rego.
Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
António Augusto Gonçalves Rodrigues.
António Calheiros Lopes.
António Gonçalves de Faria.
António Tomás Prisónio Furtado.
Armando Francisco Coelho Sampaio.
Artur Alves Moreira.
Artur Proença Duarte.
Carlos Emílio Tenreiro Teles Grilo.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Manuel Pires.
José Monteiro da Rocha Peixoto.
Purxotoma Bamanata Quenin.
Rogério Vargas Moniz.
Urgel Abílio Horta
Virgílio David Pereira e Cruz.
Vítor Manuel Dias Barros.
Voicunta Srinivassa Sinai Dempó.

O REDACTOR - Luís de Avilles

IMPRENSA NACIONAL DB LISBOA

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