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REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 13

ANO DE 1970 22 DE JANEIRO

X LEGISLATURA

SESSÃO N.º 13 DA ASSEMBLEIA NACIONAL

EM 21 DE JANEIRO

Presidente: Exmo. Sr. Carlos Monteiro do Amaral Netto

Secretários: Exmos. Srs.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira
João Bosco Soares Mota Amaral

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta, a sessão às 16 horas.

Antes da ordem do dia. - Foram aprovados os n.ºs 7, 8, 9, 10 e 11 do Diário das Sessões, com uma rectificação do Sr. Deputado Alberto de Meireles quanto ao n.º9.
Deu-se conta do expediente.
Foram lidas na Mesa algumas notas de perguntas do Sr. Deputado Camilo de Mendonça e respectivas respostas do Governo. Foram ainda lidas respostas a notas de perguntas apresentadas por outros Srs. Deputados e lidas na sessão anterior.
Foram entregues ao Sr. Deputado Correia da Cunha, ou elementos por ele requeridos ao Ministério das Obras Públicas na sessão de 10 de Dezembro de 1969.
O Sr. Presidente comunicou os nomes dos Srs. Deputados eleitos para presidentes e secretários das Comissões de Política e Administração-Geral e Local e de Contas Públicas.
Foi recebido na Mesa o Diário do Governo. n.º 11, de 14 do corrente, que insere vários, decretos-lei.
O Sr. Presidente deu conhecimento de ter recebido duas propostas de lei acerca da actividade teatral e da protecção do cinema nacional, as quais iam ser enviadas à Câmara Corporativa e seriam oportunamente remetidas à Comissão de Educação Nacional, Cultura Popular e Interesses Espirituais e Morais.
O Sr. Deputado Camilo de Mendonça apresentou um projecto de lei relativo à representação das actividades nos órgãos consultivos dos Ministérios.
O Sr. Deputado Alarcão e Silva falou sobre o problema dos transportes na linha de Cascais.
O Sr. Deputado Silva Mendes evocou a figura do poeta José Régio, recentemente falecido.
O Sr. Deputado Santos e Castro, manifestou ao Governo a satisfação da população de Torres Vedras pela oficialização do seu estabelecimento de ensino liceal.
O Sr. Deputado Delfino Ribeiro fez considerações sobre problemas da provinda de Macau.
O Sr. Deputado Pio Fernandes sugeriu algumas medidas tendentes à redenção do Estado Português da Índia.

Ordem do dia. - Na primeira parte foram eleitas as Comissões de Negócios Estrangeiros e de Defesa Nacional, as quais foram seguidamente convocadas para elegerem os respectivos presidentes e secretariou, sendo a última convocada também para iniciar o estudo da proposta, de, lei relativa à alteração da Lei do Serviço Militar.
Na segunda parle iniciou-se a discussão na generalidade da proposta de lei acerca do desenvolvimento da regido de turismo da serra da Estrela.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Pontífice de Sousa e Correia das Neves.
O Sr. Presidente convocou a Comissão de Contas Públicas para iniciar o estudo das contas relativas ao ano de 1968.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 19 horas e 15 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Eram 15 horas e 50 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Albano Vaz Pinto Alves.
Alberto Eduardo Nogueira Lobo de Alarcão e Silva.
Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira.
Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.

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Amílcar da Costa Pereira Mesquita.
Amílcar Pereira de Magalhães.
António Bebiano Correia Henriques Carreira.
António Fausto Moura Guedes Correia Magalhães Montenegro.
António Fernando Covas Lima.
António da Fonseca Leal de Oliveira.
António Lopes Quadrado.
António Pereira de Meireles da Rocha Lacerda.
António de Sousa Vadre Castelino e Alvim.
Armando Júlio de Roboredo e Silva.
Armando Valfredo Pires.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Augusto Salazar Leite.
Bento Benoliel Levy.
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.
Carlos Eugênio Magro Ivo.
Carlos Monteiro do Amaral Netto.
D. Custódia Lopes.
Delfim Linhares de Andrade.
Delfino José Rodrigues Ribeiro.
Deodato Chaves de Magalhães Sousa.
Eleutério Gomes de Aguiar.
Fernando Artur de Oliveira Baptista da Silva.
Fernando Augusto de Santos e Castro.
Fernando David Laima.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando do Nascimento de Malafaia Novais.
Filipe José Freire Themudo Barata.
Francisco António da Silva.
Francisco Correia das Neves.
Francisco Esteves Gaspar de Carvalho.
Francisco Manuel de Meneses Falcão.
Francisco de Moncada do Casal-Ribeiro de Carvalho.
Francisco de Nápoles Ferraz de Almeida e Sousa.
Gabriel da Costa Gonçalves.
Gustavo Neto Miranda.
Henrique José Nogueira Rodrigues.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Henrique Veiga de Macedo.
Humberto Cardoso de Carvalho.
James Pinto Bull.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Duarte de Oliveira.
João Lopes da Cruz.
João Manuel Alves.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
João Paulo Dupuich Pinto Castelo Branco.
João Pedro Miller Pinto Lemos Guerra.
João Ruiz de Almeida Garrett.
Joaquim Carvalho Macedo Correia.
Joaquim Germano Pinto Machado Correia da Silva.
Joaquim Jorge Magalhães.
Saraiva da Mota.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Joaquim de Pinho Brandão.
José Coelho de Almeida Cotta.
José da Costa Oliveira.
José Dias de Araújo Correia.
José Gabriel Mendonça Correia da Cunha.
José João Gonçalves de Proença.
José Maria de Castro Salazar.
José Vicente Abreu.
José Vicente Cordeiro Malato Beliz.
Leonardo Augusto Coimbra.
Lopo de Carvalho Cancella de Abreu.
Luís António de 0liveira Ramos.
D. Luzia Neves Pernão Pereira Beija.
Manuel Artur Cotta Agostinho Dias.
Manuel Elias Trigo Pereira.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel de Jesus Silva Mendes.
Manuel Joaquim Montanha Pinto.
Manuel José Archer Homem de Mello.
Manuel Marques da Silva Soares.
Manuel Martins da Cruz.
Manuel Valente Sanches.
D. Maria Raquel Ribeiro.
Maximiliano Isidoro Pio Fernandes.
Olímpio da Conceição Pereira.
Pedro Baessa.
Prabacor Rau.
Rafael Ávila de Azevedo.
Rafael Valadão dos Santos.
Ramiro Ferreira Marques de Queirós.
Raul da Silva e Cunhai Araújo.
Ricardo Horta Júnior.
Rui de Moura Ramos.
D. Sinclética Soares dos Santos Torres.
Teodoro de Sousa Pedro.
Teófilo Lopes Frazão.
Tomás Duarte da Câmara Oliveira Dias.
Vasco Maria de Pereira Pinto Costa Ramos.
Victor Manuel Pires do Aguiar e Silva.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 97 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 16 horas.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Ponho em reclamação os n.ºs 7, 8, 9, 10 e 11 do Diário das Sessões.

Acerca do n.º 9 do Diário das Sessões, que contém o relato do debate na especialidade da proposta de lei de autorização de receitas e despesas parai 1970, os serviços de taquigrafia e redacção exprimiram o seu pesar por não terem podido fazer o registo completo dag intervenções dos Srs. Deputados. O pesar é partilhado pela Mesa, mas creio inteiramente justificada essa impossibilidade, por circunstâncias que já foram expostas à Assembleia.
No entanto, desejaria informar VV. Ex.ªs de que o registo taquigráfico foi feito por um único taquígrafo e representa, como tal, ainda que não esteja completo, um trabalho notável dos serviços de redacção e estenografia e que a Assembleia deveria, em minha opinião, considerar com apreço.
Estão, pois, em reclamação os números do Diário das Sessões mencionados.

O Sr. Alberto de Meireles: - Sr. Presidente: Aderindo embora ao apreço que V. Ex.ª acaba de sublinhar ao trabalho louvável da taquigrafia, requeiro a V. Ex.ª, nos termos regimentais, a rectificação no n.º 9 do Diário das Sessões, quanto ao último período da p. 129, nos seguintes termos: onde se lê: "embora", deverá constar: "e porque"; inserir a expressão "e sobre ela" entre "Câmara Corporativa" e "a Assembleia Nacional".

O Sr. Presidente: - Como mais nenhum Sr. Deputado deseja fazer reclamações, considero aprovados, com as respectivas rectificações solicitadas pelo Sr. Deputado Alberto de Meireles, os n.ºs 7, 8, 9, 10 e 11 do Diário das Sessões.

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Deu-se conta do seguinte

Expediente

Exposições

Cópia de uma exposição enviada ao Ministro da Educação Nacional sobre a situação dos diplomados com o curso de contabilista pólos Institutos Comerciais de Lisboa e Porto colocados como professores provisórios no ensino técnico profissional.
Sobre a situação dos reformados e aposentados.
Sobre os vencimentos dos funcionários administrativos e auxiliares do Instituto de Medicina Legal do Porto.
Cópia de uma exposição reclamando contra demolições de prédios urbanos.
Sobre a situação de reforma de um segundo-sargento da Guarda Fiscal.
Sobre a situação dos escriturários de 2.ª classe das secretarias das escol as do ensino técnico profissional e ciclo preparatório do ensino secundário.
Sobre as taxas camarárias abrangidas pelo Decreto-Lei n.º 49 438.
Sobre a actual legislação do inquilinato.

Cartas

Sobre a situação dos proprietários urbanos do Porto e de Lisboa.
Sobre a criação de uma cooperativa internacional do emigrante português.
Sobre a remição de um foro.
Do Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados já apoiar a intervenção do Sr. Deputado Sá Carneiro em defesa dos direitos dos advogados e arguidos no período da investigação criminal.

Telegramas

De apoio à referida intervenção do Sr. Deputado Sá Carneiro.
Da Câmara Municipal de S. João da Madeira a manifestar pesar por ter sido transferida para a posse de estrangeiros a empresa A. J. Oliveira & Filhos, Lda. Da Cooperativa Florestal das Beiras protestando contra a descida dos preço das madeiras; importa pelas empresas de celulose.

O Sr. Presidente: - Estão na Mesa algumas notas de perguntas e as respectivas respostas do Governo, que vão ser ilidas. Entre as respostas do Governo incluem- -se algumas que foram ontem recebidas na Mesa já quando a sessão estava para encerrar.
Foram lidas. São as seguintes:

Nota de perguntas

Ao abrigo da alínea c) do artigo 11.º do Regimento pergunto ao Governo quando e por que forma pensa fazer acabar a anomalia decorrente da má qualidade do nosso pão relativamente ao de países como a Espanha ou França, quando é certo que dispõem de trigo em grão de qualidade média inferior à daquele que é utilizado entre nós para panificar.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 9 de Dezembro de 1969. - O Deputado, Camilo Lemos de Mendonça.
Resposta do Ministério da Economia à pergunta formulada pelo Sr. Deputado Engenheiro Camilo de Mendonça sobre a qualidade do pão, na sessão de 9 de Dezembro de 1969 da Assembleia Nacional.
Pensa o Governo que a revisão do regime de farinhas e pão que está a preparar trará consigo sensível melhoria da qualidade do pão consumido entre nós.
Sendo intenção do Governo proceder a uma revisão de fundo do actual regime, que ponha termo aos artificialismos que nele se contêm e elimine os incentivos às numerosas fraudes a que tais artificialismos dão lugar, e encontrando-se essa revisão estreitamente ligada a opções a fazer em relação ao regime cerealífero, a vigorar a partir da próxima campanha, e envolvendo aspectos de vasto alcance ligados ao condicionalismo das indústrias de moagem, panificação, massas alimentícias e produtos afins do pão, teve necessidade de realizar estudos e inquéritos necessariamente morosos, alguns já terminados e outros ainda em curso, mas que deverão estar concluídos até final do 1.º trimestre do próximo ano.
As principais linhas e medidas fundamentais a que pensa subordinar o novo regime de farinhas e pão, das quais deverá resultar melhoria sensível da qualidade do pão oferecido ao consumidor, são:

1.ª Elevação das características do pão do tipo mais económico, que presentemente beneficia de apoio oficial, passando a um tipo de qualidade sensivelmente superior à do actual pão de 2a., mas fabricado com farinhas com taxa de extracção superior à da actual farinha de 1.ª;
2.ª Estímulo ao fabrico de novos tipos de pão de qualidade, de preços livres ou simplesmente recomendados, adaptados ao gosto e preferências do consumidor;
3.ª Introdução de um regime de concorrência mais equitativo na produção e comércio de farinhas, eliminando ou, pelo menos, atenuando as distorções que presentemente se verificam na formação dos preços por virtude dos aludidos artificialismos;
4.ª Homogeneização dos lotes- de trigo a fornecer às moagens, de medo a assegurar maior regularidade dos tipos de farinhas e pão, mediante a alteração do sistema de concentração e armazenagem dos trigos;
5.ª Substituição do critério de humidade total pelo da percentagem mínima de matéria seca na determinação do peso do pão para efeitos de fiscalização, de modo a retirar o incentivo à má cozedura;
6.ª Alargamento do número e natureza dos locais onde é permitida a venda de pão ao consumidor, de modo a facilitar a sua aquisição em fresco, reduzidos encargos de distribuição e fomentar a concorrência em qualidade entre os fornecedores;
7.ª Revisão das taxas de panificação e reconsideração da economia da indústria e da forma de operar da mesma, de modo a oferecer-lhe condições de maior eficácia e assegurar uma mais estrita observância das exigências do fabrico e do respeito das normas de qualidade e peso;

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8.ª Intensificação do esforço de formação profissional que está sendo realizado pela indústria de panificação e eventual revisão do sistema de horários de fabrico, de modo a possibilitar um melhor tratamento e fermentação das massas.
Outras medidas complementares a estabelecer no novo regime de farinhas e pão poderão ainda contribuir, mas de forma menos directa, para a melhoria da qualidade do pão. As que se enunciam são, porém, as consideradas mais relevantes para efeito da resposta à pergunta formulada.
O Ministro da Economia, João Augusto Dias Rosas.
Nota de perguntas

Ao abrigo da alínea c) do artigo 11º. do Regimento pergunto ao Governo que medidas tenciona adoptar para:

a) Propiciar energia eléctrica a preços compatíveis à industria, agricultura e população transmontanas:
b) Fazer cessar a desproporção entre os preços praticados na zona transmontana pela Chenop e na região do Alto Douro pela Hidroeléctrica da Serra da Estrela, quando uma e outra constituem a mesma área geográfica;
c) Conceder à região do Nordeste, a exemplo do que ocorre na generalidade dos países, os benefícios directos e indirectos consequentes do aproveitamento, a benefício do País, do seu potencial hidroeléctrico, característico das regiões pobres, e benefícios aliás indiciados na concessão do Douro;
d) Prazo em que poderá esperar-se a efectivação dessa política de justiça e fomento económico-sociais.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 9 de Dezembro de 1969. - O Deputado, Camilo Lemos de Mendonça.

Resposta, do Ministério da Economia à pergunta formulada, pelo Sr. Deputado Engenheiro Camilo de Mendonça sobre problemas de energia eléctrica.
Os problemas postos pelo Sr. Deputado Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça, embora relativos a uma zona do País, enquadram-se no problema geral da distribuição de energia eléctrica a que a Secretaria de Estado da Indústria está, neste momento, dedicando uma especial atenção (grupo de trabalho dai pequena distribuição de energia eléctrica, estudos na Direcção-Geral dos Serviços Eléctricos e no Grémio Nacional dos Industriais de Electricidade).
O grupo de trabalho da pequena distribuição de energia eléctrica foi criado ao abrigo dos despachos de S. Ex.ª o Secretário de Estado da Indústria de 1 de Agosto e de 1 de Setembro do corrente amo. Fundamentam esses despachos o interesse nacional em preparar rapidamente, soluções justas para os actuais problemas da pequena distribuição de energia eléctrica, quer sob os aspectos técnico e financeiro, quer os aspectos legal e administrativo.
O grupo de trabalho iniciou as suas reuniões no dia 23 de Setembro último, tendo já realizado quatro sessões, fim duas das quais se dignou tomar parte S. Ex.ª o Secretario de Estado da Indústria.
No seguimento desta orientação foi mandado estudar o caso de Trás-os-Montes, tendo sido já providenciado no sentido de se estabelecer um mais racional, esquema de abastecimento que permita à concessionária receber energia na proximidade mais conveniente das fortes produtoras.
O Ministro da Economia, João Augusto Dias Rosas.

Nota de perguntas

Circulando boatos insistentes sobre uma eventual revisão do regime de preços dos combustíveis líquidos, nomeadamente, das gasolinas, o que implicaria para esta a substituição parcial de taxas ou diferenciais incluídos no preço de venda por impostos sobre os veiculas; estando prestes a entoar em pleno funcionamento a" novas refinarias de petróleos e fábrica de óleos do Porto; verificando-se, em consequência actual regime de quotas de distribuição, serem algumas companhias forçadas a exportar determinados derivados do petróleo enquanto outras são obrigadas a importar os mesmos derivados; sendo de admitir que o regime de quotas para assegurar a venda de 50 por cento à concessionária venha a ser estabelecido para os óleos; não podendo ignorar-se por desproporcionado, em termos europeus, o preço do fuelóleo, nem o facto de uma só indústria poder absorver quase metade do consumo deste, e tendo presente o grau de generalização do consumo de gás butano pelos lares portugueses, nos termos da alínea c) do artigo 11.º do Regimento, pergunto ao Governo:

1.º Se pensa, dentro de prazo breve, rever a estrutura de preços dos combustíveis líquidos e, particularmente, o regime de preços das gasolinas;
2.º Quais as medidas que tenciona adoptar parai fazer cessar as anomalias e estrangulamentos presentemente verificados na distribua cão de derivados do petróleo em consequência, especialmente, do regime vigente de quotas;
3.º Se pensa combater as distorções de consumo entre os diferentes derivados do petróleo, consequentes tanto da desproporção de preços finais como do sistema de imposições riscais e ainda do regime de distribuição;
4.º De que modo espera poder desonerar as indústrias grandes consumidoras de vapor, especialmente as que trabalham para a exportação, dos encargos resultantes do elevado preço, em termos europeus, do fuelóleo;
5.º Quais as soluções que tenciona adoptar, em matéria de distribuição de óleos, em consequência da aplicação das regras previstas nas condições de concessão;
6.º Como se justificam os preços internos do gás butano relativamente aos praticados em Espanha e quais as medidas que espera adoptar para defesa de tão grande número de consumidores deste gás;
7.º De que modo e com que extensão pretende oferecer aos agricultores e suas associações

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preços de combustíveis compatíveis com as condições de exploração agrícola e convergentes com a política de mecanização.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 15 de Dezembro de 1969. - O Deputado, Camilo Lemos de Mendonça.
Resposta do Ministério da Economia à nata de perguntas do Sr. Deputado Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.
Quanto ao preço dos combustíveis, caberá esclarecer que, por despacho de 23 de Dezembro, enviado paira publicação ao Diário do Governo, foram mantidos, para o 1.º trimestre de 1970, os actualmente em vigor, não se tencionando alterar a estrutura destes preços.
Em relação às restantes questões formuladas, informa-se que si matéria, abrangendo alguns dos pontos focados na "Nota de perguntas", está em estudo, esperando-se para breve poder providenciar a seu respeito.
O Ministro da Economia, João Augusto Dias Rosas.

Nota de perguntas

Após ter cessado a obrigação da mistura bastarda de azeite com outros óleos vegetais; depois de se terem iniciado novas culturas oleaginosas no território português; verificada a existência de diversos subprodutos da nossa agricultura apropriados ao fabrico de óleos alimentareis; registado o peso crescente da importação de sementes oleaginosas de países nossos adversários em oposição "os interesses da economia e política nacionais, e sendo óbvia a necessidade, por um liado, de regular as relações de preços do azeite
com os outros óleos vegetais comestíveis e, por outro, de assegurar o consumo prioritário de todas as fontes de óleos vegetais comestíveis produzidos, nos territórios portuguesas relativamente às sementes ou óleos importados do estrangeiro, assim como de garantir as preços de defesa convenientes das matérias-primas oleaginosas de produção nacional, nos termos da alínea c) do artigo 11.º do Regimento, pergunto ao Governo:

1.º Que medidas espera vir a tomar para assegurar o escoamento prioritário e a preços convenientes:
a) Do azeite virgem e refinado; b) De todos os óleos vegetais comestíveis fabricados a partir de matérias-primas de produção portuguesa;
2.º Que regime tenciona estabelecer para garantir o preço relativo adequado às diferentes matérias-primas de produção continental (grainha de uva, bagaço de azeitona, cártamo, girassol, etc.);
3.º Como explica o elevado preço do óleo de amendoim na venda, ao público relativamente aos preços praticados em Espanha, e os de importação de óleo refinado em vez das sementes correspondentes;
4.º Se admite vir a aplicar taxas sobre os óleos comestíveis originários do estrangeiro (em semente ou já em óleo) e a utilizar o seu produto na bonificação do azeite como ocorre no mercado comum; 5.º Na hipótese afirmativa, qual o valor aproximado dessa taxa para o actual preço de venda- do óleo de amendoim, tendo em atenção o referido no n.º 3.º e a circunstância de o& direitos reguladores de importação serem como os preços de aquisição de amendoim, maiores em Espanha do que em Portugal, e ser maior naquele caso o encargo no transporte com o custo de fabrico.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 15 de Dezembro de 1969. - O Deputado, Camilo Lemos de Mendonça.

Resposta do Ministério da Economia à pergunta formulada, pelo Sr. Deputado Engenheiro Camilo de Mendonça sobre problemas do azeite.
1. Não tem o Governo descurado o escoamento do azeite e óleos vegetais comestíveis fabricados a partir 1 de matérias-primas de produção nacional. As medidas tomadas no decurso dos últimos meses, nomeadamente a cessação ida mistura designada por lotado corrente a partir de 1 de Outubro próximo presente, o novo regime oleícola estabelecido pela Portaria n.º 24 439, de 26 de Novembro de 1969, e a política nela delineada, a que o Governo está a dar execução, constituem prova disso.
Por outro lado, tem asseguradas, através da aquisição pelo- organismo de intervenção de todas as quantidades que lhe sejam oferecidas ao preço de sustentação, a regularização do mercado do azeite, impedindo o aviltamento dos respectivos preços e evitado entregar ao comércio o azeite adquirido enquanto a lavoura, tinha quantidades de algum significado de azeite por escoar.
O regime de preços estabelecidos para o azeite é o da liberdade de preços no produtor, com preços de apoio variáveis segundo a graduação e com margens limites na comercialização. Na portaria que estabelece o regime oleícola para a presente campanha deixaram-se propositadamente livres as margens relativas ao azeite virgem com menos de 0,5º de acidez e organolépticamente puro.
Os elementos de que se dispõe até agora relativas, no consumo de azeite e óleos revelam uma quebra acentuaria da procura de óleo de amendoim importado e um aumento concomitante da procura de azeite, desde que foi abolido o lotado corrente, não fazendo prever dificuldades de escoamento para o azeite.
Aguardam-se, porém, dados relativos a um período mais longo - dada a incerteza que na análise de um período curto pode introduzir ia insegurança dos elementos relativos aos stocks existentes no produtor e no comércio à data da abolição do lotado corrente - para proceder à definição dais medidas precisais a adoptar para assegurar o equilíbrio (aliás extremamente difícil de realizar) entre a oferta e a procura dos vários tipos de azeite e óleos.
2. O regime de preços a estabelecer para as diferentes matérias-primas de produção continental para extracção de óleos não peide deixar de estar em relação com os seus teores em óleo e as preferências manifestadas pelo consumidor por esses óleos, se pretendermos evitar incorrer no risco de criar uma eco-

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norma puramente artificial e sem base económica para a respectiva produção.
Assim, em medidas como a garantia de preços e de aquisição por organismos de intervenção, estes factores não poderão deixar de intervir no estabelecimento de tais preços.
3. Em relação à pergunta n.º 3, o Governo deseja informar a Assembleia de que a política nacional de óleos que está a prosseguir assenta no fomento da produção interna de oleaginosas, por forma a substituir importações por produção nacional dos óleos que melhor se adaptem às preferências do consumidor e às exigências de economicidade, dando prioridade ao consumo das óleos de produção interna.
Para definir alguns aspectos relativos a essa política nomeou o Governo um grupo de trabalho, em cujo mandato se inclui o problema dos preços dos diferentes óleos alimentares.
4. As perguntas n.ºs 4 e 5 referem-se a medidas de política, sobre cuja oportunidade o Governo entende dever manter-se livre, sem se comprometer desde já quanto à sua adopção.
O Ministro da Economia, João Augusto Dias Rosas.
Resposta da Junta Autónoma de Estradas à nota de perguntas do Sr. Deputado Pinto Balsemão:

a) Qual foi o custo da construção da estrada nacional entre Penhas da Saúde-Piornos-Torre-Lagoa Comprida-Seia?
Resposta: A construção da estrada nacional n.º 339, entre Seia e as Penhas da Saúde, com a extensão de cerca de 37 km, importou em 33 250 000$.
b) Em quanto se estimam os custos de manutenção dos limpa-neves necessários para conservar essa estrada aberta à circulação automóvel durante todo o ano?
Resposta: Está neste momento em estudo nesta Junta uma solução completa do problema, que possa já ser posta em prática no próximo Inverno. Embora não se disponha ainda de elementos concretos, podem indicar-se os seguintes valores da ordem de grandeza dos encargos, correspondentes:
Primeiro investimento - 100 000 contos. Encargo anual de funcionamento e manutenção - 1500 contos.

Lisboa, 16 de Janeiro de 1970. - O Presidente, Manuel Duarte Gaspar

Resposta da Secretaria de Estado do Trabalho c Previdência à nota de perguntas do Sr. Deputado Fernando Augusto Santos e Castro acerca do contrato colectivo de trabalho do pessoal da indústria hoteleira do distrito do Funchal.
1.º Em 22 de Maio de 1967 foi feita a primeira reunião com os industriais hoteleiros deste distrito, a fim de lhes ser apresentado o anteprojecto de A. C. T. elaborado pelo Sindicato Nacional das Empregados na Indústria Hoteleira e Profissões Anexas, do Distrito do Funchal.
Apreciado o anteprojecto pelas entidades patronais no decurso daquela reunião e de muitas outras que se lhe seguiram, a última das quais em 15 de Dezembro de 1969, verificou-se, mais uma vez, a falta de entendimento entre o Sindicato e as empresas relativamente aos seguintes pontos:

a) Remunerações:

O Sindicato começou por apresentar uma tabela salarial cujos valores ficavam aquém da realidade em cerca de 15 por cento. As entidades patronais, reconhecendo, embora, a realidade que a tabela expressava, acharam-na inaceitável, pelo que propuseram uma cujos valores eram ainda inferiores aos constantes do C. C. T. vigente em Lisboa desde 22 de Abril de 1963.
Com o propósito de transigir e de se encontrar uma plataforma de entendimento, o Sindicato baixou a tabela salarial que apresentara em cerca de 40 por cento. Deste modo, os salários que viriam a figurar na convenção corresponderiam a cerca de metades daqueles que efectivamente auferem.
Não obstante o exposto e ainda o parecer que a tal respeito foi dado pelo F. D. M. O., o qual é praticamente coincidente com o pedido do Sindicato, as entidades patronais continuam a não aceitar a proposta deste organismo. É de notar, no entanto, que só na reunião de 15 de Dezembro da 1969 é que as empresas apresentaram uma contraproposta, que, sendo ainda bastante inferior ao pedido formulado pelo Sindicato, pelo menos em algumas categorias profissionais, é, porém, um pouco mais avançada do que a feita em Outubro de 1968, que consistia na adopção da tabela salarial do C. C. T. de Lisboa, actualizada em 30 por cento.
b) Previdência:

Do A. C. T. vigente neste distrito desde 15 de Dezembro de 1951 resulta que as contribuições para a Previdência incidem sobre salários reais, quer estes sejam fixos, quer tenham uma parte fixa e outra variável (taxa de serviço).
Com o objectivo de ajudar a indústria hoteleira a debelar a crise por que plissou na década de 1950-1960, foi proferido um despacho ministerial, em 12 de Fevereiro de 1960, pelo qual se permitiu às empresas determinado sistema de incidência e cálculo das contribuições para a Previdência. Em síntese, diz-se naquele despacho o seguinte:
As contribuições para a Previdência e abono de família, no período que decorre entre 1 de Março de 1952 e 6 de Abril de 1955, incidirão sobre os cômputos estabelecidos no A. C. T. de 15 de Dezembro de 1951 e as remunerações reais, depois de deduzidas de 1/6, excluindo-se o valor da alimentação.
A partir de 6 de Abril de 1955, as contribuições paira a Previdência e abono de família incidirão sobre os cômputos estabelecidos no A. G. T., acrescidos de 50 por cento, e as remunerações reais, não se incluindo igualmente o valor da alimentação.
Este despacho destinava-se a vigorar até 31 de Dezembro de 1960.
O sistema criado por teste despacho, que a destinava apenas aos hotéis., respondia ao pedido formulado pelos empresárias e ajustava-se a uma realidade - a crise na indústria hoteleira.

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Aconteceu, porém, que o período de vigência do despacho foi prorrogado até 31 de Dezembro de 1961 e não mais voltou a sê-lo, não obstante novo pedido ter surgido naquela data para que o foste. No entanto, tendo caducado em 31 de Dezembro de 1961, o regime criado pelo despacho de 12 de Fevereiro de 1960, a verdade é que as empresas por ele protegidas (hotéis) continuam a servir-se dele, fazendo tábua rasa do estatuído no A. C. T. de 15 de Dezembro de 1951. Daqui se infere que há um largo volume de contribuições em dívida à Previdência desde 1 de Janeiro de 1962.
Pretende o Sindicato que seja mantido o statu que ante ou, quando muito, que sejam fixados cômputos para os trabalhadores que participam na taxa de serviço desde que estes se aproximem dos salários que efectivamente auferem.
Por sua vez, desejam as empresas que seja afastado o sistema fixado no A. C. T. vigente e que, em sua substituição, sejam estabelecidos cômputos para aqueles trabalhadores. Na contraproposta inicialmente apresentada nos cômputos eram inferiores aos fixados no C. C. T. de Lisboa e na última contraproposta feita na reunião de 15 de Dezembro de 1969 ofereceram os empresários os cômputos do C. C. T. de Lisboa actualizados em 25 por cento. Esta contraproposta é também inaceitável, pois está ainda muito longe de expressar a realidade.
c) Horário de trabalho:

Ponto também divergente até à reunião de 15 de Dezembro de 1969 foi o do horário de trabalho, pois, enquanto o Sindicato pretendia que este fosse de oito horas diárias ou de nove horas e trinta minutos, consoante os trabalhadores não tomassem ou tomassem as refeições nos estabelecimentos hoteleiros, contrapropuseram as empresas nove ou dez horas e trinta minutos.
Resolveram as empresas aceitar a proposta sindical, a qual, de resto, é decalcada nos C. C. T. vigentes no continente.
Sem o acerto destes pontos fundamentais não poderão ser limadas outras arestas menos relevantes contidas na contraproposta das empresas, nomeadamente no que respeita a categorias profissionais, distribuição do horário de trabalho, pagamento de serviços extras, indemnizações por despedimento, etc.
2.º Espera-se que as negociações possam atingir o seu termo dentro ide curto lapso de tempo.
Resposta do Ministério da Economia à nota de perguntas do Sr. Deputado Tomás Duarte da Câmara Oliveira Dias.
Segundo informação da Secretaria de Estado da Indústria:
a) O acidente em causa foi provocado por má instalação e má utilização de um esquentador e por má utilização de um radiador móvel com garrai-a de gás incorporada;
b) No primeiro caso não se seguiram as normas correntes na instalação de esquentadores, o qual deveria ter sido ligado a uma conduta que evacuasse-os gases queimados para o exterior, a menos que no local existisse uma ventilação permanente.
No segundo caso não se seguiram, de igual modo, as normas Aconselhadas, quer pelos fabricantes, quer pelas companhias distribuidoras de gás, que recomendam que a queima seja feita em locais com ventilação permanente quando não seja feita ligação à chaminé;
c) A companhia distribuidora do gás butano utilizado nos dois aparelhos divulga um livro de instruções, para distribuição pelos seus agentes e subagentes em que recomenda as cuidadas a ter na instalação de, entre outra aparelhagem, radiadores, e esquentadores. Nesse mesmo livro está mencionado o dever de os agentes distribuidores darem à clientela todas as indicações de segurança que lhe são enviadas para esse fim pelas próprias companhias;
d) A Direcção-Geral dos Combustíveis não tem até à data exercido qualquer acção de vigilância sobre a forma como os agentes distribuidores aplicam as regras de segurança, cuja divulgação lhes é recomendada pelas respectivas companhias;
e) A Comissão Técnica Portuguesa de Normalização de "Aparelhos domésticos a gás" (CT-86), que funciona junto da Inspecção-Geral dos Produtos Agrícolas e Industriais, e que está a estudar normas de aparelhos domésticos a gás, tem no seu programa de trabalhos o estudo de normas de segurança;
f) No seguimento desse programa, em 27 de Dezembro do ano findo foi publicada a Portaria n.º 24 489, emanada das Secretarias de Estado do Comércio e da Indústria, que tornou obrigatórias as normas portuguesas 407 e 408, tendo precisamente em vista as medidas de segurança possíveis para defesa dos consumidores.
Para conhecimento do Sr. Deputado mandam-se estas normas em anexo.
O Ministro da Economia, João Augusto Dias Rosas.

O Sr. Presidente: - Estão na Mesa os elementos fornecidos pelo Ministério das Obras Públicas em satisfação do requerimento apresentado pelo Sr. Deputado Correia da Cunha na sessão de 10 de Dezembro de 1969. Vão ser entregues àquele Sr. Deputado.
Comunico à Assembleia que a Comissão de Política e Administração Geral e Local elegeu para seu presidente o Sr. Deputado Gonçalves de Proença e para secretário o Sr. Deputado Cotta Dias, e que a Comissão de Contas Públicas elegeu para seu presidente o Sr. Deputado Araújo Correia e para secretário o Sr. Deputado Martins da Cruz.
Comunico ainda à Assembleia que está na Mesa, enviado pela Presidência do Conselho, para cumprimento do disposto do § 3.º do artigo 109.º da Constituição, o Diário do Governo, n.º 11. de 14 do corrente, que insere os seguintes decretos-lei:
N.º 13/70, que insere disposições destinadas a adaptar a orgânica do Governo às exigências de maior celeridade e rendimento da Administração;
N.º 14/70, que permite que se mantenha na Força Aérea, enquanto for necessário e preencher vaga nos seus diversos departamentos, o pessoal do Exército e da Armada, do activo e da reserva, em serviço na mesma Força Aérea em 31 de Dezembro de 1969;

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N.º 15/70, que dá nova redacção a várias disposições do Decreto-Lei n.º 44063, o qual promulga a orgânica dos serviços de registo e do notariado, e substitui a tabela de remunerações do funcionalismo judicial, a que se refere o § 1.º do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 35 977;
N.º 16/70, que permite, com prévia aprovação do Ministro do Ultramar ou do Ministro das Comunicações, conforme o caso, celebrar os acordos especiais de coordenação de serviços para modificar o Convénio de Execução de Serviços, de 22 de Agosto de 1941, e o seu adicional, de 27 de Novembro de 1951, do contrato de concessão celebrado com a Companhia Portuguesa Rádio Marconi.
Estão ainda na Mesa duas propostas de lei acerca da actividade teatral e da protecção do cinema nacional. Vão ser enviadas à Câmara Corporativa para parecer e publicadas no Diário das Sessões. A seu tempo serão remetidas à nossa Comissão de Educação Nacional, Cultura Popular e Interesses Espirituais e Morais.
Tem a palavra para apresentar um projecto de lei o Sr. Deputado Camilo de Mendonça.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Sr. Presidente: Pedi a palavra para apresentar um projecto de lei relativo à representação das actividades nas diversos e múltiplos órgãos consultivos dos Ministérios.
Diz a Constituição que o Estado Português é corporativo, e às vezes parece que é verdade...
Efectivamente temos estado acostumados à existência formal e, na maior parte dos casos, vegetativa de organismos ditos corporativos, geralmente pouco acreditados entre os associados legais ou virtuais, porque igualmente pouco respeitadas pelos órgãos do Estado...
Não vou aqui fazer a história, tantas vezes triste e decepcionante, de uma organização vivendo como tolerada num regime dito corporativo e muito menos fazer o paralelo com a pujança, respeito e efectividade de organismos de natureza idêntica, funcionando sob nomes diferentes e designações diversas, em quase todos os países europeus que se não dizem corporativos...
Por hoje não me embrenharei nessa excursão histórica e geográfica, até porque a presença na chefia do Governo do doutrinador do corporativismo português entreabre esperanças de novos caminhos e de melhores perspectivas...
Por agora ocupar-me-ei de uma questão comezinha, muito concreta e restrita, mas relevante para o correcto funcionamento do sistema, autêntica representatividade, verdadeira participação e permanente renovação.
De facto, a base VI da Lei n.º 2086 - a lei que institui as corporações - dispõe que "os órgãos consultivos do Ministérios serão substituídos, sempre que possível, pelas corporações, às quais se agregarão, para exercício de funções de consulta, representantes dos serviços públicos ou de entidades especializadas", e ainda que "quando não for possível a substituição prevista no número anterior, cabem às corporações designar os representantes das respectivas actividades nos órgãos consultivos dos Ministérios".
A base IV da mesma lei dispõe, por outro lado, e especificadamente, que "os órgãos representativos dos organismos ide coordenação económica serão constituídos, sempre que possível, pelas secções das corporações".
Por seu lado, o § único do artigo 7.º dos Regimentos das Corporações da Lavoura, do Comércio, da Indústria, da Pesca e Conservas e dos Transportes e Turismo, procurando dar aplicação ao referido princípio da base IV dispõe que "quando o Governo o determinar, as secções da corporação passarão a constituir os órgãos representativos dos organismos de coordenação económica".
Não obstante, volvidos quase dezena e meia de anos, não se tornou efectiva nem, a doutrina definida na base VI nem a fixada na base IV ida mesma lei, nem o Governo se dispõe a determinar nada em ordem à consecução do previsto no § único do artigo 7.º dos Regimentos das Corporações...
E tudo continuou como dantes..., não obstante as reclamações e queixumes das corporações, os inconvenientes todos os dias suscitados, as situações incríveis criadas, os paradoxos verificados...
Há, assim, membros dos conselhos dos organismos de coordenação económica que representam (?) há vinte e tantos anos a lavoura por escolha e nomeação do Governo, sem que tenham qualquer função ou presença na mesma lavoura e, consequentemente, na sua organização, que nem lavradoras são, se alguma vez o foram ... Há outros representantes que igualmente titula representam ou ainda, que pudessem representar conduziam a situação idêntica pelo desinteresse, distância e ausência...
Muitas vezes, por morte ou renúncia de algum destes representantes procura-se que o substituto seja escolhido por acordo entre as corporações e a Administração ou até mesmo seja nomeado aquele que a respectiva corporação decida indicar...
Em qualquer caso não existe representação funcional e orgânica, nem unidade de esforços e objectivos entre os diferentes órgãos corporativos e as múltiplas representações.
Uma situação destas é gritante, é manifestamente contrairia, a princípios doutrinários como a objectivos funcionais, é absurda e geradora de profundo mal-estar como de frequentes situações de crise.
A necessidade de o resolver rápida e devidamente dentro dos princípios e de acordo com as realidades parece indiscutível, até porque o princípio da limitação da duração do mandato não pode deixar de ter-se também como essencial.
Dado que disposições legais anteriores e particulares à maior parte dos organismos de coordenação) económica (estatutos orgânicas), bem como muitas outras relativas à representação em diversos órgãos dos Ministérios, não consentem a aplicação directa dos princípios das bases IV e VI da Lei n.º 2086 (número de representantes, regionalização da representação, conselhos técnicos, conselhos de secções, etc.), até porque nem sempre as secções se correspondem entre corporações como destas para os organismos, parece-me preferível, em vez de proceder à revisão de toda esta legislação particular, múltipla, diferenciara e dispersa, legislar especificamente para aplicação daqueles princípios de acordo com as realidades existentes, até porque, sendo esta representação económica ou patronal, as secções das corporações são paritárias - trabalho e produção.
Dentro desta ordem do ideias e com estos objectivos muito concretos e específicos se elaborou o projecto de lei que neste momento apresento, manifestamente para fazer cessar uma incongruência e suprir uma ausência da iniciativa governativa, a quem, de resto, melhor deveria cabear a iniciativa.
O orador foi cumprimentado.

O Sr. Alarcão e Silva: - Sr. Presidente: Têm os órgãos de informação feito eco, neste começo de ano, do mal-estar gerado entre os utilizadores dos transportes da linha de Cascais, pelas alterações introduzidas nos preços de bi-

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lhetes e das assinaturas, bem como nos horários dos comboios, a praticar em 1970.
Ninguém, honestamente, poderá deixar, de reconhecer que a elevação dos custos de transporte, e nomeadamente da sua parcela salarial e encargos sociais, haja de determinar ajustamentos do preço dos serviços prestados, sempre que o acréscimo de produtividade conseguido pela modernização do equipamento e outros factores fique aquém dos referidos agravamentos de custo.
Sendo assim, ter-se-á de aceitar, como única solução económica e financeiramente viável para a empresa, o aumento das tarifas, até mesmo porque, tratando-se de uma empresa privada, não pode recorrer à fonte graciosa do Estado para cobertura dos seus deficits...
Do relatório, balanço e contas da Sociedade Estoril relativo ao ano de 1966 transcreve-se:

As tarifas actuais suportaram apenas um agravamento de 15,5 por cento nos últimos quatro anos. São as mais baixas do País e não são do nosso conhecimento quaisquer tarifas de transportes suburbanos tão baixas como as da linha de Cascais.
Quer isto dizer que toda a receita proveniente do tráfego da linha é inteiramente absorvida pelas despesas de exploração e pelas despesas de 1.º estabelecimento.
Todos os investimentos que fizermos terão de estar amortizados dentro dos dez anos que faltam para o termo do arrendamento.
A fórmula que nos parece mais viável para resolver o problema será a de um ligeiro aumento de tarifas, da ordem dos 25 por cento.

Não se desconhece que qualquer aumento de tarifas, qualquer que seja a sua natureza, provoca certa reacção por parte dos seus utentes.
Haverá que ponderar se a reacção é justa ou não justa. Sabemos que não seria justa a reacção ao aumento de tarifas superiormente solicitado para fazer face ao pesado encargo que temos de suportar devido ao desenvolvimento do tráfego na linha de Cascais e para cobrir o encargo com o necessário aumento de salários do nosso pessoal.
Confiamos, portanto, no justo deferimento do pedido superiormente apresentado e [...] saberemos aplicá-lo na necessária melhoria do serviço público que nos está confiado.
Do relatório, balanço e contas da Sociedade Estoril relativo ao ano imediato (1967) se transcreve:
Não nos foi consentido o aumento de tarifas de 25 por cento que tínhamos previsto. Ficou em 20,5 por cento [...].
Relativamente a 1926, os nossos preços apresentam agora um aumento médio de 29 por cento. Cada vez estão mais distantes dos restantes preços de transporte do País e não conhecemos, em qualquer parte do Mundo preços de transportes ferroviários suburbanos tão baixos como os da linha de Cascais, mesmo tendo em conta a relatividade do custo de vida.
O aumento de tarifas foi-nos superiormente autorizado, após laboriosos e demorados estudos e ensaios atinentes a que esse aumento cobrisse apenas a encomenda de novo material circulante e mais investimentos necessários por causa do crescimento do tráfego de passageiros e melhoria dos vencimentos e reformas dos nossos agentes.
Logo, portanto, que foi concedido o aumento das tarifas, estávamos constituídos ma obrigação de firmar a encomenda do material ferroviário.
E acrescentaremos, nós:

Pena é que essa encomenda tivesse acabado por vir a ser firmada com empresas estrangeiras, desaproveitando a capacidade de trabalho ou não valorizando a necessidade de expansão da indústria nacional, muito embora haja de acordar-se que a diferença dos preços propostos e as mais vantajosas condições de pagamento recomendariam a primeira solução para os interesses da empresa transportadora em causa. Mas pode e deve lamentar-se que, por parte dos responsáveis da gestão da coisa pública como da administração da empresa nacional concorrente, mão houvesse sido possível encontrar soluções que permitissem resolver, a bem da indústria nacional, uma encomenda de 107 000 contos.
Recorrendo ainda ao último relatório publicado - relativo ao exercício de 1968 - se transcreve:
O aumento da receita provém da elevação das tarifas (a já referida de 20,5 por cento em média, que passou a vigorar desde, Outubro de 1967).
Como reconhece o relatório, a receita das passageiros situa-se aquém dos cálculos feitos quando se estudou a tarifa actualmente (entende-se, na altura) praticada, talvez porque, se não haja entrado em linha de conta com a quebra do tráfego que o relatório registou e seria, aliás, fácil de prever.
Pode isto significar - no caso de a rentabilidade dos capitais investidos pela empresa se situar aquém da alcançada no mercado livre, de capitais em condições de risco similares - que a actualização de tarifas se impunha há já alguns anos e não deveria ter sido concentrada praticamente nestes últimos... apenas por recentemente ter encontrado, da parte da administração pública, aquela "luz verde que é sinónimo de "caminho desimpedido" para o progresso das tarifas.
Mas há aumentos... e aumentos, actualizações de tarifas... e actualizações. Algumas processam-se com "conta, peso e medida", outras excedem o que de razoável seria de esperar, principalmente se se tiver em conta o desejo manifestado pelo Governo ainda bem recentemente (proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1970) de que "a política económica, fiscal e orçamental durante o ano de 1970 deve procurar:
b) Contrariar as tendências de subida das preços.
Ora, quer-nos parecer que aumentos da ordem das 80, 100 por cento e mais em algumas assinaturas, como alguns dos agora alcançados, excedem um pouco os habituais de simples actualização de tarifas e assinaturas.
Pena é que tal tenha acontecido por esta forma, não podendo dizer-se que o Ministério das Comunicações, ermo departamento individualizado da administração pública, se despede em beleza na última remodelação ministerial do público lisboeta e "da linha", bem provados que ficaram por alguns, assaz acentuados, agravamentos de tarifas de transportes colectivos na região de Lisboa.
Oxalá que este andar tão apressado se não repita breve e frequentemente, para que se não tenha na linha de Cascais, a curto trecho, "os mais ciaras transportes suburbanas do Mundo". Estes... os votos que formulamos no raiar da década de 70.

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Mas não se limitam apenas a questões de tarifas as reclamações formuladas pelo público utente.
Também os horários - depois que foram conhecidos, e algo tardou ... - parecem ter deixado a desejam. Mas aí a empresa foi mais célebre a propor alteração, e novo horário veio a ser publicado quinze dias depois de o anterior ter entrado em função. Novo se encontra prometido para quando forem recebidas as novas carruagens encomendadas, mas esperamos que, quer um, quer outro, satisfaçam melhor as aspirações da maioria dos utentes do que o do anterior... a avaliar até pela pronta, alteração.
A agravar a situação também o mar entrou de "pregar partida", danificando a "muralha" e uma das vias na martirizada zona da Gibalta.
Os transtornos causados, os contratempos, a frequência com que tais acidentes se repetem em dias de maior maré, já deveriam ter feito conceber uma outra protecção ou perfil para a muralha dita "protectora" da linha de Cascais, no troço da Gibalta. E se, porventura, não o foi feito desta ainda, que se poderá esperar de nova época crítica de marés?
Já agora, para despejar o saco das queixas que chegam de muito lado - a Sociedade Estoril que me desculpe -, desejar-se-ia que com as acrescidas receitas a companhia se abalance a fazer um maior número de passagens subterrâneas entre cais e estações, ou de um lado para o outro da linha, para facilitar o trânsito dos passageiros (e quantos deles são crianças!), sem terem de pagar tributo em holocausto ao progresso.
Por último, uma palavra de justiça é devida à tentativa de atender - tirante preços - às reclamações dos viageiros. de que são exemplo os comunicados e informações da companhia vindos a público nos jornais e outros órgãos de informação.
Ë sistema que desejaríamos ver instaurado em maior grau na terra portuguesa.
O orador foi cumprimentado.

O Sr. Silva Mendes: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há perto de um mês, durante as férias parlamentares, o País recebeu com surpresa a notícia da morte de um dos maiores valores da literatura portuguesa contemporânea - José Régio!
Vivamente emocionado, acompanhei à última morada aquele que em vida mostrou extraordinária envergadura humana e intelectual.
Custa-nos suportar a ideia de que para sempre se afastou do nosso convívio, tão integrado o considerávamos na vida de cada dia e na consolidação das realidades intelectuais do nosso meio.
Foi há mais de trinta anos que entrou na história de Portalegre, como professor do seu Liceu, um homem simples e tímido.
Ali se radicou, apaixonado pelo sortilégio do Alentejo e de uma cidade onde os sentimentos mais puros se casam com a paisagem, onde a história - o passado - se dá as mãos com a poesia.
Aí viveu José Régio, na sua velha casa da Toada de Portalegre, tão caracteristicamente alentejana e de tão subtil encanto - ou não fosse ela a adaptação de um velho convento a habitação -, aí construiu poemas, deu corpo e alma a dramas, riscou romances, tendo como fundo de cenário, no dizer do poeta, os altos ciprestes, que em frente mostram os céus como dedos apontados
de gigantes enterrados...
Da janela do seu quarto de meditação, o seu olhar espraiava-se pelo Alentejo, que convidava o génio às vitórias do pensamento.
Amou o povo na rudeza das suas manifestações humanas e artísticas.
Buscou compreendê-lo e conseguiu-o, ao deixar-se dominar pela arte popular, que tão amorosamente recolheu na sua casa.
E esta foi a sua outra paixão alentejana.
Depressa se fez coleccionador culto, sabedor, consciente, dedicado, respeitador da arte popular, permitindo desta forma que a cidade de Portalegre enriquecesse o seu património artístico com a colecção, que em certa medida, legou à Câmara.
Estaria pouco a propósito, Sr. Presidente e Srs. Deputados, alongar-me neste momento em considerações desta ordem, ainda que reais e válidas da vida do grande poeta, do homem simples e bondoso que se implantara na história da cidade.
O meu desejo é apenas o de evidenciar quanto Portalegre se orgulhou e continuará a orgulhar-se pelos tempos fora de ter sido o abrigo acolhedor de um poeta e de um escritor cuja fama ultrapassou as fronteiras de Portugal! e se projectou na literatura universal do nosso século, porque o seu nome ficou inscrito em letras de ouro nas páginas das grandes literaturas.
E Portalegre sabe reconhecê-lo.

O Sr. Veiga de Macedo: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Veiga de Macedo: - Ainda bem que nesta Casa se evoca, com palavras trespassadas de justiça e de emoção, a memória de José Régio e se presta eloquente homenagem à preclara figura de intelectual de eleição e à sua multímoda obra de poeta, de prosador, de educador.
Este meu sentimento não nasceu agora, andava já no meu coração. Há bem pouco chegou-me às mãos, com as palavras de uma honrosa e generosa dedicatória do autor, o último livro de Álvaro Ribeiro, esse extraordinário pensador que da vida tem feito sacerdócio todo votado à cultura, à "restauração do perene significado da filosofia" e à "demonstração de que existe uma filosofia portuguesa e, mais ainda, de que existe um modo português de filosofar".
Deixai-me ler, de modo a ficarem bem registadas, como merecem, na nossa inteligência e na nossa sensibilidade, estas afirmações da carta que acompanhou esse livro admirável, intitulado precisamente A Literatura de José Régio:

Por este mesmo correio, tenho o gosto de oferecer a V. Ex.ª um exemplar do meu livro A Literatura de José Régio.
Poeta de alta estirpe intelectual, José Régio foi já comparado a Camões. Morreu, e creio que nenhum funcionário representativo do Estado compareceu no funeral, aliás religioso. Em vida não foi mais do que um modesto professor liceal; em espírito uma glória da Pátria e |um fervoroso Servidor de Deus.
Álvaro Ribeiro tem razão, e é sob a impressão forte das suas palavras que ousei pedir licença para interromper a voz autorizada do ilustre Deputado que é a do professor Silva Mendes, velho amigo dos tempos, para mim inesquecíveis, da campanha de educação popular em que pudemos, um e outro, e muitos, muitíssimos mais, trabalhar pela expansão do ensino e pela ascensão cultural do povo português. Não podia de modo algum - agora que estou a retomar contacto com o pensamento e a arte

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de um dos nossos maiores escritores contemporâneos e me é possível avaliar, uma vez mais, a profundidade do seu espírito aberto e inquieto em busca da verdade não podia de modo algum, dizia, deixar de me congratular por ver esta Gamara dar público testemunho da respeitosa veneração e do vivíssimo apreço devidos pelos homens justos, quaisquer que sejam as suas crenças religiosas ou ideias políticas, ao poeta das Encruzilha-las de Deus, ao romancista de A Velha Casa, ao dramaturgo de Benilde ou a Virgem-Mãe, ao crítico, ao ensaísta, ao pedagogo, ao pensador.

O Sr. Presidente: - Queria pedir a V. Ex.ª o obséquio de encurtar a sua intervenção, se fosse possível, até porque devemos esforçar-nos por não inserir discursos noutros discursos.

O Sr. Veiga de Macedo: - Agradeço as palavras de V. Ex.ª, Sr. Presidente, e vou já acabar a minha breve intervenção.
Eis o que tenho a dizer para finalizar:
Na verdade, "de braços abertos para os seus contemporâneos que se dedicaram a estudos especulativos" - atrevo-me a reproduzir outra afirmação de Álvaro Ribeiro inscrita no prefácio do livro que o mesmo me ofertou -, ma verdade, "de braços abertos para os seus contemporâneos que "e dedicaram a estudos especulativos, e de inteligência compreensiva para os seus ensaios mais tímidos ou mais ousados, José Régio mereceu de todos os pensadores sérios a bendição que lhe tem sido recusada por "quedes que se ocupam apenas d(c) literatura. A obra de José Régio anuncia o advento de uma nova arte poética, tal como significou em notável e brunido opúsculo o novel filósofo António Teimo.
Mestre de uma geração ingrata, avançado precursor de uma literatura que ascende para tributos divinos, José Régio contribuiu para o entendimento final dei que a palavra vive da sua relação com o pensamento".
Até por isto, numa Assembleia como esta em que a palavra só se legitimará se servir um pensamento e se este servir a vida portuguesa e a dignidade do homem nos seus mais fundos e permanentes anseios e direitos, seria imperdoável não se exaltasse, como está a fazer o Deputado Manuel de Jesus Silva Mendes, o glorioso poeta que foi José Régio. Que foi e que é, pois o seu grito de beleza e de bondade há-de repercutir-se pelos tempos fora, a despertar nos homens de boa vontade aqueles sentimentos puros e aquelas ideias nobres sem as quais não haverá no Mundo nem compreensão, nem paz... nem poesia.

O Orador: - A razão destas minhas pobres palavras é, Sr. Presidente, o desejo veemente de testemunhar à Assembleia, e por seu intermédio à Nação, a homenagem de profunda admiração, vincadamente significativa, homenagem que não é ainda aquela que o seu povo lhe há-de oferecer em momento oportuno, mas a evocação emocionada da presença de José Régio no convívio e na cultura da cidade.
Espero que a juventude, em quem inteiramente e cada vez mais confio, essa juventude que ele muito amou, não lhe negará a palavra que lhe deve pelo muito que com ele aprendeu.
A literatura nacional e a cidade de Portalegre, que considera José Régio filho dilecto do seu coração, é certo que perderam um homem, mas ganharam um génio para as suas glórias.
E perante esse génio, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que comovidamente me curvo!
O orador foi cumprimentado.

O Sr. Santos e Castro: - Sr. Presidente: Durante o período em que esteve suspenso o funcionamento da Assembleia foi oficializado pelo Ministério da Educação Nacional o ensino liceal que, há muitos anos, vinha funcionando em Torres Vedras.
Deu, deste medo, o Governo satisfação a pedidos insistentes que lhe foram presentes em Outubro último e que traduziam uma justíssima aspiração local interpretada muito vivamente pela Comissão Concelhia da União Nacional e pelo presidente da Comissão Distrital de Lisboa.
Cumpre-me, assim, como Deputado pelo círculo, registar com grande satisfação o facto e endereçar ao Governo as minhas felicitações pela decisão.
Sem querer de qualquer modo antecipar-me aos estudos do planeamento .regional que abrange a vila de Torres Vedras, creio poder admitir que lhe estará reservado um importante futuro como centro de uma vasta área com potencial idades muito apreciáveis.
A sua elevação a cidade talvez venha a ser apontada como consequência do muito próximo censo populacional do País e a perspectiva, de uma rodovia eficiente nas ligações com Lisboa - que está certamente merecendo a melhor atenção do Ministério das Obras Públicas - serão, ainda mais, factores decisivos para a aceleração do progresso que vem registando a vila de Torres Vedras. Bem merece ela, portanto, a atenção que lhe prestou o Governo, oficializando o seu estabelecimento de ensino liceal, mantido com tanta determinação e à custa de tantos sacrifícios.
O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Delfino Ribeiro: - Sr. Presidente: São para V. Ex.ª as minhas primeiras palavras: de consideração, respeito e homenagem ao parlamentar que, devotado à causa pública através de uma longa carreira, vem, desde o início da presente legislatura, dirigindo os trabalhos desta Casa com dignidade, elevação e aprumo.
Srs. Deputados: Queiram VV. Ex.ªs aceitar os meus melhores cumprimentos e os protestos de uma colaboração modesta, mas sincera e leal, na apreciação de todos es problemas, nacionais ou regionais, que sejam preocupação desta Câmara. Anima-me a convicção de que, dai experiência doe veteranos das lides políticas, da juventude dos novos e da sabedoria e desejo de acertar de todos VV. Ex.ªs, recolherei generoso contributo para o desempenho do meu mandato, irmanados, como estamos, no propósito de um Portugal melhor, na sua permanente unidade multirracial.
À imprensa, sobre cujos ombros recai a nobre e também difícil tarefa de informar com equilíbrio e isenção, significo o meu apreço e simpatia.
Finalmente, daqui saúdo o meu eleitorado, a quem reitero o reconhecimento pela confiança outorgada e renovo a decidida intenção de concorrer para o bem-estar colectivo.
E, nesta saudação, encaminho o pensamento à laboriosa população de Macau, onde, desde a sua fundação, se vem processando e fomentando um intercâmbio de culturas entre as civilizações chinesa e europeia, mediante o aproveitamento, por ambas as partes, do que cada uma delas oferece de bom, numa recíproca transplantação decorrente do convívio dos elementos das respectivas etnias, alicerçado no igualdade e mútuo respeito.
Nesta primeira intervenção trago para esta Casa uma mensagem da minha província natal; e dos seus interes-

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ses, problemas e anseios, de que me cabe ser observador atento, fiel intérprete e defensor firme, alguns apontamentos.
Dos portugueses que, num conjunto demográfico superior a, 200 000 habitantes, não chegam a uma dezena de milhar, e que ali se acham radicados de geração em geração, sem que a muitos vez alguma se houvesse propiciado visitarem a Mãe-Pátria, o orgulho da sua nacionalidade e a obediência e fidelidade à missão de Portugal maquetas paragens do Extremo Oriente.
Dos chineses que, arreigados, por via de regra, aos seus usos e costumes, constituem praticamente o resto da população, a confiança - da sua vida e fazenda na bandeira verde-rubra que - servida por uma política que não explora a terra nem busca o lucro fácil, antes pretende e promove a elevação moral, económica e social das suas gentes - a todos pacifica e humanamente acolhe e protege.
De uns e de outros, que lado a lado mantêm viva, num exemplo de coexistência e entendimento, aquela secular nesga de terra portuguesa, desse todo, a certeza de que os seus interesses são objecto de análise e estudo, as suas dificuldades, de cuidado e ponderação, e as suas aspirações, de solicitude e amparo, em prosseguimento de uma acção ultramarina que, sendo autenticamente nacional tão bem se concilia com outras culturas e civilizações.
De Macau, o desejo de se perpetuar como o padrão espiritual do Ocidente no Oriente.
A períodos de prosperidade têm-se seguido naquele rincão momentos depressivos, cuja debelação nem sempre se encontra totalmente dependente da boa vontade da Administração, sujeita como está a província aos particularismos, por vezes não suficiente temente compreendidos da sua conjuntura geográfica, económica e social.
O momento que passa é de dinamismo, entusiasmo e em ambiente de ordem, tranquilidade e paz, Macau encara o futuro com serenidade.
Impulsiona-se a promoção social através da solução progressiva de problemas concernentes, em especial, à e habitação; cuida-se da assistência, que absorve te 40 000 contos, ou seja, um sexto do orçamento do erário provincial; e, mediante simplificação burocrática e reapetrechamento dos serviços públicos, imprime-se maior celebridade e eficiência à actividade administrativo, sem olvidar os seus agentes que fundadamente esperam para breve merecida melhoria da sua remuneração, não só por virtude da elevação do custo de vida, como também pela necessidade de reajustamento do seu vencimento base com a recente actualização operada na metrópole.
No domínio das realizações públicas salienta-se que a próxima, construção da ponte entre a cidade do Santo Nome de Deus e a ilha da Taipa, esta já unida à de Coloane por meio de estrada, rasgará novas perspectivas ao porvir, na medida em que - pondo termo à descontinuidade territorial da província, aperfeiçoando as vias de acusação e, desta sorte, acelerando o aproveitamento das citadas ilhas - permitirá que a cidade se alivie dos inconvenientes da sua alta densidade populacional, a industrialização se intensifique e outros atractivos turísticos se criem.
Com o comprimento de 3430m e importando em pouco mais de 70 400 contos, será este empreendimento uma afirmação mais do génio e talento da nossa engenharia, novo testemunho do carinho do Governo, tanto central como provincial, e a concretização de uma das mais antigas e queridas ambições locais.
No campo económico assiste-se ao incremento da constituição urbana; ao aumento do comércio de exportação, cujo valor ultrapassou, em 1969, 1 milhão de contos, e à conquista de novos mercados; à instalação de maior número de estabelecimentos industriais - de 85, em 1968, passaram para 209, no ano seguinte, empregando mais 4131 operários, num total de 25 000 - e à diversificação das indústrias - ao lado das tradicionais, a dos têxteis (com fábricas de fiação, tecelagem e estampagem, de algodão e lã, e confecção de vestuário) e as de material óptico, calçado, brinquedos, mobílias de cânfora e teca. etc. -, sem prejuízo da salutar tendência, que também se estimula, para a concentração de pequenas unidades em conjuntos de maior produtividade, dotados de equipamentos modernos.
O crescimento económico de Macau, todavia, situa-se aquém do ritmo e intensidade que os seus recursos facultam e exigem.
Das suas causas mencionarei duas:

É o nosso ultramar um dos mercados para que se dirigem os produtos de fabrico macaense. Assim, e com referência ao ano transacto, foi a sua importância total de 142 264 contos, dos quais a Angola e Moçambique) pertenceu, como anteriormente, o maior quinhão, no montante respectivo de 66 595 e 60 690 contos.
As débeis posições cambiais de Angola e Moçambique em relação ao exterior e o déficit crónico das suas balanças de pagamentos com Macau não têm permitido assegurar, adentro do sistema vigente de compensação e de pagamentos interterritoriais, a tempestiva liquidação dos seus débitos, daí resultando sucessivos acréscimos dos "atrasados", que chegaram a cifrar-se, em meados de 1967. em mais de 100 000 contos.
Essa demora no recebimento do produto das vendas traz atrelada, a redução do capital circulante, que se agrava pela impossibilidade de realização, através do mecanismo do crédito, dos adiantamentos precisos.
Os inconvenientes são óbvios, merecendo ainda alusão, porque dificilmente compreendida pelas actividades locais, a concorrência, da vizinha terra estrangeira de Hong-Kong. que, por dispor de facilidades de pronta cobertura, regista, de ano para ano, considerável aumento de transacções com aqueles nossos mercados de África.
Reconhece-se não ser fácil a solução completa deste problema, uma vez que se não prevê, para um futuro próximo, apreciável subida, em volume e valor, das exportações de Angola e Moçambique para a sua credora, por forma que se estabeleça o equilíbrio das suas balanças de pagamentos.
Este também o pensamento do Governo, que se vem debruçando sobre o assunto e a cujas diligências se deve já. além da concessão de um empréstimo de 50 000 contos pelo Fundo Monetário da Zona do Escudo, em Abril de 1967, a afectação mensal prioritária de 5000 contos, por conta de cada uma das províncias devedoras, para pagamento aos exportadores de Macau, com início nos últimos meses de 1968.
Apesar destas medidas, subiste a acumulação dos débitos, hoje na importância de 26 717 contos.
Nesta conformidade, reunindo mais uma vez à dos sectores comercial e, industrial interessados, expressa-se a esperança de que, enquanto se não sancionar resolução integralmente Satisfatória, se liquidem os "atrasados" e se actualize o quantitativo daquela afectação.
Outra preocupação respeita à afluência a Macau dos turistas que visitam Hong-Kong, importante centro urbano com mais de 4 milhões de habitantes e ponto do

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passagem obrigatório para quem viaje em recreio pelo Extremo Orienta.
Em 1969, dos setecentos e tantos mil forasteiros que estiveram naquele território britânico, distanciado 40 milhas de Macau, apenas Conseguimos chamar uma sexta parte, a despeito de a província dispor de numerosos atractivos só seus e de grandes facilidades de comunicação rápida e confortável com a referida colónia, providas por onze hidroplanadores e quatro navios de carreira, tipo convencional, os quais, nas suas constantes travessias de ida e volta, garantem diariamente uma capacidade de transporte de uma dezena de milhares de passageiros.
Esta fraca percentagem mergulha em grande parte as suas raízes na exigência da "vistos" aos nacionais da maioria dos países, mesmo para uma pequena estada, em oposição à corrente, perfilhada em quase todo o Mundo, de livre circulação de turistas.
Na verdade - com ressalva para os residentes de Hong-Kong, para os chineses das áreas circunvizinhas e para os Brasileiros, Italianos, Espanhóis o Belgas - necessitam os estrangeiros que desejem entrar na província de um "visto" emitido por representante diplomático ou consular português.
E porque, no seu programa, Macau lhes toma umas horas ou, quando muito, um dia, bastantes são os turistas que - acompanhando, aliás, o desinteresse- de várias agências internacionais, que afastam o nosso território do itinerário projectado - se negam à observância do requisito legal, cuja taxa - 100$ para os vistos singulares e 150$ para as colectivos, com redução de 50 por cento para grupos mínimos de 10 -. já de si nada ligeira, é ainda acrescida de 6$ por indivíduo, papa compensação petiscai do cônsul.
Para que a província participe substancialmente do crescente fluxo turístico de Hong-Kong. que dele faz uma das suas grandes fontes de rendimento, e deste modo se alcandore a posição compatível com as suais possibilidades, torna-se mister que - a par do providências locais, em que sobressai o harmónico "curto das suas agências de viagens na forma de actuação - se adopte, quanto antes, e com carácter generalizado, o sistema de isenção de vistos para os estrangeiros que a visitem com curta duração.
Macau - que não detém nenhuma rota aérea ou marítima de dimensão internacional - não pode comportar o risco de se ver ignorada no circuito do Extremo Oriente.
Para remate, gostaria de aflorar um assunto que, pelo muito que tem de humano, ao coração apela.
Trata-se de um profundo anseio de alguns funcionários civis que se aposentaram ou ficaram aguardando aposentação, por razões não disciplinareis, dais- anos antes de 1 de Agosto de 1966, data da entrada em vigor do novo Estatuto do Funcionalismo Ultramarino.
Pelo diploma de 1956, que precedeu o acima indicado, dizia-se, no seu artigo 259.º, n.º 2.º, alínea c), que "serão suportadas pelo Estado as despesas de viagem dos funcionários" que "regressem da província ultramarina onde prestem serviço à terra da sua naturalidade, depois" da "aposentação, desligação de serviço para efeitos de aposentação ou limite de idade", estabelecendo-se no seu § 2.º a concessão das respectivas passagens "até dois anos depois dos factos referidos nesse numero".
O actual Estatuto, de 1966, houve por bem, e em igual articulado numérico, alargar a dita regalia, de modo a abranger os serventuários que "hajam cessado o serviço público no ultramar, ou na metrópole, tratando-se de funcionários ultramarinos, por motivo que não tenha carácter disciplinar e desejem fixar residência em qualquer parcela do território nacional", acrescentando que as respectivas passagens "poderão, pelos funcionários aposentados ou aguardando aposentação, ser requeridas em qualquer tempo".
Do esclarecimento dado à conjugação dos citados preceitos pela circular n.º 5079, de 1 de Julho de 1967, da Direcção-Geral de Administração Civil, do Ministério do Ultramar, resultou, contra a expectativa, a cisão dos funcionários aposentados ou aguardando aposentação em dois grupos: um, constituído por aqueles que, havendo cessado o exercício das suas funções antes de 1 de Agosto de 1964, são naturais de Macau e ali residentes ou, não o sendo perderam o direito de regresso à sua terra natal por dele não terem feito uso no período legal de dois anos, e o outro que abarca os que, tendo passado à inactividade depois de 1 de Agosto de 1964, ficaram a beneficiar da possibilidade de, a todo o tempo, mudarem o seu domicílio para qualquer parte do nosso território.
Bastaria semelhante disparidade de tratamento para arredar o entendimento exposto, que se propõe, contra os cânones da boa hermenêutica jurídica, aproximar disposições de conteúdo e alcance diversos, pois a primeira se restringe ao retorno à terra de origem e a última se estende à escolha de residência em qualquer outra parcela nacional. Pela letra e seu próprio espírito, o Estatuto ora vigente não quer precisamente esquecer aqueles portugueses cujo direito de regresso caduca por inobservância do prazo legal ou lhes era negado por se encontrarem no seu local de nascimento. A todos quis dar a mão, no intuito de lhes permitir, sem dependência de prazo ou de data de desligação de serviço, a sua deslocação gratuita para onde lhes apraza.
Porque a vida é limitada, são poucos, e cada vez em menor número, os que querem e estão em condições de beneficiar desta prerrogativa.
A todos esses, porém, se prende o desejo de verem ou reverem o solo metropolitano ou a terra que lhes serviu de berço.
Pouco dispêndio trará à Fazenda Nacional a satisfação ao pretendido, que. afinal, se traduz num acto de justiça e recompensa aos que dedicaram uma vida inteira ao serviço da Nação, marcando bem fundo e indelevelmente - tal como os que os antecederam e lhes seguiram - a imagem da Pátria.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Pio Fernandes: - Os meus cumprimentos a V. Ex.ª, Sr. Presidente, em quem, apesar do contacto de escassas semanas, pressinto as maiores virtudes cívicas e em quem vejo singularmente reunidos os altos predicados de saber, de isenção, de justiça e de firmeza indispensáveis ao desempenho de tão altaneiro como responsável cargo.
Endereço também as minhas .saudações aos ilustres Deputados que ornam este recinto, a todos prometendo a minha leal colaboração e o meu esforço, modesto mas total, para que a actividade desta X Legislatura conduza a um maior somatório de bem para todos os cidadãos e a uma maior grandeza para a Nação, que em nós tanto confiou.
Que Deus me ilumine no bom caminho e que Deus inspire e acompanhe toda esta Assembleia no desempenho da sua magna tarefa - é a minha sincera oração.
Fui trazido a esta tribuna pelo eleitorado da Índia Portuguesa e respondo à chamada, prometendo que, a par da

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minha resoluta decisão de realizar tudo o que estiver ao meu alcance para a promoção da causa nacional que resulta do desidrato comum a todos os portugueses de todas latitudes, procurarei a todo o custo defender o Estado Português da Índia como parte integrante do corpo, da alma e da vivência de Portugal e, com a mesma intensidade, darei o meu mais completo apoio aos portugueses da Índia nas suas justas reivindicações e no reconhecimento dos seus direitos, onde. quando e sempre que necessário.
E o que me falta em eloquência será suprido pela sinceridade, pela verdade e pela vontade de servir a Nação, que informarão todas as rainhas atitudes nesta Câmara.
A Índia Portuguesa é fulcro da história de Portugal e cúpula dos seus mais gloriosos cometimentos;
Embora sujeita a um ignóbil jugo e a uma tentativa de autêntico genocídio que procura aniquilar o seu patriotismo e se afadiga por .se locupletar da riqueza da inconfundível personalidade do seu povo e da sua cultura, entalhadas por quase meio milénio de civilização luso-oriental e valorizada pela interpenetração de valores que ali se processou;
Embora desde a espoliação se lhe venha forçando o estranho condicionalismo do opressor que deslustra aquela pequena jóia, empanando-a com o seu amontoado de gentes aos milhões e com o seu emaranhado inextricável de promiscuidade humana, de opulência e de miséria, de motins, de forno, de ódios inter-religiosos, de salários de penúria e de corrupção;
Embora cerceada da língua que fez sua - a mesma de Camões -, utilizada no dia-a-dia, pelo seu povo e enaltecida pelos seus poetas e prosadores;
Embora cruéis acontecimento atentem contra a dignidade, e o prestígio que os núcleos goeses têm grangeado Mundo fora. precisamente por serem distinguidos e distintos, pelo facto de serem portugueses:
A Índia Portuguesa não morreu, nem morrerá. Presente na Nação e representada nesta, magna Assembleia, ela viverá enquanto bater no peito um único coração de portugueses da Índia que a Pátria e a História criaram e a Pátria e a História hão-de defender como seus filhos primogénitos que são.
Por isso, aqueles que vivem no cativeiro e os que imperativos de ordem económica obrigaram a labutar em terras estranhas arrostam torturantes dificuldades, mas mantêm os corações depositados na Pátria e volvem os olhos esperançados para esta Assembleia, na certeza de que a sua causa não será esquecida e na perene ânsia de um acontecimento que permita a reintegração de Goa, Damão e Diu no seio da família lusa, onde ocupam um lugar de eleição, por motivos que se enraízam profundos na nossa história.
Não se julgue que a reparação do agravo à soberania portuguesa e a restituição dos seus legítimos direitos é causa absolutamente perdida ou ficção política: trata-se de uma perspectiva que não deixa de ter fundamento, pois, não obstante aparentar-se como empreendimento incoerente perante um fait accompli, nenhum lapso de tempo pode dar validade ao crime de ocupação e, mesmo antes das quatro décadas do cativeiro da Babilónia e depois do longo período que conduziu à Restauração de 1640, há bastos exemplos de justiça, anos demorada, mas que acabou por aflorar, apesar das mais negras perspectivas.
Nem a Nação nem esta Assembleia poderão permanecer indiferentes à posição nada invejável em que a imoralidade política internacional colocou aquelas parcelas e os seus habitantes, pois. com a funda da razão e do direito na nossa mão, impõe-se-nos a grave responsabilidade de continuar a desenvolver esforços, de atiçar a consciência dos povos e de aproveitar toda e qualquer oportunidade e os mais pequenos motivos para promover a devolução dos nossos direitos.
Enquanto - como afirmou Salazar - houver a réstia de esperança que pode entrever-se nesse vivo despertar da consciência do mundo ante os conluiados nos atropelos à paz e à soberania alheia, no sentido de serem revistos a tempo os métodos de conduzir a comunidade internacional e, acrescentamos, que reside - também no gigantismo de problemas, na instabilidade política, demográfica, religiosa e social que afligem aquele subcontinente e no paralelismo de outros casos de ocupação militar de territórios cuja libertação excita e preocupa meio mundo, ciente dos gravíssimos riscos em que incorre ao sancionar precedentes do uso da força, enquanto houver essa réstia de esperança, repetimos, vazões de sobra nos exortam a manter e a fortificar todos os laços e contactos seculares com a Índia Portuguesa.
Se é, portanto, uma lobrigarão .sagrada o não descurarmos ou cairmos em imobilismo, deverá ser considerado contrário aos interesses da Nação tudo quanto dificulte o objectivo de manter viva a causa da reivindicação daquelas terras e de conservar acesa a chama de portuguesismo ali bem acendrada.
Também, foi aquela mesma figura - a maior da política nacional de todos os tempo - quem publicamente definiu, com característica profundidade e concisão, a atitude de Portugal perante a ocupação, tendo assegurado que seriam bem recebidos em qualquer ponto do território nacional os que quisessem subtrair-se às inevitáveis consequências da invasão, como reconhecimento da inquestionável e completa cidadania aos Goeses, independentemente até da hipótese, que referiu, de lhes vir a caber dupla nacionalidade - isto decerto como mais uma arma para combater a afronte cometida, como mais um meio do conservar uma riqueza da Nação do mais elevado quilate e ainda, como técnica para o possível retorno efectivo, daqueles territórios à Mãe-Pátria, a qualquer tempo.
Bem agiu, portanto;, na última reunião do Conselho de Segurança, o Dr. Bonifácio de Miranda - mais um ilustre português, daquela plêiade com que Goa brindou a Nação -, ao atirar novamente à face da consciência internacional as palavras de que se servira Adiai Stevenson, então representante dos Estados Unidos da América, para realçar as incongruências existentes nos órgãos superiores da O. N. U. quando se referiu à invasão de Goa, como podendo ser o primeiro acto de um drama que poderá encerrar com a sua morte.
É na verdade um drama que continua a ser vivido e que toca no nosso íntimo, cujo desfecho resultará da nossa persistência em mantermos a posição vertical e irredutível que desde logo assumimos, e nunca de um vil conformismo.
A Nação recusa-se terminantemente em se curvar à violência e o nosso não estende-se de igual forma e por idênticas razões a qualquer parcela do nosso território, sejam os cobiçosos pseudo pacifistas, sejam terroristas doutrinados, armados e apoiados por países estrangeiros, comunistas ou não, utilizem de verborreia mentirosa nos areópagos internacionais ou recorram eles a armas traiçoeiras de guerra para atingirem os seus fins.
Essa recusa nobilitante e heróica é a mesma que hoje defende o Portugal africano que Goa outrora ajudou a forjar com os seus heróis, missionários, soldados, letrados e gente do povo, cujos filhos nesta hora compartilham com os seus irmãos de outras parcelas do território na-

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cional no esforço, na luta e no sacrifício que ali se desenvolve para salvaguarda dia unidade e da integridade da Nação.
Quando o venerando Chefe do Estado, ao inaugurar esta X Legislatura, afirmou solenemente que a Nação tinha fins e ideais a atingir, deveres morais a cumprir e imperativos da sua história, do seu destino e da boa missão no Mundo, não esqueceu os portugueses de Goa, Damão e Diu, a quem se referiu de uma forma especial, sublinhando o princípio de Portugal considerar de puro facto assente na violência a ocupação daqueles territórios pelo seu poderoso vizinho.
De entre esses fins ideais, toca bem de perto aos portugueses da Índia o da restauração da soberania de Portugal e o da reintegração da sua tenra, pequena mas honrada e luzida, no complexo territorial da Nação, uma causa que, embora à primeira vista se apresente como inatingível, nem por isso pode ser menosprezada, pois o seu enfraquecimento ou o seu abandono constituíram traição aos princípios mate sagrados em que assenta a própria estrutura da Nação.
Com Goa, Damão e Diu, Portugal é credor e fiel depositário de quase cinco séculos de feitos ousados, de frutífera missionação cristã e da formação de uma cultura ímpar do mais elevado substrato - ali foi criado não um novo mundo, mas um novo Portugal e uma comunidade portuguesa pujante e inseparável do todo, que não podemos permitir que venham a ser oblitcrados nem na geração presente, nem em gerações vindouras.
Compreendei-se que a recuperação multar esteja absolutamente fora de discussão; contudo, sem prejuízo de esforços a desenvolveu no campo diplomático sempre que oportuno, é perfeitamente viável em diversas esferas uma acção a nível nacional, lenta mas tenaz, designadamente através da luta pela cultura, visando a perpetuação de valores de antanho e a conservação ad infinitum da língua portuguesa por parte de uma população que de há séculos a tornou sua e cujos exponentes tão prodigamente contribuíram para o enriquecimento da prosa, da poesia, do jornalismo e da jurisprudência da Nação.
Para tanto, conte-se com a gente da Índia Portuguesa, quer no cativeiro, quer espalhada pelos cinco continentes do Mundo, como prontos e desejosos de participar activamente nessa cruzada, a cuja adesão nenhum português digno se eximirá, parecendo também de toda a vantagem e oportunidade perfilhar-se a inclusão de Goa, Damão e Diu no circuito da expansão cultural da comunidade luso-brasileira como entidade distinta, de personalidade irmã e que tornará mais representativa, mais variegada e mais completa essa admirável simbiose de ecumenismo português.
Quanto aos deveres morais da Nação, figuram com proeminência e como irrecusáveis todos os procedentes da ocupação estrangeira da Índia Portuguesa, cujo cumprimento não só a consciência nacional reclama, como razões de justiça impõem.
E que o território só em si tem um significado deveras restrito e a nacionalidade subsiste por vontade do povo, seu principal elemento formativo, cujo valor supera indefinidamente o do solo competindo sempre ao Estado sustentar e fortificar essa lealdade e esse querer das gentes.
A violação de território nacional, parcial ou in totto, não pode, portanto, afectar a cidadania portuguesa inerradicável das populações, como jamais poderá acarretar a diminuição ou a anulação dos respectivos direitos e responsabilidades e entender-se o contrário corresponderia a um beneplácito dado à usurpação e só poderia concorrer para facilitar os processos, descarados ou subtis, de amputação que nos querem impor.
Interpretando a vontade e o consenso dos cidadãos, mas norteando-se sempre no sentido dos superiores interesses da Nação, é apanágio da Assembleia Nacional e um intuito primordial desta X Legislatura prestar ao Governo uma colaboração conscienciosa e profícua, mas com toda a independência e isenção, não só fiscalizando, criticando ou louvando a sua acção, mas também, sempre que oportuno, sugerindo medidas ou preconizando soluções para os problemas da grei.
Neste espírito, é de absoluta justiça louvar o Governo pela valiosíssima e muito generosa acção que tem desenvolvido à volta da causa de Goa, Damão e Diu e que merece todo o reconhecimento e profunda gratidão dos portugueses daquelas parcelas.
Como contributo para a continuação da sua importante tarefa naquele sector e ainda para que os respectivos problemas possam ter uma solução mais justa e tempestiva, temos a honra de, em linha com o que acaba de ser exposto, propor e pedir o seguinte:

1.º Que, a fim de se preencher uma importante lacuna existente no nosso complexo administrativo, seja criada com toda a brevidade a Secretaria do Estado Português da índia, ou seja, um órgão de nível governamental, englobando quaisquer organismos oficiais de fins idênticos, que ficaria com a missão de:
a) Orientar e dirigir superiormente todos os negócios, assuntos e projectos respeitantes a Goa, Damão e Diu, bem como os peculiares aos portugueses da índia;
b) Coordenar a respectiva acção, considerar, resolver ou propor soluções para os seus problemas;
c) Promover e intensificar uma actividade cultural, com vista a manter contacto permanente com as populações e a serem salvaguardadas as instituições de cultura e de língua portuguesa existentes naqueles territórios e a forma do seu reconhecimento no espaço português;
d) Estabelecer um programa de apoio aos refugiados provenientes daquele Estado ou de países estrangeiros, nomeadamente dos da África central;
e) Unificar em todo o território nacional o movimento associativo dos portugueses da índia, com vista à congregação dos seus recursos e das suas capacidades na defesa, promoção e propaganda dos seus interesses.
Esta Secretaria, que se mostra absolutamente indispensável à articulação político-social da problemática referida, não exigiria um elenco desmedido, mas apenas uma concentração de elementos para assegurar o seu funcionamento pleno e contínuo.
2.º Considerando que a reforma, as pensões, os abonos de família e a concessão de licenças graciosas aos naturais da Índia Portuguesa e descendentes que pretendam usufruir das mesmas na terra da sua naturalidade constituem recompensas comuns a todos os servidores do Estado, que não podem ser questionadas com

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fundamento na circunstância, até repelente aos Goeses, de aquele território estar ao presente sob jugo estrangeiro e cuja recusa nem é admissível por mérito próprio da causa nem se coaduna com o princípio de a ocupação não ter invalidado a soberania portuguesa naquelas áreas que a Nação proclama como indelével e contínua:

Que a partir da data em que foi suspensa qualquer liquidação sejam pagas aos cidadãos com domicílio no Estado Português da Índia as reformas ou pensões a que, em resultado de serviço prestado ao Estado e de anos de contínuo desconto no vencimento, adquiriram irrefutável direito;
Que, de harmonia com o estabelecido no Estatuto do Funcionalismo Ultramarino, seja desde já garantida aos funcionários goeses a faculdade de gozarem a licença graciosa na terra da sua naturalidade (os dos seus pais), tendo ainda em vista a manutenção dos laços familiares e de fraternidade com aquele rincão português;
Que não sejam dificultados os abonos de família aos funcionários que tenham família com direito ao mesmo, residente no Estado Português da índia, e se estabeleçam os meios burocráticos para a sua transferência.
3.º Que sejam autorizadas pequenas transferências de numerário destinado ao sustento de familiares, na generalidade anciãos sem outros meios de subsistência senão o apoio material de filhos ou parentes trabalhando na metrópole ou no ultramar;
4.º Que, paira efeitos do registo civil, identificação, atestados de vida, instrução de pedidos aos serviços públicos e outros fins oficiais, sejam tidos como válidos s suficientes os documentos reconhecidos como autênticas pelos Consultados de Portugal, do Brasil ou do Paquistão, por agentes do Governo Português, onde estes existam, ou por quaisquer outras vias a designar, de mais fácil acesso aos interessados;
5.º Que os marítimos goeses trabalhando era navios estrangeiros que demandem portos de Moçambique sejam autorizadas a desembarcar durante a estadia dos mesmos, como o podem fazer sem peias em quaisquer outros portos da metrópole ou do ultramar;
6.º Que, não em razão da sua fidelidade à Pátria, que tem levado os Goeses (alguns com cursos portugueses) a serem preteridos, hostilizados e perseguidos, nem pelo seu desejo de se subtraírem à ignomínia e às vicissitudes da ocupação, nem tão pouco como prémio do seu patriotismo, que não se mede nem se paga, mas sim apenas porque os Goeses são cidadãos portugueses de direito e de facto, seja assegurado aos mesmos o passaporte nacional e, se possível, alguma ajuda imaterial em casos de absoluto mérito.
Defender o Estado Português da Índia e os seus habitantes é precisamente o mesmo que defender Portugal e os Portugueses, pois somos um só território e um só povo.
Com vontade indómita, com os nossos recursos e com a coragem e o sacrifício das nossas forças armadas defendemos a integridade territorial em África, mas não podemos prescindir de esforços em prol da recuperação de Goa, Damão e Diu, empenhando-nos na luta em todos os campos onde ela ofereça a mínima possibilidade - não um terçar de armas de guerra, mas sim, uma batalha de saber e de inteligência pela razão e pelo direito que nos assistem desde sempre.
Em nome dos portugueses do Estado da Índia e, muito em especial, dos que se encontram nos confins do cativeiro e não têm outro meio de fazer ouvir a sua voz nem outra forma de apelar para a Nação senão através dos seus representantes nesta Assembleia Nacional, pedimos ao Governo a resolução dos assuntos expostos e fazemos votos para que se não esmoreça, mas se intensifique, a luta por aquele nobre objectivo, através de uma acção coordenada a dirigida, a fim de que, seja em breve, seja daqui a muitos anos, possamos um dia gritar a plenos pulmões:
Portugueses, é chegada a hora da redenção de Goa, Damão e Diu.
O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - É-me ainda hoje necessário pedir a compreensão do alguns Srs. Deputadas que estavam inscritos para usar da palavra no período de antes da ordem do dia e aos quais, por razões de tempo, não poderei concedê-la.
Entraremos, pois, na ordem do dia, dando cumprimento à sua primeira parte, constituída pela eleição das Comissões de Defesa Nacional e de Negócios Estrangeiros.
Interrompo a sessão por alguns minutos para confecção das listas.

Eram 17 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.
Eram 18 horas.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada dos Srs. Deputados para votarem na eleição das Comissões de Negócios Estrangeiras e de Defesa Nacional.
Faz-se a votação.

O Sr. Presidente: - Convido para escrutinadores da eleição da Comissão de Negócios Estrangeiros os Srs. Deputados Delfino Ribeiro e Ávila de- Azevedo e da eleição da Comissão de Defesa Nacional os Srs. Deputados Silva Mendes e Cunha Araújo.
Fez-se o escrutínio.

O Sr. Presidente: - Para a eleição da Comissão de Negócios Estrangeiros entraram na urna 105 listas, tendo-se apurado as seguintes votações:

Com 102 votos, os Srs. Deputados Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira e D. Custódia Lopes: com 93 votas, o Sr. Deputado Álvaro Filipe Barreto de Lara; cem 92 votos, o Sr. Deputado Manuel José Archer Homem de Mello, e com 85 votos, o Sr. Deputado Francisco José Pereira Pinto Balsemão.
Declaro constituída a Comissão de Negócios Estrangeiros com os Srs. Deputados cujos nomes acabo de ler.

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Para a eleição da Comissão de Defesa Nacional entraram na uma 106 listas, tendo-se apurado as seguintes votações:

Com 105 votos, os Srs. Deputados Fernando Artur de Oliveira Baptista da Silva e João Duarte Liebermeister Vasconcelos Guimarães; com 104 votos, os Srs. Deputados Armando Júlio de Roboredo e Silva e Ricardo Horta Júnior; com 103 votos, o Sr. Deputado António Bebiano Correia Henriques Carreira; com 102 votos, os Srs. Deputados Filipe José Freite Themudo Barata, José da Costa Oliveira e Manuel Joaquim Montanha Pinto; com 100 votos, o Sr. Deputado José Vicente Pizarro Xavier Montai vão Machado; com 96 votos, o Sr. Deputado Manuel Marques da Silva Soares, e com 95 votos, o Sr. Deputado Henrique dos Santos Tenreiro.
Declaro constituída a Comissão de Defesa Nacional com os Srs. Deputados cujos nomes acabo de ler.
Convoco para amanhã, às 11 horas, a Comissão de Defesa Nacional, a fim de eleger os seus presidente e secretário e iniciar o estudo da proposta de lei relativa à alteração da Lei do Serviço Militar, estudo esse que continuará à discrição do seu presidente.
Quanto à Comissão de Negócios Estrangeiros, por ser pouco numerosa, peço aos Srs. Deputados para a mesma eleitos que se concertem entre si a fim de marcarem uma reunião em que procedam à eleição dos respectivos presidente e secretário.
Vamos passar à segunda parte da ordem do dia: discussão na generalidade da proposta de lei relativa ao desenvolvimento da região de turismo da serra da Estrela.
Tem a palavra o Sr. Deputado Pontífice de Sousa.

O Sr. Pontífice de Sousa: - Sr. Presidente: Muito embora já tenha tido oportunidade de fazer algumas breves intervenções nesta Assembleia, quando aqui se discutiu na especialidade a Lei de Meios para 1970, é esta a primeira vez que subo à tribuna na presente legislatura o quero, por esse motivo, dirigir a V. Ex.ª os meus cumprimentos respeitosas.
Tive a honra de participar com V. Ex.ª nos trabalhos da IX Legislatura, durante os quais pude verificar que se reuniam em V. Ex.ª elevados dotes de inteligência, integridade de carácter, vocação parlamentar e independência na acção política - qualidades estas que muito aprecio e que justificaram o, eleição de V. Ex.ª para si presidência da Assembleia Nacional.
Exprimindo ainda o meu desejo de prestar a V. Ex.ª a melhor colaboração que me for possível, quero finalmente formular sinceros votos de muitas felicidades no desempenho de tão elevado, quanto honroso, cargo.
Srs. Deputados: Aproveito esta primeira oportunidade para saudar VV. Ex.ªs e para lhes afirmar o meu decidido propósito de dar o possível contributo para que os trabalhos desta Assembleia decorram cem entusiasmo, mas também com a, serenidade indispensável a uma perfeita apreciação dos problemas que suscitarem a atenção de cada um de nós, ou que forem apresentados ao nosso estudo.
Teremos realmente de fazer um grande esforço durante os próximos quatro anos com o objectivo de tentar encontrar rumos certos para a evolução da comunidade lusíada, tendo em vista a obtenção de maior riqueza para a colectividade e maior justiça na sua distribuição.
Não deveremos, porém, esquecer nunca a necessidade da permanência - e se possível do acréscimo - dos valores morais e espirituais que, ao longo do(r) séculos, impuseram a Nação Portuguesa ao respeito e admiração do mundo inteiro.
Foram esses valores que. deram alento aos nossos antepassados para realizar obra prodigiosa e possibilitaram a independência da Pátria, o alargamento do território e a propagação da fé; e recentemente, foram ainda esses valores, cimentados já por vários séculos de história, que nos afoitaram para, a defesa, sem hesitações, das terras (portuguesas de África, quando atacadas por forças oriundas das cobiças internacionais.
Foram também esses valores que permitiram a S. Ex.ª o Presidente do Conselho, no passado mês de Outubro, que a sua voz repercutisse na consciência dos Portugueses - nos variados recantos do território, nos diferentes sectores de, actividade e nas diversas camadas de população -, de que resultou a composição desta Assembleia, a sua estrutura nacionalista, o seu desejo de trabalhar com entusiasmo, sim, mas em paz e na ordem, por uma mação multicontinental, cada vez mais próspera e feliz e sempre unida no seu portuguesismo.
Dizia atrás, Sr. Presidente, que importava obter maior riqueza para a colectividade o maior justiça na sua distribuição; e esta ordem de ideias não esteve, certamente, ausente das preocupações do Governo, ao apresentar à Assembleia Nacional a proposta de lei referente à adopção de medidas tendentes ao desenvolvimento da, região de turismo da serra da Estrela, proposta que V. Ex.ª inscreveu para a ordem do dia de hoje e em cujo debate tenho a honra de intervir.
Sou, naturalmente, bastante sensível a este problema visto que nasci numa vila situada na encosta sul da serra da Estrela, onde tenho passado grande parte dos meus anos -, vivendo os problemas da industria de lanifícios e os problemas do turismo na serra da Estrela; ambos têm sido fonte quase permanente das minhas preocupações.
Para algumas camadas de população das Beiras, que usufruem já certo nível de rendimentos, a serra é um dos poucos passeios turísticos que podem fazer, mais ou menos regularmente, nos dias de descanso semanal.
O objectivo do passeio é quase sempre o mesmo: respirar o ar puríssimo da montanha, enlevar-se com as alturas, absorver-se na contemplação de paisagens magnificentes e grandiosas, fugir aos ruídos e, talvez, tentar uma aproximação do infinito. Durante o período estival é ainda possível fazer piqueniques ou tornar banho numa piscina ou nos poços formados por alguns cursos de água; é a época, mais apropriada para fazer excursões, para a prática do campismo e do alpinismo, sendo numerosos os adeptos destes desportos que escolhem a serra da Estrela para cenário das suas actividades.
Também aparecem outros veraneantes, que apreciam passar as férias na montanha, ou dela carecem para robustecimento da sua saúde, e se instalam nos estabelecimentos hoteleiros ou nas residências particulares existentes.
O clima de Verão é muito agradável, sendo as noites quase sempre frescas e, durante o dia, o sol possibilita a obtenção de um tom bronzeado na pele, muito apreciado pelas jovens de todas as idades.
A pesca da truta, também tem inúmeros adeptos, sendo este desporto de muito interesse para o turismo, em virtude de atrair visitantes na estação de transição; nos cursos de água existentes na serra da Estrela e nas suas águas interiores encontra aquela espécie, piscatória o seu habitat natural.
Desde muito novo me habituei a visitar regularmente a serra da Estrela, sobretudo a zona conhecida por "Penhas da Saúde", onde, desde há anos, existe um hotel de montanha e, mais recentemente, uma estalagem.

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Noutra zona da semi, conhecida por "Penhas Douradas", há uma pousada, mandada construir há muito tempo pelo Secretariado Nacional da Informação, Cultura Popular e Turismo, constituindo estas três unidades a infra-estrutura hoteleira actualmente existente.
Conheço, na primeira destas zonas, locais onde se podem desfrutar paisagens maravilhosas, abrangendo horizontes vastíssimos o de extraordinária policromia, desde o oceano Atlântico e o casario de algumas das nossas praias do litoral oeste até à nossa vizinha Espanha, com as serras do sistema Luso-Castelhano.
Monfortinho, Belmonte, com o seu castelo evocativo dos Cabrais; a formosa serra da Gardunha; toda a Cova da Beira, com os seus pomares e outras culturas- hortícolas; o rio Zêzere, de traçado serpenteante; a cidade da Covilhã, com ias suas casas e as suas fábricas - todos estes pormenores podem ser apreciados em certos miradouros, alguns dos quais, como é próprio de uma região turística ainda desaproveitada, só são acessíveis a quem queira e possa fazer um longa caminhada a pé.
Nb Invento, temos uma verdadeira dádiva do céu - a neve -, que cai com frequência e abundância, atingindo, nalguns pontos, vários metros de altura e permanecendo, por vezes, até ao início do Verão, nas zonas mais apropriadas à prática do ski - que são as que se situam em volta da torre, quase a 2000 m de altura.
Uma paisagem de neve é, para mim, de beleza inexcedível e a prática dos desportos da neve atrai a todas as regiões onde ela se torna possível milhares de entusiastas, tendo originado já nalguns países uma indústria turística poderosa e rentável, que constantemente se expande e se aperfeiçoa.
O ilustre presidente da Comissão Regional de Turismo da Serra da Estrela, Exmo. Sr. Dr. Carlos Coelho - que também já foi distintíssimo parlamentar -, referiu nesta sala de sessões que "na quadra do Natal e Ano Novo de 1961, quase sem neve nas montanhas, com a neve com quinze dias de atraso, como diziam as revistas francesas, deixaram Paris com destino às estações de Inverno 600 000 parisienses! Nesse período organizaram-se 2200 comboios especiais".
E concluía da seguinte forma a sua observação:

A saturação dag estações é a regra, sobretudo nas épocas de ponta. O desportista ou o amante do espectáculo da neve determina-se, na escolha do local da sua vilegiatura, já não tanto pelas suas preferências, mas muito pela maior probabilidade de conseguir alojamento.
Também no nosso país a neve constitui já cartaz turístico, apesar da carência de infra-estruturas adequadas.
Desde há muitos anos, durante a época carnavalesca e, por vezes, durante o período das festas de fim de ano, todas as instalações hoteleiras das diversas categorias existentes na seira da Estrela, Covilhã, Tortosendo, Fundão, Alpedrinha, Castelo Branco e Guarda se encontram superlotadas, sendo frequentemente necessário recorrer às casas particulares, que, gentilmente, se dispõem a dar abrigo aos visitantes.
E isto sucede já na serra da Estrela, onde, como infra-estrutura específica da prática do ski, apenas existe um teleski rudimentar instalado na pista dos Piornos, de 2a. categoria.
Mas, para avaliar a verdadeira magia que a neve exerce já sobre os Portugueses, é indispensável conhecer a reacção dos excursionistas que visitam anualmente a seira da Estrela, sobretudo os mais jovens.
São largos dezenas de camionetas e centenas de automóveis que procuram ia montanha e largam os passageiros ao menor indício de neve, para que estes possam dar vazão ao seu entusiasmo, libertando-se de protocolos e de complexos e vivendo momentos de alegria e de sã camaradagem, que mais tarde se traduzirão por gratíssimas e inofensivas recordações.
Além disso, durante a época própria, quando as estradas da montanha estão inacessíveis ao trânsito automóvel, os desportistas mais aficcionados do sky fazem caminhadas de ida e volta de vários quilómetros quase todas as semanas, e, nalgumas, em dias consecutivos, para poderem atingir as pistas próximas da Torre e aproveitar o dia a esquiar.
A neve é, portanto, um grande motivo de atracção e fonte de uma indústria turística de Inverno, já poderosa e rentável na Europa e também possível de instalar em Portugal.
A questão é saber aproveitar convenientemente esta matéria-prima que é oferecida pela Providência a algumas regiões.
Porém, no nosso país, só na serra da Estrela há neve apropriada, em quantidade e tempo de permanência no solo, para a prática dos desportos com ela relacionados; por esse motivo, há cerca de uma dezena de anos, a Comissão regional de Turismo da Serra da Estrela entendeu, e bem, que deveria estudar a sério a possibilidade de desenvolver, em Portugal, a prática destes desportos, tão apreciados na Europa e, ainda, noutras regiões do Globo.
O estudo foi feito oportunamente, tendo-se concluído que apenas as pistas situadas a altitude superior a 1700 m ofereciam as necessárias condições para o lançamento de uma estação de desportos de Inverno.
Essa estação exigia, porém, um mínimo de infra-estruturas que permitisse o acesso às pistas de neve e a possibilidade de os desportistas utilizarem teleskis, isto é, equipamentos de subida das pistas para, como é sabido, poderem depois fazer as descidas.
Daqui nasceu a ideia da instalação de um teleférico que pudesse ligar a zona dos Piornos ao planalto da Torre.
O projecto foi confiado a um técnico estrangeiro de reconhecida competência, que o elaborou, e a orientação seguida foi aprovada, em Maio de 1960, pelo Conselho Nacional de Turismo e também pelo Secretariado Nacional da Informação, Cultura Popular e Turismo, entidade que, na altura, superintendia no turismo nacional.
Ainda nesse ano obteve a Comissão Regional um subsídio do Governo de 4000 contos, não reembolsável, para início da realização do empreendimento. Em 1965 ficou praticamente concluída a construção dois núcleos funcionais das estações da Torre e dos Piornos (que hoje se encontra completa), a montagem das duas torres metálicas intermédias e da parto motora do teleférico na estação da Torre - encontrando-se guardada na serra da Estrela a totalidade do restante equipamento necessário ao normal funcionamento do teleférico e ainda não instalado.
Entretanto faltaram os recursos e os trabalhos tiveram de ser interrompidos já, portanto, há quase cinco anos. Se na altura tivesse havido possibilidade de os continuar, já hoje, certamente, estariam a dar os seus frutos.
Porém, um ponto importante da questão é que a maior parte da despesa relativa à instalação do teleférico já está feita; o que não está é paga.
Para se poder compreender bem este estado de coisas é indispensável ter em conta que a decisão da Comissão Regional de Turismo de instalar o teleférico, com sanção das entidades competentes, se verificou há cerca de dez

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anos. Para a sua construção, a mesma Comissão teve de celebrar contratos que devem ser cumpridos - não apenas para prestígio regional, como alguém já insinuou -, mas por interesse nacional, tanto mais que uma das partes contratantes é uma entidade de direito público e outra uma empresa estrangeira.
Penso ser inequívoco, relativamente a este problema, o pensamento do Governo.
Com efeito, o subsidio extraordinário de 10 500 coutos, previsto no artigo 1.º da proposta de lei, destina-se parcialmente ao pagamento de dívidas da Comissão Regional de Turismo da Serra da Estrela, conforme expressamente se refere. Estimando-se estas dívidas em cénica de 6500 contos, dos quais uma pequena parte diz respeito a responsabilidades contestáveis - como nos informa o parecer da Câmara Corporativa -, apenas se prevêem novas despesas no montante aproximado de 4000 contos e que têm por fim a compra de dois teleskis. o acabamento da estação dois Piornos, as instalações do público nas estações terminais e do sistema de aquecimento em algumas dependências destas e, ainda, outras pequenas despesas, todas elas necessárias para que o teleférico não veja o eu interesse sensivelmente reduzido para os desportistas da neve.
Mas, de qualquer forma, na minha opinião, as dívidas da Comissão Regional de Turismo da Serra da Estrela devem ser pagas, pois, se o não forem, não se acautela devidamente o interesse nacional. Quanto a este assunto, chamo a atenção de VV. Ex.ªs para a repercussão que teria, no plano nacional e internacional, sobretudo entre as actividades económicas, uma resolução da Assembleia, contrária a uma proposta do Governo, que obstasse a que uma entidade oficial mais prontamente cumprisse um contraio regularmente firmado e pagasse as suas dívidas, contraídas para execução de um plano de investimentos que teve a necessária sanção superior.
O problema que se põe, portanto, é o de decidir se vale a pena ao Estado investir agora 10 500 contos para completar a abra iniciada, investimento este que terá a contrapartida de acções de valor equivalente, numa empresa de economia mista a constituir no prazo de um ano; ou se o empreendimento não deve ser concluído, abandonando-se por completo a programação efectuada e os investimentos feitos, de montante superior a 14 000 coutos (incluindo as dívidas), impossibilitando durante muitíssimos anos o órgão que superintende no turismo da serra da Estrela de qualquer outra actividade que não seja o pagamento dos seus débitos, condenando para o futuro uma zona turística que tem muitas condições paira ser uma das mais importantes do interior do País, se não a mais importante, e única para a prática dos desportos da neve.
O problema que se põe, em última análise, é o de decidir se vale ou não a pena à Nação despender, a curto prazo, 10 500 contos paira realizar uma obra que técnicos de reconhecida competência avalizam como a mais conveniente, no momento, para incentivar o turismo de Inverno na serra da Estrela, ou despender, a mais longo prazo, o montante das dívidas, estimado em 6500 contos, sem nada de interesse ter chegado a realizar-se, deixando para o futuro as construções feitas, as torres já erguidas, o material já pago, a testemunhar divergências de critérios, incapacidade realizadora e a ouvir as legítimas manifestações de desgosto daqueles que, como eu, têm confiado que a hora da serra da Estrela chegaria em breve.
Não pode ser imputada à Comissão Regional de Turismo a culpa do actual estado de coisas, pois houve promessas de subsídios que não se concretizaram, condições climatéricas que prejudicaram, atrasaram e encareceram substancialmente os trabalhos, materiais que subiram de preço, encargos que se acumularam e expectativas que se desfizeram.
Os esforços despendidos por aquela Comissão para solucionar as dificuldades financeiras que impediam a continuação dia obra iniciada foram porfiados, numerosos e de diversa ordem, sendo mesmo devida anima palavra de apreço aos seus ilustres membros e, particularmente, ao seu presidente, Exmo. Sr. Dr. Carlos Coelho, por toda a dedicação que tem consagrado a este empreendimento, com conhecidos prejuízos para a sua vida profissional e particular.
Mias deve aqui ser referido que o insigne Presidente do Conselho mais uma vez demonstrou o profundo conhecimento que tem dos problemas nacionais, o seu bom senso e realismo e a sua determinação de vencer os obstáculos que se opõem ao progresso do País, tomando a iniciativa de propor à Assembleia Nacional a adopção das, medidas constantes da proposta de lei em apreciação.
Estas medidas visam a salvaguarda não apenas dos investimentos feitos pela Comissão Regional de Turismo da Serra da Estrela, mas também de um vasto complexo habitacional há anos mandado construir no planalto da Torre pela Secretaria de Estado da Aeronáutica, para instalação do Grupo de Detecção, Alerta e Conduta de Intercepção n.º l, esquadra n.º 13, e que, em virtude das modificações profundas verificadas nos Últimos tempos, na técnica e na estratégia da defesa da Nação, deixou de ter interesse militar.
Este conjunto habitacional há já tempo que não é utilizado, a não ser por um grupo de zeladores, cuja permanência tem evitado a saia completa deterioração, em virtude do clima rigoroso que as edificações têm de suportar durante o Inverno.
A situação actual representa, pois, um encargo para a Secretaria de Estado da Aeronáutica, sem qualquer contrapartida de utilidade.
O complexo é constituído por várias edificações, entre as quais uma pousada, diversos tipos de alojamentos, capela, garagem, duas torres, central eléctrica, depósito de gasóleo, galerias subterrâneas que ligam os vários pavilhões entre si, e ainda servido por material para desobstrução das estradas e circulação sobre a neve. Todo este conjunto tem muito interesse para o turismo, pois se situa nas proximidades da estação terminal do teleférico e da estrada nacional n.º 339, nas imediações da implantação da Torre, que, como se sabe, é o ponto mais alto de Portugal.
A pousada e as demais edificações que constituem o complexo a que acabo de me referir poderão satisfazer, durante bastante tempo, apôs algumas adaptações e beneficiações, as previsíveis necessidades de alojamentos e refeitórios no planalto da Torre.
As circunstâncias justificam, pois, que se proceda, sem demora, à utilização de parte destas instalações, bem como dos materiais que forem julgados convenientes para fins turísticos, visto que outra utilização melhor não poderão ter nos tempos mais próximos.
É este, aliás, o parecer da Câmara Corporativa, com o qual concordo, em virtude de assim o aconselhar, segundo tudo leva a crer, o interesse nacional.
Prevê também a proposta de lei a criação, no prazo da um ano após a concessão do subsídio extraordinário, de uma empresa de economia mista "sob a forma de sociedade anónima, onde participar ao o Fundo de Turismo, a Comissão Regional de Turismo da Serra da Estrela e outras entidades públicas, e particulares.
A essa empresa seria outorgada a concessão exclusiva da exploração do turismo e dos desportos, na serra da

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Estrela e teria por obrigação estabelecer o equipamento da zona que vier a ser delimitada, e promover a sua valorização económica com o concurso de entidades privadas.
Pretende-se, assim, associar investimentos e interesses públicos e particulares, atrair capitais e conjugar vontades e esforços piara os fins referidos no artigo 4.º da proposta de lei te já atrás indicados.
Quer dizer: esta empresa, permitiria que os investimentos já feitos e a fazer pelo Fundo de Turismo e pela Comissão Regional, até à data da constituição da empresa concessionária, ficassem representados por acções dessa, empresa, onde também poderiam participar as câmaras municipais e as juntas de freguesia da área abrangida pela Comissão Regional e ainda, alguns particulares, com os valores ou capitais que pusessem à sua disposição.
Sr. Presidente: A serra da Estrela poderá desempenhar no futuro um papel muito importante no turismo nacional, na medida em que se criem infra-estruturas adequadas.
Tendo boas condições para grande movimento turístico no Verão, sendo a única zona do País onde se poderão praticar desportos de Inverno e podendo ainda atrair turistas nas estações de transição - creio poder afirmar que os investimentos a, fazer na Estrela darão um novo impulso ao desenvolvimento turístico do continente e à sua melhor distribuição geográfica.
Não deve a Nação, nem esta Assembleia, deixar de considerar que a proposta de lei em discussão representa miais um passo para a correcção dos desequilíbrios regionais de desenvolvimento, que é um dos grandes objectivos do III Plano de Fomento.
Essa correcção não poderá fazer-se distribuindo o mesmo número de escudos por metro quadrado de área subdesenvolvida, ideia que parece ter algum público, nas que traduz profunda ignorância. das teorias económicas.
A promoção das regiões subdesenvolvidas, implica uma concentração de investimentos e de esforços sobre determinados pólos, que, por sua vez, influenciarão o crescimento das regiões circundantes. Creio, porém, estarmos todos de acordo em que a serra da Estrela tem um conjunto de características e potencial idades que a recomendam para ser definitivamente eleita um desses pólos, que também interessa definir para o resto do País.
É também fora de dúvida que os aglomerados populacionais que se situam na imediata esfera de influência geográfica da Estrela, lhe servirão de forte apoio ao desenvolvimento turístico e serão, por outro lado, beneficiados por ela. Estão neste caso as cidades da Covilhã, e da Guarda e as vilas, de Belmonte, Fundão, Gouveia, Manteigas, Seia, Tortosendo e Unhais da Serra, para referir apenas as principais e por ordem alfabética.
Destes, ai Covilhã terá, certamente, ima papel de relevo a desempenhar, por sor o centro mais importante e o mais populoso dos que acabo de referir e por ser, também, ponto de passagem, quase obrigatório, para as correntes turísticas vindas do Sul.
Acredito, porém, que, se um dia pudesse ser feito um apuramento das contas de receita e despesa, entre a Covilhã-cidade o a serra da Estrela-centro de turismo, a Covilhã, viria a ser reconhecida como tributária da serra da Estrela, e não como beneficiária, ao menos durante algumas décadas.
Outro factor a ter em consideração na análise do problema da Estrela é a sua proximidade das vias de comunicação que ligam todo o litoral, o Centro e o Sul do País com a fronteira do Vilar Formoso, que detém, no continente, um dos primeiros lugares no movimento de entradas e de saídas de automóveis de e para o estrangeiro.
Esta circunstância torna ainda possível atrair alguns visitantes estrangeiros a um percurso pela serra, alternativo de uma viagem directa às praias ou aos maiores centros populacionais - o que pode significar mais algum tempo de permanência no País e portanto, maior entrada de divisas.
Este aspecto do problema, muito importante, relaciona-se ainda com a necessidade de aumentar e beneficiar a rede rodoviária, que serve a região em causa, assunto que foi tratado exaustivamente também no parecer da Câmara Corporativa.
Salientamos, entre, muitos casos, a necessidade de ser alargada e pavimentada a estrada nacional que liga Manteigas aos Piornos, junto da estacão do vale do teleférico. Esta rodovia passa pela nascente do rio Zêzere e continua, marginando este rio, num vale de grande beleza, até Manteigas. Permite comunicações rápidas entre diversos locais da serra, de muito interesse turístico, estabelece a ligação entre a Guarda e os Piornos, donde se poder seguir para ai Torre e Seia, ou para as Penhas da Saúde e Covilhã.
Ainda se recomenda, como muito necessária, uma estrada entre Unhais da Serra e a Nave de Santo António, permitindo a interligação das estradas nacionais n.ºs 339 e 230.
Para finalizar o assunto das ligações rodoviárias, não pode deixar de fazer-se um apelo aos Ministérios das Obras Públicas e das Comunicações quanto à necessidade de reorganizai, articular e modernizar o serviço da desobstrução das estradas da serra quando cai algum nevão.
Sabe-se que não é fácil, durante o Inverno, manter limpa a estrada nas proximidades da Torre, devido à acumulação que se verifica em alguns locais onde a novo atinge, por vezes, vários metros de altura. Aliás, mesmo que a estrada ficasse limpa de neve, não se poderia evitar a formação de gelo, devido às baixas temperaturas que "e verificam diariamente, na altitude a que só situai parte da estrada.
Porém, é indispensável tomar as necessárias medidas para que se procure desobstruir prontamente, logo após a existência de qualquer nevão, as ligações dos Piornos à Covilhã e a Manteigas - sendo aquele local, como se sabe, e da implantação da estação do vale do teleférico e, portanto, ponto de partida, do turismo da neve.
Para finalizar o problema das comunicações, faço um apelo a todas as entidades que tenham competência na matéria para auxiliarem a Câmara Municipal da Covilhã a ampliar, beneficiar e apetrechar o seu aeródromo, de forma a permitir o estabelecimento de carreiras regulares durante o Inverno com Lisboa e com o Porto (escalando neste caso em, Viseu), à semelhança do que já foi possível fazer durante a Primavera e Verão passados. Estas carreiras são indispensáveis ao desenvolvimento das regiões que servem e têm, agora, particular interesse para o turismo da serra da Estrela. Mas, além destes pormenores que acabo de referir a título exemplificativo, muitos pontos importantes deverão ser estudados e resolvidos no futuro.
Entre eles julgo básico reconsiderar a área, afecta à jurisdição da Comissão Regional de Turismo da Serra da Estrela, para decidir se deverá, ou não, ser ampliada. Entendo, quanto a este problema, que deverão ser ouvidos os corpos administrativos eventualmente interessados rã solução e proceder de conformidade com as deliberações por eles tomadas.

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Outro ponto importante que também interessará muito definir é o âmbito da concessão a atribuir à empresa de economia mista.
Há que assegurar aos capitais públicos e privados que irão ser investidos na serra da Estrela uma razoável rentabilidade, que será dependente do valor económico da concessão, e este, por sua vez, também relacionado com a duração e os limites geográficos que para ela vierem a ser estabelecidos.
Este problema é bastante, melindroso porque, reconhecendo a conveniência de atribuir à concessionária uma área razoável para campo das suas realizações, considero, por outro lado, indispensável atender aos direitos já adquiridos.
Mas, se julgo ser melindroso o problema, nem por isso creio que constitua dificuldade relevante. Pode, por exemplo, adoptar-se uma solução de áreas descontínuas, que não vão lesar quaisquer interesses já existentes, ou outra, que um estudo aprofundado do problema leve a concluir ser mais conveniente.
Já não considero merecedor de tantos cuidados o estabelecimento do período de tempo da concessão.
Admito que este possa ser bastante dilatado, a fim de proporcionar maior atractivo aos capitais.
De qualquer forma, a solução definitiva terá de ser estabelecida por diploma legal, onde todos os direitos ficarão, por certo, devidamente acautelados e ajustados.
Quanto ao capital da empresa, também reconheço não ser conveniente estabelecer um limite máximo, mas mínimo, acompanhando assim a sugestão apresentada no parecer da Câmara Corporativa.
Sobre este parecer, que já por mais de uma vez aqui evoquei, sinto-me na obrigação de felicitar o seu ilustre relator, Exmo. Sr. Dr. José Fernandes Nunes Barata, que fez brilhantíssimas intervenções em anteriores legislaturas, algumas sobre, problemas de turismo.
O parecer contém um estudo criterioso sobre diversos aspectos de turismo, quer geral, quer nacional, quer regional, e valiosas sugestões quanto à economia da proposta de lei e ainda referentes ao desenvolvimento do turismo na região da Estrela.
Sugere o ilustre relator uma nova redacção para o articulado da proposta de lei, com o objectivo de a tornar mais facilmente exequível e que merecerá, certamente, o interesse da Assembleia quando se proceder ao exame na especialidade.
Sr. Presidente: As potencialidades turísticas da serra da Estrela não são uma descoberta da década 1960-1970.
Já António Ferro, muito antes, referiu que o Algarve e a serra da Estrela eram as duas refines da metrópole com maiores aptidões para o turismo, ainda por aproveitar.
O desenvolvimento do Algarve está, felizmente, já em curso.
Quanto à serra da Estrela, só lamento não ter sido possível cumprir-se, ao menos em parte, a previsão de Fernandes Martins, feita em 1940 e transcrita no parecer da Câmara Corporativa:
A Estrela será, dentro em breve, um magnífico cartaz turístico, ao menos um Saint Moritz adentro das fronteiras.
Não julgo possível criar em Portugal um Saint Moritz de um ano para o outro, nem mesmo por mais dilatado período de tempo, por saber que a Estrela tem algumas limitações, que todos devemos reconhecer, para não nos iludirmos.
Mas não tenho dúvida alguma em afirmar que nesta serra existem também potencialidades que foram subestimadas, com graves prejuízos para o País.
Não penso que o desenvolvimento da região da serra da Estrela encontre a solução integral na proposta de lei em apreciação, uma vez que nem sequer ainda foi feito o inventário de todos os seus recursos.
Só este possibilitaria, realmente, uma planificação global, mas atrasaria muito o arranque desta região e comprometeria, talvez irremediavelmente, alguns valores que hoje se pretendem ainda aproveitar.
Ë dentro desta linha de pensamento que dou a minha aprovação na generalidade à proposta de lei referente a "adopção de medidas tendentes ao desenvolvimento da região de turismo da serra da Estrela", apelando para VV. Ex.ªs para que não ponham entraves às legítimas aspirações de uma vasta região do Centro do País - e uma das mais anteriores - que há muitos anos clama por justiça.
Tenho dito.
O orador foi cumprimentado.

O Sr. Correia das Neves: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: É com particular prazer que, desta tribuna, dirijo a V. Ex.ª, Sr. Presidente, os meus respeitosos cumprimentos e as mais sinceras homenagens, com entusiasmo de um dos "novos", mas com a honestidade também de quem se propõe trabalhar nesta Câmara conscienciosa e responsavelmente, como tem sido seu timbre de vida. E permita-me V. Ex.ª que estenda a todos os restantes Srs. Deputados a minha saudação e o mesmo protesto de muito apreço.
Um Deputado... é da Nação. Além de dever ocupar-se dos problemas gerais, como é óbvio, não tem de se confinar ao seu círculo, mesmo quanto aos de cariz regional. Nada de estranho, pois, que um Deputado de Beja suba à tribuna para falar da nossa Estrela; o mesmo é dizer: ir da planície à serra, em escalada longa.
Mas, desta vez, uma razão especial me impeliu para ela. Faz-se a apreciação da proposta de lei sobre o desenvolvimento da região de turismo da serra da Estrela. Ora acontece que, por agradável gosto do destino, nascemos e nos criámos à beira dela e algo conhecemos, na verdade, a respeito desse belo altar da paisagem portuguesa - "mirante de longes terras, vendo a Espanha e olhando o mar", como dela disse Fernandes Martins.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: E bem conhecida a iniciativa do Governo, com a proposta de lei para o desenvolvimento turístico da serra da Estrela.
Antes de mais, encaro-a como um sinal animador de que o Governo se propõe, decididamente, corajosamente, promover uma política de valorização sócio-económica do interior do País, onde o desânimo, a crise agrícola, o êxodo rural - este, viciosamente, efeito e causa agravativa daquela -, as deficiências de industrialização, mazelas tradicionais, fraqueza de recursos, um turismo nacional e estrangeiro de passagem, pouco mais, defeitos dos homens e da Administração, estão a criar autênticos vazios, clareiras demográfico-económico-sociais, mato bravio e pedras onde houve courelas ajardinadas ou vinhas mimosas.
Por certo, as melhores fontes económicas da serra da Estrela, por assim dizer tradicionais, são a indústria têxtil, a produção hidroeléctrica e a pecuária. Esta está directamente afectada pela crise agrícola e deserção rural e pelas deficiências da comercialização. A segunda não atingiu ainda a melhor capacidade, não investe, na região como seria de desejar e contempla áreas restritas. E a

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primeira atravessa grave crise, no próprio País em geral. O granito perdeu lia muito o seu valor económico, como material de construção, e a exploração dos recursos mineiros é modesta.
Na verdade, aquele quadro instalou-se já na vasta região das serranias da Estrela, o mesmo em Trás-os-Montes ou no Alentejo, como acontece, quanto a este, de modo particularmente confrangedor, na zona do chamado "campo branco" (a corda definida por Ourique-Castro Verde-Almodôvar-Mértola-Mina de S. Domingos).
Tenho, para mim, pois, que tal ilação positiva a tirar da iniciativa governamental merece especial realce e aplauso.
O fomento turístico em toda a região da Estrela, com o efeito multiplicador dos investimentos e despesas que lhe é próprio, e, assim, os largos benefícios capazes de proporcionar às terras e às gentes locais, há-de contribuir, em muito, para debelar a crise e reconverter a vida regional.
Logo por aqui se mostra, pois, a oportunidade e a vantagem da proposta de lei, que, a par da sua economia, compete agora à Assembleia apreciar e discutir.
K, na verdade, a serra da Estrela possui recursos tais que, indubitavelmente, a podem tornar um pólo de atracção turística dei inegável valor e projecção.
O parecer da Câmara Corporativa, documento notável que muito honra o seu ilustre relator, dá-nos bem conta disso.
Não são apenas os trechos paisagísticos, os largos horizontes; os desfiladeiros e as gargantas, como a de Loriga, algumas recortadas em estrela a partir do maciço central; os gigantes e escarpados morros de granito, como os famosos Cântaros; as manchas florestais das Penhas Douradas ou a das Penhas da Saúde, descendo sobre a Covilhã; as ravinas e os vales: do Mondego, do Zêzere ou do Alva; os espelhos de água das lagoas Comprida e Escura e das barragens já existentes e a construir, como a de Asse Dasse; a flora castiça, desde o piorno e zimbro às manchas verdes dos lameiros; as largas e fundas crateras vulcânicas, como a de Manteigas; as fracturas alpínicas; o "belo horrível" de Raul Brandão, e as mil e uma coisas do monstro sagrado...
É a neve e a sua beleza branca!
São os desportos de Inverno, em especial o ski, que podem praticar-se de Novembro a Abril, em várias pistas; desportos aquáticos, mesmo, na lagoa Comprida e outras barragens; é o excursionismo, o montanhismo, o alpinismo; é o ar fresco, puro e forte, de altitudes as mais aconselháveis, em certas zonas, mesmo para cura, e o Sol mais perto e mais azul o azul do céu de Portugal; é o campismo, como já se pratica, de forma regular e a bom nível, na Nave de Santo António, por exemplo; é a pesca, nas lagoas, barragens e cursos de água, nos muito* que descem da serra e onde a truta e outras espécies são já muito procuradas; é a caça, que abundai em algumas quebradas.
São os valores etnográficos, artísticos e histórico-culturais da extensa região. Linhares, verdadeira aldeia-museu; Belmonte e seu castelo - berço de Cabral; monumentos pré-históricos, como dólmenes; a Guarda e a sua Sé de granito nu; são as evocações de páginas atraentes de história de todo um rincão que tantos valores humanos tem dado à Pátria e onde vão implantar-se as raízes mais fundas da própria nacionalidade, no encalço das gentes e dos tempos de Viriato e de seu reduto, os Montes Hermínios!
Por outro lado, o próprio enquadramento geográfico da Estrela, no coração das Beiras tapetadas de vendeis e frescos pinhais, atraindo para si Coimbra e o seu circuito turístico, o próprio mar, mais alem, na Figueira da Foz, e ainda as searas mesmas do Buçaco e Caramulo; e podendo receber, directamente no seu seio, os turistas que entram por Vilar Formoso, uma das nossas fronteiras de terra anais movimentadas; tudo são condições a. augurar um seguro êxito para o futuro turístico da serra da Estrela, com a particularidade ainda de esta permitir, como resulta já do exposto, não apenas um "turismo de estação" de Inverno, mas igualmente o turismo estival.
Damos, pois, a nossa franca aprovação à proposta de lei, tanto mais que ela permitirá saiam do impasse em que caíram os trabalhos e obras com vista à instalação do teleférico, onde estão empatados alguns milhares de contos, bem como vem abrir a possibilidade de aproveitamento rentável das instalações da Força Aérea no planalto da Torre, como unidade hoteleira (c) de apoio, hoje praticadas "zonas intermédias".
Não obstante, há que tomar muitos cuidados, que a seriedade do empreendimento impõe, e atentar em muitos problemas decorrentes ou concorrentes que exigem especial reflexão.
O próprio desenvolvimento global do turismo há-de enquadrar-se num plano mais geral de desenvolvimento económico; e o fomento turístico de uma determinada zona, por outro lado, há-de obedecer a um plano regional de larga visão, e não pode esquecer, desde logo, as zonas confinantes por onde "e escoa ou completa e cuidar das chamadas "zonas intermédias".
E este é, particularmente, o caso da serra da Estrela.
A região de turismo da serra da Estrela, por sinal a primeira a ser criada no continente, pelo Decreto n.º 41 089, de 2 de Maio de 1957, tem a sede na Covilhã e abrange os concelhos de Belmonte, Covilhã, Fundão (na vertente sudeste), Gouveia, Seia (na vertente noroeste) e Manteigas (em pleno centro).
Ora, além de ser desejável que ela se alargue aos concelhos da Guarda e de Celorico da Beira, por razões várias, é altura de se lembrar aqui, na mais alta casa legislativa da Nação, esse trecho pitoresco e magnífico que é o "vale do Alva", tão esquecido ele tem andado dos Poderes Públicos.
Como se sabe, o Alva nasce na Estrela, desprende-se e afunda-se para noroeste, atravessando desde logo terras dos concelhos de Seia Oliveira, do Hospital, Arganil, etc., até ir morrer ao Mondego, já não longe de Coimbra.
Coleando em larga extensão o sopé da montanha, mormente naqueles três concelhos, é, por assim dizer, um complemento natural da serra da Estrela, sobretudo quando encarados um e outro sob o ângulo turístico.
Extremamente belo o seu vale. guarda nesse troço quadros de um pitoresco inigualável, conhecidos e famosos, como Sandomil, Ponte de S. Gião, Ponte, das Três Entradas, Avô, Barril e Coja. Com alguns bons areais, muita vegetação, pesca, barcas místicos, rica de etnografia, as velhas noras e azenhas, aldeias alcantiladas de sugestiva poesia, vertentes altas repletas de miradouros naturais admiráveis, como são exemplo as Varandas de Avô; romarias tradicionais, óptimos produtos agrícolas, boa fruta, majestosos montes sobranceiros, como o Colcurinho, no concelho de Oliveira do Hospital, etc.
Acontece ainda que, cortada pela estrada da Beira, na Ponte da Mucela, esta rodovia corre lado a lado com ele num extenso troço, pelo. alto da encosta norte, designadamente quando atravessa o concelho de Oliveira do Hospital, entre Senhor das Almas e Póvoa das Quartas, toda ela, nessa tira, verdadeiro miradouro para o rio, o vale e a serra.

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22 DE JANEIRO DE 1970 231

Mas, e por se reconhecer precisamente a grande atracção turística do vale em conjunção com a serra, está neste momento a Secretaria de Estado da Informação e Turismo a concluir a sua esplêndida pousada, toda cheia de raça e belas vistas, na Póvoa das Quartas, limite do concelho de Oliveira do Hospital, e que é, por certo, das mais felizes iniciativas dos serviços oficiais do turismo.
Toda a região, nomeadamente! o planalto de Oliveira do Hospital, é rica de atractivos e valores paisagísticos, artísticos e culturais. Para me não alongar, lembro apenas a existência dos vestígios romanos de Bobadela, a Capela dos Ferreiros, na vila sede do concelho (século XIII) - da qual Miguel Torga escreveu que é ir ali quem quiser ver a autêntica Idade Média: o amor, a religião, a cavalaria -, vários dólmenes. e sepulturas na rocha pela vasta zona, as igrejas moçárabes do século IX de Lourosa e S. Pedro, esta próximo de Arganil, exemplares dos famosos solares beirões; Avô - página fie história e poesia, etc.; boa cozinha, fruta, queijo da serra e vinho já de zona demarcada do apreciado Dão.
E, na verdade, Oliveira do Hospital, arrimada à serra a dois passos da estrada da Beira, via internacional das mais movimentadas, ligada a esta por uma estrada de 2 km cheios de curvas, hoje injustificáveis, tem estado clinicamente condenada a "ver passar" ali perto, à sua porta, na catraia de S. Paio, toda a torrente de turistas que entram por Vilar Formoso (destino próximo: Coimbra) ou vêm à serra da Estrela. Tal desvantagem seria fortemente atenuada se se ligasse a vila àquela estrada por uma ampla recita e moderna avenida, fácil de lançar, e cujo comprimento não iria além de 1 km.
Atente-se ainda em que, muitas vezes, a panorâmica de fora para dentro da .serra é mais surpreendente. E, quanto a turismo de montanha, até pelos riscos de certas perigos e inconvenientes, multas vezes o turista prefere alojar-se nas zonas de pé de serra ou ribeirinhas.
Vem tudo isto a propósito da conveniência que haveria em, oportunamente, o Governo, proceder à revisão da área da região de turismo da serra da Estrela. Não seria despropositado que ela "e estendesse às terras para baixo de Seia, de modo a abranger os concelhos de Oliveira do Hospital e Arganil, ou que, se criasse, por assim dizer, uma sub-região, na dependência daquela ou com autonomia.
Sugere-se no douto parece da Câmara Corporativa que a projectada sociedade de economia mista para a exploração turística da serra da Estrela, dada a complexidade do assunto, seja constituída por acto legislativo especial. Ora, em tal diploma poder-se-ia contemplar a sugestão, na eventual revisão daquela área. O fomento turístico da região serrana, não pode, não deve centralizar-se na vertem-te sudeste.
A proposta governamental sugere o estudo de muitos problemas. Porém, o tempo não nos permite o exame de todos. Ainda assim, faremos mais algumas breves considerações.
Bom seria que a sociedade de economia mista o fosse não apenas no seu capital e constituição, mas também no objecto ou fim social. Competir-lhe-á, como é natural, essencialmente, o fomento das actividades turístico-desportivas. Mas tenha-se em conta que, embora a nossa serra seja de neve sufi diante, de Novembro a Maio, não é, contudo, uma montanha de neve abundante em todo esse período.
Por outro lado, muitos dos valores económicos da região estão a deteriorar-se. Penso, em especial, no artesanato e no famoso queijo da serra, por certo o mais apetecido e típico queijo português.
Assim, estatutariamente mesmo, deveria ficar a sociedade expressamente vinculada à obrigação de fomentar, valorizar e defender também os valores económicos tradicionais da região. Aliás, os dois exemplos dados de perto se prendem com o turismo.
Pela sua particular importância, e muito em especial no caso concreto que ora se aprecia, cumpre fazer uma referência ainda às vias de acesso.
Desde logo, a chamada "Estrada da Beira" (estrada nacional n.º 17), Coimbra-Guarda, assume enorme interesse.
Ela é e será a grande via de acesso à Estreia pelas vertentes do noroeste. Por outro lado, é a importante artéria de penetração no interior d" uma vasta zona das Beiras. Acresce, ainda que, mercê da entrada de Vilar Formoso, como já se disse, é uma das estradas internacionais do País de maior movimento. Anote-se apenas o mi mero de estrangeires entrados por ali nos anos de 1966, 1967 e 1968, respectivamente: 162 115, 190 414 e 146 533.
Ora, como é sabido, é absolutamente urgente, e mormente para o bom êxito do turismo na serra da Estrela, que a estrada da Beira, a partir de Coimbra até à Guarda, seja beneficiada e rectificada, sobretudo com a eliminação de muitas das curvas que actualmente tem. Este problema é de incontestável interesse e urgente - acentuamos.
Por outro lado, há que cuidar devidamente da ligação rodoviária, da fronteira à Guarda, na continuação da estrada da Beira, e, depois, tal como sugere também a Câmara Corporativa, lançar, a partir daquela cidade, no enfiamento de Trinta, Videmonte, Penhas Douradas e Torre, uma boa via pelo interior da serra, pois, como se sabe, a estrada da Beira, descendo, como desce, da Guarida para Celorico da Beira, afasta desde logo os turistas da medula da montanha.
Impõe-se a franca melhoria da estrada, de grande pitoresco, aliás, que actualmente leva da Nave de Santo António a Manteigas, acompanhando o Zêzere, e que, segundo me informam, está já em vias dessa beneficiação.
Mas são vários os itinerários turísticos da serra da Estrela, já consagrados pela tradição. A escalada a partir da estrada da Beira-Gouveia, Mondeguinho. Penhas Douradas, Pousada de S. Lourenço, ou a de Seia, Sabugueiro, Lagoa Comprida, Torre, são dois dos mais praticados do lado noroeste. E nesta vertente ida Estrela existe ainda a entrada por S. Romão-Senhora do Desterro, cheia de interesse e pitoresco. Acontece, no entanto, que, a partir deste último local, tem de pagar-se portagem para a utilização da estrada ida Hidroeléctrica, aliás mal cuidada. Não será este momento próprio também para rever tal situação?
Tenho dito.
O orador foi cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão. Mas antes convoco a Comissão de Contas Públicas para, à discrição do seu presidente, iniciar o estudo das contas relativas ao ano de 1968.
A ordem do dia para a sessão de amanhã, uma vez que o grande número de oradores não permite dividi-la, limitar-se-á à continuação da discussão na generalidade da proposta de lei sobre o desenvolvimento da região de turismo da serra da Estrela.
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 15 minutos.

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232 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 13

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Alexandre José Linhares Furtado.
Augusto Domingues Correia.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Francisco José Pereira Pinto Balsemão.
João António Teixeira Canedo.
João Duarte Liebermeister Mendes Vasconcelos Guimarães.
José Coelho Jordão.
José Guilherme de Melo e Castro.
José de Mira Nunes Mexia.
José da Silva.
José Vicente Pizarro Xavier Montalvão Machado.
Luís Maria Teixeira Pinto.
Miguel Pádua Rodrigues Bastos.
Rogério Noel Peres Claro.
Rui Pontífice Sousa.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Álvaro Filipe Barreto Lara.
Antão Santos da Cunha.
António Júlio dos Santos Almeida.
Artur Manuel Giesteira de Almeida.
Fernando de Sá Viana Rebelo.
Francisco João Caetano de Sousa Brás Gomes.
Francisco Manuel Lumbrales de Sá Carneiro.
João José Ferreira Forte.
Jorge Augusto Correia.
José Pedro Maria Anjos Pinto Leite.
José dos Santos Baessa.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Júlio Dias das Neves.
Manuel Monteiro Ribeiro Veloso.

O REDACTOR - Januário Pinto.

Documentos enviados para a Mesa durante a sessão:

Projecto de lei

Artigo 1.º Os vogais que, nos termos do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 26 757, de 8 de Julho de 1936, fazem parte dos organismos de coordenação económica em representação das actividades por eles coordenadas serão designados pelas respectivas corporações.
Art. 2.º A designação deverá recair em membros dos conselhos das secções das corporações, correspondentes às actividades coordenadas; quando não existirem essas secções ou os seus membros não possuírem os requisitos exigidos pelo diploma orgânico do respectivo organismo de coordenação económica, a designação deverá recair, sempre que possível, em membros do conselho da respectiva corporação.
Art. 3.º O mandato dos vogais dos organismos de coordenação económica, como de todos os outros representantes em quaisquer órgãos consultivos dos Ministérios designados pelas corporações, terá a duração dos mandatos nas secções ou rios concelhos das corporações.
§ único. Enquanto as corporações não comunicarem nova designação, os anteriores vogais ou representantes continuam em exercício.
Art. 4.º Os mandatos dos vogais ou representantes actuais cessam trinta dias após a promulgação desta lei.
Art. 5.º Fica revogada toda a legislação, mesmo especial, em contrário.
O Deputado, Camilo Lemos de Mendonça.

Proposta de alteração

De acordo com o Regimento da Assembleia Nacional, proponho que o artigo 5.º do texto da proposta de lei relativa à adopção de medidas tendentes ao desenvolvimento da região de turismo da serra da Estrela seja alterado para a redacção seguinte:

Art. 5.º Para esse, efeito, fica também autorizada a Secretaria de Estado da Aeronáutica a ceder e ou arrendar a, empresa mista a constituir o material existente e as instalações que edificou no planalto da Torre, na serra da Estrela, e estiveram ocupadas pelo Grupo de Detecção, Alerta e Conduta da Intercepção n.º 1, esquadra n.º 13, pelo prazo, renda e demais condições que vierem a ser acordadas entre as duas entidades.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 21 de Janeiro de 1970. - O Deputado, João Vasconcelos Guimarães

Requerimento

Requeiro, ao abrigo do § 3.º do artigo 1.º do capítulo I do Regimento da Assembleia. Nacional, as seguintes publicações oficiais:

Dez Anos de Política Externa (volumes já publicados); Vasco da Gama e Suas Viagens de Descobrimentos (editada pela Câmara Municipal de Lisboa).

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 21 de Janeiro de 1970. - O Deputado, Fernando David Laima.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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