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REPÚBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL E DA CÂMARA CORPORATIVA
DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 69
ANO DE 1971 21 DE JANEIRO
ASSEMBLEIA NACIONAL
X LEGISLATURA
SESSÃO N.º 69, EM 20 DE JANEIRO
Presidente: Exmo. Sr. Carlos Monteiro do Amaral Netto
Secretários: Exmos. Srs.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira
João Bosco Soares Mota Amaral
SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 55 minutos.
Antes da ordem do dia. - Foi aprovado o n.º 67 do Diário doa Senões com uma rectificação apresentada pelo Sr. Deputado Leal de Oliveira.
Deu-se conta do expediente.
O Sr. Deputado David Laima requereu vários elementos relativos à importação de whisky pela província de Angola nos últimos trás anos e as receitas, despesas e quadro de funcionários e colaboradores da Junta de Energia Nuclear da mesma província.
O Sr. Deputado Ferreira Forte referiu-se a alguns aspectos do recente colóquio sobre o desenvolvimento sócio-económico da Cova da Beira.
O Sr. Deputado Lopes Frasão abordou o problema da pensão de sobrevivência aos servidores do Estado.
O Sr. Deputado Moura Ramos tratou de algumas questões pertinentes a vitivinicultura nacional.
O Sr. Deputado Aguiar e Silva manifestou-se contra os recentes acontecimentos que tem perturbado a vida universitária.
Ordem do dia. - Continuou a discussão na especialidade da proposta de lei sobre a actividade teatral, tendo sido aprovadas, algumas com alterações, as bases VIII a XIV, inclusive. No debate intervieram os Srs. Deputados Veiga de Macedo, D. Custódia Lopes, Alberto de Alarcão, Alberto de Meireles, Magalhães Mota, Pinto Balsemão, Júlio Evangelista, Pinto Machado e Gonçalves de Proença.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Eram 15 horas e 45 minutos.
Fez-te a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Alberto Eduardo Nogueira Lobo de Alarcão e Silva.
Albino Soares Finto dos Reis Júnior.
Álvaro Filipe Barreto de Lara.
António Bebiano Correia Henriques Carreira.
António Fausto Moura Guedes Correia Magalhães Montenegro.
António da Fonseca Leal de Oliveira.
António Júlio dos Santos Almeida.
António Pereira de Meireles da Bocha Lacerda.
António de Sousa Vadre Castelino e Alvim.
Armando Júlio de Roboredo e Silva.
Armando Valfredo Pires.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Augusto Salazar Leite.
Carlos Eugénio Magro Ivo.
Carlos Monteiro do Amaral Netto.
Delfim Linhares de Andrade.
Delfino José Rodrigues Ribeiro.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Eleutério Gomes de Aguiar.
Fernando Artur de Oliveira Baptista da Silva.
Fernando Augusto Santos e Castro.
Fernando David Laima.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Filipe José Freire Themudo Barata.
Francisco António da Silva.
Francisco João Caetano de Sousa Brás Gomes.
Francisco José Pereira Pinto Balsemão.
Francisco Manuel Lumbrales de Sá Carneiro.
Francisco de Moncada do Casal Ribeiro de Carvalho.
Gabriel da Costa Gonçalves.
Gustavo Neto Miranda.
Henrique Veiga de Macedo.
Humberto Cardoso de Carvalho.
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João Bosco Soares Mota Amaral.
João José Ferreira Forte.
João Lopes da Cruz.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
João Ruiz de Almeida Garrett.
Joaquim Germano Pinto Machado Correia da Silva.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Joaquim de Pinho Brandão.
Jorge Augusto Correia.
José Coelho de Almeida Costa.
José Coelho Jordão.
José da Costa Oliveira.
José Maria de Castro Salazar.
José Vicente Cordeiro Malato Beliz.
Lopo de Carvalho Cancella de Abreu.
Luís António de Oliveira Ramos.
D. Luzia Neves Pernão Pereira Beija.
Manuel de Jesus Silva Mendes.
Manuel Joaquim Montanha Pinto.
Manuel Marques da Silva Soares.
Manuel Martins da Cruz.
Maximiliano Isidoro Pio Fernandes.
Olímpio da Conceição Pereira.
Pedro Baessa.
Rafael Ávila de Azevedo.
Raul da Silva e Cunha Araújo.
Ricardo Horta Júnior.
Rui de Moura Ramos.
Teófilo Lopes Frazão.
Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 63 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 15 horas e 55 minutos.
Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente: - Está em reclamação o n.º 67 do Diário doa Sessões.
O Sr. Leal de Oliveira: - Sr. Presidente: Peço o favor de ao Diário das Sessões em reclamação ser feita a seguinte rectificação: na. p. 1363, col. 1.ª, ,1 40, onde se lê: «assalarial», deve ler-se: «salarial».
O Sr. Presidente: - Se mais nenhum de W. Exa. tem qualquer reclamação a apresentar sobre este Diário tias Sessões, considerá-lo-ei aprovado com a rectificação apresentada.
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Telegramas
Apoiando a intervenção do Sr. Deputado Sá Carneiro sobre a revisão da Concordata.
Do reitor do Liceu Normal de Coimbra apoiando a intervenção do Sr. Deputado Brás Gomes sobre o teatro nos liceus.
Vários apoiando a intervenção do Sr. Deputado Leal de Oliveira sobre a situação dos agentes rurais.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra para um requerimento o Sr. Deputado David Laima.
a Sr. David Laima: -Sr. Presidente: Pedi a palavra para apresentar o seguinte
Requerimento
Com o fim de me documentar para uma futura intervenção, requeira, aios termos regimentais, que, pelo Ministério do Ultramar, me sejam fornecidas as seguintes informações:
A
1.º Quantidades e valor das importações do whisky efectuadas pela província de Angola nos últimos três anos;
2.º Países fornecedores e respectivos contingentes;
3.º Numero de importadores inscritos e distribuição do contingente total importado por cada um dos importadores.
B
1.º Elementos discriminativos das receitas e despesas da Junta de Energia Nuclear da província de Angola;
2.º Quadro em serviço ou colaborando na referida Junta.
O Sr. Ferreira Forte: -Sr. Presidente: Trazemos hoje à consideração da Câmara alguns aspectos do colóquio sobre o desenvolvimento sócio-económico da Cova da Beira, realizado de 28 de Setembro a 3 de Outubro de 1970, integrado nas comemorações do 1.º centenário da cidade da Covilhã.
À abertura do colóquio presidiu S. Exa. o Subsecretário de Estado do Planeamento Económico e teve a presença em sessões plenárias de SS. Exas. os Secretários de Estado da Agricultura, do Comércio e da Indústria. A presença de tão ilustres como responsáveis personalidades dá-nos a ideia da importância que o Governo dedica aos problemas do desenvolvimento sócio-económico da Cova da Beira.
A Cova da Beira começa a ser considerada como uma região económica no interior do espaço português europeu, deixando de ser uma região natural e administrativa.
Dentro do esquema do planeamento regional, a Covilhã e a Cova da Beira pertencem à zona central. Citando o Dr. João Salgueiro, diremos: «A cidade da Covilhã e a Cova da Beira constituem um caso único na sub-região interior, pela dimensão das actividades industriais e pela posição do centro urbano - quer do ponto de vista puramente demográfico, quer em referência aos seus índices de equipamento e serviços, superiores aos da generalidade das capitais de distrito no interior do continente - e ainda pela existência de potencialidades já reconhecidas de investimentos sectoriais com relativa abundância.»
Na base da evolução da zona, ao longo do tempo, está o aproveitamento energético e agrícola dos bacias hidrográficos do rio Zêzere e da ribeira da Meimoa. Como é natural, o colóquio a que nos estamos referindo deu larga importância aos problemas ligados ao regadio. Recordemos que no capítulo dedicado aos problemas sectoriais e na parte desses programas que dizem respeito à hidráulica agrícola, dispõe o III Plano de Fomento (1968-1973) que, na sua vigência, se concluirão os projectos e se iniciarão as obras que visem o estabelecimento de um regadio de 15 000 ha na Cova da Beira.
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Menciona igualmente o Plano, também, quanto à Cova da Beira, a realização de obras fluviais de defesa e estabilização das margens e leitos dos cursos de água.
No colóquio foi afirmado que estilo em curso estudos no sentido de se definir a origem da agua para os blocos do regadio do Fundão, Covilhã, Caria e Belmonte, com base no maciço central da serra da Estrela. Quanto ao bloco da Meimoa, admite-se que a água que o alimentará poderá provir de duas albufeiras: uma a estabelecer nos cabeceiras da ribeira da Meimoa e outra no rio Côa.
Para a grande viabilidade do regadio concorrem a existência de uma densidade populacional apreciável, um pólo urbano com mais de 40 000 habitantes, a existência da prática da utilização da água, grandes potencialidades no campo da fruticultura e da pecuária, uma razoável rede de comunicações, existência de razoável associativismo agrícola, e um prédio rústico pertença do Estado - a Quinta da Lajeosa -, com a área de 881 ha, localizada no centro geográfico da Cova da Beira, onde funciona já uma escola para o ensino agrícola e onde se pode montar toda a experimentação que vier a ser necessária.
Antecipando-se a realização do grande regadio, os empresários agrícolas, é certo que em esforços isolados, visaram desde sempre a obtenção de água para as suas terras, de tal modo que os serviços hidráulicos inventariaram, em 1960-1961, 2840 ha de solos bem regados e 8790 ha de terrenos deficientemente regados. Iniciaram também, desde há muito, a reconversão cultural, substituindo o milho e a batata pela fruticultura. Existe hoje mais de um milhar de hectares de pomares instalados em boas condições técnico-económicas.
Não esquecemos que o sector governamental, sempre ou quase sempre, apoiou estes esforços. E, assim, no colóquio, S. Exa. o Secretário de Estado da Agricultura afirmou:
Foi-me possível contribuir, por dever de ofício, para o arranque de algumas das principais infra-estruturas que, a golpe de tenacidade e de senso prático, os agricultores aqui levaram ou estão levando a efeito. Recordo, por exemplo, algumas das adegas cooperativas, o nascente complexo agro-industrial, muitos dos modernos pomares que, no seu conjunto, estão valorizando a região e trazendo francas possibilidades de progresso à sua agricultura.
Perante todos estes factos, não é de estranhar que as forças locais, sob a égide do presidente da Câmara Municipal da Covilhã, engenheiro Vicente Borges Trenas, a quem daqui rendo as minhas homenagens, resolvesse apoiar a formação de um Grupo de Trabalho para o Planeamento da Cova da Beira. O Grupo foi formado em 1966, com o apoio efectivo das câmaras municipais da região. Ao dinâmico secretário-geral do Grupo de Trabalho, Dr. Duarte Simões, é com justiça que daqui lhe rendo também as minhas homenagens.
Acreditamos que estão lançadas as bases para a realização da grande obra - o regadio dos 15 000 ha de terrenos da Cova da Beira. Não duvidamos do êxito, dado que estão interessados o Governo, as autoridades locais e grande parte dos futuros utentes da água, esses dinâmicos empresários agrícolas, que já plantaram os pomares e se associaram em cooperativas de transformação e comercialização.
Mas convém insistir que o desenvolvimento pretendido é menos viável se não se verificar uma generalizada participação no processo que o visa, pois, mão sendo assim, perante a expectativa e espera que os problemas surjam resolvidos o as aspirações sejam alcançadas, não existem planos que consigam ser úteis.
No sector que estamos referindo, colóquio terminou com um voto no sentido de que:
No ordenamento do território, a Cova da Beira venha a ser considerada pólo de desenvolvimento e zona-piloto de investimentos concentrados;
Que se limite oficialmente a Cova da Beira;
Que se faça um inquérito rigoroso as empresas agrícolas existentes e que se estudem as condições de industrialização e comercialização das grandes produções agrícolas locais.
Esperamos que em breve o Grupo de Trabalho para o Planeamento da Cova da Beira seja reconhecido oficialmente e se lhe dêem melhores condições de trabalho.
Ao terminar, solicitamos ao Governo que acelere ainda mais os planos para que o regadio dos 15 ha da Cova da Beira esteja concluído em espaço de tempo à medida das aspirações do tempo em que vivemos, e queremos viver intensamente, pote ele poderá fornecer à mossa região condições de vida aceitáveis, evitando assim que a chaga da emigração continue a alastrar. Ele será, assim o queremos, um vector paca que a economia, beiroa possa ser - como sintetizou Marcelo Caetano - mais segura de si, mais independente, mais dinâmica.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi cumprimentado.
O Sr. Lopes Frazão: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Toda a Nação, para que seja autêntica no seu valor, precisa que o Estado seja perfeito na sua contextura, que nunca o será se os seus servidores forem imperfeitos no seu executar. E é que os servidores da função pública, nos dias que vão correndo, infelizmente, por lhes assistirem razões de sobra e de grande peso, cada vez são mais a fazerem cada vez manos.
Não vamos hoje aqui alongar muito o que a favor do funcionalismo público, no seu viveu- extremamente perturbado, tem sido dito e redito nesta Casa, onde, para bem do País, só se tonta construir, na lamentação consciente das faltas todas como factores de destruição, e que a nós, responsáveis, nos compete estorvar o mais que em nossos forcas couber.
Esta, e só esta, a razão do que vamos ditar, propugnando pelas famílias dos servidores modestos do Estado e corpos administrativos, quantas vezes os de maior diligência, e ainda pelas dos da hierarquia superior, que inteiramente devotados ao servir o público, não agenciaram o suporte necessário ao viver condigno do seu agregado, no amanha enegrecido do seu falecimento.
Nós bem sabemos, e é de justiça evidenciá-lo, que o Governo, de sempre, tem vindo a observar atentamente a situação dos seus servidores, e isso lhe compete. E mais ainda, ultimamente, por condicionalismo vário, essa atenção se vem redobrando.
Mas também sentimos em agudeza quanto todo esse esforço do erário, que é enorme, se minimiza perante os necessidades tantas e prementes de quem serve melhor, e poderá servir ainda muito melhor, em tão grande porte só porque as estruturas são velhas e imperfeitas.
Por assim o entendermos, é que nós próprios, e por varias vezes, aproveitando a discussão dos leis de meios, temos considerado a situação da extrema precariedade do funcionalismo e apontado soluções para que todos tenhamos um viver melhor, no convencimento certo de que, com maus funcionários, todos havemos de viver pior.
Em 1965 e nos anos para trás, em que era desesperada a situação dos funcionários, por extrema debilidade
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de provento, o visto a impossibilidade do seu acréscimo substancial, que em absoluto se impunha, quando o Governo apenas entendia que «o problema da situação económica dos seus servidores se revestia de particular importância e se encontrava presente na linha das suas preocupações», mas dai não passava, nós sugerimos da tribuna desta Assembleia, em intervenção de Dezembro de 1965:
À restruturação dos quadros e a simplificação efectiva do nosso prolixo mecanismo burocrático.
Esta a síntese da reforma administrativa, no ano seguinte anunciada pelo Governo, e por nós tida como a única possibilidade de, sendo menos e mais bem pagos, se conseguia, de certeza, até mais trabalho, e seguramente mais produtivo.
Hoje trabalha-se em abastardamento de acção, de um mascarado full-time por um part-time que em muitas exercitações, quase não se deixa ver!
E é que não há meio de aparecer a tão falada reforma administratival.
Nós compreendemos perfeitamente o querer do nosso Presidente do Conselho, que «as reformas alcancem o mais longe possível», como tal exigindo larga meditação.
Percebe-se, portanto, que a reforma administrativa, tão complexa, leve tempo a elaborar.
Mas o pior da demora esta nos «remendos de ocasião», que vão sendo muitos e frequentes, deteriorando cada vez mais a função pública, e que, por assim o ter por certo, o nosso Prof. Marcelo Caetano não os queria por forma alguma!
Pouco vale a pena enumerá-los, tão conhecidos eles suo. Há quem tenha gratificações e quem não tenha, quem tenha diuturnidades e quem não tenha, quem tenha horas extraordinárias e quem não tenha, quem tenha na sua hierarquia departamental letras do princípio do alfabeto e quem não tenha, quem tenha ajudas de custo permanentes e quem não tenha, quem tenha serviços sociais a funcionarem eficientemente e quem não tenha, enfim, um nunca acabar de distorções que só geram perturbação nos espíritos e embotamento nas vontades.
Depositamos a maior esperança que a chamada recente dos serviços da reforma administrativa À Presidência do Conselho seja para sua aceleração e perfeição, aquelas que se impõem e pelas quais se anseia.
Onde vai já, neste dealbar de 1971, a apagada expressão dos 18,65 por cento (média) de acrescentamento aos vencimentos da letra Q para baixo e dos 19,36 por cento (média) da letra N e até à F, percentagens essas atribuídas em Novembro de 1969, ou seja decorrido um ano e pouco mais, e que oportunamente nos mereceram franca discordância na sua fixidade e pequenez?
Bem entendíamos nós então que era mesmo verdadeira a suspeita posta no relatório preambular da Lei de Meios de que se não tinha alcançado o desejável!
E onde se situa agora a representatividade dos ínfimos 100$ do abono de família, que antes eram pouco, mas ainda eram qualquer coisa!
A habitação, essa, no volume imenso das necessidades de milhares, e tão-só na satisfação de dezenas, muito pouco conta na melhoria do esquema social do funcionário.
A assistência na doença, essa sim, já hoje reflecte imagem que se veja, se bem que carecida ainda de uma maior amplitude, pois não se entende que somente se dirija aos pais e não contemple os filhos, exactamente as células mais vivas da família, aquelas que exigem o maior desvelo e obrigam aos máximos sacrifícios, para os quais o dinheiro é sempre pouco.
E é num momento como este, em que muito se tem ouvido falar de milhões, que na bolsa de tantos funcionários tilintam apenas magros tostões!
Por isso proclamámos já em intervenção passada a absoluta necessidade de uma melhor justiça fiscal, para que tenhamos mais justiça social!
Vozes: -Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: «O Estado tem», no dizer do nosso Presidente do Conselho, «responsabilidades quanto aos seus servidores», e por esta razão e porque a reforma leva o seu tempo, entende, e bem, que em seu favor «se devem tomar as providências que seja possível».
É com base neste contexto, de tanta justeza, toda aquela a que S. Ex.ª nos habituou no seu recto e tão esclarecido pensar, que eu me permito pedir-lhe, à sua qualidade do mais alto responsável do Governo, que considere, com a maior brevidade, a necessidade premente da atribuição a todos os servidores do Estado e dos corpos administrativos da pensão de sobrevivência.
Vozes:-Muito bem!
O Orador: - O Decreto-Lei n.º 49 031, de 27 de Maio de 1969, estendeu da dois para seis meses o subsídio de morte; mas, pergunta-se, e depois dos seis meses, como passa a viver a família do funcionário cumpridor, que deu tudo por tudo ao Estado?
Vozes: -Muito bem!
O Orador: - E que exemplo para os outros é este da devoção ser causa de uma amargurada existência futura?
Para quê escolas, liceus, Universidades, departamentos vários de serviços, tudo muito bem construído e equipado, se não se ensina nem se investiga bem, se não se trabalha com fé e em franca produtividade, e isto porque o funcionário tem que melhor prover o seu sustento de hoje e pensar no amanhã da sua família, se ela tiver a desdita de perder o seu arrimo!
Os seis meses de subsídio duo para o luto e funeral, e pouco mais! E depois?
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Nós temos bem vincado no nosso sentir o passamento de um amigo grande, que foi chefe de repartição dos meus serviços, de um nosso muito querido director-geral, que foi catedrático e investigador do maior merecimento, e muito recentemente de um intendente de pecuária, todos, mas todos totalmente entregues h missão de bem servirem, e só servirem, o País. Pois são os responsáveis mais directos que se obrigam a pôr o seu coração ao serviço destas desventuras, o que não está certo e por vezes tem os seus impedimentos, quando antes devia ser a obrigação da lei a mitigá-las.
Isto não está bem!
E o próprio Estado que exige para os empregados por conta de ou trem, nos respectivos contratos colectivos de trabalho, a garantia do subsídio mensal de sobrevivência, na importância de 50 por cento da pensão de reforma para o cônjuge sobrevivo e mais 20 por cento, 30 por cento ou 40 por cento para os filhos, consoante o seu número.
Mas mais ainda o mal se evidencia, e mais a razão se me radica, por se saber que há servidores do Estado,
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os do Ministério do Ultramar, quer os dos quadros do próprio Ministério, quer os da administração provincial no ultramar, que, ao abrigo do Decreto n.º 47 109, de 21 de Julho de 1966, igualmente bom direito à pensão de sobrevivência, no montante da metade da pensão de aposentação.
E esta discriminação de funcionários é que não esta certa por princípio algum!
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Não se venha dizer que os restantes servidores têm o seu Montepio, pois este praticamente para nada serve na exiguidade das suas pensões - ainda com a suplementação estabelecida no Decreto n.º 87 184 - de 57$50 a um máximo de 1750$, mensalidade, mesmo esta, que nem sequer chega para a renda da casal Este máximo de pensão só se constitui ao fim de trinta anos do desconto mensal de 150$, verba ainda hoje incomportável para a grande maioria dos funcionários, e antes impossível de satisfazer por todos, a não ser pelos já de si senhores de proventos extra-oficiais.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Já porque, à face do artigo 12.º da Constituição Política, «ao Estado compete assegurar a defesa da família, como fonte de conservação e desenvolvimento do povo português», e a tem «por base primaria da educação, disciplina e harmonia social», já porque nos sentimos bem apoiados na ideação do nosso Presidente do Conselho, de «que criticando construtivamente se vencem as dificuldades e se encontra o rumo certo», isso nos levou a esta tessitura, «raciocinada com frieza e recta intenção», tentando reforçar a protecção social da família de tantos e tantos servidores do Estado, que se arreceiam, na incerteza do dia de amanhã, de a terem francamente desprotegida, arrostando uma vida negra de infortúnio.
Disse.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi cumprimentado.
O Sr. Moura Ramos: - Sr. Presidente: Debatida já tantas vezes e por tantas e tão qualificadas pessoas, pareceria de todo ocioso voltar a debater nesta Assembleia o problema da crise imerecida do nosso mundo rural.
O nosso objectivo é,, porém, muito outro e muito mais modesto, pois se limito a abordar questões pertinentes, segundo julgamos, à vitivinicultura nacional, que constitui um dos factores básicos da economia portuguesa, pelo que se impõe que a produção e comércio dos nossos vinhos se processe pelo modo móis aconselhável, mais útil e, por isso mesmo, com a mais larga margem, de rentabilidade.
Não é, pois, de admirar, nem parece despiciendo, que sendo a vitivinicultura u melhor fonte de rendimento e o quase exclusivo suporte das economias dos nossos lavradores, cause um justificado alarme qualquer medida tomada e que contrarie ou diminua essa fonte de rendimento.
Foi o que se verificou ainda recentemente, quando pelos ilustres Deputados Valente Sanches, Camilo de Mendonça e Gaspar de Carvalho foi nesta Câmara ventilado o problema das exportações de vinho para o ultramar, cujo mecanismo, já muito deteriorado no ano passado, corre o risco de se agravar em face das restrições oficiais anunciadas, aludindo-se as repercussões que de tal medida podem resultar para o necessário equilíbrio das explorações agrícolas da metrópole, que no vinho encontram um dos poucos pontos de apoio a contrabalançar deficits de outros iramos do sector agrícola.
Na intervenção do sr. Deputado Valente Sanches foi posta a questão de saber se se justifica que sobre a lavoura continue a pesar o encargo do pagamento a Junta Nacional do Vinho da taxa de $20 por litro, uma vez que a Junta «nem sempre tem sabido ou podido exercer a sua função de regularização do mercado do vinho ...».
Ora, a taxa sobre o vinho, lançada pela Portaria n.º 21 006, de 28 de Dezembro de 1964, constituiu medida que foi objecto de várias criticas, protestos e reacções, mormente por surgir numa altura de atmosfera sombria para a viticultura nacional, que, sem dinheiro, sem ânimo e com agravamento tributário, teria de iniciar os trabalhos para a colheita de 1965. Considerada impopular e inoportuna a aplicação da referida taxa, houve, porém, que encorá-la como «um mal necessário» contra o então aviltamento de preços, uma vez que não concedendo o Estado os créditos precisos para que a Junta pudesse intervir no mercado com preços iguais aos da campanha anterior, ela se contraporia a um mal maior, que seria o de uma baixa de preços superior ao que resultava da aplicação da mesma taxa.
Outra medida mais adequada não encontraram então os responsáveis, a qual foi também apodada de impolítica, pois que se endossaram ao Governo as odiosas responsabilidades na sua concepção e aplicação, quando é certo que este apenas a autorizou no convencimento em que estava de que tal solução havia sido sugerida e aceite por toda a vinicultura nacional, o que parece não ter correspondido bem a realidade em face das reacções em contrário que provocou.
Tendo então a Junta Nacional do Vinho por completamente esgotada a sua capacidade financeira e ganhando apreciável audiência a ideia de resolver o problema do vinho com recursos do próprio circuito, mesmo com sacrifício directo para a viticultura, o lavrador, sempre disposto a todos os sacrifícios e receoso de que a crise pudesse transformar uma questão económica num problema político e social, acabou por anuir ao pagamento da taxa de $40, por cada litro de vinho entregue. Isto fez também na esperança de ver solucionados os seus problemas e restabelecido um equilíbrio de mercado, que lhe era, de todo em todo, desfavorável. E que, perante a impopularidade da medida, prometeu-se:
1.º Que seria transitória;
2.º Que simultaneamente se tentariam medidas de simplificação do circuito comercial dos vinhos, por forma a evitar e legião de intermediários que se aproveita habilmente da instabilidade do mercado para pôr em prática um processo especulativo altamente rendoso em prejuízo do produtor e do consumidor.
E tudo isto vinha acontecendo de modo a «o consumidor nada beneficiar e o produtor tudo pagar para o intermediário amealhar», como um dia, espirituosamente, afirmou nesta Câmara o saudoso Dr. Marques Fernandes.
Porém, que veio a suceder? Apenas isto: nada das tais providências prometidas e a transformação da cobrança do diferencial que teria carácter provisório em medida de carácter definitivo.
Mantida efectivamente na campanha de 1965-1966, por força do Decreto-Lei n.º 46 861, de 7 de Fevereiro de 1966, a taxa sofreu uma redução para metade ($20) na campanha de 1966-1967, por força do Decreto-Lei n.º 47 470, de 81 de Dezembro de 1966, que também veio a modificar o sistema de cobrança, visto que o seguido
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revelara-se, na prática, menos oportuno, sobrecarregando, por igual, a lavoura.
Mais: atenta a finalidade com que foi criado o diferencial de $40, agora reduzido para $20, e que consistiu em habilitar a Junta Nacional do Vinho a estar presente por compra no mercado, assegurando preços mínimos à produção, parecia razoável e lógico que não seria de fazer a cobrança de qualquer taxa sempre que tal intervenção se não realizasse, aliviando, assim, a lavoura deste sacrifício.
Mas não tem assim acontecido, não obstante a medida adoptada pela Junta ter sido «provisória, dizendo só respeito à colheita do ano de 1964 e até se encontrarem soluções de fundo susceptíveis de colocarem, finalmente, a viticultura no caminho que há-de levar à completa reconversão das suas estruturas, que têm ainda de ser completadas», conforme afirmou ao Diário Popular, em 28 de Dezembro de 1964, o então presidente da Federação dos Grémios da Lavoura da Estremadura.
Ora, efectivamente, nos últimos dois anos, a Junta não interveio por compra no mercado dos vinhos sem que, no entanto, deixasse de ser arrecadado da mesma forma o produto da aplicação da taxa referida. E dada a razão por que a viticultura se propôs suportar, com tanto sacrifício, o diferencial, certo é que, em caso algum, aceitará o seu desvio para fins diversos, pelo que seria curial ou conveniente saber a que tem sido afectada a receita obtida pela cobrança da taxa.
São seria mesmo de excluir de todo a manutenção da taxa se fosse aplicada na efectiva intervenção da Junta em termos de rentabilidade para a lavoura.
Na verdade, ao verificar-se que a Junta deixa de intervir no mercado dos vinhos, logo os intermediários surgem a pôr em acção os seus pouco escrupulosos e oportunistas processos, numa campanha bem orientada, com tanto de satânica quanto de inteligente, para levar os mais débeis viticultores a vendas intempestivas e a preços ruinosos. Congratulemo-nos, pois, com a notícia vinda a lume nos jornais do dia 16, de que a Junta vai abrir, desde já, uma operação de compra de vinho nas zonas em que se mostrar aconselhável, lamentando-se, no entanto, que a política de intervenção da Junta não se haja definido há mais tempo, e na medida devida, quanto ao preço.
O Sr. Camilo de Mendonça: - V. Ex.ª dá-me licença?
O Orador: -Faça favor.
O Sr. Camilo de Mendonça: - Eu tenho estado a ouvir as considerações de V. Exa. com o maior interesse e com geral aplauso. E, se me permite, peço-lhe licença para o interromper, só para acrescentar que estou perfeitamente de acordo em que a taxa que a lavoura aceitou tinha uma contrapartida da parte do Governo: era manter a Junta permanentemente interventora no mercado. Efectivamente, ora campanha passada isso não aconteceu. Porventura, a lavoura também teve culpa nisso e, nesta, até muito recentemente continuou a tê-la. Simplesmente, foi um erro, para mim grave, no momento em que se aceitavam restrições para o ultramar, não se ter tornado imediatamente a Junta interventora.
Mas a razão principal do meu pedido de interrupção era para acrescentar que não fiquei tranquilo nem satisfeito com a notícia que vi nos jornais e, por isso, fui procurar esclarecer-me. Efectivamente, a intenção do Governo é ir muito mais longe do que daquele pequena nota podia deduzir-se: é intenção firme do Ministro da Economia que a intervenção se processe até onde for necessário; é também intenção do Governo praticar preços de intervenção que não se afastam daquilo que a lavoura pretende ou os seus representantes solicitaram. Creio, portanto, que, neste momento, mercê de uma notícia elaborada de forma que não é a melhor, deveremos aqui - e aproveitando o pretexto, da intervenção de V. Exa. - tranquilizar o País, pois a vitivinicultura será eficazmente defendida em termos de garantir o preço equilibrado e possível no momento presente. E creio também que, nesse aspecto, n lavoura verá justificado o seu sacrifício e nós todos ficaremos tranquilizados quanto ao futuro de uma actividade socialmente tão importante.
Muito obrigado a V. Exa.
O Orador: - Muito obrigado, Sr. Deputado Camilo de Mendonça, pela achega que deu a minha intervenção, bem como ao esclarecimento que prestou quanto nota saída nos jornais.
Mas para atacar eficazmente o problema do vinho impõem-se providências de fundo, figurando como principais as relativas ao álcool e ao plantio da vinha e, quanto a esta, deverá ter-se em consideração o possível lugar que lhe deve caber como instrumento do desenvolvimento regional.
O problema do álcool urge estudá-lo e solucioná-lo no sentido de evitar que as duas economias - vinho e álcool - se mantenham concorrentes, com grave prejuízo para a do vinho, permitindo, embora através de processos fraudulentos, aumentar quanto se quiser a produção vinícola, em vez de se tornarem antes complementares uma da outra e postas em pé de igualdade.
O plantio da vinha, suspenso pelo Decreto-Lei n.º 46 256, de 19 de Março de 1965, e cuja actualização, há tanto tempo necessária, e já anunciada, ainda se não fez, terá de assentar em moldes novos e, tanto quanto possível, em critérios objectivos, rígidos e justos, liberalizando-se tão-sòmente em função do inaproveitamento dos terrenos para outras culturas e sempre à luz dos superiores interesses nacionais, sem perder de vista que possuímos condições naturais favoráveis a uma maior produção de vinhos de alta qualidade e que é a qualidade que conquista mercados. Efectivamente, só com uma profícua política de valorização da qualidade podemos defender as zonas tradicionais onde se colhem os mais requintados produtos. Ora, para que tal política de qualidade se ponha em acção, é preciso que a iniciemos ao nível da produção. É, portanto, na vinha, na sua implantação nos terrenos e nos climas que lhe são mais apropriados, bem como na escolha das castas e melhoria da técnica do plantio e das condições de cultivo, que residem as razões de uma nomeada que a política económica vem, mais tarde, defender e dar rentabilidade. Não é de olhos postos na quantidade e atendendo, para efeitos de venda, apenas ao teor alcoólico em busca de um oportunismo, nem deixar o licenciamento das plantações completamente entregue a serviços alheios aos problemas da economia do vinho, que podemos falar em política de defesa da qualidade.
O rumo urgente e que se impõe, quanto antes, no campo da vitivinicultura é, pois, o de produzir vinho bom e a preço acessível para o grande consumo - sem prejuízo de uma goma de vinhos caros, mas de alta qualidade.
Fala-se agora muitas vezes em desafios à' iniciativa privada; mas esta tem também o direito de desafiar os diversos serviços oficiais. Este o desafio lançado à Junta Nacional cio Vinho e outros organismos - e a começar pelos serviços encarregados de estabelecer o regime do condicionamento do plantio da vinha.
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Num recente colóquio em Vila Real tratou-se do problema do vinho - a começar pelas condições em que é produzido, sobretudo tendo em vista o crescente custo e até mesmo a falta de mão-de-obra e, portanto, a possível mecanização dos trabalhos das vinhas ou destinação dos terrenos a outras culturas ou florestarão.
Ora, a evolução do mercado consumidor - interno o externo -, dia a dia mais amplo e exigente impõe coragem e decisão para que se legislo em dois sentidos, paralelos e distintos:
Regiões de vinho de qualidade;
Regiões de vinho de quantidade.
O primeiro, de custos e para preços mais elevados, mus a que não faltam pretendentes desde que realmente seja de boa qualidade; o segundo, para consumo geral, da preço acessível a generalidade da população e a nível de competir com o preço dos refrigerantes.
As adegas cooperativas têm tido meritória acção no campo da vinificação da uvas, utilizando técnicas que não estão ao alcance de todos e melhorando, por isso mesmo, o nível geral dos nossos vinhos; mas sabe-se que só até certo ponto é que esta melhoria de qualidade se faz nas adegas cooperativas, em virtude de a aceitação da matéria-prima de qualidade muito variável, não lhes permitir ir muito mais além. Algumas delas, no entanto, começam já a apresentar vinhos de qualidade a preço correspondente.
Mas a legislação vigente nem defende a qualidade das regiões a isso propícias, nem facilita a quantidade a baixo custo nas regiões para tal adequadas. Há cada vez mais quem pretenda vinhos de qualidade e disposto a pagá-los como tais - mas também há uma grande massa de público que reclama vinho bom e quanto possível barato. Cresce o interesse mundial pelos vinhos correntes, mas de cunho regional: vinhos verdes, rosés, do Douro, do Dão e Bairrada, Lagoa, Borba, Vidigueira, etc.
Mas a crescente fama de tais vinhos virá a ficar comprometida pela demora da legislação em defesa da qualidade: em cada uma dos regiões há castas que atentam contra a qualidade de outras castas já consagradas; e nos terrenos húmidos ou sombrios ou batidos pelo frio, quaisquer que sejam as castas, darão sempre um vinho de tão baixa qualidade que irá comprometer necessariamente a qualidade de todo o outro; a defesa da qualidade do vinho nessas regiões obriga a destinar esses terrenos a outros fins - e em quo podem até proporcionar maiores lucros, como forragens, florestação, etc. Sempre que se trate de reconversão destes terrenos para se evitar a produção de vinhos de baixa qualidade que comprometem a de outro vinho bom da região, isso bem merece uma ajuda especial do subsídio ou empréstimo eficientes.
Produzir para a exportação deve ser também um dos objectivos da vinicultura nacional. Para tonto importa produzir bons vinhos, fabricando bem, aproveitando da maneira mais racional as excelentes condições naturais para o alargamento, com medida, da área dos melhores e mais apreciados vinhos de marca e para a produção de uvas de casta apropriada para secagem, cuja comercialização seria a mais fácil, uma vez que importamos passas de uva ...
Sr. Presidente: Estas as breves considerações que me propus fazer sobre algumas das questões mais intimamente ligadas com o magno problema do vinho e para as quais me permito chamar a atenção do Governo. Efectivamente, desde a taxa que onera o consumidor e impede que o vinho tenha o volume de venda que de outro modo alcançaria, taxa que, sem justificação pelo menos aparente, tem sido mantida nos anos em quo a Junta Nacional do Vinho não intervém por compra no mercado, até à necessidade de solucionar, quanto antes, o problema do álcool e a não menos urgente necessidade de revisão do regime legal do plantio da vinha, tudo requer uma atenção desvelada e urgente das instâncias oficiais, pois que, a manter-se o que está, compromete seriamente o futuro do vinho em Portugal.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi cumprimentado.
O Sr. Aguiar e Silva: - Sr. Presidente e Sr s. Deputados: Hesitei muito em tomar hoje a palavra nesta Assembleia para me referir a acontecimentos que estão u ocorrer na Universidade portuguesa. Só a gravidade de certos factos ontem verificados me obriga a fazer esta intervenção.
A Universidade de Coimbra está paralisada por uma greve geral decretada e imposta por um grupo de estudantes contestatários. Mais uma vez, nestes últimos tempos, a agitação e a anarquia tomam conta da instituição universitária. Aulas invadidas, professores interrompidos nas suas lições, piquetes de grevistas a dominar corredores e salas - tudo isto não é novidade para quem viveu e sofreu quotidianamente a crise universitária coimbrã de 1969, esse longo calvário em que se crucificaram valores fundamentais de toda a ordem. Mas houve agora acontecimentos inéditos, que revelam a escalada no processo da contestação. Quando um professor catedrático, encanecido nos trabalhos do ensino e da investigação, quis cumprir singelamente o seu dever de dar aulas, foi vaiado, insultado e agredido a murro.
A brutalidade destes factos e o seu significado impõem dolorosas reflexões, desagradáveis decerto para alguns, e as quais não me furto. Já afirmei nesta Assembleia que a chamada «crise» universitária não se pode reduzir a problemas de ordem técnica e institucional, ignorando a sua dimensão ideológica e política.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Se assim fosse, bastaria uma reforma que, mais ou menos original, remediasse carências, saneasse abusos, rasgasse novos rumos. A experiência do que tem acontecido por esse mundo além mostra que não é assim - o que não significa que as reformas não sejam necessárias -, e bem perigosa será a ilusão dos que teimarem em não compreender que o problema universitário é um problema político no mais amplo sentido da palavra.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - No caso português, esta verdade impõe-se de modo irrefragável a quem tenha conhecimento, ainda que sumário, da «literatura» contestatária produzida e consumida nos meios universitários de Coimbra e Lisboa.
Ora, problemas como estes não se enfrentam com apelos retórico-sentimentais, nem com bastonadas da polícia, nem, sobretudo, com cedências e abdicações da autoridade.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Neste país de sentimentais e de líricos com o coração ao pé da boca, essa cedência e essa abdi-
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cação podem assumir a aparência de pendão e de generosa demência, mas essa ilusão só intensifica e deteriora os problemas. Não desejo, nem posso, neste apontamento rabiscado sobre o joelho, entrar em análises pormenorizadas, que ficarão, se for necessário e oportuno, para uma intervenção posterior. Só duas palavras. Nestes últimos anos têm ocorrido nas Universidades portuguesas greves; múltiplos e extensos actos de indisciplina, de desrespeito e provocação às autoridades, de corrosão de todos os valores da ética universitária; crimes de direito comum; insultaram-se diariamente as forças armadas; caricaturaram-se ignobilmente, em cartazes e panfletos, governantes do País; em edifícios construídos, subsidiados e dirigidos pelo Estado, glorificou-se publicamente o retrato de Lenine. Pergunto: onde está o apuramento das responsabilidades de tudo isto? O que se fez perante tudo isto? Perguntas que repercutem amargamente na consciência de muitos portugueses.
As consequências estão dolorosamente à vista. A Nação está a sofrer, moral e materialmente, prejuízos e feridas de gravidade incalculável. As liberdades individuais, de professores e estudantes, estilo na dependência do arbítrio de grupos extremistas. Não há reformas possíveis numa atmosfera de violência, desordem e anarquia. Não há diálogo possível com a subversão.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - E, como ainda ontem tive ensejo de verificar, está a ocorrer um fenómeno de resultados imprevisíveis. Muitos professores e estudantes que, em perturbações anteriores da vida universitária se opuseram corajosa e livremente à desordem, ao tumulto e às greves, remetem-se agora a uma atitude passiva, integram-se na chamada «maioria silenciosa», ou, quando muito, assumem, tão-sòmente, uma atitude de oposição simbólica.
E inútil e absurdo apelar para que cada cidadão exerça a parcela de autoridade que detém, quando a autoridade do Estado não corrobora, tácita ou explicitamente, essa autoridade particular.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Perante o que está a acontecer, pergunto: o que vai fazer o Governo? Sob pena de, amanhã, aumentar a escolada da contestação o engrossar gigantescamente a «maioria silenciosa», o Governo tem de dar uma resposta rápida, e sem ambiguidades, a esta pergunta.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Vamos passar à
Ordem do dia
Continuação da discussão, na especialidade, da proposta de lei sobre a actividade teatral.
Vou pôr em discussão a base VIII, em relação à qual há na Mesa uma proposta de emenda.
Vão ser lidas a base e a proposta de emenda.
Foram lidas. São as seguintes:
BASE VIII
1. A assistência financeira do Fundo de Teatro poderá revestir os seguintes formas:
a) Empréstimos;
b) Garantias de crédito;
c) Subsídios.
2. Esta assistência poderá ser acumulada com a do qualquer outra entidade pública ou privada e será concedida pelos prazos e com as condições a definir em regulamento.
Proposta de emenda
Propomos que o n.º 2 da base VIII da proposta de Lei sobra actividade teatral seja desdobrado em dois números, assim redigidos:
BASE VIII
1.............................................
2. Os prazos e condições desta assistência financeira serão determinados em regulamento.
3. A assistência financeira do Fundo de Teatro pode acumular-se com qualquer outra, pública ou privada.
Sala dos Sessões da Assembleia Nacional, 19 de Janeiro de 1971. - Os Deputados: Henrique Veiga de Macedo - Rogério Noel Pores Claro - Joaquim Germano Pinto Machado Correia da Silva - Custódia Lopes - Fernando Dias do Carvalho Conceição - Francisco João Caetano de Sousa Brás Gomes - Manuel de Jesus Silva Mendes-Júlio Dias das Neves - Luís António de Oliveira Ramos - Joaquim José Nunes do Oliveira.
O Sr. Presidente: - Estão em discussão.
O Sr. Veiga de Macedo: - Sr. Presidente: O preceito da base VIII reveste-se de especial significado, pois, pela primeira vez, a lei prevê que a assistência financeira do Fundo de Teatro se materialize na concessão de empréstimos e garantias de crédito. Como é sabido, a lei vigente (Lei n.º 2041, antigo 8.º) apenas admite a concessão de subsídios.
A Comissão congratula-se com esta aplicação dos auxílios estatais, mas formula o voto no sentido de estes não se transformarem em assistência ao mau teatro, mas em poderoso factor de fomento do teatro bom, que importa reabilitar corajosamente, quer se trate de teatro antigo, quer de teatro moderno.
A Comissão apreciou a questão de saber se a concessão de empréstimos não deveria antes ser feita através da Caixa Geral de Depósitos ou do Banco de Fomento, em execução de um amplo acordo a realizar entre o Fundo de Teatro e aquelas instituições de crédito.
Pensa-se que esta última modalidade só teria vantagens, mas não seria prudente que a Assembleia a estabelecesse, uma vez que providências desta natureza dependem, naturalmente, de morosos estudos e de melindrosas negociações com as instituições bancárias.
De qualquer modo, não pode a Comissão deixar de lembrar a vantagem que haveria em proceder a esses estudos e negociações. Na verdade, não parece bem que uma Secretaria de Estado se converta num banco de investimento,
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nem ela está preparada para operações que exigem vocação própria e serviços especializados.
Além disso, é sempre desagradável tomar providências destinadas à cobrança coerciva de dívidas, as quais não se amoldam bem a um departamento marcadamente político. Não as tomar ... também não estaria certo.
Isto não quer dizer que na concessão de créditos pela banca a Secretaria de Estado não tivesse uma interferência muito grande e, por vezes, decisiva.
Esta anotação aqui fica, pois o Governo poderá, se o desejar, enveredar por este caminho através de acordos a estabelecer com quaisquer organizações de crédito e, em especial, com as que se encontram mais ligadas ao Estado. Se assim o fizer, ficarão, além disso, disponíveis verbas muito significativas para as outras formas de auxílio ao teatro, a cargo do respectivo Fundo, o que não é vantagem para desprezar.
Não é outra a orientação consagrada na lei italiana, desde há muito, neste domínio de assistência financeira às actividades dos espectáculos públicos. Assim, por exemplo, lia no Banco do Trabalho uma secção própria para o crédito cinematográfico.
O Sr. Presidente: - Continuam em discussão.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Se mais nenhum Sr. Deputado deseja usar da palavra, passamos a votação.
Ponho primeiramente à votação o n.º 1 da base VIII, segundo o texto da proposta de lei.
Submetido à votação, foi aprovado.
O Sr. Presidente: - Ponho agora à votação a proposta de emenda, que consiste em desdobrar o n.º 2 da proposta de lei em novos números - 2 e 8 -, com algumas alterações de redacção.
Submetida à votarão, foi aprovada.
O Sr. Presidente: - Vamos passar à base IX, em relação a qual há na Mesa uma proposta de aditamento. Vão ser lidas a base IX s a proposta de aditamento.
Foram lidas. São as seguintes:
BABE IX
1. Apenas podarão beneficiar da assistência financeira do Fundo as entidades que ofereçam garantias suficientes de solvabilidade ou de realização dos objectivos para que foi concedida.
2. Nenhuma entidade poderá beneficiar de nova assistência financeira do Fundo de Teatro se não tiver cumprido as obrigações assumidas no ano antecedente ou não justificar cabalmente o seu não cumprimento.
Proposta do aditamento
Propomos que à base IX da proposta de lei sobre actividade teatral seja aditado o seguinte número:
BABE IX
8. A falta de pagamento, por parte das empresas, dos ordenados acordados para todo o período legal de vigência dos contratou, ou das contribuições para a Previdência, não obsta ao deferimento do pedido de assistência, mas impede a sua efectivação até total cumprimento.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 19 de Janeiro de 1971. - Os Deputados: Henrique Veiga do Macedo - Rogério Noel Feres Claro - Joaquim Germano Pinto Machado Correia da Silva - Custódia Lopes - Fernando Dias de Carvalho Conceição - Júlio Dias das Neves - Manuel de Jesus Silva Mendes - Francisco João Caetano de Sousa Brás Gomes - Luís António de Oliveira Ramos - Joaquim José Nunes de Oliveira.
O Sr. Presidente: - Estão em discussão.
O Sr. Veiga de Macedo: - Sr. Presidente: A proposta de aditamento de um n.º 8 à base IX vai ao encontro do parecer da Câmara Corporativa, que observa, muito criteriosamente, não se justificar beneficie da assistência financeira o empresário que não pagou os ordenados devidos ou que não efectuou o depósito de todos os descontos para a Previdência. A Câmara salienta que não se estranhará, por certo, a imposição de tal condicionamento, pois já hoje se permite a afectação de parte ou da totalidade do subsídio concedido à empresa ao pagamento ao titular do direito de fruição da casa de espectáculos (Decreto-Lei n.º 89 684, de 81 de Maio de 1954, artigo 16.º, [...] 2.º).
Não há dúvida de que, por maioria de razão, têm direito a esta protecção os artistas ou os empregados das empresas teatrais, que importa defender de abusos de que têm sido vítimas, embora, por vezes, sejam eles próprios, por fraqueza de posição ou pela delicadeza da sua sensibilidade, a darem, anuência expressa ou tácita a atitudes contrarias aos contratos firmados ou às disposições legais de carácter social.
Poderia, sobre esta matéria, apresentar esclarecimentos impressionantes, mas entendo que o não devo fazer, pois não há necessidade de ferir susceptibilidades. Direi apenas que no ano findo os débitos de certas empresas à Caixa de Previdência dos Profissionais de Espectáculos atingiam alguns milhares de contos.
O Sr. Presidente: - Continuam em discussão.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Se mais nenhum de W. Exa. deseja usar da palavra, vamos passar à votação, votando em primeiro lugar os n.ºs 1 e 2 da base IX, segundo o texto da proposta de lei.
Submetidos a votação, foram aprovados.
O Sr. Presidente: - Ponho agora à votação o aditamento de um n.º 8 à mesma base, proposto pelos Srs. Deputados Veiga de Macedo e outros.
Submetido à votação, foi aprovado.
Q Sr. Presidente: - Vamos passar à base X, sobre a qual há na Mesa uma proposta de aditamento. Vão ser lidas a base e a proposta de aditamento.
Foram lidas. São as seguintes:
BABE X
1. Na concessão e fixação do montante dos benefícios requeridos pelas empresas que explorem espectá-
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culos de teatro atender-se-á especialmente aos seguintes factores:
a) Qualidades de repertório, no qual deverá estar incluída, em cada ano teatral, pelo menos, uma obra de autor português;
b} Nível e composição do elenco;
c) Mérito da direcção artística;
d) Duração da exploração;
e) Capacidade administrativa dos requerentes;
f) O preço estimado paira os bilhetes; de ingresso no recinto.
2. Constituirão, obrigatoriamente, motivos de preferência:
a) Número e qualidade de peças portuguesas a apresentar em estreia no ano teatral;
b) À circunstância de se tratar de empresa que, tendo gozado de assistência financeira no ano antecedente, Laja exercido nesse período a sua actividade com reconhecido nível artístico.
Proposta de aditamento
Propomos que ao n.º 2 da base X da proposta de lei sobre actividade teatral seja aditada uma alínea, com a seguinte redacção:
BASE X
2..................................................
a).................................................
b).................................................
c) As deslocações programadas, designadamente às ilhas adjacentes, às províncias ultramarinas e aos núcleos portugueses no estrangeiro.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 19 de Janeiro de 1971. - Os Deputados: Henrique Veiga de Macedo - Rogério Noel Peres Claro - Joaquim Germano Pinto Machado Corroía da Silva - Custódia Lopes - Fernando Dias do Carvalho Conceição - Francisco João Caetano de Sousa Brás Gomes - Manuel de Jesus Silva Mondes - Júlio Dias das Neves - Luís António de Oliveira Ramos - Joaquim José Nunes de Oliveira - António de Sousa Vadre Castelino e Alvim - Albano Vaz Pinto Alvas.
O Sr. Presidente: - Estão em discussão.
A Sr.ª D. Custódia Lopes: - Sr. Presidente: Uso da palavra para dor o meu inteiro apoio à alteração sugerida pela Câmara Corporativo e adoptada pela Comissão de Educação, ampliando o n.º 2 da base X em discussão.
Quando no ultramar se está a processar um movimento de promoção social e cultural, não podiam deixar de ser incluídas, como preferência na concessão e fixação do montante de benefícios requeridos pelas empresas de teatro, as deslocações ao ultramar.
Ainda que esta lei não seja desde já extensiva às províncias ultramarinas, apelo para o Sr. Ministro do Ultramar para que na aplicação da lei àqueles territórios, o que esperamos seja breve, se tenham em conta estes mesmos benefícios para os deslocações das empresas teatrais do ultramar à metrópole, facilitando-se assim a intrepretação e a culturação dos diferentes meios de expressão.
Também me parecem de alto interesse nacional na difusão da cultura e manutenção da língua portuguesa as deslocações do teatro aos núcleos de portugueses no estrangeiro.
Quanto às ilhas adjacentes, a preferência é justificável pelo isolamento em que vivem e a distância em que se encontram dos grandes centros onde existe, geralmente, o bom teatro.
O Sr. Alberto de Alarcão: - Sr. Presidente: Solidarizo-me com o espírito da proposta da alínea c) do n.º 2 da base X, mas desejaria que me fosse prestado um esclarecimento.
O que são «núcleos portugueses no estrangeiro?» Não deverão ser, certamente, territórios, embaixadas, consulados ou associações de portugueses em França ou em qualquer outro país estrangeiro.
Não seria assim, porventura, mais conecta qualquer outra formulação, como «núcleos de portugueses (ou de emigrantes portugueses) e seus descendentes no estrangeiro»?
O Sr. Veiga de Macedo: - Penso que a sugestão formulada pelo Sr. Deputado Alberto de Alarcão pode ser ponderada pela Comissão de Legislação e Redacção.
Adianto apenas o meu parecer no sentido de que não se me afigura de real interesse a modificação proposta pelo ilustre colega, uma vez que o objectivo que se pretende atingir está, quanto a mim, manifestamente incluído na letra e no espírito da base em discussão.
Dizer núcleos portugueses ou núcleos de portugueses no estrangeiro parece-me, pelo menos à primeira vista, indiferente.
No entanto, a Comissão de Legislação e Redacção poderá, no exercício específico da sim função, resolver esta pequena questão formal.
O Sr. Presidente: - Continuam em discussão.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Se mais nenhum Sr. Deputado deseja usar da palavra, vamos passar à votação.
Ponho primeiramente à votação os n.ºs 1 e 2 da base X da proposta de lei.
Submetidos à votação, foram aprovados.
O Sr. Presidente: - Ponho agora à votação o aditamento de uma alínea nova, que será a c), ao n.º 2, já aprovado, da base X.
Submetido à votação, foi aprovado.
O Sr. Presidente: - Vamos passar à base XI, em relação à qual não há na Mesa qualquer proposta de alteração.
Vai ser lida.
Foi lida. É a seguinte:
BASE XI
1. A assistência do Fundo poderá também ser requerida com vista à construção, ampliação, remodelação ou apetrechamento de recintos de teatro, os quais poderão ser instalados em edifícios cuja finalidade principal não seja o exercício da actividade teatral.
2. A Direcção-Geral da Cultura Popular e Espectáculos poderá facultar aos interessados:
a) Projectos-tipo de recintos com diversas Intatações;
b) Assistência técnica gratuita durante a fase da realização das obras.
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O Sr. Presidente: - Está em discussão.
O Sr. Alberto de Meireles: - Sr. Presidente: Por mais estranho que pareça, e não havendo qualquer divergência' acerca do texto da proposta de lei, até porque a Câmara Corporativa se congratula com ele, eu entendo que deve a Câmara congratular-se também pela possibilidade que esta base dá de assistência financeira a iniciativas teatrais. Refiro-me às associações recreativas que através do País têm nas suas pequenas ou grandes sedes instalações às vezes precárias, mas que se trata séria e desinteressadamente da elevação do nível de cultura através de programas de teatro. Referiria outro aspecto, e penso que o devo fazer, até porque as circunstancias me conduziram a ser presidente de uma instituição que tem nas suas tradições um núcleo de teatro com real interesse local. Nessas instalações, com 802 lugares, salvo erro, hoje modernizadas e apetrechadas sumária, mas dignamente, instalações que ainda não há muito tempo foram inaugurados pelo nosso ilustre colega e então Ministro das Corporações Sr. Dr. José Gonçalves de Proença, tencionava continuar-se uma tradição local de muito interesse no aspecto teatral. Esta assistência financeira, extensiva a essas instituições, permitirá, nesse ou noutros casos, o apetrechamento ou a remodelação, em muitos casos indispensável, das instalações ou dos recintos destinados às iniciativas teatrais. Penso que será desnecessário insistir no aspecto de interesse que tomam estos iniciativas não só para o desenvolvimento do gosto pelo teatro, na juventude principalmente, como ainda na possibilidade de revelação de vocações teatrais. Esta extensão aos meios pequenos de iniciativas teatrais bem conduzidas é utilíssima e conveniente.
Associo, portanto, a minha congratulação aquela que a Câmara Corporativa dá no seu parecer quanto a esta base.
O Sr. Presidente: - Continua em discussão o base XI.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Como mais nenhum Sr. Deputado deseja intervir na discussão, ponho-a à votação.
Submetida à votação, foi aprovada.
O Sr. Presidente: - Vamos passar agora fi base XII, em relação à qual há na Mesa uma proposta de emenda. Vão ser lidas a base e o proposta de emenda.
Foram lidas. São as seguintes:
BABE XII
1. Os empréstimos vencerão uma taxa de juro, anualmente fixada por despacho do Secretário de Estado da Informação e Turismo.
2. Os créditos do fundo emergentes de empréstimos concedidos poro construção, ampliação ou remodelação de recintos de teatro ou para adaptação a este fim de edifícios já existentes gozam de privilégio imobiliário geral, graduado imediatamente a seguir aos estabelecidos no artigo 748.º do Código Civil.
3. Todos os restantes empréstimos do Fundo de Teatro gozam de privilégio mobiliário geral, graduado logo após tos referidos no n.º l do artigo 787.º do mesmo Código.
Proposta de emenda
Propomos que a base XII da proposta de lei sobre actividade teatral posse o ter a seguinte redacção:
BABE XII
1. Os empréstimos vencerão o taxo de juro anualmente fixada por despacho do Secretário de Estado da Informação e Turismo, depois de ouvido o Ministro das Finanças.
2. Os créditos do Fundo emergentes de empréstimos concedidos paro construção, ampliação ou remodelação de recintos de teatro ou para adaptação a este fim de edifícios já existentes serão garantidos por hipoteca legal sobre os respectivos imóveis ou por fiança bancária.
3. Todas os restantes obrigações para com o Fundo serão caucionadas por uma das garantias indicadas no artigo 628.º do Código Civil.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 19 de Janeiro de 1971. - Os Deputados: Henrique Veiga do Macedo - Rogério Noel Peres Claro - Fernando Dias de Carvalho Conceição - Custódia Lopes - Júlio Dias das Neves - Manuel de Jesus Silva Mendes - Francisco João Caetano de Sousa Brás Gomes - Luis António de Oliveira Ramos - Joaquim José Nunes de Oliveira - Joaquim Germano Pinto Machado Correia da Silva - Albano Vaz Pinto Alves.
O Sr. Presidente: - Estão em discussão.
O Sr. Veiga da Macedo: - Sr. Presidente: Como a Assembleia verificou, o Comissão de Educação Nacional opta pelo parecer da Cornara Corporativa na redacção a dar à base XII. E fá-lo não só por motivos de ordem legal e jurídica, mas também para não se iludir a boa fé de terceiros, que não devem ver frustradas as suas legitimas expectativas ao serem postos ao corrente de um privilégio que desconheciam e se não encontrava registado.
Quanto ao n.º l do mesma base XII, a Comissão entende que o fixação da taxa de juro pelo Secretário de Estado da Informação e Turismo deve ser precedida de audiência do Ministro dos Finanças. Esta consulta prévia ao mais alto e directo responsável pelo política financeira do Estado impõe-se para evitar desvios ou perturbações num domínio tão delicado como o do estabelecimento dos taxas de juro dos empréstimos. Além disso, e como bem se compreenderá, o próprio Secretário de Estado da Informação ficará em posição mais defensável para decidir.
O Sr. Alberto de Meireles: - Sr. Presidente: Ao usar da palavra, não é para discordar de nenhuma das propostas que foram feitas pela Comissão. E apenas para sublinhar que, além do aspecto que o Sr. Deputado Veiga d« Macedo acaba de referir, que me parece de aceitar inteiramente, outros há na proposta que têm real interesse no aspecto jurídico. E que, como sublinhou, a Câmara Corporativa provia manifestamente um lapso de escrita na proposta, porque, perdoar-me-ão os juristas, não há privilégios imobiliários gerais. Trata-se de um lapso, como foi aqui referido, o qual fica corrigido com a fórmula encontrada, que é certamente muito mais adequada. A Câmara Corporativa fez as observações a proposta, nesse e noutros aspectos que me dispenso de referir, mas parece-me que as soluções encontradas pela Comissão, nomeadamente quanto à referência à garantia por hipoteca legal sobre os imóveis ou por fiança bancária, em alternativa. Quanto às restantes obrigações para com o Fundo, o admitir-se que serão caucionadas por uma das formas de garantia indicadas no artigo do Código Civil satisfaz plenamente.
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Era esta apenas a palavra de apoio que entendi dever dar, até para evitar um era-o, porque o seria o enunciado do texto inicial, certamente por lapso.
O Sr. Presidente: - Continuam em discussão.
Pausa.
Sr. Presidente - Como mais nenhum do W. Exas. deseja usar da palavra, passamos à votação.
Se ninguém requerer diversamente, porei à votação, em conjunto, as emendas respeitantes aos n.ºs l, 2 e 3 da, base XII da proposta de lei, constantes da proposta de emenda apresentada.
Submetidas à votação, foram aprovadas.
O Sr. Presidente: - Há agora uma série de bases, da XIII à XXI, inclusive, sobre as quais não entraram até agora na Mesa quaisquer propostas de alteração. Vou pois pô-las à discussão e votação por grupos, se nenhum de W. Exa. requerer outra coisa.
O Sr. Magalhães Mota: - Sr. Presidente: Pedia apenas um momento para poder apresentar na Mesa uma proposta de emenda à base XXI.
O Sr. Presidente: - V. Exa. pode entregar a proposta na Mesa enquanto se discutem as outras bases.
Vão ser lidas as bases XIII e XIV.
Foram lidas. São as seguintes:
BASE XIII
1. À assistência financeira na modalidade da alínea b) do n.º 1 da base VIII consistirá na prestação de garantias à Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência ou a quaisquer outras instituições de crédito, públicas ou privadas, nacionais ou estrangeiras, para segurança do cumprimento de obrigações assumidas junto delas por terceiros para os fins consignados nesta lei.
2. Estas garantias poderão revestir, de entre as formas admitidas em direito, as que forem anualmente autorizadas pelo Secretário de Estado da Informação e Turismo, mediante proposta do conselho administrativo do Fundo de Teatro e ouvida a Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência, para as garantias que lhe hajam de ser prestadas.
BASE XIV
1. Quando o cumprimento das obrigações emergentes dos contratos de assistência financeira for garantido por penhor da bens afectos à actividade teatral, a entidade assistida pelo Fundo ficará depositária dos bens penhorados.
2. A garantia referida no número anterior subsistirá até pagamento integral dos débitos correspondentes.
O Sr. Presidente: - Estão em discussão.
Pausa.
O Sr. Presidente - Se nenhum de W. Exa. deseja usar da palavra para discutir as bases XIII e XIV da proposta de lei, ponho-as a votação.
Submetidas à votação, foram aprovadas.
O Sr. Presidente: - Vamos passar agora ao conjunto das bases XV, XVI, XVII e XVIII, que se referem à fiscalização das actividades teatrais.
Vão ser lidas.
Foram lidas. São as seguintes:
BABE XV
1. À Direcção-Geral da Cultura, Popular e Espectáculos fiscalizará a actuação das entidades assistidas pelo Fundo de Teatro, a fim de garantir o rigoroso cumprimento das obrigações assumidas.
2. Das cláusulas dos contratos de assistência financeira constará a faculdade de aquela Direcção-Geral fazei- cessar os espectáculos cuja média semanal de frequência seja inferior à fixada em regulamento.
BASE XVI
A inobservância dos pressupostos da concessão de assistência financeira do Fundo ou o incumprimento das respectivas condições contratuais determinarão, salvo motivos devidamente justificados, a cessação dos benefícios concedidos.
BASE XVIII
Todas as empresas exploradoras de recintos onde tenham lugar representações teatrais, sejam ou não beneficiárias de assistência financeira do Fundo de Teatro, fornecerão periodicamente à Direcção-Geral da Cultura Popular e Espectáculos, nos condições que vierem a ser estabelecidas, indicação do número dos espectadores e das receitas de cada uma das sessões efectuadas.
BASE XVIII
1. O Secretario de Estado da Informação e Turismo fixará, por despacho publicado no Diário do Governo, os termos em que as associações constituídas para o exercício dos direitos e interesses dos autores remeterão à Direcção-Geral da Cultura Popular e Espectáculos os resultados da contagem da assistência a que, nos condições contratuais, procedam para cobrança dos direitos de autor em todos os teatros do País.
2. Qualquer outro regime de fiscalização poderá ser instituído por diploma regulamentar.
O Sr. Presidente: - Estão em discussão.
O Sr. Pinto Balsemão: - Peço a palavra, Sr. Presidente, para fazer minha, ao abrigo do artigo 36.º do Regimento, a proposta de alteração da Câmara Corporativa.
O Sr. Presidente: - De qual das bases, Sr. Deputado? Todas?
O Sr. Pinto Balsemão: - Da base XV. E pretendia justificar esta minha adopção da proposta de alteração da Câmara Corporativa pelo seguinte: a Câmara Corporativa limita-se a consignar na base XV o n.º 1 da proposta governamental, omitindo portanto o n.º 2.
Esse n.º 2 afirma que das cláusulas dos contratos de assistência financeira constará a faculdade de a Direcção-Geral da Cultura Popular e Espectáculos fazer cessar os espectáculos cuja média semanal de frequência seja inferior a fixada em regulamento. Eu penso que, desde que a Direcção-Geral ou o Fundo de Teatro entendam subsidiar um espectáculo, não será pelo facto de esse espectáculo ser menos frequentado do que se teria suposto que
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ele deva cessar. O espectáculo terá valor por si próprio e não pela frequência que tenha. E, além disso, poderão ser afectados interesses de empresários, de actores e de técnicos contratados para realizar o referido espectáculo. A acrescer a isso, há também o facto de se pretender fixar em regulamento, cujos termos se ignoram, as normas em que o referido espectáculo poderá cessar. E é nessa base que defendo a proposta do alteração da Câmara Corporativa.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Como sabem o acaba de nos ser recordado, o Regimento permite a qualquer Sr. Deputado fazer suas quaisquer alterações sugeridos pela Câmara Corporativa. Em relação a base XV, as alterações sugeridas pela Câmara Corporativa reduzem-se efectivamente à eliminação do n.º 2 do texto da proposta de lei.
Continuam, portanto, em discussão, conjuntamente, as bases XV, XVI, XVII e XVIII, agora com a alteração sugerida pela Câmara Corporativa e perfilhada pelo Sr. Deputado Pinto Balsemão. Na altura das votações procederemos era conformidade com esta situação.
O Sr. Veiga de Macedo: - Farei apenas algumas referências sobre o conteúdo da base XV.
A primeira palavra será para lembrar que a fiscalização que o n.º l da base em discussão atribui a Direcção-Geral da Cultura Popular e Espectáculos compete agora, por força do disposto no artigo 9.º da Lei n.º 2041, ao Conselho de Teatro. Aqui está uma norma legal bem intencionada, mas sem a mínima possibilidade de efectivação prática, pois o Conselho de Teatro, por sua natureza e por não possuir funcionários próprios, não está em condições de proceder à fiscalização que a lei lhe comete. Ainda Iram que se vai agora para uma solução realista, confiando-se essa tarefa a Direcção-Geral da Cultura Popular e Espectáculos, à qual, por isso, devem ser facultados os elementos humanos e os meios materiais indispensáveis ao cabal desempenho da espinhosa missão.
Quanto ao n.º 2 da mesma base, peço a atenção da Assembleia, se acaso é necessário pedi-la, para as razões que lavaram a Comissão a concordar com a doutrina que o Governo preconiza seja aprovada, ou seja a que constai desse n.º 2. A Câmara Corporativa entende que não deve manter-se a faculdade prevista nessa bane, por considerar que ela constitui uma ingerência abusiva no negócio privado. A Câmara, é incisiva ao asseverar que o empresário deve ser juiz do que mais lhe convém, cabendo ao Estado apenas formular juízo sobre essa conduta, para apreciação de novo pedido de assistência.
Salvo o devido respeito pela douta argumentação da Câmara Corporativa, a Comissão entende que, nos casos contemplados pela proposta em apreço, o Estado tem o dever de intervir, nem que daí resulte qualquer ofensa de direitos ou liberdades legítimas dos empresários.
Na verdade, não pode conceber-se que se mantenham casas de espectáculos vazios ou quase vazias, quando por esses espectáculos BR entidades que os promoveram estuo a ser financeiramente assistidas pelo Fundo de Teatro. A experiência do que se tem passado é concludente. Quando todos se queixam da exiguidade das receitas destinadas ao fomento e protecção da actividade teatral, não está certo se concedam ou mantenham subsídios a entidades que não conseguem assistência para os espectáculos que organizam.
Há quem, no caso, entenda que a cessação do espectáculo só deve efectivar-se quando a ausência de público se filie na falta de nível do espectáculo. Ideia generosa, é, no entanto, de difícil materialização prática, pois esbarraria logo com naturais subjectivismos na definição dos critérios sobre o valor ou falta de valor do espectáculo.
De qualquer maneira, um espectáculo sem público não interessa que seja subsidiado.
E preciso não confundir a Secretaria de Estado da Informação e Turismo com os serviços do desemprego ou da assistência pública.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Seja-me permitido insistir: quando se diz que não há palcos livres, tudo deve fazer-se para; impedir se encontrem «ocupados» palcos sem público, até para não se pedir aos artistas o sacrifício de representarem .. . para ninguém.
Já em 1950, a Câmara Corporativa observava: «Ontem ainda eram possíveis as explorações de aventura, feitas por empresários milicianos que viviam apenas da bilheteira» - transcrevo o adjectivo, mas hoje ninguém o poderia considerar feliz, pois os milicianos das forças armadas portuguesas têm-se coberto de glória nos frentes da luta pela sobrevivência da Pátria. A Câmara Corporativa firmava ainda: «É preciso que as empresas responsáveis possuam, além de tino administrativo, a necessária capacidade financeira. O subsídio que o Estado se propõe conceder não se destina naturalmente a custear a aprendizagem de empresários improvisados, nem a subvencionar a simpática inexperiência de autores que cultivam o insucesso e entendem que ele deve ser generosamente protegido ...»
Apraz-me ainda transcrever esta afirmação recente da autoria de um grupo de ilustres actores da cena portuguesa, que pude ler em notável documento por eles elaborado: «Só fazendo coincidir os interesses da classe profissional da gente do teatro com o interesse geral se torna evidente a legitimidade de qualquer subsídio ou financiamento.»
Eis porque a Comissão discorda da opinião da Câmara Corporativa e, portanto, daquela que acaba de ser também aqui defendida pelo nosso ilustre colega Pinto Balsemão.
Se pus vivacidade na argumentação desenvolvida foi apenas porque o tema o merecia, mas de forma alguma essa vivacidade representa menos respeito pela Câmara Corporativa, nem pelo Sr. Deputado Pinto Balsemão.
O Sr. Pinto Balsemão: - Sr. Presidente: Eu queria, antes de mais nada, manifestar o meu apreço pela vivacidade do Sr. Deputado Veiga de Macedo, cujas qualidades oratórias e parlamentares há muito todos conhecemos.
No entanto, eu penso que esta base XV que está em discussão se aplica, segundo o n.º 1, às entidades assistidas pelo Fundo de Teatro. No entanto, é de presumir que o Fundo de Teatro, quando concede a sua assistência, conhece o programa de actividades dessas entidades e sabe, portanto, o que elas vão fazer. E é por isso mesmo que a argumentação brilhante do Sr. Deputado Veiga de Macedo não me convence ainda totalmente, visto que pode, por motivos imprevistos, e embora se tenha decidido a aprovação do Fundo de Teatro, a programação falhar.
Nessa altura, o n.º 2 da proposta, permitindo fazer cessar os espectáculos cuja média mensal de frequência seja inferior à fixada em regulamento, representa, quanto a mim, uma interferência no negócio privado de uma entidade, repito, assistida pelo Fundo de Teatro.
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O Sr. Júlio Evangelista: - Sr. Presidente: Duas observações. A primeira é para lamentar que, não tendo podido durante a semana passado- participar nos trabalhos da Assembleia, por motivo de doença, não me tenha sido possível intervir, como pensava, na discussão na generalidade da proposta de lei em discussão.
Isto quer dizer que as minhas observações, neste momento, suo observações de quem conhece de alguma maneira o problema a que a proposta se reporta, por dentro, e o conhece por o ter estudado e por de alguma forma o ter vivido.
Efectivamente, fui durante alguns anos vogal do Conselho de Teatro e também seu vogal-secretário. E isso, a par de alguma curiosidade intelectual, dá-me possibilidades de intervir no debate, como franco-atirador, neste preciso momento.
O Sr. Deputado Pinto Balsemão defende que não competiria ao Estado - portanto, aprovando o texto sugerido pela Câmara Corporativa - intervir quando a ausência de público possa sugerir ou aconselhar, ou até impor, a cessação dos espectáculos. O Sr. Deputado Veiga de Macedo sustenta a opinião contrária.
Eu, primeiro numa posição doutrinária, queria referir o seguinte: um espectáculo de teatro é um espectáculo de ordem eminentemente colectiva. É no teatro que o aspecto colectivo da realização se apresenta. O espectáculo é um texto, que tem um autor; é uma companhia, são actores que representam esse texto.
Pode ser um texto maravilhoso, Sr. Presidente; pode ser uma companhia excepcional, Sr. Presidente. Mas sem público não é teatro. Sem público não é espectáculo. O público é elemento do espectáculo; é elemento do teatro com tal dignidade, com tal interesse, de tal modo participante como o texto e como os actores.
E nada mais arrasante, nada mais aviltante para os actores do que representarem para uma sala vazia.
Aliás, Sr. Presidente, tratando-se, efectivamente, de companhias subsidiadas pelo Fundo de Teatro, o subsídio tem a ajuda financeira do Fundo de Teatro, visa a transmissão da mensagem cultural que o espectáculo leva ao público. E não havendo público, tal finalidade perde-se, irremediavelmente.
Isto é um aspecto de elementar observação para quem se debruça sobre estes problemas. Além do mais, sujeitar, através de contratos, contratos de trabalho como todos os outros contratos, a dignidade de um actor, o passado de um actor, ou tudo o que representa o orgulho profissional de uma companhia, a representar para uma sala com dez, vinte ou trinta elementos, é sujeitá-los a vexame que os actores portugueses não merecem, a não ser que circunstâncias pessoais e excepcionais os conduzam a isso, mas tão-só pela chama da cultura.
Por observações que se deduzem e que, portanto, reflectem elementos de ordem cultural, não há teatro sem público. Por outro lado, tendo em consideração elementos de ordem humana, que são a qualidade, a altíssima, a sublime qualidade do trabalho de quem interpreta, de quem representa, de quem criou um texto para ser representado, entendo que está perfeitamente certa a intervenção do Estado, para não permitir que se degradem os espectáculos, que se possam sujeitar as companhias e os autores ao vexame de trabalhar sem público.
E claro que esta permissão da proposta de lei, temos que a entender, como se diz no lugar comum da linguagem jurídica, em termos hábeis. É uma permissão com que a Direcção-Geral fica, que ela executará prudentemente, que ela executará hàbilmente.
O Sr. Magalhães Mota: - Sr. Presidente: Queria fazer uma anotação que me parece essencial à discussão.
Nos termos da proposta, o que acontece é que o próprio parecer formulado pela Secretaria de Estado vai ser sujeito a um último veredicto, que é o do público. E a própria Secretaria de Estado quem o propõe. A Secretaria e o Conselho de Teatro entenderam que determinado espectáculo mereceria ser subsidiado; mas depois vai-se sujeitar esse seu parecer a opinião favorável ou desfavorável de um público que, infelizmente - e nós o sabemos -, neste momento não está preparado para receber toda a espécie de espectáculos, especialmente aqueles espectáculos de nível mais elevado. Quero dizer que poderemos estar a abrir uma porta para que alinhemos num sistema de transigência, com algum mau gosto, pura e simplesmente porque esse mau gosto se reflecte em termos de bilheteira. Parece-me que este também é, com certeza, um elemento a ponderar.
O Sr. Veiga de Macedo: - Sr. Presidente: Uso novamente da palavra para esclarecer, se acaso é preciso fazê-lo, que este n.º 2, na faculdade que confere a Direcção-Geral da Cultura Popular e Espectáculos, não é tão amplo como parece.
A Comissão, posso dizê-lo, começou por interpretar este preceito de uma maneira por demais extensiva. Pareceu-lhe, na verdade, que aquela faculdade envolvia a possibilidade de a Direcção-Geral da Cultura Popular e Espectáculos suspender a actividade teatral da entidade assistida financeiramente. Mas, interpretando depois melhor essa disposição, a Comissão verificou que o seu alcance normativo é bem mais limitado. Na verdade, o que se pretende no fazer cessar um determinado espectáculo é pôr termo a uma situação inaceitável e estimular a entidade beneficiária do auxílio estatal a pôr em cena, em condições mais propícias, novas peças.
Quanto a observação, muito hábil - hábil no bom sentido, claro está -, do Sr. Deputado Magalhães Mota, ao meu espírito liberal nada impressiona ver um departamento do Estado rectificar posições. Ainda agora um nosso Ministro submeteu a apreciação generalizada - ia a dizer indiscriminada - importantes reformas.
Vai sujeitar-se, é natural, a que nem todos concordem. Mas do facto não vejo que advenham quaisquer inconvenientes. E, de resto, frequente ver o Governo ou os serviços públicos a rectificarem posições. Mau seria que o não fizessem sempre que há motivos para essa rectificação.
É certo que, no domínio do teatro e do cinema, a concessão de subsídios envolve um risco especial. Bem sei que há uma maneira de o evitar: seria exigir tais garantias às entidades que solicitam a assistência financeira que só muito poucas se abalançariam a aceitar as condições impostas.
Não há dúvida de que também nestes casos o Estado tem de ser compreensivo, pois, se leva as exigências longe de mais, não abrirá qualquer possibilidade a que novos valores surjam e se firmem. Mas daí a proteger iniciativas sem interesse ou a sustentar mediocridades vai uma distância muito grande.
Nem deve esquecer-se que os dinheiros públicos não são elásticos. E pode ainda dar-se o caso de haver teatros subsidiados sem público, enquanto candidatos idóneos à assistência financeira não podem ser auxiliados por falta de verba dos fundos respectivos. E isto não me parece justo, nem aconselhável.
Aliás, tenho informações de que a experiência torna o preceito em debate de todo imprescindível. Terei sido mal informado? Antes assim fosse!
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O Sr. Alberto Meireles: - Não desejava envolver-me nesta discussão, mas parece-me que há no texto motivos que me causam uma certa perplexidade. No fim diz-se, no n.º 2, que pode a assistência financeira cessar quando os espectáculos não tenham a média semanal de frequência fixaria em regulamento. É aqui a minha perplexidade.
Primeiro, este n.º 2 afigura-se-me ter carácter regulamentar, sendo mais que duvidoso para mim que devesse ser incluído nu base. Tem carácter regulamentar, ata porque estabelece uma das cláusulas do contrato de assistência financeira. Portanto, é relegá-lo para o regulamento. É mataria de cláusulas a estabelecer pela Direcção-Geral da Cultura Popular e Espectáculos ou pelo Fundo do Teatro, ao contratar com determinada entidade peticionária a assistência financeira. Portanto, é uma das muitas cláusulas que terão de ser incluídas no contrato. Porque é que ela há-de figurar nas bases de uma lei programática?
Segundo, se bem compreendo e se diz no n.º l, compete a Direcção-Geral fiscalizar a actuação das entidades assistidas, a fim de garantir um rigoroso cumprimento das cláusulas das obrigações assumidas. Mas é evidente que nenhum beneficiário do Fundo pode assumir obrigação de ter determinado número ou quantidade de público a assistir aos espectáculos, porque isso não depende dele. Evidentemente, ele desejaria a plateia cheia, mas como é que se pode obrigar o público a ir lá? É esse o drama, á a contingência do negócio teatral, a contingência do espectáculo. Pode não ir ninguém, porque não gosta, porque a publicidade foi má, porque o texto é péssimo, porque os actores não correspondem, porque choveu - eu não digo porque nevou, porque isso é lá para as terras de cima -, e está portanto o teatro bloqueado e não cumpriu, rigorosamente, a obrigação assumida quanto a média semanal de frequência. Pois é evidente. Como é que pode uma empresa obrigar-se a uma média semanal de frequência a um espectáculo se não pode forçar os indivíduos a lá ir? Parece-me, não só pelas razoes que a Câmara Corporativa apresentou no seu parecer, como por aquilo que aqui foi dito, que o n.º 2 contém matéria regulamentar. Isto sem desrespeito pela judiciosa observação e esclarecimento do Sr. Presidente da Comissão de Educação e sem menos apreço e respeito pela posição esclarecida que tomou.
O Sr. Pinto Machado: - Sr. Presidente: Recordo-me perfeitamente, quando esta base foi discutida na Comissão, de ter apresentado as minhas objecções, algumas das quais aqui referidas por alguns Srs. Deputados. Acedi, contudo, na posição que a Comissão adoptou de apoiar o n.º 2 desta base, com a ideia de se evitar a possibilidade de se manterem espectáculos sem qualidade, apenas porque o Fundo de Teatro garantia a sua rentabilidade. Não sei mesmo se, eventualmente, isto, num caso ou noutro, terá já acontecido. Pode, porém, vir a acontecer. E, na realidade, neste n.º 2, fala-se numa faculdade.
Há, evidentemente, diversos inconvenientes aqui apontados, e creio que ainda há outro que está, aliás, implícito nas considerações a que também dou todo o meu apoio, Sr. Deputado Alberto de Meireles, e que é esta: esta lei pretende fomentar o teatro de qualidade. Reconhece-se que não há público para o teatro de qualidade. Ora. quando um empresário se dispõe a montar um espectáculo de qualidade, requer, para isso, a assistência do Fundo de Teatro; mas, sabendo que tem sobre a cabeça esta espada, quê é a da possível não adesão do público que leva a cessação dessa assistência, é natural se retraia, qua hesite em apresentar um espectáculo de qualidade e que, no fundo, esta condição vá fomentar o teatro de qualidade menos aceitável, que não justifica esta lei.
Cai-se assim aparentemente numa certa posição de impasse que, a meu ver, se poderia talvez ultrapassar da seguinte forma: eliminar deste n.º 2 a referência a uma média semanal. Eu creio, realmente, que é abusivo e é absolutamente impossível, e não sei que critérios é que podem ser utilizados como referência à adopção de uma média semanal válida. Por outro lado, parece-me de manter, apesar de tudo, a faculdade dessa suspensão, confiando que efectivamente - porque, se o não fizermos, toda esta lei cai por base - as pessoas que constituem o Fundo de Teatro vão realmente sempre actuar no sentido de que o bom teatro seja fomentado, seja posto à disposição do público e insistentemente, mesmo que inicialmente ele a isso não corresponda.
O Sr. Júlio Evangelista: - Duas palavras mais, Sr. Presidente. Acentuou o Sr. Deputado Pinto Machado uma premissa que não me parece perfeitamente exacta, qual seja a de que há falta de público para o teatro de qualidade. Nada nos autoriza a fazer tal afirmação.
Primeiro: também nada nos autoriza a dizer que o teatro de qualidade seja o mais caro na montagem, nas despesas de cenografia e nas despesas da companhia.
Eu devo dizer que estou até convencido de que o grande teatro do nosso tempo é teatro bem mais barato, sob o ponto de vista de realização, do que o teatro de outros tempos, em que à falta de textos de categoria se recorria ao fausto das montagens. É que o teatro é também equilíbrio, Sr. Deputado Pinto Machado, o teatro é equilíbrio entre texto, representação e público. Nos tempos em que os textos falham, nos tempos em que, por motivos desta ou daquela ordem, a categoria dos textos desce e decai, o teatro recorre a outros instrumentos do seu arsenal de criação. O teatro é verdadeiramente mágico, nesse sentido, e, por isso, no século XVIII nós vemos o teatro alçar-se às grandes encenações e cenografias, inclusive entrar para o seio do teatro tudo aquilo que era representação, não apenas oral, mas representação cantada e recreio dos olhos. Isto é, o teatro recorre, como tudo na vida e na natureza, a processos de compreensão cultural qua lhe permitam a sobrevivência. Quando falha o texto, o teatro recorre aos extremos das grandes construções visuais e orais. O teatro do nosso tempo é um teatro suficientemente rico, Sr. Presidente e Srs. Deputados, rico de texto, rico de sentido humano, para dispensar em certa medida preciosismos de cenografia, das caríssimas companhias, de tudo aquilo que distrai os olhos ou os sentidos, quando o fundo não consegue convencer o espectador.
Não falta público para o grande teatro. Há público para o grande teatro. O que não podemos é deixar uma porta aberta para alimentar as mediocridades. Isto é o que nós temos de travar, porque, à sombra de uma disposição que se pretende que seja uma porta aberta para a defesa da qualidade, podemos estar a abrir uma porta para a defesa da mediocridade. A mediocridade, tout court, tem sempre as casas cheias, mas essa não está ao abrigo da lei de protecção.
Ora bem, Sr. Presidente, queria dizer mais o seguinte: repetir que o teatro sem público não é teatro. As companhias podem ir para a televisão e representar, mas isso deixa de ser teatro. Já em tempos se pôs o problema de que a televisão seria um processo de compensar a grande crise do teatro. Isto pôs-se em 1957, salvo erro, quando a televisão entrou no nosso país. Dizia-se: o teatro está em crise, a televisão vai dar-lhe nova força, a televisão vai trazer ao teatro todos os potencialidades, toda
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a virtualidade da expansão junto de um público que hoje lho falta nos recintos de espectáculo. Erro tremendo, porque a forma televisiva do teatro não é teatro. O teatro precisa da sala, o teatro precisa da plateia, não se sente bem nas nossas casas, a lareira. O teatro é social, precisa de calor humano, de uma plateia que se manifeste diante dos actores. Sem isso não há teatro.
Ora, se nós permitirmos subsídios a espectáculos sem público, estaremos a cometer um erro grave e até um atentado ao teatro.
Acrescento o seguinte, Sr. Presidente: O Sr. Deputado Alberto de Meireles - e muito bem -, com um espírito de que deu sobejas provas e que esta Câmara tão bem conhece, diz que este n.º 2 poderemos considerá-lo regularmente e perfeitamente dispensável na lei que estamos a votar. Isso é um ponto que considero certo. Mas quero dizer a V. Exa. que isto não impede que no regulamento venha a aparecer o que aqui se julga dispensável.
Segundo, também nada impede que nos contratos de concessão de subsídios pelo Fundo de Teatro isso lá apareça. É que o Conselho de Teatro tem que gerir e administrar os seus dinheiros com todas as cautelas. O Conselho de Teatro não é propriamente uma casa de assistência, mas uma casa de fomento cultural. Não é assistência nem a empresários, nem a actores, e este ponto convém acentuá-lo bem. Nós vivemos uma época muito ingrata, Sr. Presidente. Hoje, por exemplo - e aponto para a bancada dos jornalistas -, o grave problema da liberdade de imprensa já nem se põe tanto entre os jornais e o Estado como entre o jornalista e a sua empresa.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Estamos a querer raciocinar ainda em parâmetros ultrapassados pelo nosso tempo. Assim como o problema da dignidade do actor se põe hoje entre ele, actor, o seu espectáculo, o seu papel e o seu empresário, não se deve permitir ao empresário a possibilidade de obrigar o actor a humilhar-se num espectáculo sem público, perante uma plateia vazia. O Estado tem que ficar na sua mão com a possibilidade de arbitrar questões que impliquem não só a dignidade da representação teatral e da cultura que o teatro representa, como tudo o mais de que deixei apontamento, mas sobre que não desejo alongar-me.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Sr. Gonçalves de Proença:-Sr. Presidente: Surpreendi-me, a mim próprio no desejar intervir nesta discussão. Mas parece-me que poderei dar uma achega que situe o problema nos termos que a mim se me afiguram mais correctos.
O que está em causa é uma questão de natureza jurídico-económica. Estão frente a frente duas teses. Uma que entende que, uma vez assegurada a determinada entidade ou companhia teatral um certo subsídio ou uma certa protecção, ela deve ser deixada livre na exploração desse subsídio ou dessa protecção, evitando-se assim qualquer intervenção excessiva da porte de quem concede o referido subsídio. Considera-se que há um negócio privado e que essa intervenção exógena vai contra a natureza privada da actividade protegida.
Do outro lado bá outra tese, a que entende que o subsídio concedido ou protecção conferida advêm de uma subvenção estadual, são mantidos pela comunidade e, por conseguinte, não podem ser malbaratados. Logo só devem ser conferidos quando haja uma razão que assegure e justifique a sua manutenção.
E, assim, os defensores da primeira tese sustentam que a Direcção-Geral da Cultura Popular e Espectáculos não pode suspender o espectáculo se ele não tiver o público suficiente. A outra tese entende que a Direcção-Geral poderá proceder a essa suspensão.
A mim afigura-se-me que o problema poderia e deveria ser resolvido, se ainda for altura para o propor, da seguinte maneira: Não há dúvida de que a empresa, ao pedir um subsidio, conto com ele para a exploração da sua actividade. E não há dúvida também de que, em certos casos, a ausência de público transcende as razões da própria empresa e nem sempre significa má qualidade do espectáculo ou deficiência da exploração. Poderíamos citar aqui numerosos casos em que um espectáculo começou com pouco público, porque ele não se interessou, porque a crítica não o recebeu favoràvelmente, mas pouco tempo depois, mercê de uma resistência da parte do empresário, esse espectáculo veio a conquistar os favores dos assistentes e uma carreira que mais tarde viria a justificar a sua manutenção em cena. Logo não parece que a simples ausência de público durante algum, tempo, mesmo que seja era médios semanais, possa só por si ser considerada como razão bastante para a suspensão imediata do espectáculo subsidiado.
Por outro lado, não se compreende também que uma empresa seja surpreendida com a suspensão desse espectáculo, quando ela contava com a sua manutenção ou queria mesmo manter esse espectáculo por razões diferentes da simples exploração económica, por experiências de vária ordem ou por razões de outra natureza.
O que choca, em suma, é que haja uma intervenção do Estado inesperada para a empresa, que contava com o subsídio e não contava com essa intervenção.
Afigura-se-me que a cláusula do n.º 2 consente um arranjo que é susceptível de conciliar as duas posições.
Se em vez de se dizer «Das cláusulas dos contratos de assistência financeira constará a faculdade de aquela Direcção-Geral fazer cessar os espectáculos cuja média semanal de frequência seja inferior à fixada em regulamento» se disser antes «Das cláusulas dos contratos de assistência financeira poderá constar a faculdade de aquela Direcção-Geral fazer cessar os espectáculos cuja média semanal de frequência seja inferior a fixada em regulamento», nem a empresa mais tarde se poderá queixar, se porventura a suspensão do espectáculo se verificar, porque contava com essa possibilidade, nem tão pouco a entidade que concede o subsídio poderá também deixar de intervir naqueles casos em que, por precaução, tomou a medida, que lhe parecia mais correcta, de condicionar a concessão do subsídio h frequência que julgava suficiente para a sua justificação.
Tenho dito, Sr. Presidente.
O Sr. Pinto Machado: - Em reforço de uma tentativa que concilie a satisfação destas duas exigências, de que o Fundo de Teatro não esteja a manter um espectáculo que não interessa ao público, porque realmente não vale, mas também que ajude, como muito bem disse o Sr. Deputado Gonçalves de Proença, a manutenção de um espectáculo que, não interessando, inicialmente, o público, pode vir a interessá-lo, e porque é de qualidade a formá-lo, eu queria, respondendo ao Sr. Deputado Júlio Evangelista e agradecendo a lição que nos deu, ou pelo menos me deu, de conceito de teatro e de evolução de arte teatral, dizer que a minha premissa não é errada ao declarar o meu convencimento de que escasseia o público para o teatro de qualidade.
De resto, o Sr. Deputado Júlio Evangelista disse que a mediocridade tem sempre as casas cheias, o que im-
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plica a ideia do que a qualidade não tem sempre, necessàriamente, as casas cheias.
O Sr. Júlio Evangelista: - Mas, por isso mesmo, essa mediocridade, a que me referia, não é objecto de Auxilio do Fundo de Teatro. Está excluída do seu âmbito.
O Orador: - Mas eu recordo-me, julgo eu com relativa exactidão, dos números apresentados pelo Sr. Secretário de Estado da Informação e Turismo na reunião em que participou, com tanta utilidade, na Comissão de Educação e que eram mais ou menos estes: para muitos milhões de espectadores de cinema no ano de 1968-1969 ou 1969-1970, não me recordo bem, para teatro, houve um milhão e cerca de duzentos mil espectadores: oitocentos mil, ou pouco mais, foram de teatro de revista, e apenas uns escassos quatrocentos mil para o teatro declamado. Ora, é maior o número de companhias e de casos de espectáculos onde se realiza o teatro declamado do que o teatro de revista. Portanto, embora quantitativamente o País disponha de mais companhias e de mais casas de teatro declamado, a anuência no teatro de revista é dupla.
O Sr. Presidente: - O brilho e diversidade de pontos de vista que se têm entrecruzado sobre a base XV parecem-me demonstrar que, no espírito da Assembleia, ela requer muita atenção, pois ainda não está completamente líquido o sentido em que melhor possa ser resolvida. Por outro lado, comissões convocadas para o estudo de outra proposta de lei fizeram-me saber o grande interesse que teria para o seu trabalho poderem reunir no fim da tarde de hoje.
Em consequência, vou suspender o debate, que continuará na sessão de amanhã, e convoco a Comissão de Educação Nacional, Cultura Popular e Interesses Espirituais e Morais paca se reunir amanha, às 11 horas e 80 minutos, ou, se melhor convier, imediatamente após a presente sessão, para meditarem os seus membros sobre as dúvidas levantadas e poderem amanhã trazer à Assembleia as suas conclusões.
Permito-me sugerir aos Srs. Deputados que, não sendo membros da Comissão, tenham interesse por estia emenda que assintam a reunião que a Comissão vai ter.
Amanhã haverá sessão à hora regimental, tendo como ordem do dia a continuação do debato na especialidade da proposta de lei sobre a actividade teatral.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Albano Vaz Pinto Alves.
Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Amílcar da Costa Pereira Mesquita.
Antão Santos da Cunha.
António Lopes Quadrado.
Bento Benoliel Levy.
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.
D. Custódia Lopes.
Deodato Chaves de Magalhães Sousa.
Fernando do Nascimento de Malafaia Novais.
Francisco Correia das Neves.
Francisco Manuel de Meneses Falcão.
Henrique dos Santos Tenreiro.
João António Teixeira Canedo.
João Duarte Liebermeister Mendes de Vasconcelos Guimarães.
João Duarte de Oliveira.
João Manuel Alves.
João Paulo Dupuich Pinto Castelo Branco.
Joaquim Carvalho Macedo Correia.
Joaquim Jorge Magalhães Saraiva da Mota.
José Gabriel Mendonça Correia da Cunha.
José João Gonçalves de Proença.
José de Mira Nunes Mexia.
José Vicente Pizarro Xavier Montalvão Machado.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Júlio Dias das Neves.
Luís Maria Teixeira Pinto.
Manuel Artur Costa Agostinho Dias.
Manuel José Archer Homem de Mello.
D. Maria Raquel Ribeiro.
Prabacor Rau.
Rafael Valadão dos Santos.
Ramiro Ferreira Marques de Queirós.
Rogério Noel Pares Claro.
Rui Pontífice Sousa.
Teodoro de Sousa Pedro.
Tomás Duarte da Camará Oliveira Dias.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortes.
Vasco Maria de Pereira Pinto Costa Ramos.
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira.
Alexandre José Linhares Furtado.
Amílcar Pereira de Magalhães.
Augusto Domingues Correia.
Fernando de Sá Viana Rebelo.
Francisco Esteves Gaspar de Carvalho.
Francisco de Nápoles Ferraz de Almeida e Sousa.
Henrique José Nogueira Rodrigues.
João Pedro Miller Pinto de Lemos Guerra.
José Dias de Araújo Correia.
José Guilherme de Melo e Castro.
José dos Santos Bessa.
José da Silva.
Manuel Elias Trigo Pereira.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel Monteiro Ribeiro Veloso.
Manuel Valente Sanches.
Miguel Pádua Rodrigues Bastos.
D. Sinclética Soares dos Santos Torres.
O REDACTOR - José Pinto.
Requerimento enviado para a Mesa durante a sessão:
Nos termos regimentais, requeira que me seja fornecida A publicação do Instituto de Alta Cultura:
Projecto Regional do Mediterrâneo. Evolução da Estrutura Escolar Portuguesa (Metrópole). Previsão para 1975.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 20 de Janeiro de 1971. - O Deputado, Teodoro de Sousa Pedro.
IMPRENSA NACIONAL
Página 1420
PREÇO DESTE NÚMERO 7$20