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REPÚBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL
DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 90
ANO DE 1967 9 DE NOVEMBRO
IX LEGISLATURA
(SESSÃO EXTRAORDINÁRIA)
SESSÃO N.º 90 DA ASSEMBLEIA NACIONAL
EM 8 DE NOVEMBRO
Presidente: Ex.mo Sr. Mário de Figueiredo
Secretários: Ex.mos Srs. Fernando Cid de Oliveira Proença
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira
SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 20 minutos.
Antes da ordem do dia. - Foi lido o expediente.
A Assembleia negou autorização para o Sr. Deputado Serras Pereira depor como testemunha no tribunal da 1.ª vara cível da comarca do Porto.
O Sr. Deputado Augusto Simões requereu elementos a fornecer pelos Ministérios das Corporações e Previdência Social e da Economia.
O Sr. Deputado Cortes Simões referiu-se à viagem de um grupo de Deputados a Moçambique, realçando especialmente alguns aspectos ligados ao fomento e ao povoamento daquela provinda.
O Sr. Deputado Cutileiro Ferreira agradeceu ao Sr. Ministro das Obras Públicas o despacho que autoriza a construção do Hospital do Patrocínio, em fivora, destinado à luta anticance-rosa.
Ordem do dia. - Prosseguiu a discussão na generalidade da proposta de lei relativa à elaboração e execução do III Plano de Fomento.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Calheiros Lopes, Pinto de Meneses e José Alberto de Carvalho.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas e 20 minutos.
O Sr. Presidente: -Vai fazer-se a chamada.
Eram 16 horas e 10 minutos.
Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Pacheco Jorge.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Álvaro Santa Rita Vaz.
André Francisco Navarro.
Antão Santos da Cunha.
António Augusto Ferreira da Cruz.
António Calapez Gomos Garcia.
António Calheiros Lopes.
António Furtado dos Santos.
António José Braz Regueiro.
António Júlio de Castro Fernandes.
António Magro Borges de Araújo.
António Moreira Longo.
António dos Santos Martins Lima.
Ari indo Gonçalves Soares.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Alves Moreira.
Artur Correia Barbosa.
Artur Proença Duarte.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Augusto Sal azar Leite.
Avelino Barbieri Figueiredo Batista Cardoso.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Deodato Chaves de Magalhães Sousa.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando Cid de Oliveira Proença.
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Fernando de Matos.
Filomeno da Silva Cartaxo.
Francisco António da Silva.
Francisco Cabral Moncada de Carvalho (Cazal Ribeiro).
Francisco José Cortes Simões.
Francisco José Roseta Fino.
Gabriel Maurício Teixeira.
Gustavo Neto de Miranda.
Henrique Veiga de Macedo.
Jerónimo Henriques Jorge.
João Duarte de Oliveira.
João Mendes da Costa Amaral.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
Joaquim de Jesus Santos.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Jorge Barros Duarte.
José Alberto de Carvalho.
José Fernando Nunes Barata.
José Gonçalves de Araújo Novo.
José Henriques Monta.
José Janeiro Neves.
José Manuel da Costa.
José Maria de Castro Salazar.
José de Mira Nunes Mexia.
José Pinheiro da Silva.
José Rocha Calhorda.
José Soares da Fonseca.
José Vicente de Abreu.
Júlio Dias das Neves.
Luciano Machado Soares.
Luís Arriaga de Sá Linhares.
Manuel Colares Pereira.
Manuel João Cutileiro Ferreira.
Manuel José de Almeida Braamcamp Sobral.
Manuel Marques Teixeira.
. Maria de Lourdes Filomena Figueiredo de Albuquerque.
Mário Amaro Salgueiro dos Santos Galo.
Mário de Figueiredo.
Martinho Cândido Vaz Pires.
Miguel Augusto Pinto de Meneses.
Paulo Cancella de Abreu.
Raul da Silva e Cunha Araújo.
Rui Manuel da Silva Vieira.
Sebastião Garcia Ramirez.
Sérgio Lecercle Sirvoicar.
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães.
D. Sinclética Soares Santos Torres.
Teófilo Lopes Frazão.
Tito de Castelo Branco Arantes.
Tito Lívio Maria Feijóo.
Virgílio David Pereira e Cruz.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 81 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 16 horas e 20 minutos.
Antes da ordem do dia
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Telegrama de apoio a uma intervenção do Sr. Deputado Braamcamp Sobral sobre aferições de pesos e medidas e situação dos aferidores.
O Sr. Presidente: - Estão na Mesa os elementos pedidos em requerimento apresentado pelo Sr. Deputado Araújo Novo.
Vão ser entregues àquele Sr. Deputado.
Está ainda na Mesa una ofício do corregedor-presidente do tribunal da 1.ª vara cível da comarca do Porto pedindo autorização para o Sr. Deputado João Nuno Serras Pereira poder depor na audiência de julgamento da acção ordinária que José Maria Barbedo de Magalhães move contra a ré Hidroeléctrica Portuguesa.
Consultado o Sr. Deputado em causa sobre se via inconveniente para o exercício das suas funções parlamentares em ser-lhe concedida autorização, respondeu que sim. Nestas condições, submeto à Assembleia o problema da autorização.
Consultada a Assembleia, foi recusada a autorização.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra para um requerimento o Sr. Deputado Augusto Simões.
O Sr. Augusto Simões: - Sr. Presidente: Pedi a palavra paru enviar para a Mesa o seguinte
Requerimento
Ao abrigo das disposições legais e regimentais, requeiro que, com a maior urgência, me sejam fornecidos os seguintes elementos:
Pelo Ministério das Corporações c Previdência Social:
Tabelas das quotizações dos vários grupos de contribuintes dos grémios sujeitos à inspecção do Ministério, indicando a sua evolução.
Pelo Ministério da Economia:
Também as tabelas de quotização dos vários grupos dos contribuintes igualmente sujeitos à inspecção deste Ministério e dos organismos de coordenação económica.
O Sr. Cortes Simões: - Sr. Presidente: Por honroso convite de S. Ex.ª o Ministro do Ultramar, fui um dos dez componentes -decerto o mais apagado- da delegação parlamentar que em Junho transacto se deslocou à província de Moçambique.
Velho sonho que desde os bancos da escola acalentava em meu coração, conhecia o nosso ultramar apenas através de livros e publicações, da especialidade ou não, de depoimentos ou de imagens que conseguia recolher sempre que as circunstancias o permitiam.
Integrados nesta missão, e tendo por chefe a figura prestigiosa e justamente admirado do conselheiro Furtado dos Santos, mui ilustre vice-presidente desta Assembleia, vivemos com crescente interesse tudo o que nos foi dado ver, ouvir e ... apreciar.
Creio, pois, que V. Ex.ª e toda a Assembleia aguardavam algumas palavras sobre a visita da missão parlamentar à província de Moçambique, que percorremos de lês a lês, nuns escassos quinze dias, tempo insuficiente, que limita a substância do nosso depoimento.
Desde o momento da chegada até ao do regresso - não sem fortes sentimentos de gratidão e de saudade que enchiam nosso coração - encontrámos tudo previsto, tudo bem ordenado, portas escancaradas, sem receio de olhares indiscretos, porque nada havia a esconder, mas sim desejo enorme de tudo mostrar e esclarecer, num
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ambiente de responsabilidade consciente e vivida, com a naturalidade própria de quem se devota a uma causa - de que não conhecemos excepções -, dizia, de quem se devota a uma causa não sua, mas bem mais importante - da Nação.
Na verdade, vivemos horas altas de lusitanidade, desde o verificado no ambiente austero do Palácio da Ponta Vermelha até às zonas mais longínquas que visitámos - Tete, Metangula, Monte Puez, Porto Amélia, etc.
O denso, mas bem elaborado, programa que as entidades responsáveis nos prepararam, e que pôs à prova a nossa resistência física, abrangia muitos dos aspectos fundamentais, de modo a tomarmos contacto com o considerado essencial para a vida e progresso daquela província, tanto no sentido económico como no cultural, turístico, social e militar.
Ante a impossibilidade de me permitir, com o maior desenvolvimento possível, dar conta a V. Ex.ª, Sr. Presidente, e a esta Câmara, daquilo que mais poderia interessar - em boa verdade tudo interessa -, corria o risco de me alongar demasiado e maçar VV. Ex.ªs
Sei que estava no pensamento de alguns colegas virem aqui transmitir a VV. Ex.ªs as suas impressões desta viagem e, por isso, circunscreverei as minhas considerações, tanto quanto possível, e alguns aspectos ligados com o fomento e o povoamento da província.
Antes de prosseguir, quero deixar aqui bem expressa a forte impressão que me deixaram os contactos que tive com os comandos de terra, mar e ar, que, numa descrição meticulosa e exaustiva da guerra que nos é imposta do exterior, me deram uma visão séria das suas causas e implicações de ordem psicológica, económica, política e táctica.
Quando percorri a longa frente, que vai do lago Niassa à foz do Rovuma, não sei que mais salientar - se o calor da recepção que nos prestaram as populações nativas, com o garrido dos seus trajos e danças, se a alegria transbordante que a nossa presença despertou nos homens dos acampamentos militares que visitámos. E com que emoção recolhemos os depoimentos dos homens mais directamente responsáveis por esse sector operacional, depoimentos impregnados de conhecimento seguro da tarefa a cumprir e serena consciência daquilo que a Nação deles espera - o cumprimento do dever.
O espírito de sacrifício dos homens empenhados no apaziguamento e recuperação das populações nativas é qualquer coisa de notável. Heroísmo e simplicidade quase se banalizam no dia a dia, de que poderemos citar, entre muitos, o caso de que quase fomos testemunhas: citarei o que se passou com uma coluna militar que em missão de reabastecimento se deslocou a Valadim. No regresso à base, esta coluna detecta e «desarma uma porção de minas de elevado poder mortífero traiçoeiramente colocadas na estrada. No fim da missão de que estavam incumbidos, fora da zona que exigia maiores precauções e já próximo do quartel a que recolhiam, descontraídos, alegres e conscientes do dever cumprido, os componentes daquela coluna, esquecendo, sem dúvida, as instruções recebidas e dando largas à sua imaginação, colocam na viatura da frente um letreiro de razoável dimensão, com o seguinte dístico: «Os Mineiros de Valadim.»
São assim os nossos homens, que bem merecem da Pátria. Glória aos nossos soldados!
Foi na visita aos centros vitais do Norte - objectivo número um do terrorismo - que mais se consolidaram os nossos sentimentos de confiança. Civis o militares, todos irmanados de vontade firme, suprindo faltas de diversa natureza, vencendo mil dificuldades, sem olhar a sacrifícios, pedem mais meios para dar pleno cumprimento à sua acção específica.
Por exemplo, manifestaram-me tanto empenho no pedido de mais helicópteros como no envio de mais maquinismos e pessoal técnico com o fim de completar os planos de reordenamento agrário.
Neste aspecto, através do que já foi realizado em Cabo Delgado, os resultados práticos são espectaculares, pois têm demonstrado constituir a mais profícua forma de elevar o nível de vida das populações autóctones e, também, mais um motivo de as mantermos voluntariamente mais ligadas ao nosso convívio, porque lhes proporcionamos valiosos apoios económicos e sociais que são aplicados em seu directo proveito, sem esquecer apropriados meios de defesa contra as agressões do inimigo.
Os planos para uma criteriosa e sistemática reordenação rural, em meu modesto entender, encerram interesse da maior transcendência, por constituírem, em relação ao futuro, o antídoto que contraria profundamente os grandes objectivos que norteiam a acção do inimigo, com a vantagem de proporcionarem a sua mais rápida promoção.
Tem, de facto, constituído autêntico êxito o agrupamento das populações nativas- em espírito de colaboração com as autoridades e na- presença de vantagens imediatas, que vão desde a escola à exploração de melhores terrenos, já arroteados, tecnicamente assistidos e com garantia de remuneração para as culturas bases (por exemplo algodão) e com preço igual ou superior ao praticado nos países situados para além do Rovuma. Enfim, um conjunto de acções, justificando trabalho de planificação pela amplitude que já alcançou, que está proporcionando apoios técnicos, económicos e sociais que os autóctones jamais poderiam usufruir quando espalhados em caprichosa irregularidade, praticando a chamada agricultura itinerante, que está nas suas tradições e com muito baixa produtividade.
Parece-mos de admitir que a transformação da agricultura itinerante em agricultura empresarial se vai processar a ritmo cada vez mais rápido. No entanto, julgo que se impõe, se não é que existem dispersas por variadíssimos diplomas, despachos, circulares, etc., um conjunto de medidas de carácter técnico, económico e legislativo que consolidem toda- a obra já realizada o lhe dêem uma estrutura duradoura.
Este trabalho de reordenamento rural quase se pode classificar de verdadeiro serviço de colonização interna, transplantado para África e, portanto, sob factores diferentes dos verificados- na metrópole. As potencialidades já reconhecidas dão-nos uma ideia das espantosas possibilidades existentes. A inventariação dos recursos, levada a efeito pela Missão do Vale do Zambeze e pena é que não tenham sido constituídas outras missões para, nos mesmos moldes, actuarem noutras bacias hidrográficas -, abre perspectivas que excedem tudo quanto a nossa imaginação concebera. Devidamente programado, pareceu-nos que todo o trabalho realizado permitirá avaliar, com bastante aproximação, os meios financeiros, técnicos e humanos, próprios e alheios, que será necessário mobilizar para explorar os recursos energéticos, mineiros, silvícolas, pecuários e agrícolas cujo aproveitamento oferece condições absolutamente excepcionais.
O empreendimento de Cabora Bassa constituirá a mola impulsionadora que, a curto prazo, porá em marcha um espectacular desenvolvimento económico. Este empreendimento, só por si, permite a produção anual de energia
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eléctrica equivalente a mais de três vezes a actual produção da metrópole.
Paralelamente, as reservas de carvão, ferro e outros minérios susceptíveis de colocação em mercados estrangeiros ficarão em condições competitivas de exportação através do rio Zambeze, que, após as obras de regularização já previstas e estudadas, proporcionará transporte fluvial a baixo preço.
Se numa visão de conjunto pensarmos que Gabora Bassa fornecerá energia eléctrica a preços que se reputam dos mais baixos do Mundo, suponho que não constituirá fantasia afirmar que no vale do Zambeze a siderurgia encontra excelentes condições para a sua instalação.
Quero crer que a exploração das potencialidades que acabei de enumerar muito sumariamente será a obra do século que porá à prova a capacidade realizadora dos Portugueses.
Os planos existentes darão um impulso na economia de Moçambique para metas que ainda há meia dúzia de anos nos fariam sorrir de incredulidade. Os próprios estudos superiores da província, através de alguns dos seus mestres, colaboraram em várias fases desses planos, dando o melhor do seu esforço e saber. Ainda bem que tal tenha acontecido, pois o conhecimento de problemas de tão grande complexidade, mas de interesse verdadeiramente aliciante, confirmará o verdadeiro sentido que deve ser seguido na formação de técnicos que vão ser necessários para preencher as necessidades cada vez mais crescentes dos diversos sectores de actividade - investigação, ensino, tecnologia, economia, engenharia, etc, cujo número, actualmente, é de uma pobreza confrangedora.
Desejava fazer uma referência, ainda que muito ligeira, aos aproveitamentos hidroagrícolas que se encontram já em exploração, ou na fase executiva, ou apenas programados.
Será através de iniciativas de tão grande alcance como o fomento do regadio que se pode acelerar a fixação de agricultores à terra. E as possibilidades de acesso à terra são imensas, porquanto dos terrenos livres de Moçambique, segundo elementos colhidos, apenas 3 por cento da área da província são propriedade privada.
Existem, pois, perspectivas enormes para levar a efeito um bem ordenado programa de povoamento, quer orientado, quer de livre iniciativa.
Deus permita, que a nova estruturação dada às juntas de povoamento não só possibilite a colonização livre, através do maior rapidez na apreciação e deferimento das pretensões apresentadas, como elimine as peias burocráticas morosas, irritantes e desencorajadoras, até para os mais animosos, que têm contrariado iniciativas de grande alcance.
Uma palavra de apreço se impõe ao Instituto do Algodão, qui! está levando a efeito obra altamente meritória de povoamento orientado, constituindo valiosa experiência de colonização e racionalização agrícola.
Já se encontram em actividade vários colonatos, destinados tanto aos nativos com capacidade para tal como a europeus, sendo a maior parto destes militares que passaram à disponibilidade.
A vida económica dos colonatos tem os seus alicerces apoiados em pré-cooperativas e os aspectos sociais também não foram esquecidos.
Não queria concluir estas considerações sem dedicar uma palavra à obra do Limpopo, concebida pelo homem público de rara envergadura que foi o Eng.º Trigo de Morais: pelo muito respeito e admiração que devo à sua obra, aqui lhe presto a minha homenagem.
Segundo declarações a que foi dada larga publicidade, é intenção do. Governo continuar a engrandecer a obra erguida com o colonato do Limpopo pelo Eng.º Trigo de Morais.
Já se encontra devidamente estudada e orçamentada-a barragem do Massingir, que, através da sua elevada capacidade de armazenamento, permitirá a regularização interanual do rio Limpopo, de que resultará a possibilidade de irrigação de vastas áreas cujo prévio dessalgamento e enxugo se tornava imprescindível.
Os investimentos já feitos, tanto no que diz respeito à obra hidroagrícola propriamente dita como à criação de infra-estruturas que servem as populações instaladas, justificam amplamente a decisão do Governo.
Esperemos, pois, que, paralelamente, a um maior desenvolvimento económico por virtude do alargamento da área de regadio, se verifique uma muito maior produtividade no estrato relativo à população activa agrícola, que, oriunda do continente, foi instalada nesse colonato.
O denso programa que cumprimos, não sem com algumas baixas que rapidamente voltaram ao nosso convívio, incluía a visita aos centros populacionais de maior interesse económico, industrial ou turístico.
Lourenço Marques e Beira, mercê da sua privilegiada posição geográfica, e do constante aperfeiçoamento das suas infra-estruturas e equipamentos apropriados para servir o intenso e sempre crescente, tráfego destinado aos países vizinhos, são verdadeiras portas abertas ao progresso da província.
Existem, igualmente, outros centros populacionais em rápida expansão, quer situados na orla marítima - caso de Nacala -, quer no interior, onde encontrei da parte de todos os seus habitantes uma ânsia de progresso traduzida em numerosas iniciativas, que me surpreenderam agradavelmente.
O patriotismo das gentes de Moçambique patenteou-se a meus olhos sob as mais diversas e significativas formas. Olhos nos olhos, face a face, nos diálogos estabelecidas ficámos com a consoladora certeza de que também para aqueles irmãos a Pátria não se discute.
Gostava de saber traduzir por palavras o calor com que fomos recebidos por toda a parte. As manifestações de portuguesismo que nos foi dado observar, para não dizer que sentimos e partilhámos, durante todo o tempo da nossa permanência em Moçambique, puseram nossos nervos sob elevada tensão.
O acolhimento que nos foi prestado em Vila Cabral e Monte Puez, com a presença dos régulos e das rainhas, são imagens que destaco de entre outras que merecem igual relevo.
E que dizer da forte emoção que me causou a visita a essa formosíssima jóia carregada de história e enaltecida por Camões - a ilha de Moçambique?
A gama de motivos de natureza histórica, arqxiitectónica, turística e folclórica que foi possível observar pareceu-nos ter encurtado o tempo para o muito que ficou por ver.
No meu pobre e descolorido testemunho procurei transmitir a V. Ex.ª alguma coisa do muito que vi, comentando os aspectos que, em consciência, me pareceram dignos de realce.
Depois deste caldear de ideias e entusiasmo transbordante com que regressei ao convívio da família e me embrenhei nos mil problemas por que se dispersa a minha vida profissional, permanece bem vivo o agradecimento devido às entidades que possibilitaram esta viagem de tão profundas e gratas recordações.
Por onde quer que passámos, fomos alvos de carinhosas e entusiásticas recepções, onde todos, sem distinção de hierarquias on de cor de pele, nos cumularam de aten-
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coes e nos dispensaram desvanecedor acolhimento. Desde o Sr. Governador-Geral aos Srs. Governadores de distrito, que em suas residências nos prodigalizaram a mais requintada e acolhedora hospitalidade, aos chefes de serviço, funcionários qualificados, autoridades locais, entidades particulares, até anónimos, etc., sempre prontos a darem-nos esclarecimentos sobre os mais diversos problemas que surgiam, num desbobinar constante de ideias, sugestões e comentários, a todos lhes endereçamos, deste lugar, uma palavra de agradecimento, de muita simpatia e compreensão, que torno extensiva à imprensa e à rádio, que estiveram presentes, dando o devido relevo à nossa visita e ao objectivo que ela encerrava.
Embora incorra no risco de alguma falta, por desastrado esquecimento, introduzirei um pequeno parêntesis para informar V. Ex.ª, Sr. Presidente, de que as primeiras terras de África em que meus pés se fixaram foras as de Luanda, onde o Sr. Deputado Pinheiro da Silva, secretário provincial de Educação, e o Sr. Deputado Neto de Miranda, presidente da Comissão Provincial da União Nacional, nos aguardavam e nos proporcionaram uma bela visita pela cidade, que se alinda e moderniza, sem perder o cunho do nosso génio criador, que soubemos transplantar para os trópicos.
A nossa presença em Angola limitou-se a uns escassos 60 minutos, tempo suficiente para começarmos a tomar consciência das grandes- dimensões da velha casa lusitana.
Antes de finalizar, desejava, de igual modo, referir quanto nos sensibilizou a cortesia, ou, melhor, a camaradagem, com que nos distinguiram os colegas Deputados por Moçambique, que, em virtude da nossa presença, suspenderam totalmente os seus afazeres normais para acompanharem nossos passos durante a nossa permanência, decerto com sacrifício de seus trabalhos e incómodo de suas pessoas, e inclusive alguns partilharam connosco a grande escalada ao Norte da província, com todo o sortilégio de surpresas, imagens e imprevistos de que fomos testemunhas.
Estou certo de que ninguém levará a mal se fizer uma referência particular ao Sr. Deputado Moreira Longo, Sr. Deputado Janeiro Neves e Sr. Deputado Gonçalo Mesquitela, que abriram de par em par as portas de suas casas para nos receberem com manifestações inequívocas de amizade sincera.
Finalmente, ao Sr. Governador-Geral II seus mais directos colaboradores, ao Sr. Dr. Soares da Fonseca, ilustre Icader desta Assembleia, a S. Ex.ª o Ministro do Ultramar, que tudo determinaram para o bom êxito da nossa missão, só encontro uma expressão que traduz todo o meu reconhecimento: Obrigado! Bem hajam.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Cuttleiro Ferreira: - Sr. Presidente: Ao retomar as minhas actividades parlamentares, Sr. Presidente, respeitosamente vos saúdo, com a mais viva simpatia, veneração e respeito e a manifestação dos meus desejos de bem - servir o mandato que me foi confiado.
Em duas legislaturas, que tantas são as que levo ao serviço da Nação, várias vezes tive oportunidade de me fazer eco, sem brilho, é certo, mas com vivacidade, do grande desejo que Évora tem de poder dispor de um hospital anticanceroso provido dos meios indispensáveis para uma luta, luta contínua, poderosa e sem tréguas, contra os malefícios de tão terrível, sob todos os aspectos, doença.
Não irei repetir os argumentos, convincentes argumentos, que tantas vezes proclamei, nesta Câmara, para que se conseguisse a aprovação estatal, absolutamente necessária, de um tão indispensável hospital em Évora.
Obtidos meios financeiros pela generosidade ilimitada dos condes de Vilalva, parece que não seria necessário esperar doze anos ... doze longos anos de expectativa cruciante, para se conseguir do Governo da Nação o desejado despacho que permitiria a construção do Hospital do Patrocínio ... Doze anos de espera foi tempo demasiado.
Durante esse período, e porque pertenço, desde o início, à Delegação da Liga Portuguesa contra o Cancro em Évora e à Fundação do Patrocínio, conheço como poucos os obstáculos que tivemos que transpor, os contactos que foi necessário estabelecer, as relações, agradáveis umas. menos agradáveis outras, que tivemos que manter.
Desde S. Ex.ª o Presidente do Conselho até ao mais modesto dos contínuos dos variados Ministérios com que tivemos de contactar, por toda a parte foi um esbanjar de tempo e energias. S. Ex.ª o Presidente do Conselho foi o conselheiro, como sempre, preciso, objectivo e realístico. S. Ex.ª previu todas as nossas dificuldades, mas, infelizmente, não era de S. Ex.ª que dependia o despacho final.
Aqui fica o meu agradecimento a S. Ex.ª, não só pelo incentivo recebido, como pela paciência que nos soube insuflar, que durou doze longos anos.
Sei que não estão terminadas as nossas atribulações, mas a espera de doze anos dá-nos a certeza de que, com fé e perseverança, venceremos.
Batemos por dois anos o tempo de duração do cerco de Tróia, que, afinal, foi vencido pelo consabido estratagema do famoso cavalo de pau. Para se vencer o cerco que foi feito ao Hospital do Patrocínio, e pela parte que pessoalmente me diz respeito, foi necessário o estratagema da teimosia asinina.
Ainda não compreendi, e jamais o compreenderei, certamente, por que determinadas pessoas e responsáveis tanto se encarniçaram contra esta tão útil obra.
Não vale a pena qualquer reflexão sobre o assunto ... Apenas uma palavra ... Perdoai-lhes, Senhor, não sabiam o que faziam.
Mas alguém, e alguém que tudo merece, deu o despacho decisivo: S. Ex.ª o Ministro das Obras Públicas, o Eng.º José Albino Machado Vaz.
Não tenho a honra, propositadamente, de conhecer S. Ex.ª pessoalmente, mas isso é razão para que o meu reconhecimento seja ainda maior. Não foi uma decisão - o despacho de S. Ex.ª- ditada por amizade ou simpatia. Foi uma decisão de estudo frio e objectivo, aquecida por um coração que pulsa pelos que sofrem.
S. Exa. não é eborense ... não é alentejano, nem mesmo honorário, por ora, mas decidiu pró Évora ... pró Alentejo ... pró Nação. Uma só palavra, Sr. Ministro: obrigado.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Vai passar-se à
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O Sr. Presidente: - Continua em discussão na generalidade a proposta de lei sobre a elaboração e execução do III Plano de Fomento.
Tem a palavra o Sr. Deputado Galheiros Lopes.
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O Sr. Calheiros Lopes: - Sr. Presidente: Porque é esta a primeira vez que faço uso da palavra na presente sessão legislativa, quero, em primeiro lugar, dirigir as minhas sinceras saudações a V. Ex.ª, Sr. Presidente, tanto como testemunho da alta consideração em que tenho a pessoa de V. Ex.ª quanto em homenagem às elevadas qualidades de distinção, de inteligência, de tacto político e espírito compreensivo com que, já alguns anos, dirige os trabalhos desta Assembleia Nacional.
Meus ilustres colegas: o projecto do Plano de Fomento que é submetido à apreciação da Assembleia Nacional tem, facil como os anteriores, o objectivo de prosseguir, mais activamente, se possível, no desenvolvimento económico e progresso social do País, atingindo cada vez mais profundamente todas as províncias da Pátria Portuguesa. Ele tem como meta suprema o bem comum.
Muito têm realizado os Governos do Estado Novo. e continuarão, seguramente, a trabalhar no sentido de aproveitar todos os nossos recursos, quer metropolitanos, quer ultramarinos, única forma de continuarmos a elevar o nível de bem-estar social da população portuguesa de aquém e de além-mar.
Torna-se, portanto, absolutamente necessário fortalecer em todos os aspectos a coordenação entre a metrópole e o ultramar.
O desenvolvimento da economia europeia parece inclinar-se de preferência para a criação de um Mercado Comum, isto é, para uma progressiva liberalização do comércio externo e pela liquidação dos direitos alfandegários. E assim chegar-se-ia, segundo pensam os defensores da ideia, da unificação, a um livre-cambismo com total liberdade de circulação de mercadorias, capitais e até da própria mão-de-obra. Julgo que relativamente ao nosso caso, o desenvolvimento económico proposto por este Plano deve preparar-se também de. modo a encontrar, principalmente na Europa, um clima o mais possível favorável. Para evitar as dificuldades que o Plano proposto poderia, eventualmente, encontrar, seria necessário combinar todos os nossos esforços de desenvolvimento, principalmente com a adopção dos processos mais modernos de organização económica, técnica e administrativa das empresas industriais a criar, para podermos produzir o mais economicamente possível, desde o começo da sua execução.
Ora, considerando o estado de boas relações entre todas as províncias metropolitanas e ultramarinas - o plano de desenvolvimento económico português pode receber e planificar as nossas actividades para o conjunto dos territórios nacionais sem ser grandemente incomodado pelos elementos de insegurança que deslustram na hora presente as relações no caso de muitos outros países.
Com efeito, embora estudando separadamente os problemas de cada província ultramarina, inspirando-se na sua natureza específica e no estado de desenvolvimento atingido, o Plano faz entrar o sector do ultramar no organismo económico da metrópole, e vice-versa, de maneira que assim se possam realizar simultaneamente as tarefas seguintes:
1) Desenvolver a economia da cada província ultramarina, apoiando-se nos elementos naturais de cada território e da sua população, assim como nas possibilidades de imigração dos cidadãos da metrópole;
2) Alargar as trocas comerciais entre os territórios portugueses, bem como auxiliar a desenvolver as relações económicas com o resto do Mundo. Os problemas da navegação marítima têm assim o devido relevo no Plano; e enfim,
3) Criar o ambiente positivo e favorável para facilitar o desenvolvimento das correntes de capitais, com vista a investimentos que tornem possíveis importantes trabalhos de valorização dos territórios ultramarinos.
É evidente que a realização de vastos planos necessita de uma dispendiosa rede ferroviária e de estradas em bom estado, etc., e implica investimentos de avultados capitais.
Não seria oportuno levar a efeito um tal plano com o auxílio de capital estrangeiro - limitado, no que é relativo à sua duração, a um certo número de anos e estipulando-se, quanto à transferência dos benefícios, que esta deveria realizar-se exclusivamente em produtos específicos da metrópole e do ultramar (por exemplo: vinhos especiais, cortiça, caie e outros produtos agrícolas e igualmente produtos das nossas indústrias)?
Assim, o regime de concessão poderia, ao mesmo tempo, auxiliar a nossa economia a abrir à produção nacional novos mercados.
Sentir-se-iam os efeitos positivos de uru tal plano sobre o mercado do trabalho, pela criação de múltiplas novas possibilidades de emprego, sobre os salários, sobre a economia e, em geral, sobre o bem-estar do País.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente e meus senhores: O Plano apresenta-se como um todo orgânico.
É baseado, em primeiro lugar, sobre a exploração agrícola do País, procurando torná-la mais produtiva, pela introdução de métodos modernos de exploração e de meios técnicos, assim como dar mais valor a terrenos até ao presente fracamente explorados.
O Plano concentra os esforços sobre a industrialização nacional e progressiva do País.
O programa de electrificação e os projectos de grandes trabalhos hidráulicos constituem, por assim dizer, um poderoso incentivo, que, actuando paralelamente nos sectores agrícola e industrial, é chamado a criar o ambiente favorável para a marcha ascendente da realização do Plano.
Assim, ele inspira-se, inteligentemente, no princípio de que é necessário realizar um esforço para alargar o programa das actividades nacionais, no sentido de:
1) Abrir novas possibilidades de emprego;
2) Criar condições económicas e técnicas propícias ao aumento do trabalho obreiro e da produtividade;
3) Evitar o desemprego.
A Organização Internacional do Trabalho (O. I. T.) define deste modo a industrialização:
A industrialização não é mais do que um processo de desenvolvimento económico que mobiliza uma parte, sem interrupção de crescimento dos recursos nacionais, para realizar uma estrutura económica interna, variada, e fazendo apelo às técnicas modernas, caracterizada por um sector das indústrias manufactureiras, dinâmico, que tem e fornece os meios de produção e os bens de consumo susceptíveis de assegurarem ao conjunto da economia um valor de crescimento elevado e de fazerem progredir o domínio económico e social.
A industrialização de um País não é, pois, a orientação de um sistema político, não é uma questão de ideologia.
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É uma necessidade objectiva que se deve alicerçar na técnica e no esforço patriótico.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - E é fomentando o desenvolvimento das essenciais fontes de riqueza - a agricultura e a indústria - que se pretende atingir o nível económico que conduza ao desejado bem-estar social.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Na agricultura, como na indústria, devemos lançar-nos no caminho de uma maior produtividade, tanto pela modernização dos processos de cultura, desenvolvimento e valorização de certas culturas, como a fruticultura, horticultura, prados, como pela introdução de novas culturas: beterraba, soja, tabaco, algodão, etc., e ainda pela necessária protecção à pecuária, para um melhor abastecimento de carnes, de que tanto necessitamos, evitando assim a importação de enormes quantidades e o correspondente dispêndio de divisas.
Todos os anos se importa do estrangeiro quantidade avultada de açúcar. Ainda há dias foi fixada por portaria em 182 000 t a quantidade provável de açúcar necessário ao consumo do continente a importar durante o ano cultural de 1966-1967. E, ainda, os subprodutos da beterraba são de um enorme valor para alimentação dos gados. Tanta utilidade teriam no nosso continente, onde acontece, devido à irregularidade do clima, haver falta de pastagens e produtos para a sua alimentação.
O aumento da produtividade da agricultura depende de vários factores: de um sistema que seja suficiente e oportuno, de crédito rural, de melhoramento das técnicas de cultivo, pelo uso adequado da maquinaria, fertilizantes e insecticidas, de uma escolha criteriosa das culturas mais indicadas e, sobretudo, de uma política flexível de garantia de preços justos e remuneradores à produção.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - A crise da lavoura não se pode atribuir sómente às más condições climatéricas, mas também ao ilogismo de se terem amarrado durante alguns anos os produtos da terra a preços fixos, sem atender à fatal variabilidade dos custos de produção, agravados pela liberdade de preços consentida a outras actividades a que o lavrador tem forçosamente de recorrer, seja para abastecimento de elementos de trabalho manuais ou mecânicos, seja para necessidades do consumo familiar.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Estou certo de que todos aceitamos hoje como uma verdade incontroversa que é profunda a crise da agricultura nacional.
E, todavia, ela não poderá deixar de ser considerada e compreendida como uma das bases da nossa existência de povo que intransigentemente deseja continuar a ser livre e independente.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Já hoje estamos importando grandes quantidades de produtos para a nossa alimentação. Se o ambiente internacional se complicar, as cotações do mercado mundial subirão enormemente. Não só haverá a dificuldade em obter os géneros - e a que preço?
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - De facto, se compararmos a evolução dos preços dos produtos agrícolas com a de todos os restantes produtos, matérias-primas ou manufacturados, verifica-se a baixa percentagem do aumento dos produtos de proveniência agrícola.
Está bem patente que de há sete ou oito anos para cá a actividade agrícola - e só ela - tem pago um pesado ónus à colectividade, mediante o sacrifício das suas necessidades económicas, a fim de sustentar uma política de manutenção ou estabilização de preços.
Continuo a considerar essencial - e possível - pagar à lavoura preços justos pelos seus produtos, mantendo sensivelmente os preços ao consumidor, numa palavra, não concorrendo para elevar o custo da vida.
Justa seria a criação de um fundo destinado a garantir à agricultura uma rentabilidade equivalente à de outras actividades.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Não me parece justo que a actividade que produz os géneros para nos alimentarmos - poder viver e trabalhar - contribua sozinha para conseguir a política de estabilização dos preços. A sectores económicos de visível prosperidade- pedir-se-ia um sacrifício tributário que, sem risco para a solidez financeira de que desfrutam, bem poderia ser representado por um adicional à contribuição industrial sobre os lucros elevados.
Continuo, todavia, a confiar em que serão adoptadas as medidas consideradas mais convenientes no sentido de poder a agricultura contar com as condições de vida que lhe são indispensáveis, formulando o voto de que essas medidas venham com a urgência que as circunstâncias requerem.
A modernização da agricultura e a adaptação das estruturas económicas e sociais deveriam caminhar a par com uma industrialização racional.
Não hesito em declarar que, neste momento, uma certa esperança parece despontar no horizonte da nossa lavoura, em face das declarações do Sr. Ministro de Estado e da actuação do Sr. Ministro da Economia.
A melhoria das condições de produção necessita muitas vezes de investimentos consideráveis para irrigação, drenagem, energia e comunicações.
Estes investimentos só são possíveis pela intervenção do Estado. Mas, num país que não seja rico, está de certo modo dependente de investimentos ou de empréstimos estrangeiros, até agora muito insuficientes para que permitam uma valorização racional dos espaços cultiváveis ou tornem possível o aumento da superfície a cultivar.
Indispensável como é para a vida do homem a alimentação, a existência, a utilidade e a importância da actividade agrícola não pode ser contestada. E assim, devem, sem dúvida alguma, ocupar um dos primeiros lugares, se não o primeiro, nas actividades económicas do País.
A elevação da produção por hectare é um processo lento, e tanto mais lento que a população é menos bem alimentada, menos instruída, menos em medida de se procurarem adubos, menos enquadrada pelos técnicos competentes.
Se os países mais desenvolvidos puderam aumentar a sua produção por hectare de uma maneira espectacular, apesar da segunda guerra mundial, foi porque as suas populações agrícolas souberam rapidamente adoptar melhores técnicas, graças ao seu grau do instrução, ao uso
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intensivo dos adubos mais apropriadas e a uma organização profissional mais perfeita.
Com efeito, a formação da mão-de-obra qualificada em todos os sectores e em todos os níveis é um dos elementos essenciais da expansão económica. É uma tarefa à qual se sujeitam ou submetem os países desenvolvidos ou mesmo, em alguns países em via de desenvolvimento, que têm de fazer face a uma penúria de mão-de-obra de certos ramos de actividade, assim como aos problemas difíceis de reconversão ligados à evolução da técnica.
Sem pessoal técnico qualificado em todos os níveis, tanto nas empresas como na sua direcção, não existe programa de investimentos, nem plano de expansão económica, que possa, a longo termo, contribuir para assegurar o progresso.
Presentemente, o nosso país começa a preocupar-se com a investigação científica, a dar-lhe mais valor e a convencer-se da sua indispensabilidade.
Chegou o momento inadiável de nos preparar-mos para estarmos aptos a enfrentar as situações que um futuro próximo nos trará. Para o conseguirmos é essencial adoptar a investigação como fonte de nova vida para a nossa agricultura, para a nossa indústria e garantia de prosperidade do País.
Uma massa trabalhadora mais capaz, mais apta para todas as funções especializadas, mais sabedora e mate consciente, indubitavelmente trará para a indústria e para a agricultura um material humano mais apto para a escala completa dos aperfeiçoamentos e inovações.
As pesquisas recentes mostram que é uma mão-de-obra convenientemente formada e organizada, e não a acumulação do capital, que é a chave de um crescimento rápido.
O mundo de hoje caracteriza-se, antes de tudo, pelo impulso da ciência e o desenvolvimento do progresso técnico, assim como pelas suas repercussões cada vez mais profundas sobre a sociedade e a humanidade.
Não é apenas para novos equipamentos e maquinismos que nos devemos dirigir, é principalmente para uma espécie de nova filosofia de produção, dentro da qual os valores humanos encontrem o seu justo lugar.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - A falta de concorrência em alguns sectores tem sido prejudicial ao desenvolvimento económico do País, quer na qualidade dos produtos, quer nos preços que estabelecem no mercado, e, além disso, proporcionando situações que lhe permitem invadir outros sectores que muitas vozes já se encontram com capacidade legal, bem em excesso e em regime de franca concorrência.
Tenho dito e continuo a afirmar que o desenvolvimento industrial não pode realizar-se livre e desordenadamente; não só seria contraprodutivo, como poderia levar a um total desequilíbrio económico. Há, por conseguinte, que adoptar-se uma forma de desenvolvimento ordenado, justo e devidamente controlado, não permitindo situações privilegiadas, eximidas de concorrência e que possam dominar a seu talante os mercados e os preços. Julgo que outro aspecto importante a encarar no futuro desenvolvimento da nossa indústria consiste na necessidade de distribuir por diversas regiões a localização das instalações fabris. Deste modo se valoriza a vida de trabalho de um maior número de regiões, evitando o êxodo rural e a excessiva concentração nos subúrbios das grandes cidades.
É indubitavelmente preferível, tanto no que respeita ao recrutamento e mobilização da mão-de-obra como no aspecto de segurança ou defesa nacional, descongestionar, até onde for económicamente útil, as instalações de interesse vital.
A verdade é que, nestes problemas da localização das indústrias, tem de ser, realmente, considerado o factor importantíssimo quer de ordem económica, quer de ordem social.
No Plano Director da Região de Lisboa estão previstos aumentos muito sensíveis da população industrial para a zona a sul do Tejo.
Mas, para o distrito de Santarém, principalmente na zona desde a Ponte do Marechal Carmona até à sede do distrito, inclusive, existe uma fraca industrialização e apresenta-se uma modestíssima ou quase inexistente previsão de expansão. Quando, ao que julgo seria lógico, - e de acordo com os propósitos indicados no projecto do Plano -, se deveria estimular o desenvolvimento agro-industrial desta vasta área da região ribatejana, que tão frequentemente sofre enormes prejuízos causados pelas inundações do Tejo e seus afluentes, com perniciosos reflexos na economia regional e do País e afectando também o sector social.
A principal causa dessas cheias é o assoreamento dos rios, das ribeiras, das valas reais e das valas particulares. Não existe rede de drenagens, não podendo haver escoamento regular das águas nos anos de grande pluviosidade, dando lugar a contínuas e demoradas inundações nos terrenos marginais, planos em grandes extensões.
As águas das cheias ficam retidas durante dias e até algumas vezes semanas, visto os leitos dos rios terem em muitos sítios nível mais elevado do que áreas vastíssimas da campina ribatejana.
Mas a indisciplina das águas do Tejo e seus afluentes u fio origina só cheias destruidoras das searas, pois, além disso, arrasta em alguns sítios a camada arável das terras altas, cobrindo de areias estéreis, prejudicando e inutilizando, em certos casos, as terras da região.
Estou esperançado em que o regime hidráulico, verdadeiramente anárquico, em que se encontra toda a campina ribatejana será solucionado ou, pelo menos, resolvido em grande parte, durante este Plano de Fomento, de forma a evitar à lavoura estes enormes prejuízos quase todos os anos, e à própria economia nacional, provocando importações enormes pára substituir os géneros que as searas perdidas deveriam produzir.
Há meses, quando houve inundações em Itália, principalmente nas regiões de Florença, Veneza e terras vizinhas, foram consultados técnicos holandeses e franceses - apesar de a Itália possuir técnicos distintíssimos, como igualmente, existem no nosso país - para estudarem e encontrarem a solução mais conveniente, a fim de evitar grandes prejuízos.
A obra da rede de drenagem deveria seguir-se, ao mesmo tempo, a planificação e construção de albufeiras, a situar nas terras de maiores cotas, onde parte da água das chuvas fosse retida e armazenada, que tão útil seria principalmente para rega e de que as searas tanto necessitam em certas épocas, geralmente na Primavera e Verão.
Já mais de uma vez falei nesta Assembleia sobre a construção do canal Tejo-Sado, que passaria a dar largas possibilidades a várias indústrias que viriam a estabelecer-se ao longo de 50 a 60 km das suas margens, servidas por uma via navegável fácil e segura.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Verifica-se em diversos países da Europa que a construção de canais artificiais tem dado lugar ao estabelecimento de actividades industriais que são fontes de interesse económico. Ora nós temos canais
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naturais, rios e ribeiras, que imo são utilizados por estarem bastante assoreados.
O nosso ilustre colega Eng.º Araújo Correia, engenheiro estudioso e distinto economista, na sua recente publicação O Tejo, diz:
O Tejo é como um cavalo selvagem, indómito, impetuoso, cheio de vida, destruidor. Domesticado, pode ser, na Península Ibérica, um servidor leal, paciente, utilitário, produtor do bem-estar das populações ribeirinhas e valioso auxiliar nas economias nacionais.
Pois bem: tentemos fazer do Tejo um elemento mais útil à economia geral do País.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - De facto, perante os prejuízos enormes que ocasiona, com tanta frequência, a economia nacional, julgo que já é tempo de com o maior interesse ser devidamente estudado e de forma a encontrar a solução ou soluções mais convenientes ao País.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - No conjunto de medidas das que seria oportuno encarar para esta região, em que a província ribatejana está dividida por uma passagem não difícil, mas cara, de transpor, deveria figurar a extinção da portagem da ponte de Vila Franca de Xira, assunto a que nesta Assembleia tive já ocasião de me referir.
Como autorizada e proficientemente aqui demonstrou o nosso ilustre colega Sr. Dr. Elmano Alves, "o tráfego na ponte, de um total de 340 000, em 1953, atingiu no ano passado 1 452 000 veículos, e as receitas de portagem arrecadadas pelo Estado somaram até 31 de Dezembro de 1966 nada menos de 149 700 contos".
Conclusão: o custo da ponte - 130 000 contos - desde o fim de 1965 que se encontra reintegrado.
A abolição da portagem da Ponte do Marechal Carmona, que muito estimularia o desenvolvimento industrial e agrícola desta vasta região ribatejana, favorecia também o progresso turístico de uma província de Portugal tão cheia de cor e tão característica.
Daí tiraria o Estado uma certa compensação.
Por tudo isto, Sr. Presidente, peço licença para juntar os meus rogos aos de toda a população do distrito de Santarém e de todo o Ribatejo.
Sr. Presidente: o Plano de Fomento assinala, de uma forma concreta, os alinhamentos gerais da política económica que deve orientar a acção governamental no futuro.
Formulo os mais ardentes votos de que o Governo, dentro dos programas e prazos estabelecidos, possa levar a efeito as construções previstas, elementos de fomento e de progresso, fontes de trabalho e de riqueza da Nação. E, porque não duvidamos do valor moral e da capacidade realizadora do povo português, temos plena confiança no futuro.
Para além de tudo, confiamos em Salazar, pela sua alta capacidade orientadora, proficientemente demonstrada na nova estrutura da vida portuguesa, no restabelecimento do nosso prestígio interno e externo e ainda na realização dos planos de fomento que antecederam o que presentemente estamos apreciando.
Tudo, assim, nos dá a certeza da concretização das importantes obras e melhoramentos que figuram no Plano para 1968-1973, criteriosamente elaborado pelo Governo, na base de valiosos estudos levados a efeito por técnicos abalizados e serviços competentes do Estado, sob a alta chefia do Sr. Presidente do Conselho e direcção do Sr. Ministro de Estado.
Dentro deste espírito e sob este pensamento, dou o meu voto de concordância ao Plano de Fomento que nos é apresentado.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Pinto de Meneses: - Sr. Presidente: O assunto que me traz a esta tribuna é o ensino e investigação. Não valerá a pena expender conceitos e citar autoridades sobre a capital grandeza deste sector. Seria juntar um fraco sopro ao ímpeto do vento de ideias que corre dentro e fora de fronteiras. Estamos todos compenetrados de que sem o fomento da educação hera impossível executar qualquer plano de desenvolvimento económico, por mais bem delineado que seja, e de que sem uma política da ciência qualquer nação arrisca-se a perder a sua própria independência. Se quisermos, pois, evitar esses perigos e progredir na melhoria das nossas condições de vida material e espiritual, não temos que hesitar: optamos pela prioridade, absoluta do desenvolvimento educativo e científico do País.
De resto, é isto mesmo que o Governo tem compreendido e procurado realizar. Quem se debruçar sobre os orçamentos do Estado, pode ver que de há anos a esta parte as despesas maiores, na categoria das ordinárias, são as efectuadas com o Ministério da Educação, logo seguidas das do Exército e Comunicações. Assim, em 1964, 1965 e 1966, foram atribuídos à educação, respectivamente, 1 112 081,
1 175 289 e 1 313 067 contos, ao Exército, 1 043 459, 985 313 e 1 148 687 contos, e às comunicações, 1 054 446, 1 026 208 e 1 302 000 contos.
Nos Planos de Fomento regista-se também uma preocupação crescente com este sector. O I Plano (1953-1958) foi avaro para a educação: apenas 215 000 contos para escolas técnicas. O II Plano (1959-1964) ampliou para o triplo: 631 000. Mas o Plano Intercalar já encarou a questão com uma óptica mais dilatada, atribuindo, expressamente e pela primeira vez para o ensino e investigação,
1 038 900 contos. Relativamente aos investimentos globais, a educação levou 2,8 por cento das verbas no I Plano, 2,9 por cento no II Plano e 3 por cento no Intercalar.
No III Plano, agora em apreciação, o montante das dotações subiu ainda mais, pois estão previstos õ 643 000 contos, o que representa quase 4 por cento da totalidade dos investimentos.
Importa, porém, reparar no seguinte: o sector da educação é, financeiramente, o mais contemplado na série das dotações u cargo do orçamento estadual. A verba de 4 703 000 contos, muito superior à próxima seguinte, a da agricultura, a que se atribuem 3 600 000 contos, traduz-se na percentagem já interessante de 38 por cento dos dinheiros que hão-de sair dos fundos do Estado. Quer isto dizer que os cuidados prestados à educação e à investigação cresceram muito e exprimem uma progressão deveras notável.
Realmente, dotar um sector com mais de um terço das verbas a sair dos cofres públicos é um facto digno de ser assinalado. Por certo que, mesmo assim, a dotação não responderá às carências do sector. Disso mesmo, aliás, se dá conta o relator do capítulo X, onde se apontam, com toda a franqueza, os obstáculos a vencer, as deficiências a remediar e os objectivos a atingir. Da sua leitura colhe-
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-se que é longo o caminho que falta percorrer para se elevar o nível escolar e científico do Pais. Mas, porque faltam no relatório elementos de comparação e quadros de análise estatística, II fio se ficará talvez com a ideia precisa, do esforço que temos de fazer, porque as sínteses, embora muito boas, como u do mencionado capítulo X, restringem a capacidade de apreensão dos problemas.
Parece-se, por isso, que interessa a esta Câmara conhecer um pouco melhor alguns aspectos da problemática do ensino e da investigação, não só para dar o justo valor aos objectivos propostos no relatório, mas também para apoiar a marca de prioridade que aqui e além lhe é consignada. Com este propósito, tratarei o assunto seguindo os trâmites já hoje clássicos nesta questão: sistema escolar, investigação científica, educação, permanente e acção escolar. Limitar-me-ei aos aspectos quantitativos.
Quanto ao sistema escolar, havia, segundo os dados estatísticos de 1964-1905, os últimos publicados pelo Instituto Nacional de Estatística, no continente e ilhas, para o ensino primário, 21 116 salas de aula para o total de 852 987 alunos. Aplicando-se o parâmetro de 40 alunos por sala, encontrava-se uma falta de 2000 salas.
No referente a liceus, funcionavam, em 1964-1965, 43 estabelecimentos com capacidade para 39 000 alunos, e, todavia, eram frequentados por 62 656.
No ensino técnico profissional existiam 391 escolas, com a lotação excedida numa média de 25 por cento.
E no ensino superior a capacidade dos edifícios já em 1961-1962 era ultrapassada em cerca de 15 por cento.
Vejamos agora quanto ao pessoal docente.
Em 1964-1965 estavam ao serviço do ensino primário 25 979 agentes, dos quais 4396, isto é, 17 por cento, eram regentes.
No ramo liceal trabalhavam 2053 professores, na proporção 1 professor para 30 alunos. Daqueles, 575 eram efectivos, 180 auxiliares, 141 agregados e 1157 eventuais. Admitindo a relação ideal de 1 professor para 18 alunos, teriam sido necessários, em 1964-1965, 3481 professores, ou seja mais 1422 do que os existentes.
No ensino técnico profissional leccionavam 5869 professores em 1963-1964, quando as precisões, na base ideal de 1 professor para 17 alunos, eram de 7422, ou seja mais 1553 que os existentes.
Quanto ao ensino superior, é notória a falta de mestres em todas as Faculdades, assim como é notório que muitos deles cumprem horários superiores aos que lhes competem, sobretudo os segundos-assistentes. Além disso, é muito irregular a distribuição nos respectivos quadros. Assim, as percentagens, do lugares ocupados em 1961-1962 eram as seguintes: catedráticos, 72.5 por cento; extraordinários, 39,2 por cento; primeiros-assistentes, 93 por conto; segundos-assistentes, 266 por cento. São patentes a penúria de professores extraordinários e o sobrexcesso dos segundos-assistentes.
Este escorço sobre a carência de meios materiais e humanos no ensino, tão breve que não abrange os ensinos infantil, especializado, médio e gimnodesportivo e todo o ensino particular, dá-nos uma ideia das insuficiências de há dois anos, que, entretanto, certamente não diminuíram. Ora, formando uma previsão para o sexénio do Plano, teremos as seguintes perspectivas sobre a necessidade de instalações.
No ensino primário elementar prevê-se uma massa discente de 1 milhão de alunos em 1973, para cuja instalação haverá .que fazer urnas 4000 salas novas, substituir cerca de 3000 e fazer grandes reparações em 900. O investimento provável orçaria pelos 1 500 000 contos.
No ensino secundário (compreendendo o ciclo preparatório, o liceal superior e o técnico profissional) supõe-se, para 1973, uma população da ordem dos 300 000 alunos, a necessidade de se criarem mais 200 000 novos lugares e substituir cerca de 15 000, para o que seria de calcular um investimento de 2,5 milhões de contos. Temos, portanto, que as previsões mais moderadas exprimir-se-iam, só nos dois graus de ensino apontados (primário e secundário) , na ordem dos 4 milhões de contos. No Plano foram atribuídos 3150000 contos para tudo (instalações de ensino e investigação e apetrechamento).
Passemos ao sub-capítulo da investigação.
Pode dizer-se que a investigação fundamental é praticamente toda fomentada pelo Estado, o qual possui de há pouco um instituto coordenador e impulsionador - a Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica. Até agora toda a actividade investigadora era praticada em 160 centros ou núcleos, dos quais 62 subsidiados pelo Instituto da Alta Cultura e 98 por outros departamentos oficiais.
No período de 1962-1966 trabalhavam 675 investigadores em todos os ramos das ciências exactas e humanas. O custo anual com cada investigador andou por cerca de 28 contos, em média. Nos Estados Unidos da América esse custo é de 600 contos, e no Japão, de 160 contos; não existem ainda valores comparáveis para os diversos países europeus, mas admite-se que a média seja de 200 contos por investigador ao ano. Em percentagem do produto nacional bruto, em 1901, a Holanda consagrou à investigação fundamental 0,18 por cento, a Grã-Bretanha, 0,23 por cento, a França, 0,11 por cento, e os Estados Unidos da América, 0,33 por cento; e supõe-se que actualmente nenhum país da Europa investe menos de 0,2 por cento do seu produto nacional bruto. Em Portugal, a percentagem, nos anos de 1962-1966, foi de 0,013 por cento.
Conclusão: é baixo o número de investigadores em todos os ramos da ciência, e sobretudo nas ciências fundamentais para o desenvolvimento económico (engenharia, agronomia, química e física), e muito reduzida a verba despendida com a investigação ligada ao ensino. Além disso, é deficiente e antiquado muito do equipamento laboratorial, pobres as bibliotecas de apoio e difícil o condicionalismo dos cientistas, em tempo disponível e em meios instrumentais. E, no entanto, o progresso de uma nação está intimamente relacionado com os sons investimentos intelectuais, especialmente os relativos à investigação. É certo que não podemos ter a veleidade de acompanhar o ritmo de avanço que levam neste domínio os países altamente industrializados, mas podemos e devemos assimilar e adaptar os seus progressos científicos e técnicos, e quiçá poderemos até, num ou noutro ramo, marcar uma posição de vanguarda.
Por consequência, julgo de execução inadiável os objectivos propostos no relatório, especialmente os pertinentes à institucionalização da carreira de investigador, à formação de cursos para os pós-graduados e à criação de novos centros e ampliação dos actuais. Porém, sem uma ampla consignação de meios financeiros não será viável qualquer ideia de reformação e melhoria. Calcula-se como necessária uma equipa de 3000 investigadores no ano final do Plano, com uma média de 100 contos por investigador. Impõe-se um programa de bolsas para preparação intensiva de cientistas, em obediência a planos de investigação bem definidos. Urge procurar uma coordenação entre a investigação universitária ou similar e a investigação aplicada para o aproveitamento mais racional das condições naturais do espaço económico nacional. Ora,
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para esta e outras providências básicas e manutenção de todo o sector da investigação não se sabe que verba foi prevista, porque ela vem incluída nos
850 000 contos da rubrica "Actividades", mas uma estimativa abrangendo os subsídios para a investigação, apetrechamento laboratorial e bibliográfico, bolsas de estudo e missões ao estrangeiro deve ir muito para além daquele montante, pois há quem a compute em 1 500 000 contos.
Vejamos agora a parte referente à educação permanente e actividades culturais. A constante valorização dos Portugueses, de modo a permitir o aproveitamento de todas as suas potencialidades, exige que, para além da rede escolar, se ponha em movimento um vasto conjunto de acções complementares do ensino regular, o esquema dessas acções é difícil de estabelecer, dada a extrema mobilidade e imprecisão das necessidades e a gama das técnicas e meios com que as satisfazer.
Todavia, pode resumir-se nas seguintes rubricas: recuperação e actualização dos indivíduos em idade pós-escolar, actividades ligadas ao desenvolvimento e difusão das artes e letras e assistência educacional aos portugueses residentes no estrangeiro. Sobro a primeira rubrica, em que se salientam os cursos de educação de adultos, admite-se que nos anos de 1968-1973 ande por 1 milhão o número de pessoas a recuperar e actualizar para um nível satisfatório de cultura. Na segunda rubrica, apontam-se como mais prementes o levantamento da carta do património artístico do País, a inventariação do nosso tesouro bibliográfico e a conveniente instalação e apetrechamento das bibliotecas, arquivos e museus. Quanto à terceira, é urgente criar escolas de grau primário e secundário nos núcleos mais importantes, a fim de não se relaxar o vínculo cultural, que é, a seguir ao do sangue, o que mais fortemente os prende à Pátria. Ora, no III Plano não se vê discriminada qualquer verba para estes efeitos, mas uma estimativa prudente não poderia contar com menos de 500 000 contos.
Falemos, a seguir, do sub-sector da acção social escolar, pela qual se entendem os meios que permitem o acesso dos mais aptos aos vários graus e ramos de ensino, e o uso, para todos os estudantes, de boas condições de estudo e desenvolvimento da sua personalidade. Compreende um vasto elenco de providências, com especial relevo para a saúde escolar, alojamento e alimentação, caixas escolares, bolsas de estudo, isenção e redução de propinas, transportes e subsídios de deslocação, prémios o seguros. Só por este enunciado se avalia a extensão e complexidade deste autêntico campo de missão. Ao Estado incumbe, de harmonia com os seus princípios éticos e políticos, estimular e coordenar todas as contribuições públicas e particulares para o seu desenvolvimento.
Ora, apesar das notáveis providências recentes, os meios para esta acção social estão longe de satisfatórios, "porque", lê-se no relatório, "as disponibilidades financeiras não têm sido suficientes para obra de tanto vulto". De facto, no ensino primário, há, para 9021 núcleos em actividade, apenas 1527 cantinas. O liceal só ligeiramente tem sido contemplado com a rubrica "Alojamento". O ensino superior está mais bem provido, e é provável que dentro do período deste Plano atinja uma capacidade muito razoável de alojamentos. No tocante a serviços de saúde, havia, em 1964, 95 médicos, em regime de tempo parcial, para todos os liceus e escolas técnicas. Quanto a bolsas de estudo, o total das concedidas pelo Estado e outras entidades, em 1963-1964, não beneficiou 6 por cento da população dos ensinos secundário, superior e normal; todavia, presentemente, graças à Federação de Caixas do Previdência e à Fundação Calouste Gulbenkian, tem-se registado, de ano para ano, uma progressão espectacular neste subsector. Mas impõe-se que o Estado amplie os seus contributos, estabeleça uma rasgada política de fomento e institua um órgão central de planeamento, orientação e execução, o que, aliás, se reconhece como inadiável no capítulo que estamos analisando. A obra exige esforços e recursos imensos; só a cobertura do País com cerca de 8000 cantinas implicaria um investimento de mais de 2 milhões de contos.
Sr. Presidente: O que deixo dito não passa de um apontamento sobre os projectos educacionais do Plano, e mesmo assim sem sair do lado das expressões numéricas. A simples indicação de aspectos qualitativos e funcionais em urgência de reforma, levar-nos-ia muito tempo. O estabelecimento de cursos nocturnos liceais, a criação de novas licenciaturas (v. g. a licenciatura de Psicologia), a revisão dos planos e programas de ensino, o livro escolar e a fundação de um Instituto Nacional de Pedagogia são. entre outros, temas de esbraseante actualidade a que não podemos virar o rosto. Crê-se que o anunciado Estatuto da Educação Nacional vem responder, nestes, aspectos, aos anseios e exigências da Nação. E bem preciso é, porque o País tem-se desenvolvido e crescido de tal modo que as estruturas técnicas e administrativas do Ministério, a orgânica escolar e o funcionamento de muitas peças desta complexíssima máquina, estão a ficar desactualizados. Empregando um símil banal, diremos que o corpo da educação cresceu tanto, mercê do desenvolvimento geral do País, que a roupa que veste é curta e de talhe desajustado. Tudo, pois, reclama que nos empenhemos com redobrados esforços nesta transcendente missão.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. José Alberto de Carvalho: - Sr. Presidente: No conjunto das preocupações sociológicas que se põem à nossa consideração a nível nacional, ocupam lugar marcado os planos de desenvolvimento comunitário, pela incidência que têm no estudo e solução dos problemas que afligem as grandes massas de população disseminadas pelo território nacional.
Essa preocupação vem tomando, sucessivamente, no decurso dos últimos anos, lugar de relevo nos Orçamentos Gerais do Estado, pela melhoria na posição que as preocupações de desenvolvimento e promoção vêm ocupando na escala de prioridade, o que nos leva a acreditar que os seus reflexos venham, a reflectir-se futuramente nas Contas. No entanto, a maneira como é encarada esta questão neste projecto do III Plano de Fomento leva-me a fazer algumas considerações, com vista a uma possível efectivação do programa de desenvolvimento que ali se expõe, na esperança de que em verdade ele se venha a efectivar.
Sr. Presidente: Durante muitos anos foi critério assente nos sectores departamentais da nossa economia que seria boa política económica, a criação de zonas concentradas de actividade, as quais, por óbvias razões, se fixariam de preferência junto dos aglomerados urbanos. Pensava-se assim mais no rendimento do que no homem. Este facto trouxe à consideração, pelo deserto de progresso e bem-estar criado nas restantes zonas do País, uma série de problemas que são inerentes a todos os sectores da Administração, na medida um que se foi descobrindo uma verdade de há séculos e que se pode equacionar pela simples afirmação de que todos os planos de desenvolvimento, devem ter em vista a pessoa, o não determinado sector industrial ou região.
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Sob este aspecto, focaliza-se a nossa atenção no facto, muito de considerar, de ficarem as regiões enquadradas por focos de atracção humana que dominam a economia dos distritos que as constituem. Esses focos polarizam as actividades económicas, criam melhores condições de vida e estabelecem correntes de migração do campo, com o consequente abandono da agricultura e o abaixamento do nível de vida. das populações fixadas, reduzindo a cota de produção agrícola nacional. As cidades capitais dos distritos, por força do aparecimento ali das grandes indústrias, dos portos e do comércio, sofrem, como consequência, um surto de crescimento urbano que dia a dia se acentua e que lhes cria constantes problemas de habitação, transportes e abastecimentos, num ritmo tal que impossibilita soluções rápidas e adequadas.
Este facto, que os países da Europa, como a França e a Suécia, procuram resolver com a criação de cidades satélites, fenómeno que também entre nós naturalmente se vai verificando, põe à consideração a necessidade de estabelecer uma política, de inter-relações entre o desenvolvimento das regiões urbanas e rurais no sentido da fixação das populações, criando condições de vida que levem essas populações a uma opção que. afinal, está, até mesmo por atavismo, na base de uma preferência.
O povo emigra, ou, simplesmente, abandona a sua terra, porque sente necessidade de melhorar as suas condições de vida, fugindo a uma certeza de mediocridade que arrasta a família e todas as famílias para um viver pobre, contrário ao progresso e ao desenvolvimento. Presos a terra que amanham numa incerteza permanente de produção lucrativa, os homens são levados, naturalmente, a entregar-se, sem reacção, a uma lassa aceitação das consequências, que apenas perturbam com o lamuriar das horas de ócio, no desfiar de uma incerta esperança em melhores dias. Alguns, inconformistas por natureza ou por necessidade, reagem e apenas vêem como solução a emigração, ou a transmudação, na certeza de um viver mais difícil, mas esperançosos em obter nessas novas terras a recompensa que lhes permita um futuro calmo.
Esta experiência arrasta, em cadeia, uma corrente emigratória, que enfraquece o corpo económico das aldeias, deixando-as vazias, entregue todo o trabalho do campo às mulheres e às crianças.
E, dadas as condições em que ali se vive, mais e mais os homens jovens, ou mesmo os já entrados nos anos, procuram na quimérica visão dos que regressam a férias ao volante de automóveis a solução do seu problema económico. E ignorantes, ou incrédulos, dos episódios da vida em constante sacrifício, trabalho pesado e árduo, em condições de alojamento hipocivilizadas, tentam a sorte, e ei-los que vão acorrentados às falsas promessas do primeiro engajador que lhes apareça, e que lhes leva a economia e a fazenda. Porém, o povo ama a sua terra, que o viu nascer, e desejaria apegar-se a ela e faze-la próspera e compensadora; quando a abandona, sente em si a dor da saudade, a tristeza pela impossibilidade de a ela se agarrar e nela permanecer. Se se dessem condições de vida normal, trabalho compensador e adequada assistência cultural, o povo ficaria, interessado e colaborador, pois que jamais esquece que foi ali que nasceram, seus pais e se constituiu a sua família. A sua terra, mesmo quando emigrado, é a aldeia ou até mesmo o lugar onde se erguem as paredes que formam o seu lar, que orgulhosamente cita e descreve como sendo o melhor lugar da Terra.
Pois é necessário que se aproveite esta tendência natural no nosso povo, para com ela o fixar e através dela combater a influência desmoralizadora dos meios urbanos, preservando e salvaguardando as riquezas morais e espirituais no nosso meio rural. Para tal, torna-se indispensável que se criem meios de valorização e desenvolvimento da vida local, sendo absolutamente certo o critério, invocado no projecto, da elaboração a nível nacional de um plano de promoção baseado em planos regionais, através dos quais será dada resposta às necessidades de fomento das actividades a criar nos meios não agrícolas do sector rural e à criação de indústrias de aproveitamento dos produtos agrícolas, numa 1.ª fase da sua industrialização, nos próprios meios da produção.
A disseminação das nossas comunidades rurais, algumas com reduzido factor humano, espalhadas por regiões de difícil acesso, tais como as das encostas das serras do Marão, Geres e Suajo, cria problemas de rentabilidade que não são de desprezar, na medida em que uma iniciativa só pode perdurar se dela resultar o lucro que a justifique, embora em determinadas iniciativas, tais como as de promoção social, esse lucro se verifique a longo prazo. No entanto, até mesmo para que se possibilitem as iniciativas sociais, necessário é que existam outras que, pela sua natureza puramente económica, produzam rendimento que assegure a existência daquelas. Nas regiões do Norte e Centro que o Plano cria e delimita, dada a sua densidade populacional, as aldeias quase que se interpenetram em cadeia, o que facilita a solução, proposta pela Conferência Internacional do Serviço Social, da criação de aldeias-centros dotadas das condições indispensáveis de promoção e desenvolvimento e ligadas por meios normais de circulação rodoviária aos pequenos centros rurais. A escolha destas aldeias-centros, algumas ]á naturalmente criadas por força do seu próprio desenvolvimento, deveria ter por base não só condições de exploração das indústrias a criar, como ainda a facilidade de ligação com os centros urbanos e um critério de radiação em relação às populações que dela ficariam dependentes.
Estabelecer-se-ia assim uma cadeia de interpenetração das actividades e da vida humana, permitindo às populações beneficiarem das vantagens sócio-económicas criadas nos meios urbanos e mantendo uma vida própria, o que permitiria preservar tradições e padrões morais, ainda felizmente bem vivos nas populações das nossas aldeias.
Porém, a instituição de tal sistema acelera, como é natural, o problema da formação profissional das populações, no sentido de as preparar para bem cumprirem, em níveis de produção, as tarefas para que são chamadas pelas novas técnicas, quer no sector puramente industrial, quer mesmo no sector da produção agrícola. A criação de escolas especializadas a implantar nos centros que apontei é tarefa que cabe aos Ministérios da Educação Nacional e das Corporações e Previdência Social e é consideração a tomar na organização da carta escolar do País que, pelo Gabinete de Planeamento da Acção Educativa, está a ser elaborada. Se tal circunstância não for ali ponderada, teremos no futuro de remediar uma deficiência, com graves prejuízos para a economia nacional, pois que em qualquer futuro a solução apontada terá de ser encarada.
E, dado que no Noroeste da região do Norte, incluindo os concelhos de Baião, Lousada e Marco de Canaveses, a agricultura é ainda um factor económico a ponderar, aí se deverá criar uma escola de regentes agrícolas, localizando-se de forma a reunir as melhores condições de atracção das massas escolares.
No mais, e no sentido de uma efectiva valorização local, cada comunidade rural deveria ser dotada das condições mínimas de promoção sócio-económica, entendendo-se desde já, dado que a constituição etária das populações o aconselha e as possibilidades do erário o impõem, ser mais vantajoso e só possível que as ins-
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tituições que assegurem essas condições mínimas sejam estabelecidas nas aldeias-centros, pois me parece que nos próximos anos não será possível ir para além da criação de alguns centros.
É ainda a Conferência Internacional para o Serviço Social que chega à conclusão, através das intervenções feitas no seu 3.º Colóquio Europeu, de que é essencial que cada comunidade rural seja dotada de:
Uma escola de agricultura;
Uma escola de formação familiar, que funcionaria como escola de pais;
Campos para práticas desportivas e físicas; Um centro polivalente de actividades recreativas e culturais.
O alargamento da rede escolar, no que diz respeito ao ensino primário e ao ciclo preparatório, este com base no concelho, leva desde já uma educação mínima a todas as freguesias do País, prevendo-se que o ensino complementar possa brevemente ser assegurado a todas as populações com um número de crianças que justifique a criação de um estabelecimento de ensino desse grau. Quer isto dizer que, ao nível de educação de base, está assegurada ao meio rural a condição indispensável para uma eficiente promoção profissional, a qual virá a ser assegurada, como preconizo, nos estabelecimentos especiais a criar, não só nas sedes dos concelhos, como em todas as aldeias-centros já existentes ou que se venham a criar num plano conjunto de desenvolvimento. Os centros populacionais com um conjunto superior a 1000 famílias justificam já plenamente a instituição de estruturas de promoção como as que enunciei, podendo então considerar-se a substituição da escola de agricultura por outra de formação profissional, conforme ele seja ou não um centro agrícola.
Deve, isto se se quer efectivamente caminhar para a frente, assentar-se como norma fundamental de qualquer iniciativa de desenvolvimento em que é na educação que está o segredo do progresso e da produtividade. Ê de lamentar que no relatório se não note essa preocupação, parecendo querer manter-se a ideia de que basta que surjam infra-estruturas industriais para que funcione a "lâmpada de Aladino".
Admitindo-se uma normal reacção inicial a um plano de valorização que terá de ser, não só económico, como cultural, deve dar-se a todos os que na localidade tenham maiores possibilidades de penetração e qualidades de liderança as condições de segurança e apoio que lhes permitam expor as suas ideias, no sentido da realização das suas iniciativas, organizando-se, em colaboração com os serviços directamente interessados, os planos locais de criação de instituições e realizações. Naturalmente indicado está o aproveitamento dos professores, dos párocos, médicos, industriais e agricultores com abertura suficiente para a aceitação das técnicas modernas e do princípio da íntima colaboração com os serviços estatais, ou para-estatais, que apoiarão e elucidarão essas mesmas iniciativas.
Assim, e ainda no critério que uma existente interpenetração das populações sugere, parece recomendável a realização de planos de fomento social e distribuição de riqueza em conceito descentralizado!, a nível distrital. A arrecadação das receitas e a sua distribuição dentro de cada região seria feita a esse nível, competindo ao serviço distrital coordenador a incumbência de estudar e promover os planos de desenvolvimento, num conceito de nivelamento das conquistas de progresso e bem-estar, dentro das melhores técnicas de desenvolvimento comunitário.
Parece-me ser claro que de nada servem os grandes empreendimentos em que se despendem quase todas as possibilidades de um concelho ou de uma região, mas que apenas satisfazem uma pequena parcela da mesma região, quando a parte restante, e principal, vive em condições de vida primitiva, sem o mais pequeno conforto. O sacrifício, se é que assim se pode considerar o atraso na realização de uma ambição de um determinado grande empreendimento, será superado pela alegria de se ter proporcionado a um maior número de pessoas a satisfação do mínimo das suas necessidades. Quantas vezes se nos deparam, nas sedes dos concelhos, imponentes edifícios públicos, largos mercados, avenidas e majestosos monumentos, estando os caminhos e escolas das suas freguesias em penoso estado de abandono, estas sem luz, sem aquecimento, sem instalações sanitárias, janelas arrancadas ou simplesmente sem vidros, cantinas vivendo sem subsídios, uma pálida imagem de assistência escolar. Ao cuidarem de tanta obra grandiosa que envaidece os homens pela falseada mostra de uma obra grande, esquecem as autarquias que é na valorização humana que se promove a valorização das terras, que, sem homens cultos, saudáveis, capacidades válidas de trabalho e desenvolvimento, de nada servem as avenidas, os monumentos, os palácios, os museus, as exposições e os congressos.
Eis a velha história da galinha que, faminta, encontra no chão da sua capoeira valiosa pérola ...
E, Sr. Presidente, é precisamente na valorização das condições de protecção à infância que está o verdadeiro segredo da promoção das populações e, consequentemente, a resolução eficaz das condições de crescimento económico e social das populações rurais. Para isso, torna-se necessário levar até essas populações os benefícios de uma protecção materno-infantil, realizando-se uma campanha de educação sanitária das grávidas e das mães, e, em consequência1, assegurar, nos dispensários rurais, uma assistência médico-social das mesmas e das crianças desde o nascimento até à idade escolar.
Uma casa rural com a necessária adaptação, certamente não muito dispendiosa, mas suficiente, e eis uma instalação própria para um dispensário materno-infantil, sem luxo, convenhamos, mas eficiente na consecução da sua finalidade. Ali os médicos especialistas dos serviços centrais distritais ou concelhios, coadjuvados pelos médicos de clínica geral exercendo na área, realizariam o seu trabalho de assistência médico-social e de educação sanitária, recrutando-se o pessoal de enfermagem e auxiliar, sempre que possível, entre as raparigas do meio, a quem seria proporcionada especialização adequada subsidiada, sob o compromisso de prestar serviço durante determinado número de anos. E para o desenvolvimento desses planos de educação sanitária e assistência materno-infantil seriam chamadas a intervir as entidades com responsabilidades sociais existentes nas áreas rurais, utilizando-se, em íntima colaboração, as escolas, os salões paroquiais, as Casas do Povo e também as instalações das associações de cultura e recreio, num esforço conjunto, por certo não negado, de realizar e vencer a batalha de combate ao elevado índice de mortalidade infantil que ainda hoje preocupa o País.
Parece ambiciosa a ideia, e certamente a muitos ela se apresentará utópica e a outros absolutamente impossível. Não interessam verdadeiramente as opiniões dos que julgam que só no óptimo está a verdadeira maneira de agir, interessa, sim, que a campanha tenha um início, e, se para tal apenas for possível partir do razoável, que tal se faça,
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pois o aperfeiçoamento da mesma virá em seguida, imposto pela própria necessidade de melhorar o que a sua existência criou. Nada parece possível sem que se comece, e quantas vezes uma ideia lançada em marcha revela quão fácil e útil teria sido se em tempo tivesse sido programada.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Levámos 120 anos a procurar a maneira como realizar a extinção do analfabetismo, parecendo impossível encontrar a solução.
Uma iniciativa arrojada e uma vontade firme conseguiram vencer o impasse criado, realizando-se em 5 anos o que em 120 a todos pareceu impossível. A consideração que deixo para meditação.
No que se refere às crianças no período etário da escolaridade obrigatória, pode facilmente aproveitar-se a rede de assistência escolar em funcionamento nas escolas primárias, fazendo-se as correcções e adaptações indispensáveis.
Definitivamente torna-se necessário o abandono de iniciativas improvisadas e sem real expressão nos resultados e no funcionamento. Uma camada de população escolar da ordem do milhão vive completara ente abandonada no aspecto sanitário, como já tive ocasião de afirmar aqui. As crianças das nossas escolas primárias não têm qualquer assistência médica específica que as ampare no seu desenvolvimento psicossomático e elucide os professores. Crianças simplesmente portadoras de afecções auditivas e visuais são rotuladas de débeis mentais e vão aumentar o índice de repetência, com manifesto prejuízo para a economia nacional.
E não se poderá dizer que este aspecto não tem de ser considerado num plano amplo de desenvolvimento comunitário. Esta e outras verdades não foram devidamente ponderadas na elaboração do relatório em discussão, e isso preocupa-me na medida em que, não o sendo, torna inoperante o projecto e menos real a intenção de o vir a efectivar. Obras desta natureza, em que o que está em causa é a valorização das pessoas e das terras dessas pessoas, não poderão circunscrever-se ao limitado âmbito de uma pequena comissão de homens importantes que ditam realizações impossíveis de se realizar, por serem demasiado ambiciosas. Essas comissões quantas vezes "se aproximam da luz não para verem melhor, mas apenas para serem vistas pelos homens". E nas terras e nos seus homens que se terá de procurar as vontades impulsionadoras que, sentindo na sua própria carne a necessidade da concretização dos planos, procuram e sabem dar a essas comissões de pessoas importantes os meios que tornarão possíveis as realizações e valiosos os trabalhos programados.
Sintetizando, Sr. Presidente, eu diria que é na valorização das pessoas através de uma embora modesta instalação, mas eficiente assistência sócio-económica, que proporcione a elevação da pessoa humana ao verdadeiro plano da sua génese, que reside a chave do sucesso nos planos de valorização da vida local.
Sob essa óptica, temos necessidade de aumentar a produção nos diversos níveis económicos, conservando e melhorando os campos das nossas aldeias, dando ao povo que os amanha a possibilidade de utilização e compreensão valorativa das novas técnicas, renovando as estruturas ancestrais no melhor sentido da produtividade, e dando a todas as terras uma possibilidade de fixação, pelo trabalho, ao seu próprio povo.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Uma melhor distribuição das fontes de obtenção de riqueza, uma maior cultura e um eficaz apoio sanitário a essas populações, creio que serão a chave indispensável para que se processe a valorização que preconizamos, dotando todas as regiões do continente, ilhas e ultramar das condições indispensáveis ao seu progresso no bom sentido da retribuição recíproca, com vista a um harmónico desenvolvimento nacional. Se este não for o espírito que vá presidir ao desenvolvimento prático do que se expõe neste capítulo, receio também que os dinheiros se delapidarão e o status que actual manter-se-á ao fim de seis anos de nova vigência.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão. O debate continuará amanhã à hora regimental.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 20 minutos.
Requerimento enviado para a Mesa pelo Sr. Deputado Nunes Barata durante a sessão:
Ao abrigo do Regimento, requeiro que, pelos Ministérios das Finanças e da Economia, me sejam prestados os seguintes elementos:
1) Quais os requerimentos que nos meses de Janeiro a Junho de 1966 foram dirigidos a S. Ex.ª o Ministro das Finanças solicitando a aplicação do regime de draubaque ao fio máquina classificável pela posição 73.10.01, destinado a trefilagem de arame e ao fabrico de pregos, a exportar para mercados estrangeiros.
2) Quais as informações que a Inspecção Geral de Produtos Agrícolas e Industriais, do Ministério da Economia, prestou relativamente aos pedidos referidos no número anterior.
3) Em que data os processos foram enviados à Inspecção-Geral dos Produtos Agrícolas e Industriais e qual a data das referidas informações.
4) No caso de algum processo se encontrar ainda pendente na Inspecção-Geral dos Produtos Agrícolas e Industriais, qual a causa da pendência e em que data se prevê que o processo soja informado.
5) Se, posteriormente a entrada dos pedidos referidos no n.º l, as entidades interessadas fizeram novas diligências junto de SS. Ex.ªs os Ministros das Finanças, da Economia e Secretário de Estado da Indústria; quais as datas destes requerimentos; qual o teor dos respectivos despachos; qual o cumprimento que os serviços a quem os mesmos requerimentos porventura foram enviados lhes deram.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
André da Silva Campos Neves.
Aníbal Rodrigues Dias Correia.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António Dias Ferrão Castelo Branco.
Armando José Perdigão.
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Francisco Elinano Martinez da Cruz Alves.
Henrique Ernesto Serra dos Santos Tenreiro.
Hirondino da Paixão Fernandes.
José Coelho Jordão.
José Dias de Araújo Correia.
José Guilherme Rato de Melo e Castro.
José Pais Ribeiro.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Luís Folhadela Carneiro de Oliveira.
D. Maria Ester Guerne Garcia de Lemos.
Rui Pontífice de Sousa.
Sebastião Alves.
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Albano Carlos Pereira Dias de Magalhães.
António Manuel Gonçalves Rapazote.
António Maria Santos da Cunha.
Armando Acácio de Sousa Magalhães.
Artur Aguedo de Oliveira.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Aulácio Rodrigues de Almeida.
D. Custódia Lopes.
Fernando Afonso de Melo Giraldes.
Gonçalo Castel-Branco da Costa de Sousa Macedo Mesquitela.
Horácio Brás da Silva.
Jaime Guerreiro Rua.
James Pinto Buli.
João Ubach Chaves.
José dos Santos Bessa.
Leonardo Augusto Coimbra.
Manuel Amorim de Sousa Meneses.
Manuel Henriques Nazaré.
Manuel João Correia.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Rafael Valadão dos Santos.
Raul Satúrio Pires.
Rogério Noel Peres Claro.
O REDACTOR - Januário Pinto.
IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA