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REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 159

ANO DE 1969 9 DE JANEIRO

ASSEMBLEIA NACIONAL

IX LEGISLATURA

SESSÃO N.º 159, EM 8 DE JANEIRO

Presidente: Ex.mo Sr. José Soares da Fonseca

Secretários: Ex.mos Srs.
Fernando Cid de Oliveira Proença
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira

SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às [...] horas e 40 minutos.

Antes da ordem do dia. - O Sr. Deputado Santos Bessa foi autorizado a depor como testemunha no Tribunal Judicial de Coimbra.

Usaram da palavra os Srs. Deputados Henriques Mouta, que referiu à obra política do Presidente Salazar, e Abranches de [...ilegível] , acerca da concessão à TAP das carreiras aéreas internas.

Ordem do dia. - Concluiu-se a discussão na generalidade do projecto de lei sobre a alteração do artigo 667.º do Código de Processo Penal.

Usou da palavra o Sr. Deputado Colares Pereira.

Seguidamente passou-se à discussão na especialidade segundo texto e forma de substituição apresentados pelos Srs. Deputados Júlio Evangelista, Manuel Colares Pereira, Tito Arantes e[...ilegível]tado dos Santos, tendo sido discutidos e aprovados todos os artigos.

Usaram da palavra na decorrer da discussão os Srs. Deputados [...ilegível]ro de Mesquita, Tilo Arantes, Júlio Envagelista, Albano de Magalhães e Furtado dos Santos.

O Sr. Presidente encerrou a sessão às 19 horas.

O Sr. Presidente: - Vai fazer-se a chamada.

Eram 16 horas e 30 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Albano Carlos Pereira Dias de Magalhães.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alfredo Rodrigues dos Santos Júnior.
Álvaro Santa Rita Vaz.
André Francisco Navarro.
André da Silva Campos Neves.
Aníbal Rodrigues Dias Correia.
Antão Santos da Cunha.
António Augusto Ferreira da Cruz.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António Calapez Gomes Garcia.
António Calheiros Lopes.
António Dias Ferrão Castelo Branco.
António Furtado dos Santos.
António José Braz Regueiro.
António Júlio de Castro Fernandes.
António Magro Borges de Araújo.
António Moreira Longo.
Arlindo Gonçalves Soares.
Armando Acácio de Sousa Magalhães.
Armando José Perdigão.
Artur Alves Moreira.
Artur Correia Barbosa.
Artur Proença Duarte.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Augusto Salazar Leite.
Avelino Barbieri Figueiredo Batista Cardoso.
D. Custódia Lopes.
Deodato Chaves de Magalhães Sousa.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando Afonso de Melo Giraldes.
Fernando Cid de Oliveira Proença.
Fernando de Matos.
Filomeno da Silva Cartaxo.
Francisco António da Silva.
Francisco Cabral Moncada de Carvalho (Cazal Ribeiro).
Francisco José Cortes Simões.
Gabriel Maurício Teixeira.
Henrique Ernesto Serra dos Santos Tenreiro.

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Henrique Veiga de Macedo.
James Pinto Bull.
João Nuno P menta Serras e Silva Pereira.
João Ubach Chaves.
Joaquim de Jesus Santos.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Jorge Barros Duarte.
José Alberto de Carvalho.
José Coelho Cordão.
José Fernanda Nunes Barata.
José Henriques Mouta.
José Manuel da Costa.
José Maria de Castro Salazar.
José Pais Ribeiro.
José Soares ca Fonseca.
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Leonardo Augusto Coimbra.
Luís Arriaga de Sá Linhares.
Luís Folhadela Carneiro de Oliveira.
Manuel Colaras Pereira.
Manuel Henriques Nazaré.
Manuel João Cutileiro Ferreira.
Manuel Lopes do Almeida.
Manuel Marques Teixeira.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Manuel Tarujo de Almeida.
D. Maria Ester Guerne Garcia de Lemos.
D. Maria de Lourdes Filomena Figueiredo de Albuquerque.
Martinho Cârdido Vaz Pires.
Miguel Augusto Pinto de Meneses.
Paulo Cancella de Abreu.
Raúl da Silva e Cunha Araújo.
Rogério Noel Peres Claro.
Rui Pontífice de Sousa.
Sebastião Garcia Ramirez.
Sérgio Lecercle Sirvoicar.
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães.
D. Sinenética Soares Santos Torres.
Teófilo Lopes Frazão.
Tito de Castelo Branco Arantes.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
Virgílio David Pereira e Cruz.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 83 Srs. Deputados.

Está aberta a sessão.

Eram, 16 horas e 40 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Está na Mesa um ofício do Tribunal Judicial da Comarca de Coimbra em qual se pede que o Sr. Deputado Santos Bessa seja autorizado a depor como testemunha no próximo dia 30 naquele Tribunal.
Consultado aquele Sr. Deputado, entendeu não haver qualquer inconveniente em que fosse concedida a autorização solicitada. Consulto, portanto, a Câmara sobre se concede ou não autorização para o Sr. Deputado Santos Bessa depor como testemunha no Tribunal Judicial da Comarca, de Coimbra.

Consultada a Assembleia, foi concedida autorização.

O Sr. Presidente: - Não tenho sobre a Mesa nenhum Diário das Sessões para submeter à aprovação nem qualquer Diário do Governo que insira decretos-leis que tenham de ser aqui apontados para efeitos do § 3.º do artigo 109.º da Constituição. Não há qualquer outro expediente na Mesa e estão inscritos para os períodos de antes da ordem e ordem do dia três Srs. Deputados.
É, pois, minguada a lista dos oradores de hoje. Aponto o facto, não evidentemente como queixume, mas como uma verificação que me pareceu conveniente salientar a título de uma espécie de convite a VV. Ex.ªs para que não descurem intervenções, que é para isso que existe o Parlamento. Eu desejaria que elas fossem todos os dias abundantes, qualificadas e oportunas. Fica isso à consciência funcional de VV. Ex.ªs
Tem a palavra, antes da ordem do dia, o Sr. Deputado Henriques Mouta.

O Sr. Henriques Mouta: - Sr. Presidente: O que vou dizer todos o sabemos. Mas, como natural da Beira e representante do círculo onde nasceu notável figura nacional contemporânea, seja-me permitido um testemunho. Simples testemunho. Vou falar de um grande português. Com ele, os meus contactos pessoais limitaram-se a dois apertos de mão, meramente protocolares. Um nesta Casa e outro na sua casa da cidade, aonde acompanhei pessoa amiga. Exactamente na véspera da explosão da bomba, de sinistros e felizmente frustrados objectivos, quando lavrava, avassalador, o pavoroso incêndio da guerra civil na Espanha. Há uns bons trinta e um anos!
Esta declaração preliminar não é uma nota pessoal, pretende apenas sublinhar a independência deste depoimento que sai da consciência e da razão, não meios que do coração de português agradecido. E, sendo assim, dispensar-me-ei de muitos adjectivos, contentando-me com os factos, bem mais eloquentes que ciclones de palavras. E são de outiva e memória, na sua maioria, as citações que fizer.
Sr. Presidente: Em 1929, há perca de quarenta anos, disse alguém neste país que os nossos homens de Estado deviam governar com os olhos abertos sobre o Mundo e o coração voltado para Portugal. Eram palavras de um jovem estadista, que hoje nos contempla em silêncio e na esperança, enquanto o seu coração continua a pulsar, sempre virado para Portugal, porque nunca bateu noutra direcção. Nem antes nem depois de chamado a acudir a uma nação em ruínas e desespero.
Esguio, magro, lábios pregados, olhar cintilante, discreto, simples e austero, fez brilhar o sol da esperança nos corações dos Portugueses, com palavras austeras. Era eu estudante, quando o professor de Coimbra, dias antes de chamado definitivamente à pasta das Finanças, fazia em editorial das Novidades o lúcido diagnóstico e apontava a única terapêutica eficaz e este país anémico e esgotado pela desordem.
Nas suas primeiras mensagens anuncia uma política de verdade, uma política de sacrifício e uma política nacional. E a sua modéstia não o inibiu de falar claro, nem de dizer à Nação que sabia o que queria e para onde ia ... e que ela podia confiar nu sua inteligência e honestidade. E vieram as reformas, discretas e planificadas, numa ordem de prioridade: financeiras, económicas, sociais e políticas. Mas uma prioridade que não excluía uma certa simultaneidade. Os primeiros resultados pareciam inacreditáveis, lá fora e cá dentro. Mas o cepticismo, espontâneo ou cultivado, ainda o mais renitente, cederia ao poder das realidades manifestas.
Pagaram-se as dívidas, juntavam-se reservas, o ouro regressava em barras a Lisboa, impulsionava-se a economia e entrava-se nos planos de fomento. E, firmado na sanidade financeira perdida havia séculos, este país recuperou a sua independência, pôde ter uma política inter-

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nacional própria, conforme ao interesse nacional e ao direito que os poderosos não raro espezinham quando lhes convém.
Não fora em vão que o País correra. para Coimbra quando procurava recuperar crédito para encetar a restauração nacional. Da cátedra para o Terreiro do Paço viera mais que o mago das finanças, o génio político, encarnado num homem disciplinado, com ideias claras, perspicácia, largueza de horizonte, sentido da medida e do real, firmeza de carácter, vontade de aço. profunda humanidade e nobreza de sentimentos..
Sr. Presidente: Nestes ciclónicos quarenta anos da vida internacional, o homem que esteve ao leme da nau portuguesa nunca se deixou dominar pela temeridade nem pela cobardia. Não o tocou a asa dourada da avareza. Não ajoelhou diante dos ídolos, demagogia ou cesarismo. Não desapontou as forças armadas, que nele descobriram o concretizador dos seus patrióticos anseios, o timoneiro que lhes permitisse regressar aos quartéis, na certeza de que uma estrutura seria encontrada, que deixasse trabalhar em paz e prosperidade os Portugueses.
Nem foi iludida a esperança do povo deste país cristão, nascido da cruzada, baptizado no próprio sangue e missionário por vocação. O professor cristão de Coimbra prepararia, gradualmente, um clima de reconciliação; abriria novos caminhos às relações entre os dois poderes; e, nos centenários da Fundação e da Restauração da Nacionalidade, em 1940, aporia sigilo sagrado às comemorações, com a assinatura da concordata da esperança, a primeira do género. É assim se arrancava um espinho da consciência do povo português.
Ratificados por esta Câmara em sessão extraordinária de 25 de Maio de 1940, a Concordata e Acordo Missionário não escaparam às críticas. Alguns viam-na concordata de separação mais que um paradoxo, uma heresia. E outros uma subordinação, ou da Igreja ao Estado ou do Estado à Igreja, consoante a óptica da sua posição ou ideologia. A verdade é que os dois instrumentos diplomáticos consagraram, juridicamente, uma colaboração na distinção e na independência dos poderes. E têm sido as estruturas jurídicas do mais amplo surto de promoção humana e espiritual verificado em terras e gentes portuguesas nos últimos dois séculos.
Sr. Presidente: Quando a Sociedade das Nações entendeu recusar um empréstimo a este país arruinado e desacreditado, salvo se a utilização do empréstimo fosse por ela fiscalizada, o responsável pelo futuro financeiro da Nação Portuguesa defende a honra do povo lusíada, rejeitando a humilhante e afrontosa condição, preferindo que o País se erguesse devagar, mas andasse por seu pé e de cabeça levantada.
Quando os Portugueses se combatiam nos salões, na imprensa e nas ruas, em vez de trabalhar, unidos, por Portuga], ergueu-se entre nós o brado da concórdia, a convocar todos à colaboração, pedindo que se unissem para salvar a Pátria, em vez de se dividirem por causa da Pátria. Que todos nunca seríamos de mais.
A Europa das ditaduras e das democracias gastava-se e desgastava-se a discutir trabalho, família, pátria e o próprio Deus. Mas aqui proclamavam-se esses valores, como autênticos e necessários- à dignidade e à própria segurança do homem. Aqui não se acreditou no boato da morte de Deus, porque Deus não morre, como gritou Garcia. Moreno ao sentir-se trespassado pelas balas assassinas. Deus só pode morrer no coração dos homens. Mas então são eles que morrem. Ainda o morto não estará enterrado e já os sinos dobrarão ao colapso dos assassino?.
Entre nós não encontrou ressonância política o grito de Lúcifer: «Se houvesse deuses, como suportaria eu não ser um deles?»
Grito de Lúcifer, sem dúvida. E nunca a voz da serpente, enroscada na árvore da ciência, soou com tanta autenticidade. Mas aqui se replicou, serenamente, que só Deus é grande e que, entre os homens ditos grandes, só Deus sabe quem é grande ...
Sr. Presidente: Se as constituições europeias divinizavam o Estado e canonizavam a violência ou a liberdade, aqui afirmava-se que o Estado deve ser suficientemente forte para não precisar de ser violento; e que se deve governar com u autoridade necessária e a liberdade possível; e ainda que se não pode governar contra a vontade persistente de um povo. Rejeitavam-se, por igual, os sistemas totalitários e os sistemas parlamentaristas, estes como regimes únicos mal distintos dos partidos únicos. Preferia-se uma estrutura própria, integradora, e não desagregadora do equilíbrio dos poderes, elaborada por portugueses para portugueses, inspirada numa filosofia política de tipo empírico-existencial,- considerando o homem não em abstracto, mas em concreto, o homem e a circunstância, histórico-temperamental.
Recusavam-se ao Estado, qualquer que fosse a sua orgânica, poderes ilimitados. E confinaram-se-lhe às fronteiras da moral e do direito. Proclamava-se que não há sistemas ideais nem regimes perfeitos, como foi recordado em recente discurso do Sr. Conselheiro Albino dos Reis. discurso memorável pela- riqueza do conteúdo, equilíbrio, humanidade, bom senso e até por seu apurado cunho literário.
Não se esquecia que o objectivo de um governo ai> serviço de uma comunidade é realizar o bem comum, u não o dai- satisfação a uma teoria política ou sistema social.
Quando a Etiópia foi riscada do mapa pela violência da espada, fez-se ouvir na Sociedade das Nações a voz deste país, na. defesa do direito internacional e de uma nação que, por não ser uma potência militar nem económica, não podia perder o direito à sua já velha independência.
Quando, no areópago de Genebra, entrou um país que se transformara num açougue de vidas e de liberdades, sem renegar o seu programa de guerras e ditaduras de classe a impor ao Mundo inteiro, Portugal, confirmando uma posição que já vinha dos governos democráticos anteriores, reafirmou a sua atitude de discordância e lavrou o seu protesto contra a introdução de um monstruoso «cavalo de Tróia» no solar, das nações e na cidade]n da paz. Sei que se pretendia humanizar a selva, pelo contado com a civilização. Mas os resultados não foram brilhantes. A águia vermelha não se metamorfoseou em pomba.
Se a imprudência de uns, a ingenuidade de outros e astúcia de terceiros atearam o incêndio da guerra civil na Espanha, imolando milhões de vidas na ara das ideologias, que substituíam os ideais, a verdade e os direitos e deveres sagrados dos homens e das nações; se a Itália e a Alemanha cediam, ao menos aparentemente, a previsões muito estranhas na Comissão de Não-Intervenção. de Londres, parecendo consentir que as democracias clássicas, continentais e atlânticas, abrissem as portas ao Império Marxista do Ocidente, como segundo braço da tenaz de ferro que estrangularia a liberdade na Europa, ... este país pequeno, orientado por um homem grande, ajudaria a salvar a Espanha para a Espanha, para a Europa, para o Mundo e para a liberdade.
A recusa de Portugal caiu como bomba na Comissão de Londres e desmantelou o tenebroso plano diplomático, graças à lucidez e integridade de um governante. E

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quando as forjas do mal arrastaram o Mundo para o bloqueio diplomático e económico da Espanha, destinado a estrangulá-la o a puni-la por ter lutado pela sua liberdade e pela liberdade da Europa, este país não receou ver-se isolado, com a Argentina, mantendo o seu embaixador e desafrontando da injúria e da ingratidão a grande e nobre Espanha.
Quando as náquinas de guerra rondavam sinistramente as fronteiras a Espanha e de Portugal de aquém e de além-mar, ameaçando uma neutralidade que era simultaneamente direito e dever, até porque a ninguém prejudicava e a todos servia. Portugal e Espanha uniram-se fraternalmente, decididamente, para defenderem a sua segurança e a sua paz, não egoísticamente, mas em proveito de todo?. E a noite, que descera sobre a Europa, foi detida nos Pirenéus.
Do lado de lá não se apagou a luz da humanidade. Este canto do planeta transformou-se num oásis de paz, defendido dos ciclones de violência, fogo e sangue. Serviu de refúgio aos foragidos e perseguidos, a todos, sem curar de convicções políticas ou religiosas.
Quando a Perra era planeta beligerante, açougue de gerações de juventude e cemitério de nações e de civilizações, aqui mantinha-se fidelidade aos valores da vida e construía-se o futuro no trabalho. E, chegado o momento de poder contribuir, com riscos embora, para acelerar o advento da paz e reduzir o número de vítimas a sacrificar, facultou-se a actualização das bases dos Açores.
Sr. Presidente: Com o cessar das hostilidades não acabava o terror. O império de todas as Rússias constituía um pesadelo para todos os povos livres, e muito particularmente pira os da Europa Ocidental. E foi aqui, à beira do Atlântico português, que se lançou, tão modesta como lucidamente, a ideia da N. A. T. O., mais tarde apostolizada por Churchill, apoiada pela América e concretizada peles povos livres mais directamente ameaçados numa das horas mais negras da angústia europeia.
No momento em que a cobardia de uns, a deslealdade de outros e a cumplicidade de terceiros fizeram ou consentiram no escândalo do assalto a Goa ... um espinho se cravou no coração dos Portugueses. Goa é hoje uma base antiocidental, ... mas continua no coração de todos e, muito especialmente, no daquele que foi, em quarenta anos, o primeiro resistente e o primeiro combatente. «A questão de Goa não acabou, começou agora», declarou então. Defendeu a Pátria, não por ter pegado em armas, nem só por ser possibilitado a reorganização das forças armadas de turra, mar e ar, nem apenas por ter ordenado «... para Angola, depressa e em força», quando a Nação parecia titubear de atordoada com o golpe inimigo. Mas por ter consagrado à Nação, e totalmente, a vida inteira. E o amor a Pátria, como lembrava Ribeiro Sanches, no século XVIII, «não consiste em perder a vida por ela, atacando um corsário ou subindo por uma brecha; a glória que redunda «lestas acções recompensa bem o perigo; este amor consiste em ser útil e em aumentar por todos os meios a sua conservação e a sua grandeza: ama a sua pátria aquele que, podendo comprar um vestido de pano da Inglaterra o manda fazer de pano da Covilhã».
Sr. Presidente: Faz bem recordar estas palavras quando alguns tentam reduzir a Pátria a uma abstracção ou pieguice, fantasia ou capricho ... e ousam sentá-la no banco dos réus, como responsável pelas guerras, sugerindo-se até o extermínio das pátrias para acabar com as guerras de extermínio. As guerras, porém, não nascem das fronteiras, mas no coração e no cérebro dos homens. Quando estes confundem direito com egoísmo, justiça com força, moral com situação verdade com ideologia e ideologia com divindade, a paz convertesse num impossível.
Quando as ingratidões e as ambições e os imperialismos ideológicos e económicos, etiquetados de humanitarismo, desencadearam a violência em nossa casa, a voz de um homem falou pela humanidade, um português pelos Portugueses. E poucas vezes um homem teve mais razão a seu lado. E nunca um português interpretou mais autenticamente os sentimentos dos seus concidadãos. E a juventude tomou posições nas fronteiras e encetou o combate pela defesa de vidas, segurança, trabalho e liberdade de todos os cidadãos de todas as províncias. E com a serenidade e firmeza, decisão e dignidade, que o mundo se vai habituando a respeitar e admirar, como glória de Portugal e serviço da humanidade! E tão solícito foi quem a convocou, em defendê-la do inútil sacrifício da intervenção na Segunda Guerra Mundial, como decidido em chamá-la às armas, entregando-lhe a honra e o futuro da comunidade.
Sr. Presidente: Não foram menos admiráveis as mães portuguesas. Tão grande foi a sua gratidão ao vigilante e indefeso defensor da paz, com a sua generosidade ... na oferta do sacrifício, sangue e vida dos filhos ao futuro do País. Há muito tínhamos ouvido, todos, que «a educação deve integrar a juventude no amor da Pátria, da disciplina, dos exercícios vigorosos que a preparem e disponham para uma actividade fecunda, e para tudo quanto possa exigir dela a honra e o interesse nacional».
Este longínquo e quase profético apelo não caiu no vácuo. Foi ele, aliás, oportunamente repetido, quase à maneira de uma pedagogia: «O sistema educativo tem de ser dominado pelos princípios do dever moral, da liberdade civil e da fraternidade humana.» E assim se cumpriu um programa, na fidelidade a uma directiva nacional: «Marcar no Mundo uma posição, sem afrontar ninguém.»
Sempre que c fizemos, defendemo-nos e servimos a civilização. Sempre que abdicámos, entregámo-nos à discrição dos outros, só em proveito das forças do mal ou dos inimigos da nossa paz e prosperidade. Estou a pensar na Guerra dos Cem Anos e no Cisma do Ocidente, numa Europa dividida política e religiosamente, num continente degradado e numa Igreja achincalhada, numa Europa e numa Igreja cercadas económica, política, religiosa e militarmente. Portugal não se deixou enredar nestas quezílias continentais, que só podiam conduzir à catástrofe. Fiel à fé, a si mesmo e à Europa, salta a Ceuta e circunda a África, fazendo passar a Europa de sitiada a sitiante. E o fatalismo muçulmano não cilindrou as jovens nacionalidades europeias, onde fermentava a civilização moderna.
Penso ainda no século XVI, quando as nações da Europa eram teatros sangrentos de intermináveis e devastadoras guerras civis e religiosas, quando a Igreja ficou reduzida quase só a Portugal, Espanha e Itália numa Europa eufòricamente reformista. Nas duas Penínsulas - Itálica e Ibérica - se defendeu a doutrina e, com ela, a paz. E nelas se firmou a Igreja para recuperar a sua catolicidade de direito e de facto, geográfica e humana, reconquistando posições na Europa e expandindo-se nos outros continentes.
Também a história da Europa e do Mundo, nos últimos quarenta anos, recebeu algo de Portugal e não se projectou no tempo sem a assinatura do povo português e a sombra do grande timoneiro da Nação. E quando as nações europeias retiravam, entregando os Africanos a um dos mais lancinantes dramas da História, vítimas de uma impreparação e de ambições e de invasões, Portugal olhou só para a sua consciência e a sua responsabilidade ... e ficou, desacompanhado e hostilizado. Mais que para defender o seu direito e populações, para servir a Europa e a civilização.

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Sr. Presidente: Não há homens perfeitos nem obras acabadas numa sociedade em evolução acelerada. Do facto teve o grande timoneiro noção muito clara. Numa das suas últimas declarações, lamentava-se de não ter podido fazer mais, apesar de recordista mundial da continuidade governativa. Como os estadistas do Mundo inteiro sentem o peso da sua dramática limitação para construir a paz e resolver os problemas que a ela conduzem. Mas, todos o sabemos, não há quadros sem algumas sombras, simplesmente o artista, que só descobre as sombras não vê o seu quadro. E os que viram o jovem estadista subir, pela primeira vez. os degraus das escadas do Terreiro do Paço nunca sonharam com tanto e, muito menos, com o «milagre português» dos últimos sinos, preparado nos primeiros e seguintes.
Foi ele quem disse que só Deus sabe quem é grande. Mas Portugal sabe (e nem o Mundo já hoje o duvida) que serviu devotadamente a comunidade nacional e a internacional; que não pregou ódios; que não ateou incêndios, mas se esforçou por apagá-los; nunca pacificista, amou a paz como poucos; nunca demagogo, protestou contra o regresso à selva e respeitou a pessoa humana; isolado para estudar e presente para decidir; incansável no trabalho, os humildes ou vítimas de erros ou de injustiças sempre viram relê um discreto, mas eficaz protector e amigo.
Não se atribuiu o monopólio do amor e do serviço da Pátria. Nem reivindicou o êxito para a sua pessoa, nem mesmo para as equipas governamentais, mas para as estruturas, por cuja falta de adequação às realidades explicava o fracasso de tentativas anteriores, lúcidas, generosas e decididas. Nunca perdeu tempo com duelos de retórica em assembleias nacionais ou internacionais, onde a paixão se sobrepõe à razão. Nunca se exibiu nos palcos tumultuosos da cena política mundial, nunca se afastou muito das fronteiras do País, mas teve sempre os olhos bem abertos sobre o Mundo.
Sr. Presidente: Não faço encómio, mas história. Não esboço sequer um retrato, apenas fixo um apontamento para as linhas de um perfil, deixando o pensador, o prosador e o humanista e não pondo os olhos na pessoa, mas na obra e acção. Não deverei, porém, omitir um traço. Evoco as suas palavras de 1919, quando ameaçado pelos ventos da incompreensão e afrontado nas suas convicções: «Do Seminário nada- digo. Há pessoas que desconhecem que pode haver na alma dos outros coisas inolvidáveis e sagradas que se escondem cuidadosamente dos tolos e maus, porque não podem compreendê-las, nem são capazes de senti-las.»
E sublinhava: «Pobre, filho de pobres, devo àquela casa grande parte da minha educação ...: e, ainda que houvesse perdido a fé em que lá me educaram, não esqueceria nunca aqueles bons padres, a quem devo, além do mais, a minha formarão e disciplina intelectual.» Não esconderei que haverá muita generosidade nestas palavras. Mas elas honram quem as escreveu e espelham nobreza de sentimentos. E com elas sentem-se honrados os que passaram pela mesmo escola, embora sem o seu talent de bien faire. E recordam-nos os serviços dos seminários ao País, ajudando a preparar homens para vários sectores da vida nacional, pois é sabido que nem 10 por cento dos alunos atingem o sacerdócio. E. neste momento, não seria legítimo esquecer as diligências recentes para que o título de entrega do Seminário de Viseu se convertesse de precário em definitivo. Foi esta uma das últimas e nobres intervenções do Presidente Salazar, aliás para se cumprir uma também nobre deliberação da Câmara. Como diocesano, cumpre-me reconhecer e agradecer.
Sr. Presidente: Todos conhecemos a disponibilidade do Presidente Salazar para servir a República. Pensou em todos, mais que nele próprio: «enquanto houver um lar sem tecto ou sem pão, a revolução continua». A melhor homenagem que lhe pode ser prestada, com o aplauso de todos os portugueses, é continuar, intensificar e acelerar os esforços para acabar com lares sem tecto e sem pão. Mas nem se faz mister anotar que não seria possível realizar este sonho de todos os portugueses se todos os portugueses não se dessem as mãos, cada vez mais, sob a égide da Pátria e a orientação do novo Presidente do Conselho.
Que o lugar não ficou vácuo. A um professor sucede outro professor. A um realizador, outro realizador eficaz e dinâmico. A um grande português, outro grande português. Esta colaboração será ainda homenagem, motivo de satisfação e recompensa para o Presidente Salazar. A sucessão ocorreu, como esperei sempre e sem duvidar, à altura do povo português, em elevado nível de civismo e sob o superior critério do Chefe do Estado, figura veneranda, que prestou mais este grande serviço à Nação e há muito e cada vez mais está no coração das gentes lusíadas.
Quanto ao timoneiro destes quarenta anos, Portugal e o Mundo não o perderam. Não partirá, ficará. Entre nós, na Europa e na História.- Deus o guarde e conserve em saúde e alegria, como a Pátria o contempla em gratidão e glória.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Abranches Soveral: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Entre as novidades deste intervalo parlamentar uma há que pelo seu interesse verdadeiramente nacional merece ser costa em destacado relevo.
Refiro-me ao despacho de S. Ex.ª o Sr. Ministro das Comunicações de 2 do corrente mês, que cometeu à TAP o encargo de completar, enfim, uma rede de transportes aéreos de dimensão verdadeiramente nacional.
Há muito tempo que as circunstâncias impunham o ligação aérea, regular e permanente, das regiões do interior metropolitano com a capital, como há já anos vem acontecendo com os restantes territórios nacionais.
Não se compreendia nem se aceitava, nesta era de ultra-sons, que um habitante da Beira ou de qualquer das províncias do Nordeste, utilizando os meios de transporte públicos postos à sua disposição, demorasse mais a percorrer as escassas centenas de quilómetros a que fica Lisboa do que ou portugueses de Luanda e até de Lourenço Marques gastam a transpor os milhares de quilómetros que os separam da capital comum.
Nem se podia conceber, num regime de nacionalismo esclarecido e operante, que qualquer regionalismo absorvente ou inveja descabida minimizasse a mais pobre ou a mais remota parcela do território nacional.

O Sr. Pontífice de Sousa: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faz favor.

O Sr. Pontífice de Sousa: - Queria felicitar V. Ex.ª pela oportunidade da intervenção, que põe em relevo a ligação por via aérea de algumas regiões do interior do País à capital metropolitana, necessidade que se vem sentindo cada dia com mais premência.
Todavia, de forma alguma pode considerar-se completada essa ligação enquanto não for concretamente abrangida pelos transportes aéreos a ligação a Lisboa, e eventualmente a outras cidades, de importantes centros do interior do País cujos condicionalismos económicos e só-

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ciais tornam não só indispensável, como também muito urgente, o serviço de carreiras aéreas com carácter de regularidade desses centros até à capital, principalmente, e vice-versa.

O Orador: - Se V. Ex.ª me tivesse deixado continuar veria que eu iria considerar mais adiante o caso da Covilhã, a que, segundo creio, particularmente desejava referir-se.

Urge, pelo contrário, que todas elas sejam postas inteiramente a par nas vantagens e nas benesses, já que há muito estão equiparadas nos sacrifícios e nos encargos.

Confiantes nesta política, as regiões do interior metropolitano, até agora tão postergadas, vêm aguardando estòicamente a resolução do crucial problema dos seus acessos e ligações cómodas e rápidas com os grandes centros urbanos, problema para o qual, mercê dos acidentes orográficos, não se vê solução prática, a não ser por via aérea.

Foi, por isso, com irreprimível júbilo que tomei conhecimento do despacho do Sr. Ministro das Comunicações, que põe termo ao pesadelo e abre risonhas perspectivas para o futuro daquelas regiões.

Envolvo nesta anotação, todas as regiões da nossa meseta serrana, porque o problema de todas elas ficará, naturalmente resolvido com a solução adequada dos acessos a Viseu, que é, desde todo o sempre, o nó das comunicações do Norte e do Leste continental.

Viseu é a escala, natural de todo o Nordeste: e daí certamente irradiará para as demais cidades e centros urbanos de Entre Chaves e Covilhã o serviço complementar que o tráfego exigir.

Ponto é que o notável despacho proferido seja entendido no seu sentido verdadeiro e profundo - não o reduzindo a um simulacro de progresso ou a superficial verniz de modernismo.

Não; não cremos, nem queremos que este despaceno seja "para inglês ver".

Há que encarar desde já o estabelecimento regular de carreiras servidas por aviões com capacidade para o escoamento do elevado movimento que é fácil prever, e com aquela frequência que o tráfego normal exigirá.

Supomos não dizer nada de novo afirmando que qualquer serviço de transporte publico ou alcança o ritmo necessário ou se malogra completamente.

Felizmente que a orientação e montagem de tais serviços foi confiada à TAP, cuja organização modelar, sempre, visando os altos interesses nacionais, bem merece a gratidão e a confiança de todos nós.

Sinto-mo pessoalmente feliz em ter razão para exaltar aqui a obra do Sr. Ministro das Comunicações, cujo dinamismo e clarividência, nos auguram pronta e feliz resolução dos muitos e candentes problemas do seu Ministério; não quero ser eu a fazer o seu elogio; bastará para tanto chamar a atenção para a sua obra.

Não posso, porém, nesta hora alta, deixar de prestar, nesta Assembleia, pública homenagem ao Sr. Engenheiro Vaz Pinto, ao homem que, quando à frente da TAP, gizou as ideias mestras e orientou o estudo dos pormenores que tornaram possível apresentar ao Governo, com cronométrica precisão, o plano que alcançou agora consagração oficial.

Inteligência lucidíssima, espírito aberto o compreensivo, senso comum raro e, invulgar no nosso meio e acendrado devotamento ao bem público, foram estas qualidades do Sr. Engenheiro Vaz Pinto que o ergueram ao alto posto em que agora continua a servir o País.

Estou certo de que, ao ser tornado realidade o projecto a que deu vida e a que deu forma, S. Ex.ª não permitirá que ele seja deturpado ou reduzido às limitações e pequenezas das aparências ocas, ou melhor, das inutilidades aparatosas.

Não me alongo mais nesta nota para não ferir modéstias, mas não podia dizer menos para não cometer injustiça grave. Nós os Serranos, falamos pouco, por índole, mas sentimos o vivemos sempre quanto dizemos; e se por vezes calamos, com forçada resignação cristã, a justa revindicta a quem nos menospreza, não sabemos regatear gratidão a todos os que nos compreendem.

Creio ter chegado a altura em que os factos: vão evidenciar quanto há anos aqui disse sobre o campo de aviação de Viseu.

Situado no alto da serra de Muna, debruçado sobre a cidade, contínuo à estrada nacional n.º 2, dispõe ele de uma pista asfaltada de 1000 m e de duas pistas terraplenadas e operacionais, uma das quais pode facilmente ser alongada mais um pouco, para atingir os 2500 m de extensão.

Estas pintas, lançadas no dorso de um monte, sem outras cristas sobranceiras que as limitem ou ensombrem, estão varridas do nevoeiro durante todo o ano e podiam constituir campo de. recurso, sempre que Lisboa e Porto se tornassem inacessíveis.

Repetindo o que então disse, direi que não somos tão ricos que possamos abandonar um aeródromo em que há anos se despenderam milhares do contos na previsão de seu aproveitamento milhar.

E a posição central do campo de Muna, em relação quer ao Porto, quer a Lisboa, as magníficas instalações do próprio campo (água, luz, telefone, depósitos de gasolina, hangar, oficinas, escritórios, cómodos acessos, etc.) e os já bem conhecidos recursos hoteleiros da cidade talvez sejam agora chamados a desempenhar as, utilidades que lhes são inerentes e que tão incompreensivelmente têm sido desaproveitadas o ignoradas.

Vou terminar, expressando a S. Ex.ª o Sr. Ministro da Providência e a S. Ex.ª o Sr. Ministro das Comunicações, em nome da Beira, que aqui represento, o nosso entusiasmo, a nossa gratidão e a nossa esperança; e afirmando à TAP a nossa devotada solidariedade e colaboração e a nossa inabalável confiança de que ela saberá honrar a alta missão que lhe foi confiada.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continua em discussão na generalidade o projecto de lei sobre a alteração no artigo 667.º do Código de Processo Penal.

Tem a palavra o Sr. Deputado Colares Pereira.

O Sr. Colares Pereira: - Sr. Presidente: A brilhante intervenção de ontem, aqui nesta mesma tribuna, do Deputado Júlio Envagelista e a entrevista tão altamente esclarecedora concedida pelo Deputado Tito Arantes ao jornal O Século e hoje publicada fizeram tanta luz sobre o nosso projecto com a sua análise, história e comentário que ficou sem cabimento, e decerto sem necessidade esta minha intervenção.

Na verdade, este assunto da reformatio in pejus, que era hermético só para os profanos, em matéria jurídica, tornou-se facílimo de entender para todos, e que são a maio-

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ria, depois destas duas intervenções, destinadas a públicos diferentes.

Todos conhecem agora o alcance prático e imediato da matéria em discussão: tornar impossível ou proibida, no campo penal, que o réu, quando só ele recorre, ou até, quando o próprio Ministério Público o faz a seu favor, ambos a desejar, como é óbvio, ver diminuída a gravidade da pena aplicada, sofrerá o agravamento da pena de que recorria.

Essa possibilidade advinha do assento do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de Maio de 1950, devido à existência do artigo 667.º do Código de Processo Penal com a actual redacção.

Ora, é exactamente que ele tenha nova redacção o fim a que pretende chegar o nosso projecto em discussão. A Câmara Corporativa estudou-o e sobre ele emitiu um parecer a todos os títulos notável, examinando-o sob todos os aspectos e dando-lhe, finalmente, uma aprovação na generalidade que muito nos honra, aos que subscreveram o projecto.

Pequenas discrepâncias ou pormenores ficarão para ser apreciados quando da discussão na especialidade. Em nosso entender, a Assembleia Nacional, com a discussão deste projecto de lei, mostra ao País, mais uma vez, o seu interesse de sempre pela concretização de um anseio e chamou a si a possibilidade de realização - que, aliás, a ela e só a ela era possível - de alterar um artigo do Código de Processo Penal.

Alterando-o, viria permitir que recebesse mais justiça quem confiadamente a pedisse, sem o perigo de receber, ao contrário, trazida por suas próprias mãos, uma injustiça maior.

Era assim muita vez possível na reformatio in pejus, mas deixará de o ser com a aprovação do novo projecto, já tão exaustivo e judiciosamente demonstrado e esclarecido, se for modificado o artigo do Código de Processo Penal como se pretende.

Sr. Presidente: Não quis deixar de vir aqui a esta tribuna, porque entendi ser um dever proferir estas breves palavras, para que se não visse na minha ausência - signatário que fui do projecto em discussão - um desinteresse, quando, sinceramente e daqui o afirmo, era só uma quentão de bom senso.

Creiam, pois, que eu não tenho a falsa modéstia de me julgar incapaz de fazer uma intervenção mais longa, nem tão-pouco me atinge o feio pecado da preguiça, impedindo-me que o fizesse - o que eu tenho, Sr. Presidente, é muito viva e segura e absoluta certeza de que seria estultícia da minha parte tentar trazer algo de novo em explicação, fundamentação ou comentário, nesta discussão ainda na generalidade, ao que já sabem, por ouvir ou ler, o que pretende.

Sr. Presidente: Nilo quero tomar o tempo a quem dele tanto precisa, nem quero, tão-pouco, chamar a mim a ingrata tarefa de arrombar uma porta aberta.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Não tendo sido levantada durante a discussão na generalidade qualquer questão prévia, nada há a objectar à aprovação do projecto de lei na generalidade. Considero-o, portanto, aprovado na generalidade e passamos à discussão na especialidade.

Srs. Deputados: Foi apresentada na Mesa uma proposta de substituição que tanto pode entender-se de substituição ao projecto de lei inicial como ao texto sugerido pela Câmara Corporativa. Entendo, porém, que é de substituição ao texto do projecto de lei inicial, uma vez que não foi requerida a votação segundo o texto sugerido pela Câmara Corporativa, muito embora a proposta de substituição siga muito de perto o texto da Câmara Corporativa.

Vai ser lida a proposta de substituição.

Foi lida. É a seguinte:

Projecto de lei

ARTIGO 1.°

A disposição do artigo 667.º do Código de Processo Penal passa a ter a redacção seguinte:

Art. 667.º Quando de uma sentença ou acórdão seja interposto recurso ordinário somente pelo réu, pelo Ministério Público no exclusivo interesse da defesa, ou pelo réu e pelo Ministério Público nesse exclusivo interesse, o tribunal superior não pode, em prejuízo de qualquer dos arguidos, ainda que não recorrente.

1.º Aplicar pena que, pela espécie ou pela medida, deva considerar-se mais grave do que a constante da decisão recorrida;

2.º Revogar o benefício da suspensão da execução da pena ou o da sua substituição por pena menos grave;

3.º Aplicar qualquer pena acessória, não constante da decisão recorrida, fora dos casos em que a lei impõe essa aplicação;

4.º Modificar, de qualquer modo, a pena aplicada pela decisão recorrida.

§ 1.º A proibição estabelecida neste artigo não tem lugar:

1.º Quando o tribunal superior qualificar diversamente os factos, nos termos dos artigos 447.º e 448.°, quer a qualificação respeite à incriminação, quer a circunstâncias modificativas da pena:

2.º Quando o representante do Ministério Público junto do tribunal superior se pronunciar, no visto inicial do processo, no sentido de que deve ser agravada a pena, aduzindo logo os fundamentos do seu parecer.

Neste caso, serão notificados os réus, entregando-se-lhes cópia do parecer, para resposta no prazo de oito dias.

§ 2.° Quando o representante do Ministério Público junto da Relação ou o assistente se tenham conformado com a condenação imposta na 1.ª instância, não poderão pedir, em recurso que interponham para o Supremo Tribunal de Justiça, uma agravação daquela condenação, salvo quando for caso de qualificação diversa dos factos, nos termos do n.º 1.º do § 1.º

ARTIGO 2.°

O regime estabelecido no artigo 1.º aplica-se ao julgamento dos recursos pendentes.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 8 de Janeiro de 1969. - Os Deputados: Júlio Alberto da Costa Envagelista - Manuel Colares Pereira - Tito de Castelo Branco Arantes - António Furtado dos Santos.

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O Sr. Presidente: - Vou pôr em discussão o texto do projecto de lei juntamente com a proposta de substituição a que acabei de fazer referência e que foi lida.

Vai ler-se o texto do projecto de lei.

Foi lido. É o seguinte:

ARTIGO ÚNICO

A disposição do artigo 667.° do Código de Processo Penal passa a ter a redacção seguinte:

Art. 667.° Quando de uma sentença ou acórdão seja interposto recurso somente pela defesa ou pelo Ministério Público no exclusivo interesse da defesa, o tribunal não poderá modificar a decisão recorrida em prejuízo do arguido ou arguidos, quer aplicando pena mais grave, pela espécie ou pela medida, quer revogando o benefício da suspensão da execução da pena ou o da substituição de uma pena mais grave por outra menos grave.

§ único. O disposto neste artigo não é aplicável:

1.º Quando o tribunal alterar o título da incriminação constante da decisão recorrida dentro dos limites estabelecidos nos artigos 447.° e 448.º;

2.° Quando, em recurso extraordinário de revisão, a decisão final revista tiver sido condenatória e a proferida no juízo de revisão também o deva ser, nos termos do artigo 691.°;

3.° Quando a acusação tenha interposto recurso subordinado.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão.

O Sr. Pinto de Mesquita: - Antes de mais, Sr. Presidente, apresento a V. Ex.ª os meus cumprimentos por o ver na presidência dos trabalhos, juntando a estes cumprimentos os desejos e votos de que S. Ex.ª o Sr. Prof. Doutor Mário de Figueiredo se recomponha rapidamente da sua abalada saúde, para que, sem desprimor para V. Ex.ª, breve o vejamos de novo presidir aos trabalhos desta Assembleia.

O Sr. Presidente: - Isso, unanimemente, desejámos todos aqui na sessão de ontem.

O Orador: - Cumpre-me agora dizer o que penso sobre o assunto em discussão. Isto pela responsabilidade mental do jurista que nos esforçámos por ter sido no passado, e de que hoje nos temos como in partibus.

O que a propósito se me oferece considerar tanto cabe na generalidade como na especialidade do projecto: quero expressar apenas a minha discordância quanto à sua discussão nesta altura. Não se trata, aliás, de opinião assente de discordância de fundo. Eu não quero adiantar-me e discutir prolongadamente os prós e os contras, e são de peso de parte a parte, pelos quais em 1950 os conselheiros do Supremo, por uma maioria de três ou quatro contra um, decidiram, conforme o assento cuja revogação se visa através da pretendida reforma do artigo 667.° do Código de Processo Penal.

Não é propriamente sobre a questão de fundo que me pronuncio. Pretende-se sobretudo dar um achega humanitária pro reo, ultrapassando o rigorismo porventura excessivo do assento inspirado, sobretudo por motivos do interesse público, bem ou mal entendido. Reservando-me quanto à apreciação do fundo, eu não votarei a favor do diploma em discussão pela seguinte questão prévia de inoportunidade: o ser uma coisa sempre ingrata e promotora da proliferação da legislação extravagante o estar a legislar-se por remendos, pequenas alterações ou apostilas sobre diplomas da extensão e da gravidade que têm os códigos essenciais, seja neste caso o Código de Processo Penal.

Sabe-se, aliás, que está em curso um projecto já adiantado de um novo Código Penal. Porque não esperar por esse novo Código e subsequente adjectivo diploma de processo? Não será essa a altura em que melhor cabimento terá a apreciação dos estudos consignados, quer na exposição que precede o projecto de lei, quer no exaustivo parecer da Câmara Corporativa, quer ainda nos discursos aqui proferidos e na entrevista ontem concedida a O Século pelo Sr. Deputado Tito Arantes? É que me parece que todos estes elementos não estão neste momento plenamente estudados para o efeito futuro, sobretudo tendo em vista o conjunto sistemático que constitui sempre diploma como o Código de Processo Penal.

Por outro lado, não há dúvida nenhuma de que está em causa, de certa maneira, o poder do Supremo como órgão que tem a faculdade de elaborar assentos que passam a funcionar de lei. Ora, parece-me que não há outra maneira de revogar assentos que não seja pela via legislativa, porque a faculdade da sua auto-revogação pelo próprio Supremo foi suprimida na última reforma do processo. Nessas condições, parece-me que não se apresenta contudo propriamente um motivo determinante por gravidade aguda e urgente para aceitarmos a revogação do assento. O que me parece é que, neste caso, todos os referidos elementos de estudo merecerão vir a ser considerados na elaboração do futuro Código de Processo Penal.

Aliás, a Câmara Corporativa, como acabo de ler precisamente nos jornais de hoje, tem entre mãos um parecer sobre um projecto de reforma do processo penal para ser considerado em largo diploma.

Quanto a esta matéria, formulo o voto de que na futura reforma, quer do Código Penal, quer da subsequente reforma do Código de Processo, se não proceda, quanto a esta Assembleia, como sucedeu em relação ao Código Civil, e que pelo menos quanto a um certo número de bases essenciais, elas não deixem de ser homologadas por esta Assembleia, tal como se observou aquando da aprovação do Código Administrativo. Esse o meu voto, que penso estar também no ânimo dos juristas aqui presentes e até da generalidade dos Srs. Deputados que me escutam.

Quero ainda salientar que nesta minha tomada de posição suspensiva quanto à oportunidade do projecto não deixa de pesar, embora neste caso só coadjuvantemente, o respeito que me merece a jurisprudência, mormente quando consagrada pela autoridade dos assentos.

Na minha formação jurídica, o estreito legalismo o considerei sempre merecer ser temperado pelo jurisprudencialismo elaborado progressivamente frente à pressão das realidades e necessidades da vida social.

Como não recordar que sob a vigência centenária do Código de Seabra, elaborado sob o signo do individualismo então reinante, o que de social não foi possível à jurisprudência ir consagrando no nosso direito! Nada menos do que, por exemplo, as figuras jurídicas do "abuso de direito", do "enriquecimento sem causa", da "imprevisão"!

Estes e outros conceitos de direito consagrados pela jurisprudência do tempo, dentro do referido Código, acham-se consolidadamente regulados, e ainda bem, no vigente Código Civil.

Duvido, porém, que, à face do rigoroso espírito de positivismo normativo deste último, o problema de elaboração jurisprudencial venha a poder realizar-se, de futuro, com

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a flexibilidade proveitosa que vimos ter-se verificado dentro da vigência do anterior. Face a essa flexibilidade com que sobretudo o artigo 16.º do anterior Código Condescendia, nos termos estritos estabelecidos nos artigos preliminares do actual Código relativos às fontes de direito e à interpretação auguram-se como tendentes sobremodo ao fixismo jurídico.

Tal orientação rigorista já se antevia desde a reforma de 1928 do processo, primeiro ao substituir-se o conceito amplo de infracção do direito, para autorizar a revista, pelo conceito restrito de lei violada. Isto não obstante se dar ao Supremo autoridade para proferir assentos. A recente reforma do processo neste ponto, dando fixidez de lei a tais assentos, ainda veio jogar no mesmo sentido de fixidez, assimilando a vigência dos assentos à das leis.

Em resumo, para fechar: embora se consigne na lei ser função primacial do Supremo a uniformização da jurisprudência, pelo que deixámos dito e muito mais que houvera de se dizer, somos levados, à face da legislação vigente, a futurar antes maiores dificuldades para a elaboração de jurisprudências criadoras, tais como as que apontámos na vigência de anteriores diplomas.

Parece que, assaz., justifiquei já as razões da minha atitude perante o projecto a votar.

Disse.

O Sr. Presidente: - Antes de prosseguir a discussão quero prestar um esclarecimento. Eu tinha dito que não havia qualquer questão prévia que obstasse à aprovação do projecto de lei na generalidade. O Sr. Deputado Pinto de Mesquita disse que a sua discordância não vinha de uma questão de fundo, mas de uma questão prévia, que largamente expôs. Não se trata, porém, de uma questão prévia propriamente, dita, no sentido regimental do termo, que teria, de ser posta durante o debate na generalidade. Trata-se de um aspecto que deseja focar antes de examinar a fundo a especialidade. É nestes termos que entendi a sua intervenção.

Continuam em discussão.

O Sr. Tito Arantes: - Sr. Presidente o Srs. Deputados: Não me parece, salvo o devido respeito, que as considerações muito doutas do Sr. Deputado Pinto de Mesquita tenham razão de ser. Se bem ouvi, são dois os principais argumentos por ele aduzidos. O primeiro é que esta Câmara não deve legislar por retalhos, isto é, fazer pequenas emendas a códigos ou diplomas legais vigentes. O outro é que não é oportuna a intervenção da Assembleia, porque está mais ou menos à vista a reforma do Código Penal, e a essa se seguirá a do Código do Processo Penal.
Então seria o momento para nessa altura se tratar das questões do projecto de lei.

Quanto ao primeiro ponto, direi que há uma coisa que está realmente já reconhecida, que é, não direi a incapacidade, mas a não conveniência de uma assembleia como esta ou qualquer outra, por mais ilustres que sejam os seus componentes, legislar largamente em códigos, em textos longos, porque, realmente, pela sua preparação, pelo seu próprio modo de funcionar, isso não resulta, e nós sabemos que todos os grandes diplomas jurídicos que se publicam no País são-no através de decretos-leis ou de decretos, e não através de votação nesta Assembleia.

O Sr. Pinto de Mesquita: - Muito bem!

O Orador: - Se, quando há uma disposição que nos parece realmente pouco consentânea com as realidades fôssemos coarctar à Assembleia nesse momento a possibilidade de intervir, porque se tratada de um caso isolado, nós realmente estávamos a abdicar em absoluto de uma das regalias que temos e procuramos conservar - a de legislador em determinados casos.

Estou a lembrar-me de que não é caso virgem aquele que apresentamos ontem nesta Assembleia, em que se procura modificar um único artigo do Código de Processo Penal. Exactamente, não há muito tempo, o nosso colega Homem Ferreira propôs nesta Assembleia, e foi aprovado, creio que por unanimidade, um projecto de lei que modificou também um único artigo, e até, por coincidência, também do Código de Processo Penal, o da inquirição de testemunhas em audiência de julgamento. Portanto nem sequer inovamos nesta matéria. Já há o precedente aberto, e com menos razão talvez do que a que nos assiste nesta hora.

O segundo ponto da intervenção do Sr. Deputado Pinto de Mesquita é o de que não há oportunidade para estarmos agora a apreciar a questão visto que dentro de algum tempo vai haver uma reforma do Código Penal e depois, certamente do Código do Processo Penal. A isso responderei que, por exemplo, a publicação do novo Código Civil teve mais de vinte anos de gestação. Nada nos assegura, portanto, que o novo Código Penal, de que já têm sido publicados diversos trabalhos, não demore ainda mais cinco ou dez anos antes de ser publicado. Poderá sê-lo também dentro de dois ou três anos, mas sem garantia. E, não havendo garantia da breve entrada em vigor do novo Código Penal, muito menos a haverá relativamente ao Código de Procedo Penal. Ora, se a Câmara se convencer - e creio que este Convencimento é fácil, não digo já pela fundamentação do nosso projecto de lei, mas até pelo que, foi exposto pela Câmara Corporativa no seu exaustivo parecer -, de que, quanto ao fundo, o nosso projecto de lei é inteiramente moral e conveniente para a distribuição da justiça, eu creio, uma vez que é neste momento que se oferece o ensejo para isso, que temos imediatamente de resolver os males e as injustiças que procuramos remediar, sem ficar à espera três, cinco ou dez anos, ou o tempo que fer, pela reforma do Código de Processo Penal. A nossa intervenção vai desde já resolver um caso quo realmente carece de ser resolvido. Não vejo que haja vantagem, por qualquer prurido formalistico, em cruzar os braços e deixar que se pratiquem todas as injustiças que se estão praticando, na esperança de que um dia venha um Código Penal e depois um Código do Processo Penal para resolver o problema.

Sem ter entrado no fundo da questão, acho que as razões pelas quais o Sr. Deputado Pinto de Mesquita nos declara que não dará o seu voto à aprovação deste projecto de lei - o que lamento - não justificam que o projecto de lei em discussão não venha a merecer a aprovação da Assembleia.

O Sr. Júlio Evangelista: - Sr. Presidente: Esclarecidas devidamente as objecções do Sr. Deputado Pinto de Mesquita, pelo Sr. Deputado Tito Arames, talvez seja altura de entrar efectivamente na análise do texto proposto para votação desta Assembleia.

D texto agora proposto afasta-se quer do projecto inicial, quer do texto sugerido pela Câmara Corporativa. Recolhe, porém, aquilo que se afigura melhor numa e noutra.

Vejamos, com algum detalhe, o que foi aproveitado e o que foi rejeitado dessas duas redacções anteriores quanto ao corpo do artigo 667.°:

1. O projecto inicial empreendera a tentativa de delimitar o âmbito da proibição através de uma enumeração taxativa "... modificar a decisão recorrida em prejuízo do arguido ou arguidos, quer aplicando pena mais grave,

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pela espécie ou pela medida, quer revogando o benefício da suspensão da execução da pena ou da substituição de uma pena mais grave por outra menos grave."

Ao invés, a Câmara Corporativa preferiu uma formulação genérica para delimitar o âmbito da proibição: "... modificar a pena em prejuízo do recorrente ou dos co-réus cuja situação tenha de apreciar."

O caminho agora seguida é diferente de qualquer dos anteriores. Reconheceu-se que a enumeração taxativa encerra perigos, e, por isso o n.º 4.º do corpo do artigo 667.º do Código de Processo Penal, na redacção que se propõe, contém uma proibição genérica equivalente à sugerida pela Câmara Corporativa: "modificar, de qualquer outro modo, a pena aplicada pela decisão recorrida". No entanto o aceitar-se que uma enumeração taxativa é perigosa não implica desprezar as vantagens de uma enumeração, quando exemplificativa. Esta, na verdade, tem a montagem de afastar desde logo dúvidas sobre todas as hipóteses de que o legislador teve consciência, sem prejuízo da existência de um critério geral para a resolução de outras dúvidas que venham a surgir depois. Por outro lado, a enumeração exemplificativa, quando acompanhe uma formulação genérica, constitui valioso elemento para a interpretação que no futuro venha a fazer-se dessa mesma formulação genérica. O legislador, através de tal enumeração, concretiza desde logo - e, consequentemente, esclarece - o critério geral que estabeleceu, sem que com isso faça perder a esse critério as vantagens da sua generalidade.

Daí o agruparem-se nos três primeiros números do artigo 667.º do Código de Processo Penal, na redacção que se propõe agora todos os casos que se puderam prever, onde se justifica a proibição da reformation in pejus. Que ele deve ser proibido em tais hipóteses resulta quer da fundamentação de projecto inicialmente apresentado na Assembleia Nacional (n.º 6 dessa fundamentação), quer do parecer da Câmara Corporativa (n.ºs 13 e 14).

A estes três números, que contêm uma enumeração exemplificativa acresce o n.º 4, onde se estabeleceu em termos gerais - equivalentes aos propostos pela Câmara Corporativa -, o âmbito da proibição da reformation in pejus.

2. Aceitou-se sugestão da Câmara Corporativa (ef. O n.º 17 do parecer), no sentido de acrescentar o adjectivo "ordinário" ao substantivo "recurso", o que permite eliminar um parágrafo a esclarecer que a proibição de reformation in pejus não se aplica ao recurso extraordinário de revisão.

3. Considerou-se inútil, porém, porque claramente redundante o acrescentamento do adjectivo "final" depois de "sentença ou acórdão", proposto pela Câmara Corporativa (n.º 32 do parecer). Pois, se a proibição se refere a "modificar a pena", como duvidar de que se trata de recurso interposto de sentença ou acórdão final?

4. Indicou-se com maior clareza que em qualquer dos dois textos anteriores que a proibição tem lugar no de ter recorrido o Ministério Público "no exclusivo interesse da defesa" (ef. N.º 1.º do artigo 647.º do Código de Processo Penal), quer ainda no caso de ter recorrido o réu e também o Ministério Público no exclusivo da defesa.

Além da maior clareza obtida, conseguiu-se deste modo poupar o § 2.º do projecto da Câmara Corporativa, que passou a ser inútil, em face da nova redacção do corpo do artigo.

Por outro lado, rejeitou-se a fórmula proposta pela Câmara Corporativa para definir o recurso do Ministério Público, que aqui interessa considerar "em benefício exclusivo do réu". Esta fórmula não é mais perfeita do que a do n.º 1.º do artigo 647.º do Código de Processo Penal "no exclusivo interesse da defesa". É até menos rigorosa, porque o Ministério Público pode recorrer no interesse de um réu diverso do réu recorrente.

Por isso se adoptou, tal como no projecto inicialmente apresentado à Assembleia Nacional, a fórmula "no exclusivo interesse da defesa", que é, aliás, como se acaba de acentuar, a adoptada no Código de Processo Penal (artigo 647.º n.º 1.º), diploma onde o novo texto se destina a ser integrado.

5. A expressão "em prejuízo do recorrente ou dos co-réus cuja situação tenha de apreciar", proposta pela Câmara Corporativa, preferiu-se esta outra mais directa: "em prejuízo de qualquer dos arguidos, ainda que não recorrentes". Deixa-se porém, à Comissão de Legislação e Redacção a liberdade de optar neste ponto entre os termos "arguidos" e "réus".

6. Em suma: o corpo do artigo 667.º, na redacção agora proposta, ficará mais próximo da redacção inicialmente apresentada à Assembleia Nacional, embora sem deixar de ter em conta duas sugestões da Câmara Corporativa, ambas com bastante interesse o acrescentamento do adjectivo "ordinário" ao substantivo "recurso" (para excluir logo do âmbito da proibição o recurso extraordinário de revisão) e a consagração de um critério geral para definir o âmbito de proibição (embora se tenha conjugado este critério geral com uma enumeração exemplificativa, que se reputa útil e sem qualquer inconveniente).

O Sr. Albano de Magalhães: - Sr. Presidente: Acabamos agora de ouvir certas considerações feitas pelo Sr. Deputado Júlio Evangelista a uma análise comparativa entre o texto sugerido pela Câmara Corporativa e aquele que é da autoria do Sr. Deputado Júlio Evangelista e dos demais ilustres Deputados que o subscrevem. Há todavia dois pontos que eu gostaria de ver esclarecidos. Num deles e segundo me pareceu, pretendeu-se uma redacção mais perfeita para o artigo 667.º do projecto apresentado, querendo fazer-se sentir que ele em si era mais preciso, quer na redacção, quer no conteúdo do que aquele que aparece sugerido pela Câmara Corporativa.

Há um ponto, porém em que a não haver uma explicação mais completa e perfeita me parece dever aderir ao texto sugerido pela Câmara Corporativa. Direi porquê. No corpo do artigo 667.º e foi esse um dos pontos focados pelo Sr. Deputado Júlio Evangelista diz-se que parece mais apropriada a expressão "no exclusivo interesse da defesa" do que aquela que aparece usada pela Câmara Corporativa, falando "no benefício exclusivo do réu". Por uma questão de simpatia ou de formação jurídica, adiro mais facilmente, por não julgar satisfatória a explicação dada, ao texto da Câmara Corporativa. A razão é esta: se formos considerar como válida a expressão usada no artigo 667.º do projecto de lei "no exclusivo interesse da defesa", não podemos esquecer - juristas, julgadores ou profissionais do foro - que, quando se fala "no exclusivo interesse da defesa", pode deparar-se-nos esta situação na ordem prática: o Ministério Público interpõe recurso da decisão da instância e pode fazê-lo não apenas no exclusivo interesse da defesa, sem que deixe de ser no interesse da defesa. E pergunto: qual é o espírito que os autores do projecto de lei pretendem dar?

O Sr. Júlio Evangelista: - Se V. Ex.ª me permite, posso esclarecer desde já num pequeno aparte, a dúvida de V. Ex.ª

O orador: - Faça favor.

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O Sr. Júlio Evangelista: - A proibição da reformation in pejus só se verifica na hipótese de o Ministério Público recorrer no exclusivo interesse da defesa. Não podemos limitar a faculdade de o Ministério Público recorrer sempre que entenda não ter sido feita justiça, mas quando ele recorra "no exclusivo interesse da defesa". Nesse caso, proibi-se ao tribunal superior a reformation in pejus. Pois, se o Ministério Público recorreu apenas para defender, porque não proibir que se agrave a sorte dos réus? O adjectivo "exclusivo" é aqui necessário, ou melhor, indispensável.

O Orador: - Salvo o devido, respeito pela pronta explicação dada, não estou ainda satisfeito, porque, na sequência da minha exposição, quero apresentar um caso ao qual gostaria que me respondessem. O Pressuposto é, de facto, esse: só quando se verifica que o recurso é no exclusivo interesse da defesa é que a reformation in pejus se não aplica. Podemos, no domínio da discussão, e sem esquecer que estamos no domínio do direito processual penal - normas legais que na prática se dirigem à interpretação e aplicação por parte dos profissionais do foro, designadamente julgadores e advogados -, encontrar esta situação: sentença condenatória proferida em processo crime em que réu responde por homicídio involuntário causado por acidente de viação. A sentença condenatória, para além de uma pena de prisão, arbitra uma indemnização a favor da família da vítima. O Ministério Público entende, por hipótese, pesada a pena de prisão e, simultaneamente, modesta a indemnização arbitrada. Recorre, pedindo a redução da pena de prisão e o agravamento do montante indemnizatório. Pergunto: este recurso, não feito no exclusivo interesse da defesa, está ou não protegido, atenta a redacção dada ao corpo do artigo 667.º?

Uma segunda observação quero fazer: não me parece de boa técnica legislativa fazer-se uma enumeração, mesmo exemplificativa, de alguns casos, tanto mais que se propõe um n.º 4 que os abarca a todos. Parece-me, pois, serem desnecessários os três primeiros números, bastando o n.º 4, para que, integrado com o corpo do artigo, o intérprete, que será necessàriamente um jurista, tenha delimitado o seu campo de aplicação.

O Sr. Júlio Evangelista: - Desejo esclarecer, Sr. Presidente, que os autores do projecto de lei tiveram presente que se trata de uma disposição destinada a integrar-se em diploma mais vasto e que portanto, houve as cautelas indispensáveis para que a contextura e a própria terminologia do texto proposto se enquadrasse tanto quanto possível dentro da terminologia do diploma fundamental em que se vai integrar. E por isso se preferiu a expressão "no exclusivo interesse da defesa", que já tem consagração no Código de Processo Penal, artigo 647.º, n.º 1.º, como aliás, já tinha sido explicado.

E sobre a observação do Sr. Deputado Albano de Magalhães, considerando desnecessários os vários números do corpo do artigo, remeto para o que já antes disse: aliou-se a fórmula exemplificativa (n.ºs 1.º a 3.º) à fórmula genérica (n.º 4.º), dando-se maior segurança futura à interpretação do preceito. Estas cautelas não serão de mais se pensarmos que se está a tratar da liberdade das pessoas.

O Sr. Tito Arantes: - Desejo pedir a V. Ex.ª, Sr. Presidente, um esclarecimento sobre se V. Ex.ª vai fazer a votação separada quanto ao corpo do artigo e quanto aos parágrafos.

O Sr. Presidente: - Isso depende de ser ou não ser requerida a votação por partes do artigo, até porque a questão se suscitou não tem razão de ser neste aspecto: o texto da Câmara Corporativa não está em discussão. O que está em discussão é o texto inicial proposto pelos autores do projecto e a proposta de substituição subscrita pelos mesmos autores. O texto da Câmara Corporativa só pode considerar-se em discussão quando algum Deputado requerer e a Câmara aprovar que a votação incida sobre esse texto.

O Sr. Júlio Evangelista: - Justificarei se V. Ex.ª o permite a restante matéria do texto proposto. E começarei pelo § 1.º do artigo 667.º

Este § 1.º, no seu n.º 1.º coincide inteiramente com o texto proposto pela Câmara Corporativa.

No n.º 2.º, por razões óbvias, exigiu-se que o representante do Ministério Público junto do tribunal superior fundamente o seu parecer no sentido do agravamento da pena. Só assim se evitará que esse parecer assuma a formas, que seria condenável de um visto de chancela no sentido do agravamento. E só assim, também se dá ao réu, que vai responder no prazo de oito dias, verdadeira possibilidade de discutir a opinião do Ministério Público quanto ao agravamento.

Modificou-se também este n.º 2.º em relação ao texto proposto pela Câmara Corporativa, na medida em que, em vez de se dizer "o representante do Ministério Público junto da Relação ou junto do Supremo Tribunal de Justiça nos casos em que o recurso sobe directamente da 1.ª instância a este Tribunal", se passa a dizer apenas, "o representante do Ministério Público junto do Tribunal superior". E parece que baste. Afinal, o razoável é que se trate do representante do Ministério Público junto do tribunal ad quem. Se é interposto recurso para o Supremo Tribunal de Justiça (quer da decisão da Relação, quer, excepcionalmente da decisão da 1.ª instância), não se vê motivo por que o representante do Ministério Público junto do Supremo Tribunal não tenha sempre ao seu dispor a faculdade que se concede aos representantes do mesmo Ministério Público junto das Relações. Isto, sobretudo, se se atender à cautela, agora introduzida, que se traduz na exigência de fundamentar logo o parecer no sentido de que deve ser agravada a pena.

Em suma: este § 1.º, apesar das alterações apontadas, aproxima-se muito mais da sugestão da Câmara Corporativa do que do projecto inicialmente apresentado na Assembleia Nacional. Dá-se pois, quanto a ele, exactamente o inverso do que acontece com a redacção proposta para o corpo do artigo.

Sobre o § 2.º do artigo 667.º direi que ele coincide inteiramente com o § 3.º da redacção proposta pela Câmara Corporativa.

O Sr. Tito Arantes: - Uma vez que não foi requerida a votação por partes, pretendo referir-me ao § 1.º

Este parágrafo tem dois números:

O n.º 1.º limita-se a esclarecer que a reformation in pejus pode ter lugar quando o tribunal superior qualificar diversamente os factos, nos termos dos artigos 447.º e 448.º do Código de Processo Penal.

Na verdade, não podia estar na nossa intenção ir alterar o que se acha disposto em tais artigos.

Quanto no n.º 2.º, a explicação é esta: a introdução no nosso direito processual do princípio que o projecto sanciona poderia levar o Ministério Público a recorrer sempre, por sistema quando o réu interpusesse recurso da decisão condenatória, isto para permitir que o tribunal superior tanto pudesse baixar como agravar a pena decretada.

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Daí, no nosso projecto ter-se previsto a interpretação de recurso subordinado pelo Ministério Público, a fim de sublinhar bem que este não deveria, por sistema, por rotina interpor forçosamente recurso sempre que o réu recorresse mas apenas quando na verdade considerasse que havia fundamento para um recurso subordinado.

No parecer da Câmara Corporativa, porém, sugeriu-se outra solução que tivemos por preferível, e por isso a adoptámos na nossa proposta embora com um ligeiro acrescentamento.

Assim pelo novo preceito em vez de se prever o recurso subordinado no tribunal inferior, estabelece-se antes a faculdade de o Ministério Público junto do tribunal ad quem se pronunciar no sentido do agravamento da pena quando entender que há razões para isso.

Assim se evitou que o Ministério Público, no tribunal inferior interpusesse com frequência os tais recursos subordinados.

Mas também se prescreveu que quando o Ministério Público no tribunal superior, se manifestar no sentido do agravamento da pena terá de logo aduzir os fundamentos do seu parecer cuja cópia será facultada ao réu, a fim de em oito dias responder.

E deste modo se julga ter conciliado os justos interesses da sociedade que tem o dever de punir quando haja violação da lei penal e os não menos justos interesses da defesa.

O Sr. Furtado dos Santos: - Sr. Presidente: Nos termos constitucionais e regimentais, os colegas Júlio Evangelista Colares Pereira e Tito Arantes em 5 de Março de 1968, apresentaram um projecto de lei que visa alterar o artigo 667.º do Código de Processo Penal de molde a proibir a reformation in pejus.

A excelência da articulação do projecto foi solidamente fundamentada pelos seus autores e mereceu o acordo e o aditamento de sugestões no douto parecer da Câmara Corporativa.

A aceitação destas sugestões e a insistência nos aspectos projectados no sentido de evitar dúvidas no entendimento e aplicação do novo regime levaram à formulação e apresentação da proposta ora em discussão.

A proposta significa da parte dos signatários, uma posição de conjugação da excelência projectada ou sugerida recolhendo o equilíbrio de soluções que se pretendeu dar à matéria de tão alto melindre como o do exercício do jus paniculi.

Os graus por que passou o projecto da proibição da reformation in pejus fundaram e vão permitir uma reformation in inclius.

O que está proposto proíbe o princípio da reformation in pejus, afirmando com o equilíbrio o respeito pelas regras e princípios que devem comandar a pureza e a lealdade da luta processual no exercício do Inês punicudi.

As soluções propostas para o artigo 667.º do Código de Processo Penal são em regra o resultado do amplo acordo entre o projecto e o parecer da Câmara Corporativa quanto ao princípio da proibição da reformation in pejus, estabelecido no corpo do preceito com respeito pelo princípio que rege as impugnações no sentido de que tantum prescriptum quantum derolatum.

Os n.ºs 1.º a 4.º do corpo do artigo constavam do projecto e impõem-se para evitar dúvidas quanto ao entendimento da expressão "não pode modificar a pena", constante da sugestão do aludido parecer.

O que consta dos §§ 1.º e 2.º revela a preocupação dos autores do projecto no sentido da mais perfeita e equilibrada solução sugerida pela Câmara Corporativa.

As procedentes razões constantes do dito parecer dispensam a sua repetição que seria inútil por ser do conhecimento de todos.

No primeiro período do n.º 2.º do § 1.º eliminou-se o vocábulo "expressamente" por óbvias razões: o visto inicial do Ministério Público é segundo a lei sob a forma de parecer escrito e o que aqui interessa é que o pedido de agravamento seja acompanhado dos fundamentos.

No segundo período do n.º 2.º do § 1.º propôs-se nova redacção imposta pelos princípios de celeridade, economia e segurança processuais à luz do paralelo preceito contido no n.º 4.º do artigo 690.º do Código de Processo Civil, segundo a redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 47 690 de 11 de Maio de 1967.

Sr. Presidente: Pelo sumariamente exposta, entendo que a proposta conjugando a excelência das sugestões da Câmara Corporativa com a do projecto sobre a proibição da reformation in pejus e respeitando os princípios que regem o exercício do jus punicudi, merece unânime aceitação e votação deste plenário.

A solução proposta respeita ainda os sagrados direitos da defesa permitindo uma luta submetida a regras de pureza e de lealdade que devem dominar a acção penal para o apuramento da inocência ou da culpabilidade e não prejudica o princípio de legalidade que comanda o exercício do jus punicudi.

O regime proposto acompanha as soluções recentes dos países mais evoluídos no campo jurídico-penal como a Alemanha Federal, a França e a Itália.

Segundo ele, não haverá mais condenações-surpresa, nem prejuízo do favor defensionis legalmente conferido aos acusados: num dos pratos da balança da justiça colocar-se-ão os factos e no outro a lei e assim o equilíbrio far-se-á com a solução legalmente justa de cada caso.

A elevada consideração e apreço que a nossa Constituição Política desde 1933 como há mais de uma centúria, concede aos direitos e garantias dos indivíduos sublimam o alto valor desta lei sobre a reformation in pejus, dados os termos sociais e humanos em que está proposta - em garantia da defesa da liberdade e da dignificação do homem e sem prejuízo da disciplina jurídica da ordem social.

Votando a proposta esta mais alta Câmara de representação nacional honra-se a si própria, garantindo os legítimos direitos de cada um e em consequência servindo o direito e com ele a Nação.

Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Continuou em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como mais nenhum Sr. Deputado deseja fazer uso da palavra, vai passar-se à votação.

O Sr. Albano de Magalhães: - Relativamente à votação requeiro a V. Ex.ª que a votação do artigo 667.º e dos seus n.ºs 1.º a 4.º seja feita por números.

O Sr. Presidente: - Defiro o requerimento de V. Ex.ª antes porém desejo insistir no meu esclarecimento de há pouco para que a matéria fique bem compreendida. Quando começou a discussão na especialidade a Câmara tinha perante si três textos: o do projecto de lei inicial, o do parecer da Câmara Corporativa e o da proposta de substituição ao texto inicial. Como não foi requerido que q discussão e votação se fizessem segundo o texto sugerido pela Câmara Corporativa, a partir desse momento

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apenas ficaram dois textos: o texto inicial dos autores do projecto de lei e o texto da proposta de substituição apresentada pelos mesmos autores.

Quer VV. Ex.ª votem o texto inicial dos autores do projecto, quer o texto da proposta de substituição fica ainda para discutir e votar o artigo 2.º da proposta hoje apresentada, artigo que tem cabimento qualquer que seja entre os dois o texto votado.

Nestas condições ponho à votação em primeiro lugar o corpo do artigo 667.º segundo o texto do artigo 1.º da proposta de substituição.

Submetido à votação foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Ponho à votação o n.º 1.º do artigo.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Ponho à votação o n.º 2.º.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Ponho à votação o n.º 3.º.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Ponho à votação o n.º 4.º.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Ponho à votação o § 1.º, que tem dois números.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Ponho à votação o n.º 2.º

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Ponho em discussão o artigo 2.º que, como expliquei teria cabimento mesmo que a votação incidisse sobre o texto inicial.

O Sr. Furtado dos Santos: - Sr. Presidente: O proposto artigo 2.º visa regular transitoriamente a aplicação do novo regime do artigo 1.º já aprovado.

O preceito transitório poderia considerar-se inútil, à luz dos princípios que regulam a aplicação das leis no tempo e que estão consignados no artigo 7.º do Código de Processo Civil e no artigo 6.º do Código Penal.

Porém para obstar a dúvidas na aplicação do novo regime aos recursos pendentes elaborou-se e apresentou-se a proposta ora em discussão que em meu juízo merece unânime aprovação desta Câmara.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como mais nenhum Sr. Deputado deseja fazer uso da palavra, vai votar-se o artigo 2.º.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Fica assim concluída a votação do projecto de lei destinado a substituir o artigo 667.º do Código de Processo Penal, isto é, esgotou-se a ordem do dia marcada para hoje.

Marco sessão para amanhã à hora regimental tendo por ordem do dia a efectivação do aviso prévio do Sr. Deputado Manuel Nazaré sobre o problema da expansão da língua portuguesa em Moçambique.

Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas.

Srs. Deputados que criaram durante a sessão.

Alberto Pacheco Jorge.
Armando Cândido de Medeiros.
Francisco José Roseta Fino.
Gustavo Neto de Miranda.
Hirondino da Paixão Fernandes.
Jerónimo Henriques Jorge.
João Duarte de Oliveira.
José Gonçalves de Araújo Novo.
José de Mira Nunes Mexia.
José Vicente de Abreu.
Júlio Dias das Neves.
Sebastião Alves.
Tito Lívio Maria Feijóo.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Alberto Henriques de Araújo.
António dos Santos Martins Lima.
Artur Águedo de Oliveira.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Aulácio Rodrigues de Almeida.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Gonçalo Castel-Branco da Costa de Sousa Macedo Mesquita.
Horácio Brás da Silva.
João Mendes da Costa Amaral.
José Dias de Araújo Correia.
José Guilherme Rato de Melo e Castro.
José Janeiro Neves.
José Pinheiro da Silva.
José Rocha Calhorda.
José dos Santos Bessa.
Manuel Amorim de Sousa Meneses.
Manuel João Correia.
Manuel José de Almeida Braamcamp Sobral.
Mário de Figueiredo.
Rafael Valadão dos Santos.
Raul Satúrio Pires.
Rui Manuel da Silva Vieira.

O REDACTOR - Luiz de Avilles.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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