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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 195

ANO DE 1965 27 DE MARÇO

VIII LEGISLATURA

SESSÃO N.º 195 DA ASSEMBLEIA NACIONAL

EM 26 DE MARÇO

Presidente: Exmo. Sr. Mário de Figueiredo

Secretários: Exmos. Srs. Fernando Cid Oliveira Proença
Luís Folhadela de Oliveira

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 25 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente.

Foi autorizado o Sr. Deputado Francisco António da Silva a depor, como testemunha, no tribunal da comarca de Cuba.

O Sr. Deputado Lopes Roseira expôs & comentou, o que se passa com um concurso para professor do Instituto de Medicina Tropical.

Ordem do dia. - Terminou o debate nobre as contas públicas de 1963 com uma intervenção do Sr. Deputado Alberto de Araújo.

Por meio de propostas de resolução apresentadas pelos Srs. Deputados Sousa Meneses e Jesus Santos, a Assembleia aprovou as Contas Gerais do Estado (metrópole e ultramar) e da Junta do Crédito Público respeitantes ao ano de 1963.

O Sr. Presidente prorrogou por trinta dias o funcionamento efectivo da Assembleia.

O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas.

O Sr. Presidente: - Vai fazer-se a chamada.

Eram 16 horas e 15 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Angelo Ornelas do Rego.
Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Agostinho Gonçalves Gomes.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Alberto Pacheco Jorge.
Alberto dos Reis Faria.
Alexandre Marques Lobato.
André Francisco Navarro.
Aníbal Rodrigues Dias Correia.
Antão Santos da Cunha.
António Augusto Gonçalves Rodrigues.
António Burity da Silva.
António de Castro e Brito Meneses Soares.
António Júlio de Carvalho Antunes de Lemos.
António Magro Borges de Araújo.
António Manuel Gonçalves Rapazote.
António Moreira Longo.
António da Purificação Vasconcelos Baptista Felgueiras.
Armando Cândido de Medeiros.
Armando José Perdigão.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Alves Moreira.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Artur Proença Duarte.
Bento Benoliel Levy.
Carlos Alves.
Carlos Emílio Tenreiro Teles Grilo.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
D. Custódia Lopes.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.

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premo Tribunal Administrativo, por Acórdão Julho de 1962 - já eram decorridos 16 meses - deu provimento ao recurso, em cumprimento do douto o Sr Ministro do Ultramar, três meses depois, no sentido de ser admitido a prestação de prova dato recorrente, prestadas as provas, o candidato, por maioria, conhecido o resultado das por vás da decisão do júri, o Sr Ministro do Ultramar lavrar a portaria de nomeação do candidato, de portaria, foi ela submetida ao visto do Tribuna t as, em sessão de 22 de Fevereiro de 1963 - foram prestadas em Outubro de 1962 - o Tribunal administrativo recusou o mágico visto, com ilegalidade que topou, não só no concurso como no acto da nomeação, o Sr Ministro do Ultramar produziu um despacho pelo qual acatou as razões do visto (vaso raro) e concluiu pela universidade o curso, o candidato não esteve pelos ajustes e contra o despacho ministerial para o Supremo Administrativo, este venerando Tribunal deu p ao recurso; o magistrado do Ministério Público Supremo Tribunal Administrativo, em cumpri instruções superiores, recorreu para o tribunal pi bem este alto tribunal, como senhor da última negou provimento ao recurso e confirmou o açor rido
Trocado por miúdos o texto da douta dizer o concurso foi realizado legalmente e na vícios, as provas foram muito bem prestadas, a do candidato aprovado no concurso era a única e cia legal, moral, lógica, a recusa do visto foi u: de poder, e a declaração de conformidade e inverdade do concurso proferidas pelo Sr M Ultramar, no seu douto despacho, não passam d interpretação ou aplicação da norma jurídica», e próprio, contém o vírus epidémico de cívico de da lei»
Em 32 anos que conto de actividade forno fiz, pró domo nica, alguns recursos, ajudei amigos tos, h centenas de acórdãos do contencioso admitir e é a primeira- vez que tomo conhecimento de concurso para provimento de cargo público do que um candidato ganha a sua causa em todas,
- por quatro a zero, como se diria em termino corporativa -, pois foram proferidos quatro acórdão são todos favoráveis O último, que vale a pena tirado em 15 de Janeiro do ano corrente que cumpriu todas as formalidade do aprovado em provas públicas prestadas quatro proferidos a seu favor, ver-se nomeado e investido no exercício de funções, como lhe assiste de pleno direito Para povoamento deste edificante e
- jogo ou farsa - só falta que o Sr Ministro mm, em rasgo providencial, aliás da Mia com determine a extinção da 7 cadeira que faz parte do Instituto de Medicina Tropical, não acre qualquer justificação toda a gente ficar á ignorar foi extinta a cadeira de Antropologia Tropical pá nomear o único candidato que se mostrou compete regê-la quem lesse tão sábia providência este comentário «Sim senhores, providência porque revela apoiado sentido de economia neste em que todo o dinheiro é pouco pata a queria d
Mas não é certo que todo o mundo ficasse extinção da 7 cadeira do Instituto de Medicina Foi exagero meu atendam por favor
O concurso para provimento da tal cadeira de lógica Tropical foi anunciado no Diário do Governo então, de Março de 1961 Nesse ano, a U N E S C O realizou a 24 Conferência Internacional de Instituição Pública Nela estiveram representados a países Portugal ali esteve dignamente representado por uma delegação chefiada pelo Sr Embaixador Rui Teixeira Guerra e composta por cinco delegados, tendo sido dois dele* a nossa muito ilustre colega nesta Assembleia Dr Maria Irene Leite da Costa e o Dr Mano Peixoto Estou-me orientando por um extracto impresso da ai ta respectiva, em meu poder
Foram, precisamente, estes dos delegados que responderam ás perguntas que lhes foram formuladas a respeito de Portugal pelos delegados da Bélgica, Tunísia, Libéria, Chile e índia Que deram as informações em plena consciência e conhecimento, honrando com inteligência e fidelidade o nosso bom nome, certificai-se Passo a ler, por tradução literal
V cadeira de Antropologia Tropical de Instituto da Medicina Tropical de Lisboa, destina-se, especialmente, ao estudo do homem nascido ou estabelecido nas regiões tropicais e ao estudo das condições genéticas ou ecológicas que possam influenciar a sua evolução biológica e a sua adaptação Visto o facto de os Portugueses estarem repartidos por todos os continentes e pertencerem às raças mais diversas, há necessidade de estudar as características dessas raças, as condições de adaptação às regiões que habitam e nas quais devem expandir-se, por isso, a existência da cadeira de Antropologia Tropical no Instituto de Medicina Tropical sen e para mostrai o nível deste Instituto, um dos melhores da Europa,
Exacto, como V Ex acabaram de ouvir Mal salvam aqueles nossos ilustres delegados que viriam a ser iludidos na sua boa fé, fazendo-os passar por aquilo que repugna dizer
O Instituto de Medicina Tropical é um dos melhores da Europa, mas a cadeira de Antropologia Tropical é que tem tão insignificante interesse que é possível ao Instituto, sem baixar o seu alto nível, passar sem que ela seja professada há bons quatro anos Pelo menos, assim o tem entendido o Sr Ministro do Ultramar Mas, então, qual é o grau de respeito que merecem os nossos delegados e as afirmações que em nome de Portugal fazem nas reuniões internacionais para tomarem o prestígio nacional Será que o Ministério do Ultramar as ignora
Creio que esta situação é absolutamente desprestigiante e envolve muitos sectores, que não só o Ministério do Ultramar, que só não é uma monarquia absoluta porque o Chefe do Governo resolve, de vez em quando, substituo os titulares, dando à Nação a ilusão de que também ali chega o Poder do Estado
Quem é o candidato a quem tanta oposição faz o Ministério do Ultramar, em não se sabe de que Cientista, professor, escritório com numerosa bibliografia, publicista, conferencista, membro de diversas organizações científicas internacionais, participante em dezenas de congressos e reuniões internacional de carácter científico, regente de os de Antropologia no estrangeiro com extensão universitária etc , tal é o tipo de candidato que o Ministério do Ultramar repele, certamente com o propósito de defender o bom nível do Instituto de Medicina Tropical Mas não é em nome da ciência, porque ele tem dado superabundantes e esmagadoras provas da sua alta capacidade e do seu intenso labor e amor ciência Nem, tão-pouco, em nome do ensino, porque ele tem podido e sabido reger cursos especializados de nível universitário nesse ramo do saber, tanto no nosso país como em países estrangeiros Também não

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penso que seja por divergências de escola ou de doutrina e, muito menos, por diferenças políticas
Felizmente para nós, os mestres ainda suo livres no seu magistério, obrigados como são ao seguimento das matérias dos programas aprovados, e nada mais E tenho por afastadas causas determinantes de ordem política, não só em respeito à dignidade e deontologia do magistério de todos os graus, como também pelo respeito de vido aos próprios alunos, que repeliam qualquer tentativa de violação da sua consciência Além disso, ninguém ignora os efeitos perniciosos, até para a própria ordem social, da intromissão da política no ensino
Por isso se me afigura termos diante de nós um dos casos mais estranhos que se está desenrolando sob a responsabilidade do Ministério do Ultramar, que se mantém absolutamente indiferente às repercussões que está tendo e que tanto afectam o bom nome e prestígio do Estado Assim, eliminadas as causas possíveis, só posso inclinar-me para as insondáveis i azoes subjectivas», que, no entanto, fazem transparecer a animosidade e a injustiça contra um candidato dotado do mais alto valor intelectual, científico e cultural, que muito tem elevado e prestigiado, nos meios internacionais, a ciência médica e a cultura portuguesa Quantos homens há em Portugal que a este possam ser comparados em labor e valor intelectual e científico, comprovado por dezenas e dezenas de trabalhos de interesse universal e, por isso mesmo, consagrado e laureado por tantas organizações científicas de diversos países Teremos tantos que nos seja permitido, sem fracasso nem prejuízo, desperdiçar este? Então, a ser-nos isto permitido, por que modos e meios se orienta o Ministério do Ultramar para elevar o nível do ensino? Está provando que não é pelo recrutamento dos melhores E quem existe ali com a suficiente bagagem científica capaz de, criteriosamente, sobrepor-se ao critério de um júri de especialistas, especialmente nomeado paro- a espinhosa tarefa de examinar candidatos de tão alta craveira científica? Isto faz rir Será porque o candidato não convém?
Se a razão é essa, impõe-se que seja ela declarada publicamente, pondo-se termo a comentários desagradáveis e a injustas suspeições Mas se tal fosse declarado, não lograria convencimento o expediente Pois quê? Um homem que tem representado Portugal, oficialmente, em tantos congressos e reuniões científicas internacionais; que, tunda agora, está desempenhando actividade de relevo, colaborando com o Ministério dos Negócios Estrangeiros na preparação de exposição de Portugal no Rio de Janeiro, precisamente nos domínios da divulgação do conhecimento do homem português, não serve ou não convém para a regência da cadeira de Antropologia Tropical do Instituto de Medicina Tropical? Haja coerência, ao menos !
Sr Presidente Vou terminar Julgo ter dito o bastante para cada um poder tirar de um caso que é um exemplo de ordem pessoal, como não podia deixar de ser, a moral que comporta e que transcende o âmbito do mesquinho interesse particular Só por isso aqui o trouxe Não o fiz para apoiar-me em D'Artagnan ou Magriço Servi-me dele apenas para provai, mais uma vez, a necessidade de reduza o Ministério do Ultramar à exacta dimensão que » unidade nacional e do Estado exigem

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E é mais um protesto que fica, desta vez a bem da justiça Sei que estas atitudes nada contribuem para melhorar a condição humana, esbatendo as incompreensões que nos tornam malquistes Pelo que me
toca especialmente, a incompreensão deixa-me desolado e desgostoso, mas não me desorienta, porque sei que caminho direito por cominhos direitos, que são aqueles em que sempre nos vemos, por má formação da sociedade, «de mal com el-rei por mor dos homens e de mal com os homens por mor de el-rei» Tenho dito

Vozes: - Muito bem, muito bem !

O orador foi muito cumprimentado

O Sr Presidente: -Vai passai-se à

Ordem do dia

O Sr Presidente: - Continua o debate sobre as Contas Gerais do Estado (metrópole e ultramar) e as contas da Junta do Crédito Público relativas a 1963

em a palavra o Sr Deputado Alberto de Araújo

O Sr Alberto de Araújo: -Sr Presidente e Srs. Deputados A Assembleia Nacional aprecia na actual sessão legislativa as Contas Gerais do Estado publicadas pelo Sr Ministro das Finanças e discutidas nesta Câmara com uma regularidade que já é norma corrente da nossa administração pública
Neste fim de legislatura convém pôr em relevo a preocupação do Governo de publicar pontualmente as Contas Gerais do Estado e o desejo desta Assembleia de discutidas amplamente, como meio eficaz de apreciar os problemas que interessam directamente os diversos sectores da vida nacional
Quer as propostas de lei de autorização das receitas e despesas, quer as Contas, Gerais do Estado, não são publicadas, apenas, na simplicidade das suas disposições ou dos seus números Tanto umas como outras são precedidas de relatórios que constituem verdadeiros estudos sobre a conjuntura económico-financeira, interna e externa, e através dos quais não só se pode medir a grandeza e a extensão das tarefas a cumprir, mas também verificar a fidelidade com que no Ministério das Finanças se prossegue a política de equilíbrio 01 comentai e de sanidade monetária que Salazar corajosamente impôs e que a experiência havia de demonstrar ser a condição essencial para o País poder encarar e fazei face aos problemas correntes da administração e de fomento e aos próprios problemas políticos que os chamados «ventos da história» haviam de fazer surgiu no seu caminho
A esta preocupação do Governo de esclarecer as linhas gerais da administração financeira, fornecendo ao País uma soma vultosa de elementos e informações, tem a Assembleia Nacional correspondido com um interesse que bem demonstra o seu desejo de cumprir aquela função fiscalizadora e construtiva que lhe é assinalada pela nossa Constituição Política
A apreciação das Contas Gerais do Estado constitui sempre pretexto para que nesta tribuna, a propósito da aplicação de verbas e recursos, se formulem críticas e votos, se expunham anseios e aspirações que, sem ferir a essência dos princípios ou a estrutura do sistema, visam, apenas, colaborar com a administração pública no sentido de se encontrarem os melhores rumos pi áticos de bem servir os interesses do País
Mas a colaboração desta Assembleia na apreciação das Contas Gerais do Estado vai muito mais além, pois todo o processo de discussão parlamentar incide sobre um parecer que é, por si só, um estudo completo e exaustivo

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da vida financeira e económica da Nação, realizado vês da análise dos seus recursos e possibilidades forma como são aplicados os réditos públicos
A informação, aos dados, aos elementos que foi o Governo à Assembleia Nacional, corresponde es maca com um estudo e apreciação bem à altura da constitucional que em matéria de finanças públicas atribuída
O parecer sobre as Contas Gerais do Estado não amontoado de rubricas e de números ou a simples redução das verbas arrecadadas pelo Tesouro e gastas serviços ao longo de um ano económico Pelo contrai um trabalho critico e sistematizado, em que aos elementos fornecidos pelas Contas outros elementos se de alto poder esclarecedor A documentação, o trabalho de indagação e de recolha conscienciosa dos estatísticos, a apreciação objectiva dos factos projecção na vida económica e financeira do País, atríbutos de um parecer que honra o seu autor e a Assembleia Nacional
Caracteriza-o, talvez, por vezes, um certo tom e verdade Mas essa severidade não é mais que a e são da política financeira que está na base do rés mento nacional e que não pode sofrer nem alterações desvios
Relendo os pareceres sobre as Contas Gerais do I verificamos que o seu ilustre relator preconiza sem; práticas de uma sadia gestão financeira, a necessidade de sacrificar obras sumptuárias a empreenderem carácter reprodutivo, de se ser cauteloso e prudente recurso ao crédito externo, tendo em consideração empréstimos contraídos implicam oportuno pagam juros e amortizações, o dever de se estar atento à do comércio externo como factor importante no e tratamento da balança geral de pagamentos do Pais
Todas estas normas de orientação financeira, preconizadas no parecer, têm sido votadas nesta Assembleia, que continua, assim, a dar o seu firme e fundamentado àquela política de austeridade que o Governo pró e que hoje, mais do que nunca, se torna necessário :
Por mais de uma vez tem o parecer chamado a do Governo e do Pais para o grave desequilíbrio do comércio externo Transferências de capitais, ri de emigrantes, receitas de turismo, além de outra
permitido saldar os déficit s da nossa balança comercial e obter saldos positivos na balança geral de pagamentos Mas é impossível prever por quanto tempo se pode imitar com esses recursos, tendo-se em consideração, sobretudo, o carácter precário de certos factores que até agora constituído fonte importante de obtenção de divisas e cambiais
Segundo o parecer, o exame do comportamento do comércio externo durante um longo período, pode esclarecer as razões do lento crescimento económico do país
Em 1963 ano relativamente ao qual estamos apreciando as Contas Gerais do Estado, a balança comercial comércio externo, durante um longo período, poder
parecer as razões do lento crescimento económico metropolitana apresentou um déficit de 6 842 000
As classes mais relevantes nas importações foram as máquinas, aparelhos, etc. as matérias têxteis e os produtos minerais e os metais comuns e obras respectivas
Nas exportações figuravam, em primeiro lugar, dos materiais têxteis e obras a seguir, os produtos indústrias alimentares e as cortiças, madeiras,
Segundo o Boletim Mensal do Instituto Nacional Estatística relativo a Julho último, era natural a face da evolução do nosso comércio externo, no mestre, uma diminuição do saldo negativo das obras, e comercial do País no ano de 1964 Todavia, assim não aconteceu, porquanto o aumento de 2 790 000 contos verificado no total das exportações foi excedido por um acréscimo de 3 015 000 contos de importações
Assim, em 1964 as importações totalizaram 5 178 000 t, com o valor de 21881000 contos e as exportações 3 588 000 t, com o valor de 14 813 000 contos, pelo que se verificou um saldo negativo de 7 068 000 contos, correspondente a um agravamento de 225 000 contos relativamente ao ano anterior
Como em 1963, foram as máquinas, aparelhos e material eléctrico, as matérias têxteis, os metais comuns e os produtos minerais que mais pesaram no volume geral das importações E também como em 1963, couberam os primeiros lugares na exportação às matérias têxteis e respectivas obras, aos produtos das indústrias alimentares, às cortiças e madeiras
Para perfeita interpretação dos números relativos á nossa estatística de comércio deve dizer-se que, expressa em tonelagem, a diferença de importações entre 1963 e 1964 não atingiu l por cento No valor é que essa diferença se cifrou em 16 por cento Quanto às exportações, tome, entre os dois últimos anos, um aumento de cerca de 20 por cento na tonelagem e de 23,2 por cento no valor As estatísticas do nosso comércio externo silo bem o reflexo das necessidades do País em equipamento, em matérias-primas, em produtos de consumo corrente E exprimem também os valores e as tendências da nossa exportação
Em 1964 a importação de máquinas e aparelhos industriais não eléctricos foi de 2 862 000 contos, ou seja, mais 516 000 contos do que no ano anterior, a do algodão em rama de 1426 contos de ferro, a do aço em bruto ou semi-trabalhado de 1331 contos (mais 256 000 contos do que em 1963), máquinas e aparelhos eléctricos l 091 000 contos (mais 156 000 contos do que no ano anterior), as ramas de petróleo 932 000 contos
A importação de automóveis para transporte de pessoas desceu de 631 000 contos em 1963 para 123 000 contos em 1964, ou seja uma diferença de 508 000 contos Mas a importação de partes e peças separadas de automóveis destinados a veículos montados pela indústria nacional subiu de 32 000 contos em 1963 para 633 000 contos em 1964
Os géneros alimentares também pesaram fortemente na balança comercial do País em 1964, pois importar mais 200 000 contos de trigo, mais 158 000 e contos de açúcar, mais 65 000 contos de bacalhau, mais 45 000 contos de carne, mais 20 000 contos de café do que em 1963
Também teve um acréscimo de 43 000 contos a importação de medicamentos
A rádio, a televisão, máquinas e objectos de uso doméstico e pessoal também continuaram a influenciar a nossa balança comercial Em 1964 importaram-se 131000 contos de frigoríficos 145 000 contos de aparelhos de televisão, 73 000 contos de aparelhos de rádio, 48 000 contos de máquinas de costura, 40000 contos de relógios, 27 000 contos de brinquedos, 14000 contos de máquinas fotográficas, 7000 contos de discos gravados, 10 000 contos de máquinas de lavar roupa, 11000 contos de aspiradores de poeira, etc.
Os produtos tradicionais da nossa exportação continuaram a manter uma posição importante no nosso comércio externo relativo a 1964
A exportação de cortiça em bruto e em obra atingiu 1640 000 contos, a de conservas de peixe 1174 000 contos, a dos vinhos 1070 000 contos, a de madeiras 683 000

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contos e a de resinosos 463 000 contos Nos têxteis só a exportação de tecidos de algodão excedeu 1 100 000 contos
Em 1964 as nossas províncias ultramarinas contribuem com cerca de 15 por cento para o volume das importações totais da metrópole e os países estrangeiros com 85 por cento
Nas exportações coube ao ultramar 25,5 por cento e ao estrangeiro 74,5 por cento Mas enquanto em 1963 foi deficitária a balança comercial metropolitana com a província de Moçambique, em 1964 registou-se um saldo positivo da ordem dos 150 000 contos
No ano último, dos países estrangeiros, a Alemanha figura como o maior vendedor ao nosso país, com 3 334 000 contos de mercadorias importadas, ou seja 15,2 por cento da importação total Vêm depois a Inglaterra, com perto de 3 milhões de contos, os Estados Unidos da América, com 2 289 000 contos, a França, com 1 559 000 contos, e a Itália, com 973 000 contos
Num plano importante figuram ainda a Bélgica, a Suíça, a Holanda, o Iraque, a Suécia, etc.
A Inglaterra continuou a ser em 1964 o maior comprador de mercadoras e produtos portugueses A exportação pai n aquele país foi de 2330 contos no último ano, o que corresponde a uma percentagem de 15,7 por cento da nossa exportação total A seguir vêm os Estados Unidos da América, u Alemanha e a França, com percentagens de 10,5, 7,5 e 4,9 por cento têm ainda posições importantes no nosso comércio de exportação a Suécia, a Espanha, a Holanda, a Itália e a Dinamarca
Com excepção de um número muito restrito de países, relativamente aos quais a balança comercial apresentou saldos positivos, como o Canadá, a Dinamarca, a Suécia e a Finlândia, é geralmente deficitário o nosso comércio com a generalidades dos países A nação que apresenta um saldo mais desfavorável relativamente a Portugal continua a ser a Alemanha, cujas vendas excederam em 2 200 000 contos as compras que efectuou no nosso país O saldo negativo que a nossa balança comercial apresentou em relação àquele país no ano findo representa aproximadamente o somatório dos nossos saldos negativos com a Inglaterra, os Estados Unidos da América e a França
A Espanha manteve em 1964 uma situação de equilíbrio nas suas relações comerciais com Portugal cerca de 450000 contos de importações e de exportações
O Brasil, que foi outrora mercado importante de produtos portugueses, continua a ter posição de reduzida importância no nosso comércio externo Em 1964 importámos mercadorias no valor de 152 000 contos e exportámos 40000 contos para aquele país, ou seja 0,3 por cento das nossas exportações totais Mas continuemos a confiar que as profundas afinidades que ligam os dois povos abram novas perspectivas ao desenvolvimento das suas relações económicas
Porque o País tem seguido com o maior interesse tudo o que respeita aos movimentos de integração económica, convém referir a posição dos dois grandes blocos europeus no comércio externo português
Em 1963 a exportação portuguesa para os países do Mercado Comum foi de 2 637 000 contos. Por coincidência atingiram igual cifra as exportações para os países da E F T A Mas como as importações do primeiro daqueles agrupamentos foi muito maior do que as efectuadas do segundo, daí resultou um déficit da nossa balança de comércio com os países da Comunidade Económica Europeia de 3 870 000 contos, enquanto o que se verificou com o grupo da Associação Europeia de Comércio Livre foi de l 476 000 contos
Naquele ano as nossas compras aos países do Mercado Comum representaram 34,5 da importação metropolitana e as nossas vendas para os países que o constituem 21,9 por cento da nossa exportação Igual percentagem atingiu a nossa exportação para os países da E F T A , enquanto a percentagem, da importação destes países foi de 21,8, o que representou já um equilíbrio de transacções muito maior do que o que se verificou com o grupo do Mercado Comum.
Em 1964 as nossas importações subiram em valor 728 000 contos dos países do Mercado Comum e 566 000 contos dos países da E F T A , mas como nas exportações se verificou um aumento de 400 000 contos para o primeiro grupo e superior a 1 milhão de contos para o segundo, daí resultou que o déficit comercial com os países da Comunidade Económica Europeia quase atingiu os 4 200 000 contos, enquanto o déficit com os países da Associação Europeia de Comércio Livre não atingiu 1 milhão de contos
No último ano o nosso comércio externo com o primeiro daqueles agrupamentos correspondeu a 33 por cento da importação total da metrópole e a 20.6 por cento da exportação Com o segundo agrupamento a posição foi 20,6 por cento na importação e 25,1 por cento na exportação
Quer isto dizer que, enquanto os países do Mercado Comum, tendo concorrido com um terço do valor das nossas importações, só nos absorveram um quinto das nossas exportações, os países da E F. T A contribuíram com um quinto para o valor das importações, tendo-nos comprado mercadoras correspondentes a um quarto das vendas totais metropolitanas
O processo da integração Económica europeia corresponde à necessidade de se obterem melhores condições de vida, através de processos equilibrados de crescimento e de mais altos níveis de produtividade Os problemas que levantou, e que continua a levantar, a diferença de tratamento dado aos produtos industriais e nos produtos agrícolas, a dificuldade de harmonizar e aferir por um padrão comum determinadas políticas internas, são conhecidos de todos e não vale a pena relembrá-los Mas convém destacar a importância de que se revestia para o nosso país o fazermos parte de um dos grandes agrupamentos europeus, e beneficiai mós de regalias indispensáveis à defesa do nosso comércio externo Alcançou-se esse objectivo através de um condicionalismo que tinha em consideração a situação particular da nossa economia e as suas características, depois de negociações longas e nem sempre fáceis
No momento em que, através dos estatísticas e dos números, começam a constatar-se os benéficos resultados da nossa adesão a uma política que está hoje na base da própria sobrevivência europeia, é de elementar dever dirigir palavras especiais de louvor ao Governo, não só pela visão com que encarou a grande modificação que se está a operar na estrutura e nas relações económicas internacionais, mas também pela firmeza e tenacidade com que soube acautelar os interesses do País perante os seus pares e associados
Sr Presidente A propósito de certas modificações preconizadas para o sistema monetário internacional tive há dias oportunidade de reler a tese que o Doutor Oliveira Salazar apresentou no seu concurso, em 1916, para assistente da Faculdade de Direito de Coimbra - de que V. Ex ª, Sr Presidente, foi também mestre insigne - «O Ágio do Ouro»

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Desde então operou-se uma grande evolução na vida do Mundo, e a própria ciência; económica perdeu a sua clareza clássica para obedecer a uma nova terminologia em que, por vezes, a complexidade dos conceitos, das equações e das fórmulas matemáticas obriga a meditações fundas para compreender a linha da doutrina e o rumo o das soluções
Escrita há quase meio século, esta tese continua a ser uma página actual que se lê com interesse e com proveito como explicação dos fenómenos que em todos os tempos estão na base dos problemas monetários e cambiais e na qual não sabemos que mais admirar se a clareza da exposição e das premissas se a lógica das conclusões
Há 50 anos era então bem reduzido o nosso comércio externo Em 1913 o movimento comercial português correspondia, aproximadamente, a 90 000 contos de débitos provenientes de mercadorias importadas e 41 000 contos os de créditos sobre o estrangeiro relativos a produtos exportados, ou seja o equivalente a um déficit de quase 50 000 contos
Pois já nessa época o professor de Direito, que havia de ser mais tarde Ministro das Finanças e Presidente do Conselho, ao fazer uma análise objectiva dos diversos mentos que constituíam o nosso comércio externo, afirmava que as importações não diminuiriam facilmente E assim tem acontecido Os apelos ao aumento da produção nacional, à criação de indústrias à introdução de novos métodos e de novas técnicas nos diversos sectores e graus produtivos, têm sido neutralizados por outros factores que são inerentes ao próprio mecanismo da vida económica. A industrialização implica a importação de equipamentos e matérias-primas. Os aumentos nos níveis de vida gel necessariamente, maiores consumos
Já em 1916 o Prof. Salazar, no seu citado trabalho, destacava o vultoso valor dos produtos agrícolas e alimentares no nosso comércio de importação Passado quase século realizou-se em todo o mundo uma revolução profunda nos níveis e nas técnicas da produção industrial, e a agricultura, relegada para um segundo plano, nos métodos e nos processos de enriquecimento das nações toda a parte manifesta o seu descontentamento pelas limitações que condicionam a sua actividade e diminuem as suas possibilidades de expansão
Não se pense que é apenas em Portugal que se fazem ouvir os clamores da agricultura o fenómeno é geral. Em 15 de Novembro de 1963 as organizações agrícolas do Mercado Comum, reunidas em Estrasburgo, aprovaram um manifesto, afirmando a sua solidariedade «a fim de obterem condições de trabalho e de vida equivalentes às das populações de que são parte integrante»
E em 28 de Novembro seguinte, na U N E S C O, 1300 membros de câmaras de agricultura discutiram solenemente uma nova declaração dos direitos e deveres da agricultura e dos agricultores, concluindo que «a cultura, no seu processo de produção, no escoamento dos seus produtos, na procura dos seus mercados, recusa-se a ser considerada uma actividade económica e social subalterna e atrasada»
Os resultados incertos de uma política a longo termo, a insatisfação dos agricultores no presente e a procura de mão-de-obra por parte de outras actividades conduzem a um desinteresse humano por parte da juventude que constitui para a agricultura o problema mais grave ([...], Revue de Economia Politique, Julho-Outubro de 1964)
São fenómenos gerais da nossa época E a solicitação da mão-de-obra empregada na agricultura para outras actividades mais lucrativas não se verifica só dentro das fronteiras de cada nação Origina a formação de fortes correntes emigratórias para países estrangeiros, como tem acontecido na Europa nos últimos anos. De 1954 a 1960 mais de 1 milhão de italianos emigraram para diversos países e naquele mesmo período a Alemanha recebeu 2 191 000 emigrantes
Na Suíça um terço da mão-de-obra empregada nas indústrias é de origem estrangeira e em França sobe a 1 milhão o número de estrangeiros que fazem parte da bua população activa Segundo a Revue de Economia Politique, em 1961 chegaram a França 6716 portugueses e 12 916 em 1962 e M Grandval, ministro do Trabalho, afirmou que 25 000 portugueses se tinham introduzido naquele país em 1963
Segundo os números oficiais, emigraram em 1964 para França 32 635 portugueses
Mas sabe-se que estes números estão aquém da realidade
A experiência demonstra que a expansão económica fomenta o emprego, sobretudo quando é acompanhada de uma redução gradual das horas de trabalho Compreende-se, por isso, que os países mais progressivos e industrializados da Europa se tornassem um pólo de atracção de mão-de-obra
E a experiência também comprova que o método mais eficaz de obviar a estas deslocações maciças de trabalhadores é procurar aumentar o rendimento nacional Segundo o relatório do grupo Uri, em face do descimento do rendimento nacional na Itália, o problema da emigração naquele país deixará de ter qualquer relevância a partir de 1972
A emigração pode, por vezes, ter vantagens, sobretudo quando influencie favoravelmente a balança de pagamentos do país onde se verifica Mas, mesmo assim, esses benefícios têm de ser pesados e ponderados quando originem o abandono das terras ou das fábricas, alta de salários e de custos Os economistas modernos inclinam-se a crer que são os países do destino que mais lucram com o fenómeno emigratório, por receberem, gratuitamente, um factor primordial no ciclo da produção
Sr Presidente Na querela entre a cidade e os meios rurais, a fábrica e o campo, a indústria e a agricultura, o País deseja e formula o voto de que ambas estas actividades sejam objecto de igual interesse e cuidado, no convencimento de que, como ainda recentemente se escreveu, o desenvolvimento da riqueza, quaisquer que sejam as suas modalidades, é a melhor garantia do progresso e da paz social
E seja-nos lícito também ter uma palavra de apreço para o comércio português, tantas vezes relegado para o plano das actividades intermediárias, mas de importante função produtiva no conjunto económico nacional Não basta produzir Torna-se necessário comercializar os produtos, tornar atraente a nua venda, manter e conquistar os mercados Quando nos debruçamos sobre as nossas estatísticos de exportação e vemos os países onde conseguimos introduzir produtos portugueses, vencendo a concorrência, os preços, a propaganda, o auxílio e os prémios oficiais concedidos a produtos congéneres, temos de prestar homenagem aos que com tanta perseverança continuam uma tradição dos velhos tempos em que a medida que íamos descobrindo o Mundo por toda a parte íamos estabelecendo relações de comércio e de troca
Os nossos vinhos mantêm-se há séculos nos principais mercados europeus, conseguindo alguns deles aumentar, ultimamente, o seu consumo, as conservas vão para a Europa e para os Estados Unidos, chegam ao Canadá, às Filipinas e à Austrália, a cortiça tem uma vastidão de aplicações e de consumos, o Japão figura entre os compradores de resinosos portugueses, os nossos tecidos de algodão vestem gente de todos os continentes e de

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Desde então operou-se uma grande evolução na vida do Mundo, e a própria ciência; económica perdeu a sua clareza clássica para obedecer a uma nova terminologia em que, por vezes, a complexidade dos conceitos, das equações e das fórmulas matemáticas obriga a meditações profundas para compreender a linha da doutrina e o rumo das soluções.
Escrita há quase meio século, esta tese continua a ser uma página actual que se lê com interesse e com proveito como explicação dos fenómenos que em todos os tempos estão na base dos problemas monetários e cambiais e na qual não sabemos que mais admirar: se á clareza da exposição e das premissas se a lógica das conclusões.
Há 50 anos era então bem reduzido o nosso comércio externo. Em 1913 o movimento comercial português correspondia, aproximadamente, a 90 000 contos de débitos provenientes de mercadorias importadas e 41 000 contos de créditos sobre o estrangeiro relativos a produtos exportados, ou seja o equivalente a um deficit de quase 50 000 contos.
Pois já nessa época o professor de Direito, que havia de ser mais tarde Ministro das Finanças e Presidente do Conselho, ao fazer uma análise objectiva dos diversos elementos que constituíam o nosso comércio externo, afirmava que as importações não diminuírem facilmente. E assim tem acontecido. Os apelos ao aumento da produção nacional, à criação de indústrias, à introdução de novos métodos e de novas técnicas nos diversos sectores e graus produtivos, têm sido neutralizados por outros factores que são inerentes ao próprio mecanismo da vida económica. A industrialização implica a importação de equipamentos e matérias-primas. Os aumentos nos níveis de vida geram, necessariamente, maiores consumos.
Já em 1916 o Prof. Salazar, no seu citado trabalho,- destacava o vultoso valor dos produtos agrícolas e alimentares no nosso comércio de importação. Passado quase meio século realizou-se em todo o mundo uma revolução profunda nos níveis e nas técnicas da produção industrial, e a agricultura, relegada para um segundo plano, nos métodos e nos processos de enriquecimento das nações, em toda a parte manifesta o seu descontentamento pelas limitações que condicionam a sua actividade e diminuem as suas possibilidades de expansão.
Não se pense que é apenas em Portugal que se fazem ouvir os clamores da agricultura: o fenómeno é geral. Em 15 de Novembro de 1963 as organizações agrícolas do Mercado Comum, reunidas um Estrasburgo, aprovaram um manifesto, afirmando a sua solidariedade "a fim de obterem condições de trabalho e de vida equivalentes às das populações de que são parte integrante".
E em 28 de Novembro seguinte, na U. X. E. S. C. O., 1300 membros de câmaras de agricultura discutiram solenemente uma nova declaração dos direitos e dos deveres da agricultura e dos agricultores, concluindo que "a agricultura, no seu processo de produção, no escoamento dos seus produtos, na procura dos seus mercados, recusa-se a ser considerada uma actividade económica e social subalterna e atrasada".
Os resultados incertos de uma política a longo termo, a insatisfação dos agricultores no presente e a procura de mão-de-obra por parte de outras actividades conduzem a um desinteresse humano por parte da juventude que constitui para a agricultura o problema mais grave (Houillier, Revue de Economic Politique, Julho-Outubro de 1964).
São fenómenos gerais da nossa época. E a solicitação da mão-de-obra empregada na agricultura para outras actividades mais lucrativas não se verifica só dentro das fronteiras de cada nação. Origina a formação de fortes correntes emigratórias para países estrangeiros, como tem acontecido na Europa nos últimos auos. De 1954 a 1960 mais de 1 milhão de italianos emigraram para diversos países e naquele mesmo período a Alemanha recebeu 2 191 000 emigrantes.
Na Suíça um terço da mão-de-obra empregada nas indústrias é de origem estrangeira e em França sobe a 1 milhão o número de estrangeiros que fazem parte da sua população activa. Segundo a Revue de Economic Politique, em 1961 chegaram a França 6716 portugueses e 12 916 em 1962 e M. Grandval, ministro do Trabalho, afirmou que 25 000 portugueses se tinham introduzido naquele país em 1963
Segundo os números oficiais, emigraram em 1964 para França 32 635 portugueses.
Mas sabe-se que estes números estão aquém da realidade.
A experiência demonstra que a expansão económica fomenta o emprego, sobretudo quando é acompanhada de uma redução gradual das horas de trabalho. Compreende--se, por isso, que os países mais progressivos e industrializados da Europa se tornassem um pólo de atracção de mão-de-obra.
E a experiência também comprova que o método mais eficaz de obviar a estas deslocações maciças de trabalhadores é procurar aumentar o rendimento nacional. Segundo o relatório do grupo Uri, em face do crescimento do rendimento nacional na Itália, o problema da emigração naquele país deixará de ter qualquer relevância a partir de 1972.
A emigração pode, por vezes, ter vantagens, sobretudo quando influencie favoravelmente a balança de pagamentos do país onde se verifica. Mas, mesmo assim, esses benefícios têm de ser pesados e ponderados quando originem o abandono das terras ou das fábricas, alta de salários e de custos. Os economistas modernos inclinam-se a crer que são os países do destino que mais lucram com o fenómeno emigratório, por receberem, gratuitamente, um factor primordial no ciclo da produção.
Sr. Presidente: Na querela entre a cidade e os meios rurais, a fábrica e o campo, a indústria e a agricultura, o País deseja e formula o voto de que ambas estas actividades sejam objecto de igual interesse e cuidado, no convencimento de que, como ainda recentemente se escreveu, o desenvolvimento da riqueza, quaisquer que sejam as suas modalidades, é a melhor garantia do progresso e da paz social.
E seja-nos lícito também ter uma palavra de apreço para o comércio português, tantas vezes relegado para o plano das actividades intermediárias, mas de importante função produtiva no conjunto económico nacional. Não basta produzir! Torna-se necessário comercializar os produtos, tornar atraente a sua venda, manter e conquistar os mercados. Quando nos debruçamos sobre as nossas estatísticas de exportação e vemos os países onde conseguimos introduzir produtos portugueses, vencendo a concorrência, os preços, a propaganda, o auxílio e os prémios .oficiais concedidos a produtos congéneres, temos de prestar homenagem aos que com tanta perseverança continuam uma tradição dos velhos tempos em que à medida que íamos descobrindo o Mundo por toda a parte íamos estabelecendo relações de comércio e de troca.
Os nossos vinhos mantêm-se há séculos nos principais mercados europeus, conseguindo alguns deles aumentar, ultimamente, o seu consumo; as conservas vão para a Europa e para os Estados Unidos, chegam ao Canadá, às Filipinas e à Austrália; a cortiça tem uma vastidão de aplicações e de consumos; o Japão figura entre os compradores de resinosos portugueses; os nossos tecidos de algodão vestem gente de todos os continentes e de

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todas as raças, máquinas e aparelhos de fabrico nacional exportam-se já para a Alemanha, para a Bélgica, paia a Itália, para a África do Sul, para os Estados Unidos, para o México, paia a Venezuela e para o Paquistão Os bordados da Madeira decoram as mais lindas montras dos estabelecimentos da 5.ª Avenida, em Nova Iorque, e não tardará muito que as lindas flores daquela ilha, que já começam a aparecer, encham as vitrinas das lojas europeias da especialidade, constituindo um novo motivo de encanto, de propaganda e de atracção
Há que prestar justiça a este esforço comercial, persistente e multiforme, ao qual o Fundo de Fomento de Exportação vem dando um inteligente e valorosíssimo apoio, e sem o qual o valor da produção nacional ficaria notavelmente diminuído
Por iniciativa da Associação Industrial Portuguesa realizou-se recentemente um colóquio destinado a debater os problemas que mais interessam à expansão e ao fomento das exportações e a cuja sessão inaugural presidiu o Sr. Ministro da Economia Pela qualificação das pessoas que intervieram nesse debate e pelo valor dos estudos apresentados, podemos dizer que dele resultaram conclusões e sugestões de alto interesse para o desenvolvimento do nosso comércio exterior, tendo em conta as lições da experiência e as medidas adoptadas lá fora para conquistar e manter mercados
Se é sempre de apoiar tudo quanto se faça para estudar os mais importantes problemas nacionais - como é o de incrementar o nosso movimento exportador- sugerindo ao Governo a adopção das medidas que ao o Poder Público pode tomar, afigura-se-nos que a iniciativa particular teia de continuar a ser a grande propulsora de toda a actividade económica nacional e merecer do Estado um interesse e um cuidado que tem de ser tanto maior quanto maiores forem as dificuldades a vencer e os benefícios de ordem nacional que os empreendimentos particulares possam assegurar
Além destes colóquios de ocasião, deverá haver um colóquio permanente entre o Governo e os que produzem e exportam, e estes ouvidos com maior frequência As negociações, as conferências, os estudos, só a nível oficial e burocrático isolam o País dos problemas E não encorajam nem estimulam os que investem os seus melhores recursos e energias na valorização económica da Nação
Sr Presidente Acaba de aparecer o relatório anual do Banco de Portugal, síntese completa e perfeitíssima da conjuntura interna e externa e publicação bem à altura da importância e do prestígio do nosso primeiro estabelecimento de crédito
Pêlos números agora trazidos a público através do relatório daquele Banco emissor, e a avaliar pelos elementos de informação disponíveis sobre os principais sectores da vida económica nacional, prosseguiu, em 1964, a expansão da produção global de bens e de serviços, mas, em virtude de a progressão verificada nas indústrias transformadoras, de construção e em outras actividades ter sido, em parte, neutralizada pela quebra do sector agro-pecuário, a taxa dessa expansão deve ser inferior à de 1963.
Como aumentaram as importações de bens e de serviços (nomeadamente as importações de mercadorias e as despesas de turismo e transportes), é de supor um aumento apreciável da oferta global E como, por outro lado, aumentaram também as exportações e o volume dos rendimentos formados internamente e das transferências privadas do estrangeiro, não é de admitir que se tenha dado em 1964 uma quebra na procura interna relativamente a 1963.
Em 1964 continuou a expandir-se o crédito bancário O seu nível, no fim do ano, atingiu a cifra de 50 614 000 contos, ou seja mais 6 753 000 contos do que no fim do ano anterior
O relatório do Banco de Portugal diz que a progressão do crédito bancário deve ser seguida com a devida atenção e aquele ser concedido considerando não apenas a solvência dos solicitantes, mas também a utilidade produtiva do dinheiro emprestado E insiste para que, através de estatísticas adequadas, se apure completamente a distribuição específica e sectorial do volume do crédito bancário, a fim de, com melhor conhecimento, se reforçarem as providências de orientação e coordenação de crédito previstas no Decreto n.º 42 641
A expansão dos depósitos à ordem mediu-se por 6 377 000 contos em 1964, contra 4 591 000 contos em 1963. A proporção da reserva de caixa para os depósitos à ordem representava-se no fim do ano por 24,9
Também nas caixas económicas se verificaram no ano último apreciáveis expansões de crédito e de depósitos
Tanto o banco central como os bancos comerciais mantiveram as suas taxas de redesconto, desconto, empréstimos caucionados e depósitos Não sofreram igualmente alterações as taxas aplicadas pela Caixa Geral de Depósitos às suas operações A importância dos créditos a médio e longo prazo outorgados na metrópole por esta grande e prestigiosa organização do nosso mercado financeiro aumentou 440 000 contos
Quanto aos empréstimos hipotecários realizados no País, a importância dos respectivos contratos subiu pouco mais de 2 por cento entre os períodos de Janeiro-Setembro de 1963 e 1964, contra cerca de 10 por cento entre os mesmos períodos de 1962 e 1963 Em contrapartida, o montante dos cancelamentos aumentou 43 por cento, interessando principalmente os prédios urbanos
Aumentaram também os investimentos em prédios Nos períodos de Janeiro-Setembro de 1962 e 1963 andaram à volta de 3 500 000 contos No mesmo período de 1964 subiram para 4 237 000 contos, ou seja cerca de 20 por cento mais do que no ano anterior
Ainda segundo também o relatório do Banco de Portugal, na Bolsa de Lisboa todos os índices médios das quantidades de títulos transaccionados averbaram incrementos significativos, particularmente nas acções das instituições de crédito, das sociedades ultramarinas e das empresas hidroeléctricas
Os índices médios das cotações dos títulos aumentaram em 1964, sendo de 1,5 por cento o acréscimo do índice global dos obrigações e de 13,6 por cento o do correspondente índice das acções A maior parte do índice global adveio dos acréscimos nos grupos de "Ultramarinas" (33,2 por cento), de "Transportes e comunicações" (27,2 por cento), de "Diversos" (16,6 por cento) e de "Hidroeléctricas" (9,6 por cento)
Quanto a preços por grosso, manteve-se a tendência para a alta que vem dos anos anteriores, nomeadamente de "Matérias-primas não alimentares, excepto combustíveis" (12 pontos) e, em menor grau, de "Produtos da indústria química" (4 pontos) e "Alimentação" (3 pontos) Em contrapartida, os preços das "Bebidas, e tabaco" baixaram acentuadamente 11 pontos, em continuação do movimento já verificado no ano precedente
Os índices relativos aos produtos importados do ultramar acusam acréscimos de 4 pontos e os do estrangeiro 3 pontos.
Acusam também alta os índices gerais de preços no consumidor Em Lisboa aqueles índices subiram de 119 em 1963 para 123,2 em 1964 e no Porto de 115,9 para 118,1 Como já aconteceu nos anos anteriores, foram os produtos alimentai es que mais concorram para esta su-

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bida de preços no consumidor (em Lisboa 5,9 por cento e em Évora 7.1 por cento)
Este problema merece a maior atenção pelas dificuldades que cria às economias domésticas de recursos limitados como é a do funcionalismo público
Sr Presidente Apesar do desequilíbrio da balança comercial do Pais, a balança de pagamentos da zona do escudo deve registar um forte saldo positivo no ano de 1964
Em 1963 o resultado fanal da balança global de pagamentos externos da zona do escudo cifrou-se no saldo positivo de 2 137 000 contos, ou fosse uma quebra de 33,7 por cento relativamente a 1962
Em 1964, a avaliar pelos resultados já conhecidos, o saldo final da balança geral de pagamentos deve apresentar uma apreciável melhoria relativamente a 1963
Efectivamente, no período Janeiro-Setembro do correspondente ano o saldo da balança global de pagamentos da zona do escudo elevava-se a 2 606 000 contos, contra 545 000 e tos em igual período de 1963, e, a avaliar pela balança de operações cambiais do Banco de Portugal, a situação devia ter continuado a evoluir favoravelmente no decurso do último trimestre do ano findo
Embora se tenha registado uma subida no déficit da rubrica "Mercadorias", em consequência da expansão das importações, foi, todavia, o resultado das transacções correntes que mais contribuiu para a referida melhoria na balança geral de pagamentos do País
Nesta rubrica de transacções correntes incluem-se numerosas operações, das quais são de destacar a importação e a exportação, as abrangidas pela designação de "Diversos", transferências privadas, receitas de turismo, transportes, seguros, rendimentos de capitais, etc.
Analisando a balança de pagamentos da metrópole o estrangeiro no período Janeiro-Setembro de 1964, fica-se que são as rubricas relativas a operações de capitais, transferências privadas e turismo que exprimem os grandes saldos positivos daquela balança O déficit comercial os fretes de mercadorias, os rendimentos de capitais, os seguros, influenciam-na desfavoravelmente.
Porque a esta Assembleia tem merecido particular atenção o fomento turístico, reveste interesse constatar que as receitas do turismo figuram na balança geral de pagamentos do País no período Janeiro-Setembro de 1964 com a verba de 2 411 000 contos, ou seja mais do que a exportação do País em conservas e em vinhos Todavia, há que atender também que aumentaram as despesas daquelas rubrica, pois ascendem a mais de 1 milhão de contos no referido período Janeiro-Setembro de 1964
Apesar da obra notabilíssima da renovação da nossa frota, do esforço das companhias armadoras nacionais Junta Nacional da Marinha Mercante, a verdade é que dados, por vezes, o destino e a origem das mercadorias o condicionalismo que domina esta actividade, a concorrência e o proteccionismo concedido por certos países às suas bandeiras, os transportes continuam ainda a influenciar desfavoravelmente a balança de pagamentos Nos nove primeiros meses do último ano o saldo negativo na "Transportes" cifrou-se em 722 000 contos
As operações de capitais continuaram, no conjunto a reflectir-se benèficamente na balança de pagamentos metrópole Foi negativo o saldo de operações de capitais
a curto prazo
Nas operações de capitais a longo prazo do sector privado verificou-se um saldo positivo mas inferior ao de igual período de 1963, determinado principalmente pelos reembolsos ou amortizações de créditos
Nas operações de capitais a longo prazo do sector público e bancário diversos empréstimos externos exploram, principalmente, o aumento que esta rubrica tem de quase 1 milhão de contos relativamente a 1963
A balança de pagamentos do ultramar com o estrangeiro apresentou também uma melhoria sensível de resultados, pois a um saldo de l 630 000 contos nas transacções correntes nos meses Janeiro-Setembro de 1963 contrapõe-se um de 2 567 000 contos em igual período do último ano
Esta posição favorável da balança de pagamentos da zona do escudo teve o seu natural reflexo no volume das reservas em ouro e divisas do Banco de Portugal e no correspondente aumento dos meios centrais de pagamento em circulação notas, depósitos à ordem naquele Banco e moeda divisionária
Efectivamente, a emissão monetária do Banco de Portugal ascendeu, no fim do último ano, a 30 808 000 contos, incluindo notas em circulação e outras responsabilidades à vista
As reservas e outras garantias ultrapassaram os 33 milhões de contos A percentagem de ouro e divisas no conjunto dessas garantias subiu de 77,3 por cento em 1963 para 81 por cento em 1964
Como já tive ocasião de referir, o volume dos empréstimos externos influenciou muito favoràvalmente a balança geral de pagamentos do País no último ano
Como já tive também oportunidade de dizer, o Sr Eng.º Araújo Correia, no seu parecer, preconiza a maior atenção à evolução da dívida pública e a necessidade de a aplicação do produto dos empréstimos ser orientada num sentido reprodutivo de rendimentos, assegurados dentro do mais curto espaço de tempo possível
O último relatório do Banco de Portugal, numa orientação idêntica, ao destacar a importância dos empréstimos e créditos externos na formação dos saldos positivos da balança geral de pagamentos do País, afirma que "esses empréstimos e créditos originarão, por efeitos do pagamento de juros, um valor líquido de saídas superior ao das entradas, salvo se a reprodutividade das aplicações de capitais mutuados determinar expansão das exportações de bens e de serviços, ou contracção das importações, de montante, pelo menos, igual à soma acumulada de capital e rendimentos, e, sendo assim, a natureza e finalidade dos fundos obtidos por empréstimo, público ou privado, merecem uma atenção especial, não menos cuidada, indubitavelmente, do que a requerida para uma orientação adequada dos investimentos directos"
No fundo, o que se pretende preservai é a situação de equilíbrio da balança de pagamentos e, através dela, a estabilidade da moeda
As duas lições da guerra e os inconvenientes de balanças de pagamentos continuamente desequilibradas e de moedas emitidas como meio de resolver dificuldades de tesouraria vieram dar razão às nações - é o caso de Portugal - que obstinadamente souberam permanecer fiéis às regras clássicas de sanidade e estabilidade monetária
A firmeza com que o Prof. Oliveira Salazar defendeu esse princípio básico da administração financeira bastava para impô-lo à consideração e ao respeito do País
Toda a grande preocupação das nações, mesmo das mais ricas e poderosas, é salvaguardarem e manterem, tanto quanto possível, o equilíbrio dos seus créditos e débitos externos E através de medidas fiscais, como o agravamento ou redução de impostos, da alteração das taxas de juro ou de medidas incidindo directamente sobre as importações, as exportações e os consumos, procuram obter um equilíbrio indispensável à estabilidade dos seus valores monetários Os Estados Unidos executaram no último ano uma política de redução de impostos a fim de facilitar o consumo e não quebrar o ritmo de expansão,

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outros países aumentaram as taxas de desconto bancário pata conter a expansão da procura e a Inglaterra criou uma taxa adicional de 15 por cento sobre a importação de produtos manufacturados a fim de melhorai a posição da sua balança de comércio
Pode dizer-se que todas as políticas económicas contemporâneas visam obter taxas apreciáveis de rápido crescimento económico sem prejuízo de uma estabilidade razoável de preços Ora, a moeda ocupa um lugar primacial entre as condições necessárias à realização conjunta destes dois objectivos, tanto na ordem interna como na ordem internacional
Como já se escreveu, a exigência de base nesta matéria formula-se em termos simples o sistema monetário deve ser capaz de fornecer à economia a liquidez necessária ao financiamento das transacções, sem que se revele nem um excesso nem uma insuficiência de meios de pagamento e sem que as adaptações correntes se realizem à custa de desequilíbrios que ponham em risco a capacidade do sistema para realizar as suas funções Em resumo, liquidez e estabilidade suo dois imperativos que se impõem a todos os sistemas monetários
No plano internacional o sistema de pagamentos, que, antes da primeira grande guerra, era dominado pela libra esterlina, apoiada na praça de Londres, modificou-se a partir de 1918 com a competição crescente do dólar Ambas as moedas - a libra e o dólar - procuraram ligar a elas o maior número possível de divisas, organizando e dirigindo o sistema de pagamentos internacionais
Como escreve o Prof. Wolff, a estrutura do sistema de pagamentos internacionais passou de unipolar a bipolar
Entre 1950 e 1958 as reservas em dólares duplicaram e entre 1950 e 1957 o seu aumento foi superior ao das reservas em ouro O dólar passou a exercer uma influência irreversível sobre as outras moedas e a ser considerado como equivalendo ao ouro
Entre 1949 e 1961 cerca de 33 por cento do aumento das reservas do mundo ocidental foram efectuados com ouro e cerca de 56 por cento com saldos em dólares e libras esterlinas
O actual sistema de pagamentos internacionais, que assenta principalmente no valor do dólar como moeda chave, tem sido objecto de largos estudos de teóricos e de técnicos da economia É muito conhecida a crítica do economista Robert Triffin e que se resume assim
O actual sistema monetário internacional é ferido de contradição indiscutível Efectivamente, para que uma divisa seja considerada uma moeda de reserva é necessário que inspire confiança (de contrário os bancos centrais recusar-se-iam a conservá-la) e que o país emissor (país centro) tenha uma balança de pagamentos deficitária (senão não soía possível acumular saldos nesta moeda) Por outras palavras um país centro acha-se, por definição, colocado em face do dilema seguinte.

Ou fornecer meios de liquidez internacional, aceitando uma degradação contínua da sua posição de reserva líquida que teta como consequência uma crise de confiança que arrumará o próprio sistema,
Ou reequilibrar a sua balança de pagamentos, ficando impossibilitado de fornecer divisas destinadas a constituírem moeda de reserva a outros países

O general De Gaulle, na sua célebre conferência de imprensa de 4 de Fevereiro último, defendeu abertamente o princípio de que o actual sistema monetário internacional não corresponde mais às realidades do presente, comportando antes inconvenientes que se vão agravando cada vez mais Segundo o presidente da França, as moedas dos
Estados da Europa ocidental foram restauradas, a tal ponto que as reservas de ouro que esses Estados possuem equivalem no total às dos Americanos, podendo mesmo ultrapassá-las se aqueles Estados quiserem converter em ouro todos os dólares à sua ordem Desta forma, o valor transcendente que era reconhecido ao dólar perdeu a sua base inicial, a qual era a posse, pela América, da maior parte do ouro do Mundo
E depois de pôr em relevo a base artificial do actual sistema monetário internacional advogou a necessidade de as trocas comerciais serem estabelecidas numa base monetária indiscutível, ou seja no regresso ao padrão-ouro, o qual não tem nacionalidade e é universalmente considerado valor inalterável e fiduciário por excelência.
Tiveram a maior repercussão de um e do outro lado do Atlântico as afirmações do presidente da República Francesa, proferidas com aquele espírito de decisão e de firmeza que o caracteriza
Não foram novos os problemas que abordou nem inéditas as soluções preconizadas Simplesmente postas por uma das figuras mais representativas da Europa contemporânea, chefe de uma grande e próspera nação, as suas palavras tiveram especial significado
Efectivamente, por mais de uma vez se tem preconizado o regresso ao padrão-ouro, numa atitude que alguns classificam de ressurgimento da velha mitologia monetária do metal amarelo
Alguns dos mais eminentes economistas contemporâneos, mesmo franceses, são abertamente contrários ao regresso ao sistema do padrão-ouro
O Prof. Coulbois, num estudo publicado em 1963 na Revue de Science Financière, diz que regressar ao ouro como único elemento constitutivo de reservas monetárias implicaria o desaparecimento de saldos em esterlino e em dólares, que excluindo a Rússia, no fim de 1961 correspondiam a mais de 30 por cento das reservas mundiais Semelhante política monetária implicaria, segundo aquele economista, a criação de um clima de especulação e de incerteza, a valorização do ouro e a aplicação de maiores recursos e investimentos na obtenção de um metal cuja utilidade económica é muito contestável, em face das imensas necessidades de desenvolvimento da economia mundial
Paia obviar a instabilidade do actual sistema monetário, outras sugestões têm sido apresentadas por economistas e técnicos das finanças e que vão desde a criação de uma moeda internacional ao alargamento a outras moedas da qualidade de moedas-chaves de que até agora têm usufruído o dólar e a libra
Mas algumas das mais reputadas autoridades financeiras americanas reputam o prestígio do dólar absolutamente associado ao predomínio político e económico dos Estados Unidos no Mundo
Segundo o estudo apresentado em 1962, em Filadélfia, por Robert Roosa, secretário adjunto do Tesouro americano, as dúvidas que se levantaram, nos últimos anos, a respeito do dólar, provêm unicamente de, desde há algum tempo, os dólares terem aumentado a oferta da moeda, isto é, as reservas monetárias de outros países, num ritmo demasiadamente lapido Como o secretário adjunto do Tesouro americano se recusa a admitir que o dólar possa deixar de desempenhar a sua função de moeda internacional, é suficiente, para restabelecer a situação, que os listados Unidos equilibrem a sua balança de pagamentos
Como se obterá nessa hipótese a liquidez necessária ao financiamento das transacções internacionais? É aqui que intervêm as outras moedas, às quais Roosa quer conceder o privilégio de ajudar o dólar na sua função embora estas moedas não sejam capazes, segundo ele, de assumir todas as responsabilidades exigidas por uma moeda-chave, pode-

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riam contribuir a tomar sobre si uma parte das responsabilidades do dólar, na medida em que os Estados Unidos acertassem conservá-las
Se bem se compreende, segundo o Prof. Coulbois, o processo seria o seguinte a balança de pagamentos americana encontrando-se equilibrada não haverá dólares disponíveis para alimentar as reservas dos outros países senão na medida em que os Estados Unidos estiverem dispostos a oferecê-los A sua oferta, cuidadosamente administrada, seria feita sob a forma de compra de moeda dos principais países Assim, o dólar ficaria sendo a única moeda de reserva e os Estados Unidos os únicos senhores da liquidez internacional, servindo as outras divisas fortes, em tudo e por tudo, de contrapartida da emissão de dólares para fim internacionais
Se as recentes declarações do general De Gaulle suscitaram vivas discordâncias na América, o plano de sectário do Tesouro dos Estados Unidos provocou reacção em meios europeus responsáveis, em consequência da desigualdade em que assentava enquanto o Governo Americano tinha a escolha das moedas que desejava adquirir, os ou Estados eram uniformemente convidados a adquirir dólares, ficando à mercê do Tesouro dos Estados Unidos, que foi considerado uma curiosa defesa de soberania monetária
Será, certamente, entre estas teses opostas que se encontrará o rumo que permita obter soluções equilibradas e estáveis para um futuro sistema de pagamentos internacionais A política de cooperação tende naturalmente a alargar-se cada vez mais aos sectores do crédito e da moeda e é natural que, de acordo com sugestões de técnicos e peritos, o Fundo Monetário Internacional venha a desempenhar, no futuro papel relevante em matéria tão importante para a vida e para a economia das nações
A esta previsão aderiu o nosso ilustre colega nesta Câmara e antigo Ministro da Economia Sr Dr. Ulisses Cortês, num notável artigo publicado recentemente no Diário de Noticias, de Lisboa, sobre problemas monetários
Mercê de determinados princípios, tidos como basilares e incontroversos em matérias de finanças públicas, o nosso país vencer as dificuldades da maior guerra todos os tempos e aderir depois a diversas organizações cooperação europeia e internacional
Em todos estes organismos cumprimos sempre e continuamos a cumprir as regras essenciais ao seu funcionamento equilibrado E o valor dos recursos acumulados, a solvabilidade externa da moeda, o crédito que [...] usufruímos, o crescimento do nossa economia metropolitana e ultramarina, a princípios fidelidade a princípios regular e persistentemente observados, dão-nos para encararmos confiadamente formas mais amplas de entendimento e cooperação entre as nações
Sr Presidente Vou terminar
Quando se olha para o conjunto das obras publicas que se realizaram nos últimos anos -as barragens estradas, as escolas, as centrais eléctricas, a imigração -, para aquela monumental ponte que sobre o nosso Tejo glorioso perpetuará a grandeza de uma época, quando constatamos o incremento das nossas exportações e vemos que, partindo de uma fraca potencialidade industrial, em volume e em gama de produtos, fizemos grandes progressos na siderurgia, nos têxteis, nas indústrias químicas, dos petróleos, dos cimentos, da pasta da papel, de adubos, do vidro, de cabos metálicos, de maquinas, de material eléctrico, de conservas, de cerâmicas, de pneus, de montagem de automóveis, além de tantas outras, a custa de investimentos avultados e de reequipamentos importantes, temos de reconhecer que o Pais toma consciência dos novos imperativos que comandam a vida e a economia das nações
E quando pensamos que este esforço produtivo abrange as nossas costas e mares na valorização da pesca e se estende as ilhas e às nossas vastas e ucas províncias de além-mar, em obediência a planos previamente estruturados, só temos de nos orgulhar de uma ordem política que criou o clima de confiança sem o qual todo o fomento económico é impraticável

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - É pois, nesse ambiente de confiança que votamos as Contas Gerais do Estado e encaramos a solução dos problemas que dominam a vida do País
Estão mobilizadas as nossas forças armadas e uma juventude generosa guarda territórios descobertos, povoados, trazidos a dignidade da vida e da civilização pelos Portugueses
Para elas vai, neste momento, o nosso pensamento mais respeitoso e comovido, com b voto de que a Nação, na disciplina, na perseverança e no trabalho, seja digna dos que, todos os dias, arriscam a vida para que a Pátria sobreviva e continue
Tenho dito

Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado

O Sr Presidente: - Não há mais nenhum orador inscrito paia o debate das Contas Gerais do Estado, tanto relativas à metrópole como ao ultramar, e das da Junta de Crédito Público do ano de 1963
Nestas condições, declaro encerrado o debate, e vou submeter à votação da Assembleia duas propostas de resolução, que estão na Mesa e vão sei lidas

Foram lidas São as seguintes

Proposta de resolução

A Assembleia Nacional, tendo examinado os pareceres sobre as Contas Gerais do Estado da metrópole e das províncias ultramarinas relativos ao exercício de 1963 e concordando com as conclusões da Comissão das Contas Públicas, resolve dar a sua aprovação à Conta Geral do Estado e às contas das províncias ultramarinas recentes ao ano de 1963
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 24 de Março de 1965 -O Deputado, Manuel Amorim de Sousa Meneses

Proposta de resolução

A Assembleia Nacional, depois de tomar conhecimento do parecei da sua Comissão de Contas Públicas relativo às contas da Junta do Crédito Público, resolve dar-lhe a sua aprovação

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 24 de Março de 1965 -O Deputado, Joaquim de Jesus Santos

O Sr Presidente: - Vou pôr à votação as duas propostas de resolução que acabam de ser lidas

Submetidas à votação, foram aprovadas

Página 4658

4658 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 195

O Sr Presidente: - Srs Deputados Sena amanhã a última sessão do período normal desta sessão legislativa, mas nós temos para discutir uma proposta de lei, enviada pelo Governo, sobre o regime jurídico dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais
Esta proposta de lei já foi enviada às Comissões a que se entendeu devei submetê-la para fazerem o seu estudo
Este trabalho, por si, já indicava a minha disposição de prorrogar a sessão
Sei, pelos presidentes das Comissões aludidas, que estas foram convocadas para o dia 30, a fim de estudarem esta proposta de lei
Parece-me que, pelo facto de o Governo nos ter mandado esta proposta de lei, não podemos deixar de a discutir E, por isso, nos termos do § único do artigo 94 º da Constituição, prorrogo por um mês o funcionamento efectivo da Assembleia
A VV Ex.ªs já foram distribuídos todos os elementos essenciais ao estudo para discussão daquela proposta de lei As Comissões foram convocadas pelos seus respectivos presidentes para o dia 30. Nestas condições, não marcarei sessão plenária senão para quinta-feira 1 de Abril, visto entender que, paia além do estudo que VV Ex.ªs realmente poderão fazer, por disporem de todos os elementos de que carecem, é conveniente esperar pelos primeiros; contactos com as Comissões aludidas, pela consulta de terça-feira.
Como VV Ex.ª sabem, durante o funcionamento das Comissões não pode, nos termos regimentais, haver sessões, e, assim, a próxima sessão será no dia 1 de Abril, quinta-feira. E com esta declaração vou encerrar a sessão
A ordem do dia da próxima sessão plenária sei á a discussão na generalidade da proposta de lei sobre o regime jurídico dos acidentes de trabalho e doenças profissionais
Está encerrada a sessão

Eram 18 horas

Srs. Deputados que entraram durante a sessão

Alberto Carlos de Figueiredo Franco Falcão.
Alberto da Bocha Cardoso de Matos.
António Barbosa Abranches de Soveral
António Calheiros Lopes António Marques Fernandes
António Martins da Cruz
Augusto César Cerqueira Gomes
Augusto Duarte Henriques Simões
Augusto José Machado
Belchior Cardoso da Costa
Carlos Coelho
Délio de Castro Cardoso Santarém
Elísio de Oliveira Alves Pimenta
Henrique dos Santos Tenreiro.
João Mendes da Costa Amaral
João Ubach Chaves
Jorge Augusto Correia.
Jorge Manuel Vítor Moita
Júlio Alberto da Costa Evangelista
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel Nunes Fernandes
Manuel Seabra Carqueijeiro
D Maria Margarida Craveiro Lopes dos Beis
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães
Tito Castelo Branco Arantes.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês

Srs. Deputados que faltaram à sessão.

Alberto Ribeiro da Costa Guimarães.
Albino Soares Pinto dos Beis Júnior
Alfredo Mana de Mesquita Guimarães Brito.
António Gonçalves de Faria
António Maria Santos da Cunha
António Tomás Prisónio Furtado
Armando Francisco Coelho Sampaio.
José Guilherme de Melo e Castro
José Luís Vaz Nunes
José Monteiro da Bocha Peixoto.
José Pinto Carneiro
José dos Santos Bessa.
José Soares da Fonseca.
Manuel Lopes de Almeida
Olívio da Costa Carvalho
Purxotoma Ramanata Quenin.
Rogério Vargas Moniz.
Urgel Abílio Horta.
Virgílio David Pereira e Cruz
Vítor Manuel Dias Barros
Voicunta Srinivassa Sinai Dempó.

O RELATOR- Leopoldo Nunes

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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