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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 153

ANO DE 1968 12 DE DEZEMBRO

IX LEGISLATURA

SESSÃO N.º 153 DA ASSEMBLEIA NACIONAL

EM 11 DE DEZEMBRO

Presidente: Exmo. Sr. Mário de Figueiredo

Secretários: Exmos. Srs.Fernando Cid de Oliveira Proença
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira

Nota. - Foram publicados o 1.º e o 2.º suplementos ao Diário das Sessões n.º 136, que inserem o parecer sobre as contas gerais do Estado de 1966, respectivamente, da metrópole e do ultramar.

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 20 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foi aprovado o Diário das Sessões n.º 150.
Deu-se conta do expediente.
O Sr. Presidente deu conhecimento de estar na Mesa uma proposta de lei sobre a reorganização das Casas do Povo e previdência rural, que vai ser enviada à Câmara Corporativa e, para estudo, à Comissão de Trabalho e Previdência da Assembleia.
O Sr. Presidente informou que faleceu o antigo Deputado Rogério Vargas Moniz, propondo um voto de pesar.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Amaral Neto, acerca da necessidade de o Governo encarar medidas que assegurem maior eficiência aos serviços da Assembleia afectos ao Diário das Sessões, e Valadão dos Santos, sobre problemas de interesse para o arquipélago dos Açores.

Ordem do dia. - Prosseguiu na generalidade a discussão, da proporia de lei de autorização das receitas e despesas para o ano de 1969.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Águeda de Oliveira, Sousa Magalhães, Rui Vieira e Alves Moreira.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 19 horas e 10 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai fazer-se a chamada.

Eram 16 horas e 10 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Pacheco Jorge.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Álvaro Santa Rita Vaz.
André Francisco Navarro.
André da Silva Campos Neves.
Aníbal Rodrigues Dias Correia.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António Calapez Gomes Garcia.
António Furtado dos Santos.
António José Braz Regueiro.
António Moreira Longo.
Arlindo Gonçalves Soares.
Armando Acácio de Sousa Magalhães.
Armando José Perdigão.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Alves Moreira.
Artur Correia Barbosa.

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Artur Proença Duarte.
Augusto Salazar Leite.
Avelino Barbieri Figueiredo Batista Cardoso.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Deodato Chaves de Magalhães Sousa.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando Cid de Oliveira Proença.
Filomeno da Silva Cartaxo.
Francisco António da Silva.
Francisco Cabral Moncada de Carvalho (Cazal Ribeiro).
Francisco José Cortes Simões.
Hirondino da Paixão Fernandes.
Jerónimo Henriques Jorge.
João Duarte de Oliveira.
João Mendes da Costa Amaral.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
Joaquim de Jesus Santos.
Jorge Barros Duarte.
José Alberto de Carvalho.
José Coelho Jordão.
José Fernando Nunes Barata.
José Gonçalves de Araújo Novo.
José Henriques Mouta.
José Janeiro Neves.
José Maria de Castro Salazar.
José de Mira Nunes Mexia.
José Pais Ribeiro.
José Rocha Calhorda.
José Vicente de Abreu
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Leonardo Augusto Coimbra.
Luís Arriaga de Sá Linhares.
Manuel João Cutileiro Ferreira.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel Marcues Teixeira.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
D. Maria de Lourdes Filomena Figueiredo de Albuquerque.
Mário de Figueiredo.
Martinho Cândido Vaz Pires.
Miguel Augusto Pinto de Meneses.
Paulo Cancella de Abreu.
Rafael Valadão dos Santos.
Raul Satúrio Pires.
Raul da Silva e Cunha Araújo.
Rogério Noel Peres Claro.
Rui Manuel da Silva Vieira.
Sebastião Garcia Ramirez.
Sérgio Lecercle Sirvoicar.
D. Sinclética Soares Santos Torres.
Teófilo Lopes Frazão.
Tito Lívio Maria Feijóo.
Virgílio David Pereira e Cruz.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 71 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 16 horas e 20 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: -Vou pôr em reclamação o Diário das Sessões n.º 150, já distribuído. Se nenhum dos Srs. Deputados deduzir qualquer reclamação, considerá-lo-ei aprovado.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Está aprovado.

Deu-se conta do seguinte

expediente

Telegrama

Da Câmara Municipal de Castro Verde apoiando a intervenção do Sr. Deputado Lopes Frazão.

O Sr. Presidente: - Está na Mesa uma proposta de lei sobre a reorganização das Casas do Povo e a previdência rural. Vai ser enviada à Câmara Corporativa e, para estudo, à nossa Comissão de Trabalho e Previdência.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Morreu ontem o antigo Deputado na VIII Legislatura Sr. Rogério Vargas Moniz. Tenho a segurança de interpretar o pensamento da Assembleia mandando exarar na acta um voto de profundo pesar pelo seu desaparecimento. Sabem VV. Ex.ªs que ele foi sempre, através da vida, uma pessoa que ficava na alma de cada um daqueles com quem tomava contacto. Foi antigo Subsecretário de Estado da Indústria e vogal da Comissão Executiva da União Nacional. Era de uma bondade que a todos acolhia admiravelmente e cujos contactos deixavam em todos uma impressão de profunda simpatia. Interpreto, pois, volto a afirmar, o sentimento da Assembleia mandando exarar na acta um voto de profundo pesar pelo seu falecimento.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra antes da ordem do dia o Sr. Deputado Amaral Neto.

O Sr. Amaral Neto: - Sr. Presidente: Pedi a palavra para rogar a V. Ex.ª e, através de V. Ex.ª, ao Governo a fim de providenciar os meios necessários, pois eu creio que o problema é muito mais de falta de meios do que de deficiência dos serviços com os meios de que actualmente dispõem, para rogar a V. Ex.ª as medidas que tiver por convenientes a fim de se assegurar maior perfeição no registo dos trabalhos parlamentares e maior regularidade e pontualidade na distribuição do Diário das Sessões, que deles constitui a legítima e legal acta.
O Diário das Sessões, de sessão legislativa para sessão legislativa, tem vindo a marcar atrasos cada vez mais acentuados na sua publicação e distribuição. Para nos referirmos só às duas últimas, eu lembrarei a V. Ex.ª o que com certeza poderá ser confirmado por cada um dos Deputados presentes, que os últimos números relativos à sessão legislativa de 1966-1967 chegaram às nossas mãos em Agosto de 1967, vários meses portanto depois de encerrada essa sessão legislativa. Quanto à sessão legislativa de 1967-1968: verifica-se que o último Diário das Sessões aprovado pela Assembleia no seu plenário foi o n.º 122, de 20 de Janeiro, aprovado na sessão de 31 desse mês. sem embargo de o termos reaprovado outra vez na sessão de 5 de Dezembro. Desde fins de Janeiro não mais veio a público qualquer exemplar do Diário das Sessões, para, na semana anterior à reabertura dos trabalhos da Assembleia para a corrente sessão legislativa, recebermos em nossas casas os exemplares dos números até ao 137, inclusive, e no dia da reabertura dos trabalhos encontrarmos nas carteiras os n.ºs 138 a 147 com que acaba o relato da sessão legislativa de 1967-1968. Eu sei que sobretudo os trabalhos da Imprensa Nacional esti-

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veram extremamente sobrecarregados durante o corrente ano. Tiveram todos os trabalhos resultantes da publicação do Plano de Fomento, que envolveram, a impressão de milhares de páginas e até a reedição, por mais de uma vez, de grande parte desses milhares de páginas. Não esqueço isso, e, se o fenómeno fosse só deste ano, nem sequer importunaria V. Ex.ª e a Assembleia. Mas a situação infelizmente desenha-se desde há muito e tem vindo a agravar-se cada vez mais, com efeitos de vária ordem. Em primeiro lugar, os Deputados que aqui tomam a palavra sofrem o desgosto de verem as suas intervenções chegarem muito tarde ao conhecimento do País. Sem dúvida a imprensa sabe dar, nos seus relatos, os tópicos essenciais das nossas intervenções, mas não pode reproduzir os textos integrais. E quando as intervenções levantam o interesse ou curiosidade de alguém, se esse alguém pensa inteirar-se melhor do respectivo conteúdo através do Diário das Sessões, quando o mesmo chega a ser publicado passou-se entretanto tanto tempo que o interesse na ocasião da intervenção despertado quase se perde por completo, perdendo-se inclusivamente o esforço dos intervenientes e a boa intenção de concorrerem para o bem público e melhoria dos serviços da Administração.
Mas há outros efeitos que me permito reputar ainda mais graves. A recente Lei do Serviço Militar foi publicada com data de 11 de Julho, antes que estivesse publicado o suplemento ao Diário das Sessões que contém o texto da Comissão de Legislação e Redacção, procurando reunir todas as emendas aqui votadas. Esse texto não foi aprovado nem havia o voto da Assembleia à Comissão de Legislação e Redacção para o ultimar. É lícito dizer que esse decreto da Assembleia Nacional foi tornado lei sobre informações que não são tão autorizadas como seriam as colhidas directamente nas actas que traduzem as deliberações da própria Assembleia.
Não é preciso ir mais longe para salientar a importância e a gravidade destes atrasos. Não quero demorar-me sobre o papel da Assembleia que ainda ontem, precipitada e sumariamente, quis figurar um pouco a V. Ex.ª Não quero demorar-me sobre a importância que teria ver o Governo testemunhar publicamente o seu respeito à Assembleia, defendendo a esfera dela, assim como defende a sua própria; sobre a deferência que consistiria em dar-lhe todos os meios indispensáveis para que os seus trabalhos fossem conhecidos completa e prontamente. Não preciso dizer mais nada para V. Ex.ª tomar o assunto nas suas mãos, porquanto já V. Ex.ª nos disse aqui uma vez que ele era da sua responsabilidade, estando eu assim convencido de que, se o mesmo se não encontra ainda cabalmente resolvido, é porque ainda não foram postos à disposição de V. Ex.ª os meios para tanto necessários. Julgo que com esta manifestação, em que decerto não me encontro só, V. Ex.ª estará em condições de fazer mobilizar os recursos indispensáveis para resolver a situação.
Quanto ao registo dos trabalhos da Assembleia, a Assembleia está reduzida presentemente a um único taquígrafo, e, se é certo que todos trazemos notas suficientes para a redacção do Diário das Sessões, não é menos certo de que ficamos privados do registo das intervenções em aparte que, entre outras virtudes, têm o mérito de reanimar os debates e de afervorar o interesse em volta dos oradores, permitindo também esclarecer melhor um ou outro ponto. O velho Congresso da República, extinto em 1926, contava nos seus serviços de secretaria, de registo e redacção com nada menos de 61 elementos, contando com o director-geral, chefes de repartição, chefes de secção, com primeiros, segundos e terceiros-oficiais, com primeiros, segundos e terceiros-taquígrafos, com redactores e com taquígrafos aspirantes, redactores eram 11 e taquígrafos 18. Dactilógrafos não havia nenhum, porque parece que nesse tempo se ignorava ainda a máquina de escrever. Mas se então se podia fazer o relato parlamentar sem máquina de escrever, hoje em dia não é possível fazê-lo sem máquina de gravar. A arte do taquígrafo está a extinguir-se. As assembleias públicas e os serviços comerciais foram os domínios que mais os utilizaram. Hoje, porém, os serviços comerciais já descobriram o gravador, começando a rarear aquelas meninas que tomavam notas taquigráficas, porque já há aparelhos electrónicos para as substituir. Será difícil à Assembleia Nacional ter serviços taquigráficos com a eficácia desejável, porque um taquígrafo não se mantém treinado com umas escassas cinquenta sessões por ano. Seria conveniente, por isso, arranjar um sistema de gravação eficaz, para dela nos podermos socorrer quando quiséssemos intervir nos trabalhos, sem termos de vir para aqui com documentos escritos para os mais breves apartes.
À ponderação de V. Ex.ª deixo este comentário. Ele não envolve o mínimo desrespeito pelo intenso trabalho que fazem os que aqui estão, como não envolve o desconhecimento de quanto o Governo tem de atender a solicitações variadas, não podendo logicamente atender a todas elas ao mesmo tempo, nem completamente. Mas envolve a convicção de que o prestígio da Assembleia e o respeito pelo esforço que aqui desenvolvemos bem merecem uma grande boa vontade para que estas faltas não voltem a poder ser notadas. E incidentalmente registarei a pontualidade com que está a sair agora o Diário das Sessões, mas essa pontualidade sempre a vemos no princípio das sessões legislativas e desde há muito a não vemos no fim delas.

Vozes: -Muito bem. muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Valadão dos Santos: - Sr. Presidente: Há dias o grande jornal Diário de Noticias, ao escrever acerca da reabertura desta Assembleia para mais uma sessão de trabalhos, referindo-se a nós, Deputados, dizia, entre outras coisas, o seguinte:

... nas suas bagagens [eles levam] as aspirações legítimas dos povos que representam e os velhos problemas que é preciso insistir - note-se, insistir - para ver resolvidos.

E logo corroborava com o seguinte caso:

Passou há anos pela Assembleia um Deputado que sempre que usava da palavra se referia à necessidade de ver restaurada a Faculdade de Letras do Porto. Muitas vezes apelou o Dr. Urgel Horta para o Governo. Aparentemente ninguém o ouvia. Mas um dia o seu apelo foi escutado. Valera a pena a sua insistência!

Isto escrevia o Diário de Noticias a um comentário a propósito da abertura dos novos trabalhos parlamentares.
Pois eu, Sr. Presidente, também tenho transportado sempre na minha bagagem de Deputado, e das maravilhosas paragens do arquipélago açoriano, as aspirações legítimas e sinceras daquela portuguesíssima gente e tenho procurado trazer à atenção desta Câmara e do Governo aqueles velhos - eu ia a dizer velhíssimos - problemas que é necessário insistir, e voltar a insistir ...

Vozes: - Muito bem!

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O Orador: - Certo é que não tenho, nem as qualidades oratórias, nem o poder de persuasão do Dr. Urgel Horta, mas tenho, sim - e sem falsa modéstia o afirmo -, a mesma recta intenção, a mesma persistência e, talvez, a mesma teimosia daquele ilustre homem público. Queira Deus que um dia, como ele também, tenha a sorte ou felicidade de ver premiado o fruto desta arreigada insistência, ou seja, a solução justa e inadiável do arrastado e cansadíssimo problema das comunicações nos Açores e para os Açores.
Sr. Presidente: Desde a primeira sessão desta Legislatura que tenho levantado a minha voz nesta Câmara a solicitar ao Governo um olhar de misericórdia para o mais grave e importante de todos os nossos problemas. É certo que nem tudo foi em vão, pois durante um pequeno e fugaz período as nossas comunicações, principalmente as marítimas, melhoraram sensivelmente, embora o problema em si estivesse muito longe de estar resolvido. Todavia, passado esse pequeno período, voltou tudo à primitiva ou, talvez, pior, porque hoje a situação das comunicações marítimas é puramente caótica. O Funchal - esse magnífico navio - praticamente não existe para os Açores. C Lima acaba de ser arrematado; o Carvalho Araújo arrumado- agora, durante uns meses, e até se diz que será vendido. Das carreiras interilhas, o Ponta Delgada e o Cedros, este último sem quaisquer condições de comodidade e, normalmente, um deles desviado para as carreiras com o continente. Estou a lembrar-me que este Verão passado, e em época de ponta - no mês de Agosto -, o Ponta Delgada foi servir de hotel de turismo para os lados da Madeira! ... O que nos resta, quanto a passageiros? Praticamente, o Angra do Heroísmo (e este não escala as ilhas todas) e um Faial - um velho navio recém adquirido e que nem rápido é, não levando sequer sessenta passageiros, e que pretende substituir o Carvalho ... E, para cúmulo de tudo isto, que já não é pouco, com uns horários que nunca ninguém sabe, e que a ninguém serve, a não ser à própria Companhia ..., pois de outra maneira não se compreende. Só este ano eles já foram alterados não sabemos quanta vezes, e, já age rã, gostaria de saber se para o próximo ano já há horários feitos ... Julgo não ser necessário encarecer o enorme transtorno e prejuízo que tudo isto causa a quem tem de utilizar os serviços da Insulana. E como exemplo bem elucidativo de todo este estado de coisas direi apenas que a ilha Graciosa, situada no grupo central, esteve dezassete dias sem barco - nem tão-pouco um Cedros se dignou lá ir! -, e que ocasiões há em que os passageiros que daquela ilha se dirigem à Terceira, que dista apenas 40 milhas, os obrigam a passar por S. Jorge, Pico e Faial, fazendo mais do dobro do percurso, e levando, às vezes, quase dois dias, o que usualmente se processa numas simples quatro horas! Daqui eu apelo para a Junta Nacional da Marinha. Mercante e, sobretudo, para o seu muito ilustre presidente, e nosso distinto colega nesta Assembleia, para que o assunto mereça a atenção que o caso, na verdade, requer.
As comunicações marítimas com os Açores - nunca nos cansamos de o dizer - têm de. ser devidamente estudadas e estruturadas, tendo sempre em mente que a Empresa Insulana tem o monopólio dessas carreiras e que, por cor sequência, tem de ir ao encontro das necessidades imperiosas e inadiáveis das populações que tem por obrigação, e dever, seguir.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E eu ousava sugerir que, a exemplo do que se está a proceder para o planeamento das comunicações aéreas, se fizesse o mesmo para as comunicações marítimas, isto é, nomeie-se uma comissão em que estejam representados todos os interesses, mas todos sem excepção, e estude-se, a fundo o problema. Parece-me, daí só vantagens poderiam advir, inclusive, para a própria Empresa.
É voz corrente, e eu estou de pleno acordo, que um navio como o Funchal causa altíssimos prejuízos à Insulana. Em primeiro lugar, a população açoriana não é a culpada dos erros porventura cometidos pela Empresa concessionária. Em segundo, se o Funchal é o grande causador da alarmante (segundo se diz ...) situação financeira da armadora, pois que seja vendido ou retirado para outra linha, porque do modo como se estão a processar as viagens daquele barco com os Açores não serve de maneira nenhuma os interesses daquelas ilhas. Nós apenas precisamos - quanto a passageiros - de dois barcos do mesmo tamanho, ou pouco maiores que o Carvalho Araújo, mais velozes, a chegar e a partir em datas certas e que ofereçam comodidade, rapidez e eficiência; e nas carreiras interilhas, um navio como o Ponta Delgada, a servir, semanalmente, todas as ilhas.
Quanto a barcos de carga, principalmente quanto ao transporte de gado, há que rever o problema por completo e com urgência, uma vez que, como já aqui tive ocasião de acentuar, essa espécie de carga se processa como há cem anos. Nem mais um passo avançámos nesse sentido, o que é, lamentavelmente, triste e sintomático ...
No que concerne á comunicações aéreas, tenho a dizer, Sr. Presidente, que as palavras deste mesmo lugar pronunciadas, e por mais de uma vez. não foram completamente em vão. O novo Governo, da presidência desse ilustre e grande homem público que é o Prof. Marcelo Caetano, pouco tempo após a sua posse, fez publicar uma portaria criando uma comissão para estudar as comunicações aéreas dos Açores com o continente, interilhas e Açores e estrangeiro. Tal medida só é motivo para nós do maior regozijo e merece-nos o mais vivo aplauso. Tenho conhecimento de que essa comissão já se encontra em pleno funcionamento, o que não quer dizer que eu, como legítimo representante das populações a quem o assunto tão directamente interessa, não volte aqui a reafirmar o que já tive ocasião de dizer, neste mesmo lugar, e que é, em última análise, a maneira de pensar e sentir das populações em causa.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - Antes de mais, há que concluir as infra-estruturas aeronáuticas do arquipélago. O rápido acabamento do Aeroporto da Nordela, em S. Miguel, e seu completo apetrechamento impõem-se sem demoras e sem delongas. Ele é uma posição chave nessas infra-estruturas, pois serve a maior ilha açoriana e, por ali, como é óbvio, tem de se processar uma maior intensidade de tráfego. A sua construção tem demorado muito mais do que era de esperar. É tempo de o concluir e, sobretudo, de o apetrechar. A laboriosa e ordeira população micaelense assim o merece e o interesse dos Açores assim o exige. A construção de pistas nas ilhas Graciosa, S. Jorge e Pico é outra necessidade urgentíssima, e são as únicas que falta programar, uma vez que Flores e Horta estão em vias de conclusão. E, pelo menos, uma carreira semanal dos Boeing 707 à ida e vinda de Nova Iorque pelo Aeroporto das Lajes. Na verdade, Sr. Presidente, não se compreende que um aeroporto dos maiores do Mundo, como é o das Lajes, e dos mais bem apetrechados, em que tudo está

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construído e, para mais, no centro do arquipélago, não sirva, como devia, as populações açorianas.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - Voltar a pedir à T. A. P., que tão altos e relevantes serviços vem prestando ao País, que, ao menos, uma vez por semana, por ali escale os seus aviões julgamos não ser pedir muito, tanto mais que estamos certos da rentabilidade da operação. Mas, mesmo que ela não se verificasse - o que não é o caso -, há legítimos e justos interesses humanos, sociais e políticos em causa a sobreporem-se ao económico ...
Independentemente de tudo isto, há que não esquecer . que a concessionária das carreiras interilhas (naturalmente a S. A. T. A.) terá de ajustar os seus horários (para já não falarmos na urgência de novos, maiores e mais rápidos aviões) às chegadas e partidas daqueles, cuja ligação assegura e não, como está acontecendo actualmente, em que é vulgar os passageiros terem de aguardar mais de vinte e quatro horas por uma simples ligação.
Todos nós, nos Açores, temos os olhos postos na comissão que tem a seu cargo o estudo deste problema de capital importância, e que é o das comunicações aéreas. Estamos certos e confiantes de que alguma coisa de positivo e de útil sairá desse trabalho e que, sobretudo, se procurará fazer na distribuição dos múltiplos interesses em jogo uma justiça absolutamente equitativa. É necessário, é indispensável, todavia, andar com firmeza, mas depressa, e com dinamismo, pois é essa a nova palavra de ordem. Aguardamos com o maior interesse e em curto prazo os resultados dessa comissão e, principalmente, a tradução à realidade desses mesmos resultados. Esperamos não se encontrar pelo caminho com alguns daqueles maus burocratas que, infelizmente, ainda invadem a nossa Administração e que refreiam, reprimem e, sobretudo, emperram aquilo que, por sua natureza, deve andar depressa.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: A ilha Terceira tem uma aspiração - ia a dizer de séculos - e tem a promessa de um Governo, já lá vão mais de cem anos, e que é a de possuir um porto de abrigo. Temos um aeroporto excelente, em todos os sentidos, e que praticamente de nada nos serve, e nem, ao menos, temos um porto à altura das nossas necessidades. E isto numa ilha com cerca de 80 000 habitantes! Estamos, neste aspecto, em nítida desigualdade com os outros dois distritos açorianos, pois ambos possuem dois bons portos, o que não obstou que se gastasse - e muitíssimo bem - muitas dezenas de milhares de contos na construção- dos respectivos aeroportos. Se atentarmos nos mapas dos movimentos de barcos e cargas processados pelos portos da ilha- Terceira - Angra do Heroísmo e Praia da Vitória -, facilmente verificaremos que os números são por si eloquentes e elucidativos e que a construção de um porto - embora bastante vultosa - se justifica plenamente.
Quando pedimos, e insistimos, num porto para a ilha Terceira, não o fazemos, Sr. Presidente, nem por capricho, nem por bairrismo, nem por luxo, mas sim pela necessidade imperiosa de o possuirmos e da justiça que nos assiste, pois esse porto é condição indispensável ao progresso que todos nós tanto ambicionamos para aquelas terras.
Sr. Presidente: Nos Açores, actualmente, enfrentamos duas espécies de barreiras: barreiras alfandegárias e barreiras humanas. As primeiras, bastante complexas e, sobretudo, muito delicadas, pois envolvem taxas e impostos essenciais à vida camarária, assistencial e portuária, necessitam de um estudo em profundidade do assunto. Bem andou, pois, o Governo, por intermédio do actual Ministro de Estado adjunto do Presidente do Conselho, em criar, muito recentemente, uma comissão para se debruçar sobre tão melindrosa matéria e que de capital importância é para a economia açoriana.
As barreiras humanas - mais graves pelas implicações de ordem moral - são as que não permitem que um cidadão português, note-se, português, se desloque de uma ilha para a outra, até tratando-se do mesmo distrito, sem n, fiscalização e conhecimento da Polícia Internacional. Até há pouco tempo, tais deslocações só se poderiam fazer de bilhete de identidade na mão! Devido a uma intervenção que fiz nesta Câmara, e à atenção que o assunto mereceu ao então Ministro do Interior, Dr. Santos Júnior, foi dispensado o bilhete de identidade, o que, na verdade, foi um importante passo. Todavia, a Polícia Internacional continua a fiscalizar - é certo que com a maior correcção - todos os barcos e barquinhos que vão de uma ilha para a outra, com todos os transtornos e aborrecimentos, para já não falarmos na degradação que tal acto implica, pois parece que não somos portugueses da mesma classe. Isto fere sobremaneira, Sr. Presidente, a nossa sensibilidade e a nossa dignidade. Ter de ir de uma ilha para a outra, às vezes até do mesmo distrito, e ter de aguardar o aparecimento de um agente que ao fim e ao cabo nada verificar - uma vez que não é exigido bilhete de identidade -, para se pôr pé em terra portuguesa, é deveras pouco dignificante e sentimo-nos diminuídos na nossa condição de portugueses - e dos melhores -, que justamente nos orgulhamos de ser.
Consta-me, todavia, que essa fiscalização ainda se faz em virtude de um decreto - o n.º 44 311, de 28 de Abril de 1962, que, em resumo, dá ao governador do distrito autónomo de Angra do Heroísmo poderes para não permitir a vinda de outros portugueses trabalhar na ilha e, também, poderes para os fazer regressar à terra de origem, quando não tivessem trabalho assegurado. Pois bem, se esse decreto alguma vez teve razão de ser - se é que a teve (eu penso que todos os portugueses, se têm os mesmos deveres, também têm os mesmos direitos ...), embora compreenda que as circunstâncias anormais da época em parte o expliquem, ainda que o não justifiquem ... -. se esse decreto teve razão de ser, ia a dizer, hoje está absolutamente desactualizado e importa, antes de mais, a sua revogação.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - As tais circunstâncias sociais que o podiam explicar já hoje não existem, e por isso eu apelo veementemente para o Sr. Ministro do Interior, ciente de que este assunto merecerá da parte de S. Ex.ª - que em tão pouco tempo tem demonstrado uma preocupação dominante de justiça e de servir- aquela atenção que o assunto por si próprio merece. A revogação desse decreto, e, com ele, o livre trânsito de todos os portugueses entre as ilhas dos Açores, é um acto de pura justiça que se impõe sem demora e que, estou certo, vai encontrar no actual e dinâmico Ministro do Interior a resolução pronta e adequada.
É que nos Açores já temos o mar a separar-nos, esse mar motivo de. tanta desgraça e tragédia, e, ao mesmo tempo, razão da nossa maior glória, ele não há-de ser, por obra dos homens, causa de maior separação, mas, sim. de união e de entendimento, pois só assim é que se compreende toda a pluricontinentalidade na Nação Portuguesa.
E eis-me, Sr. Presidente, chegado ao fim.

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Acerca deste problema das comunicações nos e para os Açores, há sempre muito e muito que dizer e que apontar. Mas voltar a fazê-lo em todos os seus pormenores seria cansativo e fastidioso. Apenas procurei limitar-me ao essencial. Por isso, Sr. Presidente, acabo como comecei: eu gostaria de ter a sorte, ou a felicidade, do Dr. Urgel Horta ..., que, ao cabo de tanto insistir, acabou por ser ouvido e ver realizado aquilo que ele tão justamente e dignamente se bateu. Mas, desta vez, tenho fundadas esperanças - pois confio nos homens que actualmente se encontram no Poder - que as minhas palavras não terão sido em vão ...
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continua em discussão na generalidade a proposta de lei de autorização das receitas e despesas paia 1969.
Tem a palavra o Sr. Deputado Águedo de Oliveira.

O Sr. Águedo de Oliveira: - Sr. Presidente:
«Problemas e estadistas.»
Como o sangue é indispensável ao corpo humano, as finanças são necessárias ao corpo colectivo. O vulgo as severa que o dinheiro é a mola real, nervo da guerra, músculo da paz.
Começarei, portanto, por me referir aos problemas financeiros e aos estadistas capazes de os solucionar.
Sempre houve em Portugal problemas de finanças públicas, abrangendo as despesas fazendárias e os meios capazes de as satisfazer. As guerras pela nossa independência, destacadamente as finanças da Restauração, o financiamento das navegações e do comércio oriental e brasileiro, a obra de D. João V, o restauro, por Pombal, de Lisboa E terras destruídas, a liberalização constitucional, com o cataclismo social de Mouzinho, os remédios da crise monetária e política do último século, formam, entre outros, capítulos não muito brilhantes das nossas finanças históricas e criaram, na Europa culta, a ideia de que éramos intelectualmente avessos à matéria e incapazes como políticos de dominar a impetuosa corrente dos acontecimentos - uma grande fatalidade !
Foram os Filipes, para explorar os seus novos domínios, que tomaram medidas mais que cautelares, inventariando as nossas finanças, sobrecarregando-as, explorando um j ais tornado inerme e desencadeando a pior das opressões, pois que, na administração financeira e no controle financeiro, apuraram as medidas e as técnicas introduzindo novas mecânicas para sugar o sangue até aos ossos, em contos, réis, soldos, cruzados e pardaus e xerafins; o sangue de um país prostrado de economia combalida.
O Livro de Toda a Fazenda e Real Património, de Figueiredo falcão, o atesta sobejamente.
Mas se não faltaram problemas também não faltaram ministros e financeiros que procuraram gerir a administração fazer daria superior com critérios jurídicos e técnicos e remar contra a crise permanente.
Citarei alguns apenas, pelos seus inglórios esforços.
Além dos vedores e contadores-mores da velha monarquia afonsina, dos judeus contratados, o famoso Nuno da Cunha, que Diogo do Couto coloca acima dos heróis da índia, Pedro Alcáçova Carneiro, o conde da Castatiheira - cuja correspondência a Universidade de Harvard publicou, que atesta o zelo, seriedade e minúcia do respectivo capítulo -, o f arnoso conde da Ericeira, precursor do estado fabril, os vários Gamas, Mouzinho da Silveira, reformador mais que corajoso, o elegante barão de Quintela e suas concessões monopolistas, Oliveira Martins, que foi encontrar as dramáticas consequências da crise de 91, Anselmo de Andrade e tantos que às finanças nacionais deram o melhor dos seus intuitos, procurando remar contra a maré das desordens, das injustiças e das prodigalidades, tentando sanear uma administração corrupta ou mesquinha, desordenada ou versátil.
A história das nossas finanças não se lê sem melancolia, pois que de modo algum se ajusta às páginas brilhantes e fecundas do esforço colectivo.
«Salazar, mestre de finanças e realizador do bem comum.»
Nenhuma das obras historicamente referidas, nenhum dos nossos grandes homens de Estado, atingiu por isso as alturas, craveira e dimensão do Prof. Salazar e das suas realizações, pelo espaço de quarenta anos, tão justamente celebrados em 27 de Abril.
Um destino cruel prostrou o homem - essa grandeza humana singularíssima - num crepúsculo agónico.
Mas não se apagou o seu brilho, porque as estrelas se tornam visíveis ao entardecer.
E a majestade da obra, essa, não diminuiu também. Havia nele o tipo ideal ou o bastante da consciência e da vocação política, consagradas dos grandes homens de Estado, da sua vontade de poder, do ideal complexo de devoção total, do sentido das realidades e do carácter, capacidade, responsabilidade e força dos verdadeiros construtores do futuro.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Quando começou em financeiro, frio, metódico, dominador e sério, já ali estava o homem político com um pensamento abstracto, mas dinâmico, uma imaginação fruto de um claro ideal, um sentimento forte que coincidia com as aspirações e altivez dos povos de Portugal.
Professor universitário dos mais distintos, trouxe para a vida prática a lógica, a saber e a férrea determinação do seu ensino.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mostrou virtudes que contrastavam com os nossos erros tradicionais. Havia nele, portanto, muito de outros tipos superiores do homem de Estado - o génio prático de Richelieu, a determinação irresistível dos velhos ingleses que se empenharam em combater até ao fim e reformaram as finanças, a fidelidade de Moro às ideias, as delicadezas de formulário de Metternich, a sagacidade dos príncipes da Renascença e, na elaboração dos textos, se tornou digno também do reformador de Esparta e dos mestres de Bolonha, que deram leis às suas pátrias, das quais era lícito extrair o bem comum e o direito.
A ordem e o equilíbrio nas finanças, a ascensão do crédito do Estado como base de rearmamento, de reconstituição e de pujança industrial e eléctrica, a defesa das fronteiras e a elevação do País no concerto das nações, fazendo-se sentir, mas sem necessidade de o proclamar, o

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peso na balança de poder dos ocidentais, a justiça e a política social, a esquematização corporativa :- para não engrandecer totalmente o Estado nem endeusar o homem -, parecem-me os traços vivos, nítidos, rigorosos, imponentes dessa obra que veremos adiante, não como uma complexidade patrimonial, mas como uma herança moral para as gerações - porque foi gizada, acalentada e esculpida com os olhos postos no futuro.

O Sr. Virgílio Cruz: -Muito bem!

O Orador: - A esperança refloriu do cepticismo, a dignidade antiga refluiu nas correntes, o crédito e a reputação colectiva sucederam às apreensões e dúvidas lá de fora e esse singularíssimo educador de nações ensinou ao País uma perfeita, mas singela, noção de dignidade histórica que, se não se havia perdido, estava pelo menos obliterada.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - «A obra financeira de quarenta anos.» Essa «obra financeira de quarenta anos»! Se eu tentar condensar numa síntese esses quarenta anos, lentos, inçados de dificuldades, reparadores da inércia ou de uma administração precária, nas formas e nos resultados, direi apenas: puderam ser feitas grandes coisas, talvez nunca sonhadas, obviando-lhes com pequenos meios, aplicados necessariamente com parcimónia.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Quando se dispõe da largueza e do crédito da América do Norte ou da Inglaterra pouco custará erguer e construir e todos os milagres colectivos são permitidos.
Fez-se essa obra, pois, com mínimos custos, para repartir justamente os encargos de despesas públicas, já de si imponentes, mas sujeitas a movimento ascensional.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Uma série de reformas corajosas e francamente inovadoras na tributação, nos orçamentos, na contabilização e controle financeiro, acompanhadas das reorganizações institucionais e burocráticas, confirmaram os credores e contribuintes na sua. confiança indesmentida e nas esperanças, autorizáveis em dar por findo o ciclo histórico do desvario e do desperdício. Melhoraram os padrões monetários, foram acrescentados os seus poderes compradores e as suas reciprocidades e aos outros governos e aos capitalistas foram dadas seguranças, podendo sanear-se o crédito e a banca; melhoraram-se ainda as balanças e logrou alargar-se o domínio do fomento e das trocas.
Um sistema, fiscal de moderação e minúcia, baseado nos rendimentos presumidos, começou a ser actualizado e modernizado com novos instrumentos de tributação subjectiva e de indirecta colecta dos negócios e dos actos jurídicos da circulação.
Medidas de alta moralidade pretenderam ainda moderar ambiciosas pressões e corrigir os desvios nas relações macroeconómicas e nas administrações, isentando o corpo social das tendências e pressões que só o comprometiam.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - «As colunas do tempo.»
O templo erguido sustentou-se sobre as suas colunas, no meio de guerras, crises e devastações.
Quando das primeiras campanhas de difamação internacional contra o 28 de Maio; quando das ameaças e lances da guerra de Espanha, da crise de 1929 e da guerra mundial e partilha do Mundo; quando dos «satyagrahis», da espoliação de Goa e da eclosão do terrorismo africano; quando das compras maciças no estrangeiro e dos saques formidáveis sobre as caixas centrais do Tesouro, com suas fugas e levantamentos - o Ministério das Finanças, os seus órgãos e institutos, os seus colaboradores, permaneceram como as colunas do templo, de pé, serenas, inabaláveis, no meio das desvastações mundiais e da tríplice ameaça, quando pareciam chegados os horrores visionados em Patmos pelo evangelista S. João.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - E porque foi assim?
Como ficou e permanece de pó vendo não longe as ruínas?
Porque se mantém no nosso espírito como lição histórica e alicerce fundamental de construção económica e social?
A regeneração financeira, seguida da reconstituição económica e da revitalização social, condensa um património de princípios, de regras e de técnicas, laboriosamente adquiridas, uma repartição pelas gerações, que correspondem a um esforço desmedido dos anos de 30 e de 40, um brasão familiar, uma obra que tem sociològicamente triunfado da crítica, da distorção, dos erros de óptica e das campanhas internacionais. Essa obra é uma herança histórica, um património a preservar e - como todas as heranças magníficas - um prolongamento luminoso do seu autor.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - «A sucessão!»
Muitas vezes eu disse que os condutores excepcionais de povos são, além de homens mais que superiores, construtores singularíssimos, que deixam uma herança sem deixar herdeiros.
Mas é forçoso reconhecer que, sem testamento, nem delfinato, surgiu um herdeiro mais do que representante legítimo, não por recolhei a sucessão, mas por querer rejuvenescê-la, nestes novos tempos, e conservá-la assim viva, no meio dos naturais desgastes do tempo e da fortuna.
«Os pontos capitais da ordem financeira da oração do Sr. Presidente do Conselho.»
Falando de herança, continuo, pois, a ter de me referir aos «pontos capitais de política financeira».
Produziu, aqui, nesta tribuna, o Sr. Presidente do Conselho, Prof. Marcelo Caetano, afirmativas lúcidas, directas, poderosamente sugestivas, mas sem deixarem de ser literariamente recortadas, em que o sentido das realidades se pauta por um mais que consciente sentimento das responsabilidades do homem de Estado, de capacidade múltipla.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Destacarei, apenas, para as enumerar, as de alcance financeiro, que não podemos dissociar da política financeira a renovar e empreender, nem da marcha-geral das orações e decisões.
Começarei, pois, por aqui.
A defesa, é desenvolvimento e a promoção ultramarinas, pesando embora sobre o conjunto, carregam inexo-

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ràvelmente o Orçamento Geral, ao ponto que parecem ilimitados os sacrifícios previsíveis.
Às despesas militares tem de ocorrer-se ainda com os resultados das receitas ordinárias.
Mas as despesas reprodutivas, porque reprodutivas, hão-de satisfazer-se mediante o processo de empréstimo, o qual irá repartir os custos pelas diferentes gerações, para quem elas se vão tornar especialmente úteis.
Mas o empréstimo interno não é ilimitado como recurso e o endividar lento externo não pode comprometer a independência e o País, devedor, nem alargar-se com demasias.
Crises sucessivas apontam a solidez e a estabilidade do poder comprador do escudo, fruto de uma larga política financeira saudável, e, na zona de tufões, a sua segurança deve reforçar-se. Ele é objecto de merecida confiança e as últimas tormentas monetárias que nos rodeiam obrigam a vigilâncias, providências defensivas, trabalho, austeridade e novos métodos administrativos, como naturais corolários.
Creio que interpreto bem o que ouvi e guardei como me competia e aqui mereceu unânime aprovação. O Prof. Marcelo Caetano perfilhou a nossa ortodoxia tradicional, avisou sobre as possibilidades de uma existência continuada de excedentes e diz estar preparado para aqui, pronta e cuidadamente um capítulo em que credores, capitalistas, comerciantes, cambistas, nos acompanham com larga dose de confiança.
Sòmente a nossa seriedade de viver colectivo, finanças saudáveis e indesmentido progresso devem corresponder ao crédito que geralmente nos é aberto nas praças do Mundo, mesmo antes de vestir-se de cifras ou de provocar análises e confirmações de renúncia.
São, pois, vários os ventos de navegação: a lenta evaporação de excedentes, o crescimento inesperado das despesas de defesa, ulteriores exigências de fomento, garantias de produção e disponibilidade levam a acertar de novo as agulhas.
«O trabalho do Ministro das Finanças Dias Rosas.»
Depois do discurso do Sr. Presidente do Conselho «os trabalhos do Ministro das Finanças».
Já os oradores que me precederam na tribuna louvaram o trabalho apresentado este ano pelo Dr. Dias Rosas, e fizeram-no com justiça. Ele é o seu trabalho político inicial, embora já soubéssemos do seu mérito pelos pareceres que a Câmara Corporativa relatou.
Trata-se de um documento objectivo, em termos actualizados, enfrentando os acontecimentos com grande serenidade política e técnica, confessando ao País as razões superiores da sua tranquilidade, mas prevenindo sobre a eventualidade de algumas tensões e complementos, prevenções expostas com elegância não isenta, pois, de franqueza.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - O trabalho da Comissão de Finanças foi assim facilitado e as suas anotações complementares esclareceram devidamente os naturais reparos que formam a quinta-essência mesmo da missão parlamentar.
Por isso entendo que a Câmara deve aprová-lo e iniciar-se desta sorte com um Governo habilitado de meios uma gestão renovada, embora não isenta de novas preocupações.
«Técnicas novadoras do relatório e da proposta.»
Tanto no relatório da proposta como no próprio articulado se encontram afirmações inovadoras, conceitos, teorias e orientações referentes a estudos, esquemas e políticas reformadoras que merecem registo, por representarem perfilhação de princípios postos algumas vezes nesta tribuna, reclamações de actualização e admissão de regras e técnicas que obtêm geral consagração na doutrina e na prática destes tempos.
Destacarei as principais, para não roubar demasiado tempo à atenção do Sr. Presidente:
Reforma orçamental no sentido de tornar as despesas mais eficientes e agrupar as receitas com subido rigor, sem exageros de especificação;
Disciplina da parafiscalidade, de modo a não se desviar dos cânones financeiros. nem ultrapassar os limites de moderação que na generalidade se impõem;
Harmonização do orçamento das receitas com as necessidades práticas do fomento programado;
Contabilidade nacional, embora esta exceda o âmbito das finanças públicas e o do Ministério;
Reforma da tributação indirecta, descomunal, rendosa mas cega, que levanta clamores e merece aperfeiçoamentos e atenuações de carga;
Rentabilidade dos investimentos que excedem a planificação social de maneira a permitir intensificações ulteriores.
Adequação das técnicas financeiras aos quadros e providências reformadoras, relacionadas com uma larga reforma da Administração.
Estes e outros pontos são dignos de destaque e os critérios mencionados, por reclamações já antigas, pela sua feição de modernidade e aperfeiçoamento, merecem a aprovação da Câmara, com o desejo aqui manifestado de que venham a obter consagração e autoridade legislativa, é bem de ver, nas generalidades amplas, deixando-se ao detalhe a discussão.
«A progressão.»
Como estamos sob a incidência de novas ideias e novas técnicas, nem por isso devemos abandonar os «problemas da progressão».
A Lei de Meios põe de novo o apaixonado tema da progressividade do imposto.
A progressão desde as repúblicas italianas que encontra apaixonados propugnadores e violentos detractores.
Mas os reformadores financeiros do século XIX foram-na adoptando como expressão corajosa de uma política reparadora e justa.
Para uns essa progressão representava uma imagem fiel da capacidade de pagar do contribuinte que podia mais e mais despender na medida em que os rendimentos cresciam.
Para outros, cedendo a considerações sociais, ela era uma compensação das fraquezas e benevolências do imposto indirecto e da incidência incompleta das contribuições sobre o produto presumido nas terras, casas, profissões, capitais e negócios.
Para outros ainda a progressividade mostrava-se uma espoliação que degeneraria em confisco ou na decapitação dos rendimentos mais avultados.
Não vale a pena fazer ressurgir a discussão. Direi, a este propósito, que nos impostos globais ou subjectivos a progressão obedece a um princípio de justiça e afirma uma técnica de rigor que pelo aspecto matemático implica uma base de exactidão na determinação da matéria colectável.
À procura de levar meios para fazer frente a mais que relevantes dispêndios atrás mencionados, o ilustre Ministro das Finanças acrescenta certos escalões dos impostos devidos com adicionais e promete rever a última codificação de 1963, já de si tão inovadora que se confessava que o imposto não era o que estava e até parecia outro. Seria de muita gravidade não acompanhar o Mi-

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lustro das Finanças na procura de novas receitas quando algumas fontes parecem estancar. Mas nem tudo merece concordância. E tenho uma noção política do dispositivo da Lei de Meios, que não permite facilmente emendar ou alterar.
A Assembleia Nacional quer o equilíbrio financeiro, mas não poderá ser o seu fiador na gestão propriamente dita.
Direi apenas dos meus receios:
O imposto complementar, embora ajustável a ulteriores finanças, não deve ser, senão raramente, objecto de remodelações profundas ou de correcções apreciáveis.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Cada Ministro que venha a sobraçar a pasta deve resistir a essa tentação.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: -Estamos em face de uma relojoaria delicada, justa, é certo, que não pode ser constantemente acertada pelas latitudes.
«Repartição fora do alcance fiscal.»
Como estamos vivendo as consequências gerais de uma economia expansiva e até inflacionista, surgiram deslocações formidáveis de riqueza, concentrações de poder financeiro, benéficas em alguns casos, discutíveis em outros.
Corresponderam-lhes movimentações de títulos e de titularidade, realidades e exibições mais que surpreendentes.
O clima actual de inquietação social e a defesa ultramarina não se adaptam perfeitamente a estes acastelamentos de poder prático.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mas é verdade também que o imposto - que não pode ser confiscatório, nem decapitar as capacidades e aptidões - não será capaz de resolver tais problemas, objectos dos cuidados da governação.
Certos condicionalismos legais deverão rever-se, evitando fendas e fugas, e que as tentativas de organização e de reorganização não deixem de ser benéficas o bastante para o conjunto e a incidência de tais medidas não seja sujeita a grande elasticidade na execução.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Tais situações avultam no desfavor votado a certas actividades, no empobrecimento dos concelhos agrícolas e no nivelamento desejável dos preços agrícolas e industriais.
«Investimentos descomunais.»
Sucedem-se no espaço e no tempo os «investimentos verdadeiramente gigantescos».
Movimentam-se enormes capitais, o Estado acrescenta as suas responsabilidades, conferem-se benefícios fiscais e possibilidades de crédito, acode-se oficialmente nas dificuldades, recorre-se a técnica mais extremada e a equipamento o mais actualizado e dá-se ao País uma modernidade e um desenvolvimento que, anos antes, não podia ser previsto. Todavia, em muitos casos, o consumidor não beneficia nos preços e na qualidade e o desequilíbrio entre a estatística industrial e a estatística agrícola não melhora nem se atenua, como acabo de referir.
Parece-me que os planos hão-de ser revistos ou, pelo menos, aperfeiçoados à luz daqueles dois critérios para que a todos se imponham resultados verdadeiramente úteis.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Também pelo que tenho ouvido e lido, os investimentos naquelas condições deverão ser localmente agrupados, obedecendo a regras de sucessão e a racionalização que os tornem melhor distribuídos no conjunto e mais acessíveis nos resultados.
«Esperanças e decepções sobre o valor internacional das moedas.»
Olhemos agora «à nossa volta».
Os teóricos monetários que acreditam na teoria psicológica do valor da moeda encontraram ultimamente reacendidos testemunhos para as suas concepções.
Quando a desconfiança de alguns se tansforma em desconfiança geral, a crise parece alastrar sem remissão, porque os efeitos e limites daquela última se propagam à economia mundial.
E difícil analisar o que é especificamente nacional, nas crises de há um ano a esta parte, e o que é comportamento mais do que generalizado, embora se encontre agora uma solidariedade que surpreende, que não era dos livros; solidariedade que as nações poderosas puseram em marcha de um momento para o outro e que não tinha em vista apenas assistir, mas pôr-se a coberto também de uma tormenta generalizada.
Depois da queda da libra, das tremuras do dólar consequentes a esta, da perspectiva altista do marco, chegou a vez ao franco.
Quem tal diria!
As conjunturas e também as alterações rítmicas da economia monetária têm origem nos factores mencionados, embora estes actuem em direcções diversas.
A febre do ouro e a esperança de que este venha a ré valorizar-se ou a ter papel preponderante não esmorece nem abranda.
A desordem social, a suspensão de trabalho, a inércia clamorosa, nas comunidades de trabalho que são as nações ocidentais, custam preços descomunais e invisíveis, mas, como a flecha voltada na vertical, não poupam os que desencadeiam as fúrias, incapazes, no fim, de liquidarem com saldo.
Os especuladores e capitalistas, no seu voo por cima das fronteiras, navegam com todos os ventos, mas jogarão algumas vezes a própria túnica.
Os grandes países de alto nivelamento de riqueza e salários e que deles auferem particulares vantagens podem, através das balanças de crédito, ver anular essas vantagens e surpreendem-se a passar da opulência às dificuldades.
Porém, o ouro se limita na produção e no preço, as desordens são destruidoras e dificilmente, como as guerras, recompõem seus novos custos; os magnates apátridas sentem que o seu reino e domínio mais dia menos dia serão impugnados; e os grandes países da alta na vida e nos serviços vêem os outros abrir as portas e por elas se escoarem interesses, depositantes e viajantes, que julgavam seus.
Nesta tempestade imensa, insuspeitada de governantes e governados, mostrou-se que a política de altas decisões pode mais que as lucubrações dos especialistas e dos técnicos e que o medo de muitos também pode ser jugulado pela curiosidade de alguns.
O escudo continuou, porém, estável, afirmou-se até o seu valor, mas os bons timoneiros vêm sempre inspeccionar

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a linha dos horizontes, devendo confiar em nós próprios e nos outros também a tomar medidas de precaução, quando necessárias, com a antecipação precisa.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - «Disponibilidades monetárias.»
Se falamos de moeda, somos levados a falar de meios monetários no aspecto de «disponibilidades, aguardando serviço mais útil.»
Desde o famoso Relatório Radeliffe que a noção quantidade da moeda foi suplantada pelo conceito do conjunto de liquidez, na economia.
Mais tarde, Surley e Shaw entraram no caminho de estabelecer noções dilatadas que abrangessem a moeda, as finanças e a banca.
Chegou-se, assim, à noção, a qual consta hoje de disponibilidades que juntas às notas, fundos vendidos, depósitos, os investimentos, firmes, bilhetes de tesouro onde os há, os títulos do Estado circuláveis ostentam imponência e funções de moeda.
Mas, nem oito nem oitenta!
Fiquemos nas noções de disponibilidades com carácter de liquidez.
E estas têm ultimamente crescido de forma desmedida.
A sua cifra é tal que vence e excede a importância do rendimento nacional - circunstância que passa despercebida a tantos.
Os estudiosos farão notar que se devia analisar mais as duas grandezas e verificar até que ponto a massa pré-monetária reflecte sobre as possibilidades de aumento do primeiro - dividendo nacional.
Não se encontram nos textos oficiais um princípio, uma razão reguladora entre as duas grandes massas.
Os excedentes da balança de pagamentos sistematicamente dando lugar a notas, a expansão do crédito conferido pelas virias bancas e dormindo de hibernação, por temporadas, talvez o entesouramento, as direcções sumptuárias e de comodidades duráveis, etc., dão-nos uma ascensão incontida de meios sem progresso no rendimento.
Entre o turbilhão de cifras tão descomunais, parece que o problema está em tornar, essa massa colossal de disponibilidades capaz de produzir serviços mais úteis à produção e à exportação, enriquecendo efectivamente o País e não exercendo pressão demasiada sobre os preços.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Claro que se fosse possível destacar o que está a mais aos meios e o que pode ser a menos no produto nacional disponível, eliminadas as tensões inflacionárias dos últimos anos, as finanças mostrariam noções mais claras e mais úteis, socialmente.
Ao seleccionar pelas orientações o crédito, bancos centrais dão noções seguras para desviar a especulação, melhorar a produção e o consumo e enfrentar conjunturas prejudiciais. Mas só será possível o que eficazmente for feito.
«A dívida pública.»
Os titularei da «dívida pública» são de seu natural resignados e sofredores. E por isso merecem aqui uma palavra de assistência, não direi de conforto. Eles foram, e são, as grandes vítimas da elevação dos juros, da difusão dos tipos de obrigações e dos atractivos concedidos em muitos casos de privilégios na colocação e nas altas particulares.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Por isso as cotações têm descido, e eu nada diria se ficasse com a esperança de que iriam subir de novo.
Veja-se, por exemplo, um título querido de modestos, remediados e ricos - o dos Centenários.
Ele manteve-se anos e anos sempre no alto da escada, para ser arrastado, por fim, no turbilhão bolsista.
Já alguns países se fizeram eco de que ao Estado incumbe repor o pé em que as coisas estavam. Mas esta doutrina implica responsabilidades desmesuradas. E por isso atrevo-me simplesmente a recomendar que nas opções a tomar se entre em linha de conta com interesses tão respeitáveis como difundidos pelo conjunto, não contribuindo para o agravamento da classe média e da inferior a esta.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: Os estados ocidentais são comunidades de iniciativa e de trabalho e a máquina governativa tem limites, por não poder tudo invadir.
Urna lei de autorização financeira comporta uma programação de meios e uma definição de objectivos que devem permitir viver melhor, progredir rapidamente e realizar ainda os já velhos ideais de justiça e de distribuição de encargos.
A lei fundamental coloca-nos na situação de colaboradores úteis, de zeladores dos interesses gerais e defensores do contribuinte.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O documento que se discute é por isso, além do mais, um documento político onde ressoam os ideais presentes e se avizinham novas modalidades do bem comum.
Temos de pedir ao Governo que, no exercício deste mandato, assegure a tranquilidade da vida colectiva, atenue certas inquietações derivadas da própria riqueza, continue na sobriedade antiga e amplie ainda a vida construtiva que o povo português se habituou a reconhecer.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Temos de pedir ainda que os resultados do capital e do trabalho, perto ou longínquo, sejam assegurados por um crédito verdadeiramente produtivo e por uma moeda estável e sólida.
Acrescentemos também que normas de justiça e de reprodutividade devem obter maior audiência, quando possíveis, para que a intensidade de crescimento e o bem geral disponham de uma superstrutura a garanti-los.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Sousa Magalhães: - Sr. Presidente: Ao iniciar esta intervenção parlamentar não quero deixar de me referir, ainda que em breves palavras, ao momento político que acabámos de viver, criado pela doença inesperada do Sr. Presidente Salazar.
Nessa emergência demos uma grande lição de civismo, pois, ao contrário das divisões e perturbações que muitos anteviam ou da subversão da ordem pública que a maioria dos observadores estrangeiros pressagiava, a substituição do Presidente do Conselho processou-se naturalmente.

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sem a mais pequena nota discordante, como se tudo fosse simples e fácil.
Para isso muito contribuiu, certamente, a figura ímpar do venerando Chefe do Estado, perfeitamente à altura das difíceis e dramáticas circunstâncias, recalcando a sua dor, no momento próprio, para tomar as medidas adequadas à solução do problema imprevistamente criado.
A Constituição funcionou, assim, em plena normalidade pela mão hábil do nosso experimentado timoneiro, processando-se a transferência de poderes num clima de total serenidade e na mais perfeita ordem, tanto constitucional como cívica.
Por outro lado, foi chamado a assumir o Poder, na difícil conjuntura, o Prof. Marcelo Caetano, homem cheio de qualidades, prestígio e saber, a que se juntam a singeleza e a comunicabilidade, a vantagem de um íntimo contacto com os mais variados sectores das actividades nacionais e ainda a virtude de se encontrar permanentemente actualizado com o evoluir das ideias e dos métodos da governação pública.
Eis o homem que o Sr. Presidente da República escolheu no momento próprio para suceder ao homem de génio que, por quatro longas décadas, deteve, em suas mãos firmes e operosas, os destinos da Nação Portuguesa.
Estas são as palavras breves, Sr. Presidente, que, como político e numa Câmara Política, não poderia deixar de dizer nesta ocasião e que me tranquilizam quanto ao futuro, pois estou certo de que o Sr. Presidente do Conselho escolherá sempre para seus directos colaboradores pessoas cheias de saber e experiência e dotadas do equilíbrio indispensável às altas funções da governação.
Sr. Presidente: Ao usar da palavra na discussão da proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1969, é natural que me ocupe de problemas relacionados com o nosso desenvolvimento industrial, não só porque são aqueles que menos desconheço, mas também porque o verdadeiro progresso depende, em grande parte, da industrialização.
Em Portugal, como em todo o mundo, industrialização tornou-se palavra mágica dos meados do século XX.
E é fácil determinar os motivos dessa explosão de interesse pela industrialização. Com efeito, os países e as regiões subdesenvolvidas, que têm sido, principalmente, produtoras de matérias-primas, acabaram por verificar que existe uma forte e positiva relação entre a riqueza e o nível de vida das suas populações e a amplitude da sua industrialização. Verificaram também que, uma vez que os preços das matérias-primas são muito mais sujeitos a flutuações do que os dos produtos manufacturados, uma economia que dependa da exportação de apenas alguns produtos básicos está muito mais sujeita à instabilidade do seu rendimento nacional do que as economias industrializadas e mais auto-suficientes.
Em face disto, os povos desses países e regiões chegaram logicamente à conclusão de que necessitavam da industrialização para conseguirem maior segurança e estabilidade. No entanto, aqueles que vêem na industrialização a solução de todos os seus problemas estão ao mesmo tempo certos e errados.
Certos da sua convicção geral de que a indústria traz maiores compensações do que a produção de matérias-primas; certos também quando pensam que uma economia mais diversificada e mais auto-suficiente terá, sem dúvida, maior rentabilidade e estabilidade do que uma economia que se apoia na monocultura.
Mas laboram em erro quando pensam que qualquer forma de industrialização pode ajudá-los a atingir os seus objectivos e quando julgam que os benefícios da industrialização resultam, mais ou menos automaticamente, do investimento em projectos industriais, ou quando acreditam que um país pequeno pode dar-se ao luxo de ir muito longe na conquista da auto-suficiência. Em geral também estão errados quando atribuem prioridade ao desenvolvimento industrial nos primeiros estádios de um programa de desenvolvimento económico.
A industrialização tem um papel necessário e, sem dúvida, importante a desempenhar em qualquer bem elaborado plano de desenvolvimento. Mas, particularmente nos estádios iniciais do desenvolvimento de um país, e desde que as decisões sejam, tomadas à base de um estudo profundo dos custos e benefícios, a sua contribuição será menor, no conjunto do programa, do que muitos pensam. Um país subdesenvolvido terá certamente mais vantagem em construir a sua indústria sobre a base daquilo que já possui - a agricultura - do que envolver-se num complicado processo de industrialização.
De facto, em quase todos os países industriais a indústria foi construída, inicialmente, à custa dos agricultores, pois eram estes que detinham a actividade mais compensadora, graças à qual a industrialização pode ser financiada, além de proporcionar um bom mercado para os novos produtos industriais. Esta lição da história não deveria ser esquecida por aqueles que procuram acelerar o desenvolvimento económico. Isso porque para os países subdesenvolvidos ou em vias de desenvolvimento, cujas receitas provêm, em grande parte, da venda dos produtos agrícolas, da exploração mineira, da pesca e de actividades florestais, maiores seriam os lucros - e mais rápidos talvez -. se cuidassem, em primeiro lugar, de aumentar o desenvolvimento dessas actividades, em vez de se lançarem apressadamente em esquemas de industrialização em grande escala. Frequentemente muito mais se pode acrescentar ao rendimento nacional, com o mesmo capital, se este for aplicado na compra de equipamento agrícola ou de sementes seleccionadas, e não em complexos empreendimentos industriais.
O desenvolvimento da agricultura não será tão extraordinário como o espectáculo do crescimento industrial, mas pode representar a alternativa mais justa, à qual se deve atribuir inteira prioridade, pois o aumento da produtividade agrícola constitui um dos mais sólidos meios de sê promover a industrialização; na. verdade, a menos que a agricultura passe por substancial modernização, a expansão industrial será limitada pela falta de mercados, na maior parte dos países- subdesenvolvidos ou em vias de desenvolvimento, já que a maioria da sua população rural, carece do necessário poder de compra.
Inversamente, o desenvolvimento da agricultura não poderá ir muito longe sem um progresso industrial que aumente a capacidade produtiva e forneça uma firme base técnica para o equipamento e os serviços essenciais a uma agricultura modernizada. Concluímos, assim, que o desenvolvimento desses dois importantes sectores está intimamente ligado, e um depende em larga escala do outro.
Antes de se chegar a uma ideia geral do alcance e do lugar a desempenhar pelo sector industrial no desenvolvimento conjunto da economia, devem-se estabelecer algumas premissas quanto à extensão possível e económicamente desejável do desenvolvimento industrial, tomando-se em consideração as disponibilidades de capital, o comércio externo, a capacidade técnica e administrativa e as possíveis fontes fornecedoras de matérias-primas.
Um grande perigo reside mo excessivo optimismo de que os objectivos de um desenvolvimento industrial prá-

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tico são muito mais amplos do que na realidade, particularmente nos primeiros estádios de execução de um programa de desenvolvimento económico. Em face disso, a tendência quase geral é a de investir elevadas somas em complicados e grandiosos projectos industriais num estádio em que seriam muito mais proveitosas para o próprio processo de desenvolvimento global se fossem aplicadas no equipamento de infra-estruturas de carácter económico e social em benefício das populações rurais, que constituem ainda a grande massa da população.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Assim, o ritmo geral de desenvolvimento do País não seria tão afectado, nem pelo ritmo mais lento a que progride a sua maior massa populacional, nem pela sua emigração.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Impõe-se, por isso, um aproveitamento mais racional do território, quer utilizando mais intensivamente os recursos naturais, quer criando as infra- estruturas e actividades económicas para a população das zonas rurais.
O exemplo de Cachão, no Nordeste Trasmontano, que merece todo o nosso aplauso, devia ser seguido por outras regiões atrasadas, e teríamos assim um crescimento mais harmónico e equitativo da economia nacional.
A melhor e mais importante razão para se empreender um programa de industrialização é a de que esta pode constituir uma forma de aumento do rendimento nacional.
A atitude do Governo em relação aos principais projectos industriais deve basear-se no cálculo do valor acrescentado que cada projecto representa para a economia, isto é, a importância do aumento líquido que pode trazer ao rendimento nacional. Os projectos industriais bem elaborados podem dar considerável contribuição à renda nacional, e o essencial é pô-los em prática.
Mas, por cada bom projecto que tem, em potencial, a capacidade de dar significativo contributo ao rendimento nacional, existem muitos outros de pequena ou nenhuma capacidade de trazer à economia do País uma contribuição efective. Um dos mais importantes aspectos da tarefa do desenvolvimento industrial é impedir que tais projectos sejam postos em execução antes que a economia nacional tenha sofrido grandes prejuízos com isso.
Uma outra razão sólida em favor da industrialização é a de que esta pode constituir um meio de aumentar a estabilidade, tanto da receita de divisas como do rendimento nacional, mediante a diversificação das exportações.
Um terceiro argumento em favor da industrialização é o aproveitamento de matérias-primas nacionais é dos excedentes de mão-de-obra, pois os recursos inactivos, quer sejam humanos ou materiais, acarretam prejuízos quando não aproveitados em todo o seu potencial económico. Quando utilizados de qualquer modo produtivo, só podem ser benéficos à economia do País.
Para isso é indispensável que os projectos individuais sejam económicamente adequados. Mas se fizéssemos um exame crítico aos nossos projectos industriais, verificaríamos, com certeza, que grande parte deles não foram convenientemente estudados. Muitos desses projectos inadequados. que representam um desperdício de capital desesperadoramente escasso, de capacidade técnica e tempo, foram postos em execução sem o exame profundo que leria revelado as suas falhas.
Grande parte desses projectos económicamente inadequados foram postos em execução por motives políticos; outros, por falsos símbolos do orgulho nacional. O Governo deve evitar erros desta natureza, mandando examinar e analisar profundamente os projectos sob o ponto de vista técnico, económico e financeiro, especialmente aqueles onde tem larga participação.
No sector privado também se podem desenvolver projectos económicamente errados. No entanto, isso acontece com menos frequência, uma vez que o investimento de capital próprio dá aos homens de negócios um forte motivo para o exame cuidado do projecto que lhe assegure um mínimo de riscos.
Sempre que se encontra um desenvolvimento industrial privado pouco adequado, também isso se deve a sérios erros da política governamental, mas agora por outros motivos, que consistem fundamentalmente aã uma demorada e exagerada protecção a certas indústrias, dando, assim, origem a projectos inconvenientes do ponto de vista da economia nacional, embora lucrativos para o empresário particular.
E quase certo chegar-se a uma orientação errada da industrialização, quando se insiste em conseguir um elevado grau de auto-suficiência.
Parte dos erros cometidos no campo do desenvolvimento industrial deve-se ao facto de os responsáveis não se aperceberem que aquilo que tem sentido económico num grande e rico país pode constituir uma insensatez em países pequenos e pobres, e o que é essencial num estádio de desenvolvimento pede ser prematuro noutro.
Muitas indústrias, como, por exemplo, a fabricação de automóveis, a produção básica do ferro e do aço, a fabricação de certos produtos petroquímicos, embora praticamente essenciais num país de desenvolvida economia industrial, raramente são apropriadas em países que não dispõem de grande mercado interno e para os quais os mercados de exportação não podem existir devido aos custos elevados dos seus produtos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Outras indústrias que dependem em elevado grau da tecnologia, da capacidade científica e de outras facilidades que não podem ser encontradas em países não fortemente industrializados defrontam-se igualmente com grandes dificuldades. É evidente que se poderá importar a técnica que falta, mas, amenos que se possa evitar, em curto prazo, o elevado custo de uma administração e técnica estrangeiras, tornará prematuro o estabelecimento dessas indústrias.
Este não é um argumento válido que justifique a limitação da industrialização aos conhecimentos e à capacidade técnica existentes, pois, de contrário, nenhum desenvolvimento seria possível, mas é o reconhecimento do facto de que o desenvolvimento industrial, com a sua complexa rede de exigências técnicas e meios auxiliares interligados, avançará mais firme e eficientemente, em geral, se houver uma progressão do menor para o maior, do simples para o complexo, o que nem sempre tem acontecido entre nós, do que resulta termos produtos básicos caríssimos em comparação com os restantes países europeus.
Um outro problema importante que se põe, ao empreender qualquer processo de industrialização, é de saber se a responsabilidade da sua execução se deverá confiar AO Estado, às economias privadas ou a uma conjugação das duas.

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Os projectos governamentais e os projectos industriais privados apresentam vantagens e desvantagens completamente distintas Portanto, a questão do mérito e demérito relativos de cada forma de propriedade das empresas industriais deverá ser encarada no campo prático dos resultados económicos que provavelmente advirão da escolha de uma ou de outra alternativa. A experiência mostra que as perdas da economia resultantes de empreendimentos oficiais, devidas a administrações ineficientes, falta de estímulo e desvio do Governo de suas funções básicas, representam custos muito mais elevados do que o preço que se deveria pagar em dividendos pelo desenvolvimento industrial privado.
Mesmo os países que, apoiados numa base ideológica, resolveram colocar virtualmente toda a sua indústria no sector público, já estão a admitir certas formas de distribuição de lucros, embora baseados numa maior justiça social, a fim de melhorar a rentabilidade das suas explorações.
Por outro lado, a indústria privada é muitas vezes responsabilizada pela má distribuição da riqueza nacional ou acusada de agravá-la quando já existe. Quando é muito grande a recompensa que os proprietários privados de indústrias exigem pelo uso do seu capital e pela capacidade técnica que oferecem, é possível que se desenvolva uma poderosa classe de industriais a tal ponto que constitua a negação do que devia ser o objectivo ideal de uma igualdade económica maior. Mas este inconveniente pode ser evitado por meio de impostos progressivos e intervenção eficiente do Estado. E certo que, se as medidas tendentes a dificultar o acúmulo de riquezas forem levadas muito longe, desaparece qualquer incentivo; os riscos do investimento não são mais aceites e, assim, são liquidadas todas as vantagens da industrialização privada. Isto quer dizer que o lançamento dos impostos e contribuições deve ser muito bem ponderado, de forma a evitar uma excessiva distorção da renda, preserve o padrão de riqueza e permita incentivo financeiro suficiente para encorajar a iniciativa e o empreendimento no sector privado.
Entre nós, suponho já se ter ultrapassado o ponto óptimo da carga fiscal no estádio actual do nosso desenvolvimento, pois o clima de precaução e falta de confiança dominante entre os investidores potenciais assim o demonstra. Com efeito, tem vindo a decrescer de ano para ano tanto o número de pedidos de instalação de novas indústrias como o de remodelação ou ampliação das existentes. Assim, enquanto no 1.º trimestre de 1967 foram concedidas 33 autorizações de instalação de novas unidades industriais e 177 transformações de unidades já existentes, em igual período do corrente ano esses números baixaram, respectivamente, para 17 e 93, o que representa, aproximadamente, uma quebra de 50 por cento.
Se este sintoma, já de si, é preocupante, ainda mais se torna pelo facto de a proposta de lei que estamos a discutir diminuir os estímulos fiscais em relação aos concedidos pela Lei n.º 2134. Com efeito, o artigo 12.º da proposta em discussão restringe os estímulos fiscais que o Governo poderá conceder apenas aos investimentos destinados à instalação de novas unidades industriais, enquanto a Lei n.º 2134, no seu artigo 9.º, era extensiva aos investimentos destinados à instalação, ampliação e renovação de equipamentos das indústrias.
Ora, parece-me ser muito mais útil à economia nacional auxiliar as empresas já instaladas a renovarem ou ampliarem o seu equipamento, de forma a trabalharem em boas condições de rentabilidade, do que estar a conceder estímulos fiscais, principalmente naqueles sectores onde já existe excessiva capacidade de produção. Infelizmente, na maior parte tios países menos evoluídos, e nós não fugimos a essa regra, os industriais tendem a actuar segundo o princípio de «sigamos o exemplo daquele que vai à frente». Uma fábrica num determinado sector da indústria é, usualmente, seguida por outras e mais outras até já não haver mercado suficiente para nenhuma. Quando se criam empresas desnecessárias, cria-se excesso de capacidade de produção e emprega-se, de modo pouco económico, um capital e técnica escassos.
Em consequência, algumas firmas abrem falência e outras continuam-se arrastando, de modo pouco produtivo, até que o mercado se amplie e lhe possa consumir os seus produtos. Embora certo excesso de capacidade seja desejável para encorajar uma concorrência efectiva, além de certo ponto, isso representa uma perda económica para o País, a menos que se encontre no mercado externo fácil colocação para o excesso de produção, embora para isso se torne indispensável uma perfeita organização da classe exportadora. Vem a propósito fazer uma referência à nossa indústria têxtil algodoeira, sem dúvida o mais importante sector industrial do País, quer pelo número de operários e empregados que ocupa, cerca de 75 000, que recebem anualmente mais de 1 milhão de contos em salários e ordenados, quer pelo volume da produção e exportações, que atingiram, em 1967, mais de 5 500 000 e 2 000 000 de contos, respectivamente.
A sucessiva instalação de novas unidades ou o aumento das já existentes foi de tal ordem, nos últimos anos, que tinha forçosamente de provocar uma grande ampliação da oferta no mercado interno. E como a esta não correspondeu o necessário aumento do poder de compra da população, houve, como é óbvio, uma saturação do mercado interno.
Ficou assim à nossa indústria algodoeira a alternativa de procurar escoar os excedentes da sua produção no mercado externo. Mas, sem o apoio eficiente e disciplinador de organismos estatais, especialmente serviços comerciais adequados junto das nossas representações diplomáticas no estrangeiro, grande parte dos nossos industriais veio a cair nas mãos de organizações comerciais nacionais e estrangeiras, muitas das quais, sem o menor escrúpulo, esmagaram os preços no vendedor em seu próprio proveito. Além destas apreciáveis dificuldades iniciais, as contingentações estabelecidas nos nossos dois principais mercados - os Estados Unidos e a Grã-Bretanha -, para os quais o acréscimo das nossas exportações mais se fazia sentir, provocaram as mais sérias perturbações no sector têxtil algodoeiro, que tem sofrido crises periódicas desde o termo da última guerra. Mas a actual crise, já que as empresas não têm falta de encomendas, teve outras causas e rebentou há cerca de dois anos, quando, inesperadamente, viu limitado o seu crédito bancário. Embora não pareçam estar comprometidas as suas possibilidades de colocação dos seus produtos, o certo é que a indústria reflecte ainda a perturbação que lhe causa a pressão exercida pelas dificuldades financeiras decorrentes, nomeadamente de escassez de crédito para fundo de maneio. Por outro lado, muitos industriais mostrando desconhecer os mais elementares princípios de gestão, procederam ao reequipamento das suas instalações, mediante fundos obtidos a curto prazo. É evidente que a nossa indústria tem de se modernizar e preparar para enfrentar os grandes espaços económicos em que já estamos integrados. Mas tem de o fazer com prudência, e nunca adquirindo bens de equipamento à custa das operações correntes de curto prazo da banca comercial.
Impõe-se, por isso, que as providências anunciadas na lei em discussão sobre a política monetária e financeira,

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e que também já têm sido anunciadas em leis anteriores, sejam tomadas, sem delongas. O Sr. Presidente do Conselho, nesta Câmara e há bem poucos dias, disse que todos desejamos mais rapidez nas decisões. Neste caso particular, em que. das reformas anunciadas dependem importantes sectores da actividade económica e, consequentemente, o bem-estar geral, mais urgentes se tornam as medidas a tomar.
Um outro sector muito importante, considerado mesmo como motor d; todo o desenvolvimento industrial e que muito está a sofrer com a falta de regulamentação adequada das operações de crédito a médio prazo, é o das indústrias produtoras de bens de equipamento. Particularmente no que respeita às indústrias metalo-mecânicas, que continuam a trabalhar a reduzida capacidade devido à quebra registada na procura desses bens, o panorama conjuntural ai ida se apresenta difícil. Segundo o relatório recentemente elaborado pelo Gabinete de Conjuntura e Análise. Económica da Corporação da Indústria sobre a evolução dos investimentos, as indústrias produtoras de bens de equipamento não só não apresentam padrão de investimento suficientemente dinâmico, como até esperam que a situação venha a agravar-se nos próximos dois anos. A indústria construtora de máquinas bem se pode considerar a viga mestra de todo o desenvolvimento económico, constituindo uma actividade do mais alto interesse nacional, como, aliás, foi reconhecido no III Plano de Fomento. foi mesmo considerada prioritária no âmbito da economia nacional, visto ser uma indústria básica da qual depende toda a actividade industrial produtora de bens de consumo. Apesar disso, não tem sido convenientemente amparada pelas entidades oficiais, a despeito das inúmeras petições dos grémios interessados e das vozes que nesta tribuna se têm levantado, inclusivamente a minha, a reclamar providências que tardam a tomar.
Mais uma vez a falta de regulamentação da legislação relativa às operações a médio prazo se faz sentir, visto que os bens cê equipamento são vendidos, em geral, a prazo entre os três e cinco anos. Se esta regulamentação se fizer demorar, suponho que a indústria dificilmente poderá sobreviver. Acresce ainda o facto de os fabricantes de máquinas estrangeiras terem entre nós maior protecção do que os produtores nacionais. Parece paradoxal, mas a situação existe, e já chamei para ela a atenção desta Assembleia aquando da discussão da Lei de Meios para 1968, e um jornal diário, em 5 do corrente, num artigo intitulado «O financiamento da actividade industrial», também pôs o problema com toda a clareza.
A situação pode resumir-se nos seguintes termos:

A indústria nacional de bens de consumo pode importar, com isenção de direitos, máquinas novas e peças paru as mesmas máquinas para seu reequipamento; a indústria nacional construtora dessas mesmas máquinas tem de pagar direitos nas mesmas peças, que não pode deixar de importar por serem patenteadas.

É o caso, por exemplo, de fusos e trens de estiragem para os contínuos de fiação, o que coloca os fabricantes nacionais em posição de nítida desvantagem em relação aos estrangeirem.
Sr. Presidente: Muitos outros problemas sobre a nossa industrialização poderia trazer a esta tribuna, mas já vão longas estas considerações e vou por isso terminar. Antes, porém, quero fazer uma referência elogiosa ao bem elaborado relatório que antecede a proposta de lei e que nos dá uma visão exacta da economia internacional e da conjuntura nacional, constituindo, juntamente com a proposta, um documento demonstrativo das preocupações do Governo em prosseguir, intransigentemente, na defesa da integridade do território nacional e na obra de reconstrução económica em que todos estamos empenhados.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Rui Vieira: - Sr. Presidente: Não deixa de criar, nos espíritos conscientes, viva preocupação a leitura serena do extenso, pormenorizado e bem documentado relatório que precede o projecto da proposta de lei de autorização das receitas e despesas elaborado pelo Ministro das Finanças para o próximo ano. Preocupação que. resulta essencialmente da confusão e dos desequilíbrios que cada vez mais se evidenciam na conjuntura económico-financeira internacional, os quais fazem cair sobre a nossa tão frágil e tão dependente economia metropolitana toda a força dos seus reflexos imediatos.
Preocupação que se avoluma quando se medita na distância que nos repara dos países desenvolvidos e na dificuldade de se encontrar a alavanca segura que permita arrancar decididamente para se alcançar o ritmo indispensável a um crescimento económico e a um progresso social verdadeiramente significativos.
As crises da agricultura, as dificuldades e deficiências de muitas indústrias, os menores rendimentos do turismo e as quebras nas remessas dos emigrantes têm-se evidenciado nos últimos tempos no nosso país. Não admira, pois, que no parecer da Câmara Corporativa sobre o projecto de lei que estamos a discutir se refira expressamente:

Pensando em termos de curto prazo e considerando a evolução manifestada no último triénio, as perspectivas que se oferecem à economia metropolitana não se apresentam propensas a fundamentar uma opinião muito optimista.

Mas a administração financeira do Governo para 1969 não tem apenas, como todos sabemos, de encarar estes aspectos da política económica do País e do seu enquadramento nas conjunturas da Europa e mundial, mas tem de considerar, porque a isso é obrigada pela situação criada há mais de sete anos no ultramar, como seu objectivo primordial, a defesa da integridade de todo o nosso território.
Daí, o agravamento das nossas dificuldades, o natural avolumar das nossas preocupações...
E, por isso, tudo que constitui a matéria expressa nas disposições que hão-de determinar .a gerência do ano próximo - o progresso económico, a política de valorização humana, a defesa da moeda e do crédito, a estabilidade financeira, a cooperação no campo da defesa comum da civilização do Ocidente e na ordem económico-financeira internacional - tem de apreciar-se adentro dos condicionalismos actuais da vida política internacional e dos nossos próprios interesses, como Nação de fracos recursos, e que quer continuar independente.
Se não é legítimo supor para o próximo ano um comportamento francamente favorável de toda a nossa actividade económica, nem uma alteração sensível na posição política dos que estimulam e mantêm a subversão, é, por outro lado, imperioso que todos - Governo e Nação - contribuamos para dar à nossa economia um maior dinamismo e uma maior solidez, na certeza de que a nossa projecção neste campo poderá contribuir largamente para

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melhor sermos compreendidos por aqueles que nos hostilizam ou não nos defendem.
Sr. Presidente: Vou apenas fazer algumas referências, a propósito da lei em discussão, a dois temas que interessam particularmente ao meu distrito, embora nem só com ele se prendam: a criação de uma zona franca na Madeira e certos aspectos das providências sobre o funcionalismo.
A articulação do Orçamento Geral do Estado para 1969, nesta Lei de Meios, com o III Plano de Fomento, far-se-á principalmente através do artigo 5.º, do capítulo 2.º «Estabilidade financeira e política orçamental», artigo 15.º, do capítulo 4.º «Prioridade das despesas», e artigos 16.º e 17.º. do capítulo 5.º «Política de investimentos».
Dadas as actuais dificuldades em conseguir-se saldos vultosos que sobrem da cobertura dos encargos que o Governo é forçado á ter para a manutenção da nossa integridade territorial, justifica-se que sé adoptem critérios absolutamente rígidos na selecção e na hierarquização dos investimentos de maior reprodutividade e nos programas de desenvolvimento económico e promoção social de efeitos mais rápidos, que se enquadrem ou venham a ser enquadrados no âmbito daquele Plano de Fomento.
Nesta linha de pensamento, urge dar execução ao que se definiu como de muita importância, para a Madeira e que no texto desse Plano ficou expresso - embora ainda só a parte respeitante aos estudos -, relativamente à criação do porto franco, ou, como melhor convém desde já referir, à instituição da zona franca.
Já várias vezes aqui tenho falado da fragilidade da economia do meu distrito. E bastante difícil conseguir-se para lá um aumento de riqueza à custa das actividades económicas já tradicionais ou outras possíveis de instalar. Refiro-me, evidentemente, a um aumento sensível, aumento que, repartido equilibradamente, signifique algo notório em capitação de rendimento, em proventos individuais ou familiares. E isto, sobretudo, dada a dimensão da superfície útil, agrícola e florestal, a extraordinária pressão demográfica, as reduzidas possibilidades em matéria de industrialização, que, aliadas a todas as deficiências estruturais, também há muito conhecidas, impedem a obtenção de altos ou razoáveis rendimentos per capita.
A Madeira tem, pois, de buscar no exterior a fonte principal das receitas que hão-de constituir a base da sua nova riqueza. Não que se deixe permanecer o sector primário no seu estádio actual de desenvolvimento, pois a agricultura, a silvicultura, a pecuária e a pesca podem e devem ter maior projecção e outras perspectivas mais animadoras: não que se abandonem as possibilidades de ocupação de uma mão-de-obra abundante em alguma actividade útil e remuneradora, através de um artesanato melhor aproveitado ou de outros trabalhos que as indústrias nacionais ou estrangeiras possam mandar executar; não que se esmoreça nas mais frentes internas de todo o vasto campo do crescimento económico, sobretudo pela reestruturação ou reorganização de algumas indústrias transformadoras bastante válidas ou pela instalação de uma nova julgada de interesse. Mas que se assente numa linha de orientação que conduza a dotar o arquipélago de todas as condições de atracção de. capitais do exterior, condições que é forçoso dotar de grande dinamismo e intensidade, sob pena de fracasso ou desilusão total.
Tem a Madeira vivido já períodos de relativa estabilidade, económica - e falando apenas dos do nosso século, que imediatamente nos interessam - graças ao turismo e à emigração. A exportação de bens e serviços, por conta das belezas do mar e do clima com que a Madeira foi providencial e prodigamente dotada, e a entrada de divisas, por conta do labor e da força do? seus filhos em terras estranhas, têm sido de grande volume e cios principais responsáveis pelo progresso da região. Mas enquanto, actualmente, o turismo comporta, não obstante as incertezas que encerra, uma muito maior concentração de esforços para que adquira dimensão correspondente ao interesse e ao valor potencial da região e a Madeira tenha, pois, o direito de exigir dele o máximo de proventos -, já a emigração envolve outros temas de meditação de natureza político-social que interferem nas considerações que exclusivamente no campo económico se poderiam formular. (Aqui cabe alusão ao necessário e urgente povoamento das províncias ultramarinas à custa das correntes migratórias metropolitanas, factor humano que melhor poderá consolidar direitos de presença e soberania nessas terras portuguesas).
Colocado, pois, o problema da emigração num outro plano, para melhor estudo e equacionamento, temos então de considerar para já o turismo como uma das actividades que, de facto, mais pode impulsionar o desenvolvimento económico-social da região, pelas somas que canaliza de fora para dentro, pela maior riqueza que faz criar e distribuir. E se o turismo tem tido até hoje influência palpável no crescimento da economia madeirense, é mister que se lhe dê maior atenção, através dê medidas concretas de protecção que correspondam vertical e horizontalmente às normas legislativas que só contêm em vários diplomas sobre o que são os investimentos turísticos e os estímulos fiscais de que podem e devem beneficiar. E, sobretudo, parece que é chegado o momento do o Governo realizar uma revisão completa das normas que regulam a aplicação de capitais estranhos no desenvolvimento directo de toda a nossa economia, particularmente no campo do turismo, dada a feição desta actividade e a falta de interesse, por um lado. e de volume, por outro, dos capitais nacionais. Para que o turismo atinja o interesse económico que devemos exigir para a Madeira há que fazer investimentos consideráveis, estabelecer uma política de transportes sem estrangulamentos ou bloqueios e intensificar a propaganda nos centros de maiores possibilidades financeiras.
Mas será o turismo o único motor que fará entrar maior riqueza na Madeira?
Falámos, antes, de que o arquipélago aguarda o início dos estudos para o estabelecimento de uma zona franca, tal como ficou expresso no texto do III Plano de Fomento, e sabemos já estar a trabalhar uma comissão, »i nível nacional, para realizar em vários pontos do território português esses estudos.
Sem pretender o exclusivo da zona franca para o arquipélago da Madeira -e oxalá até que o País tivesse condições para a estabelecer em toda a sua amplidão territorial -, há, no entanto, que considerar os factores de maior peso que fazem recair sobre estas ilhas uma prioridade que se tem de reconhecer e definir.
A situação geográfica da Madeira, as características da sua insularidade, a sua apetência como região turística de primeiro plano, as dificuldades da sua economia e a imperiosa necessidade de se criar mais riqueza formam a primeira linha desses factores. A análise das fortes incidências no sector comercial do arquipélago, conduzindo a um custo de vida altíssimo, em que o preço da construção atinge um valor de mais de 40 por cento relativamente ao continente, por motivo de preços elevados de materiais (muitos fora das tabelas médias do

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mercado europeu, como o cimento e o ferro) - a que acrescem casos de transportes exagerados e mais taxas e alcavalas locais de volume exorbitante-, contribui também fortemente para dar maior consistência à necessidade de criação da zona franca no arquipélago da Madeira. E forque a zona franca permite o embaratecimento dos novos materiais plásticos usados na forçagem de muitos produtos hortícolas e porque, por outro lado, a frequência do porto passa a ser maior, também na agricultura o estabelecimento deste regime fiscal aduaneiro poderá ter benéficas consequências, quer no abaixamento dos custos de produção, quer na comercialização, virada aos mercados externos, dos produtos obtidos.
Quer dizer, a criação de uma zona franca na Madeira exige-se não só por razões de desenvolvimento da actividade comercial, onde se pode vir a obter um impulso grande no crescimento económico insular, se não também por todas as acções de fomento que faz gerar ou mover noutros campos.
Quando em 11 de Julho de 1852 se estabeleceram, por diploma legal, os portos francos em todas as ilhas Canárias, a economia local atravessava então um período dificílimo. E pensou-se transformar, por forma jurídica, o factor geográfico, que se considerava travão de desenvolvimento e até causa de regressão, em motor do crescimento económico. O êxito foi total: hoje é bem patente o desenvolvimento daquele arquipélago, concorrente da Madeira, mas já com extraordinário handicap, no chamamento de turistas e na colocação de produtos hortícolas e de flores nos mercados da Europa.
Num relatório de 1967, sobre os portos francos nas ilhas afortunadas, refere-se:

Graças aos portos francos, pôde adquirir desenvolvimento I agricultura e a agricultura industrial; pôde adquirir dinamismo, agilidade e volume o comércio; pôde ir oferecendo, o arquipélago, um movimento mercantil dos mais intensos de Espanha; pôde incorporar-se Canárias no tráfego internacional, e pôde, por fim, fazer-se das ilhas um enclave que hoje deve oferecer indiscutível interesse económico-estratégico.

Os objectivos que se pretendem para a Madeira justapõem-se aos que ficaram atrás, aliás, expressos. Podem também ser facilmente atingidos. Basta que o Governo, ao estudar todas as implicações de natureza económica, jurídica, fiscal e administrativa, a que se liga sempre o estabelecimento das zonas francas, não deixe de usar o seu mais acertado critério político.
Sr. Presidente: Relativamente às providências sobre o funcionalismo, referidas no artigo 18.º, e merecedoras do mais vivo aplauso, farei algumas considerações, muito especialmente sobre «as medidas que hajam de ser adoptadas em reli cão ao funcionalismo em geral» e a necessidade de actuar imediatamente no campo do professorado primário.
Pretende o Governo acudir à situação dos seus servidores, por forma, por um lado, a melhorar-lhes as suas condições de trabalho e, em certa medida, os respectivos proventos e, por outro, a procurar elevar o seu nível de produtividade. À interdependêncida dos vários objectivos da Reforma Administrativa conduz à necessidade de estudos prudentes e sérios, mas de- modo algum estes se podem prolongar indefinidamente, sob pena de os governantes irem continuando a assistir à debandada em massa dos seus melhores colaboradores nos serviços, por falta de suficiente compensação material, por inexistência quase total de protecção na doença e até por indisciplina ou complicada organização do trabalho.
É absolutamente indispensável o aumento de rendimento de trabalho produzido pelo funcionalismo; é urgente a criação ou o estabelecimento de um melhor espírito de cooperação, de uma plataforma de interesse e entusiasmo entre o servidor do Estado e o fim a que se destina o seu próprio serviço; é imprescindível uma actualização de métodos na administração pública para que o trabalho global seja verdadeiramente frutuoso. Mas é estultícia pensar-se que tudo isto se consegue sem uma actualização dê vencimentos - uma remuneração que venha a compensar a actual prestação de serviços e a tornar menos difícil o enfrentar da progressiva e incontrolada subida do custo de vida.
Há regiões, sobretudo as predominantemente turísticas, onde o desequilíbrio entre tabelas de vencimentos e custo de vida se torna mais evidente. E, aqui, há então razão para uma alteração de remunerações a nível regional. O caso merece também o necessário estudo, mas já foi considerado, embora parcialmente, por certos sectores do Estado, parecendo absolutamente legítima a atribuição de um subsídio, expresso em percentagem sobre o vencimento, a todos os funcionários que prestem serviço nessas zonas.
De entre o funcionalismo público, «o Governo providenciará sem demora acerca da situação do professorado primário». Esta directriz da proposta de lei filia-se em razões imperiosas e é de tal justiça que não precisa de mais considerandos. Basta apenas lembrar as palavras do Presidente do Conselho de Ministros na sua comunicação à Nação, perante esta Câmara:

Entretanto se irão tomando algumas providências consideradas de particular urgência, indispensáveis para não deixar deteriorar mais os serviços e para acautelar o futuro dos quadros.

Certa a indispensabilidade da imediata revisão dos vencimentos dos professores primários e certíssimas até as medidas já anunciadas e em execução para a cobertura dos encargos financeiros dela resultantes.
Torna-se, porém, necessário que o Governo considere devidamente a posição dos distritos autónomos das ilhas adjacentes, fazendo canalizar para as respectivas juntas gerais as verbas correspondentes ao projectado e referido aumento das remunerações do professorado primário. E que, embora sejam estes corpos administrativos o suporte financeiro de todo o ensino nos respectivos distritos, não se lhes têm criado as receitas correspondentes às alterações de vencimentos e tem sido o Estado a compensar, através de subsídios anuais - e porque para isso tem tido a contrapartida bastante - os novos encargos que delas derivam.
Saliento que, em relação à última alteração de remunerações que resultou da atribuição do subsídio eventual de custo de vida aos funcionários do Estado, pagos pelo Cofre das Juntas Gerais, incluindo professores primários, e apesar de os diplomas que a ela se referem datarem já de Agosto de 1966, o Ministério das Finanças ainda não concedeu a estes corpos administrativos os meios materiais necessários para cobrirem o encargo que os mesmos organismos têm vindo a suportar desde essa data. São atitudes que se não entendem, na medida em que o Estado, criando para as novas despesas na metrópole novas receitas, não concede aos distritos autónomos a possibilidade de estes arrecadarem na área da sua jurisdição a quota-parte que digamos, geograficamente lhes poderia pertencer, nem lhes atribui, ou tarda a fazê-lo, a verba respeitante, pelo menos, ao dispêndio que o aumento de vencimento dos seus funcionários acarreta. Tudo se conjuga, ao fim e ao cabo, para criar nos distritos autónomos maiores dificul-

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dades, sobretudo no cerceamento forte de uma obra de fomento e de promoção social que importa cada vez mais desenvolver em profundidade e extensão. E nem se diga que se trata de importâncias grandes para o cofre do Estado, porque essas actualizações nos vencimentos dos funcionários públicos a cargo das juntas gerais representam pequeníssimas percentagens no conjunto da metrópole e são insignificante parcela da receita que o Governo cria para contrabalançar o encargo respeitante a todo o funcionalismo na metrópole.
Ainda referentemente à instrução primária, nos distritos autónomos, onde as juntas gerais despendem anualmente grande parte da sua receita ordinária (a do Funchal excede já os 15 por cento, o que significa cerca de 20 000 contos), o Estado em de encarar a ideia de vir a colaborar mais activamente, comparticipando largamente aqueles corpos administrativos nas despesas normais com o professorado e, bem assim, com maior intensidade, na construção e arranjo das escolas e salas de aula para os quais os magros orçamentos das câmaras municipais não têm permitido que se mantenham, na sua maioria, em nível aceitável. Não é com professores mal remunerados que se consegue bom ensino; mas também não é com instalações impróprias e superlotadas que dele se tira o melhor rendimento.
E agora, que já se deu à instrução primária uma dimensão mais conveniente, com a criação do curso complementar (5.ª e 6.ª classes), o qual importa ainda alongar para uma melhor preparação geral da população, as necessidades de estabelecimentos escolares vão aumentar consideravelmente e recairá sobre o Estado a grande responsabilidade financeira de os erguer e de os equipar, já que aos municípios, sobretudo os rurais, tem mais o Governo o dever de auxiliar do que o direito de exigir.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Alves Moreira: - Sr. Presidente: Ao usar da palavra nesta sessão legislativa, começo por saudar, com muito respeito, V. Ex.ª, na certeza de que, ao cumprir um dever de cortesia, me anima, acima de tudo, o propósito de render, mais uma vez, a homenagem devida à extraordinária personalidade de um eminente homem público de excepção que ao País e ao Regime tem votado todo o seu melhor, numa constante e recta verticalidade, apanágio de uma superior e sólida formação política que o eleva acima do comum, pela marcante actuação que entendeu, e muito bem, dispensar a este órgão de soberania, na sequência de uma dedicação sem limites, objectivada na vincada e notável posição alcançada, até à exaustão, e numa dádiva total que enobrece e dignifica.
A V. Ex.ª, o meu mais significativo preito de homenagem, que quer dizer admiração e indelével reconhecimento pelas altas e excepcionais qualidades de inteligência e carácter que o exornam e o distinguem.
Sr. Presidente: A presente proposta de lei de autorização das receitas e despesas para o próximo ano, que se discute e aprecia, merece-me algumas reflexões, que, embora em grau de superficialidade, não quero deixar de fazer transparecer nas considerações que entendi anotar, sem pretensões, pois sei bem ajuizar até onde me é lícito objectar e apoiar legislação tão transcendente na hora actual, dominada pelos reflexos das constantes mutações internacionais e desígnios da situação interna do País que tão intensamente se vive.
Realmente, é bem difícil, no momento conjuntural, discutir as causas e muito menos os efeitos de uma eventual administração pública, que se debate com problemas transcendentes como aqueles que se nos oferecem a todo o momento, na sequência de outros que têm merecido, por parte dos responsáveis, toda uma atenção interessada na melhor solução, a encaminhar o País seguramente na, senda de uma equilibrada e conscienciosa actuação, visando progresso que o valorize e dignifique.
Há mesmo determinantes bem expressas na proposta de lei que considero indiscutíveis, pois condicionam essencialmente tudo depender de uma verdade incontestável - a situação criada com a defesa e manutenção do alto património nacional constituído pelas províncias, bem portuguesas, do ultramar - a ter em atenção, acima de tudo, sacrificando-se toda a restante actuação, que, embora de premente actualidade, terá de ser relegada para um plano secundário, perante a transcendência do problema, cuja solução só pode ser uma: preservação da integridade nacional ameaçada, custe o que custar.
Sendo assim, e ninguém poderá dizer o contrário, pois o contrário seria renegar a Pátria, as receitas e despesas deverão estar sempre condicionadas aos encargos necessários com a manutenção vigilante de todo o espaço português, na sua integridade total, com forças militares suficientes em número e com o necessário equipamento, já que qualidade existe de sobra, bem evidente rãs provas de portuguesismo e lealdade que os nossos soldados tanto têm demonstrado e tão dignamente, nessas lusitanas paragens, preservando-as das arremetidas das hordas comandadas do exterior com o único e intencional objectivo de desagregarem a unidade do território nacional, em proveito próprio, acobertadas por mentores bem conhecidos, que não desejam a cessa presença em África, nem a civilização que defendemos, antes a querem ver substituída por potentados políticos e económicos que intentam, acima de tudo, dominar posições estratégicas e usufruírem dos naturais recursos de territórios que cobiçam pelas suas conhecidas riquezas.
Eis por que o Orçamento Geral do Estado para o próximo ano prevê, e muito bem, para além do rigorismo do equilíbrio financeiro, precedência nas despesas com os encargos da defesa nacional, muito particularmente com as destinadas à salvaguarda da integridade territorial da Nação. Eis por que deve ser respeitada, e respeitamos em absoluto, a orientação governamental, aliás, dentro de uma linha de rumo que vem sendo traçada desde que surgiu a eclosão do terrorismo em Angola, no fatídico ano de 1961, orientação essa só possível pelo favorável clima financeiro existente ao tempo, na sequência da persistente acção desse estadista ímpar e providencial a quem se deve a sobrevivência da Pátria como unidade indestrutível - o Presidente Salazar -, homem de raça e de génio que todos veneramos e reconhecemos como excepcional e obreiro de um ressurgimento em que ao tempo se não acreditava.
Mas, e apesar do circunstancionalismo que nos determina, nem por isso o diploma em discussão deixa de encarar frontalmente outras necessidades de actuação nos mais variados sectores, em que sobressai o de fomento, de auxílio financeiro e de valorização social e cultural da população, de acordo com as possibilidades de momento e da aspiração a uma posição que nos emparceire com os povos mais evoluídos, que se deseja firmemente acompanhar.
Nesta ordem de ideias, é-nos grato verificar que o Governo, dentro de um programa bem definido no III Plano de Fomento e de harmonia com as possibilidades, que as há-de haver, e para tanto confiamos abertamente na administração pública, tudo fará para a tomada de medidas que se anunciam no sentido de actuação válida nos sectores da saúde, da investigação, do ensino,

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da assistência escolar, da formação profissional e dos estudos nucleares, e, ainda, da melhoria do bem-estar rural, traduzida por investimentos e substanciais e indispensáveis auxílios financeiros, visando a elevação do nível das respectivas populações, designadamente na construção de estradas e caminhos, electrificação, abastecimento de água e saneamento, e, ainda, a construção de edifícios a coberto de disposições regulamentares, que sucessivamente têm vindo a ser considerados, numa determinação muito louvável e que nunca será de mais enaltecer devidamente.
No sector da saúde, deverá o Governo, dentro do esquema de orientação contido no Estatuto de Saúde e Assistência, continuar a, dotar o País de unidades hospitalares em número bastante e com apetrechamento adequado, de molde que se; a eficiente o método de actuação, mas de maneira disciplinada, e tendo em vista uma perfeita coordenação entre os serviços respectivos dos diversos departamentos de listado, tendo como objectivo, não só o estabelecimento de uma apertada rede estendida a toda a área nacional, muito particularmente àquelas que, mercê de várias circunstâncias, se vêem em situação de inferioridade, mas ainda evitando duplicação ou multiplicação de serviços nas mesmas áreas servidas, sempre onerosos e sem qualquer proveito, antes até com prejuízo da sua eficiência. Muito particularmente me quero referir ao facto evidente de os Serviços; Médico-Sociais - Federação de Caixas de Previdência, em vez de despenderem vultosas verbas com as suas instalações, visando tais objectivos, poderem e deverem, por justo acordo com os estabelecimentos hospitalares, se servirem destes mesmos, onde os haja, de maneira a obviar o inconveniente apontado. Melhor seria que as verbas gastas pudessem reverter a favor de tais estabelecimentos hospitalares, melhorando as possibilidades de actuação destes.
Situação semelhante se passa com outros serviços de saúde dependentes de outros Ministérios, que sómente sé socorrem dos serviços hospitalares quando os meios de que dispõem são insuficientes em relação àqueles.
Quero eu dizer, em suma, que o hospital deverá ser, acima de tudo, a unidade conveniente de actuação nesta modalidade de assistência, e, como tal, usufruir das condições necessárias, materiais e técnicas, como instalações, apetrechamento, pessoal médico e de enfermagem bastantes para suprir todas as necessidades que lhes permitam facultar serviço público eficiente.
Ocorre refez ir que não se devem criar dificuldades à sua eficiente administração pela proposição de pagamento abaixo do razoável para a cobertura das despesas obrigatórias, mercê de contratos generalizados, que se vêem na contingência de aceitar, mas que se verifica serem ruinosos, como aqueles em vigor entre a Federação das Caixas de Previdência, pelos seus serviços médico-sociais, e os hospitais, quanto à assistência médica, medicamentosa, meios auxiliares de diagnóstico e, sobretudo, os que dizem respeito a actos cirúrgicos e sequente internamento e tratamento.
Haverá ainda que considerar a dotação de verbas suficientes ao desempenho cabal da missão de tais estabelecimentos hospitalares, por parte do Estado, pois todos os serviços de saúde devem ser encarados como verdadeiramente nacionais.
A melhoria gradual de todos os serviços de assistência e o seu aumento, em número tal, que permita encarar com mais optimismo uma cobertura satisfatória de toda a área nacional, merecerão sempre o nosso incondicional aplauso, pois a preservação da saúde é capital investido que muito representa em rendimento e valorização económico-social do País.
Dentro desta actuação, deve realçar-se, devidamente, o quanto se impõe a execução de um programa que baste à cobertura das necessidades quanto a internamentos de doentes do foro psiquiátrico, pois a carência de instalações é, infelizmente, uma chocante realidade, de molde a permitir integral cumprimento das disposições constantes da lei de saúde mental, aprovada nesta Câmara durante a VIII Legislatura, em Janeiro de 1963, e, ainda, das resultantes do acréscimo de doenças cujos índices de morbilidade e mortalidade são mais expressivos, nomeadamente o cancro e a tuberculose.
Há muito ainda a fazer neste capítulo e o Governo estará atento; assim se proporcionem os imprescindíveis meios financeiros.
Quero agradecer ao Governo, e muito particularmente aos Ministérios da Saúde e Assistência, das Obras Públicas e das Finanças, o facto relevante para a região que represento nesta Assembleia de se terem proporcionado todos os meios necessários para a construção do novo Hospital Regional de Aveiro, obra de vulto, a iniciar em breve, e que, vindo satisfazer antigo anseio das gentes locais, irá proporcionar aos seus utentes todo um benefício que tardava. Ainda bem que o apelo foi ouvido, e muito me congratulo com o facto, tanto mais que, em intervenção que nesta Assembleia fiz em 1963, me esforcei por salientar a necessidade da concretização de tão importante melhoramento. Oxalá que o edifício a erguer seja iniciado e concluído no mais curto espaço de tempo, que venha a ser apetrechado condignamente e preveja, como então foi solicitado, uma escola de enfermagem, a permitir a preparação de técnicos auxiliares em número bastante, a suprir actuais insuficiências, e, ainda, instalações para um adequado serviço materno-infantil, indispensável à vasta e populosa região que serve.
No sector do ensino, algo se me oferece dizer sem pretensões na matéria, mas dentro de um espírito analítico, ainda de repercussão a nível do distrito que me incumbiu da sua representação.
Tem vindo o Governo a despender profícua actuação digna de aplauso no sentido de dotar todo o País de uma cobertura escolar que vise satisfazer os reais e justos anseios da população, ávida de se instruir, valorizando-se e contribuindo para a elevação não só social, mas até económica, do agregado nacional, e com o fim bem relevante de nos equipararmos aos povos mais evoluídos.
Tal preocupação, alheia a todas as dificuldades, é ponto indiscutível e assente da Administração pelas vultosas verbas gastas e a gastar com tal finalidade. Felizmente que assim tem sido, e será, e muito nos congratulamos com o facto verificado, tanto mais que todos os graus de ensino merecem igual atenção.
Mas, permita-se-me a observação, e aqui volto os olhos para o meu distrito, apesar de tal orientação, ainda bem posta em evidência com os factos bem significativos da criação de secções liceais em Espinho, primeiramente, e, mais recentemente, em S. João da Madeira, e de escolas técnicas a cobrirem parcialmente a vasta área distrital, factos estes sempre dignos de realçar e agradecer, necessita, ainda, de ver ampliada tão relevante actuação, muito particularmente com a dotação de outros meios populacionais com estabelecimentos de ensino técnico de grau secundário, nomeadamente as evoluídas e prósperas vilas de Vale de Cambra e Albergaria-a-Velha, há muito, e justificadamente, a reclamarem tal benefício, satisfazendo necessidades e anseios que vêm de longe.
Realmente, o distrito de Aveiro, mormente pelo lugar que ocupa na economia nacional, particularmente justificado pelo terceiro lugar, em valor industrial e, ainda, por em densidade populacional representar 6,3 por cento da

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população total do continente, merece ser dotado, nos núcleos de mair expressão demográfica e desenvolvimento económico, com escolas adequadas, muito especialmente técnicas, que permitam à sua população escolar dos bancos primários prosseguir sem dificuldades os seus estudos, numa valorização de aprendizagem crescente, a- permitir um verdadeiro alfobre a que se há-de recorrer para a satisfação local das necessidades e solicitações, sobretudo das numerosas e valiosas indústrias que está enriquecido.
Eis por que também se vem justificando, há muito, dotar o distrito com um estabelecimento de ensino de grau médio, corolário lógico daqueles outros e com os mesmos objectivos, tendo em vista a formação de técnicos em número suficiente e qualidade que bastem às solicitações locais e, até, a outras, dado que muito há a fazer neste sector de valorização do País, pois escasseiam valores que o elevem devidamente nos diferentes sectores de actividade. Ali é válida a pretensão de um instituto industrial, visando a formação de técnicos especializados nos diferentes ramos de actividade profissional e de acordo com as numerosas e mais variadas indústrias da área a servir. Tal realização terá, naturalmente, todo o apoio dos industriais e das autarquias, defensoras dos interesses das suas populações, sem menosprezar o contributo à valorização económico-social do País.
A concretização de um estabelecimento de ensino, tendo em vista o fim proposto, na capital do distrito, que irá servir, a que se deverá associar outro, visando a formação de técnicos de nível médio do sector comercial, para o que bastará oficializar o já existente, pelo relevante facto de a Câmara Municipal, mesmo com manifesto prejuízo material da sua administração noutros sectores, ter chamado a si a exploração do actual Instituto Médio de Comércio, de iniciativa particular, são factos de primordial relevo para que chamo à atenção do Governo, especialmente do muito ilustre titular da pasta da Educação Nacional, Dr. Hermano Saraiva, estadista de quê tanto há a esperar, dentro deste espírito de actuação, tanto mais que, mercê de afirmações feitas já e do carinho que lhe merecem tais problemas, muito resultará de real proveito. E nós saberemos esperar a oportunidade com resignação; mais, com acrisolada esperança.
Aveiro justifica ainda por si, e pelo contributo que tal medida poderá ter como reflexo na satisfação de evidentes carências existentes, mercê de vários factores do conhecimento geral, a criação de uma escola de magistério primário oficial, pois a que existe, de carácter particular, com a regulamentação a que se sujeita, não possui perspectivas que lhe antevejam um futuro adequado à circunstância.
Formulo o melhor dos votos para que as indispensáveis dotações orçamentais ordinárias e extraordinárias se concretizem, de molde a dar expressão aos propósitos enunciados.
Dentro do objectivo ainda da política de investimentos a desenvolver, desejo também, na sequência da intervenção que oportunamente fiz nesta Assembleia, chamar a atenção dos responsáveis pela governação para algumas das justas aspirações que as populações do meu distrito reivindicam através dos tempos e que anseiam ver realizadas ou, pelo menos, encaradas em fase de estudo, tendo em vista uma oportuna, mas próxima, concretização.

O Sr. Veiga de Macedo: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça o obséquio.

O Sr. Veiga de Macedo: - Ainda bem que o ilustre colega volta a chamar a atenção do Governo para a necessidade de dotar Aveiro e o seu distrito dos estabelecimentos de ensino indispensáveis à consolidação e à aceleração do seu progresso. É sabido que, ultimamente, se deu satisfação, neste domínio, a velhas e legítimas aspirações, como V. Ex.ª acaba de salientar ao referir-se às recentes criações das secções liceais de Espinho e de S. João da Madeira. Congratulo-me vivamente com este facto tão consolador, que pelas populações interessadas foi acolhido e saudado com verdadeiro entusiasmo.
Mas é preciso dar mais ampla efectivação prática a esta política renovadora e que no respeitante ao distrito de Aveiro está ainda longe de ter reparado ou anulado injustiças relativas muito chocantes.
A importância económica e social da região aveirense, o espírito de iniciativa das suas gentes, bem patente aos olhos de todos, e os seus ardentes anseios de valorização cultural reclamam dos poderes constituídos providências rápidas e eficazes que, neste terreno essencial da educação, vão de encontro a necessidades evidentes e prementes.
Não é a primeira vez que afloro aqui este problema. Espero que me seja relevada a insistência, porque é bem intencionada e construtiva e porque, afinal, dá conta de uma situação séria que exige dos responsáveis soluções prontas e adequadas.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Deputado, e uma vez mais me congratulo pelo facto de V. Ex.ª vir valorizar uma intervenção que tem visado essencialmente chamar a atenção, para além de problemas de ordem geral, para o distrito que represento. V. Ex.ª já em anteriores apartes feitos a intervenções minhas tem tido oportunidade de realçar sempre o valor que tem para Aveiro o seu progresso e implicitamente as estruturas necessárias a esse progresso, nomeadamente no sector da educação.
Agradeço, pois, o aparte que V. Ex.ª houve por bem fazer à minha intervenção, que, se algum mérito ela tem, é precisamente a valorização que V. Ex.ª acaba de emprestar-lhe.
Realmente, o distrito de Aveiro, mercê das suas potencialidades económicas e da valorização das suas gentes, tem mais problemas a solucionar que, dentro de uma salutar política de investimentos, poderão e deverão ser considerados desde já, pois, de tal sorte, melhor contribuirá para uma gradual valorização do todo nacional, pela quota-parte que lhe diz respeito.
Ao muito que tem sido feito já, e que é justo se realce devidamente, haverá que se acrescentar, dentro desta ordem de ideias, uma programação visando dotar o distrito com uma cobertura mínima da sua área com as rodovias que o interliguem com os distritos vizinhos, de. maneira eficiente e rápida, pois a sua disposição geográfica, entre Coimbra e Porto, capitais regionais com que mantém estreitas relações, a tanto obrigam, e ainda com o distrito contíguo do interior, Viseu, de que tem necessidade absoluta de se aproximar, muito particularmente pela necessidade do escoamento de produtos provenientes das Beiras através do porto de Aveiro, e com núcleos evidenciadamente industriais, em que- o distrito do litoral está manifestamente enriquecido, valorizando-o sobremaneira. Mais se impõe, não só a realização de variantes às actuais estradas nacionais que visem eliminar os inconvenientes do atravessamento de núcleos densamente povoados, com todas as inerentes consequências de demoras que os tempos modernos já não aceitam; melhoria dos perfis transversal e longitudinal do actual sistema viário já há muito ultrapassados; e, ainda, as rectificações que o decorrer dos tempos já justifica plenamente.

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Realmente, o distrito de Aveiro, apesar da sua apertada malha d í estradas, há muito reclama uma actuação eficiente do respectivo departamento do Ministério das Obras Públicas - a Junta Autónoma de Estradas -, pois o parque automóvel que dispõe já, e que aumenta em ritmo inusitado dia a dia, ocupa um relevante terceiro lugar, em contraste flagrante com as infra-estruturas que dispõe neste sector em apreciação e que praticamente não tem sido objecto de atenção correspondente nos últimos tempos.
Não tenho a veleidade de enunciar as ligações rodoviárias mais aconselháveis e, muito menos, os seus traçados, pois aqueles c estes dependerão dos estudos técnicos que forem julgados mais convenientes, mas atrevo-me a chamar a atenção dos responsáveis para a premência da solução do problema equacionado, pela sua actualidade e dimensão, tendo em vista um ordenamento de prioridades, a seu tempo.
Somente, a relembrar, pois explanações mais pormenorizadas já as fiz oportunamente nesta Assembleia, e porque seria repetir-me, chamo à atenção do Governo e, muito particularmente, do muito ilustre titular da pasta das Obras Publicas, porque atento está, sem dúvida, aos problemas cuja solução depende do seu operante Ministério e até porque conhece a pretensão, para o excepcional melhoramento de que se reveste para a região a construção de uma estrada que venha a ligar directamente Aveiro com o vizinho concelho da Murtosa, progressiva vila que mantém estreitas relações comerciais e outras de apertado intercâmbio com a capital do distrito, há muito reclamada pelas populações, numa ânsia de progresso, para além de poder, cumulativamente, servir fins de aproveitamento hidráulico das margens do Vouga o, até possibilitar potencialidades turísticas a que a região se oferece esplendorosamente.
Que tão importante obra se possibilite para o ano que se avizinha, numa fase inicial de trabalhos, é o apelo que aqui deixo ao Governo da Nação e a S. Ex.ª o Ministro Rui Sanches.
Mas terei ainda de citar mais uma vez, que se espera também que se definam, tendo em vista a adequada execução, os acessos à cidade que chefia o distrito, tornando-a na realidade facilmente acessível a quem a demanda provindo de outras cidades e vilas vizinhas e a quem dela tem necessidade de sair, pois, tal como se encontra servida, nunca poderá desempenhar o papel que administrativamente e por direito próprio lhe cabe como capital, que é. Há que vencer os acidentes naturais, muito particularmente os hidrográficos, que a geografia lhe impõe, a que se junta ainda o grande inconveniente que uma variante mal concebida às estradas nacionais n.ºs 109 e 16 lhe ocasiona, espartilhando-a, pois já não bastava d, divisão da sua área urbana por outros produtos da acção do homem, aconselháveis ao tempo, na sua concepção, mas obsoletas nos tempos de hoje tal como se encontram, as linhas da C. P. e do vale do Vouga, a criar tantos e tantos obstáculos ao desenvolvimento e abertura da cidade.
Paralelamente com estas pretensões outras existem, já expostas superiormente, que aguardam a sua hora, de que poderei anunciar, de entre elas, a construção de uma nova ponte sobre o canal da Costa Nova, na barra, transpondo as margens da ria, em substituição da concorrida e insaciável de reparações ponte do forte, que, já estudada, há largos anos, serenamente, aguarda não se sabe bem o quê, para a sua construção imediata. E a outra ponte a ligar as duas margens da ria, em S. Jacinto, cuja validade nunca será de mais enaltecer pelos reais e indiscutíveis objectivos que alcança para a região? E aquela outra, a da Rata, que, galgando o rio Águeda, continua a aguardar a queda da actual ligação de madeira, para então se concluir da sua justificação?
Outra realidade de fulcral importância para a região é o desenvolvimento das obras do porto de Aveiro, que, pela responsabilidade que lhe advém como subsidiário do porto de Leixões, cuja saturação está atingida, ou para lá caminha, nem por isso tem tido aquele desenvolvimento que se justifica, nem sequer tem beneficiado da aplicação da totalidade das dotações orçamentais que lhe têm sido destinadas pelos planos de fomento, mercê de dificuldades essencialmente técnicas, a que urge pôr termo.
Realmente, a economia da região e, consequentemente, do País muito tem a esperar dos investimentos a levar a efeito em obra de tanta valia e projecção imediata.
Para o facto já chamei a atenção do Governo, em intervenção nesta Assembleia em 27 de Setembro de 1964, mas nem por isso o apelo teve o devido eco, apesar dos esforços despendidos ininterruptamente pela administração portuária local e dos utentes das instalações, algumas de improviso no sector industrial e comercial, e de outras já firmadas nos sectores bacalhoeiro e de pesca de arrasto costeiro.
Aguarda-se, impacientemente, a sua utilização com fins comercias de mais vasta latitude, a partir das obras do cais, construído recentemente, e a construção das docas secas, para além da realização das obras necessárias em arrastado estudo, tendo em vista o aproveitamento total e defesa da sua barra.
Ficar-me-ei com estas citações, que só servirão para simples recordatória de quem tem a grande missão de decidir com justiça e fazer com que os interesses se satisfaçam após apreciação cuidada e analítica da situação.
Falando ainda de investimentos de interesse verdadeiramente nacional e nos quais cabe plenamente um desejo de melhoria, integrada nas aspirações do distrito que venho citando, haverá também de se considerar a necessidade de servir as populações menos ambiciosas das zonas rurais, muito particularmente daquelas que, mercê da sua situação geográfica, se acantonam em áreas pouco acessíveis, dotando-as de requisitos base para a elevação do seu nível, nomeadamente no que diz respeito a acessos das populações isoladas, à electrificação, ao abastecimento de água e saneamento, estruturas estas a desenvolver gradualmente e dentro de um espírito prioritário de justiça, de que tanto carecem, tanto mais que é subido contentarem-se com o mínimo que contribua para o seu bem-estar social.
Tendo em vista actuação facilitada das administrações autárquicas restas realizações, haverá que ser prestado por parte do Estado o necessário e imprescindível auxílio financeiro, através de comparticipações e empréstimos que permita levar de vencida esta verdadeira cruzada de bem servir, dentro de um espírito de mútua colaboração, tanto mais prestimosa quanto mais eficiente. Os subsídios e comparticipações deverão ser de maior vulto e os empréstimos mais facilitados, pois é sobejamente conhecido que os municípios, mercê das suas escassas receitas e crescentes despesas, só por si não podem solucionar tantos problemas que se lhes deparam, cada vez em maior número e de maior vulto.

Vozes: - Muito bem!

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O Orador: - Aliás, tal assistência financeira, que deverá ser sempre a longo prazo, através da Caixa Geral de Depósitos, dentro das possibilidades ocasionais e com a segurança resultante das garantias que normalmente oferecem as autarquias, por exigência legal, não correrá risco algum, antes, pelo contrário, virá a ter a devida compensação, pois os contraentes de tais empréstimos, com o pagamento dos juros previstos que as operações implicam, e devo dizer que não são baixos, considerando o fim em vista (regra geral 4,5 por cento ao ano), contribuirão para uma fonte de rendimento, quando é igualmente certo que os depósitos que obrigatoriamente fazem na citada instituição de crédito beneficia de um juro muito mais reduzido.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A acrescentar às citadas facilidades quanto a auxílios financeiros, deverão juntar-se aquelas outras inerentes à simplificação da burocracia sectorial dos departamentos do Estado, que superintendem na aprovação dos planos à execução das obras sem a criação de embaraços e demoras na sua aprovação que tantas vezes conduzem ao desânimo daqueles que mais de perto vivem a ansiedade da satisfação dos problemas em que se empenham com toda a dedicação e interesse.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Realmente, diz-nos a experiência já vivida que se não compreende, mesmo com a justificação da falta de técnicos que hão-de emitir pareceres sobre os empreendimentos submetidos à consideração superior, que se aguarde às vezes largo tempo por soluções, as mais simplistas, ou por reparos tardiamente feitos que façam retroceder no tempo a execução de um empreendimento a satisfazer. Aqui fica o reparo do facto e a expressão do desejo de que, dentro do novo e eventual sistema de trabalho a adoptar e que já se vem desejando há muito, se activem os processos, de molde a simplificar, descentralizando, a favor dos serviços representativos a nível distrital, a maior parte dos estudos que necessitem aprovação estatal.
A consideração, dentro de uma sã e louvável política de investimentos, da construção de edifícios para fins assistenciais e sociais ou de casas, nos termos do Decreto-Lei n.º 34 486, de 6 de Abril de 1945, é previsão que me merece inteiro aplauso pelos objectivos a alcançar, pois denota claramente o quanto o Governo, na sequência de actuação já iniciada, se preocupa com a valorização das populações, dotando-as com os meios necessários a uma paz social que todas as civilizações se esforçam por fazer em bases sólidas de feliz vivência. Ao aplaudir a previsão, muito me congratulo com o facto, muito particularmente pela concretização da vontade do nosso muito querido e venerando Chefe do Estado, bem expressa no apelo à Nação que constantemente vem dirigindo e que maior expressão teve cem a criação da Fundação Salazar, que tanto eco teve no País inteiro, após recente e tocante apelo já merecedor das mais significativas adesões. Será de chamar à atenção dos organismos que mais possibilidades têm de dar execução ao plano enunciado para que se esforcem cada vez mais no sentido de, sem demora, intentarem os melhores esforços na realização prática da ideia. Caberá também papel relevante ao Ministério das Corporações e Previdência Social neste género de actuação, pois as suas possibilidades materiais e de organização a tal se oferecem, aliás, como já se vem notando nos tempos últimos, mas que carece ainda de maior expressão.
De entre as providências que muito poderão valorizar os meios rurais, poderão enunciar-se aquelas que venham a possibilitar o auferimento de benefícios de ordem social, assistencial e de previdência aos trabalhadores que amanham a terra com sacrifícios e canseiras de muito maior vulto que os inerentes aos seus equiparados do sector industrial e comercial nos tempos que decorrem, a usufruírem de vantagens sobre aqueles, nada de acordo com a justiça social que sempre reclamámos e que tem plena actualidade.
Sabe-se ser preocupação do Governo solucionar este descalabro e diferenciação, conforme foi tão firmemente afirmado por S. Ex.ª o Presidente do Conselho no seu memorável discurso do dia 27 último e que nos mereceu inteiro aplauso, pelo que só nos congratularemos quando assistirmos à satisfação plena das reivindicações humanas desses desprotegidos da fortuna, relegados para uma situação que tendem a abandonar pela atracção para os meios industrializados e até pelo êxodo para além-fronteiras, com os inerentes inconvenientes e reflexo no não aproveitamento das potencialidades do sector primário, a atravessar evidente crise.
A esperança renasce com a afirmação do maior responsável do Governo, já que o anúncio anteriormente feito pelo titular da pasta das Corporações e Previdência Social igualmente fazia prever tão meritória determinação.
A base VI do diploma em discussão trata de importante matéria que, pelo seu conteúdo e objectivos, tem receptividade muito particular para quem, como eu, sempre tem estado atento ao estado de coisas que vem perturbando ou poderão perturbar o funcionamento da máquina administrativa, muito particularmente quanto à constituição dós seus quadros de pessoal e eficiência dos serviços.
Realmente, ninguém poderá contestar que o estado actual do sistema sofre de enfermidade que terá de ser objecto de atenta terapêutica, atinente a resolver as deficiências onde elas existem ou onde se vislumbrem perturbações que, porventura, possam conduzir a consequências perniciosas, sempre de lamentar, quando tudo se conjuga, mercê do ambiente criado de salutar convívio, no sentido da valorização de um povo que, logicamente, aspira a mais e melhor.
Eis por que se anseia pela anunciada Reforma Administrativa, a ditar, minimizando os defeitos existentes, a concepção de medidas ajustadas ao momento e, sobretudo, ao futuro, que se deseja melhor e mais equilibrado em todos os sectores da Administração.
A reorganização dos serviços, que se deseja e espera, implicará, naturalmente, para uma produtividade que se coadune com tal medida, uma revisão dos vencimentos dos funcionários de acordo com a circunstância e, muito acertadamente, com a valorização do homem votado ao bom desempenho da sua missão.
Será a altura, e só se lamenta que as limitações do momento, fortemente condicionadas pelas absorventes despesas com as forças armadas que asseguram a estabilidade da unidade territorial, não permitam, com justeza absoluta, elevar ao grau desejado a compensação do trabalho despendido pelos servidores do Estado e equiparados de outros serviços públicos. A anunciada e já efectivada tendência de tomada de posição pelo Governo nesta matéria diz-nos que se está prestes a fazer a devida justiça às reclamadas pretensões que, em uníssono, tem significado de verdadeiro apelo aos responsáveis, por parte, sobretudo, daqueles que percebem vencimentos mais reduzidos.

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2798 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 153

À melhoria das remunerações, recentemente levadas a efeito, dos servidores nas til eiras da Polícia de Segurança Pública e da Guarda Nacional Republicana, além de outras categorias de funcionários, e, ainda, da revisão dos quantitativos das ajudas de custo, deverão acrescentar-se mais aquelas que venham a contemplar outras classes, nomeadamente a do professorado primário, que se vem debatendo com crise de quantitativo e, sobretudo, de qualitativo. Realmente, terá aceitação total, não só por parte da classe visada, mas bambem por todos os portugueses de bem que estão atentos à melindrosa situação de tais agentes de ensino a debate-se com forte crise. Eis por que é com a maior satisfação que vemos anunciar, já no próximo ano, a compensação material imprescindível à valorização de uma classe que, para o bom desempenho da sua nobilitante função precisa, de ambiente familiar, de estabilidade material, que lhe permita preparar com dedicado e inexcedível zelo os jovens portugueses de hoje e de amanhã. De contrário, a crise actual agravar-se-ia, com os seus naturais maus reflexos ria preparação da juventude, ansiosa por mais e melhores conhecimentos. A previsão de 550 000 contos: no Orçamento Geral do Estado para o próximo ano deve ser uma realidade, e oxalá a sua aplicação possa vir suprir o êxodo do professorado para outras actividades privadas ou até de outros serviços públicos onde os vencimentos, por mais elevados, são motivo de atracção que não será de estranhar.
Lamenta-se que não seja possível encarar-se também, numa fase próxima, a melhoria das condições sócio-económicas dos servidores do Estado, conforme é prometido para os professores primários, pelas razões invocadas no preâmbulo justificativo da presente proposta de lei. Mas espera-se que o assunto não se]a descurado, antes tudo se oriente no sentido da generalização das medidas que obviem aos ir convenientes apontados, pois terá de aduzir-se, como justificação válida, que todos têm as mesmas necessidades a aspirações. Embora se anuncie, com o objectivo de minorar a situação criada aos servidores do Estado com o retardamento da melhoria dos seus vencimentos, as medidas atinentes ao integral funcionamento, durante o ano que se avizinha, dos serviços da assistência na doença, em que se inclui a assistência médica, cirúrgica, materno-infantil, de enfermagem e medicamentosa, num mais vasto esquema e na sequência de medidas graduais que em sendo instituídas, abrangendo os seus agregados familiares, desde Novembro de 1965, em esquema traçado pelo Decreto-Lei n.º 45 002, de 27 de Abril de 1965, nem por isso os aproxima daqueles que labutam em actividade; sectoriais do comércio e da indústria e outros correlativos, que desde há muito usufruem destas vantagens de ordem social através dos respectivos serviços do Ministério das Corporações e Previdência Social, com a flagrante disparidade de os vencimentos daqueles serem, regra geral, muito inferiores aos destes últimos, e ainda as habilitações exigidas serem, em alguns casos, bastante superiores. Este desequilíbrio terá forçosamente de ser atenuado e, até, desaparecer, dentro de um verdadeiro critério de justiça social que se impõe alcançar. O mesmo poderá dizer-se quanto à construção e aquisição de habitações para funcionários públicos, que se deseja e espera terá o devido incremento no ano de 1969, dentro de uma planificação geral de salutares medidas à semelhança com a actividade largamente despendida neste sector, polo Ministério das Corporações e Previdência Social.
As considerações feitas deverão ser extensivas aos aposentados, que, embora tenham sido alvo, em data ainda recente, de melhoria das suas pensões de reforma, nem por isso se viram libertados do espectro da miséria, pois a compensação recebida não foi aquela que melhor se ajusta aos tempos actuais, e muito menos com a progressão evidente do acréscimo do custo de vida. Haverá que rever a sua débil situação, se possível e oportuno se considerar.
Mulalis mutantis poderei anotar a situação que se vive no sector do funcionalismo municipal, a atravessar crise séria que urge resolver, pois, de contrário, tudo se encaminhará no sentido de cada vez mais se desprestigiarem os serviços pelo desinteresse que os actuais servidores, regra geral, põem no exercício da sua profissão e, ainda, na procura dos lugares vagos ou que vão vagando, mercê do abandono dos seus titulares.
Realmente, mercê da desactualização dos vencimentos, não só em relação ao tempo decorrido sobre a sua fixação, mas também em confronto com aqueles que percebem os empregados de empresas particulares e até estatais e paraestatais, resulta, consequentemente, o desinteresse no preenchimento dos quadros do funcionalismo administrativo, em número e qualidade, dos seus componentes, desde os funcionários de secretaria, aos técnicos e assalariados, quaisquer que sejam as suas categorias e habilitações. Evidente se torna, com urgência, equiparar, pelo meros, tais servidores àqueles outros que desempenham funções semelhantes fora dos quadros administrativos; só assim se poderá fazer justiça social, a que toda a humanidade aspira; só assim haverá rendimento compatível; só assim só dignificarão os homens e as instituições, os serviços e a Nação. Mas, para além de uma equiparação de vencimentos, haverá também que considerar os benefícios de ordem assistencial, ainda em pé de igualdade com outros já existentes e em via de generalização. De contrário, não teremos nunca funcionários categorizados e dignos, como não teremos técnicos escrupulosos e dados a pleno rendimento dos serviços camarários, ou não teremos mesmo nenhuns, pois a deserção é demasiado manifesta e evidente.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: -Já vai longe o tempo em que os lugares que vagavam nos .quadros administrativos eram largamente disputados, pois se consideravam de eleição e de dignidade; presentemente, merco do circunstancionalismo actual, a que urge pôr termo, consideram-se tais posições degradantes para a classe. E se alguns funcionários desta, categoria existem merecedores de qualificação, tal se deve ao seu brio profissional e a posições adquiridas por antiguidade que não lhes convém perder; mas, retirados da actividade tais funcionários, os quadros ficarão totalmente desprovidos do mínimo de qualidade, com os graves inconvenientes que advêm de tal estado de coisas.
Não é raro observar-se, também, quando se conseguem interessados para o preenchimento de determinados lugares, que o tempo de permanência nos cargos é escassa, transitando a curto prazo para outros estranhos melhor remunerados, pois o objectivo ou foi de aprendizagem pura, com evidente perturbação dos serviços, ou de aguardar sómente a oportunidade de outra situação mais compensadora.
Aliás, a situação reveste-se de mais acuidade em regiões bastante industrializadas, em que a oferta e procura por parte das empresas atingem foros de autêntica competição.
Ora, se em tais regiões as câmaras podem e devem pagar mais aos seus funcionários, porque se não autoriza o devido ajustamento, tanto mais que os cofres expurgados são os municipais?

Vozes: - Muito bem!

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12 DE DEZEMBRO DE 1968 2799

O Orador: - E concluir-se-ia fatalmente que o rendimento superava em muito o investimento, com todas as demais vantagens na eficiência dos serviços que se destinam a bem servir o público.
Mas, dado que o tema é vasto e profundo, não quero alongar-me em mais considerações, pois o Governo está atento e verdadeiramente interessado na solução dos problemas equacionados; quero, antes, afirmar o meu incondicional apoio à prorrogação enunciada no diploma de autoria de S. Ex.ª o Ministro das Finanças, a quem é devida homenagem pela maneira criteriosa que entendeu dar à sua elaboração, conteúdo e finalidade, dentro de uma orientação adaptada ao momento, mas na sequência de uma conduta vinda de longe, com o advento da Revolução Nacional e o seu gigantesco obreiro, e a demonstrar, claramente, o equilíbrio que vem sendo característica dominante deste importante departamento do Estado, de que depende uma posição de firmeza que nos imponha no conceito de crédito internacional e estabilidade interna.
Resta-me, a finalizar, e a acrescentar à confiança afirmada, que a linha de rumo, tão serena e esclarecedoramente definida pelo Presidente do Conselho, Prof. Marcelo Caetano, na comunicação dirigida a esta Assembleia, mas que todo o País ouviu atentamente, com manifesta ansiedade e desusado interesse, é aval bastante para que se aceite, sem reservas, antes, com entusiasmo e apoio, propostas de lei que, como esta, traduzem, de uma maneira superior, a única actuação válida e adaptada aos condicionalismos actuais e vislumbram a definição de medidas ajustadas a uma total independência e insubmissão aos poderios que pretendem, em vão, fazer soçobrar, por uma eventual fraqueza financeira, um País que vem primando pelo equilíbrio orçamental, pela preocupação da prática da justiça e pela evidente valorização social e económica do seu agregado nacional, pelo qual conscientemente responde.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão.

O debate continua amanhã, à hora regimental, sobre a mesma ordem do dia.
Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 10 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Albano Carlos Pereira Dias de Magalhães.
Alfredo Rodrigues dos Santos Júnior.
Antão Santos da Cunha.
António Augusto Ferreira da Cruz.
António Calheiros Lopes.
António Dias Ferrão Castelo Branco.
Armando Cândido de Medeiros.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Fernando Afonso de Melo Giraldes.
Francisco José Roseta Fino.
Gonçalo Castel-Branco da Costa de Sousa Macedo Mesquitela.
Gustavo Neto de Miranda.
Henrique Ernesto Serra dos Santos Tenreiro.
Henrique Veiga de Macedo.
João Ubach Chaves.
José Dias de Araújo Correia.
José Guilherme Rato de Melo e Castro.
José Manuel da Costa.
José Pinheiro da Silva.
José Soares da Fonseca.
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues.
Luís Folhadela Carneiro de Oliveira.
Manuel José de Almeida Braamcamp Sobral.
Manuel Tarujo de Almeida.
D. Maria Ester Guerne Garcia de Lemos.
Rui Pontífice de Sousa.
Sebastião Alves.
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães.
Tito de Castelo Branco Arantes.

Srs. Deputados que faltaram à sessão.

António Júlio de Castro Fernandes.
António Magro Borges de Araújo.
António dos Santos Martins Lima.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Aulácio Rodrigues de Almeida.
D. Custódia Lopes.
Fernando de Matos.
Gabriel Maurício Teixeira.
Horácio Brás da Silva.
James Pinto Bull.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
José dos Santos Bessa.
Júlio Dias das Neves.
Manuel Amorim de Sousa Meneses.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Henriques Nazaré.
Manuel João Correia.
Mário Amaro Salgueiro dos Santos Galo.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.

O REDACTOR - Luiz de Avillez.

Requerimento entregue na Mesa, durante a sessão, pelo Sr. Deputado Pinto de Mesquita:

Sr. Presidente: O abaixo assinado vem requerer a V. Ex.ª que, nos termos do Regimento desta Assembleia, lhe seja enviado um exemplar do Plano de Urbanização da Região de Lisboa, publicado através do Gabinete de Urbanização da Região de Lisboa, do Ministério das Obras Públicas.
Em anterior ano desta legislatura, já o ora impetrante teve ocasião de solicitar lhe fosse fornecido tal exemplar, mas tal não pôde verificar-se por aquele Plano ainda não ter sido aprovado pelo Conselho de Ministros. Tal aprovação já teve lugar no decurso do presente ano e, assim, cessou a dificuldade antes suscitada, e tem todo o cabimento, parece, o presente requerimento, que o requerente apresenta a V. Ex.ª para efeitos do devido deferimento.

O Deputado, Simeão Pinto de Mesquita.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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