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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 86

ANO DE 1967 23 DE MARÇO

ASSEMBLEIA NACIONAL

IX LEGISLATURA

SESSÃO N.º 86, EM 22 DE MARÇO

Presidente: Exmo. Sr. Mário de Figueiredo

Secretários: Exmo.s Srs.
Fernando Cid de Oliveira Proença
Mário Bento Martins Soares

SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 11 horas e 10 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente.
O Sr. Presidente informou terem sido recebidos na Ilesa os elementos oportunamente requeridos pelo Sr. Deputado Antão Santos da Cunha, a quem foram entregues.
O Sr. Presidente deu conhecimento de estar na Mesa, para cumprimento do disposto no § 3º do artigo 109º da Constituição, o Diário do Governo n.º 66, lª série, inserindo o Decreto-Lei n.º 47 599.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Augusto Simões, para um requerimento, Gonçalo Mesquitela, que se referiu as conversações e aos acordos estabelecidos recentemente entre Portugal, a República do Malawi, Veiga de Macedo, acerca da vida e obra de Frei Diogo Crespo, há dias falecido, Sousa Meneses, sobre a construção do porto de abrigo da ilha Terceira, Horácio Silva, para se referir ao 350º aniversário da criação da cidade de Benguela, Braz Regueiro, que apelou para quem de direito no sentido de serem abolidas determinadas passagens de nível, Martins Lima, sobre problemas da comercialização do café em Angola, Duarte de Oliveira, que chamou a atenção para assuntos de interesse para o distrito de Viseu.

Ordem do dia. - Continuação do debate sobre as Contas Gerais do Estado e da Junta do Crédito Publico relativas a 1965
Usaram da palavra os Srs. Deputados António Cruz e Jerónimo Jorge.
O Sr Presidente encerrou a sessão às 13 horas.

O Sr. Presidente: - Vai fazer-se a chamada.

Eram 11 horas

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados.

Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Pacheco Jorge.
André Francisco Navarro.
António Augusto Ferreira da Cruz
António Barbosa Abranches de Soveral
António Furtado dos Santos.
António José Braz Regueiro
António Mana Santos da Cunha.
António Moreira Longo
António dos Santos Martins Lima.
Armando Acácio de Sousa Magalhães
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Alves Moreira.
Artur Correia Barbosa.
Artur Proença Duarte.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Augusto Salazar Leite.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando Cid de Oliveira Proença
Francisco Cabral Moncada de Carvalho (Cazal Ribeiro)
Francisco José Roseta Fino.
Gabriel Maurício Teixeira
Gonçalo Castel-Branco da Costa de Sousa Macedo Mesquitela
Gustavo Neto de Miranda Hirondino da Paixão Fernandes.
Horácio Brás da Silva.
Jerónimo Henriques Jorge.
João Duarte de Oliveira.
João Mendes da Costa Amaral.
João Ubach Chaves.
Joaquim de Jesus Santos.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
José Alberto de Carvalho.
José Dias de Araújo Correia.

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José Gonçalves de Araújo Novo.
José Maria de Castro Salazar.
José Pais Ribeiro.
José Pinheiro da Silva.
José Soares da Fonseca.
José Vicente de Abreu.
Luís Arriaga de Sá Linhares.
Manuel Amorim de Sousa Meneses.
Manuel Colares Pereira.
Manuel João Cutileiro Ferreira.
Manuel Nunes Fernandes.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
D. Maria de Lurdes Filomena Figueiredo de Albuquerque.
Mário Bento Martins Soares.
Mário de Figueiredo.
Miguel Augusto Pinto de Meneses.
Paulo Cancella de Abreu.
Raul da Silva e Cunha Araújo.
Sérgio Lecercle Sirvoicar.
D. Sinclética Soares Santos Torres.
Virgílio David Pereira e Cruz.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 56 Srs. Deputados

Está aberta a sessão.

Eram 11 horas e 10 minutos

Antes da ordem do dia

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Telegramas

De aplauso às considerações do Sr. Deputado Sousa Magalhães,
De aplauso à intervenção do Sr. Deputado Coelho Jordão,
De congratulação pelas palavras do Sr. Deputado Braamcamp Sobral

O Sr. Presidente: - Estão na Mesa esclarecimentos prestados pela Secretaria de Estado do Comercio na sequência de requerimentos apresentados pelo Sr. Deputado Antão Santos da Cunha nas sessões de 12 do Janeiro e 17 de Fevereiro findos. Vão ser entregues àquele Sr. Deputado.
Para efeitos do disposto no art. 3º do artigo 109º da Constituição, está na Mesa o Diário do Governo n.º 66, l.ª série, de 18 do corrente mês, que insere o Decreto-Lei n º 47 393, o qual prorroga ale 30 de Junho do corrente ano o prazo de vigência do Decreto-Lei n.º 43 670, que isenta de direitos de importação as peças de máquinas de escrever importadas pelos fabricantes nacionais.

Pausa

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para um requerimento, o Sr. Deputado Augusto Simões.

O Sr. Augusto Simões: - Sr. Presidente. Pedi a palavra para enviar para a Mesa o seguinte

Requerimento

A despeito do em várias sessões desta Câmara haver requerido ao Ministério das Comunicações os elementos que tenho reputado necessários para minha elucidação sobre o Gabinete de Estudo e Planeamento de Transportes Terrestres, criado por este Ministério em Dezembro do 1960, nunca tais elementos me foram fornecidos nem ao menos, fornecida foi qualquer razão para justificar a ostensiva falta.
Não me proponho comentar tal atitude, que, a meu ver integra reiterada e incompreensível lesão de duetos constitucionais que me pertencem como Deputado, todavia, porque persistem as razões que me motivaram a pedir aqueles elementos dado que apenas sei, pelo douto parecer sobre as Contas Gerais do Estado que está em apreciação, que o referido departamento oficial já despendeu até 31 de Dezembro de 1965 a avultada quantia de 20 064 contos, venho renovar os meus insistentes pedidos, anteriores e, assim, pequeno que, com brevidade, me sejam fornecidos os seguintes elementos, pelo aludido Ministério das Comunicações.

1º Constituição nominativa do quadro do pessoal que vem prestando serviços no mesmo Gabinete desde a sua criação, indicando-se as respectivas categorias e as remunerações totais de cada serventuário.
2º Indicação das despesas da instalação desse Gabinete e das que vêm resultando do seu funcionamento, escaladas pelas várias rubricas orçamentais.
3º Indicação dos trabalhos efectuados acompanhada tanto quanto possível dos respectivos relatórios.
4º Indicação dos trabalhos em curso em 31 de Dezembro de 1966.
5º Indicação sumária do custo das obras para a instalação em edifício próprio do Gabinete, referindo os planos do seu financiamento.

O Sr. Gonçalo Mesquitela: - Sr. Presidente. Noticiaram os jornais a feliz celebração de alguns acordos entre Portugal e a Republica do Malawi. Como Deputado por Moçambique, e portanto pelos portugueses vizinhos daquele novel país não pude deixar de pedir a palavra para, antes de concluirmos os trabalhos desta sessão legislativa, deste lugar me referiu a tal facto, que a todos satisfaz, pelo seu significado.
Tanto tem sido o mar e a tormenta nos últimos anos no que respeita a. posição de certos sectores internacionais perante a nossa presença em África, que quase nos desabituámos de encontrar factos agradáveis que confirmem a razão das razões que desde sempre temos vivido e proclamado como base das relações entre os povos.
É, com efeito doutrina portuguesa assente e nossa atitude permanente a de que a disposição de cada um dos nossos vizinhos estão as nossas melhores intenções de colaboração sincera e autentica.
Nunca fomos vizinhos que incomodassem. Jamais tivemos exigências que não fossem as que o direito, a moral, os acordos livremente celebrados connosco e as normas tradicionais de cortesia e cooperação entre os Estados devem impor mutuamente a países com fronteiras comuns, interesses regionais similares e, como no caso do Moçambique, até população flutuante, que tanto constitui problema português como dos nossos vizinhos.
E, assente aquele legitimo respeito que exigimos por nós, temos proclamado e excedido no mais elevado grau o nosso respeito pelos direitos alheios e procurando estar sempre atentos e abertos às necessidades o interesses dos

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outros que possamos servir com a nossa colaboração leal, amiga e franca.
Sempre assim vivemos e, graças a Deus e aos homens que têm dirigido a política externa portuguesa nos últimos anos, orientados por Salazar, tem sido possível, apesar de todos os vendavais que tantos têm tentado fazer desabar sobre nós, mantermos esta norma de bom convívio.
Se mais não temos feito por alguns dos nossos vizinhos tem sido devido às atitudes menos realistas que assumem, recusando as relações formais com Portugal, quando não nos hostilizam mais ou menos abertamente.
Mas, sem vacilar e sem negar, o Governo Português, através de todas as vias de que dispõe, tem sido sempre fiel àqueles princípios, aguardando com a confiança dos que sabem terem razão o momento em que queiram ou possam voltar a dar connosco as mãos para, em conjunto, resolvermos as questões e satisfazermos os interesses que em conjunto vivamos.
Há poucos anos, o pequeno Estado da Suazilândia, nosso vizinho ao sul de Moçambique, de boa fé e de coração limpo, realizou connosco um acordo pelo qual garantimos ao seu território as vias de comunicação ferroviárias e o serviço portuário de que carecia. E consolador verificarmos que as relações que por tal facto ainda mais se intensificaram entre Moçambique e aquele Estado não sofreram a mínima sombra, tendo (havido de parte a parte total compreensão e absoluta lealdade, que, só por si, tem bastado para afastar questões que de outra forma seriam delicadas. Mas a uma amizade sincera tem correspondido outra, igual na plena vivência do respeito devido à independência de cada um e aos problemas específicos que esta acarreta a ambas as partes.
E agora, Sr. Presidente — e ó este o tema da minha intervenção —, temos público conhecimento da feliz conclusão das negociações realizadas durante largos dias em Lisboa entre a delegação da República do Malawi e o Governo Português.
Uma vez ainda, são as necessidades de ligação ao mar que constituíam a preocupação daquele Estado, e foi no sentido da sua satisfação que Portugal se determinou.
Os resultados que o referido comunicado sumariamente indica permitem-nos ter a certeza de que também desta vez a linha de conduta portuguesa se manteve.
O Malawi é, como se sabe, um país situado longe das costas do Indico. Entre as suas fronteiras e os portos que as servem está a nossa província de Moçambique. As suas comunicações com o mar são as que, por via aérea, por caminho de ferro e por estrada, Portugal coloca à sua disposição até aos portos do Centro e do Norte da província e aos nossos aeródromos. Até há anos, era o porto da Beira e, de modo menos importante, o de Quelimane os que serviam o território vizinho. Daí para cá, outro grande porto passou a poder servi-los: o de Nacala.
São assim portuguesas as vias naturais da sua importação e da sua exportação. As relações que constituíram agora objecto dos acordos realizados são precisamente ligadas a esses aspectos. E, note-se bem, não constituem regulamentação de matéria nova, pois desde sempre o território e os serviços portugueses de portos e caminhos de ferro estiveram à disposição daquele nosso vizinho. Mas havia que os desenvolver, correspondendo ao crescimento da jovem república, conduzida por esse notável homem de Estado contemporâneo, o Doutor Banda, chefe lúcido e realista de um povo que vai crescendo sob a sua orientação firme e inteligente.

Vozes: — Muito bem!

O Orador: — E, assim, respeitando-se mutuamente, os dois vizinhos africanos ambos conhecedores das necessidades e possibilidades mútuas, puderam vê-las conjugadas nos documentos que representam o que os homens de boa vontade, quando falam de olhos nos olhos e com corações honrados, podem fazer no campo, tão vasto, da cooperação internacional.
Da parte do Governo Português, numa perfeita conjugação dos interesses mútuos e com integral satisfação das nossas posições, foram postos ao dispor do Malawi todas as condições de que carecia, mesmo afastando do nosso lado algumas exigências que, neste mundo pragmático e materialista que é hoje o nosso, poderiam parecer legítimas. Mas não tivemos a intenção de concluir com os nossos vizinhos um acordo em que procurássemos lucros ou benefícios para além dos estritamente implícitos nele. Não lhe regateámos as vantagens legítimas que desejavam obter, e estou certo, por isso, de que, tal como a Suazilândia, os termos acordados servirão fundamentalmente para se apertarem os laços de amizade e boa vizinhança em torno de interesses mútuos que mutuamente serviremos com honestidade integral.

Vozes: — Muito bem!

O Orador: — Aos responsáveis portugueses pelo acordo são devidos louvores por terem concluído as negociações em termos que honram a sempre destacada doutrina portuguesa de que é nosso dever servirmos o hinterland que dependa dos nossos portos com o espírito aberto às necessidades desses territórios e pondo à sua disposição as nossas possibilidades e eficiência.
A delegação do Malawi não foi por certo indiferente esta atitude, pois ela, para além do mais, confirmou a lúcida visão e a inteligente confiança com que o seu Governo encara as relações de vizinhança connosco, em espírito liberto de preconceitos injustos e em segura afirmação de que nos conhecem, e, por isso, sabem, distinguem a realidade da propaganda mal fundamentada que a outros tem desviado dos caminhos da amizade e da cooperação com um Estado que, como Portugal, tem tantos motivos como os restantes Estados africanos para, em conjunto, podermos construir naquele continente um mundo mais feliz, mais saudável, mais evoluído.

Vozes: — Muito bem!

O Orador: — E com esta consoladora esperança que quero terminar, Sr. Presidente: a de que o caminho indicado pela Suazilândia e pelo Malawi seja também seguido pelos outros nossos vizinhos, neles incluindo a República Malgaxe, com quem tanto temos de comum através do canal de Moçambique, que nos une e que naturalmente há-de contribuir para que estreitemos também relações duradouras, úteis e amistosas.
O tempo nos ajudará neste sector, pois, quanto ao que a Portugal respeita, nós não mudaremos.

Vozes: — Muito bem, muito bem! O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Veiga de Macedo: — Sr. Presidente: Morreu Frei Diogo Crespo. Desapareceu deste mundo um grande padre: grande padre, logo, grande homem e grande patriota.
Apóstolo esclarecido, culto e eloquente, a sua inteligência, a sua sabedoria e o seu poder de comunicação estiveram sempre ao serviço de Deus e da Pátria. Primeiro,

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o ideal de Deus e, depois, o ideal da Pátria foram, para Frei Diogo, toda a sua vida, numa irradiação candente de amor, bondade e fé, a que nem sequer faltaram os calvários com que os desígnios da Providência ou as injustiças dos homens sublimam as vocações fortes - aquelas que nunca desistem de se realizarem plenamente, em acção e em serviço, em luz e calor, por maiores que sejam os obstáculos a vencer e mais pesados os sacrifícios a suportar

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Conheci de perto Frei Diogo Crespo, num dos períodos mais operosos da sua existência Pude então admirar nele excelsas qualidades e virtudes que, por si, eram a melhor pregação da mensagem redentora que se empenhava em transmitir aos outros.
Intimorato e intemerato, a coragem e a pureza de intenções, irmanadas com a simpatia e a generosidade de um espírito de eleição, imprimiam à sua acção apostólica autenticidade e penetração extraordinárias acção multí-moda que se exercia, por toda a parte e por todos os meios, num afã prodigioso, só atenuado ou interrompido pela doença cruel que, há dias, acabou por o ferir de morte.
No púlpito e no confessionário, na imprensa e na vida social, nos meios intelectuais ou junto do povo, através do livro, do convívio, do diálogo, tudo fazia para disseminar a Verdade revelada. Sua alma «aberta e alegre», como ele próprio a definira, um dia, ao lançar-se em novo empreendimento, buscava ansiosamente, fosse onde fosse, sem respeitos humanos, nem temores, quantos careciam de uma palavra orientadora, de um reconforto moral, de um sentido de solução para dramas e problemas de consciência.
Frei Diogo ensaiou entre nós um novo estilo de evangelização, e bem pode, por isso, considerar-se precursor dos métodos que, embora já sabiamente preconizados por Pio XII, só mais tarde haveriam de receber plena consagração

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Entendia e sentia que a Igreja deveria estar presente, na medida do possível, em todas as actividades humanas e devia afeiçoar as suas técnicas de difusão religiosa às necessidades e exigências dos tempos modernos Por isso o - víamos, dinâmico e dinamizador, coração em fogo com revérberos por sobre a sua pobre estamenha franciscana, a levar a boa nova aos ambientes mundanos e à rua, aos recintos desportivos e às assembleias de jovens, ao cinema e ao teatro, sem que fossem tocados - antes pelo contrário - o seu prestígio, o da Igreja e o da Ordem a que pertencia, embora alguns não compreendessem e até criticassem o padre que, correndo riscos e afrontando perigos, não hesitava em aparecer onde a sua presença pudesse constituir fonte de meditação e de renovação.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Era, pois, bem fundada a exclamação do Dr. Serras e Silva, a quem a causa da educação nacional deve os mais relevantes serviços...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - ... ao referir-se a Frei Diogo nestes termos tão impressivos «Eis um padre que veio vinte anos mais cedo para ser bem compreendido». No mesmo sentido, Monsenhor Moreira das Neves pôde defini-lo, com ática justeza, «uma alma do século XIX que sabe viver a tempo o século XX, de tal maneira o calor do misticismo medieval lhe penetra as raízes do ser e anima a sua vocação no meio das exigências de acção da nossa época».
Esta forma inédita de fazer apostolado teve materialização vitoriosa nas páginas da Flama, uma das nossas melhores revistas de actualidades, na qual Frei Diogo, como redactor principal e, depois, como director, deixou impressas as marcas da sua personalidade inconfundível e do seu temperamento de lutador.
Atento aos aspectos multiformes da vida cultural, artística e desportiva e aos acontecimentos nacionais e externos, tinha o condão de os fazer chegar ao grande público com a interpretação mais conforme à verdade e a crítica mais adequada à defesa dos valores morais e espirituais Encheu a revista de artigos, notas e comentários, versando os mais variados temas, sob pseudónimos diversos, como os de José Silvestre, Padre X, Didacus, Santos Ferreira e João do Alentejo.

O Sr. Soares da Fonseca: - Verdadeiramente, nesse tempo a Flama era Flama!

O Orador: - E hoje também é.

O Sr António Santos da Cunha: - Muito bem!

O Orador: - Estava então a ganhar raízes e a expandir-se o movimento de educação popular que visava sobretudo a extinção do analfabetismo. Pois Fiei Diogo Crespo e, com ele, João Pereira da Rosa, em O Século, e Joaquim Manso, no Diário de Lisboa - como me apraz juntar nesta mesma homenagem de respeitosa e indelével gratidão e admiração estes três grandes nomes da vida portuguesa contemporânea -, pois Frei Diogo Crespo - dizia eu -, nas colunas da Flama e no seu constante peregrinar através de Portugal, muito concorreu para sacudir a opinião pública e criar um estado de espírito propício ao êxito de campanha tão decisiva para o progresso cultural e económico do País.
Se outras razões não houvera - que as há, e bem imperativas -, bastaria esta para me sentir obrigado a evocar na Assembleia Nacional a figura de Frei Diogo.
Nascido, a 5 de Outubro de 1903, em Ferreira do Alentejo, passa a sua infância e faz a instrução primária na histórica vila de Alcácer do Sal, terra de sua família, onde o seu espírito predestinado logo se terá deixado fascinar pelo sortilégio das ruínas do velho Convento de Santo António, da Ordem Franciscana, na qual, mais tarde, aos 17 anos, ingressaria, impelido por irrecusável vocação religiosa, após haver frequentado, em Lisboa, o ensino comercial.
Em 1931, canta a primeira missa e, com ela, começa o seu múnus apostólico e docente Prefeito e professor no Colégio das Missões Franciscanas de Montariol, em Braga, aí dirige a revista Alvorada Missionaria, onde se afirma a sua inclinação para o jornalismo e o seu gosto pelas artes gráficas. Entre 1934 e 1936 foi mestre de Filosofia dos seminaristas franciscanos, no Colégio de Santo António, em Tui. A seguir, até 1939, ensinou Exegese e Sociologia no Seminário Diocesano de Vila Real, onde, ao mesmo tempo, pastoreou a paróquia de S. Pedro, com inexcedível zelo apostólico.
A eficiência da sua actuação entre os jovens chamou a atenção das autoridades eclesiásticas, e, por isso, é-lhe indicada, naturalmente, a vinda para Lisboa. Aqui, exercendo, de 1939 a 1942, os cargos de secretário da Pro-

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víncia Portuguesa da Ordem Franciscana, foi ainda assistente diocesano e, depois, assistente geral da Juventude Escolar Católica, e, de 1944 a 1949, assistente nacional da Juventude Católica. De 1954 a 1967 desempenhou ainda o cargo de vice-reitor do Seminário Franciscano da Luz.
Em todas estas funções, bem como nas de professor de Religião e Moral no Liceu de Passos Manuel e de assistente de vários organismos da Acção Católica, o padre Diogo Crespo realizou, não só entre a mocidade escolar, como entre as famílias, notável obra formativa, que lhe granjeou justificadamente a admiração de todos e dele fez um dos melhores e mais queridos diligentes da nossa juventude

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - De Frei Diogo disse ainda o poeta de Sonho Azul - o primeiro livro, maravilhoso livro de sonetos, que minha mãe, sendo eu menino e moço, me ofereceu «Tem o segredo de impor a disciplina sem matar a liberdade e ama os rapazes como se todos fossem seus irmãos de sangue e de sonhos».
Era assim mesmo nele, pedagogia e bondade confundiam-se de modo perfeito. Para ele, o verbo «educar» conjugava-se tal como o verbo «amar». Este o seu segredo de modelador de almas!
De salientar também a sua participação em numerosos congressos a que levou comunicações bem reveladoras, pelo alto nível doutrinal e literário, de sólida cultura humanística e filosófica, e de recordar os seus sermões, conferências e difusos, ricos de pensamento, persuasivos, formosos, próprios do orador de raça que foi e soube ser.
A sua actividade encontra-se por outro lado, comprovada no Boletim Mensal das Missões Franciscanas e Ordem Terceira e na Alma, revista de espiritualidade e documentação, que, em substituição daquele Boletim, foi por ele dirigida desde o início, em 1955, até 1963. A revista de filosofia e teologia Hincrarium, aparecida também no ano de 1955, em continuação de outra revista intitulada, modestamente Colectânea de Estudos, teve, até 1957, a direcção lúcida e devotada de Frei Diogo, que a enriqueceu ainda, sob vários pseudónimos, com uma colaboração preciosa.
Valiosos e sempre actuais são os seus trabalhos O Homem Tangente do Infinito, no Viver da Doutrina de S. Francisco, Liberdade e Estetica, A Assunção nos Místicos Portugueses, A Crença do Povo na Imaculada Conceição. Em todas as manifestações deste intenso labor intelectual e catequístico se evidencia de modo admirável a superioridade do seu espirito, a delicadeza da sua sensibilidade, a profundidade do seu saber, a força da sua fé.
Estes atributos do seu talento polivalente afirmaram-se ainda na organização do Livro Génio da Bondade, no qual Frei Diogo Crespo coligiu com superior critério e apresentou, em denso e belo prefácio, alguns estudos do padre Manuel Alves Correia sobre S. Francisco.
Jornalista, escritor e artista, filósofo, orador e doutrinador, missionário, sacerdote franciscano. Frei Diogo foi grande em tudo - e até na dor que o martirizou nos últimos anos de vida!
Partiu, há dias para sempre envolto no seu hábito de monge. Mas ficou, na sublime lição de catolicidade e de portugalidade do seu fecundo magistério moral e patriótico.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Afastou-se da nossa convivência. Mas permanece - e permanecerá - na memória agradecida de quantos a ventura de serem distinguidos com a sua amizade ou beneficiados com a sua assistência espiritual.
Morreu. Mas vivera na eternidade da paz do Senhor, porque seu cotação foi sempre flama ardente a apontar os caminhos da verdadeira libertação e felicidade - os caminhos de Deus.
Sr. Presidente. É do Viena a advertência de que as palavras hão-de ser simples e claras como as estrelas.
Eis um escopo oratório que eu, na pobreza dos meus recursos, nem sequer ousaria tentar atingir. Mas, mesmo assim, tinha de evocar, e evoquei - de maneira imperfeita e inacabada, embora -, a simplicidade, a claridade que foi a vida toda de Fiei Diogo Crespo. Do Fiei Diogo estrela neste mundo, porque nele se identificou, em plenitude, com a Luz, estrela na Pátria sem fim, na pátria dos santos, porque, na terra, deu resplandecente testemunho dessa mesma Luz.

Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado

O Sr Sousa Meneses: - Sr Presidente Srs Deputados. Serei breve, não porque o assunto não seja de extrema importância para o meu distrito, mas porque, desde sempre, pelo menos desde que esta Câmara funciona ao abrigo da Constituição Política de 1933, todos os representantes do distrito têm aqui trazido essa aspiração.
É, portanto, assunto bem conhecido do Governo, e, assim, serei breve, para ser ouvido. Tentei também ser o mais claro possível.
Não me dei ao trabalho de ver se os Deputados pelo meu círculo que aqui estiveram antes de 1926 falaram a pedir a satisfação dessa aspiração.
É possível que sim, porque todos foram homens amantes da sua terra e sentiram, como nos sentimos agora, quanto o distrito se atrasa economicamente quanto as populações sofrem pela falta dessa infra-estrutura.
Mas é certo que, se o fizeram, não podiam ser ouvidos, e muito menos atendidos.
Não podiam ser ouvidos, porque esta Câmara era ruidosa, indisciplinada, inconsequente, nada favorecia o estudo e a análise, a ponderação e o desinteresse, tudo se rendia ao interesse do partido, às lutas entre os partidos, às desavenças entre os homens, aos jogos das votações.
Não podiam sei atendidos, porque os Governos, as dezenas dos Governos, sucediam-se e caíam como as flores da laranjeira quando a noitada sopra forte.
Sucediam-se e caiam, incapazes de resolver a questão de base que sufocava a Nação, que manietava as iniciativas que impossibilitava o desenvolvimento da economia, que tolhia a grei na sua natural e humana ânsia de progresso e bem-estar social. Questão de base, que era a ordem e a disciplina nas finanças públicas.
Mas veio a Revolução, e todos aqueles que estiveram aqui antes de mim - e cito os mais recentes. Pamplona Forjaz, Teotónio Pires, Cunha da Silveira, Alpoim do Canto, Sousa Meneses, Ramiro Valadão, Ornelas do Rego - compreenderam que ela tinha, trazido a ordem e o progresso à Nação, em todos os sectores da actividade pública, e que era chegado o momento de dar à capital do nosso distinto aquilo de que ela mais necessitava e mais ambicionava.
Necessidade que não era, nem é fruto de um capricho político, ambição que não encobre a satisfação de um êxito pessoal

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Necessidade e ambição porque eles, como o meu actual colega, e eu entendemos que um porto para uma ilha significa o mesmo que os pulmões para o corpo humano, que uma estrada ou caminho de ferro paia um centro populacional ou económico da metrópole.
Entendemos nós e entende toda a gente.
E entendeu também o Estado, que se não tem poupado a trabalhos no sentido de procurar a melhor solução para dotar a ilha Terceira com o seu porto de abrigo.
Fizeram-se modelos laboratoriais e realizaram-se ensaios na Suiça e no nosso Laboratório Nacional de Engenhara Civil. A obra seria demasiado grande e cara sobretudo quando vista sob o prisma da sua rentabilidade económica.
Os anos passaram os políticos e as populações compreenderam, mas não se conformaram com a ideia de que não poderia, nem deveria, ser encontrada uma solução.
E não se conformaram porque sofrem na sua (...) e na sua fazenda quando têm que embarcar ou desembarcar, em minúsculas Lanchas, em condições de mar narmalmente forte, das pessoas e dos bens.
Não se combinam porque sabem que a sua terra tem condições para ser rica enviando mais carne, mais manteiga, mais queijo, mais conservas de peixe e até mais leite industrializado, para os mercados da metrópole e do estrangeiro.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: E quando as condições naturais são excelentes e os esforços da técnica na criação de novas pastagens, progridem a olhos vistos lamenta-se que toda esta riqueza não possa ser capitalizada, e investida na melhor das condições de vida das populações do distrito.
Lamenta-se justamente.
E porque é justo e porque são passados, 40 anos de vida política ordenada, séria, extraordinariamente produtiva, todos os do meu distrito, que tenho a honra de representar nesta Casa, esperam e acreditam que o Sr. Presidente do Conselho, com a sensibilidade que todos lhe conhecemos, determine a satisfação desta aspiração pelo novo plano de fomento que se aproxima. E as populações do meu distrito, que nem uma só vez, durante estes longos 40 anos, (...) em duvida a justiça e a capacidade realizadora do Regime, saberão agradecer com alegria e confiança.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Ministro do Estado, coordenador directo do Plano de Fomento, o Sr. Ministro das Obras Publicas, a quem o meu distrito tanto deve e que conhece e em minúcia o problema de que estou tratando e o Sr. Ministro das Comunicações que vive com atenta inteligência os problemas das comunicações com os Açores, conhecem bem as reacções do distrito sobre esta matéria. De facto, pode dizer-se que todos os governadores civis, Deputados Junta Geral, câmaras municipais, comissões de turismo, grémios, organizações da lavoura, imprensa diária etc., todos desde há muitos anos a esta parte, têm constantemente solicitado a constituição de um porto de abrigo para a ilha Terceira.
Isto quer dizer que se trata de uma necessidade inadiável.
Disse que seria breve e por isso me dispensarei de (...) se mais profunda. Tentei fazê-la na legislatura anterior quando, na sessão de 19 de Março de 1962 falei o problema das comunicações com os Açores.
Agora apenas direi que a construção do porto representa uma necessidade tão grande e uma aspiração tão profunda que tenho razões para crer que a maioria da população já nem discute a sua localização se na capital do distrito Angra do Heroísmo, onde a obra parece ser mais difícil e por consequência cara, se na praia da Vitória, onde o aproveitamento do pontão existente, a que atracam navios estrangeiros de mais de oito mil toneladas mas não atracam navios nacionais sem se saber bem porquê, poderá facilitar a construção de uma obra mais barata.
A população aceita aquilo que foi técnica e financeiramente mais aconselhável porque compreende que as disponibilidades financeiras actuais do Estado são condicionadas pelo esforço da defesa para a manutenção da integridade da Nação.
Muito obrigado, Sr. Presidente.

Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado

O Sr Horário Silva: - Sr. Presidente. O facto de uma cidade portuguesa festejar 350 anos de existência não seria acontecimento extraordinário neste velho Solar Lusitano, sede da Pátria Portuguesa. Mas é-o sem dúvida no ultramar em África nessa África que certos grandes e pequenos paises movidos por interesses inconfessáveis - movidos por interesses que não confessam mas, saltam a vista como já uma vez aqui acentuei -, julgam ou fingem ter agora descoberto para a civilização.
Trata-se de Benguela Sr. Presidente e Srs. Deputados, a cidade que Manuel Cerveira Pereira fundou em 17 de Maio de 1617 na costa de Angola, a 12,5 de latitude sul, e a primeira cidade que na nossa grande província do Atlântico se fundaria depois da de Luanda (41 anos antes, por Paulo Dias de Novais).
Capital do imenso Remo de Benguela de outros tempos, deve-lhe a Nação o mérito de haver sido por entre menanáveis sacrifícios e antes de nenhuma outra aquela em que se estratificou e donde se difundiu aquilo a que Gilberto Frene chamaria o «luso tropicalismo» e não é mais do que o génio da colonização portuguesa em terras de África, como nas do Brasil e do Oriente.
Cidade do trabalho, outrora cidade comercial por excelência aos seus homens do comércio e da missões católicas - só mais tarde apoiados por alguma acção militar e pela acção governamental - deve-se algo mais na sucessão das gerações (e aqui cito trechos da palestra pública que proferi há anos), deve-se-lhe algo mais do que a satisfação que alguns negociantes alcançaram da simples ambição de riqueza de que eram portadores Benguela e o seu prestígio e (...) promoveram, de facto, além da obra de ocupação de vastos sertões que outrora constituíam o Reino de Benguela e se estendiam por milhar e meio de quilómetros, a fixação e o exemplo lusíadas que tornaram portuguesas para sempre largas imensidades geográficas em que só reinava a barbárie e são hoje e há bastantes anos admiráveis cidades e vilas de civilização ocidental, onde se vive por preferência e gosto.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Na verdade Benguela e as suas gentes de outrora - «a famosa e histórica Benguela» do historiador Ralph Delgado - mais do que nenhuma outra cidade ou zona de Angola ou do Mundo Português engendraram e realizaram por Portugal, a verdadeira ba-

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talha da colonização - da colonização que não é de forma alguma o pejorativo «colonialismo» hoje tanto em voga na O. N. U. e na Suécia, se não aquela que foi e é protecção e cristianização, a integração das massas nativas numa comunidade nacional que é a do todos nós, Portugueses, obra máxima de lusitanidade que foi sempre a glória e pode considerar-se hoje o orgulho de toda a Nação.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E isso não se conseguiu pela força do numero ou das armas, que, todos o sabem, foram sempre, e até 1961, reduzidos, quando não insignificantes. Deveu-se, sim, ao alto teor de simpatia humana que as gentes de Benguela souberam por vocação lusíada, inspirar às populações, tornando tradicionalmente aquela cidade, em Angola, como um toda a Nação a cidade-tipo do convívio multirracial Benguela foi assim o cadinho maravilhoso que fundindo o protótipo do português do ultramar é hoje o fundamento impar da razão portuguesa perante o Mundo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados. Essa é a traços largos, a historia pregressa da cidade africana portuguesa que em 17 de Maio próximo completará 350 anos de existência. Foi ela a cidade mãe de numerosas cidades vilas e aldeias de Angola. Examinou-se por isso muitas vezes. Os seus progressos foram, por esse motivo, muito lentos e, por vezes, devido a desatenções governamentais, tão arreliantemente lentos, ou até inexistentes que geravam mal-estar mesmo desentendimentos - que não de portuguesismo, um portuguesismo sem jaça, diga-se de passagem -, entre algumas camadas da população e o Governo. Mas isso são águas passadas que já lá vão. Houve - e foram alguns benguelenses responsáveis - quem tivesse o merito de desanuviar, clarificar a atmosfera. E a acção compreensiva benfazeja e progressiva de alguns grandes governadores-gerais e distritais - designadamente os três ou quatro últimos de ambas as categorias - pôde realizar, afinal facilmente, o «milagre» do perfeito entendimento que é o de hoje e de há vários anos, e maior ainda a partir dos acontecimentos de 1961 Benguela retoma assim a ora velha, crença no futuro e é hoje das mais progressivas cidades de Angola.
Até sob este aspecto o exemplo de Benguela se me afigura digno de ser dado a conhecer à Assembleia Nacional nesta sua derradeira sessão anterior às comemorações de 17 de Maio, cujo momento mais alto seja aquele em que, à sua mais moderna e vasta praça - a do chamado Centro Cívico - vai ser dado o nome ilustre do Chefe do Estado, Almirante Américo Tomás. E cumpre-me esclarecer a Câmara de que outra grande praça da cidade, aquela em que se situa a sede do Município tem o nome igualmente ilustre do Chefe do Governo, Prof. Oliveira Salazar.
E termino, Sr. Presidente, esta minha intervenção com a sugestão e voto - como os que apresentei exactamente há um ano - de que mais uma vez pela acção conjugada do Ministério do Ultramar e do Governo-Geral de Angola, mais alguns membros desta Assembleia sejam convidados a visitar aquela nossa província ultramarina tantas são as vantagens de toda a ordem que do conhecimento directo que assim vão obter podem e devem resultar para o País.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Braz Regueiro: - Sr Presidente. Neste mundo conturbando e impregnado de materialismo não sei, em almoeda, a como vai cotada a vida humana.
Sem perigo de atraiçoar a doutrina em que fui nado e criado, a vida para mim continua a não ter preço e, como valor inestimável, é de Deus e transcende, em ultima análise, a ambição e o destino dos homens.
Não podermos usurpar o Poder de Deus, se só Ele nos da a vida inteligente só Ele no-la poderá tirar. Acresce que sou médico e fiz um juramento de Hipocrates chamado que me obriga a aceitar todos os sacrifícios por amor do próximo, com o retorno de um só prémio e uma só compensação - a paz da consciência quando o dever esta cumprido.
A fronte do médico, cinge-a uma dupla coroa de espinhos sofremos as nossas dores
e as dores alheias E, se não for assim a arte de curar nunca seria um sacerdócio.
Guerras calamidades epidemias catástrofes, tudo o que implica sacrifício da vida humana encontra no médico o mais aguerrido e destemido adversário.
Peço a palavra hoje a pedido de algumas mães portuguesas e ao apelo e clamor de uma população indignada que me pedem que levante a minha voz em defesa do prestígio da civilização, da moral, da filantropia e até da crença, religiosa, num protesto contra as famigeradas e perigosíssimas passagens de nível que todos os anos ceifam impiedosa e cruelmente, dezenas de vidas que constituem sem duvida quota-parte do mais inestimável valor nacional.
Raro é o dia em que os diários não registam mais uma vítima de uma dessas ratoeiras que são as passagens de nível. Umas vezes, e a morte por junto por (...) uma camioneta, um automóvel, são estragados pelo monstro de aço e dezenas de vidas se perdem. A catástrofe é então notícia de sensação e arrepia, na medida em que repugna a responsabilidade do crime.
Do crime! Do crime sim.
O quinto mandamento diz «Não matarás» e, na medida em que as vidas se perdem e a indignação geral não encontra resposta, todos somos culpados, todos somos criminosos.
A não tomarmos medidas imediatas paia evitar esta história trágica dos nossos dias essa mortandade constante a exigir solução e termo esse (...) trágico de mortes a suscitar explosões do raiva, gritos de revolta e acerbos comentários, enquanto não tivermos primordial respeito pela vida do nosso semelhante pela vida humana, pondo dique a uma sequência de desastres que determinam inevitável e justa indignação e naturais protestos e clamores, nunca terá fim a expressão do nosso desgosto e da nossa inquietação.
Todos estes comentários validos, humanos aflitivos e aterradores têm em mua alertar os responsáveis para a solução de um problema que tem tanto de humano como de social.
Que me seja permitido um apontamento particular para o que se vem passando nas fatídicas passagens de nível sem guardas existentes dentro da cidade de Viana do Castelo.
A perda de vidas ultimamente registada, a aumentar o martirológo sempre crescente, tem nestes últimos dias alimentado uma campanha de protesto dos jornais diários e dos regionais a até a televisão portuguesa dedicou ao caso numa das últimas noites acerbo comentário.
Autênticas ratoeiras, uma delas - «A Guilhotina», como tristemente é conhecida - funciona frequentemente, apesar dos letreiros «Pare, escute e olhe», que

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não são legíveis por analfabetos ou por crianças, apesar do sinal sonoro, que não é ouvido pelos surdos ou por aqueles que o não são quando outros ruídos maiores se sobrepõem, apesar dos conselhos e advertências dos aterrados pais aos filhos desobedientes ou, por tributo à idade, irrequietos, descuidados e desatentos.
Os humanos clamores de uma cidade indignada têm forçosamente de encontrar eco entre as entidades responsáveis pela sua solução, já que será por certo a cidade de Viana do Castelo a terra portuguesa em que estes acidentes mortais se têm registado com mais frequência e em maior número.
Atente-se a que, a desafiar a vida dos respectivos utentes, estes são em larga percentagem crianças de uma escola primária e do liceu nacional, que pelo menos quatro vezes por dia têm de atravessar tão perigosas ratoeiras.
Não admira, pois, que reine a ansiedade, o medo, o terror, a inquietação e o permanente sobressalto no coração de tantas mães que, na cidade ou fora dela, temem pela vida dos seus filhos e me rogam e pedem uma palavra de esperança neste areópago político, na esperança também de que ela encontre eco, compreensão e, finalmente, solução, junto das entidades oficiais.
Sabemos que está prevista desde há muito a construção de duas passagens subterrâneas, mas o tempo corre e continuamos sem saber de quem é a culpa de tudo o que se tem passado e a quem ficam vinculadas as responsabilidades de tantas mortes sucessivas.
Temos de compreender que, em última análise, os milhares de escudos que hoje seriam investidos com as obras necessárias são migalhas quando comparados com o que a ratoeira já custou, está custando e continuará a custar em vidas humanas.
O sangue que tem corrido n'«A Guilhotina» constitui já nuvem negra e pesada a ensombrar e a entristecer essa formosa parcela do Alto Minho, síntese da beleza do Mundo, de horizontes largos e alegres, dessa província-jardim que estonteia e deslumbra.
Acabe-se com a indiferença perante o monstro que passa e esmaga, que não ouve e esmaga, que não vê e esmaga, indiferente às súplicas, aos gritos, à dor e às lágrimas, como que se houvera só esse monstro que, repito, passa e esmaga, caminha e esmaga.
Num dia de desastre, de mais um, as badaladas nos campanários têm um som de peso desconforme e parece que todos ali estão à espera da morte!
Sem humorismo, descabido em coisas sérias, antes com palavras que requerem uma pausa, um silêncio, uma meditação, peço encarecidamente que no ano em que se comemora em Portugal a passagem do centenário da abolição da pena de morte - a Universidade de Coimbra para o efeito pediu já a colaboração do Governo -, peço encarecidamente, repito, que se acabe com a «guilhotina» que ainda funciona em Viana do Castelo.
Pedem-nos as mulheres do Minho, essas mulheres resignadas e heróicas na sua coragem silenciosa, essas mães de vidas humildes, mas que sonham, lutam e sofrem, frementes de amor e ansiedade, essas grandes sacrificadas que continuam, sem protestos, a ser vitimas de erros milenários, essas grandes obreiras da vida a quem não vencem nem as fadigas, nem os esforços, nem os obstáculos, essas mulheres a quem a vida pesa brutalmente, suportando inconcebíveis trabalhos, rigores e angústias, mas sempre risonhas e felizes, a cantar e a sonhar amores, essas heróicas mulheres minhotas que se multiplicam em filhos que de bom grado oferecem à Pátria para defesa da sua integridade, mas que se revoltam, que se escandalizam, que se recusam a aceitar a usurpação do poder de Deus a morte antecipada dos seus filhos nas famigeradas passagens de nível.

Vozes: - Muito bem muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Martins Lima: - Sr Presidente: «Lê café fait la loi», diz Valahu no seu recente livro Angola clé de l'Afague.
No realidade, o café tem sido para Angola a mola real do seu progresso e valioso sustentáculo da economia não só provincial, mas ainda nacional.
Graças aos proventos colhidos da sua cultura e comércio, foi possível atrair e disseminar pelo interior da província grande número de povoadores, que constituíram outros tantos heróis e mártires na altura dos terríveis acontecimentos de há seis anos. Não foi sem uma ponta de emoção, Sr Presidente, que escutei as palavras de V. Exa. quando, no passado dia 15, exprimiu tão convictos e patrióticos votos, que reflectiam, aliás, o sentir unânime desta Câmara.
Sr. Presidente. Sinto-me tentado a dizer que o café tem sido para Angola como que uma «galinha de ovos de ouro».
Permitiu que Luanda, além de muitas outras cidades e localidades, experimentasse considerável desenvolvimento.
Constitui ainda a principal origem do espectacular investimento que tem vindo a registar a construção civil naquela cidade, a qual não parece dispor ainda das estruturas que o progresso requer. Abundam as construções clandestinas, dada a inexistência de um plano de urbanização e outros meios à altura de uma grande cidade como Luanda já hoje é.
Tem dominado de forma notória o comércio interno, para o qual as perspectivas de má colheita ou o declínio de preços causam sempre muitas apreensões. De facto, é vulgar ouvir dizer-se em momentos de crise prolongada «Isto está mau, o café baixou!». E são os vinhos, os tecidos, os automóveis, os aparelhos electrodomésticos, as construções, os transportes, etc, enfim, todo um mundo de comerciantes e industriais que vê pairar nuvens sombrias sobre os seus ramos de actividade.
O seu lugar cimeiro na tabela dos valores de exportação tem assegurado a Angola saldo positivo na sua balança comercial.
As receitas do Estado, provindo, quer do imposto sobre explorações, quer dos direitos e taxas de comercialização e exportação do café, constituem verba que não andarei longe da verdade afirmando será das maiores, ou talvez mesmo a maior.
Graças a Deus, o café tem dado para tudo!
Mercê da colaboração da quase totalidade dos países produtores e consumidores, através da Organização Internacional do Café, tem sido possível manter os preços em nível compensador. Tal facto, aliado à circunstância de o café ser a principal fonte de divisas da grande maioria dos países produtores, conduziu a cafeicultura mundial a crise de superprodução.
Os riscos de ruptura da colaboração internacional e as preocupações ao nível nacional são evidentes. Há precisamente um ano referi na tribuna este assunto a propósito do parecer sobre as Contas Gerais do Estado de 1964, realçando a necessidade urgente de política acertada de diversificação.
O Instituto do Café de Angola, ciente daquelas responsabilidades, encetou estudo tendente à criação de um

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fundo com tal finalidade e em moldes que achámos salutares para a nossa «galinha de ovos de ouro».
Foi pena, Sr. Presidente, que a ideia não houvesse sido rapidamente concretizada, pois evitar-se-ia situação pouco agradável para o café de Angola como aquela que resulta da Portaria n.º 22 576, publicada no Diário do Governo do passado dia 16.
Nela se estabelece um novo ónus á cafeicultura de Angola, por cobrança aos exportadores da quantia de $30 por quilograma de café que pretendam exportar ao abrigo das quotas distribuídas para utilização no último semestre do ano cafeeiro em curso.
Não discutimos a necessidade de o Governo lançar mão de tal cobrança para constituir o suporte financeiro indispensável à satisfação das exigências da resolução votada em 6 de Setembro de 1966 pelo Conselho Internacional do Café, que obriga os países beneficiários da concessão de quotas adicionais de exportação a depositar 20 por cento do valor do café que, a esse título, é permitido exportar no último semestre (l de Abril a 30 de Setembro) em conta à ordem do país e do director executivo daquela organização, importância essa que se destina, à execução de programas de diversificação nacionais.
Fazemos reparo, sim, quanto à inoportunidade da incidência deste encargo sobre o café de Angola, que vem somar-se a três outros já estabelecidos para a presente campanha. Em 23 de Julho de 1966, pela Portaria n.º 14 437, o Governo-Geral de Angola determinou que a inscrição anual dos exportadores de café verde do Instituto do Café de Angola ficasse sujeita à taxa de 50 000$ (anteriormente 1000$) O Decreto n.º 47 196, de 14 de Setembro de 1966, criou a taxa de 1 por cento ad valorem sobre todo o café exportado pela província, cujo produto da cobrança constituiria receita do Instituto do Café de Angola, e aumentou de $10 por quilograma de café exportado a taxa de propaganda criada pela Portaria n.º 16 396, de 2 de Setembro de 1957.
A estas taxas, representando aproximada e respectivamente 3500, 25 000 e 14 000 contos, há que juntar agora cerca de 21 000 contos a pagar pelo café de Angola por força da Portaria n.º 22 576, já citada.
Cerca de 64 000 contos de novas, taxas numa só campanha, em que os preços internacionais, em média, estão abaixo da anterior, não podem deixar de afectar um sector de tão grande importância para a economia e política da província e da Nação, não obstante o «estudo, pelos órgãos competentes da metrópole e da província, das possíveis repercussões sócio-económicas eventualmente derivadas da inoportunidade e gravame das medidas a adoptar por nos encontrarmos já em plena campanha do comercialização», como se afirma no preâmbulo da Portaria n.º 22 576.
Estivesse o sector económico do café convenientemente dotado, por comparticipação do sector público, de forma justa e equitativa relativamente ao total das receitas provenientes da sua fiscalidade, e não haveria, parece-nos, motivo para recorrer tão frequentemente a tributações de emergência.
Sr. Presidente: A actividade privada, nomeadamente exportadores e produtores, tem suportado exclusivamente as pesadas consequências da retenção dos elevados stocks de café da província, os preços de custo sobem e em algumas zonas é ainda necessária muita valentia para se ser cafeicultor.
Ouso, pois, pedir ao Governo que, em conjunturas requerendo tratamento especial no que concerne à tributação dos sectores interessados, tão sujeitos já à influência de factores variáveis, conceda que os mesmos possam, com o devido tempo, considerá-la nos seus planos de trabalho, e não nos termos da Portaria n.º 22 576, publicada em Lisboa a 16 de Março, para entrar em vigor na província a 1 de Abril seguinte.
Cremos que, se assim for, os sacrifícios poderão ser repartidos, na devida e justa medida, por todos os contribuintes devotados não só à defesa da cafeicultura angolana, mas também aos superiores interesses da Nação.

Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.

O Sr Duarte de Oliveira: - Sr Presidente: Agora que estão a ultimar-se os trabalhos preparatórios e estudos prévios do III Plano de Fomento quero lembrar problemas do distrito de Viseu, que são problemas autenticamente nacionais e que têm, na sua generalidade, sido preocupação dos responsáveis, como bem o atesta a constante linha de rumo seguida na lei de autorização de receitas e despesas dos últimos anos.
Refiro-me à criação, no distrito de Viseu, de um pólo de atracção industrial que interesse as gentes da região, e até outras, de forma a fixar-se lá o trabalho e o capital que tem estado, um e outro, a emigrar, com grave prejuízo do progresso regional.
A administração do distrito não se tem poupado a esforços nesse sentido e é digno do maior louvor o seu empenho no planeamento económico e na valorização industrial do distrito.
À excepção do complexo industrial de Canas de Senhorim, o distrito não tem uma indústria com repercussão notória na economia regional.
Distrito predominantemente, quase mesmo exclusivamente, agrícola, as suas gentes têm-se dedicado e gasto as suas vidas explorando solos pobres, sem rentabilidade visível, usando técnicas de exploração deficientes, fazendo culturas inadequadas às condições de solo e de clima, cavando cada ano que passa, cada dia que passa, a sua ruína, se não mesmo a sua miséria.
O grande Shakespeare, pela boca de uma das suas personagens, dizia «Se fazer fosse tão fácil quanto saber o que é bom fazer, as capelas seriam igrejas e as cabanas dos pobres palácios de príncipes».
Sabemos, pois, que não é tão fácil fazer como saber o que é bom fazer, mas, dentro da relatividade deste mundo e dentro deste mundo, do mundo português, julgamos ser fácil fundar no distrito uma indústria rendosa, onde poderão ser colocados capitais com o mínimo de risco, desde que superiormente se facilite a sua criação, dentro sempre de um «dirigismo» que hoje é lugar-comum universal.
Capitais, existem suficiente no distrito, por enquanto, à espora de colocação capaz. As indústrias nacionais existentes verdadeiramente compensadoras, não precisam das poupanças de capitalista médio do meu distrito, pois estão nas mãos de accionistas com capitais suficientes. Compreendo que assim seja. Mas peco que se criem as condições para um investimento industrial reprodutivo no distrito de Viseu.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não sou técnico para que possa escolher o ramo industrial para o meu distrito, mas estou a lembrar-me de alguns empreendimentos que seriam, sem dúvida, certeza de êxito desde que tivessem a ajuda, a compreensão e a facilidade dos Poderes Públicos.

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Com mágoa se vêem regiões menos dotadas que a nossa, mesmo quanto a matéria-prima, a caminharem num ritmo de progresso industrial assinalável, com a instalação de indústria de futuro assegurado, quando o distrito de Viseu permanece agrícola.
Ainda há pouco foi negado o alvará para a instalação de uma indústria nova nas imediações da sede do distrito por razões ignoradas, apenas segredadas por este maldoso «diz-se» e que não terão sido inteiramente válidas. E o indeferimento da petição causou desgosto geral.
Ora, porque por certo novas insistências não ser feitas junto dos Poderes Públicos para a criação do tal foco industrial no distrito, daqui ergo a minha voz pedindo um estudo sério, ponderado e também breve, pelas repartições competentes das petições apresentadas, de forma a ser facilitada uma industrialização capaz do distrito de Viseu.
Esta é a melhor maneira de combater as solicitações que de lá de fora estão a fazer-se aos nossos capitais, de anular as chamadas e vencer as facilidades que do exterior se dirigem aos nossos capitalistas.
Justiça e celeridade na concessão ou denegação de alvarás ou licenças de estabelecimentos industriais obstará melhor ao êxodo de capitais do que disposições de carácter punitivo, sempre ladeáveis com mais ou menos facilidade. Êxodo de capitais e êxodo do trabalhadores.
O êxodo dos campos é inevitável. É a ânsia de uma posição justa e decente na sociedade portuguesa que o campo não pode dar a todos quantos o trabalham. Há ainda gente a mais nos campos de Portugal e a sua fuga da terra é um bem se aqueles que os amanham ficarem, na sua maioria, entre nós pela alerta de postos de trabalho com remunerações dignas.
E isso só será possível criando novas indústrias, através de um trabalho e mesmo sacrifício ingente dos Poderes Públicos e das entidades privadas numa conjugação de esforços total.
Seria uma modificação difícil, mas isso implica o reconhecimento de que é possível e, quanto a nós, inevitável.
Temos necessidade premente inadiável, do criar riqueza, isto é, de fazer indústria, não em ritmo alucinante, com pressas, demasiadas, mas também não com as demoras do costume.
A não ser assim, terá de continuar a grande exportação de trabalho, que sempre foi uma exportação pobre.

Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.

O Sr Presidente: - Vai passai-se à

Ordem do dia

O Sr Presidente: - Continuam em discussão as Contas Gerais do Estado (metrópole e ultramar) e as Contas da Junta do Crédito Público relativas a 1965.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Cruz.

O Sr António Cruz: - Sr. Presidente: O debate sobre as Contos Gerais do Estado de 1965 permite, uma vez mais, prestar a devida homenagem ao estadista, que as subscreve e proporciona de novo ensejo para nos debruçarmos atentos sobre um parecer que reafirma as singulares qualidades do economista que deveras nos honra como nosso par dentro da Assembleia Nacional. E o mesmo debate possibilitou que viesse a erguer-se nesta tribuna a voz autorizada de quem, revestido de qualidade suficiente, pudesse dizer da sua justiça em relação a pormenores ou especialidades que importava analisar ou sublinhar.
Peço vénia, eu que não estou revestido de autoridade, para uma glosa a margem da lição do parecer sujeito a debate. Ligeira e curta glosa, confinada pelos limites do que me é caro e logo a assemelhar-se, verdadeiramente a um simples apontamento. Vai ditá-la porém, mais do que o propósito de defender os interesses de uma cidade e de uma região o vivo desejo de servir o próprio interesse nacional. Porque é esse, na realidade o que está em causa.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O acesso à promoção cultural beneficia hoje, da parte do Estado de uma protecção que obriga a investimentos dos mais avultados. E, assim, neste campo quando se estuda em ordem a elaborar um programa ou a promover uma reforma sabe-se que a execução do que é projectado é logo facilitada pela concessão das verbas necessárias. É esta uma realidade que fica também a assinalar uma época não se promete, realiza-se, não se ambiciona, cumpre-se.
Partiu-se, e bem do pressuposto de que é dos mais lucrativos para o País o investimento que se destina a fomentar a educação. Multiplicam-se as escolas, atende-se ao vivo anseio das populações, corresponde-se às exigências das técnicas.
Carece o País de um escol para vencer dificuldades de vária ordem - e esse escol o preparam os institutos de ensino médio e superior. Carece o Pais de gabinetes, de laboratórios de campos do ensaio, onde o especialista, prosseguindo estudos - venha a colher o fruto do seu labor e, assim, a possibilitar os conhecimentos que tendam a uma actualização do ensino de base quanto a permitir o recrutamento de outros candidatos à mesma especialização - e logo o Estado, pelas suas secretarias, cria, instala e mantém esses gabinetes, esses laboratórios e esses campos de ensaio.
É uma corrida em que estamos lançados prosseguindo tarefas impostas pelas realidades. Mas sabemos nós, porque assim o revela a própria experiência de outros países, que não pode sei fixado um prazo para o termo dessa corrida. Não ignoramos, porém, e ainda por força da mesma experiência da terra estranha, que importa continuar sem desfalecimentos investir sem hesitações, realizar, concretamente, sem cuidar de ouvir os «velhos do Restelo». Terá sido outra algum dia, a orientação seguida pelo Governo.
Não foi outra importa sublinhar. O Governo, atento, não hesita realiza, concretiza, auxilia, estimula, leva inovação aonde ela se requer, não regateia as verbas exigidas pelas reformas mas audaciosas.
Insere-se no complexo desta acção do Governo a criação dos Estudos Gerais Universitários de Angola e de Moçambique - as mais novas das universidades portuguesas e que embora novas ocupam já posição de relevo para não dizer singular, no continente africano. E também, ao seu lado, a mais nova das escolas superiores do continente que é a Faculdade de Letras do Porto.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A criação das duas Universidades, bem como da nova Faculdade, foi determinada sobretudo pelas necessidades decorrentes do acesso à promoção cul-

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tural. Poder-se-á anotar que a mesma criação correspondeu a velha aspiração das províncias de Angola e de Moçambique e da cidade do Porto. Mas é também de anotar que essa aspiração veio a ocupar posição paralela à das intenções do Governo, e daí a pronta solução que mereceu cada qual dos problemas.
Falece-me autoridade para dizer aqui as palavras de louvor que são devidas aos reitores e ao corpo docente dos Estudos Gerais Universitários de Angola e de Moçambique pela acção notabilíssima ali empreendida e logo coroada de êxito. Porém, nada me impede, como português, de exprimir-lhes gratidão pois que essa lhes é devida, e sobeja da parte de todos os portugueses. Consinta-se, no entanto e para além desse testemunho de reconhecimento, que eu profira, desta tubuna, algumas outras palavras essas ditadas pela situação actual da Faculdade de Letras do Porto.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Aquando da criação desta escola de ensino superior, apenas lhe foram atribuídos as quadros do estudos que habilitam à licenciatura em Historia e em Filosofia. Vai agora a caminho do seu termo o ano lectivo em que terminam o seu curso os primeiros alunos que nela se matricularam. Isto corresponde a dizer-se que daqui a meses, depois de satisfazerem a exigência legal da apresentação e defesa de uma dissertação, ficarão licenciados em História e em Filosofia aqueles que foram os primeiros alunos da Faculdade de Letras do Porto.
Após esses, ano u ano, outros se inscreveram na mesma Faculdade. A média é de cerca de um centena, em cada ano de novos candidatos à licenciatura em História e do cerca de meia centena dos que aspiram à licenciatura em Filosofia. Logo este número bem exprime quanto se impunha a criação da Faculdade provando também que agiam de acordo com os altos interesses do País, sempre em obediência ao pensamento e vontade do Sr. Presidente do Concelho os Profs. Leite Pinto e Manuel Lopes de Almeida quando lhes esteve confiada a pasta da Educação Nacional.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - ... e ainda o ilustre e dedicado director-geral do Ensino Superior e das Belas-Artes, a quem o País é devedor dos mais assinalados serviços.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - É esse número elevado de alunos que se inscrevem na Faculdade de Letras do Porto será ainda compensação das mais gratas para as (...) de todos aqueles que tanto lutaram pela sua criação, devendo citar-se, ao menos os nomes dos Profs. Amândio Tavares e Luís de Pina e do antigo Deputado Dr. Urgel Horta.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Todavia, o que é justificação, neste caso, e assim a, elevada frequência da Faculdade de Letras do Porto apresenta-se também como sério motivo para uma reflexão. É que nem um instante podemos vivei alheados de outras realidades que se nos impõem e que tocam de peito com essa mesma frequência.
Carecido de professores diplomados e habilitados para o ensino médio, poderá o Pais, na especialidade da História e da Filosofia, vir a recrutar, nos anos mais próximos, todos, aqueles que concluírem as respectivas licenciaturas nas três Faculdades de Letras do País. Decorridos, porém, alguns anos e não obstante o alargamento de quadros - esse a impor-se dia a dia e numa permanente adaptação as, exigências da multiplicação do numero dos alunos dos liceus e escolas técnicas, quer oficiais, quer particulares - decorridos alguns anos, já não será apenas na fundão docente que virão a ser investidos todos os licenciados em História e em Filosofia. Espera-nos então é certo, e como hoje acontece, qualquer outra função, melhor ou pior remunerada que a de professor ou a de documentalista, se para tanto se afirmam aptos - e essa remunerada muito acima da média geral a que andamos, habituados -, ou então, a de bibliotecário-arquivista, que, exigindo-lhes muito embora e após a licenciatura um curso de especialização, não virá a proporcionar-lhes rendimento superior ao de funcionários apenas habilitados com o 2.º ciclo liceal.
Esta é a primeira das realidades que devemos ter presentes sempre que se imponha reflectir para descortinar um rumo. Todavia, e prosseguindo a reflexão, não conseguimos desembaraçar-nos destra outra realidade que se ergue diante de nos qual seja a da falta de docentes do ensino médio para outras especialidades. E então se desdobra oferecendo-se à nossa meditação o quadro sombrio oferecido por muitas escolas nas quais o ensino de determinadas disciplinas - e assim o Português, o Francês e a Geografia por exemplo - está confiado posto que a titulo eventual a indivíduos que só agora frequentam a Universidade ou que nem sequer nela ingressaram ainda.
São em número de muitas dezenas, passante de centena e meia, por exemplo as vagas de professores do grupo de Filologia Românica. Aumentado o número de escolas - e dia a dia se impõe a criação de novas, devendo-se também atender a que não vem longe o funcionamento do ciclo preparatório unificado - o número de vagas virá também a subir (...) a curto prazo, das duas e meia a três centenas. Onde, como, recrutar professores diplomados e habilitados para o preenchimento dessas vagas. Onde, como, se as Faculdades Coimbra e de Lisboa não conseguem licenciar em cada ano, ao menos a décima parte de novos professores de que o País carece só Deus sabendo a quantos sacrifícios andam sujeitos os seus docentes quando empenhados nessa missão?
Relega-se por vezes, e não sem algum fundamento que falham as vocações para a careira de professores do ensino secundário naquela medida em que não lhes serve de estímulo uma remuneração insuficiente. Mas temos para nos que não é essa a cansa, principal da carência verificada e, com ela, do elevado número de vagas acusado pelos quadros das escolas do ensino médio, que aumenta de ano para ano.
O que importa não é apenas remunerar suficientemente os professores do ensino secundário mas sim quanto possível facilitar a sua preparação. E se há um imperativo de natureza económica a impor-se, devemos nós procurá-lo desde logo no condicionalismo da preparação escolar dos candidatos a docentes.
Não hão-de faltar a muitos jovens nem vocação, nem forte desejo de virem a dedicar-se ao ensino segundo a ingrata carreira de professores do ensino médio. Muitos deles, por natural inclinação, desejariam estudar as disciplinas incluídas nas licenciaturas dos grupos das Filo-

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logias ou da Geografia. Porém, se fixados no Porto ou em todo o Norte do País, e uma vez que não disponham do auxilio financeiro indispensável, esses jovens, quando ambicionam frequentar a Universidade para aí obterem o seu grau são obrigados a renunciar ao que era, da sua parte inclinação natural para se inscreverem nos cursos de História e de Filosofia. Com essa renuncia pouco lucram para além de uma formação que, sendo também, como é, de feição Humanística, logo, e como tal, vem a ministrar-lhes cultura desinteressada e a toná-los mais aptos na reflexão. E com essa renúncia perde sobretudo o País, se atendermos às suas necessidades imediatas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Na sequência destas considerações, acode naturalmente a formulação de um voto urge completar a Faculdade de Letras do Porto, na sua orgânica actual, com aquelas licenciaturas que lhe faltam.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Urge dotá-la das possibilidades de vir também a colaborar na preparação de professores do ensino médio de que o País tanto carece.

O Sr Nunes de Oliveira: - V. Exa. dá-me licença?

O Orador: - Faça favor

O Sr Nunes de Oliveira: - Tenho seguido com o maior interesse as considerações de V. Exa. Se o interrompo, e apenas para apoiar as suas palavras e para me associar no apelo que V. Exa. acaba de dirigir ao Governo, porque entendo que já é tempo de se encarar decisivamente a criação de certos cursos na Faculdade de Letras do Porto, dada a carência sempre crescente e preocupante de professores em determinados graus do ensino, além, evidentemente, de outras razões a que V. Exa. muito bem acaba de aludir.

O Orador: - Muito obrigado a V. Exa.
Urge fazer dessa escola superior uma Faculdade de Letras completa Porém, se vier a reconher-se que o ensino dentro das mesmas Faculdades carece de reforma, admitindo-se a possibilidade de um novo grau - talvez o do bacharel - para os diplomados que se destinem ao professorado dos primeiros ciclos, consoante o que enunciou oportunamente o ilustre titular da pasta da Educação Nacional, então, e nessa hipótese, consinta-se uma pergunta porque não ensaiar essa reforma na Faculdade de Letras do Porto?
Sr Presidente: O Porto e o Norte do País confiadamente esperam que a sua Faculdade do Letras mereça até da parte do Governo, se tanto for necessário, uma medida de excepção. Sabemos nós da atenção que o Governo dedica a todos os problemas da educação nacional e não se ignora que é hoje considerado como dos mais lucrativos todo o investimento que se faz com vista a solucionar qualquer desses problemas. O Porto, confiando tem hoje a certeza de que lhe será feita justiça.
Tenho dito

Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado

O Sr. Jerónimo Jorge: - Sr. Presidente: As Contas Gerais do Estado de 1965, que, a semelhança de anos anteriores, temos entre mãos para análise e aprovação, passo a passo exemplificam salutares princípios de administração pública, criteriosamente seguidos pelo Governo com persistência e isenção, por sua vez, o respectivo parecer da Comissão de Contas Públicas desta Assembleia encontra-se, como também já é de tradição, elaborado com clareza, método e profundo conhecimento dos problemas. Se, por um lado, a apreciação das Contas Gerais do Estado de 1965 justifica, desde já, voto de aprovação, por outro, afigura-se-me de elementar justiça associar-lhe uma expressiva palavra de muito apreço à Comissão que elaborou o parecer e, particularmente, ao seu ilustre relator, Sr. Eng.º Araújo Correia.
Sr Presidente A análise das Contas Gerais do Estado de 1965 leva-me a referências, embora breves, a assuntos de relevo na vida nacional e relativos aos meios de que a Marinha carece para bem cumprir a sua missão, quer no sector militar, quer no dos transportes marítimos.
Antes, porém, de entrar nesses assuntos, seja-me permitida uma singela evocação, simultaneamente dolorosa o estimulante, a um passado recente.
Esta evocação já V. Exa., Sr. Presidente, em melhor oportunidade a produziu, na sessão do passado dia 15, quando, em simples manifestação do seu alto sentimento patriótico, lembrou a trágica data em que teve início, nas terras lusitanas de Angola, a criminosa subversão desencadeada por forças estranhas que, embora agindo em campos diferentes se deram as mão para nos expulsarem da África.
Todos sabemos que a nossa saída forçada do continente africano não passaria de um objectivo integrado numa finalidade geopolítica de maior alcance.
Nós éramos - e somos - um dos últimos obstáculos a certos planos de domínio político e económico da África visando o envolvimento da Europa - fase preparatória para a queda da civilização ocidental.
Daí as tentativas persistentes de que temos sido alvo, daí os meios de toda a ordem de que os nossos adversários se servem para tentar em alcançar os seus objectivos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mas a nossa coragem e o nosso espírito de resistência continuam a opor-se com indomável energia, à onda terrorista que pretendia submergir-nos.
Os organizadores da agressão esqueceram se de ter sido em Portugal que, através dos séculos, os invasores, mesmo os mais poderosos, experimentaram reveses que os fizeram perder as campanhas e os obrigaram a recuar para além-fronteiras dos países que se propuseram conquistar.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Depois ante a barreira intransponível que encontraram em Angola, voltaram as suas atenções para a Guiné e Moçambique, na esperança de nos enfranquecerem com a dispersão de estorços. Mas novamente lhes falham essas esperanças!
A Nação em peso, desde os governantes à população civil manifestou uma patriótica solidariedade com as

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forças armadas que sustentaram o choque nas três frentes e, inquebrantàvelmente, continuam a repelir as agressões.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O esforço desenvolvido pelo Exército, Marinha e Aviação toma aspectos de epopeia, em especial se atentarmos nos meios que tem sido possível pôr à sua disposição.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E, assim, julguei oportuno aqui recordar actuações da Marinha e relembrar algumas das suas aspirações para poder continuar a bem cumprir a sua tão valorosa missão ao serviço da integridade do território pátrio.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não vou falar no esforço de guerra propriamente dito, das acções denodadas levadas a efeito pelos bravos fuzileiros e marinheiros em matagais e savanas, nos rios e nos canais lodosos rodeados de capim e mangais donde a morte espreita a cada passo, não vou falar das longas noites perdidas, a bordo de fragatas e lanchas, em esgotante fiscalização de águas e litorais. Vou apenas recordar uma tarefa apagada, mas básica, sem a qual as actuações sequentes soçobrariam Consistiu essa tarefa na inicial organização das forças e no estabelecimento das infra-estruturas que então se levaram a efeito graças a uma previsão admirável dos acontecimentos.
O adensamento da atmosfera internacional revestia particular incidência em África, ante a série de novas independências, face à agressividade que os países recém-independentes e outros, candidatos à independência, manifestavam, ante, ainda o apoio suspeito e sinuoso que certos díscolos mascarados de políticos encontravam em determinados areópagos internacionais - o Governo de Salazar começou a agir.
Compreendeu-se a tempo que podia acabar a normal e pacífica atmosfera de boa vizinhança nas nossas províncias ultramarinas e surgiram, metodicamente e em ritmo seguro, as medidas adequadas.
A partir de Abril de 1957, a Marinha começou a promulgar legislação, criando os comandos navais, os comandos de defesa marítima e outros meios de acção, tal como uma rede de comunicações, que foram rapidamente executados com decisão e competência. Assim, por todas as províncias ultramarinas entraram em actividade estações e postos radionavais, que tão assinalados serviços vêm prestando aos três ramos das forças armadas
Além de serem insuficientes os tipos de navios de que dispúnhamos, carecíamos ainda de outros para a situação que se antevia Previdentemente, a Marinha actuou organizando nas diferentes províncias ultramarinas esquadrilhas de lanchas de fiscalização e de desembarque Promoveu a construção e a compra dos navios a enquadrar nesses agrupamentos e, gradualmente, fez entrar ao serviço muitas dezenas de novas unidades daqueles tipos.
Julgo desnecessário acentuar o esforço desmedido, o dispêndio de energia, a competência técnica e o grau de noção do dever para com a Pátria que a realização destas tarefas, em tão curto período, representou

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Merecidos louvores devem ser tributados ao titular da pasta da Marinha pela inteligente visão e decidida firmeza com que enfrentou situação tão momentosa.
Só com tais medidas pudemos vantajosamente comparticipar, com as outras forças armadas no choque inicial e continuar ao longo destes anos a desbaratar o inimigo em todos os recontros e a neutralizar-lhe as iniciativas
Mas não bastava a chamada «poeira naval», constituída pelas pequenas unidades com as suas funções específicas, eram necessárias unidades oceânicas, de actualizado valor militar, aptas a cumprir missões diferentes das directamente impostas pelo terrorismo
Consequentemente, o Ministério da Marinha estudou o programa naval adequado, que o Governo sem demora aprovou, e ao qual me referi em intervenção anterior
Dentro de poucos anos, entrarão ao serviço mais sete fragatas, quatro submarinos e várias corvetas.
Na aludida intervenção, disse estar certo de que este programa naval continuaria, pois o Governo nunca deixará de estar atento a tão importante problema. E agora acrescento que os navios modernos têm imprescindíveis exigências quanto ao respectivo apoio logístico e à competência técnica do seu pessoal, pelo que necessitam de bases bem equipadas, oficinas especializadas e depósitos de abastecimento suficientemente providos, e, para a preparação das suas guarnições, carecem ainda de escolas técnicas com actualizados meios de ensino.
Os marinheiros, os artífices e os oficiais que irão guarnecer esses navios têm de ser verdadeiros pentes, porque, se o não forem, não poderão tirar todo o rendimento de tão delicado e moderno material

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, mesmo com uma utilização perfeita, se o material não tiver a assistência técnica competente nas suas beneficiações e reparações impostas pelo uso, dentro em pouco ficará inutilizado. E sem oficinas especializadas, sem bases adequadas - em resumo, sem apoio logístico -, não há material que resista.
E repare-se que se trata não só do vultoso capital despendido, mas - o que é mais importante - da própria segurança da Nação.
Isso justifica ser indispensável continuar a construção das infra-estruturas de apoio logístico ao novo material e a obtenção dos meios de apropriado adestramento do pessoal, sem os quais a utilização dos novos navios será precária.
É sacrifício financeiro de que resultará valiosa compensação. Sem ele, os prejuízos serão, sem dúvida, mais elevados e justificativos de profundas preocupações.
Permita-me agora, Sr Presidente, que me ocupe de outro problema que também já nesta Assembleia foquei e ao qual de novo me refiro, não só porque ele se torna cada vez mais premente, como também porque cada adiamento complica e traz um acréscimo de dificuldades, quando, em devido tempo, se lhe poderia dar solução fácil e adequada.
Trata-se da frota mercante nacional
Não vou, Sr. Presidente, alongar-me em considerações sobre este assunto, a que por vezes já nesta Casa me tenho referido, que a imprensa frequentemente põe em relevo e para o qual o Sr. Ministro da Marinha, quer verbalmente, quer por escrito, com a sua particular com-

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petência em discursos despachos e outras exteriorizações oficiais vem focando como de alto interesse para a Nação.
O tempo corre mais rápido do que desejaríamos, perde-se mesmo por vezes a noção do seu fluxo, e em finais de 1973 ou seja dentro do curto prazo do sete anos, a maior parte dos navios da nossa frota mercante quer de passageiros ou mistos, quer simplesmente de carga estará em plena decadência. Perdida a rentabilidade, em consequência do cansaço, do desgaste do material e das frequentes e dispendiosas reparações que imobilizarão os navios por longos períodos não falando já na impossibilidade de competirem com as modernas unidades estrangeiras que nessa altura sulcarão os mares a nossa frota de comércio não poderá dar o seu actual contributo para a economia nacional, cuja relevância mais se acentuará na fase de expansão e integração para que caminhamos
Em 1973 a marinha mercante nacional de longo curso pertença das seis principais empresas terá apenas em boas condições de exploração, entre navios de passageiros, carga e tanques, cerca de 22 unidades das 86 agora em actividade
Refiro-me às seis principais empresas armadoras empenhadas no longo curso, pois não considerei os barcos dos chamados pequenos armadores, pela sua reduzida tonelagem e emprego nas navegações costeiras e de cabotagem.
Ora como a frota mercante nacional, na sua actual eficiência apenas satisfaz cerca de um terço das necessidades do nosso tráfego marítimo, não é difícil imaginar para que níveis descerá essa já modesta percentagem a partir de 1973, se não forem tomadas, com brevidade as medidas que se impõem
Repare-se Sr. Presidente, que não se trata de uma ampliação da frota objectivo que, em boa razão conviria atingir. Considerando as dificuldades da época que atravessamos procura-se ùnicamente a concretização de um plano mínimo de renovação das unidades que, pelo seu envelhecimento, deixam de poder cumprir cabalmente a, sua missão.
Paia além do serviço que a economia solicita dos transportes marítimos, a frota mercante nacional tem simultaneamente, de garantir o apoio logístico requerido pelas foiças armadas, apoio este que continua a ser considerado de transcendente importância pelas autoridades responsáveis.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Pode-se com plena verdade, dizer que a segurança da integridade nacional dependerá, em larga escala das decisões que neste sector e em devido tempo forem tomadas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A propósito, sinto ter do recordar que, não obstante o previsto no II Plano e no Plano Intercalar de Fomento, ainda não foi possível concretizar os financiamentos programados, para os anos de 1964 a 1966
E achei oportuno abrir este pequeno parêntese porque está em preparação o III Plano de Fomento onde certamente as necessidades da frota mercante nacional serão consideradas por forma a ficarem satisfeitos os superiores interesses grei
Sr Presidente Não se vê, por nosso mal, qualquer tendência para um desanuviamento da atmosfera internacional Os focos de conflito chamados circunscritos aumentam em número e em intensidade, não se sabendo até onde possam alastrar.
A própria cisão que se desenhou entre poderosos elementos do mundo comunista não tem os aspectos tranquilizadores que alguns mais optimistas, lhe querem emprestar.
Há países em todos os continentes, onde se desenvolve em nível anormal a luta ideológica. Mandam-se jovens com bolsas de estudo aprender a serem sabotadores, incendiários e falsificadores como outrora se mandava a (...) escolar para a Sorbonne ou para Oxford.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E aceita-se universalmente esta situação sem um brado de protesto nos níveis responsáveis.
Isto dá uma ideia da época em que vivemos e de quão cheio de preocupantes interrogação se antevê o futuro.
Não é necessário insistir, Sr. Presidente sobre o que nos poderia suceder, rodeados de incompreensões e de antipatias, se nos faltasse a nossa frota mercante.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Tratando-se, pois de uma imperiosa necessidade nacional a renovação da nossa marinha mercante não deixará certamente o Conselho de Ministros para os Assuntos Económicos, e em particular o Sr. Ministro das Finanças - com o seu claro entendimento, a sua inteligência, dos problemas e a sua visão patriótica - de prestar ao problema a atenção que ele merece proporcionando os meios financeiros indispensáveis para que possamos ter uma frota mercante que, pelo menos, conserve o seu nível actual.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Ao dirigir-lhe este apelo anima-me a firme esperança de que ele será ouvido para bem da defesa nacional e dos interesses do espaço económico português o qual, sem navios suficientes e capazes, estará irremediavelmente comprometido.
Tenho dito

Vozes: - Muito bem muito bem!
O orador foi muito cumprimentado

O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão
A ordem do dia para a sessão da tarde já foi indicada
Quero apenas significar a VV. Exas. o seguinte é que a sessão começará um pouco mais cedo do que habitualmente VV. Exas. compreendem a razão.
Está encenada a sessão
Eram 13 horas

Srs. Deputados que entraram durante a sessão
Albano Carlos Pereira Dias de Magalhães.
Antão Santos da Cunha.
António Calapez Gomes Garcia.
António Calheiros Lopes.
António Dias Feirão Castelo Branco.
António Magro Borges de Araújo
Arlindo Gonçalves Soares.
Armando José Perdigão

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Avelino Barbieri Figueiredo Batista Cardoso.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
D. Custódia Lopes.
Deodato Chaves de Magalhães Sousa.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Fernando Afonso de Melo Giraldes.
Filomeno da Silva Cartaxo.
Francisco António da Silva.
Francisco José Cortes Simões.
Henrique Ernesto Serra dos Santos Tenreiro.
Henrique Veiga de Macedo.
James Pinto Bull.
Jorge Barros Duarte.
José Coelho Jordão.
José de Mira Nunes Mexia.
José Rocha Calhorda.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Leonardo Augusto Coimbra.
Luís Folhadela Carneiro de Oliveira.
Manuel José de Almeida Braamcamp Sobral.
D. Maria Ester Guerne Garcia de Lemos.
Mário Amaro Salgueiro dos Santos Galo.
Martinho Cândido Vaz Pires.

aul Satúrio Pires.
Rui Manuel da Silva Vieira.
Rui Pontífice de Sousa.
Sebastião Alves.
Sebastião Garcia Ramirez.
Simeão Pinto de Mesquita de Carvalho Magalhães.
Teófilo Lopes Frazão.
Tito de Castelo Branco Arantes.
Tito Lívio Maria Feijóo.

Srs Deputados que faltaram à sessão.
Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Álvaro Santa Rita Vaz.
André da Silva Campos Neves.
Aníbal Rodrigues Dias Correia.
António Júlio de Castro Fernandes.
António Manuel Gonçalves Rapazote.
Armando Cândido de Medeiros.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Aulácio Rodrigues de Almeida.
Fernando Alberto de Oliveira.
Fernando de Matos.
Francisco Elmano Martinez da Cruz Alves.
Jaime Guerreiro Rua.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
José Fernando Nunes Barata.
José Guilherme Bato de Melo e Castro.
José Henriques Mouta.
José Janeiro Neves.
José Manuel da Costa.
José dos Santos Bessa.
Júlio Dias das Neves.
Luciano Machado Soares.
Manuel Henriques Nazaré.
Manuel João Correia.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel Marques Teixeira.
Rafael Valadão dos Santos.
Rogério Noel Peres Claro.

O REDACTOR - Luis de Avilles

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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