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REPÚBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL
DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 65
ANO DE 1967 10 DE FEVEREIRO
ASSEMBLEIA NACIONAL
IX LEGISLATURA
SESSÃO N.º 65, EM 9 DE FEVEREIRO
Presidente: Exmo. Sr. Mário de Figueiredo
Secretários: Exmos. Srs.
Fernando Cld de Oliveira Proença
Mário Bento Martins Soares
SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 30 minutos.
Antes da ordem do dia.- Deu-se conta do expediente.
O Sr. Presidente comunicou que, para efeito do disposto no § 3º do artigo 109º da Constituição, recebera da Presidência do Conselho os Decretos-Leis nºs 47 520, 47 521 e 47 522.
O Sr. Deputado Santos Bessa ocupou-se da liberdade com que se vendem, sem receita medica, drogas anticoncepcionais.
O Sr. Deputado Amaral Neto solicitou do Governo que aos bombeiros municipais e voluntários sejam vendidos os combustíveis líquidos pelos mesmos preços por que os adquirem o Exército e a Legião Portuguesa.
O Sr. Deputado Janeiro Neves apoiou uma pretensão da Câmara Municipal da Beira sobre aproveitamento de terrenos na área do seu concelho.
O Sr. Deputado Cazal Ribeiro enalteceu o valor da comunidade luso-brasileira a propósito da visita da esquadra, brasileira a Angola.
No mesmo sentido falou o Sr. Deputado Pinto de Meneses.
Ordem do dia. - Continuou o debate na generalidade sobre a proposta de lei que estabelece o novo regime jurídico da caça.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Folhadela de Oliveira e Feres Claro.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas.
O Sr. Presidente: - Vai fazer-se a chamada.
Eram 16 horas e 15 minutos.
Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados.
Albano Carlos Pereira Dias de Magalhães.
Alberto Pacheco Jorge.
André da Silva Campos Neves.
Aníbal Rodrigues Dias Correia.
António Augusto Ferreira da Cruz.
António Calapez Gomes Garcia.
António Dias Ferrão Castelo Branco.
António Furtado dos Santos.
António José Braz Regueiro.
António Manuel Gonçalves Rapazote.
António Maria Santos da Cunha.
António Moreira Longo.
Arlindo Gonçalves Soares.
Armando Acácio de Sousa Magalhães.
Armando José Perdigão.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Correia Barbosa.
Artur Proença Duarte.
Augusto Salazar Leite.
Avelino Barbieri Figueiredo Batista Cardoso.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
D. Custódia Lopes.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando Afonso de Melo Giraldes.
Fernando Alberto de Oliveira.
Fernando Cid de Oliveira Proença.
Filomeno da Silva Cartaxo.
Francisco António da Silva.
Francisco Cabral Moncada de Carvalho (Cazal Ribeiro).
Francisco José Cortes Simões.
Gonçalo Castel-Branco da Costa de Sousa Macedo Mês- quitela.
Henrique Veiga de Macedo.
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Horácio Brás da Silva
James Pinto Buli
Jerónimo Henriques Jorge
João Ubach Chaves
Joaquim José Nunes de Oliveira
Jorge Barros Duarte
José Coelho Jordão
José Dias de Araújo Correia
José Fernando Nunes Barata
José Henriques Mouta
José Janeiro Neves
José Manuel da Costa
José dos Santos Bessa
José Soares da Fonseca
José Vicente de Abreu
Júlio Dias das Neves
Leonardo Augusto Coimbra
Luciano Machado Soares
Luís Arriaga de Sá Linhares
Luís Folhadela Carneiro de Oliveira
Manuel João Correia
Manuel João Cutileiro Ferreira
Manuel José de Almeida Braamcamp Sobral
Manuel Lopes de Almeida
Manuel Nunes Fernandes
Manuel de Sousa Rosal Júnior
D Maria Ester Guerne Garcia de Lemos
D Maria de Lourdes Filomena Figueiredo de Albuquerque
Mário Amaro Salgueiro dos Santos Galo
Mário Bento Martins Soares
Mário de Figueiredo
Martinho Cândido Vaz Pires
Miguel Augusto Pinto de Meneses
Paulo Cancella de Abreu
Rafael Valadão dos Santos
Raul Satúrio Pires
Raul da Silva e Cunha Araújo
Rogério Noel Peres Claro
Rui Manuel da Silva Vieira
Rui Pontífice de Sousa
Sérgio Lecercle Sirvoícar
Tito Lívio Maria Feijóo
Virgílio David Pereira e Cruz
O Sr Presidente: - Estão presentes 76 Srs Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 16 horas e 30 minutos.
Antes da ordem do dia
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Das direcções do Sindicato Nacional dos Operários Tanoeiros de Lisboa e do Grémio do Comércio de Ovar a apoiar a intervenção do Sr Deputado Pinto de Meneses sobre o transporte de vinhos para o ultramar.
Das comilões venatórias de Matosinhos, Lousada, Santa Marta de Penaguião, Esposende, Guimarães, Valongo, Gaia, Famalicão, Maia, Espinho, Fafe, Gondomar e Paredes, de Clube de Caçadores de Guimarães, de um grupo de caçadores do Porto, do Clube de Caça e Pesca de Fafe e de grupos, de caçadores de Valongo Gondomar, Porto e Lisboa a aplaudirem e a concordarem com a intervenção do Sr Deputado Sousa Magalhães no debate sobre o regime jurídico da caça.
O Si Presidente: - Paru efeito do disposto no § 3º do artigo 109º da Constituição estão na Mesa os Direitos do Governo nº 29 e 30, 1ª série, de 3 e 4 do corrente mês, que inserem os Decretos-Leis nº 47520, que declara a utilidade pública e a urgência da expropriação, requerida pela firma Celulose do Tejo, S A R L, dos prédios que necessita para instalação de uma fábrica de pasta de celulose pelo sulfato, a instalar no distrito de Castelo Branco 47521, que autoriza o Governo, pelos Ministros das Finanças, do Ultramar e da Economia, a conceder à Siderurgia Nacional, S A R L , autorização para ampliação das suas instalações siderúrgicas no Seixal, nas condições estabelecidas no presente diploma, e 47522, que sujeita à aplicação das taxas da pauta mínima as importações de determinadas quantidades de manteiga de países do Leste europeu, a efectuar pela Junta Nacional dos Produtos Pecuários, para ocorrer às necessidades do abastecimento público.
Estão também na Mesa os elementos destinados a satisfazer o requerimento apresentado pelo Sr Deputado Valadão dos Santos na sessão de 8 de Março do 1966.
Vão ser entregues àquele Sr Deputado.
Igualmente estão na Mesa os elementos, fornecidos pela Secretaria de Estudo da Agricultura, destinados a satisfazer o requerimento apresentado pelo Sr Deputado Cortes Simões na sessão de 4 de Março de 1966.
Vão também ser entregues àquele Sr Deputado.
Pausa.
O Sr Presidente: - Tem a palavra o Sr Deputado Santos Bessa
O Sr Santos Bessa: - Sr Presidente Venho hoje ocupar-me de um problema delicado - o do uso, e abuso, de certos medicamentos e da facilidade com que, neste país se reclamam livremente e livremente se vendem a qualquer pessoa mesmo sem receita médica.
Refiro-me ao grupo de drogas conhecidas como progestativas, à famosa e tão discutida «pílula».
Não se estranhe que numa assembleia desta natureza, eminentemente política, venha ocupar-me deste assunto. Ele reveste aspectos políticos da maior importância, com incidências não só na saúde dos que usam sem vigilância médica essas drogas, como também, provavelmente, na formação o desenvolvimento do produto da concepção. Quero limitar-me aos aspectos médicos do problema, deixando inteiramente de lado os de natureza moral e religiosa, que tão acaloradas discussões têm motivado e que tanta tinta têm feito correr.
Esta era da contracepção oral tem pouco mais de dez anos Nasceu em Porto Rico, em 1956, e foram seus criadores Gregory Pinkus e o grupo de colaboradores que lhe assistia no Centro de Planeamento Familiar Três anos depois, em 1959, em Los Angeles, Tyler e Olson iniciaram a sua aplicação sistemática e em massa Difundiu-se pelo mundo inteiro e as suas implicações humanas, religiosas, morais, sociais e políticas têm sido objecto de estudo cuidadoso, que preocupa teólogos, sociólogos, economistas, políticos e cientistas e tem dado origem às mais apaixonadas polémicas, não só nas registas especializadas, como na grande imprensa. Afirma-se mesmo que, só na França, em 1966, foram publicados a tal respeito nada menos de 40O artigos numas e noutra Em Portugal não tem sido poqueno o interesse despertado e, por isso mesmo, se justifica esta intervenção
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Há menos de dois anos em 27 de Março de 1965 Sua Santidade Paulo VI, ao dar posse à comissão de sacerdotes de médicos, e de outros elementos (primeiramente constituída por 20 e agora possuindo 50 membros) destinada a estudar os problemas da natalidade afirmou tratar-se "de um problema que apaixona a opinião mundial e que preocupa justamente os esposos o os seus pastores" F. disse também que a questão era muito importante e as incertezas muito dolorosas para alguns, razão por que havia necessidade e urgência de dar uma resposta.
Pois até hoje, a resposta ainda não foi dada e mantém-se de pé aquilo que Sua Santidade afirmou noutra ocasião, por muito que custe a certos entusiastas do método.
Não vejo ainda razões para alterar em nada aquilo que foi dito por Pio XII.
Ainda não há muito que 400 médicos alemães à frete dos quais estava o próprio Knaus, dirigiram uma exposição ao Ministro da Saúde Publica da Alemanha Federal exprimindo as suas preocupações pela desenfreada propagando, anticoncepcional e em que não deixaram de incluir a imoralidade moderna, a sexualização da vida pública e os problemas do abortamento.
E o Instituto de Antropologia Médica de S. Lucas, de Munster (Alemanha), dirigiu um inquérito que compreendeu 3500 médicos e 15 000 outras pessoas da Alemanha, e da Áustria, depois de cujas conclusões entendeu dever dirigir um apelo à Comissão Pontifical Família- Natalidade para que se abstivesse de recomendar tal ou tal método de limitação da natalidade.
No ano passado em França o director do Instituto Nacional de Saúde e Investigação Médica por indicação do Ministro da Saúde Publica o da População nomeou uma comissão encarregada de elaborar, um relatório sobre as "consequências para a saúde das pílulas anticoncepcionais". Foi presidida pelo Prof. Lacome director da Maternidade do Baudelocq, e dela faziam parte dez professores e dois médicos especialistas de obstetríern, ginecologia genética medicina legal etc. Cada um deles elaborou um relatório da sua especialidade, quem depois de discutidos deram origem a uma parecer final, global, aprovada por unanimidade.
Nele só afirma que não há um, mas muitos, contraceptivos à venda, consistindo geralmente em associação de estrangeiros e de progestativos diferentes e portanto, com propriedades farmacológicas diversas consoante as associações realizadas, e que todos os dias o mercado é invadido por novas composições destinadas á contracepção. Igualmente se diz que os conhecimentos de que se dispõe, mesmo em relação aos produtos, actualmente utilizadas são ainda recentes, incompletos e, em muitos aspectos importantes inseguros que parece unânime a opinião de que muitas dessas drogas produzem um estado pseudogestativo com estase venosa, que as mulheres com nefropatia ou hipertensão arterial e as que tiverem icterícia gravídica devem ser particularmente vigiadas, que as diabéticas correm risco pelas alterações da tolerância hidiocarbonada que a administração destes produtos a mulheres com antecedentes de perturbações vasculares cerebrais e perturbações psíquicas requer grande prudência, não se oculta a preocupação de uma eventual acção cancerígena de tais drogas e, por todas estas razões, afirmam ser necessário de exame médico a prescrição da tal "pílula".
Estas drogas, a, que, abusivamente algumas vezes se chamam gestagenios ou progestagenios, em vez de progestativos, são usadas, não para favorecer a gestação (progestatronem), criando condições de nidação e nutrição ao ovo fecundado como naturalmente e fisiologicamente acontece, mas como anticoncepcionais ou melhor como inibidores da maturação folicular e consequente ovulação. Para tal fim, em vez de progesterona produto natural muito caro pouco activo por via oral [...] rápida destruição no organismo, passaram a usar-se os chamados progestativos semi- sintéticos ou artificiais que são produtos químicos sintetizados no laboratório e não no organismo cuja preparação se tornou possível desde que [...], em 1934 descobriu a sua composição química, que são mais baratos e muitos activos por via digestiva que tem uma semelhança estrutural e algumas das acções da progesterona, mas que tem também algumas acções secundárias, a que é preciso atender e contra as quais há fundados recursos.
Todos eles tem acção [...], mas além desta exercem acções fármaco- dinâmicas mais ou menos complexas principalmente estrogenicas [...] antigo nodotiópicas e anabolizantes consoante as associações medicamentosas que entram em cada um dos preparados que se vendem sob várias designações comerciais. São os próprios produtos ou os metabolitos resultantes da sua transformação no organismo que as originam.
Fazer crescer os pelos da barba, dar outra tonalidade à voz, reprimir o fluxo menstrual, originar tensão da glândula mamaria, produzir náuseas, promover esta acção termogénica, podem ser problemas de pouca [...] para as preocupações estéticas ou para a comodidade de certas senhoras mas já o mesmo se não poderá das perturbações que se refere o relatório francês que citei nem da atrofia do endométrio nem da modificação do muco do colo nem da alteração da coagulabilidade sanguínea, nem da masculinização dos fetos femininos produzidos por certas substâncias androgínicas contidas na pílula (já demonstradas) nem do receio da produção de óvulos anormais dos foliculos primordiais mantidos em repouso por meses ou anos, nem da preocupação que é justo admitir-se de se originar uma gravidez- surpresa e dos anovulatórios ingeridos nem actuar sobre o embrião na fase de gastrulação onde como está provado a sensibilidade teratogénea atinge o antigo o auge e onde as drogas de mais aparente inocuidade podem originar malformações congénitas. E esta gravidez- surpresa é um fenómeno corrente quando, por qualquer descuido, se interrompe a ingestão da pílula - há uma exaltação do poder da ovulação.
Se e difícil é difícil fazer prova desta última acção mais difícil e demonstrar que não é licito pôr a hipótese.
Os problemas criados pela talidornida são de data recente e não podem ser facilmente esquecidos.
Só quem não conhece as múltiplas acções acessórias e secundárias dos progestativos artificiais é que não sente preocupações acerca das possíveis potencialidades nocivas de qualquer tratamento prolongado com esses produtos.
Essa preocupação deve estar sempre presente na mulher que utiliza tais produtos e não deve deixar de o estar também no do médico que os receita. É preciso garantir a sua inocuidade e não só a imediata como também a tardia. A experimentação animal não pode ser resposta a todas as preocupações que agora nos dominam os dez anos de aplicação das drogas não são suficientes para a recolha de dados e só o tempo trará o seu esclarecimento, mas então pode ser já tarde, como aliás tem acontecido com tantos medicamentos, o cada voz mais frequentemente sucede. Quem poderá garantir que um órgão eminentemente sensível como o ovário não possa ser profundamente alterado se se mantiver inactivo, por acção dessas drogas, durante anos e anos? Quem poderá afir-
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mar que muitas outras funções e a própria menopausa não serão seriamente perturbadas? Quem se responsabiliza pelas consequências desastrosas resultantes da possível cancerização de um nódulo do seio em senhoras que dela eram portadoras conscientes ou naquelas que ignoraram a sua existência?
Não é possível saber quantos milhares de senhoras em Portugal, usam indiscriminadamente e inconscientemente tais drogas mas julga-se saber que são muitíssimas atentando na difusão dos reclames comerciais na receptividade feminina para a "pílula", até no estimulo que provém tantas vezes dos que deviam ser mais cantos nos seus conselhos. No Congresso Internacional de Singapura, há três anos, afirmou-se que nos Estados Unidos já a usavam l 250 000 mulheres.
Sr. Presidente. Julgo ter demonstrado a necessidade de proteger a mulher portuguesa e o produto da concepção contra os perigos que correm pelo uso indiscriminado destas drogas, que em o menor rebuco ou com a mais manifesta inconsciência e liberdade se reclamam aconselham e vendem neste país. Como médico e como Deputado que se preocupa com a política da saúde, chamo para este problema a atenção do Sr. Ministro da Saúde e Assistência, uma vez que ela tem não só as implicações que citeis, mas outras do natureza demográfica que, para nós portugueses, são muito importantes.
Vozes: -Muito bem!
O Orador: -A este propósito quero recordar que na minha intervenção de 16 de Dezembro último tracei perante a câmara o panorama do envelhecimento contínuo da nossa população, consequência do uma mortalidade infantil teimosamente renitente na sua descida por causa da nossa deficiente assistência de uma duração média da vida cada vez maior e de uma taxa do natalidade cada vez mais baixa, esta última consequência não só da elevação do nosso nível cultural como acontece noutros países, mas também, principalmente nos últimos anos, devido à emigração e à mobilização que se têm verificado.
Disse também como era mais fácil promover uma baixa da mortalidade infantil do que estimular a natalidade e que a primeira bastava para garantir a juventude da população.
À renitência da taxa da natalidade infantil e aos elementos que fazem baixar a da natalidade vem agora juntar-se a "pílula".
Como disse o Prof. Miller Guerra nós não carecemos de uma política de prevenção da natalidade, como parece ser necessário noutros países. Temos campo aberto a muitos mais portugueses do que aqueles que somos hoje e, por isso, carecemos, pelo contrário, de uma política que estimule a natalidade.
Vozes: -Muito bem!
a Orador:-A política da prevenção da natalidade falhou em países onde se instaurou por várias razoes, mas sobretudo porque como diz o mesmo professor, "para haver prevenção é preciso que exista um determinado nível de cultura que permita compreender a ideia da prevenção, quer dizer, que haja consciência do futuro". Foi por isso que ela falhou no Japão e na China, e foi por isso que foi inútil a ida de Gregory Pinkus à índia.
E mesmo nas outras populações cultas a política não vingará sem um esforço consciente e sem uma vontade persistente.
Mas se não é possível instaurar no nosso país uma política que traga rapidamente para níveis europeus a nossa taxa da mortalidade infantil e se é impossível fomentar a natalidade, ao menos que se tomem medidas legais e policiais para evitar que esta ultima acelere a sua marcha regressiva.
As disposições legais que possuímos não chegam para o conseguir.
O S 3º do Decreto-Lei n º 31 171 estabelece.
Nunca poderá ser autorizada a venda de acessórios médicos ou apresentados como tais cujas propriedades ou efeitos contrários à moral e aos bons costumes ou capazes de interromper ou perturbar de qualquer modo a mancha fisiológica da gravidez.
Mas a "pílula" não está abrangida pelas drogas que têm "propriedades ou efeitos contrários à moral e aos bons costumes" e, por outro lado como por princípio não há gravidez em causa ela não vem "perturbar a mancha fisiológica da gravidez". Quer dizer este decreto-lei não impede que ela se venda sem rebuço nem o mínimo constrangimento legal. Por sua vez, também nem os que a vendem nem os que a compram têm qualquer constrangimento moral por causa de certas doutrinas que alguns que por aí andam abusivamente a propagandear antecipando-se a quem deve definir a doutrina oficial.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Também o § 2º do artigo 28º do Decreto n º 17 636 de 18 de Novembro de 1929, não abrange estas drogas nem impede a sua venda sem receita médica, porque a "pílula" não é "abortiva" e porque se parte do princípio, por conveniência que sendo um produto que impede a concepção não esta sob a sua alçada.
Também pode considerar-se excluído da lista dos proibidos por não ser rigorosamente antigenésico.
As disposições legais que possuímos condenam o abortamento a esterilização e a eutanásia mas não a contracepção.
Não é nosso propósito fazer admitir a contracepção como um processo de esterilização, embora temporária, para que possa ser abrangido pela lei actual nem procurar obter qualquer diploma para a proibir. Se tiver de vir a sê-lo, há-de ser por via de decisões de outra natureza fundamento moral ou religioso e não é a esta Câmara nem ao Governo que compete fazê-lo.
O que pretendemos salvaguardar são as consequências da aplicação cega destas drogas e que o Ministério da Saúde e Assistência faça publicar uma disposição legal que impeça a sua venda sem receita médica, que faça depois cumprir essa determinação e que, ao mesmo tempo, através da Comissão Nacional para a Educação Sanitária ou por qualquer outro processo, faça uma ampla campanha de esclarecimento sobre os indiscutíveis inconvenientes da ingestão de tais drogas sem vigilância médica.
O Sr. Campos Neves: - V. Ex.ª dá-me licença?
O Orador: - faça favor.
O Sr. Campos Neves: - Tenho estado a ouvir com a maior atenção esta intervenção de V. Ex.ª sobre um tema que se me afigura da maior oportunidade e interesse e parece-me dever pedir-lhe licença para reforçai um aspecto já referido por V. Ex.ª trata-se do receio, hoje muito generalizado, de que o uso e abuso dos contracep-
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tivos, hoje tão em voga, possa vir a resultar na génese do cancro Na verdade, as tais pílulas contraceptivas contêm normalmente como princípios activos derivados de hormonas esteróidicas do tipo da progesterona, testosterona, estradiol, etc. , preparados por síntese química.
Ora, há fortes suspeitas, que de dia a dia se vão cada vez mais acentuando, de que a existência no organismo humano de doses excessivas de compostos desta natureza possa constituir, em vários casos, a causa determinante do desenvolvimento de tumores malignos. Só o futuro nos dirá até que ponto tão generalizado receio é fundado.
Estou de inteiro acordo com V. Ex.ª. Tal género de medicamentos deverá merecer a devida atenção do Ministério da Saúde e Assistência, por forma que não possam ser facultados ao público sem receita médica.
O Orador: - O relatório dos cientistas franceses, os simpósios e as conferências realizadas em Portugal e noutros países e os múltiplos artigos publicados em revistas médicas justificam amplamente estas medidas e a urgência da sua aplicação.
E não estou sozinho nesta atitude, já que a France Presse difundiu pelo Mundo, há três dias, a notícia de que a minha colega médica Shirley Summerskill vai até mais além, porque vai pedir ao Governo de Sua Majestade Britânica que retire do circuito comercial as pílulas anticoncepcionais, fundada na morte por embolia de uma jovem de 25 anos, morte que foi atribuída ao uso da "pílula" durante dois anos. À isso a obriga a sua tripla condição de médica, de mulher e de Deputada e Deputada Trabalhista!
A tanto não chego eu, porque as drogas têm potencialidades fármaco- dinâmicas de indiscutível benefício para a humanidade. E nas mãos dos obstetras e dos ginecologistas pode mesmo resolver casos clínicos e até alguns de esterilidade feminina.
Mas só o médico tem competência para as pôr ao serviço da humanidade - só ele sabe quando e como deve fazê-lo.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Amaral Neto: - Sr. Presidente- Pedi a palavra para um daqueles assuntos pequeninos que gosto de tratar, lembrado, como sempre, do conselho do pintor ao sapateiro. Queria, com efeito, pedir a V. Ex.ª que recebesse, para daqui chegar aos ouvidos do Sr Ministro do Exército e de quem mais tenha a possibilidade de superintender na decisão, um pedido dos corpos de bombeiros da minha região, que será sentido, perfilhado e apoiado por todos quantos têm a administração e cuidado desses prestimosos organismos. O pedido é simples. Está estabelecido serem os corpos de bombeiros abastecidos de combustíveis líquidos para as suas viaturas através dos serviços especializados do Exército, que, para o caso, creio serem os da Manutenção Militar. Foi escrito numa circular de 1960, a informar as corporações interessadas, que as condições de fornecimento seriam iguais às que se praticassem, nos mesmos locais de entrega, para os serviços da defesa civil do território exercida pela Legião Portuguesa e para os serviços do Exército. Essa circular foi expedida a informar os corpos dos bombeiros da regalia que lhes era dada. Os preços para a gasolina avariam, conforme os distritos, quanto à gasolina normal, entre 3$65 e 4$ por litro, e, quanto ao gasóleo, entre l$25 a 1$60 por litro, o mais barato em Lisboa e o mais caro em Faro.
Sucede, porém, que os preços foram alterados Segundo as últimas comunicações, estão presentemente a vigorar, para a gasolina, preços que vão de 5$ a 5$20, conforme seja no distrito de Lisboa ou nos outros distritos da área da Inspecção de Incêndios da Zona Sul, e, para o gasóleo, preços que vão de l$45 a l$65. O reparo, a queixa, o pedido dos corpos de bombeiros, é que lhes seja mantida a equiparação com os preços feitos para o Exército e para a Legião Portuguesa, os quais estão a ser cerca de $40 mais baratos dos que actualmente estabelecidos para os corpos de bombeiros.
Como V. Ex.ª e a Assembleia vêem, é um pedido bem miúdo e que, por isso, parecerá a alguns observadores superficiais indigno do tempo que com ele ocupo a atenção de VV Ex.ª. Porém, nenhum de nós ignora com certeza quanto entusiasmo e dedicação são necessários para sustentar os corpos de bombeiros, sobretudo os de voluntários Perante o incêndio que tudo destrói, que fere e magoa como nenhuma outra calamidade, parece que, por um desígnio da Providência, os sentimentos de altruísmo e dedicação levam precisamente os mais humildes, os menos interessados na salvaguarda dos riscos do fogo, a sacrificar o seu descanso, a suportar incómodos e a arriscar a vida para combaterem, em comum ou suprindo os corpos de bombeiros profissionais, as chamas devastadoras.
Por essas aldeias e vilas do País não é raro encontrar homens alheados, em regra, da vida colectiva, aparentemente absorvidos no seu egoísmo, introversos no mais alto grau, que, ao toque da campainha de alarme, aparecem espontaneamente a cooperar na luta contra o flagelo do fogo. Não há dúvida de que, dos quatro elementos que os Antigos consideravam como dominadores do meio físico, o ar, a terra, a água e o fogo, é este último o que ainda hoje mais assusta e mais prejuízos causa à humanidade. Daí que seja também o que mais incita os homens a unirem-se na luta contra ele. Mas não é só no domínio da luta contra o fogo que os corpos de bombeiros são úteis. VV. Ex.ª sabem bem que os corpos de bombeiros vão pelo País fora, organizando serviços de transporte de doentes, que têm um carácter auxiliar precioso na luta contra a doença, quer seja para levar o inválido ou leso aos serviços de agentes físicos, quer para o transportar ao hospital central ou trazê-lo, em estado de convalescença, na auto-maca dos bombeiros. Ora, é no funcionamento dessas auto-macas que se faz mais despesa dos combustíveis líquidos cujo barateamento estou pedindo.
Em Agosto do ano passado, morreram em Sintra alguns militares num acidente que demonstrou claramente como um incêndio pode destruir vidas. Ao lado desses militares bem podiam ter perecido quaisquer outros de centenas de voluntários que com eles combatiam as chamas. Há poucas semanas ainda, em Lisboa, um voluntário, um burguês com a sua vida organizada, sucumbiu por acudir a um fogo, em consequência do qual acabou por perder a vida. As associações de bombeiros ainda hoje são pólos de vida associativa. Precisamente na mesma semana em que os jornais nos deram notícia dessa desgraçada morte, veio uma entrevista num dos diários da tarde que usa questionar o público sobre matérias avulsas e então se perguntava a alguém "Onde costuma encontrar-se com os seus amigos?" A resposta foi "Tenho a minha vida de trabalho, quando esta acaba, vou para a associação de bombeiros de que sou sócio, à espera de ser chamado para algum serviço. Por isso, hoje em dia não encontro os meus amigos noutro sítio".
É preciso que se tenha a noção bem clara de que os corpos de bombeiros polarizam muitas energias, dedicação e boa vontade. São merecedores, portanto, de todo o ca-
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rinho, e estes módicos $30 ou $40 que lhes sejam restituídos como benefício na aquisição de combustíveis líquidos não são pouca coisa. Nem o simples facto de se destinarem a sustentar veículos de cara aquisição nos deve fazer esquecer que, se essa aquisição é possível num arranque de boas vontades, a sua manutenção. Já se torna difícil. E, aliás, uma característica nossa há dinheiro para construir o hospital, mas depois falta a verba para o aquecimento, as caixas de previdência instalam os seus condicionamentos de ar, mas - dizem os interessados - ratinham os tratamentos, arborizam-se baldios e dunas, e depois falta-se-lhes com os cuidados regulares do ordenamento cultural, muitos particulares compram automóvel, para depois os abastecerem às doses de cinco litros. É a parcimónia no quotidiano, que não reprovo, porque ainda, quando não provenha de espírito de economia, acaba por o impor, mas é esta mesma parcimónia do quotidiano que também aflige os bombeiros e lhes tornará precioso até este modesto benefício.
Estou convencido de que acabará por ser ouvido o apelo que aqui trago, não por iniciativa própria, mas por uma questão de simples e grato apoio a uma solicitação que me foi feita Portanto, não me alongarei mais, na esperança de que seja feita aos corpos de bombeiros deste país a justiça que todos eles merecem em medida por poucos igualada
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado
O Sr. Janeiro Neves:-Sr. Presidente- Em 1942, findas as funções majestáticas que a Companhia de Moçambique vinha exercendo nos territórios de Manica e Sofala, da província de Moçambique, foi outorgado ao concelho da Beira o seu foral. Ali se estabelecem, entre outras disposições, as condições de aproveitamento dos terrenos foreiros.
Em 1945, considerando que os estabelecimentos de crédito apenas o concediam a proprietários de domínio pleno, foi, no intuito de promover o desenvolvimento da construção, introduzida naquele diploma do foral uma disposição que permitia a remição de foros, muito embora os terrenos não estivessem totalmente aproveitados.
No uso deste poder legal, foi a Câmara Municipal concedendo remições.
Entretanto, verificando-se que, afinal, aquela boa intenção dera origem a especulações, em 1950, a pedido da Câmara, novas alterações são introduzidas, de modo a obrigar os concessionários a construir, em suma, como reconhece o preâmbulo da lei, a cumprirem a sua "obrigação primária".
Estabelecem-se multas anuais e prazos para efectuar o total aproveitamento, findos os quais seriam anuladas as concessões. Exceptuavam-se desta última sanção os terrenos concedidos pela antiga majestática, que ficavam apenas sujeitos ao pagamento de multas anuais, inicialmente progressivas.
Estávamos em 1950. Pois, Sr. Presidente, aquelas sanções, solicitadas pela Câmara, sublinha-se, nunca foram aplicadas, ao que se diz, com o fundamento de que as multas eram muito pesadas. E, muito singelamente, a Câmara colocou-se na situação de não cumprimento das disposições legais.
Em 1957, com fundamento no aludido peso das multas, a Câmara pede ao Governo- Geral a sua redução. Este pedido não foi atendido, o que leva a concluir que o Governo da província não achava a "medida" da multa excessiva e como a lei é para se cumprir, não haveria mais que cumprir.
Mas não se cumpriu Porquê? Não sei.
Qual o resultado? Além da ilegalidade - o que já é muito -, foi este a cidade da Beira ficou semeada de terrenos sem qualquer aproveitamento, ou com aproveitamento mínimo, o que, além dos inconvenientes de ordem sanitária e estética, acarreta ao erário municipal enormes despesas, já que a cidade cresceu muito mais em extensão que em densidade, provocando elevados custos de serviços, para os quais não há as correspondentes receitas.
Estes os factos.
No 2 º semestre de 1965, dela tomaram conhecimento os então e agora componentes da Câmara Municipal, entre os quais me incluo. Foi determinado um estudo, já que, como facilmente se compreende, muitas, diversas e mais ou menos complicadas seriam as situações resultantes do não cumprimento da lei durante, pelo menos, quinze anos.
Com os escassos meios de que os serviços dispõem, foi-se realizando esse estudo, até que, em fins de Setembro do ano transacto, foram transmitidas ao Governo- Geral deliberações da Câmara solicitando a alteração da lei vigente, não sem que entretanto se tomassem todas as providências para defesa dos interesses do Município.
Vão já decorridos quatro meses sem que, todavia, o Governo- Geral tome qualquer decisão, o que acarreta manifestos prejuízos.
Nestes termos, aqui fica o meu apelo no sentido de que o Governo providencie com a maior urgência para que concretamente se defina a situação dos terrenos não totalmente aproveitados situados na área do concelho da Beira.
Feito este apelo, permita-me V. Ex.ª, Sr. Presidente, só mais umas breves palavras, que julgo oportunas.
No Conselho Legislativo da província de Moçambique, censurando-se a Câmara Municipal da Beira por querer cumprir a lei (III), foi afirmado que, mercê dessa atitude, a população daquela cidade estava desunida, contrariando a sua habitual união.
Ora, porque estas afirmações podem ter chegado ao conhecimento de alguns Srs. Deputados, sinto ser meu dever esclarecer esta Assembleia de que o facto de umas escassas dezenas de munícipes - entre dezenas de milhares - pretenderem a cómoda situação da ilegalidade em que se vinha vivendo, porque essa salvaguardava o seu interesse imediato, não significa que haja desunião.
Pelo contrário, a população da Beira, população de apurado civismo e profundo amor à Pátria, nunca esteve tão unida, quer em relação aos interesses locais, quer em relação aos interesses nacionais. E no ano findo várias vezes esse amor pela sua cidade e pela Pátria foi amplamente demonstrado. À cidade da Beira quer viver em legalidade e a bem da Nação Em suma a Beira é Portugal!
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr Cazal Ribeiro: - Sr. Presidente Apenas duas palavras para manifestar nesta Câmara o extraordinário significado que tem para nós, Portugueses, e para o mundo que nos espreita, e ainda para aqueles que, sem qualquer sentimento patriótico, glosam o tema de que "estamos sós", deturpando a intenção de quem um dia proclamou que, se o estivemos, era "orgulhosamente", não posso, nem quero, nem devo deixar de enaltecer o
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extraordinário significado que tem a visita de uma esquadra brasileira a Luanda
A comunidade luso-brasileira, separada pelo oceano Atlântico, mas ligada por mil laços de sangue, de ideal e de raça, sai, desta forma, extraordinariamente robustecida graças a revolução que no Brasil, como o 28 de Maio entre nós, reencontrou uma política que por todas as razões, será mimoso deturpar
Brasil e Portugal e Brasil, duas pátrias e um só povo duas concepções de vida e um só ideal o entusiasmo e a extraordinária influência na civilização de que nós fomos pioneiros e o Brasil soube seguir, mantendo em terias de Santa Cruz a fé que para levámos há quase cinco séculos
É possível que outros Deputados com mais propriedade do que eu próprio te tenham a este transcendente facto que é de hoje, que não se peide no tempo e que fará perdurar uma prova de amizade, de compreensão e lusitanidade que o Brasil pai- irmão e amigo acaba dar ao mundo.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi minto cumprimentado
O Sr Pinto de Meneses: - Sr. Presidente Os últimos acontecimentos, ocorridos dentro do quadro das relações luso-brasileiras assumiram tal expressão que certamente não será demasiado juntar às considerações muito oportunas do Sr. Deputado Cazal Ribeiro algumas palavras despretensiosas.
Os acordos assinados em Setembro do ano transacto entre os chanceleres das duas nações a visita amiga do marechal Costa e Silva presidente eleito do Brasil e presente vinda da armada brasileira a Angola são asserções de tão fraterna amizade que já não é mais lícita duvidar da comunidade de destinos das duas pátrias irmãs independentemente de júbilo que estes actos suscitaram em todo o País fica-nos radicada a convicção do que se passou afim da concepção romântica formosa mas inoperante de que Portugal e Brasil formavam uma espécie de Estados Unidos de Saudade para uma política mais pratica e realista de convívio permutas realizações
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Deste revigoramento desta mais firme vinculação de relações só benefícios poderão resultar para nós e para os liras leu os 100 milhões do homens movendo-se em teu própria dentro de cinco continente e possuindo um património físico e espiritual de potencialidades insuperáveis constituem na panorâmica mundial um bloco político e cultural de irrecusável poder decisório.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Em face de todas as provas de simpatia e colaboração que ultimamente temos recebido do Brasil ganha um novo alento a posição de Portugal no Mundo e torna-se mais esplendente a constelação das, nossas razões morais jurídicas e históricas.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Porque a verdade Sr. Presidente, a verdade que nunca será demais apregoar é que ninguém como o Brasil pode testemunhar tão ao vivo e tão ao
certo sobre a total doação de amor, sangue, alma e cultura que tem sido a presença de Pombal através dos tempos.
Bem hajam pois os governantes, de aquém e de além-mar por terem vindo a tornar cada vez mais estreita a união dos dois povos Satisfazem desta forma as aspirações mais profundas das almas das duas pátrias defendem os interesses das suas gentes e dão uma frutuosa lição de confraternidade num mundo desvanado e intolerante.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: -Com a abertura deste novo capítulo no código de convivência da comunidade luso-brasileira capítulo em que não cabem sofismas, hipócritas amuos e dialécticas mas a linguagem para da idade e a eloquência simples mas vigorosa, dos factos esvanecem-se muitas das nossas dores e pesar e começam a desenhar-se no horizonte aquelas segundas palavras do salmista.
De tarde estaremos em lágrimas
E de manhã em alegria
Vozes: -Muito bem!
O Orador: - Que mais não houvesse estes actos do Brasil já seriam muito para conforto de um povo que viu descer sobre si a iniquidade num voo lapice de abutre a procurar abafar os seus direitos e curvar a sua alma
Vozes: -Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente A hora de Portugal poderá demorar anos e anos, mas chegará infalivelmente Entretanto, a minha gratidão e a minha homenagem aos prestigiosos governantes do Brasil aos seus marinheiros soldados diplomatas escritores, enfim a todos aqueles que, nesse feracíssimo parque de certezas e esperanças que é o Brasil, têm ajudado pela palavra e pelos actos a mover os ponteiros para abreviar essa hora de Portugal hora de justiça paz e amor
Tenho dito
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado
O Sr Presidente: - Vai passar-se à
Ordem do dia
O Sr Presidente: - Continua a discussão na generalidade da proposta de lei sobre o regime jurídico de caça Tem a palavra o Sr Deputado Folhadela de Oliveira
O Sr Folhadela de Oliveira:-Sr Presidente Srs. Deputados de outras razões não houvesse e elas são várias, desde o interesse económico ao turístico - o facto de ter calcorreado de espingarda na mão e bornal à cinta as amplas ladeiras do Larouco e do Barroso, as íngremes encostas do Penacal na região bragantina ou o Pedroso no então duriense as alcantiladas vertentes do Moncorvo ou as ondulantes planurias do Sabugal ou de Monforte enfim, tão diferentes lugares onde a vista se deleita e o corpo se afadiga era para mim motivo suficiente paia usar da palavra neste debate
Entendo não dever prosseguir sem expressar cumprimentos ao ilustre Deputado Aguedo de Oliveira pela apar(...)
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(...)xonada lição sobre a caça que é o seu projecto de lei Através dele estamos agora tentando acudir a uma situação verdadeiramente calamitosa e de graves incidências na vida do País.
Mas não quero também em sã consciência esquece todos quantos ao problema da caça em Portugal têm dedicado particular atenção e ensaiado por diversos meios soluções que não alcançaram acolhimento.
Para todos há um denominador comum o terem alertado o Governo para ser dada solução a um problema de verdadeiro interesse nacional.
Quer na literatura ou nas associações venatórias quer na imprensa ou nos próprios departamentos estaduais por toda a parte se fazia eco da necessidade premente de actualizar a legislação sobre o exercício e fomento da caça.
Assim a partir do momento em que o número de caçadores se tornou elevadíssimo, os transportes se facilitaram em percurso tempo e economia, as armas e utensílios evoluíram tornando-se mais acessíveis e eficazes e a fiscalização, se não decresceu pelo menos manteve-se estacionária, a partir desse momento a caça ficou ameaçada de total extinção.
Época após época, as espécies rareavam e os abusos sucediam-se mais frequentes.
Se tornar-se impopular e antipático regulamentar medidas severas seja para restringir ou cercear actividades tradicionalmente amplas seja até para pôr [...] que elas por demasiado latas acarretam.
Mas a verdade é que as transigências costumam ter preço elevado e, no caso da caça o sentimento conformista de querer conservar as coisas no pé em que estavam foi um dos motivos que mais contribuíram para o desaparecimento da fauna cinegética.
Julgo que o desprezo a que foi votado durante tantos anos este problema se explica pelo receio de substituir uma concepção jurídica absolutamente desactualizada o conceito romanista da propriedade da caça.
O nosso povo diz com o agudo senso de quem reconheço as necessidades e aspira a soluções que «para grandes males grandes remédios» Diagnosticada foi a enfermidade mas não se prescreveu terapêutica.
Faltou coragem para actuar como as circunstâncias exigiam
O parecer é um estudo sério exaustivo e a proposta formulada pela Câmara Corporativa poderá constituir certas emendas, o objectivo a que aspiram todos quantos a este problema deram a sua contribuição.
Neste parecer na minha opinião há dois pontos de muita importância reconhecimento da necessidade de facilitar a constituição de reservas de caça permitindo contratar o seu arrendamento, e ter concluído que as espécies indígenas escasseiam tanto que seria forçoso impor limites à duração do exercício da caça.
Quanto ao primeiro caso, ninguém de boa fé deixa de reconhecer que se não existissem coutadas há muito tempo que a fauna cinegética linha sido extinta
A região do Nordeste, começando em Montalegre Vinhais e todo o distrito de Bragança, constituía uma zona considerada de abundante caça. Hoje, é uma desolação. Mas nos distritos de Viseu Guarda e Castelo Branco onde não há coutadas, a situação é igual.
Actualmente só há caça onde os proprietários se dedicam à sua protecção. 1.º porque é bem simples quanto o caçador ainda em terrenos livres dominado apenas pela intenção de abater espécies o proprietário de uma reserva tem a preocupação de não dizimar pois, embora cace também dá condições e favorece de muitas formas a conservação e repovoamento da sua coutada.
As exigências que a proposta de lei faz recair sobre as coutadas de caça tais como pagamento de taxa e fiscalização, cedência de espécies para repovoamento em terrenos livres e fomento a efectuar nas reservas retiram imediatamente qualquer característica de privilégio que porventura se pretende insinuar.
O passo que a Câmara Corporativa deu sancionado ser objecto de contrato o traspasse do direito de caça - opinião contrária ao do projecto de proposta do governo expressa na base XXIX - além de legalizar uma situação que não podia nem era justo ignorar-se, vem permitir a um maior número de caçadores aproveitarem os benefícios de uma zona em que a fauna abunda.
No que diz respeito ao segundo caso que referi, a limitação do exercício de caça em certo dias entendo ser medida acertada para a conservação das espécies.
Naturalmente que o fim de semana é o período livre em todas as profissões e portanto aquele que mais facilmente se condiciona com a necessidade de exercício salutar.
Com esta limitação consegue-se maior facilidade de fiscalização e além disso possibilita-se à caça escapar à perseguição tenaz do homem desocupado ou ao desgaste provocado aos «profissionais»
Cheguei a um ponto sobre o qual devo emitir opinião. Especula-se com o facto de no mesmo preceito em que a caça é limitada ao fim-de-semana se abrir clara excepção quanto às coutadas (base XV, n.º 2)
Para quem desconhece os problemas da caça, para quem fala por ouvir falar, limitando-se a ser eco roufenho, ou para quem gosta de atrair simpatias fáceis de conquistar em certos auditórios admito o espanto.
Mas causa-me admiração se verifico partir tal crítica de pessoas bem intencionadas.
Não tenho notícia da existência de qualquer coutada onde se realizem mais de duas batidas por época. Quer isto dizer que, tratando-se de propriedades onde não é permitido senão ao seu titular o exercício cinegético é ele próprio que disciplina, a sua actividade por forma a restringir voluntariamente a sua época de caça
Por outro lado, como as batidas só começam em 15 de Novembro mais curto se torna o período de caça nas coutadas
Ora, qualquer limitação de dias, além do representar uma injustiça, por colocar no mesmo plano de igualdade quem apenas, caça e quem, embora caçando fomenta a caça tem cedentes implicações que podem prejudicar uma bem orientada política de turismo.
Sou por natureza avesso a privilégios, e fere-me profundamente qualquer desigualdade que a lei estabeleça ou acanhe.
Por isso aplaudo a solução preconizado pela Câmara Corporativa que se mostrou atenta a uma situação que seria leviandade resolver de outro de outro modo.
Devo notar que não pretendo fazer a crítica do parecer. Todavia, há reparos que entendo apresentar a VV. Ex.ªs.
Sem preocupado de seguir a ordem estabelecida no texto, a primeira dúvida que levanto é esta.
Adoptando a Câmara Corporativa o conceito romanista de considerar a caça res nullus (§ 3.º, n.º 7, p 219) - embora com uma infinidade derrogações que a fazem quase cair na tese contrária -, como conciliar este principio com a responsabilidade civil resultante dos danos causados pelas espécies cinegéticas de um prédio nos terrenos vizinhos (§ 8.º n.º 72 p 246)
Na base III, consagra-se uma responsabilidade objectiva ou pelo risco que ou julgo talvez admissível só na
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hipótese de se considerar a caça fruto ou produto da terra (concepção germânica)
Aliás, os exemplos de legislação que ilustram o texto suo colhidos na Espanha e França, que consagram o princípio oposto ao nosso e, caso curioso, precisamente em Portugal e Itália - países que conservam o principio romanista - é que a caça mais escasseia.
Faz-se no parecer distinção entre terrenos coutados e terrenos livres, para impor somente aos proprietários que detêm exclusivo benefício do exercício da caça (os donos das reservas) a obrigação de indemnizarem os vizinhos pelos prejuízos resultantes da excessiva abundância das espécies
Parece ir-se longe em demasia sobre o proprietário, juridicamente não reconhecido dono da fauna que vive nos seus terrenos e que não pode fixá-la ou impedir a sua mobilidade.
Não compreendo a razão para a diversidade das situações e creio embaraçoso acertar com qualquer critério objectivo que estabeleça o limite acima do qual se considere excessiva a abundância das espécies.
Por outro lado, o terreno adjacente a uma coutada de caça ou é livre ou constituído pelo «corredor» previsto na base xxx, n º 3 º Ora, sempre funcionaria assim o exercício da caça como meio de defesa geral contra os danos
De qualquer modo, acho o preceito atentatório dos interesses económico, social, desportivo, turístico e fiscal que informam a proposta de lei.
Outro ponto em que discordo do parecer.
Na base XI, institui-se obrigatoriedade de seguro, em termos a fixar em regulamento, para os estrangeiros e nacionais não residentes na metrópole
Compreendo o porquê da obrigatoriedade do seguro neste caso, simplesmente não vejo razão para o não tornar extensivo a todos, pois o perigo do uso das armas de fogo não é exclusivo para determinados tipos de caçadores.
Nem colhe o argumento, explanado no projecto de proposta de lei enviado pelo Governo - e que parece nesse ponto ter impressionado a Câmara Corporativa -, que, por «princípio de equilíbrio na ordem jurídica» em relação ao ramo automóvel, não era de estabelecer de modo generalizado a referida obrigatoriedade.
Não consta da lei que os estrangeiros ou nacionais não residentes na metrópole necessitem de seguro de automóvel para circular nas nossas estradas.
Portanto, onde está o equilíbrio na ordem jurídica.
À Assembleia Nacional está a construir o regime jurídico da caça, e não um diploma transitório para ser sujeito, a curto prazo, a toda a série de enxertos
Pois que o faça sem se sentir submetida a contemporizar com situações que lhe suo alheias, situações resultantes da má visão e do imobilismo de certos departamentos oficiais.
Ponho à consideração de V. Ex., Srs. Deputados, a hipótese de um caçador desprovido de seguro e sem bens de fortuna além do seu modesto salário, caçando com arma emprestada, ter um acidente de caça em que provoca a morte de um companheiro.
Resultado prático quem tiver direito à indemnização lastimará que o acidente não sucedesse com um estrangeiro ou nacional residente fora da metrópole ...
Suponho ser altura de olharmos só para a frente, sem a preocupação de atrasar o passo lá porque outros não sabem ou não querem andar mais depressa.
Uns mais, outros menos, o certo é que todos temos dormido no caso de não haver seguro obrigatório de automóveis no nosso país, único na Europa nestas condições.
Mas instituir a sua obrigatoriedade na caça, além das vantagens reconhecidas, pode traduzir-se em exemplo digno de imitar.
Um outro ponto considero inconvenientemente apreciado na proposta
Refiro-me à base xxx, n.º l º, onde se fixa em 40 por cento da área total de cada concelho o limite máximo da superfície destinada às coutadas.
Com o devido respeito, afigura-se-me pouco esclarecido o critério adoptado.
Por disposição legal em vigor, a taxa de reserva é de 25 por cento O projecto de proposta de lei enviado pelo Governo à Câmara Corporativa eleva-se para 33 por cento O projecto de lei da autoria do ilustre Deputado Aguedo de Oliveira é omisso quanto a este ponto, por entender que só resultam vantagens da constituição do maior número de reservas de caça.
Verifica-se que, actualmente, a área das coutadas em nenhum concelho excede, por média, 20 por cento do seu território, salvo o ca«o particular de Barrancos, distrito de Beja, em que a taxa de reserva alcança 34,58 por cento.
Convém ter presente a finalidade da proposta de lei, bem expressa na primeira parte do parecer.
A caça assume importância relevante sob os aspectos desportivo, social, económico, turístico e fiscal (§ 2º, n.º 4, p 215 )
Atendendo a que há regiões onde os terrenos são manifestamente inaptos para a exploração agrícola ou florestal e podendo a caça constituir processo rentável de valorização da propriedade, limitar a área coutada aos 40 por cento fixados na proposta julgo medida pouco estimulante.
Pode suceder, em alguns concelhos, não se atingir o escopo da proposta -o fomento e abundância da caça - nem os benefícios secundários que dela se pretende obter a valorização dos terrenos de exploração pouco remuneradora
Por outro lado, concelhos existem em que a densidade populacional, a exiguidade da área, a localização ou as características predominantemente urbanas excluem desde logo a hipótese da concessão de reservas de caça que ocupem a percentagem consignada na proposta.
Ficaria a cargo da Secretaria de Estado da Agricultura a determinação, para cada concelho, da área a coutar - com critério seguro, mas espírito aberto às realidades.
Deste modo, não deve a proposta fixar no articulado a percentagem da área concelhia destinada à constituição de reservas de caça, por me parecer em contradição com os fins que se pretende atingir.
Ora, estas considerações não são mais, aliás, que pequenas discordâncias que não invalidam, a meus olhos, o mérito da proposta de lei.
O que me amedronta não está numa ou noutra divergência sobre o conteúdo da proposta de lei.
Há, todavia, um ponto que pode desvirtuar, e até tornar inoperante, aquilo que tanto tempo levou a construir refiro-me, concretamente, ao problema da fiscalização.
Se bem que a sua localização deva ser em regulamento, como bem salientou a Câmara Corporativa (§ 9 º, n º 74, ft 248), a verdade é que, na proposta de lei, tal assunto foi além da demonstração da sua importância e necessidade.
Entendo não ser pouco Mas temo que não baste dar a conhecer a necessidade vital da sua existência.
O meu receio reside nisto qualquer lei de caça, por mais equilibrada e harmónica que seja, não é suficiente,
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só por si, para se fazer respeitar se não dispuser de olhos e braços que a tornem obedecida.
Sem fiscalização rigorosa e dotada de meios que lhe facultem acção pronta e eficiente, sujeitamo-nos a ser espectadores conscientes do aniquilamento das espécies cinegéticas.
Essa mobilidade e rapidez que os agentes fiscalizadores deveriam possuir no desempenho das suas atribuições é, antes de mais, necessário a nível concelhio
Injusto seria omitir a notável acção fiscalizadora da Guarda Nacional Republicana, a despeito das múltiplas tarefas que lhe estão confiadas
Existem ponderosas razões para acreditar na eficiência de uma fiscalização local. Entre outras, ressaltam imediatamente vantajosas o conhecimento directo dos transgressores habituais, a familiaridade com as características da área concelhia e a possibilidade de cooperação com os verdadeiros caçadores.
Isto são argumentos que impõem como prioritária, em relação a qualquer outro tipo, a fiscalização de âmbito concelhio ou regional Não pretendo minimizar ou invalidar o interesse da fiscalização geral.
Simplesmente, preocupa-me que a tendência para a centralização - exagerada tendência que dia a dia entre nós se manifesta mais forte - provoque a asfixia da fiscalização concelhia em favor de qualquer outra que reputo menos eficiente
Na véspera da abertura geral da caça, no ano findo, os caçadores foram surpreendidos com a publicação do Decreto-Lei n º 47 226. Disse que constituiu surpresa, e, na realidade, dados os antecedentes, não era esperada qualquer medida legislativa sobre o assunto.
Teve merecimento o Decreto-Lei n.º 47 226 O mérito de demonstrar que o Governo, finalmente, deixava de ser o empresário abúlico de uma decadente representação para, alertado pela repercussão da doutrina emanada pela Câmara Corporativa, querer também acudir com urgência ao problema.
Em tal decreto - e é assunto pertinente como aquele de que vinha falando- eleva-se substancialmente o preço das licenças de caça, que aparecem de várias modalidades, tal como sugerira a Câmara Corporativa.
Não me interessa, de momento, analisar os custos das licenças. Considero-os francamente módicos, atendendo a que a caça é hoje, como ninguém ignora, um desporto caro Choca-me que a licença de caça dos «profissionais:», isto é, a licença com fim lucrativo, custe o mesmo que a licença geral.
Fixarei a minha atenção, concretamente, na licença de caça geral, a de 801$. Desta quantia saem 260$ para a Direcção-Geral dos Serviços Florestais e Agrícolas, 20$ para a câmara municipal do concelho onde é emitida a licença, 14$50 para a respectiva comissão venatória regional e 6$50 para a comissão venatória concelhia.
Acontece nas restantes licenças serem iguais as verbas, salvo a atribuída à Direcção-Geral dos Serviços Florestais e Agrícolas, que é variável consoante a modalidade da licença concedida regional, concelhia, de fim lucrativo e sem espingarda.
Mas, apesar do aumento de receita proveniente da alteração das taxas de licença, mantém-se a anémica dotação de 6$ 50 atribuída às comissões venatórias concelhias.
Posso ilustrar este ponto com um exemplo a Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão passou no ano findo 1411 licenças de caça. Constituiu, assim, receita da sua comissão venatória a quantia de 9171$50, sem qualquer outro subsídio oficial ou auxílio hierárquico.
E eu pergunto como é possível, com esta verba, recrutar pessoal competente e dotá-lo com meios eficazes para desenvolver acção de cobertura a um concelho com a área na casa dos 212 km.
Sem pretender abusar dos números, posso tirar outra conclusão, que suponho não ser descabida.
Admitindo que no ano em curso se requeriam as mesmas 150 000 licenças de caça concedidas no ano findo e sendo a receita das comissões venatórias regionais a taxa fixa de 14S50 por licença, arrecadava-se 2 175 000$, ilíquidos Admitindo ainda que esta quantia era dividida igualmente pelas comissões venatórias dos 272 concelhos da metrópole, cada um receberia 7937$90.
Regressando ao exemplo concreto que apontei, com 17 009$40, a comissão venatória do concelho de Vila Nova de Famalicão talvez conseguisse um homem de boa vontade que, nas suas horas vagas, também fosse fiscal de caça .
Não me parece ter caído em exagero Citarei textualmente o parecer da Câmara Corporativa a grande importância da fiscalização resulta do facto de ser uma verdade incontroversa que as leis disciplinadoras do exercício venatório, por mais bem concebidas que sejam, resultarão inúteis sem um corpo de fiscais suficientemente numeroso e competente (n.º 9 , n.º 74, p 248 )
Tal assunto terá assento em regulamento, sem dúvida
Mas sou de opinião que é fundamental ser bem meditado, pois ignorá-lo, além de erro, não constituiria caso inédito.
Poderá dizer-se, afinal, que fantasiei a partir de uma providência, de modo algum definitiva, incluída no Decreto-Lei n.º 47 226, de 30 de Setembro de 1966, que é um diploma legal transitório.
Também é verdade.
Simplesmente, o quantitativo de 6$50 para as comissões venatórias concelhias fixado no artigo 2 º, n º 2, já vem decalcado da legislação anterior e pode haver vontade de o manter no futuro regulamento, dado o nosso conhecido hábito de não mudar a tradição legislativa ...
Se insisto na necessidade de dotar convenientemente as comissões venatórias concelhias, é por descrer dos subsídios que lhes advirão do Fundo especial da caça e pesca, entidade que passa a receber e a administrar todas as receitas e a quem incumbe o encargo da fiscalização.
Este antecipado receio também resulta de conhecimento que tenho das queixas dos pescadores desportivos Dizem-me que os rios do Minho estão sem trutas, pois não se efectuam repovoamentos nem existe fiscalização.
Seria de lamentar que se fizessem à lei da caça, uma vez aprovada e regulamentada, comentários paralelos do exercício da Lei n.º 2097.
As licenças encareceram e tudo ficou como dantes.
Tudo isto, em resumo, é a vontade de não ver inutilizada esta proposta de lei, que reputo susceptível de constituir, uma vez alterados certos aspectos, a solução de grave problema.
Por isso lhe dou, na generalidade, a minha concordância Quero formular um desejo, e ele está contido no parecer da Câmara Corporativa, donde o vou extrair
Não poderá deixar de se exprimir o voto de que os funcionários respectivos satisfaçam em número e qualidade, sob pena de todos os esforços e intenções do legislador ficarem frustrados.
Dada a natureza do serviço e o estado calamitoso a que a caça chegou, requerem-se servidores que não
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sejam meios burocratas, mas que sintam e vivam os problemas (Ç 10 º, n º 77 )
Resta-me a esperança de ver bem regulamentada esta proposta de lei manter a confiança nas autênticas virtudes dos caçadores e aplaudir o entusiasmo com que os responsáveis pela caça procurarão fomentar e fiscalizar o desporto mais nobre de que a história dá notícia.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi minto cumprimentado
O Sr Peres Claro: - Sr Presidente A minha qualidade de não caçador dá-me, neste debate, uma grande independência, mas cria-me naturalmente as inibições próprias de quem não está senhor da matéria Mas o assunto reveste-se de tão aguda importância, interessa a tantos milhares de indivíduos, implica de tal forma com a economia nacional, que a mim me parece que não deverei calar algumas observações de ordem política, correndo embora o risco de ferir ouvidos mais atentos com algum solecismo técnico.
Indiferente ao mundo dos caçadores, tive no entanto, em Outubro de l963, a percepção de que algo de grave se estava a passar através de uma circular distribuída a todos os estabelecimentos de ensino, na qual se recomendavam aos professores que inculcassem no espírito dos alunos, sempre que as circunstâncias o proporcionassem, o interesse pela conservação da fauna Tal determinação baseava-se num pedido da Direcção-Geral dos Serviços Florestais e Agrícolas feito exactamente um ano antes e no qual se dizia quo pelo Conselho Internacional da Caça, reunido na Haia foi a solicitado á referida Direcção-Geral que motivasse às autoridades a necessidade que lia em fazer compreender à juventude, através do ensino, do dever que cada geração tem, tanto em não depredar a fauna, de modo que sejam protegidas as espécies em risco de desaparecimento, como em não causar desgastes que provoquem perigosos desequilíbrios a fim de ser conseguida a perpetuidade das espécies constituintes da fauna» A Direcção-Geral dos Serviços Florestais e Agrícolas comentara depois
Porque se entende que, na realidade, embora mais lentamente, os melhores resultados no fomento e protecção, tanto das espécies cinegéticas, como das tidas por nocivas, como de todas as outras, se obtém através da educação, julga, esta Direcção-Geral ser do maior interesse que a Secretaria de Estado da Agricultura intervenha junto do Ministério da Educação Nacional no sentido de ser considerada e estudada a forma de ser dada à juventude escolar um mínimo de educação nesta matéria.
Assim vim a saber que se depredava a fauna e que havia, por isso, o risco do desaparecimento de algumas espécies e perigosos desequilíbrios de sobrevivência noutras E vim mais a sabei que se considerava a educação como o melhor meio, embora o mais lento, de se conseguem melhores resultados no fomento e na protecção das espécies.
Tinha-me então passado despercebido, por não pertencer então a esta Câmara, o projecto de lei que o nosso ilustre colega Dr Aguedo de 01 ir eira aqui trouxera em A I arco do 1965, isto é então o pedido da Direcção-Geral dos Serviços Florestais e Agrícolas ao Ministério da Educação Nacional, em Outubro de 1964, e a recomendação do Ministério da Educação Nacional às escolas, em Outubro de 1965 Nesse projecto de lei, todo ele uma judiciosa análise do que há e do que só pretende pode ler-se, quanto ao extermínio da caça.
Como que movidos por sanha ancestral, criou-se nos profissionais e nalguns atiradores um estado de espírito destruidor, um estado de nada deixar, que não corresponde as tradições que eram brasão, de que o verdadeiro caçador caça por desfastio, e não por ambição Concelho ou legião onde apareça cortas linhas de atiradores, a caça desaparece durante anos e anos, em holocausto à prosápia de algumas espingardas em invalidade Este estado é contrário a todos e merece combate.
Retomando o tom, o parecer da Câmara Corporativa pergunta, logo de inicio, se sei á possível ainda reconstituir o património cinegético do País, respondendo pela afirmativa, mas desde que «todos os interessados estejam dispostos a sacrificar um pouco dos seus interesses» E isso valerá a pena, porque sou agora ou então será porventura tarde de mais» Eis pois as duas premissas em que assenta apontadas desde que a questão se levantou o problema da caça a fauna cinegética corre o grave senão inevitável, risco de desaparecer, o exercício consciente da caça faz apelo a educação do caçador É partindo destas duas realidades que o problema da caça deve ser encarado sem tibiezas sem contemplações sem portas falsas 150 000 caçadores esperam a nova lei alguns milhares deles perscrutam já a forma de a «««« Tem de ser contra estes firmamento claramente embora só ofenda porventura outros Se o problema de falta de caça é realmente grave, só com medidas de excepcional firmeza será possível atacá-lo e desenvolvê-lo Decrete-se um estado de emergência durante o tempo necessário para a fauna se reconstituir Não bastam as reservas muito bem regulamentadas, o que interessa é que elas sejam verdadeiramente parques de repovoamento e não campos autorizados de extermínio.
Contra os grandes males os grandes remédios durante alguns anos, deveria ser pura e simplesmente proibido o exercício da caça, dentro e fora, de coutadas Onde houvesse fartura a mais que se tornasse nociva pois se apanhasse o excesso e fosse lançado onde a escassez continuasse Só assim, só proibindo todas as espingardas, só proibindo todas os furões só proibindo todos os venenos, será possível garantir o êxito da campanha E mesmo assim era preciso que houvesse uma enorme equipa de fiscais Mas isto é estar, ou ser, fora da realidade nunca sei a possível tanta proibição nem tanta fiscalização Mas, repito, só se pretende realmente o repovoamento, que a lei nova venha ««««««, seca e dura para todos:, que cada um a leia e perceba logo que não há possibilidades de fuga, que a leia e não fique à espera das regulamentações feitas em gabinete do amolecimento da ofensiva, do esquecimento da própria lei.
Sr Presidente Quando um caçador, na perseguição de uma peça, salta um valado, não pode ter a preocupação geográfica de saber se entrou em domínio que lhe está proibido Não são tão definidas as fronteiras entre concelhos ou entre regiões, nem entre propriedades sujeitas ou não ao regime florestal, que todos as vejam sem hesitação Esmiuçar, pois, licenças por áreas é medida que embora possa contrai lar o afluxo dos caçadores às zonas mais abastadas será certamente motivo de involuntárias contravenções, ou até de abusos que uma fiscalização naturalmente fluida não poderá evitar Parece, assim, que a licença única, pela media das actuais taxas, viria facilitar a acção dos tascais e dai aos caçadoí es uma liberdade de
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trânsito que não será decerto a mais culpada das razias que se façam. É que Sr. Presidente e Srs. Deputados onde reside o perigo é naqueles que ««« com fim lucrativo nos chamados «profissionais» A esses é que interessa percorrer o País de lés a lés no seu negócio e estando livres os preços de venda ao consumidor para eles não há taxas de custo elevado pois se mais pagarem mais farão pagar. Eu sei quão delicado será proibir a profissão de caçador mas pergunto se exercida principalmente durante três meses ela se pode de facto considerar profissão se não será antes «««« de oportunistas Ser também que acabando-se com os profissionais deixará a caça de vir a muitas mais mesas mas é preferível que alguns se sacrifiquem agora para que muitos possam dentro de anos voltar ao prazer de comer caça. O projecto da proposta de lei procurou evitar as medidas extremas e estabelecer que a licença de caça com fim lucrativo apenas permitirá caçar na área do concelho da residência habitual do seu titular e na dos concelhos limítrofes e que pode o Governo limitar o número dessas licenças a conceder por concelho em cada ano ou em anos sucessivo. Se se for severo nas concessões se for possível limitar ainda o número de peças a abater diariamente pelos profissionais. Mas em estado de emergência não podem haver ««« Uma boa regulamentação dos postos de criação artificial resolverá o problema do comércio da caça sem os inconvenientes da depredação dos profissionais.
Sr. Presidente No mesmo sentido de defesa do património cinegético, estabelece a base XV do projecto que durante a época geral da caça apenas se cace três dias por semana e nos feriados, mas acrescenta-se que a restrição não é aplicável às reservas de e caça Eis uma disposição que tem levantado enorme problema por esse País fora pelo seu sentido antidemocrático e pergunta-se se afinal de contas o que interessa defender e a caça ou o caçador. Se é a caça pois que seja a ««« para todos porque se sabe muito bem que nos coutos não é só o proprietário que a caça mas também os seus muitos amigos. E podendo as concessões de coutadas ser pedidas por proprietários usufrutuários ««««««« comissões venatórias associações de caçadores câmaras municipais e juntas de freguesia e podendo a área sujeita ao regime de reserva de caça atingir os 40 por cento da área do concelho veja-se que a multidão não poderá caçar todos os dias veja-se com a restrição dos três dias de caça fora das coutadas é simples literatura. O que está afinal a defender-se é o caçador aquele que afinal é o réu de todo este processo. Deve pois ser geral a restrição de se caçar apenas três dias por semana como deve o Governo estabelecer talvez por notação zonas de proibição total de caçar durante o tempo necessário para o seu repovoamento.
Coutar terrenos para diversão diária dos seus concessionários e medida que se não entende, pois estamos a tratar do grave problema de se saber como se há-de evitar que desapareçam os poucos animais bravios que ainda existem Que a base xxv do projecto esteja sempre permanente no pensamento de quem tem de autorizar Ela diz que poderão ser constituídas reservas particulares de caça ou coutadas de caça, reservas zoológicas e zonas de protecção para «protecção e fomento das espécies cinegéticas e fins científicos», mas com depois tanto articulado com explicações, nada menos, de quinze outras bases, que só fica com a impressão de se estar frente a um palácio cheio de portas e que talvez algumas dessas portas não tenham a fechadura mais apropriada. Deve também ser retirada, a faculdade de se poder caçar nos dias de feriado municipal, não apenas porque os concelhos são muitos em dias de feriado, mas sobretudo porque nesses dias seriam tantos os caçadores no concelho em festa que daí resultariam, menos a tragédia de concelho após concelho serem diariamente passados a pente fino.
Um último apontamento, para chamar a atenção para a permissão de em todo o tempo sei possível destruir os animais nocivos á agricultura Se é a caça que se pretende defender, repito, tudo se deverá fazer antes de autorizar a matar nas zonas onde há a mais para se transferir animais para as zonas despovoadas Não o exterminando que se fomenta, além do que a matança em qualquer época pode ir contra a lei natural da reprodução, das espécies.
Defendam-se os animais dos excessos dos homens.
Sr. Presidente As medidas que o Governo se propõe tomar e as que já tomou quanto a preço de licenças e quantitativo de multas têm o alto mérito de procurar defender um património comum, de reflexos sensíveis na nossa economia Os interesses em jogo são, porém, muitos dos verdadeiros desportistas, dos profissionais, dos espingardeiros, dos, couteiros, dos consumidores dos serviços do Estado que ser eu! E todos em choque provocam naturalmente porque são também de muitos, condições pouco propícias a uma análise calma do problema A opinião geral e a de uma severidade extrema durante um certo tempo e, depois uma legislação adequada à boa conservação das espécies, com fiscalização atinada Nisto todos são unânimes - fiscalização. E é por essa unanimidade que eu venho a dizer que no fundo do que nós estamos a tratar é afinal de um problema de educação Foi por isso que me permiti subir a esta tribuna.
Tenho dito
Vozes: -Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado
Sr Presidente: - Vou encerrar a sessão
Amanhã haverá sessão á hora regimental, com a mesma ordem do dia
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas
Srs. Deputados que entraram durante a sessão
António Barbosa Abranches de Soveral
António Calheiros Lopes
António Júlio de Castro Fernandes
António dos Santos Martins Lima
Armando Cândido de Medeiros
Aulácio Rodrigues de Almeida
Francisco José Roseta Fino
Gabriel Maurício Teixeira
Gustavo Neto de Miranda
Henrique Ernesto Serra dos Santos Tenreiro
Hirondino da Paixão Fernandes
João Duarte de Oliveira
João Mendes da Costa Amaral
João Nuno Pimenta Sei ias e Silva Pereira
José Alberto de Carvalho
José Gonçalves de Araújo Novo
José de Mira Nunes Mexia
Júlio Alberto da Costa Evangelista
Manuel Henriques Nazaré
Sebastião Alves
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10 DE FEVEREIRO DE 1967 1189
Sebastião Garcia Ramirez
Teófilo Lopes Frazão
Tito de Castelo Branco Arantes
Srs. Deputados que faltaram à sessão
Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso
Alberto Henriques de Araújo
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior
Álvaro Santa Rita Vaz
André Francisco Navarro
Antão Santos da Cunha
António Magro Borges de Araújo
Artur Alves Moreira
Augusto César Cerqueira Gomes
Augusto Duarte Henriques Simões
Deodato Chaves de Magalhães Sousa
Elísio de Oliveira Alves Pimenta
Fernando de Matos
Francisco Elmano Martinez da Cruz Alves.
Jaime Guerreiro Rua
Joaquim de Jesus Santos
José Guilherme Rato de Melo e Castro
José Mana de Castro Salazar
José Pais Ribeiro
José Pinheiro da Silva
José Rocha Calhorda
Manuel Amorim de Sousa Meneses
Manuel Colares Pereira
Manuel Marques Teixeira
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães
D. Sinclética Soares Santos Torres
O REDACTOR - Leopoldo Nunes
IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA