Página 627
REPÚBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL
DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 36
ANO DE 1966 19 DE MARÇO
ASSEMBLEIA NACIONAL
IX LEGISLATURA
SESSÃO N.º 36, EM 18 DE MARÇO
Presidente: Exmo. Srs.
Secretários: Exmos. Srs
Fernando Cid de Oliveira Proença
Mário de Figueiredo
Mário Bento Martins Soares
SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 20 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se, conta, do expediente.
Foi recebido na Mesa, para efeitos do disposto efeitos do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição, o Diário do Governo n.º 61, 1.ª série, que insere os Decretos-Leis n.º 16 903. 46 904 e 46 905.
O Sr. Deputado Pinto de. Mesquita apresentou as bases de um aviso prévio nobre o problema do planeamento regional.
Também o Sr. Deputado Nunes de Oliveira leu uma nota de aviso prévio sobre alguns aspectos culturais, económicos e sociais da região de Entre Douro e Minho.
O Sr. Deputailo Rocha Calhorda falou sobre o povoamento no ultramar português.
O Sr. Deputado Nunes Barata referiu-se à expansão do turismo internacional e às possibilidades turísticas de Portugal, designadamente do Centro ao País.
O Sr. Deputado Correia Barbosa fez considerações sobre a Revolução de 28 de Maio e os seus efeitos na vida da Nação, pondo em relevo o espirito que preside às comemorações do 40.º aniversário daquela.
O Sr. Deputado Francisco António da Silva elogiou a acção desenvolvida pela Comissão Coordenadora das Obras Públicas no Alentejo a propósito do 10.º aniversário da criação da mesma.
O Sr. Deputado Elisio Pimenta pediu que fosse revista a situação dos veterinários municipais.
O Sr. Deputado Calhciros Lopes analixou as consequências das últimas inundações, especialmente as do Ribatejo, solicitando providências adequadas.
O Sr. Deputado Mário Bento tratou do problema das comunicações no distrito da Guarda.
Ordem do dia. - Prosseguiu a discussão das Contas Gerais do Estado e da Junta do Credito Público relativas ao ano de 1964.
Usou da palavra o Sr. Deputado Melo Giraldes.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 19 horas.
O Sr. Presidente: - Vai fazer-se a chamada.
Eram 16 horas e 5 minutos.
Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Pacheco Jorge.
Álvaro Santa Rita Vaz.
André Francisco Navarro.
André da Silva Campos Neves.
Aníbal Eodrigues Dias Correia.
António Augusto Ferreira da Cruz.
António Calheiros Lopes.
António Dias Ferrão Castelo Branco.
António Furtado dos Santos.
António Manuel Gonçalves Bapazote.
António Moreira Longo.
António dos Santos Martins Lima.
Armando José Perdigão.
Página 628
628 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 36
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Correia Barbosa.
Artur Proença Duarte.
Augusto Salazar Leite.
D. Custódia Lopes.
Deodato Chaves de Magalhães Sousa.
Duarte Finto de Carvalho Freitas do Amaral.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando Afonso de Melo Giraldes.
Fernando Alberto de Oliveira.
Fernando Cid de Oliveira Proença.
Fernando de Matos.
Filomeno da Silva Cartaxo.
Francisco António da Silva.
Francisco Elmano Martinez da Cruz Alves.
Francisco José Cortes Simões.
Gabriel Maurício Teixeira.
Gonçalo Castel-Branco da Costa de Sousa Macedo Mesquitela.
Gustavo Neto de Miranda.
Hirondino da Paixão Fernandes.
Horácio Brás da Silva.
Jaime Guerreiro Bua.
João Mendes da Costa Amaral.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
Joaquim de Jesus Santos.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Jorge Barros Duarte.
José Coelho Jordão.
José Fernando Nunes Barata.
José Janeiro Neves.
José Maria de Castro Salazar.
José de Mira Nunes Mexia.
José Pais Ribeiro.
José Pinheiro da Silva.
José Rocha Calhorda.
José Vicente de Abreu.
Júlio Dias das Neves.
Luís Arriaga de Sá Linhares.
Manuel Colares Pereira.
Manuel João Correia.
Manuel José de Almeida Braamcamp Sobral.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel Marques Teixeira.
Manuel Nunes Fernandes.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
D. Maria de Lourdes Filomena Figueiredo de Albuquerque.
Mário Amaro Salgueiro dos Santos Galo.
Mário Bento Martins Soares.
Mário de Figueiredo.
Martinho Cândido Vaz Pires.
Rafael Valadão dos Santos.
Raul Satúrio Pires.
Raul da Silva e Cunha Araújo.
Rui Manuel da Silva Vieira.
Rui Pontífice de Sousa.
Sebastião Garcia Ramirez.
Sérgio Lecercle Sirvoicar.
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães.
Teófilo Lopes Frazão.
Tito Lívio Maria Feijóo.
Virgílio David Pereira e Cruz.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 77 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 16 horas e 20 minutos.
Antes da ordem do dia
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Telegramas
Diversos a apoiar as considerações produzidas pelo Sr. Deputado Virgílio Cruz sobre instalações industriais na bacia do Tâmega.
Vários a aplaudir o discurso do Sr. Deputado Elmano Alves acerca das ligações entre as margens do Tejo.
O Sr. Presidente: - Para efeitos do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição, está na Mesa o Diário do Governo n.º 62, 1.ª série, de 15 do corrente, que insere os Decretos-Leis n.08 46 903, que altera as taxas do artigo 28.42.07 da pauta de importação; 46 904, que considera como novos direitos de base as taxas pautais indicadas no Decreto-Lei n.º 46 903, desta data, substituindo, para os mesmos efeitos, as competentes taxas resultantes da aplicação do disposto mo artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 43 295, e estabelece o programa das reduções a efectuar até 30 de Junho de 1972; 46905, que cria uma representação diplomática no Panamá com a categoria de embaixada, eleva a idêntica categoria as missões diplomáticas de Portugal na Guatemala, Manágua, S. Salvador e Teg, considerando-se extintas as legações existentes nas referidas cidades, altera as categorias de determinadas missões consulares e aumenta de duas unidades o inúmero de cônsules de 1.ª classe em serviço no estrangeiro.
Tem a palavra, para fazer um aviso prévio, o Sr. Deputado Pinto de Mesquita.
O Sr. Pinto de Mesquita: -Sr. Presidente: Uso da palavra para, nos termos do artigo 50.º do Regimento, formular o anúncio de um aviso prévio.
Seu objecto:
1.º O de chamar a atenção do Governo para o problema do planeamento regional, sugerindo-lhe a urgência de promover medidas legislativas atinentes ao seu estudo e progressiva realização com a amplitude necessária.
2.º O de provocar pelo respectivo debate - caso este venha a ter lugar - nesta Assembleia como que a consciencialização afluente da importância actual do problema e, com ela, a concretização de algumas possíveis achegas válidas para a sua solução.
Para efeitos do citado artigo regimental, passamos a consignar por escrito este aviso, constituído por um sumário, seguido de fundamentação, com termo mas conclusões de intuito definitório de medidas legislativas que se sugerem, o qual passo a ler:
Aviso prévio
A) Sumário:
Prospectivas de planeamento regional:
a) Da necessidade da acção impulsionadora do Poder Central e suas implicações quanto a meios legislativos e administrativos;
6) Da possibilidade de correspondentes revitalizações e reestruturações regionais e locais.
Página 629
19 DE MARÇO DE 1966 629
B) Fundamentos justificativos: Esquematicamente se deduzem os seguintes:
1.º As disponibilidades de energia motriz económicamente acessível obtida pelos vultosos aproveitamentos hidroeléctricos em progresso provocam no País o surto de industrialização a que assistimos processar-se, ou seja entre nós o primeiro autêntico escalão da revolução dita industrial.
2.º O efeito de tal choque traduz-se no precipitado agravamento da crise e desamparo da agricultura tradicional pela relutância e dificuldade desta em adaptar-se a métodos de industrialização rápida, à reconversão de culturas, etc.
3.º Vem tal curso de coisas conduzindo naturalmente ao abandono, por parte dos agrários, do trabalho da terra, trocando-o por actividades secundárias e terciárias mais bem pagas. Tendem, assim, a acorrer aos centros urbanos, que congestionam, quando não cedem, seduzidos pelo desnível dos salários, à tentação emigratória para países de industrialização ecuménica.
4.º Consequência: deserção dos campos e crescimento espectacular das urbes, sobretudo das que sejam nós de comunicação portuária, pólos fadados para centros de comércio e indústria.
5.º Meios tendentes a prevenir e moderar, dentro de limites de equilíbrio razoável, as desastrosas consequências deste fenómeno da deserção do espaço regional.
6.º Fenómeno nacional - metrópole e ultramar -, é claro que, para além de todas as possibilidades de iniciativa local ou particular, cumprirá ao Governo encará-lo, estudá-lo e, em correspondência, promover uma política correctora de acção directa ou indirecta.
7.º Com efeito, contrapartida da solidez do poder político central, sob o ponto de vista da vida regional, a metrópole não se estrutura hoje praticamente, à parte a sua geografia compartimentada e vagos tipicismos de população. Antes do liberalismo, existiam municípios com vida local - muito mais numerosos que hoje- e freguesias; e regionalmente, extra-Estado, talvez dioceses, e, aliás, um pouco delegadas do Poder Central, grandes comarcas judiciais e provinciais militares, com diversas atribuições administrativas, para além das que hoje lhes são específicas.
8.º Fora municípios, resíduo de tudo isto, que, aliás, era pouco, quanto ao regional nada há.
9.º Quanto a municípios, merece hoje terem-se em conta as actividades da organização corporativa, sobretudo agrícola, que, segundo a sua inclinação natural, tenderam a estruturar-se sob certa forma regional. Mas esta inclinação de espontaneidade é apenas balbuciante.
10.º No seu papel de estimulador e ordenador das actividades, tanto públicas como privadas, do espaço português, o Governo terá de promover a progressiva realização do planeamento regional.
11.º Fragmentàriamente, nesse sentido se têm vindo a esboçar medidas legislativas, ou programáticas, como, para citar algumas, se lembram as Leis de Meios para 1961 e, sobretudo, para- 1965, onde expressamente se prevê o planeamento regional. Além dos trabalhos atinentes aos planos de urbanização previstos no Código Administrativo, desdobra-se, sobretudo - programa piloto -, o plano director da região de Lisboa, definido pela Lei n.º 2099, de 14 de Agosto de 1959. Também é de lembrar a prevista localização dispersa de indústrias para pólos económicos de regionalismo.
12.º Nesta Assembleia Nacional tal anseio de integração regional tem-se manifestado frequentes vezes através de intervenções avulsas ou de avisos prévios, como os relativos à bacia do Mondego e da reforma administrativa. Outrossim, em sábios pareceres da Câmara Corporativa o problema tem sido tratado.
13.º No plano governativo, geralmente este problema tem sido encarado principalmente sob dominantes económicas ou de obras públicas, quando, não obstante a importância de arranque desta feição, carece de progressivamente ir revestindo fórmulas de integração abrangendo quase todos os sectores ministeriais, o que implica a necessidade de uma forte coordenação continuada.
14.º Além da presença dos Ministérios do Interior, das Finanças, da Economia, das Comunicações, da Justiça, da Educação, das Corporações, da Saúde e do Exército, amo se poderá prescindir, para o efeito, da do Ministério do Ultramar, tudo mentalizado, vertebrado e coordenado pela Presidência do Conselho.
15.º Embora o processo de industrialização no ultramar genericamente se venha processando no tempo de forma diversa da atrás apontada para a metrópole, o problema do planeamento convém depender de estudo e execução orientados superiormente pelo mesmo organismo, dada a interdependência económica que nacionalmente nos rege, embora sem prejuízo das peculiaridades de cada província ultramarina - e dentro delas de cada zona -, como o próprio conceito de região o postula.
Nestes termos, sugere-se que:
C) Conclusões:
1.a Necessidade de um diploma legislativo para estudo e progressiva execução de um planeamento regional, delineado em termos amplificados pelo já estabelecido para o plano director da região de Lisboa.
2.º Que no organismo de estudo e execução desse plano estejam presentes todos os sectores de administração pública necessários, presididos naturalmente por um Ministro de Estado na sua articulação directa com a Presidência do Conselho.
3.a Que o tal plano se processe, como é óbvio, em conexão com o III Plano de Fomento, em preparação.
4.a Que regionalmente se promova, desde já, para a região de influência da cidade do Porto, e para além do plano estritamente municipal já estudado, o estudado e promulgação de um plano director do desenvolvimento urbanístico da região da cidade do Porto.
O Sr. Nunes de Oliveira: - Sr. Presidente: Pedi a palavra para enviar para a Mesa, aliás interpretando o pensar de um grupo de Deputados, e ao abrigo do artigo 50.º do Regimento, a seguinte nota de aviso prévio sobre alguns aspectos culturais, económicos e sociais da região de Entre Douro e Minho.
Com o objectivo de contribuírem, na medida das suas possibilidades, para uma política de estímulo e de valorização da admirável região de Entre Douro e Minho, entenderam alguns dos Deputados que a representam que fossem traduzidos em oportuno debate os seus mais justificados anseios e as suas mais prementes necessidades, numa afirmação objectiva das potencialidades de uma das parcelas mais fascinantes de Portugal.
Página 630
630 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 36
Do ponto de vista histórico, artístico e paisagístico, ela constitui, sem dúvida, um repositório de elevado interesse e de permanente atracção. Assim, desde as belas serranias do Geres, do Marão, e projectando-se um pouco mais sobre o Sul, passando pelos idílicos recantos das aldeias, tão profundamente portuguesas, até às suas praias magníficas, toda a região se assemelha a um jardim, de vegetação exuberante e variada e de inéditas paisagens, onde os castelos, as ermidas e os velhos solares recordam e fazem meditar todos os que os contemplam sobre os mais brilhantes monumentos lusíadas.
Os problemas que nos propomos debater, sendo na verdade vincadamente nacionais; têm incidências de tal magnitude na vida desta região que nos cumpre pô-los em relevo, não esquecendo que alguns deles revelam mesmo características muito peculiares.
Está, por exemplo, neste caso a agricultura, que, assente em exploração de dimensões excessivamente reduzidas, continua a enfermar da falta de uma programação regional adequada, de um esforço de mecanização ajustada às condições locais de exploração da terra, de satisfatória protecção à comercialização dos seus produtos, etc., tudo isto factores que afectam especialmente as zonas essencialmente agrícolas, onde, apesar de tudo, o povo se mantém pletórico de energia e vai conduzindo a sua cruz com a maior dignidade, na esperança de que lhe não será negada a justiça por que tanto anseia.
No sector do ensino procurar-se-á igualmente pôr em evidência os meios de que a região carece e os problemas a que, em tal domínio, urge dar solução, o mesmo acontecendo em relação com a vida social nos seus múltiplos aspectos.
Na linha das nossas preocupações toma lugar proeminente, como se impunha, a saúde pública, bem precioso que ao Estado incumbe defender nos termos do n.º 4.º do artigo 6.º da Constituição Política, e como tal merecerá a mais viva atenção.
Finalmente, no que respeita ao turismo, o sentido e os objectivos do presente aviso prévio são o de revelar turisticamente as inesgotáveis riquezas do Noroeste do País, mostrar como se impõe reconhecê-las e aproveitá-las, apontar o volume do esforço já feito e o mérito dos empreendimentos realizados ou em curso, sustentar, enfim, que não pode ser prejudicado o trabalho de fomento turístico já levado a efeito, porque dele depende a valorização económica de regiões que não dispõem de outras possibilidades de desenvolvimento.
De acordo com os motivos sucintamente expostos, passamos a sumariar os aspectos gerais e particulares deste aviso prévio nos termos seguintes:
I) Ensino:
Valorização e fomento do ensino segundo os interesses da região, que o mesmo é dizer segundo os superiores interesses do País, no que respeita a:
a) Ensino primário;
b) Ensino secundário;
c) Ensino médio;
d) Ensino universitário.
II) Saúde e assistência:
Cobertura sanitária das populações «como processo fundamental de valorização do elemento humano:
a) Medicina curativa:
1) Assistência materno-infantil;
2) Saúde mental;
3) Organização hospitalar.
b) Medicina preventiva:
1) Medicina de trabalho;
2) Doenças sociais.
c) Formação de quadros técnicos (médicos, enfermeiros, etc.);
d) Colaboração entre assistência e previdência;
e) Assistência social.
III) Agricultura:
Necessidade de uma efectiva política de protecção, com o desenvolvimento de estruturas que permitam o aproveitamento conveniente deste sector da vida do País, de reflexos importantes na vida económica e social, impondo-se, por consequência, como de maior relevância para a região em causa:
a) Organização económica da lavoura e aperfeiçoamento das formas de representação dos seus interesses ;
b) Fomento e valorização das produções agrícolas regionais.
IV) Vida social:
Embora reconhecendo o trabalho útil que tem sido desenvolvido neste sector - não fosse o «zelar pela melhoria das condições das classes sociais» um dever que incumbe ao Estado -, entendemos ser de real interesse generalizar o debate envolvendo aspectos da maior relevância, como:
a) Urbanismo e ruralismo;
b) Fomento da habitação;
c) Valorização da vida local.
V) Turismo:
A riqueza do património histórico, artístico e paisagístico da região de Entre Douro e Minho exige que, para além do esforço já realizado, se considere como inadiável:
a) Preparação, em colaboração com as forças representativas dos interesses do sector, de um plano de valorização turística à escala regional;
b) Ampliação das facilidades de acesso ao País pela fronteira do Norte;
c) Valorização da rede rodoviária em função das novas exigências do progresso turístico da região;
d) Multiplicação das1 possibilidades de alojamento, mediante um satisfatório estímulo e apoio à iniciativa privada;
e) Execução de um plano de valorização e aproveitamento das numerosas estâncias hidrotermais;
f) Estímulo e protecção das actividades folclóricas e artesanais.
O Sr. Rocha Calhorda: - Sr. Presidente: Muito se tem escrito sobre o povoamento no ultramar português, e nesta Assembleia não têm sido poucas as vozes que se têm ouvido sobre esse mesmo assunto. Por estas razões a minha intervenção pode parecer escusada, ao focar problema já tão debatido por entidades bem mais autorizadas e competentes.
No entanto, ao focar esse problema apenas pretendo, pela insistência, contribuir para a confirmação de que o mesmo é efectivamente premente e tem elevado grau dentro das prioridades na escala nacional, já que para a sua solução as minhas considerações nenhum valimento deverão ter.
Página 631
19 DE MARÇO DE 1966 631
reportando-me especialmente a Angola, e tendo em conta o acelerado movimento local de promoção social, parece-me haver que fazer-lhe corresponder, paralelamente, e para o seu êxito, uma sólida, convicta e interessada política de povoamento de origem europeia, tanto quanto possível também promovida socialmente, dado que a necessidade de tal promoção não constitui exclusivo, daquela província. Só do crescimento harmonioso e equilibrado de ambas as realidades é que se tirarão os resultados justamente desejados e pretendidos.
A promoção social irá provocar em Angola, num futuro próximo, a existência de grande número de mentalidades com melhor preparação, as quais, se não encontrarem o ambiente adequado, virão criar um problema com reflexos de ordem social e política cuja gravidade, por evidente, me parece desnecessário salientar. Essas mentalidades têm de vir encontrar uma conjuntura suficientemente ampla e preparada para as receber e enquadrar devidamente dentro do seu novo nível.
Todos temos assistido ao esforço que vem sendo produzido no sentido de se enriquecer demogràficamente o nosso ultramar, havendo, no caso de Angola, um órgão especialmente criado para o efeito - a Junta Provincial de Povoamento -, cuja acção tem incidido, fundamentalmente, no campo agrário. Dentro do campo agrário tem aquela Junta procurado a fixação de novos colonos, provenientes de outras parcelas portuguesas, e a promoção económico-social das populações autóctones.
Para esse esforço e actuação específica a Junta Provincial de Povoamento aumentou o número de pessoas ao seu serviço no ano de 1964 de 586 para 792, ou seja um aumento de 206 pessoas, equivalente a 35 por cento. Nesse mesmo período a alteração no número de cultivadores instalados foi de 2095 para 2450, ou seja um acréscimo de 355 cultivadores, correspondente a um aumento de 16 por cento.
Por outro lado, no que respeita aos encargos com a existência e funcionamento da Junta Provincial de Povoamento, incluindo os sectores da Cela, do vale do Bengo e da Brigada de Engenharia, tal como foi feito para a determinação do pessoal ao serviço e do número de cultivadores, verifica-se que no ano de 1964 foram gastos cerca de 260 000 contos (exactamente 258 634 contos).
Analisando estes números e confrontando-os, parece-me legítimo tirar algumas conclusões, que, embora não sejam inteiramente válidas dentro da frieza dos números, devem marcar, no entanto, a tendência dos factos e das situações.
Assim, verifica-se que a máquina administrativa se revela muito pesada e densa, na proporção de necessitar de um aumento de 206 pessoas no seu quadro para obter o magro resultado de um aumento de 355 cultivadores.
Dada a necessidade de povoamento acelerado, que terá de medir-se pela ordem dos milhares, aquele índice é bastante desencorajante, mesmo tendo em conta o substancial autopovoamento que a própria Junta revela nos seus quadros, que, aliás, são insuficientes, como vem referido na parte final do seu relatório das actividades do ano de 1964.
Nesse relatório, ao assinalar-se expressamente como deficiência a falta de pessoal técnico, administrativo e de serviço social, sugere-se, como medida prioritária, o enriquecimento dos quadros com pessoal competente em todos os sectores. Mesmo assim, o dispêndio no ano de 1964 ultrapassou, como já referi, o importante valor de um quarto de milhão de contos, nível que deve ser absorvido em cada ano que vai passando. O confronto com os resultados obtidos permitirá tirar ilações sobre a virtude e conveniência do sistema seguido.
Ao atentar nos números citados, confrontando-os entre si e com o que urge atingir, não posso deixar de confessar as minhas dúvidas sobre as condições de rapidez e de economicidade, as quais constituem, factores basilares no objectivo a alcançar.
0 ritmo obtido no povoamento está longe de atingir a medida que é absolutamente necessária, o que implica ter de se concluir que o sistema seguido não satisfaz ou não é suficiente.
Torna-se, portanto, necessário rever e complementar a acção da Junta com outras formas de atracção de povoadores, a fim de se atingir um ritmo mais aceitável. À época do colono-soldado, vivida há precisamente cinco anos, tem de suceder a do soldado-colono, conforme o desejo manifestado por milhares de desmobilizados que só por falta de ocupação se vêem forçados a regressar.
O sector agrário constitui, sem sombra de dúvida, uma das bases em que deve assentar a nossa política de povoamento, embora não possa ser a única a adoptar. Entre o povoamento à base do pequeno colono e o povoamento através da instalação de grandes empresas agrícolas, trabalhando em grandes extensões de terra e com os meios de mão-de-obra e mecânicos aconselháveis, parece-me que este último sistema traria melhores resultados, não só no aspecto do povoamento, como na economicidade dos gastos públicos anuais e. ainda na obtenção de divisas do exterior pela saída de uma produção trabalhada em grande extensão.
O exemplo das frutas, nomeadamente bananas, laranjas, ananases ou abacaxis, que obtêm elevados preços nos mercados do Norte da Europa, poderá mostrar uma das muitas saídas para um empreendimento na base agrária, trabalhando produtos que permitem uma forte reprodutividade para o investimento e uma maior riqueza para a economia da província do que os tradicionais milho, trigo, arroz, feijão, batata, etc., cuja exportação teria um significado muito mais modesto.
Parece que o arranque para um desenvolvimento em larga escala no sector das frutas está prejudicado pela incerteza de os produtores terem transporte garantido para o escoamento certo e regular da sua produção. No entanto, na própria província poderia ser construída a unidade ou unidades navais necessárias, devidamente apetrechadas para a especialidade da carga a transportar, e, ainda que a sua aquisição começasse por ser feita pela Junta Provincial de Povoamento, não há dúvida de que seria um forte contributo para a política de desenvolvimento de Angola, fazendo cessar o actual círculo vicioso de não haver fruta para exportar por não haver barco e não haver barco por se recear que depois não haja fruta para carregar. A própria construção daquela unidade naval e o pessoal para a sua manutenção já por si constituiriam razões de animação no circuito económico daquela província.
Cabe-me aqui referir que, estando de certo modo ligado à construção naval de Angola, as minhas considerações não partem para ir ao encontro desse facto, mas antes aquela circunstância é que me permitiu avaliar o custo provável de um barco, custo da sua manutenção, preço provável do frete a suportar pela fruta transportada e, desse conjunto, concluir não só pela sua viabilidade, em face da modéstia do encargo frente ao valor anualmente despendido pela Junta Provincial de Povoamento, como também pela sua conveniência, em face da grande margem existente entre o preço C. I. F. da fruta e o preço de venda praticado aos consumidores do Norte da Europa.
Dentro do problema que o povoamento acelerado do ultramar constitui nem tudo é adverso, pois, fazendo falta ou não fazendo falta, não há dúvida de que existe
Página 632
632 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 36
uma substancial emigração do território metropolitano. Assim, para uma carência num território existe a possibilidade de canalizar o que de outro território se escoa, situação bastante mais favorável do que se tivéssemos apenas territórios nacionais a pedir povoamento.
O importante, pois, é ligar os dois pólos, fazendo desviar para o nosso ultramar a emigração metropolitana presentemente orientada para França, Venezuela, Canadá, Alemanha, África do Sul e outros países. Esse mal, necessário ou apenas incontível, se reverter a favor de Angola, ao menos não será em perda, dado que, continuando a metrópole a ter o mesmo benefício na sua balança de invisíveis, também a riqueza demográfica nacional não sofreria amputação, pois, em vez de sofrer desnacionalizações a sentir a longo prazo, apenas teria um deslocamento territorialmente interno e Angola obteria o seu povoamento da raiz de que tanto necessita.
Mais importante ainda ó, todavia, a determinação da forma como se poderá obter a ligação daqueles dois pólos - o da saída e o da entrada.
Dentro de uma lógica fria, mas evidente, não parece descabido que se vá verificar de que artes se servem os outros para atraírem e canalizarem para si o forte manancial de cerca de 80 000 portugueses que anualmente emigram do território metropolitano. Este fenómeno, se não tem maus reflexos a curto prazo (e é discutível se o actual benefício do afluxo de divisas do exterior supera os inconvenientes dessa emigração), não pode deixar de ser altamente inconveniente a longo prazo.
Não sei o que terão ou o que farão esses países que atraem mão-de-obra do exterior, mas certamente que o facto resulta da necessidade de mão-de-obra. E esta necessidade não pode deixar de resultar da existência de empreendimentos, nascidos, por sua vez, de um clima de atracção de capitais fundamentado nas suas razões ambientais determinantes - boa reprodutividade e confiança.
Se quisermos aumentar o povoamento do nosso ultramar através da raiz europeia, imperativo para o seu progresso, estabilidade e bem-estar social de todas as etnias, o mesmo tem de ser conseguido através do desenvolvimento económico do território.
O desenvolvimento económico, que pode apresentar-se como um fim a atingir, toma neste caso a forma de um meio - o meio de se obter o fim mais elevado e necessário do rápido aumento populacional, em prolongamento firme das nossas raízes em África e consolidação do nosso direito incontestável de estar.
Chega-se, assim, à necessidade de abordar o estudo da política económica para se chegar a conclusões sobre o povoamento. Na verdade, é a situação económica que constitui a espinha dorsal para as realizações de ordem social, para o progresso e bem-estar das populações, e para a própria estabilidade política de qualquer país. No caso do ultramar, e dentro do conceito moderno existente na evolução das doutrinas económicas, Portugal segue o sistema da integração económica.
A ideia de integração, quando aplicada à economia, significa um sistema que elimina barreiras entre economias diferentes, e tanto se pode aplicar a certos e determinados produtos ou actividades como entre países diferentes ou entre parcelas de um mesmo país, como é o nosso caso. Este sistema, tal como os antecessores que se alicerçaram em doutrinas que fizeram a sua época, terá também o seu fim, e certamente dará lugar a novo sistema quando vierem bem ao de cima os seus defeitos. Da mesma forma como o mercantilismo se viu destronado no século XVIII pelo aparecimento da escola fisiocrata e do livre-cambismo, e estas doutrinas cederam, por sua vez, o lugar aos sistemas proteccionistas, o sistema de integração económica, que se opôs a estes últimos, ver-se-á num futuro mais ou menos próximo também ultrapassado e substituído.
E não creio que seja muito distante o limite da sua vida, pois a integração económica que agora domina a ciência económica é de certo modo um regresso ao sistema livre-cambista do laissez faire, laisffez pattser, cujos inconvenientes, mais tarde aparecidos, provocaram a sua condenação. Efectivamente, essa doutrina, sabiamente explorada e difundida pela Inglaterra no início da era industrial, em cuja vanguarda se encontrava, pugnava, como àquela convinha, pela abolição dos direitos aduaneiros e defendia a livre troca da produtos, mas tinha, como teve, o grande inconveniente de arruinar as nações mais fracas de recursos ou de condições, em proveito das mais bem dotadas.
Compreender-se-á, assim, o pouco optimismo que tenho sobre o princípio da integração económica aplicado ao nosso ultramar, cujo atraso económico, diversidade de condições naturais, menor dimensão de mercado interno de cada território, relativamente à metrópole, o colocam um pouco na situação dos países que tiveram de contrariar o livre-cambismo doutrinado então pela Inglaterra. Efectivamente, a produção em grande quantidade para um mercado local de maior dimensão permite, com a abolição das barreiras aduaneiras, a venda noutro mercado, de menor dimensão, em condições que suplantam ou dificultam a sua produção própria já existente e anulam a iniciativa para novos empreendimentos. Prejudicando o que já existe, cortando-lhe a possibilidade de desenvolvimento, ou, pelo menos, de sensível e rápido desenvolvimento, contribui também decisivamente para anular o desejável espírito de iniciativa para novos empreendimentos.
Ë certo que a recente legislação sobre condicionamento industrial veio facilitar o panorama do desenvolvimento industrial em Angola, e certamente em todo o ultramar, mas é insuficiente para eliminar as dificuldades e para fomentar ali um espírito criador em larga e acelerada escala, como se impõe.
Dos ensinamentos que a sucessão das doutrinas e teorias económicas têm deixado, entendo que, da mesma maneira como nenhuma se mostrou perfeitamente inatacável com o decorrer dos anos, qualquer delas tinha, no entanto, a sua parte boa. Simplesmente, o que estava certo para determinado lugar ou em determinado momento, não se adaptava a outros lugares ou a outras épocas. Admito, por isso, a ideia de que em política económica não se devem estabelecer regras fixas e imutáveis, mas antes princípios baseados na experiência do passado, em que se aproveite a parte boa aplicável de cada uma das teorias ou doutrinas económicas, sem sujeição e nenhuma delas, e estruturados de forma a adaptarem-se com certa elasticidade às reais conveniências e necessidades, no tempo e no espaço, do todo nacional.
O bom princípio dos mercantilistas, de procurar vender mais do que comprar, a necessidade que os proteccionistas reconheceram de defender a produção própria mediante entraves à entrada de produtos concorrentes, o alargamento das áreas de produção e de consumo dos sistemas de integração económica, constituem, quanto a mim, realidades a ter sempre bem presentes, para com elas se constituir um sistema que atenda da melhor maneira a economia individual dos territórios componentes e a economia do conjunto nacional.
Conforme já assinalei, a necessidade de industrialização assume em Angola aspectos de imperativo nacional, como meio importantíssimo que é para se atingir o objec-
Página 633
19 DE MARÇO DE 1966 633
tivo mais alto do seu enriquecimento demográfico, pela absorção dos excedentes metropolitanos, que procuram, lamentavelmente, em terras estranhas a aplicação do seu trabalho. Creio bem que, dentro do espaço português, o fomento da industrialização deve ter em conta as condições especiais de cada parcela e a conveniência em acelerar ou actualizar mais o desenvolvimento económico das parcelas que se mostram mais atrasadas.
Olhando às condições próprias dos nossos diversos territórios, pela existência de matérias-primas, pelo custo da respectiva mão-de-obra, pelo preço da energia, pelo preço dos transportes para fazer chegar as matérias-primas ao local da sua laboração e dos produtos fabricados aos principais locais de consumo, chega-se, matemática e objectivamente, ao conhecimento da localização ideal para cada indústria dentro do espaço português. Fazendo intervir um factor de correcção pela conveniência em acelerar o desenvolvimento económico de uma parcela que se mostre mais necessitada, ou ainda por motivos de ordem política, social, de estratégia ou de segurança, ficará o Governo habilitado a dirigir para o bom caminho os investimentos industriais, em defesa do bem comum, procurando distribuí-los no espaço da forma mais racional e harmoniosa com os superiores interesses da Nação.
Sr. Presidente: É, pois, pensando na necessidade de se acelerar o desenvolvimento económico de Angola, como meio de ajudar a promover o seu povoamento, em harmonia de quantidade e de qualidade dos seus componentes, que peço à nossa Administração, além da revisão do sistema de povoamento agrário, para atentar nos inconvenientes que lhe são trazidos, e possivelmente ao restante ultramar, com a integração económica, e nas vantagens que lhe adviriam, como território de economia diferente e menos desenvolvida, com medidas proteccionistas para o que nela puder ser produzido ou transformado.
A integração económica deve ser adaptada e adaptada de forma a permitir e garantir o mercado consumidor de todo o espaço económico português apenas para as indústrias consideradas nacionais, de forma a permitir o seu dimensionamento em medida que lhe faculte a possibilidade de se lançar, com um bom mercado interno atrás, na competição internacional, o que pode ser positivo se a sua instalação tiver sido feita no local matematicamente indicado como o melhor, o qual pode até não coincidir com o das matérias-primas. Mas já para as restantes indústrias, de escala regional ou territorial, há que defender a sua instalação nas diversas parcelas territoriais, de forma a contribuírem localmente para o aumento do seu ritmo de crescimento e desenvolvimento.
Sei que o meu pessimismo quanto à política de integração económica não coincide com o pensamento dos nossos economistas responsáveis pelo rumo traçado para a política económica seguida, e só não fico preocupado com o facto por ter a consoladora certeza de não ser economista nem técnico de política económica. Todavia, não posso deixar de associar às considerações que fiz a circunstância de ter ouvido nesta Assembleia, em vozes autorizadas, e ter lido na própria Lei de Meios, a preocupação que existe em face das assimetrias regionais metropolitanas nos níveis de desenvolvimento e o desejo do Governo de procurar contrariar as disparidades geográficas do desenvolvimento, de assegurar o equilíbrio demográfico e de criar condições que permitam o progresso das regiões maus atrasadas .através da programação ou planeamento regional. E se o fenómeno é verificado nos escassos 89 000 km2 do território geograficamente contínuo e semelhante da metrópole, não sei a que grau de assimetria no desenvolvimento uma integração económica com Angola conduzirá aquela nossa província. Tenho dito.
Vozes: -Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Nunes Barata: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O turismo internacional continua a conhecer uma extraordinária expansão.
Segundo o relatório anual da O. C. D. E. de 1965, o movimento turístico de 1964 deve ter ultrapassado os 100 milhões de turistas, traduzindo-se1 as respectivas receitas em mais de 10 biliões de dólares, ou seja, em qualquer dos casos, num acréscimo de 15 por cento relativamente ao ano anterior.
Destes números, 8o por cento dos turistas e 80 por cento das divisas dizem respeito aos países membros da O. C. D. E., o que permite pôr em relevo a sua preponderância, e sobretudo a dos membros europeus, neste movimento turístico mundial.
As receitas turísticas dos países da O. C. D. E., mesmo sem incluir as dos transportes internacionais, constituíram, em 1964, mais de 6 por cento das suas receitas totais (visíveis e invisíveis), tendo atingido nalguns países valores bem mais expressivos: entre 10 e 20 por cento das receitas totais na Áustria, na Grécia, na Irlanda, na Itália e na Suíça e mais de 40 por cento na vizinha Espanha.
O milagre espanhol é realmente, extraordinário. Em 1965 os rendimentos brutos do turismo externo proporcionaram à Espanha 1158,8 milhões de dólares, ou seja mais de 32 .milhões de contos.
O turismo das massas gerou a explosão turística. A democratização do turismo é o resultado da promoção económico-social do mundo moderno, correspondendo ainda, no plano psicológico, ao «complexo ,de evasão de todas as rotinas, à fuga do meio em que habitualmente se vive, à ânsia incontrolável de viajar para conhecer novos povos e paisagens, à comunhão profana com a Natureza, à renascida procura do sol, do mar, da montanha e da neve».
Em 1950 visitaram Portugal 70 000 turistas, a Jugoslávia, 41 000 turistas, e a Áustria, 856 000 turistas. Pois, em 1964 o número de turistas atingiu em Portugal 1 008 000, na Jugoslávia, 2 227 000, e na Áustria, 6 157 000!
O essor turístico verificado em Espanha, na Jugoslávia, em Portugal ou na Grécia tem sido animado pelo baixo custo de vida. A defesa dos preços constitui assim um elemento nada despiciendo para a manutenção das correntes turísticas.
Em Itália, por exemplo, estimou-se que 40 por cento das dormidas dos turistas em 1963 foram noutros meios complementares de alojamento, que não os hotéis. Na Holanda as dormidas nos parques de campismo representaram 50 por cento das dos hotéis, e na própria Espanha corresponderam já a mais de 4 300 000 noites.
Por toda a Europa se vem sentindo uma acção persistente, dos governos relativamente à atracção do turismo internacional. Facilidades em vistos e passaportes, eliminação de entraves alfandegários, liberdade no movimento de divisas, campanhas de publicidade, tudo faz parte desses programas.
Mas é em matéria de transportes e de alojamentos que as estatísticas têm conhecido variações mais espectaculares.
Página 634
634 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 36
Em 1962 o parque automóvel, na Europa da O. C. D. E., ultrapassava os 28 milhões de viaturas, ou seja duas vezes e meia as existentes em 1953. Daqui a necessidade de rever a rede europeia de estradas, concebidas, em boa «parte, ,para o tráfego do século passado e onde ainda hoje a extensão das auto-estradas não atinge os 8000 km.
As grandes realizações dos últimos anos, como o túnel do Grande S. Bernardo (Suíça-Itália), o túnel do Monte Branco (França-ltália), o túnel de Guadarrama (Madrid-La Coruña). a nossa ponte sobre o Tejo (Lisboa-Algarve), a Auto-Estrada do .Sol (.Norte-Sul de Itália), a auto-estrada do Mediterrâneo (costa da Espanha), representam um esforço cuja repercussão no movimento das correntes turísticas não pode ser minimizado.
As opções do turismo internacional parece acentuarem-se, quanto a transportes, na utilização do automóvel para visita aos países limítrofes e do avião nas deslocações a maiores distâncias. Em 1964, dos turistas que visitaram a Espanha e a Itália, 75 e 72 por cento, respectivamente, utilizaram o automóvel, ao passo que no Japão e na Grécia o avião foi preferido por 75 e 52 por cento, respectivamente.
O tráfego aéreo sobre o9Atlântico norte registou, em 1964, mais de 4 250 000 passageiros, com um acréscimo de 18 por cento relativamente a 1963. De resto, o movimento nos grandes aeroportos europeus continua a acusar números record: Londres, com 10 582 000 passageiros; Paris, com 5 761 000; Francoforte, com 3 927 000; Roma, com 3 425 000. O próprio aeroporto de Lisboa, na sua modéstia (894000 passageiros), foi o que em 1964 acusou uma maior percentagem no aumento de passageiros (40,5 por cento).
Quanto ao equipamento hoteleiro e outras fórmulas complementares de alojamento, o esforço desenvolvido na Europa tem sido igualmente relevante. Em 1964 a Espanha aumentou em 15 por cento o número de camas disponíveis em hotéis e a Grécia em 9 por cento. De resto, no Plan de Desarrollo Económico y Social (1964-1967) foi previsto um investimento de 30 000 milhões de pesetas em hotéis e 12 400 milhões em outros alojamentos extra-hoteleiros, ou seja, portanto, em conjunto, de mais de 22 milhões de contos.
O turismo passou a constituir em muitos países um dos sectores mais considerados nos planos de desenvolvimento económico-social.
A importância que lhe foi dada no Plan de Desarrollo espanhol ressalta, desde logo, do montante dos investimentos programados para o período de 1964-1967: 51 108 milhões de pesetas, ou seja cerca de 26 milhões de contos.
Em Itália, o plano de 1965-1970 prevê igualmente investimentos de vulto, orientados para o desenvolvimento e modernização do equipamento hoteleiro e valorização de novas regiões onde os recursos turísticos são hoje potenciais. O programa de desenvolvimento turco considera o equipamento turístico, a formação de pessoal hoteleiro e a intensificação da publicidade, no estrangeiro. Finalmente, o segundo plano nacional da Irlanda, partindo de uma estimativa de duplicação, das receitas turísticas entre 1960 e 1970, prevê investimentos necessários para responder a este surto na procura.
Mas o sucesso das grandes planificações turísticas depende também dos «pequenos pormenores». A experiência revelou a necessidade, para cada país, de definir as suas diversas regiões turísticas e de as articular nos esforços de desenvolvimento. O. turismo é um dos principais sectores no desenvolvimento económico regional.
O IV Plano francês, para lá dos objectivos gerais de desenvolvimento da capacidade hoteleira e fomento do turismo social, preocupou-se particularmente com a abertura e equipamento de novas regiões ou centros de turismo. A montanha, as termas, as águas interiores e as próprias regiões da beira-mar inaproveitadas conheceram uma valorização já hoje patenteada na reanimação económica que revelam. O plano regional do Languedoc-Roussillon, em execução, permitirá o descongestionamento da Cote d'Azur, com dez estações turísticas e uma capacidade de albergue para 800 000 pessoas.
Na Grécia as regiões da Tessalonica, do monte Atos, entre outras, dispõem igualmente de programas de desenvolvimento turístico. A Espanha, depois dos sucessos das Baleares e das Canárias, do milagre da Costa do Sol e da regionalização do Plan de Desarrollo, preocupou-se igualmente com a Costa Brava.
Na Córsega, o recurso a uma sociedade de economia mista para o equipamento turístico (S. E. T. C. O.) permitiu encarar o desenvolvimento desta ilha. O insuficiente equipamento hoteleiro levou a programar, através da referida sociedade de economia mista, a construção de instalações com 4000 camas. O esforço está em curso e a sociedade vende os hotéis que constrói, o que lhe permite anda prosseguir nos propósitos de dotar a Córsega com as necessárias infra-estruturas turísticas. E a ilha, que em 1959 recebera 50 000 turistas, foi já procurada, em 1963, por 180 000.
Sr. Presidente: Já noutra oportunidade referi nesta Assembleia algumas razões que fundamentam as possibilidades de atracção turística do nosso país:
Portugal dispõe de uma série de factores de atracção, fundados no clima, na topografia variada do território, no património histórico e cultural, no folclore e na mesa. A atitude simpática e prestável da população ajuda a manter uma atmosfera favorável. O desenvolvimento prodigioso do turismo internacional exige novas zonas de expansão, o que permite considerar o nosso território como um mercado potencial, uma grande reserva para o turismo. O Europeu do Norte tem a nostalgia do sol, do calor, do céu azul, das praias de areias cintilantes e águas límpidas. Daí o prodigioso incremento do turismo espanhol, italiano e jugoslavo. Daí, ainda, e perante a saturação de outras zonas, a necessidade de Portugal jogar a sua oportunidade, de reafirmar a justiça da sua cantada vocação de jardim da Europa à beira-mar plantado.
Assim, se o milhão e meio de turistas que nos visitaram, em 1965, constitui um sucesso que seria injustiça olvidar, as perspectivas futuras tornarão mais atractivos 0-5 esforços de valorização turística.
Creio que, na problemática do turismo em Portugal, três questões se mantêm bem vivas: a da estrutura administrativa; a do dilema turismo de qualidade-turismo de massas; e a da planificação e do desenvolvimento turístico regional.
Creio, não obstante os ajustamentos dos últimos anos, que o turismo continua a aguardar em Portugal uma estrutura administrativa compatível com a sua importância e perspectivas.
Nos domínios da Administração Central não seria inédita a sua elevação ao plano governamental. Tornar-se-ia mais efectiva uma coordenação a nível superior e criar-se-iam serviços convenientemente dimensionados.
Página 635
19 DE MARÇO DE 1966 635
Quando ao âmbito regional, creio-manterem actualidade as exigências que, noutra intervenção, sintetizei nestes termos:
Uma definição geográfica das zonas turísticas do País, em correspondência com as regiões consideradas num plano de desenvolvimento económico-social;
A outorga às comissões regionais de uma autoridade efectiva, com uma melhor ligação aos serviços centrais;
A possível manutenção de órgãos locais, atentos aos «pequenos pormenores», mas sempre colaborantes dos esforços de desenvolvimento turístico regional e nacional.
Quanto ao debate entre o turismo de massas e o turismo de escol, parece-me oportuno reproduzir aqui um passo do notável discurso que o Dr. Miguel Quina proferiu em Outubro de 1964 no encerramento do Congresso Nacional de Turismo:
Não creio admissível aqui soluções extremistas. Não podemos esquecer que os aumentos explosivos do turismo moderno se devem principalmente ao turismo de massas. Ignorar essa realidade e dimensionarmo-nos apenas ou principalmente para o turismo de escola, o turismo das camadas de mais alto nível económico è social, arriscar-nos-ia a ficar colocados fora das correntes turísticas da actualidade, pois tudo indica que, a curto prazo, fatalmente o turismo de massas será um importantíssimo componente da procura no nosso país. A opção consiste em retermos esse caudal, criando estruturas adequadas e permitindo o aproveitamento de preços que compensem as distâncias a percorrer, ou assistir à, absorção dessas correntes pelos países do litoral mediterrâneo.
Finalmente, em matéria de planeamento parece-me largo o caminho a percorrer. O capítulo sobre o turismo, no Plano Intercalar do Fomento, foi em si mesmo um testemunho das insuficiências que nos dominam, e a própria Câmara Corporativa, no respectivo parecer, enumerou alguns erros e dificuldades.
Mas se uma planificação não se pode realizar sem programas gerais, também é evidente que o seu sucesso, nomeadamente em matéria turística, depende do que se fizer no âmbito regional.
Importa definir em Portugal as grandes regiões turísticas, esboçar e articular os respectivos planos e executar uma política de desenvolvimento, na convicção de que o País é todo o território.
A Suíça optou sempre por uma programação de pequenos espaços, talvez na certeza que de outro modo o país em poucas horas seria percorrido e o turista deixaria de se instalar.
Guardadas as devidas .diferenças, talvez não fosse inteiramente despiciendo recordar entre nós a sabedoria deste pequeno grande povo.
Sr. Presidente: Chegou assim ao ponto fulcral desta intervenção: a defesa de uma política de desenvolvimento regional turístico e, mais concretamënte, a recomendação de que se considerem as potencialidades da região de Coimbra para aí a tornar efectiva.
No Centro do País acümulam-se riquezas turísticas de todos os matizes: cidades monumentais e de cultura, regiões montanhosas, estâncias secularmente consagradas, termas ricas de equipamento, praias de areia fina.
Em pouco tempo o turista salta da serra para o mar, da convivência com obras de arte para a contemplação do grande livro aberto da natureza.
Há, pois, uns tantos pólos de atracção que garantem o sucesso no desenvolvimento turístico da região.
Comecemos pelo mar.
A Figueira da Foz, já hoje de larga projecção internacional, merece sempre os mais rasgados elogios: o azul do céu, a rever-se na toalha líquida-, a intensa claridade, a passear pelos areais cristalinos, a silhueta de uma serra onde a luz se compraz em tons de doçura e de nostalgia.
O Sr. Aníbal Correia: -Muito bem!
O Orador: - A praia de Mira, menos conhecida, é igualmente importante, nomeadamente para o turismo médio. Foi ela, com sua paisagem natural e humana, o motivo de inspiração para algumas páginas dessa «elegia diáfana» que Eaul Brandão compôs - Os Pescadores.
O Sr. Júlio Evangelista: -Muito bem!
O Orador: - Se do mar regressarmos à zona de transição entre planície e a montanha, detemo-nos em Coimbra.
Que dizer desta terra maravilhosa que outros já não tenham dito? Como cantá-la, se ela foi sempre a grande inspiradora dos poetas de Portugal?
Na, verdade, casa-mãe da poesia, Coimbra evoca o amor, a grandeza ou até a desventura de tantos altos espíritos que no recolhimento das arcadas dos seus templos, no isolamento de miradouros famosos ou até nos ardores de um bulício todo feito de inconformismo juvenil abriram os caminhos da cultura, compuseram as mais belas páginas de uma literatura poética que não é pobre.
A sinfonia das inigualáveis matizes verdes da paisagem tradicional da região, que, em sua orquestração de tonalidades múltiplas e gritantes, constituiu estímulo aos almejo do poeta do Só, conjuga-se com a variedade, riqueza e equilíbrio do conjunto monumental e urbanístico, que se desenvolveu à volta do velho centro universitário, tudo compondo cartaz turístico, principal entre os primeiros da nossa terra.
E desta cidade podemos irradiar para estâncias como o Buçaco, termas como a Cúria .e o Luso, sítios históricos como Conímbriga ou Lorvão, regiões de montanha como toda a Beira interior.
No ano de 1965 pernoitaram em Coimbra 52 302 turistas estrangeiros e na Figueira da Foz 18 966.
Estes números, que não deixam de ser expressivos, devem ligar-se ao intenso turismo de passagem e ao movimento do turismo interno para permitir uma visão da actual importância turística da região.
Mas, se atendêssemos ao depoimento de muitos destes homens que avolumam as estatísticas, talvez fosse possível seriar alguns problemas que nos envergonham e enfraquecem. Porquê estradas tão necessitadas de rectificações, alargamentos e revestimento betuminoso? Porquê aglomerados urbanos típicos sem acesso ou abandonados ao mau gosto dos novos ricos? Porquê lagoas sem um mínimo de aproveitamento desportivo? Porquê praias maravilhosas sem urbanização, água e luz? Porquê florestas sem repovoamento cinegético ou inacessíveis aos campistas? Castelos restaurados estão desertos, sem qualquer aproveitamento. Campos de aviação encontram-se fechados à aviação civil ou não beneficiam de um .mínimo de reparações que os tornem praticáveis. Hotéis, pensões e restaurantes não dispõem de uma exploração equilibrada ou acusam uma ausência de ajuda material que lhes torna a existência penosa. A própria vida nos centros urbanos
Página 636
636 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 36
carece de um mínimo de distracções sempre procuradas pelos que amam a evasão na animação do convívio.
Não vou, Sr. Presidente, sumariar aqui as aspirações do distrito de Coimbra para a sua valorização turística. Permito-me, contudo, juntar em apêndice a esta intervenção uma lista das necessidades mais urgentes e para a satisfação das quais peço a ajuda do Governo.
Em conclusão:
A região de Coimbra aguarda a definição e execução de uma política de desenvolvimento regional ainda em matéria de turismo.
As medidas a tomar preocupar-se-ão também com as respectivas estruturas institucionais de forma a torná-las aptas ao bom desempenho da sua importante missão.
Enquanto tal política não se inicia, esperamos ao menos do Governo que atenda às várias necessidades do distrito, necessidades que sumario no apêndice junto.
Valha a verdade que, se o nosso apelo for desde já escutado, Coimbra saberá também corresponder à confiança que milhões de turistas depositarão nos anos futuros em Portugal.
Vozes: -Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Correia Barbosa: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pêlos mais ilustres e qualificados Deputados e até pela voz autorizada de V. Ex.ª, Sr. Presidente, que ao acto emprestou a solenidade que advém do prestígio do seu nome, foi aqui há dias posto em relevo, com o maior brilho, o significado histórico da revolução de 28 de Maio de 1926, data gloriosa que há-de, indiscutivelmente, marcar um lugar de acentuado relevo nos fastos da história pátria, pois foi a partir daí que Portugal, mergulhado há algumas décadas numa apagada e VII tristeza que o acorrentava e tolhia todos os seus movimentos, principiou a despertar, reencontrando o caminho do progresso e do engrandecimento nacional.
De facto a arrancada do 28 de Maio trouxe a todos os portugueses, principalmente aos jovens de então, que, como eu, aspiravam por uma pátria redimida e prestigiada, um clarão de esperança que encheu todas as almas, incutindo-lhes uma forte convicção nas virtudes e nas possibilidades da raça.
Não foram iludidas essas esperanças, Sr. Presidente e Srs. Deputados, porque Portugal de norte a sul e de nascente a poente sofreu uma sacudidela que o renovou completamente, não só insuflando-lhe ar novo nos bafei-tos métodos da governação, mas também, e muito principalmente, na mentalidade dos portugueses, que principiaram a acreditar nas suas possibilidades e nos recursos extraordinários de um povo que despertava para uma vida nova.
E assim, sob a chefia de um homem de estatura incomensurável sob todos os aspectos, cujo nome a história de Portugal e até a da humanidade há-de recolher com a maior admiração e respeito, principiou a moralizar-se, a prestigiar-se e a engrandecer-se até ao ponto de impor-se à consideração de todos os portugueses de boa fé e do estrangeiro, que, durante tanto tempo, não acreditou numa recuperação nacional.
E ninguém, nenhum homem de inteligência esclarecida e desapaixonada, nenhum português digno desse nome e que no seu peito sinta o orgulho de pertencer a uma raça que levou aos confins do Mundo o facho da civilização cristã e com dignidade e aprumo soube defender o direito e a justiça, poderá com razão dizer ou afirmar que o País durante estes 40 anos não se engrandeceu, não se desenvolveu e, se não fora uma guerra que apetites insofridos vindos do estrangeiro nos movem no ultramar, não tenha gozado de paz e tranquilidade.
Restauraram-se as finanças arruinadas; fizeram-se obras de fomento que causam a admiração de nacionais e estrangeiros, algumas das quais, durante anos, consideradas irrealizáveis; prestigiou-se o País, impondo-o à consideração dos meios internacionais; realizou-se, dentro do possível, a promoção das classes trabalhadoras, e só por facciosismo ou maldade deixará de reconhecer-se que o nível de vida dos Portugueses sofreu uma apreciável melhoria. E inegável que o País enriqueceu e, se exceptuarmos os funcionários públicos, que vivem horas de verdadeira amargura, e o sector da lavoura, que não está em situação brilhante, como há dias o Sr. Ministro da Economia o reconheceu em Évora, todas as classes têm sentido os benéficos efeitos da governação séria e honesta das últimas quatro décadas.
Vem isto para dizer, Sr. Presidente, que se justificam plenamente as comemorações e os actos festivos que se preparam para assinalar este período de 40 anos de Governo.
E de entre esses actos com que se pretende marcar indelevelmente tal período é justo realçar, pelo que ele representa de espírito de justiça, de interesse pelo bem comum e pela causa do engrandecimento de Portugal, a decisão do Sr. Ministro das Obras Públicas de levar a efeito, com a colaboração das câmaras municipais, um melhoramento em todas as freguesias do País que fique a atestar não só uma época de paz e de progresso, mas também, e principalmente, o espírito que sempre presidiu na governação pública de que todo o território nacional não seja esquecido e comparticipe do bem, do impulso civilizador que o Estado com tanto acerto vem espalhando e imprimindo. E a esse espírito de justiça, do interesse pelo desenvolvimento do bem-estar e comodidade de todos os povos e regiões «nacionais, tantas vezes manifestado por S. Exª. o Ministro das Obras Públicas, que eu desejo render o preito da minha maior e entusiástica homenagem.
E eu, que represento um distrito em franco desenvolvimento, quer sob o ponto de vista material, quer sob o ponto de vista económico e espiritual, quero aqui deixar bem vincada a minha grande admiração pelo critério de equidade na distribuição de todos os benefícios que o Estado sempre se propõe espalhar.
Nada de particularismos ou simpatias por esta ou por aquela região, pois todo o território que se contém dentro das fronteiras sagradas da Pátria é Portugal, que todos nós queremos ver cada vez maior e mais próspero. E, dentro de cada região, nada também de distinções, que só servem para gerar confusões e mal-entendidos.
Eu represento aqui, repito, um círculo e pertenço a um distrito que foi indiscutivelmente um presente de Deus pelas suas belezas e pelos seus encantos e até pelo carácter do seu povo, que faz do trabalho e da honradez o timbre da sua melhor nobreza.
E se é certo que a orla marítima a todos aios prende e encanta pelas suas praias admiráveis e até pela riqueza piscatória que nos fornece, se a ria é um forte motivo de atracção para nacionais e estrangeiros pelas suas belezas incomparáveis, não é menos certo que a parte interior do distrito, com as suas montanhas, com a sua pradaria alcantilada e verde, os seus vinhedos, as suas densíssimas florestas, "os seus monumentos, os seus parques admiráveis, os seus centros fabris e industriais, onde de dia para dia cada vez se acentua mais uma intensa vida económica que faz o engrandecimento e a prosperidade da Nação, merece indiscutivelmente a atenção dos Poderes Públicos no sentido da sua valorização. Torna-se necessário olhar
Página 637
19 DE MARÇO DE 1966 637
atentamente para algumas zonas interiores do distrito de Aveiro, promovendo numas a sua industrialização, noutras fomentando e amparando a sua agricultura e ainda noutras explorando as suas incomparáveis belezas naturais, transformando-as em verdadeiras regiões de turismo, para o que têm condições excepcionais.
E indispensável, Sr. Presidente, que esse espírito de justiça e de equidade na- repartição do bem comum, de que o Sr. Ministro das Obras Públicas tem dado sobejas provas, se acentue cada vez mais, se espalhe por todo o território nacional com a mesma intensidade, de forma a que dentro em breve Portugal seja aquele país admirável, progressivo e próspero procurado por todos os estrangeiros que tenham necessidade de alguns dias de paz e de beleza que extasie os seus sentidos.
Ë forçoso que todos os Ministérios, todas as direcções-gerais e repartições públicas abracem e intensifiquem esse espírito de dinamismo e de justiça que o Sr. Ministro das Obras Públicas em boa hora impôs no seu Ministério, amparando ao mesmo tempo todas as iniciativas privadas, que mais não querem do que a valorização das suas terras, com sacrifícios enormes das suas bolsas, do seu tempo e dos seus afazeres particulares e até da sua saúde.
E indiscutivelmente Vozes: -Muito bem, muito bem! O orador foi muito cumprimentado. O Sr. Francisco António da Silva: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Em cerimónia realizada no Gabinete de S. Ex.ª o Ministro das Obras Públicas já tive oportunidade, por honrosa delegação dos presidentes dos Municípios do Alto e Baixo Alentejo, de agradecer ao Governo, na pessoa do Sr. Eng.º Arantes e Oliveira, a criação da Comissão Coordenadora das Obras Públicas no Alentejo. No entanto, e porque me parece que com isso sirvo a região que tenho a honra de representar, não quero deixar de assinalar nesta "Câmara a passagem do 10.º aniversário daquela Comissão, porque, constituindo a sua criação uma importante medida do Governo {para a resolução de problemas locais, a sua projecção atingiu, contudo, uma região que corresponde a cerca de um terço do território metropolitano. Nestes dez anos de actividade a C. C. O. P. A. desempenhou um papel de maior relevância no desenvolvimento social e económico de toda a região transtagana. Criada para combatei1 as crises cíclicas de desemprego rural, que constituíam um flagelo do Alen-tejo, conseguiu, mercê da elaboração de criteriosos programas de trabalho e do entusiasmo, da dedicação e até do sacrifício dos-seus ilustres componentes, absorver quase com-pletamente a mão-de-obra sobrante das tarefas agrícolas, aplicando-a na execução de melhoramentos de utilidade p interesse públicos. E desta, forma foi possível, não só dar concretização à letra da Portaria n.º 15 757, de 7 de Março de 1956, como ainda ultrapassá-la nos seus objectivos humanos. À letra da lei sobrepôs-se o espírito, transformando uma obra de fomento numa extraordinária obra de coração, enriquecendo as populações de melhoramentos materiais e garantindo ocupação regular aos rurais, contribuindo desta forma para saciar muitas bocas injustamente vítimas das deficientes estruturas- económicas do Alentejo. Tendo ao seu dispor os meios financeiros necessários e técnicos de reconhecida competência, elaborando, planos de trabalho fundados nas necessidades prioritárias das populações, a Comissão Coordenadora, nos dez anos da sua actividade, dotou o Alentejo, todo o Alentejo, de um sem-número de empreendimentos que melhoraram as condições de vida das suas gentes, ao mesmo tempo que as fixavam à terra, pela garantia de emprego, evitando o descalabro que representaria para a economia regional a emigração total dos seus melhores valores de trabalho. Vozes: -Muito bem I O Orador: - Assim foi possível ainda facilitar a- administração dos municípios, cujas receitas, muitos vezes, mal chegam para satisfação dos encargos obrigatórios, e que assistiam, quase impotentes, ao degradante espectáculo de homens válidos que, torturados pelo desemprego forçado, tinham de mendigar pão para si e para os seus. E pelo trabalho que o homem se dignifica. E foi com esse objectivo elevado, de -profundo alcance político e social, que o ilustre Ministro das Obras Públicas, sempre atento às necessidades do País, criou a Comissão Coordenadora, que tão altos serviços iria prestar no futuro. Pela grandeza da obra realizada pôde, ao mesmo tempo, mostrar-se que, apesar dos sacrifícios que a Nação suporta com a defesa intransigente e sagrada dos nossos territórios do ultramar, descobertos e desenvolvidos pelo génio português, é ainda possível, graças à política financeira do Governo de Salazar, prosseguir uma notável obra de fomento, que tem modificado a face do País. Para ser mais preciso, e socorrendo-me dos dados estatísticos insertos numa elucidativa .publicação, salientarei que, no conjunto do Alto e do Baixo Alentejo, no decénio de 1956-1965, aquele organismo empregou cerca de 23 milhões de homens-dias de trabalho, ou seja o equivalente a 80 por cento da mão-de-obra sobrante da agricultura, com um dispêndio superior a 2 300 000 contos, dos quais aproximadamente 700 000 contos foram aplicados no pagamento de salários. O Ministério das Obras Públicas e a Comissão Coordenadora, em realizações do Estado e em comparticipações com as autarquias locais e outras entidades, construíram e melhoraram rodovias nacionais e municipais, executaram obras de hidráulica e de salubridade e realizaram importantes melhoramentos urbanos. Se a estas obras se acrescentarem outras de importante significado económico, como as de arborização, ide regas, de drenagem, surnibas, plantações, e de oficinas tecnológicas, ter-se-á avaliado a projecção da obra executada nos últimos dez anos. O Sr. Ferrão Castelo Branco: V. Exª dá-me licença? O Orador: - Com todo o gesto. O Sr. Ferrão Castelo Branco: - Tenho estado a ouvir com a maior atenção a exposição de V. Exª e sei que V. Exª, como ilustre e dinâmico presidente da Câmara/Municipal de Cuba, conhece em pormenor essa obra grandiosa da C. C. O. P. A. E como V. Exª acaba de dizer, para o Alentejo e para todo o Sul do País - os seus números, no que se refere à província do Baixo Alentejo, foram, se não estou em erro, da ordem dos 910 200 contos quanto a pagamento de salários - essa obra, que é a todos os títulos notável, trouxe muita melhoria ao Baixo Alentejo.
Página 638
638 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 36
A mim apresenta-se-me simplesmente o ensejo de lembrar aqui que uma das obras importantes levadas a efeito justamente ,por essa Comissão ficou incompleta, e essa é uma das rodovias mais importantes e de maior projecção económico-social na província do Baixo Alentejo: a variante de Baleizão. Essa variante, como V. Exª sabe, foi feita para derivar a estrada que passava pela antiga aldeia e foi entroncar na parte pior, pior no sentido de trânsito: aquela que está ao pé da ponte sobre o rio Guadiana.
E mais. É também um grande anseio o ver construída a nova ponte. Parece que esta ponte do Guadiana, de passagem da estrada que vai de Beja para Serpa e para a fronteira de Exsalho, servindo Moura e seu termo, deve ser única no Mundo, porque é mista para rodovia e trânsito para caminho de ferro.
Oferece-se-me esta oportunidade de lembrar ao Sr. Ministro das Obras Públicas esta necessidade premente, não só para a economia do Baixo Alentejo, como até para os fins turísticos, hoje tão meritoriamente acalentados pelo Governo.
O Orador: - Tem V. Exª. muita razão e muito obrigado!
Por isso, sinto que é meu dever, em .nome das populações que represento nesta Câmara, reafirmar aqui o agradecimento devido ao Governo e ao ilustre Ministro das Obras Públicas por tão vasta obra.
O Alentejo sente-se reconhecido, mas espera que o Governo, com a mesma firmeza e o mesmo sentido das realidades, resolva também em prazo breve, como, aliás, já foi prometido, os instantes problemas da economia alentejana. Urge que os, planos de valorização regional sejam promulgados, que se defina a política económica a seguir, para que sejam criadas novas perspectivas à lavoura alentejana.
Os notáveis diplomas que promulgaram o último regime cerealífero e o fomento pecuário carecem de ser completados com medidas eficientes, que tirem a lavoura alentejana da intranquilidade e da situação angustiosa em que se encontra. Acreditamos na capacidade realizadora do ilustre Ministro da Economia, na larga experiência de estadista e de técnico do Sr. Secretário de Estado da Agricultura e no profundo conhecimento das necessidades do Alentejo do Sr. Secretário de Estado da Indústria, para que, através de um conjunto de medidas que abranjam a agricultura e a indústria, se modifique o panorama económico desta região, sujeita às vicissitudes do clima, e esgotada na sua capacidade financeira pelos condicionalismos decorrentes de uma série de maus anos agrícolas.
O Alentejo é um campo vasto, rico de potencialidades. Mas no momento actual é também cenário de muita desolação. É imperioso, por isso, revitalizá-lo, conjugando a acção do Estado com a iniciativa particular. Ao Governo compete definir o sentido da evolução. Â. iniciativa particular compete executá-la, dentro dos princípios que forem estabelecidos e dos meios postos ao seu dispor. A próxima conclusão da 1.ª fase do Plano de rega torna ainda mais premente a necessidade de definição da sua exploração económica. A água é fonte de riqueza, mas é necessário explorá-la racionalmente, em obediência a planos estabelecidos previamente e que tenham em atenção a rentabilidade das culturas e as possibilidades de comercialização dos seus produtos.
A improvisação, característica tão portuguesa, tem de ser superada pela racionalização, de forma que se caminhe esperançosamente para um objectivo definido.
No momento em que um extraordinário surto industrial se verifica no País, o que só abona o sentido de previsão do Governo, torna-se necessário alargar cada vez mais ao Alentejo os benefícios da industrialização, de forma a compensá-lo da deprimente situação da sua agricultura. Sendo a região do País de menor densidade demográfica, é, ao mesmo tempo, a região de menor densidade industrial. Por isso mesmo nos parece da maior conveniência estimular a fixação de indústrias nas amplas planícies alentejanas, que criem novas fontes de trabalho e contribuam para fixar as suas populações e lhes dêem um melhor nível de vida, de que tão carecidas estão.
Estou certo de que todos os municípios do Alentejo acolherão de braços abertos os empreendimentos que se destinem a esse objectivo. Todos procurarão conceder as facilidades que estiverem ao seu alcance. E por isso, com o estímulo do Estado, a iniciativa privada poderá encontrar aí um largo campo de acção, que muito contribuirá para a valorização económica e social do Alentejo e do País.
Confio no Governo, como sempre, para o conseguir.
Tenho dito.
Yozes: -Muito bem, muito bem! O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Elísio Pimenta:-Sr. Presidente: Em 5 de Julho de 1947 a Direcção-Geral de Administração Política e Civil do Ministério do Interior enviou um ofício - ao Sindicato Nacional dos «Médicos Veterinários comunicando que os reparos do mesmo Sindicato relativos à melhoria da situação dos veterinários municipais perante as respectivas câmaras seriam considerados na futura revisão do Código Administrativo.
Isto passou-se em 1947, há, portanto, quase dezanove anos.
Há dezanove anos, portanto, já os médicos veterinários faziam representações ao Governo, através do seu organismo sindical, sobre uma situação que desejavam fosse revista, por não estar de harmonia com as realidades, e a Administração Central prometia expressamente considerá-la na devida oportunidade, que seria a de uma projectada reforma do código, em cujas disposições se encontravam integrados como funcionários municipais.
Pois bem, em 1955, isto é, oito anos depois, foi dada uma nova redacção ao artigo 649.º do Código Administrativo e isso serviu de motivo, não a que se atendessem as legítimas aspirações dos interessados quanto a remunerações, manifestamente incompatíveis com a dignidade da sua posição social e da categoria das funções públicas que exercem, mas, pelo contrário, a uma interpretação que fez diminuir os magros proventos de uma classe de funcionários à qual são exigidas todas as obrigações no sentido da defesa sanitária das populações e negados os elementares direitos a uma vida familiar decente.
Haverá, porventura, exagera nas minhas palavras?
Estou certo de que ninguém assim as poderá entender, quando atente na circunstância desprestigiaste para a própria Administração de reconhecer a razão que assiste aos reclamantes, mas, em contrapartida, permanecer, durante quase vinte anos, surda aos seus clamores e às vozes que nesta Assembleia, em pareceres jurídicos e na imprensa não calam a sua inconformidade perante uma situação contraditória, mitigada com o conforto ilusório das promessas.
Lembro-me do Prof. Afonso Queiró, autor de um notável parecer jurídico sobre a interpretação feita pela Direcção-Geral ao problema das inspecções às reses abatidas
Página 639
19 DE MARÇO DE 1966 639
fora dos matadouro» municipais ou de outros locais apropriados, prática que a lei proíbe, mas que, autorizada por razões de interesse público ou de comodidade dos que as requerem, representam um encargo pesado e gratuito para os veterinários: e um rendimento apreciável para os municípios.
Pois dizia o Prof. Queiró, no prólogo de um volume publicado pelos médicos veterinários sobre a questão:
Tive um dia de procurar demonstrar a falta de fundamento jurídico da orientação interpretativa que a Administração: Central procurava impor às câmaras municipais em matéria de percebimento de emolumentos por parte dos veterinários dos partidos. Fi-lo, naturalmente, com a preocupação da objectividade que, por norma, me imponho na elaboração de estudos desta ordem - mas tenho de confessar que, durante a investigação a que tive de proceder, me foi extraordinariamente difícil não me deixar perturbar pela santa indignação que de mim se foi apoderando, à medida que me inteirava da confrangedora dureza com que os- veterinários dos partidos vinham a ser tratados por ela e, par obra da sua longa manus na administração local, pelas autarquias municipais onde servem.
Puseram-se-me os cabelos em pé ao certificar-me do nível das remunerações para que estavam sendo atirados estes funcionários., e não fiquei menos perturbado ao aperceber-me do afinco com que, mobilizando a sua competência legislativa, a dita Administração Central procurou entretanto tapar as portas que se mantinham abertas para uma interpretação razoável dos textos legais em vigor sobre o assunto.
Estas palavras era preciso que se conhecessem, e eu não as saberia dizer, porque definem verdadeiramente a problemática da questão.
A atitude do ilustre mestre de direito não é singular. Aqui, nesta Assembleia, levantaram a voz no mesmo sentido o meu querido amigo Dr. Urgel Horta, em 1960 e 1961 e por instâncias minhas e de um numeroso grupo de médico veterinários, depois o Dr. Augusto Simões e não há muitos dias o nosso ilustre colega Sr. Deputado Lopes Frazão, embora em breve apontamento.
O problema é simples: os veterinários de partido auferem os ordenados de 2300$, 2200$ e 2100$, conforme os concelhos a que pertencem.
Por seu lado, os veterinários do Estado vencem 6500$, 5400$ e 4000$.
Uns e outros podem exercer livremente a1 clínica, com a simples diferença de que, enquanto a maior parte dos 200 e tal veterinários de partido trabalham em concelhos rurais, pobres, sem economia capaz de compensar a magreza daqueles ordenados e ainda em regime de concorrência, os últimos vêem normalmente acrescer aos seus vencimentos; também baixos, é certo, outras possibilidades que o meio lhes proporciona.
A Administração Central, tutora da administração local, não deixa, de vez em quando, de manifestar o seu interesse na solução do problema, mas os anos vão passando - recordo novamente que há vinte anos que se vive de promessas!- e a solução, apesar dos protestos de boa vontade, continua fora do Diário do Governo ou de um simples parecer que modifique doutrina injusta, com a qual muitos não concordam.
Ainda recentemente, no Anuário da Direcção-Geral da Administração Política c Civil, foi publicada uma informação do Sr. Director - Geral, com data de 23 de Junho de 1965, na qual se procura justificar a duradoura inércia de quem tem precisamente por obrigação apresentar soluções viáveis e exequíveis no tempo, pelo menos a tempo de atender à angústia em que vivem tantos e tantos veterinários, como me dizia um deles, há dias, encostados a uma parede em ruínas, sujeita a todo o momento a derrocada, de que nada de bom poderá resultar.
Afirma-se nessa informação como se a situação tivesse surgido ontem, e não há vinte anos! que a Direcção-Geral, contrariamente ao que por vezes se tem feito supor, não se alheou do problema e, pelo contrário, algum esforço desenvolveu no sentido da sua solução em condições equitativas.
Presta-se justiça a esse esforço, que parece não ter sido muito, .segundo se confessa, e às boas intenções que animam a Direcção-Geral.
E assim é que na referida informação se lê, em resumo, que a Direcção-Geral enviou à Secretaria de Estado da Agricultura um parecer no sentido de se criar aos veterinários municipais uma situação idêntica à dos médicos municipais, uma subintendência de pecuária em cada concelho, com os vencimentos pagos em parte pelo Estado e em parte pelas coimaras, mas com a .condição de aqueles, os subïntendentes, ficarem vinculados às respectivas autarquias, e nunca fazendo parte de um quadro dentro da Direcção-Geral dos Serviços Pecuários.
Creio que a solução está certa em princípio e satisfará o interesse público e o desejo dos interessados, mas duvido de que ela possa ser executada tão depressa quanto é preciso, como impõe a crítica situação dos funcionários.
Duvido de que as circunstâncias anormais em- que o País vive e as próprias restrições postas pela Direcção-Geral conduzam a essa rápida solução. Melhor -seria continuar a estudar-se o óptimo e encontrar-se para já o sofrível. Ainda ontem li num dos diários da manhã, a propósito da decantada questão dos táxis de Lisboa, que existe neste país, no Estado e em certas instituições uma preocupação demasiada com o futuro, sacrificando-se-lhe aquilo que legitimamente pertenceria ao presente. Esta preocupação é louvável, mas, porque tantas vezes estática, conduz à estagnação dos problemas.
Melhor seria adoptar-se para já, e dada a situação angustiosa .por que passam os- veterinários de partido, a solução mais prática e mais exequível de lhes aumentar os vencimentos, o que não está fora das possibilidades das câmaras, sobretudo se nos lembrarmos de que nem em todas, nomeadamente nas de mais limitados* recursos, existem (providos esses lugares e que o encargo anual, por insignificante, como é fácil de demonstrar, pouco representaria nas finanças municipais.
Em relação aos abates ilegais, isto é, fora dos matadouros e dos locais apropriados - ilegais, porque a lei os proíbe, entenda-se, embora as câmaras os autorizem, com o silêncio ou sem o veto da Direcção-Geral, deve dizer-se que dão um rendimento apreciável aos municípios.
As taxas exigidas são superiores às dos matadouros, e os veterinários que nessas inspecções ocupam largo tempo da soía actividade sem qualquer provento ou indemnização recebem apenas um abono para transporte, que é de $60 ou de 1 $40, conforme os casos, quando se façam transportar em automóvel.
E esses abates tendem a generalizar-se, podendo avaliar-se em alguns concelhos na ordem das - dezenas ou até centenas de milhares de quilogramas por ano.
Perante tudo o que se vai passando, sem solução, pode alguém estranhar que a Escola Superior de Medicina
Página 640
640 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 36
Veterinária tenha uma frequência diminuta? Em 1963 formaram-se dez médicos veterinários; em 1964, catorze!
Perante o esforço que o Governo e a Nação procuram fazer para fomentar a pecuária na metrópole e no ultramar e a necessidade imperiosa de aumentar a defesa sanitária das populações, o que se passa com os veterinários municipais pode considerar-se de sinal negativo como estímulo para que a juventude escolha tão mal compreendida e ingrata carreira.
E a propósito de defesa sanitária, já alguém pensou nas quantidades de quilogramas de carne lançadas no consumo público por falta de inspecções sanitárias, sempre que os veterinários municipais, por doença ou por licença graciosa, que ninguém lhes pode negar, se não podem fazer substituir?
A situação exige medidas urgentes.
O Sr. Ministro do Interior é avesso a elogios e isso dá a medida do seu carácter. Nem eu, pela amizade que lhe dedico e pela consideração em que tenho as suas qualidades de estadista e de homem de bem, me atreveria a duvidar do seu desejo de (resolver o problema em questão, mesmo contra a persistência em opiniões com que se não pode concordar ou em soluções que, podendo ser boas, pecam por inexequíveis ou demoradas.
Pois dê o Sr. Ministro do Interior a sua palavra, palavra de equidade e de justiça, aquela palavra que caracteriza os bons governantes, como S. Ex.ª
Vozes: -Muito bem, muito bem! O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Calheiros Lopes: - Sr. Presidente: Não desapareceram ainda dos campos, nem dos espíritos das populações afectadas, as tristes e em muitos casos catastróficas recordações e consequências do flagelo das inundações que mais uma vez castigaram as terras ribeirinhas dos nossos principais rios, e, talvez em maior grau do que noutras regiões, do eterno mártir das cheias que é o Ribatejo.
Sem o menor propósito de dramatizar a situação e somente porque a conheço pessoalmente e repetidamente tenho nesta Assembleia solicitado para o caso as providências que podem, pelo menos, atenuá-lo, sinto-me no dever de mais uma vez me referir ao problema das inundações.
Creio firmemente que está no âmbito das funções representativas que me foram atribuídas fazer-me eco da tristeza e do desânimo que se apossam do homem dos campos perante a improficuidade dos clamores que ergue quando vê quase anualmente repetir-se o flagelo da invasão das suas terras - os muitos milhares de hectares da lezíria ribatejana - pelas torrentes caudalosas dos rios saídos dos seus leitos e que tudo arrasam e destroem e, como presentemente se verifica, depois de inutilizarem sementeiras e lavouras já feitas, tornam precário e arriscado, pelo atraso que ocasionaram, o cultivo das terras neste mesmo ano agrícola.
Ainda há dias, numa reunião em Santarém da Federação dos Grémios da Lavoura do Ribatejo, foi amplamente exposta a difícil situação criada à agricultura ribatejana pelas prolongadas inundações que tantos prejuízos vem causando.
Permita-me V. Exª. Sr. Presidente, que junte o meu apagado testemunho e reforce com o meu desvalioso apoio os rogos ali formulados para que se remedeiem, na medida do possível, os males recentemente sofridos - e para que se adoptem com a urgência necessária as providências que evitem, ou pelo menos atenuem, no futuro a sua repetição.
O Sr. Virgílio Cruz: - Muito bem!
O Orador: - Efectivamente, perderam-se totalmente sementeiras já feitas; em muitas explorações agrícolas nem foi possível fazerem-se, e não é já tempo de lançar ainda à terra qualquer semente.
Aos graves prejuízos individuais juntam-se os sérios reflexos que terá na economia nacional a falta de trigo o outros cereais, que vai obrigar-nos a volumosas importações para assegurar o abastecimento público. São igualmente más as perspectivas para a viticultura e para tantos outros sectores agrícolas.
Evidentemente, não resultam exclusivamente das desfavoráveis condições meteorológicas do Inverno último as dificuldades verdadeiramente inquietantes que a lavoura atravessa.
São múltiplas as causas, diversos os aspectos, da nossa crise agrícola.
Para a vermos debelada, na medida do possível, penso devermos confiar na acção esclarecida do Sr. Ministro da Economia, Dr. Correia de Oliveira, que tantas provas tem dado do interesse que lhe merecem os problemas da lavoura, à qual há que assegurar condições de trabalho que a coloquem, no conjunto das actividades económicas portuguesas, num nível mais aproximado de várias outras que desfrutam de muito mais feliz situação.
Vozes: -Muito bem, muito bem!
O Orador: - Também no panorama social se repercutem as consequências dos cinco meses de tempo adverso sofrido pelos nossos campos. Após uma crise de desemprego rural - que só não foi mais séria devido à intervenção das entidades oficiais, que concederam subsídios para obras de emergência -, começa a desenhar-se, à medida que as terras livres das águas se apresentam em condições de cultivo, a face contrária do problema: a procura desenfreada de mão-de-obra, toda a lavoura da Borda-d´Água a pretender recuperar o tempo perdido, sem que se possa considerar se os produtos a colher compensarão os excessivos encargos resultantes deste facto.
Ora, Sr. Presidente, este é, em traços gerais, o esboço da crise que a lavoura das zonas atingidas pelas inundações está sofrendo e continuará a sofrer ainda mais duramente no decorrer do ano agrícola há pouco, e com tão negro aspecto, iniciado.
Mas não foi somente para desenhar perante a Assembleia este triste quadro que estou usando da palavra.
Nem foi mesmo apenas para solicitar as providências que o Governo julgar oportunas para remediar até onde for possível a situação.
Penso que este recente exemplo de mais uma calamitosa cheia nas vastas lezírias e várzeas do Ribatejo, a somar à experiência de situações que quase anualmente se repetem, deve levar-nos a encarar com urgência e espírito prático de realização o que, como já mais de uma vez tive ocasião de afirmar neste lugar, julgo poder fazer-se para, se não evitar, pelo menos atenuar os efeitos e desastrosas consequências das inundações.
Na verdade, são igualmente graves os prejuízos e dificuldades de toda a ordem sofridos pelas populações das zonas inundadas no que respeita a transportes.
Este ano, durante vários dias, estiveram interrompidas as comunicações entre diversas povoações ribatejanas, muitas localidades viram-se praticamente isoladas. De Santarém para as terras da outra margem do Tejo só se passava de barco e para alcançar de Lisboa a capital ribatejana era necessário fazer um desvio que prolongava o percurso em muitos quilómetros.
Página 641
19 DE MARÇO DE 1966 641
Uma outra zona da estrada n.º 118, na altura da várzea de Samora, estrada de enorme trânsito, esteve também inundada e sem dar passagem durante dias. E, contudo, lembro que para este caso da várzea de Samora foi já há anos apontado e se encontra ultimado o projecto que soluciona o problema: o alteamento do aterro de 80 cm.
Com esta obra, a que tive ocasião de me referir já neste lugar há alguns anos, deixaria de haver cheias prolongadas na várzea de Samora e o trânsito não ficaria interrompido.
Evidentemente, no estado actual da ciência, não está na mão do homem regular de foram sensível a queda de chuvas.
As condições pluviométricas do nosso país são tão incertas que estamos sujeitos a sofrer, como se verificou o ano passado, sete meses de prolongada seca, seguidos de um longo período de cinco meses de chuva quase contínua. Mas se não é possível, certamente, evitar que as águas, por vezes diluvianas, caiam sobre as terras, a mesma impossibilidade não existe no que respeita ao seu escoamento.
E é para este ponto que, repito mais uma vez, me permito solicitar a diligente atenção do Ministério das Obras Públicas, à frente do qual se acha, felizmente, um estadista e técnico que tão notáveis serviços tem prestado ao País e em cuja acção diligente e decisiva devemos confiar inteiramente.
E inegável que a obra executada pelo importante sector desse Ministério que é a hidráulica agrícola atinge proporções consideráveis e dela se colheram já benefícios importantíssimos, tanto para os muitos milhares de agricultores, que passaram a dispor de água para rega das suas terras, como para a economia nacional, que viu grandemente aumentado o volume de diversas produções agrícolas, e ainda a adopção de novas culturas. Graças às barragens construídas e à rega que proporcionam, o panorama cultural e as próprias condições sociais de várias regiões do País foram sensivelmente melhorados.
Mas, prestando toda a justiça a essa obra incontestável, atrevo-me a insistir na necessidade de a alargarmos com dois outros aspectos complementares que nem por serem de menor vulto e, por sua vez, menos dispendiosos, deixariam de trazer, ao que penso, benefícios enormes à lavoura e, consequentemente, à economia nacional.
Não é aqui o lugar (nem me sinto a tal habilitado) para desenvolver os aspectos técnicos do assunto. Mas não me furtarei a apontar as duas obras que no sector da hidráulica agrícola se me afiguram da maior urgência e perfeitamente realizáveis.
Por um lado, a construção de maior número de pequenas barragens, cuja função seria reter, evitar, a descida para os vales e armazenar para rega grande parte das águas das chuvas que agora deixamos inundarem os campos e acabam por se perderem no mar.
E simultaneamente, com o desassoreamento dos rios e seus afluentes que constituem a rede hidrográfica sujeita às inundações, estender sobre as várzeas e campos limítrofes uma bem estudada malha .de canais e valas de drenagem. Por esta forma, conseguir-se-á tanto o escoamento dos excessos pluviométricos como a posterior irrigação das terras. E até mesmo aqueles canais que para tal tivessem capacidade seriam utilizados no transporte de mercadorias, materiais, produtos agrícolas, que tem de fazer-se através das lezírias, muitas vezes dificilmente, por escassez de vias de acesso.
São bem conhecidas as vantagens que a economia de muitos países, como a França, Bélgica, Holanda e outros, recebem utilizando os canais, artificiais na maioria dos casos, com que ali se soube aproveitar esses cursos de água, não apenas para a rega, mas igualmente para os transportes.
A saída dos produtos agrícolas das explorações localizadas nas lezírias e terras subjacentes aos rios como existem no nosso Ribatejo poderia, em percentagem importante, ser efectuada através desses canais, em condições muitíssimo mais económicas do que actualmente.
No Norte da França e na Flandres ainda não há muitos meses foram abertos ao tráfego mais quatro canais para um género de navegação que tão grandes serviços presta nessas regiões.
Se adoptássemos orientação semelhante, obteríamos ainda a extraordinária vantagem de descongestionar as estradas do intenso tráfego e ainda aliviando-as dos transportes pesados que tanto desgastam os pavimentos.
No parecer das Contas Gerais do Estado para 1963, o nosso ilustre colega Eng.º Araújo Correia chamava a atenção para as duas importantes vias fluviais - Tejo e Douro -, que podem permitir a produção de grandes quantidades de energia, além de navegação e outros usos. Que bastariam duas obras, relativamente de pequeno volume, para tornar o Tejo navegável até à fronteira, com a produção de mais de 500 milhões de unidades de energia e com aproveitamento de todas as regularizações em Portugal e em Espanha.
Sr. Presidente: Se insisto aqui no caso de regularização dos rios, na construção de canais navegáveis e de rega e na construção de albufeiras, é porque julgo que essas obras são possíveis de realizar, tal como acontece noutros países.
Seriam obras de grande utilidade para o Ribatejo e outras regiões, com influência importante na situação económica da lavoura e em outros sectores, enfim, na economia geral do País.
Yozes: - Muito bem!
O Orador: - E termino, Sr. Presidente, formulando, em nome do distrito de Santarém, de que tenho a honra de ser um dos representantes nesta Assembleia, um pedido ao Sr. Ministro das Obras Públicas, espírito clarividente e incansável realizador: é que, mediante as providências que sugiro, ou outras de maior viabilidade e eficiência que os serviços melhor entenderem, a lavoura e as populações do Ribatejo possam ser, pelo menos, bastante aliviadas das graves contingências, dificuldades e prejuízos que quase todos os Invernos duramente vêm suportando.
Vozes: -Muito bem, muito bem! O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Mário Bento: -Sr. Presidente: Quero referir-me a algumas vozes de timbre saudável e remoçado que crescem e tomam vulto a bem do interesse nacional. Trazem ao de cima uma realidade penosa que vem de longe, de muito longe, mas que urge vencer e ultrapassar. Com muita decisão, com muita coragem.
Saudemos essas vozes e emprestemo-lhes o relevo e o incentivo que merecem.
Há um mês, precisamente, que o ilustre titular das Obras Públicas, Eng.º Arantes e Oliveira, ao empossar um alto funcionário do seu Ministério, definiu uma linha de rumo que se dirige frontalmente àquela realidade, atacando e pondo a nu um dos seus aspectos mais importantes.
Página 642
642 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 36
Afirmou o Sr. Ministro das Obras Públicas:
No que respeita ao completamento da rede rodoviária nacional, há que referir - o que, aliás, se verifica com aspecto semelhante em relação a todos os demais índices de desenvolvimento do território continental que cerca de 75 por cento do tráfego rodoviário se concentram numa faixa com 25 por cento da área desse território.
E esta, Sr. Presidente, a realidade a que pretendo aludir, e que poderia sintetizar nesta expressão, um tanto brutal, mas significativa: "a triste realidade dos 25 por cento"!
Alimentemos a guerra aberta a esta deformação do corpo físico do País, que o afecta profundamente, não impedindo apenas o desenvolvimento harmónico da sua economia, pois compromete também valores mais altos de justiça e de promoção social.
Espalhemos esta mentalidade, persistentemente, e façamos tudo para que ela informe e determine os responsáveis da governação, pois é certo que a "triste realidade dos 25 por cento" está na base de alguns males que mais pungentemente nos afligem e que urge remediar.
O problema das comunicações rodoviárias é apenas um dos muitos aspectos em que se desdobra a temática geral que deixo enunciada, mas a esse aspecttf pretendo agora cingir-me, e mesmo assim terei de o fazer sumariamente, direi mesmo "telegràficamente" ...
Vou ainda cingir-me, no espaço, ao distrito da Guarda, pela razão óbvia de não conhecer suficientemente o problema noutras regiões, nem carecerem da minha achega os ilustres colegas que as representam e tão solicitamente as defendem.
Por outro lado, se é certo que o plano rodoviário nacional e rural se tem processado no distrito da Guarda e nos últimos anos com a mais louvável compreensão do respectivo sector governativo - é-me sumamente grato reconhecê-lo -, também é certo que, em virtude de um longo passado de inépcia, de marasmo, de penúria, subsistem ali necessidades clamorosas que exemplificam flagrantemente as preocupações do ilustre membro do Governo, tal como as exprimiu no seu recente e já citado discurso.
Assim, quando S. Exª. começou por aludir à "necessidade de se desviar da tarefa de completamento da nossa rede rodoviária uma parcela cada vez maior das disponibilidades financeiras, para ser aplicada na modernização dos traçados -existentes", dir-se-ia que no seu espirito estava presente a estrada nacional n.º 16, entre Vilar Formoso e Celorico da Beira, numa extensão de cerca de 76 km -a grande "rodovia do trânsito internacional, grande, mas pobre, ultrapassada, cheia de perigos, de todo em todo imprópria pára o volume e natureza do seu trânsito.
"Este, Sr. Presidente, não é um problema do distrito da Guarda, mas um autêntico problema nacional. A rectificação, alargamento e pavimentação deste troço de estrada são reclamados imperiosamente pelos interesses gerais dó País e do seu desenvolvimento turístico.
Basta .dizer, Sr. Presidente, que dos 1000 milhares de estrangeiros entrados em Portugal em 1964 por todas as vias -r terrestre, aérea e marítima - 500 milhares, aproximadamente, passaram por Vilar Formoso - a fronteira terrestre n.º 1 de Portugal.. E desde que a vizinha Espanha, inesperadamente (diríamos quase incompreensivelmente dentro de uma política de retenção do .turista), transformou a velha estrada que liga Ciudad Eodrigo a Vilar Formoso numa esplêndida e moderna rodovia, numa
autêntica "pista", mais imperiosa e mais chocante é a necessidade de beneficiar o troço referido entre Vilar Formoso e as proximidades de Celorico da Beira, através das bacias do Côa e do Mondego, cujas curvas ficam todos os anos assinaladas tragicamente com inúmeros acidentes, em que alguns portugueses e estrangeiros têm encontrado a invalidez e a morte.
Não é obra para um ano, será obra para vários anos, mas importa iniciá-la, e talvez mesmo a partir da fronteira, para que o turista esforçado, que pacientemente percorreu os 600 km que separam Hendaia de Vilar Formoso, não receba logo, de chofre, uma impressão decepcionante e um prémio tão negativo para a sua vinda a Portugal.
De urgência imediata, porém, é completar a balizagem nas curvas do chamado vale do Mondego, entre a cidade da Guarda e a ponte sobre aquele rio.
Este um exemplo frisante que ilustra a primeira linha de preocupações do ilustre titular das Obras Públicas.
Mas quando S. Exª. ataca a realidade mais pungente a que acima aludi e chama a atenção para a "área restante", a área que está fora dos tais 25 por cento, e anuncia que para ela "temos de dirigir o nosso esforço principal de construção de novas estradas, considerando-se de antemão justificadas as distorções que esta orientação necessariamente implica para os critérios, .pouco significativos em si próprios, de distribuição territorial equitativa das despesas rodoviárias" e quando, por outro lado, se estabeleceu no plano de viação rural que seria dada prioridade absoluta às construções de lanços de estradas nacionais de que dependam o acesso a povoações isoladas, seria impossível, para quem, conhece e vive os problemas do distrito da Guarda, não dirigir o seu pensamento à necessidade imperiosa de se construir a ligação da estrada nacional n.º 102 aos concelhos de Pinhel e Almeida, e assim possibilitar as ligações às populações isoladas das freguesias de Bogalhal, Cidadelhe, Ervedosa e Azevo (se a memória me permite ser exaustivo), além de vária£ anexas, verificando-se relativamente à última freguesi. citada, Azevo, a triste ironia de ser sede de um partido médico - eternamente, fatalmente, vago -, mas aonde um médico só pode chegar usando o transporte do benemérito e romanesco João Semana!
(Risos).
Estrada esta que teria ainda a vantagem de permitir uma mais rápida ligação dos citados concelhos de Almeida e Pinhel e da própria fronteira de Vilar Formoso com todo o Nordeste do País.
Imperiosa,- também, Sr. Presidente, a conclusão da estrada que irá um dia satisfazer o anseio justíssimo da região de Almendra em ligar-se à sede do concelho -Vila Nova de Foz Côa -, anseio tão justo quanto é certo que, oscilando as distâncias a percorrer pela estrada a concluir entre 10 km e 15 km, a demanda da sede do concelho só é actualmente possível mediante um percurso inacreditável que ronda ou vai além dos 100 km!
Caso paralelo é o da almejada ligação entre Banhados e Meda, que permitirá àquela freguesia alcançar a sede do concelho através de um percurso de 4 km a 6 km, o que agora só consegue com a distância esgotante de cerca de 30 km - ligação esta que ainda permitiria acesso rápido e absolutamente necessário de todo o Noroeste do distrito da Guarda com o distrito de Vis-e com o Norte e litoral do País.
São, sem dúvida, necessidades prementíssimas que ilustram flagrantemente os critérios prioritários definidos oportunamente pela entidade superiormente responsa-critérios amplamente merecedores da palavra de homenagem que a Nação lhe não pode regatear.
Página 643
19 DE MARÇO DE 1966 643
Mas seria minha a lacuna - e não do esclarecido governante - se não aludisse ainda, com a brevidade que me é imposta pelo Begimento e pelas circunstâncias em que generosamente me foi concedida a palavra e em que generosamente sou escutado por VV. Ex.ªs, se não aludisse - dizia - a uma última preocupação expendida no discurso em análise, igualmente clara, eminentemente oportuna e decididamente compartilhada por esta Câmara, e nomeadamente pelos ilustres oradores que na ordem do dia se têm ocupado, com brilho e profundidade, da análise das contas públicas. Estou a aludir, de uma forma mais específica, à correlação do problema rodoviário com o magnífico surto turístico, esse poderoso aliado da economia nacional no esforço hercúleo de equilibrar a balança de pagamentos ...
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - ... tão duramente atingida pela conjuntura económica que o País atravessa, frente a dilemas cruciais, como aquele em que a necessária poupança de divisas é contrariada pela urgência de importações altamente dispendiosas, que o próprio fomento económico, sobretudo no sector industrial, reclama sem apelo nem possibilidade de alternativa. Pois bem, esse poderoso aliado que não podemos perder, antes havemos de robustecer a todo o custo, tem também como "ponta de lança", a par com as infra-estruturas basilares do alojamento, as comunicações rodoviárias em geral e as dos circuitos turísticos em particular.
Também aqui é lúcida e peremptória a afirmação do Ministro Arantes e Oliveira:
A obra rodoviária terá de andar à frente, para que se não comprometa na base o êxito da política de valorização turística do País.
Estamos perante uma nova ordem de interesses, perante uma prioridade indiscutível, demonstrada como está pela linguagem dos factos que se não trata de um sonho, ou de uma aventura, mas-de uma autêntica, de uma poderosa, realidade: a realidade do turismo português! E consolador verificá-lo, Sr. Presidente!
No preciso momento em que uma cabala urdida na inveja e no rancor fez estremecer todo o corpo da Nação, impondo-lhe uma guerra injusta em três frentes de batalha, e uma outra, monstruosa, de calúnias e afrontas, à escala universal, nesse preciso momento, como bênção da Providência e como desmentido cabal a muitas dessas calúnias, irrompeu a benfazeja e pacífica invasão turística, que se tem avolumado, de ano para ano, em ritmo inesperado e sem precedentes. Em termos económicos -ninguém o duvida- o capital turismo é um investimento altamente reprodutivo para aeconomia nacional.
Daí que as despesas a efectuar neste sector se "justifiquem e imponham por fortes razões dedesenvolvimento económico e de riqueza material.
Quando, porém, num mesmo investimento se conjucgam e reúnem, a par com o fomento turístico plenamente assegurado, a satisfação de outras necessidades de igual içai anterior prioridade, não há dúvida de que todos os esforços se justificam, todos os sacrifícios se aceitam, quandodirigidos à efectivação da empresa.
Em matéria turístico-rodoviária há duas obras a efeito no distrito da Guarda que preenchem rigorosamente tfcle condicionalismo, e refiro apenas duas para afastar o risco de contestação da sua inegável prioridade.
Ambas dizem respeito à serra da Estrela, a rainha, que, por sê-lo, não é pertença das Beiras em que se instalou, majestosa e silente, no seu primado incontestável. Ela é, de facto, património português, fonte inesgotável de riqueza nacional.
Não obstante, a rainha mantém-se ainda, em larga medida, como princesa encantada, continua a guardar segredos estéreis, maravilhas desconhecidas, que são potencial inexplorado de beleza e seguro manancial de progresso económico.
Até quando?
Novas "pontas de lança" terão de ser atiradas decididamente às suas quebradas de sonho, aos seus varandins palacianos, monopólio das estrelas ...
A primeira será, creio bem. a ligação de Videmonte, no concelho da Guarda, a Folgosinho, no concelho de Gouveia. Mais do que uma antiga e justa aspiração daquela zona serrana, é uma autêntica necessidade do turismo português. Porque outras, várias outras, são justas aspirações também e de notável alcance económico e turístico, como, por exemplo, as ligações desta futura estrada à freguesia de Prados e à histórica vila e fortaleza de Linhares, no concelho de Celorico da Beira.
Obra de envergadura, sem dúvida, mas que plenamente se justifica e confiadamente se aguarda.
Mais fácil, de mais imediata viabilidade, é a segunda rodovia serrana que desejo referir. O simples enunciado do percurso a impõe. De forma tão evidente, tão imperiosa, que dispensa qualquer argumentação! Por outro lado, constitui um velho anseio de uma das senhoras e donas dos Hermínios - a bela, a fidalga, a progressiva Manteigas. Trata-se, Sr. Presidente, da ligação da Nave de Santo António à Colónia Termal de Férias, passando pela base dos Cântaros, pela nascente e bacia do Zêzere, cruzando ainda com o acesso único ao Poço do Inferno.
Quem poderá .contestar a justiça deste anseio, o interesse indiscutível deste traçado de alto purismo?
Não obstante, continua a aguardar a passagem a estrada nacional, de simples caminho florestal que é e quase intransitável.
Mas creio bem, Sr. Presidente, que a satisfação deste desiderato não pode demorar, porque o exige a própria existência das outras estradas que de Gouveia e Seia, por um lado, e da Covilhã, pelo outro, dão acesso à torre - o ponto mais alto de Portugal europeu -, e das quais o percurso a que me reporto é complemento indispensável, como fecho de circuito e possibilidade de rápido acesso aos lugares mais conhecidos e visitados da encantadora montanha.
Nesta esperança finalizo as minhas breves considerações - esperança que levo mais longe ao pensar que o conjunto de problemas atrás exposto encontrará nos novos rumos que se anunciam a melhor compreensão dos responsáveis nos vários escalões a que estão afectos.
E acredidto ainda que a gente portuguesíssima do distrito da Guarda, como a de Castelo Branco ou Bragança, não será vencida pelo desespero e continuará a trabalhar e a sofrer, em luta heróica com a aspereza das serras, aguentando os vendavais do infortúnio, as inquietações de um êxodo assustador, todas as contrariedades e angústias, na nobre certeza de que, sendo ela o cerne da Nação, está a aguentar e a continuar Portugal.
Tenho dito.
Yozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
Página 644
644 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 36
O Sr. Presidente: - Vai passar-se à
Ordem do dia
O Sr. Presidente: -Continuam em discussão as Contas Gerais do Estado e da Junta do Crédito Público relativas ao ano de 1964.
Tem a palavra o Sr. Deputado Melo Giraldes.
O Sr. Melo Giraldes: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O parecer sobre as Contas Gerais do Estado de 1964 esclarece com tal realismo e objectividade a situação de que são reflexo e aponta com tanta verdade e acerto não só os problemas como as suas causas, não só as dificuldades que se apresentam à vida económica do País como as possibilidades e caminhos para as vencer ou atenuar, que me parecia nada mais haver a dizer sobre o assunto.
Não quero, apesar disso, deixar de aproveitar a ocasião para algumas considerações sugeridas por esse parecer e, por isso, que julgo caberem dentro do âmbito desta ordem do dia.
Eessaltam das contas do Estado, como notas que mais me impressionaram, o déficit extraordinariamente elevado da balança do comércio metropolitano, a sua tendência para se agravar como consequência- do desenvolvimento dos-consumos internos e a descida do contributo da agri-.cultura, da pecuária e da silvicultura para a formação do produto interno bruto.
As receitas ordinárias apresentam um excesso bastante favorável sobre as despesas ordinárias, que serviu para pagar, em parte, o excesso das despesas extraordinárias.
Mas como estas, embora com algumas possibilidades de baixar, se deverão manter em alto nível por tempo prolongado e aquelas, em face de problemas como o da actualização dos vencimentos do funcionalismo, terão certamente de aumentar, nfto podemos contar com evolução favorável da situação económica do País sem que alguma coisa se modifique na sua vida e na sua orientação, parti que o equilíbrio da balança de pagamentos não continue a ser obtido fundamentalmente à custa de receitas precárias provenientes da emigração e, do turismo e do recurso ao crédito externo.
Tal como o parecer afirma, o problema imediato exigido pela balança de pagamentos reside no déficit do comércio externo - nas importações e nas exportações.
A produção aumenta, mas em ritmo moderado, e é muito inferior ao consumo, cujas exigências são cada vez maiores. E para satisfazer o excesso de consumo recorre-se, evidentemente, à importação.
As nossas exportações também aumentam em cadência pouco -inferior às importações, mas, ao passo que exportamos barato, importamos cada vez mais caro.
A diferença entre os 67$ de acréscimo por tonelada no valor unitário das mercadorias exportadas e os 567$ por tonelada no daquelas que se importaram de 1963 para 1964 dará uma ideia do nosso estado em matéria de valorização de produtos e do que nos falta e por certo poderemos aproveitar ainda nesse capítulo. ( Há que explorar todos os -recursos nacionais, procurando obter dentro do País uma percentagem cada vez maior daquilo que se precisa e uma cada vez maior valorização unitária daquilo que podemos exportar.
A solução para o problema da nossa balança de comércio parece evidente:
Importar o menos e exportar o mais que. se puder. Tão evidentes já não serão os caminhos pára lá chegar, nem eu pretendo apontá-los.
Parece-me, no entanto, que, em relação aos produtos da exploração da terra, sejam eles provenientes da agricultura, pecuária ou silvicultura, destinem-se eles a satisfazer as necessidades alimentares da população ou a servir de matéria-prima para certas indústrias, muito há a fazer e muito se pode fazer -no sentido de contribuir para aquela solução. E creio que poderíamos começar já por importar menos, principalmente, e que mais não seja, daquilo que ciclicamente abunda e se deixa estragar e aviltar nos preços, para depois, e ciclicamente também, escassear e encarecer desmedidamente, e daquilo que se deixa de produzir, apesar das crescentes necessidades e possibilidades de colocação.
E poderíamos, também e desde já, produzir mais de tudo aquilo que possa colocar-se com lucro nos mercados interno e externo e cuja produção se retrai nuns sítios, apesar das condições favoráveis, porque aí não se vende ou se vende mal, ao mesmo tempo que -noutros escasseia e se paga por bom preço.
Não pretendo apontar todos os produtos a que estas considerações se possam aplicar, mas, a título de exemplo, não deixo de referir alguns, como a batata, a carne, o açúcar, o algodão, o leite, frutas ...
ïï evidente que teremos sempre que importar alguma coisa, mas a facilidade do recurso à importação para resolver os problemas de abastecimento interno deve contribuir bastante para manter, quando não aumentar, a sua necessidade periódica.
Importa-se porque é preciso, e é preciso porque, come se pode e é mais fácil importar do que fomentar, não se fomenta ou fomenta-se pouco ... e, como não se fomenta, não se produz e, como não se produz ... é preciso importar ...
Essa facilidade deve, assim, contribuir também para a inércia da nossa política de fomento, que, embora definida para grande parte dos produtos da terra, não se concretiza, na prática, por falta de organização e infra-estruturas que a tornem verdadeiramente eficaz.
Bem definidas ficaram, em portaria de S. Ex.ª o Ministro da Economia, as linhas mestras por que devia orientar-se o fomento pecuário no que respeita à carne e ao leite.
As intenções e os princípios estão perfeitos.
Acontece, porém, que a execução de política tão bem definida não se está a verificar na prática por falta de estruturação que permita aproveitar ao máximo a pequena margem de lucro que os preços estabelecidos oferecem para aqueles produtos.
O preço para a carne revela-se pouco aliciante, permitindo lucro apenas em algumas condições de carácter extensivo, mas não é suficiente para consentir o regime intensivo, único que poderia aumentar a produção de forma a reduzir substancialmente as importações.
Acresce ainda que a pequena capacidade de matança existente não permite o abate das reses na época mais favorável, tornando assim mais contingente o resultado económico da exploração.
Torna-se indispensável para o êxito da política enunciada naquela portaria uma rede de matadouros e frigoríficos capazes de receber toda a carne que se produza nas épocas de maior rentabilidade para o produtor e de a conservar para distribuir ao longo do ano de acordo com as necessidades do consumo.
E, tendo em vista as vantagens de aumentar a oferta interna deste alimento, são necessários, além disso, preços, especiais ou não, que dêem ao regime intensivo de produção de carne de bovjno possibilidade de êxito financeiro.
O preço estabelecido para o leite, apesar de relativamente baixo, nem assim se consegue em muitas zonas
Página 645
19 DE MARÇO DE 1966 645
rurais com condições para o produzir, mas que sem infra-estruturas de recepção, transporte e distribuição não conseguem vencer a distância que as separa dos centros em que o consumo e o nível de vida permitiriam a colocação a preço compensador.
E o resultado é que num país com uma capitação de leite baixíssima e em que, apesar disso, falta o leite nos principais centros consumidores há regiões verdadeiramente aptas para a sua produção que dela desistiram, preferindo empregar o leite na recria dos vitelos ...
E para obviar a estas dificuldades ... oferecem-se vacas ... importadas ... para incrementar uma produtividade que nestas condições não tem visível sentido.
E esta falta de organização, a limitar e até a impedir as possibilidades de êxito de uma política, verifica-se não só em relação à carne e ao leite, como em relação a outros produtos, como a batata, o vinho, a fruta, etc.
O consumo interno desenvolve-se e as possibilidades de colocação dos produtos da terra deveriam aumentar também. Mas parece que aumentam as dificuldades, o que só se entende por falta de organização e de estruturas.
E embora nem tudo se possa nem deva esperar do Estado, não creio que essas infra-estruturas indispensáveis ao fomento da produção possam ser criadas pela iniciativa particular, pelo menos no início.
Não podemos actualmente pedir à produção senão que produza muito e o mais barato que puder, mas sempre em relação a um preço mínimo de rentabilidade assegurada nas condições normais de exploração e garantido na prática por uma estruturação para que poderá contribuir, mas não está em condições de montar. Só o Estado, actualmente, o poderá fazer com a devida e necessária celeridade.
Não sendo assim, não vejo como a situação possa melhorar e o comportamento do produto agrícola não venha a ser dentro em pouco uma recordação do passado, tal como no parecer sobre as contas do Estado se antevê com mais realismo do que pessimismo.
A descida da percentagem da comparticipação da agricultura e pecuária no produto interno-bruto, de 20 por cento em 1960 para 16,5 por cento em 1964, é tão acentuada que, apesar do seu significado relativo, não pode ser atribuída apenas à subida do contributo de outras actividades em expansão, como a indústria, mas a uma verdadeira decadência, que é, afinal, a consequência lógica das circunstâncias em que a agricultura tem desenvolvido a sua actividade.
E a que se verificou em relação à silvicultura, de 4,4 por cento em 1960 para 3,7 por cento em 1964, apesar de menor, não é menos significativa num país com as aptidões florestais do nosso.
O País tem necessidade imperiosa de aumentar a sua produção em todos os sectores.
No entanto, na lavoura, em relação a certos produtos necessários e outrora bem rendosos, vive-se no receio de produzir.
O ano passado um viticultor do Cartaxo dizia ter a vimha com um ataque de uva tão grande que não sabia como ver-se livre dele. Isto é uma graça, mas, no entanto, reflecte bem a realidade de uma situação que ainda se não modificou para melhor.
No decorrer da última campanha eleitoral, num dos concelhos do Norte do distrito de Castelo Branco, situado no centro da maior mancha florestal do País, ouvimos, à laia de lamentação, alguém dizer que ali estavam condenados ao pinheiro I ...
Já se vê que isto não pode deixar de ser um disparate, mas traduz uma desorientação e revela que alguma coisa está mal.
O Sr. Proença Duarte: - Podia apontar, na linha de considerações que V. Ex.ª está fazendo, um caso frisante de um produto em que de deficitários passamos a ser suficientes: a produção do arroz. Porém, em virtude de não se terem actualizado os respectivos preços em harmonia com a elevação de salários, etc., passámos a ser novamente deficitários e grandes importadores.
Assim se revela que a agricultura portuguesa, quando se lhe proporcionam preços remuneradores, produz com eficiência e dá o melhor rendimento possível.
O Orador: - No seguimento das minhas considerações referir-me-ei a esse e outros casos, mas, no entanto, agradeço muito a V. Ex.ª a sua intervenção, que considero da maior utilidade.
E, realmente, não pode estar bem que uma enorme riqueza, criada a poder de anos e poupança, esteja sujeita, na sua rentabilidade, a indústrias que nada obriga a valorizá-la, ou situadas a distâncias que, em transportes e intermediários, consomem mais de metade do preço da matéria-prima posta na fábrica. Na época passada vendia-se o eucalipto, em Idanha-a-Nova, a 85$ o estere!
Num distrito em que mais de 70 por cento da terra não terá outro aproveitamento, tecnicamente aconselhável, que não seja a floresta, que estímulo pode haver para a florestação quando na zona onde ela está já em produção se ouvem afirmações destas?
Como fazer fomento florestal sem uma industrialização integrada, na sua actividade e localização, nesse mesmo fomento?
Ainda sem sair do meu distrito, verificam-se na Cova da Beira extraordinárias! aptidões frutíoolas por aproveitar ou, salvo raríssimas excepções, mal aproveitadas. Pomares que não se plantam e outros que não se tratam porque ... não vale a pena, pois a fruta é, na sua maioria, vendida em flor ... e as contingências da colocação não entusiasmam os investimentos e a boa técnica, aplicados ao que poderia e poderá ser uma verdadeira riqueza nacional e um dos motores do desenvolvimento regional.
Mas aquelas contingências desanimadoras não estão de acordo com a falta que cada vez mais se faz sentir, em determinadas épocas, da muita e boa fruta que ali se pode produzir!?
A mesma ausência de infra-estruturas necessárias para prolongar o período de oferta dos produtos e para ligar a produção e o consumo em boas condições de economia e conservação.
O País precisa de produzir e a lavoura pode produzir muito mais, mas tem de poder fazê-lo sem medo de ficar com a mercadoria em casa a estragar-se, a desvalorizar-se, de qualquer modo a encarecer o seu custo, seja ela carne ou batata, madeira, fruta ou vinho.
E a lavoura sabe produzir .. , o que não sabe é vender.
Sempre que se lhe apresenta a possibilidade de vender com lucro, não lhe falta capacidade para procurar e aproveitar todo o progresso técnico que a conduza à máxima produtividade e à melhor qualidade.
Os exemplos do que se tem passado com a cultura do arroz, do tomate, da vinha, do azeite, onde e quando o lucro da cultura permitiu e estimulou um aperfeiçoamento técnico como meio de ganhar mais, são elucidativos a esse respeito.
Mas ninguém procura a técnica, sempre cara, para ganhar muito pouco ou ... para perder menos.
É para a rentabilidade da exploração que a nossa organização se tem de dirigir se se pretende um aumento do produto agrícola tão possível como indispensável à vida do País e das zonas rurais que dele constituem a maioria.
Página 646
646 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 36
A lavoura tem de poder contar com orientação, organização e técnica devidamente estruturadas e totalmente aplicadas à valorização do seu esforço produtivo.
E temos portarias a definir oriemtação, organismos para todos os produtos, técnicos competentes e lavoura interessada.
Faltam-nos organização e estruturas como meios indispensáveis para os conjugar numa política agrícola eficaz.
Certamente que isto exigirá trabalho e despesas. Mas não tenho dúvidas de que os seus reflexos favoráveis na balança de comércio, no desenvolvimento regional e no bem-estar rural justificam essas despesas e as recomendam como um dos investimentos maisi rápida e altamente reprodutivos e da rnais urgente necessidade.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado,
O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão.
A próxima será na terça-feira dia 22, com a mesma ordem do dia.
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas.
Anexo à intervenção do Sr. Deputado Nunes Barata sobre o d&slcniíolviin.cnto do turismo no distrito de Coimbra:
A) Principais aspirações do distrito:
1) Grande correcção da estrada internacional Vilar Formoso-Coimbra;
2) Construção da* estradas n.ºs 343 e 344;
3) Prosseguimento de Alvares ao rio Zêzere da estrada na n.º 2;
4) Completo alargamento e rectificação da estrada de Coiimbra à Figueira da Foz;
5) Realização dos acessos convenientes, a Coimbra na estrada Lisboa-Porto e na estrada da Beira;
6) Prolongamento da estrada n.º 335, com necessária passagem sobre a linha do Norte em Alfarelos;
7) Conclusão e beneficiação- da estrada que liga a Cúria à praia de Aíira;
8) Construção da nova ponte na Figueira da Foz;
9) Construção1 de um porto de recreio na Figueira da Fez;
10) Electrificação da linha de Alfarelos à Figueira da Foz;
11) Construção do caminho de ferro de Arganil, pelo menos, para já, até esta vila;
12) Abertura ao tráfego civil do campo de aviação de Monte Real;
13) Construção ou valorização dos campos de aviação da Figueira da Foz, de Coimbra e da Lousa;
14) Valoriza-ção das praias1 do distrito, nomeadamente as da Figueira da Foz e de Mira;
lõ) Ligação ao turismo do distrito da" regiões do Buçaco. Luso e Cúria;
16) Valorização do rio Mondego, com a criação, em Coimbra, de um lençol de água -permanente e, à medida que se forem construindo as barragens projectadas, com a anã utilização também para fins turísticos;
17) Elaboração de um plano de ocupação hoteleira do distrito, a executar progressivamente, e construção de pousadas, albergue, da juventude, e parques de campismo;
18) Repovoamento florestal das zonasi montanhosas do distrito e valorização turística da floresta;
19) Elaboração e execução de planos de repovoamento piscícula e uinugotico.
B) Aspirações concelhias:
Arganil:
1) Construção de uma pousada no santuário de Monte Alto;
21) Valorização turística do perímetro florestal de Arganil;
3) Construção ou valorização das estradas de acesso à zona montanhosia do concelho;
Cantanhede:
1) Construção de um restaurante e de um abrigo de pescadores na lagoa da(r) Velas;
2) Melhoria dos acessos à lagoa das Velas;
3) Criação de uma piscina em Cantanhede.
Condeixa:
1) Construção de um hotel junto às ruínas romanas de Conímbriga;
2) Iluminação da estação arqueológica de Conímbriga;
3) Valorização urbanística da sede do concelho.
Figueira da Foz:
1) Construção de uma piscina aquecida, para servir o prolongamento da época balnear;
2) Construção da estrada da mata do Urso, entre Leirosa e a Guarda do Norte;
3) Abertura permanente ao trânsito das estradas florestais do concelho;
4) Criação de uma pista de motonáutica e de remo na lagoa das Velas;
5) Construção, de um campo de golf;
6) Construção de modernos hotéis, destinados a servir o turismo médio;
7) Valorização turística da serra da Boa Viagem e construção de parques de campismo.
Góis:
1) Construção de uma estalagem local;
2) Aproveitamento turístico do rio Ceira;
3) Repovoamento florestal da área do concelho e valorização turística das florestas já existentes.
Lousa:
1) Construção de uma estalagem junto à piscina municipal;
2) Aproveitamento da montanha para instalação de colónias de média altitude;
3) Valorização turística do castelo e alcatroamento da estrada para o Santuário de Nossa Senhora da Piedade.
Mira:
1) Urbanização da praia de Mira, com uma conveniente electrificação, abastecimento de água e rede de esgotos;
2) Desassoreamento da Barrinha;
3) Valorização dos parques de campismo e construção de uma estalagem na praia de Mira;
4) Aproveitamento turístico das zonas florestais;
5) Revestimento betuminoso das estradas florestais que ligam Mira à Figueira e a Aveiro e dos ramais de acesso à praia de Mira;
6) Aproveitamento das toalhas líquidas para os desportos náuticos.
Página 647
19 DE MARÇO DE 1966 647
Miranda do Corvo:
1) Construção da estrada de Miranda do Corvo a Semide e rápida ligação a Coimbra;
2) Construção de uma pequena unidade hoteleira na Serra da Vila;
3) Defesa e valorização do artesanato local do sector da olaria popular;
Montemor-o-Velho:
1) Valorização dos velhos mosteiros existentes;
2) Aproveitamento do castelo com a instalação no mesmo de um restaurante e casa de chá;
3) Valorização das doçarias regionais.
Oliveira do Hospital:
1) Construção de uma pousada na Póvoa das Quartas;
2) Construção de uma piscina em Oliveira do Hospital;
3) Construção de uma represa no rio Alva, a jusante de Avô;
4) Eeparação da estrada para a igreja Moçarabe de Lourosa;
5) Alcatroamento da estrada d" ribeira da Alva;
6) Eeparação da estrada da ponte das Três Entradas-Vale de Maceira;
7) Alargamento e rectificação da estrada da Catraia de S. Pais-Oliveira do Hospital;
8) Defesa e valorização do artesanato local (trabalhos de cobre) e dos produtos regionais para a alimentação.
Pampilhosa da Serra:
1) Construção de uma pousada e de um abrigo para pescadores junto à barragem de Santa Luzia;
2) Grande reparação e alcatroamento nas estradas de acesso à barragem de Santa Luzia;
3) Aproveitamento da região da barragem de Santa Luzia para o turismo social; com instalação de colónias de média altitude;
4) Exploração da barragem de Santa Luzia e da barragem do Cabril do Zêzere para a pesca desportiva, desportos náuticos, etc.;
5) Repovoamento florestal do concelho e aproveitamento das florestas existentes para o turismo;
6) Aproveitamento da serra do Açor para colónias de montanha e valorização turística da região de Fajão;
Penacova:
1) Valorização turística de Lorvão, com organização em pequeno museu do recheio artístico do Mosteiro de Lorvão;
2) Valorização das estradas de acesso a Lorvão;
3) Construção de uma pousada na Portela de Oliveira, lugar vulgarmente denominado Cidade dos Moinhos, e alcatroamento da estrada florestal de acesso;
4) Instalação de uma pousada turística na Casa de Eepouso de Penacova.
Penela:
1) Aproveitamento do castelo para instalação de uma pousada e construção de um abrigo da montanha na serra do Espinhão;
2) Construção da estrada Espinhal-Castanheira de Pêra.
Polares:
1) Arborização do alto de S. Pedro Dias pelos serviçps florestais;
2) Construção de uma pousada na serra de S. Pedro Dias;
3) Apoio ao artesanato regional.
Soure:
1) Construção de uma represa no rio Soure:
2) Defesa e valorização do conjunto urbano da sede do concelho.
Tábua:
1) Construção de uma piscina da sede do concelho;
2) Valorização das estradas concelhias.
Coimbra:
1) Eestauro e aproveitamento das igrejas, palácios e monumentos da cidade, nomeadamente a Igreja de Santa Cruz, a porta especiosa da Sé Velha, a capela da Estrela, o Convento de S. Domingos, o Palácio de Sobre-Eibas e a Torre de Anto;
2) Aproveitamento das instalações do actual café de Santa Cruz para exposições de arte;
3) Construção de um novo edifício para a biblioteca municipal, libertando os claustros do Mosteiro de Santa Cruz;
4) Defesa e valorização da cidade alta;
5) Valorização da mata do Choupal e do vale de Canas, com a instalação de infra-estruturas para o turismo das classes populares;
6) Eesolução do problema ferroviário da cidade e eliminação das passagens de nível da volta da Ferradura e do Calhabé:
7) Construção do troço da estrada marginal da Portela ao parquo da cidade;
8) Construção das chamadas avenidas utilitárias e marginal;
9) Construção de albergues de juventude;
10) Construção de uma pousada no vale do Inferno, de um hotel de turismo na cidade e de um restaurante de primeira categoria.
Sr s. Deputados que entraram durante a sessão:
Antão Santos da Cunha.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António José Braz Esgueiro.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Alves Moreira.
Francisco Cabral Moncada de Carvalho (Cazal Ribeiro).
Francisco José Eoseta Fino.
Henrique Ernesto Serra dos Santos Tenreiro.
Jerónimo Henriques Jorge.
João Duarte de Oliveira.
João Ubach Chaves.
José Dias de Araújo Correia.
José Manuel da Costa.
José Soares da Fonseca.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Manuel Henriques Nazaré.
Manuel João Cutileiro Ferreira.
D. Maria Ester Guerne Garcia de Lemos.
Paulo Cancella de Abreu.
Sebastião Alves.
Tito de Castelo Branco Arantes.
Página 648
648 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 36
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Albano Carlos Pereira Dias de Magalhães.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
António Calapez Gomes Garcia.
António Júlio de Castro Fernandes.
António Magro Borges de Araújo.
António Maria Santos da Cunha.
Arlindo Gonçalves Soares.
Armando Acácio de Sousa Magalhães.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Aulácio Rodrigues de Almeida.
Avelino Barbieri Figueiredo Batista Cardoso
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Henrique Veiga de Macedo.
James Pinto Buli.
José Alberto de Carvalho.
José Gonçalves de Araújo Novo.
José Guilherme Bato de Melo e Castro.
José Henriques Mouta.
José dos Santos Bessa.
Leonardo Augusto Coimbra.
Luciano Machado Soares.
Luís Folhadela Carneiro de Oliveira
Manuel Amorim. de Sousa Meneses
Miguel Augusto Pinto de Meneses.
Rogério Noel Peres Claro.
D. Sinclética Soares Santos Torres.
O REDACTOR - António Manuel Pereira.
IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA