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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL E DA CÂMARA CORPORATIVA

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 78

ANO DE 1971 5 DE FEVEREIRO

ASSEMBLEIA NACIONAL

X LEGISLATURA

SESSÃO N.º 78, EM 4 DE FEVEREIRO

Presidente: Ex.mo. Sr. Carlos Monteiro do Amaral Netto

Secretários: Ex.mos Srs.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira
João Bosco Soares Mota Amaral

SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 50 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foi aprovado o n.º 76 do Diário das Sessões, com uma notificação apresentada pelo Sr. Deputado Nunes do Oliveira.

Deu-se conta do expediente.

Foram entregues aos Srs. Deputados Pinto Machado e Gonçalves de Proença cópias de ofícios recebidos da Presidência do Conselho relativos a requerimentos, por eles apresentados em sessões anteriores.

Os Srs. Deputados Sá Carneiro, Correia das Neves, Duarte do Amaral e Barreto de Lara requereram diversos elementos a fornecer por alguns departamentos governamentais.

O Sr. Deputado Coelho Jordão falou sobre problemas do porto da Figueira da Foz.

O Sr. Deputado Neto de Miranda chamou a atenção para aspectos do desenvolvimento económico do Angola, a propósito do 10.º aniversário da eclosão do terrorismo naquela província.

O Sr. Deputado Camilo de Mendonça ocupou-se do novo regime das farinhas e do pão.

O Sr. Deputado Linhares de Andrade reclamou providências para assegurar a assistência médica na ilha do Corvo.

O Sr. Deputado Montanha Pinto pediu ao Governo um esclarecimento ao Pais sobre as dificuldades de transferências e comércio com as províncias ultramarinas.

O Sr. Deputado Almeida e Sousa focou o problema dos preços do ferro praticados pela Siderurgia Nacional.

O Sr. Deputado Pinto Balsemão fez considerações sobre questões relativas ao desenvolvimento do distrito da Guarda.

Ordem do dia. - Prosseguiu o debate do aviso prévio sobre os aspectos culturais, económicos e sociais do distrito de Braga.

Usaram da palavra os Srs. Deputados Carvalho Conceição e António Lacerda.

O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas e 40 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 15 horas e 40 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Albano Vaz Pinto Alves.
Alberto Eduardo Nogueira Lobo de Alarcão e Silva.
Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira.
Álvaro Filipe Barreto de Lara.
Amílcar da Costa Pereira Mesquita.
António Bebiano Correia Henriques Carreira.
António Fausto Moura Guedes Correia Magalhães Montenegro.
António da Fonseca Leal de Oliveira.
António Júlio dos Santos Almeida.
António Lopes Quadrado.
António Pereira de Meireles da Rocha Lacerda.
António de Sousa Vadre Castelino e Alvim.
Armando Júlio de Roboredo e Silva.
Armando Valfredo Pires.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Augusto Domingues Correia.
Augusto Salazar Leite.
Bento Benoliel Levy.
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.
Carlos Monteiro do Amaral Netto.
D. Custódia Lopes.

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Delfim Linhares de Andrade.
Delfino José Rodrigues Ribeiro.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Eleutério Gomes de Aguiar.
Fernando Augusto Santos e Castro.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando do Nascimento de Malafaia Novais.
Filipe José Freire Themudo Barata.
Francisco António da Silva.
Francisco Correia das Neves.
Francisco Esteves Gaspar de Carvalho.
Francisco João Caetano de Sousa Brás Gomes.
Francisco José Pereira Pinto Balsemão.
Francisco Manuel Lumbrales de Sá Carneiro.
Francisco Manuel de Meneses Falcão.
Francisco de Moncada do Casal-Ribeiro de Carvalho.
Francisco de Nápoles Ferraz de Almeida e Sousa.
Gabriel da Costa Gonçalves.
Gustavo Neto Miranda.
Henrique José Nogueira Rodrigues.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Humberto Cardoso de Carvalho.
João António Teixeira Canedo.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Duarte Liebermeister Mendes de Vasconcelos Guimarães.
João Duarte de Oliveira.
João José Ferreira Forte.
João Lopes da Cruz.
João Manuel Alves.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
João Pedro Miller Pinto de Lemos Guerra.
João Ruiz de Almeida Garrett.
Joaquim Carvalho Macedo Correia.
Joaquim Jorge Magalhães Saraiva da Mota.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Joaquim de Pinho Brandão.
José Coelho de Almeida Cotta.
José Coelho Jordão.
José da Costa Oliveira.
José Gabriel Mendonça Correia da Cunha.
José João Gonçalves de Proença.
José Maria de Castro Salazar.
José de Mira Nunes Mexia.
José dos Santos Bessa.
José Vicente Cordeiro Malato Beliz.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Júlio Dias das Neves.
Lopo de Carvalho Cancella de Abreu.
Luís António de Oliveira Ramos.
D. Luzia Neves Pernão Pereira Beija.
Manuel Elias Trigo Pereira.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel de Jesus .Silva Mendes.
Manuel Joaquim Montanha Pinto.
Manuel Martins da Cruz.
Manuel Monteiro Ribeiro Veloso.
Manuel Valente Sanches.
Maximiliano Isidoro Pio Fernandes.
Miguel Pádua Rodrigues Bastos.
Pedro Baessa.
Prabacor Rau.
Raul da Silva e Cunha Araújo.
Ricardo Horta Júnior.
Rui de Moura Ramos.
D. Sinclética Soares dos Santos Torres.
Teodoro de Sousa Pedro.
Vasco Maria de Pereira Pinto Costa Ramos.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 89 Srs. Deputados.

Eram 15 horas e 50 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Está em reclamação o n.º 76 do Diário das Sessões.

O Sr. Nunes de Oliveira: - Sr. Presidente: Solicito que seja feita a seguinte rectificação: na p. 1555, col. 2.ª, 1. 44, em vez de: "planificação", deverá ler-se: "parificação".

O Sr. Presidente: - Como mais nenhum de VV. Ex.ªs deseja fazer mais qualquer rectificação, considero aprovado o n.º 76 do Diário das Sessões com a rectificação apresentada.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Oficio

Do Sr. Presidente do Conselho a acusar a recepção do Diário das Sessões com o último discurso do Sr. Deputado Homem de Melo, o qual lhe fora enviado a pedido expresso do orador.

Bilhete postal

Sobre a reforma dos beneficiários dos caixas de previdência.

Telegramas

Algumas dezenas apoiando o aviso prévio efectivado pelo Sr. Deputado Nunes de Oliveira.

Apoiando uma exposição oportunamente enviada à Assembleia pelo Sindicato dos Empregados Bancários de Lisboa.

Apoiando a intervenção do Sr. Deputado Leal de Oliveira sobre os agentes rurais.

O Sr. Presidente: - Estão na Mesa, enviados pela Presidência do Conselho, dois ofícios relativos as matérias dos requerimentos apresentados pelos Srs. Deputados Pinto Machado e Gonçalves de Proença, respectivamente nas sessões de 5 de Fevereiro e 15 de Dezembro do ano passado. Vão ser entregues fotocópias daqueles ofícios aos referidos Srs. Deputados.

Tem a palavra para um requerimento o Sr. Deputado Sá Carneiro.

O Sr. Sá Carneiro: - Sr. Presidente: Pedi a palavra para enviar porá a Mesa o seguinte

Requerimento

Requeira que me sejam fornecidos os seguintes elementos:

1) Número de pessoas detidas à ordem da Polícia Internacional e de Defesa do Estado, e depois à ordem da Direcção-Geral de Segurança, na metrópole, durante cada um dos anos de 1966, 1967, 1968, 1969 e 1970;

2) Qual o tempo durante o qual se manteve cada uma das detenções;

3) Quais as percentagens das pessoas detidas:

a) Que foram libertadas sem acusação;

b) Que foram pronunciadas;

c) Que foram condenadas.

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O Sr. Correia das Neves: - Sr. Presidente: Pedi a palavra para apresentar o seguinte

Requerimento

Nos termos regimentais, requeiro ao Governo se digne informar:

1.º Se há disposição legal que tome possível a um funcionário público, que passa à licença ilimitada ou se exonera, conseguir, total ou parcialmente, o reembolso directo ou a transferência para a caixa de previdência que cubra e nova actividade profissional que passe a exercer, das contribuições que lhe foram descontadas nos vencimentos, enquanto funcionário público, para a Caixa Geral de Aposentações, e a fim de, na segunda hipótese, serem tomadas em conta no calculo da pensão de reforma;

2.º Se não há dispositivo legal que obra tais possibilidades como se presume -, estará nos planos do Governo o propósito de vir a estudar o problema que fica aflorado, tanto mais hoje que a organização corporativa oferece já melhores possibilidades de segurança social, permitindo a transferência dos chamados "benefícios diferidos" quando o contribuinte muda de caixa de previdência?

O Sr. Duarte do Amaral: - Sr. Presidente: Pedi a palavra para apresentar o seguinte

Requerimento

Nos termos constitucionais e regimentais, requeira que, com a maior urgência possível, me sejam fornecidos, pelos Ministérios das Finanças e das Corporações e Previdência Social, elementos sobre o número, natureza e orçamentos (valores globais) de todos os institutos e organismos autónomos, incluindo as instituições de previdência social, que habitualmente não suo publicados com a documentação relativa às contas públicas.

O Sr. Barreto de Lara: - Sr. Presidente: Pedi a palavra para apresentar o seguinte

Requerimento

Ao abrigo da faculdade regimental, venho requerer que, pelos Ministérios da Marinha e do Ultramar e, por aquele, pela Junta Nacional da Marinha Mercante, me sejam remetidos com a maior urgência os seguintes elementos em ordem a poder habilitar-me a futura e possível intervenção:

a) Todas as informações e despachos, designadamente o despacho final sobre a pretensão há meses formulada por uma empresa de navegação já formada ou a formar sob a designação de Companhia Angolana de Navegação ou outra similar;

b) Todos os despachos e decisões existentes que orientem e configurem a divisão do transporte para o ultramar entra as diferentes entidades que se dedicam ou pretendam dedicar a esse tráfego.

O Sr. Coelho Jordão: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com a posse do seu presidente, ocorrida há dias, vai a Comissão de Planeamento da Região Centro iniciar a sua actividade, a qual se aguardava com a maior ansiedade e também com a maior esperança.

Da acção desta Comissão, espera-se encontrar solução para muitos dos problemas que, por ainda não estarem resolvidos ou programados, se consideram causadores da estagnação de determinadas zonas ou mesmo da regressão de muitas outras. Dessa situação resultou um despovoamento dos meios rurais, atraídas as populações pelos grandes centros urbanos, como Lisboa, ou pela aventura da emigração.

As potencialidades da região centro são grandes e haverá que aproveitá-las na sua maior intensidade para o seu desenvolvimento, progresso económico e fixação das gentes.

O Sr. Subsecretário de Estado do Planeamento, ao conferir posse ao referido presidente da Comissão da Região Centro, vincava a "necessidade de corrigir a concentração excessiva do progresso económico em torno de Lisboa, reduzindo as disparidades de dinamismo e industrialização e assegurando maiores oportunidades as populações de todo o território".

Este fenómeno não é específico no nosso país, pois por toda a parte há uma tendência natural para uma concentração junto dos grandes centros urbanos. É o caso de Paris, Londres, etc.

Para lutar contra esta corrente natural empreendeu-se um movimento de planificação regional, utilizando diversos meios, enfare os quais são de salientar a realização, pelo Estado, de grandes trabalhos, a outorga de subvenções, bonificação fiscal, etc.

Vale a pena citar o coso do célebre e tão conhecido vale do Tenessi, que por meio do aproveitamento integral do rio conseguiu-se promover o desenvolvimento de toda uma região economicamente perdida; o caso em Itália, da valorização do Mezzogiorno, no qual teve importante influência a localização em Nápoles das fábricas Olivetti; do caso do vale do Ródano, onde toda a actividade se concentra na proximidade da barragem de Donzère-Mondragon, e da fábrica atómica de Marcoule, etc.

No entanto, mesmo nestas condições, o desenvolvimento de uma região não se processa uniformemente por toda ela, mas parte de pontos de concentração chamados pólos de crescimento ou de desenvolvimento. Deles irradia em cadeia todo o desenvolvimento do território.

No distrito de Coimbra, e mesmo extravasando-o, já aqui o afirmei também, serão a Universidade, o Mondego e o porto da Figueira da Foz os pólos de desenvolvimento fundamentais que poderão decidir da prosperidade de toda a região, assegurando as populações um maior progresso económico, dinamizando a industrialização, mando maior número de postos de trabalho, fixando as populações e reduzindo a torrente emigratória, que tão intensamente se tem feito sentir nesta região.

O porto da Figueira será, de entre os três citados, o pólo de desenvolvimento de maior área de influência e, por isso, deve concentrar-se nele a maior atenção, dotando-o das condições necessários para poderem ser aproveitadas todas as suas possibilidades.

A evolução do seu movimento e a influência que já teve na década de 60, depois do início das obras do porto exterior, reflecte a importância da sua força dinamizadora; não só no concelho da Figueira se - instalaram industrias cujo investimento ultrapassa o milhão e meio de contos, que criaram muitas centenas ou milhares de empregos, como ainda se repercutiu por todo o hinterland que serve.

E se o seu efeito multiplicador não tem sido mais acelerado, ele deve-se às condições deficientes que o porto e as suas infra-estruturas ainda oferecem.

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Mesmo assim, e isso representa um índice altamente significativo do interesse com que sectores muito importantes da nossa economia procuram utilizar o porto, o movimento passou de 80001 (média) em 1957-1964 para 19 000 t em 1967, 61 000 t em 1968, 92 000 t em 1969 e 126 000 t em 1970.

Frise-se, no entanto, que mais de 50 000 t de mercadorias tiveram de ser orientadas para outros portos, a conselho das próprias entidades responsáveis pela exploração portuária, por as instalações existentes já não disporem de capacidade. Dentro deste grupo estavam as madeiras; é o não poder ser feita a exportação por aqui representou tão grande importância que alguns industriais não aceitaram contratos de exportação, porque o porto da Figueira era o único que, pela sua posição geográfica, lhes permitia condições em moldes de competição de mercado.

Todavia, apesar das restrições apontadas, o interesse pela sua utilização é de tal ordem que em 1969 ainda foi o terceiro porto exportador de madeira.

Pelo interesse permanentemente manifestado por este sector das madeiras, tudo indica que logo que o porto ofereça condições - principalmente capacidade de cais - ele passará a ser, se não o primeiro, o segundo porto de exportação de madeiras do País.

Como porto de pesca, continua a manter a sua situação cimeira, ocupando o segundo lugar na pesca da sardinha e dispondo de uma frota que é a melhor do País.

A pesca do arrasto cresce a um ritmo que ultrapassa qualquer previsão, passando de 56701 e 15 700 contos em 1968 para 6300 t e 22 000 contos em 1969 e 9200 t e 34 400 contos em 1970.

Verifica-se, assim, um aumento de 118 por cento nos últimos três anos, ocupando o segundo ou terceiro lugar no arrasto costeiro.

O movimento total do porto foi, portanto, de 84 000 t em 1968, 112 000 t em 1969 e 148 000 t em 1970, o que significa um aumento de 78 por cento.

Citei estes números apenas para dar o significado da real importância do porto, mais acrescentado ainda em virtude das condições deficientes em que se tem trabalhado.

A falta de um cais comercial com capacidade suficiente tem sido o factor mais limitante da expansão do movimento do porto. Foi recentemente adjudicado um novo cais com 200 m, obra que, concluída, irá permitir melhores condições de trabalho, maior capacidade para movimento de navios e de cargas, podendo elevar para o dobro a tonelagem hoje movimentada. Mas pela pressão que todo o hinterland exerce, estamos certos que dentro de dois a três anos se atinja a saturação de todas as instalações.

Haverá assim, que pensar já na expansão futura do porto, que só poderá fazer-se para montante da actual ponte, que tudo condiciona enquanto não for removida e que constitui problema da maior acuidade.

A construção da nova ponto, ao mesmo tempo que irá facilitar o tráfego entre o Norte e o Sul, permitirá a expansão franca e ordenada do porto para poder atingir as 500 000 t e o milhão de toneladas previstas.

Igualmente a conclusão do estudo do porto interior, a que já foi ordenada urgência, constitui peça importante e básica para o desenvolvimento de todas as obras a que possa dar-se já início, inclusivamente a construção de algumas de caracter particular e outras da administração portuária.

Sabemos do interesse do Sr. Ministro das Obras Públicas par todos estes problemas e da sua decisão em os resolver rapidamente, amplamente demonstrado ao despachar a adjudicação do cais; pelo que ao Agradecimento que lhe á devido testemunho-lhe a expressão de muito apreço, pela sua operosa e já notável obra à frente do respectivo Ministério.

A realização destas obras, que, acreditamos, se irão processar com brevidade, dá-nos a confiança na existência de um forte pólo de desenvolvimento que contribuirá para a prosperidade de toda a região e para um futuro melhor das suas populações.

O outro pólo de desenvolvimento será o aproveitamento do Mondego, cuja regularização dependerá da construção da primeira barragem, que auspiciosamente se espera ver começar ainda este ano.

É uma tarefa ingente, toda esta, que exige um esforço financeiro do Estado muito grande, mas que se impõe, para não continuarmos a assistir à regressão económica de uma regulo que tem enormes potencialidades e que o País não pode desperdiçar.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Neto Miranda: - Sr. Presidente: Completam-se hoje dez anos que teve início, em Angola, o terrorismo. Ainda temos presentes os momentos que em Luanda se viveram após o ataque de surpresa às forças da ordem que policiavam ruas e bairros e a outras que se encontravam no seu aquartelamento. Foram os guardas da Polícia de Segurança Pública as primeiras vítimas, e perante elas todos nos curvamos e as evocamos neste dia, com o ânimo que os dez anos transcorridos nos trouxeram de as mantermos presentes.

Foram vítimas que fizeram despertar em todos, nós uma onda de coesão em defesa da Nação.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Desde então temos continuado o nosso caminho, cumprimos o nosso dever, e precisamente num continente em que a sua imaturidade política e desvios psíquicos têm desencadeado as mais díspares reacções nas novas nações e no velho e novo mundo.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Assiste-se hoje a um atropelo permanente dos direitos individuais, ao desprezo pela dignidade humana, à morte da liberdade, à predominância da ofensa sobre a defesa, a uma balcanização não só das ideias, como dos territórios, soberanias, intromissão ou pressões de grupos que se odeiam e espalham vítimas à sua volta fundamentados em ideais de amor e de pureza.

Assiste-se a uma permanente ofensa ao homem, às instituições, às nações. E o mundo velho quase que assiste impassível aos desmandos de uns sobre a dignidade dos restantes.

E nós, que somos em África defensores seculares dessa dignidade, sentimos com amargura que os ventos da história estejam soprando de novo na selva, pois que aquele que nos quiseram impor o devolvemos por impróprio para consumo.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: A luta que dura ha dez anos, e que nos obrigarão ainda a manter nem que seja para reforço da defesa da nossa soberania, tem sido vária, abrangendo tão diversos sectores que é precisamente do

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contributo de todos eles que melhor podemos, como sucede, defender em consciência o dever cumprido para riqueza da Nação:

Em 1966 tive ocasião de, nesta Assembleia, ao recordar, como hoje, o dia 4 de Fevereiro de 1961, de dar um apontamento sobre a forma como então a retaguarda económica e social, a retaguarda da paz, desenvolvia em Angola uma acção extraordinária de valorização do território, em complemento de programas ou estruturas já então iniciadas. Acelerámos os métodos, foram postos à disposição do País elementos adequados, cada um viveu com mais entusiasmo o que havia a fazer, ninguém regateou esforços.

Pois a corrida continua, o processo desencadeia novos estímulos e o panorama económico e social da província apresenta-se manifestamente favorável a uma panorâmica de resultados positivos, orgulhoso sabor lusíada de conquista.

Vamos situar-nos em 1962 e percorremos oito anos de vida, atingindo o final de 1969. Mas apenas iremos focar aquela nota mais expressiva que nos vier das riquezas locais e as que ao homem também expressivamente se devem.

De riqueza da terra, direi que foram extraídos ou exportadas, em 1962, 550 000 contos de diamantes e, em 1969, 1 844 000 contos; ferro, 131 000 contos em 1962 e 1 100 000 contos em 1969; petróleo bruto, 191 000 contos em 1962 e 900 000 contos em 1969, sabendo-se que já em 1970 se produziu petróleo bruto no montante de 6 milhões de toneladas, o que poderá ter representado o valor de 1 800 000 contos. Em café, produziu-se 1 800 000 contos em 1962 e 3 800 000 contos em 1970. No algodão em rama a produção passou de 160 000 contos em 1962 para 330 000 contos em 1969, com maior produção de sempre em 1970. Se se tiver em atenção que para obter números deste valor é necessário investir numa proporção do extraordinário valor de que aqueles números são rendimento, bem se pode avaliar do entusiasmo e determinação daqueles que tem acreditado nas potencialidades políticas e económicas da Nação.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Camilo de Mendonça: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Eu estou a ouvir com o maior interesse as considerações de V. Ex.ª E, se me permite, focaria dois aspectos. O primeiro, é que, vai exactamente para dez anos, da tribuna fui o primeiro parlamentar a chamar a atenção do País para o sacrifício e heroísmo dos que morreram em defesa da Pátria em terras de Angola.

Em segundo lugar, para aproveitar as lúcidas e claras conclusões de V. Ex.ª para chamar a atenção dos metropolitanos para um facto de que não se dão conta. Ë que o crescimento, em termos de rendimento, do ultramar é de tal maneira rápido que a curto prazo poderá atingir mesmo o da própria metrópole. E eu creio que isto é muito importante, que os metropolitanos tenham inteira consciência desta riqueza e deste potencial e do seu crescimento.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Engenheiro Camilo de Mendonça, pela interrupção que fez e a que eu acedi com o maior interesse. Tanto mais que é, para mim, da maior satisfação saber que foi V. Ex.ª que, em 1961, meia dúzia de dias certamente passados depois da eclosão do primeiro acto de terrorismo em Angola, nesta Casa levantou a sua voz para prestar as homenagens àqueles que em defesa da Nação deram a sua vida.

Quanto ao interesse que possa eventualmente ter esta minha intervenção em face dos dados estatísticos, mas verdadeiros, que eu tenho fornecido para dor o valor da economia da província, posso afirmar a V. Ex.ª que, de uma maneira, geral, em tudo quanto diga respeito à riqueza de produção, e portanto rendimento bruto, poderemos considerar Angola, dentro do concerto de 36 ou 38 moções que constituem os grupos intertropicais, quase sempre em terceiro ou quarto lugar, com dois ou três países à frente, que são as Rodésias, o Malawi e o Ghana. Isso portanto, para nós, tem o maior interesse e a maior expressão, poro nos levar a trabalhar com maior entusiasmo para o enriquecimento de boda a Nação.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Para V. Ex.ª e para todos os portugueses.

O Orador: - Exactamente. Para toda a Nação, como eu disse.

Se agora passarmos para outro aspecto dos indústrias extractivas e relativos à pesca, significaremos que se em 1962 a produção foi de 848 000 contos, em 1969 foi de 784 000.

Dentro das indústrias transformadoras situam-se com preponderância as de alimentação, que, em 1962, produziram 782 000 contos e, em 1969, 2 500 000 contos; as bebidas, que em 1962 eram produzidas no valor de 260 000 contos, em 1969 foram no de 737 000 contos. Nos têxteis a produção foi, em 1962, de 166 000 contos e, em 1969, de 570 000 contos.

Para não me alongar em excessivo em indicação de números, referirei que em toda a actividade da província, desde tabaco, papel, borracha, química, etc., houve no decurso dos anos referidos acréscimos proporcionais aos números indicados, ou seja na ordem dos 300 por cento.

Fatalmente que toda esta actividade extractiva ou produtiva teria, como teve, de exercer a sua influência em outro sector da vida de Angola, como proveio de meios postos ao seu dispor para a realização de riqueza.

Neste aspecto, devo apontar que a rede rodoviária continuou a merecer o maior interesse do Governo. Se em 1962 se construíram 162 km de estradas asfaltadas, em 1969 construíram-se 529, o que correspondeu ao ritmo de construção da média de 570 km por ano. De facto, a província possuía, em 1969, 4200 km de estradas asfaltadas (contra 200 km em 1962) e ainda 3500 km de estradas terraplenadas, com as quais se despenderam 2 300 000 contos.

O ensino, em todos os graus, foi também objecto de maior interesse do Governo. Em 1962, estavam matriculados 143 000 alunos, mas em 1969 eram já cerca de 400 000.

Muito e muito mais havia que assinalar como expressão do trabalho que se vem realizando em Angola, que é idêntico ao que se processa em outras parcelas do espaço nacional. Mas, para dar uma ideia de como se cimentam os valores humanos na terra em que trabalham ou em que nasceram, direi apenas que se em 1962 se tinham construído nos principais centros urbanos 325 edifícios, em 1969 foram construídos 1073, o que representa também o valor de 700 000 contos.

Toda esta panorâmica significa uma estabilidade dos sentidos e do querer em contraste com o que se passa no Terceiro Mundo, o que não escapou ao Sr. Presidente do

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Conselho, quando, em 1969, ao visitai Angola, afirmou na sua mensagem:

A economia do nosso tempo tem de estar impregnada de profundo sentido humanista. Não nos interessa a riqueza senão enquanto sirva os homens. Criatura de Deus onde cintila o fogo do espírito, o homem não pode ser apenas teoricamente o rei da Natureza; há que fazer participar em concreto todos os homens dos benefícios que o engenho humano consiga arrancar ao domínio do mundo circundante.

O Sr. Júlio Evangelista: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Júlio Evangelista: - Tenho estado a escutar, com muito interesse, as palavras de V. Ex.ª, que se está a referir tão brilhantemente ao progresso do nosso ultramar.

O jornal inglês Sunday Telograph, dia 24 de Janeiro findo, portanto muito recente, publicava a seguinte nota:

Águas da vida.

"E o Senhor disse a Moisés: pára e Eu estarei perante ti sobre o rochedo em Horeb; e tu baterás na rocha, e dela correrá água que o povo possa beber." - (Livro do Génesis.)

O Comité Central do Conselho Mundial das Igrejas dirigiu-se ontem aos seus membros no sentido de desencorajarem os seus governos no apoio à barragem de Cabora Bassa, em Moçambique.

(Risos.)

O Orador: - Repito as últimas palavras do Sr. Presidente do Conselho:

Há que fazer participar em concreto todos os homens dos benefícios que o engenho humano consiga arrancar ao domínio do mundo circundante.

Assim sucederá para "glória e exaltação de Portugal".

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Sr. Presidente: Disposto a quase restringir as minhas preocupações parlamentares aos problemas da "terra" e da "minha terra", hesitei em me ocupar de um problema que, tendo embora origem na "terra" e naturais reflexos na minha região - a segunda produtora de cereais panificáveis -, é fundamentalmente industrial.

Trata-se do regime das farinhas e do pão, que constituiu já objecto de uma lúcida intervenção, nesta Assembleia, na sessão de 9 de Dezembro, por parte do Sr. Deputado Moura Ramos.

A 23 de Outubro, o Decreto-Lei n.º 491/70 regulou o conjunto de problemas relativos à produção de cereais panificáveis e secundários, mas também à moagem e panificação.

Se, no capítulo da produção agrícola, o regime constituiu o natural prolongamento, com as indispensáveis correcções dos desvios verificados, do anterior e se traduz num reforço de meios e medidas ordenadas à intensificação e reconversão culturais, no que se refere a farinhas e pão, representa uma revolução no charco em que caíra, desde há cerca de duas décadas, este sector.

Despertou, por isso, o regime viva controvérsia e marcada expectativa, mas também evidente resistência e forte reacção.

Deixarei de lado as diversas posições assumidas pela lavoura, que só aparentemente são convergentes e, de facto, divergem fundamentalmente por motivos vários, estruturais uns, geográficos outros, de concepções algumas vezes, de ancestralidade outras ...

A minha preocupação, volvidos dois meses após o início de aplicação do novo regime, centra-se, assim, em matéria de moagem e de panificação, já que é neste domínio em que as medidas adoptadas, profundamente inovadoras, afectam o consumidor, destinatário das mesmas.

Com efeito, o regime das farinhas e do pão traduzia-se num amontoado desconexo de regras e disposições nem sempre harmónicas entre si, estagnantes das actividades, lesivas do consumidor e prestando-se a uma infinidade de fraudes. Era um todo teratológico que só por medo e comodidade dos responsáveis se mantinha com singelas e aberrantes adendas anuais.

Dispôs-se, porém, o Governo a enfrentar esta grave enfermidade e a tentar debelar as maleitas, mas mão pode deixar de reconhecer que não poderia atingir a cura de uma vez, mas por fases, tal a enormidade dos desacertos, das incongruências e dós artificialismos ...

Mas estava o Governo condicionado pela decisão política de não elevar o preço do pão, apesar de este se ter mantido estático paira os actuais tipos ao longo de duas décadas, pois o seu nível de preços não é, no concerto europeu, barato, em consequência do sensivelmente mais elevado preço de trigo entre nós.

As resistências políticas ao aumento do preço do pão são, de resto, comuns mesmo a países de capitações de consumo de pão bem mais baixas e de rendimento bem mais elevado do que o nosso.

Mas estava também limitado pela existência de regras de condicionamento industrial e de hábitos regionais de consumo que o impediam de planificar livremente como de prosseguir por modelos teóricos.

Foi, todavia, possível reduzir substancialmente os artificialismos, limitados, agora, à farinha de 2.ª e à consequente bonificação das ramos com incorporação.

O regime instituído assentou na defesa do consumidor, assegurando-lhe a possibilidade de dispor de dois tipos de pão de preço tabelado, e igual ao anteriormente vigente, agora com controle eficaz de peso e de cozedura, libertando todos os outros tipos de pão tanto no que respeita à forma como ao peso, tanto ao preço como a qualidade.

Este regime entregava à concorrência, a um mínimo de concorrência, a melhoria efectiva da qualidade da farinha e do pão, já que técnica e economicamente esta estava assegurada pelas disposições legais.

O consumidor deixaria, assim, de sei- totalmente escravo para passar a desempenhar um papel actuante através das suas preferências, dos seus gostos, das sues possibilidades, e a indústria, quer de moagem, quer de panificação, deixaria também de se revestir da feição buro ou tecnocrática para participar activa e empresariamente no processo económico sob o acicate de uma concorrência moderada e da evidência das 'preferências do consumidor.

Sob estes aspectos, toda a crítica, que se eleve acama dos pormenores, é seguramente mal informada ou simplesmente contestatária ...

Não se me afigura que, baseado mas premissas de que partiu, tidos em conta os condicionalismos referidos e tendo como objectivo os enunciados, o regime seja criticável, pois antes deverá ser saudado pela coragem que revelou, pelo saneamento que promoveu, pela concorrencialidade que procurou, quando assegura a defesa mais forte, eficaz e leal do consumidor.

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MAS terão estes objectivos sido atingidos?

Taremos de reconhecer que, em muitos casos e em diversas regiões, o não foram, podendo afirmar-se até que o pito não melhorou de qualidade como podia e devia, pelo menos no grau e com o generalidade proporcionados, e que aumentou de preço, pana alem do resultado das opções do consumidor.

O pão de 1.ª fabricado a partir de uma farinha que não sofreu alternação de características técnicas, apenas deveria melhorar de qualidade na medida em que os farinhas fornecidos às padarias fossem melhores, mas principalmente desde que a panificação melhorasse a sua laboração, tento na preparação da massa como na cozedura.

Ora, tendo ocorrido que a qualidade das farinhas fornecidas pelas moagens de espoadas talvez por terem desejado prestar real colaboração à política do Governo, talvez por terem receado a aplicação da disposição prevista para estabelecer uma certa concorrência- melhorou sensivelmente, não se compreende facilmente por que não haveria de melhorar a qualidade do pão de primeira?

Ou talvez compreenda, apesar das possibilidades de fraude sem controle e consequente punição se terem reduzido de forma extraordinária: a sabotagem declarada e activa da indústria de panificação, particularmente a partir das chamadas "concentrações de padarias", de triste memória e pior resultado, tanto que, nas zonas em que subsistiam padarias artesanais, a melhoria de qualidade verificou-se e até os tipos tradicionais de pão se mantiveram.

Toda a gente centrara as preocupações da plena vigência do novo regime no poder do cartel corporativo da moagem, de espoadas e, afinal, aliás previsivelmente, a sabotagem do regime veio dos concentrações de padarias, maravilhosa obra do Regulamento do Exercício da Indústria de Panificação do já longínquo ano de 1959 ... que ainda subsiste, mesmo depois dos dois meses de plena verificação das suas virtualidades ...

O Sr. Moura Ramos: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Moura Ramos: - Eu quero antes de mais agradecer a V. Ex.ª a referência lisonjeira que fez ao meu trabalho sobre o pão. E depois aproveitava a oportunidade para prestar um esclarecimento.

Estou plenamente de acordo com as opiniões expendidas por V. Ex.ª Simplesmente, sem ter procuração dos industriais de panificação, uma vez que ao Governo coube o encargo de orientar e de incentivai- e até pressionar os industriais de panificação para que eles fizessem a concentração de padarias, parece-me que não será de imputar todos as culpas a esses industriais. E quanto queria dizer a V. Ex.ª

O Orador: - V. Ex.ª tem razoo em que foi a Direcção-Geral dos Serviços Industriais que, erradamente e contra o ponto de vista de alguns sectores governativos, orientou nesse sentido.

Há aqui um primeiro erro, porque, efectivamente, eu penso que, se a alguma indústria o problema da concentração não é dos importantes nem graves, antes pelo contrário, era este.

A Lei n.º 2005, da concentração, parece, afinal, que só terá sido aplicada onde não devia, onde não era precisa e onde não interessava. Mas também há culpa dos industriais, porque exageraram largamente nos investimentos que fizeram, a contar com o monopólio que iriam obter. Para lá disso, o problema actual e presente é que eles, servindo-se dessas posições de investimentos excessivos que fizeram - não desculpo os serviços industriais da orientação que lhes deram -, efectivamente se serviram dessas condições para não só prejudicar uma orientação, como sabotá-la e prejudicar gravemente o consumidor.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O pão de 2ª qualidade melhorou em geral, por vezes de forma espectacular, em consequência tanto da melhoria, muito acentuado, da qualidade de farinha, como da melhoria significativa das condições de laboração.

Efectivamente, a farinha de trigo usada passou a ser a de l.ª, baixando o grau de extracção, enquanto as de centeio e de milho continuaram a ser de boa qualidade. Por outro lado, as indústrias de padaria viram melhorada a sua receita, para os níveis de consumo prováveis, em cerca de centena e meia de milhares de contos, o que, certamente, terá tido influência o seu comportamento.

A melhoria não terá sido, pelo menos geralmente, tão grande como podia ser, tanto pelas razões apontadas para o pão de 1.ª como pela dificuldade em corresponder rápida e completamente as novas exigências ou a possibilidade de controlo das antigas ..., todavia, a melhoria da farinha de mistura relativamente à anterior foi tão grande que nem com muito boa vontade se tornou fácil fazer o pão pior ...

Quer dizer: o regime de concorrência, em que se fiara a vigência do sistema e a obtenção final dos resultados desejados, não funcionou no sector da moagem, mercê da atenuação da actividade de ramos, e reduziu-se ainda mais no da panificação.

Porém, enquanto no sector da moagem, ao contrário da expectativa, se não verificaram resistências e a qualidade dos farinhas, mesmo sem concorrência, melhorou, no sector da panificação muito pouco pôde ser conseguido, múltiplos dos objectivos foram frustrados e com grande generalidade piorou a qualidade do produto final quando melhorara o da matéria-prima recebida ...

Mas o preço do pão subiu também paro além do resultado das opções do consumidor; como se disse subiu não só porque o vendedor passou a procurar impor os pães de preço livre, já pela melhor qualidade - por vezes a durante algum tempo ...-, já por não distribuir o tabelado, que para mais muitas vezes mudara de formato e piorara no fabrico ..., já porque o pequeno número de padarias industriais de ramos reduziu o fabrico deste pão a partir dessas famílias, com incorporação e subsidiadas, dado o subsidio não ser atribuído às farinhas laborados nas padarias caseiras ou de fabrico à maquia.

Assim, a actuação referida das padarias de espoadas e dos seus vendedores, por um lado, e o limitado número de padarias industriais de ramas, por outro, determinaram um real aumento de preço de pão, sem interferência das opções do consumidor, que bem podia ter preferido pagar um pouco mais por um pão de superior qualidade, desde que a existência de tipos de pão de preço tabelado e de boa qualidade lhe facultasse uma escolha livre, tornados aqueles verdadeiro travão e efectiva defesa.

Quer dizer: a atitude do grande número de industriais de padarias, possível a sombra do célebre Regulamento, foi em geral bastante em força, determinação e extensão, paro sabotar a política do Governo, absorvendo não só a melhoria de condições propiciada, mas agravando até o condicionalismo de preços e de qualidade estabelecido.

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O argumento da escassez de taxa de laboração não colhe, mesmo quando se sabe ser esta limitada. O público consumidor não tem culpa dos investimentos excessivos, nem da transformação em capitalista da indústria de padaria.

Se algum serviço tem responsabilidade, que se lhe peça e encare frontalmente as consequências, pois, realmente, em matéria de reorganizações, esse apenas supera o da cortadoria nacional do pêlo.

Pois parece simples a solução, chegando a não se perceber a falta de reacção dos sectores responsáveis: bastará alterar ou mesmo revogar o Regulamento do Exercício da Indústria de Panificação, consentindo na imediata instalação de padarias, seja de espoadas, seja de ramas, e tudo mudará no dia seguinte ...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Por que se espera?

Eis por que vivamente apelo para o Sr. Ministro da Economia no sentido de não deixar frustrar as intenções do Governo, os propósitos das medidas adoptadas, os objectivos políticos e económicos perseguidos ... e proclamados.

Mas não ficam por aqui as questões que urge enfrentar para que os objectivos sejam cabalmente atingidos e injustiças fie não pratiquem.

Quero referir-me à situação para que estuo a ser atiradas as indústrias ditas de ramas de trigo como os de espoadas do centeio ou do milho, tanto pela falta de padarias industriais para laborar aquelas farinhas como pelo aparecimento de um pão de mistura, agora de boa qualidade e fortemente subsidiado.

Estas moagens, que detinham a maior, parte da laboração da farinha utilizada entre nós ma panificação, correm o risco de se verem substituídas, rápida e decisivamente, pela de espoadas de trigo, com duplo prejuízo para aqueles industriais que vêem os seus investimentos inutilizados e para os consumidores habituados àquelas farinhas ou beneficiários da concorrência entre indústrias.

Efectivamente, à sombra do regime de preços artificiais, em que a farinha espoada de trigo de 1.ª era vendida por um preço superior ao do custo natural, as farinhas de rama de trigo expandiram-se fortemente na medida em que permitiam fazer, por peneiração ulterior, melhor pão e a menor preço.

Assim, de pequenas moagens de ramas de trocas ou à maquia, para lá dos virgilianos moinhos e azenhas, foi-se passando sucessivamente a verdadeiras unidades industriais, com peneiração com as espoadas, mas obrigadas à mistura final da farinha e do farelo dissociados no processo de laboração para poder trabalhar e... vender.

Ora, neste momento em que a orientação governativa é declarada e fortemente orientada sucessivamente para um regime natural, fatalmente aquelas unidades industriais entrarão em progressiva crise até h ruína completa a benefício da actual indústria de espoada de trigo, já que as farinhas subsidiadas em maior ou menor grau permanecerão por muito tempo.

Nestas condições, não parece haver outra alternativa por imperativos económicos, de justiça e regionais, para a integração daquelas unidades no regime geral das moagens de espoadas, de que muitas pouco se distinguem em apetrechamento, deixando a categoria de ramas às unidades laborando apenas em regime de troca ou à maquia, como seria curial.

Que se lhes imponha o mínimo de dimensão a obter, primariamente, por fusão de várias unidades, assim como uma distância mínima relativamente a outras unidades existentes, que se obriguem a preencher determinadas exigências técnicas, compreende-se e justifica-se, mas deixar deteriorar a actual situação, com os inevitáveis reflexos económicos, sociais e regionais, é que não pode ter defesa nem explicação.

Ninguém seria prejudicado, os industriais de espoadas não seriam prejudicados e os de ramas veriam defendidos os seus direitos, criados à sombra, e como consequência, de um regime legalmente estabelecido, mas também de um dinamismo empresarial que merece ser reconhecido e recompensado.

Hoje não pode, nesta matéria, haver mais lugar a distinções artificiosas: há moagens industriais e há moagens rurais. É por aqui que as soluções tem de ser procuradas.

Deverá ainda acentuar-se que esta actuação seria correctora, imediata e decisiva, do regime presente das moagens de espoadas de trigo, contribuiria para a racionalização dos transportes de cereais e de farinhas e defenderia, como é indispensável, a persistência de algumas unidades industriais nau regiões interiores, em geral as produtoras de cereais.

Pois bem, daqui apelo para o Sr. Ministro da Economia para que encare decisiva, corajosa e rapidamente este problema a benefício da justiça devida, do equilíbrio social desejado, da descentralização industrial proclamada, das realidades técnicas e económicas insofismáveis.

Sr. Presidente: Como se tudo isto, que é pouco ..., mas tem muitas consequências ... não bastasse, as convenções colectivas, em matéria de condições de trabalho da indústria de panificação, começaram a conter também normas restritivas da concorrência por meio da regulamentação da circulação do pão!

Já assim aconteceu em .Setúbal, já assim acontece em Portalegre, assim acontecerá amanhã, sucessivamente, em toda a parte ...

Só não entendo bem é como podem incluir-se cláusulas económicas em contratos sociais sem conhecimento e prévia aprovação do sector governativo competente.

Onde vamos parar por este caminho?

Oh! Quanto tarda a lei da defesa da concorrência para cortar cerce todas estas prepotências e veleidades!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Os industriais de padaria sonharam encontrar um regime idêntico àquele que a moagem, dita de espoadas, obteve há quase quarenta anos, passando, então de artesanal, como em regra e em geral deveria ser, a uma indústria cartelizada, funcionalizada, sem estímulo nem iniciativa, desservindo os consumidores e dominando a situação.

E procuram-se contra a política do Governo, sabotando os objectivos do regime cerealífero, contra os interesses do consumidor, frustrando as suas expectativas, e procuram-no tendo como pontos de apoio o tal regulamento e os acordos colectivos de trabalho ...

Por que se espera?

É o que verei e o público ajuizará.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Linhares de Andrade: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O quadro de pessoal dos serviços de saúde da Junta Geral do Distrito Autónomo da Horta inclui um lugar de delegado de Saúde na ilha do Corvo. Vão decorridos, todavia, longos anos sem que o mesmo lugar tenha sido provido, e isso porque os respectivos

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concursos de provimento têm ficado sistematicamente desertas. Consequentemente, a população da ilha tem estado, entretanto, totalmente privada de assistência médica, já que ali não reside nenhum outro médico exercendo funções públicas ou a profissão liberal.

Uma tal situação, sem dúvida grave onde quer que se verifique, assume aspectos verdadeiramente dramáticos no caso particular do Corvo, em razoo da irregularidade e dificuldade de comunicações entre esta ilha e as outras do arquipélago. Com a sede do distrito, distante cerca de 120 milhos, só há ligações através doe navios da carreira, mas, mesmo essas, nem sempre são possíveis, porque o porto se mostra muitas vezes impraticável. Com a ilha das Flores, a mais próxima, a cerca de 15 milhas, as comunicações efectuam-se em pequenas embarcações do trafego local ou da pesca, mas com carácter eventual, e soo também muito difíceis ou impossíveis durante grande período do ano, por efeito das más condições de tempo de mor, frequentes nesta zona ocidental do arquipélago, sujeita a violentos e prolongados temporais.

Deste modo, os corvinos só com grandes sacrifícios e incómodos podem proporcionar aos seus doentes assistência médica e, bem pior, vivem sob a permanente ameaço de os verem perecer à míngua, quando dela carecem com urgência.

A falta de médico tem sido, de resto, uma constante na história da ilha. Desde o seu povoamento, só durante raros e curtos períodos foi suprida, graças ao amor pela vida simples e ao espírito de renúncia que, por vezes, ainda animam certos homens.

O Sr. Miller Guerra: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Miller Guerra: - As palavras que acabamos de ouvir acerca da assistência médica ou da sua inexistência na ilha do Corvo podem dar a impressão de que, tratando-se de uma ilha, se pode explicar essa inexistência pelas suas condições geográficas.

Tenho a dizer que aqui no continente, desde Trás-os-Montes ao Algarve, nos centros urbanos, na própria cidade de Lisboa, há populações que, do ponto de vista sanitário, vivem como se estivessem numa ilha. Este é um ponto fundamental para que se tem de olhar com toda a energia, imediatamente, e duvido que, se não formos mais longe do que as medidas que se têm tomado, se possa algum dia, proximamente pelo menos, resolver a crise gravíssima em que se acha há muitos anos a assistência médica às populações privadas de recursos. Nos hospitais de Lisboa há uma perigosa ausência de assistência médica, menos devido à falta de médicos do que as condições administrativas, tecnológicas e outras em que funcionam.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Deputado Miller Guerra.

O Sr. Ricardo Horta: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Ricardo Horta: - Eu considero que V. Ex.ª trato aqui um problema gravíssimo, que a Nação sofre, e é pertinente porque, segundo o conceito geral dos povos, especialmente da Organização Mundial de Saúde, o Governo tem o dever de velar pelo saúde e o vida das populações que estão dentro da sua administração. Portanto, é aqui nesta Assembleia que V. Ex.ª põe o problema, e muitíssimo bem. O Governo, estou certo que, ouvindo as razões que V. Ex.ª apontou e que irá em seguida apontar, não deixará de estudar o problema e dar-lhe a solução que merece. Numa ilha como a, do Corvo ainda que a sua população seja diminuta - são 600 ou 700 habitantes, não podemos deixar segregada essa população dos direitos à assistência, à conservarão da vida, à saúde. Tem o Governo obrigação, visto que é soberano nessa parcela nacional, de, através da colocação de um técnico, através de meios de evacuação em condições, prestar uma assistência digna, dentro dos exigências dos povos que se dizem civilizados.

Mas V. Ex.ª refere-se aqui ao Corvo. Aqui há tempos eu tive um problema muito semelhante nas Flores. Esta ilha, ainda que tenha uns seis, sete mil habitantes, estava desprotegida, descoberta sob o ponto de vista cirúrgico, e uma organização técnica bastante evoluída que lá se instalou exigiu que tivesse uma cobertura cirúrgica. E nós cumprimos, e muitíssimo bem. Mas esse cumprimento trouxe-nos uma flexibilidade de concepção relativamente a colocar lá um cirurgião, trouxe-nos um pagamento substancial, umas dezenas de contos por mês, trouxe-nos a obrigação de um período de prestação de serviços. Mas, no entanto, cumprimos a nossa obrigação. Existe lá uma enfermagem, da instituição que eu dirijo, onde se encontra uma enfermeira tecnicamente perfeita, que está também em regime cíclico, periódico.

Mas perante o que se passa no Corvo, como o Sr. Deputado Miller Guerra afirmou, V. Ex.ª vê uma porte substancial das pessoas que morrem sem assistência aqui na metrópole. V. Ex.ª vê aqui no continente que os hospitais têm uma insuficiência de meios extraordinária para poder cumprir a sua missão. Portanto, parece-me que o Corvo está dentro da situação geral que o País atravessa, que é preciso remediar, que é preciso resolver e que as populações e nós todos estamos dispostos a resolver. Não é só a classe médica; é preciso todos colaborarem para a solução do problema.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Deputado Miller Guerra, muito obrigado, Sr. Deputado Ricardo Horta, pelas valiosíssimas ajudas que me vieram trazer, ao chamar a atenção para este problema, deveras momentoso, não só na ilha do Corvo, mas, hoje, em todos os meios rurais. E, se me dão licença, eu continuo.

A vida no seio da comunidade corvina, onde não há pobres nem ricos, nem cadeias, nem fechaduras nas portas, onde permanecem sólidos os laços de solidariedade entre os homens, só conservam puros os costumes e o respeito pelos valores eternos, pode, sem dúvida, exercer a atracção de um refúgio acolhedor aos que mal suportam os estragos do feroz egoísmo hoje dominante nas sociedades, ditas civilizadas, dos grandes centros. Mas sempre o grande isolamento, a pequenez do meio, a falta de comodidades elementares, os minguados proventos, hão-de desencorajar quem, possuídos embora de grande espírito de abnegação, pense ali fixar-se.

Não é, portanto, de admitir, realisticamente, se repitam os exemplos dos bons clínicos que por lá passaram, sobretudo agora que o crise de médicos em todos os meios pequenos passou a constituir um sério problema nacional, denunciado há poucos dias ainda nesta Assembleia pela voz autorizada do Sr. Deputado Miller Guerra.

Numa louvável tentativa para resolver o caso do Corvo, a Junta Geral do Distrito fez construir uma residência destinada ao delegado de Saúde, que dotou de todas as comodidades possíveis, e elevou substancialmente a respectiva remuneração, fixando-a em montante muito superior ao que é devido a idêntica categoria nos outros

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concelhos do distrito. For seu lado, a Junta Central das Casas dos Pescadores, animada de bom espírito de colaboração, criou o lugar de médico privativo da Casa dos Pescadores do Corvo, a preencher, cumulativamente, pelo delegado de Saúde.

Os atractivos representados por tais medidas revelaram-se, todavia, ineficazes: o Corvo continua sem médico desde há muitos anos, como disse.

Será necessário, portanto, descobrir outras soluções, diferentes das que normalmente asseguram o provimento de cargos públicos, mas sem demora, porque não é justo consentir que a vida e a saúde de toda a população de uma ilha continuem desamparadas de assistência clinica.

O Sr. Alberto de Meireles: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Alberto de Meireles: - Eu estou a ouvir, enlevado, V. Ex.ª, porque de tantos e tão ilustres Deputados, até os que falaram, penso eu que terei sido dos poucos que visitei a ilha do Corvo. Isso está arquivado nalgumas páginas perdidas dos livros que publico raramente.

O Orador: - E que eu li com muito prazer.

O Sr. Alberto de Meireles: - Pois esta evocação do Corvo comoveu-me. É a terra mais ocidental de Portugal.

O Orador: - Da Europa.

O Sr. Alberto de Meireles: - Da Europa e de Portugal. É encantadoramente primitiva, é extraordinariamente bela. Quando por lá andei, foi por mera visita de curiosidade, de satisfação pessoal, não outro fim, e lembro-me de que todo aquele povo, as seiscentas ou setecentas pessoas que lá vivem e que eu conheci uma a uma - o que não é difícil -, dizia em resposta à pergunta "mas como é que vivem sem médico?": "O problema é muito sério", diziam-me os responsáveis da terra, "mas a senhora professora tem um pequeno arsenal farmacêutico, é muito devotada, aplica as injecções; mas", pormenor que me lembro, curiosíssimo, "há sobretudo uma pessoa que vela por mós: é Nossa Senhora." Está naquela igrejinha linda, de Nossa Senhora dos Milagres; e Ela foz o milagre de morrer pouquíssima gente, como eu pude ver naquele cemitério curiosíssimo que até tem este ressaibo poético: na parede do cemitério está uma legenda que podia, com ironia, ser cruel: "Sejam bem-vindos no Corvo." (Risos.)

E eu tive a curiosidade, porque recebi para mim essa mensagem, de ir ver o pequeno cemitério que V. Ex.ª conhece, debruçado sobre o porto. É pequenino, muito simpático e quase deserto. Havia mais de um ano que não era lá enterrado ninguém. As pessoas gozam de saúde, não têm os problemas que nós todos temos, vive-se pacatamente, não circula dinheiro, as fechaduras são desconhecidas - lembro-me que havia uma única. A porta da igreja está sempre aberta, todas as casas estuo abertos.

Mas, realisticamente, e ao contrário das doutíssimas e autorizadas opiniões que aqui apareceram, parece-me que, dado o condicionalismo da terra que eu conheci e que penso que permanece a mesma, porque estas coisas permanecem milénios, dificilmente será possível fixar um médico. O que será possível, penso eu é utilizar essa bane assistência das Flores, assistência médica, agora melhorada, que eu conheci também, porque das Flores ao Corvo vai muito pouca distancia. Mas o mar dos Açores não é para brincar. A acostagem é muito difícil. Lembro-me de me terem contado lá que foi necessário evacuar um ferido grave e foi preciso um dos nossos oficiais da aviação naval arriscar o seu avião e tentar uma amaragem dificílima. Só assim conseguiu evacuar o doente, levando-o para a Horta, onde foi operado pelo actual governador civil. Hoje há outros meios. As Flores tem uma base estratégica.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Alberto de Meireles: tenho imensa pena, mas V. Ex.ª está infringindo o preceito regimental que requer a inscrição prévia para discursos no período de antes da ordem do dia. E agradecia ao Sr. Deputado Linhares de Andrade o obséquio de não consentir mais interrupções.

A hora está muito adiantada.

Eu estou-me vendo na necessidade, sempre dolorosa, de não conceder a palavra a alguns Srs. Deputados que estão inscritos e, apesar de tudo, muitíssimo instam comigo para ainda usarem dela. Há mais inscrições para o período de antes da ordem do dia, que já vai mais longo do que o Regimento prevê. De maneira que, com imenso desgosto, com muitíssima contrariedade, tenho de começar por pedir aos Srs. Deputados que nem sequer ratão inscritos para não discursarem.

O Sr. Alberto de Meireles: - Eu peço desculpa a V. Ex.ª - As considerações que fiz talvez fossem, de facto, mais longas do que pensava. Não foram, certamente, da profundeza das dos Srs. Ilustres Deputados que me antecederam, ainda que mais breves no tamanho. Peço, pois, desculpa a V. Ex.ª de ter perturbado. E com isto termino, dizendo que realmente, para mim, já há anos a solução de um pequeno heliporto poderia resolvei- a assistência médica, satisfatória e humanamente.

O Orador: - Muito obrigado pela preciosa ajuda de V. Ex.ª e muito obrigado também em nome da população do Corvo pelas simpáticas palavras que lhe dirigiu, população que tudo merece, população que teve a honra de um dia merecer de um grande político que foi Mouzinho da Silveira o desejo, expresso em testamento, de querer ser sepultado entre aquela gente, porque teve a coragem de um dia lhe ser grata.

Se me dão licença, prossigo e prometo concluir dentro de breves minutos.

Se compreensivelmente não é possível encontrar um médico que aceite fixar-se com carácter permanente numa ilha minúscula, distante, isolada, de umas escassas centenas de habitantes apenas, penso que não haverá dificuldade em recrutar voluntários, civis ou militares, se as funções a desempenhar o forem em regime de comissão, por períodos curtos, de um ano no máximo, e se, a par de uma remuneração condigna, a comissão lhes proporcionar outras vantagens nas respectivas carreiras profissionais.

A consideração do Governo, particularmente à do Sr. Ministro cia Saúde e Assistência, deixo esta mal esboçada sugestão, com um respeitoso apelo, em nome da boa e sacrificada gente do Corvo, para que, por via dela ou de outra mais consentânea, o problema exposto venha a merecer pronta solução.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Montanha Pinto: - Sr. Presidente: Apenas meia dúzia de palavras para um apelo ao Governo.

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Torno-se necessário, diria mesmo indispensável, que o Governo informe o País, esclarecendo o "grave e complexo problema" das dificuldades de transferências e comércio cora as províncias ultramarinas.

Ainda anteontem um jornal da tarde, de grande expansão, publicava, em título a toas colunas e tipo destacado, uma transcrição do boletim informativo da Associação Comercial de Lisboa, sobre tão momentoso como importante problema.

Na verdade, só motivos imperiosos podem justificar se mantenham atrasos nas transferências além das restrições nas trocas comerciais da metrópole com o ultramar.

O sistema vigente ocasiona prejuízos e inconvenientes da mais diversa ordem, permitindo-me salientar a perturbação económica e, mais especialmente, as incidências de natureza política e social, que julgo de maior interesse impedir ou anular.

O Governo marcou sempre, e mantêm, uma posição intransigente na defesa de uma política de unidade nacional. A proposta governamental sobre a revisão constitucional é disso a prova mais recente.

Ora, mal se entende que factores, estritamente de ordem das Finanças e do Ultramar, e, se for caso disso, para piciadores de especulações, que ferem o sentimento da unidade que se pretende seja mantido incólume.

Como mal se aceita o que não só compreende, indispensável se torna um esclarecimento, claro e em termos simples, ao alcance fácil de todos.

Sr. Presidente e Srs. Deputados: Sou leigo em assuntos económicos e financeiros, e como eu grande parte Idos portugueses. Devo afirmar que par mais de uma vez tentei elucidar-me junto de especialistas no assunto; os respostas deixaram sempre mais confuso o meu modesto entendimento.

Julgo saber que por porte do Governo-Geral de Angola foram atingidas todas as possibilidades válidos ao seu alcance, o que equivale a dizer que as medidas a tomar para uma resolução aceitável do problema ultrapassam a sua capacidade de decisão.

Admito que a importância da questão mereça a atenção do Governo, portanto, apelo para os Srs. Ministros das Finanças e do ultramar, e, se for caso disso, para o Sr. Presidente do Conselho, para que a Nação seja esclarecida sobre os razões que originam as dificuldades de transferências monetárias e restrições no comércio com o ultramar.

E se assim se fizer, julgo se evitarão as especulações insistentes, quero crer todas de boa fé, mas que estilo A causar choques e reacções de emotividade, cuja extensão alcança e mina princípios morais e patrióticos com que o momento se não coaduna e o espírito de unidade nacional não aceita.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Almeida e Sousa: - Sr. Presidente: Longamente afastado, por doença, do convívio de VV. Ex.ª significativo ó que, na primeira ocasião em que tal me consentem, queira vir tomar um pouco do vosso tempo.

Muitas coisas se passaram e se disseram neste Pais e nesta sala desde a última vez que aqui vim. Se escolho apenas uma delas para objecto das minhas palavras de hoje, é simplesmente porque entendo ser de meu dever e obrigação imposta pelos que aqui represento.

E as obrigações que reconheço, por penosas que sejam, por danosas que me possam vir a ser, ensinaram-me a cumpri-las sempre e até ao fim.

Há tempos, precisamente no dia 21 de Janeiro passado, saiu em todos os jornais, nuns mais extensa, noutros mais sintetizada, uma conferência de imprensa dada por um dos administradores da Siderurgia Nacional.

Todos os que a leram com certeza que rejubilaram perante os progressos que só apontam, o aumento que se projecta, os triunfos técnicos que se alcançaram, o futuro que se antevê.

Tudo quanto é português nos deve interessar profundamente e não somos tão ricos de realizações que não devamos render preito de gratidão aos que teimam em ser os obreiros do nosso desenvolvimento.

Porque se conhecem e se reconhecem, não se negam, Antes se afirmam com alegria -que é mais do que satisfação, as qualidades e os méritos dos dirigentes, dos técnicos e dos operários que fizeram a Siderurgia Nacional.

Só quem nunca fez nada, nunca errou.

Para quem, do fundo do seu ser, sente e vive os palavras que VV. Ex.ª acabaram de ouvir, adivinharão quanto será desagradável pronunciar as que a sua consciência lhe impõe dizer a seguir.

Por mais do que uma vez, e esta é mais uma, tem a Siderurgia Nacional pretendido minimizar a protecção de que dispõe e os diferenciais de preço que pratica.

Não quero ser longo e quero ser concreto.

Penso que ao povo português têm os seus governantes o direito de lançarem os impostos, directos ou indirectos, que, em consciência, reconheçam necessários ao bem da Nação. Mesmo esses, constitucionalmente, sofrem apreciação quando nesta Casa é votada a Lei de Meios.

Não critico nem quero criticar aqui as razões, que tenho de admitir poderosas e bem fundadas, que teriam obrigado a medidas com que, pelo menos na extensão que lhe foi dada, o País, na sua grande, esmagadora maioria, nunca concordou.

Que o povo pague, se é necessário que pague, estará certo, mas que saiba ao menos que paga, quanto paga, a quem o paga e por que á que o pagai Que ninguém lhe venha dizer que não paga, quando paga!

E ao que venho. Procurarei apenas quantificar.

Tomarei números que, melhor do que eu, a Siderurgia conhecerá.

Referir-me-ei, pana uniformidade e simplificação, unicamente - já que noutros perfis e qualidades a defesa seria bem maior ao ferro redondo normal de 25 mm poro betão atinado, ferro sem extras, portanto.

Ao faze-lo, mão quer dizer que esqueça que, mais graves do que tudo quanto a respeito de varão possa dizer, são as consequências do preço da matéria-prima no desenvolvimento da indústria metalo-mecânica, essa, sim, essencial ao desenvolvimento do Pois. No entanto, como já disse, hoje só quero quantificar.

A Siderurgia Nacional sabe tão bem sorno eu que o preço por quo actualmente poderíamos comprar o ferro na Europa seria de cerca de 105 dólares por tonelada F. O. B. Antuérpia - e estamos bem longe dos pouco mais de 70 dólares que foram demorada lei, ou mesmo dos 85 que ainda não há muitas semanas se alcançavam sem dificuldade.

A Siderurgia Nacional conhece também perfeitamente os preços de frete e seguro que actualmente se pagam entoe Antuérpia e os portos portugueses. Para efeitos de cálculo, apenas, direi que o último que firmei foi, muito recentemente, de 574 francos belgas por tonelada.

Quer isto dizer que, se nos deixassem importar -o que, adias, mão defendo -, minha solução seria bem outra; seria comprar o ferro à Siderurgia Nacional, mas a preço

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que não pudesse ser considerado escandaloso - quer isto dizer, capito, que o ferro importado ficaria G. I. F. por cerca de 3330$ por tonelada.

Pelo contrário, quanto temos de pagar pelo mesmo ferro, colocado no mesmo cais, aos armazenistas a que a Siderurgia Nacional nos obriga a recorrer? Pois pagamo-lo na base dos 4800$ por tonelada da tabela.

Para uma produção total que se afirma ser 327 000 t, descontados os preços especiais feitos aos poucos grandes consumidores e os 8 por cento concedidos aos armazenistas, suponho que estes números dizem muita coisa. Dizem, pelo menos, quanto hoje custa ao povo português a Siderurgia Nacional.

Quanto aos preços nos mercados internos dos países exportadores, e já que a Siderurgia Nacional faz tanta questão nisso, não me atreverei por certo, num apontamento como este, a maçar VV. Ex.ª com complicadas tabelas e paridades. Direi apenas que são suficientemente conhecidos os baremes que têm vigorado nos mercados dos nossos dois tradicionais fornecedores: França - 638 francos franceses (cerca de 3300$) e Bélgica - 5800 francos belgas (cerca de 3400$). E todos os que alguma vez negociámos no estrangeiro em mercado livre sabemos bem o valor que devemos dar aos baremes que se anunciam.

Mas, porque apesar de ter querido ser tão concreto quanto o pude ser, adivinho que ainda possa haver argumentos de circunstância - ensinaram-nos que, os grandes interesses se defendem por si próprios" e podem defender-se muito bem creio útil acrescentar - ainda um exemplo, o exemplo que conheço, que, quanto a mim, melhor mede a protecção que o Governo português e, por sua ordem, a Nação têm consentido a Siderurgia Nacional.

Há seis anos houve no Porto um concurso para fornecimentos que, porque financiados pelo Banco Mundial, exigiram certa liberalização de processos. De entre esses fornecimentos, um referia-se precisamente a alguns milhares de toneladas de ferro para betão armado.

Porque foi muito discutido, em intensidade e em tempo, ainda conservo os elementos que então pude colher. Para simplificar, dou apenas as duas propostas que interessam à comparação. Foram elas:

Proposta de um representante de fornecedores estrangeiros:

Preço total C. I. F. Leixões - 32 990 coutos.

Proposta da Casa Sommer, como representante da Siderurgia Nacional:

Preço total no mesmo cais - 63 320 contos.

O que sucedeu? Pois não foi sem dificuldade, nem sem demora, que a empresa obteve a licença de importação, e, se a obteve, foi apenas por imposição da própria índole do concurso. Isto independentemente de lhe ter sido aplicada a pauta alfandegária máxima - 1200$ por tonelada num total que suponho ter sido de cerca de 15 000 contos.

E depois? Depois, e desde então - já lá vão cinco longos anos -, a referida entidade, que é de serviço público, vem comprando aos armazenistas fornecidos pela Siderurgia Nacional, e sempre a preços baseados na respectiva tabela, os muitos milhares de toneladas de aço de que necessita.

É uma questão de política económica, poder-me-ão dizer. Eu diria antes de sobre imposto. De serviço público como é a empresa de que se trata, no fundo será o povo português que pagará sempre a protecção que agora se impõe.

O Sr. Oliveira Dias: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Oliveira Dias: - Quero apenas corroborar as afirmações de V. Ex.ª e, se me permite, acrescentar o seguinte: é certo que a Siderurgia Nacional tem acarretado dificuldades a indústria portuguesa, pelo alto nível de preços praticados, e não só por este motivo mas também porque se têm verificado muitas dificuldades de abastecimento à nossa indústria, motivadas por carências da Siderurgia Nacional.

O Orador: - Apoio perfeitamente as afirmações do Sr. Deputado Oliveira Dias. Mas isso é outro assunto e a mim, neste momento, interessa-me apenas a questão do preço.

Ainda se a Siderurgia Nacional fosse verdadeiramente nacional, isto é, da Nação, como o seu nome, talvez não muito curialmente, parece insinuar, pois bem, pagaríamos todos o que viria a ser nosso. Assim, não parece bem nem límpido.

Estes foram e são os factos, e creio bem que estes ninguém terá coragem de desmentir. Foi o passado e ainda é o presente.

Mas - e bem gosto tenho de terminar com uma palavra de esperança - diz-nos agora a Siderurgia Nacional, textualmente, que esse pretende libertar da atmosfera de proteccionismo que sobre ela se faz pesar" e que "pretende antes mover-se no regime de concorrência que teria se integrada na C. E. C. A., em termos de garantida reciprocidade.

Meus senhores, não sei - tão lentas estas coisas vão - se ainda terei assento entoe VV. Ex.ª quando tais pretensões se vierem a realizar. Se o tiver, então sim!, então será com verdadeira alegria que aqui prometo vir felicitar, bem alto, a Siderurgia Nacional pelo cumprimento das suas promessas e o povo português pela libertação do imposto que vem pagando.

Até lá, e contra o que se afirma na conferência a que aludo, infelizmente continuarei a envergonhar-me dos preços médios dos nossos produtos siderúrgicos.

Isto não obstante as duas leis de meios que já votámos - artigo 20.º, alínea d), da Lei de 1970 e artigo 20.º, alínea 2, c), da Lei de 1971 - e a confiança ilimitada que tenho na recta intenção e na coragem nunca desmentida do Sr. Secretário de Estado da Indústria.

Acima de tudo, e contra tudo, é nele que confiamos para que, à sua maneira, dê realidade, tão rapidamente quanto for possível, os pretensões agora expressas pela Siderurgia Nacional. Outra coisa a Nação não quer ... E se todos, pelos vistos, queremos, por que não há-de ser?

É nesta esperança - esperança, repito, de que em breve a Siderurgia Nacional se liberte da atmosfera de proteccionismo que sobre ela se faz pesar e de que passe antes a mover-se, em termos de garantida reciprocidade, no regime de concorrência que teria se integrada na G. E. C. A. -, é nesta grande esperança que quero terminar.

Que o futuro venha a ser assim bem diverso do que o passado foi e do que, infelizmente, e digam o que disserem, o presente ainda é.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Pinto Balsemão: - Sr. Presidente: Há quem entenda não ser esta Câmara o local indicado para o tratamento de assuntos considerados regionais. A estrada,

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a ponto, a rede de esgotos, não teriam cabimento neste hemiciclo, órgão coda vez mais político e menos legislativo. O abastecimento de água, o fornecimento de energia eléctrica, a instalação de telecomunicações, estariam fora do âmbito de uma Assembleia Nacional, onde apenas se deveriam abordar altos problemas ideológicos.

Julgo, todavia, que este tipo de raciocínio está errado. As denominadas questões regionais podem e devem ser tratadas nesta Casa. Como sintomas de deficiências, de necessidades primarias e prementes, de legítimos anseios, elas revestem-se de- indiscutível importância, política. Como consequência de situações de injustiça, de desigualdade ou de frustração, elas transcendem o plano ... local e a sua própria solução insere-se nos superiores objectivos da Nação.

Na acolhedora quietude desta sala, nem sempre nos recordamos de que por esse país fora - metrópole, ilhas e ultramar- há milhões de portugueses que vivem mal. Sem água ou sem luz, sem estrada ou sem telefone, sem médico ou sem esgoto, esses nossos compatriotas tentam sobreviver perante condições naturais, socioculturais, económicas e até político-jurídicas pouco favoráveis.

É sobrevivem, dando-nos a nós - que vivemos bem ou menos mal - uma inquietante lição de coragem - ou de resignação -, de amor às pessoas e às coisas - ou de indiferença rotineira perante todos e tudo -, de esperança em melhores e longínquos dias - ou de desespero facilmente transformável em ódio e em revolta não obrigatoriamente pacífica.

A satisfação das naturais pretensões desses milhões de portugueses não é, a priori, para eles um problema político. Eles desejam, antes de mais, que as suas moderadas ambições sejam reconhecidas, assinaladas, identificadas. Depois, que sejam solucionadas efectiva e eficientemente, isto é, que acabem as promessas, as entradas em estudo, as esperas de melhor oportunidade, etc., e que o que precise ser feito seja concretizado com meãos oratória e mais acção. O modo de bem - ou seja, em tempo útil alcançar estas metas já constitui, em si e por si, um problema político: ou dos critérios aplicados e a aplicar resultam saldos francamente positivos, ou os referidos milhões de cidadãos que não têm culpa de nascerem na aldeia, que não têm culpa de só poderem tirar a 4.ª classe, apesar de a escolaridade obrigatória já ir em seis anos, que não têm culpa de não encontrar emprego, a não ser nas grandes cidades ou no estrangeiro - optarão, mais cedo ou mais tarde, por outros critérios. Poder-se-á argumentar que se tratará, então, de uma opção pouco esclarecida, mas quem tem pouco ou nada a perder não gasta tempo com hesitações e facilmente escolhe por exclusão de partes.

Sr. Presidente: A minha presença nesta Câmara deve-se aos votos dos eleitores do círculo eleitoral da Guarda.

Se é certo que a partir do momento em que fui eleito passei a representar a Nação, não oferece, por outro lado, qualquer dúvida que não cessaram por isso os laços muito especiais que me unem às gentes daquelas terras.

As chamadas "questões regionais da Guarda" preocupam-me, não só pela consolidação e existência desses laços, mas também porque se pode apontar o distrito da Guarda como exemplo das disparidades regionais portuguesas. Integrada, ao nível do planeamento, na sub-região interior da zona centro, a Guarda faz parte de toda uma vasta área desprotegida pela Natureza e pelos homens. As infra-estruturas não surgem no ritmo indispensável. As escolas e os serviços médicos não preenchem os requisitos mínimos para uma vida actualizada. A agricultura está parada ou em retrocesso, a indústria não avança, o comércio não progride.

As pessoas emigram ou resignam-se, mas, em qualquer caso, demonstram dos modos mais diversos a sua insatisfação.

É claro que, quer no sector público, quer no privado, há realizações dignas de apreço. Há obras de grande mérito, que minoram as agruras e possibilitam o convívio; há indivíduos de grande coragem e notável capacidade, que não se resignam nem emigram, que ficam, para criar.

O panorama, é, porém, negativo, como o demonstra o número sempre crescente de migrantes.

Se houvesse motivos para acreditar que a situação era transitória, que seriam rapidamente criadas condições de desenvolvimento para que os que partem regressem, que feudo estava previsto para recuperar o atraso - estas palavras de alarme não teriam razão de ser. Infelizmente, o agravar dos dificuldades, o círculo vicioso em que a economia enfarou, a continuada expectativa de resoluções que não vêm, levam a crer que o distrito da Guarda está condenado o uma irreversível decadência..

As boas intenções anualmente enunciadas no relatório da lei de meios não se concretizam no que respeita ao interior do País. Os notáveis esquemas do Sr. Subsecretário do Planeamento não começaram ainda a produzir frutos na zona mais pobre da metrópole. Expressões como "desenvolvimento regional", "incentivos fiscais à indústria", "criação de pólos", "equipamento urbano", "emparcelamento agrícola", etc. vão sendo consideradas letra morta, porque as pessoas não vivem de teorias e continuam a não ver satisfeitas as suas necessidades mais elementares.

No campo das grandes realizações materiais, já em marcha, o distrito da Guarda e os seus vizinhos sem acesso ao mar permanecem afastados dos respectivos benefícios. A prevista rede de auto-estradas é toda dedicada ao litoral, esquecendo-se que é precisamente pela Guarda que os Portugueses entram no Europa. Os empreendimentos industriais de grande vulto como, por exemplo, os relacionados com a indústria petrolífera também não contemplam o interior. Em mataria de turismo, se exceptuarmos a triste história do teleférico da serra da Estrela - que, aliás, continua por arrancar -, também há protegidos e desprotegidos.

Sr. Presidente: Num momento em que o regionalismo revive em países com baratas afinidades com o nosso, como a Itália e a França, não será descabido pedir a esta Camará e ao Governo uma meditação profunda e imediata sobre dois aspectos do mesmo problema:

Em primeiro lugar, o agravamento já referido do situação no interior metropolitano e a necessidade de evitar que não apenas entre os indivíduos, mas também entoe as regiões de um mesmo pais, os nacos sejam coda vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres. É preciso redistribuir o rendimento nacional, passar à acção na canalização do investimento, atrair pessoas e bens onde eles são mais necessários, proporcionar poderes de decisão ao nível local.

O Sr. Roboredo e Silva: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Com certeza.

O Sr. Roboredo e Silva: - Pretendia apenas declarar que apoio totalmente as considerações de V. Ex.ª sobre as gerais carências do desprotegido distrito da Guarda, pelo qual fomos eleitos Deputados.

De resto, também já lhes tenho feito, por vezes, nesta Câmara, rápidas mas justas referências.

Entendo que a intervenção de V. Ex.ª é manifestamente oportuna, por estar em curso a discussão do aviso

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prévio apresentado pelos ilustres Deputados do circulo de Braga sobre os aspectos económicos, culturais e sociais do respectivo distrito.

E que, salvo melhor opinião e acauteladas as características, porventura especiais daquele distrito, como, por exemplo, desenvolvimento industrial e densidade populacional, os aspectos básicos que têm sido anunciados no aviso prévio são comuns à esmagadora maioria dos distritos metropolitanos.

Assim, as considerações de V. Ex.ª afigurara-se-me que terão de merecer a atenção do Governo, de forma aproximadamente idêntica à que for concedida ao distrito de Braga.

O Orador: - Muito obrigado a V. Ex.ª Assim o espero também.

Em segundo lugar, a probabilidade de essa acção não ser viável mediante uma reforma das estruturas regionais. Não se trata neste ponto de ressuscitar defuntas políticas de campanário nem de exacerbar estéreis bairrismos. Pretende-se apenas colocar a questão - a qual oportunamente se - regressará - de se saber se a criação, para efeitos de planeamento, dos zonas e - das sub-regiões, não deverá corresponder uma mais ampla autonomia administrativa e financeira - e até política - dos órgãos locais, porventura organizados de modo diferente do actual. Se o desenvolvimento regional depende acima de tudo de um esforço interno, da actividade e da participação das pessoas que o vão impulsionar e dele vão beneficiar, será legítimo esperar que elas colaborem - e realizem, sem que lhes sejam dados ou delegados os meios indispensáveis?

Sr. Presidente: Penso ter demonstrado que os chamados problemas regionais têm pleno cabimento nesta Assembleia. Se a metrópole não é só Lisboa, o que se passa no resto do território interessa a esta Câmara.

Foi por entender que em largos áreas desse território o que se passa é grave e, por vezes, é esquecido, que decidi pedir a palavra a V. Ex.ª Não ficaria, na verdade, bem com a minha consciência se, sabendo dos dificuldades crescentes a que conduz a estagnação da vida nalgumas regiões, nu o viesse aqui chamar a atenção da Assembleia Nacional e do Governo, certo de encontrar, numa e noutro, a melhor compreensão para as minhas intenções.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vamos passar à

Ordem do dia

Continuação do debate do aviso prévio sobre os aspectos culturais, económicos e sociais do distrito de Braga.

Tem a palavra o Sr. Deputado Carvalho Conceição.

O Sr. Carvalho Conceição: - Sr. Presidente: A minha intervenção neste aviso prévio tem a finalidade de chamar a atenção do Governo para algumas das carências escolares do distrito de Braga, nomeadamente no ensino primário, secundário e normal.

Sr. Presidente: Num mundo como o nosso, em renovação contínua e acelerada, os homens devem possuir, como o afirmou G. Berger (L'Homme Moderno et son Education, p. 144), "características e armas simultaneamente fortes e maleáveis, de modo a poderem manter-se em tal estado de disponibilidade que as transformações não os abatam, e saibam, na ocasião própria, recuperar e continuar o caminho". Por outro lado, face a uma sociedade em mudança, a educação terá de ser prospectiva, olhar o futuro e não comprazer-se na mera contemplação do passado, visando fazer de cada homem um inventor, aberto às solicitações do meio, dotado de espírito crítico, sabendo conjugar a construção do seu destino pessoal com o da colectividade a que pertence, e participante na marcha comum para o desenvolvimento dos povos.

E surgiu, então, a natural pergunta: a escola está em condições de realizar tais objectivos ou, pelo contrário, encontra-se desfasada da vida?

A escola foi posta em questão e começou a falar-se da sua "crise". Surgem críticas acerbas, mais ou menos apaixonadas, contra o sistema educativo em vigor, acusado de estar isolado dos alunos pelos métodos utilizados ou por falta de efectiva participação dos estudantes; dos pais, alheados das suas responsabilidades e ignorando o que nas escolas se faz; da colectividade, que se limita a suportar os encargos da educação e desconfia das inovações; da própria cultura viva, porque divorciada dos novos meios e tipos culturais que à margem da escola se constróem.

A "crise da escola" traduzir-se-ia em dois aspectos: enfraquecimento ou mesmo ruptura das suas estruturas e transformação das suas finalidades. O ensino deverá ser do tipo humanista ou técnico? Preocupar-se-á em seleccionar ou orientar os seus alunos? Deverá assegurar a um mínimo de pessoas um máximo de cultura ou dar a todos um mínimo de cultura? Visará a pessoa do educando ou as exigências das profissões? E apenas considerado como factor de progresso económico ou preocupar-se-á com a realização pessoal, com o integral desenvolvimento do educando?

A resposta aceitável foi dada pelo Ministro da Educação Nacional, ao dizer que, no domínio da educação, há que consagrar aos princípios humanistas e a vocação comunitária do Estado Social, reconhecedor dos direitos do cidadão, considerado em si mesmo e como elemento de uma colectividade integrada". Eis por que, ao apresentar ao País o projecto da sua reforma, o Ministro Veiga Simão declarou que ela assentava no duplo princípio de que a educação do indivíduo é a finalidade' primeira do sistema educacional e de que todos, em regime de igualdade de oportunidades, devem encontrar nesse sistema as vias que garantam o seu inalienável dereito a educação". Esta a directriz governamental, como o prova o artigo 44.º da proposta da revisão constitucional:

O Estado procurará assegurar a todos os cidadãos o acesso aos vários graus de ensino e aos bens da cultura, sem outra distinção que não seja a resultante das capacidades e dos méritos.

Para concretizar "direito á educação" é necessário, por um lado, garantir a "liberdade de ensino", a qual, permitindo o estabelecimento de escolas particulares, dá a cada um a possibilidade de escolher a via que entenda ser a melhor para a sua realização, e, por outro lado, supõe a "igualdade de oportunidades" no acesso a graus sucessivos de escolaridade.

Contudo, na prática, a igualdade de oportunidades é falseada. De facto, há diferenciação escolar, quer ao nível primário, pois existem "postos escolares" e "escolas" entregues os primeiros a "regentes" e as segundas a "professoras", quer ao nível secundário, em cuja base confluem o ciclo preparatório directo ou pela TV) e a 5.ª e a 6.ª classes do ensino primário, com programas diferentes, com métodos próprios e orientados por professores com habilitações desiguais, o que dificulta a articulação com o liceu

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e as escolas comerciais o industriais. Alam disso, atribuindo-se, socialmente, "prestígio" diferente aos dois ramos do ensino secundário, as famílias orientam, sob a influência doa condicionalismos sócio-económicas, os educandos para um ou outro tipo de estabelecimento escolar. Podemos ainda acrescentar que, em virtude da deficiente rede escolar (em certas localidades, ou sua proximidade, pode existir ou nó um colégio ou só uma escola técnica, por exemplo) as possibilidades de escolha são reduzidas.

Contra esta situação injusta se ergue o espírito reformador do Ministro Veiga Simão, propondo que se acabe com os "postos escolares", cuja existência tem sido justificada pela pequena frequência da escola - como se, pelo facto de serem poucos, os alunos não merecessem professor qualificado ...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - ... que se unifique o futuro 1.º ciclo do ensino secundário, à base do ciclo preparatório, apoiado pala TV, e, acabando com "hierarquias" horizontais, criando liceus polivalentes. Desta modo surgirá a "escola única", oferecendo a todos iguais oportunidades, estabelecendo real unidade educativa e, simultaneamente, evitando os actuais estrangulamentos entre os diversos graus e ramos de ensino. Só por isto teremos de dizer: bem haja, Sr. Ministro.

Sem dúvida, outras medidas terão de ser tornadas, dado que em mintas localidades a cobertura escolar é realizada pelos colégios particulares. Estes terão de ser devidamente aproveitados, para benefício dos alunos. Para isso impõe-se prever a possibilidade de a sua frequência não ser onerosa para as magras bolsas de tantos que os desejariam ver frequentados pelos seus filhos. A melhor solução será a concessão de bolsas ou subsídios as famílias mais carecidas de recursos. Lá fora tem sido experimentado, com sucesso variado, o sistema do embaratecimento dos propinas nos colégios, mediante isenções fiscais ou a atribuição de subsídios. O problema oferece naturais dificuldades, mas terá de ser resolvido.

Mas não julguemos garantida a "igualdade de oportunidades" só porque há escolas e professores. Precisamos, em primeiro lugar, de criar condições sociais e económicas aos agregados familiares para que seja regular e rendosa a frequência dos alunos. É um facto, de todos os educadores conhecido, que muitos dos atrasos escolares tem a sua raiz precisamente no ambiente familiar, no seu nível sanitário ou alimentar, sorno aio tipo de habitação, e ou sua capacidade económica para fazer face aos encargos com a educação (material didáctico, transportes, etc.), a qual, muitas vezes, não permite que se prescindo, do contributo, embora modesto, do trabalho da criança. Enquanto estes problemas não forem devidamente resolvidos, mão poderemos afirmar que a todos são dadas as mesmas oportunidades. Isto significa que, na base da reforma educacional, está e reforma da sociedade.

Depois de removidos estes obstáculos, impeditivos da frequência, ou do rendimento escolar, um outro surge: as crianças não entram, no escola primária usufruindo do mesmo desenvolvimento somato-psíquico e com a plena posse de certos instrumentos indispensáveis para, uma eficaz adaptação à escola. Isso taram-se evidente quando comparamos crianças da 1.ª classe com ou sem frequência de um jardim infantil.

Foi, por isso, que vi com alvoroço indicada, a intenção de reoficializar o ensino infantil sob a designação de "pré-primário". E a minha satisfação resultava de dois motivos: porque se ária permitir maior rendimento dos alunos e também atendendo aos aspectos sociais de que o mesmo ensino que se reveste. Na realidade, será possível criar um ambiente mate favorável ao desenvolvimento da criança, permitindo uma educação sanitária, uma alimentação mais sadia, a modificação de muitos dos hábitos familiares e, desse modo, contribuindo para a redução dos elevadas taxas de mortalidade infantil.

Eis uma obra que bem merece o apoio das entidades particulares, em especial das empresas fabris, que, coda vez em maior número, utilizam pessoal feminino. Mas ao Estado não cumpre aconselhar os outros a montar creches ou infantários ou jardins-escolas. Essa atitude teria sempre pequeno eco. Haja em vista o que sucedeu com os despachos do Subsecretário da Assistência Social, que, tendo, em 1957, determinado que os empresas que empregassem cinquenta ou mais mulheres eram obrigadas a criar creches e jardins de infância para os crianças dos 2 aos 7 anos, acabou, em 1960, por se limitar a chamar a atenção para o dever que aos empresários incumbia de criar ou, pelo menos, de colaborar em obras desse tipo. Não quer isto dizer que não confie na iniciativa privada, até porque há exemplos válidos dessa protecção. O que quero significar é que é mais realista confiar ao Estado essa missão.

Ora, o distrito de Braga, sob este aspecto, é um dos que mais precisa de instituições deste género. Densamente povoado (em 1939 a sua população era de 667,1 milhares, pelo que ocupava o terceiro lugar no conjunto dos distritos do continente), com zonas fortemente industrializadas, apresenta uma alta taxa de mortalidade infantil, pelo que se impõe uma programação que corrija as suas disparidades de desenvolvimento e garanta a sua promoção económica e social. Em boa hora foi dada prioridade ao distrito de Braga para a instalação de centros de saúde, dos quais espero a criação de medidas de assistência materno-infantil capazes de contribuir para o abaixamento sensível da taxa de mortalidade infantil. A carência de uma política de assistência familiar não justificaria, no nosso meio, a criação de uma escola de assistentes sociais? Deixo aqui a sugestão.

O panorama do ensino infantil no distrito de Braga é o seguinte: 8 estabelecimentos de ensino (dos quais 7 acumulavam com outros ensinos) com uma população escolar de 383 crianças. Este número fala por si. Há que incrementar a instalação de novos estabelecimentos e começar desde já a preparação das respectivas educadoras. Algumas das escolas primárias das cidades do distrito poderiam, a título experimental, receber crianças dos 5 aos 7 anos, que seriam entregues a professoras primárias, após um curso de aperfeiçoamento, a realizar nos férias na cidade de Braga. E na própria Escola do Magistério, em regime de opção, deverá ser criado o curso de educadora da infância.

A análise da situação escolar do distrito revela baixo índice de escolaridade obrigatória, dado que não está integralmente realizado o alargamento à 6.ª classe. O mesmo acontece no restante do País. Ainda não há muito se declarava que a disposição legal sobre a obrigatoriedade das seis classes estava a ser cumprida somente em cerca de 50 a 60 por cento, o que naturalmente não pode deixar de causar apreensões. Tenhamos presente que o grande "estrangulamento" do sistema educacional tem lugar no fim da escola elementar. Assim, em 1968-1969, dos 147 000 alunos que concluíram a 4.ª classe, matricularam-se na 5.ª classe 23 800 e no ciclo preparatório (nas suas duas modalidades) 64 000, ou seja 59,7 por cento do total. Há que mentalizar os pais -mas haverá também que auxiliá-los -, a efectuarem a inscrição dos filhos nesse grau de ensino e simultaneamente garantir-lhes escolas para os receber, não vá continuar a

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verificar-se que muitos alunos ficam em casa porque não foram criados os respectivos núcleos.

Vejamos, em pormenor, a situação do ensino primário no distrito.

Em 1968-1969, 87 453 alunos frequentavam 1467 estabelecimentos de ensino, instalados em 1448 edifícios, dos quais apenas 373 tinham sido construídos para esse fim, com 1596 salas de aula. O escasso número de salas determinou a sua utilização intensiva, em regime duplo ou triplo; a falta de edifícios obriga a arrendar casas sem as necessárias condições pedagógicas e até higiénicas, sendo notória a ausência de logradouros para recreios ou de razoáveis instalações sanitárias. Daí que o seu estado de conservação seja deficiente, obrigando a pesados encargos.

O exemplo mais frisante é dado pelo concelho de Guimarães, com 77 salas de aula arrendadas e com 91 salas em mau estado de conservação. Devo esclarecer VV. Ex.ª de que as câmaras municipais não se têm poupado a esforços para resolverem o problema. Testemunha-o o seguinte quadro:

Despesas com arrendamentos 419 963$80

Despesas com obras de conservação 1 184 908$10

Despesas com mobiliário 669 321$80

Despesas com material didáctico 280 529$20

Despesas com higiene, conforto, etc. 302 059$90

Despesas com comparticipações 383 623$80

O ritmo das construções escolares tem de ser acelerado. Presentemente, pelo que me dizem, estão programadas 175 escolas, envidando as câmaras diligências para a aquisição de 75 terrenos. No entanto, queixam-se os municípios de que estejam por construir 53 escolas, apesar de os terrenos já terem sido adquiridos há vários anos (38 há mais de um ano). Porque não se constrói? Sem dúvida, por falta de verbas orçamentadas. Mas outras vezes por dificuldades na obtenção dos terrenos ou na adjudicação das obras.

Auscultados os responsáveis, poderemos concluir: segundo os proprietários, as exigências da localização das escolas junto de vias de comunicação colidem com os seus interesses, em virtude de esse terreno ser considerado como terreno de construção, logo de preço mais elevado, e, em segundo lugar, porque provoca desvalorização do terreno sobrante, uma vez que é vedado construir a menos de 12 m do limite da escola-logradouro. Estas objecções, comuns em todos os concelhos, ganham maior relevo em meios turísticos, como no caso de Esposende.

Por sua vez, os empreiteiros não concorrem a essas obras por vários motivos: baixos preços, carestia de materiais de construção, elevados salários, dificuldades de acesso n certas zonas, dispersão das escolas, edificações pequenas (uma sala ou duas). E as câmaras vêem os concursos desertos e sentem dificuldades (pelo custo) nas expropriações.

Parece-nos ser necessário: dar mais autonomia às câmaras, de modo a permitir o recurso a empreiteiros locais; rever os cadernos de encargos; evitar os "lotes" de escolas que vão a concurso, e que levam alguns empreiteiros a desistir, às vezes só por causa de uma escola isolada; subsidiar, (contra reembolso) as câmaras para os actos de expropriação; chamar o Ministério das Obras Públicas a si as referidas expropriações.

Aliás, a Lei n.º 2107, de 5 de Abril de 1961, estabelece essa faculdade, nos seguintes termos: os terrenos para a construção escolar devem ser postos à disposição da Delegação para as Obras de Construção Escolar no prazo máximo de cento e oitenta dias, a partir da data em que for comunicada a sua aprovação; findo esse prazo, o Ministério das Obras Públicas, poderá determinar que a Delegação adquira ou exproprie os terrenos. Só o que tem acontecido é que essa faculdade não é usada, ficando a aguardar a resolução camarária.

Uma outra solução capaz de interessar os empreiteiros consistiria em concentrar, em determinados locais, as escolas, ou melhor, em substituir a dispersão escolar pela concentração.

Em Guimarães, por exemplo, vão ser construídos dois edifícios de dez salas cada um. Com este processo, uma outra vantagem se obtinha: a criação de um núcleo de professores, que animaria a povoação e seria instrumento de uma notável acção educativa no respectivo meio, através de campainhas de educação permanente, de vulgarização de novos conhecimentos ou técnicos. Este sistema pode ser posto em prática em Cabeceiras de Basto e Arco de Baúlhe, em Amaras, em várias freguesias de Guimarães, de Vila Nova de Famalicão, de Braga e de Fafe. O pleno rendimento do sistema de "concentração escolar" será alcançado quando for possível garantir um serviço de transportes escolares,, problema este que se liga ao das vias de comunicação, a melhorar no meio rural.

Para diminuir o custo, e sobretudo o tempo de construção, há que encarar, como já vem sendo feito, a utilização de outros materiais de construção.

Mas mais importante do que o problema da construção escolar é a transformação que o ensino primário sofreu: em vez de ser tido como ensino terminal (para a grande maioria), é agora considerado como a primeira etapa de uma escolaridade mais longa, o que, naturalmente, se reflectiu nos programas.

Por outro lado, ganha relevo não o papel que ao professor cabia de "transmissão de conhecimentos", validos para a vida prática, mas a missão que lhe passa a incumbir de desenvolver as capacidades do educando, em vista de futuras aprendizagens. Esta tarefa exige professores mais bem preparados. Daí o pretender-se uma reforma das escolas do magistério, de modo a obter-se docentes com maior formação cultural e pedagógica, o que supõe a elevação do curso para três anos e um íntimo contacto com os progressos das ciências da educação, donde a ligação com a própria Universidade ou com o Instituto de Pedagogia.

Enquanto tal não suceder, impõe-se a generalização de cursos de aperfeiçoamento, a concessão de bolsas aos professores da Escola do Magistério que lhes permita a frequência de institutos pedagógicos nacionais ou estrangeiros. Sem dúvida, a melhoria da sua formação, com as suas exigências, deverá ter uma contrapartida: aumento das regalias profissionais.

A "educação básica" prevê a frequência da escola dos 6 aos 14 anos, ou seja da escola primária e do 1.º ciclo do ensino secundário. Numa fase de transição, a actual, o ensino pós-primário é realizado por três vias: ciclo preparatório (forma directa ou pela TV) e 5.ª e 6.ª classes.

Prevê o Ministro que estas vias se reduzam a uma só, embora com o apoio da TV. Este 1.º ciclo terá funções de observação (dois anos) e de orientação (dois anos), no fim dos quais ou prossegue estudos secundários ou entra numa profissão. Considera-se, portanto, que o educando adquiriu as "bases" para a sua vida activa, prevendo, inclusive, possíveis alterações no decurso da mesma.

Esta capacidade de orientação futura é facilitada, durante a vida escolar, por um jogo de disciplinas de opção, que lhe permite fazer ensaios vários, em vista de uma

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determinação mais definitiva. Infelizmente, não poderá prosseguir no caminho de novos experiências desde que, aos 14 anos, por razões várias, interrompa os seus estudos escolares. È que no 2.º sido, ao lado de matérias comuns, prossegue o jogo das opções, agora visando uma melhor escolha da futura carreira, com a frequência dos liceus clássicos, técnicos e artísticos.

O alargamento da escolaridade para os oito anos e a modificação Ana estruturas escolares chocara-se com as graves carências de edifícios e de professores.

Se tivermos presente que caminhamos para a escolarização do grupo etário completo, utilizando estabelecimentos para os alunos normais, para os deficientes e também para os 'superdotados, verificamos ser enorme o esforço a realizar ao nível do 1.º ciclo secundário. Assim, como disse o Dr. José Sampaio (A Capital, de 22 de Janeiro de 1971), em 1968-1069 havia em Portugal continental 056,1 milhares de crianças dos 11 aos 14 anos, das quais se encontravam escolarizadas 384,3 milhares, pelo que a escolarização completa corresponderia a um aumento de 278,8 milhares. Corrigido este último número para 260 malhares, conclui-se, serem precisos mais 260 estabelecimentos (de 1000 alunos cada um) e mais 16 400

Eis por que somos de parecer que, a curto (prazo, teremos de continuar a utilizar os escolas primárias e seus professores (5.ª e 6.ª classes). Por outro lodo, dado que os escolas do ensino secundário mio se dispersam como as do ensino primário, creio que talvez fosse de encarar a hipótese, 4e futuro, de considerar a escola elementar com cinco classes, pelo que o ingresso no secundário se faria aos 11 anos.

Os números acima indicados revelam não ser em vão que o Ministro da Educação apela para uma mobilização geral para ganhar a "batalha da educação". Precisamente, ao nível do 1.º ciclo assistiremos a grande "explosão escolar". Deixa-o prever a "Estimativa da População de 1961 a 1986", elaborada, para o distrito de Braga, pelo G. E. P. A. E.

[...ver tabela na imagem]

A importância deste novo período concede a prioridade a construção' de escolas para o ciclo preparatório, e todas as câmaras do distrito de Braga se afadigaram em obter terrenos, em arrendar, casas, em procurar contratos com colégios existentes nas respectivas sedes. Em alguns a solução foi simples, embora provisória (Guimarães, Celorico de Basto, Vieira do Minho e Vila Verde dispõem de casa camarária ou arrendada), noutros casos há colégios que alugam parte das suas instalações (Esposando) ou que não o desejam fazer (Cabeceiras de Basto), em certas terras erguem-se solas pré-fabricadas (Barcelos e Fafe) ou utilizam-se os edifícios do Liceu e da Escola Técnica (Braga e Barcelos); Amares (prevê uma adaptação), Terras de Bouro e Vila Verde (já com terreno), o mesmo sucedendo com Cabeceiras de Basto, acabam por garantir a cobertura do distrito, embora tenhamos de confessar que sem um sistema de transportes escolares ou sem a criação de outras escolas (está já criada a escola de Vizela, aguardando-se apenas a aquisição do terreno) será sempre deficiente. Mas esse esforço, por vezes, ultrapassa a capacidade económica dos câmaras, convindo que o Estado chame a si tais despesas.

O ensino secundário acaba por tornar-se, como se costuma dizer, um "ensino de massa". Esbatem-se as "hierarquias" 'entre os ramos do mesmo grau de ensino, para surgir uma "escola comum e média", em que os alunos terno de ser "estudantes", isto é criadores de um trabalho pessoal. Ao lado de um "tronco comum" de matérias vamos aparecer um conjunto de "opções", visando permitir ao aluno, em plena actividade, dar conta das suas aptidões, encaminhando-se, mais conscientemente, para uma carreira escolar ou profissional. Deve ser também preocupação da escola dar ao jovem a compreensão do mundo presente, através do estudo de casos concretos, veiculados pelos modernos meios de comunicação (mas média). Estes meios acabam, alias, par constituir uma verdadeira escola - "escola paralela" lhes chamou Friedman - que fornece variados conhecimentos, faculto experiências e torna mais precoce, intelectual e afectivamente, o jovem.

Vai mais longe a sim influência: faz ruir um ensino baseado no professor enquanto fonte única do saber. No entanto, e por paradoxal que pareça, a peida desse "monopólio" foz ganhar ao professor uma outra dimensão, na linha da mais velha e pura tradição docente: a de "educador", chamado a auxiliar o educando a tornar-se pessoa, afinando-lhe a sensibilidade, através de uma educação artística, desenvolvendo-lhe o espírito crítico, desse modo evitando que ele se deixe submergir pelas vagas de informações, tantas vezes desencontradas, recebidas pela imprensa, radio, cinema, televisão e outras fontes. Neste sentido como que adquire a função de "filtro", tonto móis indispensável quanto a família vem perdendo tal papel. Eis por que se impõe, igualmente, a entrada e nos programas do ensino secundário das "ciências humanas". Formar o homem e o cidadão continuam a ser objectivos da escola.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: -Se como dissemos, no ensino secundário ganha relevo o propósito da "orientação escolar", há que cuidar de criar os meios a essa missão indispensáveis. Os professores, a não ser por autodidactismo que os leva à frequência de alguns cursos, não receberam preparação específica para tal serviço.

Por outro lado, são poucos os investigadores e os centros existentes no País: um de natureza (o Instituto de Orientação Profissional) e dois particulares (em Lisboa e Porto).

Creio que se torna indispensável agrupar tais elementos, para com eles constituir "brigadas", que percorreriam as capitais de distrito, onde ficariam localizados outros órgãos de apoio. De tais brigadas e centros fariam parte, obrigatoriamente, o médico escolar, o pedagogo, a assistente social. Deste modo, poder-se-ia planificar uma política de assistência médica, psicológica e social, para uso de alunos, de pais e de professores.

Para concretizar esta orientação, urge começar também por (resolver o problema da saúde escolar, reestruturando os respectivos quadros. É que, presentemente, e para uma acção em 322 estabelecimentos do ensino secundário (é excepção San tarem, com incidência no ensino primário) existem apenas 105 módicos, o que atribui, em média, a cada um uma população escolar de 2019. Esclareço que se encontram valores excessivamente elevados.

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Num caso, um médico escolar tem sob a sua vigilância 5558 alunos, repartidos por vários estabelecimentos. No caso de Guimarães, por exemplo, com três estabelecimentos de ensino secundário e um pouco mais de 4000 alunos, o médico escolar só pode ir a cada escola duas manhas por semana ... Enorme falta fazem as auxiliares de enfermagem e, sobretudo, as visitadoras. O seu quadro actual contém somente 52 visitadoras, número manifestamente irrisório, precisamente numa época em que são mais perturbadoras as influências dos factores sociais no espirito e no coração dos jovens, a acrescentar às condições de vida familiar, em especial nos meios urbanos e rurais.

Sei que vários projectos de reforma do departamento da saúde escolar foram elaborados, embora sem êxito. Oxalá, e quanto mais não fosse como consequência do próximo Congresso Internacional sobre Saúde e Higiene Escolar, a realizar em Lisboa, surja a legislação adequada a hora que passa.

A política do novo ensino secundário, que se dirige para a criação de liceus polivalentes, obriga a que se encare um novo tipo de edifício escolar. O liceu não pode continuar a ser uma mera justaposição de salas de aula, antes deverá ser constituído por espaços e zonas de dimensões variáveis e convertíveis, a fim de possibilitar o trabalho de grandes turmas (auditórios), de pequenos grupos (seminários) ou o estudo individual.

É que caminhamos para uma nova distribuição do trabalho dos professores e dos alunos. Enquanto estes serão agrupados por disciplinas, de acordo com o seu próprio ritmo de trabalho, os professores, em equipa, saberão aproveitar as peculiaridades de cada um - desde o professor de tipo "magistral" ao encarregado dos seminários e trabalhos práticos ou da orientação e acompanhamento do trabalho individual do aluno. Dentro desta mesma linha, os chamados "deveres" para casa passam a ser realizados na escola, integrados no tempo escolar, o que exige, além do professor-orientador, locais onde possam encontrar a documentação de que carecem para a efectivação do mesmo.

Ganha, por isso, relevo o espaço destinado à biblioteca, que passará a ser o centro de documentação dai escola, donde as suas novas dimensões e, simultaneamente, o seu descongestionamento, mediante a criação de outras pequenas bibliotecas (nas salas de cotia disciplina). Quer dizer, há que utilizar intensivamente as escolas, pondo-as ao serviço dos alunos, dos professores e da colectividade em que estiverem integradas. Repare-se que, excepto quando funcione em desdobramento, a escola está fechada a maior parte do tempo, com desperdício das suas instalações e serviços.

Voltar a escola para o serviço da comunidade implica, nova arquitectura, com a criação de espaços acessíveis ao exterior, mas sem causar prejuízo a outras actividades que possam estar a decorrer. Deste modo, a escola irradia a sua influenciai, pondo à disposição de todos os seus campos de jogos, o seu ginásio e teatro, os seus anfiteatros, a sua biblioteca. 8a tivermos presente que, mercê do progresso tecnológico, o homem obtém mais tempo livre, que os alunos, em virtude do regime de desdobramento (e nas escolas primárias também existe o regime triplo), só frequentem a escola ou de manhã ou de tarde, damo-nos conta de que jovens e adultos estão disponíveis para malbaratarem o sou tempo ou para o aproveitarem em actividades "livres" que visam o desenvolvimento físico ou a actualizarão de conhecimentos ou até a promoção cultural.

Tal tempo, se devidamente aproveitado, permite "reciclagens" e "reconversões" escolares ou profissionais.

Penso em especial naqueles que, por motivos vários, abandonaram precocemente a escola, e que poderiam prosseguir seus estudos, criando, para os empregados, è semelhança do que se foz nas escolas técnicas, liceus nocturnos. A escola deve ser intensamente aproveitada, para bem da colectividade.

Deste modo, os liceus polivalentes (ou os actuais estabelecimentos do ensino técnico) serviriam de "apoio" às iniciativas locais, quer no campo cultural, quer no desportivo ou no recreativo, complementando o serviço prestado pelos pavilhões gimnodesportivos, que pena é não sejam mais numerosos (como é o desejo de todos os concelhos do distrito de Braga), e com utilização de toda uma infra-estrutura indispensável: material e humana. Impõe-se atrair mais jovens para as escolas de educação física, nas quais deveriam funcionar centros preparadores de orientadores de "actividades livres".

Em consequência do desenvolvimento do 1.º ciclo do ensino secundário e da criação dos liceus polivalentes, haverá maior número de alunos inscritos, sobretudo quando generalizados, isto é, quando, no ritmo normal das coisas, todo b ensino secundário passar a obrigatório, o que acarreta a localização de mais unidades escolares. Mas como, pela complexidade da sua estrutura, tais liceus não podem dispersar-se, haverá que garantir o acesso dos alunos através de uma rede de transportes escolares, privativa ou pública. O que é imprescindível é ter-se, dentro de uma área não muito grande, todos os tipos de ensino: do infantil ao superior. O distrito de Braga tem uma grande densidade de população, logo uma larga base de recrutamento estudantil, garantia de frequência das escolas que nele forem localizadas.

Mas, enquanto os liceus polivalentes não chegam, importa acorrer às necessidades culturais do meio: Fafe precisa de uma secção liceal, para a qual poderiam ser aproveitados os professores dá escola técnica e do ciclo preparatório (esboço do liceu polivalente); Vila Nova de Famalicão justifica a criação do 6.º ano na sua secção liceal, ao mesmo tempo que na sua escola técnica se deveriam criar novos cursos, de acordo com as indústrias montadas na sua área de influência (recordemos a existência da metalo-mecânica, da borracha, etc.); Guimarães, localizada no coração da indústria têxtil, precisa, pelo menos, e para já, de ver elevado a secundário o curso de auxiliar de tecelagem; Barcelos, com a sua indústria de confecções e com a sua maravilhosa cerâmica, anseia por ver instalados os cursos compatíveis; Braga, voltada para a electrónica, para os pistões e motores, para a metalo-mecânica, aspira igualmente ao enriquecimento do quadro dos seus cursos. E, para além destes cursos, progressivamente, ganham direito de cidade cursos de administração e de gestão; que num meio industrial e comercial como o de Braga (distrito) teriam perfeito cabimento.

E se de regionalização falamos, tenha-se presente a grande percentagem da população agrária, a pedir em Barcelos, em Braga e em Celorico de Basto escolas agrícolas (dó diversos graus). E é noticia em Braga e em Guimarães a localização nas suas zonas de um parque industrial, o que justifica amplamente ã criação de um instituto politécnico. Mas a estes pontos (ensino superior) se referiu já um meu colega.

Perante as novas condições do ensino, a tarefa do professor torna-se mais exigente, pois terá de ser "educador", seguro de si, para dialogar com os alunos. O professor, mais do que um transmissor, terá de ser o animador do trabalho dos seus alunos, o que implica disponibilidade, capacidade para aceitar o "outro" (o que implica a aceitação de si próprio), sentido de cooperação,

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domínio dos novas técnicos, conhecimento Bólido das matérias, que ensina e das leis da sua aprendizagem. As maiores exigências quanto a uma melhor formação dos educadores vai a par com a imperiosa necessidade de revalorizar a respectiva função, sem o que nos arriscamos a não ter os professores de que carecemos em quantidade e em qualidade.

Creio que é tempo de se tornar uma realidade vivida a verdade comezinha de que os vencimentos são para os docentes um meio sem o qual não podem pensar na sua actualização e aperfeiçoamento.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Remuneração compatível com a duração do seu curso e com a responsabilidade da sua missão, garantia de promoção, quer pelo tempo de serviço, que deve ser sempre (e para todos) contado a partir da data em que foi obtida a habilitação legal, quer por provas dadas no campo do ensino ou da investigação pedagógica. Esto último processo permitiria antecipar a concessão das diuturnidades.

Dignificar a carreira é atrair professores, é renovar a escola e, por esse facto, é contribuir para a sobrevivência nacional. A soberania de uma nação passa pela escola, onde se forjam os homens capazes de responderem ao desafio do nosso tempo e de prospectarem os caminhos do futuro.

Qual é, no entanto, o panorama docente?

No ensino primário houve necessidade de recorrer a pessoas sem grande preparação (geral e pedagógica) - os "regentes escolares". Apesar de entre eles haver dedicações, o caminho a seguir impõe a sua substituição, que deve, a curto prazo, ser realizada, depois de resolvidos os problemas morais e materiais que tal medida provoca.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - As crescentes necessidades de professores reclamam, para descongestionar a Escola do Magistério de Braga, a criação de uma nova escola, em Guimarães, porque pólo económico e escolar muito importante, a qual teriam, como a de Braga, um curso de "educadoras da infância".

No ensino secundário elevou-se extraordinariamente o número de professores eventuais, enquanto se assistia à progressiva desactualizarão dos quadros. Como medida de emergência, reduziu-se o estágio a um ano, com vencimento, permitiu-se a admissão apenas com concurso documental e, em certos casos, dispensa-se do próprio estágio. Quer dizer, a parte prática da formação do professor ... é considerada dispensável! Se alguns destes candidatos deram já provas como professores secundários, a porta foi igualmente aberta a quem nunca leccionou em tais estabelecimentos de ensino, dentro da errada presunção de que basta saber a matéria curricular para se ser professor. E, deste modo, entram no quadro professores com formação incompleta.

Para facilitar a admissão aos liceus dos eventuais, deveriam organizar-se cursos de férias, em que teriam os seus vencimentos, cursos esses orientados por professores de carreira, por inspectores e por professores universitários. Durante o ano de serviço organizar-se-iam colóquios e seminários. Esta prática pedagógica seria contada para qualificação de serviço e garantia de permanência, enquanto não entrasse no estágio. Naturalmente, estas medidas permitiriam a formação dos professores, enquanto o respectivo curso não for criado. Nesta mesma linha de conduta, um dos liceus do distrito poderia ser elevado & categoria de normal.

Assim como vai ser criado um Instituto Nacional de Pedagogia, importa desde já prever a. existência de serviços locais, com funções de informação, de documentação, meio de garantir a "formação permanente" do pessoal em exercício, e penhor de investigação e de melhoramento da acção pedagógica. Tais centros educativos, de âmbito distrital, teriam adstritas os "brigados" a que me referi e destinadas a cuidar da saúde, da orientação e da assistência escolares, exercendo a sua actividade sobre todos os alunos e professores, qualquer que fosse o seu grau de ensino. Igualmente, os pais poderiam utilizar os respectivos serviços, dado que a preocupação essencial do centro de educação será servir o aluno. O referido centro garantiria, verdadeiramente, a tão desejada "unidade educativa".

Em conclusão:

A situação escolar do distrito de Braga reclama:

1.º Alargamento da sua rede escolar (em todos os graus de ensino);

2.º Solução para o problema dos construções escolares, através de novas concepções arquitectónicas, e com a utilização do sistema de "concentração escolar" para o ensino primário;

S.0 Auxílio do Estado para a criação das infra-estruturas: transportes e assistência social;

4.º Regionalização do ensino, através da localização de cursos ou de estabelecimentos de ensino orientados para o desenvolvimento económico e social do distrito. Institutos politécnicos e de novas profissões;

5." Criação de uma nova escola do magistério primário, tendo anexa uma escola de educadoras da infância. Criação de um centro pedagógico regional.

O orador foi cumprimentado.

O Sr. António Lacerda: - Sr. Presidente: Na discussão da Lei de Meios para 1070 tive ocasião de referir alguns elementos que davam ideia do panorama agrícola do distrito de Viana do Castelo e da sua fraquíssima posição no conjunto da economia nacional e mesmo da de Entre Douro e Minho.

Permitir-se-á que na discussão deste oportuno aviso prévio retome o assunto e o ligue a aspectos novos da agricultura dessa região, que, infelizmente, desde lá até agora ainda não sofreu nenhuma alteração positiva para além da interessante inauguração do perímetro de emparcelamento de Estornos, possível símbolo das dificuldades da lavoura minhota, que nem a aplicação de vultosíssimos capitais consegue retirar das terríveis dificuldades com que se debate. E o emparcelamento foi uma esperança ...

São reais as dificuldades do Minho no que respeita à agricultura. Se não vejamos alguns números da sub-região litoral da zona de Planeamento Norte. E não pretendemos apresentar mais do que alguns elementos que adicionados a tantos outros que ilustres colegas e eu próprio tenho apresentado nesta tribuna, tragam à realidade, a visão clara, a Administração e até as populações locais, demasiado optimistas, por vezes, uns e outros quanto & verdadeira e segura realidade.

E esta é de que enquanto o distrito de Viana do Castelo só aufere 1,8 por cento do produto interno bruto, o de Braga detém 6,4 por cento e o do Porto 15 por cento.

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Quer dizer que a riqueza dos três distritos do Noroeste português se reparte muito desigualmente, mas talvez de acordo com a estrutura da população activa e que era na altura do último censo.

[...ver tabela na imagem]

Embora hoje seja com certeza muito diferente a distribuição da população pelos diferentes estratos e tenha diminuído substancialmente a percentagem de activos na agricultura e não banhamos elementos exactos, sabemos que essa tendência já vem de longe nos dois distritos, do Minho e que o decréscimo foi, em relação aos últimos censos de população, de:

[...ver tabela na imagem]

Ora, é do conhecimento geral que foi sobretudo ma década de 60 que se acelerou a emigração mo continente e assustadoramente no Norte, com incidência marcada no Minho, de agricultura empobrecida e indústria sem projecção.

Quando nos embevecemos com os encantos de Viana, das suas rabeiras e dos suas montanhas, do seu folclore, dos seus cantares, du sua garridice, talvez a maior parte não atente em algumas realidades que os números, com a sua frieza, indicam. Socorrendo-me sobretudo de elementos recolhidos pelo Prof. Engenheiro Agrónomo Castro Caldas, estabelecerei comparação, e novamente com os outras distritos da sub-região litoral, em relação às suas possibilidades potenciais.

A percentagem da superfície produtiva na superfície total é:

Braga 89

Porto 87

Viana do Castelo 78

O que coloca este último distrito em situação de nítido desfavor. Mas vejamos ainda mais elementos, agora respeitantes a percentagem da superfície improdutiva e inculturável na superfície total:

Viana do Castelo 19,7

Braga 7,2

Porto 4,2

Não quero continuar a maçar muito mais VV. Ex.ªs com a citação de números, e se o faço é não só para lembrar coisas que parecem esquecidas, mas que relatórios sobre relatórios contêm, como também como forma segura de apresentar um quadro que, mesmo no meu distrito, nem todos atentam e que, com o interesse que é posto no acompanhar atroavas da imprensa, a quem, presto a minha homenagem pela preocupação de dar uma visão geral dos problemas focados nesta Assembleia, desperte vontade de acção que tanta falta faz.

Apontando somente que no distrito de Viana as áreas e florestal são sensivelmente inferiores às dos restantes distritos do Noroeste, pretendo ainda referir que a percentagem, de superfície produtiva inculta na superfície total é como segue:

Viana do Castelo 22

Braga 12

Porto l

o que quer dizer que, enquanto o distrito do Porto está quase totalmente aproveitado, no de Viana ainda há mais de uma quinta parte susceptível de ser posta em produção. Enquanto o Porto, agrícola e florestal, necessita de aperfeiçoar-se nos seus métodos, em Viana, além disto - e é imenso! -, há ainda muita terra opta ao fomento de culturas e na qual haverá uma larga predominância de cultura florestal a implantar numa parte apreciável das áreas, e que a ela terão de ser dedicadas.

Vejamos agora a posição da indústria e analisemos, através de elementos referentes aos mesmos distritos da sub-região norte, a contribuição que ela traz para o seu desenvolvimento na criação de riqueza.

Comecemos por analisar os valores referentes ao capital fixo existente.

[...ver tabela na imagem]

O distrito de Viana do Castelo não valia industrialmente em 1957-1959 e em 1964 senão 1,9 por cento e 3 por cento do conjunto dos três distritos do norte litoral.

E isto com a gravidade enorme de se saber que em condições normais o progresso industrial alastra a volta das unidades existentes e que a aceleração desse mesmo progresso está particularmente ligada às empresas dinâmicas, que são factores de aceleração do progresso industrial e regional.

E não podemos pensar ter uma região globalmente forte sem um incremento substancial e rápido do equipamento industrial, que bem expresso nos elementos apresentados é dramaticamente baixo, too baixo que não julgamos possível a sua elevação sem uma intervenção decidida de forças externas que, apoiando as iniciativas singulares que vão despertando, e, ainda mais promovendo-as, se localmente não aparecem.

Ligado intimamente a este capital fixo está o valor liquido do produto obtido.

No seu conjunto, os valores líquidos da produção foram em 1957-1959 e em 1964:

[...ver tabela na imagem]

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Em percentagem, a situado do distrito é, em relação à região e nos anos indicados, respectivamente, 2,6 e 2,1 por cento, enquanto, nas mesmas condições, o distrito do Porto apresenta valores de 70,5 e 70,7 por cento e o de Braga 26,1 e 26,2 por cento. Isto é, além de em Viana ter decrescido o valor líquido da produção industrial, o que é muito triste e grave em todo o seu significado, ele é uma décima parte daquele que existe em Braga e mais do que trinta vezes inferior ao do Porto. Não vale a pena comentários, que como lágrimas de crocodilo, chorem esta terrível situação.

Mas ainda sou tentado a apresentar mais uns números que, ligados a evolução que se verifica na agricultura, ajudam a explicar a regressão demográfica real que no meu distrito se verifica e que se referem ao número de pessoas em serviço na indústria em 1957-1959 e 1964:

Entre Douro e Minho 137 958 171 005

Distrito de Viana do Castelo 4 400 3 968

Ou seja, em percentagem da mesma região 3,2 e 2,3 por cento, enquanto nos mesmos períodos no Porto sobe de 67,5 para 67,9 por cento e em Braga de 28,1 para 28,7 por cento.

O panorama agrícola e industrial que venho traçando é, sem dúvida, pouco animador e não deixa dúvidas de que o distrito de Viana tem sido tratado com muito desfavor pelos homens. E ao dizer isto não quero néon posso culpar ninguém, mas os factos, os números falam por si. E também não quero vincar razões, nem tentar atenuá-las, até porque não é isso que interessa, embrenhando-nos em caminhos melindrosos e, no fundo, com reduzido proveito.

O que interessará é abrir perspectivas para o futuro, enquadradas num ambiente humano receptivo e em condições materiais possíveis. De outra forma, iludindo-nos com sonhos ou ambientes de puras utopias, isso não. Pensando em coisas possíveis, que as populações possam compreender, aceitar e pelas quais se disponham, a lutar, e sem esta participação tudo é ilusório, então, sim, então haverá progresso, então haverá desenvolvimento.

Mas como sair desse desolador quadro de estagnação agrícola e industrial?

Em relação tanto a uma como a outra actividade, há uma constante comum, que está na base de todo o progresso.

A instrução profissional e educação da população, grande batalha que a Nação tem de vencer, com ânimo forte e vontade decidida. Queira Deus que o impulso magnífico que o Sr. Ministro da Educação Nacional propõe ao País, e pela forma que finalmente for adoptada, seja acarinhado e abraçado a todos os níveis, sem fantasias nem endeusamentos perniciosos, possibilitando uma aceleração do progresso material e social.

E esta condição, indispensável como é em qualquer região, avantaja-se quando se quer dar vida a actividades que tanto tem de pedir ao engenho e iniciativa daqueles que nelas intervém.

Até agora, no campo agrícola, os homens tem-se limitado a seguir os passos dos seus maiores, introduzindo, exemplarmente, em muitos casos, os alterações técnicas e tecnológicas que a ciência e a experimentação lhes demonstram. Mas chegados a este ano da Graça verificam, com profunda amargura e ansiedade, como já haviam notado e verificado antes, mas de forma menos angustiante, que não é suficiente aquilo que tem, ou que antevêem como possível, para ombrearem com os seus pares das outras profissões.

Há soluções que conhecem e que estão em falta, mas sentem que há necessidade de mais, de uma alteração que vá mais longe e que torne possível à grande massa dos produtos agrícolas a certeza de uma realidade melhor. E esta tem de ser preparada para o Entre Douro e Minho numa consciente alteração da sua estrutura, com incidência marcada nos aspectos legais da posse, usufruição e transmissão da terra, factor de produção, nos realidades sociais, nos condições do meio que vincula.

Ora, quanto as alterações de estrutura da propriedade e aspectos legais que influem na produção, pouco tem sido feito de útil, pois mesmo medidas há de certo interesse, embora um tanto desligadas da realidade, como, por exemplo, aquilo que é chamado "agricultura de grupo", que esbarram regionalmente com barreiras que não podem saltar nem destruir, com os campos apertados em belos e viçosos espartilhos.

Quero referir-me neste particular, com profunda amargura, a alteração da lei do plantio da vinha, indispensável à reconversão vitícola do Entre Douro e Minho, que já tratei largamente nesta Casa e que continua nas brumas do Olimpo! Ela terá não só de permitir como dor um forte incentivo a restruturação da fácies vitícola, manietada, enclausurada por uma lei anacrónica que a inércia teima em manter.

E as alterações de estrutura a fazer, e a Administração sabe-o muito bem, com certeza, pois através dos seus serviços deve estar em contacto com o caminhar dos assuntos, têm de visar fundamentalmente a criação de condições de implantação e vida a empresas agrícolas bem dimensionadas em terra e em meios, servidas por homens capazes de as conduzir na senda do progresso para além do actual período do adaptação a novas condições, aliás muito difícil de transpor.

Deixemos na prateleira a legislação ultrapassada de há poucos anos ainda, como, por exemplo, a lei do emparcelamento, ou então refresque-se, se se julgar que ainda vale a pena, e talvez valha, para ser aplicada com equilíbrio e sentido económico, mas enverede-se afoitamente pela criação de novas formas dinâmicas de associar os homens e as propriedades, dando-lhes interesse real pelo trabalho em conjunta. Por que não se criaram? Por que não se criam?

Mas há ambiente para isso, há receptividade da parte dos agricultores na procura de soluções que têm de ser encontradas no nosso meio, ou adaptadas do que outros já fizeram. Conheço casos no meu concelho de Ponte da Barca, em Ponte de Lima, nos Arcos, Viana, Valença, etc., ande senhoras e homens, e com que entusiasmo, debatem largamente os seus assuntos, que são os da comunidade, mas pouco mais encontram da parte da Administração, para além de palavras simpáticas, algumas vezes arrevesadas, promessas vagas, tão vagas mesmo que não convencem os mais atentos e porventura mais cépticos. E quase sempre a desculpa do muito que fazer, muito que fazer; falta de verbas ... e nada se vê! Mas sentem-se, gravemente, os desilusões que se acumulam. E até quando?

E tem de se viver, tem de se progredir, mesmo enquanto não são criadas melhores condições estruturais àquela bela região em que já se descrê na capacidade de realização dos homens, pois até os nossos pequenos são demasiado pequenos e o esforço rui o é suficiente para demover a inércia.

Sendo certo, como é, que agricolamente todo o distrito de Viana tem características bastantes semelhantes ao conjunto da região dos vinhos verdes, mas em que há um nítido predomínio dos terrenos socalcados de encosto,

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há problemas específicos que deverão ser encorados na sua concretização.

Uva deles, e que reputo dos principais, será a instalação rápida na região, possivelmente em Ponte de Lima, de um adequado matadouro industrial que serviria não só a magnífica zona de produção da ribeira Lima, como também, e em óptimas condições, boda a ribeira Minho e o planalto de Paredes de Coura e ainda, sem qualquer esforço, todo o vale do Cávado s inferior do Minho.

Uma comissão encarregada do estudo da, distribuição dessas unidades industriais de apoio a lavoura entendeu, e quanto a mós muito bem, que ali devia ser construído. Elementos que aqui já apresentei justificam-no plenamente. Localmente há todas as condições.

Outra infra-estrutura indispensável é uma central fruteira na mesma ribeiro Lima - talvez em Arcos de Valdevez, com boas condições geográficas em relação às zonas produtoras e boas estradas de ligação -, em que possam ser recebidas as frutas que os produtores, na sua ânsia inegável de melhorar, cultivam com muita esperança. Mas essa esperança só poderá traduzir-se em benéfica realidade se for amparada numa organização que os auxilie na vendo das suas belas frutas, de escoamento ao rico produto do seu labor.

Os produtores correspondem, em geral, da melhor maneira sempre que se lhes deparam possibilidades de obtenção de resultados animadores, e estes só são possíveis, e sobretudo perduráveis, se forem apoiados por organizações da lavoura capazes, responsáveis e apoiadas decididamente pelo Estado.

Durante anos - desde quando? - os maiores lucros foram sempre parar às mãos de outras actividades, em gemi simples intermediárias ou parasitárias que pululavam e ainda pululam numa organização económica em que os homens, como as terras, estavam distantes, onde a incultura e a falta de conhecimentos davam lugar a que medrasse a desconfiança para além das fronteiras do lugar, ou quando muito da freguesia. Os lucros, que não se acumularão em capitais reprodutivos nas zonas que criaram esses bens e nas actividades principais que lhes deram origem, têm de regressar em investimentos, comparticipações do Estado, que não dádivas, as zonas menos privilegiadas, que deles tanto carecem. Não serão mais do que actos de sã justiça distributiva, e no caso apontado de grande valor para a política, agrícola da região.

Ainda para melhor conhecimento técnico da agricultura da zona de meia encosta, aparentemente menos favorecida, sempre mais difícil e que, portanto, requer estudo mais atento, onde há frutos que vão bem e a pecuária pode ser incrementada, ou então terá de regressar à floresta, ou a um intensivo aproveitamento silvo-pastoril, é indispensável criar um centro de estudo bem apetrechado em meios humanos e materiais.

Os lavradores exigem dos técnicos soluções capazes e seguras e estas só são obtidas com segurança experimentando.

Creio que esse centro de estudo estaria muito bem localizado em Paredes de Coura, onde é preciso encontrar solução para esses problemas técnicos e económicos.

Supomos que as actuais adegas cooperativas, no futuro certamente cooperativas agrícolas polivalentes, e mais aquelas que a experiência aconselha criar, as cooperativas de fruticultores, as várias cooperativas existentes, a trabalhar Intimamente, apoiadas nas instalações que possuem e programando as novas, atendendo bem o condicionalismo futuro, serão o núcleo de uma organização regional em que todos podem participar. Embora a cooperação não seja uma panaceia, como a muitos incompreensivelmente se apresenta, ou querem fazer crer, ainda é a melhor forma de contrariar muitos desmandos, de firmar resistências salutares.

O Governo compreende-o, creio bem, mas custa-lhe bastante a demonstrá-lo!

Há um aspecto que também queremos apresentar e para o qual pedimos a atenção do Governo e que, como tantos outros em todo o panorama agrícola minhoto, e perdoem-me que incansavelmente o repita, se encontra ligado à tal alteração da lei do plantio da vinha.

A actualização da sub-região dos vinhos Alvarinho. Estes vinhos, produzidos em Monção, são um património legítimo daquela zona, são um valor real que ali se cria nas condições que os tornaram afamados em todo o País e no estrangeiro e que só não têm mais expansão em virtude da reduzida quantidade colhida. A sua protecção, a sua defesa, o seu fomento, devem ser assegurados, pois são um valor que interessa à sub-região de Monção e a todo o distrito. Com as suas características muito especiais, são um património que vale como demonstração da excelência dos vinhos verdes regionais de que este será o mais alto expoente.

Os aspectos que atrás foquei acerca da situação da indústria não quiseram ser mais do que uma chamada de atenção para as dificuldades que ali se encontram, na tentativa de fazer enveredar a região decididamente peia senda do progresso.

População activa, em declínio, agricultura com dificuldades, indústria como se viu, mas, por outro lodo, potencialidades inegáveis ligadas ao turismo que se incrementa no litoral e que se completará com o de montanha, a criar na zona serrana, em ligação estreita com a Espanha, através de S. Gregório e da ansiada fronteira do Linhoso, que é de justiça abrir, e ainda, sobretudo, o impulso enorme que poderá advir das indústrias a instalar, quando o melhoramento do seu ponto for uma realidade.

Mas para já bastariam aquelas que actualmente estão instaladas, ou em construção, para ao porto darem um movimento de exportação que justifica amplamente as obras que se projectam.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Contando somente com o quartzo e feldspatos de Ponte da Barca e Arcos, com os granitos de Ponte de Lima, com os caulinos de Viana, com os produtos de pasta e papel a exportar a partir do começo de 1973, haverá um movimento de exportação de, pelo menos, 250 000 t anuais.

Se a este grande volume juntarmos as actuais importações e exportações e a natural expansão que as facilidades portuárias criariam, pode bem considerar-se o melhoramento e ampliação do porto como alavanca cimeira no progresso da região. Mas o interesse é ainda maior pela sua natural ligação e facilidades de comunicação com grande parte do distrito de Braga, e mesmo de alguns concelhos de Vila Real com drenagem natural através de Viana e que através do seu porto poderiam realizar normalmente as suas transacções. E por que não? Por que é que Viana do Castelo não há-de ter um porto de mar em condições, se para isso condições tem?

O Governo não precisa que eu aqui, nesta altura, recorde as magníficas intervenções de ilustres Deputados pelo meu círculo, que já trataram deste mesmo assunto, ou me refira a relatórios e estudos que tem em seu poder, e que alguns também conheço. Quero recordar somente o notável despacho do Sr. Ministro das Obras Públicas e Comunicações, a quem presto as minhas agradecidas

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homenagens, aqui apresentado pelo distinto colega Júlio Evangelista, com a esperança segura de que os estudos que vão sendo iniciados, e que a Companhia Portuguesa de Electricidade acelerará ao máximo, com certeza, levem não só à regularização da bacia do Lima, como a rápida ampliação do porto da Viana da foz do Lima.

Todo este vale do Lima, melhorado com obras de cega e enxugo que permitam o aproveitamento integral das suas fertilíssimas veigas e também daquelas terras que podem ser recuperadas, e que silo muitas centenas de hectares, á zona de eleição para suporte de uma indústria com base no aproveitamento de produtos da tenra, tanto hortícolas como animais, já que os produtos silvícolas têm a sua drenagem assegurada através da fábrica de celulose em construção, e que vai ser grande impulsionadora do progresso regional, não só por esse escoamento que assegura, como também pelo fomento florestal que promoverá e riqueza que trará para o distrito.

Estou a chegar ao fim das considerações que me propus fazer e que não quero prolongar demasiado, embora tanto houvesse para dizer. Não desejo terminar, contudo, sem uma palavra de esperança, que os legítimos receios não chegam para toldar.

O desenvolvimento agrícola e industrial, que se prevê venha a ser próxima realidade com os impulsos a receber, há-de ser programado e acompanhado com o maior realismo de forma a colmatar, dentro do possível, os desequilíbrios estruturais existentes e, o que ainda é moas, a evitar que se ampliem.

O indispensável equilíbrio do desenvolvimento só pode ser fruto de harmonia das soluções encontradas e postas em prática, e essas devem não só atender aos aspectos materiais, como às realidades humanas e sociais da comunidade a que se destinam.

Mas tenho esperança nos homens da minha região, no conjunto de técnicos devotados que a servem e daqueles que constituem, a sua equipa de desenvolvimento, naqueles que, estudando e projectando, trabalham no planeamento regional. Mas quero dar um lugar de relevo ao homem notável, pela inteligência e visão, que vai orientar a comissão de planeamento da zona norte, e manifestar a esperança de que o Governo não deixará, com certeza, de apoiar, estimular, realizar - fazer justiça.

Por último, quero manifestar o meu muito apreço ao Sr. Deputado avisante, Prof. Nunes de Oliveira, dizendo-lhe quanto irmanados nos sentimos no melhor, como no pior, dos nossos dois distritos que o nosso Minho uniu.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vou encerrar a sessão.

Antes, quero recomendar e pedir a VV. Ex.ªs que releiam muito atentamente os §§ 1.º, 2.º e 5.º do Artigo 22.º do nosso Regimento. E anuncio que amanha haverá sessão, à hora regimental, tendo como andem do dia a continuação do debate do aviso prévio sobre os aspectos culturais, económicos e sociais do distrito de Braga.

Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 40 minutos.

Fernando Artur de Oliveira Baptista da Silva.
Fernando David Laima.
Henrique Veiga de Macedo.
José Dias de Araújo Correia.
José Vicente Pizarro Xavier Montalvão Machado.
Manuel Artur Cotta Agostinho Dias.
D. Maria Raquel Ribeiro.
Olímpio da Conceição Pereira.
Rafael Ávila de Azevedo.
Rafael Valadão dos Santos.
Ramiro Ferreira Marques de Queirós.
Rogério Noel Feres Claro.
Rui Pontífice Sousa.
Teófilo Lopes Frazão.
Tomas Duarte da Câmara Oliveira Dias.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alexandre José Linhares Furtado.
Amílcar Pereira de Magalhães.
Antão Santos da Cunha.
Carlos Eugênio Magro Ivo.
Deodato Chaves de Magalhães Sousa.
Fernando de Sá Viana Rebelo.
João Paulo Dupuich Pinto Castelo Branco.
Joaquim Germano Pinto Machado Correia da Silva.
Jorge Augusto Correia.
José Guilherme de Melo e Castro.
José da Silva.
Luís Maria Teixeira Pinto.
Manuel José Archer Homem de Mello
Manuel Marques da Silva Soares.
Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

O REDACTOR - Januário Pinto.

Requerimentos enviados para a Mesa durante a sessão:

Nos termos regimentais, requeira que, pela Presidência do Conselho, me sejam fornecidas as seguintes publicações oficiais:

1) Estatísticas de Turismo - 1969. Continente e ilhas adjacentes;

2) Estatísticas do Comércio Externo. Continente e ilhas adjacentes -1969;

3) Estatísticas da Educação - ultima publicação.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 4 de Fevereiro de 1971. - O Deputado, Teodoro de Sousa Pedro.

De acordo com os termos regimentais, requeiro que me sejam fornecidas as seguintes publicações:

a) Relatório de 1962-1968 da Secretaria Provincial de Economia (Angola), 3 volumes, edição do Governo-Geral de Angola;

b) História da Cartografia Portuguesa, pelo Prof. Armando Cortesão, edição da Junta de Investigações do Ultramar.

c) O Povoamento da Metrópole Observado através dos Censos, pelo Dr. F. Marques da Silva, edição do Instituto Nacional de Estatística.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 4 de Fevereiro de 1971. - O Deputado, Joaquim Jorge de Magalhães Saraiva da Mota.

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Requeiro que me sejam fornecidas as seguintes publicações:

1) Ao Compasso da Renovação, 1968-1969, pelo Dr. Gonçalves Rapazote, edição do Ministério do Interior;

2) História da Cartografia Portuguesa, pelo Prof. Armando Cortesão, edição da Junta de Investigações do Ultramar.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 4 de Fevereiro de 1971. - O Deputado, Francisco Manuel Lumbrales de Sá Carneiro.

De acordo com o disposto no Regimento da Assembleia Nacional, requeiro que me seja enviada a seguinte publicação: ...

História da Cartografia Portuguesa, pelo Prof. Armando Cortesão, edição da Junta de Investigações do Ultramar.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 4 de Fevereiro de 1971. - O Deputado, João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.

IMPRENSA NACIONAL

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