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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.° 145

ANO DE 1968 8 DE MARÇO

ASSEMBLEIA NACIONAL

IX LEGISLATURA

SESSÃO N.° 145, EM 7 DE MARÇO

Presidente: Ex.mo Sr. Mário de Figueiredo

Secretários: Ex.mos Srs.
Fernando Cid de Oliveira Proença
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão ás 10 horas e 30 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente.

O Sr. Deputado Amaral Neto requereu informações a fornecer pelo Ministério das Comunicações.

O Sr. Deputado Duarte do Amaral requereu elementos a fornecer pelos Ministérios das Obras Públicas e da Educação Nacional.

O Sr. Deputado Nunes Barata requereu também informações a fornecer pelo Gabinete de Estudos e Planeamento Turístico.

O Sr. Deputado Paulo Cancella de Abreu abordou o problema dos incêndios nos campos.

O 8r. Deputado António Santos da Cunha falou sobre a vista à Assembleia dos parlamentares da República do Malawi, sublinhando o significado das boas relações que a mesma mantém com o nosso pais.

O Sr. Deputado Duarte de Oliveira tratou da questão do abastecimento de energia eléctrica de algumas povoações.

O Sr. Deputado Pinto de Mesquita fez considerações acerca da aplicação do Decreto-Lei n.º 46 673 e, evocou a figura de Raul Brandão a propósito do centenário do seu nascimento.

O Sr. Deputado Ernesto Lacerda aludiu aos efeitos das chuvas nos pavimentos das estradas, reportando-se especialmente ao que se passa com a estrada nacional n.º 110, no troço compreendido entre Pontão e Entroncamento.

O Sr. Presidente anunciou encontrar-se na Mesa um projecto de lei apresentado pêlos Srs. Deputados Júlio Evangelista, Colares Pereira e Tito Arantes para alteração do artigo 667.º do Código de Processo Penal, que vai ser enviado à Câmara Corporativa.

Ordem do dia. - Prosseguiu o debate sobre as contas gerais do Estado (metrópole e ultramar) e da Junta do Crédito Público relativas a 1965.

Usaram da palavra os Srs. Deputados Janeiro Neves, Ferrão Castelo Branco e Marques Teixeira.

Durante a sessão foi recebido na Mesa um requerimento apresentado pelo Sr. Deputado Furtado dos Santos, pedindo várias publicações oficiais.

O Sr. Presidente encerrou a sessão às 19 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai fazer-se a chamada.

Eram 16 horas e 15 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Albano Carlos Pereira Dias de Magalhães.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Pacheco Jorge.
Albino Soares Pinto dos Beis Júnior.
Álvaro Santa Rita Vaz.
André Francisco Navarro.
André da Silva Campos Neves.
Aníbal Rodrigues Dias Correia.
Antão Santos da Cunha.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António Calapez Gomes Garcia.
António Calheiros Lopes.
António Furtado dos Santos.
António José Braz Regueiro.
António Júlio de Castro Fernandes.

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António Magro Borges de Araújo.
António Maria Santos da Cunha.
António Moreira Longo.
António dos Santos Martins Lima.
Armando Acácio de Sousa Magalhães.
Armando Cândido de Medeiros.
Armando José Perdigão.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Alves Moreira.
Artur Correia Barbosa.
Artur Proença Duarte.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Augusto Salazar Leite.
Avelino Barbieri Figueiredo Batista Cardoso.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Deodato Chaves de Magalhães Sousa.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando Afonso de Melo Giraldes.
Fernando Cid de Oliveira Proença.
Fernando de Matos.
Filomeno da Silva Cartaxo.
Francisco António da Silva.
Francisco Cabral Moncada de Carvalho (Cazal Ribeiro)
Francisco José Cortes Simões.
Francisco José Roseta Fino.
Gonçalo Castel-Branco da Costa de Sousa Macedo Mesquitela.
Gustavo Neto de Miranda.
Henrique Veiga de Macedo.
Hirondino da Paixão Fernandes.
Horácio Brás da Silva.
Jerónimo Henriques Jorge.
João Duarte de Oliveira.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Jorge Barros Duarte.
José Alberto de Carvalho.
José Fernando Nunes Barata.
José Gonçalves de Araújo Novo.
José Henriques Mouta.
José Janeiro Neves.
José Manuel da Costa.
José Maria de Castro Salazar.
José de Mira Nunes Mexia.
José Pais Ribeiro.
José Pinheiro da Silva.
José Rocha Calhorda.
José dos Santos Beasa.
José Soares da Fonseca.
José Vicente de Abreu.
Júlio Dias das Neves.
Leonardo Augusto Coimbra.
Luciano Machado Soares.
Luís Arriaga de Sá Linhares.
Luís Folhadela Carneiro de Oliveira
Manuel Colares Pereira.
Manuel João Correia.
Manuel João Cutileiro Ferreira.
Manuel Marques Teixeira.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
D. Maria de Lourdes Filomena Figueiredo de Albuquerque.
Mário Amaro Salgueiro dos Santos Galo.
Mário de Figueiredo.
Miguel Augusto Pinto de Meneses.
Paulo Cancella de Abreu.
Raul da Silva e Cunha Araújo.
Rogério Noel Feres Claro.
Rui Manuel da Silva Vieira.
Rui Pontífice de Sousa.
Sebastião Alves.
Sebastião Garcia Ramirez.
Sérgio Lecerele Sirvoicar.
Simeão Pinto de Mesquita de Carvalho Magalhães.
D. Sinclética Soares Santos Torres.
Teófilo Lopes Frazão.
Tito Lívio Maria Feijóo.
Virgílio David Pereira e Cruz.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 94 Srs. Deputados.

Está aberta a sessão.

Eram 16 horas e 30 minutos.

Antes da ordem do dia

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Telegramas

Vários apoiando o discurso do Sr. Deputado Elmano Alves sobre a ligação ferroviária da Ponte Salazar com a região da Moita.

Da Sociedade Panificadores Reunidos da Póvoa de Varzim, L.dª, agradecendo considerandos sobre panificação.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para um requerimento, o Sr. Deputado Amaral Neto.

O Sr. Amaral Neto: - Sr. Presidente: Pedi a palavra para enviar para a Mesa o seguinte

Requerimento

Nos termos constitucionais e regimentais, requeiro que, pelo Ministério das Comunicações, me sejam prestados os seguintes informes, relativamente a automóveis de transporte de mercadorias, discriminando para cada série de elementos, consoante seja cabido, entre veículos ligeiros e pesados, e, quanto a uns e a outros, entre particulares e de aluguer, e ainda por raios dos círculos limites das áreas de trânsito:

1) Números dos veículos em circulação no fim do ano de 1967;

2) Importâncias liquidadas no ano de 1967 a título de imposto de circulação sobre estes veículos;

3) Números de requerimentos de licença para o exercício da indústria de transportes de aluguer de mercadorias pendentes de despacho em 31 de Dezembro de 1963; e

4) Números de requerimentos de licença para o exercício da indústria de transportes de aluguer de mercadorias apresentados em cada um dos anos de 1964 a 1967, inclusive, e dos despachos, de deferimento e de indeferimento, que sobre os mesmos hajam sido proferidos.

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O Sr. Duarte do Amaral: - Sr. Presidente: Pedi a palavra para apresentar os seguintes

Requerimentos

A Câmara Municipal de Guimarães requereu em Maio de 1958 - há quase 10 anos! -, com o acordo das suas congéneres de Felgueiras, Fafe, Cabeceiras de Basto e Lousada, ao abrigo da Lei n.° 2082, de 4 de Junho de 1956, e do Decreto n.º 41 035, de 2 de Março de 1957, a criação de uma região de turismo com sede naquela cidade e abrangendo os concelhos citados.

Foram até agora criadas, pelo menos, a Região de Turismo da Serra da Estrela, com sede na Covilhã, e abrangendo os concelhos da Covilhã, Belmonte, Fundão, Gouveia, Manteigas e Seia, a da Ilha da Madeira, a de Ponta Delgada, a de Angra do Heroísmo, a da Serra da Arrábida, com sede em Setúbal, e a do Marão, que abrange os concelhos de Amarante, Baião, Celorico de Basto, Marco de Canaveses, Mesão Frio, Mondim de Basto e de Vila Real, sua sede.

Para me esclarecer sobre a diversidade de critérios que tanto tem prejudicado o desenvolvimento da minha região, pondo-a em atraso relativamente a outras nem mais nem menos merecedoras, porque todas são igualmente portuguesas, para saber a razão pela qual não se tem atendido ao solicitado e às inúmeras diligências feitas em mais de dez anos, requeiro que, pela Presidência do Conselho, me sejam facultadas cópias dos processos e despachos que levaram à criação das regiões de turismo existentes e igualmente me seja enviada toda a documentação que dê conta dos motivos pêlos quais a de Guimarães ainda não tem existência.

A obra de dignificação e embelezamento do conjunto constituído pelo Castelo de Guimarães, pela Igreja de S. Miguel, pelo Campo de S. Mamede e pelo Paço dos Duques - essa colina sagrada da Pátria - foi aspiração muito antiga dos melhores portugueses e das pessoas que amam as coisas belas e representativas dos valores do espírito. Não é para aqui fazer a história da forma como Guimarães aspirou e conseguiu realizá-la, mas ela vai desde o protesto ao rei por se estar a empregar a pedra destes monumentos em obras utilitárias até ao interesse de vereações municipais anteriores ao 28 de Maio. Era uma aspiração de todos os portugueses cultos e amantes da sua Pátria. Acabou por ser realizada a pedido e com a laboração activa de bons vimaranenses e da sua Câmara Municipal, com grandeza anteriormente nunca sonhada, pelo Sr. Doutor António de Oliveira Salazar e engenheiros Duarte Pacheco e Arantes e Oliveira.

Procede-se actualmente, poucos anos depois destas importantes obras acabadas, à abertura de urna rua em zona que parece dever ser de protecção a tal conjunto monumental.

Em cidade que precisa de muitas ruas, não se sabe se esta se devia abrir e sobretudo teme-se o aspecto das construções que ali se queiram levantar, ali, em local onde tantas casas foi preciso comprar para demolir.

Em vista do exposto requeiro, com a maior urgência, pelos Ministérios das Obras Públicas e da Educação Nacional, todos os elementos necessários ao conhecimento exacto do problema, e designadamente:

Projecto completo da rua que, na cidade de Guimarães, se está a construir entre a estrada nacional n.° 101, de Guimarães a Amarante, e o parque que circunda os históricos monumentos;

Parecer do urbanista que estudou os problemas;

Parecer da Direcção-Geral de Urbanização, visto essa obra não constar, segundo creio: do plano existente;

Parecer da Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais e da Junta Nacional da Educação;

Plano de loteamentos;

Cérceas, tipos e materiais das construções que se pretendo realizar.

O Sr. Nunes Barata: - Sr. Presidente: Pedi a palavra para apresentar o seguinte

Requerimento

Em 8 de Março de 1956, faz portanto agora dois anos, requeri, nesta Assembleia Nacional, que me fossem fornecidos "exemplares dos estudos realizados sobre turismo e indústria hoteleira por intermédio do Gabinete de Estudos o Planeamento Turístico".

Não obstante o longo período de tempo entretanto decorrido, a pretensão formulada em Março do 1966 não teve até agora qualquer resposta.

Eis por que insisto de novo no pedido, solicitando também cópias dos estudos realizados posteriormente a Março de 1966, com a mesma finalidade.

Requisito ainda que o Comissariado do Turismo me forneça cópia dos estudos porventura realizados sobre:

1) As consequências previsíveis da desvalorização da libra e da peseta na conjuntura turística portuguesa.

2) Os presumíveis efeitos das medidas preconizadas no plano Johnson sobre o turismo norte-americano em Portugal.

3) As providências propostas pelo Comissariado do Turismo em ordem a obviar aos possíveis efeitos negativos das referidas desvalorizações da moeda e anunciadas restrições à saída de turistas americanos.

O Sr. Paulo Cancella de Abreu: - Sr. Presidente: Aproxima-se a quadra dos incêndios!

O problema dos incêndios, de que já há tempo resolvera ocupar-me, é deveras importante e bem digno de ser contemplado na Assembleia Nacional. Do mesmo modo pensa o nosso prezado colega Sr. Dr. Augusto Simões, pois há dois dias, na ordem do dia, referiu-se ao assunto, dando-lhe igual importância e manifestando o propósito de vir a ocupar-se dele noutra oportunidade com o desenvolvimento merecido e propor medidas eficazes.

E a presente oportunidade é também manifesta, tendo-se em vista especialmente a maior frequência dos incêndios, a sua maior intensidade e o incalculável volume dos danos causados.

E isto sem falar na irreparável perda de vidas.

Nomeadamente, desde há cerca de dois anos, o aumento do número de incêndios tem sido notório e alarmante.

E porquê?

Porquê o acentuado aumento da sua frequência?

Porquê o grande aumento da sua intensidade?

Porquê o aumento dos danos causados?

Admitindo, aliás sem conceder, que é meramente ao acaso que deve atribuir-se o aumento da frequência dos incêndios, já será difícil pensar do mesmo modo quanto

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à sua maior intensidade e do consequente volume dos prejuízos resultantes, pois podia dar-se o caso de serem mais numerosos os incêndios e, todavia, serem menores a sua intensidade e os danos. Mas, infelizmente, não tem sido esta a realidade. Quanto às perdas de vidas, basta recordar a horrorosa tragédia da serra de Sintra, onde morreram asfixiados mais de duas dezenas de jovens soldados com o seu comandante.

É certo, porém, que o mesmo não sucedo com referência a incêndios em prédios urbanos, pois, na realidade, deve ter diminuído acentuadamente a sua frequência nesses prédios, especialmente quando não se trata de fábricas, oficinas, depósitos, armazéns, etc.

E é compreensível que assim aconteça, dada a simples razão de serem cada vez mais numerosos os edifícios em cuja construção não são empregadas madeiras e outros materiais de fácil combustão, mais sim tijolo, cimento, vidraça e ferro e outros metais.

É certo que se dá o caso de terem sido pasto das chamas algumas casas de espectáculos em curto espaço de tempo; mas trata-se de casos esporádicos constituídos por edifícios antigos e guarnecidos com material facilmente inflamável.

Quanto aos incêndios em propriedades rústicas dos particulares, o flagelo é cada vez maior, apesar dos esforços que se empregam para os combater. Mesmo já antigamente a sua frequência levou a dizer-se que o conde de Santa Maria, alarmado com o grave problema, reclamara no Parlamento que fosse colocada uma bomba ao pé de cada incêndio antes de este deflagrar! . . .

Aliás, mesmo relativamente à propriedade rústica, há que fazer distinção, pois, longe de aumentar, tem diminuído acentuadamente o número de incêndios nas matas do Estado a cargo dos nossos excelentes serviços florestais, que já abrangem uma área de cerca de 350 000 ha e estão a aumentar numa média anual de 12 a 15.

Sucede assim graças aos cuidados de limpeza e ao aperfeiçoamento dos serviços de vigilância e de defesa, efectuados mediante brigadas de guardas florestais e com colocação de numerosos postos de alarme, munidos de telefones e de outros sistemas de alerta, e ainda, nalguns casos, a formação de talhões separados por arrifes e aceiros.

Ora, nada disto se verifica geralmente nas propriedades rústicas particulares, especialmente nas Beiras - das quais a Beira Alta é porventura a maior vítima. Haja em vista o que se passa, por exemplo, nas encostas do Leste do distrito de Aveiro.

É certo que no que sucede deve, sem dúvida, influir o aumento substancial da área de plantações de arvoredo, formando matas ou florestas por vezes muito extensas.

Influência se pode também atribuir um pouco ao aumento das sementeiras de cercais nos declives ou encostas dos montes, que, depois de maduras, se tornam inflamáveis, bem como, depois, o são os respectivos restolhos.

Mas isto não é tudo. Melhor, não é o principal. É que, infelizmente, nas plantações particulares existe geralmente o grande perigo dos fogos originados no desenvolvimento de matos, de tojos, de fetos, de carqueja, enfim, de tudo o que seca no Verão e, portanto, se torna facilmente inflamável.

Sim. Aí se encontra, sem dúvida, o rastilho, talvez o mais propício de todos, para a deflagração dos incêndios e seu rápido e incentivei incremento.

E, assim, o começo concretiza-se na negligência, ou mesmo em simples imprudências. Uma fogueira, ou "queimada", mal extintas, uma ponta de cigarro, ou um fósforo, ainda acesos, as faúlhas de chaminés, etc., são algumas das origens mais frequentes. Ainda que lhes pese, os fumadores são grandes responsáveis, dado o seu péssimo costume do arremessarem as pontas dos cigarros ou os fósforos acesos, especialmente quando o fazem pela janela do seu automóvel em andamento.

Há também os casos de fogo posto por malvadez ou vingança, geralmente difíceis do determinar; e, portanto, ficam impunes.

Nas circunstâncias que, por brevidade, resumidamente deixo esboçadas, o grave problema dos incêndios tem de ser contemplado pelos serviços e entidades competentes, e pelos próprios interessados; e estes não só por dever de solidariedade e auxílio mútuos, mas também por interesse próprio.

E para grandes males, grandes remédios.

Assim, julgo que se impõe a obrigatoriedade de, sob pena de multa, os próprios donos das propriedades procederem periodicamente à limpeza e retirada de todas as plantas secas, nomeadamente matos, tojos, fetos, carqueja, etc. Isto de dois em dois anos, pelo menos, ou porventura todos os anos, numa faixa marginal das estradas, dos caminhos, dos atalhos ou picadas e demais pontos de acesso e trânsito público.

Nos parques de campismo, deviam ser aturadas a vigilância e a limpeza.

Certo é que os matos e outras plantas são muito aproveitados para camas do gado, ou para, curtidos ou não, adubarem as terras. Mas o interesse geral e a segurança da vida e fazenda próprias e alheias sobrepõem-se.

Em resumo e conclusão:

Estamos manifestamente em presença de um assunto que exige estudo e providências drásticas e urgentes da parte não só dos particulares, mas também do Estado e das autarquias locais, pois é necessário que aquele e estas compreendam que se truta de um problema cada vez mais importante e sério, que reveste aspectos do maior vulto, mesmo de autêntica calamidade, com projecção na economia nacional .

Faz-se mister uma constante recomendação dos cuidados contra os incêndios, nas escolas, nus igrejas, mediante cartazes, pela rádio, etc.

É certo que alguma atenção se lhe dedicou desde recuados tempos. Assim, por exemplo, datam de 1395, pelo menos, as precauções oficiais contra incêndios, pois, por Carta Régia de D. João I, foi estabelecido que "os pregoeiros da cidade saíssem de noite pelas ruas a avisar, em voz alta, os moradores de que deviam tomar cuidado com o lume em suas casas"; e através dos tempos, não faltou nunca o socorro e o auxílio das próprias populações.

Extraordinária e relevante costuma ser a sua colaboração activa em todos os trabalhos de extinção ou de redução das proporções dos incêndios e dos rescaldos, com o emprego de todos os meios possíveis, já acarretando água transportada de longe em toda a espécie de vasilhas, já empregando ramos de árvores e arbustos, ou abrindo clareiras isoladoras, etc.

Antigamente, e creio que mesmo hoje, ainda em muitas povoações, os sinos tocam a rebate ou, mediante o número das suas badaladas, indicam o local do incêndio; e toda n população válida acode, percorrendo léguas, se necessário for, extenuando-se no serviço do próximo.

As mulheres, se não podem acorrer, gritam ao fogo, postadas nas portas ou janelas das suas casas, espavoridas, desgrenhadas, alertando toda a gente; e fazem-no tão aflitivamente que, especialmente de noite, apavoram as populações.

E especialmente nos horríveis transes que a nossa gente dá mostras da sua bondade, revela quanto é capaz de sacrificar-se pelo seu semelhante, dá tudo por tudo para

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valer-lhe na desgraça, pura defender a sua vida e os seus haveres. Enfim, torna suas próprias as dores alheias.

Por isso, com verdade, me dizia em tempos o prior da minha terra: "O nosso povo leva-se com um fio do seda; questão é saber conduzi-lo".

E os bombeiros?

Escusado será. realçar a sua acção, revelada em cada momento, através das suas beneméritas corporações, mesmo que riem sempre estejam habilitadas com recursos ou meios suficientes para tão arriscada missão.

Os serviços de incêndios estão regulados no Código Administrativo de 1940 e no Decreto n.° 38 439, de 27 de Setembro de 1951, que substituiu o Decreto n.° 35 857, de 11 de Setembro de 1940; e o seu serviço coordenador é exercido pelo Conselho Nacional dos Serviços de Incêndios, criado pelo Decreto n.° 35 746, de 12 de Julho de 1940, junto da Direcção-Geral de Administração Política e Civil, do Ministério do Interior, hoje entregue à competência e dedicação do Dr. António Pires de Lima. E outras medidas posteriores existem sobre o assunto.

Como se sabe, as corporações são constituídas por sapadores bombeiros em Lisboa e no Porto, por bombeiros municipais, obrigatórios nos concelhos de l.ª ordem, por bombeiros voluntários e ainda por bombeiros privativos.

Todas estas categorias exercem abnegadamente as suas humanitárias atribuições, acorrendo a Iodos os incêndios deflagrados no seu concelho ou naqueles para que sejam requisitados conforme o artigo 160.º do Código Administrativo, ou mesmo por iniciativa própria, como muitas vezes acontece; e não se limitam a extinguir incêndios, pois comparecem indistintamente onde é necessário ou em casos de acidentes, de transportes de doentes, etc.

Acresce que os voluntários, em geral, não recebem, qualquer retribuição individual e poderá mesmo dar-se n circunstância, aliás pouco provável, de sofrerem desconto ou abatimento nos seus vencimentos fixos ou salários, relativos ao tempo em que têm de ausentar-se do seu serviço normal; mas será desumano que assim suceda.

É certo que, além das quotizações dos associados contribuintes e de companhias de seguros, há anualmente a do Estado, distribuída conforme proposta do mencionado Conselho dos Serviços de Incêndios, aprovada pêlos Ministros do Interior e das Finanças. Mas o seu destino é normalmente para aquisição, renovação e reparação de material de incêndios e ambulâncias, quando necessários.

Os bombeiros tudo merecem. Os bombeiros de tudo são dignos, pois arriscam constantemente a própria vida para salvar a vida e fazenda alheias.

A mim basta-me apresentar, a mero título de exemplo, os da minha terra, que ainda no último Verão demonstraram bom a sua coragem e o seu valor, arriscando a vida para salvar a do seu semelhante, pois impediram, com o auxílio de outros, as terríveis consequências do incêndio numas caves, onde se armazenava grande quantidade de vinhos de toda a natureza e de álcool e outros produtos inflamáveis.

Enfim: não há exagero em tudo o que deles digamos, nem é excessivo tudo o que se lhes faça, tanto mais que a reputação dos nossos bombeiros é internacional!

O New York Times, por exemplo, classificou de briosos os bombeiros portugueses, acrescentando que eles "ganharam estima em todo o Mundo", e acrescenta que são "pau para toda a obra", "têm fama mundial e já ganharam muitos prémios internacionais"!

Que mais é necessário acrescentar?

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. António Santos da Cunha: - Sr. Presidente: Pedi a V. Ex.ª que mu concedesse a palavra porque entendi ser necessário dar o devido relevo à presença, nesta Casa, dos ilustres parlamentares da República do Malawi, nação nossa vizinha e nossa amiga, que, negando a sua solidariedade aos movimentos racistas que estão perturbando e conduzindo ao caos a África, demonstrou depressa a sua maturidade política e capacidade, para fazer parte do convívio das Nações, demonstrando ainda a inteligência e bons princípios que orientam os seus dignos governantes.

Na verdade, o Malawi, nosso vizinho em ferras africanas, vizinho da nossa província de Moçambique, tem dado provas de um espírito de larga colaboração com os povos de todas as raças, afirmando-se, dessa maneira, como um povo pioneiro da paz e amante do progresso dos povos.

Todos sabemos o quanto são amistosas as relações entre o Governo Português e o da República do Malawi, nação que daqui saúdo fraternalmente e com orgulho de quem vê no seu povo o expoente de uma civilização que, nós os Portugueses, levamos às terras africanas, facho que não podemos deixar apagar, e nos está custando sacrifícios de toda a ordem, e que a Nação suporta na certeza de que não pode negar-se a si própria, deixando entregue ao terrorismo internacional os nossos irmãos de todas as crenças e etnias. Saúdo, pois, os ilustres parlamentara que se encontram na bancada de honra desta Assembleia, saúdo-os com a mais viva simpatia, e afirmo-lhes n minha admiração e o meu respeito, pelo espírito de colaboração que melhor se ajusta aos interesses da humanidade.

Que Deus faça com que o Malawi prossiga na sua rota de paz e trabalho, são os votos sinceros do Portugal, vizinho e amigo, pronto a dar-lhe todo o apoio, no sentido de levar a bom termo a cruzada comum que devo unicamente preocupar os homens com responsabilidades no continente africano, ou seja a promoção social das suas gentes.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Duarte de Oliveira: - Sr. Presidente: Conhecedor dos anseios de algumas populações rurais, que não acabam de compreender a demora na electrificação das suas terras e das preocupações de alguns presidentes de câmaras municipais que já aceitaram a impossibilidade do satisfazer, nos anos mais próximos, aqueles anseios, propus-me dizer duas palavras sobre aquilo que julgo ser o obstáculo primeiro ao fornecimento de energia eléctrica a muitas aldeias do País.

Serei breve, como sempre, e por isso abstenho-me de considerar a necessidade primária que é para todos os homens a luz eléctrica.

É um bem que a Administração, na qual, neste caso, ocupam um lugar cimeiro as câmaras municipais, hoje tem obrigação estrita de levar a todos.

O Governo, pelo Ministério da Economia, tem comparticipado em notável medida a electrificação rural, que apesar disso, em algumas zonas do País, ainda sofre confrangedor atraso.

Isto mesmo o jornal O Século, em editorial de 20 de Janeiro deste ano, fazia sentir ao afirmar que a energia não chega ainda a zonas que, consideradas no conjunto, correspondem à maior parte do território.

Ora, é preciso que a distribuição da energia beneficie toda a gente, porque todos os portugueses, em maior ou

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menor grau, proporcionaram ao Estado os recursos financeiros que ele utiliza, em escala crescente, no fomento da produção.

Esse atraso, porém, na maioria dos casos, tem a sua explicarão em factos que ilibam as câmaras municipais da responsabilidade que, porventura, se lhes queira atribuir por inacção.

Refiro-me à circunstância de haver câmaras municipais que, por exigências do momento, apareceram como distribuidoras de energia eléctrica, em baixa tensão, nos seus concelhos.

É uma situação que a maioria delas, de bom grado, cederiam i empresa distribuidora em alta, mas que esta rejeita, pois vende energia sem as preocupações de construção e manutenção da rede de baixa tensão, a cargo daquelas. Até aqui, estão no seu pleno direito.

Mas vejamos o que se passa: A câmara instala a baixa tensão, e constrói as cabinas de transformação com a comparticipação do Estado, obrigando-se as empresas distribuidoras a transportar a energia que vendem àquelas em alta tensão ate às referidas cabinas.

Surge agora uma anomalia que me parece incompreensível. E é o seguinte: as empresas distribuidoras, a quem pertence a rede de alta tensão, que são obrigadas pelos contratos a transportar a energia em alta até às cabinas, onde esta é contada, exigem às câmaras o pagamento dessa rede de alta.

E as câmaras, se querem electrificar os seus concelhos, têm que pagar uma rede que não ú sua a uma empresa distribuidora que não podo distribuir, que não é distribuidora, portanto, sem a alta tensão.

Acresce que o Estado não comparticipa a alta tensão, e muito bem, porque ela é propriedade das empresas particulares, estas exigem pela alta às câmaras o que lhes apetece, porque são elas a fixar o preço, e daí a incapacidade das câmaras para levarem a efeito a obra de electrificação que se impõe.

As câmaras, distribuidoras em baixa tensão, pagam a baixa tensão e as cabinas, pagam a energia ao preço fixado, como lhes compete, e ainda a rede de alta tensão, que lhes não compete, ao preço que lhes exigem.

Isto faz lembrar uma empresa de transporte de passageiros que cobrasse o bilhete e ainda obrigasse, por fora, os passageiros a pagarem os veículos transportadores.

Parece-nos a nós que isto esta errado e, sobretudo, que é flagrantemente injusto.

Julgo prestar um bom serviço a algumas câmaras e às populações rurais trazer este caso a público.

Trata-se, em nosso ver, de uma anomalia na actividade económica que deve ser corrigida por contactos entre governante e empresário.

O Sr. Ministro da Economia, sabedor profundo dos assuntos do seu Ministério e sempre pronto a solucionar os problemas que lhe dizem respeito, dará a resolução rápida e justa que o assunto requer e as câmaras pedem.

Basta um simples despacho ou portaria para repor as coisas no sou devido lugar - despacho que se impõe muna época em que a- promoção do bem-estar rural é palavra de ordem, bem compreendida por aquele Ministério, e para salvaguardar os dinheiros públicos.

Somos dos que desejamos empresas prósperas, com vitalidade económica que lhes proporcione crescimento, mas discordamos de situações muito fronteiras do enriquecimento sem causa.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Pinto de Mesquita: - Sr. Presidente: Terá por objecto este meu breve antes da ordem do dia dois temas, um respeitante a matéria de administração pública, outro do índole comemorativa, dentro daquilo que se qualifica política do espírito: "Nem só de pão vive o homem", o proclamou Cristo frente ao tentador. Ambos os temas, porém, com o denominador comum de solicitude pêlos tão desfavorecidos meios rurais.

Relaciona-se o primeiro destes assuntos especialmente com curto número de complicações práticas levantadas pela aplicação do Decreto-Lei n.° 46 673, de 29 de Novembro de 1965, através das pastas do Interior e das Obras Públicas. Visa tal diploma- o pôr ordem nos loteamentos a urbanizar. Estes em certas regiões, com decididas perspectivas para tal efeito, começaram a ser aproveitados espontânea, indiscriminada e indisciplinadamente, contrariando os planos de futuros aproveitamentos, além de dar lugar a inconvenientes abusos especulativos. Isto mormente na região do influência de Lisboa, em menor escala na do Porto, e ainda em centros de expansão turística.

Por carência de meios legais, os respectivos municípios c os serviços estaduais de urbanização viam-se impotentes para exercer acção disciplinada e fiscalizadora. Ora, para se obstar à criação de núcleos habitacionais ao arrepio de ordenada urbanização regional se promulgou o citado decreto-lei, que tende a evitar loteamentos sem prévia garantia das necessárias infra-estruturas. Assim reza o seu relatório.

No subsequente articulado se define em que consiste o loteamento, mas faz-se em termos por de mais genéricos, aplicando-o a casos, quer de alienação em zonas urbanas, com planeamentos aprovados, quer sem estes, quer mesmo em zonas rústicas. Refere-se inclusive à eventualidade de as visadas construções prejudicarem sítios e paisagens de interesse.

Não contestamos, e antes aplaudimos, a directriz de evitar despautérios construtivos - embora mais graves e frequentes ainda os tenha havido destrutivos -, despautérios, repetimos, irremediáveis ou de difícil e caro remédio. Mas é evidente que no propósito do diploma se encara sobremaneira a expansão dos grandes aglomerados, e foi precisamente para obtemperar a abusos em tais perímetros que ele se promulgou. Ora estes, quanto à respectiva área, correspondem a escassa porção do território metropolitano.

Sucede, porém, que os termos genéricos e até equívocos, por elásticos, em que a lei se articula- têm vindo a provocar na sua aplicação dúvidas, incertezas o disparidades de critérios municipais, e notariais, particularmente pelo que respeita a correspondentes actos de venda de terrenos para construção. Isto não pode deixar de repercutir-se gravemente nas zonas provincianas, provocando inconveniente retraimento na construção de casas de carácter rústico pêlos riscos que o receio de infracções provoca, dado o montante das penalidades.

Parece-nos por isso merecer o referido diploma ver-se convenientemente regulamentado, RC não esclarecido, no sentido de melhor se definiram critérios para os loteamentos em que se aplica, e ainda que cada câmara assente partindo de critérios não díspares as zonas a ficarem sujeitas às respectivas disposições. Através, inclusive, de instruções dirigidas aos sectores administrativos interessados, c particularmente aos municípios, também algo se poderá obter no sentido de mais criterioso ajustamento dos preceitos legais às circunstâncias locais.

Compre-nos, por isso, chamar especialmente a atenção das citadas estâncias governativas para as anomalias cx-

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postas e para a necessidade de se corrigirem, atenuando-se ao máximo as incertezas e perplexidades a que a efectivação da lei tem dado lugar.

Inspira-nos sobremaneira, neste pedido, devida solicitude para com os tão desprotegidos meios rurais, cuja adaptação aos processos de vida actual, indispensável, mas lenta, se vê perigosamente posta em causa por exageros evitáveis de urbanismo e outros.

Sr. Presidente: Precisamente esta solicitude para com o desprotegido povo miúdo do nosso meio agrário me traz à lembrança a figura de Raul Brandão, cujo ano de comemoração centenária fecha nos próximos dias. Raul Brandão, que comovidamente tratou dos rurais e dos pescadores nos seus formosos livros.

Tem este escritor lugar entre os três grandes homens de letras cujo centenário de nascimento se tem vindo desenrolando, a par de Nobre e Camilo Pessanha.

Doía-me, como seu concidadão do Porto, onde nasceu na Foz do Douro, e como Deputado pelo círculo, que o seu nome de projecção nacional, a propósito das homenagens pelo seu centenário, não fosse lembrado neste recinto, o da Representação Nacional.

Como natural do Porto, já homenageei aqui António Nobre, cabe-me agora algo dizer ainda de Raul Brandão.

Essa cidade, sua pátria, e a de Guimarães, em cuja vizinhança, em Nespereira, passou os últimos anos de vida, souberam condignamente comemorar o seu centenário, erigindo-se-lhe um monumento no Passeio Alegre, frente ao Cabedelo, além de diversas outras homenagens culturais, afora ter sido objecto de- numerosos artigos nas revistas e páginas literárias.

Dispensável me parece, por isso, insistir no que anda na lembrança de todos. Tanto se trate das suas obras chamadas de ficção - como tais se deverão literariamente qualificar A Farsa, Os Pobres, Húmus? - ou dos seus espantosos frescos históricos, El-Rei Junot, A Conspiração de 1817, ou na sua marinharia pictórica, com o indispensável elemento humano, Os Pescadores, As Ilhas Desconhecidas, ou no teatro e no jornalismo, ou, finalmente, nos três volumes de Memórias, indispensável subsídio para o estudo da época que vem de há volta do Ultimato às cercanias do 23 de Maio.

Em vez de ter a pretensão de algo acrescentar ao muito que sobre este notável homem de letras se tem discreteado, e bem, para fecho destas desataviadas regras, permitimo-nos transcrever dessas obras dois curtos, mas significativos, trechos, um que reflecte a sua personalidade, o outro em que traduz a essência do seu pensamento quanto ao caminho válido para uma restituição nacional.

É o primeiro logo da entrada de A Farsa:

E noite, cerração compacta, névoa e granito formam um todo homogéneo para construírem um imenso e esfarrapado burgo de pedra e sonho. . .

De pedra e sonho! Este trecho é como que uma projecção para o mundo exterior do mundo interior que lhe ia na alma! É o alar-se do sensitivo cru da realidade das coisas circundantes para outra, como que espécie de realismo nele sempre alerta, o do sonho!

Este trecho reflecte bem a alma do seu autor: basta insuflar à magma das coisas permanente fosforescência com chispas de génio, na gestação onírica.

Vejamos agora o segundo trecho, extraído da última página, do seu último livro de Memórias, subtitulado Faie de Josafat, no decurso do qual se focam as agitadas coisas e gentes acontecidas depois do regicídio, até próximo à sua morte. Assim, esse trecho reveste o selo conclusivo de verdadeiro testamento sobre o fundo do seu pensamento quanto à medicina de que a nação andava carecida.

Proclamava ali Brandão:

Portugal é uma pátria, porque, para ter uma pátria, o essencial é merecê-la, e nós temo-la merecido, mais e melhor do que muitos dos grandes países desse mundo.

O que é preciso é criar quanto antes novas elites. Diga-se tudo: as nossas últimas convulsões são uma, luta inconsciente de sangue que procura um ideal e não o encontra.

E assim, Sr. Presidente, o próprio escritor soube auto-outorgar-se o melhor fecho que se poderia invocar para as homenagens devidas à- sua memória.

Assim disse Raul Brandão e com ele nós.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Ernesto Lacerda: - Sr. Presidente: Depois de um Estio algo prolongado, esgotante para os mananciais, chegaram enfim, as chuvas que ultimamente, com uma abundância e regra providenciais, têm fustigado o Puís de norte a sul.

Elas são bem necessárias para retemperar os desgastes sofridos pelas nascentes e indispensáveis às terras sequiosas que os agricultores, na sua luta ingente, necessitam de revolver em busca de sempre esperançosas compensações.

Este sector bem ansiava por elas e bem benéficos se mostram já os seus efeitos.

Também as albufeiras, vazias do seu precioso conteúdo, apresentavam aspecto desolador, com todo o cortejo de inconvenientes para a economia do País, por minguada produção de energia eléctrica.

Mas, se, por um lado, vieram trazer-nos, essas chuvas, melhores perspectivas nestes e noutros aspectos, por outro, começa do agravar-se o estado lamentável de algumas estradas nacionais.

É a este momentoso problema que, muito rapidamente, queremos referir-nos.

Como é untura], prolongam-se os rigores do Inverno, sempre propícios ao desmantelamento dos pavimentos, principalmente daqueles que já se encontram em pior estado de conservação.

Embora o acaso se nos apresente com carácter de generalidade, queremos, entretanto, realçar o que se passa com a estrada nacional n.° 110, no troço compreendido entre Pontão, Tomar e Entroncamento.

Já tivemos oportunidade de nos referirmos nesta Assembleia à situação desta estrada, chamando para ela a atenção do Ministério das Obras Públicas. Agora, como então, estão de pó os motivos que justificaram aquela nossa intervenção e, como é natural, ainda reforçados por pouco ou nada se ter feito no intuito de os modificar.

Chamava então a atenção daquele Ministério para o estado em que se encontrava a estrada nacional n.° 110 e dizia que não se julgasse que esta estrada estava abandonada ou fora dos cuidados das Direcções de Estradas de Leiria e de Santarém, departamentos a quem compete zelar pelo seu estilo de conservação. Polo contrário, elas tinham desenvolvido esforços notáveis no sentido de assegurarem, dentro dos limites possíveis, a sofrível utilização do seu pavimento. Não tinham, porém, logrado o domínio da situação, nem era de esperar, com os meios de que dispõem, que tanto tivesse sucedido.

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Efectivamente, o pessoal permanente cios respectivos sorvidos de conservação não se reputa o necessário paru tão grande cometimento e, não se desconhecendo a enorme dificuldade em recrutar pessoal eventual assalariado - a preciosa mão-de-obra que nesta região escasseia em crescendo impressionante -, bem se compreende a ineficácia dos trabalhos enfrentados.

De resto, eles constituem uma improvisação, uma acção de emergência todos os anos posta em prática como rescaldo infrutífero dos Invernos rigorosos e dos efeitos do tráfego intenso a que aquele troço está sujeito.

Tantos têm sido os assentamentos, tantas têm sido as remendagens, que pouco resta do pavimento primitivo, já de si antiquado e de características que de maneira alguma se coadunam com as exigências do trânsito actual.

Deste estado de coisas emergem contrariedades e inconvenientes de evidente importância, que se traduzem em desgaste prematuro do material rodoviário e em sérios problemas de comodidade e, sobretudo, de segurança para os seus utentes.

A estrada nacional n.° 110 é uma via importante e, segundo as estatísticas, das de maior trânsito no distrito de Leiria. Por ela se escoa grande parte do movimento do Norte em demanda do Sul do País, merecendo particular atenção o acesso à cidade de Tomar, cidade em franco desenvolvimento económico e de comprovado interesse turístico, com a natural ligação para Vila Nova de Ourem e Fátima.

E, se outros motivos não houvesse, que os há, igualmente de considerar e ponderar, bastaria referirmo-nos ao aspecto turístico, essa cruzada em que todos andamos empenhados e que o País espera vencer, para que a pretensão que venho acompanhar merecesse a atenção de quem de direito.

Mas, como já tivemos ocasião de referir - dizíamos -, a acção desenvolvida pelas Direcções de Estradas não pode solucionar o problema que se lhes depara no troço de estrada de que vimos falando. As providências tomadas constituem apenas uma demonstração do zelo e do desejo do bem cumprir.

Admitindo que os próprios responsáveis pela direcção dos serviços reconhecem a validade desta asserção, permitimo-nos preconizar a necessidade de se levarem a efeito, e com a maior urgência, obras de grande reparação.

E, já que de estradas nacionais estamos a falar, seja-nos permitido lembrar uma pretensão de que fomos intérpretes e que então pusemos, deste mesmo lugar, à consideração do Sr. Ministro das Obras Públicas.

Relaciona-se com a construção da estrada nacional n.° 2. que, no seu longo traçado, tem alguns dos seus troços já construídos, outros que se encontram em construção, mas outros ainda que não foram iniciados.

É precisamente a um troço nestas condições que desejamos aludir, aquele que no extremo norte do distrito de Leiria, numa extensão de 4 km, se prolonga por mais 6 km no distrito de Coimbra, entre o Alto da Louriceira e Alvares.

Efectivamente, a sua construção, além de constituir apreciável adiantamento na conclusão daquela vital artéria de comunicação entre Chaves c Furo, viria resolver também um importante problema da viação rural daquela região.

É mais neste aspecto que justificamos u nossa solicitação a quem de direito.

Conhecedores das dificuldades que se deparam, principalmente nas regiões acidentadas o pobres como esta, na construção de vias de acesso aos meios rurais muitos benefícios se viriam a colher e bastantes contrariedades se poderiam aplanar. É que a construção deste troço permitiria que dele irradiassem depois, com facilidades evidentes, caminhos c estradas municipais de ligação às povoações que se situam à sua volta, ainda hoje privadas de acesso condigno à viação automóvel e cujos habitantes, para se deslocarem a qualquer ponto do País, têm de erguer-se a altas horas da madrugada e percorrer longas distâncias a pé para alcançarem uma carreira de camioneta que os conduza ao destino.

Mais uma vez, por isso, entrego ao alto critério do ilustre, titular da pasta das Obras Públicas a apreciação da pretensão dos povos daquela região, na esperança de que este seu legítimo anseio possa ter, em breve, plena concretização.

Dirijo-me também a S. Ex.ª solicitando a sua decisiva intervenção no sentido de ser considerado o momentoso caso da estrada nacional n.° 110, que, pelas razões que tive ocasião de expor, requer, através do seu Ministério, a urgente intervenção do Governo.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Está na Mesa um projecto de lei dos Srs. Deputados Júlio Evangelista, Colares Pereira e Tito Arantes, com o qual se pretende alterar o artigo 667.° do Código de Processo Penal, cuja interpretação foi fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça, em assento do mesmo Tribunal, interpretação que na opinião destes Srs. Deputados não é de aceitar.

Vai ser enviado o referido projecto à Câmara Corporativa, nos termos constitucionais.

Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continua o debato cias coutas florais do Estudo (metrópole e ultramar) e da Junta do Crédito Público relativas a 1966.

Tem a palavra o Sr. Deputado Janeiro Neves.

O Sr. Janeiro Neves: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Feito o exame das contas gerais do Estado de 1966, na parte relativa a Moçambique, através do bem elaborado parecer da autoria do ilustre Sr. Deputado Araújo Correia, a quem peço aceite as minhas homenagens por tão magnífico trabalho, fica-se surpreendido, não com a existência de déficit na balança comercial, que esse já é "crónico", mas com o aumento desse déficit e o seu elevado montante.

Com efeito, o acréscimo do déficit, que em relação a cada um dos anos anteriores tinha sido de 267 000 contou em 1964 e 426 000 contos em 1965, cifrou-se em 881 000 contos em 1966, excedendo o dobro do verificado no ano anterior, que já fora grande.

O saldo negativo montou a 2 755 090 contos, valor nunca atingido e verdadeiramente impressionante. Adiante nos ocuparemos deste déficit para, em comparação com outros números, tentarmos dar uma ideia do seu real significado.

Para já diremos que é indispensável a correcção da balança comercial e que, além de indispensável, é urgente que isso se faça. Claro que não pretendemos que se obtenha o equilíbrio num uno. Simplesmente, há que mudar de orientação a fim de que os saldos diminuam de forma gradual, embora no mais curto espaço de tempo, até que haja equilíbrio, e mais, que passem de negativos a positivas.

Por que este estado de coisas?

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Há já longos anos que o ilustre relator do parecer sobre as contas gerais do Estado vem martelando a tecla da necessidade de aumentar a produção, não só com vista ao consumo interno, mas também à exportação. Honra lhe seja.

Pareço, porém, que as palavras não têm sido ouvidas ou, se o foram, de duas uma: ou as levou o vento, ou não puderam ser seguidas.

Não pomos o acento tónico em exclusivo numa destas posições. Terá sido tudo: mau ouvido, vento ou falta de meios.

Ë certo que não é criticando o que já lá vai que se melhora, mas melhora-se com certeza não repetindo os erros que já lá vão.

É mais fácil criticar do que agir, mas num por isso se deixa de ter o dever de criticar quando nos parece que, dispondo-se de meios e sabendo-se o caminho a seguir, não se agiu.

Não fora uma sã e activa política de portos c caminhos de ferro e a situação da província seria mais grave. Com efeito, c nos invisíveis deles derivados que se apoia principalmente a balança de pagamentos aliás deficitária. Só nos anos de 1965 e 1966 é que o turismo veio tem seu auxílio com saldos positivos, respectivamente de 14 000 e 75 000 contos. Repare-se que a maior destas cifras corresponde apenas a cerca de 4,5 por cento do saldo de invisíveis proveniente dos transportes no mesmo ano e ficar-se-á com uma imagem da real importância de cada um destes serviços.

Referimos atrás que talvez tivesse havido falta de meios. Dir-se-á que, por se ter investido em transportes, não foi possível atender a outras necessidades. Certo parcialmente. Menos certo na medida em que, para não irmos mais longe, desde 1960 a 1966 se gastaram em planos de fomento 4 373 000 contos, dos quais apenas; 778 000 contos em portos e caminhos de ferro. Convém não esquecer que nos mesmos planos e para o mesmo período não se despenderam, embora estivessem dotados. 748 000 contos, o que, segundo a ilustre relator, com o qual concordamos inteiramente, "é uma soma muito alta considerando que a economia provincial, à parte a rede de portos e caminhos de ferro, era bastante resumida".

Procuraremos dar rapidamente uma ideia do que tem sido a economia de Moçambique.

Uma parte da população presta serviços: administração pública lato sensu, transportes e comércio. Outra parto, a maior parte, dedica-se à produção agrícola ou pecuária em regime quase generalizado de economia de subsistência. Veremos as excepções. Afloram aqui e além algumas indústrias extractivas, e transformadoras.

Dos produtos da agriculta alguns há, e são estas as excepções a que nos referimos, produzidos com vista à exportação: o algodão, o açúcar, a copra, o chá e o sisal. Paralelamente exploram-se dois. produtos espontâneos: a madeira e o caju. Industrializam-se os óleos vegetais e, nos últimos anos, entrou-se francamente no descasque mecânico da castanha de caju, mas, embora sejam grandes os investimentos já efectuados, muito ainda há a fazer neste campo, tal o volume da produção de frutos. Também se fia e tece parte do algodão produzido, ínfima parte é certo.

Extraem-se minérios, poucos, embora pareça que as potencial idades sejam grandes.

Transforma-se a energia hídrica em eléctrica, ainda que em pequena escala para o muito que se pode e vai com certeza fazer.

Para assegurar e ampliar estas actividades e para consumo da população, importam-se, como é óbvio, bens de equipamento e bens de consumo. Se quanto aos primeiros nada haverá a dizer, quando realmente reprodutivos, já quanto aos segundos há muito que apontar. Porque é mais fácil e cómodo comprar, importam-se produtos que se podiam e deviam produzir. Exemplos: milho, trigo, produtos hortícolas, leite, peixe e tantos outros. É um luxo, e, como quem quer luxos tem de os pagar, a província paga-os. E se os paga bem! Já no ano findo, neste mesmo lugar e ocasião, apontei alguns números respeitantes a esses produtos. Não os repito para não enfadar VV. Ex.ªs.

É um luxo, dizia, o que se vem passando relativamente a curtos produtos. Acresce que os hábitos resultantes de um razoável nível de vida, hoje em declínio, custam a desfazer. Pois nau são os maus hábitos os mais difíceis do perder?

A balança comercial de 1966 reflecte bem este estado do coisas, e, ao examiná-la sucintamente, procuraremos dar uma ideia do real significado do seu deficit.

Importou Moçambique, em 1966, 5 971 411 contos e exportou 3 216 321 contos, donde resultou o aludido saldo negativo de 2 755 090 contos. Importaram-se mais 990 443 contos (quase l milhão!) do que em 1965 o apenas se exportaram mais 109 25l contos.

O deficit corresponde a um aumento de 47 por cento relativamente ao ano anterior, quando em 1965 esse aumento fora de 29 por cento e em 1964 de 22 por cento. O mesmo saldo, que em 1964 e 1965 correspondia a 48 por cento e 60 por cento do valor das exportações, corresponde em 1966 a 86 por cento, deixando prever que, a manter-se o ritmo, em breve excederá aquele valor, o que é motivo de grandes apreensões.

Por que este aumento?

Responderei: exactamente porque, conforme atrás referi, Moçambique não produz o que pode e deve para seu consumo e não produz o que pode e deve para aumentar a exportação.

Pode argumentar-se, para justificar o aumento, com a circunstância de um ano em apreço ter aumentado substancialmente o valor das importações de bens de equipamento. Com efeito, em máquinas e aparelhos industriais mecânicos ou eléctricos, ferro e aço em bruto ou em obra tractores, verificou-se um acréscimo de 460 000 contos ou sejam cerca de 46 por conto de aumento total.

Mas, por outro lado, em produtos alimentares e vestuário verificou-se um aumento nas importações da ordem dos 200 000 contos, ou sejam 20 por cento do acréscimo. Simultaneamente importaram-se mais 62 000 contos de automóveis, ou sejam 6 por cento do agravamento.

Quer dizer, se por um lado nos devemos regozijar pelo valor acrescentado à economia provincial com investimentos em bens de equipamento, que se espera venham a produzir riqueza, devemos lastimar os enormes gastos, os cada vez maiores gastos, em bens de consumo, muitos das quais se poderiam produzir localmente.

Uma nota de optimismo é-nos dada pela redução de 42 000 contos na importação de tecidos de algodão, cujo total ainda se cifra em 331 000 contos. Oxalá se mantenha o ritmo da redução.

Seria também nota de optimismo a redução de 69 000 contos na compra de milho, que em 1966 só situou nos 14 000 contos. Optimismo apenas na medida em que houve uma redução substancial, pois é de lastimar, e muito, que se importo tal produto. E, já que falo de milho, não posso deixar de exteriorizar as apreensões derivadas do facto de a excelente produção que se deve ser verificado em 1967 (ainda não conheço os números oficiais) não produzir todos os bons efeitos que seriam de esperar, em vir-

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tude de as péssimas condições de armazenagem daquele cereal terem conduzido à deterioração de largas partidas.

O ano findo foi aziago nesse aspecto, pois, também por deterioração, se perderam algumas toneladas de batatas. Parte delas foi repousar nos fundos da baía do Espírito Santo.

Ë indispensável encarar o problema da conservação dos produtos agrícolas em Moçambique e daqui exprimo no Sr. Ministro do Ultramar os meus agradecimentos, que são também da província, por, nas verbas a despender na execução do III Plano de Fomento, no corrente ano, estar contemplada a armazenagem. É, assim, licito esperar que não voltem a repetir-se situações como as apontadas.

Mas voltemos ao deficit balança do comércio.

Estávamo-nos a- ocupar das razões do seu crescimento e referimos dois factores: maior valor na importação do bens de equipamento e na de bens de consumo. Outros dois factores contribuem também para aquele agravamento: o aumento do valor unitário da tonelada importada e a diminuição do valor da tonelada exportada. O primeiro cresceu de 3625$40, em 1965, para 4164$70, em 1966, ou seja mais 539$39, correspondentes a 13 por cento. O segundo baixou no mesmo período de 2679$30 para 2614$10, menos 65$20, ou 3,5 por cento.

É curioso notar que, se os preços unitários importação-exportação se tivessem mantido ao nível de 1965, e deficit apenas se teria agravado cerca de 29 000 contos, o que, só por si, não seria relevante. Com efeito, o saldo negativo resultante de uma importação no valor de 5 199 000 contos e de uma exportação no valor de 3 296 000 contos desceria para l 903 000 contos em 1966, contra l 874 000 contos em 1965.

Com o que acabamos do dizer não queremos significar conformação com os factos. De modo algum. Não ficaremos satisfeitos com dizer que, se o déficit aumentou, foi devido a razões que não nos podem ser imputadas, já que não comandamos os preços. Isso seria um fatalismo que não pode aceitar-se, sob pena de, a curto prazo, os deficits assumirem valores verdadeiramente incomportáveis.

Para se fazer uma ideia do panorama, tentemos calcular, de uma forma simples e sem qualquer pretensão de previsão certa (nesta matéria são tão falíveis as previsões!), o que se passaria no ano corrente, a manterem-se os ritmos de crescimento da tonelagem importada e exportada e a variação dos respectivos preços unitários, tomando como base o período de 1964 a 1966 (três anos).

A quantidade importada seria de 1600000 t ( + 12 por cento), que, ao valor unitário de 4955$ ( + 18 por cento), corresponderia a 7 957 000 contos. Exportar-se-iam l 434 000 t ( + 17 por cento), que, a 2853$/t- ( + 10 por cento), equivaleriam a 3 374 000 contos. O déficit seria de 4 583 000 contos, ou seja, excederia o valor total da exportação em 36 por cento.

Dissemos não termos a pretensão de fazer previsão certa. Agora diremos mais: desejamos ardentemente pecar por excesso. A acertarmos, estaríamos perante uma situação de gravíssimas consequências.

Foi só com o exclusivo fim de, mais uma vez, mostramos a vulnerabilidade da nossa balança comercial que focámos estes aspectos.

É indispensável, é urgentemente indispensável, a adopção de uma política rígida de redução de importação de bens de consumo, só admitindo a entrada do que for estritamente necessário o não possa produzir-se localmente. Usem-se meios directos (restrições no licenciamento quando possível) ou indirectos (impostos de consumo). Fiscalizem-se igualmente com o maior cuidado os preços
das importações e exportações, pois pode acontecer, e parece que tem acontecido, que haja aumentos fictícios no valor declarado das importações e redução no das exportações com vista a uma transferência ilícita de cambiais. Corre-se esse risco sempre que a base de incidência dos direitos alfandegários é o peso e não o valor, como acontece na grande maioria dos casos em Moçambique.

Em paralelo é imperioso fomentar a produção, não só para satisfazer as carências internas, mas também com vista à exportação. No que respeita à exportação, deve-se a todo o custo diversificá-la, pois só sete mercadorias representam cerca de 66 por cento do valor global exportado, o que é um dos nossos grandes pontos fracos.

Convém não esquecer, porém, uma planificação cuidadosa que considere a comercialização e armazenagem - repito-o porque nunca é de mais -, para evitar o que sucedeu no ano findo com a batata e o milho, pois não nos podemos dar no luxo de estragar produtos.

Vimos algumas das características do comércio externo de Moçambique. Para concluir, apresentaremos mais uma.

Cerca de dois terços das importações provêm do estrangeiro. No ano de 1965 as coisas estavam ligeiramente melhores, mas em 1966 voltaram a agravar-se. Com efeito, aumentaram as compras ao estrangeiro em cerca de 5 por cento, com a correspondente diminuição, é claro, nos mercados nacionais.

Relativamente à exportação, as percentagens da contribuição dos mercados nacionais e estrangeiros foi, respectivamente, de 43 por cento e 55 por cento em 1966, contra 41 por cento e 57 por cento em 1965.

A alteração deste estado de coisas não depende somente das províncias ultramarinas. É necessário um esforço conjunto metrópole-ultramar no sentido de uma e outro procurarem, comprar menos no estrangeiro. Em 1966 a metrópole apenas adquiriu aos mercados ultramarinos 3 943 000 contos, ou sejam 13 por cento do total das importações. Em compensação adquiriu 566 000 contos de milho, principalmente aos Estados Unidos e ao México, e cerca de 800 000 contos de oleaginosas, que, tirante a Guiné, que forneceu cerca do 67 000 contos, foram comprados na quase totalidade aos vizinhos desta: Gâmbia, Nigéria, Níger e Senegal.

Há que procurar satisfazer o máximo das nossas necessidades com os recursos dos territórios nacionais.

Sr. Presidente. Srs. Deputados: Para concluir, tentarei sintetizar o que ficou exposto sobre a balança de comércio de Moçambique.

Em face das realidades seguintes:

Crescente aumento do deficit:

Crescente aumento das necessidades de bens de equipamento:

Crescente aumento da importação de bens de consumo;

Crescente aumento do valor unitário da tonelada importada;

Crescente diminuição do valor unitário da tonelada exportada;

Pouca diversificação das exportações; e

Grande percentagem de compras ao estrangeiro:

é indispensável e urgente reduzir de maneira drástica as importações de bens de consumo e aumentar e diversificar a produção, produção essa que terá de apoiar-se numa rede de armazenagem eficiente para que possa acudir às necessidades do consumo e apoiar uma exportação que tem de se expandir. Simultaneamente devem adoptar-se medidas que aumentem o volume de compras recíprocas entre todos os territórios nacionais.

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Acabo como começou o ilustre relator do parecer da Conta, Sr. Engenheiro Araújo Correia, relativamente a Moçambique: "Não são boas as notícias sobre o comércio externo cie 1966." Mas espero, e espero com a maior convicção, que passe a haver melhores notícias. É que as potencial idades da terra e o ânimo dos seus habitantes, que por serem portugueses quando querem vencer vencem, transformarão tudo.

São exemplos de potencialidades da terra, nas quais depositamos as maiores esperanças, além das óptimas condições para a agricultura e pecuária, o aproveitamento de Cabora Bassa e talvez o petróleo, cuja pesquisa está A ser permanentemente incentivada pelo Sr. Ministro do Ultramar.

Exemplos do ânimo, não é preciso dá-los. Alguns de VV. Ex.ªs viram-nos, abraçaram-nos, tal como nós os de Moçambique. Todos os portugueses neles confiam, todo o mundo conhece a sua têmpera. São os bravos soldados, são os nossos jovens que para eternizar Portugal decidiram morrer sempre que a Pátria o exija.

Só isto, que é tanto, faz-nos crer que em Moçambique todos, dos mais aos menos responsáveis, trabalharão com a maior coragem, o maior ânimo e a maior fé para que se vença em todos os campos como se está vencendo no campo militar. O campo da honra não é só o da guerra. Hoje todo o território nacional é campo de honra. A nossa Pátria merece bem que a honremos, e exige que a sirvamos e só a ela.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Ferrão Castelo Branco: - Sr. Presidente: Por forma clara - a forma clara e límpida com que a Nação está habituada a ver as contas que o Governo organiza desde 1929 - foram-nos apresentadas, e nesta Câmara estão em discussão, as contas gerais do listado referentes ao ano de 1966.

De há longa data também vêm cias acompanhadas de mais um parecer - um estudo minucioso e profundo - do nosso ilustre Colega o Sr. Engenheiro Araújo Correia, que, ao longo de porfiados anos, tão judiciosos comentários vem fazendo às coutas públicas, sem nunca esquecer aquilo que, em seu alto critério, julga dever aconselhar aos bons rumos da administração financeira da Nação.

Daqui, pois, me permito, e com vénia de V. Ex.ª, dirigir a tão preclaro homem público a expressão da minha mais elevada consideração.

Sr. Presidente e Srs. Deputados: Em 1966 a economia portuguesa teve um decréscimo no seu ritmo de crescimento, que, aliás, nos anos transactos vinha em sensível progresso, pois que, em 1965 e 1964, o produto nacional bruto elevou a sua taxa de crescimento de 7 por cento.

Em parte, a baixa de crescimento do produto nacional bruto c devida ao comportamento do sector agrícola, que, mercê de mais um ano calamitoso - o ano agrícola de 1965-1966 - viu escoarem-se-lhe as culturas em caudais de água. digamos assim, que, de Setembro de 1965 a Março seguinte, não deixaram de cair, seguidos, depois até quase ao fim de Abril, de uma seca persistente.

As indústrias transformadoras, de sua banda, também deixaram, em 1966, de ter continuado o seu ritmo ascendente e, assim, a produção global, que se processou em 1964 ao ritmo de aumento de 6,1 por cento e em 1965 em 7 por cento, não logrou em 1966 ir além de 4,7 por cento.

O consumo dos bens produzidos aumentou, devendo-se o facto, sobretudo, à entrada em Portugal metropolitano de turistas - l 930 000 -, às remessas de emigrantes - num total destas duas rubricas de 9 655 000 contos - e ainda ao aumento das despesas militares - 7 389 578 contos - e à evolução crescente dos salários.

Evolução esta especialmente verificada no sector agrícola, em que o aumento foi - reportado ao ano de 1958 - da ordem de 16,8 por cento para os homens e 14,9 por cento para as mulheres, enquanto que os salários profissionais da indústria e dos transportes não foi além de 8 e 11 por cento, respectivamente, para Lisboa e Porto.

No que tange à agricultura e pecuária, prosseguiu o Governo meritório, acção no sentido de promover uma mais ampla participação da agricultura no desenvolvimento económico do País, em conexão com os restantes sectores da economia.

Em regulamentação do Decreto-Lei n.° 46595, de 15 de Outubro de 1965, que instituiu o regime cerealífero ora vigente, foi publicado o despacho de 20 de Maio de 1966 que promulga, as bases de assistência técnica e financeira à lavoura.

Esto despacho [refere-se nu douto relatório da proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1967] tem como finalidade esclarecer, um pormenor, os objectivos a atribuir no domínio agro-pecuário, através da ordenação das culturas da adopção de técnicas de produção tendentes à melhoria da produtividade.

Nele se acentua que o apoio a conceder pelo Governo se destina a organização de explorações agrícolas rentáveis, embora se confira prioridade à assistência relativa a associações de agricultores de natureza comunitária.

Promulgadas estas providencias de real interesse para os mais instantes problemas da agricultura, acrescidas de outras - tais como as respeitantes ao fomento pecuário, mecanização da lavoura, venda de sementes de trigo a crédito -, há que melhorar também o valor e a eficiência de todos os factores da produção.

Isto é, além de se Mentalizar para a nova faina agrícola o empresário, é necessário melhorar também o nível dos seus colaboradores por forma a que o seu trabalho suja, além de útil, altamente produtivo.

Com efeito, escasseiam, hoje, os podadores de oliveiras, os limpadores de azinheiras ou de sobreiros, os homens das amansias de gado muar e cavalar, os "roupeiros" (como tal se designam os que fabricam o queijo do Baixo Alentejo), os tractoristas competentes, os manajeiros ou capatazes que saibam distinguir o trigo do balanço, os maiorais que conheçam n mãe daquele borrego que está entre centenas, e - eu sei lá - quantos misteres há que aproveitar, que ensinar, para que, com efeito, o produto da agricultura possa, na verdade, aumentar sensivelmente.

É muito grande a perturbação causada à agricultura pelo êxodo rural, como muito bem, e repetidamente, se tem dito nesta Câmara, mas também é urgente ensinar aos que restam - e aos que voltam - a boa prática dos amanhos da terra, dos cuidados a ter com os gados e do carinho do que carecem as árvores.

Perfilho, pois, inteiramente, a afirmação que há dias aqui fez o nosso muito Ilustre Colega Sr. Dr. Nunes Barata ao afirmar que "o êxodo agrícola, acompanhado de urna reestruturação de sector, será uma oportunidade para a valorização dos verdadeiros profissionais agrícolas, mas o êxodo rural indiscriminado só tem conduzido nitre nós à ruína dos campos".

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Quantos suo também os emigrantes que voltam à terra da sua aldeia a desfiarem, o rosário das miragens desfeitas?

É verdade que, quer a segurança no trabalho - talvez a primeira das aspirações das massas trabalhadoras -, quer o salário justo e os subsídios na velhice e invalidez, são os grandes e legítimos direitos que lhes são reconhecidos já hoje na nossa estrutura do direito do trabalho, mas salários mais altos pressupõem uma, maior produtividade no trabalho a que, igualmente, se não eximem os trabalhadores ciinscientes du sua missão dentro da empresa.

E são estes que, para além das garantias que lhes venham a ser dadas, em regra, alcançam sensível elevação do nível de vida em relação aos que não procuram elevar-se pelo seu esforço e vontade de bem cumprir.

Tem a lavoura de produzir bens que sejam competitivos, isto é, tem de adoptar a exploração de produtos que, interna ou externamente, sejam, além de lucrativos, de colocação assegurada.

Nota-se, no parecer sobre as contas gerais do Enfado referentes ao ano de 1966, que "um raio de luz na exploração agrícola é dado pelo grande desenvolvimento da cultura do tomateiro em terrenos rogados".

E ali se consigna que, em 1966, a exportação de polpas, massas e concentrados de tomate se elevou a quantia superior a 575 000 contos.

Este um dos produtos tipo de cultura rentável e de incalculável interesse para a nossa economia e aproveitamento de terrenos regados.

Dentro da exploração da lavoura alentejana de sequeiro, além das culturas tradicionais de trigo, cevada e da aveia, avulta, também como de incontestável interesse, em determinadas regiões e, designadamente, na província do Baixo Alentejo, a de grão-de-bico.

Com efeito, a media anual desta leguminosa, produzida no País no decénio de 1930-1950 foi de 17 605,4 t, tendo só aquela provinda produzido, no decénio, 8158,6 t.

No quinquénio de 1960-1964 a produção nacional média foi de 23 600 t, cabendo à produção alentejana 18 533,6 t tendo sido a área total anual semeada em média de 67 600 ha.

Em 1965 houve um retrocesso na produção, tendo-se colhido 15 360 t numa área semeada de 74 000 ha.

Em 1966 numa área total semeada de 13 000 ha, produziram-se 23 300 t de grão-de-bico.

Ao distrito de Beja coube a área semeada de 22 216 ha, com a produção total de- 18 806,8 t.

Como destes números se alcança, representam forte valor ter em conta numa racional exploração agrícola de algumas regiões do Alentejo, designadamente no distrito de Beja.

como é sabido, n cultura do grão-de-bico, destina-se, sobretudo, a revestir os chamados alqueives de Verão e, em grande parte, é da sua boa ou má produção que depende o custo unitário do trigo que se, lhe segue na rotação cultural.

Mas, além disso, também a cultura da leguminosa de que vimos falando proporciona avultado trabalho, quer em mondas, quer na apanha, pois que para estes trabalha não procede a monda química, nem há ainda ceifeiras-debulhadoras adequadas.

Sucede, porém, que o consumo interno deste produto é diminuto - no decénio de 1956-1965 situou-se em l L 516 t anuais - e, assim, o seu preço flutua conforme a procura, nos mercados externos.

O seu valor, em media, oscila entre 4$ e 7$50 por quilo, pois o preço de compra ao produtor foi, de 1956 - 1U62. da ordem de 4$ a 4$50; de 1965 a 1965, entre 5$ e 6$, e em 1966 atingiu o preço de 7$50 por quilo.

Em 1967, ano em que a produção atingiu - em segunda, estimativa de colheita - 34 700 t, o grão-de-bico rende - com dificuldade de colocação - nos mercados correntes o íntimo preço de 4$.

É certo que o grão-de-bico não tem qualquer sombra de comparação com o valor comercial do tomateiro, mas, por representar um altíssimo valor económico para a província do Baixo Alentejo, que aqui represento, venho, Sr. Presidente, pedir ao Governo que fomente com maior intensidade a exportação deste tão precioso alimento humano.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Na Europa, além da Espanha também grande produtora de grão-de-bico, mas igualmente grande importadora -, talvez a França fosse país para onde se pudesse escoar parte da nossa produção, o que viria a minorar, bem bei que em parcela íntima, o nosso produção para com ela, que se situa em 1 303 000 000$, mas, como se observa no douto parecer sobre as contas em apreço, a França - como a Alemanha, que vende, mas não compra - importa pouco e exporta muito.

Ainda um outro aspecto eu queria, Sr. Presidente o Srs. Deputados, focar nesta minha desluzida intervenção: o referente à instalação dos tribunais e serviços de justiça nas comarcas do distrito de Beja.

Em 8 de Março do l964, o então Ministro da Justiça, Prof. Doutor Antunes Varela, ao inaugurar o Palácio da justiça de Mirandela, traçou por forma lapidar o estado deplorável em que as instalações dos tribunais se encontravam no Portugal metropolitano e insular e acentuava o que há doze anos atrás tinha sido o ingente esforço despendido pela Administração Central e municipal no sentido de modificar profundamente o anterior estado em que as mesmas se encontravam.

Apontando os inconvenientes múltiplos e de vária urdem que, tal estado de coisas acarretava para a boa administrarão da justiça, Prof. Antunes Varela acentuava que o menor dessas inconvenientes não estaria por certo no reflexo que necessariamente haveria de ter no espírito sempre receptivo das populações esta falta de consideração, real ou aparente, dos Poderes Públicos pela administração da justiça e por quem nela devotadamente continuava servir.

E aqui também queremos prestar a nossa mais rendida homenagem àqueles que têm por missão, não só aplicar a lei uns casos concretos submetidos à sua apreciação, mas também àqueles que colaboram por forma eficiente na boa administração da justiça.

Sr. Presidente e Srs. Deputados: No distrito de Beja são sete as comarcas que fazem parte do seu distrito judicial - Beja, Cuba, Mértola, Moura, Odemira, Ourique e Serpa - e três os julgados municipais - Almodôvar. Ferreira do Alentejo e Portei.

Os processos distribuídos durante o ano de 1966 nos tribunais de comarca - neles se compreendendo processos cíveis, criminais e contra menores - foram os que a seguir vamos indicar, bem como as receitas respectivas:

Tribunal Judicial de Beja:

Total de processos distribuídos - 2253.

Total das receitas - l 348 552$

Tribunal Judiciai de. Cuba:

Total de processos distribuídos - 866.

Total das receitas - 620 696$30.

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Tribunal Judicial de Mértola

Total de processos distribuídas - 350.

Total as receitas - 140 275$.

Tribunal Judicial de Moura:

Total de processos distribuídos - 681.

Total das receitas - 738 688$.

Tribunal Judicial de Odemira:

Total de processos distribuídos - 790.

Total das receitas - 454 022$40.

Tribunal Judicial de Ourique:

Total de processos distribuídos - 555.

Total das receitas - 397 861$70.

Tribunal Judicial de Serpa:

Total de processos distribuídos - 656.

Total das receitas - 294 430$90.

For seu lado, os três julgados municipais, dentro da sua esfera de competência, tiveram os seguintes processos distribuídos no mesmo ano e receitas cobradas:

Julgado Municipal do Almodôvar:

Total de processos distribuídos - 357.

Total das receitas - 60 669$20.

Julgado Municipal de Ferreira do Alentejo:

Total de processos distribuídos - 793.

Total das receitas - 80 613$.

Julgado Municipal de Portei:

Total de processos distribuídos - 340.

Total das receitas - 47 083$40.

Pode dizer-se que, com a futura inauguração do Palácio da Justiça de Moura, já hoje concluído e possivelmente a nele serem instalados, dentro de breve tempo, todos os serviços de justiça da comarca, levada a efeito a construção do da comarca de Odemira, para o que já foram orçamentadas as respectivas verbas, e concluídos que sejam os estudos para se levar a eleito a construção do de Mértola, pode dizer-se, repetimos, que os serviços de justiça no distrito de Beja ficam dignamente instalados.

Não há que proceder a obras sumptuárias, mas tão-somente que levar a efeito obras que sejam consentâneas com a austeridade, ao mesmo tempo sóbria, de que se reveste a justiça, pois à função específica que aos tribunais incumbe anda também ligada a ideia de disciplina social, de respeito e veneração pelos altos e eternos princípios da moral.

Em 11 de Abril de. 1962 foi publicada a Lei n.° 2113, que promulga as bases da organização judiciária e ali se consigna - base I, n.° 3 - que:

O Governo, quando se verifique nas comarcas congestionamento não transitório de serviço, instituirá, se razões ponderosas não impuserem outra solução, novos tribunais comarcãos nas sedes de concelho que deles não disponham, principalmente se nelas houver já tribunal municipal.

Dentro desta directriz tem o Governo criado novas comarcas e extinguido gradualmente julgados municipais, cujo funcionamento não satisfaz às imperiosas necessidades da justiça, nem ao interesse dos povos.

Pelos fiados estatísticos que atrás apresentámos, verifica-se o movimento de processos distribuídos; no Julgado Municipal de Ferreira do Alentejo - 793 - bem justifica a criação de tribunal de comarca na sede deste concelho.

É também certo que, quer a localização da sede do concelho de Ferreira do Alentejo, quer o seu desenvolvimento económico presente e aquele que forçosamente se lhe augura no futuro, justifica, só por si, a criação da sua comarca, substituindo o julgado municipal que ainda ali está instituído.

Além destas fortes e ponderosas razões, acresce a de que, pertencendo este julgado a comarca de Beja. é mais um esforço a exigir dos magistrados que, já nesta sede. têm a sua actividade altamente absorvida, e assim bem se coaduna com a linha de rumo tomada pelo Governo ao promulgar o Decreto-Lei n.º 44 268, de 14 de Abril de 1962.

Sr. Presidente e Srs. Deputados: O total das receitas atingiu o seu mais alto expoente - 19 736 214 893$50 - e as despesas somaram 19 621 113 246$20, pelo que o saldo das contas foi do montante de 115 101 647$30.

No decurso do ano de 1966, intemerato, o Governo da Nação manteve em terras do ultramar, terra da nossa terra, a integridade da Pátria e, além disso, fomentou iniciativas, criou bens e construiu obras de inegável interesse para o desenvolvimento da economia e prosperidade de Portugal, avultando, dentro destas, a ponte sobre o Tejo - a Ponte Salazar -, que tão grandes e rusgadas perspectivas veio abrir à economia do Pais, e em especial às terras do Sul.

Sr. Presidente: São estes motivos bastantes da minha conformidade com as contas apresentadas.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Marques Teixeira: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: O diploma que está a ser apreciado dá-nos, em pormenor, a panorâmica da vida da Nação à luz dos principais aspectos em que se desdobrou o conjunto da sua tessitura administrativa, económico-financeira, social e cultural ao longo do ano de 1966. A regularidade da sua publicação, ainda que facto reconhecido, não deve deixar de assinalar-se como um dos traços da seriedade e meticulosidade com que Salazar e, depois, os Ministros das Finanças que sucederam a tão eminente homem público, vêm gerindo, através de uma habitualidade dignificante, um dos mais altos departamentos integradores da orgânica estadual. Esta afirmativa envolve o nosso apreço e reconhecimento a quem tem posto uma superior inteligência, muito saber e grande dedicação no desempenho de difíceis tarefas de directa e forte incidência na multiforme vida nacional. Mais uma vez é relator das contas gerais do Estado o ilustre Colega Sr. Engenheiro Araújo Correia e também mais uma vez se evidencia e comprova, no a-propósito, profundeza c brilhantismo do trabalho apresentado, a sua competência, que tanto admiramos conscientemente exaltamos. Aqui fica o preito das nossas melhores homenagens.

Sr. Presidente e Srs. Deputados: Se nos dispuséssemos a fazer uma análise da deprimida situação em que se encontra a agricultura portuguesa, a qual, bem o sabemos, tem merecido e não deixará de continuar a merecer a atenção e os cuidados do Governo, seria fácil aflorar e até enunciar motivos conjunturais e estruturais enleantes, atormentadores e criadores de dificuldades que

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de modo nenhum podem ser encarados eufemisticamente. Do emaranhado dos mais variados problemas, instantes e intricados, postos à consideração e submetidos ao estudo de quem gere a coisa pública pelo ritmo febricitante da vida hodierna, profundamente contrastada nos mais díspares matizes de situações que surgem imprevistamente, digamos, por fornia estonteante, emergem fortes razões para obtemperar-se que a missão de governar é, na realidade, complexa e árdua! Quem sente incidir em seus ombros o peso dessa grande responsabilidade, certamente que precisa de ter antes de si e diante de si o claro e firme traçado dos princípios como arrimo e luz a melhor definir e a alumiar as linhas de orientação a seguir, ainda que susceptíveis de sofrerem, naturalmente, a pressão dê influências circunstanciais, com vista ao objectivo final da busca e conquista da meta em que se situa o bem-estar da Nação, a felicidade possível de todos os seus filhos.

Sr. Presidente: Falámos no trabalho notável novamente produzido pelo Sr. Engenheiro Araújo Correia; fizemos menção do transe difícil por que passa a nossa agricultura. Pois bem. Entendemos vir a propósito referir o que aquele distinto economista afirmara em certo passo da sua intervenção, que temos bem presente no nosso espírito, quando nesta Assembleia largamente se discutiu o III Plano de Fomento:

. . . Não entrarei agora nas causas que levaram a agricultura à situação em que se encontra. Os Diários das Sessões, desde que pela primeira vez entrei nesta Casa, estuo cheios de lamúrias, críticas, conselhos, opiniões sobre a gradual deterioração do produto agrícola, que, de 1959 a 1965, representou apenas 5,3 por cento (preços constantes de 1963) no acréscimo do produto interno bruto. Repare-se que a contribuição caiu de 29,2 por cento em 1953-1955, para 19 por cento em 1965, e, se for considerada apenas a agricultura, a percentagem no produto será de 16,3 e 13,5, em 1965 e 1966. O tremendo efeito que esta queda do produto interno produziu no sector agrícola teve logo graves repercussões nas importações de produtos alimentares, no despovoamento de zonas equilibradas, na emigração clandestina de regiões fronteiriças e na pressão exercida no sentido do êxodo para os grandes centros urbanos . . .

Diz o nosso povo, Sr. Presidente, que as palavras são como os cerejas, umas encadeando-se nas outras, e por isso é compreensível acudirem-nos ao espírito algumas afirmações contidas no discurso do Sr. Dr. Rafael Duque, prestante e devotadíssimo servidor da Nação, que muito admiramos e respeitamos, proferido aquando do almoço de expressiva homenagem oferecido na cidade de Santarém, em 11 de Junho de 1966, ao Sr. Dr. Correia de Oliveira, muito ilustre titular da pasta da Economia. Aquele ex-Ministro do Estado Novo, a quem - repetimos - não deixaremos de consagrar apreço e gratidão, depois de calorosamente elogiar o Sr. Dr. Correia de Oliveira pela magnitude e eficiência dos serviços prestados ao País através da sua inteligente e fecunda acção junto da E. F. T. A., e enaltecer a sua actividade, oportuna e brilhante, a envolver a promulgação dos diplomas atinentes à criação do espaço económico português, bordou, com pertinência flagrante, outras considerações, afirmando num dado momento da sua notável oração:

. . . em tempos não muito distantes, perante a manifesta decadência da agricultura, por motivos que ainda subsistem, dizia-se, repetindo uma expressão

de sentido necrófilo, atribuída a António Sérgio: "A agricultura é o espectro de uma actividade económica." Em face desta situação, parece que nada mais acudia ao espírito senão deixá-la ruir para sobre os escombros erguer então a cidade nova - uma espécie de colectivismo agrário, já que se evocavam os primitivos tempos em que os frutos da terra eram de apropriação comum. O Sr. Doutor Oliveira Salazar [prosseguia o Dr. Rafael Duque], com a sua particular autoridade e senso de grande homem de Estado, reagiu prontamente clamando pela sobrevivência da agricultura, que atinge os cimos heróicos quando nos períodos de isolamento, gerados pela desavença entre os povos, tudo se perdeu ou é inacessível. E, para que ninguém duvidasse de que era ele que o dizia, acrescentou: "Eu mesmo sou um rural." Pois o Dr. Correia de Oliveira [aditara o Dr. Rafael Duque] foi no encalço do Chefe do Governo e tem-se esforçado por actos e palavras em restaurar a confiança perdida, despertar energias latentes, como se ele próprio também gritasse aos quatro ventos: "Eu creio na sobrevivência da agricultura." Eis aqui um dos principais motivos por que nos encontramos reunidos neste momento e neste lugar sob o signo da esperança em melhores dias. Quer-me parecer que a primeira preocupação de um homem de Estado à altura das circunstâncias consistirá em não deixar desvanecer-se a esperança que ainda é luz que nos alumia e a força que nos sustenta. Para além deste estado só há lugar para o desespero.

Reportando-se, depois, à necessidade de ser definida claramente a política agrária que mais nos convém, faz a asserção de que o Estado sabe qual ela é e deve ser seguida, especificando que, à luz da matéria enquadrada pelo Plano Intercalar de Fomento, se aproximava muito do que fora proclamado há mais de meio século por Oliveira Martins. No expor o seu raciocínio, alongando a explanação que vinha fazendo, refere-se, acto contínuo, ao problema da "carência da mão-de-obra determinada pela fuga dos campos para as indústrias nacionais e para os países industrializados da Europa . . .".

O Sr. Ministro da Economia, por seu turno, através de uma ampla e esclarecedora entrevista concedida a um vespertino da capital, em fins de 1966, sobre múltiplos aspectos do panorama económico português, emite a sua autorizada opinião sobre as causas do movimento ascensional dos preços, declarando a certa altura:

. . . destacarei ainda- o surto emigratório de trabalhadores portugueses para o estrangeiro. Favorecido pela imensa procura de mão-de-obra nos países industrializados do Ocidente (que tentam manter uma determinada taxa de expansão à custa da procura de trabalho nos mercados externos, em lugar de se dirigirem para a desconcentração geográfica da sua capacidade de investimento), este surto emigratório coincidiu e continua a coincidir com dois fenómenos internos: um, natural e desejável - o aumento da procura de mão-de-obra especializada pela actividade industrial -, outro, o da mobilização requerida pela defesa militar da Nação. Esta quantiosa emigração cria um duplo impulso no sentido da alta de preços: rarefazendo, aliás, desequilibradamente, quer no plano regional, quer no das diversas actividades económicas, a oferta de mão-de-obra, e mantendo-se ou intensificando-se a sua procura, ela provoca, a curto prazo, o aumento dos salários e dos custos de produção; por outro lado, as transferências

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dos emigrantes, que, só no estrangeiro, quase atingiram, em 1965, 3 320 000 contos, pesam também consideravelmente sobre a procura interna de bens e serviços, pois que, deste acréscimo de meios de pagamento, só uma parte será efectivamente poupada e, depois, investida com efeitos reprodutivos apreciáveis . . .

Mais adiante, a propósito das tendências inflacionistas e o aumento dos preços em que elas se traduzem para o consumidor, o Sr. Ministro da Economia enunciou o antídoto a ser-lhes aplicado, e, discreteando, em seguida, sobre os pontos de estrangulamento do nosso desenvolvimento económico, teve ensejo de declarar que:

... a crise da actividade agrícola foi agravada e antecipada por um factor que não é inteiramente dominável - o comportamento do clima a determinar maus anos consecutivos e, ainda, pela perturbação imediata resultante da emigração . . .

Com vista aos pontos restritos essenciais que nos permitimos focar nesta modesta intervenção, decerto abaixo do nível da relevância própria do contexto em que se inserem, mas a que, aliás, já soube e pôde corresponder o somatório de apurados conhecimentos de tantos Srs. Deputados, servimo-nos ainda das altamente esclarecidas c avisadas palavras de V. Ex.ª, Sr. Presidente, aqui pronunciadas aquando da apreciação do I Plano de Fomento:

. . . sabe-se que, em vista das ideias e das necessidades que hoje dominam o Mundo, não podem deixar-se áreas capazes de contribuir substancialmente para a economia e alimentação da humanidade sem renderem o que se lhes pode pedir. Sabe-se que os espaços africanos são necessários à economia dó Mundo, eles hão-de ser convenientemente explorados. Sabe-se que esses espaços começam a ser cobiçados para absorver os excessos de população dos países de raça branca.

E depois:

. . . precisamos de marcar a nossa presença no ultramar através de obras que denunciem que estamos n continuar a seguir os caminhos da civilização. A afirmação dessa presença faz-se, sem duvida, pela realização de obras materiais, mas estas morrerão, invadidas pelo capim, se lá não estiver a fazê-las reviver o homem capaz, com exigências que vão além daquilo que a terra pode dar espontaneamente e aguçam o espírito empreendedor, levando-o a produzir, não apenas para o consumo do meio, mas para o consumo dos mercados . . .

Neste forragiar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, de válidos depoimentos revestidos de autoridade indiscutível, conducentes a uma perfeita consciencialização de algumas questões de primeira plana, interessando sobremaneira a primaciais capítulos da vida actual e vindoura da Nação, de aquém e de além-mar, é axiomático que não pode estar ausente a palavra reveladora do Sr. Presidente do Conselho, mais que nenhuma outra rica de um claro sentido de orientação, apontando, com a habitual luminosidade e segurança de sempre, as veredas que devem ser trilhadas. Dita na progressiva cidade de Braga, em 28 de Maio de 1966 - Braga, a bela capital desse Minho encantador, histórica por tantos títulos e ainda pelo que lhe advém de haver sido a cidade santa da Revolução Nacional - explicitou-se deste modo:

. . . nós fomos, de facto, um país essencialmente agrícola, mas enquanto não pudemos ser outra coisa. Durante séculos e ao lado de um artesanato modesto, a agricultura foi a grande criadora de riqueza e esse facto dominou todos os espíritos neste País. Hoje podemos dizer que só potencialmente somos ricos dos produtos da terra, mas que viremos a sê-lo de facto pêlos dois caminhos que nos estão abertos: a libertação de grande parte do trabalhador rural em favor das indústrias e do ultramar; maior produção de produtos agrícolas industrializáveis ou comerciáveis com nações estrangeiras. Continuo a pensar que a agricultura nacional deve ser acima de tudo orientada no sentido de assegurar o sustento da Nação, mas para isso não precisa absorver toda a sua força de trabalho. E quando pela mecanização e pelo regadio conseguirmos aqueles fins, deixa de ter razão de ser a lamentação de Severim de Faria quando atribuiu às "conquistas", digamos, na linguagem de hoje, ao ultramar, a primeira causa da falta de gente que se padecia e, assim, por não existir, empobrecia o reino. Posta deste modo a questão, é evidente que o primeiro destino de mais intensa capitalização deveria ser a agricultura, não só para a conversão dos meios de trabalho, como para a irrigação dos campos, sedentos e precisados de água . . .

Tentámos fixar a nitidez da linha do pensamento enunciado no que acabamos de reproduzir, para, no desenvolvimento das nossas singelas considerações, mais adiante, nos abonarmos com a essência das ideias nela contidas.

Sr. Presidente: As contas gerais do Estado de 1966 não nos criam um estado de optimismo quando abordam o capítulo referente ao comércio externo. Averiguou-se ter o problema das importações apresentado um cariz preocupante, pois agravou-se para 29 406 000 contos, de 26 553 000 contos em 1965. Analisando as secções pautais conclui-se que, quanto à natureza das importações, os produtos alimentares tom o efeito de uma sobrecarga apreciável.

A título meramente exemplificativo. diremos que em relação aos produtos de origem vegetal o deficit existente piorou, de 1965 para 1966, cerca de 837 000 contos; de trigo,, milho, arroz e batata importaram-se 829 000, 566 000, 148 000 e 214 000 contos, respectivamente. Se é motivo de lamentação verificar-se a necessidade de importação de 801 000 t de cereais, implicando um dispêndio de cerca de l 653 000 contos, não menos se deplora que os mercados fornecedores se situem, regra geral, fora das nossas províncias ultramarinas e, aos demais, pertencentes a países que procuram sorver o sangue da nossa mocidade gloriosa e chacinar os nossos irmãos de além-mar, ou, mesmo que assim não seja, cabendo-lhes, por forma que nos dói, uma posição de subalternidade.

Militam, Sr. Presidente, muitas e ponderosas razões a fim de que naquele jeito, já historicamente consagrado, de rapidez e em força, se procure, se continue a procurar revitalizar a nossa agricultura.

Por circunstâncias naturais e outras que o não são, tem a lavoura penado uma vida difícil, numa concorrência de motivos perturbadores que se seguem em cadeia e, em muitos casos e diversidade de situações, se sobrepõem e até agravam, transcendendo, pois, a vontade dos homens e quantas vezes repulsivos à acção atenta e vigilante do Poder Central.

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São múltiplos os problemas de que enferma o complexo agro-pecuário e larga e funda a sua incidência. Tenta-se debelá-los com base no diagnóstico previamente feito. Há que prosseguir na adopção de processos de terapêutica profiláctica que possam prevenir males supervenientes e da mesma sorte continuar a aplicação dos meios curativos no uso continuado de métodos e processos tidos e havidos como portadores da eficácia desejada, que passem do papel para o terreno das realizações práticas e efectivas, através da geral mobilização de boas vontades, na interligarão dos elementos oficiais e particulares actuando por forma convergente, com a consciência de que a vitória que se quer conquistar interessa no fundo ao agregado nacional e por isso é vitória que também tem de ser ganha por todos. Vamos mais longe e também diremos: proceder assim é actuar pela Pátria, é estar com a Pátria.

A raiz da solução de problema tão ingente e de tamanha magnitude estão, como se sabe, factores de ordem económica, financeira e técnica, mas também de carácter humano, social, moral, cultural e político, os quais não podem deixar de enxergar-se sob o prisma de uma óptico verdadeiramente nacional, desistindo de esmiuçá-los não só por serem sobejamente conhecidos, mas também por virtude de razões predeterminadas que a nós próprios nos impusemos.

Deter-nos-emos, Sr. Presidente, somente durante alguns instantes, na apreciação das causas e dos efeitos de questões candentes que dão pêlos nomes de êxodo rural, emigração e povoamento. Fazemo-lo, Sr. Presidente, com um sentido intencional e agora talvez concretamente se entenda por que resolvemos que a nossa intervenção se revista do valor adveniente do facto de ter sido recheada com as transcrições de precioso conteúdo insertas linhas atrás.

Antes do mais, porém, queremos exarar francamente a nota de que temos o convencimento pleno de ser minguada a nossa achega pessoal para a sua ventilação, que, aliás, foi realizada com profundidade e criteriosamente por ilustres Srs. Deputados, credores, também por isso. das nossas homenagens de admiração e apreço. Vai-se alargando nos nossos meios rurais o chamado "deserto geográfico".

O grave problema resultante do desmesurado e precipitado êxodo agrícola perturba u aflige a sacrificada lavoura; por seu turno, o êxodo rural "grava sobremodo a situação criada pelo acréscimo de implicações de ordem económica, social e. política. E já não se praticam apenas transferências de carácter inter-regional ou intersectorial dentro do País, porque o estrangeiro é a meta a alcançar, encerra o fascínio de um eldorado!

A vida campesina está a ficar despojada dos seus valores humanos; nela minguam os elementos da chamada "autoridade social"; assiste-se a uma desoladora debandada da, sua população activa; há lares abandonados; casas que ficam vazias; campos sem braços; tractos de terreno sem nenhuma espécie de amanho! Contrariamente, assiste-se ao chamado "fenómeno de hiperconcentração urbana e industrial", inçado dos múltiplos inconvenientes de todos conhecidos. Aí está patente aos nossos olhos o que se classificou de urbanismo patológico, i; fora do alcance da nossa rotina, mas dolorosamente, gravado no espírito, o que toca e se refere ao caudal do portugueses que demandam o estrangeiro em vez de se deslocarem para o ultramar e assim viverem e poderem prosperar sob o abrigo do tecto da mesma casa, embora ocupando nela compartimentos diferentes. São manifestos os desequilíbrios regionais também entre nós. Sabe-se que o nível de emprego não é uniforme, pois que se reparte de maneira desigual por diferentes zonas do País. E que resulta da progressiva falta de braços?

O agravamento, decerto, das existentes e acentuadas disparidades ou assimetrias regionais que se conhecem, a afectação do ritmo expansivo da nossa economia, visto que a escassez de mão-de-obra - pior ainda se for especializada - nem sempre poderá ser compensada pela maior celeridade do crescimento dos índices de produtividade. E se estes se não verificam logo se esvai o ensejo de uma melhoria nas condições da remuneração do factor trabalho, porque, faltando a produtividade que lhe serviria de legítimo suporte, antecedentemente falhara ou nem sequer teria sido tentada a prática de métodos de racionalização ou de quaisquer processos atinentes e conducentes ao progresso técnico.

Por outro lado, sob o prisma deste contexto económico, a valorização do trabalho, aliás sempre desejável, arrastará a uma situação altista dos custos de produção, a qual, por sua vez, baixará de ritmo com possíveis consequências sociais implicativas, porventura, do subemprego. Mas há ainda uma sobreposição de consequências nefastas que se revela por vários modos: tendência natural, embora por motivos pessoais ilusórios, quantas vezes, para o avolumar da rarefacção da mão-de-obra, assim como urna espécie do bola de neve, que quanto mais rola mais ingurgitada se apresenta; daí o agravamento do condicionalismo demográfico que se repercute na diminuição do produto nacional e depressão dos níveis de consumo, poupança e investimento. Mas assinale-se, também, o carácter funesto emergente da prática do denominado processo de selecção negativa, visto que se regista a debandada das pessoas válidas, mas ficam as crianças, os velhos c os dirimidos físicos, isto é, o nosso potencial humano activo sofre profundo desfalque, precisamente daqueles elementos da idade da produção, que possuíam capacidade de produção.

A propósito, diremos que lemos algures, já nem sabemos quando, "haver concelhos que repelem mais de 20 por cento da sua população actual, significando que, a serem nulos os saldos fisiológicos, em cerca de um século ter-se-ão tornado, praticamente, desérticos - situação que não estará tão longínqua como muitos poderão imaginar, pois se caminha a passos largos para um acentuado envelhecimento e quebra do natalidade da população desses espaços".

Os estudiosos da matéria, ao analisarem o problema dos desequilíbrios fisiológicos existentes no continente, dividem u país em duas zonas com a designação de "nuclear" e "periférica", caracterizando-as por esta forma: a primeira (nuclear) compõe-se de sete distritos: Aveiro, Braga, Coimbra, Leiria, Lisboa, Porto e Setúbal, a sua densidade demográfica - censo de 1960 - era de 219 habitantes por quilómetro quadrado, com um acréscimo populacional, entre 1950-1960, de 581 000 sendo de 99 o índice de retensão do saldo fisiológico; à luz dos resultados obtidos sobre o inquérito acerca da localização das actividades industriais, apurou-se ser da ordem dos 527 000 o número de empregados; pendia a seu favor a densidade da rede rodoviária, escolas, consumo do electricidade, casas bancárias, etc. A segunda (periférica), abarcando os onze distritos restantes e respeitando-se exactamente a ordem dos caracteres antes apontados, apresentava os seguintes traços diferenciais: 53 800, 4 e 134 900.

Na zona "periférica" enquadra-se o distrito de Viseu, a respeito do qual, só para não alongarmos em demasia esta intervenção e não abusarmos, mais ainda, da bone-

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volência de VV. Ex.ªs, mesmo som querermos transbordar da análise do sector primário, é que não desceremos ao descritivo de pormenores, sem dúvida interessantes, sobre a pulverização da propriedade e expressão do seu valor, dimensão da exploração agrícola, áreas pelas quais só repartem os diversos tipos de cultura, distribuição da população activa em relação à superfície agrícola, características do mercado agrícola u emprego na agricultura, etc.

Sr. Presidente: Se está averiguado que para, uma população de 9 082 329 pessoas, em 1966, o número de emigrantes, afora os que se transferiram clandestinamente, ascendeu a 120 239 (20 797 de 25 a 29 anos de idade), retornando 1720, no que toca só ao distrito de Viseu aquele número situou-se na casa dos 4415 - 2720 homens e 1695 mulheres - com um retorno definitivo de 188, podendo especificar-se que, no conjunto dos seus 24 concelhos, os mais fortemente contributivos para o fluxo emigratório foram, em ordem decrescente, Viseu, Mortágua, Tondela, Sátão, Mangualde e S. João da Pesqueira, através, essencialmente, das suas actividades primárias. França, Alemanha (República Federal), Estados Unidos. Brasil, República da África do Sul e Canadá foram os países de destino preferidos poios emigrantes do distrito.

Aqui ficam, Sr. Presidente, breves afirmações do muito que poderia ser dito acerca do binómio distrito de Viseu-emigração. Os filhos da nossa região, desde Lamego a Mortágua, de Cinfães a Tabuaço e de Oliveira de Frades a S. João da Pesqueira, suo sóbrios, pacientes e laboriosos, crêem em Deus, estremecem a Pátria, têm o culto da família. Mas possuem ainda a fortaleza do granito das suas serranias e também o espírito aberto próprio dos que têm à sua frente a largueza dos vastos horizontes, de modo que, quando as vicissitudes da vida os oprimem e agridem ou o sonho da aventura lhos povoa a imaginação, lançam-se em demanda de qualquer das sete partidas do Mundo e, se bem que sob o acicate constante da ansiedade do retorno, aí permanecem algum tempo, trabalham, dignificam-se e, por vezes, curtem consumições e amarguradamente sofrem com os espinhos da saudade cravados na alma por amor da Pátria que nunca renegam. Eles são assim: longe ou perto, o sou coração bate sempre: ao ritmo do coração da Pátria!

O Sr. Veiga de Macedo: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: A luz da nossa ordem jurídica sob o reflexo da doutrina da Igreja - a talhe de foice se recorda ter o venerando Episcopado Português feito a publicação, recentemente, de uma notável pastoral sobre a emigração - e não só por força da Declaração Universal dos Direitos Humanos, os Poderes Públicos não podem, na generalidade dos casos, proibir o fenómeno emigratório. Efectivamente, quem busca, para além das fronteiras do seu país de origem, uma melhoria de condições de vida exerce um direito insusceptível de ser cerceado, está no pleno uso de uma liberdade que se cataloga adentro do tipo das chamadas fundamentais.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sabe-se e entende-se, todavia, que esse direito e essa liberdade são passivos de restrições nos seus exercício e uso e podem vir a ser interditos, inclusivamente, sempre que estejam em causa altos, sagrados, digamos, imperativos de carácter nacional (v. g. no clima da guerra que nos foi bárbara, cínica e iniquamente imposta) ou, ainda, para benefício dos próprios emigrantes.

O Sr. Veiga de Macedo: - E só nestes casos.

O Orador: - Se o fenómeno emigratório pode revestir-se da acumulação do lado positivo, agora de expressão colectiva, que resulta de propiciar o envio de reservas, constituindo os chamados "invisíveis" que tão directamente influenciam a posição da balança de pagamentos, a verdade é que quando a corrente populacional não é de Portugal continental para o Portugal ultramarino e toma o rumo do estrangeiro cria, penosamente, uma rarefacção de elementos activos no seio da Nação, que, como já referimos, fica privada do espírito e dos braços dos seus filhos, tão necessários e úteis, mormente quando dotados de qualificação profissional. E sentimos a tentação de formular a pergunta: sempre a parte destacada do aforro dos nossos emigrantes terá a aplicação mais conveniente pelos seus destinatários? Duvidamos. E não pode ser causa de malefícios, tocando delicados sentimentos morais, colidindo em alguns casos mesmo com o ideal da Pátria? Pensamos que sim. Consideramos ainda e somos levados a ponderar. Sr. Presidente, que no momento histórico que vivemos, prospectando os novos tempos ao encontro dos quais nos dirigimos e atentas as largas perspectivas promissoras que se rasgam nos horizontes da vida nacional, mercê da execução do que está programado no III Plano de Fomento, de modo algum podemos prescindir da nossa mão-de-obra, quer no sentido quantitativo, quer dobradamente no qualitativo, pois ela não pode deixar de reputar-se de uma indispensabilidade e essencialidade manifestas. E neste domínio terá a mais ampla audiência o Serviço Nacional de Emprego.

Sr. Presidente e Srs. Deputados: Cremos ter sido realistas ao focar e explanar as consequências do desregramento dos fenómenos que nos tocam pela porta, mas que, de resto, nem só n nós nos afectam, porque se verificam a escala mundial. Todavia, não quisemos ser, e efectivamente não somos, pessimistas, bastando pensar que para enfrentar e dar combate aos males apontados, a par de medidas de- largo alcance, já adoptadas pelo Governo e cujos efeitos, na sua totalidade, nem sempre poderão produzir-se de maneira imediata, mas só a médio e longo prazo, foram feitos cuidadosos estudos e fixadas adequadas soluções de que se espera o raiar da aurora de novos e claros dias de prosperidade acrescida para toda a grei portuguesa, no conjunto da vida nacional. Na verdade, para acelerar o progresso sócio-económico de certas regiões do País, propiciando mais felicidade e maior bem-estar aos vários estratos da comunidade, impõe-se a sistematização e execução de medidas fomentadoras, estimulantes e proteccionistas que visem os seguintes objectivos:

Elevação do nível de bem-estar de toda a população portuguesa;

Redução de diferenças entre os níveis de vida dos vários estratos sociais;

Acudir às necessidades dos grupos mais vulneráveis;

Alargamento da partilha dos frutos de desenvolvimento económico e também do sistema de previdência e seguro social aos trabalhadores rurais;

Plena utilização e pleno emprego dos recursos naturais e humanos:

Elevação de taxa do crescimento do produto;

Aumento do poder de compra da população com menores recursos:

Tornar acessíveis os bens e serviços às classes de menor rendimento:

Redução dos desequilíbrios inter-regionais;

Elevação de certos investimentos sectoriais - saúde, educação, habitação, água, electricidade, etc. - proporcionando às populações de menores recursos ou rendimentos a melhoria das suas condições de

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vida. Ainda a construção de centros de formação profissional agrícola o extensão familiar rural e também apoio técnico e financeiro na execução de infra-estruturas de natureza Comunitária;

Maior amplitude de ministração do ensino agrícola e acção de mentalização, de doutrinação e de difusão de novos conhecimentos em benefício dos que vivem nos meios rurais, a par da concessão de facilidades de crédito, suasória explicação e justificação prática do uso das actuais técnicas no cultivo da terra, como processo de embaratecer o custo de produção e aumentar os índices de rentabilidade;

Procurar estabelecer entre a cidade e o campo certa igualdade de oportunidades no plano económico, demográfico, social e cultural, através da criação de centros rurais em dimensão, dinamismo e equipamento suficientes para fixar as populações.

Pois, Sr. Presidente e Srs. Deputados, este conjunto de providências de desenvolvimento económico e de promoção social que aí fica está, se não na sua integralidade, em grande parte, esparso no conteúdo do III Plano de Fomento, ou ao menos materializar-se-á, em boa medida, através da observância desse documento notabilíssimo, nunca c de mais repeti-lo, que o Governo concebeu e gizou, nesta hora histórica da Pátria, e irá sucessivamente executando com a cooperação das forças vivas do País e de toda a população portuguesa, suas beneficiárias, numa arrancada de determinação, de esforço e de confiança que está na base e é condição do êxito das grandes empresas a que fica bem e perfeitamente se adapta a designação de verdadeira cruzada nacional!

E agora entraremos, com sincero espírito de humildade, no tratamento breve do magno problema do povoamento do ultramar, que também já foi considerado nesta Assembleia, repetidamente e por forma que, sem hipérbole, classificamos de magistral. Com efeito, sobre tão aliciante tema, de modo plural e com mãos de mestres manejando apurado hipérbole, já foi composto no seio da Representação Nacional quadro perfeito e de largas proporções, enquanto que nós - ai de nós! -, Sr. Presidente, não saberemos senão arriscar umas brochadas largas e toscas donde sairá grosseiro esboceto, porque a míngua do nosso engenho e a pobreza da nossa arte não dão ensanchas para mais. Mas a tudo sobreleva a recta intenção que nos move ao serviço da grande paixão que consagramos ao ultramar pensando na Pátria comum de todos nós.

Os portugueses de qualquer latitude dedicam efectivamente, e têm obrigação moral de dedicar, ao ultramar todos os seus desvelos. Mas sabe-se que melhor se compreende e mais poderá amar-se aquilo que se conhece. Ora nós, graças à posição parlamentar que transitoriamente ocupamos, sentimos a alegria imensa e vivemos a rara felicidade de poder dizer que conhecemos algo do Portugal de além-mar através do nosso contacto memorável com a portuguesíssima, grandiosa, extraordinária e fascinante província do Indico e a boa gente empreendedora, de jeito afável e impressionantemente hospitaleira que nela vive e labuta. Daí que ficássemos a compreender melhor o nosso ultramar e, se possível, a amá-lo ainda com mais fervor.

Sr. Presidente: É pensamento de muitos espíritos que a chamada "pressão demográfica" deveria descongestionar-se recorrendo-se à deslocação de metropolitanos para o ultramar, por um lado, e, pelo outro, intensificando-se a industrialização do País. Isto joga, como é óbvio, com o povoamento das nossas províncias ultramarinas, visando a consecução de objectivos de grande elevação e

transcendência, primaciais e irreversíveis que esquematicamente referimos: reforço de uma acção nacionalizadora, instrumentação do progresso sócio-económico, amplitude e enraizamento da solidariedade multirracial, expansão da nossa língua, radicação e motivações para maior vivência do catolicismo como religião tradicional do País, consolidação dos princípios de unidade e de soberania nacional.

Claro que, revestindo o povoamento características agrícolas, além de outras, evidentemente, terá de ser precedido do cumprimento de medidas não apenas estimulantes, mas também cautelares, isto é, exigindo a adopção de previdências a serem observadas cá e lá, queremos dizer, impor-se-á naturalmente, como é de regra, fazer a preparação e selecção dos metropolitanos, fornecer-lhe facilidade de deslocação, aliviá-los e libertá-los de certas perrices burocráticas, mas também, nos territórios de além-mar, a par do arranjo de terrenos adequados, proceder, inadiavelmente, à execução de obras que assegurem, como é premente, um sistema regular de comunicações e transportes, realizar trabalhos de rega, enxugo, electrificação, conceder créditos, ferramental de trabalho, gado, sementes, etc.

Repete-se a necessidade de que seja levada a cabo, preliminarmente, a feitura de estudos não só de ordem técnica, mas de feição humana, e não só prevenir, mas definir e estabelecer, com sentido prático das realidades, coordenadas económicas e financeiras que envolvem, como se sabe, um modus facicndi peculiar e contêm vários cambiantes e reflectem particularidades que, sendo de maior interesse considerar, exigem profunda ponderação. Sobre esta matéria é, na verdade, altamente elucidativa a leitura do esplêndido trabalho, citado e justamente elogiado por vários ilustres Srs. Deputados, da autoria do Sr. Engenheiro Silvério da Costa. Nele se justifica a fecunda acção a ser exercida pelo militar-colono-agricultor a bem da elevação económica, social e espiritual da comunidade nacional, e em ordem ao fortalecimento da sua estrutura defensiva através do povoamento do ultramar feito também a base dos desmobilizados das nossas forças armadas e das suas famílias.

Por esta forma, Sr. Presidente, se contribuiria validamente para a corporizarão do pensamento luminoso do português de lei, homem de génio e esclarecido governante que, um dia, as circunstâncias conduziram a proclamar ter que ser o nosso ultramar defendido com uma das mãos na charrua e a outra na espada. Pois que a actividade tanto dos portugueses metropolitanos como insulares seja canalizada e aproveitada igualmente em benefício dos territórios ultramarinos, de preferência aos do estrangeiro. Assim, melhor se assegurará e perpetuará a firme intangibilidade do todo unitário da Pátria multigeográfica, mas una, coesa, incindível; assim aumentar-se-á, pela melhor forma, a densidade demográfica do Portugal de além-mar, criando-se com a exploração intensiva e aprimorada de potencialidades naturais, adentro de um clima de perfeita integração étnica e harmonia social, criando-se - dizíamos - abundantes fontes de. riqueza económica, de meios de promoção humana, de forte densidade espiritual - razão de ser de maior expansão de bem-estar colectivo, processo de aglutinação e cimento de unidade como elemento mais precioso e útil, não só em tempo de guerra, mas também em tempo de paz.

Vai a hora adiantada, Sr. Presidente, e, por isso, penaliza-nos não poder glosar encomiàsticamente, como seria nosso profundo agrado, os "fundos" de O Século, de 29 de Março e 26 de Abril de 1967, e o artigo do Diário da Manhã de 21 de Janeiro de 1968, todos brilhantes e

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oportunos no debate do fenómeno emigratório, mas no primeiro e no último explanando-se a melhor doutrina sobre o prolongamento da acção dos nossos heróicos militares participando do povoamento das províncias ultramarinas.

Quanto aos emigrantes que demandaram o ultramar, a leitura dos dados estatísticos elucida-me de que a partir de 1950 as expressões mais quantiosas foram as correspondentes aos anos de 1956, 1952, 1965, 1959 e 1962, com esta ordem de grandezas, respectivamente: 13 581, 13 724, 14 123, 14 427 e 17 219. Em 1966 apenas saíram para as nossas terras de além-mar 10 787. Mas a importância da política do povoamento está e permanece, como é curial, no âmbito das preocupações governamentais. Atesta-o o III Plano de fomento, onde se fala em "esquemas de povoamento com o indicativo de fixação de novos núcleos de povoamento agrário, baseado na necessidade de fixação de povoadores, sobretudo ex-soldados, em aldeamentos fronteiriços a zonas de infiltração". Especifica-se "a fixação de agregados familiares visando também a recuperação de fazendas abandonadas e com a vantagem de serem agentes motores junto de populações economicamente pouco evoluídas". Assim se exprime aquele notável diploma.

Estejamos, pois, confiantes na atenção e cuidados que o Ministério do Ultramar dedica e não deixará de desveladamente dedicar a tão importante questão, e conservemos a esperança em que se conjugue e intensifique a sugerida intercolaboração por parte dos comandos militares, serviços de povoamento ultramarino e juntas provinciais de povoamento, com a melhor orgânica adequada aos condicionamentos humanos, imperativos de ordem económico-social e condicionalismos ambientais, em ordem à consecução do desiderato que a todos deve empolgar. Temos esperança e fé, Sr. Presidente, que novas e reais facilidades serão criadas à estruturação e materialização de um problema, que pela sua natureza, premência, dimensão e projecção, bem pode medir-se à escala nacional: o problema do povoamento metropolitano do ultramar português - o ultramar, Sr. Presidente, também corpo, sangue, alma e vida da Pátria!

Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão.

Amanhã haverá duas sessões com a mesma ordem do dia, uma às 11 horas e outra à hora regimental, para ver se é possível concluirmos os trabalhos. Se não for possível, teremos de continuar o debate no sábado, não sei se durante uma ou duas sessões. As necessidades é que hão-de ditar.

Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 30 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

António Augusto Ferreira da Cruz.
António Dias Ferrão Castelo Branco.
Arlindo Gonçalves Soares.
Augusto César Cerqueira Gomes.
D. Custódia Lopes.
Francisco Elmano Martinez da Cruz Alves.
Henrique Ernesto Serra dos Santos Tenreiro.
James Pinto Buli.
João Ubach Chaves.
José Dias de Araújo Correia.
José Guilherme Bato de Melo e Castro.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Manuel Henriques Nazaré.
Martinho Cândido Vaz Pires.
Raul Satúrio Pires.
Tito de Castelo Branco Arantes.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Aulácio Rodrigues de Almeida.
Gabriel Maurício Teixeira.
Jaime Guerreiro Bua.
João Mendes da Costa Amaral.
Joaquim de Jesus Santos.
José Coelho Jordão.
Manuel Amorim de Sousa Meneses.
Manuel José de Almeida Braamcamp Sobral.
Manuel Lopes de Almeida.
D. Maria Ester Guerne Garcia de Lemos.
Rafael Valadão dos Santos.

O REDACTOR - António Manuel Pereira.

Requerimento enviado para a Mesa durante a sessão:

Requeiro, ao abrigo do Regimento desta Assembleia Nacional, que me sejam fornecidas as seguintes publicações oficiais:

a) Legislação do Ministério das Obras Públicas, da Secretaria-Geral do Ministério;

b) Mozambique, da Agência-Geral do Ultramar;

c) Portugal no Mundo - Macau, do Centro de Informação e Turismo de Macau; e

d) Armoriai do Ultramar Português, da Agência-Geral do Ultramar.

Lisboa e Palácio da Assembleia Nacional, 7 de Março de 1968. - O Deputado, António Furtado dos Santos.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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