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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 193

ANO DE 1965 25 DE MARÇO

ASSEMBLEIA NACIONAL

VIII LEGISLATURA

SESSÃO N.º 193, EM 24 DE MARÇO

Presidente: Exmo. Sr. Mário de Figueiredo

Secretários: Exmos. Srs. Fernando Cid Oliveira Proença
Luís Folhadela de Oliveira

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 15 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foram aprovados os n.ºs 189 e 190 do Diário das Sessões.
Deu-se conta do expediente.
Para efeitos do disposto no § 3º do artigo 109.º da Constituição Política, foram recebidos na Mesa os Diários do Governo n.ºs 63, 64 e 65, 1.º serie, respectivamente de 10, 17 e 18 do corrente, que inserem os Decretos-Leis n.ºs 46 228, 46 233, 46 234 e 46 235.
O Sr. Presidente aludiu a sua presença, em nome próprio e sem representação da Assembleia, no funeral da mãe do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, sendo aprovada a menção no Diário das Sessões dos sentimentos apresentados àquele membro do Governo pelo Sr. Presidente.
O Sr. Deputado Nunes Barata, advogou, a realização de um grama de promoção cultural das populações rurais.
O Sr. Deputado Rocha Peixoto falou sobre a projectada navegabilidade do rio Douro.

Ordem do dia. - Prosseguiu a, discussão das Contas Gerais do Estado (metrópole e ultramar) e das contas da Junto do Crédito Público relativas a 1963.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Pinto Bull, Dias das Neves e José Manuel Pires.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas.

O Sr. Presidente: - Vai fazer-se a chamada.

Eram 16 horas e 5 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados.

Agnelo Orneias do Rego.
Agostinho Gonçalves Gomes.
Alberto Carlos de Figueiredo Franco Falcão.Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Alberto Pacheco Jorge.
Alberto dos Beis Faria.
Alberto da Bocha Cardoso de Matos.
Albino Soares Pinto dos Beis Júnior.
Alexandre Marques Lobato.
Alfredo Maria de Mesquita Guimarães Brito.
André Francisco Navarro.
Aníbal Rodrigues Dias Correia.
Antão Santos da Cunha.
António Gonçalves de Faria.
António' Júlio de Carvalho Antunes de Lemos
António Magro Borges de Araújo.
António Manuel Gonçalves Rapazote.
António Marques Fernandes.
António Martins da Cruz.
António Moreira Longo.
António da Purificação Vasconcelos Baptista Felgueiras.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Alves Moreira.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Artur Proença Duarte.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Augusto José Machado.
Bento Benoliel Levy.
Carlos Alves.
Carlos Coelho.
Carlos Emílio Tenreiro Teles Grilo.
D. Custódia Lopes.
Délio de Castro Cardoso Santarém.

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Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Ernesto do Araújo Lacerda e Costa.
Fernando António da Veiga Frade.
Fernando Cid Oliveira Proença.
Francisco António Martins.
Francisco António da Silva.
Francisco José Lopes Roseira.
Francisco de Sales de Mascarenhas Loureiro.
Henrique Veiga de Macedo.
Jacinto da Silva Medina.
James Pinto Bull.
Jerónimo Henriques Jorge.
João Mendes da Costa Amaral.
João Ubach Chaves.
Joaquim de Jesus Santos.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Jorge Augusto Correia.
Jorge de Melo Gamboa de Vasconcelos.
José Alberto de Carvalho.
José Augusto Brilhante de Paiva.
José Fernando Nunes Barata.
José Manuel da Costa.
José Manuel Pires.
José Mana Rebelo Valente de Carvalho.
José Monteiro da Rocha Peixoto.
José Pinheiro da Silva.
José Pinto Carneiro.
José dos Santos Bessa.
Júlio Dias das Neves.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Luís Folhadela de Oliveira.
Luís Lê Cocq de Albuquerque de Azevedo Coutinho.
Manuel Amorim de Sousa Meneses.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Herculano Chorão de Carvalho.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel João Correia.
Manuel João Cutileiro Ferreira.
Manuel Nunes Fernandes.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
D Maria Margarida Craveiro Lopes dos Reis.
Mário Amaro Salgueiro dos Santos Galo.
Mário de Figueiredo.
Olívio da Costa Carvalho.
Paulo Cancella de Abreu.
Quirino dos Santos Mealha
Rui de Moura Ramos
Sebastião Garcia Ramires.

O Sr Presidente: - Estão presentes 82 Srs Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 16 horas e 15 minutos

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Estão na Mesa, e ]á foram distribuídos ontem, os n.º 189 e 190 do Diário das Sessões, correspondentes às sessões de 17 e 18 do corrente, respectivamente.
Estão em reclamação.

Pausa

O Sr. Presidente: - Como nenhum Sr. Deputado deduz qualquer reclamação, considero aqueles números do Diário das Sessões aprovados.

Deu-se conta do seguinte:

Expediente

Telegramas

Vários a apoiar o discurso proferido pêlo Sr Deputado Moura Ramos na sessão do dia 19 do corrente.
Do governador civil de Coimbra a aplaudir a intervenção do Sr Deputado Nunes Barata sobre o plano geral de aproveitamento da bacia do Mondego.

O Sr. Presidente: - Para cumprimento do disposto no § 8.º do artigo 109.º da Constituição, estão na Mesa os n.ºs 63, 64 e 65 do Diário do Governo, 1.ª série, respectivamente de 16, 17 e 18 do corrente, que inserem os Decretos-Leis n.ºs 46 228, que autoriza a inclusão mo programa de realizações a efectuar por força das verbas do Plano Intercalar de Fomento, atribuídas a edificações para o ensino técnico, da construção de novas instalações para a Escola Industrial e Comercial de Ponta Delgada, 46233, que dá nova redacção ao § 3.º do artigo 75.º e ao artigo 544.º do Código Administrativo, 46 234, que prorroga até 31 de Dezembro do corrente ano o prazo de vigência do Decreto-Lei n.º 43 413, que isenta ou reduz os direitos de importação aplicáveis às carnes-congeladas de bovinos e suínos e ao toucinho, quando indispensáveis para garantir a regularidade do abastecimento público, e 46 235, que aprova a Convenção relativa ao contrato de transporte internacional de mercadorias por estrada, concluída em Genebra a 18 de Maio de 1956.

Pausa

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Como todos sabem, certamente, morreu a mão do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.
Fui a Vila Franca de Xira, donde acabo de chegar, ao funeral e apresentei-lhe os meus sentimentos e os da Assembleia Declarei que estava em nome próprio e em representação da Assembleia.

Vozes: - Muito bem!

O Sr Presidente: - Tenho esperança de que a Assembleia desejará que a menção destes sentimentos fique exarada no Diário das Sessões.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nunes Barata

O Sr. Nunes Barata: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na riqueza dos problemas abordados pelo Sr. Presidente do Conselho no passado dia 18 de Fevereiro, ouvi há dias, em conversa com gentes das minhas serras, destacar o paralelismo sugerido por dois sentimentos que emanam desse discurso a compreensão amorosa pelo povo simples e o convite à modéstia e à descrição.
O «espectáculo da riqueza que se alardeia e quase afronta pelo exagero com que se manifesta», quando no ultramar morrem heroicamente os nossos soldados ou na metrópole a imprensa dá conta de dramas vividos por marginais na hierarquia dos bens da fortuna ou nos formalismos da ostentação humana, merece, na verdade, a reprovação da sã consciência nacional.
Já aqui o disse as nossas noites não poderão ser sossegadas, nem as nossas consciências cristãs se sentirão tranquilas, enquanto soubermos que ainda ao nosso lado

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irmãos nossos, filhos do mesmo Deus e cidadãos da mesma Pátria, não usufruem de um mínimo de condições de vida, vegetam em casebres imundos, não têm sequer onde reclinar a cabeça, quase numa ausência de privilégios que a própria narrativa evangélica às aves do céu e às raposas do monte.

O Sr. Marques Fernandes: - Muito bem!

O Orador: - Mas a compreensão amorosa pelo povo simples preocupa-se igualmente com os valores da sua personalidade (cf , por exemplo, o número de Janeiro-

arço de 1964 da revista Tiers Monde, dedicado a «Éducation et Developpement»)
O mundo moderno põe à consciência dos homens problemas que ainda há poucas décadas nem sequer se sonhavam.
De facto, ao mesmo tempo que a ciência colecciona dia a dia novas conquistas, a diversidade nos métodos de pensamento e de acção repercute-se profundamente no comportamento humano.
A evolução da arte e a multiplicação nos instrumentos de cultura quadram-se nesta marcha acelerada com o domínio das técnicas Milhões de homens ainda ontem isolados conhecem agora as maiores facilidades de comunicação. No plano social constata-se uma melhoria nas condições de vida, uma diminuição nas horas de trabalho, um aumento nos tempos destinados aos lazeres. O homem sente-se mais escravo dos grupos, ao mesmo tempo que a mulher, realizado um processo de emancipação, lhe disputa primazias e lugares.
A evolução do nosso país reflectirá muitos destes condicionalismos e realidades.
Valha a verdade que o fenómeno das alterações nas estruturas mentais é de sempre.
Poder-se-á negar no século passado a influência invasões napoleónicas, das ideologias francesas, da do Brasil, da expulsão das ordens religiosas, da emigração, das guerras de África e até das políticas de fomento e dos primeiros ensaios de industrialização na vida das nossas populações rurais? E os anos que preceder se seguiram à primeira grande guerra, com a República a guerra na Flandres e em África, as crises económico-financeiras, a emigração para o continente americano instabilidade política e a pressão de ideologias nas robustecidas na Europa? E a segunda grande guerra, com o impacte dos ideais, a abertura nas comunicações alterações nos hábitos do consumo, a presença dos refugiados?
As nossas regiões montanhosas do interior sentem o isolamento quebrado e as respectivas populações alimentam um êxodo que é autêntica debandada. Transplantados para novos ambientes, os nossos rurais perdem um suplemento de vida interior que resultava, ao menos, da influência secular do cristianismo e do realismo salutar da dos campos.
A Nação não pode, na hora que passa, alhear-se às repercussões das seguintes realidades, a guerra de e a experiência aí colhida por dezenas de milhares homens, «que viveram nos matos, se arriscaram nos mares e nas selvas, jogaram a vida pela Pátria e viram no ultramar projectada a Nação na sua verdadeira grandeza»; o incremento do urbanismo e da industrialização hoje servida por mais de 2 milhões de trabalhadores em boa medida portadores de outra mentalidade que não a rural, os 200 000 emigrantes que nos últimos tempos procuraram na França, ou noutras terras da Europa trabalho, contactando com outros povos ou, até, sendo solicitados por ideologias que repudiamos, o afluxo de estrangeiros, nesta idade de democratização do turismo, já traduzido em número superior a 1 milhão no último ano.
Importa, pois, para enfrentar os novos condicionalismos naquilo que têm de bom e de mau, estar atento a promoção socio-cultural dos Portugueses, realizar imediatamente um generalizado esforço de valorização das nossas populações. Eis o apelo que desejaria renovar hoje desta tribuna.
Sr. Presidente: É do conhecimento geral o baixo nível de instrução das nossas populações rurais.
Esta realidade apreende-se, desde logo, pé compararmos os índices de analfabetismo de Portugal com os dos outros países da Europa. Assim, enquanto em 1950 a nossa percentagem de analfabetos (maiores de 15 anos) era de 44,1 por cento, não excedia na Bélgica ou na França os 3 por cento, e mesmo nos países mediterrâneos era apenas de 29,9 por cento na Grécia, 17,8 na Espanha (maiores de 10 anos) e 14,4 por cento na Itália.
A situação, em 1950, conhecia ainda agravamentos resultantes dos desequilíbrios regionais (a taxa média de 40,3 por cento - maiores de 7 anos - de analfabetos no continente correspondiam 57,9 por cento no distrito de Beja, 51,2 por cento no de Castelo Branco, 48,3 por cento no de Évora ) e do peso nos grupos etários activos (50,3 por cento na população entre os 45 e os 54 anos, 46,6 por cento na população entre os 35 e os 44 anos.)
É certo que com a publicação do Decreto-Lei n.º 38 968, de 27 de Outubro de 1952, e do Decreto regulamentar n º 38 969 se iniciou a Campanha Nacional contra o Analfabetismo, cuja transcendente importância seria gravosa injustiça minimizar.
A execução do Plano dos Centenários e do Novo Plano dos Centenários para as construções escolares tem representado um esforço complementar igualmente digno de louvor.
A taxa de escolaridade obrigatória continuou, contudo, a ser baixa entre nós (cf, por exemplo, a publicação do Fundo de Desenvolvimento da Mão-de-Obra, Evolução Recente da Estrutura Escolar Portuguesa)
Só o Decreto n.º 42 994 tornou a 4.ª classe obrigatória para todos os menores em idade escolar.
Recentemente, o Decreto-Lei n.º 45 810, de 9 de Julho de 1964, criou um ciclo complementar do ensino primário, com duas classes anuais A frequência será obrigatória para todos os que não cursem, até ao seu termo, o 1.º ciclo do ensino liceal ou o ciclo preparatório do ensino técnico
No parecer subsidiário da Câmara Corporativa sobre o Plano Intercalar de Fomento - «Ensino e investigação» - escreve-se:

se atendermos a que em todos os países da Europa o ensino é obrigatório pelo menos em seis classes, verifica-se que a nossa taxa de escolaridade, no grupo dos 5 aos 14 anos, é excepcionalmente baixa, sendo entre os países da O C D E apenas superior à da Turquia.

Vencido o ausentismo e estendida a escolaridade obrigatória, importa ainda prosseguir numa larga recuperação das populações adultas.
Os meios áudio-visuais de ensino, «que tão assinalado papel são chamados a desempenhar, e efectivamente já desempenham nalguns países, como auxiliares da docência», também estão agora a ser considerados em Portugal (cf, por exemplo, a publicação da O N U L'Enseignement et Ia Formation Professionnelle, 1964)
Na verdade, o Decreto-Lei n.º 46 135, de 31 de Dezembro de 1964, criou no Ministério da Educação Nacional o Instituto dos Meios Audio-Visuais do Ensino e o Decreto-

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-Lei n.º 46 136, da mesma data, criou no referido Instituto uma telescola destinada h realização de cursos de radiodifusão e de televisão escolares
O primeiro objectivo da acção educativa deverá ser ainda a defesa dos valores culturais das populações dos campos.
Há anos, Pio XII formulava uma observação que pode ter aqui cabimento deixando as regiões onde domina uma vida austera, afluem constantemente à cidade homens cheios de saúde e de ardor, ricos de experiência de gerações laboriosas, daqueles homens de que as nações necessitam para as tarefas difíceis e para exemplo do seu povo. Impõe-se impedir que tais populações se deteriorem. Urge, antes, valorizá-las não só para a manutenção de um salutar equilíbrio regional como ainda para conveniente sustentáculo das próprias aglomerações urbanas
Mas a fidelidade aos valores culturais das nossas populações deve harmonizar-se com uma maior consciência cívica, com a compenetração da importância da participação de todos na vida colectiva A educação deve tender para a liberdade
Exemplifico com a vida municipal.
Muitos perguntam, ora numa atitude de desânimo, ora na convicção de que as realidades impõem novos caminhos, se a autonomia local ainda se justifica
Parece-me que se deve responder afirmativamente Mais entendo que não podemos fazer obra séria nos campos se não prestigiarmos as instituições locais, se não dermos a cada um consciência da importância da sua colaboração na vida social.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - As razões da autonomia local são bem evidentes no plano político-administrativo.
A iniciativa local continua a ser uma condição de equilíbrio no governo dos povos.
As administrações locais, por exemplo, garantem uma ligação entre os munícipes e o Poder Central, ao mesmo tempo que constituem largo campo de valorização para os homens que um dia podem ser chamados a mais importantes tarefas de governo
Poderíamos, em síntese, afirmar a vida local deve resultar da livre participação de todos, as instituições locais devem gozar de uma liberdade de iniciativa e de uma capacidade realizadora que as afaste de mera posição decorativa, a acção educativa deve preocupai-se muito especialmente com estes problemas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E passo a um segundo aspecto o da educação sanitária
Creio justificar-se, ao abordar o problema da saúde das populações, uma referência prévia à nutrição (formação profissional e educação do público)
A Campanha Mundial contra a Fome, empreendida pela FAO, pôs ao vivo a multiplicidade de aspectos que este problema comporta e a necessidade de uma actuação eficaz.
A enumeração seguinte poderá dar uma ideia, embora restrita, das preocupações a ter em conta necessidade da educação alimentar, definição dos hábitos alimentares, papel da educação na modificação desses hábitos, estudo das disponibilidades alimentares, inquéritos sobre os regimes alimentares, elementos sobre os processos de escolha dos alimentos, organização da educação alimentar
(A quem se deve dirigir? Em que local e momento deve ser dispensada? Quem deve assegurar o seu ensino?) (cf , por exemplo, a publicação da F A O Nutrition, Formation Professionnele et Education du Public, 1962) Penso que os programas a estabelecer entre nós não deveriam subestimar ainda os seguintes pontos.

a) Na educação do consumidor deveria insistir-se na utilização dos alimentos mais acessíveis e com maior poder nutritivo,
b) Os programas deveriam respeitar, quanto possível, os hábitos alimentares Não se trata de substituir absolutamente o arroz, os feijões ou o pão, mas de suplementar esta alimentação com produtos ricos em vitaminas, proteínas e sais minerais.

A necessidade de uma educação sanitária nacional da população é matéria pacífica. Se em face desta designação se pode concluir tratar-se de uma educação cujo escopo reside em esclarecer o público sobre os problemas sanitários, é, contudo, indiscutível encontrar-se actualmente tal estádio ultrapassado. A educação sanitária faz parte de todos os programas de bem-estar e progresso social, constituindo autêntica educação para a vida (cf , por exemplo, a publicação da O N U La Population et lês Modes do Vic, 1964).
Nos últimos anos são numerosos os organismos internacionais que orientaram as suas actividades neste sentido e abordaram, com grande amplitude, esta educação ao serviço da vida das populações. A Organização Mundial da Saúde, a F A O e a Organização Internacional do Trabalho salientam-se a tal propósito, assim como a U N E S C O , que, desde a sua fundação, consagra um imenso esforço à tarefa da «educação base» que lhe parece, bem justificadamente, essencial. Se a educação bamtáiiH é susceptível de conduzir cada membro da colectividade a um enriquecimento da sua personalidade nos domínios da saúde física e mental e na consciência dos seus direitos, faz despertar igualmente a responsabilidade de cada um perante o interesse geral.
A educação sanitária, que conduz a esta consciência de obrigação, não será mesmo uma fonte de educação cívica e de solidariedade social. Não há respeito pela vida alheia onde não se estima a própria vida Não será, pois, a educação sanitária que dá ao homem a consciência deste respeito. Para ser útil e eficaz deve, antes de tudo, ser uma «educação apropriada», com métodos ajustados ao nível das populações, às estruturas político-sociais, às condições etnopsicológicas e económicas dos vários grupos.
Os hábitos e os costumes não devem ser alterados de ânimo leve, tornando-se conveniente realizar ensaios com o objectivo de detectar as reacções que provocará nos indivíduos ou nos grupos a actividade sanitária que se pretenda desenvolvei (cf a Revue Internationale d'Education ao la Santé)
Sr. Presidente: Tem-se descurado a formação agrária das nossas populações rurais.
Já no parecer geral da Câmara Corporativa, a propósito do I Plano de Fomento, se escrevia.

Sobretudo o ensino elementar agrícola, tão necessário e tão deficiente, apesar de sobre ele se terem debruçado pessoas de real mento, bem merecia a protecção generosa de um plano de fomento disposto a atacar de frente esse momentoso problema, embora correndo o risco de ficar vencido ou de não ter vitória nítida A derrota não é desonra, fugir ao combate é pior.

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E no parecer subsidiário respectivo insistia-se pois:

a) Formação na juventude dos campos de Uma consciência rural através de conhecimentos adquiridos na escola primária e sua ulterior actualização,
b) Preparação profissional dos trabalhadores,
c) Instalação de centros de cultura nos meios rurais.

A assistência técnica à lavoura foi sempre considerada condição essencial ao seu progresso, numa renovação de métodos e de culturas.
O Decreto-Lei n.º 41 473, de 23 de Dezembro de 1957, tentou encarar este momentoso problema.
Nos termos deste diploma a assistência técnica seria realizada segundo «planos elaborados para cada região agrícola» e incidia «não apenas no campo das técnicas culturais, mas também, sobre a orientação do produtor na gestão das explorações agrícolas».
Na prática, contudo, este diploma não conheceu consagração.
Também o ensino agrícola foi reorganizado e em 1957 (Decretos-Leis n.º 41 381 e 41 382)
O conhecimento das medidas então promulgadas não deixa de ter interesse, na medida em que procuram promover este ensino, estruturando-o de modo a permitir-lhe ocupar um lugar de acordo com a posição da agricultura na vida portuguesa.
O que infelizmente acontece é ser diminuta a expansão do ensino previsto, quando se reconhece o alto interesse dos investimentos intelectuais na agricultura (cf, por exemplo, a publicação da O G D E Investissements Intelectuels dans l'Agricultura et Developpement Economique et Social)
Sem preocupações exaustivas poderíamos sumariar alguns temas que deveriam ser objecto de atenção nesta campanha de formação agrária das populações portuguesas:

a) Agricultura propriamente dita estruturas nomeadamente o emparcelamento, construções, novas culturas e novas técnicas pequena mecanização da agricultura, introdução de novas sementes e plantas matéria orgânica e adubos, defesa fitossanitária, rega e novas técnicas de regadio, trabalhos agrícolas (produtividade, aperfeiçoamento profissional, em etc),
b) Florestas realidades e importância do património florestal, legislação florestal e política fomento, sentido das novas orientações silvo-pastoris, valorização do património privado a da floresta, racionai exploração dos recursos florestais,
c) Pescas interiores valor económico das pescas anteriores, fomento e defesa da riqueza das interiores,
d) Pecuária raças apuradas e cruzamentos, d sanitária, valorização das pastagens, aproveitamento económico dos gados;
e) Industrialização importância do artesanato, pequenas unidades de aproveitamento dos agrícolas, industrialização em relativa escala
produtos agrícolas,
f) Comercialização problemas de abastecimento público, comercialização dos produtos agrícolas pelo recurso a soluções cooperativas,
g) Estruturas orgânicas interesse das fórmulas associativas, o corporativismo e a vida rural, soluções cooperativas.
Para ilustrar a importância deste sector pode referir-se a publicação da O E C E (série de 1959) Formation des Jeunes Agriculteurs et deu Travaileurs Agrecoles.
A formação ultramarina das populações metropolitanas deveria preocupar-se com dois aspectos.
Consciencialização da existência do ultramar e da sua importância cultural e económica na vida da Nação,
Preparação prática para as tarefas do ultramar, nomeadamente se tivermos em conta a missão dos soldados e dos novos povoadores.

No primeiro capítulo os temas são variados, dada a riqueza que o ultramar, na sua história, na sua geografia e no seu contexto sociológico, económico, demográfico, étnico e político, comporta.
Eis alguns pontos escolhidos ao acaso e que testemunham esta riqueza Qual o papel dos Portugueses na descoberta e civilização do Mundo 9. Qual a relevância da cultura portuguesa paia os fenómenos dos contactos de taças? Quais as tradições, princípios e métodos da colonização portuguesa? Qual o papel da juventude no quadro da vida ultramarina? O que é a integração económica do espaço português? Qual o sentido da actual estrutura político-administrativa da Nação Portuguesa?
A preparação prática das populações destinadas a servir no ultramar atinge os mais variados sectores de actividade- administrativos, missionários militares, colonos.

O Sr. Lopes Roseira: -Muito bem!

O Orador: - O povoamento dos territórios ultramarinos portugueses assumiu sempre, e assume particularmente hoje, uma importância excepcional
Um plano de desenvolvimento económico aplicável a estruturas, como os de Angola e Moçambique, deverá ser igualmente um plano de povoamento, importando para isso preparar convenientemente as populações a deslocar.

O Sr. Lopes Roseira: -Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: O sucesso de um programa intensivo e generalizado de formação cultural das populações rurais depende.

Da adequação dos temas escolhidos,
Do ajustamento das técnicas de actuação,
Da coordenação eficaz dos vários sei viços públicos empenhados

É indiscutível dispormos de um conjunto de dedicações que nos permitam levar a bom termo uma campanha sistemática e coordenada de promoção cultural das populações rurais.
No Ministério da Educação Nacional, à benemérita Campanha Nacional de Educação de Adultos segue-se agora, como já salientei o recurso aos meios áudio-visuais de ensino No Ministério da Economia, aos serviços tradicionais de extensão agrária junta-se um plano sistemático de formação elaborado com a intervenção da Junta de Colonização Interna e que se executará em colaboração com a televisão educativa No Ministério das Corporações acrescem à Junta Central das Casas do Povo a Junta de Acção Social e a Comissão de Política Social e Bui ai E a enumeração poderia prosseguir quanto a outros Ministérios.

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O que se me afigura indispensável é o que os vários serviços não se fechem. Importa, em suma, uma colaboração e uma coordenação, de forma a evitar duplicações, conflitos positivos e negativos, primazia do acessório em prejuízo do essencial.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - Pretendi demonstrar a actualidade de quatro temas formação cívica, educação sanitária, extensão agrária e consciencialização do ultramar (na dupla acepção de identificação com a nossa ideologia de estado plurirracial e preparação para as tarefas de defesa e desenvolvimento das províncias ultramarinas).
Creio que muitas vezes, nas campanhas de formação, nos termos ligado a um lirismo que, se não faz mal à vida, é por si insuficiente para nos permitir sucesso nas duras provações dos tempos presentes Por outro lado, aquela constante trapalhada nos negócios, de que falava o nosso Eça de Queirós, parece ter hoje a sua expressão actualizada na descoordenação de actividades, numa passividade altamente deletéria A sociologia poderá sugerir a inoportunidade de impor aos homens um ritmo de actividade excessivo. Mas a capacidade de adaptação dos nossos trabalhadores, o relativo sucesso dos emigrantes e o exemplo edificante de muitos que na África Portuguesa têm conhecido triunfo pela persistência no trabalho são incentivos a que exijamos mais dos que na metrópole se dedicam à venda de estampas, são caçadores furtivos, animam as sociedades recreativas e os chás de caridade ou, simplesmente, nos cafés olham, nostálgicos, o cair da chuva.

Tenho dito

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado

O Sr: Rocha Peixoto: - Sr. Presidente: Tive ontem conhecimento, por intermédio do nosso ilustre colega Dr. Rapazote, dos despachos de SS. Exas. o Ministro das Obras Públicas e Ministro cessante da Economia sobre a projectada navegabilidade do no Douro, assunto há muito pensado e ultimamente agitado em conferências, na imprensa, nesta Gamara e sempre no convívio de todos quantos se interessam pela região servida por aquele rio, e ontem também aqui ouvimos, a propósito dos mesmos documentos, a palavra fluente, elegante e apropriada daquele mencionado colega.
Sendo o distrito de Vila Real -especialmente os concelhos ribeirinhos - um dos altamente beneficiados por tão notável empreendimento, seria estranho que algum dos seus representantes nesta Assembleia não assinalasse com justificadíssimo regozijo os referidos despachos, acrescido do mais entranhado reconhecimento que ficamos devendo a todos os que estudaram, agitaram, impulsionaram e decidiram uma obra a todos os títulos excepcional pela sua projecção económica, social e política.

Muito bem!

O Orador: - Se não fora a forçada e lamentável ausência do nosso afanoso colega Eng.º Virgílio Cruz, tão intensamente e proficientemente devotado à obra referida, nenhum de nós lhe disputaria o alvoroço com que ele tocaria o «sino grande», como disse tão portuguesmente o colega Dr. Rapazote. Não é sem o mesmo júbilo, porém, ainda que com minguada propriedade, que eu registo, com singular aprazimento, a notícia daqueles documentos que iniciam, na história económica da vasta região beneficiada, uma época das mais auspiciosas.
Referiu-se o ilustre colega Dr. Rapazote a pessoas que têm vindo a dar à obra Citada o melhor do seu valor e do seu esforço.
Associo-me cordialmente ao louvor que lhes rendeu, a que junto a admiração e o apreço que me merece o seu persistente devotamento.
Da leitura dos despachos referidos ressalta que o aproveitamento hidroeléctrico do Douro nacional marcou a hora própria para realizar a almejada valorização do no como via de comunicação, mas não foram os departamentos oficiais surpreendidos por esta única oportunidade autorizadas opiniões e estudos sérios, conduzidos pelas mais categorizadas instâncias, constituíram elementos seguros para a notável decisão ministerial.
Cumpre-me, porém, sublinhar nesta ligeiríssima intervenção o interesse que mereceu a vários sectores do Estado e aos seus máximos responsáveis o futuro das regiões favorecidas, tão manifestamente e insofismavelmente evidente nas directivas já contidas, explícita e implicitamente, nos documentos citados.
Há bastantes décadas desempenhou o rio Douro um papel relevante na economia dos transportes do Norte do País. Reduzido depois quase que a mero acidente geográfico, pode dizer-se ter perdido totalmente o seu lugar na economia daquelas regiões.
Presentemente, o aproveitamento das suas características especiais deu-lhe o lugar cimeiro na produção de energia eléctrica Num futuro próximo ele será uma das grandes artérias do sistema circulatório da vasta zona, cujo solo e subsolo se desentranham em ricos valores económicos.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continuam em discussão as Contas Gerais do Estado (metrópole e ultramar) e as contas da Junta do Crédito Público relativas a 1963.

Tem a palavra o Sr Deputado Pinto Bull

O Sr. Pinto Bull: - Sr. Presidente: Mais um ano volvido e mais um minucioso parecer que a Comissão de Contas Públicas desta Câmara nos apresenta para apreciação e debate, dentro da já conhecida pontualidade e clareza, facto que, como sempre, é digno do nosso louvor e nos leva a felicitar os membros da Comissão, e muito especialmente o relator das Contas, Eng.º Araújo Correia, pelo magnífico trabalho realizado e que merece a nossa inteira aprovação
Dado o interesse que o presente debate vem tendo e o já elevado número de Deputados que nele tomaram parte, apreciando as Contas através dos mais variados ângulos, circunscreveremos a nossa intervenção à parte respeitante à província da Guiné e, numa rápida da análise, procuraremos focar os pontos que nos parecerem dignos de refe-

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rência, dada a relevância ou as implicações que possam ter com a difícil conjuntura que estamos vivenda.
Sr. Presidente Constituem as contas da província da Gume uma imagem da conjuntura política que província atravessa e mostram bem as dificuldades que as entidades responsáveis pela administração ali encontram para levar a cabo a dura tarefa que lhes está confiada.
Como já tivemos oportunidade de afirmar mais de uma vez nesta Assembleia, a condição especial da Guiné, encravada entre os dois territórios que mais directamente vêm apoiando a expansão da subversão interna desde 1961, dificulta o desenvolvimento económico e social da província e prejudica grandemente o progresso das suas gentes.
Este clima de guerra, que vem sendo mantido do exterior e que nos obriga a um desgaste financeiro muito apreciável e a uma mobilização de homens cada vez maior, tem contribuído para retardai algumas iniciativa públicas e privadas, as quais, num clima de paz e sossego, poderiam ajudar a acelerar o ritmo da evolução económica da província.
Uma análise mais pormenorizada das Contas Um debate mostra o esforço titânico que o Governo têm fazendo para melhorar as condições económicas da província, que, como se sabe, está estruturada numa agricultura rudimentar e muito tradicional, apoiada em bases pouco sólidas, dadas as flutuações na produção do amendoim e do arroz, este último hoje insuficiente para o auto-abastecimento das populações autóctones.
Contudo, e apesar de outras dificuldades não l menos importantes, foi possível cobrir o orçamento votado e fechar o ano com um saldo positivo de 2 670 866$73, graças à perfeita compreensão e colaboração de todos os serviços da província e ainda à cooperação dos organismos privados, aliada à perfeita fiscalização dos serviços de Fazenda e contabilidade, sob a superior orientação do governador da província.
Apreciando o panorama financeiro da Guiné, verificamos que a receita ordinária prevista para o ano de 1963, foi de 133 731 518$20, mas que a cobrança efectivamente realizada foi de 140 676 183$98. Houve assim um excesso de cobrança de 6 944 665$78 sobre a previsão.
Por outro lado, a receita extraordinária, que foi prevista em 32 800 contos, subiu para 35 012 859$01 totalizando, assim, a receita efectivamente arrecadada em 175 689 042$99.
Quanto às despesas orçamentadas, as dotações primitivamente inscritas nas respectivas tabelas somaram 133 471 518$20 para a despesa ordinária e 33 060 000$ para a extraordinária, porem, as despesas efectivamente pagas e contabilizadas foram respectivamente 138 005 317$25 para a ordinária e 35 012 839$01 para a extraordinária, perfazendo a soma total de 173 018 176$26, importância que deduzida do total das receitas nos dá o saldo positivo de 2 670 866$73.
Foi, pois, com este modesto orçamento de receita ordinária, melhorado com a importância de 35 012 859$01 de receita extraordinária proveniente de

Saldos de exercidos findos............................. 2 361 791$57
Rendimentos de concessões petrolíferas................. 1 539 980$01
Empréstimos da metrópole...............................26 660 257$62
Recursos previstos no Decreto n.º 44 982............... 4 550 829$81

que a província fez face aos seus encargos totais, incluindo os extraordinários.
Os encargos extraordinários foram suportados com a importância de 35 012 859$01 da receita extraordinária e foram distribuídos da forma seguinte:

Para a execução do Plano de Fomento
Contos
Agricultura, silvicultura a e pecuária.................. 8 039
Pesca................................................... 968
Comunicações e transportes..............................16 382
Instituição............................................. 2 857
Equipamento de sei viços públicos....................... 516
Soma..............................28 762

Para outras despesas extraordinárias

Outras despesas, incluindo os encargos com
as missões de estudo integradas na Junta de
Investigações do Ultramar............................... 1 800
Com a brigada móvel da Polícia de Segurança
Pública................................................. 4 451
Soma...................... 6 251

A situação da província no que respeita à dívida pública era em 31 de Dezembro de 1963 a seguinte:
Contos
Ao Banco Nacional Ultramarino....................... 12 440
Ao Fundo do Fomento Nacional........................ 56 947
Soma.............................. 69 396

e os gastos com a dívida pública foram em 1963 de 12 262 contos, provenientes de
Contos
Juros vencidos............................ 4 927
Amortizações.............................. 7 335
Soma....................... 12 262

Como se verifica, a província suporta, nesta altura difícil da sua vida económica e financeira, um encargo muito pesado para liquidar pontualmente os juros e as amortizações dos empréstimos contraídos para realizar empreendimentos urgentes e inadiáveis, tais como a construção da ponte de Ensalmá e o estabelecimento de uma estrutura sólida para o arranque que se impunha em todos os sectores da vida económica da província.
Estes encargos devem aumentar enormemente no corrente ano, pois haverá que contar com os juros e as amortizações respeitantes das importâncias despendidas com a execução do Plano de Fomento nos anos de 1959 a 1964.
Assim, muito brevemente, a província terá de suportar um encargo superior a 10 por cento do seu orçamento ordinário só para fazer face às despesas com os juros e as amortizações dos empréstimos contraídos.
Esta situação crítica em que se encontra a província portuguesa da Guiné coloca-a perante as seguintes hipóteses:

1) Continuar a pagar pontualmente, como até aqui, os juros e as amortizações dos empréstimos contraídos e paralisar a maior parte dos empreendimentos em curso,
2) Continuar com os trabalhos em curso e deixar de ser pontual no pagamento dos encargos com os compromissos assumidos,
3) Ser a sua difícil situação financeira compreendida pelo Ministério das Finanças e sanada a discriminação existente em relação às províncias de Cabo Verde e Timor, serem concedidos à Guiné

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os mesmos benefícios que aquelas províncias irmãs usufruem, isto é, que o reembolso das dotações destinadas aos planos de fomento possa ser feito na medida das possibilidades orçamentais da província e que durante este período anormal de guerra essas dotações deixem de vencer juros.
Pedimos aos Srs. Deputados de Cabo Verde e de Timor que nos perdoem a insistência com que continuamos batendo nesta tecla e mais uma vez lhes animamos que conhecemos bem a situação também difícil que aquelas províncias atravessam, mas o que as gentes da Guiné não compreendem é que, estando a província em pé de guerra com todas as suas inevitáveis implicações nos campos económico e financeiro, a metrópole não queira ou se demore a encarar objectivamente a situação aflitiva que a província virá a atravessar se não for resolvido a tempo este problema, que mais dia menos dia podei á foiçar à paralisação de determinados empreendimentos essenciais no campo económico e social e cuja paragem nesta ai tuia poderia dai azo a especulações pouco favoráveis à política firme e intransigente que adoptamos de aguentar até ao limite máximo das nossas forças para defendermos o património sagrado que os nossos maiores nos legaram
Perfilhamos esta decisão, sem nos esquecermos, porém de que para aguentar precisamos de apoiar na retaguarda os heróicos soldados e marinheiros que lutam nas diversas frentes de combate, e que esse apoio só podei á ser dado com uma política séria e convincente, acompanhada de realizações palpáveis nos campos económico e social.

Sr. Presidente e Srs. Deputados: Não compreendemos que seja razoável nem aconselhável que se mantenha a província da Guiné amairada à obrigatoriedade de liquidar pontualmente os juros e as amortizações dos financiamentos para os planos de fomento numa altura em que todos nós sabemos e reconhecemos que ela atravessa uma situação económica e financeira dificílima
Para confirmar esta nossa afirmação e mostrar as dificuldades com que vem lutando a província enumeramos algumas medidas e certos empreendimentos julgados essenciais para o seu desenvolvimento e politicamente muito oportunos na presente conjuntura, e que não puderam ser incluídos no plano de trabalhos do corrente ano por falta de disponibilidades orçamentais. Poderemos citar, entre outros, construção do edifício para a nova escola técnica de enfermagem e o seu apetrechamento, aquisição de equipamento de reanimação, aquisição de mais equipamentos cirúrgicos e de raios X, paia melhor apetrechamento dos hospitais, criação e instalação da escola para professores de posto escolar e o aumento do número de salas de aulas, para uma mais larga e rápida difusão da instrução primária, construção do lar para estudantes do liceu e da escola comercial e industrial, instalação de novas cantinas e bibliotecas escolares, criação e instalação de uma escola prática de agricultura e criação da caixa de crédito agro-pecuária, construção de bairros populares e económicos e a revisão dos vencimentos dos funcionários e empregados públicos
A concretização de todos ou parte dos empreendimentos referidos seria, nesta altura, de uma oportunidade incalculável, porém, não poderam ser considerados no corrente ano, por o orçamento não comportar mais encargos Contudo, se avaliarmos bem o seu cômputo, chegaremos ti conclusão de que não ultrapassa grandemente a importância que a província vem despendendo com o pagamento de juros e amortizações de empréstimos.
Esperamos, pois, confiados que o Governo Central, que em horas difíceis não tem regateado o seu costumado auxílio às províncias ultramarinas, concederá à Guiné os mesmos benefícios que estão usufruindo Cabo Verde e Timor, porque de contrário só um milagre poderá permitir àquela martirizada província a efectivação de tais empreendimentos, todos de grande relevância, pois fazem parte dos principais sectores de desenvolvimento de qualquer território saúde, ensino, trabalho e bem-estar, todos eles carecendo de grande impulso na arrancada que decididamente resolvemos imprimir na nossa conturbada província da Guiné.
Aproveitando os números constantes das contas de gerência e de exercícios da província da Guiné respeitantes ao ano de 1963, verificamos que foram despendidas as seguintes importâncias com:

[ver tabela na imagem]

Para um modesto e apertado orçamento como o da Guiné é alguma coisa, mas vale a pena tentai fazer mais e estamos convencidos de que seremos capazes Por isso contamos com um milagre e aguardamos confiantes.
Antes de terminarmos esta rápida intervenção queremos dedicar mais algumas palavras ao magno problema dos vencimentos dos funcionários e demais servidores do Estado na província da Guiné.
Está mais do que provado que a carência de técnicos e de funcionário? de nível superior que a província atravessa é uma consequência do reduzido vencimento que ali auferem. Na verdade, não se compreende que os vencimentos na Guiné sejam inferiores aos de Angola e Moçambique, quando o custo de vida é ali muito superior que nessas duas grandes províncias e as dificuldades e perigos criados pelo estado de guerra são maiores.
E não compreendemos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que haja ainda quem se admire quando se afirma que a vida na Guiné está num nível tal que é difícil, se não impossível, viver-se decentemente, pelo menos na classe de funcionário modesto ou de empregado de baixo ordenado.
Embora o vencimento-base seja idêntico em todas as parcelas do mundo português, o respectivo complemento vai ia de província paia província e na Guiné ainda está longe de atingir os quantitativos que se verificam em Angola e Moçambique, embota toda a gente saiba que hoje em dia o custo de vida é mais alto na Guiné
Para mais, a subida vertiginosa que se vem registando nos últimos anos nos preços correntes dos bens de consumo e nas rendas de casa na província da Guiné faz com que o custo de vida ali seja dos mais elevados do nosso ultramar.
Esperamos oportunamente voltar a este assunto com mais detalhes, pois urge que se tomem providências urgentes para minorar as dificuldades com que lutam os funcionários da Guiné, em especial os de modesta condição, como os serventes e equiparados.
Examinando ràpidamente o panorama económico da província, verificamos que toda a sua estrutura assenta principalmente na agricultura e que continuamos apegados a uma monocultura que pode ser perigosa. Referimo-nos ao produto-base da exportação, que é o amendoim, já que o segundo produto digno de nota, que é o arroz, é hoje insuficiente para o consumo local

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Toma-se imperioso resolver este problema, procurando encontrar noutros produtos a compensação da quebra que se vem verificando na produção do amendoim.
Parece-nos, pois, conveniente que se dedique especial atenção ao fomento da palmeira melhorada, à intensificação da exploração e repovoamento com palmeiras melhoradas dos vastos palmares do arquipélago dos Bijagós, ao mesmo tempo que se procure completar a substituição da semente da mancarra e se tentem os primeiros pampos para a cultura mecanizada e a adubação das terras.
Temos necessidade de acelerar o passo no sector agrícola, pois, além da vantagem de acompanharmos os nossos vizinhos, precisamos de reestruturar a nossa agricultura de forma a conseguir uma maior produção.
Se tivermos oportunidade de, sem prejudicar o esforço de guerra que nos é exigido, conseguir acelerar o ritmo das nossas realizações nos campos económico e social, de forma a apoiar na retaguarda a acção decisiva que as forças armadas mantêm em todas as frentes de combatia, então poderemos ter a certeza de que o dia da vitória não tardará e mais uma vez mostraremos ao Mundo que a nossa política é verdadeira e que a união que liga todos os Portugueses é fraterna e indestrutível.
Tenho dito

Vozes: -Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado

O Sr. Dias das Neves: - Sr Presidente, Srs. Deputados: Mais um ano esta Câmara se está a debruçar sobre as Contas Públicas, que o Governo apresenta para discussão e aprovação com uma regularidade, uma inceridade e uma verdade que hão-de impressionar todos, que não aqueles que pertencem à minha geração, que têm vivido num ambiente de austeridade e disciplina financeira impecáveis e que o consideram um acto normal por força de repetidamente cumprido.
Porém, mais do que pela periodicidade anual constante, mantida mais do que pela sinceridade e verdade destas Contas, dignas do maior realce, e aqui caberá tecer à acção de S. Exa. o Ministro das Finanças, meu ilustre professor, a quem quero testemunhar a minha maior admiração e respeito, e a toda a equipa do seu Ministério, os maiores elogios e expressar-lhes as nossas homenagens, já que corajosamente, persistentemente, sem alardes de propaganda barata, vem realizando trabalho consciente, brilhante e dedicado, no sentido de dotar o País com os mecanismos financeiros necessários para considerar e reger a acção política e económica do Governo, mais do que pelas apresentadas, dizia, impressiona a serenidade com que o Governo submete à discussão e aprovação da Assembleia as suas Contas, num alarde de consciência tranquila de certeza do rumo certo.
Serenidade que é tanto mais de apreciar quanto é torto que o País atravessa um dos momentos mais graves da sua história, ao ter de resistir a uma guerra subversiva, que lhe foi criminosamente imposta e, ao mesmo tempo, a satisfazer a necessidade vital de promover o desenvolvimento económico do País, ao ter de cumprir o II Plano de [Fomento em plena execução, e que não fora a sua potente e sólida estrutura económica e financeira, a par da coragem indómita das suas forças armadas, e a Nação teria soçobrado perante a onda avassaladora de um terrorismo assassino, comandado por cobardes que na retaguarda, por detrás do esconderijo da sua comodidade e na sua ânsia de lucros para satisfazer os seus apetites animais, assassinam milhares de seres inocentes.
Pelo extraordinário e bem elaborado relatório com o qual S. Exa. o Ministro das Finanças faz a apresentação da Conta Geral do Estado de 1963 fica o país completamente esclarecido de quanto se fez, porque se fez e como se fez.
E quando assim acontece, a apresentação das Contas constitui um verdadeiro termómetro pelo qual podemos aferir do valor de uma política. Porquanto, para além dos princípios que a informam, o valor de uma política pode medir-se pelas suas realizações a favor do bem comum e da elevação do nível das populações.
Mais uma vez também o ilustre Deputado Eng.º Araújo Correia produziu sobre as mesmas Contas um relatório contendo notável parecer, só possível mercê das suas altas qualidades de inteligência, de espírito de organização e de economista distinto, a quem quero desta tubuna prestar as minhas homenagens.
Do estudo destes dois valiosos documentos, integrado na conjuntura que o nosso país atravessa, do exame das Contas apresentadas, não resta a nenhum de nós outra alternativa na escolha do caminho que não seja o da sua aprovação unânime e incondicional Este ó o meu voto.
Todavia, sinto sei meu dever fazei ainda algumas considerações de ordem política sobre estes documentos, que constituem marcos luminosos a assinalar a acção de um Governo que, sob a égide de Salazar, vem, há quase 40 anos, conduzindo o País ao respeito e consideração a que tem direito no conceito das nações e o povo português ao nível dos mais elevados do mundo civilizado.
As Contas de 1963, apresentadas, têm como coordenadas principais do seu desenvolvimento a defesa intransigente do ultramar português, como condição básica de sobrevivência nacional, e a execução do II Plano de Fomento, e neste contexto têm de ser enquadradas.

O Sr. Sousa Meneses: -Muito bem'

O Orador: - Em relação ao ultramar português, tem o Governo da Nação seguido uma política de defesa intransigente da unidade nacional e não alienação, seja a que título for, da mínima parcela do território pátrio, ainda que o preço seja o da própria vida

O Sr Marques Fernandes: -Muito bem!

O Orador: - A essa política sinto, neste momento, a obrigação que o imperativo de consciência a todos os portugueses dignos desse nome impõe de declinar o meu «sim» honesto, sentido e convicto
Uma política que é muito nossa, mas que bem podia ser seguida pelos outros, já que serve a todos na medida em que contribui para alicerçar neste mundo em que vivemos as bases de uma convivência multirracial, que há-de ser fatalmente fonte principal de paz mundial.

O Sr. Serras Pereira: - Muito bem!

O Orador: -Política que assenta na dignidade humana e na sua elevação e respeito, a fonte de todo o progresso no Mundo e de todas as relações entre os seus habitantes, a única política que terá razão de existir e que os outros povos têm obrigação de permitir que se processe e desenvolva, para bem da humanidade.
Política que tem permitido que os Portugueses continuem ligando, num abraço único e grandioso, todos os continentes do Mundo, num prolongamento desse abraço que Cristo abre no alto do Monte do Calvário a todos os homens de boa vontade, convidando-os a unirem-se e a comungarem dos seus ideais Abraço que Portugal continua, vinte séculos depois, teimosamente, heroicamente, a manter, sofrendo embora, no seu corpo e no

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seu sangue, a flagelação dos inimigos para continuação da única e verdadeira viragem da história
Uma viagem da história não está, não pode estar nunca, ao alcance de um materialismo ateu, com o seu hálito viscoso e peçonhento, salpicado pela lama de um comunismo internacional, vermelho pelo sangue inocente de tantos irmãos nossos ou da gula obscena dos capitais de grupos económicos e sindicais financeiros que tudo sacrificam à sua sede de obtenção de lucros e à sua febre de megalómanos.
Fala-se hoje muito dos ventos da história, ventos sinistros esses que nos últimos anos têm espalhado pelo Mundo o tenor, a desgraça e a miséria Criação demoníaca que tem avassalado o Mundo com o seu abraço Sinistro e que à claridade de uma fé cristã, que Portugal espalhou pelos quatro cantos da terra, pretende sobrepor o crepúsculo sombrio da noite vermelha de um materialismo ateu.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Ao olhar-se, porém, para a história do Mundo, verificamos que no caminho sinuoso já percorrido terão soprado ventos, tempestuosos uns e bonançosos, suaves e límpidos outros Todos límpidos foram os que constituem os princípios e altos ideais que o homem criou e alimentou no seu coração e influenciou a história do seu tempo no sentido da elevação da dignidade humana.
Sopros límpidos aqueles que infunaram as velas das naus de Portugal e o coração de todos os portugueses que fizeram de tantos quantos tomaram parte nessa cruzada heróica dos Descobrimentos, e na sua continuação ,actual verdadeiros apóstolos da fé cristã, da civilização portuguesa e ocidental.
Por tudo isto, por esta política, porque temos um património material, um património espiritual, uma civilização portuguesa a defender, e com ela a civilização ocidental, cremos ninguém ter o direito de regatear qualquer sacrifício para o fazer.
A defesa da unidade nacional e da integridade territorial da Pátria impõe a todos nós o dever de lutar, de sofrer e de morrer Assim o compreendeu o povo, que não regateia o sacrifício do que tem de mais sagrado e mais querido- o sangue dos seus filhos, assim o compreendemos todos que havemos de aceitar todos os sacrifícios que nos são impostos nesta emergência.
Assim o compreendemos todos, ao darmos o nosso incondicional apoio à política ultramarina do Governo e à obtenção dos meios para a realizar.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - Sr Presidente A segunda conclusão do relatório do parecer sobre as Contas Públicas suscitou-me também algumas considerações que me parecem justas neste momento, e que farei não com sentido derrotista, que seria inadmissível, mas como confirmação das preocupações da ilustre Comissão das Contas Públicas.
O progresso do País só é possível com um desenvolvimento harmonioso dos sectores público e privado. Porém, está a verificar-se uma anomalia que, a persistir, terá consequências graves.
Enquanto o desenvolvimento do sector privado se processa em termos de produtividade de trabalho, de capital e de produção, através de uma organização empresarial racionai e científica que um plano de desenvolvimento económico impõe, e na qual o próprio Estado colabora através do impulso eficaz do Instituto de Investigação Industrial, de cujos relevantes serviços prestados
ao País este ainda se não deu verdadeiramente conta, mas a quem quero daqui prestar as minhas homenagens, o sector público continua a mover-se em termos de uma rotina que se lhe entranhou no corpo burocrático e que, se não forem tomadas medidas sérias e eficazes, chegai á a um ponto em que, por insuficiência e incapacidade, obstará ao próprio desenvolvimento do sector privado
Efectivamente, a movimentação no campo privado, mercê da simplicidade de processos e racionalização de métodos, começa a fazer-se a uma velocidade tal que não poderá nunca engrenar na pesada roda de rotina da máquina pública
A posição desfavorável dos serviços públicos é característica orgânica de uma ampliação existente, que há que ter em conta se não quisermos estar sujeitos a todos os prejuízos daí resultantes.
A deterioração dos serviços públicos está patente e é notória, e para ela contribuem vários factores, entre eles a inflação apontada. Inflação que, aparente ou importada, como, lhe queiram chamar, existe e é uma realidade.
Inflação que significa estar neste momento a exercer-se pressão sobre as disponibilidades de trabalho, que provoca uma subida crescente de salários e outros rendimentos de mão-de-obra no sector privado, num afastamento cada vez maior ao sector público, com o consequente aparecimento de oportunidades favoráveis para as pessoas trocarem os empregos públicos pelos empregos privados
Os funcionários públicos zelosos, dedicados e cumpridores, e nos nossos serviços públicos há muitos destes, continuam e hão-de continuar a servir o Estado, mas os audaciosos e empreendedores vão-no abandonando a pouco e pouco, enquanto a renovação dos quadros, por falta de estímulo, só receberá os menos aptos e os menos habilitados, numa cultura de desastrosa mediocridade, com sérias repercussões no futuro dos serviços.
Assim se está criando uma situação em que sentimentos de frustração levam a uma apatia que gera uma lentidão e imperfeição de serviços, por falta de funcionários, que, sem estímulo, perdem o sentido da sua própria função, e a um descontentamento geral, que são normalmente fonte de desequilíbrio social.

Vozes: -Muito bem, muito bem!

O Orador: - Desequilíbrio que acabará por se traduzir na incapacidade de fazer cumprir as próprias leis, mesmo aquelas que visam proteger ou fazer progredir a justiça social.
Há quem encare a situação como passageira ou aparente, mas a verdade é que os funcionários públicos já se não lembram de quando foi o último ajustamento dos seus vencimentos, há tanto tempo foi já, o que é lamentável, quando é certo que no sector privado o estabelecimento justo de novos contratos colectivos de trabalho e a actualização dos antigos têm vindo a promover a elevação contínua dos rendimentos de mão-de-obra nos sectores industrial e comercial, enquanto no agrícola, como diz S. Exa. o Ministro das Finanças no seu relatório, os salários aumentaram, em regra, 5,6 por cento neste ano de 1963, e que no ano de 1962 o aumento foi de 18 por cento para os homens e 14 por cento para as mulheres.
Assim, se é certo que a um aumento de salário corresponde um aumento do poder de compra, que equivalerá à elevação da procura e consequente aumento de preços e do custo de vida, que importa evitar, a verdade é que a elevação do nível de vida do povo português, con-

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sequência do desenvolvimento económico do nosso país, só é possível aumentando as possibilidades do consumo interno dos bens produzidos, demais que, havendo necessidade de equilibrar a nossa balança comercial, negativo se vem agravando de ano para ano, por um incremento de exportações, este incremento só baseado na organização sólida do mercado e ternos.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Além disso, se para manter o nível de preços, é necessário que no mecanismo dos salários se mantenha o nível destes, tendo em atenção que estamos em plena economia de guerra, a verdade é que esse sacrifício não pode exigir-se apenas aos funcionários públicos. Se há que fazer sacrifícios, e todos estamos conscientes dessa necessidade, estes deverão ser equitativamente distribuídos.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Urge, portanto, fazer uma revisão das condições em que funcionam os serviços e dos proventos dos seus funcionários, para lhes criar um estimulo e gosto pela sua posição, já que o único que existia até à data - a segurança, garantia de reforma- já hoje não oferece qualquer interesse em comparação com as garantias dadas pelo sector privado.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Aprofundando um pouco este te relação aos prejuízos que pode causar, eu queria à atenção para o que está sucedendo no sector da educação.
As despesas do Ministério da Educação Nacional relativas ao ano de 1963 são as mais elevadas de sempre.
1 077 910 000$ só de despesas ordinárias, que representam 12 por cento do total de despesas ordinal Estado. Todavia, a verba é nitidamente insuficiente para as necessidades do ensino e o rendimento deste é muitíssimo fraco, por falta de professores com a formação pedagógica e científica necessária para o pleno exercício das suas funções.
A profissão de professor não tem hoje qualquer estímulo, e as deficientes remunerações de todos, especialmente o pessoal do quadro, relativamente às habilitações que lhes são exigidas e às provas que têm de prestar justificam, só por si, o número baixíssimo de pessoas interessadas nela e que se candidatam aos estágios, principalmente no ensino secundário.
Foram já promulgadas algumas medidas especiais intenção de desenvolver a frequência dos estágios. Que não tiveram nem poderão ter eficiência se não forem acompanhadas de medidas de melhorias consideráveis das condições materiais e outras oferecidas aos professores.
Porque em intervenções anteriores os ilustres liados Olívio de Carvalho e José Alberto da Costa se ocuparam já com raro brilho do problema em professores do ensino liceal e primário, respectivamente, eportar-me-ei só aos professores do ensino técnico profissional, sem considerar o problema dos mestres, que já desenvolvidamente tratei nesta Câmara, em minha intervenção anterior, e cuja situação continua, infelizmente por resolver, mestres que vão escasseando cada vez mais nos quadros.
Vejamos, através de um quadro, a evolução das vagas e professores do quadro, efectivos e adjuntos, referentes aos anos de 1962 a 1065, reportados aos concursos realizados no mês de Fevereiro de cada ano:

[ver tabela na imagem]

Para esclarecimento deste mapa podemos acrescentar

1) Vagas de professores efectivos em 1961, 109,
2) Vagas de professores adjuntos em 1961, 306,
3) Durante o ano de 1962 houve uma movimentação de 24 vagas de professores efectivos e 44 de professores adjuntos, como resultado da transferência de professores para escolas situadas em meios onde têm mais possibilidades de subsistência,
4) Durante o ano de 1964 foram movimentadas 21 vagas de professores efectivos, das quais só S representam entrada de novos professores, porque as restantes 18 foram transferências Das 263 vagas de professores adjuntos foram movimentadas apenas 15.

Podemos então tirar conclusões:

I) Uma permanência de vagas, a indicar que muitas escolas têm os seus quadros incompletos há, pelo menos, cinco anos e a atestar, com o seu não preenchimento, as dificuldades de recrutamento de professores, com excepção do 8 º grupo de adjuntos (professores de Língua e História Pátria) e 11 º grupo (professores de Ciências Geográfico-Naturais e Matemáticas), a que estão concorrendo professores primários que ascendem a um ramo superior e outros com exigências de habilitação inferior a licenciatura.
Os grupos de professores efectivos onde a permanência das vagas é mais acentuada é precisamente o grupo dos engenheiros, professores de Desenho e de Ciências Económicas, os técnicos, portanto, que poderão iniciar nas técnicas respectivas os seus alunos e prepará-los para tomarem parte consciente no plano de desenvolvimento do nosso país e desenvolverem os esforços que lhes serão exigidos.

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II) Esta permanência de vagas atesta ainda o pouco ou nenhum interesse dos licenciados pela profissão de professor do quadro, o que podemos ver melhor através do mapa seguinte, contendo os candidatos aprovados no exame de admissão ao estágio:

[ver tabela na imagem]

Para esclarecimento deste quadro podemos acrescentar:

1 º Total de aprovados em conjunto

1950..................... 56
1956..................... 7
1959..................... 65
1961..................... 97
1963..................... 66
1964..................... 56

Este quadro impõe um comentário a subida de candidatos de 1956 a 1959 é consequência da melhoria dos vencimentos dos professores pelo Decreto-Lei n º 42 046, de 23 de Dezembro de 1958.
2.º Do número de candidatos a professor efectivo do 9.º grupo em 1964 - treze - fazem parte onze femininos, cujo estágio já não abria há mais de dez anos. O número de concorrentes do 8.º e 11.º grupos de adjuntos é resultante da elevação dos professores primários e de redução de habilitações para esta categoria de professores Deste número, no 8.º grupo, dos dezassete só seis são licenciados, no 11.º grupo só três são licenciados.
3.º Este desinteresse apresenta um perigo que tem de ser encarado de frente, se não quisermos prejudicar o regular desenvolvimento e execução dos planos de fomento, dado que estes têm de ir buscar o seu potencial humano ao ensino técnico, que não pode, com 67,6 por cento do seu pessoal docente, eventual, sem preparação pedagógica apropriada e exactamente a maior falta nos professores das técnicas industrias e comerciais, fornecei elementos inteiramente úteis ao País.

O Sr. Serras Pereira: - Muito bem!

O Orador: - III) Só as escolas técnicas de Lisboa, Porto e Coimbra estão apetrechadas com todo o seu pessoal do quadro, que, na maioria dos casos, não vai além de 20 por cento do pessoal em exercício.
Não há possibilidade de fazer ensino técnico sem técnicos, e estes não existem.
Tal como se está a processar o ensino, feito nas matérias teóricas por pessoal feminino e a parte técnica sem técnicos com capacidade científica e técnica e pedagógica adequada ao magistério, bem podemos compreender os frutos deste ensino.
O desenvolvimento económico requer, por toda a parte, a formação de quadros de pessoal científico e técnico mais vastos e mais adestrados. E o desenvolvimento do nosso país tem o direito de exigir do ensino técnico o rendimento, em valores humanos, dos avultados capitais investidos no apetrechamento e construção de escolas, mas não creio que o possa fazer se não conseguir dotá-lo dos professores eficientes para a execução dos suas funções, e estes só se conseguem melhorando as suas condições materiais.
Começamos a aceitar as despesas de instrução e educação, não como despesas de consumo, em que há que fazer economias, mas como investimento, de que se consegue tu ar bons rendimentos.
Ora, se o sector privado é o principal beneficiário dói frutos deste ensino, e que se queixa, a todo o momento, da insuficiência quantitativa e qualitativa de pessoal habilitado e apto para preenchimento dos seus quadros, creio que será esse sector privado que deverá investir, a longo prazo embora, contribuindo para a melhoria do ensino técnico. Que às suas contribuições se acrescente uma pequena parcela especificamente destinada ao desenvolvimento do ensino.
Assim, o Ministério da Educação deixa de ser encarado como Ministério de consumo que sobrecarrega o orçamento do Estado, mas antes máquina motora de um programa de desenvolvimento geral do País, que importa alimentar para poder render. Assim o está a considerar neste momento, S. Exa. o Ministro da Educação Nacional num bem ordenado e contínuo planeamento quantitativo e qualitativo do ensino em Portugal, com glandes realizações já no seu activo, como a extensão da escolaridade obrigatória e a criação de órgãos de controle, coordenação e investigação junto do seu Ministério, que lhe há-de permitir levar a bom termo a grande cruzada do ensino que se impõe.
Confiamos na sua acção e na compreensão e acção conjunta de S. Exa. o Ministro das Finanças para que este problema, base de toda a evolução social e económica de um povo, tenha a solução que a sua magnitude impõe e que todos desejamos
O esforço e a abnegação de S. Exa. o Presidente do Conselho exigem mais este esforço, não lho regateamos
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado

O Sr. José Manuel Pires: - Quando se estuda o Parecer sobre as Contas Gerais do Estado para 1963 - a cujos ilustres relatores quero prestar já de entrada a minha sincera homenagem, pelo esforço e saber que esse tra-

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balho modelar documenta -, quando tomamos sobretudo nas mãos o volume referente ao ultramar e o consideramos tanto em particular como no conjunto de toda a economia nacional, na perspectiva do passado e do futuro (de um passado em que às vezes as crises perduram como praga endémica, que vem de muito longe, e de um futuro em que a urgência de andar depressa tem de aliar-se com o mais prudente realismo dos factos e possibilidades que estejam ao alcance da nossa no mão), fica-nos a imagem de uma bravia batalha que todos precisamos de travar, nos campos do investimento e da produtividade, se queremos salvar a Nação, além-mar como aqui, nesta empresa em que a vitória das armas, que já se entremostra próxima e definitiva aos olhos do Mundo, é um estímulo e um modelo.
Nas modestíssimas considerações que vou tecer deter-me-ei apenas sobre o panorama financeiro de (Moçambique, salientando os problemas que pessoalmente considero mais prementes e de maior relevância para o progresso desta bela província ultramarina. Por muito confuso e escuro que ele se apresente, tenho uma grande fé nos homens e na protecção divina, e é com a antecipada certeza de que havemos de superar lá a dura crise que nos angustia presentemente que levanto sobre ela a minha desautorizada voz.

O Sr. Brilhante de Paiva:- Muito bem!

O Orador: - Quem diria, há dois ou três anos, que Angola, a mártir, gozaria, em tão breve lapso de tempo, a euforia económica do ano passado, após a guerra atroz que tão duros sacrifícios lhe exigiu e ainda continua a pedir-lhe? Com todos os nossos evidentes defeitos, somos um povo com uma capacidade de recuperação e realização muito rara e, precisamente nas situações mais desesperadas, temos sabido sempre encontrar-nos, com grandeza e heroísmo, em todos os níveis da vida nacional.
Se a economia constitui uma das estruturas fundamentais da vida nacional, não esgota e muito menos exprime a alma de um povo. Quantos da sua pobreza souberam fazer a mais alta riqueza e de um chão estéril, de um subsolo pobre, de regiões sobrepovoadas, ao cabo de um cataclismo que os devastou, partiram para o seu engrandecimento, a ponto de se tornarem, em breves anos, dos países mais ricos do Mundo? Todos estão a pensar no Japão destes últimos vinte anos? Qual a riqueza que dele fez uma das nações mais prósperas de hoje? Uma só fundamentalmente o homem, que nenhuma opulência material substitui e é capaz, desde que tenha fé, de transformar em pão as próprias pedras.

O Sr. Brilhante de Paiva: - Muito bem!

O Orador: - Muitas palavras tenho lido e ouvido de franco pessimismo, vertidas sobre a situação finai eira de Moçambique, agravada ainda o ano passado. Merecem-me elas todo o respeito, que mais não fosse pela paixão entranhada a essa magnífica terra que sempre envolvem. Mas creio que entre apontar um mal e desesperar de solução para ele medeia um abismo.
Nessa terra da esperança e da promessa vou ei forçar-me por caminhar nos próprios fracassos, vendo antes uma razão mais para crer. Se, apesar deles, rompermos para além dos mais graves contratempos, quando a prosperidade dos outros nada lhes valeu para guardarem a África, que tiveram de abandonar, enquanto nós permanecemos, porque não acreditaremos que a nossa caminhada surgirá mais expedita.

O Sr. Brilhante de Paiva: - Muito bem!

O Orador: - agora que a dura objectividade das realidades não permitirá mais que se insista em erros que travaram o nosso surto.

O Sr. Brilhante de Paiva:- Muito bem!

O Orador: - As circunstâncias também moldam a mentalidade. E não há dúvida de que um espírito novo fermenta o ultramar, principalmente Angola e Moçambique, e dele sairá mais rico, mais nosso, mais português.
Um primeiro relance logo nos permite descobrir que o mal-estar da província ultramarina que nesta Câmara represento nasce do vultoso desequilíbrio da sua balança comercial enquanto as importações trepam em carreira solta, as exportações avançam pelo passo da tartaruga. Mas o mais escandaloso é que recebemos de fora aquilo que lá temos e ainda não valorizámos ou o que primeiro vendemos em bruto, por uma pauta muito baixa, para depois o comprarmos aos outros, a preços elevadíssimos, elaborado já pela mão-de-obra ou pela indústria estrangeiras.
Veja-se o que vem acontecendo com as frutas, naturais ou em conserva, que nos manda a África do Sul, do outro lado da fronteira. Cultivamo-las nós tão boas e melhores, em regiões ubérrimas, como a da Zambézia. Mas, enquanto aqui as laranjas deliciosas, das melhores do Mundo, o ananás e a banana se vendem ao preço da chuva ou estrumam os campos, à falta de procura e mercados compensadores, os produtos sul-africanos atulham, em Lourenço Marques, as montras das mercearias finas, procurados, preferidos, pagos com lucros altamente compensadores. Zonas extensíssimas jazem ao abandono, porque as dificuldades de transporte e colocação (mesmo sem referir a falta de apetrechamento adequado que permitisse a sua elaboração industrial em escala perfeitamente rentável) desanimam as vontades mais robustas. Só este primitivismo técnico e o individualismo em que tem de manter-se a nossa agricultura explicam o paradoxo de que produtos da terra, trazidos, por exemplo, de Quelimane (uma das portas por que essa vastíssima região, das mais férteis do Mundo, se abre para o mar), fiquem tanta vez mais caros e apareçam menos atraentes, pelos maus tratos do caminho, do que aqueles que nos mandam, requintadamente embalados, os nossos vizinhos.
Remédio? Isoladas iniciativas privadas não bastam, demasiado extenso como é o campo, diante do esforço perdido de um só homem. Onde quase tudo se encontra por fazer, só organismos poderosos conseguirão levar os obstáculos de vencida.
Mas precisamos de precaver-nos contra um risco fácil, ressuscitando fantasmas que deviam estar sepultados para sempre. Os monopólios das grandes companhias exploraram e esgotaram larguíssimos prazos, procedendo quase sempre como rendeiros sem escrúpulos, que só pensam em tirar rendimento à terra, sem curarem de a melhorar, largando-a como baldio de maldição depois que lhe chuparam todas as possibilidades. Temos de estruturar para os séculos uma colonização de raiz europeia em que o continental não corra à aventura dos empréstimos que nunca mais é capaz de saldar, porque não encontra uma indústria que lhe transforme os produtos nem uma poderosa organização cooperativa que lhos leve aos grandes mercados, onde os ganhos se apuram de forma altamente compensadora.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O Estado não pode nem deve fazer tudo Proíbem-lho as leis mais sãs da sociologia, estimulador e

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garantia de riqueza privada como tem sempre de ser, pela protecção a iniciativa individual e familiar. Mas incumbe-lhe o dever de propiciar o clima em que os grandes e pequenos capitais (sempre mais estes do que aqueles) se sentem atraídos e compensados. Que importa criar uma pesada burocracia de economistas e técnicos, se ela, em vez de possibilitar riqueza, leva consigo em vencimentos a frágil economia que importava defender?

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A técnica há-de servir o espírito, nunca afogá-lo. Dirige e incita a livre expansão de forças, em caso nenhum as pode ignorar nem substituir.
Estudem-se, com pleno rigor científico, as condições do solo, do duna, das sementes, das plantas, dos gados, analise-se a terra, as propriedades químicas da leiva que pensamos lavrar, apure-se metodicamente a carta moçambicana das riquezas do subsolo, organize-se rapidamente um quadro geral das aptidões de cada zona da província e proceda-se à execução por fases, começando, naturalmente, com as mais vantajosas, pela riqueza, pelas facilidades de acesso, pela abundância da mão-de-obra nativa. Criemos condições, e os colonos hão-de acudir livremente para, na santa paz de Deus, repetirem o milagre da abundância O convívio multirracial, a fraternidade entre o branco e o preto, a miscegenação biológica e espiritual entre o continental e o ultramarino, surgirão por si, com a solidez indestrutível que a natureza imprime sempre nas suas obras.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - Também não compreendo os entraves que se têm levantado à criação de certas indústrias em Moçambique, pelo receio de que venham a competir com outras similares da metrópole. Que mal virá daí? Não é Portugal, com todas as parcelas dispersas pelo Mundo, uma velha e gloriosa nação una e indivisível? Não vemos todos a vantagem de atrair ao ultramar os excedentes da metrópole, não apenas em população, mas em tudo que represente valores positivos de progresso e fortalecimento da economia nacional?

Vozes: - Muito bem!

O Orador: -Este equilíbrio de forças, em que o pulmão económico de cada província respire livremente o ar que Deus lhe traz, laborando até ao fim os seus produtos, em vez de viver do oxigénio que de fora apressadamente lhe tragam, sempre a levantar-se e a cair, não provocará necessariamente o robustecimento da unidade nacional, porque todas as partes se sentem solidárias com o todo e nenhuma supeditada a outra, igualmente responsáveis e interdependentes? Não será muito mais rentável a transformação local das matérias-primas?
Já nesta Câmara tive a honra de chamar a atenção para o escândalo da cultura do açúcar em Moçambique. Temos lá os terrenos mais indicados para ele. Porque importamos, então, milhares de contos, até de países inimigos, como Cuba? O esforço que um grupo de abnegados pioneiros, com sede na cidade da Beira, anda a empreender, numa empresa admirável, sem precedentes entre nós, que bem pode constituir o caminho de redenção para o colono metropolitano, espero continue a merecer a mais desvelada compreensão dos Poderes Públicos, de molde a produzir todos os magníficos frutos que dela esperamos com toda a legitimidade.
Mas em relação ao tabaco o panorama apresenta-se idêntico. Quando devíamos exportar cigarros dos mais finos (e a indústria moçambicana já deu sobejas provas de poder ombrear ao menos com a mais exigente do continente), ainda oferecemos aos estrangeiros avultadas divisas para que nos traga o que nós somos perfeitamente capazes de produzir e vender.
O que se passa com a copra e a castanha de caju (e a lista poderia ampliar-se bastante ainda) é também expressivo da nossa depressão financeira. A primeira não se aproveita convenientemente, pois uma parte do fruto é rejeitada por falta de apetrechamento industrial. Quanto a esta, como se compreende que tradicionalmente oferecêssemos à índia quantias apreciáveis por carência de mão-de-obra para o descasque? Esperemos que o recurso a processos mecânicos, que se julgavam impossíveis, mas que, afinal, se encontram em vias de normalização, venha travar esta sangueira.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - As reservas mineiras de Moçambique são imensas e incalculáveis. Mal prospectadas ainda, não restam dúvidas acerca da sua opulência e variedade Se Angola, que fica mais distante dos mercados japoneses, encontra já nas suas minas uma contribuição poderosa para a normalização da balança comercial, onde poderá ir Moçambique no dia em que se olhar este sector em profundidade? A própria vizinhança com os países do interior africano, que ali têm a única possibilidade de acesso ao mar, através dos nossos portos e caminhos de ferro, constitui outro elemento de valia no enquadramento futuro da economia provincial
Para não me alongar em excesso, passo de lado sobre outros tópicos aliciantes, como a pecuária, a pesca e seus derivados, os recursos hídricos e florestais, o turismo, a que, aliás, já o ano passado me referi.
Não quero, porém, deixar sem uma alusão mais detida à primeira de todas as reservas de Moçambique - a sua juventude.
Através dela se esboça já o futuro, garantindo a sobrevivência e o engrandecimento ininterrupto da Pátria. Perdê-la é comprometer a própria independência nacional.

O Sr Brilhante de Paiva: - Muito bem!

O Orador: - Se a salvamos, todas as grandes esperanças que depositamos se hão-de encarnar, um dia, nela, além de nós.

O Sr. Brilhante de Paiva:- Muito bem!

O Orador: - Mas, absorvidos pelas nossas crises económicas, nem sempre lhe temos consagrado o desvelo que requer e merece Ora, a sua formação integral constitui o primeiro de todos os problemas políticos de qualquer povo - mais ainda que a finança, que o exército, que a cultura, que a ciência abstracta.
Os países comunistas mostram-se, neste ponto, bem lúcidos. Multiplicam as escolas elementares, médias e superiores, dotam-nas com os laboratórios, bibliotecas e instrumentos de trabalho mais modernos e caros, promovem a instrução em todas as camadas da população, embora viciando-a na sua pureza de realização completa da pessoa humana A educação da juventude absorve elevadas percentagens dos seus orçamentos, a ponto de poucos países ocidentais poderem competir com a Rússia no número de escolas superiores e de estudantes
Reportando-nos à África, as nossas províncias ocupam uma posição do maior relevo no campo da educação,

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não só pela quantidade de escolas, como pelo número de alunos e qualidade dos estabelecimentos de ensino. Aqui está um dos argumentos mais válidos para opor vitoriosamente aos que nos atacam. Uma glória e uma força para nós.
Num mundo ainda em formação, como é a África negra, os técnicos desempenham papel preponderante na sua estruturação. E mais os técnicos médios que os superiores, visto que estão mais perto da terra, desempenhar missões de trabalho manual ou b o engenheiro não quer ou não sabe cumprir.
A multiplicação de escolas, principalmente secundárias, em Moçambique impressiona logo o observador mais prevenido. Nos últimos anos a maior parte das certa importância recebeu alguma escola secundária, liceu, escola técnica ou colégio. A frequência tem crescido também a olhos vistos. Só no ensino técnico anual está a engrossar, desde 1958-1959, com oscilam entre os 800 e os 1200. E o mais animador em nenhuma parte o convívio racial se mostra expontâneo e profundo. Nos recreios, nos gabinetes, nas aulas, jogam ou sentam-se lado a lado, ìntimamente irmanados pelo seu estrutural portuguesismo.
Operam verdadeiros prodígios os mestres que se consagram inteiramente à formação desta juventude promissora. No ensino secundário, principalmente no técnico, apesar das privações de toda a ordem, ministra-se formação intensa e esmerada, de raiz bem lusíada pelas condições em que tem de se dar, se verdadeiro sacerdócio.
É tempo de sermos realistas também aqui. Não se compreende que se tenham gasto quantias fabulosas em experiências aventurosas e se deixe a juventude a receber aulas em estabelecimentos primitivos e com capacidade para umas centenas de alunos e a terem de acolher cerca de dois milhares. Tão escassas vêm as verbas orçamentais que nos concedem, que mal chegam para tinta e papel! Não falo de cor. Ando envolvido nesta gloriosa batalha há cerca de vinte anos, com alguma responsabilidade num sector do ensino técnico. Continuarei a pedir até que me ouçam. Não busco o meu interesse pessoal, preocupa-me só o serviço dessa juventude admirável, que há-de erguer, além nós, um Moçambique mais rico e forte, mais indescrutìvelmente unido à metrópole.
Olhem para nós, concedam-nos a ajuda larga de que temos a mais viva necessidade, que ela tudo merece. Sem edifícios que reunam um mínimo de conforto sem material escolar suficiente e eficiente, sem um quadro de professores competentes e bem recompensados, magros serão os resultados das nossas lides escolares.
É o secundário o ensino influente, mais que nenhum outro, uma vez que ele nos oferece técnicos médios, de que a nossa África tanto carece. Não se compreende pois, que se subsidie principescamente (quase diria prodigamente!) outro, superior e bem mais recente, com vencimentos que são dos mais tentadores do País, deixando o ensino técnico a arrastar-se penosamente, às vezes sem orçamento para reparar sequer o material que inevitavelmente se deteriora.
Aí está a que me parece a primeira de todas as necessidades orçamentáveis de Moçambique.
Da última vez que falou ao País, Salazar, em que ficaram como lição mais de admirável filosofia política, afirmou que se ganhou «alguma coisa com o dinheiro do povo, o sangue dos soldados, as lágrimas das mães», nestes quatros anos que levamos de guerra no ultramar Salvou-se a nossa África, na paz que recupera dentro das fronteiras e no prestígio restaurado, fora entre os povos estrangeiros. Mas outra batalha temos agora de travar - o resgate da economia de Moçambique e, mais ainda, a preparação da sua juventude para as missões que a esperam.
Disse.

Vozes:- Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado

O Sr. Presidente: -Vou encerrar a sessão.
O debate continuará amanhã, à hora regimental, sobre a mesma ordem do dia.
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Ribeiro da Costa Guimarães.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António Burity da Silva.
António Calheiros Lopes.
António de Castro e Brito Meneses Soares.
Armando José Perdigão.
Belchior Cardoso da Costa.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Francisco Lopes Vasques.
Henrique dos Santos Tenreiro.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
João Bocha Cardoso.
Joaquim de Sousa Birne.
Jorge Manuel Vítor Moita.
José Dias de Araújo Correia.
José Luís Vaz Nunes.
José de Mira Nunes Mexia.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Manuel Seabra Carqueijeiro.
D. Maria Irene Leite da Costa.
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães.
Tito Castelo Branco Arantes.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
António Augusto Gonçalves Rodrigues.
António Maria Santos da Cunha.
António Tomás Prisónio Furtado.
Armando Francisco Coelho Sampaio.
Augusto César Cerqueira Gomes.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Soares da Fonseca.
Manuel Lopes de Almeida.
Purxotoma Ramanata Quenin.
Rogério Vargas Moniz.
Urgel Abílio Horta
Virgílio David Pereira e Cruz.
Vítor Manuel Dias Barros.
Voicunta Srinivassa Sinai Dempó.

O REDACTOR - António Manuel Pereira

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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