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REPÚBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL
DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103
ANO DE 1967 30 DE NOVEMBRO
IX LEGISLATURA
SESSÃO N.º 103 DA ASSEMBLEIA NACIONAL
EM 29 DE NOVEMBRO
Presidente: Exmo. Sr. Mário de Figueiredo
Secretários: Exmos. Srs. {Fernando Cid de Oliveira Proença
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira
SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 10 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente.
O Sr. Presidente anunciou estar na Mesa -, para cumprimento do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição, o Diário do Governo n.º 271, 1.ª série, que publica os Decretos-Leis n.ºs 48 051 e 48 053.
O Sr. Deputado Leonardo Coimbra foi autorizado a depor como testemunha, de acordo com o pedido do 4.º juízo criminal de Lisboa.
O Sr. Presidente informou que não marcaria sessão para o dia seguinte,
quinta-feira, em virtude de virem à Comissão Eventual, para esclarecimentos, de manhã e à tarde, respectivamente, os Srs. Ministros das Comunicações e das Finanças.
O Sr. Deputado Augusto Simões requereu vários dementou a fornecer pelo Ministério da Economia.
O Sr. Deputado Neto de Miranda requereu lhe fossem fornecidos os elementos solicitados na sessão de 22 de Março último.
Ordem do dia. - Continuou a discussão na generalidade da proposta de lei relativa à elaboração e execução do III Plano de Fomento.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Gonçalo Mesquitela, Cutileiro Ferreira, Tito Livio Feijóo e Coelho Jordão.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas e 30 minutos.
O Sr. Presidente: - Vai fazer-se a chamada.
Eram 16 horas.
Fez-se a chamada, a qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Álvaro Santa Rita Vaz.
André Francisco Navarro.
Aníbal Rodrigues Dias Correia.
Antão Santos da Cunha.
António Calapez Gomes Garcia.
António Dias Ferrão Castelo Branco.
António Furtado dos Santos.
António José Braz Regueiro.
António Júlio de Castro Fernandes.
António Magro Borges de Araújo.
António Maria Santos da Cunha.
António Moreira Longo.
Arlindo Gonçalves Soares.
Armando Acácio de Sousa Magalhães.
Armando José Perdigão.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Alves Moreira.
Artur Correia Barbosa.
Artur Proença Duarte.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Augusto Salazar Leite.
Avelino Barbieri Figueiredo Batista Cardoso.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando Cid de Oliveira Proença.
Filomeno da Silva Cartaxo.
Francisco António da Silva.
Gabriel Maurício Teixeira.
Gonçalo Castel-Branco da Costa de Sousa Macedo Mesquitela.
Gustavo Neto de Miranda.
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Henrique Veiga de Macedo.
Horácio Brás da Silva.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
João Ubach Chaves.
Joaquim de Jesus Santos.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Jorge Barros Duarte.
José Alberto de Carvalho.
José Gonçalves de Araújo Novo.
José Janeiro Neves.
José Manuel da Costa.
José Pais Ribeiro.
José Pinheiro da Silva.
José Vicente de Abreu.
Júlio Dias das Neves.
Leonardo Augusto Coimbra.
Luciano Machado Soares.
Luís Arriaga de Sá Linhares.
Luís Folhadela Carneiro de Oliveira.
Manuel Colares Pereira.
Manuel João Correia.
Manuel João Cutileiro Ferreira.
Manuel Marques Teixeira.
Manuel de Sonsa Rosal Júnior.
Maria de Lourdes Filomena Figueiredo de Albuquerque.
Mário Amaro Salgueiro dos Santos Galo.
Mário de Figueiredo.
Miguel Augusto Pinto de Meneses.
Paulo Cancella de Abreu.
Raul Satúrio Pires.
Raul da Silva e Cunha Araújo.
Sérgio Lecercle Sirvoicar.
Teófilo Lopes Frazão.
Tito Lívio Marra Feijóo.
Virgílio David Pereira e Cruz.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 68 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 16 horas e 10 minutos.
Antes da ordem do dia
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Telegramas
Da Empresa de Pesca de Aveiro, apoiando o discurso do Sr. Deputado Henrique Tenreiro sobre a situação da pesca nacional.
Diversos, de aplauso à intervenção do Sr. Deputado António Maria Santos da Cunha acerca de indústrias têxteis.
Do presidente do conselho de administração da Companhia Nacional de Navegação, apoiando o discurso do Sr., Deputado Jerónimo Jorge sobre a marinha mercante nacional.
O Sr. Presidente: - Para efeitos do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição, está na Mesa o Diário do Governo n.º 271, 1.ª série, de 21 do corrente, que publica os Decretos-Leis n.º 48051, que insere disposições destinadas a regular, em tudo que não esteja previsto em leis especiais, a responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas públicas no domínio dos actos de gestão pública e dá nova redacção aos artigos 366.º e 367.º e à alínea h) do § 1.º do artigo 815.º do Código Administrativo, e n.º 48 053, que autoriza o Ministro das Finanças a conceder à comissão referida no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 46 033 um empréstimo até ao montante de 250 milhões de escudos, destinado ao pagamento da importância de 3 milhões de libras esterlinas, a liquidar a The Anglo-Portuguese Telephone Company, Ltd., e abre um crédito no Ministério das Finanças a favor do mesmo Ministério, que constituirá o artigo 224.º, capítulo 24.º, do seu orçamento para o corrente ano.
Está na Mesa um pedido do 4.º juízo criminal de Lisboa para que o Sr. Deputado Leonardo Coimbra seja autorizado a depor como testemunha de defesa no julgamento de Maurício Alves Carvalho Macedo.
Consultado sobre a matéria, o Sr. Deputado em causa declarou não ver qualquer inconveniente para o exercício das suas funções parlamentares em ser-lhe concedida a solicitada autorização. Nesta conformidade, ponho o problema a VV. Ex.ºs
Consultada a Assembleia, foi concedida autorização.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Informo VV. Ex.ªs de que amanhã não haverá sessão plenária, porque vêm à Comissão Eventual, para a esclarecerem sobre problemas das suas pastas, os Srs. Ministros das Comunicações, às 10 horas e 30 minutos, e das Finanças, às 15 horas e 30 minutos. Em consequência, pois, amanhã não poderá haver sessão.
Tem a palavra, para um requerimento, o Sr. Deputado Augusto Simões.
O Sr. Augusto Simões: - Sr. Presidente: Estando a proceder ao estudo dos problemas relacionados com o combate aos incêndios florestais e a outras calamidades, para oportuna apresentação de um projecto de lei visando a reforma do actual regime, requeiro que, pelo Ministério da Economia e Secretaria de Estado da Agricultura, me sejam fornecidos com a máxima urgência os seguintes elementos:
1.º Cópia do despacho do então Secretário de Estado da Agricultura, Dr. Mota Campos, sobre o combate aos fogos florestais na região transmontana;
2.º Cópias dos relatórios elaborados pela Direcção-Geral dos Serviços Florestais e Aquícolas e por outros serviços relacionados com o mesmo despacho;
3.º Cópia do despacho do então Secretário de Estado da Agricultura, Sr. Eng.º Luís de Azevedo Coutinho, nomeando uma comissão para o estudo dos meios de combate aos incêndios em todo o País;
4.º Cópias dos relatórios parciais apresentados pelos componentes da comissão nomeada;
5.º Cópia do relatório final da mesma comissão;
6.º Cópia do despacho que foi proferido sobre o mesmo relatório;
7.º No caso de não ter havido relatório final, cópia do despacho que extinguiu a mesma comissão.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para um requerimento, o Sr. Deputado Neto de Miranda.
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então indiquei, me fossem fornecidos vários elementos que me habilitassem a tratar do problema frutífero do ultramar e da sua posição no mercado metropolitano.
Àquele meu requerimento foi dado imediato andamento, mas acontece que até ao passado dia 16 do corrente apenas me foram fornecidos elementos pela Junta Nacional da Marinha Mercante e pela Direcção-Geral do Porto de Lisboa, o que, por si só, de forma, alguma pode satisfazer o fim em vista.
Precisamente porque os departamentos do Ministério do Ultramar, da Secretaria de Estado da Agricultura e da Secretaria de Estado do Comércio que foram referidos no meu requerimento ainda não forneceram os elementos pedidos, não me constando que a demora derive de dificuldades intrínsecas, venho respeitosamente solicitar de V. Ex.ª, Sr. Presidente, se insista no fornecimento dos elementos solicitados junto das entidades acima referidas.
O Sr. Presidente: - Vai passar-se à
Ordem do dia
O Sr. Presidente: - Continua em discussão na generalidade a proposta de lei relativa à elaboração e execução do III Plano de Fomento.
Tem a palavra o Sr. Deputado Gonçalo Mesquitela.
O Sr. Gonçalo Mesquitela: - Sr. Presidente: A responsabilidade que sobre nós impende ao votarmos a lei de autorização do III Plano de Fomento, verdadeira programação geral para os próximos seis anos da vida económica e social portuguesa, é particularmente sensível quando se trata do ultramar.
O caminho escolhido pelo Governo foi o de estruturar o Plano para cada província seguindo módulos gerais, pelo que, em relação a cada uma, teríamos de versar todos os temas sectoriais considerados, o que é manifestamente impossível.
Seja-me relevada, por isso, a forma incompleta por que me pronunciarei, na certeza de que o voto que dei na generalidade será, no entanto, perfeitamente consciente, apesar disso.
1. Do exame comparativo entre o projecto deste Plano e o dos anteriores ressalta, como muito bem o salienta o notável parecer do Eng.º Pimentel dos Santos, digno Procurador à Câmara Corporativa, que - relatou a parte ultramarina, ressalta, dizia eu, o extraordinário passo em frente que se deu.
Os sectores abrangidos e a tentativa da coordenação de todos eles ultrapassaram em muito o que nos dois primeiros planos e no intercalar se considerou.
E com esta circunstância, cujo mérito é de avultar, devemo-nos regozijar.
Mas, como adiante exporei, considero que, para o ultramar, melhor direi, para os interesses integrais da Nação, se ficou aquém do que seria necessário e virá, com certeza, a ser feito no futuro. Reconheço, porém, as muitas e grandes dificuldades que não puderam desta vez ainda ser vencidas. A falta de elementos de estudo, as carências esmagadoras de uma estatística nacional, a impossibilidade de se dispor dos números referentes à contabilidade nacional aplicáveis ao ultramar, a falta de métodos expeditos e de técnicos experimentados que permanente e cautelosamente os tivessem recolhido e interpretado segundo padrões uniformes, aplicáveis a todas as parcelas do País, tudo isso implica que não tenha sido viável a integração dos sectores a planificar num conjunto que abranja a totalidade dos territórios geogràficamente separados e económicamente ainda distintos no todo português.
E esta tarefa futura parece indispensável. Economicamente, porque a complementaridade dos territórios é um princípio da Constituição e do sentimento nacional. E assim os próximos planos terão de abarcar soluções que, sendo separadas por natureza, por terem de se completar, devem começar por ser seleccionadas e orientadas segundo directrizes verdadeiramente nacionais. Socialmente, porque não corresponde ao que Portugal está realizando no Mundo um estudo em que as questões de nível de vida, de pleno emprego, de instrução ou de emigração e tantas outras não .sejam interligadas nas metas que se estabelecerem para os planos de fomento. É indiscutível que neste projecto já o ultramar é considerado em muito maior escala do que anteriormente, ao definirem-se as questões metropolitanas. Mas só se atingirá o plano certo de trabalho quando esta mesma distinção desaparecer, para surgirem num pleno conjunto nacional.
Como atrás referi, compreendo perfeitamente que para tanto se impõem serviços de recolha de elementos, estudo e interpretação uniformizados em métodos e orientação em cada uma das parcelas do País e integrados depois num organismo único. O próximo hexénio não poderá desprezar este importantíssimo factor.
Em quase todos os sectores é necessário fazer-se a ligação das disponibilidades e das necessidades-nacionais, encaradas à escala total, e até politicamente se impõe esta meta, sem o que as diferenças territoriais se poderão vir a acentuar, criando orientações angulares distintas para cada parcela, cujas consequências não será possível depois evitar.
E é politicamente que aqui temos de nos pronunciar em primeiro lugar. Isto me leva a declarar esta minha primeira reserva, na esperança de que o futuro a faça desaparecer.
2. Mas, se compreendo as causas desta deficiência de base, que, no entanto, por serem inultrapassáveis nesta altura, não diminuem o grande mérito de esforço feito por todos os que estudaram o projecto, aqui e nas províncias, já me parece de apontar uma outra que poderia e deveria ter sido evitada e que, pela sua importância fundamental, espero venha a ser reconhecida pela Assembleia e corrigida pelo Governo.
Refiro-me, uma vez mais, ao povoamento das províncias, em especial das grandes províncias de África.
Já vão longe os tempos em que este constituía apenas uma questão académica nas preocupações dos governos ou um sector mais a ser resolvido só pelo Ministério do Ultramar, que na sua longa história tanto tem feito para povoar as províncias e tantas experiências tem tentado, com mais ou menos êxito, com maior ou menor dispêndio da Fazenda Nacional.
O povoamento é hoje uma necessidade aceite por todos, e quantos mais portugueses vão conhecendo Angola ou Moçambique ou outra qualquer das províncias mais ela se vinca na consciência de todos.
Parece oporem-se, no entanto, duas concepções para a sua solução.
Uma delas repousa no princípio de que tudo se resolverá quando a economia de cada parcela conseguir desenvolver-se e criar por si própria os estímulos indispensáveis ao apelo e à fixação de metropolitanos e de ultramarinos evoluídos em terras de além-mar. E, assim, não há que fazer esforços prioritários em direcção a medidas específicas de povoamento, mas há, sim, que os realizar no sen-
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tido de criar riqueza, porque esta atrairá os homens, que, servindo-a, se satisfarão.
Na base, a economia. Gomo subproduto consequente desta, o povoamento.
E reconhecendo-se, apesar disso, que há que realizar, entretanto, a criação de algumas infra-estruturas auxiliares, pois, através da junta do povoamento de cada uma das províncias, elas procurarão definir as linhas de orientação das soluções, delimitar as áreas mais aconselháveis económicamente em função das possibilidades de produção e promover o crescimento económico das áreas menos evoluídas, em torno dos pólos de desenvolvimento existentes, sem prejuízo de criar outros com vista à correcção de desequilíbrios regionais, tal como na metrópole.
E para este efeito, o projecto, no que se refere a Moçambique, apresenta soluções merecedoras de interesse e apoio.
E esta a que poderemos chamar a concepção estritamente económica do povoamento e que parece ter por base a de que sem riqueza não haverá portugueses evoluídos interessados em se fixarem, mas que, com ela e com essa fixação, as populações autóctones aumentarão o ritmo da sua integração no mundo actual e nos níveis de vida mais elevados que se pretendem para toda a Nação.
Compreendo que é difícil deixarmos as linhas mestras deste pensamento, que, quanto a mim, se filia nas seculares concepções de uma África em que o clima é mau, as condições de trabalho são adversas e em que o elemento mais activo de desenvolvimento é o interesse individual por largos lucros que se supõe ainda serem ali mais fáceis de obter. Mas aos poucos vamos vendo desaparecer estas ideias, substituídas pelas de um, Portugal africano em que o trabalho tem o seu justo valor perante a contribuição social e económica que presta, em que se reconhece que o clima deixou de ter a adversidade antiga com os meios actuais e em que há que fazer elevar rapidamente o grau de evolução de alguns milhões de portugueses que hoje ainda, pelo seu atraso, não prestam à colectividade colaboração igual à dos restantes e que para isso é preciso ajudar na dura ascensão para o progresso.
Tem sido, contudo, muito lenta a passagem de um plano do pensamento para o outro, mesmo em sectores responsáveis. É preciso, apesar disso, convencermo-nos de que aquela África antiga, a das febres e dos bichos, a das carências e da vida impossível para muitos, a África do desconforto e do sacrifício diário, desapareceu, Sr. Presidente e Srs. Deputados. Os inegáveis ventos do progresso, que não são os tais «da história» que fizeram soprar contra nós, e a criação do mundo novo quê trouxe consigo a destruição de tanto que nos era familiar também substituíram as razões de tal pensamento.
A ele - que, quanto a mim, estrutura a concepção económica do povoamento -
vai-se opondo á nova concepção político-social dos problemas demográficos nacionais, alargados aos territórios do além-mar.
Já ninguém discute hoje, moral ou legalmente, o princípio de que a cidadania é igual para todos os portugueses e que, portanto, as obrigações do País perante cada qual e as de cada cidadão perante o Pais comum têm de ser iguais. Em face desta igualdade, o grande problema é o de sabermos como havemos de anular as diferenças mais notáveis entre os Portugueses e como - e em que prazo - poderemos transformar os territórios tão diversos que constituem a Nação por forma a servirem paralelamente o todo português.
Decorre daqui que a antiga concepção de ocupar as nossas províncias com metropolitanos ou seus descendentes - pensamento que guiou durante decénios - as
experiências de povoamento dirigido ou orientada - vai assim dando lugar a esta outra de que o que temos de fazer é obter que cada português seja um elemento útil social, económica e humanamente, por forma que, respeitadas as suas idiossincrasias básicas - tal como com o Minhoto ou como o Estremenho -, não haja uns a servirem de suporte à Nação e outros a viverem passivamente dela.
Assim, o preocuparmo-nos exclusivamente com as condições de atracção para um sector demográfico em território distinto do da sua origem passa a ser um anacronismo, quer doutrinário, quer prático.
De resto, as estatísticas - as malfadadas estatísticas - o provam, e, quase direi, graças a Deus.
Olhando para elas, mesmo superficialmente e mesmo que o não repudiássemos em consciência, como o fazemos, concluiremos que não é possível, aritmèticamente possível, distinguir entre nós esses grupos de população, para, segundo a sua origem étnica ou geográfica, pretendermos que venha um deles a predominar sobre o outro numericamente. A da metrópole equivale-se, nos seus 10 milhões, à do ultramar e, admitindo-se mesmo taxas de crescimento muito diferentes, nunca as províncias africanas poderão ser povoadas sequer com paridade de grupos étnicos.
Conclusão evidente, portanto: o problema não está em povoar, para ocupar, zonas de diferenciação étnica por um dos grupos. Transformou-se na questão de conseguirmos a mais rápida via de criar, com todos os portugueses, a população de Portugal que venha a ser nacionalmente homogénea, enriquecida pelas diferenciações étnicas que o destino nos oferece nos diversos continentes. E para tanto é evidente a necessidade de fixarmos europeus em África para, em conjunto com os africanos, promovermos aquela homogenização futura.
Por outro lado, a extensão das províncias, as suas zonas despovoadas, as suas riquezas a explorar, o desenvolvimento humano e social a dar a cada uma, exigem que se faça uma ocupação cada vez mais eficiente e profunda com portugueses de todas as cores, raças ou proveniências, mas que tenham de comum um mínimo de desenvolvimento individual e uma mentalidade nacional adequada.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Tive já ocasião de apresentar à Assembleia este ponto de vista com largo desenvolvimento e repetidamente tenho abusado da paciência de VV. Ex.ªs com este problema, pelo que me dispenso agora de tornar a expor o meu ponto de vista para além das suas conclusões. E são elas a de que o povoamento tem de ser concebido, não como mera tarefa de transferir populações em maior ou menor número entre continentes diferentes, mas de, encarada a Nação como um todo, desenvolver cada estrato populacional, com a ajuda, dos mais desenvolvidos (ajuda, repito, porque o termo tem importância para a verdade do raciocínio), nos seus aspectos humanos de cultura, de progresso, de educação, de mentalidade, enfim, moldando-as intelectual e anìmicamente por forma a serem antes de mais e acima de tudo portuguesas.
E assim vemos já o povoamento na sua verdadeira dimensão de primeiro problema, merecedor de prioridade absoluta nas soluções, porque, se assim não for, toda a riqueza, todas as soluções da economia, todo o génio da técnica que modifique a terra e o seu aproveitamento, serão trabalho baldado, porque não teremos trabalhado todos por Portugal. Estaremos apenas a demons-
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trar que somos capazes de vencer o meio e os elementos para que outros estranhos aos futuros portugueses venham a beneficiar deste trabalho de gerações inteiras. E não é isto que se pretende.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Deixou assim o povoamento de ser uma questão de economia mais ou menos florescente que atrairá determinada gente aos pontos onde parece mais necessária. Passou a ser um conjunto integral de problemas em que a educação, a saúde, a evolução política, económica e social, o urbanismo, a promoção social e psicológica, têm de ser tratados concertadamente e cuja urgência não se compadece com menos que com o esforço integral da Nação, mesmo com o sacrifício de algumas comodidades ou prioridades de uma ou outra parcela em benefício de todos, que é o mundo português. E não nos detenhamos a lamentar o baixo nível de vida de uma ou outra região da Europa, quando em África populações muito maiores estão infinitamente mais atrasadas. Se por uns anos, menos largos, houver que sacrificar aqueles a estes, em termos de história e de gerações, o País virá a cobrar os seus enormes juros das renúncias que agora fizer, para além dos muitos que tem aceite, a benefício do ultramar.
Compreenderão agora VV. Ex.ªs como, pensando assim, me permito discordar da omissão desta preocupação prioritária no III Plano de Fomento.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Não basta afirmar-se nele que há que fazer assentar o Plano numa concepção de crescimento económico apoiado nos pólos de desenvolvimento existentes ou a criar.
O povoamento não pode ser só uma extensão do desenvolvimento regional, como o do Nordeste transmontano ou do Sul do Alentejo. Tem de ser uma das metas prioritárias do Plano, não só no que a cada província se refere, mas a todo o País, e implicará assim uma reconcepção de muitas das soluções económicas e sociais que ainda parecem lógicas para a própria metrópole.
E esta, Sr. Presidente, a crítica de mais profundidade que julgo dever aqui fazer ao projecto.
É por isso de lamentar que nas bases III, IV e V da proposta de lei que nos é apresentada para apreciação nada se leia que directamente indique o povoamento do ultramar como uma das finalidades prioritárias e uma das preocupações dominantes - a qual seja servida pelas da economia - a ter-se na execução deste III Plano.
Posta esta reserva quanto à concepção geral do Plano no âmbito nacional - à qual não podia em consciência furtar-me -, passo a indicar rapidamente mais alguns pontos que me parecem merecer referência específica já quanto a Moçambique, para além dos que os meus ilustres colegas de círculo indicaram com tanta elevação.
3. Turismo. - Quando examinamos o que, em relação à metrópole, o turismo tem representado nestes últimos anos, mercê da política determinada e inteligente seguida pelo Governo, mais se acentua a certeza de que esta é uma das actividades que em Moçambique deve ser apoiada e acarinhada como uma das que mais rapidamente produzirá resultados económicos espectaculares.
Nos estudos para Moçambique desta actividade, apresenta-nos o projecto a seguinte previsão, que, quanto a mim, só pecará por defeito:
Em 1968 admite-se que o número de turistas seja de 230 000 a 260 000, passando em 1973 para 300 000 a 340 000. Como reflexo destas cifras, temos que as receitas admitidas serão da ordem dos 310 000 a 350 000 contos para 1968 e
405 000 a 460 000 contos em 1973.
Se considerarmos as projecções de valor que o mesmo estudo nos indica para a exportação dos principais produtos da província para aqueles anos, vemos que as previsões sobre o turismo situam a sua receita em 3.º lugar - a seguir ao algodão e à castanha de caju e muito acima do açúcar, do chá, do sisal e da copra.
Sendo certo que os mercados turísticos que asseguram o crescimento da actividade estão assegurados na África do Sul e na Rodésia - para não contar senão com estes -, parece indiscutível que o incremento das receitas pode ser muito mais sensível se durante os &eis anos do Plano houver disponibilidades maiores destinadas ao turismo. E para este sector considera-se no Plano, apenas no
hexénio, a verba de 20 000 contos, manifestamente desproporcionada com a importância que nele se aponta.
Muito mais tem de ser feito nesta sementeira assegurada nos seus resultados. Se atentarmos, por exemplo, nas estradas e nos aeródromos - realidades básicas de qualquer política de turismo -, veremos como Moçambique está desprovido de elementos que o sirvam capazmente. O projecto considera, por isso, um total de 5000 contos (25 por cento da verba total) para melhoramentos de acesso e de outras infra-estruturas. Mas que são 5 000 contos utilizados em cinco parcelas de 1000 contos anuais para o muito que se pode e terá de fazer, para, através do turismo, - beneficiarmos a economia moçambicana de largas centenas de milhares de contos?
Esta é uma das verbas nitidamente baixas, e que bem merece revisão generosa, para que a melhor aplicação dos investimentos possa ser feita.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - 4. Comercialização externa. - Outra das deficiências que temos de encarar com decisão para Moçambique parece resultar, afinal, de um defeito nacional: refiro-me à incapacidade que até hoje se tem verificado na expansão da comercialização dos produtos da província nos mercados externos.
Não há entre nós, ao que me parece, a preocupação natural de agressividade comercial que nos leve a conhecer os meios que permitam a Portugal melhor vender as suas produções, os países mais favoráveis e as correcções a introduzir na política económica do Estado e das empresas privadas - ou dos grandes sectores da produção -, para aproveitarmos as possibilidades projectadas. Os nossos exemplos do amendoim, do milho, das frutas, do próprio algodão e do açúcar são patentes. Preocupamo-nos em colocar as produções na metrópole, aguardamos que nos venham comprar o que produzimos e só excepcionalmente nos esforçamos para vender no estrangeiro, concorrendo activamente com o resto do Mundo.
Esta característica, tão portuguesa, é particularmente sensível em Moçambique. Posso testemunhar que os estudos económicos oficiais feitos oportunamente, por exemplo para as novas açucareiras, indicaram para a do Sul de Moçambique uma produção inicial máxima de 45 000 t, a atingir as 70 000 t daqui a uns anos, como sendo a ideal. Ao mesmo tempo, na Suazilândia e na Rodésia as novas açucareiras .que ali se organizavam, na mesma altura, previam apenas dez vezes mais: 450 000 t iniciais.
A diferença está em que os estudos para as nossas - feitos por técnicos oficiais - contavam fundamentalmente com o mercado da metrópole para a venda da produção
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e as estrangeiras preparavam-se para lutar no mercado mundial, em que colocarão o produto a preço mais baixo, mas em muito maiores quantidades. Assim, não é possível conseguirmos concorrer, Sr. Presidente e Srs. Deputados, com os outros produtores.
Outro exemplo.
Ainda este ano. em Moçambique, depois de uma campanha firme de produção de milho levada a efeito em 1066, as quantidades que os agricultores apresentaram ao mercado constituíram logo de entrada sério problema de sobreprodução: carência de armazéns bastantes e apropriados, carência de colocação rápida dos produtos e, principalmente, carência de uma máquina de exportação dotada do necessário conhecimento dos mercados e dos indispensáveis fundos adequados às compensações que se viessem a impor. Como resultado, a agricultura de largas regiões, como as do planalto do Chimoio, vive horas graves de angústia ao ver deteriorarem-se milhares de toneladas, horas essas que podiam ser poupadas se a política agrícola e a política económica estivessem coordenadas a tempo e a horas e existisse um sistema de ensilagem, de transportes e de fomento de exportação das produções que se estimularam no início da campanha agrícola. Além do prejuízo, que é enorme, não é menos grave consequência a do desânimo dos produtores.
Este é um exemplo que quase diríamos corriqueiro, mas cujas consequências podem exceder em muito as mais pessimistas previsões. Precisamos de fomentar a produção, não só a agrícola, como a industrial, mas para tanto teremos que contar, não apenas com a solidariedade económica nacional e com a complementaridade dos territórios portugueses, mas com uma forte e decidida acção das organizações públicas e particulares, no sentido de prospectarem oportunamente e conhecerem os mercados para a exportação das nossas produções. Sem isso, nem o mercado metropolitano poderá satisfazer as necessidades de aquisição das produções do ultramar - e que há que incrementar em muito -, nem estas poderão ter assegurados os níveis económicamente mais convenientes ao seu desenvolvimento.
Também o projecto do Plano de Fomento atenta no problema em cada província, e designadamente em Moçambique. Mas este é um dos vários aspectos em que uma acção conjunta verdadeiramente nacional se impõe, sem que devamos dividir os esforços por territórios separados, que, por isso, tanta vez se desconhecem e não coordenam. Só teremos a ganhar com uma política nacional conjunta em mercados externos, como se tem realizado no passado com alguns produtos, como o café, e que permita conjugar as possibilidades do Fundo de Fomento de Exportação da metrópole com as dos diversos fundos com a mesma função existentes nas províncias do ultramar.
Para os estudos de base relativos ao comércio externo atribui-se a verba de
1000 contos para o sexónio. Isto diz tudo na sua exiguidade.
Esta é outra das observações que não posso deixar de aqui fazer ao III Plano de Fomento, pois não parece ter sido a orientação seguida a mais conveniente e convir definir aquela acção conjunta que beneficie largamente toda a economia portuguesa.
5. Por último, queria referir-me ainda a um ponto de particular interesse para Moçambique: o da investigação científica.
Não me vou alargar em considerações sobre a necessidade e conveniência dos investimentos destinados a este sector. Já na Assembleia foi longa e repetidas vezes tratado o problema e examinada a sua essencialidade no mundo moderno. Ninguém consciente se permite discuti-la. tão patente ela é.
Precisamente por isso,- já se pode discutir a orientação a dar à realização de uma política de investigação. E, aqui, julgo que haveria que diversificar as orientações da metrópole e das províncias, dada a especialidade do problema em relação a cada qual.
Parece haver também no Plano uma ideia orientadora baseada nas necessidades europeias, ou melhor, nas características específicas das possibilidades materiais e humanas da metrópole em face das suas necessidades. Não a comento. Mas no ultramar - e falo especialmente por Moçambique - os meios humanos são limitados - direi mesmo que são escassos -, talvez ainda mais do que os meios materiais.
Temos assistido nos últimos anos ao esforço do Ministério do Ultramar para a concentração de algumas actividades neste aspecto, mas ainda existem, quanto a mim, demasiadas instituições de investigação científica autónomas, que, com vantagem, se poderiam integrar, evitando duplicações e dispersões.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Quer-me parecer que esta multiplicidade actual indica em primeiro lugar uma fase do subdesenvolvimento da investigação, na qual cada sector procura ter o seu instituto, sem poder dispor nenhum deles de todos os técnicos ou de todo o equipamento de que careceriam.
Até há alguns anos atrás isto justificar-se-ia pela falta de uma instituição básica dotada do nível adequado para centralizar, coordenar e impulsionar, em nível científico superior, os diversos sectores. E assim compreendia-se que a investigação médica, a investigação veterinária ou a investigação agrária exigissem os seus institutos próprios. Assim se fez.
Mas a partir de 1962 surgiram na província os Estudos Gerais Universitários, que atingiram no ano lectivo corrente a fase já adiantada dos últimos anos de várias licenciaturas, com a instituição do 5.º ano. Estamos a caminho, portanto, na Universidade de Moçambique, com todas as suas enormes consequências vantajosas para a Nação.
Consagrando a distinção entre investigação ligada ao ensino e investigação independente do ensino, o III Plano de Fomento cria, em Moçambique, na opinião de muitos, uma separação verdadeiramente nociva.
Em primeiro lugar, porque os investigadores não são tantos em Portugal que possamos separá-los garantindo ao ensino superior e à investigação dele autonomizada o nível suficiente. E em Moçambique muito menos. A verdade é que na grande maioria dos casos, na prática, os investigadores dos diversos institutos são técnicos que passaram dos serviços tradicionais onde auferiam os vencimentos normais para as vagas- que existem nos institutos de investigação com categorias muito superiores. Ou os serviços estavam extraordinariamente bem dotados, o que não parece ser o caso, ou as qualificações científicas dos novos investigadores, não tendo aumentado, não justificam o sistema.
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actividades agrícolas, industriais e extractivas de Moçambique, colaborando nelas activamente através da investigação científica universitária.
Não se vê bem, portanto, como possa haver vantagens em estarem separados das respectivas Faculdades dos Estudos Gerais, por exemplo, os institutos de investigação existentes e que nelas poderiam estar integrados, como sejam o de Investigação Médica, o de Investigação Veterinária e o de Investigação Agrária. Atentando agora nas verbas que no projecto se destinam à investigação não ligada ao ensino, apontarei apenas as que se ligam a estes sectores para indicar que somam cifras de 121 000 contos para a investigação à agricultura (sendo 70 000 para investigação agronómica e 51 000 para a veterinária) e 114 000 contos para a biologia piscatória e pesca experimental. Noto que estas verbas são para além das suas dotações normais inscritas no orçamento geral da província.
Ora estas verbas do Plano, que somam mais de 220 000 contos no sexénio, incluem-se no total de 482 510 contos destinados a investigação não ligada ao ensino, enquanto para investigação os Estudos Gerais não são contemplados com mais do que a recomendação de que devem coordenar os seus esforços com as instituições de investigação não universitárias, e muito pouco, como comparticipação para a Universidade e como orientação efectiva dos institutos autonomizados.
Estamos numa fase da vida do ensino superior em Moçambique em que se torna necessário definir as grandes orientações do futuro.
Podemos ali corrigir muito do que preocupa hoje as nossas Universidades da metrópole, que procuram adaptar-se à vida moderna.
Mais do que nunca, temos de preparar os nossos técnicos e os nossos investigadores pela forma mais perfeita e mais eficiente. Não parece, por isso, que seja de institucionalizar a orientação de milionários, que tem sido seguida, de termos investigação universitária carecida de meios, e investigação especializada a gastar verbas importantíssimas, quando, juntas as possibilidades de todas, poderão dar resultados muito mais úteis, não só no campo científico e aplicado, como no da formação das novas gerações de que tanto carecemos.
Se tivermos então em consideração as mesquinhas rivalidades de serviços, as recusas de certos sectores de permitirem que os seus investigadores, quando qualificados, sirvam como assistentes o corpo docente dos Estudos Gerais ou de facilitarem a estes instalações, como tem sucedido, por exemplo, como o hospital escolar, indispensável aos últimos anos de Medicina - dou como exemplo a verdadeira guerra fria com certos serviços em torno da possibilidade de o professor de Cirurgia dos Estudos Gerais poder exercer a sua especialidade em condições adequadas ao seu mérito e às - suas funções no Hospital Central de Lourenço Marques -, podemos avaliar até que ponto o Plano de Fomento podia ter sido útil definindo para Moçambique o princípio da centralização das actividades de investigação científica em torno das Faculdades de Medicina, Agronomia, Engenharia ou Veterinária, e até dos cursos gerais da Faculdade de Ciências, instituídos este ano.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Nas províncias estamos tão dependentes do sucesso das Universidades ultramarinas e da preparação sólida dos novos licenciados para as realidades práticas do futuro que não podemos dar-nos ao luxo de assistir a rivalidades burocráticas ou de arreigado exclusivismo dos serviços, desde que estas prejudiquem a actividade fundamental de formação dos novos técnicos e investigadores de Moçambique, sem qualquer benefício aparente daqueles serviços ou institutos, que, no conjunto, só teriam a ganhar com a integração que se sugere.
O projecto do Plano, neste ponto, parece prescrever para a província a institucionalização do que me parece ser um erro fundamental para ela, e por isso o aponto também à consideração dos responsáveis pela elaboração final do Plano e pela sua revisão.
Sr. Presidente: Expostas as reservas quanto às dúvidas e deficiências que se me apresentam como mais graves, não quero deixar de afirmar que no seu conjunto a proposta em apreciação merece o meu mais entusiástico voto na generalidade.
Reservo-me, evidentemente,, para, na especialidade, intervir naqueles pontos que me parecem poder limitar os efeitos que mereceram a minha crítica.
Deu-se com este Plano um enorme passo em frente.
Está ainda longe de ser aquele Plano Nacional, verdadeiramente nacional, que todos pretendemos, e em especial nós, os ultramarinos.
Mas estou vivamente esperançado em que durante o hexénio da sua execução se criarão e aperfeiçoarão as estruturas e os serviços essenciais à recolha e interpretação dos elementos que para o actual Plano não foi ainda possível apresentar. E que, por isso, o próximo Plano já possa ser concebido sem distinguirmos nele a metrópole e o ultramar, a não ser regionalmente, por se reconhecer que os investimentos que em cada província- a metrópole venha a fazer não são apenas auxílios àquela prestados, mas sim a realização do interesse do todo nacional, na sua integralidade territorial.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Cutileiro Ferreira: - Sr. Presidente: Ao concorrer, com o meu modesto contributo, neste debate sobre o III Plano de Fomento, desejo começar congratulando-me por que seja possível, a uma situação política que sirvo com lealdade, e a liberdade de concordar ou discordar, apresentar um projecto de plano de fomento que, sem favor, poderemos cognominar de revolução em marcha. Não se trata, como bem sabemos, de uma programação vazia de conteúdo e sem finalidades definidas. Há, como cumpria, neste projecto do III Plano de Fomento, toda uma vasta cópia de intenções, baseadas em estudos sérios, que muito honram todos os serviços e pessoas que lhe deram meritória colaboração. O III Plano de Fomento ficará como marco miliário na longa caminhada das realizações em que, por já estarmos habituados, muitas vezes não reparamos com a atenção que convém. Contudo, o Plano de Fomento, que está merecendo atencioso estudo desta Câmara, honra uma época... uma política... uma determinação de viver.
Partindo do princípio de que este III Plano de Fomento é, ria essência, uma determinação de viver, passarei, Sr. Presidente, a considerar alguns objectivos que mais feriram a minha sensibilidade e mais pertinentes considerei, dentro dos limitados contornos que pretendo dar a esta minha intervenção.
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da libra, a nossa atitude teria sido a de acompanhar, e acompanhar sem reticências, a causa da moeda inglesa. Hoje, graças à solidez das nossas finanças, à independência dos nossos sistemas políticos e monetários e, sobretudo, a uma independência - que não dependência -, podemos seguir o rumo que mais nos convém. Portugal segue a política que melhor serve os seus interesses para equilíbrio da balança comercial e para estabilização dos seus débitos e créditos. Assim o compreendi, e creio que bem, ao tomar conhecimento da posição assumida por Portugal na crise que afectou a libra e teve, e terá, tão graves repercussões na economia geral do Mundo. Julgo esta crise, talvez mais lenta, tão grave como a de 1929.
O futuro, futuro breve, nos dirá quem seguiu os melhores caminhos, mas, e desde já, uma coisa é certa: as moedas fortes sobreviverão e fortalecerão as economias de que são base. Há, porém, que atender a circunstâncias particulares que podem comprometer certas actividades exportadoras que concorrem com países que seguiram a política da desvalorização. À frente dessas actividades estão as indústrias corticeira, conserveira e de azeites. E porque serão estas as principais, de uma possível mais vasta lista? Pela simples razão de que têm como concorrentes, nos mercados internacionais, as suas similares da vizinha e amiga Espanha, nação que desvalorizou a sua moeda.
Ora, Sr. Presidente, é fácil concluir que mercadorias de uma nação que desvalorizou a sua moeda terão mais fáceis compradores do que as mercadorias provenientes de uma nação de moeda forte. Nós sabemos, Sr. Presidente, que iremos ter dificuldades em vender os nossos produtos, especialmente os atrás referidos, e, por isso, temos de nos antecipar a qualquer possível crise, com medidas que nos ponham a coberto de graves prejuízos. E quais essas medidas? Estabelecer prémios de exportação para os produtos afectados ou, pelo menos, afrouxamento nas taxas cobradas aos exportadores.
Consideremos ainda, Sr. Presidente, que no bloco económico em que Portugal alinhou, a E. F. T. A., não houve unanimidade de critérios: há países que continuaram em regime de moeda forte e países que a desvalorizaram. Eu creio que esta diferenciação de critérios terá, fatalmente, resultados diversos e de nenhum modo conducentes a uma igualdade de resultados.
Julgo, Sr. Presidente, que o III Plano de Fomento poderá ser seriamente afectado pelos factos que acabo de referir. É cedo para conhecer a complexidade dos seus reflexos, mas é tempo de acreditar que eles existem e poderão, em maior ou menor medida, influenciar a nossa economia. Tenhamos o sentido das realidades e não seremos surpreendidos. Aproveitemos a ocasião para uma indispensável política de austeridade, a austeridade que compete a uma Nação cujos filhos lutam e morrem em três frentes da Terra Portuguesa. Haja menos festas e mais trabalho ..., haja menos luxo e mais sobriedade. Os que estão em Angola, em Moçambique e na Guiné não nos compreendem, mas nós, todos nós, temos que compreendê-los.
Reverterei, Sr. Presidente, a matéria mais confinante ao projecto do III Plano de Fomento. Começarei por me regozijar de ver atendido, como tantas vezes nesta Câmara sugeri, o grave problema da luta anticancerosa. Não é, positivamente, uma verba ao nível do Plano de Fomento em discussão a que foi consignada para esta cruenta luta, mas, e isso importa referir, o reconhecimento da necessidade de incrementar essa luta é já um ganho para a mobilização a fazer nesse campo. As estatísticas não são concludentes nos números referidos - o cancro não é doença de declaração obrigatória -, mas o que já está apurado, apenas em quatro distritos do continente, leva-nos a crer que estamos em face de uma verdadeira calamidade nacional: 140 casos por 100 000 habitantes.
Há, certamente, que aceitar que muitos dos óbitos imputados às doenças cardiovasculares são, simplesmente, o final de um processo canceroso. Não basta, porém, limitar a luta contra o cancro a novas instalações hospitalares, a centros de rastreio e pesquisa: importa higienizar a vida diária de todos nós. Importa considerar a poluição da atmosfera, especialmente nos grandes centros, cuidar do uso, e abuso, de produtos de base química na alimentação. Não esqueçamos que já foi dito, e dito por responsáveis, que um tubo de escape de um motor de combustão interna é uma verdadeira metralhadora disparando sobre uma multidão indefesa e que certas indústrias, colocadas na periferia, por exemplo, de Lisboa, são altamente atentatórias da saúde da população. A comprovar que estes factos não são uma fantasia, bastará que qualquer leigo atente no aspecto que apresentam os caules das árvores que existem em Lisboa e, por eles, avaliará como estarão as nossas vias respiratórias. Este mesmo exame, feito por técnicos, onde nos conduzirá?
Ainda no campo da saúde, desejo, Sr. Presidente, referir que verifiquei, com júbilo, que o III Plano de Fomento encara, com o positivismo requerido, o problema da saúde mental.
Foi, oficial e superiormente, reconhecido o déficit, em especialistas psiquiátricos e em camas, existentes no País. Já como outros Srs. Deputados o havia referido nesta Câmara com o pedido de imediatas providências. Está, finalmente, reconhecida, no III Plano de Fomento, a razão das nossas intervenções. Urge agora que a realidade do existente acelere as medidas preconizadas e permito-me, Sr. Presidente, solicitar para Évora a atenção das autoridades competentes.
Passarei agora, Sr. Presidente, ao planeamento regional, referindo-me, particularmente, à região que tem Évora como capital. E sabido que esta zona é eminentemente agrícola e com uma agricultura de sequeiro com poucas manchas de regadio, ainda na fase incipiente. Importa, pois, que a actividade a exercer pelo III Plano de Fomento incida, particularmente, na transformação das estruturas agrárias no sentido mais conveniente à elevação dos índices económicos das gentes da região. Sei que as mais recentes tendências são pela aplicação de fundos com vista a uma mais imediata rentabilidade. Esta política, sem dúvida realística, não é a que melhor serve os interesses dos distritos do Sul do País.
Os investimentos na causa do regadio são vultosos e, só a longo prazo, passivos de rentabilidade. Não podemos, contudo, aceitar que se enverede pelo caminho do estagnamento neste capítulo. O III Plano de Fomento não é, forçoso é dizê-lo, de largas visões quanto à região que tem Évora como pólo de atracção.
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Não nos faltem, pois, com os meios que só uma política geral, planificada, pode trazer, para que possamos ser uma realidade no conjunto deste III Plano de Fomento. Importamos carne que podemos produzir; importamos manteiga que podemos produzir; importamos leite que podemos produzir; importamos cereais que podemos produzir ... Pois bem ... Vamos produzi-los. Que as realidades deste Plano de Fomento nos facultem os meios já solicitados, e nós, os do Alentejo, como sempre, saberemos cumprir.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Uma palavra ainda, Sr. Presidente, sobre algumas generalidades da industrialização que é requerida, direi mesmo, justamente requerida, no Plano de Fomento em discussão nesta Câmara.
Revê-se, sem sombra de dúvida, o crescimento económico do País nos últimos lustros no desenvolvimento industrial. Contudo, esse desenvolvimento não tem sido fácil, nem isento, para muitos, de sérios riscos. A industrialização tem sido fracamente apoiada com uma política de crédito a longo prazo e baixo custo. A tributação, especialmente a chamada tributação social -caixas de previdência e Fundo de Desemprego -, não é suave, nem. muitas vezes, eficiente no sentido de ajuda à indústria. Ela e o comércio têm pago taxas - o Desemprego, por exemplo- que têm altamente beneficiado um sector que não paga essa taxa - o agrícola.
Como tenho em preparação uma intervenção sobre uma actividade industrial, reservo-me, Sr. Presidente, para então dizer, em pormenor, das vicissitudes de um, e, o mesmo é dizer, de todas as indústrias. Por hoje. basta que refira o meu apoio ao sentido de incentivo que, no III Plano de Fomento, é dado à industrialização. Esta, porém, tem como necessidade básica o sector dos transportes, e, aqui, Sr. Presidente, quero referir que estes não se têm conjurado às prementes necessidades da indústria; são caros e pouco eficientes.
O caminho de ferro tem uma rede de malha muito larga, é moroso e só serve como recurso, o que é lamentável. Quanto à camionagem tem que ser encarada sob os seus dois aspectos básicos: primeiro, a de aluguer, cara e nem sempre à disposição; segundo, a particular, que vive sob a asfixia dos impostos que a condenam sem remissão a uma morte certa, se for honesta. O imposto pago por raios de circulação e por períodos de utilização fixos, o trimestre, tem de ser substituído, com urgência, por imposto pago por litro de combustível consumido. Só este é justo e devido.
Apenas mais uma breve referência agora, Sr. Presidente, reportando-me ao sector comercial. E evidente, e prejudicial para todos, a pulverização que existe nas unidades comerciais, nomeadamente nas do comércio de víveres. É quase um quadro caricatural do que seja comércio a visão que se tem ao observar uma mercearia de aldeia, e esta, algumas vezes, ainda é superior a uma sua congénere de bairro. Há um sentido e desordem, de insuficiência, de desarranjo orgânico e, vamos lá, de higienização. Como é diferente este estabelecimento de outro baseado numa cadeia voluntária de armazenistas e retalhistas 1 O que vive no regime a que chamarei «convencional» é uma amálgama que vacila entre o interesse do empresário e os interesses dos fregueses. O que está baseado numa rede de armazenistas-retalhistas é apoiado por uma organização que está em constante evolução comercial. O primeiro vive mal ..., serve mal ... e acaba mal.
O segundo vive regularmente ..., serve bem ... - e acaba bem.
Não há que hesitar ... O Governo tem que incentivar o segundo. Onde ele existe sente-se a presença de uma organização válida ao serviço do bem comum. Há produtos seleccionados, há quantidades exactas, há contas certas e, lá diz o velho rifão, onde há boas contas, há bons amigos. Não é de menosprezar também a argumentação de que o aderente de uma cadeia voluntária de
armazenistas-retalhistas se controla, sob o ponto de vista fiscal, com mais facilidade e mais verdade. Creio, e decerto todos comigo, que nos interessam menos comerciantes, mas válidos, que mais em situação precária.
As cadeias voluntárias, e espero que o Governo active o aparecimento de várias, só servem em benefício do público, tanto em preços como em qualidade. Eu sei que esta norma, de aspecto mais recente, de comerciar tem os seus inimigos mas também sei que jamais houve inovações sem reacção. Bem haja o III Plano de Fomento por haver considerado este valioso auxílio ao consumidor.
Vou terminar, Sr. Presidente, com uma referência, inversamente proporcional ao valor do assunto, sobre o problema do ensino.
E de todos sabido que o mais rentável dos investimentos é feito através do ensino. O capital aqui investido rende., rende prodigiosamente. Consoladoramente verifico, Sr. Presidente, que o III Plano de Fomento considera, e considera com alguma largueza, este sector da actividade nacional.
As programações são vastas e nelas não me deterei. Uma simples lembrança para o que mais importa na minha região: a criação dos institutos comercial e industrial em Évora, já superiormente solicitados e aguardando despacho de S. Ex.ª o Ministro da Educação Nacional, que certamente quererá ligar o seu prestigioso nome a esta iniciativa e, mais ainda, o restauro, em Évora, da sua Universidade.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Tito Lívio Feijóo: - Sr. Presidente: As minhas primeiras palavras são de manifesta satisfação por verificar que, & despeito dos vultosos gastos, a partir de 1961, com a guerra que nos foi imposta, vem o Governo prosseguindo -, sem quaisquer soluções de continuidade, no desenvolvimento económico do País, dentro de uma orientação traçada em 1935, com a chamada Lei de Reconstituição Económica -, e em sequência da qual foram gizados o I e o II Planos de Fomento e o Intercalar, que, no seu conjunto, serviram de prospectores para o III, que brevemente começará a ser executado.
Conforme se diz na introdução geral do projecto do Plano de que nos estamos ocupando, «um pensamento constante tem dominado toda a política do planeamento português - o de orientar os recursos da Nação no sentido do seu melhor aproveitamento, em ordem a aumentar progressivamente a riqueza comum e, com ela, o nível de vida de todos os portugueses». E de facto o que, a nosso ver, se verifica a cada passo do exame atento do projecto, quer de uma forma genérica, quer mesmo no pormenor da sua concepção, aliás, imbuída de absoluto realismo das circunstâncias que nos rodeiam, incluindo a da manutenção de grandes contingentes militares em África, cujos gastos, graças ao desenrolar favorável do nosso problema financeiro, foram, no entanto,
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amplamente ultrapassados pelo excedente das receitas ordinárias sobre as despesas da mesma natureza, que, na gerência de 1966, atingiu a alta cifra de
5 356 500 contos, conforme se indica no bem elaborado relatório da Conta Geral do Estado respeitante àquele ano.
Neste III Plano de Fomento aparece, com especial relevância, a intenção de, gradualmente, numa evolução bem alicerçada, nos aproximarmos, tanto quanto possível, da formação de uma autêntica economia nacional, onde os nossos problemas económicos, tanto no continente e ilhas como no ultramar, sejam equacionados de forma a satisfazerem, não os interesses meramente regionais, mas sim às solicitações que digam respeito a todo o espaço português.
Tal como diz o Governo, «o Plano irá funcionar como instrumento de realização da política de unidade económica nacional em que o País está empenhado, mas, acima desta finalidade, o processo de desenvolvimento económico e social planeado e a própria integração económica nacional não constituem, em si mesmos, objectivos últimos do planeamento, mas sim simples meios para a consecução de fins mais altos - de ordem espiritual -, que podem consubstanciar-se na progressiva elevação e dignificação da pessoa humana, dentro da comunidade portuguesa».
Estabelece o Plano, como grandes objectivos a atingir, tendo em vista os problemas políticos, sociais e económicos decorrentes em todo o território nacional:
1.º A aceleração do ritmo de acréscimo do produto nacional;
2.º À repartição mais equitativa dos rendimentos;
3.º A correcção progressiva dos desequilíbrios regionais de desenvolvimento.
Para que o Plano atinja os objectivos indicados, terá o Governo de, tal como se indica na base IV do projecto de proposta de lei, assegurar a coordenação com o esforço de defesa da integridade nacional, a manutenção da estabilidade financeira interna e da solvabilidade externa da moeda, o equilíbrio do mercado do emprego e, finalmente, a adaptação gradual da economia portuguesa aos condicionalismos decorrentes da sua integração em espaços económicos mais vastos.
Considera o III Plano de Fomento um investimento global, no sexénio de 1968-1973, de 167 530 000 contos, dos quais 123 050 000 serão aplicados no continente e ilhas adjacentes e 44 480 000 nas nossas províncias ultramarinas.
O investimento de 123 milhões de contos -números redondos - que se prevê para o continente e ilhas é 80 por cento superior àquele que foi atribuído no Plano Intercalar (multiplicado por 2 para efeitos de comparação). Em relação às províncias ultramarinas, direi que os 44 480 000 contos previstos para os investimentos apresentam um aumento de 54 por cento relativamente ao mesmo Plano.
No que diz respeito ao continente e ilhas, o sector público contribuirá com 30 por cento do valor dos empreendimentos, conforme, aliás, já tinha acontecido no Plano Intercalar, ao passo que para o ultramar está previsto que, do referido valor, 36 por cento serão provenientes do mesmo sector.
Os vários oradores que me antecederam, alguns verdadeiros especialistas na matéria, fizeram já desta tribuna, e com muito brilho, pertinentes considerações, quer sobre a linha de orientação seguida na concepção do Plano, quer sobre as suas características gerais e seus objectivos, quer ainda acerca dos problemas emergentes da sua próxima execução, e daí, não por comodismo, mas apenas porque, conscientemente, entendo que nada mais poderei acrescentar de útil a tão judiciosas considerações gerais, passarei a abordar o caso específico de Cabo Verde, de que, aliás, já me ocupei na minha qualidade de relator do III Plano de Fomento para as províncias de governo simples na Comissão Eventual, para que V. Ex.ª, Sr. Presidente, se dignou nomear-me, o que muito me sensibilizou.
Os investimentos realizados em Cabo Verde durante a vigência do I e II Planos de Fomento cifraram-se em 470 685 contos, sendo de notar que nos dois Planos a programação inicial totalizava apenas 347 000 contos. A província gastou, mercê de um oportuno ajustamento da dotação do II Plano, mais 123 685 contos do que o que inicialmente havia sido fixado.
Enquanto no I Plano os 137 000 contos previstos para o financiamento foram integralmente postos à disposição da província, no II, dos 475 759 contos da dotação ajustada, apenas se realizaram coberturas para 377 661 contos, todavia importância substancialmente superior àquela fixada inicialmente, quando se aprovou a programação do II Plano.
O financiamento em ambos os Planos foi exclusivamente de origem externa, o que, aliás, se compreende, dada a fraca armadura económico-financeira de Cabo Verde. Enquanto no I Plano ele foi feito totalmente pela metrópole, no II houve outro financiamento externo resultante da transferência, a favor da província, dos saldos então verificados nos planos de Macau e Timor.
Resumidamente, podemos dizer que da execução do I Plano de Fomento resultou, na província, a seguinte evolução: o produto interno bruto (aos preços correntes) passou de 426 700 contos em 1953 para 520 000 contos em 1958, tendo dado, portanto, lugar a um aumento de 21,9 por cento, e a taxa média acumulada - foi de 3^6 por cento.
O rendimento nacional, aos preços correntes, passou de 412 800 contos em 1953 para 514 500 contos em 1958.
Houve, portanto, um aumento de 24,6 por cento, e a taxa média acumulada foi de 4,5 por cento.
As capitações do produto interno bruto e do rendimento nacional eram, em 1953, de 93 e 89 dólares, respectivamente, e passaram, em 1958, para 97 e 95 dólares.
Em relação ao II Plano de Fomento, a evolução verificada foi a seguinte: o produto interno bruto passou de 520 000 contos em 1958 para 634 700 contos em 1963, tendo havido, pois, um aumento de 22,1 por cento e a taxa média anual acumulada foi de 4,1 por cento.
O rendimento nacional, por sua vez, passou de 514 500 contos em 1958 para 614 500 contos em 1963, tendo-se verificado um aumento de 19,4 por cento, e a taxa média anual acumulada foi de 3,7 por cento.
As capitações do produto interno bruto e do rendimento nacional, que em 1958 eram, respectivamente, de 97 e 95 dólares, passaram em 1963 para 102 e 103 dólares.
Pelos números que acabei de indicar conclui-se que em 1963 os valores do produto interno bruto e do produto nacional eram baixíssimos na província. Também se verifica a lentidão do ritmo médio de crescimento anual e se verifica que as capitações, estando longe de atingirem o nível desejado, apresentam em Cabo Verde os mais baixos valores de todo o território português, com excepção de Timor.
Em relação ao Plano Intercalar, em vigor desde 1965, e cujos investimentos programados deverão atingir os 500 000 contos, nada, por ora, se poderá afirmar quanto à evolução económica a que á sua execução terá dado lugar, em virtude da manifesta falta de elementos de consulta
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que possibilitem uma análise dos resultados obtidos. Estou certo de que da sua integral execução advirão, proporcionalmente, maiores progressos no desenvolvimento económico da província do que os acusados depois da realização dos dois primeiros Planos de Fomento, dado que, entre o mais, na sua programação já se pôde contar com a experiência colhida dos anteriores planeamentos, com elementos estatísticos mais seguros, com dirigentes mais aptos e tecnicamente mais integrados no condicionalismo sócio-económico do arquipélago, com operários mais treinados e mais produtivos e com um ambiente psicológico mais propício, dada a circunstância de, durante o seu decurso, não se terem verificado em Cabo Verde quaisquer crises económicas resultantes das estiagens que, mais ou menos ciclicamente, costumam assolar o território.
Além das indicadas circunstâncias francamente favoráveis, há a acrescentar uma melhor estruturação, operada nestes três últimos anos, em alguns dos serviços, provinciais que mais directamente têm a seu cargo a execução ou a fiscalização dos trabalhos do Plano Intercalar, nomeadamente o das obras públicas e transportes, que passou, pela nova orgânica, a abranger, tanto a Brigada de Estudos e Construção de Obras Hidráulicas como a Brigada de Estradas, com manifestas vantagens, que imediatamente se fizeram sentir, quer do ponto de vista do rendimento do pessoal, quer em relação à assistência técnica, quer ainda no que respeita à compressão das despesas gerais.
A criação da Brigada de Fomento Agrário, em substituição da antiga Brigada de Melhoramentos Agrícolas, Silvícolas e Pecuários, com uma estrutura mais realisticamente adaptada às condições específicas da agricultura cabo-verdiana, veio também contribuir relevantemente para uma maior e mais directa actuação no sector do fomento dos recursos agro-silvo-pastoris, com resultados francamente positivos e jamais obtidos, tanto no I como no II Plano de Fomento.
Também não se poderá negar que na execução do Plano Intercalar se tivesse beneficiado de certas infra-estruturas, infelizmente poucas e que, à excepção das obras portuárias de S. Vicente e do Porto Novo, não corresponderam totalmente, nem ao valor dos investimentos feitos, nem aos resultados que delas eram esperados. Todavia, é de justiça realçar que nos dois últimos anos de execução do II Plano já se realizaram importantes trabalhos de infra-estruturas e que tiveram continuidade no decorrente Plano Intercalar, sobretudo no capítulo de estradas, melhoramentos locais, educação e saúde, que corresponderam, sem dúvida, ao valor dos investimentos feitos e cujos resultados muito mais se aproximaram dos objectivos visados.
Entre as infra-estruturas ultimamente referidas, são de salientar, no capítulo de comunicações rodoviárias, a estrada da Corda, na ilha de Santo Antão, a mais difícil obra rodoviária construída até hoje em Cabo Verde, e que liga o Porto Novo aos centros produtores de banana da ilha, a reconstrução e calcetamento da estrada que, na ilha do Fogo, liga a cidade de S. Filipe e o porto do Vale de Cavaleiros à povoação dos Mosteiros (importante centro produtor de café), as correcções de traçado e o calcetamento da estrada que liga o porto da Praia ao principal centro produtor de banana da ilha de Santiago, a construção e calcetamento da estrada de acesso ao aeródromo da capital da província, as correcções de traçado e o calcetamento da estrada que liga o aeródromo de S. Pedro à cidade do Mindelo, na ilha de S. Vicente, a estrada que, na ilha Brava, liga a vila de Nova Sintra ao Mato Grande, etc.
No sector da hidráulica há a salientar as obras de correcção torrencial realizadas, especialmente nestes últimos anos, nomeadamente cerca de vinte diques, de maior ou menor importância, construídos na ilha de Santiago (nas bacias hidrográficas das ribeiras de S. Filipe e dos Órgãos) e na ilha Brava e os recentes trabalhos de regularização das margens da ribeira da Torre e da ribeira Grande, na ilha de Santo Antão.
Igualmente a considerar, como importante infra-estrutura, a construção do porto do Vale de Cavaleiros, na ilha do Fogo, cuja 1.º fase deverá ficar concluída dentro de dois ou três meses e que é, sem dúvida, a maior obra até hoje lá realizada e uma das maiores de todo o arquipélago e que irá desempenhar importantíssimo papel no desenvolvimento económico da ilha nos seus variados aspectos, sem esquecer, por exemplo, a grande contribuição que irá dar ao fomento do turismo.
É ainda de assinalar, dentro da vigência do Plano Intercalar, a conclusão das pistas para aviões a jacto no aeroporto internacional de Espargos, na ilha do Sal, e a construção das respectivas instalações complementares, o prolongamento da faixa asfaltada na pista do aeródromo de S. Pedro e a conclusão da respectiva aero-gare, a consolidação das pistas de aterragem nas ilhas de S. Nicolau, Boavista e Maio e a conclusão da aero-gare da cidade da Praia.
Praticamente, Sr. Presidente e Srs. Deputados, foram concretizados na província, até à data, quase todos os empreendimentos previstos nos programas sectoriais do decorrente Plano Intercalar, nomeadamente, e além do mais, o abastecimento de energia eléctrica à cidade de S. Filipe e às vilas do Tarrafal e de Nova Sintra, a cobertura escolar, mediante a construção e apetrechamento de dezenas de escolas, a construção e apetrechamento do novo edifício do Liceu de S. Vicente, a ampliação e apetrechamento complementar do Liceu da Praia e da Escola Técnica do Mindelo, etc.
Ainda em relação ao sector da educação, também o programa se viu integralmente cumprido no que respeita à manutenção de dezenas de escolas particulares subsidiadas e ao prosseguimento de uma intensa campanha de educação de adultos, que, em alguns concelhos, já produziu resultados bastante significativos.
No sector da saúde, foi sem dúvida relevante a actuação do Plano Intercalar. Além do prosseguimento da campanha para a erradicação do paludismo, realizaram-se todas as outras programadas, nomeadamente contra a tuberculose, a lepra, a ancilostomíase, contra certas micoses, etc., em muitos casos com resultados verdadeiramente espectaculares. Neste sector, há também que referir as construções hospitalares e afins realizadas durante este último triénio. Entre o mais, são de registar a remodelação da quarta enfermaria do Hospital da Praia e a instalação nele de enfermarias de obstetrícia e de ginecologia, até então inexistentes, a construção de uma capela e de uma residência para as irmãs da Congregação do Espírito Santo que prestam serviço no mesmo Hospital, onde também foi remodelado o pavilhão de cirurgia e instalado um pavilhão para doentes infecto-contagiosos. Ainda a considerar a instalação, também no Hospital da Praia, de uma enfermaria de pediatria e, finalmente, a construção de um serviço de banco no Hospital do Fogo.
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De facto assim é. Se, por um lado, não são conhecidas, pelo menos por ora, quaisquer potencialidades do subsolo, por outro lado, reconhece-se que as condições hidrológicas, climatéricas e fisiográficas das diferentes ilhas condicionam grandemente a agricultura, que, no entanto, é, apesar de tudo, a actividade mais importante da província. Quanto às fontes potenciais de energia, apenas se poderá contar com aquelas provenientes do sol e do vento, praticamente inexploradas no arquipélago, a despeito das grandes possibilidades do seu aproveitamento em todas as ilhas. - São, para já, factores francamente positivos a considerar no desenvolvimento económico de Cabo Verde as boas condições naturais para o desenvolvimento da pesca, tanto industrial como artesanal, e para a instalação da rendosa indústria do turismo.
Conta a província com uma laboriosa população, que, devido às constantes crises, aliadas a um movimento emigratório bastante irregular, apresentou, até 1955, acentuadas oscilações, e que só a partir dessa data passou a caracterizar-se por um aumento rápido e regular. É ela hoje constituída por 236 000 habitantes, segundo consta de estimativa que tive ocasião de verificar e me merece toda a confiança.
A economia da província é, sem dúvida, nitidamente de subsistência, cujos fluxos, segundo se frisa no projecto do Governo, absorvem cerca de 50 por cento do rendimento provincial.
As despesas de consumo das famílias representam 98,3 por cento do total das despesas de consumo privado, ficando apenas 1,7 por cento para as despesas de consumo dos organismos privados sem fins lucrativos. Dentro das despesas de consumo das famílias, aparece, como componente mais importante, o que respeita aos géneros alimentícios, que em 1953 correspondia a 49,7 por cento das referidas despesas e que em 1963 passou a representar 55,3 por cento.
Em Cabo Verde há um constante aumento do volume das importações, ao passo que as exportações mantêm, de há longos anos, sensivelmente os mesmos níveis, aliás baixíssimos.
As exportações feitas em 1965 atingiram apenas cerca de 28000 contos, enquanto as importações, os 228 000 contos.
O déficit da balança comercial continua a aumentar. Em 1953 era de 55 000 contos e em 1965 já atingia os 200 300 contos. Infelizmente, não vemos, pelo menos por agora, grandes perspectivas quanto ao aumento das exportações, a não ser quanto à banana, às pozolanas e ao pescado e seus derivados.
Tendo em vista os factores físicos do território, o volume, qualidade e curva de crescimento da população e a evolução económica que se vem processando na província depois da execução das anteriores planificações, definiram-se para Cabo Verde os seguintes objectivos fundamentais a alcançar com o III Plano de Fomento:
a) Actuação prioritária nos sectores da pesca e agricultura, esta tendo simultaneamente em conta as necessidades de alimentação da população e a possibilidade de uma reconversão da produção para os mercados externos;
b) Criação de novos empregos - entre 23 000 a 26 000 - nos sectores da pesca, da indústria, e de outros serviços não domésticos ligados aos transportes, serviços públicos e turismo, sendo os criados na agricultura absorvidos pela mão-de-obra subempregada.
Concordo plenamente com a prioridade que se estabelece para a pesca e para a agricultura e que a esta se lenha atribuído, e muito bem, um primeiro objectivo dirigido para a alimentação da população e um outro no sentido de uma reconversão da produção para os mercados externos. Evidentemente que só se poderá pensar na reconversão desde que a agricultura em Cabo Verde deixe de estar tão sujeita às condições pluviométricas, como hoje acontece.
Dentro do condicionalismo que a Natureza impôs à vida daquelas ilhas, a melhoria das condições da exploração agro-pecuária só se poderá concretizar através de uma integral adaptação ao regadio de toda a terra que para isso tenha aptidão. E confrangedor saber-se que em todo o arquipélago só existem, para uma superfície total com aptidão agrícola de 55 000 ha, manchas de regadio que nem sequer atingem os 1400 ha. Sem a intensificação das culturas, através do alargamento das áreas regadas, não é possível a reconversão para produtos mais ricos e destinados à exportação. Toda a gente reconhece as manifestas vantagens da reconversão que se pretende, como ninguém também desconhece os defeitos da monocultura nos seus variados aspectos, nomeadamente no que se refere aos riscos da exploração. Todavia, não podemos perder de vista que a reconversão, pela sua própria natureza, é um processo moroso, com implicações sócio-económicas de vária ordem e que terão de ser pesadas uma a uma, sob pena de as soluções escolhidas não serem as que melhor satisfaçam aos objectivos em vista. Há, pois, que agir, logo nos primeiros passos da reconversão, com todo o cuidado, na devida oportunidade e com absoluta garantia de sucesso, de forma a propiciar um ambiente psicológico favorável ao seu prosseguimento.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Os autores da parte do Plano respeitante à província não têm de facto a ilusão de que, à custa da intensificação cultural e do alargamento da área de regadio, se conseguirá eliminar integralmente o desemprego verificado no sector da agricultura. Justamente por não terem essa ilusão, sugerem, sensatamente, a conveniência de, desde já, serem considerados novos empregos que a agricultura por ora não comporta nas suas actividades produtivas. Sendo assim, entendem, e bem, que, enquanto os sectores não agrícolas se preparam para absorver a parcela da população válida que o crescimento demográfico coloca todos os anos no mercado do trabalho, poderá utilizar-se a mão-de-obra agrícola subempregada na construção de grande parte do capital fixo necessário ao desenvolvimento da produção agrícola, nomeadamente nas surribas, despedregas, socalcos e outras infra-estruturas.
A agricultura continua a ser a principal actividade - económica de Cabo Verde e, com todas as suas contingências, é ela ainda hoje que mantém 70 por cento da população cabo-verdiana, e por isso me parece que a verba que lhe está atribuída deveria ser mais substancial, como, aliás, sugere a Câmara Corporativa. Para um valor global de 988 189 contos atribuídos a Cabo Verde, apenas 84 150 se destinam à agricultura, silvicultura e pecuária, o que coloca o sector em quarto lugar quanto ao valor dos investimentos previstos.
Não desconheço que, na actualidade, a agricultura das ilhas não tem conseguido níveis de produção compatíveis com as necessidades de abastecimento da população em produtos alimentares. Por outro lado, as exportações, conforme já tive ocasião de hoje aqui referir, são francamente insignificantes e a sua evolução, como então mostrei, é praticamente nula. Desde 1958 até agora, em re-
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lação aos produtos agrícolas; apenas a exportação da banana evoluiu progressivamente. Penso, no entanto, que ainda hoje a província não exporta mais de 6000 t, provavelmente 40 001 oriundas de Santo Antão e as restantes 2000 t de Santiago. O fomento da cultura da banana é um dos objectivos do Plano. A banana exportada por Cabo Verde destina-se exclusivamente à metrópole, cujo consumo se situa entre 30 000 t e 35 000 t, na sua maior parte proveniente da Madeira. Todavia, estou certo de que o consumo da banana na metrópole tende a aumentar, dado não só o facto de a fraca capitação presente - ter tendência para melhorar, acompanhando o aumento do poder de compra que dia a dia se vai verificando, como ainda em consequência do forte ritmo de crescimento da população. Por outro lado, também acredito que, no futuro, poderá a nossa banana ser exportada para os inúmeros mercados da Europa que compram anualmente- vultosas quantidades aos mais diversos países. Só a Alemanha Federal importou, por exemplo, em 1962, cerca de 470 000 t de banana, das quais mais de 200 000 t do Equador.
Embora reconheça não ser fácil, como disse, a progressiva transformação de boa parte da agricultura cabo-verdiana em agricultura de mercado, por via da reconversão, lembro, no entanto, que alguns factores poderão contribuir para que a evolução se processe dentro de certo ritmo e em condições aceitáveis. Dispõe o Governo de variadíssimos meios susceptíveis de estimular os agricultores a adoptarem a almejada reconversão, quer instituindo, por exemplo, prémios de produção para produtos de exportação, quer estabelecendo isenções ou protecções fiscais, etc.
A promulgação, em 15 de Novembro do ano findo, do Decreto n.º 47 713, sobre arrendamento rural e parceria agrícola em Cabo Verde, de que já me ocupei nesta Assembleia, foi indiscutivelmente um grande passo em frente na melhoria da estrutura agrária do arquipélago. Sei que o decreto, depois de regulamentado na província, já se encontra em plena execução, e estou certo de que o novo regime que ele instituiu facilitará grandemente a execução dos empreendimentos previstos no III Plano de Fomento para o sector da agricultura.
Concordo com o que diz o Governo quanto, ao fomento florestal. De facto, tal como se frisa no projecto, na província ele só é possível, «sem necessidade de recurso a processos proibitivos», em certas localizações das ilhas de maior altitude. É uma verdade que evidencia manifesto estudo e meditação sobre o problema da arborização do arquipélago. Todavia, não se deverá perder de vista que, em muitas circunstâncias e para muitas zonas, há necessidade premente de se tentar o povoamento florestal, mesmo recorrendo a processos pouco económicos, desde que se tenha um mínimo de garantia quanto ao êxito do empreendimento e a certeza de que não faltarão meios técnicos e financeiros para a manutenção das manchas arbóreas obtidas.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - O problema da defesa do património florestal da província necessita de ser encarado com objectividade, sob pena de continuarmos a caminhar nitidamente para a desertificação do arquipélago. Acerca da manifesta degradação que dia a dia se vai verificando na cobertura vegetal, por exemplo, da ilha de Santiago, diz o professor Ilídio do Amaral:
... Homens e animais muito têm contribuído para a alteração profunda do equilíbrio original entre os diversos tipos de vegetação que povoam as ilhas, pela necessidade de abertura de campos de cultura e de alimentação de gado; a par disso, a prática da derruba, para obtenção de combustível - lenha - e de materiais de construção, tem desenvolvido aspectos de degradação extrema, que se reflectem na destruição dos solos e transformação rápida das condições hidrológicas. A simples estimativa das necessidades domésticas do consumo de lenha da população actual de Santiago, sem entrar em linha de conta com os acréscimos provenientes de certas actividades, como, por exemplo, as de tipo industrial, revela um . número excessivamente elevado, para cima de 64 000 I por ano, só por si um perfeito testemunho do que tem sido a destruição da escassa reserva florestal da ilha.
O que se passa sobre o consumo da lenha em relação à ilha de Santiago aplica-se, nas devidas proporções, a todas as ilhas do arquipélago que têm feição agrícola. Neste capítulo da defesa da cobertura florestal, têm os Serviços de Agricultura um longo caminho a percorrer, e há que começar quanto antes. Torna-se necessário adoptar providências que permitam a utilização, em boas condições económicas, de outras fontes de energia. Penso que, para já, se deveria proibir o uso. da lenha em toda e qualquer indústria como fonte de energia e fazer cessar imediatamente a sua utilização como combustível em todos os departamentos do Estado e dos corpos e corporações administrativos da província. Quantas árvores se poupariam, Sr. Presidente e Srs. Deputados, com esta medida.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Dispõe a província de grandes zonas que, sendo impróprias para o desenvolvimento da agricultura, se prestam, no entanto, ao estabelecimento da exploração de gado. Todavia, há que vencer, antes de mais, certos factores negativos que têm obstado a que a pecuária assuma na província a proeminência que é de desejar. De resto, é o que se propõe fazer no próximo Plano de Fomento, que consagra, dentro do sector da agricultura,, silvicultura e pecuária, cujo investimento será de 84 500 contos, a verba de 44 750 contos para o fomento dos recursos agro-silvo-pastoris, a de ,27 400 contos para. os esquemas de regadio e povoamento e, finalmente, a de 12 000 contos para o crédito agrícola.
Entende a Câmara. Corporativa que o projecto apresenta uma demasiada pulverização de meios e objectivos noa empreendimentos indicados no subsector do fomento dos recursos agro-silvo-pastoris e diz se não seria mais realista e vantajoso tentar fazer uma selecção e concentração de objectivos a atingir, para que, ao fim dos seis anos da execução do Plano, ficasse, de pé alguma coisa de valioso para- a economia de Cabo Verde. É uma alternativa que poderá servir, pelo menos, para meditação antes de serem tomadas as medidas definitivas.
Ao fomento cafeícola atribui o Plano - a verba de 17 500 contos, a mais -vultosa- de todo o subsector. Deve ter havido lapso ao indicar-se no- projecto que a actual, produção cafeícola da província anda à roda de 785 t por ano. Penso que ela não execederá - as 850 t. De resto, para admitirmos aquele número, teríamos de concluir que, presentemente, cada um dos 840 000 cafeeiros em produção dá, em média, 930 g de café por ano, o que, dado o actual estado vegetativo e sanitário dos cafezais de Cabo Verde, não corresponde à realidade. Penso ter havido um lapso tipográfico que justamente denuncio para que não apareça na redacção definitiva.
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Entende a Câmara Corporativa que a verba de 2200 contos votada aos trabalhos de conservação da água e do solo é demasiado diminuta em relação aos graves problemas de erosão existentes em toda a província, os quais têm tendência a agravar-se, e sugere que ela seja elevada para 6 000 contos. Já me referi nesta Assembleia, numa das minhas intervenções, ao gravíssimo aspecto de que se reveste o problema da erosão nas ilhas de Cabo Verde, e nessa altura manifestei a esse respeito as minhas justificadas apreensões, pelo que dou a minha absoluta concordância à sugestão.
Em razão do tempo, que, nos termos regimentais, não poderei exceder, não me é possível sequer abordar ao de- leve todos os programas sectoriais do Plano. Daí a razão por que, quanto ao sector da pesca, sem dúvida dos mais importantes, hoje nada direi, preferindo dele tratar oportunamente e com a profundidade que estiver ao alcance dos meus conhecimentos. No entanto, como simples esclarecimento, direi que ao sector foram consignados 246 690 contos. É de notar que os investimentos que nele vão ser feitos provêm, em grande parte, de entidades privadas, que comparticipam com 225 490 contos. E a primeira vez, julgo eu, que o Estado não cobre integralmente todos os investimentos do Plano de Fomento em relação à província de Cabo Verde.
Nas indústrias extractivas são de apontar as pozolanas, o calcário e o sal, para o fomento dos quais se atribui a verba de 2000 contos, e o aproveitamento dos meios de obtenção de água doce, para o qual se considerou a importância de 8000 contos. Quanto à pozolana, de que já vários Deputados eleitos pelo círculo de Cabo Verde se ocuparam nesta Assembleia, limito-me a manifestar a minha desagradável surpresa por verificar que, tanto o Governo, no seu projecto, como a Câmara Corporativa, nó seu parecer, não fazem a mínima referência a quaisquer medidas que porventura possam ser tomadas para a defender da posição em que se encontra perante as companhas cimenteiras, pela simples razão de não terem, até agora, sido cumpridas as disposições legais que determinam a obrigatoriedade do seu emprego em determinadas obras do Estado. Sem querer .repetir sobre a matéria todas as considerações que já aqui tive ocasião de fazer, quero, no entanto, lembrar mais uma vez que, se a indústria de pozolanas fosse elevada aos índices de produção que representassem o integral cumprimento das determinações legais sobre a aplicação do produto, teríamos produzido e exportado, no ano de 1963 (ano em que a exportação foi mais elevada), não 12 646 t, como aconteceu, mas sim 170 000 t, no valor de 23 000 contos. Se disser a VV. Ex.ªs que a exportação total de Cabo Verde ainda hoje não atinge os 30 000 contos, poderão aquilatar qual a importância relativa que a pozolana podia ter na economia da província.
Quanto às indústrias transformadoras, merece especial interesse o fomento da industrialização da cana sacarina, com vista à obtenção de «aguardente de qualidade», exclusivamente destinada à exportação. Penso que finalmente &e encarou com objectividade o problema do aproveitamento industrial da cana sacarina, que no arquipélago tem sofrido reveses de toda a ordem, e aos quais não me retiro para não me alongar demasiadamente nesta minha intervenção.
A aguardente poderá vir a representar um valor importante na exportação da província, desde que o seu fabrico se faça em unidades industriais convenientemente localizadas e devidamente equipadas e dimensionadas, de molde a que o produto seja tecnologicamente perfeito e firmemente padronizado, condições indispensáveis à conquista e manutenção de mercados de cor sumo e que mais facilmente poderão ser obtidas através de uma cooperativa de produção. O ponto de vista da formação de uma cooperativa está esboçado no projecto.
Ainda no campo das indústrias transformadoras, há também a considerar a importância que poderá vir a ter para a economia da província a fábrica de cimento que a Companhia de Pozolanas de Cabo Verde pretende instalar na ilha do Maio e que, segundo estudos económicos já realizados, será dimensionada para uma produção de 300 000 t anuais. E de realçar o apoio que o Governo vem dando a esta iniciativa, nomeadamente no que se refere à prospecção geológica com vista a um conhecimento mais perfeito das potencialidades, tanto da ilha da Boavista como da do Maio, no que se refere a calcários e arguas. Ao que parece, a empresa que elaborou o estudo técnico e económico da fábrica é também a financiadora, o que, em certa medida, é uma garantia no tocante à viabilidade económica do empreendimento.
Quanto ao sector da energia, é de esclarecer que não existem no arquipélago quaisquer potencialidades no sentido do aproveitamento da energia hidráulica. Todavia, em contrapartida, há enormes possibilidades quanto ao aproveitamento da energia solar e da eólica.
O Eng.º Humberto Fonseca, que de há longos anos vem dedicando todo o seu saber e a sua brilhante inteligência aos mais importantes problemas de Cabo Verde, nomeadamente aos relacionados com a aplicação na província da técnica da provocação da chuva artificial como meio de combate às secas, no seu importante trabalho intitulado «As Fontes de Energia em Cabo Verde. Possibilidades do Seu Aproveitamento na Sua Valorização Económica», apresenta elementos colhidos em determinado local da cidade do Mindelo e pelos quais conclui, em face de cálculos que também apresenta, que, por exemplo, apenas aproveitando r esse local a corrente de nordeste, se poderia ter obtido com um aeromotor nele colocado, de 10 III de raio e 30 por cento de eficiência, uma produção anual de 172 000 kWh.
Ao referir-se, no mesmo trabalho, às possibilidades helioenergéticas de Cabo Verde, diz que os registos actinográficos efectuados durante o ano de 1955 indicam que no arquipélago se observa, por exemplo, em relação a Luanda, a Lourenço Marques ou a Faro, a radiação mais alta e mais bem distribuída ao longo do ano. Acrescenta que no Mindelo a curva anual de radiação oscila entre 12500 calorias por centímetro quadrado, em Janeiro, e 20 000 calorias por centímetro quadrado, em Maio, e indica que na referida cidade, durante o ano de 1955, a radiação total foi de 197 017 X 10 calorias por quilómetro quadrado, ou seja 2289,9 X l0 kWh/km2. Para dar uma ideia concreta - diz ele - da energia que incidiu durante o ano sobre cada quilómetro quadrado, basta dizer que nesse ano a produção total de energia pelas centrais hidroeléctricas da metrópole foi de 1660X10* k\Vh, isto é, 72 por cento daquela.
Verifico, com muita satisfação, a inclusão no III Plano de Fomento de verbas destinadas ao aproveitamento da energia do vento e aos estudos e instalações com vista ao aproveitamento da energia solar na dessalinização da água do mar. E a primeira vez que isto acontece.
Não se poderá dizer que as importâncias votadas para tais empreendimentos -
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o reajustamento do Plano, em razão da evolução que já certamente nessa altura terá sofrido o problema, em todos os seus múltiplos aspectos. Verifico, em relação ao aproveitamento da energia do vento, que o projecto se refere, objectivamente, à - localização de dois aeromotores em S. Vicente (um no Pé de Verde e outro em S. Pedro), um na cidade da Praia e, finalmente, dois no Fogo (um na Praia Ladrão e outro em Nossa Senhora do Socorro). Certamente foram realizados previamente os necessários trabalhos de prospecção, aliás absolutamente indispensáveis a qualquer tomada de posição quanto à localização dos aeromotores. Como no projecto do Plano não se indicam quaisquer pormenores quanto às potencialidades porventura prospectadas nos locais escolhidos, nenhuma opinião objectiva poderei emitir sobre a matéria.
Na electrificação dos diferentes centros populacionais vão ser gastos 19 000 contos e dela beneficiarão as vilas de Maria Pia, da Ribeira Grande, das Pombas, do Porto Novo, da Ribeira Brava, de - Sal-Rei e do Maio. Também estão previstas as ampliações da rede de distribuição de energia da cidade da Praia, com vista à electrificação de bairros suburbanos, da rede da cidade do Mindelo, com vista à electrificação da Baía das Gatas, do aeroporto de S. Pedro e bairros suburbanos e da central e rede de distribuição de S. Filipe, com o objectivo da electrificação da Praia Ladrão e Nossa Senhora do Socorro. Também se prevê a electrificação da povoação de Nossa Senhora do Monte, na ilha Brava.
Nesta questão da electrificação das diferentes vilas e povoações, cujos recursos dos respectivos corpos administrativos, na maior parte das vezes, estão longe de poderem suportar os encargos advenientes de uma assistência técnica adequada, há que ponderar na forma como manter, tanto a rede como a central, em boas condições operativas. O rendimento da exploração, dada, na maior parte dos casos, a sua franciscana modéstia, não atinge jamais níveis que permitam distrair as necessárias verbas essenciais a uma aturada assistência técnica e à formação do um fundo de capitalização destinado à renovação da rede e da central. Por todas estas considerações, aliás resultantes do directo conhecimento que tenho dos problemas a esse respeito já suscitados, ouso apelar para o espírito altamente compreensivo de S. Ex.ª o Governador de Cabo Verde no sentido de serem inscritos anualmente no orçamento geral da província subsídios a todos os corpos administrativos, à excepção dos da Praia, S. Vicente, Fogo e Sal, especificamente destinados à «manutenção da central e da rede de distribuição de energia e à formação de um fundo de reconstituição».
Os substanciais auxílios que o actual Governo de Cabo Verde vem anualmente concedendo a todos os corpos administrativos da província, aliás caso praticamente inédito na governação do arquipélago, encorajam-me a fazer o pedido. Só assim conseguiremos, na realidade, Sr. Presidente e Srs. Deputados, manter a electrificação nas vilas e povoações onde ela for instalada.
Ao sector dos melhoramentos locais e habitação foram atribuídos 120 500 contos, dos quais 42 000 para a habitação e 72 500 para melhoramentos locais. Quanto à habitação, o programa prevê a construção de 900 casas económicas e 240 moradias para funcionários.
Rendo as minhas mais calorosas homenagens ao Governo, por ter resolvi do encarar de frente tão importante problema. Sinto-me deveras satisfeito com esta tomada de posição, e consola-me lembrar que desta tribuna, oportunamente, já havia pedido as necessárias providências para a resolução do problema habitacional, tanto dos funcionários como dos económicamente débeis, sem dúvida um dos maiores problemas sociais de Cabo Verde e que se reveste de especial acuidade nas cidades do Mindelo e da Praia.
Esta política de habitação agora adoptada pelo Governo é tanto mais de louvar quanto é certo que, a despeito de a província já ter recebido da metrópole, para a execução dos anteriores Planos de Fomento, cerca de 1 milhão de contos, até hoje praticamente nada se tinha feito em relação à habitação para funcionários e pouco no que se refere à construção de casas para os económicamente débeis.
Os 72 500 contos para melhoramentos locais destinam-se a obras de abastecimento de água de diversas localidades das ilhas, de harmonia com a inteligente orientação que, a esse respeito, vem sendo seguida, especialmente de há cinco anos a esta parte, pelo Governo da província, bem como aos trabalhos de saneamento nas .cidades da Praia e do Mindelo.
Na rubrica de abastecimento de água figuram 48 500 contos, que são consignados a S. Vicente e que se destinam à instalação de um dessalinizador de água do mar, com o objectivo de satisfazer não só às necessidades da população do Mindelo, como também às da navegação que passa pelo Porto Grande. Trata-se, sem dúvida, de uma obra de grande relevância social e económica, dimensionada para uma produção diária de 2200 m3 de água potável e susceptível de ampliação, por unidade ou unidades adicionais, até uma produção de 3500 m3 em 24 horas. A cidade do Mindelo, que hoje é abastecida de água proveniente da ilha de Santo Antão e que custa 30$ a tonelada, passará, depois de o dessalinizador começar a funcionar, a dispor dela por um preço que oscilará entre 10$ e 12$ a tonelada.
O sector dos transportes e comunicações é de todos o mais beneficiado nas dotações inscritas no III Plano de Fomento para a província. A verba global que lhe é atribuída é de 335 049 contos, sendo 158 000 para os transportes rodoviários, 144 049 para os portos e navegação e, finalmente, 33 000 para transportes aéreos e aeroportos.
Os transportes rodoviários constituem das infra-estruturas mais importantes para o desenvolvimento da agricultura cabo-verdiana, que, apesar de todos os condicionalismos a que está sujeita, continua a ser o sustentáculo da economia do arquipélago.
As ilhas de Santo Antão e de Santiago são especialmente aquelas onde, ainda hoje, apesar de todo o desgaste da erosão, encontramos grandes extensões de terra com aptidão agrícola, sem que no entanto disponham, especialmente a primeira, de uma suficiente rede de estradas que permita a drenagem da respectiva produção agrícola, em boas condições económicas, para os centros de consumo e para os portos de embarque. Há, pois, que dotar estas ilhas, e não só elas, como todas as outras, de uma rede de estradas capaz de satisfazer não só as solicitações de natureza económica, sem esquecer as que dizem respeito à indústria do turismo, mas também a outras que, mais ou menos directamente, visem o bem-estar e a facilidade de deslocação das populações.
Observa a Câmara Corporativa no seu parecer que «durante anos consumiram-se avultadas verbas em trabalhos rodoviários na província, como meio de absorção de mão-de-obra» e acrescenta: «Como medida de emergência no combate às crises, certamente houve para isso plena justificação; mas não posteriormente; ...».
- De facto, na vigência do I e nos primeiros anos do II Plano de Fomento gastaram-se dezenas de milhares de contos com a construção de troços isolados,
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sem obedecerem a qualquer projecto e que, por isso, se mantêm, até hoje, absolutamente inúteis e, na maior parte das vezes, em ruína. Mas não foi só isso; construíram-se também na altura, por exemplo na ilha do Fogo, algumas obras de arte, que, por deficiência dos respectivos projectos ou por defeitos de construção - e para qualquer dos casos não há justificação -, foram
implacàvelmente destruídas às primeiras chuvas, ocasionando prejuízos de mais de um milhar de contos.
ão pretendo fazer quaisquer recriminações, e se deixo aqui este apontamento é apenas para que se não fique com a errónea ideia de que os dinheiros até certa altura aplicados na construção de estradas em Cabo Verde só não foram reprodutivos pela circunstância de terem sido aproveitados, embora em trabalhos de estradas, exclusivamente com o objectivo de absorção da mão-de-obra desempregada.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - A rede rodoviária de Cabo Verde é constituída por 1636 km de estradas, dos quais 818 km dizem respeito a estradas classificadas e, dentro destas, apenas 150 km com pavimentos de calçadas empedradas, feitas, praticamente na sua totalidade, nestes últimos quatro anos.
É de inteira justiça aqui deixar uma palavra de louvor pela forma como o actual Governo de Cabo Verde vem orientando o problema rodoviário da província, aproveitando, na medida do possível, os diferentes troços, susceptíveis de aproveitamento, outrora construídos aqui e acolá, fazendo entre eles as necessárias ligações e, simultaneamente, construindo os respectivos pavimentos empedrados, tudo previamente projectado e em obediência a uma planificação que tem conseguido fazer baixar, de forma apreciável, o custo do quilómetro de estrada construída e, simultaneamente, absorver a mão-de-obra subempregada que vai surgindo.
O projecto do Governo prevê a construção, durante os seis anos da vigência do Plano, de 345 km de estradas, dos quais 163 km pavimentados, e estabelece como prioritárias as que possam permitir o escoamento de zonas de regadio aptas para a cultura de produtos de exportação e as que possam servir zonas susceptíveis de aproveitamento turístico. Penso que o critério das prioridades estabelecidas é o que mais se coaduna com os reais interesses da província.
Vejo com muita satisfação que estão previstas estradas de penetração nos ricos vales de Santo Antão, nomeadamente «no da Graça, no da Ribeira da Cruz e Altomira, regiões com grandes potencialidades, mas que não se têm desenvolvido justamente por falta de estradas de drenagem dos seus produtos. Estará também, certamente, no espírito do Governo a pavimentação da estrada que, na ilha de Santiago, liga a cidade da Praia à vila da Assomada, aliás já pavimentada até S. Domingos, bem como o prosseguimento das correcções de traçado e de pavimentação da estrada que liga a capital da província à vila do Tarrafal, sem esquecer os «muito difíceis» 5 km por construir na estrada que liga a vila de Nova Sintra ao porto da Fajã de Água, e a pavimentação da estrada da Corda na ilha de Santo Antão.
Lembro que é urgente fazer-se a estruturação de um corpo de cantoneiros para a conservação das estradas do arquipélago. Ele já existiu ..., mas, incompreensivelmente, há longos anos que foi extinto, a despeito da sua absoluta necessidade.
O projecto atribui a verba de 59 361 contos para as obras do porto da Praia, cuja caracterização e dimensionamento, conforme diz o parecer da Câmara Corporativa, «estão dependentes, em larga medida, da evolução que tome o sector da pesca e da concretização dos planos da empresa nele interessada». Todavia, a mesma Câmara não deixa de acrescentar que «há necessidade de projectar e construir urgentemente o cais de longo curso, o cais de cabotagem e pequenas instalações de varagem e reparação de embarcações». Não há dúvida de que tais obras acostáveis, absolutamente essenciais à economia da ilha de Santiago, deverão ser consideradas prioritárias, dados os prejuízos que a sua falta vem provocando.
O porto de S. Vicente, entre o mais, irá beneficiar, durante a execução do III Plano, da construção de um complexo para reparações navais dimensionado para as suas reais necessidades. As despesas serão suportadas não só pelo Plano de Fomento, como ainda pelos Ministérios da Defesa e da Marinha. Escuso de enaltecer a projecção que semelhante empreendimento irá ter no progresso do Porto Grande.
Além de outras obras portuárias a realizar no Porto Inglês e nos portos da Furna, da Preguiça e de Sal-Rei, cujo custo total está estimado em 21 220 contos, prevê-se o prosseguimento, numa segunda fase, das do porto do Vale de Cavaleiros, no valor de cerca de 500 contos, e também outras obras e equipamentos para o porto de S. Vicente e para o Porto Novo, no valor, respectivamente, de 13 045 contos e 1490 contos.
Conforme já hoje tive ocasião de dizer, o fomento do turismo é um dos objectivos do Plano. Encontramos para o efeito na província condições naturais que encorajam os empreendimentos neste sector. Não só as óptimas características do clima, como o absoluto sossego que se desfruta em qualquer ponto do território e que tão convidativo é ao repouso do espírito, como a existência de magníficas e extensas praias de areias limpíssimas, onde o sol praticamente aparece em todos os dias do ano, as excepcionais condições existentes para a pesca submarina, para o esqui aquático e, de uma maneira geral, para todos os desportos náuticos, e ainda o próprio aspecto paisagístico, são factores positivos que revelam as potencialidades do arquipélago para a actividade turística.
Já alguns grupos estrangeiros se têm interessado pelo turismo cabo-verdiano. Concretamente, posso informar, em face de notícias que há dias me chegaram às mãos, que o grupo alemão da Sudflug, que tem como objectivo o turismo na ilha da Boavista, encontra-se na província há cerca de vinte dias, a fim de iniciar os trabalhos de prospecção que virão a constituir as bases de um projecto que, entre o mais, prevê a construção na referida ilha de um hotel dimensionado para 250 hóspedes. Também é de salientar a iniciativa do casal belga Vynckier, verdadeiros precursores do turismo na ilha do Sal, onde já construíram uma pequena pousada, aliás muito cómoda e funcional, e que, segundo as mesmas notícias, projectam construir, provavelmente em Santa Maria - onde o Governo de Cabo Verde já lhes concedeu o necessário terreno -, um hotel, piscinas, um casino, um cinema e um dessalinizador de água do mar com a capacidade para produzir 500 m3 de água potável por dia.
Há todo o interesse em acarinhar tais iniciativas, dado que o turismo poderá vir a representar para Cabo Verde Uma forte alavanca de progresso. Há que fazer um inventário das potencialidades existentes e, em face dele, planear com objectividade e executar com urgência, a começar pelas infra-estruturas que, pela sua natureza, mais poderão condicionar a actividade turística, nomeadamente aquelas que dizem respeito à construção de estra-
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das, saneamento, abastecimento dó água e de energia eléctrica, etc., sem esquecer a remodelação dos serviços de turismo, que deverão ser colocados ao nível da alta função que lhes está reservada.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Para já, deverão ser estimuladas todas as iniciativas privadas atinentes à criação de uma rede de ocupação hoteleira em todo o arquipélago. A este respeito, estou a lembrar, neste momento, o apoio que a província deverá dar, quer sob o ponto de vista de isenções fiscais e outras, quer mesmo do ponto de vista de ajuda financeira, a empreendimentos turísticos de certa envergadura, como é, por exemplo, o caso do hotel recentemente construído na cidade do Mindelo.
A verba de 7 800 contos atribuída ao sector é, sem dúvida, bastante modesta; todavia, dado o facto de, como já tive ocasião de dizer, o Plano ser reajustado daqui a três anos, não se põe de parte a hipótese de ela vir a ser reforçada.
Podemos dizer que em Cabo Verde o problema do ensino, que, depois das reformas do tempo do governador Fontoura da Costa, permaneceu durante longos anos em profunda estagnação, a partir de 1953 passou a ser encarado com o carinho que merece. Nesse ano inscreveram-se no ensino primário 6167 alunos, número que em 1965 foi de 21 871. Todavia, o pessoal docente passou de 149 em 1953 apenas para 378 em 1964 e o número de salas de aula, também muito longe de ter acompanhado a evolução do número de alunos inscritos, passou de 117 em 1953 para 307 em 1964. Conforme se diz no projecto do Governo, a capacidade das escolas, de equipamento e pessoal atingiu já o ponto de saturação, e o índice seguro desta verdade é que a percentagem de aproveitamento, que em 1953 era de 62 por cento, baixou em 1964 para 61 por cento e em 1965 para 58,7 por cento.
Sobre a evolução do ensino secundário, fiz ainda há poucos dias, nesta Câmara, julgo que suficientes considerações quando me referi ao cinquentenário do Liceu de S. Vicente.
O ensino técnico é ministrado na Escola Industrial e Comercial do Mindelo desde 1957, ano em que se inscreveram 127 alunos, número que em 1964 já era de 669.
A despeito de, em 1965, terem sido aplicados 12,2 por cento do valor global das receitas ordinárias da província no vencimento do pessoal dos serviços de educação e de as despesas, só com o ensino primário, terem naquele ano representado 7 por cento do total das despesas ordinárias, o que mostra o interesse que o actual Governo da província vem dedicando ao problema do ensino, ainda hoje, é de tal forma elevado o número de crianças por escolarizar que só com o aumento substancial de 150 unidades no professorado primário se poderá atingir um nível aceitável de escolarização em relação às 31 553 crianças recenseadas para o ensino primário. No entanto, a título de curiosidade, tenho o prazer de informar que, já no ano passado, se conseguiu atingir, na ilha do Sal, a plena escolarização.
Anunciam-se no III Plano de Fomento os seguintes objectivos em relação ao sector de que me estou ocupando: quanto ao ensino primário, a «generalização progressiva do ensino, de forma a escolarizar 70 por cento da população em idade escolar em 1973»; quanto ao ensino secundário, médio e superior, a «ampliação das possibilidades ao seu acesso».
Em relação ao ensino médio e superior, o objectivo, segundo o projecto, deverá concretizar-se na criação de uma escola de magistério primário e no aumento de bolsas de estudo para a frequência de estabelecimentos de ensino médio e superior, em Angola e na metrópole, com vista, especialmente, à formação dos quadros docentes necessários. Além disso, também se considera o problema do aperfeiçoamento profissional, sobretudo no sentido de uma especialização, conforme também se frisa no projecto do Governo.
Prevê-se para o sector da educação a verba de 30 600 contos, cabendo ao ensino primário 23 300 contos, ao liceal 4 100 e ao técnico 2 600. Para as bolsas de estudo, incluindo as que dizem respeito ao aperfeiçoamento profissional, foram considerados 600 contos, o que, em meu modesto entender, é muito pouco, não só em relação às solicitações nesse campo, o que, já por si, é suficientemente relevante, como ainda se atendermos a que o que se pretende com elas é, em especial, obter pessoal docente, cuja falta, sobretudo no que diz respeito ao ensino liceal, já se vem tornando crónica nos liceus da província, com todos os inconvenientes que escuso aqui de repetir.
Mas, voltando ainda ao ensino primário, há a distinguir, dentro da verba global que lhe é atribuída, a de 14 862 contos destinada à construção e apetrechamento de 97 edifícios escolares, com 135 salas de aula, e a de 8438 contos, que se destina à manutenção, à margem do quadro, de um substancial número de professores, única forma de se conseguir atingir, neste ensino, o objectivo que há pouco indiquei.
Ao finalizar estas ligeiras considerações sobre o sector da educação, quero aqui deixar um voto de esperança no sentido de ser, para já, revista a dotação destinada às bolsas de estudo, com a certeza de que, como há tempos tive ocasião de dizer, todas as verbas que se gastem com a educação do povo cabo-verdiano serão amplamente compensadas política, social e economicamente.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Reconheço que me alonguei demasiadamente, mas, por outro lado, VV. Ex.ªs, cuja paciência com que me têm ouvido muito agradeço, certamente também reconhecem que não seria possível, ou pelo menos muito fácil, mesmo dizendo tão pouco como disse de cada um dos sectores sobre os quais vai incidir na província este III Plano de Fomento, conseguir fazer a minha exposição em menos tempo. Para finalizar, vou agora fazer umas ligeiríssimas considerações acerca do sector da saúde e assistência.
Neste sector tem-se em vista «o prosseguimento da luta contra as endemias, através de campanhas sanitárias que visem não só o combate e essas doenças, como também a divulgação de educação sanitária básica e a conquista da confiança das populações» e, além disso, «o desenvolvimento da rede dos serviços de saúde pelo espessamento da sua malha e pela melhoria progressiva dos estabelecimentos existentes», e, finalmente, «a formação do pessoal sanitário dos vários níveis exigidos para o adequado funcionamento dos serviços».
Os objectivos enunciados partiram do exame aturado de todos os indicadores cujo conhecimento prévio é essencial a qualquer planificação sanitária, nomeadamente os demográficos e os nosológicos e necrológicos.
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Por outro lado, a taxa de mortalidade geral tem diminuído bastante, tendo passado de 20,6 por mil em 1964 para 12,2 em 1961, e, finalmente, para 10,4 em 19C6. A mortalidade infantil também tem decrescido substancialmente.. Assim, enquanto em 1961 foi, para crianças com menos de 1 ano de idade, de 107,1 por mil nados-vivos, em 1965 passou para 76,7 por mil, sendo de notar que na metrópole é de 67,5. Os números indicados são suficientemente elucidativos quanto à melhoria de nível sanitário.
Do exame dos indicadores nosológicos e necrológicos conclui-se que, em 1965, dentro das doenças infecto-contagiosas, foi o tétano que produziu maior número de mortes, com uma incidência de 50 por cento em relação ao número de mortes provocadas por aquelas doenças. A seguir, foi a tuberculose, com 68 mortes, a que correspondeu uma incidência de 26 por cento. De salientar é, naquele ano, a ausência completa de óbitos por paludismo, doença da qual morriam anualmente, só na ilha de Santiago, 176 pessoas - número médio dos vinte anos anteriores a 1957, ano em que a Missão das Endemias iniciou a campanha contra o paludismo na ilha.
O número de estabelecimentos de assistência sanitária tem aumentado, em alguns casos, substancialmente. Enquanto em 1953, por exemplo, existiam 12 postos sanitários, em 1965 passaram a ser em número de 19. No mesmo período, os postos de consulta e tratamento passaram de 9 para 17, enquanto o número de dispensários de puericultura triplicou.
Presentemente, a rede de ocupação sanitária é constituída por 3 hospitais, localizados nas três cidades, que dispõem de um total de 380 camas, por 8 enfermarias regionais, com um total de 70 camas, 2 enfermarias para leprosos, 6 dispensários de puericultura, 5 maternidades e os postos sanitários e de consulta a que há pouco me referi.
No Plano de Fomento que vai ser executado prevê-se a construção do novo hospital de S. Vicente, do hospital do Sal, de 2 enfermarias para tuberculosos pobres e ainda do hospital central da Praia.
No que respeita a pessoal, não se poderá deixar de reconhecer que ele, já hoje, é manifestamente insuficiente. Quanto a médicos, cujo número era de 18 em 1953, é hoje de 22, dos quais 5 são especialistas de radiologia, cirurgia, oftalmologia e estomatologia. Em relação a enfermeiros, o panorama é ainda mais sombrio, pois apenas existem no quadro 49, alguns dos quais, por razões da orgânica dos serviços, apenas se dedicam a trabalhos meramente burocráticos.
Enquanto a população aumentou, por exemplo, de 1953 para 1962, de 37,9 por cento, o pessoal médico e paramédico apenas aumentou de 15,7 por cento.
A despeito de tão reduzido número de médicos e enfermeiros para uma população que é hoje constituída por 236 000 habitantes, com a agravante de se distribuírem por 10 ilhas, o que dificulta seriamente, por razões óbvias, a prestação da assistência, a evolução do movimento geral, em certos departamento das diferentes formações sanitárias, foi a seguinte de 1963 para 1965:
Em 1963 Em 1965
Doentes de consulta externa............. 135 524 158 798
Tratamento e curativos ................. 128 812 138 797
Operações de grande cirurgia............ 465 544
Operações de pequena cirurgia........... 3 246 3 740
Doente hospitalizados .................. 6 614 6 845
Os números indicados são suficientemente elucidativos e mostram à evidência o grande esforço que vem sendo realizado, tanto pelos médicos como pelos enfermeiros que na província exercem as suas profissões nos diferentes departamentos oficiais de saúde, quantas vezes, Sr. Presidente e Srs. Deputados, tão mal compreendidos, quando, pelo contrário, deveriam ser acarinhados e homenageados.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Os vencimentos que auferem não correspondem, na maior parte das vezes, especialmente para aqueles que prestam serviço fora das cidades da Praia e do Mindelo, a esse esforço, e, no caso especial dos médicos, sequer ao nível de proventos que necessariamente para eles se deverá reconhecer, quanto mais não seja pela própria natureza da sua formação e pelos especiais condicionalismos da sua nobre profissão.
Penso que, à semelhança do critério adoptado, aliás muito justamente, para o pessoal técnico, tanto dos Serviços das Obras Públicas, como das diferentes brigadas e missões, se poderia atribuir aos médicos e aos enfermeiros, desde que trabalhassem em empreendimentos programados e financiados pelo Plano de Fomento no sector da saúde, subsídios diários iguais aos percebidos, respectivamente, pelos engenheiros e pessoal técnico da mesma categoria dos enfermeiros.
Apelo para o alto espírito de justiça de S. Ex.ª o Governador Sacramento Monteiro no sentido de ser considerada esta minha sugestão, que, uma vez adoptada, melhoraria as remunerações que vêm sendo auferidas por muitos médicos e enfermeiros.
Um dos objectivos do Plano é o prosseguimento das campanhas sanitárias, nomeadamente contra a lepra, a tuberculose, a malária, a ancilostomíase, as dermatomi-coses e ainda as respeitantes às vacinações antivariólicas, à protecção materno-infantil e à alimentação e nutrição. Para que na prática se possa levar a cabo tais campanhas, ter-se-á que promover o aumento de unidades de trabalho, eventuais, de diferentes níveis e à margem do quadro dos serviços de saúde. Dentro desta linha de orientação, considerou o Governo, no projecto, a rubrica «Formação do pessoal técnico e alargamento dos quadros» e atribuiu à mesma a verba de 6 000 contos. A Câmara Corporativa, no seu parecer, propõe a eliminação dela, alegando que o alargamento dos quadros é de exclusiva obrigação do orçamento ordinário. Ora, de facto, ninguém ignora que as verbas do Plano de Fomento de forma alguma poderão servir para ocorrer às despesas que são nitidamente específicas do orçamento ordinário. Tal como está a redacção, é, sem dúvida, pertinente a observação da Câmara Corporativa; todavia, no meu fraco entender, não pretende o Governo, de forma alguma, alargar com a referida verba o quadro dos serviços de saúde, com a consequente criação de novos lugares, mas tão-sòmente com ela contratar ou assalariar pessoal, a título meramente eventual, e com vista à execução de certas tarefas respeitantes aos empreendimentos previstos no Plano de Fomento e que, por manifesta carência de pessoal do quadro, terão de ser executadas por outras unidades eventualmente acrescidas, de harmonia com as necessidades de cada momento. Penso que não é outra a inte tição do Governo. Sendo assim, sugiro que seja mantida a verba, rectificando-se, todavia, a redacção da rubrica.
Além da verba de 6 000 contos a que me venho referindo, considera o Plano mais as seguintes no sector da saúde: uma de 18 000 contos para as campanhas sanitárias e uma outra de 36 000 destinada às construções e instalações hospitalares.
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em relação ao sector da saúde, dou o meu voto de aprovação na generalidade ao projecto do III Plano de Fomento e à proposta de lei para a sua elaboração e execução.
Quero, finalmente, numa última palavra, aqui manifestar a profunda gratidão do bom povo da minha terra ao Governo por mais este Plano de Fomento, que incide sobre toda a problemática sócio-económica do arquipélago e que, quer pelo volume dos empreendimentos previstos, quer pelo sentido humano que constantemente se descortina nos diferentes programas sectoriais, bem traduz a alta consideração em que são tidos os legítimos anseios da província de Cabo Verde.
Disse.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Coelho Jordão: - Sr. Presidente: Ao usar da palavra pela primeira vez nesta sessão, dirijo a V. Ex.ª, Sr. Presidente, cumprimentos do mais profundo respeito e os protestos de muita consideração.
Enviou o Governo para apreciação e discussão nesta Assembleia a proposta de lei e o projecto do III Plano de Fomento que vai vigorar no sexénio de 1968-1973 e que há-de impulsionar todo o desenvolvimento económico do País. Pelo montante dos investimentos previstos - 167 milhões de contos -, ele dá-nos a certeza do grande trabalho a realizar para conseguir os objectivos que se pretendem:
Aceleração do ritmo de acréscimo do produto nacional;
Repartição mais equitativa dos rendimentos;
Correcção progressiva dos desequilíbrios regionais de desenvolvimento.
Para tão grande empreendimento tem de se contar não só com os meios financeiros necessários, mas também com um factor da maior importância, que é o factor humano, o qual, temos a certeza, não faltará.
Perante a magnitude de tão grande empresa, de cuja concretização as populações de todas as parcelas de Portugal, da metrópole ou do ultramar, hão-de receber os benefícios, nenhum português pode deixar de viver intensamente o programa que se apresenta, de se interessar por ele e de dar o apoio e colaboração que cada sector carecer.
É, pois, Sr. Presidente, com plena satisfação e consciência da grandeza da obra programada e dos seus resultados, a cujos responsáveis pela sua elaboração tributo os maiores aplausos e felicitações, que irei procurar analisar alguns dos seus sectores, apenas com o intuito de dar o meu contributo honesto no esclarecimento de alguns pontos, arredada, no entanto, qualquer intenção de crítica.
1. Melhoramentos rurais. - Tem vindo o Governo, a partir do II Plano de Fomento, a atribuir comparticipações às câmaras municipais para a realização de obras rurais nos sectores de viação rural, electrificação e abastecimento de água, com o objectivo de proporcionar às populações um melhor bem-estar. Prevê-se no III Plano de Fomento alargar aquela acção a obras de esgotos, que, juntamente com o abastecimento de água, constituem um problema de saúde pública.
Especifica-se que, dada a magnitude dos problemas rurais e a multitude de organismos oficiais que superintendem neles, terá de haver um trabalho de coordenação, «com base na estreita colaboração entre os vários departamentos interessados».
Orientação do mais alto significado, pois irá evitar desperdícios inúteis de tempo e de dinheiro e tornar mais dinâmica e fácil a realização dos programas previstos.
Tem sido notável a obra realizada no País pelo Governe no capítulo de melhoramentos rurais, intensificada a partir dos planos de fomento, através das comparticipações concedidas às câmaras municipais, principalmente para electricidade, viação rural e abastecimento de água, obras sem as quais não pode haver progresso, bem-estar e elevação do nível de vida.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - E são as câmaras, apesar de rodeadas de inúmeras dificuldades - dificuldades financeiras resultantes dos seus magros orçamentos, carência de técnicos e de técnica -, mas que com espírito de dedicação, devoção e sacrifício dos seus servidores, vivendo os problemas das populações e conscientes da sua função na vida local, no seu engrandecimento e na elevação e dignificação da vida dos povos, que têm permitido satisfazer os anseios do Governo na consecução dos seus planos neste sector. E é consolador, Sr. Presidente, para quem percorre as nossas terras, ir encontrar já hoje aldeias, pequenas aldeias,, longe dos centros, mas ligadas por estrada ou caminho municipal, com a sua escola nova a marcar presença da vida e do futuro è, com muita frequência também, com electricidade. Mas, se muito está feito, muito falta fazer ainda, pois em 1966 havia por electrificar 922 freguesias das 3 823 existentes e cerca de 2 550 povoações - ou seja 20 por cento - sem acesso.
Toda a política de melhoramentos rurais, diz-se no Plano, deve assentar em estudos de planeamento regional, que o Secretariado Técnico está a realizar e que terão como finalidade a execução coordenada e concentrada destes e outros aspectos respeitantes ao bem-estar rural com «vista a obviar ao carácter disperso dos aglomerados rurais e estabelecer assim entre as cidades e o campo certa igualdade de oportunidades no plano económico, demográfico, social e cultural ...», pois assim se contribuirá para uma valorização efectiva do meio rural e melhoria das suas condições de vida.
As verbas previstas para este sector são de 2 880 000 contos, assim distribuídos:
Milhares
de contos
Electrificação .................... 1 220
Abastecimento de água ............. 400
Esgotos ........................... 180
Viação ............................ 960
Outros melhoramentos .............. 120
Não são, porém, muito optimistas as perspectivas que claramente se podem deduzir dos elementos fornecidos pelo parecer subsidiário da Câmara Corporativa, estimados para dotar todas as povoações com mais de 100 habitantes dos respectivos melhoramentos. E, assim, seriam necessários para:
Milhares
de contos
Electrificação ....................... 2600
Abastecimento domiciliário de água ... 3 950
Viação rural ........................ 1 650
Esgotos ............................ 13 800
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Não se pode, como é evidente, fazer à apreciação destes números num aspecto puramente matemático. Para os casos da electrificação e viação rural, que mais correctamente podem ser analisados à luz daquele critério, podemos concluir que, ao ritmo das dotações do presente Plano, levariam a ficar terminados:
A electrificação, em treze anos;
A viação rural, em dez anos.
Pelo referido parecer subsidiário, da Câmara Corporativa verifica-se que no fim do Plano Intercalar as povoações com mais de 100 habitantes e não servidas serão em número de:
Electricidade - 5192, ou seja 38 por cento;
Abastecimento domiciliário de água - 10 100, ou seja 75 por cento;
Estradas - 2 550, ou seja 20 por cento;
Esgotos - 18 150.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Se é já muito longo o caminho percorrido na consecução destes benefícios, daqui se deduz o caminho a percorrer para se conseguir uma situação satisfatória e o esforço que é necessário despender por bodas as entidades que intervêm na sua realização.
No II Plano de Fomento foram consignados 320 000 contos ao plano de abastecimento de água das populações rurais e 840 000 contos ao Plano de Viação Rural, correspondendo uma comparticipação média do Estado de 75 por cento e 25 por cento das câmaras municipais.
Não nos parece, porém, que as verbas atribuídas neste III Plano de Fomento aos sectores de abastecimento de água e viação rural sejam suficientes.
Na proposta de lei do Plano de Viação Rural põe-se em evidência a importância das estradas e caminhos municipais como factores dos mais importantes no desenvolvimento das regiões rurais, pois «é através deles que as pequenas povoações podem receber o influxo da civilização, no contacto com centros populacionais mais desenvolvidos, abrindo rovas perspectivas às actividades locais, aumentando o rendimento do trabalho das populações pela mais fácil ligação assegurada entre os centros de produção e de consumo».
Reconhece-se no projecto em discussão a necessidade de acelerar a conclusão do Plano de Viação Rural, mas parece-nos que a verba prevista, de 160 000 contos anuais, não corresponderá àquele objectivo, se atendermos a que no II Plano de Fomento a verba consignada era de 140 000 contos anuais. A diferença, para mais, de 20 000 contos não corresponde sequer ao aumento que se verificou no custo das obras, aumento que atingiu, em relação a 1960, cerca de 100 por cento. Sou de parecer, por isso, que as verbas destinadas à viação rural deveriam ser reforçadas, se não para aumentar o ritmo de execução do Plano, pelo menos para não o diminuir, o que irá acontecer nas condições propostas.
O abastecimento domiciliário de água das populações rurais é outro dos sectores do Plano de maior interesse, pelo que representa no nível sanitário das aludidas populações e na incidência que reflecte na produtividade do trabalho e na valorização social e económica do País, sector do qual não se pode desligar o sector dos esgotos.
Reconhecem-se no projecto em apreciação as dificuldades financeiras que irão surgir às autarquias locais para a realização destas obras, em virtude do baixo rendimento que poderão dar visto nem sempre os povos servidos terem capacidade económica para pagar sequer os mínimos de consumo que, teoricamente, deviam fazer face aos encargos dos empréstimos. O financiamento de tais obras terá de ser feito através de mais avultadas comparticipações do Estado e das receitas próprias das autarquias locais.
Refere-se, no entanto, que, mesmo assim e reunindo um conjunto de boas vontades dos próprios futuros utentes -, as obras se deverão realizar. Penso, todavia, que as maiores dificuldades se irão encontrar na obtenção das comparticipações, por a verba destinada ser já insuficiente para dar possibilidades de execução aos projectos aprovados.
Nesta época de progresso e desenvolvimento incontroverso que o País atravessa, a progressiva elevação do nível de vida dos povos, que é um facto, faz alterar todas as previsões possíveis, obrigando a uma constante actualização de
infra-estruturas e de novas fontes de abastecimento que exigem avultados investimentos. Quer no sector de águas, quer no sector de electricidade, tudo hoje custa verbas importantes. Daí parecer-nos que só se poderá atingir o objectivo do Plano, atendendo à capacidade financeira das câmaras municipais, aumentando o Estado a percentagem das comparticipações e, simultaneamente, aumentando as verbas destinadas a tal fim.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Se queremos realmente que o abastecimento domiciliário de água das populações rurais seja significativo, não poderemos esquecer que verbas muito grandes terão de ser investidas continuamente no reforço dos abastecimentos existentes, os quais, i dubitàvelmente, são prioritários, e o saldo que restar não dará para manter o Plano no ritmo de execução previsto e que se desejaria.
Dou todo o meu aplauso à proposta da Câmara Corporativa para que sejam reforçadas as verbas deste sector, embora com a ressalva de não sacrificar as verbas da viação rural, que também consideramos insuficientemente dotadas.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - A electricidade é uma aspiração que todos os povos hoje têm de poder dispor. Aponta-se como deficiente e inconveniente o sistema de distribuição existente, em virtude da dispersão das concessões e da «impossibilidade 4e as explorações se fazerem em condições satisfatórias do ponto de vista
técnico-económico, dadas as reduzidas áreas das concessões».
Aconselha-se, por isso, uma concentração das explorações, entregando-se as concessões a empresas privadas ou a federações de municípios. Concordamos em que explorações de pequena dimensão não possam ser rentáveis e, consequentemente, ofereçam um mau serviço aos consumidores. Mas não podemos esquecer também que as explorações de electricidade, nos meios rurais, não podem ser rentáveis, dada a extensão das redes, os elevados consumos em iluminação pública e os baixos consumos dos utentes. Mas nestes casos, como na viação rural ou no abastecimento de água, a obra não pode ter um carácter puramente financeiro, mas antes uma «função social, económica e política».
Quando os corpos administrativos são os distribuidores, pensa-se primeiro, e antes de tudo, em servir o meio rural, em servir as populações, embora se saiba e se reconheça que o investime ito não é rentável, não se podendo raciocinar em termos de empresa financeira. E é esta uma das razões por que as concessões que são exploradas pelas
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autarquias não vivem em condições de auto-suficiência desafogada.
No entanto, se a exploração é feita por uma empresa privada, entre outros aspectos que se verificam, ou a iluminação pública é limitada, ou então tem o corpo administrativo de suportar os encargos que vão além de determinado valor, previamente fixado, assim como o prolongamento das redes aos pequenos aglomerados mais afastados tem sempre as suas dificuldades. Parece-nos, todavia, que à exploração da distribuição de electricidade se deve dar todas as condições, mesmo de privilégio, para que ela seja feita pelas câmaras ou pelas federações de municípios, atendendo-se, nos regimes de comparticipações e nos regimes tarifários, à função social e política que este sector representa.
O simples facto de aumento de tarifas não satisfaz, pois vai ter reflexos nas condições económicas dos aglomerados populacionais de menores recursos. Um equilíbrio nos preços da energia desde a produção, os grandes distribuidores e a pequena distribuição, tendo em consideração os factores preferenciais nos diversos escalões, conseguirá, parece-nos, uma forma de resolver o assunto.
Estão as grandes distribuidoras a revogar os contratos de energia à pequena distribuição logo que chegam ao seu termo, impondo-se-lhes no novo contrato um aumento de cerca de 20 por cento, e até mais. Isto pretende-se justificar no novo critério estabelecido pelo Decreto n.º 46 031, de 14 de Novembro de 1964, e que motiva que a amortização das obras de produção de electricidade se faça em prazos muito curtos, de quinze a vinte anos, quando se considera normal, principalmente para as hidroeléctricas, que a amortização das obras de construção civil se faça em 60 anos e mais, como o nosso ilustre colega Eng.º Virgílio Cruz, na sua recente intervenção, esclareceu brilhantemente, afirmando ainda que «para não encarecer as tarifas de encargos decorrentes daquelas amortizações (referindo-se às amortizações financeiras dos empréstimos contraídos naqueles prazos) se aproximassem daqueles que corresponderiam a prazos idênticos ao das amortizações técnicas».
Evitar-se-ia, assim, que esses encargos fossem transferidos, como o estão sendo, para o consumidor, com a agravante ainda de vir aumentado da rede secundária para a pequena distribuição, o que me parece não seria o espírito das instâncias que autorizaram o aumento à rede primária.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - À pequena distribuição feita pelas autarquias locais teve de aumentar as tarifas para fazer face àquele encargo; no entanto, não pôde compensar o aumento das despesas de exploração que se tem vindo a verificar, quer pela subida dos materiais, quer de mão-de-obra.
Tem a minha inteira concordância o ponto de vista do Sr. Deputado Virgílio Cruz, profundo conhecedor dos problemas económicos ligados à electricidade, de que «não conviria encarecer as tarifas da electricidade, por não se justificar».
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - A alteração do Decreto-Lei n.º 40 212, em que se fixa o limite máximo de 50 por cento em relação ao valor das obras como valor máximo médio a comparticipar pelo Estado em cada ano, é necessária para se fomentar e acelerar a electrificação rural, mas devendo considerar-se, «sem prejuízo das comparticipações necessárias às obras de remodelação e ampliação das rédea
existentes», dentro do princípio, que é uma realidade incontroversa, de que as explorações rurais não podem ser consideradas apenas à luz da exploração financeira.
Têm os planos de viação rural, abastecimento de água e electrificação vindo a realizar-se a um ritmo animador, para o que tem contribuído a acção do Estado e também a dos municípios, que têm conseguido dar grande impulso à realização desses planos.
Este III Plano de Fomento, como os anteriores, continua a apoiar-se, neste sector, no poder executivo das autarquias locais, mas elas, Sr. Presidente, sentem agravar-se a sua situação de ano para ano e vêem a impossibilidade de manter o ritmo dos seus trabalhos, quando se tornava necessário aumentá-lo.
Dificuldades de toda a ordem frenam a sua acção:
As suas receitas não aumentam na proporção das despesas;
Carência de pessoal administrativo e técnico;
Aumento de encargos com sectores que, verdadeiramente, não lhes deveriam caber.
Apreciando os mapas de evolução de receitas da administração pública e das autarquias, verifica-se que, enquanto o Estado teve um aumento nas suas receitas de mais de 40 por cento no período de 1961-1965, as autarquias locais apenas obtiveram, em igual período, um aumento de 33 por cento.
Por outro lado, o aumento de receitas das autarquias locais não foi uniforme para todas: os concelhos de características rurais, pouco ou nada industrializados, ou não tiveram aumento nas suas receitas, ou este foi muito pequeno, nada significativo.
Aquele aumento verificou-se, portanto, principalmente nos concelhos de Lisboa, Porto e limítrofes e em alguns muito industrializados. Daí que aquela percentagem não pode ser tomada como uniforme.
Resulta daqui a situação financeira difícil que as autarquias locais vão ter para a execução deste Plano de Fomento, tanto mais que nos planos anteriores se atribuiu uma comparticipação média de 75 por cento nos sectores de águas e viação rural e de 50 por cento na electricidade, e agora a comparticipação média a conceder pelo - Estado é de 55 por cento, isto é, a comparticipação das autarquias locais eleva-se de 39 para 45 por cento.
Para que as câmaras possam corresponder aos objectivos do Plano e à grande tarefa que se lhes vai pedir, haverá que lhes dar maiores possibilidades, não só revendo o seu sistema financeiro, mas, e principalmente, libertando-as de encargos que, em rigor, devem pertencer à Administração Central.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Por outro lado, tão grande programa não deixa de nos criar também certas preocupações quanto à sua execução no aspecto de pessoal. E isto, como se refere no próprio Plano e no parecer da Câmara Corporativa, pela carência de pessoal técnico ao dispor das autarquias, e dos serviços do Estado que possam elaborar os projectos e dar-lhes execução.
Como não é fácil fazer técnicos de um momento para o outro, impõe-se para já a simplificação dos projectos, normalizando orçamentos e certas técnicas, evitando-se perdas de tempo sempre demoradas na sua apreciação nos diversos escalões dos serviços e redução de uma burocracia sempre demasiadamente complicativa.
É merecedor de todo o nosso aplauso o programa apresentado neste sector de melhoramentos rurais e temos a
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esperança de que ele irá dar um grande impulso no desenvolvimento regional, contribuindo para a elevação do nível de vida das populações rurais e para o seu bem-estar.
Sr. Presidente: No capítulo de transportes, verifica-se que o investimento previsto para o período do Plano é de 21 886 100 contos, sendo destinados a:
Contos
Transportes terrestres ............. 10 047 700
Transportes marítimos ............. 8 470 900
Transportes aéreos .......... ...... 3 367 500
Da verba atribuída aos transportes marítimos, aquela que desejamos analisar, destinam-se 6400 contos à marinha mercante e 2 070 900 contos aos portos, dos quais vêm especificados 800 000 contos para o porto de Lisboa, 702 900 contos para o porto do Douro-Leixões e apenas 568 000 contos para todos os outros portos do País, que são designados por portos secundários, isto é, 38,6 por cento para o porto de Lisboa, 34 por cento para o do Douro-Leixões e 27,4 por cento para os restantes portos.
Considera-se no projecto do Plano que, «dada a especialização crescente dos navios de carga e um acentuado fenómeno de economia de escala provocado pelo aumento de capacidade e elevado custo de cada unidade transportadora, do que resulta baixos custos unitários de transporte e elevados custos unitários do navio», se exige a concentração do movimento de transportes marítimos em grandes portos - Lisboa e Leixões -, devidamente equipados com material de carga e descarga, grandes fundos, cais especializados, etc.
Do movimento portuário do continente, que se cifrou em cerca de 11 milhões de toneladas, 67,5 por cento corresponderam ao porto de Lisboa, 24 por cento ao Douro-Leixões e apenas 8,5 por cento aos outros portos.
Justifica-se esta baixa percentagem dos portos secundários por não estarem devidamente preparados e apetrechados para o movimento de navios de comércio.
Os portos secundários, ou pequenos portos, agrupam-se no projecto do Plano em:
Portos comerciais e de pesca;
Portos de pesca;
Portos de turismo, recreio e desporto;
englobando nos primeiros os que possuem tráfego comercial além do pescado e nos segundos os que têm unicamente pesca.
Esta classificação foi baseada no movimento dos referidos portos no período de 1957-1964 (reunido no mapa da p. 366 do II volume), englobando assim no primeiro grupo os portos de Aveiro, Setúbal e Portimão e no segundo os de Viana do Castelo, Figueira da Foz, Peniche e Vila Real de Santo António.
Não se pode considerar certo tal critério, não só por ser incongruente com os outros planos e classificações feitas oficialmente, como, e principalmente, por se basear em dados de ocasião que induzem, como induziram, em erro, não se tendo em consideração outros pressupostos já assentes e oficialmente definidos.
É certo que se fez uma ressalva ao dizer: «Segundo os dados que actualmente se possuem, parece serem os portos de Aveiro, Setúbal e Portimão que apresentam melhores perspectivas ...» No entanto, não se deve, ou não se pode, seguir assim um sistema tão simplista ao estabelecer a classificação, mas antes terá de se atender aos programas estabelecidos, aos projectos em execução ou executados e à evolução e potencialidades do hinterlarid que serve cada porto.
O porto da Figueira da Foz aparece classificado como porto de pesca pelo simples facto de no período de 1957-1964 não ter tido movimento comercial. Mas, se se incluíssem os elementos de 1965, verificar-se-ia que o movimento comercial teria atingido 70 001, e em 1967 atingiu já cerca de 20 000 t. Isto representa apenas que o porto não tinha movimento comercial porque as obras não estavam em condições de permitir esse movimento.
Se compararmos o movimento dos diversos portos em 1953, e que hoje foram considerados comerciais, verifica-se que:
Toneladas
de mercadorias
Aveiro movimentara......... 4 000
Portimão movimentara ...... 27 000
Setúbal movimentara........ 759 000
entretanto, em 1964:
Aveiro movimentou .......... 97 000
Portimão movimentou ........ 39 000
Setúbal movimentou ...... l 039 000
Na história do porto da Figueira, se a recordarmos, verificamos que toda a sua importância e valor lhe advêm como porto regional de comércio, com relevo acentuado entre os portos secundários do tempo, e sempre subsidiariamente como porto de pesca.
O primeiro plano de obras portuárias, de 1928, classifica como portos de 1.ª classe Lisboa e Douro-Leixões e portos de 2.a classe Viana do Castelo, Aveiro e Figueira da Foz.
No plano da 2.º fase de obras nos portos (Decreto-Lei n.º 33 922, de 5 de Setembro de 1944), o porto da Figueira era classificado como porto de pesca, comercial e de cabotagem, e assim foi considerado no I Plano de Fomento, no II e no Plano Intercalar, que se lhe referia nestes termos:
Concluídas que sejam as obras exteriores para melhoramento do acesso ao porto, a que se seguirá o melhoramento geral do estuário, com a simultânea criação dos órgãos de exploração portuária e respectivo apetrechamento, poderá o porto servir a sua tripla função de porto regional de comércio, porto de pesca costeira e do largo e de porto de armamento de navios, para a pesca longínqua.
Foi dentro deste princípio que o projecto de obras foi estudado e realizado. Não se justificaria de outra forma um investimento de 80 000 contos, já realizado, apenas nas obras exteriores.
E não será necessário deduzir grandes justificações para defender o seu interesse e a sua importância como porto regional de comércio, desde que se atente na sua evolução.
As obras exteriores começaram em 1961, e logo a partir de 1963 se apresenta com movimento crescente.
No sector da pesca da sardinha, o seu movimento passou de 10 000 t, no valor de 28 000 contos, em 1963, para 20 000 t e 65 000 contos em 1966, devendo atingir cerca de 35 000 t em 1967 e 96 000 contos, situando-se assim em segundo lugar, logo a seguir, portanto, a Leixões.
Mas mais significativo é ainda atentarmos em que Leixões, em 1963, movimentou
67 000 t de sardinha, em 1964, 82 000 t, em 1965, 59 000 t e, em 1966, 61 000 t. Isto é: enquanto Leixões, no último quinquénio, não acusou qualquer taxa de crescimento, o porto da Figueira teve
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uma taxa média anual de crescimento de cerca de 35 por cento.
Se considerarmos a pesca de arrasto, verificamos, da mesma forma, a sua tendência de crescimento.
O movimento total do porto em pesca até 28 do corrente foi de 31 000 t e 75 000 contos, podendo-se prever que, no ano de 1967, o movimento total do porto em pesca atinja cerca de 38 000 t e 110 000 contos.
As suas condições como porto de pesca são realmente excepcionais, e tanto assim é que será suficiente considerar que, havendo na região apenas uma fábrica de conserva de sardinha, quase todo o peixe está a ser adquirido pela indústria conserveira de Matosinhos e Algarve, para onde é transportado por camioneta, e que, mesmo nestas condições, com o agravamento do preço do transporte, o seu movimento tem aumentado na proporção indicada, situando-se em segundo lugar.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - E o que se passa com o porto comercial?
Logo que as obras de melhoramento do porto foram iniciadas, em 1961, surgiram, e continuam a surgir, muitas iniciativas para localizar na região indústrias, muitas das quais são já uma realidade. De entre todas deve destacar-se, não só pelo investimento, como pela capacidade de produção, a Celulose Billerud. Ora, todas elas necessitaram, aquando dos estudos económicos para a localização, da certeza de que o porto seria concluído e utilizável para tráfego comercial, o que lhe foi assegurado pelos departamentos oficiais respectivos.
Começam a entrar no ritmo normal de produção muitas dessas indústrias situadas nesta zona, e só elas têm de movimentar no próximo ano cerca de 150 000 t. E se o não puderem fazer pelo porto da Figueira, terão de utilizar o porto de Leixões, como agora começa a acontecer, sendo a mercadoria onerada com 150$ por tonelada.
O Eng.º Duarte Abecassis, no estudo económico do porto, demonstra que o seu movimento atingirá as 500 000 t em 1972, o que é confirmado em estudos ulteriores dos serviços oficiais respectivos.
A seguir à conclusão das obras exteriores, foram iniciadas as grandes dragagens de 1.º estabelecimento, e logo que o efeito destas se começou a sentir o movimento comercial surgiu imediatamente. E é assim que nos últimos seis meses deste ano - período a partir do qual foi possível obter fundos para a entrada e manobra dos navios - encontramos um movimento de quase 20 000 t - carvão, combustíveis, celulose e madeiras.
Uma companhia de combustíveis vai instalar uma estação de enchimento de gás, transportado em navios butaneiros. Uma fábrica de destilação de aguarrás para obtenção de derivados está a ser construída, destinando à exportação 10 000 t na 1.ª fase e 20 000 t a seguir.
Haverá agora que juntar, para bem se apreciar o interesse deste porto, todo o movimento de mercadorias do vasto hinterland que serve. Ainda muito recentemente, na reunião plenária do Conselho de Economia Regionais do Oeste Atlântico, realizado em Salamanca, do qual faziam parte comissões francesas, espanholas e portuguesas, foi referida a importância do porto da Figueira no desenvolvimento regional da zona de Salamanca.
Consideradas as realidades existentes e apreciada, portanto, a base dos elementos mais recentes, a classificação feita no projecto do Plano terá de ser revista e considerado o porto da Figueira, como desde sempre tem vindo a ser definido, um porto comercial e de pesca e considerado também prioritário neste III Plano de Fomento.
E de um relatório da Direcção-Geral dos Serviços Hidráulicos a passagem que vou ler:
Entre o porto da Figueira da Foz e o de Lisboa, a cerca de 102 milhas, nenhum outro acidente da costa ou porto existente tem melhores possibilidades que a foz do Mondego para a instalação de um porto regional do comércio que sirva o Centro do País (p. 11 do Plano Decenal, de 1965-1974).
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Para o conveniente funcionamento do porto devem sei- incluídas neste III Plano de Fomento as obras de regularização marginal e continuação das dragagens, construção de cais comerciais e a construção da nova ponte, para substituir a actual, que, além de ser antiga, já não oferece as necessárias condições de segurança para o tráfego que a utiliza e é inibitória da expansão do porto.
O investimento já feito, de 80 000 contos, para ser reprodutivo, o volume de mercadorias que têm de ser movimentadas e ainda a importância do porto como pólo de desenvolvimento de toda esta região do Centro do País, e acima de tudo uma política de continuidade nos programas e planos definida na política do Sr. Presidente do Conselho, dão-nos a tranquila confiança de que a 2.a fase do porto se seguirá com o mesmo ritmo da 1.ª fase, garantindo o tráfego das mercadorias a movimentar no vasto hinterland que serve.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - A não ser assim e sabendo-se ser de 150$ o encargo por tonelada das mercadorias saídas daqui para o porto de Leixões, facilmente se poderá avaliar o encargo que as empresas terão de suportar.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Mas só as 150 000 t de mercadorias e mais as 40 000 t de pescas que em 1968 existem para serem movimentadas pelo porto da Figueira da Foz impõem os investimentos e o seguimento das obras necessárias ao seu cabal funcionamento.
Dos 568 000 contos que o projecto do Plano prevê gastar nos pequenos portos, apenas 320 000 contos se destinam aos portos do continente e 112 000 contos aos das ilhas adjacentes, sendo as fontes de financiamento o Orçamento Geral do Estado, com 300 000 contos, auto-financiamento, no 500 contos, e crédito, 157 500 contos.
Se deduzirmos à verba do Orçamento Geral do Estado a importância de 36 000 contos destinada a estudos e projectos e considerarmos que o financiamento da renovação da frota de dragagem, que se deve transformar numa administração de carácter empresarial ou serviço público industrial, conforme acentua o projecto de Plano, seria feito através do crédito, ficava para aplicação no período do Plano, nos pequenos portos, a verba de 264 000 contos do Orçamento Geral do Estado, muito pequena em face do volume de obras em curso e que devem ser concluídos para que, além do mais, não fiquem sem reprodutividade os investimentos já feitos.
O projecto do Plano considera ainda:
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Parece poder concluir-se daqui que os aspectos a considerar nos portos para a navegação de turismo, recreio e desporto devem ser financiados pelas entidades responsáveis pela indústria turística nacional. Assim o julgamos absolutamente necessário, para, no caso de não ser possível reforçar a verba destinada aos portos secundários, ao menos aquela verba poder ser integralmente utilizada nas grandes obras básicas para capaz funcionamento daqueles portos.
Considera-se, por outro lado, o autofinanciamento a fazer pelas juntas autónomas, no montante de no 500 contos.
Sabe-se que a exploração de qualquer porto, na sua fase inicial, não dá rendimento para poder satisfazer as exigências da sua actividade, muito menos para financiamento de obras de primeira instalação. As juntas autónomas têm, por isso, de recorrer a outras fontes, ao Orçamento Geral do Estado e a receitas indirectas, estas normalmente provenientes de adicionais às contribuições do Estado na zona ou região que se considera interessada no desenvolvimento do porto. E o caso, por exemplo, de Viana do Castelo, Tavira, Aveiro, etc.
A Junta Autónoma do Porto da Figueira da Foz apenas vive de receitas de exploração, que mal lhe chegam para os encargos com o pessoal e pequenas obras de conservação. Para poder fazer face à comparticipação que lhe irá ser pedida para a execução do Plano e aos investimentos com apetrechamento do porto, dentro do âmbito das suas funções, terão de lhe ser facultados os meios de que as outras juntas dispõem. O estudo económico foi já realizado, encontrando-se nas instâncias superiores para resolução, e desta tribuna deixo o pedido a S. Ex.ª o Ministro das Comunicações para que promova a sua aprovação, a fim de a Junta Autónoma poder corresponder aos encargos que irá ter de suportar.
Uma grande zona da vasta região que o porto serve sente o valor e o seu interesse como pólo de crescimento regional, não - constituindo, por isso, hoje, qualquer problema político à aprovação da zona tributária do porto.
Uma referência quero ainda fazer, e essa à reduzida verba com que foram dotados os pequenos portos, porquanto estamos convencidos de que, a par dos grandes portos - Lisboa e Douro-Leixões -, os outros não podem ser minimizados.
O National Ports Council, no seu relatório de 31 de Dezembro de 1965, afirma que o conselho está consciente de que os «portos mais pequenos (quinze pés) tomam um lugar importante na economia do país, particularmente onde o comércio externo se efectuar», e no relatório de 1966 acentua o mesmo conselho a importância dos portos mais pequenos para a economia nacional. As verbas gastas .nos pequenos portos nos I e II Planos de Fomento foram de 241 000 e 402 000 contos, respectivamente, o que faz ressaltar a reduzida verba de 320 000 contos agora prevista, mesmo sem atender ao aumento de custo que as obras sofreram.
- Os investimentos já realizados nos portos secundários e - as economias desenvolvidas à volta deles e nos mesmos apoiadas, os pressupostos que orientaram os outros planos portuários, os de fomento e ainda a sua função no fomento económico das regiões que servem exigem o prosseguimento das obras, como complemento imprescindível para que se possam recolher em toda a melhor extensão os benefícios dos investimentos realizados.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Um dos factores que actua negativa e continuamente sobre o desenvolvimento de um país é o desequilíbrio das suas diversas regiões ou as assimetrias que se verificam no seu território, disparidades regionais que, no caso português, estão vincadamente marcadas e que têm vindo a agravar-se no último decénio, como se refere no projecto do Plano.
Com o fim de atenuar estas assimetrias e dar uma maior «harmonização do crescimento à escala regional» - um dos objectivos do Plano -, incluiu-se pela primeira vez nos planos de fomento um sector de planeamento regional,
esperando-se obter dele:
O equilíbrio da rede urbana, com a finalidade de dotar as populações de equipamentos sócio-económicos mínimos concentrados a distâncias razoáveis;
A expansão descentralizada da indústria e dos serviços, concretizada pela utilização de pólos de crescimento;
A progressiva especialização da agricultura regional, de acordo com as aptidões dos solos e as influências climáticas, numa óptica de concentração de investimentos.
Os planos regionais devem assentar em estudos rigorosamente feitos sobre as possibilidades, as necessidades e os auxílios que podem obter para um desenvolvimento harmónico, estruturando tudo aquilo que representa algo de positivo como elemento condicionante no conjunto da economia regional e nacional. Estes planos devem ser de tipo dinâmico, pois têm como fim estimular o desenvolvimento da região aproveitando os investimentos do sector público e do sector privado.
Foi esta política de desenvolvimento económico que tem sido a origem dos planos regionais franceses, que muito têm contribuído para o desenvolvimento desta nação, e que a Itália veio também a adoptar no plano de desenvolvimento italiano, empregando todos os recursos disponíveis, dentro do princípio da máxima utilização, de acordo com as possibilidades do país, assim como também a Espanha está a adoptar.
Os planos regionais são elaborados a partir do conhecimento, dos problemas demográficos, da geografia económica e sociografia, rentabilidade das explorações, características geológicas, climatéricas, hidrológicas, de fertilidade do solo, etc., e têm de ser apoiados em estudos científicos e técnicos de qualidade, realizados na própria região, onde devem existir centros de investigação que dêem apoio às comissões de planeamento. Deverão ser de preferência as próprias Universidades regionais que deverão dar esse apoio científico às comissões, como se verifica em França e Espanha.
Renné Pleven, presidente da Comissão de Planificação da Bretanha Francesa, referindo-se à acção que a Universidade teve na elaboração do referido plano, afirmava que «a Universidade deve e pode prestar um papel de primeira ordem na França de amanhã e as nossas Universidades de província devem constituir um dos motores principais do ressurgimento económico regional».
Por outro lado, tem o planeamento regional, como não pode deixar de ser, um critério de rentabilidade e um fim do crescimento do produto nacional.
Na conjuntura que atravessamos e numa Europa onde todos os países estão a caminhar para uma política de mercado, temos de acelerar a reorganização das nossas estruturas económicas e não perder tempo, aproveitando o muito que já há feito nalgumas regiões para se poder dar rápido início.
Criam-se quatro regiões: a do Norte, a do Centro, a de Lisboa e a do Sul, onde são criadas sub-regiões.
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Pretende-se, durante a vigência do Plano, que o produto bruto agrícola aumente, devendo o crescimento médio anual atingir 3 por cento.
Prevê-se para isso o investimento no sector da agricultura, na vigência do Plano, de 14 600 000 contos, verba altamente significativa, a demonstrar o relevo que lhe foi dado e o interesse que se vai dedicar a este sector.
Ora, para que dos investimentos feitos se obtenha a maior rentabilidade, e o mais rapidamente, óptica em que assenta toda a estrutura do Plano, parece-nos que outra região não está neste momento em condições tão favoráveis e prontas para satisfazer aquele fim como a região do Centro, nomeadamente a sub-região do Mondego, para a qual existem, além de 15 000 ha de terrenos dos mais ricos do País, um plano aprovado, estudos de solos, de estrutura das explorações agrícolas, projectos aprovados das barragens necessárias para a 1.ª fase, presença efectiva de pólos de crescimento, uma Universidade como apoio a todo o planeamento, estudos de planeamento regional já iniciados e em marcha, uma mentalidade da população nesse sentido - potencialidades reais que rapidamente podem contribuir para o crescimento do produto nacional.
Por outro lado, Sr. Presidente, as condições aleatórias em que vive o lavrador do vale do Mondego, com um rio ir controlado, que pode ser fortuna, mas também é desgraça, com cheias tardias, a prejudicar as sementeiras, ou precoces, a destruir uma colheita, levam-no a abandonar a terra, a deixá-la inculta ou a submetê-la à cultura florestal.
O Sr. Nunes Barata: - Muito bem!
O Orador: - Quem subir o Mondego encontrará nas aluviões ricas do vale o choupo já a dominar. Estes terrenos, dos melhores do País, numa altura em que se pretende elevar o crescimento médio anual do sector agrícola, não podem deixar de ter o seu melhor aproveitamento.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - No projecto do Plano em apreciação está previsto «dar-se início às obras de aproveitamento hidroagrícola do Mondego, que permitirão no futuro a defesa, enxugo e rega de 14 930 ha de terras ricas do seu vale».
Para isso e antes de mais, é urgente a construção da barragem a montante de Coimbra, que irá regularizar os caudais do rio, evitando desde logo as grandes cheias.
A lavoura atravessa uma grande crise, como ainda recentemente afirmou o Sr. Secretário da Agricultura. No entanto, em muitos casos, está na mão dos homens o poder melhorar-lhe as condições de vida. Está neste caso o Mondego, e para que a pobreza se transforme em riqueza nada falta - instituição legalizada para o planeamento regional, todos os elementos necessários à execução, planos e projectos aprovados, uma compreensão humana total, como a ambição de toda uma região que deseja ver u obra realizada.
Deixo aqui o meu voto para que a obra de regularização e aproveitamento do Mondego seja prioritária neste III Plano de Fomento, que irá vigorar a partir de 1968.
Sr. Presidente: Vou terminar, dando o meu voto de aprovação na generalidade à proposta de lei em discussão.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Como já tive ocasião de dizer, amanhã não haverá sessões plenárias. A razão é que o tempo que havia de ser ocupado por elas vai sê-lo pela vinda à Comissão Eventual dos Srs. Ministros das Comunicações e das Finanças, o primeiro às 10 horas e 30 minutos, o segundo às 15 horas e 30 minutos, a fim de esclarecerem problemas das respectivas pastas ligados com o III Plano de Fomento.
Depois de amanhã é feriado. No sábado e na segunda-feira precisam as Comissões de reunir para afinarem os textos de alterações possíveis na especialidade. De sorte que, havendo ainda muitos oradores inscritos e poucos dias utilizáveis para o plenário, marco para terça-feira duas sessões, a primeira às 11 horas e a segunda à hora regimental. Quanto aos outros dias, depois veremos as possibilidades que há. Faço isto porque sou forçado a fazê-lo em consequência da necessidade que há de dar ocasião a que trabalhem fora da sessão plenária a Comissão Eventual, a Comissão de Finanças e a Comissão de Economia. Os respectivos presidentes farão o favor de dispor as coisas por maneira que possam as ditas Comissões aproveitar em cheio estes dias.
Dito isto, declaro encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 30 minutos.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão.
Albano Carlos Pereira Dias de Magalhães.
André da Silva Campos Neves.
António Augusto Ferreira da Cruz.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António Calheiros Lopes.
Armando Cândido de Medeiros.
Fernando Afonso de Melo Giraldes.
Francisco Elmano Martinez da Cruz Alves.
Francisco José Cortes Simões.
Francisco José Roseta Fino.
Hirondino da Paixão Fernandes.
James Pinto Buli.
João Mendes da Costa Amaral.
José Coelho Jordão.
José Dias de Araújo Correia.
José Fernando Nunes Barata.
José Maria de Castro Salazar.
José de Mira Nunes Mexia.
José Rocha Calhorda.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Manuel Henriques Nazaré.
Manuel José de Almeida Braamcamp Sobral.
D. Maria Ester Guerne Garcia de Lemos.
Rogério Noel Peres Claro.
Rui Pontífice de Sousa.
Sebastião Garcia Ramirez.
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães.
Tito de Castelo Branco Arantes.
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Pacheco Jorge.
António dos Santos Martins Lima.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Aulácio Rodrigues de Almeida.
D. Custódia Lopes.
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Deodato Chaves de Magalhães Sousa.
Fernando de Matos.
Francisco Cabral Moncada de Carvalho (Cazal Ribeiro)
Henrique Ernesto Serra dos Santos Tenreiro.
Jaime Guerreiro Bua.
Jerónimo Henriques Jorge.
João Duarte de Oliveira.
José Guilherme Bato de Melo e Castro.
José Henriques Mouta.
José dos Santos Bessa.
José Soares da Fonseca.
Manuel Amorim Sousa Meneses.
Manuel Lopes de Almeida.
Martinho Cândido Vaz Pires.
Rafael Valadão dos Santos.
Rui Manuel da Silva Vieira.
Sebastião Alves.
D. Sinclética Soares Santos Torres.
O REDACTOR - António Manuel Pereira
Proposta enviada para a Mesa durante a sessão sobre a proposta de lei em discussão.
Proposta de aditamento
Proponho que ao n.º 1 da base XI seja aditado o seguinte: «tanto os relatórios anuais como o relatório geral serão submetidos à apreciação da Assembleia Nacional».
O n.º 1 da base XI passaria a ter a seguinte redacção:
O Governo publicará um relatório anual sobre a execução do Plano nos dez meses seguintes ao termo de cada ano e um relatório geral até ao fim do ano de 3974; tanto os relatórios anuais como o relatório geral serão submetidos à apreciação da Assembleia Nacional.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 29 de Novembro de 1967. - O Deputado, Júlio Alberto da Costa Evangelista.
IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA